Você está na página 1de 31

A RT I G O I N É DI TO

Considerações sobre a etiologia,


o diagnóstico e tratamento da
sobremordida profunda
Resumo / A sobremordida é o componente mais comum nas más oclusões em adul-
tos e crianças, e a sua correção representa uma das primeiras e mais difíceis etapas
do tratamento. É de fundamental importância que o profissional conheça a natureza
da sobremordida profunda e, na elaboração do plano de tratamento, observe os as-
pectos relacionados à etiologia, ao diagnóstico e às considerações biomecânicas. De-
pendendo dos objetivos almejados, a sobremordida profunda pode ser corrigida com
a mecânica de intrusão de dentes anteriores, extrusão dos dentes posteriores ou a
combinação de ambas. Na mecânica de extrusão, destaca-se o emprego do batente
anterior de resina, de aparelhos ortopédicos funcionais ou, ainda, os aparelhos fixos
associados à utilização de arcos com curva reversa inferior e acentuada no arco supe-
rior. No que diz respeito à mecânica de intrusão, enfatiza-se o arco base e o sistema de
três peças, para proporcionar o controle da inclinação dos incisivos durante a intrusão.
Procurou-se, no presente artigo, discorrer sobre os aspectos pertinentes à etiologia,
ao diagnóstico e às abordagens alternativas no tratamento da sobremordida profunda.
/ Palavras-chave / Sobremordida profunda. Ortodontia corretiva. Estabilidade.

Acácio Fuziy
Doutor em Ortodontia pela Faculdade de Odontologia de Bauru-USP. Professor Doutor Associado do Programa de Mestrado em Ortodontia da UNICID.
Professor da Universidade Estadual Norte do Paraná (UENP).

Ronald de Freitas Paixão


Mestre em Ortodontia pela UNESP-Araraquara. Doutor em Odontopediatria pela USP-SP. Professor Titular da área de Ortodontia e Odontopediatria, UEFS-BA.

Sérgio Milton de Oliveira Penido


Doutor em Ortodontia pela UNESP-Araraquara. Coordenador do Curso de Especialização da ABO – Divinópolis.

Alexandre Henrique de Melo Simplício


Doutor em Ortodontia pela UNESP-Araraquara. Professor Doutor Associado da Universidade Federal do Piauí (UFPI).

Como citar este artigo: Fuziy A, Paixão RF, Penido SMO, Simplício AHM. Considerações sobre a etiologia, o diagnóstico e Os autores declaram não ter interesses associativos, comerciais,
tratamento da sobremordida profunda. Rev Clín Ortod Dental Press. 2015 jun-jul;14(3):6-36. de propriedade ou financeiros que representem conflito de
interesse nos produtos e companhias descritos nesse artigo.
Enviado em: 05/01/2015 - Revisado e aceito: 15/06/2015
O(s) paciente(s) que aparece(m) no presente artigo
Endereço de correspondência: Acácio Fuziy autorizou(aram) previamente a publicação de suas fotografias
Email: acaciofuziy@hotmail.com faciais e intrabucais, e/ou radiografias.

/ 6 / ©DentalPress Publishing / Rev Clín Ortod Dental Press. 2015 jun-jul;14(3):6-36


Considerações sobre a etiologia, o diagnóstico e tratamento da sobremordida profunda

INTRODUÇÃO E REVISÃO DE LITERATURA se os incisivos superiores ocluírem no terço médio da


A oclusão normal caracteriza-se pela relação harmo- face vestibular dos incisivos inferiores, a sobremordida
niosa dos dentes superiores com os inferiores, consi- será classificada como moderada; ainda, se ocluírem
derando-se os três planos do espaço, sagital, vertical e mais cervicalmente, será considerada grave3. Devido
transversal. Entretanto, a sobremordida profunda pode à variação morfológica no comprimento da coroa dos
ser definida como a sobreposição dos dentes anterio- dentes anteriores, outra classificação mais apropriada
res superiores sobre os inferiores, no plano vertical, e é baseia-se na porcentagem de sobreposição dos incisi-
considerada uma das más oclusões mais difíceis de se vos inferiores pelos superiores. Assim sendo, a sobre-
tratar com sucesso (Fig. 1) — sendo, essencialmente, mordida é considerada normal se os incisivos inferiores
uma manifestação dentária1,2. forem sobrepostos pelos superiores cerca de 5 a 25%
do comprimento de suas coroas. Se a sobreposição
Uma das metas do tratamento ortodôntico é obter uma estiver entre 25% e 40%, é considerada aumentada;
sobremordida adequada. E, para isso, é imprescindível entretanto, não acarretará problemas na articulação
saber que a normalidade para essa condição se mani- temporomandibular durante os movimentos mandi-
festa quando os incisivos superiores se sobrepõem à bulares. Todavia, se a sobreposição ocorrer acima de
face vestibular dos incisivos inferiores em uma região 40%, passa a ser considerada excessiva, ou profunda,
localizada a até 1,5 a 2mm de sua borda incisal. Essa si- e poderá provocar efeitos nocivos ao ligamento perio-
tuação é classificada como normal ou leve. Entretanto, dontal e à articulação temporomandibular (Fig. 2)4.

A B C

Figura 1: Sobremordida profunda: A) na dentadura mista; B, C) na dentadura permanente.

Figura 2: Graduação da sobremordida: A) normal, entre 5% e


25%; B) sobremordida aumentada, de 25 a 40%; C) sobremordida
profunda, acima de 40%.

A
B
C

©DentalPress Publishing / Rev Clín Ortod Dental Press. 2015 jun-jul;14(3):6-36 / 7 /


Fuziy A, Paixão RF, Penido SMO, Simplício AHM

PREVALÊNCIA No tocante ao crescimento vertical da maxila, pode-se


A sobremordida profunda é o componente mais comum afirmar que possui uma participação efetiva no estabele-
nas más oclusões em adultos e crianças4, podendo se cimento da sobremordida profunda — mesmo que esse
manifestar nas Classes I, II e III. É um conjunto de ca- crescimento repercuta sobre a mandíbula, por meio do
racterísticas esqueléticas e dentárias que pode ocorrer contato oclusal, direcionando o seu crescimento para
durante os períodos da dentadura decídua, mista e per- baixo e para a frente. O crescimento vertical da maxi-
manente. É mais frequente em crianças, com 20% de la juntamente com o crescimento do processo alveolar
probabilidade; sendo que em adultos ocorre em 13% posterior, é responsável pelo aumento da altura facial
dos casos3. Entre os 5 e os 6 anos de idade, o per- e, portanto, responsável pelo posicionamento vertical e
centual varia de 36,5% a 39,2%. Dos 9 aos 12 anos, a anterior do mento7,11,12.
sobremordida geralmente diminui e, até a idade adulta,
permanece constante, entre 37,9% e 40,7%3. A extrusão dos dentes posterossuperiores afeta a altura
facial anteroinferior e o espaço entre os ossos, e influen-
Há diferenças, também, entre leucodermas, que apre- cia fortemente na redução ou aumento da sobremor-
sentam prevalência maior dessa má oclusão, em relação dida. O movimento dos dentes posteriores dentro do
aos melanodermas e hispânicos3. Aproximadamente 50% complexo facial é considerado o fator de crescimento
dos adolescentes brancos não hispânicos possuem so- que provoca a diminuição da sobremordida e, portan-
bremordida maior do que 4,0mm, e 10% caracterizam-se to, apresenta uma importância maior até que o próprio
por uma sobremordida maior do que 6,0mm. crescimento do plano palatino para baixo. Por outro
lado, a extrusão dos dentes posteroinferiores exerce um
Em levantamento epidemiológico6, observou-se que papel menor na determinação da sobremordida7,11,12.
26,63% das crianças brasileiras com 5 a 12 anos apre-
sentam sobremordida aumentada. Nas faixas etárias Durante o crescimento, os incisivos superiores são
dos 5 aos 8 anos e dos 9 aos 12 anos, os percentuais deslocados para baixo e para a frente, sendo esse,
de sobremordida aumentada constatados foram de entre os fatores contribuintes, o que exerce menor
24,09% e 31,79%, respectivamente. influência no estabelecimento da sobremordida. A ca-
beça da mandíbula, ao crescer, direciona os incisivos
INFLUÊNCIA DO CRESCIMENTO E superiores para vestibular, evitando o seu movimento
DESENVOLVIMENTO DA DENTIÇÃO NA para baixo. O crescimento vertical dos incisivos in-
DETERMINAÇÃO DA SOBREMORDIDA feriores é o último dos fatores a ser considerado, e
talvez represente aquele que apresenta uma partici-
Crescimento vertical da maxila, mandíbula e pação marcante na determinação da sobremordida e,
processos alveolares também, na ocorrência da recidiva pós-tratamento.
O crescimento de determinadas áreas anatômicas exer- Outro fator que desempenha papel importante na de-
ce papel de relevância na determinação da sobremordi- terminação da sobremordida é o ângulo interincisivos,
da, como, por exemplo, o crescimento: 1) da cabeça da pois, diante de um ângulo aberto, ocorre o movimento
mandíbula; 2) do corpo da maxila, promovendo o abai- lingual das coroas dos incisivos inferiores e o movi-
xamento do plano palatino; 3) do processo alveolar pos- mento vestibular dos ápices radiculares dos incisivos
terior da maxila e mandíbula; e 4) do processo alveolar superiores, resultando no aumento da sobreposição
anterior da maxila e da mandíbula7,8. dos incisivos inferiores7.

Com relação ao crescimento da cabeça da mandíbula, ele Existe uma infinidade de combinações dos fatores de
varia em quantidade, direção e tempo cronológico, po- crescimento que podem resultar na sobremordida, e
dendo apresentar-se equilibrado ou não com as demais sobre esses atuam os músculos da mastigação. Con-
partes da mandíbula. Quando a desproporção é obser- siderando-se os tipos faciais, o hiperdivergente tende
vada e ocorre uma predominância do crescimento nessa a apresentar um prognóstico mais favorável para a
região, pode resultar em aumento da sobremordida9,10. correção da sobremordida e para a manutenção dos

/ 8 / ©DentalPress Publishing / Rev Clín Ortod Dental Press. 2015 jun-jul;14(3):6-36


Considerações sobre a etiologia, o diagnóstico e tratamento da sobremordida profunda

resultados do tratamento, ao passo que o hipodiver- CLASSIFICAÇÃO E CONSIDERAÇÕES


gente mostra uma maior dificuldade para preservar a ETIOLÓGICAS4-7
correção alcançada8,11.
De acordo com sua origem
Desenvolvimento da oclusão e participação Simples
dos incisivos na má oclusão de Classe II e A sobremordida profunda pode apresentar uma origem
na sobremordida dentoalveolar, sendo caracterizada pela supraerupção de
Vale ressaltar que, na má oclusão de Classe II, divisões 1 dentes anteriores ou infraoclusão dos posteriores. Clinica-
e 2, os incisivos apresentam características distintas e se- mente, observa-se a vestibularização dos incisivos supe-
guirão uma evolução na dentadura decídua, culminando, riores; contato dos incisivos inferiores na mucosa palatina,
na permanente, em sobremordida acentuada. Na Clas- com o consequente trauma nessa região; curva de Spee
se II, divisão 1, os incisivos caracterizam-se, na dentadura acentuada e reversa na arcada superior. Esse tipo de so-
decídua, por uma inclinação vestibular e uma sobressa- bremordida profunda não apresenta comprometimento
liência maior do que o normal; ao passo que, na divisão 2, esquelético, e os pacientes frequentemente apresentam
os incisivos superiores apresentam uma inclinação menor disfunção temporomandibular e movimentos oclusais fun-
e um trespasse vertical maior do que o normal13. cionais limitados14-17.

Em ambas as situações, o lábio inferior passa a exer- Complexa


cer uma influência determinante sobre os incisivos; na A sobremordida profunda complexa encontra-se asso-
Classe II, divisão 1, observa-se a interposição entre os ciada aos fatores esqueléticos e é caracterizada pelo
incisivos superiores e inferiores; e na Classe II, divisão 2, padrão horizontal de crescimento. A altura facial anterior
o lábio inferior promove a pressão na região cervical dos é curta, ao contrário da posterior, que se apresenta au-
incisivos decíduos, acarretando na verticalização desses mentada. O espaço interoclusal geralmente é pequeno,
elementos dentários13. sendo frequentemente presente na má oclusão de Clas-
se II, divisão 2, e ocasionalmente na Classe III14-17.
Na dentadura mista, os incisivos permanentes irrom-
pem e passam a receber a ação do lábio inferior, o De acordo com a classificação funcional
que resulta no aumento da protrusão do incisivos su- Sobremordida profunda verdadeira
periores e na verticalização dos incisivos inferiores. Essa mordida profunda resulta da infraoclusão dos den-
Nessa situação, por não apresentarem suporte verti- tes posteriores, como consequência da interposição lateral
cal, os incisivos inferiores continuarão o seu processo da língua, e se manifesta na má oclusão de Classe II, divi-
de erupção até que alcancem o contato com a região são 2. Também pode ocorrer devido à perda prematura de
do cíngulo dos incisivos superiores ou com o palato, dentes posteriores. Os pacientes apresentam suave curva
estabelecendo o aumento da sobressaliência e sobre- de Spee e espaço interoclusal aumentado14-17.
mordida na dentadura permanente13.
Pseudo sobremordida profunda
Os incisivos superiores e inferiores irrompem na denta- Nesse tipo, a sobremordida profunda é causada pela su-
dura mista, gradualmente são influenciados pela pres- praerupção dos dentes anteriores, sendo que os dentes
são do lábio inferior e acabam se inclinando para lingual. posteriores seguem o curso normal de erupção. É encon-
A falta de suporte vertical permite a erupção continuada trada na Classe II, divisão 1, e os indivíduos portadores
dos incisivos inferiores até que ocorra o contato com a desse tipo de má oclusão frequentemente apresentam
palatina dos incisivos superiores ou com o palato. A lin- uma exposição gengival excessiva durante o sorriso. Devi-
gualização dos incisivos centrais superiores promove a do à presença do trespasse horizontal aumentado, os inci-
redução no comprimento da arcada e, diante da falta de sivos inferiores contatam a mucosa palatina. Os pacientes
espaço, os incisivos laterais irrompem para a vestibu- exibem curva de Spee acentuada e o espaço interoclusal
lar, resultando na típica característica da má oclusão de é, geralmente, normal ou reduzido, pois os molares encon-
Classe II, divisão 213. tram-se completamente irrompidos14-17.

©DentalPress Publishing / Rev Clín Ortod Dental Press. 2015 jun-jul;14(3):6-36 / 9 /


Fuziy A, Paixão RF, Penido SMO, Simplício AHM

De acordo com a dentição cada paciente, de modo que possam ser atingidos os
A sobremordida profunda pode ocorrer nas dentaduras melhores resultados esqueléticos, dentários e estéticos.
decídua, mista e permanente.
No tocante ao diagnóstico da sobremordida profunda,
POR QUE CORRIGIR A existem algumas particularidades que devem ser mais
SOBREMORDIDA PROFUNDA? bem compreendidas e interpretadas durante essa eta-
Vale ressaltar que, da idade pré-puberal até a idade pa, como o diagnóstico facial, o diagnóstico cefalométri-
adulta, a sobremordida melhora em 83% dos casos18. co, o diagnóstico dentário e algumas variáveis externas,
A redução ocorrerá em função do crescimento do ramo como o sexo e a idade23.
mandibular e da extrusão dos molares. Caso não seja
tratada, a sobremordida pode resultar em: 1) trauma para Um exame clínico cuidadoso das características dos
a mucosa palatina na região dos incisivos superiores ou tecidos moles faciais dos pacientes pode ajudar na se-
para a gengiva vestibular na região de incisivos inferio- leção de estratégias para correção da sobremordida
res; 2) doenças periodontais, em virtude das limitações profunda. A face deve ser avaliada em vistas frontal e
funcionais que se impõem e do estresse anormal criado; de perfil, sempre com os lábios relaxados e fechados.
3) alterações do ciclo mastigatório nos movimentos in- Nesse exame, deve-se verificar o nível de exposição
trabordejantes, acentuando a guia anterior, o que pode gengival durante a fala e o sorriso, bem como a relação
interferir nos movimentos de lateralidade e protrusiva; do lábio superior com os incisivos.
4) problemas na articulação temporomandibular; 5) per-
da de dimensão vertical; 6) aumento do apinhamento A relação adequada do sorriso varia de uma posição na
anterior; e 7) vestibularização de incisivos superiores19-22. qual os lábios superiores repousam na margem gengival
dos incisivos centrais superiores23 até uma posição onde
ETIOLOGIA E DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL se observe 2mm de exposição gengival24,25. As exposições
O desenvolvimento de uma sobremordida esquelética gengivais acima desse valor são consideradas antiesté-
ou dentária é causado por fatores genéticos, ambien- ticas25. As Figuras 3 e 4 mostram sorrisos de pacientes
tais ou uma combinação de ambos. As sobremordidas jovens com exposição gengival variando de 0 a 2mm,
profundas esqueléticas costumam apresentar um pa- os quais são considerados esteticamente agradáveis. Nes-
drão de crescimento horizontal e são caracterizadas sa situação, diante de um quadro de sobremordida profun-
por (1) discrepância de crescimento dos ossos maxilar da, estaria contraindicada a intrusão dos incisivos superio-
e mandibular, (2) rotação convergente das bases maxi- res. Porém, na Figura 5, observa-se um paciente jovem, do
lares e/ou (3) deficiência na altura do ramo mandibular. sexo masculino, com exposição gengival acima de 2mm,
Nesses pacientes, a altura anterior da face é, muitas um sorriso que não é esteticamente agradável; diante de
vezes, pequena, principalmente no terço inferior da uma má oclusão que apresente sobremordida profunda,
face. Por sua vez, as sobremordidas profundas den- estaria indicada a intrusão dos incisivos superiores.
tárias evidenciam uma supraoclusão (supraerupção)
dos incisivos, infraoclusão (infraerupção) dos molares Vale ressaltar que a avaliação do nível de exposição gen-
ou uma combinação de ambas. Outros fatores que gival não deve ser feita somente durante o sorriso, mas
podem afetar a sobremordida profunda são as altera- também durante a fala. Deve-se também observar, du-
ções na morfologia dos dentes; a perda prematura dos rante o sorriso e a fala, o grau de exposição dos incisivos
dentes permanentes, que resulta em colapso lingual inferiores. A não exposição desses dentes é uma carac-
dos dentes anteriores superiores ou inferiores; largura terística que rejuvenesce o paciente e, sempre que pos-
mesiodistal dos dentes anteriores e aprofundamento sível, deve-se optar pela intrusão desse grupo de den-
natural da mordida relacionado à idade4. tes26. Na Figura 6, observa-se o sorriso de paciente com
pouca exposição dos incisivos superiores e com exposi-
A etiologia da sobremordida profunda deve ser anali- ção dos incisivos inferiores. Nessas condições, sempre
sada em detalhes para que se elabore um diagnóstico que possível deve-se optar pela intrusão dos incisivos
global e um plano de tratamento individualizado para inferiores para correção da sobremordida profunda.

/ 10 / ©DentalPress Publishing / Rev Clín Ortod Dental Press. 2015 jun-jul;14(3):6-36


Considerações sobre a etiologia, o diagnóstico e tratamento da sobremordida profunda

Figura 3: Sorriso agradável, com o lábio Figura 4: Linha do sorriso agradável, com Figura 5: Excesso de exposição gengival
superior repousando sobre a margem gen- exposição de 2mm de gengiva, em uma ao sorrir, em um paciente do sexo masculi-
gival dos incisivos centrais superiores, em jovem de 15 anos de idade. no com 18 anos de idade.
paciente jovem do sexo feminino.

O diagnóstico cefalométrico visa identificar o padrão facial


e a inclinação axial dos incisivos. O diagnóstico dessas ca-
racterísticas é fundamental, pois determinadas estratégias
de tratamento são contraindicadas em algumas situa-
ções. Nos pacientes com padrão vertical de crescimento,
por exemplo, a extrusão dentária posterior deve ser evita-
da, pois isso traria efeitos deletérios na estética facial, além
de colocar em risco a estabilidade do caso23. Por outro
lado, a extrusão dentária nos casos hipodivergentes, em
pacientes em crescimento, seria bem indicada27.
Figura 6: Sorriso de um paciente do sexo masculino, de 60 anos
de idade, com pouca exposição dos dentes anterossuperiores e A inclinação axial dos incisivos também é uma carac-
evidenciando os dentes inferiores. terística importante, pois encontra-se, na maioria das
vezes, alterada nos casos de sobremordida profunda.
O diagnóstico dessa condição é muito importante, pois,
Na posição dos lábios relaxados, um espaço interlabial de em grande parte das estratégias de tratamento, a cor-
3 a 4mm é considerado esteticamente aceitável. O espa- reção da inclinação desses dentes se faz necessária.
ço interlabial está aumentado em pacientes com padrão Além disso, a correta inclinação axial dos incisivos e a
vertical. A manutenção de um espaço interlabial adequa- angulação interincisivos são fatores relacionados com a
do deve ser considerada quando selecionamos estraté- estabilidade dos casos7. As Figuras 11, 12 e 13 mos-
gias para a correção da sobremordida profunda. A análise tram telerradiografias de diversos padrões faciais (do-
dessa informação pode ser obtida com o estudo da face licofacial, braquifacial e mesofacial), em pacientes que
em repouso, em vistas frontal e de perfil, bem como por apresentam sobremordida profunda. Nota-se, também,
meio da telerradiografia em norma lateral. Nas Figuras 7, a importância da telerradiografia na determinação da in-
8 e 9, podemos notar, em vista frontal, vista lateral e na clinação axial dos incisivos.
telerradiografia, pacientes que apresentam espaço inter-
labial excessivo. A Figura 10 mostra uma telerradiografia O diagnóstico dentário refere-se, principalmente, à incli-
de um paciente com exposição normal dos incisivos su- nação do plano oclusal e à curva de Spee, que estão al-
periores, com os lábios relaxados. terados em grande parte das situações clínicas, seja na
arcada superior, na inferior ou em ambas. Na análise do
É importante destacar que essas características não de- plano oclusal, deve-se avaliar o contorno das superfícies
vem ser utilizadas de forma isolada para a tomada da oclusais e incisais dos dentes, bem como o contorno gen-
decisão terapêutica, e devem incluir, também, a análise gival. O nível e a inclinação do plano oclusal podem ser
do comprimento do lábio superior. identificados por meio de uma análise cefalométrica lateral.

©DentalPress Publishing / Rev Clín Ortod Dental Press. 2015 jun-jul;14(3):6-36 / 11 /


Fuziy A, Paixão RF, Penido SMO, Simplício AHM

Figura 7: Excesso de exposição dentária Figura 8: Vista de perfil, exibindo o espaço


com os lábios em repouso. interlabial acima do padrão de normalidade.

Figura 9: Telerradiografia em norma lateral Figura 10: Telerradiografia em norma late-


de um indivíduo com excesso vertical ante- ral de um paciente com adequada relação
roinferior e grande exposição dos incisivos dos lábios e discreta exposição dos incisi-
superiores com os lábios em repouso. vos superiores.

Figura 11: Paciente apresentando padrão Figura 12: Paciente exibindo padrão facial Figura 13: Telerradiografia evidenciando
facial dolicocefálico. hipodivergente, braquicefálico. um padrão facial equilibrado, mesocefálico.

/ 12 / ©DentalPress Publishing / Rev Clín Ortod Dental Press. 2015 jun-jul;14(3):6-36


Considerações sobre a etiologia, o diagnóstico e tratamento da sobremordida profunda

A magnitude da curva de Spee é outra variável que pre- influência da força da gravidade nos lábios superior e
cisa ser investigada, pois, em grande parte dos casos, é inferior. Em função disso, a quantidade de exposição de
acentuada e, para o seu nivelamento, deve ser avaliada a gengiva no sorriso e na fala diminui, e aumenta a exposi-
quantidade de espaço presente na arcada, uma vez que, ção dos incisivos inferiores23,24,26. Além disso, a distância
para sua retificação, será necessário mais espaço na ar- da borda incisal dos incisivos superiores até o lábio tam-
cada. Na Figura 14, pode-se avaliar, por meio de modelos bém diminui com a idade28. Essa informação é relevan-
ortodônticos, os planos oclusais de um paciente, onde se te durante o diagnóstico, para que esses dados sejam
percebe a presença de dois planos oclusais, um anterior e registrados e os objetivos traçados de acordo com a
outro posterior. Vários fatores devem ser analisados para idade do paciente.
a decisão entre nivelar essa curva de Spee por intrusão
dos dentes anteriores ou por extrusão dos posteriores e Outro aspecto que deve ser levado em consideração
intrusão dos anteriores. é o sexo dos pacientes, pois diversos estudos indicam
que as mulheres apresentam a linha do sorriso mais
No tocante ao diagnóstico da sobremordida profunda, alta, com maior exposição gengival, ao passo que os
outras variáveis devem ser levadas em consideração, homens apresentam a linha do sorriso mais baixa, com
como a idade do paciente e o sexo. menor faixa de exposição23,24,25,29. A Figura 15 apresenta
fotografias da face de um paciente com os lábios relaxa-
Com o tempo, a influência do envelhecimento diminui dos, ao final do tratamento ortodôntico e 10 anos após
a elasticidade dos tecidos moles peribucais, com con- o tratamento, onde se percebe a melhora do selamento
sequente achatamento do perfil tegumentar, além da labial com o passar dos anos.

A B

Figura 14: Curva de Spee exibindo dois planos oclusais, um anterior e outro posterior: A) lado direito e B) lado esquerdo.

Figura 15: Face de um paciente ao final


do tratamento ortodôntico (A) e aos 10
anos pós-contenção (B), mostrando a
melhora na relação labial com o passar
dos anos.

A B

©DentalPress Publishing / Rev Clín Ortod Dental Press. 2015 jun-jul;14(3):6-36 / 13 /


Fuziy A, Paixão RF, Penido SMO, Simplício AHM

COMO CORRIGIR A SOBREMORDIDA PROFUNDA reduzida, curva de Spee excessiva e exposição dos in-
A sobremordida profunda é um dos problemas mais fre- cisivos de mínima a moderada. A possibilidade de se
quentemente encontrados em várias más oclusões. Esse estimular a extrusão de dentes posteriores tem sido
problema oclusal tem sido associado à função mandibu- defendida por muitas décadas. Em 1921, Case des-
lar inadequada e a desordens nas articulações temporo- creveu a correção de “mordidas cobertas” e mostrou a
mandibulares, e tem efeito prejudicial no desenvolvimento utilização de planos de mordida para permitir a erupção
mandibular. Em função disso, a sua correção durante o de dentes posteriores32. Case utilizou um acessório fixo
tratamento ortodôntico é essencial para a obtenção de posterior rígido nas coroas, para eliminar o uso de apa-
uma função normal do aparelho mastigatório30. relhos removíveis. Propôs, também, a utilização de um
arco com curva de Spee reversa, para extruir os pré-
É amplamente aceito na literatura que a correção da so- -molares e abrir a mordida. Hemley33, em 1938, apre-
bremordida profunda é mais estável e mais fácil de ser sentou alguns pacientes que foram tratados com uma
obtida em pacientes que apresentam crescimento esque- placa com batente anterior, para permitir a extrusão
lético. As razões que têm sido citadas para o potencial de dos dentes posteriores. O método mais comumente
recidiva em adultos incluem a invasão do espaço funcio- utilizado para extruir os dentes posteriores é nivelar as
nal livre e o fato de a correção se opor a uma musculatura arcadas com o uso sequencial de fios contínuos4,32,34.
forte e menos adaptável ao alongamento30. Uma vez que Uma variação dessa técnica é a utilização de uma curva
o crescimento tende a aumentar a distância vertical entre de Spee reversa mandibular e/ou curva de Spee acen-
a maxila e a mandíbula, provavelmente é útil tratar esses tuada maxilar nos arcos. Outra forma seria o aumento
pacientes durante o período de crescimento mandibular progressivo das dobras em degraus no arco ou alteran-
ativo. Durante o período de crescimento, a erupção do do a altura da colocação dos acessórios. Nas Figuras
dente pode ser estimulada nos segmentos posteriores e 16, 17 e 18, ilustra-se a aplicação do batente anterior
inibida nos segmentos anteriores, uma vez que o cresci- de resina, associado ao emprego de arcos com curva
mento da cabeça da mandíbula permite o crescimento acentuada na arcada superior e reversa na inferior, para
dentoalveolar. Em adultos, no entanto, tal movimento é proporcionar a melhoria no quadro de sobremordida, a
contrabalançado pela oclusão posterior, especialmente qual pôde ser evidenciada, no caso em questão, quatro
naqueles com um padrão esquelético hipodivergente. meses após a colagem dos acessórios inferiores.
Caso seja realizado, a estabilidade do movimento do
dente é altamente questionável, pois leva a alterações na A manipulação da curva de Spee, pela utilização de
fisiologia muscular, aumentando o risco de recidiva4. arcos contínuos construídos com fios redondos ou re-
tangulares, tem sido amplamente empregada em Or-
Estratégias de tratamento todontia, para a correção da sobremordida profunda
A sobremordida profunda possui diversas modalidades pela combinação de intrusão dos dentes anteriores
de tratamento e essas estão relacionadas à causa pri- e extrusão dos dentes posteriores. Nesses arcos, na
mária do problema. Sendo assim, as principais estraté- maioria das vezes é incorporada uma curva gradativa,
gias de tratamento são a extrusão dos dentes posterio- de anterior para posterior, contrária à curva de Spee da
res, a intrusão dos dentes anteriores, uma combinação arcada inferior e no mesmo sentido da curva de Spee
de extrusão com intrusão e inclinação para vestibular superior, só que em maior magnitude34. Os arcos com
dos dentes anteriores31. curva de Spee reversa e acentuada corrigem a sobre-
mordida profunda primariamente, pela extrusão dos
Extrusão dos dentes posteriores dentes posteriores, juntamente com a inclinação para
A extrusão dos dentes posteriores é o método mais co- vestibular dos incisivos. Ambos, extrusão e inclinação,
mumente utilizado na correção da sobremordida pro- podem ser movimentos instáveis, em muitos pacien-
funda. Para cada 1mm de extrusão dos dentes poste- tes, devido à alteração do equilíbrio muscular4,7,32.
riores, teremos uma redução do trespasse anterior da
ordem de 1,5 a 2,5mm. Essa modalidade de tratamento Os aparelhos ortopédicos funcionais também podem
está indicada para indivíduos com altura anteroinferior ser utilizados na correção da sobremordida profunda

/ 14 / ©DentalPress Publishing / Rev Clín Ortod Dental Press. 2015 jun-jul;14(3):6-36


Considerações sobre a etiologia, o diagnóstico e tratamento da sobremordida profunda

A B C

Figura 16: Fotografias intrabucais iniciais de um paciente, do sexo masculino, com idade cronológica de 30 anos, no qual observa-se
a sobremordida profunda (B) e a relação sagital de Classe I (A, C).

A B C

Figura 17: Adaptação do batente anterior em resina e colagem de acessórios na arcada inferior.

A B C

Figura 18: Melhoria na sobremordida, alcançada 4 meses após a colagem dos acessórios inferiores.

naqueles pacientes que tenham um padrão braquifacial O aparelho Bionator de Balters possibilita o controle
ou mesofacial com pouca projeção do pogônio, altura da erupção dos dentes anteriores enquanto se mani-
facial anterior reduzida, perfil convexo e exposição ade- pula a erupção dos dentes posteriores, pelo desgaste
quada de incisivos superiores ao sorrir — indivíduos seletivo do acrílico que recobre a oclusal desses den-
portadores de Classe II, divisão 1, na maioria das ve- tes, favorecendo a correção da curva de Spee. A pro-
zes apresentam essas características. Nesses casos, a pulsão e abertura mandibular incluída na aplicação
necessidade de, ao mesmo tempo, aumento da altura do aparelho promove ação ortopédica e dentoalveo-
facial anterior e melhora na convexidade facial contrain- lar maxilomandibular, que reduz a convexidade facial,
dica o uso dos recursos anteriores, onde a extrusão dos aumenta a altura facial anterior e auxilia na correção
dentes posteriores e a rotação mandibular para baixo da Classe II. As Figuras 19, 20 e 21 exemplificam a
e para trás ocorreriam e trariam como resultado efeitos abordagem com o aparelho ortopédico Bionator de
deletérios para o perfil facial. Uma opção de tratamento Balters, seguida da complementação com a aparato-
nessa situação seria a utilização de aparelhos ortopédi- logia fixa, sendo que os resultados finais podem ser
cos funcionais, tais como o Bionator de Balters34. visualizados na Figura 22.

©DentalPress Publishing / Rev Clín Ortod Dental Press. 2015 jun-jul;14(3):6-36 / 15 /


Fuziy A, Paixão RF, Penido SMO, Simplício AHM

Figura 19: Fotografias faciais iniciais de


paciente caracterizada pela deficiência
A B mandibular.

A B C

Figura 20: Fotografias intrabucais evidenciando a sobremordida profunda.

A B C

Figura 21: Fotografias intrabucais mostrando o aparelho Bionator de Balters.

A B C

Figura 22: Fotografias intrabucais finais, onde observa-se a neutroclusão (A e C) e a sobremordida corrigida (B).

/ 16 / ©DentalPress Publishing / Rev Clín Ortod Dental Press. 2015 jun-jul;14(3):6-36


Considerações sobre a etiologia, o diagnóstico e tratamento da sobremordida profunda

Intrusão dos dentes anteriores Por outro lado, o sistema que utiliza o encaixe direto
A intrusão dos incisivos superiores e inferiores é outro nas ranhuras dos braquetes anteriores pode incorpo-
método utilizado para correção da sobremordida pro- rar torques indesejados, sendo estaticamente indeter-
funda em pacientes adultos e adolescentes que apre- minado. Vale também destacar que, no sistema que
sentam excesso vertical, distância incisivo-estômio ex- amarra o fio nos segmentos de arco, pode-se mudar o
cessiva e um grande espaço interlabial. ponto da aplicação de força da mesial dos incisivos até
a distal dos caninos, controlando-se o movimento que
Os quatro métodos mais comuns para realização da se deseja realizar — ou seja, intrusão com vestibulari-
intrusão dos incisivos foram descritos por Burstone35, zação, intrusão pura ou intrusão com lingualização39.
Begg e Kesling36, Ricketts37 e Greig38. Todos esses
métodos empregam ângulos caudais nos arcos, para A Figura 23A evidencia o espaço interlabial aumen-
promover uma força intrusiva. Essas técnicas diferem tado, em um paciente do sexo masculino na fase da
no tamanho do arco, material empregado, método de dentadura mista; nas Figuras 23B e 23C, observa-se
encaixe nos braquetes e na execução de torques; no a grande exposição dentária e um perfil facial suges-
entanto, todas reconhecem a necessidade de aplicação tivo de deficiência mandibular. O paciente apresen-
de forças leves e contínuas. tava má oclusão de Classe II, divisão 1, e sobremor-
dida profunda, como pode-se verificar nas Figuras
Para a realização da intrusão de dentes anteriores, 24A, 24B e 24C. As Figuras 25A, 25B, 26A, 26B,
existem, basicamente, dois tipos de mecânicas: o arco 26C ilustram a fase após a abordagem preventiva e
contínuo do tipo arco base, e o sistema com 3 peças. interceptora, e após o emprego do ativador associa-
Na primeira forma, o arco é confeccionado contornando do ao aparelho extrabucal.
toda a arcada dentária e, na região anterior, poderá ser
ligado aos dentes diretamente nos encaixes das ranhu- O sistema de intrusão de 3 peças foi empregado na
ras dos braquetes, ou sendo amarrado em um segmen- arcada superior e o arco base, na inferior, como pode
to de arco. No sistema de 3 peças, dois segmentos de ser visualizado nas Figuras 27A, 27B e 27C. A melhoria
fio são confeccionados, um para cada lado, e encaixa- na sobremordida pode ser observada nas Figuras 28A,
dos em outro segmento na região anterior. 28B e 28C. Os resultados finais do tratamento eviden-
ciam a solução para a sobremordida profunda, o que
O sistema que utiliza a amarração em um segmento pode ser constatado nas Figuras 29A, 29B, 30A, 30B
de arco, preferencialmente a colocação do fio dentro e 30C; e o sucesso do tratamento pode ser observado
da ranhura do braquete, é uma alternativa mecâni- no controle de 10 anos pós-tratamento, nas Figuras
ca mais previsível e estaticamente determinada35,39,40. 31A, 31B, 32A, 32B e 32C.

©DentalPress Publishing / Rev Clín Ortod Dental Press. 2015 jun-jul;14(3):6-36 / 17 /


Fuziy A, Paixão RF, Penido SMO, Simplício AHM

A B C

Figura 23: Fotografias faciais evidenciando, em A, o espaço interlabial aumentado e a relação lábio-incisivo superior alterada; em
B e C, a grande exposição dentária e o perfil facial sugestivo de deficiência mandibular.

A B C

Figura 24: Fotografias dos modelos de estudo, mostrando a relação oclusal de Classe II (A e C) e a sobremordida profunda (B).

Figura 25: Fotografias faciais após a fase


da Ortodontia Preventiva e Interceptora e
após o emprego do ativador associado
A B ao aparelho extrabucal.

/ 18 / ©DentalPress Publishing / Rev Clín Ortod Dental Press. 2015 jun-jul;14(3):6-36


Considerações sobre a etiologia, o diagnóstico e tratamento da sobremordida profunda

A B C

A B C

Figura 26: Fotografias intrabucais e dos modelos de estudo, após a primeira fase do tratamento ortodôntico.

A B C

Figura 27: Fotografias ilustrativas do sistema de 3 peças, utilizado na arcada superior.

A B C

Figura 28: Melhoria obtida na sobremordida profunda.

©DentalPress Publishing / Rev Clín Ortod Dental Press. 2015 jun-jul;14(3):6-36 / 19 /


Fuziy A, Paixão RF, Penido SMO, Simplício AHM

A B Figura 29: Fotografias faciais finais.

A B C

Figura 30: Fotografias intrabucais finais evidenciando a correção sagital e vertical da má oclusão.

Figura 31: Fotografias faciais no controle


A B de 10 anos de pós-tratamento.

A B C

Figura 32: Fotografias intrabucais evidenciando a manutenção dos resultados do tratamento, 10 anos pós-tratamento.

/ 20 / ©DentalPress Publishing / Rev Clín Ortod Dental Press. 2015 jun-jul;14(3):6-36


Considerações sobre a etiologia, o diagnóstico e tratamento da sobremordida profunda

Figura 33: Fotografias faciais iniciais de


paciente que apresentava perfil conve-
A B xo (A) e face simétrica (B).

A B C

Figura 34: Fotografias intrabucais, onde observa-se sobremordida profunda (B) e má oclusão de Classe I (A, C).

A B Figura 35: Fotografias faciais finais.

A B C

Figura 36: Fotografias intrabucais finais, mostrando a melhoria na sobremordida, que passou a assumir uma condição de normalidade.

©DentalPress Publishing / Rev Clín Ortod Dental Press. 2015 jun-jul;14(3):6-36 / 21 /


Fuziy A, Paixão RF, Penido SMO, Simplício AHM

Combinação de extrusão, intrusão lingual, como os pacientes Classe II, divisão 2, ou com
e inclinação para vestibular dos incisivos más oclusões de Classe III que podem suportar uma
Em algumas situações, as características clínicas e es- inclinação dos incisivos superiores e inferiores para
queléticas dos pacientes indicam a correção da sobre- vestibular. O risco de inclinação dos dentes inclui a
mordida profunda por meio de uma associação de ex- estabilidade de se vestibularizar os incisivos, por cau-
trusão dentária posterior e intrusão dentária anterior e/ sa da possibilidade de alteração no equilíbrio neuro-
ou correção da inclinação axial. Nesses casos, o contro- muscular peribucal. Em pacientes que apresentam um
le biomecânico é menos crítico, sendo viável a utilização bom padrão facial e apinhamento anterior, estão indi-
de sistemas de forças mais simples, como o nivelamen- cadas a vestibularização dos incisivos e a abertura da
to sequencial das arcadas, para manipular a curva de circunferência da arcada32.
Spee. Outra forma de se realizar esse procedimento é
alterando o posicionamento dos acessórios, colocando Um exemplo de um tratamento envolvendo a utilização
os braquetes anteriores mais para oclusal e os posterio- da curva reversa inferior e o aumento da inclinação vesti-
res mais para gengival. bular como abordagem terapêutica para a sobremordida
profunda pode ser visualizado nas Figuras 33, 34, 35 e
Um aumento na vestibularização dos incisivos su- 36. A correção da inclinação axial dos incisivos pode con-
periores e inferiores pode, efetivamente, diminuir a tribuir para o aumento da sua protrusão e, consequente-
sobremordida profunda. A inclinação para vestibular mente, resultar na obtenção de uma sobremordida nor-
tende a diminuir a sobremordida, secundariamente mal, como pode-se observar nas Figuras 37 e 38.
ao movimento rotacional da coroa dos incisivos. Para
correções suaves a moderadas, essa conduta pode O Quadro 1 apresenta um sumário das indicações
ser muito efetiva. Essa opção pode ser melhor indi- para o tratamento da sobremordida profunda, em fun-
cada em pacientes com inclinação dos incisivos para ção do diagnóstico.

A B C

Figura 37: Fotografias intrabucais evidenciando a sobremordida profunda e a verticalização dos incisos superiores e inferiores.

A B C

Figura 38: Fotografias intrabucais finais, nas quais se observa que a correção da sobremordida profunda ocorreu em função da ade-
quação das inclinações axiais dos incisivos superiores e inferiores.

/ 22 / ©DentalPress Publishing / Rev Clín Ortod Dental Press. 2015 jun-jul;14(3):6-36


Considerações sobre a etiologia, o diagnóstico e tratamento da sobremordida profunda

DIAGNÓSTICO E INDICAÇÃO DE TRATAMENTO

Sobremordida profunda

Bom padrão facial Deficiência vertical

Dentária Esquelética

Sobre-erupção Suberupção Criança Adulto


dentes anteriores dentes posteriores (c/ crescimento) (s/ crescimento)

Intrusão Extrusão Ortopedia


Moderada Severa
incisivos molares funcional

Estimular
Superiores e/ou Camuflagem Cirurgia
desenvolvimento
inferiores dentoalveolar Ortognática
dentoalveolar

Quadro 1: Sumário das indicações de tratamento da sobremordida profunda, com base no diagnóstico20.

BIOMECÂNICA DA CORREÇÃO Predominam objetivos vagos e sequências clínicas pa-


DA SOBREMORDIDA dronizadas para tratamentos em série35.

Planejamento mecânico: sistema de forças ideal Em relação a esse ponto, Burstone42 classifica as práti-
A base para o sucesso no controle da movimentação cas ortodônticas em dois tipos: a Ortodontia conduzida
ortodôntica reside no conhecimento e aplicação clínica pelo aparelho e a Ortodontia orientada pelos sistemas
dos fundamentos de biomecânica. Após todo o pro- de forças. Sempre que opta pela primeira alternativa,
cesso de diagnóstico, faz-se necessário o estabeleci- o ortodontista perde em controle da movimentação
mento de objetivos específicos de tratamento, com a e previsibilidade de resultados, além de tornar-se re-
descrição detalhada e tridimensional dos movimentos fém de efeitos colaterais. A Ortodontia orientada pelos
ortodônticos desejados41. Entretanto, a incorporação do sistemas de forças, por outro lado, tem o ortodontista
planejamento mecânico individualizado na elaboração como protagonista na condução do tratamento, valori-
do plano de tratamento ortodôntico ainda não é uma zando a individualização do planejamento e o controle
rotina em muitas escolas formadoras de especialistas. da movimentação.

©DentalPress Publishing / Rev Clín Ortod Dental Press. 2015 jun-jul;14(3):6-36 / 23 /


Fuziy A, Paixão RF, Penido SMO, Simplício AHM

O planejamento mecânico inicia-se pela definição do


problema, por exemplo: a sobremordida profunda em
decorrência da extrusão de incisivos. A partir desse pon-
to, estabelece-se o movimento ortodôntico ideal para
corrigi-lo. Dessa forma, tem-se um ponto de partida e um
objetivo específico a ser alcançado, a intrusão dos incisi-
vos na extensão necessária para corrigir o problema.

Para o estabelecimento do sistema de forças neces-


sário para a obtenção dos movimentos desejados, é
fundamental a localização do centro de resistência do
Figura 39: Sistema de forças ideal para a intrusão de incisivos.
dente ou grupo de dentes a serem movimentados (uni-
dade ativa), bem como dos elementos de ancoragem
(unidade reativa). O movimento ortodôntico é resultante sistema de forças, e não por preferências pessoais ou
da relação entre a linha de ação da força e a distância marcas comerciais. Não há um aparelho único que gere
perpendicular dessa ao centro de resistência das uni- esse sistema de forças planejado, e diversos recursos
dades. Sempre que a linha de ação passar através do ortodônticos podem ser combinados, ou até criados
centro de resistência, haverá um movimento de trans- para esse fim, dependendo do domínio técnico, conhe-
lação. Por outro lado, sempre que isso não acontecer, cimento, experiência e criatividade do profissional para
será gerado um momento, ou seja uma tendência ao individualizar cada demanda clínica. Sob esse prisma,
movimento de rotação. Quanto maior a distância entre é pertinente a análise mecânica das estratégias mais
a linha de ação de força e o centro de resistência das difundidas para a correção da sobremordida profunda.
unidades, maior o momento resultante (M = F x d)43,44.
Arcos contínuos com curva reversa e acentuada
No caso específico em que o movimento desejado seja A forma mais frequentemente utilizada na clínica orto-
a intrusão pura dos quatro incisivos superiores (unidade dôntica para correção da sobremordida profunda, indu-
ativa), uma vez que já foi estabelecido que o centro de bitavelmente, é o nivelamento da curva de Spee com
resistência desse grupo de dentes localiza-se, aproxi- arcos contínuos7,41. Para maximizar seus efeitos, são
madamente, na mesial da raiz do canino — a cerca de incorporadas curvas, de forma a reverter o arco inferior
um terço da distância da crista óssea ao ápice radicu- e acentuar o superior. Desde a consolidação dos apa-
lar45 —, faz-se necessário o direcionamento de uma for- relhos fixos com acessórios do tipo Edgewise, principal-
ça intrusiva com linha de ação passando através dessa mente graças a Tweed, essa abordagem tem sido utili-
região. Para obedecer ao princípio do equilíbrio mecâni- zada com algumas variações de ligas ou secções trans-
co (segundo o qual, em um sistema de forças, o soma- versais. Entre os seus maiores defensores está Schudy7,
tório das forças e o somatório dos momentos sempre justificando-a, principalmente, por ser contrário à intru-
é igual a zero), ao se produzir uma força intrusiva na são de incisivos, considerando-a sem estabilidade.
unidade ativa, obrigatoriamente será gerada uma força
extrusiva reativa na unidade de ancoragem — no caso, Mecanicamente, essa estratégia consiste de um siste-
os dentes posteriores. Essas duas forças formam um bi- ma estaticamente indeterminado, ou seja não é possível
nário no sentido anti-horário, que é equilibrado com um quantificar precisamente as forças e os momentos en-
momento no sentido horário gerado na unidade reativa, volvidos. Cada dente responde individualmente, segun-
o que completa o sistema de forças ideal (Fig. 39). do a relação do seu centro de resistência e as forças
adjacentes, gerando múltiplos sistemas de forças, o que
A partir da determinação do sistema de forças ideal, o torna impossível a análise mecânica estática. Como to-
ortodontista deve selecionar a aparatologia que o pro- dos os dentes são incorporados ao arco, há uma pe-
duza; portanto, a seleção do aparelho é a quarta etapa quena distância interbraquetes, o que aumenta a mag-
do planejamento mecânico, e deve ser orientada pelo nitude das forças verticais (Fig. 40).

/ 24 / ©DentalPress Publishing / Rev Clín Ortod Dental Press. 2015 jun-jul;14(3):6-36


Considerações sobre a etiologia, o diagnóstico e tratamento da sobremordida profunda

A sobremordida é corrigida, principalmente, pela extrusão


dos pré-molares e vestibularização dos incisivos. Portanto,
nos casos em que a sobremordida profunda estiver asso-
ciada a incisivos verticalizados e altura facial inferior diminuí-
da, essa abordagem pode ter indicação. Entretanto, a sua
utilização indiscriminada, em todos os casos, certamente é
um erro frequente, cometido por muitos profissionais.

Arco Utilidade de Ricketts


O arco utilidade é um dos dispositivos da técnica Bio-
Figura 40: Sistema de forças na utilização de curva reversa e progressiva de Ricketts46, possuindo múltiplas funções,
acentuada. inclusive a correção da sobremordida profunda. Apesar
de atuar por segmentos, por ser inserido nos acessórios
tanto na unidade reativa quanto na ativa, enquadra-se
como um sistema estaticamente indeterminado. Objeti-
va, primordialmente, a intrusão; entretanto, como a linha
de ação da força intrusiva, por ele gerada, está sempre
vestibular ao centro de resistência dos incisivos, há pro-
dução de um momento no sentido anti-horário, promo-
vendo a vestibularização desses dentes (Fig. 41).

Para minimizar tal efeito, muitas vezes indesejado, pode-


Figura 41: Sistema de forças observado no emprego do arco -se fazer o travamento ativo das extremidades do arco
utilidade de Ricketts. nos tubos dos molares, ou a incorporação de torque lin-
gual de coroa na região anterior. Entretanto, tais procedi-
mentos podem alterar sensivelmente o sistema de forças
desejado, aumentando ou diminuindo a magnitude da
força intrusiva44 (Fig. 42). Da mesma forma que com o
arco contínuo com curva, se houver a indicação de al-
gum nível de projeção de incisivos, o arco utilidade pode
ser indicado, além de aumentar a distância interbraque-
tes e trabalhar por segmentos.

Figura 42: Incorporação de torque lingual nos incisivos, durante


Técnica do Arco Segmentado de Burstone
a utilização do arco utilidade de Ricketts. Charles Burstone desenvolveu a Técnica do Arco Seg-
mentado (TAS) com forte fundamentação nos princípios
básicos de biomecânica ortodôntica. Os dispositivos e a
sequência clínica são selecionados a partir do planejamen-
to mecânico e inteiramente individualizados em função do
sistema de forças ideal para o movimento desejado35,40,42,43.

Em relação à correção da sobremordida profunda, a TAS


preconiza os seguintes aspectos:

Sistema estaticamente determinado


Figura 43: Sistema de forças criado com o emprego do arco Basicamente, a TAS utiliza o arco base de intrusão ou
base de Burstone. o sistema de três peças, sendo ambos sistemas esta-

©DentalPress Publishing / Rev Clín Ortod Dental Press. 2015 jun-jul;14(3):6-36 / 25 /


Fuziy A, Paixão RF, Penido SMO, Simplício AHM

ticamente determinados; ou seja, é possível quantificar


precisamente as forças e os momentos liberados. Essa
característica deve-se ao fato de o arco ser encaixado
em apenas uma das extremidades do sistema, sendo
que a outra é amarrada ou presa apenas em um ponto
de contato43 (Fig. 43). Além de maior controle mecânico,
isso possibilita uma maior versatilidade para as indivi-
dualizações inerentes a cada caso.

Baixa magnitude e constância da força


Em decorrência de utilizar sistemas estaticamente deter-
minados, a TAS permite a quantificação de forças pela Figura 44: Linha de ação da força em relação ao centro de
medição direta, usando um dinamômetro, preservando resistência dos incisivos.
níveis predeterminados de força intrusiva, de acordo
com a região e o número de dentes. Outra vantagem é a
utilização de dispositivos com baixa proporção de carga/
deflexão. Os arcos de intrusão e os cantiléveres são con-
feccionados em fio de aço 0,018” x 0,025” com duplo
helicoide, ou fio de TMA 0,017” x 0,025” sem helicoides.
A força de desativação é mantida abaixo de 10g/mm, o
que possibilita maior amplitude de ativação, menor ne-
cessidade de reativações e redução de eventuais efeitos
colaterais, como, por exemplo, a extrusão de molares.

Recomenda-se, para a intrusão, forças de baixa mag-


nitude, sendo indicados de 15 a 20g para os incisivos
centrais superiores, 10 a 15g para incisivos laterais, 25g Figura 45: Linha de ação da força em relação ao centro de
para caninos superiores e inferiores, e 10 a 15g para resistência dos incisivos, no emprego do sistema de 3 peças.

incisivos inferiores35.

Variação da linha de ação de força


O arco base de intrusão e os cantiléveres permitem
a individualização do ponto de aplicação da força
intrusiva, possibilitando que a linha de ação da for-
ça seja adequadamente direcionada, caso a caso
(Fig. 44 e 45). As inclinações iniciais dos incisivos são
determinantes para a seleção da linha de ação mais
adequada para a obtenção do movimento desejado.
As técnicas que possuem o ponto de aplicação fixo,
sempre vestibular ao centro de resistência dos inci- Figura 46: Momentos resultantes dependendo da maior ou me-
nor inclinação dos incisivos.
sivos, produzirão momentos diferentes dependendo
da maior ou menor inclinação axial, mesmo que utili-
zem a mesma magnitude de força intrusiva (Fig. 46).
com pleno conhecimento dos componentes reativos
Controle de ancoragem e efeitos colaterais de equilíbrio, torna-se fácil e previsível o controle dos
Sempre que for planejada a intrusão de incisivos, assim efeitos colaterais, bem como da ancoragem. Na me-
que o sistema de forças ideal tiver sido determinado, cânica de intrusão da TAS, os dentes posteriores são

/ 26 / ©DentalPress Publishing / Rev Clín Ortod Dental Press. 2015 jun-jul;14(3):6-36


Considerações sobre a etiologia, o diagnóstico e tratamento da sobremordida profunda

consolidados como segmentos de ancoragem (unida- tido das forças e nos momentos, diante da desativação
de reativa) por meio de fios rígidos (aço 0,018” x 0,025” do dispositivo, sendo que a variação é constatada so-
ou 0,019” x 0,025”) e conectados entre si com barra mente na intensidade desses35,39,43,44.
transpalatina ou arco lingual, de forma a neutralizar
os efeitos das forças extrusivas resultantes. O fato de A mecânica de intrusão com o arco base pode ser
utilizar níveis de força muito baixos também reduz as realizada tanto na arcada dentária superior quanto na
forças verticais e momentos reativos. inferior, dependendo da participação dessas no esta-
belecimento da sobremordida profunda. Efetua-se, ini-
Como forma de preservar a ancoragem, Burstone re- cialmente, a consolidação dos segmentos posteriores,
comenda a intrusão inicial apenas dos incisivos, sua que deve incorporar, por vestibular, um segmento de
estabilização com um arco rígido com bypass (des- arco de fio de aço inoxidável 0,019” x 0,025”, do pri-
vios) nos caninos, e posterior intrusão desses com meiro molar ao primeiro pré-molar, e uma barra trans-
cantiléveres individuais. palatina que une um lado ao outro (Fig. 47). Em casos
de ancoragem crítica, recomenda-se incluir o segundo
Considerando a diversidade dos casos com so- molar. Na arcada inferior, a consolidação do segmen-
bremordida profunda, torna-se fundamental ajustar to posterior exige procedimento similar, porém, com a
a abordagem mecânica de acordo com as indivi- complementação com um arco lingual. A barra trans-
dualidades de cada paciente. Não se pode tratar palatina e o arco lingual são confeccionados com fio de
situações distintas sempre utilizando uma mesma aço 0,036”. O segmento posterior compõe a unidade
fórmula. O mais adequado é a incorporação do pla- de ancoragem para a intrusão dos incisivos.
nejamento mecânico à rotina do planejamento orto-
dôntico, sempre partindo da identificação do proble-
ma a ser corrigido, determinando o movimento or-
todôntico ideal para a sua correção, estabelecendo
o sistema de forças adequado para cada situação,
selecionando o aparelho para esse fim, incorporando
as ativações precisas e monitorando clinicamente a
dinâmica da movimentação.

Arco base de intrusão


A mecânica ortodôntica selecionada para tratar a so-
bremordida profunda depende não somente dos fato-
res etiológicos associados ao problema, mas também
do diagnóstico diferencial. Assim sendo, a intrusão A

de incisivos é indicada em pacientes com excesso de


crescimento vertical da maxila, padrão vertical, altu-
ra facial anteroinferior aumentada, espaço interlabial
aumentado, relação lábio/incisivo superior acima de
3,0mm, exposição gengival acima de 2,0mm durante
o sorriso, e lábio superior curto4,32,35,39,40,44.

O arco base de intrusão é comumente empregado na


Técnica do Arco Segmentado de Burstone (TAS), e visa
o nivelamento entre os segmentos anterior e poste-
rior43. Caracteriza-se por ser um dispositivo mecânico
que estabelece um sistema de forças estaticamente B

determinado, ou seja, não ocorrem alterações no sen- Figura 47: Consolidação dos segmentos anterior (A) e posterior (B).

©DentalPress Publishing / Rev Clín Ortod Dental Press. 2015 jun-jul;14(3):6-36 / 27 /


Fuziy A, Paixão RF, Penido SMO, Simplício AHM

Outro requisito necessário para possibilitar a mecânica de comprimento e, com o alicate 139, efetua-se uma
de intrusão envolve a consolidação do segmento an- dobra de 90° em uma das extremidades e, imediata-
terior com arco estabilizador de fio de aço inoxidável mente, constrói-se um helicoide de duas voltas e meia,
0,019” x 0,025”, estendendo-se de incisivo lateral ao com aproximadamente 3mm de diâmetro interno, sen-
homólogo do lado oposto; e esses elementos dentá- do adaptado na mesial do tubo triplo do primeiro molar.
rios deverão estar conjugados, para evitar a abertura Subsequentemente, na região do terço mesial do cani-
de diastemas. Os caninos não são incluídos no seg- no, realiza-se uma dobra de 45° em direção oclusal, a
mento, pois, posteriormente, serão intruídos separa- qual deve apresentar a altura equivalente ao diâmetro do
damente, com o emprego de cantiléver ou alça retan- helicoide (Fig. 48).
gular. Evita-se a intrusão em massa dos seis dentes
anteriores, pois torna-se complexa do ponto de vista Na sequência, realiza-se uma dobra em direção mesial
da ancoragem vertical e poderão ocorrer efeitos inde- e promove-se a curvatura incisal com o alicate 109 ou
sejáveis de extrusão e angulação distal das coroas dos 065. A curvatura deve estar posicionada por cervical e
dentes posteriores35,39,43,44,47. mantendo o paralelismo com o segmento de arco dos
incisivos. Repetem-se as dobras no lado oposto do arco
Para a construção do arco base, recomenda-se o uso do base, concluindo com o helicoide na mesial do tubo
fio de aço ou de titânio-molibdênio de 0,017” x 0,025”, triplo do primeiro molar. Após a confecção, deve-se
ou de aço de 0,018” x 0,025. No caso do uso do fio conferir se o arco base se encontra passivo, antes de
de aço, realiza-se a incorporação do helicoide. Inicial- promover a ativação (Fig. 49). A ativação é efetuada rea-
mente, corta-se um segmento de fio de aço com 17cm lizando-se uma dobra na mesial do helicoide, seguindo

A B

C D

Figura 48: Construção passo a passo do arco base: A) dobra de 90°, B) helicoide, C) helicoide com duas voltas e meia, D) degrau anterior.

/ 28 / ©DentalPress Publishing / Rev Clín Ortod Dental Press. 2015 jun-jul;14(3):6-36


Considerações sobre a etiologia, o diagnóstico e tratamento da sobremordida profunda

A B C

D E F

Figura 49: Construção passo-a-passo do arco base e sua ativação: A) Curvatura incisal, B) Adaptação da curvatura incisal, C) Arco base
construído, D) Passivo, E) Ativado, F) Conferência da força.

o mesmo princípio do cantiléver, no sentido ocluso-cer- acompanhada da inclinação vestibular ou lingual dos
vical, de tal forma que o arco base se desloque para incisivos, dependendo da linha de ação da força, em
cervical (Fig. 49). relação ao centro de resistência. Caso a força seja
aplicada anteriormente ao centro de resistência, a
Após a ativação, empregando-se um tensiômetro de intrusão será acompanhada da inclinação vestibular,
precisão, confere-se a força resultante de retorno do sistema de forças que é, frequentemente, indicado na
arco base da posição ativa de deslocamento para a má oclusão de Classe II, divisão 2. A melhor maneira
cervical até a posição neutra. Vale ressaltar que, para de se alcançar esse objetivo é amarrar o arco base na
a intrusão de incisivos superiores, é necessária uma linha média entre os incisivos centrais4.
força leve, de 15 a 20g por dente; já para os inferiores,
varia de 10 a 15g por elemento dentário35,48 (Fig. 49). Quando a linha de ação da força encontrar-se posterior-
mente ao centro de resistência, ocorrerá, concomitan-
O arco base ativo deverá ser fixado em seu extremo dis- temente com a intrusão, a lingualização dos incisivos.
tal, passando-se uma ligadura metálica pelo centro do Entretanto, quando se deseja a intrusão pura, o ponto
helicoide e amarrando-a ao gancho do tubo molar. Na re- de aplicação da força deve coincidir com o centro de
gião anterior, deve ser amarrado em um ponto de aplica- resistência. Nos casos em que os incisivos apresentam
ção entre o incisivo central e o lateral, ou entre os incisivos uma moderada proclinação, o arco base deve ser amar-
centrais, dependendo do objetivo da intrusão (Fig. 50). rado ao segmento anterior, em um ponto localizado dis-
Entretanto, o arco base não deve ser encaixado direta- talmente aos incisivos laterais4,40,47.
mente nas ranhuras dos braquetes dos incisivos, para se
prevenir o aumento do torque e a divergência das raízes. O sistema de forças resultante da ativação do arco base
é composto por uma força vertical intrusiva e um mo-
Para o movimento intrusivo controlado, é necessária mento que tende a promover a rotação dos incisivos,
a determinação do centro de resistência dos quatro dependendo do ponto de aplicação da força, em rela-
incisivos, que se localiza na mesial da raiz do canino, ção ao centro de resistência dos incisivos. Na unidade
a cerca de um terço da distância da crista óssea ao de ancoragem, observa-se a atuação da força vertical
ápice radicular45. Assim sendo, a intrusão poderá ser extrusiva e momento de angulação distal nos molares.

©DentalPress Publishing / Rev Clín Ortod Dental Press. 2015 jun-jul;14(3):6-36 / 29 /


Fuziy A, Paixão RF, Penido SMO, Simplício AHM

Entretanto, o efeito sobre a unidade de ancoragem pode resistência desses elementos dentários, poderá promo-
ser reduzido pela incorporação de um maior número de ver a inclinação lingual dos molares. Esse efeito pode
dentes e pela conexão dos dois lados da arcada den- ser evitado com o emprego da barra transpalatina43.
tária, por meio da barra transpalatina e do arco lingual.
Um controle vertical adicional pode ser proporcionado A aplicação de força de magnitude elevada poderá pro-
pelo uso do aparelho extrabucal de tração alta35,39,43,44. vocar a atuação de momentos de força que tendem a
angular as coroas dos molares para distal, o que pode
A evolução do tratamento pode ser observada com a ser prevenido com a utilização do aparelho extrabucal.
intrusão média de 0,7mm por mês, e o arco de intrusão
deve ser reativado a cada 6 semanas; porém, com o O arco de intrusão deve ser amarrado nos tubos mola-
controle mensal do movimento35,39,44. A intrusão média res, evitando, no caso da linha de ação da força se lo-
dos incisivos superiores pode ser de 2,36mm, com no calizar anteriormente ao centro de resistência dos incisi-
máximo 4,0mm, empregando-se uma força de baixa vos, que se inclinem para vestibular durante a liberação
magnitude, com 60g48. da força intrusiva.

Os efeitos indesejáveis do arco de intrusão podem ser A exemplificação do emprego do arco base pode ser
prevenidos com o planejamento adequado da linha de observada na Figura 51, na qual se observa que a so-
ação da força em relação ao centro de resistência. En- bremordida profunda foi corrigida com o emprego do
tretanto, como o arco de intrusão é inserido no tubo arco base de Burstone, sendo que o ponto de aplicação
molar, sendo posicionado por vestibular ao centro de da força foi entre os incisivos centrais.

A B

Figura 50: Fixação do arco base e ponto de aplicação da força nas regiões anterior (A) e posterior (B).

A B C

Figura 51: Sobremordida profunda (A), emprego do arco base (B) e correção da sobremordida (C).

/ 30 / ©DentalPress Publishing / Rev Clín Ortod Dental Press. 2015 jun-jul;14(3):6-36


Considerações sobre a etiologia, o diagnóstico e tratamento da sobremordida profunda

Sistema de 3 peças No próximo passo, na extremidade do fio será efetuada


Em casos clínicos caracterizados por incisivos em acen- uma dobra de 90° em direção distal, finalizando com
tuada inclinação vestibular, deve-se, antes de aplicar o uma dobra em forma de gota na mesial do primeiro
arco de intrusão, realizar a retração desses elementos pré-molar. Repetem-se todas as dobras no lado oposto.
dentários com fios redondos até a correção da inclina-
ção axial. Em circunstâncias em que não é possível a Para a construção do cantiléver, emprega-se o fio de
retração dos incisivos, é recomendável o emprego do aço inoxidável 0,017” x 0,025” ou 0,018” x 0,025” ou
arco de intrusão de três peças com cantiléveres49. de TMA. Na extremidade do segmento de fio de aço,
executa-se uma dobra em 90° e, imediatamente, utili-
O preparo prévio da consolidação do segmento poste- zando-se o alicate 139, faz-se um helicoide, que deve
rior é idêntico ao da utilização do arco base. Entretanto, ser adaptado na mesial do tubo molar e deve se es-
o segmento anterior sofre uma alteração, estendendo- tender mesialmente. Na sequência, o fio é dobrado em
-se o braço distalmente aos incisivos laterais, para o en- 90° para oclusal, finalizando-se com a construção de
caixe de dois cantiléveres. Corta-se um segmento de fio um gancho que será apoiado na extensão do braço do
de aço 0,019” x 0,025” ou 0,021” x 0,025”, o qual deve segmento anterior, no nível do centro de resistência,
ser contornado com o alicate 065 ou De La Rosa, de localizado na mesial do canino (Fig. 53). A confecção
maneira a adaptar-se passivamente nas canaletas dos do cantiléver do lado oposto seguirá os mesmos pas-
braquetes dos incisivos. Na sequência, na distal dos sos anteriormente descritos. A diferença observada na
braquetes dos incisivos laterais, dobra-se o fio em 90° construção do cantiléver com fio de TMA é que essa
em direção cervical (Fig. 52). exclui a incorporação do helicoide.

A A

Figura 52: Consolidação do segmento anterior: vistas frontal (A) e lateral (B).

A B C

Figura 53: A) Construção do helicoide e demarcação da localização para o gancho; B) cantiléver confeccionado e C) teste para verificar
se o cantiléver encontra-se passivo.

©DentalPress Publishing / Rev Clín Ortod Dental Press. 2015 jun-jul;14(3):6-36 / 31 /


Fuziy A, Paixão RF, Penido SMO, Simplício AHM

A A

Figura 54: Cantiléver ativado, em vistas lateral (A) e frontal (B).

Figura 55: Sistema de retração e intrusão simultânea.

Com o alicate 139 posicionado no helicoide, realiza-se Nas Figuras 56, 57 e 58, observa-se a aplicação do sis-
a pré-ativação do cantiléver, por meio de uma dobra em tema de intrusão e retração simultânea, sendo que os
direção cervical. O cantiléver ativado é fixado ao seg- diastemas existentes na região anterior foram fechados
mento posterior pelo tubo molar, e o gancho do cantilé- ao mesmo tempo em que ocorria a correção da sobre-
ver é encaixado no braço do segmento anterior (Fig. 54). mordida profunda.

Os casos clínicos caracterizados por trespasse vertical Intrusão de caninos


acentuado e pela presença de diastemas no segmento Após a intrusão dos incisivos, é realizada a estabilização
anterior podem ser solucionados com a implementação desses dentes com um arco 0,019” x 0,025”, apresen-
de uma força horizontal ao sistema do arco de intrusão tando dobras de desvios nos caninos. Os caninos de-
de três peças. Após a ativação dos cantiléveres, asso- vem ser intruídos separadamente, com o emprego da
cia-se a força horizontal, produzida pela incorporação alça retangular ou de cantiléver.
de uma cadeia elastomérica inserida da dobra em gota,
presente na extremidade do segmento de consolidação A alça retangular é confeccionada com fio 0,017” x 0,025”
anterior, ao tubo molar (Fig. 55). Esse sistema segue o de aço ou TMA, apresentando a seguinte configuração:
princípio da resultante de duas forças com o mesmo de 6 a 7mm de altura, por 8 a 10mm de largura, sen-
ponto de aplicação das forças, sendo determinada pela do que deverá permanecer centralizada no canino a ser
diagonal do paralelogramo, cujos lados representam as movimentado. A alça retangular oferece bom controle
forças aplicadas. Dessa forma, a intrusão ocorre acom- da relação momento/força (M/F); entretanto, quando
panhando o longo eixo dos incisivos. deslocada para mesial ou distal, provoca a incorporação

/ 32 / ©DentalPress Publishing / Rev Clín Ortod Dental Press. 2015 jun-jul;14(3):6-36


Considerações sobre a etiologia, o diagnóstico e tratamento da sobremordida profunda

A B C

Figura 56: Fotografias intrabucais evidenciando a má oclusão de Classe II, divisão 2, e a sobremordida profunda.

A B C

Figura 57: Fotografias intrabucais demonstrando o emprego do sistema de retração e intrusão simultânea.

A B C

Figura 58: Fotografias finais, mostrando a correção da má oclusão, em seus aspectos sagital e vertical.

A B C

Figura 59: Alça retangular, sendo que em: A) Alça retangular adaptada; B) alça retangular confeccionada e em C) Ativação.

de momentos que tendem a angular a raiz do canino efetua-se na distal do canino uma dobra em 90°, em
durante a intrusão43,47. direção cervical; posteriormente, efetua-se uma dobra
para a mesial. Na mesial do canino, dobra-se o fio em
Inicialmente, constrói-se uma dobra em forma de ôme- 90° para a oclusal. Finaliza-se a alça com uma dobra de
ga, com o alicate Tweed, visando a estabilização da forma a se encaixar passivamente na canaleta do bra-
alça retangular no sentido mesiodistal. Na sequência, quete do canino (Fig. 59).

©DentalPress Publishing / Rev Clín Ortod Dental Press. 2015 jun-jul;14(3):6-36 / 33 /


Fuziy A, Paixão RF, Penido SMO, Simplício AHM

A B

Figura 60: Cantiléver para intrusão de caninos: cantiléver ativado (A) e fixado (B).

Para a ativação da alça, simula-se o movimento de valores iniciais, ocorre em torno de 20 a 40% dos ca-
intrusão, com o auxílio de dois alicates, e efetua-se a sos50,51,52, mostrando-se relacionada à severidade inicial
pré-ativação nos ângulos alterados durante a simulação. do problema53. A recidiva ocorre nos dois primeiros anos
de pós-tratamento54; entretanto, a alteração que pode
O canino pode ser intruído com o emprego do cantilé- ocorrer no período pós-tratamento evidencia um peque-
ver, que é considerado um sistema estaticamente de- no aumento no valor da sobremordida, que pode não
terminado, ou seja, uma das extremidade é inserida no apresentar significância clínica55.
tubo molar e a outra, amarrada em apenas um ponto de
contato (Fig. 60). Alguns fatores colaboram para uma maior estabilidade
na correção da sobremordida profunda. Os pacientes
Geralmente, é confeccionado com fio 0,017” x 0,025” de em crescimento se beneficiam mais com esse proto-
aço ou de TMA, sendo que a diferenciação no uso dos colo de tratamento, pois durante o crescimento tende
fios é a introdução de um helicoide próximo ao tubo mo- a ocorrer o aumento da distância vertical entre a ma-
lar. A extremidade mesial do cantiléver termina com uma xila e mandíbula, assegurando uma maior estabilidade
dobra em forma de gota coincidindo com o longo eixo durante a correção do problema50. Assim sendo, a ex-
do canino. Após a construção, testa-se a sua passivida- trusão de molares em pacientes em crescimento pode
de e efetua-se a ativação, com uma dobra em direção proporcionar o sucesso no tratamento da sobremordida
cervical na região mesial ao helicoide. O cantiléver ativo profunda2,33,56. Por outro lado, a intrusão garante maior
é fixado ao tubo molar e ao braquete do canino. A força estabilidade em pacientes adultos57.
recomendada para intrusão de canino superior ou infe-
rior é de 25 a 30g. Os tipos faciais hiperdivergentes mostram uma estabi-
lidade maior de correção da sobremordida profunda,
ESTABILIDADE E CONTENÇÃO quando comparados aos tipos faciais hipodivergentes,
A correção da sobremordida profunda pode ser alcan- o que é justificado pelo fato de que a taxa de cresci-
çada por meio de uma variedade de métodos e com mento no sentido vertical é mais alta e apresenta maior
resultados previsíveis. Entretanto, o maior desafio con- duração nos pacientes com valor elevado do ângulo do
siste em manter essa correção. A literatura tem eviden- plano mandibular4.
ciado a preocupação com a estabilidade no tratamento
da sobremordida profunda50. Alterações na sobremordi- A extrusão de molares como forma de tratamento da
da profunda e nas dimensões verticais podem ocorrer, sobremordida profunda é uma alternativa que garante
e a recidiva no período pós-tratamento, em direção aos uma possibilidade maior de estabilidade em pacientes

/ 34 / ©DentalPress Publishing / Rev Clín Ortod Dental Press. 2015 jun-jul;14(3):6-36


Considerações sobre a etiologia, o diagnóstico e tratamento da sobremordida profunda

em crescimento, desde que não invada os limites de dentários e estéticos. É amplamente aceito pela literatura
tolerância do espaço interoclusal57. O movimento extru- que a correção da sobremordida profunda é mais estável
sivo além do espaço interoclusal pode não ser estável, e mais fácil de ser obtida em pacientes que apresentam
devido à pressão da oclusão posterior e ao alongamen- crescimento esquelético e — independentemente se será
to muscular, acarretando na recidiva em pacientes com efetuada por meio da intrusão de incisivos, extrusão dos
padrão horizontal. Em pacientes adultos, seria aconse- dentes posteriores ou pela combinação de ambas — é
lhável a intrusão de incisivos22,57, sendo possível a in- fundamental que o profissional estabeleça o planejamen-
trusão de 1,5mm dos incisivos superiores e de 1,9mm to mecânico adequado, conhecendo o sistema de for-
dos inferiores58, ou valores maiores, de até 3,3mm de ças produzido pela ativação de cada um dos recursos
intrusão55. No entanto, alguns fatores contribuem para utilizados, pois o sucesso do tratamento dependerá do
a ocorrência da recidiva, a erupção continuada dos in- domínio dos componentes ativos e reativos, e da possibi-
cisivos inferiores, a inclinação do plano oclusal, o nivela- lidade de trabalhar com a previsibilidade dos resultados e
mento inadequado da curva de Spee, ângulo interincisi- do controle dos movimentos dentários.
vos aumentado e rotação mandibular anti-horária.
ABSTRACT
O ângulo interincisivos exerce influência na estabilida- Considerations about deep overbite etiology, di-
de da correção da sobremordida profunda. Assim sen- agnosis and treatment. / Overbite is the most com-
do, a verticalização excessiva dos incisivos promove o mon component in adult and children malocclusion
aumento do ângulo interincisivos e relaciona-se com a and its correction represents one of the first and most
recidiva da sobremordida profunda. Portanto, obter a difficult stages of treatment. It is of paramount impor-
inclinação axial adequada desses dentes ao término do tance that the professional know the nature of deep
tratamento pode representar um fator de estabilidade59. overbite, and while developing a treatment planning,
observe aspects related to its etiology, diagnosis and
Os protocolos de tratamento com extrações podem biomechanical considerations. Depending on the ob-
influenciar na estabilidade da correção da sobremor- jectives, deep overbite can be corrected by means of
dida profunda57,60,61; entretanto, outro estudo62 não mechanics for intrusion of anterior teeth, extrusion of
comprovou a existência de diferenças na estabilida- posterior teeth or the combination of both. In extrusion
de entre casos tratados com e sem extrações. Ca- mechanics, the use of resin anterior bite plate, func-
sos tratados com ou sem extrações, e que incluíram tional orthopedic appliances, or even fixed appliances
a mecânica de intrusão de incisivos, não apresentam associated with arches with reverse curve of Spee in
diferenças significativas57. the lower arch and accentuated curve of Spee in the
upper arch should be highlighted. Concerning intrusion
CONSIDERAÇÕES FINAIS mechanics, base arch and three-piece base arch ap-
A etiologia da sobremordida profunda deve ser cuidado- pliances are indicated to provide control of incisors tip-
samente analisada, para proporcionar subsídios para a ping during intrusion. This paper aimed to discuss the
elaboração de um diagnóstico global e de um plano de aspects concerning etiology, diagnosis and alternative
tratamento que atenda às necessidades de cada pacien- approaches in deep overbite treatment. / Keywords /
te, visando alcançar os melhores resultados esqueléticos, Overbite. Corrective Orthodontics. Stability.

©DentalPress Publishing / Rev Clín Ortod Dental Press. 2015 jun-jul;14(3):6-36 / 35 /


Fuziy A, Paixão RF, Penido SMO, Simplício AHM

Referências:

1. Goldstein MS, Stanton FL. Various types of overbite from eight to twenty years of age. Angle 43. Burstone CJ, van Steenberg E, Hanley KJ. Modern
occlusion and amounts of overbite in normal and Orthod. 1988;58(3):237-56. Edgewise Mechanics & The Segmented Arch.
abnormal occlusion between two and twelve years. 22. Varlik SK, Alpakan OO, Türköz Ç. Deepbite Farmington: ORMCO Corporation; 1995.
Int J Orthod Oral Surg. 1936;22(6):549-69. correction with incisor intrusion in adults: a long-term 44. Burstone C J. Biomechanics of deep overbite
2. Strang RHW. A textbook of orthodontia. cephalometric study. Am J Orthod Dentofacial correction. Semin Orthod 2001;7(1):26-33.
Philadelphia: Lea & Febiger; 1950. Orthop. 2013;144(3):414-9. 45. Vander Bulcke MM, Dermaut LR, Sachdeva RCL,
3. Wylie W. The relationship between ramus height, 23. Brito HHA, Leite HR, Machado AW. Sobremordida Burstone CJ. The center of resistance of anterior
dental height, and overbite. Am J Orthod Oral Surg. exagerada: diagnóstico e estratégias de teeth during intrusion using the laser reflection
1946;32(2):57-67. tratamento. Rev Dental Press Ortod Ortop Facial. technique and holographic interferometry. Am J
4. Upadhyay M, Nanda R. Etiologia, diagnóstico e 2009;14(3):128-57. Orthod Dentofacial Orthop. 1986;90(3):211-20.
tratamento de sobremordida. In: Nanda R, Kapila S. 24. Arnett GW, Bergman RT. Facial Keys to orthodontic 46. Ricketts RM. Bioprogressive therapy as an
Terapias atuais em Ortodontia. Rio de Janeiro: diagnosis and treatment planning: part II. Am J answer to orthodontic needs. Part I. Am J Orthod.
Elsevier; 2011. cap 16, p. 186-96. Orthod Dentofacial Orthop. 1993;103(4):395-411. 1969;70(3):241-68.
5. Proffit WR, Fields HW, Sarver DM. Ortodontia 25. Hunt O, Jonhston C, Hepper P, Burden D, 47. Chiavini PCR, Ortellado G. Manual da técnica do
Contemporânea. 4a ed. São Paulo: Elservier; 2008. Stevenson M. The influence of maxillary gingival Arco Segmentado. São Paulo: Ed. Santos; 2008.
p. 461-509. exposure on dental attractiveness ratings. Eur J 213 p.
6. Boeck EM, Pizzol KEDC, Navarro N, Orthod. 2002;24(2):199-204. 48. Gottlieb BS. The effects of an intrusive base arch
Chiozzini NM, Foschini ALR. Prevalência de 26. Zachrisson BU. Esthetic factors involved in anterior on tooth position: a radiographic study [thesis].
maloclusão em escolares de 5 a 12 anos de rede tooth display and the smile: vertical dimension. J Clin Connecticut: University of Connecticut; 1979.
municipal de ensino de Araraquara. Rev CEFAC. Orthod. 1998;32(7):432-45. 49. Shroff B, Lindauer SJ, Burstone CJ, Leiss JB.
2013;15(5):127-80. 27. Ghafari JG, Macari AT, Haddad RV. Deep bite: Segmented approach to simultaneous intrusion and
7. Schudy FF. The control of vertical overbite in clinical treatment option and challenges. Semin Orthod. space closure: Biomechanics of the three-piece base
orthodontics. Angle Orthod. 1968;38(1):19-39. 2013;19(4):253-66. arch appliance. Am J Orthod Dentofacial Orthop.
8. Worms WW, Meskin LH, Isaacson RJ. Open bite. 28. Vig RG, Brundo GG. The kinetics of anterior tooth 1995;107(2):136-43.
Am J Orthod. 1971;59(6):589-95. display. J Prosthet Dent. 1978;39(5):502-4. 50. Kim TW, Little RM. Postretention assessment of deep
9. Ricketts RM. Facial and denture changes 29. Peck S, Peck L, Kataja M. The gingival smile line. overbite correction in Class II division 2 malocclusion.
during orthodontic treatment as analyzed from Angle Orthod. 1992;62(2):91-100. Angle Orthod. 1999;69(2):175-86.
the temporomandibular joint. Am J Orthod. 30. McDowell E, Baker IM. The skeletodental 51. Berg R. Stability of deep overbite correction. Eur J
1955;41(3):163-79. adaptations in deep bite correction. Am J Orthod Orthod. 1983;5(1):75-83.
10. Ricketts RM. The influence of orthodontic treatment Dentofacial Orthop. 1991;100(4):370-5. 52. Dake ML, Sinclair PM. A comparison of the Ricketts
on facial growth and development. Angle Orthod. 31. Parker CD, Nanda R, Currier GF. Skeletal and dental and Tweed: type arch leveling techniques. Am J
1960;30(3):103-33. changes associated with the treatment of deep bite Orthod. 1989;95(1):72-8.
11. Giri BT, Jyothikiran H, Shivalinga BM, Sanju malocclusion. Am J Orthod Dentofacial Orthop. 53. Pai BCJ, Huang CS. Long-term stability after
Somaiah MK. Cephalometric evaluation of 1995;107(4):382-93. orthodontic treatment- literature review. J Taiwan
dentoalveolar and morphological changes 32. Nanda R, Kuhlberg A. Management of deep overbite Assoc Orthod. 2005;17(2):29-34.
associated with overbite in maxila & mandible in 13- malocclusion. In: Nanda R, editor. Biomechanics and 54. Magill M. Changes in the anterior overbite
18 year old adolescents. Int J Contemporary Dent. esthetic strategies in clinical orthodontics. 1st ed. relationship following orthodontic treatment in
2011;2(4)35-46. St. Louis: Elsevier Saunders; 2005. extraction cases. Am J Orthod. 1960;46(10):755-88.
12. Sassouni V. A classification skeletal facial types. 33. Hemley S. Bite plates: their application and action. 55. Al-Buraiki H, Sadowsky C, Schneider B. The
Am J Orthod. 1969;55(2):109-23. Am J Orthod. 1938;24(8):721-36. effectiveness and long-term stability of overbite
13. Van Der Linden FPGM. Ortodontia: 34. Santos-Pinto A. Pergunte a um expert. correction with incisor intrusion mechanics. Am J
desenvolvimento da dentição. São Paulo: Considerando-se que a sobremordida profunda Orthod Dentofacial Orthop. 2005;127(1):47-55.
Quintessence; 1986. 206 p. pode também ser corrigida pela extrusão dos dentes 56. Sleichter CG. Effects of maxillary bite plane therapy
14. Rakosi TA. Sobremordida profunda. In: Graber TM, posteriores, qual(is) a(s) mecânica(S) que o Sr. utiliza? in orthodontics. Am J Orthod. 1954;40(11):850-70.
Rakosi T, Petrovik AG. Ortopedia dentofacial Rev Clín Ortod Dental Press. 2005;3(6):9-16. 57. Burzin J, Nanda R. The stability of deep overbite
com aparelhos funcionais. 2a ed. Rio de Janeiro: 35. Burstone CJ. Deep overbite correction by intrusion. correction. In: Nanda R, Burstone CJ. Retention
Guanabara Koogan; 1999. cap 20, p. 440-8 Am J Orthod. 1977;72(1):1-22. and stability in orthodontics. Philadelphia: W. B.
15. Sreedhar CVVR, Baratam S. Deep overbite: 36. Begg PR, Kesling PC. The differential force method of Saunders; 1993. cap. 4, p. 61-79.
a review. Deep bite, deep overbite, excessive orthodontic treatment. Am J Orthod. 1977;71(1):1-39. 58. Ng J, Major PW, Heo G, Flores-Mir C. True incisor
overbite. Ann Essence Dent. 2009;1(1):8-25. 37. Ricketts RM. Bioprogressive therapy as an answer attained during orthodontic treatment: a systematic
16. Nanda SK. Patterns of vertical growth in to orthodontic treatment needs. Part I. Am J Orthod. review and meta-analysis. Am J Orthod Dentofacial
the face. Am J Orthod Dentofacial Orthop. 1976;70(3):241-68. Orthop. 2005;128(2):212-9.
1988;93(2):103-16. 38. Greig DG. Bioprogressive therapy: overbite 59. Redahan S, Lagerström L. Orthodontic treatment
17. Nanda SK. Growth patterns in subjects with long reduction with the lower utility arch. Br J Orthod. outcome: the relationship between anterior
and short faces. Am J Orthod Dentofacial Orthop. 1983;10(10):214-6. dental relations and anterior inter-arch tooth size
1990;98(3):247-58. 39. Burstone CJ. Biomechanics of deep overbite discrepancy. J Orthod. 2003;30(3):237-44.
18. Baccetti T, Franchi L, McNamara JA Jr. Longitudinal correction. Semin Orthod. 2001;7(1):26-33. 60. Hernandez JL. Mandibular bicanine width relative to
growth changes in subjects with deepbite. Am J 40. Santos-Pinto A. Pergunte a um expert. Que recursos overbite. Am J Orthod. 1969;56(5):455-67.
Orthod Dentofacial Orthop. 2011;140(2):202-9. o Sr. utilizaria na correção da sobremordida profunda 61. Little R, Riedel R, Wallen T. Stability and relapse
19. Cantadori M, Junqueira JLC, Almeida MHC, onde a intrusão dos incisivos (superiores e/ou of mandibular anterior alignment- first premolar
Ferrer KJN, Bianchini F. Avaliações gerais sobre o inferiores) é necessária? Rev Clín Ortod Dental Press. extraction cases treated by traditional edgewise
tratamento da sobremordida profunda em dentição 2004;3(4):1-14. orthodontics. Am J Orthod. 1981;80(4):349-65.
mista. RGO. 2003;51(4):219-24. 41. Bennett J, McLaughlin R. Management of deep bite 62. Simmons ME, Joondeh DR. Change in overbite:
20. Riolo ML, Brandt D, Ten Have TR. Associations with a preadjusted appliance system. J Clin Orthod. a ten-year postretention study. Am J Orthod.
between occlusal characteristics and signs and 1990;24(11):684-96. 1973;64(4):349-67.
symptoms of TMJ dysfunction in children and 42. Burstone CJ. The biomechanical rationale of
young adults. Am J Orthod Dentofacial Orthop. orthodontic therapy. In: Melsen B. Current
1987;92(6):467-77. controversies in Orthodontics. Chicago:
21. Bergersen E. A longitudinal study of anterior vertical Quintessence; 1991. cap. 6, p. 131-46.

/ 36 / ©DentalPress Publishing / Rev Clín Ortod Dental Press. 2015 jun-jul;14(3):6-36

Você também pode gostar