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Estranha Sedução Shannon Drake

Estranha Sedução (Bianca Romance Místico


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Dead by Dusk (2005)
Shannon Drake

Uma lenda e um amor do passado ressurgem


das ruínas...
Bella Vista parecia o lugar ideal para esquecer o
passado e começar a vida nova. Mas desde que
misteriosos desaparecimentos começaram a se
suceder naquele vilarejo da Calábria, Stephanie
tem a sensação de estar sendo observada...
Grant também sente que há algo estranho na
área das escavações onde conduz seu trabalho
de pesquisa arqueológica. Algo que o leva a
trancar sua porta todas as noites... Ao mesmo
tempo que a atração e o desejo explodem entre
Grant e Stephanie, uma força oculta e poderosa
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ameaça destruir essa paixão, bem como a vida


de Stephanie, que precisa vencer uma
desesperada corrida contra o tempo, num lugar
onde nada é o que parece ser, onde todos são
suspeitos e onde aqueles que estão mais perto
dela podem ser os mais perigosos...

PRÓLOGO
A lenda
Raoul Masson, escudeiro de Conan de Burgh,
entrou no escritório de seu senhor sem bater na
porta.
Surpreso, Conan de Burgh largou a pena com
que escrevia uma carta a seu rei e o encarou.
Seu escudeiro parecia agitadíssimo.
— Eles vêm vindo, meu senhor, o povo das
vilas dos arredores da fortaleza. E os cavaleiros
que haviam deixado de lado suas armas
tomaram a pegá-las.
Aquela área, ocupada por valentes tribos
calabresas, produzira uma boa cota de
guerreiros, que, apesar de destemidos, foram
vencidos pelos normandos, comandados pelo
conde de Burgh.
Mas por que estariam se armando outra vez se
a época das batalhas terminara havia tanto
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tempo? E por que vinham com a possível


intenção de atacar a fortaleza?
Era improvável que o povo das vilas tivesse
capacidade de enfrentar o poder do conde de
Burgh, constituído de cavaleiros intrépidos, bem
armados e donos de montarias excelentes.
Sendo grande amante da paz, Conan tornou-se
famoso por seus gestos de misericórdia e boa
vontade para com os conquistados. Seus
homens poderiam, com toda facilidade, esmagar
uma pequena rebelião de camponeses, mas o
conde não queria chacina alguma.
Estava confuso. Tudo parecia estar indo muito
bem. No ano anterior, deixara claro ao povo que
eles poderiam viver sem sobressaltos sob seu
comando. Para a maioria dos trabalhadores do
campo, não importava quem fosse seu senhor.
Só o que desejavam era continuar vivos,
impedir que as esposas fossem estupradas e
que o fruto de seu trabalho fosse roubado,
Conan ficou de pé e apanhou sua enorme
espada. Nunca lutava sem ela.
— Contra o que eles protestam, Raoul?
— Contra a matança, meu senhor. Eu vi,
pessoas cortadas ao meio e caídas pelo campo.
Dizem que lady Valéria comandou a
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mortandade... Estão exigindo que o senhor tome


alguma atitude contra isso.
Conan sentiu um frio lhe percorrer a espinha. O
coração parecia ter sido apunhalado.
Chegara àquele lugar como um grande
conquistador, confiante em si mesmo, mas
fraquejara ao conhecer a filha do nobre italiano
Paolo Ratini.
Em sua primeira ida ao Palácio Ratini, Conan
avistou Valéria saindo à sacada de sua janela e
ficou deslumbrado com sua beleza, seus cabelos
negros brilhando ao sol, os olhos azuis enormes,
o rosto perfeito como se fosse feito de
porcelana. Valéria sorriu-lhe, talvez fascinada
por ver o comandante dos conquistadores diante
de seus homens.
Conan soube, naquele momento, que
encontrara a mulher de sua vida. Valéria
enviuvara durante uma das primeiras batalhas
entre senhores locais e os invasores normandos,
e era mãe de uma menina ainda pequena. O
tempo apenas lhe acrescentara formosura e
experiência. Ardente e capaz de despertar
paixões em todos os homens que a rodeavam,
Valéria se entregou a Conan. O guerreiro
normando logo começou a pensar em
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casamento, pretendendo garantir aquela


inesperada felicidade para sempre.
Mas o destino tinha outros planos para aquela
dama na figura de François de Venue, um primo
ilegítimo do rei em Paris.
A grande força e sua habilidade natural de
liderar e de atrair para junto de si pessoas leais,
garantiram a permanência de Conan naquela
região. E ao comandante normando nem sequer
ocorreu que François poderia representar uma
ameaça. Mas o nobre bastardo entrou em cena
com uma violência brutal e desnecessária.
Invadiu as terras, esmagou as pequenas
rebeliões, e aqueles que se sentiam leais ao
senhor normando foram chacinados.
E o pior aconteceu: François conquistou as
atenções de Valéria e recebeu as boas-vindas de
Paolo. Isso surpreendeu Conan. Talvez Paolo,
temendo a selvageria e crueldade de François,
não quisesse se tornar seu inimigo, mas sim um
aliado.
Logo Valéria cortou todo e qualquer elo com
Conan. E, para espanto de todos, passou a
participar de batalhas ao lado de seu novo
amante. Dali em diante, histórias de sua
brutalidade começaram a circular pelas vilas.
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Conan se recusou a aceitá-las como


verdadeiras, julgando-as meras invenções das
pessoas mais simples. Ouvira afirmações de que
era Valéria quem instigava a violência maior, e o
povo passou a chamá-la de bruxa, de monstro,
de noiva do diabo. E Conan passou a temer pela
vida da mulher que amava.
— Meu senhor, o povo estará aqui na fortaleza
em minutos! — Raoul exclamou, e sua voz
mostrava sua enorme preocupação.
Conan, munido de sua arma, foi ao encontro de
seus cavaleiros, reunidos no pátio externo.
Conhecendo seu comandante, os homens já
haviam preparado para ele, Hagar, o enorme
garanhão negro, o cavalo inseparável de Conan.
Todos se colocaram a postos para enfrentar o
ataque.
Milhares de camponeses se aproximavam,
enfurecidos depois do último massacre que se
dera logo após o anoitecer, e que não poupara
nem mesmo as crianças.
Conan montou Hagar, posicionou-se à frente de
seus soldados, mandou que o portão fosse
aberto e saiu da fortaleza, seguido de seus
cavaleiros. Logo se achou diante da multidão
enfurecida.
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— Digam o que esperam de mim — bradou,


confiante e impondo a autoridade que nunca lhe
falhava.
Conan reconheceu no meio de toda aquela
gente um rosto: Giovanni Tucci, um jovem
inteligente, fiel a Deus, mas que naquele
instante mostrava um olhar enlouquecido.
— Lorde Conan! — Giovanni gritou. —
Aceitamos sua lei e reconhecemos em sua
pessoa um homem bom. Mas esta noite, se o
senhor não nos liderar contra o exército de
François de Venue, morreremos todos, homens,
mulheres e crianças! Deve lutar contra aquele
que nos massacra impiedosamente, milorde, e
contra a bruxa que comanda o vento, a neblina e
os demônios. Lorde Conan, o senhor tem o poder
de lutar contra tais demônios. E o único que
poderá nos livrar dos monstros que caem sobre
nós!
— Mas nenhum de vocês, camponeses ou
cavaleiros, pode acreditar que lady Valéria é
uma bruxa — Conan protestou.
— Abram caminho! — Giovanni deu a ordem, e
uma jovem magra, carregando o corpo de uma
criança, se aproximou do comandante
normando.
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— Veja o que aquela mulher fez com esta


criança! — A moça caiu em pranto. — Eu vi lady
Valéria, e em seus olhos estava a luz do inferno.
Se o senhor não conseguir detê-la, ela matará a
nós todos. Por Deus, lorde Conan!
A camponesa se atirou no chão, suas lágrimas
se misturando com o sangue de seu filhinho.
— Milorde tem de nos ajudar! — ela implorou.
Ouviu-se naquele momento um som terrível
vindo do sudoeste, capaz de fazer a própria terra
tremer. Conan não temia batalha ou dor; nem
mesmo a morte. Contudo, o ruído dos gritos que
pareciam ser produzidos por animais estranhos
fez seu sangue congelar nas veias. Um medo
tremendo percorreu-lhe a espinha. Porém, de
imediato dominou-se e procurou ignorar o pavor.
Decerto eram lobos uivando, Conan tentava se
convencer.
— São lobos ou cães selvagens.
— Não, milorde! O senhor não entende, então
terá de ver o que vem vindo. Só assim
acreditará. Precisa nos liderar, pois eles estão
para atacar mais uma vila! — Giovanni ergueu as
mãos. — Lorde Conan! Pelo amor de Deus!
Conan concordou de imediato. Seda melhor
que fosse ele mesmo a liderar as forças contra
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François e Valéria. Isso o fada se tornar um


inimigo do próprio rei, mas tinha de aceitar o
comando.
Aquele era um povo que jurara proteger.
Portanto, não tinha escolha.
— Vamos, pois, enfrentar François! — ele
declarou.
— Espere! — Uma voz soou no meio da
multidão. Era um clérigo que queria rezar e pedir
proteção ao Senhor para os que combateriam
em uma das mais sangrentas batalhas.
Conan desceu de Hagar e se uniu à oração.
Logo tornou a montá-lo, e se pôs a cavalgar,
junto com seus cavalheiros e a multidão.
E a lua e a fria ventania pareciam acompanhá-
los.
Em minutos alcançaram a Trincia, a vila sob o
ataque de François de Venue.
Conan visualizou François. O nobre bastardo
que comandava-o ataque dava ordens para seus
homens formarem uma enorme barreira contra o
perigo que se avizinhava.
Valéria se achava a seu lado. Os cabelos
negros esvoaçantes, o ar destemido.
— Afaste-se daqui agora mesmo! — François
gritou ao ver Conan chegando com seu exército.
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— Vá embora e leve seus homens, e eu os


deixarei viver!
— E depois virá atrás de nós para nos dizimar
— Conan retrucou. — Não posso permitir que
continue o que vem fazendo, François. Você se
tornou um guerreiro contra a própria vida, contra
Deus e os homens. Chegou a hora, e eu o
deterei!
O rosto moreno de François escureceu de
fúria. Mas ele acabou sorrindo.
— Nunca! Esta, Conan, é uma boa-noite para
você morrer.
— Nesse caso, nós nos encontraremos no
inferno, François!
— Valéria!
Apesar do chamado de François, ela não se
moveu. Seu olhar se fixava em Conan.
— Lembre-se da criança! — François, que
chegara perto dela, cochichou-lhe.
E então surgiu diante de Conan e de todos ali
uma horda de bestas, um misto de cães e de
demônios, uivando sem cessar.
— Por Deus e pelos homens! — Conan pôs a
espada em riste.
O primeiro animal se atirou contra Hagar, e
Conan lhe decepou a cabeça. A fera era enorme.
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Não se tratava de um lobo, mas possuía dentes


iguais aos de um tigre e patas gigantescas.
— As cabeças! Cortem as cabeças! — foi a
ordem de Conan. Os gritos de morte e desespero
tomaram conta do campo de batalha, e as
bestas foram sendo abatidas em uma batalha
furiosa. As forças de Conan começavam a levar
vantagem sobre o inimigo.
François continuava de pé, lutando e matando
a sua passagem. Quando se viu diante de Conan,
a refrega chegou a proporções descomunais.
Conan sabia o que deveria fazer: para acabar
com o mal pela raiz deveria cortar a cabeça de
François, como fizera com as suas feras. E
assim, quando teve o inimigo caído a seus pés,
Conan soube que não deveria hesitar, e sua
espada procurou atingir o pescoço de François.
— Valéria... Valéria... — François gemeu,
tentando se proteger.
Ao se voltar, Conan viu que o povo estava a
ponto de atirar Valéria do penhasco.
— Corte-lhe a cabeça, Raoul. — Conan apontou
François, já mortalmente ferido, e saiu
cavalgando, para tentar evitar o assassinato de
Valéria.
— Não façam isso!
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— Ela tem de morrer, milorde! É uma bruxa


assassina! Giovanni empunhou a espada e
enfrentou seu senhor.
— Conan de Burgh! — O rugido ecoou, e todos
pararam por um instante, incapazes de crer
naquilo que seus viam: François de Venue, de
pé, tentando chegar ao penhasco.
Giovanni ergueu os braços para o céu, como
que pedindo uma explicação a Deus.
E naquele momento, como se uma força divina
estivesse agindo a pedido do camponês, o
penhasco começou a tremer e todos perderam o
equilíbrio.
François, coberto de sangue, foi o primeiro a
despencar, visto que conseguira chegar à beira
do precipício, onde estava Valéria.
A rocha continuou a tremer e esfacelar-se.
E muitos daqueles que haviam lutado com
bravura viram-se no fundo do vale, cobertos
pelas pedras.
Giovanni Tucci entre eles. A bela Valéria... E o
grande e poderoso Conan de Burgh.
Seus homens choravam como meninos.
Por que Conan não deixara o povo se vingar
das crueldades da bruxa Valéria?, eles se

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perguntavam em seus lamentos. Sabiam, porém,


a razão de sua atitude.
Conan amava demais aquela mulher, e agora
estavam juntos outra vez. Sepultados para todo
o sempre.
Ou, pelo menos, pelos séculos vindouros.

CAPÍTULO I
— Com certeza todos os atores estarão aqui
para começar os ensaios amanhã — Pietro
Agnazzi garantiu.
Exausta, Stephanie Cahill sentiu vontade de
chorar. O dia fora tão longo... A única coisa que
dera certo fora o vôo de Chicago a Roma. Então,
o avião que faria a conexão Roma/Nápoles
atrasou por horas. Quando enfim chegou a
Nápoles, o carro que deveria esperá-la no
aeroporto não apareceu. Seu celular, que
deveria funcionar no mundo todo, entrou em
pane e não fazia as ligações. E, sem saber por
que, ela não conseguia dizer uma palavra em
italiano, apesar de saber um pouco da língua, um
dos motivos de ter aceitado o emprego na Itália.
O jeito foi fazer ligações em um café, e lá
Stephanie ficou sabendo que o chofer que

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deveria ir apanhá-la esteve no aeroporto, mas


não a encontrara.
Naquele momento, no resort Bela Vista,
acabara de ser informada por Pietro Agnazzi de
que os atores da peça que ela dirigiria no teatro
local não estariam presentes ao encontro
marcado para as dezenove horas no Palácio
Ratini. Doug Wharton e Drew Cunningham nem
sequer tinham chegado à cidade, pois seu
automóvel quebrara nos arredores de Sorrento;
Lena Miro e Suzette Croix, que resolveram
visitar algumas escavações arqueológicas,
ficaram encalhadas em algum ponto da estrada
devido a um deslizamento de uma rocha que
bloqueara o caminho. Ninguém sabia do
paradeiro de Clay Barton, e muito menos o de
Gema Harris.
Stephanie sentia-se frustrada, dolorida da
viagem longa e cansativa e revoltada por ser
sempre tão pontual.
Seu desejo era estrangular Reggie, que a
convencera a aceitar aquele emprego. E por
acaso a esperta Reggie estava ali na Itália? De
modo algum. Devia estar em algum outro lugar
da Europa procurando empurrar um programa
turístico para militares.
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Mas a sra. Victória Reggie era como um


furacão na vida da sobrinha. Bem, na verdade,
Reggie não era exatamente a tia de Stephanie,
mas prima de sua mãe. Stephanie mal se
lembrava dela, até que se encontraram no
funeral de seus pais. E a partir dali, Reggie
sempre se manteve próxima e amiga.
Stephanie suspirou. Na verdade, quando
Reggie lhe fez a proposta de emprego na Itália, a
idéia pareceu excelente. Aos vinte e sete anos
de idade, Stephanie podia se orgulhar de seu
talento para os negócios.
Um acidente de carro a deixou órfã de pai e
mãe aos dezessete anos, mas ela conseguiu se
manter, formou-se em artes e ainda fez um curso
de gerenciamento. De atriz em Chicago passou
ao cargo de diretora de um pequeno clube de
comédia. E então se envolveu com o dono do
estabelecimento: Grant Peterson.
Grant se tornou muito importante em sua vida,
desde o momento em que se conheceram.
Stephanie jamais sentira por ninguém uma
atração física tão intensa como a que sentia por
ele. E era recíproca.
Por um ano, o relacionamento entre eles foi
intenso. Grant era determinado, justo, mas
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nunca cruel. O teatro era uma das paixões de


Grant, e mais do que tudo, museus, arte e
civilizações antigas. Era formado em história,
adorava colecionar armaduras e toda a
parafernália possível para filmes.
A vida de Stephanie era quase perfeita. Seu
trabalho era exatamente aquele com que
sonhara, e Grant, o homem que seu coração
sempre pedira.
E aí tudo acabou. Não se sabia bem de quem
fora a culpa. Mas não foi fácil ignorar que Grant
começara a se distrair demais. Por vezes,
parecia entrar em um estranho transe à noite,
como se não estivesse ali na cama. E Stephanie
passou a sentir ciúme. Afinal, ele era bonito,
bem-sucedido em sua vida profissional e
pessoal. Com seus quase dois metros de altura,
musculoso graças a seu trabalho como dublê de
filmes de ação no começo de sua carreira, ele
era a imagem da masculinidade, do charme e da
sedução.
E então vieram os sonhos. Ou talvez fossem
pesadelos. De qualquer modo, eram muito
estranhos. Por vezes, Grant se isolava; em
outras ocasiões, procurava Stephanie na cama
com frenesi, e o ato sexual era fantástico.
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Porém... Sucedeu o inimaginável: dormindo,


Grant gritou o nome de outra mulher. E isso foi
demais para Stephanie. Por mais apaixonada
que estivesse, por mais fantástico que ele fosse
como amante. Discutiram durante horas. Grant
jurou não estar envolvido com nenhuma outra. E
mais: o nome que gritara não fazia sentido
algum para ele. Mesmo assim, Stephanie se
decidiu pela separação definitiva.
Mas continuou trabalhando para Grant por uns
tempos até que decidiu se agarrar à oferta de
Reggie, sem se perguntar muito se o novo
emprego valeria a pena.
Concordara em ir para a Itália, e ali estava.
Pietro, o gerente da área artística do resort,
continuava a dar suas explicações sobre a
ausência dos artistas.
— Meu inglês não está ruim, não é, Stephanie?
— Pietro perguntou, com um enorme sorriso.
— Excelente, Pietro. Mas olhe, estou exausta...
Gostaria de descansar um pouco. Pode me
indicar onde ficam minhas acomodações?
— Escolhi para você um chalé bem ao lado do
teatro, assim terá mais facilidade em vir até
aqui. Teremos uma apresentação na próxima
sexta-feira. Reggie combinou uma exibição para
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um grupo de turistas de cerca de cinqüenta


militares norte-americanos com suas esposas.
Eles se hospedarão em nossos chalés e
assistirão ao show.
— Nesta sexta-feira, Pietro? Estaremos
preparados? E o teatro comporta toda essa
gente?
— Ah, sim! Há espaço suficiente.
— Bem, tomara que tudo esteja pronto para
essa data.
Stephanie se sentia apreensiva. Uma semana...
Teria apenas sete dias para reunir todos os
artistas e saber de seus talentos.
— Nós nos encontraremos amanhã bem cedo,
então.
— À tarde, Stephanie.
— Mas...
— As jovens que foram ver o sítio arqueológico
só chegarão aqui no meio da manhã. E os
rapazes cujo carro quebrou lá em Sorrento...
sem dúvida também se atrasarão. Mas não se
preocupe, porque tudo vai dar certo. Aqui é a
Itália.
Stephanie suspirou, resignada.
— Vamos ver seu chalé?
Ela começou a reunir sua bagagem.
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— Deixe as malas aí. Giovanni virá buscá-las e


as levará para você. Pegue apenas o
indispensável.
Stephanie não discutiu, e apanhou apenas a
bolsa.
— Todos os chalés são ótimos, mas o seu é o
melhor. Reggie sugeriu o mais próximo do
teatro.
Assim que entrou, Stephanie constatou que
tinha uma maravilhosa vista para o mar.
— É lindo, Pietro!
— Gostará ainda mais do andar de cima. De lá,
dá para ver melhor a paisagem. Fique à vontade.
Giovanni logo chegará com suas coisas.
— Obrigada, Pietro. Está sendo muito gentil.
— Certo. Boa-noite, então. — E ele se foi.
Stephanie resolveu seguir o conselho dele e
subiu as escadas.
O aposento lá em cima era muito bonito. Uma
enorme porta dava para uma sacada, de onde se
via o mar.
Ficou ali parada, mirando o céu estrelado e o
oceano, que ganhava novas tonalidades ao
anoitecer. Havia, inclusive, uma lua magnífica,
que parecia observar lá do alto os penhascos.
Era uma vista de tirar o fôlego.
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Ela, no entanto, estranhou a inquietação que


experimentava cada vez que fitava as
montanhas. Tudo era tão adorável e fascinante...
Sabia da existência de pequenas vilas ao redor
das montanhas, antigas, cheias de charme e
história.
Stephanie cerrou as pálpebras. E então olhou
mais uma vez para as montanhas e sorriu. Que
estranho... Elas parecem acenar para mim.
Procurou afastar tal sensação e decidiu descer e
esperar por Giovanni e pela bagagem. Precisava
de descanso.
Mas teve dificuldade em se afastar da sacada,
tomada pelo encanto da paisagem, pela magia
que vinha das montanhas e pela suave brisa
noturna. Quando as malas chegassem, tomaria
seu banho e se deitaria. M.as deixaria as janelas
abertas, para manter o encantamento e
aproveitar a brisa.
Sentira-se tão frustrada e exausta até minutos
atrás, e agora...
Bem... Via-se tomada por uma estranha
sedução.

O céu à noite era magnífico. Como se achava


longe de qualquer cidade, não havia luzes, a não
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ser as lanternas dos trabalhadores acampados a


uma boa distância.
O mundo, François pensou com certa
amargura, mudara bastante. Seu mundo, pelo
menos.
A escuridão era incrível. No firmamento
brilhava apenas uma estrela, e olhando por
entre as árvores era possível ver a trêmula linha
onde as montanhas e colinas davam lugar ao
horizonte. O ar era fresco, e o vento provocava
um suave murmúrio ao penetrar por entre os
galhos das árvores.
Ela deveria estar ali, naquele instante.
À noite, ele, um homem nem um pouco dado a
fantasias, se via como que tomado por
estranhas sensações. Estaria dentro de um
mundo de sonhos? Talvez. Seria o chamado da
escuridão? Quem sabe? Simples desligamento
do tempo e do espaço? Decerto.
E ainda assim... jurava estar em movimento.
Sonhando? Ah, sim, sonhando! Devia ser isso,
e nada mais.

Gema Harris, no barzinho em uma faixa do mar


Adriático, saboreava um bom vinho, fazendo
hora, enquanto aguardava o desbloqueamento
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da rodovia. Deveria estar trabalhando, isso sim.


Era uma boa atriz, com muito talento para a
comédia, Quanto a sua vida amorosa, nada de
novo, nem de muito interessante. Dos homens
que conhecera na Itália, alguns eram apenas
simpáticos; outros, atraentes; mas todos
casados e uma fileira de filhos.
Sentira-se inclinada a romper o contrato de
trabalho e se mudar para Roma. Mas então
avistou aquele homem no bar.
Talvez ele não falasse inglês. Não que isso
importasse muito.
Por experiência própria, Gema sabia bem que
os homens se saíam melhor com a boca
fechada. Ou melhor, não falando, mas ocupando-
a em outras atividades mais interessantes.
Conversar terminava levando a alguma
promessa, e ela não queria ouvir nenhuma.
No entanto, para uma aventura o moço do bar
parecia muito interessante.
Ouviu quando ele falou em italiano, pedindo um
Campari e uma outra bebida, que ofereceu justo
a ela.
— Obrigada!
Ele apenas sorriu.

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Gema explicou que falava apenas um pouco de


italiano e que não sabia se expressar muito bem
nesse idioma. O sorriso dele se alargou.
— Você é sexy demais! — ela exclamou, certa
de que ele não sabia falar inglês.
— Você também é uma mulher bem quente.
Gema ficou vermelha de vergonha.
— O que faz por estes lados? — ele quis saber.
— Sou atriz, e estou aqui a pedido de uma
amiga. Mas tenho de confessar que me sinto
decepcionada. Quero mais emoção em minha
vida.
Ele se aproximou de Gema.
— Pois tenho a impressão de que você provoca
fortes emoções por onde passa.
— Vivemos apenas uma vez, não é?
— De fato. — O desconhecido endireitou o
corpo e indicou uma mesa nas proximidades. —
Vejo ali uma sombra agradável. Por que não nos
sentamos e você me conta mais a seu respeito?
Gema se levantou de seu banquinho.
— Com prazer.
O local escolhido era perfeito. Discreto e na
penumbra.
Oh, aquele homem era pura sensualidade! E
talvez tivesse algo de perigoso.
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Estranha Sedução Shannon Drake

Meia hora mais tarde, Gema mal se lembrava


do que contara a ele. Nem o que ouvira. Apenas
sabia que tinham conversado e bebido bastante,
pois parecia estar flutuando.
De súbito, ele consultou o relógio e mordeu o
lábio.
— Tenho uma tarefa a realizar. Venha comigo,
Gema, e a levarei para sua casa.
— Estou hospedada em um chalé próximo ao
teatro. É um local gostoso. Pequeno, mas
charmoso.
— Muito bem.
Gema sorriu-lhe, satisfeita. Nada como um
cavalheiro bancando o protetor.
Caminharam devagar pelas ruas, àquele
horário desertas. Gema não conseguia desviar o
olhar daquele homem.
Quando ele colocou o braço em torno dos
ombros dela, tudo pareceu perfeito. Só podia ser
mesmo um cavalheiro. E ela sabia, ao observá-lo
tão de perto e por sua experiência, que seria,
sem dúvida, um amante apaixonado e diligente.

Porém, quando chegaram à porta do pequeno


chalé, seu acompanhante deu um passo para
trás.
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Estranha Sedução Shannon Drake

— Não vai entrar? — Gema convidou, sem


hesitar. — Tenho um excelente licor. E a vista é
linda.
— Tenho de ir. Voltarei mais tarde.
Ela não sabia o que fazer para convencê-lo a
não partir. Ele, porém, apenas lhe sorriu e
começou a se afastar.
— Mantenha a porta bem trancada — disse,
parando e voltando-se para Gema.
— Mas você não retomará?
— Baterei forte em sua porta.
Gema entrou no chalé e subiu apressada as
escadas. Aquela noite, estaria sozinha e
esperando.
No banheiro, abriu a torneira da banheira e
fantasiou sobre o que aconteceria mais tarde,
enquanto esfregava o corpo com o sabonete de
perfume tão delicioso.

Giovanni era um desses italianos atraentes.


Devia ter de vinte e cinco a trinta anos, e era
altíssimo.
— Boa-noite, srta. Cahill. Posso levar suas
malas para o quarto?

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Estranha Sedução Shannon Drake

— Claro, obrigada. — Stephanie ficou olhando o


rapaz subir os degraus, carregando a bagagem
como se não pesasse nada.
Não demorou e ele retomava à sala.
— Gostou daqui, srta. Cahill?
— É muito bonito. E a paisagem, maravilhosa.
As montanhas... impressionantes.
— São mal-assombradas.
— O que disse?
— Houve muitas batalhas sangrentas por lá.
— Durante a Segunda Guerra Mundial? —
Giovanni esboçou um sorriso enigmático. —
Também foi palco dessa guerra. Mas há muitos e
muitos anos, o povo daqui, os reis da região e da
Sicí1ia lutaram. Muitos Cruzados vieram para cá.
e muitos não queriam sair. Os arqueólogos têm
encontrado restos bastante significativos dessa
época. E o povo costuma comentar que as
colinas choram à noite. Interessante, não acha?
— Giovanni tomou a sorrir. — Não a assustei,
não é?
— De forma alguma. Tenho alguns poucos
temores, mas nada que inclua guerreiros das
Cruzadas vindo queimar a minha casa.
Giovanni parecia ter mais alguma coisa a dizer,
e relutava em sair.
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Estranha Sedução Shannon Drake

— Sei interpretar bem, srta. Cahill. Será que


poderia me dar um papel em sua peça?
Stephanie procurou se livrar do rapaz sem
ofendê-lo:
— Giovanni, nem conheço ainda minha equipe.
Conversaremos em outra ocasião sobre seus
talentos, está bem assim?
— Claro. Então boa-noite. Se precisar de
alguma coisa, basta me chamar.
— Eu me lembrarei disso.

Gema ouviu as fortes pancadas na porta, o que


a surpreendeu.
Fazia muito pouco tempo que se separara do
rapaz que conhecera no bar.
Saiu apressada da banheira e pôs uma
camisola de seda sobre o seu corpo ainda
molhado. Olhou-se no espelho e sorriu,
satisfeita.
Nada mal. Sexy, com certeza.
Desceu as escadas e girou a maçaneta.
Arregalou os olhos e tentou fechar a porta. Não
conseguiu, entretanto. Sentia-se entorpecida.
Pôde apenas dar alguns passos para trás,
quando seu visitante começou a entrar.

27
Estranha Sedução Shannon Drake

Ela queria falar, gritar, mas a garganta se


recusava a emitir qualquer som.
— Gema... — o visitante murmurou. — Você
está adorável. E tudo isso para mim...
A porta foi fechada. Os dois estavam trancados
ali dentro, juntos. A escuridão tomou conta de
Gema. Sua camisola de seda foi arrancada e
jogada longe.
E o toque... Os dedos dele deslizavam por sua
pele, começando pelos seios, descendo mais e
encontrando o centro de sua feminilidade,
fazendo-a suspirar.
E as coisas foram sendo feitas... E feitas...
Quando Gema começou a se mover,
finalmente, agora deitada no chão, uma
delirante onda de desejo se apoderou dela, que
sentiu como se estivesse morrendo.
Maria Alberti se arrepiou quando desceu os
degraus da entrada de sua casa onde morava
com a mãe.
Era muito cedo, e o sol demoraria a nascer. Se
Maria quisesse estar no trabalho às nove horas,
teria de sair naquele instante.
Sorriu e se arrepiou outra vez, mas agora de
antecipação. Também uma ponta de remorso.
Sempre compartilhava tudo com a mãe,
28
Estranha Sedução Shannon Drake

inclusive pensamentos e emoções, mas dessa


vez... Sua mãe teria de entender sua reserva.
Maria era uma moça séria. Tirara boas notas
na escola, mas como não tinham dinheiro, não
poderia ir para a universidade.
Sabia disso. Desde que seu pai adoecera e
morrera, seus recursos diminuíram muito. Seu
irmão conseguiu um emprego nos Estados
Unidos, e talvez mandasse buscá-la e à mãe.
Maria respirou fundo. Sua mãe passava os dias
lavando roupa para fora, trabalhando de
faxineira para levantar o dinheiro para o
sustento das duas. Por isso ela compreendia que
tivera sorte ao arranjar o emprego na loja.
E também havia Roberto.
Maria e Roberto eram da mesma idade, haviam
crescido juntos ali na vila à beira dos rochedos.
Ele era um bom moço, e trabalhava para o pai
em construções e reformas. Vinha
economizando para se casar. E todos sabiam
que um dia eles se casariam.
Ela gostava quando os dois trocavam
inocentes beijos. Nada de muito ousado, visto
que Roberto era muito respeitoso. E os dois
teriam filhos, Maria decidiu. E iriam à igreja aos

29
Estranha Sedução Shannon Drake

domingos; talvez a algum baile de vez em


quando.
Assim, Maria aceitava e aprovava a idéia
daquele matrimônio.
Não estava apaixonada por Roberto, mas ele
era o homem de sua vida.
No entanto... Estava indo ao encontro de outro
homem, alguém que lhe daria um prazer sexual
que ela ansiava conhecer. Nem que fosse
apenas uma vez.
Não seria uma aventura que mudaria sua vida,
mas algo que merecia ter, antes que se
assentasse com Roberto, se tomasse mãe e
envelhecesse trabalhando duro, como era seu
destino.
Apressou o passo, desejando que seu quase
amante viesse a seu encontro, porque assim o
caminho seria mais curto e menos difícil.
Assim que se conheceram, desde que seus
olhares se cruzaram, ela soube. Era como se
uma febre tivesse entrado em seu sangue.
Sonhara que ia ao encontro daquele homem.
Era um sonho tão bonito, sensual e repleto de
beijos e carícias ousadas!
E agora tudo se tornaria realidade.

30
Estranha Sedução Shannon Drake

Desejou que o dia amanhecesse mais


depressa, que a claridade tornasse a trilha mais
visível. No entanto, Maria vivera toda a vida
naquele lugar, e conhecia todos os caminhos.
Mirou mais uma vez o firmamento. Até lua se
escondera.
Quando enfim a nuvem saiu da frente dela, o
luar delineou a estrada, formando as sombras
das árvores.
Era preciso caminhar mais rápido. O tempo que
ficariam juntos assim seria maior.
Sem entender por que, contudo, ela se sentiu
tomada por uma estranha sensação. Era como
se alguém a estivesse seguindo.
Alguém, ou alguma coisa.
Parou e virou-se, mas apenas enxergou a
escuridão, que já escondia inclusive sua casa,
que ficara bem para trás.
Retomou o caminho, e então ouviu bem perto o
ruído de uma respiração que não era a sua, E
mais: uma risada.
Não. Devia ser sua imaginação. Eram apenas
as árvores. Mas não havia vento algum naquele
amanhecer.
Maria... Maria... Maria...

31
Estranha Sedução Shannon Drake

Seu nome ecoou no ar, e ela se assustou. Seria


a sua consciência tentando fazê-la desistir?
Não desistiria, porém.
Mas o frio... O frio em seu pescoço...
Tornou a se virar, c de novo nada viu. Exceto...
Parecia que a própria escuridão a seguia.
Maria, Maria... você não pode fugir, Maria.
E mais uma vez, aquela risada ecoou. Era
diabólica, como se...
De repente, mais do que tudo no mundo, ela
desejou voltar para a segurança de seu lar. Mas
não podia correr, com toda aquela escuridão.
Não podia retomar... Assim começou a correr ao
encontro de seu quase amante. E o encontrou.
— Há algo atrás de mim! — ela murmurou,
jogando-se nos braços do amado. — Por um
momento achei que poderia ser você.
— O dia está quase surgindo. Temos de nos
apressar.
Ele a beijou e a fez se deitar no solo, sobre um
tapete de folhas que caíram da árvore. Maria se
entregou ao deleite, à paixão da carne, e entrou
em êxtase ao sentir o toque dele.
E então... O que deveria ser doloroso não foi.
Ela escutou os sons muito estranhos,
apavorantes, e uma friagem incrível a envolveu.
32
Estranha Sedução Shannon Drake

Frio e escuridão. E, no entanto ele dissera que


o dia estava surgindo. Maria ficou confusa e
trêmula. Um frio paralisante substituiu o fogo de
momentos atrás. Abriu os olhos, e para isso fez
um tremendo esforço. Foi quando ela viu. E
devia ter gritado.
No entanto, sua vida terminou naquele exato
segundo, com Maria ainda olhando o amante e
desfalecendo.
O eco da gargalhada encheu as colinas e o
escuro.
Ainda se passaram alguns poucos minutos
antes que amanhecesse.

Stephanie agradeceu aos céus por Pietro ter


combinado a reunião do grupo para a tarde. Não
tinha de como isso fora possível, mas dormiu
como uma pedra desde que se atirou na cama,
na noite anterior, e só acordou na hora do
almoço.
Lembrava-se, contudo, de um estranho e
inquietador sonho que teve. Foi tão real... Nele,
alguém tocara com certa fúria em suas partes
íntimas.
Isso não parecia fazer sentido. Ela não era uma
mulher que estivesse desesperada por sexo.
33
Estranha Sedução Shannon Drake

Afinal, não se separara de Grant havia tanto


tempo assim. Essas fantasias eróticas eram
ridículas.
Sentiu-se desconfortável e tentou jogar a culpa
no cansaço da viagem.
— Olá! Você deve ser Stephanie, nossa
diretora. Sou Lena Miro. Estou feliz em conhecê-
la. — A mulher que lhe estendia a mão era de
baixa estatura, bonita e com olhos e cabelos
escuros.
— Como vai, Lena?
— Esta é Suzette Croix. — Lena indicou a
colega a seu lado.
Suzette era o oposto de Lena: loira e com
olhos verdes.
— Prazer, Suzette.
As duas mulheres deram-se as mãos.
— Agora, venha conhecer os rapazes. Este aqui
é Drew, e este é Doug Wharton.
— Lamentamos não ter estado aqui para nosso
encontro de ontem, Stephanie. Não imaginamos
que o carro demorasse tanto para ser
consertado.
— Mas Lena e Suzette também se atrasaram —
lembrou Doug.
— Oh, sim... — Suzette estremeceu.
34
Estranha Sedução Shannon Drake

— Foi muito excitante.


— O que, Lena? Credo! — Suzette sacudiu a
cabeça. — Como pode achar excitante ver
aquela cratera onde além de ossos havia ainda
fragmentos de tecidos e até de carne?
— Pois eu achei incrível.
— Confesse logo que estava interessada no
arqueólogo.
— Você se interessou por um arqueólogo? —
Drew arregalou os olhos. — Mas esses sujeitos
são patéticos! Vivem cheios de pó e
apaixonados por múmias.
— Pois aquele era igualzinho a Indiana Jones.
Falei com o pessoal nas escavações, e fiquei
sabendo que ele é um ator ou diretor de teatro,
mas também muito interessado em história.
Stephanie levou um susto. Seria Grant o tal
arqueólogo a quem Lena se referia? Ele era
obcecado pelo Egito antigo e por ruínas, mas
estaria bem ali, no sudeste da Itália, justo
quando ela viera dirigir um espetáculo teatral?!
Seria coincidência demais!
— Sujeito bonitão, sem dúvida. — Suzette
sorriu. — Mas parecia só ter olhos para as
ruínas.

35
Estranha Sedução Shannon Drake

— Lembra-se do nome dele? — Stephanie


indagou, tentando não demonstrar muita
curiosidade.
— Não, porque não chegamos a conversar.
Depois que o vi, ele sumiu durante a noite e
ninguém soube dizer onde estava. Era norte-
americano, disso eu sei.
Poderia ser Grant? Isso seria mais do que
bizarro. A população norte-americana era
gigantesca, e boa parte desse número
trabalhava em arqueologia e viajava.
— Bem, pessoal, estou contente por vê-los
todos bem. Ou será que falta alguém ainda? —
Ela olhou em volta à espera de uma
confirmação.
— O avião de Clay Barton sofreu um atraso,
mas ele está a caminho — Pietro informou, lá do
fundo.
— E Gema Barris?
— Passei pelo chalé dela há pouco.
— E ela estava lá, Lena?
— Bati na porta, mas ninguém atendeu.
— Quem sabe ela dormiu demais? — Stephanie
não se surpreenderia com isso. Ela própria
perdera a hora.
— Posso voltar lá — Lena se ofereceu.
36
Estranha Sedução Shannon Drake

— Não é preciso. Afinal, também Clay não está


aqui. Vocês quatro poderão começar a analisar o
texto. — Stephanie se dirigiu a Pietro: — Seria
possível dar uma passada no chalé de Gema e
lhe dizer que já começamos o ensaio?
Pietro fez que sim e se levantou da cadeira.
— Ela andava dizendo que preferia trabalhar
em Roma. Drew deu de ombros. — Atuamos
juntos em outra peça. Gema é exuberante, não
parece apreciar lugares sossegados demais
como este aqui.
— Ela poderia ter partido sem me informar
primeiro?
— Duvido, Stephanie.
— Bem, Pietro irá procurá-la. Agora, vamos à
distribuição das personagens. — Ela virou-se
para Suzette. — Você será a criada americana
que finge ser francesa.
E assim os papéis foram sendo comentados um
a um. Em instantes todos estavam tão
entretidos na conversa que não perceberam
quando um homem entrou.
Stephanie foi a primeira a notar sua presença.
Ele era quase tão alto quanto Drew, os cabelos
avermelhados, as feições clássicas. Usava jeans

37
Estranha Sedução Shannon Drake

e camisa pólo. Sorriu para todos ao se


aproximar.
— Sou Clay Barton. Era para eu ter chegado
ontem, mas meu avião atrasou de Roma a
Nápoles. Lamento.
Doug fez as devidas apresentações para que
Clay logo se enturmasse com o grupo.
Pietro retomou logo depois com a notícia de
que ninguém atendia no chalé de Gema.
— Pietro, tem uma cópia da chave? Seria
importante verificar se ela não se sentiu mal e
está lá dentro, caída. Ou até mesmo se resolveu
ir embora para Roma.
— Vou checar imediatamente o chalé!
— Irei junto. — Stephanie largou o texto em
cima de uma mesa.
— Que tal irmos todos? Somos um time, certo?
- Doug abanou a mão.
Em poucos minutos, a trupe se achava diante
do chalé em que Gema se hospedara. Pietro
pegou a cópia da chave e destrancou a
fechadura.
— Gema! Gema, você está aqui? — Pietro
gritou, cada vez mais preocupado.
Nenhuma resposta.

38
Estranha Sedução Shannon Drake

Stephanie aproveitou e entrou também,


seguida dos demais.
— Vou olhar o andar de cima. — E Suzette
subiu os degraus.
Stephanie observou que os aposentos eram
idênticos aos de seu chalé, mas menores.
Clay ficou parado no meio da sala, Com a
cabeça baixada. Estranho... Era como se ele
estivesse escutando alguma coisa. Como se
fosse uma espécie de vidente e tentasse
visualizar Gema. De repente, ele ergueu o rosto
e deparou Com Stephanie a observá-lo.
— O que foi, Clay?
— O que disse?
Ela abriu a boca para repetir a pergunta, mas
as palavras nunca foram pronunciadas.
No andar de cima. Suzette soltou um grito de
gelar o sangue de qualquer mortal.

CAPÍTULO II
— Ei, americano!
Grant Peterson ergueu a cabeça. Limpava um
crânio que devia ter centenas de anos. O
trabalho requeria tremenda paciência.
Um recente abalo sísmico acabara por
descobrir aquela área, revelando restos mortais
39
Estranha Sedução Shannon Drake

que no momento, iam sendo retirados do local


para posterior análise bem mais cuidadosa.
Corriam boatos de que aquele crânio
pertencera a uma lendária condessa, uma
mulher de fantástica crueldade. Mas Carlo Ponti,
o chefe das escavações, ainda não estava
convencido disso. Acreditava mais que fossem
os restos de alguma camponesa.
— Americano, encerramos o dia. A estrada
está aberta e vamos todos em busca de uma
comida de verdade.
Grant olhou para a sujeira de sua roupa e das
mãos.
— Tome um banho rápido. Nós o esperaremos.
— Podem ir — Grant disse.
— Está louco?! — Carlo soltou uma risada. —
Não pretendo ficar sozinho com esses alemães.
Nada disso. Quero você do meu lado. E depois
vamos ver as moças que encenarão uma peça
no teatro. Lembra-se das duas que estiveram
aqui ontem?
— Você é um sem-vergonha, Carlo...
— Iremos ver mulheres vivas, para variar, está
bem?
Grant hesitou mais uma vez. Desconfiava de
que encontraria Stephanie na vila. Isso porque
40
Estranha Sedução Shannon Drake

descobrira que o teatro local pertencia a Reggie.


E era possível que ela tivesse trazido a sobrinha
para dirigir alguma encenação. E ele não tinha
muita certeza de que seria bom reencontrar
Stephanie. Afinal, haviam se separado com
amargor. Não que entendesse o que havia
acontecido. Continuava apaixonado por ela, uma
garota maravilhosa, linda, sensual, inteligente,
divertida... enfim, a pessoa certa para qualquer
homem.
— Grant?
— Desculpe-me, Carlo. Eu me distraí. Dê-me
alguns minutos, certo?
Grant sentia algo de muito estranho naquelas
escavações. Como se ele tivesse algo a ver com
elas. Mas o quê?

— Meu Deus! O que foi? — Stephanie gritou,


subindo as escadas ao ouvir o berro aterrador de
Suzette.
— Há uma barata aqui! Do tamanho do Texas!
Pensei que não houvesse baratas na Itália... — A
jovem atriz gemeu.
— Suas palavras foram recebidas por um
silêncio geral. Todos ficaram em dúvida entre
rir, estrangular Suzette ou suspirar de alívio.
41
Estranha Sedução Shannon Drake

— Onde ela está? — Pietro indagou.


— Suzette, você quase nos matou de susto.
Achamos que tivesse encontrado Gema
assassinada! — Doug continuava abalado.
— Ainda bem que não é nada disso. — Drew se
sentou na beirada da cama. — Teria sido
horrível. De todo modo, Gema não está aqui.
Naquele momento, Clay entrou no quarto, sem
fazer ruído, e dirigiu-se aos armários. E os
encontrou vazios.
— Tudo faz sentido, agora — Suzette
murmurou. — Ela se foi.
— Sem falar com ninguém? Não acho isso
possível.
— Pelo visto, as luzes brilhantes de Roma a
atraíram.
— Bem, eu não conheço essa moça. —
Stephanie deu de ombros. — Ela seria capaz de
fazer isso?
— Pensando bem, não creio que Gema pudesse
agir assim. — Doug coçou a cabeça. — Nós
conversamos bastante. Ela quer viver
intensamente, mas se quisesse largar o trabalho
comunicaria isso a você, Stephanie.
— Pois em minha opinião Gema não teria
escrúpulos de sumir sem dizer nada a ninguém
42
Estranha Sedução Shannon Drake

— Suzette falou, com uma ponta de maldade. —


Não é que eu não goste dela... Ela não me
pareceu confiável, tenho de admitir.
Desceram as escadas, prontos para sair do
chalé. Stephanie estranhou quando Clay se
ajoelhou junto à porta da frente, observando
alguma coisa com atenção.
— Encontrou alguma pista?
Muito absorvido no que fazia, ele não
respondeu.
— Clay? — ela insistiu.
— Reparou que não encontramos nada por
aqui? Nem carta de despedida, objetos
quebrados, nenhum sinal de luta... Acreditei ter
visto uma pegada ali, no chão... - Meneou a
cabeça. _ Bom...
Pietro nos convidou para irmos ao barzinho.
Até lá, pessoal.
Clay sorriu e se foi.
Stephanie ficou a observá-lo se afastar tomada
de uma estranha impressão. Respirou fundo e
seguiu para o bar. Não havia razão para
continuar naquela casa vazia.

43
Estranha Sedução Shannon Drake

Pietro já chegara, e esperava por Stephanie. E


não estava só. A seu lado, havia um senhor de
barba e...
Grant!
Ele ficou olhando Stephanie se aproximar.
Seus olhos, de um azul profundo, se mostravam
alertas.
— Cavalheiros, quero lhes apresentar a
diretora de nosso espetáculo, Stephanie Cahill.
Stephanie, este é o famoso arqueólogo Carlo
Ponti. E seu colega americano, Grant Peterson.
Carlo cumprimentou Stephanie com
entusiasmo. Grant não se moveu.
— O mundo é mesmo muito pequeno, Pietro.
Stephanie e eu somos amigos. Muito bons
amigos, na verdade. — E estendeu a mão para
cumprimentá-la.
Foi quando Suzette e Lena chegaram, e não
esconderam sua surpresa pelo fato de Stephanie
já conhecer o atraente arqueólogo.
Não demorou e os demais artistas foram se
reunindo ao grupo, e a história de Gema veio à
baila.
— A atriz simplesmente desapareceu? - Carlo
arqueou uma sobrancelha.

44
Estranha Sedução Shannon Drake

— Sumiu sem deixar vestígios — Lena se


adiantou.
— Não chego a estar preocupada, mas algo me
parece meio confuso nisso tudo. Se ela queria ir
embora e romper o contrato, poderia ter me
esperado, conversado comigo e então ido. —
Stephanie voltou-se para Pietro. — Quem sabe
não devemos chamar a polícia?
— Conheço alguns policiais que estão aqui,
neste momento.
— Verdade?
— Venha comigo e eu os apresentarei a você.
Stephanie seguiu Pietro até uma mesa e fez
um rápido resumo para os policiais, explicando
sua preocupação pela artista desaparecida. Ao
sentir a mão de Clay em seu ombro, concluiu
que ele devia estar querendo se mostrar
solidário.
Os policiais prometeram examinar o chalé em
busca de alguma pista, e Stephanie, Pietro e
Clay voltaram a se reunir aos colegas.
Grant puxou a cadeira para ela se acomodar,
sem dizer palavra alguma. E de repente ela
tomou consciência de que tinha de um lado
Grant e do outro Clay. Era como se fossem
rivais.
45
Estranha Sedução Shannon Drake

Sua atenção se concentrou num tumulto que


acontecia naquele momento na entrada do
estabelecimento. Uma mulher gritava e chorava.
Todos se calaram.
— O que está havendo, Pietro?
— Não tenho a menor idéia, mas vou descobrir.
A mulher localizou os dois policiais e se dirigiu
a eles. Ao alcançá-los, caiu de joelhos, agarrou
as pernas de um deles e recomeçou a chorar,
desesperada, ao mesmo tempo que murmurava
palavras desconexas.
— Ela está falando da filha — Lena informou
aos colegas que era italiana e entendia inclusive
o dialeto local. — A moça desapareceu.
Pietro e Carlo se aproximaram da mesa dos
policiais. Pietro fez algumas perguntas à mulher,
enquanto um dos policiais a ajudava a se erguer.
Passados alguns minutos, os dois retomaram.
— Conte-nos o que descobriram, Pietro — Drew
pediu.
— Aquela é Lucrétia Alberti. A filha dela, Maria,
não voltou para casa.
— Desapareceu há muito tempo?
— Apenas umas poucas horas. Mas a jovem
não apareceu na loja onde trabalha, nem
retomou ao lar.
46
Estranha Sedução Shannon Drake

— Como o povo daqui é exagerado... — Suzette


deu de ombros.
— A mocinha deve ter encontrado alguns
amigos e parado para conversar. Ou, então, foi
se encontrar com algum namorado.
Pietro sorriu de leve.
— Vocês devem entender que por aqui as
coisas são diferentes.
As mocinhas não somem de casa. Além do
mais, o pai de Maria morreu há alguns anos.
Lucrétia e Maria vivem sós, e a garota se dá
muito bem com a mãe. Ela lhe contaria se
pretendesse ir a algum encontro.
— Podemos ajudar de algum modo?
Pietro fez um gesto negativo com a cabeça.
— Bem, já que não podemos fazer nada, irei
embora. O dia foi longo. Que tal voltarmos a nos
encontrar amanhã... digamos às dez horas?
Todos assentiram.
— Steph, eu a levo até seu chalé — Grant se
prontificou.
— O caminho é bem curto. Agradeço, mas não
há necessidade.
— Posso acompanhá-la. — Clay ignorou Grant.
— Já me ofereci para isso, se é que não notou
— Grant rebateu.
47
Estranha Sedução Shannon Drake

Stephanie percebeu que o clima entre eles era


tenso. Não estranharia nada se em minutos os
dois estivessem engalfinhados, esmurrando um
ao outro. E, naquele exato momento, ela não
queria estar com nenhum deles.
— Estou bem, rapazes. Portanto, sentem-se e
bebam um bom vinho.
— Tenho algo a tratar com você. — Grant não
era homem de se deixar abater com facilidade.
Stephanie tinha consciência de que todos os
olhares e ouvidos se concentravam neles.
— Se é assim, tudo bem. — Acenou para todos
e saiu, seguida de Grant.
— Há algo naquele sujeito de que não gosto.
— A quem se refere?
— Clay Barton.
— Pois pelo que pude notar, também há alguma
coisa em você que Clay não aprecia. —
Stephanie parou e encarou o ex-namorado. Não
estava aborrecida, apenas curiosa. — Está com
ciúme?
— Não se trata disso. Há algo de esquisito no
rapaz, e eu me preocupo com você. — Grant
passou os dedos pelos cabelos, em um gesto
que revelava que de fato se achava um tanto
confuso. Steph, não sei direito o que vem
48
Estranha Sedução Shannon Drake

acontecendo comigo nos últimos tempos. Todo


aquele meu comportamento bizarro... Mas tem
de acreditar em mim quando lhe digo que me
importo com seu bem estar. Assim, gostaria que
tomasse um pouco de cuidado com esse homem.
Stephanie começava a perder a paciência.
— Grant! Eu fui para meu lado, e você para o
seu. É pura coincidência estarmos agora no
mesmo lugar. Anão ser que tenha me seguido...
— Não seja boba! Já havíamos conversado
sobre a possibilidade de eu trabalhar como
arqueólogo amador. E você, me seguiu?
— Isso é ridículo! Reggie é dona de todo o
resort.
— E onde está ela?
— Arranjando novos grupos de turistas. Grant,
estou bem. Posso lidar com Clay Barton sem
problemas, e com qualquer situação que
apareça. Garanto.
— De todo modo, ficarei por aqui.
— Você não é responsável por mim!
Ele lançou um olhar para o barzinho e baixou a
voz para que ninguém o ouvisse:
— Stephanie, há algo de muito errado
acontecendo por aqui.
— O que quer dizer com isso?
49
Estranha Sedução Shannon Drake

— Sua atriz desapareceu. Outra moça também.


— Não sei o que houve com Maria, mas Gema
decidiu partir para Roma. De forma rude e sem
nenhum profissionalismo, mas é o que deve ter
acontecido.
Os dois chegaram à entrada do chalé.
— Bem, aqui estou, sã e salva.
Grant examinou a porta e as janelas.
— Não há segurança alguma neste lugar.
Qualquer um pode forçar a entrada.
— Grant, por favor, ninguém irá arrombar a
porta.
— Stephanie... — Ele a fitava, cheio de paixão.
— Você significa mais para mim do que minha
própria vida.
— Grant, já lhe disseque estou bem.
— Lamento ter aceitado esse trabalho e
também lamento que você tenha aceitado o seu.
Não devíamos estar aqui. Não é um lugar bom
para ninguém.
— Olhe, prometo trancar bem as portas hoje à
noite. Tem minha palavra. — Stephanie
constatou a sinceridade dele.
Grant ainda não parecia satisfeito, por isso ela
brincou:

50
Estranha Sedução Shannon Drake

— Quer que eu retome ao bar e peça a Pietro


para me arranjar uma réstia de alho? Posso
espalhá-lo pelo chalé todo para impedir a
entrada de vampiros.
Ela se espantou com a reação de Grant e sua
incrível seriedade.
— Talvez não fosse uma má idéia, Steph.
Stephanie suspirou, desanimada.
— Boa-noite. Obrigada por ter me trazido até
aqui. — E se pôs na ponta dos pés para dar um
beijo no rosto dele.
Mas os braços de Grant a envolveram, e logo
suas bocas se encontravam, sedentas,
apaixonadas.
O beijo se tomou mais intenso, mais ousado.
Stephanie sentiu que estava no lugar certo e
queria satisfazer aquele desejo que retomava
com a mesma potência de antes.
Porém, tudo mudara, e ela sabia disso.
Conseguiu interromper o beijo e se
desvencilhar de Grant.
— Boa-noite — repetiu, girando a chave na
fechadura — ficarei bem, eu juro.
E, no segundo seguinte, trancava-se lá dentro.

51
Estranha Sedução Shannon Drake

Clay olhava Grant entrando de novo no bar.


Tanto Suzette como Lena optaram por ir dormir
mais cedo, mas os homens ficaram.
Carlo e Artur fumavam seus charutos, Doug,
Drew e Clay saboreavam seus conhaques. Um
policial regressara e lhes perguntara se podiam
auxiliar na busca da garota desaparecida. Os
cinco estavam justamente se preparando para
isso quando Grant retomou.
— Vamos dar uma vasculhada no resort na
tentativa de achar Maria em algum lugar — Clay
foi dizendo a Grant.
— Eu disse que ajudaríamos na busca. — Carlo
acenou para o colega. — Nós, arqueólogos,
sabemos encontrar até as coisas mais bem
escondidas.
— Alguém acha mesmo que a garota pode
estar na praia?
— Ninguém, Grant. — Pela entonação de Clay,
todos ali temiam que Maria estivesse morta.
— Muito bem. Onde devo procurar?
— Você e eu iremos para o lado dos rochedos,
Grant. — Clay encarou os demais. — Drew e
Doug farão a busca na área dos chalés, e Pietro
e Carlo se encarregarão do lado norte da praia.
— Muito bem.
52
Estranha Sedução Shannon Drake

O rosto de Grant deixava clara sua


desconfiança, e Clay notava isso muito bem. No
entanto, sorriu.
— Nós nos reuniremos mais tarde aqui mesmo?
— Sim, este será nosso quartel-general. —
Pietro piscou, tentando manter o otimismo.
Todos saíram juntos do restaurante e se
separaram em seguida, rumando cada um para o
caminho determinado.
Clay e Grant caminhavam em silêncio. Por fim,
foi Clay quem falou primeiro:
— Então você tem seu próprio teatro, é famoso
por suas comédias e improvisos e, mesmo
assim, está aqui escavando ruínas
arqueológicas... .
— Isso mesmo.
— Não é o que parece.
— O que quer dizer com isso?
— Creio que veio atrás de Stephanie.
Grant estacou e enfrentou o olhar de Clay.
— Sempre fui fascinado por arqueologia,
antropologia... tudo o que faça parte da história
antiga. Cresci em Chicago, e uma de minhas
melhores lembranças é de ter visitado uma
exibição do Egito no museu. Apareceu esta

53
Estranha Sedução Shannon Drake

oportunidade de escavar este novo sítio


arqueológico, e aqui estou.
— E não sabia que Reggie tinha um resort
nesta região?
Grant procurou controlar seu gênio e não
agarrar aquele atrevido pelo pescoço. Ambos
eram altos, fortes e musculosos, mas ele sem
dúvida era mais ágil. Esforçou-se, porém, para
manter a conversa em tom amigável:
— Só encontrei Reggie três vezes. Sabia que
era italiana, nada mais. Não tinha a menor idéia
de que era dona de um resort na Calábria e que
montara um teatro.
— Mas é estranho esse seu encontro com
Stephanie, não é?
— Pode ser. Mas têm acontecido muitas coisas
estranhas ultimamente. Uma delas é que você
não parece ser um humorista.
— Sério? — Clay deu de ombros. — Por quê?
Talvez os humoristas não sejam altos e bonitos
como eu...
Grant não se deu ao trabalho de responder à
provocação. Parou de súbito. Estava bem
próximo da água, onde a areia era mais
profunda, e o ar, impregnado com o cheiro
salgado. E havia mais um odor.
54
Estranha Sedução Shannon Drake

O cheiro da morte.
— Lá! — Grant apontou.
Apesar da escuridão, os dois puderam ver algo
caído na praia alguns metros à frente.
Encararam-se por segundos, e apressaram o
passo.
— É um golfinho morto — Grant lamentou.
— Pobrezinho! Veio dar aqui na praia.
— Bem, temos de contar a Pietro que há um
animal morto aqui.
Ele deve mandar retirá-la o mais rápido
possível.
— Veja, lá estão os rochedos. Não creio que
haja alguma coisa lá, no entanto. Que tal
voltarmos ao barzinho?
Grant mirava os rochedos, inquieto, tomado
por uma sensação estranha mais uma vez.
— Está certo.
No bar, encontraram-se com todos, do mesmo
modo frustrados.
Carlo Ponti sugeriu a Grant que retomassem as
escavações.
— Carlo, vou alugar um chalé e dormir por aqui,
hoje. Amanhã bem cedo estarei com você,
combinado? — Grant dirigiu um olhar severo
para Clay, como que a alertá-lo para não se
55
Estranha Sedução Shannon Drake

meter com Stephanie, porque estaria sendo


vigiado.
Clay sentiu que talvez estivesse sendo
ameaçado.
— Talvez passe uma semana no resort. —
Grant enfiou as mãos nos bolsos. — Por
precaução. Para o caso de Stephanie necessitar
de algo. Poderei ajudar na montagem do
espetáculo, por exemplo.

Stephanie, naquela noite, trancou as portas da


frente e dos fundos e, quando subiu para o
quarto, fechou e trancou também a porta que
dava para o balcão. O que era uma lástima, visto
que adorava a brisa que vinha do mar.
Era tudo uma grande bobagem, tinha de ser.
Gema Harris fora atraída pelas luzes brilhantes
de Roma, e a garota desaparecida já devia ter
sido achada àquela hora.
Ainda assim...
Estava cansada demais para se concentrar
naquele tipo de coisa.
Certa de que fechara todas as entradas, ela se
deitou.

56
Estranha Sedução Shannon Drake

Os acontecimentos daquele dia continuavam a


atormentá-la. E terminavam sempre com um
único pensamento: Grant estava ali.
Tivera momentos muito agradáveis reunida
com seu elenco e ensaiando. E então Clay
Barton surgiu. Tinha a impressão de já ter visto
aqueles olhos antes. Eram iguais aos de um
gato, misteriosos e com riscos avermelhados.
Remexeu-se na cama por algum tempo e, e por
fim, acabou adormecendo.
Mas foram apenas alguns minutos de repouso.
Grant está aqui.
Seria um sonho? As cortinas balançavam
devido à brisa que entrava pela sacada, mas
Stephanie sabia que fechara a porta. Estava nua
entre as cobertas, e sentia o vento acariciando
eroticamente seu corpo. Tentou dizer a si
mesma que aquilo era ridículo que vestia uma
camiseta de algodão comprida, mas ainda
assim...
O ar que a alcançava era tão fresco! E havia
um homem na penumbra, e pela sombra, ela teve
certeza de conhecê-lo, e muito bem.
Ombros largos, corpo musculoso, quente e
vital, e se movendo bem devagar, vindo em sua
direção. Confiança total, como se soubesse que
57
Estranha Sedução Shannon Drake

ela não protestaria, pois estaria à espera dele,


ansiosa pela energia e o calor que viria com seu
toque.
A escuridão escondia seu rosto, mas lá estava
o sorriso de confiança e satisfação.
Ele subiu no colchão com a agilidade dos mais
belos animais.
As cortinas pareceram balançar, como se
alguma coisa tivesse vindo junto com Grant.
Algo assustador.
Mas Stephanie não conseguia raciocinar
direito, nem mesmo sentir medo de ser tocada,
porque a sensação de calor que a invadia
lembrava um vulcão em erupção, e ela sabia que
aconteceria; queria que acontecesse.
Sentiu pulsar sua parte mais íntima...
Mais próximo... Ele estava mais próximo. E
então...
Mais alguém surgiu e se sentou na cama, como
se fosse natural presenciar uma cena erótica
como aquela.
O homem ao seu lado era Clay Barton.
E a sedução entre suas pernas se tomou
completa.
A sombra sumiu, e ela se viu gritando...

58
Estranha Sedução Shannon Drake

Stephanie acordou num sobressalto, impedindo


o grito de escapar de sua garganta.
As portas estavam cerradas: As cortinas
também. O quarto se achava vazio. Ela vestia
sua camiseta, do mesmo jeito de quando fora se
deitar. E tremia e suava.
Estivera sonhando, e mesmo assim ficara
envergonhada. O sonho fora tão comprometedor!
Correu para o banheiro, acendeu a luz e
molhou o rosto com água fria.
As sombras agora se mostravam muito
naturais.
N o entanto, deixou a lâmpada do quarto
acesa. O sonho acabara, dizia a si mesma. Mas,
embora fosse ridículo, era capaz de jurar que
sentira algo inexplicável, que de alguma forma
alguém estivera ali fazendo sexo com ela.
Desceu as escadas e acendeu todas as luzes.
Porém, ainda não estava pronta para voltar a
se deitar.
Preparou uma xícara de chá e ligou a
televisão. Havia um canal de música que ficava
no ar a noite inteira. Acomodou-se na poltrona e
procurou assistir ao que passava na tela.

59
Estranha Sedução Shannon Drake

Quando o sono voltou, Stephanie continuava


ali sentada, com as luzes acesas e a música
enchendo todos os ambientes.

Stephanie entrou no restaurante, pela manhã,


e foi direto para o bule de café. Avistou Drew e
Suzette à mesa e foi se sentar com eles.
— Bom-dia.
— Buongiorno! — Drew sorriu-lhe.
— Olá, Steph!
— Sabem se encontraram a mocinha
desaparecida?
Suzette fez que não.
— Ainda não encontramos Pietro, mas Giovanni
estava por aqui agora há pouco. — Suzette
suspirou. — Foi ele quem falou que não acharam
Maria. A polícia pediu reforços para o posto
policial da cidade mais próxima.
— Talvez ela tenha se envolvido com um
arqueólogo...
— Não com aqueles que vimos, Drew. Claro
que Grant Peterson seria capaz de virar a
cabeça de qualquer mulher, mas ele não um
arqueólogo de verdade. — Suzette voltou-se para
Stephanie. — E difícil acreditar que o homem

60
Estranha Sedução Shannon Drake

com quem você trabalhou nos Estados Unidos


está aqui por coincidência.
— Concordo com você, Suzette.
— Ele acabou de sair.
— O que disse?
— Grant esteve aqui para o desjejum. Alugou
um dos chalés.
— Está brincando! — Stephanie se irritou.
Grant deveria pelo menos ter tido a decência de
ir dormir em sua barraca!
— Pois eu o acho maravilhoso. O homem mais·
sensual que conheci.
— Credo, Suzette! — Drew protestou.
— Querido, me desculpe! Você também é
adorável.
— Não quero ser adorável. Quero ser sensual!
— E claro, temos Clay Barton. Ele é sexy... —
Suzette tornou a suspirar, ignorando Drew.
— E eu sou só adorável! — Drew voltou a
protestar.
— Mas ser adorável é bom. — Suzette riu para
o colega, que fitou o teto. — Bem, voltemos a
Grant. Ele parece muito disposto a ajudá-la,
Stephanie. Não vejo mal algum nisso, se quer
saber.

61
Estranha Sedução Shannon Drake

— Porque não tem nada dentro dessa sua


cabecinha — Drew a interrompeu. — Não notou
ainda que Stephanie e Grant têm um
envolvimento romântico.
— Verdade?! — Suzette encarou Stephanie. — E
eu aqui falando bobagens... Não sei como não
percebi.
— Não há mais nada entre mim e Grant.
Nenhum de nós pensou que estaríamos
trabalhando na mesma região. Separamo-nos há
seis meses, e cada um foi para um lado.
— Briga feia, hein?
— Não chegou a tanto, Drew. Gosto de Grant e
me importo com ele. Como com qualquer outro
ser humano, lógico.
Suzette caiu na gargalhada.
— Ah, como com qualquer outro ser humano!
Suzette continuaria com a caçoada caso Lena
não tivesse entrado naquele exato momento.
— Bom-dia a todos. — Lena se serviu de café e
começou a encher um pratinho· com pãezinhos,
frios e bolo. — Ah, estou exausta, apesar de ter
dormido a noite inteira — Lena reclamou.
— Pessoal, tive uns sonhos tão bizarros!
— Você deve ter ficado impressionada com os
gritos da mãe de Maria. — Drew tomou um gole
62
Estranha Sedução Shannon Drake

de seu café. — Sabe como é, este lugar é


pequeno, e todos acabam se envolvendo mais
uns com os outros.
— Do que estão falando?
Ao se virar, deram com Clay, que usava um par
de óculos escuros que lhe conferia um ar
sofisticado.
— Não acharam Maria, ainda. — Drew meneou
a cabeça.
— Isso é ruim. — Clay se serviu de apenas uma
xícara de café.
— Pois, para mim, ela encontrou o homem de
sua vida e os dois decidiram fugir. Não é
romântico? Nada de tragédias.
— Ouvi dizer que ela estava comprometida com
um rapaz local.
— Como sabe disso, Clay?
— Andei falando com o pessoal do resort.
— Então começo a ficar assustada com essa
história — Lena murmurou.
— Talvez todos nós devêssemos nos assustar
um pouco, pelo menos a ponto de sermos bem
cuidadosos. Afinal, analisemos a situação. Um
membro de nosso grupo sumiu. Agora, uma
jovem da vila desaparece também. É melhor

63
Estranha Sedução Shannon Drake

mantermos nossas portas trancadas e não


andarmos sozinhos.
— E falando em pessoas ausentes, algum de
vocês sabe onde Doug se meteu? — Lena quis
saber.
— Talvez tenha ido direto para o ensaio —
Suzette sugeriu.
— Pois é para lá que estou indo. — Stephanie
terminou seu café e levantou-se.
— Vou com você. Também terminei aqui. —
Clay se colocou ao lado dela, disposto a
acompanhá-la.
Clay colocou a mão em seu ombro, e ela não
protestou. Talvez fosse apenas um gesto
amigável; Doug e Drew teriam feito o mesmo.
Entraram no teatro, e lá estava Doug, sentado
na beira do palco, lendo suas anotações.
— Bom-dia! — ele saudou Stephanie e Clay.
Suzette, ao entrar no local naquele momento,
vinha junto com o restante da turma, seguindo
fielmente os conselhos de Clay. Ninguém queria
andar sozinho. Ela ergueu a mão numa saudação
e perguntou a Doug:
— Vamos ensaiar, pessoal. E desta vez, sem os
scripts. Cada um decorou suas falas?

64
Estranha Sedução Shannon Drake

— Sim — responderam em uníssono à questão


da diretora.
— E quem assumirá o papel que seria de
Gema?
— Eu. — Stephanie sorriu. — Lena, você é a
primeira a entrar em cena.

O ensaio teve início e, apesar de estar no


palco interpretando, e não apenas dirigindo,
Stephanie se sentiu bem. A trupe era excelente.
Todos pareciam saber suas falas e
interpretavam muito bem.
Então, ela avistou Grant no fundo do teatro. Ele
usava jeans e camisa pólo. Os cabelos estavam
molhados como se tivesse acabado de sair do
banho. Pelo jeito, resolvera não participar das
escavações naquele dia.
Ficou tentada a pedir que ele se retirasse. Mas
isso seria um erro.
— Até quando pretende ficar aqui, Grant?
— Pelo tempo que você precisar de mim,
Steph.
— Muito bem. Obrigada. Nesse caso, vou pedir
que nos ajude com o ensaio.

65
Estranha Sedução Shannon Drake

Stephanie tomou seu lugar ao lado de Clay


Barton. Clay interpretava um gigolô, e ela uma
mulher, provocante.
O diálogo prosseguiu, e logo todos riam muito,
pois a interpretação dos dois era muito divertida
e convincente.
E então Stephanie achou ter ouvid9 uma risada
que estivera em seu sonho, que naquele instante
surgiu em sua mente com força total.
E lá estava Grant, a observá-la.
De repente, ela o imaginou como uma
gigantesca pantera negra, uma sombra, depois
um homem, tocando seu corpo como durante a
noite...

CAPÍTULO III
Era quase fim de tarde, e Stephanie decidiu dar
o dia por encerrado. Haviam passado o texto, e
agora faltava apenas ensaiar algumas canções.
Ela se virou para a equipe.
— Isso é um fenômeno, pessoal. Estamos
juntos há poucos dias e tudo tem saído perfeito!
Obrigada a todos vocês.
— Não acha que merecemos uma cerveja? —
Drew perguntou, sorridente.

66
Estranha Sedução Shannon Drake

— Um típico vinho italiano, isso sim — Lena


rebateu. — Um Peroni.
— Então, vamos todos para o bar.
A trupe saiu do teatro. Grant e Stephanie
ficaram lá mais um pouco.
— Quero lhe agradecer — ela disse a Grant,
quando se viram a sós. — Sua ajuda foi incrível.
— Gosto de teatro e vou estar aqui todas as
tardes.
— Mas isso terminará por prejudicar seu
trabalho nas escavações. Não se esqueça de
que veio para a Itália para trabalhar como
arqueólogo.
— Já combinei com Carlo de que participarei
das escavações na parte da manhã. Se não
houver deslizamento de terra pelo caminho,
levarei pouco mais de trinta minutos para
chegar aqui.
— Soube que alugou um chalé.
— Sim.
— Por que... por que decidiu que preciso de
ajuda?
— Não. Porque a tenda em que durmo é velha e
desconfortável.
— Ele pareceu impaciente. — Estou mais feliz
por aqui, está bem?
67
Estranha Sedução Shannon Drake

— Grant, fatos estranhos começaram a


acontecer desde que cheguei à Calábria, mas
não estou em perigo. Não quero que se sinta
responsável por minha segurança.
— Como já lhe disse, estou mais feliz aqui. E
sossegue. Não espero nada de você. Não quero
nenhum tipo de pagamento.
— Não sugeri nada assim. Não é esse o
problema.
— O que exatamente está querendo dizer,
então?
— Ora, posso desejar me envolver com outro
homem, mas com você ao meu redor...
Grant, com as mãos nos quadris, olhou firme
para ela.
— Clay Barton?
— Não falei isso.
— Quem mais pode ser? Bem, se sua intenção
for essa, sugiro que vá devagar. E agora, vamos
encerrar essa conversa, está bem?
Tenho mais o que fazer. Há um Peroni a minha
espera. Você não vem?
— Estou indo. — Stephanie apanhou seus
papéis e apressou o passo, passando à frente
dele.

68
Estranha Sedução Shannon Drake

Ao se reunirem aos demais, Stephanie


escolheu sentar-se junto de Lena e Doug.
— Tudo está bem, Steph?
— Claro, Lena. Por que não estaria?
— Tenho um pouco de inveja de você, sabia?
— Na verdade não está acontecendo nada
entre Grant e mim neste momento. Estamos
trabalhando juntos, só isso.
— Ele não a vê como uma colega de trabalho. E
aquele outro lá... — Lena indicou Clay. — ...não a
perde de vista um só instante.
— Porque sou a diretora do espetáculo.
Suponho que todos devam prestar atenção em
mim.
Lena riu e mudou de assunto:
— Está fazendo um ótimo trabalho. Tudo
parece estar dando certo na peça; mas mesmo
assim estou meio desanimada. Amo o que faço,
estou feliz assim, mas gostaria de viver um
grande amor, como aquele que você e Grant
devem ter vivido. Queria muito encontrar o
sujeito certo e me apaixonar. Penso que trocaria
tudo por algo assim.
— Lena, não acredito que eu tenha despertado
em Clay algum sentimento especial. E quanto a
Grant... bem... ele faz parte de meu passado.
69
Estranha Sedução Shannon Drake

— Está bem, está bem. Façamos de conta que


é assim. Sabe o que eu acho? Que este lugar é
especial. A praia, as cores da água, as
montanhas ao fundo... Mas há algo de estranho
acontecendo.
— Lena suspirou. — Não pode nem imaginar os
sonhos que venho tendo. — Tomou a suspirar.
— Pietro, meu caro! — Drew acenou para o
italiano.
Todos ficaram em silêncio, aguardando Pietro
se aproximar.
— Alguma notícia da garota desaparecida? —
Grant quis saber.
— Lamento informar que não. Temos muitas
equipes de busca... O namorado foi interrogado e
chora mais do que a mãe da Maria, mas ninguém
acha que ele tem envolvimento no sumiço da
garota.
— Quem sabe ela ainda aparece... — Lena
tentava animar o grupo.
— Pode ser. — Pietro parecia triste. — Bem, e
vocês, ensaiaram o dia inteiro? Vieram aqui para
jantar? Posso mandar o chef preparar para
vocês uma refeição especial.
— Então faça isso! — Lena e Suzette pediram
ao mesmo tempo.
70
Estranha Sedução Shannon Drake

A refeição logo foi servida, e estava deliciosa.


— Logo pela manhã a costureira trará o
figurino — Stephanie comunicou ao elenco. —
Ainda bem que temos Lena conosco, para se
comunicar com elas em italiano.
— Sem dúvida, podem contar comigo. — Lena
tomou um último gole de vinho. — Meus amigos,
o jantar estava ótimo, mas devo confessar que
estou caindo de sono.
— Bem, eu vou explorar as ruas da vila e os
locais mais agitados. Alguém quer vir comigo? —
Suzette convidou.
Drew e Doug decidiram acompanhá-la. Clay
demonstrou interesse em se unir ao trio.
— Quer ir também, Steph?
— Não, Suzette. Estou me sentindo como Lena.
Cansada demais para qualquer passeio.
— Grant? — A voz de Suzette dessa vez soou
bem doce.
— Não vai dar. Passei parte do dia escavando,
e parte trabalhando com vocês. Steph, se está
indo para seu chalé, eu a acompanho.
— Vou atrás de Lena, para confirmar se está
tudo bem com ela.
— Clay ficou de pé. — Deixamos que ela fosse
sozinha, repararam nisso?
71
Estranha Sedução Shannon Drake

Stephanie e Grant puseram-se a caminhar em


silêncio até o chalé.
— Bem, aqui estou eu, de novo sã e salva.
Obrigada.
— Eu poderia entrar?
— Olhe, Grant, tudo irá bem entre nós se
conseguirmos manter nosso relacionamento em
nível profissional. Não é que eu não goste de
você, mas...
— Steph, não pedi para dormirmos juntos.
Apenas queria ter certeza de que não há
ninguém lá dentro. Diga-me: não sente nada de
esquisito neste lugar?
— Não vou mentir; sinto, sim. Eu... — Stephanie
baixou a cabeça, para que ele não visse sua
expressão. — Seria bom mantermos certa
distância um do outro.
— Por quê?
Ela o encarou.
— Será que alguma vez cheguei a conhecê-lo
bem, Grant?
— Você sempre soube como eu era.
— Sério? Sabe, jamais poderia imaginar que um
dia iria ouvi-lo pronunciar o nome de outra
mulher, estando deitado ao meu lado.
— Foi você quem me disse que isso aconteceu.
72
Estranha Sedução Shannon Drake

— por quê? Não acredita em mim?


— Não creio que estivesse mentindo. Só não
sei como pude fazer isso. Nunca conheci mulher
alguma que se chamasse Valéria.
— Bem, tenho de confessar que você nem
parecia estar consciente quando pronunciou
esse nome. O problema é que sinto haver
qualquer coisa estranho dentro de você, Grant.
— Estranho é o que tem se passado neste lugar
— ele insistiu.
— Juro que não sabia que você estaria aqui
quando aceitei trabalhar na escavação. Também
ignorava que me encontraria, não é, Steph? Não
acha pelo menos extraordinário esse nosso
reencontro?
De fato era, ela pensou. Mesmo assim, tentou
rebater o arguo mento de Grant:
— Coincidências acontecem.
Stephanie procurava analisar a situação do
momento. Grant não se mostrava interessado
em fazer sexo com ela. Devia tomar isso como
um insulto?
Sobretudo depois do sonho...
— Está bem, pode entrar. Não há nada lá
dentro, eu lhe asseguro.

73
Estranha Sedução Shannon Drake

Grant entrou no chalé, olhou em volta e


apontou para a escada.
— Posso dar uma olhada lá em cima?
— Vá em frente.
Ela o esperou na sala. Poucos minutos depois,
ele voltava.
— A vista da sacada é fantástica. Fechei as
portas por precaução, apesar de que a brisa que
entrava por ali era muito gostosa.
— O quê? Estavam abertas? Seria capaz de
jurar que havia fechado tudo.
— Talvez a faxineira tenha aberto para o ar
entrar. Mas agora mantenha as janelas e portas
bem trancadas.
— Já lhe disse que farei isso.
— Steph, acredite em mim: existe algo de
muito errado por aqui.
No fundo, ela sabia que Grant estava certo,
mas se recusava a aceitar isso.
— Só quero que jure que manterá tudo
trancado, está bem? Agora vou indo. Durma
bem, e se precisar de mim... Bem, você sabe
onde me achar, certo? E aqui está o número do
telefone do quarto e do meu celular.
Stephanie não pôde deixar de sorrir.
— Prometo que se tiver medo, eu te ligo.
74
Estranha Sedução Shannon Drake

Grant não ficou satisfeito mesmo diante da


promessa.
— Eu receio...
— Receia o que, Grant?
— Que você não tenha tempo de me chamar se
algo a assustar.
_ Chega dessa história. Boa-noite. E obrigada
por se preocupar comigo.
Ele meneou a cabeça, ainda cismado. E se
afastou, bem devagar.
Stephanie ficou se perguntando se não era a
mulher mais tola do mundo por deixar aquele
homem sensacional ir embora.

Lena estava ao mesmo tempo excitada e


embaraçada.
O homem em cima dela parecia mais um
animal. Ela nunca se entregara antes a um
estranho. E não havia conversa entre eles,
apenas sexo, sexo e mais sexo. Primeiro, na
mesa; depois, no chão.
O desconhecido era rude, mas isso não
importava, porque as carícias que fazia eram tão
eróticas que era impossível pedir-lhe que
parasse. E ele usava os dentes, a língua, os
dedos...
75
Estranha Sedução Shannon Drake

Sim, ela queria que continuasse.


— Faça isso! — Lena implorou.
E ele fez.
Ela achou que ia morrer. Seu corpo inteiro
tremia, tomado pelo clímax do ato sexual.
Lena não conseguia agüentar mais. Toda sua
energia se fora, deixando-a exausta.
O desconhecido ficaria ali aquela noite, ela
pensou. E de repente ele saltou, como se tivesse
escutado algo. Ou alguém. E então ela percebeu
vagamente que ele não estava mais ali. Mas
tudo bem.
Não podia se mover. Não poderia repetir
aquele ato selvagem.
Cerrou as pálpebras, sentindo o sono chegar. O
descanso.
Não... não... não conseguia sequer se virar de
lado.
Tinha de admitir: tudo o que queria na vida era
que ele voltasse.
Abriu os olhos, mas não conseguiu mantê-los
abertos.
Tornou a fechá-los, e caiu em um estado de
torpor.

76
Estranha Sedução Shannon Drake

Era madrugada, e Grant não conseguira dormir.


Virara-se na cama, impaciente. E não havia
motivo para continuar acordado. Levantou-se e
foi até a varanda.
A paisagem era tão pacífica... Apenas a
natureza e o barulho constante das ondas que
chegavam, suaves, à praia.
Voltou ao quarto, vestiu-se e saiu. A área dos
chalés estava quieta e tranqüila. Afinal, eram
quatro horas da manhã.
Pisou na areia, sentindo o vento envolvê-lo. De
onde se encontrava, podia ver as casas, os
bangalôs, os chalés. Nenhuma luz acesa.
Não havia nada...
Nenhum cheiro de morte, como na véspera.
E de súbito congelou. Uma sombra se dirigiu
aos chalés e logo os envolveu. No firmamento,
apenas a luminosidade parcial das poucas
estrelas que ali cintilavam.
E a sombra possuía duas grandes, imensas
asas. Estava lá no alto, e aos poucos foi
descendo.
Grant procurava se mover, tomado pelo terror
de que a sombra estivesse pairando sobre o
chalé de Stephanie. Sem saber como, começou
a correr, numa ansiedade crescente.
77
Estranha Sedução Shannon Drake

Olhou para os lados, para ter certeza de que


ninguém o via, e escalou pelas reentrâncias da
parede até alcançar a sacada do chalé de
Stephanie.
Procurou enxergar o que acontecia lá dentro.
Ela continuava dormindo, tranqüila, alheia a
qualquer perigo que se apresentasse.
Grant ficou parado ali, sentindo-se um idiota. E
soube mais uma vez o que sempre soubera: ele a
amava, do fundo do coração. Bastava olhá-la
para querê-la em seus braços.
Saltou para baixo, sem fazer ruído e retomou à
praia, olhando novamente em busca da sombra. .
Aquela coisa, fosse lá o que fosse, era real.
E descera em algum lugar por ali.
Mas onde?!

Quando Lena chegou na manhã seguinte,


parecia estar doente.
— Desculpe-me, Steph. Acordei cedo, mas
acabei dormindo de novo. Devo ter comido
alguma coisa que me fez mal, apesar de que, me
sinto bem do estômago e péssima no resto.
— E melhor que volte para o chalé. Descanse
até ficar em condições. — Stephanie colocou a
mão sobre a testa dela.
78
Estranha Sedução Shannon Drake

Não estava quente, como imaginou, mas, ao


contrário, extremamente fria. Fria demais.
— Temos muito o que repassar — Lena
murmurou.
— E se você piorar e não puder participar da
peça? Pegue seu texto e o estude deitada entre
os lençóis. Talvez tenha contraído uma gripe.
— Pode ser. Lamento tanto...
Aquilo não estava cheirando nada bem. Uma
das atrizes sumira; agora, uma outra adoecia.
— Acompanharei você até seu chalé, Lena —
Clay se ofereceu.
— Na verdade, isso seria ótimo. Sinto-me tão
fraca!
Stephanie se voltou para os demais do elenco
e decidiu:
— Pessoal, hora de ir para a praia.
— Praia?!
— Isso mesmo. Teremos uma folga, hoje. São
onze horas; vamos nos reunir de novo só à tarde.
Passeiem e depois almocem sem pressa.
— Parece uma decisão bastante sábia! — Drew
aplaudiu.
— Enquanto vocês se divertem, irei procurar
Pietro e lhe pedir que arranje um médico para

79
Estranha Sedução Shannon Drake

examinar Lena. Mais tarde nos encontraremos


de novo. Está bem assim?
— Combinado!
O que começara como tedioso e sem graça
para Grant vinha se tornando pior ainda.
Ele não queda desistir de seu trabalho nas
escavações apenas porque fora tomado por uma
sensação de que algo estranho vinha
acontecendo por ali. Algo que ele não
compreendia muito bem e que talvez não
passasse de mero fruto de sua imaginação.
Precisava analisar bem tudo aquilo e descobrir
o que estava lhe provocando aquele
aborrecimento inesperado. Seria crise da meia
idade? Absurdo, pois tinha apenas trinta e três
anos. Podia ser o lugar? Lera em algum livro que
havia muitas lendas nas áreas em que os
Cruzados lutaram. Talvez ali também houvesse
uma, e que o levava a misturar realidade com
fantasia.
Deus! Andava pensando bobagens demais!
Parou um pouco com o que fazia. Naquele
momento, sozinho entre os rochedos, podia ouvir
Carlo dando ordens para alguns homens no vale
lá embaixo. Estavam desenterrando um dos
esqueletos, e aquele era um trabalho que
80
Estranha Sedução Shannon Drake

deveria ser feito com muito cuidado e com a


supervisão de um especialista.
Grant, de joelhos, cavava com as mãos para
evitar que alguma ferramenta viesse a danificar
algum resto arqueológico. E foi então que sentiu
um arrepio ao remexer na terra já solta.
Começou a cavoucar com mais cuidado. Não se
lembrava de já ter mexido naquele lugar em
particular.
Continuou a cavar, e o arrepio aumentou.
Havia algo enterrado ali. Ou alguém.
Endireitou a coluna, sentindo dificuldade para
respirar. A poeira o fez tossir. Primeiro, achou
uma assada muito antiga, mas parecia haver
terra fofa abaixo dela. Em seguida, tocou em
outros restos mortais.
No entanto, aquele não datava de séculos
atrás.
O cheiro putrefeito atingiu suas narinas, e ele
quase se sufocou.
E foi tomado por uma forte náusea.
Sentou-se, exausto, tomado por uma tristeza
que se misturava com desespero. Então, após
um momento, se levantou. Suado, coberto de
poeira, caminhou até onde se encontrava Carlo.

81
Estranha Sedução Shannon Drake

— Você achou alguma coisa! — Carlo


exclamou, vendo a expressão de Grant. —
Lamento dizer que sim.
— Lamenta?!
— Sim. Creio ter encontrado a garota
desaparecida. Maria Alberti.

Pietro garantiu a Stephanie que arranjaria um


médico para Lena.
A manhã estava bonita, e ela dormira bem à
noite. Costumava não gostar de tomar
tranqüilizantes, mas abrira uma exceção e
engolira um. Assim, adormecera profundamente,
e agora o mundo lhe parecia... normal.
Vestiu um maiô, pegou uma toalha, loção de
bronzear e um livro.
Stephanie estendeu a toalha, ajeitou tudo e se
pôs a admirar o oceano. Achou-o convidativo
demais; por isso, resolveu dar um mergulho.
Logo nadava com vigor, exercitando os
músculos.
Viu sua equipe chegando. Suzette usava um
biquíni ousado.
Doug e Drew optaram por shorts. Clay também
viera, mas de jeans e camisa de manga curta.

82
Estranha Sedução Shannon Drake

Stephanie nadou para a parte mais rasa e


começou a caminhar.
E ouviu o grito.
Uma das crianças que estavam na praia ia
sendo levada pela correnteza, e a mãe começou
a gritar, pedindo socorro.
Stephanie nadou o mais rápido que pôde.
Enfim, conseguiu se aproximar do menino e
segurar uma de suas pernas. Em minutos,
conduziu a criança para a praia.
Clay não hesitou e fez respiração boca a boca.
Sem demora o garotinho cuspiu água salgada e
começou a respirar melhor.
Stephanie sentiu vontade de chorar de alegria.
O som de gritos trouxera Pietro até eles.
— Você se tornou uma heroína, Steph! —
Suzette parecia empolgada.
— Imagine! Eu estava perto do menino, só isso.
— Ainda bem, porque Clay não sabe nadar.
— Não? — Stephanie não conseguiu esconder a
surpresa.
— Tenho pavor de água - ele admitiu.
— Ora, ora, o grande macho, todo musculoso,
parecendo um deus grego, e não sabe nadar! —
Drew caçoou.

83
Estranha Sedução Shannon Drake

— Mas ele tem noção de primeiros socorros —


Stephanie rebateu e virou-se para Clay: — Pode
me passar a toalha? Afinal, você está todo
vestido, não precisa dela.
— Porém, acabei me molhando.
— Mesmo assim, me dê, Clay. — Ao apanhá-la,
Stephanie notou um vermelhão no braço dele.
Arregalou os olhos. O braço parecia horrível,
como se estivesse com uma queimadura feia.
— Veja isso, Clay! O que houve?
— Não é nada, apenas uma reação ao sol'e à
salinidade do mar.
Amanhã já terá sumido a marca.
— Deveria ver um médico.
— Estou lhe dizendo que é apenas uma reação
alérgica, Steph.
Não se preocupe. É por isso que continuo de
jeans e camisa. O sol faz muito mal para minha
pele. Vou vestir uma camiseta de mangas
compridas. Vejo vocês logo mais.
— Eu, hein... — Doug murmurou.
— O que foi? — Stephanie o fitou.
— Não sei bem. Clay é tão irretocável... Era de
se esperar que aproveitasse a estada aqui para
adquirir um bronzeado bem bonito.

84
Estranha Sedução Shannon Drake

E veja o que acontece quando ele toma um


pouquinho de sol.
Todos riram. Menos Stephanie, que
permaneceu circunspecta.
A impressão que teve foi de que ele não
sofrera uma simples queimadura de sol, nem
tivera uma reação alérgica ao calor. Ao que tudo
indicava, ele se queimara com a água salgada.

A polícia veio.
Tiraram foto após foto.
Ninguém falava alto, e alguns dos homens
quase chegaram a chorar. Maria era uma garota
tão linda... E tão jovem!
— Os animais devem tê-la pego. — Carlo
balançava a cabeça bem devagar.
Grant achou a observação um tanto curiosa.
Maria teve o corpo estraçalhado por mordidas
terríveis. Mas ainda assim, como fora enterrada?
Grant tinha certeza de que os policiais
estavam se fazendo as mesmas perguntas.
O local ficara repleto de homens da lei, não
apenas da vila, como de várias partes da
Calábria, Sicília e do restante da Itália.
Corria o comentário de que um serial killer
vinha sendo procurado na Grécia. E, para
85
Estranha Sedução Shannon Drake

aumentar o nervosismo geral, a polícia queria


que o cadáver fosse levado a Nápoles, onde
seria feita uma autópsia mais cuidadosa. A mãe
de Maria, entretanto, chorava implorando que
deixassem sua filha ali, no lugar onde sempre
vivera. Queria enterrá-la como mandava o rito
católico.
Grant sabia que a vontade das autoridades
prevaleceria. No entanto, foi decidido que o
corpo de Maria continuaria ali.
Os legistas deduziram, pela temperatura do
cadáver da vítima, que a morte ocorrera durante
a madrugada.
Grant ficou arrasado. Por que teve de ser ele a
encontrá-la?
Incapaz de se mover, ficou sentado em um
tronco, com uma garrafa de água ao lado,
apenas observando a movimentação. E, de
repente, notou a presença de Clay Barton.
— O que está fazendo por aqui, Clay?
— Tivemos uma folga. Então acharam a
garota...
— Cortada em pedaços.
— Você viu o cadáver?

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Estranha Sedução Shannon Drake

— Pior. Fui eu que encontrei. Sobrou muito


pouco da pobrezinha. Não sei que tipo de animal
a atacou. Alguns sugeriram um cão selvagem.
— Você viu o pescoço?
Grant olhou espantado para Clay.
— Na verdade, sim. Tinha muito sangue seco,
assim como todos os membros. Foi mordido,
feito em pedaços. Que diabos! Por que pergunta
isso? É por acaso algum tipo de necrófilo
maluco?
Clay se irritou com a pergunta. Grant achou
isso ótimo. Seria muito bom trocar alguns socos
e assim se livrar da tensão.
— Ouvi falarem de mortes semelhantes — Clay
afirmou, por fim.
— Talvez devesse conversar com os policiais.
O lugar está cheio deles. Carlo poderá servir de
intérprete para você.
Clay o fitava sem expressão.
— Não será necessário.
Para surpresa de Grant, Clay caminhou até
onde estava o corpo de Maria e conversou em
italiano com aqueles que a examinavam.
E a surpresa foi ainda maior quando notou que
todos abriam caminho para Clay chegar mais
perto dos restos mortais da mocinha. Deram-lhe,
87
Estranha Sedução Shannon Drake

inclusive, luvas. Por que a polícia deixaria


alguém como ele, um ator, e não uma autoridade
ou um médico, examinar um cadáver?
Foi Drew quem contou a novidade a Stephanie:
— Eles a encontraram.
— A garota italiana? — Sim. Maria Alberti.
Pelo olhar de Drew, Stephanie entendeu de
imediato que a garota não fora achada com vida.
— Onde?
— Nas escavações arqueológicas.
— Ela caiu de lá de cima? Foi um acidente?
— Pelos indícios, não foi uma morte acidental,
Steph. Na verdade, Maria estava enterrada.
— Quem a achou?
— Grant. Estão dizendo que ele ficou
abaladíssimo, mas... creio que estará aqui a
qualquer momento.
— Como soube disso tudo, Drew?
— Pietro me contou. Seus amigos policiais o
informaram. Que coisa mais depressiva, não é?
— Assustadora! — Suzette vinha se
aproximando dos dois.
— Horrível! — Doug também se uniu ao grupo.
— Será que deveríamos cancelar a estréia da
peça? Não fica bem darmos um show com a vila
consternada pelo assassinato dá garota.
88
Estranha Sedução Shannon Drake

— Mas quem assistirá ao espetáculo serão


turistas, Drew. Gente que não é daqui.
— De todo modo, Lena melhorou um pouco,
mas o médico sugeriu que ela repouse. Seu
batimento cardíaco está muito fraco?
— Isso é bizarro. — Drew meneou a cabeça. —
Ela parecia ótima ontem à noite.
— Quem sabe não foi mordida por algum
inseto, ou comeu algo estragado?
Stephanie discordou de Suzette:
— O dr. Antinella não descobriu do que se
trata, mas prescreveu que Lena coma carne
vermelha e descanse bastante.
— Nesse caso, temos um problema sério.
Gema sumiu, e Lena não pode trabalhar. A única
solução seria Stephanie interpretar os dois
papéis. Bem, sendo competente como é... —
Suzette olhou para ela e deu risada. — ...poderá
se sair muito bem.
— Que tal cancelarmos a apresentação? —
Drew não escondia o desânimo.
Stephanie ponderou por alguns instantes. Em
seguida, procurou animar seu pessoal:
— Vou conversar com Pietro. Ele pode
telefonar para Reggie e decidir com ela o melhor
a fazer.
89
Estranha Sedução Shannon Drake

Enquanto falavam, a porta do bar foi aberta e


Grant entrou sem fazer ruído. Parecia abatido.
— Olá! — Drew o chamou. — Tudo bem com
você, Grant?
— Tudo. Mas tudo foi... um horror. Realmente
pavoroso.
— E como... — Drew ia perguntar, mas Suzette
o interrompeu:
— A polícia já tem um suspeito?
Grant fez que não e caminhou até uma mesa.
Estava imundo, todo cheio de poeira e lama, os
cabelos despenteados, a camisa rasgada.
— Duvido que desconfiem de alguém. Na
verdade, de acordo com Carlo, nunca aconteceu
por aqui nada semelhante. Não houve nem
mesmo mafiosos nesta região; assim, a última
história de violência registrada por estas
paragens data de séculos atrás.
Clay chegou.
— Você esteve lá? — Drew lhe perguntou.
— Sim. Mas não era o que eu esperava.
Grant gostaria muito de saber o que aquele
homem esperara ao ver o cadáver de Maria, mas
se conteve.
Stephanie parecia preocupada com mais
alguma coisa.
90
Estranha Sedução Shannon Drake

— O que foi, Steph?


— Pergunto-me se não devo cancelar a estréia,
Grant.
— Você sabe quantos assassinatos acontecem
em Chicago por ano?
— Devem ser muitos, mas aqui não é Chicago.
Estamos em uma vila. Um lugar minúsculo.
Grant passou os dedos entre os cabelos, em
um gesto nervoso.
— Vou tomar um banho e volto logo. — Ele
olhou em torno, como se procurasse alguém. —
Onde está Lena?
— Doente.
— O quê? — As suspeitas dele aumentaram.
— Pois é. — Stephanie suspirou. — Está tão
fraca que o médico mandou que ficasse em
repouso.
— O que significa que perdeu mais um membro
de seu elenco, Steph? — Grant agora estava
muitíssimo perturbado.
— Mas Lena pode melhorar em poucos dias.
Não precisamos pensar em substituí-la.
— Tenho uma sugestão.
Todos se voltaram para Clay.
— Uma amiga minha está na cidade. Ela é
escritora e veio a passeio para a Itália. Resolveu
91
Estranha Sedução Shannon Drake

vir para cá para me desejar boa sorte na peça.


Mas sabe interpretar também, e poderia ficar no
lugar de Lena.
— Ah, uma nova coincidência... Uma amiga sua
aparece e também é atriz — Grant falou com
ironia.
E deu de ombros quando Stephanie pediu a
Clay que convidasse a moça para que viesse
falar com ela.
— Vocês vão gostar de minha amiga. — Clay
sorriu.
— Tudo bem se a convidarmos para ensaiar
conosco, Grant?
— Steph, o show é seu. — Ele se virou e saiu do
bar.
— Lamento, Clay. Grant foi muito rude.
— Eu entendo. Foi ele quem achou o corpo de
Maria. Tem direito de estar azedo.
— Isso explica aquela expressão cansada. —
Suzette respirou fundo. — Oh, Deus!
— O que foi?
— Bem, Steph... eles encontraram Maria
Alberti, morta.
— Sim, Suzette, isso é terrível, mas não
significa que haja um assassino solto por aí. Já
sabemos que temos de nos cuidar. Mas tudo vai
92
Estranha Sedução Shannon Drake

dar certo. — Stephanie tentava convencer a si


mesma disso.
— Refiro-me a outra coisa, Steph. — Suzette
mordeu o lábio.
— Então o que é?
— Sei a razão de Suzette estar preocupada. —
Clay encarou Stephanie. — É sobre Gema. E se
ela não tiver ido para Roma? E se também
estiver morta e enterrada em algum lugar por aí,
como aconteceu com Maria Alberti?

CAPÍTULO IV
Grant se demorou bastante no banho, deixando
a água quente aliviar a tensão de seus
músculos.
Não tinha vontade de sair do chuveiro, mas foi
o que fez. Vestiu-se rápido, ansioso por dar uma
olhada em Lena, depois seguir direto para o
ensaio.
Conforme se aproximava do chalé, ficou
indeciso: devia mesmo visitá-la? Ela poderia
estar deitada naquele momento e teria de se
levantar para atendê-lo.
Mas a porta do chalé se abriu, e Giovanni saiu
de lá carregando uma bandeja.
— Buongiorno, sr. Peterson!
93
Estranha Sedução Shannon Drake

— Buongiorno, Giovanni. A srta. Miro está


dormindo?
— Não, não. Pietro insistiu que eu trouxesse
muita comida e vinho tinto para a senhorita. —
Sorriu. — Nós acreditamos que o vinho tinto
pode curar qualquer doença.
Grant achou graça.
— E como está ela?
— Parece melhor, creio. Uns poucos dias de
descanso, e ficará ótima! — Giovanni parecia
confiante. — Deixei a porta aberta para o senhor
entrar. Quando sair, pressione o botãozinho da
maçaneta, e a fechadura travará
automaticamente. O quarto dela fica no andar de
cima. Apenas se anuncie ao subir as escadas
para não assustá-la, certo?
— Obrigado, Giovanni.
Grant entrou. A escada ficava bem junto da
porta.
— Lena, você está acordada?
— Sim! Grant? Por favor, suba.
— Estou a caminho.
Ela assistia a um programa da BBC,
transmitido em inglês.

94
Estranha Sedução Shannon Drake

Pálida, com os olhos brilhando de maneira


estranha, recebeu Grant com aparente
satisfação. .
— Ei, menina! Como tem passado? — ele
sentou-se na beirada da cama.
— Não tão mal como antes. Pelo menos quando
fico deitada.
Mas a apresentação da peça me preocupa.
— Clay disse que trará uma amiga dele para
substituir você na estréia.
Lena recebeu a notícia com tristeza.
— Que bom, não é? Parece que perdi o
emprego...
— Nada disso. A moça apenas ficará em seu
lugar enquanto você estiver se recuperando. E
acho que deveria procurar médicos em algum
hospital vizinho.
— Não, Grant. Nem quero pensar em sair daqui.
Ela se sentou, e Grant pôde ver que usava uma
camisola rosa não transparente, contudo
bastante reveladora. Marcava seus seios e
deixava ver os mamilos pressionando o tecido.
— Olhe, se você está doente...
— Sinto-me bem melhor. Na verdade, melhorei
a partir do momento em que você entrou aqui.
Juro. Estou até mais forte. Ela se inclinou e
95
Estranha Sedução Shannon Drake

tocou no rosto de Grant. Havia uma clara


sugestão de sedução em seus movimentos.
Grant não soube bem o que fazer e tentou levar
tudo pelo lado amigável.
— Lena, todos se importam com você. Se for
examinada por um especialista...
— Eu apenas dormi mal. Foi tudo.
Ela se aproximou ainda mais de Grant,
expondo-lhe os seios.
Pegou a mão dele e a colocou sobre um deles.
— Sinta meu coração, Grant. Está batendo
forte...
Ele não poderia se afastar sem ser rude.
— É mais do que isso. — Lena continuou —
Você é tão másculo, tão sexy! E uma espécie de
vulcão... E eu queria vê-lo em erupção...
— Fico feliz por seu coração estar batendo,
Lena. — E procurou afastar as mãos dos seios
dela.
Ela, porém, chegou mais perto ainda,
murmurando a seu ouvido:
— Sinta mais do que a batida de meu coração...
Você está me dando sua força.
Levou os dedos dele direto para os mamilos,
movendo-os contra eles, enquanto sua língua
brincava com a orelha de Grant.
96
Estranha Sedução Shannon Drake

Por um minuto ele se sentiu confuso, tentado a


aceitar aquela provocação. Mas controlou-se e
se soltou dela.
Seus olhares se encontraram. Lena não se
mostrava ofendida; parecia satisfeita por tê-lo
provocado. Seu sorriso fazia lembrar uma
pantera à espreita.
— Ficou excitado, e eu posso ver o volume em
sua calça, Grant. Então... faça amor comigo.
Deixe que eu faça loucuras com você. Posso
fazê-lo sentir o que nunca experimentou antes. E
jamais revelarei nada. Este será nosso
segredinho.
Algo passou pela mente de Grant. Aquela não
parecia Lena. Era uma outra mulher que estava
ali a Sua frente.
Resolveu ficar de pé, impondo uma distância
maior entre os dois.
— Lena, quero que você sare logo. — Procurava
manter a voz firme. — E eu vou agora direto para
o ensaio.
Ela se acomodou de novo entre os lençóis,
com uma ondulação de seu corpo, toda
sorridente. Passou as mãos sobre os seios e os
pressionou. Depois deslizou a mão mais para
baixo.
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Estranha Sedução Shannon Drake

— Estou muito bem neste quarto.


— Pois fique melhor ainda.
Ao descer os degraus, Grant ainda estava
confuso, pelo esforço de dominar o desejo que
sentira por Lena.
— Você voltará para mim, Grant — ela disse, lá
do quarto. — Sei que me quer!
Ele deixou o chalé quase correndo.
A brisa fresca aliviou o calor de seu rosto.
Lena precisava procurar um médico em uma
cidade grande.
Alguém deveria convencê-la a tomar essa
atitude. E com urgência.
Havia algo de muito errado ali, naquele lugar.

A amiga de Clay era uma moça chamada Liz


Henderson. Era bonita e simpática, e parecia
muito contente por conhecer seus novos
colegas. Liz disse a Stephanie que era escritora,
estava de passagem e poderia trabalhar na peça
enquanto Lena estivesse doente.
— Amanhã será a estréia, não é?
— Sim, Liz. O papel de Lena era o de uma
italiana. Precisamos dar uma passada no texto
para ver sua pronúncia.
— Fique sossegada; eu falo italiano.
98
Estranha Sedução Shannon Drake

— Ótimo. Então vamos ensaiar? Pode manter o


texto consigo. Isso se precisar, claro.
E todos puseram-se ao trabalho.
Liz não era Lena, mas para uma escritora que
apenas substituía uma verdadeira atriz, era
extraordinária.
Não deixava de ser espantosa a coincidência:
Clay era amigo de Liz, que se dispusera a vir e
interpretava tão bem.
Quando começou a escurecer, o ensaio foi
encerrado e ninguém sugeriu que saíssem. Pelo
jeito, cada um queria um pouco de privacidade.
— Podemos nos encontrar para o jantar —
Drew propôs. — Lá pelas oito e meia, o que
acham?
— Claro — Stephanie murmurou.

O dr. Barello, o médico-legista local, estava


irritado com a sugestão da polícia de levarem o
cadáver de Maria para uma cidade maior. Isso
deixava claro que o julgavam incapacitado para
fazer uma autópsia correta.
Mas a lei estava do seu lado, e o corpo da
jovem ficou ali. O dr. Barello contaria com a
ajuda do dr. Antinella para auxiliá-lo.

99
Estranha Sedução Shannon Drake

Não havia um grande hospital na vila, mas o


posto médico funcionava bem. A autópsia seria
bem-feita, sem sombra de dúvida. Não importava
se ele e o dr. Antinella tivessem de trabalhar a
noite inteira.
Às seis da tarde, como combinado,
encontraram-se na entrada do necrotério do
pequeno posto.
Antinella, que fora o médico de Maria desde
que ela era menininha, encarregou-se de lhe
lavar o corpo ensangüentado.
Já com aventais e suas máscaras, os doutores
arrumaram as ferramentas necessárias e
começaram a examinar o cadáver. Foi quando a
porta se abriu e se fechou.
Um desconhecido estava dentro da sala de
autópsia. O que fazia ali? Quem era ele? Algum
curioso? Isso era lamentável, pensou o legista.
— Saia já daqui! — ele ordenou.
Antinella também parecia aborrecido. Maria
não merecia ser desrespeitada.
— Vocês não podem cortá-la — o homem
afirmou.
— O quê?!
— Sem cortes. Vocês vão costurá-la, isso sim.

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Estranha Sedução Shannon Drake

Os médicos começaram a agir como se


estivessem entrado em transe.
— Sim, nós vamos costurá-la. — Antinella olhou
para Barello, que concordou.

Uma hora e meia mais tarde, Barello, sentado


diante de sua escrivaninha, preenchia o
atestado de óbito e o relatório da autópsia.
Ele não tinha lembrança alguma da chegada do
desconhecido; nem mesmo suspeitava que
alguém interrompera seu trabalho com Antinella.
O episódio inteiro fora apagado de sua
memória.
E os dois médicos fizeram Maria parecer bonita
novamente. De alguma forma, isso tinha sido
possível. Tudo foi feito de maneira correta, com
muito profissionalismo. Seguindo as regras.
Nenhum médico legista de cidade grande
encontraria falha alguma no procedimento.
Como causa mortis, o encontro com um animal
selvagem, talvez um lobo, apesar de serem raros
naquela região e de não haver nenhuma
reclamação de um ataque em... Bem, em
oitocentos ou novecentos anos, pelo menos.
Pobre menina...

101
Estranha Sedução Shannon Drake

Barello conhecia o noivo de Maria tanto quanto


a jovem. O pobre rapaz não era um assassino.
No entanto, como acontecera de a moça ter sido
enterrada nas escavações?
Barello meneou a cabeça. Esse era um
problema para a polícia resolver.
Antinella foi ao encontro do colega.
— Terminamos?
— Sim. Ela agora poderá descansar. Amanhã
nós a levaremos para a casa funerária... e eles a
embalsamarão, conforme o costume.
— Pobre garota! Imagine. Lobos atacando!
— É verdade. A polícia precisa colocar avisos
aos viajantes para que não se aproximem dos
penhascos.

François ficou parado na praia. De lá, tinha


uma excelente visão da porta do chalé de Lena
Miro.
Esperou, controlando o tempo. Sempre achara
fascinante olhar a água do mar. Se somente...
bem, não havia "se somente". E, ainda assim,
ele adorava a vista, e o cheiro do oceano.
Foi quando avistou a empregada.
Ela o viu também.

102
Estranha Sedução Shannon Drake

François tomou o caminho, sem pressa. A


mulher o encarou, como se fosse uma pomba
atraída pela luz. Afastou-se para o lado,
mantendo a porta aberta para que ele entrasse.
Ele sorriu, e lhe agradeceu. Não importava. Ela
nunca se lembraria de que ele estivera ali.
Entrou no chalé, e fechou a porta.
E começou a subir as escadas.

Eram quase nove horas quando o grupo se


reuniu para jantar. Quando Stephanie entrou no
restaurante, os demais já estavam lá. Pietro,
sentado à mesa, se mostrava bastante triste ao
contar as novidades, que eram um alívio e ao
mesmo tempo dolorosas e perigosas.
— Confesso que estava aflito. O modo como
Maria foi encontrada... Mas não há um criminoso
entre nós. Doutor Barello, o legista, está certo
de que ela foi morta por animais selvagens. É
com esses animais que as pessoas devem se
preocupar.
Grant encarou Pietro como se o homem tivesse
enlouquecido.
— Os animais enterraram a garota, por acaso?
— indagou, incrédulo.

103
Estranha Sedução Shannon Drake

— Bem, não... óbvio que não. — Pietro sacudiu


a cabeça. A polícia vai investigar. O que eles
dizem é que alguém encontrou a menina em
estado tão lastimável que decidiu que a atitude
mais humana a tomar seria enterrá-la.
— Sem contar aos policiais que Maria foi
encontrada? — Grant não se conformava com a
ingenuidade das pessoas.
— Ela foi estraçalhada!
— Sei muito bem disso. Mas nada do que você
falou faz sentido, Pietro. Acha mesmo que é
mais piedoso uma mãe não ficar sabendo que
sua filha foi dilacerada, que é melhor passar o
resto da vida pensando que nada disso
aconteceu?
— E isso não é razoável? — Pietro perguntou. —
De todo modo, como eu falei, a polícia
continuará investigando até chegar às
respostas. Nesse meio tempo, e isso é muito
importante para você, Grant, todos terão de ser
cautelosos. Maria deve ter ido até as ruínas,
porque não há lobos na vila, isso eu posso
garantir.
— Olhe, eu não aceito essa história. Continua
não fazendo sentido algum — Grant insistiu. —
Uma pessoa normal, encontrando um corpo no
104
Estranha Sedução Shannon Drake

estado em que Maria estava, ficaria


traumatizado.
Sem dúvida sairia correndo para chamar a
polícia, pediria ajuda de alguma forma! E como
esse alguém poderia cavar um buraco?
Há várias pessoas acampadas e, mesmo à
noite, o lugar junto das escavações sempre é
movimentado.
— Isso tudo pode não fazer sentido, Grant. Já
que você é o único que vai para aquela área, eu
concordaria com Pietro. Você deve tomar muito
cuidado — recomendou Suzette.
— Com isso eu concordo — Grant murmurou.
— Pietro, em sua opinião nós devemos encenar
a peça amanhã à noite ou não?
— Penso que sim, Steph. Teremos muitos
turistas chegando a Nápoles amanhã de manhã,
e eles estarão aqui à tarde. Bem, pessoal, vamos
tentar nos animar! Mandarei que lhes sirvam um
vinho tinto, desta região, naturalmente. Ele fará
com que todos se sintam melhor.
Pietro se despediu em seguida e saiu do
restaurante.
— Continuo achando que é de mau gosto
encenar a peça amanhã.

105
Estranha Sedução Shannon Drake

— Mas não será o povo daqui que assistirá a


nosso espetáculo, Steph — rebateu Suzette. —
São em sua maioria americanos turistas que
vêm aqui gastar dinheiro. É importante para a
comunidade.
— Talvez você tenha razão...
— Vamos melhorar nosso astral - Doug sugeriu.
— E temos de fazer um brinde a nossa nova
companheira. Você está se saindo muito bem,
Liz. — Está maravilhosa! — Drew concordou,
com entusiasmo.
— Eu não lhes disse que ela era ótima? — Clay
sorriu de leve para a amiga.
— Bem, obrigada a todos vocês! — Liz
ruborizou de leve.
O garçom trouxe o vinho e as taças foram
passando de mão em mão.
— Esperem! — Grant ergueu a taça. —
Devemos brindar a Liz por estar no lugar certo
na hora certa. É um pouco como um milagre, não
acham? — Ele parecia sincero, mas era puro
fingimento, na opinião de Stephanie. Grant devia
suspeitar de Liz e de Clay. Mas quem andava
estranho demais era ele próprio.
— Turma, alguém foi ver como Lena está?
— Fui ao chalé na hora do almoço.
106
Estranha Sedução Shannon Drake

— E o que achou dela, Grant?


Ele pensou um pouco antes de responder:
— Com mais energia do que eu esperava. —
Sacudiu a cabeça.
— Lena devia ser examinada por um
especialista de alguma cidade maior.
— Mas disseram que o médico que cuida dela é
excelente — Clay comentou.
— Bem, sei lá... — Grant deu de ombros.
A conversa então passou a girar em torno do
espetáculo. Instantes depois, alguém comentou
que estava tarde, e os membros da trupe
resolveram se recolher a seus respectivos
chalés.
— Devemos ir juntos.
— Mas como faremos isso, Grant? — Drew quis
saber.
— Eu levarei Stephanie, Clay acompanha Liz; e
Drew e Doug vão com Suzette — Grant sugeriu.
— Assim está bem. — Drew riu. — Depois que
deixarmos Suzette, você me acompanha até
meu chalé, Doug. Não sou bom enfrentando
lobos.
— Não iremos encontrar lobos na praia, seu
tolo! — Doug entrou na brincadeira.

107
Estranha Sedução Shannon Drake

— Há diferentes tipos de lobos. Vocês sabem


disso, não é? Suzette lembrou os amigos. — E
quanto a Lena? Devemos ver como está ela?
— Pode deixar que eu me encarrego disso. —
Stephanie pendurou a bolsa no ombro.
— Ela pode estar dormindo, mas eu tenho a
chave de seu chalé.
— Suzette mostrou o chaveiro. — Deixei uma
cópia da minha com Lena, já que havíamos
decidido cuidar uma da outra. Você me devolve
depois, está bem?
Stephanie apanhou a chave e agradeceu. Saiu
ao lado de Grant, que se mantinha num silêncio
estranho. Quando chegaram à porta do chalé de
Lena, ele parou.
— Não vai subir comigo?
— Lena estava muito estranha quando vim vê-
Ia, Steph. Prefiro esperar aqui embaixo enquanto
você vai falar com ela.
Stephanie arqueou uma sobrancelha.
— Estranha como?
— Ela tentou me seduzir.
— O quê?!
— Acredite em mim, não estou inventando isso,
nem sou desses convencidos que acham que
todas as mulheres correm atrás deles.
108
Estranha Sedução Shannon Drake

Lena tentou me levar para a cama.


— Devia estar apenas flertando, Grant. A
garota está doente, esqueceu-se disso?
— Ela me agarrou!
— Jura? — Stephanie não conseguia acreditar
em nada daquilo.
Lena não era do tipo fatal. Podia flertar, rir,
brincar, mas...
— Sim, eu juro. — Grant tomou a chave da mão
dela e destrancou a fechadura. — Você sobe. Eu
ficarei por aqui.
Stephanie não queria começar uma discussão.
Assim, subiu a escada. As luzes do hall de
entrada e do banheiro estavam acesas, mas a do
quarto, não. Ela entrou no aposento e pôs a mão
sobre a testa de Lena.
— Steph? — A voz de Lena soou como a de uma
criança.
— Sim, sou eu. Vim ver como estava passando,
meu bem.
— Sinto-me melhor... apenas fraca. Pode abrir a
porta de vidro que dá para a sacada? Não há ar
aqui dentro.
— Não acredito que precise da brisa noturna.
Está tão agradável — aqui dentro, Lena...

109
Estranha Sedução Shannon Drake

Os olhos de Stephanie começaram a enxergar


melhor no escuro.
Não quis acender a lâmpada para não
perturbar a doente. Notou então que Lena
parecia agitada. Seus dedos agarravam um
medalhão, ou crucifixo, em torno de seu
pescoço.
— Talvez você tenha razão — Lena murmurou.
— Mas será que pode me dar um calmante? O
médico deixou alguns comprimidos sobre a
cômoda. Já tomei um antes, e o sono vem mais
fácil.
— Claro, pode deixar que eu pego para você.
Assim como Lena, Stephanie vinha tendo
dificuldade para dormir. Queria evitar aqueles
sonhos esquisitíssimos, mas eles vinham mesmo
com as portas trancadas.
Seriam sonhos semelhantes que acabaram por
prostrar à pobre Lena? Stephanie apanhou um
comprimido, encheu um copo com água e
entregou-os à amiga.
— Obrigada.
— Bonita essa sua jóia. — Stephanie, ao
observar mais de perto, constatou que se
tratava mesmo de um crucifixo.

110
Estranha Sedução Shannon Drake

— Ah, sim... Penso que o comprei na vila. Não


me lembro de tê-lo colocado no pescoço.
Estranho, não é? E ele está me irritando a pele.
Pode me ajudar a tirá-lo? Sozinha não consegui.
— Tudo bem.
Stephanie fez de tudo para abrir o fecho da
corrente, mas por mais ridículo que fosse, não
conseguiu.
— Também não consigo abri-lo, Lena.
— Bem, terei de suportá-lo por esta noite. São
apenas umas poucas horas, e eu estou me
sentindo melhor.
— Isso é ótimo!
— E a nova garota?
— Saiu-se bem. Portanto, não precisa se
preocupar, certo?
— Ora, Steph! Se ela se sair muito bem e fizer
sucesso, perderei o lugar, não é?
— Você é e será sempre uma comediante
melhor. Não tenha dúvida disso.
— Graças a Deus! Mas ainda lamento não fazer
parte da estréia.
Stephanie sorriu.
— Vou deixá-la descansar. Vejo você amanhã,
Lena.
— Obrigada por ter vindo. Você foi a única.
111
Estranha Sedução Shannon Drake

— Grant disse que esteve aqui mais cedo.


— Se ele veio, não o vi. Talvez eu estivesse
dormindo.
— Pode ser. Boa-noite.
Na sala, Grant aguardava por Stephanie.
— Como vai ela?
— Recuperando-se bem.
Os dois saíram, e Grant trancou a porta.
— Ela me falou que não viu você hoje.
Ele a encarou, de olhos arregalados.
— Eu lhe disse a verdade, Steph.
— Talvez Lena delire em alguns momentos.
Isso justificaria seu comportamento.
Caminharam em silêncio até o chalé de
Stephanie. Quando ela abriu a porta, desejou
poder permitir que Grant entrasse e ficasse.
No entanto, entrou rápido e lhe desejou boa-
noite.
— Veja se...
— Vou trancar todas as portas — ela lhe
prometeu. — Até amanhã.
E subiu os degraus correndo, pisando firme
para que Grant escutasse seus passos lá de
fora.
A primeira coisa que fez foi se despir e entrar
no chuveiro.
112
Estranha Sedução Shannon Drake

Precisava com urgência de um banho frio para


lhe acalmar os desejos.
Em instantes, estava pronta para deitar-se.
Para quebrar o pesado silêncio, ligou a tevê. E
sem se dar conta, acabou adormecendo.
Foi quando avistou Grant ao pé de sua cama.
Bronzeado, nu, excitado.
Stephanie... Estou esperando. Venha para
mim...
Sim, ela o desejava mais do que tudo no
mundo. Queria fazer sexo com ele naquele exato
momento.
Não! Era outra voz. Havia mais alguém ali
dentro, que a chamava de volta.
Stephanie se virou: Não achou nada mais do
que uma parede.
Tornou a olhar para Grant. Um homem
musculoso, sexy...
Contudo, ele sumira. Em seu lugar, apenas uma
sombra.
Uma sombra com asas.
O som de uma explosão ecoou muito perto.
Stephanie gritou e compreendeu que despertara
com o barulho. Portanto, tudo antes fora apenas
um sonho.

113
Estranha Sedução Shannon Drake

Ela sonhara de novo. Mas o som era real. E


vinha do vidro das portas que davam para a
sacada.
O barulho se repetiu. Aterrorizada, Stephanie
tapou a boca, tentando não gritar.
Levantou-se e forçou-se a abrir as cortinas.

— Todos estão trancados em seus chalés? —


Liz perguntou, fechando as cortinas e se
voltando para ver Clay entrar no quarto.
— Todos trancados.
— E Lena? Foi vê-la.
— Ah, sim...
Sorrindo, Liz se aproximou de Clay e tocou seu
rosto com muito carinho. Então começou a abrir
metodicamente os botões da camisa dele.
Quando terminou, deslizou as mãos sobre ü
tórax nu, ficou na ponta dos pés e começou a
sussurrar-lhe algo ao ouvido:
— Stephanie é muito... muito bonita. Aqueles
olhos azuis, e os cabelos tão negros! E aquele
corpo perfeito? Não preciso ficar com ciúme,
não é?
— Você?! — Clay deu risada, tirando a camisa e
jogando-a longe. — Nunca!

114
Estranha Sedução Shannon Drake

Ele afagou os ombros de Liz por sobre a fina


camisola que ela usava. Com um movimento
ágil, tirou-a e sem demora pressionou os seios
contra seu peito.
Liz procurou pelo cinto de Clay; abriu-o.
Escutou o zíper descendo.
— Nunca! — ele repetiu, colando os lábios no
pescoço dela.
O desejo tomou conta de Liz, que o apertou
contra si, sentindo o membro rígido de Clay.
De súbito, ela hesitou.
— E a cruz?
— Vai funcionar.
— Tem certeza?
— É o suficiente por ora.
— Mas e esta noite? — ela quis saber.
— Esta noite... eu e você... iremos descansar.
— Não passa por minha cabeça descansar...
— Então vou me expressar melhor. Hoje à noite
existe apenas você. E eu. Faz tanto tempo!
Eles se separaram, mas apenas por alguns
minutos. O suficiente para Clay tirar os sapatos,
as meias e o jeans.
— Meu amor! — Liz se atirou nos braços do
amado.

115
Estranha Sedução Shannon Drake

O toque teve um misto de desespero e


selvageria. E na escuridão noturna, eles
terminaram formando um só corpo.

Grant!
Stephanie arregalou os olhos tomada pela
surpresa. Lá estava ele, junto às portas
quebradas.
— Deixe-me entrar — ele exigiu.
Ela não tinha muita certeza do porquê, mas
obedeceu, destrancando a porta da sacada.
Grant entrou, passando os dedos trêmulos
pelos cabelos, fazendo uma vistoria geral no
recinto. Foi ao banheiro, desceu as escadas.
— Grant, o que acontece com você? —
Stephanie choramingou seguindo-o.
— Feche aquelas janelas de novo.
Minutos mais tarde, ele retomou. Parecia
agitado e não pediu desculpa por seu estranho
comportamento.
— Grant, o que está fazendo?
— Eu a vi vindo para cá.
— O que você viu? — Stephanie cruzou os
braços sobre o peito.
— Uma... sombra.

116
Estranha Sedução Shannon Drake

Ele continuava agitado e examinando o quarto.


Apesar de tudo o que Grant dizia não fazer o
menor sentido, Stephanie estremeceu.
Uma sombra... Sim, ela vira uma sombra... Em
seu quarto. Ali, ao pé da cama. Onde Grant
estivera havia poucos instantes. Só que ele não
estivera lá de verdade.
Uma sombra com asas...
— Deixe- me ver se entendi essa história. Você
viu uma sombra. À noite, sob o luar. Imaginou
tudo e achou-se no direito de vir aqui, quebrar o
vidro da sacada como se eu precisasse acordar
do mundo dos mortos, e agora fica andando de
lá para cá à procura do dono da sombra? E isso?
— Havia... alguém.
— Grant, acalme-se e reflita. Não há ninguém,
como você bem pode ver.
— De fato. — Ele encarou Stephanie, confuso,
tentando pôr em ordem os pensamentos. — Não
há ninguém aqui.
— Isso mesmo. E muito menos a tal sombra,
certo?
— Steph, não estou louco. Não vou deixar que
aconteça com você o que aconteceu com Maria
Alberti.
Ela esboçou um sorriso sem humor.
117
Estranha Sedução Shannon Drake

— Deixe-me adivinhar. Sua próxima atitude


será mandar que eu use uma cruz pendurada no
pescoço e compre uma arma com balas de
prata. Oh, Grant, por favor! Entendo que tenha
ficado perturbado ao desenterrar a jovem. Afinal,
ela estava desfigura... Mas você começou a agir
de maneira muito estranha já em Chicago. Foi
por isso que nos separamos, não é?
— Stephanie, ouça o que digo. Não estou
inventando nada. Temi que você estivesse em
perigo.
Ela caminhou até Grant, colocou a mão sobre o
peito dele e o encarou.
— Você viu uma sombra. Talvez fosse alguém
passando por perto de meu chalé. Como pôde
constatar, não há nada de errado aqui dentro.
Grant sacudiu a cabeça, distraído. Parecia
estar ouvindo os ruídos da noite. Mas não havia
nada para ouvir.
— Você tem de ir embora.
Ele fez que não.
— Steph, é preciso que eu fique.
— Nós rompemos nosso relacionamento
porque não havia saída, e não porque eu o
deteste ou coisa assim. Você conhece bem
meus sentimentos. Foi muito dura para mim a
118
Estranha Sedução Shannon Drake

nossa separação, e quando tento tocar minha


vida para frente, eis que resolve aparecer. Não
ficará aqui, sob o mesmo teto que eu.
Ele ergueu as mãos, com total impaciência.
— Não é minha intenção me aproveitar da
situação, Steph. Não vou tentar forçá-la a dormir
comigo. Dê-me apenas um travesseiro, e eu me
ajeito perto da porta. Quem quiser passar terá
de pular por cima de mim.
— Você está louco!
— Pode ser, mas não sairei daqui. Pode gritar à
vontade e até chamar a polícia se quiser. Não
sairei — repetiu, indo até o leito e pegando um
travesseiro.
Stephanie viu ele verificar se as portas
estavam trancadas e se acomodar em um canto.
— Isso é um total absurdo. Ridículo! — Ela
pegou o aparelho telefônico e fez menção de
ligar. — Estou chamando a polícia.
Grant sabia muito bem que ela jamais faria
isso, E acertou.
Stephanie recolocou o telefone na base e se
aproximou dele.
— Grant, estou muito preocupada com você.

119
Estranha Sedução Shannon Drake

— Vá dormir, Steph. — Toda energia fora


drenada do corpo dele. Não havia nenhuma
emoção em sua voz.
— Decidiu passar a noite inteira encostado
numa parede? Não terá de trabalhar nas
escavações amanhã? E, além disso, teremos a
estréia.
— Eu sei. Posso até cochilar. O importante é
que estarei aqui se houver necessidade.
Stephanie gesticulou, exasperada.
— Está bem! Fique, se quiser. Vou para a cama.
— Deitou-se e se cobriu até o pescoço.
Tentou escutar se Grant se movimentava. Mas
nada. Tudo era silêncio.
Stephanie também vira sombras. Tivera sonhos
que foram tão vívidos que pareciam reais.
Sim, talvez devesse comprar um crucifixo.
O tempo foi passando, e Grant não se
aproximou, contudo ela também não descansou.
Como poderia, com ele ali tão perto?
Grant queria evitar a qualquer custo que algo
de ruim lhe acontecesse. Era evidente que a
amava.
Mas ele disse o nome de outra mulher!
Como isso a magoara! E se não bastasse, ele
insistira em afirmar que Lena tentara seduzi-lo.
120
Estranha Sedução Shannon Drake

Lena, por sua vez, dissera que não o havia


encontrado naquele dia.
Seria uma tolice ver se ele estava bem naquele
momento, pois devia estar cochilando.
Contudo, trinta minutos mais tarde, ela
permanecia acordada.
Levantou-se e foi até o canto onde Grant se
acomodara.
Seus olhos estavam fechados contra o
travesseiro. Suas belas feições mostravam que
ele continuava tenso.
— Grant? — chamou-o com suavidade.
Ele ficou alerta de imediato e se sentou.
— Sinto muito! — ela murmurou. — Eu o
acordei...
Grant respirou, aliviado. Ainda bem que tudo
estava bem com ela.
— Quer tomar um chá ou alguma coisa? — ela
ofereceu.
— Volte a dormir, Steph.
— Penso que vou preparar leite com licor. Isso
me ajudará a conciliar o sono. Quer também?
— Quero. Tomarei uma bebida com você.
Na pequena cozinha, Stephanie encontrou os
copos, leite e um licor em um dos armários.
Voltou e entregou um copo a Grant.
121
Estranha Sedução Shannon Drake

— Olhe, admito que o que tem havido com você


nos últimos dias tem sido terrível. Ficar lidando
com esqueletos e limpando ossos não é uma
tarefa das mais animadoras, convenhamos.
Então, como se não bastasse, encontra a garota
toda dilacerada. No entanto, Grant, Maria foi
atacada por animais. Não vejo razão para que
ache que o mesmo irá acontecer comigo. Nem
saí do resort!
— Não me diga que acredita que foram os
lobos que a mataram!
— Mas os médicos fizeram a autópsia.
— Eles estão mentindo.
— E por que fariam isso?
— Para encobrir alguma coisa ou alguém. Não
sei.
— Você disse que o cadáver estava
desfigurado.
— Entretanto, Steph, nenhum lobo ataca e
mata desse jeito. Não os lobos que conhecemos.
Só se for uma fera diferente e desconhecida por
todos nós.
— Está bem. Digamos que foi o noivo dela, mas
a comunidade gosta do rapaz e não quer
incriminá-lo. Ainda assim, isso não transforma o
resort em área de risco.
122
Estranha Sedução Shannon Drake

— Se me disser que não sentiu nada de


esquisito desde que chegou a esta região, vou
chamá-la de mentirosa.
Stephanie hesitou.
— Estamos em um país onde a noite é
diferente, e a língua também. Nada é igual àquilo
a que estamos acostumados.
Grant franziu a testa.
— Sabe muito bem do que estou falando.
— Oh, Grant...
— Não estou dando uma de espertinho e
arranjando uma desculpa para dormir aqui e
levá-la para casa. Não entendeu nada ainda,
Steph? Quero protegê-la, porque sei que você
corre perigo.
— Muito bem. Pode dar uma de louco, se isso o
faz feliz. Eu vou voltar para a cama.
Subiu de novo para o quarto. Ouviu quando
Grant também subiu e se acomodou perto da
janela mais uma vez.
E sem demora uma inquietação começou a
incomodá-la. Lembrou-se de fragmentos do
sonho em que os dois faziam sexo.
Quem sabe ela poderia tomar o sonho bastante
real? Pelo menos naquela ocasião.
Mais uma vez se aproximou dele.
123
Estranha Sedução Shannon Drake

— Stephanie, estou aqui para que você possa


dormir sossegada.
Por que não pára de andar pela casa?
Ela não respondeu. Estendeu-lhe a mão, e
Grant a tomou.
— Não consigo dormir com você por perto.
— Mas não sairei.
— Sei disso.
Seus olhares se encontraram.
Um leve sorriso surgiu nos lábios dele.
— Posso me deitar a seu lado, se isso a deixar
mais tranqüila.
Não tentarei nada mais ousado. Dou-lhe minha
palavra.
— Talvez fosse um insulto para mim se você
fizesse essa promessa, Grant. Mas isso não quer
dizer que alguma coisa mudou entre nós.
— Tentarei não ser temo demais.
Ali mesmo ela ergueu os braços e tirou a
camisola. Teria tirado a ca1cinha se Grant não
houvesse se adiantado para fazer isso.
Em segundos, os dois estavam nus.
Grant a abraçou por trás, pele contra pele.
Stephanie sentiu o tórax largo, o hálito dele
contra sua nuca, os lábios deslizando em sua

124
Estranha Sedução Shannon Drake

orelha. Os dedos fizeram o caminho de sua


espinha.
Ele a fez virar-se de frente e beijou-a com
paixão, ao mesmo tempo passando a explorar as
partes femininas mais íntimas.
Stephanie conteve a respiração, imobilizada
pela força das sensações. Sentiu como se seu
sangue entrasse em ebulição. Era como se
ondas enormes do oceano estivessem passando
por seu corpo e matando seu desejo. Agarrou os
ombros de Grant, e seus dedos chegaram aos
cabelos...
Ele estava de pé. Ela se deitou e o viu.
Como em seu sonho, os músculos de Grant
brilhavam sob a pálida claridade do cômodo.
E dessa vez não desaparecia.
Grant se deitou sobre ela. Seu cheiro lhe era
familiar. Naquele momento; só o que importava
era a realidade.
Não demorou e ele a possuiu. De certa forma,
havia algo mais naquela posse, alguma coisa
mais intensa... diferente... E Stephanie começou
a se movimentar como se estivesse fora de si,
arranhando as costas de Grant, pressionando os
quadris contra os dele, tocando aquele corpo
viril com uma intensidade avassaladora.
125
Estranha Sedução Shannon Drake

O ritmo se tomou mais rápido, quase frenético,


quase inacreditável. O encontro de suas peles, o
aroma masculino que vinha dele, o som de seu
respirar, o pulsar de seu coração, suave a
princípio, mais alto e mais alto a cada segundo
que passava...
Nenhum dos dois pronunciou uma palavra
sequer, quando o ato alcançou clímax.

Às dez horas da manhã, o corpo de Maria


Alberti chegou à casa funerária.
Danielo Vedero, o encarregado que
embalsamaria o corpo, conhecia a garota, assim
como os policiais e os médicos. Pretendia fazer
o máximo para deixá-la bonita como antes. Seria
um trabalho difícil, contudo.
Daniel soubera que o cadáver da jovem fora
destroçado. E depois... acontecera a autópsia.
Bem, ele tinha dois dias para operar um milagre.
Na segunda-feira seguinte, Maria deveria ser
enterrada Era o que haviam lhe dito. Lucrétia
não fizera nada a não ser chorar desde que a
filha desaparecera. Ela sabia que a jovem estava
morta desde o começo. Intuição materna.
Mas, por Maria e sua mãe, Danielo daria um
jeito de fazer com que a morta desse a
126
Estranha Sedução Shannon Drake

impressão de apenas estar dormindo, e em


completa paz.
Disse à recepcionista que não lhe passasse
nenhuma ligação telefônica. Ele ficaria ocupado
por horas.
Danielo se fechou na sala de
embalsamamento. Seu assistente se
encarregara de colocar o corpo sobre a mesa.
Ao chegar ao lado do cadáver, Danielo se
espantou. Não havia nenhum corte de autópsia
no peito de Maria. Na verdade... teriam todos
inventado que a mocinha fora dilacerada por
garras e mastigada por animais? Tudo nela
estava perfeito. Maria parecia bela como
sempre. A pele não era cinzenta como deveria
ser. Tinha cor.
Danielo chegou mais perto. Era um pecado
aquela menina ter morrido. Agora, estava
deitada ali, sem mostrar sinal algum da violência
que sofrera.
Para ser franco ela continuava intacta. Seu
corpo ainda de adolescente, bem formado. Os
seios, empinados, os quadris, arredondados.
Cicatrizes? Não havia nenhuma recente. Nem
buracos criados pelos dentes das bestas.

127
Estranha Sedução Shannon Drake

Confuso, Danielo se aproximou mais ainda e


tocou as leves linhas que iam dos seios ao
abdome.
— Danielo, seu safado!
Ele deu um salto para trás, um grito surgindo e
ficando preso em sua garganta.
Os olhos de Maria estavam abertos e o
encaravam. Ele piscou várias vezes, tentando
afastar aquela imagem que devia ser fruto de
sua imaginação. Ou de sono atrasado. Talvez
tivesse cochilado acordado. Ou sua cabeça não
andava funcionando bem...
Ela se sentou. O cadáver se sentou! Mas não
era o sorriso habitual de Maria, e sim outro,
malicioso, brincalhão.
— Ficou excitado, seu sem-vergonha? Sua
mulher não está deixando você se satisfazer?
Ela gargalhou, e ele ficou ali, encarando-a,
petrificado.
Sacudiu a cabeça tentando de alguma forma
despertar. Claro /que aquilo era um sonho!
— Venha aqui, Danielo. Venha... Estou com
uma enorme vontade... Sinto-me cheia de
desejos... muitos mesmo... Venha...
E então ele quis gritar! Seus joelhos tremiam
que mal o sustentavam. O coração disparara
128
Estranha Sedução Shannon Drake

como se fosse explodir e saltar do peito. Ele


estava aterrorizado!
Mas nenhum som veio de seus lábios.
E então... A dor que experimentou foi horrível.
Devagar, bem devagar... Danielo ia caindo no
chão.

Danielo levantou-se do chão, sentindo uma


forte dor na cabeça. O movimento brusco o fez
ver estrelas, e ele temeu desmaiar de novo.
Nunca em sua vida lhe ocorrera algo
semelhante.
Aliás, o que mesmo acontecera?
Tudo o que se lembrava era de ter entrado na
sala de embalsamar e então...
Piscou várias vezes, tentando clarear a visão.
Teria sido atingido na cabeça por alguém?
Sua memória se recusava a funcionar. E, no
entanto, o trabalho de embalsamamento fora
feito.
E lá estava Maria. Oh, mas que linda! Seus
cabelos repletos de cachos caíam em tomo dos
ombros, sobre os seios. Parecia estar apenas
adormecida. Como se a qualquer momento...
Ela pudesse acordar.

129
Estranha Sedução Shannon Drake

CAPÍTULO V
A estréia foi um sucesso, e Stephanie não
cabia em si de tanta alegria.
Muito do êxito se devia à simplicidade do
espetáculo.
Todos colaboraram. Pietro e Giovanni haviam
se encarregado do cenário, enquanto ela e Grant
cuidavam dos ensaios. O espaço de tempo fora
mínimo, e mesmo assim'todos desempenharam
seus papéis como verdadeiros profissionais.
Naquela manhã, Lena surpreendera os colegas
aparecendo no restaurante para tomar café com
eles. Sentia-se bem melhor, ela afirmou. A
princípio, olhara com certa suspeita para Liz,
mas a nova atriz logo a conquistou, pedindo-lhe
conselhos de como interpretar sua personagem
e escutando com grande respeito algumas
instruções, o que agradou muito a todos.
A estréia aconteceu às vinte horas, e já no
primeiro ato a platéia ria muito e aplaudia.
Ao terminar o espetáculo, todos aplaudiram de
pé os artistas.
Por trás de palco, Pietro, animadíssimo, trouxe
diversas garrafas de champanhe para
comemorar.

130
Estranha Sedução Shannon Drake

— Que maravilha! Espere até ouvir Reggie ficar


a par de tudo isso! — ele exclamou.
Stephanie ficou pensativa por alguns instantes
em meio à animação geral.
— Vocês sabiam que achei ter visto minha tia
sentada no meio da platéia? Ou era ela ou
alguém muito parecido.
— Estranho...
— Por que, Grant?
— Reggie é tão especial que toma bem difícil
alguém se parecer com ela. Algum de vocês
achou que viu Reggie, também?
— Não a conheço — Drew abanou a mão. —
Enviei para Reggie meu currículo, e meu
contrato chegou pelo correio.
— Foi assim que ela contratou todos nós —
Suzette disse. — Claro que com a exceção de
Steph.
— Ela é uma prima de terceiro grau de minha
mãe. Mas não nos encontramos pessoalmente
para falar desta peça. Conversamos por
telefone. Achei que a encontraria aqui. Bem,
deixemos esse assunto para lá. Se Reggie
estivesse aqui no resort, decerto estaria
conosco. Afinal, por que minha tia viria até ali

131
Estranha Sedução Shannon Drake

sem falar comigo e se apresentar a vocês? Isso


não faria sentido.
Risadas, champanhe e comentários animados
de cada um envolveram o ambiente. Todos
estavam muito felizes.
Pouco a pouco, foram deixando o teatro. A
empolgação do sucesso os fez se esquecerem
das preocupações anteriores.
Grant, como sempre, acompanhou Stephanie
até seu chalé.
Ela abriu a porta, deixou que ele entrasse, e
decidiu deixar as preocupações de lado. Afinal,
ela estava ali. E Grant também. Como nos velhos
tempos.
— Steph, onde quer que eu durma?
— Onde você quiser.
Ela subiu para o quarto, um leve sorriso nos
lábios antecipando o que deveria vir em seguida.
Conforme foi andando, foi tirando as roupas,
deixando os sapatos no primeiro degrau, a blusa
no terceiro, a saia no sétimo, o sutiã no nono.
No quarto, ela se livrou do jeans. Olhou para
trás e avistou Grant, que fazia a mesma coisa,
largando os sapatos no primeiro degrau, a
camisa no segundo...

132
Estranha Sedução Shannon Drake

Seus olhares se encontraram, e a noite se


tornou elétrica. Ela soltou um pequeno gemido
quando ele a envolveu nos braços e começou a
beijá-la, carregando-a para a cama.
Naquela noite não haveria sonhos.
Apenas a realidade.

Suzette nem bem acabara de chegar quando


ouviu a batida na porta. Supôs que seria Doug
para dizer algo de que se esquecera.
Foi atender.
— Suzette...
Ela escutou seu nome como se fosse uma doce
carícia, um som que a tocou e hipnotizou. Uma
brisa deliciosa a envolveu, suave como pétalas
de rosa. E então ela o viu.
Era tão natural que ele estivesse ali... mas não
àquela hora.
Tomou a escutá-lo pronunciar seu nome
daquele jeito incrível:
— Suzette, posso entrar?
— Claro... — ela murmurou.
E pareceu-lhe que a noite a envolveu por
inteiro.

133
Estranha Sedução Shannon Drake

Carlo Ponti encontrou Grant no restaurante, no


café da manhã. Estava frustrado e ao mesmo
tempo animado.
— A polícia ainda não liberou nossa área, mas
tenho uma notícia incrível para lhe dar. Sabe a
peça de metal que Heinrich encontrou outro dia?
Eu a enviei ao museu para que ser analisada.
Veio notícia agora há pouco de que faz parte
da armadura de Conan de Burgh.
— Isso é fantástico! — Grant sorriu largo.
— Se conseguirmos novas peças, poderemos
escrever um pedaço da história. Saberemos o
que houve aqui naquela época. Estive
conversando com o pessoal do Discovery
Channel, e eles se mostraram bastante
interessados nesse material. Querem filmar
nossas escavações, Grant. É mais do que
podíamos esperar. Se os relatos que foram
passados de geração a geração forem
verdadeiros, logo encontraremos o corpo de
Conan e o dos demais. Aconteceu uma terrível
batalha neste local.
— Mas já achamos vários corpos.
— Sim, sim... sabemos que o terremoto que
quebrou aquele penhasco aconteceu, sem
sombra de dúvida. Não foi possível ainda
134
Estranha Sedução Shannon Drake

determinar as datas exatas. Aqueles esqueletos


que encontramos pertenceram ao povo da vila.
Mas essa pecinha de metal é um tremendo
achado. Em algum lugar ali, Conan de Burgh está
enterrado, ao lado de Valéria e François. E
daqueles que queriam executá-la.
— Espere, espere, de quem você está falando?
Que mulher foi essa?
— Valéria, a mulher por quem De Burgh era
apaixonado. Ela devia ser de uma beleza
excepcional. E diabólica até o fim, visto que,
pelo que se sabe, foi quem forçou seu próprio
povo a guerrear. Estamos assumindo que os
demônios ou feras da lenda eram seus
guerreiros. Eles acompanharam François, e
destruíram este lugar, dizimando a população.
Conan de Burgh ganhou a última batalha, mas foi
morto durante o terremoto. Ele poderia ter
sobrevivido se não tivesse tentado salvar a vida
de Valéria.
Valéria... Stephanie jurara que Grant gritara
aquele nome durante o sono, e também quando
acordado.
Coincidência?
Ele tomou seu café, tentando entender o rumo
de sua vida, o que o fizera vir até ali, e agora
135
Estranha Sedução Shannon Drake

tinha ainda mais certeza de que havia algo de


errado naquilo tudo. Precisava aceitar que algo
mudara seu destino.
Stephanie via tudo sob outro ângulo.
Acreditava que Gema tivesse resolvido partir, e
nada mais. Maria fora atacada por animais
selvagens, e não havia nada de bizarro nisso. O
esquisito vinha dos sonhos, mas era normal
sonhar quando se está em um país estranho;
dorme-se sob o som das ondas e a brisa do mar
invade os aposentos.
— Grant? Está me ouvindo?
— Perdão, Carlo, eu me distraí por instantes
pensando na antiga batalha que ocorreu aqui. Na
existência de Conan e seu grande amor, Valéria.
— Pois a polícia irá liberar a área amanhã, e
então poderemos cavar. Estou muito contente!
— Amanhã... — Grant repetiu.
Quando ficou de pé, sentiu-se tonto. Dormira
pouco nas duas últimas noites. Estivera com
Stephanie nos braços, e as madrugadas foram
mágicas. Ele a amava do fundo do coração. E
acreditava ser correspondido. Mas Stephanie
estava inquieta com a forma como ele vinha se
comportando.

136
Estranha Sedução Shannon Drake

E por que não estaria? Ele próprio algumas


vezes temia estar enlouquecendo.

No momento em que o elenco saía do


restaurante, Suzette a chamou:
— Steph, você viu quem apareceu?!
— Quem?
— Gema!
— Gema está de volta?
— Sim. Eu a vi de longe, perto da entrada do
resort.
— Nós não fomos apresentadas.
— Espero que ela não esteja querendo pegar o
papel de volta, agora que a peça fez sucesso.
Não se esqueça de que Gema nos deixou na
mão.
— Se ela tornar a aparecer, mostre-me de
quem se trata — pediu Stephanie. — Não vou
incluí-la no elenco. E mera curiosidade. Suzette
assentiu, e Stephanie seguiu direto para o chalé.
Lá, encontrou Grant, mas ele não parecia
inclinado a romance. Pelo menos não naquele
instante.
— Tenho um compromisso e preciso sair - ele
disse.

137
Estranha Sedução Shannon Drake

Stephanie não confessaria jamais sua


decepção, por isso, manteve a compostura,
como se não se importasse.
— Claro, pode ir.
— Vou ao velório de Maria. Já que fui eu quem
encontrou o corpo... Bem, sinto-me na obrigação
de comparecer e dar os pêsames para a família.
Stephanie se envergonhou de seu egoísmo.
— Gostaria de ir com você, Grant.
— Não é preciso.
— Mesmo assim, eu quero. Dê-me alguns
minutos para trocar de roupa e tirar a
maquiagem.

Stephanie e Grant apressaram o passo para


não chegar muito tarde à cerimônia.
O local estava repleto. Ela reparou que alguns
rostos eram conhecidos. Também os policiais se
encontravam lá.
E a mãe de Maria.
Lucrétia estava de joelhos ao lado do caixão,
que, para surpresa de Stephanie, estava aberto.
E, para seu total espanto, a garota parecia
bonita. Belíssima. Não havia marcas em sua
pele. Seu rosto era perfeito, e havia até um
ligeiro sorriso em seus lábios.
138
Estranha Sedução Shannon Drake

— Eles devem ter um pessoal


especializadíssimo em maquiar os mortos —
Grant murmurou.
Os dois pararam, respeitosos, ao lado do
caixão, ouvindo Lucrétia chorar. De repente, o
choro se transformou em gritos e um dos
policiais procurou afastá-la dali.
— Vamos fazer uma pequena prece — Grant
sugeriu.
Ele e Stephanie baixaram a cabeça, fecharam
os olhos e rezaram. Ela pediu a Deus que
recebesse a alma da falecida. Quando tornou a
fitá-la, seu sangue gelou, e um aperto na
garganta bloqueou sua respiração.
Maria a encarava!
Stephanie cerrou as pálpebras e voltou a abri-
las.
A garota estava como devia, hirta e inerte.
Stephanie fitou Grant, mas ele não passara
pela mesma experiência, a contar por sua
expressão tranqüila. Talvez tivesse imaginado
tudo.
Começaram a se afastar, quando Grant acenou
para Carlo que veio até eles.
— Que bom que vocês vieram...

139
Estranha Sedução Shannon Drake

Eles não tiveram tempo de falar nada, porque


naquele minuto a mãe de Maria tornou a soltar
um grito, que trouxe agonia para o coração de
todos os presentes.
Mas, então, Lucrétia largou o braço do policial
que a apoiava e correu de novo para o caixão. E
tirou algo de sua bolsa: uma faca afiada.
Antes que alguém pudesse detê-la, Lucrétia
agarrou os cabelos da filha e começou a cortar-
lhe o pescoço, em uma tentativa desesperada de
separar a cabeça do corpo.
Stephanie nunca vira algo tão horrível em sua
vida.
A energia febril e o esforço da mulher eram
insanos. A princípio, ninguém fez nada, decerto
devido ao choque.
Enfim, três homens se precipitaram em direção
ao caixão.
O suor escorria do rosto de Lucrétia, suas
mãos e suas roupas se mostravam cobertas com
sangue.
Como aquilo era possível?! Maria fora
embalsamada, e nesse processo o sangue é
removido das veias. No entanto, havia o líquido
vital, inclusive escorrendo do pescoço cortado.

140
Estranha Sedução Shannon Drake

O que escorria era sangue, sem a menor


sombra de dúvida.
Todos continuavam em silêncio, estupefatos.
Então, de repente, começaram a falar ao mesmo
tempo. Lucrétia, histérica, gritava com os
homens que a arrastavam para fora da sala. O
padre correu ao caixão, rezando e jogando água
benta sobre o corpo da jovem. Depois,
aproximou-se de Lucrétia e lhe falou com
gentileza. A pobre senhora jogou-se nos braços
do padre, chorando copiosamente... Aos poucos,
ouvindo o que lhe dizia o religioso, passou a
soluçar e logo se acalmou.
A confusão de Stephanie era enorme. Grant
tocou seu braço.
Não precisavam se falar. Viraram-se para a
porta, e em meio ao caos, foram saindo. Quase
nas escadas, avistaram Carlo, sacudindo a
cabeça como em desconsolo.
— Isso é muito incomum — ele murmurou ao
ver Grant e Stephanie se aproximarem.
— Nós nos sentimos como intrusos — Grant
confessou.
— Todos tiveram a mesma sensação. Quando
uma mãe perde a filha... e fica fora de si, é
tomada pela superstição ao ouvir os médicos e a
141
Estranha Sedução Shannon Drake

polícia comentarem como a filha foi


encontrada... Bem, Lucrétia se deixou levar pelo
desvario. E óbvio que Maria não foi
embalsamada de forma correta, o que é contra a
lei. No entanto, o embalsamador e os médicos
legistas, sabe Deus por que motivo, deixaram de
proceder como deviam. Ninguém imaginaria algo
bizarro como o que acabamos de presenciar. E
aquele sangue todo...
Stephanie viu que também Carlo ficara
transtornado.
— Como o sangue pôde jorrar? — ele
continuava. — Se o coração pára de fazer seu
trabalho, isso não pode acontecer. Toda essa
situação se toma mais e mais mágica. Grant pôs
a mão em seu ombro, tentando consolá-lo.
— Agora, vamos embora. Boa-noite, amigo.
— Durmam bem. Amanhã nos vemos, não é,
Grant?
— Claro que sim.
Carlo piscou para Stephanie.
— Você deveria visitar nossas escavações,
srta. Cahill. Por que não vai com Grant? Apesar
dessa tragédia toda, lá é um local com profundo
significado histórico.
— Pretendo mesmo visitar o sítio arqueológico.
142
Estranha Sedução Shannon Drake

As vozes perto do caixão se elevaram outra


vez.
— Vou tentar acalmar o pessoal. Acredito que
o dr. Antinella irá preparar um sedativo para
Lucrétia.
— Vá ajudar, Carlo. — Grant pegou o braço de
Stephanie, e os dois se foram. — Você ainda
está tremendo. Sente-se bem?
— Não sei dizer. Ainda estou tonta com tudo
aquilo.
— Em minha opinião, tanto os legistas como o
embalsamador tiveram dó de cortar Maria mais
ainda. Pobrezinha... Na certa, pelos sinais vitais,
atestaram que estava morta e concluíram, pelos
ferimentos, que sofreu um ataque por animais
ferozes. Assim, por que aumentar a dor de
Lucrétia? No entanto, sem querer, acabaram por
piorar a situação. Lucrétia acredita que a filha
foi atacada por demônios, que a possuíram.
Assim, somente se a cabeça de Maria for
decepada é que a moça voltará a ter paz.
— Ela parecia viva — Stephanie sussurrou,
lembrando-se de que tivera a impressão de ter
visto a moça de olhos abertos. Não sei se serei
capaz de apagar aquela cena de minha memória!
Grant a puxou mais para junto de si.
143
Estranha Sedução Shannon Drake

— Vamos voltar ao chalé.


Stephanie notou que ele parecia estudar o
firmamento. E também ela sentia como se
houvesse algo de diferente naquela escuridão.
Até as estrelas e a lua tinham dado lugar a
uma nuvem escura.
Apressou os passos, ainda assustada.
— Tem conhaque no chalé? — Grant quis
saber.
— Um bom estoque.
— Ótimo! Vamos beber uma garrafa inteira.
Stephanie percebeu que ele também ficara
abalado.
Afinal, qualquer um que tivesse visto o que
eles viram instantes atrás, teria ficado
impressionado.
— Só uma, Grant? Acho que duas seriam uma
idéia melhor.

Sim, senhor, eu tomei algumas poucas doses


de uísque, mais conhaque, mais vinho, mais
cerveja... Não!
Drew se corrigiu, tentando se manter de pé e
chegar a seu chalé.
Nada disso. Eu bebi mais do que umas poucas
doses. Que noite ótima! A estréia fora um
144
Estranha Sedução Shannon Drake

sucesso, o pessoal era amigável, o ambiente,


convidativo.
Certamente teria uma pavorosa dor de cabeça
no dia seguinte.
Aquela mistura de bebidas não podia dar bom
resultado.
Grande erro, mas...
Aspirina. Precisava já de uma aspirina. E de
alguma coisa para comer. Talvez um pedaço de
pão.
Entrou no chalé e seguiu direto para a cozinha.
Engoliu o comprimido acompanhado de dois
copos de água.
E foi então que bateram na porta. Quem
poderia ser? Talvez Suzette. Quem sabe ela
queria lhe dizer algo de que se esquecera?
Observou pelo olho mágico e decidiu estar
mais bêbado do que supusera.
Era Gema!
Por via das dúvidas, Drew a atendeu sem
demora.
— Ora! — Não estava tão embriagado a ponto
de ter esquecido o que a colega fizera, largando
todos para trás, sem a menor consideração. — O
que quer, Gema? O espetáculo estreou sem

145
Estranha Sedução Shannon Drake

você, como deve ter visto. E nos saímos muito


bem.
— Não fique bravo comigo, Drew. De fato a
apresentação foi maravilhosa. Vim dizer-lhe isso.
E sossegue, não quero meu lugar de volta. Vim
aqui apenas de passagem. Não irá me convidar
para entrar?
— Não! Você nos deixou na mão, e só nos
demos bem com muita sorte. — Drew bateu a
porta sem cerimônia.
Ela tornou a bater.
— Drew, por favor, só gostaria de conversar
com você por alguns minutos. Valerá a pena,
garanto.
Nada.
— Drew... — Agora a voz de Gema era sensual.
— Quero ir para a cama com você... Quero lhe
dar aquilo que nunca teve antes, querido. Não
vai se arrepender...
Tarde demais. Drew desmaiou por obra de todo
o álcool que ingerira.

Grant e Stephanie, ali, no sofá da sala,


tomaram quase todo o conhaque que
encontraram. Mas sem conversar. Apenas um

146
Estranha Sedução Shannon Drake

comentário ou outro sobre a peça e sobre terem


de acordar bem cedo.
E beberam mais.
Stephanie descansou a cabeça no ombro de
Grant. Em seguida, deitou no colo dele, que se
pôs a acariciar sua testa e seus cabelos.
Logo notou que ela adormecera. Isso era bom.
E ele precisava dormir, também. Necessitava de
tempo para tentar esquecer.
Durante minutos ficou apenas olhando para
Stephanie. Por um momento, o amor que sentia
por ela se mostrou tão forte que ele estremeceu.
De puro medo. Tinha de protegê-la contra tudo e
todos.
Mesmo que seu inimigo fosse o próprio diabo,
Grant o venceria.
Cerrou as pálpebras, tomado por dúvidas. Algo
lhe dizia que tudo o que vinha acontecendo era
absurdo. Por outro lado, sabia que teria de
esperar.
Sentado na sacada, esperou pela luz do dia,
que demorava tanto a chegar. Inalou o ar
noturno, experimentou o aroma do sal da água
do mar.

147
Estranha Sedução Shannon Drake

Mais uma vez, seus olhos se fecharam. A


sensação que o envolveu o fez pensar nos
braços de uma mulher a enlaçá-lo...

Doug estava deitado quando ouviu um estranho


ruído. Meio tonto, aguçou a audição, para
identificar a localização do som.
Vinha da porta da varanda, aquela que dava
para a praia. Alguém batia no vidro.
— Vá embora! — ele gritou, sem ter certeza se
era real ou fruto de sua imaginação.
As batidas continuaram.
Era real.
Levantou-se da cama com esforço. Vestiu o
jeans, caminhou até lá e puxou as cortinas.
Para seu espanto, era Gema Harris quem
resolvera vir vê-lo naquele horário tão
inconveniente.
As palavras ficaram presas em sua boca. A
aparência de Gema era fantástica. Doug nunca
reparara como seus olhos eram brilhantes, o
sorriso, doce, e o corpo, fenomenal.
— Não vai conseguir seu emprego de volta,
Gema.
— Sei disso. Vim apenas pedir desculpas. — O
olhar dela o examinou de cima a baixo.
148
Estranha Sedução Shannon Drake

— Está batendo em minha porta no meio da


noite para se desculpar? Deve procurar
Stephanie, não a mim. A propósito, já que esteve
por aqui hoje, por que não fez isso? Suzette a viu
e queria apresentá-la a Stephanie.
— Doug, sempre o considerei um amigo. Achei
que devia lhe falar. Por favor, deixe-me entrar.
Prometo que não demoro.
Ele suspirou.
— Está bem. Quer tomar alguma coisa?
— Uma bebida? Está me oferecendo... Oh,
Doug, você é adorável!
— Espere um minuto enquanto visto um
roupão.
— Ah, você não precisa disso...
Surpreso, ele se voltou para Gema. Ela nunca
demonstrara nenhum interesse sexual por ele.
Afinal, Doug não era rico o suficiente, nem tão
musculoso.
Abriu a porta, e Gema entrou envolvendo-o no
mesmo instante em seus braços.
— Gema? — A voz dele soou esganiçada.
Doug tentou dar um passo para trás devido ao
susto. Mas Gema não perdeu tempo: tirou o
vestido e se colocou nua diante dele.

149
Estranha Sedução Shannon Drake

Ali estava ela. Os seios grandes e atraentes,


os cabelos caindo nos ombros, os lábios úmidos.
Gema se moveu de forma sinuosa, como uma
gata no cio, e se colocou na ponta dos pés. Com
a ponta da língua, roçou os lábios de Doug.
Imediatamente ele ficou excitado.
Ela teria o que viera buscar.
Doug sentiu a língua de Gema se mover por
seu pescoço, descer por seu torso despido e
depois pressionar o corpo no dele com firmeza.
E por incrível que parecesse, ela se mostrava a
mais forte dos dois.
Logo o derrubou no chão e o beijou em frenesi.
E começou a lançar mão de toques que
ameaçavam levá-lo li loucura.
E então Doug sentiu como se estivesse sendo
esmagado. E, de repente, Gema começou a
querer mordê-lo de verdade.
— Ai! O que está fazendo, Gema?!
— Você não me ofereceu uma bebida?
Doug teve uma vertigem. Gema o sugava,
mantendo-o cativo.
— Não, Gema, não... — ele começou a implorar.
Um homem entrou pela sacada e arrancou
Gema de cima de Doug.

150
Estranha Sedução Shannon Drake

— Tem de ouvir o que eu digo! Não quero mais


nenhum morto... pelo menos por enquanto. O que
acontece com você?!
O homem a atirou com violência contra a
parede. O barulho soou como um trovão.
Doug, no entanto, nem notou ou se moveu.
Seus olhos estavam abertos, mas era como se
fitasse o vazio.
O estranho caminhou até Gema e pegou-a
pelos cabelos, forçando-a a encará-lo.
— Fora daqui!
Gema olhou para Doug mais uma vez.
— Fora, já lhe disse!
Ela obedeceu, soltando uma gargalhada
pavorosa.

Assim que despertaram, Grant e Stephanie


resolveram que iriam passear nas escavações,
mais tarde.
Ambos haviam dormido além da conta.
Stephanie acordou com Grant deitado a seu
lado, a observá-la. Ela estendeu a mão e
acariciou seu rosto.
— Uma moeda por seus pensamentos — ele
murmurou.

151
Estranha Sedução Shannon Drake

— Não tenho certeza se formei algum


pensamento esta manhã.
Stephanie se deu conta de que ambos
continuavam vestidos.
Haviam apenas tirado os sapatos.
— Então eu lhe direi o que estou pensando:
você é a garota mais bonita do mundo. Sabe que
é a mulher de minha vida, não é?
Ela sacudiu a cabeça, inquieta.
— Grant...
— Sossegue, anjinho. — Ele sorriu. — Vou
tomar banho. Preciso de um com urgência!
Grant foi para o banheiro.
Ele a amaria tanto quanto vinha tentando
demonstrar?
Stephanie se levantou, ansiosa para estar com
Grant e lhe dizer que o amava. Entrou no toalete
e pegou um sabonete.
— Deixe-me esfregar suas costas — ela
sugeriu, insinuante.
— Só se me deixar lhe dar um banho completo,
e tocá-la onde eu bem entender...
— Certo. Então eu farei o mesmo com você,
Grant.
— Mocinha, será uma diversão e tanto.

152
Estranha Sedução Shannon Drake

— Não espero menos do que isso. — Stephanie


entrou no boxe.

O desjejum de domingo era especial naquele


restaurante. Muitos turistas, mesmo os que não
se hospedavam no resort, vinham tomá-la ali.
Pietro estava lá e se reuniu a Stephanie e
Grant logo que os avistou. Sua expressão era
marcada pela tensão.
— Lamento que tenham assistido à cena de
ontem no velório.
— Aquela pobre mulher estava enlouquecida
pela dor, Pietro — Stephanie justificou.
— E o que vai acontecer agora?
— Maria será embalsamada de maneira
apropriada. O funeral acontecerá amanhã.
— E vai haver alguma punição contra os
legistas?
— As autoridades estaduais poderão lhes
passar uma reprimenda, mas não será nada
muito grave. E todos entendem o motivo que os
levaram a não seguir as normas habituais.
Quanto a Lucrétia... não há quem não concorde
com ela.

153
Estranha Sedução Shannon Drake

— Quer dizer que as pessoas aceitam que ela


tenha tentado cortar o pescoço da filha e quase
lhe decepado a cabeça?!
— Como eu já lhes disse, somos supersticiosos
por aqui. Nem o padre ficou horrorizado. Ele
comentou que Lucrétia já sofreu demais e
devemos esquecer o episódio. Mas agora tenho
de ir.
Passem um bom-dia.
Assim que Pietro saiu, Clay e Liz chegaram.
— Como vocês vão? — Liz perguntou. —
Soubemos que presenciaram uma cena
macabra, ontem.
— Estamos bem, dentro do possível. —
Stephanie notou que Grant não ficou nada
satisfeito com a presença de Clay ali ao seu
lado.
— Hoje iremos dar uma olhada nas
escavações. — Liz se mostrava entusiasmada. —
Clay já esteve por lá, mas eu ainda não.
— Também planejamos ir ao sítio esta tarde.
— Ótimo, Steph! Podemos ir todos juntos.
Stephanie gostou da sugestão. Seria bom ter
companhia, e gostava tanto de Clay como de Liz.
Pensava nisso, quando percebeu que havia algo
em Clay que a confundia um pouco. Procurou
154
Estranha Sedução Shannon Drake

identificar a razão disso e logo descobriu qual


era: Clay usava uma camiseta de manga curta.
Assim, ela pôde constatar que não havia sequer
uma marca em seu braço. E a irritação que
surgira no dia em que a criança quase se
afogara, que parecera uma queimadura
gravíssima?
O machucado sumira. Era como se ela tivesse
imaginado tudo.
Clay percebeu que Stephanie o olhava
espantada.
— Desculpe-me por minha indiscrição, Clay. É
que notei que a queimadura de seu braço sumiu.
— Oh, aquilo? Não lhe disse que era uma mera
irritação? Aparece e some quase de imediato.
— Mas tive a impressão de que era uma
queimadura dolorida.
Os remédios de hoje são uma maravilha, sem
dúvida...
— Não era grave, embora fosse feia.
Stephanie achou a explicação estranha. Não
exagerara sobre a gravidade da irritação na pele
de Clay. Era horrível de fato e sumira. Estranho...
Porém, decidida a não pensar mais sobre o
assunto, ela deixou a mesa, seguida dos demais.
Estava pronta para ir até as escavações.
155
Estranha Sedução Shannon Drake

CAPÍTULO VI
Suzette estava na praia fazia mais de uma hora
quando Drew veio ter com ela.
— Sinto-me péssimo! — Ele atirou uma toalha
na areia e se deitou sobre ela.
— Bebemos demais, não é?
— Mas precisávamos comemorar o sucesso da
estréia. No entanto, depois tive um sonho
maluco...
— Sério? — Suzette o encarou. — Conte-me
como foi.
— Foi tão esquisito! Ou talvez tenha sido uma
alucinação, já que estava completamente
bêbado....
— Pode ter sido isso, mas, por favor, diga logo
a que sonhou. Somos amigos, não é?
— Sonhei que Gema bateu na minha porta
querendo fazer sexo selvagem comigo.
— Com você?!
— Ei! Pensei que tivesse dito que eu era um
rapaz adorável!
— E é. Acontece que Gema nunca se
interessou por você.
— Foi bizarro, não?

156
Estranha Sedução Shannon Drake

— Que Gema tenha desejado ir para a cama


com você no sonho?
— Não só isso. A presença dela, para começar.
E no sonho eu a mandei embora.
Doug, parado ao lado de Drew e Suzette, ouvia
a conversa.
— Não brinque...
— Doug! Eu não o tinha visto.
— Drew, também sonhei que Gema me visitava.
Mas ela entrou em meu quarto pela porta da
sacada e fizemos sexo como loucos. Tenho a
impressão de que não a dispensei. O fato é que
acordei no chão, e com a calça arriada. Tudo
parecia tão real!
Suzette ponderou por minutos.
— Também eu tenho tido sonhos eróticos.
Os três amigos ficaram se olhando sem saber
bem o que dizer.

— O terremoto foi documentado. — Carlo


caminhava ao lado de Grant, Clay, Stephanie e
Liz. — Os nomes dos senhores normandos foram
registrados, também. Aconteceram terríveis
batalhas nesta região. Havia entre os normandos
um senhor chamado Conan de Burgh. Conan
venceu a última batalha contra François de
157
Estranha Sedução Shannon Drake

Venue, um meio-irmão ou primo ilegítimo do rei


da França. Quando a luta terminou, houve o
terremoto, e Conan foi uma de suas vítimas.
— Que história interessante! — Liz exclamou.
— Concordo. Estivemos parados nos últimos
dias, mas vamos recomeçar com força total.
Vem comigo por alguns instantes, Oram? Queria
lhe mostrar uma peça.
— Vou dar uma olhada nos rochedos.
— Irei com você, Clay. — E Liz seguiu o
companheiro.
Oram consultou Stephanie com o olhar.
— Pode ir, Grant, adoro isto aqui. Farei minha
própria exploração.
— Não vamos nos demorar — Carlo prometeu.
Grant continuava indeciso.
— Estarei bem, Grant. Ficarei a sua espera
aqui por perto.
Embora a contragosto, Grant se afastou com
Carlo.

Clay se aproximara mais e mais da área do


penhasco que escapara da destruição do
terremoto. Procurava revi ver a cena do que se
dera ali centenas de anos atrás.

158
Estranha Sedução Shannon Drake

Estava tenso, de olhos fechados, os dentes


apertados uns contra os outros.
— Aqui foi o centro de tudo.
— Mas há uma diferença, Clay.
Clay encarou Liz, as pupilas brilhantes.
— É Stephanie! Agora tenho certeza.
— Mas ainda não sabemos o suficiente — Liz
protestou.
— É ela. Eu sei. E já esperei tempo demais.
— Não, ainda não chegou a hora. — Liz segurou
a mão dele. — Não se precipite.
— Você se engana. Este é o momento.

Stephanie cochilara por alguns instantes, e


acordou assustada. Olhou para o lado do
penhasco e avistou Clay e Liz. Não havia sinal
de Grant.
Foi então que achou ter visto esqueletos
saindo da terra e vindo a seu encontro.
Tentou rir. Tudo não devia passar de mera
imaginação sua. No entanto, tudo parecia tão
real!
Decidiu procurar por Oram, mas neste instante
ouviu a voz dele chamá-la. Voltou-se para o lado
de onde soara o chamado. Não viu ninguém.
Stephanie... Stephanie... Onde você está?
159
Estranha Sedução Shannon Drake

Confusa, ela concluiu que devia ser Oram


chamando-a de algum lugar. Mas de onde?!
Stephanie!
O último chamado veio mais fraco, como um
grito de dor.
Alguém se machucara ou ela estava
imaginando tudo aquilo?
A escuridão desceu rápido, e ela estremeceu.
Tentou então seguir um caminho, uma trilha.

Grant terminou a conversa com Carlo e saiu à


procura de Stephanie. Não a achou onde ela
prometera esperá-lo. Olhou em tomo. Talvez
tivesse se reunido a Clay e Liz.
Mirou o penhasco e sentiu um calafrio na
espinha.
Stephanie, de olhos vítreos, estacara bem na
ponta do rochedo.
Um único passo e cairia no vale. Recebera um
chamado e o atendera.

A noite caíra.
Doug retomara da praia, exausto. Hesitara
muito em deixar os amigos, pois se sentia
melhor estando com el~s do que sozinho.

160
Estranha Sedução Shannon Drake

Nunca tivera medo antes, mas agora tinha.


Porém, o solo incomodara e a areia e a água do
mar também. Assim, deixou Drew e Suzette para
trás.
Algo lhe dizia que fizera uma tremenda
bobagem. Aquelas sensações e temores eram
injustificados.
Enfiou-se debaixo do jato do chuveiro
procurando afastar o cansaço inexplicável.
Deixara a televisão ligada como se ouvir o
locutor falando pudesse tranqüilizá-lo.
Assim que desligou o chuveiro, secou-se e pôs
uma roupa bem confortável. Sentou-se diante da
tevê e arregalou os olhos.
A imagem mostrava Gema e parecia se dirigir
direto a ele.
— Olá, Doug. Venha até mim... você sabe que
gosta... E sabe que quer fazer sexo Comigo.
Ele ficou atordoado, como se uma força o
impedisse de sair correndo e Voltar para junto
de seus amigos.
Teria dormido? Estaria sonhando?
— Durma... Deixe o sono chegar... — A voz de
Gema soava cheia de erotismo. — Estou
faminta...

161
Estranha Sedução Shannon Drake

— Então venha e me devore — Doug respondeu


naquele instante, dentro de uma espécie de
transe.
— É isso mesmo o que pretendo fazer, querido.
Um segundo depois, Gema saltou para junto
dele e ambos se agarraram no chão. Gema, nua,
lambia a pele de Doug e se dirigia a seu
pescoço.
— Você é delicioso, Doug. E esta noite... Ah,
temos a noite inteira! Ninguém irá nos
interromper. Posso me servir e me fartar de você
até... que Você morra!

— Stephanie! Pare!
Stephanie soluçou. Em como se tivesse estado
dormindo e acordado naquele exato momento. E
viu-se à beira do penhasco. Se o vento batesse
mais forte, talvez ela despencasse lá para baixo.
Fechou os olhos, horrorizada. Ouviu vozes, mas
teve medo de se Virar para ver quem era. Temia
todo e qualquer movimento.
Inclusive, segurava a respiração.
— Steph, cuidado! Fique onde está! Não se
mova!
Aquele era Grant. Mas não fora ele que a
atraíra até a beira do precipício?
162
Estranha Sedução Shannon Drake

— Stephanie... fique parada. Ele está chegando


ai. — Aquela era Liz.
Um forte nevoeiro cobria o lugar. Mesmo
assim, ela, pela visão periférica, viu Grant
chegando a sua direita, aproximando-se da
beirada do rochedo, procurando alcançá-la.
Mais alguém vinha do lado esquerdo. Era Clay
Barton.
— Sou eu, Steph, não se mova! — Grant não
queria se apressar e provocar, quem sabe, Um
deslizamento; não era possível que acontecesse
mais uma tragédia naquele exato local.
Enfim, Grant alcançou Stephanie e a segurou
com força.
— Agarre minha mão e caminhe Comigo. Bem
devagar.
Stephanie obedeceu, incapaz de entender o
que a levara a se colocar em Um situação tão
arriscada. Não era de seu feitio agir daquele
modo.
Passo a passo, os dois foram se afastando do
penhasco. Então, já em segurança, Grant a
abraçou forte, e ela se deixou ficar em seus
braços, de pálpebras cerradas.
O que pretendera ao resolver ficar a milímetros
da morte?
163
Estranha Sedução Shannon Drake

Ali estava mais Uma pergunta a que ela não


conseguiria responder.

Lena e Suzette haviam acabado de se sentar à


mesa do restaurante quando Drew chegou.
— Você está bronzeado!
— Obrigado. Você está sendo bondosa, Lena.
Estou tostado como uma lagosta, isso sim. E
onde está Doug? Ele vem jantar conosco?
— Prometeu que sim — Suzette lhe assegurou.
O garçom trouxe a cerveja que Drew pedira.
Ele a tomou devagar, conversando Com as
amigas sobre algumas mudanças no espetáculo.
O tempo passava, e nada de Doug. Por isso,
Drew decidiu buscá-lo no chalé.
Escurecera e o tempo estava estranhamente
frio.
Drew não teve de bater na porta de Doug.
Todas as portas se achavam abertas, e as
cortinas balançavam ao Vento.
— Doug? — Drew chamou, experimentando um
intenso frio.
Não houve resposta. Respirou fundo, criou
coragem e entrou.
O televisor estava ligado, com o som alto.
No andar de baixo, nada.
164
Estranha Sedução Shannon Drake

Subiu as escadas, e então encontrou o amigo


caído ao lado da cama.
— Deus meu!
Por um instante, Drew teve certeza de que
Doug estava morto.
Verificou seu pulso. Parecia parado. Por fim,
sentiu uma batida bem fraca.
Sem vacilar, correu para o telefone. Podiam
estar em uma cidade pequena, mas a resposta
veio imediata. Em minutos, ouvia-se o som de
sirenes. O resgate chegava.
Talvez não fosse tarde demais para Doug.

Grant dirigia em silêncio. A certa altura, se


voltou para Stephanie com um ar de desculpas.
— Lamento ter gritado com você. Fiquei
desesperado, temendo que você caísse lá
embaixo.
— Não sei o que me levou à beira do
precipício... Entrei em uma trilha, e no minuto
seguinte vocês estavam me chamando.
— Seria bom que mandassem iluminar aquela
área — sugeriu Liz.
— Mas é um sítio arqueológico! — Clay
reclamou. — Não um parque temático.

165
Estranha Sedução Shannon Drake

Todos se calaram, e assim se mantiveram até


chegarem ao resort.
Uma multidão conversava diante do chalé de
Doug.
— Há algo errado por aqui. — Grant desceu do
jipe em busca de informações.
Clay fez o mesmo. Logo, os dois voltavam ao
veículo.
— Vamos para o hospital. — Grant tomou a
assumir a direção.
Ao entrar no jipe, Clay contou as novidades:
— Encontraram Doug desmaiado no quarto,
sozinho. Foi Drew quem o achou.
— Meu Deus! Primeiro Lena, e agora Doug. —
Stephanie não sabia o que pensar.
Lembrou-se de que também ela própria poderia
estar ferida ou morta naquele instante.
— Chegaram a achar que Doug tinha morrido —
Clay prosseguiu. — Ele não se mexia e estava
pálido como um cadáver. Parece que perdeu
muito sangue.
— Foi esfaqueado? — Stephanie perguntou,
mas não esperou pela resposta de Clay.
Ali, naquele lugar, corpos embalsamados
continuavam com o sangue correndo em suas
veias, e vivos necessitavam de transfusões. Não
166
Estranha Sedução Shannon Drake

demoraram a chegar ao pequeno hospital.


Encontraram Lena, Suzette, Drew e Pietro na
sala de espera.

— Como ele está? — Stephanie indagou,


ansiosíssima, com lágrimas nos olhos.
— O dr. Antinella nos dará notícias em breve —
Drew afirmou. — Doug está com o nível do
sangue muito baixo e precisando
desesperadamente de sangue.
Grant viu o médico passar pelo corredor e foi
falar com ele.
Stephanie se sentou em um banco ao lado de
Suzette, que também estava abalada.
— Ele vai ficar bem. — Stephanie tomou a mão
dela.
— Você precisa ver como Doug estava, Steph.
Tão branco!
— Ele vai ficar bem — Stephanie repetiu, e
notou então que todos a fitavam.
— Stephanie, primeiro foi Lena quem adoeceu.
Depois, Suzette começou a mostrar os mesmos
sintomas. E agora... Doug quase morreu. — Drew
respirou fundo. — Quer saber? Estou com medo.
O que está acontecendo, meu Deus?!

167
Estranha Sedução Shannon Drake

Stephanie nada disse. Não sabia explicar o que


ocorria.
Nesse instante, viu Clay correndo para a saída
do hospital.
— Aonde você vai?
— Irei até o resort ver se mais alguém ficou
doente por lá.
— Vou com você. — E Liz correu atrás dele.
O silêncio reinou por minutos na sala de
espera. De repente, Drew começou a falar:
— Pode ser loucura, mas acho que tudo tem a
ver com os sonhos.
— Que sonhos? — Stephanie quis saber.
— Todos nós temos tido sonhos eróticos. Eu
sonhei que Gema queria ir para a cama comigo.
Com Doug foi a mesma coisa. Olhe, sei que nada
disso faz sentido, mas tanto Doug como eu
sonhamos com ela.
— E eu lhe disse que tinha visto Gema na
platéia. - Suzette olhou ansiosa para Stephanie.
— Talvez Gema tenha mesmo voltado. Digamos
que contraiu alguma doença por onde andou e a
está passando para todos com quem entra em
contato.
— É, Steph, talvez. — Drew analisava a
possibilidade, apesar de achá-la absurda.
168
Estranha Sedução Shannon Drake

— Tolice! — Suzette abanou a mão. — Gema


não esteve com Lena. Ela sonhou que fazia sexo
com um homem. Eu também.
Grant voltou naquele momento, informando
que haviam conseguido fazer uma transfusão de
sangue em Doug e que ele estava reagindo bem.
— Onde estão Clay e Liz? — ele perguntou.
— Os dois voltaram ao resort — Suzette disse.
Grant meneou a cabeça, bastante irritado.
— Clay foi ver se há mais alguém doente lá no
Bella Vista — Drew informou a Grant.
— Também vou voltar e fazer as coisas do meu
jeito.
Grant se encaminhou para a saída, e Stephanie
foi junto. Conseguiu alcançá-lo perto do
estacionamento.
— Grant, você tem de parar com isso!
— Parar com o quê?
— Você está errado indo atrás de Clay.
— Engana-se. Ele é a doença.
— Grant!
— De alguma forma é. Acredite no que lhe digo.
Ela se forçou a dar um passo para trás.
— Grant, começo a crer que é você quem está
doente.

169
Estranha Sedução Shannon Drake

— Pense o que quiser. Não me importo. Cansei


de alertá-la.
— Grant!
Ele parou e a encarou.
— O que foi agora?
— Não quero que durma em meu chalé esta
noite.
— Lamento, mas eu dormirei. — Grant deu-lhe
as costas.
Stephanie forçou-se a pensar direito. Ela o
queria demais. Não importava o medo, queria
que Grant ficasse junto dela.
Mirou o céu escuro e decidiu que seria melhor
retomar ao hospital.
Stephanie... Venha!
Ela escutou com nitidez a voz.
Devia ser o vento, sussurrando por entre as
folhas das árvores.
Entrou quase correndo na recepção, com uma
única certeza: estava sendo chamada... para
dentro da escuridão.

CAPÍTULO VII
François soube instantaneamente, antes de
voltar, que algo dera errado, algo fugira do
plano. E sabia multo bem o que.
170
Estranha Sedução Shannon Drake

Encontrou-a em seus aposentos. E acontecera


o que ele esperara.
Ela parecia uma gata ronronando no sofá, Com
um olhar de absoluto prazer e satisfação.
Tentou se lembrar de que era jovem, que a fome
podia ser avassaladora, mas aquilo ia contra o
temperamento dele. A garota era dispensável
como qualquer outra; tinha sido útil, mas agora
poderia colocar seus planos em risco.
Ela sorriu ao vê-lo, e François soube que a tola
se sentia autosuficiente, forte e poderosa.
— Então... você me desobedeceu.
A jovem se levantou de onde estava,
espreguiçou-se, lânguida, talvez mais insinuante
do que nunca, consciente de si mesma.
— Sim, de fato. Sou igual a você, com os
mesmos desejos. E com poder para conseguir o
que quero...
Ele sacudiu a cabeça, controlado, apesar da
raiva que o invadia.
— Não, não, pequenina, você não entende. Eu
tenho uma proteção especial. Uma que lhe falta.
Você será pega.
— Ah, é? E o que isso importa? Porque, se um
enorme lobo me atacar, basta que eu o devore.

171
Estranha Sedução Shannon Drake

Mais uma vez, ele meneou a cabeça. Colocou


as mãos nos ombros dela e a encarou.
— Há tanta coisa que você ainda não entende!
Diferentes seres, diferentes forças. Aqueles que
deixam os outros viver e aqueles que pensam
que governam o universo. Mas isso não importa
mais agora. Você foi desobediente.
— Tenho meu próprio poder.
— Já lhe disse, sou seu senhor.
— Pois eu quero ser senhora de mim mesmo.
— Eu sou o senhor; e o senhor dá, e o senhor
tira.
Ela nunca soube o que estava acontecendo.
Era uma pena... Devia ter aprendido a ser
humilde.
As mãos dele se moveram dos ombros de
Gema para sua cabeça.
E a torceram.
Ouviu-se um som horrível.
O corpo caiu aos pés dele.
Era hora de alimentar os cães demônios.

Doug fora levado para um quarto. Ele dormia, e


parecia em paz. Máquinas monitoravam seus
sinais vitais, e o soro entrava em suas veias.

172
Estranha Sedução Shannon Drake

Pietro estava agora no resort e Liz decidira


voltar ao hospital. Queria ficar no quarto de
Doug, revezando-se com o pessoal.
Stephanie ficou curiosa ao ver Liz conversar
com o médico por bastante tempo, mas pelo
visto o dr. Antinella concordava com o que a
jovem dizia, fosse lá o que fosse.
Decidiu que não deixaria Liz sozinha com
Doug. Na certa era bobagem sua. Estava sendo
influenciada pelas suspeitas de Grant. Contudo,
era melhor prevenir.
Assim, o primeiro turno ficou por sua Conta e
de Suzette. Doug readquirira um pouco de cor, e
Drew, quando chegou acompanhado de Lena,
pareceu bem mais aliviado.
Stephanie chamou Drew para conversarem
fora do aposento.
— Eu gostaria muito que sempre duas pessoas
ficassem com Doug.
— Está bem, Steph. Mas me diga: há alguém
em particular em quem você não Confia, não é?
— Não sei. Apenas não quero deixar Liz
sozinha com ele.
— Mas ela parece Uma ótima pessoa.
— Sei disso. Também penso do mesmo modo.
— Mas...
173
Estranha Sedução Shannon Drake

— Drew, estou começando a achar que nenhum


de nós deve ficar só.
— Ficou impressionada com aquela história
dos sonhos? Deve estar me achando um louco.
Stephanie deu de ombros.
— De todo modo, não deixaremos Doug a sós. E
jamais acompanhado apenas de Liz.
— Combinado.
— Conhece algum lugar onde Suzette eu
poderíamos comer um lanche?
— Há um café na esquina que serve uma
comida dos deuses.
— Ótimo. Iremos jantar e voltaremos logo.

Stephanie e Suzette encontram o café com


facilidade. Tomaram vinho enquanto
aguardavam pela refeição.
— Acredita mesmo que Gema passa ter
Voltado para cá e está passando alguma doença
para os outros sem nem se dar conta disso,
Steph?
— É uma possibilidade.
— É um milagre Doug esta, vivo. Você nem
imagina o estado dele quando Drew o encontrou.
Stephanie mal escutou o que Suzette dizia,
pois estava inquieta.
174
Estranha Sedução Shannon Drake

Um senhor de idade olhava direto para ela,


como se quisesse lhe dizer alguma coisa.
A garçonete voltou com as saladas. Falou com
Stephanie, mas ela não entendeu. Agradeceu,
Porém.
— Há um senhor idoso me encarando faz algum
tempo, Suzette.
— Os italianos, mesmo os velhinhos, têm fama
de conquistadores. Ele deve ter achado você
bonita.
— Não creio que seja isso — Stephanie
murmurou.
Suzette suspirou.
— Deixe-o olhar. Afinal, estamos em um país
livre. Quando cheguei aqui, eu...
Stephanie tornou a se distrair. O senhor não
tentava bancar o galanteador. O olhar dele era
firme e frio.
— Você não está me escutando, Steph —
Suzette reclamou.
— Ah, desculpe-me. Continuo cismada com o
homem. — Ela hesitou por um minuto. — Tive
uma idéia. Por que você e Lena não passam a
compartilhar o mesmo chalé?
— Por quê?

175
Estranha Sedução Shannon Drake

— Assim nenhuma das duas ficará sozinha. Eu,


pelo menos, tenho...
— Grant. Ei, aí vem nosso peixe! Sinta o aroma.
Céus a comida italiana é uma delícia!
Nesse minuto, o senhor se levantou e foi direto
para a mesa delas. Sua voz soou urgente e
profunda. E ele parecia bravo.
Tirou algo do bolso e depositou sobre a mesa.
Stephanie pulou, assustada, pensando que seria
uma arma.
Era um belíssimo crucifixo de prata. Uma jóia.
Suzette ficou boquiaberta.
O homem colocou a cruz nas mãos de
Stephanie. Ela tentou recusar a jóia, mas ele não
lhe deu ouvidos. Estava profundamente nervoso.
Um garçom se apressou até os três.
— Obrigado por sua paciência, senhoritas —
ele disse em inglês. — Este senhor é Adálio
Davanti. Ele é muito supersticioso e acredita
que vocês do teatro trouxeram uma maldição
para a vila. Por favor, use o crucifixo. Só assim
nosso povo voltará à tranqüilidade.
— Mas não posso aceitar essa peça. É uma jóia
valiosa.
— Por que não? Adálio é joalheiro. Deve ter
feito ele mesmo o crucifixo e quis lhe ofertar.
176
Estranha Sedução Shannon Drake

— Muito obrigada — ela disse, afinal, a Adálio,


que esperava sua resposta com ansiedade.
Ele pareceu ficar satisfeito. Virou-se e saiu do
café. O garçom suspirou.
— O peixe está bom?
— Excelente! — Suzette lhe assegurou. Voltou-
se então para Stephanie: — Incrível você ter
ganhado essa cruz. O trabalho artesanal é
fantástico, reparou?
— Ela é bonita, sim. — Stephanie examinava a
jóia. — Bem, agora vamos comer rápido para
podermos voltar ao hospital.

Grant não conseguiu encontrar Clay nem Liz no


resort. Havia gente no restaurante, mas nenhum
seu conhecido.
Grant deu uma passada no barzinho e na sala
de espetáculos.
Era estranho ver tudo aquilo silencioso quando
em geral o movimento era intenso.
Caminhou pela praia, mas, ainda assim, nem
sinal deles.
Liz estaria hospedada em algum dos chalés ou
num quarto do prédio principal do resort? De
todo modo, porém, sabia qual era o chalé de

177
Estranha Sedução Shannon Drake

Clay e decidiu ir até lá. Ao chegar, tocou a


campainha.
Silêncio.
Então, uma idéia lhe ocorreu.
Como sabia fazer-se entender em italiano,
Grant conseguiu que a portaria lhe entregasse a
chave do chalé de Stephanie. Assim, logo estava
lá dentro, mesmo sem saber ao certo o que
buscava encontrar.
Procurou não desarrumar os pertences dela. O
que queria era dar uma olhada nos currículos
dos atores. Fora Reggie quem os contratara,
mas seria razoável que enviasse as fichas para
Stephanie examiná-las.
Enfim, achou a pasta com os documentos.
Sentou-se na beirada da cama e analisou rápido
cada ficha.
E então... encontrou o currículo de Clay Barton.
O documento continha o habitual. Trabalhara
em clubes de Nova Orleans, tinha se
apresentado em Nova York e Londres.
Nenhuma menção de que tivesse algum
conhecimento da língua italiana.
Grant examinou o currículo mais uma vez,
recolocou as fichas na pasta e saiu, ansioso
para chegar a seu próprio chalé. Próximo da
178
Estranha Sedução Shannon Drake

entrada, parou, de olhos arregalados. Havia algo


estranho colocado bem junto do rodapé.
Abaixou-se para observar melhor. Era algo
morto.
Um antebraço junto com a mão. Obviamente
humano, com a carne acinzentada, os dedos
contorcidos em forma de garra.
O presente macabro fora deixado para ele. Um
braço com a mão apontando para sua porta.
E ao que tudo indicava, não fazia parte do
cadáver de uma pessoa morta nas últimas horas.
Nem na véspera. Parecia ter muito mais tempo.
E, no entanto, a carne continuava toda sobre os
ossos.
Por um momento, Grant ficou paralisado pelo
choque. Então compreendeu que aquele que
colocara o braço ali quisera que ele o
encontrasse e ficasse horrorizado.
Seria um aviso? Ou uma ameaça?
Após um exame mais minucioso, concluiu que
o membro pertencera a uma mulher. E não era
datado de séculos atrás como os encontrados
nas escavações arqueológicas.

Grant não o tocaria. Não seria tolo de colocar


suas impressões digitais ali.
179
Estranha Sedução Shannon Drake

Deu as costas e seguiu para o restaurante,


esperançoso desencontrar lá os dois policiais,
Merc e Franco. Se não os encontrasse,
telefonaria para a delegacia.
Sentiu-se mal. Começava a ter certeza de que
achara a desaparecida Gema Harris.
Ou parte da moça, pelo menos.

Stephanie estava quase cochilando na cadeira


do quarto de Doug quando Drew entrou em claro
estado de agitação. Olhou para o colega deitado
no leito, depois para Suzette, que dormia em um
pequeno sofá a um canto, e fez sinal para que
Stephanie o acompanhasse.
— Sabe toda aquela história sobre sonhos,
Steph?
— Os eróticos sobre Gema?
— Esses mesmos. Pois eu estava errado.
Completamente enganado. — Drew riu com
amargura.
— Como assim? O que quer me dizer?
— Grant acaba de telefonar. Havia um braço no
degrau de entrada de seu chalé.
— Agora estou mais confusa ainda. Que
história de braço é essa?

180
Estranha Sedução Shannon Drake

— É isso mesmo. Grant achou um braço


humano. A polícia o levou para examinar e
identificar impressões digitais, DNA, sei lá mais
o quê. Na opinião deles, pertenceu a Gema.
Stephanie sentiu um calafrio percorrer-lhe a
espinha.
— Acharam um braço humano em frente da
porta de Grant?
— Foi Grant quem o encontrou.
Stephanie sentiu dificuldade para respirar.
— Pode ser alguém querendo lhe pregar uma
peça de mau gosto.
Talvez o tenham tirado das escavações.
Drew sacudiu a cabeça em uma negativa.
— Não era um braço velho, Steph. Bem, não
tenho conhecimento sobre esses assuntos, mas
a pessoa morreu alguns dias atrás. Uma semana
pelo menos!
Stephanie compreendeu aonde Drew queria
chegar. Ela não conhecera Gema. A moça era
considerada a favorita do grupo. Mas agora isso
não importava.
— Talvez não seja de Gema, Drew.
— Pelo que Grant disse, o legista ainda não
chegou a uma conclusão definitiva. Mas afirmou

181
Estranha Sedução Shannon Drake

que o membro pertenceu a uma mulher jovem,


de vinte a trinta anos de idade.
— Ainda assim, talvez não seja o braço de
Gema.
— Amanhã terão as impressões digitais e aí
saberemos. Vou dar uma passada no laboratório
do legista e ver se posso ajudar de alguma
forma, mas pode ser que nunca se chegue a uma
identificação definitiva. A não ser que...
— A não ser o quê?
— Que o restante do cadáver apareça.

A polícia e o legista já tinham ido embora.


Saíram tão aturdidos como o próprio Grant. .
Pietro também viera dar uma olhada e ficara
transtornado.
Naquele momento, Grant estava sozinho,
tentando raciocinar direito.
Garantiu aos policiais que não se afastaria da
área. Telefonou para o hospital e conversou com
Drew, ansioso de que todos por lá soubessem de
sua descoberta antes que retomassem.
Confessou a Drew que acreditava que o braço
era de Gema, mas que ninguém ainda podia dizer
isso com certeza absoluta. .

182
Estranha Sedução Shannon Drake

As horas foram passando. Ele ainda não vira


Clay Barton, mas Liz, segundo Drew, voltara ao
hospital. Stephanie continuava por lá. Os amigos
vinham se revezando no quarto de Doug.
Grant podia agora ir para seu chalé.
Entrando rápido, conectou-se na Internet. E
começou a procurar por atores, atrizes e
currículos.

Ao entrar com Suzette no quarto de Doug,


Stephanie suspirou, aliviada. O rapaz parecia
estar respirando normalmente.
Lena sorria contentíssima. Eles quase
perderam seu amigo, e havia pouco Doug
acordara e abrira os olhos. Chegara até a
pronunciar algumas palavras.
Fora um milagre. Afirmando estar com fome,
ele pediu o jantar.
— Doug se lembra de alguma coisa, Drew? —
Stephanie quis saber.
— De nada. Apenas recorda que esteve na
praia, voltou ao chalé, tomou banho e se deitou
na cama para dar um cochilo. Bem, meninas, eu
e Lena já vamos indo.
— Até mais.

183
Estranha Sedução Shannon Drake

Stephanie se acomodou na poltrona para dar


início a sua vigília.
Doug continuava dormindo, tranqüilo. O
enfermo usava um camisolão hospitalar, e
Stephanie notou um crucifixo em seu pescoço.
Idêntico ao que ela ganhara no café.
Chamou Suzette e apontou-lhe a jóia.
— É igual a sua. — Suzette franziu a testa. —
Nunca o vi usando nenhum crucifixo. Será que o
mesmo velhinho que deu a cruz para você
colocou essa em Doug?
— Esquisito, não acha? Sabe se Doug é
religioso? Cristão, ao menos?
— Não imagino. Mas, mesmo que seja ateu,
duvido que ache ruim de, ao acordar, notar o
crucifixo. Ele decidirá o que fazer, não é? Neste
momento, até eu mesma gostaria de usar um.
— Pegue o meu.
— Mas foi você quem ganhou, Steph. O
velhinho deve ter achado que era você quem
precisava de proteção.
— Pode ser, mas vou procurar aquele joalheiro
e lhe perguntar a razão de ter me escolhido.
— Ei, olhe! Parece que Doug é alérgico a prata.
Talvez devêssemos tirar a cruz.

184
Estranha Sedução Shannon Drake

— É mesmo. Quem sabe foram as enfermeiras


que colocaram no pescoço dele? Esse povo é
tão supersticioso...
Stephanie estava indecisa, mas terminou por
concordar com Suzette. Seria melhor tirar a jóia
para não piorar a alergia de Doug.
A pele dele ficara muito vermelha Suzette se
encarregou de tirá-la, e o vermelhão
desapareceu de imediato.

Drew veio chamar Suzette e Stephanie.


Segundo os médicos, Doug melhorara bastante e
podiam deixá-lo sozinho. Stephanie relutou, mas
terminou por concordar.
Giovanni esperava por eles na van do resort.
Uma vez lá, Stephanie soube que Suzette e
Lena decidiram dividir o mesmo teto. Isso lhes
daria mais segurança.
Stephanie se encaminhou para a porta de seu
chalé, tomada por pensamentos inquietantes.
Grant encontrara o braço.
Teria sido ele mesmo quem o colocara lá?
Entrou e parou, assustada. Fez uma rápida
verificação: todas as portas se achavam
trancadas, e o lugar parecia vazio. Então, por

185
Estranha Sedução Shannon Drake

que aquela sensação de que alguém a


observava?
Decidiu aliviar a tensão com um bom banho.
Despiu-se e sentiu uma brisa vinda do quarto.
Como isso era possível? Ela vira as portas da
sacada bem fechadas, assim como as cortinas
bem puxadas.
Apavorou-se.
Com um imenso esforço, saiu do banheiro.
As cortinas balançavam com o vento. As
portas de vidro estavam escancaradas.
E parecia haver uma sombra se aproximando e
crescendo, a um canto do aposento.
E de repente, todo o chalé foi tomado pela
escuridão.

Liz subiu para seu quarto, no prédio maior do


resort.
— Clay?
Não houve resposta. Nem havia mensagem
alguma a sua espera.
Correu até a janela. Dali podia ver todos os
chalés. E o de Stephanie estava aceso. Lena
parecia procurar a chave na bolsa, com Suzette
a seu lado.
Liz se inquietou.
186
Estranha Sedução Shannon Drake

Então, ela viu.


Uma sombra descia, e o chalé de Stephanie
Cahill mergulhava aos poucos na escuridão.
Seu coração disparou. A hora chegara.
Afastou-se apressada da vidraça e saiu
correndo do quarto.
Tinha de chegar ao chalé antes que fosse
tarde demais.

Stephanie ficou paralisada, no escuro.


Parecia haver duas pessoas lutando em meio a
suas cortinas, que agora já não estavam
dependuradas, mas enroladas e emboladas no
chão.
Lá fora, amanhecia.
Sem aviso, a claridade retomou, e ela
identificou quem lutava: Grant e Clay.
— Parem com isso! O que está acontecendo?!
— Esse sujeito estava invadindo seu quarto,
Steph. Sabe Deus o que ele pretendia.
— Não vim atrás de Stephanie, mas sim atrás
de você — rebateu Clay.
— Tudo isso é absurdo! Este é meu chalé e
vocês arruinaram minhas cortinas!
— Eu vi a sombra — Clay justificou-se.

187
Estranha Sedução Shannon Drake

— Claro, a maldita sombra, ou seja: você! —


Grant o acusou.
Stephanie colocou as mãos na cabeça. Aquilo
tudo seria um sonho? Não. Era real. Acontecia
de verdade.
— Grant, pelo amor de Deus, o que está
havendo?!
— Vê esse sujeito? Existiu mesmo um homem
chamado Clay Barton, mas ele tinha AIDS e
morreu no ano passado!
— Ah! Andou pesquisando na Internet, não é?!
— Clay exclamou, irritado.
Nesse momento, antes que Stephanie pudesse
demonstrar surpresa com a descoberta, Liz
entrou com fúria pela porta da sacada.
— Lucien! — ela gritou, correndo para Clay.
— Ahá! — Grant se virou então para Stephanie.
— Eu não lhe disse que esse camarada era um
impostor? E com certeza é um assassino!
— Não! — Liz protestou. — Lucien, você tem de
revelar a verdade para eles.
— Pois é justamente o que quero saber! —
Grant exigiu.
— Esperem um momento. Sou a diretora da
peça — Stephanie protestou. — Se alguém
esteve mentindo para mim...
188
Estranha Sedução Shannon Drake

— Steph, isso não tem nada a ver com o


espetáculo. — Grant encarou o casal: — Tem,
Liz? Ou esse não é seu nome? Ora, claro que não
é!
— Meu nome é Jade.
Stephanie, aturdida, apontou para o homem a
quem ela sempre chamara de Clay.
— Muito bem. Seu nome é Lucien. E você é
Jade. E, óbvio, são velhos conhecidos, pelo que
vejo.
— Somos casados — Jade explicou.
— Maravilha! Ele é casado e tenta conquistar a
mulher dos outros! — Grant ironizou.
— Eu não fiz nada disso! — Lucien o fuzilou
com o olhar.
— Vejamos. Seu verdadeiro nome é Lucien, é
casado com essa mulher, que se chama Jade, e
você está seguindo minha mulher. O que está
acontecendo aqui, afinal de contas?!
— Você tem de contar a verdade, Lucien —
Jade implorava.
— Muito bem. Por favor, não entrem em pânico.
— Lucien respirou fundo antes de começar: —
Sou um vampiro.
— Vampiro?! — Grant mal acreditava no que
tinha ouvido.
189
Estranha Sedução Shannon Drake

— Vocês dois têm de escutar o que temos a


dizer. — Jade olhava para Grant e Stephanie. —
Lucien é mesmo um vampiro. Não um vampiro
mau, mas um que quer evitar que aconteçam
mais tragédias por aqui.
— Ele é um vampiro? — Stephanie estava
boquiaberta. — Como esses que vemos nos
filmes?
— Sim. E viemos aqui para tentar evitar que as
pessoas mordidas se transformem em criaturas
como eu. Por sorte, Doug foi acudido a tempo.
Se não tivesse sido, teríamos de enfiar uma
estaca em seu coração e decapitá-lo.
— Então existem vampiros mais perigosos em
Bella Vista? Deixe-me ver se entendi: vocês não
sugam o sangue de ninguém e também não
conseguiram evitar a morte de Maria ou de
Gema, ou o ataque a Doug. É isso? — Grant
perguntou.
O silêncio reinou no aposento.
— Temos de chamar a polícia.
— Estou coberta apenas com uma toalha,
Grant. Preciso me vestir. — Stephanie não sabia
o que fazer.
— Lucien, o dia está amanhecendo e logo vai
surgir o sol. Os vampiros não morrem de medo
190
Estranha Sedução Shannon Drake

do maravilhoso astro-rei? — Por mais que Grant


tivesse a mente aberta, aquela revelação o
abalara demais.
— De fato perdemos um pouco de nossa força
— confessou Lucien.
— Muito bem. Não sei se o que diz é verdade
ou se você não passa de um louco. De qualquer
modo, Stephanie e eu vamos procurar a polícia.
— A polícia daqui sabe que existimos. Mas
vocês dois podem nos escutar antes, não é? —
Jade implorou.
Grant mordeu o lábio e encarou Lucien.
— Você matou Maria Alberti e Gema Harris?
— Juro por Deus que não.
— Está jurando por Deus?! Um vampiro?!
— Ele fez as pazes com o Criador. — Jade
tentou sorrir.
Grant meneou a cabeça.
— Tudo isso é inacreditável!
— Sei disso, Grant. Mas você tem de admitir
que algo de estranho vem acontecendo aqui
neste lugar. Todos vocês tiveram sonhos
inquietantes. E você, Grant, sentiu-se como que
obrigado a vir trabalhar nas escavações. Um
homem ligado ao teatro mexendo com

191
Estranha Sedução Shannon Drake

esqueletos... Não acha que isso é pelo menos


incomum?
Grant suspirou.
— Muito bem. Digamos que aceito o que disse.
Esse homem é um vampiro.
— Um rei.
— Oh, o rei dos vampiros! Prove!
— Quer que eu lhe morda o pescoço e lhe
sugue o sangue? — Lucien o fitava de forma
nada amistosa.
Stephanie interveio:
— Tudo o que dizem é tão bizarro... De todo
modo, vocês permitiriam que eu me vestisse?
Estou em visível desvantagem, como podem ver.
Grant, Jade e Lucien desceram as escadas e
deixaram Stephanie no quarto. Logo depois, ia
ao encontro deles, usando jeans, camiseta e
tênis.
Jade preparava um café.
Para espanto de Stephanie, Grant e Clay
conversavam sem nenhuma hostilidade. Grant
dava atenção total ao que Lucien tinha a dizer.
— Creio que o último terremoto liberou
François de Venue e Valéria — Lucien dizia. —
Eles foram soterrados por um outro terremoto,
aquele que se deu após uma batalha sangrenta e
192
Estranha Sedução Shannon Drake

que vitimou também o normando Conan de


Burgh. Então esse segundo terremoto revirou a
terra, e os dois monstros se viram livres.
— Fale o que sabe sobre François e Valéria —
interessou-se Grant.
— Valéria tinha um poder fantástico. Era
chamada de bruxa, uma bruxa do mal: Não sei o
que houve, mas François de Venue se tornou um
vampiro, talvez em Paris, lutando nas Cruzadas,
conquistando os povos locais. Não conheço
direito essa parte. O que interessa é que ele
tinha seu poder. Valéria quase se casou com
Conan de Burgh. Em vez disso, porém, passou
para o lado de François. As lendas contam que
ela podia invocar o vento e a chuva, e criou um
exército de cães demônios.
— O que são esses cães demônios? — De
repente, Stephanie tomou consciência de que
conversava com naturalidade com um homem
que se dizia um vampiro e falava sobre coisas
sobrenaturais.
Não podia deixar de se lembrar de como a
partir de certa época Grant sofrera uma
transformação.
E também havia os sonhos eróticos.

193
Estranha Sedução Shannon Drake

Sem falar que estivera à beira de um


precipício, sem saber o que a levara até lá.
— São o que o nome diz: cães demônios, ou
demônios caninos — Jade informou, olhando
para Lucien.
— Lobisomens?
— Não, Grant. Eram feras criadas pelo espírito
maligno de Valéria. Lutavam ao lado de seu
exército e praticavam massacres medonhos.
Grant colocou o braço em torno dos ombros de
Stephanie e a puxou para mais perto.
— Bem, esse vampiro, François de Venue, se
libertou, e matou Maria Alberti e Gema. Vamos
dizer que brincou com Lena, e decerto com
Suzette.
— Por que François não matou Lena ou Suzette
também?
— Não sei dizer a razão que o impediu de tirar
a vida das duas, Grant. — Lucien meneou a
cabeça.
Stephanie e Grant trocaram olhares.
— Mas quem atacou Drew e quase levou Doug
à morte?
— Creio que tenha sido Gema.
— Ela se transformou em vampira?
— Ah, deve ter se transformado, sim.
194
Estranha Sedução Shannon Drake

— E por que François a matou? Não precisava


de ajudantes?
— Gema deve ter feito algo que o irritou. Quem
sabe não tinha autorização para atacar Drew ou
Doug...
— E quanto a Maria Alberti? — Grant queria
todas as respostas.
— Por que a autópsia não foi feita?
— François deve ter hipnotizado os legistas.
Não queria perder Maria. Ainda não, pelo menos.
Mas Lucrétia agiu depressa.
Stephanie tentava aceitar todas aquelas
explicações, o que não era nada fácil.
— Você acha que Reggie tem algo a ver com
tudo isso, Lucien?
— Veja, Steph, este resort foi construído no
ano passado por um grupo de empresários
americanos. Eles o venderam a Reggie dois
meses atrás.
— Está sugerindo que ela é uma bruxa ou coisa
assim?
— Começo a entender o papel dela nessa
história toda. — Lucien sorriu. — E também o
seu, Steph.
— O meu?!
— Sim. E o seu. — Lucien indicou Grant.
195
Estranha Sedução Shannon Drake

— Pois não sou vampiro nem nada. Pode


pesquisar que descobrirá todo meu passado,
desde o jardim-de-infância.
Lucien tomou a sorrir.
— Muitos séculos se passaram desde que
François de Venue, Valéria e Conan de Burgh
foram mortos pelo terremoto. Reggie é sua
parente, Steph?
— É prima de terceiro grau de minha mãe.
— E você a viu aqui outro dia...
— Não era ela. Pensei ter visto alguém
parecido.
— Pode ser que tenha razão.
— Ouvimos tudo o que você tinha a dizer,
Lucien. Você afirmou que é um vampiro. Dê-nos
uma prova de que não é um mero doido varrido.
Lucien, até então sentado à mesa bem em
frente de Grant, desapareceu, surgindo atrás de
Grant.
— Satisfeito?
— Pode ser um truque de mágica — Grant
resmungou.
— Não sou mágico, e você sabe disso. Está no
meio dessa história toda, Grant, e sabe que não
minto.

196
Estranha Sedução Shannon Drake

— Muito bem. Mas por que François escolheu


justo este resort para fazer suas vítimas.
— Ele pode estar procurando por Stephanie.

Lena ouviu uma batida na porta e correu para


abri-la.
O coração batia forte. Talvez fosse um dos
colegas vindo com alguma notícia sobre Doug. .
Uma má notícia...
Sem pensar, girou a maçaneta.
O homem que a encarava mostrava um leve
sorriso nos lábios.
— Lena, que bom! Vi que tirou a cruz...
Nesse momento, Suzette desceu as escadas.
— Ah, hoje temos as duas juntas! Uma boa
surpresa, sem dúvida.
Ele entrou no chalé e caminhou até Suzette.
Parou agitado ao ver o crucifixo pendurado em
seu pescoço. Virou-se então para Lena, que
começava a agir como se estivesse hipnotizada.
— Tire a cruz de sua amiga. Já!- ele ordenou.
Lena o obedeceu, porque também Suzette agia
de forma estranha. E o vampiro atacou Suzette,
mas então parou.
Ainda não queria mortas aquelas duas.

197
Estranha Sedução Shannon Drake

CAPÍTULO VIII
Grant continuava sentado à mesa, tempos
depois de Jade e Lucien terem ido embora.
Stephanie também se mantivera no mesmo
lugar.
Por fim, ela se levantou e sorriu.
— Tentarei dormir um pouco.
Lucien e Jade eram mentirosos. Tinham de ser.
Dois prestidigitadores salafrários, que mentiam
sem o menor escrúpulo.
Grant respirou fundo. Stephanie tinha razão.
Não haviam descansado nada naquela noite, e
agora o dia começava a nascer.
Haveria muito a se fazer. Era preciso dormir
um pouco.
Antes de ir para o quarto, constatou que
Stephanie trancara a porta da frente. Ao
encontrá-la, ela tentava colocar a cortina no
lugar.
Grant se aproximou de Stephanie e a abraçou
por trás.
Não precisava mais temer Clay Barton...
Porém, um ser maligno retornara à vida por
causa de um terremoto. E, por alguma razão
desconhecida, ele queria Stephanie.

198
Estranha Sedução Shannon Drake

Ela se virou e enlaçou Grant. E o desejo os


dominou.
Despiram-se em instantes e, conforme a
luminosidade do sol inundava o quarto, eles
faziam amor.

— Drew?
Ele abriu os olhos e sentiu um arrepio de medo.
— Quem me chama? — Ao fitar a cama, viu
Doug totalmente refeito. — Olá! Vejo que esta
bem melhor, companheiro.
— Ainda me sinto um pouco esquisito, mas
com uma fome de leão. Amigo, peça que me
mandem um belo bife.
Uma enfermeira entrou naquele momento, e
Drew lhe perguntou se podia trazer comida de
fora do hospital para o amigo.
— Bem, ele não está em dieta especial, pelo
que vejo em sua ficha.
Drew saiu animado, disposto a encontrar o
maior e mais suculento bife do mundo.

Grant dormia e sonhava, dentro de um sonho


agitado. Stephanie sentou-se no colchão, sem
saber o que fazer.

199
Estranha Sedução Shannon Drake

Ele gritava, suando, em meio ao mais terrível


pesadelo.
Assustada, ela o sacudiu com força.
— Grant, Grant! Acorde!
Aos poucos ele foi se acalmando e, por fim,
ergueu as pálpebras.
— Sonhei que estava em uma batalha, nos
arredores do precipício. E havia cachorros
lutando, comandados por François e Valéria.
— Então fiz bem em acordá-lo.
— Não sei, querida. O sonho me pareceu tão
real! Eram muitas as feras e eu lhes decepava as
cabeças. Steph, sinto que você está em perigo,
meu amor.
— Ficou impressionado com o relato de Lucien,
querido, nada mais.
— Você o chama de Lucien e não de Clay.
Percebeu isso? É porque acreditou no que ele
disse. E se acreditou, sabe que está em perigo.
E eu darei minha vida para salvá-la, se for
preciso.
Stephanie se arrepiou.
— Telefone para Reggie, Steph. Temos de
saber se ela também está envolvida nisso. E da
próxima vez que me vir dormindo e sonhando,

200
Estranha Sedução Shannon Drake

não me acorde. Preciso chegar ao fim da batalha


e ver o que acontece.
— Não posso permitir isso, Grant. Não o
deixarei lutar em Uma refrega na qual todos
terminaram mortos. Você pode morrer também!

— Devemos ir ao hospital — Grant resmungou


diante de sua xícara de café, A noite não fora
nada fácil. Primeiro, teve uma conversa com um
vampiro; depois, sonhou que estava em meio a
uma batalha, enfrentando feras assassinas.
— Acha que devemos verificar se Lucien e
Jade estão acordados, Grant? Apesar de que já
são mais de treze horas. — Stephanie hesitou. —
Será que vampiros dormem à tarde?
— Bem, nunca conheci um antes. — Grant
meneou a cabeça em um gesto meio
desesperado. — Será que tudo o que disseram é
verdade?
Stephanie pegou as mãos de Grant cm um
gesto carinhoso.
— Você tem de concordar que coisas
extraordinárias vêm acontecendo por aqui.
— Steph, fico surpreso comigo mesmo, mas
acredito no sujeito. Ou Lucien é de fato o que
proclama ser ou é o maior louco da face da
201
Estranha Sedução Shannon Drake

terra. Venha, vamos dar uma ajuda em Doug. No


Caminho passaremos pejo chalé de Lucien. Se
ele quiser, poderá ir ao hospital conosco.

Foi Jade quem atendeu Grant e Stephanie.


— Lucien Continua dormindo? — Stephanie
quis saber.
— Não, já saiu faz horas. Houve algo de muito
grave. Não sei do que se trata, porém. Quando
ele acorda perturbado, Pode-Se esperar uma
surpresa ruim.
— Grant teve um terrível pesadelo.
Jade olhou Com intenso interesse para Grant.
— Lembra-se do Sonho?
— Quando acordei... ainda podia sentir o cheiro
do sangue. Mas aos poucos a sensação foi
sumindo. Recordo que cavalgava, usando uma
armadura. Foi terrível. Escutei uma risada
horrenda. Pessoas, animais... cadáveres por
toda Parte. E eu sabia...
— Sabia o que, Grant?
— ...que a situação era desesperadora. E que...
— Grant! Isso pode ser importante! — Jade
disse. — Diga, sabia o quê?!
— Que as cabeças tinham de ser decepadas.
Que essa era a única forma de matar François e
202
Estranha Sedução Shannon Drake

os cães demônios. E Valéria. — Ele enfiou os


dedos pejos cabelos. — Pode não ser nada.
Afinal, mexo com esqueletos nas escavações. E,
além do mais, tivemos aquela conversa sobre
vampiros bons e vampiros maus.
— Foi demais para você, não ê? Mas é provável
que seu sonho tenha um significado especial.
— Eu já o tive antes. Só que desta vez foi tão
mais real!
— Então não foi provocado pela conversa que
tivemos.
— Seja lá o que for, não podemos fazer nada, já
que acordei e o interrompi. — Stephanie deu de
ombros. — Bem, estamos lodo para o hospital
para ver Doug.
— Ótimo. Faça com que ele continue a usar a
cruz.
— O quê?! — Stephanie arregalou os olhos.
— Ontem eu e Lucien arranjamos um crucifixo
para Doug. Não deixem que ele o tire.
— Mas... Suzette e eu o tiramos. E que... a
prata estava lhe causando alergia. — Stephanie
temeu ter feito uma grande bobagem.
— Nesse caso, é melhor virem Comigo — fade
murmurou.

203
Estranha Sedução Shannon Drake

Drew retomou ao hospital e, ao entrar no


quarto de Doug, arregalou os olhos e deixou cair
o pacote de comida que trouxera. Ele assistia,
horrorizado, a um homem de idade atacar Doug
com uma faca afiada. Doug recuava, tentando
escapar, mas o velhinho persistia.
Drew surgiu por detrás e forçou o senhor a
soltar a arma.
— Precisamos detê-lo ou ele nos matara a
todos! — gritou o homem.
Nesse momento, Grant, Stephanie e Jade
entraram no quarto.
Stephanie perdeu a fala ao se ver diante do
joalheiro que lhe ofertara o crucifixo.
— Ele me atacou! — Doug apontava para Adálio
Davanti. — Quero ir embora daqui. Se ficar,
acabarão me matando!
— Você não pode sair sem receber alta do
médico — Stephall1e começou a argumentar.
— Quero ir de qualquer jeito. Por favor, ajudem-
me!
Ninguém ousou discordar de Doug.
Em minutos, o grupo deixava o hospital e
entrava no jipe de Grant. Stephanie, porém, quis
ficar para trás.

204
Estranha Sedução Shannon Drake

— Vocês podem ir. Eu quero explicar essa


atitude ao dr. Antinella. Mas levem Doug embora
e o protejam! — E ela correu de volta para o
hospital, para desespero de Grant.

Alguma coisa mudara de maneira definitiva na


noite.
Lucien, parado junto ao precipício, tentava
recuperar as imagens da batalha de séculos
atrás.
O terremoto viera no momento em que Conan
de Burgh tentava evitar que o povo enfurecido
matasse Valéria.
Cerrou as pálpebras e tentou ver mais.
Sentiu a brisa. Por um momento, ouviu o
barulho de espadas se batendo, gritos, relinchos
de cavalos e sons apavorantes emitidos pelas
bestas. O mundo de sua imaginação começou a
tomar forma ali, no vale. Cavaleiros com elmos e
armaduras, espadas cheias de sangue dos
mortos...
E então... as imagens sumiram.
Era como se alguém tivesse entrado em sua
mente e puxado uma cortina, para impedir que
ele visse o que acontecia por detrás.

205
Estranha Sedução Shannon Drake

Praguejando, começou a descer o penhasco. O


amanhecer se aproximava. Era importante
descobrir quem exatamente o impedira de ver.
No entanto, não podia, pois aconteciam coisas
terríveis naquele momento.
Ainda não tinha pistas de como vencer aquela
força que parecia diferente da sua.

Carlo Ponti estava no centro das escavações


com um colega, lendo um texto que conseguira
na Internet, na noite anterior:

E foi assim, na noite de Nosso Senhor, no


dezoito de agosto, no ano 1215, que uma
grande batalha aconteceu. Os mortos
deixaram suas covas, chamados pela própria
noiva do diabo, e a luta transcorreu tão brutal
e violenta que um grande número de
guerreiros ficou estendido sobre a terra como
um enxame de abelhas. Aqueles que estavam
sob o comando de um grande cavaleiro
também pereceram quase todos. Porém, ao
fim do combate, encontraram a vitória,
embora sob tal pesada perda que o grande
líder não a considerou na verdade um triunfo.
E Deus, enfurecido diante de todo o sangue
206
Estranha Sedução Shannon Drake

que correra, comandou que a terra tremesse e


se tomasse o túmulo eterno dos que ali
estavam.

Heinrich, balançou a cabeça.


— Carlo, não há nada de novo nisso. Sabemos
com certeza que aqui se deu o embate, que foi
na verdade um massacre, e temos conhecimento
do terremoto. Afinal, já retiramos daí muitos
esqueletos. — Heinrich estremeceu. — Por
vezes, sinto-me estranho quando a brisa chega e
afasta o calor insuportável.
— Mas estamos deixando passar alguma coisa!
— Carlo rebateu.
Heinrich experimentou um arrepio.
Sentia uma presença estranha naquelas
escavações. E as palavras de Carlo o
perturbavam. O mal existia, e estava ali.
— Vamos voltar ao acampamento. Amanhã
recomeçaremos as escavações quando o sol
surgir. — Ele bateu nas costas de Carlo.
— Procuraremos analisar as palavras do
monge, mas não se esqueça de que monges
sempre falam de anjos e demônios.
— Pois sinto que, quando a lua aparece no céu,
ficamos todos em perigo. Como se o passado
207
Estranha Sedução Shannon Drake

nunca tivesse sido verdadeiramente enterrado e


por isso só quando algo especial vier a
acontecer e que o sossego triunfará.
Heinrich percebeu que uma sombra com a
forma de asas enormes de pássaro parecia se
aproximar e envolver o vale. Notou que estava
suando e sentindo frio ao mesmo tempo.
A respiração se tornou difícil, e o coração
bateu mais rápido.
Aquilo era medo.
— Carlo, retomaremos o texto amanhã — ele
insistiu, largando o colega para trás, tomando a
trilha e procurando chegar ao acampamento,
onde as luzes tinham sido acesas.

Stephanie ficara para trás enquanto o grupo se


apressava para retirar Doug do hospital.
Felizmente ele parecia bem. O que a perturbava
era que justo o homem que lhe entregara o
crucifixo, instantes atrás atacara Doug.
Levou a mão ao pescoço, mas lembrou-se de
que dera a jóia para Suzette.
Por sorte o hospital era pequeno. Por isso não
foi difícil encontrar uma sala com uma placa na
porta com o nome do dr. Antinella.

208
Estranha Sedução Shannon Drake

Ao sair do hospital, ela estava confusa. O jipe


de Grant não se estava nas redondezas. Pensara
que ele levada Doug e os demais para o resort e
voltada para buscá-la.
Pegou o celular e ligou para ele. A ligação,
porém, caiu na caixa postal.
Bem, o resort não ficava longe, portanto,
decidiu caminhar até lá. Talvez não levasse mais
de vinte minutos.
Apressou o passo, notando que a tarde estava
sendo substituída pela noite. De súbito resolveu
que era imperativo chegar antes do anoitecer.
As ruas pareciam estranhamente desertas.
Então lhe ocorreu que deveria estar sendo
realizado o enterro de Maria Alberti e concluiu
que todos deviam ter se dirigido ao cemitério.
Logo avistou o resort a sua frente, e suspirou,
aliviada.
Entrou na área de recepção, mas a encontrou
vazia.
O vento assobiava lá fora e nuvens
começavam a cobrir os últimos raios de sol.
Não havia ninguém na praia.
Tomou a direção que dava para o chalé de
Lena, mas estacou ao ouvir o chamado de
Giovanni:
209
Estranha Sedução Shannon Drake

— Srta. Cahill! Estava a sua procura.


— Algum problema?
— Reggie quer falar com você, mas em
particular.
Stephanie parou, tomada pela surpresa.
— Como assim? Reggie está fora do país,
cuidando de arranjar novos turistas para o
resort.
— Não tem um telefone celular? Por favor,
ligue para ela, sim?
Assim acreditará em mim.
Stephanie tomou a apanhar o celular e, cheia
de dúvidas, ligou para o número de Reggie. No
mesmo instante, uma mulher atendeu:
— Stephanie?
— Sim, sou eu. O que há, Reggie? Giovanni
disse que você quer me ver. Mas... está na
Itália?
— Oh, Steph! Sim, estou aqui desde que
chegaram os turistas para assistir à peça.
Apenas decidi me manter escondida, já que me
contaram que estavam me acusando de ser a
responsável por aquelas mortes esquisitíssimas.
Ouvi comentários de que acham que sou a
culpada por ter montado o espetáculo.

210
Estranha Sedução Shannon Drake

Sim, aquela era Reggie, Stephanie concluiu. E


parecia muito aborrecida.
— Onde você está?
— Giovanni a trará até mim, Steph.
Stephanie procurou lembrar a si mesma que
Reggie era sua parente; mesmo assim decidiu
ser cautelosa:
— Tente entender. Ninguém está bravo com
você. Vou passar pelo chalé de Lena e Suzette.
Por que não vem a nosso encontro?
— Não posso, querida.
— Pois se quiser falar comigo, terá de vir até
aqui - Stephanie falou com firmeza.
Olhou para Giovanni, que parecia muito
perturbado.
— Bem, fiz minha parte. — Com tais palavras,
ele seguiu para dentro do prédio principal do
resort.
Stephanie se apressou para chegar ao chalé de
Lena. Quando ia bater na porta, constatou que
se achava apenas encostada.
Aberta...
Com cautela, empurrou-a e chamou pelas duas.
— Steph! — Lena respondeu. — Entre, entre!

211
Estranha Sedução Shannon Drake

Estava escuro lá dentro, e Stephanie piscou


várias vezes antes de se acostumar com a
escuridão.
Então, viu Lena e Suzette e parou, estarrecida.
Começou a recuar, mas encontrou a porta
fechada.
— Nada disso, Stephanie. Você vai ficar!
Ela reconheceu a voz.
— A hora chegou — ele disse.

CAPÍTULO IX
Maria Alberti foi enterrada em uma cerimônia
emocionante.
— Agora ela estará debaixo de solo sagrado —
Pietro sussurrou para Grant, enquanto o padre
jogava água benta sobre o caixão.
Grant olhou em volta e reconheceu muita
gente.
Mas faltava uma pessoa.
Ansioso, procurou por Stephanie.
— Não vejo Steph, Jade.
— Ela não foi falar com o médico?
— Mas o dr. Antinella está aqui. — Grant ficava
mais preocupado a cada segundo.
Drew se encontrava ao lado de Jade, mas Doug
não.
212
Estranha Sedução Shannon Drake

— Tenho de achar Stephanie! — E Grant se pôs


a correr em direção aos portões do cemitério.
Jade e Drew o seguiram.
— Talvez ela tenha retomado ao hospital,
Grant.
— Para fazer o que, Jade? Todos os médicos e
enfermeiros estão aqui, no cemitério.
Nos portões, Grant estacou de repente.
Lá estava o senhor que tentara matar Doug
com uma faca. Dessa vez, ele empunhava uma
espada. Uma peça trabalhada, historicamente
preciosa.
Davanti ofereceu a espada para Grant,
insistindo para que ele a aceitasse.
— Não posso! - Grant exclamou. — Parece
original. Se não for, então é uma cópia perfeita.
— Aceite-a — Jade aconselhou diante da
insistência do joalheiro e de um pensamento que
invadiu sua mente. — Vai precisar dessa espada,
Grant.
Ele não ousou duvidar de Jade, e apanhou a
arma. Sem demora, começou a correr em
direção ao hospital.
— Grant, espere! — Jade gritou.
Ele parou irritado e olhou para trás.

213
Estranha Sedução Shannon Drake

— É tarde demais. Você ainda não entendeu?


Ele a pegou.
— Do que está falando? Quem pegou Steph?
— François de Venue. E é por isso que irá
precisar da espada.

Stephanie podia sentir o cheiro de sangue


vindo do chão onde Lena e Suzette estavam. Ao
lado das duas, havia um outro corpo.
O de uma criada, Stephanie reconheceu.
Lena e Suzette tinham se voltado para o lado
do mal, e agora faziam suas próprias vítimas.
E para piorar sua situação, Doug bloqueava a
porta.
— Chegou a hora para o quê? — ela questionou,
procurando não se mostrar apavorada. — Temos
de buscar ajuda, e depressa.
— Não você tem de vir comigo, Stephanie.
— Para onde, Doug? — Tentava manter a
calma, pois Reggie devia estar a caminho, e a
ajudaria.
— É hora de ir — Doug repetiu.
Stephanie o encarou. O ator que dias antes
tivera um excelente desempenho na peça havia
se tomado um vampiro.
— Aonde devo ir, Doug?
214
Estranha Sedução Shannon Drake

— Siga-me.
Criando coragem, ela conseguiu passar por
Doug e correu para o lado do mar. Recordou que
Lucien temia o mar. Afinal, não ficara com
aquelas queimaduras no braço?
Ela, porém, não conseguiu alcançar as águas.
Um homem lhe surgiu à frente e a dominou.
— Você! — ela exclamou.
— Achou que por ser François de Venue eu me
apresentaria como um homem poderoso? — Ele
riu. — Mas agora tudo voltará ao normal. Você se
encontra em meu poder, e juntos dominaremos o
mundo.
Stephanie tentou lutar, mas foi inútil.
Era uma batalha perdida.

— O que você quer dizer com "é muito tarde"?


Não pode ser! — Grant agarrou Jade pelos
braços e a sacudiu.
— Do que vocês dois estão falando?! — Drew,
ao lado deles, ergueu os braços, confuso.
— Poucas palavras: Jade o colocou a par de
tudo. Apesar de a história ser absurda, Drew a
aceitou como se fosse normal estar ao lado de
vampiros e prestes a participar de um confronto
de morte.
215
Estranha Sedução Shannon Drake

— Temos de chegar logo ao resort. Mesmo que


não possamos dominar Doug, talvez ainda
tenhamos chance com Lena e Suzette.
— Meu Deus, todos os meus amigos! — Drew
colocou as mãos na cabeça, desesperado, e
entrou no jipe com Grant e Jade.
Ao chegarem ao resort, passaram primeiro no
quarto de Jade.
Ela precisava se munir de algumas peças
importantes, fora o que dissera. Pegou vidros de
água benta, crucifixos de prata e estacas de
madeira.
— Ora... seu marido não é um vampiro.
— Mudamos de lado, Grant, você já sabe disso.
Sem perda de tempo, correram para o chalé de
Lena, mas, antes deram com Reggie junto à
porta.
— Grant! Ainda bem que você está aqui. Tem
de salvar Stephanie!
— Foi você quem a atraiu para cá, Reggie. Por
quê?
— Porque, na verdade, essa mulher é Valéria —
Jade murmurou, com suavidade. — É preciso
imobilizar Lena e Suzette. — Lucien acabara de
entrar no chalé. — Jade, trouxe o necessário?

216
Estranha Sedução Shannon Drake

— Elas se transformaram em vampiras? —


Drew quis saber.
— Apenas estão sob má influência. Jade,
vamos amarrá-las. Passe-me as amarras com as
cruzes. Você me ajuda, Drew?
— Pode apostar que sim!

Stephanie acordou sentindo frio.


O instinto a alertou que estava em perigo.
Abriu os olhos bem devagar e aos poucos
constatou que devia estar em uma caverna.
— Você despertou!
Ao se voltar, ela deparou com um homem
sentado em uma espécie de trono medieval,
usando um manto enorme e negro.
Cerrou as pálpebras, tentando se convencer de
que aquilo não passava de um sonho. Ao tomar a
abri-las, contudo, a visão continuava.
— Giovanni...
— Por favor, chame-me por meu verdadeiro
nome: François. Conde François de Venue, se
quiser ser mais formal. Mas eu a deixarei me
tratar por François.
Stephanie foi se levantando e procurando
movimentar as pernas. A cabeça doía.

217
Estranha Sedução Shannon Drake

— Bem, quer dizer que não estou sonhando. E


você é o tão temido senhor que morreu em
combate neste lugar. Raptar-me não fará com
que eu lhe arranje um papel em minha próxima
peça.
— Ei! Não perdeu o senso de humor, pelo que
vejo, minha cara! Mas não vamos encenar uma
espetáculo teatral esta noite. — François
esboçou um sorriso perverso.
— E o que irá acontecer?
— Hoje concluirei o que devia ter terminado
séculos atrás.
— E isso significa que...
— Vamos lutar de novo.
— Quem?
— Eu, com você ao meu lado, contra Conan de
Burgh.
Stephanie meneou a cabeça.
— Conan de Burgh faleceu na noite em que o
mandou para o inferno, François.
François de Venue sorriu de novo. Serviu-se de
um cálice de vinho e tomou a se sentar.
— Como pode ver, não fui mandado para o
inferno.
— Muito bem. Então lutaremos. Quem é Conan
de Burgh?
218
Estranha Sedução Shannon Drake

— Steph, uma garota inteligente como você


ainda não sabe? É o homem que a seguiu, como
antes seguia Valéria.
— Refere-se a Grant?
— Enfim colocou sua inteligência para
funcionar!
— Não sou Valéria, e ele não é Conan. Tenho
uma história pessoal, e não fui desenterrada
deste vale. Nem Grant. Nós temos trabalhado
juntos por muitos anos. Lamento, mas você se
enganou.
— Óbvio que você não é Valéria. Neste
momento, Valéria está com seus amigos.
Stephanie sentiu um frio lhe percorrer a
espinha.
— É Reggie?
— Sim! E ela não foi soterrada e viveu muito
bem por séculos, devido ao poder que eu lhe
conferi.
— Que poder é esse?
— Reggie é uma vampira, Stephanie. Eu mesmo
a transformei.
Tem poderes incríveis e me obedece sem
hesitar.
— Como isso aconteceu?

219
Estranha Sedução Shannon Drake

— Valéria tinha poderes especiais, pois era


descendente de mulheres curandeiras. Envolveu-
se com Conan de Burgh e se apaixonou, mas eu
a encontrei e usei de meus poderes para separá-
los. E a coloquei ao meu serviço.
François se aproximara de Stephanie enquanto
lhe narrava a história. Sentou-se ao lado dela,
que precisou se esforçar para não mostrar todo
o nojo que sentia por ele.
— Continuo confusa. Você mesmo disse que
Conan de Burgh morreu.
— Isso é verdade.
— Mas então...
— Ele está de volta. Sua alma reencarnou
como Grant Peterson. Eu soube disso no minuto
em que abri os meus olhos depois de meu longo
sono, quando retomei ao mundo mais uma vez. E
soube que nos confrontaríamos novamente. Foi
fácil identificá-lo. Bastou ver o quanto você
estava apaixonada por ele.
Stephanie respirou fundo procurando não se
desesperar. Se François pretendesse matá-la, já
o teria feito.
— Bem, então Grant é a reencarnação de
Conan de Burgh. Você e François de Venue.

220
Estranha Sedução Shannon Drake

Reggie é Valéria... Onde eu me encaixo nisso


tudo?
— Ainda não sabe?
— Perdoe-me por ser tão lenta.
— Havia uma filha.
— Uma filha?
— E a filha teve uma filha, que teve uma filha,
e... Entendeu aonde quero chegar?
— Sou descendente de Valéria?
François fez que sim.
— Quando transformei Valéria em vampira, ela
não queria esse destino para a filha. Assim eu
lhe jurei que a criança não seria tocada. Sou
uma criatura poderosa.
— Mas você ainda tem Valéria. Por que
necessita de mim?
— Digamos que você seja uma espécie de
garantia.
— E por que estou aqui?
— Porque Conan terá de fazer uma escolha
mais uma vez.
— E qual é?
— A vida dele pela sua.

Grant pegou Reggie pelo braço e a arrastou até


perto de Lucien.
221
Estranha Sedução Shannon Drake

— Esta aqui é Reggie. Tenho de descobrir o


que ela sabe. Jade disse que ela é Valéria. Isso
é verdade?
— Então, Valéria, cá estamos nós. — Lucien
respirou fundo. — Temos muito o que conversar,
não é?
— Não há tempo para isso! — Grant o encarou.
— Precisamos resgatar Stephanie!
— Você terá de esperar — Lucien afirmou.
Grant passou as mãos pelos cabelos. Como
confiar em Lucien? Afinal, ele era um vampiro!
— Quer dizer que você é a famosa Valéria... E
François é...
— Giovanni.
— O rapaz que carrega as malas — Drew
murmurou, estupefato.
— Você me reconheceu, Reggie? — Lucien quis
saber.
— Desconfiava de que um de vocês fosse
especial. Sabia que você existia e, claro, tinha
sua própria força. E tinha consciência de que
François despertara. Ele me falou que manteria
o povo a salvo se eu trouxesse Conan de volta.
Assim, arranjei um trabalho para Steph. Você
tem de me compreender... Não podia deixá-la
sozinha nos Estados Unidos. François a
222
Estranha Sedução Shannon Drake

encontraria, e Steph não teria ninguém que a


protegesse. E sou uma vítima nessa história
toda. François mentiu para mim, usou-me, e tudo
o queria era Stephanie. Mas posso ajudar vocês,
estão me ouvindo? Eu conheço François, sei o
que ele pretende!
— Eu também. — Lucien se virou para Grant. —
Terá de vencê-lo outra vez. E agora não poderá
falhar em destruí-lo.
— Quero ajudá-lo, Grant! Adoro Stephanie e
assim...
— Não podemos confiar em você. Valéria —
Lucien a interrompeu. — Foram seus poderes
que me impediram de identificar François. Você
o protegeu.
— Mas eu nem sabia quem você era! — Ela se
voltou para Grant. — Por favor, pode ser que
você não consiga salvá-la sem minha ajuda!
— Isso é verdade, Lucien?
— Bem, Valéria sempre teve poderes, Grant, e
protegeu os maus. Agora quem sabe acaba nos
protegendo...
Grant tinha de se decidir, e logo.
Já era amigo de um vampiro. Poderia agora
contar com a ajuda de uma bruxa?

223
Estranha Sedução Shannon Drake

— Lua cheia — Lucien murmurou. — A hora


chegou. Valéria, use uma cruz, se quiser nos
acompanhar.
Ela hesitou por um momento, depois aceitou o
crucifixo.
Então, todos ouviram um barulho estranho do
lado de fora do chalé. Grant abriu a porta e
arregalou os olhos.
Os moradores estavam todos ali, empunhando
tochas, facas de cozinha e estranhas armas
medievais, pelo jeito tiradas do museu.
E lá estava o joalheiro, Adálio, magro e frágil,
segurando com firmeza um machado.
— A hora chegou - ele anunciou, alto e claro.
Grant olhou em torno. Havia gente a cavalo,
como os policiais Merc e Franco. Vieram
também os garçons do clube e do restaurante,
bem como empregados do hospital e
fazendeiros.
Lucien se dirigiu a Grant.
— Hoje serei seu escudeiro. — Olhou então
para a esposa. — Jade?
— Impedirei que Lena e Suzette se libertem e
ajudem François.
— É sua vez, então, Grant.
— A espada está no carro, Lucien.
224
Estranha Sedução Shannon Drake

— Peça a alguém para buscá-la.


Saíram do chalé, e a multidão os deixou
passar. Alguém estendeu a Grant uma armadura,
depois outra a Lucien e a Drew.
Merc trouxe a espada para Grant.
— Juro que lutarei ao lado de vocês.
Grant ouviu a voz de Reggie, mas ela
simplesmente desaparecera.
— Valéria é uma bruxa — Lucien o lembrou. —
Para o bem ou para o mal, é parte desta batalha,
e ao fim saberemos a verdade.
— Ao fim?! — Drew fez um esgar.
Trouxeram um cavalo para Grant, enorme e
negro. Ele montou com facilidade e o incitou
para as colinas.
— A hora chegou! - Adálio bradou mais uma vez
o grito de batalha.
Foi então que um som se fez ouvir, como se os
demônios do inferno tivessem sido acordados.
— Os cães demônios — Lucien disse.
Cada fio de cabelo de Grant ficou em pé. O
ruído era arrepiante, aterrador.
Fez o cavalo sair a galope. Stephanie estava
lá, em algum lugar das colinas.

225
Estranha Sedução Shannon Drake

— Pode me matar agora. — Stephanie olhava


com frieza para François, sentindo-se forte e
confiante.
— Quer que eu a mate agora, minha querida
menina? Por que eu o faria justo quando preciso
que você chame os cães do inferno.
— Por que eu faria isso? Por acaso já estou
morta?
François meneou a cabeça, divertido.
— Ainda não, meu benzinho. Tenho planos, e
quero você acordada. Deve ser tão poderosa
quando Valéria foi um dia. Eu a provoquei em
seus sonhos assumindo a forma de seu amante,
e mesmo assim você sabia que não era ele.
Stephanie rememorou os sonhos, mas a figura
de Grant se sobrepôs a eles.
Grant... Belo, forte, os olhos escuros cheios de
paixão. Agressivo e terno na arte de amar.
Ela o amava e sempre o amaria.
— Pensando em seu querido, não é? Mas você
será minha. Ainda não lhe tirei sua vida mortal,
mas bastará tomar seu sangue para que comece
a me obedecer. Agora... chame os cães
demônios.
— Nem imagino do que está falando...

226
Estranha Sedução Shannon Drake

François se ergueu, irritado, ao sentir que


alguém entrava na caverna.
Era Doug, que fitou Stephanie e sorriu de leve.
Talvez algo naquele olhar tivesse aborrecido
François, porque ele perdeu a paciência.
— Ela já chegou?
— Ainda não, meu senhor.
Stephanie não conseguia acreditar no que
ouvia. Doug chamava François de "meu senhor"!
— Você também me chamará assim! - François
exclamou lendo seus pensamentos, e a sacudiu
com fúria. - Chame os cães! Você tem esse
poder! Pense nos lobos, ouça como choram nas
montanhas... pense nos cadáveres que estão
enterrados sob a terra.
Aqueles que estiveram aqui um dia deverão
voltar!
Stephanie continuava imóvel.
— Os cães demônios. Eu os quero agora!

Era como Grant sonhara. Ele e todos os demais


percorreram a distância que separava a costa da
montanha, alguns a pé, outros cavalgando. E
junto deles seguia o padre. O sacerdote
abençoara também todos os que lutariam
naquela batalha.
227
Estranha Sedução Shannon Drake

Ouviram-se os cães demônios, mas ninguém


recuou.
— Acredito que essas bestas sejam os corpos
dos mortos que praticavam o mal — Lucien
disse. — Você deve decepar-lhes a cabeça,
Grant.
Prosseguiram o caminho, e alcançaram o local
das escavações. Fora naquele exato lugar que
se dera a batalha, séculos antes.
Conforme se aproximavam, o vendo foi se
tomando mais forte mais frio e mais estranho.
Uma neblina começou a cobrir toda a área.
Podiam-se ouvir gritos e gemidos, e o grunhido
dos cães.
O acampamento estava sob ataque, Grant
compreendeu.
Viram então as tropas de François de Venue
emergindo da neblina, formando uma linha de
combate. Grant avistou Doug à direita de
François, e Reggie à esquerda. Pietro estava do
lado do mal assim como Stephanie, seus cabelos
caindo sobre os ombros os olhos azuis brilhando
como em estado de transe. E... no entanto...
Grant conseguiu notar as lágrimas dela.

228
Estranha Sedução Shannon Drake

E tudo pareceu voltar no tempo. Agora já não


era mais Grant, mas Conan. Não era mais
Reggie, mas Valéria.
— Deixe-a ir!
— Se quiser sua mulher, terá de morrer, Conan!
— François respondeu. — Esta é a noite em que
você morrerá!
— Então nos encontraremos no inferno,
François. Na verdade, se for preciso, nós nos
encontraremos lá.
— Agora! — François gritou para Stephanie. —
Comande os cães!
— Stephanie! — Grant berrou, sua voz soando
acima dos grunhidos dos cães.
A luta teve início, feroz e brutal. Grant
enfrentou uma fera e cortou-lhe a cabeça. O
corpo que caiu no chão não era o de um animal,
de um cão, lobo ou grande felino. Era humano.
Um cadáver saído do túmulo graças à bruxaria.
— As cabeças! Cortem as cabeças! — Grant
bradava para seu exército.
— Mande Stephanie devolver as bestas para o
fundo da terra. — Lucien olhava para Grant com
firmeza. — Ela pode não ter convocado os cães
demônios, mas tem força para mandá-los
embora.
229
Estranha Sedução Shannon Drake

— Stephanie! Pelo amor de Deus, mande os


cães embora!
— Entregue sua arma — Drew comandava Doug
naquele momento.
Grant viu que Doug não teria misericórdia e
mataria Drew sem hesitar. Assim, aproximou o
cavalo e com um golpe certeiro derrubou Doug.
E sentiu como se alguém o tivesse golpeado
por trás. Voltou-se com fúria, mas não encontrou
ninguém. Seu elmo fora arrancado de sua
cabeça.
Enfim, viu quem o atacava: Valéria.
Ela gritava, tomada pela ira, usando uma
espada para combatê-lo. Sem dificuldade,
conseguiu derrubá-lo.
Ela ergueu as mãos para os céus, e ele ouviu o
grunhir dos cães demônios.
— Não! — Grant segurou o crucifixo em seu
pescoço e nem sequer tentou pegar sua arma.
Apontou a cruz para Valéria e a pressionou em
sua testa.
Ela gritou, com fúria e dor, mas caiu de
joelhos.
Encarou Grant...
E então ele soube. Viu o que devia ter visto
séculos atrás: o ar de triunfo. François não era o
230
Estranha Sedução Shannon Drake

responsável por toda a maldade que Valéria


praticara. Ele lhe dera maiores poderes, e ela
adorara usá-los. Para o mal.
— Conan! — Valéria temia o que ele poderia lhe
fazer.
O chamado o deteve apenas por um momento.
Ele viu de novo a transformação no olhar de
Valéria e o mal invadir suas belas feições.
Um sorriso...
Que desapareceu porque Grant fez o que
Conan deveria ter feito.
E a cabeça de Valéria rolou, solta de seu
corpo.
Agora faltava enfrentar François e resgatar
Stephanie.
Nesse momento, o povo apontou para
Stephanie e todos começaram a gritar:
— Ela é o mal!
Grant não hesitou, e em um desesperado gesto
enfrentou o homem que segurava Stephanie. Era
Pietro, que caiu sob a força de sua espada.
— Fique atrás de mim — ele pediu a Stephanie.
François desaparecera, e tudo o que podiam
ouvir era sua risada.
— Stephanie, você precisa sair daqui.

231
Estranha Sedução Shannon Drake

— Não posso... Só eu tenho o poder de torná-lo


visível para você. Grant! Meu Deus, ele está
atrás de você!
Grant pulou de lado e visualizou uma sombra
que logo começou a desaparecer. Antes que
sumisse por completo, Grant usou a espada
contra o que seria François.
François de Venue perdera mais uma vez a
luta.
Stephanie caiu, primeiro de joelhos, depois
estendida na terra.
O vento cessou naquele segundo.
O barulho de metal dos escudos e espadas
parou.
O som dos grunhidos dos cães demônios não
foi mais ouvido.
— Stephanie! — Grant gritou a seu lado.
E foi então que a terra pareceu ganhar vida e
se mover...
Era hora de sair dali. Com Stephanie nos
braços, Grant a levou para fora da área de
combate.
A cada passo, mais a terra cedia.
E então, ele sentiu que caía e a escuridão o
invadiu.

232
Estranha Sedução Shannon Drake

O terremoto que atingiu a área foi quase tão


forte quanto o que devastara a região tantos
séculos antes. E, infelizmente, o número de
mortos não foi nada pequeno.
Foi isso o que Grant soube quando acordou,
dias depois, com uma sensação estranha. Muito
estranha. E acordou com fome e cheio de
energia.
Quando começou a se levantar, viu que estava
na cama, ao lado de Stephanie.
— Como se sente, querido? Do que se lembra?
— Quando caí... eu tinha você em meus braços.
Vi um clarão e achei que flutuávamos. Depois
veio a dor, e então...
— Sim?
— Eu acordei.
— Também tive esse sonho.
— Sério?
— Hu-hum... A luz, o flutuar, as nuvens. Acordei
antes de você.
Grant olhou em torno.
— Valéria... ou melhor, Reggie está morta.
— De fato. E também Pietro. E François.
Destruídos para sempre.

233
Estranha Sedução Shannon Drake

— Por que me sinto esquisito, Steph? Devíamos


estar em um hospital, mas em vez disso sinto-
me tão cheio de energia!
— Não sei explicar a razão de estarmos tão
bem.
— Mas talvez eu possa, sabia?
— Ah, é?
— Penso que deveríamos ter sido enterrados
pelo terremoto.
— Mas não fomos? Por quê?
— Por causa do destino, que, segundo Lucien
me disse, pode ser mudado.
— E o que isso significa?
— François teve a chance de reviver. Assim
outros mais seriam mortos. Entretanto, nós
triunfamos.
— Ainda não entendo o que você está dizendo.
— Temos alguns amigos que são... diferentes.
— Sim?
— Podemos ser diferentes também, não acha?
Stephanie arregalou os olhos.
— Quer dizer que... talvez eu seja uma espécie
de feiticeira e tenha meus poderes?
— Talvez sim. Mas me diga, está com fome? Eu
estou faminto.

234
Estranha Sedução Shannon Drake

Stephanie se jogou nos braços de Grant,


encontrando os lábios dele e saboreando-os,
perguntando a si mesma como duas pessoas que
quase haviam sido enterradas vivas poderiam
ser tomadas por um desejo sexual tão urgente.
— A comida pode esperar... — Grant murmurou
e tornou a beijá-la.
E mais outra e outra vez. Logo faziam amor
com fúria e também com imensa ternura.
Era o destino.

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