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- Porto Alegre -
2021
Ramiro Barcelos, 2600 - 5° andar - sala 520 - Porto Alegre – RS, 90010-035
tel. 3308-5327 e-mail: roger.rosa@ufrgs.br
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
Faculdade de Medicina/Programa de Pós-Graduação em Ensino na Saúde
ENS0005 – Planejamento de Educação na Saúde
Gilles Dussault**
Summary
Palavras-chave:
Organizações profissionais; serviços públicos de saúde; especificidades; exigências de
gerência; formação de gerentes.
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Material didático para a aula sobre: Teorias administrativas e relação com a gestão con-
temporânea. (Roger dos Santos Rosa, 2021). Reprodução do artigo DUSSAULT, Gilles. A
Gestão dos Serviços Públicos de Saúde: características e exigências. Revista de Adminis-
tração Pública, Rio de Janeiro, v. 26, n. 2, p. 8-19, abr./jun. 1992.
vários tipos, quanto por causa de sua nature- 4. As organizações de serviços pú-
za, que exige intervenções de vários tipos, blicos
quanto por causa da sua própria ineficácia
relativa, evidenciada pelas avaliações cientí- As organizações de serviços públicos
ficas disponíveis6. dependem em maior grau do que as demais
do ambiente sociopolítico: seu quadro de
A prestação de serviços de saúde funcionamento é regulado extremamente à
também comporta uma dimensão ética e mo- organização. As organizações públicas po-
ral importante: há problemas de ética biomé- dem ter autonomia na direção dos seus negó-
dica, como os ligados ao sigilo, ao direito do cios, mas, inicialmente, seu mandato vem do
usuário à informação sobre a sua condição, à Governo, seus objetivos, pelo menos os ge-
garantia de continuidade do tratamento (pre- rais, são fixados por uma autoridade externa.
maturos, pacientes na fase terminal), inter- Freqüentemente, incluem outras dimensões,
venções experimentais, eutanásia. Há também além das técnicas, podendo, potencialmente,
problemas de ética administrativa relativos à tornar-se contraditórios aos objetivos funda-
escolha das prioridades (crianças ou idosos, mentais. Por exemplo, a vontade de reduzir
serviços preventivos ou equipamentos supe- os custos dos serviços estatais, um objetivo
respecializados), à alocação dos recursos, o econômico, pode entrar em contradição com
que sempre implica custos de oportunidade objetivos de acessibilidade a certos serviços.
num contexto de recursos limitados (o que Um objetivo político, como responder às
vai para um setor priva um outro setor), ao expectativas de uma comunidade particular –
acesso aos serviços, ao respeito dos usuários, por exemplo, concedendo um hospital ou
ao uso da informação relativa à eficácia das qualquer outro tipo de infra-estrutura – pode
intervenções. ser contrário ao objetivo de distribuir os re-
cursos de acordo com as necessidades.
Finalmente, por causa da sua impor- Igualmente, os recursos disponíveis tendem a
tância social e econômica, o setor saúde é depender da decisão política e das flutuações
uma área disputada por atores que têm inte- da capacidade econômica do Estado. Em
resses divergentes: os usuários, que querem outras palavras, as organizações de serviços
serviços de qualidade, mas baratos; os profis- públicos são mais vulneráveis à interferência
sionais, que querem desenvolver seu conhe- política, no sentido geral do termo.
cimento, suas habilidades, sua profissão, ob-
ter uma boa renda, prestando bons serviços; Existe, também, uma probabilidade
as empresas de materiais e produtos; os segu- de contaminação burocrática, isto é, o tipo de
ros; os estabelecimentos privados que querem regulamento desenvolvido na burocracia esta-
fazer bons negócios; o Governo, que quer tal tende a ser aplicado a qualquer organiza-
benefícios políticos, etc. A reflexão sobre a ção pública.
organização e a gestão dos serviços de saúde
deve considerar essas particularidades e não Da mesma maneira, as condições e a
pode contentar-se em tratar o setor saúde organização do trabalho tendem a uniformi-
como qualquer outro. zar-se no setor público. A autoridade dos
dirigentes é delegada e, tipicamente, o âmbito
da decisão é mais limitado que no setor pri-
6
Wennberg, J. E. On the status of the scientific vado. Mintzberg menciona que, nesses casos,
basis of clinical medicine and the need for better como os dirigentes são responsáveis perante
science policy to promote the evaluative clinical uma autoridade externa ao sistema, observa-
sciences. International Conference on Quality se uma tendência à centralização das deci-
Assurance and Effectiveness in Health Care. To- sões.
ronto, Canada, 9.11.89, 16 p.
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Material didático para a aula sobre: Teorias administrativas e relação com a gestão con-
temporânea. (Roger dos Santos Rosa, 2021). Reprodução do artigo DUSSAULT, Gilles. A
Gestão dos Serviços Públicos de Saúde: características e exigências. Revista de Adminis-
tração Pública, Rio de Janeiro, v. 26, n. 2, p. 8-19, abr./jun. 1992.
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Material didático para a aula sobre: Teorias administrativas e relação com a gestão con-
temporânea. (Roger dos Santos Rosa, 2021). Reprodução do artigo DUSSAULT, Gilles. A
Gestão dos Serviços Públicos de Saúde: características e exigências. Revista de Adminis-
tração Pública, Rio de Janeiro, v. 26, n. 2, p. 8-19, abr./jun. 1992.
Está implícito, no retrato que se pre- de assegurar a adaptação dos serviços. Não
tende traçar, que os serviços de saúde têm a significa que os usuários participem necessa-
finalidade de elevar o nível de saúde da popu- riamente de cada etapa da tomada de decisão,
lação, o que é um objetivo tanto político o que pode tornar-se participação da fachada.
quanto técnico. Está implícito também que Importa que eles participem das decisões
existem outros objetivos, mais ou menos estratégicas (escolha das prioridades, mudan-
ocultos, que podem contrariar essa finalidade. ças radicais) e que sejam os últimos juízes do
Considerando as organizações de saúde como resultado dos serviços, ou seja, possam exer-
organizações profissionais, devemos lembrar cer o seu direito de receber serviços de acor-
que não será produtivo formalizar o processo do com suas necessidades. A maneira de or-
de produção nem instituir mecanismos de ganizar essa participação pode variar e, aqui
coordenação autoritários, ao menos em rela- também, mecanismos formalizados demais
ção ao trabalho dos profissionais. Por outro podem mostrar-se ineficientes.
lado, devemos prevenir que, por falta de co-
ordenação entre seus componentes, essas 6. Qual o tipo adequado de gestão
organizações podem tornar-se menos políti- para as organizações públicas de serviços
cas. A burocracia e a centralização excessivas de saúde?
ou, na outra extremidade, a autonomia sem
imputabilidade vão criar organizações inca- O tipo de gestão que parece mais
pazes de desempenhar seu papel. Para enfren- adequado a essas organizações é mais o con-
tar as mudanças das necessidades e das ex- sensual, colegiado, do que o autoritário. É
pectativas da sua clientela, as organizações de uma gestão que reconhece o papel central dos
saúde devem ser flexíveis e capazes de res- profissionais e, ao mesmo tempo, tem meca-
ponder às exigências mutáveis. Sendo organi- nismos para evitar os efeitos não desejados da
zações de serviços profissionais, têm de faci- autonomia de prática profissional e do corpo-
litar o trabalho autônomo dos prestadores e, rativismo. Essa gestão enfatiza a definição de
ao mesmo tempo, garantir que esse trabalho mecanismos de tomada de decisão que envol-
seja coerente com os objetivos organizacio- vem os profissionais tanto ao nível das for-
nais. Isso convida a conceber organizações mulação dos objetivos e das orientações ge-
descentralizadas e flexíveis, isto é, com a rais quanto da avaliação dos resultados: essa
capacidade autônoma de tomar decisões rápi- gestão aceita que os profissionais trabalhem
das em função de seus problemas próprios e não por obedecer as ordens, mas por respon-
das peculiaridades do seu ambiente. A auto- sabilidade. O desafio da gestão das organiza-
nomia dos profissionais não é tanto um direi- ções de saúde consiste em responsabilizar os
to quanto uma condição necessária para a prestadores pela criação de um ambiente pro-
produção de serviços de boa qualidade. Me- pício ao trabalho multiprofissional e pela
canismos de controle da qualidade e de impu- integração da participação de usuários no
tabilidade, administrados de maneira transpa- processo de produção dos serviços. Por defi-
rente, na perspectiva de melhorar os serviços, nição, esse tipo de gestão é mais democrático,
podem evitar os riscos ligados à concessão de no sentido de associar os prestadores ao pro-
mais autonomia. cesso gerencial. Porém, existe a possibilidade
da politização da gestão, o que acontece com
De acordo com a natureza social da certeza quando os dirigentes são nomeados de
definição das necessidades, parece sensato acordo com critérios políticos e não por crité-
associar a comunidade à identificação das rios de competência gerencial. A clarificação
necessidades e à avaliação dos serviços. Pro- das regras do jogo ajuda a prevenir a politiza-
curar o ponto de vista dos usuários (atuais e ção excessiva. Por exemplo, é possível apli-
potenciais) deve ser considerada uma maneira car-se a regra de que os objetivos podem – na
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Material didático para a aula sobre: Teorias administrativas e relação com a gestão con-
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realidade, devem – ser debatidos na etapa da rente no setor saúde, em termos de conheci-
formulação, mas precisam ser respeitados mento, de habilidades e também de atitudes.
após sua adoção. É claro que elas variam em relação ao volume
de responsabilidade, ao tipo de serviços pro-
No setor saúde, a gestão tem que ser duzidos e ao contexto.8 Concentrando-nos
orientada para o ambiente e adaptar-se às sobre os dirigentes ao nível de direção dos
mudanças demográficas, epidemiológicas e estabelecimentos, podemos sugerir que eles
sociais, o que exige flexibilidade. Uma gestão precisam ter capacidade intelectual e inter-
burocrática não pode fazer isso. pessoal que permita enfrentar um ambiente
complexo, variável e cheio de limitações. A
Considerando que a complexibilidade capacidade intelectual inclui a capacidade de
dos problemas de saúde exige, cada vez mais, identificar e analisar os problemas de sua
trabalho multiprofissional, as prioridades dos organização profissional, o processo de pro-
gestores mudam e se vinculam ao objetivo de dução de serviços de saúde, a rede de rela-
criar condições de prática favoráveis a esse ções de sua organização com o ambiente, as
tipo de trabalho. Isso implica ações como: necessidades da comunidade e sua distribui-
definir mecanismos de coordenação e de to- ção e evolução.
mada de decisões dentro das equipes; garantir
a estabilidade das equipes, que é uma condi- Uma outra capacidade importante é a
ção da criação de um ambiente de confiança; de adaptação, isto é, de ajustar suas decisões
adaptar-se ao mecanismo de avaliação de e ações a um contexto particular. Inclui a
pessoal; definir estratégias de formação para faculdade de aprender, a partir de seus erros,
facilitar a passagem do exercício individual e de se formar para poder enfrentar, com
ao trabalho de equipe. As ações mais estraté- eficácia, problemas inéditos. Uma outra ma-
gicas dos gestores estão ligadas à seleção de neira de apresentar esse tipo de capacidade é
pessoal e à formação das unidades de produ- saber definir objetivos e estratégias e divulgá-
ção. A possibilidade de definir as necessida- los, tanto dentro como fora de sua organiza-
des da organização em termos de recursos ção.
humanos, de fazer a seleção, de avaliar e,
eventualmente, de transferir o pessoal é es- Um ambiente profissional exige a ca-
sencial à constituição de organizações de pacidade de fazê-lo em colaboração, em
saúde capazes de se adaptar a seu ambiente. equipe. Os dirigentes não podem produzir os
Finalmente, é quase supérfluo mencionar a serviços nem realizar os programas pessoal-
gestão de serviços públicos exige uma ética mente: os que sabem recrutar bons colabora-
que privilegie o bem-estar dos usuários e da dores, formá-los e ajudá-los a crescer profis-
comunidade, que considere os recursos dis- sionalmente e individualmente, contribuem
poníveis como um bem coletivo a ser usado muito para elevar a qualidade dos serviços.
eficientemente e com eqüidade. Em suma, Ao nível técnico, não importa que os dirigen-
uma ética própria de servidor da comunidade. tes sejam especialistas em cada área de ges-
O desafio dos dirigentes, além de ser modelos tão ou produção de serviços de saúde, mas
de comportamento ético, é suscitar a adesão eles têm de entender o que seus profissionais
dos membros de sua organização a essa ética. fazem e ser capazes de solicitar e utilizar as
informações que possam melhorar o processo
7. A formação dos gestores dos ser- de tomada de decisão.
viços de saúde
8
Whithley, R. On the nature of managerial tasks:
Tudo o que foi dito anteriormente in- their distinctive characteristics and organization.
dica algumas das exigências do papel do ge- Journal of Management Studies, Oxford, England,
Basil Blackwell & Mott, 28(3):209-24, 1989.
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Anexo 1
As configurações organizacionais (Mintzberg, 1989)
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