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Resenha de “Sin nombre”

Francisco Octávio Bittencourt de Sousa*


*Discente de Ciências Sociais na Universidade de Brasília. Matrícula: 190045809. E-
mail: francisco.octavio@aluno.unb.br

"Sin Nombre" é um filme sensível às adversidades que as pessoas enfrentam


para chegar ao norte global. A questão da imigração ilegal é central. As pessoas que se
submetem a esse processo colocam suas vidas em risco por semanas ou meses em busca
do fictício "sonho americano". O filme narra duas histórias. Uma envolve Sayra, uma
jovem hondurenha que se junta ao pai e ao tio em uma viagem pela Guatemala e pelo
México com o objetivo de encontrar parentes em Nova Jersey. O outro envolve Willy,
apelidado de Casper, um jovem membro de uma gangue do México, que se junta a seu
líder e a um recruta de 12 anos para roubar os imigrantes no topo de vagões de carga.
Seus caminhos se cruzam. As motivações são diferentes. A história de Sayra é
“clássica”: ela e seus parentes são motivados pela busca por melhores condições de vida
em Nova Jersey. Casper, por outro lado, viaja depois de ter matado o líder de sua
gangue, fato pelo qual sabe que morrerá. Casper cria um vínculo com Sayra após tê-la
salvado de um estupro. O problema dessa união é que ele é um homem condenado,
ninguém o protegerá das gangues.
A união dos dois demonstra o quanto as migrações modernas estão fortemente
ligadas com a racialização, o colonialismo, a expansão do capitalismo e as decorrentes
estruturas de dominação e, principalmente, desigualdades sociais. Além de jogar luz
sobre o espectro amplo de fatores que podem levar a migração: trabalho, trânsito, união
familiar, causas ambientais, aposentadoria, estudo, aspectos afetivos, gênero, conflitos e
guerras (o fator mais latente no filme), entre outros. Devendo ser interpretada sob o
prisma de múltiplos aspectos que se conectam, sendo eles o: social, cultural, histórico,
geográfico, econômico, entre outros (CAVALCANTI et.al, 2017).
De uma forma ou de outra, ambos acabam caindo na ilusão do "sonho
americano". O sonho é chegar aos Estados Unidos. O pesadelo é fazer a jornada para
chegar lá. As circunstâncias nas quais os protagonistas se encontravam não eram muito
promissoras e Nova Jersey e o Texas acabam representando como um paraíso para onde
os protagonistas podem fugir. O filme é sobre a imigração ilegal, porém quase nada de
seu tempo de execução acontece dentro das fronteiras dos Estados Unidos. O foco
central são os fatores que fazem com que alguns indivíduos corram o risco de
encarceramento, deportação – no caso do tio de Sayra – e até a morte – como se sucedeu
com o pai da protagonista - por uma chance de cruzar a fronteira e escapar dos ciclos de
pobreza, impotência e violência de gangues, reforçando o papel das consequências da
expansão do capitalismo nas migrações.
No caminho as personagens encontram vários locais de apoio aos imigrantes,
organizações privadas e instituições voluntárias tornam o projeto migratório um pouco
mais fácil. São instituições e organizações que ocuparam o espaço no mercado criado
pelo desequilíbrio entre o número de pessoas que pretendem entrar nos países ricos e o
número de vistos concedidos para entrada neles, atuando até mesmo no mercado ilegal,
promovendo serviços de transporte – como o caso da “tia” de Casper – ou travessia de
fronteira além de trabalho para imigrantes sem identidade, falsificação de documentos,
casamentos por conveniência, entre outros. Há também instituições voluntárias – como
é o caso da Casa de Caridade gerida por freiras no longa – que fornecem orientações,
serviços de assistência básica e assessoramento jurídico. Com o tempo e o número de
imigrantes que obtém sucesso na viagem, essas entidades vão se tornando mais
conhecidas e “tornam-se suportes fundamentais que viabilizam os projetos migratórios,
dando origem à concepção de indústria migratória” (CAVALCANTI et.al, 2017).
Há também que se falar da pessoa que espera os imigrantes no fim de sua
jornada. A pessoa de quem a protagonista é obrigada a decorar o número de telefone na
primeira metade do longa. Ela é a representação das redes migratórias em que as
pessoas se apoiam para ganhar acesso a recursos e diminuir possíveis riscos
econômicos, sociais e psicológicos do processo migratório, estremecendo as bases
individualistas da ideologia capitalista (CAVALCANTI et.al, 2017).
É impossível deixar de citar o pequeno Smiley, com seu sorriso cativante, é o
personagem mais assustador, por demonstrar como um efeito poderoso, mesmo
hipnótico, a cultura de gangue pode ter sobre os desassistidos. A seus olhos, o Mago –
líder da gangue assassinado por Casper no trem – é uma inspiração. A gangue oferece
status de colega e ocupa o papel de prestadora de serviços sociais que deveria ser do
estado. Para oprimidos e marginalizados, a participação na gangue oferece a
oportunidade de ser respeitado mesmo que por meio do medo e da intimidação.

Referência
CAVALCANTI, Leonardo, et.al., Dicionário crítico de migrações
internacionais. Ed. UnB. Brasília. 2017. (Introdução - Um convite às teorias e conceitos
sobre migrações internacionais / Verbetes: Imigrante (imigração) e Indústria das
migrações).

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