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CRISE EPILÉTICA E ESTADO

EPILETICO NA EMERGENCIA
O tecido nervoso nada mais é do que um sistema eletroquímico, que possui uma capacidade
inerente de gerar em condições patológicas uma atividade elétrica anormal que, quando ocorre
de maneira sustentada, pode manifestar-se como uma crise epiletica.

As crises epileticas podem ser causadas por: distúrbios hidroeletrolíticos, lesões neurológicas
agudas e efeito de medicamentos. Em muitos casos há um desencadeante identificado e
retirando este fator é improvável que a crise ocorra novamente. Mas alguns indivíduos tem
crises espontâneas recorrentes, sendo chamados de epiléticos.

 CRISE: ocorrência transitória de sinais/sintomas devido a uma atividade elétrica


anormal excessiva ou sincrônica no cérebro.
 CRISE PROVOCADA: decorrente de uma causa imediata confirmada, como distúrbio
metabólico, intoxicação aguda, abstinência de drogas sedativa ou insulto neurológico
agudo. Exite uma relação temporal entre o desencadeante da crise geralmente nos
últimos 7 dias.
 CRISE NÃO PROVOCADA: quando não há uma causa conhecida
 CRISE ISOLADA: 1-2 crises ocorrendo em 24 horas
 EPILEPSIA: desordem cerebral por uma predisposição persistente a gerar crises
epileticas e pelas consequências neurológicas, cognitivas, psicológicas e sociais
o No mínimo 2 crises não provocadas em um intervalo >=24 horas entre elas OU
o Uma crise não provocada e alto risco de nova crise em 10 anos
 CONVULSAO: termo antigo para crise tonico-clonica generalizada.
 NÃO CONSULSIVO: crise ou estado epilético sem relevante atividade clonica ou
tonica. É muito usado com o estado epilético ou estado de mal epilético para indicar que
a crise persiste e afeta predominantemente a consciência ou o comportamento, com
atividade motora mínima ou nenhuma.

Existem varias classificações de crises, entre elas:

1. Crises epileticas generalizadas: iniciam em algum ponto do SNC e rapidamente


envolvem redes neuronais distribuídas bilateralmente (tonico-clonica, clonica, tonica,
atonica, mioclonica ou ausência típica/atípica)
2. Crises epileticas focais: se originam dentro de redes limitadas a um hemisfério (sem
prejuízo da consciência ou atenção, sintomas motores focais, pode evoluir para
generalizada)

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA

Em pacientes sem uma causa conhecida, sabe-se que há hiperexcitabilidade cortical,


provavelmente por alterações em canais iônicos e outros fenômenos moleculares, tumores,
infecções ou trauma, sendo a crise uma consequência deste dano.

Existe também uma classificação de acordo com a etiologia da crise:


1. Causa estrutural/metabólica:
a. Toxico/metabólica: distúrbios eletrolitocos (sódio <115,ureia >100,magnésio
<0,8, cálcio total <5), alterações glicemia, hipoxemia, intoxicação aguda ou
abstinência de álcool, drogas
b. Estrutural: encefalite aguda, meningite, toxoplasmose neurocisticercose,
tumores primários ou metastáticos, TCE e hemorragia subaracnóidea.
2. Causa genética: defeito genético direto conhecido ou presumido como epilepsia
mioclonia juvenil, epilepsia mioclonica progressiva
3. Causa não conhecida: natureza não conhecida.

Mais comumente as crises iniciais são decorrentes de lesões estruturais do SNC e de


complicações clinicas (toxico-metabolicas). Essas crises tendem a repetir enquanto o fator
provocativo estiver presente. Com a correção deste fator a possibilidade de o paciente se tornar
um epilético é pequena. Contudo, quando o fator causal não pode ser corrigido ou o dano
neurológico for muito grave o risco futuro de desenvolvimento de crises espontâneas
recorrentes é alto.
ACHADOS CLINICOS

Deve-se sempre perguntar sobre sialorreia, cianose, liberação de esfíncter vesical e anal. O
familiar ou pessoa que presenciou deve ser interrogado também, no sentido de buscar qualquer
detalhe do evento, o que pode ser essencial no diagnostico diferencial.

Perguntar ao paciente sobre sintomas e sinais ao inicio do quadro, antes da perda de consiencia,
pois podem indicar algumas lesões focais (parestesias, alterações visuais, olfatórias, auditivas e
gustatórias, deja vu, despersonalização e desrealização).

Um quadro comum no DE é um paciente que deu entrada pois teve uma crise tonico-clonica
generalizada. Esses pacientes chegam no período pós-ictal, confusos e sonolentos. Quando
acordam não se lembram do ocorrido mas queixam-se de fortes dores no corpo e de cefaleia. É
importante lembrar que perda de consciência e movimentos anormais não são necessariamente
crise epileticas. Esses eventos podem ser confundidos inicialmente com crises epiléticas mas
sinais e sintomas podem diferencia-las, como:

 Quadro de febre, rigidez na nuca, confusão e convulsões: meningite, encefalite,


vasculite
 Historia de TCE
 Hipoglicemia, hiperglicemia, distúrbios eletrolíticos, hipóxia
 Historia de tentativa de suicídio com ingestão de tóxicos
 Inicio recente de drogas que abaixam o limiar convulsivo (quinolonas, cefepima,
imipenem)
 Historia de doença ou lesão neurológica previa: AVCi, AVCh, neurocirurgia previa
 Lesões neurológicas agudas concomitante: hemorragia subaracnóidea, hemorragia
intraparenquimatosa, metástases tumorais para SNC
 Historia de etilismo importante, crônico sugerindo abstinência alcoolica.

Ou seja, diversas situações clinicas sistêmicas, toxicas, metabólicas, infecciosas e neurológicas


podem culminar em crise provocada, podendo se manifestar de diversas maneiras, dependendo
da doença de base.
EXAMES COMPLEMENTARES
GLICEMIA CAPILAR

OBS: se o paciente for epilético ver se ele esta tomando corretamente a medicação

De maneira geral, os exames complementares devem ser divididos em:

1. Avaliação da causa clinica: hemograma, plaquetas, exames de coagulação, função


renal, função hepática, glicemia, sódio, potássio, cálcio, magnésio, gasometria arterial,
exames de urina, urocultura, hemoculturas
2. Avaliação de intoxicações agudas: perfil toxicológico
3. Dosagem sérica de antiepileticos: útil em pacientes já diagnosticados com a doença
4. Avaliação de doença neurológica: TC ou RM. Se não houver uma causa plausível ou
suspeita de infecção do SNC, colher o liqour (desde de que não haja contraindicações)
5. Eletroencefalograma: deve estar disponível no DE em caráter de urgência.

O paciente deve ser mantido em observação ate que sejam afastadas as causas listadas acima.
DIAGNOSTICO DIFERENCIAL

As principais situações clinicas que geram confusão são:

 Sincope
 Crise epiletica de origem psicogênica
 Ataques de pânico
 Distúrbios de sono
 Migranea

É importante checar e buscar causas secundarias de crises epileticas pelo simples fato de que o
tratamento da causa de base é essencial para o sucesso da crise, com menor probabilidade de
sequelas.
MANUSEIO INICIAL

No DE é essencial que a conduta medica seja guiada por um processo diagnostico estruturado,
visando a intervenção terapêutica eficaz.

A prioridade inicial é buscar HIPOGLICEMIA e realizar manobras de suporte avançado de vida


(garantir vias aéreas, ventilação e circulação).

É de extrema importância também realizar exame físico geral, avaliação do estado


hemodinâmico (PA, pulso, perfusão periférica) além de glicemia, temperatura e saturação de 02.
Deve-se buscar achados neurológicos focais, avaliar sinais de irritação meníngea e realizar
exame de fundo de olho.

OBS: pedir exame de quantificação serica de antiepileticos para pacientes com esse diagnostico

TC e RM são uteis quando uma patologia neurológica é uma possível causa do quadro. Coleta
de liqour deve ser feita na suspeita de meningite, encefalite.

Crises provocadas (agudas sintomáticas)

Agentes antiepileticos são poucos eficazes quando a causa da crise é metabólica, nesses casos o
melhor tto é a correção da causa base. Assim, não se inicia tto com agentes antiepileticos nessa
situação.
OBS: Benzodiazepinicos não devem ser administrados se a crise já tiver cessado e o paciente
estiver no período pos-ictal, pois pode aumentar a depressão do SNC, prolongando o período de
recuperação. Eles não são agentes eficazes para a prevenção de recorrência de crises. Eles
devem ser reservados para casos em que se caracterize estado de mal epilético, em crises com
duração >= 5 min.

No caso de crises provocadas secundarias a lesões neurológicas agudas habitualmente se


empregam agentes antiepileticos na prevenção de recorrência de crise, embora tenha eficácia
limitada.

O agente mais empregado é a FENITOINA por não ser sedativa e passível de administração
endovenosa em dose de ataque, assim com rápido inicio de ação. Manutenção da droga durante
toda a fase aguda e até a 12 semana.

Crise única (excluída crise provocada)

Pacientes em crise única na emergencia, ou seja, estável, com exame clinico e neurológico
normal, sem nenhuma causa de crise provocada, não apresentará recorrência de crise. Portanto,
a indicação de antiepileticos NÃO está indicada na maioria dos casos.

Sua utilização neste cenário é restrita àqueles em que há alto risco de recorrência. Deste modo,
deve ser feita uma estratificação de risco de recorrência de crises, para isso são necessários os
resultados de dois exames:

 Neuroimagem: RM ou TC
 Eletroencefalograma

Caso ambos os exames sejam normais, o risco de recorrência é de 30%. Quando ambos são
anormais o risco é de 70%.

A decisão de iniciar tto com medicação epiletica deve ser feita discutindo com o paciente,
ponderando risco de recorrência e o impacto de uma nova crise em sua vida.

Pacientes em crise única sem etiologia esclarecida não devem receber alta ate que se tenham
dados completos da investigação que de subsideos para decidir sobre a introdução ou não de
medicação antiepiletica.

Crise epiletica em paciente com epilepsia

Avaliar questão de aderência ao tto (a dosagem de níveis séricos de antiepileticos é útil neste
caso). Reduções na dosagem ou troca de medicação também devem ser consideradas. Investigar
também drogas que reduzem o limiar convulsivo que foram adicionadas recentemente. Apesar
de o paciente ter epilepsia, não se pode desconsiderar o fato de que pode ter havido um trauma,
infecções ou alterações eletrolíticas e metabólicas.

Se for constatada irregularidade da tomada de agentes antiepileticos, devem ser dadas as doses
perdidas. Em pacientes que tomam corretamente, um aumento na dose pode ser necessário.
Deve-se sempre explorar o tto em monoterapia, ajustando a dose do agente ate a máxima dose
tolerada, sem eventos adversos.

Estado epilético

O estado epilético clássico convulsivo é definido como >=2 crises sem a completa recuperação
da consciência entre elas ou uma crise com >30 min. Sabe-se que crises com 5-10 min tem
baixa probabilidade de cessarem espontaneamente. Estudos demostraram que crises não
controladas predispõe o cérebro a crises de ainda mais difícil controle. Por isso do ponto de
vista operacional, crises com >5 min são consideradas e tratadas como estado epilético.

QUALQUER CRISE QUE DURA > 5 MIN DEVE SER TRATADA


AGRESSIVAMENTE

As etilogias mais frequente são:

 Infecções SNC
 TCE
 Sangramento SNC
 Complicações de lesões estruturais no SNC
 Intoxicações agudas
 Hipóxia ou anoxia
 Graves distúrbios metabólicos
 Soma de vários fatores
o Idade avançada, distúrbios eletrolitocos, historia previa de epilepsia

Em pacientes com historia previa de epilepsia, algumas etiologias são mais frequentes, como
suspensão ou retirada abrupta de agentes, mudança no esquema medicamentoso, TCE. Deve-se
sempre estar atento para o diagnostico de crises epileticas de origem psicogênica.
TRATAMENTO

1. Benzodiazepinicos: útil para abortar crises.


a. Paciente SEM acesso venoso- 10 mg de MIDAZOLAM IM (0,2 mg/kg)
b. Pacientes COM acesso venosos- DIAZEPAM IV, 2mg/min até controlar a
crise ou dose máxima de 10-20 mg. Pode levar a depressão respiratória
2. Fenitoina ou fosfenitoina: depois do benzodiazepínico deve ser adm agentes
antiepileticos com duração de acao muito mais prolongada no SNC. 20 mg/kg. Se a
crise persistir pode dar mais 5-10 mg/kg. A fenitoina deve ser diluída em 250-500 ml de
soro fisiológico e infundida em velocidade máxima de 50 mg/min. O paciente deve ser
observado durante a infusão, com monitorização eletrocariografica. Pode ocorrer
hipotensão e arritmia durante a infusão. OBS: deve-se evitar acessos na extremidade
pois se a fenitoina etravassar pode causar necrose cutânea
3. Midazolam ou propofol: se o paciente ainda persistir em crise após benzodiazepínico e
dose máxima de fenitoina deve-se iniciar midazolan ou propofol. Em geral o paciente é
intubado e colocado em ventilação mecânica. A monitorização da terapia e o ajuste de
dose com o ECG são fundamentais.
a. Midazolan: bastante empregado, mas pode dar taquifilaxia. Dose inicial-
0,2mg/kg iv lento
b. Propofol: anestésico geral de curta acao, pode causar hipotensão e problemas se
infusões por tempo prolongado. Dose inicial- 2 mg/kg iv lento
4. Fenobarbital: após o benzodiazepínico, o fenobarbital é a droga de escolha no estado
epilético relacionado a intoxicações agudas, a abstinência alcoolica e por abstinência de
fenobarbital. Fenitoina tem MINIMO efeito nessas condições. O fenobarbital tem meia-
vida longa, porem pode diminuir intensamente o nível de consciência, sendo por vezes
necessário suporte ventilatório. Dose- 20 mg/kg iv

Pacientes em estado epilético refratário devem ser transferidos a UTI o mais rápido possível e
com acompanhamento de neurologista. A monitorização continua de eletro deve ser feita para
diagnostica estado epilético subclinico.
Investigacao de crise epiletica

Historia, exame físico, exame neurológico ou fundo de olho sugerem alguma causa?

SIM. Continuar conforme hipoteses

NÃO. Paciente com exame físico e neurológico normais?

(exceto período pos-ictal)

SIM
Exemplos: NÃO
Primeira crise da vida,
Febre, rigidez de nuca e Coleta de exames paciente saudável, nenhuma
confusão:coleta de liqour laboratoriais causa de crise
Trauma SNC:TC TC com contraste
Tentativa de suicídios: Coleta liqour
dosagem de toxicos TODOS NORMAIS
eletroencefalograma TC/RM, sódio sérico, teste
gravidez

TODOS NORMAIS
Tratar conforme a causa Crise única: segmento
ambulatorial

Tabela 1: tratamento do estado


epilético
TEMPO SEQUENCIA
1. Até 5 minutos Estabilização: vias aéreas, acesso venoso,
coleta de exames, O2, monitor e GLICEMIA
CAPILAR
2. 5-10 minutos BENZODIAZEPINICO
Sem acesso: midazolan 10 mg IM
Com acesso: diazepam IV 2mg/min (até 10-
20 mg)
3. 10-20 minutos FENITOINA OU FOSFENITOINA 20
mg/kg IV
Fenitoina: max 50 mg/min
Fosfofenitoina: max 150 mg/min
FENOBARBITAL: escolha na intoxicação
aguda ou abstinência alcoolica- 20 mg/kg
(max 50-75 mg/kg)
4. Após 20 min Dose adicional de FENITOINA (5-10 mg/kg
IV)
5. Prepare material para IOT MIDAZOLAN OU PROPOFOL
Midazolan: 0,2 mg/kg IV lentamente;
manutenção 0,2-0,6 (max 2 mg/kg/h)
Propofol: 2 mg/kg IV lentamente;
manutenção 2-5 (max 15 mg/kg/h)
6. Proceder a IOT e ventilação
mecânica
7. Monitorização com ECG Continuar com monitorização continua de
EEG e ajustar a infusão para controlar
atividade ictal

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