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INFORMALIDADE OU PRECARIZAÇÃO
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Como citar:
BATISTA NETO, M. C.; DIAS, A. P. O dilema da inserção do jovem no mercado de trabalho: informalidade ou
precarização. Revista Juventude e Políticas Públicas, Brasília, v. 1, n. 2, p. 157-166, jul./dez. 2017.
DOI: 10.22477/rjpp.v1i2.34
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INTRODUÇÃO
Este trabalho trata de uma proposta de pesquisa acerca do mercado de trabalho e a
qualificação profissional de segmentos juvenis, na cidade do Natal/RN, com vistas à inserção
deles no mercado de trabalho, via o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e ao
Emprego - PRONATEC, implementado pelo Governo Federal em 2011, com o objetivo de
ampliar a oferta de cursos de educação profissional e tecnológica.
O seu tema central está vinculado ao trabalho e à sua dinâmica frente aos processos
de reestruturação dos mecanismos do sistema produtivo vigente e às políticas de qualificação
para inserção da juventude no mercado de trabalho, como resposta às consequências desse
processo. Trata-se de uma pesquisa que contempla dois eixos temáticos, quais sejam: o
mercado de trabalho e as novas tendências das ocupações e a situação da inserção da
população juvenil no mercado de trabalho. Neste sentido, o estudo busca compreender a
relação entre o mercado de trabalho e à qualificação profissional, especificamente em relação
à população demandatária de cursos de curta duração na modalidade da Formação Inicial e
Continuada (FIC).
O presente trabalho teve como polo investigativo a Escola Estadual Berilo
Wanderley, localizada na cidade do Natal/RN onde são ofertados os cursos de Auxiliar
Administrativo, Recepcionista, Inglês Básico, Espanhol Básico, Vendas, Auxiliar de
Tesouraria e Libras. Neste estudo de caso, nos serviu de subsidio um levantamente entre 40
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1
Organização Internacional do Trabalho – OIT. Para mais informações consulte o escritório virtual da OIT no
Brasil.
2
World of Work Report 2014: Developing with Jobs. Disponível em:
<http://www.os.org.br/site/sites/default/files/wcms_243961.pdf>. Acesso em: 10 nov. 2014.
3
O mundo do Trabalho 2014: Desenvolvimento com Empregos.
4
Taxa de desemprego volta a subir na Espanha a 25,93%. Disponível em:
<www.em.com.br/app/noticia/internacional/2014/04/29/interna_internacional,523545/taxa-de-desemprego-
volta-a-subir-na-espanha-a-25-93.shtml>. Acesso em: 10 ago. 2014.
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Esses dados nos permitem introduzir o debate sobre a qualidade do emprego ocupado
pela juventude, em especial da juventude pobre. O que constatamos é que essa massa de
jovens pobres cristaliza-se como o fulcro que abastece a necessidade de força de trabalho do
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mercado informal e precarizado. É tautológico fazermos essa reiteração, mas essa perversa
realidade é o que temos desenhado no Brasil por séculos de desigualdades.
Neste sentido, se retomarmos as mudanças técnicas e organizacionais apontadas por
Harvey (1992) no mercado de trabalho, ressaltamos o caráter mercantil apontado por Marx
(1997) na relação capital e trabalho podemos perceber sob a perspectiva do capital, a
juventude como uma força de trabalho vulnerável a ser explorada, é lógico, aparentemente um
silogismo, que as condições de pobreza da juventude serve estrategicamente com perfeição as
engrenagens do capitalismo e suas necessidades no processo econômico. Discutindo essa
relação entre a juventude e o processo econômico, Menezes e Uchoa (2013, p. 106-107)
fazem os seguintes apontamentos:
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dois salários mínimos e segundo o PNAD-20115 o Estado tem a maior taxa de desemprego no
Nordeste e a segunda maior do Brasil. Como não poderia ser diferente, o desemprego entre a
juventude e a precarização do mundo do trabalho juvenil são elementos constitutivos do
panorama social potiguar.
O Rio Grande do Norte como outras unidades da federação carecem de programas
governamentais que forneçam formação de qualidade, levando em consideração as
potencialidades econômicas de cada região. Dinamizar a economia potiguar também é uma
necessidade estratégica frente os desafios do século XXI, que exige inovação tecnológica e
diversificação da economia para a constituição de outros espaços de ampliação no mercado de
trabalho.
Frente ao problema da qualificação para o mercado de trabalho o Governo Federal
instituiu em 2011 o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego –
PRONATEC, que busca oferecer condições para que a população em situação de
vulnerabilidade se insira no mercado de trabalho.
Nossa pesquisa como já referenciamos nas considerações iniciais deste trabalho
detém-se especificamente a Formação Inicial e Continuada (FIC), que é uma das modalides
do PRONATEC e oferta cursos de curta duração que tem o limite de três meses de duração
para serem concluidos. Perseguir a indagação se o programa fornece suporte básico necessário
para que os beneficiários possam não somente buscar uma vaga no mercado de trabalho, mas
se inserirem nele nos fornece um ponto de partida, embora estejamos atentos também à
qualidade do emprego ocupado por esse jovem.
Nossa investigação sobre a população demandatária do PRONATEC, em sua
essencia jovens, na Escola Estadual Berilo Wanderley, localizada na cidade do Natal/RN
fornece um perfil de uma juventude carente que ainda não tem definições claras sobre o
mercado de trabalho.
Indagando um dos benefeiciários sobre sua expectativa de inserção no mercado de
trabalho, este nos falou: “Não sei ainda. Não sei onde quero trabalhar. Quero trabalhar depois
de terminar a faculdade” (Beneficiário 1, 2014). Contudo, este tipo de fala, embora recorrente
sobre o interesse em ingressar no ensino superior, não é a mesma sobre a necessidade de
ingressar no mercado de trabalho, ou se manter nele, mesmo precarizado.
Alguns desses jovens já trabalham e enfrentam um mercado precarizado como única
alternativa de sobrevivência. “Olhe, eu trabalho há um ano e seis meses numa pizzaria e o
dono ainda não assinou minha carteira. Mas, o que eu vou fazer se tenho que ajudar em casa
5
PNAD: RN tem a maior taxa de desempregados no Nordeste e a segunda mais elevada no país. Disponível em:
<http://blogdobg.com.br/pnad-rn-tem-a-maior-taxa-de-desempregados-no-nordeste-e-a-segunda-mais-elevada-
no-pais/>. Acesso em: 10 ago. 2014.
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se minha mãe ‘tá’ desempregada” (Beneficiário 2, 2014). O que é recorrente e que pode ser
percebido é que geralmente os pais desses jovens enfrentam condições de trabalho
desgastantes e precárias, muitas vezes enfrentadas por eles mesmos. “Eu ajudo meu pai na
oficina. Estudo de noite ‘pra’ ficar lá manhã e tarde. É muito trabalho” (Beneficiário 3, 2014).
Desenhando um breve quadro do perfil destes estudantes e verificamos que todos são
oriundos da escola pública com faixa etária entre 14 a 29 anos, sendo alguns já senhores e
senhoras, que não somam um número expressivo: 4 de 40, ou 10% do total. Deste total de 20
entrevistados, 72% deles concluíram ou estão concluindo o ensino médio neste ano de 2014.
Em relação ao gênero esta composição é relativamente paritária entre os gêneros feminino e
masculino, sendo 55 % homens e 45% mulheres.
Jovens pobres que muitas vezes cumprem jornadas duplas de atividades, englobando
o trabalho e os estudos, todos oritundos da escola pública e majoritariamente moradores da
periferia da cidade de Natal. Nos trabalhos que desenvolvem o predominio do mercado onde
estão é o informal e precarizado, muitas vezes para complementar a renda familiar.
Em relação ao quadro social das familias que são orifundas essa juventude,
percebemos que metade vive com uma renda entre 1,5 a 3 salários mínimos mensais,
enquanto que 40% ganha até 1,5 salário mínimo apenas, o que denota que o programa tem
atendido um publico de baixa renda, como demonstra o gráfico produzido pela pesquisa que
segue abaixo.
Sem renda - 5%
Até 1,5 SM - 40%
Entre 1,5 e 3 SM - 50%
Entre 3 e 4 SM - 5%
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responsavel por cuidar da minha irmã pequena e deixar meu irmão menor na escola”
(Beneficiário 4, 2014).
Já os jovens que trabalham, estão inseridos essencialmente em um mercado de
trabalho informal e sua grande maioria não tem carteira de trabalho assinada, o que resulta na
negação da seguridade social. 78% nao tem carteira de trabalho assinada e apenas uma
minoria de 22% têm os direitos trabalhistas assegurados.
O PRONATEC fornece uma bolsa no valor de R$ 350,00 que varia de acordo com a
frequência do aluno, ou seja, esta é a política de permanência do programa. Frente o problema
da vulnerabilidade social é evidente que a bolsa é insuficiente e tem um carater marcadamente
efemero, pois, dura no máximo três meses referente a duração dos cursos de curta duração. O
destino dado ao valor das bolsas é essencialmente dois: complementação da renda familiar e
gastos pessoais.
O que deve ter atenção especial é o elemento que é possível constatar quando
observamos que embora o programa forneça as referidas bolsas, a somatória de jovens que
procuram trabalho soma 60% dos jovens inseridos no programa. Isso denota duas dimensões:
a necessidade de complementar a renda familiar e a procura pela liberdade financeira. “Estou
procurando trabalho, todos meus amigos estão. Se eu conseguir vou ajudar lá em casa até
‘mainha’ conseeguir emprego, ai depois que ela tiver trabalhando, eu vou ser independente,
vou trabalhar só pra mim” (Beneficiário 5, 2014).
Os cursos ofertados para que este jovem consiga ingressar no mercado de trabalho
são, a saber: Auxiliar Administrativo, Recepcionista, Inglês Básico, Espanhol Básico, Vendas,
Auxiliar de Tesouraria e Libras. Sendo todos de curta duração, levam no máximo três meses
para serem conclusos.
Levando-se em consideração as limitações do programa e os espaços destinos ao
jovem no mercado de trabalho atual, algumas considerações precisam ser feitas no sentido de
apontar as percepções desse processo de (des)qualificação e legitimação do mercado de
trabalho juvenil marcadamente informal e precarizado. Primeiro, em relação ao programa é
preciso dizer os cursos de curta duração constituem uma formação completamente
insuficiente para a inserção do jovem no mercado de trabalho. Um segundo ponto importante
é perceber que um jovem formado em Auxiliar de Tesouraria que se insere no mercado, está
no mercado informal, trabalhando em uma oficina e não em um escritório de contabilidade. O
jovem de 17 anos formado em Auxiliar Administrativo pelo programa, vende CD’s em um
bairro de periferia da cidade, enquanto que aquele que é formado em Libras cumpre uma
jornada de trabalho de oito horas numa pizzaria onde trabalho há um ano e seis meses sem
carteira assinada. Permanecer neste mercado não é opção, é necessidade. O programa reintera
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CONCLUSÕES
Dentre as conclusões que podemos tirar é que os cursos profissionalizantes de curta
duração são ofertados majoritariamente aos filhos de trabalhadores que estão no mercado
informal e precarizado. Isto não caracteriza-se como uma novidade, mas como a continuação
de um processo histórico onde o Estado a serviço do capital institui um apartheid na arena da
educação.
Nascimento, Moraes e Melo (2013, p. 263) expõe esse perfil excludente da educação
que “por esse caráter discriminatório e dualista o ensino secundário continuou destinado à
formação das elites dirigentes, enquanto que o ensino profissional era destinado ao operariado
e seus filhos”. Embora o acesso ensino médio no Brasil esteja muito próximo de ser
universalizado, o PRONATEC continua a destinar o ensino profissionalizante aos
seguimentos vulneráveis.
Os cursos ofertados legitima a desqualificação da formação ao se caracterizarem pela
simplificação do conhecimento. Além disso, os alunos pouco conseguem se inserirem no
mercado de trabalho por meio do curso adquirido e, quando se inserem, assumem postos de
trabalhos precarizados ou informais, reproduzindo, em sua maioria, o lugar que os pais
ocupam no mercado de trabalho.
REFERÊNCIAS
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“O dilema da inserção do jovem no mercado de trabalho: informalidade ou precarização”
MARX, Karl. A origem do capital: a acumulação primitiva. 2. ed. Coleção Bases 3. São
Paulo: Global Editora 1977.
MARX, Karl. Contribuição à crítica da economia política. 2. ed. São Paulo: Expressão
Popular, 2008.
NASCIMENTO, Ilma Vieira do; MORAES, Lélia Cristina Silveira de; MELO, Maria Alice.
A qualificação profissional no contexto das políticas para a juventude: em foco o Projovem.
In: Trabalho e formação profissional: juventudes em transição. Organizadores: Júnior
Macambira e Francisca Rejane Bezerra Andrade. Fortaleza: IDT, UECE, BNB, 2013.
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