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* Especialista em Gestão Orçamentária e Financeira do Setor Público pelo Instituto de Cooperação e Assistência Técnica
do Centro Universitário do Distrito Federal (UniDF); mestrando em Contabilidade pela Universidade Federal de Santa
Catarina (UFSC). Analista de Finanças e Controle da Secretaria do Tesouro Nacional (STN).
Agradecimentos
1 Introdução, 7
4 Considerações finais, 51
Referências, 54
Orçamentos e Sistemas de Informação – Leonardo Silveira do Nascimento
1 Introdução
O setor público em todo o mundo está passando por significativas mudanças
em anos recentes. As demandas dos cidadãos por uma melhor prestação dos servi-
ços públicos por parte dos governos, associados à diminuição da carga tributária,
têm elevado a atenção dos gestores públicos à atividade financeira do Estado, sob o
ponto de vista da transparência, da economicidade, da eficiência e da eficácia.
Como resultado das mudanças, os governos estão cada vez mais voltados aos
modelos de gestão do setor privado, em vez de insistir nas tradicionais, e muitas
vezes ultrapassadas, abordagens da Administração Pública.
As mudanças observadas na gestão pública fazem parte de um processo de-
nominado Nova Gestão Pública ou Nova Administração Pública que, em inglês, é
conhecida como New Public Management (NPM).
A abordagem do NPM, no que se refere à gestão financeira pública tem como
diretrizes:
sobre as diretrizes a serem observadas no setor público quanto aos procedimentos, práti-
cas, elaboração e divulgação das demonstrações contábeis, para torná-los convergentes
com as Normas Internacionais de Contabilidade Aplicadas ao Setor Público.
Na referida portaria, há uma determinação à Secretaria do Tesouro Nacional
(STN), órgão central de Contabilidade da União, de que identifique as necessidades
de convergência às NICSP e adote as ações necessárias para a adaptação dos pre-
ceitos da Contabilidade Pública brasileira às normas.
No escopo deste trabalho, para o levantamento dos desafios a serem enfren-
tados na transição para a Contabilidade Patrimonial Integral, são feitos estudos
comparativos das práticas vigentes no Brasil com as de outros países, associados à
discussão de outras questões, tais como: as barreiras legais, operacionais e técnicas.
Para cada um dos desafios, são propostas soluções pautadas na experiência interna-
cional na adoção do regime, devidamente adaptadas à realidade brasileira.
E, por fim, o trabalho apresenta os benefícios a serem gerados, oriundos da
adoção da Contabilidade Patrimonial Integral, para a gestão governamental brasi-
leira à luz das diretrizes do NPM.
3
Accounting Research Study (ARS) nº 3, do American Institute of Certified Public Accountants (AICPA).
4
MEIGS, Walter B.; JOHNSON, Charles E. Accounting: The Basis for Business Decisions. New York: McGraw Hill, 1962, p. 9.
5
Estrutura Conceitual das Normas Internacionais de Contabilidade.
6
NIYAMA, Jorge K.; SILVA, César Augusto T. Teoria da Contabilidade. São Paulo: Atlas, 2008, p. 123.
7
Organisation for Economic Co-Operation and De velopment – OECD. Accrual Accounting and Budgeting: Key Issues and Recent Developments.
8
O termo heritage significa herança, mas a melhor interpretação seria bens do patrimônio histórico (N.A.).
Outro exemplo pode ser dado por um edifício que abriga determinado órgão
governamental e que custou a um ente público a quantia de $ 50.000.000. Sua vida
útil foi estimada em quarenta anos. Após 19 anos de uso, um incêndio causou sérios
problemas estruturais no edifício que, por questões de segurança, foi fechado. O
valor dos reparos foi orçado em $ 35.500.000 para que o órgão voltasse a funcionar
normalmente. O custo de reposição do edifício, ou seja, o valor estimado de um
novo edifício similar foi estimado em $ 100.000.000.
Propriedades de Investimentos
Situação 1
Entidade X Empresa A
Ativo Patrimônio Líquido
Situação 2
Entidade X Empresa A
Ativo Patrimônio líquido
Na situação acima, verifica-se que, embora não tenha sido feito nenhum tipo
de distribuição de lucros por parte da empresa A, a entidade investidora registrou
um aumento de $ 182.000 (3.432.000 – 3.250.000), que corresponde a 52% do au-
mento no patrimônio líquido da investida (52% x 350.000).
Em um momento posterior, após a deliberação do órgão diretor da empresa
A, esta decidiu distribuir, na forma de dividendos, um montante de $ 100.000 e o
restante do lucro permanecerá como lucros acumulados. Com isso, a nova situação
seria a seguinte:
Situação 3
Entidade X Empresa A
Ativo Patrimônio Líquido
12
Pode-se citar: GOBETTI, S. W. Estimativa dos Investimentos Públicos: um novo modelo de análise da execução orçamentária aplicado às
contas nacionais. [S. l.]: Secretaria do Tesouro Nacional, 2006.
13
Logicamente, em alguns casos, torna-se inevitável a simulação de alguns dados para tornar possível a conversão dos demonstrativos reais sob as regras
vigentes para os demonstrativos estabelecidos pelas NICSP. No entanto, quando os dados forem simulados, haverá uma informação a respeito.
14
O princípio da confrontação das receitas com as despesas decorre do princípio da competência, mas não se confunde com este último.
Tabela 1
Receitas da União: previsão, arrecadação e diferença para o exercício de 2007
Simulações
Para melhor ilustrar o impacto nos montantes das receitas auferidas pelo go-
verno federal no exercício de 2007, tornou-se necessário realizar algumas simula-
ções, as quais são descritas a seguir.
15
Valor de aquisição do bem (custo histórico) líquido da depreciação.
Tabela 2
Arrecadação efetiva em regime de caixa no exercício de 2007
Com base nos dados da tabela 2, a título de exemplo, podemos assumir que
a União tenha adotado a metodologia de estimar as receitas tributárias e de contri-
buições a cada três meses (ponto de reconhecimento trimestral) e tenha registrado,
ao final de 2007, os valores das outras receitas que seriam arrecadadas somente no
exercício de 2008.
Quanto às receitas oriundas de investimentos nas empresas públicas e socie-
dades de economia mista não dependentes16, é necessário registrar o lucro propor-
cionalmente à participação acionária da União. Tornar-se-ia extremamente custoso
o trabalho de detalhar cada uma das participações acionárias da União nessas em-
presas, o que não corresponde ao foco principal deste trabalho e, por isso, foram
utilizados dados globais referentes aos lucros e capitais integralizados das empre-
sas, conforme a tabela 3.
16
Empresas controladas que não recebem recursos orçamentários dos entes governamentais para custear as suas atividades.
Tabela 3
Capital social, participação acionária média da União e lucro líquido das
empresas estatais federais em 2007
Com base nos dados obtidos do BGU e na adaptação e simulação dos dados
demonstrados anteriormente, os montantes das receitas públicas segundo os concei-
tos da Contabilidade Patrimonial Integral para o ano de 2007 seriam:
Tabela 4
Receitas públicas de 2007 segundo a Contabilidade Patrimonial Integral
17
O demonstrativo é apenas para ilustrar algumas mudanças que seriam observadas com a transição para a Contabilidade Patrimonial Integral.
A obtenção dos valores exatos de cada uma das rubricas sob a nova metodologia de contabilização só será possível com a mudança no registro
dos dados.
Tabela 5
Receitas públicas apresentadas conforme a DDF
Tabela 6
Despesas da União: fixação, execução e diferença para o exercício de 2007
D = ELP + EL + ENL
ELP = despesas empenhadas, liquidadas e pagas
EL = despesas empenhadas, liquidadas e não pagas (RP18 processados)
ENL = despesas empenhadas e não liquidadas (RP não processados)
Simulações
A exemplo do que foi feito com as receitas, para melhor ilustrar as despesas
incorridas pelo governo federal no exercício de 2007, tornou-se necessário realizar
algumas simulações, as quais são descritas a seguir.
Tabela 7
Despesas públicas de 2007 segundo a Contabilidade Patrimonial Integral
Tabela 8
Demonstração do Desempenho Financeiro para 2007
Tabela 9
Balanço Patrimonial resumido apresentado no BGU 2007
Partindo-se dos dados acima, serão vistos cada um dos ajustes necessários
nos elementos patrimoniais e, em seguida, será apresentado o demonstrativo ajusta-
do conforme o modelo sugerido pela NICSP 1 (Statement of Financial Position).
Primeiramente, a NICSP 1 ordena os elementos patrimoniais por ordem de
liquidez e de exigibilidade, para ativos e passivos, respectivamente. Nota-se que,
nos moldes atuais, há dois grupos principais no ativo (financeiro e não financeiro)
e no passivo (idem), os quais dentro de cada um deles há a divisão entre direitos
ou exigibilidades a curto e longo prazos. A NICSP 1 separa os ativos e passivos em
circulantes e não circulantes.
Simulações
• O ente deverá constituir uma provisão para o caso de alguns contribuintes e outros
devedores não honrarem seus compromissos com base no histórico de inadimplência e
cálculos estatísticos. Suponha-se que a União chegou à conclusão de que, historicamente,
20% dos seus créditos de tributos e contribuições não são honrados e 5% dos demais cré-
ditos (exceto as transferências). Como, nesse caso, as provisões podem observar critérios
distintos, é necessário que elas sejam alocadas em separado no balanço patrimonial.
Tabela 10
Ativo circulante ajustado conforme a Contabilidade Patrimonial Integral
Com isso, o passivo circulante poderia ser representado como na tabela 11.
Tabela 11
Passivo circulante ajustado conforme a Contabilidade Patrimonial Integral
Nota-se também que o valor do passivo circulante, com o expurgo dos restos
a pagar não processados e com o agrupamento das contas de curto prazo, apresen-
tou-se bem inferior ao ativo financeiro do Balanço Patrimonial do BGU 2007.
Ao alocar todas as contas de curto prazo em um único grupo, evidencia-se a capacidade de
saldar compromissos a curto prazo, ao comparar com o passivo circulante. Vê-se, portanto, que os
direitos de curto prazo da União são suficientes para saldar as obrigações de curto prazo.
Simulação
Tabela 12
Apuração do valor que deveria ser registrado nos demonstrativos referente
à participação acionária da União nas estatais federais
O processo de avaliação dos bens, bem como a estimativa da vida útil e o cál-
culo da respectiva depreciação e impairment, são os maiores desafios na contabili-
zação dos ativos permanentes imobilizados. Deve ser feito um trabalho para avaliar
esses bens de acordo com o valor dos benefícios futuros esperados.
Neste trabalho, não há outra forma de inserir os dados no balanço ajustado,
senão por meio da precariedade do arbitramento de valores e dados simulados que
correspondam ao registro contábil dos bens.
Como o objetivo é demonstrar as mudanças que seriam observadas na transição
para as novas regras contábeis, sem entrar em questões de estimativas mais comple-
xas, a título ilustrativo, pode-se partir dos dados do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE) nos cálculos da formação bruta de capital fixo (FBCF).
A FBCF representa o valor dos bens duráveis adquiridos no mercado ou produzidos por
conta própria e destinados ao uso, em unidades de produção, por período superior a um ano. A
FBCF é uma parcela do investimento que corresponde à quantidade de produtos produzidos, não
para serem consumidos, mas para serem utilizados no processo produtivo nos anos posteriores. O
estoque da FBCF ao longo de vários anos aproxima-se, de certo modo, do conceito de ativo.
De acordo com o IBGE (2004), a FBCF inclui, no caso das administrações
públicas, a aquisição de equipamentos e as construções, até mesmo as militares,
deduzidas da receita de alienações de imóveis.
Simulação
• Do total apurado dos ativos, cerca de 10% (R$ 39.320,01 milhões) já havia sido depre-
ciado em exercícios anteriores (depreciação acumulada).
Quanto ao passivo não circulante, não são observados ajustes necessários, uma vez
que são registrados pelo regime de competência. Deve-se atentar apenas ao fato de que as
dívidas (mobiliárias e contratuais) de longo prazo devem ser registradas nesse grupo.
19
Fonte: IBGE e cálculos do autor.
Tabela 13
Ativo e Passivo não-circulantes ajustados conforme a
Contabilidade Patrimonial Integral
Tabela 14
Balanço patrimonial da União segundo as NICSP para 2007
é exaustiva, ou seja, não contempla todos os fatores que devem ser levados em consi-
deração, mas estabelece os requisitos mínimos a serem observados na transição para
o novo sistema contábil. É necessário sempre redefinir as necessidades de acordo com
as situações a que estarão sujeitos os responsáveis pela implementação.
4 Considerações finais
A transição para a Contabilidade Patrimonial Integral exige um grande
esforço por parte do governo no estabelecimento das diretrizes, na normatiza-
ção necessária, no recrutamento de profissionais e no levantamento de recur-
sos. Depois da implementação não é diferente, pois é necessária a manutenção
do novo sistema contábil representado por um constante aperfeiçoamento das
práticas. No entanto, a contrapartida de todo esse esforço são os inúmeros e
inegáveis benefícios que serão gerados.
Os benefícios da transição para a Contabilidade Patrimonial Integral podem
ser agrupados em três principais categorias: benefícios macroeconômicos, benefí-
cios microeconômicos e benefícios institucionais.
Os benefícios macroeconômicos são refletidos, principalmente, na elabora-
ção das informações advindas das estatísticas de finanças públicas. Os grandes ob-
jetivos econômicos buscados pelo governo – por exemplo: maior crescimento das
finanças, pleno emprego, menor inflação, entre outros – devem ser refletidos nos
seus demonstrativos. Para isso, as estatísticas fiscais (em nível mais amplo) e a
Contabilidade aplicada ao Setor Público (especificamente na esfera governamental)
devem refletir, da melhor maneira possível, o comportamento dos diversos atores
econômicos.
Um dos principais benefícios da implementação da Contabilidade Patrimo-
nial Integral é o registro mais abrangente dos eventos econômicos relacionados ao
setor público, o que irá fazer com que as estatísticas de finanças públicas apresen-
tem dados mais próximos da realidade, permitindo projeções mais seguras.
Para corresponder à tendência mundial de adoção das diretrizes do MEFP
2001 com vistas à padronização das estatísticas fiscais, faz-se necessário, primeira-
mente, mudar o enfoque da contabilidade pública brasileira, que deixaria de regis-
trar somente o orçamento público e sua execução e passaria a abranger o registro do
patrimônio público como um todo.
Além do simples fato de trazer uma informação macroeconômica mais abran-
gente, há a adequação à tendência mundial de adoção dos preceitos da Contabili-
dade Patrimonial Integral, representados pelas NICSP e pelas regras contidas no
MEFP 2001. Isto permitiria uma comparação mais adequada à realidade de outros
países, favorecendo a tomada de decisões.
Outro benefício de ordem macroeconômica pode ser representado pelo alcan-
ce de uma abordagem mais sofisticada no planejamento do gasto público no aspecto
qualitativo e quantitativo, na medida em que as informações tornar-se-iam mais
transparentes. Haveria, também, uma distinção mais clara entre os gastos correntes
e os investimentos públicos.
A regra de ouro das finanças públicas pode ser melhor mensurada e gerida
com base nas informações fornecidas pela Contabilidade Patrimonial Integral. Esta
regra proíbe a obtenção de operações de crédito para financiar os gastos correntes
do governo. Ao assumirmos que tanto as despesas públicas correntes quanto os em-
préstimos são melhor representados sob o regime de competência, não há espaço
para adaptações das informações, o que poderia gerar interpretações equivocadas
em prejuízo da gestão das finanças públicas.
A Contabilidade Patrimonial Integral é essencial para levantar os custos totais
das atividades governamentais. Com isso, a eficiência dos serviços públicos será
melhor avaliada, favorecendo a gestão. A informação dos custos totais pode ser
crucial quando se apresentam várias alternativas igualmente válidas na prestação
de determinado serviço público.
Um dos principais benefícios microeconômicos oriundos da implementação
da Contabilidade Patrimonial Integral é o registro de todos os bens, direitos e obri-
gações do ente público.
Ao reconhecer os ativos não financeiros (edificações, maquinário, bens públi-
cos típicos etc.), a contabilidade fornece ao governo, um melhor retrato dos recursos
disponíveis e da riqueza patrimonial do setor público, gerando os subsídios neces-
sários para uma condução adequada das políticas públicas. Esse registro permite,
também, que as entidades obtenham uma melhor compreensão do impacto do uso
dos ativos não financeiros no fornecimento dos serviços públicos por meio da con-
sideração do consumo de capital fixo (depreciação/amortização) e do impairment,
que indicam a necessidade de reposição do bem ou estimam as perdas ocasionadas
por eventos não previstos.
O valor correspondente aos investimentos nas empresas públicas deve ser le-
vado em consideração nos demonstrativos, fornecendo uma melhor visão das ativi-
dades governamentais no setor privado e evidenciando de que modo isso se refletirá
no ente público para gerar benefícios ao setor público. Existem diversos exemplos
de governos que privatizaram suas empresas investidas, simplesmente por não con-
tar com a avaliação do valor de mercado dos ativos dessas empresas ou do quanto
estas geraram benefícios para o setor público e isso seria solucionado pelas novas
regras contábeis.
Os demais direitos e obrigações registrados sob o regime de competência
fornecem uma melhor estimativa da situação patrimonial do ente, sem que se per-
cam as informações para a gestão do fluxo de caixa. A Contabilidade Patrimonial
Integral fornece uma informação mais abrangente, mas ao mesmo tempo permite
que sejam gerados demonstrativos de fluxo de caixa que forneçam subsídios para a
gestão financeira do setor público.
Sem dúvida, o maior benefício, em termos institucionais, da Contabili-
dade Patrimonial Integral é a transparência das finanças públicas em todos os
Referências
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REIS, H.C. Regime de Caixa ou de Competência: Eis a questão. [S. l.]: Ibam,
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VAN DER HOEK, M. P. From Cash to Accrual Budgeting and Accounting in the
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WYNNE, A. Is the Move to Accrual Based Accounting a Real Priority for Public
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