Artigo de Divulgação

Relatos clínicos e de técnicas, investigações científicas e

revisões literárias

Impacção Dentária: Condutas

Clínicas - Apresentação de
Casos Clínicos

Os autores discutem as condutas clínicas realizadas em relação aos dentes impactados, com destaque especial aos caninos
superiores.
UNITERMOS: Caninos, Cirurgia, Impacção dentária, Ortodontia, Retenção dentária, Tracionamento dentário.

Impacted teeth: Clinical procedures.

Relate of Cases

The authors present a discussion about the treatment of impacted teeth, with a special emphasis on upper cuspids.
UNITERMS: Impacted cuspids, Impacted teeth, Orthodontics, Dental retention, Surgery, Dental traction.

Décio Rodrigues MartinsA

Roberto Yoshio KawakamiB
José Fernando Castanha HenriquesC
Guilherme R. P. JansonD

A
PROFESSOR TITULAR DO DEPARTAMENTO DE ODONTOPEDIATRIA E ORTODONTIA DA FACULDADE DE ODONTOLOGIA DE BAURU, UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO.
B
ALUNO DO CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO, EM NÍVEL DE DOUTORADO EM ORTODONTIA, PELA FACULDADE DE ODONTOLOGIA DE ARARAQUARA, UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA; MESTRE EM
ORTODONTIA PELA FACULDADE DE ODONTOLOGIA DE BAURU, UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO; PROFESSOR DE CIRURGIA E DE ORTODONTIA DA UNIVERSIDADE DO SAGRADO CORAÇÃO, BAURU - SP.
C
PROFESSOR ASSOCIADO DO DEPARTAMENTO DE ODONTOPEDIATRIA E ORTODONTIA DA FACULDADE DE ODONTOLOGIA DE BAURU, UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO.
Dr. Décio R. Martins D
PROFESSOR ASSISTENTE DOUTOR DO DEPARTAMENTO DE ODONTOPEDIATRIA E ORTODONTIA DA FACULDADE DE ODONTOLOGIA DE BAURU, UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO.

REVISTA DENTAL PRESS DE ORTODONTIA E ORTOPEDIA FACIAL VOLUME 3, Nº 1 JANEIRO / FEVEREIRO - 1998 12
INTRODUÇÃO
Ao encetarem tratamentos
corretivos, não raro, os ortodontistas
se deparam com dentes impactados ou
posicionados ectopicamente em várias
regiões do arco dentário. Em geral,
observam-se estas casualidades na
região de caninos superiores, dos
terceiros molares e na região ântero-
superior, onde evidencia-se uma
grande incidência de traumatismos
dentoalveolares, ocasionados por
acidentes. Não obstante, estas
impacções também podem ser
encontradas em outras áreas. O
diagnóstico e o tratamento deste
problema requerem competência do
clínico geral, do odontopediatra, do
cirurgião bucal, do periodontista, do
ortodontista e da colaboração do
paciente.
Para obter resultados positivos, o
clínico deve estar familiarizado com
as diferentes técnicas cirúrgicas para
caninos, quando localizados por ves-
tibular ou por palatino; com o método
mais eficiente de tracionamento des-
tes dentes; com as vantagens e des-
vantagens do aparelho removível
sobre o fixo; bem como com as
implicações periodontais, cirúrgicas
e ortodônticas.
ETIOLOGIA
A impacção ou a retenção dentária é
um fenômeno muito freqüente e, nor-
malmente apresenta-se associada a obs-
táculos mecânicos16. Os caninos superi-
ores apresentam um longo período de
desenvolvimento, bem como um exten-
so e tortuoso trajeto de irrupção, desde
o ponto de sua formação, lateralmente à
fossa piriforme, até alcançarem a
oclusão com seus antagonistas8. Durante
este trajeto, as coroas dos caninos
permanentes encontram-se intimamen-
te relacionadas com as raízes dos
incisivos laterais. Recomenda-se toda
precaução na correção precoce da
inclinação distal dos incisivos laterais,
durante a fase do “patinho feio”, pois
pode acarretar uma impacção dos
caninos, ou mesmo uma reabsorção
radicular dos incisivos laterais5.
REVISTA DENTAL PRESS DE ORTODONTIA E ORTOPEDIA FACIAL
Normalmente, as causas que retar-
dam a irrupção dentária podem ser de
ordem geral ou localizada3. As causas
gerais incluem deficiências endócrinas,
doenças febris ou irradiações ionizantes.
As mais comuns das impacções dentárias
são localizadas e resultam de uma ou
mais combinações dos seguintes fatores:
(a) discrepância entre o tamanho
dentário e o perímetro do arco, (b) re-
tenção prolongada ou perda precoce
dos caninos decíduos, (c) posiciona-
mento anormal dos germes dentários
permanentes, (d) presença de fenda
alveolar, (e) anquiloses, (f) formação
cística ou neoplásica, (g) dilaceração
radicular, (h) origem iatrogênica, e (i)
condições idiopáticas.
Na ocorrência da discrepância
osteodentária, isto é, quando o espaço
disponível para o dente no arco dentário
é menor que o requerido, o dente retar-
da sua irrupção, permanecendo retido
ou desviando-se de seu trajeto normal
de irrupção, ocasionando as ectopias
dentárias15.
Passado o período normal de
irrupção e havendo espaço suficiente no
arco para que esta se processe, deve-se
suspeitar de outras causas de retenção,
como a presença de processos patoló-
gicos, neoplasias odontogênicas, dentes
supranumerários, odontomas e cistos16.
Ao constatarem-se as retenções, mesmo
nos casos com ausência de obstáculos
mecânicos, ou associadas a estes, pode-
se suspeitar do mau posicionamento do
germe dentário, ou mesmo de alterações
em sua anatomia. As alterações
morfológicas coronorradiculares são
comuns em pacientes jovens, podendo
manifestar-se como dilacerações e en-
curtamentos radiculares e anomalias
incomuns22.
Em relação à etiologia das
dilacerações, pode ocorrer por um dis-
túrbio de desenvolvimento do germe
dentário, não só resultante de trauma
sobre o dente decíduo predecessor6,17,30,
como também fruto de desenvolvimento
ectópico17,27, ou ainda, devido à presen-
ça de obstáculos de irrupção, como
condensação óssea ou processos pato-
lógicos1,16,19,26,27.
VOLUME 3, Nº 1
ZIBERMAN et al.31 observaram que
a vulnerabilidade da raiz à deformação
não se encontra diretamente vinculada
com o estágio de desenvolvimento do
germe. Contudo, a severidade da má
oclusão pode estar relacionada com a
gravidade do trauma.
Como conseqüência da impacção, pode
ocorrer o mau posicionamento do dente
envolvido, localizando-se por vestibular ou
palatino; a migração dos dentes vizinhos e
conseqüente perda de espaço; a reabsorção
interna; a formação de cisto dentígero; a
reabsorção radicular externa, tanto do dente
impactado como dos adjacentes; as infec-
ções e inflamações nos casos de irrupção
parcial, dores irradiadas ou combinações
de alguns dos itens acima23.
DIAGNÓSTICO
O diagnóstico da retenção de cani-
nos constitui um dos fatores mais im-
portantes a ser observado para a indi-
cação e planejamento do tratamento
adequado.
Para o seu correto diagnóstico, de-
vem-se realizar a anamnese, o exame
clínico bucal e o radiográfico. Na
anamnese, perquire-se a idade do pa-
ciente e seus antecedentes familiares
com respeito à agenesia ou às reten-
ções dentárias. Deve-se verificar a cro-
nologia de irrupção para, posterior-
mente, relacioná-la com as radiografi-
as, distinguindo as fases normais, como
a do “patinho feio” e de possíveis ano-
malias dentárias.
O exame clínico deve ser criterioso,
avaliando-se o posicionamento dos
dentes no arco e o seu estado de con-
servação. Deve-se averiguar o espaço
disponível para a irrupção, devendo ser
maior que o diâmetro mesiodistal da
coroa do canino ou do dente
impactado.
A avaliação dos dentes presentes e
da má oclusão é de capital importância
para se estabelecer o planejamento,
uma vez que em muitos casos, a extra-
ção de dentes é necessária para a ob-
tenção da oclusão normal.
Alguns sinais clínicos na avaliação
intrabucal podem ser indicativos de
impacção do canino, como por exemplo
JANEIRO / FEVEREIRO - 1998 13
o atraso na irrupção do canino perma-
nente ou a retenção prolongada dos ca-
ninos decíduos, após os 14 ou 15 anos
de idade; a ausência da bossa normal da
tábua óssea vestibular na área do cani-
no, quando da palpação do processo
alveolar; a presença de abaulamento por
palatino; a irrupção retardada e a incli-
nação distal ou migração do incisivo la-
teral para o espaço do canino2.
Também deve ser observado a si-
metria do hemiarco oposto, para a
comparação do seu desenvolvimento e
indicação de um possível prognóstico
do tratamento.
Para a localização do canino, o exa-
me radiográfico deve ser tecnicamente
o melhor possível. Para tanto, podem
ser utilizadas radiografias oclusais,
ortopantomografias e telerradiografias,
embora na maioria dos casos, os filmes
periapicais bastem para este propósito.
Nestes exames radiográficos, busca-
se a visualização do contorno da lâmina
dura do processo radicular do dente não
irrompido; de imagens sugestivas da
dilaceração apical; da relação do ápice
radicular no espaço ósseo limitado pe-
las corticais ósseas do seio maxilar; do
relacionamento da coroa do canino com
as raízes dos dentes vizinhos; do posici-
onamento do dente no arco e da pre-
sença de processos patológicos.
Os erros de diagnóstico podem estar
associados aos exames radiográficos in-
completos, às falhas de interpretação e à
própria limitação do diagnóstico radio-
gráfico.
Um simples filme periapical pro-
porciona a visualização dos dentes,
numa avaliação bidimensional, isto é,
pode relacionar o canino com os den-
tes vizinhos, localizando-o mesiodistal
ou verticalmente. Para avaliação da po-
sição vestibulopalatina do canino, uma
segunda tomada radiográfica deve ser
realizada, utilizando-se a técnica de
Clark, que consiste basicamente na
mudança de angulação horizontal da
primeira para a segunda tomada. Nes-
tes casos, se o objeto (canino) acom-
panhar a direção de incidência dos rai-
os-X, o canino localiza-se por palatino
e vice-versa.
REVISTA DENTAL PRESS DE ORTODONTIA E ORTOPEDIA FACIAL
Os filmes oclusais também auxiliam
na determinação da posição vestibulo-
lingual do canino impactado, em con-
junto com os filmes periapicais. As
telerradiografias lateral e frontal podem,
em alguns casos, ajudar na localização
do canino e relacioná-lo com estruturas
faciais vizinhas, como o seio maxilar e o
assoalho da cavidade nasal. O mesmo
ocorre com os filmes panorâmicos, que
permitem uma visualização mais ampla
do canino, nos três planos do espaço.
A localização do canino é de funda-
mental importância para a determina-
ção do acesso e o procedimento cirúr-
gico adequado ao dente, bem como a
direção para a aplicação de forças or-
todônticas.
ALTERNATIVAS DE TRATAMENTO
Todo paciente com um dente
impactado deve ser submetido a uma
avaliação individual da má oclusão.
Dentre os vários tratamentos, o clínico
deve considerar as seguintes opções:
a) nenhuma conduta invasiva, se o
paciente não a desejar, porém nestes
casos, deve-se acompanhar o quadro
periodicamente, para a avaliação de
qualquer alteração patológica. Infor-
ma-se o paciente, que com o passar
do tempo, o prognóstico de manuten-
ção do canino decíduo, com retenção
prolongada, é pobre, devido à rizólise
fisiológica e a aceitabilidade estética da
coroa; b) transplante autógeno do
canino 16,21,25, c) exodontia do canino
e movimentação do primeiro pré-mo-
lar para sua posição; d) reabilitação
protética do canino; e) tracionamen-
tos associados a apicotomias20, f) ex-
posição cirúrgica do canino e trata-
mento ortodôntico para colocá-lo cor-
retamente no arco dentário.
Contra-indica-se a extração de um
canino apinhado e irrompendo por
vestibular, pois a melhora estética é
temporária, e que futuramente, pode
complicar e comprometer os resulta-
dos de um tratamento ortodôntico,
como a obtenção de uma oclusão fun-
cional adequada. Porém, em alguns
casos, a extração de caninos deve ser
considerada, como quando apresen-
VOLUME 3, Nº 1
ta-se anquilosado e impossibilita a re-
alização de um transplante ou de um
tracionamento; ou com reabsorção
radicular externa e/ou interna; ou com
dilaceração radicular severa; ou com
uma impacção grave, por exemplo,
com o canino localizado entre as
raízes dos incisivos lateral e central;
ou se a oclusão for aceitável, com o
primeiro pré-molar ocupando o lugar
do canino; ou ainda, com alterações
patológicas como cistos ou infecções,
e o paciente se recusa a realizar um
tratamento ortodôntico.
Nestas situações, a única opção é a
extração 30 . Em alguns destes casos,
após a extração, é necessária, para a
complementação do tratamento, a re-
abilitação do paciente. Pode-se exe-
cutar a reabilitação ortodôntica, pro-
movendo fechamento do espaço pela
movimentação dos dentes vizinhos 30,
o tratamento ortodôntico-protético,
recuperando espaço para a instalação
de prótese9, ou simplesmente, se hou-
ver espaço suficiente, o protético, com
utilização de uma prótese fixa.
Atualmente, com a possibilidade de
diagnóstico precoce e o desen-
volvimento de técnicas cirúrgico-orto-
dônticas, tornam-se mais desejáveis os
tratamentos mais conservadores,
como os tracionamentos cirúrgico-or-
todônticos 2,7,11,12,15,16,18,28,30.
Quando detectada a retenção
dentária em estágios precoces, torna-
se possível, por meio de tratamento
cirúrgico-ortodôntico, tracionar o
dente impactado, nivelando-o e ali-
nhando-o no arco. Este tratamento
pode ser executado de diversas for-
mas, envolvendo a exposição cirúr-
gica coronária do dente em questão,
seja pelo laçamento com fios de aço,
pela perfuração na coroa, ou pela
colagem de acessórios ortodônticos
com resina composta, permitindo as-
sim, a aplicação de forças de tra-
ção 2,7,11,12,15,18,28,30 .
Em casos mais desfavoráveis, com a
raiz totalmente formada ou em estágio
avançado de rizogênese, com
dilaceração ou anquilose apical, e onde
o simples tracionamento ortodôntico
JANEIRO / FEVEREIRO - 1998 14
não obteve sucesso anteriormente, é
possível aplicar a técnica cirúrgica de
apicotomia20. Esta técnica consiste em
realizar uma fratura radicular ao nível
da dilaceração, eliminando o local de
retenção e possibilitando o tracionamen-
to ortodôntico subseqüente.
Quando nenhum tipo de tração or-
todôntica for possível, pode-se, ainda,
optar pela técnica de transplantação
dentária, que consiste em extração,
confecção de alvéolo cirúrgico artifici-
al e a reposição do elemento dentário,
devidamente nivelado e alinhado no
arco dentário16.
CONDUTAS CIRÚRGICAS
Há vários métodos cirúrgicos para
exposição e tracionamento de caninos
impactados à linha de oclusão. Dois dos
métodos mais comumente empregados
são a exposição cirúrgica, seguida da
irrupção natural, ou então pela aplica-
ção de forças ortodônticas nos acessó-
rios ortodônticos colados diretamente
nos dentes impactados, logo após a ex-
posição cirúrgica.
A primeira opção é utilizada quando
o canino apresenta-se com uma inclina-
ção axial favorável, não necessitando ser
verticalizado durante a sua irrupção. A
irrupção do canino é monitorada por
meio de radiografias, utilizando-se alguns
pontos de referência, como os dentes
vizinhos ou o arco de fio ortodôntico. A
desvantagem deste procedimento é quan-
to ao tempo, pois a irrupção é lenta e
espontânea, prolongando o tempo de
tratamento.
O tracionamento ortodôntico consis-
te na exposição cirúrgica do dente e na
colocação de um dispositivo auxiliar, que
pode ser colado diretamente ao esmalte,
ou indiretamente, por meio de bandas ou
coroas cimentadas. Este procedimento de
colocação dos acessórios pode ser reali-
zado de duas maneiras. O primeiro méto-
do empregado é realizado em somente
uma etapa, isto é, o acessório é colado na
coroa do canino durante a exposição ci-
rúrgica. A aplicação de forças ortodônti-
cas para o tracionamento do dente pode
ser realizada após a cicatrização inicial
da área operada.
REVISTA DENTAL PRESS DE ORTODONTIA E ORTOPEDIA FACIAL
LEWIS14 aconselha realizá-lo em dois
tempos. Primeiramente, realiza-se a ex-
posição cirúrgica do canino, protegen-
do toda a área coronária, por 3 a 8 se-
manas, com um cimento cirúrgico, para
impedir a formação tecidual em torno
da coroa do canino. Após a completa
cicatrização da área, o cimento é remo-
vido e um acessório é colado ao dente
não irrompido.
MÉTODOS DE TRACIONAMENTO
Diferentes métodos de união aos den-
tes impactados têm sido empregados:
coroas, fios de ligadura, elastômeros
correntes, bandas e braquetes colados
diretamente ao dente3.
O emprego de um fio de ligadura
circunferencial flexível ao redor da área
cervical do dente (laçamento) constituiu
no passado uma prática muito comum.
Atualmente, não é o mais recomendado,
pois remove-se muito tecido ósseo para
realização do laçamento na porção
cervical do dente a ser tracionado. Além
disto, esta drástica exposição pode pro-
mover danos aos dentes vizinhos. Ob-
servou-se também que esta técnica au-
menta de 8% a 14% a incidência de rea-
bsorção radicular externa4,24, podendo
ocorrer também a anquilose, e quando
esta estiver associada à reabsorção radi-
cular externa, estes dentes estarão pro-
pensos à extração24. Por estes motivos,
recomenda-se uma exposição cirúrgica
mais conservadora, expondo-se somente
a área necessária para colagem direta
de um braquete ou de um botão, evitan-
do-se o laçamento ou mesmo a perfura-
ção do dente impactado para o seu
tracionamento.
CONSIDERAÇÕES PERIODONTAIS
A freqüência da impacção de cani-
nos superiores localizados por vesti-
bular é menor do que por palatino e é
ocasionada, geralmente por deficiên-
cia do perímetro do arco. Como re-
sultado, o canino posiciona-se bem su-
periormente no osso alveolar,
irrompendo na mucosa alveolar. Os
dentes impactados por vestibular, com
uma posição vertical favorável, podem
ser tratados somente com a exposição
VOLUME 3, Nº 1
cirúrgica, sem a aplicação de forças
de tração. Este procedimento deve ser
indicado em pacientes jovens, onde o
próprio dente, após a exposição ci-
rúrgica, ainda apresenta força para sua
irrupção. Entretanto, em pacientes
adultos, o tracionamento quase sem-
pre é indicado10.
A ausência de uma adequada faixa
de gengiva inserida ao redor do canino
em irrupção pode provocar uma infla-
mação do periodonto, e deve-se enfatizar
que a movimentação dentária é temerá-
ria na presença de um processo infla-
matório29, pois a ausência de gengiva
inserida adequada, pode promover uma
recessão mucogengival e a conseqüente
perda de osso alveolar.
Tanto nos caninos impactados por
palatino ou por vestibular, cuidados
devem ser tomados, como a consecu-
ção de espaço suficiente para o posi-
cionamento do canino no respectivo
arco. Para os caninos localizados por
vestibular, a criação de espaço tam-
bém pode providenciar uma área de
gengiva inserida, que posteriormente
pode atuar como sítio doador para um
retalho reposicionado, lateral ou
apicalmente.
O principal objetivo no tratamento de
dentes impactados por vestibular, con-
siste na criação e na preservação de uma
faixa funcional de gengiva inserida. Essa
gengiva inserida pode ser conseguida
por meio de um retalho reposicionado
apical ou lateralmente, ou quando indi-
cado e necessário, por um enxerto livre
de gengiva inserida, evitando-se assim,
futuras recessões gengivais e a perda de
osso alveolar marginal.
CONSIDERAÇÕES ORTODÔNTICAS
O prognóstico para a movimenta-
ção ortodôntica de dentes impactados
depende de vários fatores, como a sua
posição em relação aos dentes vizinhos,
sua angulação, a distância a ser movi-
do até o posicionamento correto no
arco e a possibilidade de anquilose ou
dilacerações radiculares. Geralmente,
os caninos impactados na posição ho-
rizontal ou anquilosados apresentam
um prognóstico desfavorável e em
JANEIRO / FEVEREIRO - 1998 15
alguns destes casos, indica-se a extra-
ção dos mesmos 13.
APARELHOS FIXOS OU REMOVÍVEIS?
A utilização de aparelhos fixos é a
mais indicada na maioria dos casos, para
a movimentação de dentes expostos ci-
rurgicamente. Os aparelhos fixos são
preferidos porque os removíveis apre-
sentam algumas desvantagens como a
colaboração do paciente, limitação de
controle do dente a ser tracionado, e sua
impropriedade de tratamento das más
oclusões mais complexas.
Os aparelhos removíveis com placa
de resina acrílica no palato são indica-
dos para melhor distribuição das forças
na abóbada palatina e nos processos
alveolares, aumentando a ancoragem
para a realização do tracionamento or-
todôntico. Podem ser utilizados na au-
sência de múltiplos dentes ou quando
os aparelhos fixos são contra- indicados.
ANCORAGEM INTRA OU
INTERMAXILAR ?
Grande parte das más oclusões,
inclusive aquelas que envolvem a
impacção de caninos, requerem a
instalação de aparelhagem fixa, tanto no
arco superior quanto no inferior, para
que o ortodontista realize os movimentos
biomecânicos controlados, na obtenção
dos resultados desejados. O arco inferior
não é utilizado freqüentemente como
ancoragem para o tracionamento de
caninos superiores impactados, devido
à dificuldade de controle da magnitude
e direção das forças aplicadas, por ser a
mandíbula, um osso móvel no complexo
craniofacial. A ancoragem intermaxilar
deve ser utilizada somente naqueles
casos onde não seja possível a aplicação
de forças diretamente no arco superior.
MÉTODOS DE APLICAÇÃO DE
FORÇAS
Vários métodos podem ser utilizados
para o tracionamento do canino até o
seu correto alinhamento e nivelamento
no arco. Estes incluem o uso de molas
com fios leves (0,6mm) soldados ao
arco palatino ou por vestibular, ao gram-
po de Adams nos aparelhos removíveis,
ou a utilização de dobras de 2a ordem
introduzidas no próprio arco de
nivelamento. Com a comercialização de
novos materiais ortodônticos como os
fios elásticos com memória de forma e
os elos de elastômeros, o ortodontista
pode utilizar estes materiais que ensejam
um bom controle sobre a magnitude e a
direção da força aplicada ao dente a ser
tracionado.
Além do material utilizado, a direção
da aplicação de força deve ser contrária
às raízes dos dentes vizinhos, isto é, deve-
se evitar ao máximo o direcionamento
da tração para as raízes dos dentes vizi-
nhos, para não ocasionar traumas e
reabsorções radiculares externas. Reco-
menda-se também que as forças aplica-
das sejam de baixa intensidade (não
mais que 60g), que haja a obtenção e a
manutenção do espaço suficiente no
arco antes do início do tracionamento, e
que se utilizem arcos com rigidez sufici-
ente (0,018"x0,022") e resistentes à
deformação pelas forças aplicadas no
tracionamento de dentes impactados.
APRESENTAÇÃO DE CASO CLÍNICO
A paciente L.M.F., sexo feminino, leu-
coderma e com 23 anos e 6 meses de
idade, procurou a Faculdade de Odon-
tologia de Bauru, Universidade de São
Paulo, para a realização de um tratamento
ortodôntico corretivo.
Durante o exame clínico, observou-
se uma oclusão de Classe I de Angle, com
mordida cruzada anterior (pseudo Clas-
se III), apresentando também uma mor-
dida cruzada posterior unilateral esquer-
da, um suave apinhamento ântero-infe-
rior, presença de diastema localizado por
distal de canino superior e inferior, am-
bos do lado direito, rotação dentária nos
segundos pré-molares superior direito
e inferior esquerdo, além da permanên-
cia do canino superior esquerdo
decíduo. As condições de higiene e saú-
de bucal apresentavam-se satisfatórias
(fig. 1).
Os exames radiográficos ratificaram
a normalidade da morfologia dentária,
com exceção da impacção do canino
superior esquerdo e agenesia dos qua-
tro terceiros molares.
Com a documentação completa,
procederam-se, para este caso, a
bandagem e cimentação nos quatro pri-
meiros molares e a colocação de
braquetes pela técnica de colagem direta
nos demais dentes. A seqüência do tra-
tamento consistiu em alinhar e nivelar
todos os dentes superiores e inferiores,
iniciando-se esta fase com o fio “Twist-
flex” 0,014" até o fio de nivelamento
retangular 0,021"x0,025" , com as do-
bras de terceira ordem passivos. A partir
do nivelamento com fio redondo 0,018",
foi utilizada uma mola de seção aberta
entre o incisivo lateral esquerdo e o pri-
meiro pré-molar do mesmo lado, para
propiciar o espaço necessário para o
tracionamento do canino impactado e
reposicioná-lo ao arco dentário (fig. 2).
Durante esta fase, que perdurou por
cerca de 9 meses, ocorreu uma
integração e inter-relação com o
cirurgião bucomaxilar, a quem foi
encaminhada para realização dos
procedimentos cirúrgicos necessários.
Além das radiografias de rotina solicitadas
para o tratamento ortodôntico
(ortopantomografia, telerradiografia em
norma lateral e periapicais da boca
toda), realizou-se também a tomada
radiográfica oclusal superior (fig. 3) e
as periapicais pela técnica de Clark, que
constatou a localização do canino por
palatino.
O planejamento cirúrgico consistiu
em anti-sepsia e assepsia do campo ope-
ratório, anestesia terminal infiltrativa por
vestibular e por bloqueio regional dos
nervos nasopalatinos. A técnica cirúrgi-
ca empregada foi a incisão sulcular das
papilas, o descolamento mucoperiostal,
seguido de ostectomia com cinzéis sob
pressão manual, seguida com broca
para osso, em alta rotação e refrigera-
ção com soro fisiológico. A ostectomia
com broca foi realizada em torno da
coroa dentária do canino, pelo fato do
cirurgião ter optado, neste caso, pela téc-
nica da perfuração da coroa, onde ne-
cessita-se de uma área maior de exposi-
ção da coroa, e traspassar o fio de
amarrilho (0,011"), servindo como elo
de ligação para o tracionamento com
elásticos (fig. 4).

REVISTA DENTAL PRESS DE ORTODONTIA E ORTOPEDIA FACIAL VOLUME 3, Nº 1 JANEIRO / FEVEREIRO - 1998 16
 A técnica de tracionamento pela
perfuração da coroa, além de
requerer uma maior ostectomia em
torno da coroa, deve ser realizada
com muito cuidado para não se
atingir a câmara pulpar durante a
perfuração, realizada com brocas
esféricas de pequeno diâmetro
(número 1/2 ou 1), suficientes para
traspassar o fio de amarrilho.
Passada esta fase cirúrgica, ex-
traiu-se o canino decíduo e os cui-
dados operatórios locais foram re-
alizados. O retalho foi reposiciona-
do ao palato e suturas simples fo-
ram realizadas nos espaços
interdentários. Recomendaram-se
os cuidados pós-operatórios neces-
sários e prescreveu-se a medicação
pós-operatória.
A paciente retornou uma semana
após, quando foram removidos os pon-
tos cirúrgicos e realizou-se a moldagem
do arco superior para confecção de
uma placa de acrílico, com grampos de
Adams e ganchos incluídos na placa
para realização do tracionamento, por
meio de elásticos 1/8".
O período de tracionamento do
canino, com a utilização da placa de
acrílico e de elásticos 1/8" (fig. 5),
liberando uma força de cerca de
35g, perdurou por 11 meses,
quando, realizou-se a colagem dire-
ta de acessório sobre a coroa do
canino, para o seu alinhamento e
nivelamento no arco dentário. Este
acompanhamento foi realizado por
23 meses, porém, mesmo sem a fi-
nalização completa do caso, a paci-
ente decidiu-se e autorizou a remo-
ção do aparelho ortodôntico fixo. O
caso foi finalizado sem a
intercuspidação adequada, com pe-
quenas giroversões, mas com o ca-
nino, inicialmente impactado, devi-
damente posicionado no arco den-
tário (fig. 6).

Figura 1 - (A, B, C e D) - Fotos intrabucais, pré-tratamento.

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 Figura 2 - (A e B) - Nivelamento superior e inferior, com uma mola de seção aberta entre os dentes 2.2 e 2.4.

Figura 3 - (A e B) - Radiografia oclusal superior, pré e pós-cirúrgico.

Figura 4 - Canino após a perfuração da coroa e transfixação com Figura 5 - Tracionamento do canino com placa de acrílico remo-
fio de amarrilho. vível e elásticos.

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 Figura 6 - (A, B, C e D) - Fotos intrabucais, ao final do tratamento.

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 Neste segundo caso, o paciente C.S.C.,
com 10 anos e 9 meses de idade, sexo
masculino, leucoderma, procurou o
Departamento de Ortodontia (FOB-USP),
acompanhado pelos pais, queixando-se
do não irrompimento do incisivo cen-
tral superior direito.
Ao exame clínico, o paciente apre-
sentava-se com a dentadura mista e
com um pequeno abaulamento na re-
gião do dente não irrompido (fig. 7).
Durante a anamnese, os pais relata-
ram a ocorrência de um trauma no
local, numa idade mais precoce. Em
conseqüência do traumatismo, os
dois incisivos centrais não
irromperam na época de irrupção
correta, sendo que, segundo o relato
dos pais, necessitou-se de uma
intervenção cirúrgica de ulotomia
para a exposição dos dentes,
favorecendo a irrupção natural.
Porém, somente o incisivo central es-
querdo irrompeu, permanecendo o
do lado direito, impactado, o que os
trouxe até à clínica de Ortodontia.
Pela avaliação radiográfica ratifi-
cou-se a presença e a normalidade
radicular do dente em questão e dos
demais dentes (fig. 8).
O planejamento para este caso foi,
primeiramente a exposição cirúrgica do
incisivo, colagem direta do acessório
ortodôntico com o fio de amarrilho já
ligado ao botão (fig. 9). No que tange à
Ortodontia, optou-se pelo tracionamento
com a instalação de uma placa de acríli-
co removível, com mola para a aplica-
ção de forças diretamente no gancho do
fio de amarrilho (fig. 10). O período de
tracionamento foi de 3 meses com re-
sultado satisfatório (fig. 11), onde para
um melhor posicionamento dos dentes,
o paciente foi encaminhado para um tra-
tamento ortodôntico corretivo.

Figura 7 - (A e B) - Fotos intrabucais no início do tratamento.

Figura 8 - (A e B) - Radiografias periapicais, antes e após a cirurgia.

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 Figura 9 - Aspecto clínico da exposição da coroa do incisivo, com
o posicionamento do acessório e do fio de amarrilho.

Figura 10 - (A, B e C) - Tracionamento do incisivo com a utiliza-

ção de placa removível de acrílico.

Figura 11 - Aspecto clínico ao final do tracionamento.

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