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RESUMO
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Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da
Universidade Federal da Bahia - Área de Urbanismo. E-mail:
bethania.academico@gmail.com
SALVADOR E SUAS CORES 2017
ARQUITETURAS AFRO-BRASILEIRAS - UM CAMPO EM
CONSTRUÇÃO
1. INTRODUÇÃO
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“Para além dos seus impactos materiais, o isolamento espacial dos negros em relação
às classes médias e elites na cidade (Telles, 2004) contribui para alimentar um imaginário social
que racializa a pobreza, o crime e a violência, e naturaliza as distâncias sociais entre negros e
brancos. Questões de ordem simbólica e cultural relativas à ascendência africana interagem, por
sua vez, com questões de ordem material e territorial, tais como as políticas culturais, a
comunicação, as comunidades remanescentes de quilombos, a perseguição religiosa às religiões
de matriz africana, bem como a educação e o ensino da história da África” (ROCHA; CANDIDO;
DAFLON, 2016, p.131).
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A população negra refere-se aqui à somatória de indivíduos auto-declarados pretos mais
os auto- declarados pardos. Esta categoria refere-se à concepção utilizada pelo IBGE.
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Raça é conceituada aqui como uma construção social, como um princípio de
classificação feito pela sociedade que ordena e regula os comportamentos e relações sociais, a
partir dos fenótipos e atribuições de valor associados a eles. A raça como critério de classificação
extrapola a noção biológica da ausência de diferença entre os seres humanos, assim “a igualdade
biológica não impulsiona a igualdade social” (SANTOS, 2012). Sua pertinência se dá na
contínua atualização das relações de poder que são sustentadas pelo critério racial. Portanto, ao se
tratar da sociedade brasileira, historicamente marcada pela colonização portuguesa e escravização
do negro/a, identifica-se que as hierarquias raciais se dão num sistema de relações de poder que
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privilegia os europeus frente aos não europeus, privilegiando assim os brancos frente aos não
brancos.
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A partir disto, observa-se o quanto está implicado o fator raça, ou seja, a posição
social que o indivíduo negro/a tem ocupado, dentro das disputas do espaço urbano. É
importante ressaltar, que a diferenciação entre o “lugar do branco” e o “lugar do negro”
transborda as assimetrias econômicas. As hierarquias raciais configuram ambientes de
exclusão e discriminação, ladeados por fronteiras invisíveis, mas de eficácia tamanha,
que exercem um forte papel regulador no que diz respeito aos espaços – econômicos,
políticos, culturais, etc – que os indivíduos negro/as podem ou não, permear
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No século XXI, a temática das relações raciais torna-se um dos assuntos mais
discutidos no Brasil. Este debate passa a impulsionar estudos que se propõem a
compreender melhor estas relações e que buscam construir possibilidades de
transformação da sociedade, em prol de uma maior justiça social. Liderado pelo
Movimento Negro Brasileiro, este debate se torna mais visível para a sociedade
brasileira no momento de criação de políticas públicas que intencionam combater os
impactos do racismo, as chamadas ações afirmativas. Contudo, apesar das ações
afirmativas indicarem a responsabilização do Estado brasileiro, o planejamento das
cidades brasileiras tem reforçado e perpetuado a correlação de poder baseada nas
hierarquias raciais, mantendo e reconfigurando as desigualdades. Portanto, a ausência
de institucionalidade, nas práticas de apartação espacial na produção do espaço urbano é
uma ilusão, sustentada pelo mito da democracia racial5.
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O mito da democracia racial é uma construção ideológica, que teve Gilberto Freyre como seu
maior expoente, influenciando a leitura sobre as relações raciais no Brasil, no imaginário social e
no campo científico. Esta ideologia baseia-se no mito de que no Brasil, diferente de países como
África do Sul e Estados Unidos, as relações entre negros, brancos e índios se davam
harmoniosamente, tratando assim as desigualdades raciais como um não-problema e negando os
impactos da escravidão no país. (IANNI, 1987; VARGAS, 2005; GARCIA, 2006). Este mito
integra grande parte da estrutura do racismo à brasileira que é pautado numa retórica anti-
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racialista em que as disparidades são perpetuadas por um “racismo, sem racistas” (RAMOS,
2007).
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Segundo Garcia, “com a previsão do fim do regime escravocrata, as classes
dominantes trataram de se organizar, com instrumentos jurídicos-institucionais que lhes
garantissem o monopólio de terras” (GARCIA, 2006, p.80).
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do Uso e Ocupação do Solo (LOUOS) e o novo PDDU de 2016, objeto deste trabalho
(SANTOS, 2016).
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“Como a posição na estrutura social e a apropriação do espaço urbano são
estreitamente articuladas, o território metropolitano termina por assumir diferentes
“cores”. A área central de Salvador (onde ficam bairros como Barris, Graça e Canela) e a
faixa da Orla Atlântica que vai de Salvador a Lauro de Freitas, onde se concentram as
oportunidades de trabalho, a maior parte dos equipamentos urbanos e os espaços
classificados como superiores e como médio superiores constituem as áreas residenciais
privilegiadas da parcela branca da população. Ela está especialmente sobre representada
nos espaços superiores da Barra, Graça, Campo Grande/Canela e Pituba, onde os brancos
chegam a 69,1%, 69,7%, 68,5% e 65,7%, enquanto os pretos não passam de 5,9%, 4,4%,
7,0% e 5,0%. Já os pretos e pardos se abrigam predominantemente em áreas do tipo
popular ou popular-inferior do Miolo e do Subúrbio (como Cajazeiras, Fazenda Grande,
Tancredo Neves, Coutos, Plataforma, Periperi, Lobato ou Paripe), de uns poucos
enclaves do centro e da orla (Engenho Velho da Federação, Alto das Pombas, Liberdade,
Nordeste de Amaralina e Bairro da Paz, por exemplo), muitas vezes em sítios
acidentados e desfavoráveis, assim como nos demais municípios da RMS”.
(CARVALHO; CORSO, 2008, p.94)
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As Operações Urbanas Consorciadas são parcerias de caráter publico privado, onerosas
para o Estado e que permitem que uma empresa implante um projeto na cidade, gerindo
este projeto a partir de parâmetros urbanísticos acordados entre as partes. No novo
PDDU, as OUCs passam a abranger mais de 30 bairros (compreendendo a área relativa à
Orla Atlântica, ao Centro Antigo e a Península Itapagipana), áreas que coincidem com
uma Manifestação de Interesse Privado, apresentada pela Odebrecht (SANTOS, 2016).
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6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Assim, em Salvador, observa-se uma segregação urbana que tem cor: os negros
encontram-se historicamente nos espaços da cidade com condições inferiores, enquanto
os brancos encontram-se nos espaços privilegiados e com uma melhor infraestrutura
urbana e melhor condição de acesso aos serviços públicos. Dessa forma, a desigualdade
econômica é nada mais do que um reflexo da desigualdade politica.
Para obter subsídios para este estudo usa-se o Plano Diretor de Desenvolvimento
Urbano de Salvador de 2016 como objeto. O PDDU de 2016, enquanto um instrumento
de planejamento municipal, que serve para nortear as ações dos agentes públicos e
privados em Salvador, foi denunciado pelos movimentos sociais como um instrumento
que visa tão somente à manutenção dos privilégios dos grupos dominantes, reforçando e
perpetuando as desigualdades raciais no espaço urbano.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS