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Com amor e gratidão dedico este trabalho:

A minha esposa Maria Cristina Mota Santiago e Oliveira, companheira de uma vida e por
estarmos sempre juntos nos mais diversos momentos.

Aos meus filhos, Valmir Antonio de Oliveira Filho, Felipe Santiago de Oliveira e Lívia Mota
Santiago de Oliveira pelo amor, carinho e respeito.
AGRADECIMENTOS

Ao meu orientador Marcos Nogueira por acreditar no meu projeto e pelas suas orienta-
ções que tanto me ajudaram desenvolver e enriquecer este trabalho.
Aos meus pais Hely José de Oliveira (in memória) e Maria Flor de Maio Oliveira (in
memória), e aos meus irmãos Virginia, Vera, Vânia, Vilma, Valter e Valdênia pelo carinho,
incentivo e apoio.
Aos amigos integrantes da Camerata de Violões do CBM Gaetano Galifif, Artur Gou-
veia, Fabio Nin, Eduardo Gatto, Rogério Borda, Elodie Bouny e Adriano Furtado.
A Marina Helena Lorenzo Fernandez pelo carinho, amizade e consideração.
Aos meus professores de violão Geni Rosa (in memória), Mauro Necésio (in memória),
Lindolfo Bicalho e Leo Soares. E também ao grande amigo e violonista Tião Andrade que por
intermédio de grande convivência pude aprender muito da sua experiência e do seu conheci-
mento.
Aos colegas do Conservatório Brasileiro de Música pelo convívio e amizade de tantos
tempos e a todos os meus alunos pelo carinho e confiança.
Aos professores e colegas do mestrado pelo convívio e pelas discussões enriquecedoras.
A Paulo Pedrassoli, Yan Guimarães, Lenine Vasconcelos, Marcelo Mello, Fabio Adour,
Sonia Leal, Luis Carlos Barbieri, Celso Ramalho, Patrícia Peres, Lucinha Macedo, Niágara
Cruz, Talita Peres, Bruno Scantamburlo, Cecília Conde, Elza Greif, Luiz Ricardo Queiroz,
Paloma e Adriano Espínola, enfim a todas as pessoas que ao longo da minha vida me ajuda-
ram construir e realizar este trabalho, participando direta ou indiretamente, em vários momen-
tos de vivências e convivências, onde pude conhecer pessoas, fazer amigos, trocar ideias e
ouvir opiniões que tanto contribuíram para que pudesse concretizar e tornar realidade este
sonho.
Por fim e por intermédio da minha fé, agradeço sobretudo a Deus e a Nossa Senhora por
iluminar o meu caminho.
RESUMO

O violão é um instrumento que se insere bem em diversas culturas, transita facilmente


pela música tradicional, erudita e popular, assim como é bem aceito nas diferentes camadas da
sociedade, podendo ser considerado, em nosso país, um instrumento bem difundido e demo-
crático. Por meio de revisão bibliográfica e pesquisa experimental, pretendo apresentar o vio-
lão como fonte rica de possibilidades e que podem ser exploradas como recursos pedagógicos
no processo de musicalização. No estudo apresento breve abordagem histórica do violão, des-
tacando seu desenvolvimento, a partir do final do século XIX. Em seguida, discuto o conceito
de educação musical como campo de desenvolvimento cognitivo, partindo das ideias propos-
tas por Jacques Dalcroze, destacando a percepção rítmLFDSRULQWHUPpGLRGRV³PRYLPHQWRVGR
FRUSR´HRSURMHWRGH.HLWK6ZDQZLFNTXHHQIDWL]DD³FULDomR´FRPRLPSRUWDQWHHVWUDWpJLD
didática, além de abordar outros pedagogos que ajudaram a fertilizar a educação musical con-
temporânea. Por fim, pretendo apresentar o violão como fonte de recursos de apoio ao desen-
volvimento musical de jovens e adultos, enfatizando, inclusive, o potencial de adequação a
diversos campos e contextos metodológicos. Dentre os domínios experimentais explorados
estão o harmônico, o melódico, o percussivo e o timbrístico. Através deste trabalho pretendo
mostrar que o violão pode cumprir um papel eficaz, de forma criativa, no processo de musica-
lização.
PALAVRAS-CHAVE: Violão; Musicalização; Pedagogia do violão
ABSTRACT

The acoustic guitar is an instrument that fits in diverse cultures, displaces easily through
traditional, classical and popular music. It is well accepted in different layers of society and
can be considered, in our country, an instrument well diffused and democratic. Through
literature review and experimental research, I intend to present the acoustic guitar as a rich
source of possibilities which can be explored as pedagogic resources in the process of
³musicalization´. In this study I present a brief historical approach to the acoustic guitar,
highlighting its development, from the late nineteenth century. Then I discuss the concept of
music education as a field of cognitive development and, more closely, the ideas and
methodologies drawn from the first half of the twentieth century, which fertilized the
contemporary music education. Finally, I intend to present the acoustic guitar as a resource to
support the musical development of youth and adults, emphasizing the potential to match
various fields and methodological contexts. Among the experimental domains explored are
the harmonic, melodic, percussive, and the domain of timbre. By means of this work I intend
to show that the acoustic guitar can play a effective role, creatively, in the musicalization pro-
cess.

KEYWORDS: Acoustic Guitar; Musicalization; Acoustic Guitar Pedagogy


Lista de ilustrações

Figura1: Trecho inicial da obra "Estudo nº3" - Mauro Giuliani ...................................... 23


Figura2: Trecho inicial da obra "Estudo nº22" - Napoléon Coste ................................... 23
Figura3: Trecho final da obra "Capricho Árabe" - Francisco Tarrega ............................ 24
Figura4: Trecho final da obra "Estudo nº12" - H. Villa-Lobos ....................................... 24
Figura5: Trecho inicial da obra "Canticum" - Leo Brouwer ........................................... 25
Figura6: As partes que constituem o Violão .................................................................... 60
Figura7: Representando a nomenclatura das mãos .......................................................... 61
Figura8: Representando a afinação padrão do violão ...................................................... 61
Figura9: Representa as cordas soltas do violão e sua relação com a pauta musical ........ 61
Figura10: Quadro funcional de organização dos acordes a partir das suas funções har-
mônicas .............................................................................................................. 62
Figura11: Representando a associação do três compassos simples com três gêneros mu-
sicais .................................................................................................................. 63
Figura12: Representando o ciclo das quintas .................................................................... 70
Figura13: Organização das sequências harmônicas na ordem dos sustenidos .................. 71
Figura14: Organização das sequências harmônicas na ordem dos bemóis ........................ 71
Figura15: Organização das sequências harmônicas de mesma tonalidade e modos dife-
rentes ................................................................................................................. 79
Figura16: Representação do violão imitando um xilofone ................................................ 87
Figura17: Representação do violão imitando um surdo .................................................... 87
Figura18: Representação do violão imitando um tamborim .............................................. 88
Figura19: Representação do violão imitando uma cuíca ................................................... 88
Figura20: Representação do violão imitando um tarol ...................................................... 88
Figura21: Representação do violão imitando um sino ....................................................... 88
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ............................................................................................................... 12

CAPITULO I
A constituição do violão contemporâneo
1.1 A transição para o violão moderno ......................................................................... 17
1.2 Transformações importantes ................................................................................... 18
1.3 A importância do renascimento do violão .............................................................. 20
1.4 Andrés Segóvia concretiza as transformações ........................................................ 21
1.5 O violão no Brasil ................................................................................................... 25
1.6 Métodos de violão ................................................................................................... 28

CAPITULO II
Transformações em educação musical
2.1 O que é musicalizar? .............................................................................................. 32
2.2 Uma nova metodologia influenciada por um novo ambiente ................................ 34
2.3 Três princípios em que Swanwick baseia a educação musical .............................. 37
2.4 Modelo C (L) A (S) P ............................................................................................ 39
2.5 Oficinas de Música ................................................................................................ 43
2.6 A Oficina de Linguagem Musical desenvolvida por Csekö .................................. 48

CAPITULO III
Relato de uma experiência didático-pedagógica
3.1 Violão, ferramenta de uma proposta ...................................................................... 55
3.2 Contexto de desenvolvimento do trabalho ............................................................ 56
3.3 Procedimentos básicos ........................................................................................... 58
3.4 Violão de acompanhamento .................................................................................. 62
3.5 Aspectos iniciais da leitura no violão .................................................................... 72
3.6 Convergência no violão, do prático com o conceitual ........................................... 74

CAPITULO IV
Violão, uma ferramenta para a educação musical
4.1 Proposta metodológica no violão .......................................................................... 80
4.2 Os recursos expressivos e efeitos produzidos pelo violão ..................................... 81
4.3 Musicalizando com o violão .................................................................................. 86
CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................... 92
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................. 94
APÊNDICE ....................................................................................................................... 97
12

INTRODUÇÃO

Ao longo da minha trajetória como professor tive a oportunidade de trabalhar em todos


os níveis do ensino da música, tais como a musicalização infantil, que pode ser considerado
um equivalente ao curso de alfabetização, o fundamental e o nível médio, em conservatórios
que, no Estado de Minas Gerais, trabalham com uma estrutura similar ao da Educação Básica.
Posteriormente, passei a dar aulas em faculdades de música, ensinando violão nos cursos de
licenciatura em educação artística e musicoterapia. Percebi, no decorrer desse tempo, que o
violão pode oferecer interessantes possibilidades e recursos para o aprendizado da música,
principalmente em seu estágio inicial, ou preparando professores da Educação Básica para
que possam utilizar esses recursos em suas atividades pedagógicas.
Com a presente pesquisa pretendi desenvolver um método1 que associasse por adapta-
ção os procedimentos metodológicos de Dalcroze, Swanwick e da ³oficina de música´ ± neste
último caso com ênfase no trabalho desenvolvido pelo professor Luiz Carlos Csekö em sua
"Oficina de Linguagem Musical". Considero a hipótese de que este conjunto de ideias e práti-
cas reúne as condições necessárias para a constituição de um projeto consequente de musica-
lização, no seio do qual o violão possa desempenhar papel central.
Émile Jacques Dalcroze (1865 - 1950), músico compositor, educador, ator, diretor de
teatro, jornalista e coreógrafo, tem sido considerado pela literatura especializada o precursor
do ensino renovador de música, estabelecendo a importância fundamental do sentido rítmico

Método: Procedimento, técnica ou meio de se fazer alguma coisa específica de acordo com um plano. Ordem
lógica ou sistema que regula uma determinada atividade, é um meio, um recurso ou qualquer procedimento téc-
nico, científico ou também, um conjunto de regras e princípios normativos que regulam o ensino ou a prática de
uma arte. (Dicionário eletrônico Houaiss 2.0a 1679 cf. MetLus)
Método: Você tem um método quando há um determinado caminho para alcançar um determinado fim proposto
de antemão como tal. Um método adequado não é apenas um caminho, mas sim a possibilidade de abrir novos
caminhos para que seja alcançado uma determinada proposta de maneira mais completa. (MORA, pp. 197 -200)
13

percebido através do movimento do corpo por intermédio da escuta consciente, o que resultou
no desenvolvimento do método que ficou conhecido por Eurythimics. Elza Lancman Greif
(1994) afirma que "o pensamento de Dalcroze estava em conformidade com o pensamento
pedagógico da época, apoiado na Biologia e na Psicologia. A aplicação desse pensamento no
ensino da Música é que era o novo". Portanto:
Em 1903, este pedagogo cria um método que surge como uma necessidade
contra a aprendizagem concentrada em exercícios de virtuosismo técnico, de
leitura e escrita, em análise e classificação. (...)Notamos no trabalho de J.-
Dalcroze uma intenção de partir do que era biologicamente natural na crian-
ça. A respiração e os movimentos corporais de uma criança, o andar, o pular,
o correr, o balanceio são os ritmos básicos vitais, inatos, presentes em todo
ser humano. (GREIF 1994, p. 37, 42)

Keith Swanwick (1938 - ), educador inglês que já atuou como regente, compositor e
músico de orquestra, professor emérito do Instituto de Educação da Universidade de Londres
e formado pela Royal Academy of Music, propôs em seu A Basis for Music Education (1979)
a ³teoria espiral´GR desenvolvimento musical, baseada nas ideias de Jerome Bruner. No seu
trabalho como educador, ele busca alinhar as formas práticas do fazer musical com as práticas
educacionais, proporcionando atividades envolvidas diretamente com a música. Nestas o co-
nhecimento dá-se por descobertas, tendo em vista que o aprendizado é construído pelo próprio
aluno. Swanwick afirma que "em uma educação musical integrada e coerente, na qual a crian-
ça compõe, toca e escuta, as fronteiras dentro do processo musical desaparecem "(p.95).
$ ³RILFLQD GH P~VLFD´ é uma metodologia em educação musical que se estabeleceu a
partir da apropriação dos resultados das experiências estéticas renovadoras propostas pelos
compositores de música erudita, sobretudo após a 2ª Guerra Mundial. Dentre outras tantas
inovações, este ³movimento pedagógico-musical´SURS{VDLQFRUSRUação do ³ruído´RXVHMD
de toda a gama de sons que nos cercam ao conjunto de recursos sonoros tradicionais. Sua con-
sequência mais significativa no desenvolvimento teórico-metodológico em educação musical
± muitas vezes conduzida por esses próprios compositores ± foi revalorização da criatividade,
da experimentação, da improvisação e da indeterminação. Todo o processo pode ser desen-
volvido através do trabalho de manipulação de objetos sonoros, que podem ser inventados ou
descobertos pelos alunos, dedicado a pessoas de diferentes faixas etárias e culturais, privilegi-
ando o desenvolvimento da capacidade criativa.
14

³$FKDPDGDPHWRGRORJLDGHRILFLQDGHP~VLFDSRGHULDVHGHILQLUSHODrQIDVH
à criatividade; à experimentação, à manipulação e organização de sons; à so-
cialização, tanto no processo criativo como na avaliação deste, tendo como
interesse maior o desenvolvimento do aluno, de suas potencialidades en-
TXDQWRSHVVRD´ 3$=S

Luiz Carlos Csekö (1945 -), mestre em composição, educador e reconhecido difusor da
metodologia das oficinas de música, especialmente na cidade do Rio de Janeiro, é oriundo da
mesma geração de músicos/compositores que constituíram a metodologia das Oficinas de
Música do Brasil (GREIF, 1994). Csekö desenvolveu o seu próprio projeto educacional a "O-
ficina de Linguagem Musical" no qual a criação e a estilística contemporânea são utilizadas
como instrumento de educação.
A abordagem da OLM está alicerçada no experimentar-criar- refletir-
elaborar-conceituar a linguagem musical. A OLM utiliza sempre a lingua-
gem musical contemporânea experimental, abarcando também a tradicional.
(CSEKÖ, 1988, p.439)

Tenho por objetivo aprofundar o conhecimento sobre as ideias e métodos desenvolvidos


por Dalcroze, Swanwick e Csekö, para que, à luz desses conhecimentos, possa desenvolver
uma discussão acerca da inserção do violão como recurso central de um projeto de musicali-
zação relacionado a essas linhas condutoras. Uma das estratégias da pesquisa é o levantamen-
to de dispositivos técnicos, efeitos e recursos do violão, visando o uso do instrumento na ini-
ciação musical, em escolas específicas de ensino de música, bem como em escolas regulares.
Sendo o violão um instrumento portátil, de aquisição relativamente acessível, com notável
aplicação nos gêneros folclóricos e no campo da música popular brasileira profissional (tanto
quanto no repertório de concerto), é largamente difundido no país e naturalmente pode ofere-
cer ao professor um rico equipamento material, possibilidades expressivas e criativas no aten-
dimento de diversas faixas etárias e contextos.
Desenvolvo, pois, este trabalho enfocando o violão como instrumento musicalizador,
tendo em vista diversas razões que me parecem relevantes. Na América Latina, no princípio
do século XX, começaram a aparecer novos métodos de ensino do instrumento, novas propos-
tas de explorações rítmicas e sonoras, além de um repertório violonístico mais voltado às rea-
lidades culturais próprias de cada lugar. O Brasil contribuiu expressivamente, tanto com mé-
todos quanto com um relevante repertório característico, com inúmeros intérpretes de desta-
que e com obras que contribuem até hoje para a evolução técnica e a ampliação estética do
instrumento. Assim sendo, entendo que a investigação de possibilidades para utilização do
instrumento no processo de educação musical é de importância indiscutível, considerando o
15

fato de que os métodos de violão existentes no mercado preocupam-se exclusivamente com a


preparação do instrumentista para a performance artística.
O violão é um instrumento que ressurge no final do século XIX com muitas transforma-
ções na sua estrutura física, passando a chamar atenção dos compositores, que redescobriram
o instrumento como notável fonte de inspiração para suas criações. Por que não utilizar todas
essas possibilidades na educação musical? Acredito que este trabalho venha contribuir com
novos recursos e oferecer possibilidades e ferramentas que podem muito contribuir para o
ensino e a aprendizagem musical.
A presente pesquisa parte de uma experiência pedagógica pessoal, num contexto real, e
se constitui com base do desenvolvimento de um método experimental, a partir do qual eu
proponho apresentar, exemplificar e desenvolver as ideias que enfocam o violão como ins-
trumento musicalizador. Busco na fundamentação teórico-metodológica acima referida pres-
supostos e conceitos que dialogam com minhas próprias experiências e ideias; e considero
ainda a revisão bibliográfica da literatura para o ensino do violão uma etapa necessária para
que se torne mais evidente a distinção entre um ensino voltado para a formação e o desenvol-
vimento das competências artísticas do violonista e o processo de musicalização com o violão,
objeto da presente pesquisa.
A constituição do violão contemporâneo dá-se no final do século XIX, mesmo momento
em que transformações importantes acontecem nos mais diversos segmentos, desencadeando
uma grande revolução no campo intelectual, social e artístico, dirigida contra as bases do ro-
mantismo. Apesar de mera coincidência temporal o violão, a partir, digamos, de seu "renas-
cimento", passa a dispor de uma nova estrutura que possibilita ser integrado às novas, diversas
e revolucionárias ideias de educação musical que surgem nessa mesma atmosfera de trans-
formações. Portanto, enfatizo o violão contemporâneo como peça importante para o desen-
volvimento deste trabalho, na perspectiva de que através de sua nova estrutura ele possibilite
um dialogo com essas novas metodologias.
No capítulo I, faço uma breve abordagem da história do violão onde procuro enfatizar
as suas principais transformações, a partir final do século XIX, tanto no aspecto da sua estru-
tura física, quanto também em suas evoluções técnicas que trazem por consequência o surgi-
mento de novo repertório, novos intérpretes, novos métodos e novas possibilidades de explo-
ração do instrumento, não só de forma convencional, como instrumento melódico e harmôni-
co, mas também evidenciando suas riquezas tímbricas e percussivas, compondo assim um
conjunto de ferramentas apropriadas para serem utilizadas na educação musical.
16

No capítulo II, proponho discussão acerca da educação musical, baseando-me no pen-


samento metodológico de Dalcroze, Swanwick e Csekö. Dalcroze não só como precursor do
surgimento de novas metodologias no campo da educação musical, mas também por ter como
princípio a percepção rítmica sentida através dos movimentos corporais, este um pressuposto
básico para o desenvolvimento da presente pesquisa, onde entendo que o pulso é a base, o
alicerce. Já a partir da segunda metade do século XX encontro nas pesquisas de Swanwick o
propósito de buscar no aluno não só os recursos inerentes a cada um, mas também no ambien-
te e na sua própria cultura buscar os recursos disponíveis para o desenvolvimento criativo de
uma educação renovadora ± o que, de algum modo, faz de Swanwick um dos precursores da
FKDPDGD³oficina de música´. Descrevo o trabalho da Oficina de Linguagem Musical do pro-
fessor e educador Luiz Carlos Csekö, na qual pude constatar vários elementos congruentes e
constituintes das metodologias2 de Dalcroze e Swanwick.
No capítulo III descrevo os processos iniciais do aprendizado do violão, mesclando o
procedimento de leitura prática de cifras com a leitura de partituras, colocando em jogo recur-
sos melódicos e harmônicos aplicados à prática violonística, com o objetivo de dar formação
básica aos alunos do curso de Licenciatura em Educação Artística, para, em etapa posterior,
levá-los a conhecer os demais recursos tímbricos e percussivos do instrumento e assim com-
pletar a formação do futuro professor da educação básica com respeito ao emprego do violão
como ferramenta de musicalização.

2
Metodologia: Ramo da lógica que se ocupa dos métodos das diferentes ciências. Parte de uma ciência que
estuda os métodos aos quais ela própria recorre.investigação e estudo, segundo métodos específicos, dos compo-
nentes e do caráter subjetivo de uma narrativa, de um poema ou de um texto. corpo de regras e diligências esta-
belecidas para realizar uma pesquisa. (Dicionário eletrônico Houaiss 2.0a 1858 cf. MS6 )
Metodologia: Lógica ou parte da lógica que estuda os métodos. Conjunto de procedimentos metódicos de uma
ou mais ciências. (ABBAGNANO, 2000 p.668)
Metodologia é uma preocupação instrumental. Trata das formas de se fazer ciência. Cuida dos procedimentos,
das ferramentas, dos caminhos. A ciência propõe-se a captar e manipular a realidade assim como ela é. A meto-
dologia desenvolve a preocupação em torno de como chegar a isto (...). A metodologia é somente instrumento
para chegarmos lá. Discutimos caminhos possíveis, os já vigentes, os que poderíamos inventar, os discutíveis, os
que já se superam, e assim por diante. (DEMO, p. 19, 22. 1987)
17

CAPÍTULO I
A constituição do violão contemporâneo

A TRANSIÇÃO PARA O VIOLÃO MODERNO


Não é objetivo da presente pesquisa desenvolver uma história do violão, mas para que possa-
mos situá-lo no contexto em que se propõe desenvolver este trabalho, torna-se necessário con-
textualizar brevemente o surgimento do violão como o conhecemos hoje. Os instrumentos de
cordas têm a sua origem na antiguidade, tais como os instrumentos de sopro e percussão. A
denominada família dos cordofones, também conhecida pelo nome genérico de instrumentos
de cordas, subdivide-se em diferentes categorias, devido aos vários modos de produzir som,
com métodos diferenciados, como pinçar, dedilhar, friccionar e percutir.
O violão se desenvolveu de forma consideravelmente lenta em relação ao desenvolvi-
mento de outros instrumentos. Norton Dudeque enfatiza que:
o desenvolvimento do violão, desde o século XVI, quando era um instru-
mento pequeno de quatro ordens, até o instrumento atual, levou quatro sécu-
los. Uma evolução lenta se comparada ao violino ou o piano, mas que resul-
tou em um dos instrumentos mais apreciados nas salas de concerto hoje
(DUDEQUE, 1994, p. 79).

Mas é entre o final do século XVIII e o decorrer de todo século XIX que o violão apresenta
significativas mudanças, com a criação de um importante repertório violonístico e o surgi-
mento de importantes métodos para o ensino do instrumento, que trouxeram significativo de-
senvolvimento de novas técnicas. É neste período também que o instrumento passa por trans-
formações em sua estrutura física, adquirindo novas dimensões, em busca de um melhor de-
sempenho em termos de qualidade e projeção sonoras, fazendo com que chegasse à forma na
qual o conhecemos atualmente. Mesmo tendo sido intensas as transformações ocorridas no
18

instrumento, durante o século XIX, período romântico, os músicos desta época viam o violão
como instrumento em declínio, valorizando, por outro lado, o piano, apontado por Berlioz,
por exemplo, como o grande instrumento daquele momento.
A passagem do século XVIII para o XIX adquiriu significativa importância
na trajetória do violão. Foi um período de transformação marcado pelo de-
clínio de quase dois séculos de apogeu da guitarra de cinco ordens ± a guitar-
ra espanhola e de inovações que encaminhariam o instrumento a uma nova
configuração. (TABORDA, 2011, p.65)

As primeiras mudanças mais significativas no instrumento começaram pelas cordas, que


passaram de cordas duplas para cordas simples, e a adoção de uma sexta ordem de cordas à
guitarra de cinco ordens, feita pelo luthier alemão Jacob Augustus Otto (1764 - 1830), por
volta de 1790. Luis Ricardo Queiroz ressalta que esta afirmação é objeto de discussão e
controvérsia entre pesquisadores e que:
De acordo com Henrique (1994), é por volta do séc. XVIII que as cordas
passam de duplas para simples. Mas, segundo muitos pesquisadores, essa
discussão é incerta, assim como a de quem e quando se fez a adição da sexta
corda, fato que costuma ser atribuído ao alemão Jacob August Otto. Segundo
alguns registros da época já existiam guitarras de seis cordas há mais de um
século. Outra hipótese seria que Herr Naumann, mestre da capela de Dres-
den, teria sido o responsável pela adição da sexta corda. No entanto, apesar
de ser confirmada a presença da guitarra na Alemanha, esta hipótese é pouco
provável, pois Naumann estudou música na Itália e, provavelmente, trouxe
consigo várias guitarras italianas e Espanholas. (QUEIROZ, 2000, p.11)

Mesmo passando por um curto período de interseção entre estes instrumentos, a guitarra
barroca de 5 ordens de cordas duplas perde força com o surgimento do instrumento de seis
RUGHQV GH FRUGDV GXSODV TXH SRVWHULRUPHQWH SDVVRX D VHU FKDPDGD ³JXitarra clássico-
URPkQWLFD´(VWHLQVWUXPHQWRDSUHVHQWDYDMiHPVXDHVWUXWXUDVHLVFRUGDVVLPSOHVHFRPTXDVH
todas as características do violão, estabelecendo a afinação utilizada até os dias de hoje, co-
meçando da corda solta mais aguda para a corda solta mais grave: Mi(a), Si, Sol, Re, Lá,
Mi(g).

TRANSFORMAÇÕES IMPORTANTES
Como observa Dudeque (1994), ao final do século XIX, surge Antonio Torres Jurado (1817 -
1892), que era marceneiro de profissão, mas que aprende a arte de construir violões sobre a
orientação do luthier José Pernas (1830 - 1870), ambos naturais da Espanha. Sobre a influên-
cia de músicos como Julian Arcas (1832 - 1882) e Francisco Tárrega (1852 - 1909), o já luthi-
19

er Antonio Torres promove mudanças importantes no instrumento, em relação ao modelo en-


tão vigente, a guitarra clássica, surgindo assim o violão moderno. Dudeque aponta as princi-
pais mudanças promovidas por Antonio Torres, tornando-se assim referência para a maioria
dos construtores de violão do século XX. As principais inovações promovidas por ele são:
O uso da cravelha mecânica, equilibrando melhor a afinação; o comprimento
da corda vibrante em 650 mm; mudança nas proporções da caixa de resso-
nância; mudança no tamanho do braço; e a mais importante das inovações
que é o uso de leque, que é um conjunto de tiras de madeira coladas na parte
anterior do tampo e que asseguram uma melhor distribuição dos harmônicos
e um equilíbrio melhor do som. (DUDEQUE, 1994, p. 77, 78).

Esta estrutura passa a ser realmente uma referência de estrutura para o violão,
principalmente como modelo de um instrumento concertista. Mas devo advertir que da
passagem do século XIX para o XX até os dias de hoje, o violão ainda sofreu várias
modificações de toda ordem.
Há uma característica peculiar ao desenvolvimento do violão, desde o seu
surgimento até os dias de hoje: jamais lhe definiram padrão de estrutura, ta-
manho, forma, afinação, numero de cordas etc. A anatomia do instrumento
apresenta elementos comuns aos cordofones: cordas pinçadas para produção
de som, mecanismo de afinação, braço e escala que permitem modificar o
comprimento da corda e produzir notas diferentes, corpo e caixa de resso-
nância. O formato oitavado da caixa é distintivo do violão. (TABORDA,
2011, p.34)

Notamos que a exploração é um fator que sempre esteve presente na evolu-


ção da guitarra, um instrumento que se fortaleceu desse aspecto não só na
forma de tocar como também na sua estrutura física. O fato de ser um ins-
trumento que apresenta grande diversidade sonora e grandes possibilidades
de mudança na sua construção, faz com que a exploração de novos recursos
se mantenha presente à realidade do instrumento até os dias atuais. (QUEI-
ROZ, 2000, p.10)

A estrutura tradicional do violão tem como referência o modelo que ficou patenteado
como "Modelo Torres" e que mesmo mantendo o nome, assume vários diferentes formatos
que vão desde a sua caixa de ressonância, tamanho na extensão do braço e inúmeras variações
do número de cordas, considerando ainda que dependendo do modelo do violão, as cordas
caracteristicamente podem ser de aço ou de nylon, enfatizanto até o gênero musical em que
ele é empregado ou inserido.
20

A IMPORTÂNCIA DO RENASCIMENTO DO VIOLÃO


Em decorrência de tantas transformações e do desenvolvimento de basicamente toda a estru-
tura do violão, em busca de melhor desempenho sonoro, fez-se necessário também o desen-
volvimento de uma nova postura para o instrumentista, que passou a ter em mãos um novo
instrumento com possibilidades expressivas a serem descobertas. As novas dimensões do ins-
trumento impõem, naturalmente, uma nova relação com o corpo do instrumentista. Não po-
demos deixar de pensar que ao executar um instrumento, e aqui me refiro, especificamente, ao
violão, estamos desenvolvendo movimentos de contato com o instrumento para que possamos
produzir outro movimento percebido como música. Mark Johnson ressaltou que ³RVLJQLILFa-
GR GHQWUR H IRUD GD P~VLFD QmR p YHUEDO RX OLQJXtVWLFR PDV PDLV FRUSRUDO H VHQWLPHQWDO´
(JOHNSON, 2007, p.242).
Neste sentido quem desenvolveu um primeiro pensamento relativo à nova posição entre
o instrumentista e o instrumento foi o violonista Francisco Tarrega, sugerindo colocar o vio-
lão na perna esquerda elevada por um apoio, suporte de pé ou banquinho e fazendo com que
ela fique mais alta do que a perna direita. Como isso, encaixa-se, posteriormente, o violão
entre as duas pernas, visando basear-se no equilíbrio do instrumento com o nosso corpo, para
que se obtenha um bom desempenho na sua execução, tendo o corpo como ponto fixo ou ba-
se. Sendo assim o violonista poderia desenvolver, de maneira mais segura, todos os movimen-
tos físicos necessários para uma boa realização técnica, baseada no princípio elementar de que
todo objeto terá equilíbrio perfeito, quando estiver, no mínimo, apoiado em três pontos de
apoio bem distribuídos.
(...) as mudanças nas dimensões do violão, fazendo com que ele se tornasse
um instrumento maior, fazem com que posteriormente o violonista Francisco
Tárrega sugerisse um novo posicionamento para segurar e tocar o violão.
Posição até hoje adotada, em que o violão é apoiado sobre a perna esquerda.
(DUDEQUE, 1994, p. 78)

As mudanças em torno das soluções para a melhora da sonoridade do violão acarreta-


ram uma nova postura para a execução e proporcionaram o surgimento de uma nova geração
de compositores e instrumentistas interessados nessas novas possibilidades expressivas do
instrumento. Francisco Tárrega constitui-se assim num personagem muito importante, contri-
buindo fundamentalmente para o desenvolvimento técnico, musical e didático do violão, a
partir da segunda metade do século XIX. Ele recuperou inúmeras obras de períodos anterio-
res, compondo um repertório até hoje muito executado. Inúmeras inovações técnicas por ele
21

criadas vieram a definir as bases da técnica do violão moderno apesar de o mestre não ter dei-
xado, propriamente, um método de ensino. Dudeque destaca suas inovações:
- A racionalização da digitação de obras para violão, antes raramente indica-
da nas partituras;
- A racionalização da posição do instrumento em relação ao corpo do ins-
trumentista;
- O uso do toque de apoio em que o dedo da mão direita que pulsa a corda é
apoiado na corda imediatamente superior;
- Mudança da posição da mão direita em decorrência do uso do apoio, fa-
zendo com que o dedo mínimo deixasse de ser apoiado no tampo;
- A altura das cordas no cavalete sofreu uma mudança de 2mm., como era na
guitarra clássica para 6 a 7mm. no violão moderno.

Francisco Tarrega teve grandes seguidores e discípulos: Miguel Llobet (1878


- 1938), Emilio Pujol (1886 - 1980), Josefina Robledo (1897 - 1972) que
prestaram grande contribuição ajudando a difundir, aperfeiçoar e perpetuar a
sua escola violonística. (DUDEQUE, 1994, p. 80)

ANDRÉS SEGÓVIA CONCRETIZA ESTAS TRANSFORMAÇÕES


Considerado um dos mais proeminentes discípulos de Francisco Tarrega mesmo que de forma
indireta; Andrés Segóvia (1893 - 1987) sugeriu outra importante mudança que também ocor-
reu no bojo do desenvolvimento do violão moderno. Por seu intermédio, insistência e notável
influência introduziu-se o uso das cordas de nylon, fabricadas pela indústria francesa Dupont,
especificamente a seu pedido. As cordas anteriormente eram feitas de tripas; com a adoção
das cordas de nylon o instrumento passou a apresentar melhores resultados em termos de afi-
nação, sonoridade, resistência e durabilidade. Em 1946, ainda por influência de Segóvia, as
cordas de nylon passaram a ser produzidas em escala industrial pelo fabricante Albert Agusti-
ne. Como salienta Queiroz:
Andrés Segovia além de grande virtuose responsável pela divulgação das o-
bras para o violão foi também o grande responsável pela ampliação das
mesmas. Mesmo considerando-se autodidata não nega, na sua formação, ser
um discípulo indireto de Francisco Tárrega, e também admite ter sido influ-
enciado por Llobet através de gravações e encontros com ele. . (QUEIROZ,
2000, p.18)

Segóvia cumpriu ainda outro papel muito importante no desenvolvimento do violão


moderno do século XX, constituindo-se um grande intérprete do instrumento e divulgando
intensamente a obra de compositores importantes. Parte significativa desses compositores
compôs obras a ele dedicadas, fazendo surgir assim o consagrado "estilo Segoviano" de inter-
pretar, além, é claro, de promover o aumento expressivo do repertório violonístico. Em virtu-
22

de do seu trabalho, o violão passou a ser respeitado como instrumento de grande valor artísti-
co, ganhando prestígio e ocupando um lugar de respeito na programação das salas de concer-
to. Dentre os tantos compositores que dedicaram suas obras ao grande intérprete destacam-se
Joaquim Turina (1882 - 1949), Federico Moreno Torroba (1891 - 1982), Manuel de Falla
(1876 -1946), Alexander Tansman (1897 - 1986), Manuel Ponce (1882 - 1948), Mario Castel-
nuovo-Tedesco (1895 - 1968) e Joaquim Rodrigo (1901 - 1999), que dedicou a ele a "Fantasia
para un Gentilhombre", mas que se notabilizou por compor o mais conhecido e interpretado
concerto para violão e orquestra dedicado ao também violonista espanhol Regino Sanz de la
Maza (1987 - 1981), o "Concierto de Aranjuez".
Segóvia cumpriu agendas de extensas tournées, confirmando a divulgação e consolida-
ção de um repertório exclusivo para o instrumento. Dudeque (p. 86) destaca que Segóvia de-
dicou-se também ao ensino do violão propagando sua técnica, e dentre suas atividades peda-
gógicas mais relevantes estão as que ocorriam em Santiago de Compostela na Espanha, Aca-
demia Musicale Chigiana di Siena na Itália, Julliard School e Manhattan School of Music em
Nova Iorque USA, ministrando até os 94 anos de idade suas famosas masterclasses.
Embora contemporâneo de compositores da chamada música impressionista, Segóvia
não celebra em seu repertório obras de cunho vanguardista, privilegiando a atmosfera do perí-
odo romântico e neoclássico, o que não diminui o papel de fundamental importância que cer-
tamente desempenhou para o instrumento, no século XX. Um aspecto muito relevante na sua
biografia é um elenco de obras de valor inestimável para o repertório do violão moderno, sur-
gido por circunstância da amizade estabelecida entre ele e o célebre compositor brasileiro
Heitor Villa-Lobos (1887 - 1959).
Villa-Lobos compôs entre 1924 e 1929 a série dos 12 estudos para violão, dedicados a
Segóvia que escreveu o prefácio. Em 1951, compôs, a pedido do mesmo compositor, o Con-
certo para violão e pequena orquestra, estreado em 1956, na cidade de Houston, USA, tendo
ambos os músicos, respectivamente, como regente e solista. A obra de Heitor Villa-Lobos
para violão não se restringiu somente a estas peças. Destacam-se principalmente a Suíte Popu-
lar Brasileira 1908 a1912 e os 5 Prelúdios, em 1940, dentre muitas outras. É importante des-
tacar que Villa-Lobos produzia no violão uma sonoridade bastante arrojada frente aos compo-
sitores interpretados por Andrés Segóvia, utilizando-se de efeitos tais como os dedos indica-
dor e médio da mão direita cantando a melodia nas cordas graves, rasgueos, glissandos e arpe-
jos, muitas vezes com acordes em sequências de posições fixas com baixo pedal ou não, e
misturado sempre, quando há possibilidades, com cordas soltas, associados a ritmos tipica-
23

mente brasileiros, incorporando elementos das canções populares, folclóricas e indígenas,


além de aliar uma harmonia dissonante com utilização do emprego de tensões harmônicas
menos convencionais nestes gêneros, como acordes diminutos e meio-diminutos em sequên-
cia, nonas, décimas primeiras, décimas terceiras, etc. Cumpre observar que Villa-Lobos sem-
pre busca associar esses recursos com emprego de cordas soltas. Estas observações podem
bem ser verificadas, confrontando-se alguns trechos de obras escritas desde o final do século
XIX e o estilo de Villa-Lobos.

Figura1.
Trecho inicial da obra "Estudo nº3" - Mauro Giuliani (1781 - 1829)
Elementos Fundamentales de la Tecnica Guitarristica - Ejercicios de Arpegios. Bueno Aires, Editora Ricordi
Americana, 1970.

Figura 2.
Trecho inicial da obra "Estudo nº22" - Napoléon Coste (1805 - 1883) A Escola de Tarrega - Método Completo
de Violão. Rio de Janeiro, Editora Irmãos Vitale, 1962.
24

Figura 3.
Trecho final da obra "Capricho Árabe" - Francisco Tarrega. Editora Antich y Tena. Valencia, 1924.

Figura 4.
Trecho final da obra "Estudo nº12" - H. Villa-Lobos. Doze estudos para Violão. Editor Max Eching. Paris, 1953.
25

Figura 5.
Trecho inicial da obra "Canticum" - Leo Brouwer. Ed. Recordi, 1939

O VIOLÃO NO BRASIL
Segundo Taborda (2001, p.5), no Brasil o violão foi introduzido pelos portugueses, no século
XVI, com o nome de viola ou viola de arame. Informações sobre a introdução da viola no
Brasil nos levam a crer que esta se deu por duas vias: pelos colonos portugueses e pelos jesuí-
tas. Os colonos pertenciam na sua maioria a camadas subalternas da sociedade e os jesuítas,
além de pertencerem às classes dominantes, também eram a elite cultural da colônia. Assim
sendo, é importante salientar que, no aspecto social, desde seu advento em nosso país o violão
já se apresentava como instrumento com o qual os jesuítas, em seu processo de catequese,
difundiram a cultura musical moderna do ocidente às classes então subalternas, como a socie-
dade, à época, tinha os escravos africanos, os índios e os mestiços. Taborda afirma que:
Notícias certas sobre violas de arame só aparecem de fato nas cartas dos je-
suítas, que chegaram ao Brasil com Tomé de Souza em 1549. Foram eles
que introduziram aqui, de modo sistemático, as violas e os demais instru-
mentos europeus. (TABORDA, 2011, p.41)

A viola, posteriormente violão, que de acordo com Taborda (p.23) é um "mero aumen-
tativo de viola, vocábulo empregado para este instrumento, única e exclusivamente nos países
GH OtQJXD SRUWXJXHVD´ IRL PXLWR LPSRUWDQWH na execução de gêneros tais como a modinha,
26

trazida também pelos portugueses, e ritmos europeus como valsas, schotish escocesas, polcas
e tangos. Ao "abrasileirar" alguns desses gêneros, pode ser dito que surgiram ritmos importan-
tes na nossa cultura musical.
A presença do violão no desempenho da sustentação rítmico-harmônica re-
velou-se em alguns casos, aspecto identificador do próprio gênero musical a
que servia de base. Basta lembrar a importância que assumiu na música po-
pular brasileira o chamado baixo-cantante, realizado pelo acompanhamento
violonístico, e, mais recentemente, a batida "bossa-nova", que transpôs para
o violão o padrão de acompanhamento que tipifica o próprio gênero. (TA-
BORDA, 2011, p.11)

O violão fez produzir no Brasil grandes compositores e instrumentistas que são de fun-
damental importância para a história do nosso violão. A pesquisadora Myriam Taubkin em
seu livro Violões do Brasil faz um importante apanhado dos violonistas que constituem a his-
toria do violão no Brasil até a atualidade (TAUBKIN, 2007, P.240). Dentre os mais importan-
tes estão: "Sátiro Bilhar, Brant Horta, Joaquim Francisco dos Santos (Quincas Laranjeiras),
Mozart Bicalho, Melchior Cortez, Heitor Villa-Lobos´compositor este cujas obras para vio-
lão são interpretadas no mundo inteiro com obras de referência.
Podemos dizer que nos mais diferentes gêneros surgidos na música popular brasileira o
violão tem uma função importante e participativa. Foi ³SHODVFRUGDVGHXPSiQKR´FRPRRV
violonistas em geral chamam seu instrumento ± nome decorrente da madeira mais utilizada
para a construção do seu tampo desde as modificações introduzidas por Tárrega ± que muitos
compositores celebrizaram grandes obras da nossa música popular. O violão teve uma grande
divulgação desde suas mudanças estruturais, no final do século XIX, alcançando o status de
instrumento presente em cursos universitários nos anos 1980. Por outro lado, a grande versati-
lidade do instrumento o tornou popular na maioria dos países do mundo, adequando-se aos
mais diversos estilos e gêneros de música de cada lugar.
A guitarra tornou-se um instrumento de tal forma popular, que só nos Esta-
dos Unidos existem 15 a 20 milhões de guitarras (Rossing, 1990). Contribui
para isso a sua estrutura simples (apesar do comportamento vibratório e a-
cústico ser muito complexo) e a relativa facilidade de afinação e de transpor-
te. É também um instrumento muito versátil, sendo utilizado em manifesta-
ções musicais muito diversas. (HENRIQUE, 2002, p.398)

Todavia o ensino do ³violão clássico´ se mantém, até hoje, ligado à formação de ins-
trumentistas que continuam desenvolvendo, principalmente em conservatórios, centros uni-
versitários e universidades, o ensino e a aprendizagem do FKDPDGR³violão erudito´ RX³FOis-
VLFR´ . Nesse contexto os procedimentos básicos, considerados essenciais na iniciação ao vio-
27

lão, e todo o processo de desenvolvimento técnico foram estabelecidos por mestres como os já
citados anteriormente e herdados por nós. Esta herança se estende tanto no tocante ao repertó-
rio quanto aos métodos que ainda na atualidade são considerados imprescindíveis, devido à
sua importância para o desenvolvimento técnico dos alunos. Desde o período clássico uma
literatura básica orienta a organização do ensino do violão e o desenvolvimento de procedi-
mentos didáticos, observando as dificuldades técnicas de forma progressiva. No entanto,
Queiroz acrescenta,
Outro ponto que pode ser observado é que a apreciação e valorização do ins-
trumento é em parte fruto da sua grande popularidade, pois foi um instru-
mento que nasceu para a canção popular, mantendo até hoje uma forte liga-
ção com a cultura de todos os lugares onde é cultivado. Acreditamos ter sido
essa grande popularidade do instrumento o fator impulsor para a organização
do ensino do violão e o surgimento dos primeiros métodos que garantiram o
aprimoramento de sua execução. Sendo assim concluímos que a forte influ-
ência popular da guitarra foi a principal razão do seu enobrecimento.
(QUEIROZ, 2000, p.9)

Não é difícil observar que o violão é um instrumento que se mostrou propício a


transformações e atualizações exigidas pelos novos estilos emergentes ao longo do período
histórico aqui abordado. À medida que se buscou explorar suas diversas possibilidades
sonoras e de mudanças na estrutura fisica, nas palavras de Carlevaro:
o violão não permanece quieto, o violão sempre se transforma. Há muitos
instrumentos que são uma só coisa, mudam os tempos e não lhes é permitido
amoldar-se aos novos tempos. O violão permite amoldar-se. É um instru-
mento muito dócil, tanto para o camponês ± caipirinha ± que toca seu violão
em toda a América do Sul, como para um concerto clássico, como para ou-
tras coisas. É muito amoldável, é como água que se amolda em qualquer re-
cipiente.(CARLEVARO, 1997, p.5 apud QUEIROZ, 2000,p.29 ).

Enfim, o violão se reinventa, se reconstrói e se adapta ao contexto do tempo e da atualidade


em que se situa, buscando sempre novas possibilidades e recursos. Podemos prever que con-
siderando a história recente do instrumento, haverá ainda muitas coisas a serem criadas para e
³SHOR´YLROmR
28

MÉTODOS DE VIOLÃO
Método (vide introdução) em seus diversos significados pode traduzir um meio de se fazer
alguma coisa específica de acordo com um planejamento, um sistema que regula uma deter-
minada atividade, um modo, um meio de agir, uma maneira de se comportar, um procedimen-
to técnico científico, um conjunto de regras ou princípios normativos que regulam procedi-
mentos. O significado de método mais adequado ao contexto em que se propõem os métodos
de violão e de como eles foram desenvolvidos é definido por Aurélio Buarque de Holanda
Ferreira como um "caminho para chegar a um fim, caminho pelo qual se atinge um objetivo,
processo ou técnica de ensino" (1999, p.1328). No contexto aqui abordado, um método de
violão é a organização de um conjunto de procedimentos de ensino e aprendizagem, disposto
através de um planejamento.
Os métodos de violão, como forma de organização didática têm o sentido de orientar
um estudo sistemático no aprendizado do instrumento, e começaram a surgir a partir do perío-
do clássico. Baseado nas datas de edições, os métodos estão organizados a partir do estilo de
época em que foram constituídos, tais como: clássico, romântico, moderno e contemporâneo.
Apesar de as datas das edições justificarem a classificação de métodos dentro dos períodos
moderno e contemporâneo, percebe-se uma forte influência da estilística romântica sobre os
trabalhos considerados moderno e contemporâneo, o que traduz uma característica muito con-
servadora, até hoje praticada no ensino do ³violão clássico´. Enfim, a força da ³escola român-
WLFD´ ainda é considerada por muitos didatas do violão de fundamental importância para a
iniciação do aprendizado e desenvolvimento de uma boa técnica na execução do instrumento.
Podemos assim organizar os métodos em:

Pré - Clássicos
FERANDIERI, Fernando. Arte de Tocar la Guitarra Española por Música. Madri, Edi-
tor Pantaleon Azmar, 1799.
MORETTI, Frederico. Princípios Para Tocar la Guitarra de Seis Ordenes. Madri, Editor
José Rico, 1799.

Clássicos
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Ed.fac-similada, 1980.
CARCASSI, Matteo. Méthode Complète pour la Guitare, Paris. Troupenas, 1836. Min-
koff, Gêneve, Ed.fac-similada, 1988.
29

CARCASSI, Matteo. Novo Método de Violão Opus 59. São Paulo, editora Irmãos Vita-
le. 2000.
CARULLI, Ferdinando. Methode Complete Pour Parvenir a Pincer de la Guitarra - Op.
241. Paris, Editeur Monsieur Carli. 1825.
CARULLI, Ferdinando. La Harmonia Aplicada a la Guitarra. Paris: 1825. Minkoff, Gê-
neve, Editeur Monsieur Carli. Paris, Ed.fac-similada, 1987.
COSTE, Napoléon. Méthode Complète pour la Guitare par Ferdinand Sor, rédigée et
augmentée par N.Coste. Paris, Schonenberger, ca.1845.
GIULIANI, Mauro. Studien für Gitarren. Heft I-30 und Heft II-31. B. Schott's Söhne.
Mainz, 1957.
GIULIANI, Mauro. Método Per Chitarra. Milano, Ancona, Edizioni Musicali Berben,
1964.
SOR, Ferdinando. Méthode pour la Guitare. L'auteur, Paris, 1830. Minkoff, Genève,
Ed.fac-similada, 1981.
SOR, Ferdinando. Method for the Spanish Guitar. London, 1896. Ed.fac-similada: New
York Shattinger Internacional Music Corp, 1977.

Românticos
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Ricordi, 2007.
ARENAS, Mario Rodrigues. 27 Estudios Superiores , libro IVº. Bueno Aires, Ricordi,
2007.
ARENAS, Mario Rodrigues. Estudios e Preludios, libro Vº. Bueno Aires, Ricordi, 2007.
ARENAS, Mario Rodrigues. Técnica Superior libro VIº. Bueno Aires, Ricordi, 2007.
ARENAS, Mario Rodrigues. Estudio Conmpleto de las Escalas y Ejerciocios en 3ª, 6ª,
8ª y 10ª libro VIIº. Bueno Aires, Ricordi, 2007.
PUJOL, Emilio, Escuela Razonada de la Guitarra, 1º,2º, 3º, 4º vols. Bueno Aires, Ricor-
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Modernos e Contemporâneos
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Derecha( Arpejos e ejerciocio vários). Buenos Aires, Editorial Barry, 1966.
30

CARLEVARO, Abel. Serie Didática para Guitarra Cuarderno Nº3 - Tecnica de la Mano
Izquierda( Traslado de la mano izquierda en el diapasón). Buenos Aires, Editorial Bar-
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rânea 1º caderno parte A. Buenos Aires, Barry Editorial, 1972.
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PINTO, Henrique. Iniciação ao Violão(princípios básicos e elementares para principian-


tes). São Paulo, Editora Ricordi Brasileira, 1978.
PINTO, Henrique. Iniciação ao Violão, volume II (complemento). São Paulo, Editora
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SOARES, Oswaldo. A Escola de Tarrega - Método Completo de Violão. Rio de Janeiro,
Editora Irmãos Vitale, 1962.

Assim como o violão, no contexto da sua história, transforma-se e desenvolve-se estru-


tural e tecnicamente, também se constitui didaticamente associado aos estilos de época con-
forme são organizados na evolução da história da música tendo os métodos como testemu-
nhos diretos deste desenvolvimento, aliado à construção de um repertório que também o ca-
racteriza significativamente. O quadro acima apresentado intenciona produzir, através da or-
ganização dos métodos, uma associação sistemática, a partir da evolução dos estilos de época
e de suas influências.
Mesmo que tenhamos na atualidade uma recorrente busca aos exercícios propostos
principalmente por métodos dos períodos clássico e romântico, vemos em métodos constituí-
dos recentemente como, por exemplo, Guitarra y Educacion Musical Contemporânea (Farias
e Zarate) abordagens que associam o aprendizado do violão com processos de educação musi-
cal. Esses trabalhos aliam-se a metodologias surgidas a partir do século XX, utilizando-se de
uma linguagem de sinais e símbolos usuais e característicos do repertório contemporâneo e,
por consequência, do violão contemporâneo. Assim sendo, os métodos trazem na sua evolu-
ção uma importante contribuição não somente para a constituição didática do instrumento,
mas também por caracterizarem o estudo da amplitude de seus recursos técnicos, explorados
no bojo do desenvolvimento do próprio instrumento.
32

CAPITULO II
O desenvolvimento da educação musical

O QUE É MUSICALIZAR
Descobrir, sentir, criar, improvisar, experimentar são palavras que norteiam de um modo geral
a base do pensamento acerca do desenvolvimento de diversas propostas pedagógicas criadas
para educação musical e surgidas a partir do final do século XIX. No decorrer do último sécu-
lo, a importância da percepção de som e ritmo para a formação do músico passa ser mais rele-
vante do que a aprendizagem mais concentrada em escrita, leitura e exercícios técnicos repeti-
tivos. Schafer (1991) salientou que "uma aula deve ser uma hora de mil descobertas. Para que
isto aconteça, professor e aluno devem, em primeiro lugar, descobrir-se um ao outro" (p.277).
Discutindo a questão dos chamados "métodos ativos" em educação musical, Marisa
Trend Fonterrada(2002) observa que "nem todos podem, na verdade, ser considerados méto-
dos, mas abordagens3 ou propostas4". Aqueles TXH SRGHPRV GHQRPLQDU ³DWLYRV´ surgiriam
através da participação ativa do aluno numa interação direta com o professor, na intenção de
que possa compreender e perceber a matéria prima da música, som e ritmo. Para isso, no en-
tanto, o estudo de suas propriedades e a aplicação desse conhecimento passa a fazer parte in-
tegrante do desenvolvimento das primeiras ideias de uma nova educação ativa e participativa.

3
Abordagem - visão de um assunto; ponto de vista sobre uma questão; maneira ou método de enfocar ou inter-
pretar algo. (Dicionário eletrônico Houaiss 2.0a - 1767cf. DDP)
4
Proposta - Ato ou efeito de propor. Projeto proposto para alguma realização e que será estudado, avaliado.
(Dicionário eletrônico Houaiss 2.0a - 1679cf. AV Serm)
Proposta - Ato ou efeito de propor, expor, apresentar dados da experiência sobre os quais deverá se apoiar o
conhecimento. (FERREIRA, 1999, p.1651)
33

Rousseau é o primeiro pensador da educação a apresentar um esquema pe-


dagógico especialmente voltado para educação musical. De acordo com ele,
as canções devem ser simples e não dramáticas, e seu objetivo é assegurar
flexibilidade, sonoridade e igualdade às vozes. As ações proposta por ele não
incluem a leitura musical, que só deveria ocorrer anos mais tarde. (FON-
TERRADA, 2002, p.60)

Aprender a perceber e sentir, para num processo posterior grafar e conhecer os sinais
musicais proporciona um pensamento voltado para o desenvolvimento natural do aprendiza-
do, onde o individuo passa ser um personagem integrado às atividades como parte de um pro-
cesso interativo entre ele e o professor. Elza Greif (1994) diz que "a educação antiga colocava
o conteúdo da aprendizagem no centro de toda atividade pedagógica; a educação renovada ou
funcional coloca o aluno no centro, respeitando todas as suas características biológicas e psi-
cológicas" (p.65). A participação ativa do aluno em interação com o professor favorece o sur-
gimento de um novo comportamento para o desenvolvimento de atividades pedagógicas, evi-
tando a postura autoritária do professor frente aos alunos, que chegava ao constrangimento e,
muitas vezes, prejudicava a fluência do aprendizado.
2V HOHPHQWRV ³VRP´ H ³ULWPR´ VH FRQVWLWXHP FRPR HVVHQFLDLV SDUD D FRPSUHHQVmR GR
aprendizado da música, principalmente em um processo inicial de educação musical. O des-
dobramento destes elementos em suas propriedades tais como: altura (grave e agudo), intensi-
dade (forte ou fraco), duração (tempo que dura o som), andamento (velocidade mais lenta e
mais rápida) e timbre (características harmônicas da fonte sonora), passaram a ser importantes
componentes para que novas metodologias de ensino da música emergissem de propostas
voltadas para a percepção, a apreciação e o entendimento de uma estilística identificadora de
uma nova estética da música e do repertório violonístico, em especial. José Nunes Fernandes
(1997) diz que o "desenvolvimento da percepção de outros parâmetros sonoros musicais: tim-
bre, altura, registro, densidade, evoluções, texturas, assim como também a integração de lin-
guagens, com a utilização de várias linguagens simultaneamente" (p.28) são muito importan-
tes para que o aluno desenvolva a sensibilidade para os fenômenos sonoros. Entende assim
que se trata de um domínio através do qual a música e a educação musical contemporâneas se
desenvolvem, buscando-se na interiorização destes fenômenos a base para que o aluno descu-
bra os novos recursos aí envolvidos. Maura Penna considera que estímulo ao desenvolvimen-
to da percepção é muito importante para que o aluno fixe o seu aprendizado, ao dizer que:
34

"A educação musical deve prever e desenvolver os esquemas perceptivos


que fundamentam a sensibilização ao fenômeno sonoro, pois ³R DOXQR WHP
de realizar internamente a descoberta dos conceitos, através da sua própria
atividade percHSWLYD´ Ao professor cabe planejar atividades de modo a leva-
lo a essa descoberta, orientando-o, ajudando-o no processo de conscientizar
a aquisição do conceito e de forma-OR´ (PENNA, 1991, p.48)

A participação integrada de professor e alunos traz à tona a prática e a vivência dos pro-
cedimentos elaborados e criados dentro de sala de aula. Schafer (1991) diz que "como músico
prático, considero que uma pessoa só consiga aprender a respeito de som produzindo som; a
respeito de música, fazendo música" (p.68), e Swanwick (2003) afirma que, "em qualquer
programa abrangente de educação musical, os processos musicais devem ser usados da forma
mais rica possível" (p.54). Então, penso que o processo musicalizador é um diálogo propor-
cionado entre os elementos essenciais da música e as diversas estratégias de perceber esses
elementos, aliado à interação entre quem ensina e quem aprende, sem desconsiderar a auto-
nomia do indivíduo a quem se dirige a ação educacional.

UMA NOVA METODOLOGIA INFLUENCIADA POR UM NOVO AMBIENTE


Surge na Europa e nos Estados Unidos, na passagem do século XIX para o século XX, um
novo pensamento conhecido por ³psicologia funcional´, que, como o próprio nome traduz,
fundamenta-se no funcionamento da mente em harmonia com os princípios do desenvolvi-
mento e do crescimento dos seres. Para Greif (1994), seu reflexo na educação se traduz na
afirmação de John Dewey, que a "Educação é desenvolvimento dentro, por e para a experiên-
cia, é natural e está em harmonia com os princípios de crescimento" (p.24). No momento em
que o mundo vivenciava transformações importantes como o crescimento industrial e a ex-
pansão urbana, observa-se que toda a atmosfera de mudanças e transformações coincide tam-
bém com o momento do surgimento das primeiras ideias acerca do desenvolvimento de uma
educação musical renovadora.
O final do século XIX foi sacudido por uma tremenda reviravolta intelectual,
social, moral e artística, contundentemente dirigida contra as bases sustenta-
doras do romantismo. Como em outros períodos históricos, essa revolução
manifestou-se nas artes, de tal maneira que é possível traçar-se um paralelo
entre a reversão de noções do espaço pictórico, da forma e da tonalidade, e
as reavaliações de espaço e tempo efetuadas pela física. (FONTERRADA,
2002, p.91)
35

Na Europa os dois grandes nomes representativos desta corrente e que são responsáveis
pelo desenvolvimento desse novo pensamento, dentre outros, são os suíços Édouard Claparé-
de (1873 - 1940) e Jean Piaget (1896 - 1980), e nos Estados Unidos destacam-se William Ja-
mes (1842 - 1910) e John Dewey (1859 - 1952). Esta nova corrente produz grandes influên-
cias no campo da pedagogia como um todo, proporcionando mudanças no contexto educacio-
nal, voltado para a reforma do ensino baseado no princípio de que o conhecimento se dá por
descobertas que o próprio educando faz, e que o aprendizado é pelo próprio educando cons-
truído. No campo das artes estes pressupostos, ideias, conceitos e pensamentos são percebidos
e sentidos com clareza:
John Dewey colocara a arte no centro da sala de aula, tirando-a do pedestal
que se encontra desde o século XIX; exerce grande influência nos meios e-
ducacionais nos Estados Unidos e no exterior, e é um dos responsáveis pela
reviravolta no ensino pré-escolar. Sua influência no Brasil é grande, graças à
ação de seu discípulo Anísio Teixeira, e faz sentir-se principalmente nos jar-
dins de infância e pré-escolas, como eram denominados os centros de educa-
ção infantil. (FONTERRADA, 2002, p.103).

No Brasil as ideias trazidas com pioneirismo pelo discípulo de John Dewey, o educador
e jurista Anísio Teixeira (1900 - 1971) ficou conhecido como movimento "escolanovista"
cujo objetivo era renovar o ensino, contrapondo-se ao considerado "tradicional". Fernandes
(1997) nos lembra que "os métodos escolanovistas buscavam na atividade do aluno a livre
expressão, a criação e a improvisação" (p. 53). O objetivo era proporcionar ao aluno elemen-
tos a partir dos quais pudesse, passo a passo, construir o seu conhecimento sobre determinado
tema. Com isso o educando desenvolveria sua capacidade de mudar, levando em conta que a
forma como escolhemos participar do processo educacional reflete a forma como achamos
que deva ser nossa sociedade. Regina Márcia Simões Santos (2001) afirma que:
Uma das manifestações desta "pedagogia renovada" ( que se instala no Bra-
sil como movimento a partir da Semana de Arte Moderna, na década de
1920 e vigora a partir dos anos de 1930) vem ser a "Escola Nova", criada no
final do século XIX na Europa e que tem sua elaboração americana no início
do século XX, com as ideias de John Dewey: uma educação pela ação. Na
Escola Nova, Educação Nova, Escola do Trabalho, Pedagogia Ativa, Prag-
mática ou Progressista - o currículo se desenvolveria não mais com base nas
matérias de estudo convencionais, mas nas atividades e ocupações da vida
presente. (SANTOS, 2001, p.13)

Émile Jacques Dalcroze (1865 - 1950), músico compositor, educador, ator, diretor de
teatro, jornalista e coreógrafo é reconhecido como verdadeiro precursor das primeiras ideias
acerca do ensino renovador da música, se constituindo historicamente num dos marcos da
36

Escola Nova na pedagogia musical. Fonterrada (2008) diz que Dalcroze "percebeu que o erro
do ensino de música era não permitir que os alunos experimentassem sonoramente o que de-
viam escrever" (p. 122). A sua inquietação refletia seu inconformismo com o modelo conser-
vatorial de sua época, que era construído a partir dos ideais democráticos da Revolução Fran-
cesa, no Conservatório Superior de Música de Paris, no final do século XVIII.
A premissa de Dalcroze é de que uma educação musical deveria partir da
audição (escuta consciente), e que esta implicaria na participação de todo
corpo, na construção de imagens claras. Ele tem como pressuposto o fato de
que os "sons são percebidos por outras partes do organismo humano além do
ouvido" ( os músicos, involuntariamente, usam o corpo como "expressão do
pensamento", usam gestos corporais para marcar acentuações musicais). Pa-
ra Dalcroze uma educação musical deveria reintegrar corpo e mente, pensa-
mento e comportamento, pensamento e sentimento, consciente e subconsci-
ente, gosto e entendimento. (SANTOS, 2001, p.19)

A atmosfera vivida por Dalcroze, naquele momento, principalmente considerando o


surgimento de novos pressupostos e perspectivas de transformações renovadoras em diversos
campos como os da biologia, da psicologia e da pedagogia, e tendo o reconhecimento e o en-
dosso científico de Édouard Claparéde5, traz para a educação musical o desenvolvimento de
um trabalho que contempla o ritmo em movimento com o corpo. Greif (1994) esclarece que
"quando Jaques-Dalcroze criou o seu método, em 1903, havia na Europa e nos Estados Uni-
dos essas novas perspectivas sobre a Psicologia da criança e a Educação. Pensamos, portanto,
que há pontos comuns que podem ser encontrados em seu pensamento e no pensamento da
Pedagogia daquela época" (p. 41).
Há, no método de Dalcroze, elementos que refletem o pensamento da filoso-
fia e da Pedagogia do início do séc. XX. Nas últimas décadas do séc. XIX e
primeiros anos do séc. XX, houve uma eclosão de pensamentos filosóficos,
biológicos e psicológicos que trouxeram uma renovação na Educação nos
Estados Unidos e nos países da Europa (GREIF, 1994, p. 39)

No método Dalcroze, conhecido como Eurythmics, o ritmo é de importância fundamen-


tal, uma vez que os estudantes são introduzidos na música através do movimento e da dança,
valorizando também a criatividade e a improvisação. Ermelinda Azevedo Paz (2000) corrobo-
ra afirmando que "a rítmica de Dalcroze, denominada Eurritmia, entronizou o corpo como
catalisador do ritmo e de todos os fenômenos musicais. A tônica era dizer eu sinto em lugar
de eu sei" (p. 10).

5
Em 1906 Claparéde respondendo a uma carta de Dalcroze, já reconhecia que este tinha sido capaz de perceber
a importância psicológica do movimento como suporte dos fenômenos intelectuais.(FONTERRADA, 2002,
p.125)
37

TRÊS PRINCÍPIOS EM QUE SWANWICK BASEIA A EDUCAÇÃO MUSICAL


Keith Swanwick é um educador inglês que também atuou como regente, compositor e músico
de orquestra. É professor emérito do Instituto de Educação da Universidade de Londres e
formado pela Royal Academy of Music. Em seu estudo, realizado no âmbito de ³oficinas de
música´, buscou desenvolver a capacidade do aluno de entender o que lhe é proposto, e ob-
servou o que o aluno traz de sua realidade que possa contribuir para tornar o ensino mais flu-
ente, no sentido de um diálogo entre aluno e professor. Swanwick valorizou a criatividade e a
improvisação, utilizando-se de todo e qualquer material sonoro disponível no ambiente, além
do que os alunos trouxessem para a exploração dos sons. Desse modo, a notação musical pas-
sa a ser apenas o último passo a cumprir. O processo pode ser descrito em três princípios sim-
ples de ação:
1- Considerar a música como um discurso.
2- Considerar o discurso musical dos alunos.
3- Dar ênfase à fluência.

Swanwick considera que a música funciona metaforicamente através da transformação


GRVVRQVHP³PHORGLDV´GDV³PHORGLDV´ em estruturas simbólicas, e as estruturas simbólicas
HP H[SHULrQFLDV VLJQLILFDWLYDV ³(VVHV SURFHVVRV PHWDIyULFRV VmR LQWHrnos, invisíveis, mas
podemos observar seus efeitos nas várias camadas da atividade musical. Chamo essas cama-
das matérias, expressões, forma e valor´ SWANWICK, 2003, p. 56). Ele ainda complementa
TXH³XPDHGXFDomRHPP~VLFDSUHVXPHTXHRVDOXQRVWrPDSRVVibilidade de acesso aos três
SURFHVVRVPHWDIyULFRV´ Ibid., p. 57).
Ao considerarmos música como discurso, estamos pensando nos sons como formas ex-
pressivas de comunicação com movimentos e dinâmicas. Um simples exercício pode se trans-
formar em uma frase musical, desde que sejam agregados a ela elementos como mudanças de
timbre, acentos, velocidade e níveis de intensidade distintos, isto é, R³PRYLmento da música e
DµHPRomR¶ humDQD´Segundo ele, o caráter expressivo:
está implícito em muitos tipos de decisões de performance, na escolha do
andamento, nos níveis de acentuação, nas mudanças de dinâmica e na articu-
lação ± como movimento de um som ao outro som está organizado.
(SWANWICK, 2003, p. 62).

Considerar tal procedimento significa adotar pensamento contrário àquele que propõe
aos nossos alunos a repetição indefinida dos mesmos esquemas e a memorização de fórmulas
38

diversas, aplicando-se o mesmo exercício tantas vezes quanto necessárias para que ³VHWRUQH
quase impossível errar´3HUSHWXDQGRHVWHSURFHGLPHQWR estamos contribuindo para a manu-
tenção e a continuidade da não criação; considerar o discurso musical do aluno significa res-
peitar o seu fazer musical, dentro de suas possibilidades e conhecimento. No entanto Swan-
wick observa que:
2OKDUXPHILFLHQWHSURIHVVRUGHP~VLFDWUDEDOKDQGR HPYH]GHXP³WUHLQa-
GRU´RX³LQVWUXWRU´ pREVHUYDUHVWHIRUWHVHQVRGHLQWHQomRPXVLFDOUHODFLo-
nado com propósitos educacionais: as técnicas são usadas para fins musicais,
o conhecimento de fatos informa a compreensão musical. (SWANWICK,
2003 p. 58).

Assim sendo, a bagagem musical do aluno, advinda de uma aprendizagem espontânea,


ou seja não necessariamente construídos de maneira formal, constitui-se a base de um dos
princípios essenciais desse novo paradigma pedagógico. Este conhecimento trazido pelo aluno
é constituído através da relação estabelecida com amigos, parentes, tocando espontaneamente,
sozinho e em grupos. Swanwick entende que neste princípio o aluno desperta ³FXULosidade,
desejo de ser competente, o querer imitar os outros, a necessidade de inteUDJLU´ Ibid., p. 67).
Assim o ambiente da sala de aula é enriquecido com as possibilidades de trocas de experiên-
cias, tocando, apreciando, observando as diferenças individuais de cada um, encontrando
³IRUPDVFULDWLYDVSRUPHLRGDYDULHGDGHGRGLVFXUVRPuVLFDO´(Ibid., p. 68).
A habilidade de tocar um instrumento usando sua criatividade, sua capacidade de im-
provisação, utilizando todo e qualquer material sonoro disponível no ambiente para a explora-
ção é o que caracteriza o terceiro principio proposto por Swanwick, que pRGDIOXrQFLD³(s-
ses músicos têPPXLWRDHQVLQDUVREUHDVYLUWXGHVGHWRFDU³GHRXYLGR´, sobre as possibilida-
des de ampliaçãRGDPHPyULDHGDLPSURYLVDomRFROHWLYD´ ibid., p. 69). Transportando este
princípio para uma realidade brasileira, podemos imaginar um ensaio de Escola de Samba,
onde a fluência dos ritmistas é de fundamental importância para o desenvolvimento eficiente
dos trabalhos no decorrer dos ensaios até a performance final; cito também os grupos de mú-
sica folclórica, bandas de rock e os corais.
É precisamente a fluência, a habilidade auditiva de imaginar a música, asso-
ciada à habilidade de controlar um instrumento (ou a voz), que caracteriza o
jazz, a música indiana, o rock, a música steel-pan [do caribe], uma grande
parte de música computadorizada e música folclórica em qualquer país do
mundo. (SWANWICK, 2003 p. 69).

O ponto comum entre os três princípios é que a notação musical passa a ser o último
passo a ser dado, porém a visão metafórica do discurso musical se traduz em vivências musi-
39

cais formais e não formais, possibilitando uma conexão com a fluência e integrando os três
princípios nos quais Swanwick baseia o processo educativo. Entretanto ele diz que:
Tomados conjuntamente, os três princípios podem ajudar a manter o ensino
musical em um bom caminho, a mantê-OR ³PXVLFDO´ &RQVLGHUDU D P~VLFD
como discurso, considerar o discurso musical dos alunos e enfatizar a fluên-
cia, talvez seja mais eficaz em um amplo conjunto de situações de ensino do
que o detalhamento da documentação curricular. Esses cuidados ajudam a
pensar sobre a qualidade da educação musical, sobre como em vez de o que.
(SWANWICK, 2003 p.70).

Portanto os três princípios, estão intrinsecamente ligados e se constituem em um proces-


so educacional de musicalização que possibilita aos alunos a participação ativa nas aulas, to-
cando, improvisando, enfim, criando experiências musicais dentro de sua própria realidade e
condições, levando em conta o fazer musical em todos seus aspectos, do começo ao fim.

MODELO C (L) A (S) P


A educação é um processo de construção e, entre outros aspectos, de construção de conheci-
mento. Neste sentido temos a busca de elementos que servirão de apoio para o desenvolvi-
mento de uma educação musical transformadora. Uma boa educação musical exige a compre-
ensão sobre suas etapas, valores e funções, que podem ser considerados fundamentos seguros
para o trabalho do educador musical. Para construirmos uma educação transformadora e cria-
tiva precisamos contextualizá-la. Ou seja, se a educação visa transformar, é necessário saber o
que se tem e o que se deseja ter.

O Modelo CLASP, idealizado por Keith Swanwick para o desenvolvimento do trabalho


em educação musical, fundamenta-se em três atividades que integradas de forma interativa
são consideradas pilares básicos para o aprendizado da iniciação musical: composição - C,
apreciação - A e performance - P. Swanwick acredita que compor, ouvir e tocar possa trazer
em conjunto um enriquecimento muito grande no processo de aprendizagem e de envolvimen-
to com a música. Segundo ele isso estimula o surgimento de ideias criativas no trabalho em
grupo, na busca do aprimoramento, na troca de informações e experiências, e com isso os
alunos podem desenvolver melhor a comunicação e a compreensão do pensamento musical.
A ordem de como ele propõe serem dispostas as modalidades, sendo primeiramente a
composição, depois a apreciação e, por fim, a performance, traz a ideia da importância de
como devem ser, segundo o educador, desenvolvidas as atividades no processo pedagógico ±
adverte ainda que deve-se levar em conta a natureza de cada uma das atividades e a diferença
40

entre elas, respeitando-se as características próprias de cada modalidade. Cecília Cavalieri


França, juntamente com Keith Swanwick (2002 p. 15), diz que "um dos fundamentos contem-
porâneos da educação musical se baseia na ideia de que as três modalidades são, de alguma
forma, interativas, e devem ser integradas na educação musical", associando também o pen-
samento de que:
Em uma abordagem integrada e coerente da educação musical na qual as cri-
anças compõem, tocam e ouvem música, as fronteiras entre os processos
musicais desaparecem. Quando elas compõem, por exemplo, não há como
deixarem de aprender enquanto performers [intérpretes-executantes] e ou-
vintes, tanto quanto como compositores. Isso é a interdependência (Mills
1991, p. 88, apud FRANÇA; SWANWICK, 2002, p.16 )

As três atividades, compor, ouvir e tocar, são entremeadas por outras duas atividades
que são a ³técnica´ ou a aquisição de habilidades representadas pela letra (S) de skill acquisi-
tion e D³literatura´RXRVestudos acadêmicos representados pela letra (L) de literature studi-
es, consideradas por Swanwick como periféricas e que por este motivo são colocadas entre
parênteses. Contudo salienta que ajudam a completar a sigla C(L)A(S)P, dando suporte ao
complemento do trabalho educativo que representa todo o modelo, trazendo atrelado a este
uma visão filosófica sobre a educação musical ao destacar o que é central e o que é periférico.
Central e periférico, no entanto, complementam-se em torno do processo didático. França e
Swanwick (2002) salientam ainda que:
Na prática, os cinco parâmetros devem ser inter-relacionados de forma equi-
librada, oferecendo um leque de possíveis atividades curriculares. No entan-
to, a recomendação de equilíbrio não quer dizer que as três modalidades de-
vem estar presentes em todas as aulas. Elas podem ser distribuídas ao longo
destas, uma atividade sendo consequência natural da anterior, para que, ao
final de um determinado período, os alunos tenham vivenciado uma série de
experiências inter-relacionadas. (...) Uma atividade de apreciação de uma o-
bra de dois minutos pode dar início a um projeto de composição que durará
três ou quatro aulas. O equilíbrio deve ser qualitativo, e não, quantitativo.
(FRANÇA; SWANWICK, 2002, p. 18)

No Brasil, o modelo C(L)A(S)P foi traduzido por Alda Oliveira e Liana Hentschke6
como modelo (T)EC(L)A, buscando manter a mesma filosofia em que foi constituído o mode-
lo originalmente, destacando as atividades centrais e entre parênteses as secundárias, em que
(T) representa técnica, E, execução, C, composição, (L), literatura e A, apreciação. Pode-se
observar que a partir da tradução da sigla, a ordem das atividades sofre mudanças, em uma
aparente ideia de que o conteúdo de cada atividade é mais importante do que a relevância da

6
Consta em nota de rodapé no Livro Ensinando Musica Musicalmente (SWANWICK, 2008, p.70)
41

ordem em que foram constituídas. Swanwick fez questão de implantar este modelo a partir da
composição, visto que se trata de uma ideia já consagrada, não somente por ele mas por ou-
tros pedagogos e compositores ingleses como John Paynter e George Self, como primeiro
fundamento da educação musical em seu país. Fonterrada afirma que:
Nas propostas de Paynter e Self, não se trata apenas de descobrir e registrar
novos sons, mas de organiza-los como música a partir de escuta ativa, pro-
funda e atenta, de modo a permitir a reprodução do som ouvido e a criação
de novos sons. É a partir daí que se constroem as propostas de criação sono-
ra(composição). (...) Criatividade e crença nas possibilidades compositivas
da maior parte dos alunos das escolas não especializadas, com ênfase no es-
timulo a invenção e à construção da própria experiência (FONTERRADA,
2002, p.186)

A composição é uma atividade que está ligada intrinsecamente à criação e por isso é
vista por Swanwick como uma real forma de envolvimento com a construção do discurso mu-
sical. A composição é tratada neste contexto como processo inicial de educação, advertindo,
todavia, que um processo avançado de composição deve ser tratado em outros aspectos.
Nos estágios iniciais, o objetivo deve ser brincar, explorar, descobrir possibi-
lidades expressivas dos sons e sua organização, e não, dominar técnicas
complexas de composição, o que poderia resultar em um esvaziamento do
seu potencial educativo. Nas aulas, muitas oportunidades para compor po-
dem surgir a partir da experimentação que demanda ouvir, selecionar, rejei-
tar e controlar o material sonoro. (FRANÇA; SWANWICK, 2002, p.10)

Apreciação é a atividade localizada por Swanwick no centro da sigla C(L)A(S)P, fazen-


do um elo de ligação entre a composição e a performance. Aprender a ouvir é importante para
estabelecer contato com a integralidade dos bens musicais, desde a experiência com a música
folclórica e popular até o conhecimento de um repertório tradicional e erudito, menos consu-
mido no dia a dia, conhecendo os diversos efeitos por ele propostos, as formas musicais ori-
undas de diferentes culturas, assim como toda a sua gama de recursos sonoros e expressivos.
Podemos considerar que ouvir/apreciar música é uma atividade extremamente acessível e fácil
de ser realizada, ocorrendo em circunstâncias variadas da vida dos alunos e, portanto, não
restrita ao ambiente de sala de aula. Contudo, é neste ambiente que o educador pode procurar
proporcionar o entendimento mais amplo dessas experiências.
O ouvir permeia toda experiência musical ativa, sendo um meio essencial
para o desenvolvimento musical. É necessário, portanto, distinguir entre o
ouvir como meio, implícito nas outras atividades musicais, e o ouvir como
fim em si mesmo. No primeiro caso, o ouvir estará monitorando o resultado
musical nas várias atividades. No segundo, reafirma-se o valor intrínseco da
atividade de se ouvir música enquanto apreciação musical. (FRANÇA;
SWANWICK, 2002, p.12)
42

A performance é o último pilar da estrutura deste modelo de educação musical, mas não
considera habilidades virtuosísticas. No modelo C(L)A(S)P espera-se do aluno que se expres-
se e empregue suas habilidades de forma simples e direta. A performance é o resultado de
todo o trabalho desenvolvido desde o início das atividades propostas neste modelo, criando no
aluno a confiança de enfrentar uma pequena plateia, mostrando o seu trabalho. Segundo Fran-
ça e Swanwick, "performance musical abrange todo e qualquer comportamento musical ob-
servável, desde o acompanhar de uma canção com palmas à apresentação formal de uma obra
musical para uma plateia" (FRANÇA; SWANWICK, 2002, p.14).
Portanto a forma de como é desenvolvido o modelo tem uma relação direta com a forma
proposta pela sigla original C(L)A(S)P; França; Swanwick (2002), ponderam que:
- É preciso lembrar que um modelo é uma teoria apresentada em forma grá-
fica. Sua configuração externa tem uma lógica interna, bem como uma fun-
damentação que lhe respalda. Alterar-lhe a aparência pode afetar sua autenti-
cidade.
- C(L)A(S)P representa uma visão filosófica, uma hierarquia de valores so-
bre o fazer musical. Composição, apreciação e performance são os pilares do
fazer musical ativo, e por isso estão distribuídos simetricamente na sigla
C(L)A(S)P.
- No original C(L)A(S)P, as habilidades técnicas (S ± skills) aparecem pro-
positadamente mais ao fim da sigla, indicando o cuidado que se deve ter para
não permitir que o desenvolvimento técnico se sobreponha à centralidade do
fazer musical ativo dentro de um nível técnico acessível aos alunos.
- Do ponto de vista do vernáculo, entendemos que a sigla C(L)A(S)P não re-
sulta em uma expressão estranha ou difícil de ser memorizada a ponto de
justificar sua tradução. (FRANÇA; SWANWICK, 2002, p.18,19)

As outras duas atividades constituídas como periféricas e secundárias, a técnica e a lite-


ratura, fazem parte da abrangência em que o modelo C(L)A(S)P foi idealizado e devem ser
inter-relacionadas de forma equilibrada com as outras atividades, sendo importante enfatizar
que quanto mais acessível for uma atividade, maiores serão as chances de o aluno demonstrar
e desenvolver seu entendimento musical. A técnica corresponde ao domínio de diversos re-
cursos para que se possa executar bem e de maneira segura um instrumento ou para cantar. O
conhecimento da literatura traz importantes elementos que muito ajudam a compreender me-
lhor diversos aspectos de uma peça, tais como estilo de época, forma, estética, época da com-
posição, quem foi seu autor. Portanto, as atividades ³literatura´(L), literature studies, e ³téc-
nica´ (S), skill acquisition, são coadjuvantes importantes que proporcionam o enriquecimento
do estudo e ajudam a alcançar os objetivos pedagógico e artístico.
No modelo C(L)A(S)P é muito importante que, na medida do possível, todas as cinco
atividades possam ser distribuídas de forma equilibrada, com o objetivo de que uma seja
43

complemento de outra, sem dimensionar quantidade. O professor deve procurar perceber e


entender com coerência que qualquer das cinco modalidades pode ser estendida ou não em
cada sessão de aula, sem ter que obedecer a uma unidade rigorosa de medida. É importante
que se estabeleça uma relação integrada e equilibrada entre as modalidades, para que o pro-
fessor possa assim administrar com qualidade o desenvolvimento do processo pedagógico,
desde que o modelo tem uma relação direta com a forma proposta pela sigla original.

OFICINAS DE MÚSICA
Antes de tratar das questões relativas à ³Oficina de Música´, faço aqui uma síntese dos traços
estilísticos da estética musical moderna e contemporânea que foram objetos da presente pes-
quisa. Isso é necessário por entender que a partir das mudanças de pensamento estrutural e
dos modos de manipulação da matéria sonora é que surgiram as profundas mudanças no de-
senvolvimento das propostas pedagógicas musicais, na Europa e na América do Norte. O eco
dessas transformações trouxe-nos, consequentemente, uma ampla reformulação de pressupos-
tos entre os educadores brasileiros, que viria a desencadear o desenvolvimento da metodolo-
gia da ³Oficina de Música´'HVVHPRGR, não é difícil afirmar que se trata de uma proposta
pedagógica intrinsecamente ligada às correntes da música contemporânea, à gênese do pro-
cesso criativo e à aquisição e à consolidação de uma nova linguagem.
2VWHUPRV³P~VLFDPRGHUQD´H³P~VLFDFRQWHPSRUkQHD´VmR usualmente empregados ±
assim como o serão no presente trabalho ± para delimitar períodos estilísticos na tradição oci-
GHQWDOGDP~VLFDDFDGrPLFD ³GHFRQFHUWR´ , que vão, respectivamente, dos últimos anos do
século XIX até meados do século XX e de então até os dias de hoje. Estabelecida a partir do
chamado movimento impressionista7, liderado pelos compositores da chamada Belle Époche
francesa, sobretudo por Claude Debussy (1862 - 1918), e pelos compositores ligados à corren-
te denominada neoclassicismo8, fortemente associado ao russo radicado em Paris, Igor Stra-
vinsky (1882 - 1971), a música moderna se constitui de uma série de experiências, descober-
tas e experimentações que acabaram por estabelecer uma mudança de paradigma estético-

7
Impressionismo: Termo usado pela primeira vez nos anos 1870, para a obra de Monet, Pissarro e seu círculo de
pintores, mais tarde aplicado a música. Renoir empregou a expressão "impressionistas musicais" numa discussão
com Wagner. (Dicionário de Música Grove p. 449)
8
Neoclassicismo: Termo usado para descrever certos compositores do século XX que fez reviver as formas
equilibradas e os processos temáticas claramente perceptíveis dos estilos antigos, afim de substituir o que pareci-
am ser atitudes cada vez mais exageradas e o caráter amorfo do romantismo tardio. (Dicionário de Música Grove
p.634)
44

musical, resultando em correntes conhecidas por ³impressionismo´, ³neoclassicismo´, ³ex-


pressionismo´, ³dodecafonismo´, ³atonalismo´, ³serialismo´, ³UXLGLVPR´ HQWUH RXWUDV TXH
fundamentaram outras tantas propostas estéticas emergentes após a 2ª Guerra Mundial, e que
FRQVWLWXtUDPRTXHKRMHHQWHQGHPRVFRPR³P~VLFDFRQWHPSRUkQHD´VREUHVVDLQGR-VHR³mi-
nimalismo´, D³P~sica concreta´, D³música eletrônica´, D³música aleatória´HWDQWRVRXWURV
HVWLORVFRQVLGHUDGRV³FRQFHLWXDLV´. A busca por novas fontes sonoras, que inclusive impuse-
ram a pesquisa por novos recursos notacionais são algumas das características da música con-
temporânea. Segundo Fabio Adour Camara:
As primeiras rupturas permitiram, entre outras coisas maior liberdade em
termos de organização das alturas e das durações, através da pesquisa dos
mais diversos compositores como Debussy, Stravinsky, Schöenberg, We-
bern, Bartok, Villa-Lobos, John Cage, Stockhausen, Pierre Schaeffer entre
outros (...)Das liberdades conquistadas, a atonalidade (principalmente a re-
presentada pelo dodecafonismo) e a riqueza de construção rítmica (quiálte-
ras, polirritmias, compassos alternados, fragmentação frasal, etc.) foram
muito prezadas pelos compositores em meados do século XX. (CAMARA,
1999, p. 216).

A segunda geração de educadores musicais surgidos na Europa e na America do Norte,


a partir da segunda metade do século XX, desenvolveram suas metodologias influenciados
pelo novo ambiente sonoro que surgia através dos compositores que caracterizaram as van-
guardas desde então. O pensamento musical passa a dar interesse pela descoberta de novas
fontes sonoras, na perspectiva de que qualquer som pode oferecer possibilidades expressivas
para a criação musical. José Nunes Fernandes aborda também outros aspectos que são impor-
tantes para compreensão desta nova linguagem:
Para compreendermos a história e as características da linguagem musical
contemporânea devemos entender as transformações ocorridas desde o fim
do século XIX ± primeiras tentativas de quebra de tonalidade- e o início do
século XX, quando o atonalismo foi oficializado definitivamente com o do-
decafonismo e as outras tendências vigentes ± politonalidade, música micro-
tonal, etc. (FERNANDES, 1997, p. 48).

Uma característica comum entre alguns dos pedagogos desta segunda geração dos cha-
mados métodos ativos, George Self (1921-), John Paynter(1931 - 2010), Murray Shafer (1933
-) e Boris Porena (1927 -) é que além de educadores são também compositores que se utilizam
do recurso de compor para o desenvolvimento de suas propostas pedagógicas no processo
educacional. Outro ponto convergente entre estes pedagogos é que a natureza do pensamento
educacional desenvolvido sempre passa pela manipulação das fontes sonoras. Torna-se evi-
dente que, guardando as características próprias de cada proposta, o pensamento de que criar,
45

ouvir e tocar são procedimentos imprescindíveis para que tanto a criança, quanto o adolescen-
te ou o adulto estejam aptos a compreender o fazer musical. Fernandes afirma que:
A pedagogia musical contemporânea surgiu principalmente da tentativa de
aproximação do aluno com a música de nosso tempo. Esta, por sua vez, pas-
sou a ser o princípio gerador da própria metodologia, trazendo a experimen-
tação da matéria sonora, despertando novas possibilidades expressivas. Tudo
é manipulado ativamente: a exploração do ambiente sonoro, a criação de no-
vos instrumentos, o uso dos instrumentos tradicionais muitas vezes tocados
de forma não convencional, a descoberta e valorização de objetos sonoros e
a utilização de elementos extramusicais. (...), já utilizados pela própria lin-
guagem musical contemporânea. (FERNANDES, 1997, p. 56).

A palavra oficina, à primeira vista, nos remete a um ambiente onde se exerce um oficio
ou um lugar de consertar máquinas, objetos, carros, etc. Aurélio Buarque de Holanda Ferreira
(1999, p.1436) traz algumas definições da palavra "oficina" que podem ser relacionadas mais
adequadamente ao trabalho desenvolvido em oficinas de linguagem musical: "lugar onde se
verificam grandes transformações", "ambiente destinado ao desenvolvimento das aptidões e
habilidades, "manuseio de equipamentos e materiais para o ensino e a aprendizagem".
A Oficina de Música é uma metodologia musical desenvolvida a partir da segunda me-
tade do século XX, cuja origem parte das experiências empreendidas por compositores de
³música GH FRQFHUWR´ que introduziram o ruído (um som de qualquer espécie) como parte
integrante da expressão musical. O desenvolvimento desta metodologia tem, portanto, uma
contribuição significativa de vários compositores da ³música contemporânea´FRQVLGHUDQGR-
se o pensamento de estabelecer a centralidade da criatividade, em relação à aquisição de téc-
nicas (incluindo a da leitura de partituras). Greif diz que esta ideia surge em diversos países
com a participação de compositores-educadores:
Sob a denominação de Oficina de Música, surge, em vários países, a partir
da década de 1960, uma abordagem nova no ensino da Música, como uma
tentativa de aproximar o aluno à linguagem musical contemporânea apresen-
tada em concertos. Esta linguagem não só se utiliza de novos elementos
constitutivos da Música, que surgem pelo desenvolvimento da tecnologia e-
letrônica, como é, também, influenciada por um novo pensamento estético
musical. Como muitos pedagogos musicais são compositores que trabalham
com esses novos elementos, naturalmente utilizam esses mesmos elementos
em suas atividades pedagógicas. (GREIF, 1994, P. 106)

A vivência musical se dá através do contato direto com o som, num contexto em que di-
versos instrumentos tradicionais de percussão, tanto os de sons de altura determinada quanto
os de altura indeterminada, assim como os inventados, são utilizados. A Oficina de Música ou
"Arte Educação" busca priorizar a manipulação e a exploração destes instrumentos como
46

meio de estimular a criação musical, interagindo e relacionando-se também com outras for-
mas de expressão artística, como teatro, dança e artes visuais. O propósito do professor nesse
contexto é procurar interferir o mínimo possível, cumprindo especialmente a função de coor-
denador das atividades.
1R%UDVLOVHJXQGR)HUQDQGHV  ³DVOficinas de Música surgem no final da déca-
da de 60, quando alguns compositores já tentavam uma aproximação da educação musical
FRPDP~VLFDFRQWHPSRUkQHD´ S . O foco deste movimento situa-se em três polos irradia-
dores distintos, a saber: a Universidade de Brasília com, Reginaldo Carvalho (1932 - ), Emilio
Terraza (1929 - 2011), Nikolau Kokron (1937 - 1971) e Conrado Silva (1940 - ) cujo o traba-
lho desenvolvido era denominado Oficina Básica de Música (OBM); o Instituto Villa-Lobos,
no Rio de Janeiro, com Luiz Carlos Czeko (1945 - ) e Jorge Antunes (1942 - ), que juntamen-
te com alguns nomes já citados acima compõem um grupo que a partir das mesmas ideias
desenvolveu trabalho pioneiro; e complementando os três polos temos na Bahia o movimento
renovador de ensino de música que se instituiu sobre a influência de Hans Joachim Koellreu-
ter (1915 - 2005), com participação de Ernest Widmer (1927 - 1990), Lindemberg Cardoso (
1939 - 1989), Fernando Cerqueira (1941 - ) e outros. Fernandes acrescenta que:
No Brasil, como no exterior, as oficinas tiveram sua origem ligada à lingua-
gem musical contemporânea e ao ensino musical (pedagogia musical), por-
tanto a linguagem musical e a pedagogia musical estão extremamente liga-
GDV´ FERNANDES, 1997, p.67).

Os caracteres estilísticos da linguagem musical contemporânea que enfoco no presente


trabalho constituem-se da proposta de um discurso musical criativo e renovador, que vai da
percepção e da identificação das várias fontes e matérias sonoras até a forma de organizá-las e
de se produzirem expressão com as mesmas; isso sem deixar de considerar o contexto cultural
onde se produz a música. A Oficina de Música congrega tudo isso, fazendo com que exista
uma identidade entre a linguagem musical e a pedagogia musical de nossa época numa intera-
ção evidente.
A TXHVWmRGD³linguagem´9RXGD³OLQJXLVWLFLGDGHPXVLFDO´vem merecendo especial a-
tenção de inúmeros estudiosos nas últimas décadas. Constitui um vasto campo de pesquisa e
discussões devido à grande relevância que o termo adquiriu no campo da musicologia. Toda-

9
Linguagem: Em geral, o uso de signos intersubjetivos, que são os que possibilitam a comunicação. Por uso
entende-se: 1º possibilidade de escolha (instituição, mutação, escolha) dos signos; 2º possibilidade de combina-
ção de tais signos de maneiras limitadas e repetíveis. Este 2º aspecto diz respeito às estruturas sintáticas da Lin-
guagem enquanto o 1º se refere ao dicionário de linguagem. (ABBAGNANO, 2000 p. 615)
47

via, o presente trabalho não tem como escopo discutir essa questão; o termo é aqui empregado
VRPHQWHFRPRUHSUHVHQWDomRGHXPDHVWLOtVWLFDDWXDOTXHFRQVLGHUDDWULEXWRVFRPR³comuni-
cação´, ³expressão´ H ³VHQWLGR´ PXVLFDLV GDGRV WmR Lmportantes quanto foram no passado
recente as técnicas de estruturação musical. E cumpre também salientar que no caso da pes-
quisa em questão o termo ³pedagogia´10 restringe-se tão somente ao campo da música.
Em meio as diversas metodologias surgidas a partir do final do século XIX e no decor-
rer do século XX, encontrei em Dalcroze e Swanwick pressupostos que me serviram de base
para que eu pudesse desenvolver minhas ideias frente ao projeto de utilizar o violão como
instrumento musicalizador, com base nos fundamentos metodológicos das oficinas de música
no Brasil.
Partindo de uma experiência pedagógica pessoal, dentro de um contexto real de sala de
aula, defini como ponto de partida um elemento musical que pudesse me servir de alicerce,
associado à perspectiva de estabilidade, o "pulso". O pulso esta associado a periodicidades de
natureza humana, como batimentos cardíacos ou o caminhar. O pulso é um recurso de medida
que dá sustentação ao movimento que é ritmo, e, como já exposto, o método Dalcroze tem o
ritmo como de importância fundamental, percebido e sentido através dos movimentos do cor-
po "Eurythmic". Pude observar que no seu trabalho de Oficina de Linguagem Musical, Csekö
utiliza-se de movimentos do corpo para favorecerem não só a percepção do pulso e do ritmo,
mas também dos atributos do som, como altura, duração, intensidade e timbre. Enfim, saliento
que diversas atividades no campo da música podem ser desenvolvidas a partir da perspectiva
da percepção ³através do movimento corpoUDO´.
As ideias de Swanwick têm uma nítida relação com a realidade característica do ensino
do ³violão popular´ no Brasil, onde de forma intuitiva e informal os violonistas aprendem e
expõem seu discurso musical como forma de comunicação, adquirindo bagagem que os pos-
sibilita criar e improvisar. O exemplo mais explícito está na prática do violão de 7 cordas, que
mesmo sem receber atenção pedagógica formal GiRULJHPDRFKDPDGR³P~sico que toca de
ouvido". Este é um dos aspectos característicos da nossa cultura violonística, que tento trazer
para o processo formal, como um dos aspectos iniciais do aprendizado do violão, associado a
outros aspectos didáticos que considero importantes para o desenvolvimento principal deste
trabalho. Na metodologia convergente da Oficina de Linguagem Musical, Csekö valoriza a

10
Pedagogia: Este termo, que na sua origem significou prática ou profissão de educador, passou depois a desig-
nar qualquer teoria da educação, entendendo por teoria não só uma elaboração organizada e genérica das moda-
lidades e possibilidades da educação, mas também uma reflexão ocasional ou um pressuposto qualquer da prati-
ca educacional. (ABBAGNANO, 2000 p.747)
48

criatividade, a improvisação, assim como o material sonoro disponível no ambiente. A nota-


ção musical é apenas o último passo a ser cumprido.
$ ³2ILFLQD GH 0~VLFD´, por ser uma metodologia desenvolvida por compositores que
empregaram a linguagem da música contemporânea em processos pedagógicos, está direta-
mente ligada a todos os recursos tímbricos, percussivos, melódicos e harmônicos que um ins-
trumento com o violão pode produzir, e que pode transformá-lo numa ferramenta de produção
de sons de altura definida e indefinida. A Oficina de Música busca priorizar a manipulação e a
exploração de instrumentos com o objetivo de estimular a criação musical, portanto é neste
espaço que busco desenvolver minhas ideias, expondo os recursos do violão para o desenvol-
vimento de uma prática pedagógica especializada.

A OFICINA DE LINGUAGEM MUSICAL DESENVOLVIDA POR CSEKÖ


Luiz Carlos Csekö11 é compositor, educador e reconhecido difusor da metodologia das ofici-
nas de música, especialmente na cidade do Rio de Janeiro. Nasceu em Salvador, Estado da
Bahia, em 1945. É bacharel em música na área de Composição pela Universidade de Brasília,
em 1970, orientado pelos professores Nikolau Kokron, Rinaldo Rossi e Fernando Cerqueira
(membros fundadores do renomado grupo de compositores da Bahia). É mestre em Composi-
ção pela University of Colorado/Boulder, nos Estados Unidos, em 1980. Durante o tempo em
que morou nos Estados Unidos, trabalhou no Columbia-Princeton Eletronic Music Studio
com Vladimir Ussachevsky.
Csekö, como é conhecido, dedica-se de maneira intensa às atividades de composição e
educação musical. Como compositor ativo e original, vem desenvolvendo de forma coerente
uma linha estética própria, onde a importância do humano e do social criam a temática, e os
recursos cênicos, os movimentos e a iluminação configuram o caráter do espetáculo. Como
educador desenvolve intensa atividade em muitas cidades do Brasil, realizando palestras e, em
especial, conduzindo a "Oficina de Linguagem Musical", cujo projeto educacional é por ele
desenvolvido, utilizando o processo de criação e a música contemporânea como instrumentos
da educação. Luiz Carlos Csekö diz que:

11
Dados extraídos do site: http://www.atravez.org.br/ceam_6_7/alheamento.htm - Atravez Associação Artístico
Cultural - em 09/01/2013.
49

A Oficina de Linguagem Musical nasce da profunda reflexão despertada pe-


las minhas discordâncias quanto a realidade pedagógica da Educação e Edu-
cação Musical no Brasil e no exterior, da clara certeza do obsoletismo das
abordagens vigentes, e também da continua e elaborada pesquisa e processo
de criação com a linguagem musical contemporânea em meu trabalho.
(CSEKÖ, 1996, p.40)

A Oficina de Linguagem Musical tal como concebida por Csekö foi ministrada pela
primeira vez em 1981- 82, para intérpretes e compositores, nos Seminários de Música da Pró-
Arte, no Rio de Janeiro. Em 1983, a convite da direção da área de musicalização deste mesmo
seminário, Csekö adaptou também a Oficina de Linguagem Musical para um público infantil.
Desde então a "Oficina de Linguagem Musical" vem sendo realizada em diversas cidades de
praticamente todos os estados brasileiros e oferecida de maneira regular no Conservatório
Brasileiro de Música, Pró-Arte e Funarte/INM, na cidade do Rio de Janeiro.
Acompanhei in loco o trabalho desenvolvido por Csekö e faço aqui um relato descritivo
das atividades, em si, e dos seus processos didático-pedagógicos em sala de aula. Pude obser-
var, nas aulas de Oficina de Linguagem Musical para crianças, ministradas na Pro-Arte, Rio
de Janeiro, que ele imprime um trabalho de educação não só musical, mas uma educação total
e abrangente, na amplitude daquilo que a acepção do termo ³educar´12 pode nos dizer, do
momento em que as crianças chegam e são recebidas até o encerramento das atividades e a
saída dos alunos.
Com a presença de todos os alunos em sala, observo que se realiza primeiro a arruma-
ção dos instrumentos, cuja organização é feita por diversas famílias de diferentes tamanhos,
como pequeno, médio e grande, dispostos nesta mesma ordem para o desenvolvimento de
diversas atividades. Entendo que a proposta é estimular a percepção dos alunos através do
estudo dos atributos do som como: duração, altura, intensidade, timbre, andamento, no trans-
correr da aula. Os instrumentos utilizados estão disponíveis em sala de aula e são vários, den-
tre eles: xilofones, metalofones, triângulos, surdos, pratos suspenso, piano, agogôs, cuícas,
etc. A preparação do ambiente é importante para receber os alunos que se colocam à vontade,
sentados no chão e descalços, completamente integrados e associados ao ambiente onde os
trabalhos serão realizados. Csekö afirma que:

12
Educar: do latim educare, composta por ex ("fora") educere (" guiar, conduzir, liderar") ou seja "conduzir para
fora" transmitir conhecimento a; dar ensino a; instruir, criar. (FERREIRA, 1999, p.719)
50

Os diversos estágios que a OLM comporta, adequando-os ao contexto dos


seus participantes (publico adulto e infantil; leigo e especializado; homogê-
neo e heterogêneo), incluem trabalhos com a acuidade auditiva, memória so-
nora, imaginação sonora, familiarização, pesquisa, desconstrução e reflexão
sobre a linguagem musical existente (iniciando-se este processo pela lingua-
gem contemporânea) exercício do processo de criação com a linguagem mu-
sical. (CSEKÖ, 1996, p.41)

Ao som de toques num tambor o professor propõe que os alunos andem em movimentos
aleatórios, trabalhando percepção do andamento13 e duração (permite-nos distinguir sons lon-
gos e sons curtos), com velocidades estáveis ou variáveis, do lento ao rápido, em processos
contínuos de aceleração e desaceleração, com sons longos e curtos. São observados a atenção
e o cuidado do professor com relação à resistência dos alunos no transcorrer da atividade de-
senvolvida, pois se trata também de uma atividade física. Devo reiterar que no desenvolvi-
mento de várias atividades utiliza-se o recurso de associar movimentos e gestos do corpo ao
som, funcionando como suportes que favorecem a percepção das atividades que são desen-
volvidas.
Com respeito ao trabalho com timbres14, as atividades são em torno da identificação das
fontes sonoras, associando-as a movimentos e gestos do corpo: ao som do metalofone, eles
mexem a cabeça, ao som do xilofone, pulam, ao som do prato suspenso, mexem a cintura, ao
som do surdo, andam, ao som do agogô, batem palmas, e assim por diante. Em outro momen-
to, seguindo na mesma atividade, é feita a combinação de duas fontes sonoras distintas que
geram, em consequência, dois movimentos do corpo a elas associados. Com respeito ao traba-
lho com os registros sonoros, do grave ao agudo, também associam-se movimentos do corpo.
Para desenvolver esta atividade o professor utiliza um piano; se os alunos ouvirem um som
grave, ficam deitados, se ouvirem um som médio, ficam sentados, quando ouvem sons agu-
dos, ficam de pé.
Para o desenvolvimento da percepção de fontes sonoras externas, Cseko solicita silên-
cio, desligam-se quaisquer aparelhos do interior da sala de aula, como ventiladores e ar condi-
cionado, e, em seguida, o professor pede aos alunos para observarem se conseguem escutar e
identificar os sons externos à sala de aula, como ruídos diversos, sons de vozes humana, canto
de pássaros, miados de gato, latidos de cachorro, sons da natureza, etc. O aluno que conseguir
escutar e identificar algum som levanta o braço e diz o que percebe a respeito da sua desco-

13
Andamento: indicação de velocidade em que uma peça deve ser executada. (Dicionário de Música Grove,
p.28)
14
Timbre: Termo que descreve a qualidade ou o "colorido" de um som. (Dicionário de Música Grove, p.947)
51

berta. De volta ao piano, é pedido aos alunos que procurem identificar a diferença entre um
som único (uma nota) e vários sons (duas ou mais notas). A identificação é feita da seguinte
forma: ao escutarem um único som, mãos abertas, ao escutarem mais de um som simultâneo,
mãos fechadas.
Em outra atividade o trabalho central é imaginar. O professor pede aos alunos que ima-
ginem o som que é produzido pelo latido do cachorro ou miado do gato. O professor pergunta
também se na imaginação os sons estão juntos ou separados. Cada aluno dá o depoimento da
sua imaginação.
AtiYLGDGHVFRP³dinâmica´15 ou ³intensidade´WDPEpPVmRLPSRUWDQWHV(VVas ativida-
des são desenvolvidas, por exemplo, a partir do som do prato suspenso, quando se pergunta à
criança, se o som que escuta é forte, meio forte ou piano. Cada aluno descreve sua percepção.
Para o trabalho com alturas16, cada aluno se posiciona de frente para cada conjunto das famí-
lias instrumentais que já estão devidamente arrumados, conforme já descrito; a identificação
da altura é feita, num primeiro momento, de acordo com o tamanho do instrumento como, por
exemplo, triângulo grande e triângulo pequeno, surdo grande e surdo pequeno, metalofone
grande e metalofone pequeno, xilofone grande e xilofone pequeno, etc.
Regularmente, na parte final da aula os alunos ficam à vontade para improvisar, propor-
cionando experimentações sem maiores preocupações formais. O momento é lúdico e repleto
de criatividade, considerando a proposta de rodízio feito pelos alunos, em cada conjunto ins-
trumental. Encerrando as atividades, todos os alunos ajudam a guardar os instrumentos e seus
acessórios, de forma organizada, cuidadosa. Csekö argumenta, em seu artigo A Linguagem
Musical Contemporânea Experimental Enquanto Instrumento de Educação que:
A redescoberta pela linguagem musical contemporânea experimental do uso
das propriedades básicas do som estimula uma atividade criadora mesmo nos
mais elementares estágios da técnica instrumental, sem detrimento da quali-
dade (...) O novo enfoque do fenômeno sonoro, fonte sonora, propriedades
do som e a forma da obra de arte estimula para desenvolvermos a criativi-
dade nos estágios mais iniciais do nosso contato com a Música, sem necessa-
riamente nos tolher com problemas técnicos. (CSEKÖ, 1988.)

No decorrer do acompanhamento e das observações sobre as atividades da Oficina de


Linguagem Musical para crianças, na Pro-Arte, Rio de Janeiro, pude também observar como

15
Dinâmica ou intensidade: Aspecto da expressão musical resultante de variação na intensidade sonora. Forte,
fraco, crescendo,diminuindo. (Dicionário de Música Grove, p.269)
16
Altura: Parâmetro de um som que determina sua posição na escala. A altura é determinada por aquilo que o
ouvido capta como sendo a frequência de onda mais fundamental de um som. Grave e agudo. (Dicionário de
Música Grove, p.25)
52

são tratadas as questões relativas à notação gráfica17. O professor me apresentou suas propos-
tas de atividades com notação, que são realizadas pelos alunos no desenvolvimento do curso.
Trata-se de um trabalho realizado em etapas. Em seu artigo A Linguagem Musical Contempo-
rânea Experimental Enquanto Instrumento de Educação,o Csekö expõe sua posição relativa a
esta questão, dizendo que:
A notação gráfica utilizada na música contemporânea ao tornar o espaço
gráfico proporcional à duração, altura (e às vezes dinâmica) clarifica com
uma profundidade e rapidez surpreendentes o complexo e mágico momento
da transformação do som em signo e do signo em som. Ao se transformar a
gama dos novos sons em uma grafia com signos que possam por sua vez ser
transformados em som, estabelece-se um contato único e direto, contínuo e
vivo com o fenômeno da transformação do som em grafia e vice-versa. A
notação tradicional passa agora a ser compreendida e não decorada, signos
tradicionais passam a ser decifrados através de sua própria lógica. (CSEKÖ,
1988.)

Portanto, como pude observar na Oficina de Linguagem Musical, o primeiro aspecto


básico é o atendimento em grupos, fazendo-se inicialmente uma conscientização dos alunos
quanto às vantagens desta abordagem, no qual a flexibilidade e a própria condução do proces-
so não fica limitada à necessidade de o aluno dar conta de um repertório "x", em um prazo
"y". Dentre as inúmeras qualidades da proposta, é importante destacar que não é necessário
um grande aparato teórico e técnico para possibilitar o exercício da criação musical. Assim,
experimentar, inventar, refletir, elaborar e conceituar são o cerne da Oficina de Linguagem
Musical. O primeiro momento da dinâmica é constituído de exercícios de acuidade auditiva,
seguidos de memória sonora, imaginação sonora e da familiarização com a produção musical
contemporânea. Isto é seguido da abordagem de algum tópico específico, de acordo com as
características do grupo participante, conduzindo a um processo de criação, elaboração musi-
cal e discussão/reflexão, finalizando-se com improvisações. L. C. Csekö aponta a importância
deste trabalho de criação não só como resgate do processo em si, na educação, mas também
como desmistificação da criação, transformando o indivíduo que dela participa.
O conceito central é perceber para que, através da percepção, o individuo possa desco-
brir, sentir, criar, experimentar e improvisar, numa participação ativa do aluno numa interação
direta com o professor. Intenciona-se com isso que o educando possa compreender o que o
método entende ser a ³matéria prima´GDP~VLFDRsom e o ritmo. Perceber, apreciar e sentir,
e então adiante grafar e conhecer os recursos notacionais passa ser um processo natural do

17
Apêndice A - trabalhos de notação dos alunos do professor Csekö.
53

aprendizado, desenvolvido a partir da sensação dos fenômenos sonoros e de sua estrutura.


Como apresentamos antes, as ideias de Dalcroze partem do princípio de que uma educa-
ção musical deve partir da audição, e que esta implicaria na participação de todo o corpo.
Neste contexto o ritmo é de importância fundamental, pois se introduz o estudo da música
através do movimento corporal, da dança, conhecido por Eurythmics. Keith Swanwick, tam-
bém já discutimos, propôs três princípios básicos para o desenvolvimento musical: considerar
a música como discurso, considerar o discurso musical dos alunos e a dar ênfase à fluência.
Desse modo o professor busca desenvolver naturalmente a capacidade do aluno em en-
tender o que é proposto, aproveitando a bagagem de que cada um dispõe, e usando a criativi-
dade e a improvisação para tratar todo e qualquer material sonoro disponível no ambiente.
Swanwick idealizou o modelo C (L) A (S) P de educação musical fundamentado em três ati-
vidades integradas de forma interativa: composição - C, apreciação - A e performance - P e
outras duas situadas entre as fundamentais que complementam o modelo que são o (S), que
representa técnica ou aquisição de habilidades e (L), que representa literatura ou estudos aca-
dêmicos. O modelo se aplica aos três princípios assim como os três princípios se aplicam ao
modelo.
As ideias de Swanwick apontam na direção da descoberta de novas fontes sonoras, a
partir da exploração do universo sonoro, mesmo âmbito metodológico que embasou o surgi-
mento das "oficinas". No projeto da "Oficina de Linguagem Musical" percebe-se uma notável
congruência com os pressupostos aqui destacados em Dalcroze e Swanwick. Em especial ob-
servamos: a utilização de gestos e movimentos corporais na percepção do som, o emprego da
música de sua época, a fluência, a improvisação, dentre outros. A educação musical é um re-
flexo do desenvolvimento da estilística musical, considerando-se a história da exploração do
som e de sua percepção. Portanto, o que se ouve hoje é diferente do que se ouviu em épocas
passadas, em virtude não apenas do movimento dos estilos musicais, mas também do desen-
volvimento da escuta e do modo como nos relacionamos com o mundo. Schafer diz que:

Quando havia poucas pessoas e elas levavam uma existência pastoril, os


sons da natureza pareciam predominar: ventos, água, aves, animais, trovões.
As pessoas usavam seus ouvidos para decifrar os presságios sonoros da natu-
reza. Mais tarde, na paisagem urbana, as vozes das pessoas, seu riso e o som
de suas atividades artesanais pareceram assumir o primeiro plano. Ainda
mais tarde, depois da revolução industrial, os sons mecânicos abafaram tanto
os sons humanos quanto os naturais, com seu onipresente zunido. E hoje?
Eis a tabela:
54

Sons Sons Os sons de utensílios


Naturais Humanos e tecnologia

Culturas Primitivas 69% 26% 5%


Culturas Medieval 34% 53% 14%
Renascentista e
Pré -Industrial
Culturas Pós- Industriais 9% 25% 66%
Hoje 6% 26% 68%

(SCHAFER, 1991, p.128)

A aprendizagem é mais eficiente quando nos interessa, nos envolve e nos traz prazer, e
para tanto é necessário que haja uma educação transformadora e criativa, onde teremos outros
parâmetros para traçar nosso caminho e um dos mais importantes é ter em vista a liberdade de
criar e expressar do indivíduo a quem se dirige a ação educacional. Musicalização envolve o
reconhecimento do aspecto cultural, ou seja, apreender as características da clientela para a
qual será dirigido o olhar do professor. Se para termos música temos que ter uma intenção na
organização sonora, esta organização não é só pessoal, mas traz a questão da cultura em que
está inserida. Dessa forma, temos então como alicerces da musicalização a ideia de educação
contextualizada e de prazer em fazer música. Outro aspecto a ressaltar é que no novo para-
digma metodológico aqui discutido, os erros não tomam a dimensão que costumam atingir em
parte da metodologia tradicional. Errar e perceber o erro, no novo contexto pedagógico, é a-
vançar um degrau no aprendizado, e não o contrário.
55

CAPITULO III
Relato de uma experiência didático-pedagógica

VIOLÃO, FERRAMENTA DE UMA PROPOSTA


O surgimento de novos métodos, que tantos avanços trouxeram ao ensino da música,
encontra um violão que ressurge, a partir do final do século XIX (vide primeiro capítulo),
repleto de possibilidades, alçado a um patamar de descobertas de recursos diversos, num a-
bundante campo de exploração de fontes sonoras que podem bem se ajustar ao caráter e exi-
gências da musicalização contemporânea. Estas inovações promoveram mudanças importan-
tes não somente no instrumento, mas também estimularam novos compositores que passaram
a produzir um repertório inspirado nas novas possibilidades. Por exemplo, no campo da per-
cussão, o violão pode sugerir sons imitativos de tambores como o surdo, a caixa, a cuíca, o
tamborim e ainda sons alusivos a outros instrumentos como reco-reco, triângulo, e sons alea-
tórios diversos com explorações de recursos tímbricos. Fernandes enfatiza que, segundo Cze-
ko:
O conceito de fonte sonora, historicamente limitado aos instrumentos tradi-
cionais, atomiza-se, passando a abranger qualquer fonte sonora que possa
vibrar audivelmente. Multiplicam-se as áreas dos instrumentos onde se po-
dem produzir sons possíveis de estruturar uma linguagem (...) Acrescentan-
do-se aos sons secularmente tradicionais, sons dantes considerados espúrios,
resultantes de uma técnica instrumental deficiente. Então, qualquer som pode
VHUXVDGR³QDPHGLGDHPTXHYRFrHVWUXWXUHHHODERUHFRPHVVHVRPHFRQVi-
ga uma linguagem, esse som é considerado musicaO´ )(51$1'(6
p.97, apud CZEKO, 1988 p.440)

Dentre os vários compositores que dedicaram obras para violão e que inicialmente se u-
tilizaram destes recursos cito um dos mais reconhecidos: Augustin Barrios (1885 - 1944), que
utilizou vários efeitos alusivos e imitativos e cujas obras reconhecidamente mais expressivas
56

são La Catedral e Las Abejas. Atualmente, os compositores que se dedicam a escrever obras
para o violão passaram a incorporar, de forma cada vez mais natural, todo esse potencial, tan-
to no contexto do violão como instrumento solo, como também em diversas formações e es-
truturas de grupos musicais. No caso específico de conjuntos instrumentais, as possibilidades
de combinações destes recursos com os de outros instrumentos tornam possível um campo de
ricas criações, especialmente no que diz respeito ao timbre.
A redescoberta pela linguagem musical contemporânea experimental do uso
das propriedades básicas do som estimula uma atividade criadora mesmo nos
mais elementares estágios da técnica instrumental, sem detrimento da quali-
dade. (...) O novo enfoque do fenômeno sonoro, fonte sonora, propriedades
do som, forma, obra de arte, nos estimula para desenvolvermos a criativida-
de nos estágios mais iniciais do nosso contato com a Música, sem necessari-
amente nos tolher com problemas técnicos. (CSEKÖ, 1988, p.442-443)

Nas recentes propostas para a educação musical vemos refletida a ampliação do concei-
to de percepção musical. Tal fato tornou-se ferramenta e pressuposto para o desenvolvimento
de ideias que culminaram na ampliação de metodologias para a musicalização. Diante das
novas possibilidades teóricas e metodológicas, proponho aqui o emprego do violão como fer-
UDPHQWDSDUDRGHVHQYROYLPHQWRGHXPSURJUDPDGH³PXVLFDOL]DomRQRYLROmR´TXHSUHVVu-
põe a utilização desses novos recursos técnicos e expressivos do instrumento. Trata-se de uma
proposta metodológica dedicada ao professor de música da educação básica e de cursos técni-
cos profissionalizantes. A seguir apresento-a com detalhes.

O CONTEXTO DE DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO


O desenvolvimento desta pesquisa deu-se no âmbito do curso de Licenciatura em Música do
Conservatório Brasileiro de Música, nível de graduação, na formação de professores de Músi-
ca, para atuarem em escolas de educação básica e escolas de ensino profissionalizante na área
GHP~VLFD³9LROmR´FRPRGLVFLSOLQDpRIHUHFLGDQRFXUUtFulo do curso de Licenciatura em
Música como "Instrumento Complementar I e II" (por dois semestres letivos, portanto).
A presente proposta de trabalho é de uma educação musical criativa e lúdica, que pode
ser realizada tanto se considerando no processo apenas o uso do violão (ou conjunto de vio-
lões) quanto seu diálogo com outros instrumentos disponíveis no ambiente educacional. En-
tretanto, pressupõe-se que o aluno-licenciando esteja, simultaneamente, frequentando aulas de
percepção musical oferecidas na estrutura curricular de Licenciatura, que lhe dará suporte,
num contexto mais amplo, para a aquisição de competências resultantes da aplicação do pro-
grama, bem como para o desenvolvimento do trabalho com seus futuros alunos.
57

Porém faço aqui uma importante observação que diz respeito a uma característica do a-
SUHQGL]DGR³QmRIRUPDO´GRYLROmRQR%UDVLOIRQWHJHUDGRUDGHLQ~PHURVPDQXDLVGHHQVLQR
do violão. Destas propostas menos formais resultam modos diversos de conduzir o processo
de aprendizagem do instrumento. Contudo devo salientar que na dinâmica da educação não
formal ocorrem a ampliação e a troca de conhecimentos entre os participantes da ação, que
normalmente possuem diferentes níveis de competências e formações culturais distintas, o
que propicia um incentivo natural da presença do colega que já venceu dadas dificuldades
pelas quais outros ainda passam.
Na prática musical, e mais particularmente com o violão, a educação não formal oferece
a possibilidade de despertar o prazer proporcionado pela dinâmica de tocar em conjunto, ati-
vidade normalmente central. O fato de o aluno obter resultados imediatos, tocando algo que
lhe pareça significativo, e que esteja de acordo com suas possibilidades técnicas é um aspecto
próprio do processo da educação não formal levantada por Santos, e que será também aqui
empregado, pois ao longo da pesquisa mostrou-se um elemento motivador e especialmente
prazeroso:
Nos grupos pHVTXLVDGRVD³SHUIRUPDQFH´QmRVHUHGX]DXPPRPHQWRILQDO
de apresentação de um produto trabalhado com precisão. Significa, ao con-
trário, toda uma prática ± até mesmo em ensaios ± onde o prazer está mais na
ação (estar tocando, estar fazendo) que na apresentação final. (...) todo em-
penho se fará de forma a permitir a participação de todos de imediato no fa-
zer, com o que sabem. (...) Verifica-se a facilitação do engajamento do sujei-
to na prática musical, incluindo a execução instrumental desde o início, o a-
cesso ao instrumento de imediato, participando com o que é possível fazer
no momento, em função das condições reais do sujeito. (SANTOS, 1991, p.
5,11)

A educação não formal se estabelece por intermédio de diferentes práticas educacionais,


e constrói diferentes modos de experimentar e compreender o processo de ensino-
aprendizagem. O emprego de elementos próprios do processo não formal na educação formal
poderia suscitar questionamentos de compatibilidade com um curso formal (graduação). Al-
guns pesquisadores vêm se debruçando nessa questão e Valéria Aroeira Garcia esclarece que:

A educação não-formal, é um outro jeito de organizar e perceber a relação


ensino-aprendizagem, educador/educando, na produção de conhecimento no
processo educacional. Uma dessas características é a importância e relevân-
cia das ações da prática e dos saberes e fazeres cotidianos. A educação não-
formal se dá através da existência de diferentes práticas que são mediadas
por relações educacionais, mas que não são consideradas como educação por
não obedecerem a uma série de requisitos formais. (GARCIA, 2005, p.1)
58

Devo esclarecer a utilização dos termos educação formal e educação não-formal, visto que,
quando abordo o termo educação formal estou me referindo ao modelo de ensino instituído e
desenvolvido por instituições de ensino, tais como colégios, faculdades, universidades, enfim,
escolas formais com seus currículos e normas de funcionamento. Quando emprego o termo
educação não-formal, refiro-me ao não institucional, não acadêmico. A educação não-formal
ou aprendizagem espontânea, é um dos modos pelos quais o violão se constituiu na cultura
brasileira pois, por muito tempo, antes do advento dos modernos meios de comunicação, to-
das as tradições, riqueza e diversidade da nossa cultura popular estiveram muito atadas à con-
dição de transmissão oral, de geração para geração, tornando-se um meio de conexão entre
passado e presente. Como salienta Swanwick (ANO, p. 67), os processos de ensino e aprendi-
zagem apresentam múltiplas formas, dimensões, intenções e ênfases. É, entretanto, importante
ressaltar certos aspectos próprios do ensino não formal, e que é, muito comumente, o meio
tradicional do ensino e da aprendizagem do violão, em nosso país; assim se constituiu a cons-
trução de saberes de grande parte de artistas atuantes no cenário profissional brasileiro.

PROCEDIMENTOS BÁSICOS
Conhecer os princípios básicos do aprendizado do violão é necessário para que possamos en-
tender a realização de todo o processo que será adiante desenvolvido no "Violão Musicaliza-
dor". O primeiro passo nessa direção passa pelos primeiros procedimentos de desenvoltura no
manuseio e na execução do instrumento. Portanto, esta etapa constitui-se na preparação do
aluno (futuro professor de música) para que possa tocar e compreender as bases do aprendiza-
do e desenvolver as habilidades mínimas necessárias para o domínio do instrumento. O obje-
WLYRDTXLpIRUPDUXP³P~VLFRDFRPSDQKDGRU´TXHGRPLQHWDPEpPRSURFHVVRGH³WLUDUPú-
VLFDV GH RXYLGR´ FRP XP GHVHQYROYLPHQWR EiVLFR GH Oeitura, harmonia (encadeamento de
acordes) e técnica. Com tais habilidades o futuro professor terá a possibilidade de fazer acom-
panhamentos de melodias, executar diferentes padrões rítmicos e fazer ao menos a leitura de
partituras simples para violão.
Em relação à incorporação de aspectos tradicionais do aprendizado não formal do violão
ao corpo metodológico aqui proposto, enfatizo que seu objetivo geral diz respeito ao desen-
volvimento do sentido auditivo, aqui entendido como capacidade de ouvir melodias, ritmos e
SURJUHVV}HV KDUP{QLFDV H GH ³WLUi-ODV GH RXYLGR´ PHVPR TXH QXPD etapa inicial a prática
59

harmônica não inclua conhecimentos conceituais e o reconhecimento de relações estruturais


entre os elementos praticados.
Os passos iniciais incluem: postura, nomenclatura do violão, nomenclatura das mãos, afinação
do violão, localização das cordas soltas na pauta e cifragem. A postura está relacionada à ma-
neira mais adequada de o aluno segurar o instrumento, procurando um melhor equilíbrio do
violão com o seu corpo, proporcionando um modo firme, equilibrado e seguro de execução. O
aluno coloca-se sentado em uma cadeira sem braço, tendo o corpo como ponto fixo ou base;
XWLOL]D XP VXSRUWH GH Sp GHQRPLQDGR LQIRUPDOPHQWH ³EDQTXLQKR´  TXH ID] HOHYDU D SHUQD
esquerda acima da direita; posiciona o violão entre as duas pernas e encosta a caixa de resso-
nância na altura do peito. Esta postura, já abordada no primeiro capítulo por se tratar de uma
das inovações sugeridas por Francisco Tarrega, é tradicionalmente usada no ensino do violão
clássico. Outra opção de postura, que pode ser utilizada para outras formas de estudo do ins-
trumento, é trocar o violão e o banquinho de posição, passando os dois para a perna direita,
que ficará mais elevada e apoiará o instrumento.
Quanto à nomenclatura do violão, incluem-se todas as partes físicas que compõem o
instrumento, sendo este conhecimento de fundamental importância para o estudo, como va-
mos ver. Camara destaca:
Dos três principais constituintes físicos do violão (corpo, braço e mão), é ne-
cessário conhecer melhor o braço e seus componentes. Os pequenos filetes
de metal durante toda a extensão são chamados de trastos. Estes são encros-
tados na parte chamada escala, que, por sua vez, ultrapassa o limite do braço,
sobrepondo-se ao tampo. Os espaços entre os trastos são chamados de casas
e possuem um numero determinado pela contagem a partir da mão do violão.
As outras partes que constituem o corpo do violão recebem nomes mais ou
menos claros: tampo, fundo, laterais e boca. O cavalete se localiza sobre o
tampo e é o elemento de onde saem as cordas. Sobre a mão do violão é ne-
cessário conhecer as cravelhas ou tarraxas, dispositivos mecânicos que, ao
serem rodados, esticam ou afrouxam as cordas, alterando sua afinação.
(CAMARA, 1999, p. 14)
60

Figura6.
)LJXUDLOXVWUDWLYDH[WUDtGDGRVLWH³http://lacehook.blogspot.com.br/´
representando as partes que constituem o Violão.

Em relação à nomenclatura das mãos, adverte-se para a distinção de suas funções. Por is-
so são estabelecidos códigos diferentes para cada uma. A mão direita cumpre a função de a-
cionar as cordas, produzindo o som, e sua representação gráfica dá-se a partir das primeiras
letras dos nomes de cada dedo, sendo: p (polegar), i (indicador), m (médio) e a (anular) ± o
dedo mínimo não é comumente usado. A mão esquerda cumpre a função de pressionar as cor-
GDVFRPRVGHGRVFRQWUDREUDoRGRLQVWUXPHQWRGHQWURGROLPLWHGDV³FDVDV´HRVGHGRVHm-
pregados são representados graficamente pelos números 1 (indicador), 2 (médio), 3 (anular) e
4 (mínimo). O polegar da mão esquerda posiciona-se atrás do braço do violão, proporcionan-
do apoio para os outros dedos e possibilitando uma pressão mais adequada das cordas. "O
som normal do violão é obtido, portanto, com as notas desejadas pressionadas corretamente
pela mão esquerda e acionadas pela mão direita". (Camara, p.17)
61

M. esquerda M. direita

Figura7.
)LJXUDLOXVWUDWLYDH[WUDtGDGRVLWH³http://pegacifras.uol.com.br/teoria/primeiros-passos.php´
representando a nomenclatura das mãos.

A afinação tradicional do violão é apresentada aos alunos como uma estrutura harmô-
QLFD³GHEDL[RSDUDFLPD´± ou da corda solta mais aguda para a corda solta mais grave ±,
estabelecida por intervalos de quartas justas descendentes, exceto da segunda para a terceira
cordas, quando o intervalo é de uma terça maior. As cordas são identificadas na pauta por
números dentro de círculos, exatamente para diferenciá-las dos números que identificam os
dedos da mão esquerda. O número zero ("0"), dentro ou fora de um círculo, indica corda solta.
A afinação padrão dispõe-se, pois, do seguinte modo: 1ª corda, mi (agudo); 2ª, si; 3ª, sol; 4ª,
ré; 5ª, lá; e 6ª, mi (grave).

Figura8.
Figura ilustrativa representando a afinação padrão do violão.
Sua representação notacional é assim disposta:

Figura9.
Figura ilustrativa que representa as cordas soltas do violão e sua relação com a pauta musical.

Torna-se essencial discutir a questão específica da notação para o violão. Na escrita da música
para o violão usa-se somente a clave de sol, embora o instrumento apresente registro mais
grave do que agudo, considerando o dó central da escala geral. Devido à sua extensão de três
62

oitavas, Camara S VDOLHQWDTXH³RYLROmRpXPLQVWUXPHQWRWUDQVSRVLWRUjRLWDYDDEDL[R


isto é, os instrumentistas tocam uma oitava abaixo do que realmente está na pauta". Portanto,
ao escrevermos dó3 (dó central), em sua execução ouvimos dó2.
A cifragem "é um sistema de notação musical usado para indicar através de letras os a-
cordes a serem executados. As cifras são utilizadas principalmente na música popular, acima
das letras das músicas ou de uma partitura" (Guest, p.33). Esse tipo de notação indica ao mú-
sico o acorde que deverá executar, mas não indica a região do instrumento em que deve tocá-
lo, a configuração rítmica da condução do mesmo (o gênero da levada), ou qualquer outro
elemento estrutural do acorde, deixando a decisão de como executá-lo para o intérprete. Por
outro lado, em se tratando de repertório de gênero e considerando a competência estilística
dos intérpretes, as cifras facilitam a produção da música profissional de mercado, devido à
agilidade de comunicação que proporcionam aos músicos. A cifragem alfanumérica aqui uti-
lizada tem por base a representação alfabética: A = lá, B = si, C = dó, D = ré, E = mi, F = fá,
G = sol.

O VIOLÃO DE ACOMPANHAMENTO
Abaixo, apresento um quadro útil aos iniciantes, que relaciona estrutura e representação gráfi-
ca de acRUGHVRUJDQL]DGRVDSDUWLUGDVIXQo}HVKDUP{QLFDVGLWDV³SULPiULDV´,VVRWHPRREMe-
tivo de orientar o desenvolvimento de acompanhamentos com recursos harmônicos básicos,
buscando já a formação de um repertório inicial: Tônica (1º grau), Subdominante (4º grau),
Dominante (5º grau).

Figura10.
Quadro funcional de organização dos acordes a partir das suas funções harmônicas.

Proponho um primeiro estudo do tom de lá menor (Im, V7/IVm, IVm, V7/Im), pela fa-
cilidade de construção no braço (escala) do instrumento. Juntamente com o tom de lá menor
pode-VHFRPHoDUDWUDEDOKDUXPDFRQILJXUDomRUtWPLFD³GHEDODGD´ LLLLLL ), que po-
63

derá ser empregada a cada nova sequência de acordes estudada. Nesse estágio inicial do de-
senvolvimento do aluno, proponho a rítmica de balada pela sua forma de execução, pois para
que seja realizada é necessário que o aluno toque as cordas que estruturam o acorde, uma por
uma, separadamente. Assim poderá perceber se está ocorrendo algum problema técnico de
execução como, por exemplo, uma corda mal pressionada por algum dos dedos da mão es-
querda, acarretando falta de clareza e nitidez sonora. O aluno poderá tentar corrigir o posicio-
namento, se necessário, até conseguir êxito.
Em seguida, proponho associar os três compassos simples a gêneros musicais consagra-
dos pelo repertório:

Figura11.
Quadro ilustrativo representando a associação do três compassos simples com três gêneros musicais.

A partir do domínio da execução dos acordes básicos e do exercício com algumas con-
figurações rítmicas de condução, passa-se então à prática de execução, que proporcionará a
necessária autonomia e fluidez ao aluno-executante. O passo a passo do procedimento é e-
xemplificado, a seguir, com três canções folclóricas:

1º - Realiza-se o trabalho de audição da melodia, a capela. Com a participação de todos


os alunos, repetem-se tantas vezes quantas forem necessário, com o intuito de estimular
a identificação da métrica, para, em seguida, assinalar com um sublinhado as sílabas so-
bre as quais recaem os tempos fortes (da estrutura métrica).
64

Exemplos:
65

2º - Coloca-se o p (polegar) embaixo dos traços que identificam os tempos fortes (pul-
sação), e que servirá de referência para orientar as mudanças de acordes na música.
Exemplos:
66

3º - Colocam-se as cifras dos acordes onde recaem as mudanças harmônicas, que ocor-
rem geralmente nos tempos fortes.
Exemplos:
67

4º - adequar a música ao gênero rítmico e executá-la tocando e cantando num trabalho em


grupo (performance).
Na sequência, o próximo tom a ser estudado será o de Dó Maior (I, V7/IV, IV, V7/I),
obedecendo os mesmos critérios de repertório, gênero e todas as etapas que foram realizadas
no estudo da sequência de Lá menor até a performance:
68

Exemplos 1:

Exemplos 2:
69

Exemplos 3:
70

Já estudadas as duas sequências harmônicas, dó Maior e lá menor, temos dentro desta


estrutura quase a totalidade da progressão harmônica de dó (C), juntamente com seus domi-
nantes secundários. Esta forma de organização harmônica abre um grande leque de possibili-
dades na construção do repertório, agora já usando músicas populares. As sequências harmô-
nicas seguintes serão estudadas, obedecendo-se o ciclo das quintas e sempre propostas juntas
como, por exemplo:
- Seguindo a ordem dos sustenidos no ciclo de quintas: G (Sol Maior) e o seu relativo
Em (Mi menor), D (Re Maior) e o seu relativo Bm (Si menor), e assim por diante.
- Seguindo a ordem dos bemóis no ciclo de quintas: F (Fá Maior) e o seu relativo Dm
(Ré menor), Bb (Si bemol Maior) e o seu relativo Gm (Sol menor), e assim por diante.

Figura12.
)LJXUDLOXVWUDWLYDH[WUDtGDGRVLWH³http://jabira-trombonista.blogspot.com.br/2012/09/o-ciclo-das-quintas-e-uma-
ferramenta.html´UHSUHVHQWDQGRRFLFORGDVTXLQWDV
71

Chamo atenção para um aspecto didático muito importante, estabelecido a partir da


forma de organização das sequências harmônicas. Ela cria a possibilidade de, em cada nova
estrutura de quatro acordes dados, dois sempre serem revistos e retomados, cumprindo outras
funções harmônicas. Como exposto nas duas tabelas das figuras 13 e 14 a seguir, veremos que
os acordes sombreados estão contidos em duas tonalidades distintas e cumprindo funções di-
ferentes, permitindo que o aluno veja o mesmo acorde em situações funcionais diferentes.
Este processo vai se repetindo sucessivamente de forma automática a cada nova tonalidade
estudada, baseado na forma de organização e estrutura das sequências dos acordes dentro das
tonalidades e sistematicamente seguindo o ciclo das quintas. É importante salientar que esta
proposta didática de estudo das tonalidades está alinhada com a teoria espiral de Swanwick,
pois ao revisitar os acordes o aluno aprofunda o conhecimento, estimula a criação de repertó-
rio e ajuda no seu desempenho de desenvolvimento técnico. Temos então as sequências assim
dispostas e organizadas em direções distintas, seguindo a ordem dos sustenidos e dos bemóis
no ciclo das quintas:

Figura13.
Quadro demonstrativo da organização das sequências harmônicas na ordem dos sustenidos.

Figura14.
Quadro demonstrativo da organização das sequências harmônicas na ordem dos bemóis.

Observamos que os acordes em destaque, respectivamente na terceira linha de cima para bai-
xo das duas tabelas, são repetidos na quarta linha em outro tom, cumprindo outras funções.
No transcorrer do curso, as sequências harmônicas posteriores são estudadas paulatinamente,
obedecendo a organização da estrutura como demonstrado nos quadros acima. A cada nova
sequência harmônica propõe-se, conjuntamente, um novo padrão rítmico, e os padrões estu-
dados estão totalmente ligados aos gêneros mais conhecidos e característicos da nossa música
72

popular, tais como o baião, o samba-canção, a ciranda, o samba, o chorinho, entre outros, de
acordo com a necessidade exigida pelo repertório. Portanto o trabalho inicial tem o foco dire-
cionado para o desenvolvimento prático e intuitivo do aluno, para que ele possa fazer acom-
panhamentos harmônicos de canções diversas (estrutura de textura homofônica18).

ASPECTOS INICIAIS DA LEITURA NO VIOLÃO


Paralelamente ao desenvolvimento prático e intuitivo do aluno no violão de acompanhamento,
é realizado o desenvolvimento dos aspectos iniciais para aquisição da leitura e da escrita tra-
dicional de partituras para violão. Para isto, no entanto, utilizo como suporte o livro "Iniciação
ao Violão" de Henrique Pinto, das páginas 15 a 33 e, posteriormente, do mesmo livro, a peça
"Andantino" de Matteo Carcassi, na página 36, e "Valsa" de Ferdinando Carulli, na página 37,
com o objetivo de desenvolver o conhecimento da leitura de partituras ao violão. Entendo que
os aspectos iniciais para compreensão e leitura de partituras para o violão, desenvolvidos por
Henrique Pinto, atende aos objetivos deste trabalho, possibilitando sua adequação a ele. O
referido método apresenta coerência didática, oferecendo, de forma simples e prática, os ca-
minhos para a localização das notas (obtidas com cordas soltas e presas).
O desenvolvimento do trabalho de leitura orientado pelo livro "Iniciação ao Violão" de
Henrique Pinto é realizado a partir dos seguintes passos:
Passo 1- introduzir a mão direita e as cordas soltas respectivamente com suas abrevia-
ções e símbolos usados para identificações. (aspectos já familiarizados pelo contexto do
estudo inicial já realizado).
Passo 2 - Primeiro exercício utilizando somente as cordas primas soltas (mi, si, sol), to-
cadas respectivamente com os dedos anular (a), médio (m) e indicador (i).
Passo 3 - Segundo exercício utilizando somente as três cordas bordões soltas (re, la, mi),
tocadas somente com o dedo polegar (p).
Observação: Os dois primeiro exercícios são precedidos por dois quadros explicativos
com o objetivo de facilitar a localização e o reconhecimento dos símbolos.
Passo 4 - Exercício mesclando os dois primeiros.
Observação: Utilizo os passos 2 e 3 para trabalhar alturas (grave e agudo), visto que a
18
Homofonia: Literalmente, vozes e instrumentos soando juntos. Significa textura polifônica em que existe uma
distinção clara entre melodia e harmonia de acompanhamento, ou em que todas as partes seguem o mesmo ritmo
("estilo acorde") em oposição ao tratamento polifônico no qual as partes podem seguir independentemente. (Di-
cionário de Música Grove, 1994, p.438)
73

forma com que são expostas as cordas soltas nos dois primeiros exercícios, sistemati-
camente divide o violão em duas regiões distintas, sendo as primas associadas ao agudo
e os bordões, ao grave.
Passo 5 - Introduzir a mão esquerda que em consequência desencadeia o estudo das no-
tas naturais na primeira posição19.
Passo 6 - Através do desenho exposto do braço do violão próximo da pauta para facilitar
a visão é feita a localização das notas naturais respectivamente na 6ª, 5ª e 4ª cordas.
Passo 7 - Exercícios com as notas naturais sobre a 6ª corda, sobre a 5ª corda, sobre a 4ª
corda e sobre a 6ª, 5ª e 4ª cordas juntas.
Passo 8 - Exercícios práticos combinando as notas naturais dos bordões em conjunto
com as cordas primas soltas.

Passo 9 - Através do desenho exposto do braço do violão próximo da pauta para facilitar
a visão é feita a localização das notas naturais respectivamente na 3ª, 2ª e 1ª cordas.
Passo 10 - Exercícios com as notas naturais sobre a 3ª corda, sobre a 2ª corda, sobre a
1ª corda e sobre a 3ª, 2ª e 1ª cordas juntas.
Passo 11 - Estudo das alterações de sustenido (#) bemol (K) e bequadro (<)B. Observação:
o estudo das alterações realizado por Henrique Pinto neste livro não tem qualquer rela-
ção com a ordem dos sustenidos e bemóis relacionada ao estudo das tonalidades, e sim
com o movimento cromático ascendente e descendente das cordas, sugerindo assim um
modelo de estudo da escala cromática na primeira posição.
Passo 12 - Estudo das peças selecionadas "Andantino" Matteo Carcassi e "Valsa" Fer-
dinando Carulli.

É importante observar na literatura de métodos para violão (vide primeiro capítulo), que
existem outras possibilidades de métodos que são utilizados na iniciação do instrumento, e
que podem bem se adequar as intenções deste trabalho, cumprindo o objetivo de estabelecer
este contado do aluno com a leitura específica de partitura para o violão. Portanto utilizo as
paginas selecionadas da parte inicial do livro "Iniciação ao Violão" de Henrique Pinto, pelo
que já expus referente a sua forma simples, prática e pela sua coerência didática da parte ini-
cial, como sendo qualidades que facilitam a compreensão dos alunos no desenvolvimento

19
Posição: termo aplicado às diferentes configurações da mão na execução de instrumento de cordas. Indica a
disposição dos dedos da mão esquerda no espelho, de forma que a digitação seja executada, desde a corda mais
grave até a mais aguda, da posição indicada (Dicionário de Música Grove, 1994, p.738). Obs. No violão ajuda
facilitar a localização de notas e acordes.
74

desta proposta na minha pratica pedagógica. Porém, ao meu ver acredito que este método no
tocante a sua utilização aplicada ao estudo do violão clássico, carece de uma maior variedade
e quantidade de exercícios com qualidades e recursos técnicos que pudessem oferecer melho-
res possibilidades para aprofundamento inicial do estudo em sua primeira parte.

CONVERGÊNCIA NO VIOLÃO, DO PRÁTICO COM O CONCEITUAL


O resultado final do trabalho desenvolvido desde o inicio deste capitulo converge agora com
junção do violão dito popular, prático, intuitivo ou violão de acompanhamento, com os aspec-
tos da linguagem da teoria musical e leitura por partituras.
Tenho como primeiro passo a identificação do pulso como aspecto fundamental da ini-
ciação, pois penso ser o pulso inerente da música e do ser humano, o que faz dele um elemen-
to facilitador para percepção. Muitas de nossas ações, são desenvolvidas inconscientemente
através de movimentos corporais, seguem uma regularidade de pulsação, portanto trazer os
nossos movimentos espontâneos para que sejam associados ao pulso no processo inicial de
percepção vem de encontro a estrutura do alicerce do trabalho. Pulso é a base ou alicerce onde
serão erguidos os movimentos rítmicos, portanto penso que pulso é fundamento e ritmo é
movimento.
O pulso não é reconhecido como de fundamental importância para iniciação de um tra-
balho de educação musical no entendimento do pedagogo George Self, que, por ser um músi-
co de vanguarda considera que o pensamento de educação musical enfatizando os aspectos
pulso e altura, está voltado para o passado, visto que a música de hoje se constitui de novos
elementos sonoros que podem ser mais relevantes para a percepção da nova linguagem pois
estão alinhados com a contemporaneidade da música. Fonterrada diz que, para George Self:
A pulsação musical não é enfatizada, pois este é um aspecto não usualmente
encontrado no que ele chama de "música do presente". Segundo Self, seria
errôneo que o professor de música concentra-se exclusivamente num único
aspecto da música do passado - por exemplo, a regularidade da pulsação -,
sendo importante que, em vez disso, enfatizasse o emprego de organizações
rítmicas irregulares. (FONTERRADA, 2008 p. 181).

Devo observar que não se trata de um aspecto único do trabalho e sim uma primeira ati-
vidade dentro do contexto baseado em experiências bem sucedidas na recente história da pe-
dagogia musical, onde metodologias surgidas na primeira metade do século XX, enfatizam
este principio como ponto de partida, e na qual busco me orientar neste mesmo sentido ali-
75

nhado a um dos aspectos do pensamento dalcrozeano, onde o ritmo é percebido por intermé-
dio de movimentos corporais.
Considero que o desenvolvimento desta proposta visa encaminhar o aluno para o co-
nhecimento dos processos básicos da educação musical aliado ao desenvolvimento das habili-
dades básicas de tocar o violão vivenciando na pratica alguns termos teóricos incorporados
aos conceitos fundamentais da linguagem musical.
1º passo - Escolha de uma peça folclórica essencialmente de rítmica simples evitando
ritmos com contratempos e sincopes.
2º passo - Dividir as palavras da letra da música em sílabas, e identificando-as com uma
haste vertical acima de cada sílaba, procurando destacar a métrica das palavras como se
fosse uma parlenda20 aproveitando a rima dos versos, para trabalhar a rítmica das pala-
vras de forma lúdica como uma brincadeira infantil. Observa-se que quando a silaba é
prolongada as hastes são ligadas com o mesmo sinal utilizado em ligaduras, ou seja uma
linha em forma de arco.

3º passo - É a identificação do pulso, indicado por um traço acima da haste vertical da


sílaba da palavra.

20
São versos de cinco ou seis sílabas, recitados para: a) entreter, acalmar e divertir as crianças; - b) escolher
quem deve iniciar o jogo ou aqueles que devem tomar parte da brincadeira. Pode ser destinada a fixação de nú-
meros, ou ideias primárias, dias da semana, cores, nomes dos meses, etc. Os portugueses chamavam de cantilena
ou lenga-lengas. Na literatura oral é um dos entendimentos iniciais para a criança e uma das formulas verbais
que ficam indeléveis, na memória adulta. (CASCUDO, 1972, p.673)
76

4º passo - Apresentar as três primeiras figuras, começando primeiro por acrescentar na


haste uma cabeça criando a figura da semínima, posteriormente somando duas semíni-
mas teremos a mínima, e somando duas mínimas a semibreve. Fazer a correspondência
das figuras que representam os sons e as pausas que representam o silêncio, exemplo:

5º passo - substituir na peça, as hastes pelas figuras apresentadas e posteriormente subs-


tituir também as figuras ligadas.
77

6º passo - substituir a linha pelo pentagrama.

7º passo - apresentar a clave de sol e as notas nas linhas e nos espaços:

8º passo - os três compassos simples:


78

9º passo - apresentar a peça escrita na partitura.

10º passo - a peça cifrada

Sugiro que para uma proposta inicial mais simples, relativa à questão harmônica, o pon-
to de partida pode ser dado a partir do tom de Lá Maior (I, V7/IV, IV, V7/I), pois sendo ele
homônimo do menor, os dominantes das sequências - no caso A7 que prepara D e Dm e E7
que prepara A e Am - são os mesmos, o que pode facilita o aprendizado.
79

Figura15.
Quadro demonstrativo da organização das sequências harmônicas de mesma tonalidade e modos diferentes.

Tendo adquirido todas as habilidades iniciais abordadas, que vão desde a nomenclatura
do instrumento aos seus princípios harmônicos práticos mais usuais e característicos (próprios
do chamado ³violão de acompanhamento´ FRQVLGHUDQGR-se ainda a introdução e o desenvol-
vimento da prática de leitura de partituras que convergem a leitura de cifras e a leitura de no-
tas na pauta, conhecidas como "partituras cifradas", muito utilizadas na literatura violonística
e na prática profissional. Diante da aquisição desses conhecimentos básicos da didática do
violão no contexto acima exposto, considero os alunos GRFXUVRGHOLFHQFLDWXUD HP³P~VLFD´
RXHP³HGXFDomRDUWtVWLFD´ Mi devidamente preparados para ingressarem no estágio final de
forPDomR TXH GHQRPLQR ³SURFHVVR GH musicalização através do violão´. É esta etapa final,
objeto que motivou a presente pesquisa, que discuto no capítulo a seguir.
80

CAPITULO IV
Violão, uma ferramenta para a educação musical

PROPOSTA METODOLÓGICA NO VIOLÃO


Trabalhando com a ótica da oficina de música, cuja ênfase é privilegiar a criatividade na edu-
cação musical e investigar novas fontes sonoras, busco no violão, tanto executado de maneira
convencional quanto não convencional, os recursos que possibilitem revelar um caminho en-
riquecedor para a educação musical motivadora, criativa, exploradora e participativa. Procuro
incluir no repertório de procedimentos práticos tanto os efeitos tradicionais da execução do
instrumento quanto os novos efeitos e os efeitos combinados por associação com quaisquer
materiais ou acessórios externos. Musicalizar não implica, propriamente, ensinar a tocar um
instrumento, mas podemos utilizar o instrumento para desenvolver a percepção das proprie-
dades do som e proporcionar a oportunidade de ter experiências de criação e expressão com
os sons pesquisados. Hoje, considerando o projeto de reinserção da atividade musical nos cur-
rículos escolares, torna-se importante mais e mais relevante perceber o quanto o incentivo às
práticas criativas, sobretudo coletivas, pode aproximar os alunos da expressão artística e favo-
recer seu desenvolvimento cognitivo.
Primeiramente, apresentarei diversas possibilidades de recursos expressivos e efeitos
produzidos no violão, para que a seguir possa discutir o potencial de aplicação desses recursos
numa oficina de música, tendo o violão com ferramenta central, ou seja, tomando o violão
como instrumento musicalizador.
81

OS RECURSOS EXPRESSIVOS E EFEITOS PRODUZIDOS PELO VIOLÃO


O violão é tradicionalmente conhecido como um instrumento acompanhador ou solista, prin-
cipalmente na visão de apreciadores que muitas vezes possuem pouca familiaridade com o
conhecimento aprofundado do instrumento. Contudo, além deste reconhecimento tradicional
veremos que o violão pode produzir e possibilitar sonoridades muito diversas. Estes ³REMHWRV
VRQRURV´ TXH DTXL denominarei ³efeitos´ VmR SURGX]LGRs através de ações que normalmente
fogem à maneira convencional de execução do instrumento. É importante salientar que o qua-
dro a seguir apresentado pode ser sempre ampliado com recursos combinados e variados, vi-
sando-se outras propostas expressivas, em performance e composição, cumprindo inclusive
objetivos diversos daqueles voltados para a educação. O levantamento aqui realizado condiz
com a proposta de educação musical objeto do presente trabalho.
Estes efeitos serão divididos em três categorias distintas assim dispostas21:
x Efeitos tradicionais, que são divididos em duas partes sendo: formas de execu-
ção e recursos expressivos.
x Efeitos criados.
x Efeitos combinados.

Efeitos tradicionais
Os efeitos tradicionais são os que compõem de maneira geral os recursos expressivos utiliza-
dos por todos os instrumentos. Caracteristicamente os efeitos são realizados de acordo com
técnicas próprias de execução de cada instrumento, já consagradas através da trajetória de
cada um e do próprio desenvolvimento da música.
Formas de execução:
-Arpejos (dedilhado): origina da palavra harpa, e se caracteriza pela sucessão de notas
de um acorde que soam em sequência. A forma de execução é uma imitação da maneira
de como se toca harpa. (Grove p.43)
-Plaqué: Instrução para que se executem as notas de um acorde simultaneamente, em
vez de sucessivamente. (Grove p.730)
-Rasgueos: é uma varredura das cordas, executadas no sentido ascendente e descenden-
te, com o polegar e, respectivamente, o dorso das unhas ou a polpa dos dedos. Podem

21
Apêndice B: Exemplos das três categorias de efeitos em áudio e dispostos conforme a apresentação no texto.
CD1 - Faixas de 01 a 27.
82

também ser executado com uma palheta. É característico da música flamenca, mas tam-
bém muito utilizado em outras culturas. (Grove p.765)
Recursos expressivos:
Glissando ± palavra pseudo italiana que vem do francês glisser "deslizar".
Consiste num efeito obtido através do deslizamento rápido sobre as teclas ou
cordas, de forma que cada nota individual seja articulada. Na voz, violino,
trombone e violão esse efeito pode ser de um aumento ou diminuição unifor-
me de altura, portamento. (Grove p.373)

Trêmulo ± Efeito que consiste na rápida reiteração de uma nota ou acorde sem
considerar valores mensurados. (Grove p. 959). No violão o efeito consiste em
repetições rápidas e sucessivas da mesma nota, podendo ser executada de pa-
lheta ou técnica específica da mão direita.

Trinado - Ornamento que consiste da alternância mais ou menos rápida de uma


nota com a nota um tom ou meio tom acima dela. O trinado pode começar na
nota superior ou na principal, dependendo em parte de sua função ser mais me-
lódica ou harmônica. (Grove p.960)

Apogiatura ± Uma "nota apoiada" normalmente um grau conjunto acima (menos


frequentemente abaixo) da nota principal.Costuma criar uma dissonância na har-
monia e resolve por grau conjunto sobre a nota principal no tempo fraco seguinte.
(Grove p.35)

Ligaduras ± Símbolo notacional em forma de uma linha curva utilizado para ligar um deter-
minado numero de notas, podendo ser iguais ou de altura diferentes. Existem três tipos de
legato:
Valor: liga notas da mesma altura, prolongando a duração do som, pelo tempo
correspondente às notas que estiverem ligadas.

Expressão: liga duas notas de sons diferentes.

Frase: que liga três ou mais notas de sons diferentes indicando uma frase musi
cal.
83

Pizzicato - Corresponde a uma indicação técnica característica dos instru-


mentos de corda friccionada indicando que as cordas têm de ser tocadas
com os dedos em lugar de se utilizar o arco. O violão se utiliza deste recur-
so usando o termo conhecido por "abafado", que consiste em encostar a
polpa da mão direita junto ao cavalete abafando as cordas imitando um piz-
zicato dos instrumentos de cordas friccionadas.

Harmônicos - São sons parciais que normalmente compõem a sonoridade de uma nota musi-
cal. Eles se fazem presentes pelo fato de que tanto uma corda como uma coluna de ar têm a
característica de vibrar não apenas como um todo, mas também como duas metades, três ter-
ços etc. simultaneamente. A força relativa de cada harmônico proporciona a qualidade sonora
(timbre) da nota tal qual ouvida. (Grove p.408). É um recurso dos mais utilizados no violão
sendo dois tipos de harmônicos existentes, naturais e artificiais:

Naturais - são realizados com o leve encostar de algum dedo da mão esquer-
da, em pontos estratégicos das cordas, seguido do desencostar deste dedo
após o acionamento da mão direita. As notas possíveis são determinadas pe-
las series harmônicas das cordas soltas:
1º harmônico - 12º trasto (oitava)
2º harmônico - 7º e 19º trastos ( oitava mais a quinta)
3º harmônico - 5º trasto e 24º trasto "virtual" ( duas oitavas )
4º harmônico - 4º, 9º, e 16º trastos (duas oitavas mais terça maior aproxima-
damente). (CAMARA , 1999, p.32)

Artificiais - são realizados apenas com a mão direita: o dedo indicador en-
costa suavemente no ponto desejado e o anular ou o polegar acionam a cor-
da, após o que , o dedo indicador desencosta da mesma. Como a mão es-
querda fica liberada, todas as notas normais do violão têm suas series har-
mônicas como possibilidade de realização de harmônicos. (CAMARA ,
1999, p.34)

Os sinais indicativos de harmônicos são confusos e variam muito sendo estes os mais usuais:

Figura musical com a cabeça em forma de losango.

Nota normal com um zero indicativo de corda solta acima.

harm: abreviação da palavra harmônico acima da nota indicada.


84

Vibrato - É uma oscilação de altura ( mais raramente de intensidade) em uma única nota du-
rante a execução (Grove p.990). No violão o efeito é produzido vibrando-se o dedo que
comprime a corda em movimentos circular ou lateral (direito e esquerdo).
Sinais de dinâmica interpretativa - P ± piano, PP - pianíssimo, F ± forte, FF ± fortíssimo,
ascell ± ascelerando, rall ± ralentando, dimin ± diminuindo cresc ± crescendo decres ± de-
crescendo, e todos que constitui um grande conjunto de sinais utilizados neste sentido. Cama-
ra (p.21) afirma que no violão "Sinais de intensidade são sempre relativos e não absolutos,
contudo indicações como pppp ou ffff são, de certa forma, impraticáveis e serão interpretados
mais como sugestões de caráter do que de volume".

Efeitos criados

São efeitos criados em decorrência da evolução e mudanças ocorridas no violão e de-


senvolvidas partir do final do século XIX, assim como também da busca, da pesquisa e do
surgimento de diversas e novas fontes sonoras, característica da música contemporânea.

ÞÞ;Þ =Þ Þ Tambora ± Imita o som de um tambor e é executado batendo o dedo indicador da


mãodireita nas cordas em cima do rastilho no cavalete.

Percussão - Percutir os dedos sobre o tampo harmônico.


Þ
Pizzicato Bartok - consiste em segurar a corda puxar e soltar. A corda pode estar solta
ou presa em qualquer ponto do braço do violão, dependendo da indicação escrita.

Slap com o Polegar - Percutir o polegar da mão direita sobre as cordas nos bordões.

Sobreposição das Cordas ± Sobrepor duas cordas cruzando e prendendo ao mesmo


tempo, criando um efeito de esteira de caixa ou tarol. A região do braço onde se rea-
lizará o efeito, deve ser indicado através da partitura.

Toque com Unhas ± percutir com as unhas da mão direita no bojo ou fundo do vio-
lão. Este efeito não deve ser no tampo harmônico do violão, pois se trata de uma re-
gião muito sensível a este tipo recurso podendo vir acarretar dano irreparáveis ao
tampo do instrumento.
85

Percussão com Punho - Obtido pela percussão do punho nas cordas.

Distorção acústica ± Ligeira distorção da nota colocando o dedo no princípio da casa


e fazendo com que a nota tenha um som rouco.

Glissando Percussivo - Percutir com uma leve pancada em uma ou mais cordas
com um dedo da mão direita deslocando rapidamente e de forma contínua ao pon
to indicado. É necessário que se prenda a corda ou o acorde em posição determi-
nada pela partitura.
Aleatório - Com o polegar da mão direita, dedilhar as cordas na cabeça do violão,
atrás da pestana.

Extinção Progressiva do Som (EP) - Efeito proporcionado ao se colocar


uma parte da mão direita na ponta da ponte superior deitando a mão len-
tamente sobre as cordas, abafando o som gradualmente.

Bend - "São da mesma família dos glissando ( plural da palavra


inglesa para desviar, arquear), que consistem exatamente no desviar
da posição da corda com os dedos da mão esquerda, fazendo a nota marcada su-
bir até 2 semitons" (Camara, p.52). Para executar basta que puxe a corda para
cima ou pra baixo, pressionando ao mesmo tempo contra o braço do instrumento.
É mais fácil executar bends na guitarra elétrica do que ao violão, pois as cordas
da guitarra são menos tensas, podendo se obter um efeito mais perceptível.

Efeitos combinados
São efeitos criados a partir da utilização de quaisquer outros materiais ou acessórios ex-
ternos que, em conjunto ou contato com o violão possa produzir diversos efeitos e sonorida-
des diferenciadas, dependendo do tipo de material, de como é usado e do objetivo a ser alcan-
çado com os efeitos produzidos. Existem diversos exemplos que podem ser citados como os
mais usuais:
86

Palheta - Certamente o acessório externo dos mais usados no violão, devido a isso
considerado uma extensão do próprio instrumento. A palheta pode criar muitas possibi-
lidades de efeitos além de possibilitar diversas formas de execução de ritmos e gêneros,
que também é chamado popularmente de levadas.

Baquetas - Acessório percussivo, e que pode ser utilizada de diversas formas como per-
cutindo nas cordas ou no bojo, fundo, braço.

Esponjas ou espumas ± Usado entre as cordas e o tampo perto do cavalete reproduzin-


do um som de surdina.

Pequenas peças de arames ou pedaços de ferro ± Mais usual entre passados pelas
cordas em diversas localizações na extensão das mesmas e que conforme o seu po-
sicionamento podem produzir efeitos de caixa ou até mesmo de campana.

Chaves - podem ser trespassadas entre as cordas ou simplesmente colocadas sobre


elas.

Slide ± É um tipo de glissando com portamento acentuado, produzido quando se toca


uma nota e imediatamente desliza o dedo ao encontro de outra nota, com um objeto que
pode ser desde um copo de vidro, até um cilindro de metal acoplado ao dedo fazendo
produzir notas de alturas definidas e até efeitos aleatórios.

As possibilidades se ampliam usando da criatividade e improvisação, utilizando todo e


qualquer material sonoro disponível no ambiente ou que possa ser trazida pelos alunos para
exploração de novos sons em combinação com o violão numa ação conjunta. No entanto os
recursos dependem de onde e como cada trabalho esta sendo desenvolvido, do que se propõe
a fazer, para que o aluno possa criar, pesquisar e produzir novas possibilidades de sons.

MUSICALIZANDO COM O VIOLÃO


Neste ponto de desenvolvimento do trabalho pretendo discutir o modo de conhecer, experi-
mentar e explorar as possibilidades e recursos acima expostos, levando-se em consideração as
condições técnicas dos alunos no manuseio desses recursos no instrumento. Até recentemente,
87

o violão vinha se apresentando como instrumento harmônico e melódico; entretanto tem sido
largamente incrementado de recursos percussivos e tímbricos que podem desempenhar papel
significativo no processo musicalizador com o intuito de enriquecer a prática pedagógica e
estimular a criatividade.
Uma experiência bem sucedida para iniciar a prática é o emprego do efeito de tambora,
que reproduz um som de tambor. Proponho aos alunos que andem em movimentos aleatórios,
com o objetivo de trabalhar a pulsação, produzindo toques regulares entre uma batida e outra
± busca-se a estabilidade e a regularidade de uma pulsação. Em seguida, o foco passa a ser a
percepção do andamento; variando-se as batidas, vezes mais lentas, outras mais rápidas, cujos
movimentos corporais adjacentes podem variar entre o andar ou o bater palmas.
A percepção de grave e agudo pode ser praticada, primeiramente, utilizando-se as cor-
das soltas do violão, partindo-se das cordas extremas, mi grave (6ª corda) e mi agudo (1ª cor-
da). Em seguida, ainda exercitando a percepção de alturas, proponho a produção de movimen-
tos lentos de glissandos, que podem partir do grave para o agudo ou do agudo para o grave,
associados a movimento de agachar, para o som grave, e de levantar, para o som agudo. Já
utilizando estruturas de acordes, pode se exercitar a percepção de intensidade sonora (forte e
fraco), assim como a percepção de duração, utilizando-se tanto as cordas soltas quanto estru-
turas de acordes para realizar sons longos e sons curtos.
Busco desenvolver a percepção sonora dos diversos timbres que o violão pode produzir,
através de um trabalho lúdico, fazendo associação de sons e efeitos com os sons característi-
cos de outros instrumentos como, por exemplo:

O violão imitando um alaúde, trespassando um


arame entre as cordas bem próximo ao cavalete
para produzir o efeito desejado.
Figura 16.
Representação do violão imitando um alaúde

O violão imitando um surdo, batendo-se no seu


tampo harmônico.

Figura17.
Representação do violão imitando um surdo.
88

O violão imitando um tamborim, percutindo-se o


bojo do instrumento com os dedos em riste.

Figura18.
Representação do violão imitando um surdo

O violão imitando cuíca, produzindo-se ligeiros


glissandos nas cordas agudas.

Figura19.
Representação do violão imitando uma cuíca.

O violão imitando o tarol, sobrepondo-se duas


cordas para produzir o efeito da esteirinha da-
quele instrumento.

Figura20.
Representação do violão imitando um tarol.

O violão imitando os sinos, explorando-se sons


de harmônicos, etc.22

Figura 21.
Representação do violão imitando um sino.

O objetivo é fazer deste momento, um grande momento de descoberta, na intenção de ti-


rar o violão da sua condição convencional de execução, instigando o executante a uma atitude
criativa.
Devo reiterar que, em alusão ao trabalho de "Oficina de Linguagem Musical" do profes-
sor Csekö, desenvolvo esta etapa das atividades utilizando o recurso de associar movimentos
e gestos corporais ao som produzido/percebido. Isso proporciona suporte essencial que favo-
rece a percepção dos eventos sonoros realizados. Portanto, além de andarem pela sala, os alu-
nos utilizam outros movimentos como, por exemplo, agachar levantar, palmas, pular, etc.
22
Apêndice C: exemplos dos efeitos em áudio dispostos conforme representação das figuras. CD1 - figura16
faixa 28, figura17 faixa 29, figura18 faixa 30, figura19 faixa 31, figura 20 faixa 32, figura21 faixa 33.
89

Finalizando esta etapa do processo, após conhecer e praticar um conjunto relevante de


recursos expressivos do violão, realiza-VHSURSULDPHQWHD³RILFLQDGHFULDomR´GHVHQYROYHn-
do-se ideias, combinando-se eventos sonoros variados e explorando-se o violão com os de-
mais recursos harmônicos, melódicos, percussivos e tímbricos. Isso culmina na elaboração de
arranjos completos de peças folclóricas. A seguir, apresento um exemplo comentado de um
trabalho de oficina, discutindo a construção de um arranjo de música que teria sido abordada
em etapa anterior, como discutido no capítulo III. O passo a passo nesta nova etapa de traba-
lho tem uma ligação direta com o que foi desenvolvido anteriormente, sendo que cada aluno
propõe uma ideia que é desenvolvida pelos demais. Assim o trabalho vai adquirindo forma até
culminar na performance do resultado final, com a devida orientação do professor.

1º passo - Cada aluno escolhe uma peça folclórica para que nela seja desenvolvido todo o
processo. Aqui, para exemplificar o desenvolvimento de todo o processo utilizarei a peça "Ci-
randa Cirandinha".

2º passo - Definir em que compasso está a música escolhida.

3º passo - Mapear na letra da música as sílabas em que recaem as pulsações.

4º passo - Destacar estas sílabas com um sublinhado.

5º passo - Recitar a letra da música marcando com palmas os pontos em que se encontram as
sílabas que representam as pulsações.

6º passo - Fazer com que os alunos prestem atenção à rítmica das palavras, pois neste momen-
to do processo já está sendo trabalhada a estabilidade proporcionada pelo pulso e o movimen-
to proporcionado pelo ritmo.

7º passo - Introduzir a melodia da música cantando a cappella 23 ainda marcando as pulsações


± advirto que as melodias já são de conhecimento dos alunos, levando-se em consideração que
são peças escolhida por eles próprios.

23
a cappella: Expressão que designa a música coral cantada sem acompanhamento instrumental. (Dicionário de
Música Grove, 1994, p. 4)
90

8º passo - Introduzir a harmonia, o gênero musical e elaborar o acompanhamento da peça.

9º passo ± Escolher os efeitos mais apropriados para compor a próxima etapa do desenvolvi-
mento do arranjo ± é importante considerar que os motivos sugeridos pelas letras são diversos
e muito utilizados para compor esta etapa, como por exemplo, se a letra menciona algum ani-
mal, fenômeno natural, brincadeiras, romances ou alude a manifestações religiosas, etc. No
exemplo exposto abaixo utilizam-se os efeitos de "tambora" e "sobreposição das cordas".

10º passo - Cumprido todas as etapas da organização e montagem do arranjo, realiza-se a re-
presentação do mesmo em partitura.

11º passo - Na última etapa dá-se inicio à montagem da execução ± para o sucesso da ativida-
de, é essencial a participação de todos numa autêntica prática de conjunto.

Na prática de conjunto muitas vezes o aluno aprende a esperar a sua vez para participar
mais efetivamente, de acordo com a estrutura estabelecida, respeitando assim o momento de
destaque de cada colega, o que estabelece um autêntico diálogo musical. Com isso pode-se
buscar o equilíbrio da sonoridade, do timbre, da interpretação musical, do desenvolvimento do
reflexo auditivo e visual, constituindo-se a prática em algo fundamentado na criação, na apre-
ciação e na competência de execução. É o envolvimento direto com a música participando-se
do processo ativamente, desde sua primeira etapa, passando por cada uma delas. O processo
envolve, portanto, diversos aspectos educativos/ musicais como compor, ouvir, cantar, tocar e
perceber a atmosfera musical desenvolvida. A prática de conjunto se constitui no ponto cul-
minante de um importante laboratório onde os alunos podem, por meio das atividades práti-
cas, realizar tudo o que foi construído intelectual e tecnicamente no decorrer do processo.
Observo que o trabalho é dividido em duas etapas, sendo que a primeira, que denomino prepa-
ração, é focada no conhecimento na experimentação dos sons; já na segunda etapa o foco é a
criação, a prática e a performance, na qual os alunos, com orientação do professor, desenvol-
vem as ideias lançadas, sempre utilizando o violão. No entanto é importante ressaltar que é de
fundamental importância que o futuro professor (licenciando) aprenda todas as noções básicas
do violão, pois seu desempenho ao violão é um suporte essencial para as suas ações como
educador, que possibilitarão o passo a passo da presente proposta de musicalização no vio-
91

lão24. Temos em seguida o resultado do trabalho desenvolvido, representado em partitura refe-


rente a organização e montagem do arranjo25:

24
Apêndice D e E: Exemplos de trabalhos dos alunos do curso de Licenciatura em música do Conservatório
Brasileiro de Música da classe do professor Valmir Antônio de Oliveira, acompanhando partituras e áudios CD2.
25
Apêndice F : áudio do passo a passo de todas as etapas de desenvolvimento do arranjo, CD1 - faixa 34.
92

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como foi possível observar, o estudo do violão, em linhas gerais, não está associado somente
à formação de instrumentistas, sejam estes violonistas concertistas ou violonistas acompanha-
dores em música popular, que necessitam de técnica apurada e do domínio de um repertório
específico. Considero na presente pesquisa o emprego do instrumento como meio e local da
educação musical. Diante deste objetivo, naturalmente faz-se necessário o desenvolvimento
de um procedimento pedagógico diverso e esta foi a causa da minha inquietação. A proposta
aqui apresentada procurou atingir os objetivos desejados, tendo em vista o necessário estudo
dos novos recursos do violão, que o ampliam como meio expressivo musical e favoreçam um
uso satisfatório do instrumento num processo musicalizador prazeroso e criativo. Cabe ao
professor a competência profissional, o domínio do conteúdo e a habilidade de utilizar estra-
tégias diversas para atingir os objetivos.
Como a educação musical pode estar inserida em diversos ambientes e sistemas, como
escolas regulares, escolas específicas de formação musical, centros culturais, entidades cultu-
rais diversas, abrangendo grande amplitude etária e atendendo, portanto, desde crianças e ado-
lescentes até indivíduos da terceira idade, propostas de musicalização devem também consi-
derar sua possibilidade de aplicação em todas essas circunstâncias, proporcionando o exercí-
cio de descobrir, de sentir, de criar, de improvisar, etc. Este pensamento esteve na base da
elaboração da presente proposta.
Diante de tantos recursos surgidos na música nos últimos anos e do surgimento de diversos
pensamentos metodológicos, entendo que este tema merece ser abordado e ampliado em di-
versos aspectos, pois esta pesquisa tem como objeto a preparação de professores licenciados
em música para utilizar o violão como ferramenta na exploração de seus recursos harmônicos,
melódicos, percussivos e timbrísticos, âmbito temático no qual verifica-se ainda literatura
escassa e tímidos resultados de pesquisa. No decorrer do desenvolvimento desta pesquisa en-
frentei grande dificuldade no que diz respeito ao levantamento bibliográfico, pois se trata de
tema notavelmente específico e pouco explorado. Reconheço que o trabalho representou ape-
nas um ponto de partida para a delimitação da proposta que merece aprofundamentos particu-
lares, tendo o violão como ferramenta principal do processo ou dialogando com diversos ou-
tros recursos e fontes sonoras, seja referenciado no âmbito conceitual aqui apresentado, seja
apoiado em outros quadros metodológicos e pedagógicos. Isso certamente trará contribuições
relevantes para o conhecimento em educação musical e para o ensino/ aprendizagem do pró-
prio instrumento.
93

O violão é um instrumento de grande importância na cultura brasileira, e com muitas


possibilidades de socialização. Tais ingredientes tornam-no um instrumento familiar, interes-
sante e agradável à maioria das pessoas. Cabe despertar o interesse de professores e futuros
professores de educação musical para as inúmeras possibilidades expressivas e pedagógicas
do instrumento no processo educacional, bem como estimulá-los a continuar ampliando essas
possibilidades. É importante salientar que não foram abordados nesta pesquisa todos os recur-
sos técnicos do violão, tendo em vista que o público alvo da metodologia aqui desenvolvida
não é, necessariamente formado por violonistas ou alunos que pretendem se tornar violonistas
profissionais.
Em sua trajetória histórica, apenas recentemente o violão alcançou um desenvolvimento
que o estabeleceu num campo expressivo significativo, assim atraindo o interesse de um nú-
mero crescente de músicos, desde o século XIX. Nesta pesquisa procurei reunir procedimen-
tos básicos de execução acessíveis a qualquer estudante de licenciatura, mesmo não possuindo
experiência pregressa com o instrumento. Há muitos aspectos técnicos e pedagógicos que
ainda mereceriam atenção, possibilitando, pois, ampliação significativa dos pressupostos aqui
considerados. Constato, todavia, que o violão é um instrumento em pleno desenvolvimento,
tanto em sua estrutura, tamanho, forma, afinação e número de cordas quanto em relação ao
seu repertório, exigindo futuras investigações que estreitarão os campos artístico e educacio-
nal.
94

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APÊNDICE
98

APÊNDICE A
Trabalhos dos alunos do professor Csekö que representam as questões da notação gráfica co-
mo uma das propostas de atividades realizadas pelos alunos no desenvolvimento do curso.
99
100
101

APÊNDICE B
Efeitos e arranjo. interprete: Valmir Antonio de Oliveira. Rio de Janeiro, 2013. Cd1, dispos-
tos conforme a apresentação no texto.
faixa 1 - Formas de execução.
faixa 2 - Glissando
faixa 3 - Tremolo
faixa 4 - Trinado
faixa 5 - Apogiatura
faixa 6 - Ligaduras
faixa 7 - Pizzicato
faixa 8 - Harmônicos
faixa 9 - Vibrato
faixa 10 - Tambora
faixa 11 - Percussão no tampo
faixa 12 - Pizzicato Bartok
faixa 13 - Slap
faixa 14 - Sobreposição de cordas
faixa 15 - Toque com as unhas
faixa 16 - Percussão com o punho
faixa 17 - Distorção acústica
faixa 18 - Glissando percussivo
faixa 19 - Aleatório
faixa 20 - Extinção progressiva
faixa 21 - Bend
faixa 22 - Palheta
faixa 23 - Baquetas
faixa 24 - Esponja
faixa 25 - Pedaço de ferro
faixa 26 - Chaves
faixa 27 - Slide
102

APÊNDICE C
Efeitos, interprete: Valmir Antonio de Oliveira. Rio de Janeiro, 2013. Cd1, dispostos confor-
me representação das figuras:
faixa 28 - figura16
faixa 29 - figura17
faixa 30 - figura18
faixa 31 - figura19
faixa 32 - figura20
faixa 33 - figura21
103

APÊNDICE D

Áudio dos trabalhos de alunos do curso de Licenciatura em música do Conservatório Brasilei-


ro de Música da classe do professor Valmir Antonio de Oliveira. Rio de Janeiro, 2013. Cd2.
faixa 1 - A canoa virou - aluno Rafael Amaro
faixa 2 - A rosa amarela - aluno Israel Nunes
faixa 3 - Acalanto - aluno Alexandre Silva
faixa 4 - Alecrim - aluna Sonia Katz
faixa 5 - Atirei o pau no gato - aluno Vinícius Lopes
faixa 6 - Bailes pastoris - aluno Tarcísio Gomes
faixa 7 - Bambalalão - aluno Davi Nunes
faixa 8 - Bate, bate o ferreiro - aluno João Felipe
faixa 9 - Cai, cai balão - aluno Fabio Ramos
faixa 10 - Capelinha de melão - aluno Rodrigo Revelles
faixa 11 - Garibaldi - aluna Fernanda Morais
faixa 12 - Machadinha - aluna Jucemar Raymundo
faixa 13 - Marcha soldado - aluno Pablo Nascimento
faixa 14 - Meu chapéu - aluna Alessandra Netto
faixa 15 - Nesta rua - aluna Yvie Maria
faixa 16 - Peixe vivo - aluno Leo Gonzaga
faixa 17 - Pretinho de angola - aluno Márcio Silas
faixa 18 - Pula caxambu - aluno Santiago Galdino
faixa 19 - Tururu - aluna Frida Maurine
faixa 20 - Vai abobora - aluna Lidiane Aparecida
104

APÊNDICE E
Partituras dos trabalhos anexos em áudio de alunos do curso de Licenciatura em música do
Conservatório Brasileiro de Música da classe do professor Valmir Antonio de Oliveira. Rio de
Janeiro, 2013. Cd2.

Faixa 1
105

Faixa 2
106

Faixa 3
107

Faixa 4
108

Faixa 5
109

Faixa 6
110

Faixa 7

Faixa 8
111

Faixa 9

Faixa 10
112

Faixa 11

Faixa 12
113

Faixa 13

Faixa 14
114

Faixa 15

Faixa 16
115

Faixa 17
116

Faixa 18
117

Faixa 19
118

Faixa 20
119

APÊNDICE F
Arranjo, interprete: Valmir Antonio de Oliveira. Rio de Janeiro, 2013. Cd1, desenvolvimento
do arranjo.
faixa 34 - Ciranda cirandinha passo a passo

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