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UNIVERSIDADE DE MARÍLIA

SINARA LACERDA ANDRADE

A FUNÇÃO SOCIAL E A BOA-FÉ OBJETIVA COMO LIMITES À PRODUÇÃO


PUBLICITÁRIA NA SOCIEDADE DE CONSUMO

MARÍLIA
2016
SINARA LACERDA ANDRADE

A FUNÇÃO SOCIAL E A BOA-FÉ OBJETIVA COMO LIMITES À PRODUÇÃO


PUBLICITÁRIA NA SOCIEDADE DE CONSUMO

Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado


em Direito da Universidade de Marília como
requisito parcial para a obtenção do título de
Mestre em Direito, sob orientação da Profa. Dra.
Mariana Ribeiro Santiago.

MARÍLIA
2016
Andrade, Sinara Lacerda
A função social e a boa-fé objetiva como limites à produção
publicitária na sociedade de consumo / Sinara Lacerda Andrade. -
Marília: UNIMAR, 2016.
126f.

Dissertação (Mestrado em Empreendimentos Econômicos,


Desenvolvimento e Mudança Social) – Universidade de Marília, Marília, 2016.
Orientação: Profª. Dra. Mariana Ribeiro Santiago

1. Direito 2. Sociedade de Consumo 3. Publicidade 4. Função Social –


Empresa 5. Boa-fé Objetiva I. Andrade, Sinara Lacerda

CDD – 342.233
SINARA LACERDA ANDRADE

A FUNÇÃO SOCIAL E A BOA-FÉ OBJETIVA COMO LIMITES À PRODUÇÃO


PUBLICITÁRIA NA SOCIEDADE DE CONSUMO

Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado em Direito da Universidade de Marília,


área de concentração Empreendimentos Econômicos, Processualidade e Relações Jurídicas,
como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Direito, sob orientação da
Profª. Drª. Mariana Ribeiro Santiago.

Aprovada pela banca examinadora em: __/__/____

_________________________________________
Prof.ª Dr.ª Mariana Ribeiro Santiago
Orientadora

__________________________________________
Prof. Dr. Elias Marques de Medeiros Neto

__________________________________________
Prof.ª Dr.ª Lívia Gaigher Bósio Campello
A todos aqueles que escolheram a docência
por vocação. Àqueles que, apesar de tudo,
acreditam que somente o conhecimento é o
caminho para ensinar aos filhos deste solo que,
efetivamente, não se foge à luta!
AGRADECIMENTOS

a) Pessoais

A Deus por sua presença constante em minha vida, pelos insights que são seguramente
atribuídos a seu Divino Espírito Santo e por acolher minhas angústias em noites insones.
À Eleny Lacerda Andrade e Laurie Teixeira de Andrade pelo altruísmo em
abdicarem de seus sonhos em detrimento dos meus, pelo mais belo e fiel amor, pelo exemplo
diário de retidão e pela obstinação em ter fé na vida, por tudo, sempre!
À Raquel Lacerda Andrade Piassa e Bethânia Lacerda Andrade Oliveira pela
compreensão com as reiteradas ausências em momentos que era aguardada a minha presença.
Ao Leonardo de Paula Caloche por seu inigualável companheirismo, paciência e
carinho durante todo esse processo e, principalmente, por optar permanecer ao meu lado
mesmo podendo voar, fly away!
À Gabriela Eulalio de Lima por dividir comigo todo o peso cognitivo e emocional
inerente à pós-graduação, por sua amizade, lealdade, resignação perante minhas falhas e
obstinação ante as minhas inseguranças.
À Mariana Santiago minha mais profunda gratidão por me encorajar a “sair da
caverna” e explorar o mundo, um novo mundo por ela apresentado, pelo despertar intelectual
e por sua atuação e influência polivalente em minha vida.
Ao professor Paulo Roberto de Souza Pereira por propiciar e incentivar a realização
de um dos maiores e mais íntimos sonhos que eu tinha na vida, por me ensinar que
conhecimento e sabedoria são melhores, quando acompanhados de generosidade e humildade.
Ao José Augusto Marchesin pelo ser humano ímpar que é, pela excelência no
trabalho desenvolvido e, sem o qual, o programa de pós-graduação da Universidade de
Marília não seria o que é hoje.
Aos amigos iluminados de sempre pela compreensão com minhas escolhas e aos que o
mestrado me presenteou, por dividirem as angústias e dificuldades, tornando tudo mais
suportável.

b) Institucionais

À Universidade de Marília - UNIMAR aqui representada por seu corpo docente que,
sem dúvidas, torna essa universidade diferenciada.
A todos os professores do programa de pós-graduação, todos sem distinção, por
sua doação e compromisso com nossa formação em especial, à estimada Professora Doutora
Mariana Ribeiro Santiago pelas orientações e empenho para com esta pesquisa, por seu
amor à docência e compromisso com seus orientandos e à Professora Doutora Samyra
Haydêe Dal Farra Naspolini Sanches por sua inestimável contribuição com essa pesquisa,
pela maneira delicada ao tecer suas imprescindíveis ponderações e pelo título desta pesquisa.
À Universidade do Estado de Minas Gerias - UEMG - responsável por minha
formação e atuação acadêmico-profissional.
À Ordem dos Advogados do Brasil - OAB - entidade de classe que represento e que
defenderei sempre com muito afinco e orgulho.
Ao MENDONÇA & LACERDA Advogados Associados e seus colaboradores,
clientes, estagiárias, associados, em especial, ao meu estimado sócio pela compreensão com
minhas ausências semanais e por me incentivar sempre, a prosseguir na luta por um Direito
mais equitativo a todos os jurisdicionados.
“Todas as vitórias ocultam uma abdicação”.1

1
BEAUVOIR, Simone Lucie-Ernestine-Marie Bertrand de. Mémoires dúne jeune fille rangée. Paris: Gallimard,
1958, p. 243 (tradução nossa).
A FUNÇÃO SOCIAL E A BOA-FÉ OBJETIVA COMO LIMITES À PRODUÇÃO
PUBLICITÁRIA NA SOCIEDADE DE CONSUMO

RESUMO: A presente pesquisa tem por objetivo examinar a produção publicitária na


sociedade de consumo propondo a implementação da função social da empresa e da boa-fé
objetiva, como formas de limite à publicidade abusiva e enganosa. Utiliza-se, para tanto,
como referencial teórico, a abordagem do sociólogo polonês Zymunt Bauman, apontando as
premissas da mercancia e das relações de consumo na globalização econômica, com destaque
para o consumidor e sua incessante busca pela satisfação por meio do consumo, oportunizada,
sobretudo, pelos anúncios publicitários. Analisa-se uma nova perspectiva de normatividade
publicitária por meio da implementação da boa-fé objetiva e da função social da empresa
tanto para os fabricantes/fornecedores, quanto para todos os envolvidos na cadeia produtiva e
também aos sujeitos publicitários, agências e veículos de comunicação. Explicitando que, nos
casos de descumprimento dos deveres de transparência e lealdade consubstanciados também
na função social e na boa-fé objetiva, aplica-se a responsabilidade civil às empresas,
analisando-se qual modalidade será imputada não só à empresa fabricante, mas também aos
sujeitos publicitários, agências e veículos de comunicação, elencando-se, por fim, as
consequências do uso nocivo da publicidade enganosa e abusiva como mecanismo de fomento
ao consumismo. O desenvolvimento do tema deu-se por meio de pesquisa bibliográfica
nacional e estrangeira, análise doutrinária e jurisprudencial, utilizou-se o método dedutivo
com o fito de responder à problemática lançada e alcançar o escopo esperado, propondo-se
que, por meio da boa-fé objetiva e da função social da empresa, haverá uma mudança de
paradigma de todos os envolvidos na produção publicitária, tornando o consumo menos
indutivo, mais transparente e racional.
Palavras-chave: Sociedade de consumo. Publicidade. Boa-fé objetiva. Função social da
empresa.
SOCIAL FUNCTION AND GOOD FAITH AS STRICT LIMITS ON ADVERTISING
PRODUCTION IN CONSUMER SOCIETY

ABSTRACT: This research aims to examine the advertising production in the consumer
society proposing the implementation of the social function of the company and the objective
good faith, as a way to limit the abusive and misleading advertising. , Is used for both, as a
theoretical reference, the approach of the Polish Zymunt Bauman Sociologist, pointing the
premises of mercancia and consumer relations in the economic globalization, especially the
consumer and his constant search for satisfaction through consumption, nurtured mainly by
advertising. Analyzes a new perspective of advertising normativity through the
implementation of objective good faith and the social function of the company for both
manufacturers / suppliers, and for everyone involved in the production chain and also to
advertisers subjects, agencies and media . Explaining that, in cases of non-compliance with
transparency obligations and loyalty also embodied in the social function and objective good
faith applies to civil liability companies, analyzing which category will be attributed not only
to the manufacturer, but also to advertising subjects, agencies and media if elencando-finally,
the consequences of harmful use of misleading and abusive advertising and consumerism
funding mechanism to consumerism. The issue of development was given by national and
foreign literature, doctrinal and jurisprudential analysis, we used the deductive method with
the aim of responding to the released issue and achieve the expected scope, proposing that,
through good -f objective and the social function of the company, there will be a paradigm
shift for everyone involved in advertising production, making the least inductive
consumption, more transparent and rational.
Keywords: Consumer society. Advertising. Objective good faith. Social function of the
company.
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ................................................................................................................................................... 11
1 A ORIGEM DA SOCIEDADE DE CONSUMO SOB O ENFOQUE DA PÓS-MODERNIDADE .......... 15
1.1 AS PREMISSAS DO COMÉRCIO E DAS RELAÇÕES DE CONSUMO ................................................. 15
1.2 AS RELAÇÕES DE CONSUMO E A GLOBALIZAÇÃO ECONÔMICA ................................................ 20
1.3 O PAPEL DO CONSUMIDOR NA SOCIEDADE DE CONSUMO ........................................................ 254
2 O IDEAL PUBLICITÁRIO MEDIANTE A BOA-FÉ OBJETIVA E A FUNÇÃO SOCIAL ................... 29
2.1 PUBLICIDADE: DELIMITAÇÃO CONCEITUAL E ORIGENS HISTÓRICAS ................................... 321
2.2 A PUBLICIDADE ENGANOSA, ABUSIVA E O VÍCIO DE INFORMAÇÃO. ..................................... 443
2.3 A FUNÇÃO SOCIAL DA EMPRESA COMO PRINCÍPIO FUNDAMENTAL NA ORDEM
CONSTITUCIONAL E DIRETRIZ NORMATIVA DA ATIVIDADE EMPRESARIAL ............................. 610
2.4 PERSPECTIVAS SOBRE A APLICAÇÃO DA BOA-FÉ OBJETIVA COMO FORMA DE OBJEÇÃO E
ENFRENTAMENTO À PUBLICIDADE LESIVA .......................................................................................... 71
3 A RESPONSABILIDADE CIVIL DA EMPRESA NA PUBLICIDADE .................................................. 776
3.1. RESPONSABILIDADE CIVIL: QUESTÕES PRELIMINARES ............................................................. 77
3.2 ANÁLISE DA RESPONSABILIDADE CIVIL NO DIREITO COMPARADO: DIREITO ROMANO,
FRANCÊS, PORTUGUÊS ............................................................................................................................. 798
3.3 RESPONSABILIDADE CIVIL E SUAS ESPÉCIES NO DIREITO PÁTRIO ........................................... 85
3.4 RESPONSABILIDADE CIVIL DA EMPRESA E O DEVER DE INDENIZAR ....................................... 92
3.5 A RESPONSABILIDADE CIVIL SOLIDÁRIA DE SEUS SUJEITOS ANUNCIANTES: AGÊNCIAS DE
PUBLICIDADE E VEÍCULOS DE COMUNICAÇÃO. .............................................................................. 1032
CONCLUSÃO ................................................................................................................................................... 111
REFERÊNCIAS ................................................................................................................................................ 115
11

INTRODUÇÃO

O tema que será desenvolvido no decorrer da dissertação refere-se à implementação da


boa-fé objetiva e da função social da empresa especialmente aos sujeitos publicitários como
uma forma de limitação à produção publicitária tendo em vista sua responsabilidade na
criação e produção publicitária. Utilizar-se-á, para tanto, como referencial teórico a pós-
modernidade sob a ótica do sociólogo Zygmunt Bauman, analisando-se a sociedade de
consumo, a cultura do desperdício e a incessante busca pela satisfação dos anseios humanos
por intermédio do consumismo.
Por meio de uma análise da sociedade de consumo pós-moderna, observar-se-á que a
promessa de satisfação dos desejos ocorre exclusivamente por meio da aquisição de novos
bens ou serviços. Demonstrar-se-á que esse paradigma social somente obtém êxito desde que
se mantenha como modelo a postura consumista, a fim de que possa produzir cotidiana e
sucessivamente novas metas e anseios a serem alcançados, tornando a busca pela satisfação
dos desejos um comportamento compulsivo, a transformar a felicidade num conceito
inatingível e falacioso.
Com a globalização, a abertura do comércio internacional, a circulação de bens e
serviços entre as nações, a possibilidade de escoamento de produção e a inserção das novas
tecnologias propiciaram, neste contexto social, uma aproximação entre as nações, visto que a
rede mundial de computadores oportunizou e facilitou o consumismo. Ocorre que um dos
mecanismos mais utilizados para tornar a satisfação algo inatingível é, sem dúvidas, a
publicidade que passa então a ser a problemática do presente estudo, a partir da constatação
de que, quando abusiva ou enganosa, gera prejuízos às relações de consumo e danos a toda
coletividade.
Analisar-se-á uma possibilidade em estabelecer limites à produção publicitária nociva
na sociedade pós-moderna, estabelecendo uma rede de colaboração, consubstanciada na boa-
fé objetiva e na função social da empresa, atribuindo a todos os envolvidos na cadeia
produtiva e também aos sujeitos publicitários, a saber, agências de comunicação, publicitários
e veículos de comunicação, a responsabilidade civil pela produção e veiculação de
publicidade abusiva ou enganosa.
Contudo, antes de se adentrar na análise da problemática da publicidade abusiva e
enganosa, bem como no papel do consumidor no que tange ao consumismo, importante se faz
ressaltar as questões primárias que envolvem o tema, sendo imperioso elucidar todo o
12

contexto econômico. Assim, o ponto de partida para a análise do tema é a economia


crescimentista, que produz mecanismos para incentivar e promover cada vez mais o
consumismo, reforçando a necessidade inesgotável de aquisição de bens de consumo, por
meio da publicidade e propaganda, trazendo como consequência a cultura do desperdício.
Para que a economia crescimentista e o consumismo subsistam em uma era na qual os
consumidores estão mais esclarecidos e possuem constitucionalmente garantido seu acesso à
informação, é necessário utilizar desse mesmo direito já consubstanciado na publicidade e
produzir consumidores mais insatisfeitos, pois a infelicidade é a maior e mais poderosa
ferramenta do consumo, o que acaba por ocasionar a reiterada prática da obsolescência
programada e psicológica.
Em sendo assim, observa-se que a forma mais eficaz de produzir consumidores
frequentemente insatisfeitos é transformar os bens de consumo, recém-adquiridos, em
produtos obsoletos e, por meio da publicidade e propaganda, expor a esses consumidores que
há no mercado um novo produto que dispõe de nova tecnologia, ou tão somente de um novo
design. Elucidando que houve um desvirtuamento no princípio da boa-fé objetiva da função
social da empresa, pois a publicidade e a propaganda tornaram-se as principais responsáveis
por fomentar o consumismo, que passa ser a forma mais característica de autoafirmação
individual.
O resultado da economia crescimentista de consumo é a pós-modernidade, ou seja, o
período contemporâneo em que se vislumbra que o consumismo, tão salutar à economia,
trouxe consequências perniciosas às relações de consumo e sobremaneira ao ambiente, afinal,
os recursos naturais não são fontes renováveis e, por óbvio, não acompanham a celeridade da
cultura do desperdício e do consumismo. Ocorre que, diante do cenário desordenado
resultante desta sociedade de consumo, é necessário analisar os efeitos que a publicidade e a
propaganda, que não cumpram com a boa-fé objetiva e a função social, ocasionam no
consumismo e, assim, responsabilizar objetiva e solidariamente as empresas.
Importante verificar os efeitos que o direito à informação, disposto no art. 5º, inciso
XIV da Constituição da República, difundido principalmente por meio da publicidade e
propaganda, exerce sistematicamente na sociedade de consumo e quais os mecanismos seriam
propícios à implementação de um consumo racional, identificando um desvirtuamento no
princípio da boa-fé objetiva e da função social da empresa, visto que, os sujeitos de
publicidade e propagada, utilizam-se de técnicas de marketing, deixando, por vezes, de prestar
informações relevantes aos consumidores, fomentando o consumismo por meio de
publicidade abusiva ou enganosa.
13

Observar-se-á que, inerentemente ao dever de obediência ao direito da informação,


surgem vários problemas que irão influenciar sobremaneira a sociedade de consumo,
analisando, sobretudo, como o direito à informação, que positivou uma das maiores
conquistas do consumidor, tem se mostrado, por vezes, insuficiente para o enfrentamento da
problemática da publicidade abusiva e enganosa, visto que os anúncios nem sempre cumprem
com o dever de lealdade e transparência nas relações de consumo e acabam por promover
publicidade lesiva tanto ao consumidor, como às relações de consumo, configurando um
desvirtuamento do princípio da boa-fé objetiva e da função social da empresa.
Como mecanismo legal para enfrentamento da problemática envolvendo a publicidade
enganosa e abusiva, abordar-se-á uma nova perspectiva de normatividade publicitária,
implementando o princípio da boa-fé objetiva e da função social da empresa, para os
fabricantes/fornecedores e todos os envolvidos na cadeia produtiva, como também, aos
publicitários, agências publicitárias e veículos de comunicação, demonstrando a necessidade
de uma mudança de paradigma principalmente dos sujeitos publicitários, estabelecendo tais
princípios como forma de limite à produção ou veiculação de publicidade enganosa ou
abusiva.
Abordar-se-á que nos casos em que houver descumprimento da boa-fé objetiva e da
função social da empresa, deverá ser arbitrada a responsabilidade civil objetiva, segundo o
Código de Defesa do Consumidor. Apontar-se-á, ainda, que a responsabilidade civil, mesmo
que seja veiculada por terceiro contratado estranho à relação negocial, deverá ser
solidariamente distribuída entre os sujeitos publicitários, fabricantes/fornecedor, anunciantes,
agências de publicidade e veículos de comunicação, que responderão subjetivamente,
reparando o dano sofrido pelo consumidor que se achar lesado pelo produto ou serviço
oriundo de publicidade enganosa ou abusiva.
Objetiva-se, por meio da implementação da boa-fé objetiva e da função social da
empresa, estabelecer limites à produção publicitária lesiva, evitando-se a criação e a
veiculação de publicidade abusiva e enganosa. Posteriormente, objetiva-se promover um
“despertar” cognitivo e, sobretudo, social também no leitor, demonstrando que é possível
analisar criticamente sua condição enquanto consumidor. Propondo-o distanciar-se de uma
situação de “vítima” do mercado publicitário, instigando-o a repensar racionalmente sobre sua
verdadeira função/condição de consumidor, a prover um consumo menos indutivo e mais
consciente.
Demonstrando-se, com isso, que a Ciência Jurídica vai muito além da positivação e da
subsunção do fato à norma, elucidando que é preciso um desejo de cooperação social mútua,
14

para que haja uma mudança de paradigma, incutindo em todos os membros de uma relação de
consumo que se deve assumir uma responsabilidade incondicional pelo outro, que a minha
responsabilidade pelo outro está sempre um passo à frente da dele por mim.
Para a obtenção dos resultados pretendidos, utilizar-se-á como procedimento de
abordagem o método dedutivo. Quanto ao método de investigação, adotar-se-á o histórico, no
que concerne à interpretação normativa, utilizar-se-á o método sistemático e teleológico e,
como técnica de pesquisa, a bibliográfica e a documental, a averiguação se processará em
obras, revistas e documentários concernentes ao tema.
15

1 A ORIGEM DA SOCIEDADE DE CONSUMO SOB O ENFOQUE DA PÓS-


MODERNIDADE

A sociedade de consumo é fundada no modo de produção econômico capitalista e


regida por ideologias como a cultura do desperdício, a busca incessante pela felicidade por
meio da aquisição de novos bens ou serviços. Nesse contexto, fabricantes/fornecedores
utilizando-se de pesquisa de ponta e estratégias como a obsolescências programada e
psicológica alcançam um patamar extremamente desenvolvido de tecnologia, produção
industrial que somando a técnicas persuasivas de publicidade, aumentam sistematicamente o
consumo que por consequência tem reflexo imediato no crescimento econômico.
Ocorre que esta sociedade deixa como legado consequência drásticas, danos
irreversíveis ao meio ambiente e uma indelével desigualdade social. Se não bastasse, para
além desses aspectos socialmente lesivos, determinadas empresas têm conquistado fatias cada
vez maiores do mercado de consumo, utilizando-se de técnicas publicitárias por vezes
enganosas, abusivas ou até mesmo publicidade ceifada de vício de informação, condutas que
afrontam claramente a legislação pátria e que, por vezes podem ser enquadradas como crimes
contra as relações de consumo, situações que configuram objeto de análise e estudo que serão
desenvolvidas no decorrer do trabalho.
Para além de definir conceitos, o objetivo do presente capítulo é inserir o leitor no
contexto social e econômico da sociedade de consumo na era pós-moderna, analisando-se,
para tanto, inicialmente as origens do comércio e das relações de consumo, abordando a
globalização, a inserção de novas tecnologias e seus efeitos para a sociedade de consumo e
encerrando com uma releitura do indivíduo enquanto consumidor nela inserido.

1.1 AS PREMISSAS DO COMÉRCIO E DAS RELAÇÕES DE CONSUMO

A história do comércio tem certos contornos e um padrão de complexidade próprio


paralelo à evolução econômica. Sabe-se que a sociedade de consumo existe desde os
primórdios, embora não haja registros históricos sequer aproximados da data que teriam
ocorrido as primeiras relações comerciais, admite-se, contudo, que teriam ocorrido no período
pré-histórico.2

2
SARQUIS, Sarquis José Buiainain. Comércio internacional e crescimento econômico no Brasil. Brasília:
Fundação Alexandre de Gusmão, 2011, p. 18.
16

O homem em suas primeiras civilizações exercia a produção de subsistência. Ocorre


que, com o aumento populacional e o desenvolvimento da tribo, foi necessário dividir a aldeia
e subdividir as tarefas. Desse modo, a um determinado setor competia caçar, a outro pescar e
a outro plantar, atividades que exerciam sempre com excedente, a fim de realizar as trocas,
atendendo às suas necessidades.
As primeiras atividades comerciais baseavam-se em trocas naturais, de modo que as
relações comerciais que se estabeleceram foram baseadas em escambo, ou seja, a troca direta
de uma mercadoria por outra, sem o uso de moeda. Não havia qualquer escrito, tampouco lei
para disciplinar essas trocas, cabendo às partes estipularem as normas que regeriam a
permuta, quais os produtos, a quantidade, mas, principalmente, qual sanção seria aplicada
àqueles que descumprissem as negociações.3
Com o passar do tempo e o desenvolvimento científico criou-se a caravela, um navio
estável e ágil, considerado um grande projeto tecnológico que possibilitou realizar as
primeiras navegações, diminuindo as distâncias e aumentando as fronteiras. Era o momento
propício para conquistar novos territórios. Nesse período, houve um considerável aumento
populacional, a organização social tornou-se mais complexa e as trocas comerciais envolviam
um número cada vez maior de produtos e produtores.4
A comercialização de determinadas mercadorias de grande porte e de difícil transporte
que eram extraídas das colônias tornaram as trocas comerciais inviáveis, sendo necessária a
criação de mecanismos comerciais, a fim de facilitar o fluxo dessas mercadorias, dando
origem às primeiras moedas, consoante explicita Souza:

As primeiras moedas apareceram como um meio de dinamizar as atividades


comerciais entre os povos. Além de serem aceitas como meio de troca, as
moedas deveriam ser de fácil transporte, possuir valores fracionados, ter
grande durabilidade e não deveriam ser feitas de um material mais
importante para outro tipo de atividade. Naturalmente, todas essas
qualidades para uma moeda foram definidas por um longo processo, até que
as ligas de metal fossem empregadas como forma de pagamento.5

Durante a Idade Média surgiu o Direito Comercial, em virtude, principalmente, do


êxodo rural e posterior crescimento das cidades medievais. A imagem da vila fechada,

3
IANSEN, Marta. O início do escambo entre europeus e os índicos no Brasil. História & outras histórias.
Disponível em < https://martaiansen.blogspot.com.br/2012/08/inicio-do-escambo-entre-europeus-e-indios-no-
Brasil.html>. Acesso em: 21 out. 2016.
4
MARCOLIN, Neldson. Os reis dos mares: Portugueses realizavam as grandes navegações mesmo sem a
menor matemática conhecida nos séculos XV e XVI. 212. ed. São Paulo: Revista Pesquisa FAPESP, 2013, p. 87.
5
SOUSA, Rainer Gonçalves. História do Comércio. Brasil Escola. Disponível em
<http://www.brasilescola.com/historia/historia-do-comercio.htm>. Acesso em: 27 out. 2015.
17

vivendo exclusivamente de seus recursos, deve ser mitigada, pois havia certa especialização
na produção, sobretudo do vinho, o que indica a ocorrência de relações tanto entre os
domínios de um mesmo senhor quanto com o de outros proprietários. Nascia assim, as formas
de comércio existentes nos novos bairros denominados burgos e o surgimento das
corporações de mercadores.6
Essa transformação social importante ocorrida nos séculos XI e XIII passou a
desempenhar um papel central na atividade econômica propiciando o reaquecimento das
atividades comerciais. Tornando-se imprescindível a elaboração de normas que
regulamentassem as atividades comerciais. Ocorre que somente uma parcela muito pequena
da população estava diretamente envolvida com as atividades comerciais, porém esse
segmento social ganhava crescente importância, pois, as primeiras regras foram elaboradas
por esses comerciantes que, para atender a seus interesses, acabavam por privilegiar sua
própria classe.7
Em âmbito nacional, o crescimento populacional, a regulamentação da atividade
comercial e o capitalismo crescente proporcionaram uma mudança de paradigma. O problema
surge quando o desenvolvimento industrial e o surgimento da produção em massa não mais
condiziam com um código que permaneceu sendo aplicado até 1991, mesmo demonstrando
ser uma legislação inadequada para dirimir conflitos oriundos das relações de consumo.
Nunes elucida que não seria mais possível aplicar às relações comerciais o Código
Civil que entrou em vigor em 1917, pois a legislação não mais era condizente com as
demandas de produção em massa:

Pensemos num ponto de realce importante: em relação ao direito civil,


pressupõe-se uma série de condições pra contratar, que não vigem para
relações de consumo. No entanto, durante praticamente o século inteiro, no
Brasil, acabamos aplicando às relações de consumo a lei civil para resolver
os problemas que surgiram e, por isso, o fizemos de equivocada [...]. Não
tinha sentido fazer um automóvel, reproduzi-lo vinte mil vezes, e depois
fazer vinte mil contratos diferentes para os vinte mil compradores. Na
verdade quem faz um produto e o reproduz vinte mil vezes também faz um
único contrato e o reproduz vinte mil vezes.8

A legislação tornara-se obsoleta e não mais atendia às necessidades da sociedade.


Nascia a figura do empresário, o conceito de empresa, a distribuição de bens e de serviços em

6
FRANCO JÚNIOR, Hilário. A idade média: nascimento do ocidente. 2. ed. rev. e ampl. São Paulo:
Brasiliense, 2001, p. 45.
7
Idem Ibidem, p. 49.
8
NUNES, Luiz Antonio Rizzato. Curso de direito do consumidor. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 42.
18

larga escala. Por óbvio, o Direito Comercial precisou ser o disciplinador também das
empresas comerciais.
Surge, assim, um sistema jurídico estatal cujo objetivo era disciplinar as relações
mercantis no lugar do antigo direito de classe, não mais disciplinado pelo viés dos
comerciantes, mas pelo “espírito da burguesia comercial e industrial, valorizando a riqueza
imobiliária com um Código Civil que atendia aos interesses da burguesia fundiária, pois
estava centrado no direito de propriedade”.9
Não havia um código específico que dispusesse sobre as relações de consumo, havia
somente legislações extravagantes que poderiam ser aplicadas por analogia às situações
consumeristas, como a lei que regulamentava os Crimes Contra a Economia Popular e a Lei
de Usura, a Lei Delegada de 1962 que assegurava a distribuição à população de produtos de
primeira necessidade e a Lei de Repressão do Poder Econômico que regulamentou várias
situações que posteriormente seriam consideradas como conquistas dos consumidores dentre
elas, a criação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica.10
Em 1990, com a edição do Código de Defesa do Consumidor, surgiu uma nova
modalidade de relação obrigacional qual seja: a de consumo. Oportuno elucidar que Ferreira
entende como consumo: “ato de negociar, vender, revender, comprar algo, em síntese são
todas as relações de negócios, o comércio é uma relação social que é singular ao homem”.11
A posteriori, com a promulgação do Código Civil de 2002, inspirado pelo Código
Civil Italiano de 1942, houve a unificação do Direito Privado anteriormente dividido em
Direito Civil e Direito Comercial, consagrando a teoria da empresa e promovendo uma
aproximação entre as relações civis e consumeristas. Prova disso é que a responsabilidade
objetiva foi elevada a um nível de paridade entre a responsabilidade subjetiva12, evolução
normativa que será abordada de maneira pautada no terceiro capítulo.
Antes as relações de consumo eram julgadas de forma análoga e regradas de maneira
ineficaz por um Código Comercial retrógrado e que não promovia garantias ao consumidor. O
objetivo inicial, com a promulgação do novo código, seria especializar a legislação e elevar a
relação negocial a um nível de colaboração mútua, entre fornecedor e consumidor.

9
NEGRÃO, Ricardo. Manual de direito comercial. Campinas: Bookseller, 1999, p. 28.
10
ABDO. Helena Najjar. Aspectos Jurídicos e o Código de Defesa do Consumidor: o direito do consumidor
aplicado aos dias atuais. INPG Faculdade Business School. São Paulo. Disponível em:
<http://www.sustentare.net/upload/entrance_quis/20071101084337.pdf>. Acesso em: 01 fev. 2016, p. 03.
11
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário Aurélio da língua portuguesa. 3. ed. Curitiba:
Positivo, 2004. p. 535.
12
COSTA, Carlos José Sampaio. Do ato de comércio à teoria empresa. Instituto dos Advogados Brasileiro.
São Paulo. 2016. Disponível em: <http://www.iabnacional.org.br/IMG/ppt/doc-5237.ppt> Acesso em: 03 fev.
2016. p. 02.
19

Assim explicita Franschini:

Tem-se, desta forma, que na seara do Direito do Consumidor ou da Tutela


das Relações de Consumo, o vinculo jurídico é entendido como toda relação
jurídico-obrigacional que liga um consumidor a um fornecedor, tendo como
objeto o fornecimento de um produto ou da prestação de um serviço. É o
vinculo jurídico bilateral que cria um nexo entre um consumidor a um
fornecedor, com o objetivo de fornecer um produto ou de prestar um
serviço.13

A colaboração mútua justifica-se, pois os envolvidos na relação de consumo visam ao


adimplemento com o objetivo de impor obrigações e deveres aos fornecedores de produtos ou
serviços, a fim de coibir práticas abusivas e enganosas, fornecendo aos consumidores o
mínimo necessário para garantir uma contratação isonômica e livre de vícios.
Como os envolvidos na relação negocial visam seu fiel cumprimento, mas nem sempre
estão em paridade econômica, surgiu a necessidade de criar as figuras do consumidor e
fornecedor, bem como mecanismos de defesa face às práticas abusivas e enganosas, cujo
objetivo seria promover equilíbrio econômico às relações de consumo mediante a defesa dos
interesses coletivos e difusos, conforme preconizam o artigo 170, inciso V, da Constituição da
República Federativa do Brasil e o artigo 81, do Código de Defesa do Consumidor.14
Nesse sentido, quanto ao tratamento diferenciado dos reconhecidamente vulneráveis,
Marques elucida que:

[...] foi o início dessa evolução e direção à identificação de grupos de


sujeitos de direito ou pessoas consideras e presumidas como vulneráveis,
incluindo nestes os consumidores, que receberam normas especiais,

13
FRANCISCHINI. Nadialice. Elementos subjetivos da relação de consumo. In: Revista do Direito. 2012.
Disponível em: <http://revistadireito.com/elementos-subjetivos-relacao-de-consumo/#sthash.Y4B5KmbC.dpuf>
Acesso em: 03 fev. 2016.
14
Art. 170 da Constituição Federal: A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre
iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os
seguintes princípios: I - soberania nacional; II - propriedade privada; III - função social da propriedade; IV - livre
concorrência; V - defesa do consumidor; VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento
diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e
prestação; VII - redução das desigualdades regionais e sociais; VIII - busca do pleno emprego; IX - tratamento
favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e
administração no País. Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica,
independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei e Art. 81 do Código de
Defesa do Consumidor: A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida
em juízo individualmente, ou a título coletivo. Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar
de: I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza
indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato; II - interesses ou
direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível de que
seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação
jurídica base; III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem
comum.
20

assegurando direitos de ordem pública, logo, indisponíveis em face do


interesse social naquela relação privada.15

O Direito do Consumidor é resultado das mudanças e aspirações sociais ocorridas ao


longo do tempo. De tal modo que marca uma transformação de paradigma não só nas relações
de consumo, mas também, no que tange à vulnerabilidade do consumidor possibilitando a
paridade de Direitos, conferindo melhores condições de questionamentos e revisão de
cláusulas contratuais abusivas, harmonizando e equilibrando as relações negociais, atuando de
forma preventiva e repressiva, contratual ou extracontratual, pré ou pós-contratual nas
relações de consumo, abrangendo, assim, o maior número de relações consumeristas possíveis
com a finalidade de tornar o Direito do Consumidor mais equitativo.

1.2 AS RELAÇÕES DE CONSUMO E A GLOBALIZAÇÃO ECONÔMICA

A passagem da Idade Média para a Modernidade marca o surgimento de um novo


modelo econômico que priorizava as relações de consumo, propiciando o surgimento da
globalização econômica. Ocorre que há divergência no que concerne ao o período em que se
iniciou a globalização. São apontados três momentos propícios, nascendo, assim, três espécies
ou etapas da globalização econômica.
Inicialmente a globalização poderá ser considerada a partir do momento em que houve
a expansão marítima européia, esta é denominada como a primeira globalização, que acabou
por aproximar os continentes e tornar o mundo cada vez menor. Essa primeira globalização
ocorrida no período do colonialismo caracterizou-se principalmente pela ocupação territorial,
gerando profundas transformações na estrutura social da época.16
A segunda globalização é marcada pelo início do século XX e, diferentemente do que
ocorreu em um primeiro momento, caracteriza-se pela fragmentação dos territórios a partir da
exploração de suas colônias ou áreas de dominação econômica, dando origem ao capitalismo
industrial e consolidando as bases econômicas para o posterior capitalismo financeiro.17
A terceira fase da globalização é reconhecida como globalização autêntica e teve seu
início na década de 1970, quando houve os primeiros sinais da revolução tecnológica, da
microeletrônica, automação, computação, comunicações e da inserção das novas tecnologias,

15
MARQUES, Cláudia Lima; MIRAGEM, Bruno. O novo direito privado e a proteção dos vulneráveis. São
Paulo. Revista dos Tribunais, 2011. p. 15.
16
TENDLER, Silvio. Globalização Milton Santos: O mundo global visto do lado de cá. Produção de Silvio
Tendler, Caliban, Brasil, 2011. 1min 23s.
17
PENA, Rodolfo F. Alves. Fases da Globalização. In: Geografia Humana. Disponível em:
<http://mundoeducacao.bol.uol.com.br/geografia/fases-globalizacao.htm>. Aceso em: 08 fev. 2016.
21

promovendo uma integração sistêmica e profunda da sociedade capitalista internacional,


ocasionando a denominada mundialização do capital.18
A análise das diversas etapas da globalização demonstra-se imprescindível para que se
tenha uma compreensão mais aguçada de que o mundo atual, ao contrário do que propagam
os meios de comunicação, tornou-se perverso do ponto de vista social, visto que, a
globalização aumentou consideravelmente a má distribuição de renda, propiciando as
desigualdades sociais, mostrando a necessidade iminente de se construir um futuro menos
inóspito para as gerações futuras.19
Essa urgente preocupação com a posteridade foi abordada por Ruz, em um discurso
pronunciado no Rio de Janeiro na Conferência das Nações Unidas, elucidando claramente os
efeitos e consequências ambientais e sociais do consumismo:

[...] A sociedade de consumo tem destruído o meio ambiente. Eles exterminaram


milhões de peixes, plantas e animais. Eles envenenam os mares, rios e lagos. O ar
poluído. Eles saturada a atmosfera com dióxido de carbono e outros gases nocivos.
Eles terminaram o carbono e gás natural e a enorme riqueza de minerais sólidos.
Eles limparam nossas florestas e os destruiu. O que resta para nós? É o
subdesenvolvimento, a pobreza, a dependência, o atraso, a dívida e incerteza. Para as
sociedades superdesenvolvidos o problema não está crescendo, mas para distribuir.
E não só distribuir entre eles, mas distribuídos entre todos. crescimento sustentável
que falar é impossível sem uma distribuição mais equitativa entre todos os países.
Depois de toda a humanidade é uma família e todos têm o mesmo destino. Antes da
atual crise profunda, nosso preço é um futuro ainda pior e nem sempre resolve
tragédia econômica social e ecológica de um mundo que está cada vez mais difícil
de gerir. Algo tem que ser feito para salvar a humanidade. [...] 20

Fato que a globalização modificou positivamente o paradigma econômico; contudo,


promoveu prejuízos ambientais e sociais imensuráveis nesse sentido. Baudrillard dispõe que
atualmente existe uma espécie de evidência do consumo e da abundância criada pela

18
LANGUER, André. A revolução tecnológica. In: Revista Vinculando, Ciudad de México. 2004. Disponível
em: <http://vinculando.org/brasil/conceito_trabalho/crise.html> Acesso em: 08 fev. 2016
19
TENDLER, Silvio. Globalização Milton Santos: O mundo global visto do lado de cá. Produção de Silvio
Tendler, Caliban, Brasil, 2011. 9min 21s.
20
[...] la sociedad de consumo ha destruido el medio ambiente. Ellos exterminaron a millones de peces, plantas
y animales. Ellos envenenan los mares, ríos y lagos. El aire contaminado. Ellos saturado la atmósfera de
dióxido de carbono y otros gases nocivos. Terminaron la reserva de carbono y gas natural y la enorme riqueza
de minerales sólidos. Ellos exterminaron nuestros bosques y destruyeron su. ¿Qué queda para nosotros? Es el
subdesarrollo, la pobreza, la dependencia, el atraso, la deuda y la incertidumbre. Para las sociedades
superdesarrolladas el problema no está creciendo, pero a distribuir. Y no sólo distribuir entre ellos pero,
distribuir entre todos. El crecimiento sostenible que hablar es imposible sin una distribución más equitativa
entre todos los países. Después de toda la humanidad es una sola familia y todos tienen la misma suerte. Antes
de la profunda crisis actual, nuestro precio es un futuro aún peor y no siempre resuelve tragedia económica
social y ecológica de un mundo que será cada vez más difícil de manejar. Algo tiene que hacerse para salvar a
la humanidad.[...]. RUZ, Fidel Castro. Discurso pronunciado en Río de Janeiro en la conferencia de
Naciones Unidas sobre medio ambiente y desarrollo. Disponível em:
<http://www.cubadebate.cu/opinion/1992/06/12/discurso-de-fidel-castro-en-conferencia-onu-sobre-medio-
ambiente-y-desarrollo-1992/#.Vq-TqVkYGZR > Acesso em: 01 jan. 2016.
22

multiplicação dos objetos, dos serviços e dos bens materiais. Os homens não se encontram
rodeados, como sempre acontecera, por outros homens, mas por objetos. O conjunto das
relações sociais já não é tanto o laço com seus semelhantes, mas sim com as coisas. Os
objetos não constituem nem fauna, nem flora; no entanto, sugerem a impressão de uma
vegetação perniciosamente proliferante.21
Embora a globalização demonstre que economicamente possua aspectos muito
positivos, Tendler, em seu documentário, aponta que se fizer uma análise é indispensável
visualizar a globalização econômica sob três aspectos, elucidando que:

[...] De fato, se desejarmos escapar à crença de que esse mundo assim


apresentado é verdadeiro e não queremos admitir a permanência de sua
percepção enganosa, devemos considerar a existência de pelo menos três
mundos num só. O primeiro seria o mundo tal como nos fazem vê-lo: a
globalização como fábula; o segundo seria o mundo tal como ele é: a
globalização como perversidade; e o terceiro, o mundo como ele pode ser:
uma outra globalização.22

Para aprofundar o estudo sobre o tema, o enfoque específico será sobre o mundo como
ele é, a globalização autêntica ou a globalização como perversidade. Nesse sentido, Silveira
Neto define seu conceito, elucidando os aspectos econômicos e sociais oriundos desse
processo:

A globalização deve ser entendida como um processo de integração mundial


dos fatores de produção que levou a uma ampliação do comércio
internacional, assentado numa estrutura de produção descentralizada (pós-
fordista). No aspecto econômico, a globalização ocasionou o
enfraquecimento dos Estados em benefício das empresas transnacionais, o
fortalecimento dos órgãos multilaterais, a exemplo da Organização Mundial
do Comércio – OMC e a formação dos blocos econômicos entre países num
sistema de comércio aberto (UE, MERCOSUL, ALCA etc.) Sob o viés
social, a globalização, impulsionada por mudanças tecnológicas radicais,
agravou a distância entre os países centrais e periféricos, com aumento da
exclusão social, interna e externa, através da crescente concentração de
riquezas, desemprego e marginalização tecnológica.23

21
BAUDRILLARD, Jean. A sociedade de consumo. Tradução de Arthur Morão. Lisboa: Edições 70. 2014, p.
14.
22
TENDLER, Silvio. Globalização Milton Santos: O mundo global visto do lado de cá. Produção de Silvio
Tendler, Caliban, Brasil, 2011. 9min 48s.
23
SILVEIRA NETO, Antônio. A ordem econômica globalizada e as relações de consumo – aspectos
relativos à proteção do consumidor. Prim@ Facie – ano 1, n. 1, jul./dez. 2002. Universidade Estadual da
Paraíba. Brasil. Disponível em: <periodicos.ufpb.br/index.php/primafacie/article/download/4293/3244>. Acesso
em: 21 jan 2016.
23

Somado a todos esses fatores, a revolução tecnológica e a disseminação da rede


mundial de computadores possibilitaram o surgimento do e-commerce como uma forma mais
acessível para aquisição de bens e serviços. A facilidade no comércio eletrônico levou as
relações de consumo e o consumismo a tornarem-se uma prática reiterada.
Nessa perspectiva, Bauman aponta a mudança de paradigma por meio da evolução do
consumo para o consumismo:

[...] a revolução consumista ocorreu milênios mais tarde com a passagem do


consumo ao ‘consumismo’, quando aquele [...] tornou-se especialmente
importante, se não central, para a vida da maioria das pessoas, o verdadeiro
propósito da existência. E quando nossa capacidade de ‘querer’, ‘desejar’,
‘ansiar por’ e particularmente de experimentar tais emoções repetidas vezes
de fato passou a sustentar a economia do convívio humano.24

Necessário analisar a substancial diferença entre essas duas condições relacionadas à


figura do consumidor, visto que o consumismo caracteriza-se pela atividade reiterada e
inconsequente do ato de consumir. Logo, é o consumismo um sucessor oportuno e legítimo do
consumo.
Exatamente sobre isso que reflete Almeida:

O consumo é a consequência natural da relação do homem com o mundo, ou


seja, enquanto atua no mundo, envelhecem-se e se desgastam mutuamente
homem e mundo (objetos, lugares, pessoas, etc.). Logo, o consumismo se
caracteriza como transformação na lógica dessa relação, o que impele a não
desprezar o caráter destruidor do consumo natural – na intenção de não
contaminar a análise sobre a obsolescência e o consumismo capitalista na
pós-modernidade.25

Assim, é possível verificar que o consumo não é o mesmo que consumismo. Porém, se
a intenção é compreender a questão do consumismo, sua dimensão e danos, primeiro, deve-se
entender o consumo. Este é verificado no momento em que o homem é movido tão somente
pelas suas necessidades puras e simples, refletindo uma coexistência do indivíduo com o
mundo, ou seja, uma ligação das suas necessidades com os objetos consumidos. O
consumismo, para tanto, é a prática reiterada, volumosa e, na maioria das vezes, desnecessária
do ato de consumir.

24
BAUMAN, Zygmunt. Vida para consumo: a transformação das pessoas em mercadoria. Rio de Janeiro:
Zahar, 2008, p. 38/39.
25
ALMEIDA, João Flávio de. O discurso da obsolescência: o velho, o novo e o consumo. São Carlos: UFSCar,
2014, p. 17.
24

Embora a globalização originasse um crescimento econômico das empresas


transnacionais, em virtude do acesso às novas tecnologias, o consumidor encontra-se em
situação de maior vulnerabilidade, visto que a globalização promoveu o fortalecimento dos
fornecedores, ampliação do espaço de produção e oferta mundial. A abertura dos mercados,
pela formação de blocos econômicos ou diminuição das tarifas alfandegárias promoveu, como
efeito colateral, uma maior dificuldade na proteção do consumidor.26
A globalização transformou as relações de consumo, que adquiriram um aspecto de
mercado de serviços com contratos de longa duração e mutabilidade constante dos termos
ajustados, ou seja, a oportunidade de renegociação permanente, estabelecendo uma relação
contínua e duradoura entre fornecedor e consumidor, constituída na confiança e
interdependência econômica.27
A abertura do comércio internacional, a circulação de bens e serviços entre as nações e
a possibilidade de escoamento de produção apontam significativa desvantagem em relação à
vulnerabilidade do consumidor, afinal, como elucida Marques, a função social do direito
privado é a proteção da pessoa em face dos desafios da sociedade massificada e
informatizada:

Se as relações de consumo têm funções econômicas, têm funções


particulares de circulação das riquezas, a função social deve necessariamente
envolver o reconhecimento da vulnerabilidade da pessoa humana, nos seus
vários papéis ou status, inclusive de consumidor na sociedade de consumo
atual. Essa função só poder ser perseguida com uma nova visão e
interpretação do direito privado, especialmente valorizando as diferenças
materiais e formais nos poderes e liberdades das pessoas, procurando a
igualdade, a liberdade com fraternidade (os ideais da modernidade),
consciente do desafio do direito contemporâneo de não excluir as pessoas
dos mercados, mas, ao contrário, incluindo-as com igualdade e fraternidade e
protegendo-as, com liberdade, nestes contextos sociais atuais.28

Por meio da função social das relações de consumo e da inserção de novas


tecnologias, os consumidores de classes mais baixas tiveram acesso a serviços e produtos em
nível mundial por meio do e-commerce, aumentando sua vulnerabilidade, em virtude da
complexidade em discutir cláusulas abusivas em contratos de adesão internacionais. A
dificuldade vai além do idioma e da distância entre consumidor e fornecedor. Ela intensifica-
se no momento de analisar qual a legislação aplicável ao caso.
26
ALMEIDA, João Flávio de. O discurso da obsolescência: o velho, o novo e o consumo. São Carlos: UFSCar,
2014, p. 07.
27
Idem Ibidem, p. 07.
28
BENJAMIN, Antônio Hernan V; MARQUES, Cláudia Lima; BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de direito
do consumidor. 6. ed. São Paulo. Revista dos Tribunais, 2014, p. 49.
25

Esse novo cenário demonstra uma necessidade ainda maior de proteção ao


consumidor, devido à dificuldade de acesso à informação nos contratos estrangeiros,
ocasionando aumento dos riscos, defeitos e acidentes em decorrência dos usos de produtos e
serviços. Exige também o desenvolvimento de métodos de publicidade e propaganda com
alcance internacional, gerando, por fim, incertezas quanto ao tribunal competente e qual
norma aplicável ao caso concreto, ocasionando insegurança jurídica.
O Superior Tribunal de Justiça, pelo voto da ministra Nancy Andrighi, já se
posicionou quanto à vulnerabilidade do consumidor, sua necessidade de garantia de direitos e
equilíbrio em seu julgamento.

[...] É já cediça a compreensão, tanto pela doutrina, como pela


jurisprudência, de que a única maneira de se otimizar a realização do
princípio da igualdade é mediante o reconhecimento de que, em algumas
situações, os sujeitos de uma relação jurídica não se encontram em posição
similar . Nesses casos, em que as circunstâncias de fato provocam um
desequilíbrio, tratar esses sujeitos de maneira objetivamente igual não basta
para a plena realização do princípio da isonomia. É necessário reequilibrar
os pólos da relação, estabelecendo regras excepcionais que tutelem a parte
mais frágil. Promove-se, com isso - sempre nos termos estritos da lei - a
igualdade substancial entre as partes, em detrimento da mera igualdade
formal - que, em última análise, é apenas uma roupagem diferente para o
arbítrio.29

Inegável que a globalização propicia a concretização das relações negociais, elevando-


as a níveis internacionais, aumentando a circulação de produtos e serviços, o que em aspectos
estritamente econômicos é salutar, mas extremamente prejudicial ao consumidor que, diante
dessa nova perspectiva, tornou-se ainda mais vulnerável. O Direito não mais atinge a
finalidade de promover a proteção desse consumidor vulnerável, devido às divergências
normativas de jurisdição e competência em âmbito internacional.
Sensata e imperiosa seria uma harmonização ou universalização legislativa na
confecção dos contratos de relações de consumo entre a comunidade internacional, a fim de
assegurar a custódia do consumidor, sem diminuir suas prerrogativas já conquistadas nas
legislações nacionais.

1.3 O PAPEL DO CONSUMIDOR NA SOCIEDADE DE CONSUMO

29
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso especial n.º 691.738 – SC. Relator: Ministra Nancy Andrighi,
j. 12 maio 2005. DJ, 26 set. 2005. Disponível em: < http://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/7196111/recurso-
especial-resp-691738-sc-2004-0133627-7/relatorio-e-voto-12944493>. Acesso em: 05 fev. 15, p. 07.
26

O homem é por natureza um ser insatisfeito. Desde os primórdios, quando não havia
comunicação escrita ou qualquer organização social, o homem já buscava incessantemente
realizar seus anseios. É fato que na pré-história essa busca era tão somente instintiva, afinal,
era necessário subsistir. Desde então, o homem relaciona-se diretamente com o meio
ambiente, retirando dele todos os recursos necessários para satisfazer seus desejos, e, mesmo
após a evolução das espécies, o homo sapiens sapiens permanece descontente e cada vez mais
obstinado por realizar suas cobiças, consolidando a estrutura do consumo.30
Arendt elucida que se, no século XX, houve a prevalência do homo faber, para
designar o homem contemporâneo como aquele que faz, fabrica, produz, um homem de vida
activa e não contemplativa como na Idade Média, um animal laboran, um homem que
privilegia o trabalho, seja como capitalista, seja como trabalhador, atualmente, vislumbra-se o
homo economicus et culturalis, do século XXI. Este é um consumidor, um agente econômico
ativo no mercado, na sociedade de consumo (de crédito e de endividamento) e, ao mesmo
tempo, persona com identidade cultural, específica e diferenciada.31
Intrinsecamente ao homem estão suas necessidades, analisando-as, Bustamante ilustra
que podem se subdividir em três tipos: básicas, culturais e do sistema produtivo. As
necessidades básicas são as indispensáveis à vida humana. Em contrapartida, as culturais
vinculam-se às necessidades de determinado povo, geralmente têm ligação com suas tradições
e, por fim, as do sistema produtivo, vão desde os insumos utilizados na produção ao consumo
dos bens produzidos.32
Impossível não admitir que, desde os primórdios, as necessidades básicas e culturais
existiram e sempre existirão, contudo, foram as essencialidades oriundas do sistema produtivo
que surgiram a partir da identificação e reconhecimento dos desejos humanos, momento em
que o consumo passou a ser condição existencial para a vida em sociedade, mais
especificamente na sociedade de consumo.
Bauman explicita que para conseguir posição social, além de adquirir mercadorias, é
preciso tornar-se mercadoria, pois em uma sociedade de consumo nem tudo tem valor, mas
tudo, inclusive o indivíduo, tem preço:

30
SANTIAGO, Mariana Ribeiro. Teoria da empresa: crédito introdutório. 10 abr. 2015, 30 mai. 2015. 6 f.
Notas de Aula. Digitado.
31
ARENDT. Hannah. A condição humana. 11. ed. Tradução de R. Raposo, revista por A. Correia. Rio de
Janeiro: Forense Universitária, 2010, p. 147.
32
BUSTAMANTE, Laura Perez. Los derechos de la sustentabilidad: desarrolo, consumo y ambiente. Buenos
Aires: Colihue, 2007, p. 9.
27

Em suma, para ser moral você precisa adquirir bens; para adquirir bens,
precisa de dinheiro; para adquirir dinheiro, precisa vender-se a um preço e
com lucro descente. Você não pode ser um comprador a menos que se torne
uma mercadoria que as pessoas desejem comprar. Por conseguinte, o que
você precisa é de uma identidade atraente, vendável. Você deve isso a si
mesmo – porque, CQD, você o deve aos outros.33

Na sociedade de consumo o indivíduo tem a sua liberdade revelada com mais


intensidade, haja vista que com a inserção das novas tecnologias, o consumidor pode ter
acesso a informações como preço, avaliação do fornecedor, durabilidade do produto em sua
casa e instantaneamente. Defende Dubois que, nesta sociedade, tudo é consumível, mas só se
consome aquilo que deseja e somente se deseja aquilo que se vê todos os dias, assim,
vinculada esse contexto, tem-se a publicidade e o marketing de consumo.34
Contudo, como há inúmeras fontes de informação, desenvolve-se material publicitário
em excesso e numa velocidade que nem sempre se torna possível averiguar a fonte,
ocasionando uma incerteza sobre a credibilidade dessas informações.
Especificamente sobre essa excessiva difusão de publicidade que o consumidor está
exposto, por vezes, até de forma inconsciente, Santos elucida, que “não há produção excessiva
de informação, mas de ruídos”.35
Baumam explicita que a liberdade pós-moderna tornou-se uma falácia que promove,
como mal-estar, a insegurança.

Os mal-estares da modernidade provinham de uma espécie de segurança que


tolerava uma liberdade pequena demais na busca da felicidade individual. Os
mal-estares da pós-modernidade provêm de uma espécie de liberdade de
procura do prazer que tolera uma segurança individual pequena demais.36

Atrelada à velocidade da sociedade de consumo inserida em tempos pós-modernos


estão a instabilidade e a incerteza sobre a credibilidade, a veracidade e a transparência nas
informações que são prestadas pelos fornecedores/fabricantes, por meio dos meios de
comunicação, novas mídias e tecnologias que, em questão de segundos, expõem o
consumidor a um volume absurdo de informações, por vezes, desprovidas de transparência e
boa-fé.

33
BAUMAN, Zygmunt. Danos colaterais: desigualdades sociais numa era global. Tradução de Carlos Alberto
Medeiros. Rio de Janeiro: Zahar. 2013, p. 103.
34
DUBOIS, Bernard. Compreender o consumidor. Tradução e revisão de Francisco Velez Roxo. Lisboa: Dom
Quixote. 1998, p. 107.
35
TENDLER, Silvio. Globalização Milton Santos: O mundo global visto do lado de cá. Produção de Silvio
Tendler, Caliban, Brasil, 2011. 9min 48s.
36
BAUMAN, Zygmunt. O mal-estar da pós-modernidade. Tradução de Mauro Gama e Claudia Martinelli
Gama. Rio de Janeiro: Zahar, 1998, p. 10.
28

Ocorre que o consumidor, mesmo inserido no contexto da sociedade de consumo,


possui autonomia para decidir “o que” e “quando” consumir. Porém, em virtude do volume e
da velocidade das informações, passou a desenvolver um papel reativo, ao invés de proativo
na relação de consumo, mesmo dispondo de todas as informações necessárias no que
concerne ao produto. Diante das sedutoras estratégias publicitárias, o consumidor torna-se
mais vulnerável do que nunca.
Na concepção de Manstetten o consumidor não passa de um sujeito pré-fabricado,
com uma concepção surreal sobre sua condição de liberdade.

[...] a economia criou também a figura ilusória de que este ser livre e
racional, que seria o consumidor, ao realizar seus desejos no mercado, seria
ele, consumidor, o “rei” do mercado, aquele cuja vontade decidiria
sobremaneira a compra ou a recusa de compra de um produto.37

Baumam faz uma analogia entre as relações de consumo, a moral e o matrimônio,


explanando o papel imprescindível que exercem tanto a publicidade como a propaganda no
desenvolver desse conturbado casamento:

Sem dúvidas, no caso do consumismo e da moral, a relação é tudo, menos


simétrica. Um dos parceiros, o mercado de consumo, dispersa sobre o outro,
a moral, louvor irrestrito; como todos os amantes dignos desse nome,
glorifica os esplendores do objeto de seu amor, ao mesmo tempo que fecha
os olhos a seus desvios ocasionais; suas declarações públicas, conhecidas
pelo nome de “peças publicitárias” ou “comerciais”, figuram entre as obras
mais sublimes e rapsódicas da poesia amorosa [...].38

Influenciado por avançadas técnicas e estratégias de persuasão publicitária, o


consumidor pós-moderno tem seu paradigma de felicidade modificado afinal, o escopo
principal da publicidade é expor ao consumidor determinado produto ou serviço instigando-o
a consumir.
O consumismo pode ser entendido como uma prática decisiva na sociedade de
consumo, pois concede ao indivíduo uma ilusória autoafirmação e pseudoinserção social que,
para essa sociedade, possui valor inestimável, visto que se trata de uma sociedade do
espetáculo, como proposto por Debord:

37
MANSTETTEN, Reiner. Das Menschenbild der Ökonomie – Der Homo Economicus und die Anthropologie
von Adam Smith. Freiburg: Karl Alberg, 2004, p. 268 e ss.
38
BAUMAN, Zygmunt. Danos Colaterais: desigualdades sociais numa era global. Tradução de Carlos Alberto
Medeiros. Rio de Janeiro: Zahar. 2013, p. 94.
29

Considerado em sua totalidade, o espetáculo é ao mesmo tempo o resultado e


o projeto do modo de produção existente. Não é um suplemento do mundo
real, uma decoração que lhe é acrescentada. É o âmago do irrealismo da
sociedade real. Sob todas as suas formas particulares – informação ou
propaganda, publicidade ou consumo direto de divertimentos –, o espetáculo
constitui o modelo atual da vida dominante na sociedade.39

A sociedade do espetáculo utiliza-se de várias estratégias, a fim de induzir o


consumismo. Uma delas é a propaganda travestida de publicidade. Por isso Baumam dispõe
que esta economia ditadora de regras sociais na sociedade de consumo alimenta-se do
movimento das mercadorias, quando o dinheiro está sempre em circulação, quando muda de
mãos rapidamente. Para este tipo de economia, a maior das preocupações é, sem dúvidas, a
estagnação de mercadorias e serviços. Logo, para atender essa necessidade voraz de
circulação de bens e serviços, a economia utiliza-se de táticas como a publicidade de
consumo, para produzir a cultura do excesso e desperdício.40
A sociedade de consumo é o resultado da liberdade e individualidade do sujeito que
busca no consumo a satisfação inesgotável de seus desejos e faz crer que a felicidade será
alcançada somente por meio da aquisição de novos bens ou serviços. Esse modelo social é
marcado pelo desenvolvimento tecnológico, avanço da era digital e pela inserção dos meios
de comunicação em todas as classes sociais.
Diante da análise dessa sociedade, observa-se que sua conjectura é complexa, haja
vista que é formada por diversos fatores como a globalização, a inserção de novas tecnologias
e a busca incessante pela aquisição de novos bens e serviços; contudo, identifica-se que uma
das fontes primárias que alimenta todo o sistema é sem dúvidas a publicidade que passa a ser
o cerne deste trabalho.
O objetivo desta pesquisa não é arbitrar responsabilidade exclusiva à produção
publicitária ou minorar o relevante papel que desempenha tanto para o consumidor quanto
para o Direito, ao contrário disso, a proposta é no sentido de analisar a publicidade,
especialmente, a abusiva e enganosa, a fim de objetivar uma releitura de sua produção, que se
daria por meio do princípio da boa-fé objetiva e da função social da empresa, é o que passa a
se fazer a partir de agora.

39
DEBORD, Guy. A sociedade do espetáculo. Rio de Janeiro: Contraponto, 1997, p. 143.
40
BAUMAN, Zygmunt. Vida para consumo: a transformação das pessoas em mercadoria. Rio de Janeiro:
Zahar, 2008, p. 51/52.
30

2 O IDEAL PUBLICITÁRIO MEDIANTE A BOA-FÉ OBJETIVA E A FUNÇÃO


SOCIAL

Com a chegada do século XXI, a popularização da internet e o desenvolvimento das


novas tecnologias, o consumidor é submetido cotidiana e paulatinamente a anúncios
publicitários em todos os lugares que frequente. Elucida-se que o ponto de partida para o ciclo
do consumismo é, por certo, a publicidade destacada aqui, como técnica de propagação de
ideias que propicia que o consumidor tenha contato diário com o produto ou serviço ofertado,
passe a desejá-lo e, posteriormente, a consumi-lo.
A ideia principal da publicidade nesta sociedade de consumo é desenvolver estratégias
cujo escopo seria provocar o consumo, confirmando a ideia que sempre haveria espaço para
adquirir mais coisas. Incentiva-se a ideia de excesso, elucidando que o progresso ocorreria
somente pelo exercício de se jogar fora determinados bens, fomentando a cultura do
desperdício que faz com que o consumidor perca a noção do valor real de determinado bem
de consumo.41
A inserção das novas tecnologias possibilitou a propagação rápida e em massa da
informação. Tem-se acesso à publicidade cotidianamente, o tempo todo e em todos os lugares.
Consome-se material publicitário lendo um livro, vendo um filme, em momentos de lazer,
consome-se material publicitário até de forma inconsciente.
A produção em massa de determinado produto conduz a uma reação em cadeia, a
publicidade em massa e, via de consequência, o consumo em massa. Ainda assim, fomentar o
consumo vai muito além de produzir em massa. É necessário investir alto em publicidade
maciça, ostensiva e, sobretudo, incentivar a ideologia do acúmulo. Para isso, as
fabricantes/fornecedores recorrem às técnicas de persuasão cognitivo-psicológicas como a
publicidade e o marketing, a fim de tentar manipular e convencer um número cada vez maior
de indivíduos com vistas a torná-los potenciais consumidores.
Acredita-se que um dos principais propulsores do consumismo seriam os meios de
comunicação que, por meio da publicidade, buscam ampliar a visão do consumidor e
estimular a busca frenética pela felicidade que ocorrerá em uma perspectiva sempre vindoura,
a satisfação somente será alcançada no futuro quando os bens de consumo forem adquiridos.
Logo, a felicidade do indivíduo será na medida e na proporção dos bens ou serviços
consumidos.

41
PACKARD, Vance. Estratégia do desperdício. São Paulo: IBRASA, 1965. 2. ed. 1965, p. 311.
31

Nesse sentido explicita Baudrillard:

O jornal falado não é a miscelânea que parece: a alternância sistemática


[publicidade; notícia; publicidade] impõe um esquema único de recepção,
que é o esquema do consumo. Não é tanto pelo facto de a valorização tonal
publicitária sugerir que, no fundo, a história do mundo é indiferente e que só
o investimento dos objetos de consumo possui real valor. Isso é secundário.
A eficácia real é mais subtil: trata-se de impor pela sucessão sistemática das
mensagens a equivalência e do fait-drivers, do acontecimento e do
espetáculo, da informação e da publicidade ao nível do signo. Aqui reside o
verdadeiro efeito do consumo.42

Na década de 1990, Gessinger e Casarin elucidam o poder que a mídia, com destaque
à televisiva, exerce sobre o consumidor, analisando a então sociedade moderna pelo viés do
consumidor: “[...] propaganda é a arma do negócio. No nosso peito bate um alvo muito fácil.
Mira a laser, miragem de consumo. Latas e litros de paz teleguiada. Estou ligado a cabo, a
tudo que eles têm pra oferecer [...].”43
Defende Martinéz que a publicidade é considerada uma das principais incentivadoras
dos negócios jurídicos explicitando que:

A publicidade de consumo é um fenômeno cultural e econômico de grande


repercussão na sociedade, pois é ela a principal incentivadora externa de
consecução dos negócios jurídicos de consumo. Se por um lado (positivo),
ela informa, educa, incentiva a concorrência e favorece a produção e
circulação de riquezas, por outro lado (patológico), ela pode agir de forma a
prejudicar a concorrência, abusar ou engrupir indetermináveis indivíduos a
consumir algo prometido pelo anúncio publicitário, mas não cumprido,
quando da realização do contrato de consumo, requerendo, desta forma, o
44
seu controle pelo Estado ou por órgãos privados.

A mídia conduz o consumidor a uma situação de extrema vulnerabilidade, afinal, o


que impulsiona o indivíduo a consumir bens e serviços supérfluos é a publicidade, que, com o
propósito de seduzir os consumidores, lança determinado produto, e sob o manto protecionista
do direito à informação, acaba por deixar o receptor, senão desejoso, pelo menos instigado a
conhecer o produto estrategicamente apresentado no anúncio publicitário.

42
BAUDRILLARD, Jean. A sociedade de consumo. Tradução de Arthur Morão. Lisboa: Edições 70. 2014, p.
157
43
GESSINGER, Humberto; CASARIN, Paolo. A promessa. In.: HAVAII, Engenheiros. Simples de Coração,
BMG: c1995. 1 CD. Faixa 5 (0:35).
44
MARTINÉZ, Sérgio Rodrigo. Publicidade de consumo e propedêutica do controle. Curitiba. Juruá Editora.
2001, p. 13.
32

Costa e Mendes ratificam que é por meio dos apelos persuasivos e aparato
argumentativo que a publicidade persuade um determinado auditório sobre a vantagem de se
escolher um produto ou serviço em detrimento de outro.45
A publicidade é o marco inicial do consumo, pois é por meio dela que o consumidor
passa a ter conhecimento do produto e serviço que estão à sua disposição e como o modo de
produção capitalista busca a obtenção de lucro, a publicidade torna-se indispensável à
sociedade de consumo. Ocorre que nessa mesma lógica a publicidade possui também um viés
salutar de cunho informativo, justamente por isso que é imprescindível que haja, uma
proteção especial e irrestrita ao consumidor vulnerável, estendendo o controle da publicidade
inclusive a nível internacional, como já ocorre com o tabaco.46
Objetiva-se com este capítulo demonstrar a possibilidade de implementar um modelo
senão ideal, pelo menos adequado, à produção publicitária nacional, consubstanciado no
princípio da boa-fé objetiva e da função social da empresa, que traçariam moldes de forma a
orientar e até mesmo limitar à produção publicitária, promovendo a percepção dos
consumidores quanto às estratégias nocivas da publicidade enganosa e abusiva, elucidando
que, tais princípios, se adequadamente implementados, promoveriam uma mudança de
paradigma significativa nesse lesivo cenário publicitário, propiciando um consumo menos
indutivo, mais transparente e racional.

2.1 PUBLICIDADE: DELIMITAÇÃO CONCEITUAL E ORIGENS HISTÓRICAS

A informação é um direito fundamental constitucionalmente estabelecido no artigo 5º,


inciso XIV, da Constituição da República, doutrinariamente atribuído como gênero da espécie
prevista no artigo 6º, inciso III, do Código de Defesa do Consumidor. A informação é inerente
à publicidade, mesmo que se manifeste nas modalidades merchandising ou oculta, afinal, a
informação é mensagem, é conteúdo cognitivo que, por vezes, dispende de linguagem oral e,
quando prestada em desconformidade com o dever de lealdade e transparência, incorrerá em
publicidade enganosa e abusiva.
Quando se utiliza o vocábulo desconformidade, não se faz de maneira leviana, mas no
sentido de que o próprio Código de Defesa do Consumidor utiliza o conceito publicidade sem

45
COSTA, Maria I. L. da; MENDES, Marcília L. G. da Costa. A publicidade como ferramenta de consumo:
uma reflexão sobre a produção de necessidades. Disponível em: < http://www.bocc.ubi.pt/pag/costa-mendes-a-
publicidade-como-ferramenta-de-consumo.pdf>. Acesso em: 09 fev 2016.
46
BRASIL. Decreto nº 5.658. Promulga a Convenção-Quadro sobre Controle do Uso do Tabaco. Disponível
em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Decreto/D5658.htm>. Acesso em 10 jan. 2016.
33

designar-lhe definição, classificando-a, tão somente, como uma espécie de prática comercial e
condenando-a às penalidades da lei, quando comprovadamente nociva. Desta feita, torna-se
imprescindível analisar seu conceito.
Antes de se aprofundar na análise da definição e problemática da publicidade
enganosa e abusiva perante o descumprimento do princípio da boa-fé objetiva e da função
social da empresa, necessário se faz remontar as origens histórias da publicidade no cenário
mundial, bem como, suas primeiras aparições em âmbito nacional.
A publicidade, em um primeiro momento, era percebida como arte e/ou meio de
informação e só posteriormente ganhou ares de técnica de comunicação e caráter persuasivos.
Embora haja discussão doutrinária sobre o momento em que de fato surgiu o primeiro anúncio
publicitário, foi em meados do século XX que se pôde notar um evidente crescimento da
publicidade, pois somente com a difusão da informação, por meio da cultura de massas, seria
possível que a publicidade atingisse seu objetivo efetivo de persuadir o consumidor e
propiciar o consumo.
O consumo e a publicidade são parceiros desde as civilizações mais primitivas e os
tempos mais remotos. Há indícios históricos de que a primeira documentação sobre o tema foi
encontrada em um papiro egípcio, ainda conservado no Museu de Londres, que em um
anúncio publicitário relata a fuga de um escravo. Trata-se, provavelmente, do primeiro
anúncio escrito que se tem comprovação na História da Civilização. Diante disso, há três
milênios, já havia o que se poderia chamar de publicidade, tendo em vista que o escravo
tratava-se de um bem móvel, uma mercadoria e era negociado como um objeto qualquer.47
Embora consumo e publicidade andem juntos, o consumo, como explicitado e
desenvolvido no primeiro capítulo, remonta a pré-história, a arte publicitária, em
contrapartida, é mais recente e, conjuntamente às técnicas de marketing, passou a ter como
objeto central de estudo o comportamento e os anseios humanos.
Aponta Jacobina que, enquanto atividade organizada, a arte publicitária é recente, mas
entende de maneira divergente, elucidando que, no aspecto ideológico, a publicidade é tão
velha quanto o homem, que desde que passou a ter consciência de si, desenvolveu um
discurso ideológico visando à dominação cognitiva de seu semelhante.48
Independente de quaisquer aspectos, fala-se em publicidade comercial propriamente
dita após o surgimento da imprensa, apontando a Inglaterra como o berço da arte publicitária.

47
MALANGA, Eugênio. Publicidade, uma introdução. 4ª ed., São Paulo: Editora Edima. 1987, p. 15.
48
JACOBINA, Paulo Vasconcelos. A publicidade no direito do consumidor. Rio de Janeiro: Forense, 1996, p.
21.
34

Benjamin aponta o ano de 1477 como o marco do primeiro anúncio em inglês, publicado por
Willian Caxton, sobre livros religiosos, explicitando que somente a partir daí ocorreu um
desenvolvimento dessas atividades com a multiplicação dos jornais conhecidos como
mercuries.49
Mesmo havendo divergências históricas e formais sobre o surgimento da publicidade
aponta Jacobina que:

O certo, porém, é que a publicidade comercial é uma consequência da


Revolução Industrial e da formação dos chamados mercados de massa. Se o
jornal foi o primeiro meio de comunicação de massa, não poderia deixar de
ser, também, a primeira mídia utilizada em larga escala pelos comerciantes,
prestadores de serviços, produtores, enfim, todos os que precisavam colocar
no mercado seus produtos, manufaturados de forma cada vez mais acelerada
pelas técnicas de produção em escala.50

O primeiro anúncio publicitário no Brasil, elucida Ramos, apareceu no ano de 1808


nas páginas de classificados do jornal Gazeta do Rio de Janeiro, dizendo que: “Quem quiser
comprar uma morada de casas de sobrado, com frente para a Santa Rita, fale com Ana
Joaquim da Silva, que mora nas mesmas casas, ou com o Capitão Francisco Pereira de
Mesquita, que tem ordem para as vender.”51
De início, os anúncios eram majoritariamente de cunho imobiliário ou de recrutamento
de pessoal. Dispõe Giacomini Filho que eram anúncios compostos geralmente de texto, sem
quaisquer títulos e/ou frisos. Eram, ainda, publicados gratuitamente, desde que entregues as
quartas-feiras à tarde.52
Elucida Campos que surgiram inúmeros anúncios dos mais diversos possíveis:

[...] anúncios oferecendo escravos negros para vender ou para alugar seus
serviços, professoras de francês para dar aulas em domicílio, remédios
contra a rouquidão, entre muitos outros que vão surgindo e mostrando o
aprimoramento da técnica de vender unida à arte na apresentação dos
anúncios, que passam a ser compostos de desenhos e reproduções gráficas
mais sofisticadas.53

49
BENJAMIN, Antônio Hernan Vasconcelos. O controle jurídico da publicidade. In: Revista do Direito do
Consumidor, nº 09, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 1994, p. 26.
50
Idem Ibidem, p. 22.
51
RAMOS, Ricardo. Do reclame à comunicação; pequena história da propaganda no Brasil, 3ª ed., São Paulo:
Editora Atual. 1985, p. 09.
52
GIACOMINI FILHO, Gino. Consumidor versus Propaganda. São Paulo: Summus Editorial, 1991, p. 29.
53
CAMPOS, Maria Luiza de Saboia. Publicidade: responsabilidade civil perante o consumidor. São Paulo:
Cultura Paulista, 1996, p. 203.
35

Os comerciantes e leitores atinaram para a genialidade e eficácia do anúncio e


recorreram à mesma técnica, os jornais se proliferaram e, com, eles os anúncios, que logo
adquiriram colaboração mais propriamente comercial. Giacomini Filho colaciona, a título de
ilustração, um anúncio da época de caráter intrinsecamente publicitário. Anúncio do Xarope
Honorio de Prado:

Eu era assim (figura de uma pessoa doentia). Cheguei da ficar quasi assim!
(figura de uma cabeça de caveira) Soffria horrivelmente dos pulmões, mas
graças ai milagroso Xarope Peitoral de Alcatrão e Jatahy, preparado pelo
farmacêutico Honorio de Prado consegui ficar assim!! (figura de um homem
são) Completamente curado e bonito. Esse xarope cura tosses, bronchites,
ashtmas, rouquidão e escarros de sangue. Preço do vidro: 1$500. Único
depósito na Capital Federal. J. M. Pacheco & Comp. Rua dos Andradas, nº
58.54

Verifica-se a técnica publicitária era rudimentar e os anúncios, por vezes, tornaram-se


desinteressantes, afinal, vislumbrava-se mais propaganda do que a publicidade propriamente
dita, o que fez com que, ao longo dos anos, fossem aprimoradas as técnicas publicitárias, a
fim de efetivamente persuadir leitores.
Periscinoto aponta como marco da integração entre a publicidade e a economia a art-
nouveau55, momento em que o marketing começa a ser utilizado como poderoso instrumento
de informação. Logo, a relação da propaganda com a arte tornou-se imediata:

[...] basta lembrar, como exemplo, e escola francesa de cartazistas do final


do século 19, quando artistas importantes do desenho e da pintura (Gaudí,
Montant, Desfontaines, Nevil e outros) foram recrutados para a criação de
posters destinados a promover os primeiros salões do automóvel e as
primeiras feiras comerciais e industriais.56

Com o crescimento da produção em série nasce a publicidade como instrumentos de


vendas, oferta em massa para abraçar a produção em massa. Comparato, constata que a

54
GIACOMINI FILHO, Gino. Consumidor versus propaganda. São Paulo: Atlas, 1991, p. 29.
55
Art nouveau é um estilo ornamental utilizado em arquitetura, decoração, joalheria, ilustração, que se
caracteriza pelo uso de linhas longas, ondulantes e assimétricas, muitas vezes apresentando elementos que
lembram formas da natureza, que posteriormente passou a ser incorporado nos anúncios em jornais e atualmente
a técnica artística é vastamente utilizada na publicidade em geral. Andréa Poshar. A influência estética dos
cartazes artísticos na publicidade moderna. Revista eletrônica temática. (NAMID) Núcleo de Arte, Mídia e
Informação Digital, do Curso de Comunicação em Mídias Digitais e do Programa de Pós-Graduação em
Comunicação - PPGC/UFPB 2007. Acesso em: 10 abr. 2016. Disponível em:
<http://www.insite.pro.br/2007/52.pdf>.
56
PERISCINOTO, Alex. Arte e propaganda. In: História da propaganda no Brasil. Coord. por Renato de
Castelo Branco, Rodolfo Lima Martensen e Fernando Reis. São Paulo, Instituto Brasileiro de Altos Estudos de
Comunicação Social IBRACO, T.A. Queiroz Editor, 1990, p. 123.
36

Revolução Industrial não deu origem apenas à produção em massa, mas também à cultura de
massas notadamente explorada pelos meios de comunicação.57
O contexto social da cultura de massas deu-se precipuamente no período de
desenvolvimento industrial e tecnológico da sociedade no século XX. De acordo com Adorno
e Horkheimer, esse conceito parte de uma perspectiva de que a cultura contemporânea confere
a tudo um ar de semelhança, em que a indústria cultural e seus produtos constituem um
sistema no qual fazem parte o cinema, o rádio e as revistas, sendo cada um coerente em si
mesmo e em conjunto, desta feita, houve uma multiplicidade de bens culturais que passaram a
ser produzidos e consumidos pelas diversas classes sociais.58
O consumo da cultura de massa se registra em grande parte no lazer moderno, na
medida em que o homem começa a ter mais tempo para o lazer, exemplifica Morin dispondo
que a semana de trabalho passa de 70 horas para 37 em 1960 nos Estados Unidos da América;
de 80-85 horas para 45-48 na França; muitas vezes em um dia suplementar de lazer é
acrescentado ao domingo.59
Os dados sobre o consumo na indústria do entretenimento são expressivos, Salles
mostra a importância do que denomina revolução silenciosa desta Nova Era. Aponta que, dos
cinco bilhões de habitantes do mundo, mais de dois bilhões já têm acesso à televisão; são
mais de três bilhões de pessoas com acesso ao rádio, e mais de três bilhões de pessoas com
acesso à mídia impressa. Dispõe que é gritante a presença da comunicação diversificada,
difusa e que a tecnologia tornou possível baratear, difundir e até banalizar.60
Elucida Ceneviva que a passividade do ouvinte de rádio ou do telespectador que não
precisa de qualquer esforço para se entreter com os meios de radiodifusão, diferentemente da
leitura de jornais e revistas, somada às técnicas de divulgação da imagem em cores,
aumentaram a possibilidade de incentivo ao consumo.61
Salles ainda aponta um dado contraditório no sentido de que, nos Estados Unidos da
América, cada pessoa já vê mais de cinco horas de vídeo, perto de 30% das horas de um dia.
Apesar disso, os Estados Unidos são o país onde os índices de leitura, o consumo de livros e

57
COMPARATO, Fábio Konder. A proteção do consumidor. In: Revista de Direito Mercantil nº 15/16, 1974
p. 92.
58
ADORNO, Theodor W.; HORKHEIMER, Max. Dialética do esclarecimento: fragmentos filosóficos. Rio de
Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1985, p. 19.
59
MORIN, Edgar. Cultura de massas no século XX; o espírito do tempo. 3. ed. Tradução de Maura Ribeiro
Sardinha, Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1975, p. 56.
60
SALLES, Mauro. O poder excitador da comunicação. In: Cadernos IBRACO, publicação do Instituto de
Altos Estudos de Comunicação, transcrição da palestra proferida no I Simpósio IBRACO, mar. 1991, n. 1, p. 16.
61
CENEVIVA, Walter. Publicidade e o direito do consumidor. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 1991, p. 28.
37

jornais estão nos níveis mais altos da história. No Brasil, já passa de quatro horas e meia por
dia o tempo que o brasileiro médio dedica à televisão.
Ocorre que é justamente no momento de lazer que o consumidor se expõe com maior
intensidade aos efeitos da publicidade, aponta Morin:

[...] o lazer moderno não é apenas privilégio das classes dominantes. Ele saiu
da própria organização do trabalho burocrático e industrial. O tempo de
trabalho enquadrado em horários fixos, permanentes, independentes das
estações, se retraiu sob o impulso do movimento sindical e segundo a lógica
de uma economia que, englobando lentamente os trabalhadores em seu
mercado, encontra-se obrigada a lhes fornecer não mais apenas um tempo de
repouso e recuperação, mas um tempo de consumo.62

A cultura de massa é produzida segundo as normas maciças da fabricação industrial.


Assim, com um modo pragmático de encerrar a divergência existente entre Jacobina e
Comparato, dispõe Morin que a Revolução Industrial operou-se em duas fases: a primeira
deu-se início no século XX, com o poder industrial que se estendeu por todo o globo terrestre,
quando a colonização da África e o domínio da Ásia chegaram ao seu apogeu, e a segunda
industrialização tem se processado nos sonhos e nas imagens, penetrando na grande reserva
que é a alma humana, visto que a produção está voltada aos valores e padrões estéticos e
éticos orientados para o consumo de massa.63
No Brasil, assinala Jacobina, com o decorrer da evolução industrial houve, sobretudo,
a diversificação dos meios de comunicação, surgiram as revistas e almanaques, seguidas da
implantação dos primeiros sistemas radiofônicos, na década de 1920, passando pela instalação
das primeiras emissoras de televisão, na década de 50 e sua popularização na década de 1970,
até chegar ao final do século XX, com um mundo de comunicação e informação globais, com
telefonia integrada, satélites, computadores em rede, modens, fax e televisão interativa até a
chegada dos dias de hoje com a presença constante da internet.64
A essa altura, a única forma de proteção do consumidor encontrava-se no extinto
Código Comercial, proteção nada satisfatória, pois a legislação dispunha tão somente sobre
vícios redibitórios sem, no entanto, preocupar-se com a difusão publicitária desmedida e a
responsabilidade dos sujeitos nelas envolvidos, que passaram a ter sua responsabilidade

62
MORIN, Edgar. Cultura de massas no século XX; o espírito do tempo. 3. ed. Tradução de Maura Ribeiro
Sardinha, Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1975, p. 56.
63
Idem Ibidem, p. 56.
64
JACOBINA, Paulo Vasconcelos. A publicidade no direito do consumidor. Rio de Janeiro: Forense, 1996, p.
25.
38

positivada pelo Código Civil, com significativas evoluções, subdividindo-as em solidária e


objetiva.
A Publicidade, nas palavras de Ferreira, é tratada como sinônimo de propaganda,
desde que realizada de maneira gratuita:

[De público + -(i)dade; fr. Publicité.] S. f. 1. Propaganda (4). 2. Rel. Públ.


Publicação de matéria jornalística, ger. de interesse de uma empresa, pessoa,
organização, etc., por veículo de comunicação. [Nesta acepç., a publicidade
não é paga.] 3. Rel. Públ. Arte e técnica de obter publicidade (2). 4.
Qualidade do que é público: a publicidade dum escândalo. 5. Caráter do que
é feito em público: a publicidade dos debates judiciais [...]65

Elucida Ceneviva que a passividade do ouvinte de rádio ou do telespectador que não


precisa de qualquer esforço para se entreter com os meios de radiodifusão, diferentemente da
leitura de jornais e revistas, somada às técnicas de divulgação da imagem em cores,
aumentaram a possibilidade de incentivo ao consumo.66Para Costa e Mendes, a publicidade é
o meio pelo qual se permite ao anunciante adentrar na psique do consumidor para provar e
estabelecer o posicionamento da marca, transmitindo sua mensagem e recriando ou
despertando a necessidade obstinada de consumo. Nesta perspectiva, a publicidade tem a
finalidade de levar seu público-alvo à aquisição de novos produtos. A ideia é chamar a
atenção do consumidor por meio de apelos sedutores. A arte da sedução adentra a publicidade
como forma de ganho mercadológico visando o consumismo.67
Segundo Marques, publicidade é toda informação ou comunicação difundida, cujo
escopo direto ou indireto é promover junto aos consumidores a aquisição de um produto ou
serviço, independente do local ou meio de comunicação utilizado. Observa-se que nessa
definição informação e publicidade não se distinguem, sendo apontadas de forma genérica,
mas possuindo como destinatário final o consumidor.68
Embora se encontre autores de renome tanto nas esferas extrajudiciais, como nas
judiciais, que abordam publicidade e propaganda de maneira indistinta, como o objetivo do
presente estudo é a abordagem jurídica consumerista dos institutos, torna-se imprescindível ao

65
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário Aurélio da língua portuguesa. 3. ed. Curitiba:
Positivo, 2004. p. 1656.
66
CENEVIVA, Walter. Publicidade e o direito do consumidor. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 1991, p. 28.
67
COSTA, Maria I. L. da; MENDES, Marcília L. G. da Costa. A publicidade como ferramenta de consumo:
uma reflexão sobre a produção de necessidades. Disponível em: < http://www.bocc.ubi.pt/pag/costa-mendes-a-
publicidade-como-ferramenta-de-consumo.pdf>. Acesso em: 08 fev. 2016.
68
MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 3. ed. São Paulo. Revista dos
Tribunais, 1998, p. 673.
39

prosseguimento deste explanar sobre as diferenças existentes entre a publicidade e a


propaganda, visto que, nesse contexto, possuem significação própria.
Jacobina entende a publicidade como a veiculação de informação, através de meio de
comunicação, realizada com o objetivo de ofertar um bem ou serviço a consumo, por um meio
de comunicação capaz de atingir, ainda que, potencialmente, um número indeterminado de
pessoas, e veiculada às expensas do fornecedor.69
A informação aqui é tratada como parte integrante da publicidade há novos elementos
como o meio de comunicação e a figura do fornecedor, mas o destinatário final deixa de ser
determinado passa e ser indeterminável não se restringe a categoria do consumidor, mas sim
pessoas em sua totalidade.
O Comitê de Definições da American Association of Adversiting Agencies oferece a
definição que publicidade é qualquer forma paga de apresentação impessoal e promoção,
tanto de ideias, como de bens ou serviços, por um patrocinador identificado. Nessa definição a
informação pode ou não ser inerente à publicidade, visto que se trata de uma universalidade
de formas de manifestação. O Comitê também aponta a figura do fornecedor como
patrocinador identificado e inova ao definir publicidade sem o consumidor.70
Embora subsistam consideráveis distinções entre as definições mencionadas, observa-
se, conquanto, que todas têm em comum dois elementos que são indispensáveis à
consolidação e materialização da publicidade, quais sejam, informação e divulgação.
Como anteriormente apontado, toda e qualquer forma de publicidade prescinde para a
sua existência de informação, afinal, é nela que haverá a mensagem relativa ao produto ou ao
serviço ofertado. É somente por meio da informação que se manifestará a vontade do
fornecedor. Fazendo uma analogia ao conceito defendido por Bion, na publicidade o
continente seria a publicidade e o conteúdo, a informação que nele contiver.71
A divulgação, por fim, é a própria razão de ser da publicidade. Não há sentido em
realizar determinada publicidade quando a informação ilustra as qualificações do produto ou
serviço, mas a mensagem não instiga o destinatário final a consumir. Para persuadir e
convencer uma determinada parcela de pessoas é necessário, primeiramente, que elas tenham
acesso às informações do bem ofertado.

69
MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 3. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1998, p. 11.
70
American Association of Adversiting Agencies, Associação Americana de Agências de Publicidade (tradução
nossa) apud BENJAMIN, Antônio Hernan V; MARQUES, Cláudia Lima; BESSA, Leonardo Roscoe. Manual
de direito do consumidor. 6. ed. São Paulo. Revista dos Tribunais, 2014, p. 272.
71
ANDRIATTE, Aparecida Malandrin. Biografias Wilfred Ruprecht Bion. Federação Brasileira de
Psicanálise. Disponível em: < http://febrapsi.org.br/biografias/wilfred-ruprecht-bion/>. Acesso em: 09 fev. 2016.
40

Nesse sentido e com muita precisão, Harris dispõe como surge o desejo: “[...] como é
que começamos a ter ambições? Começamos ambicionando aquilo que vemos diariamente.”72
Por possuir esse caráter inerente à publicidade, a informação é considerada um
elemento material ou objetivo. Em contrapartida, como a divulgação caracteriza-se por ser o
escopo da publicidade, constitui-se como elemento finalístico.
Quanto aos elementos formativos da publicidade Benjamin aponta que:

[...] a difusão é um elemento material da publicidade, seu meio de expressão.


O outro é o seu elemento finalístico, no sentido de que é informando que o
anunciante atinge o consumidor, mesmo quando se está diante de técnicas
como nonsense73. Sem difusão não há falar em publicidade, uma vez que o
conhecimento de terceiro é inerente ao fenômeno. Um anúncio que
permanece fechado a sete chaves na gaveta do fornecedor não merece a
atenção do direito do consumidor. Aquilo que se conserva secreto não é
publicidade. Do mesmo modo, sem que traga um conteúdo mínimo de
informação, não deve se falar em publicidade.74

Alguns estudiosos do tema apontam a onerosidade como outro elemento inerente e


indispensável à publicidade dentre os autores de peso, destaca-se Martinéz, explicitando que:

[...] é verificada a existência de outra particularidade da publicidade de


consumo, evidenciada como característica econômica decorrente da
onerosidade atribuída ao fornecedor pela utilização dos veículos de
comunicação social, representando esta onerosidade uma contraprestação
necessária para que o fornecedor possa divulgar a sua mensagem publicitária
nos veículos de comunicação social.75

Com a máxima vênia ao entendimento do renomado autor, entende-se que a


onerosidade não é condição essencial à existência da publicidade visto que é plenamente
possível, principalmente por meio da rede mundial de computadores, os fornecedores, por
meio da informação, divulgarem produtos e serviços à toda a coletividade e em especial a
seus consumidores, de forma gratuita ou não onerosa.

72
HARRIS, Thomas. The Silence of the Lambs. 1991. Tradução de Antônio Gonçalves Penna. 12. ed. Rio de
Janeiro. Record. 2007, p. 159.
73
Sem sentido; contra-senso; (tradução nossa). Trata-se de gênero literário geralmente utilizado em contos de
fadas com a finalidade de entreter o público alvo com personagens que apresentam características físicas como
tamanho e forma peculiares. A espécie literária foi transportada para publicidade sendo vastamente utilizada na
publicidade infantil.
74
BENJAMIN, Antônio Hernan V; MARQUES, Cláudia Lima; BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de direito
do consumidor. 6. ed. São Paulo. Revista dos Tribunais, 2014, p. 272.
75
MARTINÉZ, Sérgio Rodrigo. Publicidade de consumo e propedêutica do controle. Curitiba. Juruá Editora.
2001, p. 78.
41

A Lei nº 4.680/65, em seu artigo 2º, definia a propaganda como qualquer forma
remunerada de difusão de ideias mercadoria ou serviços. Ocorre que referida lei foi revogada
após a promulgação do Código de Defesa Do Consumidor que passou a dispor claramente
sobre a publicidade, deixando a propaganda sem positivação. A publicidade tendo em vista
que é nosso objeto de pesquisa já foi cuidadosamente analisada demonstrando ter uma
finalidade comercial bem definida cujo objetivo é arrebatar o maior número de pessoas
possível.76
Contrariamente, a propaganda possui outras finalidades que não comerciais e/ou
econômicas. Seu escopo primordial é a propagação de ideais, juízos, opiniões, fazendo-se
oportuno, neste momento, analisar sua definição.
Na etimologia, o vocábulo propaganda tem origem no latim propaganda. Ferreira
define como a propagação de princípios, ideias, conhecimentos, teorias ou doutrinas que são
propagadas por meio de arte ou técnica de planejar constituindo um conjunto de atos para
criar, executar e veicular mensagens de propaganda.77
A propaganda, segundo Benjamin, possui um fim ideológico, religioso, filosófico,
político, econômico e social, e, por esse caráter não comercial, nem sempre há identificação
de seu patrocinador.78
De forma concisa, Nunes define que a propaganda é reservada tão somente para ações
políticas e religiosas, propagação de princípios, ideias, conhecimentos ou teorias.79
Já na visão de Ceneviva, propaganda é a arte ou técnica de informar ou notificar a
coletividade, comunicando-lhes fatos ou versões, que a fonte da divulgação deseja tornar
conhecidos.80
A Associação Brasileira de Propaganda define seu ramo de atividade como exercício
fundamental e indispensável à livre circulação de ideias, bens e serviços, enfatizando que a
atividade da propaganda no Brasil é base de existência do Estado Democrático de Direito.81
À luz das definições apresentadas resta evidente o caráter social da propaganda em
difundir ideais, crenças, princípios e ideologias, das mais diversas naturezas, abrangendo

76
BRASIL. Lei nº 4.680/65. Dispõe sobre o exercício da profissão de Publicitário e de Agenciador de
Propaganda e dá outras providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4680.htm>
Acesso em: 14 fev. 2016.
77
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário Aurélio da língua portuguesa. 3. ed. Curitiba:
Positivo, 2004, p. 1642.
78
BENJAMIN, Antônio Hernan V; MARQUES, Cláudia Lima; BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de direito
do consumidor. 6. ed. São Paulo. Revista dos Tribunais, 2014, p. 273.
79
NUNES, Luiz Antonio Rizzato. Curso de direito do consumidor. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p.109
80
CENEVIVA, Walter. Publicidade e o direito do consumidor. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 1991, p. 73.
81
ABP. Associação Brasileira de Propaganda (ABP). Disponível em: <http://abp.com.br/sobre-abp/> Acesso em:
12 fev 2016.
42

desde aspectos religiosos e morais até políticos, cujo objetivo primordial é tão somente a
difusão e propagação dessas sem vislumbrar perspectivas mercantis ou econômicas.
Cumpre-se, todavia, analisar que mesmo havendo finalidades opostas a publicidade e a
propaganda tem em sua essência a informação como elemento estruturante. A informação
como é inerente aos dois institutos possui caráter de imprescindibilidade, o que lhe concede
determinadas prerrogativas, a exemplo da norma que estabelece o direito à informação como
direito fundamental.
O artigo 5º, inciso XIV, da Constituição da República Federativa do Brasil, 82
estabeleceu de forma indistinta e irrestrita o acesso à informação, como afirma Moraes:

O direito a receber informações verdadeiras é um direito de liberdade e


caracteriza-se essencialmente por estar dirigido a todos os cidadãos,
independentemente de raça, credo ou convicção político-filosófica, com a
finalidade de fornecimento de subsídios para a formação de convicções
relativas a assuntos públicos [...].83

Ocorre que a forma como o direito à informação publicitária tem sido empregado
promoveu uma alteração ou supressão na boa-fé objetiva que deveria ser sua finalidade. A
norma positivada com o objetivo de fornecer a todos os cidadãos indistintamente qualquer
informação que lhes fosse imprescindível, na prática comercial, tornou o consumidor
possivelmente mais vulnerável, pois, o direito à informação deixa de ser instrumento de mero
informe, utilizando das técnicas desenvolvidas na publicidade e descumprindo preceitos como
a boa-fé objetiva e a função social, desperta no consumidor o desejo de aquisição de novos
produtos e serviços, deixando de cumprir com sua intenção inicial de informar.
Disso surge a necessidade de se pensar em uma nova abordagem jurídica ou, pelo
menos, tornar o ordenamento atual de controle da publicidade mais efetivo, tendo em vista
que somente o Código de Autorregulamentação Publicitária demonstrou não ser capaz de
promover e implementar a boa-fé objetiva e a função social como condições indissociáveis à
produção e veiculação publicitária.
Ressalta-se que leviano seria dizer que a atuação do CONAR em nada obsta a
veiculação de publicidade abusiva e enganosa ocorre que suas decisões não possuem caráter

82
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes: [...] XIV - é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo
da fonte, quando necessário ao exercício profissional;
83
MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais: teoria geral, comentários aos artigos 1º a 5º da
Constituição da República Federativa do Brasil, doutrina e jurisprudência. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2000, p. 162.
43

imperativo-obrigacional o que enfraquece ou menospreza a atuação do conselho frente às


questões publicitárias submetidas a seu crivo.
Nesse sentido, elucida Pasqualotto:

O problema é que as decisões do CONAR são de cumprimento espontâneo.


Os estatutos da entidade não lhe outorgam nenhum poder coativo – e, de
qualquer modo, esse poder sempre seria limitado, por se tratar de sociedade
privada. Além do mais, é notório que é acanhada a atuação do órgão de
controle ético da publicidade. Basta ligar a televisão para constatar. O
primeiro engano, lamentavelmente, é praticado pelo próprio CONAR, que se
autoproclama corifeu da ética, mas ao ser citado para responder ação por
publicidade abusiva, juntamente com o anunciante e a agência de
publicidade, pediu sua exclusão da lide, afirmando que tem atuação
meramente consultiva.84

Por óbvio que a promulgação do Código de Defesa do Consumidor trouxe avanço no


que tange ao controle da publicidade. Observa-se, contudo, que mesmo havendo positivação
normativa a lei não se tornou efetiva, por isso a necessidade restabelecer um sistema de
controle publicitário híbrido, unificando o Código de Autorregulação e o Código de Defesa do
Consumidor:

A precisão e o caráter técnico do Código Brasileiro de Autorregulamentação


Publicitária, assim como a boa vontade e esforço dos seus implementadores,
não foram (como não são) suficientes para impedir, isoladamente, toda sorte
de abusos praticados contra os interesses dos consumidores. Daí ter o
Código de Defesa do Consumidor buscado um sistema misto de controle,
conjugando autorregulamentação e participação da administração e do Poder
Judiciário. A Constituição Federal estabelece que “a lei não excluirá da
apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito” (art. 5º, XXXV).
Logo, nenhum ato ou atividade que provoque ou seja capaz de provocar
danos a alguém – nem mesmo a publicidade – pode ser excluída da
apreciação judicial.85

Desse modo, observa-se que a atuação do CONAR, mesmo que em uma perspectiva
privada de autorregulamentação consultiva, conjuntamente com a atuação jurisdicional
repressiva e punitiva, consubstanciada pelo Código de Defesa do Consumidor, poderá de uma
maneira mais eficaz promover a proteção do consumidor e tonar o sistema já existente mais
efetivo, sendo absolutamente dispensável a criação de um novo sistema jurídico para dispor
sobre a publicidade em âmbito nacional.

84
PASQUALOTTO, Adalberto. Os efeitos obrigacionais da publicidade no código de defesa do consumidor.
São Paulo: Revistas dos Tribunais, 1997, p. 68.
85
BENJAMIN, Antônio Hernan V; MARQUES, Cláudia Lima; BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de direito
do consumidor. 6. ed. São Paulo. Revista dos Tribunais, 2014, p. 275.
44

O que se torna impreterível seria estabelecer políticas públicas de conscientização do


consumidor para que tome ciência e fique atento àqueles fabricantes/fornecedores que foram
punidos, seja pelo CONAR, seja pelo Estado, a fim de que evitem consumir os produtos
oriundos de publicidade declaradamente enganosa ou abusiva, promovendo a implementação
da boa-fé objetiva na produção e veiculação publicitária para além de despertar no indivíduo a
responsabilidade em se analisar enquanto consumidor priorizando as empresas que cumpram
com sua função social.

2.2 A PUBLICIDADE ENGANOSA, ABUSIVA E O VÍCIO DE INFORMAÇÃO

A análise publicitária inicia-se na década de 1950, período marcado pela ausência de


meios e dispositivos legais destinados à proteção do consumidor. A ausência de positivação
normativa específica era, até então, admissível tendo em vista o reduzido volume do mercado
de consumo. Nesse período, somente o artigo 210 do Código Comercial, dispunha sobre os
vícios redibitórios que era a única forma de proteção do consumidor contra a publicidade.
Ocorre que o Código Comercial com o passar dos anos demonstrava-se ineficaz, pois,
dispunha ao consumidor como mecanismo de proteção um instrumento pós-contratual, cujo
ônus da prova ficava a seu encargo. Não havia um controle da propaganda propriamente dita,
tampouco de responsabilidade arbitrada a seus co-obrigados, o que efetivamente ocorreu só
posteriormente com o Código Civil e o Código de Defesa do Consumidor.86
Nesse sentido, Jacobina elucida que o desenvolvimento do interesse jurídico pela
publicidade não começou, porém, com o interesse pela proteção do consumidor, mas que a
necessidade de positivação deu-se inicialmente pelo interesse à proteção do próprio
anunciante contra o seu concorrente, preceitos que só foram estabelecidos em 1934 com a
repressão à concorrência desleal, posteriormente tipificada como crime no Código de
Propriedade Industrial.87
A relação entre a agência e o anunciante inicia-se muito antes da própria peça
publicitária. O anúncio é, muitas vezes, apenas uma das etapas da estratégia mercadológica
criada para o produto ou serviço. Por isso, a responsabilidade da agência há de ser avaliada
individualmente sempre com vistas à profundidade dessa relação, avaliando-se os danos
gerados pela veiculação de publicidade enganosa ou abusiva.

86
GIACOMINI FILHO, Gino. Consumidor versus propaganda. São Paulo: Atlas, 1991, p. 29.
87
JACOBINA, Paulo Vasconcelos. A publicidade no direito do consumidor. Rio de Janeiro: Forense, 1996, p.
37.
45

Segundo o artigo 37, §, 1º do Código de Defesa do Consumidor, entende-se como


publicidade enganosa, toda e qualquer modalidade de informação ou comunicação de caráter
publicitário, inteira ou parcialmente falsa, ou por qualquer outro modo, mesmo por omissão,
capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza, características, qualidade,
quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outros dados sobre produtos ou serviços.
Em seguida, o §2º diz que é abusiva, dentre outras, a publicidade discriminatória,
violenta, terrorista, supersticiosa, aquela que se aproveita de deficiência ou incapacidade
infantil, que desrespeita o meio ambiente, ou que induz o consumidor a portar-se de forma
arriscada ou prejudicial à sua integridade física ou saúde. Por fim, no §3º, o artigo 37
especifica que a publicidade é enganosa por omissão, quando deixa de informar o consumidor
sobre dado essencial ao produto ou serviço.
Para além do Código de Defesa do Consumidor, o controle da abusividade da
publicidade decorre de imposição constitucional, como dispõe Jacobina:

Constante no art. 220, II e §4º da Lei Maior, ali exige-se que a lei estabeleça
meios que garantam a possibilidade, à pessoa e à família, de se defenderem
da propaganda de produtos práticas e serviços que possam ser nocivos à
saúde e ao meio ambiente [SIC]. Outrossim, o §4º restringe a propaganda
dos produtos ali elencados (tabaco, bebidas alcoólicas, agrotóxicos,
medicamentos e terapias) e o art. 221 garante que a propagação das
emissoras de rádio e televisão atenderá ao princípio do respeito aos valores
éticos e sociais da pessoa e da família. Tudo isso, combinado com o
princípio da defesa do consumidor, previsto em diversas passagens da
Constituição (ver art. 5º, XXXII, e art. 170, V), dão a necessária
fundamentação a tal controle.88

A primeira análise a ser elaborada no que tange à publicidade enganosa ou abusiva,


refere-se à letra da lei e a utilização de cláusulas gerais. O Código de Defesa do Consumidor,
ao vedar práticas publicitárias abusivas ou enganosas, utiliza cláusulas gerais e não normas
fechadas, situação que permite uma condição de subjetividade e assim, comodidade ao
intérprete no momento de aplicar a legislação.
Buscando definir o conceito de cláusula geral, Martins-Costa traz os seguintes
ensinamentos:

[...] é geral, quando diz algo que vale, ao mesmo tempo, para todos os
objetos que pertencem a uma determinada classe, sem nenhuma exceção. [...]
só poderá conotar o adjetivo “geral” às cláusulas gerais se, por este, se
estiver compreendendo que esta técnica permite, em razão da extensão do

88
JACOBINA, Paulo Vasconcelos. A publicidade no direito do consumidor. Rio de Janeiro: Forense. 1996, p.
97.
46

seu campo previsivo-estatutivo, uma “previsibilidade geral” de condutas, ao


modo de ensejar o tratamento “em conjunto” de um vasto domínio de
casos.89

Do mesmo posicionamento coaduna Khouri, elucidando que para um combate mais


eficaz à publicidade enganosa e abusiva imperioso seria uma correta interpretação dos §§1º e
2º do artigo 37, que apenas exemplificam o que seria uma publicidade enganosa e abusiva,
tendo em vista o caráter aberto dos preceitos, é imprescindível ao intérprete detectar os
critérios que permitem identificar no caso concreto essas formas viciadas de comunicação
mercadológica ou publicitária.90
A grande problemática que circunda as cláusulas gerais que definem a publicidade
enganosa e abusiva, é que como elas permitem que o intérprete recorra a outros
microssistemas para preencher seu conteúdo, o consumidor em sede de jurisdição, não
possuirá uma previsibilidade da decisão, tendo em vista, que o intérprete terá a possibilidade
de interpretar a norma à sua maneira.
Por outro lado, a cláusula geral possibilita maior controle da legalidade das mais
variadas inovações e formas publicitárias, torna-se, dessa feita, mais abrangente fornecendo
maior proteção ao consumidor podendo inclusive, ser aperfeiçoada pela doutrina e
jurisprudência de modo a acompanhar as mudanças no plano publicitário, bem como, as
evoluções sociais e, por fim, o Direito.91
No que concerne às cláusulas de publicidade enganosa, deve-se observar que o
conteúdo, inteira ou parcialmente falso, ou também omisso, só caracteriza a publicidade como
enganosa quando capaz de induzir o consumidor a erro a respeito da natureza, características,
qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outros dados sobre produtos
ou serviços. Não se considerada como enganosa a publicidade de consumo fantasiosa, fictícia,
que apenas cria uma ilusão materialmente impossível para chamar a atenção do consumidor
ao divulgar o produto ou serviço. Quando, porém, a publicidade de consumo traz algo
chamativo, mas capaz de induzir o consumidor em erro, violando-o em sua incolumidade
econômica, há a ocorrência de tipo enganoso previsto no Código de Defesa do Consumidor.92

89
MARTINS-COSTA, Judith. A boa fé no direito privado: para um conceito de cláusula geral. 1. ed. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 304.
90
KHOURI, Paulo R. Roque. Direito do consumidor: contratos, responsabilidade civil e defesa do consumidor.
3. ed. São Paulo: Atlas, 2006, p. 79.
91
DIAS, Lucia Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2010, p.
98.
92
MARTINÉZ, Sérgio Rodrigo. Publicidade de consumo e propedêutica do controle. Curitiba. Juruá Editora.
2001, p. 208.
47

De forma mais objetiva, Rodycz dispõe que a legislação dispensa a comprovação do


engano do consumidor, como também, não pressupõe que houve má-fé do anunciante,
explicitando que:

É relevante lembrar que a lei não exige a consumação do engano do


consumidor. Contenta-se em que a publicidade seja capaz de induzi-lo em
erro a respeito de aspectos contidos na publicidade. Por fim, a enganosidade
não supõe existência de má-fé do anunciante ou da agência na criação da
peça publicitária.93

Não se exige que o consumidor seja efetivamente lesado, basta uma plausível
capacidade de induzi-lo a erro, ou que o anúncio publicitário crie no consumidor uma
potencial expectativa para que esta publicidade seja considerada enganosa. Dando ensejo à
aplicação, independente da repressão administrativa, das sanções penais dos artigos 66 e 67
do Código de Defesa do Consumidor, como também, as do artigo 7º, inciso III, da Lei.
8.137/90, que define os crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de
consumo.94
Nesse sentido, a 1ª Turma Recursal do Tribunal de Justiça do estado do Rio de Janeiro
condenou a ocorrência da publicidade enganosa oriunda da mera capacidade do anúncio de
induzir o consumidor em erro, visto que o fabricante/fornecedor possui o dever jurídico de
prestar informação, uma vez que os princípios de lealdade, transparência e boa-fé objetiva
devem integrar todas as fases da relação jurídica negocial. Dispõe que a ausência de
informação faz aflorar expectativas legitimas do interessado identificando-se como
publicidade enganosa. Conclui que o consumidor é detentor da garantia legal de informação
adequada e clara, estando protegido contra a publicidade enganosa e métodos comerciais
abusivos, a efetiva prevenção e reparação de danos e a inversão do ônus da prova, devendo o
fornecedor ainda na oferta e apresentação de produtos ou serviços assegurar informações
suficientemente claras sobre características, quantidade, composição e preço. 95

93
RODYCZ, Wilson Carlos. O controle da publicidade. Revista de Direito do Consumidor, São Paulo, n. 8.
out./dez., 1993, p. 65.
94
Seguem o teor das sanções: Art. 66. Fazer afirmação falsa ou enganosa, ou omitir informação relevante sobre a
natureza, característica, qualidade, quantidade, segurança, desempenho, durabilidade, preço ou garantia de
produtos ou serviços: Pena - Detenção de três meses a um ano e multa.§ 1º Incorrerá nas mesmas penas quem
patrocinar a oferta. § 2º Se o crime é culposo; Pena Detenção de um a seis meses ou multa. Art. 67. Fazer ou
promover publicidade que sabe ou deveria saber ser enganosa ou abusiva: Pena Detenção de três meses a um ano
e multa. Art. 7° Constitui crime contra as relações de consumo: III - misturar gêneros e mercadorias de espécies
diferentes, para vendê-los ou expô-los à venda como puros; misturar gêneros e mercadorias de qualidades
desiguais para vendê-los ou expô-los à venda por preço estabelecido para os demais mais alto custo.
95
BRASIL. Tribunal De Justiça Do Rio De Janeiro. 1ª Turma Recursal. Recurso Inominado nº
00180941220098190087-RJ. Relator: Andre Luiz Cidra. Data de Publicação: 10 mar 2011. Disponível em:
48

A mera potencialidade de indução do consumidor em erro enseja a condenação em


danos morais, visando coibir a proliferação e veiculação de anúncios publicitários em sentido
análogo. A publicidade enganosa manifesta-se também em sua forma omissiva, quando a
ausência de conteúdo na mensagem é que passa a ter a capacidade de induzir o consumidor
em erro. Mas não somente na mensagem omissiva, enquadra-se também como modalidade de
publicidade enganosa, anúncios publicitários que tenham por conteúdo mensagens ambíguas
ou inexatas, ou qualquer outra modalidade tácita capaz de influenciar a vontade com
repercussão na escolha econômica do consumidor.96
Para configurar a publicidade enganosa por omissão, basta que o anunciante deixe de
afirmar algo relevante e que, por isso mesmo, induz o consumidor em erro, isto é, deixa de
dizer algo que é. Conclui Benjamin que esta quantia omissiva de informação publicitária é
considerada como dano essencial.97
Com relação à publicidade abusiva, inserida no §2º do artigo 37, o legislador forneceu
apenas alguns critérios para identificá-las. Ocorre que sua identificação torna-se mais
complexa afinal, a publicidade enganosa tem como critério a veracidade da informação e da
sua essencialidade, não sendo verdadeira a mensagem divulgada omitindo dado relevante do
produto ou serviço anunciado. Entretanto, quando se trata de uma publicidade abusiva, ainda
que haja critérios para identificá-las, não se consegue com o mesmo grau de objetividade que
ocorre na publicidade enganosa.98
Referido artigo não traz em seu texto normativo um conceito preciso de uma
abusividade, mas, a partir das situações nele exemplificadas, pode-se definir como abusiva
toda publicidade que contrarie o sistema valorativo que permeia o ordenamento jurídico da
nossa sociedade, sobretudo nos mandamentos da Constituição Federal e das leis
infraconstitucionais, tais como o valor da dignidade da pessoa humana, da paz social, da
igualdade e não discriminação, de proteção à criança e ao adolescente, ao idoso, da tutela à
saúde e ao meio ambiente, artigos: 1º, inciso III; 3º, inciso IV e 5º caput; 227; 230; 196 e 225
da Constituição da República, respectivamente. Enfatizando-se que, no âmbito das relações de

<http://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/157527150/recurso-especial-resp-1329556-sp-2012-0124047-6>.
Acesso em: 28 maio 16.
96
DIAS, Lucia Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2010, p.
100.
97
BENJAMIN, Antônio Hernan V; MARQUES, Cláudia Lima; BESSA, Leonardo Roscoe. Código brasileiro
de defesa do consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária,
2007, p. 281.
98
KHOURI, Paulo R. Roque. Direito do consumidor: contratos, responsabilidade civil e defesa do consumidor.
3. ed. São Paulo: Atlas, 2006, p. 81.
49

consumo já se reputava ilícita a publicidade que excedesse a sua finalidade econômica e


social, a boa-fé ou os usos e costumes.99
Como visto, a norma que dispõe a publicidade abusiva tem por objetivo tutelar um
dano que ultrapassa a esfera patrimonial do consumidor, ela atinge outros valores sociais que
também são protegidos pelo ordenamento jurídico. Nesse sentido, Rodycz dispõe que: “a
publicidade de consumo abusiva refere-se ao “princípio da ordem pública”, sendo que os
“valores protegidos ultrapassam a própria relação de consumo situando-se na órbita do
interesse público.”100
Constata-se que a publicidade abusiva tende a ser mais lesiva, danosa e prejudicial que
a publicidade enganosa, visto que tutela valores constitucionalmente estabelecidos e
princípios de ordem pública que comprometem toda a coletividade. Nesse sentido. explicita
Dias:

A publicidade abusiva, portanto, é aquela que agride os princípios e valores


maiores do ordenamento jurídico e que informam e permeiam nossa
sociedade. Nesse sentido, o §2º do art. 37 do CDC, por oferecer um
conteúdo vasto e flexível a ser preenchido no caso concreto pelo julgador,
introduz nas relações de consumo uma verdadeira cláusula geral de não
abusividade. Proíbe-se qualquer forma de publicidade que atende contra os
valores sociais fundamentais ou que induza o consumidor a adotar
comportamento prejudicial à sua saúde ou segurança. O rol do §2º é, assim,
meramente exemplificativo, de modo que podem surgir outras situações de
abusividade vis à vis o exame do caso concreto.101

Como publicidade abusiva pode-se definir aquela de cunho discriminatório de


qualquer natureza, a que incita a violência, explora o medo ou a superstição, aproveita-se da
deficiência de julgamento e da inexperiência da criança, desrespeita valores ambientais, ou
seja, capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua
saúde ou segurança.102
Publicidade abusiva discriminatória é aquela cujo anúncio publicitário faça distinção
entre o ser humano em qualquer aspecto: raça, gênero, preferência sexual, condição social,
profissão e opções religiosas ou políticas. A exploradora de medo ou superstição é a
publicidade que se utiliza de medo ou superstição para persuadir o consumidor a adquirir
determinado produto. Incitadora de violência é a modalidade de publicidade abusiva que

99
DIAS, Lucia Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2010, p.
161.
100
Idem Ibidem, p. 66.
101
Idem Ibidem, p. 162.
102
MARTINÉZ, Sérgio Rodrigo. Publicidade de consumo e propedêutica do controle. Curitiba. Juruá
Editora, 2001, p. 211.
50

incita toda e qualquer forma de violência, seja do homem contra homem, animais ou bens. A
publicidade antiambiental é aquela que atenta contra a ambiência, citando-se como exemplo o
anúncio de uma motosserra que o anunciante a teste em área de proteção ou em uma árvore
centenária e, por fim, a publicidade indutora de insegurança é o anúncio que induz o
consumidor a comportar-se de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde.103
Merece destaque e análise apartada a publicidade direcionada aos hipossuficientes,
visto que, as crianças possuem uma condição característica por serem pessoas em
desenvolvimento sem cognição formada, com déficit de julgamento e sem qualquer
experiência. Insta elucidar inicialmente que hipossuficiente são determinadas categorias de
consumidores, como idosos, crianças, silvícolas, doentes e rurícolas, enfatizando que a
hipossuficiência pode ser física, psíquica ou econômica.
A legislação consumerista, no §2º do artigo 37, concede proteção à criança e ao
adolescente contra a publicidade abusiva, norma que vai ao encontro dos valores e deveres
constitucionais estabelecidos no artigo 227 da Constituição da República, nesse diapasão o
artigo 71 do Estatuto da Criança e do Adolescente dispõe a proteção da criança e do
adolescente contra o conteúdo inadequado da publicidade ou da programação de rádio e
televisão elucidando que as informações publicitárias e os produtos e serviços quando
direcionados especificamente às crianças devem observar a condição peculiar deste público-
alvo, sendo vedada a exploração de sua inexperiência ou de sua deficiência de julgamento.104
Nesse mesma diretriz, o Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária dispõe
que é lícito à publicidade utilizar símbolos próprios do imaginário das crianças, como animais
que falam, fadas e inclusive publicidade nonsense, respeitando-a em sua ingenuidade e
credulidade. Deve-se evitar, contudo, mensagens que levam a criança a se sentir diminuída ou
menos importante caso não consuma o produto ou serviço oferecido, ou que a leve a
constranger seus responsáveis, importunar terceiros ou promover comportamentos
socialmente condenáveis até mesmo para uma criança.105

103
BENJAMIN, Antônio Hernan V; MARQUES, Cláudia Lima; BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de direito
do consumidor. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 289.
104
MOMBERGER, Noemi Friske. A publicidade dirigida às crianças e adolescentes. São Paulo: Memória
Jurídica, 2002, p. 26 e ss.
105
JACOBINA, Paulo Vasconcelos. A publicidade no direito do consumidor. Rio de Janeiro: Forense, 1996,
p. 99.
51

Bittar dispõe que a publicidade abusiva é aquela na qual se atenta contra: “valores
essenciais da convivência social e as próprias pessoas em seus direitos substanciais à vida e à
segurança”.106
Justamente por esse aspecto, observou-se a necessidade se de efetivar a legislação que,
semelhante ao modelo constante no Código de Autorregulamentação Publicitária e no
ordenamento jurídico, regulasse verdadeiramente a publicidade por setores e características
próprias de cada tipo de serviço e respectivo público-alvo. Segundo Campos, isso já ocorre
em países mais desenvolvidos como a França, Alemanha, Bélgica, Dinamarca, Espanha, Grã-
Bretanha, Grécia, Irlanda, Itália, Portugal e Suiça.107
Calais-Auloy aponta que a publicidade é provavelmente uma das fontes mais
importantes de informação, mas também a mais perigosa, pois é destinada, prioritariamente,
mais a convencer do que propriamente a informar. Elucida ainda que na França em
determinados casos a legislação vai além de apenas vetar a publicidade abusiva: ela enumera
as informações que devem necessariamente figurar na publicidade, como em matéria de
crédito ao consumidor entre outras, a fim de tornar a publicidade mais informativa.108
Nesse sentido, importante explicitar que a informação prestada de forma adequada
trará ao consumidor maior segurança para exigir seus direitos, bem como, trará mais
efetividade à legislação vigente. Bittar, assim que publicado o Código de Defesa do
Consumidor, asseverou com certo otimismo que, com o advento da legislação consumerista a
maioria dos problemas oriundos das relações de consumo seriam extintos:

[...] não terão mais guarida no cenário econômico, a bem da própria


economia, publicidades enganosas ou abusivas, promessas mirabolantes,
anúncios de curas milagrosas, cobranças vexatórias, contratos com
vantagens excessivas para o ofertante, perdas injustificadas de direitos dos
consumidores, e outras ações ou omissões ilícitas, que tantos reflexos
negativos impõem à sociedade como um todo e ao mercado de consumo em
particular.109

O comportamento do fabricante/fornecedor e a postura do consumidor modificaram


após a promulgação do Código de Defesa do Consumidor. Mas é fato que os litígios
consumeristas não deixaram de existir em virtude disso. Para que o Código de Defesa do

106
BITTAR. Carlos Alberto. O controle da publicidade: sancionamentos a mensagens enganosa e abusiva.
Revista de Direito do Consumidor. São Paulo: Revistas dos Tribunais, nº 4, p. 129.
107
CAMPOS, Maria Luiza de Saboia. Publicidade: responsabilidade civil perante o consumidor. São Paulo:
Cultura Paulista, 1996, p. 226.
108
CALAIS-AULOY, Jean. Droit de la consommation. 3. ed. Paris: Dalloz, 1992, p. 45.
109
BITTAR, Carlos Alberto. O advento do Código de Defesa do Consumidor e seu regime básico. In: Revista
de Direito do Consumidor. São Paulo: Revistas dos Tribunais, n. 2, 1992, p. 146.
52

Consumidor alcance a tão almejada efetividade no que tange à publicidade abusiva e


enganosa, imprescindível que o controle publicitário caminhe conjuntamente com vindouras
políticas públicas que poderão promover incentivos fiscais ou tributários aos
fabricantes/fornecedores que implementarem a boa-fé objetiva e a função social da empresa.
Uma educação consumerista deve ter um enfoque no futuro, nas novas tecnologias e as
novas gerações, a fim de acompanhar as mudanças e os anseios sociais. Afinal a publicidade é
um fator de influência sobre o público infantil, certos limites de horário e conteúdo à sua
veiculação, quando direcionadas às crianças, pessoas ainda em desenvolvimento, desprovidas
de capacidade de julgamento clara ou experiência, podem e devem se justificar.
Tendo em vista que já foram apontados os efeitos da publicidade enganosa ou abusiva
na sociedade de consumo, necessário se faz apontar, o vício na informação. Para tanto,
ressalta-se que a produção de publicitária especificamente nesse tópico, será analisada com
enfoque na informação nela contida, como elemento essencial tanto à publicidade como a
propaganda.
Ressalta-se preliminarmente que existem consideráveis divergências quanto ao vício
de informação em sede de publicidade. A divergência justifica-se no sentido de que o dever
de informação refere-se à propaganda e não à publicidade, visto que, a publicidade não possui
o dever de prestar toda e qualquer informação relativa ao produto ou serviço, como por
exemplo, sua composição ou a existência elementos alergênicos no produto, afinal, a função
precípua da publicidade, até mesmo em virtude de sua onerosidade, seria tão somente
despertar no consumidor o desejo de aquisição do então objeto publicitário.110
No decorrer do presente tópico, demonstrar-se-á que o dever de informação está
intimamente ligado à propaganda, tendo em vista seu caráter ideológico, religioso, político e
social. A publicidade, em contrapartida, mesmo possuindo a informação como elemento
intrínseco, não possui essencialmente o objetivo de informar, pois como instrumento de
venda, inserida no modo de produção capitalista, possui como escopo principal a oferta em
massa com a finalidade de gerar lucro, incentivar e propiciar o consumo de determinado bem
ou serviço.
O Código de Defesa do Consumidor estabelece a liberdade de fazer a publicidade, que
encontra proteção constitucional sob dois principais aspectos, primeiramente como atividade
econômica resguardada pela livre iniciativa, fundamento da ordem econômica, pela livre

110
ANVISA. Diretoria Colegiada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução nº 26/15. Dispõe
sobre os requisitos para rotulagem obrigatória dos principais alimentos que causam alergias alimentares.
Disponível em: < http://adcon.rn.gov.br/ACERVO/Suvisa/doc/DOC000000000083199.PDF>. Acesso em 23
ago. 2016.
53

concorrência, ambos dispostos no artigo 170 da Constituição da República e, por derradeiro,


pelo princípio da liberdade de expressão disposto no artigo 5º, inciso IX e artigo 222 da
Constituição da República.111
Além da publicidade, é livre o exercício de qualquer atividade econômica,
independente de autorregulação de órgãos públicos, salvos nos casos previstos em lei. Mais
do que um princípio, a livre-iniciativa foi elevada a um nível de fundamento da ordem
econômica paralelamente à valorização do trabalho humano. Comentando o referido artigo
170 da Constituição da República Federativa do Brasil, Tavares, assim, dispõe:

Além daqueles princípios fundamentais – livre iniciativa e valor social da


iniciativa humana – enumerados em seu caput, o art. 170 das Constituição
relaciona em seus nove incisos os princípios constitucionais da ordem
econômica, afirmando que esta tem por fim assegurar a existência digna,
conforme os ditames da justiça social, respeitados os seguintes princípios:
soberania nacional, propriedade privada, função social da propriedade, livre
concorrência, defesa do consumidor, defesa do meio ambiente, redução das
desigualdades regionais e sociais, busca do pleno emprego e tratamento
favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis
brasileiras e que tenham sua sede e administração no país. Estes princípios
perfazem um conjunto cogente de comandos normativos, devendo ser
respeitados e observados por todos os Poderes, sob pena de
inconstitucionalidade do ato praticado ao arrepio de qualquer deles. Portanto,
serão inadmissíveis inválidas perante a ordem constitucional as decisões do
Poder Judiciário que afrontarem estes princípios, assim como as leis e
qualquer outro ato estatal que estabelecer metas e comandos normativos que,
de qualquer maneira, oponham-se ou violem tais princípios. 112

Subsidiariamente aos princípios norteadores da ordem econômica, a proteção da


publicidade pode analisada também a partir da proteção à liberdade de expressão, uma vez
que, as peças publicitárias consistem em manifestações criativas do intelecto humano. Nesse
contexto, observa-se que o §4º do artigo 220, ao regulamentar a publicidade comercial de
produtos potencialmente nocivos, acaba por reconhecer ser a publicidade forma de
manifestação da liberdade de expressão, pensamento e informação, condições que fazem parte
do livre exercício da democracia.113
Nesse seguimento o dever de informação ficaria a encargo do fabricante/fornecedor
que teria a discricionariedade de realizá-lo, por exemplo, dispondo no rótulo ou manual de
instruções do produto todas as informações imprescindíveis ao consumidor, informações que

111
DIAS, Lucia Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2010,
p. 35.
112
TAVARES, André Ramos. Direito constitucional econômico. São Paulo: Método, 2003, p. 134.
113
LOPES, Teresa Ancona. Nexo causal e produtos potencialmente nocivos: a experiência brasileira do
tabaco. São Paulo: Quartiner Latin, 2008, p. 116.
54

embora importantes, não compete que sejam explicitadas em um anúncio publicitário,


ademais, levando-se em conta que existem modalidades publicitárias como o merchandising,
a publicidade oculta e subliminar, que não utilizam a linguagem falade tornando-se
impraticável, especialmente nessas modalidades, o dever de informar.
A informação é inerente à publicidade e como explicitado anteriormente, publicidade é
continente e informação conteúdo, àquela faz referência ao caráter formal e essa material.
Elucida-se, contudo, que mesmo na publicidade oculta ou subliminar, tendo-se, como
exemplo, anúncios publicitários que apenas exibem uma celebridade consumindo ou
utilizando determinado produto e que, por vezes, não possuem qualquer tipo de linguagem
verbal, salta aos olhos a informação que se manifesta de diversas maneiras, consciente ou não.
Essas celebridades são cuidadosamente escolhidas para protagonizar os comerciais,
visto que inerente a elas está a informação a ser exposta ao consumidor. O mesmo raciocínio
para produtos com um público alvo homossexual que utilizará uma celebridade com
orientação sexual idêntica. Outro exemplo são as publicidades nacionais de bebidas alcoólicas
que, em sua grande maioria, exibem belíssimas mulheres desnudas, que protagonizam um
comercial inteiro sem qualquer diálogo, ou que utilizam um jargão de fácil compreensão. A
celebridade ao protagonizar um comercial traz consigo uma mensagem, a informação é
inerente à celebridade, devido ao ramo de atuação profissional, devido a ideologias ou
posições que defende.
A informação é muito além da comunicação verbal, ela é sensorial. Para se transmitir
uma mensagem, pensamento, ideia ou conceito não há necessidade de locução. A
comunicação é um mundo inteiro a ser explorado, não se restringindo necessariamente a
diálogos. Desta feita, uma celebridade vinculada direta ou indiretamente a um determinado
produto anunciante, por si só configura uma mensagem ou informação.114
Embora tudo configure como informação, há que se elucidar que nem toda informação
é atribuição da publicidade, visto que ela não tem o dever de prestar toda e qualquer
informação inerente ao produto ou serviço anunciando, como: composição, volume, efeitos
colaterais, pois as informações dessa natureza deverão estar descritas detalhadamente nas

114
Nesse sentido, explicita Dubois que: “Se as motivações e a personalidade de um indivíduo, analisadas
anteriormente, se concretizam por vezes na compra e consumo, não se deve concluir daí que as forças internas
do ser humano são suficientes para explicar o seu comportamento. A razão é simples: o que um consumidor
compra, depende, para além de suas necessidades mais profundas, dos produtos e serviços disponíveis no seu
meio envolvente e do modo como os percebe. O mecanismo perceptual rege as relações entre os indivíduos e o
mundo que o rodeia e todo o conhecimento necessariamente adquirido através da percepção.” Dubois, Bernard.
Compreender o consumidor. Tradução e revisão de Francisco Velez Roxo. Lisboa: Dom Quixote, 1998, p. 53.
55

embalagens como dispõe a lei da rotulagem ou poderão ser objeto de propaganda, mas não de
publicidade.
O fato de a publicidade não ter como objetivo primordial o dever de informar não a
desonera, contudo, de elaborar um anúncio probo e adequado que informe de maneira
fidedigna tendo como critério a veracidade da informação e não omitindo dado relevante do
produto ou serviço anunciado, que não possua conteúdo discriminatório de qualquer natureza
e que não incite a violência ou explore o medo ou a superstição, cumprindo assim com a boa-
fé objetiva e a função social da empresa.
Sant’anna, Júnior e Garcia dispõem que a publicidade é instrumento de veiculação de
oferta, cujo fito é informar o consumidor em massa sobre determinado produto ou serviço, a
fim de promover sua venda e auferir lucro:

Publicidade é uma técnica de comunicação de massa, paga, com a finalidade


precípua de fornecer informações, desenvolver atitudes e provocar ações
benéficas para os anunciantes. Ela serve para realizar as tarefas de
comunicação de massa com economia, velocidade e volume maiores que os
obtidos com quaisquer outros meios.115

Sanar a divergência elencada ou esgotar o tema, não é o objetivo do presente tópico,


contudo, é inegável que a dissonância ganha força tendo em vista que o próprio Código de
Defesa do Consumidor foi omisso ao utilizar o conceito publicidade sem designar-lhe
definição específica classificando-a, tão somente, como uma espécie de prática comercial e
quando comprovadamente abusiva, condenando-a às penalidades da lei. Desta feita,
imprescindível analisar a abordagem jurídica destinada à publicidade, o âmbito de atuação e
definição do mercado publicitário.
Para tanto, corrobora Dias explanando que a publicidade é o conjunto de atividades de
comunicação de massa que informa o consumidor sobre a existência de produtos e serviços
com o objetivo de fixar a marca ou promover estilos de vida, bem como e, sobretudo,
estimular sua aquisição.116
A finalidade primordial da publicidade é inquestionavelmente estimular o consumo de
determinado produto ou serviço, prestando, não só aos potenciais consumidores, mas à
sociedade como um todo, informações concernentes ao produto anunciado, evitando que seja
colocada em risco a incolumidade física ou psíquica do consumidor ou que ele venha a sofrer

115
SANT’ANNA, Armando; JÚNIOR, Ismael Rocha; GARCIA, Luiz Fernando Dabul. Propaganda: teoria,
técnica, prática. 8 ed. ver. ampl. São Paulo: Cengage Learning, 2009, p. 61.
116
DIAS, Lucia Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2010,
p. 35.
56

danos, para tanto, a legislação consumerista exige que a publicidade seja prestada de forma
clara, precisa, não abusiva e fidedigna.117
O Código de Defesa do Consumidor enfatiza e valoriza a comunicação na sociedade
de consumo, priorizando o dever de informar como meio de educar e prevenir danos futuros
aos consumidores. Zapata elucida que mais da metade dos artigos normativos inseridos na
legislação consumerista, sendo 44 de um total de 80 artigos, mencionam a expressão
informação.118
A legislação reitera a responsabilidade de todos os envolvidos no ciclo de criação,
circulação, divulgação e comercialização dos produtos e serviços, concedendo às agências
publicitárias, veículos de comunicação e vendedor um status de corresponsáveis pela
obediência e efetividade à boa-fé objetiva e a função social da empresa a fim de, com o
auxílio dos coobrigados, identificar com precisão a existência de eventual vício que ocasione
uma publicidade enganosa ou abusiva.
Com efeito, as peças publicitárias são expressões artísticas, que apresentam finalidade
essencialmente comercial. Conclui Carpena que “o objetivo comercial não macula o discurso
publicitário, pois constitui sem sombra de dúvida, expressão do pensamento e da criatividade
humana.”119
A publicidade goza de uma primordial característica econômica, pois, a comunicação
publicitária consubstancia-se como importante ferramenta para a dinâmica de mercado e para
a competição entre os agentes econômicos, nesse sentido dispõe Pasqualotto:

[...] exigiram da publicidade uma nova função: a de orientar o consumo,


estimulando necessidades e provocando demanda. Ela se transformou, ao
mesmo tempo, na alma do comércio e no principal instrumento das empresas
na luta concorrencial.120

Para além disso, a publicidade revela-se como um instrumento essencial para a


entrada, captação e manutenção de fatias de mercado consumidor pelas empresas. É através
da publicidade que os fornecedores buscam criar uma diferenciação de seus produtos e

117
CAMPOS, Maria Luiza de Saboia. Publicidade: responsabilidade civil perante o consumidor. São Paulo:
Cultura Paulista, 1996, p. 289.
118
ZAPATA, Julio Cesar. Em defesa dos direitos do consumidor. O Estado de São Paulo, São Paulo, 27 ago
1991, p. 64. Disponível em: <http://acervo.estadao.com.br/pagina/#!/19910827-35749-nac-0064-pai-4-not>.
Acesso em: 21 abr. 2016.
119
CARPENA, Heloísa. Prevenção de risco no controle da publicidade abusiva. Revista Direito do
Consumidor, vol. 35, São Paulo: Revistas dos Tribunais, jul-set, 2000, p. 126.
120
PASQUALOTTO, Adalberto. Os efeitos obrigacionais da publicidade no Código de Defesa do
Consumidor. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 1997, p. 28.
57

serviços em relação aos de seus concorrentes e, assim, influenciar a preferência e escolha dos
consumidores.121
Segundo Campos, vício de informação é aquele que induz o consumidor a comportar-
se de forma prejudicial à sua saúde ou segurança, ou ainda, aquele contido na mensagem que
potencialmente gera uma expectativa falsa sobre o desempenho do produto ou do serviço, ou
abusar de sua confiança, ofendendo-o ou aproveitando-se de sua inexperiência e
ingenuidade.122
Nesse sentido o Superior Tribunal de Justiça em sede de Recurso Especial explicita
que a propaganda enganosa ou viciada na informação cria uma circunstância em que há
aptidão a induzir em erro o consumidor fragilizado, pois a venda de produto medicinal
destinado à cura de doenças malignas, cujo consumidor é portador, caracteriza-se pela
hipótese de estado de perigo. Explicita que a vulnerabilidade informacional agravada ou
potencializada, ocasionou a hipervulnerabilidade do consumidor, derivada do manifesto
desequilíbrio entre as partes. 123
Constata-se que o anúncio proposto pela empresa vai muito além de induzir o
consumidor a erro, o que já configuraria a publicidade como enganosa e a informação nela
contida como viciada, pois realmente induziu o consumidor, que se encontra em uma
condição de vulnerabilidade, acima do habitual, tornando-o hipervulnerável, visto que é
portador de doença grave e encontra-se em estado de perigo, ao adquirir o produto com a
plena convicção que obteria por meio do medicamento a cura do câncer, incidindo em
indenização cível e dando ensejo ainda à sanção prevista no artigo 66 do Código de Defesa do
Consumidor.
O produto ou serviço viciado na informação é aquele que apresenta falha, tendo em
vista, a forma inadequada, imprópria, ludibriosa ou incompleta, com que foi comunicado ao
público no anúncio publicitário, quando coloca em risco ou causa dano à saúde ou à
segurança, ou ainda, quando o desempenho do produto apresenta-se diverso ou aquém da
expectativa legítima do consumidor.
Nesse sentido, entende a 1ª turma do Tribunal de Justiça do Distrito Federal ao
condenar por vício de informação e propaganda enganosa o fabricante/fornecedor

121
BENJAMIN, Antônio Hernan Vasconcelos. O controle jurídico da publicidade. Revista do Direito do
Consumidor. n. 09, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1994, p. 33.
122
Idem Ibidem, p. 291.
123
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. 3ª Turma. Recurso especial n.º 1329556 SP 2012/0124047-6.
Relator: Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva. Data de Julgamento: 25 nov 2014, Data de Publicação: DJe 09
dez 2014. Disponível em: < http://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/157527150/recurso-especial-resp-1329556-
sp-2012-0124047-6>. Acesso em: 28 mai. 2016.
58

independentemente de culpa, pelos danos causados ao consumidor por informações


insuficientes ou prestadas de forma incompleta no que tange à utilização de determinado
produto.124
Explicita Almeida que o direito dos consumidores à informação é um direito
instrumental, pois que constitui um meio, aliás, privilegiado, de fazer valer os direitos
substanciais à sua proteção física e econômica.125
Campos aponta que, embora não haja positivação normativa, a lógica para a análise do
vício de informação no anúncio publicitário deverá ser prudente:

Não há norma positivada que diga respeito à necessidade, forma e alcance da


informação para determinado produto. O critério adotado para se comprovar
a incidência do dever de informar é aquele que se baseia na relevância de
determinado elemento da informação no processo de escolha do consumidor,
consistente no conteúdo da publicidade, dação promocional, embalagens,
etiquetas, rótulos e manuais de instrução.126

Enfatiza Almeida que a prevalência do dever de informar em relação aos interesses


próprios da empresa, elencando que o dever de informação coloca-se acima de sua finalidade
lucrativa, dos seus projetos de expansão ou de aumento da sua produtividade. A informação a
ser dirigida ao consumidor deve ser completa e conforme os princípios de lealdade e
veracidade.127
Observa-se que tais princípios são específicos da publicidade. Observa-se que o
princípio da lealdade publicitária, disposto na Constituição da República no artigo 1º, inciso
IV, artigo 3º, inciso I e artigo 173, § 4º, como também, o princípio da veracidade, positivado
no artigo 37, § 1º do Código de Defesa do Consumidor, dizem respeito à proporcionalidade na
licitude da publicidade na medida em que, seja prestada de maneira clara, objetiva com
finalidade exclusiva de promover esclarecimento. Coelho encerra explicitando que a
veracidade: “diz respeito à adequação entre aquilo que se afirma sobre o produto ou serviço e
aquilo que ele realmente é”.128

124
BRASIL. Tribunal de Justiça do Distrito Federal. 1ª Turma Apelação Cível nº 1191116220078070001 DF.
Relator: Maria De Fátima Rafael De Aguiar Ramos, Data de Julgamento: 23 jun 09. Data de Publicação: 10 set
09. Disponível em: < http://tj-df.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/5437925/acao-ci-vel-do-juizado-especial-acj-
1191116220078070001-df-0119111-6220078070001> Acesso em: 30 jun. 2016.
125
ALMEIDA, Carlos Ferreira de. Os direitos dos consumidores. Coimbra: Livraria Almedina, 1982, p.180.
126
CAMPOS, Maria Luiza de Saboia. Publicidade: responsabilidade civil perante o consumidor. São Paulo:
Cultura Paulista, 1996, p. 291.
127
ALMEIDA, Carlos Ferreira de. Os direitos dos consumidores. Coimbra: Livraria Almedina, 1982, p. 182.
128
COELHO, Fábio Ulhoa. “Art. 28 ao 45. VVAA, Comentários ao código de proteção ao consumidor. São
Paulo: Saraiva, 1991, p. 151.
59

Quanto às atividades das empresas e ao dever de informar de forma fidedigna nos


anúncios publicitários Almeida assevera que:

[...] a falta ou incorreção de informação pode desencadear responsabilidade


pré-contratual; a noção de cumprimento defeituoso deverá ser equiparada à
de não-cumprimento sempre que a coisa ou os serviços prestados não
correspondam às características que são ou deverão ser enunciadas, de forma
a fazer funcionar os mecanismos de proteção do consumidor relativos à
responsabilidade pelo dato do produto e do serviço, pelo vício ou pelas
práticas comerciais.129

Calais-Auloy analisa que nas relações entre profissionais e consumidores na sociedade


de consumo, os primeiros provavelmente conhecem as características principais dos bens e
serviços que estão oferecendo, enquanto que os consumidores, na maioria das vezes, são
incapazes de julgar antecipadamente e comparar desempenhos entre os concorrentes.130
Com a finalidade de equiparar ou diminuir a diferença no volume e diversidade de
informação que estão de posse fabricante/fornecedor e consumidor, surge a necessidade de
subdividir o direito fundamental à informação em três aspectos, quais sejam: o direito de
informar; o direito de se informar e por fim, o direito de ser informado.
Explicita Nunes que o direito de informar refere-se à manifestação do pensamento, sob
qualquer forma, sendo livre a expressão da atividade independentemente de censura, tendo
como limite a inviolabilidade da intimidade, da honra e imagem das pessoas. Por sua vez, o
direito de se informar assegura a todos o acesso à informação, quer receber ou exigir a
informação, pois seu teor torna-se público, possuindo como limites o sigilo da fonte, ou
quando se trata de informação relativa à própria pessoa. Por fim, o direito de ser informado
nasce da obrigatoriedade que o fornecedor ou de outrem qualquer, tem de prestar informações
seja de pessoas físicas ou jurídicas de natureza privada.131
O direito à informação veio, a justo título, como um dos temas prioritários na política
de defesa do consumidor, pois a publicidade mesmo não sendo enganosa, tende a ser
tendenciosa, enaltece as qualidades e normalmente omite as desvantagens do produto ou
serviço, demonstrando não ser o melhor recurso de informação ideal para que o consumidor
se baseie a fim de tomar sua decisão de compra.

129
ALMEIDA, Carlos Ferreira de. Os direitos dos consumidores. Coimbra: Livraria Almedina, 1982, p. 182.
130
CALAIS-AULOY, Jean. Droit de la consommation. 3. ed. Paris, Dalloz, 1992, p. 33
131
NUNES, Luiz Antonio Rizzato. Comentários ao código de defesa do consumidor: Direito material arts. 1º
a 54. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 43.
60

O recurso de informação mais adequado e confiável é o dos profissionais que, por


simples interesse comercial próprio, são conduzidos a fornecer espontaneamente as
informações ao consumidor, apresentando mais detalhes e instruções de uso e não somente as
informações de praxe, relativas ao preço, condições de pagamento, ingredientes e indicações
de conservação.
Enfatiza-se, contudo, que essas informações não necessariamente precisam ser
transmitidas nos anúncios publicitários, no momento de promover o bem ou serviços, elas
podem, no entendo, ser prestadas ao consumidor no manual de instruções, rótulo, embalagens,
etiquetas ou até mesmo, em um anúncio de propaganda que tenha cunho informativo e não
comercial.
Explicita Franco que o consumidor por ter acesso instantâneo e imediato à informação
está se transformando em pessoa consciente de seus direitos e dotada de senso crítico.

Atualmente o consumidor está aprendendo a se fazer ouvir, e isso não é


utopia, pois já se traduz em realidade nos muitos departamentos de
atendimento ao consumidor abertos pelas empresas para com ele manter
diálogo próximo e intenso. O consumidor passa a interferir até na produção
de bens, sugerindo mudanças de embalagens de produtos para incrementar
sua praticidade, opinando sobre a adequação e desempenho e apontando para
a necessidade de novos lançamentos.132

Essa mudança de comportamento pôde ser notada em uma recente mobilização


ocorrida por meio nas redes sociais que, por meio de um movimento denominando
“#poenorotulo”133, exigiu a modificação dos rótulos e das embalagens, a fim de se fazer
constar a composição de produtos alergênicos. O movimento deixou como legado a já citada
Resolução nº 26/15 da ANVISA, que estabeleceu os requisitos para rotulagem obrigatória dos
principais alimentos que causam alergias alimentares.
O comportamento do consumidor, em resposta à dinâmica do próprio mercado de
consumo tem diuturnamente mudando, a prova é o crescente número de adeptos ao consumo
ético e sustentável. O consumidor tem buscado cada vez mais, adquirir produtos e serviços de

132
FRANCO, Célia de Gôuvea. Indústria ouve consumidor e muda produtos. Gazeta Mercantil. São Paulo:
Caderno de Administração e Negócios, 09 maio 94, p. 01.
133
O movimento Põe no Rótulo “#poenorotulo” foi criado em fevereiro de 2014 com o objetivo de conscientizar
a população não-alérgica para a necessidade da rotulagem destacada de alimentos reconhecidamente mais
alergênicos. Como resultado dessa mobilização, a ANVISA iniciou processo de discussão de projeto de
normatização da rotulagem de alérgenos em alimentos, tendo promovido uma consulta pública sobre o tema em
meados de 2014, que resultou em mais de 3500 manifestações apresentadas pela sociedade e em maio de 2015,
promoveu uma audiência pública que reuniu diversos interessados no tema: sociedade civil, representantes da
OAB, do Governo e da indústria de alimentos, para discutir a rotulagem de alergênicos. A proposta de
regulamentação foi aprovada pela Diretoria Colegiada da Anvisa e publicada no Diário Oficial em 3 de julho de
2015. Disponível em: <http://www.poenorotulo.com.br/>. Acesso em: 23 ago. 2016.
61

empresas que cumpram com a boa-fé objetiva e a função social da empresa e atuem de forma
a exibir uma postura mercantil que vá além daquela exigida pela positivação normativa.
Ocorre que, muito difícil seria positivar uma conduta repressiva ao
fabricante/fornecedor antiético. Em um despretensioso sentir, acredita-se que a maneira mais
eficaz de promover uma mudança de paradigma de todos os envolvidos na cadeia produtiva,
seria incentivar o consumo de produtos que veiculem publicidade ética norteada pelos
princípios da lealdade e veracidade e como medida fundamental, implementar a todos os
envolvidos na criação publicitária: agências publicitárias e publicitários, o princípio da boa-fé
objetiva e da função social da empresa como um padrão de conduta a gerir à produção
publicitária.

2.3 A FUNÇÃO SOCIAL DA EMPRESA COMO PRINCÍPIO FUNDAMENTAL NA


ORDEM CONSTITUCIONAL E DIRETRIZ NORMATIVA DA ATIVIDADE
EMPRESARIAL

A Constituição da República dispôs determinados princípios que necessariamente


orientam e direcionam o exercício da livre iniciativa, tais como: a livre concorrência, a
proteção dos empregados, a defesa do consumidor e do meio ambiente, a redução das
desigualdades sociais e o tratamento diferenciado à empresa de pequeno porte, por óbvio que
a função social da empresa relaciona-se com todos esses princípios.
Desta feita o presente tópico adotará uma postura crítica a cerca da (in)eficácia da
função social da empresa, expondo o entendimento de alguns doutrinadores estudiosos do
tema sem, contudo, sustentar qualquer pretensão de exauri-lo, cujo objetivo é averiguar a
viabilidade da implementação do princípio na criação, produção publicitária nacional.
Para tanto, inicia-se fazendo um apontamento sobre a transição do Estado Liberal para
o Estado Social e o fortalecimento da função social da empresa apresentando uma definição
sobre o conceito, demonstrando sua importância social e jurídica em tempos pós-modernos,
em razão da função social ser uma das matrizes do Estado Social que, embora ainda não seja
uma realidade perfeita em lugar nenhum do mundo, está em constante aprimoramento.
A transição do Estado Liberal para o chamado welfare state e a consequente crise do
Estado social abriu caminhos para um novo modelo de Estado de direito, que pudesse
encontrar na democracia a solução para administrar as tensões entre a liberdade e a igualdade,
62

afinal o Estado Liberal priorizava a liberdade sobre a igualdade, enquanto que o Estado Social
defendia a valorização da igualdade em detrimento da liberdade.134
Nesse contexto de Estado Liberal Dworking explicita que, a liberdade deve ser
interpretada no sentido lato sensu, pois o equívoco estaria na presunção de que o direito à
liberdade é mensurável. “Somente se a liberdade for definida de uma forma neutra é que se
pode suscitar a oposição entre a mesma e a igualdade, o que não ocorre quando a liberdade é
conceituada em função da igualdade”. É por meio da autonomia que a liberdade e a igualdade
são vistas em uma perspectiva de complementaridade e não de oposição, o que possibilita a
convivência entre os iguais direitos dos indivíduos que vivem em sociedade, transformando
essa coexistência em justiça social. 135
Inerente ao termo “liberalismo”, encontra-se um alto índice de polissemia, pois sua
formação e amadurecimento, enquanto doutrina econômica e ideologia social, deu-se ao longo
dos séculos XVII a XX. Esse período de alta ebulição social, política e econômica assistiu ao
surgimento do Estado Nação, à ascensão da burguesia, ao surgimento e predominância do
mercado como principal instituição política e econômica e à progressiva internacionalização
da economia e do comércio.136
O Estado Liberal possui como sistema econômico o liberalismo que defende
sobremaneira o livre comércio e a propriedade privada. O direito à propriedade seria um dos
dez pilares sobre liberdades econômicas, que fundamentam o liberalismo, dentre eles:
liberdade empresarial, liberdade de comércio, liberdade fiscal, tamanho do Estado, liberdade
monetária, liberdade de investimento, liberdade financeira, liberdade de governo e trabalho
livre, todos mensurados em pesos iguais. Defende-se a redução do poder político, sendo a
liberdade humana uma presunção universal. 137
O liberalismo objetiva a criação de um mercado autorregulado e imune a interferências
estatais de qualquer gênero. De tal modo que o direito à propriedade era tradicionalmente
absoluto, exclusivo e perpétuo. Absoluto, no sentido do poder garantido ao proprietário em
gozar e fruir de seu bem imóvel, da maneira que melhor entendesse. Exclusivo, por ter o
proprietário o poder de excluir terceiros da utilização da coisa, inclusive, o Estado, que não
poderia privar o proprietário de seu direito, exceto mediante indenização, quando expropriado

134
LOPES, Ana Frazão de Azevedo. Empresa e propriedade: função social e abuso do poder econômico. São
Paulo: Quartier Latin, 2006, p. 123.
135
DWORKIN, Ronald. Los Derechos en Serio. Tradução de Marta Guastavino. Barcelona: Editorial Ariel,
1999, p. 382-383.
136
POLANYI, Karl. A Grande Transformação: as origens de nossa época. Tradução de Fanny Wrobel. Rio de
Janeiro: Editora Campus Ltda. 1980, p. 163.
137
MELNIK, Stefan. Liberdade e propriedade. São Paulo: Instituto Friedrich Naumann, 2009, p. 13
63

e perpétuo, no sentido de que o direito somente se extingue pela vontade do titular ou em


virtude de lei, e não pelo mau uso ou inutilização.138
Em 1880, o espírito liberal vai ser fortemente abalado pela Primeira Guerra Mundial,
as críticas ao liberalismo centravam-se na percepção de que ele acabava por garantir à
burguesia um domínio quase total dos bens de produção e das riquezas em geral, ao mesmo
tempo em que deixava o proletariado com o mínimo necessário para uma subsistência ínfima,
momento em que já começa a existir uma forte tendência ao Estado do Bem-Estar, não sendo
mais possível falar em um Estado Liberal nos moldes descritos.139
A mudança da estrutura econômica foi acompanhada de perto por uma mudança nos
instrumentos jurídicos. Evidentemente que os antigos instrumentos jurídicos, a propriedade
individual e o contrato não mais serviam para lidar com as novas situações econômico-
sociais. Assim, a propriedade individual dos meios de produção dá lugar à sociedade por
ações e a liberdade contratual é limitada, principalmente no que toca ao contrato de
trabalho.140
A necessidade de regulação do Estado na economia e a tentativa de perpetuação do
modelo liberal ampliaram sua crise e deram margem a um momento de ruptura, dando
passagem a um modelo de Estado que intervém na ordem social e econômica, ocorrendo,
concomitantemente, o fortalecimento das organizações operárias, fundadas essencialmente no
consentimento democrático e no acordo de classes, de energias humanas, de colaboração
mútua e livre, elevando os direitos sociais à categoria de condicionante da plena participação
política dos vários segmentos da sociedade.141
Como consequência do clamor das massas e dos desafios econômicos surge, no século
XX, o Estado Social, aquele modelo de Estado historicamente determinado pelo fim da
Segunda Guerra Mundial, que se consolidou a fim de superar a imparcialidade e o formalismo
do Estado Liberal. O adjetivo social atribuído ao Estado refere-se “à correção do
individualismo clássico liberal pela afirmação dos chamados direitos sociais e realização de
objetivos de justiça social”142

138
SANTIAGO, Ribeiro Mariana. Princípio da função social do contrato. 2. ed. rev., ampl. e atual. Curitiba:
Juruá. 2008, p. 105.
139
LASKI, Harold Joseph. O liberalismo europeu. São Paulo: Mestre Jou, 1973, p. 172.
140
MORAES, Ricardo Quartim de. A evolução histórica do estado liberal ao estado democrático de direito e
sua relação com o constitucionalismo dirigente. Brasília: Senado Federal, Revista de Informação Legislativa,
ano 51, n. 204 out/dez, 2014, p. 275.
141
BONAVIDES, Paulo. Do estado liberal ao estado social. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 186.
142
SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 16. ed. São Paulo: Malheiros, 1999, p.
119.
64

Assim, o Estado deixa de ser apenas o poder soberano para tornar-se um dos principais
responsáveis pelo direito à vida, concretizado por meio dos direitos sociais. Com a execução
de políticas públicas, confia-se ao Estado o poder de decidir, em nome de todos, o que é o
bem de cada um, por meio dos direitos sociais. Isso só pode ocorrer efetivamente quando o
pressuposto do Estado Social é a democracia, afinal, somente nesse sistema político seria
plausível a coexistência dos direitos sociais e da atividade empresarial.
Inserida nesse contexto em que a extensão das funções da empresa passa a ser
exigência mínima do Direito, a Constituição da República Federativa do Brasil coroou o
processo de redemocratização da política brasileira, incorporando em seu bojo o elemento
social. Do ponto de vista simbólico, ela representou a superação de um modelo autoritário e
excludente de Estado e sociedade, além de selar um novo começo na trajetória político-social
do país, articulando direitos e liberdades individuais com os direitos sociais, de modo a
propiciar segurança jurídica com igualdade social.143
Com efeito, o equilíbrio entre a liberdade empresarial e o igual direito à liberdade dos
demais membros da sociedade é extremamente delicado e envolve a questão de justiça social.
Daí porque os princípios da função social da propriedade e da empresa podem ser
considerados como uma forma que a Constituição encontrou de condicionar o exercício da
atividade empresarial à justiça social sem ter que recorrer a nenhum compromisso
previamente determinado.144
O primeiro confronto entre o pensamento liberal e a tendência socializante da época
atual ocorreu em detrimento da propriedade, sendo pacífica, atualmente, a concepção de que a
propriedade é um direito limitado. Desse entendimento por si só já seria possível deduzir
a função social do contrato e da empresa, uma vez que se trata de institutos ligados à
circulação da propriedade. Tendo em vista que a empresa é instrumento legal para o exercício
de iniciativas econômicas, nada mais coerente do que reconhecer a função social da empresa,
já que a própria Constituição de 1988 estabelece que a livre iniciativa deve ter um valor
social.145
Inequívoco assim que a justiça social e atividade empresarial não se anulam, a
presença de uma não elimina a outra. A tarefa do jurista é priorizar valores a serem tutelados
pelo direito frente ao caso concreto, avaliando as características intrínsecas e extrínsecas de
143
SARMENTO, Daniel. Direitos fundamentais e relações privadas. 2 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juis, 2007,
p. 123.
144
LOPES, Ana Frazão de Azevedo. Empresa e propriedade: função social e abuso do poder econômico. São
Paulo: Quartier Latin, 2006, p. 199.
145
SANTIAGO, Mariana Ribeiro; CAMPELLO, Lívia Gaigher Bósio. Função social e solidária da empresa na
dinâmica da sociedade de consumo. Scientia Iuris, v. 20, 2016, p. 128.
65

casa situação que se lhe apresenta, de tal modo que, o princípio da função social da empresa
auxilia o aplicar do direito no sentido de tornar possível a convivência harmônica entre a
justiça social e a atividade empresarial, desde que, esta seja prestada de forma a garantir e
promover àquela.146
Explicita Tepedino que a Constituição da República de 1988 não é considerada como
o primeiro diploma legal a dispor sobre a função social, tendo-se em vista que o artigo 170 da
Carta Política de 1946, já estabelecia que o uso da propriedade seria condicionado ao bem-
estar social e a Emenda Constitucional de 1969, em seu artigo 160, inciso III, também
dispunha que a ordem econômica e social tinham por fim realizar o desenvolvimento nacional
e a justiça social, com base em princípios, dentre os quais o da função social da
propriedade.147
Em posicionamento divergente, Grau dispõe que é inquestionável o fato de que a
Constituição Federal é uma carta dirigente, tem-se que o conjunto de diretrizes, programas e
fins que enuncia a serem pelo Estado e pela sociedade realizados, confere a ela um caráter de
plano global normativo, do Estado e da sociedade. O seu artigo 170 prospera, evidentemente,
no sentido de implantar uma nova ordem econômica.148
A interpretação sistêmica deste dispositivo permite concluir que o exercício da
atividade econômica deve estar fundamentado na pessoa, ou seja, deve objetivar a garantia da
dignidade humana, para o alcance da justiça social. Ao eleger o valor social do trabalho como
fundamento da atividade econômica, pretende dignificar as condições de trabalho, ao efeito de
garantir a dignidade de toda a pessoa.149
No que concerne à função social da empresa, Lopes afirma que toda a construção
tecida acerca da função social do contrato e da propriedade se aplica integralmente à função
social da empresa que se constitui em um aspecto dinâmico do direito de propriedade. A
função social da empresa diz respeito às obrigações para com os empregados e consumidores
atividades que dizem respeito igualmente à sociedade, vez que geram diversas externalidades.
Frisa-se, por fim, que todos esses princípios estão conectados à função social da empresa,

146
CAMPOS, Maria Luiza de Saboia. Publicidade: responsabilidade civil perante o consumidor. São Paulo:
Cultura Paulista, 1996, p. 141.
147
TEPEDINO, Gustavo. Temas de direito civil. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 306.
148
GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988: interpretação e crítica. 5. ed. São
Paulo: Malheiros, 2000, p. 153.
149
FALLER. Maria Helena Ferreira Fonseca. Função social da empresa & economia de comunhão: um
encontro à luz da constituição. Curitiba: Editora Juruá, 2013, p. 87.
66

ampliando os interesses que devem ser protegidos e atendidos por meio da atividade
empresarial.150
Dispõe Naspolini e Curi que não há na Constituição, previsão expressa de que as
empresas devam ter qualquer função social, tendo em vista que a única previsão existente
sobre o assunto no corpo da Constituição da República, o artigo 173, §1º, inciso I, diz respeito
à necessidade de a lei que instituir os estatutos das empresas públicas e das sociedades de
economia mista, dispor sobre a função social que estas instituições devam exercer.151
Salomão Filho aponta que no Brasil a ideia de função social da empresa também
deriva da previsão constitucional sobre a função social da propriedade. Estendida à empresa, a
ideia de função social é talvez uma das noções de mais relevante influência prática e
legislativa no direito brasileiro.152
Nesse aspecto, o Direito Civil dispõe a função social dos contratos, da propriedade e
extensivamente da empresa, estabelecidas como princípios fundamentais do Estado
Democrático de Direito no texto constitucional, evidencia a imprescindibilidade em ampliar a
todo o ordenamento jurídico fundamentos como a cidadania, soberania e a dignidade da
pessoa humana.
Os denominados direitos não patrimoniais elencados no caput e incisos do artigo 5º da
Constituição da República tais como: direitos sociais, intimidade, honra, imagem, e,
sobretudo, a dignidade da pessoa humana, são pilares do Estado Democrático de Direito, pois
consideram cada cidadão como indivíduo autônomo que possui plena liberdade para realizar o
seu projeto de vida, desde que não vedado por lei ou incompatível com o igual direito dos
demais indivíduos da sociedade.
A atual e crescente preocupação com a difusão dos dispositivos constitucionais
decorre em grande parte da intensidade com que os problemas econômicos passaram a definir
os valores da vida e se impuseram tanto ao cidadão como à sociedade encarnada na figura do
Estado moderno, que em nome de uma compreensão equivocada de desenvolvimento realiza
cotidianamente a suspensão de direitos fundamentais como saúde, informação, cultura,

150
LOPES, Ana Frazão de Azevedo. Empresa e propriedade: função social e abuso do poder econômico. São
Paulo: Quartier Latin, 2006, p. 123 e 198.
151
NASPOLINI SANCHES, Samyra. H D. F; CURI, Fábio Martins Bonilha. Direitos Fundamentais e os
Limites da publicidade dirigida ao público infantil em face da função focial da empresa. Prim@ Facie, v.
14, 2015, p. 12
152
SALOMÃO FILHO, Calixto; COMPARATO, Fábio Konder. O poder de controle na sociedade anônima.
Forense: Rio de Janeiro, 2005, p. 133.
67

provocando uma verdadeira desestrutura social, política e econômica. Tudo em nome do


mercado fundamentado sobre as falácias da economia crescimentista.153
Um país como o Brasil, onde a pobreza e a miséria impedem parte substancial da
sociedade de ter o legítimo direito à autonomia, a função social da empresa implica
necessariamente a existência de um padrão mínimo de distribuição da riqueza e dos benefícios
da atividade econômica, aspecto que vem sendo reconhecido pela doutrina e jurisprudência.154
No que se refere à doutrina, Abreu aponta que atualmente são sobremaneira as ideias
de relações sociais mais justas, de igualdade real, de aumento e distribuição mais equitativa da
riqueza socialmente útil que consubstanciam a função social da empresa.155
No que concerne à jurisprudência, o Supremo Tribunal Federal na ADI nº 319,
empossou entendimento de que a livre iniciativa não será legítima enquanto exercida com
objetivo unicamente de lucro e realização individual do empresário, mas somente será no
momento em que propiciar a justiça social em seu aspecto distributivo.
Elenca o tribunal superior que, embora a livre iniciativa seja um dos fundamentos da
ordem econômica, ressalta-se que visa assegurar a todos a existência digna, em conformidade
com os ditames da justiça social, observando-se os princípios enumerados nos sete incisos do
artigo 170. E sendo a justiça social uma justiça distributiva em casos de incompatibilidade
entre alguns deles, mister se faz, evidentemente, que se lhes dê sentido relativo para que se
possibilite a sua conciliação a fim de que, em conformidade com a justiça distributiva, se
assegure a todos os elementos de produção e distribuição de bens e serviços, promovendo
existência digna.156
Incontroverso que dispende ainda de esforços, a fim de se estabelecer parâmetros de
justiça social tanto dos empresários, como também aos gestores empresariais, nesse sentido
Lopes explicita que:

Se já é difícil exigir o cumprimento da dimensão ativa da função social


diretamente dos empresários, mais complexo ainda é exigi-lo diretamente dos

153
SOUZA, Washington Peluso Albino de. Teoria da Constituição Econômica. Belo Horizonte: Del Rey,
2002, p. 182.
154
LOPES, Ana Frazão de Azevedo. Empresa e propriedade: função social e abuso do poder econômico. São
Paulo: Quartier Latin, 2006, p. 200.
155
ABREU, Jorge Manuel Coutinho de. Do abuso de direito. Ensaio de um critério em direito civil e nas
deliberações sociais. Coimbra: Almedina, 2006, p. 33.
156
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº ADI-QO 319. Rel. Min.
Moreira Alves. Disponível em: <http://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/14708060/questao-de-ordem-na-acao-
direta-de-inconstitucionalidade-adi-319-df> Acesso em: 02 jul. 16.
68

gestores, mediante a responsabilidade pessoal destes, em hipóteses nas quais


não há nem mesmo a prévia identificação das obrigações pelo legislador.157

Embora haja inúmeras normas positivadas no sentido de exigir uma postura


condizente com a função social da empresa, tais como, o artigo 1º, artigo 170 e artigo 5º da
Constituição da República, como também os artigos 421 e 1228 do Código Civil, espera-se
que o gestor, no desenvolver de suas atividades, atue em consonância com o princípio da
eticidade. Ocorre que o princípio refere-se a uma cláusula geral, tornando-se necessária uma
interpretação normativa sistêmica. Nesse sentido, a teoria da constitucionalização do direito
privado propiciará uma melhor compreensão de suas definições a fim de limitar e condicionar
o poder de controle e de administração empresarial ao cumprimento da função social da
empresa, sem, contudo, estabelecer nenhum dever determinado.
Binembojm explicita que a constitucionalização do direito privado significa uma
leitura, interpretação e aplicação infraconstitucional à luz do texto constitucional, “[...] trata-
se de uma teoria que deverá guiar o intérprete no equacionamento de qualquer questão
jurídica”. É uma concepção que implica a releitura dos conceitos e disciplinas, a partir da
perspectiva constitucional.158
Nesse sentido, Jayme defende que a constitucionalização do direito privado é mais do
que uma tendência, trata-se de um imperativo visto que, a civilização pós-moderna é
caracterizada por um pluralismo de estilos e valores desconhecidos e por isso, marcada por
um direito com fontes legislativas múltiplas, ressurgindo a necessidade de coordenação entre
leis no mesmo ordenamento, como exigência para um sistema jurídico eficiente e justo.159
Ao encontro do respeitável posicionamento elencando, Tepedino defende que o
caminho mais acertado, a fim de que se alcance a plena efetividade normativa, seria uma
constitucionalização do Direito Civil ao elucidar que:

Diante do novo texto constitucional, forçoso parece ser para o intérprete


redesenhar o tecido do direito civil à luz da nova Constituição. De modo
que, reconhecendo embora a existências dos mencionados universos
157
LOPES, Ana Frazão de Azevedo. Empresa e propriedade: função social e abuso do poder econômico. São
Paulo: Quartier Latin, 2006, p. 203.
158
BINEMBOJM, Gustavo. Uma teoria do direito administrativo: direitos fundamentais, democracia e
constitucionalismo. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 65
159
La civilisation posmoderne est caractérisée par un pluralisme de styles et de valeurs inconnu autrefois. L’Age
des lumières avance l’idée de la tolerance envers lês autres, amis ce terme présupposait la conviction en la
supériorité de sés propes valeurs. Aujord’ hui l’ on a vu émerger – comme l’ a dit M.René - Jean Dupuy – le
droit à la diference. Son apparition est le signe d’une transformation radicale dans la perception de l’
humanité. Ce sont les droits socioculturels qui sont élevés au rang de droits de l homme. Jayme, Erik. Identité
culturelle et intégration: Lê droit international Privé Posmodern .Recueil de cours, tomo 251:Martinus Nijhoff
Publishers, 1995, p. 251.
69

legislativos setoriais, é de se buscar a unidade do sistema, deslocando para


a tábua axiológica da Constituição da República o pondo de referência
antes localizado no Código Civil. [...] Trata-se, em uma palavra, de
estabelecer novos parâmetros para a definição de ordem pública, relendo o
Direito Civil à luz da Constituição, de maneira a privilegiar, insista-se
ainda uma vez, os valores não-patrimoniais [SIC] e, em particular, a
dignidade da pessoa humana, o desenvolvimento de sua personalidade, os
direitos sociais e a justiça distributiva, para cujo atendimento deve se voltar
a iniciativa econômica privada e as situações jurídicas patrimoniais.160

Explicita Barroso que a constitucionalização do Direito consiste no efeito expansivo


das normas constitucionais, cujo conteúdo material se irradia, com força normativa por todo o
sistema jurídico. Dispõe que os valores, os fins públicos e os comportamentos contemplados
nos princípios e regras da Constituição passam a condicionar a validade e o sentido de todas
as normas do direito infraconstitucional, que vinculam os poderes tradicionalmente
constituídos, bem como os particulares, nas suas relações interprivadas.161
O desapontar da função social da empresa como um dos princípios da atividade
econômica objetiva reforçar o conjunto de garantias constitucionais que visam um
crescimento empresarial ético, bem como, a construção de uma sociedade que permita o
desenvolvimento pleno da pessoa, em todas as esferas de sua vida.162
Ao discorrer sobre a questão da ética empresarial, Nalini entende que a sofisticação do
mercado e o esclarecimento do consumidor permitem que se diferencie a escala valorativa do
produto e do fornecedor, elencando que não basta à empresa se autodenominar ética se
reincide em práticas lesivas demonstrando ser tal conduta, puro marketing. Verdade,
franqueza, transparência, são valores de que nem as pessoas, nem as entidades formadas para
os mais distintos objetivos podem se descuidar.163
O legislador com a devida cautela que geralmente lhe é peculiar, já agiu nesse sentido
ao positivar e distribuir a responsabilidade sobre a publicidade enganosa e abusiva entre todos
os envolvidos na cadeia produtiva e os sujeitos publicitários, fomentando, dessa maneira, o
dever de lealdade e confiança mútua entre as partes. Estabelecendo assim, um parâmetro de

160
TEPEDINO, Gustavo. Temas de direito civil. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 13.
161
BARROSO, Luís Roberto. Neoconstitucionalismo e constitucionalização do Direito. O triunfo tardio do
direito constitucional no Brasil. In: SARMENTO, Daniel Antonio de Moraes (Org.); SOUZA NETO, Cláudio
Pereira (Org.). A Constitucionalização do Direito: fundamentos teóricos e aplicações específicas. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2007, p. 217.
162
FALLER, Maria Helena Ferreira Fonseca. Função social da empresa & economia de comunhão: um
encontro à luz da constituição. Curitiba: Editora Juruá, 2013, p. 93.
163
NALINI, José Renato. Sustentabilidade e ética empresarial. In: SILVEIRA, Oliveira da;
MEZZAROBA, Orides (Coord.). Justiça, empresa e sustentabilidade. Vol. 2. Empresa, sustentabilidade
funcionalização do direito. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011, p. 121.
70

conduta ético-moral que deveria reger os contratos, a função social da empresa, a fim de que
se alcance o dever de transparência na condução de todos e quaisquer negócios jurídicos.164
Ocorre que enfrentar a problemática da publicidade e seus efeitos na sociedade de
consumo, somente por meio de imposição legal consubstanciada na função social da empresa,
não tem surtido efeito tampouco, demonstrado a efetividade que propõe a legislação.
Esclarecer que não se está aqui menosprezando os consideráveis resultados já obtidos, mas
ocorre que, igualmente, não se pode enfrentar a discussão com um otimismo “Polianico” e
simplesmente considerar que os resultados conquistados já atingiram o patamar esperado e
exigido para que se alcance justiça social.
Também não há que se falar em tão somente arbitrar responsabilidade a um
determinado sujeito, seja fabricante-fornecedor ou qualquer outro membro da cadeia
produtiva ou agência publicitária. Para além de indicar um culpado, trata-se de uma atuação
conjunta entre todos os entes envolvidos direta ou indiretamente na comunicação publicitária.
Nesse sentido, sabiamente explicita Kosovski que a responsabilidade para com a sociedade
inclui o respeito e a ética para com os cidadãos. A responsabilidade não pode ser delegada,
delega-se autoridade – a responsabilidade é compartilhada.165
Um caminho plausível para que se alcance resultados efetivos a médio e curto prazo
seria implementar a ética na comunicação através do princípio da boa-fé objetiva, distribuindo
a responsabilidade ética entre todos os envolvidos na realização da comunicação como forma
de enfrentamento à publicidade lesiva e provável solução para relações e sociedade de
consumo.

164
O dever de informação encontra-se no Código de Defesa do Consumidor no artigo 6º, inciso III que dispõe
que: São direitos básicos do consumidor: [...] a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e
serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e
preço, bem como sobre os riscos que apresentem. Parte da doutrina entende que o inciso IV do mesmo artigo
menciona expressamente o dever de lealdade ao dispor sobre a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva,
métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no
fornecimento de produtos e serviços. Já no Código Civil nos artigos 421 e 422 é evidente o dever de lealdade e
confiança recíprocas entre as partes contratantes, respeitando-se a função social dos contratos, sobretudo como
princípio fundamental do Estado Democrático de Direito, esculpido no artigo 5º, inciso XXIII da Constituição de
República de 1988, ao dispor que a propriedade atenderá sua função social. Nesse sentido, Maria Helena Diniz
afirma que o art. 421 do Código Civil de 2002 “é mero corolário do princípio constitucional da função social da
propriedade e da justiça, norteador da ordem econômica”. DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil
brasileiro: teoria geral das obrigações. v. 2. 19. ed. ver. aum. e atual. de acordo com o novo Código Civil, São
Paulo: Saraiva. 2004, p. 36.
165
KOSOVSKI, Ester. Ética, imprensa e responsabilidade social in Ética na Comunicação. KOSOVSKI, Ester
(org.). 4 ed. Rio de Janeiro: Mauad, 2008, p. 27.
71

2.4 PERSPECTIVAS SOBRE A APLICAÇÃO DA BOA-FÉ OBJETIVA COMO FORMA


DE OBJEÇÃO E ENFRENTAMENTO À PUBLICIDADE LESIVA

O presente tópico tem por escopo elucidar que por meio da função social da empresa
seria possível lançar uma tentativa de garantir melhor proteção à sociedade, no que tange ao
equilíbrio econômico e social, promovendo um controle mais eficaz sobre a publicidade.
Passa-se a repensar uma análise vindoura do plano publicitário em tempos pós-modernos,
apontando como perspectiva para a problemática publicitária o princípio da boa-fé objetiva e
da função social da empresa como um possível caminho para o enfrentamento da publicidade
enganosa e abusiva.
Importante esclarecer, preliminarmente, que a proposta de implementação da boa-fé
objetiva se restringirá ao âmbito empresarial e, em especial, sobre as agências publicitárias.
Primeiramente, por serem parte envolvida, produtora e responsável na relação de consumo e,
a posteriori, por estarem na condição de prestadoras de serviço e assim, responderem objetiva
e solidariamente pela criação publicitária.
Como já elucidado, o princípio da boa-fé surgiu primeiramente como norma de direito
no artigo 131 do Código Comercial de 1.850, tendo, em um segundo momento, previsão
expressa no Código de Defesa do Consumidor. Aponta parte da doutrina que à época da
vigência do referido Código, não se havia efetividade na aplicação da norma, justificando-se
que a realidade fático-normativa daquele momento não permitia a utilização deste preceito
nas relações de consumo ou atém mesmo nas relações comerciais.166
Theodoro Júnior aponta que a boa-fé objetiva, cláusula geral prevista no artigo 422 do
Código Civil, está intimamente ligada aos princípios da solidariedade e eticididade, invocando
assim, uma conduta ética de todos os contratantes.167
Explicita Rosenvald que o princípio da boa-fé objetiva apresenta-se como um padrão
de conduta jurídica a ser estabelecido:

166
Segue o teor do artigo no revogado Código Comercial: Art. 131 - Sendo necessário interpretar as cláusulas do
contrato, a interpretação, além das regras sobreditas, será regulada sobre as seguintes bases:
1 - a inteligência simples e adequada, que for mais conforme à boa fé, e ao verdadeiro espírito e natureza do
contrato, deverá sempre prevalecer à rigorosa e restrita significação das palavras; 2 - as cláusulas duvidosas
serão entendidas pelas que o não forem, e que as partes tiverem admitido; e as antecedentes e subseqüentes, que
estiverem em harmonia, explicarão as ambíguas; 3 - o fato dos contraentes posterior ao contrato, que tiver
relação com o objeto principal, será a melhor explicação da vontade que as partes tiverem no ato da celebração
do mesmo contrato; 4 - o uso e prática geralmente observada no comércio nos casos da mesma natureza, e
especialmente o costume do lugar onde o contrato deva ter execução, prevalecerá a qualquer inteligência em
contrário que se pretenda dar às palavras; 5 - nos casos duvidosos, que não possam resolver-se segundo as bases
estabelecidas, decidir-se-á em favor do devedor.
167
THEODORO JÚNIOR, Humberto. O contrato e sua função social. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 20.
72

Compreende o princípio da boa-fé como um modelo de conduta social,


verdadeiro standard jurídico ou regra de conduta, caracterizado por uma
atuação de acordo com determinados padrões sociais de lisura, honestidade e
correção de modo a não frustrar a legítima confiança da outra parte. [...] Esse
dado distintivo é crucial: a boa-fé objetiva é examinada externamente, vale
dizer que a aferição se dirige à correção da conduta do indivíduo, pouco
importando a sua convicção. De fato, o princípio da boa-fé encontra a sua
justificação no interesse coletivo de que as pessoas pautem seu agir pela
cooperação e lealdade, incentivando-se o sentimento de justiça social, com
repressão a todas as condutas que importem em desvio aos sedimentados
parâmetros de honestidade e retidão. Por isso, a boa-fé objetiva é fonte de
obrigações, impondo comportamentos aos contratantes, segundo as regras de
correção, na conformidade do agir do homem comum daquele meio
social.168.

Boa-fé objetiva, segundo Tartuce, é um princípio de ordem pública que traz a


inoponibilidade do ato simulado frente a terceiros de boa-fé. Aponta que conjuntamente com
a função social da empresa, a boa-fé objetiva busca valorizar a conduta de lealdade dos
contratantes em todas as fases contratuais e que em caso de dúvida, os negócios jurídicos
devem ser pautados e interpretados sempre, conforme a boa-fé. Assinala que essa
interpretação é extensiva ao consumidor, como exposto no artigo 47 do Código de Defesa do
Consumidor e do aderente artigo 423 do Código Civil. A boa-fé objetiva está relacionada com
deveres anexos, inerentes a qualquer negócio, logo a quebra desses deveres caracteriza o
abuso de direito artigo 187 Código Civil.169
Agregando à temática, Santiago explicita que o princípio da boa-fé objetiva, disposto
no artigo 422 do Código Civil, ao fazer uso de uma cláusula geral, torna evidente que não há
contornos precisos e rigorosos para o instituto. Elenca que a consequência da adoção de tal
técnica, devido a sua elasticidade, implica que não existem soluções imediatas para a questão,
mas apenas linhas gerais de orientação, deixando ao critério do aplicador no caso concreto,
definir a sanção para o descumprimento do preceito.170
Nesse sentido, aponta Martins-Costa que:

[...] estão subjacentes as idéias e ideais que animaram a boa-fé germânica: a


boa-fé como regra de conduta fundada na honestidade, na retidão, na
lealdade e, principalmente, na consideração para com o ‘alter’, visto como
um membro do conjunto social que é juridicamente tutelado. Aí se insere a

168
ROSENVALD, Nelson. Código civil comentado: doutrina e jurisprudência. In: PELUSO, Cezar (Coord.). 3.
ed. Barueri, São Paulo: Manole, 2009, p. 458.
169
TARTUCE, Flávio. A função social dos contratos, a boa-fé objetiva e as recentes súmulas do superior
tribunal de justiça. In: Revista científica da Escola Paulista de Direito (EPD – São Paulo). Coord. Giselda
Maria Fernandes Novaes Hironaka. Ano I. N. I. Maio/Agosto de 2005.
170
SANTIAGO, Ribeiro Mariana. Princípio da função social do contrato. 2. ed. rev., ampl. e atual. Curitiba:
Juruá. 2008, p. 104/105.
73

consideração para com as expectativas legitimamente geradas, pela própria


conduta, nos demais membros da comunidade, especialmente no outro pólo
da relação obrigacional.171

A lei da publicidade, no que tange à boa-fé objetiva, varia de maneira significativa de


pais para país, mesmo assim, em âmbito internacional preocupa-se em equilibrar interesses
diferentes e, muitas vezes, conflitantes, no sentido de manter a liberdade de expressão e
abordagem desejada pelo anunciante e de outro lado, proteger o potencial cliente e público
alvo. Marshall dispõe que esse equilíbrio deverá ocorrer prevalecendo o bom senso, a boa-fé e
a verdade nos anúncios publicitários: “tanto o mensageiro como a mensagem, devem gozar de
um considerável grau de amplitude latidude para as iniciativas.”172
Para tanto, em 1962 foi criado o Advertising Standards Authotiry – ASA, que é o
órgão responsável por garantir que todos os anúncios publicitários estejam em consonância
com o código e sejam legais, decentes, honestos e verdadeiros. Ele investiga as reclamações e
podem exigir que os anunciantes retirem de circulação ou mudem seus anúncios ou
promoções a fim de se adequarem aos padrões mínimos exigidos pela legislação no Reino
Unido.173
O sistema jurídico nacional concernente à publicidade não apresenta uma norma
positivada especificamente com o fito de propor um possível controle publicitário, não com o
fim de desestimular o consumo, tendo em vista que tal medida seria proporcionalmente
inversa ao que dispõe o artigo 170 da Constituição Federal, mas com o objetivo de promover
publicidade com lisura, ética e boa-fé.
Acredita-se, contudo, que a problemática da produção publicitária abusiva e enganosa
não se dá exclusivamente pela ausência de positivação normativa, mas sim pela falta de
efetividade da legislação existente, pois mesmo não havendo positivação específica, se caso
efetivamente implementados o princípio da boa-fé objetiva e o da função social da empresa,
analisados em uma interpretação sistemática, como forma de limite à produção publicitária
nacional, seriam suficientes no sentido de sanar ou pelo menos coibir a publicidade enganosa,
abusiva, na esfera publicitária, e, na propaganda, o vício de informação.
O consumidor munido de informação e mediante uma publicidade transparente terá
autonomia, inclusive cognitiva, de consumir desempenhando um papel proativo, não mais se

171
MARTINS-COSTA, Judith. A boa-fé no direito privado. Sistema e tópica no processo obrigacional. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 412.
172
Marshall, Caroline. Tudo sobre publicidade. Tradução de Saulo Krieger e Lúcia Helena F. Sant’Agostino.
São Paulo: Nobel, 2002, p. 30-32.
173
ASA - Advertising Standards Authotiry, the UK’s independente regulator for advertising across all media.
Diponível em: <https://www.asa.org.uk/>. Acesso em: 17 jul 2016.
74

tornando vítima de um sistema de poder publicitário consumista. Verifica-se, contudo, a


presença do princípio da boa-fé no Código de Defesa do Consumidor, inserido especialmente
no direito à informação, previsto no inciso III do artigo 6º. Nesse sentido, elucida Negreiros
que “o mais típico dever acessório derivado do princípio da boa-fé é o dever de informar”.
Desta feita, mesmo que as agências publicitárias não participem diretamente da relação de
consumo, estabelecida entre fornecedor e consumidor, é por meio dela que este tem acesso ao
produto ou serviço que estão à disposição e assim, não só a obrigação principal é objeto de
tutela, mas sim o interesse de toda a coletividade em adquirir produtos ou serviços prestados
de maneira a cumprir com o princípio da boa-fé objetiva.174
A publicidade como técnica de comunicação persuasiva propicia ou gera um discurso
coletivo, pois além de informar, uma de suas finalidades é expor o produto ou serviço do
anunciante à venda, não se preocupando inicialmente em promover essa publicidade em
consonância com a boa-fé objetiva ou a função social da empresa, induzindo desta feita o
consumidor à aquisição exagerada de produtos e serviços de consumo, o que gera reflexos
negativos a toda a sociedade.
Torna-se imperioso repensar a consciência social e transparências nas relações
negocias principalmente em uma sociedade de consumo inserida no contexto pós-moderno
tendo em vista a ilimitada aquisição de produtos e serviços que demonstram, por vezes, serem
absolutamente dispensáveis. Irrefutável que o modelo econômico capitalista ainda demonstra
ser, o mais viável e adequado à sociedade pós-moderna. Incontroverso também, que o
capitalismo é uma das principais molas propulsoras do consumismo e desta feita, fonte da
problemática oriunda das relações de consumo.175
Como levantado no decorrer do trabalho, a publicidade gera um discurso coletivo e
persuasivo, ela é o principal instrumento que coloca o consumidor em contato direito com o
produto ou serviço ofertado. É através da publicidade que o consumidor passará a enxergar o
produto, assim para que se projete uma mudança de paradigma no que tange ao consumismo,
imprescindível repensar uma nova forma de abordagem publicitária, por meio de uma
consciência também coletiva, no âmbito social e empresarial.
Essa consciência deve atingir a todos os envolvidos na cadeia produtiva e publicitária
fornecedor/fabricante, agentes publicitários e veículos de comunicação que conjuntamente
passem a produzir e veicular conteúdo publicitário claro e objetivo, prestando informações

174
NEGREIROS, Teresa. Fundamentos para uma interpretação constitucional do princípio da boa-fé. Rio
de Janeiro: Renovar, 1998, p. 48/49.
175
MONTIBELLER-FILHO, Gilberto. O mito do desenvolvimento sustentável: meio ambiente e custos
sociais no moderno sistema produtor de mercadorias. 3. ed. Florianópolis: UFSC, 2008, p. 4.
75

fidedignas aos consumidores. Demostrando que, somente por meio da boa-fé objetiva e da
função social da empresa, estabelecidas como limites à produção publicitária, ocorrerá uma
mudança de paradigma, a fim de propiciar uma proteção maior ao consumidor e às relações
de consumo, estimulando e promovendo um desenvolvimento econômico e social.
Embora haja positivação normativa suficiente, a fim de implementar a boa-fé objetiva
e a função social da empresa no momento de criar o anúncio publicitário, como a proposta
promove uma nova releitura da produção publicitária, que por décadas vislumbrou
unicamente o lucro, essa perspectiva provavelmente ocorrerá de maneira paulatina e tímida.
Desta feita, até que tais princípios sejam efetivamente implementados, torna-se
imprescindível tutelar o consumidor, logo, quando a publicidade for comprovadamente
enganosa ou abusiva, será dever das empresas indenizar o consumidor pelos danos causados,
recorrendo para tanto, ao instituto da responsabilidade civil.
76
77

3 A RESPONSABILIDADE CIVIL DA EMPRESA NA PUBLICIDADE

Abordada a problemática que envolve o cenário publicitário nacional, observa-se que


mesmo havendo inúmeras normas que regulamentam e propiciam um maior controle na
produção publicitária por vezes e, não raras, ocorre o descumprimento desses preceitos legais,
ocasionado publicidade enganosa e abusiva. Desta feita, torna-se necessário realizar uma
análise das situações em que houver descumprimento da legislação, dando ensejo à
responsabilidade civil da empresa e seu dever de indenizar.
Em virtude da temática escolhida para a pesquisa, a responsabilidade civil será
abordada com enfoque especialmente publicitário, visto que, por imposição legal, a
responsabilidade do fabricante/fornecedor na criação publicitária é objetiva. Abordar-se-á em
quais casos a responsabilidade civil poderá ser solidariamente distribuída entres os demais
sujeitos publicitários: agência publicitária ou veículos de comunicação, que responderão
subjetivamente pela veiculação de publicidade enganosa ou abusiva, analisando-se, para tanto,
se sua conduta foi dolosa ou culposa para só, então, arbitrar o quantum indenizatório.
Para tanto, torna-se imprescindível analisar questões preliminares que circundam o
tema da responsabilidade civil, como a genealogia do conceito, sua definição; os elementos
que a compõe, sua aplicação no direito comparado, especificamente no Direito Romano,
Francês e Português e direito pátrio e as transformações que o instituto sofreu ao longo dos
anos. Abordar-se-á ainda a responsabilidade objetiva da empresa e seu dever de indenizar e,
por fim, qual espécie de responsabilidade a serem arbitradas às empresas
fabricante/fornecedora, aos envolvidos na cadeia produtiva, bem como aos sujeitos
publicitários: às agências publicitárias e aos veículos de comunicação que descumpram com
os deveres de informação, transparência e lealdade, motivando a publicidade enganosa e
abusiva.

3.1. RESPONSABILIDADE CIVIL: QUESTÕES PRELIMINARES

O léxico responsabilidade tem sua origem no latim spondeo, pelo qual se vinculava o
devedor, solenemente, nos contratos verbais do direito romano. Utilizar-se-á a acepção de
responsabilidade em seu aspecto puramente social, afinal toda e qualquer atividade que
78

acarrete prejuízo traz consigo um fato social, uma atividade humana. A responsabilidade
exprime a ideia de restauração de equilíbrio, de contraprestação de reparação de dano.176
Guimarães apresenta uma definição sobre a distinção existente entre responsabilidade
e seu aspecto civil, elencando que:

Responsabilidade – dever jurídico a todos impostos de responder por ação ou


omissão imputável que signifique lesão a direito de outrem protegido por lei.
Civil: obrigação imposta a uma pessoa de ressarcir os danos que causou a
alguém. Pode ser contratual, se prevista em contrato, regendo-se pelos
princípios gerais do contrato; e extra-contratual [sic], também denominada
“aquiliana” que se baseia, em princípio, na culpa. Refere-se “àquele que, por
ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito ou
causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano”.177

A noção jurídica de responsabilidade pressupõe a atividade danosa de alguém que,


atuando a priori ilicitamente, viola uma norma jurídica preexistente, independente se legal ou
contratual, subordinando-se, dessa forma, às consequências de seu ato.178
De tal modo que o significado da palavra responsabilidade remete à ideia de segurança
ou garantia da restituição ou compensação do bem sacrificado. Possui, assim, a acepção de
recomposição, de obrigação de restituir ou ressarcir.179
A definição do conceito reponsabilidade civil em sentido estrito dispõe que todo
aquele que causar dano a outrem tem o dever de indenizar. Mas para elucidar sobre tal dever,
imprescindível abordar a evolução histórica que sofreu essa definição, pois o conceito, por
vezes, possui caráter subjetivo e diverge entre sociedades e períodos históricos.
Quanto à origem da responsabilidade civil, nota-se que as espécies de reparação por
danos causados a um indivíduo inserido em determinada sociedade vêm, ao longo dos
séculos, demandando adequações no sentido de que, em virtude da realidade de cada época, a
responsabilidade possa abranger maior complexidade de relações jurídicas, tutelando
situações diversas e adquirindo eficácia quando se trata de ressarcir aquele que sofreu perda
ou dano.180

176
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 5. ed. São Paulo: Saraiva.
2010, v. 4, p. 19.
177
GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri. Dicionário técnico jurídico. 11. ed. São Paulo: Rideel. 2008, p. 494.
178
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: rresponsabilidade
civil. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2006, 3v, p. 09.
179
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 5 ed. São Paulo: Saraiva.
2010, v. 4, p. 41.
180
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil: de acordo com Constituição Federal de 1988, 2.
ed., Rio de Janeiro, Forense, 1990, p. 06.
79

Tal consideração demonstra a necessidade de analisar a definição e as premissas da


responsabilidade civil, conjuntamente com a origem e o surgimento da sociedade, pois sua
evolução e a diversidade das condutas humanas demonstraram a necessidade de se
desmembrar o instituto, pois, inerente ao estudo da responsabilidade civil, está o surgimento
da sociedade.
Nesse contexto de desenvolvimento social e de tomada de consciência das condutas
humanas delitivas, surge a moral, cujo caráter é eminentemente social e ocupa um lugar
fundamental na articulação da vida individual, ganhando um valor inquestionável na
formação cultural do indivíduo, passando-se a adotar a responsabilidade civil a partir de uma
ideia de castigo, sendo necessário, desta feita, classificar e distinguir as espécies de
responsabilidade civil, tornando seu estudo mais complexo e criterioso.181

3.2 ANÁLISE DA RESPONSABILIDADE CIVIL NO DIREITO COMPARADO: DIREITO


ROMANO, FRANCÊS, PORTUGUÊS

A responsabilidade civil tem seu advento, segundo a teoria clássica, em três


pressupostos indissociáveis à sua existência: dano, culpa do autor e nexo de causalidade entre
o fato culposo e o mesmo dano, ressalta-se, entretanto, que, no início das primeiras
civilizações, sequer se averiguava o fator culpa.182
Nesse resgate histórico, Campos explicita que:

Nas civilizações romanas as figuras delutuais revelaram-se insuficientes para


conter todas as espécies de ressarcimento. Situações que não constituíam
propriamente delictum a este eram assemelhadas de modo a oferecer àquele
que sofrera dano ou perda a reparação cabível.183

Nessas primeiras civilizações, o dano provocava a reação contínua, instintiva e brutal


do ofendido, não havendo quaisquer regras de limitação a tal conduta. O direito ainda não se
fazia presente, não havia qualquer organização político-social, dominava a vingança privada,
que se manifestava por uma forma primitiva, selvagem, irracional e espontânea contra o mal

181
GELLIS, André; HAMUD, Maria Isabel Lima. Sentimento de culpa na obra freudiana: universal e
inconsciente. In: Psicologia USP, Brasil, v. 22, n. 3, p. 635-654, sep. 2011. ISSN 1678-5177. Disponível em:
<http://www.revistas.usp.br/psicousp/article/view/42144/45817>. Acesso em: 28 fev. 2016.
182
CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 2. ed. São Paulo: Malheiros. 2000, p. 20.
183
CAMPOS, Maria Luiza de Saboia. Publicidade: responsabilidade civil perante o consumidor. São Paulo:
Cultura Paulista, 1996, p. 18.
80

sofrido, embora bárbara, era a solução comum a todos os povos a fim de promover a
reparação imediata do dano.184
A definição de responsabilidade civil está intimamente ligada à reparação, ao dever de
indenizar o dano causado, seja ele de natureza matrimonial ou moral. Ocorre que, diferente do
que acontece atualmente, a culpa ou dolo do agente eram irrelevantes para arbitrar o valor a
ser reparado. Nesse sentido, Diniz elucida que em um primeiro estágio não se levava em
consideração a culpa do agente causador do dano, bastando, somente, a ação ou omissão deste
e o prejuízo sofrido pela vítima para que aquele fosse responsabilizado.185 E continua,
elencando que, à época, os costumes regiam as regras de convivência social, levando os
ofendidos a reagir de forma direta e violenta contra o causador do dano. Essa ação lesiva do
ofendido era exercida mediante a vingança coletiva, caracterizada pela reação conjunta do
grupo contra o agressor pela ofensa a um de seus componentes.186
Essa retaliação, se não pudesse acontecer de imediato, sobrevinha desde logo, era uma
conduta legitimada pela Lei de Talião utilizada primeiramente pelos povos do Oriente Médio
que foram influenciando outros povos até chegar a Roma, do século V a.C., período em que
vigia a Lei das XII Tábuas, que simbolizavam outro progresso, propondo a reciprocidade
entre ofensa e castigo.187
Mesmo com os consideráveis avanços alcançados pelos romanos, eles jamais
chegaram a distinguir complemente a pena de reparação da ideia de punição, mas somente
com a Lex Aquilia foi possível realizar efetivamente uma mudança no que tange à
responsabilidade civil, atribuindo-a o elemento culpa. É o que se nota nas palavras de Dias:

[...] verifica-se que o conteúdo da Lex Aquilia se distribuía por três capítulos.
O primeiro tratava da morte causada a escravos ou animais, da espécie dos
que pastam em rebanhos. O segundo regulava a quitação por parte do fiador
com prejuízo do credor estipulante; regia casos de dano muito peculiares,
[...] sem, no entanto, entender que haja qualquer interesse em elencar tais
casos. O terceiro e último capítulo da Lex Aquilia merece maior atenção por
tratar do damnum injuria datum, de alcance mais amplo, compreendendo as
lesões a escravos ou animais e a destruição ou deterioração de coisas
corpóreas.188

184
LIMA, Alvino. Da culpa ao risco. São Paulo: Revistas dos tribunais, 1938, p. 10.
185
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 23. ed. São Paulo: Saraiva,
2009. v. 7, p. 11.
186
Idem Ibidem, p. 12.
187
NORONHA, Fernando. Direito das obrigações. 2. Ed. São Paulo: Saraiva, 2007. v. I, p. 528.
188
DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. Rio de Janeiro, Forense, 1997, 10 ed. v. 1, p. 24.
81

Foi por meio da Lex Aquilia que iniciou uma mudança de paradigma no que se refere à
responsabilidade civil, atrelando-se a ela, ainda que de maneira tímida, verifica-se a
concepção do elemento culpa, propondo significativas transformações, pois se cogitava a
possibilidade de substituição de multas fixas por uma pena proporcionalmente aplicada ao
dano causado.189
Sobrevém a este período o da composição dos danos. O prejudicado passa a perceber
as vantagens e conveniências da substituição da vingança, pela compensação econômica. A
vingança é substituída pela composição a critério da vítima, subsiste como fundamento ou
forma de reintegração do dano sofrido, sem tampouco se cogitar, ainda, expressamente a
figura da culpa. Lima dispõe que, em um período posterior, a composição econômica deixa
de ser voluntária e torna-se compulsória:

Num estágio mais avançado, quando já existe uma soberana autoridade, o


legislador veda à vítima fazer justiça pelas próprias mãos. A composição
econômica, de voluntária que era, passa a ser obrigatória, e, ao demais disso,
tarifada. É quando, então, o ofensor paga um tanto por membro roto, por
morte de um homem livre ou de um escravo, surgindo, em consequência, as
mais esdrúxulas tarifações, antecedentes históricos das nossas tábuas de
indenizações preestabelecidas por acidentes de trabalho. É a época do
Código de Ur-Nammu, do Código de Manu e da Lei das XII Tábuas. 190

Após a Lex Aquilia, foi somente no período de Justiniano, em 529 a 534 a.C., que
efetivamente o Direito Romano vislumbrou a concepção de culpa subjetiva, que, longe de se
assemelhar à noção moderna do instituto, apresentou exemplar contribuição às atuais
legislações, tanto que o léxico aquilia firmou-se de tal maneira em nosso ordenamento
jurídico que é hodiernamente utilizado para designar a responsabilidade extracontratual.191
Em contraponto a grande número dos estudiosos do tema, os irmãos Mazeaud, citados
por Dias, mencionam que no Direito Romano a noção de culpa sempre foi muito precária,
jamais tendo chegado a ser estabelecida como princípio geral ou fundamento da
responsabilidade, apesar da considerável evolução nesse sentido.192
Embora haja posicionamentos controversos sobre a discussão, origem e surgimento do
elemento culpa na definição de responsabilidade civil, Pereira encerra com maestria a
discussão, elucidando que independente se a noção de culpa manifesta-se expressamente no
texto da Lex Aquilia ou fora incorporada por ser elementar à responsabilidade civil, o que

189
Idem Ibidem, p. 19.
190
DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. Rio de Janeiro, Forense, 1997, 10 ed. v. 1, p. 11.
191
Idem Ibidem, p. 19.
192
Idem Ibidem, p. 42.
82

resta incontroverso é que a ideia de culpa originou-se no Direito Romano, permanecendo na


definição de responsabilidade civil durante toda a Idade Média.193
O mesmo tirocínio também foi utilizado por Beviláqua, quando propôs, no Código
Civil brasileiro, que obrigação é a relação transitória de direito que nos constrange a dar, fazer
ou não fazer alguma coisa economicamente apreciável, em proveito de alguém que, por ato
nosso ou de alguém conosco juridicamente relacionado, ou em virtude de lei, adquiriu o
direito de exigir de nós essa ação ou omissão. Demonstrando com essa definição que a
evolução da noção culpa dá-se desde o Direito Romano.194
O direito francês legou das leis romanas alguns princípios e normas que
paulatinamente foram incorporados e passaram a exercer sensível influência nos outros povos,
notadamente o princípio geral da responsabilidade civil, a fim de promover a reparação do
dano sempre que houvesse culpa.195
Os franceses não fizeram quaisquer distinções quanto à intensidade da culpa, afinal, o
dever de reparar o dano era cediço. Gonçalves, à luz dos considerações dos irmãos Mazeaud,
dispõe que se tratava da generalização do princípio aquiliano: in lege Aquilia et levissima
culpa venit, ou seja, a culpa, ainda que levíssima, obriga a indenizar.196
Aponta Planiol que o Código Civil francês constituiu-se como referência no tema ao
tratar da noção genérica de culpa, não reconhecendo, entretanto, a necessidade de distinção
entre delito e quase delito, afirmando que tal distinção não está fundada em nenhuma
diferença prática tendo o legislador do Código Civil alemão, acertado ao aglomerar tanto os
delitos como os quase delitos sob a denominação de atos ilícitos.197
Posteriormente, nos séculos XVIII, durante o período do Iluminismo, é que houve a
distinção entre a responsabilidade civil, àquela circunscrita à sua função essencial de
reparação de danos à vítima no âmbito privado e penal, perante o Estado, com imposição de
penas, quando houvesse infração penal. Noronha menciona a existência de uma culpa
contratual, para referir-se às obrigações contratuais, que estavam dissociadas de crimes ou
delitos, originando-se por negligência ou imprudência.198
Defende Lopes que foi nesse período que surgiu a tripartição da culpa em lata, leve e
levíssima. A culpa lata consistia no fato de não terem tido cuidado elementares, na omissão de
193
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil: de acordo com Constituição Federal de 1988, 2.
ed. Rio de Janeiro: Forense, 1990, p. 07.
194
BEVILÁQUA, Clóvis. Direito das obrigações. 2. ed. Bahia: Livraria Magalhães, 1910, p.13.
195
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. 5. ed. São Paulo: Saraiva. 2010, v. 4, p. 26.
196
Idem Ibidem, p. 26.
197
PLANIOL, Marcel. Traité élémentaire de droit civil. 6. ed. Paris: Librairie Générale de Droit et de
Jurisprudence, 1912, v.2, p. 275.
198
NORONHA, Fernando. Direito das obrigações. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2007, v. 1, p. 528 e s.
83

um comportamento que seria o de qualquer um. A culpa leve, posteriormente reduzida a


somente culpa, desmembrava-se em duas modalidades, a culpa in abstracto e in concreto.199
Nesse sentido, Dias dispõe que a ideia de culpa in abstracto200 e a distinção entre
culpa delitual e culpa contratual foi inserida no Código Napoleão, inspirando a redação dos
artigos 1382 e 1383, que dispunham que a responsabilidade civil se funda na culpa.
Justamente por meio dessa definição que a culpa passou a inserir-se nas legislações de todo o
mundo.201
A origem do direito português é marcada pela invasão dos romanos em território
português por ocasião da 2ª guerra púnica, no século III a.C., observa-se, contudo, que não
houve em rigor, um domínio cartaginês, o objetivo inicial dos invasores envolvia o comércio,
a resistência por parte dos lusitanos ao progresso das tropas romanas, destinava-se a, tão
somente, preservar sua independência e soberania. Após reiteradas guerras, seguem séculos
de paz o que propiciou intensa assimilação de entre os povos.202
Posteriormente, durante a invasão dos povos alanos, vândalos e suevos pela península
hispânica, no ano de 409, instaurou-se o caos, pois tais povos eram reconhecidos por seus
métodos cruéis e violentos de dominação. Até que em meados de 411, as autoridades romanas
cederam a cada qual, parte de um território para se fixaram, havendo, assim, o
estabelecimento dos visigodos pela primitiva legislação soberana de Portugal, que possuía
acentuado cunho germânico e fortes influências cristas.203
Após esse breve período de paz, o primeiro aspecto de comunicação entre tais povos,
deu-se na disseminação do cristianismo, que abolia a diferença de cultos e substituía a
separação racial por uma fraterna comunhão de fé, situação que influenciou sobremaneira a
legislação de Portugal, que caracterizada pela influência do cristianismo, não fazia distinção
entre a responsabilidade civil e a responsabilidade criminal.204

199
LOPES, Miguel Maria de Serpa. Curso de direito civil, 5. ed. Rio de Janeiro: Biblioteca Jurídica Freitas
Bastos, 1989, v. 2, p. 328.
200
SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil responsabilidade civil. 2003, p. 101. A culpa in
abstracto caracteriza-se no momento em que o agente falta com atenção e cautela quando deveria tê-las
empregado na administração de seus atos. Resta configurada a partir de uma análise comparativa da conduta do
agente com a do homem médio, diligens pater familias dos romanos. Na culpa in abstracto avalia-se o dano sob
a ótica da transgressão daquilo que se espera de um padrão normalmente admitido. No direito civil brasileiro,
prevalece o critério da culpa in abstracto, devendo-se aferir o comportamento do agente pelo padrão admitido,
se este transgredir ao normal, poderá surgir o dever indenizatório. A culpa in concreto era apreciada de acordo
com as circunstâncias de cada caso, como na hipótese de culpa grave.
201
Ibidem, p. 20.
202
FERNANDES, Ernesto; RÊGO, Anibal. História do Direito Português: súmula das lições proferidas pelo
Excelentíssimo Professor Doutor Marcelo Caetano. Lisboa, Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa,
1941, p. 21. Disponível em: <http://www.fd.unl.pt/anexos/investigacao/3597.pdf>. Acesso em: 25 mar. 16.
203
Idem Ibidem, p. 26.
204
Idem Ibidem, p. 21.
84

Em 711, ocorre a invasão e domínio muçulmano com ideais islâmicos e sob a égide do
alcorão. Desta sorte, a sociedade religiosa é simultaneamente uma sociedade política, um
Estado universal, nesse contexto elucida Caetano:

[...] os que não aceitavam a revelação de Maomé ou Mafoma, isto é, os que


não são crentes, são infiéis, colocam-se fora da sociedade político-religiosa
e, portanto, consideram-se estrangeiros ao islã independente do lugar do
nascimento, filiação e raça. [...] Portanto, se as populações cristãs resistiam,
eram passadas à espada e reduzidas à escravidão confiscando-se-lhes as
terras.205

Ressalta-se que, embora o Direito muçulmano não provenha de nenhum órgão


legislativo terreno, ou seja, humano, a atividade jurídica resume-se a interpretar a revelação
divina e aplicar ao caso concreto a norma extraída das lacônicas manifestações da vontade de
Alá. Somente após a invasão foi possível desvincular o cristianismo, a ideia de igualdade e
perdão das leis do Estado. Foi exclusivamente por meio da postura cruel dos povos
muçulmanos que a reparação pecuniária passou a ser aplicada paralelamente às penas
corporais.206
Um marco para o Direito Português foram as grandes navegações que exerceram, a
partir do século XVI, influência sobremaneira na evolução jurídico-lusitana, pois, os tribunais
do reino aplicavam as leis do Corpus Juris Civilis, não só subsidiariamente, quando houvesse
obscuridade de lei pátria, mas também em determinados litígios quando a lei nacional das
colônias não fizesse menção.207
Claro exemplo foram as Ordenações do Reino que vigoravam no Brasil colonial, as
quais não faziam distinção entre a reparação, pena e multa. Elucida Pontes De Miranda, ao
mencionar o alvará de 1668, uma lei extravagante, relativo a determinado caso particular que
se permitida o princípio da solidariedade, resgatando assim, os moldes do direito romano. 208
A Constituição Política de 1933, o Código Administrativo de 1936, o Código de
Processo Civil de 1939 e o Código de Processo Penal de 1929 são diplomas legais que
definem novas perspectivas para um direito social. Abandona-se o sistema normativo
individual-autoritário e adota-se nova orientação no sentido de privilegiar o interesse do

205
FERNANDES, Ernesto; RÊGO, Anibal. História do Direito Português: súmula das lições proferidas pelo
Excelentíssimo Professor Doutor Marcelo Caetano. Lisboa, Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa,
1941, p. 62. Disponível em: <http://www.fd.unl.pt/anexos/investigacao/3597.pdf>. Acesso em: 25 mar. 16.
206
Idem Ibidem, p. 66.
207
Idem Ibidem, p. 131.
208
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de direito privado. Rio de Janeiro: Borsoi. 1962,
v. 53, p. 366.
85

grupo, da coletividade, família e nação mantendo-se ainda, contudo, o humano como valor
maior.209
Nesse contexto de mudança de paradigma legal, o Código Civil Português de 1966,
influenciado pelo Código Alemão de 1900 e buscando atender à nova ordem no que tange à
responsabilidade civil, dispunha, em seu artigo 483210, que somente existiria a obrigação de
indenizar, independente de culpa, estritamente em determinados casos previstos em lei.211
Embora o novo Código não trouxesse expressamente garantida a proteção abrangida
pela responsabilidade objetiva, observa-se que, como dispõe Varela, a legislação cumpre seu
papel e visa refletir a tendência social do direito moderno, conciliando o respeito que a lei
deve à liberdade individual com as supremas exigências de uma ordem fundada na Justiça e
na reta convivência entre os homens, harmonizando os benefícios da iniciativa privada com os
deveres de solidariedade impostos pelo bem comum, pela paz social e pela segurança do
direito.212

3.3 RESPONSABILIDADE CIVIL E SUAS ESPÉCIES NO DIREITO PÁTRIO

A análise da evolução histórica da responsabilidade civil e o seu desenvolvimento no


estado moderno, compreende-se como uma conquista a garantia da reparação ao prejuízo
causado. Dispõe Thomaz que, somente após a Segunda Guerra Mundial, com o advento da
revolução industrial, tecnológica e o crescimento econômico, que se verificaram as primeiras
alterações no campo dos contratos e dos princípios reguladores do dever de indenizar. 213
Nesse contexto, percebe-se que o histórico da responsabilidade civil na cultura
ocidental apresenta mudanças sistemáticas e constantes que oscilam desde as ideias mais
clássicas até as formas atuais, fruto da necessidade de adequação social e tendente a propiciar
209
FERNANDES, Ernesto; RÊGO, Anibal. História do Direito Português: súmula das lições proferidas pelo
Excelentíssimo Professor Doutor Marcelo Caetano. Lisboa, Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa,
1941, p. 131. Disponível em: <http://www.fd.unl.pt/anexos/investigacao/3597.pdf>. Acesso em: 25 mar. 16.
210
Segue o Código Civil Português, Secção V. Responsabilidade civil. Subsecção I. Responsabilidade por factos
ilícitos. Artigo 483.º (Princípio geral) 1. Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de
outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado
pelos danos resultantes da violação. 2. Só existe obrigação de indemnizar independentemente de culpa nos casos
especificados na lei.
211
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 5. ed. São Paulo: Saraiva.
2010, v. 4, p. 27.
212
VARELA, Antunes apud MESQUITA, Euclides de. O código civil português. Conferência proferida pelo
Instituto de Ciências Sociais e Direito Comparado. Faculdade de Direito da Universidade Federal da Paraíba. 05
Fev. 1969. 14 f. Notas de palestra. PDF.
213
THOMAZ, Sandra Regina. Normas e princípios aplicáveis ao contrato internacional de trabalho. 30 ago.
13. 105 f. Dissertação de Mestrado – Pontifícia Universidade Católica. São Paulo. 30 ago. 13. Acesso em: 08
mar. 16. Disponível em: <http://www.sapientia.pucsp.br/tde_arquivos/9/TDE-2013-11-25T12:08:33Z-
14364/Publico/Sandra%20Regina%20Thomaz.pdf>.
86

maior proteção as vítimas. Adequação no sentido de que a reparação do dano ficou


condicionada ao preenchimento determinados requisitos como: conduta comissiva ou
omissiva; culpa; nexo de causalidade e dano sofrido pela vítima.214
Antes de se dedicar a análise do tema proposto imprescindível apontar a definição do
conceito de reponsabilidade civil, sua natureza jurídica, espécies e seus elementos. Para esse
fim, Michaelis, recorrendo a Beviláqua, apresenta o conceito de culpa com a seguinte
definição:

sf (lat culpa) 1 Ato repreensível ou criminoso. 2 Responsabilidade por um


ato ou omissão repreensíveis ou criminosos: "Culpa é toda violação de um
dever jurídico" (C. Beviláqua). 3 Consequência de se ter feito o que não se
devia fazer. 4 Delito, crime. 5 Causa de um mal. 6 Pecado.215

Entende-se assim dever jurídico como toda e qualquer conduta determinada em lei.
Lei no sentido latu sensu, apresentada como regra, norma ou conjunto de normas.
Nas palavras de Cavalieri Filho, a violação de um dever jurídico originário configura
um ilícito civil que, quase sempre, gera um prejuízo a alguém, decorrendo daí um novo dever
jurídico, o de reparar o dano. Desta forma, a responsabilidade civil é um dever jurídico
sucessivo que surge para recompor o dano decorrente da violação de um dever jurídico
originário.216
Diniz dispõe que a responsabilidade civil nada mais é que a aplicação de medidas que
obriguem alguém a reparar dano moral e/ou patrimonial causado a terceiro em razão de ato do
próprio imputado, de pessoa por que ele responde, ou de fato de coisa ou animal sob sua
guarda, ou, ainda, de simples imposição legal.217
Ao se esboçar sobre a definição do instituto da responsabilidade civil, imprescindível e
oportuno torna-se abordar as espécies de responsabilidade abarcadas pela legislação, quais
sejam: as responsabilidades civil e penal, contratual e extracontratual e subjetiva e objetiva,
que além de possuírem atuação diversa estão positivadas também de maneira peculiar e serão
a partir de agora objeto de análise.

214
THOMAZ, Sandra Regina. Normas e princípios aplicáveis ao contrato internacional de trabalho. 30 ago.
13. 105 f. Dissertação de Mestrado – Pontifícia Universidade Católica. São Paulo. 30 ago. 13. Acesso em: 08
mar. 16. Disponível em: <http://www.sapientia.pucsp.br/tde_arquivos/9/TDE-2013-11-25T12:08:33Z-
14364/Publico/Sandra%20Regina%20Thomaz.pdf>.
215
BEVILÁQUA, Clóvis apud MICHAELIS, Dicionário de Português Online. São Paulo: Melhoramentos,
2009. Disponível em: <michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portugues-
portugues&palavra=culpa>. Acesso em: 20 fev 2016.
216
CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 02.
217
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 23. ed. São Paulo: Saraiva,
2009. Vol. 7, p. 200.
87

Tanto a doutrina como a jurisprudência nacional dispõem que não são passíveis de
reparação todos e quaisquer atos, mas somente aqueles que causarem danos a terceiros.
Assim, nas palavras de Venosa, somente haverá o dever de indenizar mediante uma conduta
antijurídica, elencando que o agente responsável deve ter praticado uma conduta contra o
Direito contratual ou Direito latu sensu:

[...] o problema de saber quando a conduta é antijurídica no Direito Civil é


de exame mais lato do que no Direito Penal. Não existe um critério formal.
Apuramos a antijuridicidade, [...] no exame de uma transgressão de um
contrato, de uma técnica profissional, da diligência de um homem normal. A
descrição do artigo 186 (antigo, art. 159) é fundamental entre nós. Quando
existe um contrato a ser examinado, a tipificação da ação irregular é mais
fácil, porque existe uma redução da conduta a uma descrição.218

Explicita Gonçalves que a Lex Aquilia começou a fazer uma sutil distinção entre
responsabilidade civil e penal e que, embora a responsabilidade continuasse sendo penal, a
indenização pecuniária passou a ser a única forma de sanção nos casos de condutas lesivas
não criminosas.219
Nesse sentido Gonçalves elucida que, inicialmente a reparação estava condicionada à
condenação criminal e apenas posteriormente, adotou-se o princípio de independência entre a
jurisdição civil e a criminal.220
A respeito da responsabilidade civil e penal dispõe Dias que, para efeito de punição ou
de reparação, isto é, aplicar uma ou outra forma de restauração da ordem social é que se
distinguem tais espécies. A sociedade toma à sua conta aquilo que a atinge diretamente,
deixando ao particular a ação para se restabelecer à custa do ofensor no statu quo anterior à
ofensa. Não porque não se impressione com ele, mas porque o Estado ainda mantém um
regime político que explica a sua não intervenção. Restabelecida a vítima na situação anterior,
está desfeito o desequilíbrio experimentado.221
Exemplifica Gonçalves que quando ocorre uma colisão entre veículos automotores, o
fato pode acarretar a responsabilidade civil do culpado, que será obrigado a pagar as despesas
com o conserto do outro veículo e todos os danos causados. Mas poderá acarretar, ainda, a
responsabilidade penal, se causou ferimentos em alguém configurando os crimes dos artigos

218
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. 5. ed. São
Paulo: Atlas, 2005. Vol. 2, p. 508.
219
GONÇALVES, Luiz da Cunha. Tratado de direito civil em comentário ao Código Civil Português v. XII t.
II. 2. ed. atual. aum. e 1ª edição Brasileira. São Paulo: Max Limonad, 1957, p. 456.
220
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 5. ed. v. 4. São Paulo:
Saraiva. 2010, p. 41.
221
DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 10. ed. Rio de Janeiro, Forense, 1997, p. 08.
88

129, §6º ou, artigo 121, §3º do Código Penal. Isto significa que uma ação ou omissão pode
acarretar a responsabilidade civil do agente, ou a responsabilidade penal, ou ambas as
responsabilidades.222
Na responsabilidade civil, o interesse diretamente lesado é o privado. O prejudicado
poderá pleitear ou não a reparação, trata-se de um direito disponível, balizado na autonomia
da vontade. No caso da responsabilidade penal, o agente infringe uma norma de direito
público. O interesse lesado é o da sociedade, trata-se, inclusive, de direito indisponível. A
responsabilidade penal é pessoal e intransferível, respondendo o réu com a sua privação de
liberdade, por isso, o Estado deve estar cercado de todas as suas garantias, cabendo-lhe
reprimir o crime e arcar com o ônus da prova.223
Quando coincide a responsabilidade penal e a responsabilidade civil proporcionam as
respectivas ações, isto é, as formas de se fazerem efetivas: uma exercível pela sociedade;
outra, pela vítima; uma tendente à punição; outra, à reparação. A ação civil aí sofre, em larga
proporção, a influência da ação penal. Na esfera civil, a regra actori incumbit probatio,
aplicada à generalidade dos casos, sofre hoje muitas exceções, não sendo tão rigorosa como
no processo penal. Na responsabilidade civil não é o réu, mas a vítima que, em muitos casos,
tem de enfrentar entidades poderosas como as empresas multinacionais e o próprio Estado.
Por isso, mecanismos de ordem legal e jurisprudencial têm sido desenvolvidos para cercá-la
de todas as garantias e possibilitar-lhes a obtenção de ressarcimento do dano.224
A responsabilidade disposta no Código Civil é aquela que sobrevém de um ilícito
praticado por determinada pessoa, que por meio de uma ação; omissão voluntária; negligência
ou imperícia, ou cometido pelo titular de direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os
limites impostos pela razoabilidade, boa fé ou bons costumes que consiste na violação de
direito alheio e resulta em prejuízo, enquanto que, na esfera penal, é necessário que haja uma
perfeita adequação do fato concreto ao tipo penal, tendo em vista que a tipicidade é um dos
requisitos genéricos do crime.225
Assim certos fatos põem em ação somente o mecanismo recuperatório da
responsabilidade civil; outros movimentam tão somente o sistema repressivo ou preventivo da
responsabilidade penal; outros, enfim, acarretam, há um tempo a responsabilidade civil e a
penal, pelo fato de apresentarem, em relação a ambos os campos de incidência equivalente,

222
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 5. ed. v. 4. São Paulo:
Saraiva. 2010, p. 42.
223
SILVA, Wilson Melo da. Da responsabilidade civil automobilística. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 1980. p. 36.
224
DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. Rio de Janeiro, Forense, 1997, 10. ed. v. 1, p. 10.
225
RODRIGUES, Silvio. Direito civil: responsabilidade civil. 19. ed. 4. v. São Paulo: Saraiva. 2002, p. 10.
89

conforme seus diferentes critérios. É quase o mesmo fundamento da responsabilidade civil e


da responsabilidade penal, as condições em que surgem é que são diferentes, porque uma é
mais exigente do que a outra, quanto ao aperfeiçoamento dos requisitos que devem coincidir
para se efetivar.226
Ocorre que, por vezes, há necessidade de se indenizar um dano causado em virtude de
um descumprimento contratual, expresso ou tácito. Quando, por exemplo, o comodatário não
devolve a coisa emprestada que pereceu, por sua culpa; quando a celebridade ou ator não
comparece para apresentar espetáculo contratado, ou ainda, quando o motorista de empresa de
transporte coletivo envolve-se em acidente de trânsito e não cumpre com a obrigação de
assegurar a integridade física de seus passageiros, dando-se causa ao inadimplemento
contratual.227
Quando a responsabilidade não deriva de contrato, diz-se que ela é extracontratual,
pois o agente infringe um dever legal, aplicando-se os dispositivos 186, 188 e 927 a 945 do
Código Civil, visto que não há nessa modalidade, nenhum vínculo jurídico existente entre a
vítima e o causador do dano, no momento da prática do ato ilícito. Em contrapartida, na
responsabilidade contratual, o agente descumpre o avençado, tornando-se inadimplente, uma
vez que, existe uma convenção prévia entras as partes que não foi cumprida, aplicando-se ao
caso os artigos 389 e 395 e seguintes do mesmo diploma legal.228

226
DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 10. ed. 1. v. Rio de Janeiro, Forense, 1997, p. 08.
227
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 5. ed. v. 4. São Paulo:
Saraiva. 2010, p. 44.
228
Segue o teor dos artigos que disciplinam a responsabilidade extracontratual: Art. 186. Aquele que, por ação
ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que
exclusivamente moral, comete ato ilícito; Art. 188. Não constituem atos ilícitos: I - os praticados em legítima
defesa ou no exercício regular de um direito reconhecido; II - a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a
lesão a pessoa, a fim de remover perigo iminente. Parágrafo único. No caso do inciso II, o ato será legítimo
somente quando as circunstâncias o tornarem absolutamente necessário, não excedendo os limites do
indispensável para a remoção do perigo. Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a
outrem, fica obrigado a repará-lo; e seguintes. Quanto à responsabilidade contratual, eis o teor dos dispositivos
legais que a disciplina: Art. 389. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e
atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado. Art. 390.
Nas obrigações negativas o devedor é havido por inadimplente desde o dia em que executou o ato de que se
devia abster. Art. 391. Pelo inadimplemento das obrigações respondem todos os bens do devedor. Art. 392. Nos
contratos benéficos, responde por simples culpa o contratante, a quem o contrato aproveite, e por dolo aquele a
quem não favoreça. Nos contratos onerosos, responde cada uma das partes por culpa, salvo as exceções previstas
em lei. Art. 393. O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se
expressamente não se houver por eles responsabilizado. Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior
verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir. Art. 394. Considera-se em mora o
devedor que não efetuar o pagamento e o credor que não quiser recebê-lo no tempo, lugar e forma que a lei ou a
convenção estabelecer. Art. 395. Responde o devedor pelos prejuízos a que sua mora der causa, mais juros,
atualização dos valores monetários segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de
advogado. Parágrafo único. Se a prestação, devido à mora, se tornar inútil ao credor, este poderá enjeitá-la, e
exigir a satisfação das perdas e danos.
90

A responsabilidade contratual abrange também o inadimplemento ou mora relativos a


qualquer obrigação, ainda que proveniente de um negócio unilateral, tais como: testamento,
procuração, ou oriundas da própria lei, como a prestação de alimentos. E a responsabilidade
extracontratual compreende, por seu turno, a violação dos deveres gerais de abstenção ou
omissão, com os que correspondem aos direitos reais, aos direitos da personalidade ou aos
direitos autorais, propriedade literária, científica, artística, direitos de patente ou invenções e
às marcas.229
Conclui Dias que, basicamente, as soluções são idênticas para os dois aspectos, pois
tanto em um como em outro caso, o que se requer, essencialmente, para a configuração da
responsabilidade, são essas três condições: o dano; o ato ilícito; e a causalidade, isto é, o nexo
de causa e efeito entre os primeiros elementos.230
Nada obstante, em determinadas situações, a culpa mostra-se com fundamento
essencial para que seja arbitrada a responsabilidade. Desta feita, a análise se dará inicialmente
por ela, afinal, a culpa é o divisor de águas para o desenvolvimento das espécies de
responsabilidade civil subjetiva e objetiva.
A definição do conceito de culpa é unitária, contudo elucida Pereira, que sua
ocorrência possa se dar de maneira diversa, concluindo que a noção de culpa caracteriza-se
por um erro de conduta, cometido pelo agente que, procedendo contra o direito, causa dano a
outrem, sem a intenção de prejudicar, e, sem a consciência de que seu comportamento poderia
causá-lo.231
O Código Civil de 1916 adotou a teoria subjetiva que exige prova de culpa ou dolo do
causador do dano para que seja obrigado a repará-lo. Em alguns poucos casos, porém,
presumia-se a culpa do lesante, mais especificamente nos artigos 1527, 1528 e 1529.232
A culpa é posta em relação com a antijuridicidade, sendo precisamente considerada
como um estado de ânimo que integra, psicologicamente, o fato danoso antijurídico. A análise
precisa desse estado psicológico no qual consiste a culpa, conduzindo à distinção entre o dolo

229
VARELA, João de Matos Antunes. Direito das obrigações: conceito, estrutura e função da relação
obrigacional; fontes das obrigações e modalidades das obrigações. Rio de Janeiro: Forense, 1977, p. 10.
230
DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 10. ed. v. 1, Rio de Janeiro, Forense, 1997, p. 124.
231
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil: de acordo com Constituição Federal de 1988. 2. ed.
Rio de Janeiro, Forense, 1990, p. 77.
232
BRASIL. Lei nº 3.071/16. Promulga o Código Civil dos Estados Unidos do Brasil. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L3071.htm>. Acesso em 13 jan. 2016. Eis o teor dos artigos: Art.
1.527. O dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano por este causado, se não provar: I. Que o guardava e
vigiava com o cuidado preciso; II. Que o animal foi provocado por outro.
III. Que houve imprudência do ofendido; IV. que o fato resultou de caso fortuito, ou força maior; Art. 1.528. O
dono do edifício ou construção responde pelos danos que resultarem de sua ruína, se esta provier de falta de
reparos, cuja necessidade fosse manifesta. Art. 1.529. Aquele que habitar uma casa, ou parte dela responde, pelo
dano proveniente das coisas, que dela caírem ou forem lançadas em lugar indevido.
91

e a culpa, onde se pode revelar uma intensidade descrente de reprovação, ocorre que, a teoria
subjetiva adota o princípio da culpa como fundamento da responsabilidade, em contrapartida
a teoria objetiva, também conhecida como teoria da causalidade, a exclui, assim não havendo
culpa na modalidade subjetiva, não há que se arbitrar responsabilidade.233
A lei impõe, entretanto, a determinadas pessoas em situações específicas, a reparação
de um dano cometido independente de culpa, trata-se da denominada responsabilidade legal.
A responsabilidade nessa modalidade é analisada sob o viés objetivo, tornando-se
desnecessária a averiguação da ocorrência de culpa, pois não se leva em consideração, o
comportamento doloso ou culposo do agente concretizando-se apenas, com o dano e o nexo
de causalidade.234
Essas obrigações de reparar o dano causado por atividades não culposas interessam,
especialmente, a essa teoria da responsabilidade objetiva, visto que, essas obrigações, que
nascem sem ter a culpa como elemento integrador, ocorrem pela ausência da ideia de
confiança, solidariedade social, assistência e garantia que são de todo diferentes. Não se exige
a prova de culpa do agente pois em alguns casos ela é presumida em lei e em outros porque é
absolutamente dispensável.235
Dispõe Rodrigues que, em casos de culpa presumida, ocorrerá a inversão do ônus da
prova, cabendo ao autor provar somente a ação ou omissão e o dano resultante da conduta do
réu, visto que, sua culpa já é presumida. Assim atua culposamente aquele que causa prejuízo a
terceiro em virtude de sua imprudência, imperícia ou negligência, existindo, assim, infração
ao dever preexistente de atuar com prudência e diligência na vida social, surgindo a obrigação
de reparar o prejuízo causado a uma pessoa, por fato próprio, ou por fato de pessoas ou coisas
que dela dependam elucida, ainda, que vocábulo coisa pode ser interpretado extensivamente
abrangendo situações que envolvam semoventes.236
Explicita Nery que no Código de Defesa do Consumidor o caráter objetivo da
responsabilidade do fornecedor emana do texto do art. 6º, inciso IV, quando se exige que haja
o dever de indenizar, a ocorrência de dolo ou culpa do fornecedor, observa-se desta feita que,

233
CAMPOS, Maria Luiza de Saboia. Publicidade: responsabilidade civil perante o consumidor. São Paulo:
Cultura Paulista, 1996 , p. 18.
234
LOPES, João Batista. Perspectivas atuais da responsabilidade civil. RJTJSP, volume 57/14.
235
STARCK, Boris. Domaine et fondement de la responsabilité sans faute. Revue Trimes-trielle de Droit Civil,
Paris, Sireym 1958, t. 56, p. 476.
236
RODRIGUES, Silvio. Direito civil: parte geral. 34. ed. 1. v. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 311.
92

independente de qualquer que seja a natureza e origem dos danos causados ao consumidor,
serão indenizáveis a título objetivo.237
Observa-se, assim, que a legislação consumerista não adota a bipartição da
responsabilidade civil em contratual e extracontratual, primeiro devido a sua dificuldade na
caracterização, depois porque é fundada na aferição de culpa. Optou por abandonar a
responsabilidade extracontratual e a subsunção da conduta à culpa, para acolher a teoria do
contrato social direto entre qualquer partícipe da corrente de fornecimento de produtos e/ou
serviços e o consumidor.238
Angariando cada vez mais seguidores, a denominada teoria do risco cobre muitas
hipóteses em que o apelo às concepções tradicionais, da teoria da culpa, revela-se insuficiente
para a proteção da vítima. Essa teoria procura justificar a responsabilidade objetiva
explicitando que toda e qualquer pessoa que exerça uma atividade cria um risco a terceiro e
tem o dever legal de repará-lo, tal posicionamento confirma que responsabilidade da empresa
tem caráter objetivo, temática que será desenvolvida no tópico seguinte.
Como visto, hodiernamente, sequer a legislação ou a doutrina consumerista
condicionam a culpa aos pressupostos necessários para configurar o dever de indenizar. Desta
feita, necessário analisar a responsabilidade objetiva do fornecedor e seu dever de indenizar,
no que se refere à publicidade, encargo que se fará, posteriormente, sendo necessário
inicialmente abordar os aspectos doutrinários que envolvem a responsabilidade objetiva.

3.4 RESPONSABILIDADE CIVIL DA EMPRESA E O DEVER DE INDENIZAR

Imprescindível apontar a genealogia da responsabilidade civil para, posteriormente,


analisar sua principal peculiaridade que se vislumbra no momento de estipular o quantum
indenizatório averiguando-se primeiramente a extensão do dano, para posteriormente, arbitrar
a indenização, afinal, o dever de indenizar está intimamente ligado ao dano causado, que na
responsabilidade objetiva independe de culpa.
Nas palavras de Campos, a essência da responsabilidade objetiva é substituir a
definição de culpa pela definição de risco:

A responsabilidade objetiva se apóia [sic] no raciocínio de que a ideia de


indenização deve desvincular-se da ideia de culpa. Desenvolve o conceito

237
NERY JUNIOR, Nelson. Aspectos do processo civil no código de defesa do consumidor: revista de direito
do consumidor. v. 1, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1992, p. 212.
238
FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Manual de direito comercial. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2005, p. 597.
93

de risco como substituto do de culpa, e estabelece que aquele que cria o risco
e produz perturbações nas relações normais de direito deve arcar com as
consequências advindas em caso de dano.239

A ideia de se desvincular a culpa da reparação do dano deu-se no final do século XIX,


em um contexto de crescimento econômico e de grandes consequências sociais da revolução
industrial, principalmente, no que concerne aos acidentes de trabalho. De tal modo que foi
imprescindível que a legislação evoluísse no sentido de desenvolver uma teoria da
responsabilidade sem culpa, buscando substituir a culpa, como fundamento da
responsabilidade, por outros elementos.240
Corroborando para tal perspectiva, Briz dispõe que a existência da responsabilidade
objetiva no sistema jurídico não significa que, nos casos em que se demonstra uma conduta
culposa, não exista responsabilidade. Demonstra, entretanto, que a responsabilidade civil não
se restringe unicamente aos casos em que haja conduta culposa ou dolosa, mas sim que, às
vezes, o requisito da culpabilidade é substituído pelo da responsabilidade subjetiva pela
responsabilidade objetiva.241
Nery Junior ensina que a norma estabelece a responsabilidade objetiva como sendo o
sistema geral da responsabilidade do Código de Defesa do Consumidor. Logo, toda
indenização derivada de relação de consumo se sujeitará ao regime da responsabilidade
objetiva, salvo quando o Código expressamente disponha em contrário. Há responsabilidade
objetiva do fornecedor pelos danos causados ao consumidor, independentemente da
investigação de culpa.242
O artigo 931 Código Civil,243 como elucidam Direito e Cavalieri Filho, estabelece uma
cláusula geral de responsabilidade objetiva para melhor dirimir quaisquer problemáticas que
envolvem a responsabilidade civil da empresa, pois tem a finalidade específica de proteger o

239
CAMPOS, Maria Luiza de Saboia. Publicidade: responsabilidade civil perante o consumidor. São Paulo:
Cultura Paulista, 1996, p. 118.
240
Mantiveram-se ainda, no Código Napoleônico, alguns resquícios do sistema responsabilidade que,
tipicamente, independe de culpa. É o caso da responsabilidade por atos de terceiros, quais sejam: pais,
empregadores, donos de animais e por fato da coisa. Desse modo, no século XIX vislumbrou-se determinadas
situações, que a responsabilidade civil prescinde do elemento culpa, fundando-se no dever geral de
guarda/vigilância. No Brasil, o primeiro diploma a tratar da responsabilidade objetiva é o Decreto nº 2.681/1912,
sobre a responsabilidade das empresas operadoras de estradas férreas com relação a danos causados aos
proprietários das áreas marginais. LIMA, Alvino. Da culpa ao risco. São Paulo: Revistas dos tribunais, 1938, p.
50.
241
BRIZ, Jaime dos Santos. La responsabilidad civil; derecho substantivo e derecho procesal. 3. ed. Madri:
Editora Montecorvo, 1981, p. 10.
242
NERY JÚNIOR, Nelson. Novo código civil e legislação extravagante anotados. São Paulo: Revistas dos
Tribunais, 2002, p. 725.
243
Eis seu teor: ressalvados outros casos previstos em lei especial, os empresários individuais e as empresas
respondem independentemente de culpa pelos danos causados pelos produtos postos em circulação.
94

consumidor e claramente atribuir a responsabilidade civil objetiva à empresa por eventuais


danos causados, independe de averiguação de culpa.244
Em sentido contrário, Dias critica a redação do referido artigo justificando que:

[...] padece, sem necessidade, de deselegante redação, pois a expressão


‘empresários’ abrange o termo ‘empresas’. O empresário pode ser individual
e pode ser coletivo, assim como a empesa não se define, necessariamente,
como pessoa jurídica. Seria mais feliz uma fórmula abrangente, segundo a
qual se estabelece que os empresários respondem pelos prejuízos resultantes
dos riscos criados pelas suas atividades, à vida, à saúde e à segurança de
terceiros, o que teria como campo de incidência todos os casos de proteção
contra a poluição em geral e de danos relacionados com o abuso do direito
de vizinhança, de incômodos e moléstias decorrentes dessas atividades.245

Quanto à responsabilidade civil objetiva da empresa e sua positivação, elucida Bessa


que seu fundamento extrai-se diretamente da proteção constitucional disposta no artigo 5º,
inciso X da Constituição da República Federativa do Brasil, que dá amparo ao princípio geral
do dever de indenizar, constante no artigo 6º, inciso VI do Código de Defesa do
Consumidor.246
Analisando os elementos da responsabilidade civil, Cavalieri Filho elucida que pode
haver responsabilidade sem culpa, mas nunca sem nexo causal, pois este é a relação que “deve
existir entre o dano e o fato para que este, sob a ótica do Direito possa ser considerado causa
daquele”.247
No que tange ao nexo de causalidade, Campos esclarece que:

Toda a ênfase do sistema na responsabilidade objetiva é dada ao nexo de


causalidade existente entre o ato e o dano produzido, não interessando se
esse ato foi culposo ou doloso. Por esse motivo, a responsabilidade objetiva
também é conhecida como responsabilidade causal, fundada na causalidade,
ou ainda responsabilidade sem culpa.248

A teoria da responsabilidade objetiva do fornecedor desenvolveu-se diante da


necessidade de se superar o óbice nos casos de danos decorrentes de defeito de fabricação em
veículos. Entendia-se então, que o adquirente de produto com defeito poderia ter ação contra

244
DIREITO, Carlos Alberto Menezes; CAVALIERI FILHO, Sérgio Cavalieri. Comentários ao novo código
civil. v. XIII. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 182.
245
DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. Rio de Janeiro, Forense, 1997, 10. ed. v. 1, p. 33.
246
BENJAMIN, Antônio Hernan V; MARQUES, Cláudia Lima; BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de direito
do consumidor. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 345.
247
CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 1999, p. 49.
248
CAMPOS, Maria Luiza de Saboia. Publicidade: responsabilidade civil perante o consumidor. São Paulo:
Cultura Paulista, 1996, p. 115.
95

o vendedor/comerciante, mas não contra o fabricante, com quem não tinha nenhuma relação
contratual, a mesma situação aplicava-se aos terceiros. Apenas em 1960 a jurisprudência
norte-americana defende a noção de responsabilidade objetiva do fornecedor inclusive perante
terceiros. A teoria propôs uma equiparação do fabricante ao vendedor, a quem é imputado um
dever geral de diligência, considerados os usos previsíveis de um produto e os riscos
esperados. É uma doutrina voltada tanto à reparação do dano quanto à adequação de um
padrão de conduta no mercado.249
Quanto ao risco propriamente dito, pode-se analisá-lo de forma concisa como: “a
somatória de probabilidades de ocorrência de situações potencialmente perigosas”. Ocorre
que, em sendo assim, demonstra-se insuficiente definir somente o risco de maneira isolada,
pois como já analisado anteriormente, a culpa tem papel de extrema relevância e, em virtude
disso, necessário foi desenvolver duas teorias com o objetivo de melhor classificar a
responsabilidade civil, a teoria do risco e a da garantia.250
A teoria do risco fundamenta-se na responsabilidade pela qual deve responder quem
causa dano a outrem no desenvolver de uma atividade da qual tire proveito ou lhe gere lucro.
Gonçalves explicita que essa teoria consolidou-se quando o direito francês acabou por
admitir, na responsabilidade complexa por fato das coisas, a chamada teoria da culpa na
guarda, a qual antes admitia a presunção juris tantum, (que admite prova em contrário), de
culpa por parte do agente e passou a aceitar a presunção juris et de jure (presunção absoluta,
não admitindo prova em contrário).251
Enfatiza-se, contudo, que existem determinadas situações cuja obrigação de indenizar
pode nascer de fatos permitidos por lei e não abrangidos pelo risco, como os atos praticados
em estado de necessidade, que mesmo considerados lícitos pelo artigo 188, inciso II do
Código Civil, obrigam seu autor a indenizar o dono da coisa, igualmente destacam-se as
atividades de consumo que não podem ser consideradas em sua universalidade como
atividades de risco e que nem por isso, a responsabilidade deixa de ser objetiva.

249
SANSEVERINO, Paulo de Tarso Vieira. Responsabilidade civil no código do consumidor e a defesa do
fornecedor. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 16
250
CHEVITARESE, Leandro; PEDRO, Rosa Maria. Risco poder de tecnologia: as virtualidades de uma
subjetividade pós-humana. Anais do seminário internacional de inclusão social e as perspectivas pós-
estruturalistas de análise social. Recife: CD-ROM, 2015, p. 8. Disponível em:
<http://brasil.campusvirtualsp.org/sites/default/files/Chevitarese.pdf > Acesso em: 20 mar. 2016.
251
GONÇALVES, Carlos Roberto. Comentários ao código civil. São Paulo: Saraiva. 2003, p. 308.
96

Em contrapartida, a teoria da garantia consolida seu pensamento sob a forma de uma


garantia implícita existente em casos específicos, nos quais, apesar de inexistir a culpa,
persiste a responsabilidade e a obrigação de reparar.252
A responsabilidade da pessoa que comete o dano está diretamente vinculada à
obrigação de indenizar a vítima sob dois pontos: ou porque cometeu uma falta, ou então,
porque retira proveito do ato praticado, Pereira, citando Starck, refere-se à teoria da garantia,
abordando que:

[...] a teoria da garantia pretende que o fundamento da responsabilidade sem


culpa reside em que, todos os casos em que o legislador ou a jurisprudência
condene o autor do dano a repará-lo, com abstração da culpabilidade, o dano
sofrido constitui um atentado aos direito da vítima, protegidos por si mesmo,
como o é o direito de propriedade, o direito ao nome, os direitos à
“propriedade intelectual”, e bem assim outros direito objetivamente
assegurados, independentemente da culpa do defedente.253

Não há consenso sobre a ampliação da responsabilidade objetiva, pois elucida-se que o


elemento culpa não pode ter uma interpretação flexível, alegando que culpa e risco são duas
fontes que alimentam o campo da responsabilidade civil, mas que não é possível identificar
com precisão o campo de aplicação de uma ou de outro.254
Defende-se que tanto na teoria do risco, que aponta a responsabilidade de indenizar
daquele que cause dano a outrem no desenvolver de uma atividade lucrativa, quanto na teoria
da garantida, em que há a relativização ou até mesmo a extinção do elemento culpa, haja
vista, uma interpretação individualizada tanto da culpa, como do risco. Mesmo porque há
atividades de consumo, as quais implicam culpa exclusiva do consumidor, caracterizando
casos de excludentes de responsabilidade, como também há nessas mesmas relações de
consumo atividades isentas de risco, por isso, a imprescindibilidade de individualizar, no
momento da interpretação, cada um dos elementos.
Parte da doutrina, que possui como representante Starck, critica a teoria do risco, pois
entendem que ela rejeita a culpa como condição de responsabilidade, buscando na ideia do
lucro econômico ou moral, a razão de ser e o fundamento da condenação de indenizar e,
sobretudo, questionam como a teoria do risco justifica a responsabilidade dos loucos de toda

252
OROZIMBO, Nonato. Aspectos do modernismo jurídico e o elemento moral na culpa objectiva. Rio de
Janeiro: Revista Forense, n. 56. 1931, p. 15.
253
STARCK, Boris apud PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil: de acordo com Constituição
Federal de 1988. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1990, p. 282.
254
CAMPOS, Maria Luiza de Saboia. Publicidade: responsabilidade civil perante o consumidor. São Paulo:
Cultura Paulista, 1996 , p. 120.
97

espécie e dos menores de idade, explicitando que eles não tiram lucro, proveito econômico de
sua atividade danosa.255
Em contrapartida, outra parte da doutrina defende que há condições taxativas para
ausência da averiguação de culpa em casos específicos como a responsabilidade objetiva dos
pais pelos atos danosos de seus filhos menores; na responsabilidade objetiva da empresa nos
atos de seus empregados; na responsabilidade advinda de contrato de seguro, entre outras
limitadas em virtude da atuação humana. Contudo, uníssono demonstra ser a responsabilidade
objetiva da empresa no dever de indenizar sob o aspecto da legislação consumerista, aspecto
que acabou por influenciar também a legislação cível que foi promulgada posteriormente.
Em outro viés e, em contraponto às demais modalidades, a responsabilidade pela perda
de uma chance aponta para uma nova perspectiva da responsabilidade civil, visto que não há
em nosso ordenamento qualquer positivação normativa específica que abarque a
probabilidade de uma evidência, contudo, a doutrina e os tribunais pátrios têm demonstrado
considerável empatia com a teoria à luz do direito comparado.
Dispõe Savi que, na França na década de 1960, doutrina e jurisprudência passaram a
examinar com mais afinco a possibilidade de mensurar e quantificar, mediante estatísticas, as
expectativas de uma certeza. Vislumbrou-se a probabilidade de indenização de um dano
diverso daquele auferido como resultado final, ou seja, a perda da chance. Para os franceses, a
definição do conceito chance juridicamente, é a perspectiva de obter um lucro ou evitar uma
perda, justificando assim, a nomenclatura dada à teoria.256
Cavalieri Filho elucida que a teoria da perda de uma chance, perte d'une chance, deve
ser aplicada a casos concretos determinados. Àqueles que algum ato ilícito obstaculizou a
pretensão de uma certeza do requerente:

[...] deve ser aplicada nos casos em que o ato ilícito tira da vítima a
oportunidade de obter uma situação futura melhor, como prosseguir na
carreira artística ou no trabalho, arrumar um novo emprego, dentre outras.
Entretanto é necessário que se trate de uma chance real e séria, que
proporcione ao lesado efetivas condições pessoais de concorrer à situação
futura esperada.257

A teoria, contudo, não se restringirá a determinados casos concretos afinal, o que se


deve apreciar no momento de invocar a aplicação da perda de uma chance é averiguar se a

255
STARCK, Boris. Domaine et fondament de la responsabilité sans faute. Revue Trimes-trielle de Droit
Civil. Paris: Sirey, 1958, n. 56, p. 478.
256
SAVI, Sérgio. Responsabilidade civil pela perda de uma chance. São Paulo: Atlas, 2006. p. 3.
257
CAVALIERI FILHO, Sérgio. Responsabilidade civil. 4. ed. São Paulo: Ed. Malheiros. 2005. p. 91/92.
98

probabilidade de um ganho futuro é efetiva e mensurável e assim, muito plausível de ocorrer.


Entende-se que quaisquer casos concretos que possuam uma presumível possibilidade de
ocorrência de determinado resultado, que não foi atingido unicamente em virtude de ato de
terceiro, é passível de indenização à luz da teoria da perda de uma chance.
Tal posicionamento encontra respaldo na doutrina encabeçada por Venosa, quando
dispõe que:

Importa examinar no caso concreto quais as chances que efetivamente foram


perdidas e poderiam beneficiar a vítima. Quando há perda de chance, o que
se indeniza é a potencialidade da perda e não se leva em conta a perda
efetiva. [...] Se a possibilidade frustrada é vaga ou meramente hipotética, a
conclusão será pela inexistência de perda de oportunidade. A “chance” deve
ser devidamente avaliada quando existe certo grau de probabilidade, um
prognóstico de certeza, segundo avaliamos.258

Observa-se que há divergência doutrinária no que tange à espécie do dano e por


consequência, à aplicação da indenização. A doutrina clássica dispõe que o dano decorrente
da perda de uma chance deverá ser indenizável nos mesmos parâmetros do lucro cessante,
outra parte dos estudiosos, ratificam que se trata de relação de gênero-espécie e, por isso, a
indenização teria como molde o dano emergente e, por fim, uma parte considerável da
doutrina defende que se trata de dano moral.
Ocorre que, como o ordenamento pátrio ainda não conta com nenhuma legislação
específica positivada e somando-se a isso ainda existe muita divergência doutrinária, as
decisões dos tribunais acabaram por ser afetadas e passaram a ter posicionamentos diversos
quanto à teoria da perda de uma chance merecendo, alguns julgados, destaque.
O Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região, em sede de recurso ordinário, explicita
de maneira clara e pormenorizada que, na teoria francesa da perda de uma chance, o autor do
dano é responsabilizado quando priva alguém de obter uma vantagem ou impede a pessoa de
evitar prejuízo, elucidando a necessidade de se haver uma probabilidade sendo difícil a
distinção entre o dano meramente hipotético da chance real do dano. Ressalta, por fim, a
inaplicabilidade da teoria frente a uma a ausência de plausividade no dano pleiteado.259
Em oposição, o Tribunal do Rio Grande do Sul, conhecido por suas decisões de
vanguarda, em julgado proferido pela 6ª Câmara Cível, posicionou-se a favor da teoria

258
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: responsabilidade civil. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2003, p. 265.
259
BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho. 5ª Região. Recurso ordinário nº 7330720135050014-BA.
Relatora: Léa Nunes, 3ª. Turma. Data de Publicação: DJ 05 dez 2014. Disponível em: <http://trt-
5.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/158336450/recurso-ordinario-record-7330720135050014-ba-0000733-
0720135050014> Acesso em: 26 mai 2016.
99

enquadrando-a, contudo, na modalidade de dano moral. Aponta que a negligência e o descaso


da requerida ocasionaram a perda da possibilidade de transferência do curso frequentado pela
autora, visto que, para um novo ingresso terá que se submeter a vestibular, cuja aprovação é
incerta. Explicita, por fim, que, para o arbitramento dos danos morais, deve-se ter em mente
que a indenização deve ser em valor tal que garanta à parte credora uma reparação pela lesão
experimentada, bem como implique, àquele que efetuou a conduta reprovável, impacto
suficiente para dissuadi-lo na repetição da conduta lesiva.260
Tendo em vista a divergência das decisões e a insegurança jurídica que trazem
consigo, torna-se necessário elucidar que aplicação mais cautelosa da teoria da perda de uma
chance, seria mensurar a indenização pelos danos decorrentes da perda de uma chance,
cumulando-os com uma indenização por danos morais. Nesse sentido, Savi dispõe que: “[...] o
que não se pode admitir é considerar o dano da perda de uma chance como sendo um dano
exclusivamente moral.”261
Urge elencar que as decisões divergentes em processos análogos sobremaneira os que
invoquem a teoria da perda de uma chance, que, devido à ausência de positivação, poderão
ocorrer interpretações doutrinárias e jurisprudenciais diversas, afrontam o princípio da
isonomia e o direito à previsibilidade das decisões judiciais expondo os jurisdicionados a uma
instabilidade jurídica, que poderá ser sanada utilizando-se o artigo 926 do novo Código de
Processo Civil, que salienta o dever dos tribunais uniformizarem a jurisprudência e assim,
conservarem a estabilidade, probidade e coerência das decisões.
Mitigando o crivo da responsabilidade objetiva, o Código Civil em seu artigo 393,
contempla as excludentes que isentam o agente causador de eventuais reparações quando os
prejuízos forem resultantes de caso fortuito ou força maior observa-se que, na falta de
quaisquer dos pressupostos não se configura a responsabilidade, podendo ser ilidida se
provado que não houve dano, culpa do agente, ou relação de causalidade.
A culpa da vítima pode ser exclusiva ou concorrente com a culpa do agente. Na
modalidade exclusiva, a responsabilidade é extirpada, pois cessa a relação de causalidade
entre o ato do agente e o evento danoso. Na espécie concorrente ela se atenua, pois a vítima,
de alguma maneira, contribuiu para o dano com negligência ou imprudência. Nesta última
hipótese, o julgador fixará indenização em valor inferior ao prejuízo porque ambas as partes

260
BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível n. 70037261146-RS. Relator: Artur
Arnildo Ludwig. 6ª Câmara Cível. Data do Julgamento: 25/08/2011. Data da Publicação: DJ 05 set 2011.
Disponível em:<tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/21346666/apelacao-civel-ac-70046823233-rs-tjrs>. Acesso
em 25 mai 2016.
261
SAVI, Sérgio. Responsabilidade civil pela perda de uma chance. São Paulo: Atlas, 2006. p. 54.
100

concorreram para o seu advento e não seria justo que só uma arcasse com ele na
integralidade.262
Convergente a tal entendimento, Gonçalves dispõe que:

[...] a melhor doutrina é a que propõe a partilha dos prejuízos: em partes


iguais, se forem iguais as culpas, ou não for possível provar o grau de
culpabilidade de cada um dos co-autores; [SIC] em partes proporcionais aos
seus graus de culpa, quando estas forem desiguais.263

Assinala, ainda, Monteiro que se houver concorrência de culpas, do autor do dano e da


vítima, a indenização deve ser reduzida. Posto não enunciado expressamente, esse princípio é
irrecusável no sistema do direito pátrio, constituindo, entre nós, jus receptum. A
jurisprudência consagra, com efeito, a solução do pagamento pela metade, no caso de culpa de
ambas as partes.264
No que concerne à força maior e caso fortuito, ressalta-se que, em tais casos, o sistema
jurídico pátrio consagra em termos gerais a isenção da responsabilidade. Para tanto, a doutrina
distingue tais eventos explicitando que caso fortuito é o acontecimento natural, derivado da
força da natureza. Na força maior há um elemento humano, a ação das autoridades.
Diniz elucida, de maneira pormenorizada, a disparidade existente entre as duas
espécies de excludentes dispondo que:

Na força maior por ser um fato da natureza, pode-se conhecer o motivo ou a


causa que deu origem ao acontecimento, como um raio que provoca um
incêndio, inundação que danifica produtos ou intercepta as vias de
comunicação, impedindo a entrega da mercadoria prometida ou um
terremoto que ocasiona grandes prejuízos, etc. Por outro lado o caso fortuito
tem origem em causa desconhecida, como um cabo elétrico aéreo que sem
saber o motivo se rompe e cai sobre fios telefônicos causando incêndio
explosão de caldeira de usina, provocando morte. 265

Aponta Fonseca que se encontra na noção de caso fortuito um elemento interno,


objetivo, representado pela inevitabilidade do evento. Em contrapartida, nos casos de força
maior, vislumbra-se um elemento externo e subjetivo, representado pela ausência de culpa do
pretenso agente do dano. Adota, pois, um conceito misto, no sentido de que:

262
RODRIGUES, Silvio. Direito civil: parte geral. 34. ed. v. 1. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 315.
263
GONÇALVES, Luiz da Cunha. Tratado de direito civil em comentário ao código civil português. 2. ed.
São Paulo: Max Limonad, 1957, v. XII, t. II, p. 576 e ss.
264
MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil. 7. ed. São Paulo: Saraiva. v. 5, 1971, p. 414.
265
DINIZ. Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria geral das obrigações - de acordo com o novo
Código Civil. v. 2. 19. ed. ver. aum. e atual. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 35.
101

não há acontecimento que possam, a priori, ser sempre considerados casos


fortuitos; tudo depende das condições de fato em que se verifique o evento.
O que hoje é caso fortuito, amanhã deixará de sê-lo, em virtude do progresso
da ciência ou da maior previdência humana266

A força maior poderá ser arguida como excludente de responsabilidade em critério de


excepcionalidade ainda em ocorrências que envolvam acidentes causados por animais. Em
regra, a responsabilidade dos danos provocados por animais recairá sobre seus respectivos
donos ou detentores, tratando-se de responsabilidade presumida, como dispõe o artigo 936 do
Código Civil. Ocorre que, excepcionalmente, permite-se a destituição da responsabilidade
pelo dono ou detentor em casos de culpa da vítima ou força maior, equiparando tal
responsabilidade à do guarda da coisa inanimada, na forma elaborada pela jurisprudência
francesa.267
Exatamente nesse sentido a jurisprudência nacional, representada aqui pelo Tribunal
de Justiça do Rio de Janeiro, que demonstrou ser precedente em casos análogos, proclamou
que, na responsabilidade objetiva, encontra-se a obrigação mais ampla de reparar,
independente de apuração de culpa, como se verifica no § 6º do art. 37 da Constituição
Federal e § 1º do art. 14 do Código de Defesa e Proteção do Consumidor.268
Retomando o tema responsabilidade objetiva, insta salientar que tanto o §6º do artigo
37 da Constituição da República, como o artigo 14 da legislação consumerista,
responsabilizam as pessoas jurídicas de direito privado, prestadoras de serviços em geral,
estendendo-se a aplicação da norma às concessionárias e permissionárias, independente de
verificação de culpa pelo defeito na prestação do serviço, podendo assim, ser considerada a
permanência de animal na pista de rolamento, expondo a risco os usuários.269
O mesmo artigo 14, §3º, contempla algumas excludentes, cujo reconhecimento
dependerá de demonstração pelo fornecedor, que poderá não ser responsabilizado quando
comprovar que não colocou o produto no mercado ou que, mesmo colocando, o defeito
inexiste, como também, nos casos em que haja culpa exclusiva do consumidor ou terceiro,
não fazendo, no entanto, qualquer menção ao caso fortuito ou força maior.

266
FONSECA, Arnoldo Medeiros da. Caso fortuito e teoria da imprevisão. 2. ed. rev. ampl. Rio de Janeiro:
Revista Forense, 1943, p. 147.
267
RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. v. 4, n. 52. São Paulo: Saraiva. 1975, p. 146.
268
BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Apelação Cível n.º 5.481/99 – RJ. Relator: Desembargador
Jorge Luiz Habib, j. 25 mai 1999. Disponível em: <http://tj-
pr.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/21454614/8096139-pr-809613-9-acordao-tjpr/inteiro-teor-21454615>. Acesso
em: 22 mai 16. p. 12.
269
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 5. ed. v. 4. São Paulo:
Saraiva. 2010, p. 213.
102

A interpretação restrita do mencionado dispositivo pode conduzir a equivocado


entendimento, no sentido da inaplicabilidade da excludente do caso fortuito ou força maior
aos casos regidos pelo Código de Defesa do Consumidor. Não obstante, explicita Gonçalves
que o dispositivo em questão cuida exclusivamente do elemento culpa. O fato inevitável,
porém, rompe o nexo de causalidade, especialmente quando não guarda nenhuma relação com
a atividade do fornecedor, não se podendo, destarte, falar em defeito do produto ou do
serviço.270
O Recurso Especial nº 120.647, empossado pelo Superior Tribunal de Justiça, pelo
relator Ministro Eduardo Ribeiro, referenda que, mesmo que não disponha o Código de
Defesa do Consumidor sobre o caso fortuito ou força maior, como causas de excludente de
271
responsabilidade, não se pode subentender que as mesmas não possam ser invocadas.
Elucida ainda que a inevitabilidade e não a imprevisibilidade é que efetivamente mais importa
para caracterizar o fortuito. A condição de ser determinada situação inevitável há de se
entender dentro de certa relatividade, tendo-se o acontecimento como inevitável em função do
que seria razoável exigir-se.
Menciona Fazzio Júnior que diferentemente do que propõe a teoria clássica da
responsabilidade civil, o Código de Defesa do Consumidor não considera como excludentes a
culpa concorrente da vítima e o caso fortuito e a força maior, com o escopo e a proposital
intenção de tornar mais eficaz a garantia do consumidor.272
Constata-se, assim, que nem a Constituição da República Federativa, tampouco o
Código de Defesa do Consumidor, referem-se à culpa como pressuposto necessário para
caracterizar o dever de indenizar. Aliás, como dispõe Marques: “exigir prova de culpa
poderia, ao contrário do que pretende a Lei nº 8.078/90, dificultar a efetiva reparação dos
danos patrimoniais e morais”.273
Vale lembrar que a publicidade também tem de ser analisada sob o manto da
responsabilidade civil objetiva, tendo em vista que, mesmo que veiculada por terceiro
contratado estranho à relação negocial, a responsabilidade é objetiva e será distribuída entre a
agência de publicidade, fabricante, fornecedor, por tratar-se de responsabilidade solidária.

270
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 5. ed. v. 4. São Paulo:
Saraiva. 2010, p. 233.
271
BRASIL. Superior Tribunal De Justiça. 3ª Turma. Recurso especial nº 120.647-SP. Relator: Ministro
Eduardo Ribeiro, j. 16 mar 2000. DJ, 15 mai 2000, p. 156. Disponível em:
<http://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/8291392/recurso-especial-resp-120647-sp-1997-0012374-0>. Acesso
em: 23 mai 2016.
272
FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Manual de direito comercial. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2005, p. 599.
273
BENJAMIN, Antônio Hernan V; MARQUES, Cláudia Lima; BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de direito
do consumidor. 6. ed. São Paulo. Revista dos Tribunais, 2014, p. 345.
103

Tema de tamanha relevância que deverá ser abordado posteriormente em tópico


individualizado.

3.5 A RESPONSABILIDADE CIVIL SOLIDÁRIA DE SEUS SUJEITOS ANUNCIANTES:


AGÊNCIAS DE PUBLICIDADE E VEÍCULOS DE COMUNICAÇÃO

Embora haja intensa discussão doutrinária e jurisprudencial, irrefutável que a


responsabilidade civil da empresa no dever de informação é objetiva e solidária, haja vista,
que o embasamento legal encontra-se positivado no Código de Defesa do Consumidor, que
abdica a bipartição da responsabilidade civil em contratual e extracontratual e acolhe a teoria
do contrato social direto existente entre consumidor e qualquer partícipe da cadeia de
fornecimento de produtos e/ou serviços.
A responsabilidade objetiva representa o sistema geral da responsabilidade no Código
de Defesa do Consumidor. Logo, toda indenização derivada de relação de consumo, sujeitar-
se-á ao regime da responsabilidade civil, cuja principal peculiaridade vislumbra-se no
momento de averiguar a obrigação de reparar o dano, ocasião que o elemento culpa
desvincula-se do dever de indenizar.
É fato que nem todas as obrigações da esfera civil acarretam o dever de indenizar. Há
circunstâncias em que se vislumbram causas de excludente de responsabilidade, na legislação
consumerista o reconhecimento das excludentes ocorrerá quando houver culpa exclusiva do
consumidor ou de terceiro. O artigo 14, §3º estabelece que ficará a encargo do fornecedor
comprovar que não colocou o produto no mercado, ou que mesmo colocando, inexiste o
defeito. O artigo não faz menção ao caso fortuito ou força maior, o que não quer dizer que não
são aplicáveis, mas, indica que a legislação cuida especialmente do elemento culpa e que fatos
inevitáveis representam o rompimento do nexo de causalidade, que não tem qualquer relação
com culpa.
Como demonstrado também no decorrer do trabalho, a responsabilidade cabível ao
anunciante, às agências publicitárias e ao veículo de comunicação, refere-se a três aspectos
indispensáveis, uma vez que não exclui integralmente a responsabilidade da agência e do
veículo de comunicação, todavia, entende que somente o anunciante poderia ser
responsabilizado objetivamente pela publicidade enganosa e/ou abusiva de modo que a
agência e o veículo seriam subjetivamente corresponsáveis quando agissem dolosa ou
culposamente, por esse motivo, a responsabilidade além de objetiva é, também, solidária entre
os sujeitos publicitários na reparação do dano causado.
104

Incontroverso que o dever de indenizar o dano causado é assegurado pelo


ordenamento pátrio. Nada obstante, o artigo 944 do Código Civil estipula um quantum
indenizatório, fixando o valor da indenização pela extensão do dano. O Enunciado nº 46
delibera que a redução do montante indenizatório seja interpretada restritivamente por
representar uma exceção ao princípio da reparação integral do dano. Ocorre que a ponderação
e a proporção da indenização, não mais caberão à sensata discricionariedade do aplicador,
tudo ficará predeterminado pelo caso concreto que poderá prescrever a referida redução.274
Ainda que a redução seja legalmente prevista é imprescindível que o ofendido obtenha
uma garantia de que ocorrerá a reparação do dano, resultado da segurança jurídica que deve
existir, sobremaneira no direito consumerista. Sobrevém que, por vezes, a redução do
quantum indenizatório somada à vinculação do arbitramento ao caso concreto, não alcança
um patamar satisfatório a fim de que a indenização obtenha um caráter punitivo-pedagógico,
que além de atender à reparação da vítima, sirva igualmente de desestímulo à reiteração da
conduta pelo ofensor.275
Desta feita, conclui-se que não basta a subsunção do fato à norma, pois ainda que se
tenha uma imposição legal para a redução da alíquota indenizatória, é imperioso que haja
equilíbrio, razoabilidade e, sobretudo, sensibilidade por parte do intérprete com o propósito de
ponderar, especialmente nos casos de relação de consumo, o poderio econômico do
fabricante-fornecedor e a realidade econômico-financeira da vítima se a situação fática
permite o decréscimo indenizatório, ou se justifica uma majoração da indenização, para que,
no momento de arbitrar o valor da indenização, se chegue o mais próximo possível da justeza,
valor máximo a ser exarado de toda e qualquer norma.
A configuração da responsabilidade publicitária prescinde de três condições
cumulativas: a) a publicidade deve estar identificada como tal – é fundada na existência do
suporte publicitário à difusão da mensagem; b) deve ser mentirosa ou abusiva; c) deve conter
elementos preciosos pelos quais, por valoração subjetiva do juiz – levando em consideração o
tipo de produto ou de serviço e o perfil do público-alvo -, se possa verificar o potencial
danoso da mensagem.276

274
AGUIAR JÚNIOR, Ruy Rosado de. (Coord.) Jornadas de direito civil I, III, IV e V: enunciados aprovados.
Brasília: 2012. Conselho da Justiça Federal, Centro de Estudos Judiciários. Disponível em:
http://www.cjf.jus.br/cjf/corregedoria-da-justica-federal/centro-de-estudos-judiciarios-1/publicacoes-1/jornadas-
cej/EnunciadosAprovados-Jornadas-1345.pdf.> Acesso em: 03 jun 16.
275
LISBOA, Roberto Senise. Responsabilidade civil nas relações de consumo. São Paulo: Revistas dos
Tribunais. 2001, p. 112.
276
CAMPOS, Maria Luiza de Saboia. Publicidade: responsabilidade civil perante o consumidor. São Paulo:
Cultura Paulista, 1996, p. 225.
105

Dispõe o artigo 4º que a Política Nacional de Relações de Consumo tem por objetivo o
atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, à saúde e à
segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida,
bem como a transparência e harmonia das relações de consumo. Analisando tais diretrizes,
Eros Grau elucida que:

[...] esta norma do art. 4º, realmente não cabe nem no modelo de norma de
conduta, nem no modelo de norma de organização. Porque, na verdade, ela é
uma norma-objetivo. Ela define o fim a ser alcançado. Essas normas que
definem fim – e que eu acho que não são programáticas, são normas de
eficácia total, completa, absoluta, inquestionável, indiscutível – começam a
surgir modernamente.277

Desta feita, a responsabilidade objetiva mostra-se como fundamento estrutural da


legislação consumerista, afinal não se faz qualquer referência valorativa à condução do agente
causador do dano. Nesse sentido, elucida Dias que não há duvidas de que o fornecedor-
anunciante responde sempre solidária e objetivamente por quaisquer danos causados. As
agências e os veículos quando prestadores de seus próprios serviços, evidentemente, também
respondem de modo objetivo, posto que na qualidade de fornecedores.278
Os fornecedores são alvo de um longo elenco de dispositivos referentes à sua
responsabilidade. Algumas dessas responsabilidades referem-se aos fornecedores em geral,
sem distinção. Em outras os sujeitos passivos, destinatários da norma, são distinguidos pela
natureza do fornecimento.279
Prossegue Dias elucidando que controverso é saber o quantum de responsabilidade
deve-se imputar aos diferentes sujeitos envolvidos no processo de criação e difusão da
mensagem publicitária quando contratados como terceiros prestadores pelo fornecedor-
anunciante e para além do fornecedor, a agência, o veículo e por vezes a celebridade que
atuou profissionalmente no espaço publicitário.280
Há divergência doutrinária no que tange especificamente aos sujeitos passivos da
publicidade, subdividida em duas correntes. Elucida ainda Dias que a primeira interpretação
entende que caberia apenas ao fornecedor-anunciante, e somente a ele, a responsabilidade
pelos danos decorrentes da publicidade, na medida em que é o fornecedor o único responsável

277
Eros Grau, em comunicação apresentada no Seminário Internacional de Direito do Consumidor, realizado
na cidade de São Paulo, no período de 24 a 27 de setembro de 1990, citado por Benjamin. GRAU, Eros Roberto.
A Ordem Econômica na Constituição de 1988. 5. ed. São Paulo: Malheiros. 2000, p. 26.
278
DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. Rio de Janeiro, Forense, 1997, 10. ed. v. 1, p. 299.
279
CENEVIVA, Walter. Publicidade e o direito do consumidor. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 1991, p.
105.
280
DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. Rio de Janeiro, Forense, 1997, 10. ed. v. 1, p. 299.
106

em requisitar e aprovar o anúncio publicitário, definindo de antemão seus principais


contornos.281
Nessa ótica, agência publicitária e veículo de comunicação estariam isentos de
qualquer responsabilidade, aplicando-se, por consequência lógica, a mesma regra às
celebridades que participaram da publicidade, com esse mesmo entendimento, Coelho dispõe
que:

[...] a agência de propaganda não tem responsabilidade civil ou


administrativa pela concepção, produção, ou intermediação na veiculação de
publicidade enganosa ou abusiva pertinente a fornecimento alheio. As
repercussões, em nível civil e administrativo, envolvem unicamente o
empresário anunciante. Ele é quem define os objetivos e alguns dos
contornos básicos da publicidade, ao elaborar o briefing, e, em última
instância, aprova a proposta de campanha e os filmes, anúncios e peças
publicitárias correspondentes. Nada é feito pela agência de propaganda sem
o conhecimento, a orientação e aprovação do anunciante, que por tudo
assume integral responsabilidade. [...] O veículo também não responde civil
ou administrativamente pela transmissão de mensagem publicitária alheia
julgada enganosa ou abusiva, uma vez que não exerce e não pode exercer
qualquer controle sobre o respectivo conteúdo.282

Em posicionamento similar, o Superior Tribunal de Justiça, no Recurso Especial nº


604.172, afastou a responsabilidade civil dos meios de comunicação pela transmissão de
eventual publicidade inadequada, ratificando que o Código de Defesa do Consumidor dispõe
que a ausência de responsabilidade da agência, do veículo e da celebridade, decorreria da
interpretação de seu artigo 38, que versa especificamente sobre a atividade publicitária. E,
ainda, determina que o ônus da prova da veracidade e correção da informação ou
comunicação publicitária cabe a quem as patrocina, ou seja, ao fornecedor-anunciante.
Segundo demonstra o voto do Ministro Humberto Gomes de Barros:

[...] os deveres impostos nos capítulos da oferta e publicidade somente


atingem os veículos de propaganda, comunicação e anúncio quando estejam
na condição de fornecedores. O art. 38 do Código protecionista diz que ‘os
ônus da prova da veracidade e correção da informação ou comunicação
publicitária cabe a quem os patrocina’. Portanto, o art. 38 exclui a
responsabilidade dos veículos de comunicação por eventual publicidade
enganosa ou abusiva, pois o ônus de provar a veracidade e correção (ausência
de abusividade) é do fornecedor anunciante, que patrocina a propaganda ou
anúncio, tanto que o art. 36 impõe que mantenha, em seu próprio poder, os

281
DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. Rio de Janeiro, Forense, 1997, 10. ed. v. 1, p. 300.
282
COELHO, Fábio Ulhoa. O empresário e o direito do consumidor. São Paulo: Saraiva, 1994, p. 291.
107

dados fáticos, técnicos e científicos que são sustentação à mensagem para


informação dos legítimos interessados.283

Em posicionamento distinto Benjamin elucida que não exclui totalmente a


responsabilidade da agência e do veículo, mas entende que somente o anunciante poderia ser
responsabilizado objetivamente pela publicidade enganosa ou abusiva, de modo que a agência
e o veículo só seriam corresponsáveis quando agissem dolosa ou culposamente, assim, seriam
responsabilizados subjetivamente por suas condutas.284
Analisando tal posicionamento, observa-se que as agências, os veículos e as
celebridades responderiam nos termos do direito civil, sempre que de sua ação ou omissão,
negligência, ou imprudência, sobreviesse danos aos consumidores, obrigando-se a repará-los,
artigo 186 do Código Civil. Logo, a responsabilidade de tais sujeitos seria apurada
subjetivamente.
Guimarães defende que a responsabilidade da agência, do veículo e até mesmo da
celebridade, seria solidária à do anunciante/fornecedor, invocando, para tanto, a aplicação do
parágrafo único do artigo 7º do Código de Defesa do Consumidor c/c o §1º do artigo 25 do
códex285.
Ressalta-se ainda que essa solidariedade passiva permite ao consumidor ou às pessoas
enumeradas no artigo 82, da mesma norma legal, a seu critério, propor ação contra todos,
alguns, ou contra apenas um dos causadores do dano, tornando-se irrelevante nessa
solidariedade o grau de participação para o dano de cada responsável, pois perante o credor,
responderão por toda a dívida e, posteriormente, analisada sua participação, poderão
promover respectivas ações regressivas.286
No que tange às agências publicitárias, não há dúvida de que elas participam
ativamente no processo criativo da mensagem publicitária. No momento da elaboração da

283
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso especial n.º 604.172 – SP. Relator: Ministro Humberto
Gomes de Barros, j. 27 mar 2007. DJ, 21 mai 2007, p. 568. Disponível em:
<http://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/8932345/recurso-especial-resp-604172-sp-2003-0198665-8/inteiro-
teor-14100155>. Acesso em: 16 abr. 16, p. 07.
284
BENJAMIN, Antônio Hernan V; MARQUES, Cláudia Lima; BESSA, Leonardo Roscoe. Código brasileiro
de defesa do consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária,
2007, p. 365.
285
Segue o teor dos dispositivos, o § único do artigo 7º do Código de Defesa do Consumidor, inserido na parte
dos Direitos Básicos do Consumidor, dispõe que tendo mais de um autor a ofensa, todos responderão
solidariamente pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo. Já o artigo 25, inserido na seção de
Responsabilidade por Vício do Produto e do Serviço, apresenta redação praticamente idêntica, e prescreve que
havendo mais de um responsável pela causa do dano, todos responderão solidariamente pela reparação prevista
nessa e nas seções anteriores.
286
GUIMARÃES. Paulo Jorge Scartezzini. Publicidade ilícita e a responsabilidade civil das celebridades que
dela participam. 2. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora dos Tribunais, 2007, p. 170.
108

campanha elabora-se um estudo aprofundado, analisam-se as especificidades do produto, seu


público-alvo, com o fito de incentivar e propiciar um aumento no consumo e assim, dar maior
efetividade aos resultados mercadológicos esperados.
Como dispõe a própria Associação Brasileira de Agências de Propaganda, mencionada
por Guimarães, a agência é especializada na arte e técnica publicitária, e por meio de
especialistas estuda, concebe, executa e distribui propaganda a veículo de divulgação com o
objetivo de promover a venda de produtos ou serviços.287
Elucida Sampaio que os publicitários afirmam que a maior função da agência é a
criação da propaganda, a geração de ideias a serem transformadas em slogan, temas
publicitários, anúncios para jornais e revistas, comerciais de rádio, televisão e cinema,
cartazes e outras mensagens publicitárias.288
Desta forma, não há possibilidade para afastar eventual responsabilização da agência
publicitária, visto que, vislumbrando sua atuação configura como coautora da publicidade
conjuntamente com o fornecedor-anunciante, por estarem diretamente envolvidas com a
criação e produção publicitária de determinado produto ou serviço e por darem vida e forma
ao anúncio, são as agências ao lado do fornecedor-anunciante, também responsáveis objetiva
e solidariamente pelos anúncios publicitários.289
Quanto aos veículos de comunicação e às celebridades diferentemente do que ocorre
com as agências, são sujeitos que não participam do processo de planejamento, concepção e
criação da publicidade. Os veículos são responsáveis em apenas difundir as mensagens
publicitárias aos destinatários, não exercendo qualquer controle acerca de seu conteúdo.
Tratando-se apenas do meio pelo qual a mensagem alcança os consumidores, não havendo
uma coautoria, no sentido de produção do dano, havendo a possibilidade, no entanto, de
solidariedade em casos que tenha agido com dolo ou culpa grave na transmissão do conteúdo,
situações que seriam avaliadas, subjetivamente, como já elucidado por Benjamin.290
Suprimida a fase de discussão doutrinária, conclui-se que a responsabilidade civil
compreende três aspectos indispensáveis na relação jurídica, quais sejam: anunciante; agência
de propaganda e, também, o veículo de comunicação no momento em que veicula dolosa ou

287
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE AGÊNCIAS DE PROPAGANDA (ABAP) apud MALANGA, Eugênio.
Publicidade: uma introdução. 4. ed. São Paulo: Editora Edima, 1987, p. 87.
288
SAMPAIO, Rafael. Propaganda de A a Z. 3. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2003, p. 63.
289
DIAS, Lucia Ancona Lopez de Magalhães. Publicidade e direito. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2010,
p. 303.
290
Idem Ibidem, p. 304/305.
109

culposamente publicidade lesiva. Desta feita, o Código de Defesa do Consumidor impõe a


solidariedade passiva entre essas pessoas jurídicas na reparação de danos causados.291
Embora o objeto de análise do presente tópico refere-se à responsabilidade dos sujeitos
publicitários, temática que vai além da proposta no presente estudo, imprescindível que se
fizesse essa breve análise afinal, o presente tópico e tão-somente subsídio para dissecar e
esmiuçar o tema proposto no presente estudo. Ocorre que, mesmo arbitrando-se a
responsabilidade civil objetiva aos casos que envolvam publicidade abusiva e enganosa,
frequentemente, a indenização auferida pelo consumidor é arbitrada tendo-se como paradigma
tão somente o dano sofrido, condição que por vezes não é capaz de extirpar ou minimizar a
conduta lesiva reincidente da empresa.
Por sua vez, o quantum indenizatório como dispõe o artigo 944, parágrafo único, não
deve extrapolar excessivamente a gravidade do dano, ou ir além de sua extensão, desta feita,
deverá a atividade jurisdicional se orientar à luz do princípio da razoabilidade e
proporcionalidade, para tanto, a jurisprudência tem oferecido alguns critérios para quantificar
o valor do dano moral a fim de que se leve em consideração à intensidade da ofensa, a
capacidade financeira do ofensor e a condição econômica do ofendido, de forma que a
reparação não represente a ruína para ao devedor, nem constitua fonte de enriquecimento sem
causa para o credor, devendo ser estabelecida criteriosamente.292
Acredita-se, contudo, que o arbitramento da indenização na medida da extensão do
dano mostra-se, por vezes, insuficiente, pois somente indenizar a vítima não é medida capaz
de desestimular uma conduta empresarial lesiva. Um dos escopos da indenização, tendo em
vista seu caráter punitivo-pedagógico, é imputar uma sanção exemplar ao ofensor, capaz de
puni-lo pelo ilícito praticado, visando, assim, inibir a repetição da conduta danosa, servindo
como uma ferramenta preventiva contra o cometimento de novos ilícitos.293
Afinal, tão importante quanto restituir ao ofendido o que lhe é de direito, é promover
medidas que tornem pecuniariamente inviável às empresas a reincidência na prática de
publicidade abusiva ou enganosa podendo-se, inclusive, nas ações de danos morais coletivos,
nesse aspecto entendido como uma injusta lesão moral de uma dada comunidade, ou seja, a

291
CAMPOS, Maria Luiza de Saboia. Publicidade: responsabilidade civil perante o consumidor. São Paulo:
Cultura Paulista, 1996, p. 289.
292
BRASIL. Tribunal de Justiça de Rondônia. 2ª Vara Cível. Apelação Cível nº 0009341-97.2015.8.22.0014.
Juíza: Sandra Beatriz Merenda. DJ, 24 ago. 2016. Disponível em:
<http://www.jusbrasil.com.br/diarios/documentos/377554966/andamento-do-processo-n-0009341-
9720158220014-procedimento-ordinario-26-08-2016-do-tjro?ref=topic_feed>. Acesso em: 26 ago 2016.
293
FERREIRA, Gezina Nazareth. O Caráter Punitivo do Dano Moral. In: Revista do Curso de Especialização
em Direito do Consumidor e Responsabilidade Civil da EMERJ, n 1. Rio de Janeiro: Escola da Magistratura do
Rio de Janeiro. 2012, p. 14.
110

violação antijurídica de um determinado círculo de valores coletivos, referindo-se a um


patrimônio valorativo de determinada comunidade agredido de maneira absolutamente
injustificável, do ponto de vista jurídico, cuja violação feriu a própria cultura da coletividade
em seu aspecto imaterial, nesses casos, admite-se a aplicação de uma pena pecuniária visando
a reversão de uma alíquota aos fundos especiais dos órgãos de defesa e proteção dos direitos
do consumidor e similares.294

294
BITTAR FILHO, Carlos Alberto. Dano Moral Coletivo. In: Revista de Direito do Consumidor nº 12. São
Paulo: Revista dos Tribunais, p. 44-62, out-dez. 1994.
111

CONCLUSÃO

A publicidade é um tema bastante discutido e controvertido, ademais quando se tem


como pano de fundo a sociedade de consumo em tempos pós-modernos. Como elucidado no
início deste estudo, a primeira parte da pesquisa dedicou-se a analisar as relações de consumo
e a evolução histórica do comércio com a finalidade de contextualizar e compreender as bases
das relações de consumo e da economia contemporâneas.
Desta análise, foi possível verificar que o aumento populacional, o capitalismo
crescente e o desenvolvimento tecnológico proporcionaram uma mudança de paradigma,
estabelecendo-se uma estreita relação entre a globalização e a publicidade de consumo, que
ganhou mais espaço e passou a integrar o contexto do mundo empresarial e social.
A publicidade passa a ser vista como uma técnica de comunicação persuasiva que, por
intermédio das novas tecnologias, propicia um discurso coletivo. A mídia encurtou distâncias
e atingiu consumidores das mais variadas sociedades, culturas, classes e perfis, além de
informar a existência de determinado produto, passou a expô-lo à venda, instigando sua
aquisição e conquistando casa vez mais fatias do mercado consumidor, por meio de uma
construção astuta de mensagens favoráveis ao consumo em seus anúncios publicitários.
Influenciado por essas avançadas técnicas e estratégias de persuasão publicitária, o
consumidor tem seu ideal de felicidade modificado, afinal, o escopo principal da publicidade
é exibir determinado produto ou serviço instigando e fomentando no consumidor o desejo de
aquisição. De tal modo que a publicidade, a propaganda e o marketing, nesse contexto, podem
ser analisados como uma prática decisiva na sociedade de consumo, uma vez que concede ao
indivíduo uma ilusória autoafirmação e inserção social, condição que, para essa sociedade,
possui valor inestimável.
Tendo em vista a difusão da informação por meio da cultura de massas e a imensidão
de produção publicitária à disposição do consumidor, o fabricante/fornecedor, com vistas a
atingir o seu objetivo de persuadir o consumidor e promover o aumento do consumo com o
fim exclusivo de obtenção de lucro, passou a investir cada vez mais em publicidade de
consumo. Diante de todo esse contexto, no segundo capítulo, foi possível abordar a
problemática publicitária, suas delimitações conceituais, origens históricas e todas as questões
circunscritas ao tema.
A publicidade inicialmente era encarada como arte e/ou meio de informação e só
posteriormente ganhou ares de técnica de comunicação e caráter persuasivo. Embora haja
112

discussão doutrinária sobre o momento em que realmente surgiu o primeiro anúncio


publicitário, foi no século XX que se pôde notar um evidente crescimento da publicidade.
Nesse momento da pesquisa, a publicidade foi adquirindo contornos jurídicos
mediante a análise das suas modalidades abusiva e enganosa, visto que, a empresa passa a
intensificar as técnicas persuasivas, promovendo por vezes publicidade discriminatória,
violenta, supersticiosa, que se aproveita de deficiência ou incapacidade infantil, que
desrespeita o meio ambiente, ou que induz o consumidor a portar-se de forma arriscada ou
prejudicial à sua integridade física ou saúde, ou promovendo publicidade omissiva, deixando
de informar o consumidor, sobre dado essencial ao produto ou serviço, ocasionando o
descumprimento do dever de informação que deverá atuar como mecanismo de educar e
prevenir danos futuros aos consumidores.
Enfrentada a problemática da publicidade lesiva, foi possível propor novas
orientações, a fim de objetivar uma releitura de sua produção na tentativa de se alcançar um
“dever-ser” publicitário que seria possível mediante uma maior efetividade da boa fé objetiva
e da função social da empresa como princípio fundamental e diretriz normativa da atividade
empresarial.
Defende-se que o princípio da função social da empresa deverá ser considerado como
uma forma que a Constituição da República encontrou de condicionar o exercício da atividade
empresarial à promoção da justiça social, inequívoco, assim, que a justiça social e atividade
empresarial não se anulam, pelo contrário, o exercício da atividade econômica deverá estar
fundamentado na pessoa, a fim de objetivar a garantia da dignidade humana, para o alcance da
justiça social, ambas estão estabelecidas como princípios fundamentais do Estado
Democrático de Direito, evidenciando a imprescindibilidade de se ampliar a todo o
ordenamento fundamentos como a cidadania, soberania e a dignidade da pessoa humana.
A problemática da produção publicitária abusiva e enganosa não se dá exclusivamente
pela ausência de positivação normativa, mas sim pela falta de efetividade da legislação
existente, posto isso, propõe-se no decorrer da pesquisa, como lege ferenda, a aplicação da
boa-fé objetiva e da função social da empresa, visando ao enfrentamento à publicidade lesiva.
A análise desses institutos deu-se, exclusivamente, no âmbito empresarial estendendo-se a
uma proposta sobre as agências publicitárias, por serem parte envolvida, produtora e
responsável na relação de consumo e, posteriormente, por estarem na condição de prestadoras
de serviço e, assim, responderem objetiva e solidariamente pela criação publicitária.
Ocorre que, mesmo diante dos diplomas legais já existentes e das perspectivas
apontadas aos casos de publicidade lesiva, elucida-se que por vezes e, não raras, ocorre o
113

descumprimento desses preceitos. Afinal, enfrentar a problemática da publicidade por meio da


legislação vigente não surtiu o efeito esperado e, tampouco, demonstra a efetividade que
propõe a lei, explicitando, para tanto, a necessidade de se punir os responsáveis por causar
danos advindos de publicidade lesiva, abordando alguns aspectos da responsabilidade civil e
suas definições no direito pátrio com uma breve análise sobre o direito comparado.
O Código Civil estabelece uma cláusula geral de responsabilidade objetiva para
melhor dirimir quaisquer problemáticas que envolvem a responsabilidade civil da empresa,
pois tem a finalidade específica de proteger o consumidor e claramente atribuir a
responsabilidade civil objetiva à empresa por eventuais danos causados, independente de
averiguação de culpa. Tal norma extrai-se diretamente da proteção constitucional disposta no
artigo 5º, inciso X da Constituição da República Federativa do Brasil, que dá amparo ao
princípio geral do dever de indenizar, constante no artigo 6º, inciso VI do Código de Defesa
do Consumidor.
Embora o Código aponte uma regra geral de responsabilidade objetiva, o Código
Civil, em seu artigo 393, contempla as excludentes que isentam o agente causador de
eventuais reparações quando os prejuízos forem resultantes de caso fortuito ou força maior.
Observa-se que, na falta de qualquer dos pressupostos, não se configura a responsabilidade,
podendo ser ilidida se provado que não houve dano, culpa do agente, ou relação de
causalidade.
Quanto à responsabilidade objetiva ser apontada como regra geral no sistema jurídico,
não significa que nos casos em que se demonstra uma conduta culposa não exista
responsabilidade. Demonstra, entretanto, que a responsabilidade civil não se restringe
exclusivamente a esses casos, mas sim que o requisito da culpabilidade é substituído pelo da
responsabilidade subjetiva pela responsabilidade objetiva.
Constatou-se no decorrer da pesquisa que a publicidade também tem de ser analisada
sob o manto da responsabilidade civil objetiva, ponderando-se que, mesmo que seja veiculada
por terceiro contratado estranho à relação negocial, a responsabilidade será solidariamente
distribuída entre os sujeitos publicitários, fabricantes/fornecedor anunciantes, agências de
publicidade e veículos de comunicação, que responderão subjetivamente pelos danos
causados, exatamente como dispõe o parágrafo único do artigo 7º do Código de Defesa do
Consumidor c/c o §1º do artigo 25 do referido código.
Observa-se que essa solidariedade passiva permite ao consumidor e/ou às pessoas
elencadas no artigo 82, do mesmo diploma legal, proporem ação contra todos, alguns, ou
contra apenas um dos causadores do dano, tornando-se irrelevante nessa solidariedade o grau
114

de participação para o dano de cada responsável, pois perante o credor responderão por toda a
dívida e, posteriormente, analisada sua participação, poderão promover respectivas ações
regressivas.
Concluiu-se, por fim, que a publicidade é um mundo inteiro a ser percorrido e que a
abordagem levantada nesta pesquisa não tem qualquer pretensão de esgotar o tema, pelo
contrário, em proporções tímidas e despretensiosas, aponta, como perspectiva para o
enfrentamento da problemática publicitária, a implementação da função social da empresa e
da boa-fé objetiva a todos os envolvidos na cadeia produtiva, bem como a todos os sujeitos
publicitários, tendo em vista que no decorrer do estudo foi possível averiguar as mazelas
jurídicas e sociais que uma publicidade enganosa e abusiva podem causar às relações de
consumo e à sociedade como um todo.
Constatou-se que a publicidade, mediante suas técnicas persuasivas, promove discurso
coletivo e que, por isso, sua análise deve ser fundamentada, visto que os efeitos danosos de se
veicular uma publicidade lesiva vão muito além do inter partes, ou seja, dos danos causados
aos envolvidos na relação negocial. A publicidade abusiva e enganosa atinge toda a
coletividade e gera efeito erga omnes, por isso a necessidade de arbitrar responsabilidade civil
solidária a todos os sujeitos publicitários, a fim de dar mais efetividade à legislação já vigente,
promovendo o objetivo primário da legislação consumerista, a proteção do consumidor
vulnerável e, como consequência, alcançando um escopo secundário, primar pelas relações de
consumo, objetivando que se tornem mais equitativas e justas a todos os nelas inseridos.
115

REFERÊNCIAS

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