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Curso RSC Online

2º Grupo de Estudos para o concurso do MPSP


LUCAS DE MELO BORGES Encontro 4 – Stalking (Crime de Perseguição)

GRUPO DE ESTUDOS PARA O CONCURSO DO MPSP


RSC Online – Ano 2021
Stalking – Crime de Perseguição (Rogério Sanches)
Anotações Pessoais – LUCAS DE MELO BORGES

1. Crime de Stalking

a) Introdução

Encontra-se para sanção presidencial o PL n. 1.369/2019, que revogou o artigo 65 da


Lei de Contravenções Penais e criou no Código Penal o crime de perseguição.

É o mais novo crime contra a liberdade individual. No exterior é nomeado stalking,


enquanto no Brasil preferiram a expressão “crime de perseguição”.

Destaca-se ter sido suprimido do tipo legal o termo “obsessiva”, para evitar a redução
de alcance do dispositivo. Vejamos o texto legal:

Perseguição
Artigo 147-A. Perseguir alguém, reiteradamente e por qualquer meio,
ameaçando-lhe a integridade física ou psicológica, restringido-lhe a
capacidade de locomoção ou, de qualquer forma, invadindo ou
perturbando sua esfera de liberdade ou privacidade.
Pena. reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.
§1º. A Pena é aumentada de metade se o crime é cometido:
I. contra criança, adolescente ou idoso;
II. contra mulher por razões da condição de sexo feminino, nos termos
do §2-A do art. 121 desde Código;
III. mediante concurso de 2 (duas) ou mais pessoas ou com o emprego
de arma.
§2º. As penas deste artigo são aplicáveis sem prejuízo das
correspondentes à violência.

ANOTAÇÕES PESSOAIS (@lucasmeloborges)


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§3º. Somente se procede mediante representação.

b) Como a perseguição era tratada antes do art. 147-A

Para melhor compreensão, vejamos o seguinte esquema:

(1). Em se tratando de perseguição cometida com violência ou grave ameaça etc.


(crime comum, o delito era enquadrado nos arts. 129, 146, 147 etc., do CP.

(2). O ato de molestar alguém ou lhe perturbar a tranquilidade, por acinte ou por
motivo reprovável, enquadrava-se no art. 65 da LCP.

Aqui, calha pontuar algumas questões:

i. Entrando em vigor o art. 147-A, haverá utilidade na contravenção penal (art.


65 da LCP)?

O professor esclarece que a incriminação é necessária, principalmente por


trazer um aumento de pena. Ora, da forma como estava, sendo tratado como
mera contravenção penal, gerava uma manifesta proteção insuficiente do bem
jurídico tutelado.

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Porém, o art. 147-A revogará o art. 65 da LCP, conforme disposição do texto


submetido à sanção presidencial. Nesse ponto, o professor tece críticas,
aduzindo que o legislador errou, pois, nem todo comportamento que
configurava o art. 65 da LCP agora se subsume ao crime do art. 147-A.

Exemplo: cantada grosseira, que humilha, intimida a vítima. Em um primeiro


momento, a cantada grosseira configurava a importunação ofensiva ao pudor.
Ocorre que, em 2018, o legislador criou o crime de importunação do art. 215-A
do CP e revogou a contravenção do art. 61 da LCP. Isso posto, tem-se que a
cantada grosseira não acompanhou a evolução legislativa, mas o MPSP
começou a enquadrar o fato no art. 65 da LCP.

O problema é que agora a perturbação da tranquilidade foi revogada pelo art.


147-A, tornando a cantada grosseira, em regram em um indiferente penal - uma
falta de educação, um pecado, mas não um delito -.

ii. Ocorreu abolitio criminis da contravenção penal do art. 65 da LCP?

A resposta depende principalmente da natureza jurídica da contravenção


penal.

1ª corrente: a contravenção penal do art. 65 é habitual. Para essa corrente, fica


fácil defender a continuidade normativo típica se a perturbação da
tranquilidade foi praticada com as características que hoje compõe o art. 147-
A.

2ª corrente: a contravenção do art. 65 não é habitual. Aqui há um problema,


pois o delito do art. 147-A é habitual. Será necessário, portanto, analisar o caso
concreto para averiguar a ocorrência ou não da continuidade normativo típica.
Se praticada sem reiteração, haverá abolitio criminis.

Para melhor visualização, segue esquema elaborado pelo professor:

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(3). O art. 7º da LMP não é um tipo incriminador e nem é uma norma de extensão. Ora,
só se deve combinar o tipo incriminador com normas de extensão ou com agravantes,
causas de aumento ou de diminuição. Assim, tecnicamente, não é correto cumular o
delito do art. 147-A com o art. 7º da LMP, mesmo que o crime de perseguição
corresponda a uma violência doméstica (art. 7º, II).

c) Bem jurídico

Pune-se no art. 147-A do CP o crime de perseguição, sendo que a sua finalidade é a


tutela de liberdade individual.

Não sendo crime de menor potencial ofensivo, não se admite transação penal, mas
admite suspensão condicional do processo.

Questão: cabe o instituto do ANPP?

R. Em regra, sim. Salvo: (a) se praticado com violência ou grave ameaça (art. 28-A,
caput, CPP); (b) se praticado no ambiente doméstico e familiar – não importando se a
vítima é homem ou mulher -; (c) se praticado contra a mulher por razões da condição
de sexo feminino (art. 28-A, §2º, IV, CPP).

d) Crime bicomum

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Trata-se de crime comum quanto ao sujeito ativo e passivo.

Destaca-se que, se a vítima for criança, adolescente, idoso ou mulher perseguida por
razões da condição do sexo feminino, a pena é aumentada de metade (§1º), retirando
do agente uma medida despenalizadora.

e) Conduta

O crime consiste em perseguir alguém, reiteradamente e por qualquer meio,


ameaçando-lhe a integridade física ou psicológica, restringindo-lhe a capacidade de
locomoção ou, de qualquer forma, invadindo ou perturbando sua esfera de liberdade
ou privacidade.

O verbo perseguir não significa apenas sair no encalço de forma frenética, mas de
importunar, transtornar a vida da pessoa.

f) Estrutura do crime

A ação nuclear (perturbar) pode atingir de três formas:

i. Ameaçando a integridade física ou psicológica

Na primeira forma, o tipo do art. 147-A incorpora o crime de ameaça –


tipificado no dispositivo precedente -, que consiste em ameaçar alguém por
palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico, de causar-lhe mal
injusto e grave.

Atenção: o ato de perseguição não se restringe às situações de violência


doméstica e familiar contra a mulher (aliás, não se limita nem mesmo às vítimas
mulheres, embora seja o mais comum).

Há stalking (crime de perseguição) fora do ambiente doméstico e familiar e a


vítima não precisa ser mulher.

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Exemplo n. 1: perseguição no ambiente de trabalho – empregador manda


embora o empregado e este passa a persegui-lo (stalking ocupacional; assédio
ambiental).

Exemplo n. 2: cobrança vexatória de dívida entre particulares. Anote-se que, se


praticada em contexto de direito do consumidor, há crime próprio (Art. 71, do
CDC); e em se tratando de tributo, pode acarretar excesso de exação ou até
abuso de autoridade.

ii. Restringindo a capacidade de locomoção

Na segunda forma, os atos de perseguição ostensiva reduzem a capacidade da


vítima para exercer a sua liberdade de locomoção.

O stalking não pode ser praticado com o agente privando a vítima da liberdade
de locomoção – nesse caso será de sequestro ou cárcere privado -. Uma coisa é
o agente privar a vítima, outra é a vítima se privar por causa do agente.

iii. Invadindo ou perturbando a esfera de liberdade ou privacidade

A invasão ou perturbação da esfera de liberdade ou privacidade, terceira forma


de perseguição, pode consistir em qualquer ato que iniba a vítima de
desempenhar suas atividades cotidianas.

g) Cyberstalking

Dentre os meios possíveis de cometer o crime está o cyrberstalking. Nos primórdios, os


atos de perseguição normalmente pressupunham a presença física do agente no
entorno da vítima. No máximo, havia remessas de correspondência e ligações
telefônicas insistentes, mas a grande maioria dos casos envolvia também perseguições
ostensivas que, não raro, culminavam em ataques à integridade física da vítima.

Atualmente, o cyberstalking é um problema crescente, facilitado pela imensa


quantidade de pessoas que mantêm perfis em diversas redes sociais, nas quais
publicam, sem cautela, imagens e informações de sua vida pessoal (stalking aleatório).

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Trata-se de crime informático impróprio – stalking pode ou não ser praticado por
meios informáticos -.

Trata-se, ademais, de crime habitual, tendo em vista que o tipo penal é expresso sobre
a necessidade de a perseguição ser praticada reiteradamente. Apenas um ato
importuno, ainda que restrinja momentaneamente a capacidade de locomoção ou
invada a privacidade de alguém, não caracteriza este crime, embora seja possível que
a conduta se adeque a outro tipo penal, como a da ameaça, por exemplo.

h) Requisitos para definir stalking

A doutrina elenca três requisitos para caracterização do stalking: (a) comportamento


doloso habitual, composto necessariamente por mais de um ato de perseguição ou
assédio à mesma vítima; (b) o motivo do autor para praticar a conduta é um interesse
pessoal, como admiração, crença, interesse relacional ou vingança; (c) a vítima, por
conta da repetição, deve se sentir incomodada em sua privacidade e/ou temerosa por
sua segurança.

i) Voluntariedade

O crime só pode ser cometido com dolo. Embora seja comum que os atos de
perseguição tenham o propósito de alterar o estado de ânimo da vítima, de lhe
provocar medo e de limitar sua liberdade, o tipo não pressupõe nenhuma finalidade
específica. Isso é importante para o MP, pois inexiste o dever de comprovar finalidade
específica, sob pena de atipicidade relativa ou absoluta.

j) Consumação e tentativa

Tratando-se de crime habitual, consuma-se com a reiteração dos atos de perseguição.


A tentativa é inadmissível em crimes dessa natureza (habitual).

k) Prisão em flagrante de crime habitual

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Tem prevalecido que não admite flagrante. O professor entende que o crime de
perseguição fará a doutrina repensar essa posição: teremos tantos flagrantes que vai
gerar uma reviravolta.

l) Majorantes (§1º)

O §1º aumenta a pena de metade se o crime for cometido:

i. Contra criança, adolescente ou idoso

O conceito de criança é extraído do art. 2º do ECA, enquanto o de idoso é


previsto no art. 1º do Estatuto do Idoso.

ii. Contra mulher por razões da condição de sexo feminino, nos termos do §2-A,
do art. 121 do CP

Preconceito, discriminação ou menosprezo quanto ao sexo.

iii. Mediante concurso de duas ou mais pessoas ou com o emprego de arma

Empregou-se o termo “arma”, logo, abrange arma branca.

Questão: e se for arma de fogo? Teremos concurso com o crime do Estatuto


do Desarmamento?

R. Se o perseguidor tem porte de arma, incide somente a causa de aumento. Se


o perseguidor não tem porte: (a) armou-se para cometer a perseguição: aplica-
se somente o aumento; (b) se já estava armado ou continuou armado, aplica-se
o concurso de crimes.

m) O §2º dispõe que as penas são aplicáveis sem prejuízo das correspondes à violência

Em se tratando de perseguição com grave ameaça, a grave ameaça será absorvida.


Agora, se for perseguição com violência, não será absorvida (art. 147-A + violência).

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Embora o caput do art. 147-A não contenha nenhuma menção à violência, nada impede
que o perseguidor lance mão desse meio para provocar uma intimidação mais intensa.
Nesse caso, devem ser aplicadas também as penas relativas à violência.

A maioria da doutrina quando se depara com dispositivos como esse leciona que o
concurso é material, mas com o devido respeito é um erro, já que não há duas condutas
gerando dois resultados. O que se tem aqui, em verdade, é uma conduta gerando dois
resultados. Trata-se de concurso formal impróprio – cúmulo material -.

n) Ação Penal

Nos termos do §3º do art. 147-A, a ação penal é pública condicionada à representação
do ofendido.

A regra se aplica inclusive nos casos em que incidem as disposições da Lei Maria da
Penha, pois o legislador, embora tenha majorado a pena do crime cometido segundo
a definição do art. 5º daquela lei, não impôs nenhuma exceção à regra da ação penal
no §3º.

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