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O DISCURSO DE HOMOSSEXUAIS MASCULINOS SOBRE O

HOMOEROTISMO.

THE HOMOSSEXUAL MEN’S DISCOURSE ABOUT THE


HOMOEROTISM.

Marcela Pastana, Ana Cláudia Bortolozzi Maia


Campus de Bauru – Faculdade de Ciências– Psicologia – marcelapas@gmail.com

Palavras chaves: sexualidade; homossexualidade; preconceito.


Keywords: sexuality; homosexuality; prejudice.

1- INTRODUÇÃO
A homossexualidade refere-se a uma prática de relacionamento afetivo e sexual entre
pessoas de “mesmo sexo” biológico. A palavra tem raiz do grego Homos e significa “semelhante”;
“igual”. A compreensão da homossexualidade, influenciada pelos dogmas da religião judaico-cristã
e também pela medicina e pela ciência do século XX, referia-se a um fenômeno patológico e
aberrante baseado, sobretudo, pela “normalidade” atribuída à heterossexualidade, como sendo a
condição natural destinada a reprodução dos seres humanos. Práticas sexuais “naturais” seriam
aquelas que visavam a reprodução humana e tudo o que não levasse a essa finalidade era tido como
anormal, indesejável e pecaminoso, passível de julgamento moral e criminoso (RIBEIRO, 2002;
2005; KATZ, 1996; SPENCER, 1996; ROUDINESCO, 2003).
Historicamente, a homossexualidade foi então divulgada pela opinião científica, médica e
psiquiátrica como uma doença congênita resultante de alguma anormalidade associada a problemas
mentais na família, visão que, associada às idéias emergentes de eugenia e pureza racial dos últimos
30 anos do século XX teve conseqüências desastrosas. As teorias que surgiram foram várias e
métodos como a lobotomia, a hipnose, a castração e, ainda, as terapias aversivas e reparativas foram
usados na tentativa de reversão e cura da homossexualidade. As teorias e os métodos de “cura”
tinham almejavam alterar as preferências e os desejos individuais das pessoas para que elas
seguissem às normas sexuais da sociedade (COSTA, 2002; NAPHY, 2004).
Ao longo dos tempos estas posturas relacionadas ao indivíduo homossexual reproduziram
violência e discriminação. Em contraste com a infinidade expressiva do potencial erótico dos
sujeitos, ideais normativos de realização ou perfeição sexuais foram e são impostos aos indivíduos
nas diversas culturas e em diferentes momentos históricos, através de regras produzidas e
transmitidas de modo a parecerem estáveis, naturais e universais. A heteronormatividade diz
respeito à postura de aprovação social diante da heterossexualidade, considerando o relacionamento
entre pessoas de diferentes sexos como a única forma aceitável e válida de relação afetivo-sexual,
tornando-o padrão, um modelo hegemônico e “qualitativamente” superior em relação à
homossexualidade. A crença básica de que os seres humanos são naturalmente divididos em
“homossexuais” e “heterossexuais” não é questionada, alimentando a concepção errônea de que há
uma essência, uma estrutura e um conjunto de traços comuns e determinantes àqueles considerados
homossexuais (COSTA, 2002; KATZ, 1996; FIGUEIRO; 1996).
A Psicologia, como uma ciência que estuda os comportamentos humanos a partir de
diferentes abordagens teóricas, tem considerado a homossexualidade como um variante da
sexualidade humana. Desde a década de 70, a homossexualidade não é caracterizada como doença,
nem patologia psiquiátrica e, em 1999, o Conselho Federal de Psicologia declara que os psicólogos
não colaborarão com eventos e serviços que proponham tratamento e cura para a homossexualidade,
estabelecendo normas de atuação aos psicólogos em relação a este assunto. Não se prioriza mais, no
campo de atuação psicológico a busca pelas “explicações e causas” pois isso pode reforçar o
preconceito que pesa sobre essas pessoas, uma vez que, independentemente do porque sentem
desejo homoerótico, as pessoas teriam o direito de viver comportamentos homossexuais e/ou uma

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condição homossexual, se isso lhes for prazeroso e satisfatório (COSTA, 2002; KATZ, 1996;
NAPHY, 2004).
Parece consenso que a homossexualidade, como complexa manifestação erótica, faz parte da
sexualidade humana e historicamente ela tem sido atrelada moralmente às questões de desvio e de
perversão. Muitas mudanças ocorreram nas sociedades em prol da eqüidade de direitos de
homossexuais, embora ainda se prevaleça, em muitos discursos, equívocos, preconceitos e
dificuldades para lidar com a diversidade humana. Há certa imagem estereotipada sobre as pessoas
homossexuais, reforçada em vários setores da sociedade, generalizando de modo grosseiro e
equivocado àqueles que assumem a homossexualidade. Neste sentido, seria importante desvelar
concepções sobre a homossexualidade almejando atender os segmentos que mais necessitem de
esclarecimentos sobre o assunto visando diminuir as atitudes sociais preconceituosas.

2. OBJETIVOS
Investigar, a partir do relato de pessoas que se assumem homossexuais, a concepção que têm
sobre o fenômeno da homossexualidade, especialmente sobre as motivações de sua manifestação, as
características e padrões de comportamentos envolvidos, etc. Pretende-se com os dados obtidos,
confrontar as crenças e as concepções das pessoas, sejam estas homossexuais ou não, e também
com os dados da literatura de modo a esclarecer possíveis equívocos que alimentam o preconceito e
a discriminação às práticas contrárias à norma heterossexual vigente.

3. MÉTODO
Todos os procedimentos éticos foram respeitados e esta pesquisa só foi realizada após
parecer favorável do Comitê de Ética em Pesquisa – CEP da FC-Unesp, Bauru e os participantes
foram voluntários. Participaram 40 homens, de idade média de 26 anos, a maioria jovens
universitários, que responderam, individualmente, a um questionário com questões fechadas. A
análise de dados foi o qualitativo-quantitativo (SPATA, 2005), isto é, envolveu o cálculo de
freqüência e, sobretudo, a análise temática Franco (2005).

4. RESULTADOS.
4.1 Percepção da homossexualidade
A maioria dos homens relatou ter descoberto a homossexualidade no período da puberdade e
adolescência (entre 11 e 18 anos), percebendo o desejo sexual por pessoas de mesmo sexo. Os
sentimentos mais freqüentes, diante desta descoberta, foram ‘medo’ e ‘insegurança’. Atualmente,
quem sabe da homossexualidade são os amigos e familiares, porque as pessoas relataram
verbalmente a eles.

4.2 Vida afetiva e sexual


A maioria da primeira relação sexual ocorreu, segundo eles, com consentimento, entre 15 e
19 anos de idade, com parceiro de mesmo sexo (17) e sexo oposto (10) e foi uma experiência
regular (nem boa, nem ruim). Atualmente a maioria dos participantes relatou manter relações
afetivo-sexuais exclusivamente homossexuais, com vínculo amoroso, ocorrências iguais a de
pessoas heterossexuais.

4.3 A idéia de papéis sexuais heteronormativos


Muitos jovens afirmaram não existirem as identificações rígidas de papéis femininos e
masculinos não assumindo predominantemente um ou outro papel. Muitos também afirmam não
exibirem comportamentos ‘ditos’ efeminados; alguns participantes disseram que se o fazem, não
percebem.

4.4 Concepções sobre causas e explicações para homossexualidade


Acreditam que a homossexualidade, assim como a heterossexualidade, é uma condição que
nasce com o ser humano, de origem biológica ou social. Desconhecem o que dizem as abordagens

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psicológicas sobre o assunto e muitos gostariam de saber o que diz a teoria e procuram informar-se
lendo livros e revistas, vendo filmes e programas de TV. Acreditam que a homossexualidade é uma
questão pessoal irreversível, embora afirmem que há quem se proponha a fazer essa reversão.

4.5 Homossexualidade e sociedade


Muitos homens comentam que seus pais acreditam que a homossexualidade seja algo
reversível. Também que eles se culpam e se incomodam com a homossexualidade deles. Os
participantes comentaram que a visibilidade da homossexualidade, em trejeitos, aumenta a
discriminação e evitam fazê-lo, pois percebem em demasia o preconceito social e se incomodam
por isso.

5. CONCLUSÕES.
Os relatos mostram que a vida afetiva e sexual de pessoas homossexuais é muito
semelhante da de pessoas heterossexuais, evidenciando que muitas idéias são crenças generalizantes
e preconceituosas das pessoas que tomam o homossexual como “diferente” e “atípico”, julgando
seus comportamentos variantes como se fossem patologias. Muitas pessoas homossexuais e seus
familiares acabam sendo estigmatizados pela “diferença”, que só existe diante do mundo
heternormativo o que reforça os sentimentos de desvalia social.
Não há consenso na literatura sobre muitas questões relacionadas às questões homoeróticas;
para alguns esse conhecimento é importante e para outros nem tanto. Ocorre que para a
heterossexualidade, as curiosidades leigas e de pesquisas não existem talvez porque a tenhamos
como norma, isto é, um comportamento saudável e desejável, mas isso discrimina os considerados
desviantes e desconsidera que a expressão da sexualidade é abrangente e múltipla e representa os
valores sociais e culturais.
A Psicologia tem um papel fundamental em esclarecer e divulgar sobre a equidade de
direitos em expressar a sexualidade, independentemente da orientação afetivo sexual que
assumimos na vida adulta procurando diminuir e erradicar a discriminação que prejudica a todos.

Referências:
COSTA, J. F. A ética e o espelho da cultura.2ª ed.Rio de Janeiro: Rocco, 1995.
COSTA, J. F. A Inocência e o Vício: estudos sobre o homoerotismo. Rio de Jaleiro: Relume
Dumará, 2002.
DIAS, M.B. União homossexual: o preconceito e a justiça. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2006.
FARIAS, M. O. Adoção por Homossexuais: concepções de psicólogos judiciários. Dissertação
de Mestrado. Pós-Graduação em Psicologia do Desenvolvimento e da Aprendizagem. Bauru:
UNESP, 2007.
FIGUEIRO, M.N.D. Educação Sexual: retomando uma proposta, um desafio. Londrina: UEL,
1996.
FRANCO, M. L. P. B. Análise de Conteúdo. Série Pesquisa, 6. 2a edição. Brasília: Liber Livro
Editora, 2005.
GOFFMAN, E. Estigma: notas sobre a manipulação da identidade deteriorada. (4.ª Ed). Rio de
Janeiro, Zahar, 1982.
KATZ, J.N. A invenção da heterossexualidade. Rio de Janeiro: Ediouro, 1996.
MOTT, L. História da Sexualidade no Brasil. 2005. Disponível em:
Http:\\br.geocities.com/luizmottbr/artigos05.html. Acessado em 28/5/2008.
NAPHY, W. Born to be gay – história da homossexualidade. Lisboa Portugal:Edições 70, Ltda,
2004.
RIBEIRO, P.R.M. Sexualidade Também tem História: comportamentos e atitudes sexuais
através dos tempos. In: MAIA, A.C.B.; MAIA, A. F. (ORG). Sexualidade e infância. Cadernos
CECEMCA no 1, p.17-34 Bauru, Faculdade de Ciências: Cecemca; Brasília: MEC/SEF, 2005.

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RIBEIRO, P.R.M. (Org.). Sexualidade e educação sexual: apontamentos para uma reflexão.
Araraquara: FCL/ Laboratório Editorial; São Paulo Cultura Acadêmica editora, 2002.
ROUDINESCO, E. A família em desordem. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2003.
SPATA, A. Métodos de Pesquisa – ciência do comportamento e diversidade humana. Tradução de
ªB. Pinheiro de Lemos. Rio de Janeiro: LTC, 2005.
SPENCER, C. Homossexualidade: uma história. Rio de Janeiro: Record, 1996.

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