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e Composição
Indaial – 2021
1a Edição
Copyright © UNIASSELVI 2021
Elaboração:
Prof. Alexandre Luís Vicente
V632a
ISBN 978-65-5663-418-0
ISBN Digital 978-65-5663-414-2
CDD 789.99
Impresso por:
APRESENTAÇÃO
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ENADE
Acadêmico, você sabe o que é o ENADE? O Enade é um
dos meios avaliativos dos cursos superiores no sistema federal de
educação superior. Todos os estudantes estão habilitados a participar
do ENADE (ingressantes e concluintes das áreas e cursos a serem
avaliados). Diante disso, preparamos um conteúdo simples e objetivo
para complementar a sua compreensão acerca do ENADE. Confira,
acessando o QR Code a seguir. Boa leitura!
LEMBRETE
Olá, acadêmico! Iniciamos agora mais uma
disciplina e com ela um novo conhecimento.
REFERÊNCIAS.......................................................................................................................72
REFERÊNCIAS..................................................................................................................... 137
REFERÊNCIAS.................................................................................................................... 204
UNIDADE 1 -
CRIAÇÃO
DE ARRANJOS
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:
PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer dela, você encontrará
autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.
CHAMADA
Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure
um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.
1
CONFIRA
A TRILHA DA
UNIDADE 1!
Acesse o
QR Code abaixo:
2
UNIDADE 1 TÓPICO 1 -
TEORIA: CONCEITOS DE ARRANJO
1 INTRODUÇÃO
Uma cena habitual, para quem trabalha com a prática musical e é ligado à área
do arranjo e composição, é ter, em mãos, um repertório composto ou escrito no perfil da
melodia acompanhada – os conhecidos lead sheets – com apenas melodia e harmonia.
A composição, geralmente, parte desse embrião, e nem sempre temos disponíveis
repertórios já arranjados previamente, escritos para formações que precisamos e que
sirvam como uma luva ao nosso contexto de trabalho.
A questão central é: como fazer música em grupo, a partir de uma simples cifra/
melodia, produzindo uma boa sonoridade dentro de tantas possibilidades individuais, e
realizar uma prática em conjunto que extraia o melhor de cada um? Nesses contextos, o
ideal é dominarmos uma série de ferramentas para tratar de um repertório, arranjando e
adaptando dentro da possibilidade do grupo em questão, independentemente de níveis, e
estando sensíveis às possibilidades de exploração de cada instrumento e instrumentista.
3
2 FORMA
A etapa inicial e o ponto de partida para compreendermos um arranjo e uma
composição são a noção da forma. A partir de um entendimento do macro, podemos
melhor planejar, programar-nos, termos uma noção do todo e, com isso, preparar
arranjos, ensaios, aulas e a nossa didática para chegar ao micro. Entender a forma de
uma obra é como ter em mente um mapa para guiar e poder guiar, com segurança,
músicos e alunos nos caminhos de uma composição e de um arranjo.
NOTA
A forma é o nome dado à estrutura geral de uma música, compreendida
em partes, subdivisões ou seções.
No dia a dia musical, vários nomes são usados para identificar a mesma seção,
sinônimos como:
DICA
Para identificar as seções, fique atento à unidade ou contraste; semelhança ou
diferença entre as partes; lógica e coerência em uma mesma parte. Onde? No
perfil melódico e perfil harmônico, quadratura, rimas, simetria, proporção no
número de compassos, fechamento de ideias ou novas ideias em elementos,
como altura, timbre, intensidade, instrumentação, textura e densidade.
4
Na prática, nomeamos e identificamos as seções pelas chamadas letras de
ensaio, que podem ser acompanhadas dos números de compasso.
• Forma simples – A
• Forma binária – A B ou A A B B
• Forma ternária – A B A ou A B C
Três partes, ou melhor, apenas duas seções repetidas em três partes, como: A
B A ou AABA ou AABBAA, que são formas ternárias. No entanto, duas partes repetidas
assim, A B A B A B A B ou AAAABBBB, constituem uma forma binária. Exemplos: Opus
39 nº 16 (Tchaykovsky), Enter Sandman (Metallica)
• Canção – A A B A ou A B A C
IMPORTANTE
O sinal de apóstrofe, como em A’, é usado em esquemas de forma
para indicar que é realmente uma repetição, mas com alguma ligeira
modificação, que não é o bastante ou necessário para nomear uma
seção nova. Em uma canção, é muito comum que o segundo A tenha
um fechamento diferente, que encerra e indica a novidade da seção B. O
último A pode ser uma repetição do primeiro ou do segundo, como AA’BA’.
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O formato A B A C também é conhecido como canção, especialmente, pelo
número de compassos, e por possuir três partes diferentes. Exemplos: Corcovado (Tom
Jobim), Four (Miles Davis)
• Rondó – A B A C A
• Forma livre
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DICA
Ouça o áudio e perceba que, na verdade, a composição de uma canção
– a forma A A’ B A’ – é acrescida de seções acessórias, formando um
arranjo completo.
3 REARMONIZAÇÃO
Rearmonizar se trata de alterar a harmonia de uma composição. Utilizaremos,
aqui, uma dentre tantas maneiras: a rearmonização funcional. Com essa ferramenta,
a ideia é trocar um acorde por outros de mesma função harmônica, livremente, o que
sempre vai dar certo.
• Exemplos em Dó:
o Subdominantes (S): tétrades do campo harmônico que possuem a quarta
da tonalidade, a nota Fá – sensação de movimento.
o Dominante (D): tétrades do campo harmônico que possuem o trítono da
tonalidade, as notas Fá e Si – sensação de tensão.
o Tônicas (T): tétrades do campo harmônico que sentimos ausência de
tensão – ausência da nota Fá e do trítono – sensação de repouso.
7
TABELA 1 – FUNÇÕES DO CAMPO MAIOR
• Exemplos em Dó menor:
o Subdominantes (S): tétrades do campo harmônico que possuem a sexta
da tonalidade, nota lá bemol ou lá natural – sensação de movimento (note
que é a quarta de Mi bemol maior, o relativo de Dó menor).
o Dominante (D): tétrades do campo harmônico que possuem o trítono da
tonalidade com as notas Fá e Si – sensação de tensão (mesma regra de
Dó maior).
o Tônicas (T): tétrades do campo harmônico que sentimos ausência de tensão
– ausência sexta da tonalidade, nota Lá bemol – sensação de repouso.
Im7 bVII7
bIImaj7 bIIImaj7 IVm7
Im(maj7) V7 bVImaj7 bVIImaj7
IIm7(b5) bIIImaj(#5) IV7
Im6 VII°
IIm7(b5); bIImaj7;
Presença da sexta nota da escala (nota
SUBDOMINANTE IVm7; IV7; bVImaj7;
Láb ou Lá natural em Dó Menor)
bVII7; bVIImaj7
Presenças da quarta nota da escala (nota
DOMINANTE V7; VII° Fá em Dó Menor) e da sétima nota da
escala (nota Si natural em Dó Menor).
8
Portanto, todos os acordes de uma mesma função são intercambiáveis, o que
pode dizer que há sonoridade muito próxima, com notas comuns, e você pode trocar
livremente. Como exemplo, sejam eles provenientes do tom de Dó, essas três funções
são substituíveis entre os campos harmônicos de Dó maior, e por empréstimo modal Dó
menor, Dó menor harmônico e Dó menor melódico.
S D T S D T
bII7M Db7M
bVII7M Bb7M
FONTE: O autor
Compreendendo o exposto, são oito acordes para a função de tônica, três para
a função de dominante e dez para a função de subdominante. Você pode trocar um C
por outros sete, um G por outros dois, e um Dm por outros nove.
A dica é: analise sempre a melodia em relação aos novos acordes para evitar
choques. Ainda, use a criatividade! Com o mesmo raciocínio, você pode pensar em reduções
no sentido inverso e facilitar uma harmonia, percebendo que só existem três funções.
DICA
A respeito dos acordes bII7M e bVII7M, que não estão contidos na
estrutura do campo, porém, podem ser considerados diatônicos,
visto o uso na prática em repertórios, leia: https://archive.org/details/
QueAcordeTeseFREITASVersaoO1O52o11.pdf.
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4 VOZES
Partindo de uma composição dada em formato melodia/cifra, a primeira
iniciativa para ampliar a melodia para um maior grupo será a de abrir vozes. Por abertura
de vozes, consideramos, aqui, o arranjo de apenas uma segunda voz e para até quatro
novas linhas a serem executadas por cantores ou por outros instrumentos, com o
mesmo ritmo da melodia.
• Movimentos:
o paralelo: as vozes seguem o mesmo sentido e em intervalo constante;
o contrário: sentidos inversos – se uma voz sobe e a outra desce, e vice-versa;
o oblíquo: uma voz se mantém e a outra movimenta.
• Intervalos:
o Consonantes: 3 e b3; 6 e b6
Utilizar somente terças pode trazer uma sonoridade básica ou ingênua para
alguns repertórios. Como a sexta é o intervalo de terça invertido, ela pode servir para
ampliar essa sonoridade e para diversificar livremente o paralelismo, além de resolver
pontos nos quais as terças gerem algum intervalo que deva ser evitado pela harmonia.
Para abrir em terças, use sempre a tonalidade. Por vezes, o intervalo será terça
maior, outras, menor.
Quando há uma sequência grande de terças e soar básico, pense na terça, seja
abaixo ou acima da melodia, e oitave-a. Isso gerará o intervalo de sexta que trará outra
sonoridade e modificará completamente o sentido da melodia. Isso foi feito no exemplo da
figura anterior, em todos os compassos, exceto o primeiro.
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• Dissonantes: 2 e b2; 7 e b7
Outro cuidado é com a escolha de instrumentos que realizem esses intervalos, para
que, através dos timbres, possam atenuar uma dissonância exagerada. Exemplos: duos
entre de flauta, voz, clarinete, trompete com surdina e órgãos.
DICA
Ouça, em Surfboard, de Tom Jobim, a utilização de segundas maiores
por todo o trecho da introdução.
11
Em alguns momentos, as terças surgem nos compassos 1, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10 e
11. São provenientes dos próprios arpejos, e enriquecem, melodicamente, o caminho
dos intervalos de segunda. É uma estratégia simples para resolver pontos nos quais as
segundas não soarem bem.
• Justos: 4j, 5j e 8j
5 CONTRACANTOS
Os contracantos podem ser entendidos como linhas melódicas em segundo
plano, com perfil rítmico ou melódico diferente da melodia original. Podem assumir uma
participação mais passiva ou ativa.
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Quando ativos, têm, realmente, o papel de uma nova melodia e, mesmo que em
segundo plano, devem enriquecer a textura do arranjo, propor contrastes e deslocar a
percepção do ouvinte em relação à melodia principal. Muitas vezes, o contracanto é até
mais bonito do que a melodia, e se torna parte da composição.
• Dicas gerais:
o Notas longas: use as notas do acorde. Opte por terças, sétimas e as tensões
que já estão sendo tocadas na cifra. Deixe um pouco de lado fundamentais e
quintas, que devem ser usadas para conectar a linha. Lembrando, já estão na
função de instrumentos graves e são consonantes demais.
o Melodias: use as outras notas da escala. Cromatismos, de preferência,
em tempos fracos.
o Pausa na melodia: aproveite o espaço para desenvolver o contracanto
livremente, sem regras.
ATENÇÃO
O contracanto deve soar bem sozinho e fazer sentido melódico, mas analise
sempre o intervalo resultante em relação à nota da melodia, não apenas
o intervalo em relação ao acorde.
13
FONTE: Guest (1996a, p. 107)
FONTE: O autor
14
6 BLOCOS
E quando temos vários instrumentos, ou um naipe para acompanhar a melodia?
Quando precisamos de apenas uma segunda linha, usamos a concepção de abrir vozes
ou um contracanto, vistos anteriormente.
Para diversos músicos ao mesmo tempo, usamos a ferramenta dos blocos. Estes
acompanham a rítmica da melodia e, eventualmente, podem inserir notas longas ou pausas
para buscar diversidade. Geralmente, são escritos por famílias de instrumentos – metais/
madeiras/cordas ou vozes – que, pelos timbres semelhantes, conseguem homogeneidade,
como uma harmonia tocada por vários instrumentos melódicos.
ATENÇÃO
Atente para abrir, primeiramente, a posição fechada, a partir da nota da
melodia na sequência do arpejo. Depois, escolha com que drop deve trabalhar.
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FIGURA 7 – BLOCOS DO ACORDE Dm7 POSIÇÃO FECHADA [FAIXA 7]
No arranjo anterior, para quatro saxofones, note como o Dm7 é aberto a partir da
nota aguda da melodia. A melodia está no lá, quinta justa do arpejo. Portanto, a posição
fechada é quinta, terça menor, fundamental e sétima, do agudo para o grave. Todos os
acordes estão abertos assim.
Se for a sua opção escolher outro drop, a abertura é feita a partir da posição
fechada. A seguir, o mesmo trecho em drop 2, compare:
No arranjo, note que a posição fechada anterior do Dm7 com as notas lá, fá, ré e
dó, uma “caiu” com o drop 2 para lá, ré, dó e fá. Ou seja, no drop 2, “cai” a segunda nota,
portanto, caiu o fá, abrindo as vozes do acorde.
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Eliminar notas repetidas: quando abrimos os blocos, é comum que,
inicialmente, as notas abaixo da melodia tragam muitas repetições nas vozes individuais.
Notas repetidas diminuem a fluidez da linha, o interesse melódico, a inspiração do
instrumentista e são de difícil articulação. Saídas práticas: 1) substituir por tensões
disponíveis; 2) outras notas do acorde; ou 3) drops diferentes.
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A dica da figura anterior é simples e eficiente: sax alto e tenor cruzam as
vozes intermediárias, gerando linhas sem as repetições originais e com variedade e
movimentos contrários através dos timbres.
Veja, a seguir, o resultado de compor uma linha para a ponta da melodia com a
ideia de cruzamento: o sax alto 1 é gerado a partir da escolha entre os blocos escritos
(em cinza) nos três trompetes e trombone.
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FIGURA 13 – BLOCO: SAÍDA POR ABORDAGENS DIATÔNICA E DOMINANTE
7 SEÇÃO RÍTMICA
O ritmo tem função primordial na escrita de um arranjo ou composição. Uma peça
que traga interesse rítmico é capaz de suingar, conectar fisicamente, visceralmente e
entrelaçar músicos e audiência. Em um arranjo, não se trata “apenas” da parte percussiva
e dos instrumentos, mas perceber como nossa atenção ao ritmo pode e deve estar em
tudo, na métrica como um todo: na melodia, instrumentos da seção rítmica, backgrounds,
riffs, ostinatos, levadas e convenções.
• Levadas:
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IMPORTANTE
A batida não é simples fundo neutro sobre o qual a canção viria a passear
com indiferença. Ao contrário, a primeira nos diz muito do conteúdo
da segunda. A batida é, de fato, na música popular brasileira, um dos
principais elementos pelos quais os ouvintes reconhecem os gêneros.
Nesse país, e, certamente, em outros, quando escutamos uma canção, a
melodia, a letra ou o estilo do cantor permite o classificar em um gênero
dado, mas antes mesmo que tudo chegue aos nossos ouvidos, tal
classificação já terá sido feita graças à batida que, precedendo o canto,
nos fez mergulhar no sentido da canção.
Foi uma exitosa prática brasileira de arranjo adaptar nossas células rítmicas
e levadas para os diferentes naipes de instrumentos e, inspirados nisso, podemos
aproveitar ou até criar novas levadas. Um exemplo quase mítico simboliza o momento
da incorporação da rítmica brasileira nos arranjos do rádio nos anos de 1940. Ary
Barroso compôs Aquarela do Brasil no mesmo período em que Gnattali, então diretor da
orquestra da Rádio Nacional, que estava procurando um modo mais efetivo de trazer o
suingue do samba para a grande orquestra:
20
Luciano Perrone, o baterista da estação, recomendou levar algumas
das responsabilidades rítmicas da percussão para os sopros. Gnattali
e Perrone depois descreveram isso como uma inteira e autônoma
invenção brasileira. Na realidade, as bandas de swing jazz americanas
estavam usando técnicas similares com os ritmos de jazz há vários
anos. Gnattali era um admirador de Benny Goodman, Duke Ellington
e Tommy Dorsey, e já havia utilizado algumas das suas técnicas de
arranjo no seu trabalho na Rádio Nacional (MCCANN, 2004, p. 71).
DICA
Vamos assistir a uma gravação de Aquarela, com o claro toque do
tamborim abrindo o grandioso arranjo de Laércio de Freitas para a Banda
Mantiqueira, Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo e Mônica
Salmaso. Ao longo de toda execução, ouvimos as referências rítmicas
brasileiras distribuídas em diversos naipes. O tamborim é aproveitado nas
cordas, metais e coro: https://tvcultura.com.br/videos/29340_concerto-
de-ano-novo-monica-salmaso-banda-mantiqueira-e-osesp.html.
21
FONTE: O autor
• Backgrounds rítmicos:
Ostinatos:
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FIGURA 18 – OSTINATO DE CELLOS
• Riffs:
• Pontuação/convenções:
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FIGURA 20 – PONTUANDO A MELODIA
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RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:
• Arranjar pode ser sofisticar ou simplificar uma música, de acordo com o grupo e os
instrumentos trabalhados.
• A forma é como um mapa, para guiar alunos e músicos pelos caminhos de uma
composição e de um arranjo.
• Vozes podem ser abertas em qualquer intervalo, as mais consonantes são terças e
sextas. Quartas e quintas trazem uma sonoridade diferenciada. Segundas e sétimas
são as mais dissonanteas.
• Sempre estude com o instrumento à mão: é necessário saber executar o que você
arranja, e poder exemplificar para os alunos e instrumentistas. É necessário sempre
transpor a teoria para o instrumento.
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AUTOATIVIDADE
1 Para rearmonizar, as funções harmônicas são muito práticas. Considere a seguinte
progressão no tom de dó maior: C7M - Am7 - F7M - G7. Assinale a alternativa que traz
uma harmonia que possa substituir esses acordes, respeitando as funções originais:
2 Por abertura de vozes, consideramos o arranjo de apenas uma segunda voz e para
até quatro novas linhas a serem executadas por cantores ou por outros instrumentos,
com o mesmo ritmo da melodia. Com relação às vozes, assinale V para verdadeiras e
F para falsas:
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4 Assinale a alternativa que traz as características de um contracanto ativo:
5 Disserte sobre: o que são blocos? Quantas são suas aberturas e no que consistem?
27
28
UNIDADE 1 TÓPICO 2 -
1 INTRODUÇÃO
Neste tópico, desenvolveremos os seis conceitos apresentados na unidade
anterior em arranjos reais. O objetivo, aqui, é analisar minuciosamente, para absorver as
técnicas em repertórios consagrados por grandes arranjadores e compositores.
29
Os arranjos são de All of Me, standard do jazz, de 1931. Chama atenção,
nessa música, a força dos motivos melódicos originais, baseados em transformações
e figurações de três notas a partir de uma simples tríade de Dó. Provavelmente, isso
influenciou o sucesso e a projeção como um dos maiores clássicos americanos,
reconhecido em todo planeta. Seguem melodia e cifra da composição:
No arranjo a seguir, para a Count Basie Orchestra, o arranjador Billy Byers usou
o emblemático motivo inicial de três notas na introdução:
30
NOTA
Hemíolas são grupos melódicos com um número de notas diferente
do grupo rítmico, gerando uma sensação de deslocamento através da
repetição. Exemplo: uma pentatônica ascendente em quatro colcheias.
Cinco dentro de quatro.
31
Na sequência, finalmente, será apresentado o motivo original nos trombones:
32
DICA
Ouça a gravação original da canção e uma ao vivo, do grupo da cantora Rosa
Passos, toda rearmonizada, especialmente, na segunda exposição do tema:
• https://www.youtube.com/watch?v=7wvIu740BOw
• https://www.youtube.com/watch?v=h2jC9CPMt8A
ATENÇÃO
Essas preparações secundárias, que podem ser realizadas para todos os
acordes do campo harmônico, são feitas com o tom do momento, visando
ao acorde para o qual se encaminham e o tratando com o respectivo
campo harmônico. Exemplo: a cadência S D T de Dm7 é Em7(b5), A7(b13).
Esses acordes/funções são provenientes do tom de Ré menor. As
rearmonizações devem atentar a isso.
33
FONTE: Chediak (1990, p. 59)
FONTE: O autor
34
FONTE: O autor
DICA
A respeito das rearmonizações extremas, veja o baixista youtuber, Adam
Neely: https://www.youtube.com/watch?v=JXfQsHT5c30.
35
DICA
Para conhecer a composição, é preciso assistir a uma boa versão com
apenas a primeira voz e o piano. Assim, a segunda voz, no arranjo
analisado na sequência, faz mais efeito aos ouvidos: https://www.
youtube.com/watch?v=z0BOrRhVAZw.
36
estrategicamente pensados para soar nas tensões diatônicas 9 e 11, e, no D7, #11 (não
diatônica) e 13. Na casa 1, como a melodia é ascendente, a segunda voz enriquece com
um movimento contrário, soando um intervalo consonante de sexta, porém, entre a 3 e
b9 do acorde de G7(#5). A ideia final da parte A é quartal, retomando a ideia inicial.
A seção B traz novas ideias de intervalos paralelos, mas como apojaturas de fora
para dentro do diatonismo no E7M e C#m7. Choques de segunda maior na sequência.
Os quatro últimos acordes têm uma linha cromática na 11ª dos acordes, já na
melodia original. São harmonizados com as nonas, que perfazem intervalos consonantes
e paralelos de terça menor (sem a sonoridade ingênua, pois estão nas tensões) entre as
duas vozes, finalizando com um intervalo quartal para o Eb7, entre nona e quinta.
37
da voicing se identifica mais com a sonoridade modal da escala do
que com o acorde do momento, e isso é positivo, porque aproxima
a sonoridade das voicings à sonoridade dos blocos ocorrentes que
resultam da coincidência rítmica das vozes lineares (OLIVEIRA, 2004,
p. 87, grifo nosso).
• Macetes:
o Movimentos contrários são muito bem-vindos, e são mais fáceis de serem
inseridos, iniciando por uma linha grave. Claro, você tem mais espaço.
o Evite repetir notas, mas se soar bem, ok, vá na fé!
o Lembrando, podemos arranjar, dessa forma, texturas de duas vozes, ou seja,
melodia e contracanto, ou várias, e dá certo.
FIGURA 29 – ALVOS
Passo 3: a escolha dos modos para cada acorde. Para essa progressão tonal
em Eb maior, VIm7 – bVII7 – SubV7 – V7 – I7M, foram selecionados os modos: eólio –
mixolídio – lídio b7 – simétrica dominante diminuta – jônio.
38
FIGURA 30 – ABRINDO OS PONTOS HARMÔNICOS
Passo 4: são feitas conexões com os modos entre esses pontos harmônicos.
Geram uma trama de sonoridade bem interessante e aberta. Ouça e veja a liberdade e a
independência nas direções das linhas em relação à primeira voz:
39
FIGURA 32 – REDUÇÃO [FAIXA 21]
40
Ainda, na figura anterior, algumas abordagens, evitando a repetição de notas,
foram adotadas: um A7 é inserido como aproximação dominante do Dm7, harmonizando
a nota dó.
No último passo da figura anterior, mais instrumentos são adicionados aos metais
da ideia anterior. O timbre das palhetas dos saxofones é trazido em posição fechada, a
partir da segunda voz dos trompetes. O Alto 1 e seu naipe dobram a partir do trompete 2,
e adicionam mais uma voz. Dessa maneira, o Tenor 2 dobra o trompete 1 oitava abaixo, o
que evidencia a clareza da melodia no registro.
41
Figuras, como Pixinguinha, Radamés Gnattali, Moacir Santos, Guerra-Peixe e
Tom Jobim, trouxeram, para esses instrumentos, nossa riqueza e excelências rítmica
e percussiva, e “inventaram” uma linguagem e sonoridade brasileiras para grandes
formações.
FONTE: O autor
FONTE: O autor
42
FIGURA 39 – OUTRA COISA [FAIXA 23]
44
• Backgrounds
A seguir, teremos três choruses de improviso. O sax tenor sola, então, Alto 1, Alto
2 e Tenor 2 executam um riff motivicamente repetido no primeiro chorus:
45
FIGURA 44 – RIFFS DE TROMBONE [FAIXA 27]
46
FIGURA 46 – PONTUAÇÃO E RIFFS DE TROMPETES E TROMBONES [FAIXA 27]
47
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:
• Para ter ideias em seções acessórias, como introdução, interlúdio e fim, aproveite
elementos da própria composição. Eles criam conexão, coerência e são fonte óbvia
de inspiração. Então, elabore a sua ideia.
• Qualquer música com harmonia difícil pode ser tocada por um grupo. Arranjo é
elaborado, mas, simplificar, também é arranjo. Rearmonizar, facilitando a música, é
uma bela ferramenta para educação musical.
• Abrir vozes pode ser muito criativo. Muito do mérito do arranjador está nisso. Não
tenha receio de testar, use a criatividade para além de terças e uníssonos. Teste, se
necessário, reescreva.
• A técnica linear pretende dar liberdade aos contracantos, liberar as linhas. Pode
parecer complicado se você não entender as escalas e modos, mas, esclarecendo
isso, as linhas ganham uma feição de improvisação.
• Para os blocos, a dica mais rápida e útil é a escolha de aberturas (drops), sem choque
com a melodia.
48
AUTOATIVIDADE
1 Analise as asserções a seguir:
PORQUE
a) ( ) Dm7 – G7 – Em7.
b) ( ) Fm7 - Bm7(b5) – Em7.
c) ( ) Fm7(b5) – B7 – Em7.
d) ( ) F7M – B7 - Em.
3 A “levada”, ou “batida”, não é simples fundo neutro sobre o qual a canção viria a passear
com indiferença. Ao contrário, a primeira nos diz muito do conteúdo da segunda. A batida
é, de fato, na música popular brasileira, um dos principais elementos pelos quais os
ouvintes reconhecem os gêneros. Tendo isso em vista, elabore um parágrafo definindo o
que é a levada ou batida.
49
4 Na partitura a seguir, o arranjador em sua introdução inseriu o motivo inicial da canção
All of me. Assinale a alternativa que contém este fragmento:
5 A partitura a seguir traz um arranjo para Prelude to a kiss. Escolha um dos cinco
sistemas e disserte sobre a abertura de vozes com suas próprias palavras:
50
UNIDADE 1 TÓPICO 3 -
SONORIDADES CULTURAIS,
INTERNACIONAIS E ORIENTAIS
1 INTRODUÇÃO
Podem ser úteis e criativas em arranjos, assim como em sua didática como
professor, quando atividades específicas de educação com temáticas culturais como
direitos humanos, alteridade, diversidade étnico-racial, preconceitos sociais, sincretismo,
democracia, História ou Geografia forem o objetivo.
2 ESCALAS E MODOS
Nossa porta de entrada para diferentes culturas será através das escalas e
modos. Por escalas, entendemos a sucessão de tons e semitons, e a compreensão
de seus intervalos a partir de uma tônica, primeiro grau de uma tonalidade. Por modos,
também entendemos uma sucessão de tons, semitons e seus intervalos, mas gerados a
partir dos outros graus de uma escala. Por exemplo, a escala de dó maior gera o modo
ré dórico se iniciarmos o mesmo conjunto de notas a partir da nota ré, gerando uma
sucessão de tons e semitons, intervalos e sonoridade completamente diferente.
Teremos, a seguir, todos os exemplos a partir da nota dó, para que a sonoridade do
modo fique mais clara quando comparados entre si. Toque sempre! Toque em vários tons!
51
IMPORTANTE
Compare, sempre, os modos em uma mesma fundamental, assim, você
compreenderá as diferenças entre eles. Compare os maiores com a escala
maior natural, e, os menores, com a escala menor natural, para analisar e
ouvir as notas características. Exemplo: dó maior com dó lídio e dó mixolídio.
Dó menor com dó dórico, dó frígio e dó lócrio. Assim, você gera e ouve sons
e escalas completamente diferentes. Quando fazemos dó maior (jônio), ré dórico, mi frígio,
fá lídio, sol mixolídio, lá menor (eólio) e si lócrio, estamos tocando sempre as mesmas sete
notas, dó – ré – mi – fá – sol – lá – si. Por isso, muitos estudantes não percebem diferenças
auditivamente, mas apenas na estrutura dos intervalos, o que já é importante e útil, mas não
é tudo. Cada modo tem a sua sonoridade. Faça questão de ouvi-los e de tocá-los sobre o
acorde e harmonia que geram também, para que os intervalos fiquem claros.
Nas imagens, a classificação dos intervalos segue Guest (1996, p. 97, grifo nosso):
“Maiores: 2, 3, 4, 5, 6, 7. Menores: b2, b3, b4, b6, b7. Justos: 4, 5, 8. Aumentados: #4,
#5, Diminutos: b4, b5, bb7”.
3 SONORIDADES NACIONAIS
Neste subtópico, será discutida a sonoridade brasileira, além das principais
identidades.
FONTE: O autor
Sua estrutura surge no quinto grau de uma escala maior. Sua nota característica
é a sétima menor. Melodias idiomáticas do Nordeste trazem os fragmentos melódicos
b7 – 6 - 5, e terminações melódicas com 6 – F. Padrões de terças neste modo também:
8 – 6 – b7 – 5 – 6 – 4 – 5 – 3 – 4 – 2 – 3 – F.
52
Quanto às harmonias, é usual a predominância de acordes do tipo dominante
(X7) e sua utilização no primeiro grau. Também pode ocorrer uma melodia exclusivamente
com notas do modo mixolídio sobre uma harmonia tradicionalmente em campo
harmônico maior. Exemplos: Juazeiro (Luiz Gonzaga), O ovo (Hermeto Pascoal), Quebra
pedra (Tom Jobim).
• Modo mixolídio #4
FONTE: O autor
Pode ser compreendido como uma variação do modo anterior, no qual a quarta
aumentada é sentida como uma inflexão melódica. Notado em cantorias tradicionais
nordestinas, se difundiu também na música nacionalista de concerto, música
instrumental brasileira e na prática de improvisação. Exemplos: Chá de panela (Guinga),
Ponteio nº 16 (Camargo Guarnieri), Promessa ao padre Cícero.
• Modo dórico
FIGURA 49 – DÓRICO
FONTE: O autor
53
Tratando de progressões harmônicas, nota-se a ênfase no acorde dórico e as
cadências partindo e direcionando-se a ele, como se fosse um primeiro grau. Ocorre,
também, a prática de uma melodia, ressaltando a sexta maior do modo dórico, sobre
cadências tradicionais do campo harmônico menor. Exemplos: Carcará (João do Vale),
Lamento sertanejo (Gilberto Gil e Dominguinhos), Forró Brasil (Hermeto Pascoal).
FONTE: O autor
• Modo Hexacordal
54
FONTE: O autor
FONTE: O autor
55
3.3 SONORIDADE INDÍGENA
A riqueza cultural indígena e sua música foram quase extintas de nosso país. De
fato, muito pouco desta musicalidade, em termos melódicos e harmônicos, sobreviveu
como referência clara para nós na música popular, música de concerto, rádios, cinema
e televisão. Sua instrumentação nos é um pouco mais familiar, por ser material, sólida, e
de alguma forma resistiu em chocalhos, reco-reco, flautas, trombetas, ganzás, tambores
e percussão corporal. Seus cantos, transmitidos pela tradição oral e não materializados
em partituras ou discos, em grande medida esvaneceram no tempo pelo desenrolar
colonialista das culturas dominantes.
Mário de Andrade (1972, p. 16), grande pensador brasileiro das bases de nossa
música, afirmava, em tom de crítica, no pioneiro e influente livro para tantos compositores
brasileiros, o Ensaio sobre a Música Brasileira: “O homem da nação Brasil hoje está mais
afastado do ameríndio que do japonês ou húngaro. O elemento ameríndio no populário
brasileiro está psicologicamente assimilado e praticamente já é quase nulo... o que
evidentemente não destrói nossos deveres para com ele”.
INTERESSANTE
Vejamos dois cantos tupinambás registrados em 1557. Notadas em clave de
dó pelo viajante francês Jean de Léry, na Baía de Guanabara, Rio de Janeiro,
chamada, na época, de França Antártica. Vamos, em uma imaginária viagem
ao passado, sintetizar, em uma linha, os sons remotos dos nossos indígenas e
prestar a devida homenagem aos originais:
Agora, em clave de sol, para facilitar a sua vida. Utilizadas por Villa-Lobos na composição
Caninde Ioune – Sabath:
56
FIGURA – CANIDE IOUNE E SABATH, DE VILLA-LOBOS
57
FIGURA 55 – CANTO INDÍGENA NOZANI-NÁ NO CHOROS Nº 3 (VILLA-LOBOS) - MELODIAS EM GRAU
CONJUNTO
4 SONORIDADES INTERNACIONAIS
• Blues
O blues, como expressão maior de uma raiz da cultura norte-americana, tem sua
linguagem, também afro, fundada na pentatônica, somada a um símbolo característico
de sua sonoridade: a blue note.
58
FONTE: O autor
• Bebop scales
59
FONTE: O autor
Nesse sentido, a escala bebop pode ser entendida como uma fórmula pronta de
sonoridade jazzística, pelo cromatismo previamente entremeado às escalas e modos.
Basicamente, tome uma escala maior, menor ou um modo, e adicione um cromatismo,
transformando uma escala originalmente de sete notas em oito.
Assim, torna-se interessante que, pelo fato de possuir oito notas, sua utilização
é facilitada ao executá-la em semínimas, colcheias e semicolcheias ascendentes ou
descendentes em qualquer andamento. Iniciando no tempo forte, as notas do arpejo ou
da pentatônica irão também soar sempre nos tempos fortes, o que cria uma liberdade
para a improvisação com segurança. Exemplos: Donna Lee (Charlie Parker), Oleo (Sonny
Rollins), Well you needn’t (Thelonious Monk)
• Flamenco/hispânico/árabe:
A escala menor harmônica, o modo frígio e sua versão frígio maior são sonoridades
muito relacionadas às culturas de povos hispânicos e árabes. Nota-se essa ênfase na escala
menor harmônica e seus modos derivados, devido ao poder simbólico e força melódica do
intervalo de um tom e meio entre a sexta menor e a sétima maior (sensível), que estão
vinculados a musicalidades mouras e árabes, as quais foram muito presentes historicamente
na península ibérica, região da Espanha. Nota-se que tal ênfase se apropria desse som
como um atributo de identidade, e para se firmar, como consequência evita sonoridades da
menor melódica, que em sua estrutura visa justamente eliminar esse intervalo.
FONTE: O autor
60
FIGURA 59 – MENOR HARMÔNICA E FRÍGIO MAIOR
FONTE: O autor
IMPORTANTE
Essas mesmas escalas são executadas por povos árabes, com os
próprios nomes: maqam nahawand (menor harmônica), maqam bayati
(frígio) e maqam hijaz (frígio maior). O detalhe é que essas culturas
utilizam intervalos menores do que o semitom para várias dessas alturas,
o que entendemos como quartos de tom, ou seja, dividir um semitom em
quatro notas. Isso, geralmente, acontece na segunda nota dos intervalos,
nos quais há meio tom nas escalas. De maneira geral, no Oriente Médio,
os turcos tocam esses microtons mais graves, os árabes no meio e os
iranianos (escalas persas) mais altos.
• Escala cigana/húngara
61
A mescla na utilização dos termos cigano e húngaro pode ser compreendida
como uma primeira manifestação de orientalismo na música de concerto europeia. Esta
sonoridade, por vezes denominada “escala cigana”, “escala húngara” ou mesmo juntas
“cigana húngara” (gypsy/hungarian) traz a impressão de algo de exótico, misterioso e
faz menção ao folclore e tradições de ciganos de uma região que compreende a Hungria,
Áustria e Romênia, conotando uma música oriental do leste europeu. Esta sonoridade
não ocidental se popularizou e se desenvolveu tanto na música nacionalista de concerto
europeia como no “gypsy jazz” e até no rock.
FIGURA 60 – CIGANA/HÚNGARA
FONTE: O autor
62
Estas sonoridades se difundiram amplamente na cultura japonesa, através de
instrumentos como o shamisen, koto e shakuhachi, que são espécies de banjo, uma
harpa horizontal, e flauta doce respectivamente. São ouvidos na música do teatro de
máscaras kabuki, no estilo de dança kyomoto, e gêneros musicais como tokiwazu,
tomimoto, e bungo-bushi.
ATENÇÃO
Alguns conceitos a esclarecer: esses modos se baseiam em tetracordes.
São diferentes da nossa visão ocidental de escalas dentro de uma oitava.
Baseiam-se em distâncias de quartas, portanto, entre quatro notas, como mi
até lá. Na figura a seguir, as quatro variedades de tetracordes, diferenciadas
pela nota escolhida para o meio: miyako-bushi (música urbana), minyo
(folclore), ritsu e ryukyiu.
Entre cada distância de quarta, uma nota é escolhida no meio. Dois conjuntos
desse, um a partir da fundamental (mi) e outro a partir da quinta (si), compõem um
modo de cinco notas.
63
Esses modos da Figura 61 têm sonoridades que podemos aproximar ao que
conhecemos pelos intervalos, como mi frígio, pentatônica menor de mi, pentatônica
maior de lá, arpejo de mi com sétima maior com quarta, respectivamente. No entanto,
chamamos a atenção para os conjuntos de cinco notas exclusivamente, e que se
aplicam, no caso da Figura 62, sobre uma fundamental, bordão ou baixo pedal na nota
mi. Além disso, podem também ser combinados entre dois tetracordes distintos, um
a partir da fundamental e outro diferente a partir da quinta, gerando novas opções de
sonoridades japonesas:
64
LEITURA
COMPLEMENTAR
CONSIDERAÇÕES SOBRE O CONCEITO DE ARRANJO NA MÚSICA POPULAR
Paulo Aragão
1 INTRODUÇÃO
Este trabalho tem como proposta a realização de uma breve reflexão sobre
o conceito de “arranjo” no campo da música popular, em especial da música popular
brasileira. A motivação para a escolha desse tema veio da constatação de que a palavra
“arranjo” pode remeter a diversos significados e que as sutilezas existentes entre as
diferentes ações de que o termo pode dar conta provocam frequentemente, certa
indefinição conceitual e uma imprecisão no discurso, observáveis tanto no cotidiano da
prática musical quanto na literatura sobre música popular em geral. O termo “arranjo”
aparece em inúmeros trabalhos, utilizado, em geral, a partir de uma noção calcada no
senso comum nem sempre definida com rigor. Na prática, essa indefinição não acarreta
maiores problemas, sendo atenuada ou eliminada de um jeito ou de outro. Em um
estudo acadêmico, porém, torna-se absolutamente essencial definir, com exatidão, o
que se deve entender por “arranjo”.
2 DESENVOLVIMENTO
65
As duas principais fontes utilizadas nesse texto acabaram sendo, por força das
contingências, duas fontes estrangeiras (os verbetes do Grove e do Grove of Jazz). A
compreensão efetiva do significado de arranjo nesses dois universos musicais (música
clássica e jazz) será extremamente útil no estabelecimento de paralelos com a música
popular brasileira e no entendimento das particularidades características do arranjo
brasileiro. Além dessas, foram utilizadas outras fontes complementares, como aquelas
em que encontramos as referências ao termo arranjo já nas primeiras décadas do século.
A definição mais usual de arranjo, e aquela a que o Grove dedica quase a totalidade
do verbete, aponta para o caminho já esboçado na definição geral transcrita anteriormente.
Arranjo seria a “transferência de uma composição de um meio para outro ou a elaboração
(ou simplificação) de uma peça, com ou sem mudança de meio”. Haveria aí um grau variável
de recomposição envolvido, que faria o resultado do arranjo variar “de uma transcrição quase
literal até uma paráfrase, que seria mais obra do arranjador do que do próprio compositor
em si”.
De fato, esta parece ser a definição utilizada com mais frequência no cotidiano
da música clássica, o que pode ser confirmado, inclusive, com a observação da presença
corriqueira, nesse universo, de algumas das modalidades de arranjo apontadas pelo Grove.
66
Essas modalidades seriam espécies de categorias informais (já que não se
trata de uma caracterização rígida, havendo superposição e entrecruzamento entre os
diversos tipos) que ajudariam a mapear as diversas formas de arranjo. Teríamos assim,
por exemplo, uma primeira categoria constituída por “arranjos comerciais”, ou seja,
partituras elaboradas como objetivo de fazer uma composição alcançar um público
consumidor sempre maior.
O verbete prossegue com um longo histórico dos arranjos desde a Idade Média.
Nota-se que a definição de arranjo exposta aqui nos remete à definição de “transcrição”,
usual em vários países, inclusive no Brasil, e muito mais associada à música clássica.
A única diferença reside no fato de que a noção de transcrição seria um pouco menos
ampla, dando conta apenas da reelaboração de uma obra com mudança de meio.
Não se consideraria como “transcrição” a simplificação de uma obra virtuosística para
amadores ou a reorquestração de uma sinfonia de Schumann, por exemplo. De todo
modo, continuaremos usando a terminologia tal como encontrada no Grove.
67
Tal como no Grove, a abertura do verbete traz uma definição mais ampla do
conceito de arranjo no jazz. Segundo esta definição, “toda a performance de jazz, mesmo
que improvisada e completamente renovada, constitui uma forma de arranjo, uma vez que
os executantes rearranjam o material básico a cada nova variação”. Assim, toda execução
jazzística prescindiria, necessariamente, de um arranjo, ainda que totalmente improvisado
e sem nenhum tipo de estruturação a priori. Haveria casos, portanto, de execuções únicas,
que não poderiam ser repetidas da mesma forma. Um caso como esse seria denominado
pelo Grove of Jazz de um one-time arrangement, que seria uma vez mais rearranjado em
uma outra execução.
Em uma perspectiva não tão ampla, o Grove of Jazz chega a uma segunda
definição de arranjo, afirmando que o termo seria aplicado a uma versão mais fechada,
“escrita, fixa e às vezes impressa ou publicada de uma obra, em geral arranjada para uma
das formações tradicionais do jazz (jazz orchestra, big band ou algum grupo menor)”.
68
3 CONCLUSÃO
FONTE: ARAGÃO, P. Considerações sobre o conceito de arranjo na música popular. Cadernos do Colóquio, Rio de
Janeiro, v. 1, n. 3, p. 94-107, 2000. Disponível em: http://www.seer.unirio.br/index.php/coloquio/article/view/40/.
Acesso em: 28 jan. 2021.
69
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:
• Comparando os modos entre si, você descobre as suas notas características. São
elas que geram a sonoridade, a “cor” específica do modo. Compare, sempre, com a
maior natural, os modos maiores, e, com a menor natural, os modos menores. Afinal,
são “naturais”, são a referência.
• Existem diversos “Brasis”, cada um com a sua sonoridade particular. Vimos o Nordeste,
o afro e o indígena. Existem outros não cobertos aqui. Grandes compositores
e arranjadores musicaram diversas regiões para compor o seu estilo, o seu perfil,
engrandecer a música culturalmente.
• Escalas que possuem o intervalo de um tom e meio têm conotação árabe, hispânica,
moura etc. A menor melódica visa diminuir esse intervalo. Também há uma bela
sonoridade e os modos particulares.
70
AUTOATIVIDADE
1 Todos os modos possuem notas características e intervalos específicos. Podemos
os descobrir ao comparar modos maiores, com a escala maior (jônio), e menores,
com a escala menor (eólio). As tonalidades maior e menor, compostas por natural,
harmônica e melódica, geram sete modos cada. Analise as sentenças a seguir:
I- Devo comparar a escala maior com os modos jônio, lídio, mixolídio e dórico.
II- A nota característica do frígio é a nona menor (b9).
III- A escala menor harmônica, a partir do quinto grau, gera o modo frígio maior.
IV- O modo mixolídio, com quarta aumentada, é gerado a partir da escala húngara.
3 Assinale as escalas ou modos que possuem o intervalo de um tom e meio entre duas
notas da estrutura:
5 A música flamenca, espanhola, hispânica e árabe são atadas por algumas estruturas
comuns. Disserte sobre os principais elementos estruturais dessas sonoridades.
71
REFERÊNCIAS
ALMADA, C. Arranjo. 1. ed. Campinas: Unicamp, 2000.
ANDRADE, M. de. Ensaio sobre a música brasileira. 3. ed. São Paulo: Vila Rica;
Brasília: INL, 1972.
CHEDIAK, A. Songbook Tom Jobim: vol. III. Rio de Janeiro: Lumiar Editora, 1990.
FREITAS, S. P. R. de. Que acorde ponho aqui? Harmonia, práticas teóricas e o estudo
de planos tonais em música popular. 2010. 857 f. Tese (Doutorado em Música) –
Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2010. Disponível em: http://repositorio.
unicamp.br/jspui/handle/REPOSIP/284967. Acesso em: 28 jan. 2021.
LOWELL, D.; PULLIG, K. Arranging for large jazz ensemble. Berklee Press, 2003.
McCANN, B. Hello, hello Brazil: popular music in the making of modern Brazil. Durham:
Duke University Press, 2004.
72
MELLO, G. de. A música no Brasil. 2. ed. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1947.
MOREIRA, G. F. O estilo indígena de Villa Lobos (Parte II): aspectos rítmicos, texturais,
potencial significante e tópicas indígenas. Per Musi, Belo Horizonte, v. 1, n. 27, p. 29-
38, 2013. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/pm/n27/n27a04.pdf. Acesso em:
28 jan. 2021.
RAWLINS, R. The real book of jazz volume I. Milwaukee: Hal Leonard Corporation,
1970. Disponível em: http://www.play-along.ch/notationz/Volume1C.PDF. Acesso em:
28 jan. 2021.
SANTOS, M. Ouro negro: cancioneiro Moacir Santos. Rio de Janeiro: Jobim Music,
2005a.
STURM, F. Changes over time: the evolution of jazz arranging. Mainz: Advance
Music, 1995.
TOKITA, A. Mode and scale, modulation and tuning in japanese shamisen music: the
case of Kiyomoto. Ethnomusicology, Urbana, v. 40, n. 1, p. 1-33, 1996.
VICENTE, A. L. Moacir Santos, seus ritmos e modos: “coisas” do ouro negro. 2012.
219 f. Dissertação (Mestrado em Música) – Universidade do Estado de Santa Catarina,
Florianópolis, 2012.
73
74
UNIDADE 2 —
O ARRANJO
E A COMPOSIÇÃO NO
CONTEXTO EDUCACIONAL
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:
• diferenciar o que é arranjar, adaptar, transcrever e reduzir para melhor atender aos
objetivos;
PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer dela, você encontrará
autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.
CHAMADA
Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure
um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.
75
CONFIRA
A TRILHA DA
UNIDADE 2!
Acesse o
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76
UNIDADE 2 TÓPICO 1 —
PLANEJAMENTO E ADAPTAÇÃO
DO ARRANJO
1 INTRODUÇÃO
Neste tópico, trataremos de uma etapa fundamental para a produção de
arranjos: planejamento e adaptação.
ESTUDOS FUTUROS
No Tópico 3, ao fim desta unidade, teremos atividades práticas para trabalhar
vários formatos no contexto escolar. Os exemplos trazem aplicações de
arranjo e composição para violão, coro, flauta, jogos e percussão corporal.
77
• Extensão das vozes masculina e feminina: assim como no caso dos instrumentos,
as nossas vozes, e as vozes das crianças, têm limites que devem ser respeitados, a
partir da classificação por extensão e naipes.
• Escrita para bateria e percussão: esses instrumentos, a princípio, não possuem
sons melódicos, com alturas de notas na pauta convencional. Têm escrita particular,
baseada em símbolos próprios, que devem ser conhecidos pelo arranjador e professor
quando houver necessidade de arranjo específico.
• Orientações para a seção rítmica: orientações gerais que devem ser mencionadas
e levadas em consideração sempre. Essa seção engloba todos os instrumentos que
realizam uma função ritmo-harmônica e, muitas vezes, são necessários e suficientes
apenas alguns comandos, indicações e sínteses na partitura e ensaios para a boa
interpretação e a liberdade.
2.1 PLANEJAMENTO
Propósito: tenha claro, qual é o seu objetivo: Educacional? Artístico? Gravação?
Comercial? Considere, sempre, o público que essa música e arranjo devem atingir,
considere o ouvinte.
78
Tenha em mente a escolha dos instrumentos ou a instrumentação disponível,
considerando o nível dos envolvidos e extraindo o melhor de cada um, mas nunca
ultrapassando demais os limites.
Como comentado na Unidade 1, a forma deve estar clara, é o seu mapa. Ao arranjar,
perceba, na composição, as seções, e utilize letras de ensaio. Localize em caixas, acima
do início de cada seção, com o número de compasso. Por exemplo, uma canção de 32
compassos, que será executada duas vezes: A A9 B17 A25 - A33 A41 B49 A57. Isso é vital
para organizar ensaios, e você poder dar as direções sem ninguém se perder.
Deixe claro se, ao se comunicar, você dirá a altura das notas com o som
real ou transposto. Isso é um acordo pessoal entre você e os músicos.
IMPORTANTE
Diga o som real para não confundir o grupo e deixe que o músico/aluno
pratique a transposição na sua própria mente. Entregue, sempre, aos
instrumentistas, partituras individuais nos seus tons, já transpostos.
Ao fim do arranjo, você pode traçar um gráfico para a sua própria orientação e para
guiar os músicos. Isso também pode servir de inspiração durante a produção do arranjo.
Segue um plano de arranjo de uma grande estrutura, para big band, com cinco
saxofones, quatro trompetes, quatro trombones, guitarra, piano, baixo e bateria, em 18
páginas. Os números indicam quantidade de compassos, e as letras de ensaio indicam
as seções do arranjo. Os pequenos textos indicam o principal evento, ou a novidade do
trecho. Divirta-se ouvindo o áudio e tentando acompanhar o esquema que segue.
79
FIGURA 1 – PLANO DE ARRANJO [FAIXA]
2.2 ADAPTAÇÃO
Consiste em alterar o formato original de uma música para um grupo diferente
com o qual trabalharemos.
2.3 TRANSCRIÇÃO
Consiste na conversão da música de um meio para outro, mantendo fielmente
o conteúdo, sem alteração ou intenção criativa. Por “meio”, entende-se: do áudio para o
papel e de um instrumento para o outro.
80
Muitos arranjos ou composições com os quais trabalharemos não estão disponíveis
escritos, lançados ou editados, é necessário transcrever. Quando trocamos a instrumenta-
ção, pode ser necessária a tarefa de transcrição, por exemplo, do trompete para a guitarra,
da voz para a flauta etc., ou pelas transposições do sax alto para o sax tenor.
2.4 REDUÇÃO
Consiste em diminuir ou limitar uma grande amplitude de partitura que tem
muitas vozes ou instrumentos, a fim de a tornar executável a um único instrumento.
3 TRANSPOSIÇÕES DE INSTRUMENTOS
Esse é um dos assuntos que mais causa confusão. Vamos esclarecer de vez!
Para isso, nada melhor que tomar um exemplo prático: João toca saxofone soprano.
Esse instrumento é transpositor, ou seja, o som real, aquele que ouvimos, é diferente do
que ele lê. Dizemos que esse instrumento é em Bb (si bemol). Portanto, ao ler uma nota
dó, na partitura, João lê dó, fala que é dó, executa a chave do dó no instrumento, mas
soa a nota real si bemol. Ao compararmos em uníssono com um instrumento que não é
transpositor, como piano, guitarra, violão, o som é do si bemol. Então, o sax soprano soa
um tom abaixo. Se quisermos, como arranjadores e professores, ouvir, de João, a nota
dó, devemos, então, escrever, para ele, um tom acima, a nota ré. Vejamos um trecho:
81
FIGURA 2 – MELODIA EM DÓ
FONTE: O autor
Para o sax soprano, deve ser escrita dessa maneira. Deve soar como o exposto
a seguir:
FONTE: O autor
ATENÇÃO
Se você não tem certeza de quem serão os alunos, níveis, presenças
ou faltas, tenha uma grade com todos os instrumentos em cada tom –
tudo em C – tudo em Eb – tudo em Bb (F é mais raro). Ainda, escritos em
uma região média, nunca nos extremos agudos ou graves. Escreva tudo
mais ou menos no meio da pauta. Assim, você adapta qualquer linha
para qualquer instrumento disponível, o ensaio flui sem dificuldade.
Quando necessário, peça para o músico oitavar algo para o grave ou
para o agudo. Isso é relativamente fácil de fazer.
82
Ao se comunicar, deixe claro e entre em acordo se você falará em dó e deixará
a transposição por conta do instrumentista, ou se falará transpondo. As tonalidades
com as quais mais lidamos na prática são Bb (sax soprano e sax tenor, clarinete,
trompete, fluguelhorn), Eb (sax alto e sax barítono) e F (trompa).
Se o instrumento é em Eb, isso quer dizer que ele lê a nota dó, mas soa a nota
mi bemol. Por exemplo, o saxofone alto lê um dó, mas soa a nota mi bemol abaixo,
uma sexta maior abaixo. Portanto, você deve compensar essa diferença, pensando em
uma terça menor abaixo, ou sexta maior acima, assim, a nota dó vira a nota lá na pauta.
Para escrever para esse sax e soar o som real desejado, utilize uma sexta maior acima.
INTERESSANTE
Ao escrever, pensar, ler transpondo, falar transpondo, resuma com o seguinte
cálculo mental: instrumentos em Bb, escrever um tom acima. Instrumentos
em Eb, escrever uma terça menor abaixo. Instrumentos em F, escrever uma
quinta acima. Depois, no software, oitave o que for necessário.
Veja, a seguir (em inglês): Instrumento, Tom de Concerto (som real desejado),
Nota escrita (para conseguir aquele som real) e Transposição para o tom de
concerto (o cálculo de intervalo para chegar ao som real):
FIGURA 4 – TRANSPOSIÇÕES
83
FONTE: Lowell e Pullig (2003, p. 1-2)
84
Esses são os principais instrumentos e as devidas transposições. É bom lembrar
que alguns instrumentos muito populares não estão listados na figura anterior, como
violão, guitarra e contrabaixo (acústico e elétrico), mas são transpositores de oitava, ou
seja, leem e tocam a mesma nota, mas soam, na verdade, uma oitava abaixo da nota
escrita. Nesse caso, não precisamos escrever transpondo.
ATENÇÃO
Note que, entre as notas pretas, está a “extensão prática”, que é a região
daquele instrumento, onde a execução para o instrumentista e o timbre são
facilitados e mais confortáveis. Na primeira pauta de cada, o som como deve
ser escrito para soar a nota real da segunda pauta.
85
FONTE: Lowell e Pullig (2003, p. 3-4)
86
5 EXTENSÃO DAS VOZES MASCULINA E FEMININA,
ADULTA E INFANTIL
Na etapa de planejamento, é importantíssimo avaliar a extensão dos cantores
em primeiro lugar. Não corra o risco de ter que reescrever todo o arranjo ao notar, só
depois, que a tonalidade escolhida não serve para aquele grupo vocal.
87
QUADRO 1 – EXTENSÕES VOCAIS INFANTIS RECOMENDADAS PARA TURMAS MISTAS
88
6 ESCRITA PARA A BATERIA E A PERCUSSÃO
A bateria e o leque de instrumentos percussivos possuem notação própria. São
escritos sobre a pauta, mas com símbolos diferenciados para as cabeças de nota, pois,
geralmente, não têm altura melódica definida. Como na pauta tradicional, são escritos
do grave ao agudo, de baixo para cima.
ATENÇÃO
Cuidado com a questão pausas/ligaduras/notas longas. Os instrumentos
percussivos, muitas vezes, não possuem sustentação da nota, o sustain, notas
longas. Isso pode dar a entender que, a cada toque, necessitamos grafar os vazios,
as pausas entre os sons. Isso torna a partitura, visualmente, muito complexa, o
que prejudica a leitura e a execução. Portanto, escreva, sempre, a duração da
nota, até o momento do próximo som, sem pausas entre notas. As pausas podem
ser utilizadas quando necessitamos deixar clara a necessidade de não haver prolongamento,
como exemplo, quando há uma convenção, e o naipe da percussão executa em conjunto com
instrumentos melódicos, células que trazem pausas na melodia. Paralelamente a isso, alguns
elementos da percussão possuem notas muito longas, como pratos, sinos, que podem soar por
muitos compassos. A noção anterior segue funcionando: não escreva a duração total desses
sons, apenas o valor até a próxima nota.
No exposto anterior, note que cada peça tem um lugar individual. Os tambores
têm cabeças de nota tradicionais. Pratos, cabeças de nota em x, e o chimbal, três figuras
diferentes: aberto, fechado e com o pé esquerdo.
89
7 ORIENTAÇÕES PARA A SEÇÃO RÍTMICA
Conhecida a escrita para a bateria e a percussão, vale mencionar orientações
gerais muito úteis para a seção rítmica, que inclui instrumentos que fazem a função
rítmico-harmônica.
90
Convenções: as convenções são momentos nos quais a levada de todo o
grupo é interrompida, e todos ou grande parte dos instrumentos executam a mesma
célula rítmica. As convenções podem ser notadas na pauta da bateria. Uma excelente
ferramenta, prática e rápida, é uma notação apenas rítmica acima da partitura da
melodia/cifra, indicando as convenções.
91
FIGURA 11 – LEGENDA PARA PERCUSSÃO
92
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:
• É muito útil termos sempre ao alcance das mãos uma partitura transposta e outra
com o som real.
• Os tons dos instrumentos não se confundem com o tom da música, por exemplo, se
a tonalidade da música é dó maior, o saxofone soprano em si bemol deve ler ré maior.
• As tonalidades com as quais mais lidamos na prática são: Bb (sax soprano e sax tenor,
clarinete, trompete, fluguelhorn), Eb (sax alto e sax barítono) e F (trompa).
• Nos anos iniciais, comumente trabalhamos com turmas mistas entre meninos e
meninas, e, muitas vezes, não haverá divisão em naipes. Se for necessário, podemos
dividir e classificar as vozes através dos quadros indicados.
93
AUTOATIVIDADE
1 Muitas vezes, lidamos, em aulas de arranjos, com instrumentos transpositores. Se for
necessário escrever a seguinte melodia, sol – fá# – ré – dó# para o saxofone alto, quais
serão as notas escritas na partitura? Acerca da transposição, assinale a sequência
CORRETA:
a) ( ) lá – sol# - mi – ré#.
b) ( ) ré – ré bemol – si – lá bemol.
c) ( ) mi – ré# - si – lá#.
d) ( ) sol – sol bemol – ré – ré bemol.
94
UNIDADE 2 TÓPICO 2 -
ARRANJO E COMPOSIÇÃO NA ESCOLA
1 INTRODUÇÃO
Este tópico traz, a você, técnicas de arranjo e composição com base em ferramentas
que podem ser utilizadas em qualquer contexto profissional e níveis de execução.
Relembrando, todas as técnicas aqui apresentadas são aplicáveis em via de mão dupla, seja
para sofisticar ou simplificar, dependendo do objetivo. São ferramentas para uma big band,
orquestra, gravação e, até mesmo, para uma sala de aula.
ESTUDOS FUTUROS
No Tópico 3, mais adiante, teremos exemplos de diversas atividades práticas
para trabalhar vários formatos na escola.
95
DICA
Um extenso material, intitulado A Música na Escola, foi elaborado pelo
Ministério da Cultura em parceria com a Vale, em 2012, para auxiliar e
orientar professores nessa tarefa. Disponível para download em: http://www.
amusicanaescola.com.br/pdf/AMUSICANAESCOLA.pdf.
Devemos manter viva a percepção de que nossos assuntos, neste livro, arranjar
e compor, são tarefas musicais essencialmente criativas. Muitas instituições, escolas e
professores de música ainda permanecem em um padrão somente tecnicista, talvez,
tradicional, ou conservador, ou, simplesmente, tímido: ensinar música apenas através
da repetição por longas horas, técnica de instrumento, execução padronizada a uma
gravação original ou fiel à partitura, carecendo de estímulos às práticas criativas, tão
essenciais à música. Devemos estar sempre atentos à nossa própria prática, e alertas para
não cair no perfil de professor repetidor, levantado por Teca Alencar de Brito (2003, p. 52):
Tendo esse horizonte como meta, é importante termos, como base, a noção das
competências dos alunos por suas idades através dos estágios de desenvolvimento, a
fim de reconhecer o tipo e o nível de conteúdo, adequando as atividades de arranjo e
composição que devemos propor.
96
Keith Swanwick (2014) desenvolveu um consagrado modelo orientador das
relações entre idades e competências, em forma de espiral, para demonstrar os níveis
de desenvolvimento musical. Divide-se em quatro estágios, da esquerda para direita:
97
Fora da espiral, do lado esquerdo, há as áreas nas quais esses processos são
abertos. Ainda, fora, do lado direito, as idades aproximadas.
DICA
Para ampliar as informações das idades, do desenvolvimento e das
capacidades, leia:
• PARIZZI, M. B. O canto espontâneo da criança de zero a seis anos: dos
balbucios às canções transcendentes. Revista da ABEM, Recife, v. 14, n. 15,
p. 39-48, 2016.
• FRANÇA, M. C. C. Composing, performing and audience-listening as symmetrical
indicators of musical understanding. 1998. 296 f. Tese (Doutorado em Filosofia) –
Institute of Education, University of London, Londres, 1998.
• SLOBODA, J. The musical mind - The cognitive psychology of music. Oxford: Clarendon
Press, 1985.
• SWANWICK, K. Música, mente e educação. Tradução Marcell Silva Steuernagel. Belo
Horizonte: Autêntica Editora, 2014.
• SWANWICK, K.; TILLMAN, J. The sequences of musical development: a study of children’s
composition. British Journal of Musical Education, London, v. 3, n. 3, p. 305-339, 1986.
• DAVIES, C. Listen to my song: a study of songs invented by children aged 5 to 7 years.
British Journal of Music Education, London, v. 1, n. 9, p. 19-48, 1992.
• HARGREAVES, D. J. The developmental psychology of music. London: Cambridge
Press, 1986.
98
Nem apenas passamos através desses modos, mas também os
levamos conosco para o próximo. Em certos momentos, é necessário
recomeçar. Por exemplo: se manuseamos um novo instrumento,
ou trabalhamos com um idioma novo, ou uma nova peça musical,
somos imediatamente levados de volta ao problema do domínio. É
importante ter claro que essas transformações são cumulativas e
cíclicas (SWANWICK, 2014, p. 90-91).
Outro trabalho de Swanwick (2014), muito influente no Brasil, e que pode servir
como guia de atividades, valoriza a inclusão da composição no contexto escolar. A Basis
for Music Education (1979) propõe uma fundamentação através do Modelo C L A S P.
NOTA
Composição trata de criar material melódico, textual ou harmônico. Já o
ARRANJO significa organizar e tratar desse material escolhendo ritmos,
andamento, instrumentação, timbres, textura, forma e interpretação.
Partindo disso, o professor deve perceber que, muitas vezes, esses elementos
estão completamente mesclados na prática da composição em sala de aula, e isso
não é um problema. Deve, também, perceber, a partir de que momento atividades,
idade e nível teórico/técnico, gradativamente, o arranjo que vai se diferenciando e se
especializando como tarefa à parte.
99
São passíveis de compreensão e aplicáveis em uma composição por adultos,
músicos, professores, conhecedores e iniciados na teoria musical. Já, neste tópico,
pensando a partir da concepção TECLA e das atividades para o ensino básico, a criação e o
arranjo podem estar difusos e entremeados nas tarefas de composição, execução e técnica.
A soltura de conceitos para as crianças não deve ser confundida com um lúdico,
que abre espaço para falta de esmero na criação e na execução, seja em qualquer idade,
seja em qualquer nível de complexidade:
100
Certamente, deve-se trabalhar no sentido de identificar, refinar e apri-
morar qualidades artísticas e o impacto expressivo nas peças. A abran-
gência da definição não implica que tudo o que se fizer em com-
posição será musicalmente significativo ou educacionalmente
válido. O potencial educativo da composição reside no significado
e na expressividade que o produto musical é capaz de comuni-
car [...]. Da mesma forma que na composição, a amplitude da definição
não pode representar um pretexto para se descuidar da qualida-
de artística da performance. Seja qual for o nível de complexidade,
é preciso procurar a melhor qualidade artística possível para que
ela resulte significativa, expressiva e relevante. As crianças devem ser
encorajadas a cantar ou tocar a mais simples peça com compro-
metimento e envolvimento, procurando um resultado criativo, expres-
sivo e estilisticamente consistente. Isso deve ser almejado por ser essa
a única forma pela qual a performance, em qualquer nível, pode se tor-
nar uma experiência esteticamente significativa (FRANÇA; SWANWICK,
2002, p. 11-14, grifos nossos).
101
Como trabalhar arranjo e composição nesse cenário? Criatividade. Ela faz parte
da composição e da arte da música. Iniciativas como jogos, instrumentos alternativos
e percussão corporal são extremamente enriquecedoras e prazerosas, dão conta do
conteúdo teórico de uma aula e são muito estimulantes aos alunos.
Teca Alencar de Brito (2013), a partir da ampla experiência prática e das influentes
e criativas pesquisas na área, nos inspira a jogar e a criar com os alunos, quando relembra
a riqueza da sua formação musical na importante referência do músico e educador Hans-
Joachim Koellreutter (1915-2005), desde muito jovem: “Ele dizia que só respondia como
educador quando o aluno perguntava algo. “O resto do tempo eu faço música com ele”, ele
completava, capturando-me com tais palavras” (BRITO, 2013, p. 103).
103
• Pandeiro
13 – PANDEIRO ALTERNATIVO
104
Materiais: copos ou garrafas de vidro transparentes (cuidado com os menores)
com tampa, água, tinta guache ou suco em pó colorido, colher de madeira ou metal,
afinador eletrônico. Como fazer: 1) encha os copos com água e vá tocando com uma
colher, observando as alturas no afinador eletrônico; 2) tinja com guache ou suco em
pó; 3) reveja a afinação, adicionando água para afinar mais agudo e retirando para afinar
mais grave. As garrafas podem ser sopradas no bico, também, produzindo um belo
timbre. Para isso, é mais efetivo que tenham o gargalo fino.
• Xilofone de PVC
DICA
Veja mais da sonoridade e construção desse exato xilofone em:
• https://youtu.be/m3uFWrf3pIE
• https://frugalfun4boys.com/how-to-make-pvc-pipe-xylophone-
instrument/
• Mais uma inspiração para você e para os alunos, em uma abordagem muito profissional,
com o Snubby J + Blue Man Group:
• https://www.youtube.com/watch?v=WuNKWaxHtoY&ab_channel=BlueManGroup
105
sempre para mais e ir tirando, aos poucos, para chegar na nota desejada. Melhor sobrar,
mas caso passe a afinação, reutilize para a próxima nota mais aguda; 3) para extrair
notas mais graves e com maior ressonância, aumente o comprimento dos tubos. Utilize
joelhos de PVC para dobrar e não ficar muito comprido.
Materiais: cano fino de PVC e fita-crepe. Como fazer: 1) corte dois ou mais
pedaços de cano PVC entre 20 mm a 30 mm de diâmetro; 2) tampe um buraco de cada
cano usando a fita-crepe, rolhas ou tampas de pvc mesmo; 3) com os buracos tampados
virados para baixo, alinhe os canos por cima e os fixe com fita-crepe. Podem ser vários
tubos, fazendo escalas completas. Utilize o afinador eletrônico como parâmetro.
• Flauta d’água
106
Materiais: 30 cm de cano fino de PVC, fita-crepe e uma bexiga. Como fazer:
1) encaixe o bico da bexiga na ponta do cano e fixe com fita-crepe; 2) coloque água
através do cano e encha, parcialmente, a bexiga. Apertando a bexiga, extraímos notas
diferentes e efeitos de glissando.
Materiais: polaina, tornozeleira ou, até mesmo, meias. Luvas. Guizos de metal.
Como fazer: prenda os guizos na polaina através das argolinhas, costurando ou com
clips de papel. São muito fáceis de fazer e excelentes para estudar divisões rítmicas de
forma movimentada na sala. A variação dos guizos, nas luvas, também é muito musical
e lúdica.
107
Materiais: latas de alumínio de diversos tamanhos, bexigas e fita-crepe. Como
Fazer: 1) corte o bico da bexiga, ajustando ao diâmetro da lata; 2) quanto mais esticar a
bexiga, mais estendido e mais agudo; 3) prenda com fita-crepe para não escapar.
• Percussão corporal
Quantos sons e timbres podem conseguir com o corpo? Uma infinidade, e, nas
figuras a seguir, veremos diversas opções baseadas no trabalho do grupo brasileiro
Barbatuques:
108
FIGURA 21 – MÃOS PERCUTINDO NO TRONCO E NAS PERNAS
109
FIGURA 24 – NOTAÇÃO ALTERATIVA PARA PERCUSSÃO CORPORAL
110
FIGURA 25 – GRUPOS QUE UTILIZAM INSTRUMENTOS ALTERNATIVOS.
DICA
Confira mais no YouTube:
111
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:
• Arranjar e compor são duas das atividades mais úteis, eficientes e lúdicas para se
trabalhar na educação musical.
• Nos estágios iniciais, os objetivos devem ser brincar, explorar, descobrir possibilidades
expressivas dos sons e organização, e não dominar técnicas complexas de composição, o
que poderia gerar um esvaziamento do potencial educativo.
• Brincadeira gera uma atividade não estruturada. Jogo é uma brincadeira que envolve
regras. Brinquedo é o objeto de brincar. Atividade lúdica abrange os conceitos
anteriores, com objetivo de divertimento.
• Podemos utilizar a notação rítmica tradicional, mas com símbolos alternativos para
cada timbre da percussão corporal. Para a aplicação de atividades com instrumentos
alternativos e percussão corporal, a apreciação musical é indispensável.
112
AUTOATIVIDADE
1 TECLA é uma concepção de ensino-aprendizagem elaborada pelo educador Keith
Swanwick (2014), que visa a uma didática integral da experiência musical. Assinale a
alternativa CORRETA, que compreende essa sigla:
3 A área da Educação Musical no Brasil explora e destaca, nas últimas décadas, a importância
das práticas criativas. Traz, para o centro da discussão, a composição e a improvisação
como vitais para o ensino e a aprendizagem da música, alicerçadas em pesquisas, como
Fonterrada (2008), Beineke e Zanetta (2014), e Brito (2007). Avalie as afirmações a seguir,
com base nessa contextualização:
113
Essa bibliografia nos mostra uma valorização dessas práticas no século XX, após
um longo período de ênfase ao ensino voltado à formação do “virtuose”, abordagem
de cunho quase exclusivamente técnico, visando à destreza e à repetição voltadas à
performance.
PORQUE
114
UNIDADE 2 TÓPICO 3 -
APLICAÇÃO NA ESCOLA: EXEMPLOS
PRÁTICOS E ATIVIDADES
1 INTRODUÇÃO
Agora, vamos direto ao ponto, ao que interessa. Exemplos práticos de atividades
selecionadas a partir de pesquisas de consagrados autores, músicos e professores da
educação musical. Os exemplos trazem aplicações de arranjo e composição para violão, coro,
flauta, jogos, instrumentos alternativos e percussão corporal.
2 VIOLÃO
A seguir, atividades de arranjo para violão no ensino básico. Têm, como referência, o
artigo Ensino Coletivo de Violão: Técnicas de Arranjo para o Desenvolvimento Pedagógico,
de Vieira e Ray (2007).
Mesmo sendo ideais para turmas de violão que estão começando, fazem uma
síntese de algumas ferramentas apresentadas na Unidade 1 deste livro. É um exemplo
perfeito do que falamos desde o início: essas técnicas servem de inspiração em qualquer
nível e ambiente, em via de mão dupla: para sofisticar ou simplificar uma composição,
seja para uma orquestra, seja para a sala de aula.
115
DICA
Os Saltimbancos é uma peça de teatro musical infantil, inspirada no conto Os
Músicos de Bremen, de 1819, de autoria dos irmãos Grimm. Na peça original,
em italiano, as canções têm letra de Sergio Bardotti e música de Luis Enríquez
Bacalov. A versão em português ganhou canções adicionais de Chico Buarque.
Foram gravadas e lançadas em discos de vinil em 1977, como uma proposta
de canções infantis educativas.
• Confira o link da gravação original: https://www.youtube.com/watch?v=BWLho1frFBI&ab_
channel=OsSaltimbancos-Topic
• Do DVD atualizado, lançado em 2006: https://www.youtube.com/watch?v=jPN8ra6LvCQ&ab_
channel=RWR
Na primeira aula, faça primeiro a leitura da melodia oitava abaixo. Após a leitura
oitava acima, podemos harmonizar essas notas com tríades do campo harmônico de dó
maior. Use a primeira região do braço com cordas soltas e melodia de acordo com as
fundamentais dos acordes:
116
A seguir, como soa muito simples, podemos propor para os alunos fazerem
uma rearmonização com outros acordes para que as notas da melodia soem não só
na fundamental, mas também nas terças quintas e sétimas dos acordes. Ideal para
exemplificar o conteúdo de tétrades:
Sugiro que seja feito através da improvisação e posteriormente escrito pelo professor.
Os alunos podem ler essa improvisação/composição em uma aula seguinte.
117
FIGURA 30 – CONTRACANTO PARA MINHA CANÇÃO
3 CORAL
A próxima atividade relaciona o canto coral com a improvisação. Fundamentado,
a partir do colaborador Marcelo Petraglia (2012), para o livro A Música na Escola,
elaborado pelo Ministério da Cultura. Canto coral e improvisação são áreas geralmente
desconectadas, pelo motivo de que, para cantar em conjuntos corais, faz-se necessário
o trabalho de um arranjador, abertura em quatro vozes, grades de partituras, piano etc.
118
Organize a turma em uma grande roda. O professor deve cantar improvisando
frases curtas, e os alunos repetem em coro. Professor/professora: lembre-se que
isso é uma básica e efetiva interação entre artistas e plateia em qualquer show de rock.
Se necessário, leve exemplos para tirar a inibição da turma. Isso deve ser feito até o
processo de imitação fluir bem:
DICA
Não deixe de assistir e mostrar este exemplo do cantor Bobby Mcferrin,
fazendo uma improvisação vocal com um grupo de leigos em uma convenção.
Isso demonstra o enorme potencial musical humano acessível a todos: https://
www.youtube.com/watch?v=ne6tB2KiZuk&ab_channel=WorldScienceFestival.
• Qual a diferença entre cantar “como eco”, imitando, e cantar simultaneamente, todos
juntos comigo em tempo real?
• De onde vêm as melodias que eu estava cantando? Isso é composição ou
improvisação?
119
• O que ajudou e o que dificultou o grupo para me seguir no cantar simultâneo?
• Quem gostaria de guiar o grupo assim como eu fiz, criando suas próprias melodias?
(Esse participar deve ser espontâneo, sem uma obrigação, evitando uma exposição
contrariada, o que acabaria com a fluência da atividade)
INTERESSANTE
Como professor, erre de propósito, mas erre feio, desafinando alguma melodia
como exemplo. Isso diverte o grupo, tira, de você, uma responsabilidade de ser
perfeito, assim como alivia a todos. Em um ambiente descontraído, a criação
sempre flui melhor. Deixe claro que o erro faz parte do processo de aprender.
Por fim, peça que cada grupo compartilhe sua experiência. Sugestões de
perguntas a seguir:
Guie o foco das respostas sempre extraindo dos alunos reflexões sobre
conteúdos musicais: afinação/desafinação, divisão rítmica, excesso/ausência de notas,
duração das notas, dinâmica (volume).
120
IMPORTANTE
Esclareça que afinação se trabalha, se consegue. Nunca diga que alguém é
desafinado, mas que deve trabalhar a afinação, como qualquer instrumento.
Essa orientação respeitosa faz milagres, pode acreditar.
4 FLAUTA
A atividade de composição para flauta pode ser estimulada por meio de um
objetivo externo: a produção de uma partitura alternativa. A proposta que faço a seguir
é inspirada pela dissertação de mestrado Caminhos Criativos no Ensino da Flauta Doce,
de Cláudia Maradei Freixedas (2015), orientada por Teca Alencar de Brito. A atividade
pode ter duas direções: 1) produzir uma composição na flauta e registrá-la em objetos;
ou 2) produzir uma bela partitura alternativa com os objetos e realizar uma leitura e
interpretação posteriormente. Ainda, uma boa e terceira dinâmica também é permitir
uma interação criativa entre os dois procedimentos.
121
FIGURA 33 – COMPOSIÇÃO COLETIVA 1
Ao tentar reproduzir a composição, seja através de fotos que você pode imprimir,
projetar, ou até mesmo refazer a obra, é divertido comparar posteriormente com a
gravação original, para uma reflexão dos alunos sobre o sucesso da sua partitura e obra
musical/visual como um todo. Sempre traga as respostas dos alunos para o conteúdo
teórico e prático musical, aproveitando para fazer analogias com a partitura tradicional
e técnica da flauta doce.
5 JOGOS
O jogo a seguir traz uma mescla dos elementos composição, percussão
alternativa e partitura alternativa, Ele é baseado no livro e cd Lenga la Lenga, dos
professores Viviane Beineke e Sérgio Freitas (2006), que traz muitas canções com
atividades baseadas em voz, jogos de copos, mãos e percussão.
122
DICA
Aproveite e conheça mais do livro Lenga la Lenga: Jogos, Mãos e Copos,
acessando: https://www.academia.edu/9754415/_Lenga_la_Lenga_jogos_
de_m%C3%A3os_e_copos_Brasil_
As crianças se sentam de frente umas para as outras, em duas rodas, uma dentro
da outra. As crianças de fora tocam flauta, e as de dentro jogam com o copo.
Pode tanto haver uma alternância entre a parte falada, a flauta e a rítmica dos
copos, quanto uma sincronia entre os três. Isso deve ser combinado entre as crianças
e o professor.
123
A seguir, uma extensa e completa legenda de tantas movimentações e
sonoridades que podem ser extraídas pelos copos e mãos. Note e explique aos
alunos como as cabeças das notas mimetizam e imitam o movimento, para facilitar a
memorização e leitura.
124
DICA
Não deixe de assistir e mostrar este exemplo do cantor Bobby Mcferrin,
fazendo uma improvisação vocal com um grupo de leigos em uma convenção.
Isso demonstra o enorme potencial musical humano acessível a todos: https://
www.youtube.com/watch?v=ne6tB2KiZuk&ab_channel=WorldScienceFestival.
6 PERCUSSÃO CORPORAL
A atividade que se segue tem como inspiração uma proposta do grupo Barbatuques.
Pode ser realizada em todas as idades, a partir do estabelecimento da sensação de pulso na
criança. A complexidade do ritmo de base utilizado pode ser adaptada para figuras simples,
mantendo a dinâmica canto, percussão corporal e improviso.
125
FONTE: Barba et al. (2012, p. 9)
Em roda, parte do grupo executa um dos ritmos que se queira estudar. Outros,
na roda, cantam um refrão de uma canção a escolher. Ao término do refrão, todo o grupo
silencia para a execução individual de um único som corporal. Sempre intercalando
com o refrão, todos executam o seu som. Com rodada completa, retorna ao primeiro
solista que acrescenta mais um som à sua produção anterior. E, gradativamente, cada
um vai compondo um solo, que deve ter uma duração pré-determinada: quatro ou oito
compassos, ou, ainda, a mesma duração do refrão.
Caso a roda seja muito grande, sugerimos dividir em grupos menores para
não ficar um processo muito longo. Ainda, se a opção for trabalhar com uma grande
roda, pode-se, ao invés de um único som por solista, determinar já um improviso para
cada, com duração de tempo maior, previamente definida. A primeira opção flui melhor:
todos têm tempo para pensar, trabalha a memória musical e os alunos se inspiram
nas produções dos colegas, além de ser mais agregadora para os mais tímidos com a
improvisação e seu próprio corpo.
126
DICA
Veja os Barbatuques em ação. A música apresentada tem uma dinâmica
um pouco diferente. Estão, ali, os ritmos brasileiros na percussão corporal,
na ideia de refrão e, no caso, há os solos no fim: https://www.youtube.com/
watch?v=_Tz7KROhuAw&ab_channel=barbatuques.
LEITURA
COMPLEMENTAR
FERRAMENTAS COM BRINQUEDOS: A CAIXA DA MÚSICA
1 Introdução
Esse devaneio inicial se justifica porque proponho, neste trabalho, tecer relações
entre uma bonita análise desenvolvida pelo filósofo e psicólogo mineiro Rubem Alves
(1933-) em um artigo intitulado A Caixa de Brinquedos (ALVES, 2004) e os territórios da
música e da educação musical. O texto, de significativo valor, foi publicado em 2004 no
caderno Sinapses, do jornal Folha de S. Paulo, e me acompanha, desde então, pela sintonia
e ressonância que estabelece com pontos que eu considero essenciais ao acontecimento
musical, de um lado, e à sua atualização nos territórios da educação musical, de outro.
Criando tramas entre arte e jogo, o artigo cria pontes entre o brincar da criança (e a atividade
lúdica, de modo geral) e a produção e/ou fruição artística no decorrer da vida. Discorrendo,
com poesia e bom humor, sobre as distinções que marcam o mundo das questões de
ordem utilitária, mecânicas e funcionais, e o mundo dos sentidos e significados mais
plenos que movem a existência, os quais abarcam, dentre outros, planos das sensações,
da dimensão expressiva, da estética, Alves convida-nos a refletir, dentre outros pontos,
sobre a presença da arte no viver e os territórios da educação, aspectos que estimularam
o desenvolvimento da análise que ora apresento.
127
Nos últimos tempos, as discussões em torno do Decreto-Lei 11.769/08, o qual
versa sobre a volta da música como conteúdo obrigatório da área de artes no ensino
básico, trouxe à tona, com maior ênfase, questionamentos relacionados aos motivos, ou
razões, para a inserção da música nos currículos escolares. Dessa feita, pontos como os
que eu apresento a seguir têm sido frequentemente colocados em questão: por que –
afinal – importa criar e/ou fortalecer a aliança entre a música e a educação? Por que a
música é importante na formação das crianças? Quais os benefícios proporcionados? A
música colabora, efetivamente, com o desenvolvimento integral do ser humano? Auxilia
e/ou facilita o processo de alfabetização, o desenvolvimento do raciocínio matemático,
as tramas interdisciplinares? Deve ser uma disciplina obrigatória? O que mais?
128
Os professores(as) de música, por sua vez, especialmente quando trabalham
em escolas especializadas ou, ainda, em cursos particulares, lidam com outros senões,
dentre os quais podemos destacar alguns: quando introduzir a leitura e a escrita musical?
Convém exigir mais do aluno ou é melhor deixar que ele faça música por prazer? O que
fazer quando trabalhamos com um aluno talentoso? Como lidar com as expectativas
dos pais, que querem ver seus filhos tocando músicas reconhecidas como tal e não
improvisações ou criações “estranhas”? Quando iniciar o estudo de um instrumento
musical? Tais pontos nos remetem a outros planos, a territórios marcados, por sua vez,
por outras concepções de música, de educação e, quiçá, de infância.
Enfim, são muitas as frentes, que poderíamos seguir listando, as quais nos
incitam a pensar a respeito, enredando-nos nas tramas que envolvem as relações entre
a música e a educação. Nestes tempos da aprovação da lei, muito se tem falado acerca
desta questão: a música é realmente importante na educação? Por quê? Por esses e
tantos outros motivos, debrucei-me novamente sobre a caixa de brinquedos de Rubem
Alves, com o intuito de compartilhar algumas ideias acerca das relações entre a música,
a educação e a educação musical.
A caixa de brinquedos
O autor faz referência aos idiomas que contam com uma única palavra para se
referir à arte e ao brinquedo (no inglês, play; no alemão, spielen; no francês, jouer), como
meio de aproximar e fortalecer a relação entre essas “atividades inúteis que dão prazer e
alegria […], brincadeiras que inventamos para que o corpo encontre a felicidade, ainda que
em breves momentos de distração, como diria Guimarães Rosa” (ALVES, 2004).
Rubem Alves (2004) apresenta tais ideias enquanto defende que as mesmas
resumem sua filosofia de educação. Nela, o sentido do brincar, tal como ele propõe, deve
estar presente e integrado às ferramentas do aprender, motivo que o leva a questionar:
“os saberes que se ensinam em nossas escolas são ferramentas? Tornam os alunos mais
competentes para executar as tarefas práticas do cotidiano? E eles, alunos, aprendem a
ver os objetos do mundo como se fossem brinquedos? Têm mais alegria?”
Por tudo isso, desapontando – quem sabe? – alguns dentre aqueles que me
indagaram a respeito da importância da música no ensino básico, principalmente por
ocasião da aprovação da nova lei, eu, diversas vezes, respondi: a música é importante na
educação porque a música é importante no viver, como uma das formas de relação que
estabelecemos conosco, com o outro, com o ambiente. Somos seres musicais, dentre
outras características que nos constituem, e o jogo expressivo que estabelecemos
com sons e silêncios, no tempo/ espaço, agencia dimensões que por si só são muito
significativas. Fazendo música trabalhamos nossa inteireza, o que é essencial.
130
Acreditando e ansiando pelo fortalecimento do acontecimento musical na
educação de todas as crianças, também defendo que o mesmo aconteça em uma escola
que, a exemplo do que propõe o neurobiólogo chileno Humberto Maturana (1928-), seja
um espaço de convivência, de conversações, de aprendizagem mútua, de reinvenções
(MATURANA, 1999). Entendo, outrossim, que também é preciso redimensionar muitas
das ideias de música vigentes, além das concepções de educação musical. Não
devemos (nem podemos) aprisionar a música em bancos escolares duros e imóveis.
Música é movimento, aventura, criação, sensação, devir, e desse modo, considero, deve
estar presente nos planos da educação.
E como afirmou Rubem Alves, as ferramentas devem ser as chaves que nos
inserem no território dos brinquedos. Ferramentas, inclusive, que se tornam mais e mais
complexas no decorrer do percurso, favorecendo, no curso do processo de transformação
do fazer musical, mergulhos mais profundos, com ganhos de complexidade que,
evidentemente, não se limitam à aquisição de técnicas e conhecimentos, mas, sim, à
capacidade de expressar, de disparar sensações e devires, de criar e desfazer territórios,
de favorecer o exercício do jogo ideal: jogo no qual, conforme propôs Deleuze, não
há ganhadores ou perdedores, mas que jogamos pelo prazer de jogar; jogo da arte.
Misturar ferramentas e brinquedos significa, igualmente, superar as posturas dualistas
que costumavam dissociar teoria e prática e que, ainda hoje, pontuam contextos
pedagógicos diversos, da etapa da iniciação até o estágio da profissionalização.
131
Quantos exercícios, com finalidades diversas, que não cabe aqui detalhar, são
trabalhados em situações alheias ao fato musical? Aprende-se a ler notas sem escutar, a
identificar os parâmetros do som, a resolver exercícios de harmonia movendo-se apenas
por regras escritas, a treinar modos e escalas, identificar intervalos etc. Infelizmente, nem
sempre tais ferramentas se tornam chaves efetivas para o verdadeiro brincar, no sentido
colocado por Rubem Alves em seu trabalho.
É preciso escutar, observar e caminhar junto com os alunos e alunas, para que
a expressão musical se amplie e enriqueça, efetivamente. Fazendo música é possível
integrar (ou dissociar!) corpo e mente, emoção e razão, intelecto e sensibilidade, intuição
e raciocínio lógico, ação e reflexão. Assim é porque assim somos; porque a realização
musical reflete consciências, sendo um dos modos de exercício expressivo de nossos
modos de ser. Fazendo música nós também qualificamos características humanas
essenciais, que nos fortalecem enquanto seres na relação com o outro, com o mundo
e consigo mesmo.
Tais aspectos devem constituir, a meu ver, o cerne dos projetos de educação
musical. É preciso distinguir a formação profissionalizante de músicos e a educação
musical de crianças (no espaço da educação formal ou não), de jovens ou adultos
isentos da pretensão (ao menos imediata) de fazerem da música uma profissão, já que,
não raro, características da atividade profissional do músico contaminam projetos de
educação musical, em seus múltiplos espaços. No âmbito da educação infantil, no
ensino fundamental e médio, como exemplo, é comum confundir educação musical
com a mera e permanente produção de espetáculos, festas e/ou comemorações.
A música, dentro da escola, deve ser viva, efetivamente. “Música viva” significa
bem mais do que realizar exercícios mecânicos para desenvolver uma ou outra
habilidade musical; mais do que aprender a cantar e/ou reproduzir músicas; preparar
apresentações ou, ainda, iniciar-se nos processos de leitura e escrita musical. Tudo
isso faz parte, sim, do todo de realizações musicais, que deve valorizar as atividades
de criação, de exploração e pesquisa, bem como de reflexão. O pensamento musical
se elabora e reelabora dinamicamente, e o verdadeiro sentido se estabelece quando
a música é parte efetiva do jogo do viver, da vida em si mesma. O cotidiano do viver
atualiza o fazer musical que, por sua vez, realimenta e transforma o cotidiano.
132
Finalizo essas reflexões apontando, enquanto reafirmo, aspectos que avalio
como importantes à constituição de uma caixa da música, ou seja, de um projeto
que misture ferramentas e brinquedos, os quais, interagindo e dialogando, produzirão
múltiplos e diversos sentidos. Tal projeto, a meu ver, deve considerar:
FONTE: BRITO, T. A. de. Ferramentas com brinquedos: a caixa da música. Revista da ABEM, Porto Alegre, v.
24, n. 1, p. 89-93, 2010.
133
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:
• Afinação se trabalha, se consegue. Nunca diga que alguém é desafinado, mas sim
que deve trabalhar a afinação, como qualquer instrumento.
• A atividade de composição para qualquer instrumento pode ser estimulada por meio
de um objeto externo: a produção de uma partitura alternativa, sonorização de uma
paisagem, trilha sonora de uma história, cena ou filme.
• A percussão executada pelos copos é lida pela partitura alternativa. Uma extensa e
completa legenda de movimentações e sonoridades pode ser extraída pelos copos
e mãos. Você pode trabalhar com a partitura em qualquer instrumento alternativo.
• Uma excelente opção de escrita para os que ainda não dominam a partitura é a tablatura
corporal. Ela auxilia na compreensão das relações entre pulso, compasso e subdivisões,
para a posterior compreensão da partitura e das figuras.
134
AUTOATIVIDADE
1 A partitura a seguir trará a melodia de Minha Canção, de Chico Buarque, para os
Saltimbancos. Como visto no Tópico 3 desta unidade, podemos harmonizar de forma
simples e sugerir, aos alunos, uma fácil técnica de rearmonização. Experimente,
livremente, acordes com as notas da melodia na tríade: tônica, terça e quinta dos acordes.
A partir da concepção anterior, assinale a alternativa que traz uma harmonia CORRETA
para a melodia, com dois acordes por compasso, em dó maior:
a) ( ) C Dm / Em F / G Am / B° C.
b) ( ) F Am / Dm Gm / C A / Fm Dm.
c) ( ) Am C / Dm G / Em Am / Dm F.
d) ( ) C Am / B° D / Em Am / F B°.
2 Segue uma tablatura corporal, ferramenta usada para a percussão, e muito útil
quando as crianças ainda não dominam a leitura da partitura.
3 A figura a seguir trará uma partitura com figuras alternativas a serem tocadas em
copos. Classifique V para as alternativas verdadeiras e F para as alternativas falsas:
135
( ) O símbolo de X é uma pausa.
( ) O primeiro compasso traz uma anacruse.
( ) No último compasso, uma pausa está ausente.
( ) As cabeças de nota imitam os movimentos com os copos.
136
REFERÊNCIAS
BARBA, F. et al. Curso de formação básica. São Paulo: Núcleo Educacional
Barbatuques, 2012. Disponível em: http://www.professorrobsonsantos.com.br/wp-
content/uploads/2019/07/Apostila-Barbatuques.pdf. Acesso em: 28 jan. 2021.
BEINEKE, V.; FREITAS, S. P. R. de. Lenga la lenga: jogos de mãos e copos. São Paulo:
Ciranda Cultural Editora, 2006.
BEINEKE, V.; ZANETTA, C. “Ou isto ou aquilo”: a composição na educação musical para
crianças. Revista Música Hodie, Goiânia, v. 14, n. 1, p. 197-210, 2014. Disponível em:
https://www.revistas.ufg.br/musica/article/view/32978/17518. Acesso em: 28 jan. 2021.
137
FRANÇA, M. C. C. Composing, performing and audience-listening as symmetrical
indicators of musical understanding. 1998. 296 f. Tese (Doutorado em Filosofia) –
Institute of Education, University of London, Londres, 1998.
LOWELL, D.; PULLIG, K. Arranging for large jazz ensemble. Boston: Berklee Press,
2003. Disponível em: http://dj.piarrot.free.fr/Stockage/Dick%20Lowell%20&%20
Ken%20Pullig%20-%20Arranging%20For%20Large%20Jazz%20Ensemble.pdf. Acesso
em: 28 jan. 2021.
138
ROBERTY, B. B. A extensão vocal infantil: um estudo sobre o ensino da voz infantil
no contexto do ensino regular brasileiro. 2016. 119 f. Dissertação (Mestrado em Música)
– Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2016. Disponível
em: http://www.repositorio-bc.unirio.br:8080/xmlui/bitstream/handle/unirio/11019/
Bruno.pdf?sequence=1&isAllowed=y. Acesso em: 28 jan. 2021.
THE LATIN real book: salsa, brazilian music, latin jazz. Petaluma, CA: Sher Music Co.,1997.
VIEIRA, G.; RAY, S. Ensino coletivo de violão: técnicas de arranjo para o desenvolvimento
pedagógico. In: ENCONTRO ANUAL DA ABEM, 16.; CONGRESSO REGIONAL DA ISME,
2007, Campo Grande. Anais [...]. Campo Grande: ABEM, 2007. Disponível em: https://
www.academia.edu/4579419/Ensino_coletivo_de_violao_tecnicas_de_arranjo_
Gabriel. Acesso em: 28 jan. 2021.
139
140
UNIDADE 3 —
TÉCNICAS DE COMPOSIÇÃO
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:
PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer dela, você encontrará
autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.
CHAMADA
Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure
um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.
141
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A TRILHA DA
UNIDADE 3!
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142
UNIDADE 3 TÓPICO 1 —
TEORIA DAS ESTRUTURAS MELÓDICAS
1 INTRODUÇÃO
Neste tópico, apresentaremos conceitos teóricos e estruturais que norteiam a
construção de melodias.
143
• Onde procurar: “O motivo, geralmente, aparece de uma maneira marcante e
característica, no início de uma peça” (SCHOENBERG, 1993, p. 35).
• O que fazer com um motivo: “Na sucessão das formas-motivo, obtidas pela variação
do motivo básico, há algo comparável ao desenvolvimento, ao crescimento de um
organismo” (SCHOENBERG, 1993, p. 36).
• Onde está a conexão: “Quase todas as figuras de uma peça revelam algum tipo
de afinidade, o motivo básico é, frequentemente, considerado o ‘germe’ da ideia”
(SCHOENBERG, 1991, p. 35).
• Repetir, mas variar, é fundamental: “Um motivo aparece continuamente no curso de
uma obra: ele é repetido. A pura repetição, porém, engendra monotonia, e esta só pode
ser evitada pela variação” (SCHOENBERG, 1993, p. 35).
• O uso dos motivos dá lógica à música, construindo sentido para quem ouve:
“usado de maneira consciente, [...] deve produzir unidade, afinidade, coerência, lógica,
compreensibilidade e fluência do discurso” (SCHOENBERG, 1993, p. 35).
FONTE: O autor
144
DICA
Ouça todo esse movimento, baixe a partitura. Tente acompanhar e contar
quantas vezes surge essa ideia, identificar variações ou apenas perceber a
mágica feita por Beethoven com um único intervalo: https://www.youtube.
com/watch?v=Rxvj_uJIv4U&ab_channel=All-StarOrchestra. Link para a partitura:
https://musopen.org/pt/music/2567-symphony-no-5-in-c-minor-op-67/.
145
2.1.2 Rarefação e preenchimento
Partindo de um motivo inicial de três notas, a rarefação é esvaziar/excluir algumas
notas. O caso complementar seria preencher/incluir notas nessa ideia básica:
FIGURA 3 – MOTIVO
2.1.3 Retrogradação/reversão
Trata-se, literalmente, de tocar um motivo ou uma melodia de trás para frente.
A última nota se torna a primeira, e assim por diante. Praticada no Barroco, incomum na
música popular. Causa evidente conexão a um motivo ou melodia original, de maneira
estranha e curiosa.
2.1.4 Transposição
Uma das técnicas mais usadas. Pode acontecer de maneira literal ou
diatônica. A seguir, a melodia em a) será transposta de tom, para b) uma terça maior
abaixo, mantendo os intervalos, literalmente. Ou seja, de dó maior para lá bemol maior.
Já em c), a melodia será transposta uma terça abaixo dentro do mesmo tom de dó maior
diatonicamente, o que gerará intervalos diferentes. Por exemplo, o primeiro compasso
lá – si – dó – se torna – fá – sol – lá:
146
FIGURA 6 – MELODIA (A) MODELO E TRANSPOSIÇÕES
2.1.5 Aumentação
A duração das notas é dobrada, ou aumentada, em valores proporcionais.
Exemplo: uma semínima vira uma mínima. Cria conexão óbvia, mas não tão evidente em
uma primeira audição:
2.1.6 Diminuição
Torna a melodia mais rápida, com valores proporcionais. Exemplo: as colcheias
viram semicolcheias. Claramente perceptível aos ouvidos.
147
2.1.7 Preenchimento/Ornamentação/Contorno
Compreendida por esses três diferentes termos, essa ideia parte de um motivo
ou melodia original, que é preenchido ou ornamentado internamente, mantendo a
composição inicial evidente no contorno da nova melodia:
FIGURA 9 – CONTORNO
3 FRASE
O que define uma frase? Termo que remete ao estudo da gramática, da
língua, da literatura, linguagens oral e escrita. Por isso, a partir daí, faremos analogias,
trazendo-a para a música, entendendo, então, a frase musical – um trecho que pode
ser cantado em um único fôlego, e conclui uma estrutura melódica com sentido
completo.
148
Por fim, conectando com o assunto anterior, entenda que a frase é uma
estrutura maior do que o motivo. No interior, somos capazes de perceber um motivo e
alguma variação, continuidade ou transformação, formando uma unidade melódica
maior. Perceba, também, a aplicação dos elementos citados anteriormente. Vejamos, por
exemplo, a partitura de uma composição que possui dois cantores, mas não há letra.
Podemos deduzir, visualmente, de maneira bem clara, o tamanho das frases pelas pausas
e pelo perfil melódico similar.
Veja, a seguir, como o poeta Vinicius de Moraes opera um exemplo perfeito entre
letra e música em uma das perguntas que mais movem as artes no ocidente: “Sabe você
o que é o amor?” – anuncia a primeira frase e o motivo melódico da música. A seguir, a
resposta, com perfil melódico diferente, e a resposta “Não sabe. Eu sei”, com a resolução
da dúvida na tônica C7M. Veja como a pergunta é ascendente e, a resposta, descendente.
Na sequência, nova pergunta no texto, mas com mesma frase e motivo melódico:
“Sabe o que é um trovador?”, e a mesma resposta reafirmada, com nova harmonia, mesma
frase e motivo melódico.
149
DICA
Perceba como a letra traz esse assunto da composição mais à frente:
“Você não tem alegria, nunca fez uma canção. Por isso a minha poesia,
ah, você não rouba não”.
DICA
Acompanhe as frases e a genial relação entre texto e música com áudio e vídeo:
• Djavan: https://www.youtube.com/watch?v=RyADHyzzSwE&ab_
channel=Direngreyniano
• Áurea Martins e Nelson Faria: https://www.youtube.com/
watch?v=8wRuJ1PWi_c&ab_channel=UMCAF%C3%89L%C3%81EMCASA
150
4 ANTECEDENTE E CONSEQUENTE
Antecedente e consequente são estruturas completas, com a noção de frases
complementares dentro de uma melodia mais longa, que se desenvolve em vários
compassos. Estão para a música assim como pergunta e resposta. Produzem diálogo e
comunicação, equilíbrio e balanço, simetria e contraste. Seguindo o comparativo com a
linguagem, perguntamos: como aprendemos uma língua nova na primeira aula de inglês?
FONTE: O autor
151
FIGURA 13 – ANTECEDENTE E CONSEQUENTE EM “FOR BILL” [FAIXA 27]
Perceba como, nas partituras anteriores, está muito clara a divisão em duas partes,
chamadas de antecedente e consequente. A cesura, ou seja, a divisão entre as frases,
é exatamente na metade do total de compassos. A simetria é óbvia. O perfil melódico
é claramente diferenciado, e a divisão rítmica é alterada na segunda parte. Na primeira
partitura, a progressão harmônica demonstra uma única seção com antecedente e
consequente, já na segunda, vemos duas seções em um espaço maior, pois o antecedente
e o consequente são separados, também, por cadências novas e contrastantes.
5 SENTENÇA E PERÍODO
A partir da compreensão dual de frases, podemos adentrar nos conceitos
de sentença e período, que comportam, no interior, o antecedente e o consequente.
São muito influentes e constantes na teoria musical da disciplina Composição para
percebermos a estruturação de melodias.
152
Traremos, aqui, linhas gerais sintetizadas a partir do entendimento de Schoenberg
nos livros Fundamentos da Composição Musical (1993) e Modelos para Iniciantes na
Composição Musical (1991), que lançam esse olhar sob as melodias da música de concerto:
Haydn, Beethoven, Mozart, Schubert. Em seguida, traremos exemplos que conversam
como estão claros, também, na música popular. Ainda, afirmamos que são estruturas
muito presentes em qualquer composição, no barroco, clássico, música popular, jazz,
rock. Por isso, elas comunicam muito eficientemente aos ouvidos, mas não devem ser
entendidas como formas rígidas ou molduras fixas que possam prender a criatividade,
mas dar vazão.
IMPORTANTE
Nessa consagrada e influente referência, Arnold Schoenberg propõe antecedente e
consequente só para o período. Porém, afirmamos que esses termos se difundiram e são,
hoje, de uso geral, para a sentença e para o período, percebidos, mais simplesmente, por
duas metades. No prefácio do próprio livro de Schoenberg, o Fundamentos da Composição
Musical, o professor da USP, Eduardo Seincman, situa o leitor de alguns aspectos:
FONTE: O autor
153
• O PERÍODO se elabora em: 1) ANTECEDENTE: primeira frase; 2) segue uma
segunda frase nova, com elementos diferentes; 3) CONSEQUENTE: repetição
literal ou variação da primeira frase, e, em seguida; 4) fim melódico e cadencial.
FONTE: O autor
154
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:
• Motivo é a menor estrutura melódica que faz com que reconheçamos uma música.
• Frase é uma estrutura melódica maior do que o motivo, com sentido musical
completo. Frases são separadas por pausas e reconhecíveis pelos contornos.
• A sentença pode ser resumida em uma estrutura melódica com frases em forma:
a – a – b – c.
• O período pode ser resumido em uma estrutura melódica com frases em forma: a
– b – a – c.
• Repetir é essencial para criar lógica musical interna e conexão com os ouvintes,
mas variar essa repetição é fundamental.
155
AUTOATIVIDADE
1 Assinale a alternativa CORRETA, que traz técnicas de transformações do motivo:
156
UNIDADE 3 TÓPICO 2 -
PRÁTICA - CONSTRUÇÃO DE MELODIAS:
AUDIÇÃO E ANÁLISE
1 INTRODUÇÃO
O ensino da composição tem, como premissa, que, através da análise e da
compreensão das estruturas em obras de referência, tornamo-nos capazes de as
reproduzir e, assim, adquirimos ferramentas para o nosso exercício criativo.
Ao fim deste tópico, teremos uma análise de música completa como síntese e
visão geral da aplicação de todos os conceitos, com base no repertório das canções
consagradas. Canções nas quais, certamente, a construção da melodia teve êxito,
um sucesso sob o ponto de vista composicional, legitimada pelo público, crítica, pela
indústria musical. É uma espécie de resumo do tópico em forma de música.
2 FERRAMENTAS DE COMPOSIÇÃO
Compreendemos, então, que o motivo é a menor estrutura melódica portadora
de significado musical. Agora, o que fazer com algo tão pequeno? Como trabalhar,
transformar-se em frases, crescer em sentenças e períodos e virar música? Perceberemos
essas utilizações através do repertório e dos macetes na construção das melodias.
158
FIGURA 17 – GAROTA DE IPANEMA (TOM JOBIM/VINICIUS DE MORAES) - [FAIXA 30]
159
Grande parte das melodias de choro tem, como base, a compreensão de fluência
por movimentos contrários. Em Noites Cariocas, de Jacob do Bandolim, auditivamente e
musicalmente falando, é muito claro como a música é composta inspirada nesse princípio.
O bem humorado samba de partido alto, de João Bosco e Aldir Blanc, traz
variações no texto (nunca há repetição, nem refrão) e nas alturas melódicas. No entanto,
a composição garante conexão estrutural através do ritmo, que é sempre repetido. A
melodia vai se acomodando e variando pelos intervalos dos acordes. Note que a frase
inicial traz os intervalos b7 – tônica – 5 – 4, transposta de maneira literal na sequência.
Já na terceira vez, o ritmo segue, mas os intervalos são b7 – #11 – 6. Ao longo da
música, diversas variações motívicas e melódicas são acrescentadas, mas permanece
o motivo no plano rítmico.
160
2.5 MESMAS ALTURAS, DIFERENTE RITMO
Observe o contrário do exemplo anterior na melodia de Spain, a mais emblemática
composição do pianista Chick Corea. O fim da parte A, entre parênteses:
FONTE: O autor
162
FIGURA 24 – TEMA DE A NO CONTORNO DO INTERLÚDIO - [FAIXA 35]
FONTE: O autor
DICA
A respeito da REVERSÃO, acompanhe a animação de uma partitura
de Bach, o Cânone do Caranguejo, que usa essa técnica de maneira
impressionante. A melodia não é “apenas” tocada de trás para frente, é
tocada reversa sobre a melodia original e, logo após, reversa e invertida.
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=xUHQ2ybTejU&ab_
channel=JosLeys.
Sua característica e efeito são simbolizar e trazer, aos ouvidos, a sonoridade das
trocas harmônicas através de uma única linha melódica. Elas nos permitem ouvir toda a
progressão mesmo sem a presença da harmonia. Para isso, geralmente, são notas das
funções harmônicas, ou estão no jogo entre terças e sétimas nas cadências. Ainda, uma
linha extraída da progressão harmônica através da lei do menor esforço, podendo trazer
tensões e cromatismos. Uma das melodias mais marcantes dos standards de jazz foi
composta assim.
163
Observe, a seguir, a proximidade dos intervalos. O menor esforço no caminho
mais curto possível. Terças e sétimas resolvendo nas terças e sétimas dos próximos
acordes. A melodia é composta preenchendo, ou “embelezando” essas notas-guia.
FIGURA 26 – AND WHY NOT? (TED PEASE) - CRIANDO A MELODIA EM TORNO DE GUIAS - [FAIXA 37]
164
Toque a melodia de Ode à Alegria, de Beethoven, nos diferentes modos, e sinta
como soa. Originalmente, é em ré maior, como já escrita no Tópico 1, como exemplo didático
do período. A seguir, será escrita em ré menor eólio, frígio, lídio e lócrio.
2.12 SENTENÇAS
Em uma das mais conhecidas melodias do choro, Pixinguinha inicia a sentença
com uma anacruse. Veja como, por isso, a frase melódica ultrapassa as barras de
compasso para completar o sentido. Perceba como a repetição da frase 1 é transposta
165
diatonicamente uma terça abaixo. Veja como ele consegue o contraste da frase nova,
na continuação da sentença. A primeira frase é baseada em graus conjuntos na escala.
Portanto, a novidade são frases por arpejos. A finalização da melodia traz um padrão
novo de terças e saltos, além da resolução na nota lá da melodia, aqui, sobre um acorde
de G7 que resolve adiante em C.
A frase 1 foi repetida imediatamente. Note que, após isso, o perfil melódico
segue completamente diferente. Temos uma frase nova e, por fim, uma resolução no
acorde tônica G7M. Observe que a última nota, na melodia, é um lá. Ouça a música e
perceba, também, na partitura, como Lenine resolve a melodia na nota sol apenas na
última nota de toda seção A, após várias repetições da sentença, justamente para trazer
a sensação enfática de encerramento e fim do trecho, o que anuncia a entrada de algo
novo na seção B.
166
2.13 PERÍODOS
A próxima melodia é de uma suíte de Johann Sebastian Bach, a qual tem clara
estrutura de período: a frase 1 é repetida de maneira exatamente igual no consequente,
porém, veja a arte do contraponto: a voz aguda da clave de sol, na repetição, é totalmente
nova. Observe como o início dessa frase não se localiza no primeiro tempo, já que há
uma anacruse extrapolando o tamanho dos compassos:
Os refrões de rock são conhecidos por grudar nos ouvidos e conseguir fazer
grandes multidões cantarem energicamente, em uníssono, uma mesma melodia. Uma
dessas estruturas mais conhecidas no mundo do rock foi composta no formato de
período abaixo, antecedente e consequente de oito compassos cada. As pausas
recortam as frases:
167
Pratique perceber essas estruturas, auditivamente, em toda e qualquer música.
Lembrando que “essas construções podem ser flexíveis e estar abertas a diversas
formações híbridas” (CAPLIN, 2013, p. 99). Ainda, em estruturas maiores, combinando os
dois. Casos sem classificação existem como músicas em que ouvimos apenas repetições
de uma mesma ideia, ou mesmo uma melodia extensa, sempre nova, que nunca repete
nada em toda uma seção.
INTERESSANTE
A título de curiosidade, Garota de Ipanema, bossa nova de Tom Jobim e Vinicius de
Moraes, já ocupou o segundo lugar no Guinness Book World Records. Esse recorde,
hoje em dia, está em análise, pois, ao que parece, Summertime, da ópera negra
de George Gershwin e do repertório do jazz, chegou a 67.591 regravações (não
necessariamente discos).
FONTE: <https://www.guinnessworldrecords.com.br/world-records/70103-most-recorded-song>.
Acesso em: 29 jan. 2021.
168
Dados quantitativos, o sucesso na mídia e cifras de vendas garantem a qualidade
artística? Podemos assumir, por isso, que é a mais bela melodia já criada? Definitivamente
não. Independentemente de julgamentos de valor ou de gosto pessoal, também é inegável
o poder de qualquer melodia quando é reconhecida em todo o planeta.
Segundo o Guinness (2021), os Beatles são, até hoje, o grupo com o maior
número de álbuns vendidos na história, ultrapassando 1 bilhão de cópias. Alguma coisa
os quatro rapazes de Liverpool realmente fizeram.
Os Beatles são quase uma unanimidade do que simboliza uma música simples,
mas com qualidade, que toca as pessoas de qualquer época e origem, feita com boa dose
de sinceridade e poesia comovente. Valores a serem pensados, relativizados e considerados
por nós, músicos, professores de música e acadêmicos de música. Yesterday servirá como
uma síntese do nosso assunto melódico. Será que nossas ferramentas podem dar conta de
tal melodia? Investigaremos o que faz sucesso. Segue a análise.
169
3.1 FORMA
Yesterday é uma canção AABA, sua primeira exposição. No arranjo e gravação,
a forma é ampliada para Introdução – AABA – BA – Coda. Detalhe: o A possui sete
compassos, então, ao todo, são 29 compassos. Como o último A é uma repetição, não
há necessidade de repetir os símbolos na análise.
A Seção B é um período:
170
• ANTECEDENTE: traz contraste, inicia com uma frase 2, diferente da seção A. Na
sequência, uma frase nova.
• CONSEQUENTE: inicia com a repetição literal da frase 2. Por fim, uma resolução
melódica – sensível na tônica e cadencial – II V I.
Além de ser uma boa escolha melódica, a apojatura abre a música com um
belo intervalo de segunda em tempo forte, resolvendo na tônica, sol - fá. O intervalo de
segunda é o motivo.
171
Na sequência do motivo, algo formidável: as seguintes frases são compostas por
perfeitos e matemáticos movimentos contrários. Observe que as notas – lá – si natural – dó#
- ré – mi – fá – estão em intervalos de 2 – 2 – b2 – 2 – b2, exatamente os mesmos intervalos
descendentes de ré – dó natural – si bemol – lá – sol: 2 – 2 – b2 – 2 (curiosamente, o
motivo, na sequência, faz o intervalo de b2 que falta – si bemol – lá).
172
Seguindo a seção B, mais explorações da ferramenta do movimento contrário.
A frase nova, mais uma vez, tem relações com a frase da seção A:
DICA
Em instrumentos com tons e semitons regulares, como os trastes,
visualizamos os padrões intervalares facilmente, diferentemente do piano
ou dos sopros.
173
Por fim, salientamos que, apesar de óbvio esmero nas proporções, coerências e
conexões compostas por Paul McCartney nessa música, toda análise possui um grau de
subjetividade e interpretação dos olhos de quem vê.
174
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:
• As notas chamadas de guia são aquelas comuns entre dois acordes, escolhidas por
movimento de grau conjunto, ou semitom ao longo das cadências. A característica e
o efeito são de simbolizar e trazer, aos ouvidos, a sonoridade das trocas harmônicas
através de uma única linha melódica. Treine ouvir toda a progressão através de uma
nota por acorde, mesmo sem a presença da harmonia.
• As partituras originais, muitas vezes, não ajudam a análise, até prejudicam; não
apresentam os sistemas dividindo as estruturas de acordo com a composição, mas
com a impressão ou necessidades editoriais. Pode ser útil reescrever.
175
AUTOATIVIDADE
1 A melodia de Ode à Alegria, da Nona sinfonia de Beethoven, foi composta na tonalidade
de ré maior. Se a reescrevermos no modo frígio, através do intercâmbio modal,
surgirá a melodia a seguir. Compare ré maior com ré frígio e assinale a alternativa que
demonstra as notas diferentes, que devem ser alteradas na melodia original:
a) ( ) fá sustenido – dó sustenido.
b) ( ) sol natural – lá natural.
c) ( ) mi natural – fá sustenido – si natural.
d) ( ) mi bemol – fá natural – si bemol – dó natural.
O que pretendemos demonstrar é que uma estrutura pode ser construída como uma
inversão e, ainda assim, admitir uma superfície completamente nova.
PORQUE
FONTE: O autor
177
178
UNIDADE 3 TÓPICO 3 -
A CONSTRUÇÃO DAS HARMONIAS
1 INTRODUÇÃO
Neste tópico final do livro, o assunto é a composição, através do foco, na
harmonia.
2 HARMONIZANDO A MELODIA
Como ponto de partida, uma lista de dez conselhos, ou primeiras observações,
quando queremos harmonizar uma melodia:
179
• Por consequência do item anterior, entre notas longas, estarão, provavelmente, as
outras notas, provenientes da escala do tom ou do acorde.
• Observe se há sensível resolvendo na tônica: ali, estará um acorde dominante.
• Ritmo harmônico: em que compasso estamos: de início, desenvolvimento ou conclusão
de uma frase? Lembre-se das funções repouso, movimento e resolução.
• Teste diversos acordes até chegar na sonoridade que deseja. Use a lógica teórica,
mas não se esqueça de usar o ouvido: teste qualquer acorde sem medo, com
criatividade e sem nenhuma regra.
• Coloque a nota da melodia em todos os intervalos de um acorde: primeiramente
tônica, terça, quinta e sétima. É o que veremos a seguir.
A partir desse primeiro olhar, digamos que há uma nota dó soando longa na
melodia, então, provavelmente, é uma nota de acorde. Que acordes cabem ali? Aí vem o
óbvio: C – F esses dois no máximo? Pense bem, podem ser 20 acordes.
Vamos aos poucos. Sua vontade e intuição de compositor dizem que quer ali um
acorde com uma sonoridade maior, aberta, feliz, brilhante ou algum desses adjetivos.
Harmonizaremos, então, com o acorde maior, com sétima maior, o mais aberto de todos.
Então, pode ser C7M – melodia na tônica; Ab7M – melodia na terça; F7M – melodia na
quinta; Db7M – melodia na sétima maior.
FONTE: O autor
180
A partir dessa conclusão, se você colocar a nota da melodia nos intervalos de
cada um desses cinco acordes, então, teremos 20 escolhas. Compor é escolher. A
infinidade de escolhas é a parte prazerosa e criativa da composição.
Mais um conselho, que pode parecer óbvio, mas que exige ousadia e vontade de
experimentação: nem tudo precisa ser tonal, estar dentro de um mesmo campo harmônico.
Existem diversos sistemas de música e correntes estéticas, ao longo da história, que
buscam fugir das amarras da tonalidade: modalismo, politonalidade, impressionismo, free
jazz, serialismo, música universal, dodecafonismo etc. Sua música pode se abrir a esses
mundos, assim como os exercícios de composição com os seus alunos de qualquer idade e
experiência. Por que não?!
FONTE: O autor
181
FIGURA 44 – NOTAS LONGAS E ESCOLHAS DE ACORDES NO CAMPO HARMÔNICO DE DÓ MAIOR
FONTE: O autor
FONTE: O autor
182
A seguir, desenvolveremos uma melodia a partir das notas longas. Nas escolhas
anteriores, a linha tracejada funcionaria mal para a melodia a seguir. Há um choque
entre o lá da melodia e a terça menor – lá bemol – de Fm7. No caso, é só escolher outro.
Todos os outros acordes soam muito bem:
FONTE: O autor
FIGURA 47 – INVERSÕES
FONTE: O autor
183
Você pode manter o acorde no agudo e variar o baixo. Dobre o que for necessário
para soar bem, dependendo da instrumentação.
FONTE: O autor
Com essa visão, são gerados diferentes acordes resultantes, com sonoridade
diferente da original e das inversões tradicionais. Você pode tocar as tríades mais básicas
e originais de uma composição, e testar os graves livremente, experimentar improvisar
qualquer nota no baixo. Gostou? Confira, depois, qual acorde resultante é aquele.
184
QUADRO 2 – INVERSÕES USANDO TODAS AS NOTAS DA ESCALA
INVERSÕES
acorde /C /D /E /F /G /A /B
G7sus(9)
Dm Dm/C E7sus(b9) Dm/F Dm/A Bm7(b5)
*Dm7/G
A7sus(9)
Em C7M Em/D - F7M(9,#11) Em/G Em/B
*Em7/A
D7sus(9)
Am Am/C Am/E F7M Am/G B7sus(b9)
*Am7/D
B° - D° - F° G7 Dm6/A
FONTE: O autor
FONTE: O autor
185
4 TRABALHANDO COM TENSÕES DISPONÍVEIS
Um assunto essencial à composição, quando trabalhamos com o acabamento
ou com o arranjo final da harmonia, são as tensões disponíveis: Que notas podemos
acrescentar a um acorde básico para torná-lo mais dissonante? Que notas são evitadas e
soam mal? Que notas posso variar na harmonia? Isso gera muita dúvida durante os estudos,
e, para sanar isso, traremos um quadro completo em relação às tensões disponíveis para
cada acorde. A seguir, uma lista de três conselhos, lembretes e orientações.
A seguir, observaremos um quadro geral, que pode servir para sua conferência
quando necessário.
186
FIGURA 50 – ACORDES, GRAUS, FUNÇÕES, ESCALAS E TENSÕES NOS CAMPOS MAIOR, MENOR,
HARMÔNICO E MELÓDICO
187
FIGURA 51 – REDEMPTION SONG - BOB MARLEY - [FAIXA 44]
188
Para além de uma simples dualidade, podemos afirmar que estas práticas tonais
e modais se misturaram de maneira difusa ao longo da história, e alguns períodos,
lugares e movimentos musicais evidenciaram e optaram por desenvolver mais um
dos lados. Outros as misturaram livremente. Hoje, temos acesso a todas as músicas,
e liberdade para entendê-las como sistemas sonoros distintos, que se influenciam e
podem ser fonte de inspiração para a composição.
Teremos figuras com os campos harmônicos produzidos a partir dos outros cinco
modos gerados pela escala maior/menor: dórico, frígio, lídio e lócrio. Os modos jônio e eólio
não constam a seguir porque são os já conhecidos maior e menor natural. Analogamente à
música tonal, pense agora que o acorde mais importante é este novo primeiro, e a sonoridade
melódica é a do modo, privilegiando suas notas características e tensões.
189
aparece em formulações como “lídio [...] escala maior com o quarto
grau aumentado [...] mixolídio [...] escala maior com sétimo grau
abaixado [...], dórico [...] escala menor natural com o sexto grau
elevado” etc. A junção desses conceitos (campo harmônico modal
e nota característica) permite uma ideia de funcionalização modal
onde os graus possuidores da nota característica, se diferenciando
dos modelos de referência maior e menor, compõem junto com I
grau de cada modo um grupo de acordes com função primária. (P.ex.,
os acordes com funcionalidade primária em Dó mixolídio são o C7,
o Gm7 e o Bb7M. Os primários de Dó frígio são Cm7, Db7M e Bbm7
etc.). A ideia de que os modos podem estar ordenados de acordo
com sua relação tensiva, onde o maior número de sustenidos ou
bemóis produz uma gradação flexível entre modos “mais brilhantes”
aos “mais sombrios” (onde o lídio é o mais aberto e brilhante e o lócrio
é o mais fechado e sombrio) também aparece em Persichetti (1984,
p. 33) (FREITAS, 2008, p. 273).
Acordes secundários são aqueles que não possuem a nota característica, mas
progressões com estes também fazem parte da sonoridade do modo. A tríade diminuta
é um caso à parte e deve-se atentar para sua utilização, pois, pelo seu perfil de carregar
o intervalo de trítono facilmente, pode levar às cadências tonais e sensação de tensão
e resolução típicas da harmonia tonal. Os exemplos estão em tríades, mas execute os
acordes também em tétrades.
190
• Campo harmônico de ré frígio – Sabor característico: segunda menor. Acordes
primários: Im, II e VIIm. Acordes secundários: III, IVm, VI. Tríade de V°.
191
FIGURA 56 – CAMPO RÉ LÓCRIO
FONTE: O autor
Para realmente ouvir o som dos modos e seu campo gerado, experimente tocar
os acordes destes campos harmônicos ressaltando sempre o primeiro grau como um
ponto de partida e lugar de chegada.
192
FIGURA 57 – ESCALA DE DÓ QUARTAL - TRÊS NOTAS
FONTE: O autor
FONTE: O autor
193
ATENÇÃO
As estruturas quartais, formadas em todos os modos dos campos maior e
menor, sempre serão iguais, a diferença será o ponto de partida apenas, ou
seja, a tônica do modo escolhido.
194
FONTE: The Real… (1970, p. 281)
DICA
Para finalizar esta unidade, recomendamos sua entrada no universo
das sonoridades modais e quartais de maneira musical. No YouTube,
você pode ativar as legendas para o inglês-português no ícone de
configurações, embaixo, à direita, com o nome “detalhes”. Veja, agora,
algumas recomendações de vídeos:
• https://www.youtube.com/watch?v=SJQiAmSWiE4&ab_channel=TerradaM%C3%BAsica
• https://www.youtube.com/watch?v=ANIOTcRuZHc&ab_channel=TerradaM%C3%BAsica
• https://www.youtube.com/watch?v=vh4DEi28HzQ&ab_channel= UMCAF%C3%89L%C3%81
EMCASA
• https://www.youtube.com/watch?v=nfroW6KaXXc&ab_channel=Polyphonic
• https://www.youtube.com/watch?v=yJC8uT1PKt0&ab_channel=JazzDuets
• https://www.youtube.com/watch?v=O4IJnSTS84A&ab_channel=RickBeato
• https://www.youtube.com/watch?v=nfroW6KaXXc&ab_channel=Polyphonic
• https://www.youtube.com/watch?v=DlML3adH9yQ&ab_channel=RickBeato
• https://www.youtube.com/watch?v=L47SRue0gt8&ab_channel=Medtnaculus
• https://www.youtube.com/watch?v=twFx9_R25d8&ab_channel=TonyWinston
• https://www.youtube.com/watch?v=S96Ojs9mcxg&ab_channel=StudyMusic
Chegamos ao final de nosso livro didático, fique, agora, com uma leitura
complementar a respeito do conteúdo estudado.
Bons estudos!
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LEITURA
COMPLEMENTAR
O “CÁLCULO” SUBJETIVO DOS CANCIONISTAS
Luiz Tatit
Essa dependência inicial da fala fazia com que todos os fragmentos da composição
já tivessem em geral melodia e letra. A busca de parceiros representava a necessidade de
alongar a canção com outros fragmentos que também já tivessem versos entoados.
Por isso, era prática habitual um compositor entregar ao seu colega uma parte
da obra esperando que ele criasse uma segunda parte, ambas já com melodia e letra.
Já havia, como hoje, a parceria entre melodistas e letristas, mas não era a regra. Sem
um real convívio com as técnicas musicais e literárias, nossos primeiros cancionistas
preferiam ter como matéria-prima as frases já melodizadas da linguagem oral.
No entanto, ao criar a letra para o retorno da mesma melodia (“Ela falou você tem
medo/ Aí eu disse quem tem medo é você”), os autores, em vez de duas, isolam quatro
unidades entoativas fazendo uso de simples operações enunciativas que modulam
linguagens indiretas e diretas: (1) “Ela falou”, sujeito em terceira pessoa, no passado, ou
seja, o eu-lírico se reporta à fala de um outro ocorrida num tempo distante; (2) “você
tem medo”, sujeito em primeira pessoa (só o “eu” pode se dirigir a “você”, pronome com
função de “tu” na nossa língua) dizendo, no presente, o que o outro teria dito no passado;
(3) “Aí eu disse”, sujeito em primeira pessoa, mas se referindo ao que disse no passado;
(4) “quem tem medo é você”, sujeito em primeira pessoa dizendo, no presente, o que ele
próprio teria dito no passado:
198
Esses recursos enunciativos, habituais na literatura ou em qualquer
manifestação da linguagem verbal, tomam vulto especial no universo da canção em
virtude do encanto irresistível da voz. Tudo que é cantado se torna também um modo de
dizer atual. Ao pronunciar “você tem medo” dentro da melodia proposta, o intérprete está
reproduzindo, no instante em que canta, a curva entoativa executada pela personagem
(ela, a menina) em outra ocasião. Da mesma forma, ao replicar “quem tem medo é você”,
refaz a curva que o próprio “eu” teria flexionado para dizer a frase em tempos atrás. Nos
dois casos, as curvas são refeitas aqui e agora pela voz do cantor, de tal maneira que os
sentimentos a elas associados parecem reviver na voz e interpretação de quem canta.
199
Em campo oposto, houve tendências na bossa nova que exploraram o máximo
possível os recursos musicais no âmbito da canção, não apenas as célebres dissonâncias
harmônicas, mas também o improviso vocal tão incentivado nos circuitos de produção do
jazz. Nas experiências-limite, chegavam a neutralizar o conteúdo da letra com vocalises
(“sabadabadá...”) para evitar o apelo figurativo (falar das coisas do mundo e das relações
humanas). Restava apenas a voz como um modo de dizer, mas sem foco no que era dito.
Não são muitos os compositores brasileiros que apostaram nessas tendências. Nossas
canções deixam, em geral, pouco espaço para o improviso puro e simples; sempre que
aparece, exerce funções de passagem, introdução, finalização etc. e jamais se confunde
com o núcleo cancional determinado pela relação melodia e letra.
A estratégia rap
Seu formato, menos música mais fala, é ideal para se fazer pronunciamentos,
manifestações, revelações, denúncias etc. sem que se abandone a seara cancional.
Podemos dizer que o trabalho musical, no rap, é para restabelecer as balizas sonoras
do canto, mas nunca para perder a concretude da linguagem oral ou conter a crueza e
o peso de seus significados pessoais e sociais. Esse mínimo percussivo e aliterativo é o
seu quantum ideal de música.
200
Para concluir
FONTE: TATIT, L. O “cálculo” subjetivo dos cancionistas. Rev. Inst. Estud. Bras., São Paulo, v. 1, n. 59, p. 369-
386, 2014. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/rieb/n59/0020-3874-rieb-59-00369.pdf. Acesso em: 29
jan. 2021.
201
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:
• Todas as harmonias que ouvimos são baseadas apenas nestes cinco tipos de acordes:
X7M, X7, Xm7, Xm7(b5), X°. A partir desta conclusão, se você colocar a nota da melodia
nos intervalos de cada um destes cinco acordes, então teremos 20 escolhas.
• Notas evitadas: são aquelas que não entram como opção de tensões disponíveis,
pois soam mal ou confundem a sonoridade de um acorde com outro. Basicamente,
lembre-se de observar as funções harmônicas nas tétrades.
202
AUTOATIVIDADE
1 Assinale a alternativa que traz acordes que harmonizam a nota melódica sol natural
no interior das suas tétrades:
203
REFERÊNCIAS
ALMADA, C. de L. A estrutura do choro. Rio de Janeiro: Da Fonseca, 2006.
CAPLIN, W. Analyzing classical form: an approach for the classroom. New York:
Oxford University Press, 2013.
CHEDIAK, A. Songbook Tom Jobim: vol. III. Rio de Janeiro: Lumiar Ed., 1990.
FREITAS, S. P. R. de. Que acorde ponho aqui? Harmonia, práticas teóricas e o estudo
de planos tonais em música popular. 2010. 857 f. Tese (Doutorado em Música) –
Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2010. Disponível em: http://repositorio.
unicamp.br/jspui/handle/REPOSIP/284967. Acesso em: 28 jan. 2021.
204
O MELHOR do choro brasileiro. São Paulo e Rio de Janeiro: Ed. Irmãos Vitale, 1997.
PEASE, T. Jazz composition: theory and practice. Boston: Berklee Press, 2003.
THE BEATLES real book: C instruments. Milwaukee: Hal Leonard Corporation, 1980.
THE NEW real book: volume II. Petaluma, CA: Sher Music Co., 1991.
THE REAL book of jazz: volume I. Milwaukee: Hal Leonard Corporation, 1970. Disponível
em: http://www.play-along.ch/notationz/Volume1C.PDF. Acesso em: 28 jan. 2021.
205