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Universidade do Sul de Santa Catarina

Economia
Brasileira
Universidade do Sul de Santa Catarina

Economia
Brasileira

UnisulVirtual
Palhoça, 2014

1
Créditos

Universidade do Sul de Santa Catarina – Unisul


Reitor
Sebastião Salésio Herdt
Vice-Reitor
Mauri Luiz Heerdt

Pró-Reitor de Ensino, de Pesquisa e de Extensão


Mauri Luiz Heerdt
Pró-Reitor de Desenvolvimento Institucional
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Pró-Reitor de Operações e Serviços Acadêmicos
Valter Alves Schmitz Neto

Diretor do Campus Universitário de Tubarão


Heitor Wensing Júnior
Diretor do Campus Universitário da Grande Florianópolis
Hércules Nunes de Araújo
Diretor do Campus Universitário UnisulVirtual
Fabiano Ceretta

Campus Universitário UnisulVirtual


Diretor
Fabiano Ceretta

Unidade de Articulação Acadêmica (UnA) - Educação, Humanidades e Artes


Marciel Evangelista Cataneo (articulador)
Unidade de Articulação Acadêmica (UnA) – Ciências Sociais, Direito, Negócios e
Serviços
Roberto Iunskovski (articulador)
Unidade de Articulação Acadêmica (UnA) – Produção, Construção e Agroindústria
Diva Marília Flemming (articuladora)
Unidade de Articulação Acadêmica (UnA) – Saúde e Bem-estar Social
Aureo dos Santos (articulador)

Gerente de Operações e Serviços Acadêmicos


Moacir Heerdt
Gerente de Ensino, Pesquisa e Extensão
Roberto Iunskovski
Gerente de Desenho, Desenvolvimento e Produção de Recursos Didáticos
Márcia Loch
Gerente de Prospecção Mercadológica
Eliza Bianchini Dallanhol

2
Amilton de Carvalho Guedes
Kátia Macedo
Luis Augusto Araújo (Organizador)

Economia
Brasileira

Livro didático

Revisão e atualização de conteúdo


Luis Augusto Araújo

Design Instrucional
Eliete de Oliveira Costa

4ª edição

UnisulVirtual
Palhoça, 2014

3
Copyright © Nenhuma parte desta publicação pode ser reproduzida por
UnisulVirtual 2014 qualquer meio sem a prévia autorização desta instituição.

Livro Didático

Professores conteudistas Projeto gráfico e capa


Amilton de Carvalho Guedes Equipe UnisulVirtual
Kátia Macedo
Diagramador(a)
Luis Augusto Araújo (Organizador)
Daiana Ferreira Cassanego
Revisão e atualização de conteúdo
Revisor(a)
Luis Augusto Araújo
Diane Dal Mago
Designer instrucional
ISBN
Eliete de Oliveira Costa
978-85-7817-622-8

330.981
E22 Economia brasileira: livro didático / organizador, Luis Augusto
Araújo ; [conteudistas], Amilton de Carvalho Guedes, Kátia
Macedo ; revisão e atualização de conteúdo, Luis Augusto
Araújo ; design instrucional Eliete de Oliveira Costa. – 4. ed. –
Palhoça : UnisulVirtual, 2014.
198 p. : il. ; 28 cm.

Inclui bibliografia.
ISBN 978-85-7817-622-8

1. Economia – Brasil. 2. Desenvolvimento econômico. 3. Brasil –


Condições econômicas. I. Araújo, Luis Augusto. II. Guedes, Amilton
de Carvalho. III. Macedo, Kátia. IV. Título.

Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Universitária da Unisul

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Sumário

Introdução | 7

Capítulo 1
A economia brasileira do período colonial
à origem da indústria | 9

Capítulo 2
Desenvolvimento econômico e a inflação
dos anos 1970 e 1980 | 27

Capítulo 3
Setor externo: o balanço de pagamento
e a crise da dívida externa | 55

Capítulo 4
Abertura comercial, privatização e os
planos de estabilização | 83

Capítulo 5
Estabilização, desequilíbrios
macroeconômicos e as reformas | 111

Capítulo 6
As mudanças recentes na economia
brasileira: a euforia | 147

Considerações Finais | 191

Referências | 193

Sobre os professores conteudistas | 197

5
Introdução

Este livro didático corresponde à unidade de aprendizagem Economia Brasileira.

O material foi elaborado visando a uma aprendizagem autônoma e aborda


conteúdos especialmente selecionados e relacionados à sua área de formação.
Ao adotar uma linguagem didática e dialógica, objetivamos facilitar seu estudo a
distância, proporcionando condições favoráveis às múltiplas interações e a um
aprendizado contextualizado e eficaz.

Lembre-se que a sua caminhada, nesta disciplina, será acompanhada e


monitorada constantemente pelo Sistema Tutorial da UnisulVirtual, por isso,
a “distância” fica caracterizada somente na modalidade de ensino que você
optou para a sua formação, pois, na relação de aprendizagem, professores e
instituição estarão sempre conectados com você.

Então, sempre que sentir necessidade entre em contato; você tem à disposição
diversas ferramentas e canais de acesso, tais como: telefone, e-mail e o Espaço
UnisulVirtual de Aprendizagem, que é o canal mais recomendado, pois tudo o
que for enviado e recebido fica registrado para seu maior controle e comodidade.
Nossa equipe técnica e pedagógica terá o maior prazer em lhe atender, pois a sua
aprendizagem é o nosso principal objetivo.

Bom estudo e sucesso!

Equipe UnisulVirtual.

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Capítulo 1

A economia brasileira do período


colonial à origem da indústria

Habilidades Este capítulo possibilitará ao (à) aluno (a)


analisar questões referentes ao surgimento do
Capitalismo e Mercantilismo; reconhecer os ciclos
econômicos brasileiros; perceber a vinculação
entre o período colonial e a economia brasileira
contemporânea; analisar questões referentes
à produção cafeeira e sua importância para a
economia brasileira e reconhecer as proporções
da Crise Mundial de 1929, além de perceber a
relação entre a produção do café e a Crise de
1929 para o surgimento da indústria no Brasil.

Seções de estudo Seção 1:  Constituição do Capitalismo e


o Mercantilismo

Seção 2:  Pacto colonial e os ciclos econômicos

Seção 3:  O início da produção cafeeira e as


principais regiões produtoras de café

Seção 4:  A vinda dos imigrantes para o Brasil,


o comércio e as operações financeiras no ciclo
do café

Seção 5:  A Crise de 1929 e a origem da indústria

Seção 6:  Processo de substituição de importação

9
Capítulo 1

Seção 1
Constituição do Capitalismo e o Mercantilismo
O Capitalismo surge a partir das primeiras fortunas entre os burgueses da Idade
Média, com um novo sistema econômico e social baseado na iniciativa particular,
na propriedade privada dos meios de produção e gosto pelo investimento de
capitais com fins lucrativos.

O Capitalismo tem três casos em que se pode desenvolver: o clássico, o prussiano


e o colonial. A mudança dada a cada caso varia devido ao itinerário da inserção de
cada região no Capitalismo mundial.

•• No caminho clássico desenvolveram‑se os países líderes do


Capitalismo. Sua forma foi sustentada por realizar a industrialização,
beneficiando‑se dos recursos provenientes da exploração das colônias.
•• Já o caminho prussiano consistiu‑se do processo que envolveu
os países que tiveram um desenvolvimento industrial mais
tardio, no século XIX, e ausência de processos democráticos de
emancipação, mas com autonomia econômica.
•• O caminho por via colonial denota os países que sofreram não só
um atraso democrático, como também econômico, pois passaram
por total dominação econômica e sem autonomia política.

No período colonial, as conquistas econômicas de Portugal, Espanha, França,


Inglaterra e Holanda foram marcantes. Suas colônias eram fundamentais por
conta do processo exploratório.

Aconteceu o chamado monopólio comercial que representava o total domínio


da metrópole sobre a região de exploração. As colônias não podiam produzir
algo que competisse com a metrópole, devendo atuar somente no mercado
de consumo.

A produção da colônia estava vinculada às necessidades da metrópole.


Os produtores não tinham o interesse em se estabilizar nas colônias, mas sim
captar recursos para sua permanência na metrópole, dessa forma, você pode
compreender por que algumas regiões se transformam em países ricos e outras
pobres, como o caso do Brasil.

Se no período colonial a produção do Brasil fosse voltada também para o mercado


interno e se os empreendedores viessem se estabelecer efetivamente, como
aconteceu posteriormente, as riquezas exploradas não seriam totalmente deslocadas
para a Europa, dessa forma, certamente o Brasil estaria melhor estruturado.

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Economia Brasileira

Dentro do Brasil temos um exemplo semelhante. Pense numa região como


a “Serra Pelada”, que produziu recentemente um quantitativo incalculável
de riqueza mineral (ouro). As riquezas extraídas não ficaram na região da
“Serra Pelada”. Tampouco o grande volume de trabalhadores e exploradores
permaneceram na região. Por conta do grande volume de ouro extraído,
podemos afirmar que se fosse destinado um pequeno percentual para
investimentos na “Serra Pelada”, ela também estaria mais bem estruturada.

A expressão Mercantilismo vinculada à economia significa dar prioridade às


questões econômicas.

Mas você saberia responder como surgiu o Mercantilismo?

A referência para elaborar a resposta você encontra nos Estados Europeus,


pois foram eles que, ao consolidar a centralização política, atribuíram as práticas
econômicas conhecidas como Mercantilismo.

O Mercantilismo apresenta características econômicas diferenciadas entre


Estados Europeus, por conta das diferentes estruturas econômicas de cada
um, tais como: o comércio da Inglaterra, a indústria manufatureira da França e
o metalismo da Espanha.

O Mercantilismo tinha como objetivo fortalecer o Estado e a burguesia na fase de


transição entre o Feudalismo e o Capitalismo. As características que se destacam
no Mercantilismo são:

•• metalismo – a riqueza de um Estado era avaliada pela quantidade


de metais preciosos que possuía em seu território;
•• balança de comércio favorável – comércio internacional no qual as
exportações teriam que superar as importações;
•• protecionismo – o Estado tinha que tomar medidas protecionistas,
apoiando a produção interna para que pudesse concorrer com
produtos externos;
•• intervencionismo estatal – o Estado deveria intervir na economia
por meio de tarifas alfandegárias, estímulos às empresas
manufatureiras e ao industrialismo etc.

Fazendo uma interligação entre o Mercantilismo e o período contemporâneo


pode‑se dizer que o Mercantilismo produziu os instrumentos para a
atualidade. Considerando as proposições dos burgueses que colocavam
como indispensáveis a união dos territórios, a homogeneização linguística,

11
Capítulo 1

a instrumentação monetária, além de outros, é possível comparar essas


informações com a calorosa expressão amplamente citada nos dias de hoje:
“a globalização”.

Seção 2
Pacto colonial e os ciclos econômicos
O chamado pacto colonial não é a expressão adequada para atender ao objetivo
de sua criação. O pacto colonial dá ideia de um acordo formal, ou contrato, entre
as metrópoles e as colônias.

O que vigorou na prática foi a metrópole ter adquirido, imperativamente, o direito


exclusivo (monopólio comercial) de realizar as compras da produção das colônias.
Com um único comprador, os preços ficavam limitados, reduzindo o lucro dos
colonos. A metrópole adquiriu também o direito exclusivo de fornecedor. Nesse
caso, com preço elevado para os produtos vendidos aos colonos.

Portanto, o pacto colonial serviu de instrumento para que os Estados Europeus


controlassem a economia colonial, como foi o caso do Brasil, e se apropriassem
dos recursos financeiros.

A expressão ciclos econômicos é utilizada para identificar as fases


contínuas do conjunto crescimento/crise econômica. Ou seja, num primeiro
momento, a economia está crescendo e o desemprego desaparecendo,
posteriormente, surge a crise identificada pela queda da produção,
do consumo, do desemprego etc. Em seguida, retorna o crescimento.

Nesta seção, você observará que os ciclos do período colonial brasileiro


abrangem as produções do pau‑brasil, do açúcar, do ouro e do algodão.

2.1 Ciclo do pau‑brasil


Quando o Brasil foi “descoberto” por Portugal no ano de 1500, não foram
encontradas riquezas de metal para exploração em prol da Coroa portuguesa,
exceto infinitas árvores de pau‑brasil, sendo essa, então, a primeira riqueza a ser
explorada, pois de sua madeira era extraída uma substância vermelha que servia
para tingir tecido, saindo daí o interesse de sua exploração.

Não demorou muito para a Coroa portuguesa declarar a extração do pau‑brasil,


um monopólio português, com isso, oficialmente ninguém poderia retirar a
madeira da mata sem a concessão da Coroa e o pagamento de um tributo.

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Economia Brasileira

A mão de obra utilizada era a indígena, que começou de forma amigável.


Os colonos faziam pagamentos com escambo, que seria uma série de objetos:
tecidos, espelhos, facas, que eram trocados por trabalho. Com o tempo esse
relacionamento tornou‑se complicado, devido à maneira que era imposto o
trabalho para os índios. Diante à resistência indígena, passou a usar a violência
e impor a escravidão.

O professor da Unisul, Jaci Rocha, entre seus projetos e atividades sociais,


no seu trabalho e contatos com os índios guaranis no Alto do Morro dos
Cavalos em Santa Catarina, obteve informação curiosa, contida em sua
crônica, sobre a expressão Brasil, que não estaria vinculada somente a
uma árvore: “Em Kuaray Guá o índio chora, refaz o fôlego da resistência
e deixa explodir sua alma mística, espiritual, como na primeira dança para
o europeu desembarcado, o Mbyá‑guarani chama novamente pelo Anjo
da Guarda, pelos Brasis, espíritos protetores da floresta e das milhares de
tribos que habitam esta terra”. Rocha (2011)

O monopólio da exploração do pau‑brasil só terminou em 1859, quando


a Coroa já registrava que o volume contrabandeado era superior ao das
vendas oficias e surgiram os corantes produzidos a partir do alcatrão
mineral. Foram mais de três séculos de extração predatória, sem que
o processamento da madeira para extração do corante tivesse sido
desenvolvido na colônia, agregando algum valor ao produto ou gerando
postos de trabalho.

2.2 Ciclo do açúcar


O açúcar entrou no Brasil no século XVI. Os fatores que levaram a Coroa
portuguesa a implantar a monocultura açucareira foram as condições do
litoral nordestino, que eram favoráveis, a experiência portuguesa no cultivo,
a perspectiva de lucros que eram boas, devido ao comércio restrito e à facilidade
de mercado para a exportação, bem como a proteção que a colonização daria a
ameaças estrangeiras de ocupação do território.

Com o início da produção açucareira, houve a necessidade de mão de obra


de qualidade, e o índio logo demonstrou a sua incapacidade física para
suportar as funções do trabalho, sob agressões do senhor de engenho.
Começou‑se aí a substituição pela mão de obra escrava africana, essa
implantação foi lenta devido aos custos altos, pois as condições de viagem e
maus‑tratos acabavam diminuindo o quadro e elevando os preços.

13
Capítulo 1

O ciclo açucareiro desperta o interesse pelo Brasil de outros povos europeus e,


principalmente, os holandeses, que até então transportavam o açúcar brasileiro
para ser refinado em Flandres.

Com isso, a Coroa portuguesa começa a sofrer dificuldades com as invasões


holandesas na região do Nordeste.

A luta entre holandeses e a Coroa portuguesa durou 30 anos, ficando conhecida


como a guerra do açúcar. Ao serem expulsos do Brasil, os holandeses passaram
a cultivar a cana‑de‑açúcar em seus domínios nas Antilhas, colocando o produto
no mercado europeu por um preço abaixo do que os portugueses pediam na
oferta do açúcar brasileiro. Conseguiram, assim, mesmo vencidos no Brasil,
derrotar o monopólio português de produção e comércio. Ao passo que o açúcar
antilhano ganhava o mercado europeu, aumentava a avidez da Coroa portuguesa
pelo ouro brasileiro. O açúcar entrava em declínio e um novo ciclo econômico
tinha início.

Por outro lado, vale ressaltar que durante esse período as fronteiras do território
colonial português sofrem um aumento, levando um alargamento da fronteira
sobre o domínio ibérico, atingindo assim a região da Amazônia.

2.3 Ciclo do ouro


No final do século XVII, são encontradas as primeiras jazidas de ouro em Minas
Gerais, por meio das expedições feitas no Brasil. Entre as várias expedições,
a que mais se destaca é dos bandeirantes paulistas, que tinham como objetivo
a captura de índios, assim, surgia um alarde, atraindo as atenções locais e
internacionais sobre o território.

O ouro atraiu para região um contingente populacional não só de pessoas


de posse, mas também de pessoas com a ilusão de enriquecimento rápido,
dessa forma, houve um movimento migratório para o Brasil, alterando o perfil
populacional, sobretudo por aparecer uma nova camada social na escala
média. Assim, ocorreu uma expansão no território e surgiram novos núcleos de
povoamento, dando origem a novas cidades.

As acentuadas quantidades de pessoas que foram atraídas para a região mineira


se deslocaram não só da própria colônia como também de Portugal. A divulgação
da descoberta de ouro motivou a vinda de muitos portugueses.

Quantitativo não registrado, mas a criação de um decreto coibindo a saída de


portugueses para o Brasil, não deixa dúvidas de que foi marcante o volume de
pessoas que se deslocaram na busca do ouro.

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Economia Brasileira

O quantitativo de recursos financeiros produzidos com o ouro foi inferior aos


recursos produzidos com o açúcar, contudo, o ciclo de ouro acrescentou
modificações significativas, tais como o envolvimento de um número maior de
pessoas e uma maior distribuição de renda entre os trabalhadores, mesmo
com a alta carga tributária. O trabalho escravo também fez parte do ciclo,
principalmente entre os grandes mineradores que os exploraram de forma brutal.
O trabalho por cotas possibilitou que os escravos acumulassem recursos para a
aquisição de sua liberdade.

Para melhor administrar essa nova forma de exploração, Portugal criou leis
específicas e organizou um esquema de administração, criando um órgão
chamado de Intendência Mineira, que exercia várias funções administrativa,
judicial e tributária. A última função, considerada a mais importante, servia para a
cobrança de imposto, que equivalia a um quinto de qualquer quantia extraída de
ouro, ficando esse imposto conhecido como “quinto”.

Por conta da produção mineral e do deslocamento de pessoas das demais


regiões para Minas Gerais, houve mudança do núcleo produtivo para o
Centro‑Oeste, mudando a capital da Bahia para o Rio de Janeiro, deslocando
o centro econômico, devido à facilidade de comunicação pelo porto marítimo do
Rio de Janeiro, bem como para gerar um maior controle sobre Minas Gerais.

Com a cobrança do quinto, os mineradores começaram a criar maneiras de burlar


esse alto tributo, isso fez com que surgissem as Casas de Fundição. Todo o ouro
extraído tinha que ser cunhado, recebendo um selo régio. Nenhum ouro poderia
circular se não fosse quintado. Os infratores teriam penas severas que poderia
chegar até a expulsão do território de domínio português.

Contudo, outras atitudes mais drásticas foram tomadas pela Coroa portuguesa, com
essas vieram as decretações da cota mínima, sendo que 100 arrobas ou 1500 quilos,
deveriam ser espontaneamente doados à Coroa ou de forma compulsória no
derrame na hora da fundição. Com essas medidas, acaba acontecendo uma revolta
dos mineradores, conhecida como a Inconfidência Minera.

A produção de ouro apresentou dados quantitativos importantes nos primeiros


anos de produção, “nesse período, o Brasil produziu mais ouro que toda a
América espanhola em 357 anos” (CONTRIN, 1999), entrando em queda a partir
de 1770.

A região de Minas Gerais, além de ouro, apresentou na atual cidade de


Diamantina pedras preciosas (diamantes) para exploração. Portugal também
adotou estratégias de controle por meio de contratos, e posteriormente da
criação de órgão (Intendência dos Diamantes) para total controle da população
residente na cidade.

15
Capítulo 1

O Estado de Minas Gerais continua como o Estado de maior produção


mineral do Brasil. Na Tabela 1.1, é possível visualizar o percentual de
recursos repassados ao Governo através da Compensação Financeira pela
Exploração de Recursos Minerais (CFEM), nos anos de 2003 a 2005.

É do Estado de Minas Gerais que o setor público brasileiro arrecada em


torno de 50% da CFEM ao ano. Somando a arrecadação dos Estados
de Minas Gerais e Pará, os maiores produtores de minério do Brasil,
o percentual de arrecadação do CFEM fica entre 75% a 85% ao ano,
do total arrecadado pelo Governo.

Tabela 1.1 ‑ Arrecadação do CFEM nos Estados de maior Arrecadação (em %)

Ano
Estados
2003 2004 2005

Bahia 1,88 % 2,84 % 2,38 %

Goiás 4,12 % 4,47 % 3,93 %

Minas Gerais 51,26 % 47,08 % 46,87 %

Pará 25,26 % 28,52 % 31,80 %

Santa Catarina 2,15 % 2,19 % 1,92 %

São Paulo 2,85 % 2,65 % 2,25 %


Fonte: Adaptado do relatório do Departamento Nacional de Produção Mineral (2007).

O percentual do ano de 2003 está relacionado à arrecadação de julho a dezembro.


O percentual do ano de 2005 está relacionado à arrecadação de janeiro a julho.

2.4 Ciclo do algodão


O cultivo do algodão no Brasil teve início no período colonial. O algodão era
cultivado em pequena escala, nos grandes latifúndios, pelo interior das capitanias.

Seu cultivo inicialmente era restrito, devido às leis rigorosas impostas pela Coroa
portuguesa sobre a implantação de indústrias no Brasil, afinal, os produtos
consumidos aqui deveriam ser importados da Europa.

O algodão arbóreo era apenas utilizado para a confecção de sacarias para


produtos agrícolas (café e açúcar) e também vestimentas grosseiras do enorme
contingente de escravos.

O algodão, que é natural do continente americano, passa a ter acentuado


processo de produção a partir da Revolução Industrial, que teve origem na

16
Economia Brasileira

Inglaterra. Como a Revolução estava vinculada com o aumento da produção


industrial, fez‑se necessário o aumento da produção dos insumos, que nesse
caso era o algodão.

O incentivo ao cultivo de algodão no Brasil só aconteceu após a Guerra Civil nos


Estados Unidos (1861‑1865), que era o fornecedor da matéria‑prima para a Inglaterra.
Em consequência da guerra, houve uma interrupção no processo de exportação.
Sentindo os efeitos que abalaram as estruturas das indústrias têxteis, os grandes
empresários ingleses resolvem implantar indústrias no Brasil, principalmente na
província de São Paulo, durante a segunda metade do século XIX.

O ciclo do algodão, na época denominada “ouro branco”, gerou uma economia


sólida, engrandecendo e destacando significativamente a economia brasileira,
dessa forma, passa a ter lugar de destaque na produção do algodão.

Seção 3
O início da produção cafeeira e as principais
regiões produtoras de café
A importância da produção cafeeira no Brasil geralmente é relacionada à Crise
do Café e à evolução do processo de industrialização brasileiro. Para você obter
um melhor entendimento do que irá ver a seguir, torna‑se necessário apontar
e descrever características peculiares ao ciclo do café, que estão vinculadas
à ascensão da produção capitalista no Brasil. Para isso, é necessário levantar
algumas questões históricas sobre esse produto.

O café é originário da Abissínia, hoje Etiópia, que passou pela Europa e,


posteriormente, chegou à América. Sua introdução no Brasil se deu em torno
do ano de 1727, no Período Colonial.

Você sabia que, inicialmente sem valor comercial, o café era utilizado
apenas para o consumo?

A partir do início do século XIX, o consumo mundial de café passou a ter um


acentuado crescimento, tornando‑se um produto de consumo popular nos
Estados Unidos e na Europa.

O consumo do café nos Estados Unidos foi altamente significativo para o


crescimento da produção cafeeira no Brasil, por aquele país ter sido o principal
consumidor do café brasileiro, chegando a comprar mais de 50% da produção.

17
Capítulo 1

O café, a partir da década de 1830, segundo Gilberto Cotrim (1999), tornou‑se


o principal produto de exportação do Brasil, avançando sistematicamente,
conforme os dados da tabela a seguir, gerando lucros que induziram a
recuperação econômica do país, chegando a superar os demais produtos que
também eram destinados à exportação.

Tabela 1.2 ‑ Principais produtos agrícolas para exportação (porcentagem sobre valor global das exportações)

Período Café Açúcar Algodão Fumo Cacau

1831‑1840 43,8 24,0 10,8 1,9 0,6

1841‑1850 41,4 26,7 7,5 1,8 1,0

1851‑1860 48,8 21,2 6,2 2,6 1,0

1861‑1870 45,5 12,3 18,3 3,0 0,9

1871‑1880 56,6 11,8 9,5 3,4 1,2

1881‑1890 61,5 9,9 4,2 2,7 1,6

1891‑1900 64,5 6,0 2,7 2,2 1,5


Fonte: Cotrim (1999, p. 225).

Enquanto a produção agrícola brasileira esteve concentrada nas regiões Norte e


Nordeste do Brasil, esteve também relacionada à falta de capital, às limitações
técnicas e a outros aspectos que ajudaram a gerar uma crise econômica naquele
período. Essa crise só foi superada a partir do momento em que a produção de
café no Brasil passou a se tornar significativa, sendo que esse processo se deu
em outras regiões diferente daquelas em que se concentravam as produções
agrícolas anteriores.

As regiões que iniciaram a produção do café no Brasil possuíam características


diferenciadas das regiões que, posteriormente, alavancaram a produção cafeeira.
A produção do café iniciou na Baixada Fluminense e no Vale do Paraíba. A partir
da década de 1870, a produção cafeeira passa por um rápido crescimento,
acompanhado pelo deslocamento do centro geográfico das plantações.

No período inicial do cultivo do café, era no Rio de Janeiro o local de maior


produção cafeeira do Brasil. Contudo, a produção, na época, era realizada em
fazendas mais antigas, com solos e técnicas não muito adequados, desfavoráveis
ao crescimento da produção e marcada pela utilização do trabalho escravo.

Mas isso não é tudo! Essas características citadas anteriormente irão


mudar a partir da década de 1880.

18
Economia Brasileira

É a partir de 1880 que São Paulo passa a superar a produção do Rio de Janeiro,
sendo que houve, nesse período, um deslocamento da produção da região do
Vale do Paraíba em direção ao Oeste paulista. Essa mudança levou a produção
para um solo mais apropriado, ocupando áreas das cidades de Campinas,
Sorocaba, Ribeirão Preto, Araraquara e São José do Rio Preto. Essas novas áreas
de produção avançaram com a redução do trabalho escravo e a incorporação do
trabalho assalariado.

Seção 4
A vinda dos imigrantes para o Brasil e o comércio
e as operações financeiras no ciclo do café
A partir da década de 1880, com o crescimento da produção cafeeira e
o deslocamento do centro geográfico de produção para o Oeste paulista,
ocorrem mudanças marcantes no processo produtivo do café, entre elas
podemos destacar a substituição do trabalho escravo pelo trabalho assalariado,
incrementando a imigração no Brasil, em favor dos interesses dos cafeicultores
de São Paulo.

A vinda de imigrantes e sua vinculação com as atividades agrícolas eram


formalizadas por meio do contrato de um ano de vigência, prevendo o pagamento
de um salário calculado com base na produção proporcional ao número de pés de
café sob a responsabilidade do trabalhador. Muitos trabalhadores cumpriam suas
tarefas e, ao final de um ano de trabalho, deslocavam‑se para outras atividades.

Em 1888, com abolição da escravatura, aumentou o número de pessoas sem


fontes de renda e estruturas de manutenção, iniciando o surgimento de favelas.
Esse ano foi também o de maior entrada no Brasil de imigrantes, atingindo um
total de 91.826 pessoas.

É comum avaliar a abolição da escravatura vinculando esse fato somente


à libertação dos escravos. Contudo, não se pode esquecer que naquele
momento a escravidão no Brasil era praticamente insustentável. A manutenção
de um escravo se tornou inviável e sem sentido diante dos “salários” pagos
aos trabalhadores livres, que passaram a representar menores custos para os
fazendeiros ou empresários.

Dessa forma, é fácil perceber que os produtores de café e as indústrias já instaladas


logo começaram a optar pelos trabalhadores imigrantes. Mesmo com salários mais
elevados, se comparados com aqueles pagos aos poucos trabalhadores assalariados
brasileiros, ainda era mais vantagem pagar um imigrante do que manter um escravo.

19
Capítulo 1

Você pode imaginar o quanto isso trouxe dificuldades para os trabalhadores


locais considerados menos qualificados?

As imigrações contavam com subsídios do Governo Federal e dos Estados. Entre


os anos de 1870 e 1939, somente o Estado de São Paulo atingiu o quantitativo
de 2.429.711 imigrantes. E entre 1900 a 1940, 10% do crescimento populacional
brasileiro estava relacionado à entrada no país de imigrantes estrangeiros.

Somente na década de 1930, com os problemas vinculados à Crise Mundial e


o agravamento do desemprego, começaram restrições à imigração. O Governo
brasileiro estabeleceu um sistema de cotas com o objetivo de controlar a entrada
de imigrantes. Então, a imigração entra em queda, perdendo sua relevância na
taxa de crescimento da população.

A contribuição da imigração no crescimento populacional se deu de forma direta,


ou seja, pelo do somatório dos próprios imigrantes, e de forma indireta, por meio de
seus descendentes. Os dois casos representavam 19% do crescimento populacional
entre 1840 a 1940. Um percentual relativamente insignificante, se comparado com
outros países, como Argentina (58%), EUA (44%) ou Canadá (22%).

Quais eram os grupos e pessoas envolvidas na atividade comercial do café


e nas operações financeiras?

Para sua melhor compreensão acerca da integração entre os envolvidos, como


fazendeiros, comissários, ensacadores e exportadores, é interessante conferir as
atividades desenvolvidas por eles:

•• comissários – eram brasileiros que estavam vinculados à prestação


de serviços, exercendo a função de representantes dos fazendeiros
no comércio e, como você vai ver a seguir de forma mais detalhada,
operavam como intermediadores financeiros, disponibilizando
recursos para os fazendeiros;
•• ensacadores – desempenhavam de modo geral a tarefa de comprar
o café dos comissários, faziam os trabalhos de manipulação do café
e repassavam aos exportadores;
•• exportadores – estrangeiros, principalmente ingleses, que forneciam
o café para o mercado internacional. Ao longo do tempo foram
também incorporando as funções dos ensacadores. Sua lucratividade
aumentava com a baixa do preço de exportação. Considerando que
eram firmas estrangeiras, tinham como motivação para se instalarem
no Brasil a apropriação de capital e a remessa para o exterior.

20
Economia Brasileira

A produção do café no Brasil tornou os cafeicultores uma classe relevante na


sociedade brasileira, ao longo do período cafeeiro do séc. XIX, mesmo não
existindo uma estrutura financeira adequada à produção do café. Para suprir essa
deficiência os comissários adotavam estratégias, fazendo a interação entre os
bancos e os fazendeiros.

Cabia então aos comissários a captação de recursos para atender os


investimentos de longo prazo, considerando que uma plena produção do café
vigorava somente a partir do sexto ano do plantio, bem como o capital de giro
para a manutenção da lavoura.

O comissário conseguia junto ao banco o capital para a lavoura de café e


repassava ao fazendeiro com a mesma cobrança de juros do banco, que girava
em torno de 9% a 12% ao ano. A remuneração dos comissários estava vinculada
à interação comercial, por meio das negociações do café, com uma margem de
lucro em torno de 3%. O produto era vendido ao ensacador que selecionava e
classificava o tipo de café e depois repassava ao exportador que fazia a ligação
com os outros países.

Os empréstimos destinados diretamente aos fazendeiros só começaram a ocorrer


por volta de 1920, com a abertura de agências de bancos nacionais e agências
do Banco do Brasil no interior do Estado de São Paulo, ficando mais próximas
aos fazendeiros, possibilitando uma negociação direta com o banco.

Essa Crise teve seu momento máximo quando ocorreu a quebra da Bolsa de
Valores de Nova York em 1929, e ficou conhecida como Crise Mundial de 1929.
Essa crise foi caracterizada pela produção que superava o consumo.

Seção 5
A Crise de 1929 e a origem da indústria
Com a crise que a economia cafeeira começou a enfrentar, alguns mecanismos
de defesa foram implantados. O mais utilizado foi a redução cambial para conter
a queda na redução das exportações, com preços mais acessíveis, diminuindo
as perdas para os fazendeiros. Outra medida foi adotada em 1906, quando o
Governo de Taubaté, com ajuda de investimentos estrangeiros, passou a comprar
o excedente da produção de café, o que acabou incentivando ainda mais a
produção e retardando uma crise cafeeira. Mas essa política não conseguiu
se manter por muito tempo, pois com a Crise, as reservas de ouro do Brasil
chegaram quase a zero.

21
Capítulo 1

A solução encontrada durante a Crise Mundial Capitalista foi baixar os preços do


café para aumentar a exportação desse produto, sendo assim, vendia‑se mais café
e ganhava‑se menos. Outra forma que o Governo brasileiro adotou foi a diminuição
da oferta do produto no mercado internacional, com a queima do estoque.

Esse ato por parte do Governo consistiu na queima de 1/3 da produção de café
no período de 1931 a 1939. Para o financiamento de tal prática, utilizaram‑se os
impostos sobre a exportação e a expansão do crédito.

A economia brasileira começa a ter reação a partir de 1933, não impulsionada


pela recuperação da economia dos países industrializados, mas por uma política
interna de fomento e em defesa dos interesses nacionais.

A Crise de 1929 provocou uma crise geral do capitalismo liberal e da democracia


liberal. Ocorrendo, assim, uma crise de superprodução, na qual as indústrias
produziram acima da capacidade de absorção do mercado, pois os salários não
subiram, acompanhando o crescimento da produção.

Assim, passou a existir um excedente de produção. Os preços dos produtos


começaram a baixar e, como não havia condições para o consumo, as empresas
passaram a entrar em falência, causando o desemprego e diminuindo ainda mais
o poder de compra da população.

A sociedade norte‑americana tinha como segurança, para momentos de crise,


uma reserva (em Ações), mas com a intensificação do processo de crise passou
a liquidar suas reservas (venda das ações) para sobreviver. Toda a população
tomou essa iniciativa ao mesmo tempo, vender as Ações, o que provocou sua
extraordinária desvalorização.

Como naquele momento os EUA eram o centro da economia capitalista mundial,


essas atitudes abalaram fortemente a economia americana, dessa forma, a crise
se espalhou por todo o Ocidente.

Como consequência de tudo isso, no Brasil acontece a perda da hegemonia


política da burguesia cafeeira em favor de uma nova classe industrial ascendente.
A partir dessa perda começa o processo de industrialização brasileira.

A dinâmica industrial brasileira foi, em geral, pautada pelas necessidades de


consumo, seguindo etapas mais ou menos definidas. Os investimentos, em
termos setoriais, foram se dando em “blocos”, de acordo com as necessidades
de demanda e com as possibilidades de materialização dos investimentos.

Uma das primeiras tentativas da implantação da indústria no Brasil, no período de


1880 a 1890, apoiava‑se num tratado comercial, desigual, com a Inglaterra, no qual
essa limitava os impostos alfandegários. Mesmo assim, uma parte da população
que tinha maior poder aquisitivo sentiu‑se estimulada a montar indústrias no Brasil.

22
Economia Brasileira

Esse apoio somente era dado para produtos de interesse da Inglaterra.


Só no primeiro governo republicano de Marechal Floriano Peixoto
(1891‑1894) foram tomadas medidas mais enérgicas para a defesa da
indústria brasileira.

O ministro da Fazenda, na época Ruy Barbosa, estabeleceu impostos


protecionistas para os produtos manufaturados nacionais, tendo
uma queda considerável nas taxas cobradas sobre a importação de
equipamentos e matéria‑prima.

Nessa época, é promulgada a Lei da Proteção à Indústria com privilégios


adicionais.

No governo de Prudente de Morais (1894‑1898), as medidas de apoio


à indústria foram anuladas e voltou‑se para o interesse da burguesia do
café, tendo uma política anti‑industrial. Com isso, as indústrias existentes
surgiram nas “franjas” da economia cafeeira, ou seja, de acordo com as
possibilidades de atender as necessidades da economia cafeeira.

Surgem assim duas linhas de teorias para a implantação da indústria no Brasil:

•• na primeira, é a crise do setor exportador que gera o impulso para a


industrialização, ou seja, surgiu como uma resposta às dificuldades
de importar produtos industriais em determinados períodos;
•• na segunda, o impulso é o bom desempenho do setor exportador,
que aparece no momento da exportação do café.

Nos dois casos, a indústria visava a atender as necessidades de consumo dos


trabalhadores assalariados do café, com produtos cuja importação era mais difícil.

Exemplos disso seriam os bens perecíveis ou aqueles que apresentavam baixa


relação valor/frete, ou seja, alto custo para importar.

Nesses casos, viabilizava‑se a concorrência doméstica, apesar da menor


produtividade. Outra pré‑condição para que determinados setores fossem objeto
de investimento industrial era a baixa necessidade de capital.

Analisando as duas explicações anteriores, pode‑se concluir que o investimento


industrial ocorreu nas fases de expansão do setor exportador, quando havia
divisas para importar as máquinas necessárias ao investimento. Já quanto
à ocupação da capacidade instalada, o aumento da produção ocorreu nos
momentos de crise do setor exportador, quando se dificultava a importação de
bens de consumo e se permitia que a produção nacional se tornasse competitiva.

23
Capítulo 1

É importante saber que no início do século XX, mesmo com a produção brasileira
centrada no café e na borracha, destinados à exportação, o processo de
industrialização já havia iniciado.

Em 1907 já existiam 3258 estabelecimentos industriais dos ramos de madeira,


mobiliário, calçados, fósforos, vestiários, couro, chapéus, fumos e cerâmicos,
oferecendo 152 mil empregos.

A industrialização brasileira começa a crescer em 1920. Nessa primeira fase,


destacavam‑se os bens de consumo leve, ou seja, os produtos têxteis, alimentícios
e bebidas que respondiam por mais de 80% do valor da produção industrial no
país. Os demais ramos industriais existentes eram basicamente setores acessórios,
que surgiam para a prestação de serviços aos principais setores.

As etapas a seguir foram elencadas com base no relato de Gremaud (1999),


na obra Economia Brasileira Contemporânea.

O crescimento industrial, nas décadas de 10 e 20, ficou em torno de 50% em


cada período. Somente na década de 30 é que se acelerou o ritmo de crescimento
industrial, mas no período de 1931 e 1932, sob o impacto da crise internacional,
o país ficou praticamente estagnado. Em 1933 retomou‑se o crescimento
econômico com base na indústria.

O crescimento industrial no período de 1933/39 foi de 100% e, na década seguinte,


apesar da Segunda Guerra Mundial, o crescimento foi de 110%.

O investimento industrial avançou de forma dinâmica na produção interna,


substituindo as importações.

Seção 6
Processo de substituição de importação
Durante a crise internacional de 1929 houve a necessidade de iniciar a produção
interna do que antes era importado, sendo assim, surge no Brasil um processo de
industrialização com base no processo de substituição de importação (PSI), como
você pode ver a seguir:

O processo de industrialização brasileiro, baseado no chamado


PSI, tinha como uma de suas características o protecionismo,
que levava a uma despreocupação com a questão da eficiência.
A necessidade de sobrevivência, ao longo da crise, levou vários

24
Economia Brasileira

setores e indústrias específicas a um processo de modernização


e de busca de competitividade. Este processo levou, inclusive,
a um aumento nas exportações de manufaturados, uma vez
que a crise forçou as empresas a buscar novos mercados
consumidores. (FORTUNA, 1995, p. 117)

Esse modelo de industrialização é caracterizado pelas seguintes etapas:

•• estrangulamento externo com a queda do valor das exportações, com


manutenção da demanda interna, mantendo a demanda por importação;
•• para se contrapor à crise cambial, o governo toma medidas que
acabam por proteger a indústria nacional preexistente, aumentando
a competitividade e a rentabilidade da produção doméstica;
•• geração de onda de investimentos nos setores substituidores
de importação, produzindo internamente parte do que antes era
importado, aumentando a renda nacional e a demanda agregada;
•• novo estrangulamento externo, em função do próprio crescimento
da demanda, que se traduz em aumento das importações e de
parte dos investimentos que se materializam em matérias‑primas e
equipamentos importados.

Nota‑se que o processo de industrialização nasce do dinamismo do PSI, gerado


pela queda do mercado externo e as necessidades maciças do consumo
interno. Gerando um estímulo e investimento interno para industrialização,
substituindo a importação, passando a determinar o crescimento econômico.
Caracterizando‑se assim pela ideia de alcançar o desenvolvimento e a autonomia
com base na industrialização.

O crescimento de alguns setores de produção acaba gerando dificuldades


em outros, a demanda nesses setores acaba sendo suprida pela importação.
Com o tempo, esses setores acabam ganhando investimentos e substituindo
as importações, surgindo, assim, a industrialização por partes, que se divide
em quatro setores: bens de consumo leves, bens de consumo duráveis, bens
intermediários e bens de capital.

A implantação do processo de substituição de importação provocou modificações


nas características da economia brasileira, com enfoque na industrialização e no
deslocamento populacional dos meios rurais para os centros urbanos.

Todavia, durante o período de implantação, principalmente nas décadas iniciais,


foram encontrados transtornos diferenciados na implementação do plano, tais como:

25
Capítulo 1

•• tendência ao desequilíbrio externo, que teve várias razões, entre


elas a política cambial que visava a estimular a indústria e baratear
os investimentos, transferindo a renda da agricultura para a indústria.
Uma indústria sem competitividade com a visão de atender somente
o mercado interno e a elevada demanda por impostos, devido ao
investimento industrial e ao aumento da renda;
•• aumento da participação do Estado com as funções de implantação
da legislação trabalhista, definindo direitos e deveres dos trabalhadores
e a relação empregado/ empregador, direcionamento do capital da
agricultura para a indústria, criação de agências estatais, criação
de infraestrutura básica, fornecimento de insumos básicos, criando
setores produtivos estatais como a Companhia Siderúrgica Nacional
(CSN), Petrobras, entre outros, e sistemas de financiamentos públicos
para a captação e distribuição de poupança;
•• aumento do grau de concentração de renda que ocorreu em função
do êxodo rural incentivado pela indústria, fazendo que acontecesse
esse deslocamento do campo para a cidade. Mas os investimentos
nas indústrias não significam mais trabalho, mas sim substituição da
mão de obra assalariada por máquinas, sendo assim, ocorreu um
excedente de mão de obra e baixos salários;
•• escassez de fontes de financiamento pela falta de sistemas
financeiros, pois o sistema restringia‑se a bancos comerciais,
algumas financiadoras e agentes financeiros, como o Banco do
Brasil e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE),
sendo que se operava com recursos de empréstimos compulsórios.

Além da ausência de uma reforma tributária.

Este capítulo mostrou os aspectos históricos relevantes da economia brasileira.


Nele você aprendeu sobre o período mercantilista e os ciclos econômicos do
período colonial. Você estudou o ciclo do café e como ocorreu a integração entre
esse importante ciclo econômico e a evolução da indústria no Brasil. Além disso,
percebeu como foi surpreendente a evolução da economia brasileira a partir do
ciclo do café.

Foi um processo produtivo que criou um modelo financeiro de autossustentação,


e, mesmo após a evolução da indústria no Brasil, continuou num bom patamar,
alimentando o auge das exportações brasileiras na década de 1950 e se mantendo
na liderança nas exportações até os anos 1970. Quando falamos sobre o café,
associamos sua crise à evolução da indústria no Brasil. Isso é um fato provocado
pelo Governo, que buscava uma melhor estrutura para a economia brasileira.
Contudo, observamos nesta unidade que o surgimento da indústria aconteceu por
meio da disponibilidade de recursos provenientes da produção do café.

26
Capítulo 2

Desenvolvimento econômico e
a inflação dos anos 1970 e 1980

Habilidades Este capítulo possibilitará ao(à) aluno(a) entender


o processo evolutivo da produção e dos setores
econômicos no Brasil nas décadas de 1970
e 1980; avaliar a participação na produção
nacional de cada região no Brasil; compreender o
conceito de desenvolvimento econômico e suas
diferenças do crescimento econômico; desenvolver
habilidades de percepção e avaliação do índice de
distribuição de renda no Brasil, compreendendo
o índice de desenvolvimento humano (IDH),
a sua importância e evolução durante os anos
1970 e 1980. Além disso, conhecer a história,
as causas da inflação e os planos econômicos
implantados no Brasil durante a década de 80.

Seções de estudo Seção 1:  Evolução da produção e dos setores


econômicos brasileiros

Seção 2:  A participação regional na produção e o


PIB per capita brasileiro

Seção 3:  Desenvolvimento econômico e a


distribuição de renda no Brasil

Seção 4:  Índice de desenvolvimento humano (IDH)


no Brasil

Seção 5:  Saga brasileira: a luta para domar o dragão

Seção 6:  Os planos de estabilização dos anos 1980

27
Capítulo 2

Seção 1
Evolução da produção e dos setores
econômicos brasileiros
Nesta seção, inicialmente, você analisará o crescimento econômico brasileiro
durante as décadas de 70 e 80. Em seguida, com a análise dos diferentes setores
de produção econômica, você aprenderá sobre o avanço do setor secundário no
Brasil, por meio da industrialização, que gerou profunda mudança na estrutura
econômica brasileira.

1.1 Evolução da produção


Como nossa proposta inicial é avaliar a evolução da produção no Brasil entre
1970 a 1989, vamos, então, com a ajuda do PIB, identificar o crescimento e a
crise econômica nos diferentes períodos históricos.

Figura 2.1 ‑ Variação do PIB do Brasil: 1970 a 1989

Fonte: Adaptação do autor (2014).

Na Figura 2.1 você pôde observar que o período de crescimento da economia


brasileira mais marcante de sua história foi entre 1969 e 1973, conhecido como o
período do “milagre brasileiro”. Durante a década de 1970, passando o período do
incontestável crescimento, o Brasil continuou crescendo. Mas, se você comparar
ao período do “milagre”, vai perceber a queda na produção brasileira, que surge
provocando aumento do desemprego e queda na renda dos trabalhadores.

Na década de 80, apenas em quatro anos foram obtidas taxas de crescimento


significativas (ver Figura 2.1): 1980, com 9,2%; 1984, com 5,4%; 1985, com 7,8%;
1986, com 7,5%.

28
Economia Brasileira

A queda na produção dos demais anos caracterizou a década de 80


como período de recessão. Comparando a crise da década de 80 com os
anos anteriores, somente se observará crise semelhante na década de 30.
Contudo, como nos anos 80 a estrutura econômica brasileira já era muito
diferenciada dos anos 30, o agravamento da crise foi muito maior.

Com o avanço da industrialização no Brasil, houve um grande deslocamento


(imigração) do meio rural para as cidades. Pessoas que deixaram de produzir não só
para os consumidores que estavam na cidade, como para a sua subsistência. Agora,
morando nos centros urbanos, necessitam de poder de compra para se manter.
Então, no momento da crise da década de 80 a situação contou com o agravamento
da dificuldade de emprego para a geração da renda e acesso à produção.

O crescimento da produção dos anos de 1985 a 1987 demonstra a reativação


da economia na década de 80, mas a falta de sustentabilidade leva o Brasil para
outra crise na década de 90. Você aprenderá sobre o desempenho da atividade
econômica de 1990 aos dias atuais, a partir do capítulo 4.

1.2 Evolução dos setores econômicos brasileiros


As produções dentro dos países estão vinculadas aos setores primário, secundário e
terciário. Para analisar os setores da economia brasileira convém lembrar inicialmente
o que representa cada setor.

Setor primário – constituído pelas unidades de produção que utilizam


intensamente recursos naturais, não acrescentando transformações que gerem
substanciais aumentos no valor de seus produtos (não agrega valor).

Setor secundário – constituído pelas unidades dedicadas às atividades


industriais, pelas quais os bens são transformados. Caracteriza‑se pela intensa
utilização do fator de produção capital.

Setor terciário – é composto pelas unidades de produção que tem como função
a prestação de serviços, tais como: educação, saúde, comércio, propaganda etc.
A produção desse setor difere dos demais setores, por não ter forma de material
(ou ser tangível).

Entre os setores da economia, o mais relevante até o início da década de


30 foi o setor primário, relacionado, principalmente, à produção agrícola.

No período colonial, como você viu no capítulo 1, o Brasil passou por diversos
ciclos econômicos como o do açúcar, do ouro etc. Nesse período, não era
permitida a produção de bens manufaturados no Brasil. Até sua independência,
o Brasil ficou caracterizado como uma colônia de exploração.

29
Capítulo 2

A partir de sua independência, em 1822, o ciclo de maior relevância para a


economia brasileira foi o do café, que era o produto de maior desempenho no
processo de exportação. A produção nacional de café chegou a ultrapassar o
quantitativo de consumo mundial.

Conforme você já A crise de 1929 induziu a implantação no Brasil do Processo


estudou na unidade de Substituição de Importação (PSI). A indústria brasileira
anterior, a crise de (setor secundário), a partir da implantação do PSI, entra em
1929, que ficou
ascensão com crescimento em termos percentuais, que
marcada pela queda
da Bolsa de Valores ultrapassou o setor primário na década de 40.
de Nova York, gerou
uma das maiores A Figura 2.2 mostra a participação de cada setor na
crises mundiais produção econômica brasileira no período de 1970 a
provocando um
1989, apresentando total superação do setor primário
abatimento acentuado
nas exportações pelo setor secundário. O avanço do setor secundário está
do café e queda na relacionado ao crescimento industrial estabelecido a partir
economia brasileira. do processo de substituição (PSI).

Figura 2.2 ‑ Composição setorial do PIB compreendendo o período de 1970 a 1989

Fonte: Adaptação do autor (2014).

Observe que os dados da Figura 2.2 são expressos em percentuais, ou seja,


do total produzido quanto representa cada setor da economia. Avaliando em
quantitativos absolutos, o setor primário continua em crescimento. Porém,
também em termos absolutos, o setor secundário tem uma maior produção,
e isso o eleva, colocando o setor à frente em termos percentuais.

O setor primário passa por um contínuo crescimento, e é desse setor que


saem os chamados insumos utilizados pelo setor secundário (indústria),
que transforma o produto, agregando valores. O setor primário está
relacionado também ao mercado internacional, para onde é destinada
grande parcela da produção primária brasileira, como a soja.

30
Economia Brasileira

Mesmo com o significativo e continuado crescimento da produção vinculada


ao setor primário da economia no Brasil, a partir do momento em que o setor
secundário superou o setor primário, surgiu uma profunda mudança na economia
brasileira, ou seja, evoluiu a industrialização, tornando a participação de cada
setor da economia brasileira semelhante aos setores das economias dos
chamados países avançados.

Portanto, mesmo considerando relevante o avanço do setor primário, é por


demais importante o avanço do setor secundário, pois é nesse setor que consta
a incorporação de amplo avanço tecnológico. É o setor secundário que tem o
mérito de alavancar a economia, provocando ainda mais a produção do setor
primário e do terciário.

Veja, como exemplo, uma empresa produtora de calçados que está aumentando
sua produção. Para isso necessitará de couros e outras matérias‑primas advindas
do setor primário. Aumentando a produção de calçados, esses serão repassados
ao setor terciário (serviços) para atendimento ao consumidor final.

Seção 2
A participação regional na produção e o PIB
per capita brasileiro
Nesta seção, você poderá comparar a produção por Estados e regiões no
Brasil, bem como a produção brasileira em relação a outros países, por meio de
dados quantitativos.

Além disso, estudará como evoluiu a produção interna brasileira relacionada ao


quantitativo populacional, denominada PIB per capita.

2.1 A participação regional na produção brasileira


A evolução da participação regional no PIB brasileiro no período de 1970 a 1990 (%),
dados quinquenais a preço constante do ano 2000, é apresentada na Tabela 2.1.

O ranking da importância regional permaneceu inalterado no período 1970 a 1990,


obedecendo à seguinte ordem de importância: sudeste, sul, nordeste, centro‑oeste
e norte.

31
Capítulo 2

Tabela 2.1 ‑ Participação regional no PIB brasileiro no período de 1970 a 1990 (%), a preço constante
do ano 2000

Fonte: Adaptação do autor ( 2014).

A região sudeste concentra a maior produção, ultrapassando em boa parte do


período mais de 60% do PIB brasileiro, sendo que em 1990 detinha 58,8% do
PIB brasileiro.

Todos os resultados das Contas Regionais podem ser acessados pelo link
http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/economia/contasregionais/2011/
default.shtm.

A Figura 2.3 mostra o desempenho da evolução do PIB dos Estados do Sudeste


do Brasil, em milhão de Reais, a preços constantes de 2000, compreendendo o
período de 1970 a 1990.

Durante o período, o Estado de São Paulo permaneceu em primeiro lugar, ao


passar de 112 milhões de Reais em 1970 para 341 milhões de Reais em 1990.
Da mesma forma, o Rio de Janeiro permaneceu em segundo lugar, ao passar de 47
milhões de Reais em 1970 para um pouco mais de 100 milhões de Reais em 1990.

Você deve observar que o Rio de Janeiro, durante todos os anos da década de
1980, manteve praticamente inalterado o seu PIB, próximo de 100 milhões de Reais.

Figura 2.3 ‑ Evolução do PIB dos Estados do Sudeste do Brasil, em milhão de Reais, a preços constantes
de 2000

Fonte: Adaptação do autor (2014).

32
Economia Brasileira

A região Sul concentra a segunda maior produção ultrapassando em boa parte


do período mais de 17% do PIB brasileiro, sendo que em 1990 detinha 18,2% do
PIB brasileiro.

Através da Figura 2.4, é possível visualizar a hierarquia produtiva da região Sul


com o Rio Grande do Sul, como o Estado de maior PIB, seguido de Paraná e
Santa Catarina.

Figura 2.4 ‑ Evolução do PIB dos Estados do Sul do Brasil, a preços constantes de 2000, em milhão
de Reais

Fonte: Elaboração do autor (2014).

Você já deve ter observado nas figuras anteriores (e também poderá observar
nas figuras seguintes) que ocorreu uma redução da atividade econômica no
último ano da série histórica. Isso ocorreu para todas as regiões do Brasil. Como
veremos nos próximos capítulos, o Plano Collor I promoveu uma violenta retração
da economia no ano de 1990, ‑ 4,3% ao ano (a.a.).

A região nordeste corresponde à terceira região de maior concentração de produção


do Brasil, obtendo uma participação regional de 12,86% do PIB, no ano de 1990.
Nesse mesmo ano, os três primeiros Estados produtores, de um total de nove
Estados, detinham 68,20% do PIB regional: Bahia (34,94%); Pernambuco (20,67%);
e Ceará (12,59%).

33
Capítulo 2

Figura 2.5 ‑ Evolução do PIB dos Estados do nordeste do Brasil, a preços constantes de 2000, em milhão
de Reais

Fonte: Adaptação do autor (2014).

As duas últimas regiões iniciam o primeiro ano da série histórica, com uma
participação regional de 6% e encerram o período com 10,1% do PIB brasileiro.
Nessa série histórica de 1970 a 1990, destacam‑se, no Centro‑Oeste, Goiás e o
Distrito Federal, alternando de posição em quatro ocasiões, sendo que em 1990
o Estado de Goiás detinha 16,17 milhões de Reais e o Distrito Federal 14,86
milhões de Reais.

Figura 2.6 ‑ Evolução do PIB dos Estados do Centro‑Oeste do Brasil, a preços constantes de 2000,
em milhão de Reais

Fonte: Adaptação do autor (2014).

Por último, na região Norte, os dois primeiros Estados produtores (ver Figura 2.7)
detêm 78,53% do PIB regional. O primeiro produtor é o Estado do Pará, que
obteve uma produção de 18,98 milhões de Reais, contribuindo com 41,69% do PIB
regional. O segundo produtor é o Estado do Amazonas, que obteve uma produção
de 16,78 milhões de Reais, com uma participação de 36,85% do PIB regional.

34
Economia Brasileira

Figura 2.7 ‑ Evolução do PIB dos Estados do Norte do Brasil, a preços constantes de 2000, em milhão
de Reais

Fonte: Adaptação do autor (2014).

A Tabela 2.2 sintetiza a evolução do PIB das regiões brasileiras no período de


1970 a 1990, a preço constante do ano 2000.

Tabela 2.2 – Evolução do PIB das regiões brasileiras no período de 1970 a 1990, a preço constante do
ano 2000

Fonte: Adaptação do autor, (2014).

O artigo de Barros (2013, p. 447) traz informações sobre as desigualdades


regionais do Brasil:

Apesar de haver várias políticas regionais concebidas ao longo


do século XX tendo como objetivo reduzir as disparidades
regionais, a maioria delas voltou‑se para o subsídio ao capital
ou suporte aos investimentos nas regiões mais pobres. A maior
parte dessas políticas, pelo menos no Brasil, trouxe muito pouco
resultado concreto. As políticas deveriam na verdade estimular
a extensão e melhoria da qualidade da educação nas regiões
mais pobres. De acordo com o que foi visto, esse tipo de política

35
Capítulo 2

teria muito maior probabilidade de reduzir as desigualdades


regionais e eliminaria a sua consequência mais perversa, que é a
desigualdade de oportunidades entre indivíduos.

Para uma discussão detalhada sobre as “desigualdades regionais e o


desenvolvimento econômico”, além da simples participação regional no PIB
brasileiro, recomendo a leitura de Barros (2013, cap. 15). Vale a pena conferir!

2.2 PIB per capita brasileiro


O somatório em termos monetários de toda a produção dos setores da economia,
ou seja, de todos os bens e serviços produzidos dentro do Brasil ou de qualquer
fronteira geográfica em determinado período, chama‑se Produto Interno Bruto (PIB).

Contudo, ao relacionar a produção com a população é possível fazer a


divisão do PIB pelo quantitativo populacional, chegando ao resultado que
leva o nome de PIB per capita (PIB por pessoa).

A Figura 2.8 mostra o PIB per capita no Brasil entre 1970 a 1990. Observe que se a
produção brasileira fosse distribuída igualmente para toda a população, os brasileiros
receberiam os valores representados no eixo da ordenada do gráfico abaixo.

Figura 2.8 – Evolução do PIB per capita no Brasil entre 1970 a 1990, com valores em mil Reais de 2012

Fonte: Adaptação do autor (2014).

Nas duas décadas, a economia brasileira passou por duas fases distintas, em
termos de crescimento econômico. Na década de 1970, apresentou uma das
maiores taxas de crescimento do PIB per capita do mundo. O PIB per capita
cresce rapidamente, partindo de R$9.350,00 em 1970 e chegando a R$15.690,00
em 1970.

36
Economia Brasileira

Ferreira (2013, p. 130) observa que entre 1950 e 1980 a renda per capita brasileira
expandiu‑se a uma taxa de 4,4% ao ano (a.a.), o que representou um aumento de
quase quatro vezes no período.

Qual a diferença existente entre PIB e renda per capita?

Entender essa diferença é importante quando objetivamos comparar


o desempenho do indicador entre regiões. Observe que o PIB inclui a
produção realizada na região, enquanto a renda inclui a renda apropriada
pelos indivíduos.

Você deve notar que, por exemplo, nas regiões mais pobres, os indivíduos
recebem mais renda a partir de transferências do governo. Isso significa
que nessas regiões a renda per capita tende a ser relativamente mais
elevada que o PIB per capita.

Por outro lado, na década de 1980, esse crescimento desapareceu dando lugar
à estagnação e à instabilidade, que caracterizou esse período. Observe que
o PIB per capita de R$16.810,00, em 1980, reduz a R$14.690,00 em 1983 e,
em seguida, com ligeira oscilação, eleva seu valor a R$16.910,00 em 1989.

De acordo com as contas nacionais, a década de 1970 caracterizou‑se por rápido


crescimento, até o início da década de 1980. A partir daí, você observará um
longo período de baixo crescimento (resultado de uma grande desaceleração).

Seção 3
Desenvolvimento econômico no Brasil
Há seis décadas e meia, o Brasil era um país agrícola, com renda per capita muito
baixa e seus indicadores sociais bastante precários. Esse quadro mantinha‑se
desalentador, quando comparado ao desempenho de outros países.

Ferreira (2013, p. 129) aponta para uma resposta positiva:

...nossa renda per capita correspondia somente a 15% da


norte‑americana e encontrava‑se muito abaixo do nível de outros
países latino‑americanos, como Argentina, Venezuela, México e
Colômbia. Ao mesmo tempo, a escolaridade média da população
era a menor da América do Sul, e os indicadores de pobreza e
desigualdade de renda estavam entre os mais elevados.

37
Capítulo 2

Entre 1950 e 1980, o Brasil cresceu a uma das taxas mais elevadas do mundo,
deixando de ser predominantemente rural para tornar‑se urbano. Ocorreu intensa
transferência de recursos da agricultura para setores mais produtivos, como
serviços e indústria.

Você já estudou nas seções 1 e 2 que o crescimento está relacionado ao aumento


da produção, no entanto, o desenvolvimento está vinculado à qualidade de vida
da população.

Para uma melhor qualidade de vida é fundamental a integração entre


o desenvolvimento e o crescimento, pois o desenvolvimento evolui a
partir da socialização do crescimento. Caso o crescimento não seja
socializado, teremos um crescimento econômico não acompanhado do
desenvolvimento.

As condições de vida populacional qualificam se o país é ou não desenvolvido.


Pensando no conceito citado anteriormente, lembre‑se como foi o caso brasileiro
no período do “milagre econômico” que, historicamente, foi o período de maior
crescimento observado no Brasil e caracterizado pela concentração de renda,
nosso próximo assunto.

3.1 Índice de distribuição de renda


O instrumento padrão utilizado para identificar o grau de concentração de renda é
o índice de GINI, que possibilita avaliar a distribuição de renda de um país, região,
Estado ou município.

O índice de GINI varia de 0 a 1, com as seguintes características:

a. quanto mais próximo de zero estiver o valor calculado, melhor é a


distribuição de renda;
b. quanto mais próximo de 1 estiver o valor calculado, mais
concentrada é a renda.

A Tabela 2.3 apresenta o coeficiente de Gini para o Brasil e regiões no período


1970‑1991, estimado a partir do rendimento domiciliar per capita.

38
Economia Brasileira

Tabela 2.3 ‑ Brasil e regiões: coeficiente de Gini (renda domiciliar per capita), 1970‑1991

1970 1980 1991

Norte 0,543 0,589 0,609

Nordeste 0,596 0,618 0,662

Sudeste 0,615 0,584 0,608

Sul 0,574 0,574 0,604

Centro‑Oeste 0,591 0,624 0,648

Brasil 0,639 0,620 0,637


Fonte: Adaptação do autor (2014).

Note‑se que, em 1970, o valor mais alto do coeficiente de Gini era o


brasileiro (0,639), o mais baixo (0,543), o de um Norte com uma economia
ainda dominantemente extrativista.

De acordo com Albuquerque (2007), na década de 1970, o coeficiente de Gini


para o Brasil caiu a 0,30% anuais. Esse resultado refletiu o ocorrido no Sudeste
(variação de ‑0,52% ao ano), mas cresceu no Norte, Centro‑Oeste e Nordeste,
permanecendo estável no Sul.

Entre 1970 e 1980, porém, vários autores encontram discreta elevação no


coeficiente de Gini para o Brasil, quando considerado o rendimento das pessoas
com renda e não a renda domiciliar per capita. Entre eles, BONELLI & SEDLACEK
(variação no Gini de 0,57 em 1970 para 0,58 em 1980, comparada com variação
de 0,50 para 0,57 na década de 1960) e BARROS & MENDONÇA (Gini de 0,56 em
1970 e de 0,59 em 1980).

O que explica esses patamares de desigualdade tão elevados do


coeficiente de Gini no Brasil e suas regiões nos anos de 1970 a 1990?

Albuquerque (2007, p. 21), nos ajuda a responder a questão:

Cabe lembrar, inicialmente, que o coeficiente de Gini (ou o coeficiente


de igualdade, seu complemento para 1) são indicadores de estrutura,
e não de desempenho. Como tais, eles comumente espelham
legados fortemente enraizados na sociedade, que refletem tendências
pesadas o suficiente para inibir ou retardar quaisquer alterações mais
abruptas nas características do organismo social que eles espelham.

39
Capítulo 2

A Figura 2.9 apresenta uma série histórica anualizada do coeficiente de Gini para
o Brasil, no período 1976‑1990.

Figura 2.9 – Índice de Gini do Brasil – IPEA: 1976/1990

Fonte: Adaptação do autor (2014).

O Índice de Gini do Brasil no período entre 1976 a 1990 oscilou um pouco acima
e abaixo de 0,60. No início da série, em 1977, sofre uma redução de 0,62, para
um pouco acima de 0,58 em 1981. Em seguida, o índice apresenta alguma
oscilação ao redor de 0,59 até 1986. A partir desse último ano, esse índice tem
aumento, ano após ano, chegando próximo a 0,64 em 1989.

A tendência revelada foi de relativo agravamento da desigualdade, até início


dos anos 1990, quando se considera a desigualdade nas regiões e quando se
considera o Brasil como um todo constata‑se que a desigualdade manteve‑se
num patamar muitíssimo elevado (entre 0,58 e 0,64).

A quantificação do desenvolvimento para análise da evolução do país ou para


as comparações internacionais pode ser elaborada pelos vários índices, tais
como o índice de pobreza, o índice de desenvolvimento de gênero e o índice de
desenvolvimento humano (IDH). Tais índices permitem a ordenação dos países,
Estados, municípios ou bairros, segundo o grau de desenvolvimento alcançado
em cada um desses aspectos da vida humana.

O IDH é calculado pela combinação de três indicadores: esperança de vida ao


nascer, educação e PIB per capita. Esse é o nosso próximo assunto.

40
Economia Brasileira

Seção 4
Índice de desenvolvimento humano (IDH) no Brasil
O IDH pretende ser uma medida geral, sintética, do desenvolvimento humano e
foi criado por Mahbub ul Haq com a colaboração do economista indiano Amartya
Sen, ganhador do Prêmio Nobel de Economia de 1998.

Segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), o IDH


é um indicador que busca “captar e sintetizar as diversas e complexas dimensões
do processo de desenvolvimento humano”.

Para avaliação do nível de desenvolvimento pelo IDH é utilizada sua expressão


numérica que varia de zero a um. E quanto mais próximo a zero, pior o
nível de desenvolvimento, e quanto mais próximo a um, maior o nível de
desenvolvimento humano.

Para o cálculo do IDH, o Programa das Nações Unidas utiliza uma metodologia
concentrada nas variáveis: esperança de vida, educação e PIB per capita.

A variável esperança de vida é relacionada à longevidade das pessoas ao


nascerem. Portanto, para que o país tenha um melhor índice de esperança de
vida ao nascer, a mortalidade geral tem que ser mantida em declínio.

A variável educação é relacionada ao índice de alfabetização das pessoas


adultas e a taxa de escolaridade, que corresponde às matrículas efetuadas nos
cursos primários, secundários e superior.

Para o ano de 2010, a metodologia para o cálculo do IDH sofreu


modificações. O PNUD substituiu a taxa de alfabetização pela média de
escolaridade e a taxa de matrícula pelos anos de escolaridade esperados
(anos de escolaridade que uma criança pode esperar receber se as taxas
de matrícula permanecer iguais).

O PIB per capita é a expressão monetária da produção do país, Estado,


município ou região, dividida pelo número de habitantes do país, estado,
município ou região. É o indicador de acesso a recursos. Por conseguinte, para
um continuado crescimento do PIB per capita, a produção deve ter sempre um
crescimento econômico maior que o aumento populacional.

41
Capítulo 2

O Programa das Nações Unidas para o desenvolvimento (PNUD) estabeleceu os


índices para três categorias do IDH:

•• 0 ≤ IDH < 0,5 = baixo desenvolvimento humano;


•• 0,5 ≤ IDH < 0,8 = médio desenvolvimento humano;
•• 0,8 ≤ IDH < 1 = alto desenvolvimento humano.

Segundo o IPEADATA (2013), o índice sintético do IDH do Brasil apresentado na


Tabela 2.4 “foi calculado pela média simples de três subíndices, referentes às
dimensões de Longevidade (IDHM‑L), Educação (IDHM‑E) e Renda (IDHM‑R)”.

Tabela 2.4 – Evolução do IDH do Brasil de 1970, 1980 e 1991

1970 1980 1991


IDH do Brasil
0.462 0.685 0.742
Fonte: Adaptação do autor (2014).

Percebe‑se claramente uma melhora no desenvolvimento humano da população


brasileira, em decorrência, principalmente, de um maior acesso ao conhecimento
(especialmente, depois de 1975). O Brasil, ao longo do período1975/91, sempre
se situou na faixa característica de países de médio desenvolvimento humano.

Você pode consultar o Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil (1998), para


obter maiores informações metodológicas.

Desde 2010, quando o Relatório de Desenvolvimento Humano completou


20 anos, as classificações dos países foram baseadas em quartis e
passaram a indicar um IDH muito alto, alto, médio e baixo. Além disso,
o PNUD introduziu o Índice de Desenvolvimento Humano Ajustado à
Desigualdade (IDHAD), que ajusta o IDH à desigualdade na distribuição de
cada dimensão pela população.

Isto significa que o IDH mascara a desigualdade na distribuição do


desenvolvimento humano entre a população no nível de país. Segundo a
instituição PNUD:

O IDH 2010 introduziu o IDH Ajustado à Desigualdade (IDHAD),


que leva em consideração a desigualdade em todas as três
dimensões do IDH “descontando” o valor médio de cada
dimensão de acordo com seu nível de desigualdade. Com a
introdução do IDHAD, o IDH tradicional pode ser visto como
um índice de desenvolvimento humano “potencial” e o IDHAD

42
Economia Brasileira

como um índice do desenvolvimento humano “real”. A “perda”


no desenvolvimento humano potencial devido à desigualdade é
dada pela diferença entre o IDH e o IDHAD e pode ser expressa
por um percentual.

Aqui no Brasil, o IDH tem sido utilizado pelo governo federal e por administrações
regionais por meio do Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDH‑M).

Segundo PNUD, o IDH‑M é um ajuste metodológico ao IDH Global, e foi publicado


em 1998 (a partir dos dados do Censo de 1970, 1980, 1991) e em 2003 (a partir dos
dados do Censo de 2000).

Segundo BNDES (2000), analisando a evolução do IDH‑M observa que:

A evolução do IDH‑M mostra que, em 1970, mais de 90%


dos municípios brasileiros situavam‑se no patamar do baixo
desenvolvimento humano. No nível médio estavam 361
municípios, com 38% da população total do país. Não havia
nesse ano, nem em 1980, nenhum município na faixa de alto
desenvolvimento humano. Já em 1991, 80 municípios do Sul e
Sudeste, além do Distrito Federal, situavam se no patamar do
alto IDH‑M. Neles, viviam cerca de 20% da população brasileira.
A porcentagem da população brasileira em municípios de
baixo IDH‑M caiu de 62%, em 1970, para 22% em 1991. Já a
porcentagem de municípios com baixo IDH‑M passou de 91%
em 1970 para 40% em 1991. (BNDES, 2000)

Você pode consultar o IDH‑M nas respectivas edições do Atlas do


Desenvolvimento Humano do Brasil, que compreende um banco de dados
eletrônico, com informações socioeconômicas sobre todos os municípios e
estados do país e Distrito Federal.

Seção 5
Saga brasileira: a luta para domar o dragão
Ao longo de sua história, o Brasil viveu uma intensa batalha contra o tormento
inflacionário. Segundo vários economistas, o inimigo foi vencido (domado), mas
não morreu.

A colunista e comentarista de economia Mirian Leitão, em seu recente livro


“Saga brasileira”, registra a luta e a “vitória” do povo brasileiro contra a inflação.
Sabemos que nada é definitivo, nem tão pouco a “vitória” conquistada. A única
certeza é que muitas outras batalhas nos aguardam.

43
Capítulo 2

No segundo capítulo intitulado de “Nosso vício, desde o início”, Leitão (2013,


p. 15) relata um breve panorama da aceleração inflacionária do século XX:

Durante quase todo o século XX a inflação subiu. Como o vírus


[dragão, grifo meu] traiçoeiro que se infiltra e se esconde e
confunde para melhor crescer e dominar. Às vezes, parecia ceder:
pequenas quedas e depois novas escaladas. Alguns combatiam,
outros desfaziam. O país teve várias atitudes diante deste
desconforto. Até que ele deixou apenas de ser um desconforto
para ser a mais perigosa ameaça econômica enfrentada pelo país
em sua história republicana.

Se recuarmos mais na história a tendência será concluir que a


inflação é velha como o Brasil. D. João VI cunhando moedas
para financiar o gasto da corte que desembarcou em crise;
D. Pedro fabricando dinheiro para financiar a Independência
proclamada na penúria foram fatos fundadores da velha sina do
tormento monetário.

A República produziu ao nascer uma crise inflacionária que o


país jamais esqueceria: o encilhamento. O primeiro ministro da
Fazenda, Rui Barbosa, permitiu o aumento descontrolado da
emissão da moeda. O trabalho assalariado exigia mais dinheiro
em circulação. Chegavam imigrantes. A nova ordem política tinha
pressa. A convicção era de que melhor seria soltar os cavalos
de corrida para o sucesso republicano. Uma proposta que já
tinha sido considerada no Império foi adotada com radicalismo
que o momento incentivava. Vários bancos ganharam o direito
de emissão monetária. Muito dinheiro circulando produziu
euforia na Bolsa, fortunas instantâneas se formaram, explodiu a
especulação financeira. Nas ruas da Alfândega e Candelária no
Rio todos negociavam freneticamente. Parecia maravilhoso até
que a bolha estourou em crise, falências e altíssima inflação. Isso
marcaria os primeiros anos do novo regime.

Você já sabe que o governo mantém as taxas de juros em patamares elevados


para combater a inflação. Mas nem sempre foi assim. É o que você estudará a
partir de agora!

O déficit do governo, ao longo da década de 1950, é considerado uma das


principais causas da inflação. Depois disso, devido a causas internas e externas,
o processo inflacionário passou a ter um caráter crônico.

Na década de 1980, o diagnóstico da inflação no Brasil passou a ser a indexação


da economia, ou seja, todos os preços (salários, aluguéis, contratos etc.) eram
corrigidos pela inflação passada, a chamada “inflação inercial”.

44
Economia Brasileira

Bacha (2012, p. 12) cita a proposição de alguns economistas para lidar com uma
inflação tão alta, uma vez restaurada a democracia:

Bulhões propôs um “choque ortodoxo”, contemplando a supressão


da correção monetária da dívida interna acompanhada de
forte contenção da oferta de moeda. Francisco Lopes replicou
com a proposta de um “choque heterodoxo”, envolvendo o
congelamento temporário de preços e salários. Persio Arida
defendeu a neutralização da inflação através de graus mais
elevados de indexação. André Lara Rezende propôs a criação de
uma moeda com paridade fixa em relação ao dólar. Ela circularia
concomitantemente com o cruzeiro, que continuaria a se depreciar.
A ideia era permitir que os agentes econômicos migrassem
voluntariamente para essa nova moeda, desde que abandonassem
qualquer cláusula de indexação, dando assim fim à inflação
aparentemente sem traumas.

Assim, para combater a inflação, os planos econômicos de estabilização tinham


como objetivo, quebrar a expectativa inflacionária. Vieram então os planos
Cruzado (I e II), Bresser, Verão, Collor (I e II) e o Plano Real. Com exceção do último
plano citado, todos os demais fracassaram na sua intensão de domar o dragão.

José Murilo de Carvalho comenta na orelha do livro de Leitão (2013. p. 17):

13,3 trilhões por cento foi a inflação acumulada nos 15 anos


que antecederam o Plano Real. O país teve cinco moedas entre
1986 e 1994. Para os brasileiros, isso significou instabilidade de
preços, indexações, congelamentos, tabelamentos, confisco de
poupança, privações, insegurança.

Mas este é um país que sofre de Alzheimer. Passados 16 anos


[20 anos, grifo meu] do Plano Real, as novas gerações não têm
noção do que foram os anos de hiperinflação. Para as mais
velhas, eles já se esfumam no horizonte. No entanto, lembrar
é preciso. Se o manto do esquecimento não deve acobertar a
passada violência política, também não pode ocultar os males
causados ao país pelo descontrole inflacionário.

Mas você saberia responder quais são as causas da inflação no Brasil?

Muitas são as causas da inflação brasileira. No entanto, destaca‑se


inicialmente a necessidade de recursos para fomentar o crescimento
econômico do país. Esse quadro levou o governo a emitir moeda,
consequentemente, tal medida gerou inflação de demanda.

45
Capítulo 2

Você sabe por que o Brasil precisava captar dinheiro lá fora?

Após a 2ª Guerra Mundial o Brasil precisava crescer. O país importava a maioria


dos bens de consumo que não possuía a capacidade de produzir internamente.
Assim, era necessário um grande volume de recursos para investir em
infraestrutura (estradas, portos, energia etc.), para o desenvolvimento do país.

Assim, para financiar os desequilíbrios orçamentários, os governos emitiam moeda


ou captavam recursos externos, por meio de financiamentos ou empréstimos.

Leitão (2013, p. 17) observa que nos anos 1950 surgiu a ideia de que a inflação
era considerada um combustível para o crescimento. Os ministros que queriam
controlar as causas dos problemas eram trocados por outros que propunham
expansão dos gastos.

Os economistas defendiam que a causa da inflação nas décadas de 1960 e 1970


era basicamente o desequilíbrio nas contas públicas. Dessa forma, propunham
medidas como:

•• redução dos gastos públicos;


•• políticas salariais restritivas (arrocho salarial);
•• controle da oferta monetária (menos moeda na economia).

Leitão (2013, p. 18) lembra que o povo brasileiro cantou a música de


Paulinho da Viola, tema da novela “Pecado capital”, em meados dos anos
1970. Era um reclamo pela perda de valor do dinheiro, cujo verso mais
famoso entoava “Dinheiro na mão é vendaval”. Em seguida, a música
“Saco de feijão”, de Francisco Santana, fez sucesso no ano de 1977.

As crises do petróleo em 73 e 79 agravaram ainda mais o problema da inflação,


levando o país a entrar em recessão no início dos anos 80. As letras das músicas
de Paulinho da Viola e Francisco Santana serviram de aviso, pois se ia ao
supermercado com cada vez mais dinheiro para trazer cada vez menos produto.

A Figura 2.10, a seguir, apresenta o comportamento da Inflação medida pelo


IGP‑di (% a.a.), no período de 1970 a 1990.

46
Economia Brasileira

Figura 2.10 ‑ Comportamento da Inflação medida pelo IGP‑di (% a.a.) no período de 1970 a 1990

Fonte: Adaptado de IPEADATA (2014).

O Brasil é um exemplo relativamente recente a experimentar os efeitos de


uma inflação alta e até de uma hiperinflação. Segundo FMI, “entre 1985 e
1995, a oferta de moeda e o nível de preços no Brasil cresceram em estreito
paralelismo e por um montante enorme”. Ambos aumentaram próximos de
100 bilhões por cento.

Krugman (2007, p. 697) pergunta e responde sobre os preços e a impressão de


moeda no período 1985 e 1995:

Por que o governo brasileiro aumentou sua oferta de moeda


de forma tão excessiva ao longo de uma década? A razão em
última instância, está no conflito político que tornou impossível
que o governo do país conseguisse equilibrar seu orçamento,
seja aumentando impostos, seja cortando gastos. Dificuldades
financeiras durante os anos 80 impediram o Brasil de tomar
dinheiro emprestado nos mercados internacionais. Como muitos
outros antes dele, o governo do Brasil recorreu à impressão
de dinheiro para cobrir o hiato, levando a uma inflação maciça.
(KRUGMAN, 2007, p. 697).

Na segunda metade da década de 80, os governos decretavam “planos de


estabilização”, tentando conter as pressões inflacionárias, que nessa época
atingiram índices elevadíssimos.

47
Capítulo 2

Seção 6
Os planos de estabilização dos anos 1980
Os planos de estabilização, também chamados de “pacotes”, continham diversas
medidas de política econômica (monetária, fiscal, cambial e creditícia), visando a
estabelecer o controle dos preços e, consequentemente, a estabilização da economia.

Você estudará uma síntese do que foram esses planos: o Cruzado (1986),
o Bresser (1987) e o Verão (1989).

6.1 Plano cruzado


Na presidência de José Sarney, a proposta aceita para controlar a inflação foi
o Plano Cruzado. Bacha (2012, p. 14) observa que o Plano Cruzado tinha a
atratividade da simplicidade, ao propor uma troca de moeda acompanhada de
congelamento de preços e salários, e era similar a planos que haviam dado certo
em Israel e pareciam estar funcionando também na Argentina.

Esse plano foi implantado em fevereiro de 1986, como tentativa de debelar a


escalada inflacionária que, medida pelo IGP‑di, atingiu 235% em 1985.

Entre as principais medidas adotadas, destacam‑se:

•• alteração da unidade do sistema monetário, com o corte de


três zeros, passando a denominar‑se Cruzado (Cz$), com valor
correspondente a Cr$ 1.000,00 (mil cruzeiros);
•• congelamento de preços a partir daquela data, com exceção da
energia elétrica, que foi reajustada em 20%;
•• congelamento dos salários pela média de seu valor dos últimos
seis meses, acrescido de um aumento de 8%. O salário mínimo foi
fixado em Cz$ 804,00, e como os demais salários, congelado por
um ano;
•• substituição da ORTN (Obrigação Reajustável do Tesouro Nacional),
pela OTN (Obrigação do Tesouro Nacional), cujo valor foi fixado
em Cz$ 106,40, congelado por um ano. Foi criado o IPC (Índice de
Preços ao Consumidor) para corrigir a poupança e as aplicações
financeiras superiores a um ano;
•• adoção de uma tabela de conversão para transformar as dívidas
contraídas antes do plano, expurgando os juros da inflação passada;
•• a fixação da paridade Cz$ 13,77 por dólar;
•• criação do seguro‑desemprego, com o objetivo de amenizar os efeitos
das demissões que ocorressem em virtude da falência das empresas;

48
Economia Brasileira

•• os salários passaram a ser reajustados por um mecanismo


denominado “gatilho salarial”, que estabelecia o repasse automático
do índice de inflação, sempre que ela atingisse 20%.

Após seu lançamento, o Plano Cruzado provocou muita esperança no povo


brasileiro. Havia a sensação de que as medidas implantadas realmente
conseguiriam estabilizar os preços e o país iniciaria uma nova fase econômica.

Em alguns meses, no entanto, os problemas começaram a surgir, entre os quais


se destacam:

•• o congelamento não atingiu todos os preços da economia, haja vista


que, enquanto alguns preços sofreram reajustes pouco antes do
plano, outros foram congelados com preços defasados, como foi o
caso das tarifas públicas;
•• o congelamento das tarifas públicas prejudicou a arrecadação do
Governo, aumentando ainda mais o déficit público;
•• os empresários começaram a “maquiar” os produtos, como forma
de escapar do congelamento.
•• a eliminação da correção monetária e, consequentemente, a redução
das taxas de juros nominais estimulou o consumo e inibiu a poupança;
•• a taxa cambial permaneceu congelada durante nove meses,
enquanto vários preços se elevaram no mercado interno,
estimulando as importações e desestimulando as exportações.

Entende‑se por maquiar As eleições de novembro de 86 impediram que o Governo


o ato de substituir um tomasse medidas para corrigir as distorções do plano.
produto da lista do
congelamento por outro O governo obteve sucesso nas eleições, porém, em
com especificações
novembro, após as eleições, com o Plano Cruzado II,
diferentes (embalagens,
volume, nome etc.), promoveu o descongelamento dos preços de produtos
mas que na realidade é e serviços. Houve um aumento generalizado de preços,
o mesmo produto, para provocando a volta da inflação.
poder alterar o preço.
Dessa maneira, o mecanismo do “gatilho salarial” é
acionado, causando mais pressão inflacionária.

O aumento do consumo, taxas de juros elevadas, debilidade das contas públicas,


perda das reservas cambiais, levam à decretação da moratória, em fevereiro de 1987.

Em abril de 1987, o ministro da Fazenda Dilson Funaro é substituído por Luís


Carlos Bresser Pereira.

49
Capítulo 2

6.2 Plano Bresser


A retomada do processo inflacionário e a evolução do déficit público exigiram
novas medidas. Em junho de 1987, após a inflação, medida pelo IGP‑di, atingir
415,83 % nos últimos 12 meses, o Governo decreta o Plano Bresser.

O Plano Bresser adotou um novo congelamento e a eliminação do sistema


de reajuste automático de salários, o “gatilho salarial”.
Dessa vez os preços
das tarifas públicas
Em contrapartida, houve aumento de impostos e
foram reajustados antes redução dos gastos do Governo para tentar controlar o
do plano. Os salários déficit público.
foram congelados por
três meses, nos valores O plano estava focado nas seguintes medidas:
de 12/6, sendo que o
congelamento de preços e salários por um prazo de
resíduo da inflação seria
pago em seis parcelas 90 dias. Após esse período, adoção de um prazo de
a partir de setembro. flexibilização de preços, seguido, então, pela liberação
definitiva dos preços.

•• criação da Unidade de Referência de Preços (URP), para reajustar


os salários e determinar os tetos para os reajustes de preços,
cujo valor foi fixado em NCz $ 100,00 a partir de 15/6/87, ficando
congelado por 90 dias;
•• aplicação da “tablita” nos contratos firmados antes do plano, com
taxas pré‑fixadas;
•• nos três meses seguintes, a URP foi reajustada a uma taxa fixa
determinada pela variação média mensal do Índice de Preços ao
Consumidor (IPC), ocorrida durante o período de congelamento;
•• adoção de uma política monetária e fiscal austera, com a intenção
de reduzir o déficit público e impedir o crescimento da demanda,
ocorrido no plano anterior.

O plano obteve um relativo sucesso em termos de controle da inflação, assim


como a recuperação do saldo da balança comercial. Por outro lado, o déficit
público não foi contido e a produção industrial caiu.

A partir de setembro, a tentativa de reajuste dos preços das tarifas públicas


trouxe novas pressões inflacionárias, que foram aceleradas pelos reajustes
mensais dos preços e salários. A Tabela 2.5 ilustra o comportamento da inflação
mensal em 1987.

50
Economia Brasileira

Tabela 2.5 ‑ Índice da inflação medido pelo IGP‑di, em 1987

Mês IGP‑di (%) Mês IGP‑di (%)

Janeiro 12,04 Julho 9,33

Fevereiro 14,11 Agosto 4,50

Março 15,00 Setembro 8,02

Abril 20,08 Outubro 11,15

Maio 27,58 Novembro 14,46

Junho 25,87 Dezembro 15,89


Fonte: Revista Conjuntura Econômica – FGV(1987).

No final de 1987, a retomada da inflação levou à substituição de Bresser Pereira.


Em dezembro, assume o cargo Maílson da Nóbrega.

6.3 Plano verão


O ministro Maílson da Nóbrega manteve, durante o ano de 1988, uma política
econômica sem grandes medidas de impacto, a chamada “política do
feijão‑com‑arroz”. O IGP‑di iniciou o ano em 19,14% e atingiu 28,89% em
dezembro, totalizando 1.037,56 % em dose meses.

O fracasso na condução dessa política levou o Governo a decretar, em


janeiro de 1989, o Plano Verão. Novamente houve uma mudança no
padrão monetário, com a introdução do Cruzado Novo (NCz$), equivalente
a Cz$ 1.000,00.

As principais medidas do plano foram:

•• adoção de uma política recessiva, com redução dos gastos públicos,


restrições ao crédito e aumento das taxas de juros, com o objetivo
de conter a demanda agregada;
•• congelamento de preços de produtos e serviços por tempo
indeterminado;
•• os salários foram congelados pela média dos últimos 12 meses,
sofrendo um reajuste de 26,1% e a URP, que corrigia os salários,
foi extinta;

51
Capítulo 2

•• desvalorização e congelamento da taxa cambial em 18%


(US$ 1,00 = NCz$ 1,00);
•• extinção da OTN e criação dos Bônus do Tesouro Nacional (BTN).

O BTN foi criado pela Mais uma vez a tentativa de acabar com a inflação não
medida provisória obteve êxito. Em primeiro lugar, o governo não conseguiu
nº 48, e teve seu valor
fixado em Cz$ 1,00.
realizar o ajuste fiscal. Em segundo lugar, algumas novidades
introduzidas pela Constituição de 1988 trouxeram ganhos na
renda dos trabalhadores, incentivando o consumo.

Finalmente, as eleições no final de 1989 impossibilitaram a adoção de medidas


mais drásticas para conter a escalada do déficit público e, consequentemente,
da inflação.

Até aqui você estudou sobre as principais causas da inflação e que nos anos de
1980, o governo implantou vários planos de estabilização econômica.

A Figura 2.11 exibe o comportamento da inflação mensal medida pelo IGP‑di,


no período 1985‑90, com destaque para o momento da adoção dos planos de
estabilização (Cruzado, Bresser e Verão).

Figura 2.11 ‑ Inflação mensal medida pelo IGP‑di, no período 1985‑90

Fonte: Adaptado de IPEADATA (2014).

Vimos os principais pontos dos planos Cruzado, Bresser, e Verão. Todos esses
planos tinham características próprias, porém, todos eles tinham o mesmo
objetivo: controlar a inflação. Todos foram implantados e sem alcançar os
resultados almejados.

52
Economia Brasileira

É bom lembrar que em 1989 comemorávamos os 100 anos da Proclamação


da República, que nos seus primeiros anos produziu uma crise inflacionária: o
encilhamento. Assim como lá atrás, o objetivo de domar o dragão exigiu mais
algum tempo (os esforços durante a década de 1980 não foram suficientes!).
Os detalhes dessa travessia serão abordados nos próximos capítulos.

53
Capítulo 3

Setor externo: o balanço


de pagamento e a crise da
dívida externa

Habilidades Este capítulo possibilitará ao(à) aluno(a) conhecer a


evolução do balanço de pagamentos nas décadas
de 1970 e 1980; conhecer os efeitos da política
cambial sobre a balança comercial e identificar
as principais causas da dívida externa brasileira.
Além disso, visa a desenvolver habilidades
para a análise e a compreensão da evolução
e a composição da dívida externa nas últimas
décadas, bem como a compreensão de como
o Brasil se inseriu na economia internacional no
período. Entender a importância do agronegócio
nas exportações brasileiras e as principais barreiras
impostas sobre esses produtos. Por último,
aprender noções básicas sobre conceitos, evolução
e funcionamento do sistema financeiro brasileiro.

Seções de estudo Seção 1:  Evolução do balanço de pagamentos

Seção 2:  Histórico da dívida externa brasileira

Seção 3:  A crise da década de 80

Seção 4:  Composição do comércio exterior e


suas barreiras.

Seção 5:  Sistema financeiro brasileiro

55
Capítulo 3

Seção 1
Evolução do balanço de pagamentos
Na economia mundial existe alguma nação que apresente condições de produzir
todos os bens e serviços de que necessita? A resposta, com certeza, é negativa
para a grande maioria das nações, o que faz surgir a necessidade de as nações
estabelecerem trocas entre si.

Como você sabe, o balanço de pagamentos é de suma importância para a


economia de um país. Essa ferramenta pode ajudar o governo a adotar medidas
visando ao saneamento das contas externas, cujos desequilíbrios podem ser
causados por fatos internos ou externos.

O balanço de pagamento é o registro de todas as transações relacionadas a


produtos, bens, serviços e capitais, entre um país e o resto do mundo. Aqui no
Brasil, Mariano (2012, p. 56) observa que “o Banco Central, em colaboração com
o IBGE, é o órgão responsável pela elaboração do balanço de pagamento”.

Os recursos disponíveis de uma nação devem ser suficientes para efetuar o


pagamento dos capitais que deixam o país.

O que o governo pode fazer quando existe uma situação de desequilíbrio


no balanço de pagamentos?

Mariano (2012, p. 61) aponta as seguintes medidas para minimizar a situação de


déficit no balanço de pagamentos. Observe a seguir:

a. Na balança comercial
»» Ampliar as exportações por meio de incentivo ao setor exportador;
»» Reduzir as importações por meio da taxação e de impostos
sobre os produtos;
»» Pressionar as empresas para promoverem processos de
nacionalização de componentes na produção;
»» Promover desvalorizações cambiais.

b. Na conta de serviços e rendas


»» Exercer maior controle com relação à remessa de lucros
ao exterior;
»» Empreender medidas que reduzam os gastos dos turistas
brasileiros no exterior.

56
Economia Brasileira

c. Na conta capital e financeira


»» Obter empréstimos;
»» Estimular a entrada de investimentos no país.

Com relação ao país que possui déficit em transações correntes, Leite (2011,
p. 32) observa que:

- com déficit em transações correntes, o país fechará o saldo do


balanço de pagamentos com a entrada de capitais autônomos ou
compensatórios. Se o país receber capital autônomo além do seu
déficit em conta corrente, ocorrerá um superávit total no balanço
de pagamentos;
- o excesso de capital não será absorvido pela economia, ficará
depositado no exterior sob a forma de reservas adicionais, como
uma provisão para o futuro. Mas, se o país não recebe capital
suficiente para cobrir o déficit em conta corrente, terá que
usar os capitais acumulados anteriormente. Se esses capitais
provisionados não forem suficientes, o país terá que recorrer
aos empréstimos do FMI, por exemplo, ou contabilizar como
atrasados comerciais, que implica em “sujar” a imagem do país
no exterior. ( LEITE,2011, p. 32)

Nesta seção você estudará como o balanço de pagamentos brasileiro se


comportou nas décadas de 1970 e 1980 e as várias medidas de ajuste do
balanço de pagamentos, entre as quais a desvalorização cambial, muito utilizada
no Brasil.

Para um melhor entendimento, a evolução do balanço de pagamentos no Brasil


está dividida em períodos, para que você tenha uma visão mais clara do tema.

1.1 Evolução do balanço de pagamentos (1970/1980)


É muito importante a relação do país com o resto do mundo, tendo em vista
que é por intermédio dela que se obtêm as divisas necessárias para pagar os
compromissos externos (pagamento das importações, amortização da dívida
externa, pagamento dos juros etc.). Essa relação não é fácil, pois a dependência
do Brasil de capitais externos traz problemas para a economia do país.

O grande volume de capitais que saem do país anualmente para pagar juros e
amortizar a dívida pode ser compensado por dólares que entram por meio de
exportações. Por isso, o desempenho da balança comercial passou a ser de vital
importância para o país.

57
Capítulo 3

Durante o milagre econômico (1968‑1974), o governo brasileiro adotou várias


medidas para incrementar o comércio exterior, tais como:

•• política cambial caracterizada por minidesvalorizações da taxa


de câmbio;
•• incentivos fiscais (crédito de IPI e depois do ICM);
•• isenção de Imposto de Renda nas vendas ao exterior;
•• assistência financeira (linhas de crédito).

Desvalorização é o mecanismo de política cambial caracterizada


pela redução oficial do valor da moeda do país em relação a moedas
estrangeiras. Tem como principal objetivo eliminar o déficit acumulado no
balanço de pagamentos. Dependendo do percentual de desvalorização,
o mercado costuma classificá‑la de maxi, midi ou minidesvalorização.
(SANDRONI, 1999).

A Tabela 3.1 apresenta o desempenho de contas selecionadas do Balanço de


pagamentos do Brasil, em US$ bilhões, para o período de 1970 a 1980.

Tabela 3.1 – Balanço de Pagamentos do Brasil em US$ Bilhões: 1970 a 1980

1970 1971 1972 1973 1974 1975 1976 1977 1978 1979 1980
‑ Balança
0.2 ‑0.3 ‑0.2 0.0 ‑4.7 ‑3.5 ‑2.3 0.1 ‑1.0 ‑2.8 ‑2.8
comercial (Fob)
 Exportação
2.7 2.9 4.0 6.2 8.0 8.7 10.1 12.1 12.7 15.2 20.1
de bens
 Importação
‑2.5 ‑3.2 ‑4.2 ‑6.2 ‑12.6 ‑12.2 ‑12.4 ‑12.0 ‑13.7 ‑18.1 ‑23.0
de bens
‑ Serviços
‑1.1 ‑1.3 ‑1.5 ‑2.1 ‑2.8 ‑3.5 ‑4.2 ‑4.9 ‑6.0 ‑7.9 ‑10.1
e Rendas
‑ Transferências
unilaterais 0.0 0.0 0.0 0.0 0.0 0.0 0.0 0.0 0.1 0.0 0.1
Correntes
Transações
‑0.8 ‑1.6 ‑1.7 ‑2.1 ‑7.5 ‑7.0 ‑6.4 ‑4.8 ‑7.0 ‑10.7 ‑12.7
correntes
Conta capital
1.3 2.2 3.8 4.1 6.5 6.4 8.5 6.2 11.9 7.6 9.6
e financeira
Resultado
0.5 0.5 2.5 2.4 ‑1.0 ‑1.1 2.7 0.7 4.3 ‑3.2 ‑3.5
do balanço
Fonte: Adaptado de Banco Central do Brasil (2014).

58
Economia Brasileira

Os reflexos dessas medidas representaram um crescimento médio de 27% ao


ano nas exportações nesse período (1968‑1974). As importações acompanharam
o mesmo ritmo, o que significou um equilíbrio no saldo da balança comercial.

A evolução no déficit da balança de serviços foi compensada pela balança de


capitais, que registraram um aumento na entrada de investimentos diretos e
empréstimos para financiar o crescimento do país nesse período (o país teve
crescimento médio do PIB de 10% ao ano).

Em 1973, a primeira crise do petróleo interrompeu essa fase de intenso


crescimento da economia brasileira, afetando o equilíbrio da balança de
pagamentos, haja vista que o Brasil nessa época importava grande parte do
petróleo que consumia.

O governo brasileiro, com o objetivo de não interromper a boa fase de


crescimento da economia, não reduziu o consumo de petróleo, como
fizeram os demais países, resultado: o déficit na balança comercial em 1974
Petrodólares: termo
chegou a US$ 4,7 bilhões. A Balança de Serviços, e,
utilizado para designar consequentemente, o saldo das transações correntes
os dólares provenientes acompanharam o mesmo déficit.
da venda de petróleo.
A elevação do preço Como havia muita liquidez no mercado internacional
do barril de petróleo
(os chamados petrodólares) mais uma vez, esse déficit
resultou em um
aumento significativo foi coberto pelos capitais externos. Esse seria um fator
de capitais oriundos fundamental para o endividamento externo brasileiro.
dos países membros da
OPEP (Organização dos Como você pôde observar na Tabela 3.1, nesse período
Países Exportadores há um aumento na entrada de capitais no país, porém,
de Petróleo), que
eram aplicados no
acompanhado de um aumento na saída de capitais,
mercado internacional, via importações e balança de serviços.
sendo que muitos
desses recursos Giambiagi (2011, p. 77), ao tratar do conturbado contexto
vieram para o Brasil. internacional de 1974 a 1984, observa:

Em meados de 1979, um segundo choque dos preços do


De acordo com petróleo interrompeu, dessa vez de forma duradoura, o fluxo
Lacerda (2013, p. 138), de capital dos países industrializados para aqueles em
“a prime rate, ou taxa desenvolvimento. Por decisão da OPEP, o preço do barril
referencial de juros, no mercado internacional saltou da média de US$13,60 em
é cobrada pelos 1978 para US$30,03 em 1979 e US$35,69 no ano seguinte.
bancos americanos
Visando a conter os efeitos inflacionários do segundo choque
dos clientes com
do petróleo, os bancos centrais dos países industrializados,
melhores avaliações
em geral, elevaram suas taxas básicas de juros. Nos Estados
de créditos”. A maior
parte dos empréstimos Unidos, esta subiu continuamente até 1981, quando atingiu
internacionais utilizam 16,4% ao ano – mais que o dobro dos 7,9% ao ano vigente antes
como referência essas do choque. A prime rate, usada como taxa de referência nos
taxas básicas. empréstimos (domésticos e externos) dos bancos americanos,

59
Capítulo 3

seguiu trajetória semelhante, saltando para 18,9% em 1981.


O novo patamar das taxas de juros inaugurou uma fase de
recessão nos países industrializados, que se estendeu, na
maioria deles, até 1982.

Você deve lembrar também que para países pobres e com altas dívidas, são
cobrados juros bem acima dessas taxas básica, dependendo da avaliação do
risco da operação.

Finalmente, a segunda crise do petróleo em 1979 agravou ainda mais a questão


da dívida externa.

1.2 Evolução do balanço de pagamentos (1980/1990)


A década de 80, por muitos chamada de a “década perdida”, sofreu os efeitos
do endividamento externo. A economia brasileira entrou numa grande recessão
nesse período. Os efeitos dessa crise levaram o Brasil a recorrer ao Fundo
Monetário Internacional (FMI) em 1982 e a decretar a moratória em 1987.

A elevação das taxas de juros internacionais sobre os empréstimos tomados


na década anterior resultou num sério desequilíbrio das contas externas, como
mostra a Tabela 3.2 a seguir.

De 1981 a 1983 a economia brasileira entrou em recessão. Esse fato provocou a


debilidade das contas externas que apresentaram os seguintes pontos:

•• saída expressiva de dólares para pagar juros;


•• redução da entrada de capitais externos no Brasil, que foram
desviados para os EUA em função da elevação das taxas de juros
naquele país;
•• redução das reservas cambiais para fechar o balanço de pagamentos.

Diante desse quadro, em 1983, o governo provocou uma


maxidesvalorização na taxa cambial. Essa medida causou impacto
na balança comercial, aumentando as exportações e reduzindo as
importações. O saldo da balança comercial começou a apresentar
superávits significativos a partir daí.

A crise da dívida externa brasileira mostrou como é perigoso para o país


compensar os déficits nas transações correntes com empréstimos externos.
Após algum tempo, todo o esforço exportador do país é totalmente absorvido
pelo pagamento dos juros da dívida.

60
Economia Brasileira

A escalada inflacionária nesse período resultou na implantação do Plano Cruzado


em 1986. O congelamento de preços adotado pelo plano aumentou o poder de
compra dos salários e provocou um aumento da demanda agregada. O aumento
do consumo, aliado ao congelamento do câmbio, prejudicou a competitividade
das exportações brasileiras, e o volume das importações voltou a subir
gradativamente até o final da década.

Você deve lembrar que nesse período o país passou por vários planos
econômicos que tentaram conter a inflação, que, no entanto, não obtiveram êxito,
não é mesmo?

Todos tinham em comum a preocupação com o problema das contas


externas. Por conta disso, o país vivenciou várias desvalorizações cambiais.

A partir de 1987, os superávits da balança comercial conseguiam cobrir os


capitais que saíam do país por intermédio da balança de serviços.

Tabela 3.2 – Balanço de Pagamentos do Brasil em US$ Bilhões: 1980 a 1990

1980 1981 1982 1983 1984 1985 1986 1987 1988 1989 1990
‑ Balança
‑2.8 1.2 0.8 6.5 13.1 12.5 8.3 11.2 19.2 16.1 10.8
comercial (Fob)
 Exportação
20.1 23.3 20.2 21.9 27.0 25.6 22.3 26.2 33.8 34.4 31.4
de bens
 Importação
‑23.0 ‑22.1 ‑19.4 ‑15.4 ‑13.9 ‑13.2 ‑14.0 ‑15.1 ‑14.6 ‑18.3 ‑20.7
de bens
‑ Serviços
‑10.1 ‑13.1 ‑17.0 ‑13.4 ‑13.2 ‑12.9 ‑13.7 ‑12.7 ‑15.1 ‑15.3 ‑15.4
e Rendas
‑ Transferências
unilaterais 0.1 0.2 0.0 0.1 0.2 0.1 0.1 0.1 0.1 0.2 0.8
correntes
Transações
‑12.7 ‑11.7 ‑16.3 ‑6.8 0.1 ‑0.2 ‑5.3 ‑1.4 4.2 1.0 ‑3.8
correntes
Conta capital
9.6 12.7 12.1 7.4 6.5 0.2 1.4 3.3 ‑2.1 0.6 4.6
e financeira
Resultado
‑3.5 0.6 ‑4.5 0.0 7.0 ‑0.5 ‑3.8 1.0 1.2 0.9 0.5
do balanço
Fonte: Adaptado do Banco Central do Brasil (2014)).

A crise da dívida externa no início da década de 80 provocou uma retração na


entrada de capitais no país, diferente da década anterior, na qual houve uma
entrada maciça de capitais estrangeiros.

61
Capítulo 3

Como mostra a Tabela 3.2, nesse período havia mais saída do que entrada de
capitais no país. Assim, o balanço de pagamentos passou a apresentar déficits
significativos, destacando‑se o ano de 1986, cujo montante ultrapassou os
US$ 3,8 bilhões.

Giambiagi (2011, p. 78) menciona como resultado desse novo cenário internacional
o racionamento do crédito para os países altamente endividados e a deflagração
da “crise da dívida” latino‑americana. Lembrou o caso do México, primeiro país
latino‑americano a declarar moratória em agosto de 1982, e também o longo
período de estancamento do fluxo de capital para os países em desenvolvimento.

Em resumo, nas condições relatadas até aqui, a compensação dos déficits


em conta corrente por superávits na conta de capital, como se fez durante o
“milagre”, não era mais possível.

Seção 2
Histórico da dívida externa brasileira
Uma das consequências das relações econômicas do país com o resto do mundo
é a dívida externa. Você já parou para pensar o que compõe a dívida externa?

A dívida externa representa o somatório dos débitos de um país garantidos


pelo governo. Essa dívida é resultante de empréstimos e financiamentos
contraídos com entidades financeiras internacionais, como o Fundo Monetário
Internacional (FMI), Banco Mundial (BIRD), Banco Interamericano de
Desenvolvimento (BIRD), bancos e empresas privadas.

Os capitais externos são obtidos por meio de empréstimos, quando não possuem
uma destinação específica, ou na forma de financiamentos, quando estão
vinculados a programas e projetos de investimentos específicos que necessitam
de aprovação (construção de estradas, hidrelétricas etc.) para serem liberados.

Em relação às empresas privadas, o endividamento ocorre com aval do governo


para o fornecimento das divisas que servirão para amortizações e pagamento
dos juros.

A dívida externa é classificada de acordo com o seu prazo:

•• dívida registrada – são os empréstimos e financiamentos cujo prazo


de vencimento é superior a um ano. São os chamados capitais de
médio e longo prazo;

62
Economia Brasileira

•• dívida não registrada – são os financiamentos com prazo de


vencimento inferior a um ano. São os chamados capitais de curto
prazo, geralmente destinados a operações de exportação.

A dívida externa pode ser considerada dívida externa bruta quando ela inclui as
reservas internacionais, e dívida externa líquida, quando se excluem as reservas.

Lacerda (2013, p. 108) discorre que “no campo contábil, o estoque da dívida
externa bruta é o resultado acumulado da parcela dos déficits em transações
correntes não financiados pelo ingresso de capitais de risco ou pela redução das
reservas internacionais do país”.

Historicamente, o Brasil sempre foi dependente do capital externo. Na realidade,


a dívida externa brasileira não é um fato recente, ela antecede ao período republicano.
Os desequilíbrios orçamentários acentuaram‑se no final do século XIX, e levaram o
Brasil a declarar moratória em 1889.

O capital externo serviu para impulsionar o desenvolvimento durante o


auge do ciclo do café, porém, significou um grande endividamento do
país. Apesar do crescimento das receitas com as exportações do café,
com o passar do tempo elas não eram mais suficientes para pagar os
juros dessa dívida.

A partir daí, vários períodos da história brasileira evidenciam a tendência do país em


buscar recursos externos para fomentar o crescimento, mas que, gradativamente,
agravaram a situação do país junto aos credores internacionais, observe:

•• no governo de Getúlio Vargas – com o PSI (Processo de


Substituição de Importações) e a implantação de uma indústria
de base (criação de estatais nos setores de siderurgia, petróleo,
mineração etc.);
•• após a 2ª Guerra Mundial – o país também se valeu dos
empréstimos e financiamentos externos para impulsionar o processo
de industrialização nacional;
•• no governo de Juscelino Kubitschek (1956‑60) – Plano de Metas,
com a captação de empréstimos externos para grandes obras,
como a construção de Brasília;
•• no regime militar – o governo buscava tornar o Brasil uma potência
nuclear, especialmente na gestão de Geisel (1974‑79).

63
Capítulo 3

No decorrer da década de 60, a dívida externa permaneceu estável, todavia, a partir


daí ela passou de US$ 3,1 bilhões em 1960, para US$ 53,9 bilhões em 1980.

Durante o chamado “milagre econômico”, entre 1968 e 1973, o país vivenciou


altos índices de crescimento econômico (taxa média de 10% a.a.), porém, tal fato
provocou pressões inflacionárias e problemas na balança comercial, haja vista a
necessidade de importação de bens de capital, dos quais o país carecia.

Em 1973, já com uma dívida externa elevada (US$ 12,6 bilhões), ocorre o
“primeiro choque do petróleo”, originário da crise no Oriente Médio. Essa alta no
preço do petróleo provocou um grande impacto nas importações, e, a partir daí,
a balança comercial começou a apresentar déficits constantes.

O governo tentou combater o desequilíbrio da balança comercial com medidas


de desestímulo às importações e obtenção de novos empréstimos externos, já
que nesse período havia uma grande liquidez internacional, proporcionando taxas
de juros mais baixas. A prosperidade econômica no Brasil acabou atraindo os
investidores externos.

Lacerda (2013, p. 136), sobre a origem e crescimento da dívida externa sustenta que:

No período 1974‑1977, a dívida cresceu aceleradamente com


o financiamento, via endividamento, dos altos déficits em
transações correntes, causados pelos choques externos. A dívida
líquida saltou de US$6,2 bilhões, em 1973, para US$31,6
bilhões, em 1978, crescendo a taxa média de 38,7% ao ano.
Nessa época, o aumento do endividamento decorreu também
da decisão de implantar o II PND, que financiou os déficits da
balança comercial e de serviços com recursos externos. O peso
da participação estatal no endividamento subiu de 51,7%, em
1973, para 63,3%, em 1978, ultrapassando os 80% do total
durante a década de 1980. Esse aumento decorreu dos grandes
investimentos estatais desse período, que foram financiados,
basicamente, por empréstimos externos. Simultaneamente,
ocorreu uma retração nos investimentos privados financiados por
esses recursos, em um momento de aumento de seus custos.
(LACERDA, 2013, p. 136).

No final dos anos 1970, quando o estoque da dívida já era significativo, houve
uma mudança na situação internacional:

•• o preço do barril de petróleo elevou‑se de US$ 12,4 para US$ 34,4,


acarretando um adicional de despesas na balança comercial de
US$ 37,3 bilhões, entre 1979 e 1983;
•• a deterioração nas relações de troca do Brasil com os parceiros
comerciais;

64
Economia Brasileira

•• o início da recessão mundial;


•• o aumento da taxa de juros nos Estados Unidos (a prime rate sobe
de 5,7% em 1975 para 18,7% em 1981) fez com que a dívida
externa bruta atingisse a casa dos US$ 100 bilhões em 1984.

Você pode concluir que a situação das contas externas tornou‑se extremamente
grave a partir do final dos anos 1970.

Seção 3
A crise da década de 80
O quadro internacional agravou‑se em 1982 e fez com que o fluxo de capitais
externos no Brasil cessasse. Assim, o Brasil recorreu ao Fundo Monetário
Internacional, que concedeu empréstimos ao país condicionados à adoção de
medidas de ajuste fiscal, como o arrocho salarial e liberalização dos mercados
(de bens e financeiros), o que viria a abrir as portas para o neoliberalismo dos
anos 90.

A crise da dívida externa

O final dos anos 70 é marcado por grande alteração na condução da política econômica
nos EUA. O FED – Federal Reserve (banco central norte‑americano), que vinha até então
sustentando, com emissão monetária, a ampliação da liquidez internacional, passou a
adotar uma política monetária restritiva, adotou o sistema de taxas de câmbio flutuantes
em 1973. Com esse aperto monetário, em conjunto com os profundos déficits públicos
que se mantinham naquele país, houve um aumento substancial nas taxas de juros,
transformando‑o no grande absorvedor da liquidez mundial.

Essa situação levou a um endurecimento dos credores com os países em


desenvolvimento endividados, aumentou a dificuldade de obtenção de recursos,
bem como encareceu a rolagem da dívida, ao aumentar substancialmente os
serviços dessa, dada a cláusula de taxas de juros flutuantes (repactuadas).

As consequências desse quadro foram a situação de insolvência da Polônia e da


Argentina e a moratória mexicana em setembro de 1982, sendo que a partir daí
praticamente estancou‑se o fluxo voluntário de recursos a esses países.

Fonte: Economia contemporânea brasileira (2012).

65
Capítulo 3

Leite (2011, p. 76) também sintetiza como esse problema mundial, “a crise da
dívida”, ocorreu:

A crise da dívida

Os choques do petróleo tiveram significativas consequências


sobre as economias em desenvolvimento, especialmente as da
América Latina.

Em lugar de investir em projetos produtivos, os governos


utilizaram os recursos de forma a angariar mais popularidade na
manutenção de empresas estatais ou, como afirma Roberts (2000),
desapareceram nas mãos de políticos e burocratas.

Em 1982, muitos países em desenvolvimento se viram


impossibilitados de pagar os juros de suas dívidas. A crise
começou quando o México anunciou a moratória dos
pagamentos de sua dívida. A moratória mexicana foi um choque
para os principais bancos credores.

Estes, especialmente os grandes bancos americanos, estavam


expostos às dívidas dos países em desenvolvimento. Veja no
quadro a seguir a dívida externa de alguns países da América
Latina em 1982.

País Dívida Externa (US$ bi)


Argentina 43,6
Brasil 92,8

México 86,0
Venezuela 32,1
Fonte: World Bank (1982).

Assim, como a exposição dos bancos estrangeiros nos países


em desenvolvimento colocava em risco o sistema financeiro
internacional, os governos dos países desenvolvidos e as
instituições financeiras internacionais passaram a se envolver
na administração da crise. A principal consequência para os
países em desenvolvimento foi a redução do acesso a crédito,
ou seja, na redução dos fluxos de capital para estes países,
especialmente os da América Latina.

Muitos estudiosos creditam à crise da dívida a grave recessão


econômica que reduziu os gastos per capita em um quinto,
comparando com a década de 70, na região na década de 80,
que é conhecida como “A década Perdida”. (LEITE, 2011, p. 76)

66
Economia Brasileira

3.1 A crise da dívida externa brasileira


A dívida externa brasileira no período de 1970 a 1990 exibiu comportamento
ascendente conforme mostra a Figura 3.1, em bilhões de dólares.

Figura 3.1 ‑ Dívida externa bruta ‑ US$ (bilhões)

Fonte: Adaptado de IPEADATA (2014).

Todos esses fatos fizeram com que a dívida externa bruta atingisse a casa dos
US$ 100 bilhões em 1984, ao mesmo tempo em que reduziu a capacidade
do país em obter novos recursos para efetivar o seu pagamento. O país, que
fora recebedor líquido de capitais nos anos 70, torna‑se, a partir de 1983, um
exportador de capitais, por exemplo, sob a forma de pagamento da dívida ou
remessa de lucros das empresas estrangeiras instaladas no Brasil.

De acordo com o Banco Central, o ingresso de recursos no país destinados a


investimentos atingiu, no período de 1974 a 1982, cerca de US$ 50 bilhões e
as elevações dos preços do petróleo, no mesmo período, representaram um
dispêndio adicional de mais de US$ 30 bilhões.

A Figura 3.2 representa o comportamento da dívida externa brasileira (exclui


empréstimos entre companhias), em % do PIB. Observe que a dívida externa
salta de 30% do PIB em 1982 para próximo de 50% do PIB em 1983.

67
Capítulo 3

Figura 3.2 ‑ Dívida externa (%PIB)

Fonte: Adaptado de IPEADATA (2014).

O Brasil teve que recorrer ao FMI no final de 1982, assinando um acordo, cujo
objetivo central era o equilíbrio das contas externas. As principais medidas eram:

•• maxidesvalorização cambial;
•• ajuste da taxa de câmbio de acordo com a inflação do período;
•• arrocho salarial;
•• redução dos gastos públicos;
•• aumento dos impostos;
•• controle monetário e aumento das taxas de juros.

Plano Brady: processo Em 1987, o Brasil, sob o comando do ministro da Fazenda


de renegociação Dílson Funaro, decretou moratória. Com a saída de
da dívida de vários
países, entre os quais
Funaro, o novo ministro, Carlos Bresser Pereira, suspende
Brasil, Argentina, a moratória e retoma a renegociação da dívida. Porém,
México, Polônia e a tentativa é inócua, e um ano depois o Brasil declara
Rússia. A negociação
nova moratória.
foi conduzida pelo
secretário do Tesouro
O processo de renegociação da dívida externa brasileira
dos EUA, Nicholas
Brady, que conseguiu se estendeu até 1994 com o Plano Brady, quando o Brasil
um acordo graças chegou a um acordo com os credores. A dívida “antiga” foi
a uma proposta de trocada por títulos que chegaram a quase US$ 50 bilhões,
redução no montante
com vencimentos de até 30 anos. Esses títulos receberam
da dívida e a troca
por títulos lastreados o apelido de bradies.
por papéis do Tesouro
dos Estados Unidos. Na época, foram emitidos vários títulos com prazos, taxas
e rendimentos diferenciados que você poderá saber mais a
respeito desse assunto no próximo capítulo. Antes de chegar até lá, uma pergunta.

68
Economia Brasileira

3.2 O custo da moratória


Existe um custo altíssimo para os países que deixam de pagar suas dívidas com
os credores externos. E, mesmo após uma renegociação, ou seja, a retomada
dos pagamentos, o país leva muitos anos para recuperar a confiança dos
investidores internacionais.

Cabe ressaltar que a moratória significa que o país perde a capacidade de


tomar empréstimos e atrair investimentos externos por um certo período.
Posteriormente, mesmo restabelecendo as condições de pagamento, o país sofre
com taxas de juros mais altas sobre novos empréstimos tomados e prazos para
pagamentos mais curtos.

Portanto, não é interessante para nenhum país, especialmente os considerados


países em desenvolvimento, deixar de honrar seus compromissos externos.

Mas você deve estar se perguntando se essa dívida é pagável ou não, não é mesmo?

Bem, digamos que o problema da dívida não esteja no seu montante, mas
sim no seu prazo e nos juros que incidem sobre ela.

Desde a moratória em 1987, e a sua renegociação em 1994, o Brasil vem


recuperando a confiança dos investidores externos com a retomada dos
pagamentos. Quanto mais essa confiança se restabelece, mais o Brasil terá
condições de captar recursos com taxas mais baixas e prazos mais longos.

Pode‑se avaliar a capacidade de endividamento de um país pelo


coeficiente da dívida externa:

CDE = DE ‑ RI
X

Onde,
CDE = coeficiente da dívida externa;
DE = dívida externa;
RI = reservas internacionais;
X = exportações de 1 ano.

O coeficiente mostra quanto o país dispõe de reservas internacionais totais (inclui


os empréstimos do FMI) e de exportações anuais para pagar a dívida externa.
Segundo o Banco Central, o coeficiente CDE em 1981 foi de 3,17 e em 1990
atinge 3,87.

69
Capítulo 3

No caso do Brasil, a capacidade de honrar sua dívida externa vem se ampliando


nos últimos anos, ou seja, essa relação (dívida – reservas/exportações) vem se
reduzindo. Isso é, quanto mais o país exporta, mais ele obtém divisas para pagar
a dívida externa.

Até aqui, você pode concluir que o peso da dívida externa limitou consideravelmente
as possibilidades de desenvolvimento da economia brasileira. Lembre‑se de que
o esforço do governo brasileiro, ao longo de toda a década de 1980, foi de gerar
superávit na balança comercial para pagar os juros dessa dívida.

Seção 4
Composição do comércio exterior e suas barreiras
Nesta seção, você estudará sobre o comércio exterior brasileiro, ou seja, de que
forma o Brasil se relaciona comercialmente com os demais países. Em seguida,
aprenderá como eram distribuídas as exportações do país nos anos de 1970 a
1990 e vários exemplos de barreiras existentes no comércio internacional.

Você saberia dizer se o Brasil é um bom comerciante quando se trata de


vender os produtos lá fora?

Até a década de 70, o Brasil exportava principalmente produtos básicos. A partir


daí houve uma melhora na pauta de exportações, ou seja, passamos a exportar
produtos com maior valor agregado (aviões, motores, celulares etc.).

O advento da globalização tornou possível uma maior interação entre os países.


Independente das distâncias, essa interação se dá cada vez mais pelo comércio.
A tecnologia também aproximou os povos. Hoje, as mercadorias podem viajar de
um ponto a outro do globo num período cada vez mais curto.

Até o início da década de 90 o Brasil era uma das economias mais fechadas
do mundo, ou seja, para proteger a economia nacional, ele impunha muitas
restrições sobre a compra de produtos importados de outros países. Essas
restrições eram feitas por intermédio de mecanismos como:

•• imposição de guias e obrigações de depósitos compulsórios;


•• suspensão de benefícios fiscais;
•• carga tributária pesada (IPI, Imposto de Importação, IOF);

70
Economia Brasileira

•• alíquotas de até 100% sobre determinados produtos;


•• cotas anuais de importação.

Para você ter uma ideia, durante a década de 80 a balança comercial registrou
uma média anual de US$ 26 bilhões em exportações e US$ 16 bilhões em
importações.

Era uma forma de o governo manter a balança comercial positiva ou


superavitária, isto é, quando as exportações são superiores às importações.
Quando as importações são superiores às exportações, a balança
comercial torna‑se negativa ou deficitária.

Você deve lembrar que a moeda brasileira está valorizada quando se recebe
menos Reais por US$ 1 e, ao contrário, a moeda encontra‑se desvalorizada.

Um importador compra US$ 10 mil em produtos brasileiros, isso significa que o


exportador receberá:

• se a cotação do dólar for R$ 3,00 (moeda nacional está desvalorizada)


US$ 10 mil X 3,00 = R$ 30 mil;

• se a cotação do dólar for R$ 2,50 (a moeda nacional está valorizada)


US$ 10 mil X 2,50 = R$ 25 mil.

Isso quer dizer que a valorização da moeda nacional proporcionou redução de


R$ 5 mil que o exportador recebeu com a venda de seus produtos no exterior.

Agora pense no exemplo acima e imagine quando isso envolve milhões de dólares!

Com esse exemplo você pode entender porque os exportadores não gostam
quando a preço do dólar está caindo. Nesses casos os exportadores ganham
menos Reais pelos produtos que vendem. Para receber a mesma quantia é
preciso que eles aumentem os preços dos produtos, e quando isso acontece,
o exportador corre o risco de perder o cliente.

71
Capítulo 3

Em 1990, o Brasil iniciou sua política de abertura de mercado baseada na progressiva


redução das alíquotas de importação. Em 15 de março daquele ano, o ministro
da Fazenda expediu portaria eliminando da tarifa aduaneira a lista de bens cuja
importação permaneceu suspensa durante longos anos, ressalvando, apenas, alguns
poucos ligados à proteção da saúde.

Essa medida significou a eliminação das tarifas sobre mais de dois mil produtos,
impedidos de entrar no país durante quase vinte anos.

Fonte: PIRES, Adilson Rodrigues. Práticas abusivas no comércio internacional.


Rio de Janeiro: Ed. Forense, 2001.

Em função dessa abertura comercial, o Brasil tornou‑se mais competitivo em


diversos setores, estando, inclusive, entre os principais exportadores de produtos
como: soja, frango, açúcar, suco de laranja, algodão, álcool etc.

Todos concordam que a abertura comercial foi um dos pontos mais importantes
para a recuperação econômica do país, que ocorrerá mais intensamente em
meados da primeira década do século XXI. Os resultados positivos da balança
comercial dos últimos anos têm colaborado sobremaneira para o equilíbrio do
balanço de pagamentos. Voltaremos a discutir esse tema nos próximos capítulos!

4.1 Composição do comércio exterior


Você estudou que durante muito tempo as exportações brasileiras eram formadas
principalmente por produtos agrícolas.

Para você ter uma ideia, o café representava 65% das exportações totais
do país no início do século XX, e manteve‑se assim até a década de 30.

O Tabela 3.3, a seguir, mostra como eram distribuídas as exportações do país no


período de 1964 a 1990.

Tabela 3.3 ‑ Exportações brasileiras por fator agregado e participação sobre total geral (%)

Ano Básicos Semimanufaturados Manufaturados


1964 85,4 8,0 6,2
1970 74,8 9,1 15,2
1980 42,2 11,7 44,8
1990 27,8 16,3 54,2
Fonte: SECEX/DEPLA – Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior.

72
Economia Brasileira

Essa situação começou a se reverter após os processos de industrialização


implantados pelos governos militares. Atualmente, a pauta de exportação
brasileira já é bem mais diversificada. É um equívoco pensar que o Brasil hoje só
exporta grãos, apesar da importância desse produto na balança comercial.

Os produtos básicos (minério de ferro, farelo de soja, soja em grão,


café em grão, fumo em folhas, carne de frango, carne bovina etc.) que
constituíam quase 75% da pauta de exportações em 1970, responderam
por apenas 29% em 2004. Os produtos semimanufaturados (celulose,
produtos de ferro e aço, alumínio bruto, açúcar cristal, óleo de soja bruto,
couros e peles, ferro gusa, ferro‑ligas, ouro para uso não monetário,
ligas de alumínio etc.) cresceram de 9% para 15%. Já os produtos
manufaturados (automóveis, suco de laranja, bombas e compressores,
pneumáticos, café solúvel, papel, motores e geradores, açúcar refinado,
cigarros, móveis, produtos químicos, laminados planos de ferro e aço,
têxteis e calçados etc.) passaram de 15% para 55% no mesmo período.

Todavia, essa evolução não significa que o Brasil possui um desempenho


adequado em termos de comércio. Na realidade, a participação do nosso país
no comércio internacional é ainda muito incipiente. Desde 1993, a participação
do Brasil nos fluxos de comércio mundial gira em torno de 1%, o que pode ser
explicado pelo excesso de barreiras comerciais impostas pelos países ricos aos
produtos brasileiros.

4.2 Barreiras no comércio internacional


Diversos produtos exportados pelo Brasil sofrem pesadas restrições no mercado
internacional. Existem vários tipos de barreiras, dependendo do produto e do
mercado em que ele é vendido. EUA, União Europeia (UE) e Japão são os países
industrializados que mais aplicam barreiras sobre o comércio internacional e que
envolvem bilhões de dólares por ano.

Observe alguns exemplos dessas barreiras:

•• tarifas de importação – chama‑se de tarifa ad valorem quando se


refere a um percentual calculado sobre o preço de importação,
e tarifa específica quando se refere a um valor específico acrescido
ao preço de importação, expresso em moeda corrente;
•• medidas antidumping – são as medidas que visam a neutralizar
práticas do dumping, que é a comercialização de produtos a preços
inferiores ao preço de custo de produção, com o objetivo de eliminar
a concorrência;

73
Capítulo 3

•• quotas – estabelecimento de uma quantidade máxima para a


importação de determinado produto, visando à proteção do
mercado interno. Os EUA aplicam quotas sobre o açúcar que
entra no país, sendo que a quota do Brasil em 2001/2002 foi de
162.422,05 ton/ano;
•• subsídio – de acordo com as normas do GATT, é qualquer forma
de ajuda do governo a determinados setores exportadores que
implique na transferência direta de recursos em benefícios, visando
a uma maior competição no mercado externo;
•• salvaguardas – são medidas adotadas pelos governos, tais como
elevação de tarifas ou estabelecimento de quotas, com o objetivo
de dar uma proteção temporária à indústria doméstica contra
importações crescentes que estiverem causando, ou ameaçando
causar, um grave prejuízo a essa indústria.

O Brasil e outros países exportadores de produtos agrícolas lutam em fóruns


internacionais para que essas barreiras sejam reduzidas. Recentemente, esses
países venceram uma disputa na OMC (Organização Mundial do Comércio) que
dizia respeito aos subsídios que produtores de algodão nos EUA recebem todos
os anos. Como você sabe, o subsídio é uma prática desleal de comércio.

Uma forma de driblar essas barreiras, especialmente pelos países em


desenvolvimento como o Brasil, é reunindo forças para competir no mercado
internacional. Assim, os países formam blocos econômicos. Temos vários
exemplos hoje no mundo: UE, NAFTA, MERCOSUL e a ALCA, sendo que essa
última ainda está em processo de formação.

Você viu nesta seção que o Brasil tem ampliado sua participação no comércio
mundial, não só quantitativamente como também na diversificação dos produtos
exportados. Na medida em que a agricultura é um dos setores mais protegidos
do mundo, o sucesso das negociações agrícolas nos diversos fóruns hoje
existentes, seguramente trará significativos benefícios à economia brasileira.

Seção 5
Sistema financeiro brasileiro
Nesta unidade, seu estudo será sobre sistema financeiro. Você vai compreender
alguns conceitos e a evolução histórica do sistema financeiro brasileiro, bem como
das principais instituições que o compõem.

74
Economia Brasileira

O sistema financeiro tem como principal função a intermediação da


moeda entre os agentes econômicos superavitários e os agentes
econômicos deficitários.

Pinheiro (2012, p. 36) define o sistema financeiro como o “conjunto de instituições,


instrumentos e mercados agrupados de forma harmônica, com a finalidade de
canalizar a poupança das unidades superavitárias até o investimento demandado
pelas deficitárias”.

Rede de mercados e instituições que têm por função transferir fundos disponíveis
dos poupadores para investidores vemos representado na Figura 3.3.

Figura 3.3 ‑ Fluxo do Sistema Financeiro

Fonte: Adaptado de Pinheiro (2012).

Mas você saberia definir o que é uma instituição financeira?

Instituições financeiras são pessoas jurídicas, públicas ou privadas, que possuem


como principal atividade a coleta, intermediação ou aplicação de recursos
próprios ou de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira, e a responsabilidade
pela guarda e proteção de recursos de terceiros.

Lund (2012, p. 22) define o sistema financeiro nacional:

É composto por um conjunto de instituições financeiras


que têm por objetivo intermediar o fluxo de recursos entre
poupadores e tomadores.

75
Capítulo 3

Em outras palavras, viabiliza a relação entre agentes carentes


de recursos para consumo e investimento e agentes capazes de
gerar poupança e, consequentemente, financiar o crescimento da
economia. (Lund,2012, p. 22)

Para possibilitar uma melhor avaliação do que sejam os agentes deficitários e os


agentes superavitários, convém observar que se encontra no sistema econômico
agentes econômicos (famílias, entidades, empresas e Governo) que em alguns
momentos gastam, quantitativamente, mais do que arrecadam, ficando com
déficit, enquanto outros agentes econômicos gastam menos do que arrecadam,
ficando com superávit.

São diversos os motivos que conduzem um agente econômico a ser deficitário,


sendo que se destacam dois motivos adversos e comuns na economia:

•• pode ser causado por aumento de despesas não previsíveis,


que provoca transtorno e a busca de solução por meio do
sistema financeiro;
•• pode ser causado por interesse do próprio agente econômico que
se torna deficitário, racionalmente, buscando recursos no sistema
financeiro para investimentos que lhe trarão maiores retornos.

Para uma fácil compreensão da taxa de juros, considere que no mercado


um bem ou serviço tem um preço expresso monetariamente (em dinheiro).
A taxa de empréstimo paga pelas pessoas físicas ou jurídicas ao serviço de
empréstimo do setor financeiro corresponde então ao preço do dinheiro.

O sistema financeiro tem como função a captação de recursos que implica custos
para as instituições financeiras. Os recursos captados são disponibilizados a pessoas
físicas ou jurídicas que pagam a taxa de empréstimo à instituição financeira.

A diferença entre os valores pagos pelo custo médio de captação e a taxa média
de empréstimo determina a receita das instituições financeiras, denominada de
spread bancário.

O sistema financeiro brasileiro possui duas fases distintas para análise, que abrange
o período anterior e o período posterior a 1964.

76
Economia Brasileira

5.1 O período anterior a 1964


Aspectos relevantes desse período dizem respeito à Lei da Usura, criada
pelo decreto pelo presidente Getúlio Vargas, em 1933, fixando a taxa de juros
nominal de 12% ao ano, tendo como objetivo a redução dos lucros do sistema
financeiro. Com a Lei da Usura, o sistema financeiro brasileiro passou a registrar
rendimentos em queda e nos períodos inflacionários a ter rendimento real
negativo, pois a inflação superava a taxa cobrada pelo sistema financeiro.

A Lei da Usura provocou transtornos do ponto de vista econômico, induzindo


a atos irregulares. Quanto aos transtornos econômicos, como o retorno não
era compensador para os agentes superavitários, ficou reduzido o volume
de poupança encaminhado para o sistema financeiro. A redução de recurso
disponível no sistema financeiro representou menos recursos para os agentes
deficitários usarem para consumo e investimentos.

As irregularidades foram identificadas no ato dos empréstimos ou financiamentos.


As entidades financeiras exigiam dos clientes que parcelas dos recursos
disponibilizados ficassem depositadas na entidade ou utilizadas para compra de
letras de câmbio com preços em depreciação.

As autoridades monetárias, nesse período, eram desempenhadas pela


Superintendência da Moeda e do Crédito (Sumoc), pelo Banco do
Brasil (BB) e pelo Tesouro Nacional.

A SUMOC foi criada em 1945, sendo determinada ao uso dos instrumentos


monetários e à preparação e organização de um banco central, tendo como
principais atribuições:

•• definir os percentuais de reservas obrigatórias dos bancos comerciais;


•• fixar as taxas do redesconto;
•• fixar as taxas de assistência financeira de liquidez;
•• fixar as taxas de juros sobre depósito bancário;
•• supervisionar a atuação dos bancos comerciais;
•• gerenciamento das políticas cambiais;
•• representar o Brasil perante as organizações internacionais.

77
Capítulo 3

5.2 O período posterior a 1964


A partir de 1964 é criada a última fase da evolução do sistema da intermediação
financeira no Brasil, por meio da criação dos instrumentos legais que produziram
profundas mudanças no sistema financeiro, dando início à atual estrutura do
sistema financeiro brasileiro. Observe a seguir:

•• lei nº 4380, de 21/08/64 –criou o Sistema Financeiro de Habitação


(SFH), o Banco Nacional de Habitação (BNH) e instituiu a correção
monetária nos contratos imobiliários de interesse social;
•• lei nº 4.595, de 31/12/64 – base da Reforma Bancária, reestruturou
o Sistema Financeiro Nacional com a criação do Banco Central do
Brasil (Bacen) e do Conselho Monetário Nacional (CMN), definindo
as características e as funções específicas de atuação das
instituições financeiras;
•• lei nº 4.728, de 14/07/65 – disciplinou o mercado de capitais
definindo medidas para seu desenvolvimento e estabelecendo
padrões de procedimentos para os participantes no mercado e
criação de novas entidades, estimulando, também, o processo de
abertura do capital das empresas.

A criação inicial de uma nova estrutura do sistema financeiro brasileiro representou


um passo inicial para um processo contínuo de alterações e aprimoramentos.

5.3 Principais agentes financeiros no Brasil


Analisando os principais agentes financeiros você irá perceber as atribuições de
cada um e compreender a estrutura do sistema financeiro.

5.3.1 Conselho Monetário Nacional (CMN)


É o Conselho Monetário Nacional quem coordena o Sistema Financeiro Nacional,
tendo como finalidade, conforme regimento interno, a formulação de política da
moeda e do crédito, com o objetivo de estabilizar a moeda e o desenvolvimento
econômico e social brasileiro.

É o órgão normativo máximo do sistema financeiro do país. Formula


a política da moeda e do crédito, de acordo com a Lei nº 4.595,
de 31‑12‑1964, objetivando o progresso econômico e social do país.

78
Economia Brasileira

São atribuições do CMN:

•• as determinações do quantitativo de moedas necessárias para o


funcionamento da economia;
•• o controle do valor oficial da moeda estrangeira;
•• a coordenação de instrumentos econômicos monetários para o
gerenciamento da economia brasileira.

O CMN é integrado pelos seguintes membros: ministro da Fazenda (presidente),


ministro do Planejamento, Orçamento e Gestão e o Presidente do Banco Central
do Brasil. A Figura 3.4 representa a estrutura atual do CMN.

Figura 3.4 – Estrutura atual do CMN

Fonte: Adaptado de Pinheiro (2012).

São inclusas junto ao CMN:

•• Comissão Técnica da Moeda e do Crédito (Comoc);


•• Comissões Consultivas de Normas e Organização do Sistema
Financeiro;
•• Mercado de Valores Mobiliários e de Futuro;
•• Crédito Rural;
•• Crédito Industrial;
•• Crédito Habitacional e para Saneamento e Infraestrutura Urbana;
•• Endividamento público;
•• Política Monetária Cambial.

No cumprimento de suas atribuições, o CMN deve reunir‑se ordinariamente uma


vez por mês e eventualmente por convocação do seu presidente.

79
Capítulo 3

5.3.2 Banco Central do Brasil (Bacen)


O Banco Central do Brasil é uma autarquia Federal criada em 1964, a qual
incorporou as funções de autoridade monetária, desempenhando o papel de
“banco dos bancos” no Sistema Financeiro Nacional. É o órgão executor das
políticas monetárias e das normas formalizadas pelo CMN.

A seguir suas principais atribuições:

a. O gerenciamento de política monetária que consiste, entre outras,


nas seguintes funções:
»» emissão de moeda: papel e moeda metálica; serviços de
meio circulante;
»» realizar operações de mercado aberto (open market);
»» controle de crédito;
»» concessão de empréstimo para instituições financeiras;
»» operações de redesconto para instituições financeiras;
»» receber em depósito recolhimentos compulsórios das
instituições financeiras.

b. Atua como “banco dos bancos” por meio das seguintes funções:
»» regula os serviços de compensação de cheques;
»» regula o sistema financeiro brasileiro;
»» fiscaliza as instituições financeiras.

c. Atua como banco do Governo da seguinte maneira:


»» gerenciando a dívida pública interna e externa;
»» depositário e gerenciador das reservas internacionais brasileiras;
»» representante brasileiro perante as instituições financeiras
internacionais.

O Banco Central do Brasil possui características que diferem dos bancos centrais
de outros países, como o dos EUA. O banco central dos EUA contém a chamada
independência em relação ao poder executivo, ou seja, os gerentes do banco
central possuem mandato fixo e não são indicados pelo presidente dos EUA,
não podendo por ele serem demitidos.

No Brasil, a situação é diferente, pois a chamada independência não existe, uma


vez que o presidente do BACEN e seus diretores não possuem mandatos fixos

80
Economia Brasileira

e são indicados pelo presidente da República, que tem o poder de destituí‑los a


qualquer momento.

5.3.3 Comissão de Valores Mobiliários (CVM)


A Comissão de Valores Mobiliários é a instituição normatizadora do mercado de
capitais. É administrada por um presidente e quatro diretores nomeados pelo
presidente da República. Os cinco membros constituem o colegiado, os quais
criam os instrumentos a serem implantados.

As atividades executivas da CVM são acompanhadas e coordenadas pelo


superintendente geral e pelos subordinados e gerentes.

Suas atividades são direcionadas às empresas; aos intermediários financeiros;


aos investidores; à fiscalização externa; às normas contábeis e de auditoria; aos
assuntos jurídicos; ao desenvolvimento de mercado e internacionalização; à
informática e à administração.

Pelo exercício de suas funções, visando a estimular o aumento da aplicação de


recursos no mercado de capitais, a CVM tem como objetivo:

•• assegurar o funcionamento eficiente, regular e equitativo do mercado


de valores mobiliários e promover sua expansão nessas bases;
•• proteger os titulares de valores mobiliários e os investidores,
evitando e coibindo irregularidades, fraudes e práticas manipulativas
destinadas a criar condições artificiais de oferta, demanda e preços;
•• assegurar a divulgação de informações relevantes sobre os valores
mobiliários e as empresas que os emitem;
•• estimular a formação de poupança e o investimento de longo prazo;
•• registrar e fiscalizar as companhias emissoras de valores mobiliários
admitidos para negociação em Bolsa e no mercado de balcão;
•• fiscalizar as atividades e os serviços do mercado de valores
mobiliários, bem como as informações relativas ao mercado,
às pessoas que dele participam e aos títulos nele negociados;
•• credenciar auditores independentes, consultores e analistas de
valores mobiliários;
•• autorizar a atividade de administração de carteiras e custódia;
•• autorizar a distribuição de valores mobiliários no mercado.

O processo de globalização tem induzido a interação entre a CVM e as comissões


de valores estrangeiros, na busca da integração e cooperação mútua. A integração

81
Capítulo 3

está formalizada por meio de memorandos de entendimento (MOV – memorandum


of understanding), estabelecendo assistência em investigações internacionais sobre
fraudes e irregularidades nos mercados financeiros.

Neste capítulo, você aprendeu sobre a evolução do sistema financeiro brasileiro.


Pôde distinguir os períodos anterior e posterior a 1964, data do início da criação
da atual estrutura do sistema financeiro brasileiro.

Você teve acesso a informações relacionadas às funções dos agentes financeiros,


bem como à distinção entre as mesmas. Aprendeu ainda sobre o Conselho
Monetário Nacional e a inclusão de comissões destinadas ao gerenciamento do
sistema financeiro e sobre o Banco Central, denominado “banco dos bancos”, que
atua como executor das normas estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional.

Seguindo a proposta da disciplina, no próximo capítulo você irá estudar a


abertura comercial, a privatização e os planos de estabilização, destacando fatos
que ocorreram até meados da década de 1990. Até lá!

82
Capítulo 4

Abertura comercial, privatização


e os planos de estabilização

Habilidades Este capítulo possibilitará ao(à) aluno(a) compreender


que a primeira metade dos anos 90 é marcada pela
continuidade da “saga dos planos heterodoxos”
na condução de políticas econômicas voltadas
ao combate da inflação. Esses planos buscavam
uma queda abrupta da inflação e traziam como
principal elemento o congelamento de preços.
Entender, ainda, a abertura comercial, a forma de
sua implementação no Brasil, e como se iniciou
o processo de privatização. Por último, analisará
os principais indicadores macroeconômicos da
economia brasileira no período 1990‑94, que
apresentou grandes oscilações nas taxas de
inflação e uma recessão no início da década.

Seções de estudo Seção 1:  Modelo de desenvolvimento no início


dos anos 90

Seção 2:  Abertura comercial nos países em


desenvolvimento e no Brasil

Seção 3:  O governo Collor: Planos Collor 1 e 2

Seção 4:  Privatizações

Seção 5:  A economia brasileira entre 1990 a 1994

83
Capítulo 4

Seção 1
Modelo de desenvolvimento no início dos anos 90
A economia brasileira sofreu uma profunda reestruturação produtiva, influenciada
pelas medidas liberalizantes propostas por organizações com vínculos a Washington,
como o FMI e o Banco Mundial. Esse assunto será abordado neste capítulo e será
útil para você entender, especialmente, a abertura comercial e a privatização.

A primeira metade dos anos 90 é marcada pela continuidade da “saga dos planos
heterodoxos” na condução de políticas econômicas voltadas ao combate da
inflação. Esses planos buscavam uma queda abrupta da inflação e traziam como
principal elemento o congelamento de preços.

Neste capítulo, abordaremos ainda os planos de estabilização do governo Collor:


Plano Collor I e Plano Collor II. Além disso, entenderá por que o insucesso
de cada um dos planos econômicos fez com que os agentes econômicos se
precavessem de novos congelamentos.

Por último, você analisará os principais indicadores macroeconômicos da


economia brasileira, no período 1990‑1994, que apresentou grandes oscilações
nas taxas de inflação e uma recessão no início da década.

Do ponto de vista político, é importante registrar um fato importante. Pela primeira


vez desde o ano de 1961, os brasileiros empossam o primeiro presidente eleito pelo
voto direto, o presidente Fernando Collor de Mello, que após dois anos e meio de
mandato sofrera um impeachment.

Você está lembrado dos números da primeira “década perdida”, a década


de 80?

Vamos relembrar dois deles: a taxa média de crescimento do PIB na década


de oitenta foi 2,9% por ano, em decorrência das medidas adotadas para pagar
os serviços da dívida externa e interna; e, no último ano desta década, o PIB
per capita era 2% maior do que no início deste período, em termos reais.

A segunda metade da década de oitenta corresponde ao período do governo


José Sarney que, de acordo com Gremaud (2011, p. 435), foi marcado por um
grande descontrole das contas públicas, o crescimento do endividamento interno
e a necessidade de sua rolagem. Em suma, a política fiscal e a monetária estavam
reféns da rolagem da dívida interna.

A política monetária estava refém porque, nessas condições, por exemplo,


as taxas de juros precisavam se manter elevadas. Não havia muita possibilidade
de flexibilização.

84
Economia Brasileira

É neste contexto que você irá aprender sobre a mudança do modelo de


desenvolvimento pela qual passou a economia brasileira no início dos anos 90.
Essa mudança é influenciada pelo surgimento, no cenário internacional,
do chamado Consenso de Washington e o Plano Brady, que se discute a seguir.

1.1 Consenso de Washington


Em 1989, acontece uma reunião, no Institute for Internacional Economics em
Washington, entre membros do Fundo Monetário Internacional (FMI), Banco
Interamericano de Desenvolvimento (BID), Banco Mundial,
Expressão cunhada
pelo economista
governo americano e representantes latino‑americanos,
norte‑americano John especialmente economistas. Segundo Guedes (2007,
Williamson, que lecionou p. 174), o objetivo era analisar o panorama mundial e as
na PUC/RJ. Trata‑se
crises econômicas da América Latina.
de um decálogo de
medidas liberalizantes e
Como conclusões desse encontro, John Willianson
de ajustes sugerido para
reformas nos países relacionou uma série de medidas que os países devem
em desenvolvimento, adotar na área econômica para crescer de forma
concebido no âmbito sustentável, medidas conhecidas como Consenso de
de organizações
Washington. A palavra “Consenso” é utilizada aqui
sediadas ou vinculadas
a Washington, como o por se acreditar que o conjunto das medidas propostas
FMI e o Banco Mundial. estivesse de acordo com o pensamento dos economistas
(REGO, 2006, p. 202). ali presentes.

As propostas buscavam assegurar disciplina fiscal, liberalização comercial e forte


redução do papel do Estado na Economia. Segundo Baumann (2000, p.13), elas
abordavam as seguintes questões:

Disciplina fiscal, redirecionamento das prioridades de gastos


públicos para as áreas de saúde, educação e infraestrutura,
reforma fiscal (ampliando a base fiscal e reduzindo impostos
marginais), estabelecimento de taxas de câmbio competitivas,
garantia dos direitos de propriedade, desregulamentação,
liberalização comercial, privatização, eliminação de barreiras ao
investimento estrangeiro e liberalização financeira.

Souza (2008, p. 201) resume em quatro pontos o que ficou conhecido pelo
documento Consenso de Washington:

1. A abertura econômica representada pelo fim das barreiras


protecionistas entre as nações;
2. A desestatização representada pela privatização das
empresas estatais;

85
Capítulo 4

3. A desregulamentação representada pelo fim das regras que


limitam o movimento de capitais entre os países e ao interior de
cada país, particularmente o especulativo;
4. A flexibilização das relações de trabalho, sobretudo, nos países
da América Latina. (SOUZA, 2008, p. 201)

1.2 Plano Brady


Antes de abordar questões relacionadas à inserção internacional do Brasil,
você estudará sobre o Plano Brady, que muitos consideram uma das medidas
fundamentais para o sucesso da estabilidade de nossa moeda ocorrida na
segunda metade dos anos 90.

O secretário do tesouro dos Estados Unidos, Nicholas F. Brady, anunciou,


em março de 1989, um plano que pretendia renovar a dívida externa de países
em desenvolvimento. A renovação da dívida ocorreu pela troca de bônus novos,
que ficaram conhecidos como bradies.

Segundo Giambiagi (2011, p. 136), o Plano Brady reestrutura a dívida soberana


de 32 países. Troca‑se a dívida pela emissão de um bônus emitido pelo país
devedor que contempla um abatimento do encargo da dívida, em decorrência da
redução de seu principal ou por alívio na carga de juros.

Na América Latina, vários países aderiram ao plano, que alterou


significativamente as condições de liquidez desses países. O México
concluiu o acordo em 1989, a Argentina em 1992 e o Brasil em 1994,
apesar de iniciar a negociação em 1992.

Os principais títulos da dívida externa brasileira estão listados na Tabela 1.1:

Tabela 4.1 – Títulos da dívida externa: Bradies Bonds

Título Prazo (ano) Carência (ano) Juros

C‑Bond 20 10 4% até o sexto ano e 8% depois


do sétimo ano

Par Bonds 30 30 4%, subindo até 6% que vigora


depois do sexto ano.

Discount onds 30 30 Libor* mais 0,8125%


Fonte: Gremaud (2011).

86
Economia Brasileira

* Libor é a sigla para London Interbank Offered Rate. Segundo o Banco


Central do Brasil, é a taxa preferencial de juros oferecida para grandes
empréstimos entre os bancos internacionais. Disponível em: <http://www.
bcb.gov.br/htms/infecon/dividarevisada/apends_gloss_bibliografia.pdf>.
Acesso em: 15 nov. 2012.

Os principais títulos emitidos pelo Brasil neste acordo foram os Par Bonds e os
Discount Bonds. Em abril de 2006, o governo brasileiro faz o resgate antecipado
dos títulos bradies e elimina da dívida externa brasileira todos os títulos
relacionados com o plano Brady.

Especialmente para o caso brasileiro, o Plano Brady tem um papel


importante para consolidar a estabilidade no primeiro governo de Fernando
Henrique Cardoso, ao permitir a renegociação da dívida.

Você deve lembrar também que o financiamento internacional naquele momento


estava condicionado à realização de reformas e de um profundo ajuste fiscal.
Trataremos desses condicionantes nas próximas seções.

Seção 2
Abertura comercial nos países em
desenvolvimento e no Brasil
A globalização da economia corresponde ao aumento da interdependência entre
as pessoas, as empresas e as nações. Mariano (2012, p. 71) define globalização
da economia como “um processo de intensificação das trocas comerciais,
capitais e serviços realizados entre os países”.

Aqui no Brasil, esse processo é intensificado a partir dos anos 90. Você já parou
para pensar sobre a importância da abertura comercial como uma das dimensões
da globalização da economia? Lembre‑se que, além da comercial, existem a
dimensão produtiva e financeira da globalização da economia.

Pois bem, a partir de agora você conhecerá questões a respeito da abertura


comercial e sua forma de implementação nos países em desenvolvimento e no Brasil.

87
Capítulo 4

2.1 As vantagens do comércio internacional


Vou iniciar com outra pergunta:

Será que as vantagens da liberação do comércio externo vão além da


tradicional teoria das vantagens comparativas?

A resposta é positiva. As novas teorias do comércio internacional apresentam


novas visões acerca das vantagens dessa prática. Gremaud (2011) aponta pelo
menos outras três visões que fundamentam a defesa da abertura comercial:

•• A diversidade de opções de consumo. Admita que o consumidor


valoriza ter uma diversidade de opções de consumo. Nessas
condições, a liberalização traz ganhos de bem‑estar para a
coletividade, ao oportunizar um leque maior de produtos e serviços.
•• Os ganhos de eficiência e de escala. A liberalização do comércio
força as empresas a adotarem estruturas de custos mais adequadas
e a buscarem melhorias na produtividade. Por outro lado, os ganhos
de escala resultam do “ajuste tecnológico das empresas em direção
a volumes de produção com custos unitários inferiores”. Os ganhos,
aqui, advêm do processo de concorrência quando da liberação do
comércio externo.
•• As vantagens no processo de estabilização. Aqui a abertura
comercial sustenta os efeitos benéficos que ela traz em um
processo de estabilização, tal como você poderá verificar seus
efeitos durante a adoção dos planos de estabilização (especialmente
a partir do Plano Real).

Os argumentos em defesa da abertura comercial e os argumentos em defesa de


medidas protecionistas são relacionados no Quadro 4.1.

Quadro 4.1 – Argumentos favoráveis à abertura comercial e a medidas protecionistas

Argumentos em defesa da Argumentos em defesa de


abertura comercial medidas protecionistas
Teoria das vantagens comparativas A crítica estruturalista
Ganhos de escala A indústria nascente
Ganhos de eficiência Falhas de mercado
Ampliação das possibilidades A vulnerabilidade externa e os problemas
de consumo de Balanço de Pagamentos
Vantagens no processo de estabilização Combate ao desemprego no curto prazo
Fonte: Gremaud (2011).

88
Economia Brasileira

Ainda segundo Gremaud (2011, p. 555), o argumento protecionista é baseado no


fato de os mercados não se aproximarem da estrutura de concorrência perfeita.
Esse é o argumento que se relaciona à crítica estruturalista.

Admita que com uma economia aberta seja possível melhorar a situação do
país com a proteção a alguns setores. Este é o argumento para a defesa
da indústria nascente, que foi utilizado na economia brasileira ao longo do
processo de industrialização.

Outro argumento tão controverso quanto importante está relacionado à ocorrência


de rendimentos crescentes de escala. Essa condição favorece as situações de
monopólio, “falhas de mercado”, que podem resultar em duas situações:

1. A perda dos benefícios obtidos por conta dos ganhos de escala, que
se constituem em um dos argumentos favoráveis à abertura comercial;
2. A existência de custos elevados de aprendizado na produção de
novos produtos configura vantagens às empresas que primeiro se
estabeleceram no mercado. Essa situação representa barreiras à
entrada de novas empresas e pode não conferir benefícios para os
países consumidores do produto.

Nas próximas linhas, você poderá acompanhar a discussão sobre como se deu a
abertura comercial nos países em desenvolvimento e no Brasil.

2.2 Abertura comercial nos países em desenvolvimento e


no Brasil
Até o início da década de 90, o Brasil era uma das economias mais fechadas do
mundo. O país utilizava o argumento de proteção da economia nacional, impondo
muitas restrições à compra de produtos importados.

Você saberia argumentar alguns motivos que justifiquem termos sido, até o
início dos anos 90, uma das economias mais fechadas do mundo?

Como você estudou em outras disciplinas, durante muito tempo as exportações


brasileiras eram formadas, principalmente, por produtos agrícolas, dado o seu
histórico caráter agroexportador.

89
Capítulo 4

A adoção do modelo de desenvolvimento baseado no Processo de


Substituição das Importações (PSI), segundo Gremaud (2011, p. 556),
visava a atender fundamentalmente a demanda doméstica (interna) de
produtos, que antes eram importados. Outros países em desenvolvimento,
entretanto, tinham um processo de industrialização que visava atender
o mercado externo, o que explica a condição de baixo grau de abertura
comercial da economia brasileira.

Você deve lembrar que, para realizar o PSI, era necessário importar, especialmente
máquinas e equipamentos, com objetivo de ampliar a capacidade produtiva.
Em decorrência disso, mesmo praticando um PSI voltado para atender a demanda
doméstica, havia uma importante participação do mercado internacional em
nossa economia. Além de atender à demanda doméstica, as políticas comerciais
protecionistas tinham também o objetivo de conter os desequilíbrios relacionados
ao Balanço de Pagamentos (especialmente graves nos anos 80).

Segundo Rego (2006, p. 204), as discussões a respeito da abertura comercial dos


países em desenvolvimento vão além dos argumentos favoráveis e desfavoráveis.
Devem contemplar também questões sobre a maneira de como implementar a
abertura econômica.

Você pode estar se perguntando: qual o ritmo do processo de abertura?


Qual o contexto macroeconômico propício? O que deve ser liberalizado
primeiro, o mercado de bens ou o mercado de capitais?

De acordo com Rego (2011, p. 204), existe um razoável consenso de qual seja
a resposta para as duas primeiras questões, porém, a última questão tem uma
resposta mais polêmica. Um indicativo de resposta às indagações anteriores é
apresentado a seguir:

•• o ritmo do processo de abertura não deve ser muito lento,


tornando‑se vulnerável às pressões políticas, e nem tão pouco um
processo muito rápido, para não agravar o impacto do ajuste;
•• o processo de liberalização deve ocorrer em um contexto de
economia estável possibilitando uma melhor alocação dos recursos;
•• muitos analistas sustentam a tese de que, em primeiro lugar, deve
ser liberalizado o mercado de bens, para num segundo momento
liberalizar o mercado de capitais.

90
Economia Brasileira

Sobre a abertura comercial de países da América Latina, é preciso destacar que:

Na década de 1970, vários países da América Latina promoveram


a liberalização da economia: o Chile em 1973, a Argentina em
1976, o México em 1977 e a Venezuela em 1979. As crises da
dívida externa, em 1982, acabaram por abortar todas essas
experiências liberalizantes, com exceção da Chilena.

A partir da segunda metade dos anos 80, ocorreu uma


generalizada abertura comercial nos países latino‑americanos.
Em 1988, o Brasil iniciava a sua reforma comercial com a
eliminação dos controles quantitativos e administrativos sobre
suas importações e uma proposta de redução tarifária. (REGO,
2006, p. 206).

A evolução da liberalização comercial do Brasil no período 1988 – 1995, tendo por


base as tarifas de importação, é apresentada na Tabela 4.2.

Tabela 4.2 ‑ Evolução da liberalização comercial do Brasil no período 1988 – 1995, tendo por base as
tarifas de importação (%)

Anos 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995

Tarifa média 51,3 37,4 32,3 25,3 21,2 13,2 11,2 13,9

Desvio‑padrão ‑ ‑ 19,2 17,4 14,2 6,7 5,9 9,5


Fonte: Moreira e Correia (1997 apud GREMAUD, 2011).

Você deve observar na Tabela 4.2, que a abertura comercial no Brasil teve início
ainda no governo José Sarney, em 1988. Durante esse período, acabaram as
formas mais importantes de controle de quantitativo de importação, e aplicou‑se
um controle tarifário com alíquotas reduzidas gradualmente. O anúncio das
reduções graduais, feitas com antecedência pelo governo, tinha por objetivo
preparar os produtores nacionais para uma economia mais aberta.

No ano de 1995, resultado da pressão de grupos que tiveram problemas com a


abertura (por exemplo, a indústria automobilística), de sérios distúrbios externos
(crise mexicana e asiática) e com o Balanço de Pagamentos, o ritmo da abertura
comercial brasileira diminui (ocorreu a elevação da tarifa para 13,9%).

O valor das importações do Brasil, que havia aumentado 13% no primeiro ano do
governo Collor, estacionou até o final de seu mandato.

Como a forte queda das tarifas não provocou um forte aumento


das importações?

91
Capítulo 4

Souza (2008) sinaliza a resposta apontando para duas razões básicas:

•• a contração da economia acabou por limitar a demanda por


produtos importados. Você deve lembrar que no início dos anos 90
o Brasil experimentou um período de recessão econômica;
•• a maxidesvalorização realizada no início do Plano Collor tornou o
produto importado mais caro.

Giambiagi (2011, p. 137) compara a experiência brasileira de abertura comercial


com a de outros países latino‑americanos e com algumas experiências asiáticas.
Conclui, assim, que:

o ritmo e a extensão das reformas introduzidas no período


Collor/Itamar podem ser consideradas razoavelmente
moderados, compreendendo as dificuldades que a indústria
nacional teria após anos de baixo nível de investimento e
turbulência econômica. (Giambiagi, 2011, p. 137)

As críticas relacionadas à forma como foi implementada a abertura comercial


dizem respeito à velocidade do processo. Muitos a julgaram rápida, com forte
redução das tarifas e sem o devido tempo para que os agentes econômicos
pudessem realizar os ajustes necessários.

Outra crítica importante se deve à valorização cambial ocorrida, que intensificou


as consequências esperadas da abertura comercial, os problemas relacionados à
questão social e os problemas do ponto de vista da indústria.

Gremaud (2011, p. 558) comenta que, neste período, o Brasil experimentou um


expressivo fluxo de entrada de capitais, em decorrência dos seguintes pontos,
que contribuíram para atrair para o Brasil os chamados capitais privados:

•• das modificações no sistema financeiro internacional;


•• da abertura financeira que também se processou na economia brasileira;
•• da política econômica interna, com suas elevadas taxas de juros.

Agora você tem condições de argumentar porque a abertura financeira ocasionou


uma valorização da taxa de câmbio. Isto ocorre num momento em que os
agentes econômicos sentiam os efeitos da redução tarifária, entre 1992 e 1995.

A abertura comercial no Brasil e a valorização da taxa de câmbio tornam


explícita e agravam a falta de competitividade da indústria nacional. Ocorre um
fechamento de várias empresas e a retração do emprego em vários setores.

92
Economia Brasileira

Seção 3
O governo Collor: Planos Collor I e II
Você estudou anteriormente que a primeira metade dos anos 90 é marcada
pela continuidade da “saga dos planos heterodoxos” na condução de políticas
econômicas voltadas ao combate da inflação.

Você tem clara a diferença existente entre o pensamento ortodoxo e o


pensamento heterodoxo?

Gremaud (2011, p. 432) apresenta a distinção entre esses pensamentos:

Ortodoxia – de acordo com o pensamento ortodoxo, a inflação é


decorrente do processo de emissão monetária devido aos déficits
públicos, o que eleva a demanda e força a alta de preços. Assim,
para combater a inflação, deve‑se estancar a emissão de moeda,
o que só pode ser conseguido com a retração da demanda,
quer do setor privado, pela elevação de impostos, quer do setor
público, pela queda nos gastos públicos. Assim, o combate
inflacionário é conseguido mediante uma política recessiva.

Heterodoxia – para estes, a inflação não decorre de excesso


de demanda provocado pela emissão monetária. A emissão
monetária é vista muito mais como uma decorrência da inflação
do que como causa. Assim, a inflação poderia ser combatida
sem o apelo ao controle da demanda, isto é, não haveria
necessidade de uma política recessiva. O congelamento de
preços e salários é um tipo de medida (política de rendas)
característico dessa corrente.

Nesta seção você irá conhecer os planos de estabilização do governo Collor,


marcadamente heterodoxos, e os resultados obtidos com sua aplicação.

3.1 Alguns antecedentes


Segundo Bresser Pereira (1991, p. 92), a inflação tendia para uma aceleração
permanente e era interrompida por congelamento de preços. O colapso do Plano
Cruzado, em 1986, e particularmente do Plano Verão, em 1989, acelera mais ainda
este processo, dado que esses planos contribuíram para desorganizar a economia.

A Figura 4.1 ilustra as condições inflacionárias dos anos 80 e o momento


do estabelecimento dos planos de combate à inflação. A partir de 1986, em
praticamente todos os anos o governo brasileiro lança um novo plano.

93
Capítulo 4

Figura 4.1 – Taxa de inflação mensal no período 1980 a 1989, medidas pelo IGP‑di da Fundação Getúlio
Vargas

Fonte: Adaptado de IPEADATA (2013).

“A hiperinflação é uma Você deve lembrar que a indexação convencional é


situação de inflação baseada na inflação passada, que deixou de ser um bom
tão alta que a perda
substituto para a inflação corrente. O sistema de preços
do poder aquisitivo
da moeda faz com perde sua principal âncora e o nível geral de preços de
que as pessoas nossa economia se acelera como uma espiral.
abandonem aquela
moeda”. (GREMAUD, No início dos anos 90, a economia brasileira, pela primeira
2011, p. 96). Não existe vez apresenta uma situação de hiperinflação. Vale a
uma taxa certa para
que se possa afirmar
pena lembrar alguns números: a inflação chega a 56% em
sobre a ocorrência de janeiro, 73% em fevereiro e 84% em março de 1990.
hiperinflação. Muitos
autores consideram
que taxas de inflação 3.2 As medidas do Plano Collor I
superiores a 50%, como
aquelas ocorridas no O presidente Fernando Collor de Mello assume a
início do ano de 1990, presidência no dia 15 de março de 1990 e nesse mesmo
já caracterizam um
quadro de hiperinflação.
dia lança o Plano Collor. A adoção imediata do plano
visava a romper com a indexação da economia.

As principais medidas adotadas foram:

•• Reforma monetária
Adoção de redução drástica da liquidez da economia por meio do
bloqueio da metade dos depósitos à vista, 80% das aplicações do
overnight e fundos de curto prazo, e aproximadamente um terço dos
depósitos de poupança. A medida objetivou evitar as pressões de
consumo e retomar a capacidade do Banco Central de fazer política
monetária ativa.

94
Economia Brasileira

Segundo Giambiagi (2011, p. 138), as aplicações acima do limite


de NCr$ 50.000,00, em torno de US$1.200,00 ao câmbio da época,
sofreram um bloqueio por um prazo de um ano e meio. A devolução
dos cruzados novos bloqueados aconteceria a partir de setembro
de 1991, em doze prestações iguais e sucessivas, recebendo a
correção monetária mais os juros de 6% ao ano.

•• Reforma administrativa e fiscal


A reforma administrativa previa o programa de privatizações e a
melhoria dos instrumentos de fiscalização e de arrecadação para
diminuir as fraudes e a sonegação. Além disso, o governo adotou
um maior controle sobre os bancos estaduais e medidas para
aumentar a eficiência da administração do setor público e redução
dos gastos.

Giambiagi (2011, p. 139) cita que o número de ministérios foi


reduzido de 23 para 12, uma série de autarquias e fundações
foram extintas e um regime de câmbio flutuante foi implementado.
O Ministério da Economia agregou as pastas da fazenda e do
planejamento, sob o comando da ministra Zélia Cardoso de Mello.

Fez parte dessa reforma medidas de: redução do custo de rolagem


da dívida pública, suspensão dos subsídios, incentivos fiscais
e isenções, ampliação da base tributária pela incorporação dos
ganhos da agricultura, do setor exportador e dos ganhos de capital
nas bolsas, tributação das grandes fortunas, IOF extraordinário
sobre o estoque de ativos financeiros e fim do anonimato fiscal,
mediante a proibição dos cheques e das ações ao portador.

De acordo com Souza (2008, p. 207), citando os estudos do Instituto


de Economia do Setor Público da Fundação do Desenvolvimento
Administrativo (Iesp‑Fundap), a redução dos gastos públicos afetou
principalmente os gastos sociais. Os gastos com a educação foram
reduzidos pela metade e os com a saúde caíram 44%, quando
comparados aos valores aplicados em 1989.

•• Congelamento de preços e desindexação dos salários em


relação à inflação passada
O Plano Collor I reintroduziu o cruzeiro como padrão monetário.
O congelamento de preços de bens e serviços aconteceu em meados
do mês de março, sendo que os trabalhadores não receberam a
variação ocorrida nos primeiros dias deste mês. Uma nova regra de
prefixação de preços e salários entraria em vigor a partir de 1º de
maio de 1990.

95
Capítulo 4

•• Mudança do regime cambial para taxas flutuantes, definidas


livremente pelo mercado. A taxa de câmbio sofreu forte valorização
com a aceleração inflacionária no segundo semestre de 1990.
Esse fato, combinado com os menores incentivos para exportação
e a maior facilidade para importação, (além da Guerra do Golfo que
elevou significativamente o preço do barril do petróleo), deteriorou
o saldo da Balança Comercial. O Banco Central, então, interveio
no mercado cambial e promoveu uma grande desvalorização do
cruzeiro, medida que alimentou ainda mais o processo inflacionário.
•• Promoção da abertura comercial
A política comercial mudou, dando início ao processo de liberalização
do comércio exterior. Especialmente esse assunto você estudou na
seção dois desta unidade.

O Plano Collor I recebeu muitas críticas, entre elas:

•• O bloqueio dos recursos foi considerado uma inadmissível


intervenção estatal;
•• O limite imposto era baixo e prejudicava pequenos poupadores;
•• A remuneração oferecida foi inferior ao rendimento de outras aplicações;
•• A prática do congelamento de preços e salários já estava
desgastada perante a sociedade brasileira;
•• O ajuste fiscal foi baseado em aumento de receitas e não em cortes
de gastos;
•• O Plano Collor I confundiu os conceitos de “fluxo” e “estoque”.

Mas por que a inflação voltou após os Planos Collor?

Segundo Bresser Pereira (1991), existem três explicações para a volta da inflação:

•• a monetarista: O pensamento monetarista tem por base o aumento


de oferta monetária, que nos três meses seguintes ao plano sofreu um
aumento de quatro vezes. O aumento da base monetária basta para
a volta da inflação, não necessitando haver um excesso de demanda.
“O aumento de liquidez gerou expectativas que a inflação voltaria – e a
“expectativa racional” é uma profecia que se autorrealiza”.

96
Economia Brasileira

•• a keynesiana:. De acordo com o pensamento keynesiano, a inflação


voltou porque o aumento da oferta de moeda teria causado um
excesso de demanda. O choque de liquidez “contém” a inflação
temporariamente. A liquidez se restabelece, a demanda se recupera
e, por conta disto, volta a inflação;
•• a neo‑estruturalista (inercialista): A explicação não reside nos erros
relacionados à oferta de moeda, mas sim na natureza da inflação
no Brasil. A inflação aqui era inercial e, como dito anteriormente,
em níveis de hiperinflação, quando do lançamento do Plano Collor I.
Os agentes econômicos, acostumados à inflação, acreditaram que
aumentar os preços seria a melhor maneira de se proteger.

Observe que:

Em 16 de março, no momento do congelamento de preços e salários,


as empresas que tinham acabado de aumentar seus preços “ganharam
com o congelamento”. Já aquelas que estavam por aumentar os preços,
perderam com essa medida, prejudicadas pelo bloqueio de seus ativos
financeiros. Aqui estão dois bons motivos para que as empresas, na
primeira oportunidade, façam a remarcação de seus preços para cima.

Bresser Pereira (1991, p.112), ao estudar a hiperinflação e os planos de


estabilização, conclui sobre o Plano Collor I:

O Plano Collor não foi capaz de controlar a inflação. O governo


Collor falhou em sua primeira prova. Mas ela não será a última.
A época da inflação crônica está acabando no Brasil. Depois
da breve experiência brasileira com hiperinflação, parece claro
que o controle da inflação terá prioridade no governo Collor.
O Plano Collor I contou demais com a drástica redução da oferta
monetária. Por outro lado, alguns erros relacionados a oferta de
moeda e aos salários, um ajustamento fiscal incompleto, uma
visão errônea acerca da taxa de câmbio, as dificuldades naturais
em sair de um congelamento em condições de preços relativos
desequilibrados, a demora em enfrentar a dívida externa e em
liberalizar o comércio e finalmente a falta de um verdadeiro
acordo social e político trabalharam contra o plano. Mais uma vez,
o pior inimigo dos planos de estabilização no Brasil – a inflação
inercial – não foi vencido.

A aceleração inflacionária no início de 1991 e a dificuldade crescente de financiamento


do governo levaram a um novo plano de estabilização: o Plano Collor II.

97
Capítulo 4

3.3 As medidas do Plano Collor II


Em 1º de fevereiro de 1991 é lançado o Plano Collor II, com objetivo de conter as
taxas de inflação, que já estavam ao redor de 20%.

As duas principais medidas tomadas sob o comando da Ministra Zélia Cardoso


de Mello foram:

•• Reforma financeira. A proposição do plano é dar fim a toda e


qualquer forma de indexação da economia. São extintos os fundos
de investimento de curto prazo, inclusive aqueles cobertos por
operações de overnight, e outras formas de indexação como o BTN
(Bônus do Tesouro Nacional), que era utilizado como referência para
a indexação dos impostos.
Giambiagi (2011, p. 141) comenta que foi criado o Fundo de
Aplicações Financeiras (FAF), que teria como rendimento a Taxa
Referencial (TR). A TR, ao invés de considerar a inflação passada,
introduzia um elemento forward looking para a indexação no Brasil,
e embutia “expectativas de inflação futura”.

•• Congelamento de preços e salários. Segundo Souza (2008, p. 209),


“os preços foram congelados somente pró‑forma, pois se adotaram
cláusulas que significavam, na prática, manter os preços livres”.
Os salários foram convertidos pela média real dos últimos doze
meses, isso, em momento de acelerada inflação, acaba se traduzindo
em “arrocho salarial”.

Simultaneamente às medidas anteriores, o governo tentou uma maior austeridade


fiscal, por meio da racionalização dos gastos nas administrações públicas e do
corte das despesas (GREMAUD, 2011, p. 442).

Apesar da queda da inflação observada entre fevereiro a maio de 1991, escândalos


e a resistência política à equipe econômica, a Ministra Zélia Cardoso de Mello deixa
o cargo e assume o ex‑embaixador brasileiro em Washington, Marcílio Marques
Moreira, como Ministro da Fazenda.

O novo ministro adotou uma tentativa de combate gradual à inflação,


contemplando as medidas:

•• Controle do fluxo de caixa do governo e dos meios de pagamento;


•• Preocupação com a negociação da dívida externa;
•• Reaproximação do país com o sistema financeiro internacional;
•• Descongelamento dos preços;
•• Desbloqueio dos ativos que estavam no Banco Central.

98
Economia Brasileira

Nesse período, o Brasil tem certo alívio do ponto de vista externo. As altas
taxas de juros, a manutenção da taxa de câmbio real e a abertura financeira,
combinadas com um cenário de desaquecimento internacional, contribuem para
a entrada de capital externo no país e elevação de reservas.

O comportamento da evolução das reservas internacionais do Brasil (liquidez


internacional, em milhões de US$), de 1990 a 2000, é apresentado na Figura 4.2.

Figura 4.2 ‑ Reservas Internacionais do Brasil: liquidez internacional US$ (milhões)

Fonte: Elaboração do autor (2013).

Concluímos que o período Collor de Mello marca a volta dos recursos externos
ao Brasil e traz à baila a discussão sobre a abertura comercial (mudança na
estratégia de comércio exterior) e sobre um tema ainda hoje controverso:
a privatização. Esse último é o nosso próximo assunto.

Seção 4
Privatização
Você inicia o estudo de um tema controverso e que tomou um bom espaço na
mídia nos anos 90: as privatizações.

A presença de empresas estatais em nossa economia acontece desde o período


colonial. Segundo Guedes (2007, p. 196), essa presença toma impulso durante o
Governo de Getúlio Vargas, com o objetivo de:

•• manter sob controle público setores estratégicos da economia;


•• defender o nacionalismo econômico, o protecionismo, os investimentos
públicos em infraestrutura e a criação de monopólios públicos.

99
Capítulo 4

Em 1940, havia no Brasil cerca de 20 empresas estatais. Esse número pula


para 268 em 1979. Com o agravamento das condições econômicas a partir de
1980, o governo brasileiro inicia o processo de privatização, que se mostra mais
dinâmico na década de 90.

Quais são as razões alegadas para se iniciar um processo de privatização?

Gremaud (2011, p. 580) aponta quatro razões:

a. I neficiência das empresas públicas, decretada pela baixa


qualidade dos serviços e/ou pela existência de déficit financeiro
nas empresas estatais;
b. Diminuição da capacidade estatal em fazer os investimentos
necessários à manutenção e da ampliação dos serviços e
atualização tecnológica das empresas;
c. Necessidade de gerar receitas para abater a elevada dívida estatal;
d. Mudanças no quadro tecnológico e financeiro internacional.

O mesmo autor faz referência ao primeiro aspecto, relacionado à qualidade dos


serviços prestados, e apresenta os resultados de análises de empresas estatais
válidas não só para o Brasil, mas em termos mundiais, listados a seguir:

•• baixo nível de eficiência operacional, que traz como resultado baixa


qualidade dos serviços prestados;
•• fraca mobilização de recursos financeiros, que traz como resultado
uma inadequada capacidade de recuperação dos custos incorridos
na prestação dos serviços;
•• crescente deterioração física dos ativos, resultado de inadequada
manutenção e decorrente da indisponibilidade de recursos financeiros;
•• desbalanceamento entre oferta e demanda que se agrava por um
viés preferencial por novos investimentos.

O último ponto apresentado está associado aos interesses de natureza política,


que tendem a privilegiar a realização de novas obras quando comparado ao
cuidado e à otimização dos ativos existentes.

100
Economia Brasileira

Sobre os resultados apontados pelos estudos, Gremaud (2011, p. 580) observa:

Tais resultados são vistos como decorrência da própria


característica monopolista das empresas, que, em razão da não
existência de concorrentes, diminuem sua preocupação com
a eficiência na utilização dos recursos. Esse fato é fortemente
agravado pela ingerência política na administração e pela falta
de responsabilidade que o aparato institucional imputa aos
administradores da empresa.

Souza (2008, p. 212) prefere não adotar a expressão “monopólio público”.


A empresa pública expressa o conjunto de interesses representado pelo Estado,
interesses que sempre terão objetivos coletivos. Argumenta, ainda, que o Estado
“tem que responder às necessidades do conjunto da sociedade, sob pena de
perder legitimidade – e assim também as estatais. Não é, portanto, monopólio”.

No Brasil se observou certa decepção em relação aos resultados e à qualidade


dos serviços prestados pelo serviço público, apesar do seu crescimento.
Este tipo de serviço deveria ser especialmente importante para a diminuição da
pobreza e das desigualdades, mas muitas vezes quem mais se aproveita não são
os que mais necessitam dos serviços.

Giambiagi (2011, p. 136) utiliza a metáfora que será preciso uma “cenoura” e um
“porrete” para fazer a “carroça da indústria nacional” voltar a andar. Cita Erber e
Vermulm (1993), que concebem a Política Industrial e de Comércio Exterior (PICE)
como sendo uma “pinça” que possui uma “perna” para incentivar a competição e
a outra “perna” para incentivar a competitividade.

Erber e Vermulm (1993) afirmam ainda que a “perna” da competição foi


mais forte do que da competitividade, apesar dos gastos em pesquisa e
desenvolvimento (P&D) no Brasil terem saltado de 0,5%, em 1989, para 1,3%
do PIB, em 1994, como resultado da PICE. Você deve lembrar que o governo
enfatizaria, internamente, uma estratégia de privatização e, externamente, uma
reforma tarifária e de comércio exterior.

Outra interessante reflexão feita por Gremaud (2011, p. 581) é sobre a difusão de
novas tecnologias, novos métodos de produção e mesmo novos produtos que
criam a oportunidade de modificar o modo de fornecimento dos serviços públicos.
O avanço tecnológico minimizaria as preocupações citadas anteriormente sobre a
falta de concorrência em certas atividades.

O desenvolvimento de novos produtos pode gerar concorrência não somente


dentro de determinado ramo de atividade, mas entre diferentes ramos.
A concorrência entre determinados tipos de energias ou formas alternativas de
transportes são alguns exemplos.

101
Capítulo 4

4.1 Resumo das fases do processo de privatização do Brasil


até 1994
O processo de privatização até 1994 pode ser dividido em três fases: a ocorrida
na década de 80; entre 1991 e 1992; e, por último, entre 1993 1994. A seguir,
vamos estudar um pouco mais sobre essas fases e os resultados obtidos.

Um resumo sobre o processo de privatização por período e os resultados obtidos


é apresentado na Tabela 4.3.

Tabela 4.3 – Processo de privatização: um resumo até o ano de 1994, com valores em milhões de US$

Moedas
Nº de Valor Dívidas
Tipo Período Total podres/
empresas arrecadado transferidas total

1981‑89 39 735

1991 4 1.614 374 1.988 98,9


Reprivatização
1992 14 2.401 982 3.383 98,7
PND
1993 6 2.627 1.561 4.188 92,3

1994 9 1.966 349 2.315 28

Total   72 8.608 3.266 12.609


Fonte: Adaptado de Gremaud (2011).

Na década de 80, primeira fase, ocorre a reprivatização, quando foram


vendidas as empresas estatizadas que estavam em situação de falência.
Naquele período, foram reprivatizadas 39 empresas, o que permitiu arrecadar
um total de US$ 735 milhões.

A segunda fase do processo de privatização do Brasil, entre 1991 e 1992,


ocorre com a criação do Programa Nacional de Desestatização (PND), que
naquele momento foi considerado prioritário. Giambiagi (2011, p. 136) aponta as
pretensões do PND:

1. Contribuir para o redesenho do parque industrial;


2. Consolidar a estabilidade;
3. Reduzir a dívida pública (via aceitação de títulos como moeda
de privatização).

Entre 1991 e 1992 foram vendidas 18 empresas, ainda durante o governo Collor,
representando um valor total arrecadado de US$5.371 milhões. Segundo

102
Economia Brasileira

Gremaud (2011, p. 583), as principais empresas vendidas eram de setores


produtores de bens siderúrgicos, petroquímicos e fertilizantes.

Segundo Rego (2006, A terceira fase do processo de privatização no Brasil,


p. 217), o incentivo à entre 1993 e 1994, ocorreu durante todo o governo Itamar
compra foi realizado
mediante aceitação
Franco. Nessa fase, segundo Gremaud (2011, p. 583),
das moedas de parte dos aspectos legais sofreram alterações: “ampliação
privatização, também do aceite das chamadas moedas podres – antigas dívidas
conhecidas como
do Governo Federal, não limitação ao capital estrangeiro,
moedas podres.
venda de participações minoritárias”.

O processo de privatização brasileiro admite, para aquisição das


participações acionárias das sociedades a serem desestatizadas,
outros meios de pagamento além da moeda corrente: as
chamadas moedas de privatização. São dívidas contraídas no
passado pelo governo federal, aceitas como forma de pagamento
das ações das empresas estatais que estão sendo privatizadas.
Dessa forma, o governo federal reduz seu endividamento e
liquida os compromissos financeiros provenientes dessas dívidas.

Ainda na terceira fase, 15 empresas do setor siderúrgico, petroquímico e


fertilizante foram privatizadas, permitindo arrecadar US$6.503 milhões. Essa fase
praticamente finaliza a privatização de empresas produtoras de bens.

Você pode concluir que nos governos Fernando Collor e Itamar Franco foram
privatizadas 33 empresas federais, uma arrecadação de US$ 8.6 bilhões, com
transferência para o setor privado de US$ 3,3 bilhões em dívidas.

Os números acima são relativamente modestos em relação à proposição inicial.


Giambiagi (2011, p. 137) apresenta várias explicações para esses números:

(1) Muitas empresas públicas estavam em má situação financeira


e precisavam ser saneadas para que existisse interesse em sua
aquisição;
(2) Existia grande dificuldade em avaliar os ativos de diversas
estatais, após anos de alta inflação e várias mudanças de moeda;
(3) Havia resistência do público e um governo que perdia credibilidade;
(4) Alguns setores, tais como o de jazidas minerais e setor
elétrico, não podiam, pela Constituição de 1988, ser vendidos
para estrangeiros;
(5) Operações mais complexas exigiam per se ganhos de
experiência de privatização, que ainda não existiam.

Além dessas explicações, você deve lembrar que as dificuldades relacionadas ao


controle da inflação exigiram boa parte do esforço do governo. Isso fez com que
as privatizações ficassem em segundo plano.

103
Capítulo 4

Seção 5
A economia brasileira entre 1990 ‑ 1994
Nas seções anteriores, você estudou as reformas relacionadas à abertura
comercial, a política de privatização e os Planos Collor I e II, que ocorreram no
período 1990 – 1994.

Agora chegou o momento de conhecer, com mais detalhes, o comportamento


do PIB, da inflação, do balanço de pagamentos e das contas fiscais no período
1990 a 1994, utilizando‑se de séries estatísticas disponíveis. Com isso, você irá
entender melhor as implicações das mudanças que ocorreram na economia por
conta das reformas e dos planos econômicos.

5.1 A evolução do Produto Interno Bruto


O crescimento médio do PIB no período compreendido entre os governos
Fernando Collor e Itamar Franco (1990 a 1994) foi de 1,24% ao ano, mas
apresentou um comportamento diverso quando avaliado ano a ano. A Figura 4.3
destaca a evolução do PIB do Brasil no intervalo de 1989 a 1994.

Figura 4.3 ‑ Variação real anual do PIB do Brasil, em % a.a.: período 1989 a 1994

Fonte: adaptado de IPEADATA e IBGE (2013).

O Plano Collor I promoveu uma violenta retração da economia no ano de


1990, – 4,3% ao ano (a.a.). A explicação é simples, e você já a conhece:
o “sequestro de liquidez” realizado com o plano retira o dinheiro da economia e,
por conta disso, essa entra em crise. Segundo Souza (2008, p. 207), “a situação
se agravou em face do violento arrocho salarial e do corte dos gastos públicos,
que derrubaram fortemente a demanda”.

104
Economia Brasileira

No ano seguinte, em 1991, o desempenho do PIB melhorou um pouco ao crescer


1,03%, mas volta a cair em 1992, ‑ 0,47%. A queda observada muito se deve à
instalação de uma crise em decorrência do processo de impeachment do presidente.

O ano de 1992 foi o último com taxa de crescimento negativa para o PIB
brasileiro até a chegada do ano de 2009, que diminui 0,33%, sob os efeitos
da crise financeira mundial de 2008.

No intervalo 1993‑94, no governo Itamar, a economia brasileira retoma seu ciclo


de expansão, apresentando taxas expressivas de crescimento de 4,9% em 1993
e 5,9% em 1994.

Giambiagi (2011, p. 155) associa esse crescimento à recuperação da indústria e


ao bom resultado da agropecuária em 1994, que foi chamada de “âncora verde
do real”. O aumento da oferta agrícola contribuiu para a queda da inflação. Setti
(2011), em sua coluna na Revista Veja, em 9 de março de 2011, escreveu um
artigo intitulado “PIB cresceu mais, em média, no governo de Itamar do que nos
de FHC e de Lula”. Reproduzo aqui parte de seu texto:

Em balanços publicados a partir de sexta‑feira passada, 4, muito


se enfatizou a comparação entre a média de crescimento do PIB
durante o governo do presidente Fernando Henrique Cardoso
(1995‑2003), que enfrentou várias crises internacionais – crescimento
médio de 2,3% – e a do alcançado no governo do presidente Lula,
que pegou pela proa a grande crise de 2008: 4%.

Ninguém se lembrou, porém, de apontar que bem superior, mais


de 30% melhor do que a do lula, foi a média de crescimento obtida
pelo governo do presidente Itamar: sonoros, eloquentes 5,4%.

Não se pode contar para Itamar o ano de 1992, em que a


catastrófica gestão do então presidente Fernando Collor
(1990‑1992) levou o PIB a cair 0,5%: o então vice‑presidente
assumiu a 2 de outubro de 1992, ainda como interino que depois
permaneceria com a renúncia do presidente para escapar ao
impeachment, a 29 de dezembro daquele ano.

Apesar da condução um tanto errática e atabalhoada que deu


aos negócios públicos, inclusive trocando freneticamente de
ministros – os da Agricultura, por exemplo, foram 9, em pouco
mais de dois anos, os da importantíssima Fazenda, 6 –, já no
primeiro ano completo de gestão, 1993, o país cresceu 4,9%.
No segundo, 1994, com a implantação do Plano Real, em junho,
a pancada na inflação e o aumento da renda e do consumo,
o PIB bateu em 5,9%.

Itamar, portanto, pode orgulhar‑se dos números que deixou.

105
Capítulo 4

Em linhas gerais, você pode concluir que o crescimento médio do PIB brasileiro
no período 1990‑94 foi baixo: 1,3% a.a.

5.2 O comportamento do “dragão”: a inflação


O comportamento da inflação no período 1990‑94 acompanhou o mesmo padrão
verificado na segunda metade da década de 80. Após uma tentativa de estabilização,
você deve lembrar‑se do plano Cruzado, Bresser e Verão, quando a taxa de inflação
caia muito e depois voltava a acelerar. A Figura 4.4 ilustra essa afirmação.

O Plano Verão, editado durante a gestão do ex‑ministro da fazenda Mailson da


Nóbrega, faz as taxas diminuírem significativamente, para em seguida voltar a
crescer de forma preocupante. O mesmo veio se suceder com os planos Collor I
e Collor II.

Figura 4.4 – Comportamento da taxa de inflação mensal brasileira, IGP di: 1989 – 1994

Fonte: Adaptado de IPEADATA (2013).

Nos dois primeiros meses de 1990, o Brasil viveu um momento de hiperinflação:


as taxas ultrapassaram a marca de 80% ao mês. Souza (2008, p. 208) lembrou
afirmação do presidente Fernando Collor sobre a inflação: “era um tigre que se
mataria de um tiro só”, provavelmente tentando atrair a atenção da população
para o novo pacote.

O Plano Collor I fez com que ela cedesse vertiginosamente, mais ainda em
patamares elevados, vindo sofrer aceleração logo em seguida. Segundo Cordeiro
(2005, p. 111), “a variação do IPCA em dezembro foi de 18,45%, o que perfazia o
total de 927,4% ao ano”.

Mais uma vez o dragão da inflação não estava domado. A adoção do Plano
Collor II em janeiro de 1991 faz a inflação cair e, como padrão, voltar a crescer
continuamente nos meses seguintes.

106
Economia Brasileira

Souza (2008, p. 217) afirmou que o Brasil, entre fins de 1980 até fins de 1992,
somente nos dois primeiros anos do governo Sarney escapou de adotar uma
política recessiva. Sobre isso, destaca:

Havendo concluído que, apesar de mais de uma década de


política recessiva, não se conseguira dominar a inflação, o
Presidente Itamar optou por um outro caminho: o de que a
prioridade seria não mais um suposto combate à inflação,
mas a retomada do desenvolvimento; isso implicava
também a concepção de que a inflação se combate com
desenvolvimento – e não com recessão.

O padrão de comportamento descrito anteriormente só iria sofrer uma alteração


com a introdução do Plano Real, em 1994. Este plano de estabilização será
abordado no próximo capítulo.

5.3 A balança comercial

Você lembra que o Brasil sofreu uma recessão no início do período


entre 1990‑1994?

A partir de 1992 ocorre uma expansão de nossa economia e acontece a


intensificação do processo de abertura comercial. Esses dois fatos são
importantes para a análise da balança comercial brasileira no período.

O período é marcado por superávits no saldo balança comercial, que pode ser
verificado na Figura 4.5.

Figura 4.5 – Balança comercial: exportações, importações e saldo, em US$ milhões, 1989 – 1994

Fonte: Adaptado de IPEADATA (2013).

107
Capítulo 4

Giambiagi (2011, p. 157) faz a seguinte afirmação, que pode ser verificada no
gráfico anterior:

[...] nos dois primeiros anos do período (1990 – 91), houve uma
forte retração nas exportações, em relação aos patamares
anteriores. Entretanto, nos três anos que se seguiram, as
exportações – especialmente as de manufaturados – tiveram um
comportamento significativamente expansivo.

As importações apresentaram um aumento contínuo durante esses anos.


A diminuição das tarifas médias de importação, somada à expansão da economia,
contribui para que as importações cresçam de US$20.661 milhões para
US$32.701 milhões: um aumento de 60%.

5.4 As contas públicas

Você pode se perguntar: qual foi a interferência do resultado do déficit


público no comportamento da inflação?

Segundo Lopreato (2002, p. 279) a visão dominante em economia mostra que a


causa fundamental do processo inflacionário é a expansão da moeda, e que uma
expansão acima do crescimento da produção provoca aumento da taxa de juros
nominal e da inflação. A explicação usual para a expansão da moeda é a
existência de déficits orçamentários.

O mesmo autor questiona a tese de que a política econômica deve ter como
preocupação central o déficit público e propõe:

O deficit público pode O déficit público não foi a causa determinante do processo
ser caracterizado como inflacionário vivido pela economia brasileira desde os anos
deficit primário (DP), 1980 até o início dos anos 1990. A questão central tem de ser
quando as despesas buscada na crise da dívida e na incapacidade do país de garantir
com juros e correção fontes externas de financiamento do Balanço de Pagamentos.
monetária são excluídas (LOPREATO, 2002, p. 279).
do cálculo do deficit.
O deficit público pode
ser caracterizado como Mas o bom resultado das contas públicas no período de
deficit operacional (DO) 1990 até 1993, não conteve a aceleração inflacionária.
quando somente as
A Tabela 4.4 mostra os números do déficit operacional
despesas com correção
monetária (CM) são e do resultado primário, além dos valores de juros reais
excluídas do cálculo. líquidos pagos no período de 1990 a 1994.

108
Economia Brasileira

Tabela 4.4 ‑ Necessidades de financiamento do Setor Público – 1990 ‑ 1994 (% do PIB)

1990 1991 1992 1993 1994

Déficit operacional ‑1,4 0,2 1,9 0,8 ‑1,3

Resultado primário 2,3 2,7 1,6 2,2 5,2

Juros reais líquidos 0,9 2,9 3,5 3,0 3,9


Fonte: Giambiagi (2011, p. 158).

O resultado primário apresentou um superávit de 2,3% em 1990 e continuou


a melhorar em 1991, chegando a 2,7%. A melhora do resultado primário foi
interrompida em decorrência da instabilidade política em1992, mas logo em
seguida ocorreu nova melhora nos anos seguintes, alcançando, em 1994, um
superávit de 5,2%.

Ainda sobre a tese de que para debelar a inflação é preciso cortar o gasto público,
Souza (2008, p. 218) afirma:

[...] existindo capacidade ociosa, como existia naquela época, o


déficit público, em lugar de ser inflacionário, estimula o aumento
da produção. Além disso, não havia déficit nas contas públicas
naquele período. O insuspeito Delfim Neto, que adotara um
programa anti‑inflacionário com base no corte do gasto público,
demonstrou que o déficit havia desaparecido. Em artigo na Folha
de S. Paulo, denominado “Qual o Plano”, revelou que, de 1986 a
1989, houve nas contas públicas, um superávit primário (conceito
que não inclui o pagamento dos juros) de 0,37% do PIB, em 1990
de 2,23%, em 1991 de 2,77%, em 1992 de 1,77% e em 1993 de
2,90%. (Souza, 2008, p. 218).

Os números apresentados nos permitem concluir, entre outras coisas, que o


Brasil apresentou melhora em suas contas públicas no período imediatamente
anterior ao estabelecimento do Plano Real.

5.5 Conclusão
Dessa forma, neste capítulo, você estudou a mudança de modelo de desenvolvimento
pela qual passou nossa economia no início dos anos de 1990, que foi influenciado
pelo surgimento, no cenário internacional, do chamado Consenso de Washington e do
Plano Brady.

Em seguida, você iniciou o estudo de um tema que ainda hoje é controverso e


que tomou um bom espaço na mídia nos anos de 1990: as privatizações.

109
Capítulo 4

A primeira metade dos anos 90 foi marcada pela continuidade dos sucessivos
planos de combate à inflação, que traziam como principal elemento o
congelamento de preços, com exceção do Plano Real (um dos assuntos da
próxima unidade). Você conheceu os planos de estabilização do governo Collor:
Plano Collor I e Plano Collor II.

Você aprendeu sobre o processo de abertura comercial e sua forma de


implementação nos países em desenvolvimento e no Brasil. Entendeu porque as
vantagens da liberação do comércio externo vão além da tradicional teoria das
vantagens comparativas.

Finalmente, você analisou os principais indicadores macroeconômicos da


economia brasileira no período 1990‑94 e concluiu que: o crescimento médio
do PIB foi baixo, influenciado por uma recessão no início da década; a inflação
anual média foi alta, 1.200% a.a., com grandes oscilações nas taxas de inflação;
as importações cresceram a uma taxa bem superior àquela verificada para as
exportações; e houve uma clara melhora das contas públicas.

110
Capítulo 5

Estabilização, desequilíbrios
macroeconômicos e as reformas

Habilidades Este capítulo possibilitará ao(à) aluno(a) conhecer


as circunstâncias e a implementação do plano de
estabilização de maior êxito na história do Brasil,
além de compreender alguns desequilíbrios na
economia brasileira, que surgiram por conta da
condução do plano. Estudar os esforços em favor
da estabilização empregados no primeiro governo
de Fernando Henrique. E, finalmente, conhecer
as mudanças de política macroeconômica e as
principais mudanças estruturais implementadas a
partir do seu segundo governo, que fizeram com
que nosso país ficasse com uma economia muito
mais moderna e competitiva do que em 1990.

Seções de estudo Seção 1:  O Plano Real: contexto econômico

Seção 2:  A implementação do Plano Real

Seção 3:  O primeiro governo de FHC: os esforços


em favor da estabilização

Seção 4:  Desequilíbrio do setor externo e a crise fiscal

Seção 5:  O segundo governo de FHC: a tríplice


mudança de políticas e as mudanças estruturais

111
Capítulo 5

Seção 1
O Plano Real: contexto econômico
A primeira metade dos anos 90 é marcada pela continuidade dos sucessivos
planos de combate à inflação, que traziam como principal elemento o
congelamento de preços. O último plano que você estudou, o Plano Collor II,
também não obteve êxito no controle do processo inflacionário.

A partir de agora você conhecerá a mais bem sucedida tentativa de combate à


inflação empreendida na economia brasileira, o Plano Real, que conseguiu reduzir
a inflação e mantê‑la sob controle durante longo período de tempo. Apesar do
sucesso em termos de estabilização, alguns problemas permaneceram e outros
até se agravaram.

Conhecerá os esforços em favor da estabilização de empregados no primeiro


governo de Fernando Henrique. E, finalmente, irá aprender sobre as mudanças
de política macroeconômica e as principais mudanças estruturais implementadas
a partir do seu segundo governo, que fez com que nosso país ficasse com uma
economia muito mais moderna e competitiva do que em 1990.

Bem, então vamos lá!

Em maio de 1993, o ministro das Relações Exteriores, Fernando Henrique


Cardoso, tomou posse como o quarto ministro da Fazenda do governo Itamar.
Antes dele, assumiram o ministério da Fazenda Gustavo Krauser, Paulo Haddad e
Eliseu Rezende, revelando um pouco da instabilidade dos oito meses iniciais do
governo Itamar.

Ao assumir o novo ministério, Fernando Henrique e sua equipe econômica


prepararam o novo plano de estabilização. Segundo Bacha (2012, p. 137),
os desequilíbrios das contas do setor público foram identificados como a causa
fundamental da inflação crônica e que ocorria no Brasil um “efeito Oliveira Tanzi
às avessas”.

[...] a inflação ajudava a equilibrar o orçamento, já que os


impostos eram protegidos contra a inflação, enquanto as
despesas eram determinadas no orçamento em termos
nominais. O efeito Oliveira‑Tanzi sustenta, ao contrário, que o
déficit orçamentário aumenta quando a inflação sobe, sob o
pressuposto de que os gastos do governo são fixos em termos
reais, enquanto as receitas tributárias não são protegidas contra a
inflação. (BACHA, 2012, p. 137).

Naquele período, a inflação reduzia o gasto real previsto no orçamento e gerava


um imposto inflacionário para o Tesouro Nacional, resultado do aumento da

112
Economia Brasileira

demanda de moeda a ser emitida pelo Banco Central. Segundo Giambiagi (2011,
p. 143), existia um desajuste fiscal ex ant (isto é, entre os gastos e as receitas
orçadas) muito elevado, mas, conforme a inflação ia corroendo os gastos do
governo em termos reais (e suas receitas mantinham‑se relativamente protegidas),
surgia ex post, um déficit apenas moderado.

A adoção do novo plano não poderia incorrer nos mesmos erros dos planos
anteriores. Para Gremaude (2011, p. 449), as medidas deveriam:

•• ser adotadas de forma gradual, sem provocar surpresas;


•• promover uma substituição natural de moeda, sem recorrer a
congelamentos de preços e salários;
•• ter uma preocupação com os desequilíbrios existentes na economia;
•• considerar que o contexto da aplicação do plano era muito diferente,
dado que a inserção internacional do país era completamente
distinta daquela observada nos planos anteriores.

O deficit público pode O ministro Fernando Henrique e sua equipe sabiam da


ser caracterizado como necessidade de ir além das metas fiscais do programa
déficit nominal (DN)
econômico. Em 1993, o orçamento operacional apresentou
quando se inclui no seu
cálculo o pagamento um superávit de 0,25% do PIB, enquanto o déficit nominal
dos juros nominais foi de 58.4% do PIB. Lembre‑se de que a inflação, naquele
sobre a dívida pública. ano, foi de 2.490%.

Quando o déficit nominal seria igual ao déficit operacional?

Segundo Bacha (2012, p. 139), isso ocorreria quando não houvesse inflação,
uma vez que, se o déficit operacional está em equilíbrio, a oferta monetária deixa
de crescer, contribuindo para o fim da inflação. Nesse sentido, o controle do
déficit nominal era um problema monetário, e não fiscal.

O programa de estabilização foi submetido ao presidente Itamar, que esperava


resultados mais imediatos e com menos precondições, mas aprovou o programa.
Segundo Bacha (2012, p. 141), o programa foi submetido também à liderança
do PSDB, quando o senador Mário Covas sintetizou a discussão nos seguintes
termos: “Neste partido, nós, políticos, damos a direção política e vocês,
economistas, dão a direção técnica: se essa é a única maneira pela qual vocês
acham razoável proceder, OK, nós os acompanharemos... até o precipício!”.
BACHA (2012, p. 141).

Souza (2008, p. 224) identifica oito etapas em que o Plano Real foi desdobrado:
1) renegociação da dívida externa e suspensão da moratória; 2) criação da “âncora

113
Capítulo 5

monetária”; 3) criação da “âncora fiscal”; 4) transição para uma nova moeda;


5) criação da nova moeda; 6) criação da “âncora cambial”; 7) implementação de
um amplo programa de desestatização da economia; e, 8) eleição do presidente
Fernando Henrique para a presidência da república.

A maioria dos autores identifica três estágios principais, que compreenderiam


estas etapas: Estágio 1 – O ajuste fiscal; Estágio 2 – Desindexação; e Estágio
3 – Âncora nominal. Na próxima seção, você estudará o desdobramento,
a concepção e a prática da implementação do Plano Real em cada um desses
três estágios.

Seção 2
A implementação do Plano Real
Você estudou que o Plano Real pode ser concebido como um programa em três
estágios, de modo a evitar os equívocos e os fracassos dos planos anteriores.
O ataque ao processo inflacionário foi apresentado ao país por Fernando Henrique,
em 7 de dezembro de 1993.

Oliveira (2006, p. 113) cita que o governo diagnosticava as seguintes necessidades,


quando em junho de 1993 apresentou um plano econômico para estabilizar a
economia, o Plano de Ação Imediata (PAI): reduzir os gastos da União e aumentar a
eficiência no ano de 1993; recuperar a receita tributária; equacionar as dívidas dos
estados e municípios com a União; controlar os bancos estaduais de forma mais
rígida; sanear os bancos federais; aperfeiçoar o programa de privatização.

2.1 Estágio I: o ajuste fiscal


O primeiro estágio do Plano Real era um mecanismo de equilíbrio orçamentário
para os próximos anos e para impedir a ocorrência de pressões inflacionárias em
decorrência do desequilíbrio orçamentário. Foi composto por três esforços de
ajuste fiscal: a) o Programa de Ação Imediata (PAI); b) o aumento das receitas; e
c) o Fundo Social de Emergência (FSE).

a) Programa de Ação Imediata (PAI)


Segundo Giambiagi (2011, p. 143), o Programa de Ação Imediata já havia sido
lançado em maio de 1993, redefinindo a relação da União com os Estados e do
Banco Central com os bancos estaduais e municipais, além de um programa de
combate à sonegação.

114
Economia Brasileira

Oliveira (2006, p. 115) ressalta o otimismo de Fernando Henrique, em junho de


1993, a respeito das perspectivas do PAI:

O Brasil está a um passo de uma grande transformação (...)


Vamos resolver esses problemas [da inflação, crise cambial,
da miséria etc.] sem mágica ou planos mirabolantes. Se vários
países latino‑americanos têm logrado êxito em seus programas
de estabilização, por que o Brasil, com uma economia muito mais
forte e dinâmica, não haverá de consegui‑lo também?

Souza (2008, p. 222) comenta que a ideia básica do PAI pode ser assim resumida:
“O diagnóstico sobre a causa fundamental da doença inflacionária já foi feito. É a
desordem financeira e administrativa do setor público”. Por isso, a terapia preconizada:
o governo deve arrumar a sua própria casa e colocar as contas em ordem.

Para enfrentar esses problemas, o PAI previu as seguintes medidas iniciais:


corte orçamentário de US$ 6 bilhões em 1993; a proposta orçamentária de 1994
deveria ser uma estimativa realista; um projeto de lei que limitasse as despesas
com os servidores civis em 60% da receita corrente da União, assim como dos
estados e municípios; elaboração de projeto de lei que defina as normas de
cooperação da União com os estados e municípios.

b) O aumento das receitas


Rego (2006, p. 231) comenta que “para cada cruzeiro arrecadado, outro cruzeiro
era sonegado.” Em vista deste problema, para aumentar a arrecadação foram
tomadas medidas de combate à sonegação, entre elas: iniciou‑se uma campanha
massiva de conscientização contra a sonegação; aumentou‑se a fiscalização
especialmente sobre as maiores empresas do país; e atuou‑se de maneira mais
contundente na cobrança dos impostos das pessoas físicas.

Segundo Gremaude (2011, p. 450), o aumento da arrecadação se daria também


pela criação de um novo imposto, chamado de Imposto Provisório sobre
Movimentação Financeira (IPMF), que depois se tornou a Contribuição Provisória
sobre Movimentação Financeira (CPMF). Esse imposto ficou conhecido como
“imposto do cheque”, que estabelecia uma alíquota de 0,25% sobre o valor de
toda operação com cheque.

Era um imposto criado para equilibrar as contas do governo no biênio 1993‑1994,


que apresentava facilidade de recolhimento e uma ampla base tributária (com
incidência inclusive nas atividades informais). Como sua incidência ocorria em
todas as etapas do processo produtivo, o imposto desestimulava a intermediação
financeira e contribuía para ampliar as taxas de juros.

115
Capítulo 5

c) O Fundo Social de Emergência (FSE)


A criação do Fundo Social de Emergência, que não era nem de emergência e nem
tão pouco social, foi a principal medida de ajuste fiscal que abrigou no primeiro
ano US$15,8 bilhões.

Segundo Souza (2008, p. 227), o FSE seria abastecido por três fontes de recursos:

1. Aumento dos impostos dos que já pagavam, mediante a


incidência de 5% sobre as taxas vigentes dos tributos federais;
2. Desvinculação de 20% das transferências constitucionais e
legais, particularmente das destinadas aos Estados, municípios,
educação, habitação (20% do então IPMF) e fundos regionais;
3. Destinação de 20% de todas as receitas não vinculadas.

A aprovação do Fundo Social de Emergência permitiu um corte de 20% das


destinações orçamentárias, nos anos fiscais de 1994 e 1995. Até esse percentual
de impostos arrecadados, a União não teria que cumprir as vinculações de
despesas estabelecidas na Constituição de 1988.

A diminuição das transferências do governo ampliava os recursos livres à


disposição do governo federal. Você deve lembrar também que o FSE foi
concebido como um instrumento temporário para equilibrar o orçamento,
enquanto as medidas mais permanentes não entrassem em vigor.

Para Giambiagi (2011, p. 145), as mudanças introduzidas pelo PAI e pelo FSE
não se mostraram suficientes para assegurar o equilíbrio fiscal sequer em 1995.
Lembre‑se também de que reformas estruturais, consideradas fundamentais
para a estabilidade duradoura, não foram feitas. Essas reformas não tiveram sua
aprovação no Congresso.

Na prática, o ajuste fiscal não se comprovou como uma precondição para a


estabilidade. Como você verá a seguir, o mesmo não poderá ser dito em relação
às medidas do segundo estágio: as medidas de desindexação.

2.2 Estágio 2 – desindexação


Em primeiro de março de 1994, o governo brasileiro introduziu uma unidade
de conta estável denominada de Unidade Real de Valor (URV), que marca o
início da reforma monetária. O objetivo principal da desindexação foi eliminar o
componente inercial da inflação e “zerar a memória inflacionária”.

A URV seria corrigida diariamente pela taxa de inflação medida por vários índices
(IGP‑M, IPC‑FIPE e IPCA), sendo que o seu valor nessa fase seria a própria taxa
de câmbio (paridade fixa de um para um com o dólar).

116
Economia Brasileira

Bacha (2012, p. 143) explica que os contratos com preços e salários foram
redenominados nessa nova unidade de conta, com poucas exceções. Os termos
das conversões poderiam ser negociados livremente, com exceção dos salários,
aluguéis residenciais, mensalidades escolares e preços e tarifas públicos.

Por que é mais fácil combater uma hiperinflação do que eliminar


inflações altas?

Giambiagi (2011, p. 147) comenta que na inflação alta os preços acompanham os


movimentos da inflação passada, enquanto que na hiperinflação isso não ocorre:
os preços passam a seguir os movimentos de outra moeda (por exemplo, o dólar).
Assim, através da URV, implementou‑se uma reforma monetária que anula a
memória inflacionária, simulando uma hiperinflação, sem viver suas consequências.

Bacha (2012, p. 144) sustenta que a principal finalidade deste segundo estágio era:

[...] alinhar os preços relativos mais importantes da economia,


uma vez que contratos indexados, com indicadores e datas de
reajuste diferentes, implicava uma grande dispersão de preços
a qualquer momento, com alguns deles tendo sido reajustados
recentemente e outros apresentando uma grande defasagem.
Em tais circunstâncias, uma súbita interrupção do processo
inflacionário surpreenderia alguns preços em seu valor de pico
e outros no vale. Tais desalinhamentos de preços tenderiam
inevitavelmente a impor pressões inflacionárias adicionais, na
medida em que cláusulas prévias de reajustes continuariam
a forçar para cima os preços defasados. Esse mecanismo de
indexação não sincronizado forçaria o chamado componente
inercial da inflação brasileira, distinto do componente estrutural
associado ao déficit operacional ex ante do orçamento federal.

A URV durou apenas de março a junho de 1994. Em 1º de julho, daquele ano,


o Banco Central começa a emitir a URV como a nossa nova moeda: o Real.
Inicia‑se aqui o terceiro estágio: a introdução do Real.

2.3 Estágio 3 – a nova moeda e a âncora nominal


As medidas que afetaram diretamente a vidas das pessoas foram: (1) a mudança
na unidade monetária; (2) a conversão de todos os contratos pré‑fixados em URV
para reais; e (3) a limitação da correção monetária à variação do Índice de Preços
ao Consumidor em reais (IPCr).

117
Capítulo 5

Se você recebesse seu salário no dia 25 de junho de 1994, no valor de


CR$ 4.000.000,00 (quatro milhões de cruzeiros), qual seria o valor do seu
salário em URVs? Você teria que identificar o valor da URV do dia 25/06/94,
que no caso era CR$2.547,09. Assim sendo, bastaria dividir o valor de seu
salário pelo valor da URV diária (CR$ 4.000.000,00 / CR$ 2.547,09) para
encontrar o valor de seu contracheque: 1.570,42 URVs. Assim, quando
praticamente todos os preços estavam expressos em URV, o governo
introduziu a nova moeda, o Real (R$). Os preços em CR$ foram convertidos
em R$, agora dividindo pelo valor da URV do dia, que no caso de nosso
exemplo seria 1º de julho: CR$2.750,00.

O humorista e apresentador de televisão Jô Soares escreveu um texto sobre a


chegada da nova moeda, que foi publicado na Revista Veja, de 6 de julho de 1994.
Vale a pena conferir!

DE AO REAL
Jô Soares

Do nome que já trazes do teu berço altivo,


nascendo assim, sem mais, trazendo sangue azul,
já és de fato, e tão adjetivo
quanto a constelação do Cruzeiro do Sul.

Real! Que nome lindo e cheio de esperança,


só mesmo sendo nobre pra de supetão,
num gesto audaz, viril, usando em riste a lança,
matar, como São Jorge, o dragão da inflação.

Não sei porque ninguém pensou: sensacional!


Trocar o nome logo de nosso dinheiro:
se perde o seu valor, que ideia genial!
É só mudar o nome do plebeu cruzeiro.

O que me aflige ainda é que no plano inteiro


ninguém imaginou nem viu este percalço:
como saber de cara olhando este dinheiro
quando o real é real ou quando o real é falso?

E fico pensando se vai ser aceita


na hora de pagar a conta do açougueiro.
O seu Manoel estuda a nota recém‑feita:
“Este real é falso, o senhor não tem cruzeiro?”

118
Economia Brasileira

E o que será leitor, realmente um falso real?


Isso me deixa neste instante curioso:
é apenas uma falsificação genial
ou não passa de um rei que é muito mentiroso?

E outra dúvida cruel já me atormenta,


nesta hora vital da troca de dinheiro.
O que vai valer mais depois dessa tormenta?
O real falso ou um cruzeiro verdadeiro?

Em vez deste real seria melhor talvez


pra termos finalmente a inflação em queda
trocar mesmo por dólar logo de uma vez
todo o dinheiro lá da casa da moeda.

Fonte: Revista Veja, 6 de julho de 1994, edição 1347.


Disponível em: <http://veja.abril.com.br/acervodigital/
home.aspx>. Acesso em: 8 jan 2013.

No momento da conversão houve uma aceleração inflacionária, já que alguns


agentes tentaram elevar seus preços para tirar alguma vantagem ou se precaver
de um possível congelamento, que de fato acabou não sendo efetivado.

Oliveira (2006, p. 117) lembra que durante a apresentação da Exposição de


Motivos da Medida Provisória do Real pode‑se aprender a visão do então ministro
da Fazenda Rubens Ricúpero. O ministro assim apresentou as medidas:

A partir de 1º de julho, com a entrada da nova moeda,


os brasileiros começarão a sentir os efeitos da queda decisiva
da inflação. Cabe recapitular as medidas preparatórias que,
cuidadosamente elaboradas e implementadas ao longo dos
últimos doze meses, permitem a Vossa Excelência transmitir
ao País a convicção de que a vitória agora conquistada
sobre a inflação nada tem de artificial ou efêmera, mas
inaugura um ciclo duradouro de estabilidade, prosperidade
crescente e – o que é mais importante – de justiça social
na história brasileira. (OLIVEIRA, 2006, p. 117).

Você deve lembrar também que o Plano Real foi implantado em condições de
período eleitoral, inclusive para a presidência da República. Bacha (2012, p. 151),
sobre o momento político, lembra o seguinte:

119
Capítulo 5

Tendo‑se obtido a partir de 1º de julho de 1994 o controle


inflacionário inicial, todos os candidatos tiveram de adaptar
seus discursos eleitorais à nova realidade monetária,
comprometendo‑se a manter intacto o plano caso fossem eleitos.
Mas o principal beneficiário do sucesso inicial do plano foi seu
autor, Fernando Henrique. No início da campanha, as pesquisas
de opinião conferiam‑lhe a metade dos votos do candidato líder,
Lula. Fernando Henrique assumiu a liderança das pesquisas após
a introdução do real e elegeu‑se presidente com uma maioria de
54% dos votos no primeiro turno.

Segundo Bacha (2012, p. 146), quando comparado a outros programas de reforma


monetária, o Plano Real apresentou cinco principais características peculiares:

1. A desindexação de preços e salários foi precedida de


uma fase de indexação plena. Pode parecer estranha essa
medida, dado o diagnóstico de que a dificuldade de controle da
inflação residia exatamente no alto grau de indexação de nossa
economia. A explicação de como seria possível uma acentuação
no mecanismo de indexação ajudar o combate à inflação é
apresentada pelo mesmo autor, Bacha (2012, p. 146).
2. A reforma monetária foi preanunciada, negociada com o
Congresso e introduzida sem congelamento de preços e salários.
Através de mecanismos informais de consulta e de negociação
para manter seus preços constantes em reais, chegou‑se a acordos
entre o governo e os grupos empresariais mais importantes do país.
A cooperação foi negociada, e não imposta.
3. A estabilidade foi alcançada sem confisco de ativos financeiros.
Como você estudou, o Plano Collor I decretou o bloqueio de 75%
de todas as contas de curto prazo por um período de 18 meses
(apenas os 25% restantes teriam liquidez imediata). Diferentemente,
o Plano Real procurou: conscientizar a população da necessidade
de zerar o déficit operacional do orçamento; obter do Congresso
a aprovação da emenda constitucional para garantir tal equilíbrio
no período 1994/95; proceder à conversão monetária passo
a passo, introduzindo a nova moeda de forma transparente e
gradual. Prometia‑se uma estabilização, segundo Bacha (2012,
p. 158), “sem choque, sem congelamento e sem confisco” e, para
conquistar a confiança da população, seria feito apenas o que foi
anunciado e anunciado apenas o que seria feito.
4. Estabilização com políticas cambial e monetária flexíveis.
No estágio inicial do Plano Real, as autoridades estavam
comprometidas com um limite superior de R$1,00 para US$ 1,00,

120
Economia Brasileira

para a taxa de câmbio real/dólar. Além disso, as taxas de juros


internas foram mantidas altas o suficiente para evitar a depreciação
do Real frente ao Dólar, e foram estabelecidas restrições à entrada
de capital estrangeiro para evitar uma valorização excessiva do real.
O real operou com um regime de bandas cambiais, mas com um teto
fixo de R$1,00 para US$ 1,00 (banda assimétrica), que durou apenas
três meses. A política monetária e a política cambial foram flexíveis,
uma vez que não obedeciam a metas monetárias estritas ou a um
regime cambial fixo.
5. A estabilização aconteceu no contexto de uma economia em
expansão. O fim de uma inflação muito elevada tende a provocar
uma retomada da atividade econômica. A estabilização acontece
sem recessão. O Plano Real seguiu exatamente esta regra, apesar
do esforço para equilibrar o orçamento federal e a adoção de taxas
de juros reais elevadas. Você pode encontrar a explicação para este
fenômeno em Bacha (2012, p. 163).

Como explicar o funcionamento da chamada “âncora monetária” e


da “âncora cambial”?

A inflação foi também diagnosticada como de caráter inercial, e seu controle


dependia da ausência de choques no período posterior à conversão da URV em
real. Nesse sentido, o governo anunciou metas de expansão monetária bastante
restritivas, limitou as operações de crédito e impôs depósito compulsório de
100% sobre as captações adicionais do sistema financeiro.

Como não existem A política econômica pós‑plano tentaria controlar a demanda


pressões competitivas e desestimular processos especulativos, mantendo as taxas
no setor de bens não de juros elevadas. O controle da demanda e da expansão
comercializáveis, quanto
monetária, nessa fase, ficou conhecido como “âncora
maior a diferença
entre a demanda e a monetária”.
oferta desses bens,
espera‑se que haja Segundo Giambiagi (2011, p. 152), em outubro de
um crescimento no 1994, o governo abandona a âncora monetária em
consumo no período prol da cambial e cita duas grandes virtudes da âncora
imediatamente após
a estabilização. Assim
cambial: (a) estabelecer contratos de longo prazo; e
sendo, maiores tendem (b) exercer forte pressão sobre os preços no setor de bens
a ser os preços no setor comercializáveis. A pressão a ser exercida sobre os preços
de não comercializáveis
é dependente do grau de abertura da economia e do
e, em consequência,
menor a redução do desequilíbrio existente entre oferta e demanda no setor
nível geral de preços. de bens não comercializáveis.

121
Capítulo 5

Bens não comercializáveis internacionalmente podem ser encontrados no setor


de geração de energia, da habitação, de transporte, de serviços pessoais e de
serviços educacionais.

A valorização da taxa de câmbio em um contexto no qual o grau de abertura


da economia do país tinha aumentado significativamente, além desse possuir
um volume significativo de US$ 40 bilhões de reservas internacionais, foi muito
importante para romper com o processo inflacionário.

Gremaude (2011, p. 452) comenta que “com a manutenção da taxa real de juros
elevada e como permanecia o excesso de liquidez internacional, o fluxo de capital
externo se manteve”. Como o Banco Central deixou o câmbio flutuar, ocorreu
uma profunda valorização da taxa de câmbio, estimulando a importação em
uma economia aberta e com um volume significativo de reservas. Isso travou
a possibilidade de aumento do nível geral de preços e ficou conhecido como a
“âncora cambial” do Plano Real.

A adoção da “âncora cambial” traz algumas consequências negativas para


algumas variáveis econômicas, entre as quais:

(i) Reforça a absorção interna, podendo ocasionar pressões


inflacionárias e até o abandono do programa. [Observação
minha: lembre‑se de que a elevação dos preços de bens não
comercializáveis causa uma redistribuição de renda para setores
que possuem uma maior propensão a consumir.]
(ii) Faz com que a economia perca competitividade no comércio
exterior, em função do aumento dos salários médios em dólares
(redistribuição de renda em favor dos não comercializáveis).
(iii) Deteriora as contas externas devido à apreciação real do
câmbio, uma vez que a inflação interna cai; porém, permanece
acima da internacional por algum tempo.
(iv) Até que o programa se torne crível ou devido à existência de
rigidez em alguns preços, as taxas de juros devem permanecer
inicialmente superiores às internacionais, para depois convergirem.
(v) Provoca ciclos na atividade real da economia. (GIAMBIAGI,
2011, p. 152).

Giambiagi (2011, p. 153) avalia que o Plano Real apresentou características comuns
aos planos de estabilização baseados em âncora cambial adotados em países com
longa história inflacionária. Entre essas características, destacou as seguintes:

‑ houve apreciação cambial, decorrente de um câmbio pouco


flexível e resistência na queda da inflação;
‑ a atividade real da economia sofreu um boom inicial com queda
do desemprego (1995) e posterior aumento deste;
‑ a expansão do produto (também) se baseou principalmente
no consumo (duráveis em particularmente, mais sensíveis ao

122
Economia Brasileira

crédito), apesar de que, como na experiência internacional,


tenha ocorrido modesto aumento dos investimentos produtivos e
ganhos mais significativos de produtividade;
‑ os salários reais, nos primeiros períodos do plano, também
se elevaram;
‑ os índices de preços ao consumidor tenderam a ficar, numa
primeira fase, acima dos índices de preços do atacado (onde os
tradables têm maior peso);
‑ houve rápida deteriorização da balança de conta‑corrente;
‑ o Brasil teve os déficits em transações correntes financiados por
fluxos de capital, abundantes durante certo tempo, que (também)
se reverteram em momentos de crise de confiança (Crise do
México, Crise Asiática e Crise Rússa);
‑ e por fim, o país sofreu uma crise cambial seguida de
desvalorização em 1999. (GIAMBIAGI, 2011, p. 153).

Na próxima seção você estudará alguns desdobramentos dessas características e


os esforços adotados pelo governo Fernando Henrique em favor da estabilização.

Seção 3
O primeiro governo FHC: os esforços em favor
da estabilização
A estabilização foi o tema dominante no primeiro governo de Fernando Henrique
Cardoso, que tomou posse em 1º de janeiro de 1995.

Até aquele momento, o sucesso inicial do Plano Real era incontestável. A inflação
havia caído de pouco mais de 40% ao mês para 1 a 2% no final do ano de 1994,
conforme ilustrado na Figura 1.4, ver p. 27 da primeira unidade.

O governo Fernando Henrique inicia com intensa pressão. Giambiagi (2011, p. 166)
aponta pelo menos quatro razões:

1. A economia se encontrava em processo de superaquecimento.


Este fato trazia à memória o ocorrido durante a implementação do
Plano Cruzado, quando o aumento de consumo provocou o colapso
da estabilidade.
2. O impacto da crise mexicana na economia brasileira. No final de
1994, a situação de seu balanço de pagamentos (BP) levou a uma
forte desvalorização. O fato alimentou as suspeitas de que regimes
de câmbio rígido poderiam não acabar bem, sendo o Brasil um
candidato potencial para ser afetado.

123
Capítulo 5

3. As reservas internacionais do Brasil começaram a cair. O motivo


dessa pressão ocorre pelo efeito combinado do crescimento da
demanda agregada e da redução da entrada de capitais associada
ao ambiente externo.
4. Certa resistência à queda da inflação. No primeiro ano de
implementação do Plano Real (julho de 1994 a junho de 1995),
a variação de preços medida pelo INPC foi de 33%.

A visão existente no começo de 1995 era de que a inflação voltaria com força e
a indexação se reinstalaria na economia. Assim, no mês de março daquele ano,
considerando as pressões e desequilíbrios que ameaçavam a sustentação do Plano
Real, o governo brasileiro adotou um conjunto de medidas, com destaque para:

•• Uma desvalorização controlada, de aproximadamente 6% em


relação à taxa de câmbio da época;
•• Uma alta da taxa de juros nominal, que passou de 3,3% em fevereiro
para 4,3% em março (taxa de juros expressa em termos mensais).

Os efeitos dessas medidas logo apareceram. Bacha (2012, p. 171) comenta que,
a partir do segundo semestre de 1995, verificou‑se uma recuperação das perdas
das reservas internacionais (algo em torno de US$10 bilhões). Atraídos pela
rentabilidade das aplicações em moeda local, os investidores retornaram ao país.
No final de 1995, o Brasil acumulou US$ 59 bilhões de reservas internacionais.
A situação esteve sob controle até a primeira metade de 1996, quando os déficits
comerciais começam a aumentar.

As medidas de ajustamento foram bem‑sucedidas em reverter a tendência


inflacionária. Durante quatro anos consecutivos, a taxa anual de inflação
caiu ano após ano. Por outro lado, as medidas adotadas reverteram apenas
temporariamente o déficit externo.

Giambiagi (2011, p. 168) concluiu que o Plano Real, nas circunstâncias de


1995, foi salvo por dois fatores: a política monetária (a adoção dos juros altos)
e a situação do mercado financeiro internacional, que naquele momento havia
recuperado ampla liquidez e buscava a atratividade dos mercados emergentes.

A Figura 5.1 apresenta a evolução mensal da taxa de juros over/selic, que é a


base para a remuneração dos títulos do governo federal, entre julho de 1994 e
dezembro de 2002. Essas taxas são extremamente elevadas, alcançando uma
média de 26% por ano no período 1995 a 2003.

124
Economia Brasileira

Figura 5.1 ‑ Taxa de juros Over/Selic (% a.a.) ‑ Banco Central do Brasil: jul/1994 a dez/2002

Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do IPEADATA).

A crise econômica do A taxa de câmbio e o desequilíbrio externo crescente


México de 1994, mais
têm influência direta para um patamar mínimo bastante
conhecida como Efeito
Tequilla, tratou‑se de elevado da taxa de juros. Você deve notar que, durante a
uma crise de balança crise mexicana, a elevação das taxas de juros permitiu
de pagamentos, manter a taxa de câmbio e o país atrativo para receber
associada à
capital estrangeiro.
especulação financeira,
resultantes de uma
Com a entrada de capital estrangeiro e a acumulação de
crise política interna
do México. Segundo reservas após a crise mexicana, os patamares da taxa
Kessler (2001, p. 3), de juros declinam até meados de 1996, e a partir daí
após três semanas do praticamente permanecem inalterados.
governo Ernesto Zedillo,
o Ministério da Fazenda
O governo precisou dobrar a taxa de juros em outras duas
ampliou a banda
cambial em 15,3% ocasiões: na crise asiática em 1997 e na crise russa em
e, no dia seguinte, a meados de 1998. Na crise asiática, o aumento dos juros
paridade peso/dólar foi e o pacote fiscal adotado ainda foram eficazes. O mesmo
abandonada. “O valor
não se pode dizer quando da adoção dessas medidas na
do peso imediatamente
caiu a metade de crise russa, como você verá mais adiante.
seu valor nominal,
mergulhando o México A Figura 5.2 ilustra o comportamento da inflação, medido
numa depressão pelo IGP_di, durante os dois governos de Fernando
surpreendentemente Henrique Cardoso. Nos primeiros anos de seu governo,
profunda”.
as taxas de inflação apresentaram algumas oscilações, mas
sempre com tendência de baixa. A inflação conseguiu ser
controlada durante todo o período. Somente em fevereiro de 1999 e nos meses
de outubro e novembro de 2002 que o índice mensal excedeu a 3%. Mas esses
números são insignificantes quando comparados aos 82% de março de 1990.

125
Capítulo 5

Figura 5.2 – Comportamento da taxa de inflação mensal brasileira, IGP di: 1995 – 2002

Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do IPEADATA)

A inflação anual para o ano de 1995, medida pelo mesmo indicador, foi de 14,8%;
e em 1996, já se encontrava abaixo de dois dígitos, marcando 9,3%. Nos anos
seguintes caiu para 7,5% em 1997 e 1,7% em 1998.

Oliveira (2005, p.136) observa que um dos mecanismos para o controle da inflação
adotado no período foi a abertura comercial. A oferta internacional contribuiu para a
estabilização principalmente dos preços agrícolas. Explica o autor:

Quando os produtores locais, como os de leite, arroz, feijão


ou trigo, pressionavam para obter aumentos, as importações,
beneficiadas por um câmbio sobre valorizado, forçavam os
preços internos para baixo. Isto pode ser exemplificado pelos
preços da cesta básica na cidade de São Paulo, calculado
pelo Departamento Intersindical de Estudos Socioeconômicos
(Dieese). Entre janeiro de 1995 e dezembro de 1998, a cesta
básica variou apenas 17,6%.

Gremaude (2011, p.455) afirma que a possibilidade de importação, com a folga


cambial e manutenção da taxa de câmbio, força os preços a se acomodarem aos
padrões internacionais, principalmente para os produtos industriais. Por outro
lado, essa estratégia de estabilização é ineficaz para o caso dos produtos que
não são comercializáveis.

Citamos como exemplos de mercadorias que não se pode importar (não


comercializáveis), principalmente o setor de serviços, tais como: aluguel,
mensalidades escolares, médicos e alimentação fora de casa.

A Tabela 5.1 mostra a taxa de variação de preços de alguns itens de agosto de


1994 a janeiro de 1997. No Índice de Preços ao Consumidor (IPC), o setor de

126
Economia Brasileira

serviços tem grande importância no seu cálculo, o que não ocorre no Índice de
Preços por Atacado (IPA). Esse fato explica o % mais alto para o IPC quando
comparado ao IPA.

Tabela 5.1 – Variação de preços acumulada para alguns itens selecionados – agosto/1994 a janeiro/1997

Item % Item %

Índice de Preços por Atacado (IPA) 22,88 Índice de Preços ao Consumidor (IPC) 55,04

Gêneros alimentícios 20,93 Alimentação fora do domicílio 48,14

Serviços de residência 66,58 Aluguel 198,12

Material escolar 36,41 Educação – cursos formais 132,13

Medicamentos 39,36 Médico, dentista e outros 92,46

Peças e acessórios – veículos 14,01 Serviços de oficina 28,94


Fonte: Elaboração do autor, 2013 (adaptação de Gremaud, 2011, p. 456).

Vários itens da Tabela 5.1 ilustram o fato de que a variação de preços no setor
de serviços ficou bem acima da variação dos preços dos produtos industriais.
O preço dos alimentos aumentou 20,93%, enquanto comer fora de casa ficou
48,14% mais caro. O mesmo ocorreu com os preços dos medicamentos, que
aumentaram em 39,36%, enquanto os preços de serviços médicos e dentários
subiram 92,46%.

A eficácia dos remédios para a estabilização era cada vez menor e trazia consigo
alguns efeitos colaterais indesejáveis. Você estudará, neste material didático, dois
desses efeitos principais: o desequilíbrio externo e a crise fiscal.

Seção 4
Desequilíbrio do setor externo e a crise fiscal
Você conheceu até aqui aspectos da implementação do plano econômico de
maior êxito na história brasileira de combate à inflação. Apesar do sucesso
em seus primeiros meses de Plano Real, a gestão macroeconômica deixava a
economia brasileira numa rota insustentável.

Bacha (2012, p. 124) aponta causas múltiplas para essa tendência: a apreciação
da taxa de câmbio, o déficit do setor público, a indexação salarial e a expansão
do crédito para o setor privado.

127
Capítulo 5

4.1 Desequilíbrio do setor externo


A apreciação do real e o aprofundamento do processo de liberalização comercial
trouxeram dificuldades adicionais, ao incentivarem o aumento das importações
combinado ao desempenho das exportações.

Você deve lembrar que, numa economia aberta, a taxa de câmbio é uma variável
importante. O fluxo de comércio exterior e as decisões de investimento de
empresas internacionais são influenciadas pelo seu preço. A Figura 5.3 descreve
a trajetória da taxa de câmbio mensal entre julho de 1994 a julho de 2002.

Figura 5.3 ‑ Taxa de câmbio mensal ‑ R$/US$: jul/1994 a jul/2002

Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do IPEADATA).

O período julho de 1994 a dezembro de 1998 ficou caracterizado como de


estabilidade do câmbio, que oscilou dentro de uma pequena margem de “bandas
cambiais”. É exatamente nesse período que o país apresentou o déficit da
balança comercial.

Em 1999, com a introdução da política de flutuação cambial, a taxa de câmbio


passa a operar em outros patamares. No final da série, a cotação do câmbio
alcança R$3,00, influenciada por fatores externos, tais como os atentados de
11 de setembro de 2001 nos Estados Unidos e a crise argentina.

A Figura 5.4 mostra o desempenho do comércio brasileiro no exterior. Ao visualizar


o gráfico, você pode constatar que as duas variáveis apresentaram grande
oscilação e cresceram durante a série. Giambiagi (2011, p. 169) comenta:

Nos três anos entre 1995‑1997 as importações em dólar


cresceram a uma taxa média de 21,8% a.a. – com destaque para
o crescimento de 51% em 1995 – enquanto as vendas ao exterior

128
Economia Brasileira

cresceram apenas 6,8% a.a., em que pese o fato de esses terem


sido anos de grande expansão do comércio internacional e nos
quais a economia mundial cresceu 4,3% a.a.

Figura 5.4 ‑ Importações e Exportações (FOB) mensais, em US$ (milhões) ‑ Banco Central do Brasil:
jan/1994 a dez/2002

Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do IPEADATA).

A balança comercial brasileira apresentou saldo negativo no intervalo entre 1995 e


2000, muito influenciada pela abertura comercial e política de câmbio valorizado.
Segundo Oliveira (2005, p. 140), a desvalorização cambial ocorrida em janeiro
de 1999 e as sucessivas crises cambiais até 2002 foram as responsáveis pela
inversão de tendência, contribuindo para o aparecimento de superávit.

Os superávits comerciais do Brasil eram utilizados para compensar os déficits


na Balança de Serviços, que a partir de 2001 passou a ser chamada de Balança
de Serviços e Rendas. Em 1995, com a deterioração da Balança Comercial,
começaram aparecer os déficits em transações correntes, conforme nos mostra a
Figura 5.5, a seguir.

Segundo Mariano (2012, p.60), a Balança de Serviços e Rendas é o volume


de transações relacionadas a pagamento de bens intangíveis.

A subconta serviços contempla: remuneração de serviços públicos e


privados; serviços de fretamentos e seguros de transportes; gastos
realizados por turistas; serviços financeiros e bancários, corretagem,
comissões e tarifas de fianças; serviços de informática; remuneração pela
utilização de marcas, patentes e licenças; e serviços governamentais.

A subconta rendas contempla: remuneração de trabalhadores; renda de


investimento direto decorrente de lucros oriundos da participação no capital
de empresas; e renda de investimentos em carteira, referente a lucros e
juros auferidos por empresas que tenham efetuado a emissão de papéis.

129
Capítulo 5

Figura 5.5 ‑ Balanço em transações correntes, em US$ milhões: 1994 a 2002

Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do Banco Central).

Em 1994, o déficit em transações correntes foi de US$ 1,8 bilhões e, em 1997,


saltou para US$ 30,5 bilhões.

A existência de déficits em transações correntes pode não ser um problema a


curto prazo, enquanto houver uma entrada de recursos externos para financiá‑lo
ou o país dispor de reservas internacionais suficientes. Para Gremaude (2011,
p. 457), “o problema é que se vai acumulando uma dívida externa que no futuro
pressionará a remessa de juros, e que em algum momento deverá ser paga”.

A partir de 1995, a piora das transações correntes, influenciada pelo desempenho


da balança comercial e pela necessidade de financiamento do déficit em transações
correntes realimentou os desequilíbrios externos. Como você pode observar na
figura anterior, o déficit de serviços, rendas e transferências
Segundo Mariano
(2012, p. 60),
unilaterais quase que dobrou no primeiro governo de
as transferências Fernando Henrique.
unilaterais
“correspondem Os déficits apresentados no saldo de transações correntes
a transações que durante todo o período foi compensado pela entrada dos
envolvem pessoas
capitais externos. O ingresso de capitais estrangeiros no
residentes e não
residentes no país e Brasil continuou até o final da década, proporcionando um
não exigem nenhuma aumento das reservas internacionais.
contrapartida, por isso
são chamadas As reservas internacionais correspondem ao volume de
unilaterais”. moeda estrangeira acumulado por um país (disponível no
cofre do Banco Central).

Gremaude (2011. p. 460), sobre a natureza do capital ingressante no país, comenta


que nos primeiros anos ocorre predomínio dos investimentos de portfólio (ações,
fundos de aplicação financeira, fundos de privatização). O problema é que este tipo

130
Economia Brasileira

de ingresso de capital é bastante volátil, o que significa dizer que os especuladores


podem facilmente deixar de investir no país.

Segundo Leite (2011, p.58), o investimento de portfólio é uma das formas


de movimento internacional de capitais e dizem respeito somente a ativos
financeiros. Os investimentos são de curto prazo e seu movimento se dá de
acordo com a remuneração (taxa de juros do país). Como se trata de aplicação
de curto prazo, torna vulnerável a situação financeira do país hospedeiro.

Souza (2008, p. 259), sobre a ameaça de explosão das contas externas, comenta
Segundo Leite (2011, que, no final de 1996, as reservas somavam “US$ 60 bilhões
p. 58), o IED é um no conceito de liquidez internacional e estimava‑se que
investimento de longo havia no país US$ 62 bilhões de capitais especulativos”.
prazo e representa um
As reservas seriam pulverizadas, caso esses capitais fossem
importante canal para
os fluxos internacionais afugentados do país.
de capitais privados.
É a operação na qual Outro importante movimento de capital internacional
uma empresa cria ocorre por meio do Investimento Externo Direto (IED).
uma subsidiária no
A Figura 5.6, a seguir, mostra o fluxo de IED que
exterior ou compra uma
empresa já existente aumentou de forma exponencial no país durante o
em outro país. governo Fernando Henrique.

Figura 5.6 ‑ Investimentos diretos estrangeiros no país ‑ US$ (bilhões) ‑ Banco Central do Brasil: 1994
a 2002

Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do IPEADATA).

Oliveira (2005, p. 143) comenta que muitas empresas privadas brasileiras foram
vendidas para grupos estrangeiros, como Bamerindus, Lacta, Metal Leve,
Cofap e outras. Por outro lado, tomando o exemplo do setor automobilístico,
verificou‑se: o ingresso da montadora Renault, Peugeot‑Citroen, Honda, Toyota e
outras; e a construção ou ampliação da planta da GM, em Gravataí, Volkswagem,
em Curitiba, e Ford, em Camaçari.

131
Capítulo 5

Como resultado do processo de privatização, ingressaram no país US$ 30


bilhões de investimento direto estrangeiro em empresas no período de
1996 a 2000.

A Figura 5.7 mostra o comportamento das reservas internacionais do Brasil,


em milhões de US$, destacando o momento da ocorrência da crise mexicana,
asiática e russa. Você deve notar que as reservas cambiais alcançaram elevados
patamares no período em que o câmbio esteve apreciado.

Figura 5.7 ‑ Reservas internacionais ‑ liquidez internacional – em US$ milhões: jan/1994 a dez/2002

Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do IPEADATA).

O governo obteve sucesso nas medidas adotadas para conter o ataque


especulativo e manter a taxa de câmbio quando da crise mexicana. Como você
estudou anteriormente, a política monetária (taxa de juros) seria utilizada para
manter a taxa de câmbio e atrair o capital estrangeiro para o país.

As reservas cambiais declinaram em torno de US$ 10 bilhões nos primeiros


três meses de 1995, sob o efeito da crise mexicana. A partir de abril, voltam
a crescer continuadamente até atingirem, no fim de 1995, U$50 bilhões.

Bacha (2012, p. 171) comenta que os dados indicam uma mudança muito
significativa entre o início de 1995 e o final de 1996:

Em 1995, as entradas a curto prazo atraídas pelos diferenciais


de taxas de juros representaram a maior parte do financiamento.
Em 1996, as entradas de curto prazo diminuíram, enquanto
os investimentos diretos e empréstimos de longo prazo
representaram a maior parte do financiamento. Tais movimentos
sugerem que os déficits comerciais eram menos preocupantes

132
Economia Brasileira

no fim de 1996 do que no início de 1995, já que, pelo menos


temporariamente, um financiamento mais adequado parecia estar
à disposição do país.

Depois do efeito da crise asiática ter passado, em abril de 1998, ocorre o pico
das reservas cambiais de US$ 74 bilhões, na série mostrada na Figura 2.6.
Em seguida, sob os efeitos da moratória decretada pela Rússia em agosto,
as reservas declinam de US$ 70,2 bilhões, em julho de 1998, para US$ 45,8
bilhões, em setembro de 1998.

Após esse período, entre 1999 e 2002, as reservas cambiais situam‑se entre
US$ 30 e US$ 40 bilhões e não apresentaram qualquer oscilação brusca
semelhante ao que acontecera anteriormente.

4.2 O setor público e a crise fiscal


A decisão de elevar as taxas básicas de juros e impor restrições adicionais
à expansão do crédito foi uma reação do governo aos desequilíbrios que
ameaçavam a estabilidade.

Os objetivos da adoção de uma política monetária baseada na gestão da taxa de


juros eram relacionados à necessidade de: conter a demanda para controlar a
inflação; impedir que os déficits comerciais se tornassem muito elevados; manter
o país atraente ao capital estrangeiro (permitindo financiar, assim, os déficits em
transações correntes).

Uma das consequências negativas da política de elevação das taxas de


juros foi sobre o déficit público, que interrompeu o processo de declínio da
dívida líquida do setor público como proporção do PIB.

Giambiagi (2011, p. 172) aponta a situação fiscal crítica como o segundo grave
problema do período que foi caracterizada pelos seguintes fatos:

•• Um déficit primário do setor público consolidado.


•• Um déficit público (nominal) de mais de 6% do PIB, na média de
1995‑1998.
•• Uma dívida pública crescente.

A Figura 5.8 mostra a trajetória da evolução da dívida pública em relação ao PIB.


Você pode observar que, a partir de 1996, a dívida líquida se agrava continuamente,
saltando de um nível próximo de 28,0%, em janeiro de 1996, para 56,0%, em
setembro de 2002.

133
Capítulo 5

Figura 5.8 – Dívida líquida total do setor público mensal ‑ com Petrobras e Eletrobrás ‑ (% PIB) ‑ Banco
Central do Brasil: 1994 a 2002

Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do IPEADATA).

Segundo Oliveira (2005, p. 147), a política de juros adotada pelo governo foi
determinante para a elevação da dívida, que tinha como causas: a assunção de
dívidas estaduais e municipais pelo governo federal; o ajuste de contas do setor
imobiliário; e o socorro ao setor bancário através do Programa de Estímulo à
Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional (Proer).

Outro autor, Giambiagi (2011, p. 172), responsabiliza, principalmente, a política


fiscal expansionista pela piora do resultado fiscal no período 1995 a 1998.
Segundo este autor:

¾ da piora do resultado operacional das Necessidades de


Financiamento do Setor Público (NFSP) entre as médias de
1991 – 1994 e 1995 – 1998 foram causadas pela deterioração
do resultado primário e só um quarto pela maior despesa com
juros reais.

A Tabela 5.2, que apresenta a necessidade de financiamento do setor público


como % do PIB, ilustra esse argumento em relação à questão fiscal.

Tabela 5.2 ‑ Necessidade de financiamento do setor público como % do PIB – Conceito Operacionala

Composição 1991/1994 1995/1998 Deterioração Composição (%)

Resultado primário 2,9 ‑0,2 3,1 72

Juros reais 3,3 4,5 1,2 28

NFSPb 0,4 4,7 4,3 100


a
Médias anuais.
b
NFSP = Juros reais ‑ Resultado primário

Fonte: Banco Central, (2011) apud Giambiagi (2011, p. 174).

134
Economia Brasileira

Os encargos financeiros que se elevaram de 3,3%, em 1991/1994, para 4,5%, em


1995/1998, combinados com os baixos superávits primários, contribuíram para os
elevados déficits operacionais e para o acentuado crescimento da dívida pública.

A deterioração do superávit primário ocorre apesar da contínua elevação da carga


tributária diante do PIB, conforme mostra a Figura 5.9.

Figura 5.9 ‑ Carga tributária total (% PIB) ‑ Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Sistema de
Contas Nacionais: 1994 a 2002

Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do IPEADATA).

Souza (2008, p. 265) observa que o pacote fiscal de 1998 inaugurou uma
trajetória de aumento da carga tributária até o final do governo Fernando
Henrique. Só a partir do ano de 1999 que começam a ser gerados crescentes
superávits primários, possibilitando o pagamento de juros.

Quais as considerações sobre o desequilíbrio externo e a crise fiscal


ocorrida no período de 1995 e 1998?

Giambiagi (2011, p. 174) faz as seguintes considerações:

a. A âncora cambial sofreu um progressivo desgaste como principal


instrumento de política econômica. Os problemas decorrentes de
sua aplicação começaram a se tornar crescentemente onerosos,
basicamente por dois motivos: a deteriorização das transações
correntes, causando um aumento dos passivos externos do
Brasil; e a necessidade de compensar o déficit externo mediante
a entrada de capitais atraídos pelas elevadas taxas de juros
(estas últimas pressionavam as contas públicas, além de conter a
atividade econômica).

135
Capítulo 5

b. A combinação de déficit em transações correntes e taxas de juros


elevadas, com o tempo e diante de três crises internacionais, fez
com que o espaço para o endividamento público e externo se
fechasse no decorrer do segundo semestre de 1998.

O primeiro mandato de FHC terminou em um processo de crise cambial,


em função dos desequilíbrios gerados nas contas externas e na situação
fiscal. Além disso, a alta da taxa de juros utilizada para combater os ataques
especulativos contra o real – as crises mexicana, asiática e russa – deixou de
ser eficiente e agravava a situação fiscal. Foi nesse contexto de crise que os
instrumentos adotados de política econômica se mostraram exauridos, deixando
um claro desafio para o período seguinte do governo FHC: como corrigir esses
desequilíbrios, assegurando a estabilização, e recolocar o país numa trajetória de
crescimento econômico sustentável?

Seção 5
O segundo mandato de FHC: a tríplice mudança
de políticas e as mudanças estruturais
A década de 1990 tem tudo para ser reconhecida como uma “década de
transformações”, época em que o primeiro governo FHC será marcado por uma
importante mudança comportamental. Com o dragão da inflação dominado,
os consumidores passam a comparar os preços, forçando uma disputa entre as
empresas que sofriam a concorrência dos produtos importados.

O primeiro governo foi também marcado pela dependência da âncora


cambial e pela adoção de uma política fiscal “frouxa”, que dificultou a
exportação e o investimento privado e impediu a retomada sustentável do
crescimento. Apesar do quadro econômico desfavorável em 1998, ocorre a
reeleição do presidente Fernando Henrique em outubro daquele ano.

Após a crise cambial de 1999, o tripé da política macroeconômica muda para:


cambial, monetário e fiscal. Além disso, ocorrem importantes reformas estruturais
que você estudará a partir de agora.

136
Economia Brasileira

5.1 A adoção do câmbio flutuante


Como você estudou, em 1998 os fundamentos da economia brasileira se
agravaram, aumentando a desconfiança dos credores, e a crise russa dificultou
ainda mais a obtenção de créditos externos.

A situação econômica era tão desfavorável que o governo não esperou as eleições
para começar a negociar um acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI),
em troca de um empréstimo de US$ 41,5 bilhões.

Giambiagi (2011, p. 176) comenta que este acordo não previa mudanças na política
cambial, mas contemplava um aperto fiscal em que o superávit primário passaria a
2,6% do PIB, em 1999, 2,8% do PIB, em 2000 e 3,0% do PIB, em 2001.

Apesar da defesa do regime cambial adotado anteriormente, em 15 de


janeiro de 1999, o novo presidente do Banco Central, Armínio Fraga, decidiu
adotar o sistema de câmbio flutuante. O impacto foi imediato, ocorrendo
uma forte desvalorização de 60%, quando se compara o câmbio de fevereiro
de 1999, R$ 1,91, com o câmbio de dezembro de 1998, R$ 1,20.

Segundo Bacha (2012, p. 213), a adoção do regime flutuante marca o início de


uma nova fase. A depreciação da taxa de cambio chegou a ponto de o Brasil ter
saldos elevados na conta de comércio e reduzir significativamente o déficit em
transações correntes do balanço de pagamentos. Além disso, as contas do setor
público apresentaram superávits primários continuamente.

Quando se adotou o sistema de câmbio flutuante, a inflação entrou numa trajetória


ascendente. Para evitar o processo inflacionário, adotou‑se uma política bastante
restritiva, estipulando uma elevação da taxa de juros (Selic) para 45% a.a. em março.

Para controlar a política monetária e as taxas de juros, é criado o Comitê de Política


Monetária (Copom), no início da gestão de Armínio Fraga no Banco Central.

Por que a desvalorização do real não provocou os efeitos


inflacionários indesejáveis?

Giambiagi (2011, p. 177) aponta alguns fatos que explicam a baixa inflação
registrada quando da desvalorização cambial:

•• a produção industrial estava 3% abaixo do primeiro trimestre de


1998 que, por sua vez, era 3% inferior aquela do primeiro trimestre
de 1995. Isto gerou uma retração da demanda, que diminuiu muito a
chance de repasse do câmbio aos preços;

137
Capítulo 5

•• houve uma mudança de mentalidade indexatória, em decorrência


de quase 60 meses (5 anos) de estabilidade e do desmonte dos
mecanismos de reajuste dos preços;
•• a baixa inflação mensal, no começo, diminuiu muito o temor do
processo inflacionário;
•• a política monetária rígida, pela adoção de uma taxa de juros real de
15%, cumpriu seu papel de evitar as remarcações e de apreciar o real;
•• cresceu a confiança de que a economia estaria sob controle em
decorrência do cumprimento sucessivo das metas fiscais acertadas
com o FMI;
•• o aumento de menos de 5% nominais do salário mínimo em maio de
1999 balizou reajustes baixos nas negociações salariais da época;
•• foi estabelecida, em junho, uma meta de inflação de 8% para o ano.

O último fato acima marca o início da adoção do sistema de metas da inflação,


o que vinha sendo estudado pela equipe econômica desde o início do ano. Esse é
o nosso próximo assunto.

5.2 Sistema de Metas de Inflação


A perda da âncora cambial como referencial de preços pela adoção do câmbio
flutuante funcionou como uma espécie de troca de âncora. O Banco Central
adotou, a partir de julho de 1999, por meio da Resolução nº 2.615 do Conselho
Monetário Nacional, o Sistema de Metas de Inflação como regra para a política
monetária: a nova âncora.

O Sistema de Metas de Inflação

Com a adoção do sistema de metas de inflação, o Conselho Monetário Nacional


(CMN) ao definir um “alvo” para a variação do IPCA, passou a balizar as decisões
de política monetária do Banco Central (BC) tomadas todos os meses pelo Comitê
de Política Monetária (Copom). Este tomada de decisões acerca da taxa Selic com
base em um modelo no qual a hipótese adotada quanto à taxa de juros e à cotação
cambial gera um certo resultado da inflação, nos termos desse modelo. Assim,
teoricamente, se a variação dos preços resultante de incorporar às equações uma
hipótese correspondente à taxa de juros Selic vigente na época se mostrasse inferior
à meta, o BC estaria em condições de reduzir os juros, enquanto, se a inflação

138
Economia Brasileira

estimada fosse superior à meta, o BC deveria subir os juros. O sistema de metas


trabalha com uma margem de tolerância acima ou abaixo da meta, para acomodar
possíveis impactos de variáveis exógenas, procurando evitar grandes oscilações do
nível de atividade. A meta inicial fixada para 1999 foi de 8% ‑ com tolerância de 2%
acima ou abaixo do alvo – e nessa mesma oportunidade adotaram‑se metas de 6%
para 2000 e de 4% para 2001, passando a partir de então a se definir a meta para
o ano t no mês de junho de (t‑2). A inflação se manteve dentro do intervalo previsto
em 1999 e 2000, mas se situou muito acima do teto em 2001 e, particularmente,
em 2002.

Fonte: Giambiagi (2011, p. 177).

A relação existente entre a taxa de juros e a inflação é conhecida por Regra de Taylor.


É um sistema bastante eficiente para a política monetária, que já estava sendo
Segundo Gremaude adotado por vários países: Nova Zelândia (1990), Chile e
(2011, p. 476), Canadá (1991), Israel e Reino Unido (1992), Austrália e Suécia
quando a inflação está (1993), Espanha (1994), Hungria e República Tcheca (1998),
crescendo deve‑se
Brasil e Polônia (1999).
diminuir a demanda
para controlá‑la. Essa é
Com o sistema de metas de inflação, o Banco Central
a ideia básica da Regra
de Taylor. O aumento (BC) deixa de cuidar da defesa de uma determinada taxa
da taxa de juros de crescimento do PIB ou de uma determinada taxa de
provoca retração da câmbio. O compromisso do BC agora passa a ser com o
demanda, elevação do
desemprego e redução
patamar da inflação.
do produto, fazendo
com que se diminuam as
pressões inflacionárias. 5.3 Superávit primário
Completando o terceiro tripé da política macroeconômica do
segundo mandato de Fernando Henrique, tem‑se a mudança do desempenho fiscal.
A partir de 1999, ocorrem superávits primários, conforme acordado com o FMI.

Segundo Gremaude (2011, p. 478), considerando o novo contexto


macroeconômico, a existência de superávits primários seria importante
para: absorver os choques na economia, liberar a taxa de juros para
controle da inflação, permitir a estabilização por meio da redução da dívida
pública ao longo do tempo.

Com a desvalorização cambial, as taxas de juros descem aos menores patamares,


desde a implantação do Plano Real. Os gastos com juros continuam elevados em
1999, mas ocorre uma pequena redução em relação aos do ano anterior.

139
Capítulo 5

O governo obteve um superávit primário de 2,92% do PIB em 1999. A Figura 5.10


mostra a evolução do resultado primário no período 1994 a 2002.

Figura 5.10 – Resultado primário (%PIB): 1994 a 2002

Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações de Giambiagi (2011, p. 173))

Nos anos seguintes, o superávit primário segue se elevando e o déficit


operacional se reduzindo, em decorrência do aumento significativo da
arrecadação. Pelo menos dois fatos explicam esse aumento:

1. O Congresso aprovou a Contribuição Provisória sobre Movimentação


Financeira (CPMF), o aumento do Cofins e a cobrança da contribuição
previdenciária dos inativos e pensionistas do setor público.
2. Nos Estados e Municípios existe forte elevação da arrecadação do
ICMS, em decorrência da desvalorização cambial.

Além do ajuste fiscal ter sido feito por elevação das receitas de impostos,
algumas mudanças estruturais relacionadas ao comportamento das despesas
foram implementadas. As principais mudanças foram:

(i) A aprovação da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), em


2000. A LRF estabelecia limites para despesas com pessoal em
cada um dos três níveis de governo, dispositivos para controle e
transparência das contas públicas, impôs limites ao endividamento,
proibiu novas renegociações de dívidas entre entes da federação e
penalizações aos gestores públicos que não cumprissem a lei;
(ii) A reforma da previdência social. A reforma previdenciária se
dá em dois momentos. No primeiro, em 1998, estabeleceu‑se
uma idade mínima para novos entrantes no serviço público e
ampliou‑se a necessidade de tempo de contribuição para quem
já estava na ativa. No segundo momento, em 1999, aprovou‑se o

140
Economia Brasileira

fator previdenciário para o INSS, que alterou a regra de cálculo dos


benefícios e substituiu o preceito do tempo de serviço pelo tempo
de contribuição;
(iii) A renegociação das dívidas estaduais. A renegociação consistia
no comprometimento dos estados junto à União, na federalização
das dívidas, que seriam pagas em 30 anos, em parcelas mensais.
Como contrapartida, conseguiu evitar que os estados burlassem a
regra de pagamento.

Gremaude (2011, p. 480) observa que, apesar dessas mudanças estruturais, o gasto
público manteve um crescimento elevado durante todo o período. Isto reflete a
dificuldade existente de se cortar gastos no país.

5.4 As reformas do período FHC


Uma das marcas registradas do governo FHC foi a continuidade e o aprofundamento
das reformas iniciadas no governo Collor.

Além das três reformas citadas anteriormente (a Lei de Responsabilidade Fiscal,


a Reforma da Previdência Social e a Renegociação das Dívidas Estaduais),
Giambiagi (2011, p. 181) identifica mais sete mudanças importantes.

1. Privatização. Empresas deficitárias e superavitárias com níveis


inadequados de investimentos foram desestatizadas. Esses gastos
deixariam de pressionar as contas públicas. A realidade forneceu
argumentos para os dois lados do debate sobre o tema das
privatizações. Houve um conjunto de consequências positivas, mas
que não chegou perto de um caso de sucesso, como na Inglaterra
de Margaret Thatcher. Do lado negativo, o processo de privatização
ficou aquém do que fora inicialmente alardeado, mas também
não foi um caso de insucesso como o ocorrido como a Argentina,
no final dos anos de 1990.
2. Fim dos monopólios estatais nos setores de petróleo e
telecomunicações. Permitiu que esses setores fossem prerrogativa
exclusiva de atuação do Estado.
3. Tratamento do capital estrangeiro. Abriu os setores de mineração
e energia à possibilidade de exploração por parte do capital
estrangeiro e permitiu que firmas com sede no exterior passassem
a dispor do mesmo tratamento que as empresas constituídas por
brasileiros. A medida contribuiu para a elevação dos investimentos
estrangeiros a partir de 1995.

141
Capítulo 5

4. Saneamento do sistema financeiro. Algumas medidas adotadas


foram: (1) instituir o Programa de Estímulo à Reestruturação e ao
Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional (Proer); (2) privatizar
a maioria dos bancos estaduais; (3) facilitar a entrada de bancos
estrangeiros no mercado brasileiro; (4) favorecer um processo
de conglomeração no setor; (5) ampliar os requisitos de capital
para constituição de bancos; e (6) melhorar substancialmente o
acompanhamento e monitoramento do nível de risco do sistema por
parte do Banco Central.
5. Ajuste fiscal, a partir de 1999. Tema já discutido anteriormente.
6. Criação de uma série de agências reguladoras de serviços de
utilidade pública. Agências criadas com o intuito de defender os
consumidores, assegurar cumprimento de contratos, estimular
níveis adequados de investimentos e zelar pela qualidade de
serviços nas áreas de telecomunicações, petróleo e energia elétrica.
7. Estabelecimento de um sistema de metas de inflação como
modelo de política monetária. Apesar de precário pela ausência de
autonomia do Banco Central, o estabelecimento de um sistema de
metas de inflação caracterizou um compromisso das autoridades com
a estabilidade de preços. Até então, isso era algo inédito no país.

Ainda segundo Giambiagi (2011, p. 181), o conjunto de medidas moldou a


economia brasileira “com menor presença do Estado nas atividades produtivas,
sistemas financeiros sólidos, contas fiscais sob controle e níveis de inflação
relativamente baixos”.

5.5 A atividade econômica e o emprego


O segundo mandato do presidente Fernando Henrique apresentou taxas de
crescimento econômico próximas de uma média de 2,1% a.a. A Figura 5.11
descreve a evolução do crescimento do Produto Interno Bruto brasileiro entre
1994 e 2002.

142
Economia Brasileira

Figura 5.11 – Evolução do PIB ‑ variação real anual ‑ (% a.a): 1994 a 2002

Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do IPEADATA).

As expectativas de crescimento econômico no início do seu mandato eram


desfavoráveis. O governo havia promovido a elevação dos juros simultaneamente
à própria desvalorização do Real, e o ajuste fiscal implementado indicava uma
forte contração da atividade econômica, para 1999.

A expectativa acabou não se concretizando, pelo menos em sua intensidade,


e conforme você pode observar na Figura 2.11, o PIB ainda conseguiu crescer
um pouco, 0,25 % a.a. naquele ano.

Gremaude (2011, p. 485) avalia que o Brasil, com o câmbio flutuante, poderia
ter encontrado um caminho para o crescimento sustentado pelo tripé: metas
de inflação, superávit primário e câmbio flutuante. Esse tripé só produziu seus
efeitos no ano 2000, em especial pela desvalorização cambial. Nesse ano, o país
apresentou a maior taxa de crescimento econômico do segundo mandato de
FHC, 4,31% a.a.

No ano de 2001, você pode observar que há uma forte queda na taxa
de crescimento, agora em torno de 1,31% a.a. A economia brasileira foi
fragilizada por uma combinação de eventos, incluindo a desaceleração da
economia mundial (causada pelo atentado terrorista de 11 de setembro,
o maior da história nos EUA), o “colapso” da economia argentina (o Brasil
foi afetado pelo aumento do risco da região, diminuindo a entrada de
capitais) e a crise de energia (com a necessidade de racionamento de
energia elétrica).

143
Capítulo 5

Segundo Gremaude (2011, p. 487), neste cenário, as pressões cambiais,


a elevação da taxa de juros e o baixo crescimento de 2001 fizeram com que a
dívida pública se elevasse naquele ano, o que teve importância crucial para o ano
seguinte. Assim, em 2002, o PIB cresceu apenas 2,66%, e o baixo crescimento
econômico se refletiu no desemprego. A evolução da taxa mensal de desemprego
aberto da região metropolitana de São Paulo no período 1994 a 2002 é mostrada
na Figura 5.12.

Você deve observar que o desemprego pula do patamar de 9% no início


do primeiro mandato para 12% no final do segundo governo de FHC.
No mesmo sentido, o desemprego médio do primeiro governo foi 10,18%
e do segundo governo aumentou para 11,59%.

As taxas de desemprego apresentaram oscilações e uma tendência de alta no


primeiro governo. Por outro lado, declinaram até próximo da metade do segundo
governo. Em seguida, retomaram um período de alta, com oscilações ao longo de
todo o período.

Figura 5.12 ‑ Taxa mensal de desemprego aberto da região metropolitana de São Paulo (%) – Fundação
Seade/PED: jan/1994 a dez/2002

Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do IPEADATA).

Giambiagi (2011, p. 192) identifica o desempenho do mercado de trabalho no


período entre 1995 e 2002 como uma das razões para a derrota do candidato do
governo, José Serra, nas eleições de 2002. A política macroeconômica deixou a
desejar em termos dos seus efeitos sobre o emprego e a renda.

Neste capítulo, você conheceu o contexto econômico brasileiro durante a


concepção do plano de estabilização de maior êxito da história brasileira: o Plano
Real. Em seguida, estudou o desdobramento, a concepção e a prática da
implementação do Plano Real em cada um dos seguintes estágios: (1) o ajuste
fiscal; (2) a desindexação; e (3) a nova moeda e a âncora nominal.

144
Economia Brasileira

Conheceu como foi o primeiro governo Fernando Henrique (FHC), os esforços em


favor da estabilização e a natureza do desequilíbrio das contas do setor externo e
do setor público. O seu primeiro governo foi marcado pela dependência da âncora
cambial e pela adoção de uma política fiscal “frouxa”, que acabou causando uma
profunda deterioração das contas públicas. Além disso, a valorização cambial
conduziu a um baixo crescimento econômico pela necessidade de se manter
elevadas as taxas de juros.

O término de seu primeiro governo ocorreu num contexto de crise, quando o


desafio para o período seguinte estava claro: a correção desses desequilíbrios,
assegurando a estabilização, e recolocando o país numa trajetória de crescimento
econômico sustentável.

Aprendeu que o segundo governo FHC foi muito diferente do primeiro. Após a
crise cambial de 1999, mudou o tripé da política macroeconômica adotando:
o câmbio flutuante, o sistema de metas para a inflação, e a austeridade fiscal
com metas para o superávit primário.

Foi um governo marcado pela continuidade e aprofundamento das reformas


iniciadas no governo Collor, incluindo a Lei de Responsabilidade Fiscal, a reforma
da Previdência Social, o ajuste fiscal nos Estados, o fim dos monopólios estatais
nos setores de petróleo e telecomunicações, e a reinserção do Brasil no mundo.
Finalmente, você conheceu que o desempenho fiscal e externo melhorou, mas o país
continuou apresentando baixas taxas de crescimento econômico e alto desemprego.

Você encerra aqui o estudo do período que compreende os dois governos de


Fernando Henrique, desde o Plano Real. O esforço maior do governo foi no sentido
de manter a estabilidade que será também do próximo presidente: Luiz Inácio Lula
da Silva.

145
Capítulo 6

As mudanças recentes na
economia brasileira: a euforia

Habilidades Este capítulo possibilitará ao(à) aluno(a) compreender


o contexto econômico e político no início do governo
Lula, as desconfianças em relação ao novo governo
e as medidas econômicas de transição, aprender
que as metas de inflação foram cumpridas dentro
do intervalo de tolerância, com uma tendência
contínua de queda, estudar como se desenvolveu
a política fiscal e o desempenho das contas
públicas, com destaque para o pagamento de juros
do setor público, o déficit nominal, o resultado
primário, o comportamento da dívida pública e
da carga tributária. Também, analisar a trajetória
da taxa de câmbio e o desempenho externo de
nossa economia, com destaque para as contas do
Balanço de Pagamento. Por fim, aprender como
se deu a retomada do crescimento econômico
e discutirá os avanços nos indicadores do
emprego, da distribuição da renda e da pobreza.

Seções de estudo Seção 1:  Início do governo Lula

Seção 2:  Acertando o alvo e a estabilidade monetária

Seção 3:  A fantasia fiscal e as contas públicas

Seção 4:  O desempenho externo e o balanço


de pagamentos

Seção 5:  A retomada do crescimento econômico


com distribuição de renda

Seção 6:  Dilma Rousseff: as nossas insuficiências

147
Capítulo 6

Seção 1
Início do governo Lula
Você já descobriu que o governo Fernando Henrique terminou com um quadro de
instabilidade econômica relacionada a pressões cambiais, a uma aceleração da
inflação e ao risco‑país. As medidas implementadas no seu governo não foram
suficientes para gerar crescimento sustentado.

Nesta seção, você irá compreender o contexto econômico e político no início


do governo Lula, que, na visão de muitos analistas, passou por um processo de
moderação e caminho para o centro.

1.1 As desconfianças em relação ao novo governo


Em 2002, os problemas econômicos refletiam, em parte, uma crise de desconfiança
em torno do que ocorreria com a política econômica com o novo governo.

O Banco Central apurou, em janeiro de 2002, uma expectativa inflacionária


de 4%, variação pelo IPCA, para o ano de 2003. Em novembro, estando
clara a eleição de Lula e com um cenário de dólar em desvalorização (em
janeiro de 2002 estava R$ 2,37, enquanto no mês de outubro alcançou
R$ 3,80), a expectativa para a inflação de 2003 chegou a 11%.

Pois bem, lembre‑se também que o governo precisou lidar com uma sucessão
de choques adversos: a crise de energia, o estouro da bolsa de valores Nasdaq,
o 11 de setembro, a moratória da Argentina e a forte possibilidade de assumir a
presidência da república um partido de esquerda.

Quais eram as desconfianças relacionadas à postura do Partido dos


Trabalhadores (PT)?

Gremaude (2011, p. 491) comenta que, historicamente, as políticas defendidas


pelos seus membros eram:

•• redução das despesas com juros (pela queda acelerada dos juros
e/ou pela renegociação da dívida);
•• redução do superávit primário;
•• repulsa ao acordo com o FMI;

148
Economia Brasileira

•• críticas ao regime de metas de inflação;


•• questionamentos relacionados à privatização e do papel das
agências reguladoras.

Dessa forma, as políticas defendidas anteriormente colocavam em dúvida o


compromisso com a estabilidade e incertezas em relação à preservação dos
contratos, contribuindo para agravar o quadro de instabilidade de 2002. A posse
de Lula assumiu, portanto, outro significado: seu governo servia como um teste
importante para a economia brasileira.

A defesa da estabilidade, desde o período Collor/Itamar, e a austeridade fiscal,


a partir do final dos anos 1990, faziam parte do discurso das mudanças. Porém,
o mercado colocava dúvidas sobre até que ponto esses compromissos seriam
também assumidos pelo governo seguinte.

Giambiagi comenta a possibilidade de se elencar uma longa lista de declarações


que fundamentavam essas dúvidas. A seguir, reproduzimos algumas dessas
declarações e sua autoria (GIAMBIAGI, 2011, p. 199):

“Está mais do que na hora de submeter à população um


plebiscito nacional sobre a dívida externa que esclareça os
prejuízos decorrentes de manter essa situação de submissão às
regras do FMI que mantém o país prisioneiro do capital financeiro
internacional” (TAVARES, Maria da Conceição. [Ex‑deputada
federal do PT e, na época, conselheira de Lula], 02 jul. 2000.
Folha de São Paulo).

“Apoiamos a iniciativa da CNBB de realizar um plebiscito sobre


o endividamento do país” (MERCADANTE, Aloísio [Deputado
federal do PT na época]. 04 set. 2000. Jornal do Brasil).

“A meta de superávits primários de 3% (do PIB) de 2001 a 2004,


contida na última LDO, é exagerada e suicida para uma economia
que precisa de investimentos” (MANTEGA, Guido. 10 maio. 2001.
Valor Econômico).

“Precisamos, em primeiro lugar, readquirir o controle sobre nossa


política fiscal e monetária, hoje comentada pelo FMI, a serviço
da geração de superávits primários para pagar os credores”
(SILVA, Luís Inácio Lula da. [na época, presidente]. 02 maio. 2000.
Valor Econômico).

O teor dessas declarações e uma leitura do primeiro documento oficial do


partido, intitulado “Um outro Brasil é possível”, de 2001, e que posteriormente foi
complementado, ajudam a compreender o comportamento do mercado financeiro
em 2002.

149
Capítulo 6

Com a possibilidade de vitória de Lula nas eleições, ao longo de 2002


observou‑se uma mudança de discurso, em que teve papel fundamental a
indicação de Antônio Palocci como coordenador do programa de governo.
Palocci transmitia a ideia da estabilidade, da defesa dos contratos, da
preservação do ajuste fiscal e da garantia de pagamento das dívidas.

Para Giambiagi (2011, p. 203), três documentos do Partido dos Trabalhadores


confirmam essa mudança de posição no ano de 2002: a “Carta ao Povo
Brasileiro”, em junho; o programa de governo, apresentado em julho e a “Nota
sobre o Acordo com o FMI”, em agosto. Além desses, o documento oficial
“Política Econômica e Reformas Estruturais” sacramentam a mudança, em 2003,
na gestão do ministro da Fazenda Antônio Palocci.

1.2 A eleição do presidente Lula


Os brasileiros elegeram, no dia 27 de outubro de 2002, Luiz Inácio Lula da Silva
como seu presidente. No mesmo dia, em seu discurso de posse, Lula procurou
deixar claro que a palavra chave de seu governo seria “mudança”.

Segundo Giambiagi (2011, p. 197), a posse de Luiz Inácio Lula da Silva teve um
significado político‑ideológico importante: representou a ascensão da esquerda
ao poder. O governo de Lula “encarnou” uma mensagem de transformação
comparável apenas à posse de Salvador Allende no Chile, nos anos de 1970.

Souza (2008, p. 288), sobre o discurso do presidente eleito, lembra que não se
tratava de qualquer mudança e cita os seguintes trechos do discurso:

O Brasil, nesta nova empreitada histórica, social, cultural e


econômica, terá de contar, sobretudo, consigo mesmo, terá de
pensar com a sua cabeça, andar com as suas próprias pernas,
ouvir o que diz seu coração. E, para isso, basta acreditar em
nós mesmos, em nossa força, em nossa capacidade de criar e
em nossa disposição para fazer. Estamos começando hoje um
novo capítulo na História do Brasil, não como nação submissa,
não como nação injusta, assistindo passivamente o sofrimento
dos mais pobres, mas como nação altiva, nobre, afirmando‑se
corajosamente no mundo como nação de todos.

Na apresentação de seu livro, Mercadante (2006) comenta que a eleição de


Lula foi uma esperada e extraordinária conquista das forças progressistas do
Brasil, que sempre tiveram o compromisso maior de transformar o país para
uma sociedade mais justa e digna. Complementou, ainda, que “transformações
inadiáveis, dentro do Estado de Direito, sem rupturas [grifo meu], violência ou
autoritarismo, finalmente, tiveram a chance de ser incorporadas à agenda do
país.” (MERCADANTE, 2006, p. 13).

150
Economia Brasileira

Segundo Souza (2008, p. 288), a ampliação de sua base política teve um peso
decisivo na eleição de Lula.

Na época, o senador José Alencar foi indicado para a vice‑presidência e foi


obtido o apoio de várias lideranças do PMDB, tais como: Orestes Quércia,
Roberto Requião, José Sarney e Itamar Franco.

A coligação “Lula Presidente” era composta pelos partidos PT, PL, PC do B, PMN
e PCB, e a coligação “Grande Aliança” pelo PSDB e PMDB. Após a vitória de Lula,
em nome da governabilidade, o PMDB foi convidado a fazer parte do governo,
mesmo tendo apoiado o candidato José Serra para a presidência em 2002.

Com a constituição de 1988, a aprovação das Emendas Constitucionais exigiria três


quintos dos votos das duas casas do Congresso. A Tabela 6.1 mostra a distribuição
das bancadas partidárias na Câmara dos Deputados na eleição de 2002.

Tabela 6.1 ‑ Distribuição das bancadas partidárias na Câmara dos Deputados na eleição legislativa
de 2002

Partidos Deputados Participação %

PT 91 17,7

PFL 84 16,4

PMDB 74 14,4

PSDB 71 13,8

PPB 48 9,4

Outros 145 28,3

Total 513 100


Fonte: Adaptado de Giambiagi (2011, p. 202).

Observe que o PT obteve apenas 17,7% dos votos na Câmara dos Deputados.
A aprovação de uma emenda exigiria a soma de todos os votos dos quatro
partidos com mais bancadas, explicando a necessidade do chamado
“presidencialismo de coalizão”, adotado no governo Fernando Henrique e, agora,
no governo Lula.

1.3 As medidas econômicas de transição


O primeiro desafio do governo seria conter e reverter a instabilidade de 2002.
Gremaude (2011, p. 492) comenta que a situação vivida pelo país era de
“dominância fiscal”:

151
Capítulo 6

Para aquele nível de juros, crescimento econômico e montante


de dívida, o superávit primário prometido pelo governo era
insuficiente para estabilizar a dívida. Assim, a reversão da
situação passaria por uma sinalização do novo governo de que
este geraria um superávit primário superior aos 3,75% do PIB
do governo FHC, em nível suficiente para estabilizar e reverter à
tendência de crescimento da dívida.

Segundo o mesmo autor, o PT deveria sinalizar o compromisso com a estabilidade,


rompendo com seu discurso contra elevação das taxas de juros, e com a
ampliação do ajuste fiscal, rompendo com as ideias anteriores de redução do
superávit primário.

Mas qual deveria ser o nível de superávit primário?

Segundo Giambiagi (2011, p. 204), essa era uma questão aberta, em razão das
dificuldades para se conhecer as taxas futuras de juros e de crescimento do PIB,
existindo uma percepção de que o superávit de 3,75% do PIB, para 2003, já não
era mais suficiente. Lembrou também a existência de uma fórmula para calcular
o superávit primário necessário para manter estável a relação dívida pública/PIB,
que é:

p = d . (i – q) / (1 + q) – s

Assim:

p é o superávit primário expresso como proporção do PIB;


d é a relação dívida pública/PIB;
i é a taxa de juros real da dívida pública;
q é o crescimento da economia;
s expressa a relação “Senhoriagem”/PIB.

Segundo relatório do A “Senhoriagem” /PIB corresponde ao fluxo de


BACEN (2011, p. 56), financiamento por meio da emissão monetária, enquanto
“a senhoriagem pode que “d” considera a dívida “pura” (aquela que rende a
ser definida como a
receita ou o lucro do
necessidade de pagamento de juros).
governo proveniente do
monopólio de emissão A expressão acima revela que quanto maior (menor)
de moeda”. Em 2010, a dívida pública e a taxa de juros e menor (maior) o
o fluxo relativo às crescimento da economia e/ou a emissão monetária
receitas de senhoriagem
para financiar parte do déficit, maior (menor) terá que ser
foi de R$ 15.848.166
e, em 2011, o superávit primário a ser alcançado para evitar que a
R$ 20.291.041. relação dívida pública/PIB aumente.

152
Economia Brasileira

Você encontrará uma explicação sobre o que é e a importância do


“Superávit primário” na seguinte publicação:

ROCHA, Alexandre; ÀLVARES, Fernando. O que é e para o que serve o


“Resultado Primário”? Publicado em 14/02/2011. Disponível em: <http://
www.brasil-economia-governo.org.br/2011/02/14/o-que-e-e-para-o-que-
serve-o-resultado-primario/>. Acesso em: 2 fev. 2013.

A Tabela 6.2 mostra o conjunto de superávit primário requerido para valores de taxas
de juros e de crescimento da economia, considerando uma dívida inicial de 55% do
PIB e uma senhoriagem de 0,4% do PIB (numa condição de inflação baixa).

Tabela 6.2 – Superávit primário requerido para estabilizar a relação dívida pública/PIB (% PIB),
com d = 0,55 e s = 0,004

Crescimento real do PIB (%)

2 3 4 5

8 2,8 2,3 1,7 1,2

9 3,4 2,8 2,2 1,7


Taxa de
juros real 10 3,9 3,3 2,8 2,2
(%)
11 4,5 3,9 3,3 2,7

12 5 4,4 3,8 3,3


Fonte: Giambiagi (2011, p. 205).

No início de 2003, as perspectivas para a taxa de crescimento de 2% e a taxa


de juros real de mais de 10% sinalizavam para a necessidade de um superávit
primário em torno de 3,9% do PIB.

Você deve notar que se a economia crescesse mais e os juros diminuíssem,


a relação superávit primário/PIB também poderia cair. Além disso, caso o
objetivo fosse diminuir a relação dívida/PIB, o superávit a ser obtido deveria ser
maior do que aquele estimado pela fórmula anterior.

Além disso, paralelamente à política fiscal, a política monetária exigia decisões


em relação às taxas de juros. Muitos analistas julgavam que o aumento definido
de 18% para 25% da taxa de juros Selic havia sido insuficiente para conter o
processo inflacionário, além de aplicado tardiamente.

O governo manteve toda a diretoria do Banco Central e nomeou para o cargo de


presidente Henrique Meirelles, que havia anteriormente ocupado a presidência do
Bank Boston.

153
Capítulo 6

•• As primeiras medidas econômicas tomadas pelo novo governo


foram no sentido do ajuste fiscal e da estabilidade: elevou a meta
do superávit primário de 3,75% para 4,25% do PIB, em 2003,
e também para os demais três anos do governo Lula;
•• Ordenou cortes do gasto público, na intenção de viabilizar o
objetivo fiscal;
•• Elevou a taxa de juros básica, já nas primeiras reuniões do Copom,
deixando claro o firme propósito em relação à estabilidade;
•• Anunciou metas de inflação de 8,5% e 5,5%, respectivamente,
para 2003 e 2004, reforçando a política anti‑inflacionária.

O conjunto dessas medidas sinalizou para a nova postura em relação à política


econômica, deixando de lado muitas das bandeiras defendidas pelo partido até
ali. O mais importante foi prevalecer à tese de que a estabilidade e a austeridade
fiscal devam se constituir em políticas de Estado, e não apenas de governo.

As medidas fiscais e monetárias, vistas como “pró‑mercado”, geraram resultados


positivos em relação à inflação. Lembre‑se de que a abundância de liquidez
internacional e as medidas monetárias restritivas (elevação das taxas de juros)
contribuíram para a apreciação de nossa moeda, ajudando no combate à
inflação. Em relação à atividade econômica, essas medidas comprometeram o
desempenho do PIB em 2003.

Além das medidas fiscais e monetárias, o compromisso do novo governo com as


reformas estruturais (proposta de reforma tributária e de reforma da previdência)
foram também vistas como favoráveis “pró‑mercado”, amenizando a onda de
desconfiança anterior à eleição de Lula.

Segundo Cardoso (2013, p. 206),o governo Lula, nos dois primeiros anos de seu
mandato, efetivamente promoveu duas reformas estruturais:

1. A primeira, de caráter macroeconômico, consistiu na emenda


constitucional que definiu as regras para a criação de regimes de
previdência complementar para servidores por capitalização e
estabeleceu o teto para remuneração de servidores federais;
2. A segunda, de caráter microeconômico, incluiu a nova legislação
de falências, a legislação que criou os empréstimos consignados
em folha de pagamento e aprimoramentos relacionados à
execução de garantias nos casos de alienação fiduciária em
financiamentos imobiliários.

154
Economia Brasileira

Após o segundo ano de seu governo, Lula deixou de lado as agendas de reformas
e buscou apoio junto à ala contrária às políticas implementadas até ali. Você deve
lembrar que em meados de 2005 ocorreram denúncias de corrupção envolvendo
pagamentos a parlamentares, isso ficou conhecido por “mensalão”.

Sobre as denúncias relativas ao financiamento ilegal de campanhas associadas


a desmandos e desvios administrativos no último ano do primeiro mandato de
Lula, Mercadante (2006, p. 15) avaliou que elas não podem ser subestimadas,
e comentou:

É essencial ter a clareza e a humildade para assumir que, em


nosso denso esforço de reconstrução do Brasil, marcado por
tantos êxitos, lamentavelmente cometemos erros importantes.
Seguramente o mais grave foi errar naquilo que não tínhamos o
direito de errar: o império da ética.

Seção 2
Acertando o alvo e a estabilidade monetária
A gestão do governo Lula manteve o tripé metas de inflação, regime de câmbio
flutuante com intervenção e ajuste fiscal. No período entre 2003 a 2010, o regime
de metas de inflação foi capaz de manter a estabilidade monetária, mesmo tendo
o país retomado o crescimento econômico.

Em 2009, o sistema de metas de inflação completou seu décimo aniversário,


merecendo uma avaliação positiva por parte do economista Armínio Fraga Neto,
a quem devemos a implantação do sistema durante sua gestão no Banco Central.
Fraga Neto (2011, p. 29) argumenta que:

Em geral, em momentos de crise, o sistema de metas tem se


mostrado bastante eficaz. Podemos dizer que, até esses dias,
a experiência brasileira representa o maior teste de estresse de
um sistema de metas para a inflação já registrado. Em diversos
momentos difíceis, o Banco Central tem podido agir de acordo
com a prática hoje universalmente aceita de acomodar desvios
temporários da meta, com o objetivo de suavizar as flutuações
no nível de atividade da economia. Esse delicado equilíbrio de
objetivos depende crucialmente da credibilidade do sistema que,
entre uma crise e outra, vem se consolidando adequadamente
desde sua implantação.

155
Capítulo 6

A Figura 6.1 mostra o comportamento da inflação ao consumidor medida pelo


IPCA, com dados em variação percentual no ano (% a.a.), do período 2000 a 2013.

A inflação herdada pelo governo Lula se deveu à rápida e intensa desvalorização


de nossa moeda que, com o aumento dos preços dos produtos importados,
contaminou os demais preços. Você deve lembrar que a economia brasileira em
2001 e 2002 praticamente não cresceu, com as vendas em queda, indicando que
não se tratou de uma “inflação de demanda”.

Figura 6.1 – Inflação ao consumidor – IPCA (% a.a.)

Fonte: Adaptação de IPEADATA ( 2011).

Legenda:
Linhas tracejadas: Limites superior e inferior
Linha cheia: Meta de inflação

A partir daí, com um comportamento favorável da taxa de câmbio (valorização) e


a política restritiva adotada pelo Banco Central, a inflação de 2003 foi de 9,3%,
situando‑se um pouco acima da meta de 8,5%, redefinida pelo novo governo.
Já a meta redefinida para 2004 era 5,5% e o resultado observado foi uma inflação
de 7,6%. Dessa forma, você pode observar a trajetória da inflação declinante, o
que contribuiu para a fixação da meta de inflação em 4,5%, para o ano de 2005 e
também para os anos seguintes.

A Figura 6.1 mostra que, nos cinco anos entre 2005 e 2010, a meta estabelecida
para a inflação foi de 4,5%, com uma banda de 2% para cima ou para baixo.
O limite superior, considerando a banda era 6,5% e o inferior 2,5%. Note que,
neste período, a inflação observada sempre se manteve no intervalo da banda,
revelando a eficiência das medidas adotadas.

156
Economia Brasileira

Giambiagi (2011, p. 224) comenta que contribuíram para os resultados


observados “a trajetória bem comportada da taxa de câmbio – com exceção
do ano de 2008 – e uma taxa de juros real, em média, ainda bastante elevada,
embora com tendência de queda”.

O mesmo autor (2011, p. 224) aponta quatro desafios associados ao sistema de


metas, no final da década:

i. Combater a alta conjuntural da inflação observada em 2010,


com chances de “contaminar” o resultado de 2011;
ii. Reduzir a meta, em médio prazo, para um número mais
próximo da inflação nos países mais avançados, talvez para algo
entre 3% e 4%, ligeiramente abaixo do alvo de 4,5% mantido
durante vários anos;
iii. Conciliar a preservação do regime de metas com um
crescimento médio sustentado mais robusto da economia,
idealmente mais próximo de 5%;
iv. Conseguir implementar (ii) e (iii) em um contexto de juros
menores que as taxas observadas no Brasil na primeira década
e meia a partir da estabilização de 1994.

Como justificar as elevadas taxas de juros Selic observadas na primeira


década do século XXI?

Arida (2012, p. 213) apontou, no final do primeiro ano do governo Lula (dezembro
de 2003) as seguintes interpretações correntes para as elevadas taxas de juros:

•• A política monetária tem sido excessivamente conservadora, depois


que a inflação foi estabilizada;
•• O ajuste fiscal ainda é insuficiente;
•• A existência nos últimos anos de uma série excepcional de choques
externos e internos adversos, tais como: o estouro da bolha de
tecnologia Nasdaq, o racionamento de energia, o 11 de setembro,
o colapso da Argentina e o chamado risco Lula.

Curado (2011, p. 95) considera três aspectos centrais que podem justificar a
manutenção de elevadas taxas de juros:

1. A convivência com um longo período de alta inflação, com elevados


custos para o desenvolvimento social e econômico, ajuda a explicar
a adoção de medidas mais conservadoras (o Banco Central reage
de forma mais forte quando da ocorrência de desvios entre a meta
e a expectativa de inflação);

157
Capítulo 6

2. A relação existente entre política monetária e as finanças públicas,


ou seja, a necessidade de rolagem da dívida pública, que impõe
limites para a queda de juros real. Além disso, o governo Lula não
utilizou instrumentos fiscais na contenção da demanda agregada;
3. A ocorrência de uma verdadeira explosão do crédito, especialmente
ao consumidor. “Em janeiro de 2003, a relação operação de crédito
(setores público e privado) /PIB era de 23,94%. Em outubro de 2010
esta relação atingiu 47,25%.”

A Figura 6.2, a seguir, exibe o histórico das taxas de juros nominais (% a.a.) fixadas
pelo Copom, no período de janeiro de 2003 a janeiro de 2013, mostrando uma
importante redução de sua taxa de juros.

•• No começo de 2003, com o dólar pressionado, a taxa Selic


anualizada foi aumentada de 25% para 26,5%;
•• Entre setembro de 2004 e maio de 2005, em decorrência de uma forte
alta das commodities, a taxa de juros subiu de 16% para 19,75%;
•• Entre abril e setembro de 2008, quando o crescimento da economia
e o temor quanto à pressão de demanda levaram a uma alta de
11,25% para 13,75%;
•• Entre abril e julho de 2010, pelos motivos anteriores (depois de
apaziguado os efeitos da crise de 2009), eleva‑se de 8,75% para
10,75%.

Figura 6.2 – Histórico das taxas de juros nominais (% a.a.) fixadas pelo Copom, período de janeiro de
2003 a janeiro de 2013

Fonte: Adaptado de Giambiagi (2011, p.212).

158
Economia Brasileira

É importante registrar que o comportamento da taxa de juros, tanto no


primeiro como no segundo mandato de Lula, foi influenciado fortemente
pelo comportamento da inflação. Ao final da série apresentada no gráfico,
a taxa Selic apresentou seu menor patamar desde o lançamento do Plano
Real, 7,25% em janeiro de 2013.

Segundo o Ministério da Fazenda (2012, p. 63), no documento “Economia


Brasileira em perspectiva”, 17ª edição, “a redução da taxa real de juros de curto
prazo no Brasil foi significativa, saindo de 14%, em dezembro de 2002, para 1,8%
em novembro de 2012”.

Curado (2011, p. 95) lembra que, no período especialmente após a crise


financeira de 2008, as taxas de juros reais caíram praticamente em todos os
países do mundo. Veja a evolução do Brasil neste contexto:

Em 2002, o Brasil liderava o ranking das taxas de juros reais com 11,1% a.a. e,
o segundo colocado, a Turquia, tinha um juro real de 9,4%.

Em setembro de 2004, mês em que as taxas de juros voltaram a subir no país,


o Brasil praticava a segunda maior taxa de juro real no mundo, 9,3%.

Em janeiro de 2006, o Brasil estava na dianteira com juros reais de 12,1% e,


o segundo colocado era Cingapura, com 6,4%.

Em dezembro de 2010, o Brasil também liderava o ranking com 4,8% a.a. de juros
reais e, a África do Sul, em segundo lugar, tinha juros reais de 2% a.a.

Souza (2008, p. 299), aponta outro tema relevante relacionado às elevadas taxas
de juros reinantes em nosso país:

Sabemos perfeitamente que, como os especuladores se


acostumaram a usufruir de uma taxa de juros elevada aqui
no Brasil, sua tendência, diante de um movimento de queda,
é ameaçar retirar o dinheiro como forma de pressão para impedir
esse movimento. E, para isso, recorrem ao poder de monopólio
de que desfrutam na esfera mundial.

Segundo Gremaude (2011, p. 498), o elevado patamar das taxas de juros


em contexto internacional favorável e a significativa redução do risco país
contribuíram para atrair capital estrangeiro e para pressionar, no sentido da
valorização cambial. Isso ocorreu mesmo com as intervenções do Banco Central
e sua política de elevação dos níveis das reservas internacionais.

159
Capítulo 6

Finalmente, deve‑se ressaltar também que, apesar de o país ter taxas de juros
muito elevadas no contexto internacional, os picos e os vales exibidos no gráfico
anterior de cada ciclo foram cada vez menores (indicando a tendência de baixa
da taxa de juros ao longo do período).

Você pode concluir que, ao longo dos dois governos de Lula, as metas de inflação
foram cumpridas dentro do intervalo de tolerância, com uma tendência contínua
de queda. A mesma tendência pode ser dita em relação ao comportamento da
taxa de juros, que contribuiu para acertar o alvo e a estabilidade monetária.

Seção 3
A “fantasia fiscal” e as contas públicas
O emprego da expressão “fantasia fiscal” no título é apenas para enfatizar que o nosso
país tem sido conduzido como se não estivesse sujeito a limites, especialmente no
que diz respeito ao gasto público. A expressão foi empregada por Giambiagi (2012,
p. 15), em sua recente publicação, o livro “Além da euforia”, que discute os riscos e as
lacunas do modelo brasileiro de desenvolvimento contemporâneo.

O aumento do gasto público pode ser financiado pelo aumento dos impostos,
pela emissão de dívida pública, ou em última instância, por mais inflação.
Em relação à situação fiscal, lembre‑se de que uma das primeiras medidas
anunciadas pelo governo Lula foi a elevação da meta de superávit primário para
4,25% do PIB. Pois bem, a partir de agora você aprenderá como se desenvolveu
a política fiscal e o desempenho das contas públicas nos dois governos Lula.

Giambiagi (2008) relembrou o editorial do Boletim de Conjuntura do IPEA de 2004,


onde se faz uma reflexão inspirada sobre o que tinha acontecido nos processos
de consolidação em outros países, baseada em análise do FMI (2001):

...o País poderá estar ingressando... na fase do tão almejado


círculo virtuoso, verificado em outros países que passaram
por processos de ajustamento fiscal no passado, mais
especificamente nos anos de 1990, com destaque para alguns
casos da Europa Ocidental que atingiram níveis de dívida pública
[elevados]. Nesses casos nacionais, em que pesem as diferenças
e nuanças entre os países, observou‑se um padrão, ao qual a
experiência do Brasil dos últimos anos não foi alheia. No que se
poderia denominar Fase 1 desse processo, o resultado primário
das contas públicas era modesto ou até mesmo deficitário e,

160
Economia Brasileira

devido aos juros, a dívida pública era crescente, quadro esse


que se encaixa como uma luva na situação do Brasil até 1998.
Na Fase 2, que correspondeu aos primeiros anos do ajustamento,
houve um forte ajuste primário e o setor público passou a gerar
superávits primários que, com o tempo, foram superiores a
4% a 5% do PIB mas, devido à presença de desconfianças
acerca da sustentação do ajuste no tempo, as taxas de juros
eram ainda altas e, consequentemente, uma carga de juros e de
déficits elevados ainda pressionava a dívida pública. Isso espelha
exatamente o que aconteceu no Brasil de 1999 até agora.
Se colocadas em um gráfico mostrando a dívida pública e o
superávit primário ... como proporção do PIB, as duas variáveis
mostram uma trajetória clara: na primeira fase, resultados
primários modestos ou negativos relativamente estáveis convivem
com uma dívida pública crescente, enquanto na segunda o
superávit primário é claramente ascendente, mas a dívida pública
também continua aumentando, em função das citadas razões.
Finalmente, na Fase 3, na qual pode ser que o Brasil ingresse
entre 2004 e 2005, a persistência do ajustamento fiscal, ou seja,
a manutenção de superávits primários robustos por um número
considerável de anos, foi aos poucos consolidando a confiança
entre os investidores. Isso ajudou a reduzir as taxas de juros e
permitiu que, enquanto o superávit primário se manteve – em
alguns casos até mesmo declinando ligeiramente – a queda
da taxa de juros possibilitou uma diminuição significativa das
despesas financeiras do governo e do déficit público, gerando,
em consequência, uma trajetória declinante da relação Dívida
pública/PIB. Esta queda pôde ser conservada ao longo do
tempo, pelo efeito benéfico desse processo sobre a carga de
juros, viabilizando novas reduções do coeficiente Juros/PIB.
(GIAMBIAGI, 2008, p. 536).

Neste material didático, você descobriu que, de fato, a economia brasileira nos
anos de 1990 vinha de um processo de deterioração da situação fiscal, quando
passou a conviver, na década atual, com superávits primários. Vamos verificar
como se deu esse processo de ajustamento na direção do almejado equilíbrio
fiscal durante o governo de Lula.

Diferentemente do esperado pelas posições defendidas durante a campanha


eleitoral, no início do novo governo, a política fiscal se revelou mais contracionista.
A Figura 6.3 exibe a evolução do superávit primário no período 2003 a 2012.

161
Capítulo 6

Figura 6.3 – Resultado primário (%PIB): 2003 a 2012

Obs.: O dado de 2013 corresponde ao acumulado de janeiro, até o mês de outubro de 2013.
Fonte: Adaptado de Ministério da Fazenda (2012, p. 83).

Nos três primeiros anos do governo Lula, ocorreu um aumento contínuo do


superávit primário, passando de 3,3% em 2003 para 3,8% em 2005. Ao longo dos
quatro anos, o superávit situou‑se entre 3% e 4%, sendo que em 2006 foi de 3,2%.

Souza (2008, p. 300), para a obtenção desses crescentes saldos primários,


comenta que no primeiro ano (em decorrência da carga tributária), o governo
cortou fortemente os investimentos públicos. Para o segundo e terceiro ano,
o governo utilizou como principal instrumento o aumento da carga tributária.

Segundo Gremaude (2011, p. 495), a melhora do superávit primário


combinado com a valorização cambial contribuiu para a redução da Dívida
Líquida do Setor Público em relação ao PIB.

Apesar da obtenção dos superávits relativamente elevados, a política monetária


restritiva acarretou em despesas expressivas com o pagamento dos juros.
A Figura 6.4 exibe a evolução do pagamento de juros do setor público, do déficit
nominal (Necessidade de Financiamento do Setor Público ‑ NFSP) e do resultado
primário no período 2003 – 2012 (% PIB).

162
Economia Brasileira

Figura 6. 4 ‑ Evoluções do pagamento de juros do setor público, do déficit nominal e do resultado


primário no período 2003 – 2012 (%PIB)

Obs.: O dado de 2012 corresponde ao acumulado em doze meses, até o mês de outubro de 2012.
Fonte: Adaptado de Ministério da Fazenda (2012, p. 83).

Você deve observar a tendência de redução do pagamento dos juros ao longo do


período, que está relacionada à diminuição dos juros, como ilustra a Figura 6.2,
e pela diminuição da relação Dívida/PIB.

Giambiagi (2011, p. 215) identificou uma nítida mudança de postura com a saída
de Antônio Palocci e a chegada de Guido Mantega no ministério da Fazenda,
manifestando ou nos seguintes elementos:

A taxa de variação real do gasto público teve um aumento


expressivo em relação à média dos dois primeiros anos
de Governo, com ênfase nos aumentos do funcionalismo,
especialmente no segundo Governo Lula;
- Observou‑se uma tendência a um afrouxamento dos
superávits primários;
- O Governo passou a usar a possibilidade de desconto – por
vezes, até mesmo expressivo – de parte do investimento da
meta de superávit primário, mecanismo que, embora estivesse
formalmente disponível ainda no final do Governo FHC, nunca
tinha sido utilizado. Com isso, a “meta fiscal”, na prática, deixou
de ser efetivamente perseguida, uma vez que passou a ficar
sujeita a uma espécie de “banda de tolerância”;
- O Ministério da Fazenda passou a divergir claramente em
várias ocasiões do Banco Central acerca da condução da
política monetária;

163
Capítulo 6

- Foram abandonados os estudos que a área econômica vinha


fazendo em 2005, destinados a elaborar um plano de longo prazo
visando maior contenção do crescimento da despesa, para atacar
de modo mais vigoroso o desequilíbrio fiscal;
- A retórica ministerial deixou de enfatizar os aspectos de
continuidade ligados à manutenção das políticas herdadas
do Governo anterior e passou a procurar diferenciar de forma
sistemática a política oficial em relação à que era praticada no
Governo FHC; e
- Houve um aumento substancial da importância e do papel do
BNDES na economia.

Segundo Curado (2011, p. 96), a prometida reforma tributária não saiu do papel,
ou seja, não houve simplificação e nem ocorreram reduções da carga tributária.
Por outro lado, ocorreram avanços importantes, com destaque para a evolução
da dívida pública. Esse último é o nosso próximo assunto.

3.1 A evolução da dívida pública


Segundo Souza (2008, p. 301), a evolução da dívida pública saltou de US$ 881,1
bilhões, em dezembro de 2002, para US$ 1,002 trilhão, em dezembro de 2005.
No triênio considerado, os juros da dívida pública acumularam um montante de
R$ 430,6 bilhões, que correspondia a 8,23% do PIB.

Apesar do crescimento absoluto da dívida pública, a relação dívida/PIB diminuiu


no triênio considerado, assim como diminuiu nos demais anos da primeira década
(apresentando um comportamento diferenciado no ano de 2009, por interferência
da crise mundial).

A Figura 6.5 mostra a evolução da dívida líquida do setor público, que caiu
de 60% do PIB em 2003, para 40% do PIB em 2010, e chegou a 35% do PIB
durante o ano de 2012.

Segundo Giambiagi (2011, p. 217), a explicação para a inflexão observada


no déficit nominal e na dívida pública (redução do déficit e aumento da dívida
pública), em 2009, relaciona‑se à “combinação de frustração de receita, incentivos
concedidos no bojo da adoção de uma política anticíclica e manutenção de
crescimento do gasto em função de decisões previamente tomadas”.

164
Economia Brasileira

Figura 6.5 ‑ Dívida líquida total do setor público (% PIB) ‑ Banco Central do Brasil

Fonte: Elaboração do autor, (2013) .

Souza (2008, p. 303), considerando o triênio 2002 a 2005, comenta que a melhoria
da relação dívida/PIB se deveu não à desaceleração do crescimento da dívida em
valores absolutos, mas ao crescimento do PIB alavancado pelas exportações.

Giambiagi (2011, p. 215) destacou dois elementos que explicam o processo


contínuo de redução da relação dívida líquida do setor público/PIB:

1. A apreciação cambial verificada a partir de 2002 incidia sobre uma


dívida pública ainda fortemente atrelada à taxa de câmbio, mesmo
apresentando uma redução do superávit primário no segundo
governo de Lula;
2. A tendência de redução do juro real entre os governos Fernando
Henrique e Lula reduziu as despesas financeiras e, ao mesmo
tempo, os ajustes patrimoniais evoluíram favoravelmente.

3.2 A carga tributária


A carga tributária A melhoria dos indicadores fiscais foi resultado da
é o valor de todos elevação contínua da carga tributária até o ano de
os impostos pagos
2008, conforme nos mostra a Figura 6.6. Nos dois
pelos cidadãos
e empresas na anos seguintes, 2009 e 2010, sob os reflexos da crise
proporção das riquezas econômica mundial, ocorreu uma diminuição da carga
produzidas no país. tributária, que voltaria a subir no ano de 2011.

165
Capítulo 6

Figura 6.6 ‑ Carga tributária total (% PIB) ‑ Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Sistema de
Contas Nacionais: 2003 a 2012

Fonte: Adaptado de IPEADATA (2014).

A elevação da carga tributária, que passou de 27,90% do PIB em 1994 para


34,86% do PIB em 2008, contribuiu significativamente para a redução da
capacidade de poupança e investimento do setor privado.

A Tabela 6.3 apresenta a taxa de crescimento da receita e da despesa totais do


governo por períodos (% a.a.).

Tabela 6.3 ‑ Taxa de crescimento da receita e da despesa totais do Governo Central por períodos
(% a.a.) que inclui transferências a Estados e Municípios

Variável 2003‑2004 2005‑2010 2003‑2010

Receita total 3,3 5,2 4,8

Despesa primária 2,2 6,4 5,4

PIB 3,4 4,2 4,0


Fonte: Adaptado de Giambiagi (2011, p. 223).

Despesa primária é também Segundo Giambiagi (2011, p.223), nos dois primeiros
conhecida como despesa
anos do governo Lula, a política adotada no segundo
não financeira, corresponde
ao conjunto de gastos que governo Fernando Henrique foi mantida. De acordo
possibilita a oferta de serviços com essa política, o crescimento da receita (3,3%)
públicos à sociedade, ocorre a taxas superiores às de incremento da
deduzidas às despesas
despesa primária (2,2%) do governo central,
financeiras. São exemplos
os gastos com pessoal, que incluem as despesas do Tesouro Nacional,
custeio e investimento. da Previdência social e do Banco Central.
Pode ser de natureza
obrigatória ou discricionária. A despesa primária apresentou um crescimento médio
(GLOSSÁRIO DE TERMOS anual de 6,4% nos seis últimos anos do governo
ECONÔMICOS, 2013).

166
Economia Brasileira

Lula, 2005‑2010, que se baseou nas transferências diretas a indivíduos, por meio
de medidas como o aumento do salário mínimo, das aposentadorias, seguro
desemprego, o programa Bolsa‑Família, e outras. Esse padrão de gestão implicou
num estímulo ao consumo.

Rodrigues (2010, p.18) identificou, entre 1991 e 2008, os períodos em que a política
fiscal foi de fato expansionista ou contracionista, tendo por base o comportamento
das finanças públicas e da característica do ano. No período mais recente, de 2003
em diante, as tendências relativamente claras foram as seguintes:

•• No ano de 2003 ‑ a política fiscal foi caracteristicamente


contracionista, com redução dos gastos públicos e crescimento da
carga tributária;
•• De 2004 a 2008 ‑ a política fiscal expansionista, com aumento dos
gastos públicos e crescimento da carga tributária.

Giambiagi (2008, p. 567) aponta a redução da carga tributária como um dos


desafios da área fiscal:

Embora a reversão ao passado seja provavelmente utópica,


uma vez que muitos dos fatores que geraram a necessidade de
financiar novos gastos mediante uma maior pressão tributária
são irreversíveis – como o efeito do aumento do salário mínimo
sobre as despesas previdenciárias e assistenciais – o fato é que,
assumindo que a carga tributária elevada atue como um elemento
negativo para o crescimento econômico, o País poderia, uma vez
superada a emergência fiscal das últimas duas décadas, desfazer
parcialmente o aumento da carga impositiva observada desde
meados dos anos de 1990. Ainda que retornar a uma carga de
25% do PIB seja irrealista, em um contexto de redução da despesa
de juros e menor superávit primário, uma carga tributária mais
próxima de 30% do PIB poderia ser um objetivo viável para daqui
a 15 ou 20 anos. Isso poderia contribuir, assim como o maior
investimento, para alavancar as taxas de crescimento do PIB.

Você estudou que a carga tributária brasileira somou 35,3% do Produto Interno
Bruto em 2011, estabelecendo nova marca recorde.

Levando esse número em consideração, concluímos que é necessário conter os


gastos públicos, que tem se expandido a taxas reais maiores que as da economia
brasileira nos últimos vinte anos. Além disso, é preciso modificar a composição
das despesas entre os gastos correntes e os investimentos. Só assim nosso país
poderá aspirar um crescimento sustentável.

167
Capítulo 6

Seção 4
O desempenho externo e o balanço
de pagamentos
Você já descobriu que, com a introdução da política de flutuação cambial, a moeda
brasileira sofreu um processo contínuo de desvalorização. A taxa de câmbio,
influenciada pelo atentado de 11 de setembro de 2001, pela crise argentina e,
depois pelo chamado “risco‑Lula”, alcançou valores superiores a R$ 3,00.

A Figura 6.7 descreve a trajetória da taxa de câmbio nominal mensal entre janeiro
de 2002 a dezembro de 2012, que ao longo dos dois governos Lula apresentou
uma apreciação substancial.

Figura 6.7 ‑ Taxa de câmbio nominal ‑ R$ / US$ ‑ comercial venda média: 2002 a 2012

Fonte: Adaptado de IPEADATA (2013).

Você estudará, a seguir, que o crescimento firme da economia mundial no período


de 2003 a meados de 2008 encobriu em parte os problemas decorrentes da
apreciação cambial. Depois disso, estudará de forma mais abrangente o balanço
de pagamentos que apresentou algumas mudanças cruciais no período.

4.1 Balança Comercial


A desvalorização cambial ocorrida em janeiro de 1999 e as sucessivas crises
cambiais ocorridas até 2002 contribuíram para o aparecimento de um superávit
da balança comercial. A Figura 6.8 exibe o desempenho da balança comercial no
período 2002 a 2011.

168
Economia Brasileira

Figura 6.8 ‑ Importações e Exportações ‑ (FOB) ‑ US$ (milhões) ‑ Banco Central do Brasil: 2002 a 2011

Fonte: Adaptado de IPEADATA (2013).

As exportações sofreram forte elevação durante todo o primeiro mandato e até


a metade do segundo mandato de Lula. No primeiro ano de governo (2003),
as exportações somaram US$ 73, em 2004, aproximaram‑se dos US$ 100 bilhões, e,
em 2008, chegaram perto dos US$200 bilhões, dobrando seu valor em quatro anos.

As importações ficaram estagnadas em 2003 em torno de US$ 48 bilhões e,


a partir daí, passam a crescer até o ano de 2008, quando alcançaram US$ 173
bilhões. O aumento no período refletiu a valorização real da taxa de câmbio.

O comportamento das duas variáveis anteriores (da exportação e importação)


resultou em saldos comerciais crescentes até 2006, quando atingiu US$ 46. A partir
de 2007, os saldos voltam a decrescer, atingindo US$ 20 bilhões em 2010.

Giambiagi (2011, p. 221) observa que o desempenho da balança comercial no


governo Lula impressiona pela dimensão monetária dos superávits observados no
período, apresentando o seguinte comportamento:

•• A evolução do volume de exportações e importações no período não


foi tão brilhante;
•• Os superávits deveram‑se, em boa parte, ao “boom” de preço das
exportações (forte aumento dos preços internacionais das commodities);
•• A participação dos manufaturados na pauta de exportações do país,
que por mais de uma década e meia respondia em torno de 55% do
total exportado, caiu para 39% em 2010.

Curado (2011, p. 101) identifica dois fatores essenciais para explicar o aumento
da participação de produtos não industriais e a queda das exportações de
produtos de alta tecnologia:

169
Capítulo 6

1. A profunda mudança no destino das exportações brasileiras,


com significativo incremento da participação dos países
emergentes, cuja demanda por produtos não industriais é relevante;
2. A redução da competitividade externa dos setores que
dependem de uma taxa de câmbio competitiva, especialmente
setores de alta e médio‑alta tecnologia.

Devido a essas mudanças apontadas por Curado, até o ano de 2000 a China não
constava entre os dez principais países de destino das exportações brasileiras.
Já em 2009, a China se tornou o principal destino das exportações brasileiras.

Segundo o Ministério da Fazenda (2012, p. 98), “a diversificação dos mercados


compradores tem sido uma das estratégias para ampliar as exportações do
Brasil.” A Figura 6.9 mostra a participação percentual dos maiores parceiros
comerciais do Brasil (% do total exportado), permitindo a comparação entre os
anos 2004 e 2012.

Figura 6.9 ‑ Participação percentual dos maiores parceiros comerciais do Brasil (% do total exportado)

Obs.: Os dados de 2012 correspondem ao período de janeiro a outubro. Nos parceiros do MERCOSUL
não se incluiu a Venezuela.
Fonte: MDIC e Ministério da Fazenda (2012).

Você deve notar que na crise externa do Brasil nos anos 1998/1999, a China
demandava produtos brasileiros em torno de 1% do total exportado. Já em
2012, o peso da demanda da China foi superior a 17% das nossas exportações,
representando um aumento significativo da capacidade de influenciar variáveis
relevantes da economia brasileira.

170
Economia Brasileira

4.2 Balanço de Pagamentos


A partir de 2005, o saldo em transações correntes, expresso como proporção
do PIB, inverte sua tendência. Os déficits apresentados no saldo de transações
correntes durante o período, a partir de 2008, foram compensados pela entrada
dos capitais externos. O ingresso de capitais estrangeiros no Brasil continuou até
o final da década, proporcionando um aumento das reservas internacionais.

A Tabela 6.4 apresenta o desempenho de contas selecionadas do Balanço de


Pagamentos do Brasil, em US$ bilhões, para o período de 2003 a 2013.

Tabela 6.4 – Balanço de Pagamentos do Brasil em US$ Bilhões: 2003 a 2013

2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013

Transações
4,18 11,68 13,99 13,64 1,55 ‑28,19 ‑24,30 ‑47,27 ‑52,48 ‑54.25 ‑81.37
correntes
‑ Balança
24,79 33,64 44,70 46,46 40,03 24,84 25,29 20,15 29,81 19.40 2.56
comercial (Fob)
 Exportação
73,08 96,48 118,31 137,81 160,65 197,94 153,00 201,92 256,04 242.58 242.18
de bens
 Importação
‑48,29 ‑62,84 ‑73,61 ‑91,35 ‑120,62 ‑173,11 ‑127,71 ‑181,77 ‑226,23 ‑223.18 ‑239.62
de bens
‑ Serviços e
‑23,48 ‑25,20 ‑34,28 ‑37,12 ‑42,51 ‑57,25 ‑52,93 ‑70,32 ‑85,27 ‑76.49 ‑87.30
Rendas
‑ Transferências
unilaterais 2,87 3,24 3,56 4,31 4,03 4,22 3,34 2,90 2,98 2.85 3.36
Correntes
Conta capital
5,11 ‑7,52 ‑9,46 16,30 89,09 29,35 71,30 99,91 112,39 70.01 73.78
e financeira
Resultado
8,50 2,24 4,32 30,57 87,48 2,97 46,65 49,10 58,64 18.90 ‑5.93
do balanço
Fonte: Elaboração do autor, 2014 (a partir de informações do Banco Central do Brasil).

Você deve observar que em todos os anos do período entre 2003 e 2012, o Balanço
de Pagamentos apresentou superávit. Esse resultado foi obtido graças à contribuição
da conta capital e financeira, que a partir de 2006 se apresentou superavitária.

Desde 2007, ocorre uma preocupante deterioração no saldo em transações correntes


que teve início antes mesmo da crise financeira internacional. A Figura 6.10 exibe
o comportamento da balança comercial, dos serviços, rendas e transferências
unilaterais e do saldo em transações correntes no período de 2002 a 2013.

171
Capítulo 6

Figura 6.10 ‑ Balanço em Transações Correntes, em US$ milhões: 2002 a 2011

Fonte: Adaptado de IPEADATA (2013).

Curado (2011, p. 99) credita principalmente a dois fatores a deterioração do saldo


em transações correntes:

1. A retomada do crescimento, que pressiona as importações;


2. O processo de valorização do real que tem contribuído para a
queda do saldo comercial e para a ampliação do déficit na conta
de rendas.

É importante lembrar que a apreciação de nossa moeda estimulou o envio


de remessas de lucros e dividendos para o exterior, pressionando a conta
de rendas.

Os superávits em transação corrente obtidos no período 2003 a 2007 e o ingresso


contínuo de investimento estrangeiro gerou uma significativa acumulação de
reservas, conforme exibe a Figura 6.11.

Você deve lembrar que situação similar ocorreu na década de 90, quando o
ingresso de capitais estrangeiros no Brasil continuou até o final da década,
ocasionando um aumento das reservas internacionais.

172
Economia Brasileira

Figura 6.11 ‑ Reservas internacionais em US$ milhões (liquidez internacional): 2002 a 2012

Fonte: Adaptado de BACEN( 2013).

O aumento contínuo de reservas coincide com a persistência da apreciação do


Real, como foi mostrado na Figura 6.7, interrompido em 2008 em decorrência
dos reflexos da crise econômica internacional. Segundo Giambiagi (2011, p. 220),
“a partir de meados da década, a maior parte dos superávits no Balanço de
Pagamentos do país – responsáveis pelo aumento das reservas – originaram‑se
da evolução da conta de capitais e não dos resultados da conta corrente”.

O acumulo de reservas internacionais proporcionou uma redução da dívida


externa líquida brasileira, conforme mostra a Figura 6.12. A partir de 2008
a dívida externa líquida do país se tornou negativa, o que representou uma
melhora da posição externa do país (exatamente no momento da maior crise
financeira internacional).

Figura 6.12 ‑ Brasil: Dívida externa líquida/Exportações de bens – 2002‑2010

Fonte: Giambiagi (2001, p. 220).

173
Capítulo 6

Segundo Giambiagi (2011, p. 219), a melhora da posição externa denota “uma


transformação fundamental em relação ao padrão histórico observado nas
décadas anteriores, nas quais o Brasil sempre tinha sido um devedor líquido”.

Seção 5
A retomada do crescimento econômico com
distribuição de renda
No campo da economia real, você se lembra de como ocorreu a variação do PIB
brasileiro desde o início do governo Collor? Já estudamos que, a partir de 1980,
antes mesmo de Collor, ocorreu um colapso do crescimento do PIB brasileiro do
qual o país não se recuperou mesmo após a estabilização em 1994.

Ao longo desta seção se analisa a expansão de nossa economia no período


2003 a 2010. Além disso, pretende‑se discutir os efeitos obtidos sobre o
emprego, a distribuição da renda e a pobreza.

5.1 A expansão do crescimento econômico


A Figura 6.13 exibe o comportamento deste indicador, compreendendo o período
1990 a 2013. Observe que o crescimento médio no governo Collor/Itamar foi
1,24%; nos dois governos de Fernando Henrique 2,31%; e, por último, nos dois
governos Lula 4,06%.

Figura 6.13 ‑ Variação do PIB do Brasil: 1990 a 2013

Fonte: Adaptado de IPEADATA(2013).

174
Economia Brasileira

Segundo o gráfico, a taxa média de crescimento da economia foi 1,80%, durante


a década de 1990, e 2,1% durante o segundo mandato de Fernando Henrique.
Lembre‑se também que ao final do seu último mandato a economia brasileira se
deparou com uma forte crise cambial e com a expectativa do mercado diante da
possibilidade de um partido de esquerda assumir o governo.

A Tabela 6.5 mostra a evolução do PIB do Brasil e Mundial entre os períodos


2003/2006 e 2007/2010.

Tabela 6.5 ‑ Evolução do PIB: Brasil x mundo

Brasil Mundo Brasil/Mundo

2003/2006 3,49 4,59 (‑) 31,22%

2007/2010 4,62 3,20 31,02%


Fonte: Adaptado de IPEADATA (2013).

O primeiro período, compreendido entre os anos de 2003 e 2006, foi marcado


pela retomada do crescimento. Nesse período, sobre a taxa média de expansão
do PIB brasileiro podemos destacar:

•• Foi da ordem de 3,49% a.a, em torno de 66% da observada no


período imediatamente anterior (1999 e 2002);
•• Ao confrontarmos esse desempenho com as taxas de crescimento
mundial, verificamos que o Brasil ficou 31,22% abaixo do
crescimento mundial.

Mariano (2012, p. 87) identificou os seguintes fatores como sendo importantes


para explicar a recuperação da economia brasileira:

- O fato de as expectativas do mercado não se concretizarem.


Ou seja, não houve ruptura em relação aos principais pilares da
política econômica vigente no governo anterior;
- O elevado superávit fiscal possibilitou ao governo reduzir a
proporção da dívida em relação ao PIB;
- A forte desvalorização cambial ocorrida em 2002 produziu uma
vantagem significativa para o setor exportador, contribuindo para
a geração de expressivos superávits na balança comercial;
- Ao longo do período, devido ao forte crescimento das
economias emergentes (China, Índia e Rússia) e o consequente
aumento da demanda, ocorreu uma elevação dos preços das
matérias‑primas, favorecendo a economia brasileira.

175
Capítulo 6

Ainda sobre o primeiro governo Lula, verifica‑se um crescimento praticamente


nulo em 2003, com um desempenho de 1,15%, refletindo o esforço de
estabilização realizado. Em 2004, no rastro do significativo crescimento da
economia mundial, obteve a maior taxa de crescimento, 5,71%, e redução nos
dois anos seguintes para a faixa de 3 a 4% a.a.

Souza (2008, p. 311), pergunta: como o PIB e a produção industrial


brasileira alcançou esse respeitável crescimento em 2004?

A resposta encontrada é simples e está relacionada às exportações, que cresceram


21% em 2003 e avançaram 32% em 2004. Na época, existiam vários fatos
desfavoráveis para essa expansão do PIB: juros reais e saldos primários das contas
públicas elevados, e taxa de câmbio e salário real muito baixo. “Fatos que deprimem
a demanda interna e desanimam os investimentos”. (SOUZA, 2008, p. 311)

A Figura 6.14 exibe, com mais detalhes, a evolução das taxas anuais de
crescimento do PIB brasileiro e mundial para o período 2002 a 2012.

Figura 6.14 ‑ Evolução da variação do PIB do Brasil e do Mundo: 2002 a 2012

Fonte: Adaptado de IPEADATA (2013).

Segundo Gremaude (2011, p. 500), o desempenho do PIB brasileiro em 2004,


5,71%, foi influenciado pelo forte crescimento das exportações e pela elevação
do consumo impulsionado pelo crédito. Os baixos investimentos em formação
bruta de capital acabaram por limitar as possibilidades de expansão, “gerando
pressões inflacionárias e fazendo com que o Banco Central utilizasse a política
monetária para reverter esse processo”.

176
Economia Brasileira

A desaceleração de nossa economia, nos dois anos seguintes, 2005 e 2006,


refletiu as medidas adotadas para conter o processo inflacionário: elevação das
taxas de juros, da carga tributária e da apreciação de nossa moeda.

Você lembra o que foi discutido em seções anteriores sobre o comportamento


da taxa de juros nesse período?

Pois bem, no começo de 2003, com o dólar pressionado, a taxa Selic anualizada
chegou a 26,5% e, a partir daí, apresentou progressiva redução até 16%, em
maio de 2005. As reduções na taxa básica, com algumas altas durante o período
2003/2010, contribuíram para a retomada do crescimento e também para que as
taxas de crescimento do PIB fossem as mais intensas em duas décadas.

No segundo governo Lula, período entre 2007 e 2010, excluindo o ano de 2009,
as taxas de crescimento do PIB foram superiores aos 5% a.a. A taxa média
de crescimento do período foi 4,62%, ficando 31% acima do crescimento da
economia mundial (ver Tabela 6.5).

A crise econômica de 2008 praticamente afetou todas as economias do planeta


e ficou longe de ser apenas uma “marolinha” (expressão utilizada pelo presidente
Lula) em terras brasileiras. A Tabela 6.6 mostra o comportamento do PIB do Brasil
por setor de atividade, no 3º e 4º trimestre de 2008.

Tabela 6.6 ‑ PIB do Brasil por setor de atividade, no 3º e 4º trimestre de 2008

Setores 3º trimestre de 2008 4º trimestre de 2008

PIB 1,7 ‑3,6

‑ Indústria 3,6 ‑7,4

‑ Terciário 0,8 ‑0,4

‑ Agropecuária 1,7 ‑3,6


Fonte: IBGE, 2008.

Segundo Mariano (2012, p. 91), o 1º trimestre de 2009 ainda apresentava um


quadro de retração, com uma taxa de ‑0,8%. Lembrou ainda que o Brasil
estabeleceu as seguintes ações para enfrentar a crise:

•• Na área monetária, o governo promoveu gradativa redução


das taxas de juros, os bancos públicos (Banco do Brasil, Caixa
Econômica Federal e BNDES) ampliaram as linhas de crédito para
o setor público e privado, a margem de crédito consignado para
aposentados foi elevada, entre outras medidas;

177
Capítulo 6

•• Na área fiscal, o governo realizou intervenção em vários setores,


promovendo, como a desoneração fiscal com redução do IPI na
produção de automóveis, caminhões, eletrodomésticos e materiais
de construção. Em relação aos gastos públicos, o governo
ampliou os investimentos e os repasses para os municípios
(simultaneamente, reduzindo o superávit primário);
•• Na área cambial, promoveu ações de vendas de divisas, valendo‑se
da boa quantia de reservas internacionais.

O Brasil foi uma das economias do mundo que mais rapidamente


conseguiu se recuperar e, em 2010, o PIB apresentou uma expansão de
7,5%. No ano seguinte, em 2011 (já no governo Dilma), o país obteve um
crescimento modesto de 2,7%.

Um dos reflexos do crescimento da economia brasileira é exibido na Figura 6.


15, que mostra a evolução do PIB per capita do Brasil no período 2002 – 2012,
a preços de 2012.

Figura 6.15 ‑ Evolução do PIB per capita do Brasil (a preços de 2012): 2002 – 2012

Fonte: Adaptado de IPEADATA (2013).

Você deve observar que a partir de 2004 o PIB per capita apresenta forte elevação
nos valores, tendo sofrido uma ligeira queda em 2009.

178
Economia Brasileira

5.2 Taxa de desemprego


Você sabe que o crescimento econômico pode contribuir para a redução das
taxas de desemprego. Entretanto, isso pode não ocorrer caso esse crescimento
intensifique inovações tecnológicas poupadoras de mão de obra, o que faria com
que o mercado de trabalho sofresse retração.

Aqui no Brasil, a partir do segundo ano do governo Lula, o maior otimismo com
a evolução da economia proporcionou um aumento na demanda por emprego,
ocasionando uma redução nas taxas de desemprego. A Figura 6.16 exibe o
comportamento da taxa de desemprego aberto – RMSP (%), durante o período
2002 a 2013.

Figura 6.16 ‑ Taxa de desemprego ‑ aberta ‑ RMSP ‑ (%) – Fundação Sistema Estadual de Análise de
Dados, Pesquisa de Emprego e Desemprego (Seade/PED)

Fonte: Adaptado de IPEADATA (2013).

A taxa de desemprego, ao redor de 12,5% no ano de 2003, experimentou uma


tendência declinante, alcançando um patamar de 8,5% durante o ano de 2010.
Essa queda na taxa de desemprego veio acompanhada de uma elevação nos
níveis de formalização da economia.

Segundo Giambiagi (2011, p. 235), “o percentual de trabalhadores com carteira


assinada, em relação ao total de trabalhadores ocupados – nesse total incluindo
aqueles empregados no governo, que não possuem carteira de trabalho – passou
de 44% em 2003, para 51% em 2010”.

179
Capítulo 6

5.3 Distribuição de renda e a pobreza


O processo de desenvolvimento brasileiro no século XX, até a crise da década
de 1980, se caracterizou por altas taxas de crescimento, mas com grande
exclusão social. Nesta seção, você irá compreender a dimensão da pobreza e
desigualdade atuais no Brasil, procurando entender as escolhas de política feitas
no passado recente.

A partir da estabilização da economia, em 1994, e sob os efeitos da retomada do


crescimento na primeira década do século XXI, ocorreu uma melhora de vários
indicadores sociais, melhora que foi sentida também no mercado de trabalho,
como vimos na seção anterior.

Segundo Mariano (2012, p. 51), a capacidade de possibilitar uma distribuição


de renda mais justa na sociedade é um dos aspectos importantes de uma boa
estrutura fiscal e tributária. Lembrou também que, quando se fala de distribuição
de renda, objetiva‑se verificar de que modo o total da riqueza produzida é
distribuído no país.

Souza (2008, p.231), citando as ideias de Celso Furtado, aponta que o


desenvolvimento se dá em decorrência do aumento da produção de riqueza
combinado com a transformação das estruturas econômicas, o aumento da
produtividade do trabalho e a melhor distribuição de renda. Portanto, um
dos indicadores do grau de desenvolvimento de uma economia é o perfil da
distribuição de renda.

Giambiagi (2012, p. 229) seleciona os principais indicadores sociais que


apresentaram melhoras:

1. A distância entre os mais ricos e os mais pobres reduziu‑se fortemente ao


longo da década. Entre 2001 e 2009, a renda per capita dos 10% mais ricos
da população brasileira aumentou 1,5% ao ano, enquanto a renda dos mais
pobres cresceu a taxa de 6,8% (Neri, 2010). O ganho proporcionalmente maior
deste último grupo está relacionado aos programas sociais, com destaque para
o Programa Bolsa Família (PBF). Esse foi criado em 2004 e concebido como
um programa “focado” nas famílias de menor renda. O PBF unificou cinco
programas federais pré‑existentes de transferência de renda (Bolsa Escola,
Bolsa Alimentação, Auxílio Gás, Cartão Alimentação e Erradicação do Trabalho
Infantil). De acordo com o Ministério do Desenvolvimento Social, o programa
atendia, em 2010, mais de 12 milhões de famílias, com maior impacto no
Norte e Nordeste, contribuindo, dessa forma, também para a redução das

180
Economia Brasileira

desigualdades regionais do país. Um dos grandes méritos do programa é


seu custo relativamente baixo, uma vez que, mesmo após sua ampliação,
consumiu, em 2010, menos de 0,5% do PIB.

2. O Índice de Gini (indicador que indica maior desigualdade quanto mais próxima
de um; e maior equidade quanto mais próximo de zero) das pessoas ocupadas
caiu de 0,57 em 2001 para 0,52 em 2009. Entre as causas desse fenômeno,
destacam‑se: a) a elevação do salário mínimo; b) o aumento do emprego, em
particular do emprego formal com carteira assinada; c) o incremento da taxa de
escolaridade; e d) a queda do trabalho infantil (Souza, 2010).

3. Considerando o país dividido entre cinco classes (A, B, C, D, E, sendo “A” a


mais elevada), 29 milhões de brasileiros ingressaram na “nova classe média”
(Classe C) entre 2003 e 2009, conforme o estudo de Marcelo Neri acima citado.
Muito embora o título “classe média” seja polêmico, uma vez que o termo vai
além do poder aquisitivo e também se refere a formas de comportamento
(Rocha, 2010), o fato é que milhares de brasileiros ingressaram na “Classe
C”, tendo se tornado o maior grupo social, representando mais de 50%
da população total. Para isso, contribuiu o aumento da massa salarial e a
democratização ao acesso ao crédito, associado, no caso das classes mais
baixas, a políticas públicas como a do “Crédito Consignado”. A ampliação do
crédito popularizou o acesso aos bens, sendo essa também uma forma de
aferir a redução da desigualdade.

4. Por fim, o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) que reúne indicadores


de renda, educação e saúde, também evoluiu positivamente. Considerando a
metodologia iniciada em 2010, o Brasil passou de 0,65 em 2000 para 0,69 em
2010 – sendo a unidade de valor máximo do índice. Nessas condições, o Brasil
se situou ao final da década na posição 73, entre 169 países avaliados, com um
índice que classifica o país como de “alto desenvolvimento humano”.

A Tabela 6.7 exibe como se apresenta a evolução e a classificação dos estados


brasileiros segundo o IDH‑M de 1991, 2000 e 2010.

Tabela 6.7 – Evolução e a classificação dos estados brasileiros segundo o IDH‑M de 1991, 2000 e 2010

Lugar 1991 2000 2010


Brasil 0.493 0.612 0.727
Acre 0.402 0.517 0.663
Alagoas 0.37 0.471 0.631
Amapá 0.472 0.577 0.708

181
Capítulo 6

Lugar 1991 2000 2010


Amazonas 0.43 0.515 0.674
Bahia 0.386 0.512 0.66
Ceará 0.405 0.541 0.682
Distrito Federal 0.616 0.725 0.824
Espírito Santo 0.505 0.64 0.74
Goiás 0.487 0.615 0.735
Maranhão 0.357 0.476 0.639
Mato Grosso 0.449 0.601 0.725
Mato Grosso do Sul 0.488 0.613 0.729
Minas Gerais 0.478 0.624 0.731
Pará 0.413 0.518 0.646
Paraíba 0.382 0.506 0.658
Paraná 0.507 0.65 0.749
Pernambuco 0.44 0.544 0.673
Piauí 0.362 0.484 0.646
Rio de Janeiro 0.573 0.664 0.761
Rio Grande do Norte 0.428 0.552 0.684
Rio Grande do Sul 0.542 0.664 0.746
Rondônia 0.407 0.537 0.69
Roraima 0.459 0.598 0.707
Santa Catarina 0.543 0.674 0.774
São Paulo 0.578 0.702 0.783
Sergipe 0.408 0.518 0.665
Tocantins 0.369 0.525 0.699
Fonte: ATLASBRASIL, (2013).

Pela Tabela 6.7 é possível perceber a ascensão do índice de desenvolvimento


brasileiro municipal de 1991 (0,493) para 2010 (0,727).

Em 1991, o Estado da federação com maior IDH‑M é o Distrito Federal (0,616),


seguido do Estado de São Paulo (0,578) e por Rio de Janeiro (0,573). Neste mesmo
ano, o Estado de Piauí (0,362), seguido pelo Estado de Tocantins (0,369), foram
aqueles que apresentaram menor IDH‑M.

Comparativamente, em 2010, o Estado da federação com maior IDH‑M é o


Distrito Federal (0,824), seguido do Estado de São Paulo (0,783) e por Santa
Catarina (0,774). Nesse mesmo ano, o Estado de Alagoas (0,631) e o do
Maranhão (0,639), foram aqueles que apresentaram menor IDH‑M.

Giambiagi (2012, p. 229) destacou, ainda, sobre a redução da desigualdade,


quatro principais desafios para a década de 2010 a 2020:

182
Economia Brasileira

1. A redução da desigualdade regional;


2. A precariedade do acesso ao saneamento básico nas regiões
mais pobres do país;
3. A melhora da qualidade do ensino;
4. A pobreza feminina, sobretudo entre mães solteiras.

Barros (2013, p. 447) comenta que a maior parte das políticas regionais voltadas
para a redução das desigualdades regionais no Brasil, baseadas no subsídio
ao capital ou suporte aos investimentos nas regiões mais pobres, trouxe muito
pouco resultado concreto. Sobre esse assunto, concluiu:

As políticas regionais deveriam na verdade estimular a extensão


e a melhoria na qualidade da educação nas regiões mais
pobres. De acordo com o que foi visto, esse tipo de política
teria muito maior probabilidade de reduzir as desigualdades
regionais e eliminaria a sua consequência mais perversa, que é a
desigualdade de oportunidade entre os indivíduos.

Segundo Giambiagi (2012, p. 231), a elevada popularidade de Lula pode ser


explicada pelos seguintes fatos: combinação de aumentos reais do salário
mínimo; injeção de recursos em programas sociais; e forte crescimento do
emprego. Lembre‑se de que esses fatos ocorreram num contexto de economia
em crescimento, com inflação sob controle e melhora na distribuição de renda.

Dos indicadores sociais apresentados anteriormente, dois deles são muito utilizados
para representar a forma de como a renda está distribuída: a estratificação por faixas
de renda; e, a utilização do Índice de Gini.

A Figura 6.17 exibe o comportamento do Índice de Gini do Brasil, compreendendo


o período 1990 a 2012, calculado pelo IPEA.

Figura 6.17 ‑ Índice de Gini do Brasil – IPEA: 1990/2012

Fonte: Adaptado de IPEADATA (2013).

183
Capítulo 6

O Índice de Gini do Brasil, no período entre 1993 a 1998, oscilou um pouco acima
de 0,60. Em seguida, sofreu uma pequena queda, passando em 2002 para 0,59.
A partir de 2003, com a recuperação da economia, esse índice tem reduzido, ano
após ano, chegando a 0,53 em 2012.

Mariano (2012, p. 52) destaca que o Brasil apresenta um dos piores quadros
de concentração de renda. De acordo com dados do IBGE, no ano de 2009,
a parcela dos 50% mais pobres ficava com 15,25% da renda e 1% da população
mais rica ficava com 12%. Uma década atrás, em 1999, esses números eram
14% e 13%, respectivamente, para os 50% da população mais pobre e 1% para
a população mais rica.

Soares (2008, p. 6), em seu texto para discussão, procurou responder se o ritmo
de queda da desigualdade no Brasil está adequado ou não. Concluiu que o ritmo
de queda na desigualdade é adequado, mas que o desafio será manter esse
ritmo por várias décadas para alcançar o nível de desigualdade, por exemplo,
do Canadá. Soares explica que:

Os dados indicam que o ritmo de queda da desigualdade no Brasil


de 0,7 pontos de Gini ao ano é superior ao ritmo que todos os
países analisados seguiram enquanto construíam seus estados
de bem‑estar social, salvo a Espanha, cujo ritmo foi um pouco
superior (0,9 pontos ao ano). Por seu turno, as distâncias que nos
separam dos países‑referência escolhidos são seis anos para o
México, 12 para os Estados Unidos, e 24 anos para o Canadá.

A recuperação do crescimento brasileiro se dá, também, num contexto de


diminuição das desigualdades e de redução da pobreza. De acordo com
Curado (2011, p. 93), a taxa de extrema pobreza era de 11,49% em 2005,
passando para 7,28% em 2009, enquanto que a taxa de pobreza era de 30,82%
em 2005, passando para 21,42% em 2009.

A taxa de extrema pobreza mede “o percentual das pessoas na população total


com renda domiciliar per capita inferior à linha de extrema pobreza (ou indigência,
ou miséria)”. (CURADO, 2011, P. 93).

Você sabe definir a linha de extrema pobreza?

Segundo Curado (2011, p. 93), a linha de extrema pobreza corresponde


a uma estimativa do valor de uma cesta de alimentos com o mínimo de
calorias necessárias para suprir adequadamente uma pessoa, com base em
recomendações da FAO e da OMS. O fato é que não existe um consenso sobre
o critério a ser utilizado como linha de extrema pobreza.

184
Economia Brasileira

O governo federal adota como medida de extrema pobreza familiar


rendimentos mensais abaixo de R$70,00 por pessoa, enquanto que o Banco
Mundial utiliza a faixa de US$ 1 dólar por dia por pessoa, como linha de
indigência, e de US$ 2 dólares por dia por pessoa como linha de pobreza.

Schwartzmann (2012, p. 297) comenta que ainda persiste no Brasil a ideia de que
os principais problemas sociais do país são o baixo acesso aos serviços públicos
essenciais e a pobreza extrema. No entanto, existem relativamente poucos
pobres no Brasil quando se adota a linha de extrema pobreza sugerida pela ONU:
“apenas 3,8% da população têm renda per capita inferior a US$ 1,25 por dia”.
(SCHWARTZMANN, 2012, p. 297).

A Figura 6.18 exibe a evolução da taxa de pobreza e da taxa de extrema


pobreza (%), obtidas pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA).

Figura 6.18 ‑ Taxa de pobreza e extrema pobreza do Brasil, em %: 1992‑2012

Obs.: Não existem dados para os anos de 1994 e 2000, que foram preenchidos por mim com números
intermediários.
Fonte: Adaptado de IPEADATA (2013).

Até 1995, a taxa de pobreza oscilava próximo de 40%, quando passou para o
patamar de 35% como resultado do Plano Real (com a queda observada nas
taxas de inflação). Permaneceu nesse patamar até 2003, quando passou a cair
continuamente até atingir 21% em 2009.

Por sua vez, a taxa de pobreza extrema exibe comportamento semelhante


ao anterior, mas em diferentes patamares. Antes de 1995, as taxas eram
próximas de 20%. Com o Plano Real, as taxas caíram para o patamar de 15%,
permanecendo neste patamar até o ano de 2003. A partir daí, também passam
a cair continuamente até atingir 7,28% em 2009.

185
Capítulo 6

A extrema pobreza existe, mas vem sendo reduzida pelos programas


focalizados de transferência de renda e pela expansão do mercado
de trabalho. O acesso aos serviços básicos, como educação e saúde,
aumentou muito nas últimas décadas. Segundo Schwartzmann (2012,
p. 297), “o que se requer, cada vez mais, é atenção para iniquidade, a má
qualidade e o mau uso dos recursos públicos nesse acesso”.

O maior aprofundamento dessas questões vai além dos limites desta disciplina.
Entretanto, vale a pena transcrever parte das conclusões de Schwartzmann (2012,
p. 297), em seu artigo “Repensando a agenda social”:

Repensando a agenda social

Devido à alta concentração de renda no país, os 80% mais pobres da população


detêm apenas 43% da renda e sua renda familiar per capita mal chega aos
R$1.300 por mês. A assim chamada “nova classe média” consiste de pessoas com
frequência dependente do INSS, do SUS e do ensino público básico e que mora
nos locais onde é maior a criminalidade no país. As políticas sociais hoje requeridas
para atender a essa população são muito mais complexas e caras do que no
passado, requerendo conhecimentos aprofundados e capacidade de gestão que o
setor público muitas vezes não dispõe. Em particular, o rápido envelhecimento da
população brasileira, que se avizinha, vai requerer recursos redobrados nas áreas de
saúde e previdência.

O total dos gastos governamentais com saúde, educação, segurança pública,


previdência e transferência de renda estão em torno de 24% do PIB, um nível bem
superior àquele dos demais países de renda média como o Brasil. A carga tributária
já atinge 36% do PIB no Brasil, igual à média dos países da OCDE, com renda
per capita três vezes superior à do país. Não parece mais haver espaço político
para aumento de impostos, mas há muito a fazer para que os recursos disponíveis
sejam utilizados de forma eficiente.

Concluímos, pois, estar na hora de desenvolver uma nova agenda social para o
Brasil, que seja equânime, ao privilegiar o acesso dos mais pobres à seguridade
social; realista, ao reconhecer a restrição orçamentária; e eficaz, ao lidar com a
complexidade das tarefas à frente com uma gestão responsável e consequente
dos recursos públicos. Mais especificamente, as novas políticas sociais brasileiras
precisam ir além da miséria, para cuidar das necessidades básicas da grande
massa da população brasileira – os 80% das famílias brasileiras com renda per
capita inferior a R$1.300 por mês.

186
Economia Brasileira

Para focar as políticas sociais nesses 80%, é preciso lidar com alguns problemas
políticos e legais complicados. Boa parte dos chamados gastos sociais beneficia
não os 80% mais pobres, mas os 20% mais ricos. É assim com a previdência
do servidor público, a gratuidade das universidades públicas, os gastos do SUS
com remédios pelas de ações judiciais. É assim também com os “bicos” que os
policiais fazem para dar segurança aos mais ricos, nas suas 48 horas de descanso
remunerado. Para ter dinheiro para praticar política social de qualidade para os
80% mais pobres, é preciso limitar os privilégios dos 20% mais ricos, o que significa
confrontar as corporações que representam seus interesses.

Os problemas legais para focalizar os gastos sociais nos 80% mais pobres derivam
de uma peculiar, mas disseminada, interpretação dos princípios constitucionais
da universalidade e da igualdade. Na interpretação corrente, as desigualdades
dos benefícios sociais não devem ser corrigidas com o redirecionamento dos
gastos públicos, mas sim pela expansão dos gastos e a extensão para os demais
dos benefícios já conquistados por uma minoria de 20% que são considerados
direitos adquiridos. É claro, entretanto, que não há dinheiro suficiente para essa
expansão. O país tem uma carga tributária elevadíssima para seu nível de renda e
mesmo assim os orçamentos públicos continuam deficitários. A única maneira de
implantar os princípios da universalidade e da igualdade na prestação dos
serviços públicos é partindo de baixo para cima, e não de cima para baixo
[grifo meu]. A equidade se impõe como o princípio norteador básico das políticas
sociais, numa sociedade tão desigual como a brasileira.

Você deve reconhecer que são enormes os avanços do país quando se compara
a situação atual com aquela descrita na primeira metade dos anos 1990.
O “dragão da inflação” foi domado e a longa década perdida ficou para trás.
Desfrutamos de um período de estabilidade e crescimento com distribuição de
renda, ainda que estejamos numa situação nada confortável em relação a esse
último indicador.

É nesse quadro econômico que o presidente Lula elegeu sua sucessora no


segundo turno da eleição de 2010, com 56% dos votos válidos. Em 1º de janeiro
de 2011, Dilma Rousseff assumiu a presidência do país.

187
Capítulo 6

Seção 5
Dilma Rousseff: as nossas insuficiências
Você observou que esta unidade contemplou indicadores econômicos com dados
dos anos 2011 a 2013, período do governo Dilma. Longe de querer realizar uma
abordagem sobre o governo atual, as próximas linhas se ocupam, principalmente,
em apontar algumas insuficiências de nossa economia.

Em meados de 2012, na solenidade do “Prêmio Melhores e Maiores 2012 – Revista


Exame”, o ministro Guido Mantega chamou atenção para um aspecto fundamental de
cujo impacto real, segundo ele, os agentes econômicos ainda não se deram conta.

Trata‑se da mais importante reforma estrutural feita nos últimos


anos e cujos efeitos ainda serão sentidos em sua plenitude: o
novo equilíbrio macroeconômico representado por juros reais
bem mais baixos, política fiscal sólida, combinada com uma
política de maior competitividade do real.

[...] Aos que ainda não estão enxergando a nova realidade que se
configura, minha sugestão é que abram os olhos para aproveitar
as imensas oportunidades que se colocam no Brasil. (MANTEGA,
2012, p. 2).

Apesar dos avanços obtidos nos últimos anos, em 2013, o Brasil continua com
alguns problemas similares aos que existiam em meados da década de 1990,
que precisam ser enfrentados.

Estamos nos preparando de maneira adequada para aproveitar no longo


prazo a bonança dos últimos anos?

Segundo Giambiagi (2012, p. 266), existem algumas tarefas mais ou menos claras
para serem implementadas, a fim de que o país possa crescer vigorosamente e
de forma animadora no longo prazo:

•• A necessidade de conter o gasto público e modificar o mix de


despesas entre os gastos correntes e os investimentos;
•• A melhoria da produtividade total dos fatores, que tem apresentado
uma evolução bastante pobre. É bom lembrar que, uma vez
ocupados os recursos existentes, o desenvolvimento do Brasil se
fará a partir da melhoria da produtividade;

188
Economia Brasileira

•• A precariedade evidente da educação, apesar da melhora


alcançada especialmente nos anos do século XXI. A julgar pela
experiência internacional na relação existente entre desenvolvimento
educacional e progresso econômico, nossa perspectiva futura de
desempenho nessa área parece ainda distante de ser animadora;
•• A baixa poupança doméstica tem sido um limitador importante para a
economia brasileira, o que tem sido contornado pelo acesso à poupança
alheia (externa). Na eventualidade de uma nova retração da entrada de
capitais externos, esse mecanismo poderá se revelar preocupante;
•• As condições da infraestrutura, a qual apresenta gargalos importantes
para o crescimento robusto e sustentável no longo prazo;
•• O arcabouço institucional continua sendo inadequado para o
ambiente dos negócios, resultado da combinação de: ineficiências
administrativas, dificuldades para abertura de empresas, burocracia
oficial e elevada carga tributária;
•• As mudanças demográficas pelas quais o país transitará nas
próximas décadas, quando teremos em 2050 a mesma População
Economicamente Ativa (PEA) de 2010. As projeções do IBGE
apontam para um fator de mais de 5 vezes o número de indivíduos
com 80 anos ou mais e 3,5 vezes o número de indivíduos com 60
anos ou mais. A transição demográfica talvez seja o desafio mais
importante de todos.

É preciso agir na intensidade necessária para promover o gasto público eficiente


e de qualidade, a produtividade, a poupança doméstica, a boa infraestrutura e
a educação.

Ignorar os fatos anteriores, não os fará deixar de existir. O conhecimento da


história e de como se desenvolveu o caso da economia brasileira no período
recente é fundamental para obtenção de um diagnóstico, para que se possa
definir o que fazer e se propor as medidas de política econômica.

Sempre é bom lembrar que, em economia, a versão na qual se acredita


importa muito. Isso porque é essa versão que irá influenciar as políticas
a serem implementadas e a maneira como se comportará, no futuro,
a economia brasileira.

Neste capítulo você compreendeu o contexto econômico e político no início do


governo Lula, que passou por um processo de moderação e caminho para o

189
Capítulo 6

centro. Conheceu as desconfianças em relação ao novo governo, a eleição do


presidente Lula e as medidas econômicas de transição.

Em seguida, com o título “acertar o alvo e a estabilidade monetária”, aprendeu que


ao longo dos dois governos de Lula as metas de inflação foram cumpridas dentro
do intervalo de tolerância e apresentaram uma tendência contínua de queda.

Você aprendeu como se desenvolveu a política fiscal e o desempenho das


contas públicas nos dois governos Lula, com destaque para o pagamento de
juros do setor público, o déficit nominal e o resultado primário. Estudou, ainda,
o comportamento da dívida pública e da carga tributária que estabeleceu nova
marca recorde em 2011.

Analisou a trajetória da taxa de câmbio nominal mensal entre janeiro de 2002


a dezembro de 2012, que apresentou uma apreciação substancial. Conheceu
o desempenho externo de nossa economia, com destaque para as contas do
Balanço de Pagamento e da Balança Comercial.

No campo da economia real, você aprendeu como se deu a retomada do


crescimento econômico, que havia entrado em colapso desde os anos 80,
e seus efeitos sobre o emprego, a distribuição da renda e a pobreza.

Finalmente, você reconheceu que são enormes os avanços do país quando


se compara a situação atual com aquela descrita na primeira metade dos
anos 1990: o que justifica a utilização no título desta unidade da palavra
“euforia”. Apesar disso, o Brasil, em 2014, continua com alguns problemas
similares aos que existiam em meados da década de 1990 e que precisam
ser enfrentados.

190
Considerações Finais

Esperamos ter cumprido com a mediação entre os futuros profissionais das ciências
econômicas com o conteúdo da economia brasileira. Como comentamos no início
deste livro, temos uma ambiciosa expectativa de que isso produzirá frutos que,
se bem cultivados, poderão mudar a sua história de vida pessoal e profissional.

Os conhecimentos adquiridos permitem a contextualização da situação econômica


e política atual ao processo evolutivo histórico da economia brasileira e sua relação
com a economia e política mundiais. Somente através do reconhecimento da
realidade brasileira será possível um economista emitir juízo de valor ou propor
soluções adequadas.

Os debates e questionamentos de aspectos relacionados à economia brasileira


envolveram temas como: o desenvolvimento e crescimento; as políticas de
combate à inflação; a evolução do sistema financeiro; o Brasil no cenário
internacional, tanto na questão da dívida externa, quanto de comércio exterior;
a atuação do setor público por meio da formalização de planos e orçamentos;
e a redução da participação do Estado na economia durante o processo de
privatização, entre outros.

Sem pretensão de esgotar o assunto, esperamos que os estudos tenham


contribuído para a compreensão dos problemas econômicos fundamentais
de nosso país. Aliás, é preciso compreendê‑los bem, para que possamos
equacioná‑los e evitarmos a interrupção do ciclo de bons resultados obtidos
neste segundo milênio.

É bom lembrar que os conhecimentos sobre como funciona a Economia Brasileira


são fundamentais para a formação do futuro profissional de economia e, também,
de importância para cada cidadão de nosso país.

Sucesso em sua caminhada!

Professor Amilton de Carvalho Guedes


Professora Kátia Regina de Macedo
Professor Luis Augusto Araújo

191
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SILVA, Sergio. Expansão Cafeeira e Origens da Indústria no Brasil. São Paulo:


Alfa - Omega, 1976.

196
Sobre os professores
conteudistas
Amilton de Carvalho Guedes
Graduado em Ciências Econômicas pela Universidade Federal de Santa
Catarina (UFSC); graduado em licenciatura de disciplinas especializadas pelo
Centro Federal de Educação Tecnológica do Paraná; pós‑graduado, em nível
de especialização em economia, pela Universidade Federal de Santa Catarina
(UFSC). Atua como professor da Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL)
desde 1988. Leciona em diferentes cursos, com ênfase nos cursos de Relações
Internacionais, Administração e Ciências Contábeis.

Kátia Regina de Macedo


Graduada em Ciências Econômicas pela Universidade do Vale do Itajaí (Univali);
especialista em Administração Financeira Bancária pela Fundação de Estudos
Superiores de Administração e Gerência (ESAG) e mestre em Relações
Internacionais para o Mercosul, pela Universidade do Sul de Santa Catarina
(Unisul). Ministra a disciplina de Economia no curso de Direito e a de Economia
Brasileira no curso de Relações Internacionais.

Luis Augusto Araújo


Possui mestrado em Economia Aplicada pela Universidade de São Paulo – USP
e especialização em Administração Rural pela Universidade de Lavras – MG.
Atua em projetos de pesquisa e desenvolvimento do programa de "Gestão de
Negócios e Mercados" da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural
de Santa Catarina – Epagri. Desde 1998, é professor da Universidade do Sul de
Santa Catarina – Unisul. Tem experiência na área de Administração e Economia,
atua, principalmente, nos seguintes temas: fundamentos de economia, cenários
econômicos, economia brasileira, administração rural, mercado agrícola e
pesquisa operacional.

197
Economia Brasileira
O livro apresenta uma análise diversificada da
economia numa perspectiva histórica que permitirá
ao aluno desenvolver uma melhor compreensão
dos fatos mais marcantes do desenvolvimento da
economia brasileira do período colonial até os dias
atuais, focando particularmente os últimos vinte
e cinco anos. Em cada capítulo você confirma o
acesso a dados históricos e análise da economia
brasileira sob diferentes aspectos.

w w w. u n i s u l . b r

9 788578 176228

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