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Ortodontia 2021.

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Bloco 1 – Aula 7 – Etiologia das Maloclusões – Fatores Gerais

Etiologia – etio no grego é “origem” e logia no grego é “conhecimento”.


Em ortodontia, etiologia é o conhecimento da causa das maloclusões, onde maloclusão é qualquer desvio das
relações dento-faciais consideradas normais.

Saber a causa é essencial para corrigir e manter a correção da maloclusão. A maioria das maloclusões resultam de
uma interação complexa de múltiplos fatores que influenciam o crescimento e o desenvolvimento, sendo difícil
apontar um fator etiológico isolado.

Temos que conhecer todas as possibilidades para: prevenir, interceptar e corrigir.

Classificação dos fatores etiológicos

Equação Ortodôntica de Dockrell (1952)

Causa Tempo Tecidos Resultados


Hereditária Contínuo Neuromuscular Má função
Anomalia de Intermitente Ossos/Cartilagens Maoclusão
desenvolvimento
Trauma Dentes Displasias ósseas
Agentes físicos Tecidos Moles
Habitos
Enfermidades
Má Nutrição

McCoy (1956)

Predisponentes Determinantes
Hereditariedade Dentes ausentes
Defeitos congênitos Supranumerários
Anomalias pré-natais Dentes mal posicionados
Infecções agudas e crônicas Anomalias da forma
Enfermidades nutricionais Freio labial anormal
Transtornos metabólicos Pressão intrauterina
Desequilíbrio endócrino Hábitos ao dormir
Causas desconhecidas Postura e pressão
Hábitos musculares anormais
Perda prematura dos dentes decíduos
Erupção tardia dos permanentes
Retenção prolongada dos decíduos
Restaurações inadequadas

Salzmann (1957)

Pré-natais Pós-natais
Hereditários Desenvolvimento
Diferenciação Funcionais
Congênitos Ambientais
Adquiridos

Graber (1966)
Engloba diversos fatores etiológicos, de fácil entendimento, fácil utilização e didática. Ele dividiu os fatores
etiológicos em 2 grupos:

- Gerais ou Extrínsecos: fatores de origem sistêmica ou que ocorrem durante o desenvolvimento do indivíduo,
afetando a oclusão de uma maneira geral.

- Locais ou Intrínsecos: fatores externos que agem sobre as estruturas buco-dentais, afetando a oclusão de forma
localizada.

Gerais Locais
Hereditariedade Anomalias dentárias
Deformidades congênitas Anomalias do padrão eruptivo
Meio ambiente Patologias ósseas
Alterações metabólicas Cárie dentária
Alterações nutricionais Restaurações mal adaptadas
Hábitos viciosos Perdas precoces de dentes decíduos
Anquiloses
Traumatismos dentários

Fatores Etiológicos Gerais

1. Hereditariedade

“A hereditariedade é o maior fator na produção de maloclusões” - Kingsley, 1891

“Maloclusões surgem principalmente de causas locais” - Angle, 1898

- A maioria das desarmonias dentofaciais são causadas pela combinação de fatores genéticos e ambientais.

- Influencia étnica hereditária – estudos realizados:

• Índios Chavantes (BR): observou que 95% da população apresentava oclusão normal.
• Crianças brancas (Maryland): 18% apresentava oclusão normal.
• Esquimós: 44%
• Japoneses: 34%
• Crianças negras (Chicago): 57%

Populações “puras” → população com maior isolamento e uniformidade genética → apresentam baixa
frequência de maloclusão.

Miscigenação → aumenta a frequência de maloclusões.

- Características buco-dentais hereditárias:

• Tamanho dos dentes;


• Largura e comprimento da arcada;
• Profundidade do palato;
• Apinhamento e espaço entre os dentes;
• Grau de overbite e overjet (em quantidade menor);
• Posição e conformação da musculatura peribucal;
• Tamanho e forma da língua;
• Características do tecido mole.

- Tipo Facial hereditário:


• Braquicéfalo – apresentam a face mais curta no sentido vertical e mais larga no sentido horizontal, com
arcada quadrada.
• Mesocéfalo – apresentam distribuição mais harmônica com arcada parabólica.
• Dolicocéfalo – apresentam a face mais alongada no sentido vertical e estreita no sentido horizontal, com
arcada no formato em “V”.

- Padrão de crescimento e desenvolvimento:

• Segundo essa foto, a classe III sofre mais influência genética do que a classe II que sofre mais influência
ambiental.

- Síndromes genéticas: acondoplasia, displasias e síndromes.

- Acondroplasia – conhecida também como nanismo acondroplásico, tipo mais comum de nanismo.

• Herança autossômica dominante;


• Provoca distúrbios na formação óssea endocondral – nas placas de crescimento (sincondroses);
• Membros curtos, tronco normal, macrocefalia (cabeça é maior proporcionalmente ao corpo);
• Crescimento restrito da base do crânio e por isso os pacientes apresentam uma retrusão maxilar;
• Podem apresentar ausência congênita de dentes e dentes com forma alterada.

- Displasia Cleidocraniana

• Autossômica dominante;
• Clavículas ausentes ou hipoplásicas;
• Suturas e fontanelas com fechamento retardado/abertas;
• Cabeça grande com bossas frontal e parietal pronunciadas;
• Hipertelorismo ocular e base nasal alargada;
• Geralmente apresentam prognatismo mandibular;
• Dentes supranumerários;
• Retenção prolongada de decíduos;
• Atraso ou falha na erupção dos permanentes.

- Displasia Ectodérmica

• Herança autossômica recessiva;


• Afeta todas as estruturas derivadas do ectoderma;
• 1:10000 nascimentos;
• Gera ausência ou hipoplasia de glândulas sudoríparas e salivares;
• Cabelo fino e esparso, faltam sobrancelhas e cílios;
• Pele lisa, fina e seca;
• Oligodontia (ausência completa de dentes) ou hipodontia (quantidade reduzida de dentes);
• Quando presentes, apresentam formato de dentes conóides.

- Síndrome de Crouzon

• Autossômica dominante;
• Ocorre fechamento prematuro das suturas;
• Hipoplasia do terço médio da face;
• Exoftalmia (olhos aparentam estar para fora da face – real ou aparente);
• Hipertelorismo ocular (maior distância entre os olhos);
• Dentes superiores apinhados.

- Síndrome de Treacher Collins

• Autossômica dominante;
• 1:50000 nascimentos;
• Morte excessiva de células do gânglio trigeminal;
• Hipoplasia do zigoma, mandíbula e maxila;
• Ângulo mandibular obtuso;
• Palato profundo – e 30% apresentam-se fissurados;
• Fissuras palpebrais anormais com inclinações divergentes;
• Má formação do ouvido (externo, médio e interno).

- Síndrome do Incisivo Maxilar Mediano Único (SIMMU)

• É uma microforma da Holoprosencefalia;


• Herança autossômica dominante;
• Único incisivo central superior, presente na linha média;
• O sinal para que não confunda com a exodontia do outro incisiso central e tenha ocorrido uma migração dos
dentes vizinhos é a presença ou ausência do freio labial;
• Mal formações estruturais, sobretudo na região de linha média;
• Exostose da sutura palatal mediana.

2. Deformidades congênitas

São anomalias causadas por danos no desenvolvimento fetal e que estão presentes ao nascimento, que podem
causar alterações morfológicas ou funcionais.

- Fissuras

Durante a embriogênese, qualquer fator que interfira na diferenciação, migração e proliferação dos processos
envolvidos no desenvolvimento da face, pode provocar o aparecimento das fissuras.

• Prevalência: 1:1000 (raras em negros e mais comuns em orientais).


• Época: 1º trimestre de vida IU.
• Etiologia: fatores genéticos (40%) e fatores ambientais (60%).

• Fissura labial: problema na fusão entre o processo nasal mediano e o processo maxilar; uni ou bilateral.
• Fissura facial lateral: problema na fusão entre os processos maxilar e mandibular.
• Fissura mediana do lábio superior: problema na fusão entre os processos nasais medianos (rara).
• Fissura palatina: problema na fusão entre os processos palatinos da maxila; pode ser classificada em:
o Fissura pré-forame (anterior ao forame incisivo), pode acontecer:
▪ Fissura do lábio superior;
▪ Fissura do palato primário;
▪ Combinação de ambas: fissuras lábio-palatais (cerca de 60% dos casos).

o Fissura trans-forame (atravessa o forame incisivo):


▪ Envolvem lábio e palato em toda sua extensão.

o Fissura pós-forame (posterior ao forame incisivo):


▪ Comprometem menos a estética;
▪ Totais: envolve palato duro e mole;
▪ Parcial: envolve somente palato mole ou simplesmente a úvula.

→ Perda precoce de dentes decíduos;


→ Gengivite, periodontite;
→ Agenesia dentária na região fissurada – o dente mais acometido é o incisivo lateral superior;
→ Mastigação alterada;
→ Fonação alterada;
→ Deglutição alterada;
→ Respiração alterada.

• Tratamento multidisciplinar: fonoaudiólogo, ortodontista, protesista, otorrino, psicólogo, assistente social,


pediatra, cirurgião, odontopediatra e patologista bucal.

- Paralisia Cerebral: acontece por uma parada ou falta de coordenação muscular atribuída a uma lesão intracraniana

• Desequilíbrio muscular;
• Mordida aberta;
• Protrusão dos dentes anteriores superiores;
• Mordida cruzada;
• Excessiva erupção dos dentes posteriores;
• Distrofia muscular – com excessivo crescimento vertical.

- Torcicolo congênito

• É um encurtamento do músculo esternocleidomastóide;


• Esse encurtamento provoca alterações no desenvolvimento da mandíbula do lado da contração;
• Assimetria facial;
• Desvio da linha média;
• Maloclusão dentária.

- Sífilis congênita

• Acontece na 2º metade da gravidez (T. pallidim atravessa a placenta);


• Palato profundo;
• Maxila curta;
• Nariz em sela;
• Tríade de HUTCHINSON (surdez, queratite ocular e hipoplasia dental – incisivos em “chave de fenda” e
molares em “amora”).

- Síndrome fetal alcoólica:

• Ocorre devido a deficiências do tecido da linha média da placa neural bem no inicio do desenvolvimento
embrionário, causada pela exposição a altos níveis de etanol.
• Traços discriminados: Fissuras palpebrais curtas, face média diminuída, nariz curto, filtro indistinto e lábio
superior fino.
• Traços associados: ponte nasal baixa, dobras epicantais, mínimas anormalidades na orelha e micrognatia.

- Microssomia hemifacial

• Perda precoce de células da crista neural;


• Problema unilateral e assimétrico;
• Ouvido externo deformado (do lado afetado);
• Ramo mandibular deformado ou ausente (do lado afetado);
• Músculos faciais deficientes ou ausentes (do lado afetado).

- Sequência de Pierre Robin

Cabeça do feto é pressionada contra o tórax impedindo a mandíbula de crescer para frente e por conta disso,
apresenta:

• Micrognatia;
• Glossoptose – obstrução das vias aéreas nos primeiros 6 meses;
• Fissura palatina – porque a posição da língua impede a fusão dos processos palatinos.
• Isso acontece por conta da quantidade reduzida de líquido amniótico, logo o espaço para o desenvolvimento
fetal fica reduzido.

3. Meio ambiente

- Influência pré-natal:

• Posição intrauterina do feto: a pressão contra a face em desenvolvimento pode levar a distorções em áreas
de rápido crescimento.
Ex: braço pressionado ao longo da face, impedindo o desenvolvimento maxilar normal; ou cabeça
pressionada fortemente contra o tórax impedindo a mandíbula de crescer.

• Dieta e metabolismo materno: maturação e mineralização dos tecidos duros dos dentes antes do
nascimento depende do metabolismo IU. Então, a falta de nutrientes essenciais pode afetar o crescimento e
desenvolvimento normal do feto. O que a mãe consome interfere no desenvolvimento da criança.

• Fatores teratogênicos: são substâncias químicas e outros agentes capazes de produzir defeitos embrionários
quando administrados em momentos críticos.

- Influência pós-natal:

• Traumatismos na infância (injúria → cicatrização → restrição dos movimentos normais de crescimento →


crescimento alterado → desenvolvimento de assimetrias)
o Fratura de côndilo mandibular: prognóstivo melhor quanto mais cedo ocorrer;
o Cicatrizes derivadas de queimaduras;
o Trauma ao nascimento (parto por fórceps).
4. Alterações metabólicas

- Endocrinopatias

• Hipofise (ou Pituitária)


o Hipopituitarismo (nanismo pituitário):
▪ Raro;
▪ Produção diminuída de hormônio do crescimento (GH) ou incapacidade de responder ao GH;
▪ Baixa estatura;
▪ Maxila e mandíbula menores que o normal;
▪ Dentes com retardo na erupção;
▪ Microdontia difusa.
o Hiperpituitarismo:
▪ Raro;
▪ Aumento da produção de GH geralmente devido à presença de um adenoma de hipófise;
▪ Antes do surto de crescimento – desenvolve gigantismo hipofisário;
▪ Depois do surto de crescimento – desenvolvimento acromegalia;
▪ Erupção dentária acelerada;
▪ Maior crescimento alveolar;
▪ Altura vertical da face aumentada.
• Tireoide
o Hipotireoidismo:
▪ Letargia, pele grossa e seca, rouquidão, fraqueza, fadiga, bradicardia e hipotermia;
▪ Arco dental diminuído;
▪ Macroglossia com protrusão da língua;
▪ Retenção de dentes decíduos e erupção retardada de dentes permanentes;
▪ Remodelação óssea retardada durante o tratamento ortodôntico.
o Hipertireoidismo:
▪ Sintomas: nervosismo, intolerância ao calor, fraqueza muscular, taquicardia e perda de peso;
▪ Atrofia alveolar;
▪ Esfoliação precoce dos dentes decíduos e erupção acelerada dos dentes permanentes;
▪ Remodelação óssea acelerada no tratamento ortodôntico.
• Paratireoide
o Hipoparatireoidismo:
▪ Hipoplasia do esmalte;
▪ Retardo na formação dentária;
▪ Falhas na erupção dentária.
o Hiperparatireoidismo:
▪ Afeta o sistema esquelético: provocando fraturas patológicas, dores ósseas e rigidez das
articulações;
▪ Osteoporose generalizada;
▪ Inclinação de dentes e diastemas;
▪ Surgimento de cistos ósseos.

5. Alterações nutricionais

- Avitaminoses

▪ Vitamina A
o Carência de vitamina A:
▪ Distúrbios de calcificação do esmalte e dentina;
▪ Retardo na erupção dentaria;
▪ Interfere negativamente no crescimento e desenvolvimento das estruturas dentais.
▪ Vitamina B
o Carência de Vit B:
▪ Atrasa o desenvolvimento dentofacial;
▪ Afeta o tecido nervoso – polineurite (beri-beri);
▪ Retarda o crescimento;
▪ Língua despapilada.
▪ Vitamina C
o Carência de Vit C:
▪ Afeta diretamente tecidos conjuntivos (muda o metabolismo do colágeno);
▪ Dentina hipocalcificada;
▪ Distúrbios periodontais (gengivas ulceradas e sangramento) – Escorbuto;
▪ Atrofia do osso alveolar.
▪ Vitamina D
o Carência de Vit D – Raquitismo nas crianças:
▪ Hipocalcificação de esmalte e dentina;
▪ Erupção dentaria retardada;
▪ Fechamento lento das suturas;
▪ Erupção e desenvolvimento dentofacial estão retardados;
▪ Maloclusões se tornam frequentes.
▪ Vitamina E
o Carência de Vit E:
▪ Alterações estruturais na dentina e no esmalte;
▪ Retardo no crescimento da mandíbula e maxila.

6. Hábitos viciosos

A presença de hábitos viciosos pode gerar maloclusões graves dependendo da tríade de Graber, que é intensidade e
frequência e duração.

- Hábitos de interesse para a ortodontia:

• Sucção digital;
• Sucção de chupeta;
• Interposição lingual;
• Aleitamento artificial;
• Morder objetos.

Conclusões

Maloclusão é um problema multifatorial.

Fatores gerais interagem com fatores locais.

Fatores gerais afetam todo o sistema em desenvolvimento criando maior dificuldade de correção e controle das
maloclusões.

O conhecimento dos fatores etiológicos é fundamental para o diagnóstico, planejamento e contenção dos
resultados.

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