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Supremo Tribunal Federal

Ementa e Acórdão

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03/03/2020 SEGUNDA TURMA

SEGUNDO AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO


1.197.808 SÃO PAULO

RELATOR : MIN. GILMAR MENDES


AGTE.(S) : ELISABETH SAHÃO
ADV.(A/S) : MARILDA DE PAULA SILVEIRA
INTDO.(A/S) : MARIO MAURICI DE LIMA MORAIS
ADV.(A/S) : CAIRO ROBERTO BITTAR HAMU SILVA JUNIOR
INTDO.(A/S) : MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA

Segundo agravo regimental em recurso extraordinário. 2. Direito


Eleitoral. 3. Eleições 2018. Inelegibilidade declarada a despeito da
constatação de ato de improbidade administrativa. Inelegibilidade
afastada. 4. Ausência de argumentos capazes de infirmar a decisão
agravada. 5. Agravo regimental a que se nega provimento.

AC ÓRDÃ O
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do
Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, sob a presidência da
Senhora Ministra Cármen Lúcia, na conformidade da ata de julgamento e
das notas taquigráficas, por maioria de votos, negar provimento ao
agravo regimental, nos termos do voto do Relator.
Brasília, 03 de março de 2020.
Ministro GILMAR MENDES
Relator
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Relatório

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04/02/2020 SEGUNDA TURMA

SEGUNDO AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO


1.197.808 SÃO PAULO

RELATOR : MIN. GILMAR MENDES


AGTE.(S) : ELISABETH SAHÃO
ADV.(A/S) : MARILDA DE PAULA SILVEIRA
INTDO.(A/S) : MARIO MAURICI DE LIMA MORAIS
ADV.(A/S) : CAIRO ROBERTO BITTAR HAMU SILVA JUNIOR
INTDO.(A/S) : MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA

RE LAT Ó RI O

O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (RELATOR): Trata-se de


agravos regimentais contra decisão pela qual dei provimento a recurso
para afastar a declaração de inelegibilidade de Mário Maurici de Lima
Morais.
O Ministério Público Eleitoral interpôs agravo regimental,
sustentando, preliminarmente, nulidade absoluta por ausência de
intimação para se manifestar sobre petição e documentos acostados.
Argumenta que não lhe teria sido oportunizada vista dos documentos
juntados pelo candidato após a apresentação de sua contraminuta de
agravo.
No mérito, indica ausência de estatura constitucional da
controvérsia. Narra que a discussão dos autos limita-se apenas à
verificação do enquadramento legal da conduta apurada e julgada pela
Corte de Contas para fins de inelegibilidade. (fls. 1385v - 1386)
Anota, ainda, que a decisão agravada acabou por reconhecer como
fato superveniente um acórdão do TCU proferido em recurso de revisão,
julgado em 11.9.2019. Argumenta, nesse sentido, que o Tribunal Superior
Eleitoral entende que a data da diplomação é o termo final para se
conhecer de fato superveniente ao registro de candidatura que afaste a
inelegibilidade. (fls. 1382 - 1389v)

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ARE 1197808 AGR-SEGUNDO / SP

Em seu agravo regimental, Elisabeth Sahão apresenta


fundamentação semelhante. Indica, em síntese, que a diplomação seria o
termo final para estabilização dos fatos supervenientes a serem
considerados em registro de candidatura, e que alteração de
entendimento jurisprudencial em matéria eleitoral deve observar o
princípio da anualidade. (fls. 1362-1379)
Em 25 de novembro de 2019, deferi pedido de concessão da tutela de
urgência para atribuir efeito suspensivo ativo ao agravo regimental, até
julgamento do seu mérito. (fls. 1392-1393)
Intimada, a parte recorrida apresentou contrarrazões, solicitando a
reconsideração da aplicação do efeito suspensivo concedido aos agravos
regimentais e o desprovimento dos agravos regimentais interpostos. (fls.
1395 - 1414)

É o relatório.

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04/02/2020 SEGUNDA TURMA

SEGUNDO AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO


1.197.808 SÃO PAULO

VOTO

O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (RELATOR): os Agravos


Regimentais ora examinados foram interpostos pelo Ministério Público
Eleitoral do Estado de São Paulo (MPE-SP) e por Elisabeth Sahão contra
decisão de minha lavra que, em juízo de retratação, deu provimento ao
recurso extraordinário para afastar a declaração de inelegibilidade do
agravado, considerando que a premissa estruturante de acórdão do
Tribunal Superior Eleitoral (TSE), qual seja a rejeição das contas do
candidato pelo TCU, não mais subsistiria.
Os agravantes sustentam, em síntese, que a decisão recorrida não
poderia ter restabelecido a elegibilidade do agravado porquanto, segundo
a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a data de
diplomação seria o termo final para se conhecer de fato superveniente ao
registro da candidatura que afaste inelegibilidade.
Sobre esse ponto, não se desconhece que a jurisprudência da Corte
Superior Eleitoral quanto à matéria tenha passado por oscilações ao longo
dos anos, ante ao laconismo do art. 11, § 10, da Lei 9.504/1997 (Lei
Eleitoral), o qual se limita a estabelecer que: “as condições de elegibilidade e
as causas de inelegibilidade devem ser aferidas no momento da formalização do
pedido de registro da candidatura, ressalvadas as alterações, fáticas ou jurídicas,
supervenientes ao registro que afastem a inelegibilidade”.
Inicialmente, a jurisprudência do TSE entendia que o fato
superveniente poderia ocorrer até mesmo após a data das eleições. Essa
posição foi aplicada pelo Tribunal, por exemplo, para os pleitos ocorridos
no ano de 2010.
A partir do julgamento do Agravo Regimental no REspe 458-86, em
05.11.2013, o Tribunal passou a fixar como marco obstativo a data da
eleição.

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Já no final de 2014, a partir do julgamento dos EDcl-RO 294-62, a


Corte mudou novamente de entendimento, passando a entender que o
termo final do fato superveniente a ser considerado pela Justiça Eleitoral
coincidiria com a data de diplomação. Transcreve-se o acórdão abaixo:

“ELEIÇÕES 2014. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO.


EFEITOS MODIFICATIVOS. CANDIDATO A DEPUTADO
FEDERAL. REGISTRO DE CANDIDATURA INDEF ERIDO
PELO TRE. DECISÃO MANTIDA PELO TSE. INCIDÊNCIA
NA CAUSA DE INELEGIBILIDADE DO ART. 1º, INCISO I,
ALÍNEA l, DA LC Nº 64/1990. FATO SUPERVENIENTE:
OBTENÇÃO DE LIMINAR NO STJ ANTES DO
ENCERRAMENTO DO PROCESSO ELEITORAL. REGISTRO
DE CANDIDATURA DEFERIDO.
1. Fato superveniente que afasta a inelegibilidade. Liminar
do Superior Tribunal de Justiça que suspende a condenação por
improbidade administrativa e, consequentemente, afasta a
causa de inelegibilidade do art. 1º, inciso I, alínea 1, da LC nº
64/1990.
2. Considerado ter o TSE entendido ser possível
reconhecer inelegibilidade superveniente em processo de
registro de candidatura (caso Arruda), como ocorreu no caso
concreto, com maior razão a possibilidade de se analisar o fato
superveniente que afasta a inelegibilidade antes da diplomação
dos eleitos, sob pena de reduzir o alcance do art. 26 - C da Lei
Complementar nº 64/1990 às situações de inelegibilidade que
surgiram após o pedido de registro de candidatura, não
proporcionando ao candidato a possibilidade de suspender a
condenação.
3. Desconsiderar a liminar obtida pelo embargante no
Superior Tribunal de Justiça nega a própria proteção efetiva
judicial segundo a qual ‘a lei não excluirá da apreciação do
Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito’ (art. 5º , inciso XXXV,
da CF/1988), não competindo ao intérprete restringir essa
garantia constitucional e, por via de consequência, negar ao
cidadão o próprio direito constitucional de se apresentar como

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representante do povo em processo eleitoral não encerrado.


4. Negar o fato superveniente que afasta a inelegibilidade
constitui grave violação à soberania popular, traduzida nos
votos obtidos pelo candidato, plenamente elegível antes do
encerramento do processo eleitoral, isto é, da diplomação dos
eleitos. Entendimento em sentido contrário, além de fazer do
processo eleitoral não um instrumento de resguardo da
soberania popular, mas um processo exageradamente
formalista em detrimento dela, pilar de um Estado
Democrático, nega o próprio conceito de processo eleitor al
definido pelo Supremo Tribunal Federal, o qual se encerra com
a diplomação dos eleitos.
5. A não apreciação do fato superveniente neste momento
violaria o art. 5º, inciso LXXVIII, da CF/1988, segundo o qual ‘a
todos, no âmbito judicial e administrativo , são assegurados a
razoável duração do processo e os meios que garantam a
celeridade de sua tramitação’, pois simplesmente haverá uma
indesejável postergação de solução favorável ao candidato,
considerado o eventual manejo de rescisória, admitido pelo Ple
nário do TSE no julgamento da AR nº 1418 - 47/CE, redatora
para o acórdão Min. Luciana Lóssio, julgada em 21.5.2013. 6.
Embargos de declaração acolhidos com efeitos modificativos
para deferir o registro de candidatura”. (Embargos de
Declaração em Recurso Ordinário nº 29462 [Aracaju/SE],
Acórdão de 11/12/2014, Relator(a) Min. GILMAR MENDES,
Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 11/12/2014 )

Ressalvando que este entendimento jurisprudencial não é


absolutamente pacífico, entendo que, no caso concreto, a
inconstitucionalidade da decisão combatida neste Recurso
Extraordinário, na realidade, parece ocorrer não em razão da limitação
temporal da ocorrência do fato superveniente, mas sim da própria
aplicação extensiva da alínea “g” do inciso I do art. 1 da Lei
Complementar 64/90 no caso em tela.
A Lei Complementar 64/90 é taxativa ao estabelecer a configuração
do ato doloso de improbidade administrativa como condição para a

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configuração da causa de inelegibilidade prevista alínea “g” do inciso I


do seu art. 1º:

“Art. 1º. São inelegíveis:


I - para qualquer cargo:
(...)
g) os que tiverem suas contas relativas ao exercício de
cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade
insanável que configure ato doloso de improbidade
administrativa, e por decisão irrecorrível do órgão competente,
salvo se esta houver sido suspensa ou anulada pelo Poder
Judiciário, para as eleições que se realizarem nos 8 (oito) anos
seguintes, contados a partir da data da decisão, aplicando-se o
disposto no inciso II do art. 71 da Constituição Federal a todos
os ordenadores de despesa, sem exclusão de mandatários que
houverem agido nessa condição”. (Redação dada pela Lei
Complementar nº 135, de 2010, grifo nosso)

Referido dispositivo legal é claro ao prever que a rejeição de contas


relativas ao exercício de cargos ou funções públicas pelo candidato só
atrai a inelegibilidade se da rejeição se configurar “ato doloso de
improbidade administrativa”.
A caracterização do ato doloso de improbidade, no entanto, não se
faz presente no caso em tela, conforme se depreende de uma análise
cuidadosa dos autos.
A presente demanda se iniciou a partir do ajuizamento de Ação de
Impugnação de Registro de Candidatura (AIRC) MPE-SP em face do
agravado, então candidato ao cargo de Deputado Estadual.
Na ação, o Parquet pleiteava o reconhecimento de causa de
inelegibilidade prevista na alínea “g” do inciso I do art. 1 da Lei
Complementar 64/90 em razão de Acórdão do Tribunal de Contas da
União (TCU) que havia julgado irregulares as contas prestadas pelo
candidato na qualidade de então Diretor-Presidente da Ceagesp.
O Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE/SP), porém, julgou
improcedente a impugnação e deferiu registro de candidatura do

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agravado por entender que, embora o TCU tenha julgado irregulares as


contas da Ceagesp, não estaria configurada a hipótese de inelegibilidade
prevista na alínea “g” do inciso I do art. 1 da Lei Complementar 64/90, já
que a mera rejeição das contas não configuraria “irregularidade insanável”
ou “ato doloso de improbidade administrativa”, requisitos necessários para
tornar o candidato inelegível. Nesse sentido, colaciona-se abaixo a ementa
do acórdão do TRE-SP:

“REGISTRO DE CANDIDATURA. ELEIÇÕES 2018.


CANDIDATO A DEPUTADO ESTADUAL. AFASTADA A
CAUSA DE INELEGIBILIDADE PREVISTA NO ART IGO 1º,
INCISO I, LETRA “G”, DA LEI COMPLEMENTAR Nº 64/90.
IMPUGNAÇÃO IMPROCEDENTE. REGISTRO DEFERIDO”.
(TRE-SP, RRC nº 0604731-31.2018, Rel. Des. Fábio Prieto de
Souza, julgado e publicado no DJe em 17.09.2018).

Ressalta-se que o desembargador relator do processo no TRE


destacou em seu voto que “o v. Acórdão [do TCU] não fez censura por
dolo, nem reconheceu a existência de dano ao erário”, concluindo que
“não se deve confundir ilegalidade ou incompetência com ato de improbidade
administrativa”.
Em face desse acórdão, o MPE-SP interpôs Recurso Eleitoral perante
ao TSE. No TSE, o relator, Ministro Luís Roberto Barroso, deu provimento
monocraticamente ao recurso em 08.10.2018. Após a interposição de
agravo regimental, o Plenário do TSE, por maioria de votos, manteve
aquela decisão.
O entendimento que prevaleceu no julgamento foi de que, embora,
de fato, o acórdão do TCU não tenha apontado a existência de conduta
dolosa ou de ato de improbidade administrativa, a inelegibilidade
incidiria em razão de as contas terem sido rejeitadas por violações à Lei
de Licitações. Transcreve-se a posição do relator no TSE sobre esse ponto:

“10. O TRE/SP, à unanimidade, entendeu pelo deferimento


do registro de candidatura do recorrido, por não vislumbrar

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que as irregularidades apontadas no acórdão do Tribunal de


Contas da União configurariam ato doloso de improbidade
administrativa. O relator afastou a causa de inelegibilidade da
alínea g por entender que a Corte de Contas não reconheceu a
existência de dolo.
11. Ocorre que a jurisprudência do Tribunal Superior
Eleitoral considera que violações à Lei de Licitações constituem
irregularidades graves. É certo que entendo que a existência de
afronta à Lei nº 8.666/1993 não deve conduzir, por si só, à
caracterização do dolo, sendo necessário aferir, à luz dos
princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, a
gravidade da conduta e sua reiteração pelo administrador
público. No entanto, no caso, penso que estão caracterizadas a
gravidade e a reiteração da conduta necessárias para a
configuração da causa de inelegibilidade da alínea g. O
próprio voto condutor do acórdão do Tribunal de Contas
afirmou que a ausência de licitação para a contratação de
serviços de telefonia já havia sido objeto de ressalva pela
Controladoria Geral da União desde 2009.
12. Desse modo, a conclusão do Tribunal Regional é
contrária aos precedentes deste Tribunal no sentido de que a
ausência ou dispensa indevida de licitação é considerada
irregularidade insanável que configura ato doloso de
improbidade administrativa, sendo conduta apta, portanto, a
atrair a inelegibilidade do art. 1º, I, g, da LC nº 64/1990. Nesse
sentido, confiram-se os seguintes precedentes:

‘AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO


ORDINÁRIO. ELEIÇÕES 2014. REGISTRO DE
CANDIDATURA. REJEIÇÃO DE CONTAS. LEI DE
LICITAÇÕES. AUSÊNCIA OU DISPENSA INDEVIDA DE
LICITAÇÃO. DOLO. IRREGULARIDADE INSANÁVEL.
ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
INELEGIBILIDADE. ART. 1º, I, g, DA LC 64/90.
1. A rejeição das contas pela ausência ou indevida
dispensa de licitação consubstancia vício insanável e

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doloso, revelador de ato de improbidade administrativa,


razão pela qual deve ser mantida a inelegibilidade a que
se refere o art. 1º, I, g, da LC nº 64/90. 2. O pagamento de
multa, de todo modo, não conduz à sanabilidade das
contas. Precedentes. 3. Na espécie, verifica-se a ocorrência
de dolo genérico, relativo ao descumprimento dos
princípios e normas que vinculam a atuação do
administrador público, suficiente para atrair a cláusula de
inelegibilidade. Precedentes. 4. Agravo Regimental a que
se nega provimento’. (AgR-REspe nº 925-55/PR, Rel. Min.
Maria Thereza de Assis Moura, j. 20.11.2014)

‘ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO


ESPECIAL ELEITORAL. REGISTRO DE CANDIDATURA.
VEREADOR (COLIGAÇÃO RENOVAÇÃO E VERDADE
PRB/PMDB/PHS). INDEFERIMENTO.
INELEGIBILIDADE. ART. 1º, I, G, DA LC Nº 64/1990.
DESCUMPRIMENTO DA LEI DE LICITAÇÕES.
EXCESSO DE SUBSÍDIOS. IRREGULARIDADES
INSANÁVEIS. ATOS DOLOSOS DE IMPROBIDADE
ADMINISTRATIVA. REENQUADRAMENTO JURÍDICO.
POSSIBILIDADE. FUNDAMENTAÇÃO. SUFICIÊNCIA.
1. A ausência ou indevida dispensa de licitação e o
pagamento irregular de subsídios a vereadores
consubstanciam vícios insanáveis e dolosos, reveladores
de ato de improbidade administrativa. Precedentes. 2.
Reenquadramento jurídico da matéria. Limites da
moldura fática delineada pela Corte de origem
respeitados. Ausência de afronta à Súmula nº 24/TSE.
Precedentes. 3. Julgamento que não se limitou a invocar
precedentes, enunciado ou súmula. Violação do art. 489, §
1º, V, do CPC/2015 afastada. Agravo regimental conhecido
e não provido’. (AgR-REspe nº 118-56/PB, Rel. Min. Rosa
Weber, j. 14.03.2017)

13. Por fim, registro que o acórdão do TCU transitou em

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julgado em 31.01.2015, conforme consignado no acórdão do


TRE/SP (ID 412456). Desse modo, como as Eleições 2018 serão
realizadas nos oito anos subsequentes a essa data, não cessou a
incidência da causa de inelegibilidade prevista no art. 1º, I, g, da
Lei Complementar nº 64/1990.
14. Diante do exposto, com fundamento no art. 36, § 7º, do
RITSE, dou provimento ao recurso ordinário, para indeferir o
registro de candidatura de Mário Maurici de Lima Morais ao
cargo de deputado estadual nas Eleições 2018”.

O voto-relator na Corte Superior Eleitoral considerou que, embora o


TCU não tenha concluído pela ocorrência de ato doloso de improbidade,
seria possível ao próprio TSE fazer esse juízo a partir da gravidade da
violação à Lei 8.666/93:

“É certo que entendo que a existência de afronta à Lei nº


8.666/1993 não deve conduzir, por si só, à caracterização do
dolo, sendo necessário aferir, à luz dos princípios da
proporcionalidade e da razoabilidade, a gravidade da conduta
e sua reiteração pelo administrador público. No entanto, no
caso, penso que estão caracterizadas a gravidade e a reiteração
da conduta necessárias para a configuração da causa de
inelegibilidade da alínea g”. (grifo nosso)

Ainda no julgamento no TSE, foi apresentada divergência ao


entendimento da maioria pelo Ministro Tarcísio Vieira, que repisou os
mesmos fundamentos do acórdão do TRE no sentido de que a rejeição de
contas pelo TCU não implicaria ato doloso apto a atrair a hipótese de
inelegibilidade assentada no alínea “g” do inciso I do art. 1 da Lei
Complementar 64/90. Destaca-se trecho do voto minoritário:

“Do acórdão atacado pelo recurso ordinário, recolho a


fundamentação de que houve, sim, descumprimento das
normas que regem as licitações e, segundo o relator do acórdão
recorrido, que foi unânime, houve violação à Lei de Licitações e

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desrespeito às determinações do Tribunal de Contas. Em outra


passagem: “mas o acórdão não fez censura por dolo, nem
reconheceu a existência de dano ao erário, de onde se conclui
que não se deve confundir ilegalidade ou incompetência com
ato de improbidade administrativa”.
E a conclusão do acórdão unânime do TRE-SP é que não
há incidência da causa de inelegibilidade.
Para conforto da minha posição, verifico o acórdão do
Tribunal de Contas da União, que é o fato gerador da suposta
inelegibilidade, e recordo uma passagem que me causa, no
mínimo, dúvida sobre a caracterização da inelegibilidade, que é
o item 13 do voto proferido pelo ilustre Ministro Benjamin
Zymler, no âmbito do TCU. Sua Excelência diz assim: ‘Ademais,
o entendimento consolidado desta Corte é no sentido de que a
imputação de multa prescinde da caracterização do dolo’.
Diante da moldura do acórdão da Corte de Contas,
reforçado pelo acórdão do TRE-SP, em decisão unânime, não
me parece claramente evidenciado o dolo, que é integrante e
obrigatório do tipo da alínea “g” da Lei de Inelegibilidades”.

Foi em face dessa decisão que o agravado interpôs o recurso


extraordinário em exame.
Está claro, portanto, que o TSE realizou uma interpretação
extensiva da cláusula de inelegibilidade para pressupor que a simples
afronta à Lei de Licitações implicaria a caracterização do ato doloso de
improbidade na demanda em análise, o que se revela em desacordo com
o texto constitucional e com a jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal.
Isso porque, quando esta Corte se manifestou sobre o § 4º do art. 37
da CF, procedeu à devida distinção entre ato meramente ilegal e ato
ímprobo, exigindo para este uma qualificação especial: lesar o erário ou,
ainda, promover enriquecimento ilícito ou favorecimento contra legem
de terceiro.
Nesse sentido, transcreva-se ementa de julgado sob o rito da
repercussão geral:

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Voto - MIN. GILMAR MENDES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 13 de 36

ARE 1197808 AGR-SEGUNDO / SP

“CONSTITUCIONAL. AUTONOMIA DE INSTÂNCIAS.


POSSIBILIDADE DE RESPONSABILIZAÇÃO PENAL E
POLÍTICA ADMINISTRATIVA (DL 201/1967) SIMULTÂNEA À
POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA,
DEVIDAMENTE TIPIFICADO NA LEI 8.429/92.
INEXISTÊNCIA DE BIS IN IDEM . 1. ‘Fazem muito
mal à República os políticos corruptos, pois não apenas se impregnam
de vícios eles mesmos, mas os infundem na sociedade, e não apenas a
prejudicam por se corromperem, mas também porque a corrompem, e
são mais nocivos pelo exemplo do que pelo crime’ (MARCO TÚLIO
CÍCERO. Manual do candidato às eleições. As leis, III, XIV, 32).
2. A norma constitucional prevista no § 4º do art. 37 exigiu
tratamentos sancionatórios diferenciados entre os atos
ilícitos em geral (civis, penais e político-administrativos) e os
atos de improbidade administrativa, com determinação
expressa ao Congresso Nacional para edição de lei específica
(Lei 8.429/1992), que não punisse a mera ilegalidade, mas sim
a conduta ilegal ou imoral do agente público voltada para a
corrupção, e a de todo aquele que o auxilie, no intuito de
prevenir a corrosão da máquina burocrática do Estado e de
evitar o perigo de uma administração corrupta caracterizada
pelo descrédito e pela ineficiência. 3. A Constituição Federal
inovou no campo civil para punir mais severamente o agente
público corrupto, que se utiliza do cargo ou de funções públicas
para enriquecer ou causar prejuízo ao erário, desrespeitando a
legalidade e moralidade administrativas, independentemente
das já existentes responsabilidades penal e político-
administrativa de Prefeitos e Vereadores. 4. Consagração da
autonomia de instâncias. Independentemente de as condutas
dos Prefeitos e Vereadores serem tipificadas como infração
penal (artigo 1º) ou infração político-administrativa (artigo 4º),
previstas no DL 201/67, a responsabilidade civil por ato de
improbidade administrativa é autônoma e deve ser apurada em
instância diversa. 5. NEGADO PROVIMENTO ao Recurso
Extraordinário”. (RE 976.566, Rel. Min. Alexandre de Moraes,

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Voto - MIN. GILMAR MENDES

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ARE 1197808 AGR-SEGUNDO / SP

Plenário, DJe 26.9.2019, tema 576 da RG, grifo nosso).

Vê-se, pois, que o entendimento do STF está sedimentado de que o


ato de improbidade administrativa não pode ser presumido pelo simples
descumprimento da Lei de Licitações (Lei 8.666/1993), devendo ser
comprovado o especial fim de agir do agente público, a depender do tipo
enquadrado.
Há de se observar a existência de volição no intuito de contribuir
para a corrupção (desonestidade), a título doloso – ainda que genérico
(arts. 9º, 10 e 11), assim como descumprimento das regras legais que
cause prejuízo ao erário, ainda que a título culposo (art. 10 – culpa
consciente), sob pena de admissão de responsabilidade objetiva em sede
de improbidade administrativa.
Todavia, para a Lei de Inelegibilidade, o ato de improbidade
administrativa, a título culposo, não configura situação ensejadora da
pecha de inelegível mas apenas o doloso.
Do voto do relator do acórdão recorrido, parece ter havido uma
presunção de que, ocorrendo ilegalidade na contratação pública, o ato de
improbidade administrativo doloso seria daí decorrente, sem se ater a
elementos factuais, partindo de mera construção exegética destituída de
dados empíricos. Senão vejamos o seguinte trecho:

“12. Desse modo, a conclusão do Tribunal Regional é


contrária aos precedentes deste Tribunal no sentido de que a
ausência ou dispensa indevida de licitação é considerada
irregularidade insanável que configura ato doloso de
improbidade administrativa, sendo conduta apta, portanto, a
atrair a inelegibilidade do art. 1º, I, g, da LC nº 64/1990” (grifo
nosso)

Redobrando as vênias, tal conclusão não se coaduna com a


jurisprudência do STF, tampouco com o posicionamento do Superior
Tribunal de Justiça (v.g. AgInt no AREsp 1136354/SP, Rel. Ministro Gurgel
De Faria, Primeira Turma, DJe 7.11.2019 e AgInt no AREsp 761.173/RS,

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Voto - MIN. GILMAR MENDES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 15 de 36

ARE 1197808 AGR-SEGUNDO / SP

Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe


12.12.2019), sendo passo equivocado interpretar em contrariedade ao
entendimento estratificado nas Cortes responsáveis por julgar matéria de
interpretação constitucional e infraconstitucional, respectivamente, as
quais, em eventual ação de improbidade administrativa (de competência
da Justiça comum Federal ou Estadual), inevitavelmente objetariam
aquela linha de raciocínio presente no acórdão do TSE.
Desse modo, a lei eleitoral exige que seja ato de improbidade
administrativa doloso, o que requer maior rigor na apuração fática do
elemento volitivo, isto é, a intenção deliberada de descumprir a norma
que rege a Administração Pública.
Não custa ressaltar que o fato de “a ausência de licitação para a
contratação de serviços de telefonia já hav[er] sido objeto de ressalva pela
Controladoria Geral da União desde 2009” não configura argumento
suficiente para amparar qualquer conclusão de que se trata de ato de
improbidade administrativa doloso, tal como exige a alínea “g” do inciso
I do art. 1 da Lei Complementar 64/90.
Além disso, reforço as palavras do voto-vencido, no sentido de que
“(...)o acórdão não fez censura por dolo, nem reconheceu a existência de dano ao
erário, de onde se conclui que não se deve confundir ilegalidade ou incompetência
com ato de improbidade administrativa”, razão pela qual “Diante da moldura
do acórdão da Corte de Contas, reforçado pelo acórdão do TRE-SP, em decisão
unânime, não me parece claramente evidenciado o dolo, que é integrante e
obrigatório do tipo da alínea “g” da Lei de Inelegibilidades”.
Não havendo reconhecimento de dano ao erário, nem restando clara
a existência de dolo, tal como assentado pelo TRE/SP, não subsiste a
conclusão extraída pelo Tribunal Superior Eleitoral.
Ademais, como já relatado, em 11.9.2019, o TCU, em sede de recurso
de revisão interposto contra o Acórdão 3766/2014-1, nos autos da TC
034.474/2011-0, julgou regulares as contas do Sr. Mário Maurici de Lima
Morais.
Com base nessa decisão, o Tribunal de Contas afastou a
irregularidade das contas e as multas impostas ao então Diretor-

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Voto - MIN. GILMAR MENDES

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ARE 1197808 AGR-SEGUNDO / SP

Presidente da Ceagesp. A prestação de contas, portanto, restou aprovada


com ressalvas, conforme se depreende do trecho do acórdão abaixo
colacionado:

“ACORDAM os ministros do Tribunal de Contas da


União, reunidos em sessão do Plenário, ante as razões expostas
pela relatora (…) em:
9.1. conhecer do recurso de revisão e dar-lhe provimento
com o fim de:
9.1.1. julgar, com fundamento nos arts. 1º, inciso I, 16,
inciso II, 18 e 23, inciso II, da Lei 8.443/1992, regulares com
ressalva as contas de Mario Maurici de Lima Morais e dar-lhe
quitação;
(…)
9.1.3. afastar as multas aplicadas a esses responsáveis
(...)”. (eDOC 13, grifos nossos).

Embora essa decisão superveniente do TCU reforce a inadequação


da interpretação extensiva dada pelo TSE ao caso, a bem da verdade,
antes mesmo de tal “fato novo”, já era incontroverso que a posição inicial
do TCU não firmava a ocorrência de ato doloso ou de dano ao erário apto
a amparar a incidência da alínea “g” do inciso I do art. 1 da Lei
Complementar 64/90.
Tanto a decisão do TRE-SP quanto a decisão do TSE reconheceram
essa circunstância, daí não havendo que se falar em necessidade de
revolvimento fático-probatório.
Assim, considero que a decisão do TSE que declarou a
inelegibilidade do agravado é originariamente acoimada de
inconstitucionalidade, não havendo que se falar em limitação para a
ocorrência de fato superveniente.
Ante o exposto, nego provimento aos agravos regimentais.

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Antecipação ao Voto

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04/02/2020 SEGUNDA TURMA

SEGUNDO AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO


1.197.808 SÃO PAULO

ANTECIPAÇÃO AO VOTO
O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN - Senhora Presidente,
eminentes Pares, eminente Ministro-Relator, Ministro Gilmar Mendes;
Senhora Subprocuradora-Geral da República, Doutora Cláudia Sampaio
Marques; advogadas e advogados presentes.
Eu vou proferir o voto, Senhora Presidente, seguindo a metodologia
que, obviamente, vem do pregão e do eminente Ministro-Relator em
ambos os agravos, eis que todas as matérias são praticamente declinadas
de forma simétrica, quer no segundo, em que figura como agravante
Elizabeth Sahão, quer no terceiro, em que figura como agravante o
Ministério Público Eleitoral.

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Voto - MIN. EDSON FACHIN

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04/02/2020 SEGUNDA TURMA

SEGUNDO AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO


1.197.808 SÃO PAULO

VOTO

O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN: Trata-se de recurso


extraordinário com agravo contra decisão do Tribunal Superior Eleitoral
assim ementada:

DIREITO ELEITORAL. AGRAVO INTERNO EM


RECURSO ORDINÁRIO. ELEIÇÕES 2018.
REGISTRO DE CANDIDATURA. DEPUTADO
ESTADUAL. REJEIÇÃO DE CONTAS PÚBLICAS PELO TCU.
INCIDÊNCIA DA CAUSA DE INELEGIBILIDADE DO ART. 1º,
I, G, DA LC Nº 64/1990. DESPROVIMENTO.
1. Agravo interno interposto em face de decisão
monocrática que deu provimento a recurso ordinário para
indeferir requerimento de registro de candidatura ao cargo de
deputado estadual nas Eleições 2018.
2. O candidato teve as suas contas relativas ao exercício
de 2010, na condição de Diretor Presidente da Companhia de
Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (Ceagesp),
julgadas irregulares por decisão transitada em julgado do
Tribunal de Contas da União. Não há prova nos autos de que a
decisão tenha sido suspensa ou anulada por decisão judicial.
3. O TCU julgou irregular as contas em virtude de: (i)
ausência de licitação para a contratação de serviços de telefonia,
apesar de ter sido objeto de ressalva por parte da Controladoria
Geral da União desde 2009; (ii) contratação de serviços por
inexigibilidade de licitação sem a devida comprovação da
alegada exclusividade; (iii) descumprimento da exigência de
apresentação de três propostas válidas para a realização de
convite; (iv) reiteração das práticas de contratação e nomeação
para funções de confiança e cargos em comissão em desacordo
com as determinações do TCU.
4. A jurisprudência deste Tribunal é no sentido de que a

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Voto - MIN. EDSON FACHIN

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ARE 1197808 AGR-SEGUNDO / SP

ausência ou a dispensa indevida de licitação configura


irregularidade insanável e ato doloso de improbidade
administrativa, apta a atrair a inelegibilidade da alínea g do
inciso I do art. 1º da LC nº 64/1990. Precedentes.
5. Cabe à Justiça Eleitoral, rejeitadas as contas, proceder
ao enquadramento das irregularidades como insanáveis ou não
e verificar se constituem ou não ato doloso de improbidade
administrativa, não lhe competindo, todavia, a análise do acerto
ou desacerto da decisão da corte de contas. Precedente.
6. Agravo interno a que se nega provimento.

A decisão ora agravada, proferida pelo Ministro Gilmar Mendes, deu


provimento ao recurso extraordinário com agravo de Mario Maurici de
Lima Morais, interposto contra a supra-citada decisão, para afastar a
declaração de inelegibilidade, por entender que “(...) a decisão do Tribunal
Superior Eleitoral que declarou a inelegibilidade do recorrente não se sustenta,
porquanto proferida com base em premissa que não subsiste, uma vez que as
contas – que teriam gerado o ato doloso de improbidade administrativa em
questão – restaram aprovadas pelo Tribunal de Contas da União”.
Verifico, entretanto, a impossibilidade de manter a decisão agravada,
seja pela impossibilidade de, em sede de recurso extraordinário, rever,
nessa estreita via processual eleita, a decisão do Tribunal Superior
Eleitoral que, com base na sua jurisprudência acerca da interpretação da
matéria infraconstitucional e nos fatos que lhe foram apresentados
(Súmula 279/STF), entendeu pela caracterização de hipótese de
inelegibilidade; seja porque não estão caracterizadas as ofensas
constitucionais indicadas no recurso dirigido a esta Suprema Corte (art.
14 e 93, IX, da Constituição da República).
O provimento do recurso extraordinário depende do
reconhecimento, em primeiro lugar, da repercussão geral da questão
constitucional trazida, o que não ocorreu; ou, como segunda opção, da
existência de jurisprudência dominante em casos análogos, o que também
não parece ser o caso dos autos, até pelas suas peculiaridades intrínsecas.
Verifica-se, no caso concreto dos autos, que a decisão em processo de

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ARE 1197808 AGR-SEGUNDO / SP

Revisão do TCU foi proferida em 11.09.2019, portanto mais de dez meses


após a decisão do Tribunal Superior Eleitoral sobre o indeferimento do
registro de candidatura (23.10.2018); e mais de oito meses após a
diplomação dos candidatos eleitos no Estado de São Paulo (17.12.2018).
Ora, a firme jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral é no
sentido de que a data da diplomação é o termo final para se considerar e
conhecer qualquer alteração fática ou jurídica superveniente que se refira
aos requisitos para o registro da candidatura. Nesse sentido alguns
precedentes: REspe 150-56, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho,
DJe 21.06.2017; REspe 170-16, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia
Filho, redator para o acórdão Ministro Tarcísio Vieira de Carvalho Neto,
DJe 04.10.2018. Em decisão de minha relatoria, confirmei esta
compreensão:

ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO


ESPECIAL ELEITORAL. REGISTRO DE CANDIDATURA.
INELEGIBILIDADE. ART. 1º, INCISO I, ALÍNEA G, DA LC Nº
64/90. FATO SUPERVENIENTE QUE AFASTA A
INELEGIBILIDADE. TERMO FINAL. DATA DA
DIPLOMAÇÃO. RESTABELECIMENTO POSTERIOR DA
RESTRIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE CONHECIMENTO.
SEGURANÇA JURÍDICA. AGRAVO REGIMENTAL
DESPROVIDO.
1. A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral entende
que os fatos supervenientes que afastem a inelegibilidade
podem ser conhecidos desde que ocorridos até a data da
diplomação (RO nº 96-71/GO, Rel. Min. Luciana Lóssio, PSESS
de 23.11.2016). Por outro lado, só podem ser declaradas as
inelegibilidades supervenientes se constituídas até a data da
eleição (Súmula nº 47/TSE).
2. Admitir a cassação de diploma com base em
inelegibilidade reconstituída quase 6 meses após a diplomação
e posse do prefeito eleito implica violação à soberania do voto e
à segurança jurídica.
3. A responsabilidade objetiva pelo risco-proveito de

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medidas cautelares não pode ser aplicada de maneira


automática ao processo eleitoral, pois existe interesse público na
manutenção do mandato e na preservação dos direitos políticos
fundamentais, resguardado o uso de instrumentos processuais
legítimos à preservação do jus honorum.
4. Agravo a que se nega provimento.
(Recurso Especial Eleitoral nº 32663, Acórdão, Relator(a)
Min. Edson Fachin, DJE - Diário de justiça eletrônico, Data
06.11.2018)

Ademais, a substituição da decisão do Tribunal de Contas da União,


que constituiu fundamento primeiro do entendimento do TSE, o qual está
sendo impugnado nesta Suprema Corte, via recurso extraordinário, não é
suficiente para ensejar revisão dos fatos em disputa, os quais foram
soberanamente avaliados pelo Tribunal especializado, concluindo devido
processo legal eleitoral, com o devido respeito à segurança jurídica e à
soberania da cidadania eleitoral.
Mantenho, pois, a minha posição por ocasião do julgamento no
Tribunal Superior Eleitoral, pelos seus principais fundamentos:

1. O TCU julgou irregular as contas em virtude de: (i) ausência de


licitação para a contratação de serviços de telefonia, apesar de ter sido
objeto de ressalva por parte da Controladoria Geral da União desde 2009;
(ii) contratação de serviços por inexigibilidade de licitação sem a devida
comprovação da alegada exclusividade; (iii) descumprimento da
exigência de apresentação de três propostas válidas para a realização de
convite; (iv) reiteração das práticas de contratação e nomeação para
funções de confiança e cargos em comissão em desacordo com as
determinações do TCU.

2. A jurisprudência do TSE é no sentido de que a ausência ou a


dispensa indevida de licitação configura irregularidade insanável e ato
doloso de improbidade administrativa, apta a atrair a inelegibilidade da
alínea g do inciso I do art. 1º da LC nº 64/1990.

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3. Cabe à Justiça Eleitoral proceder ao enquadramento das


irregularidades como insanáveis, ou não, e verificar se constituem, ou
não, ato doloso de improbidade administrativa, não lhe competindo,
todavia, a análise do acerto ou desacerto da decisão da corte de contas.

Assim sendo, divirjo do Ministro Relator, com todas as vênias, e dou


provimento ao presente agravo regimental para negar provimento ao
recurso extraordinário com agravo, em face do óbice da Súmula 279 do
STF e da impossibilidade, em sede de recurso extraordinário, rever a
interpretação de legislação infraconstitucional e seus requisitos (art. 1º, I,
g, da Lei Complementar 64/1990).

É como voto.

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Vista

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04/02/2020 SEGUNDA TURMA

SEGUNDO AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO


1.197.808 SÃO PAULO

VISTA

O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI -


Presidente, nós estamos diante de dois votos divergentes, do Relator e do
Ministro Fachin. Acabo agora, no intervalo, de receber um memorial
bastante substancioso de um advogado interessado na causa. Então, vou
pedir vista dos autos para trazer o voto oportunamente.
A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA (PRESIDENTE) -
Uma matéria realmente muito importante e significativa. Eu aguardo o
voto de Vossa Excelência.

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Extrato de Ata - 04/02/2020

Inteiro Teor do Acórdão - Página 24 de 36

SEGUNDA TURMA
EXTRATO DE ATA

SEGUNDO AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO 1.197.808


PROCED. : SÃO PAULO
RELATOR : MIN. GILMAR MENDES
AGTE.(S) : ELISABETH SAHÃO
ADV.(A/S) : MARILDA DE PAULA SILVEIRA (33954/DF, 90211/MG)
INTDO.(A/S) : MARIO MAURICI DE LIMA MORAIS
ADV.(A/S) : CAIRO ROBERTO BITTAR HAMU SILVA JUNIOR (17042/DF,
46855/PE)
INTDO.(A/S) : MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA

Decisão: Após o voto do Ministro Relator, que negava


provimento ao agravo regimental, e do voto divergente do Ministro
Edson Fachin, que dava provimento ao agravo e negava seguimento ao
recurso extraordinário, pediu vista o Ministro Ricardo
Lewandowski. Ausente, justificadamente, por motivo de licença
médica, o Ministro Celso de Mello. Presidência da Ministra Cármen
Lúcia. 2ª Turma, 4.2.2020.

Presidência da Senhora Ministra Cármen Lúcia. Presentes à


sessão os Senhores Ministros Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e
Edson Fachin. Ausente, justificadamente, por motivo de licença
médica, o Senhor Ministro Celso de Mello.

Subprocuradora-Geral da República, Dra. Cláudia Sampaio


Marques.

Ravena Siqueira
Secretária

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Supremo Tribunal Federal
Voto Vista

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03/03/2020 SEGUNDA TURMA

SEGUNDO AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO


1.197.808 SÃO PAULO

VOTO

O Senhor Ministro Ricardo Lewandowski (Vista): Trata-se de


agravos regimentais interpostos, respectivamente, por Elisabeth Sahão e
pelo Ministério Público Eleitoral (MPE) contra decisão monocrática, da
lavra do Relator, Ministro Gilmar Mendes, que deu provimento ao
recurso extraordinário para afastar a declaração de inelegibilidade de
Mário Maurici de Lima Morais.

Em suas razões recursais, o MPE sustenta, no mérito, que o


marco temporal para o afastamento da inelegibilidade é o da data da
diplomação. Destaca, a propósito, que o fato novo trazido à colação -
acolhimento do recurso de revisão interposto contra o Acórdão
3766/2014-1, no qual o Tribunal de Contas da União (TCU) afastou a
irregularidade das contas e as multas impostas ao recorrido – se
aperfeiçoou tão somente em 11 de setembro de 2019. Vale dizer, 8 meses
após a diplomação dos parlamentares eleitos para a Assembleia
Legislativa do Estado de São Paulo (18/12/2018). Assim, pugna pela
reconsideração da decisão agravada ou o provimento do agravo.

A recorrente Elisabeth Sahão pleiteia, por sua vez, sua admissão


como assistente do MPE. Argumenta, outrossim, que a diplomação
constitui o termo final para estabilização dos fatos supervenientes a
serem considerados no registro de candidatura. Além disso, a alteração
de entendimento jurisprudencial deverá observar o princípio da
anualidade, nos termos do art. 16 da Constituição Federal de 1988.

Na sessão realizada no dia 4/2/2020, o Ministro Relator, Gilmar


Mendes, votou pelo desprovimento dos recursos. Após o voto do
Ministro Edson Fachin, que dava provimento aos agravos regimentais,

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pedi vista dos autos para melhor análise da matéria.

Bem examinados os autos, acompanho o voto do Ministro Relator


para negar provimento aos recursos.

Confira-se trechos da decisão impugnada:

“[...]
Após detida análise dos autos, observo que o objeto do
presente caso, do modo como é apresentado na petição de
recurso extraordinário, é diverso do inicialmente interpretado.
Nesses termos, reconsidero decisão monocrática de minha
lavra, julgo prejudicado o agravo regimental e passo à
apreciação do recurso.
Trata-se de agravo interposto contra decisão de
inadmissibilidade de recurso extraordinário em face de acórdão
do Tribunal Superior Eleitoral, assim ementado:
‘DIREITO ELEITORAL. AGRAVO INTERNO EM
RECURSO ORDINÁRIO. ELEIÇÕES 2018. REGISTRO DE
CANDIDATURA. DEPUTADO ESTADUAL. REJEIÇÃO
DE CONTAS PÚBLICAS PELO TCU. INCIDÊNCIA DA
CAUSA DE INELEGIBILIDADE DO ART. 1º, I, G, DA LC
nº 64/1990. DESPROVIMENTO’. (fl. 392v)
Opostos embargos de declaração, estes foram rejeitados.
(fl. 953v)
No recurso extraordinário, interposto com fundamento no
art. 102, III, a, da Constituição Federal, aponta-se violação aos
arts. 14 e 93, IX, do texto constitucional.
No mérito, afirma-se a não configuração de um dos
requisitos previstos em lei para gerar a inelegibilidade – o da
conduta dolosa – pois o acórdão do TCU que rejeitara as contas
do recorrente não teria apontado o dolo do prestador das
contas. (fl. 972)
É o relatório.
Decido.
A irresignação merece prosperar.

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Registro, desde pronto, que os direitos políticos formam a


base do regime democrático.
Nesse contexto, a Lei Complementar 64/1990, com as
alterações feitas pela Lei Complementar 135/2010, a chamada
Lei da Ficha Limpa, representa, sem dúvida, incomensurável
avanço. Em termos gerais, seu conteúdo é extremamente
importante para o regular desenvolvimento dos processos
eleitorais segundo parâmetros de moralidade e probidade.
Da análise dos autos, verifico que a decisão do Tribunal
Superior Eleitoral ora questionada não se afastou dessa
premissa democrática ao apreciar a incidência da causa de
inelegibilidade disciplinada no art. 1º, I, g, da LC 64/1990,
conforme trecho do voto vencedor que ora destaco:
‘Para a incidência da causa de inelegibilidade
prevista na alínea g do inciso I do art. 1º da Lei
Complementar nº 64/1990, é necessário o preenchimento
cumulativo dos seguintes requisitos: (i) rejeição das contas
relativas ao exercício de cargos ou funções públicas; (ii)
decisão do órgão competente que seja irrecorrível no
âmbito administrativo; (iii) desaprovação decorrente de (a)
irregularidade insanável que configure (b) ato de
improbidade administrativa, (c) praticado na modalidade
dolosa; (iv) não exaurimento do prazo de oito anos
contados da publicação da decisão; e (v) decisão não
suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário.
3. Na hipótese, o agravante teve as suas contas
relativas ao exercício de 2010, na qualidade de Diretor-
Presidente da Companhia de Entrepostos e Armazéns
Gerais de São Paulo (Ceagesp), rejeitadas por decisão
transitada em julgado do Tribunal de Contas da União nos
autos do TC nº 034.474/2011-0.
(…)
4. Com efeito, da leitura do acórdão do Tribunal de
Contas da União (ID 410849), verifica-se que as
irregularidades encontradas na prestação de contas,
relativas à ausência e à dispensa indevida de licitação,

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consubstanciam irregularidades insanáveis,


configuradoras de ato doloso de improbidade
administrativa’. (fl.393)
Com efeito, nos termos do art. 1º, I, g, da LC 64/1990,
ficam inelegíveis, para qualquer cargo ‘os que tiverem suas
contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas
rejeitadas por irregularidade insanável que configure ato doloso
de improbidade administrativa, e por decisão irrecorrível do
órgão competente, salvo se esta houver sido suspensa ou
anulada pelo Poder Judiciário, para as eleições que se
realizarem nos 8 (oito) anos seguintes, contados a partir da data
da decisão, aplicando-se o disposto no inciso II do art. 71 da
Constituição Federal, a todos os ordenadores de despesa, sem
exclusão de mandatários que houverem agido nessa condição’.
Constato, entretanto, que o acórdão do Tribunal de
Contas da União, que embasou a decisão do Tribunal Superior
Eleitoral ora recorrida, não subsiste.
Em recurso de revisão interposto contra o Acórdão
3766/2014-1, nos autos da TC 034.474/2011-0, o TCU afastou a
irregularidade das contas e as multas impostas ao então
Diretor-Presidente da Ceagesp. A prestação de contas restou,
portanto, aprovada.
Destaco trecho do acórdão, no que interessa ao presente
caso:
“ACORDAM os ministros do Tribunal de Contas da
União, reunidos em sessão do Plenário, ante as razões
expostas pela relatora (…) em:
9.1. conhecer do recurso de revisão e dar-lhe
provimento com o fim de:
9.1.1. julgar, com fundamento nos arts. 1º, inciso I, 16,
inciso II, 18 e 23, inciso II, da Lei 8.443/1992, regulares com
ressalva as contas de Mario Maurici de Lima Morais e dar-
lhe quitação;
(…)
9.1.3. afastar as multas aplicadas a esses responsáveis
(...)” (eDOC 13, grifos nossos).

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Nesse sentido, verifica-se que a decisão do Tribunal


Superior Eleitoral que declarou a inelegibilidade do
recorrente não se sustenta, porquanto proferida com base
em premissa que não subsiste, uma vez que as contas –
que teriam gerado o ato doloso de improbidade
administrativa em questão – restaram aprovadas pelo
Tribunal de Contas da União.
Ante o exposto, dou provimento ao recurso
extraordinário, para afastar a declaração de
inelegibilidade de Mário Maurici de Lima Morais (art. 932,
IV, do CPC, c/c art. 21, §1º, do RISTF)” (e-doc 19).

Cumpre destacar, inicialmente, que as questões centrais guardam


correlação lógica entre si e estão fundadas nas seguintes teses: (i) fixação
do marco temporal para o afastamento das causas de inelegibilidade –
momento da diplomação, de acordo com os recorrentes – para assegurar
segurança jurídica às fases e etapas concluídas do processo eleitoral; (ii)
adequada compreensão hermenêutica da hipótese de inexigibilidade
prevista na alínea g do inciso I do art. 1 da Lei Complementar 64/1990,
prescindindo-se, ou não, da comprovação do dolo de improbidade
administrativa aos que tiverem suas contas rejeitadas.

Trago à colação, desde logo, a redação do dispositivo acima


mencionado, verbis:

“Art. 1º São inelegíveis:


I - para qualquer cargo: [...]
g) os que tiverem suas contas relativas ao exercício de
cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade
insanável que configure ato doloso de improbidade
administrativa, e por decisão irrecorrível do órgão competente,
salvo se esta houver sido suspensa ou anulada pelo Poder
Judiciário, para as eleições que se realizarem nos 8 (oito) anos
seguintes, contados a partir da data da decisão, aplicando-se o
disposto no inciso II do art. 71 da Constituição Federal, a todos

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os ordenadores de despesa, sem exclusão de mandatários que


houverem agido nessa condição” (grifei).

Como se nota, mostra-se imperativo, para caracterização desta causa


de inelegibilidade, o preenchimento, cumulativo, dos seguintes
pressupostos fáticos-jurídicos: (i) o exercício de cargo ou funções
públicas; (ii) a rejeição das contas pelo órgão competente; (iii) a
insanabilidade da irregularidade apurada; (iv) o ato doloso de
improbidade administrativa; (v) a irrecorribilidade do pronunciamento
que desaprovara; e (vi) a inexistência de suspensão ou anulação judicial
do decisum que rejeitara as contas.

Assinalo, a propósito, que a referida compreensão hermenêutica


encontra-se em harmonia com entendimento jurisprudencial desta
Suprema Corte, que, ao conferir sentido e alcance à norma prevista no §
4º, do art. 37, da CF/88, assentou que o dispositivo constitucional impõe
tratamento jurídico distinto entre o ato meramente ilegal e o ato de
improbidade administrativa, também denominado de ilegalidade
qualificada. Confira-se o seguinte precedente com repercussão geral:

“CONSTITUCIONAL. AUTONOMIA DE INSTÂNCIAS.


POSSIBILIDADE DE RESPONSABILIZAÇÃO PENAL E
POLÍTICA ADMINISTRATIVA (DL 201/1967) SIMULTÂNEA À
POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA,
DEVIDAMENTE TIPIFICADO NA LEI 8.429/92.
INEXISTÊNCIA DE BIS IN IDEM.
1. "Fazem muito mal à República os políticos corruptos,
pois não apenas se impregnam de vícios eles mesmos, mas os
infundem na sociedade, e não apenas a prejudicam por se
corromperem, mas também porque a corrompem, e são mais
nocivos pelo exemplo do que pelo crime” (MARCO TÚLIO
CÍCERO. Manual do candidato às eleições. As leis, III, XIV, 32).
2. A norma constitucional prevista no § 4º do art. 37
exigiu tratamentos sancionatórios diferenciados entre os atos
ilícitos em geral (civis, penais e político-administrativos) e os

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atos de improbidade administrativa, com determinação


expressa ao Congresso Nacional para edição de lei específica
(Lei 8.429/1992), que não punisse a mera ilegalidade, mas sim
a conduta ilegal ou imoral do agente público voltada para a
corrupção, e a de todo aquele que o auxilie, no intuito de
prevenir a corrosão da máquina burocrática do Estado e de
evitar o perigo de uma administração corrupta caracterizada
pelo descrédito e pela ineficiência.
3. A Constituição Federal inovou no campo civil para
punir mais severamente o agente público corrupto, que se
utiliza do cargo ou de funções públicas para enriquecer ou
causar prejuízo ao erário, desrespeitando a legalidade e
moralidade administrativas, independentemente das já
existentes responsabilidades penal e políticoadministrativa de
Prefeitos e Vereadores.
4. Consagração da autonomia de instâncias.
Independentemente de as condutas dos Prefeitos e Vereadores
serem tipificadas como infração penal (artigo 1º) ou infração
político-administrativa (artigo 4º), previstas no DL 201/67, a
responsabilidade civil por ato de improbidade administrativa é
autônoma e deve ser apurada em instância diversa.
5. NEGADO PROVIMENTO ao Recurso Extraordinário.
TESE DE REPERCUSÃO GERAL: “O processo e julgamento de
prefeito municipal por crime de responsabilidade (Decreto-lei
201/67) não impede sua responsabilização por atos de
improbidade administrativa previstos na Lei 8.429/1992, em
virtude da autonomia das instâncias” (Recurso Extraordinário
976.566/PA, de relatoria do Ministro Alexandre de Moraes)
(grifei).

Logo, a melhor exegese da norma eleitoral consiste em exigir a


prática de ato doloso de improbidade administrativa nos termos da
legislação em regência (Lei 8.429/1992), consubstanciado no inequívoco
propósito de violar os deveres jurídicos e princípios constitucionais da
Administração Pública, além da efetiva prova de lesão ao erário. Bem por
isso, entendo que não se pode presumir atos de improbidade pela

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simples violação da Lei de Licitação.

Feitas essas considerações, registro, desde logo, que o Tribunal


Regional Eleitoral de São Paulo (TRE/SP) julgou improcedente o pedido
de impugnação de registro de candidatura apresentado pelo Ministério
Público Eleitoral de São Paulo (MPESP) em desfavor do agravado.

Assento, por oportuno, que o TRE/SP corroborou o entendimento


jurisprudencial desta Corte no sentido de que, apesar de o TCU ter
julgado irregulares, num primeiro momento, as contas do agravado (na
condição de Diretor-Presidente da Ceagesp), não se pode confundir
ilegalidade ou incompetência com atos dolosos de improbidade
administrativa, de sorte que, no caso em exame, não estaria configurada
a causa de inexigibilidade prevista na alínea g do inciso I do art. 1 da Lei
Complementar 64/1990. Confira-se a ementa:

“REGISTRO DE CANDIDATURA, ELEIÇÕES 2018.


CANDIDATO A DEPUTADO ESTAUDAL. AFASTADA A
CAUSA DE INELEGIBILIDADE PREVISTA NO ARTIGO 1º,
INCISO I, LETRA “G, DA LEI COMPLEMENTAR Nº64/90.
IMPUGNAÇÃO IMPROCEDENT. REGISTRO DEFERIDO”
(RRC 0604731-31.2018, Relator Desembargador Fábio Prieto de
Souza).

Verifico, outrossim, que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ao


apreciar o AgReg. no Recurso Ordinário 0604731-31.2018.6.26.0000 (de
relatoria do Ministro Roberto Barroso), assentou que o ora recorrido
praticou conduta prevista como causa de inelegibilidade, verbis:

“DIREITO ELEITORAL. AGRAVO INTERNO EM


RECURSO ORDINÁRIO. ELEIÇÕES 2018. REGISTRO DE
CANDIDATURA. DEPUTADO ESTADUAL. REJEIÇÃO DE
CONTAS PÚBLICAS PELO TCU. INCIDÊNCIA DA CAUSA
DE INELEGIBILIDADE DO ART. 1º, I, G, DA LC nº 64/1990.
DESPROVIMENTO.

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1. Agravo interno interposto em face de decisão


monocrática que deu provimento a recurso ordinário para
indeferir requerimento de registro de candidatura ao cargo de
deputado estadual nas Eleições 2018.
2. O candidato teve as suas contas relativas ao exercício de
2010, na condição de Diretor-Presidente da Companhia de
Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (Ceagesp),
julgadas irregulares por decisão transitada em julgado do
Tribunal de Contas da União. Não há prova nos autos de que a
decisão tenha sido suspensa ou anulada por decisão judicial.
3. O TCU julgou irregulares as contas em virtude de: (i)
ausência de licitação para a contratação de serviços de telefonia,
apesar de ter sido objeto de ressalva por parte da Controladoria
Geral da União desde 2009; (ii) contratação de serviços por
inexigibilidade de licitação sem a devida comprovação da
alegada exclusividade; (iii) descumprimento da exigência de
apresentação de três propostas válidas para a realização de
convites; e (iv) reiteração das práticas de contratação e
nomeação para funções de confiança e cargos em comissão em
desacordo com as determinações do TCU.
4. A jurisprudência deste Tribunal é no sentido de que a
ausência ou a dispensa indevida de licitação configura
irregularidade insanável e ato doloso de improbidade
administrativa, apta a atrair a inelegibilidade da alínea g do
inciso I do art. 1º da LC nº 64/1990. Precedentes.
5. Cabe à Justiça Eleitoral, rejeitadas as contas, proceder ao
enquadramento das irregularidades como insanáveis ou não e
verificar se constituem ou não ato doloso de improbidade
administrativa, não lhe competindo, todavia, a análise do acerto
ou desacerto da decisão da corte de contas. Precedentes.
6.Agravo interno a que se nega provimento”.

Contudo, pelo que se colhe dos votos prolatados no referido


acórdão, apesar de a decisão do TCU não ter indicado conduta dolosa ou
ato de improbidade administrativa, a inexigibilidade da candidatura do
agravado decorreria substancialmente do fato de ter suas contas

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rejeitadas por suposta ofensa à Lei 8.666/1993.

Consigno, nesse sentido, trechos do voto divergente no aludido


julgamento, proferido pelo Ministro Tarcísio Vieira do TSE:

“Do acórdão atacado pelo recurso ordinário, recolho a


fundamentação de que houve, sim, descumprimento das
normas que regem as licitações e, segundo o relator do acórdão
recorrido, que foi unânime , houve violação à Lei de Licitações e
desrespeito às determinações fo Tribunal de Contas.
Em outra passagem:
‘Mas o acórdão não fez censura por dolo, nem
reconheceu a existência de dano ao erário, de onde se
conclui que não se deve confundir ilegalidade ou
incompetência com ato de improbidade administrativa’.
Para conforto da minha posição, verifico o acórdão do
Tribunal de Contas da União, que é o fato gerador da suposta
inexigibilidade, e recordo uma passagem que me causa, no
mínimo, dúvida sobre a caracterização da inelegibilidade, que
é o utem 13 do voto proferido pelo ilustre Ministro Benjamin
Zymler, no âmbito do TCU.
Sua Excelência diz assim:
‘Ademais, o entendimento consolidado desta Corte
é no sentido de que a imputação de multa prescinde da
caracterização do dolo’.
Diante da moldura do acórdão da Corte de Contas,
reforçado pelo acórdão do TRE-SP, em decisão unanime, não
me parece claramente evidenciado o dolo, que é integrante e
obrigatório do tipo alínea “g” da Lei de Inexigibilidades”
(grifei).

Some-se a isso, ainda, a existência do provimento superveniente


do “recurso de revisão” interposto pelo agravado no TCU (autos da TC
034.474/2011-0), que, em 11/9/2019, julgou regulares - com ressalvas - as
contas apresentadas, afastando, por consequência, as sanções e as
penalidades anteriormente impostas (e-doc.13).

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Assinalo, a propósito, que não se depreende dos julgamentos na


Corte de Contas nenhuma conclusão no sentido de firmar a ocorrência de
ato doloso ou lesão ao erário.

Como se vê, o mosaico fático constante dos autos revela a manifesta


ausência do ato intencional de improbidade praticado pelo agravado e,
por conseguinte, torna-se incompreensível a interpretação extensiva do
TSE acerca do sentido e alcance da restrição prevista na alínea g do inciso
I do art. 1 da Lei Complementar 64/1990.

Sendo assim, entendo que descabe, no caso concreto, qualquer juízo


exauriente acerca do marco temporal para o afastamento das causas de
inelegibilidades, porquanto tanto a decisão do TCU quanto o acórdão do
TRE/SP descortinam, de forma irrefutável, a ausência de dolo ou de dano
efetivo ao erário antes do diplomação, a denotar, portanto, que o
agravado não se encontrava inelegível.

Vale dizer, à míngua de prova cabal da existência do dolo, tal como


assentado pelo TRE/SP, outra conclusão não resta senão assentar que não
subsiste o epílogo extraído pelo TSE.

Em outras palavras, acompanho o Ministro Relator em sua


conclusão sobre a inconstitucionalidade da decisão do TSE, de modo que
não há que cogitar, neste caso específico, da limitação para o
reconhecimento de fatos supervenientes à diplomação, na linha da
jurisprudência atual da Corte Eleitoral.
Isso posto, nego provimento aos agravos regimentais.

É como voto.

11

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Extrato de Ata - 03/03/2020

Inteiro Teor do Acórdão - Página 36 de 36

SEGUNDA TURMA
EXTRATO DE ATA

SEGUNDO AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO 1.197.808


PROCED. : SÃO PAULO
RELATOR : MIN. GILMAR MENDES
AGTE.(S) : ELISABETH SAHÃO
ADV.(A/S) : MARILDA DE PAULA SILVEIRA (33954/DF, 90211/MG)
INTDO.(A/S) : MARIO MAURICI DE LIMA MORAIS
ADV.(A/S) : CAIRO ROBERTO BITTAR HAMU SILVA JUNIOR (17042/DF,
46855/PE)
INTDO.(A/S) : MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA

Decisão: Após o voto do Ministro Relator, que negava


provimento ao agravo regimental, e do voto divergente do Ministro
Edson Fachin, que dava provimento ao agravo e negava seguimento ao
recurso extraordinário, pediu vista o Ministro Ricardo
Lewandowski. Ausente, justificadamente, por motivo de licença
médica, o Ministro Celso de Mello. Presidência da Ministra Cármen
Lúcia. 2ª Turma, 4.2.2020.

Decisão: A Turma, por maioria, negou provimento ao agravo


regimental, nos termos do voto do Relator, vencido o Ministro
Edson Fachin. Não participou, justificadamente, deste julgamento,
a Ministra Cármen Lúcia. Ausente, justificadamente, por motivo de
licença médica, o Ministro Celso de Mello. Presidência do Ministro
Gilmar Mendes. 2ª Turma, 3.3.2020.

Presidência da Senhora Ministra Cármen Lúcia. Presentes à


sessão os Senhores Ministros Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e
Edson Fachin. Ausente, justificadamente, por motivo de licença
médica, o Senhor Ministro Celso de Mello.

Subprocurador-Geral da República, Dr. José Elaeres Marques


Teixeira.

Ravena Siqueira
Secretária

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