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UNIVERSIDADE FEDERAL DO SUL E SUDESTE DO PARÁ

INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS


FACULDADE DE HISTÓRIA

ANA LUCIA LOPES RAMOS

HISTÓRIA DE VIOLÊNCIA NO MANICÔMIO COLÔNIA EM BARBACENA/MG


(ano de 1930 ao ano de 1980)

MARABÁ
2023
ANA LUCIA LOPES RAMOS

HISTÓRIA DE VIOLÊNCIA NO MANICÔMIO COLÔNIA EM BARBACENA/MG,


(1930-1980)

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à


Faculdade de História do Instituto de Ciências
Humanas da Universidade Federal do Sul e
Sudeste do Pará, como requisito para a
obtenção do Grau de Licenciatura em História.

Orientador: Dr. Reginaldo Cerqueira Sousa

MARABÁ, 2023
AGRADECIMENTOS

A realização desse trabalho de conclusão de curso contou primeiramente com a ajuda


de Deus que me concedeu vida e ânimo para prosseguir e de várias pessoas, as quais quero
aqui fazer meus agradecimentos:
Ao meu orientador – Prof. Dr. Reginaldo Cerqueira Sousa, que desde a elaboração
do projeto se dedicou e aceitou o desafio de me orientar.
Aos meus professores do curso, representados na pessoa do professor Dr. Giovanni
Cabral, que durante esses anos, me ajudaram com seus ensinamentos para que hoje eu
pudesse chegar até a realização desse trabalho.
A todos que contribuíram com as pesquisas, direto e indiretamente.
A minha família, em especial minha filha Amanda Ramos a minha maior inspiração
na realização dessa pesquisa e mina incentivadora, à minha sobrinha Rebeca Ramos que
também me encorajou e me aconselhou a prosseguir.
Aos meus colegas por compartilharem comigo conhecimento.
RESUMO

Este trabalho objetivou abordar o acontecimento histórico de práticas de violência


manicomial ocorrido no Hospital Colônia de Barbacena/MG, destinado ao tratamento de
pessoas com transtorno mentais que, a partir da negligência, corrupção, abandono do Estado e
outros fatores como o preconceito contra pessoas consideradas “loucas”, tornou-se local onde
métodos de violência eram aplicados em pacientes e justificados como práticas psiquiátricas,
baseando-se nos conceitos de higienização societária e eugenia, com intuito de segregar não
apenas a doentes, mas todos considerados incômodos sociais. Por meio de pesquisa
qualitativa e revisão bibliográfica, realizou-se uma contextualização da história da psiquiatria
no Brasil, analisando os aspectos dos tratamentos a saúde mental, abordando a sua aplicação
entre o ano de 1930 e o ano de 1980, fatores que levaram a instauração do Hospital Colônia.
O objetivo geral dessa pesquisa foi detalhar como o manicômio se tornou um dos maiores
marcos de violência hospitalar já registrado no país, enfatizando os métodos de violência
realizados no hospital, seu impacto na vida dos internos, a repercussão nacional da situação, o
encerramento e o legado deixado pelo hospital, concluindo-se na necessidade da reforma
psiquiátrica.

Palavra-chave: História. Loucura. Violência Manicomial. Psiquiatria.


SUMMARY (refazer)

This work aimed to address the historical event of practices of asylum violence that occurred
at the Hospital Colônia de Barbacena/MG, intended for the treatment of people with mental
disorders who, based on negligence, corruption, abandonment of the State and other factors
such as prejudice against people considered “loucas”, became a place where methods of
violence were applied to patients and justified as psychiatric practices, based on the concepts
of societal hygiene and eugenics, with the aim of segregating not only the sick, but all
considered social nuisances. Through qualitative research and bibliographic review, a
contextualization of the history of psychiatry in Brazil was carried out, analyzing aspects of
mental health treatments, approaching its application between the year 1930 and the year
1980, factors that led to the establishment of from Colonia Hospital. The general objective of
this research was to detail how the asylum became one of the biggest landmarks of hospital
violence ever recorded in the country, emphasizing the methods of violence carried out in the
hospital, its impact on the lives of the inmates, the national repercussion of the situation, the
closure and the legacy left by the hospital, concluding in the need for psychiatric reform.

Keyword: History. Craziness. Manicomial Violence. Psychiatry.


LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

OMS Organização Mundial da Saúde


LBHM Liga Brasileira de Higiene Mental
CHPB Centro Hospitalar Psiquiátrico de Barbacena
FEAP Fundação Estadual de Assistência Psiquiátrica
HCB Hospital Colônia de Barbacena
CPB Código Penal Brasileiro
CAPS Centro de Atenção Psicossocial

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1. Mulheres na ala feminina


Figura 2. Paciente bebendo esgoto
Figura 3. Pacientes despidos de roupas no pátio
SUMÁRIO (refazer)

1. INTRODUÇÃO---------------------------------------------------------------------------------09
CAPÍTULO I-----------------------------------------------------------------------------------------11
2.1 Histórico do tratamento psiquiátrico no Brasil---------------------------------------------11
2.2 A questão da loucura----------------------------------------------------------------------------
11
2.3 Origem da abordagem psiquiátrica no Brasil------------------------------------------------16
2.4 O tratamento manicomial-----------------------------------------------------------------------
20
CAPÍTULO II----------------------------------------------------------------------------------------23
3.1 O HOSPITAL COLÔNIA DE BARBACENA----------------------------------------------
23
3.1 A cidade dos loucos-----------------------------------------------------------------------------23
3.2 A origem dos internos---------------------------------------------------------------------------
28
3.3 O cotidiano do hospital Colônia---------------------------------------------------------------33
CAPÍTULO III ---------------------------------------------------------------------------------------
38
4.1 MÉTODOS DE TRATAMENTOS NO NOSPITAL COLÔNIA-------------------------
38
4.2 Características do tratamento do psiquiátrico do HCB-------------------------------------38
TERAPIAS UTILIZADAS-------------------------------------------------------------------------
38
4.3 Violência como tratamento psiquiátrico------------------------------------------------------
42
4.4 A VIOLÊNCIA MANICOMIAL E A REFORMA PSIQUIÁTRICA-------------------44
4.5 ATUAÇÃO DO CAPS NA ASSISTÊNCIA A SAÚDE MENTAL----------------------
49
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS------------------------------------------------------------------50
REFERÊNCIAS-------------------------------------------------------------------------------------54
9

1. INTRODUÇÃO (refazer)

A atenção psiquiátrica e assistência à loucura atravessaram os séculos e se


estabeleceram nas diferentes sociedades em suas peculiaridades e contextos. Nos últimos
séculos, a atenção psiquiátrica foi pautada na instituição hospitalar – o modelo asilar. Com
base nisso, a nossa pesquisa parte do início da situação da questão da saúde mental no Brasil,
onde, inicia-se com a criação do Hospício de Pedro II em 1852, inaugura-se o modelo
manicomial no país. Desde o início das civilizações, por conta do preconceito, as pessoas com
algum grau de adoecimento mental carregam um estigma de periculosidade, incapacidade e
inutilidade. Partindo desse pressuposto, nos propomos abordar em nossa pesquisa; práticas de
violência manicomial contra pessoas com adoecimento mental no Brasil, no século XX (ano
de 1930 a 1980), para tal, foi necessário revisitar os marcos históricos correspondentes ao
assunto, fazendo um apanhado da história dos manicômios no Brasil, bem como a história da
psiquiatria desde o seu nascimento como especialidade médica.
Para tal pesquisamos as diferentes práticas de violência aplicadas aos internos do
manicômio Colônia-hospital psiquiátrico na cidade de Barbacena, Minas Gerais, o qual foi
caracterizado como hospital dos loucos.
A escrita desse material justifica-se, primeiramente, pela necessidade de
reafirmarmos a importância de uma sociedade sem manicômios. Para tanto surgiu o interesse
pelo tema. Com isso, buscamos repostas para os seguintes questionamentos: como a loucura
foi vista ao longo da história? Como era a atenção voltada para as pessoas que eram
consideradas loucas? Como se dava o tratamento às essas pessoas com as práticas do modelo
asilar de assistência? Havia retorno do tratamento dessas pessoas à sociedade? Há motivo
aparente para cessar a liberdade de um sujeito, retomando as práticas do modelo asilar de
assistência? Como se deu e como se concretizou o processo de reforma psiquiátrica? Esses
questionamentos foram o ponto de partida para o desenvolvimento desse trabalho.
Para desenvolver a nossa pesquisa foi necessário percorrer os caminhos pelos quais a
saúde mental se desenvolveu através dos anos, quando essa denominação de cuidado à
loucura sequer existia. Para desvendar quais foram as práticas utilizadas nesse processo e
quais as queixas desses modelos assistenciais. Apresentamos uma revisão dos acontecimentos
históricos que dizem respeito à atenção à loucura e que antecederam a Reforma Psiquiátrica
no Brasil; analisar os fatos de cunho histórico e político que levaram à mobilização e
participação social para que seja possível repensar o paradigma psiquiátrico; inferir sobre a
10

importância dos movimentos de transformação da psiquiatria e redirecionamento dos modelos


assistenciais em saúde mental.
Devido ao recorte temporal de nosso tema, optamos pela pesquisa bibliográfica,
utilizando-se também outros elementos, como artigos acadêmicos, dissertações e documentos
públicos, relacionados a história dos manicômios no Brasil (ano de 1930 ao ano de 1980), à
reforma psiquiátrica.
Para contribuir com nossa pesquisa utilizamos as contribuições de Michel Foucault,
com suas considerações à loucura na idade clássica. Para esse filósofo, a loucura não está
relacionada ao biológico de uma pessoa, e nem recebe influência da natureza, mas está
intimamente relacionado a cada momento da história e de acordo com a cultura dos
indivíduos. Nilo Odália, conceituando diferentes tipos de violência, documentos públicos que
tratam de criação de leis voltadas as pessoas com adoecimento mental, a Jornalista e
documentarista Daniela Arbex, com seu trabalho intitulado “o holocausto brasileiro”, bem
como Duarte, Fullin, dentre outros autores que tratam da questão da violência praticada dentro
de outros manicômios no Brasil. Nos apropriamos de outras leituras, bem como o acesso do
vídeo documentário “em nome da razão” produzido por Helvécio Ratton -1979, vídeo
documentário “Holocausto Brasileiro” produzido pela jornalista e documentarista Daniela
Arbex -2016, com o intuito de analisar depoimentos das pessoas que foram internadas,
torturadas e que tiveram seus direitos violados, bem como relatos de ex-funcionários do
colônia, médicos psiquiátricos, pesquisadores, relatos de sobreviventes e depoimentos de
outros agentes que testemunharam o tipo de tratamento dado aos seres humano dentro do
manicômio colônia.
Os depoimentos que ouvimos através dos vídeos documentários analisados como
fontes históricas, demonstram que houve muita crueldade e extrema violência
institucionalizada, onde governantes e sociedade foram coniventes com as barbáries
cometidas contra seres humanos. Um passado recente, mas que pouco se fala sobre tal
crueldade que causou dor e deixou marcas em quem vivenciou esse período obscuro da
história do manicômio Colônia em Barbacena, Minas Gerais.
No capítulo um, realizamos um apanhado geral do que se constitui a loucura, e como
essa era vista no decorrer da história e de que forma se dava o tratamento aos doentes mentais.
Apontamentos de como estes foram vistos no Brasil durante o século XX. Abordaremos fatos
sobre o adoecimento mental e seus tratamentos, além da evolução da psiquiatria através dos
anos, mediante estudo de autores de referência na área, tendo como objetivo detalhar como e
11

quando dentro desse período histórico houve o reconhecimento da necessidade de abertura


dos manicômios.
No capítulo dois, descrevemos o nosso objeto de pesquisa (o hospital Colônia) onde
destacamos como se dava o tratamento aos internos, desde a sua abertura, descrevendo o
perfil desses internos e os motivos que os levaram a internação, bem como os profissionais
que atuavam no hospital e suas práticas, fatos ocorridos no local, a visão sociopolítica que o
hospital tinha a época, casos de corrupção, e as práticas ocorridas no hospital que marcaram a
história da psiquiatria brasileira, destacando-se acontecimentos da rotina dentro do colônia.
No capítulo três, detalhamos o tema proposto, utilizando-se de bases teóricas de
registros históricos do hospital Colônia, abordando as práticas realizadas pelos profissionais
do referido hospital, que tornaram o local conhecido por sua violência hospitalar. Trago
alguns relatos de violência praticadas contra os internos do Colônia, a partir de depoimentos
de sobreviventes e de testemunhos constantes no livro e no vídeo documentário “Holocausto
Brasileiro” da jornalista Daniela Arbex e do vídeo documentário “Em nome da Razão” do
documentarista Helvécio Ratton, de quem vivenciou uma das maiores barbáreis da história
do Colônia, o resultado exposto as consequências dessas práticas e a sua influência na
implementação da reforma psiquiátrica no Brasil, a partir dos anos de 1970.
Conhecer a história de violência praticada dentro de manicômios por meio da
pesquisa bibliográfica, nos possibilitou não só pensar historicamente, mas refletir sobre a
importância do trabalho de pesquisar para esclarecer processos e acontecimentos de nossa
história. Entender as ações de homens e mulheres no decorrer desses processos e buscar uma
resposta sobre os problemas que nos despertara. Reconhecendo-se a importância da pesquisa
bibliográfica, como indispensável para a realização de estudos históricos.
O hospital colônia viveu uma história de aniquilamento de 60 mil vítimas. Pessoas
tristes, introvertidas, epilépticas, alcóolatras, homossexuais, prostitutas, meninas que
engravidaram dos patrões, esposas repudiadas por seus maridos, moças que perderam sua
castidade antes do casamento, crianças rejeitadas pelos pais por terem nascido com algum tipo
de deficiência. Os depoimentos que ouvimos através dos vídeos documentários nos levam a
refletir sobre como a sociedade é cruel e pouco se sabe sobre um passado tão cruel e cheio de
marcas que ainda causam dor a quem os vivenciou nessa história.

2 CAPÍTULO I – HISTÓRICO DO TRATAMENTO PSIQUIATRIO NO BRASIL


12

Neste capítulo será analisado a abordagem dos transtornos mentais no início do


século XX no Brasil, tendo em vista o contexto social da época que categorizava
psicopatologias como “loucura”. Também será descrito como essa abordagem influenciou o
desenvolvimento do tratamento psiquiátrico no país, tendo como um dos métodos de
intervenção o encaminhamento manicomial.

2.1 A questão da loucura

Registros de adoecimentos mentais constam por toda a história da civilização


ocidental. Na Grécia antiga, por exemplo, a filosofia gerou estudos sobre as divergências
sociais ocasionadas por alterações comportamentais, algo que não havia explicação na época.
O que era visto como fora dos padrões sociológicos foi considerado anormal em essência, o
ser diferente e incontrolável, o “louco” na visão dos cidadãos. A partir do que consta em
registros longínquos, o doente mental era posto à margem da sociedade.

A loucura está aí, neste mundo indomado. Designa o que não é razão triunfante. É
categoria sociológica e antropológica, não psicológica (embora tenha aí
representação), muito menos psicopatológica (embora possa por aí se cristalizar).
Enquanto fenômeno é sempre na subjetividade e no comportamento dos indivíduos
que podemos encontrá-la, mas inúmeros fenômenos podem estar referidos a uma
categoria que os explique, e não é por expressar-se no individual que exija para
explicar-se uma categoria psicológica. (SAMPAIO, 1998, p. 86).

A compreensão da loucura tem passado por diversas fases dentro da história. Na


antiguidade pré-clássica, as doenças eram explicadas como resultantes da ação sobrenatural, a
partir de 600 a.C., os filósofos gregos trouxeram a idéia da loucura. No começo da Idade
Média, o tratamento dispensado aos “alienados”1 era de apoio e conforto. Até que na Idade
Moderna aconteceram mudanças em tais conceitos, a partir desse momento, o doente mental
passou a ser visto como um possuído pelo mal. Dessa forma, o tratamento, antes, humanitário,
foi substituído pela violência física e mental, privação de alimentos, aprisionamento, entre
outros métodos, com a intenção de expurgar dos doentes a possessão demoníaca (LOPES,
2001).

1
Estado mental consequente a uma doença psíquica em que ocorre uma deterioração dos processos cognitivos,
de caráter transitório ou permanente, de tal forma que o indivíduo acometido se torna incapaz de gerir sua vida
social.
13

O termo psicopatologia é mais adequado, tendo em vista que essa condição é


caracterizada por pensamentos e atitudes tidos como anormais para a sociedade, logo sendo
visto como resultado de algum transtorno mental. Algumas visões sobre a loucura defendem
que o sujeito pode não ter doenças da mente, sendo apenas vítima do julgamento da
população, conforme as regras sociais vigentes. No Artigo 149, havendo dúvida acerca da
integridade mental de um acusado, poderiam ser tomadas medidas legais para a realização de
um diagnóstico mediante o qual haverá tratamento especializado. De acordo com o decreto, o
réu deve ser julgado de acordo com sua capacidade mental, ou seja, não poderia ser julgado
da mesma forma que as pessoas sem indícios de adoecimentos mentais.2
Também está disposto pela nossa Constituição Federal de 1988, o Estatuto da Pessoa
com Deficiência, que garante os direitos civis a todos que apresentam variados tipos de
transtornos mentais, além de possibilidades de ingresso ao trabalho formal, mediante suas
capacidades. As pessoas com transtornos mentais devem ser tratadas de modo que se percebam
acolhidas e valorizadas no seu modo de ser ouvidas e reconhecidas em suas necessidades e vontades,
inclusive em seu próprio projeto de tratamento de modo a permitir e promover melhorias em sua vida,
ou seja, é reconhecida como sujeito de direitos e lhe é garantido por lei o acesso a cidadania e
tratamento equitativo, entretanto, sabe-se que ainda existe diversos paradigmas sobre o trato
com o doente mental dentro dos ciclos sociais., que vão desde o preconceito, descriminação e
segregação dentro dos ciclos sociais. O doente mental ainda é tido como o incapacitado, o
incomodo para determinados grupos.
Com o estatuto da pessoa com deficiência fora possível garantir direitos antes não
contemplados³. E que somente a partir de 2015 as pessoas com adoecimento mental passaram
a ser asseguradas a viver em uma sociedade mais justa e humanitária. O estatuto assegura que
a pessoa com algum grau de adoecimento mental deve ser protegida contra toda a forma de
negligência, de crueldade e de exploração. Não deve ser submetido a tráfico, seja de que tipo
for. Não deve permitir-se que o deficiente mental trabalhe com o fim único de produzir, mas
que o trabalho assuma fins ocupacionais, como processo de terapia e de utilidade para o
deficiente e para a sociedade que o deve proteger. Não deve, em nenhum caso, ser obrigado
ou autorizado a ter uma ocupação ou um emprego que lhe prejudique a saúde ou a autonomia,
ou que impeça o seu desenvolvimento físico, mental ou moral.
O que percebemos é que a lei (nº 3.689 ) anterior ao estatuto da pessoa com algum
tipo de doença mental só tinha reconhecimento de sua sanidade mental dentro do código penal

2
BRASIL. Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941.
³Lei nº 13.146/2015.
14

brasileiro e que uma vez diagnosticado com algum adoecimento mental era encaminhado para
os manicômios para fins de tratamento, o qual não lhe assegurava cura.
Analisando a compreensão da loucura a partir das falhas culturais da sociedade
(religiosidade, medo generalizado, preconceito) podemos considerar a abordagem do filósofo
Michel Foucault (1978) sobre o tema, em seu livro “História da Loucura na Idade Clássica”,
um marco importante. Nele, o filósofo descreve não apenas o significado da loucura, mas a
sua designação às pessoas, e como ela impacta a realidade do indivíduo. A abordagem
descrita por Foucault, influenciado pelo filosofo alemão Friedrich Nietzsche, faz uma
genealogia da loucura com um novo modo de analisar o insano, ou seja, não será por uma via
médica especulativa e neurológica e nem mesmo por uma via psicológica, mas sim, por uma
ótica, da qual, busca-se a raiz da patologia mental na história das relações humanas
(CAMARGO, 2004).

É sob a influência do modo de internamento, tal como ele se constituiu no século


XVIII, que a doença venérea se isolou, numa certa medida, de seu contexto médico
se integrou, ao lado da Loucura, num espaço moral de exclusão. De fato, a
verdadeira herança da lepra não é aí que deve ser buscada, mas sim num fenômeno
bastante complexo, do qual a medicina demorará para se apropriar. Esse fenômeno é
a Loucura.” (FOUCAULT 1972 apud CAMARGO 2004, p. 8).

De acordo com Guilherme Gonzaga Duarte Providello e Silvio Yasui, (2013, p.


1516), Foucault estudou a loucura em busca de analisar a exclusão dos corpos. Seu objetivo
era identificar as tecnologias dessa exclusão que se operou sobre o louco e qual a lógica por
traz desse ato. O filósofo tinha a consciência que a questão da loucura estudada em sua época
tinha o viés segregador e limitante do ser, visando o afastamento social mediante a diferença
do ser “louco” dos demais membros da sociedade.
Então, enquanto filósofo e analista da história, Foucault sabia que a vivência da
pessoa com transtornos mentais não se resumia apenas a sua doença, e existia maneiras de não
apenas adequação deste ao seu ambiente inserido como a compreensão de todos sobre sua
realidade, assim havendo a possibilidade de convivência em comum:

Foucault se nega a criar um conceito de loucura. Para ele, importa o que é entendido
como “o louco”, o que as diferentes sensibilidades em relação à loucura podem fazer
para alterar a situação dessa exclusão. Em sua análise das tecnologias de exclusão da
loucura, o pensador se concentra em uma questão muito importante: para ele, a
loucura se caracteriza estritamente pela forma como a sociedade experimenta,
vivencia essa relação com a loucura. Ele recusa qualquer ação do saber sobre a
loucura, qualquer patologização ou conceituação, preocupando-se principalmente
com a lógica da exclusão do louco, com as tecnologias que o retiram da sociedade.
(PROVIDELLO; YASUI, 2013, p. 1516).
15

Foucault trouxe uma leitura sobre o tema mais empática e consolidador a pessoa com
adoecimento mental frente a sociedade. Suas análises sobre as questões da loucura humana
notaram que os padrões do adoecimento advêm também da vivência pessoal, não só da
doença como aptidão. A questão dos transtornos mentais, a partir desses estudos, apontam que
além da doença mental advir ao ser assim como a doença física, por meio da
imprevisibilidade e fatores hereditários, a ocorrência de traumas e outros fatores sociais
causam ao indivíduo o adoecimento, que é tão comum quanto diversos adoecimentos físicos.
A loucura só existe em cada homem, porque é o homem que a constitui no apego que
ele demonstra por si mesmo e através das ilusões que alimenta. O apego a si próprio é o
primeiro sinal da loucura, porque o homem se apega a si próprio, aceitando o erro como
verdade, a mentira como a realidade, a violência e a feiura como a beleza e a justiça.
(FOUCAULT, 1972, p. 30).
Mesmo com a compreensão acerca da loucura para além do transtorno, persistiu um
marcador social enviesado de preconceito. Sabe-se que a saúde mental não é vista,
atualmente, como parte integrante do quadro de adoecimentos comuns ao ser humano. A
compreensão social sobre o adoecimento mental ainda é marcada por estigmas, noções
deturpadas do que se trata e tem caráter segregador, onde separam-se o que convive com a
doença daquele tido como “normal” a sociedade vigente. Até mesmo a condição em si é
invalidada, mesmo pertencente ao corpo humano, muitos acometimentos como a ansiedade e
a depressão não são vistos como doenças reais, por não prejudicarem o corpo de forma
visível.
Diante dessas concepções, torna-se difícil a compreensão da doença mental como
realidade na vida dos cidadãos assim como as demais doenças físicas, o que interfere na
autoaceitação do indivíduo acometido pelo adoecimento e em seu acolhimento familiar e
comunitário, já que, sem o devido reconhecimento, a pessoa com transtornos mentais é
invisibilizada como cidadão e em casos extremos, marginalizada, posta em posição de
incômodo a sociedade e é inserido em uma consciência geral de segregação, tornando-se
minoria, assim como outros grupos societários, e não tendo acesso a mesma vivência e
garantia de direitos que os indivíduos tipos como “comuns” e “úteis” a vivência social.

Então é possível pensar que saúde mental e doença mental são conceitos que
emergem da noção de bem-estar coletivo. Anormal é uma virtualidade inscrita no
próprio processo de constituição do Normal, carecendo, portanto, de instrumental
médico, psicológico, filosófico, sociológico, antropológico, econômico e político
para ser compreendido. (SAMPAIO, 1998, p. 88 apud SAMPAIO, 1988)
16

As diferentes deduções sobre a pessoa adoecida permaneceram pelo imaginário


popular como perigoso, asqueroso, gerando a intenção de afastamento social e impregnou-se
não apenas no saber comum, como nas áreas de responsabilidade como profissões e
profissionais que estão, direta ou indiretamente, ligados a questão da loucura, especificamente
na medicina. Alguns profissionais do núcleo médico, científico, administrativo e outros, que
tem ligação a loucura no que tange ao tratamento e aproximação para manutenção da
sociedade também, baseados na visão social, perpetuam a segregação de pessoas com
transtornos mentais. Tornando, desta maneira, o louco como uma ferida heterogênea, um mal-
estar contínuo perante a sociedade moderna, que é racionalista, higienista e classista. Eliminar
estes elementos não sociáveis era a constituição do sonho burguês. O internamento seria
assim a eliminação espontânea dos ‘a-sociais’. (CAMARGO, 2004 apud FOUCAULT, 1972,
p. 79).
Apesar dessas colocações, para entendermos todos esses processos envolvendo o
tema proposto vale considerar a existência da psiquiatria, uma das especialidades da medicina
desenvolvida desde V a.C., que é destinada ao estudo e tratamento mental em suas variedades,
sendo a porta de entrada para a compreensão do adoecimento mental. Para compreensão dos
fatos, apesar dos registros sobre o adoecimento mental e tentativas de tratamento datarem de
tempos tão remotos, os primeiros avanços nos estudos sobre a loucura no mundo civilizado
partiram do progresso científico realizado no século XVIII, com os estudos realizados pelo
médico francês Philippe Pinel (1745 – 1826)3, considerado o pai da psiquiatria, que instituiu
reformas humanitárias para o cuidado com os doentes mentais. No caminho do grande
desenvolvimento científico do século XIX, a medicina se firmou como uma ciência. A
psiquiatria, deixando, assim como a medicina, o campo da filosofia, veio a se firmar como
ciência médica algumas décadas mais tarde (MACHADO, 2009). Retorno novamente à
questão da loucura na história.
Vale destacar também que, dentro das pesquisas científicas atuais, o termo “louco” e
“alienado” é desatualizado para tratar pessoas em condição mental excepcional, para a
Organização Mundial da Saúde - OMS, por exemplo, o transtorno mental é entendido como
uma combinação de pensamentos, percepções, emoções e comportamento anormais, que
também podem afetar as relações com outras pessoas, onde faz-se necessário o atendimento
médico seguro, contínuo e eficaz para tratamento e/ou controle, visando trazer qualidade de
vida a pessoa com esse tipo de adoecimento, seja ela possível de cura ou não.
3
Nascido na França, foi médico e zoologista que se destacou no campo da psiquiatria.
17

2.2. Origem da abordagem psiquiátrica no Brasil

Segundo Jurandir Freire Costa (2007), até meados do século XIX, não havia opções
de tratamento médico para os acometidos por transtornos mentais no Brasil. Quem sofria com
perturbações mentais era considerado “vagabundo” e perturbava a ordem pública, era comum
que qualquer indivíduo que demonstrasse alguma inadequação ao que era considerado
“normal” a época, fosse visto a margem da sociedade, chegando a ser detido pela polícia ou
mantido em celas especiais de hospitais como a Santa Casa de Misericórdia.4
Em 1830, tem-se o primeiro registro de interesse ao tratamento psiquiátrico a partir
da junta de médicos autodenominados criadores da Sociedade de Medicina do Rio de Janeiro.
Esses médicos tinham a intenção de, além de outras intervenções de higiene pública, dar
início a asilos especiais para as pessoas tidas como loucos ou doentes mentais. Para fomentar
a opinião pública, os médicos criticavam abertamente a postura do tratamento fornecido pelos
hospitais com a Santa Casa e o trato social que pessoas com acometimentos mentais recebiam
por viverem nas ruas, marginalizados e abandonado por suas famílias, de acordo com
(COSTA 2007) ao invés de celas insalubres dos hospitais gerais e dos castigos corporais, os
médicos advogavam pela necessidade de asilos higiênicos e arejados, onde os “loucos”
pudessem ser atendidos segundo os princípios do tratamento moral.
Em 1841, foi fundado, a partir do decreto do Imperador Dom Pedro II do Brasil 5
(1825 – 1891), o primeiro hospital psiquiátrico brasileiro, Hospital Dom Pedro II, inaugurado
em 1852.6 Embora os doentes mentais tenham sido direcionados a este hospital, a liderança do
local era confiada aos religiosos da Santa Casa de Misericórdia. Após diversas mudanças na
direção, promulgações de mandatos a respeito do tratamento psiquiátrico, além da instauração
da república, entre os anos 1881 a 1890, o Hospital Dom Pedro II passou a chamar-se
Hospital Nacional dos Alienados, e a administração, antes cedida a Santa Casa, foi
direcionada a tutela do Estado. O governo Campos Sales (1898–1902), em 1899, impôs
drásticas reduções orçamentarias a assistência psiquiátrica, que começou a degradar-se.

4
Fundado em meados do século XVI, o hospital é uma instituição filantrópica de assistência médico-hospitalar
do Rio de Janeiro, que continua suas atividades desde a fundação até a atualidade.
5
Pedro de Alcântara João Carlos Leopoldo Salvador Bibiano Francisco Xavier de Paula Leocádio Miguel
Gabriel Rafael Gonzaga de Bragança e Bourbon, filho do Imperador Dom Pedro I e da Imperatriz Dona Maria
Leopoldina, foi o segundo e último monarca do Império do Brasil, tendo imperado no país durante 58 anos.
6
Localizado no Rio de Janeiro e conhecido como o “Hospício Pedro II”, foi o primeiro hospital psiquiátrico do
Brasil e segundo da América Latina. Após irregularidades na administração e superlotação, os pacientes foram
realocados e o hospital foi desativado em 1944, o prédio do hospital atualmente está sob os cuidados e uso da
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
18

Como relata Jurandir Costa Freire (2007, p. 40), em 1902, foi instaurado um
inquérito no Governo Rodrigues Alves (1902 - 1906), onde revelou-se que: “O Hospital
Nacional é simplesmente uma casa para detenção de loucos, onde não há tratamento
conveniente, nem disciplina, nem qualquer fiscalização”. A partir desse fato, Rodrigues Alves
decidiu reformular a assistência psiquiátrica, alterando a administração do hospital e
promulgando a primeira Lei Federal de Assistência aos Doentes Mentais, em 1903.7
Em 1912, a psiquiatria tornou-se especialidade médica autônoma e até 1920, ocorreu
um aumento no número de estabelecimentos destinados aos doentes mentais. Em 1927, o
governo de Washington Luís cria o Serviço de Assistência aos doentes mentais do Distrito
Federal, encarregado pela administração de todos os estabelecimentos psiquiátricos, o que
culmina na incorporação ao Ministério da Educação e Saúde, obedecendo a tendência
centralizadora do governo surgido após a revolução de 1930. Com o Decreto Nº 24.559 de 3
de julho 1934 promulgou- se a Lei Federal de Assistência aos Doentes Mentais, que tornava
obrigatório:

a) Proporcionar aos psicopatas tratamento e proteção legal;


b) Dar amparo médico e social, não só aos predispostos a doenças mentais
como também aos egressos dos estabelecimentos psiquiátricos;
c) concorrer para a realização da higiene psíquica em geral e da profilaxia das
psicopatias em especial. (BRASIL, 1934).

Com o estabelecimento da Liga Brasileira de Higiene Mental, em 1923, pelo


psiquiatra Gustavo Riedel e filantropos, houve o interesse inicial de melhorar a assistência aos
doentes mentais através da renovação dos quadros profissionais dos estabelecimentos
psiquiátricos no Rio de Janeiro. A Liga era uma entidade civil, de reconhecida utilidade
pública, que funcionava com a subversão federal. Até 1925, a Instituição seguia as intenções
de Riedel em aperfeiçoar a assistência a doentes, até que, em 1926, os psiquiatras vinculados
a Liga passaram a elaborar projetos que visavam a prevenção do adoecimento de indivíduos,
ou seja, havia o pensamento de levar o tratamento psiquiátrico a pessoas consideradas
“normais”.
Os médicos passaram a se interessar apenas na prevenção de pessoas “civilizadas” e
não na cura dos já possuidores de transtornos, ou seja, negligenciando quem realmente
necessitava de tratamentos.

Para Juliano Moreira, a psiquiatria tinha se limitado a reproduzir o discurso teórico

7
Decreto nº 1.132, de 22 de dezembro de 1903.
19

da psiquiatria francesa e seguir a prática ditada pelo pessoal leigo ou religioso,


encarregado da administração dos hospitais. Juliano Moreira e seus discípulos
tentaram transformar esta situação, inaugurando uma psiquiatria cujo fundamento
teóricos, práticos e institucionais constituíam um sistema psiquiátrico coerente.
Todavia, por falta de tradição cientifica mais sólida, este empreendimento não vai
atingir seus objetivos.” (COSTA, 2007, p. 41- 42)

Havia a dificuldade em relação à delimitação do campo da psiquiatria em virtude da


fragilidade entre o pensamento racional e científico, além do senso comum datado da
realidade brasileira no início do século XX. Apesar do avanço jurídico e institucional da
psiquiatria, a sua abordagem ainda era permeada por preconceitos da época. Os psiquiatras
tinham a tendência a associar os problemas psiquiátricos aos a problemas culturais em geral.
Para eles, os fenômenos psíquicos e culturais explicavam-se, pela hipótese de uma
causalidade biológica que, por sua vez, justificava a intervenção médica em todos os níveis da
sociedade. (COSTA, 2007, p. 42)
A problemática dessa afirmação é que, os propósitos precursores da psiquiatria na
época não seguiam apenas aos conceitos de estudos do tema, mas também eram influenciados
pelas instituições sociais vigentes, ou seja, o pensamento que limitava a doença mental ao
biologismo era datado dos preconceitos e, em vista disso, tinha caráter eugenista. 8 A aplicação
da psiquiatria no período tinha o interesse de limpar a sociedade, esse pensamento eugenista
fazia com que os profissionais usassem conceitos biológicos como afirmadores de seus
dogmas, pois a cobertura semântica lhe servia para a justificação de preconceitos, portanto,
era de base ideológica, não científica.

Em resumo, a história da psiquiatria brasileira criou uma atmosfera psiquiátrica


saturada de conotações ideológicas. A LBHM herdou esse tipo de pensamento,
reforçando-o e desenvolvendo-o, graças à incapacidade que tiveram seus
psiquiatras em discriminar aquilo que, nas suas teorias, era determinado pelos
preconceitos da cultura. (COSTA, 2007, p. 43).

Em continuidade, vale destacar que as pesquisas históricas sobre a psiquiatria no


Brasil se detiveram, majoritariamente, no período que se inicia com a criação do primeiro
hospício brasileiro (1852) até meados dos anos 1930. Neste último período, observa-se ao
menos três eventos importantes para a história da assistência psiquiátrica no Brasil. Além da
criação do Instituto de Psiquiatria da Universidade do Brasil (IPUB) e a transferência do
locus de produção de saber do hospício para o espaço universitário, destaca-se a criação do
Serviço Nacional de Doenças Mentais e a formulação do Plano Hospitalar Psiquiátrico para a

8
Crença na melhoria da qualidade genética da população. Uma das justificativas para a existência da eugenia é a
de que as raças humanas consideradas superiores prevalecem no ambiente de maneira mais adequada.
20

União, ambos em 1941 (CASSILA; VENANCIO, 2010, p. 2).


Durante esse período, houve o desenvolvimento de uma política assistencial
psiquiátrica “forte”, no sentido do planejamento e implantação de diretrizes modernizadoras
de organização do próprio Estado, frente ao problema da assistência aos doentes mentais,
visando constranger o fluxo de pacientes de outros estados para os grandes centros urbanos da
região sudeste, em particular o Distrito Federal, o qual, historicamente, acolheu os então
alienados de diferentes regiões do país. Na justificativa das ações terapêuticas a serem
implementadas nas novas instituições, encontrava-se menção as mais modernas técnicas de
tratamento: sejam as mais “científicas”, ancoradas numa visão orgânica do paciente e balizada
por estudos e análise de casos clínicos, seja as de cunho mais socializante, como a
praxiterapia e a assistência hetero- familiar. (CASSILA; VENANCIO, 2010, p. 4).
A partir dessas afirmações sobre o histórico do desenvolvimento da psiquiatria no
Brasil, cabe-se entender a sua aplicação, a partir dos locais de atendimento e tratamento, tidos
primeiramente como asilos e após, manicômios.

2.3 O tratamento manicomial

No século XVIII, Phillippe Pinel propôs uma forma de tratamento aos doentes
mentais abandonando os tratamentos desumanizados e transferindo-os para manicômios, onde
eram destinadas a pessoas com transtornos psíquicos. Várias experiências e tratamentos foram
desenvolvidos e difundidos pela Europa naquele período, com influência da visão de Pinel
sobre a reeducação das pessoas em tratamento, baseado no respeito às normas sociais vigentes
e desencorajando condutas consideradas inconvenientes. Para Pinel, a função disciplinadora
do médico e do manicômio deve ser exercida com firmeza, porém com gentileza, o que
demonstra o caráter do tratamento moral com o qual a loucura passa a ser trabalhado.
Com o pioneirismo de Phillippe Pinel no tratamento psiquiátrico, que tinha o intuito
de libertar os doentes mentais do aprisionamento com intuito de apagamento da vivência da
pessoa com deficiência mental, os asilos foram substituídos com o decorrer dos anos, em
vários países, pelos manicômios, que são estabelecimentos ou hospitais psiquiátricos
especializados em tratar pessoas com problemas mentais. A partir disso, foi desenvolvido
várias formas de tratamento nos hospitais La Bicêtre e Salpêtrière 9 que se difundiram da
França para o resto da Europa. Entretanto, como efeito mais direto da segregação do louco via
internamento, o que se tem e, principalmente, a invenção social da alienação através do
9
Hospitais tradicionais localizados em Paris, França, existentes desde o século XVII.
21

isolamento dos excluídos em ambiente estranho, não familiar, portanto, alienante.


(SILVEIRA; SIMANKE, 2009, p. 28).
O tratamento no manicômio, de acordo com Pinel, deveria ser de reeducação do
paciente, implicando respeito às normas e desencorajamento de condutas inconvenientes. A
função disciplinadora do manicômio e do médico deveria ser exercida com equilíbrio entre a
firmeza e gentileza. Além disso, o constante contato do médico com os pacientes traria
melhorias ao seu conhecimento como profissional, aprendendo e cooperando na compreensão
e desmistificação de sintomas e evolução da loucura. (LOPES, 2001).
O método de tratamento moral de Pinel fora modificado pelos profissionais
especializados em lidar com a saúde mental e o sentido do tratamento humanizado e gentil
esvazia-se. A ideias de controle e disciplina aos hábitos dos doentes permanece, porém com
viés segregador e limitante, incluindo medidas físicas de tratamento como duchas, banhos
frios, chicotadas, máquinas giratórias e sangrias, com o intuito de aquietar o paciente,
deixando de lado a intenção de tratamento para recuperação para medidas imediatas de
silenciamento e controle físico. Neste período, foi demonstrado os primeiros indícios de que o
tratamento manicomial serviria para limitar doentes mentais aos permanecê-los em locais
específicos e novamente, os tratando a margem da sociedade, aos serem retirados dela e
controlados em locais especializados.
O acesso ao tratamento manicomial foi designado aos doentes mentais desde o
princípio do tratamento psiquiátrico no país, sendo afirmado no decreto nº 1.132, de 22 de
dezembro de 1903, que reorganiza a “Assistência aos Alienados”:

Art. 1º O indivíduo que, por moléstia mental, congênita ou adquirida, comprometer


a ordem pública ou a segurança das pessoas, será recolhido a um estabelecimento
de alienados.
§ 1º A reclusão, porém, só se tornará efetiva em estabelecimento dessa espécie,
quer público, quer particular, depois de provada a alienação. (BRASIL, 1903)

A partir de então, tornou-se comum a internação de doentes mentais em manicômios


institucionais, como medida de tratamento. Porém, com o tempo, não somente os acometidos
com transtorno mentais era internado, houve também a prática de internação de pessoas
consideradas “loucas” por violarem os acordos sociais, como a moral da geração vigente a
época. No século XVII já existiam hospitais para os excluídos socialmente, grupo constituídos
pelos doentes mentais, criminosos, mendigos, inválidos, portadores de doenças venéreas e
libertinos.
22

Os internamentos eram efetuados sob as mais diversas formas: através de cartas


régias, de encaminhamentos policiais, de solicitações de familiares ou por pedido
das curas paroquiais. A multiplicidade de critérios e de apelos para internação
gerava uma fauna heterogênea de internados, podendo ser eles, por exemplo: pobres,
desempregados, criminosos, prisioneiros políticos, prostitutas, usurários, sodomitas,
crianças órfãs, mulheres viúvas, ateus, vagabundos, epilépticos, senis, alquimistas,
blasfemadores, sacrílegos, regicidas. Dentre eles, apenas dez por cento eram
internados por insanidade. De tal maneira que o internamento se configurava mais
como um dispositivo de exercício de poder, através do isolamento dos excluídos
sociais do que enquanto medida na diferenciação dos diversos tipos de
subjetividades e na constituição diferenciada da categoria médica do louco.
(SILVEIRA; SIMANKE, 2009, p. 28)

Como destaca Janis Alessandra Cassilia e Ana Teresa A.Venâncio (2010) em sua
pesquisa, existem narrativas que ampliam significativamente a compreensão historiográfica
sobre esses espaços, de sua constituição em tempos passados até a contemporaneidade,
abrindo questionamentos acerca dos limites do saber e do poder psiquiátrico e,
especialmente, acerca dos sujeitos que os ocuparam. Para os autores, os manicômios
passaram a ser usados como um espaço de poder, de elaboração de saberes relacionados
com a gestão e o disciplinamento da população, e não como um espaço de cura do doente
mental e compreensão da doença, e nesse sentido, pela forma como se emergiram e se
instrumentalizaram durante os séculos XIX e XX, não teriam representado nenhum avanço
em termos científicos, não tendo os médicos uma autoridade fundada em parâmetros
científicos, mas sim em uma ordem ética dominante. (CASSILIA; VENANCIO, 2010, p.
252)
Quando pesquisamos as condições em que os internos dos manicômios eram
submetidos, logo entramos em um processo de profunda reflexão sobre as instituições
psiquiátricas criadas no Brasil, pois não correspondiam, em suas práticas, com um tratamento
condizente a seres humanos. Ao fazermos diferentes leituras sobre o tema, aponta-se que os
locais usavam de torturas e punições físicas como métodos de tratamento, visando preservar a
ordem social e evitar que a loucura fosse disseminada para a sociedade. Este pensamento era
equivocado em essência, mas foi disseminado pelos profissionais e gestores das instituições, e
aceitos pela sociedade daquele período.

Arquivos sombrios em todos os sentidos: no sentido físico, das suas materialidades


arquitetônicas; no sentido metafórico, das suas materialidades incorpóreas reveladas
na efemeridade de gritos de dor e de medo, na transitoriedade dos momentos de
encontros e desencontros, no instante mínimo que divide a vida da morte, na linha
tênue que separa o normal do patológico, o são do insano, a vítima do algoz, o
médico do monstro [...]. (GODOY, 2014, p. 4)

Nesta perspectiva, entende-se que o sofrimento e a dor dos internos fazia parte da
23

realidade dos manicômios. Em algum momento da história do tratamento psiquiátrico dentro


de manicômios houve o consenso de que a loucura era um estado de inconsciência
relacionada a um aspecto mental, capaz de ser controlado através da repreensão física,
compreensão que era usada como justificativa para o preconceito existente contra os alienados
que era impregnado a sociedade. Como anteriormente citado, os dogmas sociais eram
justificados por viés pseudocientíficos dos psiquiatras da época, o que autorizava a aplicação
de diferentes práticas de violência contra os internos com o intuito de buscar a cura ou ao
menos, o controle dos loucos.
Ao analisarmos as propostas contidas no Plano Hospitalar Psiquiátrico, observa-se
que a estrutura hospitalar privilegiada e implementada como tipo padrão pelo
SNDM foi o hospital-colônia. Dentre os 20 estados brasileiros (incluindo-se o
Distrito Federal) 14 deles são citados como aqueles que deveriam ser contemplados
com a construção ou ampliação de hospital-colônia ou colônia. Esse modelo
institucional defendido desde os anos de 1910 por Juliano Moreira, era reafirmado
nos anos 40 e 50 do século XX como “padrão”, tanto no sentido de parecer ser
considerado o que havia de mais adequado ao tratamento de doentes mentais, quanto
no sentido do incentivo sistemático que é dado à sua reprodução. (CASSILA;
VENANCIO, 2010, p. 3)

Era dentro deste contexto histórico que se encontrava o doente mental hospitalizado.
Enquanto população específica, os loucos tiveram a perda de sua autonomia e tornaram-se
vulneráveis não só em decorrência da própria doença que os afetava, mas também pela
situação de violência que sofriam dentro dos manicômios. Ao serem indivíduos
institucionalizados, com famílias omissas, em situação de abandono social, a pessoa doente
passava a existir em uma realidade diferente, enclausurada e a margem da civilização, em
situação de maus tratos permitida pelos profissionais que atuavam em seu tratamento.
Nesta perspectiva de manicômio, enquanto perpetuador de violências justificadas
como tratamento a doentes mentais, buscamos compreender como tais instituições se
mantiveram por longo tempo como lugares de aprisionamento e apagamento de sujeitos e suas
memórias, tendo como tema principal de abordagem o maior caso de negligência e violência
hospitalar no Brasil, ocasionado no Hospital Colônia de Barbacena, fundado em 1903, no
Estado de Minas Gerais, Brasil.

3 CAPÍTLO II – O HOSPITAL COLÔNIA DE BARBACENA


Rever todo
Neste capítulo será descrito a abertura do Hospital Colônia de Barbacena/MG e suas
características, também a origem dos pacientes, com a intenção de contextualizar o início
24

deste marco histórico. Localizado em Barbacena Minas Gerais, também conhecido como
hospital Colônia.

3.1 A “cidade dos loucos”

A cidade de Barbacena, em Minas Gerais, fora fundada em 1791, e situa-se a 169


quilômetros da capital do estado, Belo Horizonte. Possui o título de “Cidade das Rosas”
devido à grande produção de flores para comercialização na localidade, e é nacionalmente
conhecida pelo apelido “Cidade dos Loucos”, por ter sido berço de 7 hospitais psiquiátricos
de 1903 a 1990, entre eles o mais conhecido, Hospital Colônia de Barbacena.
Segundo registros constantes no livro “Holocausto Brasileiro” historiadores analisam
que os motivos que levaram Barbacena a ser referência manicomial no país deriva-se de a
cidade ter sido preterida na escolha para ser a capital de Minas Gerais. Por não possuir
recursos hídricos satisfatórios, o título foi fornecido a cidade de Belo Horizonte e, como
prêmio de consolação, Barbacena ficou a cargo de inaugurar o primeiro “Hospital para
Alienados” do estado.
Houve uma crença, defendida por alguns médicos no início do século XIX, que o
clima ameno da cidade de Barbacena, com temperaturas médias de 17ºC e umidade de 73%,
valores baixos para os padrões tropicais brasileiros, influenciavam no tratamento de pessoas
com doenças mentais, fazendo com que estes ficassem mais calmos e passivos, supostamente
facilitando o tratamento psiquiátrico. Daniela Arbex e Armando Mendz retratam em seu vídeo
documentário, o vislumbre que se tinha do clima de Barbacena:

[...] O final do século 19 em Barbacena é marcado por um mito que se cria na


cidade, e no Brasil como um todo, de que aqui (Barbacena) havia um clima todo
especial, clima serrano. Ele era o oposto daquele momento em que o Rio de
Janeiro/RJ era tido como uma cidade insalubre, das grandes febres, das grandes
epidemias. Então, de certa forma, a elite do Rio de Janeiro, que era a capital do
Brasil até então, começa a descobrir em Barbacena um lugar pra se tratar. E não é só
das doenças respiratórias, das doenças clínicas, as chamadas doenças nervosas,
começam a ter espaço no antigo sanatório, que é o ancestral do Hospital Colônia
[...]. (ARBEX; MENDZ, 2016)

Havia uma instituição anterior ao Hospital Colônia de Barbacena chamada Sanatório


de Barbacena, Casa de Veraneio e de Repouso, inaugurado em 1889. O Sanatório de
Barbacena, que era de iniciativa privada, dedicava-se ao tratamento dos “nervos” e
posteriormente, tuberculose. Direcionado a um público de classe alta, o local recebia pessoas
“sãs” e “loucas”, que recebiam atendimento médico especializado e repouso, como um hotel
25

para doentes. Por ser destinado a tratamento da alta sociedade brasileira, o sanatório possuía
uma grande estrutura e área territorial, de cerca de 8 mil metros,² localizado nas terras da
Fazenda da Caveira, que pertenceram a Joaquim Silvério dos Reis (1759-1819) 10 – o delator
da Inconfidência Mineira. Além disso, os pacientes dispunham de acesso ferroviário especial,
autorizado pelo governo estadual, com parada de trens da Estrada de Ferro Central do Brasil
próximos a instituição.
O chamado “trem de doidos”, pela população de Barbacena, era um vagão específico
com grades nas janelas utilizado somente pelos pacientes. Edson Brandão pesquisador,
ratifica o sanatório da seguinte maneira:

“[...] O antigo sanatório, que funcionava nos prédios que hoje compreendem a
Assistência aos Alienados, era um lugar de muito requinte, com talheres de prata,
com menu muito charmoso, todo em francês, ele tem uma linha de trem exclusiva
para atender essa clientela [...]. Então, é uma história paradoxal, ela começa com
requinte, de um spa de luxo para pessoas ricas, que depois foi adquirido pelo
governo do estado de Minas Gerais, e ao longo do século XX se tornou no terrível
Hospital Colônia de Barbacena [...]”. (ARBEX; MENDZ, 2016)

Com a falência do Sanatório de Barbacena, no início dos anos 1900, o local foi
adquirido pelo governo do estado de Minas Gerais, que a época dava início a “Assistência aos
Alienados” a partir da lei nº 290, de 16 de agosto de 1900, que autorizada em seu artigo 1º e
2º a criação da Assistência de Alienados, a qual seria responsável pela instalação e
administração de hospícios (MINAS GERAIS, 1900). Em 12 de outubro de 1903 aconteceu a
inauguração do primeiro hospital psiquiátrico de Minas Gerais, o Centro Hospitalar
Psiquiátrico de Barbacena – CHPB, financiado pela Fundação Estadual de Assistência
Psiquiátrica (FEAP), com a intenção de receber pacientes, chamados de “alienados”, antes
atendidos pela Santa Casa de Misericórdia e Instituto Philippe Pinel, localizados no Rio de
Janeiro/RJ, e pacientes sem vínculos familiares que vivam no antigo sanatório de Barbacena.
Localizado no antigo sanatório, a instituição era um extenso prédio com 16 pavilhões
independentes de cerca de 1.500 m² cada, tendo cada um deles a sua função específica, como
por exemplo: Pavilhão "Zoroastro Passos" e “Arthur Bernardes” para mulheres indigentes;
Pavilhão "Antônio Carlos" para homens indigentes; Pavilhão "Milton Campos", para
trabalhadores; entre outros como o Pavilhão "Afonso Pena", Pavilhão "Rodrigues Caldas" e
Pavilhão "Júlio Moura”, que eram dispostos em forma de um grande retângulo, conectados
entre si, como um casarão de fazenda. O espaço era fechado e distante da população
10
Joaquim Silvério dos Reis Montenegro Leiria Grutes foi um coronel português e comandante do Regimento de
Cavalaria Auxiliar de Borda do Campo, além de um dos colaboracionistas responsáveis por delatar os
inconfidentes mineiros, dentre eles, Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes.
26

barbacenense, com prédios compostos por enfermarias, oficinas, lavanderias e cozinhas, com
alas especiais para práticas terapêuticas, além de praças, pátios, capela e necrotério, a
estrutura do novo hospital foi organizada com a capacidade para 200 leitos.
A nova instituição (HCB) contava com escolta policial, ônibus para transportar os
pacientes e um vagão específico para os indivíduos que seriam internados considerados
loucos.
Com a abertura do local, também foi inaugurado o cemitério da Paz, destinado ao
sepultamento dos pacientes.
Sobre o cemitério, o Dr. Jairo Toledo, ex-diretor do CHPB, declarou no
documentário “Holocausto Brasileiro”:

“O cemitério (da Paz) era uma cultura de que os loucos não poderiam ser sepultados
próximo as pessoas normais. Assim como os suicidas e os negros, também os loucos
tinham que ter um local para sepultamento. Pouco depois da criação do hospital, em
1903, já se fazia sepultamento no cemitério do cascalho, depois Cemitério da Paz,
foi mudado o nome, esse cemitério é criado praticamente junto com a criação do
hospital [...]” (ARBEX; MENDZ, 2016)

Entende-se aqui que, desde o início do CHPB, havia o entendimento da falta de


recuperação e alta dos pacientes, prevendo-se a morte de pessoas durante a internação. Sobre
esse fato, Brandão declarou: “[...] é muito estranho você pensar um hospital que já tinha
acoplado a ele um cemitério, porque a expectativa do hospital não era curar, era levar essa
vida até onde fosse possível até finalmente sepultá-la [...]”. (ARBEX; MENDZ, 2016)
Sob direção do Dr. Joaquim Antônio Dutra, o hospital atendia pensionistas, pessoas
pertencentes às classes abastadas, pessoas enviadas por familiares que não tinham como
custear o tratamento e indigentes, por vezes enviados pela polícia civil, provenientes de várias
localidades brasileiras. Em sua grande maioria, a clientela de internos do CHPB era formada
11
por “anormais” ao padrão societário, enviado ao hospital mesmo sem diagnóstico e contra a
vontade do paciente, já que, segundo Costa (2007, p. 43), o pensamento eugenista, difundido
pela Liga Brasileira de Higiene Mental, considerava todos aqueles portadores de transtornos
psíquicos como degenerados, o que se unia ao pensamento popular a época, que não entendia
o conceito de psicopatologias, vendo-os apenas como “loucos” que precisavam ser afastados
do ambiente social.

11
¹¹Lei criada pelo decreto n. 206 – A de 15 de Fevereiro de 1890.
¹² Lei nº 290, de 16 de agosto de 1900.
27

Nesse sentido, o CHPB tomou popularidade pelo país ao contribuir com uma espécie
de limpeza social, ao tirar os loucos do convívio societário e inseri-los numa vigilância estatal
segregadora, sem a intenção de cura e retorno a liberdade.
Concepção confirmada pela lei de Assistência aos Alienados¹¹, que em seu artigo 3º
define a seguinte autorização: “No prédio que for destinado ao hospício haverá, além das
acomodações precisas, um pavilhão para observação dos indivíduos suspeitos, um gabinete
eletro-terápico e oficinas, quando necessárias e a juízo do governo.”¹². Com o conceito de
“suspeito” pode-se entender que aquele sem transtornos mentais comprovados poderia ser
internado no CHPB mediante interesse público, o que dava margem a pessoas que se
encaixavam na visão preconceituosa da época, do louco que atrapalha a normalidade de
outros indivíduos. Esses subjugados tinham espaço para análise de sua situação já dentro do
CHPB, com internação imediata e consequentemente, afastamento social.
CHPB tornou-se referência nacional em psiquiatria, sendo procurado por diversas
famílias que buscavam tratamento para seus "desajustados". Com a adesão popular, a procura
do hospital não apenas para consultas e tratamento, mas também internação, o hospital
excedeu a capacidade planejada de internos, já que “a cada duas consultas e meia, uma pessoa
era hospitalizada” (ARBEX, 2013, p. 31). Dessa forma, em 1911, houve a necessidade de
tornar o CHPB em um “Hospital Colônia”, isto é, a instituição dali em diante abrigaria grupos
de indivíduos para tratamento contínuo, o espaço tornou-se a moradia dos internados, para
tratamento médico e acompanhamento integral, além de acesso a lazer e trabalho.
Durante os primeiros 30 anos de funcionamento, o Hospital Colônia de Barbacena
oferecia atendimento humanitário aos pacientes, mesmo dispondo de métodos populares,
porém pouco eficientes em termos de tratamento e cura. Tendo a aceitação nacional, o
Hospital Colônia passou a ser um ponto de convergência para todos os pacientes que as
comunidades pretendiam curar ou isolar, ou seja, a instituição passou a ter uma grande
demanda de doentes mentais, pessoas portadoras de IST’s12, tuberculosos e marginalizados. O
Dr. Jairo Toledo descreveu: “[...] no primeiro momento no hospital, as coisas funcionaram de
uma forma diferente. Ele cumpria seu papel baseado na medicina francesa, pelo menos até a
década de 30, que é o que sempre digo, a partir do Estado Novo 13, o ‘Regime Forte’, as coisas
começaram a complicar dentro da instituição [...]”. (ARBEX; MENDZ, 2016)
Antes desse período, ainda em 1924, a superlotação já havia se tornado um problema
constante a ser enfrentado pela administração do Hospital Colônia de Barbacena. A
12
Infecções Sexualmente Transmissíveis.
13
Terceira República Brasileira, foi a ditadura brasileira instaurada por Getúlio Vargas em 10 de novembro de
1937, que vigorou até 29 de outubro de 1945.
28

medicalização e a “psiquiatrização” de doentes mentais e de indivíduos inseridos na categoria


de “anormais” tornou-se igual e já não havia mais distinção de tratamento, devido a
precariedade de recursos e falta de equipe médica especializada para a quantidade alarmante
de pacientes. Mesmo assim, o fluxo constante de novos pacientes não foi interrompido, com o
tempo, a falta de critério médico para as internações tornou-se rotina no lugar onde se
padronizava tudo, inclusive os diagnósticos. (ARBEX, 2013, p. 29)

O Hospital passou por uma mudança radical: os leitos eram insuficientes e a


escassez de recursos financeiros, materiais e principalmente humanos, tornaram-se
graves problemas. O tratamento dispensado aos pacientes passou a ser desumano e
degradante, atingindo elevadas taxas de mortalidade. O Hospital tornou-se mero
depósito de doentes, entreposto de comércio de cadáveres, Barbacena ganhou o
estigma de “Cidade dos Loucos”, e o problema foi se arrastando sem soluções a
curto prazo. (BORGES, 2017)

Em 1930, o hospital projetado para 200 pacientes possuía 5 mil pessoas internadas.
Com o processo de sucateamento do serviço oferecido pelo Hospital Colônia, o fator protetivo
e psiquiátrico da instituição se perdeu, o local passou a ser administrado a partir da
precarização do atendimento psiquiátrico, desvio de verbas, falta de fiscalização, descaso com
pacientes e consequentemente, violação dos direitos humanos. No documentário “Em Nome
da Razão” (1979) realizado com filmagens originais da instituição, o cineasta Helvécio Ratton
descreve o hospital da seguinte maneira:

‘[...] Devemos compreendê-lo como uma instituição que cumpre um papel


determinado em nossa sociedade. O hospital psiquiátrico funciona como um
depósito. Para cá (Hospital Colônia) vem os improdutivos de alguma maneira geral,
os inadaptados, os indesejáveis e os desafetos. Todos aqueles que por um ou outro
motivo se desviam daquilo que chamamos normalidade. Através do hospício, a
sociedade exclui os que não se adaptam a um sistema baseado na competição [...]’.
(RATTON, 1979)

O Hospital Colônia de Barbacena passou a ser descrito como um instrumento


mantenedor da ordem pública ao invés de um ambiente de tratamento e cura de enfermidades
mentais. Os problemas institucionais passaram a ser evidentes devido à falta de aumento de
recursos financeiros para custear o serviço “inflado” pela superlotação, uma série de
improvisações para prover os cuidados com os pacientes foram aderidas ao tratamento
oferecido. Má administração, incapacidade de fornecer tratamento adequado, sem corpo
médico suficiente, corrupção e contrabando de suprimentos, medicamentos insuficientes,
entre outros fatores, passaram a fazer parte da realidade do Colônia. “A teoria eugenista, que
29

sustentava a ideia de limpeza social, fortalecia o hospital e justificava seus abusos.” (ARBEX,
2013, p. 30)
Avançou sobre o Hospital Colônia um consciente sucateamento e improvisação
constante, fazendo com que os internos fossem submetidos a uma realidade de precariedade e
com o tempo, completo descaso, evoluindo para uma vida de violências realizadas sob a tutela
do estado. A sobrecarga no serviço psiquiátrico impactou todas as esferas do hospital:
Pavilhões lotados, falta de leitos, de profissionais da saúde, tratamento e medicação
inadequado, falta de higiene, comida, bebida, vestimenta, calçamento, proteção das baixas
temperaturas da cidade, tudo passou a ser permitido, mesmo violando os direitos civis e
humanos dos pacientes.

3.2 A origem dos internos

Como anteriormente citado, a falta de critério para a internação, validado pela


prerrogativa legal de “suspeitos” de doença mental, levou a internação de diversas pessoas
qualificadas como “anormais” a sociedade, estimando-se que, em todo os anos de
funcionamento do Hospital Colônia de Barbacena, a maioria dos internados não possuíssem
transtornos mentais diagnosticados.
Os internados no Hospital Colônia eram pessoas a margem da sociedade do século
XX, desamparadas pela própria família, marginalizados pela sociedade, sem suporte estatal e
sem a possibilidade de se defender. Ao longo de 80 anos, mais de 60 mil pessoas foram
forçadamente institucionalizadas, obrigadas ao viver segregadas em um ambiente distante da
convivência social, negligenciadas em suas necessidades mais básicas e consequentemente,
violentadas, com a autorização do estado de Minas Gerais. O intuito dessas práticas era “livrar
a sociedade da escória, desfazendo-se dela, de preferência em local que a vista não pudesse
alcançar.” (ARBEX, 2013, p. 31)
A origem dos pacientes e o diagnóstico de transtorno mental não interessava
a equipe profissional do Colônia. Ao chegarem à instituição, os indivíduos eram separados
por sexo, idade e características físicas, obrigados a entregar seus pertences e ignorados
enquanto seres de direitos. Passavam a ser “um não ser” dentro do hospital que os submetiam
a práticas ineficazes de tratamento psiquiátrico, sem interesse na ressocialização dos internos.
Para Ana Boff de Godoy (2014) o documentário em nome da razão, de Helvécio
Ratton, deve ser entendido como acontecimento discursivo o que para essa autora propõe
igualmente que o livro-reportagem O holocausto brasileiro, de Daniela Arbex, seja também
30

entendido como documentário e, da mesma forma e pelos mesmos motivos, como


acontecimento. Ainda que as materialidades de ambos sejam distintas (fílmica o primeiro,
textual e fotográfico o segundo). Ver a reportagem igualmente como um trabalho
interpretativo de juntada de documentos, de recortes discursivos, que produzem efeitos de
memória. Ambos são objetos memoriais que fazem movimentar-se a memória por meio de
discursos verbais adaptados audiovisualmente no momento da enunciação no primeiro;
registrados em texto escrito, no segundo e por meio de imagens (captadas audiovisualmente
no momento do acontecimento, no primeiro; registradas em fotografias, no segundo).
As fotografias apresentadas no vídeo documentário são na sua maioria feitas pelo
fotógrafo Roberto Fulgêncio no momento mesmo das entrevistas e, em sua maioria,
registradas no ano de 1961, pelas mãos e olhos de Luiz Alfredo, as quais à época foram feitas
para a revista O Cruzeiro apresentadas pelo próprio Luiz Alfredo no vídeo documentário da
jornalista Arbex. (GODOY, 2014, p17).
Para essa autora a imagem deve ser entendida como discurso pois, a partir dela,
instala-se uma posição sujeito/leitor, um efeito para o espectador.
Sem documentos, muitas pacientes do Colônia eram rebatizadas pelos
funcionários. Perdiam o nome de nascimento, sua história original e sua referência, como se
tivessem aparecido no mundo sem alguém que as parissem. Entretanto, esses pacientes tinham
história e boa parte deles não havia esquecido disso, apesar da tentativa de apagamento social.
Suas histórias de vida e relações com a sociedade se igualavam em diversas maneiras, devido
ao tratamento recebido em suas vidas anteriores ao Colônia. Fica aqui claro, pelo destino dos
pacientes, como a ordem societária vigente a época baseava-se no moralismo, hipocrisia e
preconceito, visto que ao serem violentados pela sociedade, os “loucos” eram condenados
pelos “normais” ao aprisionamento no Hospital Colônia. Como descrito por Helvécio Ratton:
[...]os muros e todas as barreiras físicas funcionam para isolar o hospital psiquiátrico. Aqui
dentro a loucura, lá fora, a razão. Escondidos entre os muros, longe dos olhares, os chamados
‘loucos’ são degradados física e moralmente[...]. (RATTON, 1979)
Como foi estimado, apenas 30% dos pacientes apresentavam indícios de psicopatias,
e os demais 70% (4.800 mil) eram pessoas que simplesmente não se adequavam ao padrão
normativo da época, como homens tímidos e mulheres que não desejavam casar-se.
Andarilhos, crianças indesejadas, inimigos da elite local, filhos que desobedeciam aos pais,
mulheres que impunham seu direito à liberdade em uma sociedade machista e patriarcal,
prostitutas, amantes de políticos, alcoólatras, homoafetivos, até casos de pessoas franzinas
sem força para o trabalho braçal, gagos, de raciocínio lento, com crises de ansiedade e medo,
31

todos que eram considerados diferentes ou ameaças à normalidade tornavam-se indesejados


sociais.
Há registro de diversos casos de internação com diagnósticos simplórios, muitas
vezes suposições dos familiares, que levavam uma pessoa que vivia em vaga divergência com
a sociedade a viver isolada dela, muitos até a morte. Como por exemplo: Maria de Jesus,
brasileira, 23 anos, internada no Hospital Colônia, em 1911, por apresentar tristeza; Antônio
Gomes da Silva, sem diagnóstico, que ficou 21 dos 34 anos de internação mudo porque
ninguém se lembrou de perguntar se ele falava. (ARBEX, 2013, p. 19-20). No documentário
de Ratton, dois pacientes não identificados informam que foram internados pela família
porque eram nervosos e “bagunçavam” em casa, um deles relata que o pai o amarrou com
uma corda e o levou a força ao Hospital Colônia.
A instituição também foi o local de destino para silenciamento de casos de injustiça e
crimes, diversos relatos informam a internação de jovens abusadas sexualmente que, ao
engravidarem, eram direcionadas ao hospital para “desaparecer” do convívio com o agressor e
sua família, e evitar a denúncia. Como o caso de Geralda Siqueira Santiago Pereira relatado
pela própria Geralda no vídeo documentário “holocausto brasileiro”, órfã de mãe e empregada
doméstica, abusada sexualmente pelo patrão, um homem de 53 anos, na sua adolescência, foi
levado grávida por duas freiras ao Colônia em 1966, onde teve o filho. Por não apresentar
problemas mentais, foi liberada para trabalhar em casas de família em Barbacena. Seu filho,
João Bosco, foi fornecido a adoção irregular sem a sua autorização e Geralda Siqueira ainda
foi agredida por funcionários do Colônia e ameaçada, ao tentar reivindicar a localização do
filho. Geralda conta que foi levada ao pátio e recebeu choque por ordem da freira (ARBEX;
MENDZ, 2016).
Diversos pacientes se tornaram notórios dentro do Hospital Colônia, como Sueli
Aparecida Resende, que chegou ao local em 1971, aos 15 anos, devido as crises de
epilepsia e denúncias de prostituição, e viveu por todos os seus 50 anos de vida
institucionalizada. Relatos denotam como Sueli era excepcionalmente inteligente e
carismática, com capacidade de memorização impressionante, capaz de divertir pacientes e
funcionários, mas também de enfrentá-los com violência, defendendo-se das agressões
vividas da forma que podia. É dela uma composição que relata a vivencia dentro do hospital,
eternizada no documentário "Em nome da Razão” (1979).
Sueli deu à luz a 2 filhos dentro da instituição nas décadas de 70 e 80, os quais foram
cedidos a adoção ilegal e sem a sua autorização. Estima-se que 30 crianças nasceram dentro
do Hospital Colônia e foram afastados do convívio com os pais a força, sendo roubados de
32

suas mães (ARBEX, 2013, p. 19). No que tange a menores de idade, o hospital abrigou cerca
de 150 crianças e adolescentes, alguns deles advindos do Hospital de Neuropsiquiatria de
Oliveira/MG. A instituição, aos moldes do Colônia, também sofria com superlotação e casos
de violência entre as crianças e dos funcionários contra elas, com relatos de abuso físico e
sexual. Não foi encontrado registros oficiais sobre o que ocorreu com os demais
institucionalizados que não foram direcionados ao Colônia.
O Hospital de Oliveira, criado em 1924, atendia a indigentes e mulheres, mas mudou
de público-alvo em 1946, quando passou a receber crianças com qualquer tipo de deficiência
física e mental, a maioria rejeitada pelas famílias (ARBEX, 2013, p. 138). Com o fechamento
do hospital em 1976, 33 crianças da unidade foram transferidas ao Hospital Colônia para
continuidade da internação, e ficaram conhecidas como os “Filhos de Oliveira”. Como
descreve Daniela Arbex no documentário “Holocausto Brasileiro”:

‘[...] Uma das partes mais impressionantes dessa história é a situação dos meninos
de oliveira, exatamente porque – ao contrário dos pacientes do Hospital Colônia –
eles tinham alguma deficiência física ou mental, e os pais sentiam vergonha desses
filhos e encaminhavam esses filhos para um ‘deposito de criança’ chamado Hospital
de Oliveira. E aí, quando esse hospital fecha, eles meninos acabam mudando de
deposito, sendo encaminhados para o Hospital Colônia. [...]’. (ARBEX; MENDZ,
2016)

Um deles, “Luizinho” de Oliveira Melo, foi enviado ao Hospital Oliveira pela mãe
aos 15 anos, na década de 50, por apresentar “esquisitices” como não gostar de andar descalço
ou brincar com outras crianças na rua. Convencida que o filho tinha transtornos mentais, já
que qualquer moléstia mental serviria, afinal, o rapaz era filho da pobreza como a maioria dos
depositados nos manicômios do Estado (ARBEX, 2013, p. 216), o jovem foi transferido ao
Hospital Colônia em 1952 e mantido, assim como as outras crianças, nos pavilhões,
recebendo tratamento idêntico ao oferecido aos adultos, permanecendo, inclusive, no meio
deles.
Havia poucos pacientes que eram visitados pelos familiares. Seja pela falta de
condições financeiras para chegar até a instituição ou vergonha e horror ao local, o abandono
era normalizado a maioria dos internos, que buscavam consolo entre eles, em amizades que
duraram toda a vida. Os pacientes apadrinhavam-se entre si, como a relação de amizade de
Sônia Maria da Costa, rejeitada aos 11 anos por fazer “molecagem” na rua, em Belo
Horizonte/MG, foi despachada para o hospital pela polícia (ARBEX, 2013, p. 83) e
Terezinha, considerada indigente, sem registros de sua naturalidade. As duas pacientes se
uniam para proteger-se da miséria vivida no hospital: “Quando Terezinha caía sem poder dar
33

conta de si, a paciente mais velha procurava a torneira para molhar um pano e limpar o rosto
dela, na tentativa de oferecer-lhe o mínimo de dignidade. Também ensinou a amiga a tomar
banho e manter a higiene pessoal.” (ARBEX, 2013, p. 76)
Os internos entravam na instituição inocentes as práticas do local e leigos ao
acreditarem que suas diferenças dos familiares eram mesmo um transtorno mental, enquanto a
família convencia-se de que o local seria o fim de suas responsabilidades com o familiar visto
como estorvo devido a suposta anormalidade. Alcoólatras, pessoas que vadiavam pela cidade,
moradores de rua, viciados em substâncias psicoativas, pessoas com doenças físicas tratáveis,
crianças e adolescentes órfãos ou negligenciados, desobedientes, incômodos a madrastas e
padrastos, entre tantos outros casos, eram destinados ao Hospital Colônia que, na prática, era
um depósito de pessoas indesejadas, e era eficiente no que se refere ao apagamento da
dignidade humana.
No vídeo documentário “em nome da razão” Helvécio Ratton descreve que ao
adentrar a instituição, as pessoas perdiam o direito a nome, pertences pessoais, ao livre
arbítrio, e com o tempo ia-se também o direito à alimentação balanceada, a uma cama,
banheiro e água potável, a expressividade e individualidade, a sobriedade no que tange a
medicações sedantes, e por fim, o direito à vida e até à um sepultamento digno “[...] aquele
que não tem família é confinado para sempre. E recebe um rótulo: ‘Crônico Social’. Mesmo
depois de terminado o processo da loucura que o levou ao internamento, ele continua aqui
(Hospital Colônia), sem ter para onde ir, ou voltar [...]”(RATTON, 1979).
A marginalização do ser que ocorreu dentro do Hospital Colônia apagou a história de
vida da maioria dos pacientes. Ao adentrar no hospital, deixavam de ser filhos, de ter nome,
infância e liberdade, suas capacidades eram menosprezadas e o interno era resumido a sua
doença mental, isso aos que a de fato possuíam, já que a maioria dos pacientes só foram
designados a opressão social, como uma gentrificação ocorrida com a finalidade de expulsar
os indesejados da sociedade, segregando-os em um único local, onde lhe foram retirados o
direito a humanidade. A margem da sociedade, o Hospital Colônia foi um campo de
concentração para milhares de brasileiros inocentes e indefesos, onde todas as práticas de
violência eram permitidas e validadas pelo argumento de serem ações inerentes ao tratamento
manicomial.
As análises desse material audiovisual utilizados em nossa pesquisa não tem
caráter de verdade absoluta, mas nos proporcionou pensar a partir de um conjunto de
possibilidades metodológica pautadas por uma abordagem frequentemente enfatizada por
34

historiadores especialistas em fontes de natureza não-escrita. Ou seja, possibilita compreender


o processo de construção do conhecimento histórico.

3.3 O cotidiano no Hospital Colônia

Com a política interna de improvisação mediante a superlotação de pacientes e falta


de planejamento para a administração de um “hospital colônia”, a instituição funcionava
mediante relações abusivas de trabalho e tratamento psiquiátrico. Todos no ambiente eram
lesados de alguma maneira: os funcionários eram subaproveitados em funções que não eram
de suas capacidades, como funções médicas, ao participarem da distribuição de medicamentos
e aplicação de eletrochoques; e os pacientes sofriam com os subalternização de suas vidas na
vivência cotidiana dentro do Colônia.
Os guardas, nome dos servidores contratados pela Fundação Educacional de
Assistência Psiquiátrica, em sua maioria sem formação profissional na área da saúde, tinham
autoridade para controlar os pacientes. Esses funcionários eram responsáveis pelos 16
pavilhões que eram preenchidos por, em média, 200 pacientes, e faziam todos os tipos de
serviço, como: aplicação de tratamentos médicos, sem supervisão de psiquiatras ou ao menos
de enfermeiros; limpeza; distribuição de alimentos e supervisão dos internos em tempo
integral. Sem saber lidar com os pacientes de forma adequada, tornou-se diário casos de
negligência, violência e abandono, e o hospital passou a ser considerado um depósito de lixo
humano (ARBEX, 2013, p. 216). Walkiria Monteiro, ex-enfermeira do Colônia, declara no
documentário “Holocausto Brasileiro”:

“[...] tinha 5 mil pacientes quando eu entrei aqui, na época. Toda quarta feira,
chegava um ônibus ‘entupido’ de paciente vomitando, tendo diarreia, urinado, do
Hospital Raul Soares, porque a polícia militar, polícia de rua de Belo Horizonte, não
sei qual o tipo de polícia, pegavam todas as pessoas que estavam perambulando pela
rodoviária, por lá, e ‘enfiavam’ no (Hospital) Raul Soares. Do (Hospital) Raul
Soares tocava pra gente aqui (Hospital Colônia de Barbacena), sem nome, sem nada.
E aqui tinham muitos pacientes que os hospitais mandavam, porque era muito fácil,
o diretor era médico, todos tinham hospitais com uma fonte de renda excelente né,
excelente mesmo, porque ‘doido’ não tem coisa melhor pra dar dinheiro... e
mandavam quem estava dando trabalho pra cá. Aqui era deposito, sempre foi
deposito [...]”. (ARBEX; MENDZ, 2016)

Ao adentrar na instituição, os pacientes eram triados, entregando seus pertences e


tomando um banho coletivo, os homens tendo os cabelos raspados. Após a sessão de
desinfecção, o grupo recebia o famoso “azulão”, uniforme azul de brim, tecido incapaz de
35

blindar as baixíssimas temperaturas da cidade (ARBEX, 2013. p. 43-44). Devido a


fragilidade, o azulão, que era a única peça de roupa fornecida a todos, tornava-se inutilizável
com o passar do tempo, restando pedaços de pano para os pacientes cobrirem ao máximo seus
órgãos genitais. Alguns nem tinha essa possibilidade, segundo registros oficiais em fotos e
vídeos, era comum aos pacientes viverem pela instituição completamente nus, apesar da
vergonha de muitos deles. Após a inserção no Colônia, os internos passavam a transitar pelo
local sem separação entre grau de enfermidade ou direito a alas separadas, como quartos
individualizados. O ambiente dali em diante tornava-se para muitos o único local do mundo
em décadas, e para alguns pacientes, para a vida toda. Como narra Ratton: “[...] Neste
hospital, que é uma instituição fechada, não há qualquer possibilidade de manter uma área
para o ‘eu’. Uma área de privacidade e autoisolamento, o ‘eu’ é violado e devassado a todo
momento [...]” (RATTON, 1979)
Sem poder sair e sem órgãos de vistoria para fazer cumprir os direitos humanos
dentro da instituição, o Hospital Colônia foi palco de inúmeras situações degradantes ao ser.
A primeiro momento, com o número exacerbado de pacientes, cada pavilhão passou a ser
ocupado por, em média, 200 pacientes, amontoados em camas improvisadas, sendo os leitos
dispostos no chão e improvisados com capim, devido à falta de colchões para todos. Em
noites de frio em Barbacena, os pacientes faziam um “mutirão de camas” para passar a noite,
juntando-as sem lençol ou cobertor e dormindo sobre a cama de capim amontoados entre si,
na tentativa de acordarem vivos no dia seguinte. (ARBEX, 2013, p. 225)
A primeira refeição do dia era composta por café, pão e manteiga, porém sendo
distribuídos somente para os que estivessem em fila. A alimentação era racionada, no
intervalo entre o almoço e o jantar, servidos ao meio-dia e às 5 horas da tarde, não era
fornecido outro alimento aos pacientes, nem antes de dormir, fazendo com que muitos
tentassem se alimentar de outras formas, como a já citada paciente Sueli, que foi flagrada em
várias ocasiões comendo ratos e pombos. Nem todos tinham estômago para se alimentarem de
bichos, mas os anos no Colônia consumiam os últimos vestígios de humanidade. (ARBEX,
2013, p. 42)

Por dia, a cozinha gastava 120 quilos de arroz e apenas sessenta quilos de feijão para
alimentar um exército de 4.800 pessoas. Como a quantidade não dava, o jeito era
engrossar a água preta com farinha de mandioca na tentativa de encorpar o caldo e
fazer a comida render. Além de aguada, a comida era insossa, pois quase não levava
tempero. À época da colheita de milho, todas as refeições eram provenientes dos
grãos da espiga, sendo comum diarreia provocada pelo excesso de amido. Quando
havia carne, ela era triturada e misturada às refeições, já que faca e garfo eram
proibidos. Farta mesmo somente a quantidade de verduras colhidas na horta do
36

hospital e levadas para a cozinha em um pequeno caminhão. Apesar de couve em


quantidade, faltava funcionário para picar tudo aquilo. Por isso, boa parte das folhas
tinha o lixo como destino. (ARBEX, 2013, p. 70-71)

Os pacientes eram acordados ainda na madrugada para a limpeza dos pavilhões


realizada pelos guardas, e eram obrigados a esperar no frio dos pátios até o fim do trabalho.
Sem o fornecimento de qualquer proteção das temperaturas gélidas da cidade, os pacientes
agrupavam-se em círculos, com os corpos juntos em movimento, para tentar dissipar o frio.
Como relatado por Geraldo Magela Franco, um dos guardas que cuidavam da disciplina em
1969: “[...] A gente tinha que acordar os pacientes às 5 horas para entregar o pavilhão em
ordem ao próximo plantão que começava às 7 horas. Eles eram colocados no pátio houvesse o
frio que fosse. Os doentes ficavam lá o dia inteiro e só voltavam aos prédios no início da noite
para dormir [...].” (ARBEX, 2013, p. 77)
No decorrer do dia, os funcionários forneciam medicamentos aos pacientes, que em
suma era o resumo do tratamento psiquiátrico oferecido. Os internos passam o dia vagando
pelo pátio do hospital, já que as alas de oficinas terapêuticas foram desativadas devido à falta
de profissionais para desenvolver práticas de lazer e estudo com a grande quantidade de
pacientes do hospital. Restava aos internos passarem horas deitados no pátio, interagindo
entre si, aguardando o fim do dia. “[...] Aqui dentro não existe a dimensão temporal. O tempo
é percebido apenas em função das necessidades biológicas. Há uma hora para comer, uma
hora para dormir, mas não há uma hora para fazer, nem de acontecer. O ócio é absoluto. [...]”
(RATTON, 1979)
Apesar da descrição de Ratton, nem todos os pacientes tinham o seu cotidiano
resumido a ociosidade. Aqueles considerados apenas “anormais” não passavam despercebidos
pela equipe do hospital, tendo em vista a própria designação de trabalho como tratamento,
defendido tanto pelo diretor do Colônia, Dr. Joaquim Dutra, quanto pelo diretor do Instituto
Raul Soares14, Lopes Rodrigues, que consideravam que a melhor terapia para a loucura era o
trabalho. A partir desse viés, os anormais tornaram-se força produtiva, sendo obrigados a
realizar atividades braçais sem remuneração.
Com serviços análogos a escravidão, dezenas de internos trabalharam em obras
públicas como pedreiros, ajudante de obras, jardineiros, lavradores, entre outras atividades.
Os pacientes foram responsáveis pela pavimentação de ruas em Barbacena/MG, construção de
casas populares, de prédios públicos, até diretores do hospital levaram internos para a

14
Hospital fundado em 7 de setembro de 1922 em Belo Horizonte/MG para o tratamento de doentes
psiquiátricos. O instituto faz parte da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig).
37

construção de suas casas. (ARBEX, 2013. p. 219). Recebendo maços de cigarro como
pagamento, os internos considerados “úteis” foram submetidos à trabalhos contra sua vontade,
passando o dia fora da instituição e retornando à realidade do hospital a noite, como
prisioneiros em regime semiaberto15.
No vídeo documentário “holocausto brasileiro”, Milton Raposo ex-funcionário do
Colônia conta como esses internos eram submetidos a trabalhos dentro e fora do manicômio
em troca até mesmo de um cigarro.

“[...] Os pacientes do hospital colônia eram tranquilos, não agrediam ninguém, eram
uns pacientes educados, eles precisavam de um afeto. Os pacientes do hospital
colônia na época, eles iam para o olaria, faziam tijolos. Eu frequentava a olaria
porque meu pai inclusive era um chefe daquela parte. Tinham alguns que dormiam
lá, pois tinha que refazer o fogo para assar os tijolos, eram eles quem refaziam, no
tempo em que eu vivia lá dentro eram 200 a 300 pacientes para dois funcionários
olharem eles. Os pacientes pegavam uns cobertores e iam arrancar capim para fazer
colchões para eles dormirem, eles mesmos costuravam, davam os pontos. Como
dizia o Doutor Faustino para mim, o paciente psiquiátrico ele precisa de um fumo,
um cigarro e comida[...]” (ARBEX; MENDZ, 2016)

Milton quando questionado, fala que para ele cuidar daqueles pacientes era normal
pois eles não agrediam ninguém. E que se incomodava quando tinha que retirá-los para
realizarem trabalho pesado fora do manicômio e que muitos ao sair davam a mão para que
pudesse segurá-los.
Na fragilidade humana e em toda forma de descaso e desumanização, os internos do
Colônia viviam em regime análogo a escravidão. Sem direito a vida. Esses sujeitos
vivenciavam diariamente um processo de anulação mascarado como forma legitima de
tratamento psiquiátrico, no qual as drogas legais, afastamento social e a obrigação do trabalho
docilizavam e domesticavam seus corpos e mentes, descontruindo os seus laços familiares e
sociais e fazendo com que os pacientes perdessem sua identidade e dignidade. O modus
operandi do Colônia era manter os apagamentos dos preteridos por meio da padronização de
pessoas, segregação e escravidão, sem se importar com a individualidade dos pacientes.
Ademais, além da vida resumida a ociosidade, exploração da força de trabalho e
negligência dos aspectos básicos da vida humana, ou seja, alimentação, dormitório,
vestimenta, proteção e manutenção da saúde, o Hospital Colônia marcou a história recente do
país ao ser palco de violências físicas e psicológicas admitidas como tratamento psiquiátrico.
Tais práticas institucionais irregulares, junto ao tratamento psiquiátrico desumanizado e

15
No Brasil, de acordo com a lei n.º 7.210 de 11 de julho de 1984, dá-se o nome de prisão em regime semiaberto
à pena de prisão que é cumprida em colônias agrícolas ou industriais ou em instituições equivalentes. Neste
regime, o indivíduo poderá ser alojado em locais coletivos e sua pena estará atrelada a seu trabalho.
38

vexatório, levaram a vida dos pacientes sob tortura durante décadas, culminando no óbito de
milhares deles.

Figura 1 – Mulheres na ala feminina

Fonte: (ARBEX, 2013, p.46)

Mulheres eram mantidas em condições subumanas. A imagem retrata o descaso e


o abandono se repetindo no dia a dia dessas mulheres. Ociosidade contribuindo para a morte
social.

Figura 2– pacientes despidos no pátio


39

Fonte: (ARBEX, 2013, p.82)

A imagem revela que estão despidos não somente de panos, mas falta de
dignidade humana. E o quão é o descaso e o desrespeito que os internos HCB foram
submetidos.

4. CAPÍTULO III - MÉTODOS DE TRATAMENTOS NO HOSPITAL COLÔNIA


introdução
4.1 Características Do Tratamento Psiquiátrico Do Hospital Colônia

TERAPIAS UTILIZADAS

A perspectiva que se tem da loucura tem sofrido mudanças ao longo da história,


assim como o tratamento recebido para os categorizados como doentes mentais. Por volta de
1830 estas pessoas podiam circular livremente, conviviam habitualmente com outras pessoas,
vagavam pelas ruas, alguns estavam em prisões, outros em porões de Santa Casa de
Misericórdia. Porém essa liberdade de ir e vir não lhes garantia condições humanizadas. Cerca
de 1852 inaugura-se o primeiro hospício no Brasil, nomeado Hospício de Pedro II tendo por
objetivo uma forma de cuidar daqueles que possuíam algum transtorno mental, porém só eram
acolhidos os doentes em que eram vistos possibilidade de cura para que pudessem retornar ao
convívio social. Dessa forma aqueles que se readequassem as normas que pudessem se tornar
40

úteis socialmente novamente. O tratamento consistia na seguinte forma, isolava-se os doentes


do resto da sociedade, onde o próprio hospício se localizava geograficamente já cuidava desse
isolamento.
Um propulsor foi o hospício Pedro II se desvincular da Santa Casa de Misericórdia,
passando a ser administrado pelo estado, recebe também o nome de Hospício Nacional dos
Alienados, sua administração sai do meio religioso e vai para os médicos. As doenças mentais
se tornam enfoque científico e de cunho assistencial clínico. Dessa forma a medicina alcança
um novo patamar sendo motivadora do desenvolvimento capitalista. A psiquiatria exerce o
papel de controlar e excluir encontrando na loucura um meio de gerar capital, lucrando com
os períodos maiores de internação, sendo as altas concedidas na maioria dos casos por
motivos de óbito, mesmo esses óbitos eram fonte de renda como no caso dos corpos vendidos
em Barbacena. (RODRIGUES et al, 2021)
Os internos do HCB eram vistos como alienados que poderiam ser classificados de
dois tipos: como plenamente loucos, ou simplesmente delirantes. Sendo os loucos conhecidos
por ser incuráveis pois estavam em um constante sofrimento com o próprio ser. Já os
considerados delirantes eram vistos com possibilidade de cura, uma vez que acreditavam que
eles estavam encobertos de sensações delirantes que por sua vez os conduziam a prática de
atos impróprios e fora da razão. (NUNES et al, 2013, p. 83)
Segundo Rodrigues et al. (2021) dentro do hospital colônia era comum a utilização
de métodos duvidosos no que tange o aspecto científico, uma vez que os internos eram
compostos por pessoas que não necessariamente eram portadoras de doenças mentais. Dentre
os métodos está o tratamento de eletro-convulso-terapia que vinha sendo utilizado em meados
de 1938, o método consiste na aplicação de anestesia utilizando um estímulo elétrico com dois
eletrodos na parte frontal da cabeça, sendo capaz de induzir a convulsão. Outro método
utilizado era lobotomia, considerado mesmo na medicina atual como bastante desumano,
neste, consistia na perfuração cranial e retirada de uma parte do encéfalo. Além disso havia
também a psicocirurgia que era feita da mesma forma que os já citados.
Dentro do HCB havia um médico para três pavilhões, onde entregavam medicação
para os funcionários distribuírem, que usavam a mesma seringa para injeção, ameaçando os
pacientes que se recusavam a tomar, médicos também estipulavam a voltagem dos choques e
deixaram a cargo dos funcionários, que chegam a dar eletrochoque em 5 funcionários
simultaneamente, e cerca de 40 pacientes por dia, funcionários acreditavam que era por
finalidade terapêutica, mas também relatavam que os choques eram usados como castigo a
41

pacientes que se comportavam mal. O sofrimento velado sobre o falso pretexto de estar sobre
o processo de cura pode ser mais bem compreendido na fala de:

“Esses sujeitos vivenciam um processo de anulação, mascarado sob a forma


legitimada de tratamento psiquiátrico, no qual as drogas legais embotam os sujeitos,
docilizando e domesticando seus corpos e mentes, desfazendo todos os seus laços
familiares e sociais e fazendo com que tais sujeitos percam a sua própria dignidade e
identidade.” (GODOY, 2014, p. 02)

Os métodos de tratamento eram utilizados de forma indiscriminadas em qualquer


interno que apresentasse comportamento ‘rebelde’, era uma forma de conter a massa humana
que se formava dentro do hospital colônia. Além de arcaicos os métodos eram administrados
por terceiros que não tinham preparo clínico para lidar com este tipo de trabalho, precarizando
ainda mais a condição humana. Havia as medicações que eram administradas de qualquer
forma e a todos igualmente no HCB. Estes funcionários não eram cobrados conhecimentos
prévios, apenas o básico, serviços gerais, dar banho nos pacientes e saber cozinhar. A estes
lhes eram atribuídos a função de dispensar medicação para os internos, sendo dois
comprimidos: um rosa e um azul.
Todas essas formas de tratamento contribuírem para a dizimação em massa de vários
pacientes que morreram e tiveram seus corpos vendidos para faculdades de medicina. Em
média estima-se que foram vendidos cerca de 1853 corpos durante 1969 a 1980. Em suma as
torturas físicas e psicológicas predominavam nos tratamentos dado aos internos do HCB.
Tratamentos de choque e banhos por máquinas de alta pressão.
Enquanto o plano do Hospital Colônia era primariamente atender a pessoas
com transtornos mentais, o local acabou por tornar-se um campo de extermínio para aqueles
que não se adequavam aos padrões normativos da época ou não atendiam aos interesses
políticos de classes dominantes. Embora com a reforma psiquiátrica veremos que o
asilamento não era o método ideal para tratar desse grupo de pessoas, segundo o seguinte
autor esse processo era uma forma de assistência social “na formação dos nossos hospícios.
Para esses alienistas, o asilamento era apregoado como um meio de prestar assistência física e
moral aos internos, devendo-se assim separar os insanos dos arrazoados” (VENÂNCIO, 2003;
SILVEIRA, 2008 apud NUNES et al 2013, p. 88).
Esse modo de expressar o discurso, de separar os sãos dos loucos fortalece o
pensamento preconceituoso, ao mesmo tempo que cria uma ilusão, de que de fato dentro do
HCB seria o melhor lugar para as pessoas com adoecimento mental estarem. Humaniza a
ideia do isolamento social.
42

“Desordem franca e ociosidade, perturbação da paz social e obstáculo ao


crescimento econômico, estão aí as mesmas condições sociais que, alguns séculos
antes, determinaram na Europa o que Foucault qualificou de “o grande
enclausuramento”; as diferenças residem apenas nas causas estruturais, aqui e lá, e
que não foram poucas.” (Resende, 1992, apud FULLIN, 2018, p. 20).

Resende fala desse sujeito que está ali entre os loucos, mas que não é diagnosticado
de fato, um perturbador da paz, alguém, que não se encaixa no moralmente correto da
sociedade, e que vai ser também depositado no HCB, logo quanto este é quem vai ser a figura
mais ativa na laborterapia.
A conhecida “laborterapia” era usada na época como parte do tratamento da loucura,
na crença de que era necessário evitar a ociosidade, a qual era perniciosa ao espírito do louco.
Por meio do trabalho, retirava-se o louco de sua condição de criatura inútil, possibilitando a
canalização da sua agressividade e, consequentemente, a cura. Dessa forma, os pacientes
pobres e considerados indigentes eram forçados a trabalhos monótonos e repetitivos, sem
remuneração, e faziam trabalhos pesados na lavoura, na área do hospital, e na confecção de
tijolos, bonecos, tapetes e outros produtos que eram vendidos ou consumidos internamente.
A laborterapia teve uma tendência a ser estimulada pelo fato de nem todos os que
estavam internos no HCB serem loucos, conjectura-se que o estado estava muito ciente disso.
Porém não usava outra nomenclatura para as pessoas que viviam em ociosidade e que eram
recolhidas e destinadas ao trem dos loucos. De certa forma estavam sendo garantidos que
esses sujeitos estivessem dando retorno positivo para a sociedade de qualquer forma.
Existiram propostas de divisões dos internos em pavilhões, para os modelos de
assistência psiquiátrica e recursos terapêuticos, onde também existiam o tratamento e
atendimento realizados em ambulatórios de higiene mental são relatadas em diversos
regulamentos expedidos pelo governo de Minas em 1922, 1927, 1934 e 1946. Estes
constituíram o movimento de expansão do campo psiquiátrico para além do espaço asilar, se
estendendo para uma biopolítica. Dessa forma, tratava de questões que objetivavam o corpo
do indivíduo com intuito de buscar o adestramento social através de convenções sociais.
Portanto, o poder disciplinar imposto por essas instituições que controlava comportamentos e
atitudes colaboraram para o adestramento destes corpos os tornando “úteis” ao processo
produtivo. (DUARTE, 2009, p. 40).
Os doentes ficavam divididos dentro do espaço asilar no interior de forma que se
propicia-se a interação com o trabalho. Sendo separados os inválidos dos incuráveis e dos
43

crônicos, ou seja, era feita uma anamnese para distinguir quais dos pacientes possui sequela
física que o impossibilitasse ao trabalho, daqueles que poderiam ser ressocializados e
reinseridos. Desta maneira o trabalho não constituía em apenas um recurso terapêutico, mas
uma forma de diferenciação do indivíduo normal ressocializado do doente improdutivo.
(DUARTE, 2009, p. 40).
Existem certas divergências entre a indicação de repouso no leito e sua aplicação por
métodos de coerção, como uso de colete de forças, proibição das visitas, ser recolhido à
solitária. O sistema em si era contraditório, havia uma espécie de punição de cunho moral. No
regulamento interno constam como terapias: banhos e hidroterapia entre outros. A utilização
de internos para o ofício não era de forma generalizada, sendo apenas determinado grupo,
obedecendo regulamento interno. (NUNES et al, 2013, p. 93).
O trabalho do psicólogo no setor público e privado, atuando de forma comunitária ou
pessoal, deve ser norteado pelo código de ética, visando uma reflexão sobre suas ações,
compromissos e responsabilidades em determinada profissão. Estando envolvido em diversas
atividades, desenvolvendo pesquisas para produção de conhecimento em relação a saúde
mental, trabalhar com práticas psicoterápicas entre outras. Deve possuir um olhar atento
históricas, socioeconômicas, políticas e culturais, elaborando a melhor forma de intervenção
diante da realidade disposta. (RODRIGUES et al, 2021)

Figura 3– paciente bebendo esgoto

Fonte: (ARBEX, 2013, p.33)

A imagem revela o descaso e o abandono e o tamanho da crueldade humana


contra seres humanos. O Estado, a família e a própria sociedade ao invés de defender o
cidadão, o oprime e entrega a própria ruína.

4.2 A Violência Como Tratamento Psiquiátrico


44

Os pacientes precisavam lidar com uma lista de horrores que ocorriam ali: estupros,
maus tratos físicos e mentais muito recorrentes no HCB. Internos eram obrigados a passar
pela supracitada terapia de choque e mais duchas escocesas, como punição ou mesmo por
vontade dos funcionários. Centenas que passaram por esses processos faleceram. Além de
tudo isso não possuíam vestimentas para todos e a maioria andava nu, mesmo com as baixas
nas temperaturas de Barbacena. Tentando sobreviver, eles tentavam se aquecer dormindo uns
próximos aos outros, mas devido ao clima pesado, muitos padeceram. A situação de
sobrevivência era insalubre, não havia água encanada ou fornecimento de comida que
provesse para a quantidade exacerbada de pessoas.
Segundo Arbex os pacientes faziam suas necessidades fisiológicas em público e
muitas vezes se alimentavam de dejetos. Utilizavam esgoto como fonte de água para suas
prioridades. Sendo estas práticas fontes de muitas doenças que os acometiam.

“A coisa era muito pior do que parece. Cheguei a ver alimentos sendo jogados em
cochos, e os doidos avançando para comer, como animais. Visitei o campo de
Auschwitz e não vi diferença. O que acontece lá é a desumanidade, a crueldade
planejada. No hospício, tira-se o caráter humano de uma pessoa, e ela deixa de ser
gente. Havia um total desinteresse pela sorte. Basta dizer que os eletrochoques eram
dados indiscriminadamente. Às vezes, a energia elétrica da cidade não era suficiente
para aguentar a carga. Muitos morriam, outros sofriam fraturas graves”, revela o
psiquiatra e escritor Ronaldo Simões Coelho, 80 anos, que trabalhou na Colônia no
início da década de 60 como secretário geral da recém-criada Fundação Estadual de
Assistência Psiquiátrica, substituída, em 77, pela Fundação Hospitalar do Estado de
Minas Gerais (Fhemig). A Fhemig continua responsável pela instituição,
reformulada a partir de 1980 e, recentemente, transformada em hospital regional.
Hoje, o Centro Hospitalar Psiquiátrico de Barbacena (CHPB) atende um universo de
50 cidades e uma população estimada em 700 mil pessoas.” (ARBEX, 2014)

A superlotação e as condições desumanas no HCB eram sinal de uma série de


violências que estariam acontecendo dentro deste. A começar pela forma como as pessoas
eram selecionadas para estarem ali. Não havia um controle, e nem uma preocupação em se
ter. Homens, mulheres e crianças depositados no confinamento insalubre do HCB. Uma forma
de entendermos como se deu esse processo vem na fala de:

No Brasil o doente mental faz sua aparição na cena das cidades, igualmente a um
contexto de desordem e ameaça à paz social, mas diferentemente do que se observou
na Europa, em plena vigência da sociedade rural pré-capitalista, tradicionalmente
pouco discriminativa para a diferença (RESENDE apud FULLIN, 1992, p. 30).

Como cita Heitor Resende, esse conceito de doente mental surge de um ambiente
diferente, ele é o estranho, o incômodo social. Daí vem um ponto onde as práticas do HCB
45

tentaram se legitimar no conceito de limpeza social. Onde como já foi dito anteriormente se
pega todos os socialmente inadequados e coloca em um único lugar fora do âmbito social. Por
isso tudo que era considerado estranho também era levado no trem dos loucos. Até mesmo
pessoas sãs mentalmente. Tudo isso foi amplamente relacionado ao fim da escravidão, a
“onda de desocupados”, onde o louco está aliado ao segregado, ao que possui baixa condição
social. Sendo vistos como resíduos da sociedade. Vejamos como Resende fala desses:
“O Hospital Colônia, apesar de ser uma instituição pública, também se tornou
reconhecido por seu caráter mercantilista, em que utilizou desde a venda de
cadáveres para faculdades de medicina até a recepção de um número de pessoas
muito superior à sua capacidade, para arrecadar lucros. O mesmo também se tornou
conhecido por seu caráter de utilitarismo social devido às controvérsias em relação
ao diagnóstico das pessoas ali internadas e os motivos aos quais elas eram asiladas
no local, já que muitas não apresentavam sintomas de neuroses.” (RESENDE apud
FULLIN, 1992, p. 22).

Segundo Fullin (2018) A doença pode ser vista como processo onde é uma categoria
que envolve uma sequência de eventos, onde estes eventos são impulsionados por dois
objetivos: “(1) compreender o sofrimento no sentido de organizar a experiência vivida, e (2)
se possível, sanar o sofrimento”, assim, “para compreender a percepção e o significado [da
doença] é necessário ver todo o episódio da doença: o seu percurso terapêutico e os discursos
dos atores envolvidos em cada passo da sequência de eventos” (Langdon, 1996, p. 9).Desta
forma, o corpo é quem carrega os sintomas que não estão separados da experiência social na
qual vive o indivíduo, uma vez que as sensações e experiências corporais são subjetivas e se
manifestam em conjunto com o mundo natural, social e cosmológico.

4.3 A VIOLÊNCIA MANICOMIAL E A REFORMA PSIQUIÁTRICA

A superlotação e as condições insalubres no Hospital Colônia de Barbacena


ganharam destaque no final da década de 1970, a loucura nesse momento passou a ser um
problema a ser eliminado a todo custo. Isso tudo se deve a imprensa que passou a veicular
imagens relacionadas perturbadoras dentro das instituições de saúde mental. Chegavam
denúncias de movimentos que vieram a se chamar o Movimento da Luta Antimanicomial.
Essa luta possibilitou as bases das propostas para a Reforma Psiquiatra Brasileira.
É no período de 1978 e 1980 que se passa a reconhecer as ideias que passaram a
nortear a Reforma Psiquiatra Brasileira. A reforma propõe uma crítica ao sistema de saúde
mental brasileiro. Uma série de críticas, tanto como melhorias de salário, diminuição no
número de consultas por turno, quanto aos tipos de tratamento dado a pacientes graves,
46

solicitação de um trabalho mais humanizado. Com essa nova realidade foi possível a entrada
dos jornalistas dentro dos grandes hospitais, com a missão de desvendar o cotidiano dos
internados, recebendo Minas Gerais destaque nacional.
Esse processo de reforma se concretiza a partir de diversas iniciativas em relação aos
direitos humanos. A crítica para o modelo atual até 1970 principalmente em Minas Gerais,
sendo 1979 ano de destaque, fora o momento em que o psiquiatra italiano Franco Basaglia
veio ao Brasil realizar seminários, onde divulgou o trabalho de desmonte que realizou em um
hospital público na Itália e também da lei que tinha sido aprovada pela Itália e visava a
recuperação da cidadania para as pessoas com doenças mentais, assim como a regulamentação
da internação compulsória, bem como extinção gradual dos manicômios.

Sônia cresceu sozinha no hospital. Foi vítima de todos os tipos de violação. Sofreu
agressão física, tomava choques diários, ficou trancada em cela úmida sem um único
cobertor para se aquecer e tomou as famosas injeções 5 de “entorta”, que causavam
impregnação no organismo e faziam a boca encher de cuspe. Deixada sem água,
muitas vezes, ela bebia a própria urina para matar a sede. Tomava banho de
mergulho na banheira com fezes, uma espécie de castigo imposto a pessoas que,
como Sônia, não se enquadravam às regras. Por diversas vezes, teve sangue retirado
sem o seu consentimento por vampiros humanos que enchiam recipientes de vidro, a
fim de aplicá-lo em organismos mais debilitados que o dela, principalmente nos
pacientes que passavam pela lobotomia. A intervenção cirúrgica no cérebro para
seccionar as vias que ligam os lobos frontais ao tálamo era recorrente no Colônia.
(ARBEX, 2013, p.47)

Segundo Figueiredo (2019) Reforma Psiquiátrica no Brasil tem início, ainda no seu
começo, na década de 1980, dentro desse contexto vem a criação do SUS com a constituição
de 1988. O movimento tem seu ponto alto com a criação da lei 10.2016 de 6 de Abril de 2001.
Com isto ganha destaque as Conferências Nacionais de Saúde Mental e 1992 e 2001 que
alavancaram as ideias na política de formação de recursos humanos, subsídio e controle social
com foco no desenvolvimento de serviços abertos de base territorial. Estes serviços
objetivavam ser substitutivos dos manicômios com uma proposta de cuidado integral com o
trabalho interdisciplinar, dando abertura para criação de um novo espaço com uma proposta
para as práticas de na saúde mental: o campo da Atenção Pessoal.

Em 2004 foi realizado em São Paulo o I Congresso Brasileiro dos Centros de


Atenção Psicossocial (CAPS) organizado pela Coordenação de Saúde Mental do
Ministério da Saúde, na pessoa do professor da UFRJ Pedro Gabriel Delgado
(gestão 2001-2010), celebrando os 500 CAPS no Brasil. Em 2018 são quase 2000,
um número cerca de quatro vezes maior em um pouco mais de uma década (Brasil
[Ministério da Saúde], 2005) (FIGUEIREDO, 2019)
47

Nesse congresso, com as presentes lideranças da Reforma Psiquiatra que reuniram


sua contribuição para validar as políticas nesse campo, fora então criada a Escola de
Supervisores, uma importante proposta para criar uma formação fixa dos profissionais e
qualificar os serviços. Estes deveriam operar também como especialistas na área da saúde
indo de encontro à perspectiva de formação de redes, ampliando para estratégias intersetoriais
com a assistência social, a educação, o jurídico e os dispositivos de controle social. A Escola
de Supervisores deve capacitar supervisores para que possam desenvolver um trabalho clínico
e institucional, unindo essas duas dimensões com a implantação e consolidação de cada CAPS
no Brasil. (FIGUEIREDO, 2019).
O conceito de saúde mental vem de um amplo processo de reformulação das políticas
psiquiátricas. O modelo utilizado nos EUA da psiquiatria comunitária, da época dos anos
1960, somando-se as propostas da OMS, tem como missão prover saúde. Isto já foi alvo de
muito questionamento, mas o foco principal que é a promoção a saúde tem perdurado até os
dias atuais, com os novos dispositivos de assistência a doente mentais e a fixação de projetos
de reforma psiquiátrica. Os psicólogos e psicanalistas em nenhum momento estiveram fora
desses processos, tomando a frente em alguns movimentos, se empenhando nas discussões a
fim de trazer melhorias na reforma psiquiátrica, como no caso comunidades terapêuticas de
inspiração inglesa na antipsiquiatria dos anos 1960, e no movimento dos trabalhadores de
saúde mental no Brasil nas décadas de 1970 e 1980.
O processo de reforma psiquiátrica é dono de sua própria história inserida em um
contexto de luta na perspectiva internacional contra a violência asilar. Sendo fundado ao final
dos anos 1970, em meio à crise assistencial nos hospitais psiquiátricos e aos grandes esforços
dos movimentos sociais pelos direitos dos pacientes psiquiátricos. O processo de Reforma
Psiquiatra não se limita ao sancionamento de leis e normas, sendo maior que as novas
mudanças impostas. Fora um grandioso e complexo processo político e social a Reforma
Psiquiátrica onde os atores, instituições e forças de origens diferentes incidiram em diversos
territórios, nos governos tanto federal, quanto estadual e municipal em diversos âmbitos
como: universidades, mercados de serviços da saúde, conselhos profissionais, nos
movimentos sociais e nas associações de pessoas com transtornos mentais.
A partir do ano de 1992, inspirados pelo projeto de lei de Paulo Delgado, os
movimentos sociais conseguem aprovação em vários estados brasileiros as primeiras leis que
determinam a substituição dos leitos psiquiátricos por uma rede de saúde mental. É nesse
ponto que de acordo com as diretrizes da Reforma Psiquiátrica que o Ministério da Saúde para
a saúde mental começa a ganhar destaque. Sendo na década de 1990, o compromisso firmado
48

pelo Brasil ao assinar a Declaração de Caracas, com a realização da II Conferência Nacional


de Saúde Mental, quando passam a entrar em vigor as primeiras normas federais regulando a
implantação de serviços de atenção diária, com base nas experiências do primeiro CAPS,
NAPS e Hospitais-dia.
É importante entender a reforma psiquiátrica a partir de um olhar que envolva todo
um contexto político e social onde está inserida, sendo necessário destacar o contexto político
que se intensificaram a favor da reforma que se deu logo após o período da ditadura militar,
neste período o país estava passando por uma redemocratização, portanto, houve um incentivo
maior para que os movimentos se fortalecessem e a mídia atuasse a respeito. Além disso,
nesse exato período da década de 1980, as políticas na área de saúde mental, as iniciativas
oficiais tencionavam “racionalizar” e “humanizar” os hospitais psiquiátricos, melhorando
assim a qualidade de vida nos manicômios, investindo em ambulatórios como meio
alternativo as internações. (FULLIN, 2018)
As residências terapêuticas foram criadas com o propósito de realocar os pacientes
que estão passando pelo processo de desinstitucionalização em que, são rejeitados pela família
ou que não possuem vínculos devido aos anos de internação, e que não teriam para onde ir
caso não houvesse este programa de acolhimento. Desta forma a reforma psiquiatra se torna
um grande desafio, pois carece de articulação de diversos pontos estratégicos para que haja
um amparo humanitário dessas pessoas, que por muito tempo só viveram o cárcere do
manicômio.
A partir dos anos 2000 a atenção psicossocial se expande com novas articulações,
sem perder seu objetivo principal ampliar a rede de cuidados. Os indivíduos que procuram
esta rede é cada vez mais constituído por jovens e adultos em situação de vulnerabilidade
socioeconômica, além dos acometidos por graves transtornos como os psicóticos e neuróticos
graves com um longo histórico clínico. As ações preventivas geralmente tomam a cena, sendo
necessário mais que disposição para avaliação de um caso e na tomada de decisões partilhadas
com outros setores. Sendo de suma importância essa liberdade do usuário em transitar de um
espaço a outro de maneiras diversas no campo formal e informal. É esta a priori deste
trabalho.

A contribuição possível e importante a partir da orientação da psicanálise deve se


dar na ampliação do dispositivo da 'construção do caso', agora promovendo a
'circulação do caso' como meio permanente de sua construção. Isso envolve mais
atores sociais, profissionais de diferentes origens e setores e a tarefa se torna mais
complexa. Para promover essa circulação do caso, é preciso acompanhar o itinerário
49

do sujeito em sua particularidade nos diferentes serviços e dispositivos, para tecer a


própria rede ao tecer o caso.” (FIGUEIREDO, 2019, p. 84)

Em 2001, cerca de 12 anos de tramitação a lei Paulo Delgado é sancionada,


redirecionando a assistência em saúde mental dando destaque ao oferecimento de tratamentos
em serviços comunitários, dispondo sobre os direitos e a proteção das pessoas com
transtornos mentais, porém não impõe mecanismos claros para a progressiva extinção dos
manicômios. Após isso começou um processo para desinstitucionalizar as pessoas que
estavam há muito tempo nos manicômios, surgiu o “De volta para casa”.

O processo de redução de leitos em hospitais psiquiátricos e de


desinstitucionalização de pessoas com longo histórico de internação passa a tornar-
se política pública no Brasil a partir dos anos 90, e ganha grande impulso em 2002
com uma série de normatizações do Ministério da Saúde, que instituem mecanismos
claros, eficazes e seguros para a redução de leitos psiquiátricos a partir dos macro-
hospitais. Para avaliar o ritmo da redução de leitos em todo o Brasil, no entanto, é
preciso considerar o processo histórico de implantação dos hospitais psiquiátricos
nos estados, assim como a penetração das diretrizes da Reforma Psiquiátrica em
cada região brasileira, uma vez que o processo de desinstitucionalização pressupõe
transformações culturais e subjetivas na sociedade e depende sempre da pactuação
das três esferas de governo (federal, estadual e municipal). (BRASIL, 2005, p. 10)

Este programa De Volta Para Casa, foi lançado em 2003 pelo Ministério da Saúde,
com objetivo de fornecer auxílio-reabilitação psicossocial e amparo social para as pessoas que
precisam viver nas residências terapêuticas, necessitando de uma ampla rede de recursos
assistenciais e de cuidados, que vão além do campo da psiquiatria, porém se relacionam com
diversos outros como: psicologia, serviço social e artes. (FULLIN, 2018).
No intento de se obter um tratamento eficaz, se faz necessário considerar não apenas
os sintomas clínicos do paciente, mas se fazer um estudo empírico a partir das experiências
humanas, nas quais o indivíduo não está só em si, mas envolvido em toda uma ordem social
em que este se insere e o seu contexto cultural. Tratamento este muito diferente do oferecido
nos manicômios, pois nestas instituições a subjetividade humana é anulada.
Os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), dentre todos os dispositivos de atenção
à saúde mental, têm tido a maior importância estratégica para a reforma psiquiátrica brasileira.
É devido a atuação de serviços como o CAPS que se torna real e possível a organização de
uma rede que substitua os manicômios no país. Sendo função do CAPS prestar o devido
atendimento clínico diariamente, evitando ao máximo internações em hospitais psiquiátricos;
é sua função também promover a integração social das pessoas com transtornos mentais
através de ações; controlar a porta de entrada da assistência em saúde mental em sua área de
50

atuação fornecendo suporte à atenção à saúde mental na rede básica. O CAPS tem por primor
organizar a rede de atenção às pessoas com transtornos mentais nos municípios.
Os CAPS devem ser substituintes dos hospitais psiquiátricos e não complementares.
Nessa perspectiva é responsabilidade do CAPS realizar o acolhimento e prestar a devida
atenção às pessoas com transtornos mentais graves e persistentes buscando criar e fortalecer
laços sociais em seu ambiente.
O novo e grande desafio para o profissional desta vez, é que este não deve mais
trabalhar sozinho, todo trabalho agora será realizado por uma equipe multiprofissional. Como
resposta imediata a este método houve uma perda sobre o controle do caso e uma dispersão
por parte da gestão em relação ao apoio técnico. Temos uma mudança considerável também
sobre as relações de poder e sobre os saberes do trabalho coletivo nas relações profissionais.
Além de que na formação das equipes à marca das disputas imaginárias ou “narcisismo das
pequenas diferenças” de Freud, gerador de contendas. Esses problemas ocorrem, entre outros
mais, já com os pacientes e o saber dos casos havendo uma incapacidade em compartilhar
esse saber e responsabilidades. (FIGUEIREDO, 2019)

5. PARTICIPAÇÃO DO CAPS NA ASSISTÊNCIA A SAÚDE MENTAL

Os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), dentre todos os dispositivos de atenção


à saúde mental, têm tido a maior importância estratégica para a reforma psiquiátrica brasileira.
É devido a atuação de serviços como o CAPS que se torna real e possível a organização de
uma rede que substitua os manicômios no país. Sendo função do CAPS prestar o devido
atendimento clínico diariamente, evitando ao máximo internações em hospitais psiquiátricos;
é sua função também promover a integração social das pessoas com transtornos mentais
através de ações; controlar a porta de entrada da assistência em saúde mental em sua área de
atuação fornecendo suporte à atenção à saúde mental na rede básica. O CAPS tem por primor
organizar a rede de atenção às pessoas com transtornos mentais nos municípios.
Os CAPS devem ser substituintes dos hospitais psiquiátricos e não complementares.
Nessa perspectiva é responsabilidade do CAPS realizar o acolhimento e prestar a devida
atenção às pessoas com transtornos mentais graves e persistentes buscando criar e fortalecer
laços sociais em seu ambiente.
O novo e grande desafio para o profissional desta vez, é que este não deve mais
trabalhar sozinho, todo trabalho agora será realizado por uma equipe multiprofissional. Como
resposta imediata a este método houve uma perda sobre o controle do caso e uma dispersão
51

por parte da gestão em relação ao apoio técnico. Temos uma mudança considerável também
sobre as relações de poder e sobre os saberes do trabalho coletivo nas relações profissionais.
Além de que na formação das equipes à marca das disputas imaginárias ou “narcisismo das
pequenas diferenças” de Freud, gerador de contendas. Esses problemas ocorrem, entre outros
mais, já com os pacientes e o saber dos casos havendo uma incapacidade em compartilhar
esse saber e responsabilidades. (FIGUEIREDO, 2019)

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Embora o diagnóstico de insanidade mental só possa ser feito por especialistas em


psicopatologia, a consideração social do “louco” ultrapassa os limites científicos, com base na
vivência e no senso comum, o que pode se tornar perigoso mediante o pré-julgamento e
possibilidade de preconceito a pessoa considerada anormal, além de outras más intenções que
levam o indivíduo a ser considerado a parte da sociedade a qual está inserido.
O acesso ao tratamento manicomial foi designado aos doentes mentais desde o
princípio do tratamento psiquiátrico no país, sendo afirmado no decreto nº 1.132, de 22 de
dezembro de 1903, que reorganiza a “Assistência aos Alienados”:
O termo psicopatologia é mais adequado tendo em vista que essa condição é
caracterizada por pensamentos e atitudes tidos como anormais para sociedade, logo sendo
visto como resultado de algum transtorno mental.
Está disposto pela nossa Constituição Federal de 1988, o Estatuto da Pessoa com
Deficiência, que garante os direitos civis a todos que apresentam variados tipos de transtornos
mentais, além de possibilidades de ingresso ao trabalho formal, mediante suas capacidades.
Ou seja, a pessoa acometida por transtornos é reconhecida como sujeito de direitos e lhe é
garantido por lei o acesso a cidadania e tratamento equitativo.
Vale destacar também que, dentro das pesquisas científicas atuais, o termo
“louco” e “alienado” é desatualizado para tratar pessoas em condição mental excepcional,
para a Organização Mundial da Saúde - OMS, por exemplo, o transtorno mental é entendido
como uma combinação de pensamentos, percepções, emoções e comportamento anormais,
que também podem afetar as relações com outras pessoas, onde faz-se necessário o
atendimento médico seguro, contínuo e eficaz para tratamento e/ou controle, visando trazer
qualidade de vida a pessoa com doença mental, seja ela possível de cura ou não.
O Hospital Colônia de Barbacena passou a ser descrito como um instrumento
52

mantenedor da ordem pública ao invés de um ambiente de tratamento e cura de enfermidades


mentais. Os problemas institucionais passaram a ser evidentes devido à falta de aumento de
recursos financeiros para custear o serviço “inflado” pela superlotação, uma série de
improvisações para prover os cuidados com os pacientes foram aderidas ao tratamento
oferecido. Má administração, incapacidade de fornecer tratamento adequado, sem corpo
médico suficiente, corrupção e contrabando de suprimentos, medicamentos insuficientes,
entre outros fatores, passaram a fazer parte da realidade do Colônia.
A falta de critério para a internação, validado pela prerrogativa legal de
“suspeitos” de doença mental, levou a internação de diversas pessoas qualificadas como
“anormais” a sociedade, estimando-se que, em todo os anos de funcionamento do Hospital
Colônia de Barbacena, a maioria dos internados não possuíssem transtornos mentais
diagnosticados.
Os internados no Hospital Colônia eram pessoas a margem da sociedade no século
XX entre os anos de (1930 a 1980) desamparadas pela própria família, marginalizados pela
sociedade, sem suporte estatal e sem a possibilidade de se defender.
Com a política interna de improvisação mediante a superlotação de pacientes e
falta de planejamento para a administração de um “hospital Colônia”, a instituição
funcionava mediante relações abusivas de trabalho e tratamento psiquiátrico. Todos no
ambiente eram lesados de alguma maneira: os funcionários eram subaproveitados em
funções que não eram de suas capacidades, como funções médicas, ao participarem da
distribuição de medicamentos e aplicação de eletrochoques; e os pacientes sofriam com os
subalternização de suas vidas na vivência cotidiana dentro do Colônia.
Apesar da descrição de Ratton que diz que os pacientes viviam na ociosidade,
nem todos os pacientes tinham o seu cotidiano resumido a ociosidade. Aqueles considerados
apenas “anormais” não passavam despercebidos pela equipe do hospital, tendo em vista a
própria designação de trabalho como tratamento, defendido tanto pelo diretor do Colônia,
Dr. Joaquim Dutra, quanto pelo diretor do Instituto Raul Soares Lopes Rodrigues, que
consideravam que a melhor terapia para a loucura era o trabalho, o que não havia
remuneração para tais atividades. Com serviços análogos a escravidão, dezenas de internos
trabalharam em obras públicas como pedreiros, ajudante de obras, jardineiros, lavradores,
entre outras atividades.
Os pacientes precisavam lidar com uma lista de horrores que ocorriam ali:
estupros, maus tratos físicos e mentais muito recorrentes no HCB. Internos eram obrigados a
53

passar por terapia de choque e mais duchas escocesas, como punição ou mesmo por vontade
dos funcionários.
A superlotação e as condições insalubres no Hospital Colônia de Barbacena
ganharam destaque no final da década de 1970, a loucura nesse momento passou a ser um
problema a ser eliminado a todo custo. Isso tudo se deve à imprensa que passou a veicular
imagens relacionadas perturbadoras dentro das instituições de saúde mental. Chegavam
denúncias de movimentos que vieram a se chamar o Movimento da Luta Antimanicomial.
Essa luta possibilitou as bases das propostas para a Reforma Psiquiatra Brasileira. E foi no
período de 1978 e 1980 que se passa a reconhecer as idéias que passaram a nortear a
Reforma Psiquiatra Brasileira. Esse processo de reforma se concretiza a partir de diversas
iniciativas em relação aos direitos humanos. Os psicólogos e psicanalistas em nenhum
momento estiveram fora desses processos, tomando a frente em alguns movimentos, se
empenhando nos discursões a fim de trazer melhorias na reforma psiquiátrica, como no caso
comunidades terapêuticas de inspiração inglesa na antipsiquiatria dos anos 1960, e no
movimento dos trabalhadores de saúde mental no Brasil nas décadas de 1970 e 1980.
Os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), dentre todos os dispositivos de
atenção à saúde mental, têm tido a maior importância estratégica para a reforma psiquiátrica
brasileira. É devido a atuação de serviços como o CAPS que se torna real e possível a
organização de uma rede que substitua os manicômios no país.
Devemos considerar que que a violência praticada contra seres humanos dentro do
hospital Colônia de Barbacena teve a ver com médicos e autoridades, mas também teve
participação de uma sociedade que na incapacidade de lidar com as indiferenças demonstrou
através do ofício, todo o poder de opressão, anulação e apagamento dos sujeitos.
Conhecer a história de violência praticada dentro do hospital Colônia em
Barbacena, MG – Brasil, por meio da pesquisa bibliográfica, nos possibilitou não somente
pensar historicamente, mas a refletir sobre a produção e na sistematização do conhecimento
como passo importante para o desenvolvimento científico, tecnológico e humano de uma
sociedade.
54

REFERÊNCIAS

ARBEX, Daniela. Holocausto brasileiro. 1. Ed. – São Paulo: Geração Editorial, 2013.

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