Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
SANTOS
2021
GABRIEL FERREIRA RIBEIRO DE JESUS
SANTOS
2021
Primeiramente, dedico este trabalho a meu avô, que acompanhou meu processo de iniciar uma
graduação, tinha grandes perspectivas de me ver finalizar esse processo, mas não está aqui
para presenciar esse momento. Dedico este trabalho a todos que de alguma forma
participaram dele, sendo através de inspirações para o tema, contribuições bibliográficas,
conversas esclarecedoras ou colaborando com sua própria construção. Dedico aos meus pais e
amigos, meu orientador e todos que de alguma forma se beneficiem do conteúdo deste
trabalho.
AGRADECIMENTOS
Primeiramente quero agradecer aos meus pais, Reinaldo e Ligia, sem os quais eu não
estaria finalizando essa etapa tão simbólica na minha graduação, mas mais ainda, por terem
sempre me apoiado e se dedicado incansavelmente para que eu conseguisse chegar até esse
momento na minha formação acadêmica, como pessoa e como futuro profissional da
Psicologia.
Gostaria de agradecer ao meu orientador, Prof. Dr. Vinícius Demarchi Silva Terra, por
ter me guiado com tanto afeto na escrita e construção desse projeto com tanto, por seu
empenho em cada uma de nossas reuniões sempre a fim de garantir que eu estaria no melhor
caminho possível. Mas principalmente, por ter levado em conta minhas individualidades,
gostos e preferências ao compor a temática deste trabalho.
E por último, mas com certeza não menos importantes, gostaria de agradecer aos meus
amigos que me apoiaram durante cada etapa e progresso deste trabalho. Ao meu amigo Ciro,
por ter dado o pontapé inicial na construção das entrevistas. À minha amiga Luana, com sua
inesgotável praticidade para as minhas dificuldades de organização. E à minha segunda
família (Liam, Davi, Rômulo, Juan, Henrique e João), por terem comemorado em cada
pequena conquista minha e me dado o privilégio das suas companhias até esse ponto da
minha vida.
EPÍGRAFE
“A ciência atua na fronteira entre o conhecimento e a ignorância sem medo de admitir que
não sabemos. Não há nenhuma vergonha nisso. A única vergonha é fingir que temos todas as
respostas.”
Neil deGrasse Tyson
RESUMO
1. INTRODUÇÃO 10
2. DESENVOLVIMENTO 11
2.1 Revisão de literatura 11
3. METODOLOGIA 15
3.1 Pesquisa qualitativa 15
3.2 Instrumentos 15
3.3 Coleta de Dados 16
3.4 Análise dos Resultados 17
3.5 Riscos do projeto 17
4. RESULTADOS 19
5. DISCUSSÃO 24
5.1 A percepção ampliada do processo de preparação para show 24
5.2 Análise dos objetivos do aquecimento 28
5.3 Concepções dos entrevistados sobre as práticas meditativas 32
6. CONCLUSÃO 34
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 36
APÊNDICES 38
ANEXOS 42
10
1. INTRODUÇÃO
Para o autor deste Trabalho de Conclusão de Curso, o tema da música sempre foi algo
de grande interesse durante todo o período de graduação. Por ter sempre tido enorme
proximidade, devido à prática instrumental de bateria, fez com que desde o início do projeto
houvesse a intenção de pesquisar algo relacionado à música. Para o autor, tocar um
instrumento musical tem grande significado subjetivo, por conta de possibilitar uma expressão
da individualidade particular do sujeito, revelando emoções, pontos de vista, experiências
vividas, crenças, entre outras temáticas relativas ao ambiente no qual o indivíduo está
inserido. Ainda, por conta do orientador deste trabalho ter conhecimento sobre área de
práticas meditativas, foi decidido fazer a investigação aprofundada a respeito da possível
relação entre as duas temáticas, pensando a preparação anterior à performance pública como
um momento no qual haveria qualidades meditativas envolvidas.
Ademais, apurar como se dá o funcionamento e o efeito das práticas de aquecimento
para músicos, por meio da base teórica das práticas meditativas, pode ser bastante proveitoso
para o ramo da Psicologia como um todo. Tendo em mente que tais práticas agem sobre
processos cognitivos (EYSENCK; KEANE, 2017), uma correlação entre ambos os conteúdos
possibilita maior entendimento sobre os efeitos que o aquecimento possui sobre a cognição de
músicos.
Além disso, mais especificamente com relação à área de pesquisa em música, e muito
possivelmente o ramo da “Psicologia da Música” (Music Psychology), as contribuições deste
trabalho visam a investigação minuciosa e qualitativa das estratégias de aquecimento
utilizadas por músicos, incluindo também suas estratégias para manejo de ansiedade ligada à
performance. Nesse sentido, explicitar quais são algumas dessas estratégias, como funcionam
e qual sua relação com a organização do preparo para show proporcionaria grandes avanços
para as competências técnicas e saúde mental da classe musicista.
Por fim, há a contribuição conceitual sobre a “ansiedade de performance musical” (ou
MPA), temática que será detalhadamente abordada no decorrer deste trabalho, haja vista que
se tornou um conceito crucial para desenvolvimento deste estudo. A MPA é qualificada como
um fenômeno multidimensional, variando seu grau de influência de acordo com a
11
2. DESENVOLVIMENTO
1
No trabalho citado, primariamente selecionou-se artigos empíricos e teóricos, teses, dissertações e livros, ao
longo de 10 anos; e numa seleção secundária, publicações mais antigas, com maior número de citações e
referências de revistas de alto impacto foram escolhidas. Com esse método, foram apreciados inicialmente 1730
trabalhos, porém 27 satisfizeram os critérios levantados.
13
avaliados por este grupo de pesquisadores concluem que técnicas de meditação Mindfulness e
Zen foram benéficas para os musicistas, pois, além de auxiliarem nos pontos já citados, as
habilidades meditativas adquiridas permitiriam a transformação da MPA em propulsor
qualitativo da execução artística, ao interpretar a situação ansiogênica como um desafio e com
isso nutrindo a interpretação da obra tocada.
Em afinco com os trabalhos supracitados, revisões de periódicos realizadas por Diaz
(2018) atestam práticas meditativas, do tipo Mindfulness, transcendental, yoga, tai chi, entre
outras, tiveram maior chance de redução de estresse psicológico em músicos,
consequentemente, melhorando a qualidade da performance. Particularmente, Diaz (2018)
também analisou a relação entre traços de perfeccionismo, traços de Mindfulness, meditação e
a redução de MPA em musicistas, concluindo que uma parte considerável dos participantes
praticava meditação (48%), obtendo então redução de MPA apesar de manterem níveis
constantes de perfeccionismo e traços de Mindfulness.
Para além da performance, a meditação tem se mostrado benéfica no dia-a-dia ao ser
mantida como uma prática regular. Seus benefícios abrangem: diminuição da frequência
cardíaca, pressão arterial, colesterol, sintomas de ansiedade e depressão; aumento de
bem-estar, nível de percepção e atenção, memória e concentração; melhora da coordenação
motora e tempo de resposta, dentre outros benefícios (GOMES, 2016).
O termo meditação pode ser entendido tanto como um estado de consciência quanto
como uma técnica, e como uma técnica é possível de ser descrito, refinado e passível de ser
usado em protocolos de pesquisa.
Seguindo a definição de Cardoso et al. (2016), o processo meditativo ocorre a partir de
um foco em si mesmo, o qual é usado pelo indivíduo como ponto de retorno quando ele
percebe que está se deixando levar pelo fluxo de pensamentos, continuando até atingir o
“relaxamento lógico”; desta forma, o estado meditativo pode proporcionar uma melhora
significativa na atenção e no estado de humor do indivíduo, os quais são fatores
importantíssimos para que o instrumentista consiga ter uma boa performance pública.
Com relação à situação anterior à performance, Paull e Harrison (1998) propõem que
o artista faça alguma forma de aquecimento. Alguns exemplos seriam uma caminhada ou trote
rápido, e subir e descer escadas repetidamente, de modo que se sinta mais quente e
fortalecido. Também é possível aquecer com o instrumento, sendo uma ilustração clara o
preparo que pianistas efetuam ao praticarem escalas e arpejos em sequência, alternando a
14
velocidade a medida que vão se sentindo confortáveis para isso e dependendo da demanda do
concerto em questão (PAULL e HARRISON, 1998).
O estudo de Zaza e Farewell (1997) explicita que o aquecimento musical, assim como
intervalos entre momentos de prática, devem ser incorporados à rotina do musicista, pois tem
potencial preventivo de lesões musculoesqueléticas, além de poderem contribuir no processo
de aprendizado e treino do instrumento. Em conformidade, Gonçalves (2014) argumenta que
o aquecimento musical tem como propósito não apenas uma preparação física, mas também
auxilia na concentração e foco das características sonoras, proporcionando melhora dos
momentos de estudo e de apresentação. Ademais, a autora indica que o aquecimento pode
englobar outros propósitos como: antecipação de problemas; introdução de novos conteúdos
de forma simples e lógica; e ainda, representar uma forma de preparação física e psicológica.
Por fim, considerando então essa forma de preparo como sendo o “aquecimento”
como descrito por Gonçalves (2014), pode-se afirmar que ele possui elementos de preparo
não só físico – preparação de forma relaxada, sem tensão dos músculos e gradual – como
também de preparo psicológico – tomada de consciência de fatores relevantes para aspectos
musicais mais detalhados.
A Figura 1 ilustra o processo descrito acima, indo do “foco na Âncora” para o “efeito de
exercitar o foco na Âncora”, então o “Relaxamento Lógico” e em seguida deixando-se envolver no
“fluxo de pensamentos” para enfim retornar ao “foco na Âncora”. Fonte: Autoria própria.
15
3. METODOLOGIA
3.2 Instrumentos
4. RESULTADOS
A Tabela 1 exibe dados dos perfis dos entrevistados, a fim de constatar possíveis
informações em comum entre os participantes. As informações presentes são idade,
instrumento(s) tocado(s), nível de escolaridade, profissão, tipo de vínculo com a instituição da
qual os participantes foram indicados, cidade e bairro onde residem, frequência de prática
com o(s) instrumento(s), duração média diária do treino com o(s) instrumento(s), a quanto
21
A seguir constam as tabelas respectivas à cada categoria juntamente com falas dos
sujeitos.
Percepção ampliada do processo de E1: Normalmente coletivo. Porque normalmente a gente está em
preparação da performance pública camarim, né, então antes da apresentação a gente fica junto no
camarim. Então tem muita brincadeira né, a gente... a banda é
muito sarrista assim, então tira bastante sarro, brinca, a gente está
comendo junto, tomando bebida junto, então tem essa coisa de
deixar o clima bom, né. [...] Não, a gente não tem esse costume de
fazer prática com instrumento antes do show. A prática acontece
na passagem de som, a gente vai montar lá né, fazer o
soundcheck. Os cantores que fazem aquecimento sim, os cantores
têm lá as técnicas para aquecer e tal, entendeu.
Num geral, como exposto na Tabela 2.1, os sujeitos demonstraram uma percepção
ampliada do processo de preparação da performance pública, pois não era caracterizado
apenas como um período específico com ações pontuais a serem realizadas. Dependendo da
demanda do show e das particularidades de cada entrevistado, a organização para a
apresentação poderia iniciar meses, semanas ou até momentos antes e cada entrevistado
possui técnicas individuais a serem realizadas no pré e pós show.
23
Manejo de ansiedade E5: Mas geralmente, pelo menos antes de tocar, seja num lugar
pequeno ou grande eu sempre tiro, antes de ir para o palco, tiro
uns 10 - 15 minutos, perto da hora de começar...eu dou uma
respirada, acalmo, eu ponho a música no fone de ouvido só para
dar uma dispersada no ambiente [...].
Prevenção de lesões E7: Essa questão do preparo físico e tal, porque...como a gente é
batera, meu, a gente faz muito movimento repetitivo, né. E...puts,
conheço tanto cara que tem tendinite por causa disso. E quando
você aquece, você alonga, você está evitando né, dar uma
tendinite ou alguma coisa do tipo…
Manejo de ansiedade (abordagem E4: Como sempre...parece que o meu cérebro parece que não quer
psicológica) parar de funcionar, então eu tinha muita dificuldade para dormir.
E, naquela técnica de meditação simples que ele ensina é a
concentração no respirar. Incrível como começou a funcionar, eu
comecei a conseguir dormir.
Espiritualidade e contemplação E1: Então eu gosto de [ir à] praia, cachoeira, eu gosto de pescar e
(abordagem espiritual) essas coisas eu gosto assim, na maioria das vezes de fazer sozinho
sabe, que é a hora que eu consigo poder colocar a cabeça no lugar,
tomar algumas decisões, traçar alguns rumos.
Fonte: Autoria própria.
5. DISCUSSÃO
A partir da Tabela 2.1 tornou-se possível salientar que os sujeitos atribuem diferentes
perspectivas de planejamento das tarefas, etapas e tempo gasto no preparo pré-apresentação.
Dependendo da demanda do show e das particularidades de cada entrevistado, a organização
para a apresentação poderia iniciar meses, semanas ou até momentos antes, envolvendo
métodos e interações grupais distintas, e cada entrevistado possui estratégias individuais a
serem realizadas no pré, e ocasionalmente, no pós show.
Os dados coletados evidenciaram um interessante contraponto, levando-se em conta os
pressupostos iniciais, os quais foram adotados inclusive durante as entrevistas
semi-estruturadas. A princípio, assumiu-se que previamente à apresentação havia apenas o
aquecimento, portanto, esta seria a noção de preparo. Sendo assim, para este estudo o
aquecimento foi considerado como uma técnica cujo objetivo é a preparação de forma
relaxada e sem tensão dos músculos, de forma que os exercícios praticados sejam
moderadamente variados e desafiadores e, por fim, proporcionem o aumento gradual da
circulação sanguínea sem causar estresse à musculatura (PAULL e HARRISON, 1998).
No entanto, como exposto na Tabela 2.1, os sujeitos demonstraram perceber de forma
estendida o processo de preparação da performance pública, não o caracterizando apenas
como um período específico com ações pontuais a serem realizadas. O seguinte trecho ilustra
o contraponto entre a conceituação teórica encontrada inicialmente e as informações
adquiridas através das entrevistas:
Então, isso varia muito, né. Como eu te falei, na parte de instrumento não é uma
coisa que a gente leva o instrumento para o camarim e fica praticando, assim essa
prática é feita através de ensaio, né. Nos ensaios sim, nos ensaios a gente pega a
música e volta do início milhões de vezes até montar o arranjo que a gente quer. Na
hora do show mesmo o contato com o instrumento que a gente tem é durante o
soundcheck né. Então por exemplo assim, às vezes a gente passa o som quatro da
tarde o show vai ser só meia noite, então nesse meio tempo é onde a gente faz a
parte de confraternização assim...Pra te ser bem sincero, não existe uma coisa assim
“Agora vamos nos concentrar para o show”, isso não ocorre assim, acaba ocorrendo
de maneira é...sem querer, de maneira não “imposicional”. A gente tenta quebrar
o… Todo show existe um receio né, uma ansiedade, a gente quebra isso através de
amizade, de papo, de sarro [...] (ENTREVISTADO 1).
26
É preciso, ainda, fazer uma consideração quanto ao uso de uma periodização mais
ampla do preparo, pois esta conformação torna mais propícia a aplicação de variadas
estratégias de coping, consequentemente, favorecendo a redução de estresse e melhores
condições para a execução do show. Esta vantagem organizacional não pareceu ser
28
outros exemplos similares aos que já foram apresentados nos diversos trechos de
entrevistados ao longo deste trabalho.
Em suma, a análise das informações das tabelas 2.1 e 3 explicitam que o uso de
estratégias semelhantes à Periodização de Treinamento tornam a organização e preparo para
apresentação muito mais eficazes, além de viabilizar considerável redução de ansiedade e
estresse ao prover tempo suficiente para que os músicos apliquem diversas estratégias de
coping.
[...] e aí, no caso, pego as baquetas e um PAD, e sem pedal mesmo, sento no sofá do
camarim, coloco o PAD em qualquer superfície plana, par de baquetas e começo a
tocar e fico aí uns 40 minutos pelo menos, fazendo os exercícios comuns do
dia-a-dia, aquecimento em rudimentos2 e tal. Mas nada muito pensado, só para
principalmente esquentar os tendões né… (ENTREVISTADO 4).
No entanto, o uso de tal recurso tem seus limites. Segundo Farnsworth-Grodd (2012),
a repetição incessante com intenção de tornar o movimento o mais automático possível acaba
sendo um método menos efetivo. Diante disso, a autora defende a técnica de Mindfulness
como um modo de dispor um “engajamento cognitivo” na aprendizagem. A técnica citada
permite sentir, explorar e refinar características da tarefa, portanto, desencadeando evoluções
mais consistentes do que aquelas através de repetição constante. A autora demonstra que por
meio da meditação Mindfulness é possível aprimorar a atenção e concentração de modo a
sustentá-los em uma prática focada e exploratória. Esta percepção dos comportamentos
condicionados - o chamado “piloto automático” -, com o refinamento das tomadas de
consciência (meta-awareness) é uma dos desfechos esperados da prática de Mindfulness que,
segundo (Kabat-Zinn, 1994), é o estado de consciência que emerge pelo prestar atenção, de
forma aberta e sem julgamento, no momento presente.
Esta proposta de uma preparação mais engajada mentalmente foi pouco encontrada
nos métodos e técnicas utilizados pelos entrevistados do presente estudo, pois eles parecem
tender à repetição de padrões, aos treinos sucessivos, em busca da performance esperada. No
entanto, pudemos identificar que alguns entrevistados procuram manter um “engajamento
2
Rudimentos de percussão são pequenas combinações padronizadas de baqueteamento, que formam padrões
rítmicos e cadências mais complexos da bateria, com o objetivo de fazer os percussionistas tocarem em
uníssono, e desenvolverem a coordenação, sensibilidade e, destreza entre as mãos durante a execução no
instrumento.
31
Não, eu mentalizo bastante aquilo que eu vou fazer. Eu estou me alongando, por
exemplo, antes de sentar, já estou me alongando olhando meio que para os tambores
dizendo “Ah, tal frase eu posso começar nesse tambor.”. Porque sempre muda a
quantidade de tambores que você vai tocar, de um canto para o outro. Então eu
começo me alongando, para depois eu ir para a bateria me aquecer e a mentalidade é
sempre aquela: “Ah, tal música vai ficar legal isso”, “Tal música vai ter um
improviso que eu posso fazer isso”. (ENTREVISTADO 6).
Ademais, as respostas dos entrevistados muitas vezes não foram tão descritivas para
identificar características constitutivas de processos meditativos, como no trecho a seguir:
Depende do dia… Que nem, se é um show que eu já faço aqui, que eu estou me
aquecendo e tal, estou focado aqui. [...] Beleza...pego o repertório e tal, só que tem
essa questão, né. Você nunca ensaiou, nunca tocou, não sabe como que o pessoal
toca, então eu fico meio apreensivo no início, tal e...faço alongamento, aquecimento
pensando nas músicas que vai rolar no show, como que vai ser, né?
(ENTREVISTADO 7).
5.3 Concepções dos entrevistados sobre as práticas meditativas (Tabela 2.3), variando
do manejo de ansiedade à relação com espiritualidade
6. CONCLUSÃO
Este trabalho teve como objetivo principal a investigação qualitativa dos métodos e
técnicas utilizados por músicos a fim de prepararem-se para apresentações públicas,
relacionando-as com a bibliografia pertencente às práticas meditativas e buscando pontos
comuns. Inclusive, a hipótese levantada foi que as técnicas de preparo utilizadas,
especialmente para eventos de performance pública, contém elementos estruturais de uma
prática meditativa.
Quanto à averiguação das táticas utilizadas por músicos, a análise de conteúdo de seus
relatos foi bastante satisfatória nesse quesito. As categorias desenvolvidas permitiram que
verificações aprofundadas e mais precisas fossem realizadas.
Posto isto, foi possível apurar que os participantes deste estudo adotam diferentes
organizações de preparo para suas apresentações, mas em sua maioria, a estrutura
assemelha-se com a de Periodizações de Treinamento, por conta da divisão temporal e seleção
de táticas a serem utilizadas a depender de características do show (como data e complexidade
da performance). Além disso, especulou-se que ao decompor a preparação em períodos
longos, resulta em mais oportunidades para que diferentes estratégias de Coping sejam
empregadas e, por consequência, haja maior eficácia na execução da apresentação e também
maior redução de estresse e ansiedade. Com a análise final supôs-se também que, o
conhecimento leigo associa meditação, em parte, às ciências e terapêuticas da saúde mental
(pela diminuição de estresse e ansiedade), mas também à expressão de espiritualidade, sendo
necessários estudos mais aprofundados para entender estas associações e predominância das
questões de cuidado e terapêutica.
Ao examinar a categorização dos dados coletados, concluiu-se que as técnicas e
estratégias utilizadas pelos entrevistados associam-se com maior exatidão à utilização de
recursos de Coping o u modos mais informais de mentalização. Ainda assim, é possível fazer
alguma aproximação ao conceito operacional de Cardoso et al. (2016), entendendo que os
métodos empregados demonstram possuir, ainda que não todas, algumas características
constitutivas de meditação como: usar uma técnica específica e definida; proporcionar um
estado auto-induzido; e utilizar um artifício de auto-focalização. Dadas essas considerações, é
razoável admitir que o objetivo principal deste estudo foi totalmente satisfeito, porém há
informações insuficientes para totalmente confirmar a hipótese.
36
O presente estudo teve diversas limitações. Primeiro, nossa amostra foi relativamente
pequena, por conta da seleção de candidatos ter sido restrita à disponibilidade de professores
da escola, e uma amostra maior permitiria dados mais consistentes. Segundo, todos os
entrevistados eram pertencentes à mesma instituição de ensino musical, possivelmente
afetando a variedade das formas de aprendizado e preparo musical. Terceiro, a grande maioria
dos participantes toca o mesmo instrumento musical, influenciando novamente a diversidade
de técnicas de aprendizado e preparo. Quarto, tal homogeneidade também se manifesta em
relação aos marcadores sociais de gênero, raça, geração, condições de moradia e escolaridade
dos indivíduos. Por último, é importante levar em conta o enviesamento do pesquisador ao
verificar o material coletado nas entrevistas, e ao fazer o comparativo com a literatura
acadêmica.
Também é importante frisar que, devido ao formato deste estudo e às características da
amostra, não foram levados em consideração os aspectos citados por Papageorgi; Hallam e
Welch (2007) com relação à influência da MPA sobre musicistas. Este estudo objetivou
outros tópicos, portanto a predisposição do sujeito à ansiedade, dificuldades para executar
obras musicais e o ambiente da apresentação não fizeram parte do escopo investigado. Ainda,
não foi englobado no trabalho discussões sobre os conceitos de corpo e arte, pois são diversos
e não fez parte do enfoque desta pesquisa desenvolver aprofundar essa discussão teórica.
A despeito desse entendimento, as extensivas bibliografias revisadas contribuíram
para difusão de conteúdos e conceitos-chave ligados à área musical. Constatou-se a
importância da definição de MPA, o qual foi pouquíssimo encontrado nos trabalhos
brasileiros consultados, tendo em vista que foi um ponto crucial na construção desta pesquisa.
Também, foi possível averiguar a capacidade de aprimoramento para evolução
técnica-musical proporcionada pela meditação Mindfulness, permitindo evoluções mais
consistentes do que aquelas através de treinamento recorrente, utilizando-se de “engajamento
cognitivo” durante a preparação.
É encorajado que estudos futuros investiguem com maior rigor não só a relação entre
práticas meditativas e preparo para performance pública, mas que principalmente levem em
conta as concepções mais atualizadas sobre “ansiedade de performance musical” (Music
Performance Anxiety).
37
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALDWIN, Carolyn M.; REVENSON, Tracey A. Does coping help? A reexamination of the
relation between coping and mental health. Journal of personality and social psychology, v.
53, n. 2, p. 337, 1987.
CARVER, Charles S.; SCHEIER, Michael F.; WEINTRAUB, Jagdish K. Assessing coping
strategies: a theoretically based approach. Journal of personality and social psychology, v.
56, n. 2, p. 267, 1989.
COLZATO, Lorenza S.; KIBELE, Armin. How different types of meditation can enhance
athletic performance depending on the specific sport skills. Journal of Cognitive
Enhancement, v. 1, n. 2, p. 122-126, 2017.
GOMES , Romeu. A Análise de Dados em Pesquisa Qualitativa. In: MINAYO , Maria Cecília
de Souza et al. Pesquisa Social: Teoria, Método e Criatividade. Petrópolis: Vozes, 2002.
ZINNBAUER, Brian J. et al. Religion and spirituality: Unfuzzying the fuzzy. Journal for the
scientific study of religion, p. 549-564, 1997.
ZHANG, J. Diana et al. The definition of a musician in music psychology: A literature review
and the six-year rule. Sage Journals Publishing , [S. l.], p. 1-21, 22 out. 2018. Disponível
em: https://journals.sagepub.com/doi/abs/10.1177/0305735618804038?journalCode=poma.
Acesso em: 22 jun. 2019.
39
APÊNDICES
Pós-apresentação
(avaliação, resolução
de conflitos)
Aquecimento para
prevenção de lesões
ANEXOS