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O discurso: um
novo objeto, uma
nova disciplina?
AULA
Fernanda Lunkes
Mercedes Marcilese
Silmara Dela Silva
Meta da aula
Apresentar o discurso como objeto nos estudos
da linguagem e o campo teórico
da análise de discurso.
objetivos
Pré-requisitos
Antes de iniciar esta aula, sugerimos a leitura
do prefácio e do texto “O discurso”, primeira
parte do livro: ORLANDI, E. P. Análise de discurso:
princípios e procedimentos. 3. ed. Campinas, SP:
Pontes Editores, 2001. p. 9-22.
Linguística III | O discurso: um novo objeto, uma nova disciplina
INTRODUÇÃO Desde o início desta nossa disciplina, temos pensado no quanto a linguagem
é complexa. Tal complexidade fica evidente quando tentamos definir o que é
a própria linguagem e também quando observamos, na história dos estudos
linguísticos, a pluralidade de objetos selecionados pelas diferentes perspectivas
teóricas para o seu estudo. A língua, a enunciação, a conversa e o texto são
somente alguns exemplos desses múltiplos objetos que já estudamos até aqui.
Nesta aula, vamos começar a falar mais diretamente sobre outro objeto de
estudos: o discurso. Você sabe o que é discurso? Perguntando assim, tão
diretamente, pode até parecer que se trata de uma pegadinha, não é mesmo?
Afinal, o termo discurso não é exatamente uma novidade neste curso: já fala-
mos em gêneros do discurso, quando apresentamos as propostas de Bakhtin
para o estudo da língua na interação verbal; mais recentemente, estudamos
a semiótica discursiva, com atenção para cada um dos níveis do percurso
gerativo do sentido, inclusive para o nível discursivo... E nos atentamos para
a diferença entre texto e discurso nessa perspectiva teórica.
Como já vimos falando de discurso há um bom tempo, parece óbvio que
sabemos do que se trata... Mas quem disse que o óbvio não pode ser ques-
tionado? Como veremos, o discurso que interessa às análises discursivas não é
aquele que é feito em festinhas familiares e tampouco aquele que os políticos
fazem quando inauguram uma obra ou estão em campanha eleitoral, embora
todas essas situações possam ser tomadas para análise.
O discurso, enquanto objeto teórico, possui a sua especificidade. É para
pensarmos esse objeto, o discurso, que vamos iniciar a aula de hoje com a
leitura de alguns textos que tratam da velhice. Você já reparou nos diferentes
modos que temos de significar a velhice em nossa sociedade? Um exemplo
está no quadro “Mulher jovem e mulher velha”, de Albrecht Dürer. Em sua
obra, o artista alemão aborda a velhice, significando-a em relação à juventude,
ao estabelecer o contraponto entre as faces das duas mulheres (ou seria a
mesma mulher?) nela representadas.
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AULA
Figura 14.1: Mulher jovem e mulher velha (1520), do artista alemão
Albrecht Dürer.
Fonte: http://www.wikipaintings.org/en/albrecht-durer/an-young-and-old-
woman-from-bergen-op-zoom-1520
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ciência, no segundo fragmento, ela é vista de outro modo, como comparável
ao por do sol, período que antecede a noite, mas que possui uma beleza ímpar,
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que merece ser apreciada por todos.
E você, com qual dos sentidos para a velhice se identificou mais após a lei-
tura? Com o sentido da velhice como uma doença e que, portanto, precisa
de uma cura? Ou com aquele que a identifica a um momento de sabedoria
diante da vida propiciada pela certeza de finitude?
Figura 14.2: A velhice pode ser significada de diferentes modos, por isso, pode-
mos dizer que são muitos os discursos sobre a velhice que circulam na atualidade.
Fontes: Laboratório: http://openclipart.org/detail/667/doctor-by-jicjac (JicJac); Pôr do sol:
http://openclipart.org/detail/3994/sunset-by-nicubunu (nicubunu); Com bengala: http://
openclipart.org/detail/91291/al-old-man-by-cybergedeon (cybergedeon); Pensando: http://
openclipart.org/detail/171299/indecisive-silhouette.svg-by-tulvur-171299 (ulvur)
Para além desses dois sentidos, privilegiados nos fragmentos textuais que
selecionamos para iniciar esta aula, muitos outros modos de significar a velhice
estão por aí, circulando em nossa sociedade, o que se marca até mesmo nas
variadas expressões que usamos diariamente: velhice, terceira idade, melhor
idade... São apenas algumas delas. É por isso que podemos dizer que são
vários os discursos sobre a velhice, e é com eles (ou com alguns deles) que
nós, seres interpretantes, somos chamados a nos identificar.
Estudar a linguagem pelo viés do discurso é, assim, um modo de se ocupar de
questões semânticas, de questionar os modos como se produzem os sentidos,
como você já deve ter notado em nossos estudos sobre a semiótica discursiva.
Além dela, são várias as perspectivas de estudos da linguagem que se interessam
pelo discurso. Mas, de maneira geral, podemos dizer que todas têm em comum
o interesse pelo funcionamento da língua, pela língua produzindo sentidos.
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Ricardo Maia
Nesta aula, vamos estudar as propostas teóricas das chamadas linguísticas dis-
cursivas, observando com mais atenção o discurso, em suas variadas acepções
no campo dos estudos da linguagem. Também vamos tratar da constituição
de algumas das principais tendências de análises discursivas e, em especial,
de uma de suas vertentes: a análise de discurso de linha francesa.
A expressão análise do discurso (discourse analysis, em inglês) é citada pela
primeira vez pelo linguista norte-americano Zellig Harris, em 1952, há 60 anos.
Desde então, muito se falou e se fala em discurso. Em suas diferentes concep-
ções, o discurso já pode ser considerado um objeto de estudos sexagenário...
E tomá-lo como objeto de análise nos permite olhar para a linguagem de um
modo ímpar, considerando a beleza de seu funcionamento sócio-histórico.
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NA “ÁRVORE” DOS ESTUDOS DA LINGUAGEM, OS RAMOS
DO DISCURSO
AULA
Você já deve ter tido a oportunidade de ver uma árvore genea-
lógica, não é mesmo? A árvore, com seus múltiplos galhos e ramos, é
bastante usada para representar graficamente as origens de uma família
e suas descendências: um casal, seus filhos que se casam ou não, os netos
que chegam, que mais tarde também têm filhos, e assim sucessivamente.
Trata-se mesmo de um processo sem fim, com uma origem que também
é apenas estimada pela genealogia, já que pode sofrer alterações se são
encontradas novas ascendências de uma família.
Nos estudos da linguagem, a metáfora da árvore genealógica
vem bem a calhar: cada nova disciplina, vertente ou ponto de vista
sobre a linguagem, ao estabelecer relações de proximidade e, em
alguns casos, “casamentos” com outras áreas, faz com que novos
galhos brotem nessa árvore.
nicubunu
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frodoxv
Fonte: http://openclipart.org/
detail/3672/family-by-frodoxv
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A semântica nos estudos da linguagem
AULA
Como vimos em nossa Aula 8, o filólogo francês Michel Bréal é conside-
rado o fundador da semântica moderna por ter sido o primeiro a usar o
termo “semântica” para se referir ao estudo dos sentidos. Em seu Ensaio
de semântica, publicado em 1897, Bréal propõe a necessidade de um
novo ramo de estudos, que se ocupasse da significação na linguagem,
ao qual denomina semântica.
A primeira menção ao termo semântica é feita por Bréal no texto “As
leis intelectuais da linguagem. Fragmentos de semântica”. Assim diz
Bréal nesse texto:
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enunciados” (PAVEAU; SARFATI, 2006, p. 191). Desse modo, esses estudio-
sos adotam como ponto de partida a proposta do linguista norte-americano
AULA
Zellig Harris que, como vimos na introdução desta aula, foi o primeiro a
usar a expressão análise do discurso, no ano de 1952.
Harris emprega a expressão em inglês discourse analysis em sua
proposta de estudo da dimensão transfrástica da linguagem, que consiste
na análise linguística para além da frase, e que dará origem à proposta
da linguística textual. Sobre a tradição de análises transfrásticas nós
já falamos lá em nossa quarta aula, quando estudamos o texto como
objeto teórico.
Fonte: http://openclipart.org/detail/85393/
search-for-fingerprints-by-jhnri4
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situa-se fora de qualquer reflexão sobre a significação e as consi-
derações sócio-históricas de produção que vão distinguir e marcar
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posteriormente a análise do discurso (BRANDÃO, 2004, p. 14).
Centro academico
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ção com a linguagem. Para entendermos melhor, vejamos a explicação
dada por Mussalim:
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[...] o que diferencia a Análise do Discurso de origem francesa
da Análise do Discurso anglo-saxã, comumente chamada de
americana, é que esta última considera a intenção dos sujeitos
numa interação verbal como um dos pilares que a sustenta,
enquanto a Análise do Discurso francesa não considera como
determinante essa intenção do sujeito; considera que esses
sujeitos são condicionados por uma determinada ideologia que
predetermina o que poderão ou não dizer em determinadas
conjunturas histórico-sociais. Essa é, entre outras, uma das
diferenças teóricas entre as linhas (MUSSALIM, 2001, p. 113).
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ATIVIDADE
Atende ao Objetivo 1
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d) ( ) Em Bakhtin, Harris e Benveniste, temos exemplos de diferentes
concepções de discurso na história dos estudos da linguagem.
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e) ( ) A análise crítica do discurso define o discurso como “efeitos de
sentido entre interlocutores” e propõe o seu estudo a partir das suas
condições de produção.
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Respostas Comentadas
1. a) (F) Para a análise crítica do discurso, tal como proposta por
Fairclough, o discurso é conceituado como o uso de linguagem, em
suas modalidades oral e escrita.
b) (V)
c) (F) Em Harris e em Bakhtin, temos acepções de discurso seme-
lhantes, que aproximam as noções de discurso e de texto, e que
também serão centrais para o desenvolvimento das propostas
teóricas da análise de discurso anglo-saxã.
d) (V)
e) (F) A análise de discurso de linha francesa define o discurso como
“efeitos de sentido entre interlocutores” e propõe o seu estudo a
partir das suas condições de produção.
2. Como vimos nesta aula, são duas as diferenças fundamentais
entre as vertentes de análise do discurso, francesa e anglo-saxã. A
primeira diz respeito à própria noção de discurso, que, na análise de
discurso anglo-saxã é definido como fundamentalmente interativo.
Já na perspectiva francesa, o discurso é analisado em relação às
suas condições de produção, que são consideradas partes integran-
tes do processo de constituição de sentidos. A segunda diferença
está na concepção de sujeito. Em consequência de sua concepção
interacionista de discurso, a vertente anglo-saxã leva em conta a
intenção do sujeito em sua análise. Na análise do discurso francesa,
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por sua vez, compreende-se que o sujeito tem seu dizer determina-
do ideologicamente, como vamos estudar com mais detalhes em
nossas próximas aulas.
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gestos de releitura, questionam o significado de ler, colocando em questão
o que é ler, o que é interpretar.
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Dentre os autores que propõem tal reflexão, estão o filósofo Louis
Althusser, que faz uma leitura da obra O capital, de Marx, com o seu
livro Ler “O capital”; o também filósofo Michel Foucault, com o seu
livro Arqueologia do saber, publicado em 1969, que busca constituir
um aparato teórico para o estudo de como se constituem historicamente
os saberes; e o psicanalista Jacques Lacan, que propõe uma releitura
de Sigmund Freud que, em seus estudos, havia afirmado a presença do
inconsciente no sujeito. Como nos diz Orlandi (2010), esses estudiosos,
dentre outros, reconhecem que a questão da leitura, do “como” ler, deve
levar em consideração o dispositivo teórico que a sustenta. Ou seja: toda
leitura se pauta em um dispositivo, em um método que determina como
ler e como interpretar.
A reflexão desses estudiosos, em seus gestos de propor releituras,
encaminha para uma “des-naturalização da leitura”, para o questiona-
mento sobre os textos e os modos como eles produzem sentidos. Como
afirma Orlandi, a partir da questão “O que ler significa?”, “abre-se aí
um lugar teórico – podemos dizer mesmo disciplinar – para a análise de
discurso” (ORLANDI, 2010, p. 14).
Pesasa
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Fonte: http://openclipart.org/detail/75667/speech-bubbles-by-shokunin (Michal
Konstantynowicz - editada pelas autoras)
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Língua → Língua
x e
Fala Discurso
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do simbólico com o mundo. Ao considerar o discurso em sua forma
material, a análise de discurso não reconhece a divisão entre forma e
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conteúdo. Como afirma Orlandi (1996a, p. 28), pela noção de forma
material, reconhece-se a relação entre a língua “como sistema sintático
intrinsecamente passível de jogo e a discursividade como inscrição dos
efeitos linguísticos materiais na história”.
Forma material
A compreensão de que o discurso possui uma forma material está rela-
cionada a uma das influências teóricas de Pêcheux para a elaboração de
sua teoria do discurso: o materialismo histórico. É por isso que a análise
de discurso proposta por Pêcheux é também chamada de análise de
discurso materialista.
Para o materialismo histórico, preconizado por Karl Marx, existe um real
da História de tal modo que o homem, embora faça a História, não tem
clareza de suas ações. Em outras palavras, a História não é transparente
ao homem. Mas o que significa assumir uma perspectiva materialista no
que tange à reflexão sobre a linguagem?
Guimarães e Orlandi (2006, p. 152) explicam que pensar a linguagem
de um ponto de vista materialista é “considerar o que é propriamente
linguístico fora do logicismo, de um lado, e do sociologismo, de outro”.
O que quer dizer que é preciso pensar a linguagem de um modo distinto
do que fazem o formalismo (logicismo) e as perspectivas que buscam
explicá-la pelo social. Segundo os autores, “a inclusão do sujeito, da
História, da sociedade não se reduz a um apêndice de uma reflexão feita
pela linguística ou pelas ciências sociais”. Trata-se de pensar o discurso
em sua materialidade linguística, mas que produz sentidos ao se inscrever
na História.
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Como nos diz Orlandi (2001, p. 20): “As palavras simples do
nosso cotidiano já chegam até nós carregadas de sentidos que não sabe-
AULA
mos como se constituíram e que, no entanto, significam em nós e para
nós”. Do modo como se constituem esses efeitos de sentidos é que se
encarrega a análise de discurso.
Para finalizarmos essa breve apresentação da análise de discurso
proposta por Michel Pêcheux, vamos ler o que nos diz Orlandi a respeito
da constituição dessa disciplina:
ATIVIDADE
Atende ao Objetivo 2
Conceituando o discurso
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Resposta Comentada
3. a) A análise de discurso pecheutiana tem como objeto teórico
o discurso, definido como “efeitos de sentidos entre interlocutores”.
A sua proposta é compreender a língua fazendo sentido no discurso,
que é um objeto sócio-histórico. Diante de um dizer qualquer, a aná-
lise de discurso questiona o modo como os sentidos se constituem
para e por sujeitos.
b) A análise de discurso se constitui como disciplina em relação a
três campos do conhecimento: a linguística estruturalista, o marxis-
mo e a psicanálise. Ao definir o objeto teórico discurso, a análise
de discurso questiona o materialismo histórico, que deixa de lado a
linguagem em suas reflexões, e interroga a linguística de Saussure,
que, ao eleger a língua como foco de seus estudos, deixa de lado
a inscrição da língua na História, bem como os sujeitos. Além disso,
a análise de discurso traz para os seus estudos a noção de sujeito
enquanto afetado pelo inconsciente, uma contribuição da psicanálise.
Ao contrário da linguística, que tem como objeto a língua enquanto
um sistema autônomo, a análise de discurso tem como objeto
o discurso, que se constitui em relação à língua, mas também à
História e aos sujeitos.
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Para finalizar esta aula, vamos pensar um pouquinho sobre a dife-
rença entre texto e discurso, como trabalhada na análise de discurso de
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linha francesa. Como dissemos desde o início, o objeto teórico da análise
de discurso não é o texto, mas o discurso. Apesar disso, começamos a
nossa aula de hoje com a leitura de dois fragmentos textuais... Como
pensar essa relação entre texto e discurso, os tais “efeitos de sentido”
de que falamos nesta aula?
Para respondermos a essa questão temos de levar em conta que,
enquanto o discurso são os efeitos de sentido, o texto é a materialidade
a partir da qual se constituem tais efeitos. Ou seja: é dos textos, verbais
ou não, que o discurso pode ser depreendido pelos sujeitos. No Glossário
de termos do discurso, texto é definido da seguinte forma:
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Do texto ao discurso
Um outro exemplo que pode nos ajudar a compreender melhor a distinção
entre texto e discurso é trazido por Eni Orlandi, em seu texto “Funcio-
namento e discurso”, publicado originalmente em 1981. Nesse texto,
Orlandi faz algumas considerações sobre o funcionamento do discurso
a partir de um poema de Adélia Prado. Vejamos o que nos diz Orlandi:
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Tentemos, então, ver isto na perspectiva de uma ciência da lin-
AULA
guagem que não se defina como uma linguística imanente (2003,
p. 115),
Em sua análise, Orlandi irá mostrar como uma análise discursiva é diferen-
te de uma análise textual e de uma análise gramatical. Para além de sua
função como conjunção adversativa, ou de seu funcionamento no texto
como conector argumentativo, o mas no poema pode ser visto como o
elemento linguístico que estabelece a fronteira entre dois campos distin-
tos: o campo do trabalho e o do lazer. Como para a análise de discurso
um dizer sempre significa na relação com outros já ditos em outro lugar,
em outro momento, vemos que um dos modos como se produzem os
sentidos no poema é pela retomada da fábula da formiga e da cigarra:
quem trabalha não canta; quem canta não trabalha.
Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:The_Ant_and_the_Grassho-
pper_-_Project_Gutenberg_etext_19994.jpg
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Atividade Final
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Resposta Comentada
Como vimos nesta aula, o discurso é o objeto de estudos da análise de discurso. O
texto é a sua unidade de análise, a materialidade a ser analisada para se chegar
aos processos de produção de sentidos. Na citação de Orlandi, vemos que o texto
não importa à análise de discurso enquanto uma sequência linguística em sua
organização interna. Ele deve ser tomado em relação ao linguístico e ao histórico,
já que são os modos como os efeitos de sentidos se constituem que interessam ao
analista de discurso.
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CONCLUSÃO
AULA
O surgimento do termo discurso no âmbito dos estudos linguísticos
não se dá de modo inocente e sem consequências. Retomando a metáfora
da árvore genealógica, é possível entender que cada ramo que brota na
“árvore” dos estudos linguísticos de algum modo é uma resposta a um outro
ramo, seja concordando ou discordando de seus pressupostos. As análises
discursivas, em suas diferentes vertentes, respondem à necessidade de se
pensar a linguagem para além de sua forma e do interesse pelo sentido, tão
antigo quanto a proposta formalista de estudos da língua.
Nesse quadro, o projeto teórico-metodológico da análise de discurso
de linha francesa se constitui a partir de alguns deslocamentos em relação à
linguística de Saussure, sobretudo em relação à dicotomia língua versus fala
e as suas consequências para o pensamento sobre a linguagem.
Por outro lado, ao articular conceitos da linguística, do marxismo e
da psicanálise, ela descentra noções como língua/História/sujeito, tirando a
ciência do “púlpito da verdade” e enveredando pelo caminho desafiador da
pesquisa, um caminho que exige muita observação, reflexão e, acima de tudo,
curiosidade para dar conta das particularidades de seu objeto, o discurso.
RESUMO
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Linguística III | O discurso: um novo objeto, uma nova disciplina
Em nossa próxima aula, daremos continuidade aos nossos estudos sobre a análise
de discurso de linha francesa. Vamos entender melhor por que o discurso deve ser
analisado em relação às suas condições de produção.
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