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Todos os esforços foram envidados no sentido de garantir o devido crédito aos detentores de direitos
autorais. No caso de um detentor se identificar, faremos com prazer constar o crédito nas impressões e
edições seguintes.
Editores executivos
Maria Cristina Antonio Jeronimo e Rodrigo de Almeida Gerência de produção Maria Cristina Antonio
Jeronimo Produção editorial
Mariana Bard
Preparação
Vera Cristina Rodrigues Feitosa Revisão
Bárbara Anaissi
Diagramação
Adriana Moreno e Anderson Junqueira Pesquisa iconográfica Renato Venancio
Pesquisa documental
Carlos Milhono
Referências bibliográficas
Brasília, Brasil em construção.
Congresso Nacional, Brasília, 1959.
ARQUIVO NACIONAL [FUNDO AGÊNCIA NACIONAL
PREFÁCIO
Grandeza e pequenez da vida cotidiana
C gostei. Ela convida o historiador a contar a própria história para que seu
leitor entenda de onde ele fala. Isso tem a ver com transparência, palavra
que vem se impondo como sinônimo de ética e deontologia. Tal prática exige
que o historiador volte o olhar para si mesmo e para o contexto em que está
inserido. É bastante conhecida a recomendação de que não cabe ao historiador
julgar, mas sim compreender. Então, caro leitor, leia este livro como uma
tentativa de autocompreensão, tentativa que não implica ausência de perspectiva
crítica.
Digo isso porque, neste volume, vamos falar dos anos 1951 até 2000,
décadas em que o Brasil atravessou inúmeras crises políticas. Até aqui, nada de
novo. Desde as “inconfidências”, no século XVIII, as revoltas regenciais, no
século XIX e as quarteladas da primeira metade do XX, as crises deixaram ouvir
a voz do “povo” e das elites, serviram a interesses vários e de vários grupos e
terminaram em poucas transformações para o desenvolvimento do país. Mas, na
segunda metade do século XX, houve décadas de grande modificação na
política, nos costumes, nas mídias, na cultura e na sociedade. Nem todos os
brasileiros foram beneficiados, mas o país mudou. Eu já era nascida e fui,
portanto, testemunha das tantas mudanças, quando não movida por elas. Por
isso, acho importante adaptar-me à moda e dizer ao leitor “de onde falo”.
A eleição que não ocorreu.
Material de campanha de Juscelino Kubitschek, 1965.
COLEÇÃO PARTICULAR.
COLEÇÃO PARTICULAR.
amos olhar para trás e lembrar o que levou Jango Goulart ao poder. Tudo
V começou sete meses antes, durante uma breve faxina contra a corrupção.
Corrupção, segundo o então presidente eleito Jânio Quadros,
supostamente nascida durante o governo JK. O slogan “Varre, varre,
vassourinha. Varre, varre a bandalheira”, que embalou a campanha, empolgava
milhões. Mas ao que, exatamente, Jânio se referia? Aos chamados Anos
Dourados e à atuação de Juscelino Kubitschek na Presidência entre 1956 e 1961.
Na época, JK estava em toda a parte: no nome de carro, o Alfa Romeo FNM JK,
na letra de música de Juca Chaves, “Presidente Bossa Nova”: “Bossa Nova
mesmo é ser presidente desta terra descoberta por Cabral / Para tanto basta ser
simpático, risonho e original.” Sorrisos, otimismo e esperança identificavam esse
momento: “Vivíamos os anos loucos do desenvolvimentismo, uma coisa que eu
nunca soube se era para valer ou se era papo furado. Mas que ajudava a viver,
isso ajudava. Minha geração teve a oportunidade de viver sua juventude durante
esses Anos de Ouro do século, anos de liberdade desenfreada, de onipotência
adolescente, de descontraída responsabilidade. O futuro era para amanhã de
manhã.” São palavras do cineasta Cacá Diegues, que assim resume o clima de
otimismo que marcou os anos JK.
No ar, a voz de Elizeth Cardoso cantava “Canção do amor demais”, música e
letra de Tom Jobim e Vinicius de Moraes. O violão de João Gilberto revelava o
movimento musical que invadiria o mundo, sublinhando a doçura de viver nos
trópicos, junto com o amor, o sorriso e a flor. No teatro, público e palco se
aproximavam para encenar os problemas nacionais, encarnados nos personagens
criados por Gianfrancesco Guarnieri e José Celso Martinez Corrêa: era o povo
em cena. Nas telas, contra as chanchadas adoradas pelo público, Nelson Pereira
dos Santos e Glauber Rocha pariam o Cinema Novo, com pouco riso e muitas
preocupações sociais. A inauguração de Brasília, em pleno cerrado, construída
em cinco anos, e do cruzeiro rodoviário composto pelas rodovias Belém-
Brasília, Fortaleza-Brasília, Belo-Horizonte-Brasília e Goiânia-Brasília
prometiam uma guinada no desenvolvimento nacional, levando-o para o interior
do país e alargando o mercado interno. A capital correspondia à possibilidade de
unir racionalidade e organização do espaço – explicava seu criador Oscar
Niemeyer. A conquista da Copa do Mundo em 1958 e o sucesso nos ringues do
peso-galo Éder Jofre, campeão mundial, pareciam fazer do país um líder nas
provas de entusiasmo popular e de autodeterminação.
Mas, ao mesmo tempo, o canteiro de obras em que se transformou o Planalto
Central ensejou inúmeras denúncias de corrupção. “Até a década de 50, eram
construtoras que tinham seus limites no território do estado ou região. O que
acontece de JK para cá é que eles se infiltraram em Brasília”, explicou numa
entrevista o historiador Pedro Henrique Pedreira Campos. “A construção de
Brasília, fundada em 1961, foi um marco para a história das construtoras: foi a
partir de então que elas se uniram. Ali, reuniram-se empreiteiras de vários
estados e começaram a manter contato, se organizar politicamente.”
Morador de Ipanema, num prédio erguido pelas empreiteiras para as quais
tinha concedido a construção da Ponte da Amizade, que liga Foz do Iguaçu a
Ciudad del Este, no Paraguai, JK – que, segundo seus inimigos, aceitara
benfeitorias delas num terreno de sua propriedade na região de Foz do Iguaçu –
sofria acusações de corrupção, além de outras que datavam dos seus tempos de
governador. Foi responsabilizado pelo significativo aumento da dívida pública
interna, da dívida externa, e seu mandato terminou com o crescimento da
inflação, embora tenha valorizado o salário mínimo como nunca até então e
promovido distribuição de renda. Em suma, uma mistura de sorriso com careta
de dor.
E esse era o “lixo” que Jânio Quadros queria varrer. Para se eleger, ele
abusou de um estilo que mesclava erudição com artifícios como o de jogar talco
sobre a ombreira do terno para se identificar com os mais humildes, que “tinham
caspa”. Usava ternos amassados, gravatas desalinhadas e carregava nos bolsos
sanduíches de mortadela embrulhados em papel de pão, que mordiscava em
público. As contradições de seu programa de governo monetarista e anti-
inflacionário, sua política externa de aproximação com Cuba e com a China,
além da falta de interlocução com o Congresso, acabaram por inviabilizar
qualquer gestão. Em fins de agosto de 1961, porém, a renúncia de Jânio
Quadros, cujas interpretações – diz a historiadora Lucília Delgado – nunca foram
satisfatórias, tornou Jango Goulart presidente. A situação foi assim vivida por
Luiz Augusto de Castro Neves, que testemunhou:
Caixa de fósforo da campanha de Jânio Quadros.
COLEÇÃO PARTICULAR.
Jovem aluno do Colégio Naval (tinha, à época, 17 anos), situado em Angra dos Reis, eu havia obtido uma
licença extraordinária de fim de semana (no internato, só podíamos sair de Angra para visitar nossas
famílias uma vez por mês) para vir ao Rio de Janeiro para a festa de aniversário de meu pai. Relativamente
ligado no noticiário político da época, apesar da pouca idade, lembro-me de que a situação política estava
muito tensa. O governador da Guanabara, Carlos Lacerda, foi à televisão e acusou o presidente Jânio
Quadros de articular um golpe de estado, havendo inclusive convidado Lacerda a participar dele. Ainda
segundo o governador da Guanabara, o golpe implicaria o fechamento do Congresso Nacional.
Voltei do Rio ao cair da tarde do dia 25 de agosto. No ônibus vínhamos um pequeno grupo de alunos e
dois professores, que viajavam semanalmente a Angra dos Reis para dar aulas no Colégio Naval. Os alunos,
todos adolescentes, estavam um tanto curiosos sobre a crise política desencadeada pela renúncia do
presidente Jânio Quadros. Os professores especulavam sobre possíveis cenários, inclusive sobre as
dificuldades, naquele momento ainda não explícitas, que o vice-presidente João Goulart teria para assumir.
Chegamos a Angra de noite e fomos para o Colégio Naval.
No dia seguinte, 26 de agosto, a rotina de aulas e exercícios era normal, mas percebia-se nos professores
e, sobretudo, nos oficiais uma maldisfarçada excitação e comentários esparsos sobre a “extrema gravidade
da situação do país”, segundo um deles, particularmente em face do “perigo comunista”. Mas à parte essa
perceptível ansiedade dos militares, o dia transcorreu normalmente. Os que tínhamos radinhos de pilha
procurávamos, nos intervalos das aulas e durante os recreios, escutar os noticiários, que pouco ou quase
nada acrescentavam aos boatos que circulavam entre os professores (boa parte deles morava no Rio de
Janeiro) e os oficiais. Posteriormente, soube-se que a imprensa, de maneira geral, já estava submetida à
censura, em particular na Guanabara, cujo governador era inimigo ferrenho do vice-presidente João
Goulart.
Por volta de 1 hora da manhã, o corneteiro do colégio, um soldado fuzileiro naval, começou a tocar no
sistema de alto-falantes o toque de “reunir”, seguido do de “postos de combate”. Entre assustados e
perplexos, saímos da cama, vestimos o uniforme às pressas e entramos em forma no pátio interno. Logo em
seguida apareceu o diretor do Colégio Naval, um capitão de mar e guerra de nome Mario Geraldo Ferreira
Braga e, com voz emocionada, proclamou aos alunos que “se espera para esta noite um levante comunista
em todo o país”. Mandou distribuir a cada aluno um fuzil Mauser 1908 (que usávamos para exercícios de
ordem unida e para desfiles). Acrescentou que distribuiria munições em momento oportuno e que nós,
“apesar de jovens, iríamos defender este pedaço de Brasil até a última gota de sangue”. Dispensados da
formatura, fomos instruídos a continuar no pátio com os nossos fuzis. Ainda perplexos, conversávamos
excitadamente, especulando de onde viria o tal ataque comunista e onde estariam eles naquele momento.
Havia, apesar do clima de apreensão que fora instalado, certo ceticismo por parte dos alunos sobre a
iminência do tal ataque comunista, sobretudo por parte daquele grupo de alunos que havia chegado do Rio
de Janeiro na véspera sem haver detectado mais anormalidades.
Umas duas horas mais tarde, recebemos a ordem de devolver os fuzis e voltamos para os nossos
dormitórios. Na manhã seguinte havia certo ar de normalidade (nem tanto entre os oficiais, que tinham
semblantes entre preocupados e temerosos); parecia que na noite anterior havíamos tido uma mistura de
sonho e pesadelo. Dali em diante, os fatos são conhecidos: entre negociações políticas e movimentos de
tropas para um lado e para outro, instituiu-se o parlamentarismo, e o vice-presidente pôde tomar posse na
Presidência da República. Na véspera da posse presidencial, fomos novamente reunidos no pátio interno, e
foi-nos lida uma comunicação do diretor dando conta de que havia sido instituído o regime parlamentar de
governo no país e que a Marinha o aprovava.
O medo do comunismo.
Manifestantes no Comício da Central, Rio de Janeiro, 13 de março de 1964.
ARQUIVO NACIONAL [FUNDO CORREIO DA MANHÃ].
Sim, as pessoas sentiam muito medo do comunismo. Sentiam que não se sabia bem o que era aquilo. Eu
mesma não sabia onde ler, então perguntei a um irmão que tinha um jornal em Belo Horizonte e
consegui ter uma consciência do que era. Mas as pessoas tinham medo, também por não saberem
praticamente nada, por falta de informação. Sentiam que era quase proibido falar [sobre isso], só falar
parecia que havia interesse. Também nas Forças Armadas, garanto que não todos, mais ou menos partes
iguais, não saberiam nem definir o que era, e os mais cultos não comunistas nunca procuraram instruir
os oficiais, cadetes e soldados. Os superiores, generais, coronéis, davam as ordens sem explicar as
razões, e os subalternos obedeciam.
A revista O Cruzeiro, então a mais lida pela classe média no país, colocou
nas bancas uma “edição histórica da revolução” em 10 de abril de 1964. O
editorial do conhecido jornalista Davi Nasser explicava que o silêncio dos
generais até então não era anestesia, era vigília: “Sabíamos todos que estávamos
na lista negra […] que se eles consumassem seus planos, seríamos mortos. Sobre
os democratas brasileiros não pairava a mais leve esperança, se vencidos. Uma
razzia de sangue, vermelha como eles, atravessaria o Brasil de ponta a ponta,
liquidando os últimos soldados da democracia e os últimos paisanos da
liberdade.”
E teve gente com medo também. Jandira Gualberto dos Reis o vivenciou e
narra em seu testemunho: Em 1964 eu tinha apenas 8 anos, e toda a lembrança
que tenho da ditadura, do início dela, pelo menos, era de muito medo.
Morávamos eu, minhas três irmãs, meu irmão, meu pai e minha mãe numa casa
simples de um bairro da Baixada Fluminense. Eu era a caçula dos quatro filhos.
Lembro-me do toque de recolher, dos saques aos supermercados e de meu pai
chegando em casa com o nariz sangrando ao tentar pegar uma barra de sabão
português num desses saques. Minha mãe brigou com ele dizendo: “Precisamos
de comida, e você me chega com uma barra de sabão!” Meu pai se justificava,
dizendo que não sabia fazer aquilo. Eu ouvia e observava tudo com muito medo.
O medo não estava apenas em mim; estava em todo lugar.
A metralhadora nas mãos do governador.
O Cruzeiro, número extra, p. 25, 10 de abril de 1964.
ARQUIVO O Cruzeiro/EM/D.A. PRESS.
A direita guerrilheira.
Última Hora, p. 1, 1º de abril de 1964.
ARQUIVO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO [PERIÓDICOS]
classe média brasileira não era anticomunista apenas pelo que lia e ouvia
Como? Publicou artigos nos principais jornais do país; produziu uma série de
catorze filmes de “doutrinação democrática”, apresentados em toda parte;
financiou cursos, seminários, conferências públicas; publicou e distribuiu
inúmeros livros, folhetos e panfletos anticomunistas. Também atuou no
financiamento de outras entidades contrárias ao governo Goulart, tais como os
círculos operários, carioca e paulista, a Confederação Brasileira de
Trabalhadores Cristãos, a Campanha da Mulher pela Democracia (Camde) do
Rio, a União Cívica Feminina de São Paulo, o Instituto Universitário do Livro e
o Movimento Universitário de Desfavelamento. O Ipes-RJ auxiliava também a
Associação de Diplomados da Escola Superior de Guerra. Juntou-se a ele o
Instituto Brasileiro de Ação Democrática (Ibad), com a mesma finalidade:
fragilizar o populismo e combater o comunismo. Durou pouco, foi extinto em
1963.
Com efeito, a participação do Ipes na derrubada do governo Goulart se valeu
de intensa propaganda, além da atuação direta de muitos de seus membros. O
reconhecimento dos seus préstimos pelo regime militar ocorreu em 7 de
novembro de 1966, quando foi declarado “órgão de utilidade pública” por
decreto presidencial. O Ipes paulista foi completamente desativado em 1970, ao
passo que o do Rio encerrou suas atividades em março de 1972. Mas, enquanto
funcionou, as áreas-alvo para sua doutrinação específica e pressão política direta
eram os sindicatos, o movimento estudantil, a classe camponesa, as camadas
sociais intermediárias, a hierarquia da Igreja, o legislativo e as Forças Armadas –
informa René Armand Dreyfus, que estudou profundamente o Ipes. “A
infiltração comunista”, seguida do temor de uma intervenção, foi o principal
motivo que justificaria a ação do Ipes a partir de 1961. “Escritores, ensaístas,
personalidades literárias e outros intelectuais emprestavam seu prestígio,
escrevendo e assinando, eles próprios, artigos produzidos nas ‘estufas políticas e
ideológicas’ do complexo Ipes-Ibad”, explica o historiador e cientista político. O
instituto também canalizava o apoio de algumas das maiores companhias
internacionais de publicidade e propaganda, criando assim uma extraordinária
equipe para manipulação da opinião pública.
Os maiores e mais importantes jornais, rádios e redes de televisão do país
estavam sincronizados com os objetivos do Ipes e recebiam, gratuitamente,
remessas de material noticioso para divulgar. Era assim com o grupo Diários
Associados – poderosa rede de jornais, rádio e televisão de Assis Chateaubriand,
por intermédio de Edmundo Monteiro, seu diretor-geral e líder do Ipes; com a
Folha de S.Paulo, grupo de Octávio Frias de Oliveira, associado do Ipes; com o
Estado de S. Paulo e o Jornal da Tarde, do grupo Mesquita, ligado ao Ipes, que
também era dono da prestigiosa Rádio Eldorado de São Paulo; e com O Globo,
das organizações Globo, do grupo Roberto Marinho, que também detinha o
controle da influente Rádio Globo, de alcance nacional. Eram também criadas
em O Globo notícias sem atribuição de fonte ou indicação de pagamento,
reproduzidas como factuais.
No campo editorial, o Ipes contava com uma estrutura completa para editar,
publicar, traduzir, distribuir e financiar livros, livretes, revistas e folhetos. A
qualidade das publicações acompanhava a qualidade do público ao qual se
dirigiam. Para atingir pessoas simples, papel de má qualidade; material
sofisticado, só quando se tratava de um público seleto. Multiplicavam-se desde
publicações sensacionalistas e vulgares até a prosa acadêmica “séria”.
Segundo Dreyfus, algumas das publicações eram basicamente factuais e
continham informação cuidadosamente selecionada à qual se adicionava certa
“torção”. Já outros trabalhos eram mentiras declaradas ou ficção. Um dos
instrumentos da guerra psicológica era a publicação regular de O Gorila,
distribuído dentro das Forças Armadas. O sistema comunista era ali apresentado
como fonte de “assassinatos em massa, abolição da dignidade, campos de
trabalho forçado e rejeição de toda a noção de liberdade e fraternidade” –
informação que, depois da publicação de livros de sobreviventes dos gulags,
como Varlam Chalámov ou Alexander Soljenítsin, mostrou-se assustadoramente
verdadeira na análise do comunismo de Stalin. Quem era o comunista? “Ele é
aparentemente inofensivo… Nunca se trai, sempre trairá outros. Ele fala de paz e
amor fraternal.” “Ele será o seu mais querido amigo, o mais sincero, o mais
leal… até o dia em que ele o assassinará pelas costas, friamente… Eles matam
frades, violam freiras, destroem igrejas.” Procurava-se também moldar opiniões
dentro das Forças Armadas, infundindo o senso de iminente destruição da
“hierarquia, instituição e da nação” e estimulando uma reação quase histérica das
classes médias, que, por sua vez, fortaleciam a radicalização militar para a
intervenção.
Mas seriam o Ipes ou o Ibad capazes de provocar, sozinhos, o golpe ou a
revolução? Aarão Reis responde que não. A frente social que se uniu contra
Goulart era ampla e heterogênea. E a classe média não recebia passivamente as
mensagens que emanavam de ambas as instituições. Protagonista do evento em
curso, ela não queria um processo radical de redistribuição de renda, que afetaria
posições e privilégios já consolidados. Ela era igualmente desatenta à desigual e
crescente distribuição de renda. “Farinha pouca, meu pirão primeiro”, dizia o
ditado popular. Para a classe média, os militares eram bem-vindos para restaurar
a ordem e a segurança de seus lares e bens. Tal sentimento permitiria ao general
Carlos de Meira Mattos, em entrevista ao CPDOC, afirmar com segurança que
“havia muito civil conspirando [para tirar Jango]. Porque, quando irrompeu 64,
as organizações civis, federação das indústrias, federação de comércio, de
agricultura, ostensiva ou veladamente apoiavam […] Era o apoio das maiorias
naquela época”.
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso analisou o ambiente da época:
Que poderia ter feito o Brasil? Por um lado, é difícil retrospectivamente argumentar a favor de Jânio ou
de Goulart. Ambos transformaram a Presidência numa catástrofe. Provocaram abertamente os setores
mais poderosos da sociedade brasileira – Jânio com seu esdrúxulo flerte com o comunismo, Goulart
com seus planos de reforma agrária –, ao mesmo tempo fazendo muito pouco para ajudar os pobres. A
inflação disparou e os investimentos despencaram. Dessa perspectiva, o argumento a favor da
intervenção militar parecia até racional. Mas a história mostrou que os militares estavam tão excitados
que oscilariam quase tão radicalmente para a direita quanto Goulart foi para a esquerda, posto que este
nunca foi um radical, muito menos de esquerda.
Broches de espadas.
COLEÇÃO PARTICULAR.
COLEÇÃO PARTICULAR.
Jovens militantes.
Prisão de estudantes, Rio de Janeiro, 1968.
ARQUIVO NACIONAL [FUNDO CORREIO DA MANHÃ].
Música censurada.
Parecer de 12 de abril de 1973.
ARQUIVO NACIONAL [SERVIÇO DE CENSURA DE DIVERSÕES PÚBLICAS].
A Bossa Nova tinha ficado velha, e as melosas músicas dos Beatles deram
lugar ao rock progressivo que embalava os sonhos lisérgicos. O cabelo comprido
e a nudez dos hippies enchiam as páginas quando da realização dos grandes
concertos de música, ao ar livre como o da ilha de Wight, na Inglaterra, ou o de
Woodstock e Monterey, nos EUA. Os protestos contra a Guerra do Vietnã deram
origem à música de protesto. Ouvia-se Bob Dylan, Joan Baez e Peter, Paul e
Mary, mais para dançar do que para protestar. E um novo som chegava de Minas
Gerais. Não mais o sino das igrejas ou a lagarta dos tanques, mas, o feito no
Clube da Esquina por Milton Nascimento e os irmãos Borges. Quase ao mesmo
tempo, a TV Record trouxe para as telas o programa Jovem Guarda. Sua estreia,
em 1965, colocou em cena Roberto Carlos, Erasmo Carlos e Wanderléa, que
deram visibilidade a uma faixa geracional que antes passava quase despercebida:
os adolescentes.
Dois anos mais tarde, os membros da Jovem Guarda já concorriam
amigavelmente com o Movimento Tropicália, que trouxe da Bahia Caetano
Veloso e Gilberto Gil, além de Os Mutantes de São Paulo. Vozes e tendências
musicais se confrontavam nos Festivais da Canção, onde tentavam responder à
repressão e à censura da ditadura, sem pegar em armas. E, nas ondas de rádio, na
venda de discos, todos competiam com os Jackson Five, The Doors ou os
Rolling Stones: “I Can’t Get No Satisfaction” era o hino da geração! Se a
denúncia dos valores conservadores e o movimento de “contracultura” criaram
um sentimento de descontrole social, fortalecendo a sensação de insegurança e
dando, aos militares no poder, motivos adicionais para endurecer posições, a
chegada da pílula anticoncepcional e os “baseados” passaram a convidar os
jovens a outras aventuras, menos arriscadas. Para muitos, o sonho da guerrilha
deu lugar a uma rebeldia difusa, contra os valores parentais. Os “entorpecentes”,
como se dizia na época, começaram a se tornar populares na classe média, e a
sociedade conheceria uma nova forma de ação armada. Só que, agora, liderada
por traficantes.
1 | Boris Leonidovitch Pasternak, romancista e poeta russo, crítico do regime comunista, autor de Doutor
Jivago, recebeu o Prêmio Nobel em 1958, que lhe foi proibido.
8. REPRESSÃO À “GUERRA SUJA”
oje, o que mais chama atenção é o fato de ditadura e tortura terem se tornado
sinônimos. A imprensa falada e escrita, documentários e filmes, assim como a
“memória da resistência”, não deixam esquecer o que houve nos porões. A
Comissão Nacional da Verdade – voltada para a investigação de
Plano de sequestro.
Movimento Revolucionário Oito de Outubro (MR-8), Rio de Janeiro, 1969.
ARQUIVO PÚBLICO MINEIRO.
Segundo Alves, Castelo não era responsável pelas torturas, mas seria por
deixar os torturadores impunes. Ao voltar ao Rio, em setembro de 1964, listou
39 nomes de torturadores com sua localização. “A honra do Exército foi
maculada por um grupo de sádicos. Punir criminosos não é vergonha, é dever.”
Preocupado em manter a aura de legalidade de seu governo, Castelo mandou
Geisel investigar os casos. Nenhum torturador foi punido, mas o número de
denúncias caiu de 203, em 1964, para 50, em 1967. Todos os militares eram
monstros torturadores? Não. Houve, sim, bárbaros, canalhas, perversos. Mas,
como já sublinhou Celina d’Araújo, as Forças Armadas não podem ser reduzidas
a sinônimo de tortura.
A reação à “guerra suja” prosseguiu. Já depois do AI-5, em 1968, a tortura se
tornou um instrumento de interrogatório sistemático, com recursos, pessoal,
instrumentos próprios. Isso começou com a Oban, montada em São Paulo em
meados de 1969, e se generalizou pelo país graças aos DOI-Codi. Centros de
tortura também mantinham médicos para reduzir danos físicos perceptíveis,
avaliar a capacidade dos presos e os efeitos de cada método – informa o
historiador Maurício Horta. A apostila sobre “Interrogatório”, do CIE,
reconhecia a necessidade de “métodos de interrogatório que, legalmente,
constituem violência”. Se o prisioneiro fosse apresentado ao tribunal, porém,
deveria “ser tratado de forma a não apresentar evidências de ter sofrido coação
em sua confissão”. O manual considerava a tortura “ineficiente”. Nem o general
Adyr Fiúza de Castro, fundador do CIE, concordava, mas relativizava: “Não
admito a tortura por sadismo ou vingança. Para ter informações, acho válida.”
Em entrevista concedida a Celina d’Araújo e Gláucio Soares, o general Fiúza
de Castro conta:
Nós tínhamos gente infiltrada no movimento estudantil, nos sindicatos, tínhamos escuta telefônica, e
sabíamos que a tempestade estava se aproximando […] Nesse período de 67 a 69 em que estive no CIE,
nós verificamos que se estava organizando a luta armada por esses diferentes grupos. Através de nossos
infiltrados, dos nossos informantes, e pela escuta telefônica, nós sabíamos que eles estavam tramando
coisas realmente violentas, cujo início foi o sequestro do embaixador americano. Antes, já havíamos
tido vários assaltos a bancos. […] Quando houve o rapto do embaixador americano, no dia seguinte,
mercê de informações avulsas, anônimas às vezes, e de trabalho de pesquisa, nós já sabíamos quem
tinha raptado. Era o grupo do Gabeira. […] e por telefonemas de uma moça que morava em frente à
casa onde eles estavam abrigados, eu mandei fazer o reconhecimento do local. […] (Essa pessoa que
denunciou era uma informante ou apenas vizinha?) Era vizinha. Nessa hora, chovem informações. É
uma coisa tremenda. E temos justamente que selecionar. As que parecem ter alguma veracidade, vamos
investigar. Mas chegam centenas.
Sobre a tortura e o papel de Frota, o general Meira Mattos não hesitou e disse
também a Celina d’Araújo e Gláucio Soares: “O general Frota, quando foi
comandante do I Exército, preocupou-se muito com esse problema [prática de
tortura]. De manhã, a primeira coisa que ele fazia era correr os locais onde havia
presos políticos. Visitava todos os presos políticos e pedia que lhe dissessem se
tinham sofrido alguma coisa. Mas havia comandantes que entregavam
completamente essa tarefa a estruturas de menor hierarquia, não iam ver e não
sabiam o que se passava.”
Aula sobre terrorismo.
Conferência na Escola Superior de Guerra, Rio de Janeiro, 1971.
ARQUIVO NACIONAL [FUNDO AGÊNCIA NACIONAL]
Pichação.
Manifestação no Rio de Janeiro, 1968.
ARQUIVO NACIONAL [FUNDO CORREIO DA MANHÃ].
Carimbo da polícia política.
ARQUIVO NACIONAL [DIVISÃO DE SEGURANÇA E INFORMAÇÕES DO MINISTÉRIO DA
JUSTIÇA].
A taça é nossa!
Carlos Alberto Torres segurando a Taça Jules Rimet, Última Hora, 1970.
ARQUIVO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO [ICONOGRAFIA].
o início dos anos 1970, embalado pela vitória da Arena, partido que
Meu pai trabalhava como operário na construção de estradas de rodagem e as obras estavam
“bombando”. Dentro de três anos meu pai conseguiu comprar uma casa própria (mais nova e melhor
localizada que a primeira, na mesma rua, próxima da via onde circulavam os ônibus), adquiriu
geladeira, uma vitrola e, depois, uma televisão. Foi uma mudança enorme. Assistimos ao Brasil ser
tricampeão na Copa do Mundo de 1970. Por essa época, o número de aparelhos de TV e de geladeiras
na redondeza já havia aumentado muito, talvez triplicado. […] Na minha lembrança, os políticos eram
mais confiáveis. Os governantes eram elogiados. […] Lembro que se falava bem do presidente Castelo
Branco e sua morte foi muito comentada. Meu pai elogiava “os militares”, porque haviam colocado
ordem no país. […] a segunda metade da década de 1960 foi muito boa. Foi uma época feliz: de
pobreza, mas sem privações; sem luxo nem sofisticação, mas se tinha o necessário, que funcionava bem.
As escolas eram simples, mas boas. As professoras não eram ricas, mas eram admiradas e respeitadas.
Havia disciplina. Os hospitais eram modestos, mas atendiam a contento. As coisas funcionavam.
Éramos bem mais pobres, mas muito mais nobres.
Geisel, no entanto, não hesitou: não só queria garantir seu sucessor, como
queria também garantir um quadro institucional que, depois da abertura,
resistisse a qualquer hipótese de caos. Em 1976, a Lei Falcão, assim chamada em
alusão ao ministro da Justiça da época, proibiu programas televisivos, debates e
palestras em torno de críticas ao regime. Como o MDB resistia às reformas
propostas, o presidente promulgou, em 1977, o “pacote de abril”, sob a proteção
do AI-5. “Um surto ditatorial para garantir a restauração democrática”, explica
Aarão Reis. A candidatura alternativa de Frota foi detonada quando Geisel
anunciou formalmente seu sucessor: João Baptista Figueiredo, ex-chefe do SNI e
da Casa Militar. Geisel aposentou os atos institucionais e a censura política,
assim como os aparelhos de repressão. A opinião pública, porém, derivava para a
oposição num quadro econômico desanimador. Mesmo os segmentos
conservadores criticavam o regime. A transição despontava em meio a
indefinições.
Atos ditatoriais deram meios de a Arena manter a maioria no Congresso,
apesar da derrota nas urnas. Nasciam os senadores “biônicos” e se oferecia uma
representação maior aos conservadores estados do Norte e do Nordeste. Graças a
essa engenharia, Geisel se manteve no poder e garantiu a sucessão na figura do
general Figueiredo, empossado em 1979. Era o início do fim da ditadura. Como
bem resume Aarão Reis, “já não havia ditadura, mas ainda não existia uma
democracia”.
10. EM TRANSIÇÃO…
O presidente Figueiredo.
Foto de João Baptista de Oliveira Figueiredo, chefe do Serviço Nacional de Informações (SNI), 1974.
ARQUIVO NACIONAL [FUNDO AGÊNCIA NACIONAL].
Por essa época, comecei a frequentar a universidade e a participar de diretórios acadêmicos. Com o
sucesso da primeira grande greve do ABC, logo surgiu uma greve de motoristas de ônibus em Fortaleza, e
os estudantes universitários começaram a organizar passeatas. Participei de algumas, mas logo percebi que
meu negócio era estudar mesmo. A coisa estava feia lá em casa. Eu tinha que correr atrás de algum trocado
para, pelo menos, me sustentar.
Para manter uma boa imagem pública, Figueiredo aparecia praticando esportes: ginástica e equitação.
Sua meta era fazer do Brasil uma democracia, promover a abertura política. As mudanças eram tão rápidas
que meu pai, ao ver revistas de mulheres despidas expostas na bancas, dizia que estavam fazendo não uma
“abertura”, mas um “arreganhamento”. Negociou-se a anistia, e vários exilados retornaram ao Brasil. Criou-
se o pluripartidarismo: os antigos partidos Arena e MDB deram origem a várias outras legendas. Mas a
dívida externa, os juros, os preços do petróleo, a inflação eram o terror do cidadão comum. A vida não
estava fácil.
P
normal, mas atualmente percebo que foi melhor do que poderíamos viver hoje. Tínhamos uma
situação confortável, mesmo com os poucos recursos de meu pai, carpinteiro, e de minha mãe,
faxineira. Morávamos numa casa popular nos arredores da cidade do Rio Grande. Eu e minhas duas
irmãs estudamos numa escola particular e católica, dos padres Salesianos.
Em casa, não se ouviam comentários sobre o governo ou sobre a situação do país. Não conversávamos
sobre isso, tampouco na escola. Fui dar-me conta sobre o governo que tínhamos quando prestei o serviço
militar inicial obrigatório. Aí, sim, percebi. Mas, aos meus ouvidos e olhos, parecia um governo como
qualquer outro. Tínhamos liberdade e segurança para transitar pelas ruas. Saíamos para festas e escolas em
completa normalidade. Em minha cidade, Rio Grande, tudo era normal. Cresci assim.
Rogerio Liberato nos dá um depoimento que retrata que sua família não
participava muito dos eventos políticos públicos, e que a forma pela qual
participavam era por meio dos noticiários. “Na morte de Tancredo Neves, eu
estava com 17 anos, mas me lembro do noticiário, do cortejo fúnebre e, logo
depois, das primeiras identificações de Tancredo com Tiradentes.”
O ex-presidente Figueiredo, que não queria o mineiro como substituto, deve
ter se arrependido de tê-lo, premonitoriamente, apelidado de Tancredo Never!
Quanto ao novo presidente, opina Aarão Reis: “Mais do que qualquer outro,
Sarney explicitou, naquele momento, e mais uma vez, a importância decisiva da
migração política de ex-adeptos da ditadura para posições favoráveis à
restauração democrática.” Propostas mais radicais, como a de uma reforma
agrária extrema, foram enquadradas nas relações de conciliação tramadas por
Tancredo, que não queria que o novo governo fosse de confronto ou
justiçamento com o anterior.
O primeiro desafio de Sarney era “resgatar as esperanças”. Sua estratégia foi
legitimar-se por gestos políticos emblemáticos: revestiu de dignidade o retorno
das Forças Armadas aos quartéis; reconheceu os partidos políticos na
clandestinidade e recebeu líderes de esquerda, como João Amazonas e Giocondo
Dias; autorizou a liberdade de expressão e da imprensa; aos sindicatos, ofereceu
a liberdade de manifestação; convocou eleições e convocou a Constituinte.
Retomou a ideia de uma política externa independente, abrindo o diálogo com a
América Latina, voltando-se para a Argentina. Na ação administrativa, abriu
espaço para as questões até então marginalizadas: a reforma agrária, a cultura, a
política urbana, o meio ambiente; avançou na desburocratização, criou no
Ministério da Fazenda a Secretaria do Tesouro Nacional, e implementou o Siafi,
um sistema contábil integrado para controle e execução do orçamento da União.
Porém, em 1985, o combate econômico encontrou seu desafio na inflação e
na recessão econômica herdadas do governo militar. A população tinha
expectativas de transformação da economia que as políticas tradicionais não
solucionavam. Segundo Renato Venancio, o novo presidente deu início a uma
política de tentativa de contenção da inflação – que em 1989 chegou a atingir
índice anual de 1.000%. Os planos econômicos se sucederam. Alguns atendendo
a objetivos meramente eleitorais, e acirrando ainda mais o processo
inflacionário. Em 1986, o governo lançou o Plano Cruzado, que congelava
preços e salários e inventava uma nova moeda: o cruzado. Os resultados
imediatos foram de otimismo, sobretudo nas camadas populares, entusiasmadas
com seu poder aquisitivo subitamente elevado, o que revelou o duplo caráter do
processo inflacionário: confiscador dos salários dos pobres e concentrador da
renda nacional nas mãos dos ricos. A frustração em relação ao presidente Sarney
se estendeu ao Congresso.
No plano econômico, porém, apesar da inflação, em geral acompanhada de
correção monetária que evitava a corrosão dos salários, o governo Sarney
alcançou resultados relevantes. A própria inflação, dolarizada, teve uma média
anual de 17,3%, segundo estudo da Consultoria Tendências. O Brasil teve o
terceiro saldo exportador no mundo. Os resultados de balança de serviços,
balança comercial e transações correntes só vieram a ser superados no governo
Lula. A dívida externa caiu de 54% para 28% do PIB. O déficit primário de
2,58% do PIB, em 1984, foi substituído por um superávit de 0,8% do PIB em
1989. O Brasil passou a ser a sétima economia mundial. O PIB, medido em
dólares (variação cambial), cresceu 119%. O PIB per capita cresceu 99%. A
média do índice de desemprego foi de 3,89% a 2,16%, durante o Plano Cruzado,
e a 2,36% em fins de 1989.
A Constituição de 1988.
Capa da Constituição da República Federativa do Brasil, 1988.
COLEÇÃO PARTICULAR.
O Plano Real.
COLEÇÃO PARTICULAR.
Em 1993, já se discutia abertamente o processo sucessório. Lula liderava as
pesquisas de voto. Inicialmente, imaginava-se que seu concorrente seria Paulo
Maluf, recém-eleito para a Prefeitura de São Paulo. Contudo, em agosto daquele
ano, teve início um novo plano econômico. Ao contrário do precedente, que,
como se dizia na época, tentava “matar o tigre da inflação com um único tiro”, o
Plano Real foi concebido como um processo de estabilização a ser implantado
aos poucos. A inflação – contida graças à política cambial ancorada no dólar e à
redução das emissões monetárias – começava finalmente a ceder. Fernando
Henrique Cardoso, então ministro da Fazenda, procurou capitalizar para si os
dividendos da vitória. Em março de 1994, como candidato do PSDB, aliou-se ao
PFL e preparou-se para receber um apoio discreto do antigo PDS, então sob a
sigla PPB.
As transformações ocorridas nos anos 1990 esvaziaram em boa medida o
discurso anticomunista. Imagens do muro de Berlim sendo desmantelado a
golpes de picaretas por jovens eufóricos e o desmonte da União Soviética, com a
substituição do modelo socialista pela abertura de mercados – que fez oligarcas
mafiosos se tornarem milionários –, são exemplos desse momento. O regime,
que antes mobilizava despesas militares exageradas, não mobilizava mais nem
adeptos, nem armas. Enterrado numa economia estatista e ineficiente, foi
fulminado pela tentativa de se autorreformar, como explicou Aarão Reis. Entre
nós, o PCB, finalmente legalizado, abandonou a bandeira comunista e aprovou,
em 1992, sua autodissolução, formando o Partido Popular Socialista, PPS,
agremiação social-democrata.
Fernando Henrique Cardoso fez do prosseguimento do Plano Real, da
eficiência administrativa e da reforma do Estado sua plataforma, vencendo as
eleições em 1994. Menos de três anos mais tarde, o Congresso aprovou o
dispositivo de reeleição. O presidente em exercício saiu vitorioso. Durante oito
anos, foram implementados programas voltados para a internacionalização da
economia, a privatização de estatais, a desregulamentação de mercados e o
controle de gastos públicos. Incentivos de várias naturezas foram postos em
prática para atrair investimentos estrangeiros, de longo e curto prazo, ao mesmo
tempo que, para manter a estabilidade econômica, o país entrava em nova espiral
de endividamento externo e de desemprego crônico. Definida genericamente
como neoliberal, tal política gerou controvérsias e críticas. Mas, em 1999,
nuvens escuras se avolumavam no céu novamente. No dia 24 de janeiro daquele
ano, Affonso Romano de Sant’Anna gravava em seu diário: “Parece que estamos
nos anos 80 de novo. O real foi desvalorizado há cerca de dez dias, uma semana.
Câmbio flutuante. Desvalorização chega a 40%. [Pedro] Malan foi correndo para
os EUA. Gustavo Franco demitiu-se do Banco Central. O caos do governo faz
tudo despencar […] Fernando Henrique conseguiu o massacre dos aposentados.
Estarei, por exemplo, pagando 50/60% do meu salário, uns 4 mil […] Merda de
país.”
Contínuas crises externas abalavam o país, lembra o economista Rubem de
Freitas Novaes: a do México, em 1995, a asiática, entre 1997 e 1998, a russa,
entre 1998 e 1999, somadas a uma política cambial irrealista e ao
estrangulamento da balança de pagamentos. A expansão da carga tributária, que
atingiu 32,64% do PIB em 2002, junto aos racionamentos de energia, deram um
“apagão” no governo FHC. Alijado pela maioria da população, o PSDB foi
varrido do poder e deu lugar ao PT e a Luiz Inácio Lula da Silva, que, em 1º de
janeiro de 2003, assumiu a Presidência da República.
A eleição de Lula não foi a ascensão de um indivíduo, mas a de parte de uma
geração que se queria revolucionária nos anos 1960, e sobretudo de sindicalistas
e políticos que emergiram nas ondas sociais de 1978-1981. Quando isso se deu,
o mundo tinha mudado e, com ele, as perspectivas políticas dos partidos de
esquerda. No fim dos anos 1980, a mundialização ou globalização que se impôs
na década seguinte designou novas realidades. A constituição de um planeta
geofinanceiro talvez seja seu aspecto mais espetacular. Operações de fusão e
concentração nos setores de eletrônica, automotivo, comunicação e bancos
aceleraram o crescimento mundial, fazendo desabrochar os mercados
emergentes. A revolução desapareceu do foco dos partidos de esquerda, dando
lugar a propostas reformistas. Se o discurso do PT mencionava calote da dívida
interna e a adoção de medidas radicais, Lula comprometeu-se, numa “Carta ao
povo brasileiro”, com a estabilidade e o respeito aos contratos – sublinha
Novaes. Um tucano, o ex-presidente do Bank of Boston Henrique Meirelles, foi
escolhido para chefiar o Banco Central; da fina flor de jovens economistas de
tendência liberal saíram os quadros de apoio à gestão da economia. Procurou-se
diminuir os efeitos negativos da globalização, com a proteção do sistema
econômico nacional e por meio de programas sociais. Atualizado em 2004, o
próprio estatuto do PT inseriu essas questões. O resultado foi bom: investidores
estrangeiros se acalmaram, empresários retomaram a confiança e a conjuntura
internacional ajudou. O primeiro mandato de Lula foi exitoso.
Lula era a encarnação de Getúlio Vargas ou de João Goulart? Não. Esses
líderes avançaram na aprovação dos direitos sociais, mas ficaram marcados por
atitudes autoritárias ou por crises políticas. Lula negociou entre banqueiros e
operários, manteve o programa econômico do governo anterior, reconheceu os
contratos de vendas das empresas estatais ao capital internacional e concedeu
tímido aumento no salário mínimo, não incluindo perdas registradas nos anos
anteriores.
Outras mudanças chegaram junto. Um enorme conjunto de fatores propiciou
a ascensão e a mobilidade de classes no Brasil nos últimos anos. O principal foi
o equilíbrio da economia brasileira, conquistado após quase quinze anos de
muito trabalho e de políticas econômicas acertadas. O resultado foi a
possibilidade de trabalhadores ascenderem a uma renda mais garantida, mas
também de poderem trabalhá-la de forma mais produtiva. Por meio do crédito, a
renda multiplicou-se e promoveu uma mobilidade social importante, com classes
anteriormente marginalizadas passando a obter o acesso a bens. Além disso, os
gastos com políticas sociais, muito limitados no longo prazo, ajudaram a tirar da
linha da miséria uma significativa parcela da população. O Programa Bolsa
Escola foi implementado ainda sob outros vieses bem ao fim do governo FHC.
No governo Lula, houve a fusão de vários programas sociais já existentes com a
instituição do Programa Bolsa Família, que procurou atingir cerca de 50 milhões
de pessoas e retirou da linha da miséria cerca de 36 milhões de brasileiros.
Atingiu em parte os objetivos de mobilidade social. O beneficiário da bolsa
precisa cadastrar-se como “pobre”, perpetuando sua condição de “cidadão de
segunda classe”.
COLEÇÃO PARTICULAR.
O lazer da leitura.
Reportagem, Rio de Janeiro, s.d.
ARQUIVO NACIONAL [FUNDO CORREIO DA MANHÃ].
1. URBANIZAÇÃO E SEUS NOVOS
ATORES: condomínios, apartamentos,
favelas e shopping centers
idades: quantas mudanças e quanta gente! Elas se tornaram o lugar do fluxo e do
refluxo, do vai e vem. Buzinas, som de motores, ranger de máquinas escavando
os buracos do metrô. De uma hora para outra, tudo era possibilidade,
movimento, tudo era iminente. De milhares de lojas escapava a conversa
“Lata d’água na cabeça, lá vai Maria, lá vai Maria, sobe o morro e não se
cansa […], lá vai Maria, sonhando com a vida no asfalto, que acaba onde o
morro principia” não é apenas o refrão de samba entoado pela cantora Marlene;
é o retrato do abandono em que ficou a parte pobre da sociedade. E tal retrato
não era segredo. Matéria de muitas páginas na revista O Cruzeiro denunciava,
em outubro de 1964: “As estatísticas dizem: o Brasil já tem 80 milhões de
habitantes. Mas não informam com precisão quantos brasileiros não têm onde
morar ou moram em condições precárias […] para um em cada três brasileiros
não passa de ironia a expressão ‘lar, doce lar’.” A “miséria é bela” vista de longe
em pinturas, dizia a matéria referindo-se à “Cidade Flutuante” no rio Negro, em
Manaus. Na Guanabara, alertava, a conjuntura poderia assumir “proporções
catastróficas”. Pois os migrantes a caminho das cidades “seriam pessoas de
renda baixíssima, sem quaisquer condições de viver dignamente”. A equação
demografia e espaço urbano foi um problema que poucos governos resolveram.
Absorver a migração significou empurrar as pessoas para setores de serviços,
com baixos salários e baixa produtividade, aumentando sua indigência.
Resultado: entre 1960 e 2000, incharam as urbes. Nasciam cidades dentro de
cidades. Duas ou mais se agruparam em regiões metropolitanas, atraindo o
trabalho informal e, também, a cada vez que uma crise se anunciava,
engrossando o desemprego, a favela e o cortiço. Aumentavam assim os
indigentes urbanos. Criaram-se vocábulos para dar conta de sua presença:
vulneráveis, excluídos, novos pobres. Em São Paulo, em 1971, o prefeito José
Carlos Figueiredo Ferraz alertava: “São Paulo tem que parar!” Ninguém ouviu.
Tampouco se pensava em meio ambiente. Os tentáculos da grande cidade
avançavam por matas, cerrados, estrangulando mananciais, entupindo rios. Era
raro haver tratamento para dejetos e resíduos sólidos. E abundavam os eternos
lixões, denunciados pelo voo de urubus, pelo mau cheiro e pela presença de
gente em busca de restos de alimentos. E isso há séculos.
Além de se espraiar, as cidades se verticalizavam. Multiplicavam-se os
“espigões”, que foram até assunto de novela de Dias Gomes. Nas chamadas dos
capítulos, um retrato das transformações: “Cidade Grande! O homem vira
máquina, a máquina esmaga o homem. A engrenagem engolindo… O futuro
brotando… O Espigão!” No Rio de Janeiro, por exemplo, Copacabana, bairro
que até a década de 1930 reunia pequenas residências, dobrou-se ao processo.
Em 1946, foi aprovada a Planta de Zoneamento para o Bairro, criando as áreas
coletivas e limitando os gabaritos em até catorze pavimentos. A lei, contudo, não
impunha limites às formas das construções. Resultado? Edifícios com centenas
de pequenos apartamentos: os chamados conjugados, quitinetes ou quarto e sala.
A ocupação desordenada beneficiou a indústria imobiliária. Mais e mais
edifícios escalavam o céu, escondendo garagens no subsolo e pousando sobre
pilotis. Antes bairro de classe alta, Copacabana foi se democratizando. Atraída
pelo glamour da “Princesinha do Mar”, pelos empregos e serviços, a classe
média baixa afluía. A vida cultural também se desenvolvia ali. O famoso Beco
das Garrafas abrigou o nascimento da Bossa Nova. “Copacabana, princesinha do
mar”? Não, um paredão de cimento. Nos fundos, escalando os morros, as favelas
da Babilônia, Leme e Cantagalo.
Ambas as capitais, Rio de Janeiro e São Paulo, foram “o foco dos
investimentos do governo federal na década de 1960, para o desenvolvimento da
indústria, em detrimento das regiões Norte e Nordeste […] Eis porque as
populações dessas regiões migravam para os polos do Sudeste em caminhões
que recebiam improvisações precárias para passageiros, conhecidos como ‘paus
de arara’”, testemunhou o arquiteto Leopoldo Teixeira Leite.
Enquanto verticalização e inchaço aumentavam, nos escritórios de
engenharia e arquitetura se discutiam as concepções urbanas, modernistas e
funcionalistas, resultado da construção de Brasília. Conceitos como eficiência,
ciência e técnica substituíam os de melhoramentos e embelezamento, aplicados
na República Velha. A regra era seguir os ditames de Le Corbusier, inspirador de
Oscar Niemeyer, embora o segundo tenha preferido as linhas curvas tropicais às
retas europeias: “É preciso criar o estado de espírito da série. O estado de
espírito de residir em casas em série. O estado de espírito de conceber casas em
série!”– preconizava o arquiteto suíço.
E o encarregado de fazê-lo seria o Estado, agente responsável pela regulação
e disciplinamento do espaço. As populações pobres contariam com o poder
público para morar. Tais casas em série nasceriam dos projetos do Banco
Nacional de Habitação (BNH), criado em 1964, destinado a promover a
construção e a aquisição da casa própria pelas classes de menor renda, bem
como a ampliar as oportunidades de emprego e dinamizar o setor da construção
civil. Ele seria responsável pelo que a arquiteta Ermínia Maricato chamou de
“conjunto-depósito de gente”!
A agenda do BNH não podia ser mais necessária: coordenação da política
habitacional e do financiamento para o saneamento; difusão da propriedade
residencial, especialmente para as classes menos favorecidas; melhoria do
padrão habitacional e eliminação das favelas; redução do preço da habitação;
melhoria sanitária da população; estímulo à poupança privada e,
consequentemente, ao investimento; aumento de investimentos nas indústrias de
construção civil, de material de construção e de bens de consumo duráveis;
aumento da oferta de emprego, visando a absorver mão de obra ociosa não
especializada; criação de polos de desenvolvimento com a consequente melhoria
das condições de vida nas áreas rurais. Cinco anos depois de sua criação, os
descaminhos se acumulavam. De autarquia federal passou a empresa pública. A
má gestão de operações de crédito imobiliário e um escândalo com o Grupo
Delfim, agente de empréstimos extremamente endividado junto ao BNH, levou à
sua extinção em 1986.
A importância dos prédios no imaginário.
Arquitetura, prédios famosos, Brasil, c. 1965.
ARQUIVO NACIONAL [FUNDO CORREIO DA MANHÃ].
A cidade vertical.
Maquete do projeto do Grupo Maguefa, Jornal Movimento, Porto Alegre, c. 1970.
ARQUIVO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO [ICONOGRAFIA].
Lares desfeitos.
Expulsão dos moradores da Favela de Ramos, Rio de Janeiro, 1964.
ARQUIVO NACIONAL [FUNDO CORREIO DA MANHÃ].
Preocupações ecológicas.
Governador do Rio de Janeiro planta muda de pau-brasil, Rio de Janeiro, 1976.
ARQUIVO NACIONAL [FUNDO AGÊNCIA NACIONAL].
A novidade, contudo, foi o jardim à volta dos prédios. São Paulo, por
exemplo, foi mais feliz do que o Rio de Janeiro, pois obrigava os seus edifícios
públicos e residenciais a um recuo, incentivando a ornamentação das laterais e
das áreas sobre pilotis. Na antiga capital, somente com o plano de Lúcio Costa
para a Barra da Tijuca seria dada mais atenção ao paisagismo. Também em
Brasília houve a preocupação de erigir uma cidade-parque, erguida sobre um
bosque artificialmente plantado em local antes ocupado pelo cerrado. Se a
intenção deu certo na Superquadra do Plano Piloto, permitindo aos seus
privilegiados moradores todas as vantagens de uma vida saudável e rodeada de
verde, outras superquadras não mereceram projeto paisagístico.
A tendência na época era adotar pisos que integrassem os espaços internos e
a calçada. Arborização nas laterais do edifício, desenhos orgânicos ou
geométricos pelo chão cujo material é o mosaico português, a ardósia ou seixos,
bancos em concreto ou madeira e poucos elementos decorativos. No máximo,
painéis assinados por artistas de renome ou uma ou outra escultura moderna,
disposta casualmente, em meio às plantas, quebravam o padrão dos projetos.
Na maioria das vezes, porém, existiam apenas gramados e trechos
arborizados sem critério, diz Macedo. E ele critica:
Os espaços livres das centenas de conjuntos habitacionais nas cidades verticalizadas e espelhados pelas
grandes cidades brasileiras tornam-se paradigmas do fracasso de um ideal, o qual, por ter sido mal
interpretado […] justifica o aparecimento de espaços livres coletivos, generosos e superdimensionados.
Com o passar dos anos, a maioria desses espaços são lentamente ocupados pela população que
incorpora partes de suas áreas aos edifícios, construindo puxadinhos, andares inteiros, cercas, garagens,
depósitos, churrasqueiras, guaritas, pequenos jardins e áreas de recreação infantil. Muitas das áreas são
também ocupadas por novas edificações, as conhecidas invasões, as quais tomam o lugar de áreas
aparentemente devolutas […] Os conjuntos são construídos por todas as partes da cidade, especialmente
em subúrbios e áreas mais distantes. Os prédios, como modelos de papelão numa maquete, têm
construídos apenas os seus acessos pedestres, vias de circulação de automóveis, às vezes,
estacionamentos, teoricamente imersos em verdejantes gramados.
O brasileiro pôde optar por parcelar mais suas compras, sem a necessidade
de realizar estoques ou aquisições para períodos mensais ou quinzenais de
consumo. A partir de 1999, quando houve a desvalorização cambial e o aumento
das tarifas públicas, o consumo foi diretamente afetado pelas restrições de
crédito, em particular o consumo daqueles bens de maior valor unitário, cuja
demanda dependia de maior financiamento. Um exemplo clássico é o caso dos
eletrodomésticos, que, com o aumento dos juros, passaram a apresentar um
desempenho negativo. Entretanto, o setor de alimentos e bebidas teve uma
menor dependência de crédito e continuou a definir uma trajetória ascendente,
porém em ritmo mais lento.
O mercado de comidas congeladas foi o que mais cresceu no mundo de 1993
a 1998: cerca de 30%. De acordo com números da Perdigão, em 1997, o
crescimento da linha total de congelados e resfriados ficou em 190%, comparado
a 1994. Esse índice sobe 253% quando comparado com o ano de 93, segundo o
Instituto ACNielsen. O mercado de legumes e vegetais foi o que mais evoluiu no
segmento de congelados entre 1995 e 1997. As vendas de 1997 foram 272%
maiores que as de 1995 segundo dados da Perdigão. Em 1998, legumes e
vegetais já representavam 7% do volume total de congelados no país.
O setor de alimentos pré-prontos também cresceu demasiadamente em fins
da década considerada, devido ao aumento na demanda de refeições prontas por
parte dos consumidores. A área de congelados, desse modo, passou a apresentar
variedade e qualidade de produtos, com liderança nas vendas de lasanha em
1998. O mercado de salgadinhos chegou a crescer a uma taxa acima de 30% em
1995 e 1996, devido a uma invasão das grandes empresas no mercado de
salgadinhos congelados, entre coxinhas de frango, croquetes de carne, bolinhas
de presunto e queijo e de bacalhau, ideal para festas e complementos de pratos.
A polenta pré-frita era, ao lado da coxinha, o carro-chefe dos negócios da Friogel
em fins de 1998. No setor de massas, uma das categorias que mais cresceram foi
a de massas instantâneas, em nome da praticidade e rapidez no preparo da
refeição. Segundo números do Instituto ACNielsen, a massa instantânea saiu de
uma produção de 24,5 mil toneladas, em 1995, para 48 mil toneladas em 1999,
um aumento de 100% no volume. Já o consumo de sopas prontas, segundo
Nielsen, aumentou 171% entre 1994 e 1997. Em 1997, a produção nacional
atingiu mais de 137 milhões de litros, garantindo um faturamento ao setor de
US$137,3 milhões. Para suprir essa demanda, só a Knorr lançou 21 novos
produtos em 1998. O investimento no desenvolvimento de novas sopas e caldos
ultrapassou US$ 8 milhões na empresa.
A mesa via chegar não novidades nos pratos, mas a ciência da alimentação.
O prazer de comer se juntava com preocupações sobre a saúde e, sobretudo, a
forma física. Também em 1995, numa linha de 40 itens dietéticos, os adoçantes e
também o Diet Shake eram os recordistas em vendas. Só o setor de informática
crescia nesse mesmo ritmo, segundo estimativas de vários supermercadistas.
Segundo a Associação Brasileira da Indústria de Alimentos Dietéticos (Abiad), o
mercado para diet e light cresceu 200% entre 1995 e 2000, superando de longe a
indústria de alimentos convencionais, que evoluiu numa taxa de 5% ao ano. A
cada ano, essa indústria lançava duzentos produtos no mercado. Um mercado
promissor tanto para os agricultores quanto para os supermercados foi o
segmento dos alimentos orgânicos. O segmento cresceu aceleradamente. Foram
US$ 10 milhões em 1999, sendo metade da produção voltada para o mercado
externo. Em 2000, já eram registrados cerca de vinte novos agricultores
orgânicos por mês, sendo que quem produzia este tipo de alimento também
passou a conseguir preços melhores.
Especialistas chamam atenção para essa longa mudança: a transição
nutricional pela qual a sociedade teria passado é caracterizada por uma dieta
extremamente calórica, rica em açúcares e gorduras e insatisfatória quanto ao
aporte nutricional, revelando as consequências que uma alimentação sem
qualidade pode trazer do ponto de vista da saúde. O surgimento e/ou
agravamento de patologias como a obesidade, a desnutrição, as dislipidemias,
hipertensão, diabetes, cardiopatias, entre outras, além da diminuição da
qualidade de vida da população, estão intimamente ligados à alimentação do
indivíduo. Esclarecer o quanto o binômio urbanização/industrialização
influenciou e vem influenciando os hábitos alimentares dos brasileiros, bem
como apontar as suas possíveis consequências na saúde da população, são os
primeiros passos para a conscientização a respeito da importância de uma
alimentação saudável.
Porém, se cozinhar foi considerado um trabalho monótono, repetitivo, sem
charme nem inteligência por um tempo, no Novo Milênio se tornou chique!
Panela, coisa de mulher? Não mais. A palavra gastronomia, vulgarizada na
França no século XIX, invadiu o imaginário. São centenas de programas de TV,
concursos e revistas, além da internet, que, por meio de blogs e afins,
multiplicaram infinitamente o acesso a receitas e conselhos culinários. O
cozinheiro ou a cozinheira passaram a responder como chefs. Elevados ao nível
de celebridades, eles se tornaram a expressão de uma sociedade onde o artista na
cozinha é sinônimo de sucesso. Essas foram décadas em que, muito lentamente,
a prática de cozinhar deu lugar a conversar sobre cozinha!
ara os sociólogos, o lazer é a soma de práticas cujo número e variedade nunca foi
tão grande. Sobre ele, poderíamos fazer um catálogo: televisão, cinema, teatro,
praia, esporte, conversa na mesa do bar, viagens etc. E para cada forma de lazer,
E tinha peixe para todo mundo. Que o diga uma bancária entrevistada pelo
sociólogo Alcides Guzzi, identificada como Maria, sobre uma cidade do interior
de São Paulo: “Aí tinha domingo que a gente ia para o parque. Era perto […]
mas o meu pai pegava a varinha de pescar e a gente ia para a lagoa e lá ele
pescava… Pescava? Ficava lá e ele ficava lá, e a gente pegava amizade com a
família do lado direito, aí já começava, deixava a vara para lá, já ia correr no
meio das árvores, brincar de esconde-esconde, brincava de pega, sabe? E era
muito legal, ele chegava: ‘Vamos embora?’ ‘Vamos embora… Aí, pegou muito
peixe?’ ‘Oh, pegamos nada, não deu muito peixe.’”
As “rotas supersaturadas” dos fins de semana faziam multiplicar os
rendimentos das oficinas e postos de gasolina que cuidavam de abastecer e
colocar em bom estado os automóveis.
Aos domingos, segundo o humorista Jô Soares, as praias “tinham tanto
espaço quanto uma cabine telefônica para dois”! As 4 mil praias estendidas em
8.500 quilômetros da costa brasileira, de Uacá ao Chuí, recebiam gente aos
magotes. A pequena Ubatuba, em São Paulo, com 15 mil moradores, recebia nas
férias de verão 60 mil visitantes. E, como ela, Guarapari, no Espírito Santo;
Torres, no Rio Grande do Sul; Cabo Frio, no Rio de Janeiro; ou Matinhos no
Paraná. Para receber tal invasão de gente, punham-se a pintar muros e renovar
pousadas e hotéis. O comércio comemorava: sorvetes, cervejas, cangas e
biquínis eram vendidos aos milhões. A população dobrava e as ruas ficavam
intransitáveis. No Rio de Janeiro, em 1971, segundo a Veja, os turistas
estrangeiros de verão ainda eram poucos em comparação com os brasileiros: 15
mil, contra 450 mil! O Castelinho, um bar de gosto duvidoso, e a praia, na frente
da rua Montenegro e o Pier de Ipanema, eram os pontos de atração para mineiros
e paulistas. O “estrangeiro” tinha que dar provas de conhecer os códigos
ipanemenses: era considerado fora de moda falar de Sartre ou de Pasolini.
Artefatos básicos: cabelo comprido para homens e curto para mulheres, bermuda
colorida, prancha de surf e óleo de bronzear. Futebol em Ipanema era grotesco.
Só era praticado nas praias de Ramos, Flamengo e Barra da Tijuca. Ali a
“galera”, ou gente do subúrbio, protegia-se do sol com chapéus de palha,
mascava biscoito de polvilho, chupava laranjas e ouvia radinho de pilha.
A divisão social do litoral funcionou em vários estados. Em São Paulo, a
gentil Caraguatatuba ficou abandonada à “cafonália”. Os mais exigentes se
mudaram para Ubatuba, cinquenta quilômetros adiante e detentora de um campo
de aviação. Em toda a parte, era preciso vencer o labirinto de guarda-sóis,
toalhas e esteiras. A economia informal prosperava: abacaxis em rodelas,
pirulitos de caramelo, raspadinha e pinga, milho cozido, hot dogs, churros. O
cardápio matava todas as fomes. Já os mineiros que iam para Cabo Frio
preferiam levar comes e bebes: do lombo de porco à cerveja. E ao chegar a
Guarapari, ouviam: “Chegou a mineirada!” As praias do Nordeste continuavam
vazias: Porto de Galinhas, Timbaú, Genipabu. Não tinha graça frequentar
desertos de areias onde se cruzavam apenas casais de namorados e crianças com
suas mães. “Esse negócio de férias na praia é coisa de gente do Sul”, explicava,
na época, o baiano José Patrício Sobrinho, entrevistado por repórter da Veja.
Boliche: a diversão dos anos 1950 e 1960.
A chegada do fliperama.
Brinquedos eletrônicos, Rio de Janeiro, 1970.
ARQUIVO NACIONAL [FUNDO CORREIO DA MANHÃ].
Para quem não quisesse ir longe, o boliche, lazer em alta nos anos 1950 e
1960, foi destronado pelos fliperamas, que espocavam como pipoca nas esquinas
das cidades. A epidemia das diversões eletrônicas invadiu o Brasil. O jogador de
flipper tinha que ter mais de 18 anos e 50 centavos para comprar a ficha. Sorte
ou azar, cada um trazia o seu. Diante de painéis intensamente coloridos, era
preciso deslocar as bolas entre hastes brilhantes para ver quem fazia mais
pontos. Grande emoção!
Fascinadas pelos jogos eletrônicos, as crianças também abandonavam as ruas
e as cantigas de roda. O crescimento exponencial de prédios e carros pelas ruas
as empurrava para o sofá, onde as aguardava a TV e, primeiro, o básico e
simples Telejogo. Depois, os Atari e os preferidos: Mario Bros, Frogger, Enduro,
Pac Man e River Raid, heróis de novas brincadeiras. E, por fim, os
carinhosamente chamados “Nintendinhos”. Enfim, havia cada vez menos sol,
menos imaginação, menos exercício e menos saúde para a infância.
Adolescentes e adultos passavam a noite na discoteca e, depois, na
danceteria. O termo “danceteria” foi criado durante a ressaca da discoteca, lugar
onde se tocava música disco, já no fim dos anos 1970 e início dos anos 1980. Na
realidade, os dois termos têm uma correlação estreita. No início dos anos 1980, a
discoteca acabou agonizando, e os empresários envolvidos se endividaram e
começaram a sinalizar a necessidade de reciclagem. Foi então que a música
disco teve seu auge, em nível mundial. Nos anos 1980 e 1990, os espaços para
dançar saíram de fechadas áreas urbanas para ganhar o campo, o ar livre noturno
– e a denominação de rave também encontrou ligação estreita com os termos
danceteria e discoteca. Nos anos 1990, o rock ‘n’ roll perdeu um grande espaço
para a música pop. Na mesma época, a house music surgiu das cinzas da disco
music, popularizando a música eletrônica, um dos movimentos musicais que
mais cresceram no mundo.
A historiadora Vanessa Rodrigues esclarece que o gênero musical norte-
americano disco chegou ao Brasil entre os anos 1976 a 1979, e que o próprio
nome “disco” deriva da abreviação da palavra francesa discothèque: “Invenção
francesa de cerca de duas décadas […] compõe-se de som de todo volume,
decoração luxuosa […] luzes estonteantes e bolhas de sabão que se desprendem
do teto”, explicou à revista Veja em 1977.
Como se percebe, a batida dançante e a discothèque eram indissociáveis por
definição. Rodrigues explica:
A disco ganhou amplitude nas grandes cidades brasileiras através dos espaços de sociabilidades voltados
para a diversão através da dança. Mas as discotecas estavam centralizadas nas grandes cidades no país e,
somente com a telenovela Dancin’ Days, da Rede Globo de televisão (1978/1979), a disco se projetaria
nacionalmente. A discothèque incentivou as discussões relativas à liberalização do corpo e gerou
polêmica ao chocar-se com a engajada MPB no momento da abertura política. O debate acerca da
função social da arte atingiu os compositores que dialogavam com o ritmo dançante disco. A polêmica
recebeu o nome de “Patrulhas Ideológicas” e estabeleceu um impasse entre música para dançar e música
para pensar.
Os esportes…
Selo, s.d.
COLEÇÃO PARTICULAR.
O surf foi outra febre. O esporte que ensinava a ler o mar, a deslizar sobre
paredes de água que engoliam os praticantes. Seus avós seriam encontrados na
praia de Santos, quando três jovens paulistas confeccionaram pranchas de
madeira com moldes fornecidos por uma revista estrangeira. Nos anos 1950, no
Rio, pioneiros deslizaram sobre as chamadas “portas de igreja”. Três foram os
aspectos que se somaram para colocar o esporte no top do ranking nessas
décadas, explica o historiador Rafael Fortes: a adesão de jovens e crianças, os
meios de comunicação – especialmente a televisão, que passou a lhes dar espaço
nas novelas e seriados – e, graças ao crescimento econômico, o consumo em
massa de artefatos ligados à prática do esporte. Nascia, assim, um estilo de vida
e moda. O Jornal do Brasil, em abril de 1966, por exemplo, sublinhava: “A
moda surf foi praticamente lançada em grande estilo num concurso de fim de
semana. Tanto as moças quanto os rapazes exibiam um conjunto de cores, que
agora fazem parte do surf. Para o verão que vem, calções surf e camisas com
letreiros e desenhos de onda já estão garantidos… As meninas da geração surf
foram um sucesso absoluto. Coloridas e mais descontraídas que as de qualquer
outra geração, estavam em todas.”
Na cena nacional, as praias de Ipanema e do Arpoador, com seus
frequentadores assíduos, como as artistas Leila Diniz e Sonia Braga, e o mais
belo “garoto da praia”, Arduíno Colassanti, incentivavam a claque de leigos. A
eles sucederam os “surfistas ripongas”, egressos do movimento hippie com seu
cerimonial de “Recepção ao Pai Sol” e cheiro de maconha. E seus sucessores, a
“geração cocota”, com seus “gatos”, “gatas” e “feras”. As marcas de
diferenciação, lembra a revista Veja, tinham que ser evidentes: para eles, calças
de cós baixo, com boca estreita, cabelos longos e louros obtidos graças à
parafina. Para elas, “camisas americanas hang-ten, com dois pés estampados, e
nada de maquilagem! Para as cocotas, tudo que fosse americano era melhor”. As
ondas se sucederam e, sobre elas, os surfistas foram mudando de cara e de
hábitos. Hoje, mais associados ao consumo de sucos de cenoura e sanduíches de
pão preto e ricota, são os “atletas da natureza”. Fumo, zero. Só ar puro.
Pegavam-se ondas na Prainha e em Grumari, no Rio de Janeiro, em Maresias e
Ubatuba, em São Paulo, Matinhos, no Paraná, e Praia da Silveira e Imbituba, em
Santa Catarina. Para surfar no Nordeste, Fernando de Noronha.
Os esportes tomam o céu também.
Também nos anos 1970, surf e rock se deram as mãos. A duas horas do Rio,
o V Festival de Saquarema exibia Raul Seixas e Rita Lee na etapa final de
classificação para ir ao Havaí. Alojados em barracas ou dormindo sobre as
campas do cemitério, 35 mil jovens se sentiram num Woodstock à beira-mar.
Sobre as ondas também, outras práticas tiveram desenvolvimento desigual,
mas estiveram sempre presentes nas praias: windsurf, body-board e jacaré ou
bodysurf. No céu explodiam as cores das asas-deltas. Rampas para voo livre
eram construídas e cursos oferecidos por instrutores. Os jovens eram a
esmagadora maioria dos praticantes. Como diz Fortes, a juventude era encarada
como uma virtude. A ditadura, que erodia, era “velha”. Velho ou antigo tinha
valor negativo. Não por acaso surgiu a Nova República.
A aparição de jovens esportistas na TV, em horário nobre, consagrou os
esportes na natureza. Um exemplo foi o programa Armação Ilimitada, em que
dois surfistas, Kadu Moliterno e André di Biase, praticavam todos: pegavam
ondas, mergulhavam, escalavam montanhas. E tudo ao som de rock e no embalo
das histórias em quadrinhos. Em telas maiores, as do cinema, o filme Menino do
Rio, dirigido por Antonio Calmon, contava uma história de amor açucarada, mas
projetava sobretudo um estilo de vida: o herói de corpo dourado, praticante de
surf e voo livre, vivia próximo à natureza e tinha total despreocupação com bens
materiais. O Havaí – embalado pela música De repente, Califórnia, de Nelson
Motta na voz de Lulu Santos – era seu paraíso. Eles queriam ir para lá, éden de
todos os surfistas, lugar da onda perfeita!
Fortes lembra ainda que o surf se materializou não só no consumo de
atividades como shows ao ar livre e luaus, mas em estilos musicais como o
reggae e o surf music, em hábitos como a alimentação natural; na estética dos
cabelos louros; nos equipamentos e acessórios, de cordinhas para prancha a
adaptadores para transportar pranchas, bicicleta e roupas. Deslizava-se também
sobre o asfalto e seus obstáculos. Os anos de 1975 e 1977 foram os da explosão
do skate – um surf a seco. A revista Pop destinava-se aos praticantes dessa
modalidade, além de outras publicações: Jornal do Skate, Brasil Skate, Surf Sul
Esqueite, que trazia também matérias sobre surf e voo livre. Apesar de tudo
parecer tão novo, tão jovem, o olhar dos redatores sobre as “gatinhas” era velho:
presentes nas festas regadas à cerveja pipocavam nas fotos, não em cima das
pranchas, mas de biquíni na areia com destaque para nádegas e seios salientes.
Nos anos 1980, teve início a criação de associações de surf, locais e
estaduais. Circuitos e campeonatos enchiam as praias. Mas junto com o número
de participantes, aumentou o de observadores e de queixas: as praias estavam
intransitáveis. A fibra de vidro e o poliuretano potencializaram as manobras, e as
pranchas ganhavam pinturas mais chamativas. Na água, seu número excessivo
“atrapalhava” o esporte. Inaugurou-se, em resposta, o localismo. Pontos na areia
e praias só para surfistas.
A partir dos anos 1980, surfistas e skatistas começaram timidamente a se
profissionalizar. Faltava apoio estatal, mas a iniciativa privada ou o
autofinanciamento permitiam a alguns ganhar dinheiro em exibições ou eventos.
Houve até greve de atletas, num circuito brasileiro, exigindo melhor premiação.
Grandes redes de lojas de departamentos criaram marcas próprias estampando
pranchas, skates, ondas e asas-deltas em roupas, buscando a clientela jovem.
Nas quadras, novidades. Nos anos 1970, foi a vez do vôlei fazer uma
revolução. Tudo começou – explica o jornalista Milton Leite – com um
investimento muito forte nas categorias de base, não só na formação dos
jogadores, mas também na sua internacionalização, com presença constante em
campeonatos continentais e mundiais. Em 1978, a seleção brasileira masculina
sub-21 ficou em terceiro lugar no campeonato mundial. Em 1982, os atletas
venceram o campeonato mundial na Argentina e, em 1984, ganharam a medalha
de prata nos Jogos Olímpicos de Los Angeles. William, Montanaro, Renan,
Amauri e Xandó integravam a nossa “geração de prata”. Quatro anos depois, em
Seul, o vôlei brasileiro ficou em quarto lugar entre as grandes potências. E o
ouro chegou em Barcelona, 1992. As jogadoras também fizeram a diferença em
Atlanta em 1996 e em Sydney em 2000, quando conquistaram o bronze. A
televisão impulsionou as conquistas, congregando torcedores e entusiastas nas
quadras e na areia, com o vôlei de praia a partir de 2000. O litoral se encarregou
de suprir a modalidade de novos atletas.
Na veia da gente brasileira subsistia, porém, mais do que um esporte; uma
paixão: o futebol. Ao mesmo tempo jogo e espetáculo, ele colocava em cena não
só estrelas ou artistas solitários, mas equipes. Os estádios eram o lugar da
felicidade dos torcedores que acorriam para aplaudir o estranho balé. O
bicampeonato no Chile, ao som de “A taça do mundo é nossa Com brasileiro
não há quem possa Ê-êta esquadrão de ouro / É bom no samba, é bom no
couro”, deixara excelentes lembranças. O historiador Plínio Labriola Negreiros
recorda que, depois de vários sucessos, a seleção brasileira colocara o futebol
sul-americano na frente do europeu: quatro Copas a três. “O forte do Brasil não
era o futebol, era o homem”, gabava-se Nelson Rodrigues em crônica de Fatos
& Fotos. Mas na Copa da Inglaterra veio a reação europeia.
Negreiros sublinha que a derrota veio junto com o regime autoritário. A
desorganização imperou: após mais de quarenta jogadores pré-selecionados, o
time nacional chegou à Inglaterra sem uma equipe definida. Como resultado,
uma vitória contra a Bulgária e duas derrotas: Hungria e Portugal. Com a Copa
nas mãos dos donos da casa, o bicampeão mundial amargou um 11º lugar. De
mestres passamos a aprendizes, diz Guerreiro. E o técnico Zezé Moreira
arremata: “Os europeus, como é do conhecimento de todos, estão aplicando o
futebol-força e vêm obtendo excelentes resultados.”
Pelé, o futebol-arte.
Selo, 1970.
COLEÇÃO PARTICULAR.
Como bem diz Farias, com o fim das restrições, o Brasil pôde conhecer
novas campeãs, como as judocas Vânia Ishii e Edinanci Silva, a carateca Lucélia
de Carvalho, a maratonista Márcia Narloch e a saltadora Maureen Maggi, entre
tantas outras. Quanto ao futebol feminino, após um longo período de resistência
e perseguição, as meninas conquistaram a medalha de ouro nos Jogos Pan-
Americanos de Santo Domingo, em 2003, e a jogadora Marta Vieira da Silva foi
eleita pela Fifa a melhor do mundo em 2006 – feito que ela repetiria outras
vezes. Numa época em que o esporte era amador e a discriminação predominava,
as atletas pioneiras romperam com o modelo de conduta feminina tradicional,
que valorizava o casamento e a maternidade. Elas venceram todas as corridas de
obstáculos. Ao priorizar suas carreiras esportivas, lutaram pela afirmação de seus
direitos e pela afirmação de seus corpos.
A educação física.
Atletismo, 1971.
ARQUIVO NACIONAL [FUNDO CORREIO DA MANHÃ].
7. JOVENS, BELOS E SAUDÁVEIS:
DO CORPO “PECADO” AO CORPO
“PRAZER”
O culto ao corpo.
or falar em corpo, dividido entre servidão e liberdade, ele nunca teve tanta
visibilidade. Como bem disse o professor de medicina social Jurandir
A busca da beleza.
Estética, c. 1970.
ARQUIVO NACIONAL [FUNDO CORREIO DA MANHÃ].
A busca pela perfeição dos corpos, a corrida para o prazer que eles
proporcionavam tinha seu “lado B”. Era o stress ou estresse. Usada nos Estados
Unidos, em 1976, a palavra rapidamente chegou ao Brasil. No vocabulário
médico queria dizer “estado gerado pela percepção de estímulos que provocam
excitação emocional e, ao perturbarem a homeostasia, levam o organismo a
disparar um processo de adaptação caracterizado pelo aumento da secreção de
adrenalina, com várias consequências sistêmicas”. No dia a dia, se manifestava
por irritabilidade, nervosismo e desequilíbrio emocional, sensação de
esgotamento. Os psicólogos Júlio César Filgueiras e Maria Isabel Hippert
acrescentam que o conceito de estresse já era amplamente utilizado, chegando
mesmo a tornar-se parte do senso comum. Os meios de comunicação de massa
veiculavam-no de forma indiscriminada, o que favorecia certa confusão a
respeito do verdadeiro significado do termo. O estresse passou a ser responsável
por quase todos os males que afligissem as pessoas, principalmente em
decorrência da vida moderna. Cresceu, portanto, o número de terapêuticas e de
programas voltados para o controle do estresse. Muitos deles, carecendo de
embasamento aprofundado, enquanto outros eram desenvolvidos por
profissionais sérios e competentes. Além do interesse científico, cresceu também
o interesse econômico em torno do estresse, observado tanto na indústria
farmacêutica, produtora de numerosos produtos para combatê-lo, quanto nas
companhias de seguro, preocupadas com a saúde de seus segurados.
Novidade? Não. Em 1967, a revista O Cruzeiro já alertava para o “mal do
século”: a neurose. Os sintomas eram depressão, irritabilidade, insônia,
vertigens, dores de cabeça, medo vago. A cada dez habitantes da cidade grande,
quatro eram “neuróticos” graças à “pressão da vida moderna”. “A angústia era o
fenômeno básico” que caracterizava a “neurose”. Os remédios ministrados para
a “fadiga da vida moderna” se baseavam em tranquilizantes, fisioterapia e
sonoterapia! Ou, em casos graves, hipnose e psicanálise. À febre do corpo
saudável opunha-se o medo da doença, da degradação, da morte. Antes, as
pessoas se preocupavam com seus corpos quando estavam doentes. Na segunda
metade do século XX, as desconfianças diante do surgimento de enfermidades,
da degradação da idade e do envelhecimento se tornaram regra.
Vinte anos depois, o que mudou? Matéria especial da revista Veja, de 26 de
fevereiro de 1996, alertava: “À beira de um ataque de nervos – as pressões da
vida moderna deixam os brasileiros cada vez mais tensos e exaustos.” O repórter
Ernesto Bernardes explicava: “Milhares de brasileiros passam os dias duelando
com o stress: aprisionados em engarrafamentos, encarcerados em apartamentos
com fechaduras de segurança e angustiados em empregos que não sabem por
quanto tempo serão capazes de manter.” Uma foto em close do piloto de corrida
Rubinho Barrichello exemplificava: “Após a morte de Senna, insônia e dores
que não passam com massagem.”
A Organização Mundial de Saúde confirmava: era uma epidemia global! A
PUC de Campinas entrevistara 1.800 pessoas e confirmou: 32% eram
estressados. Os remédios Frontal e Lexotan eram campeões de venda. Até os
presidentes da República sofriam desse mal: José Sarney trazia o nariz vermelho
e empipocado quando tenso. Fernando Collor de Mello emagreceu tanto que
corria o boato de que sofria de aids. E Itamar Franco “tinha faniquitos” – diz a
reportagem. Na Prefeitura de São Paulo, um relatório da Secretaria de
Administração atestava que havia mais licenças concedidas por estresse do que
por acidentes de trabalho ou domésticos. E as explicações se sucediam: “Os
avanços da tecnologia no início do século haviam prometido facilitar a vida de
todos. Economistas previam que, na década de 80, os operários felizardos
trabalhariam apenas três horas por dia. Mas as invenções que prometiam um mar
de rosas, cobravam seu preço. O computador que emperrava em meio a uma
operação, fazia um homem civilizado enfurecer-se como um canibal. A vida
tornou-se acelerada demais para o ritmo do corpo humano.” Uma tabela
elencava os desdobramentos da moléstia em vários órgãos: no cérebro, nos
maxilares, nas glândulas suprarrenais, no coração, nos pulmões, na pele, no
estômago, nas mãos, nos órgãos sexuais e, por fim, nas articulações.
As soluções estariam sempre associadas ao bem-estar do corpo, confirmando
sua preeminência nas décadas que corriam: descarregar nos esportes, tirar alguns
dias de férias num SPA, deixar as preocupações na gaveta do escritório, viajar
sempre que possível e jantar fora, saunas, massagens, “caminhar em parques é
uma grande ideia”, remédios só no período prescrito e, se nada desse certo,
“tratamentos de psicoterapeutas poderiam ajudar”. Enfim, coisa nenhuma para
“operários”, confirmando que no Brasil se construiu um “corpo de classe”.
Quem pudesse pagar tinha todos os bônus. Quem não podia, os ônus. Embora
tenha sido pioneiramente descrito por um psicanalista nova-iorquino, Herbert J.
Freudenberger, que trabalhava com populações pobres e desempregados no East-
Village, o estresse, mais tarde denominado burnout, virou doença de
trabalhadores de escritórios, empresas, serviço público, enfim, de classe média e
cidade grande.
O corpo se transformou em algo que se quer administrar e não há nele
nenhuma parte que não se possa modificar com a tecnologia, a cirurgia estética,
a tatuagem, o piercing, até a procriação assistida. Processos que o transformaram
num mercado a ser explorado infinitamente.
8. OS VENTOS DA MODA OU AS
MODAS AO VENTO
utubro de 1964, e as páginas de O Cruzeiro anunciavam: “A primavera tem leis.”
E tinha. Era a lei da moda: “Algodão ou jersey estampado para a manhã,
musselina ou tailleur Chanel em fustão, piquê ou seda para a tarde e vestidos
bordados com pedrarias para a noite.” Entrava no vocabulário feminino a
Adereço hippie.
Acessórios (moda), 1970.
ARQUIVO NACIONAL [FUNDO CORREIO DA MANHÃ].
O impacto dos shopping centers na difusão da moda não foi pequeno. Sabino
explica que teve início o declínio do negócio das franquias com as lojas
multimarcas de rua, as lojas de grife se multiplicando nos corredores
climatizados. E os problemas se sucederam a reboque da inflação. A moda
encolheu à medida que os planos Cruzado I e II, Bresser, Collor e Real se
sucediam. A matéria-prima desaparecia e aumentavam os cancelamentos de
pedidos. Produtores se queixavam da restrição à importação de máquinas e da
falta de mão de obra especializada. Ceará, Minas Gerais e Rio Grande do Sul
tinham se tornado polos de produção, mas, embora o governo tivesse interesse
na descentralização de empreendimentos e na criação de empregos, os negócios
patinavam. Os desfiles, antes verdadeiros shows, estavam cada vez mais raros.
Uma das primeiras consequências foi o fim do grupo de estilistas denominado
Moda-Rio, difusor da moda solar, arejada e cheia de charme, exportada, então,
Brasil afora. Alimentado pela recessão, mas também pelas rivalidades internas e
pelo caldeirão de vaidades do meio fashion, desfez-se numa noite – diagnosticou
Marília Valls, uma de suas componentes. Mas ficou uma mensagem importante:
o Brasil tinha profissionais “estilistas”. E eles foram muito, muito importantes.
E brotaram talentos, sobretudo em São Paulo. Nos anos 1980, cansados da
estética hippie, os tempos pediam uma estética urbana descolorida e repleta de
correntes, típicas do movimento punk, ou o cinzento entediado dos góticos, ou
ainda, a egopatia dos yuppies – explicam Braga e Prado. A moda deixava de ser
“peladinha e bronzeadinha”, como a feita no Rio, para usar botas e coturnos,
feitos em São Paulo. Surgiu o Núcleo Paulista de Moda reunindo onze
confecções e, mais tarde, o Grupo São Paulo de Moda. Este último, sempre
agrupando grandes nomes, tinha uma postura bem mais engajada. Preocupava-se
em lutar contra a deficiência de informações no meio, a inexpressividade das
entidades de classe e, o mais importante, o descaso do governo. O grupo ainda
cobrava respeito dos fornecedores de matéria-prima quanto a prazos e entregas, e
um calendário de lançamentos, coerente com as condições de trabalho das
confecções e do mercado comprador.
Outra novidade da década foi o aparecimento de escolas de moda. Antes,
costura era coisa de comadres, e apenas se aprendia o trivial para fazer corte e
costura. De início, a Fundação Armando Álvarez Penteado promovia cursos
livres na área de moda. Mas foi o Serviço Nacional da Indústria (Senai) que, em
1984, disponibilizou o primeiro curso de longa duração de design de moda em
nível técnico. A seguir, a Universidade Federal de Minas Gerais abriu um curso
de extensão de estilismo e modelagem do vestuário implantado em 1986. Ele
teria duração de dois anos, e as matérias eram história da moda, modelagem,
desenho, estilismo, criação e pesquisa. Associada ao estudo das artes, a moda
também virou curso na Universidade de Caxias do Sul, na Universidade Veiga
de Almeida, do Rio, e nas Universidades Estaduais de Londrina, no Paraná, e de
Florianópolis, em Santa Catarina. Ganhar competitividade, identificar grades
curriculares com exigências do mercado e identificar nossa moda com nossa
cultura era um dos objetivos a serem atingidos.
Em 1986, a Faculdade Santa Marcelina inaugurou o primeiro curso superior,
idealizado por uma professora e irmã francesa: Eugenie Jeanne Villien. O
segundo curso superior de moda nasceu em 1990, também em São Paulo, na
Universidade Anhembi Morumbi, intitulado negócios da moda. Seguiu-se o
terceiro, em 1991, na Universidade Paulista (Unip). E, em 1994, foi a vez do
Senac de São Paulo assinar convênio com a renomada L’École Supérieure des
Arts et Techniques de la Mode, a Esmod, da França, para no ano seguinte
implantar cursos profissionalizantes de estilismo e modelagem. Professores
franceses vieram para cá, garantindo a qualidade dos cursos, e os anos 1980
deram início a uma cadeia de instituições, que formou estilistas de sucesso e
alimentou um importante segmento da economia do país.
O chique da época.
A Cigarra, ano 61 (7), p. 14, julho de 1975.
A CIGARRA/D.A. PRESS.
João Braga e Luiz André Braga falam do resultado disso: “Foi a partir da
década de 1990 que as primeiras gerações de estilistas e profissionais de moda,
graduados nas escolas pioneiras do país, chegaram ao mercado. Criar moda
deixava de ser, finalmente, resultado da oportunidade fortuita ou da vocação ou
talento nato de alguns para se tornar área de ação profissionalizada, com
metodologias e técnicas próprias.” O problema continuava sendo a imitação da
moda estrangeira, sobretudo no prêt-à-porter.
Junto com os importados, os estilistas tiveram que enfrentar os planos
econômicos malsucedidos, o impeachment de Collor e a instabilidade
econômica. O mundo da moda foi diretamente afetado: empresas faliram,
estilistas mudaram de profissão, revistas de moda fizeram cortes em seus
quadros, enfim, o mercado murchou. E como se não bastasse, nomes importantes
foram levados pela aids.
Por isso, os jovens costureiros que entravam em cena buscavam ter
independência criativa e identidade própria. A questão da identidade tinha
certamente relação com o fato de que a globalização entrara em pauta. Origens,
raízes e valorização do que era nosso passaram a ser discutidos, enquanto os
produtos importados invadiam as vitrines. Porém, os negócios informais
cresciam. Ao fugir da carga de impostos que debilitava os comerciantes, bazares
e mercados informais viam seu público aumentar. A diversidade de tendências e
o supermercado de estilos, longe de qualquer ditadura da moda, vingavam. O
culto ao corpo e a valorização dos esportes trouxeram a tendência dos sportwear,
divulgada pelas revistas femininas e adotada em nome do conforto: calças
legging, calças fuseau, malhas, moletom. Roupas justas e coladas valorizavam as
linhas “malhadas” do corpo. Tecidos de elastano ou leves e fluidos invadiam as
ruas. Grunge, hippie chic e new age misturavam-se aos visuais coloridos vistos
nas pistas de dança das boates techno. A caminhada para um novo milênio
convidava os criadores a olhar para trás quanto às modelagens. Mas os materiais
viriam do futuro: fibras e tecidos “inteligentes” como a microfibra. Com a
aproximação do novo milênio, vinha também a preocupação com a ecologia e o
desenvolvimento sustentável – afinal, o Rio sediara a ECO-92.
Em 1994, a jornalista Costanza Pascolato, num editorial da revista Vogue,
previa ferveção no verão: “A moda se alimenta do novo. Após longo período de
jejum, o circuito fashion volta a ficar eletrizado. A mídia, para modernizar, cria
novos mitos e revela, à luz dos holofotes, comportamentos e estéticas para lá de
alternativos.” A cena clubber fora importada de Londres, divulgada pelo
jornalismo de moda concentrado em São Paulo, onde lotavam os clubes noturnos
com a dança das drag queens, de funkeiros e de cybermanos. Era um estilo de
vida, uma batida e um som, e uma forma de se individualizar por meio da
indumentária. E mais, empresas ligadas à beleza e aos shopping centers
investiam verbas publicitárias em grandes eventos onde os jovens criadores
exploravam a tendência clubber com muito vinil e pelúcia. Aliás, ela também era
exibida em eventos que tinham lugar em boates e feiras alternativas de moda,
como o Mercado Mundo Mix em São Paulo e outras cidades, ou a Babilônia
Feira Hype, no Rio.
Na tradição da extinta Fenit, cresceram as Semanas da Moda: Phytoervas
Fashion, Semana Barra Shopping, São Paulo Fashion Week, entre outras que
agitavam os diversos talentos e exibiam rostos de jovens manequins que fariam
carreira no exterior, com aparência mais saudável do que as anoréxicas e
drogadas – as heroin chic – da década anterior.
Na mesma década, as sandálias havaianas se tornaram obrigatórias. Antes
chinelos populares, passaram a ser revestidas de contas coloridas e flores, como
as enfeitava o bijoutier Marco Sabino, e foram um dos maiores itens de venda da
época. Editoriais de moda consagravam as que não soltavam tiras, não tinham
cheiro e tal… O sucesso exportou-se e as Havaianas começaram a viajar e a se
vender mundo afora. Viajaram, também, jovens estilistas, Francisco Costa,
Inácio Ribeiro ou Gustavo Lins, que foram trabalhar em Paris ou nos EUA. A
moda praia e os jeans “made in Brazil” fizeram seu lugar ao sol e alcançaram
exportações significativas. Na década seguinte, o Brasil contaria com 130 cursos
de graduação presencial nas áreas de moda, estilismo e desenho de moda,
superando França, Inglaterra, Itália ou Estados Unidos, países com longa
tradição na área.
Propaganda de roupas íntimas femininas.
Propaganda de sutiã, s.d. COLEÇÃO PARTICULAR.
O fim?
Reportagem, Rio de Janeiro, 1972.
ARQUIVO NACIONAL [FUNDO CORREIO DA MANHÃ].
1. A GUERRA DAS PÍLULAS
O Cruzeiro, nº 2.452, p. 8, 24 de novembro de 1978.
ARQUIVO O CRUZEIRO/EM/D.A. PRESS.
uma época em que era comum ver mulheres conceberem sete, dez, até mais de
Para as que consumiam a pílula, nem tudo era um mar de rosas. Muitas
mulheres se queixavam dos efeitos colaterais. No início dos anos 1970, o debate
na imprensa sobre benefícios e malefícios da pílula teve início. Uma
universitária carioca de 23 anos entrevistada pela revista Veja reagiu: “Todos
fazem campanha contra os perigos da pílula. E da cortisona – muito mais
perigosa –, ninguém fala?!” Já uma paulista casada de 26 anos comentava:
“Minha irmã começou a tomar a pílula faz três semanas. Com toda essa onda, já
parou.” E uma dona de casa de 26 anos, de Salvador, se mostrava furiosa: “Estou
louca da vida com o médico. Nunca me falou nada.” Uma porto-alegrense
solteira de 23 anos concluía: “Prefiro sofrer os enjoos da pílula a enfrentar a
grande dor de cabeça da gravidez.” Entre as principais acusações contra a pílula,
as mais graves eram a de causar tromboses e até mesmo câncer. O resultado foi o
aumento de cirurgias de esterilização. Um aumento de 100% em relação à
década anterior.
A Igreja católica não descansava. Vários documentos associando pílula e
pecado continuavam bombardeando os fiéis. A própria encíclica Humanae Vitae
fora uma pá de cal entre os católicos esperançosos da aceitação da pílula. D.
Lucas Moreira Neves, contudo, tinha outra leitura: não se tratava de mera
condenação, mas de incentivo a que os cientistas aprimorassem, “o mais
depressa possível”, o método da continência periódica. No início dos anos 1970,
apareceu uma pílula masculina. A Veja deu ampla cobertura. Mais uma vez,
discutiam-se os efeitos colaterais: aumento de peso e, sobretudo, a diminuição
do apetite sexual. Para o cientista Elsimar Coutinho, “nas mulheres, entretanto,
esse aspecto não é valorizado. Muitas aceitam submeter-se a uma atividade
sexual não satisfatória em troca da garantia de não conceber”.
Passados quinze anos do desembarque da pílula, as taxas de natalidade
começavam a cair em relação às décadas anteriores. O IBGE registrava os
reflexos da mudança de comportamento da classe média brasileira, que tinha
cada vez menos filhos. Segundo uma pesquisa patrocinada pela Fundação Ford,
essa mudança estava relacionada com a maior oferta e consumo de
anticoncepcionais orais. Mas, se a ciência avançava, o desenvolvimento
econômico rateava. O problema é que, entre as crianças que continuavam
nascendo, 70% aumentavam famílias com renda de menos de dois salários
mínimos e 12 milhões sofriam de desnutrição – informava a Veja em novembro
de 1983.
Na época, discutia-se o número de filhos, mas também o parto. Antes
considerado o “mais singelo momento da vida humana”, passou a ser realizado
em salas esterilizadas, sob lâmpadas frias, mesas reclináveis, ambientes
aquecidos, assepsia, anestesia, instrumentos cirúrgicos especiais e um enxame de
médicos, assistentes e enfermeiras. As mulheres passavam pela experiência do
parto com a mesma indiferença pela qual passavam por pequenas cirurgias: dor e
parto iam se distanciando, pois ele passara a complicada manobra cirúrgica.
Mais e mais, nas clínicas particulares do Rio de Janeiro e de São Paulo, os partos
exigiam o “corte cesáreo”: já eram seis a cada dez. Os números já contrariavam
os padrões da Organização Mundial da Saúde (OMS), que, em 1985,
preconizavam, no máximo, 15 partos cesáreas a cada 100 partos. Em 1978,
mesmo no INPS, as cifras se mostravam alarmantes: 13,77% dos partos feitos
nos ambulatórios e clínicas, e 22,73% nos serviços contratados de Previdência
Social. O Brasil chegou a ser o campeão das operações: com 36%, enquanto os
EUA contavam com uma taxa de 25%. À sombra de motivos pecuniários – a
cesárea custava cinco vezes mais que o parto normal – ou mesmo dos mitos que
pairavam sobre o parto normal, a cirurgia de cesárea se difundiu enormemente,
quando na verdade deveria ser executada como recurso para parturientes entre a
vida e a morte: tamanho exagerado do feto, falta de dilatação do colo do útero e
outros.
A falta de educação pré-natal e a propaganda enganosa prometiam um parto
sem maiores sofrimentos, criticava o dr. João Yunes, assessor do ministro da
Saúde para assuntos materno-infantis. Sim, pois 67% das mulheres afirmavam
sofrer com o parto normal, contra 33% que diziam pouco padecer na cesárea. Os
obstetras alegavam que era o momento de pôr fim ao mandato bíblico “darás à
luz com dor” e que, ao contrário, na falta de dor a parturiente ganhava em
consciência sobre a importância da maternidade e dava à luz com calma e
alegria. Os médicos, por sua vez, eram criticados: não precisavam esperar mais
doze horas para um nascimento, mas podiam, sim, realizar quatro operações
seguidas! O aperfeiçoamento da anestesia peridural da bacia privava a mulher
dos movimentos e do esforço que ela fazia no passado para dar à luz. Em meio a
tantas novidades, as cesarianas cederam pouco a pouco lugar aos partos normais.
O número aumentou tanto que, no fim dos anos 1990, o governo federal destinou
a elas apenas 40% das verbas totais para partos em hospitais conveniados ao
Sistema Único de Saúde (SUS).
Já os partos monitorizados buscavam um espaço entre os partos normais e as
cesáreas. Tratava-se do emprego de aparelhos eletrônicos para a denúncia de
possíveis anormalidades na mãe ou no feto. Foi introduzido pelo dr. Jorge
Rodrigues de Lima, do Departamento de Pesquisa da Maternidade-Escola da
Universidade Federal do Rio de Janeiro, como recurso para dispensar as
cesarianas desnecessárias. No Rio Grande do Sul, o dr. Antonio Celso Ayub
tentava colocar de pé o “parto vertical”, aproveitando a ação da gravidade que
tendia a diminuir a duração média da expulsão do feto – explicava o obstetra. O
trabalho muscular era mais eficaz e o corte no períneo menos necessário. A mesa
do parto era também inclinada de 40 a 80 graus. Em Curitiba, outra novidade: o
parto de “cócoras”, à maneira das índias caingangues, da Reserva de Chapecó,
divulgado pelos obstetras Cláudio e Moisés Paciornick. A posição facilitava a
saída da placenta, permitia a expulsão mais rápida do bebê e evitava asfixias e
complicações mecânicas. O método mais revolucionário, porém, foi o
denominado “parto sem dor”. Introduzido pelo dr. Adolpho Goldenstein, em São
Paulo, consistia em bombardear a gestante com ginástica, fisioterapia, métodos
de respiração e sessões psicoterápicas de conversa com outras gestantes. Pouca
luz, silêncio, temperatura ambiente próxima daquela intrauterina, nada de
colocar a criança de cabeça para baixo, mas, uma vez cortado o cordão
umbilical, ela repousava serenamente no colo materno: era o método Leboyer,
do obstetra francês do mesmo nome, aqui adotado por alguns.
As novidades dos anos 1970 foram acompanhadas da introdução da
ultrassonografia obstétrica, ferramenta pioneira no diagnóstico no
acompanhamento pré-natal, assim como da “medicina fetal”, que dava maior
tranquilidade à gestante. Em fevereiro de 1974, um programa de TV apresentou
em reportagem o aparelho Vidoson 635, de propriedade da Maternidade de São
Paulo, o primeiro equipamento de ultrassom existente no Brasil e o primeiro da
América do Sul.
No interior, contudo, mulheres continuavam a dar à luz em casa, e o parto se
anunciava pela “perrengada”, o “despacho” ou o “rodiadô”. Era comum a
gestante fechar-se no quarto, portas e janelas cerradas, somente avós, tias e
vizinhas no recinto. Daí a pouco um choro anunciava a chegada de mais um
membro da família. Pesquisas revelam que, até o fim da década de 1990,
técnicas, posições, rezas e beberagens usadas para facilitar o parto em domicílio
não sofreram grandes mudanças. Banquinhos baixos, gamelas, o colo do marido
ou de uma mulher forte, cordas passadas por portas e traves em que as gestantes
se penduravam, parto de cócoras, de joelhos, de pé com as pernas abertas e
fletidas – enfim, desde a noite dos tempos, não houve variações nas posições em
que se dá à luz.
Para expulsar a placenta? Ingeriam-se três grãos de feijão. Depois, era
preciso juntar a “mãe do corpo”, ou seja, “os ovários, o útero, tudo que a mulher
usa para reproduzir”, explicava uma parteira. Parteiras no interior falavam com a
“mãe do corpo”: “Eu coloco o dedo no umbigo e aperto, quando ela não bate ou
bate fraquinho é porque a mulher está doente.” O remédio era a massagem com
óleo de andiroba, cânfora ou azeite. Para secar umbigo, na falta de mertiolate, pó
de fumo em corda. Os saberes tradicionais ainda interessavam às parturientes e,
em pleno século XX, organizações não governamentais reconheciam a
contribuição das parteiras na defesa do parto normal. A Universidade Federal da
Bahia continuava a formar “enfermeiras obstetrizes”, um nome novo para as
velhas aparadeiras. Em 1978, foram mais de quinhentas.
Mas se no Brasil pouco mudava na vida da gente pobre, na rica Europa
ocidental tudo mudava! Notícias mostravam, com estarrecimento, o
aparecimento de mães de aluguel. Cinquenta mulheres inglesas estariam à espera
para ter seus bebês de proveta, “embriões gerados à luz fria dos laboratórios” –
informava a Veja em janeiro de 1978! Seriam “gente como nós”? Desenhos
coloridos explicavam ao leitor a nidação dos óvulos enquanto entrevistas
esclareciam que não se tratava de “fabricar” crianças, mas de resolver o
problema de mulheres inférteis. Já a esterilidade masculina era combatida com
tratamentos hormonais. Quem falaria disso na primeira metade do século?
Multiplicar-se para constituir uma família como desejava a Bíblia ou para
fortalecer uma nação eram argumentos ultrapassados. Doravante, bancos de
esperma ou óvulos permitiram escolher a cor dos olhos ou dos cabelos de um
bebê. Ele teria alma? A Igreja católica condenava. Afinal, a concepção era coisa
de Deus que a abençoava e, para a obtenção de espermatozoides, era obrigatória
a masturbação, perseguida desde sempre como pecado.
A liberdade controlada.
Concurso de miss, c. 1968.
ARQUIVO NACIONAL [FUNDO CORREIO DA MANHÃ].
Outra questão: qual o papel e a imagem da criança? Nos anos 1930, ela devia
ter um comportamento que a aproximasse do adulto, ser madura, pura, mártir.
Tinha que se comportar de acordo com o desejo dos pais. Nos anos 1950, devia
ter a imagem de uma criança “feliz”. Ela seria o centro de atenções com espaço
para suas necessidades, deveria ser “compreendida” e ter bom comportamento
sem que nada lhe fosse imposto. Na década de 1970, tinha que ser muito cuidada
para impedir problemas futuros, ser respeitada nas suas características, e educada
de acordo com suas particularidades.
Alterou-se o papel da família – do pai e da mãe – na educação. Mais ou
menos até os anos 1950, a mãe era o elemento fundamental e qualquer falha na
educação era de sua inteira responsabilidade. Nos anos 1960 e 1970, ela continua
sendo o elemento central na educação, mas o pai deve participar também.
Ambos são responsáveis pelo bom relacionamento com a criança e cabe-lhes
conhecer e compreender seu filho. A partir dos anos 1980 e 1990, o papel do pai
e da mãe no âmbito familiar continua sendo cada vez mais repensado, e as
diferenças entre a função feminina e a masculina diminuem bastante,
principalmente nos anos mais recentes – ainda que em muitos lares a mulher
permaneça como a principal responsável pelas tarefas domésticas e pelo cuidado
dos filhos. Essa mudança faz com que a tarefa educacional recaia sobre o pai e a
mãe, e a família é inteiramente responsável pelo “vir a ser” da criança.
As educadoras sublinham a importância crescente de especialistas como
pediatras, psicólogos, fonoaudiólogos e fisioterapeutas, que davam status de
ciência à educação que, antes, ficava integralmente na mão das mães. O
importante, então, era que a criança crescesse dentro “dos melhores moldes”. Tal
mudança fica muito clara nas respostas que elas receberam quanto à procura de
soluções para os problemas com os filhos. Nos anos 1930, buscava-se
aconselhamento com a sogra, a mãe, as amigas, as comadres ou os parentes mais
experientes: “Eu segui a orientação da minha mãe, ela sempre nos orientou
muito bem. Então, é uma tradição que a gente traz. A minha sogra também criou
muito bem os filhos, vem de família isso…” Na época seguinte, ainda se
desejava o aconselhamento da mãe ou de familiares. Havia pouco acesso a
revistas ou livros: “Eu ia criando… Sempre você traz aquilo que aprendeu e
automaticamente você transmite.” Ou: “Mãe é mãe. Então ela sabe a hora que
deve cuidar, corrigir, castigar. Está na gente, né?” Já nas décadas de 1970 ou
1980, fica evidente a busca por livros e manuais científicos: “Tudo que cai na
minha mão sobre criação de filhos, eu leio…” E recorria-se a psicólogos,
pediatras e professores: “Eles sabem mais do que a mãe, tem mais estudo, mais
experiência…”
As mães dos anos 1930 disseram às educadoras: “Acho que a criança de
antigamente era melhor do que a de hoje… As pessoas eram mais exigentes com
a gente”, ou “Acho que com tantos cursos que têm hoje, com tantos livros,
parece que, ao invés das crianças estarem mais bem-educadas, elas estão mais
mal-educadas”. As mães deixariam “as crianças fazerem muita coisa que não
deviam… está uma coisa louca”. As dos anos 1960 disseram: “Hoje em dia as
mães complicam mais… Antigamente era mais natural… E as crianças podem
tudo, não têm freio… E eu acho que, se deixar, a criança desaprende…” As das
décadas de 1970 e 1980: “A mãe não pode ser o carrasco do filho… E já percebi
que certas coisas se aprendem sem exigir…”, ou “Não se deve reprimir a
criança… Não se deve inibir o potencial que ela tem porque isto traz problemas
mais tarde”.
Segundo as educadoras, o discurso das mães demonstra a existência de
contato e aceitação de certa linha de orientação calcada em “conhecimentos
psicológicos” sobre o desenvolvimento infantil e leva-as frequentemente a tomar
para si os encargos e a culpa, admitindo que, para educar, é necessário ser quase
perfeito e que, antigamente, “a cabeça era diferente, era outro mundo! Era aquilo
que tinha que ser naquela época… Mãe não conversava nada […] a preocupação
de antigamente era comer, se vestir porque tá frio, não tomar chuva”. Hoje é
preciso “superar nossos dramas, nossas falhas, nossos problemas”. E, ainda
assim, enfrentar “a preocupação com o futuro, se vai ser feliz, realizado, se vai
fazer o que quer”.
A segunda metade do século XX revela transformações importantes. Da
preocupação religiosa com a salvação da alma, na década de 1930, passou-se a
uma visão edênica da criança na de 1950, para se concluir, nos anos 1980, que
educar é preparar para o futuro. Educar seria, então, construir um indivíduo
adulto independente, capaz, competitivo e emocionalmente equilibrado. Para
isso recorre-se a profissionais especializados, e os pais são constantemente
chamados a participar, orientar e contribuir com sua presença junto aos filhos. O
papel masculino, então, começou a mesclar-se definitivamente ao feminino,
explica a pedagoga Michele Candiani Santos. Da imagem piedosa de São José,
presente no discurso da Igreja católica na República Velha, passou-se a um ideal
de paternidade no qual a delicadeza, a pureza, os altos ideais morais e sociais, o
cultivo da intimidade e a felicidade no lar são características também
masculinas, e não mais exclusivas das mulheres. Há uma valorização do privado,
e um convite é feito ao homem: que direcione cada vez mais sua atenção ao lar e
à família, pois é ali que está sua felicidade. A valorização do íntimo, do privado,
do pessoal e familiar, produto típico do capitalismo individualista, numa
tendência que já dava mostras de si desde 1943, apresenta-se no seu auge. A
partir dos anos 1980, a “família igualitária” começou a dividir espaço com a
ideia de família patriarcal, sobretudo nas classes médias e identificadas com a
modernização.
Some-se a isso a valorização do consumismo e da psicologia clínica, voltada
para a saúde emocional, ambas reflexo da influência norte-americana nas classes
médias brasileiras. Com a expansão do mercado de bens de consumo, a família,
e nela a criança, passaram a ser grandes consumidores em várias áreas: saúde,
lazer, cultura, educação, psicologia etc. A imagem da criança consumista passa a
ser veiculada pela televisão. É o que ela deseja, e sua família compra para ela, o
que lhe proporciona status e prestígio. A criança é também símbolo de ascensão
social.
Em meio a tantas transformações não faltavam problemas. O advogado e
educador Edgar Flexa Ribeiro alertava: a vida se transformara radicalmente.
Mães trabalhando fora de casa, vida urbana intensa, fim das refeições comuns. E
na falta de estar com os filhos, os pais preferiam cobri-los de vontades. Nascia o
“filhocentrismo”, “forma nova e pouco saudável de lidar com os filhos”. O
fenômeno guardava parentesco distante com a superproteção, mas era diferente.
No primeiro caso, os pais se sentiam culpados por não poderem oferecer o
melhor. No segundo, eles se anulavam, sentindo-se incapazes de dizer não,
explicava Flexa Ribeiro. “Quando a criança passa a ser a única razão de ser do
casal, e atender o pequerrucho, sempre, sem limitação, passa a ser uma fixação,
estamos lidando com algo muito diferente. Não se está propondo que pais
abandonem os filhos, ou seja, que esqueçam que lá em casa tem alguém que
precisa de atenção. Quer-se aqui apenas sugerir que os pais mantenham vida
própria e zelem por ela. Até para que seus filhos saibam fazer o mesmo, quando
chegar a hora deles.” Era preciso estabelecer limites, sinalizar o espaço da
criança.
Crianças: um novo mercado de consumo.
Brinquedos Estrela, Jornal Aqui São Paulo, s.d.
ARQUIVO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO [ICONOGRAFIA].
Dos quadrinhos à TV.
O Cruzeiro, nº 33, p. 129, 18 de agosto de 1971.
ARQUIVO O CRUZEIRO/EM/ D.A. PRESS.
O trabalho infantojuvenil.
Engraxates, Rio de Janeiro, 1968.
ARQUIVO NACIONAL [FUNDO CORREIO DA MANHÃ].
O vendedor de balões.
Brinquedos, Rio de Janeiro, 1971.
ARQUIVO NACIONAL [FUNDO CORREIO DA MANHÃ].
Nelson tinha nostalgia do que chamava “hermético pudor”, que já não existia
mais. E tudo indicava, não fazia mais falta. Ia longe o tempo em que Celly
Campello cantava que Ana Maria enrubescia ao botar “um biquíni de bolinha
amarelinha, tão pequenininho”! No fim da década de 1960, o secretário de
Segurança Pública do Espírito Santo proibira o uso do biquíni e da sunga nas
praias capixabas. O resultado foram pressões e mais pressões. Os jornais locais,
O Diário e O Jornal, não perderam tempo e foram às ruas. A enquete revelou
que ninguém apoiava a atitude abafada em zelo. Um entrevistado chegou a
perguntar ao secretário por que não fizera o mesmo em Copacabana, quando era
administrador regional.
Minas Gerais não ficou atrás e, em Montes Claros, ergueu a voz um apóstolo
do pudor. Era o padre Geraldo Zuba, que investia contra “a mulher nua”, dando
início a uma campanha radical. A sensualidade – explicava – ia afundar a
humanidade no pecado e no vício. O biquíni e a minissaia eram apenas o início
do fim. E, por outras razões, Nelson Rodrigues concordava com padre Zuba. Em
entrevista à revista Veja, em junho de 1969, lá estava o famoso jornalista a
fustigar os consagrados retalhos de pano:
VEJA – E o Carnaval?
NR – O Carnaval está morto pra burro. E o que mata o Carnaval é o impudor. Antigamente, quando
havia pudor, o Carnaval era a festa mais erótica do mundo. Hoje, o pudor é um anacronismo intolerável.
E, então, o Carnaval está morto?
NR – O biquíni é um caso óbvio. O biquíni é a degradação da nudez. A nudez, para que tenha um valor
plástico, para que tenha um interesse visual, na pior das hipóteses, exige o desejo. Mas eu vou além: a
nudez exige o amor. Portanto, a nudez sem o desejo e, pior ainda, a nudez sem o amor é o que há de
mais feio. E isso se verifica observando na praia os corpos mais lindos do mundo, ali no Castelinho, ou
em Copacabana […]. E nada disso inspira a mais vaga, a mais remota curiosidade a ninguém. Ninguém
se volta para ver essa nudez que ninguém pediu, que ninguém desejou, que ninguém amou.
NR – Não, a culpa é da burrice suicida das mulheres que o usam. No tempo em que a nudez tinha
mistérios, tinha suspense, era um dos mais altos bens da mulher. Mesmo a mulher mais destituída de
encantos tinha essa nudez latente debaixo do seu vestido. E isso era fascinante. Uma pobre-diaba vestida
era salva, não pelo gongo, mas por uma possibilidade de nudez. O biquíni acabou com esse encanto.
[…] Quer dizer, a nudez do biquíni tem a maior solidão da Terra: a mulher mais invisível do mundo é a
mulher de biquíni.
Chocado, Nelson não entendia o que via. Não se tratava de moda, mas da
evolução do moral moderno. Proibido pelo Vaticano em 1964, o acessório criado
pelo francês Louis Réard em 1946 tomou o mundo das praias, do lazer e das
férias de assalto. Foi proibido em vários países: Austrália, Bélgica, Espanha e
França. Mas o uso nas telas de cinema, graças a figuras como Jayne Mansfield,
Marylin Monroe, Brigitte Bardot e Ursula Andress, ajudou a consolidar sua
comercialização.
Ao fim de 1969, o biquíni diminuía, enquanto sua venda aumentava. Não
faltavam reservas. Aceitos entre São Paulo e Rio, impressionavam mal na região
Nordeste e causavam temor no Sul tradicionalista. Os donos de confecções
refletiam essas diferenças e oscilavam entre fabricar maiôs clássicos ou biquínis.
Na época, o problema era estético. Para usar biquíni, dizia o gerente da Malharia
Águia, no Rio de Janeiro, era preciso um corpo perfeito como os que via Nelson
Rodrigues pelas praias e piscinas: “Isso é raro. Juventude dura pouco, e por isso
a preferência pelo biquíni dura pouco.” Os “confeccionistas” concordavam que
as brasileiras, em geral, ainda preferiam o maiô clássico. No início dos anos
1970, as mulheres hesitavam em cobrir-se, mais ou menos, nas praias entre Rio e
São Paulo.
Na França, porém, o topless já começara. Em nome de um bronzeado
uniforme a moda era tirar a parte de cima dos biquínis. A notícia circulou, mas a
moda não pegou nos trópicos. Retribuíamos com a diminuição dos retalhos e
muita discussão. A revista Veja, em número de janeiro de 1973, anunciava um
“longo striptease” na matéria “A caminho do nada”. Aquele verão marcaria o
gran finale em direção à progressiva nudez, com o surgimento da tanga:
reduzida a dois triângulos, na frente e atrás. A novidade, porém, estava restrita a
algumas poucas centenas de metros da praia de Ipanema. A matéria prosseguia,
fazendo referência ao periódico Pasquim, que foi um dos primeiros a explicar as
razões da diminuição da parte de baixo dos biquínis e a reação àquela tendência:
“A polícia mostrou-se disposta a não permitir no verão carioca o que aconteceu
no verão europeu: a abolição da parte de cima.” De fato, a Divisão de Censura e
Diversões Públicas da Secretaria de Segurança da Guanabara havia proibido a
prática do topless.
A visão do famoso cartunista e jornalista Ziraldo era desfavorável à tanga.
Para ele, o modelo mais deformava que realçava: “O bumbum é intocável. Deve
ser mostrado em toda a sua beleza ou inteiramente protegido, como se protegem
os anjinhos com um pano roxo, durante a quaresma.” Se na Zona Sul as tangas e
seus variados acessórios – camisetas molhadas transparentes, tiras de látex ou
lenços em lugar do sutiã e até calcinha e sutiã em vez de biquínis – faziam
sucesso, nos subúrbios não acontecia o mesmo. Na praia de Ramos raramente
eram vistos maiôs mais ousados, encarados pelas banhistas como feios,
indecentes e imorais. Laurinda Cunha, de então 19 anos, esclarecia: “Eu tenho
um biquíni amarelo que não cobre quase nada. Mas, se eu vier a Ramos com ele,
ficarei ouvindo piadinhas. Por isso, quando quero usá-lo, vou até Ipanema.”
Afonso Faisal, que usava em Ipanema uma cueca francesa como calção de
banho, afirmava que “para ver mulher despida, não é mais preciso ir a um teatro
de revista”. Walter Pinto, que durante 25 anos mostrou mulheres seminuas no
palco do velho Teatro Recreio, no Rio, concordava: “Hoje meus antigos
fregueses, que pagavam 10 cruzeiros por um striptease, preferem ir à praia onde,
em troca de um cachorro-quente e alguns refrescos, presenciam um belíssimo
espetáculo.” E Carlos Machado, o rei da noite carioca, na época há 32 anos
trabalhando como produtor de espetáculos musicais, jogava a pá de cal: “As
vedetes agora estão na praia, sem saltos, sem plumas, sem penteados e muito
mais despidas.”
A guerra dos pelados não parou por aí. No verão de 1980, novidades. Era a
tanga unissex, a knitknot, “parecida com a dos índios brasileiros e sem costura,
como uma fralda de criança”, descrevia a revista Veja. Ainda mais importante
era a adesão ao topless – a essa altura, o termo já era bastante usado –,
praticamente liberado, ao menos em Ipanema, no Rio de Janeiro. “Em outras
capitais, continuam as tentativas solitárias, e geralmente malsucedidas, de
transformar o topless em traje rotineiro.” Na praia de Tramandaí, ao norte de
Porto Alegre, certa Lorena Borges, de 18 anos, bem que tentou adotar a moda.
Sua exibição não duraria três minutos antes de ser cercada por uma roda de
homens e ouvir aplausos e palavrões. “O homem gaúcho é muito machista”,
disse a moça. A polícia local também era contra a prática, tanto que o delegado
Avalmor Otávio Belina foi apelidado na cidade de “Dr. DeMillus”.
Mesmo sendo “o topless uma depravação”, segundo o cardeal d. Vicente
Scherer, a prática ia abrindo caminho, com extrema dificuldade, por todo o
Brasil. Em Recife, uma estudante de 20 anos teve de entrar na Justiça com um
habeas corpus para poder desfilar impunemente pelas praias sem sutiã. O
argumento do seu advogado foi o seguinte: “A aplicação do sunbathing [banho
de sol] muito difundida recomenda na terapêutica cutânea o aproveitamento dos
raios solares uniformemente ao longo do corpo.” Ela conseguiu o habeas corpus,
mas, na praia de Boa Viagem, se viu cercada de vendedores de picolé, chamada
de exibida e coberta de areia ao som de “Joga pedra na Geni…”, música de
Chico Buarque referente a uma prostituta: “Ela é feita pra apanhar. Ela é boa de
cuspir. Ela dá pra qualquer um…”
As tentativas de institucionalização da prática foram “sumária e
estupidamente rechaçadas por indignados e ofendidos banhistas conservadores”,
reagiam alguns jornais da época. Em fevereiro de 1980, na praia de Ipanema, um
episódio quase terminou em linchamento, quando certa turista gaúcha tirou a
parte superior do biquíni e começou a desfilar acompanhada por um amigo.
Como já havia acontecido antes com outras ousadas banhistas, uma “multidão
excitada” se formou ao redor do casal e, em pouco tempo, uma centena de
pessoas, aos gritos de “Geni”, novamente em referência à música de Chico
Buarque, corria atrás deles atirando areia e latas de refrigerante vazias. Revistas
e jornais bombardearam seus leitores com imagens. Para acabar com a confusão,
a polícia militar teve de intervir com cassetetes e bombas de gás lacrimogêneo.
Em outro caso, também em Ipanema, um vendedor de melancia sacou o facão
para defender outra turista, dessa vez francesa, que fazia topless e foi cercada
por uma multidão “dos que queriam mais e dos que não queriam nada”.
Fumar, usar biquíni e ver Malu Mulher, naqueles tempos, podia acabar em
morte. E não se estava longe da grita que houve em Belo Horizonte, quando da
visita da atriz Norma Bengell, conhecida por cenas eróticas no cinema, e que
teve nas mulheres suas porta-vozes: “A mim, me choca… Eu não gosto de ver”,
explicava a presidente da Camde, Amélia Molina Bastos.
Ali, a pena de morte para mulheres infiéis não tinha sido revogada, como
demonstrou o assassinato em “legítima defesa da honra” perpetrado pelo
engenheiro Márcio Stancioli, de 32 anos, que descarregou seu revólver calibre
.38 na mulher, Eloísa Ballesteros Stancioli, também de 32 anos.
Em depoimento à Veja, o engenheiro contou que começou a desconfiar dela
em 1978, depois que ela passou alguns dias sozinha em São Paulo. “Ela voltou
com um probleminha, um corrimento semelhante a uma doença venérea”, disse
o assassino. Exames médicos descartaram essa hipótese, mas ele não acreditou.
A relação do casal tinha azedado de vez após o nascimento do segundo filho, um
ano e três meses antes. Ainda segundo o engenheiro, ele e a esposa já teriam
combinado a separação, mas, ao voltar do trabalho um dia, discutiu com a
mulher, que teria lhe revelado que o seu amante não era quem ele pensava. Ele
então concluiu que ela tinha pelo menos dois homens fora do casamento, e essa
foi sua desculpa para fazer o que fez. Depois de beber uma garrafa de uísque
“pra relaxar”, voltou a discutir com a mulher, pegou o revólver e descarregou
suas cinco balas nela. Ele ainda recarregou a arma e deu mais dois tiros, mas não
se recordava disso.
A matéria diz que não foram encontradas provas da infidelidade da vítima, e
que “deslocar a vítima para o banco dos réus e oferecer aos jurados os mais
apimentados segredos de alcova” foi técnica anteriormente usada por Evandro
Lins e Silva para absolver Doca Street do assassinato de Ângela Diniz. A
reportagem cita ainda outros casos ocorridos na alta sociedade mineira e que
também ficaram impunes, como o assassinato de Jô Lobato, filha de um ex-
prefeito de Belo Horizonte, também pelas mãos do marido. Em comum as
vítimas tinham o fato de serem mulheres independentes. O jornalista não mediu
palavras: “Foram todas mulheres de temperamento forte que acabaram se unindo
pelo matrimônio a caracteres mais fracos. Enquanto seus casamentos duraram,
foram o polo dominante da vida do casal. Quando quiseram separar-se e escolher
outros caminhos, foram fulminadas pelas balas que Minas ainda reserva às
mulheres que violam seu código de honra conjugal.”
A violência entre marido e mulher tinha fundo musical. Neste mesmo ano,
Ângela Maria fazia sucesso com uma balada que narrava as agruras de uma
esposa na mão do marido machista que lhe maltratava e batia: “Sentou-se ao
meu lado, me olhando calado/ E a seguir me abraçou Me deu muitos beijos,
matou seus desejos E depois levantou Me pisou, me xingou, me humilhou E não
disse o motivo E o pior disso tudo é que eu sei Que sem ele eu não vivo Não
adianta eu querer me enganar Noutros braços tentar esquecer Esse amor dia a
dia me mata Mas é minha razão de viver.”
A sucessão de brutalidades diárias e sem limites fez O Cruzeiro dedicar
grande matéria, em 1977, ao que chamou de “Sindicato das Pancadas”. No ano
de 1980, choveram “balas conjugais”. Dos 45 casos noticiados pelos principais
jornais do país, desde 1979, vítimas masculinas foram menos de dez. Só naquele
ano, seis mulheres já haviam sido assassinadas por seus parceiros em Belo
Horizonte, “todas vítimas da compulsão de resolver à bala desavenças
conjugais”. O comerciante fluminense Ademar Augusto Barbosa da Silva, de 26
anos, surrou, fuzilou, queimou e jogou numa represa do rio Pará o corpo de sua
mulher, Norma Helen Luciano Pereira, que estava grávida. O assassino era tão
ciumento que havia decidido fazer o parto com suas próprias mãos, “assim
nenhum outro homem, nem mesmo um médico, a veria nua”. O motivo do crime
teria sido a confissão da mulher de que o pai da criança seria na verdade o irmão
do acusado. Na delegacia, não se mostrou arrependido: “Se o Doca Street, o
Georges Khour, o Michel Frank e tantos outros que matam e têm dinheiro não
são presos, eu também sou rico e não tenho medo da Justiça.”
Se a presidente da Camde admirava Minas por sua religiosidade, pudor e
família ideal, foi de lá que vieram as primeiras reprovações aos maridos
suspeitosos, ciumentos e brutais. Em novembro de 1981, era condenado o
comerciante José Maia Vicente que matou a tiros a mulher Zuleyka Nastasity
Maia e José Divino de Andrade, ao surpreendê-los dentro de um automóvel. Para
variar, alegou em sua defesa uma “tese que há tempos assegura a impunidade de
autores de crimes semelhantes: a legítima defesa da honra”. A condenação foi
celebrada, pois foi a primeira vez que, em Minas, um júri popular rejeitava a tese
da defesa da honra, o que sugeria que os mineiros, “tradicionalmente tolerantes
com delitos do gênero”, estavam revendo suas posições, informava a Veja.
A matéria sugere que a sentença aplicada a Doca Street, dois anos com
sursis, havia estimulado a decisão dos jurados. Na mesma semana, ainda seria
julgado o já mencionado Eduardo Souza Rocha. A expectativa era de que, se ele
também fosse condenado, seria muito provável que os próximos julgamentos de
maridos assassinos seguissem a trilha aberta pela condenação de José Maia. E
assim: “O abuso da tese da legítima defesa da honra – surgido há sete anos, com
a absolvição do empresário Roberto Lobato, assassino de sua mulher Jô Lobato
– receberá o atestado de óbito exatamente na cidade em que ganhou fôlego.”
Tais casos tornaram-se símbolos de denúncias na imprensa e apertaram outro
gatilho: o das lutas feministas em favor da condenação de maridos violentos.
Problemas de abusos domésticos e conjugais começavam a ganhar maior
visibilidade na imprensa e nos tribunais. Os principais casos tinham a ver com
espancamentos, bofetões, pontapés, uso de objetos contundentes, contatos
íntimos não autorizados com ou sem relação sexual, intimidações, calúnias,
rapto, injúrias e ameaças. O movimento passou a exigir que os crimes cometidos
nas relações íntimas tivessem um tratamento equivalente ao dos crimes de igual
natureza praticados por desconhecidos. Os direitos tinham que ser iguais para
todos. No âmbito familiar – denunciavam as feministas – escondiam-se os piores
agressores. O bordão “quem ama não mata” ecoava em toda a parte. O esforço
foi correspondido. A partir da década de 1980 foram criadas instituições de
amparo às vítimas: S.O.S Mulher, Conselhos da Condição Feminina, Delegacias
de Defesa da Mulher. Mas, só em agosto de 2006, a Lei Maria da Penha viria a
combater a usina de pancadas que era a casa de muitas vítimas.
A ofensiva teve repercussão na televisão, esse espelho da sociedade. Em
julho de 1982, teve início uma minissérie da TV Globo chamada Quem ama não
mata. O enredo girava em torno de crimes passionais, ainda que segundo os
autores, Euclydes Marinho e Daniel Filho, tivesse “sido concebida com a
preocupação fundamental de desmentir o próprio título”. Ainda de acordo com
os autores, “no Brasil costuma-se ignorar qualquer distinção entre crimes
causados pela simples brutalidade, os chamados ‘crimes de honra’ e os crimes de
paixão”. Daí a história de cinco casais de classe média e seus dilemas em torno
do casamento, amor e fidelidade. Cada capítulo se fechava ao som de um tiro
que explicaria o assassinato de um dos personagens.
A presença de debates em torno da violência contra as mulheres não era por
acaso. Se em grande parte da sociedade ainda prevalecia a Lei do Machão,
mutações tornavam-se visíveis. O produtor Mariozinho Rocha, por exemplo, em
entrevista à revista Playboy, em 1979, explicava: “Pintou uma dose de coragem
coletiva entre as mulheres. É só ir à praia para notar que a sexualidade está
aflorando cada vez mais. Antigamente, só as piranhas usavam tanga
transparente, mostrando o púbis. Agora, qualquer menininha taí de topless.” A
educadora Martha Zanetti, diretora do Centro de Estudos e Atendimentos à
Mulher e à Infância, concordava: “Antes, sempre foi permitido o rebolado das
sambistas, geralmente negras, em tangas cada vez mais sumárias. Agora, chegou
a vez das mocinhas de classe média. Elas também estão reivindicando prazer,
através da posse do próprio corpo.”
Do corpo e da voz. A cantora Nana Caymmi, por exemplo, cantava: “Ah!
Vem cá, meu menino Pinta e borda comigo Me revista, me excita Me deixa mais
bonita.” Rita Lee anunciava, em “Perigosa”: “Eu tenho um veneno no doce da
boca”; Milton Nascimento exaltava Maria: “Uma mulher que merece viver e
amar Como qualquer outra do planeta”. E Maria Bethania louvava a que dava a
volta por cima depois do abandono: “Quero ver o que você faz / Ao sentir que
sem você eu passo bem demais.” E Simone dava força para a liberação feminina,
na abertura do revolucionário Malu Mulher: “Sem as tuas garras, sempre tão
seguras / Sem o teu fantasma, sem a tua moldura.” Enfim, por meio de músicas
ou de imagens, as mulheres falavam abertamente de uma nova postura, de sexo,
de seus afetos e de seus limites. Os ventos da mudança, sem dúvida, não
paravam de soprar.
Mas logo, logo encontraram barreiras. Contra as mudanças, o que foi
considerado um “castigo para pecados” caiu dos céus como um raio. A
tranquilidade sexual que vinha sendo conquistada sumiu! A revelação de casos
de aids na sociedade propagou-se com rapidez. Conhecidos artistas eram
apontados com suspeição: Lauro Corona, Cazuza, Renato Russo… Eram
chamados preconceituosamente de “bichas” e sofriam do “câncer gay” –
murmurava-se. O fato de tratar-se de uma doença sexualmente transmissível
simbolizava um mundo de modos de vida antes invisível para a sociedade. As
reações foram ambíguas, pois o alvo, no primeiro momento, era a população
homossexual. Manchas no rosto, diarreias constantes e dores acusavam os
“infectados”. Quando se descobriu que a transmissão se podia fazer via
transfusão de sangue, o alarme soou. Passou-se a falar em abstinência,
preservativos e fidelidade.
Nos primeiros anos da década de 1980, a divulgação de informações sobre a
aids oscilou entre tratar a questão de forma moral – condenando os grupos mais
contaminados – e fazê-lo pelo viés da saúde pública, procurando garantir
tratamentos e remédios apropriados. Matérias choviam nos jornais, na maior
parte das vezes traduzidas do exterior. Entre setembro de 1987 e dezembro de
1996, foram quase duas matérias por dia em importantes veículos como a Folha
de S.Paulo.
Na TV, o programa Fantástico, da Rede Globo de Televisão, caracterizado
por apresentar histórias extraordinárias, grotescas ou bizarras, divulgou o
assunto, para quase 90% dos lares brasileiros. Em 27 de março de 1983, a voz do
locutor Hélio Costa anunciou o que era a Síndrome de Deficiência Imunológica
– Epidemia do Século. O assunto era “grave”; a doença, “misteriosa”; a
epidemia, “violenta”; o mal, “fulminante”; e o avanço, “assustador”. Nos
primeiros anos da década de 1980, o clima era aterrorizante. A partir de 1985, o
governo brasileiro oficializou um programa nacional voltado para a doença,
revelando um sistema público deficiente. Até 1991, quando o jogador de
basquete americano Magic Johnson anunciou ter contraído aids de uma mulher,
“drogados” e “gays” pareciam ser as únicas vítimas. Falava-se pouco em
prevenção. Muito em morte. No fim dos anos 1980, os doentes ficavam em
pavilhões de isolamento e o pessoal que fazia enfermagem tinha medo dos
pacientes. Os familiares eram discriminados. Até os médicos também sabiam
pouco. Na época, entrevistada sobre o filho doente, certa mãe confessou ao
pesquisador: “Na minha cabeça, a aids estava tão longe para mim… Uma coisa
tão distante, que se ouvia falar como hoje se fala nos clones… No Brasil
ninguém falava em aids.”
Em 1988, reações tiveram início. Foi fundado o Grupo de Apoio e Prevenção
da Aids (Gapa) na Bahia. O jornalista Herbert Daniel, sentindo-se agredido pelo
tratamento e preconceito dispensado aos aidéticos, publicou Vida antes da morte:
“Um chamamento à solidariedade como alternativa à morte civil.” O desafio era
lutar contra a moléstia ajudando a construir a cidadania. Foi ouvido. Em
Fortaleza, o Grupo de Resistência Asa Branca (Grab) reagia às “discriminações
de todo o tipo”, como dizia um de seus fundadores, Luís Rabelo. Atividades
desenvolvidas na instituição ajudaram muitos travestis e homossexuais a se
mobilizar. Em lugar do “luto do estigma”, nascia a mobilização em favor de
direitos. Janaína Dutra, “a primeira travesti advogada do Brasil”, lembrou a
situação de homossexuais e travestis à época: “Em meados dos anos 80, na
cidade de Fortaleza, não se conhecia bem a aids. A Igreja tripudiou em cima, o
Estado tripudiou em cima, disseram que era o câncer gay. E tudo isso foi
desmistificado. […] as travestis foram convocadas para falar, para ajudar na
conscientização, com relação à doença […] Isso trouxe uma abertura, uma
conscientização e uma cidadania plena, buscando despertar, através da cultura e
autoestima, outro pensar na cidadã travesti.” Ia longe o tempo em que O
Cruzeiro lhes dedicava páginas inteiras, montadas, maquiladas e belíssimas, sob
o título “O mundo secreto das travestis”.
Ao fim da década, as mudanças provocadas pelo vírus tinham dado um nó
nos costumes. Pessoas reavaliavam hábitos sexuais, estilos de vida, princípios
morais e padrões de cultura. Virgindade e fidelidade conjugal voltavam a ser
exigidos. Ninguém estava acima de suspeitas. Sintomas, sumiço súbito e
emagrecimento eram sinais alarmantes. O cantor Cazuza foi internado; a
imprensa protegia. Tratava-se apenas de uma infecção bacteriana contraída numa
recente turnê do Barão Vermelho na Amazônia. Até o cantor defendeu-se: “É a
peste negra do século, e ninguém pode descartar a hipótese de contraí-la.”
Quanto aos boatos, “é o velho mito de que todo artista é promíscuo”.
Jovens passaram a se preocupar e corriam para pediatras e clínicos em busca
de informação. Para muitos, uma dor de garganta podia ser mau sinal. Outros
tantos evitavam, simplesmente, relações sexuais. O jornal baiano A Tarde, em
janeiro de 1985, chegou a propor a erradicação dos “elementos que podem
transmitir a peste gay”. As maiores vítimas da histeria provocada pela aids foram
membros da comunidade homossexual cujas famílias reagiam ao peso social e à
dependência provocada pela doença. Os que ainda estavam “no armário”
chocavam ao revelar sua identidade. Celso Curi, jornalista e porta-voz da
comunidade gay de São Paulo, explicava: “Morrer de aids é um problema, é
como deixar para os parentes e amigos um enorme nariz de Pinóquio.” Esse tipo
de rejeição fazia aumentar também o número de suicídios entre as pessoas que
contraíam a doença. Entrevistado pela Veja, o estilista Clodovil relatou: “Agora
eu tenho receio, não é mais aquela coisa solta como antes. Eu não quero mais
transar com pessoas fáceis, e as pessoas difíceis fecharam-se definitivamente
com a doença. […] Quando se está com uma pessoa, é difícil ignorar que ela
pode ter estado com alguém doente. Inevitavelmente, a gente sempre perde um
pouco do prazer. O pânico está instalado.”
A sedução do proibido.
Carnaval 1968, O Cruzeiro, p. 24, 17 de fevereiro de 1968.
ARQUIVO O CRUZEIRO/EM/ D.A. PRESS.
Foi em 1987, aos 52 anos, que Betinho revelou ser soropositivo, numa
entrevista a Zuenir Ventura para o Jornal do Brasil. Quando perguntado que
cuidados uma pessoa nas mesmas condições deveria tomar, ele foi taxativo:
“Não entrar em situação depressiva. A depressão mata mesmo sem aids. Tem
gente que se canceriza. O principal remédio é manter o horizonte da esperança.
Por isso me recuso a dizer que sou um condenado e que a aids não tem cura. Me
recuso até a dizer que é um desastre; é um desafio que a humanidade está
enfrentando. E, sobretudo, não aceito o estigma, não internalizo o anonimato.
Isso faz um mal terrível.”
Betinho viveria mais dez anos.
A vida sexual parecia fortemente ameaçada pela doença. Uma placa de
chumbo abatia-se sobre a frenética busca do prazer. Voltavam à cena a
abstinência ou a monogamia sexual, o uso de preservativos, a cautela no uso de
drogas, o fim do culto à magreza. Segundo a Veja, “a prática do sexo anal, as
escapadas no mundo da prostituição feminina, a alegre roda-viva de parcerias
sexuais podem estar entrando em declínio, mesmo que só temporariamente, na
esteira dos primeiros sustos. Significativamente, as zonas de prostituição tanto
feminina quanto masculina nas principais capitais do Ocidente registraram uma
sensível baixa de movimento”. Para o antropólogo argentino Néstor Perlongher,
a aids estava sendo utilizada pelos grupos conservadores para disciplinar o
comportamento sexual: “É uma contrarrevolução que se volta também contra os
heterossexuais não monogâmicos.”
Nos anos 1990, os progressos da informação fizeram recuar o significado
moralista que se dava à aids. A partir dos anos 2000, vozes cada vez mais altas
levantaram-se em prol de ações governamentais em favor do tratamento de
soropositivos. Predomina, desde então, o discurso oficial e científico sobre a
doença. As vozes dos atingidos ainda se ouvem mal. Porém, fala-se mais em
gente que “vive” com o HIV do que naqueles que “morrem”.
Em novembro de 1979, a imprensa foi sacudida pela notícia: Valdir
Nogueira, agora Valdirene, era o principal personagem do escândalo que abalava
São Paulo. Seu médico, o cirurgião plástico Roberto Farina, fora acusado de
“prática de lesões corporais de natureza”. Ou seja, o médico mudara-lhe o sexo.
Valdirene, “que orava diariamente pela libertação do réu”, teve a felicidade de
ver os juízes da 5ª Câmara do Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo
absolverem o médico, extinguindo a pena imposta no julgamento de primeira
instância – dois anos de reclusão, com sursis.
A decisão abria ainda “o caminho ao reconhecimento legal de uma prática
médica largamente difundida em alguns países mais adiantados”, segundo a
imprensa. Enquanto nos Estados Unidos, até aquela data, já haviam sido
realizadas 4 mil cirurgias, no Brasil existiriam, pelo menos, 1.200 pacientes
potenciais. Segundo estimativas do próprio Farina, haveria 1 transexual em cada
100 mil pessoas. Esperava-se que, com o fim do julgamento, pacientes e
médicos pudessem percorrer caminhos menos tortuosos do que o experimentado
por Valdirene e o dr. Farina.
Mas o que os levou às primeiras páginas de jornais e revistas? A operação de
Valdirene foi realizada em dezembro de 1971, no hospital Oswaldo Cruz, em
São Paulo. Poucos meses depois, Valdirene – cujo nome foi retificado com a
permissão de um juiz da Vara de Família – já podia não só manter relações no
papel de mulher, como “garantia conseguir atingir plenamente o orgasmo”. Ela
se tornara “uma mulher completa”. Depois disso, voltou para sua cidade natal,
Lins, no interior de São Paulo, onde levou uma vida “inteiramente normal” até
dezembro de 1975, quando o dr. Farina relatou sua experiência num congresso
médico, tornando o caso público.
Toda a repercussão levou o procurador da Justiça Luiz de Mello Kujawski a
encaminhar representação reclamando providências policiais contra o médico,
por julgar que a cirurgia fora um crime. A tese do promotor era de que “os
problemas da vítima não eram de ordem física, mas sim psíquica” e que o
médico havia agido “sob o desejo da notoriedade, do sensacionalismo”,
praticando então uma cirurgia “desnecessária e mutilante” e que serviria apenas
para “fixar de modo irreversível e agora, sim, incurável a doença mental da
vítima”.
Em defesa do médico foram apresentados inúmeros pareceres médicos que
mostravam que o procedimento fora um sucesso e que tinha causado, “se não a
cura, pelo menos a melhora do estado da vítima”. Nada disso foi suficiente para
impedir a condenação do dr. Farina, o que acumulou prejuízos profissionais ao
médico e uma indesejada publicidade a Valdirene, que inclusive teve a sentença
de retificação de nome revogada, voltando a chamar-se Valdir.
Entre a gente brasileira, até a virada do século, a maior parte das pessoas que
recusava o sexo que lhes foi determinado no nascimento preferia tratar do
assunto com discrição. Ser transexual era um destino individual e não havia
previsão de um status social específico para esses indivíduos. O que eles
desejavam era tornar-se membro de outro sexo, e não de um “terceiro sexo”. E
embora tivessem pontos em comum, cada indivíduo tinha sua história e
formulações específicas sobre seu próprio caso. A maior parte se queixava de ser
prisioneiro de um corpo que não reconhecia como seu. Sua demanda revestia
não o desejo de ser mulher ou homem, mas uma convicção de ser mulher ou
homem.
Nos últimos anos, desenvolveu-se um movimento transgênero, que tem por
objetivo transcender o “gênero”. Outro movimento reagrupa os que desejam um
sexo sem gênero fixo, indeterminado, múltiplo. O transexualismo é um
fenômeno próprio de nossa cultura. Foi necessário o desenvolvimento de
técnicas cirúrgicas e de endocrinologistas para tornar possível a transformação
corporal. Um verdadeiro corpo do outro sexo? Não tanto, pois os cromossomos
não podem ser transformados, e o interior do corpo, apesar das mudanças
externas, continua o mesmo.
A palavra “transexualismo” – ou transexualidade – está ligada às tentativas
de agir sobre o corpo para modificá-lo. Foi cunhada em 1953 pelo médico
alemão Henry Benjamin, pioneiro em intervenções e tratamentos, autor de O
fenômeno transexual, publicado nos EUA. Em dez anos o conceito se impôs e
começou a distinção clínica entre transexualidade e travestismo, que até então se
confundiam. No primeiro caso, trata-se de um problema de identidade de alguém
que não pode viver na pele de um homem (transexualidade masculino para o
feminino) ou na pele de uma mulher (feminino para o masculino). O travestismo
é um prazer particular, originado por múltiplos motivos, de vestir-se com roupas
do outro sexo, de “montar-se”.
Depois dos anos de luta e sofrimento e da absolvição do médico, tais
cirurgias só começaram a ser regulamentadas pelo Conselho Federal de
Medicina em 1997. Apenas em 2008 o governo oficializou as chamadas
“cirurgias de redesignação sexual”, implantando o Processo Transexualizador
por meio de seu órgão da saúde, o SUS. O mais importante, contudo, é a
sociedade aceitar a identidade narrativa de cada transexual: ou seja, aceitar a
narrativa que cada um faz de sua própria história, sem que seja necessário
escondê-la ou apagá-la.
Mudanças, agora, não mais de sexo, mas no sexo, também atingiriam a “mais
velha profissão do mundo”! Nos fins dos anos 1970, todo mês de julho, a vida
noturna das grandes cidades animava-se. Em época de férias, com mulher e
filhos distantes para descansar melhor, exauriam-se os maridos: “as cigarras”,
como eram chamados. Sua presença em boates, nightclubs e todo o tipo de casa
noturna azeitava o faturamento da indústria da prostituição, um negócio com
muitos interesses. No meio do ano, eles batiam recordes. Não só o preço das
prostitutas subia, mas acresciam a venda de bebidas alcoólicas e drogas, a
frequência de hotéis e motéis, e até porteiros de boates eram beneficiados. Em
1973, apenas em São Paulo, a polícia calculava haver 10 mil prostitutas, sendo 4
mil cadastradas. Entre essas, de 3 mil a 3.900 atuavam exclusivamente na “boca
do luxo”, região onde casas como o La Licorne, Vagão, Telecoteco da Paróquia,
Catedral do Samba etc. tornavam-se terreno de caça entre cigarras e formigas.
Todo esse aumento da prostituição, no entanto, não era coibido pela polícia, uma
vez que vender sexo não era crime.
As cigarras não cantavam igual em toda a parte. A revista Veja, em matéria
sobre o assunto, registrava as diferenças no país:
São Paulo, sem dúvida, é o centro nervoso desta época de apoteose – segundo as mulheres, é na capital
paulista que está o “grosso do dinheiro” […] Os cariocas são em geral menos generosos do que os
paulistas na remuneração dos seus programas. Os homens de negócios ou os senhores casados de
cidades como Salvador e Recife, por sua vez, não têm o hábito de se afastar de suas famílias durante as
férias de verão ou inverno […] Os mineiros igualmente não têm sido clientes ideais para as boates. Eles
recorrem mais às call-girls, que atendem em seus apartamentos (ou “apertamentos”) nos edifícios
Malleta, JK e San Remo no centro de Belo Horizonte. […] A segunda alternativa corre por conta dos
encontros marcados, ainda por telefone, com uma das call-girls recomendadas pelos barmen de uma das
principais boates da capital mineira, Lido, Chat Noir e People, sob um intrincado sistema de código que
funciona na base do “dr. Antônio pediu para o sr. José ligar amanhã para ele às 10 horas”. Ou de que “o
dr. Antônio confirmou que vai esperá-lo amanhã às 14 horas”. Em Brasília, o recesso parlamentar não
chega a alterar a vida noturna da cidade. Pelo contrário, as boates de Música pop Kako e Shalako
continuam bastante frequentadas, e a saída dos políticos, seguindo os porteiros e ascensoristas dos
hotéis de alta categoria, recompensada pela chegada dos turistas.
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Velhice e pobreza.
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ARQUIVO NACIONAL [FUNDO CORREIO DA MANHÃ].
Mas tenho muito medo do morrer. O morrer pode vir acompanhado de dores, humilhações, aparelhos e
tubos enfiados no meu corpo, contra a minha vontade, sem que eu nada possa fazer, porque já não sou
mais dono de mim mesmo; solidão, ninguém tem coragem ou palavras para, de mãos dadas comigo,
falar sobre a minha morte, medo de que a passagem seja demorada. Bom seria se, depois de anunciada,
ela acontecesse de forma mansa e sem dores, longe dos hospitais, em meio às pessoas que se ama, em
meio a visões de beleza. Mas a medicina não entende. Um amigo contou-me dos últimos dias do seu
pai, já bem velho. As dores eram terríveis. Era-lhe insuportável a visão do sofrimento do pai.
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