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RECURSO ESPECIAL Nº 1835983 - PR (2019/0262515-2)

RELATOR : MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO


RECORRENTE : C A F - ESPÓLIO
REPR. POR : C A N - INVENTARIANTE
ADVOGADO : PEDRO VINICIUS VICENTIN PETRAFEZA - PR086850
RECORRIDO : NCP
ADVOGADO : JOSÉ FRANCISCO PEREIRA - PR015728

EMENTA

RECURSO ESPECIAL. DIREITO DE FAMÍLIA. DISSOLUÇÃO DE


UNIÃO ESTÁVEL. ALIMENTOS PROVISÓRIOS À EX-
COMPANHEIRA. FALECIMENTO DO ALIMENTANTE NO CURSO
DO PROCESSO. OBRIGAÇÃO PERSONALÍSSIMA.
IMPOSSIBILIDADE DE TRANSMISSÃO AOS HERDEIROS DO "DE
CUJUS" OU AO SEU ESPÓLIO.

1. A obrigação de prestar alimentos, por ter natureza personalíssima,


extingue-se com o óbito do alimentante, cabendo ao espólio recolher,
tão somente, eventuais débitos não quitados pelo devedor quando em
vida, ressalvada a irrepetibilidade das importâncias percebidas pela
alimentada (REsp n.º 1354693/S, Rel. p/ o acórdão o Ministro Antônio
Carlos Ferreira, Segunda Seção, julgado em 26/11/2014 DJe
20/02/2015).
2. Excepcionalmente e desde que o alimentado seja herdeiro do
falecido, é admitida a transmissão da obrigação alimentar ao espólio,
enquanto perdurar o inventário e nos limites da herança.
3. Possibilidade de ser pleiteada pela alimentanda ajuda alimentar de
outros herdeiros ou demais parentes com base no dever de
solidariedade decorrente da relação de parentesco, conforme preceitua
o art. 1.694, do Código Civil, ou, ainda, de postular a sua habilitação
no inventário e lá requerer a antecipação de recursos eventualmente
necessários para a sua subsistência até ultimada a partilha, advindos
da sua meação.
4. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.

RELATÓRIO

Trata-se de recurso especial interposto por C. A. F. - ESPÓLIO, com

fundamento no art. 105, III, "c", da Constituição Federal, contra acórdão proferido

pela 12ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná no curso da

ação de dissolução de união estável, cumulada com partilha de bens e alimentos,

que N. C. P. moveu em face de C. A. F.

Esta a ementa do acórdão recorrido (fls. :

Agravo de instrumento. Ação de dissolução de união estável c/c partilha de


bens. Alimentos provisórios fixados em prol de ex-companheira. Falecimento
do alimentante. Potencial direito à meação de parte dos bens registrados em
nome exclusivo do de cujus. Transmissão da obrigação aos herdeiros.
Cabimento. Art. 1700, CC. Precedentes. 1.DIREITO CIVIL. OBRIGAÇÃO.
PRESTAÇÃO. ALIMENTOS. TRANSMISSÃO. HERDEIROS. ART. 1.700 DO
NOVO CÓDIGO CIVIL. 1 - O espólio tem a obrigação de prestar alimentos
àquele a quem o de cujus devia, mesmo vencidos após a sua morte. Enquanto
não encerrado o inventário e pagas as quotas devidas aos sucessores, o autor
da ação de alimentos e presumível herdeiro não pode ficar sem condições de
subsistência no decorrer do processo. Exegese do art. 1.700 do novo Código
Civil. 2 - Recurso especial conhecido, mas improvido. (REsp 219.199/PB,
Rel. Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, Rel. p/ Acórdão Ministro
FERNANDO GONÇALVES SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 10/12/2003, DJ
03/05/2004, p. 91) 2. Recurso conhecido e provido.

Em suas razões (fls. 471/481), alegou divergência interpretativa do art. 1.700,

do Código Civil, uma vez que o Tribunal a quo, divergindo de outros Tribunais do

país e do próprio STJ, reconheceu a obrigação do espólio de pagar alimentos

provisórios à recorrida após a morte do alimentante até que seja ultimada a

partilha. Postulou o provimento.


Contrarrazões às fls. 380/398.

O recurso especial foi admitido (fls. 444/445).

O Ministério Público Federal, em parecer de fls. 489/494, opinou pelo

provimento do recurso especial.

Em decisão de fls. 496/500, deferi o pedido de atribuição de efeito suspensivo

ao recurso especial.

É o relatório.

VOTO

Eminentes colegas.

Cuida-se, na origem, de ação de dissolução de união estável, cumulada com

partilha de bens e alimentos, ajuizada pela recorrida, Neuza, em face de Casemiro,

no ano de 2013.

Segundo a narrativa da petição inicial, o casal viveu em união estável por

cerca de 34 anos, conforme reconheceram em 27/11/2012 por meio de escritura

pública de declaração de convivência, adquirindo vasto patrimônio. Durante este

período, a autora sempre dependeu economicamente do companheiro, com quem

teve dois filhos.

Em decisão de fls. 115/117, proferida em 10/10/2013, foram fixados

alimentos provisórios em favor da autora, no valor equivalente a 15 salários-

mínimos mensais.

Paralelamente, a autora ajuizou execução de alimentos, tendo sido

determinada a penhora dos alugueis dos imóveis recebidos pelo alimentante (fls.

152/153).
Na sequência, com a notícia do falecimento do requerido, ocorrida em

07/07/2017, o juízo de primeiro grau reconheceu a intransmissibilidade da

obrigação alimentar aos sucessores do alimentante e ao seu espólio, ressalvada a

cobrança das parcelas que se venceram até a sua morte (fls. 122/123).

O Tribunal a quo, por sua vez, com apoio em antigo precedente deste

Superior Tribunal de Justiça, reformou a decisão do juízo de primeiro grau e

deferiu o pedido de transferência do encargo alimentar aos sucessores do

alimentante, até que ultimada a partilha, em razão do potencial direito à meação de

parte dos bens arrolados no inventário.

Daí advém a irresignação recursal do espólio recorrente, composto por filhos

comuns e exclusivos do inventariado.

Devolve-se, assim, no recurso especial, a questão relativa ao alcance da

transmissibilidade da obrigação alimentar aos herdeiros do alimentante, aludida no

art. 1.700, do Código Civil, especificamente na hipótese de alimentos provisórios

fixados em favor da ex-companheira do de cujus.


Dispõe o art. 1.700, do Código Civil:

Art. 1.700. A obrigação de pagar alimentos transmite-se aos herdeiros do


devedor, na forma do art. 1694.
Já o art. 1.694, ao qual faz expressa remissão o art. 1.700, preceitua:

Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos


outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com
sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação.
§º 1º - Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do
reclamante e dos recursos da pessoa obrigada.
§º 2º - Os alimentos serão apenas os indispensáveis à subsistência, quando a
situação de necessidade resultar de culpa de quem os pleiteia."

A literalidade do dispositivo em comento, como se observa, conduz a


compreensão de que a obrigação alimentar se transmite após o óbito do alimentante

aos seus herdeiros, consideradas as circunstâncias do art. 1.694, ou seja, as

necessidades do alimentado e as atuais possibilidades dos herdeiros.

Cuida-se de inovação trazida pela atual codificação civil de 2002, invertendo,

de forma geral, a tradicional regra da intransmissibilidade da obrigação alimentar,

antes estatuída no art. 402 do Código Civil de 1916, segundo o qual “a obrigação

de prestar alimentos não se transmite aos herdeiros do devedor”.

Em relação ao casamento ou à união estável, ressalta-se que o caráter

intransmissível dos alimentos já havia sido mitigado pela Lei do Divórcio (Lei n.º

6.515/77), prescrevendo em seu art. 23 que "a obrigação de prestar alimentos

transmite-se aos herdeiros do devedor, na forma do art. 1.796 do Código Civil [de

1916]", ou seja, até os limites das forças da herança.

Com o advento da Lei n.º 6.515/77, já se instaurara forte polêmica doutrinária

acerca do tema, intensificada com a transformação operada pelo Código Civil de

20002, estatuindo a transmissibilidade da obrigação alimentar como regra geral, e

não mais como exceção concedida em favor dos cônjuges e conviventes.

É certo, porém, que, inobstante as divergências jurídicas surgidas, a

interpretação a ser atribuída ao art. 1.700, do Código Civil, deve ser

compatibilizada com as demais regras de direito sucessório, tais como a

impossibilidade de o herdeiro responder por encargos superiores às forças da

herança (art. 1997, CC), ou, ainda, o princípio constitucional da igualdade entre

filhos.

Não se pode olvidar, também, que a obrigação alimentar é

personalíssima, decorrendo do princípio da solidariedade familiar e estando


intimamente ligada ao vínculo pessoal entre credor e devedor.

Sobre o caráter personalíssimo dos alimentos, valho-me da doutrina de Rolf

Madaleno (in Direito de Família, 8. ed., Rio de Janeiro: Forense: 2018, p.

922/923):

Os alimentos são fixados em razão do alimentando, como sendo um direito


estabelecido, de regra, 'intuitu personae'.
Visa a preservar estritamente a vida do indivíduo, não podendo ser
repassado este direito a outrem, como se fosse um negócio jurídico, embora a
obrigação alimentar possa ser transmitida aos herdeiros do devedor (CC, art.
1.700).
Segundo Nieves Martínez Rodríguez, a natureza essencialmente pessoal
dos alimentos fica evidente tanto do ponto de vista daquele que deve
proporcionar os alimentos como em relação ao destinatário da obrigação,
devedor e credor respectivamente, pois são as suas particulares
circunstâncias pessoais que determinam a existência da relação alimentar.
E este caráter pessoal dos alimentos deriva de alguns pontuais aspectos.
Em primeiro lugar, é personalíssimo enquanto pessoal é o vínculo
familiar entre o devedor e credor que compõem os polos da relação
obrigacional. O crédito e a dívida são inseparáveis da pessoa, porque estão
baseados em determinada qualidade que não é transmissível, estão fora do
comércio inclusive.
Em segundo plano, são pessoais porque surgem de uma situação concreta
das possibilidades de um e das necessidades do outro e os alimentos só
podem ser reclamados por quem está em estado de necessidade e só são
devidos por quem tem meios para atendê-los.
Em terceiro lugar, a finalidade dos alimentos não tem caráter
patrimonial, não obstante se concretizem em algo material com significado
econômico, pois o seu estabelecimento e sua fixação têm em mira assegurar
a conservação da vida, do cônjuge, companheiro ou parente, atendendo suas
vindicações de cunho pessoal e espiritual, qual seja, a satisfação de uma
necessidade essencialmente pessoal.

À luz dessas características fundamentais dos alimentos, prevaleceu no âmbito

desta Corte Superior de Justiça o entendimento segundo o qual a transmissão da

obrigação alimentar é excepcional e limitada.

Já se decidiu, assim, que "os alimentos ostentam caráter personalíssimo, por


isso, no que tange à obrigação alimentar, não há falar em transmissão do dever

jurídico, (em abstrato) de prestá-los" (REsp .º 1.30.742/DF, Rel. Ministro Luis

Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 04/12/2012, DJe 17/12/2012).

Também nessa medida, firmou-se neste STJ a orientação de que é necessária a

existência de condenação ao pagamento de alimentos previamente ao falecimento

do alimentante para que seja possível a sua transmissão post mortem.

A propósito:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. REPRESENTAÇÃO.


PROCESSUAL.ELEMENTOS DOS AUTOS QUE CONFIRMAM A
REGULARIDADE. AÇÃO DE ALIMENTOS. ESPÓLIO. LEGITIMIDADE.
OBRIGAÇÃO ALIMENTAR INEXISTENTE ANTES DA MORTE DO AUTOR
DA HERANÇA.
1. Se o ato processual, ainda que praticado de forma irregular, cumpre o fim
a que se destina, deve ser aproveitado, em homenagem ao princípio da
instrumentalidade das formas.
2. "Inexistindo condenação prévia do autor da herança, não há por que
falar em transmissão do dever jurídico de prestar alimentos, em razão do
seu caráter personalíssimo e, portanto, intransmissível". (REsp 775180/MT,
Rel. Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, QUARTA TURMA, julgado em
15/12/2009, DJe 02/02/2010) 3. AGRAVO REGIMENTAL PROVIDO. 4.
RECURSO ESPECIAL PROVIDO. (AgRg no REsp 981180/RS, Rel.
Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA,
julgado em 07/12/2010, DJe 15/12/2010).

Finalmente, ainda sob o prisma da pessoalidade, a Segunda Seção desta Corte,

no julgamento do REsp n.º 1.354.693/SP, consolidou o entendimento de que, por

ostentar caráter personalíssimo, o dever de prestar alimentos extingue-se com o

óbito do alimentante, não se transmitindo aos seus sucessores.

O que se transmite, assim, é a dívida existente antes do óbito e que

eventualmente não tenha sido paga enquanto em vida.

A propósito, confira-se a ementa do acórdão proferida no referido julgamento:

CIVIL. AÇÃO ORDINÁRIA. RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE


UNIÃO ESTÁVEL. CELEBRAÇÃO DE ACORDO COM FIXAÇÃO DE
ALIMENTOS EM FAVOR DA EX-COMPANHEIRA. HOMOLOGAÇÃO.
POSTERIOR FALECIMENTO DO ALIMENTANTE. EXTINÇÃO DA
OBRIGAÇÃO PERSONALÍSSIMA DE PRESTAR ALIMENTOS.
IMPOSSIBILIDADE DE TRANSMISSÃO AO ESPÓLIO. 1. Observado que os
alimentos pagos pelo de cujus à recorrida, ex-companheira, decorrem de
acordo celebrado no momento do encerramento da união estável, a referida
obrigação, de natureza personalíssima, extingue-se com o óbito do
alimentante, cabendo ao espólio recolher, tão somente, eventuais débitos
não quitados pelo devedor quando em vida. Fica ressalvada a
irrepetibilidade das importâncias percebidas pela alimentada. Por maioria.
2. Recurso especial provido. (REsp 1.354.693/SP, Rel. Ministra Maria
Isabel Gallotti, Relator p/ acórdão Ministro ANTONIO CARLOS
FERREIRA, SEGUNDA SEÇÃO, DJe 20/2/2015).

Conforme restou decidido naquela oportunidade, apenas excepcionalmente e

desde que o alimentado seja herdeiro do falecido, é admitida a transmissão da

obrigação alimentar ao espólio, enquanto perdurar o inventário e nos limites das

forças herança.
Confira-se trecho do voto vencedor, da lavra da e. Ministra Nancy Andrighi:

04. Nessa estreita senda deve ser lido comando do art. 1.700 do CC-02,
que prevê a transmissão da obrigação de prestar alimentos, por ser uníssona
a doutrina no sentido de que a obrigação alimentar é fruto da solidariedade
familiar, não devendo, portanto, vincular pessoas fora desse contexto.
05. A morte do alimentante traz consigo a extinção da personalíssima,
obrigação alimentar, pois não se pode conceber que um vínculo alimentar
decorrente de uma já desfeita solidariedade entre o falecido-alimentante e a
alimentada, além de perdurar por cerca de quatro anos após o término do
relacionamento, ainda lance seus efeitos para além da vida do alimentante,
deitando garras no patrimônio dos herdeiros, filhos do de cujus.
06. E aqui não causa espécie a limitação proposta no voto da Relatora, de
que os alimentos respeitem os limites da herança, porque ainda assim, é o
patrimônio de seus enteados (adquirido desde o óbito por força da saisine)
que será agredido. Aliás, o que se transmite no disposto do artigo 1.700 do
CC-02, é a dívida existente antes do óbito e nunca o dever ou a obrigação de
pagar alimentos, pois personalíssima.
07. Não há vínculos entre os herdeiros do falecido e a ex-companheira
que possibilite se protrair, indefinidamente, o pagamento dos alimentos a
esta, fenecendo, assim, qualquer tentativa de transmitir a obrigação de
prestação de alimentos, após a morte do alimentante.
08. Enfatize-se que quando o de cujus faleceu – 2008 – a união estável já
estava desfeita há mais de 05 anos (desde o final de 2002), e os alimentos
eram pagos há quatro anos, por força de acordo firmado pelos ex-
companheiros.
09. O que há, e isso é inegável, até mesmo por força do expresso texto de
lei, é a transmissão da dívida decorrente do débito alimentar, que por ventura
não tenha sido pago pelo alimentante, enquanto em vida.
10. Essa limitação de efeitos não torna inócuo o texto legal que preconiza
a transmissão, pois vem se dando, no âmbito do STJ, interpretação que
embora lhe outorgue efetividade, não descura dos comandos macros que
regem as relações das obrigações alimentares.
11. Daí a existência de precedentes que limitam a prestação dos alimentos,
pelo espólio, à circunstância do alimentado também ser herdeiro, pois aqui
existe o grave risco de que demoras, naturais ou provocadas, no curso do
inventário, levem o alimentado à carência material inaceitável.
Nesse sentido:
Direito civil e processual civil. Execução. Alimentos.
Transmissibilidade. Espólio. - Transmite-se, aos herdeiros do
alimentante, a obrigação de prestar alimentos, nos termos do art.
1.700 do CC/02. - O espólio tem a obrigação de continuar
prestando alimentos àquele a quem o falecido devia. Isso porque
o alimentado e herdeiro não pode ficar à mercê do encerramento
do inventário, considerada a morosidade inerente a tal
procedimento e o caráter de necessidade intrínseco aos alimentos.
Recurso especial provido.
(REsp 1010963/MG, de minha Relatoria, TERCEIRA TURMA,
DJe 05/08/2008).
12. Qualquer interpretação diversa, apesar de gerar mais efetividade ao
art. 1.700 do CC-02, vergaria de maneira inaceitável os princípios que regem
a obrigação alimentar, dando ensejo à criação de situações teratológicas,
como o de viúvas pagando alimentos para ex-companheiros do de cujus, ou
verdadeiro digladiar entre alimentados que também são herdeiros, todos
pedindo, reciprocamente, alimentos.
13. Assim, admite-se a transmissão, apenas e tão somente quando o
alimentado também seja herdeiro, e ainda assim enquanto perdurar o
inventário, já se tratando aqui de uma excepcionalidade, porquanto extinta a
obrigação alimentar desde o óbito.
14. A partir de então – no caso de herdeiros – ou a partir do óbito do
alimentante – para aqueles que não o sejam –, fica extinto o direito de
perceber alimentos com base no art. 1.694 do CC-02, ressaltando-se que os
valores não pagos pelo alimentante, podem ser cobrados do espólio.

Seguiram, nesse sentido, entre outros, os seguintes julgados das duas Turmas

integrantes da Segunda Seção desta Corte:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.


PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. OBRIGAÇÃO DO
ESPÓLIO. INEXISTÊNCIA. DIREITO PERSONALÍSSIMO. ACÓRDÃO
RECORRIDO E ENTENDIMENTO DESTA CORTE. CONSONÂNCIA.
DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO.
1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do
Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e
3/STJ).
2. A obrigação de pagar alimentos a ex-companheira é de natureza
personalíssima e extingue-se com o óbito do alimentante, cabendo ao espólio
apenas recolher eventuais débitos não quitados em vida pelo devedor.
Precedentes.
3. É inadmissível o inconformismo quando o acórdão recorrido está em
consonância com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça.
4. A divergência jurisprudencial, nos termos dos arts. 541, parágrafo único,
do CPC/1973 e 255, § 1º, do RISTJ, exige comprovação e demonstração, em
qualquer caso, com a transcrição dos julgados que configurem o dissídio, a
evidenciar a similitude fática entre os casos apontados e a divergência de
interpretações, o que não restou evidenciado na espécie.
5. Agravo interno não provido. (AgInt no AREsp 1324757 / RS, Re.,
Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA,
julgado em 18/03/2019, DJe 21/03/2019);

RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. FAMÍLIA.


PROCURAÇÃO AD JUDICIA. ASSISTÊNCIA. GENITORA. INSTRUMENTO
PÚBLICO. PRESCINDIBILIDADE. INSTRUMENTO PARTICULAR.
SUFICIÊNCIA. ALIMENTOS. AÇÃO. HERDEIRO NECESSÁRIO. AUTOR
DA HERANÇA. MORTE. PROPOSITURA POSTERIOR. EXTINÇÃO.
OBRIGAÇÃO PERSONALÍSSIMA. INTRANSMISSIBILIDADE.
1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do
Código de Processo Civil de 1973 (Enunciados Administrativos nºs 2 e
3/STJ).
2. É válida a procuração ad judicia outorgada por instrumento particular
pelo representante de menor em seu favor.
3. Não se transmite dívida alimentar constituída contra o autor da herança
após a sua morte aos herdeiros necessários, porquanto obrigação
personalíssima.
4. A transmissão da obrigação alimentar em que condenado previamente o
falecido ao alimentado coerdeiro é admitida excepcionalmente enquanto
perdurar o inventário e nos limites da herança. 5. Recurso especial
parcialmente conhecido, e nessa parte, provido.
REsp 1598228 / BA, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS
CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 11/12/2018, DJe 17/12/2018);

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE ALIMENTOS. AVÔ PATERNO.


OBRIGAÇÃO DE NATUREZA COMPLEMENTAR. COMPROVAÇÃO DE
QUE A GENITORA E O ESPÓLIO DO GENITOR ESTÃO
IMPOSSIBILITADOS DE ARCAREM COM A PRESTAÇÃO ALIMENTAR.
NÃO OCORRÊNCIA. RECURSO PROVIDO.
1. A obrigação dos avós de prestar alimentos tem natureza complementar e
somente exsurge se ficar demonstrada a impossibilidade de os dois genitores
proverem os alimentos dos filhos, ou de os proverem de forma suficiente.
Precedentes.
2. No julgamento do REsp 1.354.693/SP, ficou decidido que o espólio
somente deve alimentos na hipótese em que o alimentado é também herdeiro,
mantendo-se a obrigação enquanto perdurar o inventário.
3. Nesse contexto, não tendo ficado demonstrada a impossibilidade ou a
insuficiência do cumprimento da obrigação alimentar pela mãe, como
também pelo espólio do pai falecido, não há como reconhecer a obrigação do
avô de prestar alimentos.
4. O falecimento do pai do alimentante não implica a automática transmissão
do dever alimentar aos avós.
5. Recurso especial provido." (REsp 1.249.133/SC, Rel. Ministro
ANTONIO CARLOS FERREIRA, Rel. p/ Acórdão Ministro RAUL
ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 16/06/2016, DJe 02/08/2016)

Na hipótese dos autos, conforme restou assentado no acórdão recorrido, a

autora não é herdeira do de cujus.

Nesse contexto, não cabe ao espólio, a teor da orientação jurisprudencial desta

Corte, continuar a prestar alimentos à recorrida.

O instituto dos alimentos constitui verdadeiro instrumento de preservação da


dignidade da pessoa humana.

Plenamente compreensível, assim, a preocupação do Tribunal a quo de

assegurar à autora, que já conta com mais de 60 anos, o recebimento da

prestação alimentar até ultimada a partilha, uma vez que goza do status de possível

coproprietária dos bens que se encontram em nome do de cujus e sob os quais não

possui nenhum poder de disposição ou fruição.

Não se pode descurar, contudo que os alimentos são a expressão da

solidariedade familiar. A relação de parentesco, vale dizer, é o fundamento da

obrigação alimentar.

Aqui, assim como no caso julgado pela Segunda Seção desta Corte, acima

aludido, não há vínculo entre os filhos exclusivos do falecido e a ex-companheira a

justificar a manutenção do encargo alimentar, sendo certo que o pagamento da

pensão alimentícia perdurou até a morte do alimentante, ou seja, por mais de quatro

anos.

Sobre esse prisma, cumpre à autora pleitear ajuda alimentar de outros

herdeiros ou demais parentes com base no dever de solidariedade decorrente da

relação de parentesco, conforme preceitua o art. 1.694, do Código Civil.

Ainda, como não poderia deixar de ser, poderá requerer a sua habilitação no

inventário e lá postular a antecipação de recursos eventualmente necessários à sua

subsistência, advindos da sua meação, ou até mesmo, com a alienação de bens.

Cuida-se de solução que se mostra mais razoável, na medida que não onera a

herança deixada pelo de cujus aos seus herdeiros, dada a natureza dos alimentos,

que são irrepetíveis e, portanto, não podem ser descontados da meação da

recorrida.
Ante o exposto, reafirmando a orientação jurisprudencial desta Corte,

dou provimento ao recurso especial, afastando a obrigação imposta ao espólio

de pagar alimentos provisórios à recorrida.

É o voto.

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