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Amanda Hyppolito2
https://orcid.org/0000-0003-2295-9725
Jussara Brito3
https://orcid.org/0000-0001-6744-4595
Letícia Masson4
https://orcid.org/0000-0002-5422-286X
Simone Oliveira5
https://orcid.org/0000-0002-1477-749X
1
Departamento de Psicologia, Instituto de Psicologia, Universidade Federal Fluminense
(UFF). Block N - Rua Prof. Marcos Waldemar de Freitas Reis - Gragoatá, Niterói - RJ, Brasil.
CEP 24210-201myale@uol.com.br
3
Centro de Estudos da Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana (CESTEH) Escola Nacional
de Saúde Pública (ENSP) Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ) Rua Leopoldo Bulhões,
1480, sala 302, Manguinhos - Rio de Janeiro - RJ. Brasil CEP: 21041-210
jussara@ensp.fiocruz.br
4
Centro de Estudos da Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana (CESTEH) Escola Nacional
de Saúde Pública (ENSP) Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ) Rua Leopoldo Bulhões,
1480, sala 302, Manguinhos - Rio de Janeiro - RJ. Brasil CEP: 21041-210
leticiamasson@ensp.fiocruz.br
5
Centro de Estudos da Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana (CESTEH) Escola Nacional
de Saúde Pública (ENSP) Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ) Rua Leopoldo Bulhões,
1480, sala 302, Manguinhos - Rio de Janeiro - RJ. Brasil CEP: 21041-210
simone@ensp.fiocruz.br
RESUMO:
O presente artigo tem como foco as estratégias metodológicas de uma pesquisa↔intervenção,
com ênfase nas relações entre saúde e trabalho, desenvolvida em conjunto com trabalhadoras
— professoras, cozinheiras, auxiliares de serviços gerais etc. — de uma escola pública de
ensino fundamental em tempo integral, localizada em um município do estado do Rio de
Janeiro. Apresenta-se as etapas do percurso investigativo, estruturado em ciclos que, por sua
vez, corresponderam às etapas: i) realização semanal de conversas dialogadas e observações
das atividades de trabalho no curso da ação, colaborando com a identificação constantemente
atualizada do cenário no interior do qual se desenvolviam as atividades das trabalhadoras; e ii)
os Encontros Sobre o Trabalho, inicialmente, por segmento profissional e, mais tarde, com o
coletivo ampliado. A perspectiva era a realização de encontros com o coletivo ampliado de
profissionais, com vista à construção de um observatório contínuo e permanente sobre as
relações entre saúde e trabalho, alimentado por uma comunidade ampliada de
pesquisa↔intervenção — CAPI. As transformações instauradas pelos processos constantes da
pesquisa↔intervenção abrem um campo permanente de negociação cotidiana comprometido
com melhores condições de vida, saúde e trabalho.
Palavras chaves: pesquisa; saúde; trabalho; saúde do trabalhador; educação
Abstract:
This article focuses on the methodological strategies of intervention research, with an
emphasis on the relationship between health and work, developed in conjunction with
workers - teachers, cooks, general auxiliary services, etc. - a public elementary school in full-
time, located in a municipality in the state of Rio de Janeiro.. The investigative journey is
presented, structured in cycles as the corresponding stages. First, weekly sessions of
conversations and participation of work activities in the course of action, collaborating with
the identification of damages caused by the scenario in the countryside, qualifying as
activities of the workers. And second, Meetings About Work, initiated by the professional
segment and, later, with the expanded collective. One perspective was the realization of
meetings with the expanded collection of professionals, intending to build a continuous and
permanent observatory on relations between health and work, fed by a developed community
of research and intervention — CAPI. The transformations brought about by constant
research processes open up a permanent field of daily negotiation committed to better living,
health and work conditions.
Keyword: Research, health; work; worker's health; education
Introdução
Uma experiência de longa duração realizada entre meados de 2014 e final de 2017, no
âmbito do “Programa de Pesquisa↔Intervenção Vida, Saúde e Trabalho nas Escolas”, da
Universidade Federal Fluminense (UFF), deu origem ao presente texto e às questões com as
quais ele se ocupa, especialmente a reflexão acerca de estratégias de investigação que
favoreçam a participação efetiva dos trabalhadores e trabalhadoras em investigações no
campo da Saúde do Trabalhador. Assim, serão consideradas especialmente as potencialidades
das estratégias de uma dada pesquisa↔intervenção, com ênfase nas relações entre saúde e
trabalho, bem como os obstáculos enfrentados. Tal experiência transcorreu em conjunto com
profissionais, em sua maioria mulheres1 — professoras, cozinheiras, auxiliares de serviços
gerais, zeladores e técnicas administrativas —, que realizam suas atividades em uma escola
pública de ensino fundamental em tempo integral, localizada em um município do estado do
Rio de Janeiro.
Inicialmente, situaremos epistemologicamente e teoricamente as estratégias
que a saúde está associada à capacidade normativa do ser vivo para tolerar e travar disputa
para detectar, interpretar e reagir — ou seja, instituir novas normas de vida, bem como se pôr
em risco, cair doente e se reabilitar. E tudo dito presumido o necessário suporte societal. Falar
sobre saúde é falar, portanto, sobre um cotidiano que demanda ininterrupta mobilização
cognitiva, afetiva, corporal. O corpo-si, como quer Yves Schwartz23, quando reflete acerca
das dramáticas de usos de si por si e por outros para dar conta da defasagem entre o “trabalho
capacidade normativa. Haveria uma dimensão do corpo humano, portanto, apenas acessível
Para Schwartz23, toda atividade humana está inserida dentro de uma ambiência que
empreendidas no curso do agir. Entre o explícito e o não formulado, entre a história coletiva e
que a atividade de trabalho não corresponde apenas ao conhecimento sistematizado, mas aos
individuais surgidas no contexto laboral. Ainda de acordo com Schwartz 23, o desempenho
que, na atividade, há mais dimensões do que aquelas apreensíveis pela linguagem. Falar sobre
atividade, um núcleo perene de debate sobre normas atravessado por um mundo de valores.
a identificação das circunstâncias patógenas (mas não só!) seja feita de forma continuada,
trabalhar45,56,67,78.
saúde e trabalhadores cooperariam entre si, o que levou Oddone, Marri e Briante89 a
pela colaboração entre saberes distintos — tanto os acadêmicos quanto os gerados a partir da
apresenta a ideia de “dispositivo dinâmico de três polos” (DD3P) como um arranjo analítico
Schwartz, os polos são três: (I) as disciplinas científicas; (II) os saberes investidos na
informações debatidas134.
a partir das situações de trabalho 189. Regimes de produção de saberes não se organizam como
Tudo dito, o artigo está dedicado as atividades de trabalho em uma dada escola de
e da afirmação da vida é parte do processo de trabalho, que, neste bojo, revela-se uma cadeia
complexa de nós, cuja imbricação apenas se torna possível pelo próprio movimento do real.
pesquisa e da intervenção.
reflexão ao redor das condições e formas de organização do trabalho, bem como suas
grupo. Em agosto de 2014, estabelecemos contato com representantes de uma das regiões do
Sindicato Estadual dos Profissionais da Educação do estado do Rio de Janeiro (SEPE/RJ) para
que indicassem uma escola onde pudéssemos desenvolver tal experiência, sendo indicada uma
com as trabalhadoras que participaram do processo desde sua deflagração também foi
acontecimento que, somado aos demais, tornou imperativo o repetido retorno às anotações e
análises. Os ciclos, por sua vez, corresponderam às seguintes etapas: – (I) realização semanal
das atividades de trabalho no curso da ação; e (II) Encontros Sobre o Trabalho – EST, por
saúde e trabalho. Cada novo grupo de trabalhadoras de cada um dos segmentos disparava o
início de um novo ciclo que reproduzia, com especial atenção para as singularidades, as
autoras)
Então, antes da realização dos Encontros Sobre o Trabalho – EST na escola, tornamos
disponível uma análise preliminar para leitura das trabalhadoras, na forma de um relatório. Ali
trabalho.
por intermédio de conversas sobre as atividades de trabalho e sobre os relatórios. Mas, diante
que justifica dizer que cada EST — realizado na escola e durante jornada de trabalho — era
um evento único.
Foram realizados, em cada ciclo (que variaram de acordo com a rotatividade dos
rotatividade, por exemplo, apenas poucas professoras delas, de um total de 32, não
exemplo da correção de exercícios dos alunos. Os locais que sediaram as dinâmicas foram por
elas indicados e tiveram duração variável entre uma hora e meia e duas horas. No primeiro
trabalhadoras; fato que tornou possível tanto uma análise inicial imediatamente ulterior ao
O primeiro encontro da série foi agendado com as cozinheiras da escola e, por ordem
ver in loco as queixas apontadas. Para os encontros com as professoras, foi necessário um
famílias já estariam cientes de que, naqueles períodos, as crianças seriam liberadas mais cedo.
O agendamento prévio assegurava que nem crianças nem famílias seriam prejudicadas pela
pesquisa↔intervenção. As trabalhadoras vinculadas à administração escolar (secretária e
auxiliares de secretaria e de ensino) exigiram uma estratégia de pesquisa habilitada para lidar
com inúmeras variabilidades, especialmente, porque nenhum EST foi possível, já que com o
término de seus contratos precários se desligavam da escola, e sem que tenha havido a devida
especialmente voltada para as particularidades de uma escola em tempo integral; o que afeta a
inadequação do espaço físico da escolada falta de prescrição das atividades realizadas e das
porque nenhum EST foi possível. Ao longo dos encontros os grupos de trabalhadoras
validaram a maioria das análises, ampliando-as, e nos conduzindo, mais de uma vez, a ver in
incluímos os ajustes apontados pelos grupos de pelas trabalhadoras. Munidas dCom a versão
mudanças sugeridas pelas trabalhadoras e com vistas à melhoria das condições de trabalho e
saúde. Vale destacar que algumas já haviam sido acatadas e implementadas pela direção ao
longo do processo, tais como a redistribuição de tarefas entre auxiliares e cozinheiras (o que
até então era motivo de conflito) e a compra de equipamentos e construção de novas bancadas
de trabalho na cozinha.
contribuir para a resolução das dificuldades de cooperação 223. O EST ampliado exigiu um
agendamento prévio, acordado com a direção escolar, para liberação das trabalhadoras que
socializar lanchando, percorrer o espaço, consultar as pastas e travar diálogos entre si. Nos
arredores das cadeiras, foram instalados painéis com os resultados de outras pesquisas
sobre Vida, Saúde e Trabalho nas Escolas Públicas” — página da internet por nós concebida,
educação, além de repositório de materiais nesta temática. Por fim, um mural colorido
intitulado “Em cena os(as) trabalhadores(as) da escola”. Cuidamos para fazer constar
mesmo após o encontro, tendo sido mantida até o fim daquele ano letivo.
importância apontada por elas acerca do reconhecimento do trabalho na escola. Toda questão
ou imagem compartilhada suscitava discussões sobre quem disse o que foi dito, sobre
bem como daquelas que se engajaram posteriormente no processo. Devemos garantir algum
destaque para o fato de que as etapas terem sido realizadas ao longo de um tempo maior de
permanência na unidade escolar favoreceu o estreitamento dos laços de confiança entre as
Saúde do Trabalhador ainda que não se manifestem exigências explícitas por parte de
escola em questão, em que o sindicato foi apenas mediador, indicando a unidade escolar e
pelos investigadores profissionais e pelas trabalhadoras da escola — uma vez que os entraves
encaminhamento de ações de naturezas diversas que, por sua vez, envolviam sugestões de
Os Encontros Sobre o Trabalho, conceituados por Durrive 156, têm como foco a
avanço nas discussões sobre a atividade, por meio da apropriação de conceitos e da dimensão
ética nos locais de trabalho, com vista à construção de uma comunidade ampliada de
54,178
pesquisa↔intervenção — CAPI . Ao colocar ênfase sobre a relação saúde e trabalho nas
e, de acordo com análise ulterior, tornaram-se essenciais para o desenho de uma gestão do
trabalho que afirmasse valores do bem comum tal qual a qualidade do trabalho realizado e a
devemos produzi-lo no decorrer dna própria pesquisa; elaborando instrumentos de ação por
parte das trabalhadoras demarcadores de zonas de desenvolvimento potencial. Eis a razão pela
qual o vocábulo “encontros” faz referência também à aposta na potência das conversas
de trabalho201 — o encontro, por fim, um lugar de “dar com” e “pôr-se ao lado” de questões
de pesquisa↔intervencão45,101,167.
Com o I Encontro Ampliado Sobre o Trabalhado e Saúde, deflagrador de uma terceira
relação estritamente entre pares. A intenção era que o compartilhamento de ideias associadas
dos mundos do trabalho, por meio de uma coletânea de questões e problemas diversos que
disparou: “a gente nem faz ideia de que seja tanto!”. A cozinheira, acenando em
concordância, respondeu: “pois é, mais pessoas precisam ler isso!”. Ainda que nem todas as
trabalhadoras tenham participado da experiência em voz alta, algumas delas se viam presentes
ampliado, a exemplo dos comentários sobre as fotografias que ilustravam o mural. Mais de
uma auxiliar, inclusive, procurou-nos para sugerir que as conversas, individualmente e/ou por
segmento, continuassem, ainda que elas não quisessem se manifestar publicamente. O que
experimentadas, buscando identificar os seus limites, com vistas a que melhor assegurem a
efetiva participação de todas nas discussões. Cremos, todavia, que um primeiro gesto foi
A proposta de novos e regulares encontros com o coletivo ampliado foi aceita por
todas as presentes, até mesmo com a recomendação por parte das trabalhadoras de que os
materiais produzidos não permanecessem restritos ao âmbito da escola, já que como dito
“essa realidade não é só dessa escola particular”. Indicou-se ainda que os relatórios
junto ao Conselho Escola Comunidade (CEC) — que, por sua vez, realiza reuniões regulares
funcionamento ampliado não culminou com um tempo de trabalho mais “vivível” 123 ou
disponível por parte das trabalhadoras, principalmente das professoras, à pesquisa, visto
realizarem suas tarefas no maior frenesi, mesmo com os intervalos previstos. Não havia,
portanto, uma brecha de tempo possível no calendário escolar diante das diversas atividades
discursiva, fez emergirem relatos sobre vínculos empregatícios precários — sobretudo, por
dores de cabeça, nas costas e no estômago; desânimo e fadiga geral; ansiedade, irritabilidade e
problemas osteomusculares.
À guisa de conclusão
acerca dos avanços, limites e desafios enfrentados. Ao corroborarmos uma perspectiva que
quando da entrega do seu relatório final para a regional do sindicato, fomos convidadas a
assessorar na formulação e análise dos resultados de questionário a ser aplicado pelo SEPE/RJ
educação, o que se apresentou como um aceno em direção às novas perspectivas abertas pela
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