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do Princípio do Prazer”
caráter polêmico das ideias do texto, a recepção das novas teses foi marcada por
1
conceitual nas diferentes partes do texto, evitando interpretações que procurem na
Exposição da questão
transferência e de destino, bem como uma brincadeira infantil. Esses fatos apresentam
como elemento comum a busca por repetir situações que não causam nenhum tipo de
prazer, o que desafia um dos pontos centrais de seu quadro teórico, o princípio do
são sentidos como desprazer. Dessa forma, Freud postula a existência de uma
regulador.
1
Daqui em diante, adotaremos a sigla APP para se referir ao artigo “Além do princípio do prazer”.
2
Correlacionado ao princípio de prazer está o conceito de pulsão 2, atuando, em
linhas gerais, como uma força de caráter constante cuja fonte de estímulo é endógena.
Dessa maneira, é postulada uma pressão permanente que exige o trabalho do aparelho
apontar para um tipo de movimento não regulado pelo princípio do prazer. Para
que a pulsão possui um caráter regressivo, uma vez que ao caracterizá-la como uma
era tomada como uma mola propulsora para o desenvolvimento individual e da espécie.
2
Como pontua Luiz Hanns (1996) a tradução do termo Trieb é uma das mais polêmicas na obra freudiana.
O termo em alemão denota uma grande gama de significados, como afirma o autor: “Abarca um princípio
maior que rege os seres viventes e que se manifesta como força que coloca em ação os seres de cada
espécie; que aparece fisiologicamente "no" corpo somático do sujeito como se brotasse dele e o
aguilhoasse; e, por fim, que se manifesta "para" o sujeito, fazendo-se representar ao nível interno e
íntimo, como se fosse sua vontade ou um imperativo pessoal. No texto freudiano também, a palavra
mantém estas características de uso. Estes significados estão todos muito próximos e sempre
correlacionados com um núcleo básico de sentido: algo que "propulsiona", "coloca em movimento"”
(p.331). Contudo, após o estabelecimento da “The Standard Edition of the Complete Psychological
Works of Sigmund Freud”, traduzida para o inglês por J. Strachey, o termo Trieb foi traduzido por
instinto, o que aproximou a psicanálise de uma linguagem naturalista, conforme aponta Tavares (2013).
Na obra freudiana o termo Instintik aparece poucas vezes, conotando o instinto animal. Partilho do ponto
de vista de Hanns e Tavares que traduzem o termo Trieb por pulsão uma vez que está mais próximo do
uso alemão, contudo diversas traduções optam pela opção de instinto. Em vista de tal problema irei alterar
os trechos em que determinados tradutores optaram por instinto.
3
FREUD, 1920/2010a, p.202
3
Ao contrário, a hipótese conceitua a pulsão como uma força que busca “estados
anteriores”, que em última instância leva Freud a questionar o que seria um suposto
estado primitivo no qual a pulsão anseia. Diante de tal problemática, Freud desenvolve
de uma força que busca o estado anterior à existência da vida, que é deduzida ser a
instância, em uma força que se empenha na direção da morte do organismo. Tais ideias,
Freud apresenta cautelosamente de modo hipotético, mas a partir de 1923 passa a aceitá-
psicanálise. 4
recebidas com amplas resistências, inclusive por parte dos seguidores de Freud.
matéria inorgânica. Jones aponta que entre os intérpretes, surgiram duas linhas de
e a segunda linha interpretativa iniciada por Melanie Klein, buscou encontrar aplicações
4
A partir do artigo “O Eu e o isso” (1923) Freud passa a adotar as hipóteses de APP do ponto de vista
topográfico, estabelecendo uma nova divisão do aparelho psíquico em Eu, Isso e Super-Eu.
4
Segundo Jones, ambas as linhas interpretativas apresentam um distanciamento das
propostas iniciais de APP. Jones rebate a primeira linha interpretativa afirmando que até
o final de sua vida, Freud manterá o desenvolvimento das investigações de APP, o que
de Freud. Jones então sugere uma opção interpretativa a partir da consideração das
Contudo, apesar da indicação, ele não progride nesse tipo de análise. A presente
será orientada pela seguinte pergunta: quais relações são estabelecidas entre
obra.
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No início do artigo “As pulsões e seus destinos” (1915), Freud esquematiza de
de seu pensamento:
delas são de maior interesse para os objetivos desta proposta de investigação, a saber: i)
formalização dos conceitos freudianos7. Para tal feito, Freud recorre a especulações
utilizando ideias abstratas “tomadas de algum lugar”, seja da ciência, dos mitos, da arte.
6
FREUD, 1915/2013a, p.15-7
7
Em “Introdução à epistemologia freudiana” (1984), Paul-Laurent Assoun aponta que tanto a censura
aos aspectos sistemáticos do saber quanto a referência às convenções como forma de compreender o
processo argumentativo, são influências da obra de Ernst Mach, particularmente “Conhecimento e erro”
(1905). Pretendo investigar essa influência durante a pesquisa.
6
O aspecto convencional que estas ideias ocupam no argumento freudiano pretende
Freud afirma que o caráter regressivo da pulsão é a terceira etapa de teoria das pulsões,
sendo precedido pela extensão do conceito de sexualidade em “Três ensaios para uma
o terceiro passo na teoria das pulsões, que aqui empreendo, não pode
reivindicar a mesma certeza dos outros dois anteriores, a extensão do
conceito de sexualidade e a tese do narcisismo. Essas inovações foram
transposições diretas da observação para a teoria, sem maiores fontes de erros
do que as inevitáveis nesses casos. É certo que também a asserção do caráter
regressivo das pulsões baseia-se em material observado, isto é, nos fatos da
compulsão à repetição. Mas talvez eu tenha superestimado o significado
deles. De toda maneira, só é possível levar adiante essa ideia combinando
repetidamente o factual e o apenas excogitado, assim afastando-nos da
observação8,
APP quando comparada com as precedentes. Até então o vínculo estabelecido entre o
entre os dados de uma psicologia clínica e conceitos metapsicológicos. Com APP, Freud
aponta para um momento de cisão entre metapsicologia e psicologia clínica, uma vez
O trecho também aponta três momentos em que houve “inovações” na teoria das
8
FREUD, 1920/2010a, p.233
7
investigar, será necessário apontar alguns elementos das etapas apontadas como
da pesquisa.
ao aspecto não integrado da busca pelo prazer. O aspecto parcial é em virtude da origem
concepção precisa do conceito geral de pulsão, uma vez que o argumento conceitual
está fortemente vinculado com a diversidade do material empírico estudado pelo autor.
Apenas em 1915, Freud acrescenta ao texto uma concepção precisa do conceito geral de
pulsão
9
Garcia-Roza (2018, p.79) aponta que Freud utiliza a expressão “trieb” desde os textos de 1890, contudo
tal termo ainda não é definido de maneira clara, apresentando-se ainda em um nível terminológico e não
conceitual.
8
entre o psíquico e o físico. A mais simples e imediata suposição sobre a
natureza das pulsões seria que elas não possuem qualidade nenhuma em si,
devendo ser considerados apenas como medida da exigência de trabalho feito
à psique. O que diferencia as pulsões uma das outras e as dota de atributos
específicos é a relação com suas fontes somáticas e suas metas. A fonte da
pulsão é um processo excitatório num órgão, e sua meta imediata consiste na
remoção desse estímulo no órgão10
Freud pensa a pulsão não inteiramente no interior do aparelho psíquico. A parte capaz
enquanto força constante. É a partir desse caráter constante que impulsiona o organismo
que Freud postula que “são as pulsões, e não os estímulos externos, os verdadeiros
motores dos progressos que conduziram o sistema nervoso, com sua infindável
10
FREUD, 1905/2016, p.66-7
11
FREUD, 1915/2013, p.23
9
Contudo, no artigo “Introdução ao narcisismo” (1914), Freud apresenta a hipótese
que o Eu, até então uma instância inibidora da pulsão sexual, também é objeto da
Schreber13, Freud atenta para um investimento amoroso em direção ao Eu, que leva o
doente a diminuir seu interesse pela realidade externa. No artigo de 1914, Freud
como objeto da pulsão sexual. Com essa tese, os contornos do dualismo entre pulsão
sexual e pulsão do Eu passam a ficar cada vez menos claros. Como aponta Inara Marin
pulsional incluindo a tese do narcisismo. A autora aponta que entre 1914-1920 Freud
contrárias. Será apenas com APP que conseguirá desenvolver essa contradição através
Logo nos dois primeiros parágrafos do texto, Freud faz uma breve referência aos
problemas ligados os nexos entre conceituação teórica e prática clínica que não se deve
subestimar a importância:
compreender que, nessa passagem, Freud aponta que os conceitos estão subordinados
12
O termo parafrenia foi introduzido por Freud ao tratar pacientes com duas características fundamentais:
megalomania e perda de interesse com a realidade exterior. O quadro clínico também é chamado de
dementia precox, na definição de Emil Kraepelin, e também denominado como esquizofrenia, segundo a
definição Eugen Bleuler.
13
“Observações psicanalíticas sobre um caso de paranoia relatado em autobiografia” (1911),
14
FREUD, 1920/2010a, p. 162.
10
aos dados no que se refere à função terapêutica do saber psicanalítico. A psicologia
passagem, esse saber procura criar um quadro explicativo que não se filia,
relação permanente com o factual. Dessa forma, caso sejam apresentados dados que
excitação vivida enquanto desprazer e procura abaixar essa quantidade de tensão, o que
gera a sensação de prazer. ii) o aparelho psíquico procura manter a sua excitação interna
Freud apresenta uma série de quatro casos que possuem a característica de uma
busca por uma experiência de desprazer sem vinculação com qualquer tipo de prazer.
situação traumática através de seus sonhos. Freud aponta a relevância desse dado, uma
vez que contraria as teses apresentadas em "A interpretação dos sonhos” (1900) na qual
os sonhos são processos nos quais há uma vivência imaginária de uma realização de
assemelha a primeira porque também diz respeito a uma vivência de perigo, Freud
observa uma brincadeira realizada por seu neto após sua mãe o deixar. A criança
representa sua saída através do lançamento de um carretel e sua chegada com a puxada
capaz de trazer o objeto de novo a seu domínio. Freud nota que o fato da mãe da criança
11
ir embora era motivo de desprazer e, ao contrário, o retorno causava alegria a ela; os
mesmos afetos eram vividos com o lançamento e a puxada do carretel 15. Contudo Freud
nota que seu neto repetia compulsivamente o lançamento, não dando a mesma
repetidas vezes. O terceiro caso são as neuroses de transferência, fenômeno que ocorre
fim, Freud nomeia um conjunto de fenômenos como neuroses de destino, casos em que
impressão de que são produzidas fora de sua influência, revivida como um destino.
elementar e, portanto, anterior a este. Para procurar justificar tal suposição, Freud inicia
uma nova etapa de sua investigação, na qual supõe-se que há uma mudança na relação
usada por Freud no início da sessão IV de APP para denominar a etapa que aí se inicia.
explorar sua hipótese. Essa é a parte considerada mais polêmica do texto, onde se
15
O caso é relatado entre os parágrafos 6 à 8 da segunda sessão de APP (1920/2010a, p.171-3)
12
Para justificar a hipótese da anterioridade da compulsão à repetição em relação ao
princípio do prazer, Freud transforma uma série que aparecia enquanto uma anomalia da
estado livre e ligada. No primeiro caso, a energia flui livremente, sem o controle do
partes do aparelho. Com esses elementos, Freud introduz o tópico da vivência de dor
como uma grande soma de excitações advindas de uma fonte externa capaz de romper
as proteções do organismo, invadindo-o sem que este esteja preparado. Segundo essa
estavam ligadas a certas regiões do aparelho psíquico com o intuito de criar, em torno
analogia destes com a vivência de dor. Na seguinte passagem Freud apresenta sua
hipótese de leitura para o caso das neuroses traumáticas, o mesmo raciocínio será
13
Creio que podemos nos arriscar a ver a neurose traumática ordinária como a
consequência de uma vasta ruptura contra estímulos[...] Se os sonhos dos
neuróticos que sofreram acidentes fazem os doentes voltarem regularmente à
situação do acidente, então eles não se acham a serviço da realização de
desejo, cuja satisfação alucinatória tornou-se, sob domínio do princípio do
prazer, função dos sonhos. Mas podemos supor que desse modo eles
contribuem para outra tarefa, que deve ser resolvida antes que o princípio do
prazer possa começar seu domínio. Tais sonhos buscam lidar
retrospectivamente com o estímulo [...] a outra tarefa do aparelho psíquico,
controlar ou ligar a excitação, teria precedência, não em oposição é certo,
mas de forma independente dele e sem consideração por ele, em parte16.
possibilitando que a excitação seja regulada pelo princípio prazer. Considera-se que,
embora seja uma etapa em que o autor não utiliza dados empíricos para construir seu
entre metapsicologia e psicologia clínica no qual há uma interrupção das relações entre
um campo e outro.
aparelho psíquico, sendo incorporada a este somente por meio de seu “representante
energia ligada. Em APP Freud assume outra posição: “Talvez não seja muito arriscado
supor que os impulsos que partem as pulsões não obedecem ao tipo de processo nervoso
‘ligado’, mas àquele livremente móvel, que pressiona por descarga” 17. Essa mudança
16
FREUD, 1920/2010a, p.194
17
FREUD, 1920/2010a, p.198
14
Em busca do aspecto mais elementar da pulsão, Freud levanta a hipótese segundo
a qual a pulsão é uma força que visa restabelecer estados anteriores. A definição é vaga:
o que são os esses estados anteriores? Esse ponto possibilitou diferentes tipos de
Procurando elaborar o que é esse movimento que busca estados cada vez mais
de uma pulsão que impele para a morte, da origem da relação sexual e da possibilidade
de uma força unificadora tal qual o Eros grego. Para prosseguir no desenvolvimento de
tais questões Freud recorre a teses retiradas das ciências biológicas, da mitologia e da
filosofia para buscar meios que tornem possível seu pensamento. Este desenvolvimento
De um lado pulsão de vida, força de união que procura retornar a uma suposta fusão
existente em um estado primordial, de outro, pulsão de morte, força que busca retornar à
15
nos problemas deixados em aberto a partir do artigo “Introdução ao narcisismo” e na
forma:
- (ii) Seção IV, parágrafos 1-4 da seção V. Etapa na qual os sintomas clínicos são
- (iii) Seção V a partir do 5°parágrafo, Seção VI e VII. – Etapa caracterizada por uma
clínica.
Objetivos
pulsão em APP.
16
Para tanto, os objetivos específicos são: (i) investigar os aspectos epistemológicos
da metapsicologia freudiana em APP; (ii) realizar uma leitura de APP que pontue as
etapas:
terapêutica.
acerca da temática da pulsão, entre eles: “Três Ensaios sobre a teoria da sexualidade”
para a dissertação.
17
Ademais, pretendo submeter à FAPESP um pedido de Bolsa de Estágio de
com o professor Patrick Guyomard, importante nome que vem contribuindo no estudo
destaque para sua tese: “Recherche sur les rapports entre la théorie et la pratique en
com destaque para sua tese “Pour une épistémologie de la métaphore biologique en
psychanalyse” (1978).
Cronograma:
Métodos
dos textos citados na bibliografia, recorrendo aos textos no idioma original quando
18
necessário; (ii) análise e interpretação da literatura secundária; (iii) elaboração de
hipótese da pesquisa; (iv) estágio de pesquisa no exterior; (v) discussão dos relatórios e
dos rumos da pesquisa com a professora orientadora e seu grupo de pesquisa; (vi)
Referência bibliográficas
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