Você está na página 1de 2

Guilherme de Ockham, Questões quodlibetais

Primeiro conjunto de questões


Questão 16 (Quodl. I.16)

Se pode ser de modo suficiente provado que a vontade causa


seus atos de modo efetivamente livre

[1] Que não: Porque a vontade é livre e, no entanto, não é ativa. Portanto, não é
livremente ativa. A consequência é evidente. O antecedente se prova, pois <a
vontade> é passiva.

[2] Contra: O que é passivo não é livre. A vontade é passiva. Logo, etc.

[3] Nesta questão exporei primeiro o que chamo de “liberdade”. Em seguida, tratarei
da questão.

[Artigo primeiro]

[4] Com relação ao primeiro artigo, deve-se entender que chamo de “liberdade” o
poder pelo que posso, indiferente e contingentemente, realizar muitas coisas
<diversa ponere>, e isso de modo tal que posso causar e não causar o mesmo efeito,
mesmo que não haja nenhuma diferença no que quer que seja distinto daquela
potência.

[Artigo segundo]

[Duas dificuldades]

[5] Com relação ao segundo artigo, há duas dificuldades a considerar. A primeira é a


de se determinar se se pode de modo suficiente provar que a vontade é livre. A
segunda, que pressupõe a liberdade da vontade, é a de se determinar se se pode
de modo suficiente provar que a vontade é ativa.

[Quanto à primeira dificuldade]

[6] Quanto à primeira <dificuldade>, digo que aquilo não se pode provar por
nenhum argumento <ratio>, pois aqui todo argumento que se quer cogente aceita,
junto com a conclusão, algo que é tão ou mais desconhecido do que ela. No
entanto, aquilo pode ser conhecido de modo evidente pela experiência, pelo fato

[trad. Rodrigo Guerizoli (em progresso, para uso didático apenas)] 1


de o ser humano experimentar que, não importa o quanto um argumento
estabeleça algo <como o que deve ser feito>, a vontade pode querer aquele algo,
pode não o querer ou pode rechaçá-lo.

[Quanto à segunda dificuldade]

[7] Quanto à segunda <dificuldade>, digo que sim <, ou seja, se pode determinar etc.>.
O que assim é demonstrado: porque a algo natural e suficientemente ativo (e não
impedido), aproximado de algo passivo e disposto, se segue necessariamente
uma ação. Mas todo agente diferente da vontade é algo natural e suficientemente
ativo (e nem está impedido), e a vontade está suficientemente disposta, uma vez
que nada aqui é contraditório nem se faz necessária qualquer outra disposição.

[8] Se dizes que a vontade pode ser livremente afetada sem qualquer ação, saliento
que o argumento recém oferecido vai diretamente contra essa possibilidade, por
isso desconsiderarei tal dificuldade.

[Uma objeção]

[9] Levanta-se aqui, no entanto, uma objeção, pois é impossível que um agente,
existindo durante um certo tempo e em potência essencial a um ato, se modifique
da potência ao ato sem <a presença> de nenhum agente extrínseco. Ora, a
vontade pode existir durante um certo tempo em potência essencial a uma
volição. Portanto, ela não é capaz de modificar a si mesma <da potência ao ato>.

[Com relação à objeção]

[10] Respondo: Ali se assume algo que é verdadeiro com respeito ao agente natural,
seja ele corporal ou espiritual. Mas a vontade, na medida em que é um agente
livre, oferece um contraexemplo evidente, pois o objeto pode ser conhecido e
estar presente à vontade, assim como também tudo o mais exigido para que se dê
o ato da vontade, pode existir durante um certo tempo e, não obstante, a vontade
pode produzir seu ato <apenas> depois e sem que nenhuma ação que lhe seja
extrínseca <tenha tido lugar>. E tudo isso ocorre devido à sua liberdade.

[Com relação ao cerne da objeção]

[11] Com relação ao cerne <da objeção>, digo que o mesmo pode ser ativo e passivo
com relação ao mesmo e que isso não implica contradição.

[trad. Rodrigo Guerizoli (em progresso, para uso didático apenas)] 2

Você também pode gostar