A especialista conta que a luta pela reforma psiquiátrica come-
çou na década de 70 com denúncias de que pacientes internados
em hospitais psiquiátricos sofriam maus-tratos, fome, frio, agres- sões, estupros, e ainda a influência da chamada “indústria da lou- cura”, que buscava lucros em cima do tratamento desses pacien- tes. Melissa acrescenta que, na época, já havia bons exemplos de 9º TEMA tratamentos alternativos, abertos, em cidades como Santos (SP), Fortaleza (CE) e Belo Horizonte (MG), nos quais os pacientes Texto I mantinham contato com a sociedade. Conheça a macabra história do maior hospício do Brasil O maior hospício do Brasil funcionou em um prédio de Barba- Hospitais psiquiátricos cena, em Minas Gerais. Chamado de Hospital Colônia, o edifício foi Dados do Ministério da Saúde mostram que entre 2002 e 2015 palco de verdadeiras e sombrias torturas. houve redução de 51,3% no número de leitos em hospitais psiquiá- De 1950 a 1980, doentes mentais e pessoas normais foram tor- tricos, caindo de 51.393 para 25.009. Segundo a pasta, ainda há turadas e mortas dentro do hospital psiquiátrico e até hoje, as 163 hospitais psiquiátricos no país, distribuídos em 113 municípios denúncias de maus-tratos não foram investigadas e não há puni- de 23 estados. Atualmente, a maioria dos atendimentos é feita nos dos. Na época em que o manicômio funcionava, os pacientes eram 2.328 Centros de Atenção Psicossocial espalhados pelo país. Para enviados para lá de trem e sem se quer tomarem conhecimento do os pacientes que ficaram muito tempo internados e não têm para motivo e das sessões de terror a que seriam submetidas ao passa- onde ir, existem as residências terapêuticas, casas onde essas rem da portaria. pessoas são acompanhadas por profissionais sem sair do convívio O desembarque dos pacientes era feito nos fundos do mani- com a sociedade. cômio e, em seguida, todos tinham que entregar os documentos e pertences. Além disso, eles eram obrigados a vestir uniformes, Modelo brasileiro tinham a cabeça raspada e tomavam banho gelado. Tratamento Segundo Walter Oliveira, presidente da Associação Brasileira muito parecido com os campos de concentração nos tempos de de Saúde Mental e professor da Universidade Federal de Santa guerra. Catarina, o modelo brasileiro hoje é referência na Organização das O Hospital Colônia era uma espécie de depósito de lixo huma- Nações Unidas. “É muito mais produtivo do ponto de vista terapêu- no, onde os internados perdiam a identidade e a dignidade. Em tico você tratar uma pessoa fora da internação do que internada”. torno de 60 mil pacientes que viviam em condições sub-humanas O especialista esclarece que esse novo modelo não exclui a possi- no maior hospício do Brasil morreram. Os pacientes dormiam bilidade de internação. “Você pode ter necessidades pontuais de amontoados no chão, que apenas era forrado com capim. Eles internação, mas não é uma regra, deveria ser como qualquer outra também eram trancados, castigados e chegaram a testemunhar especialidade médica, uma exceção, por menos tempo do que os alguns corpos de colegas serem queimados em tanques de com- hospitais costumam ditar”. bustíveis. Para o professor, a forma como a sociedade vê as pessoas A internação dos pacientes era feita a mando de autoridades com transtorno mental é um fator de exclusão. “Há um avanço, um locais, como delegados, prefeitos, vereadores e padres, além de grande avanço que levou a uma compreensão melhor, uma aceita- familiares. Normalmente, os mandados para o manicômio eram ção da diversidade, e com isso veio uma certa compreensão me- pessoas que perderam os documentos, mães solteiras, mulheres lhor da saúde mental. Mas ainda há muitos resquícios de incom- que perderam a virgindade antes do casamento e prostitutas. preensões resultadas de falhas educacionais, de achar que toda Hoje, o cenário de tanto horror ainda atende doentes mentais. pessoa com transtorno psíquico é incapaz. O país perde muito com Mas, segundo a diretora do hospital, a realidade do manicômio é isso, pois as pessoas partem do pressuposto de que ela não pode bem diferente. Ao todo, 174 pacientes são tratados com dignidade, trabalhar, produzir, e aí relega a pessoa com transtorno a um de- têm cama, refeitório e lazer. Toda a história de horror do maior semprego, a uma falta de significado de função na sociedade”. hospício do Brasil pode ser relembrada no Museu da Loucura, que Embora o país tenha vivenciado avanços, Melissa de Oliveira foi construído no prédio onde funcionava o manicômio. acredita que o sistema manicomial no Brasil é usado hoje inade- Entre os medicamentos usados no tratamento dos doentes quadamente para o tratamento de usuários de álcool e drogas, mentais existia o chá da meia noite, que era uma espécie de inje- com denúncias de maus-tratos. ção letal. Quando os pacientes morriam e a família não reivindica- (Disponível em: http://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2016-05/reforma- psiquiatrica-tem-avancos-mas-brasil-ainda-vive-processo-de-transicao/ va o corpo, eles eram doados para faculdades. Ao todo, 1853 Acesso em: 25-8-2018 Adaptado.) cadáveres forram entregues para 17 universidades. Texto III (Disponível em: https://www.ahoradomedo.com.br/conheca-macabra-historia-do- maior-hospicio-do-brasil/ Acesso em: 25-8-2018 Adaptado) Texto II Reforma psiquiátrica tem avanços, mas Brasil ainda vive pro- cesso de transição Após mais de 15 anos de vigência, a lei que estabelece a re- forma no modelo de atenção à saúde mental no Brasil tem promo- vido mudanças positivas para o tratamento de pessoas com trans- tornos mentais. No entanto, na semana em que se reforça a luta antimanicomial, especialistas lembram que o país ainda está em processo de transição, já que o sistema que preconiza os trata- mentos alternativos à internação hospitalar ainda convive com a existência de manicômios. A pesquisadora da Escola de Saúde Pública Sérgio Arouca (Fiocruz) Melissa de Oliveira ressalta que a Lei 10.216, que forma- (Disponível em: liza a reforma psiquiátrica no Brasil, prevê o fechamento dos hospi- https://bhaz.com.br/2018/05/15/samba-luta-antimanicomial-desfile-1/ tais psiquiátricos, mas não dá um prazo para isso. "A gente tem o Acesso em: 25-8-2018 Adaptado) convívio entre uma psiquiatria ultrapassada, já cientificamente questionada, essa que se baseia exclusivamente na lógica médica A partir da leitura dos textos motivadores e com base nos conhe- e nos espaços asilares, e novos modelos mais avançados em cimentos construídos ao longo de sua formação, redija texto disser- saúde mental, em que o serviço é aberto, voltado para a comuni- tativo-argumentativo em norma padrão da língua portuguesa sobre dade". Para a ativista na luta antimanicomial, o processo não se o tema A realidade das pessoas com transtornos mentais em encerra mesmo com os leitos fechados, porque nos novos serviços questão no Brasil, apresentando proposta de intervenção, que existe o risco de a lógica manicomial continuar, "a lógica da tutela e respeite os direitos humanos. Selecione, organize e relacione, de da redução de todos os problemas da pessoa considerada louca a forma coerente e coesa, argumentos e fatos para defesa de seu uma questão médica, e a gente vê isso acontecendo hoje em dia". ponto de vista. Por que ser 10, se você pode ser 1000?