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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

Departamento de Geografia
Programa de Pós-Graduação em Geografia

Diogo Loibel Sandonato

POLÍTICAS AMBIENTAIS E CONFLITOS TERRITORIAIS NO ACRE,


BRASIL: O Sistema Estadual De Incentivos A Serviços Ambientais
(SISA)

Niterói - RJ

2015
Diogo Loibel Sandonato

POLÍTICAS AMBIENTAIS E CONFLITOS TERRITORIAIS NO ACRE,


BRASIL: O Sistema Estadual De Incentivos A Serviços Ambientais
(SISA)

Dissertação apresentada ao Programa de


Pós-graduação em Geografia da
Universidade Federal Fluminense, como
requisito parcial para obtenção do título de
Mestre em Geografia.

Orientador: Carlos Walter Porto-Gonçalves

Niterói - RJ
2015
S218 Sandonato, Diogo Loibel.
Políticas ambientais e conflitos territoriais no Acre, Brasil: o Sistema
Estadual de Incentivos a Serviços Ambientais (SISA) / Diogo Loibel
Sandonato. – 2015.
145 f. ; il.
Orientador: Carlos Walter Porto-Gonçalves.
Dissertação (Mestrado em Geografia) – Universidade Federal
Fluminense, Instituto de Ciências da Sociedade e Desenvolvimento
Regional, 2015.
Bibliografia: f. 140-145.

1. Políticas ambientais. 2. Conflito territorial. 3. Acre. 4. Brasil.


5. Sistema Estadual de Incentivos a Serviços Ambientais (SISA).
I. Porto-Gonçalves, Carlos Walter. II. Universidade Federal
Fluminense. Instituto de Ciências da Sociedade e Desenvolvimento
Regional. III. Título.
Diogo Loibel Sandonato

Politicas Ambientais e Conflitos Territoriais no Acre, Brasil: 0 Sistema Estadual de


Incentivos a Serviyos Ambientais (SISA)

Disserta9ao apresentada ao Programa de P6s­


Gradua9ao em Geografia da Universidade
Federal Fluminense, como requisito parcial
para obtenyao do Grau de Mestre em
Geografia.

Aprovada em 14 de dezembro de 2015.

Prof. Dr. Valter do Carmo Cruz


Universidade Federal Fluminense

Prof. Dr. Paulo Roberto Raposo Alentejano


Universidade do Estado do Rio de Janeiro

Niter6i

2015
AGREDECIMENTOS

Em primeiro lugar é importante destacar que essa pesquisa e a consequente


dissertação de mestrado são frutos de um esforço coletivo. Nada do que foi realizado
aqui seria possível sem a participação de muitas pessoas e organizações. Não terei
como explicitar aqui todas e todos que direta ou indiretamente contribuíram no processo,
mas tentarei aqui destacar parte delas. Pontuado essa questão, nomeio e agradeço
pessoas e organizações fundamentais para a realização desse trabalho: Meu
orientador, Carlos Walter Porto-Gonçalves por toda ajuda, companheirismo, paciência
e pelo incrível aprendizado durante esses anos de trabalho. Não fosse sua experiência
e contatos no Acre, esse trabalho não seria possível; Osmarino Amâncio, pela
generosidade de me receber em sua casa, compartilhar suas experiências e me ensinar
muita coisa. Ele foi o principal motivador da realização dessa pesquisa no Acre; As
companheiras e companheiros do Centro de Memória das Lutas e Movimentos Sociais
da Amazônia pelo acolhimento e toda ajuda durante a pesquisa. O acúmulo dessa
organização foi fundamental para a pesquisa; Ao Conselho Indigenista Missionário do
Acre por todo apoio e auxílio durante o período que estive no Acre; Ao companheiro
Lindomar Padilha pelas reflexões e conversas e auxílio durante a pesquisa; A Comissão
Pastoral da Terra do Acre pelas contribuições; Laura e Marineide pelo acolhimento,
generosidade e amizade. Ajudaram imensamente na pesquisa; As companheiras e
companheiros do Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Xapuri; A todas
as famílias seringueiras da RESEX Chico Mendes que me acolheram de forma generosa
em suas casas; Aos professores do Acre Israel Souza, Silvio Simione da Silva, Elder de
Paula, Michael Schmidlehner pelas contribuições; Larissa Packer pela ajuda jurídica; Ao
militante e pesquisador Luiz Henrique “Zarref” Moura, que além de ter sido uma das
minhas principais referências de entrada nesse debate, foi um parceiro fundamental de
experiências e reflexões durante minha passagem pelo Acre, gerando os acúmulos mais
importantes desse trabalho; A Via Campesina Brasil e principalmente MST do Rio de
Janeiro por ter me dado a oportunidade de adentrar no debate do capitalismo verde e
ter experiências com entidades e movimentos que pautam essa questão; Ao grande
companheiro Alexandre Henrique Asada, cuja convivência, troca de ideias e grande
ajuda durante todo o período de mestrado foi essencial para que eu conseguisse realizar
essa pesquisa; A todas companheiras e companheiros do Laboratório de Estudos de
Movimentos Sociais e Territorialidades (LEMTO), dentre eles Milson, Leandro, Nathalie,
Alana, Eduardo, Lina, Aline, Hugo, Danilo, pela convivência, troca de ideias e
experiências compartilhadas, fundamentais para o amadurecimento da minha trajetória
e pesquisa na Geografia; Aos professores que tive a oportunidade de conviver no Rio e
que de forma direta ou indireta contribuíram para a pesquisa, dentre eles Valter do
Carmo, Ruy Moreira, Paulo Alentejano, Henry Acselrad; O professor José Gilberto de
Souza, do departamento de geografia da UNESP de Rio Claro pela ajuda na retal final
da escrita da dissertação; As amigas e amigos que fiz no Rio e Niterói que se tornaram
muito importantes na minha vida para além dessa pesquisa, em especial Larissa,
Daiane, Ana Elena e Lívia; A minha querida amiga Deborah pela ajuda durante todas
as etapas do mestrado; As companheiras e companheiros de vida e luta que nos
momentos mais difíceis e estressantes dessa pesquisa me aguentaram horas no
telefone escutando meios devaneios Bira, Igão, Talitinha, Lívia e Ju; A minha família por
todo o apoio.
RESUMO

O Acre possui um sistema jurisdicional de serviços ambientais chamado Sistema de


Incentivo aos Serviços Ambientais (SISA). Esse sistema vem sendo considerado
referência nas experiências de implementação dos mecanismos de mercado voltados
para conservação ambiental, como pagamento por serviços ambientais (PSA) e
Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação (REDD). Essa dissertação
analisa como esse sistema foi gestado, os principais agentes na sua formulação e
execução e que efeitos ele vem produzindo no Acre. Para tal, após introduzir a questão,
elencamos o conjunto de ferramentas teórico-conceituais que ajudam a analisar o tema
da dissertação, das quais as centrais são o conceito de conflito e de território. Em um
segundo momento analisamos o contexto histórico que possibilitou que esse sistema
“pioneiro” fosse criado e porque o foi no Acre. A formação e disputas que ocorrem em
um campo ambiental e a importância das lutas e conquistas dos povos da floresta no
Acre, das quais a formulação do conceito de Reservas Extrativistas é a mais
emblemática, e a posterior aproximação desses povos através de seus movimentos com
Organizações Neo-Governamentais ambientalistas no contexto do campo ambiental. A
partir daí abordamos como o SISA foi elaborado e como é operacionalizado, os efeitos
de seu funcionamento a partir dos recursos provenientes do banco de desenvolvimento
alemão KfW através do programa para sistemas jurisdicionais pioneiros chamado
“REDD Early Movers”. Por fim, analisamos como essas políticas ambientais descritas
no trabalho geram um novo padrão de conflitividade no estado, com implicações na
perda de autonomia e subordinação dos povos da floresta e a produção de novos
espaços capitalistas.

Palavras-Chave: SISA, Acre, KfW, Serviços Ambientais, REDD.


ABSTRACT

Acre has a jurisdictional system of environmental services called Sistema de Incentivo


aos Serviços Ambientais (SISA). This system is considered a reference in
implementation experiences of market mechanisms geared to environmental
conservation, such as Payment for Environmental Services (PES) and Reducing
Emissions from Deforestation and Degradation ( REDD). This dissertation examines how
this system was gestated, the main agents in its formulation and implementation and the
effects it produces in the Acre state. After explaining the subject, we list the set of
theoretical and conceptual tools that help analyze the topic of the dissertation, in which
its core is the concept of conflict and territory. In a second stage we analyze the historical
context that allowed this "pioneer" system to be created and why it was done so in Acre.
The formation and disputes that occur in an environmental field and the importance of
the struggles and achievements of the forest people in Acre, of which the formulation of
the concept of extractive reserves is the most emblematic, and later approach of these
people through their movements with Neo-governmental environmental organizations in
the context of the environmental field. From there we approach how SISA was developed
and how it is operationalized, the effects of its operation from resources from the German
Development Bank KfW through the program for pioneering jurisdictional systems called
"REDD Early Movers". Finally, we analyze how these environmental policies outlined in
this work generate a new pattern of conflict in the state, with implications on loss of
autonomy and subordination of the forest people and the production of new capitalist
spaces.

Key words: SISA, Acre, KfW, environmental services, REDD.


LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1 - Entidades que participaram da Rio+20, da Cúpula dos Povos e Fórum


Empresarial................................................................................................................... 63

FIGURA 2 - Formas de fluxo de carbono consideradas no mecanismo de reduções de


emissões por desmatamento e degradação.................................................................. 73

FIGURA 3 - Marina Silva e Jorge Viana, em 1998, em Washington, com o cineasta


Adrian Cowel, em busca de apoio para o projeto de desenvolvimento sustentável do
Acre............................................................................................................................ 106

FIGURA 4 - Mapa com mosaico de áreas protegidas do Acre.................................... 108

FIGURA 5 - Mapas de gestão territorial a partir do Zoneamento Econômico


Ecológico.................................................................................................................... 110

FIGURA 6 - Níveis de referência e meta utilizados para calcular o desmatamento evitado


e as emissões do Estado do Acre seguindo a metodologia usada pelo o Prodes (A) e
dados do UCGEO (B).................................................................................................. 120

FIGURA 7 - Modelo híbrido de repartição de benefícios considerando a abordagem


estoque-fluxo e abordagem programática................................................................... 125

FIGURA 8 - Arranjo institucional do SISA.....................................................................134

FIGURA 9 - Linha do tempo dos principais programas, políticas e leis ambientais do


Acre............................................................................................................................ 166

FIGURA 10 - Alocação dos recursos do Programa REM KfW..................................... 170

FIGURA 11 - Desmatamento bruto anual no Acre....................................................... 177

FIGURA 12 - Concentração do desmatamento em 2007 e projetado até 2030........... 178

FIGURA 13 - Comparação entre desmatamento bruto anual na Amazônia Legal e


Acre............................................................................................................................ 179

FIGURA 14 - Participação relativa do Acre no desmatamento amazônico.................. 179

FIGURA 15 - Incremento do desmatamento no Acre por classe fundiária em 2011.... 181

FIGURA 16 - Incremento do desmatamento no Acre por classe fundiária em 2012.... 182

FIGURA 17 - Número de estabelecimentos agropecuários por grupo de área total.... 186


FIGURA 18 - Área dos estabelecimentos agropecuários por grupo de área total....... 187

FIGURA 19 - Área dos estabelecimentos agropecuários por condição legal das terras e
grupos de área total..................................................................................................... 188

FIGURA 20 - Número de estabelecimentos agropecuários por condição legal das terras


e grupos de área total.................................................................................................. 189

FIGURA 21 - Áreas dos estabelecimentos agropecuários em hectares por utilização das


terras........................................................................................................................... 192

FIGURA 22 - Série histórica com tamanho do rebanho bovino e produção de leite no


Acre............................................................................................................................ 194

FIGURA 23 - Número de estabelecimentos agropecuários que produziram leite no ano


de 2006 (Unidades) por grupo de cabeças de bovinos e grupo de área de
pastagem................................................................................................................... 195

FIGURA 24 - Número de estabelecimentos, com mais de 50 cabeças de gado, e efetivo


de bovinos com relação ao tamanho do estabelecimento – Pecuária de corte e leite...195

FIGURA 25 - Efetivo de bovinos e número de estabelecimentos agropecuários em 31/12


por grupos de área total............................................................................................... 196

FIGURA 26 - Rentabilidade líquida da pecuária de 2010 a 2021................................ 200

FIGURA 27 - Área plantada total no estado do Acre.................................................... 203

FIGURA 28 - Área plantada e produção de milho no estado do Acre.......................... 204

FIGURA 29 - Área de florestas plantada no PAE Cachoeira........................................ 212

FIGURA 30 - Complexo Agroindustrial da Dom Porquito S.A...................................... 223

FIGURA 31 - Complexo agroindustrial de piscicultura da Peixes da Amazônia S.A.... 230

FIGURA 32 - Diagrama representando o arranjo PPPC da empresa Peixes da Amazônia


S.A............................................................................................................................. 231

FIGURA 33 - Exploração de produtos florestais madeireiros...................................... 235

FIGURA 34 - Movimentação de madeira no Acre........................................................ 235

FIGURA 35 - Usuários emissores de DOF e Guias Estaduais comuns no Acre.......... 236

FIGURA 36 - Identificação dos lotes dos moradores da Floresta Estadual do Mogno. 237
FIGURA 37 - Total de áreas de planos de manejo protocoladas e licenciadas no
Acre............................................................................................................................ 240

FIGURA 38 - Exportações de madeira de 1997 a 2014 no Acre, em valor (US$) e peso


(kg líquido).................................................................................................................. 241

FIGURA 39 - Fábricas de produtos de madeira e móveis – unidades e produção...... 242

FIGURA 40 - Áreas destinadas a projetos de manejo florestal comunitário no Acre... 243

FIGURA 41 - Áreas com manejo florestal “comunitário” dentro no PAE Cachoeira e da


RESEX Chico Mendes, Xapuri, Acre........................................................................... 251

FIGURA 42 - Principais produtos do extrativismo no Acre........................................... 254

FIGURA 43 - Usina de beneficiamento de castanha da COOPERACRE em Xapuri... 258

FIGURA 44 - Índice de Desenvolvimento Humano Municipal do Brasil e Estado da


Amazônia Legal.......................................................................................................... 267
LISTA DE TABELAS

TABELA 1 - Avaliação do cumprimento de salvaguardas socioambientais no Acre.... 154

TABELA 2 - Programas do Eixo Estratégico de Economia Sustentável do Plano


Plurianual de Governo para o período de 2012 – 2015................................................ 160

TABELA 3 - Principais programas que financiam as ações no Acre............................ 163

TABELA 4 - Informações sobre os contratos realizado com o KfW............................. 168

TABELA 5 - Dinheiro destinado ao fortalecimento institucional................................... 171

TABELA 6 - Programas e políticas apoiados pelo REM KfW por cadeia produtiva ou
atividade..................................................................................................................... 172

TABELA 7 - Entidades apoiadas pelo REM KfW por cadeia produtiva ou atividade.... 173

TABELA 8 - Incremento do desmatamento no Acre por classe fundiária..................... 181

TABELA 9 - Categorias fundiárias no Acre, Brasil....................................................... 182

TABELA 10 - Desmatamento acumulado por categorias fundiárias no Acre, Brasil.... 184

TABELA 11 - Desmatamento bruto anual por categoria fundiária no Acre.................. 185

TABELA 12 - Desmatamento bruto anual no Acre total e a contribuição de parte das


categorias fundiárias................................................................................................... 185

TABELA 13 - Número de estabelecimentos e área dos estabelecimentos agropecuários


por condição legal das terras e grupos de área total.................................................... 188

TABELA 14 - Número de imóveis rurais, área e porcentagem com base no grupo de


área total..................................................................................................................... 189

TABELA 15 - Número de famílias e área total de assentamentos rurais por fase de


implementação no Acre............................................................................................... 190

TABELA 16 - Desmatamento por família ou estabelecimento rural para diferentes


categorias fundiárias................................................................................................... 191

TABELA 17 - Mudanças no uso e ocupação do solo no Acre por classe.................... 193

TABELA 18 - Mudanças no uso e ocupação do solo no Acre por categoria de uso da


terra............................................................................................................................ 193
TABELA 19 - Arranjos PPPC de madeira e financiadores em diversos pontos da cadeia
produtiva.................................................................................................................... 239

TABELA 20 - Entidades certificados com selo FSC no Acre........................................ 244

TABELA 21 - Ações do subprograma Territorial Extrativista do programa ISA


Carbono..................................................................................................................... 253

TABELA 22 - Índices de Progresso Social da Amazônia............................................ 268

TABELA 23 - Articulação de diferentes investimentos com atividades e regiões no


Acre............................................................................................................................ 271
LISTA DE SIGLAS

AAPBI- Associação Agroextrativista Poyanawa do Barão e Ipiranga


AAFI - Agente Agroflorestal Indígena
AAU - Assigned Amount Unit
ABC - Agricultura de Baixo Carbono
ACIH - Associação de Cultura do Povo Indígena do Humaitá
ACREPEIXE/COOPERPEIXE - Central de Cooperativas dos Piscicultores do Acre
AEIA - Assessoria Especial de Assuntos Indígenas do Gabinete do Governador
AJHJ - Associação de Jovens Hunikui do Jordão
AKAC - Associação Katukina do Campinas
AMAIAC - Associação do Movimento dos Agentes Agroflorestais Indígenas do Acre
AMARCA - Associação de Moradores e Agroextrativistas do Remanso de Capixaba
AMOPREAB - Associação dos Moradores e Produtores da Reserva Extrativista Chico
Mendes de Assis Brasil
AMOPREX - Associação dos Moradores e Produtores da Reserva Extrativista Chico
Mendes de Xapuri
AMPPAECM - Associação dos Moradores e Produtores do Projeto Agroextrativista
Chico Mendes
ANA – Articulação Nacional de Agroecologia
ANAC - Agência de Negócios do Acre
APAHC - Associação dos Produtores e Agroextrativista Hunikui do Caucho
APIWTXA - Associação Ashaninka do Rio Amônia
ASCAK - Associação Sócio Cultural e Ambiental Kuntamanã
ASCY - Associação Sociocultural Yawanawá
ASIMMANEJO - Associação de Indústrias de Madeira e Manejo do Acre
ASKARJ - Associação de Seringueiros Kaxinawá do Rio Jordão
ASKPA - Associação dos Produtores e Criadores Kaxinawá da Praia Carapanã
ASPAKNO - Associação dos Seringueiros, Agricultores e Artesãos Kaxinawá de Novo
Olinda
ASPIRH - Associação do Povo Indígena do Rio Humaitá
ASSPAE-SE - Associação dos Produtores do Projeto de Assentamento Agroextrativista
do Seringal Equador
BANPARÁ - Banco do Estado do Pará
BASA - Banco da Amazônia
BID - Banco Interamericano de Desenvolvimento
BIRD – Banco Mundial
BMZ - Ministério Para Cooperação e Desenvolvimento da Alemanha
BNDES - Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
BVRio – Bolsa de Valores Ambientais do Rio de Janeiro
CAET - Cooperativa Agroextrativista de Tarauacá
CAEX - Cooperativa Agroextrativista de Xapuri
CAPEB - Cooperativa Agroextrativista de Brasiléia
CAR - Cadastro Ambiental Rural
CCBA - The Climate Community & Biodiversity Aliance
CDRFS - Conselho de Desenvolvimento Rural Florestal Sustentável
CDSA - Companhia de Desenvolvimento de Serviços Ambientais
CEGdRA - Comissão Estadual de Gestão de Riscos Ambientais
CEMACT - Conselho Estadual de Meio ambiente, Ciência e Tecnologia
CENTRAL JURUÁ - Central Cooperativas do Vale do Juruá
CEPAL - Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe
CEVA - Comissão de Validação e Acompanhamento
CFE - Conselho Florestal Estadual
CFTT - Centro de Formação dos trabalhadores e trabalhadoras na Agricultura do estado
do Acre
CI - Conservation International
CIMI - Conselho Indigenista Missionário
CM AMAZÔNIA – Centro de Memórias das Lutas e Movimentos Sociais da Amazônia
CNS - Conselho Nacional das Populações Extrativistas
CNUDS/RIO+20 - Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável
CNUMAD/ECO-92 - Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o
Desenvolvimento
CO2 – Dióxido de Carbono
COICA - Coordinadoria de las Organizaciones Indigenas de la Cuenca Amazónica
COOPGRÃOS - Cooperativa de Produtores de Grãos de Brasiléia
COOPEIXE BUJARI - Cooperativa de Produtores e Criadores Rurais de Peixe de Bujari
COOPERACRE - Cooperativa Central de Comercialização Extrativista do Acre
COOPERBISCOITOS - Cooperativa das Produtoras de Biscoito de Goma de Cruzeiro
do Sul
COOPERFLORESTA - Cooperativa dos Produtores Florestais Comunitários
COOPERMOGNO - Cooperativa de Produtores Familiares e Economia Solidária da
Floresta do Mogno
COOPERPEIXE JURUÁ - Cooperativa de Piscicultores do Vale do Juruá
COOPERSONHOS - Cooperativa Sonhos de Todos
COOPYAWA - Cooperativa Agroextrativista Yawanawá
COP - Reunião das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças
Climáticas
CPI-AC - Comissão Pró-Índio do Acre
CPT – Comissão Pastoral da Terra
CPS Conlutas – Central Sindical e Popular
CRA - Cota de Reserva Ambiental
CREA-AC - Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do estado do Acre
CTA – Centro dos trabalhadores da Amazônia
CUT – Central Única dos Trabalhadores
DHESCA - Direitos Humanos Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais
DOF - Documento de Origem Florestal
EBC – Empresa Brasil de Comunicação
EDF - Environmental Defense Fund
EKF - Energie-und Klimafonds
EMBRAPA - Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
EPRI - Eletric Power Research Intitute
ETS - Sistema De Troca De Emissões
FAEAC - Federação de Agricultura e Pecuária do estado do Acre
FAO - Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura
FEF - Fundo Estadual de Florestas
FETRACRE - Federação dos trabalhadores na Agricultura do Acre
FIEAC - Federação das Indústrias do estado do Acre
FIFA - Federação Internacional de Futebol
FIP – Fundo de Investimento em Participações
FMI – Fundo Monetário Internacional
FPA – Frente Popular do Acre
FSC - Forest Stewardship Council
FUNAI - Fundação Nacional do Índio
FUNBIO - Fundo Brasileiro Para A Biodiversidade
FUNTAC - Fundação de Tecnologia do estado do Acre
GCF Task Force - Força Tarefa dos Governadores para o Clima e Floresta
GEE - Gases do efeito estufa
GEF - Fundo Global para o Meio Ambiente (Global Environmental Facility)
GIZ – Cooperação Alemã (Gesellschaft für Internationale Zusammenarbeit)
GPFC - Grupo dos Produtores Florestais Comunitários
GTA - Grupo de Trabalho Amazônico
IAP – Investigação Ação Participativa
IBAMA - Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IBM - International Business Machines
ICMBio - Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade
IDHM - Índice de Desenvolvimento Humano Municipal
IEA - Instituto de Estudos Amazônicos
IETA - Climate Group, International Emissions Trading Association
IHU - Instituto Humanitas Unisinos
IMAFLORA - Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola
IMAC - Instituto de Meio Ambiente do Acre
IMC - Instituto de Mudanças Climáticas e Regulação de Serviços Ambientais
IMAZON - Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia
INCRA – Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
IPAM - Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia
IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
IPS - Índice de Progresso Social
ISA – Incentivo a Serviço Ambiental
ISA (2) - Instituto Socioambiental
ITERACRE - Instituto de Terras do Acre
ITTO - Organização Internacional de Madeira Tropical (International Timber of Tropical
Organization)
KfW – Banco de Desenvolvimento Alemão (Kreditanstalt für Wiederaufbau)
LED - Low Emissions Development
MDIC – Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior
MDL - Mecanismo de Desenvolvimento Limpo
MDS - Ministério de Desenvolvimento Social
MPE-AC – Ministério Público do estado do Acre
MPF - Ministério Público Federal
MST - Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
NOVA CINTRA - Cooperativa dos Produtores de Agricultura Familiar e Economia
Solidaria de Nova Cintra
OCIP - Organização da Sociedade Civil de Interesse Público
OIT – Organização Internacional do Trabalho
OMC – Organização Mundial do Comércio
ONG – Organização Neo-Governamental
ONU – Organização das Nações Unidas
OPIAC - Organização de Professores Indígenas do Acre
OPIHARP - Organização dos Povos Indígenas do Alto Rio Purus
OPIN - Organização dos Povos Indígenas do Acre, Sul do Amazonas e Noroeste de
Rondônia
PA - Projeto de Assentamento
PAA - Programa de Aquisição de Alimentos
PAD - Projeto de Assentamento Dirigido
PAE – Projeto de Assentamento Agroextrativista
PAF – Projeto de Assentamento Florestal
PAR - Projeto de Assentamento Rápido
PASM - Plano Acre Sem Miséria
PCA - Projetos Casulo
PDC – Plano de Desenvolvimento Comunitário
PDRFS - Programa Estadual de Desenvolvimento Rural Sustentável
PDS – Projeto de Desenvolvimento Sustentável
PDSA - Programa de Desenvolvimento Sustentável do Acre
PE - Polos Agroflorestais
PEF - Programa Emergencial de Financiamento aos Estados e Distrito Federal
PESACRE - Grupo de Pesquisa e Extensão em Sistemas Agroflorestais do Acre
PGE - Procuradoria Geral do Estado do Acre
PGTI - Plano de Gestão Territorial e Ambiental
PIDS - Programa Integrado de Desenvolvimento Sustentável do Estado do Acre
PNMC - Política Nacional sobre Mudança Climática
PNUMA - Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente
PNUD - Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
POA - Plano de Operação Anual
PPCD/AC - Plano Estadual de Prevenção e Controle do Desmatamento do Acre
PPDCAM - Plano Nacional de Prevenção e Controle do Desmatamento da Amazônia
Legal
PP-G7 - Programa Piloto para a Proteção das Florestas Tropicais
PPPC – Parceria Público-Privada-Comunitária
PRA - Programa de Regularização Ambiental
PROACRE - Programa de Inclusão Social e Desenvolvimento Econômico Sustentável
do Acre
PRODES-INPE - Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por
Satélite realizado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
PROINVESTE - Programa de Apoio ao Investimento dos Estados e Distrito Federal
PRONAF - Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar
PROSER - Programa de Saneamento Ambiental e Inclusão Socioeconômica do Acre
PSA - Pagamento por Serviço Ambiental
PSDB – Partido da Social Democracia Brasileira
PT – Partido dos Trabalhadores
PVAAF - Política de Valorização do Ativo Ambiental Florestal
REDD - Redução de emissões por desmatamento e degradação
REDD+ SES – REDD+ Social and Environmental Standards
REM - REDD Early Movers
RESEX – Reserva Extrativista
SAF - Sistema Agroflorestal
SAI - Secretaria de Articulação Institucional
SBPC – Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência
SEANP - Sistema Estadual de Áreas Naturais Protegidas
SEAPROF - Secretaria de Estado de Produção Familiar e Extensão Rural
SECOM - Secretaria de Estado de Comunicação
SEDENS - Secretaria de Estado de Desenvolvimento Florestal, da Indústria, do
Comércio e de Serviços Sustentáveis do Acre
SEE - Secretaria de Estado de Educação e Esporte
SEF - Secretaria Estadual de Florestas
SEMA – Secretaria de Estado do Meio Ambiente
SEPLAN - Secretaria de Estado de Planejamento
SINDSPREV-RS - Sindicato dos Trabalhadores Federais da Saúde, Trabalho e
Previdência no RS
SINGA – Simpósio Internacional de Geografia Agrária
SISA – Sistema de Incentivos a Serviços Ambientais
SITOAKORE - Organização de Mulheres Indígenas do Acre, Sul do Amazonas e
Noroeste de Rondônia
SNCR - Sistema Nacional de Cadastro Rural
SNUC - Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza
STR – Sindicato de Trabalhadores Rurais
STTRX - Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Xapuri
TECMAN - Tecnologia e Manejo Florestal
TEEB - The Economics of Ecosystems and Biodiversity
TI – Terra Indígena
TNC - The Nature Conservancy
UC – Unidade de Conservação
UCEGEO - Unidade Central de Geoprocessamento e Sensoriamento Remoto
UDR - União Democrática Ruralista
UFAC – Universidade Federal do Acre
UFF – Universidade Federal Fluminense
UICN - União Internacional para a Conservação da Natureza
UnB – Universidade de Brasília
UNIMMAC - Central De Cooperativas De Produção dos Moveleiros e Marceneiros do
estado do Acre
UN-REDD - United Nations Collaborative Programme on Reducing Emissions from
Deforestation and Forest Degradation
USAID - Agência Internacional para o Desenvolvimento dos EUA
USP – Universidade de São Paulo
VCS - Verified Carbon Standard
WHRC – Woods Hole Research Center
WRM – World Rainforest Movement
WWF - World Wildlife Fund
ZAP - Zona de Atendimento Prioritário
ZED – Zona Especial de Desenvolvimento
ZEE - Zoneamento Ecológico-Econômico
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO........................................................................................................... 24

CAPÍTULO 1 – PRINCIPAIS FERRAMENTAS: O MARCO TEÓRICO-


CONCEITUAL............................................................................................................ 37

1.1. Conflito................................................................................................................. 38
1.2. Produção do Espaço............................................................................................. 40
1.3.Território................................................................................................................ 44
1.4. Produção dos espaços capitalistas: acumulação e crise do capital..................... 46
1.5. Acumulação primitiva/por espoliação................................................................... 48
1.6. Atualidade e importância da acumulação por espoliação para o capital.............. 50
1.7. A produção de espaços capitalistas e geração de conflitos territoriais................ 53
1.8. Neoliberalismo ambiental e sistema de normas................................................... 55
1.9. Dimensão epistêmico-política do conflito territorial: a colonialidade do saber e
poder........................................................................................................................... 57

CAPÍTULO 2 – COMO CHEGAMOS NO SISA E COMO ELE FUNCIONA................ 62

2.1. Disputas no Campo Ambiental e como influenciam a conjuntura do Acre


(localização no debate).............................................................................................. 62
2.1.1. Formação do Campo Ambiental......................................................................... 63
2.1.2. Constituição do Campo Ambiental...................................................................... 66
2.1.3. A força do neoliberalismo ambiental, “desenvolvimento sustentável” e “Economia
Verde”.......................................................................................................................... 68
2.1.4. Os mecanismos de serviços ambientais – REDD, TEEB................................... 72
2.1.5. O papel do Banco Mundial e das grandes ONGs ambientalistas...................... 76
2.1.6. Conflitos, tensões e outras perspectivas no campo ambiental.......................... 78

2.2. Confluência perversa no campo ambiental e conformação do bloco


hegemônico no Acre (localização no tempo e no espaço)..................................... 82
2.2.1. Histórico da luta do movimento seringueiro no Acre........................................... 82
2.2.1.1 A Amazônia sob os Holofotes Globais: a última fronteira................................. 84
2.2.1.2. A Aliança dos Povos da Floresta: um outro protagonista desde abajo............ 88
2.2.1.3. A Criatividade dos/das Seringueiros/as Autônomos/as: a RESEX.................. 92
2.2.2. Inflexão política do movimento social no Acre.................................................... 95
2.2.3. Conformação e ascensão do bloco de poder hegemônico no Acre................... 99
2.2.4. Primeiras ações do bloco a partir da gestão da FPA......................................... 105

CAPÍTULO 3 - SISTEMA DE INCENTIVOS AOS SERVIÇOS AMBIENTAS DO


ACRE.......................................................................................................................... 111

3.1. SISA: Arquitetura e Funcionamento..................................................................114


3.1.1. Sistema jurisdicional de serviços ambientais.................................................... 114
3.1.2. Captação de recursos e repartição de benefícios............................................. 121
3.1.3. Abrangência do SISA........................................................................................ 128
3.1.4. Arquitetura do Sistema...................................................................................... 132
3.1.5. Construção e pseudoparticipação comunitária no SISA................................... 139

3.2. Principais políticas e programas alimentados pelo SISA e especialmente pelo


programa “REDD Early Movers” do KfW................................................................. 156
3.2.1. Principais programas que sustentam o conjunto de políticas ambientais do
Acre............................................................................................................................ 163
3.2.2. Programa “REED Early Movers” – KfW............................................................ 166

CAPÍTULO 4 – POLÍTICAS AMBIENTAS E NOVO PADRÃO DE CONFLITIVIDADE


NO ACRE.................................................................................................................... 176

4.1 Aplicações das políticas ambientais no estado e suas implicações nos


conflitos territoriais.................................................................................................. 176
4.1.1. Desmatamento no Acre.................................................................................... 176
4.1.2. Pecuária............................................................................................................ 194
4.1.3. Agricultura........................................................................................................ 202
4.1.4. Modelos de participação e a Parceria Público Privada Comunitária (PPPC)... 214
4.1.5. Cadeia do Peixe............................................................................................... 225
4.1.6. Madeira............................................................................................................. 233
4.1.6.1 Conflitos relacionados ao Manejo florestal comunitário.................................. 245
4.1.7. Borracha e Castanha........................................................................................ 252
4.1.8. Indígenas.......................................................................................................... 258
4.1.9. Dados sociais e conflitos no campo.................................................................. 266

4.2. SISA como “cereja no bolo” das políticas ambientais do Acre.....................270


4.3. Vozes abafadas, criminalização da resistência e luta – o conflito
explicitado................................................................................................................ 278

4.4. Novo padrão de conflitividade no Acre: Conflitos territoriais e perda da


autonomia dos povos da floresta............................................................................ 289

5. CONCLUSÕES....................................................................................................... 291

REFERÊNCIAS......................................................................................................... 298

ANEXOS.................................................................................................................... 325
INTRODUÇÃO

O ponto de partida

Uma comunidade no interior do Acre é impedida de plantar seu roçado de


subsistência. De usar o fogo. São ameaçados de serem expulsos de terras que ocupam.
Um conflito que se repete na história da região, mas que nesse caso tem motivações
novas. Quem quer expulsa-los? Para que? Qual será o uso daquela terra? São
latifundiários locais, nada de novo, mas aliados com empresários norte-americanos que
querem transformar as florestas da área em lastro para comercialização de créditos de
carbono. Por tanto, nada de “brocar” um hectare de mata para fazer roçado, nada de
usar o fogo para poder plantar, nada de criar um pouco de gado. Em uma área
historicamente ocupada por seringueiros, agora eles estão impedidos de reproduzir
suas condições de vida. Proibidos de plantar o alimento para sobrevivência de suas
famílias na terra que ocupam, algumas vezes a mais de 70 anos.
Esse conflito acima descrito é gerado por um projeto de redução de emissões
por desmatamento e degradação (REDD), chamado Projeto Purus, em área de
aproximadamente 34.000 hectares em dos seringais em Manoel Urbano, Acre. Os
proponentes são latifundiários locais e empresas de carbono, CarbonCO LLC e Carbon
Securities, da Flórida, Estados Unidos. (CM AMAZÔNIA, 2013a; FAUSTINO;
FURTADO, 2015; CARBONCO LLC, s/d).
As famílias de seringueiros presentes nas áreas desses seringais, segundo o
documento de concepção do projeto (CARBONCO LLC, s/d apud FAUSTINO,
FURTADO, 2015):

(...) são agentes do desmatamento e limpam uma porção da floresta (muitas vezes
anualmente) para ter terra para agricultura e pecuária de pequena escala para
subsistência (...) Como o agente do desmatamento são os pequenos agricultores e
não o próprio proprietário, este desmatamento não é planejado. Este desmatamento
é tecnicamente ilegal pois esses agentes de desmatamento não têm permissão para
converter florestas em pasto ou terras agrícolas; no entanto, este desmatamento
raramente é processado por autoridades (CARBONCO LLC, s/d apud FAUSTINO,
FURTADO, 2015, pp. 86-87, grifos nossos)

Como os proponentes consideram as famílias que moram na área do projeto


“agentes do desmatamento” e que estão fazendo algo “tecnicamente ilegal”, o projeto
prevê que a polícia militar de Manoel Urbano garantirá as medidas legais de punição
aos que descumprirem o que foi definido pelo projeto. Segundo seus proponentes, o

24
projeto garantirá a construção de escola, centro de saúde, oferecerá cursos para as
famílias da área além do principal, garantirá que as famílias não serão expulsas da área,
através de uma pretensa regularização fundiária que destinará para cada família uma
porção de terra de cerca de 100 hectares (área incompatível como o modo de vida das
famílias de seringueiros ali presentes). O projeto que é internacionalmente validado
pelas certificadoras CCBA1 e VCS2 foi utilizado pela FIFA para neutralizar as emissões
da Copa do Mundo (CM AMAZÔNIA, 2013a; FAUSTINO; FURTADO, 2015;
CARBONCO LLC, s/d).
As famílias que moram na área do projeto foram assediadas a assinar um
documento em que declaram ter ciência e acordo com o projeto. Mas várias pessoas
são analfabetas e assinaram sem saber exatamente o que continha nesses documentos
(CM AMAZÔNIA, 2013a; FAUSTINO; FURTADO, 2015). Mesmo assim o projeto foi
certificado pela CCBA, como destacado por FAUSTINO e FURTADO (2015), e a
certificadora apenas ponderou “que este documento era ‘culturalmente inadequado’ pois
não seria ‘apropriado solicitar às pessoas que elas assinem um documento que não
podem ler’” (WRM, 2014 apud FAUSTINO; FURTADO, 2015, p. 82)
A compreensão do funcionamento de um mecanismo como REDD já é complexa
e difícil de entender mesmo para aqueles que estão envolvidos ou estudam esse tipo
de iniciativa. Mais ainda para comunidades em que o tipo de conhecimento técnico-
científico necessário para entender o REDD não existe e não dialoga com os modos de
vida. Isso fica claro em um trecho de uma fala de um morador da área atingida pelo
Projeto Purus:

Eu quero que explique para mim o que é carbono porque pelo que sei este carbono,
pra gente, não vai servir de nada. Pra nós, não serve. Estão tirando daqui para levar
para os EUA... Eles vão vender isso aí pra lá e passar por cima de nós. E nós, o que
vamos fazer? Eles ganharem dinheiro e a gente perder? (FAUSTINO; FURTADO,
2015, p. 82)

O mercado de carbono, através de compra de créditos para compensar


emissões, gerou em todo mundo cerca 200 milhões de dólares em 2013, um aumento

1 The Climate Community & Biodiversity Aliance (CCBA) formado pelas ONGs Care,
Conservation International (CI), The Nature Conservay (TNC), Rainforest Alliance e Wildlife
Conservation Society desenvolve padrões para certificar e validar o cumprimento de
salvaguardas socioambientais em projetos de REDD e outros mecanismos (FAUSTINO,
FURTADO, 2015).
2 Verified Carbon Standard (VCS) criado em 2005 pelo Climate Group, International Emissions

Trading Association (IETA), pelo Fórum Econômico Mundial e pelo Conselho Empresarial
Mundial de Desenvolvimento Sustentável para criar normas de validação e certificação de
projetos de carbono (FAUSTINO, FURTADO, 2015).

25
de 17% comparado ao ano anterior. O valor acumulado desse mercado chegou a 1
bilhão de dólares. (GOLDSTEIN; GONZALEZ, 2014). Segundo a plataforma “Climate
Funds Update”, o Brasil é o país que mais recebe fundos destinados a projetos
relacionados ao clima, com cerca de 700 milhões de dólares em investimentos e
doações (CLIMATE FUNDS UPDATE, 2015).
Essa foi minha motivação inicial para estudar os conflitos territoriais no Acre,
especialmente os relacionados ao mercado de carbono. Minha intenção era ir para o
Acre e estudar detalhadamente conflitos relacionados a projetos de REDD de iniciativa
privada.
Mas, meu objetivo já começou a mudar, a partir do contato com uma liderança
histórica da luta do movimento seringueiro, Osmarino Amâncio Rodrigues, pois me dei
conta de que aqueles conflitos faziam parte de um processo mais complexo do que
imaginava. Aqui transcrevo trechos de entrevista que realizamos com Osmarino, eu e o
pesquisador Milson Bettancourt, no Rio de Janeiro em Maio de 2013, antes de eu ir para
o Acre:

(...) foi criado o SNUC, o Sistema Nacional de Unidades de Conservação, o SNUC


tirou o direito do seringueiro que a gente decidia na reserva, não podia ser elaborado
nada dentro das RESEX que não fosse com autorização de uma assembleia de base.
Então criaram a lei do SNUC, e ai a lei do SNUC chega e tira esse poder do seringueiro
decidir. Quem tem que decidir o que é pra ser feito dentro da reserva agora é um
conselho deliberativo criado pela iniciativa privada, pelas ONGs, pelo governo
estadual, federal, municipal, por empresário, né, essa, como a Natura, como tantas
outras ONGs que tão trabalhando essa nova proposta de economia verde, mas o
objetivo é o lucro imediato e a grande preocupação é com a exportação (...)
(informação verbal3)

Nesse trecho da entrevista Osmarino denuncia a perda de poder por parte dos
seringueiro na Reserva Extrativista Chico Mendes em parte relacionada a novas
determinações que surgiram com a Lei 9.985 de 2000, o Sistema Nacional de Unidades
de Conservação. As RESEX foram criadas a partir da luta e conquistas dos povos da
floresta, principalmente seringueiros, e tinha por objetivo garantir áreas protegidas e
geridas pelos mesmos, mas reconhecidas e de propriedade do estado. Antes o IBAMA,
órgão responsável à época, supervisionava as áreas extrativistas, mas com o SNUC, é
criado um conselho deliberativo da RESEX que passa a ser presidido pelo IBAMA
(posteriormente ICMBio) o que muda a função do órgão ambiental que passa a ser o

3Entrevista concedida por Osmarino Amâncio Rodrigues [mai. 2013] Entrevistadores: Diogo
Loibel Sandonato; Milson Bettancout. Rio de Janeiro, 2013.

26
principal gestor das RESEX (CUNHA; LOUREIRO, 2009). Devido a essas mudanças na
estrutura de poder nas RESEX, Osmarino coloca:

(...) agora chegou uma determinação para o seringueiro, para cada manejo que é feito,
para cada concessão de uma área de terra, que pode ser de 500 mil, 200 mil hectares,
50 mil hectares, as populações daquela área ali ficam sem direito de mexer em uma
palha. Nós já fomos determinados que nós não pode mais matar a nossa paca, que
antes a gente podia comer a nossa caça, nós podia pegar o nosso peixe, agora não
podemos mais, o ICMBio chegou agora na minha colocação lá no seringal e disse que
se eu quiser comer o mel de abelha eu tenho que criar abelha, e a abelha tá lá dentro
da floresta, eu sei onde tá o mel da abelha, agora eu tenho que plantar o açaí, o açaí
tá dentro da floresta. Então hoje virou tudo para o mercado. Aquilo ali virou uma
mercantilização só, os meios naturais, a reserva extrativista tá servindo para o
monopólio, pras indústrias, para ONGs ganhar dinheiro fácil e imediato. Isso está
sendo um impacto muito grande para nós, porque, começaram a expulsar as
comunidades dos seringueiros, lá na minha área agora foram expulsos 5 famílias, por
que estavam tirando madeira pra fazer uma casa. Eu to sendo processado por 60, 70
mil reais de multa, por que eu tava tirando umas estacas pra fazer um corredor, pra
fazer uma manga pra criar porco, sabe, pra cobrir minha casa, pra fazer minha casa,
é tábua pra fazer minha casa e agora eu não posso. Tudo que for fazer agora tem que
ter o manejo, e nós não temos consultoria, nós não somos técnicos, nós não temos
formação catedrática pra fazer a concessão, pra pedir a concessão e fazer o manejo
por que exige uma certa estrutura e nós não temos essa capacidade (...)

Nesse trecho fica explícito conflitos decorrentes dessa estrutura de poder e dos
novos projetos que estão chegando nos territórios, um processo de criminalização dos
moradores da RESEX e uma dimensão epistêmica desses conflitos relacionada ao
saber técnico-científico que tem sobreposto o saber de quem vive no território. Isso é
corroborado por outro trecho em que Osmarino coloca:

(...) criaram a lei do fogo zero, eu sempre usei o fogo pra queimar meu roçado de
subsistência, onde eu plantava o arroz, a macaxeira, o milho, aquilo pra gente comer
no dia a dia, e nós nunca incendiamos a floresta, por que a gente bota um roçadinho
pequeno, 100 x 100, e a gente não deixa o fogo entrar na floresta, a gente tem o maior
cuidado por que a gente vive da floresta, a gente não quer que incendeie o nosso
castanhal, nosso seringal, a gente não quer que mate a nossa caça, e se o fogo invadir
a floresta, então obviamente vai muitas espécies vai desaparecer, a gente tem, a
gente foi que cuidou dessa floresta, não esse pessoal que tão vindo agora ensinar pra
nós como é que tem que ser sustentável, a gente viveu, nascemos e se criamos lá, e
a floresta só tá em pé por que o movimento dos seringueiros se levantou contra a
pecuária, contra a mineração, contra as madeireiras, contra o latifúndio (...)

Em outro trecho, Osmarino expõe outros projetos que chegam na RESEX:

(...) nas reservas agora eles criaram a onda de açudagem, fazer açude, a Reserva
Chico Mendes já tem um estudo pra fazer mais de 200 açudes, só na RESEX Chico

27
Mendes, então vai ser muito açude, de cada barragem daquela que se cria num
pequeno açude, para a exportação, que é peixe, ao mesmo tempo eles estão
preparando essa cadeia produtiva, né, então nós não podemos mais pescar, né, eles
estão tirando o nosso direito, eu tenho que fazer o manejo, eu tenho que me, fazer um
curso pra fazer um açude, né, então, tudo aquilo que era orgânico, tá deixando de ser,
que agora eles chegaram lá dizendo que nós temos que trabalhar a castanha
orgânica, tudo que nós fizemos lá foi sempre orgânico, agora eles estão levando
roundup lá pra dentro, o roundup chega lá com toda a força né (...)

Osmarino mais um vez denuncia os conflitos decorrentes das imposições vinda


de fora na RESEX. Começa a me chamar muito a atenção a questão do manejo,
principalmente de madeira, que Osmarino novamente fala em outro trecho:

(...) agora no estado do Acre por exemplo, já tá chegando a quase 200 planos de
manejo madeireiro, tá sendo a maior destruição, o estado do Acre é o pioneiro, criou
a primeira lei do mercado de carbono, sabe, então quer dizer, é um investimento que
é... tá sendo contra a vida das populações tradicionais (...) o Estado garantiu essa
logística e pra fazer isso, o manejo, eles estão jogando a força nacional, a polícia
federal, o exército, é tudo pra ir de encontro com o que nós tanto defendíamos que
era uma reforma agrária sob controle dos trabalhadores (...) nós não temos que estar
preocupado com exportação, principalmente de matéria prima, você tá levando a
matéria prima, 1 metro de cubo de madeira, eles estão pagando lá, o mais caro é 40
reais, lá na Amazônia, e chega ali em Belém, você já vende esse metro cúbico por 2
mil dólar, então quer dizer, é um assalto que estão fazendo, né, e o valor é
insignificante, o seringueiro não ganha dinheiro, sabe, o índio não ganha dinheiro,
quem ganha dinheiro é a madeireira, é a ONG, é o empresário, sabe, nós estamos
sendo vendidos junto (...)

Segundo Osmarino, o estado do Acre garantiu as bases, a legislação para que


fossem realizados projetos que tem gerado conflitos na RESEX onde ele mora. A
relação do estado com a implementação de projetos relacionados a mecanismos de
mercado de carbono e outros era algo que ainda não tinha me atentado e isso ampliou
minha visão sobre esse debate.
Em outro trecho importante, Osmarino explicita:
(...) então, eles tão destruindo com o sonho de Chico Mendes, sabe, tão destruindo,
não destrói os ideais, mas o sonho de uma vida, hoje quando eu vejo, companheiros,
parentes do Chico Mendes entrando com o discurso de é importante você exportar e
fazer o manejo madeireiro, entra nesse discurso, ai é complicado (...)

A trajetória do movimento seringueiro e o atual uso do legado e imagem de Chico


Mendes também é fundamental para entender o que se passa no Acre e foi a partir
primeiro da fala de Osmarino que comecei a me atentar para isso.
A partir dessa entrevista, comecei a modificar os rumos de minha pesquisa e já
pensei em incluir entender melhor a dinâmica dos conflitos que atingem as Reservas

28
Extrativistas no Acre. Osmarino, em fortes colocações, fala do que viveu e vive dentro
da floresta, da luta histórica do movimento seringueiro e do atual estado da Reserva
Extrativista Chico Mendes, um símbolo da conquista do movimento. Fala dos conflitos
atuais que ele vive no Acre, denuncia a perda de poder por parte dos moradores na
tomada de decisão na Reserva, dos projetos que estão sendo implementados de cima
para baixo, com grande influência de ONGs ambientais. Isso me chamou muito a
atenção, numa área que é símbolo da conquista do movimento seringueiro, hoje os
próprios seringueiros que participaram dessa dura luta, estão sofrendo com a forma com
que a Reserva é gerida.
Chegando no Acre, outro fato central para definir os rumos da pesquisa foi o
contato com o Centro de Memórias das Lutas e Movimentos Sociais da Amazônia (CM
Amazônia). A partir do diálogo com essa organização comecei a compreender melhor a
conjuntura atual do Acre. Começou a ficar claro que tanto o que se passava em Manoel
Urbano, com o projeto Purus, como o que se passava na RESEX Chico Mendes, com
os projetos de manejo madeireiro e açudagem colocados por Osmarino, estava
relacionado a um sistema estadual de incentivos a serviços ambientais, o SISA, com
arquitetura complexa e com diversos atores, considerado “o sistema de serviços
ambientais mais avançado do mundo” (ANDERSON et. al., 2013).
Então comecei a estudar esse sistema, a lei estadual que o consolida, nº 2.308
de 2010, e publicações a respeito do mesmo (ACRE, 2010a, 2012, 2013a). Vi que é
uma estratégia estadual de captação e aplicação de recursos na implementação de
planos e programas do governo estadual que abrange o estado do Acre como um todo,
reservas extrativistas, terras indígenas, assentamentos, unidades de conservação,
propriedades particulares etc. Que integra os serviços ambientais com o
desenvolvimento de cadeias produtivas, como por exemplo, a cadeia da madeira, da
castanha, da borracha, do peixe e até a do gado. Que tem um complexo e diverso
conjunto de agentes que participam do planejamento e implementação desse sistema
no Acre.
Mas por que isso ocorre no Acre? Por que o Acre tem o sistema de serviços
ambientais considerado mais avançado do mundo? Como esse sistema funciona e o
dinheiro flui por ele? Como ele interage com áreas legalmente protegidas? Qual a
relação do dinheiro captado pelos mecanismos de serviços ambientais e o
desenvolvimento das cadeias produtivas? A partir desse momento formulei o que
pretendia pesquisar na dissertação: analisar as propostas e efeitos do planejamento,
regulamentação e execução de políticas e projetos relacionados ao capitalismo verde
no Acre, especialmente o SISA, e os potenciais conflitos territoriais gerados.

29
Para tal, como método de investigação, realizamos uma análise qualitativa com
base nos pressupostos conceituais de conflito de Porto-Gonçalves (2013) e produção
do espaço de Lefebvre (2006) entre outras ferramentas, que serão descritos e
desenvolvidos nessa dissertação, ao longo dos capítulos, principalmente no capítulo 1,
rapidamente introduzido na seção a seguir.
Geralmente esses conflitos no Acre estão associados à soberania territorial dos
povos e como esses projetos afetam a dinâmica de reprodução dos mesmos em seus
territórios. Analisamos diversas fontes de documentos, o discurso e a prática dos
principais agentes envolvidos na estabelecidas e a história dos conflitos com suas
negociações, alianças, acomodações e rupturas políticas.
Realizamos levantamento bibliográfico em fontes diversas como livros, artigos,
periódicos jornalísticos, publicações das organizações e órgãos alvos da pesquisa,
sítios com dados dos projetos, leis, decretos, acordos e, quando possível, bancos de
dados de parte dos atores envolvidos. Também realizamos entrevistas
semiestruturadas e acompanhamos de reuniões.

1. Principais Ferramentas

Em primeiro lugar, o ponto de partida é concreto, mundano, terreno: é o conflito,


a contradição em estado prático (PORTO-GONÇALVES, 2013). Famílias são impedidas
de reproduzir suas condições de vida, de usufruir dos bens naturais presentes em seu
território. Agora para usufruir desses bens, é preciso de um conhecimento técnico-
científico e recursos financeiros para formular planos de manejo, conseguir concessões,
obter assistência técnica. Acreditamos que a opção metodológica de privilegiar o
conflito, como centro da análise ajuda a entender a complexidade do que se passa no
Acre. Mas, não se trata de qualquer conflito, mas sim um conflito que envolve diferentes
territorialidades, formas de se apropriar do espaço, conflito territorial, portanto.
A complexidade dos conflitos territoriais demanda uma análise do espaço que
considere as relações de poder e conflitos que permeiam o social em cada situação
(LEFEBVRE, 2006). Para tal, utilizaremos a leitura de produção social do espaço de
Henri Lefebvre, que amplia e enriquece a análise dos conflitos territoriais trazendo a
dimensão do cotidiano e da experiência vivida, influência da fenomenologia, e a
dimensão da linguagem, do poder do discurso, provinda da linguística e semiótica
(SCHMID, 2012; LEFEBVRE, 2006).
A produção social do espaço presente em Lefebvre, possui três dimensões:
espaço percebido, concebido e vivido. Esse olhar de Lefebvre ajuda a orientar os

30
diferentes ângulos da complexidade dos conflitos territoriais no Acre com suas
dimensões da produção social do espaço, lembrando que elas não são separáveis.
Outro elemento fundamental é entender o atual momento do processo de
acumulação e crise do capital e as formas pelas quais ele se expande, produz novos
espaços. Para tal, com base em autores como Marx, Rosa Luxemburgo e outros mais
recentes como Harvey e Bartra, vamos relacionar a crise do capital com acumulação
primitiva/por espoliação e com os territórios ainda não completamente penetrados pelo
capital, caso por exemplo das terras indígenas e reservas extrativistas, como ocorre no
Acre, onde quase 50% da área do Estado é legalmente regulada como áreas protegidas
(ACRE, 2013b).
Para entender os conflitos territoriais no Acre, é preciso identificar em que escala
operam os principais agentes que estão definindo o que está sendo realizado lá e
através de que formas, quem planeja a produção do espaço (espaço concebido). Quem
define os mecanismos? Quem financia? Quais são as regras? Para tal, precisamos de
mais ferramentas. Milton Santos nos ajuda quando pensamos que o atual padrão de
acumulação capitalista, que ocorre no período técnico-científico-informacional que ora
vivemos, segue as diretrizes do que vem sendo chamado Neoliberalismo, enfim, um
sistema de normas que rege o espaço, o sistema de objetos e sistema de ações
(SANTOS, 2008). Podemos entender que os acordos internacionais, frutos de grandes
convenções e os mecanismos jurídicos e financeiros relacionados a economia verde,
como o SISA no Acre, são parte do Neoliberalismo Ambiental (PORTO-GONÇALVES,
2006; LEFF, 2008), um sistema de normas que é operado principalmente por agentes
que atuam em escala global (grandes ONGs ambientais, empresas, intuições
multilaterais) aliados a gestores e classes proprietárias à escala
nacional/regional/estadual/local e que são aplicadas em territórios como reservas
extrativistas e terras indígenas através do que Milton chama de verticalidades
(SANTOS, 2008).
Como podemos ver na entrevista de Osmarino, no Acre, o saber dos seringueiros
é desqualificado e sujeitos de fora, técnicos, biólogos, engenheiros é que passam a
definir como manejar a floresta, como cortar a madeira, como extrair o mel etc. Isso
demonstra uma relação de saber/poder em que apenas os que detêm recursos para
produzir um determinado conhecimento, técnico-científico, são legitimados, e que
passam a determinar o acesso a extração dos bens naturais dentro de “regras do jogo”
que definem como “racional”. A perspectiva da “gestão racional”, com base no saber
técnico-científico convencional, é fortemente etnocêntrica, marcado pela colonialidade
do saber e do poder (PORTO-GONÇALVES, 2006).

31
2. Campo ambiental e bloco hegemônico no Acre

Disputas no Campo Ambiental e como influenciam a conjuntura do Acre

Com esse conjunto de ferramentas elencados, no capítulo 2 veremos o contexto


presente no Acre que possibilitou que lá surgisse o SISA, antes de descrever sua
arquitetura e funcionamento com os programas e políticas que o estruturam.
Localizamos esse contexto no debate atual, no espaço e no tempo. No conflito, as
posições e interesses dos diferentes agentes envolvidos ficam mais explícitos (PORTO-
GONÇALVES, 2013), e com isso, fica claro que a questão ambiental não é consensual.
Na verdade, temos um campo (BOURDIEU, 1996, 2001) com diferentes forças sociais
que disputam, com graus diferentes de visibilidade e poder, as concepções do que seria
o problema e as soluções para o meio ambiente. Essa concepção de campo de
Bourdieu, nesse trabalho dialoga também com a produção social do espaço de
Lefebvre, principalmente pensando o espaço concebido, dimensão do discurso da
produção do espaço.
O campo ambiental (CARVALHO, 2001; COSTA, 2005), vem sendo conformado
desde a década de 60, e tem forças sociais relacionadas aos que questionam o
desenvolvimento e todas as suas implicações, relacionados a contracultura, e também
forças que deslocam o debate ambiental enquanto uma questão técnico-científica,
articulando os interesses do grande capital multinacional, como por exemplo o Clube de
Roma (PORTO-GONÇALVES, 2006). Para entender como se dão essas disputas no
interior do campo ambiental, outra reflexão pertinente é a de “confluência perversa”
(DAGNINO, 2004) que ajuda analisar porque, por exemplo, no Acre, o Banco
Interamericano de Desenvolvimento (BID) financia a criação de unidades de
conservação (SOUZA, 2009). Demandas e bandeiras de luta que antes eram do polo
crítico ao desenvolvimento, passam, em parte, a serem também de um banco
multilateral de desenvolvimento, o que demonstra a complexidade do campo. Ainda
dentro da dinâmica de disputa das forças dentro do campo ambiental, podemos pensar
na necessidade de legitimação do capital no seu novo momento de acumulação, e
portanto, a necessidade de um novo discurso que dialogue mais com as críticas, no
nosso caso, ambientais, ao seu desenvolvimento, um novo espírito do capitalismo
(BOLTANSKI; CHIAPELLO, 2009). Essas ferramentas de análise nos ajudam a
entender como se conformou a ideia de “desenvolvimento sustentável” e seu derivado
mais recente, “economia verde”.
Dedicaremos o segundo capítulo para desenvolver essa reflexão e sua influência
no Acre, onde o olhar do campo ambiental e as disputas no seu interior, nos ajudam

32
muito a entender os interesses e posições teórico-políticas envolvidos nos conflitos
territoriais. Ajuda a olhar de forma complexa a história do movimento seringueiro, suas
conquistas e seu atual momento.
Pensando nas disputas dentro do campo ambiental e o processo de confluência
perversa que tivemos, conseguimos entender melhor as posições e alianças atuais de
entidades históricas do movimento como o Conselho Nacional dos Seringueiros (CNS)
e Centro de Formação dos Trabalhadores da Amazônia (CTA). Entender a força
simbólica e o atual uso da imagem de Chico Mendes. Conseguir ir para além da
aparência do discurso ambiental difundido pelo conjunto de atores, que foram
conformando um amplo bloco durante as décadas de 80 e 90, e que atualmente
implementam os projetos de economia verde, e aprofundar a análise dos fatores que
levam a essa conjuntura atual e os conflitos territoriais decorrentes. Além disso nos
ajuda a compreender os distintos padrões de conflitividade que tínhamos a época das
grandes mobilizações do movimento seringueiro e o os atuais padrões derivados das
políticas ambientais aplicadas no Acre.

Confluência perversa no campo ambiental e conformação do bloco hegemônico


no Acre

Para entender como chegamos no SISA, um sistema de incentivos ambientais


complexo considerado o mais avançado do mundo, e porque ele foi desenvolvido no
Acre, vamos utilizar o arsenal de ferramentas já elencados no capítulo 1 e considerar
as disputas dentro do campo ambiental, desenvolvidas no capítulo 2, para analisar a
formulação desse sistema de normas. Aqui também estamos privilegiando o olhar do
espaço concebido.
Um primeiro fator é identificar que o SISA é fruto de um histórico de políticas
ambientais que podemos traçar desde o final da década de 80, das quais podemos
destacar o Zoneamento Ecológico-Econômico, a Política de Valorização do Ativo
Ambiental Florestal e Plano Estadual de Prevenção e Controle do Desmatamento do
Acre – (PPCD/AC), que fornecem as bases e diretrizes para a formulação e aplicação
do SISA (ACRE, 2013a). Essas políticas foram formuladas principalmente por um bloco
amplo e contraditório (elite local, grandes ONGs ambientais, partidos políticos, corpo
técnico de universidades, instituições multilaterais e parte do movimento seringueiro)
que foi se formando desde então e que ganhou mais poder no Acre em 1999, quando
passou a hegemonizar as ações do Estado. Utilizando a concepção de estado ampliado
e hegemonia de Gramsci (COUTINHO, 2011), analisamos como essa frente se formou

33
e como influiu na estruturação das políticas ambientais no Acre, que por fim
desembocou no SISA.
Também é importante entender a influência das instituições multilaterais e dos
grandes empréstimos internacionais e nacionais, feitos ao longo dos anos por essa
frente ampla que assumiu o poder do Estado. Empréstimos esses que influenciaram o
ordenamento territorial através da formulação do zoneamento ecológico-econômico do
estado, que a princípio foi uma condição que o BID impôs para liberar um dos
empréstimos (SOUZA, 2009). Também influenciaram na definição dos programas e
políticas estaduais que tem relação com o projeto da frente que hegemoniza o poder no
estado e com as políticas ambientais em curso. Dentre os agentes desse bloco de
poder, é importante destacar o papel das grandes ONGs ambientais, internacionais,
nacionais e regionais no processo de construção e manutenção da hegemonia e
também da formulação das políticas ambientais no Acre.

3. Sistema de Incentivos aos Serviços Ambientas do Acre

A partir dessa contextualização, partiremos para descrever a arquitetura do


SISA, um sistema jurisdicional monitorado institucionalmente, que criou estruturas,
como IMC (Instituto de Mudanças Climáticas) e CDSA (Companhia de Desenvolvimento
de Serviços Ambientais), e tem participação de diversas secretarias de estado (ACRE,
2010a), e muitos agentes envolvidos como já foi colocado. Veremos como ele foi
pensado para abarcar tanto as ações por dentro do Estado como também os projetos
privados de REDD, entre outros projetos relacionados aos serviços ambientas. Com a
descrição da estrutura do SISA, teremos mais elementos para entender parte das
estratégias refinadas de manutenção da hegemonia da frente no Acre, uma arquitetura
débil de participação popular na formulação e aplicação das políticas no Estado, através
de conselhos estaduais e construção de “salvaguardas socioambientais”.
Por fim veremos como se deu a negociação de uma doação condicionada do
banco alemão KfW, no chamado programa “REDD Early Movers” e como os recursos
provindos desse banco foram alocados.

4. Políticas ambientas e novo padrão de conflitividade

Com a análise da conjuntura acreana e a descrição das políticas e mecanismos


realizada, no capítulo 4, analisaremos os impactos e conflitos gerados a partir de dados
empíricos e os investimentos realizados, principalmente do programa do REM KfW, em

34
cada área ou cadeia produtiva. A partir dos primeiros recursos desse programa que
fluem pelo sistema, iremos entender o funcionamento do SISA, a sua relação com os
planos, políticas e programas estaduais e com o desenvolvimento das cadeias
produtivas do Estado.
O SISA tem um avançado aparato de monitoramento e fiscalização das reduções
de desmatamento que envolve diversas estruturas e iremos analisar esse que é um dos
principais objetivos declarados das políticas ambientais do Acre, reduzir o
desmatamento. Veremos também como o dinheiro que chega através dos mecanismos
de redução de emissões de carbono estão sendo aplicados na pecuária extensiva
beneficiando latifundiários. Outro elemento importante são os conflitos gerados por
políticas voltadas para agricultores familiares, seringueiros, ribeirinhos e indígenas,
relacionados com a repressão e proibição da reprodução das condições de vida. A ação
repressora do ICMBio, IBAMA entre outros na proibição do uso dos bens naturais e das
práticas culturais e históricas, como o uso do fogo, intensificou conflitos territoriais no
estado.
O estado do Acre elegeu algumas cadeias produtivas prioritárias. Isso se dá
através de modelos de integração dos diversos agentes das cadeias produtivas, como
por exemplo o modelo da “Parceria Público-privada-Comunitária” (PPPC), em que além
do Estado, através das políticas e programas, isenções fiscais e financiamentos, temos
a iniciativa privada, através, por exemplo, de fundos de investimentos privados (FIPs) e
a participação “comunitária”, através de cooperativas centrais e associações. Esse
modelo tem o exemplo mais claro, na cadeia do peixe, a qual Osmarino cita na entrevista
e iremos descrever melhor para exemplificar esse arranjo.
Nesse capítulo também daremos destaque para a cadeia da madeira,
principalmente ao abordar os planos de manejo comunitário que foram bem explicitados
por Osmarino em sua entrevista e que tem grande importância nos conflitos territoriais
no Acre. Também abordaremos as cadeias da borracha e castanha, importantes tanto
do ponto de vista econômico quando simbólico para os conflitos no Acre e a questão
dos povos indígenas que receberam investimentos. Analisaremos alguns índices sociais
que reforçam as contradições entre o discurso e realidade do que se passa no Acre.
Também abordaremos a repressão e criminalização dos que criticam e se opõe
ao que está sendo implementado no Acre, algo que explicita os conflitos que ocorrem
nesse estado. O bloco hegemônico, que se apropria da imagem de Chico Mendes para
legitimar suas ações, não aceita as críticas, inclusive de antigos companheiros de Chico
na luta seringueira.
Podemos observar um novo padrão de conflitividade para o Acre. Um clara
mudança de postura do antigo bloco no poder e o atual no que diz respeito a interação

35
com os movimentos sociais, associações e sindicatos. Isso é explicitado pela mudança
nas características dos conflitos territoriais. Passam de explícita violência dos
assassinatos e expulsões e da estratégia de maior enfrentamento dos movimentos
sociais e sindicatos para conflitos territoriais mais velados que atacam os modos de vida
nos territórios, mas, que ao mesmo tempo trazem políticas sociais e programas, que em
parte são negociadas pelos movimentos sociais, associações e sindicatos. Um
movimento conjunto de espoliação e cerceamento dos direitos das populações junto aos
seus territórios e uma integração dessas populações em cadeias produtivas através das
políticas e programas sociais do Estado.

36
CAPÍTULO 1. PRINCIPAIS FERRAMENTAS: O MARCO TEÓRICO-CONCEITUAL

Nesse capítulo, abordaremos as principais ferramentas conceituais e teórico-


metodológicas utilizadas nesse trabalho e como o estruturamos a partir delas. A busca
de coerência no trabalho é importante, mas não deve sufocar a criação, criatividade do
pesquisador na busca do método que melhor dialogue com seu objetivo. O
embasamento teórico-conceitual deve ser enxergado de forma pragmática como uma
“caixa de ferramentas” que pode auxiliar na pesquisa, e não algo que tenha finalidade
nele mesmo (CRUZ, 2010) ou que se defina a priori. Como nos diz Valter do Carmo:

(...) compreendemos o ato de fazer pesquisa como uma espécie de “artesanato


intelectual” que exige criação, esforço, repetição, paciência para que possa ser
construído e que não tem receitas prontas, formas e moldes acabados, é sempre uma
construção singular. O pesquisador como artesão intelectual, como qualquer
trabalhador, precisa de instrumentos, de ferramentas (teorias e conceitos) para
realizar sua ação, essas ferramentas podem ser adquiridas, emprestadas,
aperfeiçoadas, deformadas e até “roubadas” de outros autores, assim como podem
ser criadas, inventadas de acordo com os problemas e questões enfrentadas por cada
um na sua labuta de pesquisar. É preciso encontrar outro modo de lidar com as teorias
e os conceitos, de torná-los efetivamente uma “caixa de ferramentas” (CRUZ, 2010,
p.2).

Cabe também ressaltar que a escolha dessas ferramentas tem implicações


políticas, como todo método, por mais que a ciência positivista difunda a ideia de
neutralidade, a produção de conhecimento científico é atravessada por relações de
poder. A ciência pode se confundir com ideologia, quando a pesquisa buscando
coerência e coesão elimina as contradições da vida cotidiana e também da informação
e do saber (LEFEBVRE, 2006).
Portanto, a escolha das ferramentas e do caminho aqui proposto para esse
trabalho é uma opção teórico-política. Apesar das limitações de diversas naturezas, a
realização desse trabalho se inspirou em metodologias que fazem a disputa das
concepções de ciência e buscam romper com o positivismo. Dentre elas, a importante
contribuição de Orlando Fals Borda, que caminhou no sentido da construção de um
método de produção de conhecimento, de uma ciência, de caráter popular (BORDA,
1981), a IAP – Investigação Ação Participativa. Ele coloca que:

(...) podemos nos aproximar de um tipo de brecha metodológica se os pesquisadores


engajados seguirem os efeitos dinâmicos do rompimento da díade sujeito-objeto que
esta metodologia (pesquisa participante) exige como uma de suas características

37
básicas. São muito evidentes as potencialidades de se obter um novo conhecimento
sólido a partir do estabelecimento, na pesquisa de uma relação proveitosa sujeito-
sujeito, isto é, uma completa integração e participação dos que sofrem a experiência
da pesquisa (BORDA, 1981, p. 59).

Apesar de não utilizar especificamente um método de IAP no presente trabalho,


as reflexões de Fals Borda nos inspiram e influência a condução do mesmo.
Adotando a perspectiva da construção de um caminho para a pesquisa de forma
pragmática, em que o embasamento teórico-conceitual pode ser considerado uma
“caixa de ferramentas”, e também levando em consideração a tomada de uma posição
política, como colocado, agora podemos passar a desenvolver as principais
ferramentas, propriamente ditas.

1.1. Conflito

Como colocado na introdução, em primeiro lugar, partimos do conflito. Essa


escolha se dá por diversos fatores que fazem do conflito, uma ferramenta privilegiada
de análise. Ele é a expressão das mudanças em ato, é a contradição em estado prático
(PORTO-GONÇALVES, 2003; 2013). Pode ser enxergado como um conceito
analisador-revelador, evidenciando com nitidez as contradições sociais (LEFEBVRE
apud MARTINS, 2009). Como coloca Porto-Gonçalves:

Ele é a manifestação concreta dos antagonismos de grupos e classes e por meio dele
se evidencia a experiência concreta de construção de sujeitos sociais, onde se
configuram a construção de identidades coletivas, de motivações e interesses
compartilhados, estratégias de luta, assim como formas de organização e
manifestação (PORTO-GONÇALVES, 2013, p.2).

Partindo dessa perspectiva, estamos valorizando a experiência no entendimento


dos processos sociais, em parte inspirado em E.P. Thompson, para o qual, parte das
análises teóricas marxistas, influenciadas pelo funcional-estruturalismo, não levavam
em consideração a experiência como fator importante na conformação e ação dos
sujeitos. (THOMPSON, 1981). Para ele, pela experiência, os sujeitos, enquanto pessoas
experimentam suas situações e relações como necessidades, interesses e também
como antagonismos, lidam com essa experiência através de sua consciência e cultura
de maneira complexa, e em seguida agem sobre determinada situação. Não exclui a
importância das estruturas em que as experiências se dão, mas, segundo ele: “As
maneiras pelas quais qualquer geração viva, em qualquer “agora”, “manipula” a

38
experiência desafiam a previsão e fogem a qualquer definição estreita da determinação”
(THOMPSON, 1981, p. 189). Influenciado também por Thompson, o estudo de Eder
Sader sobre o processo de emergência de novos sujeitos na conjuntura política
brasileira na década de 80, também valoriza a experiência como fator chave (SADER,
1988). Segundo Sader, esse processo depende: “das experiências vividas e que ficaram
plasmadas em certas representações que aí emergiram e se tornaram formas de o
grupo se identificar, reconhecer seus objetivos, seus inimigos, o mundo que o envolve”
(SADER, 1988, p. 44).
Através do conflito, podemos analisar empiricamente as contradições sociais e
a identificar as classes em luta (PORTO-GONÇALVES, 2013), partindo novamente da
concepção de Thompson, que diz:

As classes acontecem à medida que os homens e mulheres vivem suas relações de


produção e experimentam suas situações determinantes, dentro do ‘conjunto de
relações’ com uma cultura e expectativas herdadas, e ao modelar essas experiências
em formas culturais (THOMPSON apud SADER, p. 44).

Essa experiência vivida está relacionada a outra característica importante do


conflito, é algo aberto, contraditório e historicamente indeterminado, ou seja, a
indeterminação não é abstrata, mas histórico-geograficamente condicionada (PORTO-
GONÇALVES, 2003; 2013). A experiência está inscrita “numa dialética aberta que se
faz por meio dos próprios conflitos onde os diferentes sujeitos implicados constroem,
nas próprias circunstâncias, seus possíveis históricos.” (PORTO-GONÇALVES, 2013,
p.2). Essa perspectiva dialoga também com a concepção dialética de Henri Lefebvre
para o qual a experiência vivida é de fundamental importância e que também traz
ferramentas que serão utilizadas nesse trabalho, principalmente sua concepção de
produção social do espaço, que desenvolverei posteriormente ainda nesse capítulo, me
atentando agora para sua formulação sobre a dialética.
A dialética de Lefebvre parte de Hegel, mas, assim como Marx, não aceita sua
base idealista. Para ele a contraditória natureza da vida é real e não imaginada.
(SCHMID, 2012). Além disso, segundo Schmid, “[...] ao sistematizar a filosofia, Hegel
para o fluxo do tempo, declara o processo do devir fechado, destruindo sua mais valiosa
abordagem” (SCHMID, 2012, p. 94). Para Lefebvre, a suprassunção da contradição não
significa chegar a sua verdade ou destino final, pois ela própria carrega um germe de
uma nova contradição. Para ele, suprassunção significa movimento histórico e denota
uma ação, uma atividade criativa, um devir que não pode ter uma completa definição
(SCHMID, 2012). Como coloca Schmid: “[...] entre as duas determinações, a negação e

39
a conservação, se encontra, de acordo com Lefebvre, o indefinido, a abertura: a
possibilidade de realizar, por meio de uma ação, o projeto” (SCHMID, 2012, p. 93). O
devir fechado de Hegel, aliado ao poder, domina a prática do homem tirando-o a
liberdade. Influenciado por Nietzsche, Lefebvre critica a força da abstração (pensar,
escrever, e da linguagem) e o poder prático (SCHMID, 2012). Também baseado em
Nietzsche, ele vê na arte, da vida cotidiana, a contraposição a abstração da linguagem,
a metamorfose do signo em poesia. Sua dialética é baseada, portanto, na prática social
de Marx e na arte de Nietzsche (SCHMID, 2012). Segundo ele, “Por este meio, a
racionalidade marxista se junta ao pensamento de Nietzsche na elucidação do devir”
(LEFEBVRE apud SCHMID, 2012, p. 95). Ele não quer interpretar ou produzir o devir,
mas analisá-lo. Descobrir ou reconhecer um sentido, um horizonte de possibilidades,
incertezas, probabilidades que permitam formular uma estratégia, sem a certeza de que
seu objetivo será atingido (SCHMID, 2012). Sua dialética “[...] liga três momentos, que
permanecem distintos entre si, sem reconciliá-los numa síntese – três momentos que
existem em interação, em conflito ou em aliança entre si” (LEFEBVRE apud SCHMID,
2012, p. 95). Podemos sintetizar o pensamento dialético de Lefebvre na contradição
entre pensamento e ação social, suplementada pelo ato criativo e poético (SCHMID,
2012).
Essa concepção do conflito, valorizando a experiência vivida, em que podemos
identificar os sujeitos e seus interesses em contradição e movimento, através dessa
dialética aberta tem que ser somada a outra característica fundamental do conflito: ele
é parte das relações sociais e de poder (PORTO-GONÇALVES, 2013). Como colocado
por Tramontani:

As mudanças que transcorrem nas relações sociais e de poder têm nos conflitos
sociais sua expressão privilegiada e, por meio deles, novas (co)relações de forças se
instauram configurando novos padrões de conflitividade no contexto de uma dada
formação social (TRAMONTANI, 2003, p. 5).

Por fim, e talvez o mais importante, é que o conflito é situado, localizado, ocorre
em lugar determinado no espaço. Ele está aberto às condições do lugar e do tempo em
que ocorre e estabelece uma relação de imanência sociedade-espaço (PORTO-
GONÇALVES, 2013). O conflito possui geograficidade, ou seja, está inscrito na terra, é
movido por uma espacialidade ou territorialidade (PORTO-GONÇALVES, 2013).

1.2. Produção do Espaço

40
Aqui é importante definirmos o que entendemos por espaço geográfico. Iremos
adotar a visão de que o espaço é a expressão de uma dimensão da sociedade, em
sentido amplo (HAESBAERT, 2012). A sociedade ao constituir-se, constitui o seu
espaço, o qual é condicionante e condicionado por ela (SANTOS, 2008). Ele é material
e simbólico e como nos diz Porto-Gonçalves:

A materialidade do espaço geográfico é, sempre, sign-ificada, de-sign-ada, posto que


é, sempre, apropriada, até mesmo pela palavra. Os homens só se apropriam do que
faz sentido para suas vidas e esse sentido é, sempre, criação social, e não das coisas
em si e por si mesmas. Afinal, dar nomes próprios já é se apropriar e, assim, partilhar
em comum um espaço de existência, um espaço de significações, uma comunidade
de destino. O que se oferece à apropriação – o espaço-que-aí-está - implica que haja
uma ação no sentido de se apropriar dele que, por sua vez, depende da correlação
de forças entre os agentes. (PORTO-GONÇALVES, 2003, p.3)

Também para Milton Santos, o espaço geográfico é um híbrido indissociável do


físico e mental, uma união de sistema de objetos e sistema de ações. Para ele não
existem significações independentes de objetos (SANTOS, 2008). Ele coloca que: “Os
sistemas de objetos, o espaço-materialidade, formam configurações territoriais, onde a
ação dos sujeitos, ação racional ou não, vem instalar-se para criar um espaço”
(SANTOS, 2008, p. 294).
Segundo a teoria de Henri Lefebvre, o espaço é socialmente produzido e não
pode ser concebido como passivo apenas, enquanto produto, ele interage ou retroage,
intervém na própria produção (LEFEBVRE, 2006). Para ele, são centrais os seres
humanos em sua corporeidade e sensualidade, sua sensibilidade e imaginação, seus
pensamentos e ideologias (SCHMID, 2012), e isso dialoga com nossa perspectiva de
conflito que valoriza a experiência. A produção do espaço têm três momentos que
dialogam entre si através de sua concepção dialética que já colocamos. Como coloca
Schmid:

(...) A prática social material tomada como ponto de partida da vida e da análise
constitui o primeiro momento. Ela permanece em contradição com o segundo
momento: conhecimento, linguagem e palavra escrita, compreendidos por Lefebvre
como abstração, como poder concreto e como compulsão ou constrangimento. O
terceiro momento envolve poesia e desejo como formas de transcendência que
ajudam o devir a prevalecer sobre a morte. Lefebvre, porém, não para nessa
suprassunção em transcendência e poesia. Desta maneira, uma figura dialética
tridimensional emerge em que os três momentos são dialeticamente interconectados:
prática social material (Marx); linguagem e pensamento (Hegel); e o ato criativo,
poético (Nietzsche) (SCHMID, 2012, p. 95).

41
Para Lefebvre o espaço e o tempo são relacionais e fundamentalmente históricos
(SCHMID, 2012). Sua teoria da produção social do espaço busca sintetizar e relacionar
campos que geralmente são distanciados: o espaço físico, o mental e o social (FILHO,
2013). Ele reconstitui um processo complexo de descoberta, produção e criação que
ocorre de forma simultânea (LEFEBVRE, 2006).
Segundo Schmid: “O núcleo da teoria da produção do espaço identifica três
momentos da produção: primeiro, a produção material; segundo, a produção de
conhecimento; e, terceiro, a produção de significados” (SCHMID, 2012, p. 104).
Com base em SCHMID (2012), FILHO (2013), HAESBAERT (2009) e o próprio
LEFEBVRE (2006), podemos dizer que partindo dessa correspondência linguística e
dessa dialética triádica, a produção do espaço está associada a três dimensões ou
momentos:
1. A prática espacial: dimensão material da prática social, em que se destaca a
simultaneidade das atividades. Corresponde, na teoria da linguagem, a dimensão
sintagmática, o sistema de articulações e conexões de elementos. Está associada aos
processos e relações de produção e reprodução e troca, em uma relativa coesão
associada aos membros de uma determinada sociedade com o seu espaço. Redes de
interações ou atividades interligadas que residem em uma base determinada. Tem
relação também, com a realidade cotidiana e com competência e performance.
2. A representação do espaço: dimensão relacionada aos signos, códigos, geram uma
imagem, um discurso e também conformam o espaço. Corresponde, na teoria da
linguagem, a dimensão paradigmática, representações com algumas similaridades
podem ser substituídas. Ligado ao espaço instrumental, dos cientistas e planejadores.
Relacionado ao saber em transformação, está associada às descrições, definições,
teorias, disciplinas (principalmente arquitetura, planejamento e ciências sociais), mapas
e plantas. Um esquema organizador ou quadro de referência para comunicação e co-
determinador das atividades. Até certo ponto, tendem para um sistema de signos
verbais, elaborados intelectualmente.
3. O espaço de representação: dimensão simbólica, considerada o inverso da
representação do espaço. Corresponde, na teoria da linguagem, ao processo de
significação que tem relação com um símbolo (material). Está associado a arte, o
imaginário e é fluído e dinamizado, situacional e relacional, ligado ao lado “oculto”,
subterrâneo da vida social, um simbolismo espacial. Assim como a representação do
espaço, com alguns limites, o espaço de representação tende para um sistema, mais
ou menos coerente de símbolos e de signos não verbais.

42
Outro elemento presente no materialismo considerado heterodoxo de Henri
Lefebvre é a sua influência fenomenológica. Ele relaciona as três dimensões da
produção do espaço com a fenomenologia, a relação dos corpos dos sujeitos com o
espaço, contemplando tanto a auto-produção do homem (análise individual) como a
auto-produção da sociedade (análise social) simultaneamente (SCHMID, 2012).
Partindo do enfoque fenomenológico, segundo Schmid (2012), Harvey (2013) e o
próprio Lefebvre (2006), temos a seguinte tríade:
1. Espaço percebido: relacionado ao que pode ser apreendido por meio dos sentidos
(visão, audição, tato, paladar, olfato), a tudo que é percebido e sentido por sua dimensão
material. Segundo Lefebvre: “A base prática da percepção do mundo exterior.”
(LEFEBVRE, 2006, p. 36).
2. Espaço concebido: relacionado ao ato de pensamento, produção de conhecimento e
abstração.
3. Espaço vivido: relacionado ao mundo como ele é experimentado pelos homens no
cotidiano, segundo Harvey citando Lefebvre: “(...) das sensações, imaginações,
emoções e significados incorporados no modo como vivemos o dia a dia.” (LEFEBVRE
apud HARVEY, 2013, p. 19). Aqui temos o indizível, o que não é possível de se esgotar
por análises, algo que só pode ser expresso por meio da arte.
Também é interessante destacar que Lefebvre diferencia períodos, em que a
relação entre os três momentos da produção do espaço tem pesos diferentes. Por
exemplo, como coloca Haesbaert:

Ele contrapõe espaço absoluto a espaço abstrato, numa leitura muito própria de
“espaço absoluto”. Assim, absoluto é o espaço que conjuga todas aquelas dimensões,
sem separá-las, e sob o domínio do espaço vivido, com profundo valor simbólico,
como predominava aproximadamente até o Império Romano. Já no espaço abstrato,
dominante no mundo moderno-capitalista, aquelas dimensões se separam, sob
domínio do funcional ou do instrumental, ou seja, das práticas espaciais, do espaço
concebido. (HAESBAERT, 2009, p. 103)

Portanto, segundo Lefebvre, o espaço social é produzido por três dimensões,


processos ou momentos dialeticamente (com base em sua proposta original de
dialética) interconectados e duplamente designados: uma abordagem linguística ou
semiótica que aponta para tríade prática espacial, representações do espaço e espaços
de representação e uma tríade baseada numa abordagem fenomenológica que se refere
ao espaço percebido, concebido e vivido (SCHMID, 2012).
A teoria da produção do espaço de Lefebvre, dialogando com outras matrizes
teórico-conceituais ajudam a enriquecer nossa análise dos conflitos pois contempla a

43
dimensão do cotidiano e da experiência vivida, influência da fenomenologia, e a
dimensão da linguagem, do poder do discurso, provinda da linguística e semiótica. O
espaço é político e estratégico, não pode ser dissociado da ideologia e política (FILHO,
2013). Isso demanda uma análise do espaço que considere as relações de poder e
conflitos que permeiam o social em cada situação (SCHMID, 2012).
Assim, a relação da expressão das relações de poder, que o conflito proporciona,
com sua localização no espaço, sua geograficidade, nos possibilita entender como o
poder se manifesta no espaço. Segundo Porto-Gonçalves: “a análise da espacialidade
dos processos sociais é a análise das relações de poder, dos conflitos, das tensões e
das forças criativas dos ‘homens e mulheres de carne e osso’ (Thompson, 1983)”
(PORTO-GONÇALVES, 2003, p.12).

1.3. Território

Para realizar essa análise, a ferramenta que mais nos ajuda é o conceito de
território, entendido como interação relacional entre diferentes dimensões das relações
de poder espacializadas (espaço dominado e/ou apropriado), sejam elas políticas,
simbólicas, econômicas e jurídico-políticas (HAESBAERT, 2007; 2012). Essa interação
relacional pode ser vista como complexo de forças, complexo de interesses, de
necessidades, desejos (PORTO-GONÇALVES, 2013, p.1).
As relações de poder espacializadas, segundo Lefebvre, podem se dar pela
dominação, um espaço natural transformado por uma técnica e uma prática, e
apropriação no qual, um espaço natural é modificado para servir as necessidades e as
possibilidades de um grupo (LEFEBVRE, 2006). Para Lefebvre, existe uma tensão
permanente entre a livre apropriação do espaço e o domínio do espaço por meio da
propriedade privada, do Estado e outras formas de poder (HARVEY, 2012a). Como
coloca Lefebvre:

O dominado e o apropriado podem ir juntos. Eles deveriam; mas a história (a da


acumulação) é também a história de sua separação, de sua contradição. O dominante
o conduz [o arrasta/prevalece]. Inicialmente houve apropriação sem dominação: a
choupana, o iglu, a casa camponesa etc. A dominação aumenta com o papel das
forças armadas, da guerra, do Estado e do poder político. A oposição “dominado-
apropriado” não se limita ao discurso; não se trata de uma simples oposição
significativa. Ela dá nascimento a uma contradição, a um movimento conflitual, que se
desenvolve até a vitória opressiva de um dos termos: a dominação até a redução
extrema de outro termo: a apropriação. Sem que esta última possa desaparecer. Ao
contrário: a prática e a teoria proclamam sua importância, reclamando a restituição.
(LEFEBVRE, 2006, pp. 60-61)

44
Podemos dizer que o território se define por relações de poder espacializadas
mais concreto-funcionais, de dominação, em conjugação com relações mais simbólico-
identitárias, de apropriação (HAESBAERT, 2009). Segundo Porto-Gonçalves, “o
território é constituído pela sociedade no próprio processo em que tece o conjunto das
suas relações sociais e de poder“ (PORTO-GONÇALVES, 2003, p.4) e sua construção
adquire diversas feições dependendo da espacialidade a qual está vinculada
prioritariamente, em suas múltiplas dimensões, mas nunca podem ser puramente
funcionais nem puramente simbólicos. Ele é definido pelas relações sociais e contexto
histórico em que os sujeitos, elementos-chave responsáveis, estão inseridos
(HAESBAERT, 2009). Aqui, como coloca Porto-Gonçalves, “é preciso considerar,
sempre, a tríade - Território, Territorialidade e Territorialização. Um mesmo espaço
apropriado e constituído por uma determinada sociedade contém, sempre,
territorialidades distintas” (PORTO-GONÇALVES, 2003, p.4). A territorialidade é um
componente do poder que cria e mantém o contexto geográfico pelo qual
experimentamos o mundo e o dotamos de significado (HAESBAERT, 2009), tem relação
com as relações de poder espacializadas. Como coloca Haesbaert:

Embora todo território tenha uma territorialidade (tanto no sentido abstrato de


‘qualidade ou condição de ser território’ quanto no de sua dimensão real-simbólica),
nem toda territorialidade – ou, se quisermos, também, aqui, espacialidade – possui
um território (no sentido de sua efetiva realização material). (HAESBAERT, 2009, p.
106)

Um grupo social, classe ou instituição, com sua territorialidade, se territorializa


por um processo no qual cria mediações espaciais que proporcionam efetivar o poder
(que é sempre multiescalar e multidimensional, material e imaterial, de dominação e
apropriação ao mesmo tempo) sobre as condições de reprodução enquanto grupos
sociais, (HAESBAERT, 2012), dependendo da correlação de forças. Como Haesbaert
coloca:

(...) a territorialização é desigualmente distribuída entre seus sujeitos e/ou classes


sociais e, como tal, haverá sempre, lado a lado, ganhadores e perdedores,
controladores e controlados, territorializados que desterritorializam por uma
reterritorialização sob seu comando e desterritorializados em busca de uma outra
reterritorialização, de resistência e, portanto, distinta daquela imposta pelos seus
desterritorializadores. (HAESBAERT, 2012, p. 259)

45
Entender as diferentes relações de poder espacializadas numa correlação de
forças que gera ou têm relação com conflitos é o ponto chave para nós. O território,
segundo Tramontani “nos permite entender a concretização das relações sociais e de
poder sob o espaço.” (TRAMONTANI, 2003, p.8). Ele coloca em foco, no interior da
dimensão espacial, as problemáticas de caráter político, que envolvem como se
manifestam ou se realizam as relações de poder, em suas múltiplas esferas
(HAESBAERT, 2009). Portanto, conjugando essa concepção de território com o conflito,
temos uma potente maneira de analisar os processos sociais, através dos conflitos
territoriais.

1.4. Produção dos espaços capitalistas: acumulação e crise do capital

Como estamos falando de relações de poder espacializadas, dependendo de


correlação de forças, e a relação com a produção do espaço e conformação de
territórios, precisamos agora analisar qual a forma hegemônica de produção do espaço
contemporâneo: a produção capitalista do espaço (LEFEBVRE, 2006; HARVEY, 2006).
Para nós, o desenvolvimento do capitalismo, seu processo de acumulação e
crise, será analisado na perspectiva espacial, como indicamos, da produção social do
espaço na perceptiva que nos oferecem Lefebvre, Harvey, Porto-Gonçalves e
Haesbaert. No processo de acumulação capitalista, sua reprodução ampliada (MARX,
2013), temos uma dimensão espacial em que novos espaços capitalistas são
produzidos (LEFEBVRE, 2006; HARVEY, 2006). E essa expansão espacial é vital para
o capital devido sua necessidade de além de produzir o mais-valor, ter que realizá-lo.
Como Marx coloca: “Não são idênticas as condições da exploração imediata e as da
realização dessa exploração. Diferem no tempo e no espaço e ainda em sua natureza”
(MARX, 1981, p. 281). E isso não é completamente possível pelos espaços capitalistas
já produzidos (MARX, 1981; LUXEMBURGO, 1984).
Isso ocorre, por que a dinâmica de acumulação do capital possui contradições
internas que não se resolvem internamente (MARX, 1981; LUXEMBURGO, 1984;
HARVEY, 2006; 2012b; 2012c). Em sua dinâmica de acumulação, existe uma tendência
ao desenvolvimento das forças produtivas, aumento da produtividade que não consegue
ser acompanhado pela taxa de extração de mais-valor do trabalho na mesma proporção,
o que tende a gerar uma queda da taxa de lucro (MARX, 1981). Além disso, e em parte
decorrência disso, ocorrem processos de superacumulação de capital e de
superpopulação que não consegue ser empregada (que influencia a dinâmica do preço
dos salários) que fazem com que o capital tenha dificuldade de realizar o mais-valor

46
(MARX, 1981; LUXEMBURGO, 1984; HARVEY, 2006; 2012b; 2012c). Como Marx
coloca:

Demais, se o motor da produção capitalista (cuja finalidade única é a valorização do


capital) é a taxa de valorização do capital todo, a taxa de lucro, a diminuição dela
retarda a formação de novos capitais independentes e se patenteia ameaçadora ao
desenvolvimento do processo capitalista de produção, pois contribui para a
superpopulação, especulação, crises, capital supérfluo ao lado de população
supérflua (MARX, 1981, p. 278)

Devido a essa dinâmica da acumulação capitalista, que é movida pela


necessidade de constantes revoluções tecnologias nos métodos de produção, pela
depreciação de parte do capital em funcionamento decorrente disso, pela luta geral da
concorrência para os capitalistas individuais não serem engolidos pelo processo de
centralização temos, como Marx coloca:

O mercado tem por isso de ser constantemente ampliado, e desse modo suas
conexões e as condições que as regulam assumem cada vez mais a configuração de
lei natural independente dos produtores e se tornam cada vez mais incontroláveis.
Essa contradição interna busca um equilíbrio, aumentando o campo externo da
produção. A produtividade, quanto mais se desenvolve, tanto mais conflita com a base
estreita em que repousam as relações de consumo. Ajusta-se perfeitamente a esse
sistema contraditório a circunstância de o excesso de capital estar aliado ao excesso
de população, pois, embora a combinação dos dois aumente a massa de mais-valia
produzida, esse aumento aguçaria a contradição entre as condições em que se produz
essa mais-valia e as condições em que ela se realiza. (MARX, 1981, pp. 281-282)

Cada vez mais as condições de realização de mais-valor entram em contradição


com a renovação do capital total (LUXEMBURGO, 1984). Para resolver as contradições
internas que se manifestam nas crises, o capital precisa de novos espaços. Rosa
Luxemburgo nos diz:

Em sua ânsia de apropriação das forças produtivas com vistas à exploração, o capital
esquadrinha o mundo inteiro, procura obter meios de produção em qualquer lugar e
os tira ou os adquire de todas as culturas dos mais diversos níveis, bem como de
qualquer forma social. A questão dos elementos materiais da acumulação do capital
está longe de encontrar-se resolvida pela forma material da mais-valia de cunho
capitalista; (...) Para o emprego produtivo da mais-valia realizada é necessário que o
capital disponha cada vez mais do globo terrestre todo a fim de ter uma oferta
qualitativa e quantitativa ilimitada no condizente aos respectivos meios de produção.
(LUXEMBURGO, 1984, pp.23-24)

47
O capital precisa de espaços ainda não penetrados por suas relações para
conseguir realizar a mais-valia, espaços que ele consegue exercer grande influência
nas forças produtivas materiais e humanas a fim de suprir suas demandas tanto de
matérias-primas, como de mercados para seus produtos (LUXEMBURGO, 1984). Além
disso, existe a questão da constante necessidade de ampliação da força de trabalho,
como Rosa Luxemburgo fala:

O exército industrial de reserva não pode constituir-se a partir do crescimento


vegetativo do proletariado assalariado capitalista. Ele tem de possuir outros
reservatórios sociais, de onde lhe aflua força de trabalho, a força de trabalho que não
se encontrava, até então, sob o comando do capital e que, segundo as necessidades
deste, é acrescentada ao proletariado assalariado (LUXEMBURGO, 1984, p. 26).

1.5. Acumulação primitiva/por espoliação

Essa relação entre o capital e espaços não capitalistas é reconhecida por Marx
através do processo de acumulação primitiva (MARX, 2013). Mas, para ele, esse
processo foi/é principalmente uma condição histórica para o desenvolvimento do
capitalismo, a necessária separação da força de trabalho dos seus meios de produção
e formação dos primeiros capitais para que as relações de produção capitalistas se
desenvolvessem (MARX, 2013). Segundo ele:

A relação capitalista pressupõe a separação entre os trabalhadores e a propriedade


das condições da realização de seu trabalho, processo que, por um lado, transforma
em capital os meios sociais de subsistência e de produção e por outro, converte os
produtores diretos em trabalhadores assalariados (MARX, 2013, p. 786).

Ele aborda as distintas formas em que esse processo ocorreu, dentre elas o
roubo dos bens da igreja, alienação de domínios estatais, furto da propriedade comunal,
transformação da propriedade feudal e clânica em propriedade privada, destruição do
vínculo entre agricultura e a indústria doméstica rural, espoliação de bens da América,
guerras comerciais e dívidas públicas, (MARX, 2013). Mas Marx já aponta um caminho
que parcialmente contradiz sua condição apenas enquanto gênese do capital, quando
diz:

Essa dissociação entre condições de trabalho e produtores, que constitui o conceito


de capital, inaugura-se com a acumulação primitiva (livro primeiro, capítulo 24) depois
aparece como processo ininterrupto na acumulação e concentração de capital e agora

48
finalmente se expressa pela centralização em poucas mãos de capitais já existentes
e pela descapitalização (a nova forma de expropriação) de grande número de
capitalistas (MARX, 1981, p. 283)

A necessidade da acumulação primitiva, não é só histórica, mas estrutural, para


o capital (LUXEMBURGO, 1984, OLIVEIRA, 2013, HARVEY, 2006; 2012b; 2012c;
MATINS, 2009; BARTRA; 2013) devido a suas contradições internas que geram crises,
como exposto acima e que só acham solução em espaços não capitalistas. Rosa
Luxemburgo, quando fala da luta do capital contra a economia natural e camponesa,
explicita isso (LUXEMBURGO, 1984). Ela sintetiza os objetivos do capital como:

1) Extrair principais fontes das forças produtivas: terra, caça, florestas virgens,
minérios, pedras preciosas e metais, produtos exóticos como a borracha etc.;
2) “Liberar” força de trabalho e submetê-la ao capital, para o trabalho;
3) Introduzir a economia mercantil;
4) Separar a agricultura do artesanato; (LUXEMBURGO, 1984, p.32)

Essa necessidade estrutural da acumulação primitiva também é abordada por


Francisco de Oliveira, quando ele estuda o desenvolvimento da industrialização no
Brasil pós década de 30 e a relação entre agricultura e indústria nesse processo
(OLIVEIRA, 2013). Ele defende a tese que o “subdesenvolvimento” da maioria dos
países da América Latina é produto da expansão do capitalismo, criados como reserva
de acumulação primitiva do sistema global, na linha da teoria de desenvolvimento
desigual e combinado proposta por Trotsky (OLIVEIRA, 2013). Quando vai abordar o
complexo de soluções que o capital encontra para que no Brasil passemos de uma
economia de base agroexportadora para urbano-industrial, com a acumulação primitiva,
principalmente nesse caso, da agricultura, que cumpre um papel vital fornecendo os
contingentes de força de trabalho e fornecendo os alimentos baratos ele coloca:

(...) a acumulação primitiva não se dá apenas na gênese do capitalismo: em certas


condições específicas, principalmente quando esse capitalismo cresce por elaboração
de periferia, a acumulação primitiva é estrutural e não apenas genética. (OLIVEIRA,
2013, p. 43)

Outro autor que reafirma essa questão é José de Souza Martins ao abordar a
escravidão moderna e o desenvolvimento capitalista. Analisando os investimentos
capitalistas em agropecuária, principalmente na Amazônia, ele reforça que relações
arcaicas, como a escravidão, ocorrem simultaneamente ao capitalismo considerado
desenvolvido (MARTINS, 2009). Para ele, a expansão territorial do capital nessa

49
situação se deve, por um lado a grandes incentivos e subsídios dados pelo governo, e
por outro, do uso de mão-de-obra que não está submetida as relações capitalistas,
principalmente na produção do empreendimento, formação das fazendas de gado.
(MARTINS, 2009). O capital não só dissolve relações sociais que dificultam sua
reprodução ampliada, como também se apropria e recria, em certas situações, relações
não capitalistas, como a escravidão (MARTINS, 2009). Aqui ele vê a importância do
processo de acumulação primitiva, e coloca:

(...) o trabalho escravo tem sido utilizado sobretudo fora do processo de trabalho
propriamente dito, isto é, fora do processo normal e permanente de produção
propriamente capitalista. Nesse sentido, é uso de trabalho em tarefas próprias de uma
situação de acumulação primitiva. Conceito que, aliás, ganha melhor definição se,
além de considerarmos a expropriação que força a entrada do trabalhador no mercado
de trabalho, considerarmos, também que esse momento de expropriação dos meios
de vida se prolonga na superexploração da força de trabalho. (...) Quando se pensa
na acumulação primitiva como processo e não como rótulo, pode-se entender que é
processo que pode ter, e tem, ritmo mais ou menos lento. Por isso, além de ser um
requisito histórico da acumulação capitalista (e não necessariamente um requisito
simultâneo dessa acumulação em todos os ramos e momentos da produção), a
acumulação primitiva pode se mesclar e se confundir com a reprodução do capital
(MARTINS, 2009, pp. 81-82).

1.6. Atualidade e importância da acumulação por espoliação para o capital

Essas leituras sobre o processo de acumulação capitalista de Rosa Luxemburgo,


Francisco de Oliveira e José de Souza Martins também podem dialogar com David
Harvey, que nos ajuda a entender o processo na sua dimensão geográfica.
Harvey afirma que dentro da perspectiva de acumulação capitalista, a crise de
aplicação de excedentes de capital e de trabalho gera uma sobreacumulação. Ela pode
ser caracterizada por apresentar capacidade produtiva ociosa, excesso de mercadorias
e de estoques, excedente de capital-dinheiro e grande desemprego. Sua superação
exige uma reestruturação no desenvolvimento geograficamente desigual (um novo
ordenamento espaço-temporal) do capitalismo, explicitado em crises econômicas
globais (HARVEY, 2006, 2012a, 2012b, 2012c). Na fase atual do capitalismo em que
tantos ajustes foram/são propostos chamaríamos de “ajuste espacial”. Ainda segundo
Harvey (2012a, 2012b), essa reestruturação pode se dar por meio da absorção da
sobreacumulação através de deslocamentos temporais, por investimentos em projetos
de capital de longo prazo ou gastos sociais, que fazem com que ocorra um adiamento
da reentrada do capital em circulação ou pela aceleração do tempo de giro fazendo com

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que parte da capacidade excedente anterior seja absorvida. Também pode se dar por
deslocamentos espaciais que produzem novos espaços e liberam ou produzem novos
ativos para absorção de excedentes de capital: criação de novos mercados, nova
divisão territorial do trabalho, acesso a novos recursos, novas capacidades produtivas,
novas regiões como espaços dinâmicos de acumulação do capital e expansão de
relações sociais e arranjos institucionais capitalistas em formações sociais preexistentes
(como regras de contrato e formas de gerenciamento de propriedade privada). Por fim,
por uma combinação das duas formas anteriores de deslocamentos, produzindo
deslocamento tempo-espaciais.
Tivemos um grande processo de reestruturação da acumulação do capital, em
parte gerada pelo problema da sobreacumulação, no início da década de 70, que
segundo Harvey (2012a), foi uma transição de um período de acumulação capitalista
fordista para um período de acumulação capitalista flexível. Esse novo período envolve
um confronto com a rigidez do fordismo, estimula a flexibilidade dos processos de
trabalho, mercados de trabalho, dos produtos e padrões de consumo. Está associado
por rápidas mudanças nos padrões do desenvolvimento desigual. Também se
caracteriza pelo surgimento de novos setores produtivos e mercados, e inovações no
setor financeiro, tecnológicas e organizacionais. As economias de escala,
características do período fordista, são substituídas por economias de escopo, produção
variada de bens e preços baixos em pequenos lotes, que atendem a uma gama bem
mais ampla de necessidades do mercado, cada vez mais fluídas. O novo período é
marcado por deslocamentos espaciais e temporais que geraram um fenômeno de
“compressão do espaço-tempo”, em que os processos de tomada de decisão são
muitos mais rápidos e quase que imediatamente são difundidos de forma cada vez mais
ampla (HARVEY, 2012a).
Essas mudanças também foram acompanhas por reformulações nas normas e
regras que regulavam o sistema de acumulação, o que configurou o que mais tarde foi
chamado de neoliberalismo, caracterizado pelas práticas político-econômicas de
fortalecimento dos direitos individuais a propriedade privada; das instituições de
mercado e de livre comércio; das privatizações e desregulações (como a quebra
unilateral pelos EEUU do acordo de Bretton Woods) combinadas com a intensificação
da competição; da livre mobilidade de capital entre setores, regiões e países; da
precarização das relações de trabalho e repressão das organizações de trabalhadores
(HARVEY, 2008).
A partir dessa transição, se tornou cada vez mais acentuada a acumulação
primitiva ou por espoliação ou despossessão (HARVEY 2012a, 2012b, BARTRA, 2013),
processos de mercantilização e privatização que integram novas partes do mundo ao

51
capitalismo e que geram expulsão de populações camponesas, convertem formas
diversas de direito de propriedade em direitos exclusivos de propriedade privada,
mercantilizam formas de trabalho e suprimem formas alternativas de produção,
envolvem a apropriação e cooptação de realizações culturais e sociais preexistentes,
mercantilizam formas culturais, históricas e da criatividade intelectual e geram
apropriação de bens naturais (considerados ativos produtivos) como a água, terra, as
florestas, o ar.
Para Armando Bartra, que prefere o termo acumulação primaria, é importante
relacionar a espoliação dos bens comuns com a valorização do que foi expropriado
através da exploração do trabalho, ou seja, articular essa acumulação primária ao
processo de reprodução ampliada do capital, e isso se dá pela monopolização sobre um
determinado bem e geração de uma renda com isso (BARTRA, 2013). Esses preços de
monopólio de bens essenciais para reprodução da vida, inclusive a humana, pagamos
todos nós, não só como consumidores, mas também como produtores assalariados ou
não que geram trabalho excedente, fundamental para geração de mais-valor, que está
por de trás de qualquer renda. Ele coloca, baseado em Marx: “detrás de toda ‘renta’, lo
que hay es plusvalía y, en sentido estricto, un reparto desproporcionado de la plusvalía
social entre los capitales rentistas y los no rentistas.” (BARTRA, 2013, pp. 105-106).
Nesse caso não é através de um investimento produtivo que o capital se valoriza, mas
sim por meio do monopólio privado sobre um bem limitado (BARTRA, 2013). Bartra
também afirma, que o processo de acumulação primária é fundamental para o capital
devido a fatores sociais e ambientais necessários a produção capitalista que não podem
ser produzidos internamente e devem, portanto, ser transformados em mercadorias e
passar a integrar sua acumulação (BARTRA, 2013). Assim, ele conclui:

(…) si el valor es trabajo social, toda acumulación lo es de plusvalía, pero en la medida


en que hay factores socio-naturales indispensables en la producción que no se
reproducen como mercancías, la propiedad excluyente de estos recursos puede ser
valorizada por si misma dando lugar a pagos de rentas a los que va a parar parte del
excedente generado por el trabajo en inversiones que sí son productivas. Este
ingreso, que no es ganancia sino renta, tiene su base en la acumulación primaria,
entendida como recurrente y violenta mercantilización del hombre y la naturaleza. La
clave de la acumulación primaria y de la renta es la irreductibilidad última de la
reproducción socio-natural a los procesos productivos del capital (BARTRA, 2013, p.
111).

O capitalismo de grandes crises de hoje, se volta fortemente a privatização e


exploração de bens de forma excludente que geram grandes rendas. Não só bens
naturais como minerais, água, petróleo, bandas do espectro eletromagnético, genoma,

52
mas também patentes tecnológicas, de softwares, da informação, das partes do
mercado que tem relação com demandas constantes e fundamentais como
alimentação, saúde e educação (BARTRA, 2013).
Nesse trabalho, entendemos que a produção de novos espaços capitalistas, nos
quais a acumulação por espoliação cumpre um importante papel, são fundamentais para
que o capital lide com suas permanentes contradições internas, visíveis através das
crises financeiras. Nesse sentido, analisaremos os mecanismos da chamada “economia
verde”, não apenas na perspectiva da legitimação de um discurso através da disputa
ideológica, que ocorre dentro do campo ambiental (o que será desenvolvido no capítulo
2), mas também como forma do capital lidar com suas crises e seguir no processo de
acumulação, o que também tem sido apontado por outros autores. Para Larry Lohmann,
a criação e consolidação de mecanismos de mercado relacionados ao clima está
ocorrendo em um contexto de necessidade do capitalismo de produzir novas formas de
expansão e superar a última manifestação da crise econômica do sistema (LOHMANN,
2009). O capital, com sua voracidade e a intensidade de suas crises, especula, ou
melhor cria, ativos ambientais no mercado financeiro e expropria bens naturais e sociais
(MOURA; DURÃO, 2011). Essa linha também é colocada por Fabrina Furtado que diz:

Este processo se aprofunda em momentos de crise econômica, inerentes ao sistema


capitalista, apropriada como oportunidade para aumentar as taxas de lucro e garantir
uma re-estabilização do sistema através da criação de novos mecanismos, produtos
e formas de expansão capitalista em nome do meio ambiente (FURTADO, 2012,
p.26).

1.7. A produção de espaços capitalistas e geração de conflitos territoriais

Relacionando a produção do espaço com o território, podemos concluir que a


produção de espaços capitalistas, através de sua acumulação em suas diversas formas
(inclusive a acumulação primitiva ou por espoliação), gera conflitos territoriais sobretudo
em territórios que ainda não estão tomados por completo pelo capitalismo. Processos
de acumulação por espoliação através da mercantilização e privatização dos bens
naturais (como o ar e as florestas, no caso dos mecanismos de serviços ambientais),
são importantes fatores dos conflitos territoriais gerados pelas políticas ambientais no
Acre como analisaremos nos capítulos posteriores. Mas antes, para entender as formas
pelas quais esse processo conflitivo de penetração do capital nos territórios ocorre,
outras ferramentas analíticas nos serão úteis.
Podemos dizer que, por um processo predominantemente de dominação do
espaço, as relações de poder capitalistas se espacializam em territórios que são

53
principalmente apropriados por grupos sociais que os conformam com seus sentidos
próprios, com suas territorialidades e, assim, se configuram conflitos territoriais. Aqui é
interessante a leitura de Milton Santos que nos indica que o território pode ser usado
por agentes hegemônicos como um recurso, para suprir suas demandas particulares
enquanto para os agentes hegemonizados, ele é um abrigo em que constantemente se
recriam estratégias de sobrevivência (SANTOS apud HAESBAERT, 2012). Segundo
ele: “Na interação território-sociedade, o território participa num sentido explicitamente
relacional, tanto como ‘ator’ quanto como ‘agido’ ou ‘objeto da ação’” (SANTOS apud
HAESBAERT, 2012, p. 59).
O conflito territorial aqui configurado se dá em múltiplas escalas, onde os grupos
sociais envolvidos têm capacidades distintas de ação configurando uma determinada
correlação de forças assimétrica. As formas pelas quais operam nessas distintas
escalas são importantes para compreensão do conflito territorial. Agentes hegemônicos
que pensam o território como recurso, planejam e projetam sua utilização. Esse
planejamento ou representação do espaço (espaço concebido) é uma redução da
realidade, conforme a visão dos agentes que o pensam. Quando o projeto sai do papel,
os conflitos se dão no espaço vivido (LEFEBVRE apud LASCHEFSKI; ZHOURI, 2010).
Como coloca Porto-Gonçalves:

À unidimensionalidade dos que tomam as decisões se contrapõe a


multidimensionalidade da vida inscrita na geografia de cada dia, locus de conformação
da subjetividade. A percepção remota, o sensoriamento remoto, ignora a percepção
imediata do espaço vivido (PORTO-GONÇALVES, 2002, p. 234).

Cada vez mais o planejamento, que é estratégico, é definido na escala global,


tornando a ação na escala nacional e local apenas de gestão (PORTO-GONÇALVES,
1996, SANTOS, 2008). Intensificando um processo que Porto-Gonçalves descreve:

Assim, novas escalas se inscrevem na vida de todos e de cada um, hierarquizando a


organização social do espaço. Já não é mais o espaço vivido capaz de determinar o
que vai ser feito nele mesmo. [...] Isso implica uma outra relação com a natureza, onde
em vez de se partir dela como condição de produção da vida, ao contrário, se parte
das determinações de mercado para depois “corrigi-las” (PORTO-GONÇALVES,
1996, p. 34).

Assim, a ordem trazida pela ação dos agentes hegemônicos (que operam em
escala global), gera desordem localmente, não só porque produzem mudanças
funcionais e estruturais, mas principalmente por que essa ordem não faz sentido
localmente, pois tem como objetivo o mercado global (SANTOS, 2008). São

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verticalidades que segundo Santos, tem um “efeito desintegrador das solidariedades
locais então vigentes, com a perda correlativa da capacidade de gestão da vida local”
(SANTOS, 2008, p. 285). A concepção dominante de planejamento se choca com outras
concepções sobre a utilização do espaço, desenvolvendo conflitos ambientais que se
materializam quando são transferidas para o espaço vivido (LASCHEFSKI; ZHOURI,
2010).
A produção dos espaços capitalistas e seu correspondente ordenamento
territorial é ao mesmo tempo o desordenamento territorial do território pré-existente.
Como coloca Haesbaert:

(...) podemos afirmar que, assim como não há ordem sem desordem, ordenamento
sem desordenamento, também não há territorialização sem desterritorialização, ou
seja, precisamos destruir ou deixar um território para construir ou ingressar em um
outro (Deleuze e Guattari, 1995). Para sermos mais precisos, todos os nossos atos
interferem, de forma mais ou menos acentuada, em processos permanentes de des-
re-territorialização (HAESBAERT, 2006, p.5).

Esse ordenamento territorial produzido tem uma correlação de forças entre


macropoderes políticos institucionalizados e os “micropoderes” produzidos e vividos no
cotidiano das populações na dinâmica do território (HAESBAERT, 2012).

1.8. Neoliberalismo ambiental e sistema de normas

O capital, em sua dinâmica de expansão e crise, passou por mudanças nos


padrões de acumulação associadas a novas regras e práticas político-econômicas como
foi colocado acima. Essa transição para o período neoliberal que caracterizamos está
associada também a novas práticas, discursos e disputas no campo ambiental. No
capítulo 2, abordaremos melhor a dinâmica e as disputas no campo ambiental, mas por
enquanto queremos destacar o papel que cumprem esse conjunto de regras e normas
na produção e ordenamento de espaços capitalistas e nos consequentes conflitos
territoriais.
Segundo Gudynas, com o aumento da influência do neoliberalismo, emergem
políticas ambientais com características neoliberais, onde o mercado e seus agentes
aparecem como principais regulador e gestores das questões ambientais, deixando de
lado as questões como o valor intrínseco dos seres vivos, e privilegiando questões de
ordem técnica, onde a dificuldade é encontrar a melhor fórmula para atribuir preço a
vida e gerar patentes e direitos de propriedade sobre os seres vivos (GUDYNAS, 1992).
Podemos dizer que dentro do conjunto dessas políticas ambientais, estão os

55
mecanismos da chamada “Economia Verde” como os mercados de carbono, pagamento
por serviços ambientais etc.
Esse neoliberalismo ambiental busca debilitar as resistências culturais e da
natureza, imbricando os conflitos locais à escala global. Tenta legitimar o espólio dos
bens naturais, por exemplo, pressionando as populações indígenas a valorizar sua
cultura e bens enquanto “capital natural” e aceitar compensações econômicas pela
cessão desses bens (LEFF, 2008).
Podemos dizer que esse neoliberalismo ambiental tem sua condição de
possibilidade associado ao que Milton Santos chamou de meio técnico-científico-
informacional, no qual o casamento entre ciência e técnica é a base material e ideológica
do discurso e prática do capital (SANTOS, 2008). Como ele coloca:

Essa união entre técnica e ciência vai dar-se sob a égide do mercado. E o mercado,
graças exatamente à ciência e a técnica, torna-se um mercado global. A ideia de
ciência, a ideia de tecnologia e a ideia de mercado global devem ser encaradas
conjuntamente e desse modo podem oferecer uma nova interpretação à questão
ecológica, já que as mudanças que ocorrem na natureza também se subordinam a
essa lógica (SANTOS, 2008, p. 238).

Ainda segundo Milton Santos, a “(...) economia contemporânea não funciona


sem um sistema de normas, adequadas aos novos sistemas de objetos e aos novos
sistemas de ações, e destinados a provê-los de um funcionamento mais preciso”
(SANTOS, 2008, p. 275). Novas normas financeiras e técnicas são estabelecidas de
acordo com as necessidades do mercado (SANTOS, 2008).
Podemos entender a dinâmica do neoliberalismo ambiental a partir da leitura de
Milton Santos, como um sistema de normas (pacotes econômicos e mecanismos dos
quais faz parte os mecanismos de serviços ambientais) idealizados pelos agentes
hegemônicos (FMI, OMC, Banco Mundial entre outros), que são aplicadas
principalmente pelas Organizações Neo-Governamentais (ONG’s) que fazem o contato
direto com os povos afetados e materializam, em parte, o sistema de ações e de objetos
que atingem os territórios. Segundo Milton Santos “(...) essas normas são criadas em
diferentes níveis geográficos e políticos, mas as normas globais, induzidas por
organismos supranacionais e pelo mercado, tendem a configurar as demais.” (SANTOS,
2008, p. 252).
Essas ONGs tornam-se, assim, parte da nova governança global, como um novo
léxico produzido nessas inter-relações das instituições ditas multilaterais e as ONGs.
Assim, a sigla ONG deve ser interpretada não mais como Organizações NÃO-
Governamentais, mas sim como Organizações NEO-Governamentais, como já sugerira

56
Porto-Gonçalves em 1996. Afinal, elas fazem parte do novo sistema de regulação social,
da nova governabilidade, como diz o novo léxico que esse campo vem propondo
(PORTO-GONÇALVES, 1996). Essa governança realizada pelas ONGs fica ainda mais
clara se considerarmos a concepção de Estado ampliado de Gramsci, que considera
além da hegemonia de um grupo político no poder, as organizações “privadas” que
sustentam essa hegemonia (COUTINHO, 2011).
Por tanto, a produção dos espaços capitalistas, a espacialização de suas
relações de poder, envolve sujeitos que operam em escalas globais através de normas
e uma tecnociência orientadas para a produção desses espaços. Isso não ocorre sem
gerar conflitos territoriais. Para o capital, os novos espaços que ele penetra, são
recursos para sua acumulação, mas para os sujeitos em seus territórios, são vitais para
reprodução das suas condições de vida.

1.9. Dimensão epistêmico-política do conflito territorial: a colonialidade do saber


e poder

Durante o desenvolvimento desse capítulo, um dos principais objetivos foi


destacar a importância das relações de poder nos conflitos territoriais. Uma dimensão
fundamental dessas relações de poder, associada a dinâmica de produção do espaço,
podemos dizer mais relacionada aos espaços de representação (espaço concebido) é
a produção do conhecimento. Como coloca Foucault: “A descrição espacializante dos
fatos discursivos desemboca na análise dos efeitos de poder que lhe estão ligados”
(FOUCAULT apud PORTO-GONÇAVELS, 2002, p. 228). Os conflitos territoriais tem
uma importante dimensão epistemológica, e por tanto é importante fazermos uma
análise das relações de poder que atravessam a produção de conhecimento
hegemônica, uma das dimensões da produção do espaço.
Com a colonização da América, em pouco tempo o capitalismo, eurocentrado,
se espalha por todo o mundo. Com o Iluminismo, no século XVIII, o eurocentrismo foi
consolidando a ideia de que esse padrão de poder seria anterior e que a Europa já era
um centro mundial do capitalismo, que com sua racionalidade e modernidade, grau
máximo de um caminho linear, unidirecional de progresso, colonizou o restante do
mundo (QUIJANO, 2009). A modernidade, um dos eixos constitutivos do padrão de
poder eurocentrado, segundo Quijano tem relação com:

(...) E as relações intersubjetivas correspondentes, nas quais se foram fundindo as


experiências do colonialismo e da colonialidade com as necessidades do capitalismo
foram-se configurando como um novo universo de relações intersubjetivas de

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dominação sob hegemonia eurocentrada. Esse específico universo é o que será
depois denominado como a modernidade. (QUIJANO, 2009, p. 74)

A colonialidade, sustentada por uma classificação racial/étnica dos povos


imposta e que influencia todos os aspectos da existência social também se consolida
como importante eixo constitutivo do padrão de poder hegemônico (QUIJANO, 2009). A
ideia de raça e o racismo se tornam princípios organizadores que estruturam as
múltiplas hierarquias do sistema-mundo (QUIJANO apud GROSFOGUEL, 2009). A
colonialidade se diferencia, mas se beneficia do colonialismo, estrutura de
dominação/exploração de um povo/classe/grupo social de um território sobre outro,
onde a autoridade política, recursos de produção e do trabalho são controlados pelo
grupo social dominante, mas não necessariamente relações racistas de poder, marca
fundamental da colonialidade (QUIJANO, 2009). Como coloca Grosfoguel:

(...) A colonialidade permite-nos compreender a continuidade das formas coloniais de


dominação após o fim das administrações coloniais, produzidas pelas culturas
coloniais e pelas estruturas do sistema-mundo capitalista moderno/colonial. A
expressão ‘colonialidade do poder’ designa um processo fundamental de estruturação
do sistema-mundo moderno/colonial, que articula os lugares periféricos da divisão
internacional do trabalho como a hierarquia étnico-racial global e com a inscrição de
migrantes do Terceiro Mundo na hierarquia étnico-racial das cidades metropolitanas
globais (GROSFOGUEL, 2009, p. 395).

A partir dessa leitura, a matriz descolonial faz uma crítica epistêmica a produção
de conhecimento com a hegemonia eurocêntrica e destaca a importância do lugar de
enunciação de que fala o pesquisador/investigador. A produção do conhecimento é
sempre situada e o locus de enunciação é essencial que seja explicitado, é o lugar
geopolítico e corpo-político do sujeito que fala (GROSFOGUEL, 2009). Para Grosfoguel:

(...) A ‘egopolítica do conhecimento’ da filosofia ocidental sempre privilegiou o mito de


um ‘Ego’ não situado. O lugar epistêmico étnico-racial/sexual/de gênero e o sujeito
enunciador encontram-se, sempre, desvinculados. Ao quebrar a ligação entre o sujeito
da enunciação e o lugar epistêmico étnico-racial/sexual/de gênero, a filosofia e as
ciências ocidentais conseguem gerar um mito sobre um conhecimento universal
Verdadeiro que encobre, isto é, que oculta não só aquele que fala como também o
lugar epistêmico geopolítico e corpo-político das estruturas de poder/conhecimento
colonial, a partir da qual o sujeito se pronuncia (GROSFOGUEL, 2009, pp. 386-387).

Essa forma de produção de conhecimento, historicamente, devido a essas


relações de poder, foi legitimada como a única capaz de alcançar a universalidade,

58
deslegitimando outras formas que são consideradas particularísticas, incapazes de
serem universalizáveis (GROSFOGUEL, 2009). Segundo Costa, “(...) a produção de
conhecimento atende a um princípio circular e auto-referenciado, de sorte que “novos”
conhecimentos construídos sobre uma base de representação determinada reafirmam,
ad infinitum, as premissas inscritas nesse sistema de representações” (COSTA, 2006,
pp. 85-86). Isso faz com que todas as experiências que não estejam no que se definiu
como “centro”, sejam tratados a partir de sua funcionalidade, semelhança ou divergência
com esse padrão normativo definido pelas relações de poder, por sua ausência ou
incompletude em face do padrão moderno das sociedades ocidentais (COSTA, 2006).
Como coloca Grosfoguel:

(...) A pretensa superioridade do saber europeu nas mais diversas áreas da vida foi um
importante aspecto da colonialidade do poder no sistema-mundo colonial/moderno. Os
saberes subalternos foram excluídos, omitidos, silenciados e/ou ignorados.
(GROSFOGUEL, 2006, p. 405).

Por isso, entre outras razões, a matriz descolonial critica a maior parte da
produção de conhecimento científico, como eurocêntrica e que pouco ou nada valoriza
os autores que não sejam dos centros hegemônicos de poder. O pensamento
descolonial valoriza a produção de conhecimento baseada em outras epistemes,
racionalidades, cosmogonias, vindas dos subalternos como conhecimentos
fundamentais e, deste modo, trazem uma perspectiva crítica do conhecimento
hegemônico e das relações de poder envolvidas (GROSFOGUEL, 2009), e os vê como
essenciais para avançar na emancipação e superação da dominação/exploração, uma
justiça cognitiva (SANTOS, 2009).
Essa crítica epistemológica que o pensamento descolonial traz é uma ferramenta
importante para o nosso trabalho pois ajuda a desconstruir a colonialidade do saber e
do poder, presente na produção científica e tecnológica e que são vetores fundamentais
dos conflitos territoriais e que tendem a ser ocultadas. Como coloca Porto-Gonçalves:

A “colonialidade do saber” implicada no eurocentrismo olvida a dimensão conflitiva


que constitui a modernidade (Lander et al, 2000) ao privilegiar o devir no sentido linear
do tempo. A colonialidade é esse-outro da modernidade, é esse mal-estar que ela
procura ocultar ignorando essa conflitividade que lhe é constitutiva e se mostra
quando se toma o espaço em conta. (PORTO-GONÇALVES, 2013, p. 3)

A perspectiva da “gestão racional”, com base no saber técnico-científico


convencional, é fortemente etnocêntrica, marcado pela colonialidade do saber e do

59
poder (PORTO-GONÇALVES, 2006), e o sistema técnico-científico que reproduz,
segundo Santos, tende “(...) a competir vantajosamente com os sistemas técnicos
precedentemente instalados, para impor ao uso do território ainda mais racionalidade
instrumental” (SANTOS, 2008, p. 221).
A análise dos conflitos territoriais gerados pela produção de novos espaços
capitalistas regulados por normas e políticas apresentadas com ambientais, precisa
levar em consideração o caráter epistemológico desses conflitos. Como coloca um dos
fundadores da Confederação de Nacionalidades Indígenas do Equador (CONAIE), Luis
Macas “(...) o debate em torno da sustentabilidade é um debate epistêmico e político.”
(PORTO-GONÇALVES, 2012).
Com base no conjunto de reflexões e ferramentas apresentadas nesse capítulo,
iremos analisar as propostas e efeitos do planejamento, regulamentação e execução de
políticas e projetos relacionados ao capitalismo verde no Acre, especialmente o SISA,
os potenciais conflitos territoriais gerados. Para tal guiamos a análise, principalmente,
como exposto acima, pelo o conflito e suas características. A partir dele e em sua
articulação com o território, temos uma forma de identificar as formas e processos pelos
quais as relações sociais se especializam, através dos conflitos territoriais. Para articular
as múltiplas escalas e dimensões da espacialização das relações de poder, que são
materiais, imateriais, de dominação e apropriação achamos que a teoria de produção
do espaço de Henri Lefebvre oferece grande ajuda. Henri Lefebvre considera as
relações de produção capitalista, sua dinâmica de acumulação, em sua escala mais
ampla, mas articula isso com as relações de poder produzidas através do conhecimento
e também a influência das escalas menores, do cotidiano, do espaço vivido. Essa
articulação, os três momentos da produção do espaço, traz a possibilidade de entender
os conflitos territoriais em sua complexidade. Com base em sua teoria e nos trabalhos
de Schmid (2012), Harvey (2013) e Haesbaert (2009) podemos sintetizar os em três
momentos, que sempre caminham simultaneamente ligados dialeticamente:

1º Momento – A produção do espaço capitalista: Com base na prática espacial,


dimensão material da prática social e da produção do espaço (espaço percebido);

2º Momento - O discurso sobre/no espaço: Com base na representação do espaço,


dimensão do discurso da produção do espaço, a produção do conhecimento e do
planejamento, das relações de poder concreto que geram constrangimento (espaço
concebido);

3º Momento - A experiência/vivência do/no espaço: Com base no espaço de


representação, significações da dimensão material da produção do espaço, que se

60
desenvolvem ao passo que constroem valores, experiências sociais cotidianamente e
incorporam emoções e significados no modo como vivemos (espaço vivido);

61
CAPÍTULO 2 – CAMPO AMBIENTAL E BLOCO HEGEMÔNICO NO ACRE

Para entender por que o Acre se tornou o grande local de incubação, uma
espécie de laboratório, de políticas ambientais relacionadas aos mecanismos de
serviços ambientais, culminando no Sistema de Incentivos aos Serviços Ambientais
(SISA), primeiro precisamos entender o contexto geográfico, histórico e ideológico que
permeia esse sistema, o que faremos na parte inicial do presente capítulo. Depois
descreveremos sua arquitetura e funcionamento, os programas que possibilitaram sua
implementação e os arranjos que o tornam viável. Por fim detalharemos os recursos
alocados pelo programa REDD Early Movers financiado pelo banco alemão KfW.

2.1. Disputas no Campo Ambiental e como influenciam a conjuntura do Acre


(localização no debate)

Trazemos a concepção de que a problemática ambiental e os sujeitos que


interagem com esse debate disputam espaço dentro de um campo extremamente
heterogêneo e muitas vezes com forças antagônicas. Em 2012 tivemos a Conferência
Rio+20 no Rio de Janeiro com a participação ativa desde movimentos sociais que
compõe a Via Campesina, na Cúpula dos Povos, atividade paralela, mas que objetivava
fazer o debate de um ponto de vista crítico do que seria abordado na conferência, até
um fórum empresarial chamado “Rio+20 Corporate Sustentability Forum” com a
participação de grandes empresas e ONGs internacionais, inclusive de setores
responsáveis por grandes impactos ambientais como petroleiras e representantes do
agronegócio, com o objetivo de pensar nos negócio relacionados a conservação do meio
ambiente.
A princípio parece que todos tem o mesmo objetivo, achar soluções para a crise
ambiental contemporânea. Entretanto, aprofundando a análise percebemos que na
verdade os objetivos são muito distintos e na maior parte das vezes inconciliáveis. A
reflexão dessa seção, fruto de parte da pesquisa desse mestrado, teve a colaboração
dos pesquisadores Alexandre Henrique Asada e Luiz Henrique Gomes de Moura e foi
apresentada no SINGA de 2013 (SANDONATO et. al. 2013) e no encontro da SBPC de
2014 (SANDONATO et. al., 2014).
Para ilustrar esse processo elaboramos uma figura com entidades que
participaram da conferência Rio+20:

62
Figura 1. Entidades que participaram da Rio+20, da Cúpula dos Povos e Fórum Empresarial.
Fonte: SANDONATO et. al. 2014.

2.1.1 Formação do Campo Ambiental

Partimos da contextualização de que no final da década de 60, tivemos um


momento em que sujeitos antes invisibilidades: indígenas, camponeses, negros,
mulheres, ambientalistas ganham a cena política através de mobilizações que
apontavam para os limites e contradições do desenvolvimento e o modelo de civilização
hegemônico (LEFF; 2009; PORTO-GONÇALVES, 2006).
Esse momento de intensa contestação do atual modelo de sociedade, uma crise
de legitimidade, em que ocorriam lutas por quase todo o mundo que de alguma forma
iam contra o sistema vigente, período no qual ocorreu o emblemático maio de 68, tem
relação com o importante momento de crise, devido a sobreacumulação de excedentes,
e restruturação da dinâmica de acumulação capitalista.
Como colocamos no capítulo 1, a superação dessa crise exigiu uma
reestruturação espaço-temporal da dinâmica de acumulação, a transição de um período
de acumulação fordista para um de acumulação flexível, gerando deslocamentos
espaciais e temporais e o fenômeno de “compressão do espaço-tempo”. (HARVEY,
2012a).
Essas transformações geraram uma mudança na experiência do capitalismo,
com a compressão do espaço-tempo, que influenciou em diferentes dimensões da
vida. Segundo Harvey:

63
À medida que o espaço parece encolher numa “aldeia global” de telecomunicações e
numa “espaçonave terra” de interdependências ecológicas e econômicas – para usar
apenas duas imagens conhecidas e corriqueiras -, e que os horizontes temporais se
reduzem a um ponto em que só existe o presente (o mundo do esquizofrênico), temos
de aprender a lidar com um avassalador sentido de compressão dos nossos mundos
espacial e temporal (HARVEY, 2012a, p. 219).

A intersecção do domínio sobre o dinheiro, o tempo e o espaço forma um nexo


de poder social e a progressiva monetização das relações na vida social transforma as
qualidades do tempo e do espaço. Os modos de uso e definição do tempo e do espaço
podem ser modificados com base na busca do lucro e isso está associado a circulação
do capital (HARVEY, 2012a).
Essa nova experiência, incluindo seu efeito na produção da cultura e do
conhecimento de forma geral é o que Harvey (2012a) veio chamar de condição pós-
moderna. Segundo ele, se considerarmos a cultura como um complexo de signo e
significações que origina códigos de transmissões de valores e significados sociais,
podemos reconhecer que o dinheiro e as mercadorias são portadores de códigos
culturais que influenciam as formas culturais, e que isso depende da circulação do
capital.
A aceitação da instabilidade, do efêmero, do fragmentário, do descontínuo e do
caótico e a celebração da diferença, do espetáculo fazem parte dessa condição. Os
movimentos mais flexíveis do capital produzem e acentuam essas características
percebidas e contrapõe valores mais sólidos implantados na vigência do fordismo. Para
ele parte dessas percepções estão associadas com a aceleração dos tempos de giro na
produção, na troca e no consumo. Outro ponto importante é que a necessidade de
produção de novos mercados conforma novas subjetividades, que produzam a vontade
de consumir, e isso significa a produção de novos sistemas de signos e imagens, que
constituem um aspecto importante da condição pós-moderna (HARVEY, 2012a). Essas
características levam Harvey a concluir:

A intensidade da compressão do tempo-espaço no capitalismo ocidental a partir dos


anos 60, com todos os seus elementos congruentes de efemeridade e fragmentação
excessivas no domínio político e privado, bem como social, parece de fato indicar um
contexto experiencial que confere à condição pós-moderna o caráter de algo um tanto
especial (HARVEY, 2012a, pp. 275-276).

A mudança do padrão de acumulação foi acompanhada por uma mudança no


discurso, em um conjunto de ideias, que além de refletirem em maior ou menor medida

64
a mudança na experiência capitalista (compressão do espaço-tempo), também
constituem uma forma de legitimar o sistema vigente, que justifique sua aceitação.
Para analisar esse movimento de mudança de discurso, recorremos aos autores
Boltanski e Chiapello, que retomando a tese de Weber do “espírito do capitalismo”
(WEBER, 1999) e fazem uma leitura de que o capital atualiza esse “espírito” de acordo
com as mudanças na sociedade (BOLTANSKI; CHIAPELLO, 2009). Segundo eles:

O espírito do capitalismo é justamente o conjunto de crenças associadas à ordem


capitalista que contribuem para justificar e sustentar essa ordem, legitimando os
modos de ação e as disposições coerentes com ela. Essas justificações, sejam elas
gerais ou práticas, locais ou globais, expressas em termos de virtude ou em termos
de justiça, dão respaldo ao cumprimento de tarefas mais ou menos penosas e, de
modo mais geral, à adesão a um estilo de vida, em sentido favorável à ordem
capitalista (BOLTANSKI; CHIAPELLO, 2009, p. 42).

O capitalismo necessita dessa legitimação, inclusive dentre os que o


impulsionam, para manter sua hegemonia. O compromisso no processo de acumulação
capitalista vai depender dos argumentos que valorizam não só os benefícios individuais,
mas também vantagens coletivas, definidas como bem comum. Ele se apoia em
representações capazes de guiar a ação, justificar e tornar aceitável e até desejável,
como a melhor das opções o modelo capitalista. As justificativas tem que ser boas o
suficiente para serem aceitas pacificamente por um grande número de pessoas, entre
os oprimidos pela ordem capitalista, como também pelos principais sujeitos que se
beneficiam das relações capitalistas. (BOLTANSKI; CHIAPELLO, 2009).
Essas justificações estão ligadas ao momento histórico do capitalismo e suas
formas de acumulação de capital, ou seja, o espírito do capitalismo é indissociável, em
cada momento, das formas de obtenção de lucro e acompanham as mudanças nas
condições de vida e trabalho (BOLTANSKI; CHIAPELLO, 2009). A condição pós-
moderna em parte, sustenta ideologicamente a nova forma de acumulação capitalista,
ajudando a constituir um novo espírito capitalista. O que vimos no final da década de 60
foi uma crise da legitimidade do atual espírito do capitalismo e a transição para um novo
espírito.
Mas para que essa transição fosse realizada era necessário que o capitalismo
assimilasse as críticas dirigidas a ele, pois ele não consegue gerar a partir de si mesmo
os recursos para fundamentar argumentos de engajamento, em especial, orientados
para a busca de justiça (BOLTANSKI; CHIAPELLO, 2009). Como colocam os autores:

Para manter seu poder de mobilização, o capitalismo, portanto, deve obter recursos

65
fora de si mesmo, nas crenças que, em determinado momento, têm importante poder
de persuasão, nas ideologias marcantes, inclusive nas que lhe são hostis, inseridas
no contexto cultural em que ele evolui. O espírito que sustenta o processo de
acumulação, em dado momento da história, está assim impregnado pelas produções
culturais que lhe são contemporâneas e foram desenvolvidas para fins que, na maioria
das vezes, diferem completamente dos que visam a justificar o capitalismo
(BOLTANSKI; CHIAPELLO, 2009, p. 53).

Essa transição ocorre, em parte, assimilando as críticas que vem de fora do


capitalismo, dos seus opositores, convertendo-as para fazerem parte da dinâmica de
legitimação da acumulação capitalista. O novo espírito capitalista incorpora, nessa
operação, parte dos valores pelos quais o capitalismo é criticado, gerando uma
satisfação parcial, mas sem efetivamente ameaçar os princípios de acumulação
capitalista e a necessidade do lucro. Nesse processo, parte dos valores que a crítica
mobiliza, são então postos a serviço dessa mesma acumulação que é criticada, apesar
de aparentemente atender a princípios de justiça. Ocorre uma transformação nos modos
de realização do lucro, de forma que a crítica fica desarmada, pelo menos
momentaneamente, devido à falta de referências e compreensão desses novos
processos (BOLTANSKI; CHIAPELLO, 2009). Assim, Boltanski e Chiapello concluem:

A crítica parcialmente ouvida e integrada em certos aspectos, parcialmente evitada ou


contrariada em outros, precisa movimentar-se e forjar novas armas incessantemente,
retomando sempre as suas análises para permanecer o mais próxima possível das
propriedades que caracterizam o capitalismo de seu tempo (BOLTANSKI;
CHIAPELLO, 2009, p. 77).

Com base nesse movimento de assimilação parcial das críticas podemos


analisar o debate e constituição de um campo ambiental desde o intenso momento de
contestação do capitalismo do final da década de 60.

2.1.2 Constituição do Campo Ambiental

No presente trabalho, acreditamos ser útil o uso do conceito de campo de Pierre


Bourdieu (1996, 2001), para melhor entender a história, os agentes, as disputas e
conflitos com relação ao meio ambiente. Assim, tal como descreveu Bourdieu (1996,
2001), há no espaço social uma série de campos que se inter-relacionam e são
relativamente autônomos, com uma lógica própria, um jogo com regras de
funcionamento definidas. No macro cosmo do espaço social, haveria uma série da
campos como o campo político, científico, das artes, da literatura, por meio das quais a

66
sociedade se relaciona com as estruturas objetivas e as forças da economia.
Ainda segundo Bourdieu (1996, 2001), os campos possuem estruturas objetivas,
que são definidas pelas posições que os diversos agentes (indivíduos ou instituições)
que participam de cada campo, pelas disposições que esses agentes adquirem a
mediada que participam do campo (o habitus), e suas regras de funcionamento
específicas. Sem querer adentrar especificamente na complexidade do pensamento do
autor, entender a realidade do meio ambiente como um campo ambiental ajuda a
entender que as lutas e as disputas entre os diversos agentes fazem parte de uma lógica
própria, onde o próprio discurso é forjado no interior do campo, e como ele se relaciona
com outros campos da sociedade. O capital cultural que os agentes adquirem no campo
é que determina, ou limita, as ações dos outros agentes no campo.
Podemos dizer que desde a década de 60, vem se consolidando um campo
ambiental (CARVALHO, 2001; COSTA; 2005), em que tensões e disputas entre forças
sociais, com graus diferentes de visibilidade e poder, se desenvolvem. No seu interior,
temos aqueles que questionam o desenvolvimento e todas as suas implicações e que
estão relacionados, segundo Porto-Gonçalves:

[...] a origem do ambientalismo na contracultura e toda a tensão que se estabelece


com o modo de produção de verdades no interior da sociedade moderno-colonial,
onde a ciência e técnica ocupam um lugar de destaque. Afinal, se por cultura
entendemos um conjunto de saberes e valores que empresta sentido às práticas
sociais, a contracultura indica, exatamente, a busca de outros sentidos para vida. Ora,
o discurso científico e técnico se constituía exatamente como o discurso de verdade
(de Verdade, com maiúscula, prefere-se) no mundo moderno-colonial e, com isso,
trouxera a desqualificação de outros saberes, de outros conhecimentos de outras falas
(PORTO-GONÇALVES, 2006, p. 68).

Como também estão no campo aqueles que deslocam o debate enquanto uma
questão técnico-científica, como por exemplo, o Clube de Roma conformado por
grandes empresas mundiais como Fiat, XEROX, Ollivetti, Remington Rand, IBM, que
articulava os interesses do grande capital multinacional aos técnicos e cientistas. Esse
Clube financiou o estudo Limites do Crescimento (1971) que argumentava que a
“capacidade suporte” do planeta estava se esgotando (PORTO-GONÇALVES, 2002b;
2006).
Esse trabalho foi influenciado pelo pensamento neomalthusiano do final da
década de 60, que prevalecia à época, como se pode ver em duas publicações
importantes: em 1966, Paul Ehlich publicou “The Population Bomb”, cujo argumento
central afirmava que a capacidade humana de produção de alimentos só seria maior à

67
custa de uma grande devastação ambiental e que o grande crescimento populacional
levaria milhões de pessoas a passarem fome já a partir das décadas de 70 e 80; em
1968, Garret Hardin publicara “Tragedy of the Commons”, no qual defendia que a
disputa dos bens comuns por uma população cada vez maior geraria sua destruição e
que era necessário que esses bens fossem privatizados ou geridos pelo Estado para
evitar que eles fossem explorados de forma destrutiva (COSTA; 2005). É importante
destacar que Hardin iria posteriormente reavaliar suas próprias conclusões e também
criticaria a apropriação de seu trabalho, inclusive reescrevendo o artigo da Tragédia dos
Comuns mais de uma vez (HARDIN, 1998).
O relatório Limites do Crescimento teve grande importância na primeira grande
Conferência Mundial sobre Meio Ambiente, realizada em Estocolmo, em 1972 (PORTO-
GONÇALVES, 2002b). Nessa conferência, também teve papel de destaque em sua
organização um ator muito importante dentro do campo ambiental, o Banco Mundial, em
que seu então presidente, Robert MacNamara, afirmara publicamente durante o evento
a necessidade de se conciliar crescimento econômico e respeito ao meio ambiente
(PEREIRA, 2011). Desde então, a questão ambiental passou a ser institucionalizada,
principalmente em instituições supranacionais (PORTO-GONÇALVES, 1996) e a
ganhar importância nas relações internacionais, constituindo um dos principais vetores
da nova des-ordem mundial (HAESBAERT; PORTO-GONÇALVES, 2006).
Como afirma Porto-Gonçalves “(...) veremos aproximações e tensões no interior
do campo ambiental entre perspectivas mais tecnocientíficas e outras mais abertamente
preocupadas com questões culturais e políticas” (PORTO-GONÇALVES, 2006 p. 68) e
que “(...) quase sempre, se procura deslocar o debate do terreno público para o terreno
tecnocientífico, como se esses dois campos fossem excludentes” (PORTO-
GONÇALVES, 2002b, p40). A disputa dentro do campo ambiental resulta em um
discurso que é mais legitimado, levando em consideração o que Zhouri coloca:

(...) as relações de poder entre os sujeitos sociais que conjugam determinados


significados de meio ambiente, espaço e território, consolidam certos sentidos, noções
e categorias que passam a vigorar como as mais legítimas e passíveis de sustentar
as ações sociais e políticas. Em consequência, produzem um efeito silenciador e,
portanto, excluem outras visões e perspectivas concorrenciais (ZHOURI, 2007, p.2).

2.1.3 A força do neoliberalismo ambiental, “desenvolvimento sustentável” e


“Economia Verde”

Na constituição do campo ambiental, o debate se desloca para a busca de

68
tecnologias alternativas, assimilando uma das características da subjetividade da
modernidade, a crença na capacidade redentora da técnica, ou no fetiche da tecnologia
(NOVAES, 2007), onde grandes setores empresariais relacionados à restruturação da
acumulação do capital, como as indústrias ligadas aos novos materiais, à
microeletrônica e à biotecnologia, se envolveram fortemente (PORTO-GONÇALVES,
1996). Pouco a pouco começa a ganhar muita força uma linha, baseada numa
racionalidade econômica, com o discurso da eficiência (melhoria de procedimentos de
produção) e da escala (menor consumo de matérias para produção), em que não se
questiona o objetivo, que é a acumulação capitalista (ACSELRAD, 2004a). Aqui é
importante destacar a ponderação de Acselrad:

(...) a noção de eficiência que prevalece em determinadas sociedades, por exemplo,


não pode ser absolutamente considerada como trans-histórica ou onivalente. A
eficiência das técnicas pode variar de sentido no tempo e no espaço (...) O padrão
tecnológico das atividades resultará, portanto, de escolhas técnicas que são
condicionadas por estruturas de poder (econômico e também de controle sobre os
recursos do meio material) vigentes. Tais estruturas procuram atualizar-se
permanentemente pela disseminação de categorias de percepção que fazem valer
socialmente os critérios dominantes de “eficiência”, “capacidade competitiva”, “níveis
de produtividade” etc., critérios estes que tendem a legitimar e reforçar a superioridade
real e simbólica dos dominantes (Acselrad, 2004b, p. 16).

Também observamos progressivamente no desenvolvimento do campo, uma


mudança no perfil dos agentes com maior força e legitimação e também nas principais
reinvindicações. Até a década de 80, apesar da força crescente dos agentes ligados à
perspectiva técnico-científica, o campo ambiental era identificado predominantemente
com a imagem de um sujeito político crítico, fruto dos movimentos e mobilizações da
década de 60, que lutavam por direitos e tinha uma perspectiva transgressora. Já os
anos 90 têm como principal sujeito o especialista técnico, o gestor dos “recursos
naturais”, geralmente associado ao mundo das ONGs, devido a um retraimento do
Estado e o fortalecimento do neoliberalismo (ZHOURI, 2007).
A retórica do neoliberalismo fortaleceu a aproximação do debate ambiental da
ideia clássica de desenvolvimento, através da noção de Desenvolvimento Sustentável
(PORTO-GONÇALVES, 1996). Esse termo, que ganhou força com o relatório
Brundtland, de 1987, utiliza uma noção de “sustentabilidade”, que vêm de uma linha de
argumentação amadurecida durante 30 anos dentro do campo ambiental, fortemente
técnico-científica, em que teríamos uma forma nova, mais eficiente, de exploração dos
recursos, uma forma “sustentável” (ACSELRAD, 2004a).
Ela é baseada em uma visão economicista dos sistemas vivos, em que os

69
processos biológicos são considerados análogos a economia de produtos e excedentes,
ou seja, como afirma Acselrad, pensa “(...) os sistemas vivos como compostos de um
‘capital/estoque’ a reproduzir e de um ‘excedente/fluxo’ de biomassa, passível de ser
apropriado para fins úteis sem comprometer a massa de ‘capital’ originário.”
(ACSELRAD, 2004a, p. 2).
A Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento
(CNUMAD), conhecida também como ECO-92, foi o palco que consolidou e difundiu a
noção de “desenvolvimento sustentável” baseado no relatório Brundtland e fortaleceu
ainda mais dentro do campo ambiental e visão ambientalista técnico-científica e
neoliberal que recentemente culminou na noção de “economia verde”. Segundo Ribeiro
(2011), já na ECO-92, as grandes empresas transnacionais se pintavam de verde
apoiando projetos de conservação, “educação” ambiental, selos verde, etc., mas nunca
questionando o modelo produtivo e de consumo, “solucionando” os problemas
ambientais com tecnologias e negócios “verdes” em que seria possível o lucro e a
melhoria do ambiente. Como o neoliberalismo ambiental ainda está sendo forjado e
existem disputas dentro do campo ambiental, também dessa conferência saem
mecanismos contraditórios, que ainda consideravam o papel do Estado e da sociedade
como mediadores da questão ambiental, como a Agenda 21 e os Princípios da
Conferência. A proposta aparentemente nova da “economia verde” consolida o mesmo
caminho neoliberal, mas com processos mais intensos de produção de novas
tecnologias (nanotecnologia, transgênicos, biologia sintética, geoengenharia) e
mercantilização da natureza (RIBEIRO, 2011).
Como forma de assimilar a crítica gerada pela crise ambiental, no processo de
constituição de um novo espírito para o capitalismo, a racionalidade econômica induz,
numa forma de simular e perverter o pensamento ambiental, o discurso da
sustentabilidade, onde o equilíbrio ecológico e a justiça ambiental seriam conseguidos
pelo crescimento econômico orientado pelos mecanismos do livre mercado, buscando
conciliar dessa forma, os contrários da dialética do desenvolvimento (LEFF, 2008). Aqui
podemos dizer, segundo Acselrad, que temos a “(...) lógica da chamada modernização
ecológica, que estaria privilegiando a esfera econômica em relação à política: traduz-se
o meio ambiente em economia para não explicitar o que de conflito político ele encerra.”
(ACSELRAD, 2004a, p. 9).
Com a força da concepção de “desenvolvimento sustentável” dentro do campo
ambiental, também ganha muito peso uma ideia de consenso, em que termos como
parceria, participação, negociação, comunidade e sociedade civil, que faziam parte do
léxico das lutas por direitos como acesso aos bens naturais, ao território, ao espaço,
aos serviços urbanos, são apropriados e ressignificados pelo neoliberalismo, em uma

70
confluência perversa (DAGNINO, 2004), em que agora as responsabilidades passam
do Estado para a sociedade e os direitos são tratados de forma mercadológica
(ZHOURI, 2007). Exemplo desse processo de apropriação e ressignificação é o uso por
agências oficiais e de financiamento como o Banco Mundial de termos como “população
local”, que pode se referir tanto às comunidades indígenas como também às empresas
madeireiras voltadas para a exportação (ZHOURI, 2006), assim como “resolução de
conflitos”, onde a “resolução” sempre resulta no convencimento (pelas ideias ou pela
força) das comunidades pela aceitação dos projetos estrangeiros nos seus territórios
(FURTADO; STRAUTMAN, 2012). Nesse mesmo sentido de fortalecer a ideia de
consenso, Acselrad afirma:

Um meio ambiente único é então evocado para soldar as forças sociais da cidade. O
discurso ambiental serve também para isto; não exclusivamente, mas é, também,
apropriado por este viés – o de que o “ambiente” é uno, diz respeito a todos, é supra-
classista e justifica devermos darmos-nos as mãos, fazer uma só e inelutável política
para protegê-lo. No entanto, mesmo que em nome do interesse de todos, é a política
de algum grupo que será feita. (ACSELRAD, 2007, p. 4)

Estabelece-se um novo tipo de exclusão política e social, onde se legitima


apenas a participação dos que possuem o conhecimento técnico e capacidade
organizativa e de ação, geralmente grandes ONGs e fundações equipadas e
institucionalizadas (ZHOURI, 2007).
Nesse contexto, se legitima o neoliberalismo ambiental que, através da
mercantilização da natureza, fortalece uma geopolítica econômico-ecológica que
aprofunda as diferenças entre países centrais e periféricos (que revalorizam sua
capacidade de absorver a poluição produzida pelos países centrais), não apenas pela
superexploração visível de recursos, mas por estratégias de apropriação dos bens
naturais camufladas sobre as novas funções atribuídas à natureza (LEFF et. al., 2002).
Progressivamente ganha força até se tornar hegemônica, dentro do campo
ambiental, a lógica mercantil, onde a problemática ambiental é apropriada por grandes
corporações e organismos financeiros multilaterais (como Banco Mundial) que
conduzem suas agendas com propostas neoliberais, beneficiando o papel do mercado
e das organizações neo-governamentais4 (essas que estão cada vez menos
relacionadas com movimentos sociais e mais com empresas, órgãos financeiros
multilaterais e governos que as financiam). Essa hegemonia fica evidente nas grandes

4 A sigla ONG deve ser interpretada não mais como Organizações NÃO-Governamentais, mas
sim como Organizações NEO-Governamentais, como já sugerira Porto-Gonçalves em 1996

71
conferências ambientais (PORTO-GONÇALVES, 2006; HAESBAERT; PORTO-
GONÇALVES, 2006; PEREIRA, 2011) e culmina na consagração da “economia verde”
na última grande conferência ambiental, a Conferência das Nações Unidas sobre
Desenvolvimento Sustentável (CNUDS), conhecida também como Rio+20.

2.1.4 Os mecanismos de serviços ambientais – REDD, TEEB

Na última década, a agenda principal das conferências de mudanças climáticas


e de biodiversidade foi a formulação e aprimoramento de mecanismos financeiros que
mercantilizam e privatizam os bens naturais. Exemplos disso são os mecanismos do
chamado “mercado de carbono” que surgiram a partir do Protocolo de Kyoto, em 1997,
em que os países passam a ter limites máximos de emissões de gases do efeito estufa
(GEE) e para flexibilizar esses limites e continuar poluindo, foram desenvolvidos
instrumentos financeiros como o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) em que
países que estão abaixo do limite ou que não têm limites a cumprir vendem créditos e
permissões aos países acima do limite. (PACKER, 2012). Já em 2007, na 13ª Reunião
das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas
(COP-13), o conceito de REDD (Redução de Emissões por Desmatamento e
Degradação) foi difundido e teve rápida propagação e adesão, visto como uma forma
promissora de reduzir o desmatamento através de pagamento pela prestação de
“serviços” ambientais (MORENO, 2012). O mecanismo consiste em incentivos
econômicos a projetos que controlem a emissão global de CO2 (um dos gases do efeito
estufa), por meio do impedimento ou redução do desmatamento e degradação de
florestas (que nas negociações oficiais da ONU incluem a monocultura de árvores). É
atribuído um valor econômico à quantidade de carbono que a área florestal não emite,
o que pode ser comercializado como crédito no mercado internacional de carbono. Em
2010, na COP-16, em Cancún no México, foram introduzidos o manejo florestal
“sustentável” e atividades de aumento dos estoques de carbono (reflorestamento, por
exemplo), o que definiu o REDD+ (GLASS, 2012). Abaixo utilizamos uma figura
elaborada por EPRI (2012) que ajuda a entender o mecanismo de REDD+:

72
Figura 2. Formas de fluxo de carbono consideradas no mecanismo de reduções de emissões
por desmatamento e degradação (1). Fonte: EPRI, 2012.

(1) a) emissões de conversão de florestas para áreas agrícolas e de pastagem (“desmatamento”,


ou o primeiro “D” de REDD+); b) emissões de degradação de florestas por extração desordenada
de madeira e por fogo (“degradação” ou o segundo “D” de REDD+); e c) acúmulo de carbono por
meio do plantio de árvores, regeneração e restauração florestal, e ainda por meio da recuperação
de áreas de floresta degradadas por consequência de fogo e extração madeireira

De acordo com estimativas do mercado financeiro norte-americano, atualmente


o comércio de créditos de carbono já movimenta 300 bilhões de dólares, o que pode
chegar a 2 a 3 trilhões de dólares na próxima década (SHAPIRO, 2010). No Brasil, cerca
de 58% das emissões de gases do efeito estufa estão relacionadas a desmatamento e
mudança do uso do solo (NOBRE apud MORENO, 2012, p. 50) e reduções no
desmatamento entre os anos 2005 e 2007 fizeram com que 17 mil km 2 de floresta não
fossem derrubadas, o que representa 220 milhões de toneladas de carbono. Se esta
área estivesse inserida nos mecanismos financeiros do mercado de carbono, resultaria
em 2,2 bilhões de dólares em créditos (com base em 10 dólares/tonelada de carbono)
(NOBRE, 2008). O CO2 armazenado na floresta amazônica vale 500 bilhões de dólares,
segundo o pesquisador do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), Paulo
Moutinho (FATHEUER, 2012).

73
A demanda por estímulo e regularização desse mercado fez com que o Brasil,
em 2009, aprovasse a Política Nacional sobre Mudança Climática (PNMC) com o
pretexto de reduzir em quase 40% as emissões de gases até 2020, compromisso
assumido internacionalmente. Esse conjunto de medidas, em que a redução de
desmatamento seria responsável por 80% das reduções de emissões, opera na lógica
do mercado de carbono, em que a PNMC cria a demanda pela redução das emissões
e delega ao mercado, através de autorização de emissões de bônus e créditos de
carbono por setores tidos como “limpos” (PACKER 2012). Também temos um projeto
de lei (PL nº 195/2011) tramitando no congresso, com o objetivo de regulamentar o
mercado de REDD/REDD+ estabelecendo o Certificado de Redução de Emissões por
Desmatamento e Degradação Florestal (CREDD), título mobiliário representativo de
uma tonelada de dióxido de carbono (CO2) (PACKER, 2012). O projeto de lei cria direitos
sobre o carbono ou a propriedade privada do ar, transformando as florestas e territórios
em “lastros”, garantindo a emissão dos títulos que são comercializados e comprados
por agentes privados que pagam por “serviços” ambientais realizados pelos detentores
das florestas e territórios (GLASS, 2012). Esses “ativos verdes”, resultantes de créditos
ou bônus de carbono, serão negociados na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa)
e no final de 2011, foi criada a Bolsa Verde do Rio (BVRio), com o objetivo de promover
o mercado de ativos ambientais (PACKER, 2012).
A partir da COP-10 da Convenção da Diversidade Biológica em Nagoya, em
2010, ganhou peso político no debate sobre a conservação da biodiversidade um estudo
chamado “The Economics of Ecosystems and Biodiversity” (TEEB) que propõe um
instrumento que possibilitaria precificar todas as interações entre os seres vivos
(MOURA; DURÃO, 2011). Podemos dizer que a origem desse tipo de proposta vêm de
muitos antes e já na década de 70, Robert Costanza, economista ecológico já elaborou
a disciplina de “serviços ambientais” na qual atribuía um valor econômico para as
interações e características ecológicas (CONSTANZA et al. apud FAUSTINO;
FURTADO, 2015). A partir de então, as bases para o mecanismo de Pagamento por
Serviço Ambiental (PSA) começa a serem desenvolvidas.
A partir dessa lógica, são determinados “fornecedores” que podem vender e
compradores desses “serviços”, o que demanda para tal transação a padronização de
unidades que podem ser quantificadas, verificadas e certificadas (KILL, 2014; WRM,
2012 apud FAUSTINO; FURTADO, 2015). Dessa forma temos um processo de
simplificação da complexidade social e ecológica da biodiversidade (FAUSTINO;
FURTADO, 2015), um reducionismo tanto econômico, quanto biológico.
O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), em seu
relatório preparatório para Rio+20 “Rumo a Economia Verde – Caminhos para o

74
Desenvolvimento Sustentável e a Erradicação da Pobreza” enfatiza o papel do REDD+
de facilitar a transição para uma “economia verde” (PNUMA, 2011) e mesmo em
períodos de crise financeira, existem grandes investimentos relacionados ao
desenvolvimento desses mecanismos, provindo principalmente dos EUA através da
Agência Internacional para o Desenvolvimento dos EUA (USAID) (MORENO, 2011).
Durante a Rio+20, a síntese desse processo de defesa da mercantilização e
privatização dos bens naturais ocorreu com a consolidação da “economia verde” como
proposta para enfrentar a problemática ambiental. Ela se apoia basicamente em 3
pilares segundo Ribeiro (2011): 1. Uma maior mercantilização e privatização dos bens
naturais que passam a ser considerados “serviços” para os mercados financeiros; 2.
Novas tecnologias e grande aumento da produção e consumo de biomassa; 3. Um
marco regulatório que permita essas políticas ambientais.
Segundo sistematização realizada por FURTADO e FAUSTINO, (2015), hoje as
principais fontes para esse tipo de mecanismo são: Fundo de Parceria de Carbono
Florestal (BIRD), criado em 2007; Programa das Nações Unidas (UN-REDD), criado em
2008; Programa de Investimento Florestal – Fundo Estratégico Climático (BIRD), criado
em 2009; Parceria Florestal Mundial de REDD+ que envolve 58 países e foi criado em
2010; REDD Early Movers (KfW) que conta com apoio do GIZ e foi criado em 2012 e
Fundo Amazônia (BNDES), fundo voluntário que tem financiamentos bilaterais como da
Noruega e Alemanha e de empresas como Petrobrás e foi criado em 2008.
Apesar da retórica em favor desses mecanismos, quando analisamos a dinâmica
do mercado ao qual estão inseridos, os limites de superar problemas ambientais ficam
evidentes. Para pagar o “custo da oportunidade” do não desmatando das florestas,
precisa haver uma demanda pelos créditos de compensação e, por tanto, o crescimento
das atividades que geram a necessidade de comprar esses créditos, atividades essas
que geram um aumento da poluição e emissão de gases do efeito estufa (MORENO,
2011). Então, vemos um atrelamento da chamada “economia marrom” a “economia
verde”, pois quanto maior for a atividade industrial e do agronegócio, maior é o valor dos
“ativos ambientais”. (PACKER, 2012). Além disso, como o central é a redução de
emissões, créditos podem ser gerados por projetos de recuperação de áreas
degradadas com monocultivos florestais, o que não tem efetividade na recuperação de
biodiversidade. Também não existe obrigação, por parte do investidor ou empresa, de
levar em consideração as áreas próximas aos projetos em execução. Essas áreas
podem ser afetadas quando o desmatamento evitado em nas áreas dos projetos de
REDD/REDD+, “vaza” ou pressiona áreas de territórios próximos. (MORENO, 2011)
Mas, para além dessas pressões “indiretas”, o REDD/REDD+ é uma forma de
integrar novas áreas ao mercado capitalista, principalmente terras públicas ou territórios

75
de povos indígenas, quilombolas e camponeses, gerando um processo de
mercantilização e de especulação desses territórios e, portanto, de tensões entre
territorialidades (PORTO-GONÇALVES, 2006, 2012). Como muitas das áreas que estão
sendo incorporadas, principalmente na Amazônia, têm dinâmicas de apropriação
comunitária da terra, quase sempre consuetudinárias, não baseadas no nosso direito
formal, distintas da lógica da propriedade privada e por tanto com regulação jurídica
formalmente precária, são mais suscetíveis as pressões geradas pelos processos de
privatização e mercantilização dos mecanismos de REDD e REDD+ (PORTO-
GONÇALVES, 2012). São áreas vulneráveis a violação dos direitos humanos e ao
consentimento livre, prévio e informado, entre outras, criando ou acirrando processos
de conflito (MORENO, 2011).
Além disso, os projetos de REDD limitam as práticas desses povos nos
territórios, algo recorrente nas políticas ambientais no Brasil conforme afirma Porto-
Gonçalves (2006) alertando que unidades de conservação estão sendo criadas sem a
primazia do controle e gestão dos bens naturais pelas populações originárias, passando
para ONGs e empresas a administração do “uso racional dos recursos naturais”.

2.1.5. O papel do Banco Mundial e das grandes ONGs ambientalistas

O Banco Mundial, sensível às disputas dentro do campo ambiental, mudou ao


longo do tempo suas formas de atuação (PINTO, 2012). Pereira afirma que:

“(...) o banco respondeu às pressões ambientalistas crescendo e ampliando suas


atividades, mediante um processo conflitivo e contínuo de estiramento institucional e
mudança incremental que acomodou tais pressões no paradigma de desenvolvimento
propugnado pela instituição. (PEREIRA, 2011, p. 236-237)

Na década de 80, esse importante agente do neoliberalismo, ainda mantinha


uma postura de pouco diálogo e concessão com relação às demandas ambientais
apresentadas principalmente pelas grandes ONGs ambientalistas com grande influência
nos países centrais do capitalismo. A partir da década de 90, devido a grandes pressões
geradas pelos fortes impactos socioambientais negativos dos projetos de
desenvolvimento do banco, ele mudou de postura, “esverdeando-se” e adotando uma
“administração ambiental” com a contratação de membros de ONGs ambientalistas. O
banco também aproveitou a proximidade da ECO-92 para lançar seu relatório anual com
o objetivo central de fortalecer o conceito de “desenvolvimento sustentável” e assim

76
melhorar sua imagem pública e colocá-lo com um agente importante no debate das
políticas ambientais (PEREIRA, 2011).
Porém isso não alterou em nada sua política neoliberal, apenas abrindo uma
nova oportunidade em sua agenda com respeito a mercantilização dos bens naturais.
Com a legitimidade do discurso do “desenvolvimento sustentável”, promoveu um regime
internacional de normas direcionado as instituições, em que os Estados só seriam aptos
a conseguir empréstimos mediante a restruturação das legislações nacionais
relacionadas aos bens naturais, que possibilitassem o livre comércio destes como
”ativos ambientais” (PEREIRA, 2011).
Uma importante ferramenta que possibilitou o “esverdeamento” do Banco e o
aumento do seu poder de influência nas políticas ambientais foi a criação do Fundo
Global para o Meio Ambiente (Global Environmental Facility – GEF) que lhe possibilitou
administrar recursos de projetos ambientais internacionais. Com a legitimidade
conferida pela ECO-92, com a presença de 118 chefes de Estado, o Banco Mundial,
através do GEF passou a ser a principal fonte multilateral de financiamento para
implementação da Agenda 21 (PEREIRA, 2011).
Outra força muito importante dentro do campo ambiental que gerou mudanças
significativas no rumo do debate ambiental é representada pelas grandes ONGs
ambientalistas que ganharam cada vez mais influência nas conferências ambientais da
ONU e também nos governos nacionais, especialmente nos países periféricos do
capitalismo (DIEGUES, 2008). Elas que antes tinham uma postura de enfrentamento
aos grandes projetos de desenvolvimento financiados principalmente pelo Banco
Mundial, passaram a ser parceiras e cogestoras de projetos financiados pelo Banco,
tendo maior poder de influência nas políticas de gestão ambiental (ZHOURI, 2006;
PEREIRA, 2011; DIEGUES, 2008). Isso pode ser exemplificado pelo discurso de uma
das maiores ONGs ambientalistas, a World Wildlife Fund (WWF), que no momento de
um lançamento de campanha de suas estratégias florestais, em 1995, colocou a
prioridade nas interações positivas, construção de consenso e soluções comuns para
as questões de conservação e manejo florestal (ZHOURI, 2006). Temos então a
tendência a hegemonização do “ambientalismo de resultados”, em que, como diria
Zhouri “(...) as organizações voltam-se para uma acomodação ao paradigma dominante
de adequação ambiental, no bojo do atual modelo de sociedade” (ZHOURI, 2006, p.153)
Essas grandes ONGs ambientalistas como WWF, a Conservation International
(CI) e The Nature Conservancy (TNC), têm uma concepção preservacionista, com
tendência a separar os aspectos sociais dos ambientais. Enfatizam os “perigos para a
biodiversidade” como perda de ambientes naturais, introdução de espécies exóticas,
fragmentação dos ambientes e prioritariamente investem seus esforços na criação de

77
unidades de conservação integrais apartadas da interação com a espécie humana, além
de mecanismos financeiros para compensação e regulação dos problemas ambientais
(DIEGUES, 2008; ESCOBAR, 1998). Como elas têm o apoio de organização financeiras
multilaterais como o Banco Mundial ou instituições como a Agência dos Estados Unidos
para o Desenvolvimento Internacional (USAID), há fartura de recursos para implementar
ou financiar suas ações, principalmente em países periféricos do capitalismo que não
possuem recursos. Assim, essas ONGs atuam de diferentes formas, realizando
treinamentos e formações, identificando áreas prioritárias para conservação e
realizando planos de manejo, geralmente para áreas de proteção integral. Fazem isso
seguindo critérios externos que tem mais relação com as instituições que as financiam
do que com as especificidades dos locais aonde os planos de manejo são colocados
em prática, gerando conflitos com as comunidades locais que muitas vezes são
expulsas de suas áreas originárias (DIEGUES, 2008; PORTO-GONÇALVES, 2006).
Outro mecanismo importante que as grandes ONGs ambientalistas apoiam e
ajudam a executar, utilizando o conhecimento técnico e a eficiência com base no
“desenvolvimento sustentável” é a criação de certificação “verde” de produtos, o que
pode ser demonstrado pelas políticas de manejo florestal construídas principalmente
para a Amazônia. Essas grandes ONGs ambientalistas associadas ao setor madeireiro
desenvolveram um mecanismo de certificação de madeira chamado Forest Stewardship
Council (FSC), com base na “construção de consensos” e assim facilitando práticas
industriais orientadas para eficiência na produção. Apesar dos defensores da
certificação alegarem que ela beneficia “comunidades locais”, ela basicamente beneficia
as grandes indústrias madeireiras de exportação (ZHOURI, 2006). Zhouri afirma que
“Como lugares vazios no contexto do mercado global, as florestas são reduzidas ao
estatuto de mercadoria para a sustentabilidade do hegemônico modelo econômico”
(Zhouri, 2006, p.165).
Outro exemplo de certificação “verde” mais recente e emblemático da
“construção de consensos” é o “selo verde” atribuído pela WWF em parceria com
empresas como Bunge, Cargill, Monsanto, Nestlé, Shell, Syngenta, Unilever para a
produção de “soja responsável” no Brasil, em 2011, ao Grupo Maggi, um dos maiores
produtores de soja do mundo que tem áreas com plantio de soja em largas extensões
principalmente no Mato Grosso (CM AMAZÔNIA, 2013b). Podemos ver que a retórica
do “esverdeamento” pode ser empregada largamente, incluso em situações como essa,
em que um modelo de produção que para muitos é predatório e altamente impactante
para o ambiente é considerado “verde” por esse selo.

2.1.6. Conflitos, tensões e outras perspectivas no campo ambiental

78
Nos projetos relacionados a mecanismos de serviços ambientais, os
compromissos firmados em contrato, pelos “fornecedores” de “serviços” ambientais,
geram obrigações e restrições que muitas vezes excluem práticas tradicionais de
agricultura e extrativismo realizadas nos territórios, criminalizando seus detentores
(MORENO, 2011, 2012, PACKER, 2012). Por exemplo, o programa Bolsa Verde do
governo federal brasileiro gera, para os beneficiários, obrigações de cumprimento de
metas de redução de emissões, requisitos do termo de adesão, que quando não
cumpridos, além da perda da bolsa, podem gerar multas por práticas como os roçados
de subsistência (PACKER, 2012). Esses projetos prejudicam as práticas realizadas por
esses povos e também atingem a soberania dos territórios. Temos um exemplo claro
disso no caso dos índios Munduruku que firmaram um contrato com a empresa irlandesa
Celestial Green (especializada no mercado de carbono). A empresa teria livre acesso a
extensão de 2,3 milhões de hectares do território Munduruku, localizado no município
de Jacareacanga (PA), e direito de propriedade de quaisquer benefícios gerados pela
biodiversidade da área durante o período do contrato (30 anos). O Contrato também
proibiria os índios de utilizarem suas terras sem a prévia autorização da empresa
compradora dos “serviços” ambientais (PACKER, 2012; GLASS, 2012; SALOMON,
2012). Esse contrato acabou sendo invalidado pelo ministério público federal devido as
condições do mesmo. Entretanto, segundo informações da Fundação Nacional do Índio
(FUNAI), existem mais 30 contratos parecidos ao assinado pelos índios Munduruku
(SALOMON, 2012).
Apesar da hegemonia do discurso neoliberal de consenso do “desenvolvimento
sustentável”, dentro do campo ambiental ainda estão presentes outras perspectivas
sobre o debate, que se originaram em parte nas mobilizações sociais do final da década
de 60. Como afirma Acselrad (2004a):

A sustentabilidade remete a relações entre a sociedade e a base material de sua


reprodução. Portanto, não trata-se de uma sustentabilidade dos recursos e do meio
ambiente, mas sim das formas sociais de apropriação e uso desses recursos e deste
ambiente. Pensar dessa maneira implica certamente em se debruçar sobre a luta
social, posto que torna-se visível a vigência de uma disputa entre diferentes modos
de apropriação e uso da base material das sociedades. (ACSELRAD, 2004a, p.4)

As resistências e lutas contra as políticas neoliberais da chamada “economia


verde” vêm de vários movimentos sociais e povos do Brasil e por todo o mundo,
mostrando que as lutas contra esses mecanismos não é residual. Em Outubro de 2009,
em Belém (PA), se reuniram vários movimentos sociais e organizações para debater

79
mecanismos de mercado relacionados ao meio ambiente, e como resultado produziram
a Carta de Belém, em que não aceitam tais mecanismos como solução, pois são formas
de fortalecer o poder econômico e político dos principais agentes, em detrimento das
populações, e permitem que os países industrializados continuem poluindo (CARTA DE
BELÉM5, 2009,). Em Abril de 2010, em Cochabamba na Bolívia, na Conferência
Mundial dos Povos sobre Mudanças Climáticas e os Direitos da Mãe Terra, o “Acuerdo
de los Pueblos” produzido condenou o REDD, que segundo o documento, está violando
a soberania dos Povos, seus direitos e os direitos da Natureza. (CMPCC, 2010).
Simultaneamente a COP-16, em Cancún no México, ocorreram diversas encontros e
manifestações contrárias às políticas do mercado de carbono. A declaração do Fórum
Internacional de Justiça Climática afirmou que o REDD tem como objetivo incorporar ao
mercado terras férteis e bens naturais através de contratos que visam o controle dos
territórios, violando a soberania territorial e constituem uma contra reforma agrária em
escala global (FORO INTERNACIONAL DE JUSTICIA CLIMÁTICA, 2010). Várias
declarações foram produzidas, fruto da resistência às posições oficiais favoráveis ao
REDD/REDD+ na Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável
(Rio+20). Uma das mais contundentes foi a denúncia dos conflitos explicitada pela
declaração “Não ao REDD+! na Rio+20”:

Os povos indígenas e os camponeses estão sendo assassinados, deslocados a força,


criminalizados, e culpados pela mudança climática. Nossa terra está sendo
classificada como “desocupada”, “degradada”, ou precisando de “conservação” e
“reflorestamento”, para justificar grilagens massivas em nome de REDD+, de projetos
de compensação de carbono e da biopirataria (ALIANÇA GLOBAL DOS POVOS
INDIGÉNAS E COMUNIDADES LOCAIS SOBRE MUDANÇA CLIMÁTICA CONTRA
O REDD+, 2012).

O Conselho Indigenista Missionário (CIMI), que assessora os povos indígenas


do Brasil, lançou nota pública na qual considera o REDD, dentre outros mecanismos,
“uma forma de transformar a natureza em mercadoria, a gratuidade em obrigação, a
mística em cláusula contratual, o bem estar em supostos ‘benefícios do capital’” (CIMI,
2012a). Em Setembro de 2012, em Chiapas no México, no “Fórum Campesino e
Indígena: pela defesa da Vida e do Território”, a Via Campesina (articulação
internacional de movimentos camponeses) convocou todos os povos e organizações do
México e do mundo a combater o que consideram as falsas soluções ao aquecimento
global, como os mecanismos de REDD e REDD+ que, segundo os movimentos,
estimulam monocultivos florestais industriais e de transgênicos e também geram um

5 Carta na íntegra nos anexos

80
processo de apropriação, mercantilização e controle dos bens naturais que existem nos
territórios campesinos e indígenas (VIA CAMPESINA, 2012). Já em 2013, durante a VI
Conferência Internacional da Via Campesina, em um dos documentos produzidos é
colocado, que dentre mecanismos da chamada “Economia Verde”, o REDD/REDD+
deve ser imediatamente detido e a dívida climática e ecológica dos países centrais do
capitalismo deve ser enfrentada (VIA CAMPESINA, 2013).
Durante o Abril Indígena de 2013, jornada de luta dos povos indígenas, realizada
devido ao avanço de diversas ameaças aos seus territórios, um ponto claro colocado na
“Declaração da mobilização indígena nacional em defesa dos territórios indígenas” foi a
crítica ao projeto de lei (PL 195/11) que prevê a instituição de um sistema nacional de
REDD+. Segundo o documento: “em flagrante desrespeito ao princípio constitucional
que prevê usufruto exclusivo das terras pelos próprios povos indígenas, o PL elege,
dentre outras, as terras indígenas como objeto de projetos de REDD+.” (ABRIL
INDÍGENA, 2013). Durante a COP de Lima, em 2014, os projetes de REDD+ foram
julgados no Tribunal Internacional da Natureza em que foi colocado que enquanto a
natureza for considerada propriedade na lei, não haverá justiça para as comunidades,
o clima e a natureza (Redd-Monitor.org apud FAUSTINO; FURTADO, 2015)
A perspectiva proposta por Martinez-Alier (2002) do “ecologismo dos pobres”,
em que os sujeitos sociais são os ameaçados pela contaminação das indústrias,
camponeses ameaçados pelas construção de barragens ou pelos grandes latifúndios
com monocultores, e que lutam e resistem ao processo de espoliação, aponta para um
caminho que se leve em consideração outras matrizes de se pensar a sustentabilidade,
pensando também na diversidade cultural e equidade.
Existe “um processo de resistência ao “alisamento” do território e à abstração
das diferenças” (PORTO-GONÇALVES, 2013, p. 1). Leff afirma que:

(...) emergem hoje em dia lutas de resistência dos povos a submeter-se às regras
homogeneizantes do mercado globalizado: a serem reduzidos a elementos de um
“capital humano”, a dissolver seus valores e estilos de vida (LEFF, 2006, p. 236).

O processo de resistência ao modelo do neoliberalismo ambiental e seus


mecanismos gera lutas pela reapropriação da natureza, que reafirmam distintas
territorialidades (PORTO-GONÇALVES, 2011) e tem profundas implicações para a
problemática ambiental, explicitando as relações de poder, os conflitos de interesses e
as distintas relações da sociedade com a natureza (PORTO-GONÇALVES, 2012a;
LEFF, 2009).

81
2.2. Confluência perversa no campo ambiental e conformação do bloco
hegemônico no Acre (localização no tempo e no espaço)

Agora que já situamos o debate nesse campo ambiental com disputar de poder
em uma correlação de forças desigual e introduzimos os mecanismos do capitalismo
vede, abordaremos mais especificamente o Acre melhorando o contexto de nossa
problemática. Para entender por que o sistema que estudamos foi formulado no Acre é
importante resgatar o contexto geográfico-histórico desse estado, principalmente da
década de 70 para cá, e os sujeitos que foram fundamentais para esse contexto.
Também é importante entender como a dinâmica de disputas dentro do campo
ambiental influenciou um movimento de inflexão e aproximação de sujeitos que antes
eram antagônicos e como foi construído um bloco de poder hegemônico fundamental
para implementar e legitimar as políticas que construíram as bases para o SISA.
As elaborações contidas nessa seção, serão parte de publicação conjunta com
o orientador dessa publicação, professor Dr. Carlos Walter Porto-Gonçalves.

2.2.1. Histórico da luta do movimento seringueiro no Acre

Os altos cursos dos rios Purus e Juruá, grandes afluentes da margem direita do
rio Amazonas6, vêm sendo palco de originalíssimas iniciativas político-institucionais.
Desde a segunda metade dos anos 1980 que a região vem contribuindo para imprimir
um novo sentido ao campo ambiental através do que viria, mais tarde, a ser conhecido
como “ecologismo dos pobres” (MARTINEZ-ALIER, 2002), “ecologismo popular” e
“ecosocialismo”, onde a questão social aparece imbricada com a questão ambiental.
O/as seringueiro/s tiveram um papel protagônico ao colocarem essa região no centro do
debate mundial nesses anos 1980. Por outro lado, e com/contra essa corrente do
“ecologismo dos pobres”, “ecologismo popular” e “ecosocialismo”, surge uma outra
perspectiva onde a questão ambiental é vista como oportunidade de negócio, como
oportunidade de lucro, como um novo campo para a acumulação de capital. Para essa
corrente, veremos, a questão técnica aparece como fundamental.
Não é a primeira vez que essa região passara a ser objeto de interesses e notícia
no cenário internacional. A região que viria a ser conhecida como Acre começou a
ganhar o atual contorno jurídico-territorial com o chamado “ciclo da borracha” que, nessa
região específica da Amazônia, se estendeu de 1870 a 1920. O Tratado de Ayacucho,
de 1867, que tratava das fronteiras entre o Brasil e a Bolívia reconhecia explicitamente

6 Região em parte abarcada pelo atual estado do Acre brasileiro.

82
que os limites entre os países “estavam às cegas”, o que indica o caráter periférico e
marginal da região até finais do século XIX e inícios do século XX.
Por essa época, os/as seringueiros/as sob o comando dos “patrões seringalistas”
e suas “correrias” protagonizaram a inserção à divisão internacional capitalista do
trabalho com o mono-extrativismo da goma elástica (a borracha). Sublinhe-se a
expressão mono-extrativismo na afirmação anterior, haja vista a Amazônia se
caracterizar, até o “ciclo da borracha”, por ofertar uma enorme variedade de frutos,
ervas, resinas, madeiras, peles e peixes que configurava uma pauta de exportação com
centenas de produtos onde nenhum deles ultrapassava mais que 3% do total (SANTOS,
1980). Registre-se que a ocupação humana da Amazônia remonta a cerca de 11.200
anos, segundo Anna Roosevelt (ROOSEVELT et. al., 1996), período que corresponde
ao recuo da última glaciação – a Glaciação Würm ou Wisconsin – quando os climas do
planeta ficaram mais úmidos e as amplas áreas de savanas que cobriam a Amazônia
atual passam a ser “colonizadas” pela floresta, como coloca Aziz Ab’Saber (AB’SABER,
1997). Todo esse período, de mais de onze milênios de coevolução entre a formação
da floresta e a ocupação humana plasmaram um rico acervo de conhecimentos de caça,
coleta, pesca, agriculturas, culinárias, medicinas e arquiteturas, enfim, de povos que
com suas culturas souberam tirar proveito de uma floresta que oferece, em média, de
40 a 70 toneladas de biomassa líquida (produtividade biológica primária) por
hectare/ano.
Ao período da borracha considerado áureo pelos seringalistas e casas aviadoras
ligadas à sua exploração, segue-se a perda de liderança amazônica, particularmente
brasileira, no mercado internacional do látex que passa ao controle britânico através de
suas colônias asiáticas. No Acre, aquela história ancestral de mais de 11.000 anos a
que veio se juntar a história de finais do século XIX e inícios do XX, virá se somar uma
história ainda mais recente protagonizada pelos/as seringueiros/as que sobreviveram
ao ciclo da borracha depois dos anos 1920 que, em vez de continuarem a fazer
“correrias”, tiveram que aprender com os povos originários modos de
conviver/sobreviver com a floresta. Afinal, o legado do seringalismo patronal (1870-
1920) não só proibia que se plantasse ou se criasse o que quer que fosse, não só para
manter o seringueiro-produtor de borracha comprando tudo que necessitasse no
“barracão do patrão”, no “puesto gomero”, como também para que maximizasse a
produção de borracha na medida em que a coleta do látex estava restrita ao período do
ano que não chovia e, como sabemos, os dias sem chuva são os que se deve lavrar a
terra. Nesses dias, os seringueiros estavam proibidos pelos patrões de lavrarem a terra
e, deste modo, deviam dedicar todo seu tempo à coleta do látex. A região do rio Acre-
Purus era, particularmente, benfazeja para a exploração do látex pois é a área na

83
Amazônia que dispõe de mais dias sem chuvas, cerca de 180 dias/ano. Em suma, o
seringueiro que sobreviveu ao seringalismo patronal sequer tinha algo para comer como
legado daquela época: a borracha não se come e só servia como mercadoria, como
valor de troca. Enfim, muitos ex-patrões seringalistas a partir da decadência do
seringalismo mono-extrativista foram gozar das imensas riquezas que acumularam,
principalmente em Fortaleza, no Rio de Janeiro, em Manaus ou em Belém. Os/as
seringueiros/as que permaneceram se viram obrigados a diversificar a extração de
frutos e resinas da floresta, obtendo dos indígenas ensinamentos que lhes foram vitais
e começaram a praticar a agricultura e a criação de pequenos aninais para subsistência,
que antes também estavam proibidos7. Passaram, ainda, a constituir família, o que
também antes estavam proibidos, agora se casando com uma índia. Enfim, com a crise
do seringalismo patronal um novo Acre começa a emergir onde os/as seringueiros/as
cumprem um papel relevante construindo uma nova relação com a floresta e com os
povos que nela habitavam ancestralmente.
São esses/essas seringueiros/as autônomas/os que vão colocar o Acre
novamente no centro de um debate de interesse mundial nos anos 1980, quando a
região volta a ocupar as manchetes internacionais, agora em virtude da ação desses
grupos sociais até então invisibilizados. E, mais, os/as seringueiros/as que antes, no
sistema do seringal-empresa, do seringalismo patronal, co-protagonizaram as
“correrias”, agora, se manifestam aliados politicamente aos indígenas com a Aliança dos
Povos da Floresta.

2.2.1.1. A Amazônia sob os Holofotes Globais: a última fronteira

A Amazônia passa a viver uma nova fase da sua ocupação geográfica a partir
dos anos 1960, fase essa marcada por dois macroprocessos que lhes são externos e
que, a princípio, eram independentes entre si:
De um lado, um macroprocesso geopolítico interno ao país em que a região
passa a estar integrada fisicamente à rede de transportes ao centro-sul do país, com
construção da Rodovia Belém-Brasília (1962) e, mais tarde, com a integração à região
Nordeste do país, com a Transamazônica (1970). Esse processo de integração imposto
à região pelas elites empresariais, burocráticas e militares desde uma perspectiva
externa à região, se aliará ao grande capital internacional ainda que sob um discurso
nacionalista de “integrar para não entregar”, como se dizia à época da ditadura. Grandes

7Em censo demográfico realizado no então Território Federal do Acre, em 1910, cerca de 75%
da população era de homens e somente 25 de mulheres. Ou seja, com essa relação entre os
gêneros não era uma sociedade o que se constituía no Acre.

84
grupos empresariais do setor de mineração serão convidados a investir na região em
parceria com a empresa estatal Vale do Rio Doce para explorar a bauxita, o ferro, o
caulim e outros minérios no maior complexo de exploração mineral em produção no
mundo: a Projeto Grande Carajás. Toda a logística de estradas de rodagem (Belém-
Brasília e Transamazônica) e ferrovias (E.F. Carajás), de energia (Tucuruí), portuária
(Barcarena, no Pará, e Itaqui, no Maranhão) será acompanhada de um sistema de
normas, como diria Milton Santos, onde se destacam subsídios e isenções fiscais para
investimentos na região, como os polpudos subsídios para a energia para as industriais
mineiras, altamente consumidoras de energia como a indústria do alumínio que explora
bauxita.
De outro lado, um macroprocesso que se desenvolve à escala global e que
introduz um novo vetor geopolítico na nova ordem mundial: o vetor ecológico. O marco
normalmente tomado para isso é a Conferência sobre Meio Ambiente convocada pela
ONU em Estocolmo, em 1972. Como vimos no debate do campo ambiental, existe uma
disputa com correlação de forças desigual que definem os rumos desse vetor ecológico
e neoliberalismo ambiental promove uma geopolítica que aprofunda desigualdades.
Os dois macroprocessos acima enunciados vão se encontrar tendo a Amazônia
como um palco privilegiado, e o Acre em particular. A Conferência de Estocolmo
estabeleceu um novo princípio nas relações internacionais ao introduzir o tema
ambiental como estruturante nas relações entre países e suas relações com as
empresas. O governo brasileiro, então uma ditadura sob tutela militar aliada ao
capitalismo internacional em plena Guerra Fria, criará imediatamente, em 1973, uma
Secretaria Especial de Meio Ambiente, a SEMA, ligada diretamente à Presidência da
República, o que não é qualquer coisa numa ditadura. Sua missão era, sobretudo,
garantir que as mega-obras projetadas pelo regime (Rodovia Transamazônica,
Hidrelétrica de Tucuruí e de Balbina, Estrada de Ferro Carajás, Porto de Itaqui, para nos
restringirmos às obras amazônicas) cumprissem aquelas exigências ambientais para
obter o aval do Banco Mundial e outras organizações do sistema de poder mundial para
que pudessem captar os investimentos necessários. Surge um ambientalismo
burocrático a serviço dos megaprojetos estatais-empresariais8.

8 Registre-se que grande parte da devastação da Amazônia e da enorme dívida externa legada
pela ditadura contou com o aval do capital internacional e das organizações multilaterais. O
processo de democratização que se seguiu não se estendeu à auditoria da dívida ecológica e
financeira. Eis um tema que permanece aberto na agenda política.

85
Desde então, uma nova leitura se impõe sobre a Amazônia agora não mais somente
como uma reserva9 inesgotável de recursos e como futuro10 dos países que sobre ela
exercem soberania. A região se torna um verdadeiro “hot spot” do debate ambiental
mundial onde aparece ainda como se fosse a “última fronteira” de natureza prístina.
Verdades pseudocientíficas passam a circular como a “Amazônia, pulmão do mundo”
repetida ad nauseam. Todavia, pouco a pouco um consenso científico vai sendo
produzido sobre a região que a coloca no centro do debate ambiental planetário,
sobretudo pelo papel da floresta na dinâmica climática global, sua riqueza hídrica e a
enorme riqueza em biodiversidade, o que não é qualquer coisa diante dos novos
paradigmas científico-tecnológicos que começam a se desenhar, em particular, a
engenharia genética e novos materiais.
A Amazônia passa, então, a ser disputada, por cima, por setores capitalistas
apoiados em dois paradigmas científico-tecnológicos distintos:

a) um paradigma tradicional, que vem desde o período colonial, de extração destrutiva


que quer a exploração dos recursos naturais na base da rapina: expansão da pecuária,
exploração madeireira, exploração mineral. Devastação é o resultado da ação com base
nessa “extração destrutiva” (BASEY, 2015). As populações tradicionais, sobretudo
indígenas, quilombolas e camponeses em geral, são violentadas pela expansão desse
setor madeireiro, pecuarista e mineral. Trata-se de um setor muito refratário à causa
ambiental, embora o oligopolizado setor mineral vá pouco a pouco se rendendo à causa,
tamanha a pressão do movimento ambientalista e graças a seus enormes ganhos
financeiros11;

b) Um paradigma que vai tentar se apropriar da tradição milenar dos povos da região de
viver com a “floresta em pé”. Desse paradigma faz parte um setor tecnologicamente de
ponta, bioengenharia e de novos materiais sobretudo, que requer a preservação de
amplas áreas para a pesquisa de material genético e outros novos materiais. Um novo
tipo de latifúndio começa a se desenhar, o latifúndio genético, onde o Estado cumpre
um papel de guardião estratégico ao criar unidades de conservação ambiental restritas,

9 Cabe sempre a pergunta: Reserva para quem?


10 E também cabe a pergunta: futuro para quem? Não tem presente? Tudo parece indicar que
permanece uma visão colonial sobre a região que ignora a visão dos que ali habitam. No fundo,
permanece o mito do vazio demográfico. Afinal, se é vazio estamos autorizados a ocupar. É uma
reserva para os de fora, seu futuro.
11 Não devemos ignorar que o caráter altamente oligopolizado desse setor e o fato dessas

grandes empresas mineradoras terem suas sedes nos países capitalistas centrais, o faz,
paradoxalmente, muito vulnerável às denúncias de suas ações. Seus enormes ganhos
derivados, inclusive da renda de monopólio (renda absoluta e renda diferencial por teor) permite
concessões a la carte.

86
com base no paradigma eurocêntrico que separa a natureza da sociedade. Esse setor
estabelece relações de outro tipo com as populações tradicionais, pois depende em
grande parte do conhecimento tradicional dessas populações como fonte de
conhecimento. Mais que biopirataria, como comumente se chama este tipo de roubo,
estamos diante não de roubo de plantas e animais, mas sim de roubo de conhecimento
sobre essas plantas e animais, logo etnobiopirataria. Também associado a esse
paradigma estão os interesses, a partir das áreas legalmente protegidas como unidades
de conservação e terras indígenas, de utilizar essas áreas como reserva para
especulação financeira através de mecanismos de mercado relacionados aos serviços
ambientais, como Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação (REDD),
assim como estoque de madeira e outros bens para futura exploração. Através desse
paradigma os territórios das populações tradicionais passam a ser alvo dos interesses
desses novos setores empresariais gerando novos conflitos territoriais. Aqui, esse
corrente técnico-científica de um ambientalismo da “floresta em pé” se afirma em grande
parte apoiado por grandes corporações empresariais e, através delas, muitas ONGs12.

O processo de expansão da fronteira geográfica do capitalismo posto em prática


pela ditadura sob tutela militar (1964 e 1985) teve por base o velho padrão de
acumulação de rapina, com base na “extração destrutiva”, devastador. A ideia dos
“novos bandeirantes”, agora não mais só de “paulistas”, mas também de “gaúchos”13,
vai se dar com base na violência e na devastação ambiental. As denúncias
internacionais sobre a devastação da Amazônia brasileira ganhavam as manchetes e
um elo que interligava os dois macroprocessos acima descritos ainda não havia sido
devidamente identificado e acionado: o elo que mostrava as responsabilidades dos
organismos multilaterais (Banco Mundial, FMI, OMC e outros) por seu aval às
corporações que financiavam e operavam na Amazônia, para não dizer de seu apoio à
ditadura que, por seu lado, procurava obter financiamentos para seu projeto geopolítico
com base em grandes corporações capitalistas nacionais (Cia Vale do Rio Doce14) e
multinacionais, essas sobretudo no setor de mineração, como a Albrás, Alcoa, Alunorte.

12 Mais tarde um pacto territorial entre essas duas correntes se fará em torno dos zoneamentos
econômico-ecológicos pela mediação de gestores estatais.
13 “Gaúcho” passou a ser uma designação genérica para todo sulista que migrava para a

Amazônia em virtude da predominância dos que vinham do Rio Grande do Sul. A mentalidade
colonial dos filhos de imigrantes italianos e alemães, principalmente, se fará sentir na “fronteira”
contra os “caboclos”, indígenas e “nordestinos”.
14 Registre-se que a Cia. Vale do Rio Doce, assim como a extinta Cia. Siderúrgica Nacional –

CSN - foram criadas em 1942 como parte das negociações do governo brasileiro para sair de
sua posição de neutralidade na guerra e oferecer a borracha para os Aliados contra o Eixo, haja
vista que a maior parte da goma elástica, artigo tecnicamente estratégico, estava na Ásia.

87
2.2.1.2. A Aliança dos Povos da Floresta: um outro protagonista desde abajo

Em parte, em função das novas oportunidades que as comunicações ofereciam,


mas sobretudo em função da visibilidade que a Amazônia passara a ter como “hot spot”
ecológico e das visões e divisões entre os setores dominantes (de um lado, o setor da
“extração destrutiva” e, de outro, o setor da “floresta em pé”, das unidades de
conservação e da engenharia genética, o primeiro devastador e outro conservacionista)
abria espaço para outras perspectivas teórico-políticas que não estavam presentes no
debate. E é aqui que o movimento dos seringueiros do Acre e o movimento indígena
desempenham um papel protagônico, com destaque para algumas de suas lideranças,
como Ailton Krenak, Chico Mendes e Osmarino Amâncio Rodrigues por sua projeção
internacional.
A aliança dos Povos da Floresta articulada no Brasil, todavia, trará uma enorme
contribuição à compreensão do complexo e contraditório jogo de poder mundial ao
desvelar o elo que interligava os organismos multilaterais, às grandes corporações
capitalistas nacionais e multinacionais e à ditadura militar e a transição negociada pós-
ditadura (a “Nova República”) pelos efeitos perversos de devastação que
protagonizavam na Amazônia ao denunciarem, por exemplo, que os recursos
destinados à proteção das comunidades indígenas e à proteção ao meio ambiente ao
longo da BR 36415, não chegava ao seu destino. Chico Mendes foi portador da denúncia
feita em Nova Iorque em reunião do Banco Mundial realizada em março de 1987,
reunião a que teve acesso pelas redes de movimentos sociais a que a Aliança dos Povos
da Floresta estava ligada.
Não se pode olvidar o papel desempenhado pelas Comunidades Eclesiais de
Base no apoio à organização desses setores quase sempre junto com setores de
esquerda. Muitas das oposições sindicais vão ser organizadas e, depois, ainda
assumirão STRs – Sindicato de Trabalhadores Rurais – dando origem ao que se
chamou de “sindicalismo combativo”, a que Chico Mendes e Osmarino Amâncio
Rodrigues, entre outros, tiveram um papel de estaque. À época, muitas organizações
que se forjaram junto com os movimentos sociais de base se definiam como
“organizações sem fins lucrativos” 16 e atuavam em apoio aos movimentos sociais de
base (Vide a FASE e o CTA).

15 A BR 364 interliga Brasília-Cuiabá-Porto Velho-Rio Branco contava com o aval financeiro do


BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento.
16 À época, a ideologia liberal ainda não se fazia tão presente e, portanto, não era a designação

de Organização Não Governamental – ONG – que predominava. Observemos que ambas as


designações se definem pela negativa: uma pelo “Sem” e a outra pelo “Não”. O que talvez nos
ajude a identificar o campo teórico-político onde se situa cada uma seja o que negam: umas
negam o “Lucro” e as outras negam o “Governo”. A simpatia para quem nega o Governo num

88
Essa rede de alianças se articulava em várias direções e escalas: na base, os
Sindicatos de Trabalhadores Rurais - STRs - comandavam os “Empates” e, com a ajuda
do jornal “O Varadouro: um jornal da selva” e do Centro de Trabalhadores da Amazônia
– CTA – ampliavam a organização da base político-comunitária com base na educação
apoiada no método Paulo Freire e, à escala nacional, se articulavam com a Central
Única dos Trabalhadores – CUT- no campo sindical; com os Comitês de Apoio aos
Povos da Floresta (Brasília, São Paulo e Rio de Janeiro) no campo do movimento
popular envolvendo ambientalistas, artistas, intelectuais, cientistas e também ativistas
do movimento sindical e, ainda, à escala nacional com o Instituto de Estudos
Amazônicos – IEA - com sede em Curitiba17, através de quem se articulavam
internacionalmente obtendo apoio político e material de organizações como Ashoka e
Environmental Defense Fund – EDF18.
É importante destacar a importância das relações do movimento seringueiro com
o IEA e o EDF entre outros para o futuro do movimento e para a conformação do bloco
de poder que se constituirá no Acre em finais dos anos 1990 como veremos mais à
frente. A aproximação com essas ONGs, que tanto ajudaram a dar visibilidade
internacional para luta dos seringueiros no Acre, também foi o começo de uma relação
que pressionará por mudar o sentido do movimento pelas relações que essas ONGs
ambientalistas mantêm com as organismos multilaterais e organizações financeiras,
sendo que essas últimas são protagonistas do que chamamos deslizamento do caráter
público do Estado para o setor privado corporativo.
Os Povos da Floresta através dos camponeses florestais, conforme os designa
o antropólogo acreano e professor da Unicamp Mauro Almeida, com seus “Empates”
emprestam uma enorme legitimidade à luta em defesa da Amazônia, de dentro para
fora. As elites políticas brasileiras buscavam, às tontas, alternativas diante do
protagonismo desses grupos sociais em suas lutas contra a expropriação e a
devastação ao mesmo tempo. Ao mesmo tempo que estavam fazendo “Empates” em
Boca do Acre, ou em Xapuri ou em Brasileia estavam também em Nova Iorque ou em
Londres articulando a luta pela Terra, com maiúscula, pois assim demonstravam a
dimensão planetária de sua luta local. Estavam também em Brasília como dirigentes da
CUT fazendo a luta pela terra, com minúscula, ainda que emprestando um sentido

país (ou numa região, como a América Latina) que acabara de sair de uma ditadura, empresta
legitimidade para quem o nega mesmo que essa negação venha de um campo não-liberal. A
“confluência perversa”.
17 Inicialmente coordenado pelas antropólogas Mary Allegretty e Lucia Helena de Oliveira Cunha.
18 A figura do antropólogo Stephan Schwartzman, do EDF, foi fundamental nas articulações nos

EEUU e Europa junto com Mary Allegretty.

89
própria a essa luta19 como luta por território. Ou, ainda, se fazendo presente no “Empate”
realizado em pleno Rio de Janeiro, em 1987, quando obrigaram o então governador do
Acre, Sr. Flaviano Mello, a mudar sua agenda pública naquela cidade quando procurava
atrair investidores para o Acre. Em vez de “vender o Acre”, como seus opositores
denunciavam, o governador teve que dar explicações públicas sobre os atentados
contra trabalhadores rurais que haviam sido baleados em Xapuri em sua luta pela
terra/território na véspera de sua visita ao Rio de Janeiro. Em menos de 24 horas
dezenas de ativistas convocados pelo Comitê de Apoio aos Povos da Floresta daquela
cidade haviam ocupado o Clube de Engenharia onde o governador iria fazer sua
exposição exigindo explicações do governador.
É nesse contexto que, em 1987, é instituída no Acre a Fundação de Tecnologia
do Acre - FUNTAC - que se orgulha de ter sido uma iniciativa de engenheiros florestais20.
Um dos primeiros financiamentos para estudos da FUNTAC foi fornecido pela
International Timber of Tropical Organization (Organização Internacional de Madeira
Tropical – ITTO - por sua sigla em inglês) que disponibilizaria US$ 1 milhão de dólares
para o estudo da cubagem de madeira que poderia justificar a abertura de uma estrada
para o Pacífico. Desde então, e cada vez mais, se fala de “uso racional da floresta”,
quase sinônimo do uso que os engenheiros florestais formulam, como se o uso que os
seringueiros e os povos indígenas fazem fosse desprovido de racionalidade21. Já ali, em
1987, se instaurava uma divisão de projetos políticos de modo bem claro, conforme
veremos.
O ano de 1987 mostra o alcance político das ações do movimento dos
seringueiros e da Aliança dos Povos da Floresta não só com seus “Empates” locais e
nacionais, ou com os prêmios internacionais que Chico Mendes, sua liderança mais
expressiva, havia sido laureado, como o Prêmio Cidadão Global 500 do PNUMA entre
outros, mas, principalmente, pelo impacto da denúncia junto ao Banco Mundial em Nova
Iorque, das instituições implicadas no não-cumprimento das responsabilidades junto às
comunidades indígenas e na proteção do meio ambiente acordadas no financiamento

19 Não só com sua proposta de Resex, mas também com a resolução que submeteu e viu ser
aprovada no IV Congresso Nacional de Trabalhadores Rurais realizado em Brasília em 1985 que
reza que “a reforma agrária deve respeitar os contextos sociogeográficos e culturais específicos”.
20 Os engenheiros florestais têm uma formação profundamente marcada pela matriz

eurocêntrica, cartesiana, e atravessada por um viés econômico mercantil onde a floresta é vista
como recurso. Destaque-se que o estudo das florestas tropicais não faz parte dos currículos da
maior parte das universidades que os formam.
21 Um desses engenheiros, o Sr. Jorge Viana, mais tarde seria um político de destaque no Acre.

Ele chegou a afirmar, logo que chegara ao governo, que quem conhecia a floresta eram os
engenheiros florestais e não os ecologistas, o que desqualificava outros conhecimentos que não
fossem o dos engenheiros, como o dos seringueiros e dos povos indígenas que, sabemos,
mantinham fortes relações com os ecologistas.

90
da BR 364. Os empréstimos internacionais ao Brasil chegaram a ser suspensos
momentaneamente, logo após as denúncias que Chico Mendes havia feito em Nova
Iorque. Definitivamente, os Povos da Floresta passam a ser agentes
locais/regionais/globais e o Acre voltava a estar no mapa do mundo, agora através do
protagonismo dos camponeses, como os seringueiros, e dos povos indígenas.
A tensão política atinge níveis máximos em diferentes escalas sobretudo em final
dos anos 1980. E, para isso, muito contribuiu a conjuntura política nacional que dava
contornos ainda mais (in)tensos às tensões que se abriam com o protagonismo dos
Povos da Floresta em suas articulações internacionais, que já destacamos. O Brasil,
com o fim da ditadura, vivia um clima de maior liberdade de organização política e de
liberdade de imprensa, clima esse ainda mais aguçado em termos de explicitação de
projetos políticos com a Assembleia Nacional Constituinte (1988) e a primeira eleição
direta para a presidência da República desde 1960 que se realizaria em 198922.
A questão fundiária estava sendo abertamente debatida, com o movimento dos
trabalhadores rurais pautando a questão (da reforma) agrária, o movimento indígena
ganhando grande visibilidade e, ainda, com o debate e posterior consagração na nova
Constituição do direito das populações negras remanescentes de quilombo terem seus
territórios reconhecidos. Enfim, a questão fundiária estava em aberto debate.
A tensão no campo brasileiro não podia ser maior: as oligarquias fundiárias
passaram a lançar mão amplamente da prática de atear fogo às matas e aos campos
em suas propriedades para, assim, garantir que suas terras estavam sendo usadas não
sendo, pois, improdutivas, haja vista que a lei determinava que as terras improdutivas
eram passíveis de desapropriação para fins de Reforma Agrária. Essas mesmas
oligarquias latifundiárias passaram a defender suas propriedades “na marra” depois do
fim da ditadura e não foram poucos os leilões de gado para comprar armas organizados
pela União Democrático (sic) Ruralista, a UDR. O período entre 1985 e 1990 registra o
maior número de assassinatos no campo no Brasil, conforme série histórica da
Comissão Pastoral da Terra 1985-2014. A violência institucionalizada na ditadura
passava a ser privatizada, como se vê. As queimadas generalizadas e a violência contra
os que lutavam pela terra/pelo território indicam que, para esses setores, a defesa do
patrimônio é mais importante que a defesa da vida, seja a vida em sentido amplo - das
plantas, animas e das águas – seja a vida dos que lutam pela terra/por território.

22O prestígio de Chico Mendes no movimento sindical chegou a mobilizar certos setores para a
lançar sua candidatura como vice na chapa que seria encabeçada por Luiz Inácio Lula da Silva,
nas eleições de 1989. Com seu assassinato o nome e Júlio Barbosa chegou a ser debatido na
convenção do PT como candidato à vice-presidente.

91
Em 22 de dezembro de 1988, explodia nas manchetes dos jornais de todo o
mundo a notícia do assassinato de Chico Mendes por fazendeiros ligados à União
Democrática Ruralista. Só depois do assassinato de Chico Mendes são decretadas as
primeiras RESEXs que traziam em si um outro paradigma de relação sociedade-
natureza que estava em curso nas propostas dos movimentos sociais. Assim, vemos
como os paradigmas são concretamente instituídos, sobretudo quando trazem outros
horizontes de sentido dos grupos/classes sociais/etnias/povos e nacionalidades
subalternizados e contra o padrão de saber/poder dominante. Não se trata somente de
uma questão epistêmica, embora o seja, mas sobretudo de uma questão epistêmico-
política. Estamos diante de uma situação emblemática em que movimentos sociais se
mostram formuladores intelectuais no melhor sentido da palavra. E, no caso, das
Reservas Extrativistas o conceito e o paradigma que sugerem foi forjado concretamente
com sangue.

2.2.1.3. A Criatividade dos/das Seringueiros/as Autônomos/as: a RESEX

A Reserva Extrativista foi a forma que os/as seringueiros/as encontraram para


afirmar: (1) o saber das populações como condição da preservação da natureza; (2) o
caráter comum da apropriação das condições naturais da existência com o respeito à
propriedade de cada família de sua Colocação e (3) estabelecer o controle sobre suas
condições de reprodução, enfim, afirmar sua territorialidade por meio da autonomia.
Chico Mendes afirmara que “não há defesa da floresta sem os povos da floresta” e,
assim, criava as bases para o reconhecimento do notório saber das populações
tradicionais. A ideia de autonomia se afirma fortemente no mundo seringueiro com as
Reservas Extrativistas. Registre-se que essa cultura autonomista do mundo seringueiro,
que o movimento social soube traduzir na RESEX, se inscreve numa cultura política que
veio sendo engendrada nos movimentos sociais em luta pela democratização do país,
onde mais que lutar por direitos constituídos lutam para constituir direitos: o direito a
inventar direitos. O conceito de RESEX, por exemplo, é uma invenção de direito, pois
não havia, até então, unidade territorial de caráter ambiental que consagrasse a
dimensão social junto com a natural e ao mesmo tempo o caráter comunitário da forma
de propriedade.
Enfim, a partir da iniciativa dos movimentos sociais organizados é criada a
primeira unidade territorial em que a defesa da natureza contempla não só a questão
cultural, o “notório saber” das populações como assinalado acima, mas também a

92
questão social com a criação das Reservas Extrativistas23. Chico Mendes, assim como
Osmarino Amâncio Rodrigues, vão afirmar que “a Reserva Extrativista é a reforma
agrária dos seringueiros”.
É interessante observar que as primeiras reservas extrativistas anunciadas
depois do assassinato de Chico Mendes não foram criadas na sub-região da Amazônia
mais devastada, a Amazônia Oriental (Sul de Sudeste do Pará, Norte do Mato Grosso
e do Tocantins e Oeste do Maranhão), nem tampouco em Rondônia onde os projetos
de colonização dirigidos pelo Estado e pela “colonização espontânea” provocaram as
maiores extensões de áreas desmatadas. Ao contrário, será no Acre que serão
decretadas as primeiras RESEXs onde entre os ativistas que agiam junto com os STRs,
com o CNS e sua rede de apoio (jornal “O Varadouro”, CTA e IEA e alguns
pesquisadores de algumas universidades como a UFAC, UnB, USP e UFF,
principalmente) falava-se abertamente que havia de se evitar a “rondonização do Acre”.
Com isso, indicava-se que devia se evitar a colonização com base nas pequenas
propriedades que avançavam sobre a floresta “amansando a terra” para os grandes
fazendeiros com o avanço da “pata do boi”, como diziam. Essa compreensão era bem
diferente daquela que predominava na Amazônia Oriental, região onde além do avanço
dos grileiros/fazendeiros/madeireiros incentivados pelo governo, houve uma luta
renhida de camponeses do Nordeste e das demais regiões do país em busca de um
pedaço de terra, migração essa também em parte incentivada e tolerada pelos governos
ditatoriais, seja na perspectiva geopolítica de “integrar para não entregar”, seja para
garantir mão de obra barata para os grandes projetos que empreendiam24. A região do
Sul e Sudeste do Pará concentrará o maior número de trabalhadores rurais assentados
do país.
A originalidade do Paradigma que os seringueiros propõem, que tem nas
RESEXs seus princípios ético-políticos e que se consagrou após o assassinato de Chico
Mendes, colocou o Acre no centro do debate político ambiental numa região que era o
centro desse debate no mundo: a Amazônia. Até mesmo no campo dos direitos
humanos propriamente ditos o movimento dos seringueiros e o Acre têm um papel
fundamental: os primeiros mandantes de assassinato de um trabalhador rural a serem
presos, julgados e condenados no Brasil foram justamente os que mandaram matar
Chico Mendes. E foi exatamente a visibilidade política conquistada pelos seringueiros

23 À mesma época são criados pelo INCRA, e com os mesmos princípios que as RESEXs, os
Projetos de Assentamento Agroextrativistas.
24 Ficou famosa a frase atribuída ao ditador General Emílio Garrastazu Médici: "Homens sem

terras do Nordeste para terras sem homens na Amazônia" ao justificar a construção da rodovia
Transamazônica.

93
do Acre que trouxe ao Brasil centenas de jornalistas de todo o mundo para acompanhar
o júri que culminou nessas condenações.
A repercussão da luta dos seringueiros e dos Povos da Floresta colocou o Acre
no centro do debate ambiental planetário e foi responsável por trazer a Conferência da
ONU sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento – a CNUMAD – para o Rio de Janeiro,
em 1992. Sem dúvida, o assassinato de Chico Mendes desempenhou um papel decisivo
para que assim fosse. E o Rio de Janeiro assistiu a primeira grande jornada mundial de
movimentos sociais quando mais de 100 mil ativistas se reuniram no Aterro do
Flamengo no 1º fórum paralelo às reuniões protagonizadas pelo sistema de poder
mundial em torno da ONU.
Nos inícios dos anos 1990, e ainda no calor das queimadas na Amazônia e dos
assassinatos que se perpetravam no campo, com destaque para a Amazônia e entre os
quais o de Chico Mendes foi o de maior repercussão, inclusive mundial, o Grupo dos 7
países mais ricos do mundo cria um programa piloto para a proteção das florestas
tropicais – PP-G7. Os movimentos sociais, com o CNS à frente, vão exigir sua
participação nesse fórum afirmando, com isso, um componente que marcava a cultura
política dos movimentos sociais que lutaram contra a ditadura e pela democratização do
país: o protagonismo dos movimentos sociais. Enfim, reivindicavam que a política não
se restringia ao Estado e aos governos. Na conjuntura política tensa que envolveu a Rio
92, em que alguns setores militares chegaram a ver uma conspiração internacional para
tomar a Amazônia, quando ativistas de movimentos sociais, sobretudo das populações
tradicionais da Amazônia, transitavam com grande mobilidade em diversas escalas,
inclusive internacionalmente, o governo brasileiro propõe a criação de um Conselho
Nacional de Populações Tradicionais e, com isso, atrai os movimentos para operar na
escala de poder nacional. Novas ambiguidades se instauram nessa instância política
entre o caráter público e o caráter privado no interior do Estado mesmo, onde há a
tendência que a política tradicional tem de se separar da vida social, que é o terreno a
partir de onde os movimentos sociais inventam a política. Sabemos como a política
tende a ser vista a partir do instituído, das instituições do estático – Estado – e, assim,
a ignorar os processos/sujeitos instituintes - o movimento.
É importante destacar também que o PP-G7 será gerido pelo Banco Mundial e
não só proporcionou maior institucionalização do CNS através da participação no
Conselho Nacional de Populações Tradicionais, mas também um maior contato com o
próprio Banco Mundial e sua rede de colaboradores no processo de implementação do
PP-G7 com agências de fomento e ONGs ambientalistas. O programa contou com
financiamento de US$ 428 milhões e 28 projetos dentro os quais os primeiros tiveram
relação com a criação de uma política nacional de manejo dos recursos naturais

94
(FAUSTINO; FURTADO, 2015). A partir dessa relação entre PP-G7 e organizações do
movimento social se formou a articulação do Grupo de Trabalho Amazônico (GTA), com
a finalidade de acompanhar e negociar a implementação do programa. O GTA também
cumprirá um papel importante na mudança de atuação de organizações na Amazônia
(CM AMAZÔNIA, 2012). Aqui temos um dos marcos importantes para entendermos os
rumos que o movimento tomará posteriormente. Já destacamos acima como o começo
da relação com o IEA e EDF foi importante nesse processo de articulação nacional-
internacional do movimento dos seringueiros. Essas organizações foram responsáveis
pela articulação internacional captando fundos e apoios para o movimento seringueiro
e, ao mesmo, proporcionaram um progressivo aumento de contato entre as mesmas.
Essas ONGs operam com fundos captados de empresas, fundações e governos e, em
sua maior parte, operam com a “lógica do consenso” enquanto entidades mediadoras.
Esse caráter das ONGs provocará, pouco a pouco, uma profunda mudança na cultura
política dos movimentos sociais cuja história é marcada por lutas sociais e conflitos de
caráter público. Isso fez com que, progressivamente, as estratégias adotadas fossem
cada vez mais direcionadas a perspectivas integradas ao sistema de valores
dominantes como, por exemplo, em lugar do ativismo a assessoria e a competência
técnica; em lugar da política o mercado (PAULA, 2004), onde cada vez mais se observa
a profissionalização da mediação social.
Toda essa mudança terá profundas implicações com os princípios ético-políticos
das RESEXs que, inclusive, explicitam que são os próprios interessados que devem ter
a prerrogativa de propor e gerir esses espaços25. Para isso, o Estado deve emitir um
documento de “concessão de direito real de uso” por um prazo de 30 anos, renovável,
para a unidade territorial assim definida como RESEX. Enfim, a RESEX não é um
conceito meramente técnico é, sobretudo, político onde a cultura das populações – seu
notório saber – se mostrou capaz de nos legar um patrimônio de vida que a sociedade,
através do Estado, por esse meio está formalmente reconhecendo. Mais que espaço,
mais que terra, se quer território: autonomia.

2.2.2. Inflexão política do movimento social no Acre

Como se vê, uma nova dialética complexa se instaura nas lutas sociais nos anos
1990 e o campo ambiental, por toda significação que adquire na nova ordem geopolítica,

25Chico Mendes chegou a afirmar que se quiserem acabar com as Reservas Extrativistas era só
começar a decretá-las sem que seja por iniciativa das populações previamente organizadas e
que, assim, se manifestem e as reivindiquem.

95
é um campo fértil de disputas e para experimentações26, como as que emanam do
campo das lutas populares e democráticas, como a proposta das RESEX e o desenho
de um outro paradigma de relação sociedade-natureza, como assinalamos acima. Por
outro lado, já em 1987 tanto à escala regional amazônica, com destaque para o Acre,
como à escala global, uma perspectiva empresarial, que privilegia o debate político no
campo técnico vai começar a dar passos importantes e, pouco a pouco, aglutinará em
torno de si um conjunto de agentes e instituições em tensão com/contra os movimentos
sociais e sua cultura política de direitos e de participação protagônica. No Acre, essas
iniciativas podem ser claramente identificadas na FUNTAC e a visão da floresta forjada
por engenheiros em perspectiva de mercado. O caráter contraditório entre as diferentes
perspectivas pode ser visto no antagonismo entre o governo que fundaria a FUNTAC e
o movimento dos seringueiros, como vimos em 1987. O episódio acima narrado do
“Empate” no Clube de Engenharia no Rio de Janeiro, onde cada um estava em lados
opostos, é sintomático.
No cenário internacional é, também, em 1987 que a ONU lança o Relatório
Brundtland sob o título Nosso Futuro Comum onde, pela primeira vez no campo
ambiental é sistematizada uma proposta em que o desenvolvimento capitalista em sua
perspectiva mercadológica não é questionado, como vinha sendo com a Contracultura
e a Nova Esquerda desde os anos 1960 e de onde emana o movimento ambientalista.
Ao contrário, no Relatório Brundtland o desenvolvimento é recuperado e passa a ser
adjetivado como ambiental: desenvolvimento sustentável27. Tudo indica que o
substantivo – desenvolvimento – não pode ser discutido como tal e, no máximo, pode
receber adjetivos como esse - desenvolvimento sustentável - eis a nova panaceia.
Pode-se apontar a CNUMAD, a Rio 92, como um momento de bifurcação no
interior do campo ambiental e, para o “ecologismo popular”, talvez tenha sido seu
momento de maior visibilidade. Desde então, uma nova “governança global” começa a
se impor. Nele, o Estado passa a ser capturado por uma lógica mais explicitamente
privatista e, dessa perspectiva, a se impor sobre a sociedade sob a influência cada vez
maior das grandes corporações e seus intelectuais (think thanks). O Consenso de
Washington é o seu desenho estratégico.
Nesse novo contexto, serão enormes os desafios que se apresentarão para os
movimentos sociais que haviam construído uma forte cultura democrática e que

26 Sobretudo para a questão das escalas geográficas de poder haja vista que com a questão
ambiental nossa casa já não é somente o estado territorial onde nascemos, mas também o
planeta. A soberania se torna mais complexa e outros grupos sociais até então marginalizados
comparecem à cena política nacional e global desde o local.
27 É interessante que a afirmação do desenvolvimento como sustentável não tenha sido resultado

de um diagnóstico das causas e dos porquês de o desenvolvimento até ali ser insustentável.

96
reivindicavam participação na política e viam o Estado como um lugar privilegiado de
mediação do interesse público, do bem comum. Todavia, os anos 1990 passamos a ver
o Estado perdendo seu caráter público. A perspectiva nutrida pelos movimentos sociais
de afirmação de direitos passa a ser substituída pela ideia de “qualidade de vida”; a ideia
de participação vai ganhando um sentido individualizante; a responsabilidade social
deixa de ser uma questão pública e passa a ser “responsabilidade social e ambiental”
de empresas (quase sempre através de ONGs), enfim, os movimentos sociais vão se
ver diante das Organizações que de Não-Governamentais passam a ser Neo-
Governamentais. Nesse sentido, é importante registrar como o ideário chamado de
neoliberal se fortalece com seu discurso de menos-governo e mais mercado através de
organizações que se dizem não-governamentais. Hoje sabemos o quanto as políticas
que se dizem de menos-governo se afirmaram capturando o Estado. Ou seja, em lugar
do velho liberalismo que procurava limitar a ação do Estado para proteger o cidadão,
passamos a ter a colonização do Estado pela lógica privada com sua captura pelas
grandes corporações. As ONGs terão um papel fundamental nessa nova governança
estabelecendo um fino e sofisticado controle social através de assessorias que pouco a
pouco substituem o velho protagonismo dos sindicatos e dos partidos políticos e outras
formas de mobilização na luta por justiça e reconhecimento dos grupos sociais
subalternizados. Com as organizações Neo-governamentais o controle social se faz a
partir de baixo. Evelina Dagnino aponta que há um deslocamento de sentido de
cidadania e de solidariedade que, segunda ela:

(...) obscurece sua dimensão política e corrói as referências à responsabilidade


pública e interesse público, construídas com tanta dificuldade pelas lutas
democratizantes do nosso passado recente. A distribuição de serviços e benefícios
sociais passa cada vez mais a ocupar o lugar dos direitos e da cidadania, obstruindo
não só a demanda por direitos – não há instâncias para isso já que essa distribuição
depende apenas da boa vontade e da competência dos setores envolvidos – mas,
mais grave, obstando a própria formulação dos direitos e da cidadania e a enunciação
da questão pública. Quando se processa a desmontagem das mediações
institucionais e políticas que possibilitam que o direito possa ser formulado,
reivindicado e instituído como parâmetro na negociação do conflito, o significado da
ideia da pobreza como denegação de direitos se completa (Telles, 2001). A eficácia
simbólica dos direitos na construção de uma sociedade igualitária e democrática se
perde, reforçando ainda mais um já poderoso privatismo como a orientação dominante
no conjunto das relações sociais. (DAGNINO, 2004, p. 108)

A ideia de participação democrática sofre uma inflexão liberal onde o conflito


passa ser negado em nome do consenso e os movimentos sociais passam, inclusive, a

97
serem criminalizados. A socióloga Evelina Dagnino lembra-nos, como exemplo desse
deslocamento de sentido, a afirmação do então Presidente, o sociólogo Fernando
Henrique Cardoso, que acusava o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, o
MST, de ser “um movimento político”. Ora, o MST era um movimento que emanara de
uma gama de movimentos de reinvenção da sociedade brasileira em luta contra a
ditadura, onde a política era recuperada no protagonismo dos movimentos sociais. A
desqualificação de movimentos justamente por serem políticos dá conta do novo espírito
de época que estamos vendo nascer onde a política passa a ser negada.
O Acre vai ser um lugar privilegiado nesse embate teórico-político, sobretudo
porque tinha um movimento social que, tal como o MST à época, era bastante
prestigiado e, assim, aquele estado passou a atrair as atenções dos organismos
internacionais e das organizações neo-governamentais internacionais articuladas às
organizações sobretudo locais acreanas que passam a ser objeto de forte assédio. Um
novo bloco de poder estava se forjando no Acre articulado a partir do campo ambiental.
Essa inflexão começa a ser sentida lá mesmo no interior do movimento dos
seringueiros onde o assédio das ONGs e dos organismos internacionais vai impor,
pouco a pouco, sua agenda política. Já destacamos que o mundo seringueiro não é um
mundo onde a integração ao mercado seja algo estranho, afinal, os migrantes foram
atraídos para a Amazônia no “ciclo da borracha” para produzir algo que não tinha
nenhum valor de uso para eles. No entanto, esse novo momento será de grande tensão.
Os seringueiros que tanto haviam lutado para que o Acre e Xapuri entrassem no mapa
político verão, inclusive, a sede da entidade que tão criativamente haviam fundado, o
CNS, ser transferida para Brasília. Verão seus estatutos serem alterados, com destaque
para a retirada da exigência de que todos seus dirigentes tivessem que estar associados
a algum sindicato de trabalhadores o que, como vimos, consagrava o protagonismo dos
segmentos sociais de trabalhadores. O CTA, entidade que tanto contribuiu para o
processo de formação comunitária e para uma cultura política de participação com o
método Paulo Freire, verá seus quadros serem cada vez mais predominantemente de
engenheiros florestais e menos de educadores, como, até então, havia sido.
As mediações das ONGs ambientalistas nacionais (IEA) e internacionais (EDF,
UICN, CI, WHRC, WWF) passarão a imperar e junto com as políticas que se impunham
desde os organismos internacionais com o aval das elites locais/nacionais que
deslizavam o Estado do público para o privado, passarão a falar mais de economia, de
geração de emprego e renda, do que de organização comunitária, de reforma agrária,
de autonomia das RESEXs. O movimento seringueiro, agora em maior diálogo com o
Estado, devido a necessidade de garantir a implementação de políticas públicas nas
RESEXs passam a focar o debate em questões de “desenvolvimento” (SILVA, 2006).

98
Até mesmo o “notório saber” dos seringueiros será inferiorizado pela exigência
de que a RESEX, como toda UC segundo o SNUC, deve ter um plano de manejo feito
por “técnicos”. Talvez aqui possamos falar de um segundo assassinato de Chico
Mendes! Afinal, foi o saber ancestral do indígena em parte assimilado pelos
camponeses da floresta como os seringueiros, que nos haviam legado todo esse
patrimônio de vida que a floresta encerra. Subordinar seu “notório saber”, já comprovado
em sua eficácia – a floresta-que-aí-está - a um “saber técnico”, repõe uma visão colonial
que tantos males tem trazido à Amazônia e seus povos.

2.2.3. Conformação e ascensão do bloco de poder hegemônico no Acre

Nesse contexto de inflexão política do movimento social do Acre descrito acima,


um bloco de poder, direcionado por uma perspectiva técnica e empresarial, associada
ao paradigma da “floresta em pé”, vai aglutinando diferentes forças sociais durante a
década de 90.
Como vimos, houve um processo de aproximação das ONGs ambientais que
atuam em diferentes escalas com o movimento social no Acre. Uma confluência
perversa galvanizada por parte dos interesses comuns de alguns setores do movimento
social e da corrente “técnica e empresarial” em manter as áreas florestais, em oposição
aos setores da elite que hegemonizavam o estado até então mais associadas ao
paradigma da “extração destrutiva”. Nesse bloco se soma parte do corpo técnico
associado a instituições públicas como UFAC e FUNTAC, também mais identificados
com o paradigma “floresta em pé”. Como já citamos, a FUNTAC já na sua criação, em
1987, tivera apoio da ITTO e, em 1988, cria a Floresta Estadual do Antimary28 visando
a exploração florestal através do manejo madeireiro que se inicia em 1999, a primeira
experiência de concessão para exploração em uma floresta estadual no Brasil
(ANDERSON et. al, 2013), com financiamento de 1,8 milhões de dólares também da
ITTO (AQUINO et al., 2011). Em 2004 o projeto recebeu o selo da Forest Stewardship
Council (FSC), sendo que 66 mil hectares estavam sob manejo florestal empresarial e
outros 11 mil hectares sob manejo florestal comunitário. Registre-se que a extração de
madeira era, até meados dos anos 1990, explicitamente vetada pelas organizações do
movimento dos seringueiros.
Outro aspecto importante desse bloco a ser destacado é a grande influência de
fundações e instituições multilaterais que financiam projetos tanto de ONGs ambientais
como de instituições públicas. O dinheiro do BID, BIRD, WWF entre outros, garantiu a

28 A Floresta Estadual do Antimary foi formalizada pelo Decreto 046 de 07 de Fevereiro de 1997.

99
penetração no movimento social, a partir de projetos e apoios e, assim, deu enorme
capilaridade política a esse novo bloco de poder (CAMELY, 2009; PAULA, 2013). Como
já vimos, as ONGs, ambientais e outras, vêm se constituindo como parte da nova
governança através da ação de instituições multilaterais, como o demonstra o
pesquisador João Márcio Pereira (PEREIRA, 2011) que estudou a relação do Banco
Mundial com grandes ONGs ambientalistas durante as décadas de 80 e 90 e observou
que essas organizações passaram de críticas aos projetos financiados pelo banco a
parceiras na execução das suas políticas.
A ação da WWF é reveladora desse processo como componente do bloco de
poder que estamos descrevendo no Acre, sobretudo por meio de ações conjuntas
às organizações do movimento social, onde cada vez mais tem influência, através da
formação com cursos e assessoria para o desenvolvimento das cadeias produtivas de
produtos da floresta e fortalecimento de cooperativas (CAMELY, 2009, PAULA, 2013).
Em trecho de entrevista realizada, em 14 de maio de 2014, com Alberto Tavares que foi
coordenador do escritório da WWF antes de assumir o cargo de diretor presidente da
CDSA, ele fala da atuação dessa ONG no Acre:

(...) então o WWF começou trabalhar, trabalhou e trabalha com uma série de ações
em estruturação de cadeias produtivas, que vão desde as cadeias produtivas de
pesca (...) ao manejo também das cadeias produtivas florestais, madeireiras e não
madeireiras. As não madeireiras principalmente castanha e borracha, mas também
olha de copaíba (...) E ao longo do tempo se trabalhou principalmente essa questão
de estruturar essas cadeias produtivas não numa perspectiva só manejo, então
ensinar as pessoas a fazerem uma boa prática, não adianta as pessoas produzirem e
não ter mercado pra elas comercializar. Então começa a se olhar, que mais do que só
trabalhar o manejo, tem que se trabalhar a cadeia como um todo. (informação verbal29)

Em outro trecho, ele explicita como a WWF pensou sua atuação em diversos
pontos das cadeias produtivas:

(...) WWF começou a se propor a assessorar essas comunidades e mobilizar


parceiros, apoiadores para fortalecer todos os elos das cadeias produtivas, então
desde as boas práticas do manejo passando processos tecnológicos de
beneficiamento, abertura de mercados e um componente que praticamente, talvez o
WWF tenha sido inovador, que é começar a discutir governança dessas cadeias
produtivas. Nada mais é do que a orquestração e gestão dos recursos humanos,

29
Entrevista concedida por Alberto Tavares [mai. 2014] Entrevistador: Diogo Loibel Sandonato.
Rio Branco, 2014.

100
financeiros etc.... que estão e que são necessários estarem naqueles coletivos, por
que cadeias produtivas são coletivos, não é um ator só que faz (...)

Com a influência dessa ONG, muitos sindicatos de trabalhadores rurais que


eram fundamentais para o movimento social do Acre perderam força para associações
onde não há formação política comunitária, e acabam assimilando propostas políticas
vindas de fora, de cima pra baixo, muitas vezes formuladas sob influência da própria
WWF. Em trecho de entrevista realizada em 12 de maio de 2014 com Ricardo Mello,
atual coordenador do escritório da WWF no Acre ele coloca:

(...) ai a gente veio, começou a trabalhar muito forte com Xapuri, onde surgiu esse
movimento aqui no Acre e depois disso é um momento, vamos dizer de contradição
ao regime dominante da época, político, e teve toda uma estratégia de fortalecimento
para base, sindicatos, cooperativas, essas ações lá. (...) (informação verbal30)

No projeto Cabeceiras, por exemplo, que foi realizado a partir da década de


2000, a WWF assessorou na formulação de estatutos de associações de base,
promoveu extensão rural e ajudou a organizar núcleos de base dentro da RESEX Chico
Mendes (LOPES, 2010, LOPES; FÉLIX, 2014). Tudo isso originalmente era feito pelos
STRs e seus parceiros, à época CTA, por exemplo. Além disso, a WWF tem formulado
e ajudado na implementação de planos de manejo e utilização das reservas extrativistas
no Acre (WWF, 2013, 2014). Também as ONGs locais e regionais como SOS Amazônia,
Grupo de Pesquisa e Extensão em Sistemas Agroflorestais do Acre (PESACRE 31) e
CTA cada vez mais passam a atuar como intermediários da implementação de projetos
elaborados por grandes ONGs ambientais, fundações e instituições multilaterais
(CAMELY, 2009). Assim, essas organizações têm desempenhado um papel importante
como parte do bloco de poder conformado sobretudo pós 1999, atuando junto às
organizações de base, na assistência técnica rural e assessoria das associações em
áreas antes sob ação dos STRs.
Esse bloco que foi se formando e ocupando cada vez mais espaço se apoiou
institucionalmente no Partido dos trabalhadores que tinha sua base no movimento social
do estado. O PT do Acre foi fundado principalmente por sindicalistas e lideranças de
movimentos sociais que travaram lutas históricas particularmente nas décadas de 1970
e 80. A partir da década de 90, o partido lidera o sindicalismo e demais organizações e

30
Entrevista concedida por Ricardo Mello [mai. 2014] Entrevistador: Diogo Loibel Sandonato. Rio
Branco, 2014.
31 O Grupo de Pesquisa e Extensão em Sistemas Agroflorestais do Acre (PESACRE) nasce de

parceria entre a Universidade Federal do Acre com a Universidade da Flórida (CM AMAZÔNIA,
2012).

101
os submete a uma orientação voltada para ocupar o poder institucional (PAULA, 2004).
Vemos, assim, a diminuição do protagonismo dos movimentos sociais com a influência
progressiva das ONGs ambientalistas e de seus financiadores, institucionalmente
apoiados no PT no Acre.
O bloco de poder também atrai parte da elite local32. Vale lembrar também que
Jorge Viana, engenheiro florestal também foi quadro técnico da FUNTAC. Já eleito em
1992 como prefeito de Rio Branco, Jorge Viana começa a consolidar institucionalmente
o novo bloco de poder, que cada vez se torna mais forte sobretudo após a vitória eleitoral
em 1998, com a conquista do governo do estado com a denominada Frente Popular do
Acre, que contava com 12 partidos sendo a maior parte de setores conservadores, entre
eles o PSDB de quem o PT, à escala nacional, era antagonista (CM AMAZÔNIA 2013b,
PAULA & DA SILVA, 2008). Em trecho de entrevista concedida pelo professor da UFAC
Silvio Simione da Silva em 23 de julho de 2014, ele comenta esse processo:

(...) A medida que uma parte dessa elite acreana, sobretudo vinculada a alguns nomes
da política, como a família Viana, Raimundo Angelim, família Mâncio Lima, são
famílias tradicionais de direita que vêm da Arena (...) famílias de extrema direita com
discurso mais progressista aproxima-se do PT e fazem aliança e ai automaticamente
a um processo de endireitamento do partido (...) (informação verbal33)

Na afirmação da hegemonia política no estado, além dessa frente partidária


ampla, foi fundamental o discurso que foi sendo gestado dentro do bloco de poder da
“floresta em pé”. Uma hábil apropriação e mesmo inversão do discurso e da imagem de
Chico Mendes, que passa de sindicalista e defensor da reforma agrária dos seringueiros
e dos direitos territoriais dos povos da floresta a ser visto como um ambientalista
defensor da floresta (CM AMAZÔNIA, 2012; PAULA & DA SILVA, 2008; 2009). A
confluência perversa que descrevemos anteriormente fica evidente, por exemplo, na
declaração da então senadora Marina Silva em 1998:

Carismático, convincente e seguro, ele foi capaz de buscar aliados e apoiadores até
mesmo em setores historicamente hostis à esquerda e ao Partido dos Trabalhadores.
(CM Amazônia, 2013b, p.2).

32 Talvez o melhor exemplo, sejam os irmãos Tião e Jorge Viana, herdeiros de uma família
tradicional na política do estado, filhos de Wildy Viana, deputado estadual pela ARENA (1967 e
1979) e deputado federal (1979 e 1987), e sobrinhos do governador (1979 e 1983) Joaquim
Falcão Macedo, indicado pelo General Ernesto Geisel (CM AMAZÔNIA, 2013b).
33
Entrevista concedida por Silvio Simione da Silva [jul. 2014] Entrevistador: Luiz Henrique
Gomes de Moura. Rio Branco, 2014.

102
Em trecho de entrevista, Silvio Simione também comenta essa apropriação
simbólica:

(...) qual a importância dessa elite acreana da direita que vêm pro PT e ela consegui
aliados fortes que diziam e se dizem de esquerda (...) é por que eles dão uma
legitimidade que essa burguesia não constitui no lugar que ela está, a burguesia não
produziu no Acre, como não produziu quase em lugar nenhum, significados que dê
sustentação seus projetos que ela emplaca depois. E transformar o discurso do
relatório de Bruntland como um discurso do ideal do Chico Mendes é importante, por
que 98% dessa população nunca nem sequer ouviu falar no relatório de Bruntland e
acha ainda que foi o Chico Mendes que criou o termo desenvolvimento sustentável
(...)

A partir de então, como o objetivo de manter a “floresta em pé”, veremos mais


explicitamente setores como pecuaristas e madeireiros, antigos inimigos do movimento
seringueiro, se tornando parceiros no “desenvolvimento sustentável”.
Já antes da conquista do governo do estado pelo bloco de poder liderado pelo
PT, as ONGs ambientalistas, como WWF, atuavam junto às organizações de base dos
movimentos sociais, como associações e sindicatos rurais, como vimos acima. Quando
Jorge Viana se torna governador do Estado, essas ONGs ambientais passaram a atuar
diretamente no governo influenciando diretamente as políticas públicas e os programas
sociais (CAMELY, 2009). Isso fica explícito em trecho de entrevista com Ricardo Mello:

(...) No momento que o poder político do estado muda, que ai entra o Jorge Viana na
prefeitura depois estado, todo esse processo (...) a WWF acompanhou e começou
também muito mais priorizar um aporte, suporte a materialização de políticas públicas,
na questão de você, a possibilidade de você aumentar a área de atuação, então você,
o estado ele tem uma dimensão maior então a gente começou a trabalhar muito
próximo ao governo (...)

Em outro trecho ele explicita qual a principal forma de atuação hoje da WWF no
estado:

(...) a gente deu uma mudança muito grande de apoiar iniciativa direto, iniciativa
indireta a partir de políticas públicas, essas foi uma mudança que a gente teve de perfil
de atuação aqui no estado. Então essa, tem muitas, então a gente acabou, que a
gente fazia essa costura direto, antigamente a costura era direto, como não tinha
interlocução estadual, a gente fazia a costura direto com as agremiações, então
acabou que agora ficou muito mais no âmbito das políticas (...)

103
Em publicação analisando a participação da sociedade civil nos conselhos
estaduais do Acre, Meneses-Filho (2008) coloca: “Não se formaram novos quadros na
Sociedade Civil, enquanto que os quadros da Sociedade Civil vieram para o Governo.”
(MENESES-FILHO, 2008, p. 42). Ricardo Mello também comentou esse processo no
Acre:

(...) como o estado, ele acaba sendo, visto como um parceiro muito próximo, acabou
que é uma coisa que todo mundo queria que o estado fosse, então acabou que, todo,
grande parte do potencial da sociedade civil, ela acabou migrando para o governo,
então teve um esvaziamento do terceiro setor do estado (...)

Vários quadros dessas ONGs são deslocados diretamente para estruturas do


estado, como por exemplo o ex-gestor do escritório da WWF do Acre, Alberto Tavares,
que após 8 anos à frente do escritório da ONG assumiu o cargo de diretor presidente
da Companhia Agência de Desenvolvimento de Serviços Ambientais do Estado do Acre
(CDSA), entidade que desempenhará um papel relevante na formulação da nova
agenda política do bloco de poder, conforme veremos mais adiante. Em outra entrevista
realizada em 9 de maio de 2014, Rodrigo Neves, Procurador Geral do estado do Acre à
época, também afirma esse processo:

(...) a grande maior parte das pessoas que são os gestores hoje na administração
pública, ou vieram do movimento social ou de organizações não governamentais, a
grande maioria (...) (informação verbal34)

Também parte das lideranças do movimento social e sindicalismo passa a


compor o governo. Isso foi analisado por Silva (2006) que comenta:

(...) Muitas práticas se justificam, pois como várias lideranças dos movimentos sociais
(do campo, da cidade e da floresta) assumem cargos da Administração Estadual, há
uma diminuição do poder de embate. Então, da condição de contestadores, passam
a ser difusores de um Projeto de “Desenvolvimento Sustentável”, que não tem raízes
locais, tampouco expressam propósitos de transformação (SILVA, 2005), pois está
enraizada em princípios neoliberais de mercado, embora se proponha outa base de
matrizes produtivas e tecnológicas para a região. (SILVA, 2006, pp. 173-174)

Elder Andrade de Paula (2012) sistematiza o que ele considera os pontos


fundamentais para as políticas ambientais que seriam desenvolvidas:

34
Entrevista concedida por Rodrigo Neves [mai. 2014] Entrevistador: Diogo Loibel Sandonato.
Rio Branco, 2014.

104
(...) As condições políticas que permitiram a realização dessas adaptações resultam
da confluência de três elementos fortemente articulados: 1) rearticulação do bloco de
poder estadual sob a direção de frações das velhas e novas oligarquias; 2)
Assimilação subordinada dos movimentos sociais a esse bloco de poder através do
que Antonio Gramsci (1978) denominou como “transformismo”; 3) Adesão
subordinada a matriz neoliberal e aos agentes nacionais e internacionais que a
fomentam na forma de financiamentos e investimentos. (PAULA, 2012, p 10)

Por tanto, um bloco hegemônico composto por parte da elite local acreana, parte
do comporto técnico e científico do estado, ONG locais, regionais, nacionais e
internacionais, algumas lideranças dos movimentos sociais e sindicalismo e a influência
de instituição multilaterais como o Banco Mundial se fortalece e passar a direcionar as
políticas estaduais a partir de 1999, com a conquista do governo pela Frente Popular do
Acre.

2.2.4. Primeiras ações do bloco a partir da gestão da FPA

Logo no começo da gestão Jorge Viana se inicia a formulação de um


zoneamento ecológico-econômico (ZEE) no estado, com apoio técnico e financeiro de
uma rede de agentes, principalmente relacionados ao PP-G7, dentre eles Banco
Mundial e o banco alemão KfW. O PP-G7, que já demarcamos como um dos pontos
chave de inflexão do movimento social do Acre, teve grande influência nas políticas
ambientais destinadas para Amazônia a partir da década de 90 e o ZEE do Acre,
financiado em parte pelo programa, foi fundamental para subsidiar a elaboração de
programas e empréstimos estratégicos no Acre. (ACRE, 2010b; MEDEIROS et. al,
2008).
O ZEE foi formulado em 2 fases, a primeira de 1999 a 2000 e a segunda entre
2003 e 2006. A partir de sua segunda fase, um mapa de gestão territorial do Estado do
Acre foi elaborado com diretrizes para o planejamento identificando no estado diferentes
zonas, num ordenamento onde se nota a forte influência dos que financiaram sua
elaboração.
É importante que se registre que antes mesmo da posse de Jorge Viana no
governo do estado, em 1998, ele juntamente com Marina Silva, visitam os EUA onde
obtém a garantia de um empréstimo do Banco Interamericano de Desenvolvimento
(BID) para a finalização da BR-36435.

35Não é demais lembrar que o financiamento pela ITTO à FUNTAC, ainda nos seus inícios, e da
qual Jorge Viana era parte do corpo técnico como engenheiro florestal, fora feito justamente para

105
Figura 3. Marina Silva e Jorge Viana, em 1998, em Washington, com o cineasta Adrian Cowell,
em busca de apoio para o projeto de desenvolvimento sustentável do Acre. Fonte:
http://amazone-se.blogspot.com.br/

Depois de um período de negociação se estabeleceu o “Programa de


Desenvolvimento Sustentável do Acre” (PDSA) em sua primeira fase, no qual o banco
emprestou US$ 64,8 milhões estabelecendo várias metas e condições (BID, 2014;
VEROCAI et. al. 2012). Esse programa, iniciado em 2002, já foi elaborado seguindo as
diretrizes do ZEE e indica um padrão que será recorrente na gestão realizada pela
Frente Popular no Acre, onde há uma articulação de diferentes apoios financeiros,
investimentos e empréstimos no desenho e implementação das políticas públicas que
são formuladas com grande influência das instituições multilaterais e ONGs ambientais.
O programa financiado pelo BID assimila o discurso do “desenvolvimento
sustentável” em parte devido ao fato de que os grandes bancos multilaterais passaram
a ter mais cautela na atuação nessa região após o constrangimento internacional gerado
pelas denúncias de impactos negativos e conflitos no projeto da BR-364 no trecho entre
Porto Velho (RO) e Rio Branco (AC) financiado pelo próprio BID, principalmente a partir
das denúncias realizadas por Chico Mendes como descrevemos anteriormente.
(SOUZA, 2009). Entretanto, mais importante ainda, é o fato de que o banco começa a
assimilar um discurso verde e passar a ser considerado parceiro dos povos da floresta
e do legado de Chico Mendes.

fazer a cubagem de madeira para que, eventualmente, pudesse justificar a abertura de uma
estrada para o Pacífico.

106
Entre as condicionalidades impostas pelo Banco nas negociações do PDSA,
estava a criação e ampliação de unidades de conservação e ampliação de uma política
de exploração florestal madeireira (SOUZA, 2009, 2012). Em função dessas
condicionalidades, o governo do Acre, a partir da Lei 1.426 de 27 de dezembro de 2001,
institui o Sistema Estadual de Áreas Naturais Protegidas (SEANP) e regulamenta as
concessões florestais que, entre outras coisas, possibilitou a intensificação da
exploração privada de madeira em florestas públicas. (SOUZA, 2009). É importante
destacar que a regulamentação das concessões florestais só foi possível por que no
ano anterior, foi instituído o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC)
através da Lei nº9.985 e nele está contido a definição de Florestas Públicas Estaduais
que enfatiza a exploração “sustentável” dessas florestas (FAUSTINO; FURTADO,
2015).
Já apoiado no ZEE, no PDSA e no SEANP são criadas as unidades de
conservação de proteção integral, como o Parque Estadual do Chandless com 693.970
ha, e outras de uso sustentável, como as Florestas Estaduais do Mogno, da Liberdade
e do Gregório totalizando 486.320 ha (FUNBIO, 2014). Segundo o relatório do
programa, a meta era inicialmente criar 1 milhão de hectares de florestas estaduais com
a finalidade de exploração florestal e as estimativas, ao final da primeira fase do
programa, já eram de num futuro próximo disponibilizar 1 milhão e 700 mil hectares de
florestas estaduais para exploração florestal36 (BID, 2014; VEROCAI et. al. 2012). Com
a concessão de florestas públicas, inclusive para o manejo empresarial, também
regulamentada pela mesma lei estadual de 2001, conhecida como lei florestal, se
estimulou fortemente a exploração de madeira. Isso ficou ainda mais consolidado
quando, em 2006, foi aprovado a Lei Federal 11.284 que regulamentou a concessão de
florestas públicas em escala nacional. Esta lei possibilita concessões de até 40 anos
para empresas explorarem as áreas. É importante destacar que essa lei foi aprovada
na gestão de Marina Silva no Ministério do Meio Ambiente e que quadros de seu
ministério já tinham atuado na área de manejo florestal no Acre, como por exemplo,
Tasso Azevedo, que era diretor do Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola
(IMAFLORA) e trabalhava com certificação Forest Stewardship Council (FSC) (CM
AMAZÔNIA, 2013b). Dentro da política de estímulo a exploração florestal, também
podemos citar que o Plano Regional de Reforma Agrária do Acre de 2004 a 2007 previa
a destinação de 400 mil hectares para implementação de Projetos de Assentamento
Florestais (PAF) que também destinam áreas públicas para exploração privada (PAULA,

36 No relatório foi contabilizada a área da Floresta Estadual de Jurupari que ainda está em
processo de criação, a época cobrindo 1.194.382,22 ha e a Floresta Estadual do Antimary, criada
antes do programa do BID, em 1988, relacionada a projeto do ITTO, com 45.686 ha.

107
2004). A partir do ZEE e de políticas e programas implementados com financiamento de
instituições multilaterais e apoio das ONGs ambientais, cada vez aumenta o
comprometimento territorial no Acre, no qual áreas são destinadas principalmente para
exploração dos bens naturais secundarizando os direitos dos povos que ali vivem
(SOUZA, 2012). A Reforma Agrária, ideia defendida por Chico Mendes, Osmarino
Amâncio Rodrigues e outros líderes seringueiros, inclusive afirmando que a RESEX era
Reforma Agrária dos seringueiros, sequer é mencionada.
O Sistema Estadual de Áreas Naturais Protegidas (SEANP) é composto pelo
conjunto de unidades de conservação (federais, estaduais e municipais) existentes ou
em criação, reservas legais de propriedades, áreas de proteção permanente, áreas
destinadas ao manejo florestal e parte das reservas indígenas. Segundo dados do
governo, o Acre possui hoje 45,6% de seu território em áreas protegidas, sendo 9,5%
representado por UCs de Proteção Integral; 14,5% são Terras Indígenas e 21,6%
compreendem UCs de Uso Sustentável (Reservas Extrativistas, Florestas Nacionais e
Estaduais) (ACRE, 2011a):

Figura 4. Mapa com mosaico de áreas protegidas do Acre: 1 – Parque Nacional da Serra do Divisor; 2 –
Estação Ecológica do Rio Acre; 3 – Parque Nacional Chandless; 4 – RESEX do Alto Juruá; 5 –
RESEX Chico Mendes; 6 - RESEX Alto Tarauacá; 7 – RESEX Cazumbá-Iracema; 8 – Floresta
Nacional Macauã; 9 – Floresta Estadual do Antimary; 10 – Complexo de Florestas Estaduais do
Mogno, Gregório e Liberdade; 11 - Complexo de Florestas Estaduais do Jurupari; 12 – Floresta
Nacional Santa Rosa do Purus. Fonte: ZEE Acre, 2006.

108
Na mesma lei florestal, de 2001, foi criado o Fundo Estadual de Florestas (FEF)
e o Conselho Florestal Estadual (CFE). O FEF foi criado para receber dinheiro
relacionada a exploração florestal de áreas públicas, doações, empréstimos entre outros
e o CFE foi criado para fiscalizar a aplicação dos recursos. O Conselho possui
representantes do governo e sociedade civil (com 25 membros) e possui entre suas
atribuições, além de acompanhar o FEF e o desenvolvimento florestal no estado,
aprovar a criação de novas florestas estaduais, reservas extrativistas e de
desenvolvimento sustentável, aprovar taxas e tarifas relacionadas a exploração florestal
privada de áreas públicas. Esse conselho cumprirá um papel importante na arquitetura
de participação da sociedade civil na execução das políticas ambientais no Acre. O
fundo estadual de florestas é aplicado no fomento florestal; serviços ambientais;
planejamento, implementação e gestão de unidades de conservação de uso
sustentável; reposição florestal; divulgação e educação florestal; pesquisa em prol do
desenvolvimento do setor florestal.
Pode-se verificar que, já no começo da gestão da Frente Popular no Acre (que
está no poder desde 1999), foram criadas importantes ferramentas técnicas e
institucionais - SEANP e o Fundo Estadual de Florestas, ZEE e do PDSA - para
operacionalizar a exploração pelo capital da “floresta em pé” sob o manto do discurso
do desenvolvimento sustentável. Já nessa lei florestal de 2001, está explicitada a
possibilidade de investimentos relacionados aos serviços ambientais o que demonstra
que essa perspectiva é desenvolvida no Acre a 14 anos, pelo menos.
As primeiras ações da gestão Jorge Viana demonstram a grande influência de
instituições multilaterais como BID e BIRD no ordenamento territorial do estado a partir
das condicionalidades dos grandes empréstimos e programas e também como foi feito
um pacto político-territorial, institucionalizado pelo ZEE. Esse “pacto de uso sustentável
do território”, na retórica de um dos documentos do governo (ACRE, 2009), fica explícito
por outra declaração de Marina Silva, presente em uma publicação de seu gabinete,
quando ainda senadora, em 2001:

Foi-se o tempo em que a ‘turma do Chico Mendes’ e empresários – principalmente


madeireiros – eram como água e óleo. As coisas amadureceram nos últimos 15 anos,
o mundo girou, o Acre está mudando, a ‘turma do Chico’ chegou ao poder e pôde
concretizar suas ideias. Aplacaram-se radicalismos. Viu-se que é possível negociar
diferentes interesses com ética e conhecimento técnico. (…) Por incrível que pareça,
há madeireiros, pecuaristas e petistas sentados à mesma mesa (CM AMAZÔNIA,
2013b, pp. 2-3).

109
O Zoneamento Econômico Ecológico estabelece, na verdade, um pacto territorial, em
que fica estabelecida uma zona para o desenvolvimento do agronegócio mais
relacionado como paradigma da “extração destrutiva”, denominada “consolidação de
sistemas de produção sustentáveis” com 24,4% (zona 1 da figura 5) do território e uma
zona destinada para o capital associado ao “latifúndio genético” através do discurso do
desenvolvimento sustentável com a “floresta em pé”, com seus mecanismos de serviços
ambientais e exploração de bens da floresta, principalmente madeira através do manejo
florestal. Essa zona é denominada “uso sustentável dos recursos naturais e proteção
ambiental” e cobre do 49,5 % do território (zona 2 da figura 5), composta por unidades
de conservação, terras indígenas e projetos de assentamento diferenciados (PAE, PDS,
PAF). Além dessas 2 zonas, também temos a zona de “áreas prioritárias para o
ordenamento territorial” com 25,9 % (zona 3 da figura 5) e a zona de “cidades do Acre”,
com 0,2 % (zona 4 da figura 5) (ACRE, 2010b). Abaixo vemos 4 mapas com as referidas
zonas do ZEE do Acre:

Figura 5. Mapas de gestão territorial a partir do Zoneamento Econômico Ecológico. Fonte: ZEE Acre, 2006.

Para a implementação do ZEE, foram elaboradas ferramentas pensadas para


diferentes escalas e especificidades das áreas. Temos o Ordenamento Territorial Local,
pensado para escala municipal; as zonas de atendimento prioritário (ZAPs),
identificadas assim por serem áreas com altos índices de analfabetismo, reduzida

110
capacidade de organização, condições de saúde precárias e muitas vezes comunidades
isoladas; as zonas especiais de desenvolvimento (ZEDs), áreas com infraestrutura e
investimentos consolidados destinadas a consolidação de cadeias produtivas, e uma
ferramenta para pensar o ordenamento de terras indígenas, o Etnozoneamento com a
finalidade de gerar maior contato entre o poder público e os povos indígenas e subsidiar
os Planos de Gestão Territorial e Ambiental (PGTI) que são a base para posterior
entrada de políticas públicas e financiamento de projetos direcionados aos indígenas
(ACRE, 2010b; 2010c). Essas ferramentas possibilitam um refinamento da escala de
ação e penetração das políticas do estado e também possibilitam a formulação de ações
específicas para comunidades isoladas e territórios indígenas.
Com isso, o novo bloco de poder no Estado articulou os interesses dos diferentes
setores do capital de forma não conflitante e abriu espaço para futuras interações
sinérgicas, conforme veremos adiante. As chamadas “economia verde” e “economia
marrom”, como nos falam Moreno (2012) e Packer (2012) se complementam e se
reforçam, pois, quanto maior a pressão sobre a floresta, mais dinheiro deve ser pago
para compensar o “custo da oportunidade” de não desmatar. Assim, o paradigma da
extração destrutiva, o agronegócio por exemplo, deve receber uma compensação por
não desmatar mais áreas e implementar a pecuária extensiva.
A articulação dos interesses desses setores será a base para o desenvolvimento
das políticas e programas ambientais, com perspectiva técnica e empresarial, realizadas
por esse bloco de poder (elite local, grandes ONGs ambientais, partidos políticos, corpo
técnico de entidades públicas, instituições multilaterais e algumas lideranças do
movimento social) que passa a hegemonizar institucionalmente o estado a partir de
1999 com a vitória da frente popular representada por Jorge Viana. Em trecho de
publicação Silva (2006) comenta o projeto de “desenvolvimento sustentável do Acre:

(...) Este nasce com “os pés” em alguns dos ideais de lutas sociais dos seringueiros,
mas o “o resto do corpo, inclusive a cabeça”, estarão plantados nas pautas das
agências internacionais, sob as teses preconizadas no Relatório Bruntland (“Our
Future Common”). Assim, o Acre começava a se tornar um portal de experiências de
alternativas produtivas no espaço agrário, mas que trazem em si a condição ambígua
de, sob um discurso social e ecológico, firmar muito mais bases para a ação da
iniciativa privada do que para a real firmação de condições de vida melhor ao homem
da floresta. (SILVA, 2006, 173)

Essas políticas e programas ambientais terão sua sistematização mais


elaborada no SISA – Sistema de Incentivos aos Serviços Ambientais – que será objeto
da análise no capítulo a seguir.

111
CAPÍTULO 3 - SISTEMA DE INCENTIVOS AOS SERVIÇOS AMBIENTAS DO ACRE

Com o contexto geográfico, histórico e político, agora podemos entender melhor


como foi elaborado um sistema de serviços ambientais no Acre. Como veremos mais a
frente, a elaboração de políticas ambientais que apontam para a perspectiva dos
serviços ambientais no Acre tem mais de uma década e muitas políticas ambientais
anteriores ao SISA são base para o sistema que é transversal as políticas do estado.
Podemos dizer que as bases para o SISA foram melhor estruturadas a partir de
2007 com a construção do Plano de Valorização dos Ativos Ambientais Florestais
(PVAAF) no qual existia como meta a elaboração de projeto de PSA para o estado. A
partir dos estudos que vinham sendo realizados, em 2009 foi elaborado o projeto de
PSA que a princípio era pensado para áreas específicas do estado, baseado numa
abordagem de projeto de REED, no contexto do Plano Estadual de Prevenção e
Controle do Desmatamento no Acre (PPDC). Durante o processo de revisão desse
projeto, a proposta foi mudando, passando a ser mais abrangente como veremos a
seguir, até chegarmos na proposta do SISA que foi aprovada em 2010.
Em entrevista concedida durante a pesquisa, o Procurador Geral do Estado do
Acre, Rodrigo Neves37 defini o contexto para a formulação do SISA:

(...) você tem um caldo, um conjunto de apoio político, movimento social, ONGs,
modelo de desenvolvimento sustentável, novas políticas públicas, bancos
financiadores (...) existe uma possibilidade ai que é a gente fazer um projeto de REDD,
esse é o contexto mais geral, mais amplo (...)

O SISA foi pensando, nesse contexto, para ser horizontal a um conjunto de


políticas do estado, com foco na redução de desmatamento e emissões. Na publicação
da Lei de 2010 é colocado:

Por tudo isso, o Estado do Acre, que há muito se impôs o desafio de se recriar com
uma base ética fundamentada na proteção da floresta e das culturas dos povos que
nela vivem, tem por meta o estabelecimento de uma política ambiental que esteja
transversalmente introduzida nas políticas do Estado em geral. (ACRE, 2010a, p. 3)

37
Rodrigo Neves à época da entrevista era Procurador Geral do Estado do Acre, foi responsável
por grande parte acompanhamento jurídico na elaboração do SISA e já foi presidente do Instituto
de Mudanças Climáticas (IMC) do Acre.

112
Em entrevista em 16 de maio de 2014 com Monica Julissa de Los Rios de Leal,
que já foi quadro da SEMA e hoje é diretora técnica do IMC, ela demonstra essa ligação
com o planejamento do governo:

(...) o SISA não é um projeto, não é um projeto de REDD, então ele não ser um projeto
de REDD e sim uma política de estado de redução de emissões, então ele tem que
estar baseado na implementação de estratégias, políticas e programas do estado na
área do desenvolvimento econômico que leve a uma contínua redução de emissões.
Então nesse sentido, o arranjo institucional do SISA, ele vêm complementar um
arranjo institucional do Estado, então as instâncias do SISA, de gestão do SISA se
articulam a todo o aparato do estado de implementação de políticas públicas, seja no
setor produtivo, seja no setor de meio ambiente. (...) (informação verbal38)

Em outro trecho da entrevista, ela explicita onde o SISA se encaixa dentro do


plano de governo e plano plurianual, em que foi pensando para dialogar principalmente
com as ações de redução de desmatamento e emissões:

(...) O SISA em realidade, ele acaba pegando todo o arranjo de programas e políticas
do estado que estão dentro do eixo do Plano Plurianual, do eixo de economia de baixo
carbono desse plano de governo, e que estavam dentro do plano de governo anterior,
dentro do economia sustentável, agora passou a se chamar economia de baixo
carbono mas é a mesma coisa (...) ai, dentro desse eixo nós temos então foco tanto
no setor econômico, quanto na gestão ambiental e territorial e de fiscalização e
controle. Com essas três linhas de ação, a gente consegue direcionar soluções aos
vetores que promovem o desmatamento no estado.

Nesse trecho Mônica cita os focos principais do eixo de economia de baixo


carbono presente no plano de governo e plano plurianual. No plano de governo 2015-
2018 é colocado:

A valorização do ativo florestal, o reflorestamento, a geração de energia limpa e o


mercado de serviços ambientais serão fatores importantes da implementação da
economia de baixo carbono. O REDD (Redução de Emissão de Desmatamento e
Degradação) é, não só instrumento fundamental de realização desse propósito, mas
uma oportunidade de negócios para o setor rural, pois poderá se constituir como
uma nova modalidade de renda adquirida com a floresta em pé das áreas de reserva
legal e outros remanescentes florestais das propriedades. (ACRE, 2014a, p. 82, grifos
nossos)

38
Entrevista concedida por Monica Julissa de Los Rios de Leal [mai. 2014] Entrevistador: Diogo
Loibel Sandonato. Rio Branco, 2014.

113
No plano plurianual 2012-2015 temos referência a Política Estadual de
Incentivos aos Serviços Ambientais cuja meta:

(...) é valorizar o ativo ambiental como fonte de serviços ambientais enfatizando


inicialmente a manutenção dos estoques de carbono florestal. Os mecanismos de
incentivos aos serviços ambientais buscam estabelecer fluxos financeiros para os
provedores deste serviço visando a sua provisão continua pautada no
fortalecimento de sistemas produtivos, valorização cultural e mitigação e
adaptação às mudanças climáticas globais. (ACRE, 2011a, p.33, grifos nossos)

Nas seções posteriores desse capítulo, veremos como se dá essa articulação do


SISA com todo o conjunto de políticas ambientais do Estado. Mas primeiro
descreveremos melhor sua arquitetura e funcionamento.

3.1. SISA: arquitetura e funcionamento

3.1.1. Sistema jurisdicional de serviços ambientais

Coerente com a linha das políticas ambientais anteriormente formuladas, o


sistema aos incentivos ambientais do Acre foi pensado para promover o
“desenvolvimento sustentável”, na qual a floresta é considerada provedora de “produtos
e serviços ambientais” (ACRE, 2013a) e as ações devem ser pensadas para integrar
essas áreas florestais com áreas já convertidas, por meio de um “uso eficiente do
território e dos recursos naturais, promovendo assim a conciliação entre
desenvolvimento econômico e conservação ambiental” (ACRE, 2012, p. 10). Segundo
o Plano Plurianual de 2012-2015 do Acre (2011a), o SISA foi elaborado “baseado em
princípios e objetivos internacionalmente construídos para o fortalecimento de um
mercado para ‘floresta em pé’ e para a preservação dos diversos serviços e produtos
ecossistêmicos” (ACRE, 2011a, p. 62). Ainda segundo Stephan Schwartzman39 (2015)
do EDF, importante consultor da elaboração e implementação do SISA, a concepção de
sustentabilidade do Acre é baseado numa visão de que

39 Já citamos a importância do Stephan Schwartzman, diretor de políticas para florestas tropicais


e quadro fundamental do EDF no Brasil, quando ele foi um dos principais articuladores que deram
visibilidade internacional para o movimento seringueiro. Esse processo de aproximação com o
movimento também gerou as possibilidades de que uma ONG como EDF influenciassem os
rumos do movimento seringueiro no Acre como debatemos. Hoje Stephan continua influenciando
ativamente as políticas do Acre como assessor do IMC para implementação do SISA.

114
(...) em um mundo em que aumenta a demanda por estoques de recursos naturais
estratégicos finitos, serviços ambientais e bens comuns globais como chuva,
regulação climática, suprimento de água e biodiversidade podem e vão,
eventualmente ser reconhecidos e valorizados nos mercados globais.
(SCHWARTZMAN, 2015, p. 11, tradução nossa)

A partir dessa concepção explicitada acima, o SISA foi estruturado como uma
ferramenta para apoiar a transição para um desenvolvimento com baixas emissões de
carbono ou em inglês Low Emissions Development (LED)40, articulando e alimentando
o conjunto de políticas ambientais, através da captação de recursos provindos da
quantificação e precificação de bens naturais e interações ecológicas, ou na linguagem
de seus promotores, “coletar, analisar e valorar os produtos e serviços ambientais”
(NEVES, 2010, p. 10). Segundo a publicação que contem a Lei do SISA (2010a):

O Sistema tem, assim, como objetivo principal fomentar a manutenção e a ampliação


da oferta de serviços e produtos ecossistêmicos, quais sejam:

I. o sequestro, a conservação, manutenção e aumento do estoque e a diminuição do


fluxo de carbono;
II. a conservação da beleza cênica natural;
III. a conservação da sociobiodiversidade;
IV. a conservação das águas e dos serviços hídricos;
V. a regulação do clima;
VI. a valorização cultural e do conhecimento tradicional ecossistêmico;
VII. a conservação e o melhoramento do solo. (ACRE, 2010a, p. 6, grifos nossos)

Partindo desses objetivos o sistema contempla, além das reduções de emissões


de CO2, através do Programa de Incentivo a Serviços Ambientais - Carbono (ISA
Carbono), programas voltados para sociobiodiversidade, recursos hídricos, beleza
cênica natural, regulação do clima, valorização do conhecimento tradicional
ecossistêmico e conservação e melhoramento do solo (ACRE, 2010a). O programa ISA
carbono já é regulamentado pela lei de 2010, está estruturado e operacional, visto que
utilizou como base o projeto de PSA de 2009, que era voltado para o mecanismo de
REDD. Os programas de sociobiodiversidade, recursos hídricos e valorização do
conhecimento tradicional ecossistêmico estão sendo elaborados e já constam no plano
de governo de 2015 até 2018 (ACRE, 2014a).
A estratégia adotada pelo SISA, condizente com o pacto político-territorial que
explicitamos a partir do ZEE, é investir os recursos captados pelo sistema para valorizar

40A prioridade que as emissões de gases, principalmente o CO2, ganha para os defensores do
“desenvolvimento sustentável” se deve ao fato de que, até agora, o mercado de carbono é o
mais estruturado, dentre os chamados “serviços ambientais”.

115
“a floresta em pé”, mas também para apoiar as áreas já convertidas, “(...) aumentando
a produtividade e oportunidades de mercado para setores da economia rural”
(ALENCAR et al., 2012, p.8), com a justificativa de melhorar a eficiência produtiva e
evitar a conversão de novas áreas. Segundo a visão do IPAM, expressa em Alencar et
al. (2012):

A transição do Estado do Acre para este modelo de baixas emissões de carbono deve
levar em consideração o custo de manutenção da floresta em pé em relação as
atividades de conversão florestal, de forma a minimizar o “custo de oportunidade”
dessa transição. (ALENCAR et al., 2012, pp. 8-9)

Como visto na citação acima, a lógica que direciona a “transição para uma
economia de baixo carbono” é o custo de oportunidade. Ainda segundo o IPAM, para
calcular esse custo:

(...) Neste sentido, o custo de oportunidade da conservação de florestas pode ser


calculado como o lucro potencial da produção agrícola e pecuária se a floresta tivesse
sido convertida para esses sistemas produtivos, menos a rentabilidade que pode ser
adquirida através de atividades econômicas que mantenha a floresta em pé.
Similarmente, o custo de oportunidade do desmatamento pode ser calculado com
base na rentabilidade da produção sustentável de madeira, borracha, castanha do
Brasil e de outros produtos florestais, subtraído da rentabilidade daquelas atividades
que dependem do desmatamento (ALENCAR et al., 2012, p.21)

Como já abordamos anteriormente baseado em Moreno (2012) e Packer (2012),


a lógica de custo de oportunidade é perversa pois atrela a valorização da “floresta em
pé” por mecanismos como PSA e REDD com a pressão e ameaça exercida sobre os
considerados “ativos ambientais”, seguindo uma lógica de especulação financeira e uma
possibilidade de extrair, por exemplo, uma renda de monopólio por esses “ativos”.
Essa suposta transição para uma “nova economia”, seguindo essa lógica, não
deve afetar as taxas de lucro, ou seja, deve ser tão rentável quanto uma atividade como
a pecuária extensiva que consegue altas taxas de lucros baseada na não contabilização
das assim consideradas “externalidades” como por exemplo legislação trabalhista e
ambiental41. A lógica é predominantemente financeira.
O SISA é considerado um sistema jurisdicional subnacional por que é
regulamentado por um lei estadual, engloba toda a jurisdição do estado do Acre e é

41A pecuária extensiva realizada em grandes latifúndios na Amazônia é a principal atividade


explora trabalhadores análogos a escravidão. Dos trabalhadores libertados de 2003 a 2014,
12.458 ou 29% estavam em fazendas de pecuária (REPORTER BRASIL, 2015).

116
implementado por estruturas do poder público estadual. Por ser uma das primeiras
experiências desse tipo de inciativa e devido ao contexto propício para o seu
desenvolvimento no Acre, esse sistema é considerado um dos mais avançados do
mundo (FISHBEIN; LEE, 2015; SCHWARTZMAN, 2015) e um laboratório para o
desenho desses sistemas (ALENCAR et al., 2012).
Passando de um projeto de pagamento por serviços ambientais com foco em
áreas específicas para um sistema estadual de incentivos aos serviços ambientais,
tivemos uma mudanças de abordagem. Ele passa ter um escopo ambicioso, agora
abrange o estado do Acre por completo, inclusive as áreas geridas pelo governo federal,
como unidades de conservação e assentamentos federais, como também as
propriedades privadas além das terras indígenas (ANDERSON et. al., 2013). Além
disso, diferente de uma abordagem de projeto, esse sistema jurisdicional é transversal
as políticas ambientais do Estado, intervêm na paisagem42 e cadeias produtivas e os
benefícios provindo pela captação dos recursos do sistema são prioritariamente
aplicados através de incentivos gerados por políticas públicas em vez de pagamentos
diretos. Como já destacamos, ele interage com as políticas dos eixos presentes no plana
plurianual e plano de governo e foi pensando para interagir principalmente com todas
as ações que objetivam reduzir o desmatamento.
Para que o sistema funcione a partir do seu primeiro programa estruturado, o
ISA Carbono, precisam ser contabilizadas as “emissões evitadas” de dióxido de carbono
através do desmatamento e degradação do estado como um todo. Essas “emissões
evitadas" são calculadas com base numa coeficiente de desmatamento ou nível de
referência estimado a partir das taxas de desmatamento já realizadas e
consequentemente as emissões já lançadas. Esse nível de referência é utilizado para
gerar a chamada linha de base que é projetada para os anos futuros. Ela deve ser
utilizada como referência como coloca o IPAM:

(...) O nível de referência ou linha de base representa o nível atual e a projeção do


volume das emissões de carbono que ocorreriam na ausência da implantação do
programa de REDD+ Jurisdicional. Esse nível de referência deve ser utilizado para o
cálculo dos créditos pela redução de emissões a serem gerados pelo estado.
(ALENCAR et. al., 2012, p. 28)

42
Nesse caso e nas demais vezes que nos referimos a categoria de paisagem nesse trabalho, utilizamos
uma definição da Ecologia de Paisagem baseada em Metzger (2001) que define paisagem como: “(...)um
mosaico heterogêneo formado por unidades interativas, sendo esta heterogeneidade existente para pelo
menos um fator, segundo um observador e numa determinada escala de observação” (METZGER, 2001,
p.4)

117
A lógica utiliza é a seguinte: caso não sejam realizadas ações para redução do
desmatamento, ou como colocam os formuladores e promotores desse tipo de
mecanismo, continue o “business as usual”, a projeção é que o desmatamento continue
seguindo essa linha de base. Por tanto, com base nas ações, políticas e projetos que
reduzem o desmatamento, as taxas devem diminuir e ficar a baixa da linha de base e a
diferença é contabilizada como emissões evitadas que podem ser transformadas em
créditos de carbono.
Com isso ganha centralidade os métodos de cálculo de desmatamento e
consequentemente o cálculo das linhas de base, visto que dependendo da linha de base
assumida, a diferença entre ela e as taxas atuais estimadas de emissões pode ser
menor ou maior, o que se traduz em mais ou menos créditos e em última instância, mais
ou menos dinheiro. Aqui temos uma das razões para o Acre fortalecer seu próprio
sistema de monitoramento de desmatamento através da Unidade Central de
Geoprocessamento e Sensoriamento Remoto (UCEGEO), criado em 2008 e vinculada
a FUNTAC.
O SISA e o programa ISA Carbono seguem a Política Nacional de Mudanças
Climáticas (PNMC) de 2009 que regulamentou um nível de referência e uma linha de
base para a região amazônica com base nos dados do PRODES/INPE para não gerar
posterior incompatibilidade com um possível programa nacional de REDD. O sistema
também adota os dados do PRODES/INPE de desmatamento para calcular as
“emissões evitadas” pela mesma razão. O nível de referência da PNMC foi calculado a
partir nas taxas de desmatamento para o período de 1996 até 2005 e segundo sua
regulamentação, deve ser ajustado para baixo a cada 5 anos com base no mais recente
intervalo de desmatamento de 10 anos. Isso significa que, com esse ajuste, a margem
que corresponderia aos créditos de carbono é ajustada a cada 5 anos, diminuindo a
possibilidade de geração de créditos.
Aqui temos 2 pontos interessantes de serem destacados. O primeiro é que como
o nível de referência é calculado a partir de taxas de desmatamento realizadas para o
período de 1996 a 2005, quanto maior for o desmatamento nesse período, maior o nível
de referência, o que possibilita uma maior geração de créditos. Devido a isso é
interessante para o Acre que ele comprove que desmatou mais para o referido período.
Devido a isso o IPAM coloca:

(...) No Acre, a estimativa de desmatamento do PRODES é conservadora (Alencar et


al. 2012). O próprio programa de monitoramento de desmatamento do Estado do Acre
demonstrou que o desmatamento foi, na maioria dos anos, aproximadamente 20%
mais alto que a estimativa do PRODES, sendo que a média do período de 1996 –

118
2005 foi 30% mais alta que a taxa média de desmatamento pelo PRODES na mesma
época (ALENCAR et. al., 2012, p.28)

Também devido a isso o Acre através do seu Plano Estadual de Prevenção e


Controle do Desmatamento (PPDC) calculou um nível de referência e uma linha de base
com base nos dados da UCEGEO para demonstrar que as reduções de emissões no
estado são maiores que a estimativa calculada com base no PRODES/INPE. Mas, a
partir da data que se assumi que o programa ISA Carbono teve início, ou seja, a partir
do momento que teoricamente o estado do Acre, através de um conjunto de políticas
ambientais promoveu uma redução do desmatamento e consequente redução de
emissões, as taxas de desmatamento tem que ser as menores possíveis, gerando uma
diferença maior com relação ao nível de referência, ou seja mais “emissões evitadas”.
O IPAM coloca:

(...) Apesar de usar o PRODES como principal fonte de dados, o Acre possui um
programa próprio de monitoramento do desmatamento que detecta em torno de 20%
a mais desmatamento que o sistema federal e que, se usado como base para o nível
de referência, pode indicar um grande pool de redução de emissões e
potencialmente mais créditos por emissão evitada para o programa ISA
Carbono. (ALENCAR et. al., 2012, p.9)

A UCEGEO foi utilizada para demonstrar que o desmatamento do Acre foi maior
que a estimativa do PRODES/INPE para o período de 1996-2005, mas para os últimos
anos não tem divulgado seus dados gerados para o desmatamento no Acre (a última
publicação é de 2013 com dados de 2011 e 2012) o que é no mínimo intrigante. Para
ilustrar essa questão colocamos abaixo uma figura que compara diferentes
metodologias de cálculo de nível de referência e linha de base elaborada pelo IPAM
(ALENCAR, et. al., 2012). Nela, o cenário 1 utiliza a abordagem da PNMC, com dados
do INPE/PRODES e o cenário 2 foi feito com base em dados da UCEGEO. Além disso,
como o IPAM defende que o nível de referência não seja ajustado, ele colocou nos 2
cenários níveis de referência com e sem ajuste:

119
Figura 6. Níveis de referência e meta utilizados para calcular o desmatamento evitado e as
emissões do Estado do Acre, seguindo a metodologia usada pelo o Prodes (A) e dados do
UCGEO (B); o cenário 1 de níveis de referência segue a abordagem do Governo Federal; o
cenário 2 de níveis de referência é baseado no nível de referência que não é ajustado para baixo
a cada 5 anos. A meta é estimada como sendo 42% mais baixa do que o cenário 1 dos níveis de
referência. Fonte: ALENCAR et. al., 2012.

O outro ponto que vale a pena ser destacado é a questão do ajuste do nível de
referência adotado pela PNMC. Como o ajuste diminui os créditos potencias de carbono,
ele é criticado pelo o IPAM:

(...) Esse ajuste carece de justificativa, uma vez que a lógica econômica por trás da
dinâmica do desmatamento poderá não mudar em um período tão curto de tempo.
(ALENCAR et. al., 2012, p. 28)

O IPAM (ALENCAR et. al., 2012) defende que os níveis de referência não sejam
ajustados, ou seja, que se assuma que as taxas de desmatamento serão as do

120
“business as usual”. Esse tipo de disputa pela definição dos níveis de referência e linhas
de base explicita algo que já comentamos: a relação desses mecanismos com o aqui
chamado “business as usual” ou apelidado de “economia marrom”. Ou seja, quanto
maior o desmatamento, maior o potencial de “emissões evitadas”, maior o crédito e mais
dinheiro. Isso faz com que organizações que estão envolvidas nesse tipo de iniciativa
assumam modelos de projeção de desmatamento que desconsideram possíveis ações
e políticas que diminuam o desmatamento e que não tenham relação direta com esses
mecanismos que operam na lógica de mercado.

3.1.2. Captação de recursos e repartição de benefícios

Um ponto muito importante possibilitado pela abordagem jurisdicional, é que o


existe grande flexibilidade para definir onde serão investidos os recursos captados
através da venda dos “ativos ambientais” do estado todo, uma vez que são considerados
“provedores de serviços ambientais”, pela lei do SISA, todos aqueles “que promovem
ações de preservação, conservação, recuperação e uso sustentável de recursos
ambientais“ e beneficiários do sistema, todos que estiverem integrados aos programas,
subprogramas, planos de ação ou projetos (ACRE, 2010a). Essa flexibilidade na hora
de definir os Incentivos aos Serviços Ambientais (ISAs) é justificada na análise da WWF
(ANDERSON et. al., 2013):

(...) A flexibilidade no desenho dos ISAs reflete a amplitude de custos de oportunidade


no estado, que determina a necessidade de desenvolver os ISAs localmente, de
acordo com as condições geográficas e as necessidades e demandas das populações
locais (ANDERSON et. al., 2013, p. 62).

Podem ser custeados ações e intervenções, como é explicitado na descrição do


sistema (ACRE, 2014b), de:
i) florestas ameaçadas pela fronteira agrícola a partir da inserção e/ou consolidação
de práticas produtivas sustentáveis,

ii) florestas conservadas aptas ao manejo de produtos madeireiros e não madeireiros


e conservação da biodiversidade e

iii) florestas plantadas visando a recuperação de serviços ambientais e produção


florestal em áreas já desmatadas (ACRE, 2014b, p. 45).

Os incentivos do sistema foram pensados para priorizar ações de:

121
(...) proteção das florestas; o manejo florestal e as cadeias produtos florestais; a
intensificação de práticas agrícolas, pecuárias, silviculturais e agroflorestais
associadas à restauração de áreas degradadas, de forma a valorizar as florestas e
reduzir a pressão por novas áreas desmatadas (ACRE, 2010a, p. 42).

Partindo do escopo definido pelo Programa ISA Carbono, que visa redução de
emissões de gases de efeito estufa oriundos de desmatamento e degradação, ao fluxo
de carbono, ao manejo florestal sustentável e à conservação, manutenção e aumento
dos estoques de carbono florestal (REDD+) (ACRE, 2013a), as atividades incentivadas
são:
Os principais incentivos relacionados a este programa incluem: a promoção da
transição da produção agropecuária para sistema mais produtivos, reduzindo a
necessidade de expansão das mesmas e, portanto, evitando novos desmatamentos;
o aumento do valor econômico da floresta em pé, visando melhorar a qualidade
de vida dos povos dependentes da floresta e aumentar a conservação das florestas;
e, finalmente, a distribuição de benefícios por serviços ambientais, com base na
comercialização de créditos de carbono, provenientes do desmatamento evitado e
também do sequestro de carbono através de regeneração e restauração florestal.
(ACRE, 2013a, p. 4, grifos nossos)

Sobre os incentivos do SISA, Rodrigo Neves coloca:

(...) você saiu do nível de projeto para programa, e ainda de programa para sistema,
não dá pra falar em pagamento, é um grande, um modelo, é a criação de uma série
de incentivos para estabelecimento de um novo modelo de desenvolvimento, então
incentivo pode ser por meio de recursos financeiros, mas pode ser por incentivo fiscal,
pode ser por novos programas, pode ser por entrega de áreas, pode ser apoio técnico,
pode ser por N instrumentos que estão disponíveis pro Estado incentivar o
desenvolvimento desses novo modelo de desenvolvimento (...)

Pela lógica presente nessa definição, é possível enquadrar como “provedores de


serviços ambientais”, grandes latifundiários que passam a aumentar a taxa de cabeças
de gado por hectare, passando a realizar uma “pecuária sustentável”, assim como
empresas madeireiras que realizam manejo empresarial em áreas de florestas
estaduais, pois estão promovendo o “manejo sustentável da floresta”. No documento
que publica a lei, também é destacado que o SISA não pretende criar novos
instrumentos para realizar os incentivos previstos, mas sim utilizar os que já existem nos
programas governamentais que foram criados independentes do SISA (ACRE, 2010a).
Nesse sentido, “repartição de benefícios” do sistema deve atender a todos no
Acre por essa definição de ISAs, inclusive consolidada na Lei do SISA. Segundo
documento de descrição do Programa ISA Carbono:

122
A Lei Nº 2.308 estabeleceu os critérios que regem a repartição de benefícios oriundos
do SISA e portando do Programa ISA Carbono. Por exemplo, o Art. 2 inciso IX e X
fazem referência à ‘Justiça e equidade na repartição dos benefícios econômicos e
sociais oriundos dos produtos e serviços vinculados aos programas associados a esta
lei; e transparência, eficiência e efetividade na administração, gestão, monitoramento,
avaliação e revisão do sistema e de seus programas’. (ACRE, 2014b, p. 45)

Com base nisso, os investimentos do SISA irão levar em consideração, segundo


documento de descrição (ACRE,2014b) duas questões importantes:

(...) (1) a distribuição das categorias fundiárias no estado e (2) setores (extrativista,
agrícola, florestal e pecuário) que devem receber atenção e em que momento. A
combinação destes dois pontos resulta na valorização da floresta e na diminuição da
pressão por novos desmatamentos. (ACRE, 2014b, p. 27)

A lei não define exatamente percentuais, um modelo fechado de repartição de


benefícios, mas se baseia em estudos das principais ONGs que ajudaram a formular o
sistema. O IPAM é uma das principais organizações que assessorou e deu
embasamento técnico-científico para esse tipo de política que se propõe a combater o
desmatamento. Ele desenvolveu modelos de repartição de benefícios para o ISA
Carbono baseados no que se chama de estoque (áreas de floresta que armazenam o
carbono), associados aos grupos que conservam a floresta, e fluxo (áreas em que seria
evitado o desmatamento), associados aos principais vetores de desmatamento.
Segundo essa abordagem, o IPAM coloca:

Nesta abordagem, os grupos socioeconômicos considerados como vetores de


conservação são os povos indígenas (representados pelas Terras Indígenas – TI) e
os ribeirinhos, seringueiros e outras populações extrativistas tradicionais (que residem
nas reservas extrativistas, e assentamentos agroextrativistas e em outros tipos de
unidade de conservação – UC). Os vetores de desmatamento incluem produtores
familiares vivendo nos projetos de assentamento (PA) e colonos, médios e grandes
proprietários ocupando porções do restante do estado incluindo áreas públicas não
destinadas (PP). O Acre poderia alocar a proporção destinada ao estado, de terra e
recursos naturais (em torno de 6% de acordo com a abordagem de estoque e fluxo
proposta por Moutinho et al. 2011) dentre as categorias de uso da terra de acordo com
essa abordagem que incorpora tanto a quantidade de carbono florestal existente em
cada tipo de categoria fundiária (estoque) e quanto as taxas de desmatamento
associadas a cada categoria (fluxo) (Figura 11). (ALENCAR et. al., 2012, pp. 32-33)

123
O que o IPAM propõe é uma abordagem de estoque-fluxo, justificando que dessa
forma todos seriam beneficiados, tanto os que conservam quanto os que reduzem o
desmatamento e:

O percentual destinado ao estoque e ao fluxo pode ser ajustado para atingir a


proporção mais eficiente que estimule tanto a redução de emissões quanto a
manutenção dos estoques, sendo politicamente negociado entre os grupos
socioeconômicos do estado. (ALENCAR et. al., 2012, p. 34)

Mônica de Los Rios comentou em entrevista sobre essa abordagem que é


referência para o SISA:

(...) a repartição de benefícios, ela deve, dentro do SISA, ela deve atender tanto
aqueles, vamos dizer assim, provedores de serviços ambientais que geram fluxo, isto
é, desmatamento, tentando readequar, de alguma forma incentivar a readequar seu
sistema produtivo e diminuir o fluxo, quanto aqueles que promovem conservação e de
alguma forma apoiar ou incentivar essas populações a continuar fazendo
conservação. Isso a gente denominou de uma abordagem de estoque-fluxo (...)

Além desse modelo, também foi pensando um abordagem programática para


repartição de benefícios, direcionada para “desenho e implantação de programas que
enfoquem atividades historicamente responsáveis por grande parte do desmatamento,
de modo a convertê-las em atividades de baixas emissões” (ALENCAR et. al., 2012,
p.9) na qual o SISA poderia ter investimentos: ”(...) setoriais (agricultura, floresta,
pecuária, etc.), temáticos (cadeias produtivas) ou territoriais (áreas sob risco extremo
de desmatamento).” (ACRE, 2014b, p.46).
Um terceiro modelo, que na verdade é um híbrido entre os dois descritos acima
também é colocado pelo IPAM com o objetivo de proporcionar “apoio sistêmico à
transição para um desenvolvimento rural de baixas emissões” (ALENCAR et. al. ,2012,
p. 36), que inclusive sugere porcentagens para cada categoria fundiária segundo essa
abordagem, como podemos observar na figura abaixo:

124
Figura 7. Modelo híbrido de repartição de benefícios considerando a abordagem estoque-fluxo
e abordagem programática. Fonte: ALENCAR et. al., 2012.

Na entrevista com Mônica de Los Rios, ela também cita essa abordagem e
relaciona mais uma vez com as políticas que compõe o plano plurianual:

(...) Considerando que o estado, ele tem um plano plurianual onde ele tem programas
e políticas destinados a cada um desses atores, que visam obviamente, dinamizar a
economia desses setores, melhorar a qualidade de vida desses setores, então a
repartição de benefícios para cada um desses setores viria através dessas políticas,
então é o que a gente chamou de estoque-fluxo-programática, por que é uma
combinação de ambos. E essas políticas, elas sempre são readequadas conforme a
situação corrente, ela sempre vai ser diferente (...)

Com base nessa abordagem, o IPAM sugere uma estratégia para o Acre de
investir em um programa de pecuária:

125
Nesta abordagem, o estado rapidamente intervém em diminuir o desmatamento,
atacando o principal vetor de conversão florestal – o setor da pecuária - aumentando
assim, a probabilidade de diminuir o desmatamento em escala significativa e criando
uma grande redução de emissões que deverá ser usada para gerar os recursos
financeiros necessários para pagar os outros programas setoriais.” (ALENCAR et. al.,
2012, p.35)

Seguindo essa lógica, o IPAM justifica os incentivos para esse setor:

(...) Essa é a base da premissa que incentivos governamentais direcionados para os


principais atores rurais responsáveis pelo desmatamento comprariam tempo e
garantiriam recursos para que o ISA Carbono fosse implementado (ALENCAR et. al.,
2012, p. 34)

Esse debate de “fluxo” justifica que muitos recursos sejam investidos nos setores
que mais realizam o desmatamento, e no caso do Acre, faz com que o IPAM sugira o
investimento na pecuária para que ela se torne mais eficiente e por tanto, reduza o fluxo
e gere mais créditos. Isso embasa a criação do subprograma de “Pecuária Sustentável”
do programa ISA Carbono. Podemos observar que a questão do fluxo de carbono
associada a questão ao custo de oportunidade, demonstram que a lógica de
mecanismos como o REDD é direcionada pela dinâmica do mercado. O custo de
oportunidade para não realizar a pecuária é alto e como ela é uma atividade que gera
muito fluxo (desmatamento), dentro da lógica desses mecanismos, investir na pecuária
é uma estratégia considerada boa. Outra questão levantada pelo IPAM e que demonstra
a possiblidade de sistemas jurisdicionais dialogarem com o agronegócio é:

(...) algumas empresas que dependem de commodities agrícolas e que


voluntariamente se propuseram a reduzir suas emissões de gases do efeito estufa
(como Unilever, Coca Cola e outras) estão começando a focar na cadeia produtiva
como uma forma de reduzir suas emissões. O “empacotamento” de reduções de
emissões de carbono via commodities agrícolas pode ser muito facilitado com
programas jurisdicionais de REDD+ que definem, registram e comercializam créditos
para um número crescente de compradores. (ALENCAR et. al., 2012 pp. 10-11).

Um elemento muito importante pensado para o sistema, e contemplado na lei


que o regulamenta, são os diversos arranjos de captação dos recursos que depois
podem “incentivar” toda a gama e programas, subprogramas, planos de ação e projetos
especiais que promovem ações “sustentáveis” de redução de desmatamento e
emissões. Segundo Neves (2010), entre as alternativas estão:

126
(...) prevê-se a utilização dos Fundos de Meio Ambiente e de Floresta, além do aporte
de recursos provenientes de acordos bilaterais ou multilaterais sobre o clima; de
doações realizadas por entidades nacionais e internacionais, públicas e privadas; de
fundos públicos nacionais, tais como o Fundo Nacional sobre Mudanças do Clima; da
comercialização de créditos relativos a serviços e produtos ambientais; investimentos
privados ao se consagrar um modelo público-privado na Agência de Serviços
Ambientais, empresa de economia mista que responde a um dos principais desafios,
o de fazer participar o setor público e o privado em parceria para vencer tão grande
desafio; e, por certo, recursos orçamentários próprios do Estado. (NEVES, 2010, p.12)

Iremos mais a frente descrever melhor a dinâmica de funcionamento de algumas


das formas citadas por Neves, mas a princípio é interessante destacar como o SISA foi
pensando para poder receber dinheiro de praticamente qualquer fonte. Isso é justificado
pelo mesmo Rodrigo Neves em trecho de entrevista:

(...) considerando que não existe um mercado amplo, consolidado e efetivo de


carbono, a gente precisaria criar as condições da maior variedade possíveis de
modelos de financiamento e aplicação de recursos dentro do sistema.

As combinações entre modelos de captação de recursos e aplicação dos


mesmos, torna o SISA extremamente complexo e com grande multiplicidade de arranjos
possíveis. Posteriormente veremos em maior detalhe algumas das formas de
funcionamento do sistema, mas por enquanto é interessante, para exemplificar,
destacar o seguinte trecho da entrevista com Rodrigo Neves:

(...) dentro da regra da lei, a gente foi criando alguns instrumentos que permitiam, veja
bem, é como se fosse uma matriz, de instituições, instrumentos de execução e
modelos financeiros (...) então você pode numa relação matricial, de combinação, uma
análise combinatória, se você fizesse uma análise combinatória, você poderia ter essa
instituição, com esse instrumento nesse modelo, essa instituição com esse
instrumento nesse modelo (...) então você pode nessa análise combinatória ter N
possibilidades dentro do sistema (...) Pode ser um país que queria fazer uma doação
para cuidar de uma área específica, como pode ser uma empresa pra fazer uma
compra de créditos de um território indígena, como pode ser um sócio da nossa
empresa que vai investir em um projeto em uma área pública pra venda pra terceiros,
como pode ser a criação de uma nova empresa com investimento privado pra
reflorestamento que vai gerar crédito, então você pode ter uma variedade gigantesca
de instrumentos em que o crédito de carbono ele é quase como um coringa, se vai
utilizando esse coringa, que é o produto desse processo, é o crédito, e esse crédito
serve de coringa pra incentivar qualquer um desses modelos, pode ser usando fundo
público, fundo privado, fundo de investimento, empresa, novas empresas, sociedade
de proposta específica, doação, sociedade, novos empreendimentos, é uma

127
variedade gigantesca, e isso é proposital, isso não torna o sistema menos seguro e
não torna menos auditável, ele torna o sistema flexível o suficiente para se adaptar a
projetos, a programas, programas nacionais e internacionais.

Com base nessa flexibilidade, o Acre realizou já, logo que a lei foi implementada,
alguns acordos visando operacionalizar o SISA. Por exemplo o acordo realizado com a
Califórnia, que está em vias de regulamentar um programa de cap-and-trade43, em que
por exemplo termoelétricas de carvão poderiam compensar parte de suas emissões com
créditos de carbono que poderiam vir do Acre e também do estado de Chiapas no
México, que fez parte do acordo (ALENCAR et. al., 2012; ANDERSON et. al., 2013).
Segundo FURTADO e FAUSTINO (2015), em 2011 foi criado um grupo de trabalho para
elaborar mecanismos técnicos, jurídicos e metodológicos para conseguir ligar os
programas jurisdicionais do Acre e Chiapas com o programa de cap-and-trade da
Califórnia, mas, como colocam as autoras:

(...) Devido à luta social de organizações da Califórnia e dos Estados Unidos como um
todo, além de questões políticas internas, embora o sistema cap-and-trade da
Califórnia tenha sido lançado em 2013, o mesmo ainda não permite a compra de
créditos internacionais de compensação das emissões locais, incluindo os de créditos
de REDD. (FAUSTINO; FURTADO, 2015, p. 70)

Além desse acordo com a Califórnia, em 2012 o Acre também assinou acordos
para implementar sistemas de cap-and-trade, no qual o programa ISA carbono poderia
compensar as emissões de São Paulo, Rio de Janeiro e do BNDES (ANDERSON et.
al., 2013).

3.1.3. Abrangência do SISA

O sistema foi pensando para integrar tanto as áreas públicas, inclusive as áreas
sem regularização fundiária44, como também propriedades privadas, que podem se
beneficiar por parte das políticas públicas, como também pelos projetos especiais que

43O mecanismo de cap-and-trade ou meta/limite e comércio, é gerado a partir de regulamentação


que impõe metas ou limites para, por exemplo, emissões de gases do efeito estufa durante
determinado período, mas ao mesmo tempo permite a compensação por meio de compra de
cotas ou créditos de carbono (FURTADO, 2012).
44 Um dos problemas que dificulta a implementação de projetos de REDD é a falta de

regularização fundiária e os conflitos associados, principalmente em florestas tropicais. A


abordagem adotada pelo Acre possibilita a separação dos mecanismos de serviços ambientais
da questão de regularização fundiária (SCHWARTZMAN, 2015) permitindo o estado englobar as
áreas sem ordenamento territorial (26,2 % do estado) no sistema.

128
descreveremos melhor. O Programa ISA Carbono já está funcionando e tem a função
de captar recursos para dar sustentabilidade financeira para implementação das demais
ações do sistema (ALENCAR et. al., 2012). A lei de 2010 que promove uma abordagem
jurisdicional permite para o programa:

(...) creditação na escala estadual e na escala de projetos. A Lei do SISA permite que
ações do Programa ISA Carbono possam ser executadas pela iniciativa pública ou
privada. Portanto, atividades de projetos de privados são permitidos desde que estes
sejam reconhecidos e integrados como parte do Programa ISA Carbono. (ALENCAR
et. al., 2012, p. 5)

Sobre essa abrangência do SISA, Rodrigo Neves coloca:

(...) não é um projeto de REDD, é uma estratégia de um estado de desenvolver uma


nova política de desenvolvimento de baixas emissões, é isso, é como desenvolver um
estado emitindo pouco, e isso muda a escala, não só de tamanho, mas de estratégia
(...)

A partir dessa perspectiva de atuação no estado como um todo de formas


variadas foram pensadas diferentes ferramentas para implementação do sistema como
colocado na publicação do EPRI (2012), citado por Anderson et. al. (2013):

Agora, por meio de subprogramas e projetos, o enfoque está sendo dirigido a escalas
menores. Essa abordagem distingue o ISA Carbono da grande maioria de
experiências de REDD documentadas no mundo, que geralmente iniciam projetos em
locais específicos, sem um sistema para integrar a jurisdição inteira (EPRI, 2012 apud
ANDERSON et. al., p. 40).

O SISA foi construído seguindo uma abordagem aninhada que permite a


construção de programas, subprogramas e planos de ação, com recorte, que pode ser
tanto espacial, como de uma cadeia produtiva ou de público alvo (ALENCAR et. al.,
2012; NEVES, 2010). Os programas e subprogramas e planos de ação são ferramentas
de implementação do governo, realizados a partir de políticas públicas e demais ações
de como incentivos fiscais e tributários (NEVES, 2010). Além disso existem os “projetos
especiais”, iniciativas privadas, em que estão previstas principalmente ações de:

- florestamento e reflorestamento a longo-prazo, objetivando a expansão da base


florestal para o fornecimento de insumos industriais;
- o florestamento urbano ou a recuperação de áreas degradadas, abandonadas ou
desmatadas. A garantia de sustentabilidade destes setores de atividades deve ser
assegurada por órgãos certificadores nacionais ou estrangeiros de reputação

129
internacional, favorecendo assim, a biodiversidade e a definição de uma proporção de
floresta nativa por área de floresta plantada;
- melhoria do manejo florestal;
- melhoria da agricultura e manejo de pastagens que levem a redução de emissões e
conservação dos solos. (ACRE, 2014b, p. 29)

Tanto os planos de ação quanto os projetos especiais, que são de ordem mais
local, para serem reconhecidos como parte do SISA precisam ser registrados e
regulamentados, assim evitando sobreposição de contabilidade de créditos (ACRE,
2013a; NEVES, 2010). A abordagem aninhada permite a compatibilidade entre essas
diversas escalas de ações e sobre isso, Rodrigo Neves coloca que:

(...) permite que você tenha um projeto, mas de alguma forma esse projeto esteja
encaixado dentro do programa estadual. Que permita um programa estadual, mas que
este programa estadual de alguma forma esteja aninhado dentro de uma estratégia
nacional. E você permite uma flexibilidade ou uma capacidade institucional de que
esse modelo nacional, ele se encaixe em outro, ou se adeque a um eventual sistema
internacional (...)

Para ficar mais claro, a publicação da WWF cita exemplos:

Os subprogramas poderão ser temáticos (podem, por exemplo, abranger terras


indígenas, terras dedicadas à pecuária ou outro tema relacionado ao uso da terra),
geográficos (por exemplo, podem selecionar a região da bacia do Rio Purus, com
enfoque na área de influência da BR-364) ou uma combinação de ambos
(assentamentos da bacia do Alto Acre, por exemplo). Os projetos terão uma
abrangência local dentro dos subprogramas e podem ser implementados com o
envolvimento direto de agências governamentais ou, no caso de projetos especiais,
sob a gestão de agentes privados. Parcerias público-privadas também são previstas
por meio da recém-criada Companhia de Desenvolvimento de Serviços Ambientais.
(ANDERSON et. al., 2013, p. 41)

Com base nesse arranjo, o SISA permite que os desenvolvedores de projetos


privados, os “carbon cowboys” (MORENO, 2011), possam atuar no estado e não
estarem necessariamente em conflito com os objetivos postos para o sistema. Um
exemplo claro disso são os projetos Purus, em Manoel Urbano, citado na introdução
desse trabalho, e os projetos Russas e Valparaíso em Cruzeiro do Sul. Nessa
dissertação não entraremos em maiores detalhes sobre os desdobramentos de tais
projetos, mas isso foi objeto de análise em CM AMAZÔNIA, 2013a; GLASS, 2013;
FAUSTINO; FURTADO, 2015. Nenhum dos projetos “especiais”/privados pré-
cadastrados no SISA estavam reconhecidos e validados como parte do sistema até o

130
final de 2014 (FAUSTINO; FURTADO, 2015). Mas é importante destacar que esse tipo
de projeto é de interesse do estado do Acre e é estimulado e, como colado, já é previsto
no sistema. Para nós, o que o governo do Acre tenta fazer, para garantir a legitimidade
do SISA, é se dissociar de qualquer experiência conflitiva que já tenha vindo a público.
Como, principalmente o Projeto Purus já foi denunciado internacionalmente por várias
entidades, ele ainda não tinha sido cadastrado dentro do SISA.
Essa abrangência que confere uma grande diferença do SISA para outras
experiências de serviços ambientais no mundo, segundo a WWF (2013), confere ao
sistema maior segurança jurídica:

Essa abordagem oferece uma base robusta para um regime de REDD no âmbito
estadual e evita os problemas potenciais que podem surgir quando projetos de REDD
são desenvolvidos dentro de jurisdições políticas sem linhas de base e sem
instituições oficiais estabelecidas – o que ocorre frequentemente em outras regiões
do mundo. (ANDERSON et. al., 2013, p. 60)

O sistema foi construído pensando em garantir segurança para os potenciais


investidores como colocado por Rodrigo Neves em trecho da entrevista:

(...) A gente tem diálogos com empresas e com setores públicos e países que tem
interesse de investir por que a gente tem essa fortaleza institucional, técnica e
científica do que a gente está fazendo. Desse “low emissions development”, que a
gente nem chama mais de REDD, é o nosso LED, que tem fortaleza na nossa política
pública.

Uma dos grandes argumentos utilizados para defender o SISA é essa questão
das garantias jurídicas e institucionais dadas pelo Estado, ou como coloca o IPAM, “(...)
A estrutura do SISA é um excelente exemplo da institucionalização de garantias
socioambientais em termos jurisdicionais”. (ALENCAR et. al., 2012, p.13). Além da
questão da contabilidade do carbono e das linhas de base de desmatamento apontadas
pela WWF, os proponentes desse sistema colocam que por ser mediado pelo Estado, o
SISA garante o controle social e o respeito aos direitos e interesses da população. Seria
uma grande salvaguarda como é colocado:

Por tudo isto, está claro que o Governo e a sociedade acreana se anteciparam em
alguns anos com as mesmas preocupações, já expressas por instituições de direitos
humanos sobre o risco que os mecanismos de compensação podem trazer para
populações tradicionais e indígenas. Razão pela qual o Governo assume a
responsabilidade de garantir que estes riscos não venham se instalar no Estado,

131
estruturando o SISA como uma grande salvaguarda construída a muitas mãos.
(ACRE, 2012, p. 51)

Mais afrente debateremos a questão do controle social dentro do sistema e das


pretensas salvaguardas ambientais, mas aqui vale ressaltar que o SISA foi objeto de
missão da Relatoria Nacional de Direito Humano ao Meio Ambiente da Plataforma
DHESCA45 justamente por denúncias de violação desses direitos no Acre por esse
sistema (FAUSTINO; FURTADO, 2015).

3.1.4 Arquitetura do Sistema

Para que esse arranjo desenhado para o SISA seja colocado em prática, uma
arquitetura complexa foi criada com base em estruturas já existentes, mas também com
a criação de novas, como por exemplo o Instituto de Mudanças Climáticas e
Regulação de Serviços Ambientais - IMC e a Companhia de Desenvolvimento de
Serviços Ambientais (CDSA).
Essa arquitetura se baseou na premissa, presente no documento de descrição
do ISA Carbono (ACRE, 2013b), de que o SISA possui 3 esferas:

1) uma mediação pública na qual o governo desenvolve as políticas públicas


de desenvolvimento e de gestão territorial e ambiental necessárias ao sistema. O IMC,
componente dessa esfera, foi criado com o objetivo de regulamentar, monitorar,
controlar e registrar os “ativos ambientais” gerados pelo SISA. Ele também é
responsável “pela criação de protocolos para projetos e programas de carbono florestal,
assim como pela criação dos padrões técnicos e científicos de definição e transação de
carbono.” (ALENCAR et. al., 2012, p. 13.). Se comunicando diretamente com o IMC,
temo também um Comitê Científico, formado por um grupo de cientistas que presta
consultoria ao sistema, responsável por embasar e ratificar as questões técnicas.
(ALENCAR et. al., 2012). Além disso, o monitoramento dos estoques de carbono e
demais “ativos ambientais” é auxiliado pela Unidade Central de Geoprocessamento
e Sensoriamento Remoto (UCGEO) que é vinculada a Fundação de Tecnologia do
Acre (FUNTAC). Além disso o Instituto de Meio Ambiente do Acre (IMAC), associado
a fiscalização e licenciamento ambiental e o Instituto de Terras do Acre (ITERACRE),

45 A Relatoria Nacional de Direito Humano ao Meio Ambiente integra o projeto Relatorias


Nacionais em Direitos Humanos da Plataforma Brasileira de Direitos Humanos Econômicos,
Sociais, Culturais e Ambientais (DHESCA) formada por uma rede de organizações da sociedade
civil. Os relatórios produzidos pela plataforma tem objetivo de ser um instrumento de exigibilidade
dos direitos humanos no Brasil (FAUSTINO; FURTADO, 2015).

132
responsável por parte das atribuições de regularização fundiária do estado também tem
uma relação direta com o sistema.

2) o controle social realizado no acompanhamento e adequação das políticas


públicas resguardando os interesses e direitos da sociedade. Para tal, foi criada a
Comissão de Validação e Acompanhamento – CEVA, composta de forma paritária
entre “sociedade civil” e governo estadual. Responsável por acompanhar e validar as
ações do SISA e seus programas, ela também se reporta ao Colegiado de Conselhos
do Estado, formados pelo Conselho Estadual de Florestal (CEF), Conselho Estadual
de Meio ambiente, Ciência e Tecnologia (CEMACT) e Conselho de Desenvolvimento
Rural Florestal Sustentável (CDRFS). As entidades que compõe a CEVA são eleitas
dentro das entidades que compõe esses três conselhos. Ainda relacionado ao controle
social, temos a Ouvidoria Geral, que tem por objetivo de receber propostas,
reclamações e denúncias sobre o SISA, além de mediar potenciais conflitos gerados
pelo sistema (ACRE, 2014c). Por fim, também temos um GT Indígena, estabelecido por
uma resolução da CEVA com objetivo de garantir a participação e representação dos
povos indígenas no SISA (ACRE, 2014c).

3) a iniciativa privada justificada como sendo necessária, visto que os recursos


públicos estaduais são escassos para promover as transformações necessárias para
uma transição para uma economia de baixo carbono (ACRE, 2013a). Para tal foi criada
a Companhia de Desenvolvimento de Serviços Ambientais (CDSA), empresa de
capital público e privado, responsável por atrair investimentos tanto públicos, como
privados, além de gerenciar os investimentos de projetos e planos de ação do SISA.
Segundo o IPAM: “Esta parceria público-privada é uma entidade semiautônoma que
opera fora da burocracia estadual, mas que tem o IMC como órgão regulador”
(ALENCAR et. al., 2012, p. 14, grifos nossos). Segundo Neves isso se justifica visto que:
“Uma vez que possui natureza jurídica privada, a empresa poderá atuar com essa
característica flexível, “empacotando” os subprogramas e projetos vinculados aos
Programas do SISA a partir de critérios aceitos no mercado” (NEVES, 2010, p. 16). Parte
do capital dessa empresa vêm de outra empresa mista do estado do Acre, a Agência
de Negócios do Acre (ANAC), que tem por objetivo estimular negócios e produtos
acreanos. Outro ponto muito importante sobre a CDSA é que, segundo a Lei Estadual
2.728 de 21 de agosto de 2013, o Poder Executivo fica autorizado a transferir os “ativos”
gerados pela reduções de emissões de carbono para a CDSA (ACRE, 2014b). Segundo
Neves, entre as atribuição da CDSA estão:

133
(...) fomentar a elaboração de ações e projetos, bem como estabelecer e desenvolver
estratégias voltadas à captação de recursos financeiros e investimentos nos
programas, subprogramas e projetos, buscando investidores privados para tornarem-
se sócios do processo. Terá possibilidade, também, de captar recursos financeiros
oriundos de fontes públicas, privadas ou multilaterais, criando planos de ação e
projetos viáveis. Poderá, dessa maneira, criar uma competência específica que a
permitirá assessorar a concepção e a execução de projetos privados, quando se
estabelecer uma relação volitiva entre as partes, ou seja, quando expressamente
solicitado pelos potenciais proponentes (NEVES, 2010, p. 16)

Ainda sobre a arquitetura do SISA, é importante destacar que, apesar da


flexibilidade de arranjos que destacamos quando debatemos captação e aplicação de
recursos, e a possibilidade de comercialização de “ativos” ambientais diretamente pela
a CDSA, até o momento presente nesse trabalho, todo o dinheiro captado pela redução
de emissões devido a desmatamento e degradação no estado foram direcionadas para
o Fundo Estadual de Florestas (FEF) que já descrevemos anteriormente. Esse fundo,
vinculado a SEMA, é gerido pelo Conselho Estadual de Florestas, e ganha importância
estratégica na definição e execução do dinheiro captado pelo SISA até agora. Para
ilustrar e detalhar melhor essa arquitetura, elaboramos um diagrama e uma lista das
entidades que compõe cada estrutura:

Figura 8. Arranjo institucional do SISA. Fonte: elaboração própria (1) (2).

134
(1) Devido a uma reforma administrativa realizada, através da Lei Complementar Nº 300 de 9 de
Julho de 2015, várias atribuições relacionadas a política florestal do Acre que eram da SEDENS
passaram para a SEMA. Dentre elas, algumas estruturas centrais para o funcionamento do SISA:
a CDSA e Fundo Florestal. Além disso o IMC que antes era vinculado à Secretaria Estadual de
Ciência e Tecnologia (SECT), também passou a ser vinculado a SEMA. O presente trabalho não
teve condições de analisar essa reforma administrativa mais a fundo e as possíveis motivações
da mesma.

(2) O Comitê Gestor de Mudanças Climáticas, apesar de previsto em lei, não tem funcionado
como instância deliberativa do IMC e planejamento do SISA e sim um Comitê Executivo Gestor,
que não foi previsto em lei, com a presença de PGE, SEDENS, IMC, CDSA e EMBRAPA.

- Conselho Estadual de Florestas: Conselho Nacional das Populações Extrativistas


(CNS); Grupo de Trabalhadores da Amazônia (GTA); WWF; Federação dos
trabalhadores na Agricultura do Acre (FETRACRE); Cooperativa dos Produtores
Florestais Comunitários (COOPERFLORESTA); Associação de Indústrias de Madeira e
Manejo do Acre (ASIMMANEJO); Federação de Agricultura e Pecuária do estado do
Acre (FAEAC); Federação das Indústrias do estado do Acre (FIEAC); Conselho
Regional de Engenharia e Agronomia do estado do Acre (CREA-AC); Instituto de
Mudanças Climáticas e Regulação de Serviços Ambientais (IMC); Secretaria de Estado
de Desenvolvimento Florestal, da Indústria, do Comércio e de Serviços Sustentáveis do
Acre (SEDENS); Secretaria de Estado de Planejamento (SEPLAN); Secretaria de
Estado de Meio Ambiente (SEMA); Secretaria de Estado de Produção Familiar e
Extensão Rural (SEAPROF); Secretaria de Estado de Educação e Esporte (SEE);
Fundação de Tecnologia do estado do Acre (FUNTAC); Instituto de Meio Ambiente do
Acre (IMAC); Instituto de Terras do Acre (ITERACRE); Procuradoria Geral do Estado do
Acre (PGE); Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
(IBAMA); Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA); Empresa
Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA); Universidade Federal do Acre
(UFAC); Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio); Banco da
Amazônia (BASA); (baseado no Decreto Estadual nº 2.980 de 13 de maio de 2008 e
portaria CFE nº1 de 08 de Abril de 2013)
- Comissão Estadual de Validação e Acompanhamento (CEVA): WWF; Central
Única de Trabalhadores (CUT); ASIMMANEJO; Grupo de Trabalhadores da Amazônia
(GTA); Secretaria Estadual de Produção Familiar e Extensão Rural (SEAPROF);
Secretaria Estadual de Meio Ambiente (SEMA); Procuradoria Geral do Estado do Acre
(PGE); Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) (baseado no Decreto
Estadual nº 7.208 de 19 de março de 2014).

135
- Comitê Científico: Prof. Dr. Carlos Afonso Nobre; Prof. Dr. Daniel Nepstad; Prof. Dr.
Irving Foster Brown; Prof. Dr. Luiz Gylvan Meira Filho; Prof. Dr. Elfran Amaral; Prof. Dr.
José Antônio Sena do Nascimento (baseado no Decreto nº 4.301 de 18 de julho de
2012, Decreto nº 6.183 de 7 de agosto de 2013, Decreto nº 8.651 de 15 de novembro
de 2014 e Decreto nº 8.724 de 3 de dezembro de 2014)
- Comitê Gestor de Mudanças Climáticas: SEMA; SEDENS; PGE; IMAC; ITEACRE;
IMC.
- Coletivo de Conselhos: Conselho Estadual de Meio Ambiente, Ciência e Tecnologia
– CEMACT; Conselho Estadual de Florestas; Conselho de Desenvolvimento Rural
Florestal Sustentável – CDRFS.
- GT Indígena: IMC; Fundação Nacional do Índio (FUNAI); Comissão Pró-Índio do Acre
(CPI-AC); Forest Trends; Assessoria Especial de Assuntos Indígenas do Gabinete do
Governador - AEIA; Associação Sociocultural Yawanawá – ASCY; Associação do
Movimento dos Agentes Agroflorestais Indígenas do Acre – AMAIAC; Organização de
Professores Indígenas do Acre – OPIAC; Associação do Povo Indígena do Rio Humaitá
– ASPIRH; Associação de Cultura do Povo Indígena do Humaitá – ACIH; Organização
dos Povos Indígenas do Alto Rio Purus – OPIHARP; Associação de Jovens Hunikui do
Jordão – AJHJ; Associação de Seringueiros Kaxinawá do Rio Jordão – ASKARJ;
Organização de Mulheres Indígenas do Acre, Sul do Amazonas e Noroeste de
Rondônia– SITOAKORE; Associação Katukina do Campinas – AKAC (baseado na
Resolução nº 001 de 20 de agosto de 2012)
Além das estruturas e entidades diretamente envolvidas na execução do SISA,
explicitadas acima, muitas outras estruturas e entidades envolvidas nas políticas
ambientais também interagem com o sistema, mesmo que de forma indireta. Aqui
vamos apenas destacar a Secretaria de Extensão Agroflorestal e Produção Familiar
(SEAPROF) que tem um papel importante em muitas políticas executadas no Acre como
veremos posteriormente.
Sobre essa arquitetura algumas observações são relevantes. Primeiro, a
ouvidoria foi a última estrutura do SISA46 a ser implementada enquanto que a CDSA foi
uma das primeiras. Outra questão fundamental é que a CDSA, como destacado pelo
IPAM (ALENCAR et. al., 2012), não é subordinada inteiramente a burocracia estatal mas
pode receber “ativos” do Estado, o que já foi garantido por lei estadual. Ela teria uma
vantagem com relação a outras empresas:

46 Em publicação de Outubro de 2014 ela ainda precisava de estruturação (ACRE, 2014d)

136
(...) A primeira parte da estratégia da CDSA está projetada para tirar vantagem do
principal ativo da CDSA e de sua vantagem comparativa, que é o direito de gerir e/ou
vender ativos e créditos de serviços ecossistêmicos criados em terras do estado.
(CDSA, s/d, p. 10)

Segundo a concepção de seus formuladores a CDSA é quem garante a


execução dos programas, subprogramas e projetos do SISA na “ponta”, ela seria os
“braços e as pernas para locomoção do Sistema” (NEVES, 2010, p. 16). Segundo
Mônica de Los Rios a CDSA:

(...) é a empresa público-privada responsável pela execução do SISA, isto é, fazer a


conexão entre provedores de serviços ambientais e investidores, mercado, doadores,
etc. (...) ela não substitui as ações das secretarias, mas ela ajuda a capilarizar as
ações das secretarias (...)

A companhia é administrada por um conselho administrativo, que representa o


interesse dos acionistas, e uma diretoria de gestão liderada por um diretor presidente47
(CDSA, s/d). Como uma empresa com decisões tomadas por uma diretoria, que é
escolhida de forma interna na lógica da empresa privada, por seus acionistas, ela não
estarei inteiramente subordinada a pretensa arquitetura construída para garantir o
controle social do SISA, a segurança conferida para o processo por ser regulado pelo
Estado. Em seu plano estratégico de gestão, a CDSA coloca que atua através de
empreendedorismo e cooperação e isso significa:

(...) Iniciativa e capacidade para aproveitar oportunidades, realizar investimentos,


constituir competências, assumir riscos, aprendizado contínuo e disponibilidade para
novos negócios. Tomar decisões com autonomia e liberdade, com base em suas
competências técnicas interagir com instituições do estado com vistas ao
desenvolvimento sustentável do Estado e regional (...) (CDSA, s/d, p. 8)

Questionei Rodrigo Neves sobre essa autonomia da CDSA na tomada de


decisão sobre os “ativos ambientais” e ele argumentou o seguinte:

(...) O sistema prevê justamente a questão do coletivo de conselhos, o próprio comitê


de participação, ele pode informações com transparência o tempo inteiro, é por isso
que é importante você ter o sistema, por que você tem instituições olhando o tempo

47O atual diretor presidente é Alberto Tavares que como já destacamos é ex-gestor do escritório
da WWF do Acre, no qual ficou 8 anos. Isso não é coincidência, mas algo recorrente no Acre.
Podemos observar alguns quadros chave que migram de estrutura para estrutura, sejam órgão
do estado ou privados, para garantir a implementação do projeto do bloco hegemônico no poder.
Eufran Amaral já foi secretário da SEMA, presidente do IMC e hoje diretor da EMBRAPA-AC.
Rodrigo Neves, além de Procurador Geral do Estado do Acre também já foi presidente do IMC.

137
inteiro, se tiver alguma coisa, comitê tem dúvida, ingressou um recurso, nós queremos
mais informações de como vai ser esse modelo de reflorestamento, vai lá, a
companhia vai lá e vai prestar informações para o comitê (...)

A fala de Rodrigo aponta para a possibilidade de acompanhamento e


esclarecimentos sobre as ações da CDSA, mas não a tomada de decisões sobre suas
ações. Em seu documento de planejamento estratégico é colocado como mecanismos
de consulta e participação:

(...) Estes mecanismo poderão ser seminários de formação e informação sobre


serviços ambientais, reuniões consultas para elaboração de projetos em comunidade
(observar sempre as orientações do SISA/CEVA), implantar meios eletrônicos de
consultas e informações e periodicamente emitir relatórios públicos para
conselheiros da empresa, dos conselhos públicos e instituições de estado de controle
(TCE,MPE etc.). (CDSA, s/d, p.20, grifos nossos)

Podemos observar apenas um caráter consultivo e informativo, mas não


deliberativo pensado para além da diretoria dessa companhia. Mas Rodrigo coloca:

(...) é condição suprema para que a gente consiga fazer esse sistema funcionar, que
a gente tenha legitimidade. O dia que fizer alguma coisa, que esta turma dos
conselhos e do comitê achar que está tudo errado e que aquilo não deveria ser feito,
acabou matou. A gente perde a credibilidade e acabou o sistema. Por que o dia que
os próprios comitês, os conselhos, começarem a dizer, gente, para com isso, está
tudo errado, não sei o que, como é que você vai conseguir andar com uma estrutura
dessa (...)

O que podemos ver por esse trecho da entrevista é que é colocado grande peso
na importância da CEVA e do Coletivo de Conselhos na garantia do controle social do
sistema. Na próxima sessão entraremos em maiores detalhes sobre a dinâmica dessas
instâncias na pretensa garantia dos interesses e direitos e no controle social do SISA.
A WWF, em sua publicação a respeito do SISA, analisou a arquitetura do sistema
pensada para garantir o controle social da mesma e ponderou:

No entanto, a transparência impõe exigências que podem diminuir a eficiência de


gestão. O modelo de governança definido para o SISA é complexo, especialmente
devido à existência de diversas entidades responsáveis pelo controle social.
Transparência e controle social são essenciais para manter a legitimidade do
programa, mas essas qualidades têm que ser equilibradas com eficiência na tomada
e execução de decisões – especialmente para um programa como o ISA Carbono,
que depende nitidamente da colaboração de outros setores do governo (ANDERSON
et. al., 2013, p. 73-74, grifos nossos)

138
Lembrando que a WWF tem grande inserção no Acre e assessorou na
construção do SISA, é importante destacar essa visão que permeia o sistema, de
“eficiência de gestão” que não deve ser diminuída pela transparência e participação
popular.
Posteriormente também analisaremos melhor qual a relação da CDSA com a
ANAC e o como isso interfere no funcionamento do SISA até o momento, visto que por
enquanto os recursos que fluíram pelo sistema não foram conseguidos através da
CDSA, mas sim em negociações e propostas construídas de forma mais ampla como é
o caso dos contratos com o banco alemão KfW que analisaremos em detalhe mais à
frente.

3.1.5. Construção e pseudoparticipação comunitária no SISA

Uma das grandes virtudes defendidas pelos que difundem o SISA é o seu
processo de construção que, segundo afirmam, teve a participação da sociedade
(ACRE, 2012). A proposta inicial foi divulgada e enviada para 120 pessoas de diversas
organizações, além de ser discutida de forma presencial em 5 reuniões, 3 oficinas e um
seminário técnico com um total de 174 pessoas consultadas diretamente o que gerou
mais de 300 recomendações (ACRE, 2012). Analisemos, mas atentamente, como se
deu essa participação.
Entre as entidades que participaram das primeiras etapas de elaboração da
proposta temos a WWF, IPAM, IUCN, GIZ, EDF, Forest Trends, The Woods Hole
Research Center, Biofílica (NEVES e LIMA, 2010; ACRE, 2012). Essas organizações
tiverem grande influência no processo de elaboração da proposta, inclusive financiando
parte do processo. Em trecho da entrevista, Mônica de Los Rios do IMC destaca que:

(...) o IPAM, que tem sido um parceiro bastante importante na definição conceitual
sobre o próprio SISA, o WWF, uma ONG internacional, mas com presença no estado
já a algum tempo, que também ajudou nessa, e contribuiu nessa definição conceitual,
a GiZ que é parceira do estado já quase, acho que desde a década de 90, já é parceira
do estado, inclusive na parte de cooperação técnica para implementação do
zoneamento, para ordenamento territorial, então tem sido uma parceira grande do
estado (...)

Ricardo Mello, da WWF do Acre também comenta em trecho de entrevista a


atuação da WWF na construção do SISA:

139
(...) a gente apoio o estado desde o começo, desde a concepção, a elaboração de
estudos estratégicos, parcerias para negociações internacionais (...)

A GIZ, WWF e IUCN aportaram R$ 240 mil nas etapas iniciais de construção.
(ANDERSON et. al., 2013). Além disso, também ocorreu uma oficina com especialistas
em mercado em São Paulo para colher recomendações (ACRE, 2012). Segundo
Rodrigo Neves, em trecho de entrevista:

(...) então a gente não podia fazer uma coisa que tivesse uma, que tive resistência
social, por exemplo, tinha que ter uma coisa que fizesse sentido para as comunidades,
mas também não podia fazer um negócio, ah, faz absoluto sentido pra comunidade
mas ninguém compra, então você tem que perguntar pra quem vai comprar,
perguntamos pro mercado, fomos na BOVESPA, fomos pra desenvolvedores de
projeto, potenciais compradores, potenciais parceiros de desenvolvimento de
projetos, e a gente foi ouvindo, perguntado, pra que isso dê certo, o que, na sua visão,
um sistema, na realidade um sistema não, um projeto do Acre precisa (...)

Das 97 entidades consultadas no processo inicial, 44 eram de ONGs ambientais,


23 eram pesquisadores e 16 eram ligadas aos governos, 12 eram empresas e 2 eram
cooperações internacionais, sendo que não foram consultadas entidades de base
(ACRE, 2012). Também é interessante destacar que durante o processo de consulta
pública, foram recebidos apenas 3 relatórios por escrito, da WWF, do Katoomba Group
e Forest Trends e da EMBRAPA-AC (ACRE, 2012).
Apesar da consulta às populações potencialmente beneficiárias representadas
pelas 3 oficinas com extrativistas e indígenas, os principais direcionamentos dados,
foram realizados pelas ONGs ambientais e pelo corpo técnico e burocrático do estado.
Um dos motivos para tal constatação pode ser identificado na linguagem técnico-
científica bastante distante da realidade desses povos que, até hoje, com 5 anos da
consolidação da lei, não se apropriaram dos mecanismos da mesma. Em trecho de
entrevista concedida a relatoria da Plataforma DHESCA, um dos membros da WWF
coloca: “continua sendo uma abstração enorme – o conceito, a ideia, o que significa
para a vida do produtor... continua havendo uma dificuldade enorme de entendimento e
algo que seja compreendido e internalizado (FAUSTINO; FURTADO, p. 67). Mesmo as
organizações que participam da CEVA e deveriam ter maior compreensão do SISA tem
dificuldades como avaliado em documento:

(...) A capacidade de compreender, implementar e monitorar requisitos legais do SISA


por parte dos provedores só pode ser avaliada no nível estadual. Isto acontece através
das instâncias de participação e controle social como são a CEVA e o Colegiado de
Conselhos, uma vez que, em se tratando do Programa ISA Carbono este não se

140
constitui em um conjunto de projetos individuais, mas de políticas mais abrangentes.
Muito embora tenham existido esforços para criação dessas capacidades, os
membros dos conselhos ainda não se sentem confiantes quando o assunto é o
SISA, dada a sua complexidade e interconexão com várias políticas (ACRE, 2014d,
p. 32, grifos nosso)

Sobre o processo de construção “participativa” do SISA, o que fica claro a partir


das informações elencadas acima, é que apesar de seguir formalmente alguns
procedimentos de consulta pública, de fato ele foi elaborado por quadros técnicos de
ONGs, universidades e empresas, algo que não é novidade nas políticas ambientais no
Acre. Em entrevista concedida para Israel Pereira Dias de Souza no “Dossiê Acre,
Documento Especial para a Cúpula dos Povos – Rio de Janeiro, 2012”, publicado pelo
CIMI, a liderança seringueira Dercy Telles comenta essa pretensa construção
participativa do SISA:

Olha, em Xapuri eu posso te afirmar que eu desconheço essa participação. Pelo


menos de 2006 pra cá, não houve nenhum diálogo nesse sentido de consultar essa
população a respeito desse assunto. Quando ele, quando o governo fala que teve a
participação é em função das entidades que foram constituídas, pelo movimento social
organizado e que hoje estão a serviço desse governo. (CIMI, 2012b, p. 39)
Sobre a participação dos povos indígenas na construção e acompanhamento do
SISA, também existem críticas. Como já descrevemos, dentro do sistema foi criado um
GT Indígena que teria justamente a função de garantir a participação dos povos
indígenas na gestão do SISA. Mas como destacado em trecho de declaração de
coordenadora da Comissão Pró-Índio do Acre:

(...) a gente tem um problema muito sério de comunicação. A gente não sabe nada
sobre a Ceva, a gente não troca informação. É uma luta para saber como está esse
projeto sobre o KfW (...) Aqui tem um esvaziamento dos indígenas, já perderam o
interesse. Não tem dinheiro para eles vir. Esse negócio de que o índio é problema tem
que acabar dentro do governo do Acre. (Brasil, 2013 apud FAUSTINO; FURTADO,
2015, p. 74)

Nosso ponto de vista é compartilhado com as conclusões da relatoria da


plataforma DHESCA que coloca que:

(...) a participação comunitária via representações, tais como associações e


federações comunitárias, não necessariamente implicaria o diverso, tanto pelo
pressuposto político e metodológico, quanto pela provável ausência de possibilidades
de transformação estruturantes das propostas. Os procedimentos políticos e
pedagógicos estariam, desde sua raiz, comprometidos com a ‘propaganda’

141
governamental e com o alinhamento à perspectiva da economia verde e com o
pressuposto da fatalidade do projeto. Tal metodologia inviabilizaria a criticidade e a
autonomia das comunidades, que têm menos acesso à informação, menos
familiaridade com a linguagem específica utilizada e estão mais necessitadas de
políticas públicas, dadas as suas vulnerabilidades históricas. (FAUSTINO; FURTADO,
p. 68)

Para legitimar essa construção, parte das recomendações colhidas nesse


processo foram incorporadas ao projeto inicial. Sobre as recomendações, outro ponto
chama atenção, presente no documento que fala do processo de “construção
participativa”:

(...) No entanto, por força das circunstâncias, diversas recomendações trataram de


aspectos específicos propostas para o Programa ISA Carbono que já estão
superados. Exemplos disso são o estabelecimento de uma metodologia para
definição de áreas prioritárias para atuação inicial do programa e a natureza dos
Incentivos por Serviços Ambientais (ISAs) conforme o grupo socioeconômico
contemplado. Na regulamentação do programa a partir de 2011, optou-se por um
enfoque de planejamento que poderia responder às demandas por subprogramas e
projetos, em vez de pré-definir um desenho. (ACRE, 2012, p. 50, grifos nossos)

Aqui fica explicitado que com relação a “repartição de benefícios”, as


recomendações, em sua maioria não foram acolhidas. Como vimos, o sistema foi
pensado para ser extremamente flexível nas diretrizes de alocação dos recursos
gerados e isso não é por acaso.
A partir do acolhimento de parte das recomendações, o projeto passou a ser um
sistema de incentivos aos serviços ambientais do Estado. Essa proposta foi debatida e
aprovada em reunião dos 3 conselhos estaduais consultados nas políticas ambientais
do estado: de Meio Ambiente, Ciência e Tecnologia (CEMACT), de Florestas (CEF) e
Rural Florestal Sustentável (CDRFS). Posteriormente, já formatado na forma de lei, o
SISA foi aprovado e segundo o governo do Acre:

(...) não foi uma Lei criada de cima para baixo, mas expressa todos os anseios dos
setores da sociedade diretamente e indiretamente impactados por ela, sendo o que
possibilitou a sua aprovação na Assembleia Legislativa por maioria absoluta.” (ACRE,
2012, p.49-50)

Como podemos observar pelo processo de construção do SISA e também por


sua arquitetura, é dado grande peso, por parte do governo do Acre, a efetividade dos
conselhos estaduais na garantia dos interesses públicos. É importante destacar que
desde o ZEE, a primeira grande política ambienta do Acre, o arranjo institucional que

142
tem a participação de CMACT, CDRFS, CEF que pretensamente garantiria participação
social na construção das políticas públicas é utilizado. Por isso iremos analisar em maior
detalhe esses conselhos.
Como já descrevemos anteriormente, o Conselho Estadual de Florestas (CEF)
foi criado junto do Fundo Estadual Florestal em 2001 a partir da Lei 1.426. O conselho
“(...) é o órgão superior de caráter colegiado, normativo e deliberativo, responsável pela
definição da política, dos planos e das estratégias florestais do Estado” (MENESES-
FILHO, 2008, pp. 11-12). O Conselho Estadual de Meio Ambiente, Ciência e Tecnologia
(CEMACT) foi criado através da Lei nº 1.022 de 1992. É um órgão colegiado, deliberativo
e normativo que integra o Sistema Estadual de Meio Ambiente, Ciência e Tecnologia -
SISMACT, na condição de órgão Superior. Entre suas funções estão planejar ações de
ciência, tecnologia e meio ambiente que dialoguem com as realidades locais e propiciem
desenvolvimento sustentável (MENESES-FILHO, 2008). O Conselho Estadual de
Desenvolvimento Rural e Florestal Sustentável (CDRFS) foi criado a partir do Decreto
2.544 de 2000 e modificado pelo Decreto 8.423 de 2003. Ele tem a função de pensar o
Programa Estadual de Desenvolvimento Rural Sustentável – PDRFS, o Programa
Estadual de Reforma Agrária e ações do Programa Nacional de Fortalecimento da
Agricultura Familiar – PRONAF no estado do Acre (MENESES-FILHO, 2008).
Em estudo justamente sobre a dinâmica de funcionamento e participação da
sociedade civil no Acre, Luis Meneses-Filho48 (2008) registrou importantes elementos.
Avaliando a dinâmica de funcionamento desses três conselhos, os principais
coordenadores dos mesmos fazem revelações importantes. Sobre o CEMACT, o estudo
colheu a avaliação de 2 coordenadores importantes à época, Carlos Edgard de Deus49,
que presidiu o conselho de 1999 até 2006, e Eufran Ferreira do Amaral50 que presidiu o
conselho a partir de 2007. Em trecho da publicação de Meneses-Filho (2008) analisando
esses conselhos é colocado:

(..) ‘Nenhum Governo vai correr o risco de perder o controle do processo, sempre
estivemos preocupado em ter o controle’. O papel da Presidência é muito de mediação
de conflitos e interesses, mas sua dedicação é inferior à necessária pois, ao mesmo
tempo que preside o fórum deliberativo, ele é responsável por coordenar o executivo.
(...) (MENESES-FILHO, 2008, p. 39)

48 Luis Meneses-Filho foi coordenador da WWF no Acre e hoje é da ONG Global Cannopy.
49 Carlos Edgard de Deus é atual Secretário de Meio Ambiente do Estado
50 Eufran Ferreira Amaral já foi Secretário de Meio Ambiente, presidente do IMC e hoje é diretor

da EMBRAPA-AC

143
Além de explicitar o forte direcionamento dado pela coordenação do conselho,
Meneses-Filho (2008) a partir de entrevistas com membros do conselho, coloca
dificuldades da sociedade civil pautar suas demandas:

(...) a maior parte das pautas é definida pelo Governo e os conselhos são usados
para referendar as pautas. Outra colocação dos membros da Sociedade Civil é que
assuntos de pauta sugeridos pelos conselheiros levam muito tempo para entrar na
pauta, a reação do presidente é que a demanda do executivo é grande e dinâmica e,
por outro lado, por muitas vezes não havia quórum para realização das reuniões,
consequentemente, as demandas dos conselheiros entravam na pauta quando havia
tempo livre sendo relegadas ao segundo plano. (MENESES-FILHO, 2008, p. 40,
grifos nossos)

Ainda sobre esse conselho, Meneses-Filho (2008) afirma que há:

(...) Baixa mobilização da Sociedade Civil para participar nestes espaços:


Conselheiros não entendem bem o seu papel e as oportunidades e possibilidades
do conselho; Desencanto de que os conselhos podem ser um canal efetivo das
demandas da Sociedade, já que estes espaços estão muito ligados aos interesses
do Governo. (MENESES-FILHO, 2008, p. 41, grifos nossos)

Gilberto Siqueira, que foi Secretário de Planejamento e presidente de 2 destes


espaços (CDRFS e CFE) desde a sua formação até o final de 2007 avalia:

(...) Em geral, a gestão é fraca por que tem estrutura amadora. Não tem Secretaria
Executiva delineada, não tem pessoa encarregada por fazer a pauta, não há formação
e informação para os conselheiros. Conselheiros não lêem documentos e decidem
com base em informações superficiais (...) (MENESES-FILHO, 2008, p. 47)

Na condição de presidente por vários anos, Gilberto Siqueira coloca que não
existe uma organização básica das reuniões e que os conselheiros deliberam sem se
aprofundar no tema. Mais do que isso ele coloca:

(...) Raramente organizações propõem pauta. No CDRFS, os bancos eram os que


mais propunham pauta. A Indústria Florestal e as empresas associadas ao Manejo
Florestal, assim como ONGs, é que propunham mais pautas no CFE (...) (MENESES-
FILHO, 2008, p. 48)

144
Nesse trecho citado acima, ele explicita quais as organizações direcionam as
pautas e deliberações dos referidos conselhos, no caso bancos, empresas e ONGs51.
Ele ainda expõe a precariedade da participação das organizações que deveriam
representar os interesses populares:

(...) Conselheiros não tem formação para estarem ali representando uma organização
e emitem opiniões irresponsáveis (...) Antes do Governo do PT havia um Movimento
Social mais forte. Hoje os quadros do movimento social estão no Governo, e há uma
confusão de papéis. (MENESES-FILHO, 2008, p. 48)

Mas se tratando de setores empresariais, Gilberto Siqueira avalia:

(...) Setor empresarial da indústria e da agropecuária tem participado com muita


determinação, são mais atentos e participam com mais organização e opinião. Estes
setores sabem que num Governo com nível de aprovação e respeitabilidade como
este, não devem deixar vago a representação de seus interesses, pois nestes
espaços as deliberações afetam suas atividades. (MENESES-FILHO, 2008, p.49,
grifos nossos)

Sobre a questão da participação das organizações populares, a análise da PGE,


consultada por MENESES-FILHO (2008) foi de que: “a ascendência do PT ao poder que
levou a uma confusão de papéis. Quem estava no movimento passou a ser governo,
levando a situações onde a sociedade faz as vezes do Estado e vice versa” (MENESES-
FILHO, p. 51). Em outra publicação analisando a formulação e execução das políticas
do Acre, BROSE (2014) também explicita esse ponto quando coloca:

(...) Profissionais de diversas áreas das ciências sociais assessoraram nos anos 1980
lideranças de movimentos sociais e comunidades de base, transformando suas
demandas em projetos e iniciativas-piloto que, posteriormente, foram levados ao
cerne do governo quando estes profissionais passaram a fazer parte da administração
pública. (BROSE, 2014, p. 289)

Outro coordenador importantes desses espaços, Fabio Vaz de Lima52, que a


época das declarações, era assessor do Governador Arnóbio Marques e coordenador

51 Aqui é importante entender a sociedade civil dentro da concepção de estado ampliado de


Gramsci em que parte dessa sociedade civil é composta por aparelhos privados de hegemonia
(COUTINHO, 2011).
52
Fábio Vaz de Lima, marido de Marina Silva, já ocupou cargos chave nas gestões da Frente
Popular desde que essa assumiu o poder, o último como secretário adjunto da SEDENS
responsável por planejar a implementação do programa REM do KfW, e hoje é diretor presidente
da Peixes da Amazônia S.A., que como veremos cumpre papel fundamental no projeto em
andamento no Acre.

145
do objetivo estratégico do plano de governo associado à economia justa, limpa,
saudável e com base florestal, e a partir de outubro de 2007, assume a presidência dos
referidos conselhos no lugar do Secretário de Planejamento, também coloca pontos
importantes:

(...) No geral não tem pessoal dedicado para realizar a memória, a convocação com
antecipação, o envio de documentos para análise prévia à reunião ou não tem equipe
ou quem é responsável não tem a experiência necessária (...) Quem participa tem
pouca capacidade de decidir, quando não domina o assunto, ou tem tendência de
frear o processo ou de acatar o que está sendo proposto (MENESES-FILHO, 2008, p.
47, grifos nossos)

Fábio Vaz aponta os mesmos problemas colocado por Gilberto Siqueira no que
diz respeito a organização das reuniões dos conselhos e também a capacidade de
decisão dos membros. Além disso, analisando fatores que interferem na qualidade de
participação da sociedade ele coloca: (...) A origem destes espaços: sendo demanda de
atores externos e não legítima de setores da sociedade local (...) (MENESES-
FILHO, 2008, p. 49). A partir das entrevistas e pelo conhecimento da dinâmica da
tomada de decisão no Acre, Meneses-Filho conclui:

(...) Quanto ao processo de tomada de decisão em relação às propostas apresentadas


nos espaços, a Sociedade Civil como alguns membros do Governo observam que a
prática é referendar as pautas apresentadas pelo Governo sem uma discussão
qualificada. (...) A Sociedade Civil reconhece que, em função da desarticulação do
movimento social e dos procedimentos de convocação em cima da hora, por muitas
vezes, ela vota com o Governo que vem mais preparado e com fortes
argumentos para as pautas propostas por eles. Quem propõe a pauta em preparo
e interesse e a discussão entre as partes é desigual. A discussão se baseia em cima
da defesa do proponente e não dos outros membros. A sociedade não tem uma
atitude de impedimento de propostas mas de busca de consenso. Esta observa
que há mobilização do Governo na hora da decisão encaminhada mas, quando segue
para as secretarias, as decisões se perdem, ou quando há resistência por parte da
sociedade, o Governo acata mas executa como bem entende. A Sociedade Civil não
acompanha a execução dos encaminhamentos e resoluções tomadas nos espaços.
(MENESES-FILHO, 2008, pp. 68-69, grifos nossos)

Ainda sobre a questão da participação popular nessas instâncias ele coloca:

(...) há hoje um marasmo do movimento social decorrente de uma silenciosa


acomodação política dos conflitos; dificuldade de discutir as questões por diversas
razões culturais, históricas e partidárias e; pela reatividade às pautas do Governo, que
faz com que a desarticulada Sociedade Civil não tenha capacidade de intervir e

146
propor políticas (...) as organizações, cada vez mais, estão atreladas a projetos
políticos partidários voltados a processos eleitorais e não mais em sua missão como
organização. Isto estimula um processo competitivo entre as organizações,
dificultando a união em torno de interesses comuns. Esta situação é agravada em
função da desqualificação, despreparo e descompromisso de lideranças para
representar os interesses de sua base e; conforme citado por diversos membros da
Sociedade Civil, tanto ONGs como as próprias representações de classe, muitas
vezes as lideranças são cooptadas pela injeção de dinheiro público através de
convênios e salários gerando atrelamento político e partidário. (MENESES-FILHO,
2008, p. 69, grifos nosso)

O que fica claro a partir da declaração dos principais coordenadores desses


conselhos, da PGE e do próprio MENESES-FILHO (2008), é que essas instâncias são
mais uma forma de legitimação das políticas propostas do que de fato de discussão e
deliberação. Como colocado por Fábio Vaz, são instâncias criadas por demandas
externas e não a partir da pressão por participação popular. As entidades membro que
deveriam representar o interesse popular, como CUT, CNS e GTA, por exemplo, estão
aparelhadas pelo governo e, portanto, não vão se opor as políticas apresentadas.
Com essa constatação, fica difícil imaginar que as principais instâncias de
controle social do SISA, o coletivo de conselhos e a CEVA irão de fato cumprir papel
ativo na gestão do sistema. Vemos os interesses empresarias e patronais bem
representados pela ASIMMANEJO, FIEAC, FAEAC, assim como das ONGs ambientais
com a WWF, mas o interesse popular fica prejudica visto que entidades como a CUT,
CNS e GTA não tem uma postura ativa dentro desses espaços.
Um ponto importante de destacar é que o CEF é uma importante instância de
deliberação dos recursos relacionados as políticas ambientais, visto que é ele que gere
o Fundo Estadual de Florestas. Até agora, todos os recursos que foram captados pelo
SISA foram direcionados para esse fundo. As políticas que serão alimentadas pelo
sistema, portanto dependem muita da dinâmica de funcionamento desse conselho
estadual. Durante a pesquisa, solicitamos, inclusive com base na Lei 12.527 de 2011,
de Acesso à Informação, as atas do CEF justamente por causa disso e nos foram
passadas apenas 3 atas53 justificando que as outras eram de difícil acesso por que
estavam ainda em um antigo sistema inacessível naquele momento. A falta de
transparência do Conselho e gestão do fundo que observamos é corroborada por trecho
da publicação de Meneses-Filho (2008):

53
Atas da primeira reunião ordinária de 2011, segunda reunião ordinária de 2012 e segunda reunião
ordinária de 2013.

147
(...) É de praxe em espaços como o CDRFS e CEMACT, a publicação das resoluções
em Diário Oficial, no entanto, as resoluções do CFE nunca foram publicadas no
Diário Oficial. Gilberto Siqueira afirma que os encaminhamentos são sempre prestado
contas à Sociedade no âmbito dos espaços, fato este discordado pelos membros
da Sociedade Civil. (MENESES-FILHO, 2008, p. 68-69, grifos nossos)

Além da questão da débil participação nos conselhos, temos uma outra pretensa
garantia dos interesses e direitos dos povos e comunidades através das chamadas
“salvaguardas socioambientais”. O Acre é um ativo participante dos fóruns de discussão
e deliberação de salvaguardas socioambientais, inclusive integrando a Iniciativa
Internacional REDD+ SES. Essa iniciativa se refere a construção de padrões
socioambientais para REDD+ e foi coordenado pela Aliança para o Clima, Comunidade
e Biodiversidade (CCBA, em inglês), composta pelas ONGs Conservation Internacional
(CI), Care, The Nature Conservancy (TNC), Rainforest Alliance e Wildlife Conservation
Society e pela CARE Internacional (FAUSTINO; FURTADO, 2015). Segundo seus
formuladores os padrões foram: “(...) discutidos e elaborados através de um processo
participativo e inclusivo com representantes de governos, ONGs e sociedade civil em
diversos países do mundo com floresta tropical.” (ACRE, 2014b, p.61). Mas problemas
com esse tipo de proposta já foram analisados onde as salvaguardas foram aplicadas.
Segundo FAUSTINO e FURTANO (2015), algumas dessas experiências:

(...) demonstram a incapacidade das salvaguardas de garantirem os direitos das


comunidades indígenas e tradicionais. Alguns exemplos incluem denúncias de
violação dos critérios de participação e consulta em Honduras e de violação de direitos
territoriais em Suriname, nos projetos FCPF [Fundo de Parceria de Carbono Florestal].
No caso no UN-REDD [programa das Nações Unidas sobre REDD], em fevereiro de
2013, os indígenas do Panamá se retiraram do programa alegando falta de
participação e outras violações dos direitos dos povos indígenas. A sociedade civil da
Indonésia, do Vietnã e de outros países da Ásia também tem tensionado e criticado
as salvaguardas. No Peru, a organização indígena Asociación Interétnica de Desarollo
de la Selva Peruana (Aidesep) vem denunciando violações dos direitos territoriais e
de participação em projetos de REDD financiados pelo FIP [Programa de Investimento
Florestal]. (FAUSTINO; FURTADO, 2015, p. 76)

Importante destacar que as mesmas entidades que constroem as certificações


VCS e CCBA para projetos, que já citamos na introdução dessa dissertação, estão
participando dos debates e definições sobre as salvaguardas de programas
jurisdicionais, como o é o caso do Acre. Mesmo com problemas graves relacionados a
conflitos territoriais explicitados pela missão da plataforma DHESCA no Acre
(FAUSTINO; FURTADO, 2015), os projetos privados do Purus e Russas e Valparaíso

148
são validados por essas certificadoras. Sobre isso, questionamos Mônica de Los Rios,
que inclusive é membro da Iniciativa Internacional REDD+ SES, e ela me respondeu:

(...) para um auditor externo, por exemplo, um contrato de compra e venda é suficiente,
por exemplo, da terra, só que o contrato de compra e venda, não necessariamente
significa que ele foi executado, então isso pode trazer problemas futuros (...) é por que
justamente no entendimento dos auditores, geralmente são auditores estrangeiros,
entidades estrangeiras, no entendimento aquele documento atende o requerimento
que está lá, então ele vai na caixa, é sim ou não, não tem mais ou menos, não tem
escrito mais ou menos, não é um degrade de cinzas, é sim ou não, preto e branco,
tem o documento? Tem, está aqui, tem esse outro documento? Tem, está aqui, mas
não há uma análise da elegibilidade do documento, aliás, da elegibilidade tem, mas
não há uma análise desse documento realmente atender na íntegra o requerimento
(...)

Esse trecho da entrevista, deixa claro a fragilidade de critérios utilizado


principalmente pelo CCBA que é focada em salvaguardas socioambientais, no que diz
respeito a garantia de não violação de direitos humanos. Com relação as salvaguardas
jurisdicionais, veremos a frente que isso não muda muito.
O Acre, com base nessa iniciativa REDD+ SES, utiliza sua metodologia e
princípios e adapta para o contexto local através de um comitê local de padrões, que no
caso do Acre é composto pela CEVA. Nesse processo foi elaborado um manual estadual
de monitoramento de salvaguardas, elaborado em parceria com a CARE Brasil e com a
ONG IMAFLORA (ACRE, 2014b). Segundo documento de descrição do programa ISA
Carbono (2014b) o Acre:

(...) Fazendo um comparativo entre as salvaguardas da iniciativa brasileira, do REDD+


SES e das Salvaguardas recomendadas na COP 16 de Cancun, entendemos que as
salvaguardas adotados pelo SISA e seus programas são compatíveis com as
salvaguardas de Cancun e com as recomendações da sociedade brasileira para
REDD+ na Amazônia brasileira (ACRE, 2014b, p.64)

Sobre esse padrão adotado no Acre, perguntamos para Mônica de Los Rios se
ele fortalecia pontos que as certificadoras para projetos tinham fragilidades,
principalmente a questão de conflitos territoriais fundiários e ela me respondeu:

(...) está mais fortalecido, mas nem... mas fortalecido por que antigamente no VCS
não considerava salvaguardas, então nos requerimentos de projeto é apenas
quantificação de carbono, dentro do padrão VCS, no âmbito jurisdicional já não, ele já
traz um componente de salvaguardas, que não me define a salvaguarda tem que ser
assim ou tem que ser assado, ele simplesmente me dá a liberdade de usar algum

149
padrão que me demonstre o alcance de salvaguardas socioambientais, mas não me
define, não me qualifica como é esse alcance, vamos dizer assim, então está mais
fortalecido, está, mas de repente nem tanto. (...)

Aqui, ela já demonstra uma certa insegurança sobre os padrões adotados no


Acre para as salvaguardas. Além disso, um relatório feito analisando o cumprimento dos
princípios e critérios das salvaguardas adotadas foi publicado em 2014 e demonstra que
as mesmas, mesmo aos olhos dos que tem acordo com o SISA, não são cumpridas de
forma satisfatória (ACRE, 2014b). Abaixo elaboramos uma tabela com seleção de parte
dessa avaliação, que aponta as salvaguardas não cumpridas ou parcialmente
cumpridas:

Princípio 1: Os direitos a terras, aos territórios e aos seus recursos são reconhecidos e respeitados pelo
SISA e seus programas.

Critério Ponto Condição Avaliação


1.3 O SISA e seus 1.3.1 O Programa mantém e Parcial (com - Ainda falta um procedimento formal a ser
programas requerem dissemina o princípio do lacunas) adotado pelo SISA para a aplicação do
o consentimento Consentimento Livre, Prévio e consentimento livre, prévio e informado na
livre, prévio e Informado, de acordo com a escala de projetos individuais de REDD+,
informado dos Povos Declaração 169 da OIT e a pois os mesmos precisam se integrar ao
Indígenas e Declaração das Nações Unidas SISA.
comunidades locais para Povos Indígenas para
para quaisquer atividades que afetem seus - Ainda falta uma normativa que regule os
atividades que direitos sobre as terras, territórios procedimentos adotados pelo IMC para
afetem seus direitos e recursos, com a garantia do integração dos projetos privados de forma
sobre as terras, poder de decisão destes grupos. a evitar que projetos em áreas de disputa
territórios e recursos. por titularidades e direitos a terra sejam
iniciados.

- Não existem ainda informações da SEP


Mulheres que permita identificar
procedimentos formais para garantir a
participação das mulheres de forma
1.3.2 Os titulares de direitos Não
paritária na tomada de decisão.
coletivos, com representação cumprido
Articulação do SISA com estas políticas.
paritária de mulheres, definem
um processo verificável e
- Ainda existem necessidades de
transparente para autorizar
regularização de Terras Indígenas
instituições a outorgar o
reconhecidas pelo
consentimento em seu nome.
ZEE e posteriormente respeitados.

Princípio 2: Os benefícios do SISA e seus programas são compartilhados equitativamente entre todos os
titulares de direitos e atores relevantes.
Critério Ponto Condição Avaliação
2.2. Mecanismos 2.2.2. Existência de Parcialmente - Ainda faltam procedimentos
transparentes, procedimentos administrativos cumprido transparentes e acessíveis para revisão
participativos, transparentes e eficazes para (com das opções, equidade, eficácia e eficiência
eficazes e eficientes que o gerenciamento dos fundos lacunas) do SISA no desenho dos mecanismos de
são estabelecidos e a distribuição dos benefícios distribuição dos benefícios.
para a divisão ocorram em tempo oportuno e
equitativa dos apresentem uma relação custo- - Ainda precisa melhorar a comunicação
benefícios do SISA e benefício adequada. entre as diferentes esferas de governança
seus programas 2.2.3. Existência de Parcialmente e adotar procedimentos de publicação de
entre e dentro dos procedimento transparente e cumprido informação que permita maior

150
grupos de titulares acessível para revisão das (com transparência e acesso a informação por
de direitos e atores opções, equidade, eficácia e lacunas) parte da sociedade civil.
relevantes, levando- eficiência do Programa no
se em conta os desenho dos mecanismos de
benefícios, custos e distribuição dos benefícios.
riscos socialmente
diferenciados.
Princípio 3: O SISA e seus programas melhoram a segurança dos meios de vida em longo prazo e o bem-estar
dos Povos Indígenas e das comunidades locais com atenção especial às mulheres e às pessoas mais
vulneráveis.
Critério Ponto Condição Avaliação
3.1. O SISA e seus 3.1.1. Os beneficiários do SISA e Parcialmente - Embora a dinâmica dos conselhos varie
programas geram seus programas reconhecem cumprido ao longo do tempo de avaliação deste
impactos positivos que têm recebido benefícios, relatório, ainda precisa-se de um
adicionais sobre a impactos adicionais positivos procedimento formal dos Conselhos
segurança em longo relacionados à segurança em Estaduais para monitoramento e avaliação
prazo dos meios de longo prazo dos meios de vida e das políticas públicas, utilizando como
vida e a melhoria do a melhoria do bem-estar pela insumo os relatórios produzidos pelo
bem-estar dos Povos participação nas iniciativas SIPLAGE.
Indígenas e das implementadas no âmbito dos
comunidades locais, programas do SISA. - Ainda falta um Plano de Comunicação do
com atenção SISA e seus programas com período
especial para definido para atualização das informações,
mulheres e as bem como, o formato da informação a ser
pessoas mais disponibilizado.
marginalizadas e/ou
vulneráveis. - Não está estabelecido um fluxo para
3.2 Existe avaliação 3.2.1. Existência de Parcialmente avaliação dos relatórios produzidos pelo
participativa dos procedimento de avaliação cumprido SIPLAGE através dos instrumentos de
impactos culturais, participativa de monitoramento e participação estabelecidos pela lei.
sobre os direitos de comunicação dos impactos
humanos, previstos e reais, tanto positivos
ambientais e como negativos, da implantação
econômicos, tanto de iniciativas no âmbito do SISA
positivos como e seus programas, sobre
negativos, do aspectos sociais, culturais, de
Programa Isa direitos humanos, ambientais e
Carbono para os econômicos deste programa
Povos Indígenas e para os beneficiários do
comunidades locais, Programa.
com atenção
especial para
mulheres e as
pessoas mais
vulneráveis,
incluindo os
impactos previstos e
reais.
Princípio 4: O SISA e seus programas contribuem para boa governança, para os objetivos mais amplos de
desenvolvimento sustentável e para justiça social.
Critério Ponto Condição Avaliação
4.1 As estruturas 4.1.1. O SISA e seus programas Parcialmente - Não está estabelecido o período de
para governança do contribuem com os objetivos e cumprido atualização das informações, bem como, o
SISA e seus governança das políticas, formato da informação a ser
programas são programas e planos (inclusive o disponibilizada no Portal da
definidas de modo seu fortalecimento) pertinentes Transparência.
claro, transparente, nos âmbitos federal, estadual e
efetivo e municipal – e ambientais, - Ainda precisa ser estabelecido um
responsável. econômicos, de direitos mecanismo de divulgação dos relatórios
humanos, culturais – de execução do SISA e seus programas.

151
considerando aspectos
relacionados à equidade, - Nos processos de monitoramento e
eficácia, eficiência e efetividade avaliação do SIPLAGE não estão incluídos
por meio de mecanismos que os aspectos relacionados à equidade,
assegurem a participação efetiva eficácia, eficiência e efetividade, de forma
dos beneficiários (as) nas complementar ao monitoramento das
decisões. salvaguardas.
4.2. O SISA e seus 4.2.1. Informação adequada Parcialmente
programas sãosobre o SISA e seus programas cumprido - Não está estabelecido o período de
coerentes com as é disponível publicamente. atualização das informações, bem como, o
políticas, estratégias formato da informação a ser
e planos relevantes disponibilizada.
em todos os níveis e
existe uma
coordenação eficaz
entre agências/
organizações
responsáveis pelo
desenho,
implementação e
avaliação do SISA e
seus programas e
outras agências/
organizações
relevantes.
4.3. Informação 4.3.1 Informação sobre o Parcialmente
adequada sobre o gerenciamento financeiro do cumprido
SISA e seus SISA e seus programas é
programas está disponível publicamente.
publicamente 4.3.2 Relatórios financeiros do Parcialmente
disponível para SISA e seus programas são cumprido
promover publicados regularmente.
conscientização
geral e boa
governança.
Princípio 5: O SISA e seus programas mantêm e melhoram a biodiversidade e os serviços ecossistêmicos.
Critério Ponto Condição Avaliação
5.1 A biodiversidade 5.1.1. Existência, no SISA e seus Parcialmente - Baixa implementação efetiva dos
e os serviços programas, de procedimento cumprido instrumentos legais para proteção da
ecossistêmicos para identificação, priorização e biodiversidade nas UCs;
potencialmente mapeamento da biodiversidade e
afetados pelo SISA e dos serviços ecossistêmicos. - Falta ainda um processo de articulação
seus programas são interinstitucional e levantamento de
identificados, iniciativas que contribuam para a
priorizados e manutenção e melhoria da biodiversidade
mapeados. as quais poderiam ser potencializadas
5.3 O SISA e seus 5.3.1 O SISA e seus programas Não pelo SISA;
programas não incluem medidas para identificar, cumprido
causam a conversão monitorar e propõe ações para - Ainda falta sinergia entre o SISA e o
ou degradação de mitigar os impactos negativos e SIPLAGE para incorporar a análise de
florestas naturais ou potencializar os impactos impactos positivos e negativos do SISA na
outras áreas positivos. gestão das unidades de conservação e na
importantes para a 5.3.2. O feedback do Não manutenção da sua biodiversidade.
manutenção e monitoramento é usado para cumprido
melhoria da desenvolver medidas para
biodiversidade e dos mitigar ainda mais os potenciais
serviços impactos ambientais negativos,
ecossistêmicos e acentuar os positivos.
identificados como 5.3.3. O plano de monitoramento Não
prioridade inclui indicadores para medir a cumprido

152
biodiversidade e os serviços
ecossistêmicos afetados pelo
próprio SISA e seus programas,
identificados a partir do
conhecimento tradicional e da
pesquisa científica.
Princípio 6: Todos os titulares de direitos e atores relevantes participam de maneira plena e eficaz do SISA e
seus programas.
Critério Ponto Condição Avaliação
6.3 O desenho, 6.3.2 Conhecimento, habilidades Parcialmente - Precisa-se ainda da estruturação da
implementação e e sistemas de manejo Cumprido ouvidoria para que as possíveis disputas
avaliação do SISA e tradicionais com relevância para relacionadas com o SISA e seus
seus programas o SISA e seus programas são programas efetivamente possam ser
consolidam, identificados. direcionadas pela mesma.
respeitam e apoiam 6.3.3 O SISA e seus programas Parcialmente
o conhecimento, consolidam, respeitam e apoiam Cumprido - Ainda precisa-se de um procedimento
habilidades e o conhecimento, habilidades e formal de aplicação do CPLI para o uso de
sistemas de manejo sistemas de manejo tradicionais conhecimentos tradicionais,
dos titulares de relevantes. principalmente de povos indígenas.
direitos e atores,
inclusive dos Povos - Não existe um procedimento para
Indígenas e das averiguação se os representantes
comunidades locais. repassam informações para os seus
6.4 O SISA e seus 6.4.2 Titulares de direitos e Parcialmente representados, na escala estadual
programas atores são informados a respeito Cumprido requerida para o SISA.
identificam e usam de mecanismos para
processos para reivindicações e têm acesso aos
efetiva resolução de mesmos.
reivindicações e 6.4.4. Existência de serviço de Parcialmente
disputas assessoria jurídica disponível e Cumprido
relacionadas ao acessível para os provedores de
desenho, serviços ambientais beneficiários
implementação e do SISA e seus programas e para
avaliação do SISA e as instituições interessadas no
seus programas, tema.
incluindo disputas
referentes aos
direitos sobre terras,
territórios e recursos
relacionados ao
programa.
Princípio 7: O SISA e seus programas cumprem com as leis locais e nacionais, tratados, convenções e outros
instrumentos internacionais relevantes.
Critério Ponto Condição Avaliação
7.1 O SISA e seus 7.1.3 Os Provedores de Serviços Parcialmente - Ainda falta um detalhamento: de que
programas cumprem Ambientais Beneficiários do Cumprido maneira o SISA e seus programas
com as relevantes SISA e seus programas e as contribuirão de forma explícita para
leis locais, nacionais instituições interessadas no melhorar o respeito, a proteção e
e tratados tema têm capacidade de cumprimento dos direitos humanos, em
internacionais, assim compreender, implementar e concordância com essas leis e tratados.
como monitorar requisitos legais deste Cabe mencionar que essas atividades
Sistema. requererão de recursos ainda não
7.2 Onde o SISA e 7.2.1. O SISA e seus programas Não previstos.
seus programas não estabelecem procedimento de cumprido
forem consistentes revisão para abordar - Ainda não se tem um procedimento
com a legislação inconsistências entre os específico para levantamento de
estadual ou nacional padrões, tratados internacionais, inconsistências com os marcos legais
ou com relevantes convenções ou instrumentos e o internacionais, nacionais e estaduais.
tratados, marco legal local ou nacional de
convenções ou inserção do programa.

153
outros instrumentos - Precisa-se ainda de um programa de
internacionais, um formação de lideranças dos diferentes
processo de revisão segmentos sociais que compõem os
será conduzido para conselhos para o adequado
resolver as acompanhamento do SISA.
inconsistências.

Tabela 1. Avaliação do cumprimento de salvaguardas socioambientais no Acre. Fonte: Relatório de autoavaliação do


cumprimento de salvaguardas socioambientais no SISA e no Programa ISA carbono do estado Acre, 2014d.

O que essa avaliação demonstra é que apesar da retórica de que o sistema


resguarda os interesses e direitos de quem é afetado pelo SISA, o sistema está longe
de cumprir com isso. Tentando justificar o não cumprimento integral do consentimento
prévio, livre e informado, o governo coloca que ele “(...) está implícito na elaboração e
implementação das políticas públicas (...) (ACRE, 2014d, p. 34). Sobre repartição de
benefícios, o governo justifica que houve uma “(...) análise transparente e participativa
do desenho A provisão de procedimentos para implementação ainda foi cumprida
parcialmente” (ACRE, 2014d, p. 34). O governo assumi que foi parcialmente “(...)
cumprido nas definições transparentes e participativas, nos fluxos de informação,
inclusive sobre recursos financeiros.” (ACRE, 2014d, p. 34). Com relação a manutenção
da biodiversidade e dos serviços ecossistêmicos o governo reconhece “(...) não
cumprido no fornecimento de provas de não causar, monitorar e mitigar impactos
negativos” (ACRE, 2014d, p. 34). Ainda, o governo reconhece que, com relação ao
cumprimento pelo SISA de leis e convenções “(...) ainda não há um procedimento
estabelecido institucionalmente para identificação de inconsistências” (ACRE, 2014d, p.
34).
Como vemos, as salvaguardas são um recurso que tem efeito mais retórico do
que prático e isso, nós sentimos durante a realização dessa pesquisa. Com relação a
transparência no processo de elaboração e implementação do sistema, enfrentamos
muitas dificuldades para acessar informações e documentos que na teoria são públicos.
Já comentamos isso com relação as atas do Conselho Estadual de Florestas. Mas além
dessas informações, muitas outras solicitações não foram cumpridas, ou apenas
cumpridas parcialmente, mesmo que as mesmas tenham sido feitas com base na Lei
de acesso a informação54. Segundo esse relatório de cumprimento de salvaguardas,
“(...) todas as atas das reuniões da CEVA e dos GTs além de serem encaminhadas para
seus membros também se encontram disponíveis no site do IMC” (ACRE, 2014d, p. 23).
Porém, na verdade a última ata publicada no site é a de dezembro de 2013 e até o

54Em anexo colocamos alguns exemplos de solicitações não cumpridas ou cumpridas apenas
parcialmente para exemplificar a dificuldade de conseguir informações que na teoria deveriam
ser públicas.

154
presente momento, dezembro 2015, não existem novos documentos no site do IMC.
Mais um exemplo de “transparência” na implementação do SISA.
No Acre, podemos ver uma versão extremamente elaborada de uma arquitetura
de “pseudoparticipação comunitária” baseada nos conselhos estaduais e na retórica das
salvaguardas ambientais. Toda esse arranjo complexo que tem sua materialização no
SISA serve como legitimação das ações realizadas pelo bloco de poder hegemônico no
estado, formado, como vimos anteriormente, por parte elite local, grandes ONGs
ambientais, partidos políticos, corpo técnico de entidades públicas, instituições
multilaterais e algumas lideranças do movimento social.
Apesar do SISA ser um sistema jurisdicional com mediação do estado, nada
garante a proteção do interesse público, visto que o bloco hegemônico no poder pauta
suas ações visando interesses particulares. Em trecho de entrevista, Rodrigo Neves
explicita esse ponto quando fala da formulação do sistema:

(...) e depois a gente fez a interface com o próprio mercado, o que o mercado precisa
pra que essas reduções de emissões que a gente está tendo aqui tenham valor. Por
que não adianta também tu fazer tudo isso, fazer todo sentido, cumprir todos os
princípios e como eu disse, você chega pro mercado, ele fala, olha, mas isso não tem
confiabilidade, o mercado não aceita isso, não paga. Também a gente estaria
investido tempo, recursos e dinheiro sem a gente ter a contrapartida desse esforço.
Então a gente percebeu que a gente precisava dar segurança jurídica para esse
processo e segurança institucional, por isso a questão da lei e por isso a criação de
uma série de instituições que garantissem a perpetuidade desse sistema (...)

Na verdade, o que o sistema jurisdicional garante, é uma segurança jurídica e


institucional para o capital privado conseguir penetrar espaços antes não penetrados
por completo, como por exemplo as Reservas Extrativistas e Terras Indígenas, com
também acumular e intensificar o agronegócio no estado. Também garante a
possibilidade que projetos relacionados ao sistema possam ser implementados em
áreas sem regularização fundiária, algo que muitas vezes dificulta projetos de REDD,
pois o SISA não demanda essa regularização para que proponentes privados realizem
seus “projetos especiais”.
O SISA, por meio de toda sua flexibilidade e multiplicidade de arranjos, funciona
como um “polvo” com muitos braços de atuação, seja estimulando a iniciativa privada
com projetos, seja por dentro do aparato de estado, intervindo com seus “incentivos” por
meio políticas públicas e demais ferramentas. O potencial de ação, por meio desse
sistema, é enorme, visto que ele atua em diversas escalas, intervindo na paisagem e
em cadeias produtivas com veremos mais à frente. Também veremos como a dinâmica
de “repartição de benefícios” desse sistema, justificada por metas de reduções de

155
desmatamento, faz com que o mesmo possa aportar grande parte dos recursos nos
setores que fizeram o pacto político-territorial institucionalizado pelo ZEE e são vetores
do desmatamento no Acre: pecuaristas (associados a “extração destrutiva” e
madeireiros (nesse caso associados ao setor da “floresta em pé” como veremos).

3.2. Principais políticas e programas alimentados pelo SISA e especialmente


pelo programa “REDD Early Movers” do KfW

A partir do entendimento da dinâmica de funcionamento do SISA, agora veremos


como esse sistema se articulado com todos os outros projetos e programas do estado,
na qual ele atua como uma espécie de catalisador da penetração do capital no Acre.
Nessa seção daremos destaque ao Programa “REDD Early Movers” (REM) do banco
de desenvolvimento alemão KfW. Abordaremos como ele foi negociado e para onde o
dinheiro foi direcionado, mas antes veremos o conjunto de programas que foram
fundamentais para estruturação das bases para o funcionamento do SISA e que
mantém diálogo com o programa REM KfW.
Aqui é importante retomar o ponto que destacamos quando começamos a
descrever o SISA. O SISA foi pensado para ser transversal a todo um conjunto de
políticas do estado presentes no plano de governo e no plano plurianual, conjunto esse
que recebe diversos financiamentos, principalmente internacionais como veremos. A
chamada “transição” para uma economia de baixo carbono, segundo a concepção do
governo do Acre envolve:

(...) a continuidade da construção de uma nova economia para a consolidação do


projeto de desenvolvimento sustentável diversificado do Acre, envolvendo a produção
com uso diversificado dos recursos (floresta, solo, água, beleza cênica, identidade,
cultura, patrimônio arqueológico e os serviços da floresta), e associando produção
florestal, “agroflorestal” e agropecuária, articuladas ao processo de industrialização e
de prestação de serviços, com forte agregação de valor à produção primária, sintetiza
a estratégia de formação de emprego, ocupações produtivas e renda, tendo em vista
a melhoria das condições e qualidade de vida da população. (ACRE 2014a, p. 83)

A redução do desmatamento ganha centralidade nessa retórica de “transição”


para essa “nova economia” e o SISA está relacionado diretamente as políticas voltadas
para essa redução. Mônica de Los Rios coloca que o sistema:

(...) ele está sustentado, assim como eu falei, em três, vamos dizer assim, políticas de
estado. Aquelas que promovem produção sustentável, aquela que promove

156
monitoramento e controle e aquela que promove ordenamento territorial e
regularização fundiária.

A relação do SISA com essas políticas de estado são justificadas por Mônica da
seguinte forma:

(...) Por que que tem que ser considerado todas essas políticas? Por que elas visam
trabalhar os principais causadores do desmatamento que é: uma, a falta de
regularização fundiária, então o que acontece com a falta de regularização fundiária,
se eu tenho uma estrada, facilmente a estrada leva ao desmatamento se eu não tiver
uma regularização fundiária, se não tiver um ordenamento territorial que me defina
quais são as diretrizes de uso daquela região e se eu não tenho políticas para fomento
da produção sustentável definindo as diretrizes de uso para aquela região, se eu não
tenho um monitoramento pra saber se o que foi definido de diretriz de uso para aquela
região realmente está sendo cumprido, então, a falta de monitoramento e controle, a
falta de política de dinamização de uma economia que leve a sustentabilidade, então,
o desmatamento, ele é decorrente de várias faltas e deficiências que a gente tem,
principalmente na região amazônica (...)
Com base nessa concepção exposta acima o governo estruturou um conjunto
de políticas que fazem parte tanto do plano plurianual quanto o plano e governo do
estado do Acre. É importante destacar, como é colocado pelo próprio governo:

(...) que o Zoneamento Ecológico-Econômico foi escolhido como o principal


instrumento para orientar todas as políticas públicas do Estado. Sendo assim, todos
os demais instrumentos e ações devem estar articulados a ele. Esta lógica é seguida
pelo Acre a aproximadamente dezesseis anos. (ACRE, 2014b, p. 75)

Trazemos esse ponto para reforçar que já debatemos o contexto em que foi
formulado o ZEE do Acre e que ele, através do pacto político territorial realizado “por
cima”, consolida os interesses os setores hegemônicos do estado.
Antes do SISA, em 2009, dialogando com a inciativa do Plano Nacional de
Prevenção e Controle do Desmatamento da Amazônia Legal (PPDCAM) e também com
a Política Nacional de Mudanças Climáticas (PNMC), o Acre elaborou a seu Plano
Estadual de Prevenção e Controle do Desmatamento no Acre (PPDC-AC).
Basicamente, esse plano direcionou e deu mais ênfase à redução de desmatamento e
emissões de gases que passou a ser transversal ao conjunto de políticas já existentes.
Foram propostas metas voluntárias de redução de desmatamento em 80% até 2020 e
de emissões de gases de efeito estufa em aproximadamente 165 milhões de toneladas
de CO² equivalentes. Para tal, o plano foi organizado nos eixos comentados por Mônica

157
em: ordenamento territorial e fundiário, cadeias produtivas agroflorestais e
práticas “sustentáveis” e monitoramento e controle e fiscalização (ACRE, 2010c).
Segundo a concepção do governo do Acre, a “economia sustentável” que
estrutura as políticas de estado guia os planos plurianuais desde 2004 (ACRE, 2014d).
No Plano Plurianual de Governo para o período de 2012 – 2015, os eixos do PPDC
citados por Mônica estão organizadas dentro das “Políticas de Gestão Territorial e
Desenvolvimento Sustentável do Acre” que podem ser sintetizadas abaixo:

- Política de valorização do Ativo Ambiental Florestal do Estado do Acre: Alicerça-


da em dois planos: o plano de recuperação de áreas alteradas focado nas áreas que já
foram convertidas e alteradas e o plano do ativo florestal focado nas áreas florestadas;

- Plano Estadual de Prevenção e Controle do Desmatamento: tem como objetivo


garantir diminuição nas taxas de desmatamento do Estado, a partir da gestão ambiental
e consolidação de uma economia forte de base florestal e agroecológica, pautado na
implementação do ZEE, com preservação e conservação de seu ativo socioambiental e
florestal;

- Política Estadual de Incentivos aos Serviços Ambientais: a meta é valorizar o ativo


ambiental como fonte de serviços ambientais enfatizando inicialmente a manutenção
dos estoques de carbono florestal. Os mecanismos de incentivos aos serviços
ambientais buscam o fortalecimento de sistemas produtivos e mitigação e adaptação às
mudanças climáticas globais;

- Sistema Estadual de Gestão de Riscos Ambientais: programas, ações e atividades


voltadas para a prevenção, controle e mitigação dos impactos decorrentes de
queimadas, secas, desmatamentos, enchentes, acidentes com produtos químicos
perigosos e outros eventos de riscos ao meio ambiente e às pessoas decorrentes das
atividades antrópicas e dos efeitos das mudanças climáticas globais.

No mesmo Plano Plurianual de Governo para o período de 2012 – 2015 essas


políticas dialogam com programas que estão estruturas no Eixo Estratégico de
Economia Sustentável da seguinte forma, sintetizadas na tabela abaixo:

Eixo Estratégico de Economia Sustentável do Plano Plurianual de Governo para o período de 2012 - 2015.
Programa Objetivo Metas (1)

1. Investir mais de 100 milhões - 400% de elevação da produção de pescado (passando de 5 mil
Industrializ na consolidação do setor ton./ano para 20 mil ton./ ano), garantindo o processamento de toda
ação industrial e ampliar o modelo a produção;
de Parcerias Público-

158
Privadas Comunitárias - Duplicação da capacidade instalada de produção de preservativos
(PPPC). masculinos da fábrica de preservativos masculino Xapuri, passando
a produzir 200 milhões de unidades por ano;

- Implantação do Complexo Industrial de Piscicultura;

2. Estruturar e fortalecer as - 5.000 tanques construídos para produção de peixes


Desenvolvi cadeias produtivas
mento das estratégicas para o - 1.600.000 alevinos produzidos na estação de piscicultura de Rio
Cadeias abastecimento dos mercados Branco-AC
Produtivas interno e externo
nas Zonas - 5.600 hectares de frutas plantadas (açaí, abacaxi, banana,
Especiais maracujá, manga e coco)
de
Produção - 4.000 famílias de agricultores familiares incorporadas no programa
certificação de produção rural

- 5.000 pessoas físicas e jurídicas (urbanas e rurais) contempladas


com microcrédito/recursos financeiros
3. Fortalecer os serviços de - Polo logístico de Rio Branco implantado;
Comércio e comércio e turismo por meio
turismo da ampliação das relações - 01 complexo de lazer construído (balneário do igarapé Preto em
comerciais internacionais Cruzeiro do Sul);

- 13 comunidades e aldeias indígenas estruturadas e qualificadas


para a prática do turismo de base comunitária como alternativa de
trabalho e renda;
4. Gestão Desenvolver uma gestão - 200 novos Planos de Desenvolvimento Comunitário elaborados e
Ambiental ambiental integrada, validados;
referenciada em processos
participativos e de educação - Realização de etnozoneamento e plano de gestão em 16 Terras
ambiental, de forma a obter o Indígenas;
empoderamento comunitário
e uso sustentável dos - 2.600 hectares de área de preservação permanente- APP na bacia
recursos naturais do Estado do rio Acre, visionários e nascentes do rio Iquiri reflorestados;
5. Garantir as condições - 3.000 títulos de regularização de posse na zona rural emitidos;
Economia estruturais para a inserção
de baixo de uma economia de baixo - 1.500 famílias inseridas no programa de manejo florestal
carbono carbono na estratégia de comunitário;
desenvolvimento sustentável
do Estado do Acre. - 25 mil ha de florestas plantadas (seringueira, frutíferas,
oleaginosas e para fins madeireiros);

- 06 estudos realizados nas áreas de REDD, produção florestal,


produtos florestais não madeireiros e produtos naturais a serem
utilizados pelo setor produtivo;
5.1 Elevar a escala, - Programa de Florestas Plantadas;
Subprogra competitividade e
ma competência do setor - Fortalecimento da Cadeia Produtiva da Borracha;
Expansão e florestal.
Modernizaç - Fortalecimento da Produção Extrativista da Castanha;
ão da
- Gestão de Florestas Públicas de Produção;
Economia
Florestal
- Manejo Florestal Comunitário;

- Certificação Florestal;

- Restauração Florestal.

159
Tabela 2. Programas do Eixo Estratégico de Economia Sustentável do Plano Plurianual de
Governo para o período de 2012 - 2015. Fonte: Elaboração própria a partir de ACRE, 2011a.

(1) As metas destacadas em azul tiveram recursos provenientes diretamente do SISA.

Mais à frente descreveremos melhor quais políticas e programas recebem


recursos captados pelo SISA. Mas aqui já fizemos um primeiro exercício para
demonstrar as relações existentes entre esse conjunto de políticas e programas e o
SISA. Para além da relação mais clara entre o sistema e o programa 5, de economia de
baixo carbono, todos os outros programas tiveram aplicação de recursos provindos do
SISA em maior ou menor quantidade.
Mas, os recursos que chegam captados através do SISA por si só não garantem
todos esses programas com objetivos e suas metas. A possibilidade de estruturação e
implementação dos mesmos se deve a articulação com diversas outras fontes. O
discurso utilizado para justificar isso, é que antes do SISA, o Acre já caminhava para
uma “transição” para o “desenvolvimento sustentável” reduzindo o desmatamento no
estado e que o SISA seria mais uma fonte nesse processo. Isso fica claro em trecho da
entrevista com Rodrigo Neves:

(...) Que é um conceito de um desenvolvimento de baixas emissões, e que permeia


todas as políticas públicas do estado. Não interessa se o dinheiro está vindo ou não
do crédito de carbono. O objetivo vai ser sempre fazer uma atividade produtiva que
não emita. Não importa da onde vem o dinheiro. Então, se você somar tudo que a
gente investiu nos últimos 10 anos nessa estratégia, é infinitamente maior do
que o que a gente pode arrecadar com os créditos de carbono. (...) é mais um
elemento [crédito de carbono] de financiamento e de criação dessas estruturas
econômicas e financeiras que garantam uma estratégia muito maior, que é uma
estratégia de desenvolvimento de baixas emissões. (...)

Mônica de Los Rios também explicita esse ponto além de demonstra o principal
objetivo do sistema, funcionar com um catalisador:

(...) Quando a gente vai tratar de redução contínua e duradoura de reduções de


desmatamento, se a gente for colocar o custo de tudo que precisa para gente ter isso
daí, o recurso do REDD não cobre. Agora, ele ajuda a alavancar inclusive outras
fontes de financiamento. Então o que a gente fez, foi ao revés, o inverso. A gente
já tinha outras linhas de financiamento e o REDD veio complementar aquilo que
a gente já tinha. Então, o que acabou gerando reduções que possibilitaram a
implementação do SISA, e do programa Carbono. (...)

160
Dentro dessa perspectiva, o governo do Acre considera que vêm realizando
ações relacionadas ao programa ISA Carbono desde que a Frente Popular do Acre
assumiu o governo em 1999:

(...) considera-se a data de início do Programa coincidente com a data da Lei Estadual
1.277 de 03 de janeiro de 1999 e suas modificações, conhecida como Lei Chico
Mendes, a qual estabelece o pagamento por serviços ambientais aos extrativistas por
meio de subsidio no valor da borracha e produtos florestais extrativistas. A data de
início da quantificação do programa será a partir de 01 de agosto de 2006, quando de
fato inicia-se a redução expressiva e consistente nas taxas do desmatamento (ACRE,
2013a, p.8)

Segundo essa concepção, a promoção do subsídio para produção de látex é


considerado como um incentivo a um “serviço ambiental”. Alberto Tavares, explicita isso
em trecho de entrevista:

(..) Desde 99 tem uma lei de subsídio a produção de borracha nativa, que que é isso?
Isso é incentivo a serviço ambiental, por que um seringueiro de casa, faz um recorrido
na sua terra, faz vigilância, faz reconhecimento, interage com aquele meio, leva seu
filho, faz o processo educativo do que é lidar com a floresta, extrair a sua sobrevivência
da floresta, tem uma relação intima produtiva e mística com a floresta (...) esse
princípio que quando lá em 99 se cria a Lei Chico Mendes de subsidio da borracha, é
pensando na mesma coisa, é reconhecer que essas populações prestam um serviço
ou potencializam os serviços ecossistêmicos (...)

Por tanto, os recursos que entraram no Acre desde que a Frente Popular
assumiu o governo, são considerados como parte da mudança rumo ao
“desenvolvimento sustentável”. Para financiar essa “transição”, o Acre articula diversos
recursos:

(...) A implementação de todas estas ações, as que já foram executadas no período


de 2006 a 2013 e as que estão planejadas até 2020 tiveram aportes de recursos
nacionais e internacionais. Muitos deles, de empréstimo, foram direcionados para a
diversificação da economia, buscando integrar a preservação do patrimônio natural
do estado com o desenvolvimento econômicos (ACRE, 2014c. 13-14)

Em outro trecho da entrevista com Mônica, ela demonstra o caráter do SISA de


potencializar outras políticas e também reforça a articulação com outros investimentos:

(...) O que o SISA faz é aumentar a abrangência dessas políticas para eu superar
essas faltas, então, obviamente o SISA não é a única fonte, por exemplo, se alguém

161
me perguntar que o REDD reduziu tantas toneladas de carbono, eu vou dizer não
sozinho. Porque além do KfW, tem outros investimentos do estado que vêm de
empréstimo que o estado faz pra tentar consolidar ou demonstrar que isso daí é
possível (...)

Abaixo elaboramos uma tabela com os principais programas (na maior parte
empréstimos) que financiam as ações no Acre que descreveremos brevemente na
seção posterior:

Programa Financiador Caráter Objetivo Valor Ano de


início
Programa de BID Empréstimo O programa possui três objetivos US$ 2002
Desenvolvimento específicos: (i) modernizar a 64,8
Sustentável do capacidade da gestão ambiental do milhões
Acre (PDSA) – Estado e assegurar o uso eficiente
fase I dos recursos naturais; (ii) aumentar
a taxa de crescimento do setor silvo
agropecuário e gerar emprego; e (iii)
reduzir os custos de transporte e
aumentar o acesso à eletrificação
rural no Acre.
Programa de BID Empréstimo Expansão da economia florestal do US$ 72 2012
Desenvolvimento Acre para promover o aumento da milhões
Sustentável do produtividade, da competitividade e
Acre (PDSA) – da competência, induzindo um
fase II ambiente de negócios para uma
economia de baixo carbono com
inclusão social.
Programa de BIRD Empréstimo Promoção da inclusão social e US$ 120 2009
Inclusão Social e econômica das populações mais milhões
Desenvolvimento pobres e mais desfavorecidas, que
Econômico vivem tanto nas áreas urbanas
Sustentável do quanto nas áreas rurais isoladas ou
Acre – PROACRE remotas do estado.
Programa de BIRD Empréstimo Implantação de infraestrutura US$ 150 2013
Saneamento urbana com ênfase no saneamento milhões
Ambiental e ambiental e inclusão de populações
Inclusão isoladas em sistemas produtivos
Socioeconômica locais, através de um processo
do Acre – integrado de planejamento local e
PROSER instrumentos de gestão territorial
focado nos municípios com menor
IDH do Estado do Acre.
Projeto de BNDES Doação de Fomento as práticas sustentáveis R$ 60 2010
Valorização do (Fundo fundo voluntário para a redução do desmatamento e milhões
Ativo Ambiental Amazônia) pagamento por serviços ambientais,
Florestal valorizando o ativo ambiental
florestal do Acre, consolidando uma
economia limpa, justa e competitiva,
fundamentada no Zoneamento
Ecológico Econômico do Acre –
ZEE/AC.

162
Cadastra BNDES Doação de Apoiar a implantação do Cadastro R$ 16,8 2013
Ambiental Rural (Fundo fundo voluntário Ambiental Rural (CAR) e a adesão milhões
Acre Amazônia) ao Programa de Regularização
Ambiental (PRA) no estado do Acre
Acre: Incêndios BNDES Doação de Apoiar as ações de monitoramento, R$ 13,3 2012
Florestais Zero (Fundo fundo voluntário prevenção e combate ao milhões
Amazônia) desmatamento decorrentes de
incêndios florestais e queimadas
não autorizadas no Estado do Acre,
por meio de capacitação e
aquisições de veículos e
equipamentos de apoio para os
Batalhões de Educação, Proteção e
Combate a Incêndios Florestais do
Corpo de Bombeiros Militar do
Estado do Acre.
Programa BNDES Empréstimo Consolidação da economia do Acre R$ 1,47 2002 a
Integrado de através de investimentos em bilhão 2011
Desenvolvimento infraestrutura viária e urbana,
Sustentável do logística, cadeia produtiva de
Estado do Acre alimentos, turismo, indústria e
(PIDS), fases I a modernização da gestão pública.
IV
Programa de BNDES Empréstimo R$ 449 2012
Apoio ao milhões
Investimento dos
Estados e Distrito
Federal
(Proinveste)
Programa BNDES Empréstimo Recursos do Tesouro Nacional, que R$ 342 2009
Emergencial de visaram compensar as perdas de milhões
Financiamento arrecadação e de transferências
aos Estados e federais, decorrentes da crise
Distrito Federal econômica naquele período.
(PEF), fases I e II
Programa REDD KfW Doação € 25 2013 e
Early Movers KfW condicionada milhões 2014
fase I e II
Tabela 3. Principais programas que financiam as ações no Acre.

3.2.1. Principais programas que sustentam o conjunto de políticas ambientais do


Acre

O conjunto de políticas, programas e projetos, que são a base para o SISA, foram
formuladas sob grande influência das ONGs ambientais e principalmente dos Bancos,
que financiaram, através de grandes programas, a implementação de todas essas ações
propostas.
Além do PDSA financiado pelo BID, que teve sua primeira fase entre 2002 e
2010, tivemos o início de uma fase 2 em 2012, com 72 milhões de dólares emprestados
pelo BID. O programa segue a mesma tendência, direcionado para o estímulo da
exploração florestal no estado como podemos ver em parte de suas metas destacadas
aqui: a criação da Floresta Estadual do Jurupari, também com o objetivo de concessões

163
para exploração florestal; concessão florestal de 240.000 ha da F.E. do Gregório;
criação de 180.000 ha de projetos de manejo florestal comunitário; certificação FSC do
manejo florestal comunitário; criação e manutenção de ramais, necessários para
logística de exploração madeireira; fundo de investimento privado destinado a
reflorestamento com fins econômicos.
Também temos, desde 2009, um programa financiado pelo BIRD chamado
Programa de Inclusão Social e Desenvolvimento Econômico Sustentável (ProAcre). O
programa, com empréstimo de 120 milhões de dólares do BIRD, propõe, entre suas
ações, apoiar as comunidades rurais mais isoladas através dos Planos de
Desenvolvimento Comunitário (PDC). Esses planos que são elaborados junto às
comunidades por ONGs, como PESACRE, CTA e SOS Amazônia, que são contratadas
como consultoras e promovem, como coloca SOUZA (2009), um “ordenamento ou
adequação para o desenvolvimento sustentável, especialmente dentro de Unidades de
Conservação, Terras Indígenas e projetos de assentamento” (SOUZA, 2009, p. 17).
Direcionado aos indígenas, o programa apoiou a elaboração de planos de gestão
territorial e ambiental com o etnozoneamento nas terras indígenas. Os PDCs estão
articulados com o conjunto de políticas, como certificação da propriedade rural, roçados
sustentáveis, estímulo ao manejo florestal comunitário entre outras (DOC PROSER), e
como são direcionados principalmente para comunidades de mais difícil acesso, são
uma das formas de capilarizar as políticas e também direcionar as comunidades para
integrar as cadeias consideradas prioritárias. O programa teve um financiamento
adicional - o PROSER - de 150 milhões de dólares, em 2013.
Além do BIRD e BID, outro grande financiador é o BNDES que desde 2002 tem
investido no Programa Integrado de Desenvolvimento Sustentável do Acre (PIDS) que
já está em sua quinta fase. Em sua primeira fase, o programa apoiou principalmente
ações de infraestrutura e urbanização, mas já na segunda fase, em 2005, começam a
ser investidos recursos nas cadeias produtivas consideradas prioritárias pelo estado. O
programa, apoia ações em várias áreas, mas dialogando com as políticas ambientais
do Estado estão, principalmente, as ações de industrialização e fortalecimento das
cadeias produtivas, como por exemplo, na cadeia da madeira com o programa de gestão
de florestas, apoiando a construção de polos moveleiros e complexos industriais
florestais. Cumpre um papel importante nos arranjos PPPC, principalmente nos
investimentos dos complexos agroindustriais. Somando recursos adicionais do
Programa Emergencial de Financiamento aos Estados e Distrito Federal (FEF),
acessado pelo Acre em 2009, e também o Programa de Apoio ao Investimento dos
Estados e Distrito Federal (Proinveste), acessado em 2012, o Acre já tomou emprestado
2,2 bilhões de reais do BNDES no período 2002 a 2012 (BRAGA; RAMOS, 2014).

164
Outra fonte de recursos importante, principalmente por estar diretamente ligada
as políticas ambientais, é o Fundo Amazônia que também é gerido pelo BNDES. Com
recursos de doações principalmente da Noruega e Alemanha e da Petrobras, o Fundo
é direcionado para ações de redução de desmatamento e emissões de gases do efeito
estufa e promoção da conservação e uso sustentável das florestas na Amazônia
(FUNDO AMAZÔNIA, 2015). O Acre possui 3 projetos propostos pelo estado apoiados
pelo Fundo: um projeto de fortalecimento do combate ao fogo, através de melhorias nos
sistemas de monitoramento e controle e aquisição de equipamentos para o corpo de
bombeiros do Estado, aprovado em 2012 com 13,3 milhões de reais; um projeto de
implementação do Cadastro Ambiental Rural (CAR)55, aprovado em 2013 com 16,8
milhões de reais; e o principal recurso, um projeto de apoio à política de valorização do
ativo ambiental florestal que foi aprovado em 2010, com aporte de 60 milhões de reais
(FUNDO AMAZÔNIA, 2015). O dinheiro que vêm do Fundo, basicamente apoia a
estruturação e o fortalecimento institucional e a implementação das políticas
relacionadas a redução do desmatamento e, também, do próprio SISA, constituindo o
primeiro recurso para sua implementação (WWF, 213).
Além dos programas negociados pelo governo do estado, existem outros
projetos aprovados pelo Fundo Amazônia com entidades que atuam no Acre. Segundo
dados do portal do Fundo, a WWF tem um projeto chamado “Pesca Sustentável”, que
iniciou em 2014 e que tem apoio de 3,2 milhões de reais do Fundo. O objetivo principal
é o manejo e estabelecimento de acordos de pesca, principalmente com relação a pesca
do Pirarucu. A Comissão Pró-Índio do Acre (CPI-AC) também tem projeto aprovado pelo
Fundo em 2015, no valor de R$ 3,1 milhões de reais, mas que ainda não teve início. O
projeto visa promover a cadeia de valor de produtos agroflorestais manejados. O Fundo
também apoia um projeto da SOS Amazônia, que além de abranger o Acre, também é
destinado a alguns municípios do estado do Amazonas com ações de desenvolvimento
de cadeias produtivas de óleos vegetais, cacau silvestre e borracha. O projeto teve início
em 2015 e prevê um total de aproximadamente 10 milhões de reais. Por fim, temos
também um projeto da Cooperativa Central de Comercialização Extrativista do Estado
do Acre (COOPERACRE) apoiado pelo Fundo com valor de cerca de 5 milhões de reais
para o fortalecimento da cadeia da castanha e de polpa de frutas. Ele teve início em
2014 (FUNDO AMAZÔNIA, 2015).

55O Cadastro Ambiental Rural foi instituído a partir da reforma do Código Florestal, Lei nº 12.651,
de 25 de maio de 2012, gera um banco de dados com base nas informações ambientais, como
por exemplo os remanescentes de vegetação nativa, de todas as propriedades no Brasil. A partir
dele é possível mapear os “ativos” ambientais o que possibilita a posterior comercialização
desses “ativos”, devido as possibilidades de compensação do novo Código Florestal, inclusive
na Bolsa Verde do Rio (BVRio).

165
Abaixo fizemos uma síntese das principais políticas e programas do Acre em
uma linha do tempo para ajudar a compreender a relação das mesmas com o SISA:

Figura 9. Linha do tempo dos principais programas, políticas e leis ambientais do Acre.

3.2.2. Programa “REED Early Movers” – KfW

Os primeiros recursos relacionados ao SISA estavam associados a sua


formulação, os R$ 240 mil aportados por GIZ, WWF e IUCN e o projeto de valorização
do ativo ambiental florestal custeado pelo Fundo Amazônia que viabilizou o início da
implementação do sistema como criação e o fortalecimento das estruturas importantes.
Podemos dizer que o primeiro grande recurso captado pelo sistema e que fez suas
“engrenagens” girarem foi o Programa “REDD Early Movers” (REM) negociado com o
banco de desenvolvimento alemão Kreditanstalt für Wiederaufbau (KfW).

166
O programa REM foi desenvolvido após a COP 15 de Copenhague56 para
estimular o desenvolvimento e implementação de ações pioneiras de REDD, tanto nas
fase de implementação como de funcionamento. O foco são sistemas jurisdicionais
como o do Acre que foi o primeiro beneficiado. O programa é financiado pelo fundo de
energia e clima do governo alemão (Energie-und Klimafonds, EKF) comissionado pelo
ministério para cooperação e desenvolvimento (BMZ) e implementado pelo KfW e pela
cooperação alemão GiZ (Gesellschaft für Internationale Zusammenarbeit) (STECHER;
EHRINGHAUS, 2013). Segundo a WWF (ANDERSON et. al, 2013), o recurso desse
fundo provêm de impostos da Alemanha gerados por transações realizadas dentro do
sistema de troca de emissões (ETS) da União Europeia, chamadas AAUs (Unidades de
Quantidade Atribuídas ou Assigned Amount Units, que são compostas por unidades
comercializáveis de uma tonelada equivalente de dióxido de carbono – 1 tCO2e).
O governo do Acre negociou o programa REM com o banco alemão KfW e,
diferentemente das doações do Fundo Amazônia (BNDES), o aporte dos recursos pelo
banco no Acre tem outras condicionantes além da questão da comprovação de
reduções no desmatamento. Como coloca Mônica de Los Rios, definindo a transação
como uma “doação condicionada” em trecho de entrevista:

(...) essa primeira transação do KfW, essa foi uma doação condicionada, vamos dizer
assim, eu te dou mais você reduz desmatamento. Essa doação condicionada, ela
tinha umas outras condições, não somente redução do desmatamento (...)

Rodrigo Neves defini o programa REM como um híbrido entre venda e doação:

(...) Chega o KfW, o KfW, o modelo dele é de, é um modelo em que eles fazem,
propuseram um negócio que é algo que fica a meio termo entre uma venda e uma
doação, é um híbrido de uma venda com doação. Pra fazer essa venda com doação
eles precisariam que a gente se comprometesse com algumas coisas, que tivesse a
possibilidade de auditar, e tivesse transparência no processo de gasto, esse foi o
primeiro ponto. (...)

A transação é baseada em um modelo de pagamento baseado em resultados.


O banco alemão transfere os recursos com base nas reduções de emissões
relacionadas a desmatamento e degradação que já ocorreram em anos anteriores ou
que estão acontecendo agora, o que é chamado de créditos já performados. Para
contabilizar as reduções de desmatamento, a negociação utilizou como base os dados

56 15ª Reunião das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças
Climáticas realizada em Copenhague, Dinamarca em 2009

167
do PRODES/INPE que monitora o desmatamento na Amazônia. Esses créditos devem
ser comprovados, validados, registrados e “aposentados” ou desativados, ou seja, não
podem ser novamente comercializados. Para tal uma empresa que realiza esse tipo de
registro chamada Markit foi contratada. O período contabilizado pela negociação é de
2011 até 2015, correspondente a 2 contratos firmados com o banco, e a tonelada de
CO2 foi negociada por US$ 5. A tabela abaixo resumi a negociação:

Ano 2012 2013


Contrato I II
Reduções de emissões 4 milhões de CO2 2,47 milhões de CO2
verificadas
Valor 16 milhões de euros 9 milhões de euros
Alocação de benefícios 30% fortalecimento 10% fortalecimento
proposta no contrato institucional; 70% institucional; 90%
beneficiários beneficiários
Repasses (parcelas) 2012 – 1,9 milhões de euros 2013 – 9 milhões de euros
(depositado) (única parcela - depositado)
2013 – 9,2 milhões de euros
(depositado)
2014 – 4,2 milhões de euros
(1)
2015– 2,1 milhões de euros
(1)
Período dos créditos 2011-2012; 2014-2015 2012-2013
performados (3)
Total depositado até junho R$ 35.551.235,07 (11,1 R$ 29.341.583,50 (9 milhões
de 2014 milhões de euros) (2) de euros) (2)
Tabela 4. Informações sobre os contratos realizados com o KfW. Fonte: ACRE, 2012b, 2013c,
2013d, 2014e, 2014f, 2014g, 2014h.

(1) Esses valores estavam previstos no início de execução do programa mas não
necessariamente foram repassados. Em 2013 estavam previstos 7,8 milhões de euros. Como a
análise se baseia em relatórios até junho de 2014, não temos exatamente os valores das
parcelas executa em 2014 e prevista para 2015. O programa pode se estender até 2016.

(2) Os valores convertidos em reais foram retirados dos relatórios execução do Programa REDD
Early Movers KfW de 2013 até junho de 2014.

(3) Os períodos usados como referência para comprovação da redução de desmatamento


correspondem aos “anos florestais” que são de 01 de agosto de um ano à 31 de julho do ano
seguinte devido a metodologia do PRODES/INPE para calcular o desmatamento na Amazônia.

Com relação a “repartição de benefícios”, como já vimos na descrição sobre o


funcionamento do SISA, existem várias possibilidades, conforme a ampla definição de
incentivos e de beneficiários para o sistema, e vai depender muito da relação com o
investidor/doador. No caso do KfW, como aponta Mônica de Los Rios em trecho de
entrevista:

(...) No âmbito dos recursos transacionados com o KfW, foi algo a nível estadual, então
deverá considerar todos os setores que a lei define, que são todos. Então deverá vir
recursos para quem faz fluxo, deverá vir recurso para quem faz conservação. E ai eu

168
estou falando de todos os setores. Então, os extrativistas, produtores rurais pequenos,
médios, grandes, indígenas (...)

Essa repartição foi baseada na abordagem estoque-fluxo programática que nós


já descrevemos e segundo relatório de execução do programa:

(...) Os detalhes sobre a distribuição de benefícios, no nível de subprogramas, ainda


não estão definidos para o SISA, mas foi informado que a abordagem a ser adotada
será a de estoque-fluxo. Esta abordagem é considerada adequada para atender o
requisito de destinar no mínimo 50% dos recursos financeiros do Programa REM para
os “protetores” históricos das florestas. Esta abordagem deve ser integrada a uma
“programática”, para priorizar setores da economia que são motores do
desmatamento (ACRE, 2012c, p.4)

Segundo Stecher e Ehringhaus (2013), as áreas de fronteira agrícola, inclusive


propriedades privadas são parte do programa, representando parte do fluxo. Segundo
os formuladores do programa:

(...) o setor privado é crucial para transformar o setor rural assim como a pecuária. Na
implementação da repartição de benefícios, nós tentamos apoiar políticas capazes de
redirecionar o engajamento de atores privados para sistemas produtivos mais
sustentáveis através de incentivos diferenciados (...) (KFW, 2014, p. 8, tradução
nossa)

Com base nessa perspectiva ficou acordado que os recursos do KfW devem ser
investidos prioritariamente em 2 programas de governo: direcionados às cadeias
produtivas sustentáveis e à economia de baixo carbono. Dentre as ações pensadas
para o programa de economia de baixo carbono e incentivadas pelo KfW, de acordo
com o plano plurianual de 2012-2015 estão:

(...) o plantio de 25 mil hectares de florestas para uso econômico sustentável,


incluindo espécies frutíferas como o açaí, seringueiras e outras para fins madeireiros
(...) Áreas de manejo florestal comunitário serão ampliadas em cerca de 300 mil
hectares (...) (ACRE, 2011a, p. 61)

Com relação as cadeias produtivas sustentáveis, o programa REM KfW pretende


incentivar de diversas formas, desde investimentos até microcréditos a diversificação da
produção com apoio a produção de frutas, pequenos animais, peixes, agroflorestas e
outros recursos da floresta (STECHER; EHRINGHAUS, 2013).
No primeiro contrato firmado em 2012, ficou definido que pelo menos 70% do
recurso deveria ser destinado diretamente a políticas que atingissem os beneficiários do

169
programa e os outros 30% poderia ser utilizado para fortalecimento institucional das
estruturas que fazem parte do SISA. Segundo o relatório de aplicação dos recursos:
(...) A primeira, de até 30 % do total dos recursos para ações de fortalecimento e
consolidação do SISA. Para esta linha são contempladas as instituições que
contribuem diretamente (IMC, CDSA, FEF) ou indiretamente (IMAC, UCEGEO,
EMBRAPA, ITERACRE) com o funcionamento do SISA. (...) Os outros 70% são todos
relacionados com os beneficiários seguindo a diretriz de apoio às cadeias produtivas
sustentáveis e a implantação de dois subprogramas: i) Subprograma indígena e,
ii) Subprograma produção familiar sustentável (...) (ACRE, 2013d, p. 2, grifos nossos)

Já no contrato de 2013, 90% do recurso deve ser direcionado aos beneficiários


e envolvem ações, segundo o relatório de execução:

(...) A linha de atuação será junto a comunidades de áreas extrativistas em


Unidades de Conservação conhecidas como RESEX e em áreas de pecuária com a
difusão e implantação de tecnologia inovadoras de produção. (ACRE, 2014g, p.
5, grifos nossos)

Baseado nos relatórios de execução do programa REM até Junho de 2014 e nos
convênios e cooperações firmados relacionados ao programa e publicados no Diário
Oficial até Novembro de 2015 temos os 2 cenários57 abaixo:

Cenário 1 Cenário 2

R$ 13.031.503,30 R$ 14.631.503,30
; 22% ; 19%

Fortalecimento Fortalecimento
Institucional Institucional

R$ 46.352.543,48 ; Beneficiários R$ 63.621.972,85 Beneficiários


78% ; 81%

Figura 10. Alocação dos recursos do Programa REM KfW. Fonte: ACRE, 2012b, 2013c, 2013d, 2014e, 2014f,
2014g, 2014h.

57
Já debatemos a questão da falta de transparência de implementação do SISA anteriormente e
aqui temos mais um exemplo. Tivemos que construir esses 2 cenários por que não temos certeza
sobre alocação de todos os recursos do programa REM. Isso se deve ao fato de que, apesar ter
sido planejado, os relatórios de execução do programa não são publicizados e nem todos os
convênios e cooperações são publicados no diário oficial identificando que a fonte do recurso
provem do programa REM KfW. O detalhamento dos dados que conseguimos sistematizar sobre
os recursos estão na parte dos anexos.

170
(1) Cenário 1 - Dados de recursos já destinados presentes nos relatórios de acompanhamento
de execução do Programa REDD Early Movers KfW de 2013 até junho de 2014 e nos convênios
e cooperações firmados posteriormente, presentes no Diário Oficial do Acre até Novembro de
2015 de forma identificada;

(2) Cenário 2 - Adiciona recursos de convênios e cooperações presentes no Diário Oficial mas
que não estão explicitamente identificadas como relacionadas ao REM KfW

Com base nesses cenários, de 74% até 97% dos recursos previstos, cerca de
R$ 80,1 milhões, do programa REM já foram alocados. Abaixo temos uma tabela com
as estruturas do SISA que foram fortalecidas com esse recurso:

Cenário 1 Cenário Cenário 2 Cenári Atividade


Entidade
(R$) 1 (%) (R$) o 2 (%)
Instituto de Mudanças -Consolidar SISA;
Climáticas e Regulação
de Serviços Ambientais
(IMC) 8.318.000,00 63,83 8.318.000,00 56,85
Companhia de -Auxilio mutuo para elaboração e a
Desenvolvimento de implementação dos programas e
Serviços Ambientais do subprograma do SISA;
Estado do Acre (CDSA) 3.383.700,00 25,97 3.383.700,00 23,13
-Realização de sobrevoos e visitas a
campo;
Instituto de Meio -Analise do desmatamento no entorno
Ambiente do Acre das unidades de produção sustentável do
(IMAC) SISA;
- Análise de imagem e satélites nas
700.000,00 5,37 1.400.000,00 9,57 regiões de produção sustentável do SISA;
- Regularização fundiária de famílias
Instituto de Terras do residentes na Floresta Pública do
Acre (ITERACRE) Gregório, para a inclusão no Programa de
60.000,00 0,46 60.000,00 0,41 Certificação Florestal;
- Promover o funcionamento, a
estruturação e a difusão do Sistema
Estadual de áreas Naturais Protegidas,
Secretaria de Meio
com vistas a potencializar os esforços de
Ambiente (SEMA)
redução de desmatamento e degradação
ambiental, no âmbito da gestão direta de
0 0 600.000,00 4,10 8 unidades de conservação estadual;
- Publicidade e difusão de informações
Secretaria de Estado de
por meio de instrumentos diversos de
Comunicação
comunicação das metas e objetivos do
(SECOM)
250.000,00 1,92 250.000,00 1,71 SISA e do REM KfW;
- Operacionalização e funcionamento da
UCEGEO para o apoio as ações de
monitoramento do desmatamento no
Fundação de
Estado do Acre;
Tecnologia do Estado
- Realizar estudo fotoquímico de espécies
do Acre (FUNTAC)
oleaginosas e recursos florestal, visando
contribuir com ações que possam diminuir
199.803,30 1,53 499.803,30 3,42 o desmatamento no Estado do Acre (1);
- Recolher subsídio para o componente
Comissão Pró-Índio do
de subprograma indígena junto aos
Acre (CPI/AC)
120.000,00 0,92 120.000,00 0,82 Agentes Agroflorestais Indígenas;
Total
13.031.503,30 100,00 14.631.503,30 100,00
Tabela 5. Dinheiro destinado ao fortalecimento institucional. Fonte: ACRE, 2012b, 2013c, 2013d,
2014e, 2014f, 2014g, 2014h.

171
(1) Essa atividade representaria parte do cenário 2, ou seja, não temos certeza se faz parte dos
recursos alocados pelo KfW.

Com relação as recursos que são destinados aos beneficiários através de


políticas de governo, elaboramos as tabelas abaixo com a alocação de recursos do
programa REM e quais programas e políticas estaduais ele alimenta:

Cadeia Programas de governo Políticas e ações apoiadas


produtiv
a ou Cenár Cenár
atividad io 1 io 2
e Cenário 1 (R$) (%) Cenário 2 (R$) (%)
Madeira 8.008.200,00 17,28 8.008.200,00 12,59 Subprograma Expansão Apoio ao Manejo florestal
e Modernização da empresarial e comunitário por
Economia Florestal meio de assistência técnica,
elaboração de planos de
manejo e fomento a
comercialização.
Peixe 14.003.349,00 30,21 22.828.349,00 35,88 Industrialização; Assistência técnica para
Desenvolvimento das piscicultura; Construção de
Cadeias Produtivas nas açudes e tanques; Logística
Zonas Especiais de de transporte e
Produção comercialização.

Pecuária 4.650.000,00 10,03 4.650.000,00 7,31 Economia de baixo Reforma de pastos e


carbono mecanização; difusão e
organização dos produtores
Borracha 4.719.000,00 10,18 10.185.344,37 16,01 Industrialização; Subsídio da produção;
Subprograma Expansão logística de abastecimento da
e Modernização da Natex; Fomento a
Economia Florestal comercialização
Indígena 4.937.574,00 10,65 5.315.659,00 8,36 Gestão Ambiental Formação de Agentes
Agroflorestais Indígenas;
Assistência aos PGTIs;
Agricultur 9.734.420,48 21,00 12.334.420,48 19,39 Desenvolvimento das Programa de florestas
ae Cadeias Produtivas nas plantadas; Programa de
Silvicultu Zonas Especiais de certificação da propriedade
ra Produção; Economia de rural; Roçados sustentáveis;
baixo carbono;
Subprograma Expansão
e Modernização da
Economia Florestal
Outros 300.000,00 0,65 300.000,00 0,47 Realização do II Copão da
Floresta.
Total 46.352.543,48 100,0 63.621.972,85 100,0
0 0
Tabela 6. Programas e políticas apoiados pelo REM KfW por cadeia produtiva ou atividade. Fonte: ACRE,
2012b, 2013c, 2013d, 2014e, 2014f, 2014g, 2014h.

172
Cadeia Entidades apoiadas
produtiva
ou
atividade
Madeira COOPERFLORESTA; Associação de produtores agrícolas do PAF Havaí; Central De Cooperativas De
Produção dos Moveleiros e Marceneiros do estado do Acre (UNIMMAC); Associações de moradores das
Florestas Estaduais (Antimary e Igarapé Sossego)
Peixe Cooperativa de Piscicultores do Vale do Juruá (COOPERPEIXE JURUÁ); Prefeitura do município de
Jordão; Cooperativa de Produtores de Grãos de Brasiléia (COOPGRÃOS); Associação dos Moradores e
Produtores da Reserva Extrativista Chico Mendes de Assis Brasil (AMOPREAB); Associação dos
Moradores e Produtores da Reserva Extrativista Chico Mendes de Xapuri (AMOPREX); Cooperativa de
Produtores Familiares e Economia Solidaria da Floresta do Mogno (COOPERMOGNO); Cooperativa de
Produtores e Criadores Rurais de Peixe de Bujari (COOPEIXE BUJARI); Central de Cooperativas dos
Piscicultores do Acre (ACREPEIXE); Associação Agroextrativista da Reserva Extrativista do Rio
Liberdade; empresa PROJETO PACU - Aquicultura LTDA;
Pecuária Centro de Formação dos trabalhadores e trabalhadoras na Agricultura do estado do Acre - CFTT
Borracha Cooperativa Central de Comercialização Extrativista do Acre (COOPERACRE); AMOPREAB; FUNTAC
(Natex); Cooperativa Agroextrativista de Tarauacá (CAET) (1)
Indígena CPI; AMAIAC; Prefeitura do Município de Jordão; Associação Agroextrativista Poyanawa do Barão e
Ipiranga (AAPBI); Associação Ashaninka do Rio Amônia (APIWTXA); ASPIRH; Associação dos
Seringueiros, Agricultores e Artesão Kaxinawá de Novo Olinda (ASPAKNO); ASCY; Associação dos
Produtores e Agroextrativista Hunikui do Caucho (APAHC); Associação Sócio Cultural e Ambiental
Kuntamanã (ASCAK) (1); Associação dos Produtores e Criadores Kaxinawa da Praia Carapanã (ASKPA)
(1); Cooperativa Agroextrativista Yawanawá (COOPYAWA) (1)
Agricultura Central Cooperativas do Vale do Juruá (CENTRAL JURUÁ) (1); CAET; Associação Agroextrativista da
e reserva extrativista do rio liberdade; Cooperativa das Produtoras de Biscoito de Goma de Cruzeiro do Sul
Silvicultura (COOPERBISCOITOS); Prefeitura do Município de Jordão; Cooperativa Sonhos de Todos
(COOPERSONHOS); Associação de moradores do projeto de assentamento Envira as margens do
igarapé diabinho e Rio Envira/Projeto Envira União; Associação dos seringueiros e agricultores da RESEX
Alto Juruá; Associação agroextrativista do Rio Tejo; Associação agroextrativista do Rio Juruá; Associação
Agro-extrativista São Francisco de Assis do Riozinho da Liberdade; Associação dos pequenos produtores
agroflorestais da comunidade São Vicente; Associação Agroextrativista Fortaleza Acreana;
COOPERMOGNO; Cooperativa dos Produtores de Agricultura Familiar e Economia Solidaria de Nova
Cintra (NOVA CINTRA)
Outros Associação Agro-extrativista São Francisco de Assis do Riozinho da Liberdade
Tabela 7. Entidades apoiadas pelo REM KfW por cadeia produtiva ou atividade. Fonte: ACRE, 2012b,
2013c, 2013d, 2014e, 2014f, 2014g, 2014h.

(1) Essas entidades recebem apoio com base no cenário 2, ou seja, não temos certeza se fazem
parte dos recursos alocados pelo programa do KfW.

Alguns pontos chamam atenção sobre a alocação dos recursos do programa do


KfW. Dos recursos destinados ao fortalecimento institucional, pelo menos 23% são
destinados a CDSA, empresa mista que como já colocamos não é inteiramente
subordinada ao pseudocontrole social do SISA. Esses recursos seriam destinados a
desenvolver e implementar subprogramas e projetos.
Com relação aos recursos destinados a “ponta” começamos a entender melhor
o que significa o sistema de “repartição de benefícios” adotado por esse modelo de
“incentivos” do SISA. Segundo documento do governo (ACRE, 2014d.), o programa tem
meta de atender 8.000 beneficiários em 4 anos com ações:

173
- Fortalecimento da cadeia extrativista da borracha através do pagamento do
subsídio da borracha.

- Fortalecimento da agricultura familiar do Programa de Certificação.

- Apoio para implementação do Subprograma Indígena e dos Agentes


Agroflorestais Indígenas.

- Apoio para territórios extrativistas sustentáveis com foco na consolidação


das unidades de conservação.

- Apoio para uma Pecuária Sustentável. (ACRE, 2014d, pp. 20-21)

Segundo SCHWARTZMAN (2015), as ações de apoio para os indígenas


incluem:
(...) cursos de capacitação para formadores em mudanças climáticas e serviços
ambientais, treinamento dos agentes agroflorestais indígenas (focados em juntar o
conhecimento tradicional e científico dos recursos florestais para melhorar a renda e
a subsistência baseados na sustentabilidade), pagamento dos agentes agroflorestais
indígenas, e um fundo para pequenos projetos comunitários para implementação do
etnozoneamento e os planos de gestão territorial (SCHWARTZMAN, 2015, p. 14,
tradução nossa)

Ainda segundo esse importante assessor do SISA e membro do EDF, os


recursos pensados para as “comunidades tradicionais” se concentram:

(...) na intensificação e adição de valor na agricultura e outras atividades produtivas


em terras já limpas ou degradadas. O recurso foi dividido igualmente entre diminuir
diretamente o desmatamento (produzir mais em áreas já abertas), ou fluxos de
carbono, e proteger estoques de carbono existentes (apoiar iniciativas indígenas)
(SCHWARTZMAN, 2015, p. 14)

Essa lógica segue a abordagem estoque-fluxo que já comentamos. Segundo


esse discurso é justificável investir recursos em quem promove “fluxo”/desmatamento,
por que isso reduz a pressão sobre a floresta. Isso justifica, por exemplo a destinação
de 4,6 milhões de reais para o setor da pecuária associado ao subprograma de
“Pecuária Sustentável”. Seguindo essa lógica, como a pecuária tem grande influência
no desmatamento, por tanto promove “fluxo”, ela deve ser incentivada. Em trecho de
entrevista, Alberto Tavares demonstra mais uma vez a lógica por trás da alocação de
recursos do programa REM KfW:

(...) se a gente está falando que o mecanismo que está ativo no SISA hoje, o primeiro
ativo foi o de REDD, a gente tem que olhar também quais são aquelas cadeias que

174
mais pressionam a floresta que você possa olhar pra elas e investir, parte do recurso,
a outra parte, como é REDD+, é olhar pra aquelas que tradicionalmente conservar
floresta e você focar pra elas, é por isso que o SISA tem investimento previstos, o
SISA hoje entendendo o recurso do KfW, tem recursos para o extrativismo, no caso
do Acre, entenda-se principalmente moradores de reservas extrativistas, produção
familiar, entenda-se ai o programa estadual de certificação da propriedade rural, que
trabalha essa questão de redução, de eliminação do uso do fogo através de práticas
agroflorestais e o setor da pecuária (...)

Independente da justificativa dada, vemos aqui como se relacionam os recursos


captados através do REDD e o agronegócio no Acre. Também vemos como a cadeia
da madeira é estimulada pelo programa REM com cerca de 12,6% dos recursos (com
base no cenário 2). Na teoria, isso é realizado beneficiando principalmente comunidades
que participam de planos de manejo comunitário. Mas veremos melhor a dinâmica de
funcionamento desse tipo de manejo no capítulo 4. O que fica claro, nas impressões
mais gerais da distribuição dos recursos é que a grande cadeia privilegiada pelo
programa REM é a piscicultura. Essa cadeia sintetiza a estratégia adotada pelo bloco
hegemônico que direciona as ações no Acre e entenderemos melhor isso também no
capítulo 4.

175
CAPÍTULO 4 – POLÍTICAS AMBIENTAS E NOVO PADRÃO DE CONFLITIVIDADE
NO ACRE

Nesse capítulo abordaremos os efeitos das políticas ambientais, programas e


arranjos descritos no capítulo 2, contextualizando alguns dados sobre o Acre e
analisando os fatores que geram conflitos territoriais. Para tal, utilizaremos como base,
principalmente os recursos captados pelo SISA através do programa REM KfW. Com a
descrição das políticas ficará mais fácil de entender como SISA articula e catalisa
recursos diversos e atua na paisagem e em cadeias produtivas que são estruturadas
em um modelo de PPPC que explicaremos melhor. Abordaremos a questão da
criminalização e repressão dos que se opõe aos projetos em curso no estado e por fim
debateremos o novo padrão conflitivo no Acre.

4.1 Aplicações das políticas ambientais no estado e suas implicações nos


conflitos territoriais

Com base nas tabela 6 e 7 do capítulo 2, que expõe a alocação de recursos do


programa REM KfW, agora descreveremos as políticas e ações, relacionando com o
contexto de formulação dos programas pelo governo. Guiaremos a análise pela
centralidade do pacto político-territorial firmado com o ZEE e a perspectiva ampla do
SISA que permite e justifica a alocação de benefícios “para todos”. Podemos ver com
maior clareza esse pacto político com o discurso conciliador do desenvolvimento
sustentável e com a deliberada apropriação da imagem de Chico Mendes em trecho de
uma publicação sobre esse conjunto de políticas:

“Desta forma, o sonho de Chico Mendes continua vivo e se refletirá em cada


propriedade rural deste Estado, desde as reservas extrativistas às grandes
propriedades, bem como as pequenas propriedades formadoras de assentamentos
tradicionais, florestais e agroflorestais, constituindo-se num grande pacto onde a
sustentabilidade integra ao mesmo tempo a inclusão social das famílias rurais, a
consolidação de uma economia de base agroflorestal e a manutenção da qualidade
dos serviços ambientais.” (ACRE, 2009, p. 07).

Como vimos, o desmatamento é um dos principais elementos retóricos que


justifica a amplitude dos incentivos e a “repartição de benefícios”. Por tanto, começamos
analisando a dinâmica de desmatamento no Acre.

4.1.1. Desmatamento no Acre

176
Existe uma tendência por parte das secretarias de estado como também por
parte de ONGs ambientais com atuação no Acre, como por exemplo a WWF e IPAM,
de responsabilizar principalmente agricultores familiares e assentamentos rurais pela
maior parte do desmatamento nos últimos anos (ANDERSON et. al., 2013; ALENCAR
et. al., 2012; ACRE, 2013e). Analisaremos mais de perto essa questão, inclusive por
que a identificação dos principais vetores do desmatamento é o subsídio para a
formulação das estratégias das políticas de comando e controle, com caráter mais
repressor, e a definição de alocação de recursos, os incentivos do SISA.
Segundo dados do PRODES/INPE, nos últimos anos o desmatamento no Estado
foi irregular apresentando alguns anos com aumentos consideráveis como por exemplo
2012, com 305 km2, e 2014 com 312 km2, como podemos ver no gráfico abaixo:

DESMATAMENTO ANUAL BRUTO NO ACRE


(PRODES)
1078

883

728
Km²/ano

592
547
441 419 398
280 305 312
254 259
221
184 167

1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014
Figura 11. Desmatamento bruto anual no Acre. Fonte: PRODES/INPE 2015.

As taxas de desmatamento dos anos recentes tem gerado dúvidas sobre a


eficiência das políticas de redução de desmatamento do estado, até mesmo para as
organizações que apoiam esse tipo de iniciativa como a The Nature Conservancy
(FISHBEIN; LEE, 2015). As áreas mais pressionadas se concentram na regiões do Alto
e Baixo Acre, regiões próximas a 2 grandes rodovias, BR-317 e BR-364 (ANDERSON
et. al., 2013). Essas áreas também concentram a maior parte da atividade agropecuária
do Estado, que tem grande importância no desmatamento, como veremos mais à frente.

177
Figura 12. Concentração do desmatamento em 2007 e projetado até 2030. Fonte: IPAM, 2009.

Outro elemento importante é que desde que o SISA e o programa ISA Carbono
foram implementados em 2010, o desmatamento tem apresentado uma tendência de
crescimento. A queda apresentado do ano de 2004 até 2007 acompanhou uma
tendência geral para os estados da Amazônia, o que não necessariamente teve grande
influência das políticas ambientais específicas do Acre, já os aumentos observados
desde 2010 no Estado, seguem um padrão distinto da região amazônica, como
podemos ver no gráfico abaixo:

178
Percentual de incremento anual de desmatamento no Acre e
na Amazônia
0,8
0,74
0,7 0,66
0,59
0,6
0,54 0,55
Taxa média (%)

0,59
0,57 Amazônia
0,5
0,5
0,4 0,36 0,36 0,36 0,43
0,340,34 0,44 0,37 Acre
0,26 0,36 0,28
0,3 0,33 0,25
0,27 0,33 0,23
0,24 0,27 0,26 0,17 0,19 0,19
0,2 0,26 0,22 0,150,16
0,24 0,14

0,1 0,15 0,14 0,13


0,11 0,12
0,1 0,09 0,10
0

Figura 13. Comparação entre desmatamento bruto anual na Amazônia Legal e Acre. Fonte:
PRODES/INPE 2015.

Devido a essa tendência a contribuição do Acre para o desmatamento da


Amazônia tem aumentado nos últimos anos (exceto em 2013), mesmo com a instituição
do SISA em 2010 como podemos observar abaixo:

Participação relativa do Acre no desmatamento amazônico


8

7 6,67
6,44

5
4,36
4,08 4,24
(%)

4 3,70 3,75

3,00 3,11
3 2,62 2,79
2,56
2,31 2,24
1,97
2 1,58

0
1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014

Figura 14. Participação relativa do Acre no desmatamento amazônico. Fonte: Adaptado de


CEPAL, IPEA e GIZ 2014, com dados do PRODES/INPE, 2015.

179
Dentro da retórica utilizada para gerar e comercializar os créditos de carbono, o
governo do Acre justifica que vêm realizando ações no sentido de reduzir o
desmatamento no estado desde 1999 como já citamos (ACRE, 2013a). O programa ISA
carbono contabiliza as reduções de emissões a partir de 2006, justificando que a partir
de então o estado tem reduções expressivas e consistentes nas taxas de desmatamento
(ACRE, 2013a). Mas os dados demonstram, primeiro que as reduções do Acre
acompanham o padrão geral de queda da Amazônia e mais importante, as taxas de
desmatamento no Acre seguem um padrão irregular justamente após a implementação
do SISA em 2010.
Através de seu sistema estadual de geoprocessamento, a UCEGEO, o Acre
também vêm monitoramento o desmatamento no Estado, inclusive relacionando com
categorias fundiárias, apesar de não divulgar os dados todos os anos como o INPE faz.
Em seu único documento divulgado publicamente em 2013, os dados de desmatamento
de 2011 e 2012 são analisados. A análise aponta que a maior parte dos desmatamento
nesses anos, foram de pequenas áreas, a maior parte entre 0,5 e 3 hectares (ACRE,
2013e). O estudo infere a partir disso que que essa dinâmica de desmatamento se deve
principalmente à agricultura familiar. Mas é importante destacar que o estudo não faz a
correlação das áreas desmatadas com dados fundiários para reforçar essa tese
(ANDERSON et al., 2013).
Outro ponto importante é que a metodologia da UCEGEO difere do INPE como
destacado no relatório publicado pela CEPAL, IPEA e GIZ (CEPAL; IPEA; GIZ, 2014)
Comparando as análises feitas pelas duas entidades mostra diferenças significativas
entre a participação de pequenas áreas para o Acre. Segundo o INPE, a participação
de pequenas áreas com até 6,5 ha no total desmatado era de 36% em 2004 e 27% em
2006, mas a partir de 2007 caiu bastante chegando a apenas 4% em 2012. Já áreas
entre 6,5 a 12 ha eram 21% em 2004 e subiram para 55% em 2012 e áreas de 12 a 25
ha passaram de 19% em 2004 para 30% em 2012. Por essa metodologia, nos anos
recentes, as áreas entre 6,5 e 25 ha representam 80% da área desmatada em 2012.
Já para a UCEGEO, áreas menores que 6 ha foram responsáveis por 96,9% do
total desmatado em 2011 e 93,5% em 2012. Mesmo considerando a diferença de
metodologia e também de resolução já que a UCEGEO consegue identificar e mapeia
polígonos de até 0,54 ha e o INPE/PRODES apenas polígonos de 6,25 ha ou maiores
o que pode ocasionar subregistros de áreas pequenas desmatadas, as análises das
duas entidades diferem significativamente e demonstram mais uma vez a necessidade
de aprofundamento da análise sobre os principais responsáveis pelo desmatamento no
Estado.

180
Com relação as categorias fundiárias, a análise presente na publicação da
UCEGEO faz um detalhamento dos desmatamentos em assentamentos rurais,
unidades de conservação e terras indígenas, mas não analisa as propriedades privadas
e áreas em disputa fundiária ou sem ordenamento, que são responsáveis juntas por
metade do desmatamento nos anos analisados, como podemos ver na tabela e nos
gráficos abaixo:

2011 2011 2012 2012 Média


(hectares) (%) (hectares) (%) (%/ano)
Incremento do
30.979 100 36.751,30 100
desmatamento
Assentamentos Rurais 11.095,70 35,81 14.480,70 39,40 37,60

Unidades de Conservação 3.505,70 11,31 3.753,60 10,21 10,76

Terras Indígenas 855,8 2,76 634,4 1,72 2,24


Propriedades Privadas e
áreas em disputa ou sem 15.521,80 50,10 17.882,60 48,65 49,38
ordenamento
Tabela 8. Incremento do desmatamento no Acre por classe fundiária. Fonte: Adaptado de ACRE,
2013e.

Incremento do desmatamento em 2011 no Acre por


categoria fundiária

Assentamentos Rurais

36% Unidades de
Conservação
50%
Terras Indígenas

11%
Propriedades Privadas e
áreas em disputa ou sem
3% ordenamento
Figura 15. Incremento do desmatamento no Acre por classe fundiária em 2011. Fonte: Adaptado
de ACRE, 2013e.

181
Incremento do desmatamento em 2012 no Acre por
categoria fundiária
Assentamentos Rurais

Unidades de Conservação
39%
49%
Terras Indígenas

Propriedades Privadas e
10% áreas em disputa ou sem
ordenamento
2%
Figura 16. Incremento do desmatamento no Acre por classe fundiária em 2012. Fonte: Adaptado
de ACRE, 2013e.

Tanto nessa análise como em outras publicações que abordam o desmatamento


no Acre como WWF (ANDERSON et. al., 2013) e IPAM (ALENCAR et. al., 2012), o foco
do desmatamento é colocado em cima principalmente dos assentamentos rurais e
pouco se fala por exemplo da influência das propriedades privadas nas taxas de
desmatamento. Realmente os assentamentos são vetores importantes do
desmatamento no Acre como podemos ver na tabela acima, mas isso não exclui a
importância das áreas privadas ou sem definição.
Além disso, para entendermos a contribuição no desmatamento por cada classe
fundiária de forma mais efetiva, precisamos considerar quanto cada uma ocupa no
Estado e também a estrutura fundiária. Os dados sobre a área ocupada por distintas
categorias fundiárias no Acre varia bastante segundo a fonte. Abaixo colocamos uma
tabela comparativa com diferentes estudos:
IMAZON (2012)
ACRE (2006) (1) MPE (2007) (2) ACRE (2008) (3) WWF (2010) (4) (5)
Categorias Área Área Área Área
Fundiárias (km²) (%) Área (km²) (%) (km²) (%) (km²) (%) (km²) (%)
Unidades de
Conservação (6) 51.078,4 31,10 50.965,7 31,06 53.437 31,28 51.100 31,12 52.189,2 34,2
Terras Indígenas (7) 23.901,1 14,55 27.971,0 17,04 24.846 14,55 24.000 14,62 24.263,4 15,9
Assentamentos
Rurais (8) 16.411,6 9,99 16.741,7 10,20 16.927 9,91 16.400 9,99 17.701,6 11,6
Propriedades
particulares (9) 50.503,9 30,75 29.011,0 17,68 33.386 19,54 32.200 19,61 34.792,8 22,8
Terras públicas, em
disputa ou não
ordenadas (10) 22.326,4 13,60 39.415,6 24,02 42.224 24,72 40.500 24,67 23.653,0 15,5
Total (11) 164.221,4 100,00 164.104,9 100,00 170.820 100 164.200 100 152.600,0 100
Tabela 9. Categorias fundiárias no Acre, Brasil. Fonte: Elaboração própria com dados de ACRE,
2011b; MPE-AC, 2009, ACRE, 2010c; ANDERSON et. al.,2013; SANTOS, PEREIRA,
VERÍSSMO, 2013.

182
(1) Zoneamento Ecológico-Econômico, Livro Temático Vol. 5 (2011) - Fonte: SEMA/AC, IBAMA,
ITERACRE, INCRA, 2006.
(2) Caracterização Socioambiental das Bacias Hidrográficas do Estado do Acre (2009) Fonte:
ZEE-AC, Fase II, 2006, banco de dados ambientais do governo do Acre.
(3) Plano Estadual de Prevenção e Controle do Desmatamento do Acre (2010) - Fonte: IMAC,
SEMA/AC, 2008.
(4) O Sistema de Incentivos Por Serviços Ambientais do Estado do Acre, Brasil (2013) - Fonte:
WWF, Dados dos assentamentos e terras públicas, em disputa ou não ordenadas estimados a
partir de base de dados geográficos da UCEGEO (não publicados), 2010.
(5) O estado da Amazônia: Uso da Terra (2013) - Fonte: IBGE, ,2007,2010; IMAZON, ISA, 2012;
INCRA,2002.
(6) Parte das variações encontradas estão relacionadas a unidades de conservação que estão
em processo de retificação dos perímetros. Também podem ser fonte de variação a sobreposição
de unidades de conservação com terras indígenas.
(7) Variações se devem a estudos que consideram áreas que ainda não estão demarcadas e
algumas vezes ainda não estão completamente identificadas.
(8) Existem variações relativas a área oficial demarcada pelo INCRA e área real que os
assentamentos ocupam. Também foram criados novos assentamentos desde os estudos mais
antigos.
(9) Os dados do ZEE, que são os mais discrepantes, consideraram que algumas propriedades
particulares não estão georeferênciadas, sendo assim, não se pode afirmar com absoluta certeza
quanto de área real existem sob o domínio particular, portanto, para não existir superposição de
dados, foram extraídas 70% das propriedades particulares, entre os intervalos até 50,00 ha, 50,1
a 100,00 e 15% no intervalo de 101,00 a 500,00 ha, imóveis cadastrado no SNCR e que estão
localizados nos Projetos de Assentamentos e nas Áreas de Proteção de Uso Sustentável.
(10) Terras em discriminação sub judice; Terras Arrecadadas, sem destinação, por serem de
difícil acesso; Terras originadas do deslocamento da nova Linha Cunha Gomes e áreas que
ainda não foram discriminadas (terras devolutas). Por não se ter condições técnicas de se
mensurar a área real, para efeito de cálculo, os valores foram obtidos através da dedução de
todas as demais áreas; Terras dominicais estaduais (lotes titulados e a titular).
(11) Parte da variação no tamanho total do Estado se deve a mudança na linha Cunha Gomes
que foi reconhecida pelo STF e pelo IBGE em 2006. Também pode existir variação devido a
áreas que são parcialmente sobrepostas, como unidades de conservação e terras indígenas ou
assentamentos e propriedades particulares que podem ser contabilizadas 2 vezes.

A tabela deixa claro que há uma grande variação, dependendo do estudo, na


área ocupada pelas categorias fundiárias de propriedade particular, terras públicas, em
disputa ou não ordenadas o que dificulta a avaliar a contribuição de cada categoria para
o desmatamento relativo ao tamanho que ocupam no Acre. Mas a importância da
propriedade privada para o desmatamento no Acre, que como já afirmamos não é
explicitada pelas entidades que fazem as análises de desmatamento, deveria ter mais
atenção, como podemos ver na tabela abaixo:

183
Porcentagem Desmatamento Porcentagem da área
Categoria Área (1.000 da área total acumulado até total desmatada do
fundiária km²) do Estado 2010 (km²) Estado
Terras Indígenas 24 14,6 249,41 1,2
Unidades de
Conservação 51,1 31,1 1434,12 6,9
Propriedades
Particulares 32,2 19,6 6547,08 31,5
Projetos de
Assentamentos(1) 16,4 10 7274,54 35
Terras em
processo de
definição(1) (2) 25,6 15,6 4447,86 21,4
Terras sem
definição 14,9 9,1 810,59 3,9
Total 164,2 100 20784,4 (3) 100
Tabela 10. Desmatamento acumulado por categorias fundiárias no Acre, Brasil. Fonte:
Elaboração própria com dados de ANDERSON et. al., 2013 e PRODES/INPE, 2015.
(1) Dados estimados a partir de base de dados geográficos da UCEGEO (não publicados).
(2) Terras discriminadas, ou terras discriminadas e arrecadadas.
(3) Desmatamento acumulado total para o Acre até 2010 segundo INPE/PRODES.

Na tabela 10 utilizamos dados da WWF (ANDERSON et. al, 2013) que, como
observado na tabela 9, considera que as propriedades privadas ocupam 19,6% do Acre,
bem diferente dos dados do ZEE (ACRE, 2011b) em que a categoria fundiária de
propriedade privada ocupa 30,75%. Isso se deve principalmente pela variação da
categoria de áreas ainda não ordenadas ou em disputa, que para WWF, ocupam 24,7%
enquanto que nos dados do ZEE ocupam 13,6%. Isso vai influenciar no desmatamento
atribuído para cada categoria dependendo de que dados são utilizados. Mesmo assim,
consideram o total desmatado por cada categoria, a propriedade privada é a segunda
que mais desmatou até 2010, com 31,5% e se somarmos com as áreas em processo
de definição temos 52,9 % do desmatamento acumulado até 2010.
Também sobre essa questão, considerando a análise presente no relatório da
CEPAL, IPEA e GIZ (CEPAL; IPEA; GIZ, 2014), também vemos que a propriedade
privada tem grande relevância para o desmatamento no Acre, como podemos observar
na tabela abaixo:

184
Categoria Desmatamento bruto anual (PRODES/INPE)
Fundiária 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012
(Km2) (%) (Km ) (%) (Km ) (%) (Km ) (%) (Km ) (%) (Km ) (%) (Km2) (%)
2 2 2 2 2

Terras Indígenas 1 1 1 1 4 1 2 1 6 2 3 1 2 1
Unidades de 0 0 1 1 3 1 1 1 5 2 6 2 0 0
conservação de
proteção integral
Assentamentos 97 42 59 36 95 33 60 37 96 36 101 34 84 31
Glebas federais 5 2 5 3 5 2 5 3 4 2 7 2 8 3
Unidades de 10 4 8 5 27 9 6 4 33 13 27 9 24 9
conservação de
uso sustentável
Outros (privado) 119 51 89 55 154 53 89 55 122 46 153 51 154 56
Total 231 163 288 162 266 297 272
Tabela 11. Desmatamento bruto anual por categoria fundiária no Acre, Brasil. Fonte: CEPAL;
IPEA; GIZ, 2014 com dados do PRODES/INPE.
A ONG IMAZON monitora o desmatamento na Amazônia e em sua metodologia
também explicita a contribuição das categorias fundiárias de assentamentos rurais,
unidades de conservação e terras indígenas no desmatamento, mas não explicita a
contribuição da propriedade privadas. Abaixo vemos uma tabela elaborada para o Acre
com base nos dados dos boletins mensais de desmatamento do IMAZON:

Ano Total Assentamentos % UCs % Terras % Soma da


identificado (km2) (2) (km2) Indígenas porcentagem
(1) (2) (km2) (2) das 3 categorias
fundiárias
2009 28 9,21 32,89 1,69 6,04 - - 38,93
2010 54 13,32 24,67 0,7 1,30 - - 25,96
2011 57 7 12,28 1,6 2,81 - - 15,09
2012 20 2,4 12 0,3 1,5 - - 13,50
2013 13 1,1 8,46 2,7 20,77 3,4 26,15 55,38
2014 119 20,7 17,39 11,8 9,92 1,1 0,92 28,24
2015 126 8,2 6,51 5,3 4,21 - - 10,72
Tabela 12. Desmatamento bruto anual no Acre total e a contribuição de parte das categorias
fundiárias. Fonte: Elaboração própria com dados dos boletins SAD IMAZON, 2015.
(1) O desmatamento de um ano é contabilizado a partir de Julho do mês anterior até Agosto do
ano em questão. Exemplo: desmatamento de 2015 contabiliza os meses de julho de 2014 até
agosto de 2015.
(2) A contribuição presente na tabela dos assentamentos rurais, unidades de conservação e
terras indígenas são a soma de áreas que o IMAZON destacou em sua metodologia, não
necessariamente representando toda a contribuição para o desmatamento das categorias

Apesar das diferenças metodológicas com relação ao PRODES/INPE, que


deixam os dados muitos diferentes, os dados do IMAZON também demonstram que
mesmo com a implementação do SISA em 2010, o desmatamento não diminui de forma
consistente no Estado. Podemos observar por esses dados, que para os anos
levantamentos, apenas em 2013 a soma das 3 categorias fundiárias destacadas

185
contribui com cerca da metade do desmatamento encontrado58. Além disso, a maior
contribuição dos assentamentos rurais foi em 2009 com cerca de 33%, das unidades de
conservação, com 21%, e as terras indígenas com 26% foi em 2013.
Incluindo dados sobre estrutura fundiária do estado, conseguimos analisar
melhor a categoria fundiária da propriedade privada. A questão fundiária do Acre é
complexa devido a história da região, com títulos de terra expedidos pelos Governos do
Amazonas, República da Bolívia, ex-Estado independente do Acre, pelo o Estado atual,
a partir de 1962 (ACRE, 2011b). Podemos observar nos gráficos abaixo, com dados de
2006 do Censo Agropecuária do IBGE que a maior parte dos estabelecimentos (24.285,
88%) tem até 200 hectares e que grande parte da área (1.591.611, 45,2%) está nas
mãos de poucos estabelecimentos maiores que 500 hectares (1.173, 4,21%). Isso
demonstra uma grande concentração fundiária, um índice de Gini de 0,716 com os
dados de 2006:

Número de estabelecimentos
agropecuários por tamanho (2006)
1.173; 4,21%
2.175; 7,80%

Até 200 ha
De 200 a menos de 500 ha
Maiores que 500 ha
24.530;
87,99%

Figura 17. Número de estabelecimentos agropecuários por grupo de área total. Fonte: Censo
Agropecuário/IBGE, 2006

58A metodologia utilizada nos boletins do IMAZON não coloca o total de desmatamento de cada
categoria fundiária, apenas destacando alguns assentamentos, unidades de conservação ou
terras indígenas que segundo eles tiveram um incremento grande nas taxas de desmatamento.

186
Área dos estabelecimentos agropecuários
por grupo de área total (2006)

493.265;
Privados até 200
14,02% ha
920.724;
26,16% Privados de 200 a
menos de 500 ha

Privados maiores
que 500 ha
1.591.611; 513.819;
45,22% 14,60% Outras condições
legais

Figura 18. Área dos estabelecimentos agropecuários por grupo de área total. Fonte: Censo
Agropecuário/IBGE, 2006

Se analisarmos a área dos estabelecimentos agropecuários por condição legal


das terras na tabela 13 e nas figuras 19 e 20, podemos observar que a maior parte da
área, 795.687 ha pertencem a apenas a 124 propriedades privadas de mais de 2.500
ha:

Condição legal das terras


Terras concedidas
por órgão
fundiário ainda
sem titulação
Próprias definitiva Arrendadas Em parceria Ocupadas
Número Área Número Área Número Área Número Área Número Área
(Unidad (Hectare (Unidad (Hectare (Unidad (Hectare (Unidad (Hectare (Unidad (Hectare
es) s) es) s) es) s) es) s) es) s)
Até 10 ha 3459 10.241 457 1.992 15 23 242 222 1243 4.184
De 10 a
menos de 1.483 19.232 854 12.580 16 185 2 X 266 3.240
20 há
De 20 a
menos de 3.536 115.881 857 27.200 13 328 8 122 285 8.504
50 ha
De 50 a
menos de 5.793 383.119 743 48.914 25 1.382 26 1.520 556 31.370
100 ha
De 100 a
menos de 3.293 392.251 230 25.165 15 1.670 22 2.540 1.093 121.383
200 ha
De 200 a
menos de 1.783 513.819 176 47.501 7 1.526 11 2.300 198 51.533
500 ha

187
De 500 a
menos de 692 448.394 22 12.556 4 2.257 1 X 71 47.824
1000 ha
De 1000 a
menos de 247 347.530 3 3.244 2 X 1 X 5 5.000
2500 ha
De 2500 ha
124 795.687 5 27.000 0 0 1 X 0 0
e mais
3.026.15
TOTAL 20.410 3.347 206.152 95 7.371 309 6.704 3.717 273.038
4
Tabela 13. Número de estabelecimentos e área dos estabelecimentos agropecuários por condição legal
das terras e grupos de área total. Fonte: Censo Agropecuário/IBGE, 2006. (OBS: Os dados das Unidades
Territoriais com menos de 3 (três) informantes estão desidentificados com o caractere X.)

Área por condição legal e grupo de tamanho


900.000

800.000

700.000

600.000
Hectares

Ocupadas
500.000 Em parceria

400.000 Arrendadas
Sem titulação definida
300.000 Próprias

200.000

100.000

0
Até 10 ha De 10 a De 20 a De 50 a De 100 a De 200 a De 500 a De 1000 a De 2500
menos de menos de menos de menos de menos de menos de menos de ha e mais
20 ha 50 ha 100 ha 200 ha 500 ha 1000 ha 2500 ha
Figura 19. Área dos estabelecimentos agropecuários por condição legal das terras e grupos de área total. Fonte:
Censo Agropecuário/IBGE, 2006

188
Número de estabelecimentos por condição legal e grupo
de tamanho
8000

7000
Número de estabelecimentos

6000

5000 Ocupadas
Em parceria
4000
Arrendadas
3000
Sem titulação definitiva
2000 Próprias
1000

0
Até 10 ha De 10 a De 20 a De 50 a De 100 a De 200 a De 500 a De 1000 a De 2500
menos de menos de menos de menos de menos de menos de menos de ha e mais
20 ha 50 ha 100 ha 200 ha 500 ha 1000 ha 2500 ha

Figura 20. Número de estabelecimentos agropecuários por condição legal das terras e grupos de área
total. Fonte: Censo Agropecuário/IBGE, 2006

Segundo dados do Sistema Nacional de Cadastro Rural (SNCR) do INCRA de


2005, consultado do documento publicado sobre o ZEE (ACRE, 2011b), fica ainda mais
explicitado a concentração fundiária como podemos observar na tabela abaixo:

Grupo de área total (1) Número de Área (ha) (%)


imóveis
rurais
Acima de 10.0000 hectares 184 5.091.354 44,01
Entre 100 e 10.000 (intervalo
compreende PAF, PDS, PAE) 3.002 4.471.033 38,65
Até 100 (intervalo compreende
PA, PCA, PE, PAR, PAD) 38.308 2.004.465 17,32
Total 41.594 11.566.797 100
Tabela 14. Número de imóveis rurais, área e porcentagem com base no grupo de área total.
Fonte: SNCR/INCRA, 2006.
(1) Nesses dados do SNCR estão inclusos além das propriedades privadas, assentamentos
rurais de diversas modalidades: Projetos de Assentamentos Agroextrativistas (PAE), Projetos de
Desenvolvimento Sustentável (PDS), Projetos de Assentamentos Florestais (PAF), Projetos de
Assentamento (PA), Projetos de Assentamentos Dirigidos (PAD), Projetos de Assentamento
Rápido (PAR), Projetos Casulo (PCA - modalidade descentralizada de assentamento criado por
meio de convênio do INCRA com as Prefeituras Municipais), Polos Agroflorestais (PE -
assentamento alternativo, localizado em áreas para-rurais também conhecidas como áreas de
cinturões verdes).

Os dados são bem diferentes do Censo Agropecuário de 2006, já que o Censo


trabalha com estabelecimentos agropecuários e os dados colhidos do SNCR possuem

189
imóveis rurais cadastrados. Também o intervalo dos grupos de área desses dados do
SNCR é bem mais grosseiro, trabalhando com apenas 3 grupos de tamanho, mas é
relevante observar que 184 imóveis rurais detém 44% de toda área cadastrada. Com
base nesses dados e segundo documento do ZEE (ACRE, 2011b), cerca de 21.157
imóveis rurais estão cadastrados sob domínio particular, compreendendo propriedades
particulares, propriedades particulares com parte destas definidas como apossamento,
posses a justo título, e, posses por simples ocupação. Apenas 92 imóveis com mais de
10.000 hectares, representam 0,4% desses imóveis e ocupam 44% das áreas
cadastradas com 2.545.650 hectares. As propriedades com menos de 100 hectares que
somam 19.154 imóveis, ocupam apenas 1.002.232 hectares.
Como esses dados podemos observar que a categoria fundiária das
propriedades privadas, que como já destacamos, tem relevante papel na dinâmica do
desmatamento no Acre, tem grande concentração fundiária com a maior parte da área
nas mãos de latifundiários. O que torna a situação mais complicada é que o próprio
INCRA tem dificuldade de acompanhamento como explicitado por um comentário em
uma das oficinas realizadas para formulação das políticas públicas:

A re-concentração de terras é problemática no Estado do Acre. O INCRA tem boa


parte da culpa, pois em várias ocasiões concedeu terras de reforma agrária sem
manter um cadastro adequado, facilitando o processo de venda de lotes e de
aquisição de novos lotes por pessoas que já haviam sido beneficiadas. (ACRE, 2010c,
p.68)

Segundo dados presentes em Teixeira (2011), as grandes propriedades no Acre


passaram de 444 com um total de 2.787.398 hectares em 2003, para 583 com 6.183.554
hectares em 2010, um claro processo de concentração. Mais à frente veremos o uso e
ocupação do solo e ficará mais claro o papel da grande propriedade privada no
desmatamento do Acre. Mas antes, com base nos dados do INCRA, podemos observar
mais detalhadamente a categoria dos assentamentos rurais:

Fase de implementação PA Número de famílias Área (km²) (1)


Assentamento Consolidado 10.002 6.360,87
Assentamento em Consolidação 3.110 1.197,95
Assentamento Criado 3.888 2.467,05
Assentamento em Estruturação 3.956 5.029,21
Assentamento em Instalação 6.363 4.514,69
Total 27.319 19.569,77
Tabela 15. Número de famílias e área total de assentamentos rurais por fase de implementação
no Acre. Fonte: INCRA, 2015.
(1) A área total correspondente aos assentamentos no Estado difere da tabela 9, pois os dados
são mais recentes e existem variações relativas a área oficial demarcada pelo INCRA e área real

190
que os assentamentos ocupam. Também foram criados novos assentamentos desde os estudos
mais antigos.

O que podemos observar é que existem mais de 27 mil famílias assentadas no


Acre em área que varia segundo o levantamento e metodologia, mas pelo menos 16 mil
km2 (tabelas 9 e 15). Essa informação é fundamental para analisar a contribuição de
cada categoria fundiária no desmatamento, pois dependendo da concentração de
famílias, a tendência será maior de pequenas áreas abertas na floresta, mas não
necessariamente representam a maior parcela da responsabilidade do desmatamento.
Para ilustrar essa questão, adaptados uma tabela presente na publicação da WWF
(2013) que segue abaixo:

Área por Área


Nº de famílias família ou desmatada
Grupo ou Área estabelecimen Área por família ou
socioeconô estabelecimento Área total florestada to rural (ha desmat estabelecime
mico s rurais (2006) (ha) (ha, 2007) /família) ada (ha) nto rural (ha)
2,390 2,365
Famílias milhões (30 milhões
Indígenas ± 2000 áreas) (99%) 1195 25.000 12,5
2,678 2,605
Famílias milhões (5 milhões
Extrativistas ± 6000 áreas) (97,2%) 446,3 73.000 12,16
1,995
Famílias de milhões 1,177
assentados (108 milhões
(<100ha) 21.040 projetos) (51%) 94,819 818.000 38,87
Propriedades 3,203
privadas 4,781 milhões 1.578.0
(>100ha) ± 2000 milhões (67%) 2390,5 00 789
Outras áreas 4,054
públicas (1) -- milhões --
11,844 9,350
Total ± 31.040 milhões milhões
Tabela 16. Desmatamento por família ou estabelecimento rural para diferentes categorias
fundiárias. Fonte: Elaboração própria com base em ANDERSON et. al.,2013 (Meneses-Filho et
al., 2009; IBGE, 2006; UCEGEO, dados não publicados; Alencar et. al., 2012.).

Essa tabela foi elaborada para explicitar que se olharmos a contribuição do


desmatamento com base no número de famílias ou estabelecimentos rurais, veremos
que uma grande diferença entre as categorias fundiárias. Essa elaboração da WWF no
entanto não refina a categoria fundiária das propriedades privadas, considerando acima
100 ha, por tanto não explicita a grande concentração fundiária que existe dentro dessa
categoria. Mas mesmo não conseguindo analisar de forma mais detalhada a
contribuição dos grandes latifúndios, podemos observar que um estabelecimento rural
nessa categoria desmatou em média 789 hectares, muito acima dos assentamentos
rurais, com 38,87 hectares por família. O que queremos explicitar é que as análises

191
realizadas (ACRE, 2013e; ANDERSON et. al., 2013; ALENCAR et. al., 2012) não expõe
a diferença entre categorias fundiárias no que diz respeito a quantidade de pessoas que
utilizam essas áreas na hora de considerar os principais responsáveis pelo
desmatamento. Isso é fundamental para entendermos as estratégias adotadas tanto
para fiscalização e punição do desmatamento, quanto para a alocação de recursos.
Como veremos a frente, órgãos como IBAMA e ICMBio direcionam a maior parte dos
esforços de suas ações repressoras nos agricultores familiares e extrativistas.
Outra informação fundamental para entender a dinâmica do desmatamento no
Acre é o uso e ocupação do solo. Os dados da série histórica do IBGE de 1970 até 2006
demonstram ao longo do tempo as atividades priorizadas pelos estabelecimentos
agropecuários como podemos ver na figura com a tabela abaixo:

Área dos estabelecimentos agropecuários em hectares


por utilização das terras - série histórica (1970/2006)
100%
90%
Porcentagem de cada
utilização das terras

80%
70%
60%
50%
40%
30%
20%
10%
0%
1970 1975 1980 1985 1995 2006
Matas plantadas 1.313 2 257 2.443 11.298 7.785
Matas naturais 3.913.859 4.047.566 5.109.207 4.597.272 2.327.114 2.225.506
Pastagens plantadas 22.256 70.113 197.996 257.681 552.193 891.733
Pastagens naturais 41.098 53.991 66.206 68.345 62.020 159.586
Lavouras temporárias 31.242 37.675 53.852 51.665 59.419 100.639
Lavouras permanentes 4.065 3.512 22.756 17.054 16.520 63.630

Lavouras permanentes Lavouras temporárias Pastagens naturais


Pastagens plantadas Matas naturais Matas plantadas

Figura 21. Áreas dos estabelecimentos agropecuários em hectares por utilização das terras.
Fonte: Séries históricas IBGE.

Essa série histórica demonstra que a principal atividade que influencia a


dinâmica de uso e ocupação do solo no Acre é a pecuária como podemos observar pelo
grande aumento das áreas de pastagens naturais e plantadas. Dados recentes dos anos
de 2008, 2010 e 2012 do projeto TerraClass que analisa os dados do PRODES/INPE
também demonstram essa tendência, como podemos ver abaixo:

192
Classes de uso e 2008 2010 2012
cobertura do solo Área total (%) Área total (km²) (%) Área total (km²) (%)
(km²)
Agricultura anual - - 3,79 0,02 26,23 0,13
Área não observada 385,99 2,01 210,93 1,07 229,34 1,13
Área urbana 231,22 1,20 199,49 1,01 226,18 1,12

Mosaico de ocupações 1522,32 7,91 1000,01 5,07 1037,12 5,11


Outros 18,68 0,10 21,15 0,11 57,95 0,29

Pasto com solo exposto 1,09 0,01 0 0,00 4,48 0,02


Pasto limpo 11.498,16 59,77 12166,71 61,74 11.902,03 58,76
Pasto Sujo 904,54 4,70 462,38 2,35 1.345,16 6,64

Regeneração com pasto 620,85 3,23 629,74 3,20 973,52 4,81

Vegetação secundária 3785,94 19,68 4717,38 23,94 4186,66 20,66


Desflorestamento no
ano 269,37 1,40 293,87 1,49 268,37 1,33
Total 19.238,16 100 19.705,45 100 20.257,04 100
Tabela 17. Mudanças no uso e ocupação do solo no Acre por classe. Fonte: Projeto TerraClass
- INPE, EMBRAPA, 2014.

Somando as classes de pasto com solo exposto, pasto limpo, pasto sujo e
regeneração com pasto temo aumento de 67,71% em 2008 para 70,21% o que reforça
que a maior parte das áreas desmatadas são convertidas em pasto e essa tendência
continua. Os dados presentes nos inventários de emissões realizado pela EMBRAPA-
AC nos anos de 2010 e 2012 também demonstram essa realidade:

Categoria Total 2004 Área Total 2010 Área Total 2012 Área
de uso da (ha) convertida (ha) convertida (há) convertida
terra (%) (%) (%)

Floresta 14.517.835 -- 14.148.759 -- 14.092.725 --


Capoeira 226.173 12,05 230.273 10,35 319.354 14,00
Pastagem 1.579.737 84,17 1.894.915 85,15 1.920.541 84,18
Agricultura 58.806 3,13 88.127 3,96 30.482 1,34
Espelho-
d'água 25.711 -- 47.512 -- 47.512 --
Mancha
urbana 11.045 0,59 10.969 0,49 10.964 0,48
Praia 1.715 -- 558 -- 556 --
Outros 1.112 0,06 1.021 0,05 0 0
Área
convertida 1.876.873 100 2.225.305 100 2.281.341 100

Total 16.422.134 16.422.134 16.422.134


Tabela 18. Mudanças no uso e ocupação do solo no Acre por categoria de uso da terra. Fonte:
Inventário das emissões de gases de efeito estufa do Acre, ano base 2010 e 2012, COSTA et.
al., 2012; COSTA, AMARAL, 2014.

193
4.1.2. Pecuária

Como vimos a partir dos dados de uso e ocupação do solo, a maior parte das
áreas desmatadas no Estado do Acre são destinada para formação de pastos, mais de
84% das áreas em 2012, e a tendência é de que esse processo se amplie visto que
grande parte dos pastos está degradada, o que faz com que os produtores precisem de
novas áreas (ANDERSON et. al.,2013). A partir dessa informação vamos olhar com
mais atenção a pecuária, principal atividade econômica do Acre com 92% de suas
transações em 2010, com 498 milhões de reais (ALENCAR et. al., 2012). O rebanho
bovino do estado vêm crescendo e está principalmente relacionado a pecuária de corte
como podemos ver na figura abaixo:

Rebanho x produção de leite


3.000.000 120.000

2.500.000 100.000
Número de cabeças de gado

2.000.000 80.000

Leite (1000 L)
1.500.000 60.000

1.000.000 40.000

500.000 20.000

0 0
1974 1980 1986 1992 1998 2004 2010

Rebanho bovino Produção de leite

Figura 22. Série histórica com tamanho do rebanho bovino e produção de leite no Acre. Fonte:
Pesquisa Pecuária Municipal/IBGE, 2013.

Enquanto o rebanho bovino tem aumentando consistentemente, passando de


cerca de 930 mil cabeças em 1999 para 2,7 milhões em 2013 (cerca de 290%) em 14
anos, a produção de leite começa a decrescer a partir de 2007, passando de 80 milhões
de litros para 47 milhões em 2013. A partir disso podemos afirmar que a pecuária de
corte é a principal atividade, algo relevante, pois como veremos nas figuras abaixo, é
predominante realizada em grandes propriedades privadas do Estado:

194
Número de estabelecimentos agropecuários que produziram leite no ano
de 2006 (Unidades) por grupo de cabeças de bovinos e grupo de área de
pastagem
1800 De 500 ou mais
1600 cabeças
1400 De 100 a 499
Número de estabelecimentos

cabeças
1200
De 50 a 99 cabeças
1000
800 De 20 a 49 cabeças
600
9 a 19 cabeças
400
200 De 5 a 8 cabeças
0
Maior De 1 a De 2 a De 5 a De 10 a De 20 a De 50 a De 100 a De 200 a De 500 e Produtor De 3 a 4 cabeças
que 0 e menos menos menos menos menos menos menos menos mais ha sem área
menor de 2 ha de 5 ha de 10 ha de 20 ha de 50 ha de 100 de 200 de 500 de De 1 a 2 cabeças
que 1 ha ha ha ha pastagem

Grupo de área de pastagem

Figura 23. Número de estabelecimentos agropecuários que produziram leite no ano de 2006 (Unidades)
por grupo de cabeças de bovinos e grupo de área de pastagem. Fonte: Censo Agropecuário, IBGE, 2006.

Número de estabelecimentos, com mais de 50 cabeças de gado, e


efetivo de bovinos com relação ao tamanho do estabelecimento -
Pecuária de corte e leite
2000 700.000
1800 600.000 Cabeças de gado
1600
1400 500.000
Estabelecimentos

1200 400.000
1000
800 300.000
600 200.000
400
200 100.000
0 0
De 2 a De 5 a De 10 a De 20 a De 50 a De 100 a De 200 a De 500 e
menos menos menos menos menos menos menos mais ha
de 5 ha de 10 ha de 20 ha de 50 ha de 100 de 200 de 500
ha ha ha
Área

Corte (unidades) Leite (unidades) Corte (cabeças) Leite (cabeças)

Figura 24. Número de estabelecimentos, com mais de 50 cabeças de gado, e efetivo de bovinos
com relação ao tamanho do estabelecimento – Pecuária de corte e leite. Fonte: Censo
Agropecuário, IBGE, 2006.

195
Efetivo de bovinos e número de estabelecimentos agropecuários em 31/12 por
grupos de área total

450.000 6000
400.000
5000

Nº de estabelecimentos
350.000
Nº de cabeças

300.000 4000
250.000
3000
200.000
150.000 2000
100.000
1000
50.000
0 0
ProdutorAté 10 ha De 10 a De 20 a De 50 a De 100 a De 200 a De 500 a De 1000 De 2500
sem área menos menos menos menos menos menos a menos ha e mais
de 20 ha de 50 ha de 100 de 200 de 500 de 1000 de 2500
ha ha ha ha ha
Nº de cabeças
Nº de estabelecimentos

Figura 25. Efetivo de bovinos e número de estabelecimentos agropecuários em 31/12 por grupos
de área total (2006). Fonte: Censo Agropecuário, IBGE, 2006.

Nas figura 23 e 24, podemos ver que a maior parte dos estabelecimentos que
produzem leite no Acre tem até 50 hectares e menos de 50 cabeças de gado e que a
maior parte gado de corte está em propriedades maiores que 500 hectares. A pecuária
leiteira é praticada na maior parte das vezes pela agricultura familiar (EMBRAPA-AC,
2014). Na figura 25, temos que a maior parte dos estabelecimentos com gado tem entre
50 e 100 hectares, 5.611 unidades, mas a maior parte do rebanho, 397.212 cabeças,
está em apenas 123 propriedades de mais de 2.500 hectares.
Outro elemento que demonstra a prioridade dada a pecuária no Estado é que a
maior parte do crédito rural é direcionada a essa atividade. Isso tem uma relação
importante com o desmatamento pois os nove municípios que foram responsáveis por
75% do desmatamento entre 2006 e 2008, em sua maioria tiveram um crédito para
pecuária maior do que para outras atividades agrícolas, ou seja, no Acre o crédito para
atividade pecuária está associado ao aumento de áreas desmatadas para formação de
pastagens (CEPAL; IPEA; GIZ, 2014). A atividade é mais rentável próxima as rodovias
que possibilitam uma logística mais barata, principalmente na região oriental do Acre
onde as condições de transporte são melhores (ALENCAR et. al., 2012), pressionando
áreas naturais como por exemplo a Reserva Extrativista Chico Mendes.

196
Por esse caminho que estamos seguindo, temos que a maior parte das áreas
desmatadas no Acre foram convertidas em pasto e que a maior parte da pecuária do
estado é realizada na grande propriedade privada que detêm a maior parte do rebanho.
Apesar disso o Acre tem desenvolvido políticas ambientais que beneficiam esse setor
do agronegócio. A partir da consolidação do ZEE em lei, Lei 1.904 de 2007, foi elaborada
a Política de Valorização do Ativo Ambiental Florestal (PVAAF), composta por um
conjunto de programas, políticas e ações baseada no ordenamento territorial proposto.
Sua aplicação foi pensada prioritariamente para as regiões de influência das rodovias
federais (BRs 364 e 317) e estaduais.
Voltado principalmente para o setor da “extração destrutiva” do agronegócio,
identificamos um esforço na regularização do passivo ambiental gerado pelo histórico
de descumprimento da legislação ambiental, em particular o Código Florestal Brasileiro
por esse setor da sociedade. Para atender esse objetivo foi elaborado um programa que
flexibiliza as leis ambientais com vários mecanismos de compensação além da
suspensão de multas. A partir do ZEE e da PVAAF foi possível reduzir de 80% para
50% a manutenção de Reserva Legal na zona de “consolidação de sistemas de
produção sustentáveis”, por exemplo, que comentamos no capítulo 2 (figura 5).
Aderindo ao programa, além da possibilidade de recuperação por plantio ou
regeneração natural, os proprietários poderiam compensar a Reserva Legal com áreas
em outras propriedades, doação de área destinada para unidades de conservação ou
depósito no Fundo Estadual de Florestas.
Também foi pensado um programa para recuperação de áreas degradadas com
linhas de crédito, assistência técnica, equipamentos públicos. Nesse programa já
começa a se desenhar o que posteriormente seria o “Subprograma de Pecuária
Sustentável” que já citamos, que tem como objetivo estimular uma pecuária mais
eficiente e consequentemente reduzir a abertura de novos pastos com ações de
implementação de sistemas silvipastoris, recuperação de pastos e melhoria do
rendimento de número de cabeças por hectare. Segundo o plano de governo de 2015-
2018:

(...) Na área rural, o aumento da produtividade é um requisito fundamental para evitar


desmatamento. Principalmente, a elevação da produtividade da exploração florestal e
do setor agropecuário, onde se ressalta a produção agrícola familiar e a pecuária
sustentável de pequeno e grande porte. Nos últimos três anos, foram feitos
investimentos e implantadas ações em grande escala, visando o aumento da
produção e da produtividade nesses ramos de produção. Os resultados foram
significativos. (ACRE, 2014a, p. 80, grifos nossos)

197
Como colocamos no capítulo 2, o programa REM do KfW alocou pelo menos 4,6
milhões de reais para esse subprograma em ações de reforma de pastos, mecanização
de áreas, assistência técnica e difusão do programa para os pecuaristas do Estado.
Ainda mais recursos estão previstos para o setor. Em documento de planejamento de
aplicação de recursos do programa do KfW foi previsto um investimento total de 20
milhões de reais, envolvendo além das ações citadas, apoio para melhoramento
genético do gado. (CEVA, 2014). Em trecho de entrevista, Alberto Tavares fala sobre o
programa:

(...) a gente está no trabalho de desenhar o que vem a ser esse subprograma pecuária,
já existe diálogo com os setores e existe já recurso também destinado a que? A se
conseguir fazer uma transição de uma pecuária extensiva de baixa produtividade para
uma pecuária intensiva ou mais intensiva com alta produtividade, com tecnologia de
melhoramento genético, com manejo de pastagens, com as estratégias conhecidas,
pela EMBPAPA e por diversos atores que trabalham nesse setor (...)

Além dessas ações, estão pensados estímulos creditícios, como previsto pelo
IPAM (ALENCAR et. al.,2012), o subprograma poderia facilitar: “(...) acessar a linha de
crédito ABC (Agricultura de Baixo Carbono), que fornece empréstimos apoiando uma
transição para uma pecuária e agricultura de baixo carbono (...)” (ALENCAR et. al, 2012,
pp.35-36). No plano estratégico de gestão da CDSA isso também é abordado:

(...) o Acre pode desenvolver um subprograma de pecuária para incentivar a produção


pecuária intensiva que possa ser certificada pelo estado do Acre, pelo Grupo de
Trabalho da Pecuária Sustentável e/ou pela Aliança da Terra 59. Um dos limites para
o desenvolvimento deste programa, está o acesso a crédito como uma barreira para
os pecuaristas que estão interessados em melhorar suas práticas de produção. Assim,
expandir o acesso a linhas de crédito mais baratas ou reestruturar o financiamento
disponível para atender os interesses dos pecuaristas pode ser crucial para facilitar
as mudanças necessárias para o aumento da produção e redução do desmatamento.
(CDSA, s/d, p. 17)

Além disso, no mesmo plano estratégico é colocado uma das possíveis funções
da CDSA no desenvolvimento do subprograma:

59A Aliança da Terra foi fundada em 2004 e é uma Organização da Sociedade Civil de Interesse
Público (OCIP) que tem como objetivo de promover o conceito de “Produzindo Certo”, que nada
mais é do que certificar empreendimentos e propriedades do agronegócio que são consideradas
“sustentáveis” que aderem a um cadastro de “compromisso socioambiental”. Um dos seus
idealizadores foi Daniel Nepstad, antigo membro do IPAM e WHRC e hoje um dos principais
membros do Earth Innovation Institute. Entre seus parceiros estão o Grupo Amaggi, Unilever,
Monsanto, IPAM, WHRC, entre outros

198
(...) A CDSA poderia facilitar o acesso a financiamento através do desenvolvimento
de programas que permitam o apoio (ou da participação no desenvolvimento) de
pacotes integrados de financiamento com o Governo Federal, bancos e com o setor
privado para alavancar fundos, existentes ou potenciais, não provenientes da CDSA.
(CDSA, s/d, p. 17)

Esse subprograma foi elaborado com consultorias do IPAM que tem divulgado
sua proposta de pecuária com “desmatamento zero” (ALENCAR et. al., 2012) e como já
citamos no capítulo 2, trabalha na lógica de custo de oportunidade. Segundo eles: “(...)
O custo de oportunidade de manutenção das florestas do Acre é expresso
principalmente através do lucro potencial principalmente da pecuária” (ALENCAR et. al.,
2012, p. 24). O mercado dessa atividade no Acre tem grande potencial, segundo a
mesma publicação:

(...) A indústria que pode estar mais bem posicionada para aproveitar o acesso aos
novos mercados é a pecuária. Esta indústria compreende 92% da receita estadual de
exportação e pode crescer através da intensificação das áreas de pastagens
existentes (ALENCAR et. al., 2012, p. 22)

A lógica que justifica esse tipo de estratégia é de que investindo no agronegócio,


com um aumento na eficiência da alocação de cabeças de gado por hectare, reduziria
a necessidade de abertura de novas áreas. Como o IPAM coloca:

(...) Nossas análises preliminares indicam que a transição para um setor de pecuária,
baseada no desmatamento zero, que cresça a uma taxa de 3,5% por ano e pode dar
lucro aos produtores ao mesmo tempo em que gera um montante de redução de
emissões suficientes para abastecer o SISA e o programa ISA Carbono. (ALENCAR
et. al., 2012, p.35)

Entretanto, como podemos observar no estudo que foi um dos subsídio para
pensar o subprograma (ALENCAR et. al., 2012), do ponto de vista econômico, a melhor
estratégia é intensificar parte das áreas e abrir outras. O estudo calcula a rentabilidade
líquida para pecuária de 2010 a 2012, considerando cenários de crescimento do
rebanho de 2,2% e 3,5% ao ano, preços da carne de R$65, R$85 e 105R$ a arroba e
intensificação das pastagens de 25, 50, 75 e 100%:

199
Figura 26. Rentabilidade líquida da pecuária de 2010 a 2021. Fonte: ALENCAR et. al.,
2012, p.43

O estudo propositadamente não mostra os dados da renda líquida para o cenário


de aumento do rebanho de 3,5% ao ano e a intensificação em 25% das áreas de
pastagens justificando que: “(...) ultrapassa a capacidade suporte do sistema e, portanto
a renda não é mostrada” (ALENCAR et. al., 2012, p.43). Ou seja, esse cenário com
certeza gera novos desmatamentos. A questão que fica clara é que o mais vantajoso do
ponto de vista econômico é intensificar parte da produção, 25 ou até 50% das áreas de
pastagens e aumentar o rebanho também abrindo novas áreas. Dentro do cenário com
aumento do rebanho de 3,5%, a renda líquida para 50% da área intensificada é 2,97
bilhões de reais enquanto que para intensificação de 100% das áreas é 2,57 bilhões. O
mais provável é que o subprograma gere uma intensificação de parte das pastagens
dos pecuaristas que utilizem o lucro líquido disso na abertura de novas áreas para lucrar
ainda mais.
Em oficinas realizadas sobre as políticas públicas no estado existiram
divergências sobre essa estratégia, alguns considerando que a pecuária deveria ser
fomentada e outros considerando que deveriam ser extintos os mecanismos de

200
financiamento da atividade no Acre (ACRE, 2010c). Até um dos membros do comitê
científico do SISA, que ajudou na formulação e implementação do sistema tem suas
dúvidas sobre essa estratégia. Em trecho de entrevista realizada em 27 de agosto de
2014 com Irvin Foster Brown60, quando perguntado sobre a questão do recurso do SISA
ir para pecuária com a justificativa de promover uma pecuária mais eficiente que
desmate menos, ele respondeu:

(...) Você conhece o paradoxo do Jevons? (...) basicamente, o paradoxo é o seguinte,


você melhora, a melhora da eficiência de máquinas a vapor, usando carvão, então o
que que esperava? Diminui o uso de carvão, por que são mais eficientes. Mas não
aconteceu. A produção de carvão ficou igual. O que aconteceu? Aumentou o número
de máquinas a vapor. Então você faz uma situação mais eficiente não significa que
reduz, até pode ser o contrário. (...) Então se eu faço, numa área, no lugar de 3
cabeças de gado, eu posso botar 6, então a pessoa vai reduzir, usar menos pasto? A
tendência é ser o contrário, aumentar pasto. Por que agora é mais lucrativo.
Então o que que pressupõe tudo isso é governabilidade. Sem governabilidade as
regras brutas, simples de economia leva para um processo que nós não sabemos (...)
(informação verbal61)

Aqui podemos ver de forma mais explicita que temos interações de benefício
mútuo entre o setor da “extração destrutiva”, nesse caso representando pelo
agronegócio da pecuária extensiva em latifúndios, com o setor da “floresta em pé” com
esse Subprograma “Pecuária Sustentável” que aloca recursos captados através da
redução de emissões de gases nesse setor do agronegócio. As áreas que “lastreiam”
os créditos de redução de desmatamento ficam imobilizadas, gerando conflitos
territoriais, pois as famílias não conseguem usufruir dos bens necessários para
reproduzir seus modos de vida, e os recursos provindos dos créditos estimulam uma
atividade que gera mais desmatamentos e conflitos no Estado.
Essas estratégias adotadas no Acre foram importantes referências para a
reforma do Código Florestal Brasileiro que ocorreu em 2012. Podemos ver a influência
das políticas do Acre no que condiz a regularização do passivo, que no código recebeu
o nome de Programa de Regularização Ambiental (PRA) e toda a parte relacionada a
serviços ambientais, com a instituição, por exemplo, da Cota de Reserva Ambiental
(CRA), que pode ser comercializada. No novo Código a CRA é definida como “título
representativo de vegetação nativa” e pode ser comercializado entre produtores que

60É interessante destacar que Irvin Foster Brown é do Woods Hole Research Center (WHRC),
além de ser membro do comitê científico do SISA e professor da UFCA, e o IPAM que tem
promovido essa proposta da pecuária “sustentável” é praticamente um braço do WHRC no Brasil.
61 Entrevista concedida por Irvin Foster Brown [ago. 2014] Entrevistador: Diogo Loibel

Sandonato. Rio Branco, 2014.

201
mantêm a reserva legal e os que não a mantêm (BRASIL, 2012 apud FAUSTINO;
FURTADO, 2015, p. 33). Essa cota pode ser comercializada em uma bolsa
especializada, a Bolsa de Valores Ambientais do Rio de Janeiro (BVRio) que já tem pelo
menos 2 milhões de hectares de imóveis rurais cadastrados (FAUSTINO; FURTADO,
2015).
Também nessa reforma, se introduz a possiblidade de pagamentos ou incentivos
por serviços ambientais, inclusive, dando brecha para que os estados possam ter seus
próprios sistemas subnacionais, como é o caso Acre com o SISA (ACRE, 2014b, 2014c).
Em entrevista concedida na missão da Plataforma DHESCA, um membro do governo
afirmou que o artigo 41 do no código “é praticamente uma transcrição do artigo 1º da
Lei do SISA e ainda:

(...) a lei nacional, se baseou na lei do SISA, para estabelecer uma regra nacional (...)
há praticamente um encaixamento do que a gente tem na legislação estadual para
essa legislação nacional que é o Código Florestal (informação verbal, FAUSTINO;
FURTADO, 2015, 2015, p. 71)

Não é por acaso que Jorge Viana, senador pelo Acre, foi relator das mudanças
e André Lima, também do IPAM, que foi um dos principais consultores na elaboração
da Política de Valorização do Ativo Ambiental Florestal, também teve papel importante
na articulação dos interesses do setor da “floresta em pé” nessa reforma. Várias
publicações fazem uma análise crítica da reforma do Código Florestal e demonstram os
interesses por trás da mesma que além de beneficiar o setor da “extração destrutiva” de
diversas formas como anistia de multas, flexibilização e incentivos para regularização
ambiental, impedimento da reforma agrária pelo conceito de função social da terra e
facilitação de fraudes e novas grilagens de terra, também demonstram os claros
interesses do setor da “floresta em pé”, privilegiando o setor da indústria da silvicultura
e dos especuladores de área de florestas através de mecanismos como o das cotas
ambientais descritas acima. Destacamos as publicações de Larissa Packer (2011;
2015), Gerson Teixeira (2011), Via Campesina (2011), Repórter Brasil (2011) e Luiz
Henrique Gomes de Moura (2014).

4.1.3. Agricultura

Apesar da pecuária ser o principal vetor de desmatamento no Acre como vimos,


a agricultura, principalmente a de subsistência, que utiliza a técnica de abrir pequenas
áreas com fogo (coivara) recebe muita atenção tanto dos órgãos de estado quanto das
ONGs que atuam nessa área. Mas, apesar do estado do Acre ter uma população que

202
vive no campo relativamente grande, em assentamentos rurais temos por volta de
30.000 famílias, nas unidades de conservação de uso direto, cerca de 10 mil famílias
(segundo dados do INCRA consultados em 2015) e em terras indígenas cerca de 13 mil
indígenas (segundo censo de 2010 do IBGE), as áreas abertas utilizadas para o plantio
não tem aumentado significativamente, oscilando nos últimos anos, como podemos ver
na figura abaixo:

ÁREA PLANTADA TOTAL

146.928

128.842 132.201 130.776


123.843

94.431
Hectares

2007 2009 2010 2011 2012 2013

Figura 27. Área plantada total no estado do Acre. Fonte: Produção Agrícola Municipal, IBGE, 2013.

Por outro lado, a produção do milho tem crescido bastante, relacionada a


produção de ração para as cadeias produtivas de criação de pequenos animais como
aves e suínos (SÁ et. al., 2009), as quais estão estruturadas com arranjos de PPPC
como veremos mais a frente com as empresas Acreaves e a Dom Porquito e mais
recentemente com a cadeia de piscicultura com a Peixes da Amazônia S.A. Abaixo
temos dados sobre a produção de milho no Acre:

203
Área plantada e produção de Milho
50.000 140.000
45.000
120.000
40.000

Produção (toneladas)
100.000
Área plantada (ha)
35.000
30.000
80.000
25.000
60.000
20.000
15.000 40.000
10.000
20.000
5.000
0 0
1990 1992 1994 1996 1998 2000 2002 2004 2006 2008 2010 2012

Milho em grãos (área plantada ha) Milho em grãos (toneladas)

Figura 28. Área plantada e produção de milho no estado do Acre. Fonte: Produção Agrícola
Municipal, IBGE, 2013.

As políticas do SISA dão muito peso para tentar reduzir o desmatamento


realizado pelos agricultores familiares e assentamentos com base nas análises de
desmatamento que debatemos acima. O programa REM KfW já alocou recursos em
diversas dessas políticas como por exemplo os “Roçados Sustentáveis” que objetivam
evitar o uso do fogo, da abertura de pequenas áreas e também direcionam os produtores
para as cadeias que são mais interessantes para o planejamento do estado. A estratégia
adotada é estimular os agricultores a preparem as áreas para plantio ou com auxílio de
mecanização ou com adubação verde utilizando sementes de Mucuna por exemplo.
Essa política está articulada com os PDCs, o que faz com que atinja muitos produtores
em lugares mais isolados. Algumas ONGs que prestam assistência técnica rural como
o PESACRE e CTA estão articuladas nesse esforço. Ainda associado aos roçados
sustentáveis, temos o estímulo a implementação de Sistema Agroflorestais (SAFs) com
a distribuição de mudas de espécies de interesse comercial como café e açaí.
Mas a eficiência de implementação dessas ações da política de “roçados
sustentáveis” é questionável. As ONGs e equipes de assistência técnica da SEAPROF
não conseguem fazer um acompanhamento dos locais onde introduzem a técnica da
adubação verde e distribuem as mudas. Em entrevista com vários moradores da RESEX
Chico Mendes, um dos focos desse tipo de política, perguntamos sobre a efetividade
das mesmas e as respostas mais frequentes foram de que quando chegam mudas,
coisa que pra muitos não acontece, elas apenas são entregues e toda responsabilidade
por preparar uma área para o plantio fica para o morador. Muitas dessas áreas não

204
possibilitam a mecanização para preparação do solo o que dificulta ainda mais a
realização do plantio dessas mudas. Em uma das entrevistas realizado com moradores
de colocação em Brasiléia, nos foi colocado que todas as mudas foram deixadas no
centro de uma das comunidades dentro da RESEX sem os devidos cuidados e porcos
comeram todas elas. A promessa de mecanização de áreas é inviável para a maior parte
das famílias dentro da RESEX, onde é impossível e até, na teoria, proibido a entrada de
máquinas e mecanização do solo.
Com relação a uso de adubação verde, também a falta de acompanhamento e
assistência técnica não garantem a efetividade dessa prática. Em trecho de entrevista
realizada em 4 de agosto de 2014 com Antônio Batista de Araújo mais conhecido como
Tota, um dos membros da ONG PESACRE, responsável pelo acompanhamento técnico
na RESEX Chico Mendes, principalmente na região de Assis Brasil, ele coloca:

(...) Não foi muito bom por que quando a gente entrou o governo tinha feito uma
distribuição de mucuna, né, que é a semente para recuperação do solo, eles tinham
feito, só distribuído muita mucuna, mas sem nenhuma assistência técnica, então ficou
muito difícil de trabalhar, por que quando a gente entrou pra trabalhar já, o pessoal já
estava desacreditado. Há isso ai não dá certo, isso ai não funciona, não da certo de
jeito nenhum, eu nem quero saber de mucuna, quero inventar outra coisa, o negócio
ficou muito mais difícil de trabalhar e não surtiu muito efeito (...) foi poucas pessoas
que aderiram a essa proposta (...) enquanto pode queimar, eu vou queimar por que
tenho mais garantia, esse negócio aqui vai dar muito trabalho. Não deu muito
resultado. Não tenho hoje nenhum produtor aqui, que ele realmente trabalhe só com
essa prática sem usar o fogo (...) (informe verbal62)

Em outro trecho de entrevista ele desacredita a eficiência de que sem uma


proibição rígida do uso do fogo, os produtores irão fazer uma transição para outras
técnicas:

(...) a gente só acredita que isso vai conseguir fluir esse trabalho quando de verdade
for proibido, por que enquanto que não for não vai ter condição não, assim, por mais
que as pessoas saibam, visita, leva lá, nós já fizemos intercâmbio, né a gente já
provou que dá certo, já foi feito muito isso e trabalhando também outras alternativas
como a criação de galinhas e outras coisa que a gente vem a trazer pra melhorar a
renda, e a gente sente essa dificuldade (...) as famílias aderirem e ai é aquele negócio,
é você pegar pra obrigar, você não consegue obrigar ninguém (...) as pessoas pra
aderirem vai ser difícil pra caramba, acho que só com uma pressão mesmo (...) só
vai fluir, não vai mudar, mas fluir, 2016, o ministério público disser agora quem botar

62
Entrevista concedida por Antônio Batista de Araújo [ago. 2014] Entrevistador: Diogo Loibel
Sandonato. Assis Brasil, 2014.

205
um palmo de fumaça vai ser penalizado e começar realmente a penalizar alguém
mesmo, vai começar algumas pessoas começar a trabalhar essa outra prática, mas
enquanto não chegar lá eu tenho quase certeza que vai ser empurrando e não flui
muito isso não (...)

A questão do fogo é um dos principais fatores de geração de conflito no Acre e


está totalmente associada as políticas de redução de desmatamento do estado. O uso
do fogo no preparo de pequenas áreas, geralmente com 1 hectare, destinadas a
agricultura de subsistência, prática que faz parte do modo de vida das populações tanto
indígenas (coivara), quanto dos seringueiros, ribeirinhos e demais agricultores
familiares, tem sofrido, nos últimos anos, crescente pressão e criminalização devido as
novas orientações dessas políticas ambientais. Isso foi reforçado por incêndios de
grandes proporções, como o de 2005, o pior incêndio em 34 anos quando foram
queimados cerca de 250.000 hectares de floresta e mais 200.000 de áreas abertas
(ACRE, 2010c). Geralmente os incêndios com grandes impactos ambientais são
causados pela expansão de pastos para pecuária, visto que, para as comunidades que
vivem na floresta e dependem dela, da onde extraem bens e alimentos, manejar o fogo
controlado é fundamental para não prejudicar sua própria sobrevivência. Em 2009,
entretanto, os Ministério Públicos Federal e Estadual entraram com uma ação com o
objetivo de proibir por completo o uso do fogo no estado até 2012 (ACRE, 2010c).
Entrevistamos em 14 de agosto de 2014 o superintendente do IBAMA do Acre, Diogo
Selhorst e perguntamos sobre essas políticas e essa ação e ele colocou:

(...) o fogo zero eu acho muito difícil de ser alcançado, lá no Paraná, no sul de Santa
Catarina, Minas Gerais, já não tem quase mais nada, a agricultura dominou né, os
espaços são tudo mecanizados, você quase não vê mais o uso do fogo pra agricultura
ou qualquer outra coisa. Aqui, a pessoa tem um imóvel e quer converter uma floresta
tropical tal como a nossa, com 400 toneladas de carbono por hectare, se não for com
fogo, muitos lugares é impossível você fazer, até daria pra fazer com a máquina, mas
eu ia ter um custo tão elevado que torna inviável, além de causar outros danos no
solo, por exemplo que você está com máquina pesada lá trabalhando, tirando
madeira, e ai você vai levar essa madeira pra onde? A galhada e tudo isso, você pode
enlear em algum lugar e deixar apodrecendo lá, mas será que é melhor que queimar?
Se você deixar apodrecendo se tá gerando metano, que é muitas vezes mais
prejudicial que o CO2 que é o principal produto da queima, né. Então assim, tudo isso
tem que ser pesando. Nas cabeceiras dos rios aqui do Acre não tem nem como chegar
uma máquina pra fazer um desmatamento. Então assim, o desmatamento que é legal,
a pessoa tem direito, em um imóvel aqui na Amazônia é 20%, a primeira conversão

206
da floresta para outro tipo de uso, se não com o uso do fogo, hoje eu vejo assim como
dificuldade da pessoa pode fazer isso. (informe verbal63)

Essa tentativa de proibição completa do uso do fogo com a inexistência de


alternativas com capilaridade necessária, principalmente, para as comunidades com
mais dificuldade de acesso onde, por exemplo, não chegam máquinas que poderiam
preparar o solo, atenta diretamente contra a soberania alimentar das famílias que
produzem essa agricultura de subsistência (SOUZA, 2009). São priorizadas as políticas
de comando e controle e as alternativas são pouco desenvolvidas e implementadas.
Existe uma articulação de entidades relacionadas ao tema de combate ao fogo chamada
Comissão Estadual de Gestão de Riscos Ambientais (CEGdRA), criada em 2008 e que
tem mais 26 entidades, dentre as quais temos as que são mais envolvidas com o
comando e controle como por exemplo polícia militar, exército, IBAMA e IMAC e outras
mais relacionadas a produção como SEAPROF, EMBRAPA, FIEAC (ACRE, 2011c). Em
outro trecho da entrevista com o superintendente do IBAMA, perguntamos sobre a
dinâmica dessa comissão e ele colocou:

(...) a parte de alternativas é reclamação que inclusive eu fiz dentro da comissão (...)
dentro da comissão o foco maior é no combate, na questão da articulação das
instituições pra combate ao fogo e a questão da alternativa está muito pulverizada (...)

A falta de efetividade das políticas fica explícita na declaração de um participante


de uma oficina de políticas do governo:

“Esse discurso já foi ouvido, as políticas, as promessas do governo, são antigas, mas
depois que a oficina acabar os representantes do governo vão embora e os pequenos
produtores ficam largados. O Ministério Público Estadual e o governo só sabem cobrar
e proibir; “(ACRE, 2010c, p. 71)

Em entrevista concedida a Israel Silva (CIMI, 2012b), uma da lideranças


históricas do movimento seringueiro e à época presidente do Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Xapuri (STTRX), Dercy Telles explicita o
conflito gerado por essas políticas e a ação repressora do MPE e MPF:

(...) Mas uma das coisas que mudou significativamente, foi a liberdade de se usufruir
dos bens comuns. A população tradicional, ou seja, os seringueiros, quem mora na
floresta, sempre utilizou a técnica rudimentar de usar o fogo pra limpar a área de

63
Entrevista concedida por Diogo Selhorst [ago. 2014] Entrevistador: Diogo Loibel Sandonato.
Rio Branco, 2014.

207
produção de subsistência e hoje sem que tenha se levado outra alternativa que
substitua essa técnica – e isso é um agravante porque sem produzir o sentido que se
tem de viver na zona rural é você ter a alimentação básica garantida, ou seja, você ter
certeza de que quem trabalha na terra não passa fome - essa população fica cada vez
mais ameaçada em função de uma recomendação do Ministério Público Estadual que
determina “fogo zero” pra todo o estado, inclusive a partir desse ano de 2012. (CIMI,
2012b, p. 38)

Devido ao grande potencial conflitivo dessa ação, em 2013, ela foi revertida em
parte permitindo o uso do fogo em áreas de até 3 hectares para pequenos produtores.
Mas a pressão e criminalização sobre a atividade continuam, devido às metas impostas
pelas políticas ambientais. Ainda sobre essa questão do “fogo zero”, Diogo explicita que
apesar da possibilidade dada pela justiça, não necessariamente o uso do fogo pelos
pequenos será respeitado e permitido pelo IMAC:

(...) Então eu acho que tem um benefício dessa ação civil pública que foi colocar isso
pra ser discutido pela sociedade, mas até a justiça entendeu que pra algumas
atividades não tem como substituir ainda, e concedeu que até 3 hectares poderia ser
autorizado para fins de agricultura de subsistência e o IMAC, tem uma portaria do
IMAC que fala não, nós vamos dar licença para até 1 hectare. Ai entra numa outra
discussão que, para o IMAC dar uma licença, uma autorização, a pessoa tem que
estar toda regularizada, tem que ter documento do imóvel, e isso não é a realidade da
maioria das pessoas, então assim, é uma coisa muito complexa, muito complexa.

Em trecho de entrevista realizada no 1º Congresso da CPS Conlutas, Osmarino


Amâncio coloca essa pressão que as comunidades estão passando:

(...) E tem um povo nativo que não é levado em consideração nessa região, o qual
vive da pesca, da caça, da castanha, do roçado de subsistência. Esse povo está se
tornando para os governantes o principal empecilho para implementar os
megaprojetos. Estão sendo criminalizados por uma coisa que sempre fizeram. Agora
foi decretado em nossa região “fogo zero”, todo mundo tem que cozinhar à lenha.
Como você vai decretar “fogo zero”, quando o seringueiro cozinha à lenha? O
trabalhador precisa do carvão para fazer comida, da lenha para fazer a comida, e
queimar o seu roçado para plantar a macaxeira, o milho, criar os seus bichinhos. Nós
trabalhamos com leguminosas, não vamos desmatar na beira dos igarapés, ou
derrubar a floresta, pois dependemos da floresta para nossa sobrevivência.
(SINDISPREV-RS, 2012)

Dialogando com essa estratégia de reduzir o uso do fogo, também foi fortalecido
um programa de certificação de propriedades rurais, consolidado na Lei 2.025 de 2008,
que prevê pagamentos de bônus (que varia de R$ 500,00 a R$ 600,00 por ano), na

208
lógica de pagamento por serviços ambientais (PSA), para adoção de práticas
condizentes com o planejamento da produção para essas áreas, com o objetivo,
segundo seus elaboradores, de reduzir a pressão do desmatamento, principalmente nas
áreas de influência de rodovias (ACRE, 2009). O programa, que foi inspirado em projeto
do PESACRE, possui grande apoio de um projeto da SKY da Inglaterra em parceria com
a WWF chamado “SKY Rainforest Rescue” que está em execução desde 2009 e já
recebeu mais de 6 milhões de libras esterlinas (LAVRATTI; TEJEIRO; STANTON,
2014). Também recebeu recursos do KfW dentro do conjunto de políticas voltadas para
agricultura. Além disso o programa possibilita, segundo documento de governo:

(...) A Certificação da Produção Familiar Sustentável permite a integração com


outros programas e projetos. Esta sinergia consiste na possibilidade de incluir
centenas de famílias, de maneira voluntária, em atividades que requerem redução
ou eliminação de desmatamento e uso do fogo como técnica/tecnologia de
produção. Ao se integrarem ao programa, as famílias têm prioridade de recebimento
de subvenções econômicas para atividades produtivas sustentáveis por diferentes
fontes financeiras. (...) (ACRE, 2014d, p. 6)

As propriedades que aderem ao programa, além de não poder mais usar o fogo
na produção, são progressivamente direcionadas a integrar cadeias produtivas
“prioritárias”, dialogando com outras políticas como, por exemplo, o programa de
Florestas Plantadas que veremos abaixo (ACRE, 2009; NEVES, 2010).
As políticas direcionadas a essas populações são, por um lado, de maior
fiscalização e punição, por outro, de integração de forma subordinada, quando viável
logisticamente (proximidade de ramais e rodovias), em cadeias produtivas consideras
prioritárias pelo governo. Em trecho de entrevista com Mônica de Los Rios, ela explicita
isso:

(...) Nas cadeias das áreas, por exemplo, abertas, uma questão que está sendo
trabalhada, é a parte do programa de certificação, com apoio não somente em
assistência técnica (...) a parte de implantação de estrutura para escoamento de
produção, a parte de organização de associativismo e fortalecimento do
associativismo, dos produtores, e tem, por exemplo, georreferenciamento, apoio nos
planos de uso das propriedades, enfim, então tem no programa de certificação, que
são produtos, são produções não de alta escala, mas são produções, vamos dizer
assim, de produtos de subsistência (...) mas está ligada sempre dentro do programa
de certificação, a escolha sempre acaba sendo do produtor, que cadeias, mas ela,
tem algumas linhas já a serem fortalecidas pelo plano do governo, então o
recurso vai direcionado a isso (...)

209
Assim, podemos ver como o capital começa a penetrar espaços onde antes a
mediação do dinheiro não era tão forte. A lógica do PSA estimula essa penetração. Em
vez de produzir o milho para ração para os animais em pequenas áreas de agricultura
de subsistência, as famílias passam a ter que comprar a ração, uma vez que cada vez
mais se impossibilita essa atividade, com a justificativa das metas de redução de
desmatamento e queimadas. Há uma gradativa perda de autonomia e soberania
alimentar. Em outro trecho da entrevista com Mônica de Los Rios, ela coloca que é
possível reduzir o desmatamento de forma consistente se:

(...) Isso seria possível conseguir se a gente fizer com que esses produtores todos,
eles estejam dentro de uma cadeia produtiva que lhe propicie o ganho de renda e ao
mesmo tempo faça com que ele proteja sua floreta, não vá além da reserva legal, por
que hoje o que tem é, ah não, eu preciso comer, a justificativa é eu preciso comer,
e vai vai vai comendo floresta (...)

Nessa parte, Mônica deixa claro a concepção que embasa as políticas de


combate ao desmatamento. Que a agricultura de subsistência com a abertura de
pequenas áreas com uso do fogo é um grande vetor do desmatamento e deve ser
impedida. Já debatemos que as análises de desmatamento no Acre tendem a dar
destaque e responsabilizar os agricultores familiares, seringueiros e ribeirinhos e
invisibilizam os grandes latifundiários que promovem a maior parte do desmatamento.
Também Rodrigo Neves, deixa explícito essa concepção em outro trecho de entrevista:

(...) A gente vai criando um enraizamento de atividades produtivas que são


sustentáveis em que a pessoa que fazia o roçadinho dela pra, por que ela precisava
comer, porque estava morrendo de fome, ela seja inserida dentro de uma cadeia
que seja sustentável e que tenha sustentabilidade não só ambiental mas
sustentabilidade econômica (...)

A ideia de uma valorização do ativo ambiental florestal já demonstra claramente


o direcionamento desse conjunto de políticas. Podemos ver como as articulações de
interesses entre os setores da “exploração destrutiva”, representando principalmente
pelo agronegócio da pecuária, e da “floresta em pé”, representando principalmente pelos
setores madeireiros e de PSA, dialogam com a perversa lógica entre passivo e ativo
ambiental. Perversa, pois baseada na compensação, que não enfrenta as reais
motivações da criação desse passivo.
O SEANP mapeia as áreas consideradas ativos ambientais do estado - unidades
de conservação, terras indígenas, áreas de reserva legal das propriedades etc. -,
proporcionando as informações necessárias para que os detentores de passivo, com

210
destaque para grandes latifundiários do agronegócio, possam se regularizar, passando
a ter suas multas suspensas e acessar incentivos e linhas de crédito, compensando seu
passivo com o ativo presente em outras áreas, como por exemplo florestas estaduais
que são criadas com o objetivo de exploração de madeira. Ativo esse que, inclusive,
pode ser monocultivo de árvores do Programa de Florestas Plantadas, que segundo
governo:

(...) O Projeto de Reflorestamento (Florestas64 Plantadas) visa consolidar e


implementar estruturas de viveiros de mudas para recuperação e reincorporação ao
processo produtivo de áreas alteradas e degradadas, por meio do estabelecimento de
florestas plantadas com fins ecológicos, energéticos e econômicos e também gerar
renda através da venda de carbono decorrente dos créditos gerados a partir do plantio.
(ACRE, 2010c, p. 92)

Esse programa consiste em uma estratégia do estado de “recuperar” áreas


degradadas e ao passo que gera produção de matéria-prima para as indústrias, como
por exemplo da madeira e também para geração de energia (ACRE, 2010c). Segundo
o Plano de Outorga Florestal do Acre de 2013:

(...) O objetivo principal do Programa é promover o estabelecimento de florestas


plantadas em áreas alteradas e degradadas, com vistas à formação de suprimento de
caráter produtivo e estratégico, aumentando a competitividade das indústrias de base
florestal do Estado (...) (ACRE, 2013f, p. 47).

64 Aqui cabe destacar que o conceito de floresta nesse caso segue a definição da FAO e PNUD
que consideram que monocultivos de árvores são floresta o que possibilita a ideia que a
silvicultura em larga escala recupera áreas, beneficiando grandes empresas com incentivos e
demais benefícios inclusive certificações ambientas como o selo FSC. Como coloca o WRM
(2003): Um dos principais problemas enfrentados por aqueles que lutam contra as plantações de
árvores em grande escala é a confusão (gerada pela FAO) entre florestas e plantações
(classificadas como florestas "naturais" e florestas "plantadas"). A definição do Conselho de
Manejo Florestal (FSC, em inglês) só faz aumentar essa confusão, pois afirma que as plantações
são florestas: "Plantação: áreas florestais carentes das principais características e dos
elementos-chave dos ecossistemas naturais, como resultado do plantio ou de tratamentos
silviculturais". Chamando as plantações de "áreas florestais", essa definição permite ao FSC
incluir as plantações em sua relação de "florestas certificadas". (WRM, 2003, p. 25)

211
Figura 29. Área de florestas plantada no PAE Cachoeira. Foto: Diogo Loibel Sandonato

Por enquanto o programa tem se voltado bastante para estimular os


monocultivos de seringa para aumentar a capacidade de abastecimento da Natex,
fábrica de preservativos de Xapuri, utilizando em parte os recursos do REM KfW.
Segundo o governo o programa:

(...) permite ao mesmo tempo que se recupera os ativos florestais, atividades


produtivas extrativistas para incrementar a renda familiar. Com este propósito, foram
implementadas ações de apoio a produtores familiares para reflorestamento com
seringa e açaí, incluindo mecanização das áreas atendidas (ACRE, 2014d, p. 8).

Esse programa de florestas plantadas não é efetivo para a maior parte dos
pequenos agricultores pelos mesmos problemas que já abordamos com relação a
implementação dos SAFs dos roçados sustentáveis. Devido à dificuldade de
mecanização de áreas ou falta de acompanhamento de assistência técnica, mudas são
perdidas antes mesmo antes de serem plantadas. Essa constatação de que a maior
parte dos benefícios ficam para os grandes produtores é reforçada, inclusive, por uma
crítica feita em uma das oficinas realizadas pelo governo em comunidades para discutir
suas políticas:

212
As políticas do governo (regularização dos passivos) são muito direcionadas para os
grandes produtores (p. ex: reflorestamento). As propostas são inviáveis aos pequenos
e, como consequência, há grande rejeição às políticas propostas; (ACRE, 2010c, p.
70)

Mais ainda, o detentor do passivo, pode contribuir com o Fundo Estadual de


Florestas, dos quais os recursos são fundamentalmente utilizados no estímulo da
exploração de madeira, por exemplo, custeando planos de manejo. O fundo que deveria
direcionar boa parte de seus recursos para criação, regulamentação e gestão de
unidades de conservação, não o faz como afirma FUNBIO (2014):

“(...) O Fundo Florestal existente, por exemplo, deveria beneficiar as UCs geridas pela
SEMA mas não o faz (...) O Fundo está voltado atualmente para o produtor
agroflorestal, então não está diretamente beneficiando as UCs.” (FUNBIO, 2014, pp.
37-38).

O relatório realizado pela CEPAL, IPEA e GIZ sobre as políticas públicas do Acre
também vai na mesma linha, afirmando que o Fundo Estadual de Florestas que poderia
ser acessado por áreas protegidas ainda não está operacional (CEPAL; IPEA; GIZ,
2014). Isso apesar de que em sua publicação de 2013, a WWF afirmar que até
novembro de 2012 o fundo acumulava mais de 2,7 milhões de reais quer seriam
destinados, segundo eles, para ações de reflorestamento, mas sem especificar que tipo
de ação (ANDERSON et. al.,2013).
Essa lógica de ativo e passivo vai ser ainda mais potencializada com a
implementação do Cadastro Ambiental Rural (CAR), ferramenta criada e
regulamentada na reforma do Código Florestal. Como já comentamos, o novo Código
teve influência de quadros do bloco hegemônico do Acre e por tanto existe grandes
semelhanças das políticas estaduais com partes do Código. A partir da implementação
desse cadastro no Acre, a intenção do governo é migrar seu programa de regularização
do passivo ambiental para o Programa de Regularização Ambiental (PRA) instituído
com o novo Código Florestal. O programa de certificação estadual também migraria
para se adequar ao novo código, visto que seguem a mesma lógica. Com o CAR, os
“ativos ambientais” de todas as terras, incluindo as griladas e com conflito fundiário, são
mapeados e cadastrados o que permite comercialização de Cotas de Reserva
Ambiental (CRA) para os que detém o “passivo”, principalmente o agronegócio. Isso
pode ser feito numa escala nacional através da BVRio. Como o Acre possui grande
parte de sua área coberta por florestas, tem muito “ativo” para ser comercializado. Como
já colocamos, existe um projeto aprovado junto ao Fundo Amazônia (BNDES) de 16,8
milhões para fazer essa transição.

213
4.1.4. Modelos de participação e a Parceria Público Privada Comunitária (PPPC)

Como já citamos, existe um esforço das políticas ambientais para controlar e


proibir práticas tradicionais de reprodução da vida dos povos da floresta no Acre
articulado com um direcionamento desses povos para determinadas atividades de
interesse do estado com a justificativa de combater o desmatamento e promover o
desenvolvimento sustentável. No plano de governo 2015-2018 é coloca que:

(...) Para assegurar a sustentabilidade do desenvolvimento, serão indissociáveis,


desse processo, a continuidade das políticas de inserção dos pequenos
produtores às parcerias de grandes empreendimentos produtivos e a inclusão
produtiva de famílias em situação de extrema pobreza por meio de pequenos negócios
como premissas de uma melhor distribuição de renda. (ACRE, 2014a, p. 83)

Dentro do plano plurianual e plano de governo, os programas de


industrialização, Desenvolvimento das Cadeias Produtivas nas Zonas Especiais
de Produção e Subprograma Expansão e Modernização da Economia Florestal são
estruturados pensando nesse processo.
As chamadas Cadeias Produtivas Agroflorestais e Práticas Sustentáveis,
segundo um documento de governo publicado (ACRE, 2010c), tem como objetivos
“aumentar a competitividade de produtos sustentáveis do setor agropecuário e florestal
em mercados nacionais e internacionais” (ACRE, 2010c, p. 9). Com essa política fica
clara a importância dada para cadeias produtivas prioritárias para além da madeira, por
meio de programas e projetos como o “fortalecimento da cadeia produtiva de produtos
florestais não-madeireiros” que prevê ações voltadas para cadeia da castanha e da
borracha, como também outras cadeias consideradas prioritárias, englobadas em
programas e projetos de “fomento à modernização da produção agroindustrial e das
cadeias produtivas”, como a cadeia da pecuária, piscicultura e pequenos animais (aves,
porcos, ovinos). Segundo o plano de governo 2015-2018:

(...) O desenvolvimento de cadeias produtivas estratégicas representa importantes


oportunidades econômicas para o Acre, tendo a indústria como o setor dinâmico de
alta participação no valor adicionado (...) É preciso ressaltar, que os projetos
econômicos são resultantes de uma estreita parceria, uma articulação, uma
concertação entre o governo, a iniciativa privada e as comunidades de pequenos
produtores. No geral, são projetos que têm participação dos agricultores familiares
e/ou entrega de benefícios às comunidades. (ACRE, 2014a, p.89)

214
Segundo a retórica utilizada, a forma de combater o desmatamento e
consequentemente as emissões seria intervir nos diversos pontos dessas cadeias
produtivas consideradas “sustentáveis”. Em trecho de entrevista com Mônica de Los
Rios ela esclarece essa estratégia:

(...) Então quais são essas cadeias estratégicas, pra manter a redução do
desmatamento? Uma dessas cadeias estratégicas está voltada para o extrativismo, a
valorização do extrativismo, a recuperação do extrativismo. Então quais são as
cadeias principais que precisam de consolidação, isto é não somente ir lá apoiar o
produtor (...) você tem que pensar em todos os pontos da cadeia, desde o produtor
até a fase final da produção que é qual produto transformado com aquela produção
(...) Então o apoio vem, por exemplo, não somente para assistência técnica na área
da produção, mas também para fortalecimento organizacional, competição com o
mercado e etc.... (...) Então, o apoio vai desde assistência técnica, de melhoria da
produtividade, nesse setor, até os outros pontos da cadeia (...)

Rodrigo neves também comenta sobre esse processo:

(...) vai criando clusters, ou cadeias produtivas e agregando as comunidades, nova


cadeia produtiva, agrega comunidade, nova cadeia produtiva, agrega comunidade. A
ideia também de garantir também que eles, que eles se associem, é muito importante
que eles trabalhem coletivamente, é uma coisa extremamente difícil.

Para entender quais as estratégias utilizadas para intervir nessas cadeias e


como o SISA e o programa REM KfW se relacionam com isso, primeiro precisamos
entender um arranjo replicado em todas essas cadeias produtivas e que é fortemente
estimulado no Acre, a Parceria Público-Privada-Comunitária (PPPC). Segundo o
plano de governo 2015-2018, a Frente Popular do Acre deu um grande impulso a
industrialização e:

(...) A política industrial praticada pelo atual governo envolve investimentos diretos e
incentivos fiscais, financeiros e locacionais. Os investimentos diretos são
realizados na forma de parceria com a iniciativa privada e as comunidades que
produzem a matéria prima (PPC). Especialmente nas pequenas indústrias, acontece
a parceria exclusivamente com as comunidades de produtores. As formas de
parceria PPC já operam na indústria madeireira, moveleira, de castanha, na
agroindústria de aves e de suinocultura. A parceria público-comunitária já existe nas
pequenas indústrias de óleos vegetais, peixe e biscoitos. Este tem se mostrado o
caminho apropriado para mudar o padrão de especialização da economia. (ACRE,
2014a, p. 83, grifos nossos)

215
Em trecho da entrevista com o professor da UFAC, Silvio Simione da Silva, ele
comenta as origens da proposta de PPPC dentro da Frente Popular:

(...) o Jorge Viana ele tinha um discurso muito forte, que ele estava criando a base
estruturante para industrialização do Acre, e essa criação da base estruturante seria
o que, era mais precisamente a implementação do sistema rodoviário que agora já
não era mais problema ecológico (...) e junto com esses eixos de estruturação que ele
foi fomentando e tentando fortalecer essa vocação de cada município, município
pesqueiro, por diante, era ele criar industrias, e ai a ideia era, criar indústria e atrair
empresários pra cá, não era nenhuma base social, e ai criou-se a maldição do PPPC
(...)

Dentro do contexto do pacto político-territorial foram desenvolvidas estratégias


de desenvolvimento das cadeias produtivas abarcando os diferentes setores sociais
para que contemplassem o capital privado do agronegócio, com acesso a recursos dos
bancos tanto nacionais como multilaterais e também integrassem os seringueiros,
ribeirinhos, indígenas e agricultores familiares ou, nas palavras dos difusores dessas
estratégias, o “capital comunitário” (MACHADO65, 2007, 2009). A ideia propagada pela
Frente Popular é de que todos ganham com o consenso em torno da construção do
“desenvolvimento sustentável”. Para implementar essa proposta, dependendo do
contexto e participação de cada cadeia produtiva, foram elaborados subsídios,
concessões, políticas públicas e doações.
Na perspectiva de integração do “capital comunitário”, um passo importante foi
o direcionamento das ações para as associações e cooperativas. Aqui o governo do
estado não só cumpriu o papel de apoio com recursos e subsídios, como também
“encubou” parte dessas organizações. Muitas das cooperativas e associações que
nasceram no seio do movimento social do Acre na década de 80 e início da década de
90 foram instrumentalizadas politicamente. Com isso, parte delas sucumbiu, como a
CAEX e CAPEB, e parte passou a adotar comportamentos distintos das propostas
originais (SILVA, 2005). Em trecho de entrevista Silvio, que pesquisou essas
cooperativas e conviveu com esse processo de mudança coloca:

(...) O modelo de gestão originário dos movimentos sociais não interessa ao modelo
de desenvolvimento que o estado quer propor, esse modelo coletivo, quase de
colegiado, que as cooperativas fomentaram não tem isso ai (...) quando o movimento
social percebeu a possibilidade da parceria e do dinheiro, o movimento social tranquilo
aceito, quem não quer dinheiro? Todo mundo quer dinheiro. As cooperativas

65As publicações de Sibá Machado, importante quadro do PT do Acre, demonstram a relação


da Frente Popular com esse a elaboração e implementação dessa estratégia.

216
aceitaram dinheiro. Bom até que o dinheiro estava chegando, estava tranquilo, estava
ótimo. Só que chegou um dado momento que o governo do estado começou a querer
interferir (...) o governo estadual destruiu as iniciativas de movimento social por que o
modelo de gestão que ele queria era outro, não era esse modelo colegiado, de
participação popular, ele quer o modelo empresarial que trabalha com escala de
mercado, com tecnologia, com todas essas coisas, e que permita que grupos
empresariais externos e até internos se formem e apossem disso daí (...)

Já pautada nesse modelo “empresarial”, em 2001 nasce a Cooperativa Central


de Comercialização Extrativista do Acre66 (COOPERACRE), voltadas para produtos
extrativistas, principalmente castanha e borracha. A cooperativa central congrega 25
cooperativas e associações, com aproximadamente 2.000 famílias de várias regiões do
estado (CEPAL; IPEA; GIZ, 2014). Segundo NUNES (2008), ela é constituída com o
objetivo de tornar mais eficiente o processo de comercialização e produção dos
cooperados. Ele coloca:

A COOPERACRE foi concebida a partir de um “projeto” do governo que envolveu


lideranças políticas municipais e estaduais, assim como gerentes do primeiro e
segundo escalão de governo (...) Ela representou durante os primeiros anos de
existência, uma forte relação com as políticas de governo, voltadas ao setor
extrativista. (NUNES, 2008, p. 64)

Em entrevista realiza 15 de julho de 2014 com Antônio Teixeira Mendes mais


conhecido como Duda Mendes, primo de Chico Mendes e liderança do movimento
seringueiro ele explicita como a cooperativa foi criada:

(...) A COOPERACRE ninguém nem participou (...) foi criado por pessoal de governo
lá, acharam que era importante ter um associação das associações pra representar
(...) já veio pronto (...) (informação verbal67)

Em outra trecho da publicação de Nunes (2008) ele cita Silva que destaca a
relação da criação da cooperativa com os objetivos do governo com as cadeias
“sustentáveis”:

(...) as que estão sendo instituídas (pois é assim que são formadas como metas
políticas) aparecem como instrumentos de ‘entrada’ (subordinadas e acatando um

66 É interessante notar que no próprio sitio da COOPERACRE, eles se autodenominam como


empresa: http://www.cooperacre.com/a-empresa
67
Entrevista concedida por Antônio Teixeira Mendes [jul. 2014] Entrevistadores: Luiz Henrique
Gomes de Moura e Diogo Loibel Sandonato. Xapuri, 2014.

217
projeto vindo de cima para baixo), para as propostas de novas formas de inserções
produtivas no âmbito da produção geral e da sociedade, sob metas do “Projeto de
Desenvolvimento Sustentável” do “Governo da Floresta” (SILVA, 2005 apud NUNES,
2008, p. 73)

Em outro trecho Nunes (2008) afirma a ingerência do governo nas decisões e


formação dos cooperados e associados:

(...) Fortemente influenciadas pelo movimento político até os dias atuais, as


cooperativas foram, aos poucos, tornando-se estratégicas para o então cenário
político instalado. Ainda cabe mencionar que a gestão destas organizações também
foi decididamente influenciada, visando ao atendimento de interesses, muitas vezes
políticos ou da própria administração (...) forças do Estado interferirão nos processos
de decisão das cooperativas e centrais já consolidadas, ocorrendo também no
trabalho de continuidade e formação para o cooperativismo e associativismo entre os
trabalhadores rurais, fato que promove uma desaceleração no movimento em defesa
da terra. (NUNES, 2008, p.73)

Seguindo essa mesma tendência, outra cooperativa importante para


entendermos as cadeias produtivas foi gestada em 2005, a Cooperativa dos Produtores
Florestais Comunitários (COOPERFLORESTA), voltada para exploração florestal com
o manejo florestal comunitário (STONE-JOVICICH et al., 2007). Atualmente, a
COOPERFLORESTA possui 201 famílias cooperadas de 10 comunidades organizadas
em 6 associações (CEPAL; IPEA; GIZ,2014). Ela nasceu do Grupo dos Produtores
Florestais Comunitários – GPFC, uma rede de associações de produtores florestais que
existia desde 2001. Essa grupo teve acompanhamento do consórcio Amazoniar68 que
ajudou inclusive na certificação com selo FSC de membros do grupo. O que podemos
ver é que além da orientação dada pelo governo, essa cooperativa foi encubada sob
influência das ONGs ambientais, como WWF e UICN, considerados parceiros atuais da
cooperativa. Além disso a cooperativa tem parcerias com, a ITTO e a Empresa Triunfo
Laminados.
Mas a frente veremos melhor os impactos do manejo florestal comunitário, mas
por enquanto queremos destacar que dentro desses arranjos de cadeias produtivas, o
considerado “comunitário” através dessas cooperativas e grandes centrais de

68 No começo da década de 2000, a WWF foi um ator chave no consórcio Amazoniar, do qual
também faziam parte o Centro de Trabalhadores da Amazônia (CTA), Associação de Defesa
Etno Ambiental Kanindé, Conselho Brasileiro de Manejo Florestal (FSC-Brasil) e SOS Amazônia
e que era financiado pela Agência de Cooperação para o Desenvolvimento Internacional do
Governo dos Estados Unidos (USAID). Um dos principais objetivos desse consórcio era estimular
o fortalecimento da cadeia produtiva da madeira através do “lobby” a favor do manejo madeireiro
“sustentável” junto as comunidades e em espaços de formulação de políticas públicas. (FSC;
WWF; SOS AMAZÔNIA; CTA; KANINDÉ, 2007)

218
cooperativas não segue um modelo democrático de cooperativismo pautado em um
debate político de empoderamento e autonomia, mas sim uma lógica de empresa de
terceirização de serviços. Segundo informações coletadas pela Plataforma DHESCA:

(...) De acordo com moradores do PAE Porto Dias, a Cooperfloresta foi criada de forma
muito “atropelada”, sem muita discussão, “dentro de um mês”, sendo hoje “mais
empresa que cooperativa”. Representante do STTRX afirmou ainda que a
Cooperfloresta “não funciona dentro dos conceitos de cooperativismo” (...)
(FAUSTINO; FURTADO, 2015, informação verbal, p. 47)

Dentro desses arranjos “inovadores” promovidos pelo governo do Acre, as ações


voltadas, a princípio, para essa estruturação e direcionamento das cooperativas e
associações, que geram um início de apoio por parte do governo em logística e
comercialização da produção sem beneficiamento, seriam parte de um tipo de interação
de baixa complexidade (MACHADO, 2007, 2009), como no caso da relação do governo
do Acre com a COOPERACRE no apoio da comercialização de borracha e castanha in
natura (MACHADO, 2007).
Outro tipo de interação, considerado de média complexidade, envolve um aporte
de capital bem maior em uma Parceria Público Comunitária entre o estado e essas
cooperativas e associações, para um início de industrialização para o beneficiamento
da produção. Também a COOPERACRE foi apoiada por essa modalidade com a
recuperação e doação, por parte do governo, de uma usina de beneficiamento de
castanha de Brasiléia. Esse aporte maior de capital necessário, já envolvendo
agroindústrias, depende de financiamentos, como por exemplo, do Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), no caso da COOPERACRE. Já
colocamos que essa cooperativa acessou o Fundo Amazônia do BNDES em cerca de
5 milhões de reais, mas articulado a isso, parte dos empréstimos feitos pelo governo do
Acre através do PIDS, também do BNDES, serviram para esse propósito de
recuperação e construção de agroindústrias para a COOPERACRE. Em trecho da
entrevista com Rodrigo Neves, ele comenta sobre esse processo:

(...) O estado criou, e comprou e construiu diversas industrias de beneficiamento de


castanha e fizemos a doação para COOPERACRE. A COOPERACRE é gigantesca,
tem uma quantidade de pessoas associados ali imensa. Hoje o maior tomador de
empréstimo privado no estado do Acre é a COOPERACRE, e adimplente. Castanha
já o segundo produto mais importante do estado do Acre. A gente vendia, 5, 6 anos
atrás, uma lata, que eles chamam, uma lata de castanha por 5 reais. Hoje custa 35
reais, porque sai beneficiado, embalado a vácuo, vende pra Nestlé, pra outros
compradores grandes (...)

219
A interação considerada de maior complexidade se dá através da Parceria
Público Privada Comunitária (PPPC). Nesse modelo, além de grandes aportes de
recursos por parte do estado e da participação das comunidades, que
fundamentalmente funcionam como fornecedoras de matéria prima e força de trabalho,
entra o capital privado na forma de investimentos, principalmente nos complexos
agroindustriais associados e em ações das empresas criadas para gerir a cadeia. Nesse
arranjo, que é o mais estimulado pelo governo do Acre para impulsionar as cadeias
produtivas e integrar os povos da floresta, geralmente é criada uma empresa de
sociedade anônima, em que as ações são em parte do governo, parte do capital privado
e uma pequena parcela das comunidades. Para que tal arranjo funcione as pequenas
associações e cooperativas precisam se organizar em uma cooperativa central,
processo esse catalisado pelo governo. Além disso, o governo, através da Agência de
Negócios do Acre (ANAC69), empresa de capital misto (público e privado), também pode
participar do arranjo, inclusive, comprando ações das empresas criadas para cada
cadeia produtiva. Entrevistamos em 15 de agosto de 2014 Inácio Moreira Neto, diretor
da ANAC que nos ajudou a esclarecer em um dos trechos da entrevista a estratégia
pensada para a ANAC:

(...) Só que a gente acabou identificando que precisava ter um choque de


industrialização, que se o estado fosse fazer, acabava a burocracia do estado, você
acaba tendo mais uma estatal, como na década de 90 foi criado muita autarquia
também né (...) Então a ANAC no governo do Tião Viana fez, que é o atual governo,
veio o desafio que era o seguinte, como é que a gente fazia uma experiência que já
tem no Brasil, que é a parceria público privada mas a gente ir além disso, o público
privado e o comunitário, pra inserir o comunitário. (informação verbal70)

Esse modelo é utilizado para várias cadeias produtivas consideradas prioritárias


para o governo, como a da madeira e criação de pequenos animais (aves e porcos). A
ANAC tem ações em 9 empreendimentos relacionado a essas cadeias: Dom Porquito
(cadeia de suínos), Cordeiros da Amazônia (ovinos), Peixes da Amazônia, Juruá Peixes
(cadeia da piscicultura), Complexo Industrial de Xapuri, de Tarauacá e Soar Floresta
Juruá (cadeia da madeira), além da CDSA e de um Fundo de Investimentos em
Participações (FIP) chamado Empresas Sustentáveis na Amazônia. A formação dessas
empresas funciona da seguinte forma: o governo por meio de diversos investimentos,
principalmente empréstimos, garante a estrutura e logística, principalmente na parte

69
Já citamos no capítulo 2 que a ANAC detêm parte do capital de outra empresa “híbrida”, a CDSA.
70
Entrevista concedida por Inácio Moreia Neto [ago. 2014] Entrevistador: Diogo Loibel
Sandonato. Rio Branco, 2014.

220
industrial da cadeia e depois passa o patrimônio, primeiro para a ANAC, que já em parte
privada. Inácio esclarece essa etapa:

(...) por que, como é que funciona, o governo constrói o empreendimento, depois ele
valoriza, através de, faz um laudo e diz olha, essa obra custa 18 milhões, ele
integraliza na ANAC e quando a ANAC vai montar o negócio, ela pode entrar tanto
com dinheiro como com bens. Por exemplo, no casa dessas a gente entrou com os
bens, a gente alugou os bens e ai a gente pega a iniciativa privada que vai pra dentro
pra tocar (...)

Em um momento posterior, quando a cadeia já está consolidada, a ANAC passa


sua parte para o capital privado, como esclarece em outro trecho da entrevista Inácio:

(...) por que, o que a ANAC quer fazer, deu certo a cadeia produtiva, nós queremos
vender as nossas ações, né, pra outros investidores, sai do negócio e deixa o negócio
numa parceira o privado e o comunitário. É estratégico essa união do privado e do
comunitário, por que o comunitário ele acaba, tendo uma fidelidade dos insumos com
essa, com a indústria, com a empresa.

Isso já aconteceu por exemplo na cadeia de aves. Com relação a essa cadeia,
temos o complexo agroindustrial da Acre Aves em Brasiléia. Com investimentos
públicos, principalmente por meio do BNDES, o complexo é administrado por capital
privado com 94% das ações e a Cooperativa de Produtores de Aves do Alto Acre
(Agroaves) com 6%. O governo também ajuda com implantação de criadouros e
assistência técnica rural (CEPAL; IPEA; GIZ, 2014). Aqui o estado vendeu suas ações
da empresa deixando a relação entre o privado e “comunitário”, como colocar Inácio em
outro trecho da entrevista:

(...) A Acraves foi o projeto inicial que deu certo e hoje não tem participação do governo
(...) foi o mesmo modelo, hoje ela só comunitário e público né? Privado que digo (...)

O que o governo pretende, por meio da ANAC é alavancar essas cadeias e atrair
capital privado ao mesmo tempo que garante a matéria-prima que muitas vezes está na
mão do “capital comunitário”. O economista Ronald Polanco, ex-deputado estadual e
atual conselheiro Tribunal Estadual de Contas comenta em trecho de entrevista
concedida em 18 de agosto de 2014 que para o arranjo:

(...) O estado volta a ter um papel importante e ai o setor privado, em regiões como a
nossa, se a gente não fizer isso, em boa parte de alguns capitais, patrimônios

221
principalmente naturais, está na mão das comunidades, então essa ideia do público
privado e comunitário aqui é negócio que deve prosperar (...) (informe verbal71)

Para tal acesso aos bens que estão nas mãos das comunidades, um dos papéis
da ANAC é organizar as cooperativas, como por exemplo na cadeia de suínos com a
Dom Porquito, na região do Alto Acre. O governo apoia na parte de produção, com
construção de galpões de engorda entre outras ações e também fez grande aporte de
recursos em um frigorífico, inclusive com empréstimo do Banco da Amazônia de 26
milhões de reais (FRIGORÍFICO...2014). Inácio descreve a participação da ANAC no
processo de constituição da cadeia:

(...) Mas nós temos a do suíno. A do suíno também que é a Dom Porquito, uma
empresa também que a ANAC é sócia, ela está mais situada ali na região do alto acre
que é Xapuri, Brasiléia, Epitaciolândia e Assis Brasil. Nós estamos com, construímos
55 galpões, a empresa Dom Porquito construiu 55 galpões e funciona assim. Tem as
matrizes que são os suínos que tem uma origem de DNA, eles ficam em um berçário,
e lá tem a reprodução que é feita, com tantos dias que o suíno passou por todo o
processo de vacina, é castrado, tudo direitinho, ele é entregue a esse criador na zona
rural lá desses municípios e com (...) 3 meses ele está pronto pro abate, então o
caminhão passa recolhendo e deixando os suínos novos (...) nós identificamos as
pessoas que tinham aptidão com essa cultura do suíno e depois de identificar essas
pessoas, foi construído um galpão e agora nós estamos já em fase de reunião para
esses 55 constituírem a cooperativa (...) então a princípio, nós implantamos lá,
estamos fazendo reunião, criando estatuto e tudo pra criar a cooperativa, o mesmo
modelo que a gente fez com peixe, criando a cooperativa, a ideia é a gente doar
algumas ações nossas da ANAC (...)

A participação do comunitário no arranjo PPPC, além do fornecimento da


matéria-prima das cadeias, envolve uma participação minoritária nas empresas criadas
para gerir as cadeias. Inácio coloca que essa seria a grande diferença para os modelos,
por exemplo da Sadia no sul do Brasil:

(...) Isso a Sadia, a Perdigão utiliza muito isso lá no sul né, por exemplo com frango,
com suíno, utiliza muito. Então a diferença aqui, é que lá é a relação, é uma relação
de, a Sadia entrega o frango, tem uma margem de lucro, tem esse acompanhamento
técnico mas, esse criador, ele não tem participação na empresa. O nosso aqui, além
de a gente tem uma política que ele tem uma cadeia produtiva que ajuda no sustento
dele e que pra nós ajuda ele a não, a diminuir a pressão na floresta, pra não fazer o
desmatamento. E ele se torna dono, essa cooperativa que é organizada, o presidente

71
Entrevista concedida por Ronald Polanco [ago. 2014] Entrevistador: Diogo Loibel Sandonato.
Rio Branco, 2014.

222
da cooperativa ou um representante escolhido por ele faz parte do conselho de
administração dessas empresas que nós estamos criando.

Figura 30. Complexo Agroindustrial da Dom Porquito S.A. Fonte: http://www.kaeteinvestimentos.com.br/

Outro exemplo desse arranjo na cadeia da madeira é Complexo Industrial de


Xapuri. O governo aportou recursos para construção de fábrica de tacos e decks que é
operada por empresas locais que possuem consórcio com a COOPERFLORESTA que
fornece a madeira explorada em planos de manejo comunitário (CEPAL; IPEA; GIZ,
2014), que são licenciados e elaborados com recursos do governo. A matéria-prima
utilizada no Complexo é proveniente da Reserva Extrativista Chico Mendes, da Floresta
Pública Estadual do Antimary e Planos de Manejos Privados. O governo do estado, por
meio da ANAC possui 25% das ações do Complexo Industrial (COMPLEXO...2014).
Temos outro exemplo relacionado a COOPERACRE e a cadeia da borracha, um
arranjo de maior complexidade relacionado a Fábrica de preservativos NATEX em
Xapuri, que tem como proposta a produção de artigos de saúde com borracha nativa.
Existe um convênio como o Ministério da Saúde que contribui com recursos e recebe
parte da produção de preservativos (SCHWARTZMAN, 2015). A fábrica é gerida pela
FUNTAC e a COOPERACRE é responsável pela logística de colheita e entrega do látex
que abastece a fábrica. Relacionando esses exemplos com o SISA e o recurso do KfW
podemos observar que uma boa parte é destinado para esses arranjos, seja com
relação a cadeia da borracha com a Natex, que recebeu possivelmente cerca de 10

223
milhões de reais, seja com o estímulo ao manejo madeireiro em arranjos PPPC, parte
com a COOPERFLORESTA, parte em outros arranjos com 8 milhões de reais. Mas a
frente daremos destaque ao arranjo PPPC que certamente recebeu mais recursos e
também é o exemplo que demonstra de forma mais clara a complexidade desse arranjo,
a cadeia do peixe.
Nos arranjos PPPC temos várias pontos positivos para o capital privado. O
fornecimento de matéria-prima por meio das cooperativas e associações deixa a cargo
dessas todas as dificuldades da produção, inclusive contribuindo para processos de
precarização do trabalho. O aporte financeiro inicial necessário para estruturação de
toda a cadeia fica por conta do governo que, para tal, tem que cada vez mais se
endividar com bancos nacionais e multilaterais. Participando desse tipo de parceria
mista, o capital privado também consegue acessar benefícios de políticas públicas que
são destinadas apenas para agricultura familiar, como por exemplo os mercados
institucionais do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) (CEPAL; IPEA; GIZ, 2014).
A perspectiva do governo nesse tipo de arranjo é progressivamente destinar mais
espaço para o capital privado até que a parceira finalmente se torne Privada
Comunitária. Os investimentos públicos funcionariam apenas como um estímulo inicial
para o processo.
Em trecho de entrevista realizada em 28 de agosto de 2014 com o professor
José Fernandes do Rêgo, secretário da Secretaria de Articulação Institucional (SAI), ele
comentou a visão do governo sobre o arranjo PPPC:

(...) isso faz parte da nossa estratégia, o PPPC, público privado comunitário e o PC,
público comunitário, e o público privado. Você pode ter essa várias alternativas (...)
Nós temos o caso da piscicultura, os complexos florestais, da castanha, vamos ter da
borracha agora, então isso é uma coisa definida e é o nosso caminho, primeiro por
que, um dos motivos para pensarmos nas parceiras é ainda a pouca força e o pouco
capital que tem o setor privado no estado, então a gente tem que colocar, na verdade
numa avaliação que nós fizemos, eu fiz um comentário lá, eu falei o comentário, o
seguinte: o Acre é, digamos assim, o estado mais Keynesiano do Brasil, ai o
governador se levantou e falou: e tenho grande orgulho disso. Então na verdade é
uma coisa já definida, nós somos Keynesianos, nós sabemos que temos que
socializar o investimento. Então eu tenho que colocar um investimento lá, do público
né, pra que junto com o privado e com o comunitário a gente tenha, primeiro uma
equação certa da realização do investimento, e uma equação social certa. (...)
(informação verbal72)

72
Entrevista concedida por José Fernandes do Rêgo [ago. 2014] Entrevistador: Diogo Loibel
Sandonato. Rio Branco, 2014.

224
Aqui vemos mais uma grande vantagem para o capital privado que tem a
tendência de se apropriar por completo do controle das cadeias. Com o aumento da
complexidade do arranjo, diminui a capacidade de participação política e financeira das
parcelas comunitárias Sibá Machado, um dos defensores desse modelo, aponta riscos
e limites da participação comunitária nos arranjos de alta complexidade quando diz:

“Nesta fase a propriedade dos meios de produção fica quase sempre no modelo PPP,
na qual a tradição do capital é assumir também a propriedade dos meios de produção
no setor primário (a terra), ou no máximo realizar uma integração com a mini e a
pequena produção, dado o volume dos investimentos e a complexidade
administrativa, tecnológica e comercial deste processo produtivo. O custo financeiro
de um investimento de Alta Complexidade requer que o Estado entre com a maior
parte ou todo, inibindo o Capital Comunitário de participar do processo.” (MACHADO,
2009, p. 76).

Um momento a ser destacado nesse processo de direcionamento das cadeias


produtivas do estado para o arranjo PPPC foi o Pacto Agrário de 2007. Dialogando com
a demanda de entidades como CUT, FETRACRE, CNS e GTA, o governo firmou um
pacto “socioprodutivo” que, segundo Machado (2007), foi importante pois “as
reivindicações dos movimentos sociais, as tentativas de acordo, os atos e programas
de Governo do Estado abrem possibilidades para implantar ações concretas do PPC”
(MACHADO, 2007, p. 35). Diante da falta de apoio para agricultura familiar e
extrativismo, o governo negociou formas de atender essas demandas direcionando para
arranjos como PPPC, que mais que gerar melhorias e empoderamento nas
comunidades, gera uma integração subordinada que atende principalmente aos
interesses do capital.

4.1.5. Cadeia do Peixe

A cadeia do peixe no Acre é o melhor exemplo para entendermos o arranjo PPPC


na prática e também a articulação das cadeias produtivas “sustentáveis” com o SISA, o
recurso do REM KfW e com outros investimentos e empréstimos. A piscicultura, que
tem sido uma das prioridades do governo, inclusive nas políticas ambientais de redução
de desmatamento e é justificada por ser uma atividade que ocupa uma pequena área e
portanto reduz a pressão sobre a floresta. Devido a isso, no programa REM do KfW é
uma das principais cadeias alimentadas como vimos na destinação dos recursos. Com
ela, o governo do Acre conseguiu realizar o arranjo de PPPC mais complexo no estado

225
em funcionamento. Em trecho de entrevista, o professor Rêgo do SAI explica a
estratégia do governo:

(...) Por que a piscicultura? Por que nós estávamos insistindo muito tempo, fazendo
uma discussão meio estéril de desmatar ou não desmatar, essa briga com a oposição
né. O nossos problema é outro. Primeiro, valorizar os ativos florestais, valorizar a
floresta, o que que a gente vai transformar em valor na floresta. (...) Então veja, por
que a gente pensou na piscicultura? (...) Então eu tenho o objetivo de valorizar a
floresta, de conservar, de preservar e tudo mas eu tenho que produzir alguma coisa
que possa gerar renda, então nós podemos usar primeiro o solo, solo já descoberto,
desmatado, desflorestado de forma intensiva. Podemos manejar a água que é outro
fator de produção e podemos manejar por exemplo serviços ambientais de modo que
eu não, nós estávamos centrados, não desmatar (...) tem que ser atividades
intensivas, primeiro delas, a piscicultura que usa pouco espaço e produz muito valor
em pouco espaço (...)

Segundo documento de governo: “(...) O complexo industrial da Piscicultura veio


complementar a estratégia para assegurar os meios de vida a longo prazo, envolvendo
16 mil famílias, desde a alevinagem até a indústria.” (ACRE, 2014d, p. 20). Em trecho
de entrevista com Inácio da ANAC, ele explica como foi o início da estruturação da
cadeia:

(...) nós estamos na Amazônia, rica em água né, por que que a gente não organiza
essa cadeia produtiva? então que que nós fizemos, chamamos esses empresários,
dissemos olha, a gente tem como fazer um complexo de piscicultura onde a gente
tenha lá, o alevino, por que eles tinham dificuldade de ter acesso ao alevino, ao peixe
com uma boa origem né, e o preço era caro, então que a gente possa ter lá o alevino,
possa ter a ração e possa ter o frigorífico (...) o que nós fizemos, identificamos a área,
pegamos os engenheiros mecânicos do estado, criamos uma planta e dissemos tá
aqui, essa é a indústria que a gente tá querendo (...) essa matriz aqui, dá conta de 20
toneladas que é a capacidade que a gente quer chegar. Alguns empresários que já
mexiam com peixe entram como sócios e outros (...) o investimento inicial era de 500
mil, nós somos 18 sócios, são 16 empresários autônomos, a ANAC (...) hoje tá na
casa de 58 milhões já, Peixes da Amazônia, por que teve todo equipamento, veio da
Dinamarca, a fábrica de ração é a única da região Norte que é ração para peixe
carnívoro (...)

A ANAC criou a empresa que gere a cadeia e esse complexo agroindustrial, a


Peixes da Amazônia S.A73, que em janeiro de 2015 já tinha capital superior a 100

73Vale a pena destacar novamente que atualmente o principal diretor da empresa é Fábio Vaz
de Lima, marido de Marina Silva que até meados de 2014 era secretário adjunto da principal

226
milhões de reais (ACRE...2015). Além do complexo de Rio Branco que tem a parte de
criação de alevinos, fábrica de ração e frigorífico, também estão previstos um frigorífico
para Cruzeiro do Sul (CEPAL; IPEA; GIZ, 2014). Parte das ações dessa empresa
pertence ao governo, através da ANAC, parte vem de investimentos de alguns
empresários do Acre, inclusive da pecuária como coloca o professor Rêgo da SAI em
trecho de entrevista:

(...) empresários grandes, que tem agropecuária de corte, estão correndo para
piscicultura por que é pelo menos 4 ou 5 vezes mais rentável, do que a pastagem
extensiva entendeu? Então na verdade essa é a nossa estratégia (...)

Um outro membro do arranjo é o “capital comunitário” que Inácio explica como


foi integrado:

(...) e ai o outro principal nosso, que que nós fizemos, o governo do estado tem a
SEAPROF que já estava fazendo açudes, que era uma forma de diminuir a pressão
sobre a floresta, por que o homem do campo, tá lá, se não tem uma outra cadeia
produtiva que ele explore, ele ia derrubar pra vender madeira, então a gente, com
essa cadeia produtiva do peixe nessa fase de organização tinha uma outra secretaria
que estava fazendo açudes, fizemos 3.700 açudes. Ai já a ANAC via SEDENS
organizou nos 22 municípios cooperativas de criador de peixes, então com os 22
municípios, cada um com a sua cooperativa com os criadores de peixe, nós fizemos
uma central que é a COOPERPEXIE, que é uma central das cooperativas. A ANAC
fez um investimento em ações, por que a composição dessas empresas sociedade
anônima, capital fechado e a ANAC investiu 18 milhões nesse investimento, 18
milhões em ações, nós doamos 3 milhões e 200 para a cooperativa, colocamos a
cooperativa na empresa, com acento no conselho de administração (...)

Nesse trecho vemos claramente como o governo “encuba” as cooperativas já


com o propósito de integrar nesse arranjo. Além disso, na fala de Inácio, fica claro a
concepção de que para reduzir o desmatamento é necessário integrar as comunidades
a esse tipo de cadeia. Em trecho de entrevista com Rodrigo Neves, quando ele comenta
esse arranjo PPPC do Peixe ele explicita ainda mais isso:

(...) você vai ter aqui milhares de famílias que hoje vivem de roçado e que vão estar
integrados dentro de outra cadeia produtiva, que não desmata, que ela vai atuar só
em áreas abertas, e que a força produtiva dela vai estar toda concentrada naquilo
ali, ela nem consegue, nem que ela quisesse, ela tem como cuidar daquilo e
roçar. No final o que que vai acontecer, você vai ter uma redução de desmatamento,

secretaria de estado do Acre, a SEDENS, quando pediu exoneração para acompanhar a


campanha da esposa.

227
com a redução de desmatamento você gera novo crédito, esses novos créditos
geram novos recursos que podem ser inseridos em qualquer um desses modelos
dessa matriz que a gente falou antes (...)

O que Rodrigo diz é que integrando as comunidades na cadeia, elas ficam


inviabilizadas de realizar outra atividade. Já aqui fica explícito como isso atenta contra
a soberania alimentar das famílias. Mais ainda, esse processo gera créditos dentro de
toda aquela estrutura do SISA que podem ser investidos, como já debatemos, de forma
flexível em diversas atividades.
O “capital comunitário”, no arranjo vista fornecer o insumo para o complexo e
comprar os alevinos e ração, e passa a ficar atrelado de forma dependente e
subordinada. Em trecho de entrevista Inácio coloca:

(...) a cadeia produtiva, por exemplo, tem alevinos que foram distribuídos, vendidos
no início do ano, por que que o frigorífico inaugurando agora é estratégico, por que
quando o alevino é jogado no açude e alimentado, com 10 meses ele está com 2
quilos, ele está pronto pro abate, então, a inauguração do frigorífico agora dá a
garantia daquele criador que tem lá o alevino, ele pode agora vender esse alevino e
adquirir alevinos novos né, por que o peixe já está com 2 quilos (...)

Como o arranjo é estimulado pelo governo, o subproduto da cadeia foi


incorporado a merenda escolar das escolas estaduais como colocado por Inácio:

(...) Fora isso, nós incluímos na merenda escolar o peixe, que ai a gente, é uma política
de governo, que a ANAC cumpre um papel, a SEAPROF cumpre um outro, e a
educação também está adquirindo o miúdo do peixe que a gente chama, pra merenda
escolar, mais saudável né (...)

O que complexifica ainda mais o arranjo é a participação do FIP Empresas


Sustentáveis da Amazônia que já citamos quando falamos dos empreendimentos que a
ANAC tem participação. Em trecho de entrevista, Rodrigo Neves explicita essa
complexidade descrevendo como funciona essa participação:

(...) existe um FIP que foi o BNDES que criou, ai tu vai ver o tipo de complexidade que
o negócio vai dando e como tem efeitos interessantes. O BNDES criou um FIP e a
gente criou, a gente tem a ANAC, foi criado uma empresa chamada Peixes da
Amazônia, que não é a CDSA, que é uma empresa privada, a ANAC é sócia em ações.
Começou o estado sócio de ações e dez privados sócios também. Começou assim.
Ai o Estado pegou parte das ações que tinha dentro dessa companhia e doou para
associações de pequenos produtores. Doou, 20% da companhia. O BNDES, através
desse FIP, que é um FIP exclusivo para empreendimentos de desenvolvimento

228
sustentável, ele tinha 80 milhões de reais pra investir, mas ele só poderia investir se
ele alcançasse 100 milhões. Eles já tinham lá conseguido 15, o estado do Acre
colocou mais 5 milhões dentro desse FIP para tornar ele ativo. Esse FIP investiu mais
15 milhões dentro do negócio, se tornou sócio de mais 20%. (...) E ai os privados são
sócios lá, de 51%. Eles são sócios de 51%. Então você vê, o que a gente fez, olha o
arranjo que a gente está fazendo, que é sempre o que a gente tenta fazer. A gente
está fazendo uma parceria público-privado-comunitário, é um modelo que você não
vai encontrar em lugar nenhum. Você tem PPP, PPPC, isso não existe. O estado é
sócio de uma parte, associações de pequenos produtores são sócios de outra, e
privados são sócios de outra. O estado paralelamente criou um programa de
piscicultura e está construindo 5.000 tanques para pequenos produtores, pequenos.
(...) Junto essa companhia aqui está criando um laboratório para criação dos alevinos
e de ração, a mais moderna do Brasil. Só vai ter equivalente lá. (...)

O FIP foi criado pelo BNDES, que é o maior investidor do fundo mas também
conta, além da ANAC, com o Banco do Estado do Pará (Banpará), Grupo Jarina e a
empresa Kaeté investimentos, que foi escolhida para gerir o fundo (AMAZÔNIA...2015).
Além da cadeia do peixe, o FIP já investiu 5 milhões na cadeia de aves, através da
Acreaves e 15 milhões na cadeia de suínos, na Dom Porquito (KAETÉ, 2015). Segundo
o site da empresa Kaeté:

(...) a equipe da Kaeté Investimentos tem uma vasta experiência com questões de
sustentabilidade trabalhando em organizações da sociedade civil (ONGs) e no
desenvolvimento de negócios sustentáveis (florestas plantadas e nativas, alimentos
processados, produtos florestais madeireiros e não madeireiros) (KAETÉ, 2015)

229
Figura 31. Complexo agroindustrial de piscicultura da Peixes da Amazônia S.A.: Fonte:
http://www.kaeteinvestimentos.com.br; Secretaria de Comunicação do estado do Acre (SECOM).

Os recursos do Programa do REM KfW são destinados para construção de


tanques e açudes, assistência técnica e apoio à comercialização, que como vimos já
investiu pelo menos 22 milhões de reais, cerca de 36% do total alocado do programa.
Como colocado por Rodrigo, a cadeia recebeu investimento do BNDES através desse
FIP, mas além disso, o BNDES também foi importante na construção do complexo
através dos programas de empréstimos que já citamos que geraram a parte pública na
PPPC através das ações da ANAC no empreendimento. Essa cadeia explicita a
complexidade desses arranjos e como os programas de investimentos se articulam.
Como foi colocado, 2 secretarias de estado, no caso SEAPROF e SEDENS, estão
envolvidas na construção de tanques e açudes e na assistência técnica para a cadeia.
Além da verba do KfW, outras fontes de financiamento viabilizaram esse processo por
meio do programa de piscicultura estadual, como por exemplo o ministério da pesca. Na
tentativa de ilustrar a complexidade desse arranjo de PPPC fizemos o fluxograma da
figura abaixo:

230
Figura 32. Diagrama representando o arranjo PPPC da empresa Peixes da Amazônia S.A.
Legenda: Flechas: Azuis – acionistas; Rosas – financiadores; Pretas – bens ou integrantes;
Verdes – apoios na assistência técnica e construção dos tanques e açudes; Vermelhas – apoio
no “fortalecimento comunitário” através da “organização das cooperativas”; Amarelas – relações
de compra e venda.

O governo, através do IMAC têm acelerado o processo de licenciamento para


que a cadeia se expanda de forma mais rápida. Dos 1.292 processos administrativos
que o órgão tinha entre 2010 e 2012, 1.035 forma dispensados de licença, das quais
282 solicitações de dispensa foram solicitadas pelo próprio governo (CEPAL; IPEA; GIZ,
2014). O IMAC tem uma acompanhamento frágil dos impactos ambientais da atividade,
inclusive não tendo incluso em sua base de dados geoprocessamento essa atividade
(CEPAL; IPEA; GIZ, 2014). Além disso existem casos em que os tanques e açudes são
realizados sem os devidos estudos ambientais o que pode acarretar impactos
ambientais relevantes, como no caso da RESEX Chico Mendes, ondem nascentes
foram degradadas. Em trecho de entrevista realizada em 16 de julho de 2014 com
Dalmo Rufino da Silva, técnico do ICMBio de Xapuri, ele comenta um caso:

(...) ai pegaram uma máquina lá, fuçaram a área de um cara pra mostrar que estava
fazendo açude, entupiram (...) pegaram um trator, foram lá e pegaram uma hora ai pra

231
ir atrás de uma área pra mostrar que estão fazendo, pra filmar, pegaram o trator e
entupiram a nascente do cara lá embaixo (...) (informação verbal74)

Ainda sobre os impactos ambientais, justamente na questão de redução


desmatamento, algo que é usado como justificativa para a promoção da atividade, visto
que os açudes e tanques não precisariam da abertura de áreas grandes, temos que um
terço dos lagos para produção de piscicultura foram implementados em áreas
desmatadas com esse propósito até 2008, caindo para um quarto no período até 2011,
demonstrando indícios de relação entra a expansão da piscicultura e o desmatamento
no estado (CEPAL; IPEA; GIZ, 2014).
Com essa cadeia conseguimos ver a complexidade e inter-relações do SISA e
os principais beneficiados pelo sistema. Ela explicita a relação da Agência de Negócios
do Acre como SISA e também é um dos melhores exemplos da articulação de diversos
programas e investidores, inclusive um FIP. Podemos observar a integração
subordinada dos povos da floresta que são direcionados a fazer a piscicultura e ficam
dependentes da assistência técnica dos órgãos do estado, além de ter que comprar
ração e alevinos do complexo agroindustrial, para onde tem que vender a produção.
A piscicultura não é uma prática histórica das comunidades pelo menos as da
região da RESEX Chico Mendes. Em entrevistas realizadas, os moradores disseram
que isso é recente e que chegou como proposta do governo, primeiramente levando
cursos sobre o tema e depois com a construção dos açudes e tanques e assistência
técnica. Como vimos, as cooperativas já foram criadas a partir da demanda do arranjo
e da empresa o que demonstra a artificialidade da participação comunitária no processo.
A participação acionária da COOPERPEXIE no arranjo, além de justificar o “comunitário”
no arranjo e portanto a alocação de recursos do programa REM KfW, por exemplo,
aparenta gerar benefícios para os pequenos produtores. O arranjo de PPPC que pode
proporcionar participação de pequena parcela das ações das empresas criadas pelas
associações e cooperativas através de uma cooperativa central gera uma aparência de
empoderamento e participação ativa das comunidades nesse arranjo. Esse tipo de
estratégia poderia ser comparada ao modelo japonês de toyotismo, na qual o
trabalhador é um “colaborador” e participa das decisões da empresa. Ricardo Antunes
(2002) comparando o fordismo com o toyotismo coloca:

(...) A subsunção do ideário do trabalhador àquele veiculado pelo capital, a sujeição


do ser que trabalha ao "espírito" Toyota, à "família" Toyota, é de muito maior

74
Entrevista concedida por Dalmo Rufino da Silva [mai. 2014] Entrevistador: Diogo Loibel
Sandonato. Xapuri, 2014.

232
intensidade, é qualitativamente distinta daquela existente na era do fordismo. Esta era
movida centralmente por uma lógica mais despótica; aquela, a do toyotismo, é mais
consensual, mais envolvente, mais participativa, em verdade mais manipulatória.
(ANTUNES, 2002, pp. 20-21)

Nesse paralelo que estamos traçando, a participação com cadeira no conselho


administrativo dessas empresas de sociedade anônima, por representante da central de
cooperativas de uma determinada cadeia produtiva, gera uma aparência de que os
cooperados estão participando ativamente do processo. Aparência por que as decisões
de fato não são dos cooperados, ainda mais em uma cooperativa “encubada” de forma
artificial. Ainda comparando com o toyotismo, o trabalhador, segundo Antunes:

(...) na lógica da integração toyotista, deve pensar e agir para o capital, para a
produtividade, sob a aparência da eliminação efetiva do fosso existente entre
elaboração e execução no processo de trabalho. Aparência porque a concepção
efetiva dos produtos, a decisão do que e de como produzir não pertence aos
trabalhadores. (...) (ANTUNES, 2002, p 21)

Também com relação a participação nos lucros, visto que a central de


cooperativas tem ações na empresa, o modelo japonês pode servir de referência. Em
texto que analisa a participação do trabalhador nesse modelo japonês, Novaes e
Dagnino (2010) analisa que a participação nos lucros leva o trabalhador a intensificar
sua exploração, na esperança de obter mais lucro, mas sem um aumento
correspondente na remuneração real e coloca citando Tragtenberg:

(...) Para Tragtenberg (2005), as propostas ensejadas pelo capital a partir dos anos
1960, que vão desde políticas de estímulo à participação do trabalhador nas decisões
de assuntos marginais até à participação nos lucros e resultados, são, na verdade,
uma “pseudo-participação”, pois quem, de fato, participa e controla a produção nesta
nova fase de acumulação é o capital financeiro. (NOVAES; DAGNINO, 2010, p. 245)

No nosso caso, não estamos abordando trabalhadores em uma empresa, mas


sim a relação de uma cooperativa central com essa empresa. Mas podemos analisar
que essa central de cooperativas cumpre um papal de empresa terceirizada no
fornecimento de matéria prima e dentro desse processo, tem uma relação similar ao
modelo japonês, no que diz respeito a aparência de participação e benefícios dos
trabalhadores na empresa.

4.1.6. Madeira

233
Nesse tópico aprofundaremos a análise da importância da cadeia da madeira
para as políticas ambientais promovidas no Acre e como ela explicita articulações de
diversos recursos e sujeitos e também conflitos territoriais gerados pelo espólio e
imobilização de bens nos territórios dos povos das florestas. A maior parte das reflexões
aqui presentes, formuladas durante a pesquisa de mestrado, foram feitas em parceria
com o pesquisador Luiz Henrique Gomes de Moura e foram apresentadas no SINGA de
2015 (MOURA et. al, 2015).
Apesar da retórica de sustentabilidade e as políticas ambientais destinadas a
redução de desmatamento, uma das cadeias mais estimuladas no Acre é a cadeia da
madeira. Observando mais de perto o setor que opera com base no paradigma da
“floresta em pé” temos um dos grandes focos das políticas de governo, já explicitado
nas primeiras ações da Frente Popular. Para tal foi criado um Programa de Gestão de
Florestas para impulsionar planos de manejo madeireiro em áreas de florestas públicas
e privadas. Foram realizadas ações, como implementação de um escritório de manejo,
para facilitar e agilizar o processo de licenciamento. Segundo o Plano de Outorga
Florestal Estadual de 2013: “o Estado possui reserva (ou ativos florestais) florestal capaz
de sustentar o crescimento da atividade madeireira” (ACRE, 2013f, p. 16). A partir do
ZEE foram mapeados 6 milhões de hectares de florestas potencialmente aptas para
exploração florestal (ACRE, 2013f). A madeira é uma das principais cadeia que tiveram
recursos alocados pelo programa REM KfW além de ser a principal motivação do PDSA
do BID. Fortes estímulos para a exploração de madeira nas unidades de conservação
como florestas estaduais (das quais muitas foram criadas já com esse objetivo) e mais
recentemente reservas extrativistas tem relação com as políticas articuladas pelo SISA.
Seja o manejo empresarial ou “manejo comunitário” com arranjos de PPPC como
descrevemos, a madeira é um dos principais bens explorados no Acre, sendo a principal
atividade econômica de base florestal representando 80% da receita florestal
(ALENCAR et. al., 2012). Podemos observar um aumento da exploração com destaque
para madeira em tora a partir de 2010, já com o SISA regulamentado em lei, nos dados
sobre extração de madeira abaixo:

234
Exploração de Produtos Florestais Madeireiros
1200000 90000
80000
1000000
70000
Quantidade (m³)

Valor (R$ 1000)


800000 60000
50000
600000
40000
400000 30000
20000
200000
10000
0 0
2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013

Lenha (m³) Madeira em tora (m³) Lenha (R$ 1.000) Madeira em tora (R$ 1.000)

Figura 33. Exploração de produtos florestais madeireiros. Fonte: PEVS, IBGE, 2014.

Os dados sobre movimentação da madeira a partir dos DOFs75 provenientes do


IBAMA em seu relatório de transporte e do consumo de produtos florestais (FREIRE,
2014) também demonstram uma tendência de aumento de madeira saindo, em toras ou
apenas serrada, do Acre indo para outros estados, apesar de um queda em 2012:

Movimentação de Madeira no Acre


30.000 450.000
400.000 Madeira movimentada (m³)
25.000
Documentos emitidos

350.000
20.000 300.000
250.000
15.000
200.000
10.000 150.000
100.000
5.000
50.000
0 0
2007 2008 2009 2010 2011 2012

Documentos eletrônicos emitidos


DOFs para Isento de CTF emitidos
Origem da movimentação de madeira em toras (m³)
Origem da movimentação de madeira serrada (m³)

Figura 34. Movimentação de madeira no Acre. Fonte: FREIRE, 2014.

75 O Documento de Origem Florestal – DOF representa a licença de uso obrigatório para o


transporte, recepção, beneficiamento e armazenagem de produtos florestais de origem nativa,
nos termos da Lei 9.605, de 12 de fevereiro de 1998 (Lei de Crimes Ambientais) e Lei 12.651,
de 25 de maio de 2012 (Lei de Proteção da Vegetação Nativa).

235
Parte dessa queda, que podemos observar em 2012 nos dados acima, pode ter
relação com a menor adesão ao sistema de DOFs e guias estaduais comuns ao longo
dos anos presentes do relatório:

Usuários emissores de DOF e Guias


Estaduais comuns no Acre
300
Quantidade de usuários

250
200
150
100
50
0
2007 2008 2009 2010 2011 2012

Figura 35. Usuários emissores de DOF e Guias Estaduais comuns no Acre. Fonte: FREIRE,
2014.

Se olharmos para os recursos do programa REM KfW, temos estímulos para


exploração da Floresta Estadual do Antimary, no PAF Havaí, e no complexo de florestas
do Gregório, cerca de 8 milhões de reais ao todo, 12,6% do total de recursos do
programa. Essas áreas tem a exploração de madeira promovida pelo programa de
gestão de florestas do estado. No Plano de Outorga Florestal de 2013, são consideradas
passíveis de concessão para manejo florestal as florestas estaduais do Mogno, que
compõe o complexo do Gregório e fica no município de Tarauacá, como também a
Floresta Estadual do Antimary localizada no município de Bujari. Nessas áreas os
projetos de manejo são geridos por secretaria de estado e são considerados “públicos”
(ACRE, 2013f), mas seguem os moldes do manejo empresarial, com a diferença de
serem geridos por uma secretaria do governo. Além das áreas de florestas destinadas
para o manejo madeireiro empresarial, cerca de 89 mil hectares das duas florestais, 100
mil hectares são destinados a planos de manejo comunitário com 510 famílias (ACRE,
2013f).
Na região do complexo do Gregório, para acompanhar principalmente o manejo
madeireiro, mas também a implantação de outras políticas estaduais, o governo
construiu duas Unidades de Gestão Ambientai Integrada (UGAI) nas proximidades das
florestas do Rio da Liberdade e do Rio Gregório (TECMAN, 2012). Para a realização do
manejo florestal, as famílias que viviam dentro das florestas do complexo foram

236
realocadas para as margens da BR-364, cada uma recebendo um lote de 100 hectares
(ACRE, 2013f) como podemos ver na figura abaixo com o exemplo da Floresta do
Mogno:

Figura 36. Identificação dos lotes dos moradores da Floresta Estadual do Mogno. Fonte: Plano
de manejo mogno. 2012.

De acordo com informações do plano de manejo dessa floresta estadual, as


famílias são “ex-seringueiros e colonos, descendentes de nordestinos e remanescentes
dos seringais de extração do látex” (TECMAN, 2012, p. 37). Aqui já temos um dos
fatores que potencialmente geram conflitos. Lotes de 100 hectares não são garantia de
reprodução das condições de vida para essas famílias, visto que diferentemente do sul
do Brasil, onde 100 hectares pode ser considerado um tamanho interessante de
propriedade, para a territorialidade seringueira é problemático como analisado por
Porto-Gonçalves, que publicou livro sobre a territorialidade seringueira (PORTO-
GONÇALVES, 2003b). Deslocar as famílias para a margem da rodovia nesse tipo de
lote inviabiliza a reprodução da territorialidade seringueira. Como coloca Paula e Silva
(2008b):

237
Isso representava a inviabilização de sua tradicional produção extrativista. Muitos
seringueiros que viveram essas situações têm explicado que para continuar na terra,
sob tais condições, tiveram que “se tornar um colono sulista em suas próprias terras”
(PAULA; SILVA, 2008b, p. 92).

Devido a luta e pressão do movimento seringueiro, foram criadas modalidades


de assentamento rural no Acre como por exemplo os Projetos de Assentamento
Agroextrativistas que justamente visam rever essa política de colonização do que foi
apelidado de “quadrado burro” para região Norte (PAULA; SILVA, 2008b). Mais à frente
debateremos a questão do manejo “comunitário” que demonstra melhor a profundidade
do conflito.
As três iniciativas de manejo de madeira apoiadas por recursos captados pelo
SISA através do programa REM do KfW envolvem arranjos de PPPC. No caso da
Floresta do Mogno que possui uma área de 141,4 mil hectares e com 197 famílias
vivendo agora nesses lotes de 100 hectares, o estado entra participando do complexo
industrial de Tarauacá, que já citamos que tem participação da ANAC. Existe uma
cooperativa no arranjo que envolve o manejo comunitário da madeira e o capital privado
na concessão empresarial de manejo na Floresta e também com ações do complexo. O
complexo tem capacidade para processar 78.600 m3 em tora por ano. No PAF Havaí,
assentamento no município de Rodrigues Alves que tem 29,7 mil hectares e 141 famílias
(INCRA, 2015), temos o mesmo arranjo a partir da empresa Soar Floresta Juruá, em
Cruzeiro do Sul, também com ações da ANAC, participação do capital privado e
“comunitário” e com capacidade para processar os mesmos 78.600 m3 em tora por ano.
Essa empresa também tem previsão de ser abastecida pelo complexo de florestas do
Gregório (ACRE, 2013f). Já a Floresta Estadual do Antimary, com 45,7 mil hectares e
53 famílias, abastece o complexo de Xapuri que já descrevemos o arranjo PPPC acima.
Com a articulação desses diversos investimentos que demonstram a complexidade das
relações do SISA com as cadeias produtivas podemos observar que a cadeia da
madeira é apoiada nos inventários florestais, subsídios na comercialização, assistência
técnica e monitoramento das áreas de manejo, industrialização entre outras ações como
podemos ver na tabela abaixo:

238
Financiador
Arranjo PPPC REM (KfW) PIDS (BNDES) PDSA (BID)
Complexo de Apoio por meio de fomento Financiamento Ramais; Certificação Florestal; planos
Xapuri da produção das áreas dos complexos de manejo florestal, planos
manejadas pela industriais operacionais; Treinamento e
COOPERERFLORESTA capacitação para produtores,
Complexo de Planos de manejo florestal e empresas, e associações de
Tarauacá assistência técnica produtores em diversos elos da
Soar Floresta Juruá Apoio por meio de fomento cadeia do manejo florestal; Estudos
da produção no PAF Havaí de viabilidade técnica para manejo
florestal em áreas isoladas; reforma
de UGAIs;
Tabela 19. Arranjos PPPC de madeira e financiadores em diversos pontos da cadeia produtiva.

Um das justificativas dadas para regulamentação da exploração de madeira,


mesmo em unidades de conservação e assentamentos rurais é o combate ao
desmatamento ilegal. Já em 1999, ano em que a Frente Popular assume a gestão do
Estado, o governo federal começou a transferir responsabilidades sobre a gestão de
florestas e foi feito um pacto entre o IMAC, IBAMA e o Sindicado da Indústria Madeireira
do Estado do Acre para legalizar o setor e elaborar planos de manejo tanto empresariais
como comunitários (ANDERSON et. al., 2013; CEPAL; IPEA; GIZ, 2014). A criação da
Lei de Floresta Públicas em 2001 e a criação de uma secretaria específica, a Secretaria
Estadual de Florestas (SEF) no mesmo ano, foram importantes momentos para que o
setor madeireiro fosse impulsionado na perspectiva de transformar as florestas em
“ativos ambientais” (HUMBERTO; XERFAN NETO, 2012). Em 2004, já com o PDSA
sendo implementado, se inicia uma estruturação que envolveu a disponibilização de
pessoal e instalações e normatizações e regulamentações para impulsionar a
exploração de madeira no Estado (CEPAL; IPEA; GIZ, 2014). Entre 1995 e 2007 forma
autorizados 291,4 mil hectares de planos de manejo pelo IMAC (ACRE, 2010c). O
estado contava em 2013 com cerca de 970 mil hectares em planos de manejo, somando
todos os tipos, protocolados pelo IMAC, dos quais aproximadamente 284 mil hectares
já estavam licenciados como podemos observar nas figura abaixo:

239
Total de áreas de planos de manejo protocoladas e
licenciadas no Acre
1.200.000
Área (hectares) 1.000.000
800.000
600.000
400.000
200.000
0
Área total (ha) Área licenciada (ha)
Público 533.403,68 37.094,13
Comunitário 37.970,17 22.573,51
Empresarial 395.321,98 224.166,63

Empresarial Comunitário Público

Figura 37. Total de áreas de planos de manejo protocoladas e licenciadas no Acre.


Fonte: ACRE, 2013f.

Nos anos de 2010, 2011 e 2012, o IMAC autorizou a exploração de 755.925,


859.392 e 750.521 metros cúbicos de madeira respectivamente (ACRE, 2013f;
EMBRAPA, FAEAC, 2013). Os projetos de manejo florestal madeireiro predominam em
áreas com alto índice de desmatamento, leste e sudeste do Estado (ACRE, 2010c). Mas
mesmo assim não é possível afirmar que a intensificação de planos de manejo reduziu
o desmatamento ilegal no Estado pois os processos e autos de infração referentes à
exploração, transporte e armazenamento de madeira estão em segundo lugar, após
desmatamento, nas estatísticas da Divisão de Controle Ambiental do IMAC (CEPAL;
IPEA; GIZ, 2014). Outro problema é o monitoramento da execução dos planos de
manejo já que o IMAC alega problemas de efetivo de pessoal e dificuldades de
deslocamento, além da falta de acompanhamento pelos responsáveis técnicos, o que
gera danos ambientais e irregularidades nos planos (CEPAL; IPEA; GIZ, 2014).
Outra justificativa dada para o manejo de madeira no Acre é que o objetivo é o
beneficiamento da madeira no estado, agregando valor e melhorando o preço para
quem tem suas áreas exploradas como seringueiros e agricultores familiares. O
programa estadual direciona esforços para apoiar complexos industriais e envolve a
construção de polos moveleiros em diversos municípios (ACRE, 2010c). Segundo o
Plano de Outorga de 2013:

(...) Hoje, o manejo florestal comunitário já supre parte substancial das demandas da
indústria florestal local (...) As comunidades que detém planos de manejo têm suas

240
áreas florestais mais valorizadas e protegidas, além de que parte de seus moradores
e lideranças são capacitados para a atividade florestal. (...) Para aumentar a eficiência
e valorizar o produto florestal acreano, várias iniciativas foram tomadas para permitir
o acesso a novas tecnologias e a matéria-prima legal para o setor industrial. Neste
sentido, vários Polos Moveleiros foram e estão sendo implantados nos principais
municípios do Estado. Os polos são estruturas de referência para o setor moveleiro,
oferecendo serviços especializados, como a manutenção de equipamentos,
capacitação e design (ACRE, 2013f, pp. 47-48)

Mas observando os dados de exportação do estado, percebemos que a maior


parte da madeira é exportada praticamente sem nenhum beneficiamento ou na forma
de compensados que são confeccionados com materiais residuais ou madeiras de
menor valor:

Exportações de Exportaões de madeira


madeira de 1997 a de 1997 a 2014 no Acre
2014 no Acre (em 734.962; (em kg líquido)
760.866;
1%
US$) 1%

Madeira bruta,
Madeira bruta, serrada ou afim
serrada ou afim
Compensados e
66.163.35
52.254.6 54.615.4 Compensados e 75.647.50 Laminados
Laminados 1; 46%
93; 48% 18; 51% 0; 53% Madeira
Madeira beneficiada
beneficiada

Figura 38. Exportações de madeira de 1997 a 2014 no Acre, em valor (US$) e peso (kg líquido). Fonte:
Aliceweb, MDIC, 2015.

Além disso, segundo os dados da Pesquisa Industrial Anual do IBGE, não


houveram aumentos na produção e unidades das fábricas de beneficiamento de
madeira no estado, apesar do aumento da extração da madeira:

241
Valor bruto da produção industrial (R$
Fábricas de produtos de madeira e móveis
50 70.000

Número de unidades locais


60.000
40
50.000
30 40.000

1000)
20 30.000
20.000
10
10.000
0 0
2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013

Fábrica de produtos de madeira (unidades)


Fábrica de móveis (unidades)
Fábrica de produtos de madeira (R$ 1000)
Fábrica de móveis (R$ 1000)

Figura 39. Fábricas de produtos de madeira e móveis – unidades e produção. Fonte: Pesquisa
Industrial Anual, IBGE, 2015.

Com esses dados podemos concluir que a maior parte da madeira extraída no
estado não é beneficiada. É importante destacar o papel de uma das principais
madeireiras que atuam no Acre, a Laminados Triunfo Amazônia, oriunda do Mato
Grosso do Sul. Esta empresa foi atraída pelos benefícios concedidos pelo governo
estadual e se instalou no Parque Industrial de Rio Branco em 2003. Cerca de 60% da
produção da empresa é exportada, principalmente para a Europa, correspondendo a
70% do PIB de exportação do Acre. (CASTRO; FERNANDES; CARVALHO, 2012).
Outros 30% são destinados aos estados do sul e sudeste do país, ficando apenas 10%
no comercio estadual. Segundo os autores, para garantir matéria-prima, a empresa
adquiriu um total de 7.497 ha no município de Sena Madureira, de onde extrai 40% da
madeira consumida. Outros 30% advêm dos contratos com a COOPERFLORESTA,
25% vem áreas de privadas de fazendeiros e 5% da madeireira Ouro Verde, de Xapuri.
Segundo Inácio da ANAC:

(...) A COOPERFLORESTA explora os manejos nas reservas e fornece para essa,


hoje acho que o maior comprador dela acho que é a Triunfo (...)

Entre suas metas, o programa de florestas direciona parte dos esforços para
integrar os povos que vivem nas áreas destinadas a exploração florestal através do
Manejo Florestal Comunitário. Ações como facilitar o licenciamento, melhorar
infraestrutura para produção e escoamento e acompanhar os planos de operação

242
anuais (POA) fizeram com que, em 2010, existissem 366 famílias e 41.884 hectares de
planos de manejo em 21 comunidades (ACRE, 2010c).
Segundo dados mais recentes, em 2010 existiam 180 planos de manejo
comunitário no Estado e em 2014 esse número passou para 960 planos e cerca de
180.000 hectares (SCHWARTZMAN, 2015). Abaixo colocamos um mapa elaborado
dentro do contexto do PDSA II do BID, mas que ajuda a ter uma ideia das áreas
destinadas a projetos de manejo comunitário no estado do Acre:

Figura 40. Áreas destinadas a projetos de manejo florestal comunitário no Acre. Fonte:
BAZZANELLA, 2012.

Das áreas de manejo comunitário, pelo menos 22.000 hectares são certificados
com o selo FSC (ACRE, 2013f). Existe um estímulo por parte do governo, inclusive com
subsídios, para que os projetos de manejo comunitários sejam certificados por selos
internacionais como o FSC. É o caso da certificação do primeiro projeto de manejo
comunitário de madeira na Amazônia realizado no Projeto Agroextrativista Chico
Mendes (ANDERSON et. al., 2013).
A certificação FSC serve como uma forma de legitimação, conferindo
supostamente “sustentabilidade ambiental e social” a esse tipo de exploração de

243
madeira e é realizada principalmente pelo Instituto de Manejo e Certificação Florestal e
Agrícola (IMAFLORA) nos projetos do Acre. Segundo o Instituto: “a certificação florestal
visa conservar os recursos naturais, proporcionar condições justas de trabalho e
estimular boas relações com a comunidade” (IMAFLORA, s/d apud FAUSTINO;
FURTADO, 2015, p. 30). Porém, por exemplo, moradores do PAE Chico Mendes
criticam o IMAFLORA:
O Imaflora vem aqui. Vocês conhecem, né? Eles estiveram na minha casa. Eles [o
pessoal do Imaflora] vêm entrevistar a gente. Eles são as pessoas que vêm aqui para
corrigir, só que eles não vão para os cantos que é necessário ir. Só vão para os cantos
melhor que tem. Eles perguntaram coisa demais. Por que a senhora vai sair? Não vou
continuar porque não quero derrubar a minha mata. Amanhã, como vou fazer? O
pessoal do Imaflora é tipo o IMAC. O que eles ver aqui eles ficam calados e, aí, eles
vão pra São Paulo. Aí, vem de lá pra cá. Quando chegam lá mandam umas cartas
(Informação verbal, FAUSTINO; FURTADO, 2015, p. 50)

Na tabela abaixo segue a lista de entidades certificadas pelo selo FSC no Acre
em 2012:

Entidade Município Ano da Área


certificação certificada (ha)
Associação de Moradores e
Agroextrativistas do Remanso de
Capixaba, Acre - AMARCA (1) Capixaba (AC) 2004 3.529,00
Associação dos Moradores e
Produtores do Projeto Agroextrativista
Chico Mendes – AMPPAECM (1) Xapuri (AC) 2002 4.390,00
Associação dos Produtores do Projeto
de Assentamento Agroextrativista do
Seringal Equador – ASSPAE-SE (1) Xapuri (AC) 2005 4.300
Associação dos Seringueiros de Porto
Dias (1) Acrelândia (AC) 2002 7468,31
Floresta Estadual do Antimary - Funtac Bujari (AC) 2005 47.061,00
Laminados Triunfo Ltda. Sena Madureira (AC) 2005 7.872,99
Ouro Verde Importação e Exportação
Ltda. Bujari (AC) 2006 15.285,00
Tabela 20. Entidades certificados com selo FSC no Acre. Fonte: SANTOS, PEREIRA,
VERÍSSMO, 2013.
(1) Projetos de manejo florestal comunitário

Como já debatemos no capítulo 2, a certificação FSC, apesar do que é colocado


pelo IMAFLORA, representa mais uma forma de legitimar o processo de mercantilização
das florestas em escala global. O selo FSC, como coloca o CM AMAZÔNIA (2012):

244
(...) legitima os monocultivos de eucalipto e o manejo madeireiro na Amazônia,
jogando para os consumidores a responsabilidade de selecionar os produtos
pretensamente produzidos sem causarem agressão à natureza. Além de ampliar
desproporcionalmente o impacto das escolhas individuais, o mito da certificação
ambiental considera o certificador (geralmente uma ONG) como órgão imparcial, não
comprometido com os interesses da indústria. Na prática, é fácil conferir a
inconsistência desse pressuposto. (CM AMAZÕNIA, 2012, p. 11)
Em publicação que analisa a certificação FSC, Freis e Laschefski (2003)
colocam:

(...) Em geral, todos os relatórios apontam negligências na certificação e falta de


transparência, resultando numa aplicação frouxa dos princípios e critérios do FSC,
estes últimos considerados os mais rigorosos do mundo. Além disso, a maioria dos
casos investigados revela falhas naquilo que é tido como o maior diferencial do FSC:
a participação de todos os interessados nas florestas, ou seja, o chamado
“Stakeholder Process”. A principal causa dos problemas é a estratégia de crescimento
rápido do FSC, resultado da pressão do mercado e da competição entre vários outros
esquemas de certificação. (FREIS; LASCHEFSKI, 2003, pp. 2-3)

A certificação dos projetos de manejo “comunitário” é mais uma elemento da


grande narrativa promovida pelo bloco hegemônico de que está realizando o
desenvolvimento “sustentável”.

4.1.6.1 Conflitos relacionados ao Manejo florestal comunitário

Os planos de manejo florestal comunitário são amplamente defendidos pelo


governo do Acre (ACRE, 2011a; ACRE, 2013f; ACRE, 2010c) e por diversas ONGs
como por exemplo a IUCN (PIRES, 2010) e a WWF (JOHNSON, 2012) como uma forma
de empoderamento e melhoria da qualidade de vida e renda de famílias que vivem nas
florestas. Mas esse tipo de proposta apresenta diversas contradições. Rigoroso estudo
empreendido por Medina e Pokorny (2011), aborda oito diferentes experiências de
manejo florestal comunitário, de pequena e grande escala. A primeira constatação
relevante é que, diferentemente do preconizado, esse tipo de manejo não propiciou um
controle das famílias participantes sobre todo o processo, tendo estes se restringindo a
algumas etapas. Embora os projetos de pequena escala apresentem baixa
rentabilidade, é neles que as famílias estão mais envolvida nas diversas fases dos
projetos, desde a delimitação das áreas até o beneficiamento da madeira.
Outra conclusão é que nenhuma das experiências gerou rentabilidade
econômica frente a outras práticas produtivas tradicionais, como roçados, criação de

245
animais e extrativismo. O “céu de brigadeiro” apontado pelos defensores do manejo, na
realidade, se desenha de outra forma:

O conceito do Manejo Florestal Comunitário partiu do princípio de que é uma atividade


financeiramente interessante para o produtor familiar e representa baixo risco. A
análise revelou, porém, que os rendimentos são modestos e os riscos são
relativamente altos. (...) Os modelos estudados têm rentabilidade financeira limitada,
exigem altos investimentos na implementação e tendem a demandar subsídios
constantes. (MEDINA; POKORNY, 2011, pp. 33-34)

Essa suspeição é compartilhada por Lima et al (2008), que, ao estudar o impacto


da certificação FSC nas comunidades, aponta que a atividade de manejo:

“(...) mostrou-se bastante custosa do ponto de vista financeiro e operacional(...). As


associações não possuíam estrutura técnica e capacidade operacional para dar
suporte às atividades de manejo(...)” (LIMA et. al. 2008, p.116).

Esses planos se constituem em mais uma forma de integração subordinada dos


povos da floresta a cadeias produtivas de interesse do capital e mais um processo que
aprofunda a perda de autonomia e soberania em seus territórios. Processo realizado
pela mediação técnica e política feito pelas ONGs ambientais como WWF. Conforme
afirma Negret (2010):

“O sistema de difusão e propaganda do próprio governo do Estado (GUIMARÃES


JUNIOR, 2007), junto com uma série de empresários madeireiros e a ação de algumas
organizações de assessoria e ONGs, tem contribuído para a elaboração e pressão no
licenciamento de alguns planos de manejo madeireiros, comunitários e empresariais.”
(2010, p. 376)

Um exemplo da perda de autonomia e soberania é o que acontece no manejo


comunitário da Floresta Estadual do Antimary. O primeiro ponto do acordo entre a ITTO
e a FUNTAC com a comunidade foi o fim da abertura das áreas de roçado, prática
fundamental para a manutenção da mínima condição das famílias segundo Aquino
(2011). Torna-se ainda mais evidente o caráter subordinador dessa medida no momento
em que se constata que essas áreas de roçado significam cerca de 1% do total dessa
Floresta Estadual (AQUINO et al., 2011).
A impossibilidade de domínio dos meios de produção por parte das famílias que
participam desse tipo de projeto inicia-se já no inventário, realizado por empresas
especializadas – passando pela extração – não mais com motosserra e carro-de-boi,
mas sim com diferentes tratores de corte e arraste – pelo beneficiamento – que, como

246
aponta Araújo (2011), fica restrito à grande indústria de caráter global – e
comercialização. As comunidades participantes na maior parte das vezes, apenas
cedem as áreas que quando inventariadas não podem ser utilizadas para outros fins.
Em trecho de informação verbal recolhido pela Relatoria da Plataforma DHESCA, fica
explícito os conflitos territoriais gerados pelo manejo na Floresta Estadual do Antimary:

Eu tinha 1.600 hectares e hoje tenho 100. Perguntei se podia seringar ao redor e me
falaram que não. Não consigo seringar porque as estradas ficam entupidas. Para ter
renda, vendo refrigerante. Não posso plantar, nem seringar. Vou morrer de fome
depois de velho? Estou há 20 anos aqui (FAUSTINO; FURTADO, 2015, informe
verbal, p. 44)

Em alguns casos, as comunidades aceitam entrar no manejo pela promessa de


que terão mais facilidade de locomoção com ramais e que novas políticas chegarão. Em
trecho de entrevista, Dalmo do ICMBio de Xapuri comenta um desses exemplos com
relação ao projeto de manejo dentro da RESEX Chico Mendes:

(...) a maioria desse manejadores lá, eles entraram na onda do manejo lá, a
exploração de madeira, mais pensando no ramal, pra tirar a madeira, vai ter o ramal
(...) e eles acharam que o ramal ia até na porta da casa deles, todos ali iam ter um
ramal dando na porta da casa, e não, e ai a máquina vai lá, o skidder vai lá dentro
pega a madeira e traz por carreador, ai tem uns lá que estão dando a cara, já não
estão aceitando, não querem vender a madeira mais, por que eles não estavam tanto,
nem interessado no valor da madeira, eles queriam mais o ramal (...)

Segundo o estudo conduzido por Medina e Pokorny (2001), quanto mais intensa
a escala de produção do projeto de manejo, mais próximo dos sistemas empresariais
se encontra. Da mesma forma, esses processos de escala mais intensa (como o caso
dos PAE Cachoeira e do PAE Porto Dias) encontram grande similitude com os
processos empresariais no que tange à terceirização das etapas mais tecnificadas. Aqui
podemos dizer que a COOPERFLORESTA age como empresa que terceiriza etapas da
produção (inventário, extração). O trabalho de Segatto (2012) aponta para o
licenciamento de 50 mil m³ por ano em nome da COOPERFLORESTA. Apesar de estar
sob o “manto” do sistema cooperativista, a relação com as famílias “manejadoras” é
bastante limitada, impositiva e, do ponto de vista financeiro, nebulosa (CARVALHO,
2009; NEGRET, 2010).
Mesmo trabalhos defensores do manejo florestal apontam a diversidade de
interesses envolvidos nessa questão. Segundo Alavalapati e Zarin (2005), a
rentabilidade econômica é prioridade para um grupo de interesse articulado ao manejo

247
florestal, que são os concessionários privados. Os autores levantam ainda dois grupos:
i) as comunidade locais e povos indígenas e ii) as ONGs. O primeiro visa garantir a
demarcação de seus territórios, seus direitos tradicionais e de usufruto. O segundo visa
ampliar a área protegida de floresta, articulando criação de unidades de conservação e
pagamento por serviços ambientais. Para isso, segundo os autores:

“(...) tentam estabelecer estratégias nacionais e internacionais para a proteção da


biodiversidade, criar planos de uso da terra e desenvolver mecanismos de mercado
para gerar renda por meio de serviços ambientais” (AVALAPATI, ZARIN, 2005, p.356).

As propostas e execuções desse tipo de manejo florestal comunitário tiveram


início na década de 90 no Acre com o PAE Porto Dias, mas até hoje, não houveram
ações verdadeiramente sólidas para garantir maior participação das comunidades nas
etapas do processo produtivo, possibilitando por exemplo, que essas famílias
beneficiassem a madeira extraída agregando valor. Em entrevista realizada em 21 de
agosto de 2014 com o professor da UFAC Écio Rodrigues, defensor e um dos
idealizadores desse tipo de manejo, quando era coordenador do CTA no final da década
de 80, perguntei justamente sobre a questão de beneficiamento da madeira e ele
colocou:

(...) 90% é prancha, é beneficiamento muito precário, quase tora (...) o cara transforma
uma tora em prancha com uma moto-serra, então não tem nem equipamento, ou seja,
é coisa muito precária, a agregação de valor via beneficiamento da madeira é um
desafio que tem que rolar (...) aqui devido a produtividade da floresta mesmo, a
quantidade mesmo que tu tem lá de madeira, ela não te permite tu vender pranchão
ou tora, ela não te permite fazer isso, por que tu vai ganhar pouquíssimo dinheiro (...)
mesmo no Porto Dias (...) o negócio da agregação, de agregar, de chegar na fruteira,
não chegou nem na mesa, não chegou nem na esquadrilha (...) (informe verbal 76)

O estudo de Araújo (2011) é contundente em apontar como o manejo florestal


comunitário não beneficia o comercio local em Xapuri, uma vez que as marcenarias da
cidade não são beneficiarias dos produtos oriundos desses projetos. Essa matéria prima
possui preço proibitivo para essas pequenas empresas familiares, e os produtos dela
resultantes também são de pouca assimilação nas camadas médias e populares da
região. Em entrevista realizada em 17 de julho de 2014 com Renato Farias, responsável
da SEDENS pelo polo moveleiro de Xapuri, ele colocou:

76
Entrevista concedida por Écio Rodrigues [ago. 2014] Entrevistador: Diogo Loibel Sandonato.
Rio Branco, 2014.

248
(...) na realidade o polo é ínfimo, se você ver a divisão de matéria prima, o polo é
ínfimo, uma vez que eles trabalharam, fazendo caixilho, mesas, então são as coisas
mais específicas, o grande foco são para os madeireiros, por que a madeireira pega,
ela faz, ela produz todo o material (...) longarinas que falam né e pranchas, essas
coisas e ai exportam, entendeu? (...) o grande mercado mesmo para essas madeiras
são os madeireiros (...) (informe verbal77)

Na teoria, esse tipo de manejo foi concebido para que as próprias comunidades
beneficiassem a madeira, mas isso não ocorre como coloca Dalmo, do ICMBio de
Xapuri:

(...) queria ou não queria, é um manejo comunitário, mas a exploração é industrial, vai
pra indústria né, se fosse comunitário para usar lá, pra serrar lá, ou pra beneficiar ali
mesmo, os cara tirassem ali, cada um tirasse a sua madeirinha, né, botasse lá uma
serrariazinha móvel, marcenaria, enfim, ia agregar valores né (...)

Segundo a relatoria da Plataforma DHESCA, os carpinteiros locais próximos a


Florestal Estadual do Antimary também se queixam desse problema de acessar a
madeira, devido ao preço, principalmente para confecção de móveis e um deles
declarou:

Uma boa tora custa R$ 1.000 e até R$ 3.000. É muito caro. Conseguimos um acordo
num determinado momento inclusive com o governo e o Ministério Público para que
os madeireiros fornecessem o m3 a R$ 400, mas as madeireiras só davam as toras
pequenas, escondiam as toras boas. Ou seja, não funcionou (...) Com tanta
exploração de madeira no Acre, temos dificuldades de conseguir madeira, e a
responsabilidade é do governo (FAUSTINO; FURTADO, 2105, Informação verbal, p.
44)

O impacto do manejo na vida das famílias é contraditório com todas as


promessas feitas para adesão aos projetos. A situação de pobreza não se alterou,
chegando Aquino et. al. (2011) a sugerirem que “a assistência técnica poderia ser
continuada, ajudando os comunitários na implantação de outras ações, desta forma
minimizando o impacto negativo da adoção da atividade florestal” (AQUINO et al.,
2011, p. 113, grifos nossos).
Segundo Segatto (2012), o valor pago às famílias é de cerca de R$ 60,00 por m³
de madeira em tora. Isso independente da qualidade da madeira, muitas vezes árvores
nobres que chegam a valer mais 3 mil dólares o metro cúbico, quando beneficiadas para

77
Entrevista concedida por Renato Farias [jul. 2014] Entrevistadores: Luiz Henrique Gomes de
Moura; Diogo Loibel Sandonato. Xapuri, 2014.

249
exportação (EXPLORAÇÃO...2015). Pelas entrevistas que realizamos na RESEX Chico
Mendes e PAE Equador, para as famílias, além do valor irrisório pago, ficam os impactos
negativos nas áreas de floresta como a diminuição da caça, aumento de sub-bosque
com cipós com espinhos que dificultam a coleta de castanha e extração de borracha
entre outros.
Isso também foi observado pela missão da plataforma DHESCA realizada no
Acre para apurar as denúncias de violações de direitos humanos nas diversas políticas
ambientas do Estado. Os impactos sistematizados pela relatoria relatados pelas famílias
são: estão i) a ausência de regularização da propriedade da terra para as comunidades;
ii) redução do território para práticas tradicionais e de subsistência e proibição de formas
de manejo dos agroecossistemas, como a utilização de fogo para abertura/renovação
dos roçados; iii) obstrução das “estradas de seringa”, caminho por onde os seringueiros
chegam às árvores para extrair o látex; iv) baixa remuneração e atraso nos pagamentos;
v) insegurança sobre o futuro da regeneração da floresta; vi) baixa participação da
comunidade na elaboração do inventário e no planejamento do manejo (FAUSTINO;
FURTADO, 2015).
Crítica também existiram nas falas em uma oficina de políticas públicas
promovidas pelo governo:

“O maquinário pesado utilizado no Manejo Florestal prejudica a floresta amazônica. O


preço pago pelas árvores é irrisório. Há dissenso sobre a viabilidade econômica e
sustentabilidade dos planos de manejo florestal.” (ACRE, 2010c, p. 68)

Mesmo o prof. Irvin Foster Brown, membro do comitê científico do SISA


considera, em trecho de entrevista que o manejo da forma como é feita no Acre:

(...) Nós não temos, no momento, sustentabilidade comprovada em extração de


madeira em floresta tropical (...) o aspecto de tirar em florestas tropicais sem o manejo
efetivo, já temos informações suficientes que isso não vai dar, no caso
sustentabilidade. Primeiro que nada é mágico em um ciclo de 30 (...) no tivemos datas
de 300 anos para essas árvores (...)

250
Figura 41. Áreas com manejo florestal “comunitário” dentro no PAE Cachoeira e da RESEX
Chico Mendes, Xapuri, Acre. Fotos: Luiz Henrique Gomes de Moura

Devido a essa proposta não trazer benefícios concretos para quem vive nas
áreas exploradas, não se combate a ilegalidade, algo colocado em outra fala dessa
oficina:

“O manejo florestal só é viável para grandes empresários, dificultando a participação


e aumentando a pressão sobre os pequenos produtores/extrativistas/exploradores,
que são obrigados a operar na ilegalidade” (ACRE, 2010c, p. 68)

Um representante de associação do PAE Porto Dias também criticaram o


manejo:

(...) chegou um caba [um homem] meio louco aqui, um engenheiro do CTA que
convidou a Associação para participar do manejo. Então, passamos três dias falando
de manejo. E nos colocaram duas alternativas, ou manejo ou acabar com a nossa

251
[suas] terra por causa das invasões dos madeireiros. O que convenceu a gente foi a
garantia de que a gente ia conseguir vender a madeira. Acreditei tanto, por tanto
tempo, mas, olhando bem, foi uma forma de tirar a tradição do seringueiro. O manejo
é coisa de engenheiro. Seringueiro tira borracha e sabe vender, tira castanha e sabe
vender, mas madeira não. (informação verbal, FAUSTINO; FURTADO, 2015, pp. 48-
49)

Sobre a questão do manejo ser “comunitário” o mesmo morador coloca:

Na verdade, o manejo aqui não é comunitário porque a gestão não está na mão da
comunidade. Nenhum dos comunitários tem condição de trabalhar na negociação com
o madeireiro porque vai ser engando. Já tomamos calote e está na justiça. Uma coisa
é um engenheiro chegar lá (no IMAC), outra coisa é eu (informação verbal,
FAUSTINO; FURTADO, 2015, pp. 48-49)

Devido aos diversos impactos e violações promovidos nos projetos de manejo


comunitário a relatoria da plataforma DHESCA recomendou que o governo do Acre
considere:

i) os impactos negativos ao meio ambiente e possíveis crimes ambientais, como o


desmatamento ilegal; ii) os impactos negativos aos modo de vida; iii) crimes sexuais
cometidos contra mulheres e meninas; iv) a exploração econômica das comunidades
por madeireiras; v) as denúncias de irregularidades e negligências envolvendo órgãos
e agentes privados implicados na elaboração e execução dos planos de manejo e
certificação. (FAUSTINO; FURTADO, 2015, p. 105)

Os projetos de manejo florestal “comunitário” são uma forma refinada e perversa


de espolio dos bens naturais, no caso a madeira, de territórios como unidades de
conservação, assentamentos rurais e terras indígenas. As grandes madeireiras, com a
mediação do estado, ONGs e pseudocooperativas conseguem extrair esses bens de
uma forma aparentemente menos conflitiva, visto que o manejo é considerado
“sustentável” e as comunidades na teoria são beneficiadas. Esse tipo de ação
representa bem o novo padrão de conflitividade no Acre em comparação com a década
de 70 e 80 onde os conflitos se davam de forma mais explícita.

4.1.7. Borracha e Castanha

Dentro do programa ISA Carbono, pensado para os extrativistas, foi criado um


subprograma chamado Territorial Extrativista para promover as políticas do estado
relacionadas as cadeias desses sujeitos. Além do incentivo a políticas que já

252
debatemos, como piscicultura e manejo florestal, estão pensada ações para apoiar a
cadeia da castanha, basicamente melhorando logística e infraestrutura e para apoiar a
cadeia da borracha com distribuição de materiais para o corte da seringa, subsídios
entre outras ações. Os recursos já definidos e destinados pelo KfW foram quase todos
para estimular a borracha, seja com logística e transporte, materiais ou como subsídios
para produção com 10,1 milhões de reais. Abaixo colocamos uma tabela com as
diversas ações pensadas para o subprograma Territorial Extrativista:

Caracterização Atividades apoiadas Local – Reserva Extrativista


Área de floresta Manejo florestal Chico Mendes e Alto Juruá
Manejo não madeireiro Alto Juruá, Riozinho da Liberdade,
Alto Tarauacá e Cazumbá-Iracema
Assistência técnica para o manejo Chico Mendes
Subsídio de produtos florestais Todas
Produção de castanha Chico Mendes
Produção de borracha Chico Mendes, Alto Tarauacá e
Riozinho da Liberdade
Logística e Infraestrutura Chico Mendes
Áreas abertas Implantação da Piscicultura Chico Mendes
Produção de roçados sustentáveis Alto Tarauacá, Alto Juruá, Riozinho
da Liberdade, Cazumbá-Iracema
Produção de cafeicultura Chico Mendes
Plantio de seringa Chico Mendes
Fomento a Para cada cadeia de valor (per capita) Todas
comercialização
Organização Associações ou conselhos Todas
Social
Atividades culturais e esporte Todas
Tabela 21. Ações do subprograma Territorial Extrativista do programa ISA Carbono.

A castanha é o principal produto do extrativismo hoje no Acre como podemos


observar nos dados do IBGE presentes na figura abaixo. O Estado aumentou sua
produção de castanha de 9,6 mil toneladas em 1999 e 3,5 milhões de reais para 13,6
mil toneladas e 22,6 milhões de reais em 2013 e é o segundo maior produtor brasileiro.
Além disso é o segundo produto em exportações perdendo apenas para a madeira
(CEPAL; IPEA; GIZ, 2014), visto que o gado que é a principal atividade econômica do
estado é destinado principalmente para o mercado nacional.

253
Principais produtos do extrativismo no Acre
25000 16000

14000
20000
12000
x(R$ 1.000)

10000

Toneladas
15000
8000
10000 6000

4000
5000
2000

0 0
1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013

Açai (fruto)
Castanha do Brasil
Borracha (látex coagulado e líquido)
Açaí (fruto) - valor da produção
Castanha do Brasil - valor da produção
Borracha (látex coagulado e líquido) - valor da produção

Figura 42. Principais produtos do extrativismo no Acre. Fonte: Produção da Extração Vegetal e
Silvicultura, IBGE, 2015.

Apesar dessa cadeia não ter tido até o momento da presente análise recursos
alocados especificamente pelo programa do REM KfW, ela com certeza é impulsionada
no estado com recursos tanto do PDSA do BID como do BNDES. O programa estadual
de apoio a essa cadeia viabilizou a implantação de usinas, compra de caminhões,
construção de galpões comunitários para armazenar a castanha colhida em pontos de
recolhimento e ainda recebe assistência técnica para melhorar as práticas dos
produtores extrativistas (CEPAL; IPEA; GIZ, 2014).
Como vimos essa cadeia é organizada numa estratégia público “comunitária”
com recursos públicos provindos principalmente do BNDES possibilitaram a
COOPERACRE hoje gerir 3 unidades de beneficiamento de castanha, com capital de
11 milhões de reais, que faz com que o Acre seja o maior processador de castanha para
exportação do Brasil (ANDERSON et. al., 2013; SCHWARTZMAN, 2015). Além do
beneficiamento da castanha, essa central de cooperativas também faz beneficiamento
de polpas de frutas, principalmente o açaí, na maior parte com frutas compradas de
outros estados (SCHWARTZMAN, 2015). É importante destacar que a COOPERACRE
é um importante agente de implementação das políticas estaduais. Além da castanha e
borracha, cadeia que ela tanto é responsável pela logística de recolhimento do látex,

254
como também por pagar os subsídios para a produção que são repassados pelo
governo do estado e federal, ela também tem maquinário utilizado para auxiliar na
implementação das florestas plantadas e abertura de ramais que apoiam inclusive as
atividades de manejo florestal. Já citamos o modelo empresarial da COOPERACRE e
isso é bem importante para entender como ele atua em relação aos seus “cooperados”.
Um dos principais motivos da organização em cooperativas para produção e
comercialização da castanha é para evitar o intermediário chamado de “marreteiro” e
assim garantir um preço melhor na venda para as famílias cooperadas. Mas desde a
falência das cooperativas mais locais com a CAEX e CAPEB e a criação da
COOPERACRE isso não é mais garantido. Em trecho da entrevista com Duda Mendes,
também “cooperado”, quando perguntamos sobre a venda da castanha e qual seria o
benefício da relação com a COOPERACRE ele coloca:

(...) as vezes vende pra marreteiro (...) para COOPERACRE, por que hoje eu não vou
dizer que ela tem muita diferença do marreteiro, a COOPERACRE funciona quase do
mesmo jeito que o marreteiro, com gente marretando aqui dentro (...) então é um
marreteiro um pouco, meio disfarçado né (...)

A cadeia da borracha está em decadência no Acre, apesar do estado ter


investido e aumentado o valor dos subsídios. O subsídio estadual para extração de
borracha foi instituído através da Lei 1.277 de 1999, conhecida como Lei Chico Mendes.
Segundo a CEPAL, IPEA e GIZ (2014), a inciativa de apoio do governo:

(...) tinha como objetivo incorporar mais de 3.000 famílias ao programa e elevar a
produção a um patamar acima de 4.000 toneladas/ano. Segundo o relatório, em 2010
o programa envolvia cerca de 1.700 famílias, apesar dos reajustes do subsídio. Desde
o decreto, o estado investiu mais de R$ 11 milhões no pagamento dos subsídios.
(CEPAL; IPEA; GIZ, 2014 p. 49)

Isso sem contar os 10,1 milhões de reais injetados pelo programa REM KfW
nos últimos anos. Ainda segundo relatório da CEPAL (2014), a produção de borracha
do Acre que representava 40% do valor da produção nacional em 2002, em 2011
representava apenas 20% e a produção de borracha nativa está em queda constante.
Como podemos observar na figura 42, apesar da melhora do valor, relativa
principalmente aos subsídios, a produção continua caindo. Segundo a CEPAL, IPEA e
GIZ (2014):

“Esse cenário levanta questionamentos acerca das políticas de apoio ao extrativismo


no Acre, já que elas não foram capazes de impedir a queda da produção de borracha,

255
apesar dos subsídios e da estrutura de compra de látex por parte da Natex.” (CEPAL;
IPEA; GIZ, 2014, p.49)

A principal estratégia utilizada para o fortalecimento da cadeia da borracha no


estado é a Natex, Fábrica de Preservativos Masculinos de Xapuri, que como já citamos,
funciona em um arranjo PPPC. Dentro dessa estratégia a fábrica deveria comprar
borracha nativa provinda de áreas como reservas extrativistas e assentamentos
justamente para fortalecer a atividade nessas áreas. Segundo a WWF (2013) ela
processou, em 2008, 103 mil litros de látex fornecido por mais de 400 seringueiros.
Atualmente a fábrica, que vendeu 86 milhões de camisinhas para o programa de
combate a AIDS do Ministério da Saúde, emprega 170 pessoas e compra látex de 700
famílias da RESEX Chico Mendes e reservas vizinhas (SCHWARTZMAN, 2015). Além
do subsídio estadual através da Lei Chico Mendes, o látex comprado pela Natex tem
um subsídio federal provindo do Ministério da Saúde, o que faz o preço da borracha
subir para quase 8 reais o quilo da borracha.
Entretanto, apesar de na teoria a fábrica ter sido construída para fortalecer o
extrativismo das áreas de floresta nativa, a Natex acaba comprando a borracha cultivada
em monocultivos mais próximos de sua planta devido aos custos logísticos que são
responsabilidade da COOPERACRE. Em trecho de entrevista realizada em 11 de julho
de 2014 com Maria Araújo Aquino78 da chefe da unidade da SEAPROF de Xapuri, ela
coloca:

(...) a Natex, hoje ela está pegando látex de outros municípios, Rio Branco, de outros
produtores que não são seringueiros, alguns seringais de cultivo que tem, por que o
nativo não está abastecendo 100% (...) no estudo de elaboração do projeto, uma
logística que é viável pra fazer a coleta do látex para ela é em um raio de 100 km,
então ela fica só com o Alto Acre mesmo (...) (informação verbal79)

Esse é um outro exemplo da lógica empresarial da COOPERACRE.


Responsável pela logística de recolhimento do látex, para ela, o custo é menor

78 Mais conhecida como Leide Aquino, ela é esposa de Júlio Barbosa de Aquino, liderança
histórica do movimento seringueiro, que já foi prefeito de Xapuri e hoje é Secretário Nacional de
Meio Ambiente do PT. Um ponto relevante de se destacar é que existe um grande poder
acumulado nas mãos de poucas lideranças históricas do movimento seringueiro nessa. O
exemplo disso é que o irmão de Júlio Barbosa, Dionísio Barbosa de Aquino é o presidente da
COOPERFLORESTA e seu filho Sebastião Aquino é o presidente da Associação de Moradores
e Produtores da Reserva Extrativista Chico Mendes de Xapuri (AMOPREX), entidade
fundamental para decidir as ações dentro da RESEX CHICO MENDES, visto que é a detentora
dos direitos reais de uso de parte da reserva.
79
Entrevista concedida por Maria Araújo Aquino [jul. 2014] Entrevistadores: Luiz Henrique
Gomes de Moura e Diogo Loibel Sandonato. Xapuri, 2014.

256
comprando o látex de áreas de mais fácil acesso e com maiores escalas de produção,
como por exemplo propriedades com monocultivos que ficam nas margens de estradas
do que promover a logística necessária para o recolhimento do látex em regiões com
ramais ruins no interior da RESEX Chico Mendes. Em trecho de entrevista com Dalmo,
do ICMBio de Xapuri, ele comenta sobre as propriedades fora da reserva que possuem
monocultivos de seringa e vendem para Natex que compra por um preço melhor:

(...) tá o pessoal fora da reserva também, tem essas florestas plantadas, por que está
incentivando essas florestas plantadas também, fora da reserva, principalmente fora
da reserva é isso, o preço que tá vendendo né (...) por que tem muita gente que tem
floresta plantada antiga, de 10, 20 anos atrás, antes dessa coisa, e agora estão
vendendo (...)

Dentro da RESEX Chico Mendes pontos organizados para o recolhimento do


látex, principalmente os mais distantes dos ramais principais se tornaram inativos
devido, entre outros fatores, à falta de logística de recolhimento da COOPERACRE. Isso
tornava muito difícil a atividade visto que para as famílias realizarem o transporte do
látex por conta própria, algumas vezes é inviável. Devido a capacidade ociosa da fábrica
relacionada a dificuldade de produção e recolhimento do látex na região, ela acabou
tendo que importar de outras regiões para manter a produção. Isso nos foi informado
por Silvio Simione no seguinte trecho de entrevista:

(...) Lá na Chico Mendes, com a extração da borracha, a um tempo atrás (...) boa parte
da borracha que usada ali, não sei se tu sabe ela vêm do Mato Grosso e do estado
de São Paulo (...)

Um outro problema identificado nas entrevistas com moradores da RESEX Chico


Mendes com relação aos subsídios é a burocracia necessária para acessar aos
mesmos. Mesmo sendo a COOPERACRE quem paga os produtores por meio das
associações cooperadas, para retirar o subsídio é necessário documentação e
comparecer na cidade com uma frequência, o que muitas vezes inviabiliza os
seringueiros de acessarem esse recurso. Esse é um dos motivos que levam, mesmo
com valores mais atrativos devido a esses subsídios, essa atividade continuar em
decadência no Acre.
Essas cadeias produtivas associadas ao extrativismo são importantes não só do
ponto de vista econômico, mas também simbólico, visto que segundo o governo do Acre,
ele está colocando em prática o projeto que é uma conquista do movimento seringueiro
e um sonho de Chico Mendes. A imagem de Chico Mendes mais uma vez é utilizada
para legitimar um projeto vertical e não provindo da base do movimento, como podemos

257
ver na fachada de uma das indústrias de beneficiamento de castanha da
COOPERACRE em Xapuri na figura abaixo. A cadeia da borracha cumpre um papel
mais retórico do que econômico dentro das perspectivas das “cadeias sustentáveis
prioritárias” pensadas pelo governo, assim como dentro do programa REM do KfW visto
que a extração da borracha nativa nas estradas de seringa continua em constante
declínio.

Figura 43. Usina de beneficiamento de castanha da COOPERACRE em Xapuri. Fonte: Diogo Loibel
Sandonato

4.1.8. Indígenas

A conjuntura dos povos indígenas no Acre é complexa. Segundo o governo


estadual existem 16 povos com uma população total de 18.240 pessoas e que ocupa
um total de 2.390.112 hectares do estado (ACRE, 2013b). Para a ONG Instituto
Socioambiental (ISA), o estado conta com 36 terras indígenas e 9 ainda não
homologadas e o Conselho Indigenista Missionário (CIMI) afirmar que ainda existem
pelo menos 21 terras indígenas não demarcadas, sem contar os povos isolados

258
(FAUSTINO; FURTADO, 2015). Segundo o Coordenador do CIMI que atua na região,
Lindomar Padilha, a situação do Acre é bem conflitiva devido:

(...) desde 2003, nenhuma Terra indígena é demarcada aqui no estado do Acre e
também no entorno, em toda essa região da Amazônia Ocidental, isso tem resultado
em uma série de conflitos que tem, embora esses conflitos sendo negados, e as vezes
omitidos, enfim, mas eles estão acontecendo e cada vez ficando mais acirrados e os
nervos também mais aflorados, então, nós partimos do maior problema que é o
problema do acesso à terra, nós estamos numa realidade em que 85% das terras
estão de posse dos não, verdadeiramente, vamos dizer assim, donos, no caso tem 21
Terras Indígenas ainda por serem demarcadas sem nenhuma providência (...) a
regularização fundiária é um problema gravíssimo na nossa região e isso, daí decorre
uma série de outros problemas que também não são menos graves, daí os conflitos
pela posse da terra, as ameaças, enfim, a uma série de outros fatores que agregam a
essa situação do território (...) (EBC, 2014)

Lindomar em outro trecho demonstra a intensidade e gravidade dos conflitos


gerados pelos problemas fundiários:

(...) pra se ter uma ideia, em menos de um ano, a liderança indígena que é o cacique
Francisco Jaminawa, já sofreu três atentados, graças a deus, nenhum obteve
sucesso, de leva-lo a óbito, mas fizeram com uma das lideranças indígenas daquele
povo. Concretamente esse povo vive hoje numa área de menos de 2 hectares de terra
sendo que a terra indígena concretamente tem mais de 200 mil hectares de terra,
então eles estão com menos de 2 hectares, é um absurdo, eles não tem acesso nem
a água para beber. Então a terra está totalmente invadida por fazendas e é um
exemplo claro, por que Sena Madureira está a menos de 250 km daqui da capital Rio
Branco, quer dizer, é muito próximo, a cidade de Sena Madureira é muito próxima do
centro de decisões do estado, e no entanto esses povo não tem a menor opção e o
Estado é omisso, pra não dizer conivente até com essa situação gravíssima que esse
povo Jaminawa vive e é um povo absolutamente sem-terra, não tem nenhum tipo de
assistência e a situação dos Jaminawa é um exemplo de tantos outros que nós temos
vivenciado aqui na nossa região lamentavelmente (...) (EBC, 2014).

O que complexifica ainda mais é a quantidade de organizações dos povos


indígenas no estado. São 30 associações indígenas que representam terras indígenas
ou aldeias específicas, duas cooperativas, três organizações regionais, uma
organização de professores, uma dos agentes agroflorestais, duas organizações de
mulheres e uma de indígenas urbanos, além da Organização dos Povos Indígenas do
Acre, Sul do Amazonas e Noroeste de Rondônia (Opin) (CEPAL; IPEA; GIZ, 2014).
Dentre o conjunto de políticas e ações pensadas para os povos indígenas no
Acre, se destaca a construção dos Planos de Gestão Territorial e Ambiental das Terras

259
Indígenas (PGTIs) construídos a partir do etnozoneamento, ferramenta implementada
pelo ZEE do Acre. Segundo o governo estadual:

(...) Para promover uma relação mais estreita entre o poder público e os povos
indígenas, foi utilizado o etnozoneamento, conceituado como “um instrumento de
diagnóstico, zoneamento e planejamento dos povos indígenas para a gestão dos seus
territórios, sendo elaborado de forma participativa com o intuito de contribuir com a
autonomia indígena”. (ACRE, 2010c, p. 80)

Segundo dados do plano plurianual de 2012-2015, entre 2010 e 2011


começaram a ser implementados 22 PGTIs em 15 terras indígenas e estavam previstos
planos para mais 20 terras indígenas do Acre (ACRE, 2011a). Segundo a CEPAL, IPEA
e GIZ (2014) no momento estão sendo realizados etnozoneamentos em 5 terras
indígenas.
Mas os PGTIs, inclusive alguns formulados com participação da EMBRAPA-AC,
são pensados também para direcionar o modo de vida dos povos indígenas para as
políticas e cadeias produtivas de interesse do governo, como por exemplo a piscicultura
como colocou Inácio em trecho de entrevista, a atividade “(...) até nas aldeias indígenas
nós estamos incentivando (...). Segundo um documento de governo os planos:

(...) servirão de base para a assistência técnica e financeira dos subprojetos sobre:
sistemas agroflorestais; práticas agroflorestais sustentáveis para a venda de produtos,
enfatizando o uso de sementes nativas; ampliação da criação de pequenos animais
(galinhas, porcos, etc.), e a construção de pequenos açudes e repovoamento com
espécies nativas de peixes e quelônios em rios e lagos. (...) (ACRE, 2010c, p. 80)

Segundo reportagem da EMBRAPA-AC a respeito da parceira realizada com os


indígenas Kaxinawá da Terra Indígena Nova Olinda:

(...) Buscamos contemplar tanto a diversificação e melhoria da produção agrícola, para


garantir a segurança alimentar das famílias, como novas alternativas de renda,
considerando a tradição agrícola das aldeias e o potencial da floresta (...) (EMBRAPA,
2015)

Ainda segundo a reportagem:

(...) Desde 2013 o programa estadual de piscicultura investe na construção de açudes


em diversas comunidades indígenas do Acre. Além desse apoio, algumas aldeias
possuem lagos naturais que possibilitam a prática da pesca para a alimentação e
comercialização. Diversas atividades do projeto articulam-se a ações governamentais

260
que objetivam tornar a criação de peixes uma importante alternativa de renda para as
famílias kaxinawá, a partir de potencialidades da floresta. (EMBRAPA, 2015)

Para que o governo do estado consiga ter essa “relação mais estreita” com os
povos indígenas, foi elaborado uma forma muito eficiente de influenciar as Terras
Indígenas, a formação dos Agentes Agroflorestais Indígenas. Segundo Gavazzi (2012):

(...) programa de formação de agente agroflorestal indígena, ação educacional de


formação de jovens e adultos indígenas de diferentes etnias e regiões do estado do
Acre para a gestão territorial das terras indígenas e seu entorno. Esta ação
educacional é desenvolvida como parte das estratégias do Programa de Gestão
Territorial e Ambiental da Comissão Pró-Índio do Acre (CPI/AC) desde 1996, como
ação educacional específica junto à nova categoria social dos Agentes Agroflorestais
Indígenas (AAFIs). (GAVAZZI, 2012, p. 236)

Em reportagem que fala sobre as atividades desses agentes, no caso em


oficinas realizadas na Terra Indígena Kaxinawá do Rio Humaitá:

(...) Com o intuito de apoiar e fortalecer as ações de gestão territorial e ambiental, e a


segurança e soberania alimentar dos Huni Kuῖ da Terra Indígena Kaxinawá do Rio
Humaitá, foi realizada entre os meses de março e abril pelo projeto Gestão Indígena
no Acre, assessoria aos Agentes Agroflorestais Indígenas (AAFIs). Nessa assessoria
também foram realizadas em todas as aldeias da TI, mini-oficinas de mapeamento
participativo para discutir a situação de uso, manejo e conservação dos recursos
naturais. (ANA, s/d)

Os agentes formados pela CPI-AC e que recebem uma ajuda de custo através
do programa PROACRE do BIRD, tem o objetivo de promover os planos de gestão nas
terras indígenas, articulados com as políticas estaduais pensadas, ou seja, são os
incentivadores das políticas dentro das terras indígenas. Em trecho do relatório da
CEPAL, IPEA e GIZ é citado o caráter de atrelamento como iniciativas do governo
estadual:

(...) Outra frente de atuação do governo estadual era constituída pela busca de apoio
ao desenvolvimento econômico dos povos indígenas, entre outros, pelas iniciativas
de estruturação de uma vertente especifica de assistência técnica e extensão rural
indígena na Seaprof e pelo apoio ao movimento dos chamados agentes agroflorestais
indígenas. Este havia emergido de uma série de cursos de formação inicialmente
realizados pela organização indigenista Comissão Pró-Índio do Acre (CPI), mas, ao
longo dos anos, vem evoluindo para uma consolidação como categoria formalmente
reconhecida e engajada em promover a conservação e o uso sustentável dos recursos
naturais nas terras indígenas. (CEPAL; IPEA; GIZ, 2014, p. 86)

261
Um grande objetivo do programa REM KfW é destinar recursos para políticas
direcionadas aos indígenas, inclusive como uma condição do banco para o pagamento.
Como vimos, dentro da arquitetura do SISA, existe um GT Indígena com o objetivo de
garantir a participação ativa dos povos indígenas na construção do sistema, mas que
na prática é direcionado pelas ONGs que assessoram os indígenas no Acre,
principalmente a CPI-AC e a importante ONG internacional Forest Trends, que inclusive
foi uma das formuladoras, em parceria com o IMC, da publicação “Serviços Ambientais,
incentivos para a sua conservação, SISA: dialogando com os Povos Indígenas” (ACRE,
2013g). Nesse contexto, para aplicar os recursos provindos do KfW, foi elaborado um
“Edital indígena” do SISA dentro desse GT Indígena. Nesse edital que prevê o
investimento de 3 milhões de reais em 2 anos, as propostas foram encaminhadas por
cada associação indígena e deveriam cumprir princípios construídos nesse GT Indígena
dentre os quais estavam o fortalecimento dos PGTIs e dos agentes agroflorestais
indígenas (ACRE, 2014i). Os projetos devem ter por objetivo:

(...) a incorporação de ações para a conservação e o uso sustentável da floresta, a


adaptação e a mitigação de mudanças climáticas, a manutenção e valorização de
serviços ambientais e ações voltadas à segurança alimentar e à valorização do
conhecimento e do patrimônio cultural dos povos indígenas. (ACRE, 2014i, p. 3).

Por tanto, as principais ações custeados pelo programa REM KfW foram
promover a formação e pagamento de Agentes Agroflorestais Indígenas e ações dos
Planos de Gestão Territorial e Ambiental, que até o momento de nossa análise
somavam 5,3 milhões de reais. Em trecho de entrevista, Rodrigo Neves comenta sobre
o aporte de recursos do KfW para indígenas através do edital:

(...) Então desse recurso aqui, tem 1 milhão de reais, pra contração de 200 e alguma
coisa, 250 ou alguma coisa, agentes agroflorestais indígenas. Isso aqui, ele vai lá em
cada comunidade, não é cada nação indígena não, é cada comunidade indígena vai
ter uma pessoa lá pra ajudar eles a desenvolver e implementar os PGTIs. Então ai já
é um exemplo de como as reduções que a gente conseguiu no passado, que é coisa
que a gente vendeu, que a gente transacionou com o KfW, é coisa que já aconteceu,
não é coisa pro futuro, entendeu? É coisa que já aconteceu ou está acontecendo ao
longo de 2014 e 2015. Ingressa recurso em um fundo público e esse fundo público
abre um edital pra contratação de agentes agroflorestais que vai trabalhar em cada
uma das comunidades (...)

262
Aqui novamente os recursos do KfW interagem com recursos de outro programa,
no caso o PROACRE, do BIRD, que também direciona recursos para esses fins e
também parte do recurso do Fundo Amazônia do BNDES.
Dentro da mesma linha de mercantilização e precificação de bens e relações, o
SISA tem a previsão de construir um programa de “incentivo aos conhecimentos
tradicionais” que é voltado principalmente para os povos indígenas. Em trecho de
entrevista, Mônica de Los Rios comenta essa perspectiva:

(...) o SISA, ele justamente visa a promoção da manutenção, incremento, de todos


esses serviços ambientais que nós temos potenciais no estado, incluindo inclusive o
conhecimento tradicional e valorização da cultura, que as vezes, sempre é deixado de
lado, mas no nosso estado isso ai é bastante forte, inclusive o estado dos povos da
floresta não é somente feito pelo extrativismo, porque todo mundo conhece Chico
Mendes, mas antes de Chico Mendes já existiam populações indígenas que lutaram,
justamente, pela conservação da floresta, então há uma diversidade cultural muito
grande aqui no estado, e essa diversidade cultural tem levado a conservação dos 87%
de remanescente de floresta que nós temos (...)

A estruturação e as ações pensadas para os indígenas do SISA, inclusive a


elaboração desse programa previsto em lei estão sendo estruturadas pela CDSA.
Alberto Tavares comentou isso em trecho da entrevista:

(...) como a CDSA está com o papel de elaborar, vamos dizer assim, os mecanismos
e as ações, o plano de ação ou o subprograma que vêm a ser do termo indígena (...)

É importante destacar que a relação do SISA com os povos indígenas não


acontece sem conflitos. Em trecho de entrevista realizada pela missão da plataforma
DHESCA, um membro da WWF do Acre coloca:

(...) Dentro dos povos tem uma divisão; existem uns que acham o esquema
interessante, e estes estão mais na frente da construção do SISA, e outros que
acreditam que o processo não está bem construído, que é uma resposta capitalista
para um problema causado pelo capitalismo. Estes últimos estão dentro da discussão,
mas não fazem parte do esquema. Tem outra parte que participa ativamente, inclusive
recebendo parte dos créditos (FAUSTINO; FURTADO, 2015, pp. 72-73)

Uma liderança do povo Huni Kui, também citado pelo relatório da plataforma
DHESCA coloca:

(...) O Brasil está violando a Convenção 169, porque os povos indígenas não foram
consultados sobre o REDD e ele está se movendo para a frente. O segundo impacto

263
do REDD é que dividiu os líderes indígenas, que antes estavam unidos em defesa dos
territórios e da Mãe Terra. Um terceiro impacto do REDD é que resultou na cooptação
de alguns líderes, que aceitaram dinheiro e eles nem sequer sabem de onde vem esse
dinheiro e o que significa. Outro impacto é que o governo do Brasil, porque está
abrindo suas portas a este mecanismo de compensação de carbono, é que ele é
evisceração das leis e do quadro legal sobre os direitos dos povos proteger os nossos
direitos aos nossos territórios (KAXINAWÁ, 2014 apud FAUSTINO; FURTADO, 2015,
p. 73)

Devido ao refinamento de escala do ordenamento territorial da ferramenta de


etnozoneamento que geram os PGTIs e a atuação dos Agentes Agroflorestais Indígenas
temos uma eficiente forma de capilarizar e promover a penetração do capital em espaço
antes não mediados por dinheiro, como coloca SOUZA (2009):

(...) Sob os cânones (conservacionistas, mercantilistas, privatizantes, colonizadores)


do BM, isso concorre para o aprofundamento da subordinação do Estado às
instituições financeiras internacionais, a promoção da territorialidade do capital e o
desmantelando da territorialidade do homem da floresta, resultando numa
reconfiguração territorial ainda maior e mais perversa que a que temos assistido até
agora. (SOUZA, 2009, p. 18)

Segundo o que foi apurado pela missão da Relatoria da Plataforma DHESCA


dialogando com as organizações indigenistas locais:

(...) a expansão desses projetos de economia verde em territórios indígenas, sem a


adequada compreensão por parte dos povos e que, frequentemente, aumentam a
presença de atores externos nesses territórios, agravam a pressão e os riscos contra
os direitos territoriais e culturais dos povos, que acabam aceitando os projetos com
base em promessas de melhorias nas suas condições de vida. Além disso, a
preparação de agentes florestais estaria ocorrendo a partir do princípio de que “tudo
na natureza pode ser manejado”, configurando-se como fator de risco para a garantia
dos direitos dos povos indígenas (FAUSTINO; FURTADO, 2015, p. 56)

Como vimos pelas declarações de Lindomar do CIMI, um problema fundamental


para os povos indígenas no Acre, é que o reconhecimento de suas terras ainda não foi
resolvido de forma satisfatória. O governo do estado, ao contrário vem executando
políticas e ações que geram mais conflitos e problemas. Em relatório “Violência contra
os povos indígenas no Brasil, realizado pelo CIMI em 2015 com dados de 2014, são
apontados diversos casos de violência contra os povos indígenas no Acre dos quais
destacamos dois. O primeiro foi a construção pelo governo do estado de uma estrada
de 40 km entre os rios Muru e Tarauacá próximo as terras indígenas destinadas a 300

264
indígenas isolados na fronteira do Brasil com o Peru. Essa construção não teve EIA-
Rima e nem consulta a Funai e ICMBio, além das comunidades e associações
indígenas. A estrada trouxe uma intensificação da exploração ilegal de madeira assim
como caça predatória nas terras indígenas (CIMI, 2015).
O segundo caso é emblemático para demonstrar a profundida do projeto de
“desenvolvimento sustentável” do Acre. Segundo o relatório do CIMI:

(...) Desde a década de 1980 que a Petrobrás vem fazendo pesquisas para identificar
a existência de petróleo na região do Vale do Juruá, no Acre, e do Vale do Javari, no
Amazonas. Desde 2011 o processo de prospecção e extração de petróleo e gás tem
ocorrido sem que tenha sido feita uma consulta prévia às populações indígenas
afetadas, conforme determinam a Constituição Federal e a Convenção 169 da OIT. O
Ibama isentou a empresa contratada de apresentar o Relatório de Impacto Ambiental
(Rima). Rasgaram a floresta em diversos pontos e foram detonadas toneladas de
dinamites, muito próximo à terra indígena. Um dos blocos comprados pela Petrobrás
(n. 9) fica a apenas 10 km das terras de vários povos, inclusive isolados, na região de
fronteira com o Peru. (CIMI, 2015, p. 63)

Além dos impactos já causados pela exploração de petróleo e gás no Vale do


Juruá, agora existe uma iniciativa de “fracking” para exploração de gás de xisto também
pensada para região e apoiada pelo governo. A PETROBRAS é empresa responsável
pelo lote para exploração da área que está a 13 e 39 metros, respectivamente, das
Terras Indígenas Poyanawa e Nukini (EXTRAÇÃO...2015). O “fracking” consiste em
uma técnica de exploração do gás de xisto com uso de injeções de milhares de litros
cúbicos de água com areia e mais de 600 solventes químicos em altas pressões que
causam a fratura da rocha com explosões (NÃO FRACKING BRASL, 2015). A técnica
que já foi proibida em diversos países devido a contaminação provocada, segundo
reportagem:

(...) Na saúde humana, as cerca de 600 substâncias químicas, entre metais pesados,
radioativos e cancerígenos, têm provocado uma alta incidência de câncer (até 20
vezes mais), morte de animais, alterações de funções sexuais e reprodutivas,
infertilidade e anomalias genéticas entre a população, nas regiões afetadas. (NÃO
FRACKING BRASL, 2015)

Em trecho de entrevista, Lindomar Padilha do CIMI analisa os impactos:

(...) A Agência Nacional do Petróleo não fez um estudo de impacto ambiental,


desrespeitando uma convenção da Organização Internacional do Trabalho, entidade
da qual o Brasil é signatário. O governo criou uma cortina de fumaça e gera

265
expectativas de desenvolvimento para região do Vale do Juruá. O problema são as
técnicas utilizadas para a extração do gás, que é a fratura da rocha. (...) É certo o risco
trazido pela injeção dessa água misturada no subsolo, com a possibilidade de se
contaminar os aquíferos. O Alto Juruá é nascente de rios e igarapés que alimentam
simplesmente a maior bacia hidrográfica de água doce de superfície do mundo, a
Bacia Amazônica. A água é a maior riqueza da região. Estudam afirmam que o
Aquífero Juruá é o segundo maior da Região Norte, ficando atrás apenas do aquífero
de Alter do Chão, no Estado do Pará. Estudos recentes confirmam que esse tipo de
exploração prejudica, inclusive, o agronegócio, porque o gado, ao beber água
contaminada, contamina a carne, que é o carro-chefe da economia brasileira.
(DEPOIS...2015)

Ao mesmo tempo que a política de “desenvolvimento sustentável” do Acre


criminaliza e reprime os pequenos agricultores, seringueiros e ribeirinhos que utilizam a
coivara para produção de alimento com o pretexto de “combater o desmatamento”, é
conivente, por exemplo, com uma forma de exploração extremamente destrutiva e
danosa como o “fracking”. Um bom exemplo pra ver até onde o discurso condiz com a
prática no Acre.

4.1.9. Dados sociais e conflitos no campo

Outro aspecto importante de ser avaliado sobre o Acre e que tem influência das
políticas ambientais que estão sendo aplicadas no estado desde o início da gestão da
Frente Popular, são alguns índices sociais. Além da questão da redução de
desmatamento, uma das principais justificativas empregada pelo governo para
implementar a maior parte dessas políticas, é a melhoria da condição de vida dos povos
da floresta.
A princípio é necessário ponderar que as concepção usada por muitos relatórios
de índices sociais não necessariamente contemplam os modos de vida dos diferentes
povos que habitam a região. É importante se atentar a questão da construção da
pobreza, muitas vezes influenciada por bancos de desenvolvimento como explicitado
por Arturo Escobar em seu livro “La invención del Tercer Mundo: Construcción y
desconstrucción del desarrollo” (2007) e por João Márcio Mendes Pereira em seu artigo
“O Banco Mundial e a construção político-intelectual do ‘combate à pobreza” (2010).
Segundo o Ministério de Desenvolvimento Social (MDS), em 2010 existiam 133.410
pessoas na situação de extrema pobreza no Acre, predominantemente na região rural,
a maior taxa da Região Norte, mas utilizando o critério a partir do rendimento familiar
per capita de R$ 70 mensais (CEPAL; IPEA; GIZ, 2014). Existe o perigo de se interpretar
modos de vida que tem pouca mediação por dinheiro como situação de extrema

266
pobreza. Isso inclusive pode ser utilizado de pretexto para introdução de políticas que
geram conflitos territoriais e ferem os modos de vida dessas populações. Esse é o caso
do “Plano Acre Sem Miséria” (PASM) que segundo o relatório da CEPAL, IPEA e GIZ
(2014) tem orçamento de R$ 852,9 milhões provindos de diversas fontes, inclusive o
PROACRE financiado pelo BIRD. Como vimos os Planos de Desenvolvimento
Comunitário (PDCs) são mais orientados a promover as cadeias de interesse do
governo, geralmente direcionando as comunidades a realizar atividades que não
necessariamente dialogam com as necessidades e modos de vida.
Considerando as ressalvas feitas acima sobre as concepções que permeiam
esses índices sociais, iremos considerar alguns deles. Com relação ao Índice de
Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) que leva em consideração as variáveis
longevidade, educação e renda, temos a seguinte figura abaixo comparando os Estados
que compõe a Amazônia Legal com base nos dados do Atlas Brasil do PNUD (2015):

IDHM do Brasil e Estados da Amazônia Legal


0,8
0,7
0,6
Índice IDHM

0,5
0,4
0,3
0,2
0,1
0
1991 2000 2010

Brasil Acre Amazonas Amapá Maranhão


Mato Grosso Pará Rondônia Roraima Tocantins

Figura 44. Índice de Desenvolvimento Humano Municipal do Brasil e Estado da Amazônia Legal.
Fonte: Atlas Brasil, PNUD, 2015.

Podemos observar que apesar da melhora, que acompanhou o Brasil e os


estados da Amazônia Legal, o IDHM do Acre foi em 2010 o terceiro pior com 0,663.
Dentro das variáveis de escolaridade e longevidade do índice, o Acre ocupa a segunda
pior colocação (PNUD, 2015).
Analisando a concentração de renda no estado, segundo dados do Atlas Brasil
do PNUD (2015), os 10% mais ricos se apropriam de 50,56% da renda do estado, a
segunda pior concentração de renda apenas abaixo do estado do Amazonas com 53,64.

267
O índice de Gini para concentração de renda no estado é de 0,63 também um dos piores
da região norte. Importante destacar que a concentração de renda no Acre praticamente
não se alterou de 1991 até 2010 segundo os mesmo dados (PNUD, 2015)
Abaixo vemos uma tabela com parte dos dados do relatório de Índice de
Progresso Social (IPS) para os Estado da Amazônia Brasileira, do IMAZON (SANTOS
et. al., 2014), que apesar de em parte seguir as mesmas concepções de índices como
IDHM e uma concepção de desenvolvimento questionável, não dá um peso tão grande
para o fator financeiro o que é interessante para nossa análise:

Necessidades humanas básicas


Mato
Componente Rondônia Acre Amazonas Roraima Pará Amapá Tocantins Maranhão Grosso
Nutrição e cuidados 75,68 70,66 73,89 75,82 76,01 78,8 70,28 68,63 73,34
médicos básicos

Água e saneamento 21,02 28,42 30,98 42 31,1 33,11 41,82 38,6 36,94

Moradia 80,01 68,95 67,49 58,4 69,39 84,03 76,84 61,99 85,04
Segurança pessoal 50,36 48,11 60,24 44,18 51,92 51,51 53,08 62,28 51,09

Fundamentos para o bem-estar


Mato
Componente Rondônia Acre Amazonas Roraima Pará Amapá Tocantins Maranhão Grosso
Acesso ao 64,95 56,43 56,06 55,89 58,2 62,17 64,33 56,85 65,59
conhecimento
básico
Acesso à 64,97 43,41 32,69 32,59 44,74 19,91 66,62 53,44 61,27
informação e
comunicação

Saúde e bem-estar 71,67 68,81 73,89 72,44 72,35 72,64 67,05 68,47 72,92

Sustentabilidade 78,46 81,72 87,24 85,19 77,58 88,95 71,07 66,39 76,16
dos ecossistemas

Tabela 22. Índices de Progresso Social da Amazônia. Fonte: SANTOS et. al., 2014.

O índice de analfabetismo no Acre continua, mesmo depois de 16 anos de Frente


Popular no Acre, sendo pior da Região Norte com 14,38% da população com mais de
15 anos (CEPAL; IPEA; GIZ, 2014). Segundo o relatório do IMAZON, o acesso ao
conhecimento básico no estado é segundo pior dos estados da Amazônia apenas à
frente de Roraima. Olhando para questão da saúde, a uma concentração das estruturas
de atendimento na capital e uma demanda de interiorização principalmente na oferta de

268
leitos hospitalares (CEPAL; IPEA; GIZ, 2014). Segundo dados presentes no Atlas Brasil
do PNUD (2015), apesar da melhora de 1991 até 2010, a mortalidade infantil do Acre
ainda era a maior da região norte com o índice de 23,01, bem acima do Brasil com 16,7.
Nos dados da tabela podemos observar que os índices para o Acre de nutrição e
cuidados médicos básicos, o segundo pior, água e saneamento básico, segundo pior e
saúde e bem-estar, terceiro pior, demonstram problema nesse campo.
Segundo dados sistematizados pelo geógrafo Eduardo Girardi com base no
banco de dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT), da ONG Repórteres Sem
Fronteira e do Ministério do Trabalho e Emprego, entre 2003 e 2012 foram resgatados
109 trabalhados em situação análoga à escravidão ou em situação degradante no Acre,
todos trabalhando em fazendas (CEPAL; IPEA; GIZ, 2014). Vale lembrar que uma das
principais fontes de trabalho escravo no Brasil é a agropecuária realizada em grandes
latifúndios da região Norte, e essa é a principal atividade econômica do Acre. Além
disso, o Acre é o terceiro estado da região norte com maior exploração de mão-de-obra
infantil principalmente em áreas rurais (CEPAL; IPEA; GIZ, 2014).
Como podemos observar por esses dados, as populações do Acre sofrem com
diversos problemas estruturais, que quando articulados com as políticas trazidas, as
tornam ainda mais vulneráveis e os conflitos mais profundos. A missão da relatoria da
Plataforma DHESCA (FAUSTINO; FURTADO, 2015) concluiu em suas averiguações
que os territórios em que projetos de economia verde estão sendo realizados as
populações:

- têm baixa escolaridade, o que as coloca em desvantagem em relação ao


acesso à informação e à igualdade no diálogo com empresários e técnicos;
- apresentam alto nível de dependência em relação aos proprietários,
madeireiros e pecuaristas, sobretudo por não terem garantidos seus direitos de posse;
- possuem pouca possibilidade de enfrentamento às situações de violência
doméstica, as mulheres apresentam elevados níveis de vulnerabilidade e reduzido
acesso à saúde naquilo que lhes é específico;
- têm baixíssimo nível de acesso à instituições públicas e à justiça na busca
de garantidas de direitos de diferentes ordens; (FAUSTINO; FURTADO, 2015, p. 103)

Outro problema, relacionado a estrutura fundiária no Estado é a dinâmica recente


de conflitos no campo. Segundo dados do Caderno de Conflitos de 2013 da Comissão
Pastoral da Terra (CPT, 2014), a dinâmica de ocupações de terra foi retomada no
estado, foram 11 ocupações com 882 famílias totalizando 59.400 hectares. A violência
contra ocupações e posses cresceu passando de 3.310 para 5.036 famílias atingidas,
das quais 676 foram despejadas, 799 ameaçadas de despejo, 747 ameaçadas de
expulsão, 296 tiveram suas casas destruídas, 278 tiveram seus roçados destruídos, 218

269
tiveram seus pertences destruídos e 380 ameaçadas por pistolagem. Ainda de acordo
com os dados da CPT, a violência contra a população na Amazônia diminuiu mas:

(...) Houve uma redução de 30% no número de pessoas, em relação a 2012. O Acre,
porém, é exceção: o número de conflitos cresceu 33%, com 53 conflitos registrados,
contra 40 em 2012, passando de 16.550 pessoas envolvidas, para 25.193, 52% a
mais. (CPT, 2014, pp. 87-88)

Os dados do Caderno de Conflitos de 2014 demonstram que os conflitos estão


aumentando, foram registrados 73 conflitos envolvendo 27.548 pessoas. (CPT, 2015)
Apesar de toda retórica de que o Acre caminha para um projeto que “desenvolvimento
sustentável”, a realidade é distinta. O que queremos destacar nesse debate é que
apesar de estar no poder desde 1999, a Frente Popular que em parte é formada por
lideranças de forças sociais que vieram dos sindicatos e movimentos sociais que tem
bandeiras históricas de defesa dos direitos e do acesso à terra e território dos
agricultores familiares e seringueiros entre outros, não obteve grandes avanços nessas
bandeiras apesar de toda essa retórica empregada durante esses 16 anos no poder. O
que vemos é um aumento da violência nos últimos anos e problemas estruturais que
estão longe de ser resolvidos.

4.2. SISA como “cereja no bolo” das políticas ambientais do Acre

Como vimos no capítulo 2, o Acre, ao longo do histórico de hegemonia do bloco


de poder representado pela Frente Popular do Acre desde 1999, vêm desenvolvendo
um conjunto de políticas para uma pretensa transição para uma política de
desenvolvimento “sustentável” que reduz o desmatamento e gera menos emissões de
gases. Também vimos que um passo fundamental para esse processo, foi o
Zoneamento Ecológico Econômico que, em nossa análise, foi um pacto político-
territorial dos setores que compõe o bloco hegemônico, parte do agronegócio mais
ligado a uma acumulação que promove uma “extração destrutiva” e parte de um grupo
que tem interesses de acumular com a “floresta em pé”.
Aqui nessa seção, o nosso objetivo é explicitar mais uma vez como esse pacto
político-territorial se manifesta de uma forma complexa com diversas relações sinérgicas
com o SISA e os recursos captados pelo mesmo. Para exemplificar o ponto que
queremos reforçar utilizamos tabela formulada com o objetivo de demonstrar a relação
dos investimentos do Fundo Amazônia do BNDES com outros investimentos no Acre,
tanto do ponto de vista do caráter da atividade financiada, como também da região

270
pensada a partir do ZEE. A tabela foi feita por Fábio Vaz de Lima, que na época ainda
era subsecretaria da SEDENS:

Tabela 23. Articulação de diferentes investimentos com atividades e regiões no Acre. Fonte:
LIMA, 2014.

O sistema foi pensando para “repartir” os benefícios de forma a contemplar esses


setores de diversas formas. Em trecho da entrevista com Alberto Tavares da CDSA fica
mais explícita essa estratégia, quando ele define o que seria o sistema:

(...) um conjunto de ações estratégias de gestão territorial e gestão de recursos


naturais consequentemente, que passa por conservação, uso sustentável, pensando
que o uso sustentável você pode ter olhar sobre produtos e serviços. Pensando os
serviços como complementos a, por exemplo, a cadeias produtivas. Dois pontos
importantes: desde do início no Acre nunca se pensou em pagamento por serviços
ambientais dentro de uma relação de que vá se fazer pagamento pelo fato de alguém
estar numa área X, Y ou Z, mas muito mais uma concepção de um incentivo pelas
boas práticas do usos recursos naturais que fortaleçam, promovam ou potencializem
os serviços ambientais, por isso a lei é de um sistema de incentivos aos serviços
ambientais (...) o segundo ponto é que nada disso é feito desconectado, ou melhor
isso é feito absolutamente conectado com as políticas que vêm acontecendo no
Acre já a mais de uma década em termos de gestão territorial, que o zoneamento é
a maior expressão disso, mas gestão de recursos naturais de maneira geral, como é
o plano estadual de recursos hídricos ou o sistema estadual de áreas protegidas, que
faz a gestão de áreas protegidas, ou até mesmo os programas e projetos de fomento
as cadeias produtivas florestais por exemplo, então o SISA é concebido para ser

271
um potencializador dessas ações (...) esse sistema está, e tem que assim ser, cada
vez mais acoplado a uma base de políticas públicas (...)

Como Alberto afirma, o SISA funciona como um catalisador para alavancar


outros investimentos e projetos no Acre. Parte de uma concepção de mercantilização
da natureza e das relações sociais que as transforma em produtos e serviços, e pensa
como articular e potencializar a venda dos mesmos. Em um dos relatório de execução
do programa REM do KfW é colocado o papel do REM:

(...) nas ações de redução de desmatamento em sinergia com outras fontes de


financiamento do desenvolvimento sustentável no Estado. De um modo geral o
REM demonstra ser um fonte de apoio que permite a alavancagem de outras
recursos (BID, Fundo Amazônia) (ACRE, 2013d, p.2)

E esse processo de alavancagem pode ser de diversas formas como já


expusemos quando debatemos a concepção do SISA e como explicita Rodrigo Neves
em trecho de entrevista:

(...) A gente fez um segundo contrato com o KfW no qual a gente está propondo gastar
100% com a ponta, que a gente já está estruturando com recurso daqui. Esse modelo
pode ser um modelo completamente diferente com outros, a gente pode, com outros
parceiros, por exemplo. A gente está conversando com algumas empresas que
querem criar uma empresa conjunto com a gente pra fazer reflorestamento, pra
desenvolver toda uma cadeia que possa estar vinculada não só com madeira, mas
com produção de energia, no qual a nossa parcela de sociedade nesse novo
empreendimento é a entrega de créditos de carbono que a gente tenha. Qual vai
ser o benefício? A gente diz, olha, tem que investir tanto com seringueiro, envolvendo
comunidades tradicionais, etc. etc....tem que envolver tantas mil famílias dentro
desse novo projeto. E ai o que que vai acontecer? A gente tem que ter atividades
que gerem, que a economia ande, que tenham sustentabilidade econômica social e
etc. Então nesse caso aqui, qual é o benefício das comunidades? É que elas sejam,
a gente vai moldando novos negócios que não existem hoje e que não existiriam se a
gente não tivesse o sistema e fazendo sempre esse processo inclusivo, oh tem que
colocar, faz parte do contrato que inclua tantas mil famílias, tais tipos de atividades
em tantos territórios e tantos não sei o que (...)

Aqui vemos um ponto importante da estratégia do estado que é promover esse


desenvolvimento integrando de forma subordinada as comunidades, gerando um
aparente benefício para as mesmas, além de acessar os bens naturais de seus
territórios e explorar a força de trabalho das mesmas. O objetivo é integrar mais
comunidades no processo e o SISA potencializa isso como coloca Mônica:

272
(...) Por exemplo a cadeia, vamos supor da borracha, com o recurso do estado, ou
com recurso próprio ou com recurso já captado, a capacidade do governo de apoiar
as famílias nisto é X, com o REDD seria 2X, do setor madeireiro, com recurso do
governo e de outras fontes de financiamento é X, com o REDD seria 2X, então a ideia
é ampliar a nossa capacidade de atendimento, que hoje é baixa, nós temos no setor
rural, 40.000 produtores aproximadamente, dos quais eu posso te dizer que eu
acredito que nem 20% a gente consegue atender diretamente. Então se eu ainda
tenho um passivo bastante grande de atendimento, eu ainda preciso de um volume
de recursos bastante grande, então a ideia com o SISA e com o REDD é aumentar
essa abrangência de atendimento e de incorporação desse passivo que está aqui
dentro dessas cadeias produtivas, por isso que o programa Carbono do estado, ele
não pode ser caracterizado como um projeto de REDD, por que as reduções nesse
nível jurisdicional, elas só se mantem, se cada um desses produtores está inserido
numa cadeia produtiva sustentável que no lugar de promover desmatamento,
ela promove conservação (...)

Com o pretexto de combater o desmatamento, o SISA auxilia nessa integração


subordinada das comunidades nas cadeias produtivas estratégicas para o bloco
hegemônico do estado. Isso também é apontado no relatório da plataforma DHESCA
quando coloca:

“(...) Em seus territórios históricos, os povos da floresta são excluídos dos processos
de decisão sobre seus próprios futuros ou, ainda mais grave, são considerados
obstáculos ao desenvolvimento e progresso. Nesse sentido, a política de economia
verde também caracteriza-se por uma maneira de integrá-los ao sistema de produção
e consumo hegemônico.” (FAUSTINO; FURTADO, 2015, p. 103)

Em trecho de entrevista, Mônica demonstra a relação do SISA com o


desenvolvimento dos investimentos e projetos no estado:

(...) o SISA em realidade é assim: nós temos o “bolo” aqui, várias coisas, você falou
da piscicultura, tem o frigorífico, tem outro sistema industrial madeireiro, tem outro
sistema industrial da borracha, sistema industrial dos tacos de madeira, então tem
várias camadas desse “bolo”, que já estão prontas. O SISA é a cereja no bolo (...)

Para operacionalizar esse processo, a CDSA cumpre papel chave. Ela tem
direito por lei de receber parte dos “ativos ambientais” do estado e pode usa-los em
diversos tipos de investimento, como o exemplo que Rodrigo Neves citou acima. Como
coloca Mônica:

273
(...) a tarefa da companhia é a partir das reduções de emissões, ela atrair investidores
de REDD, e usar para as finalidades de construir esse “bolo” aqui, de colocar aliás,
de colocar a cereja nesse bolo (...) ou várias cerejas (...)

No seu documento de planejamento estratégico, a CDSA coloca:

(...) A CDSA pode alavancar recursos e a posição do Acre no cenário internacional de


REDD+ para atrair capital adicional - por exemplo, voltado para o desenvolvimento
de baixas emissões, agricultura sustentável e sistemas pecuários - em um modelo
integrado e eficiente de financiamento. Ao estruturar a CDSA para maximizar a sua
habilidade de monetizar ativos e de usar esses fundos para efetivamente catalisar
outros investimentos em LED, o Acre pode criar um importante mecanismo através
do qual o estado pode avançar na sua estratégia de desenvolvimento de base florestal
e de baixas de emissões. (CDSA, s/d, p. 6-7)

Alberto Tavares também fala da gama de possibilidades de atuação da empresa:

(...) Então ela tem no seu papel institucional três grandes eixos, o principal, quer dizer,
os 2 principais de ser uma promotora, provocadora, estimuladora dos negócios
relacionados a serviços ambientais, que estejam promovendo e fortalecendo os
serviços ambientais. Isso significa, pode significar a elaboração de planos de trabalho
com setores ou com áreas territoriais, pode ser participando ou sendo a proponente
de projetos específicos. Ela também tem um outro eixo que é a de gestão dos ativos
ambientais gerados pelos projetos que ela participa, ou gerados no âmbito do
programa jurisdicional do Acre, que é o próprio SISA, e nesse casa o recorte do
programa ISA carbono, que é o primeiro programa criado depois do estabelecimento
da lei (...)

O SISA, enquanto um sistema jurisdicional estadual, foi pensando para integrar


todas áreas com seus diferentes regimes de propriedade, inclusive terras indígenas e
unidades de conservação, e como a CDSA pode comercializar os “ativos ambientais”
do estado, temos a seguinte “vantagem competitiva” da empresa:

(...) A CDSA também pode ser um atraente coinvestidor para o setor privado por sua
capacidade de desenvolver projetos de REDD+ em terras do estado. Quase 30% das
emissões evitadas estimadas no Acre estão em terras públicas, e as futuras reduções
de emissões criadas nessas terras provavelmente exigirão investimento em planos de
gestão para as comunidades tradicionais e extrativistas que lá residem, fiscalização
ambiental, etc. (CDSA, s/d, p. 18)

Ou seja, ela pode atuar fazendo a mediação entre o capital e as comunidades,


ou nas palavras de Alberto ela pode ser:

274
(...) um agente de desenvolvimento e estabelecimento de diálogo inter-setorial sobre
oportunidades de negócios e de, vamos dizer assim, arranjos de projetos e iniciativas
que possam fazer esse tipo de, digamos de, de estímulo a, comunitários, ou
proprietários privados ou negócios ou empresas, possam estar fazendo isso (...).

Além de atuar como uma ponte para o capital penetrar espaços de mais difícil
acesso direto como unidades de conservação e terras indígenas, ela também atua para
minimizar o risco do investimento privado:

(...) CDSA tem a oportunidade de utilizar os fundos de forma estratégica para reduzir
o risco do investimento privado e comunitário em atividades de REDD+ e LED para
que mais e mais desse investimento seja atraído para essas atividades no Acre ao
longo do tempo, uma vez que os riscos são mais bem conhecidos e podem ser
administrados por meio de diversas ferramentas. (CDSA, s/d, pp.15-16)

Outro ponto importante para entender esse processo é a relação da CDSA com
a ANAC. Como colocado por Alberto na fala sobre a concepção do SISA, ele considera
que o sistema trabalha com produtos e serviços. Quando ele fala do objetivo da criação
da CDSA, comenta sobre os papeis das duas empresas mistas:

(...) a ANAC é esse ser focado para cadeias produtivas de bens, se pensou então na
concepção do SISA que era necessário se pensar em um agente, vamos dizer assim,
de negócios, uma, no caso ai, a companhia, que pudesse estar voltada para as
cadeias produtivas dos serviço, então ai nasce a CDSA, na sua concepção, dados os
modelos de S.A., que é regulamentado em legislação brasileira, então ela nasce com
essa natureza inicialmente de focar essa, vamos dizer assim, sua missão para
trabalhar o que seriam as oportunidades e as possibilidades de promoção desses
serviços ecossistêmicos. (...)

Lembrando que a ANAC possui ações da CDSA, quando a CDSA monetiza os


ativos ambientais e reinveste em programas que apoiam as cadeias produtivas em que
a ANAC participa, temos essa relação sinérgica das duas empresas. Em trecho da
entrevista com Inácio da ANAC ele comenta a relação entre as empresas:

(...) como a gente é sócio e participa das reuniões e dos planejamentos, na verdade é
o seguinte, o recurso que entra na CDSA é fruto de um crédito gerado de carbono,
pra a gente ter esse crédito, o nosso crédito que a gente tem hoje, foi o que a gente
deixou de emitir de carbono (...) então assim, esse é o nosso crédito, então daqui pra
frente, pra gente aumentar os créditos na CDSA (...) a ANAC tem que cada vez mais,
a CDSA identificar que existe por exemplo, um desmatamento ou índice que está
aumentando na região tal, como é que a gente identifica uma outra forma de a
população que está morando ali possa ter uma fonte de renda que diminui essa

275
pressão na floresta, então quando identificou, seja na aldeia indígena, seja qualquer
comunidade rural, ai o papel da ANAC é organizar o comunitário em forma de
cooperativa e ir industrializando né, minimamente, ou se não organizando essa cadeia
produtiva (...)

A ANAC se beneficia da CDSA e a CDSA pode se beneficiar da ANAC como


coloca o documento de planejamento estratégico da CDSA:

(...) Além disso, a CDSA pode ser capaz de monetizar seus créditos ecossistêmicos
de maneira mais lucrativa se puder demonstrar que o uso de fundos vai atrair, direta
ou indiretamente, outras fontes privadas de capital. (CDSA, s/d, p. 15)

O SISA é a “cereja no bolo” e a CDSA e ANAC cumprem papel estratégico em


colocar essas “cerejas”80. E isso pode se dar diversas formas, mas o arranjo PPPC é
um dos principais. São fortalecidas pontes de interação entre o agronegócio e o setor
madeireiro e especulativo dos mecanismos financeiros como REDD através do sistema,
ou seja “todos são beneficiados pelos incentivos ambientais” voltados para um
“desenvolvimento com baixas emissões”.
O que vemos hoje no Acre são as diversas formas em que são produzidos novos
espaços capitalistas. Como vimos, todo o projeto de “desenvolvimento sustentável” do
estado e a concepção do SISA são pautados numa visão de mercado, através de
cálculos de custo de oportunidade. Se fosse diferente, esse projeto enfrentaria o
agronegócio, principal vetor de desmatamento e não faria um programa para justamente
beneficiar o mesmo.
O que se tenta fazer é mercantilizar e precificar os bens da floresta para “valorizar
também a floresta em pé” em uma lógica hegemonicamente de mercado. Isso fica claro
com a parceria que o Acre tem com a ONG Global Canopy Programme como colocado
por Alberto em trecho da entrevista:

(...) a gente tem uma parceria com uma ONG que é o “Global Canopy Programme”
que é pra pensar, chamasse “unlocking forest finance”, ou seja, desbloqueando
finanças para florestas, ou seja como você captar recursos para investimento em
cadeias produtivas, que você sabe que a grande questão, o custo de oportunidade
das cadeias produtivas florestais tem menos vantagem hoje, na sua forma
tradicional que as cadeias produtivas não florestais tem, então é o custo de
oportunidade que é uma desvantagem para floresta em pé, a gente tem que
encontrar, estamos buscando formas e arranjo para que esses mecanismos possam
atrair investimentos e que de fato, orientados por princípios de internalizar as

80Interessante notar que nas publicações a respeito do sistema praticamente não se comenta o
papel da ANAC para o funcionamento do SISA.

276
chamadas externalidades, ou seja, de que considerar as variáveis sociais e
ambientais como algo relevante, ainda assim, possam garantir que essas cadeias
produtivas sejam viáveis no mercado, então estamos buscando esses mecanismos.
(...)

Segundo a ONG Global Canopy Programme, promover esse processo envolve:

(…) esse processo requer consideravelmente investimento em cadeias produtivas


sustentáveis, na conservação do capital natural e no desenvolvimento sustentável das
comunidades dependentes da floresta (...) O projeto “Unlocking Forest Finance”
almeja catalisar a criação de instrumentos financeiros – incentivos verdes – operando
em escala de regiões subnacionais, para interromper a conversão das florestas
tropicais para produção de commodities, e para direcionar a transição para modelos
de desenvolvimento sustentável (...) Investimentos em incentivos verdes serão
direcionados para cadeias produtivas, conservação e atividades de subsistência de
forma integrada, e terão a capacidade de gerar a escala necessária de investimento
usando fundos públicos para alavancar o capital privado (...) (GCP, 2015, tradução
nossa)

Até o momento o programa ISA carbono é o único programa em operação no


sistema, mas já está previsto, inclusive em lei, outros programas com essa proposta de
“monetizar” os “serviços ambientais” como o programa de biodiversidade e recursos
hídricos que já estão em fase avançada de elaboração. Sobre o programa de
biodiversidade, perguntamos a Rodrigo Neves qual seria a estratégia e ele colocou:

(...) Quando a gente fala de conceito de um modelo de desenvolvimento sustentável,


a gente tem que estar alinhado com um modelo de consumo sustentável, ou seja,
você tem que ter alguém, pra gente produzir de forma sustentável, você vai ter que
tem alguém que compre a produção sustentável. Hoje a produção sustentável ainda
é mais cara que a produção tradicional (...) agora pra você fazer um investimento
numa cadeia produtiva sustentável, quem é que vai pagar isso? Quem é que vai
comprar? (...) Então a gente tem feito conversas, estivemos recentemente com o
Banco Mundial, tivemos em Washington com uma associação que representa os 400
maiores varejistas do mundo, estivemos com o EDF, estivemos com o Forest Trends,
discutindo esse próximo passo (...) se é pra preservar um local com beleza cênica
fantástica, isso vai custar alguma grana, se você tem que garantir a integridade hídrica
de uma determinada bacia, isso vai custar uma grana, se você tem que ter certeza de
que uma determinada atividade numa localidade está garantindo os direitos de uma
comunidade, que ela não seja movida, não seja perturbada na sua forma tradicional
de convivência, isso vai custar algum dinheiro. Se você tem que garantir a
sociobiodiversidade, o conhecimento tradicional, isso vai ter algum custo. Que são os
outros serviços que estão envolta do ISA Carbono, você vai agregando isso. Então,
todas as cadeias produtivas que a gente está desenvolvendo, ela envolve a questão

277
associativismo, sociobiodiversidade, a água, a preservação de solo, todos esses
elementos dos outros serviços ambientais, eles já estão embutidos (...) A grande
sacada que a gente está tendo que provavelmente vai acontecer é o seguinte: não
tem como rastrear um quilo de boi, é um custo muito grande, não tem como rastrear
uma grama de soja pra saber se ele está protegendo recursos hídricos, se ele está
protegendo as comunidades, etc. etc... (...) Talvez o grande salto que a gente vai ter
é, criar grandes áreas, macrorregiões, no nosso caso um estado inteiro no qual, a
gente embuta todas as políticas públicas de desenvolvimento econômico com controle
social, com redução de emissões, com garantia de proteção das comunidades, e ai
você garanta com que os produtos que sejam dessa região sejam comprados com um
selo completo, incluindo tudo, e não só a questão de carbono.

A questão de respeitar ou não as comunidades, nos seus direitos, passa a ser


visto como um agregador de valor para o produto. O bloco hegemônico hoje no estado,
se aproveitando, se apropriando e subvertendo a história emblemática da luta da Aliança
dos Povos da Floresta no Acre, foi construindo toda essa retórica de que está gerando
um desenvolvimento sustentável que respeita os povos da floresta, e com isso a ideia é
gerar uma espécie de selo de “responsabilidade socioambiental” para seus produtos.

4.3. Vozes abafadas, criminalização da resistência e luta – o conflito explicitado

Esse arranjo complexo com o qual o capital acumula no Acre, espoliando


territórios e subordinando comunidades não acontece sem gerar muitos conflitos
territoriais e processos de luta e resistência como veremos nessa seção.
Desde que a Frente Popular assumiu o poder no Acre, o bloco hegemônico usou
como estratégia, se apropriar e subverter o legado de Chico Mendes para legitimar as
ações do governo como já debatemos. Em documento do governo é colocado:

(...) O projeto político do Governo Estadual desde 1999 procura tornar realidade o
sonho de Chico Mendes e do movimento dos seringueiros, por meio de propostas de
desenvolvimento que melhorem o modo de vida do povo do Estado e, ao mesmo
tempo, permitam o uso sustentável com a valorização da floresta e a sua conservação.
(ACRE, 2010c, p. 74)

Essa apropriação foi analisado pela pesquisadora Maria de Jesus Morais e


publicado, por exemplo, no Dossiê Acre realizado pelo CIMI (CIMI, 2012b). Isso também
é afirmado no Relatório da Plataforma DHESCA que analisa:

(...) Enquanto isso, parte da referência histórica do Acre, da política do MFS e do SISA
é construída também a partir da subjetividade social e do alcance internacional da

278
história de luta dos seringueiros e povos da floresta e das conquistas de políticas
públicas. A imagem de Chico Mendes e os conceitos de povos da floresta e florestania
que emergiram das lutas sociais do Acre fazem, atualmente, parte do discurso público
não só do SISA, mas do que se poderia denominar de “tendência verde” da economia
da floresta do estado. (FAUSTITNO; FURTADO, 2015, p. 102)

Isso foi articulado a um processo de progressiva desqualificação, ameaças e


criminalização de seus opositores, dentre eles, lideranças que lutaram ao lado de Chico
Mendes e organizações que historicamente apoiaram e assessoraram movimentos
sociais como veremos a seguir.
Um dos exemplos desse processo aconteceu com Osmarino Amâncio
Rodrigues, liderança histórica do movimento seringueiro que hoje é ferrenho opositor do
bloco hegemônico que está no poder e critica com propriedade diversas das políticas
executadas no Acre, como por exemplo o manejo florestal comunitário:

Quando fizeram o manejo madeireiro, nós perdemos o controle da floresta, porque


não temos mais o direito de entrar na área. Quando percebemos, já era um deserto o
que antes foi floresta. Os engenheiros florestais argumentam que a floresta se
recompõe em 30 anos. Recentemente um pessoal foi à floresta medir a idade das
árvores, e a árvore mais nova tem duzentos anos de existência. Nós já encontramos
um Cumaru Ferro que tem mil anos de existência. A Engenharia Florestal está
confundindo a ciência com a disciplina educacional, está arriscando. Eu perguntei
para um técnico se ele acreditava nessa questão da sustentabilidade com a
mercantilização da natureza, e ele disse que era um risco, mas que precisávamos
arriscar. Temos que nos opor a essa política de mercado, porque todo o potencial da
floresta está sendo leiloado pelas empresas que hoje se instalam ao longo da estrada
do Pacífico. (IHU, 2012).

Em outra entrevista Osmarino, também criticando o manejo, fala de como a vida


dos seringueiros não melhorou:

(...) o manejo tá expulsando o seringueiro de sua colocação, tirando a dignidade dos


extrativistas, dos índios, tirando a biodiversidade. Isso vem acontecendo em Santa
Quitéria, no Antimary. Você vai lá, o povo não ficou rico, está recebendo uma bolsa
verde, a bolsa família. A economia estagnou e a pobreza continua.
(OSMARINO...2011).

Em outro trecho da entrevista, Osmarino acusa a falta de espaço dos que se


opõe as políticas do governo:

Aparelharam os movimentos, amordaçaram os meios de comunicação. Eu não posso


falar em uma rádio sobre o que eu penso, sobre a política suicida, enganosa,

279
fraudulenta, um projeto que não é sustentável, que entrega o potencial natural.
(OSMARINO...2011).

Osmarino, que possui uma colocação na RESEX Chico Mendes foi processado,
acusado de danificar unidade de conservação como coloca em trecho de entrevista
concedida a Luiz Azenha para o Viomundo:

(...) eu mesmo estou sendo criminalizado por que eu estava tirando madeira para fazer
uma casa pra mim e uma casa pra minha mãe na colocação onde eu moro, então o
ICMBio chegou e tentou me criminalizar e eu que recorri (...) (VIOMUNDO, 2014)

Após o julgamento Osmarino acabou inocentado das acusações. Ele claramente


foi processado por motivação política numa estratégia com objetivo de desqualificar sua
militância e críticas aos projetos que estão sendo implementados, principalmente na
RESEX Chico Mendes. Ele cita essa estratégia em outra entrevista, assim como uma
das formas pelas quais o movimento dos seringueiros foi desmobilizado:

(...) A criminalização é tática para o governo do estado. Ele atrelou todo o movimento.
Levou os parentes do Chico Mendes, por exemplo, que receberam cargos
comissionados e salários do governo para fazer o comercial do manejo madeireiro,
ficar contra o movimento, e defender o governo. Nós estamos resistindo a isso há
quatro décadas. (SINDISPREV-RS, 2014)

Em trecho de entrevista concedida para a UNISINOS, Osmarino relata as


condições de sua colocação, que explicitam o despropósito de acusa-lo de danificar a
RESEX:

Para você ter uma ideia, eu tenho mil e duzentos hectares de floresta, e as árvores
têm mais de cem anos. Conheço pessoas que estão com noventa anos e ocupam
aquela área muito antes de mim. Eu vivo da castanha, do látex, da caça, dos produtos
que vendo. Não preciso desmatar a área para sobreviver. Se eu vivo de ovos, por que
vou matar a galinha? Sustentabilidade é isso: diversificar a produção de uma região,
fazer ela gerar riqueza, gerar economia sem ameaçar a fonte de renda. Só que o
manejo da madeira e a construção das hidrelétricas estão destruindo a fonte de renda
de muitas pessoas e ameaçando a vida de gerações futuras. (IHU, 2012).

Ele se opõe as estruturas de poder que gerem a RESEX e da forma como o


ICMBio conduz o processo:
(...) Uma lei do Sistema Nacional de Unidade e Conservação (SNUC) tirou o poder
dos seringueiros de decidir sobre os projetos para a Amazônia. Antes havia um plano
de utilização que dizia que qualquer projeto para a Amazônia teria de passar primeiro

280
pelo crivo da assembleia dos seringueiros. O SNUC tirou esse poder. Hoje, quem
decide é o conselho deliberativo, criado pelas entidades governamentais. (...) hoje, o
Instituo Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio), entidade criada pela Marina Silva
para fiscalizar a floresta e as reservas extrativistas, tem criminalizado as lideranças
dos seringueiros, os quais antes podiam colocar um roçado de subsistência, e já não
podem mais queimar o roçado para plantar a lavoura para a própria subsistência. Hoje,
você não pode mais matar uma caça, porque o ICMBio está proibindo. Então, eles
estão criminalizando as lideranças e a população, fazendo terrorismo dentro da
reserva, andando armado. (SINDISPREV-RS, 2014)

Recentemente foram organizadas audiências justamente para debater as ações


repressoras do ICMBio na RESEX Chico Mendes. Cerca de 327 pessoas participaram
em Brasiléia, de uma audiência que aconteceu no dia 26 de Junho de 2015, com a
participação de políticos locais, presidentes de associações rurais, imprensa local,
moradores do município e representantes do ICMBio, com o objetivo de debater multas
aplicadas pelo órgão federal em moradores da RESEX Chico Mendes
(AUDIÊNCIA...2015; CÂMARA...2015). As multas aplicadas aos moradores da Reserva
variam de 20 mil a 1 milhão de reais, principalmente associadas ao uso do fogo e
desmatamentos, e segundo os moradores, o ICMBio os trata como “marginais”
(CÂMARA...2015). Na ocasião Osmarino colocou:

O ICMBio chega nas nossas localidades armados, como se nós fossemos bandidos.
Ali só tem pai e mãe de família, que luta diariamente pelo seu sustento e de seus filhos
(AUDIÊNCIA...2015).

Dessa audiência, um dos encaminhamento acordados foi que o ICMBio não


entre mais armado nas residências dos moradores da Reserva (AUDIÊNCIA...2015), o
que explicita o caráter repressor do órgão junto aos moradores. Em outra audiência,
realizada em Agosto de 2015, cerca de 80 moradores da Reserva e políticos locais se
reuniram novamente para debater a questão das multas abusivas do ICMBio. Dessa vez
nenhum representante do órgão compareceu à audiência (VEREADORES...2015). Os
moradores vêm recebendo multas que ultrapassam R$ 40 mil reais, inviáveis de serem
pagas pela comunidade que sobrevive muitas vezes com renda mínima
(VEREADORES...2015). Nessa ocasião, novamente os moradores acusam o ICMBio
de agirem de forma intimadora: “(...) Eles chegam às nossas propriedades nos
intimidando, avisando que temos que assinar as multas e que podemos ser presos”
(VEREADORES...2015). Segundo a reportagem, um morador recebeu uma multa de 30
mil reais por “brocar” um roçado que era menor do que o que foi considerado na
penalização. O morador coloca: “(...) não tenho condições de pagar essa multa, vivo

281
com muito sacrifício, trabalho para sustentar minha família e acho isso um desrespeito
a nós da zona rural” (VEREADORES...2015).
Devido aos conflitos causados pelo ICMBio, o Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais de Xapuri lançou nota em 26 de Agosto de 2015, em que coloca:

(...) A Lei de Crimes Ambientais não protege a tradição de manejo do solo dos povos
das florestas. Ao contrário, os coloca no mesmo patamar daqueles que desmatam
sem autorização em busca do lucro. A tradição criminaliza, enquanto o Plano de
Manejo absolve. As Leis Ambientais descaracterizam as comunidades Extrativistas e
Ribeirinhas. (...) Diante desse quadro, o ICMBio, fiscaliza e autua como criminosos
ambientais àqueles que no passado defenderam a floresta com suas próprias vidas.
Abusa do poder de autuar e amedronta moradores. Tais situações, relatadas ao
Sindicato, não se restringem a Resex Chico Mendes, pois existem relatos de
truculência em outras Unidades de Conservação em nossa Federação. (STTR
XAPURI, 2015)

Como vimos, o STTR de Xapuri mantém uma posição crítica ao ICMBio. Outra
liderança histórica que se opõe aos projetos em curso na RESEX e sofre com
desqualificações devido a isso é Dercy Telles, ex-presidente desse sindicato. Entre as
estratégias dos opositores de Dercy, tentam associa-la aos latifundiários locais,
inclusive da família que teve participação no assassinato de Chico Mendes. Em trecho
de entrevista com Duda Mendes ele demonstra essa estratégia de desqualificação:

(...) o órgão que ajudou antes muito e é o pai da história, é o sindicato, mas o sindicato,
ele distorceu o caminho, o sindicato hoje (...) sou filiado, pago, mas não me representa
mais, por que lá é mais pros fazendeiros (...) pessoas que criou problema por causa
de partido A ou partido B, daí começou a dividir né e chegar ao ponto de se virar
mesmo, e ai pra prejudicou muito nós né, por que o sindicato ele é o, pra melhor dizer,
o pai da história desse movimento, mas hoje não representa mais (...) vai ter uma
eleição no sindicato, tu vê só os cara dos fazendeiros lá votando, ela associou os
caras, caras que ajudaram a fazer todos os problemas ai tudo, hoje os cara votam lá
pra montar a diretoria (...) os fazendeiros é os cara que, não foram, não vou dizer que
foi o cara que matou, mas foi ele junto, que se organizaram através da UDR pra pegar,
matar o Chico né (...) filho dos fazendeiro tudo votando (...)

Dercy Telles critica as políticas ambientais do governo do Acre relacionadas a


pagamento de serviços ambientas:

(...) essas políticas só vem a amordaçar a vida dessas pessoas. Elas ficam sem vez
sem voz. Sem voz porque assinam um contrato que é no mínimo de trinta anos.

282
Disponibiliza a área de moradia delas por trinta anos pra que o governo e as
multinacionais pesquisem e se usufruam de todo o conhecimento da área por uma
mixaria que é insignificante. E o mais grave ainda é que elas não podem mais mexer
na área, elas não podem mais pescar, elas não podem mais tirar madeira para seu
uso, elas não podem mais caçar, elas não podem mais nada. Eu tenho acompanhado
o desenvolvimento dessas políticas, inclusive no Pará, que tem situações aonde um
morador foi preso por abater uma árvore pra fazer uma canoa pra pescar. Então, na
minha opinião, essas políticas nada mais é do que o confinamento dessas populações
dentro do seu próprio território, fazendo com que futuramente elas desistam, porque
não faz sentido você viver no meio de uma floresta sem poder usufruir dos bens que
ela te oferece. A vida não faz sentido (...) (CIMI, 2012b, p. 39).

Ela também faz críticas ao manejo florestal e a outras políticas do governo. Em


nota lançada pelo STTR de Xapuri na época em que era presidente ela coloca:

O Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Xapuri, que luta desde de 2006 contra o
projeto do governo do Estado do Acre e das empresas madeireiras, que sob a batuta
do desenvolvimento sustentável planejaram a exploração na Reserva Extrativista
Chico Mendes para exportação, compreendendo que na lógica do capital não existe
sustentabilidade (...) (COMBATE RACISMO AMBIENTAL, 2012).

A Comissão Pastoral da Terra (CPT) que acompanha diversos conflitos no


campo no Acre, inclusive em projetos de manejo florestal (FAUSTINO; FURTADO,
2015), tem seus agentes pastorais sofrendo constante ameaças de morte e sua sede já
foi depredada diversas vezes. Segundo o Caderno de Conflitos no Campo de 2013:

(...) Os constantes ataques à sede da CPT Acre, seis invasões entre 2011 e 2013,
sendo duas em janeiro de 2013, são consequência das denúncias realizadas sobre
conflitos em áreas de plano de manejo. (CPT, 2014, p. 88)

Em 2012, a pastoral teve sua sede invadida 2 vezes no intervalo de 15 dias e


segundo a reportagem realizada por Altino Machado, à época, a coordenação da
pastoral suspeitava de ser uma represália com relação a apoio dado a comunidades
que sofreram impactos de manejo florestal na bacia do Riozinho do Rola, inclusive com
o encaminhamento de documento para o MPE do estado (BLOG DA AMAZÔNIA, 2012).
Segundo a reportagem:

A coordenadora da CPT suspeita que a invasão escritório esteja relacionada ao apoio


da entidade aos posseiros que denunciaram danos ambientais causados no Riozinho
do Rola pelo manejo de madeira da Laminados Triunfo Ltda., do empresário Jandir
Santin, que se instalou no Acre em 2004 e beneficia madeira para exportação. (BLOG
DA AMAZÔNIA, 2012)

283
Já em 2013, em nota pública lançada em Janeiro, denuncia:

(...) Na madrugada do dia 20 para o dia 21 de janeiro último, a sede da CPT do Acre
foi invadida. O local foi destelhado e o forro destruído para permitir o acesso às
dependências. Foram roubados computadores, data show, impressoras, máquinas
fotográficas, além de muitos documentos (CPT, 2013a)

Ainda nesse nota, sobre a recorrência desse tipo de ação coloca:

(...) Com esses dois últimos episódios, já são seis os casos de invasões na sede da
CPT no Acre nos últimos dois anos. Julgamos importante destacar o fato dessas
invasões à sede terem se intensificado após a CPT denunciar irregularidades em
planos de manejo florestal e ação de fazendeiros e madeireiros no estado do Acre e
sul do Amazonas, questionando o latifúndio e as novas formas de apropriação dos
meios naturais coletivos para transformá-los apenas em capital para alguns (...)
Somadas às recorrentes invasões, ameaças foram direcionadas ao agente pastoral
que atua no município de Boca do Acre (AM), Cosme Capistano da Silva, bem como,
a Maria Darlene Braga Martins, coordenadora da CPT na região (...) Os signatários
acreditam que as ameaças de morte são feitas tendo em vista a atuação da CPT Acre
nas áreas onde há conflito envolvendo seringueiros, pretensos donos das terras,
grileiros, fazendeiros e madeireiros. (CPT, 2013a).

Logo em seguida, no mesmo mês a CPT novamente sofreu um ataque e


denunciou:

Pela sétima vez a sede da CPT em Rio Branco, Acre, foi invadida nessa madrugada.
É a quarta invasão somente no mês de janeiro desse ano. Em nota divulgada (...), a
CPT Nacional, o CIMI e a Comissão 8 da CNBB, já haviam denunciado esse claro
sinal de coação contra o trabalho da pastoral no estado (...) (CPT, 2013b)

O Conselho Indigenista Missionário (CIMI), por ter uma posição crítica à política
indigenista do governo do Acre e ONGs indigenistas com atuação local é outra entidade
pastoral que já sofreu ameaças e teve sua sede invadida e depredada mais de uma vez.
A sede da pastoral foi atacada em Setembro de 2014 e em nota publicada no dia 24 do
mesmo mês, o CIMI coloca:

Nós, do Conselho Indigenista Missionário Regional Amazônia Ocidental, entendemos


que nosso trabalho mexe com interesses poderosos capazes de tudo para
continuarem a espoliação dos territórios e subjugando povos e comunidades.
Entretanto, denunciamos e repudiamos toda e qualquer forma de violência, seja contra
os povos indígenas e trabalhadoras e trabalhadores das comunidades, seja seus
apoiadores e aliados, como é o caso do Cimi (CIMI, 2014a)

284
Em nova nota emitida após a segunda invasão em Outubro de 2014, a pastoral
declara:

O Conselho Indigenista Missionário (Cimi) vem a público manifestar preocupação


diante da recorrente invasão da sede do Regional Amazônia Ocidental da entidade,
localizada no município de Rio Branco, no Acre. O escritório, que havia sido invadido
na madrugada do dia 22 de setembro, sofreu nova invasão no dia 13 de outubro. Tudo
faz-nos crer que os invasores não buscam simplesmente bens econômicos, haja vista
a intensa desordem provocada no escritório. (...) Importante é salientar que fatos
análogos ocorreram em relação ao escritório da Comissão Pastoral da Terra (CPT),
no mesmo município, que foi invadido sete vezes no período compreendido nos anos
2012 e 2013 (CIMI, 2014b)

Em entrevista concedida a rádio EBC, o coordenador do CIMI Amazônia


Ocidental, Lindomar Padilha analisa o que o CIMI vêm sofrendo no Acre:

(...) o que a gente quer colocar é que fazem isso conosco, estamos em uma instituição
ligada à igreja católica e historicamente é comprometida com o poder nesse país (...)
então se fazem isso conosco que somos de uma instituição forte, historicamente
estruturada como a igreja católica, imagina o que eles não fazem com, nas
comunidades indígenas, nas comunidades ribeirinhas onde esses povos, essas
comunidades não tem a menor assistência, não tem ninguém. Se fazem isso conosco,
imagina o que não fazem com esses povos, então a gravidade ainda é maior nesse
sentido, por que por exemplo do ponto de vista de bens materiais, entendeu, o prejuízo
é mínimo, mas isso nos remete a uma questão política e histórica, o que está em
questão é intimidação dos povos indígenas, a intimidação dos trabalhadores e
trabalhadoras rurais, isso que nós precisamos remeter (...) (EBC, 2014).

Ainda sobre os ataques ao CIMI, Lindomar fala dos impactos e destaca o


carácter dessa violência:

(...) da primeira vez, roubaram nossos sistemas de backup dos nossos computadores,
levaram, as nossas informações que estavam contidas nos nossos computadores,
dessa vez levaram alguns documentos e outros foram queimados, inclusive
documentos históricos, ao longo de 40 anos de nossa atuação, nós perdemos muito
material de filmagem, material de fotos, enfim, foram queimados e outros danificados
e outros simplesmente foram levados, então é completamente do ponto de vista
material, é claro, evidente que a gente lamenta por esse aspecto, mas o aspecto mais
importante a se destacar são mesmo as violências contra o processo de construção
de uma sociedade que realmente fosse voltada para os interesses dos povos e
comunidades tradicionais e isso que é o grave, quer dizer, ao nos atingir, na verdade
não estão nos atingindo apenas, estão atingindo a ideia que a gente ajuda, procura

285
ajudar a construir, que é de um povo, de vários povos com autonomia, com sua
liberdade, com seus direitos respeitados, suas terras definidas e os modos de vida
preservado (...) (EBC, 2014).

Lindomar também comenta os ataques sofridos pela CPT e a gravidade dos


conflitos que ocorrem no Acre:

(...) em um ano, a CPT aqui do Acre foi invadida por 7 vezes (...) é gravíssimo, como
eu volto a dizer, não pelo aspecto da invasão em si, por que isso na verdade é um
atentado contra os direitos dos povos e comunidades tradicionais, ribeirinhos, das
trabalhadoras e trabalhadores rurais, não é possível que em pleno século 21, nós
tenhamos que ter relação com a posse da terra, com a construção de modos de vida
próprios ainda a bala e a fogo e a espada, isso nós não podemos mais assistir em um
estado de direito em que os direitos deveriam ser respeitados (...) (EBC, 2014).

Em uma das falas sistematizadas pela missão da plataforma DHESCA, uma das
lideranças indígenas do Povo Huni Kui também denuncia ameaças sofridas por aqueles
que não compactuam com as políticas propostas no Acre:

(...) os líderes estão sendo criminalizados por se oporem ao projeto, e as comunidades


são informadas de que os serviços prestados nas áreas de educação, transporte ou
saúde serão suspensos se eles se oporem ao projeto (FAUSTINO; FURTADO, p. 73)

Apesar da violência e repressão realizada com aqueles que se opõe as políticas


ambientais como as que são realizadas no Acre, iniciativas para dar mais visibilidade
para crítica, resistência e luta contra esse tipo de política são realizadas. Em 2011, 28
organizações de diversos tipos, entre sindicatos, pastorais sociais, organizações
indígenas entre outras, tanto locais como regionais, nacionais e internacionais se
reuniram em Rio Branco, no Acre para debater as políticas ambientais focadas em
mecanismos de mercado como acontece no Acre. A oficina foi intitulada: “Serviços
Ambientais, REDD, e Fundos Verdes do BNDES: Salvação da Amazônia ou Armadilha
do Capitalismo Verde?”. Desse encontro, saiu a Carta do Acre81 com o posicionamento
do coletivo de organizações que participaram desse encontro em que destacamos
alguns pontos. A carta analisa o bloco de poder hegemônico no Acre:

(...) Percebemos a formação de um consenso em torno da ideia de que, desde 1999,


com a eleição do governo da Frente Popular do Acre (FPA), foram tomadas iniciativas
para a implantação de um “novo modelo” de desenvolvimento. Desde então, tal

81 Disponível na íntegra nos na seção dos anexos.

286
modelo é celebrado como primor de harmonia entre desenvolvimento econômico e
conservação da floresta, de seus bens naturais e do modo de vida de seus habitantes.
Com forte apoio dos meios de comunicação, de sindicatos, de ONGs promotoras do
capitalismo verde na região amazônica, de bancos multilaterais, de oligarquias locais,
de organizações internacionais, ele é apresentado como “modelo exitoso” a ser
seguido por outras regiões do Brasil e do mundo (CARTA DO ACRE, 2011, p. 1)

Outro ponto destacado é a formulação e implementação do SISA e seu impacto:

(...) Ressaltamos que, além de desprovida de amparo constitucional, a Lei N° 2.308,


de 22 de outubro de 2010, que regulamenta o Sistema Estadual de Incentivo a
Serviços Ambientais foi criada sem o devido debate com os setores da sociedade
diretamente impactados por ela, isto é, os homens e mulheres dos campos e floresta.
Reproduzindo servilmente os argumentos dos países centrais, os gestores estatais
locais a apresentam como uma forma eficaz de contribuir com o equilíbrio do clima,
proteger a floresta e melhorar a qualidade de vida daqueles que nela habitam. Deve-
se dizer, entretanto, que a referida lei gera “ativos ambientais” para negociar os bens
naturais no mercado de "serviços ambientais", como o mercado de carbono. Trata-se
de um desdobramento da atual fase do capitalismo cujos defensores, no intuito de
assegurar sua reprodução ampliada, lançam mão do discurso ambiental para
mercantilizar a vida, privatizar a natureza e espoliar as populações do campo e da
cidade (CARTA DO ACRE, 2011, p. 2).

Sobre a dinâmica dos mecanismos do capitalismo verde e os impactos sobre


territórios a Carta aponta:

(...) Os destruidores seriam agora os grandes defensores da natureza. E aqueles que


historicamente garantiram a conservação natural são, agora, encarados como
predadores e por isso mesmo são criminalizados. Não surpreende, portanto, que
recentemente o Estado tenha tornado mais ostensiva a repressão, a perseguição e
até expulsão das populações locais de seus territórios. Tudo para assegurar a livre
expansão do mercado dos bens naturais (CARTA DO ACRE, 2011, p. 3).

Também é destacada a apropriação da imagem de Chico Mendes:

(...) Dentre os mecanismos utilizados a fim de legitimar essa ordem de coisas, ganha
destaque a manipulação da figura de Chico Mendes. A crer no que nos apresentam,
deveríamos considerá-lo o patrono do capitalismo verde. Em nome do seringueiro,
defende-se a exploração de petróleo, o monocultivo da cana-de-açúcar, a exploração
madeireira em larga escala e a venda do ar que se respira (CARTA DO ACRE, 2011,
p. 4).

287
Por fim, a Carta explicita quem são os beneficiados por esse tipo de política
ambiental e aponta para as bandeira de luta que permanecem vivas pelos que resistem
a esse tipo de espólio e exploração:

(...) Ante tal quadro, cumpre perguntar o que mais não caberia nesse modelo de
“desenvolvimento sustentável”. Talvez em nenhum outro momento os pecuaristas e
madeireiros tenham encontrado cenário mais favorável. É por essa razão que cremos
necessário e urgente combatê-lo posto que, sob aparência de algo novo e virtuoso,
ele reproduz as velhas e perversas estratégias de dominação e exploração do homem
e da natureza (...) deixamos aqui nossa reivindicação pelo atendimento das seguintes
demandas: reforma agrária, homologação de terras indígenas, investimentos em
agroecologia e economia solidária, autonomia de gestão dos territórios, saúde e
educação para todos, democratização dos meios de comunicação. Em defesa da
Amazônia, da vida, da integridade dos povos e de seus territórios e contra o REDD e
a mercantilização da natureza. Estamos em luta. (CARTA DO ACRE, 2011, p. 4).

Além dessas iniciativa, que deu mais visibilidade para os conflitos territoriais que
estão ocorrendo no Acre, missões promovidas para averiguar violação de direitos
humanos e conflitos também foram realizadas, produzindo importantes informações e
documentos. Ao longo dessa dissertação eu já me referi diversas vezes ao relatório
produzido pela Plataforma DHESCA que teve como objetivo justamente registrar e
denunciar as violações aos diretos humanos cometidas pelas políticas promovidas no
Acre. Especialmente com relação a repressão de quem se opõe as políticas
implementadas, a Relatoria recomenda ao Ministério Público Federal (MPF) que apure
as denúncias de ameaças físicas e psicológicas às lideranças e as coletivos que
denunciam as contradições da política executadas e coloca:

(...) chama atenção as constantes denúncias e os receios dos sujeitos que questionam
os projetos de economia verde de perseguição, tensão e vigilância institucional contra
os grupos críticos a essas políticas. De toda forma, ficou evidente para essa Relatoria
a baixa capacidade dos representantes dos entes públicos de reconhecerem os
problemas e limitações das ações desses órgãos, que é acompanhada da
desqualificação generalizada das críticas e de um notório esforço em construir uma
espécie de “blindagem”, não havendo um esforço de reflexão autocrítica (Relatoria
FAUSTINO; FURTADO, 2014, p. 103)

Além dessa missão, destacamos as missões realizadas pela organização World


Rainforest Movement (WRM) e parceiros que também averiguaram conflitos no Acre,
principalmente relacionados ao manejo de madeira (OVERBEEK, 2013) e projetos
privados de REDD (CM AMAZÔNIA, 2013a).

288
4.4. Novo padrão de conflitividade no Acre: Conflitos territoriais e perda da
autonomia dos povos da floresta

A partir do que foi exposto acima nesse capítulo, podemos destacar algumas
questões que nos levam a creem que atualmente observamos um novo padrão de
conflitividade no Acre. Esse padrão é associado com as novas formas em que se
articulam os momentos de produção do espaço com as formas atuais de
acumulação capitalista.
No início do presente capítulo fizemos um esforço para demonstrar que o debate
sobre desmatamento realizado pela maioria das entidades e organizações envolvidas,
tem influência de setores que participam do bloco hegemônico de poder no Acre, parte
do agronegócio. A formulação das políticas ambientais de comando e controle com
proibições e multas e de incentivos passa por essa questão e vemos aqui como a
dimensão do espaço concebido, com os ordenamentos territoriais, planejamentos,
regulamentações e políticas públicas, influência na produção do espaço atualmente no
Acre. Um claro exemplo disso é a importância estratégia que dados obtidos por
geoprocessamento nas definições de políticas de redução de desmatamento, algo que
faz com o que o Acre fortaleça seu próprio órgão, a UCEGEO. Isso se dá através de
verticalidades, as vezes trazidas por ONGs ou Bancos de escala internacional, que
não dialogam com o espaço vivido dos seringueiros e agricultores familiares, que por
exemplo, tem o fogo como aliado na reprodução das condições de vida, o que também
demonstra uma dimensão epistêmica do conflito. São as ONGs ambientais que são
reconhecidas por conhecer as “boas práticas” a partir do seu conhecimento técnico-
científico. O campo ambiental, hegemonizado por essa concepção técnico-científica
legitima esse processo.
Como debates que o território tem relação com um processo de apropriação e
dominação relacionados uma determinada correlação de forças, podemos afirmar
que conflitos de ordem territorial ocorrem quando a autonomia sobre o território é
enfraquecida, como vimos com relação tanto as proibições de uso de bens (áreas
imobilizadas para manejo de madeira ou créditos de carbono), técnicas (por exemplo
fogo) mas também quando os sujeitos desses territórios sofrem uma ingerência sobre
que cadeias produtivas adotar e são integrados em arranjos em que as decisões não
passam por suas próprias instâncias deliberativas. Podemos observar o que Rosa
Luxemburgo (1981) chamou de guerra contra economia natural, em que a destruição
de formas de reprodução da vida sem a mediação pelo dinheiro são substituídas por
formas que fazem o capital circular, como por exemplo com o pagamento de serviços
ambientais.

289
Quando falamos da imobilização de partes de territórios e a extração de bens
que não geram benefícios para as comunidades que habitam esses espaços, como no
caso do manejo florestal comunitário, estamos falando de um processo de
acumulação por espoliação. Processo este que está articulado com outras formas de
acumulação através do desenvolvimento das cadeias produtivas através das PPPC.
Quando pensamos no arranjo da cadeia do peixe, que envolve desde dinheiro
provindo das reduções de emissões, através do programa REM do KfW, de latifundiários
locais que investem na Peixes da Amazônia S.A., de um banco nacional de
desenvolvimento, o BNDES, para construção de um grade complexo agroindustrial, de
um fundo privado de investimentos, de uma empresa mista com participação do
governo estadual e a integração das comunidades em escala refinada através diversas
associações e pequenas cooperativas organizadas em uma central de cooperativas,
vemos a complexidade e refinamento do processo de acumulação capitalista no Acre.
Aqui a dimensão do espaço percebido demonstra os arranjos de produções e
reprodução que produzem novos espaços capitalistas no Acre. Um processo de
atrelamento da chamada “economia verde” ou setores da “floresta em pé” com a
“economia marrom”, setores da “extração destrutiva”.
O novo padrão de conflitividade se dá por que esse processo é distinto do que
tivemos, principalmente, nas décadas de 70 e 80, em que os conflitos resultavam em
assassinatos e uma espoliação mais explícita com a expulsão de famílias e a derrubada
da floresta. Os conflitos atuais são predominantemente menos explícitos, visto que
muitas vezes as comunidades que são afetadas são integradas nos projetos, como no
caso do manejo florestal comunitário ou piscicultura, e teoricamente estão sendo
beneficiadas com renda e participação nos lucros das empresas.
Temos um processo perverso de quebra da autonomia dos territórios e expansão
do capital que concentra terra e renda, legitimado pela transfiguração do legado da luta
dos movimentos sociais do Acre, em que o uso da imagem de Chico Mendes é o
exemplo mais claro. Ao mesmo tempo, esse processo reprime quem se opõe ao projeto
da Frente Popular e o bloco hegemônico no poder, com desqualificações, ameaças e
criminalização de lideranças, como vimos acima. O espaço concebido por essa
retórica do “desenvolvimento sustentável” está em conflito com o espaço vivido dos
que ainda tentam sustentar as bandeiras dos movimentos sociais e sindicatos da
década de 70 e 80 de defesa das trabalhadoras, trabalhadores e povos da floresta, uma
reforma agrária que contemple esses povos e a defesa da autonomia em seus
territórios.

290
5. CONCLUSÕES – SÍNTESE E APONTAMENTOS

A experiência do Acre é singular no que diz respeito a luta dos povos da floresta
e as conquistas históricas nesse processo. Durante a década de 70 e 80, o estado
passou por intensos conflitos relacionados a política de expansão do agronegócio em
que muitas pessoas foram assassinadas, dentre elas lideranças históricas dos
sindicatos e movimentos sociais como Chico Mendes e Wilson Pinheiro. Mas com uma
resistência organizada e a formulação de táticas de luta como os Empates, o movimento
seringueiro em aliança com outros, como por exemplo os indígenas, conseguiu alterar
a correlação de forças no estado e barrar a expansão do agronegócio sobre seus
territórios e mais, formulou uma nova concepção de reforma agrária, dialogando com o
modo de vida dos seringueiros e demais povos da floresta, a paradigmática ideia de
Reserva Extrativista. Devido a essa incrível luta, praticamente metade do estado foi
destinado a unidades de conservação e terras indígenas.
As RESEX foram institucionalizadas e a partir de então, um maior diálogo com o
Estado e outras organizações, necessário para garantir a viabilização dessas reservas,
gerou novos desafios para o movimento seringueiro no Acre. Ao mesmo tempo, o
processo de expansão do capital fluiu por outros meios, já que a forma “tradicional” de
espoliação e acumulação implementada na Amazônia sofreu um duro golpe no Acre
com a vitória dos povos da floresta. Aqui começa a se desenvolver um novo padrão de
conflitividade no Estado, menos explícito do que o que ocorreu na década de 70 e 80,
com os muitos assassinatos e derrubadas de áreas de floresta para o latifúndio,
caracterizado predominantemente por conflitos relacionados a perda, por parte do
povos da floresta, de autonomia e gestão sobre os territórios.
A aproximação entre os movimentos sociais e sindicatos com ONGs
internacionais no final da década de 80 e início da década de 90, que gerou um processo
de desmobilização através da “cooperação” e “assessoria” as organizações sindicais e
demais instrumentos de luta, articulado a aproximação do campo técnico-científico
estadual e parte da elite local, criou as bases para que no final da década de 90, um
grupo representado pela Frente Popular do Acre chegasse ao governo do estado e a
partir daí hegemonizasse a política. Isso se deve em parte a prioridade dada pelo PT a
via institucional, promovendo uma política de conciliação de classes e uma frente ampla
de alianças (inclusive com o setor dessas ONGs ambientalistas e seus financiadores),
e também contribuiu para a desmobilização do trabalho de base e o enfraquecimentos
das lutas populares, com lideranças passando a compor o governo.
Uma nova correlação de forças vai se desenhando em que os setores populares
perdem muita força. Com o PT, um novo grupo da burguesia interna acreana ascendeu

291
ao poder, não mais o estereótipo do fazendeiro “de bota suja”, mas sim o “moderno
empreendedor” apoiado na ciência e na técnica rumo ao “desenvolvimento sustentável”.
Isso, aliado a maior influência de grandes programas como PPG-7 do BIRD e PDSA do
BID, foi fundamental para entendermos as políticas ambientais que foram formuladas a
partir de então.
A legitimação do projeto implementado pela Frente Popular é feita pelo uso da
imagem de Chico Mendes e da luta socioambiental dos povos da floresta. O discurso
de luta é apropriado e subvertido, num processo de confluência perversa, legitimando o
desenvolvimento do capitalismo no Acre.
O caso acreano é importante de ser analisado até porque o que ali está se
desenhando o foi nas circunstâncias históricas e não que houvesse um projeto prévio
que ali fosse implantado. Não, o que vem sendo posto em prática pelo bloco de poder
que se estrutura formalmente em torno da Frente Popular, é um projeto de controle
social que assimila, por cima, toda a força vinda de baixo criada pelos movimentos
sociais, o que lhes empresta grande legitimidade. Isso articulado a um discurso que
busca afirmar o “desenvolvimento sustentável” onde todos devem ser integrados e
beneficiados no projeto. Não devemos perder de vista que boa parte dessas agenda
técnico-política vem sendo elaborada junto aos organismos multilaterais e por grandes
ONGs nacionais e internacionais que vêm desempenhando um papel orgânico na nova
governança no direcionamento dado pelo projeto de desenvolvimento proposto para o
estado.
Com a formulação do Zoneamento Ecológico-Econômico, primeira grande
política elaborada durante a gestão da Frente Popular, se explicita as alianças que
garantem a hegemonia desse bloco de poder, quando o ordenamento territorial
realizado gera um pacto que destina áreas para os setores do agronegócio e também
para os setores do capital mais associados a exploração dos bens florestais. Isso gera
as condições para que atualmente, as políticas ambientais beneficiem mutuamente
esses setores como vimos com relação a pecuária no estado. O dinheiro provindo dos
créditos de redução de desmatamento e emissões do SISA, são aplicados em um
programa de pecuária “sustentável”. Isso é possível pela forma com que foi pensada a
arquitetura e a distribuição de “incentivos” do sistema.
Esse processo é articulado a um enfraquecimento dos movimentos sociais e
sindicados e integração dos povos da floresta a cadeias produtivas de interesse dos
setores hegemônicos no estado. Algumas das organizações que lutaram primeiro para
conquistar as reservas extrativistas e depois para conseguir realizar um projeto de
autonomia dentro das mesmas, hoje devido a esse processo de fragilização e
confluência perversa e uma falência do “projeto RESEX” daquela época, são

292
mediadoras da penetração das políticas do bloco hegemônico nos territórios,
juntamente com as ONGs ambientais. Muitas comunidades sofrem com a ausência de
amparo do Estado e políticas públicas, não tendo muita opção se não aceitar as políticas
para as quais são direcionadas. Através das Parcerias Público-Privadas-Comunitárias,
arranjos aplicados a diversas cadeias produtivas do estado como madeira, castanha,
borracha, criação de pequenos animais e piscicultura, o bloco hegemônico consegue
direcionar segundo seus interesses, a produção de áreas como assentamento rurais,
terras indígenas e reservas extrativistas, gerando conflitos territoriais e perda de
autonomia das populações que habitam esses territórios. Além disso, uma política
repressiva de órgãos ambientais apoiada por ONGs ambientais proibi o uso do fogo,
fundamental para garantia da soberania alimentar para os povos da floresta. As florestas
se transformam em “ativos ambientais” e os povos da floresta em “provedores de
serviços ecossistêmicos” que devem ser beneficiados através do fortalecimento de
“cadeias produtivas sustentáveis”, integrando-os a grandes projetos agroindustriais
controlados por grandes empresários e latifundiários do estado.
Outro ponto importante é que o Acre implementa esse projeto com base em
muitos empréstimos, parte deles internacionais, como por meio do BID e BIRD, gerando
um grande endividamento do estado, além de grande influência dessas instituições no
ordenamento territorial do estado (SOUZA, 2011). O estado contrai dívidas, investe nas
cadeias produtivas, criando grandes agroindústrias e depois praticamente “doa” para
iniciativa privada o que foi construído com dinheiro desse empréstimos, o que pode ser
visto como mais um processo de acumulação por espoliação.
O SISA tem diversos braços, como um “polvo”, que atingem tanto as
propriedades privadas como também assentamentos, terras indígenas, unidades de
conservação e áreas em disputa. Ele é um elo e catalisador para “desbloquear as
finanças florestais” e gerar um “custo de oportunidade” atrativo, ou seja, mercantilizar e
precificar os bens e interações sociais e ambientais gerando capital que pode ser
investido nas cadeias do agronegócio, através da atuação da CDSA e ANAC, em um
processo que gera espoliação dos bens nos territórios e exploração da força de
trabalhos das comunidades. Aqui a um grande refinamento e perversidade, visto que
esse processo se dá de forma “velada” e reforçada pelo discurso do desenvolvimento
sustentável ou “de baixas emissões” e pela apropriação e desfiguração do que foi o
legado da luta dos povos da floresta.
Do ponto de vista do epistêmico-político, vemos como o corpo técnico das ONGs
de diversas escalas de atuação e do governo do estado deslegitima o saber popular
com projetos de promoção de “boas práticas” para o manejo dos bens da floresta. O
saber técnico-científico com sua promoção de “eficiência” se impõe através de relações

293
de poder numa correlação de forças desigual, enquanto outras formas de produção de
conhecimento são aceitas apenas no discurso mas não na hora de decidir a gestão do
território e dos bens naturais. Outro ponto importante dessa dimensão do conflito é que
o SISA propõe uma redução da vida na sua complexidade a preços e mercadorias que
podem ser comercializadas. A biodiversidade, interações ecológicas e sociais devem
ser traduzidas em “métricas” possíveis de padronizar commodities para os mercados
globais. Uma violência objetiva e simbólica sem tamanho. Como até o momento essas
métricas ainda estão sendo elaboradas, o carbono, que já está mais avançado nesse
processo se transformou em grande referência. Aqui a reflexão de Camila Moreno
(2009) nos ajuda a pensar esse processo quando coloca que o debate sobre mudanças
climáticas e consequentemente a redução de emissões de dióxido de carbono
funcionam como um novo eixo estruturante para uma narrativa moderno-colonial. Ela
coloca:

(...) A cooptação das comunidades e organizações para este projeto é o que defino
como a “catequese do carbono”. Comparável em escala e escopo à entrada das
missões jesuíticas na região amazônica nos séculos XVII e XVIII, atualmente o
universo indígena amazônico, suas formas de vida e suas cosmologias estão sob uma
investida similar à da evangelização cristã e colonial. Através deste evangelho
contemporâneo, além da floresta – visto por seu potencial como sumidouro e estoque
de ‘carbono’ - tem o propósito de criar valores crematísticos e mercados para os
‘serviços ambientais’, e seus respectivos mercados: água, biodiversidade e
conhecimentos tradicionais. Os Povos Indígenas em sua autonomia política, cultural
e espiritual ficam reduzidos a “prestadores de serviços”, “guardiães da floresta” ou
ainda “guardiães do carbono florestal” e assim subjugados como sujeitos políticos.
(MORENO, 2009, p.7)

De forma geral, vemos um processo articulado de expansão e penetração do


capital no Acre em três movimentos articulados que geram o padrão conflitivo atual: i)
por um lado, um movimento mais explícito em que os territórios são imobilizados, devido
as políticas de redução de desmatamento e também exploração de bens como madeira,
impedindo que os que ali habitam possam usufruir dos bens e realizar as práticas como
a agricultura de coivara, necessários para reprodução das condições de vida. Aqui as
populações são direcionadas a comprar bens necessários através de PSA, gerando
uma maior penetração do capital em espaços antes não tão mediados por dinheiro; ii)
por outro lado, um processo que é menos explícito, de integração dos que habitam os
territórios, de forma subordinada, a cadeias produtivas prioritárias para o bloco
hegemônico como por exemplo a cadeia da madeira e do peixe, gerando um processo
de perda de autonomia; iii) o terceiro movimento, estimulado por recursos gerados pelo

294
primeiro e segundo, gera uma modernização conservadora do agronegócio,
marcadamente da pecuária extensiva.
Esse processo não ocorre sem resistências e a explicitação dos conflitos. Hoje,
os que discordam da visão do bloco no poder desde 1999 são alijados, quando não
criminalizados, como vimos recentemente com um desses líderes e também com os
atentados sofridos por duas entidades, como a CPT e o CIMI, que sempre estiveram ao
lado dos seringueiros e dos indígenas e que, hoje, mantém independência diante do
governo da frente popular e dos movimentos a ele assimilado.
Uma das principais contribuições dessa pesquisa é demonstrar de maneira
empírica que o modelo proposto pela chamada “economia verde” ou de um
“desenvolvimento com baixas emissões”, ou como aqui apelidamos “floresta em pé”,
não é contraditório, mas sim sinérgico com o modelo da chamada “economia marrom”
ou “extração destrutiva” do agronegócio, mineração, hidroelétricas, obras de
infraestrutura e assim por diante. Hoje, cada vez mais as ONGs ambientais que provem
o “o desenvolvimento sustentável” se aliam explicitamente as empresas do agronegócio.
Um exemplo disso é o “Katoomba Group” uma articulação internacional coordenada
pela ONG Forest Trends. Em um dos seus encontros de 2014, realizado em Foz do
Iguaçu com o tema “desenvolvendo cadeias de fornecimento de commodities
sustentáveis” tivemos a participação ativa de ONGs como Forest Trends, TNC, GTA,
IPAM, IDESAM e empresas como Marfrig Group, McDonald’s, Syngenta, Grupo Amaggi,
Nestlé, Monsanto, JBS, Cargill entre outras.
Mas essa relação nem sempre é explícita o que pode gerar leituras, na nossa
opinião, equivocadas de conjuntura e de potenciais aliados e inimigos. Falamos isso
com base, por exemplo, no caso da Coordinadoria de las Organizaciones Indigenas de
la Cuenca Amazónica (COICA), importante articulação dos povos indígenas da América
Latina, mas que opta por se aliar a um conjunto de ONGs e empresas associadas aos
mecanismos de mercado de carbono e pagamento por serviços ambientais por
avaliarem que esses teriam um projeto distinto dos grandes empreendimentos que estão
ameaçando os povos indígenas em toda América Latina, como as obras de
infraestrutura e monocultivos do agronegócio. A COISA, com assessoria de ONGs como
Forest Trends, EDF, WWF entre outras, elaborou uma proposta de “REDD indígena”, o
qual submeteu como proposta na COP20 em Lima em 2014 e consiste:

(...) propomos o respaldo oficial ao REDD+ Indígena Amazônico (RIA) e seus setes
projetos pilotos em 5 países com mais de 5 milhões de hectares (...) com a aplicação
prática e sustentável de uma busca por formalizar um “REDD+ de benefícios e
mecanismos, muito além do carbono e do mercado”. O RIA baseado nos princípios
de segurança e consolidação territorial, livre determinação, fundos públicos regulados

295
(sem offset), salvaguardas desde começo, integração com adaptação, consulta
vinculante, entre outros. Nós amazônicos, avançamos com uma alternativa própria
dentro do REDD+ aplicando o direito de adequação de políticas públicas
contemplando o Convênio 169 da OIT (REDD+...2014, tradução nossa)

A COICA aposta em garantir mecanismos de “salvaguardas”, consentimento


livre prévio e informado, investimentos de fundos públicos regulados em planos de
gestão territorial sobre o controle das organizações indígenas assim resguardando seus
direitos e autonomia. Mas como vimos com a experiência do Acre essas “adequações”
nos mecanismos de REDD+ podem não garantir efetivamente essas condições. Além
de toda a perversidade desse tipo de mecanismos do ponto de vista econômico e
epistêmico-político que já debatemos, a correlação de forças dentro dessas parcerias
da COICA com essa grandes ONGs e os bancos que as financiam não garantem que
elas consigam direcionar a implementação dessa proposta de “REDD+ indígena”. Para
além de todos esses riscos, como colocamos, o REDD não representa uma alternativa
ao projeto de desenvolvimento em curso que espolia e explora os territórios da América
Latina, mas sim uma potencialização desse processo. Empreendimentos como
hidroelétricas, por exemplo, também se articulam e podem ser beneficiados por esse
tipo de mecanismo como é o caso da Hidroelétrica de Jirau que entrou com solicitação
para obtenção de créditos de carbono através do mecanismo de desenvolvimento limpo
(MDL) (FEARNSIDE, 2014). Além disso, dentro da perspectiva de incentivo das “cadeias
produtivas sustentáveis” nessa dinâmica do capitalismo verde, empresas como a
Unilever que obtém grande parte da matéria prima para seus produtos através de
empreendimentos do agronegócio que geram conflitos em todo o mundo, é uma das
principais empresas que as ONGs ambientais querem se aliar. Foi emblemático
presenciar em mesa de um evento, realizado em Rio Branco em 2014, de promoção
dos sistemas jurisdicionais de REDD promovido pela “Força Tarefa dos Governadores
para o Clima e Floresta” ou “GCF Task Force”, uma representante da Unilever falando
que a empresa tem como meta adquirir toda sua matéria prima de “cadeias produtivas
sustentáveis”, lembrando que o monocultivo de palma africana que tem gerado muitos
conflitos na América Latina é promovido por essa empresa, e na mesma mesa, uma das
lideranças da COICA que falou da proposta do REDD+ Indígena que seria apresentada
na COP20 de Lima no final daquele ano. Dentro do campo ambiental que já debatemos
que é extremamente complexo e heterogêneo, confluências perversas e dificuldades de
identificação dos aliados e inimigos pode gerar um aprofundamento da desmobilização
da luta pela garantia dos territórios e direitos.
Consideramos que a questão central colocada por essa dissertação é o ataque
a autonomia e bens dos territórios que são ainda fronteiras para a acumulação do

296
capital. Como já colocamos, o capital em sua dinâmica de acumulação, se expande
constantemente, lidando com suas próprias crises, e se apropria sempre de novos áreas
produzindo novos espaços capitalistas. Os mecanismos do SISA que debatemos são
mais uma forma de expansão do capital articulada e potencializando os outros
processos de acumulação. Esse processo gera conflitos territoriais com o ataque aos
modos e condições de reprodução da vida dos povos em seus territórios. É fundamental
manter a perspectiva crítica e combater esse tipo de “proposta”, uma armadilha para as
organizações e territórios como faz por exemplo a articulação da Via Campesina que
considera a “economia verde” uma falsa solução para crise climática.

297
REFERÊNCIAS:

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dos territórios indígenas. Distrito Federal, 16 Abril. 2013. Disponível em:
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AB’SÁBER, Aziz. Conhecimentos sobre as Flutuações Climáticas do Quaternário


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2011b.

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América Latina y el Caribe. Programa Regional de Becas CLACSO. 2003

VEREADORES de Brasiléia participam de reunião com moradores da RESEX em


protesto a multas abusivas do ICMBio. O Alto Acre, 5 de ago. de 2015. Disponível em:
<http://www.oaltoacre.com/vereadores-de-brasileia-participam-de-reuniao-com-
moradores-da-resex-em-protesto-a-multas-abusivas-do-icmbio/> Acesso em: 23 de
nov. de 2015.

VEROCAI, Iara; LUDEWIGS, Thomas; PEREIRA, Valéria de Fátima Gomes Pereira.


Banco Interamericano para o Desenvolvimento. Programa de Desenvolvimento
Sustentável do Acre – PDSA II. Expansão da Economia Florestal. Relatório de
Avaliação Ambiental e Social. 2012.

VIA CAMPESINA. Convocatoria a los pueblos y organizaciones de México y el


Mundo contra las falsas soluciones para combatir el calentamiento global, Foro
campesinino y indígena: Por la defensa de la vida y territorio, 26 set. 2012. Disponível
em: <http://viacampesina.org/es/index.php/acciones-y-eventos-mainmenu-26/cambios-
climcos-y-agro-combustibles-mainmenu-79/1469-foro-campesinino-y-indigena-por-la-
defensa-de-la-vida-y-territorio>. Acesso em 28 set. 2012.
______________. Llamamiento de la VI Conferencia de la Via Campesina Egidio
Brunetto, Yakarta, Jun. 2013. Disponível em:
<http://viacampesina.org/es/index.php/nuestras-conferencias-mainmenu-28/6-yakarta-
2013/declaracion-y-mociones/1768-llamamiento-de-yakarta>. Acesso em 10 ago. 2013.

______________. Em defesa do Código Florestal e da produção de alimentos. 8 p.,


2011.

VIOMUNDO. Seringueiro diz que florestas públicas foram privatizadas por 70


anos. Entrevista concedida para Luiz Carlos Azenha, 13 de set. 2014. Disponível: <
http://www.viomundo.com.br/denuncias/osmarino-amancio-seringueiro-seculo-21-
prega-agregacao-de-valor-e-diz-que-marina-privatizou-amazonia-por-70-anos.html>
Acesso em: 15 de nov. 2015.

WEBER, Max. A ética protestante e o espírito do capitalismo. São Paulo: Editora


Pioneira, 233 p.,1999.

WORLD RAINFOREST MOVEMENT (WRM). As plantações não são florestas. 150


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WWF. Lições aprendidas sobre participação social na elaboração de planos de


manejo de unidades de conservação: comunidades de ensino e aprendizagem em
planejamento de unidades de conservação. Brasília: WWF-Brasil, 2003.

WWF; SOS AMAZÔNICA; ICMBIO. Relatório Final da Proposta de Revisão do Plano


de Manejo Participativo da RESEX Chico Mendes. Rio Branco, 2014.

ZHOURI, Andréa. Conflitos Sociais e Meio Ambiente Urbano. Série Documenta Eicos
“Comunidade – Meio Ambiente – Desenvolvimento”, Rio de Janeiro, n.17, p.1-8 ,
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em:<http://www.psicologia.ufrj.br/pos_eicos/pos_eicos/arqanexos/documenta/documen
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ZHOURI, Andréa. O ativismo transnacional pela Amazônia: entre ecologia política e o


ambientalismo de resutaldos. Horizontes Antropológicos, Porto Alegre, ano. 12, n. 25,
p.139-169, 2006.
LISTA DE ANEXOS:

1. Carta de Belém – 2009:

Fonte: http://terradedireitos.org.br/2009/10/15/carta-de-belem-os-efeitos-das-
mudancas-climaticas-e-a-politica-de-redds/

2. Ofícios baseados na lei de acesso à informação:

2.1. Ofício recebido em 01 de Setembro de 2014, encaminhado para o secretário da


SEPLAN

2.2. Ofício recebido em 02 de Setembro de 2014, encaminhado para a diretora


presidente do IMC

2.3. Ofício recebido em 01 de Setembro de 2014, encaminhado para o secretário da


SAI

2.4. Ofício recebido em 28 de Agosto de 2014, encaminhado para o secretário da


SEDENS

3. Detalhamento da execução financeira do programa REM KfW baseado em


relatórios de execução e convênios publicados do Diário Oficial do Acre:

3.1. Planilha – Balanço geral

3.2. Planilha – Fortalecimento institucional

3.3. Planilha – Programas e políticas apoiados

4. Carta do Acre – 2011:

Fonte: http://terradedireitos.org.br/2011/10/11/carta-do-acre-em-defesa-da-vida-da-
integridade-dos-povos-e-de-seus-territorios-e-contra-o-redd-e-a-mercantilizacao-da-
natureza/

5. Lista de entrevistas realizadas durante a pesquisa e utilizadas na dissertação


Carta de Belém

Somos organizações e movimentos sócio-ambientais, trabalhadores e trabalhadoras da


agricultura familiar e camponesa, agroextrativistas, quilombolas, organizações de
mulheres, organizações populares urbanas, pescadores, estudantes, povos e
comunidades tradicionais e povos originários que compartilham a luta contra o
desmatamento e por justiça ambiental na Amazônia e no Brasil. Reunimos-nos no
seminário “Clima e Floresta – REDD e mecanismos de mercado como solução para a
Amazônia?”, realizado em Belém em 02 e 03 de outubro de 2009, para analisarmos as
propostas em curso de Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação
(REDD) para a região à luz de nossas experiências sobre as políticas e programas
implementados na região nas últimas décadas. Nesta Carta vimos a público manifestar
nossa reivindicação que o governo brasileiro rejeite a utilização do REDD como
mecanismo de mercado de carbono e que o mesmo não seja aceito como compensação
às emissões dos países do Norte.
Rechaçamos os mecanismos de mercado como instrumentos para reduzir as emissões
de carbono, baseados na firme certeza que o mercado não é o espaço capaz de assumir
a responsabilidade sobre a vida no planeta. A Conferência das Partes (COP) e seus
desdobramentos mostraram que os governos não estão dispostos a assumir
compromissos públicos consistentes, transferem a responsabilidade prática de
cumprimentos de metas, além do que notoriamente insuficientes, à iniciativa privada.
Isso faz com que, enquanto os investimentos públicos e o controle sobre o cumprimento
de metas patinem, legitima-se a expansão de mercado mundial de CO2, que aparece
como uma nova forma de investimento de capital financeiro e de sobrevida a um modelo
de produção e de consumo falido.

As propostas de REDD em debate não diferenciam florestas nativas de monoculturas


extensivas de árvores, e permitem aos atores econômicos – que historicamente
destruíram os ecossistemas e expulsaram as populações que vivem neles –
encontrarem nos mecanismos de valorização da floresta em pé maneiras de continuar
com e fortalecer seu poder econômico e político em detrimento dessas
populações. Além disso, corremos o risco que os países industrializados não reduzam
drasticamente suas emissões pela queima de combustíveis fósseis e mantenham um
modelo de produção e de consumo insustentáveis. Precisamos de acordos que
obriguem os países do Norte a r econhecerem a sua dívida climática e a se
comprometerem com a reparação da mesma.

Para o Brasil, as negociações internacionais sobre clima não podem estar focadas no
debate sobre REDD e outros mecanismos de mercado e sim na transição para um novo
modelo de produção, distribuição e consumo, baseado na agroecologia, na economia
solidária e numa matriz energética diversificada e descentralizada, que garantam a
segurança e soberania alimentar.

O desafio central para o enfrentamento do desmatamento na Amazônia e em outros


biomas do país é a solução dos graves problemas fundiários, que estão na raiz dos
conflitos sócio-ambientais. O desmatamento – resultante do avanço das monoculturas,
das políticas que favorecem o agronegócio e um modelo de desenvolvimento voltado à
exploração predatória e exportação de recursos naturais – só será evitado com a
resolução da questão fundiária, a partir de uma Reforma Agrária e de um reordenamento
territorial em bases sustentáveis, e do reconhecimento jurídico dos territórios dos povos
e comunidades tradicionais e povos originários.

Temos outra visão de território, desenvolvimento e economia, que estamos construindo


ao longo do tempo, articulando o uso sustentável da floresta e o livre uso da
biodiversidade. Faz-se necessário um conjunto de políticas públicas que permitam o
reconhecimento e valorização dessas práticas tradicionais, baseadas na convivência
entre produção e preservação ambiental.

Nos comprometemos a seguir lutando a partir destas premissas, e para que todo e
qualquer mecanismo de redução do desmatamento esteja inserido em uma visão
abrangente de políticas públicas e fundos públicos e voluntários que viabilizem nossos
direitos e a vida na Amazônia e no planeta.

Assinam:

Amigos da Terra – Brasil

ANA – Articulação Nacional de Agroecologia

Associação Agroecológica Tijupá

APACC – Associação Paraense de Apoio às Comunidades Carentes

APA-TO – Alternativas para a Pequena Agricultura do Tocantins

CEAPAC – Centro de Apoio a Projetos de Ação Comunitária

CEDENPA – Centro de Estudos e Defesa do Negro do Pará

COFRUTA – Cooperativa dos Fruticultores de Abaetetuba

Coletivo Jovem Pará

Comissão Quilombola de Sapê do Norte – Espírito Santo

CONTAG – Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura

CUT – Central Única dos Trabalhadores

FASE – Solidariedade e Educação

FAOC – Fórum da Amazônia Ocidental

FAOR – Fórum da Amazônia Oriental


FEAB – Federação dos Estudantes de Agronomia do Brasil

FETAGRI – Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Pará

FETRAF – Federação Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura


Familiar do Brasil

FMAP – Fórum Mulheres Amazônia Paraense

FORMAD – Fórum Mato-Grossense pelo Desenvolvimento e Meio Ambiente

Fórum BR 163

Fórum Carajás

FUNDO DEMA

GIAS – Grupo de Intercâmbio em Agricultura Sustentável do Mato Grosso

GMB – Grupo de Mulheres Brasileiras

IAMAS – Instituto Amazônia Solidária e Sustentável

Instituto Terrazul

MAB – Movimento dos Atingidos por Barragens

Malungu – Coordenação das Associações das Comunidades Remanescentes de


Quilombos do Pará

MAMEP – Movimento e Articulação de Mulheres do Estado do Pará

MMM – Marcha Mundial das Mulheres

MMNEPA – Movimento de Mulheres do Nordeste Paraense

MMTA-CC – Movimento das Mulheres Trabalhadoras de Altamira Campo e Cidade

Movimento Xingu Vivo para Sempre

MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra

RBJA – Rede Brasileira de Justiça Ambiental


Rede Brasil sobre Instituições Financeiras Multilaterais

REBRIP – Rede Brasileira pela Integração dos Povos

RECID – Rede de Educação Cidadã

Rede Cerrado

Rede Alerta contra o Deserto Verde

Reserva Extrativista Marinha Araí-Peroba

Reserva Extrativista Marinha Mãe Grande de Curuçá

Reserva Extrativista Tapajós-Arapiuns

SDDH – Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos

STTR – Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais – Abaetetuba

STTR – Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais – Cametá

STTR – Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais – Lucas do Rio Verde –


Mato Grosso

STTR – Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais – Santarém

Terra de Direitos – Organização de Direitos Humanos

UNIPOP – Universidade Popular

Via Campesina Brasil

Belém, 02 e 03 de outubro de 2009


2. Ofícios baseados na lei de acesso à informação:

2.1. Ofício recebido em 01 de Setembro de 2014, encaminhado para o secretário da


SEPLAN

2.2. Ofício recebido em 02 de Setembro de 2014, encaminhado para a diretora


presidente do IMC

2.3. Ofício recebido em 01 de Setembro de 2014, encaminhado para o secretário da


SAI

2.4. Ofício recebido em 28 de Agosto de 2014, encaminhado para o secretário da


SEDENS
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Univ,,rsidade Federal Fluminense

Ao Secretario da Secretaria de Estado de Planejamento, SEPLAN, Marcia Veri.s sim~ ·


Carvalho Dantas

Do LEMTO - Programa de P6s-graduac;ao da Universidade Federal Fluminense

Rio Branco, 27 d~ Agosto de 2014

Vimos por meio desta solicitar desta institui9ao as informa96es abaixo relacionadas cujo
e
objetivo contribuir com parte da pesquisa de disserta9ao de mestrado relacionada ao SISA
(Sistema de Incentive aos Servi9os Ambientais) ea rela9ao deste com as comunidades que
vivem em areas beneficiadas pelos recurses captados por esse sistema no estado do Acre,
em especial, os recurses provindos dos contratos com o banco alemao Ktw.
Reforc;amos essa solicitac;ao para fornentar atividade de pesquisa com base na Lei
12.527 de 18 de Novembre de 20·11 (Lei de acesso a informa9ao) conforme o artigos 10 e 7:

As informac;oes solicitadas sao as seguintes:

- Relat6rios de acompanhamento da execu~ao do piano de governo e piano


plurianual 2012-2015;
- Relat6rios de acompanhamento da execuc;ao do PDSA II (BID); PROACRE (BIRD);
PIDS V (BNDES); Fundo Amazonia (BNDES); Programa REM (KfW);

Requeremos o prazo de 10 dias para resposta com base nos art. 11, art. 21 e art. 32 da
mesma lei:

Solicito que as informa96es sejam fornecidas ern forrnato digital, quando disponiveis,
conforme estabelece o artigo 11 , § 5° da lei 12.527/2011.
Na eventualidade de as informac;oes solicitadas nao serem fornecidas, requeiro que seja
apontada a razao da negativa bem como, se for o caso, eventual grau de classificac;ao de
sigilo (ultrassecreto, secrete ou reservado), tudo nos termos do artigo 24, § 1° da Lei
12.527/2011.

~ntecipadamente agradecernos pelas informac;oes prestadas e nos colocamos a


disposic;ao deste 6rgao para quaisquer esclarecimentos, assim como nos comprometemos a
enviar a essa instituic;ao os resultados de nossas investigac;oes e, assim, afirmarmos o carater
publico das instituic;oes a que estamos vinculados.

Atenciosamente

Prntocoln SEP LAN


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Diogo Leibel Sandonato
(68) 99159541
mphsto@gmail.com
Pesquisador do Laborat6rio de Estudos de Movimentos Sociais e Territorialidacles -
LEMTO
Mestrando em Geografia pelo Programa de P6s-graduac;ao em Geografia da
Universidade Federal Fluminense
Orientando do Prof. Dr. Carlos Walter Porto-Gonc;alves

Prof. Dr. Carlos Walter Porto-Gonc;alves


Departamento de Geografia da Universidade Federal Fluminense
Coordenador do Laborat6rio de Estudos de Movimentos Sociais e Territorialidades -
LEMTO
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Universidade Federal Fluminense

A diretora presidente do lnstituo de Mudancas Climaticas - IMC, Magaly Medeiros

Do LEMTO - Programa de P6s-gradua~ao da Universidade Federal Fluminense

Rio Branco, 27 de Agosto de 2014

Vimos por meio desta solicitar desta institui9ao as informa96es abaixo relacionadas cujo
e
objetivo contribuir com parte da pesquisa de dissertac;ao de mestrado relacionada ao SISA
(Sistema de lncentivo aos Servic;os Ambientais) e a relac;ao deste com as comunidades que
vivem em areas beneficiadas pelos recurses captados por esse sistema no estado do Acre,
em especial, os recurses provindos dos contratos com o banco alemao KfW.
Refor9amos essa solicita9ao para fomentar atividade de pesquisa com base na Lei
12.527 de 18 de Novembre de 2011 (Lei de acesso a informa9ao) conforme o artigos 10 e 7:

As informa96es solicitadas sao as seguintes:

- Todos os relat6rios produzidos com a finalidade de repassar para o banco alemao


KfW o andamento da execucao do programa REM/KFW;
- Relat6rio de execucao financeira da primeira parcela do contrato de 2012 com
KfW;
· - Todos os extratos dos convenios e contratos do IMC relacionados ao recurso do
KfW;
- Atas do Conselho Cientifico do SISA;
- Linhas orcamentarias, planejamentos e detalhamentos de execucao finanteira
para o recurso provindo dos contratos com o KfW de 2012 e 2013 no ambito do
programa REM;
- lnformacoes e dados relativos ao subprograma territorial extrativistas presente no
programa ISA Carbono;
- lnformacoes e dados relativos ao subprograma de pecuaria sustentavel presente
no programa ISA Carbono;
- Relat6rio de atividades da CEVA- 2013;
- Relatorias das reunioes da CEVA de 2014;

Requeremos o prazo de 10 dias para resposta com base nos art. 11, art. 21 e art. 32 da
mesma lei:

Solicito que as informa96es sejam fornecidas em formate digital, quando disponiveis ,


conforme estabelece o artigo 11, § 5° da lei 12.527/2011.
Na eventualidade de as informag5es solicitadas nao serem fornecidas, requeiro que seja
apontada a razao da negativa bem como, se for o caso, eventual grau de classificagao de
sigilo (ultrassecreto, secrete ou reservado), tudo nos termos do artigo 24, § 1° da Lei
12.527/2011.
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Antecipadamente agradecemos pelas informac;oes prestadas e nos colocamos a
disposiyao deste 6rgao para quaisquer esclarecimentos, assim coma nos comprometemos a
enviar a essa institui9ao os resultados de nossas investiga96es e, assim, afirmarmos o car.~ter
publico das institui9oes a que estamos vinculados.

Atenciosamente

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Diogo Loibel Sandonato
(68) 99159541
mphsto@gmail.com
Pesquisador do Laborat6rio de Estudos de Movimentos Sociais e Territorialidades -
LEMTO
Mestrando em Geografia pelo Programa de P6s-gradua9ao em Geografia da
Universidade Federnl Fluminense
Orientando do Prof. Dr. Carlos Walter Porto-Gon9alves

Prof. Dr. Carlos Walter Porto-Gon9alves


Departamento de Geografia da Universidade Federal Fluminense
Coordenador do Laborat6rio de Estudos de Movimentos Sociais e Territorialidades -
LEMTO
Universidade Federal Fluminense

Ao Secretario da Secretaria de Articulacao lnstitucional, SAi, prof. Jose Fernandes do


Rego

Do LEMTO - Programa de P6s-gradua~ao da Universidade Federal Fluminense

Rio Branco, 27 de Agosto de 2014

Vimos por rneio desta solicitar desta institui9ao as informac;oes abaixo relacionadas cujo
e
objetivo contribuir com parte da pesquisa de dissertac;ao de mestrado relacionada ao SISA
(Sistema de )ncentivo aos Servic;os Ambientais) e a rela9ao deste com as comunidades que
vivem em areas beneficiadas pelos recursos captados por esse sistema no estado do Acre,
em especial, os recurses provindos dos contratos com o banco alemao KfW.
Reforc;amos essa solicita9ao para fomentar atividade de pesquisa corn base na Lei
12.527 de 18 de Novembre de 2011 (Lei de acesso a informa9ao) conforme o artigos 10 e 7:

As informa96es solicitadas sao as seguintes:


- Relat6rios de acompanhament:o cia execucao do piano de governo e piano
plurianual 2012-2015;
- Relatorios de acompanhamento da execu~ao do PDSA II (BID); PROACRE (BIRD);
PIDS V (BNDES); Fundo Amazonia (BNDES); Programa REM (KfW);

Requeremos o prazo de 10 dias para resposta com base nos art. 11, art. 21 e art. 32 da
mesma lei:
Solicito que as informac;oes sejam fornecidas em formate digital, quando disponfveis,
conforme estabelece o artigo 11, § !5° da lei 12.527/2011.
Na eventualidade de as informat;6es solicitadas nao serem fornecidas, requeiro que seja
apontada a razao da negativa bem como, se for o caso, eventual grau de classificac;ao de
sigilo (ultrassecreto, secrete ou reservado), tudo nos termos do artigo 24, § 1° da Lei
12.527/2011.
Antecipadamente agradecemos pelas informac;oes prestadas e nos colocamos a
disposic;ao deste 6rgao para quaisquer esc!arecirnentos, assirn como nos cornprometemos a
enviar a essa institui9ao os resultados de nossas investiga96es e, assim, afirmarmos o carater
publico das instituk;oes a que estamos vinculados.

Atenciosamente

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Diogo Leibel Sandonato
(68) 99159541
mphsto@gmail.com
Pesquisador do Laborat6rio de Estudos de Movimentos Sociais e Territorialidades -
LEMTO
Mestrando em Geografia pelo Programa de P6s-gradua9ao em Geografia da
Universidade Federal Fluminense
Orientando do Prof. Dr. Carlos Walter Porto-Gon<;alves

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Prof. Dr. Carlos Walter Porto-Gon<;alves


Departamento de Geografia da Universidade Federal Fluminense
Coordenador do Laborat6rio de Estudos de Movimentos Sociais e Territorialidades -
LEMTO
Universidade Federal Fluminense

Ao Secretario Edvaldo Magalhaes da Secretaria de Estado de Desenvolvimento


Florestal, da lndustria, do Comercio e dos Servi~os Sustentaveis - SEDENS

Do LEMTO - Programa de P6s-gradua~ao da Universidade Federal Fluminense

Rio Branco, 28 de Agosto de 2014

Vimos por meio desta solicitar desta instituic;ao as informac;oes abaixo relacionadas cujo
e
objetivo contribuir com parte da pesquisa de dissertac;ao de mestrado relacionada ao SISA
(Sistema de Incentive aos Servic;os Ambientais) e a relac;ao deste com as comunidades que
vivem em areas beneficiadas pelos recurses captados por esse sistema no estado do Acre,
em especial, os recurses provindo dos contratos com o banco alemao KfW.
As informac;6es solicitadas sao as seguintes:

- Todos os relat6rios produzidos com a finalidade de repassar para o banco alemao


KfW o andamento da execu~ao do programa REM/KfW;
- Relat6rio de execu~ao financeira da primeira parcela do contrato de 2012 com
KfW;
- Todos os extratos dos convenios e contratos entre a SEDENS e cooperativas,
associa~oes e empresas relacionados ao recurso do KfW;
- Todas as atas do Conselho Estadual de Florestas de 2011 ate hoje;
- Linhas or~amentarias da SEDENS e planejamentos e detalhamentos de execu~ao
financeira para o recurso provindo dos contratos com o KfW de 2012 e 2013 no ambito
do programa REM; ·
- Relat6rios de implementa~ao das a~oes relacionadas ao programa de Piscicultura
e Florestas Plantadas que sao executadas pela SEDENS;

Antecipadamente agradecemos pelas informac;6es prestadas e nos colocamos a


disposic;ao . deste .6rgao para quaisquer esclarecimentos, assim como nos comprometemos a
enviar a essa instituic;ao os resultados de nossas investigac;6es e, assim, afirmarmos o carater
publico das instituic;oes a que estamos vinculados.

Atenciosamente

b i?Sa ~ikl W0~


Diogo Leibel Sandonato
(68) 99159541
mphsto@gmail.com
Pesquisador do Laborat6rio de Estudos de Movimentos Sociais e Territorialidades -
LEMTO
Mestrando em Geografia pelo Programa de P6s-graduac;ao em Geografia da
~ . : . ~ ~ · 2-17 _is 1. l f Universidade Federal Fluminense
Orientando do Prof. Dr. Carlos Walter Porto-Gonc;alves
~ Lll.~~- Fluminense
Marky Lowell Rodrigues de Brito
Diretor de Desenvolvimento Floreslai•SEDENS
3. Detalhamento da execução financeira do programa REM KfW baseado em
relatórios de execução e convênios publicados do Diário Oficial do Acre:

3.1. Planilha – Balanço geral

3.2. Planilha – Fortalecimento institucional

3.3. Planilha – Programas e políticas apoiados


BALANÇO GERAL - Alocação de recursos do Programa REM KfW

Cenário 2 - Não
Ponta Cenário 1 - Alocado Porcentagem Porcentagem
tenho certeza
Madeira 8.008.200,00 17,28 8.008.200,00 12,59
Peixe 14.003.349,00 30,21 22.828.349,00 35,88
Pecuária 4.650.000,00 10,03 4.650.000,00 7,31
Borracha 4.719.000,00 10,18 10.185.344,37 16,01
Indígena 4.937.574,00 10,65 5.315.659,00 8,36
Floresta Plantada 2.608.249,95 5,63 4.908.249,95 7,71
certificação da propriedade 3.726.416,33 8,04 4.026.416,33 6,33
Café e Açai 3.399.754,20 7,33 3.399.754,20 5,34
Outros 300.000,00 0,65 300.000,00 0,47
Total 46.352.543,48 100,00 63.621.972,85 100,00

Cenário 2 - Não
Sistema Cenário 1 - Alocado Porcentagem Porcentagem
tenho certeza
IMC 8.318.000,00 63,83 8.318.000,00 56,85
CDSA 3.383.700,00 25,97 3.383.700,00 23,13
IMAC 700.000,00 5,37 1.400.000,00 9,57
ITERACRE 60.000,00 0,46 60.000,00 0,41
SECOM 250.000,00 1,92 250.000,00 1,71
FUNTAC 199.803,30 1,53 499.803,30 3,42
CPI 120.000,00 0,92 120.000,00 0,82
SEMA 0 - 600.000,00 4,10
Total 13.031.503,30 100,00 14.631.503,30 100,00

Cenário 2 - Não
Cenário 1 - Alocado Porcentagem tenho certeza Porcentagem
Fortalecimento Institucional 13.031.503,30 21,94 14.631.503,30 18,70
Beneficiários 46.352.543,48 78,06 63.621.972,85 81,30
TOTAL 59.384.046,78 100,00 78.253.476,15 100,00
Recursos do Programa REM KfW alocados em fortalecimento institucional

Estrutura
de
Governo contrato nº convênio Entidade Entidade 2 Entidade 2 valor atividade
Consolidar e ampliar o Sistema Estadual de Incentivos a
Serviços Ambientais do Acre (SISA) como mecanismo
IMC I 001/2013 8.318.000,00 inovador de financiamento de serviços ambientais.
Subtotal 8.318.000,00
TOTAL 8.318.000,00

Auxilio mutuo para elaboração e a implementação dos


CDSA I 006/2013 660.000,00 programas e subprograma do SISA.
017/2014 1.529.960,00
subvenção 1.193.740,00
Subtotal 3.383.700,00
TOTAL 3.383.700,00

Realização 01 de sobrevoos.
Realização de 05 visita a campo.
Analise do desmatamento no entorno das unidades de
IMAC 010/2013 100.000,00 produção sustentável do SISA

15 visitas realizadas em unidades de produção sustentável; -


2 sobrevoos realizados; - 2 análise de imagem e satélites nas
002/2014 600.000,00 regiões de produção sustentável do SISA
Subtotal 700.000,00
OBJETIVO: o referido convenio tem por objetivo a realização
de atividades de controle ambiental (licenciamento,
monitoramento e fiscalização), objetivando a redução do
desmatamento e das queimadas para o aumento do estoque
007/2015 700.000,00 de floretas e CO2
subtotal 700.000,00
TOTAL 700.000,00
TOTAL+incerto 1.400.000,00
O referido Convênio tem por objeto a cooperação mútua
entre a SEDENS/FEF, ITERACRE e o IMC e os demais
instrumentos, visando a regularização fundiária de famílias
residentes na Floresta Pública do Gregório, para a inclusão no
ITERACRE 004/2013 60.000,00 Programa de Certificação Florestal.
Subtotal 60.000,00
TOTAL 60.000,00
OBJETIVO: promover o funcionamento, a estruturação e a
difusão do Sistema Estadual de áreas Naturais Protegidas,
com vistas a potencializar os esforços de redução de
desmatamento e degradação ambiental, no âmbito da gestão
direta de 8 unidades de conservação estadual e na
participação e promoção de fóruns de discussão para as
SEMA 009/2015 600.000,00 Áreas Protegidas (UCs e TIs) no estado do Acre
subtotal 600.000,00
TOTAL+incerto 600.000,00

Com o objetivo de dar publicidade e difusão de informações


por meio de instrumentos diversos de comunicação,das
metas e objetivos, bem como dos resultados e lições
apreendidas pelos beneficiários e demais instituições
integrantes do SISA, em decorrência da aplicação dos
recursos oriundos da KfW, especialmente os oriundos da
Cooperação Financeira Programa Global REDD para
SECOM 007/2014 250.000,00 EarlyMovers – REM com o Estado do Acre/Brasil
Subtotal 250.000,00
TOTAL 250.000,00

Recolher subsídio para o componente de subprograma


indígena no âmbito do sistema Estadual de Incentivos a
Serviços ambientais – SISA junto aos Agentes Agroflorestais
CPI I 005/2013 120.000,00 Indígenas.
Subtotal 120.000,00
TOTAL 120.000,00
O presente Termo de Convênio tem por objeto a
operacionalização e funcionamento da UCEGEO para o apoio
as ações de monitoramento do desmatamento no Estado do
FUNTAC 024/2014 199.803,30 Acre.
Subtotal 199.803,30
OBJETIVO: realizar estudo fotoquímico de espécies
oleaginosas e recursos florestal, visando contribuir com ações
que possam diminuir o
006/2015 300.000,00 desmatamento no Estado do Acre.
subtotal 300.000,00
TOTAL 199.803,30
TOTAL+incerto 499.803,30

TOTAL GERAL 13.031.503,30


TOTAL + INCERTO 14.631.503,30
Programas e políticas apoiados apoiados pelos recursos do programa REM KfW

Cadeia contrato nº convênio Entidade Entidade 2 Entidade 2 valor atividade


Assistência 575 técnica para famílias com planos de manejos florestal.
Madeira I x SEDENS - UGAI 920.000,00 Assistência Técnica de 80 famílias com moradias reformadas
200 famílias em processo de exploração de manejo florestal. 275 famílias
para definição de implantação de manejo florestal (madeireiro e não
I x SEDENS - UGAI 3.000.000,00 madeireiro) X familias com moradias
UNIMMAC - CENTRAL
Objetivo: Assistência Técnica e monitoramento das ações fomento a
DE COOPERATIVAS DE
produção primária. (Aumento de madeira manejada comercializada com
PRODUCAO DOS
II 009/2013 2.000.000,00 polos de marceneiros e moveleiros)
MOVELEIROS E

subtotal 5.920.000,00
O referido Termo de Cooperação Técnica tem por objetivo a cooperação
Associações de entre a SEDENS/FEF e as Associações de Moradores das Floresta
moradores das Estaduais acima citadas, para fomentar a comercialização da produção
florestas estaduais de madeira de origem sustentável do Termo de Permissão de Uso
(Antimary e Igarapé 001/2014 do manejo florestal de 1.400 (mil e quatrocentos) hectares de
030/2014 Sossego) 583.200,00 terras integrantes da Floresta Estadual do Antimary- FEA.
Repasse de recursos financeiro, com encargos, destinados a execução das
ações de Fomento a Comercialização, por meio do mecanismo de
032/2014 COOPERFLORESTA 560.000,00 pagamento per capita da produção sustentável.
O presente Termo de Convênio tem por objeto o repasse de recursos
Associação de financeiros, com encargos, destinados as ações de fomento à produção
produtores agrícolas do florestal do PAF Havaí, por meio do mecanismo de pagamento per capita
048/2014 PAF Havaí 615.000,00 da produção sustentável.

Apoio ao fortalecimento da produção florestal madeireira sustentável


001/2015 COOPERFLORESTA 330.000,00 nas associações cooperadas.
TOTAL 8.008.200,00

Assistência Técnica para a 750 famílias acessar implantação de Unid. de


Peixe I 004/2013 COOPERPEIXE JURUÁ 1.000.000,00 produção sustentável de piscicultura
Apoio a segurança de 600 alimentar de famílias
Incremento produtiva da piscicultura em Municípios isolados
I 010/2014 COOPERPEIXE JURUÁ 200.000,00 Capacitação de produtores na modernização da produção
II 015/2014 Pref. De Jordão 290.000,00 Apoio a cadeia produtiva da Piscicultura na REXEX Alto Tarauacá
Apoio a cadeia produtiva da Piscicultura na RESEX Brasiléia e Chico
II 014/2014 COOPGRÃOS 480.000,00 Mendes. (Brasiléia)
Apoio a cadeia produtiva da Piscicultura na RESEX Brasiléia e Chico
AMOPREAB
II 013/2014 360.000,00 Mendes. (Assis Brasil)
Apoio a cadeia produtiva da Piscicultura na RESEX Brasiléia e Chico
AMOPREX
II 012/2014 600.000,00 Mendes. (Xapuri)
subtotal 2.930.000,00
Implantação de ações elegíveis visando o desenvolvimento das Cadeias
COOPERMOGNO
020/2014 740.000,00 Produtivas Prioritárias da Piscicultura.
normatizar os repasses de recursos financeiros, destinados a execução
das ações de Fomento a Comercialização da produção sustentável
023/2014 COOPEIXE BUJARI 150.000,00 (Piscicultura).
Implantação de ações elegíveis visando o desenvolvimento e
ACREPEIXE COOP
035/2014 300.000,00 fortalecimento das Cadeias Produtivas Prioritárias (Assistência Técnica)
Associação
Agroextrativista da
reserva extrativista do Implantação de ações elegíveis visando o desenvolvimento das Cadeias
042/2014 rio liberdade 500.000,00 Produtivas Prioritárias (Piscicultura).
aditivo O presente Convênio tem por objetivo a implementação de ações
Prefeitura municipal de
convênio elegíveis, visando o desenvolvimento da Cadeia Produtiva Prioritária da
Jordão
015/2014 22.000,00 Piscicultura, na Reserva Extrativista do Alto Tarauacá
aditivo
convênio Implantação de ações elegíveis visando a Desenvolvimento das Cadeias
012/2014 AMOPREX 58.949,00 Produtivas Prioritárias (Piscicultura).
OBJETIVO: Apoio a piscicultura da Produção Familiar através de apoio
ACREPEIXE COOP
003/2015 1.000.000,00 técnico e logístico a comercialização da produção - KfW
Contratação de serviços técnicos especializados na construção de viveiros
piscícolas (açudes e/ou tanques escavados e semi escavados) destinados
à piscicultura recria e engorda, nas regionais do Baixo Acre (Acrelândia,
Bujarí, Capixaba, Plácido de Castro, Porto Acre, Rio Branco e Senador
contrato Guiomard), Alto Acre (Assis Brasil, Brasiléia, Epitaciolândia e Xapurí),
081/2015 empresa PROJETO PACU - Aquicultura LTDA 8.264.000,00 Juruá (Cruzeiro do Sul, Mâncio Lima, Rodrigues Alves).
Associação
aditivo Agroextrativista da
convênio reserva extrativista do Implantação de ações elegíveis visando o desenvolvimento das Cadeias
042/2014 rio liberdade 38.400,00 Produtivas Prioritárias (Piscicultura).
subtotal 11.073.349,00
Programa de Trabalho: 752.622.185422263.2815.0000 – Manutenção
ACREPEIXE COOP das Atividades a Cargo do Fundo Estadual de Floresta. (não tenho
002/2015 1.300.000,00 certeza se é KfW)
termo de
cooperação
ténica e Programa de Trabalho: 752.622.185422263.2815.0000 – Manutenção
financeira das Atividades a Cargo do Fundo Estadual de Floresta. (não tenho
002/2015 ANAC 700.000,00 certeza se é KfW)
aditivo Programa de Trabalho: 752.622.185422263.2815.0000 – Manutenção
convênio das Atividades a Cargo do Fundo Estadual de Floresta. (não tenho
002/2015 ACREPEIXE 325.000,00 certeza se é KfW)
O presente Termo de Convênio tem por objeto contratação de serviços
técnicos especializados na construção de viveiros piscícolas (açudes e/ou
tanques escavados e semi escavados) destinados à piscicultura recria e
engorda, na regional do Baixo Acre (Acrelândia, Bujari, Capixaba, Plácido
de Castro, Porto Acre, Rio Branco e Senador Guiomard). (não tenho
001/2015 SEDENS 2.440.000,00 certeza se é KfW)
O presente Termo de Convênio tem por objeto contratação de serviços
técnicos especializados na construção de viveiros piscícolas (açudes e/ou
tanques escavados e semi escavados) destinados à piscicultura recria e
engorda, nas regionais do Alto Acre (Assis Brasil, Brasileia, Epitaciolândia
e Xapuri) e Juruá (Cruzeiro do Sul, Mâncio Lima e Rodrigues Alves). (não
002/2015 SEDENS 4.060.000,00 tenho certeza se é KfW)
subtotal 8.825.000,00
TOTAL 14.003.349,00
TOTAL+incerto 22.828.349,00
Apoio a produção familiar no Estado do Acre e a médios produtores
inseridos em sistema silvipastoris das regiões do Alto e Baixo Acre (1.100
hectares reformados de pastos e mecanização.
150 produtores envolvidos.
Pecuária II 002/2014 SEAPROF 4.400.000,00 150 unid. Produtivas geo, termo de adesão a não fogo e desmate.)
subtotal 4.400.000,00
Centro de Formação
dos trabalhadores e
trabalhadoras na
Agricultura do Estado Para difusão e organização dos produtores rurais para implantação de
026/2014 do Acre - CFTT 250.000,00 pecuária sustentável.
TOTAL 4.650.000,00

Borracha I 008/2013 SEAPROF 1.200.000,00 subsídio da borracha


Aditivo
convênio
I 008/2013 SEAPROF 1.000.000,00 subsídio da borracha

006/2014 + Melhoria da condição de logística da borracha (látex, FDL, CVP)


COOPERACRE
aditivo sem (Aumento da comercialização de látex para fábrica de preservativo
II diário oficial 300.000,00 Natex)
Repasse de recursos financeiro, com encargos, destinados a execução das
ações do Fortalecimento da Cadeia Produtiva da Borracha e apoio ao
mecanismo de pagamento per capita da produção sustentável, na
II 011/2014 AMOPREAB 219.000,00 Reserva Extrativista Chico Mendes no município de Assis Brasil.
subtotal 2.719.000,00
O referido convênio tem por objeto a cooperação mútua entre a
SEDENS/FEF e a FUNTAC para operacionalizar e custear a compra de
LATEX dos produtores extrativistas para o abastecimento da Fábrica de
Preservativos NATEX, no âmbito do contrato de Contribuição Financeira -
016/2014 FUNTAC 2.000.000,00 KfW
subtotal 2.000.000,00
OBJETO: O presente Termo de Convênio tem por objeto o repasse de
COOPERATIVA recursos financeiros, com encargos, destinados às ações de fomento à
AGROEXTRATIVISTA DE cadeia produtiva da borracha nativa, por meio do mecanismo de
053/2014 TARAUACÁ – CAET 80.000,00 pagamento per capita nos municípios de Tarauacá e Feijó.
OBJETIVO: aquisição de borracha seca em forma de látex (in natura),
preferencialmente de seringal nativo, visando atender as demandas da
008/2015 FUNTAC 2.350.000,00 fábrica de preservativo masculino de Xapuri
OBJETIVO: o referido convenio tem por objetivo a cooperação mútua
entre SEDENS/FEF, SEAPROF E O IMC e os demais instrumentos para
apoio ao programa de pagamento por serviços ambientais, denominado
001/2015 SEAPROF 1.857.270,22 “subsídio da Borracha”
termo de O referido Termo tem por objeto a cooperação mútua entre a SEMA/FEF,
cooperação SEAPROF e o IMC e os demais instrumentos de participação, gestão,
técnica e controle e registro do SISA previstos na Lei Estadual 2.308/2010, para
financeira apoiar o programa de pagamento por serviços ambientais, denominado
001/2015 SEAPROF 1.179.074,15 “Subsídio da Borracha”.
Subtotal 5.466.344,37
TOTAL 4.719.000,00
TOTAL+incerto 10.185.344,37

Indígenas I 025/2014 CPI 220.000,00 Formação de agentes agroflorestais indígenas


Assistência aos PGTIS e aos projetos a serem implantados do SISA. Por 76
I 001/2014 AMAIAC 3.558.940,00 AGFIs
32 aldeias indígenas com locomoção para atividades de proteção das TI
indígenas e indiretamente apoio a produção e deslocamento social
I 019/2014 Pref. De Jordão 220.000,00 (aquisição de 25 barcos)
Associação Puyanawa
I 005/2014 80.000,00 Reforma da Arena Puyanawa para intercambio dos Povos Indígenas
subtotal 4.078.940,00
fortalecer e modernizar o Centro YorenkaÃtame e Aldeia Apiwtxa no
Associação Ashaninka município de Marechal Thaumaturgo, através da adequação, ampliação e
do Rio Amônia – instrumentalização do referido centro e construção de uma casa de
039/2014 Apiwtxa 171.000,00 passagem na Aldeia Apiwtxa para atender demandas associadas na
Associação
Agroextrativista
Puyanawa do Barão e fortalecer a base de produção de mandioca na TI Puyanawa para reduzir
040/2014 Ipiranga (AAPBI) 160.000,00 desmatamento e ampliar a provisão de serviços ambientais
Associação do Povo
Indígena do Rio Implementação de ações prioritárias do Plano de Gestão Territorial e
043/2014 Humaitá (ASPIRH) 123.600,00 Ambiental da Terra Indígena Kaxinawá do Rio Humaitá.
Associação dos
Seringueiros,
Produtores e Artesãos
Kaxiwaná de Nova Implementação de ações prioritárias do Plano de Gestão Territorial e
044/2014 Olinda (ASPAKNO) 139.000,00 Ambiental da Terra Indígena Kaxinawá Nova Olinda.
Associação
Sociocultural Implementação de ações prioritárias do Plano de Gestão Territorial e
049/2014 Yawanawá (ASCY) 150.000,00 Ambiental na Terra Indígena Rio Gregório.
Associação dos
Produtores e Implementação de ações prioritárias do Plano de Gestão Territorial e
050/2014 Agroextrativistas 95.034,00 Ambiental da Terra Indígena Igarapé do Caucho.
aditivo
convênio PROGRAMA DE TRABALHO: 752 622 2815 0000 - Manutenção das
005/2014 AAPBI 20.000,00 Atividades a Cargo do Fundo Estadual de Florestas
subtotal 858.634,00
Associação Sócio O presente termo de convênio tem como objeto a Gestão Ambiental e o
Cultural e Desenvolvimento Sustentável, no Território do Povo Kuntanawa, na
AmbientalKuntamanã Resexdo Alto Juruá no âmbito do Sistema de Incentivo aos Serviços
051/2014 (ASCAK) 170.000,00 Ambientais – SISA.
Associação dos OBJETIVO: O presente termo de convênio tem como objeto a
Produtores e Criadores implementação as ações prioritárias do Plano de Gestão Territorial e
Kaxinawá da Praia do Ambiental na Terra Indígena Kaxinawá da Praia do Carapanã, Município
052/2014 Carapanã - ASKPA 118.085,00 de Tarauacá.
Cooperativa OBJETO: O presente termo de convênio tem como objeto a
Agroextrativista implementação de ações prioritárias do Plano de Gestão Territorial e
054/2014 Yawanawá (Coopyawa) 90.000,00 Ambiental da Terra Indígena Rio Gregório
subtotal 378.085,00
TOTAL 4.937.574,00

TOTAL+incerto 5.315.659,00
1.200 hectares de seringa
400 Unid. Familiares
007/2013 + 220 mil mudas de açaí
Florestas aditivo sem 550 hectares de açaí
plantadas I diário SEAPROF 2.608.249,95 150 famílias beneficiadas
subtotal 2.608.249,95

OBJETIVO: Fomentar o plantio de seringueiras nos municípios do Estado


do Acre, fortalecendo as unidades produtivas de produtores familiares e
extrativistas a recuperação do passivo ambiental, recuperação de áreas
degradadas e com o objetivo de atender a demanda da Usina de
Beneficiamento de borracha natural em Sena Madureira e a fábrica de
004/2015 SEAPROF 300.000,00 preservativo masculino em Xapuri.
OBJETIVO: apoiar a produção de base familiar, por meio de serviços de
mecanização agrícola que prevê a recuperação de áreas alteradas e a
otimização de outras destinadas a agriculturas familiar com integração
simultâneas ou sequencial, de arvores frutíferas, com culturas de ciclo
005/2015 SEAPROF 2.000.000,00 curto ou longo.

Subtotal 2.300.000,00

TOTAL 2.608.249,95

TOTAL+incerto 4.908.249,95

Certificação da Apoio para 220 famílias na coleta e beneficiamento do Murmuru.


propriedade rural I 003/2013 Nova Cintra 150.000,00 Coleta e beneficiamento de 18 ton de murumuru

I 002/2013 COOPERMOGNO 222.000,00 Apoio para 215 famílias para produção sustentável.
II 018/2014 Pref. De Jordão 250.000,00 Implantação de Roçados Sustentáveis na REXEX Alto Tarauacá
Aquisição de subprodutos de macaxeira (goma) de x produtores
familiares; Uma unida familiar industrial em funcionamento (pagamento
I 009/2014 COOPERBISCOITO 100.000,00 per capita da produção sustentável)
subtotal 722.000,00
Associação Implantação de ações elegíveis visando o desenvolvimento das Cadeias
Agroextrativista Produtivas Prioritárias e a Produção Agro Extrativista Familiar
021/2014 Fortaleza Acreana 250.000,00 Sustentável.
Associação dos
pequenos produtores
agroflorestais da Implantação de ações elegíveis visando o desenvolvimento e
comunidade São fortalecimento das Cadeias Produtivas Prioritárias (Construção Centro de
022/2014 Vicente 400.000,00 Comercialização de Produtos da Floresta).
Associação
Agroextrativista da Implantação de ações elegíveis visando o desenvolvimento das Cadeias
reserva extrativista do Produtivas Prioritárias (Produção Sustentável).Através da implantação de
029/2014 rio liberdade 250.000,00 roçados sustentáveis.
Associação agro- Implantação de ações elegíveis visando o desenvolvimento e
extrativista são fortalecimento das Cadeias Produtivas Prioritárias na Reserva Extrativista
francisco de assis do do Riozinho Liberdade (Construção Centro de Comercialização de
034/2014 riozinho da liberdade 600.000,00 Produtos Agroextrativistas).
Associação OBJETIVO: Implantação de ações elegíveis visando o desenvolvimento e
agroextrativista do Rio fortalecimento das Cadeias Produtivas Prioritárias (Produção
036/2014 Juruá 202.000,00 Sustentável), na Resex do Alto Juruá
Associação OBJETIVO: Implantação de ações elegíveis visando o desenvolvimento e
agroextrativista do Rio fortalecimento das Cadeias Produtivas Prioritárias (Produção
037/2014 Tejo 186.000,00 Sustentável), na Resex do Alto Juruá.
Associação dos
seringueiros e OBJETIVO: Implantação de ações elegíveis visando o desenvolvimento e
agricultores da RESEX fortalecimento das Cadeias Produtivas Prioritárias (Produção
038/2014 Alto Juruá 228.000,00 Sustentável), na Resex do Alto Juruá.
Associação de
moradores do projeto
de assentamento
Envira as margens do
igarapé diabinho e Rio Implantação de ações elegíveis visando o desenvolvimento e
Envira/Projeto Envira fortalecimento das Cadeias Produtivas Prioritárias (Produção Sustentável)
045/2014 União 300.000,00 no Rio Envira.

OBJETIVO: O presente Termo de Convênio tem por objeto normatizar os


repasses de recursos financeiros, destinados a execução das ações de
046/2014 COOPERSONHOS 150.000,00 Fomento a Comercialização da Produção Sustentável de Feijão.
aditivo
convênio Prefeitura municipal de Conservação de ativos florestais, na Reserva Extrativista do Alto
018/2014 Jordão 27.666,00 Tarauacá, através da implementação de roçados sustentáveis
aditivo
convênio Implantação de ações elegíveis visando o desenvolvimento das Cadeias
021/2014 37.000,00 Produtivas Prioritárias (Produção Sustentável)
aditivo objetivo a conservação dos ativos florestais na Associação
convênio Agroextrativista da Reserva Extrativista do Rio Liberdade, através da
029/2014 35.500,00 implantação de roçados sustentáveis.
O presente Convênio tem por objetivo a implementação de ações
elegíveis, visando a Desenvolvimento da Cadeia Produtiva do Biscoito de
056/2014 COOPERBISCOITOS 100.000,00 Goma de Cruzeiro do Sul
O presente Convênio tem por objetivo a implementação de ações
057/2014 Nova Cintra 100.000,00 elegíveis, visando a Desenvolvimento da Cadeia Produtiva do Murmuru.
Cooperativa O presente Convênio tem por objetivo a implementação de ações
Agroextrativista de elegíveis, visando a desenvolvimento da Cadeia Produtiva da Fruticultura
058/2014 Tarauacá - CAET 100.000,00 (Industria de Polpa de Frutas)
aditivo Associação Implantação de ações elegíveis visando o desenvolvimento das Cadeias
convênio Agroextrativista da Produtivas Prioritárias (Produção Sustentável).Através da implantação de
029/2014 reserva extrativista do 38.250,33 roçados sustentáveis.
subtotal 3.004.416,33
CENTRAL DAS
COOPERATIVAS DOS
PRODUTORES OBJETO: O presente Termo de Convênio tem por objeto o repasse de
FAMILIARES DO VALE recursos financeiros, com encargos, destinados às ações de fomento à
DO JURUA – CENTRAL cadeia produtiva da Farinha de Mandioca, por meio do mecanismo de
055/2014 JURUA 300.000,00 pagamento per capta

subtotal 300.000,00

TOTAL 3.726.416,33

TOTAL+incerto 4.026.416,33
Incentivo a Produção Sustentável do Café para pequenos produtores
rurais e extrativistas visando a redução do desmatamento e do uso do
Café e Açai 027/2014 SEPN 447.500,00 fogo.
Incentivo a Produção Sustentável do Café e do Açaí para pequenos
produtores rurais e extrativistas visando a redução do desmatamento e
028/2014 SEAPROF 2.952.254,20 redução do uso do fogo.
subtotal 3.399.754,20
TOTAL 3.399.754,20

Associação agro-
extrativista são
francisco de assis do Implantação de ações elegíveis visando a realização do II Copão da
Outros 041/2014 riozinho da liberdade 300.000,00 Floresta.
subtotal 300.000,00
TOTAL 300.000,00

TOTAL GERAL 46.352.543,48


TOTAL + INCERTO 63.621.972,85
4. Carta do Acre – 2011:

Fonte: http://terradedireitos.org.br/2011/10/11/carta-do-acre-em-defesa-da-vida-da-
integridade-dos-povos-e-de-seus-territorios-e-contra-o-redd-e-a-mercantilizacao-da-
natureza/
Carta do Acre

Em defesa da vida, da integridade dos povos e de seus territórios


e contra o REDD e a mercantilização da natureza

Estivemos reunidos em Rio Branco - AC, entre os dias 3 a 7 de outubro


de 2011 na Oficina: Serviços Ambientais, REDD e Fundos Verdes do
BNDES: Salvação da Amazônia ou Armadilha do Capitalismo Verde?
Estávamos presentes, organizações socioambientais, de trabalhadoras
e trabalhadores da agricultura familiar, organizações de Resex e
Assentamentos Extrativistas, de direitos humanos (nacionais e
internacionais), organizações indígenas, organizações de mulheres,
pastorais sociais, professores, estudantes e pessoas da sociedade civil
comprometidas com a luta “dos de baixo”.
Percebemos a formação de um consenso em torno da ideia de que,
desde 1999, com a eleição do governo da Frente Popular do Acre
(FPA), foram tomadas iniciativas para a implantação de um “novo
modelo” de desenvolvimento. Desde então, tal modelo é celebrado
como primor de harmonia entre desenvolvimento econômico e
conservação da floresta, de seus bens naturais e do modo de vida de
seus habitantes. Com forte apoio dos meios de comunicação , de
sindicatos, de ONGs promotoras do capitalismo verde na região
amazônica, de bancos multilaterais, de oligarquias locais, de
organizações internacionais, ele é apresentado como “modelo exitoso”
a ser seguido por outras regiões do Brasil e do mundo.
Nesses dias, tivemos oportunidade de conhecer, em campo, algumas
iniciativas tidas como referência no Acre. Vimos de perto os impactos
sociais e ambientais do “desenvolvimento sustentável” em curso no
estado. Visitamos o Projeto de Assentamento Agroextrativista Chico
Mendes, Fábrica de Preservativos NATEX e o Seringal São Bernardo
(Projeto de Manejo Florestal Sustentável das Fazendas Ranchão I e II).
As visitas nos colocaram diante de um cenário bastante distinto daquilo
que é propagandeado nacional e internacionalmente.
No Seringal São Bernardo, pudemos constatar que o atendimento dos
interesses das madeireiras se faz em detrimento dos interesses das
populações locais e da conservação da natureza. Mesmo as
questionáveis regras dos planos de manejo são desrespeitadas e,
segundo dizem os moradores, com conivência de gestores estatais. No
caso do Projeto de Assentamento Agroextrativista Chico Mendes
Cachoeira (em Xapuri), constatamos que os moradores continuam
subjugados ao domínio monopolista, atualmente vendem a madeira
para a empresa “Laminados Triunfo” a R$90,00 m3, quando a mesma
quantidade de madeira chega a valer até R$1200 na cidade. Por isso,
endossamos a reivindicação de diversas comunidades pela suspensão
dos famigerados projetos de manejo. Solicitamos a apuração de todas
as irregularidades e exigimos a punição dos culpados pela destruição
criminosa dos bens naturais.
Os dias em que tivemos reunidos foram dedicados ainda ao estudo
sobre Serviços Ambientais, REDD e Fundos Verdes do BNDES.
Compreendemos o papel dos Bancos (Banco Mundial, FMI, BID e
BNDES), ONG´s comprometidas com o capitalismo verde, tais como
WWF, TNC e CI; bem como o papel de outras instituições como ITTO,
FSC e USAID, setores da sociedade civil e Governos Estadual e
Federal que têm se aliado ao capital internacional na intenção de
mercantilizar o patrimônio natural da Amazônia.
Ressaltamos que, além de desprovida de amparo constitucional, a Lei
N° 2.308, de 22 de outubro de 2010, que regulamenta o Sistema
Estadual de Incentivo a Serviços Ambientais foi criada sem o devido
debate com os setores da sociedade diretamente impactados por ela,
isto é, os homens e mulheres dos campos e floresta. Reproduzindo
servilmente os argumentos dos países centrais, os gestores estatais
locais a apresentam como uma forma eficaz de contribuir com o
equilíbrio do clima, proteger a floresta e melhorar a qualidade de vida
daqueles que nela habitam. Deve-se dizer, entretanto, que a referida lei
gera “ativos ambientais” para negociar os bens naturais no mercado de
"serviços ambientais", como o mercado de carbono . Trata-se de um
desdobramento da atual fase do capitalismo cujos defensores, no
intuito de assegurar sua reprodução ampliada, lançam mão do discurso
ambiental para mercantilizar a vida, privatizar a natureza e espoliar as
populações do campo e da cidade. Pela lei, a beleza natural, a
polinização de insetos, a regulação de chuvas, a cultura, os valores
espirituais, os saberes tradicionais, a água, plantas e até o próprio
imaginário popular, tudo passa a ser mercadoria. A atual proposta de
modificação do Código Florestal complementa esta nova estratégia de
acumulação do capital, ao autorizar a negociação das florestas no
mercado financeiro, com a emissão de "papéis verdes", a chamada
Certidão de Cotas de Reserva Ambiental (CCRA). Desse modo, tudo é
colocado no âmbito do mercado para ser gerido por bancos e
empresas privadas.
Embora apresentada como solução para o aquecimento global e para
as mudanças climáticas, a proposta do REDD permite aos países
centrais do capitalismo manterem seus padrões de produção, consumo
e, portanto, também de poluição. Eles continuarão consumindo energia
de fontes que produzem mais e mais emissões de carbono.
Historicamente responsáveis pela criação do problema, agora
propõe m a “solução” que mais atende a seus interesses. Possibilitando
a compra do “direito de poluir”, mecanismos como o REDD forçam as
denominadas “populações tradicionais”is (ribeirinhos, indígenas,
quilombolas, quebradeiras de coco, seringueiros etc.) a renunciarem a
autonomia na gestão de seus territórios.
Com isso, embaralham-se os papeis. O capitalismo, civilização mais
predadora da história da humanidade, não representaria nenhum
problema. Ao contrário, seria a solução. Os destruidores seriam agora
os grandes defensores da natureza. E aqueles que historicamente
garantiram a conservação natural são, agora, encarados como
predadores e por isso mesmo são criminalizados. Não surpreende,
portanto, que recentemente o Estado tenha tornado mais ostensiva a
repressão, a perseguição e até expulsão das populações locais de
seus territórios. Tudo para assegurar a livre expansão do mercado dos
bens naturais.
Com o indisfarçável apoio estatal, por esse e outros projetos o capital
hoje promove e conjuga duas formas de re-territorialização na região
amazônica. De um lado, expulsa povos e comunidades do território
(como é o caso dos grandes projetos como as hidrelétricas), privando-
os das condições de sobrevivência. De outro, tira a relativa autonomia
daqueles que permanecem em seus territórios, como é o caso das
áreas de conservação ambiental. Tais populações até podem
permanecer na terra, mas já não podem utilizá-la segundo seu modo
de vida.Sua sobrevivência não seria mais garantida pelo roçado de
subsistência - convertido em ameaça ao bom funcionamento do clima
do planeta -, mas por “bolsas verdes”, que, além de insuficientes, são
pagas para a manutenção da civilização do petróleo.
Cientes dos riscos que tais projetos trazem, rechaçamos o acordo de
REDD entre Califórnia, Chiapas, Acre que já tem causado sérios
problemas a comunidades indígenas e tradicionais, como na região de
Amador Hernández, em Chiapas, México. Por isso nos solidarizamos
com as populações pobres da Califórnia e Chiapas que já têm sofrido
com as consequências. Solidarizamo-nos também com os povos
indígenas do TIPNIS, na Bolívia, sob ameaça de terem seu território
violado pela estrada que liga Cochabamba a Beni financiada pelo
BNDES.
Estamos num estado que, nos anos de 1970-80, foi palco de lutas
históricas contra a expansão predatória do capital e pela defesa dos
territórios ocupados por povos indígenas e populações camponesas da
floresta. Lutas que inspiraram muitas outras no Brasil e no mundo.
Convertido, porém, a partir do final da década de 1990, em laboratório
do BID e do Banco Mundial para experimentos de mercantilização e
privatização da natureza, o Acre é hoje um estado “intoxicado”
pelo discurso verde e vitimado pela prática do “capitalismo verde”.
Dentre os mecanismos utilizados a fim de legitimar essa ordem de
coisas, ganha destaque a manipulação da figura de Chico Mendes. A
crer no que nos apresentam, deveríamos considerá-lo o patrono do
capitalismo verde. Em nome do seringueiro, defende-se a exploração
de petróleo, o monocultivo da cana-de-açúcar, a exploração madeireira
em larga escala e a venda do ar que se respira.
Ante tal quadro, cumpre perguntar o que mais não caberia nesse
modelo de “desenvolvimento sustentável”. Talvez em nenhum outro
momento os pecuaristas e madeireiros tenham encontrado cenário
mais favorável. É por essa razão que cremos necessário e urgente
combatê-lo posto que, sob aparência de algo novo e virtuoso, ele
reproduz as velhas e perversas estratégias de dominação e exploração
do homem e da natureza.
Por fim deixamos aqui nossa reivindicação pelo atendimento das
seguintes demandas: reforma agrária, homologação de terras
indígenas, investimentos em agroecologia e economia solidária,
autonomia de gestão dos territórios, saúde e educação para todos,
democratização dos meios de comunicação. Em defesa da Amazônia,
da vida, da integridade dos povos e de seus territórios e contra o REDD
e a mercantilização da natureza. Estamos em luta.

Rio Branco, Acre, 07 de outubro de 2011.

Assinam esta carta:

Assentamento de Produção Agro-Extrativista Limoeiro-Floresta


Pública do Antimary (APAEPL)
Amazonlink
Cáritas - Manaus
Centro de Defesa dos Direitos Humanos e Educação Popular do Acre
(CDDHEP/AC)
Centro de Estudos e Pesquisas para o Desenvolvimento do Extremo
Sul da Bahia (CEPEDES)
Comissão Pastoral da Terra – CPT Acre
Conselho Indigenista Missionário – CIMI Regional Amazônia Ocidental
Conselho de Missão entre Índios – COMIN Assessoria Acre e Sul do
Amazonas
Coordenação da União dos Povos Indígenas de Rondônia, Sul do
Amazonas e Noroeste do Mato Grosso - CUNPIR
FERN
Fórum da Amazônia Ocidental (FAOC)
Global Justice Ecology Project
Grupo de Estudo sobre Fronteira e Identidade - Universidade Federal
do Acre
Instituto Madeira Vivo (IMV-Rondônia)
Instituto Mais Democracia
Movimento Anticapitalista Amazônico - MACA
Movimento de Mulheres Camponesas (MMC - Roraima)
Nós Existimos - Roraima
Núcleo Amigos da Terra Brasil
Núcleo de Pesquisa Estado, Sociedade e Desenvolvimento na
Amazônia Ocidental -Universidade Federal do Acre.
Oposição Sindical do STTR de Brasiléia
Rede Alerta Contra o Deserto Verde
Rede Brasil sobre Instituições Financeiras Multilaterais
Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Bujarí (STTR - Bujarí)
Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Xapuri (STTR- Xapuri)
Terra de Direitos
União de Mulheres Indígenas da Amazonia Brasileira
World Rainforest Movement (WRM)
5. Lista de entrevistas realizadas durante a pesquisa e utilizadas na dissertação:

5.1. Osmarino Amâncio Rodrigues - 29 de Maio de 2013 - entrevista realizada por


Diogo Loibel Sandonato e Milson Bettancourt. Rio de Janeiro, RJ.

5.2. Alberto Tavares (CDSA) – 12 de Maio de 2014 – entrevista realizada por Diogo
Loibel Sandonato. Rio Branco, AC.

5.3. Ricardo Mello (WWF) – 14 de Maio de 2014 – entrevista realizada por Diogo
Loibel Sandonato. Rio Branco, AC.

5.4. Silvio Simione da Silva (UFAC) – 27 de Julho de 2014 – entrevista realizada por
Luiz Henrique Gomes de Moura. Rio Branco, AC.

5.5. Rodrigo Neves (PGE) – 09 de Maio de 2014 – entrevista realizada por Diogo
Loibel Sandonato. Rio Branco, AC.

5.6. Monica Julissa de Los Rios de Leal (IMC) – 16 de Maio de 2014 – entrevista
realizada por Diogo Loibel Sandonato. Rio Branco, AC.

5.7. Irvin Foster Brown (UFAC/WHRC/Comitê Científico SISA) – 27 de Agosto de 2014


– entrevista realizada por Diogo Loibel Sandonato. Rio Branco, AC.

5.7. Antônio Batista de Araújo (PESACRE) – 04 de Agosto de 2014 – entrevista


realizada por Diogo Loibel Sandonato. Assis Brasil, AC.

5.8. Diogo Selhorst (IBAMA) – 14 de Agosto de 2014 – entrevista realizada por Diogo
Loibel Sandonato. Rio Branco, AC.

5.9. Antônio Teixeira Mendes (PAE Chico Mendes) – 15 de Julho de 2014 – entrevista
realizada por Luiz Henrique Moura e Diogo Loibel Sandonato. Xapuri, AC.

5.10. Inácio Moreira Neto (ANAC) – 15 de Agosto de 2014 – entrevista realizada por
Diogo Loibel Sandonato. Rio Branco, AC.

5.11. Ronald Polanco (TCE) – 18 de Agosto de 2014 – entrevista realizada por Diogo
Loibel Sandonato. Rio Branco, AC.
5.11. José Fernandes do Rêgo (SAI) – 28 de Agosto de 2014 – entrevista realizada
por Diogo Loibel Sandonato. Rio Branco, AC.

5.12. Dalmo Rufino da Silva (ICMBio) – 16 de Julho de 2014 – entrevista realizada por
Diogo Loibel Sandonato. Xapuri, AC.

5.13. Écio Rodrigues (UFAC) – 21 de Agosto de 2014 – entrevista realizada por Diogo
Loibel Sandonato. Rio Branco, AC.

5.14. Renato Farias (SENDES Xapuri) – 17 de Julho de 2014 – entrevista realizada


por Luiz Henrique Moura e Diogo Loibel Sandonato. Xapuri, AC.

5.15. Maria Araújo Aquino (SEAPROF Xapuri) – 11 de Julho de 2014 – entrevista


realizada por Luiz Henrique Moura e Diogo Loibel Sandonato. Xapuri, AC.

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