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Osteonecrose de mandíbula e maxila secundária ao uso de bisfosfonatos

A osteonecrose de mandíbula e/ou maxila (ONMB) é uma condição rara,


descrita como possível evento adverso relacionado ao uso de medicações
antirreabsortivas ósseas, como bisfosfonatos e denosumab. Esta complicação foi
descrita pela primeira vez em 2003, quando 36 pacientes oncológicos submetidos a
tratamento com bisfosfonatos endovenosos (pamidronato e ácido zoledrônico)
desenvolveram quadro de dor e exposição óssea em mandíbula ou maxila. Desde
então, têm sido descritos casos de ONMB em pacientes em tratamento com
bisfosfonatos e, mais recentemente, denosumab.(1) “ONMB relacionada ao uso de
bisfosfonatos” foi definida pela American Society for Bone and Mineral Research
(ASBMR) como a ocorrência de uma área de exposição óssea na região
maxilofacial que não cicatriza em 8 semanas após sua identificação por um
profissional de saúde, em um paciente exposto a tratamento com bisfosfonatos e
que não tenha sido submetido a radioterapia na região craniofacial.(2) Já a
American Association of Oral and Maxillofacial Surgeons (AAOMS) define “ONMB
relacionada ao uso de medicações” baseada nos seguintes critérios: (a) uso atual
ou prévio de tratamento com medicações antirreabsortivas ou antiangiogênicas; (b)
exposição óssea com fistulação intra ou extra-oral na região maxilofacial que
persiste por um período superior a 8 semanas; e (c) ausência de história de
radioterapia na região craniofacial ou doença óssea metastática.(3)
O diagnóstico de ONMB pode ser realizado por meio da identificação de
manifestações clínicas sugestivas, conforme as definições apresentadas acima, e
pela exclusão de outras possíveis causas. Algumas doenças que devem fazer parte
do diagnóstico diferencial de ONMB são: abscesso apical ou periodontal, pulpite,
ulceração mucosa e neoplasia, entre outras. Métodos de imagem, como radiografia
simples, tomografia computadorizada e ressonância nuclear magnética, podem
eventualmente ser utilizados para auxiliar o diagnóstico e excluir outras condições.
(1, 4)
Tendo em vista o universo de pacientes em tratamento para Osteoporose e
os resultados de estudos clínicos com medicações para o manejo da doença, a
ONMB é relatada como um evento adverso raro, acometendo cerca de 1 a cada
1.000 pacientes tratados com bisfosfonatos ou denosumab.(1) A via de
administração do bisfosfonato parece estar associada à ocorrência da ONMB.
Pacientes que utilizam a via endovenosa apresentam prevalência entre 1%–10%,
enquanto os que foram tratados por via oral apresentam prevalência entre
0,00007%–0,04%. A American Dental Association (ADA) e a AAOMS corroboram
que tal risco é dose/tempo-dependente, porém esse fato é baseado apenas em
observações clínicas, sendo necessários mais estudos para uma posição
conclusiva. O uso concomitante de outros medicamentos, como corticosteróides e
quimioterápicos, pode potencializar o risco de ONMB. O tempo de uso dos
bisfosfonatos, a utilização concomitante com estrógeno e idade superior a 65 anos
também podem potencializar o risco de ONMB.(5, 6) São outros potenciais fatores
de risco descritos: extração dentária, doença periodontal, diabetes melitus,
tabagismo e insuficiência renal crônica dialítica.(1)
A maioria dos casos de ONMB pode ser manejada de forma conservadora
(higiene local, cuidado dental profissional regular, tratamento de doença dental ou
periodontal ativa, enxaguantes orais com efeito antisséptico e, quando necessário,
antibioticoterapia sistêmica).(1) A suspensão do uso do bisfosfonato por três meses
antes da realização de procedimentos cirúrgicos odontológicos, como indicado pela
AAOMS e pela ADA, no intuito de reduzir o risco de ONMB, é controversa, já que a
meia-vida destes medicamentos é de aproximadamente 10 anos, e seu uso
prolongado resulta em acúmulo substancial da droga no esqueleto. Dessa forma,
seria necessário um longo período de interrupção para eliminar o fármaco do
organismo. Além disso, a suspensão da medicação muitas vezes não é possível,
devido aos benefícios que a droga proporciona para o tratamento da osteoporose e
de metástases ósseas.(5-7)
Em resumo, a ONMB é uma complicação incomum do tratamento com
drogas antirreabsortivas ósseas, como bisfosfonatos e denosumab. Pacientes
submetidos ao uso destas medicações devem ser adequadamente informados
sobre esta complicação, devendo ser sempre receber esclarecimentos também
quanto ao baixo risco de sua ocorrência e ao fato de que, na grande maioria dos
casos, os benefícios do tratamento antirreabsortivo superam o risco de ocorrência
de ONMB. Possíveis medidas preventivas, fatores prognósticos, bem como o efeito
da interrupção do uso dos bisfosfonatos sobre o risco de desenvolver ONMB, são
questões cujas respostas permanecem ainda incompletamente conhecidas.(1, 2, 4)
Referências:

1. Fassio A, Bertoldo F, Idolazzi L, Viapiana O, Rossini M, Gatti D. Drug-induced


osteonecrosis of the jaw: the state of the art. Reumatismo. 2017;69(1):9-15.
2. Khosla S, Burr D, Cauley J, Dempster DW, Ebeling PR, Felsenberg D, et al.
Bisphosphonate-associated osteonecrosis of the jaw: report of a task force of the
American Society for Bone and Mineral Research. J Bone Miner Res.
2007;22(10):1479-91.
3. Ruggiero SL, Dodson TB, Fantasia J, Goodday R, Aghaloo T. American
Association of Oral and Maxillofacial Surgeons Position Paper on Medication-
Related Osteonecrosis of the Jaw—2014 Update. J Oral Maxillofac Surg.
2014;72:1938-56.
4. Khan AA, Morrison A, Hanley DA, Felsenberg D, McCauley LK, O'Ryan F, et
al. Diagnosis and management of osteonecrosis of the jaw: a systematic review and
international consensus. J Bone Miner Res. 2015;30(1):3-23.
5. Affairs ADACoS. Dental management of patients receiving oral
bisphosphonate therapy: expert panel recommendations. Journal of the American
Dental Association (1939). 2006;137(8):1144-50.
6. Surgeons AAoOaM. American Association of Oral and Maxillofacial Surgeons
Position paper on
bisphosphonate-related osteonecrosis of the jaws. J Oral Maxillofac Surg.
2007;65(3):369-76.
7. Brozoski MA, Traina AA, Deboni MCZ, Marques MM, Naclério-Homem MG.
Osteonecrose maxilar associada ao uso de bifosfonatos. Rev Bras Reumatol.
2012;52(2):260-70.

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