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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL

Faculdade de Medicina/Programa de Pós-Graduação em Ensino na Saúde


ENS0005 – Planejamento de Educação na Saúde

Aula: Teorias administrativas e relação


com a gestão contemporânea

ROGER DOS SANTOS ROSA(1)

Reprodução do artigo DUSSAULT, Gil-


les. A Gestão dos Serviços Públicos de Sa-
úde: características e exigências. Revista de
Administração Pública, Rio de Janeiro, v.
26, n. 2, p. 8-19, abr./jun. 1992, para utili-
zação pelos alunos da disciplina ENS0005
– Planejamento de Educação na Saúde.

- Porto Alegre -
2021

(1) Médico; Doutor em Epidemiologia/PPGEpi-UFRGS; Mestre em Administração, PPGA/UFRGS;


Professor do Departamento de Medicina Social da Faculdade de Medicina/UFRGS; Analista do Banco
Central do Brasil; Especialista em Saúde Pública ENSP/FIOCRUZ e em Medicina Preventiva e Soci-
al/HCPA.

Ramiro Barcelos, 2600 - 5° andar - sala 520 - Porto Alegre – RS, 90010-035
tel. 3308-5327 e-mail: roger.rosa@ufrgs.br
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
Faculdade de Medicina/Programa de Pós-Graduação em Ensino na Saúde
ENS0005 – Planejamento de Educação na Saúde

A GESTÃO DOS SERVIÇOS PÚBLICOS DE SAÚDE:


CARACTERÍSTICAS E EXIGÊNCIAS*

Gilles Dussault**

“It is often the case that the


more fully a problem is under-
stood, the smaller will be the change
necessary to solve it. (K. E. Weick,
1989)

1. Introdução; 2. As organizações de serviços profissionais; 3. As organizações de ser-


viços de saúde; 4. As organizações de serviços públicos; 5. Qual o tipo de organização para
produzir serviços de saúde? 6. Qual o tipo adequado de gestão para as organizações públicas de
serviços de saúde? 7. A formação dos gestores dos serviços de saúde; 8. Conclusão.

Descrição das especificidades das organizações de saúde como organizações profissio-


nais, segundo a terminologia de Mintzberg. Identificação das características descritivas dos
serviços de saúde e dos serviços públicos. Implicações em termos de organização e de gestão
dos serviços e também de formação dos gestores.

Summary

Public health services management: characteristics and requirements.


Characterization of health organizations as professional organizations, using Mintz-
berg’s terminology of health services and of public services. The author discusses the conse-
quences of these specificities for the organization and management of health care services as
well as for the training of managers.

Palavras-chave:
Organizações profissionais; serviços públicos de saúde; especificidades; exigências de
gerência; formação de gerentes.

* Artigo recebido em dez. 1991 e aceito em mar. 1992.


** Ph.D em Sociologia; professor do Departamento de Administração de Saúde da Fa-
culdade de Medicina da Universidade de Montreal, Canadá; pesquisador-visitante no Departa-
mento de Administração e Planejamento em Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz, Rio de
Janeiro, RJ.

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Material didático para a aula sobre: Teorias administrativas e relação com a gestão con-
temporânea. (Roger dos Santos Rosa, 2021). Reprodução do artigo DUSSAULT, Gilles. A
Gestão dos Serviços Públicos de Saúde: características e exigências. Revista de Adminis-
tração Pública, Rio de Janeiro, v. 26, n. 2, p. 8-19, abr./jun. 1992.

Essa discussão deve levar-nos às se-


1. Introdução guintes indagações: a) que tipo de organiza-
ção é mais apropriado para produzir o impac-
A procura da melhoria do nível de to desejado sobre o nível de saúde de uma
saúde remete à questão da utilização eficiente população? b) que tipo de gestão pode favo-
dos recursos disponíveis para produzir servi- recer mais a eficácia e a eficiência dos servi-
ços de saúde. O desafio, em qualquer país, ços de saúde? c) como preparar os gerentes
consiste em aumentar a coerência entre os para esse tipo de gestão? Há outra questão,
recursos, os serviços e as necessidades da que fica fora do âmbito deste trabalho, mas
comunidade, isto é, tentar eliminar os dese- que é fundamental: quais serão as mudanças
quilíbrios geográficos (colocar os serviços necessárias no sistema brasileiro de serviços
onde estão as necessidades), numéricos (ex- de saúde e como realizá-las?
cesso de médicos, falta de enfermeiros), or-
ganizacionais (falta de serviços básicos, 2. As organizações de serviços pro-
abundância de serviços hospitalares). fissionais

Esse desafio é maior nos países po- O corpo de conhecimentos denomi-


bres devido à falta de recursos financeiros, nado Teoria das Organizações tem uma histó-
físicos e humanos. A hipótese deste artigo é a ria relativamente curta, de mais ou menos um
de que o aumento dos recursos não vai, de per século. Cresceu rapidamente, porém sem
si, elevar a eficácia nem a eficiência dos ser- produzir teorias capazes de refletir a comple-
viços. Maior volume de recursos administra- xidade das organizações. Sua imagem passou
dos de uma maneira] ineficiente resultará no de entidades programáveis, funcionando co-
aumento dos custos sem melhoria significati- mo máquinas, a sistemas complexos, mudan-
va do impacto dos serviços. Suponho a vali- do todo o tempo, adotando formas novas para
dade desse argumento, a reflexão sobre a se adaptar ao ambiente mutável. Gradualmen-
maneira de organizar e gerir os serviços de te, a visão racionalista e positivista (one bes-
saúde torna-se uma prioridade. A primeira tway) foi substituída por outra que aceitava a
etapa dessa reflexão é identificar as especiali- existência da indeterminação (contingência),
dades das organizações de serviços de saúde e, mais recentemente, segundo uma nova
para entender as exigências particulares da corrente de literatura1, uma visão “naturalísti-
sua gestão. ca”, que enfatiza a complexidade, o caráter
sistêmico e holográfico das organizações, a
Este artigo objetiva focalizar as pecu- multicausalidade e a indeterminação das mu-
liaridades das organizações públicas que pro- danças, bem como a inexistência de uma
duzem serviços de saúde, caracterizando-as ordem natural.
em termos de seus elementos constitutivos,
funcionamentos e problemas típicos, como A popularidade do uso de analogias e de me-
uma etapa no processo de reflexão sobre mu- táforas para explicar o funcionamento das
danças necessárias para melhorar o impacto organizações ilustra eloqüentemente a difi-
sanitário e social do sistema de serviços de culdade de teorização de uma realidade tão
saúde. Serão discutidas, sucessivamente: a) as
características das organizações de serviços
profissionais; b) as particularidades dos ser- 1
Lincoln, Y.S., ed. Organizational theory and
viços de saúde; c) as peculiaridades dos ser- inquiry; the paradigm revolution. Beverly Hills,
viços públicos. Sage Publications, 1985; Weick, K. E. Theory
construction and disciplined imagination. The
Academy of Management Review, Massachusetts,
University of Massachusetts, 14:516-31, 1989.
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complexa. Num livro importante, Morgan2 agências de regulamentação, grupos de inte-


propõe uma síntese da literatura segundo oito resse).
metáforas: a organização como máquina,
organismo, cérebro, cultura, sistema político, A estrutura de uma organização é o
“presídio psíquico”, fluxo e transformação, e conjunto de mecanismos de divisão e de co-
como instrumento de dominação. Segundo ordenação do trabalho4. Organizações utili-
ele, qualquer organização tem várias dimen- zam vários mecanismos de coordenação, mas
sões, o que exige várias maneiras de “pensá- habitualmente enfatizam um deles, quer seja
las”. É o que as metáforas permitem. o ajustamento mútuo, através da comunicação
informal, quer seja a supervisão direta (uma
Outra estratégia de explicação do pessoa dá ordens ou instruções), a padroniza-
funcionamento das organizações é considerá- ção dos processos, dos resultados, das quali-
las em termos de configurações, isto é, de ficações ou das normas de comportamento; o
sistemas típicos de relações entre atributos tipo de agrupamento das unidades (por fun-
básicos, cada uma tendo características, modo ção, clientela, de produção, por região, etc.),
de funcionamento e problemas específicos: tipo de mecanismo de ligação entre as unida-
Mintzberg3, a partir de observações empíri- des, de sistema de planejamento e de contro-
cas, identifica sete configurações que corres- le; e o grau de centralização da tomada das
pondem às principais combinações de atribu- decisões.
to. (ver anexo 1). Essa tipologia pode ajudar a
compreender as organizações de serviços de Finalmente, há fatores contingenciais
saúde e a definir as condições de sua gestão. ou “situacionais” que influenciam as deci-
sões relativas aos parâmetros básicos: a
Mintzberg propõe que qualquer orga- idade e o tamanho da organização (organiza-
nização pode ser descrita como constituída ções maiores e mais velhas tendem a estar
de “operadores” que produzem bens ou mais formalizadas); o sistema técnico de pro-
serviços (operating core); de um centro de dução (sistemas tipo assembly line favorecem
decisão (strategic apex ); de gerentes, mais a burocratização; sistemas complexos, em
numerosos à medida que a organização cresce termos de equipamento usado, exigem o de-
(middle line); de especialistas, técnicos ou senvolvimento do apoio técnico); o ambiente
analistas, se for necessário, que planejam o (estabilidade facilita a formalização, comple-
trabalho dos operadores (technostructure); de xidade exige descentralização, hostilidade
pessoal de apoio (support staff). São os com- encoraja a centralização da decisão); a orga-
ponentes básicos da organização, ligados (ou nização do poder (o controle externo maior
divididos) por crenças, representações, tradi- induz à centralização e formalização: coliga-
ções que compõem a cultura da organização. ções divididas induzem à politização).

Os membros da organização formam Configurações organizacionais são


uma “coligação interna” que disputa a distri- combinações típicas de atributos básicos,
buição de poder e dos recursos, distinta da resultado da interação das forças que influen-
“coligação externa”, isto é, os grupos que ciam a organização. Tipicamente, hospitais,
tentam influenciá-la (cliente, competidores, universidades, firmas de serviços profissio-
nais (contabilidade, engenharia, serviços jurí-
2
Morgan, G. Images of organization. Beverly dicos, sociais, etc.) são organizações que
Hills, Sage, 1986. dependem, para funcionar bem, de seus ope-
3
Mintzberg, H. The structuring of organizations.
4
Englewood Cliffs, N.J., Prentice-hall, 1979; ____. _______________. Inside our strange world of
Inside our strange world of organizations. New organizations. op. Cit. P. 100-1
York, The Free Press, 1989.
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radores, em primeiro lugar. Mintzberg as eles atendem a necessidades complexas e


chama “organizações profissionais”: o traba- variáveis que têm dimensões (biofísicas, psi-
lho de produção exige qualificações de alto cossociais), e cuja definição varia em função
nível e não se presta bem a formalização. O de classe social e das respectivas representa-
mecanismo dominante de coordenação é a ções de saúde, da doença, da morte; da clien-
padronização das qualificações: o saber e as tela (crianças, velhos, homens e mulheres) e
habilidades são formalizados através do pro- do tipo de problema (agudo, crônico). Há
cesso de formação e as normas definidas variações individuais e, até certo ponto, cada
pelas associações profissionais. Porém, por problema é único: casos simples também
causa da complexidade e da variabilidade de comportam elementos de risco para o consu-
seu trabalho, os profissionais conservam mui- midor. Serviços ruins podem causar prejuízos
ta discrição nas decisões relativas ao tipo e a graves. Por isso, os serviços de saúde têm de
maneira de produzir os serviços. Em conse- respeitar normas de qualidade, mas, ao mes-
qüência, o papel da technostructure, dos ge- mo tempo, não podem estar formalizados
rentes e também do locus de tomada de deci- demais. Os prestadores precisam de autono-
são pode ficar limitado. mia para adaptar os serviços às necessidades
específicas dos usuários.
Os profissionais precisam de serviços
de apoio (auxiliares, técnicos, manutenção, No setor saúde, os usuários nem
etc.), mas eles podem produzir quase sem os sempre têm a informação para definir suas
outros componentes da organização. necessidades e a maneira de atendê-las. Nas
últimas décadas, a elevação dos níveis educa-
O ambiente dessas organizações é ge- cionais e a vulgarização do conhecimento
ralmente complexo, embora estável. Quando médico contribuíram para reduzir a depen-
são de grande porte, uma certa burocracia dência dos consumidores, mas permanece
aparece. Os profissionais vão tentar controlá- uma falta de informação que os coloca em
la para manter seu poder sobre decisões que posição de subordinação parcial diante do
influenciam seu trabalho (condições de traba- profissional. As regras do mercado não se
lho, sistema de produção, distribuição de aplicam à área de saúde da mesma maneira
recursos). A autonomia profissional tende a que nos outros setores.
favorecer a segmentação em grupos com
interesses divergentes, o que explica a difi- Um problema adicional é o da relação
culdade de fazer mudanças ao nível da orga- entre os serviços e a saúde: os resultados dos
nização como unidade. Paradoxalmente, mu- serviços (outcomes) são difíceis de medir,
danças acontecem facilmente ao nível das particularmente nos casos complexos, como
unidades, justamente por causa da autonomia os problemas psicossomáticos, as doenças
dos operadores. Por natureza, esse tipo de mentais, crônicas, os casos de co-morbidade.
trabalho é difícil de ser formalizado e contro- Aceita-se mais facilmente, hoje, que a saúde
lado; então a centralização e a burocracia não é determinada por um conjunto de indicado-
são estratégias administrativas compatíveis res (biológicos, comportamentais, ambien-
com a produção de serviços de bom nível. tais), cujas relações não são bem conhecidas5.
A capacidade dos serviços de saúde de resol-
3. As organizações de serviços de ver os problemas é limitada tanto por causa
saúde de sua natureza, que exige intervenções de
5
Os serviços de saúde têm característi- Evans, R. Stoddart G.L.L. Producing health:
cas que geram exigências particulares, em consuming health care. Social Science and Medi-
termos de organização e de gestão. Primeiro, cine, New York, Pergamon Press, 31(12):1.347-
63, 1990.
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vários tipos, quanto por causa de sua nature- 4. As organizações de serviços pú-
za, que exige intervenções de vários tipos, blicos
quanto por causa da sua própria ineficácia
relativa, evidenciada pelas avaliações cientí- As organizações de serviços públicos
ficas disponíveis6. dependem em maior grau do que as demais
do ambiente sociopolítico: seu quadro de
A prestação de serviços de saúde funcionamento é regulado extremamente à
também comporta uma dimensão ética e mo- organização. As organizações públicas po-
ral importante: há problemas de ética biomé- dem ter autonomia na direção dos seus negó-
dica, como os ligados ao sigilo, ao direito do cios, mas, inicialmente, seu mandato vem do
usuário à informação sobre a sua condição, à Governo, seus objetivos, pelo menos os ge-
garantia de continuidade do tratamento (pre- rais, são fixados por uma autoridade externa.
maturos, pacientes na fase terminal), inter- Freqüentemente, incluem outras dimensões,
venções experimentais, eutanásia. Há também além das técnicas, podendo, potencialmente,
problemas de ética administrativa relativos à tornar-se contraditórios aos objetivos funda-
escolha das prioridades (crianças ou idosos, mentais. Por exemplo, a vontade de reduzir
serviços preventivos ou equipamentos supe- os custos dos serviços estatais, um objetivo
respecializados), à alocação dos recursos, o econômico, pode entrar em contradição com
que sempre implica custos de oportunidade objetivos de acessibilidade a certos serviços.
num contexto de recursos limitados (o que Um objetivo político, como responder às
vai para um setor priva um outro setor), ao expectativas de uma comunidade particular –
acesso aos serviços, ao respeito dos usuários, por exemplo, concedendo um hospital ou
ao uso da informação relativa à eficácia das qualquer outro tipo de infra-estrutura – pode
intervenções. ser contrário ao objetivo de distribuir os re-
cursos de acordo com as necessidades.
Finalmente, por causa da sua impor- Igualmente, os recursos disponíveis tendem a
tância social e econômica, o setor saúde é depender da decisão política e das flutuações
uma área disputada por atores que têm inte- da capacidade econômica do Estado. Em
resses divergentes: os usuários, que querem outras palavras, as organizações de serviços
serviços de qualidade, mas baratos; os profis- públicos são mais vulneráveis à interferência
sionais, que querem desenvolver seu conhe- política, no sentido geral do termo.
cimento, suas habilidades, sua profissão, ob-
ter uma boa renda, prestando bons serviços; Existe, também, uma probabilidade
as empresas de materiais e produtos; os segu- de contaminação burocrática, isto é, o tipo de
ros; os estabelecimentos privados que querem regulamento desenvolvido na burocracia esta-
fazer bons negócios; o Governo, que quer tal tende a ser aplicado a qualquer organiza-
benefícios políticos, etc. A reflexão sobre a ção pública.
organização e a gestão dos serviços de saúde
deve considerar essas particularidades e não Da mesma maneira, as condições e a
pode contentar-se em tratar o setor saúde organização do trabalho tendem a uniformi-
como qualquer outro. zar-se no setor público. A autoridade dos
dirigentes é delegada e, tipicamente, o âmbito
da decisão é mais limitado que no setor pri-
6
Wennberg, J. E. On the status of the scientific vado. Mintzberg menciona que, nesses casos,
basis of clinical medicine and the need for better como os dirigentes são responsáveis perante
science policy to promote the evaluative clinical uma autoridade externa ao sistema, observa-
sciences. International Conference on Quality se uma tendência à centralização das deci-
Assurance and Effectiveness in Health Care. To- sões.
ronto, Canada, 9.11.89, 16 p.
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Nas organizações profissionais, ob-


Enfim, as organizações públicas têm serva-se também um problema de coordena-
uma obrigação de prestar serviço, um dever ção entre os prestadores e os administradores.
de atendimento que não existe no setor priva- Tipicamente, os profissionais são leais, pri-
do. Os cidadãos têm direito de receber servi- meiro, a sua profissão; depois, a sua organi-
ços, o que significa, em princípio, que não zação. Isso é, muitas vezes, institucionalizado
existe a possibilidade de selecionar a cliente- na coexistência de uma estrutura profissional,
la, os problemas a atender, nem os serviços a que supervisiona a qualidade do trabalho de
produzir. Não é possível repelir os casos difí- acordo com as normas das associações profis-
ceis ou dispendiosos. Evidentemente, esse sionais e uma estrutura administrativa, res-
dever de atendimento está, habitualmente, em ponsável pelo alcance dos objetivos da orga-
contradição com a limitação dos recursos. De nização. Um problema maior de gestão con-
outro lado, as organizações públicas não são siste, justamente, em suscitar a adesão dos
submetidas às regras do mercado e podem profissionais aos objetivos organizacionais,
sobreviver mesmo quando não são eficientes. sabendo que controlar demais e privá-los da
sua autonomia só vai impedir a prestação de
O objetivo desta discussão é enfatizar serviços de boa qualidade. Há um outro pro-
as especificidades das organizações de saúde: blema ligado a essa questão do controle e da
são organizações profissionais por causa de autonomia: como assegurar, ao mesmo tem-
sua dependência em relação trabalho de espe- po, a autonomia e a discrição profissional e
cialistas, produzindo serviços que requerem prevenir a falta de consciência profissional e
autonomia de prática. Os serviços produzidos a incompetência? Associações profissionais
atendem a necessidades multidimensionais e pretendem garantir a qualidade dos serviços
são difíceis de avaliar. Valores e julgamentos dos seus membros, mas, na realidade, tendem
morais desempenham um papel significativo a ser mais reativas do que proativas, isto é,
nas decisões relativas à produção desses ser- elas vão reagir frente a casos de flagrantes,
viços. Enfim, são serviços públicos. Essas erros ou culpas, mas pouco farão para preve-
três dimensões implicam problemas típicos nir a ocorrência de tais erros. Na área da saú-
de organizações e de gestão. O melhor co- de, o problema é ampliado pela incerteza
nhecimento deles pode ajudar a escolher as quanto ao que seja “a boa prática médica”
melhores estratégias para desenhar organiza- (como, ademais, em relação a outras ativida-
ções capazes de atingir os objetivos de saúde des). As variações, na prática,7 mostram que
da comunidade. Por exemplo, organizações existe discordância ou, pelo menos, flexibili-
profissionais enfrentam problemas de coor- dade nas normas profissionais, entre profis-
denação entre os grupos de profissionais: sões e dentro de cada uma. Dessa descrição
cada um se define como o único especialista das organizações públicas de serviços de
no seu ramo e tenta protegê-lo ardentemente. saúde, temos de tirar os ensinamentos que
No setor saúde, onde os problemas exigem a possam ajudar-nos a desenhá-las e geri-las
colaboração de profissionais de muitas disci- de maneira eficiente.
plinas, por causa da multidimensionalidade e
da multicausalidade, essa coordenação é tanto 5. Qual o tipo de organização para
necessária quanto difícil. A prática “interdis- produzir serviços de saúde?
ciplinar” supõe uma desconsideração das
fronteiras disciplinares e exige uma renúncia
ao corporativismo e às rivalidades profissio-
7
nais. Payer, L. Medicine and culture. Varieties of
treatment in the United States, England, West
Germany and France. New York, Holt, 1988.

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Está implícito, no retrato que se pre- de assegurar a adaptação dos serviços. Não
tende traçar, que os serviços de saúde têm a significa que os usuários participem necessa-
finalidade de elevar o nível de saúde da popu- riamente de cada etapa da tomada de decisão,
lação, o que é um objetivo tanto político o que pode tornar-se participação da fachada.
quanto técnico. Está implícito também que Importa que eles participem das decisões
existem outros objetivos, mais ou menos estratégicas (escolha das prioridades, mudan-
ocultos, que podem contrariar essa finalidade. ças radicais) e que sejam os últimos juízes do
Considerando as organizações de saúde como resultado dos serviços, ou seja, possam exer-
organizações profissionais, devemos lembrar cer o seu direito de receber serviços de acor-
que não será produtivo formalizar o processo do com suas necessidades. A maneira de or-
de produção nem instituir mecanismos de ganizar essa participação pode variar e, aqui
coordenação autoritários, ao menos em rela- também, mecanismos formalizados demais
ção ao trabalho dos profissionais. Por outro podem mostrar-se ineficientes.
lado, devemos prevenir que, por falta de co-
ordenação entre seus componentes, essas 6. Qual o tipo adequado de gestão
organizações podem tornar-se menos políti- para as organizações públicas de serviços
cas. A burocracia e a centralização excessivas de saúde?
ou, na outra extremidade, a autonomia sem
imputabilidade vão criar organizações inca- O tipo de gestão que parece mais
pazes de desempenhar seu papel. Para enfren- adequado a essas organizações é mais o con-
tar as mudanças das necessidades e das ex- sensual, colegiado, do que o autoritário. É
pectativas da sua clientela, as organizações de uma gestão que reconhece o papel central dos
saúde devem ser flexíveis e capazes de res- profissionais e, ao mesmo tempo, tem meca-
ponder às exigências mutáveis. Sendo organi- nismos para evitar os efeitos não desejados da
zações de serviços profissionais, têm de faci- autonomia de prática profissional e do corpo-
litar o trabalho autônomo dos prestadores e, rativismo. Essa gestão enfatiza a definição de
ao mesmo tempo, garantir que esse trabalho mecanismos de tomada de decisão que envol-
seja coerente com os objetivos organizacio- vem os profissionais tanto ao nível das for-
nais. Isso convida a conceber organizações mulação dos objetivos e das orientações ge-
descentralizadas e flexíveis, isto é, com a rais quanto da avaliação dos resultados: essa
capacidade autônoma de tomar decisões rápi- gestão aceita que os profissionais trabalhem
das em função de seus problemas próprios e não por obedecer as ordens, mas por respon-
das peculiaridades do seu ambiente. A auto- sabilidade. O desafio da gestão das organiza-
nomia dos profissionais não é tanto um direi- ções de saúde consiste em responsabilizar os
to quanto uma condição necessária para a prestadores pela criação de um ambiente pro-
produção de serviços de boa qualidade. Me- pício ao trabalho multiprofissional e pela
canismos de controle da qualidade e de impu- integração da participação de usuários no
tabilidade, administrados de maneira transpa- processo de produção dos serviços. Por defi-
rente, na perspectiva de melhorar os serviços, nição, esse tipo de gestão é mais democrático,
podem evitar os riscos ligados à concessão de no sentido de associar os prestadores ao pro-
mais autonomia. cesso gerencial. Porém, existe a possibilidade
da politização da gestão, o que acontece com
De acordo com a natureza social da certeza quando os dirigentes são nomeados de
definição das necessidades, parece sensato acordo com critérios políticos e não por crité-
associar a comunidade à identificação das rios de competência gerencial. A clarificação
necessidades e à avaliação dos serviços. Pro- das regras do jogo ajuda a prevenir a politiza-
curar o ponto de vista dos usuários (atuais e ção excessiva. Por exemplo, é possível apli-
potenciais) deve ser considerada uma maneira car-se a regra de que os objetivos podem – na
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realidade, devem – ser debatidos na etapa da rente no setor saúde, em termos de conheci-
formulação, mas precisam ser respeitados mento, de habilidades e também de atitudes.
após sua adoção. É claro que elas variam em relação ao volume
de responsabilidade, ao tipo de serviços pro-
No setor saúde, a gestão tem que ser duzidos e ao contexto.8 Concentrando-nos
orientada para o ambiente e adaptar-se às sobre os dirigentes ao nível de direção dos
mudanças demográficas, epidemiológicas e estabelecimentos, podemos sugerir que eles
sociais, o que exige flexibilidade. Uma gestão precisam ter capacidade intelectual e inter-
burocrática não pode fazer isso. pessoal que permita enfrentar um ambiente
complexo, variável e cheio de limitações. A
Considerando que a complexibilidade capacidade intelectual inclui a capacidade de
dos problemas de saúde exige, cada vez mais, identificar e analisar os problemas de sua
trabalho multiprofissional, as prioridades dos organização profissional, o processo de pro-
gestores mudam e se vinculam ao objetivo de dução de serviços de saúde, a rede de rela-
criar condições de prática favoráveis a esse ções de sua organização com o ambiente, as
tipo de trabalho. Isso implica ações como: necessidades da comunidade e sua distribui-
definir mecanismos de coordenação e de to- ção e evolução.
mada de decisões dentro das equipes; garantir
a estabilidade das equipes, que é uma condi- Uma outra capacidade importante é a
ção da criação de um ambiente de confiança; de adaptação, isto é, de ajustar suas decisões
adaptar-se ao mecanismo de avaliação de e ações a um contexto particular. Inclui a
pessoal; definir estratégias de formação para faculdade de aprender, a partir de seus erros,
facilitar a passagem do exercício individual e de se formar para poder enfrentar, com
ao trabalho de equipe. As ações mais estraté- eficácia, problemas inéditos. Uma outra ma-
gicas dos gestores estão ligadas à seleção de neira de apresentar esse tipo de capacidade é
pessoal e à formação das unidades de produ- saber definir objetivos e estratégias e divulgá-
ção. A possibilidade de definir as necessida- los, tanto dentro como fora de sua organiza-
des da organização em termos de recursos ção.
humanos, de fazer a seleção, de avaliar e,
eventualmente, de transferir o pessoal é es- Um ambiente profissional exige a ca-
sencial à constituição de organizações de pacidade de fazê-lo em colaboração, em
saúde capazes de se adaptar a seu ambiente. equipe. Os dirigentes não podem produzir os
Finalmente, é quase supérfluo mencionar a serviços nem realizar os programas pessoal-
gestão de serviços públicos exige uma ética mente: os que sabem recrutar bons colabora-
que privilegie o bem-estar dos usuários e da dores, formá-los e ajudá-los a crescer profis-
comunidade, que considere os recursos dis- sionalmente e individualmente, contribuem
poníveis como um bem coletivo a ser usado muito para elevar a qualidade dos serviços.
eficientemente e com eqüidade. Em suma, Ao nível técnico, não importa que os dirigen-
uma ética própria de servidor da comunidade. tes sejam especialistas em cada área de ges-
O desafio dos dirigentes, além de ser modelos tão ou produção de serviços de saúde, mas
de comportamento ético, é suscitar a adesão eles têm de entender o que seus profissionais
dos membros de sua organização a essa ética. fazem e ser capazes de solicitar e utilizar as
informações que possam melhorar o processo
7. A formação dos gestores dos ser- de tomada de decisão.
viços de saúde
8
Whithley, R. On the nature of managerial tasks:
Tudo o que foi dito anteriormente in- their distinctive characteristics and organization.
dica algumas das exigências do papel do ge- Journal of Management Studies, Oxford, England,
Basil Blackwell & Mott, 28(3):209-24, 1989.
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Material didático para a aula sobre: Teorias administrativas e relação com a gestão con-
temporânea. (Roger dos Santos Rosa, 2021). Reprodução do artigo DUSSAULT, Gilles. A
Gestão dos Serviços Públicos de Saúde: características e exigências. Revista de Adminis-
tração Pública, Rio de Janeiro, v. 26, n. 2, p. 8-19, abr./jun. 1992.

acham que a formação de gerente deveria


Esse retrato pode parecer bem idea- estar voltada para pessoas com experiência,
lístico, mas só corresponde às características que seria utilizada como base para organizar
das organizações públicas de saúde e as suas a formação.
exigências. A gestão não é uma ciência, use
seu conhecimento das disciplinas que estu- O objetivo seria ajudar o gerente a
dam os processos de administração das orga- avaliar suas capacidades (forças e fraque-
nizações; não é uma técnica, embora use um zas) e a formar-se de maneira autônoma,
conjunto de métodos e instrumentos formais; utilizando-as de acordo com suas necessi-
não é uma arte, que só pode ser praticada dades. A formação pode ajudar o gerente a
pelos indivíduos com vocação inata. Necessi- aprender a comunicar-se, incluindo a “arte”
ta, porém, de intuição, empatia, visão, imagi- de escutar, a “ler” sua organização e seu am-
nação. Na verdade, gerir tem dimensões cien- biente, a tirar lições de seus sucessos e fra-
tíficas, técnicas, “artísticas”, da mesma forma cassos, a tornar-se o formador dos seus cola-
que a medicina, por exemplo, embora em boradores. Esse gerente vai poder adaptar-se
proporções diferentes. Resta discutir se é a situações mutáveis e, mais facilmente, mo-
possível formar dirigentes com esse perfil. bilizar o potencial da sua organização e de
seus membros para atingir os resultados dese-
É quase evidente que são necessárias jados.
aptidões básicas para gerir, mas elas não bas-
tam. Pode-se apreender os conceitos, méto- Nada sugere aqui que tipo de profis-
dos, instrumentos básicos de gestão, particu- sional é mais adequado para gerir uma orga-
larmente os que ajudam a concepção e a im- nização de saúde. Pode ser um profissional de
plantação de uma gerência estratégica, orien- saúde ou de uma outra área. O necessário é
tada para resultados mensuráveis, de acordo que possua as capacidades, o conhecimento,
com objetivos de saúde. a formação dos ges- as atitudes compatíveis com as exigências da
tores pode incluir também o aprendizado dos gerência desse tipo de organização. Da mes-
conceitos e modelos explicativos que ajudam ma maneira, não há um tipo único de forma-
a entender o funcionamento do sistema de ção. Não seria coerente com nossa descrição
saúde e do sistema de serviços. De um lado, das características e exigências para gestão
precisa incluir o conhecimento dos fatores das organizações de saúde propor programas
ligados à saúde e as necessidades de uma formais e padronizados da formação. A for-
comunidade; de outro, deve incluir o conhe- mação dos gerentes pode ser feita de várias
cimento do quadro jurídico e institucional da maneiras e os formadores têm que imaginar
organização e da prestação de serviços, da programas adaptados às necessidades dos
dinâmica de relações entre os atores do setor alunos, em lugar de reproduzir os modelos
saúde e da tomada da decisão em relação à tradicionais que, às vezes, atendem mais às
escolha das prioridades e à alocação dos re- necessidades dos formadores do que às dos
cursos. alunos. Os programas devem desenvolver
capacidades analíticas e intervencionistas, o
Em relação às habilidades e às atitu- que exige a utilização da competência aca-
des, podem ser desenvolvidas por atividades dêmica, da experiência em pesquisa e em
de formação tanto autodidatas quanto for- formação, em conjunto com a de gerentes de
mais. Muitos educadores, como Mintzberg,9 alto nível que tiveram experiências significa-
tivas. Esse tipo de aliança constrói-se sobre
uma base de confiança e de respeito mútuo.
9
Mintzberg, H. Inside our strange world of or- Um modo de criá-la é refletir em conjunto
ganizations. op. Cit sobre os programas a desenvolver.
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tração Pública, Rio de Janeiro, v. 26, n. 2, p. 8-19, abr./jun. 1992.

para organizar e gerir os serviços de maneira


8. Conclusão a atingir os resultados capazes de melhorar o
bem-estar dos indivíduos e das comunidades.
A visão da contribuição dos serviços Acreditamos que uma compreensão mais
de saúde para a melhoria do bem estar dos completa dos problemas pode diminuir a
indivíduos e das comunidades mudou radi- amplitude das mudanças a serem efetuadas
calmente nas últimas décadas. Há 50 anos, os para resolvê-los. Já é um modo de ser mais
que conceberam o sistema nacional de servi- eficiente.
ços de saúde inglês (National Health Service)
estavam convencidos de que a ampliação do
acesso aos serviços médicos e hospitalares
iria diminuir o consumo dos serviços por
causa da melhoria, do nível de saúde e da
diminuição das necessidades. Outros países
estabeleceram programas de seguro-saúde
perseguindo os mesmos objetivos. Gradual-
mente, verificou-se que os serviços são ape-
nas um dos determinantes da saúde (uma
evidência esquecida na época de confiança
ilimitada na capacidade da ciência e da medi-
cina moderna); que a eficácia dos serviços é
limitada, que não existe uma correlação direta
entre o volume de recursos e de serviços e a
saúde de uma população.

As implicações disso são a necessi-


dade de formular políticas de saúde que in-
cluam ações sobre todos os determinantes da
saúde e que não se limitem às ações tradicio-
nais de um Ministério da Saúde. E ainda vin-
cular a alocação de recursos e o desenvolvi-
mento de serviços a objetivos de saúde ex-
pressos em termos de indicadores observáveis
de uma maneira eficiente, o que implica a
escolha de intervenções eficazes e uma gestão
também eficaz. No setor saúde, a gestão é
difícil por causa da complexidade dos pro-
blemas a resolver e da natureza dos serviços a
produzir. Ela não pode ser reduzida a um
conjunto de técnicas ou de receitas. A tese
aqui defendida é que a gestão dos serviços de
saúde pode ser eficiente. Isso exige que sejam
criadas condições organizacionais congruen-
tes com as peculiaridades e as exigências da
produção de serviços profissionais no contex-
to público. A melhor compreensão das orga-
nizações de saúde e da relação entre recursos
– serviços-saúde – pode indicar estratégias
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Anexo 1
As configurações organizacionais (Mintzberg, 1989)

Configuração (ti- Mecanismo de Componente- Características dominantes


po de organização) coordenação prin- chave da organiza-
cipal ção
Empreendedora Supervisão Centro de decisão Líder carismático/autoritário
direta Estrutura Simples, pouca hie-
rarquização
Organização em desenvolvi-
mento ou em crise
Mecanicista Padronização do Tecnoestrutura Burocracia centralizadora
processo de Trabalho formalizado
produção Comum nas organizações de
produção de grande volume

Profissional Padronização Operadores Dependência sobre os profissio-


das qualificações nais
Normas de prática definidas por
fora
Estrutura dupla: administrati-
va/profissional
Diversificada Padronização de Gerentes Componentes quase autônomos
resultados (middle-line) Centro controla os resultados
Comum nas organizações de
produção variada
Inovadora Ajustamento Pessoal de apoio Pouca formalização
mútuo Funcionamento por projeto
Descentralização
Missionária Padronização Ideologia Sistema de valores e de crenças
das normas muito desenvolvido (tradições,
rituais, etc.)
Centralidade da missão
Valoriza lealdade dos membros
Política Nenhum Nenhum Jogos de poder substituem-se ao
sistema formal de coordenação
Alta prevalência de conflitos

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