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Ele é gelo...
Ela é fogo...
Gillian Shaw sofreu muitas tragédias em sua vida muito curta, mas
nada poderia ter preparado a frágil humana para sua transição para a
imortalidade. Para viver para contar a história, ela devria casar com um
monstro com chifres que tanto a intriga quanto a assusta... e transformá-
la na rainha guerreira que ela nasceu pra ser.
1 Do Inglês, pecado.
Mate um homem, adquira a magia dele. Um conto tão antigo quanto o tempo.
Com um rugido, Puck o Invicto balançou um par de espadas curtas em seu
último oponente, o rei do Clã Walsh. Uma lâmina encharcada de sangue cortou o
peitoral de metal do homem, deixando-o de joelhos; outra cortou sua garganta da
frente para trás.
Não é páreo para um príncipe Connacht. Quem é?
O rei ofegou com choque e dor, depois gorgolejou quando uma maré vermelha
escorreu pelos dois lados de sua boca.
— P-por que?
Sem esforço, Puck se transformou em sua aparência normal, deixando que o
rei visse o verdadeiro semblante daquele que o superava.
— Meu irmão envia seus cumprimentos — Puck torceu as lâminas e disse: —
Que você possa descansar em pedaços.
O rei ficou boquiaberto, dando seu último suspiro sibilante antes de ficar em
silêncio, com a cabeça pendendo pra frente. Puck arrancou as espadas e o corpo
desabou no chão, atirando areia.
Na guerra, havia apenas uma regra: vencer, qualquer que fosse o custo.
Os soldados de Walsh recuavam em uma corrida frenética.
Uma névoa escura e brilhante se levantou do cadáver do rei e vagou até Puck.
Magia potente aderiu às runas marcadas em suas mãos — símbolos dourados que
se estendiam das pontas dos dedos até o pulso. Puro poder. Intoxicante. Não havia
coisa melhor.
Sua cabeça zumbiu, o sangue em suas veias esquentou e borbulhou. Por
causa da magia, sim, mas também porque se sentia triunfante. Numa fração de
segundo, a mais nova guerra em uma longa série de guerras terminou, e os
Connachts venceram.
Puck manteve sua posição no centro do campo de batalha encharcado de
sangue. As dunas de areia se estendiam até onde os olhos podiam ver, quebradas
pelo ocasional oásis com árvores imponentes e lagoas cristalinas. Os sóis gêmeos
do reino haviam desaparecido a muito tempo do horizonte. A noite reinava, o céu
da mesma cor das amoras criando um mar infinito de vermelho púrpura escuro.
Nenhuma estrela brilhava hoje à noite.
Seus olhos se fecharam enquanto saboreava a vitória. As chances contra ele
eram enormes, com um exército inimigo com mais que o dobro do tamanho do seu.
Então, ontem à noite seu irmão Sin sugeriu que Puck entrasse no acampamento
inimigo, matasse um comandante de Walsh, queimasse o corpo — e tomasse o seu
lugar. Não facilmente feito, mas de qualquer modo executado.
Em seu novo disfarce, Puck instruiu os soldados para "emboscarem" os
Connachts e finalmente levou todo o exército para uma armadilha. De lá, chegar
até o rei foi brincadeira de criança.
Sin podia olhar para qualquer situação — qualquer homem — e de alguma
maneira discernir cada fraqueza escondida.
Puck às vezes se perguntava quais fraquezas seu irmão percebia nele. Não que
isso importasse. Sin só procurava protegê-lo, fazendo qualquer coisa, tudo, para
garantir que ele vencesse cada batalha.
Juntos, eles desafiariam a profecia falada a respeito deles quando crianças.
Um irmão matar o outro? Nunca! Puck e Sin governariam os cinco clãs juntos, e
nada se interporia entre eles.
Um vínculo tão forte quanto o deles nunca poderia ser quebrado.
Quando um vento frio cuspiu areia, Puck abriu os olhos. Apesar da
temperatura gelada, ele irradiava calor, adrenalina nas veias. O suor se misturava
ao sangue dos vencidos respingado em seu torso, escorrendo de cada curva de
músculo.
Ao longe, alguém gritou:
— A vitória é nossa!
Outros gritos seguiram.
— A magia de Walsh é nossa!
— Nós vencemos, nós vencemos!
Vivas jubilantes aumentaram, um coro familiar. Ele treinava, sofria e sangrava
com — e para — esses homens. Para Puck, lealdade era muito mais preciosa do
que ouro, diamantes ou até magia.
— Voltem ao acampamento — ele gritou. — Comemorem.
Em uníssono, os soldados avançaram em direção ao acampamento logo depois
das dunas — um sub-reino escondido dentro de um reino, oculto pela magia de
Sin.
Puck embainhou suas espadas e pegou a lâmina do rei, o troféu perfeito. O
orgulho erguia sua cabeça enquanto seguia seus homens pelo campo de batalha.
Mais cadáveres e um excedente de membros decepados cobriam o caminho, o ar
saturado com o cheiro acobreado de sangue e o fedor de tripas esvaziadas.
Carnificina nunca o agradou. Mas também nunca o incomodou.
Ele se recusava a fugir da violência. Ameace o seu povo e sofra. O dia em que
mostrasse misericórdia seria o dia em que condenaria seu clã à escravidão ou à
morte.
Permanecendo nas sombras, Puck deslizou através de uma entrada invisível
acessível apenas para as pessoas que tinham sido marcadas com a magia de
Connacht. Para qualquer outra pessoa, a entrada permanecia fechada; por muitas
vezes homens, mulheres e crianças passavam sem nunca saber que uma sub-
dimensão existia a mera distância de um braço.
De repente, tendas, brasas ardentes, soldados e suas mulheres o cercavam.
O mau cheiro da morte evaporou, substituído pelo aroma de carne assada, trabalho
árduo e perfume doce.
Uma serva avistou Puck e cobriu a distância, interesse brilhando em seus
olhos.
— Olá, Alteza. Se precisar de companhia esta noite...
— Deixe-me interrompê-la aí mesmo. Eu nunca volto para uma segunda vez.
— Ele nunca esquecia um rosto também, e se lembrava que havia possuído aquela
mulher ano passado.
Antes de subir na cama com uma mulher, certificava-se que ela entendesse
sua política de só uma vez e pronto.
Decepção sombreou a expressão dela.
— Mas...
Já tendo acabado com a conversa, esquivou-se dela e foi até as margens do
acampamento, onde ele e Sin ergueram uma tenda. Uma ação fria de sua parte,
sim, mas necessária.
Puck não era como outros da realeza. Enquanto a maioria dos príncipes
mantinha um “haras” e viajava com suas “potras” mesmo durante os tempos de
guerra, Puck se recusava a dormir com as mesmas mulheres duas vezes. Não podia
arriscar promover um relacionamento romântico com alguém. Um laço romântico
despertaria a esperança de um casamento. Sem casamento, sem rainha amorosa.
Sem uma rainha amorosa, a profecia não seria cumprida.
Contudo, verdade seja dita, Puck adorava tudo na “suavidade feminina” a que
tinha sido negado a maior parte da sua vida. Ele amava beijar, tocar e a construção
da antecipação. Corpos suados se esfregando juntos, criando atrito. Gemidos,
grunhidos e suspiros ofegantes em seus ouvidos. A felicidade de finalmente se
afundar dentro de sua amante.
Às vezes, algumas horas na cama de uma estranha apenas estimulavam seu
apetite...
No fundo, ele tinha um desejo secreto e vergonhoso de manter uma mulher só
para si, de aprender cada pequeno detalhe do seu passado, todas as suas
esperanças e sonhos. Ele sonhava em passar semanas, meses, anos mimando-a e
somente a ela, deixando sua marca dentro e fora dela. Sendo marcado por ela.
Ele ansiava em ter uma "minha".
Talvez um dia pudesse.
Não, nunca. Sin vinha antes das mulheres, sempre. Sin vinha antes de tudo.
Esta noite, os irmãos revisariam os sucessos e falhas da batalha. Eles
beberiam, ririam e planejariam seu próximo passo, e tudo ficaria bem no mundo
de Puck.
Uma videira espinhosa rodeava e protegia sua tenda, ninguém capaz de entrar
ou sair sem sua permissão. Desencadeando uma espiral de magia, forçou as
videiras a se separarem e entrou.
Quando seu irmão apareceu a vista, afeição socou Puck no meio do peito.
Apesar de compartilharem a mesma pele escura, olhos escuros e cabelo ainda mais
escuro, o mesmo nariz aquilino e lábios implacáveis, os traços de Sin formavam
um quadro mais suave. Em várias ocasiões, Puck foi informado de que seu rosto
parecia "esculpido em pedra".
Sin passou a andar, aparentemente alheio ao mundo.
— O que o incomoda? — Os dedos de Puck apertaram em volta do punho da
espada.
Seu irmão nunca havia andado de um lado para o outro... até recentemente.
Um mês atrás, ele participou das negociações de paz com um reino vizinho e
retornou... mudado. De calmo a paranoico, de certo a inseguro.
Ele disse a Puck que acordou na última manhã e encontrou seu exército
assassinado. Ele ficou entre a carnificina, o único sobrevivente, sem memória do
que tinha acontecido. Agora não conseguia dormir, assustado com movimentos e
ruídos repentinos, e olhava as sombras como se alguém estivesse escondido entre
elas. Ele não visitava seu estábulo e se recusava a tirar a camisa durante o
treinamento.
Puck suspeitava de novas cicatrizes no peito de seu irmão. Será que ele achava
que os outros o considerariam fraco se as vislumbrassem?
Se alguém dissesse uma única palavra contra ele, esse “alguém" morreria.
Sempre que Puck expressava preocupação, Sin mudava de assunto.
Sin parou diante da fogueira crepitante, o olhar encontrando Puck antes de
se desviar.
Gradualmente Sin relaxou, até sorrir com um sorriso familiar que só Puck
tinha o privilégio de ver.
— Você demorou para voltar ao acampamento. A velhice está te atrasando?
Ele bufou.
— Você é apenas dois anos mais novo. Talvez devêssemos trocar de lugar na
próxima guerra. Eu planejo, você luta.
— Você esquece que eu o conheço melhor do que você a si mesmo. A
preocupação com a minha segurança o levaria direto para o meu lado.
Sin não estava errado.
Seu irmão saberia se virar em uma luta, qualquer que fosse a arma. Não havia
alguém igual a ele, exceto Puck. Mas se algo lhe acontecesse...
Eu queimarei este reino inteiro.
Puck foi até a bacia de água no alto de seu arsenal de viagem. Depois de
colocar a espada de Walsh de lado, ele lavou a sujeira da noite.
— Quando éramos crianças, você se preocupava comigo — disse ele, secando
o rosto com uma toalha. — O que aconteceu?
— Você aprendeu a usar a espada — Sin esfregou as têmporas, como se
odiasse os pensamentos que rodavam sua mente.
Ele precisava de uma distração.
— Vamos começar nossa revisão da batalha?
— Ainda não. Eu trago notícias — Segundos se passaram, cada um crepitando
com tensão.
Puck enrijeceu.
— Conte-me.
Com os olhos austeros, Sin disse:
— Nosso pai anunciou seu noivado com a princesa Alannah de Daingean.
Primeira reação de Puck: vou ter uma esposa. Ela será minha!
Então ele franziu o cenho. Deve proceder com cautela. Desde muito cedo, viu
o mundo ao seu redor através de um filtro quase ofuscante: MEU irmão, MEU clã,
MEU reino.
Ele tinha visto Alannah apenas uma vez, e embora gostasse da sua aparência,
não se dignaria a se deitar com ela, muito menos se casar com ela. A tentação não
podia ser favorecida, mesmo no mais leve sentido.
No entanto, compreendia a preocupação de Sin. O Rei, em vez de utilizar a
primogenitura, decidia um sucessor. A menos que o Rei se recusasse a fazer uma
seleção, é claro, então o guerreiro mais forte levava a coroa. Mas com aquele
anúncio, o rei Púkinn III tinha feito sua escolha.
— Pai falou sem pensar — disse Puck. — Não me casarei com ninguém. Você
tem minha palavra.
— Este é um movimento político destinado a solidificar a aliança entre nossos
clãs, mas... a profecia... — A voz de Sin foi perdendo a força. — Um se tornará rei
com uma rainha amorosa ao seu lado, e matará o outro. Os oráculos nunca estão
errados.
— Há uma primeira vez para tudo — Ele fechou a distância para emoldurar
as bochechas de seu irmão com as mãos. — Confie em mim. Um casamento nunca
acontecerá. — Nenhum dos dois se casaria, e a profecia continuaria sem ser
cumprida. — Eu escolho você, irmão. Eu sempre escolherei você.
Sin continuou tão inflexível quanto o aço.
— Se você se recusar, vai insultar os daingeanos. Outra guerra ocorrerá.
— Outra guerra está sempre acontecendo. — Cada clã coletava magia dos
homens que matavam, desesperados para possuir mais do que os outros.
Magia era força, e força era magia.
Sin se afastou de Puck para passar dois dedos na barba escura de sua
mandíbula.
— Ao casar com Alannah, você vai unir os clãs como sonhou. Connacht,
Daingean, Fiáin, Eadrom e Walsh.
Como ele poderia fazer seu irmão entender? Sim, ele sonhava em unir os clãs.
A guerra acabaria por fim. Vidas seriam salvas. A paz reinaria. Amaranthia
floresceria, as terras não mais devastadas por batalhas quase constantes.
Mas um acordo sem Sin significaria menos que nada.
— Nada importa mais do que você — disse ele. Séculos atrás, havia doze clãs.
Agora, por causa de reis e exércitos ávidos por magia, apenas cinco permaneciam.
Se algo não fosse feito, toda a população morreria. — Não para mim.
— Você não está ouvindo — insistiu Sin. — Daingean agora se alia a Fiáin.
Com seu casamento com Alannah, Connacht vai se aliar com Daingean, então Fiáin
será forçado a ficar ao lado de Connacht. Quando isso acontecer, Eadrom, que
atualmente é aliado de Fiáin, terá que romper sua aliança com Walsh para manter
a paz conosco. E eles vão. Eles não têm laços familiares com Walsh. E agora que o
atual, ou melhor, o ex-rei de Walsh está morto, o novo governante tem uma conta
limpa conosco.
— Eu não me importo — disse ele com uma sacudida de cabeça. — O preço é
muito alto.
Silencioso, Sin o estudou do jeito que frequentemente estudava seus mapas
favoritos. A tristeza escureceu seus olhos, até ser extinta pela determinação. Ele
assentiu, como se estivesse tomando uma decisão monumental, e acenou para a
mesa ao canto. No centro repousava o que parecia ser um pequeno estojo de
bugiganga.
— Isto chegou esta manhã — disse Sin. — Pouco antes da batalha.
— Um presente?
— Uma arma.
Arma?
— Não se preocupe. Eu cuido disso — Puck faria qualquer coisa, mataria
qualquer um, para resolver os problemas de seu irmão. Justo era justo. Sin sempre
resolvia os seus.
Ele cruzou a tenda para ficar diante do pequeno estojo. Madrepérola cobria
algum tipo de metal. Um grupo de diamantes brilhava em cada canto. Quando
estendeu a mão, um pulso de malevolência roçou sua pele. Não era magia, mas um
mal puro e não adulterado. Seu sangue gelou.
— Quem mandou? — E que tipo de arma era, exatamente?
— Uma mulher chamada Keeleycael, com o título de Rainha Vermelha. Ela
disse que espera que aproveitemos nossa queda.
Keeleycael. Nunca ouviu falar dela.
— Ela governa um reino vizinho? — Até onde Puck sabia, uma mulher nunca
liderava... coisa alguma. Não inteiramente, de qualquer maneira. As mulheres
auxiliavam seus reis.
— Eu não tenho certeza — disse Sin.
A resposta dificilmente importava, ele supunha. Ninguém ameaçava seu irmão
e vivia. Derrota? Não enquanto Puck vivesse e respirasse.
Sin não apenas salvou sua vida por incontáveis vezes; ele salvou a alma de
Puck.
Pouco antes do sétimo aniversário de Puck, seu primo morreu em batalha.
Precisando de um novo comandante da linhagem real, o rei escolheu Puck. Quer
dizer, um pequeno príncipe foi arrancado dos braços de sua mãe mais cedo, para
que a doçura de uma mulher não o "influenciasse" mais.
Estrague um menino, e arruíne o homem que ele se tornará.
As palavras que seu pai gritou para sua mãe no dia em que Puck foi levado.
— Eu também vou — tinha dito Sin aos cinco anos de idade. — Onde você for,
eu vou.
Os detalhes daquele dia fatídico estavam marcados para sempre na memória
de Puck. Como os soluços de sua mãe podiam ser ouvidos em toda a fortaleza.
Meus bebês. Por favor, não leve os meus bebês. Como as lágrimas escorreram pelo
rosto de Sin quando ele pegou a mão de Puck e saiu voluntariamente da única casa
que conhecia. Quão consolado Puck foi pela resolução inabalável do menino para
que ficassem juntos.
Os dois garotos viveram e treinaram com os soldados mais endurecidos do clã
por anos, emoções mais suaves esmurradas, chicoteadas ou cortadas.
Nas idades de doze e dez anos, ambos receberam uma espada e foram
abandonados por seu pai no meio das mais perigosas dunas de areia com estas
palavras de despedida: Retornem com o coração de nosso inimigo... ou
desapareçam.
Se Puck pudesse voltar no tempo, ele exigiria que Sin permanecesse mimado
com sua mãe, seguro em seus braços amorosos. Agora, a culpa era sua
companheira constante. Até que aprendesse a lutar, e a lutar bem, foi incapaz de
proteger Sin dos abusos diários. Pior, a mãe deles morreu antes que pudessem
visitá-la.
Ela deu à luz a um bebê natimorto logo após a partida deles e, em sua dor,
propositadamente ateou fogo ao próprio corpo. Um guerreiro poderia ter
sobrevivido às chamas, mas não uma mulher sem runas e sem magia.
Massageando a nuca, Puck considerou a melhor maneira de proceder.
— Você abriu o estojo?
— Não. Esperei por você — Sin disse, com um tremor de medo.
Medo? Impossível. Sin não temia nada enquanto Puck guardasse suas costas.
— Eu não deveria ter trazido essa coisa amaldiçoada para sua tenda — seu
irmão caminhou em direção à mesa. — Vou pegá-la e...
— Não. — Braço estendido, Puck deteve Sin antes que ele pudesse entrar em
contato com o estojo. Sim, Sin já havia tocado nela sem consequências. Não
importa. Não havia razão para que corresse mais riscos. — Eu quero saber o que
tem dentro. — Queria saber o que essa rainha desconhecida pensava usar contra
sua família.
— Eu vou buscar um dos comandantes. Deixe-o...
— Não. Eu mesmo abrirei. — Um bom rei não colocava a própria vida à frente
de seu povo. — Deixa. Eu vou deixar você saber o que vou encontrar.
— Você fica, eu fico.
Outro tronco caiu na fogueira de sua culpa. Ele estalou o queixo.
— Eu não o quero em perigo, irmão. — Nem agora, nem nunca.
Por um instante, os olhos de Sin brilharam com lágrimas não derramadas. Ele
rapidamente as piscou de volta.
— E ainda assim — ele disse — pretendo ficar.
Por que essas quase lágrimas? De repente, Puck não conseguiu tolerar a ideia
de ter seu irmão em qualquer lugar que não fosse nas proximidades.
— Muito bem. Afaste-se.
Quando Sin se moveu para o outro lado da tenda, Puck palmeou uma espada
curta e se preparou para o pior. Explosão? Uma armadilha mágica? Então ele fez
— abriu a tampa.
No começo, nada aconteceu. Mas entre uma batida de coração e a seguinte,
fumaça preta subiu do estojo, cheiro de enxofre saturando o ar, ardendo suas
narinas. Olhos vermelhos brilhantes se abriram, focaram nele e se estreitaram.
Puck recuou mesmo enquanto empurrava a espada para frente. O metal
apenas atravessou a escuridão. Mas que...
Uma criatura com chifres apareceu — o dono daqueles olhos. Com um grito
estridente mergulhou. Alvo: Puck. Ele tentou pular fora do caminho. Muito tarde.
A criatura...
A dor o queimou, empurrando um rugido por seus lábios. A criatura entrou
em seu corpo e agora rasgava seus órgãos. Ela mordia e arranhava também, e
ainda assim Puck não experimentava sinais externos de lesão.
Frenético, largou a espada para enfiar as unhas no peito, cortando a pele e os
músculos — sem sucesso. A criatura permanecia dentro dele, uma presença
obscura, uivando com uma mistura tóxica de ódio e prazer.
O sangue nas veias de Puck também poderia ter sido combustível; cada célula
do seu corpo parecia pegar fogo, derretendo-o de dentro para fora enquanto ele...
se transformava? Dois anéis de fogo irromperam na coroa de seu crânio, como se
círculos tivessem sido queimados no osso. Ele estendeu a mão e sentiu... chifres?
A respiração ofegou através dos dentes cerrados enquanto ele puxava as
mechas de pêlo marrom que brotavam em suas pernas. A pelagem permaneceu.
Em seguida, uma casca dura cresceu sobre seus pés — cascos? — quando suas
botas de couro rasgaram nas costuras.
Mudar de forma não era novidade para ele, mas essa transformação tinha o
controle de Puck e não o contrário. Ele não conseguia parar isso.
Linhas negras irregulares apareceram em seu peito, pequenos rios de lava
queimando ao se espalharem. Uma imagem se formou. Uma borboleta com asas
tão afiadas quanto vidro quebrado. Cores diferentes brilhavam a luz do fogo, uma
após a outra, alterando-se à medida que várias emoções o inundavam.
Principalmente o pânico que agarrava Puck pelo pescoço e o segurava firme,
sufocando-o. Aquilo era uma alucinação causada pela fumaça?
Ou ele estava se transformando em um monstro em definitivo?
Seus joelhos cederam incapazes de suportar seu peso. Quando estava deitado
no chão, ofegante, o pânico morreu. Seu olhar pousou na espada de Walsh e o
orgulho que experimentou apenas momentos antes desapareceu completamente.
A devoção que ele nutria por seu reino e seu povo... se foi. Ele não sentia nada. A
espada era um pedaço de metal finamente afiado, o reino era uma localização sem
sentido, seus cidadãos eram pessoas sem importância.
Puck procurou por emoção, qualquer emoção, escondida em qualquer lugar.
Ali! Seu amor por Sin, um farol brilhante.
Ele protegeria o homem mais novo disso... o que quer que isso fosse. Mas
quando tentou alcançar seu irmão, o músculo travou no osso mantendo-o imóvel,
e o pânico retornou.
— Sin!
Sin não o olhava nos olhos.
Alguma coisa estava errada...
Um nada terrível começou a passar por Puck pela segunda vez — esse dirigido
ao seu irmão. Ao precioso Sin. Estimado Sin. A sua razão para... tudo. Mas uma
adaga invisível cortou seu coração, afeição sendo drenada... drenada...
Ainda assim ele lutou.
— Eu amo você — ele murmurou. Não posso perder Sin. Não posso... Mas
mesmo enquanto falava, seu coração esvaziou.
Em um momento seu amor ardia, uma luz inextinguível pela guerra, pela
perseguição ou pela farsa, no momento seguinte não passava de uma tocha
apagada.
Puck piscou para Sin e sentiu... nada. Ele não tinha esquecido seu passado,
ou as muitas maneiras que seu irmão o havia ajudado ao longo dos séculos, ou
tudo o que Sin tinha abdicado em seu nome, mas não se importava nem um pouco.
Sin se agachou ao lado dele, tristeza mais uma vez escurecendo seus olhos.
— Eu sinto muito, Puck. Eu realmente sinto. Eu sabia o que estava dentro do
estojo... Keeleycael... ela sabia da nossa profecia, alegou que já estávamos no
caminho da destruição, e um de nós mataria o outro. Desta forma, nós podemos
viver. Eu só... eu não podia te matar, e não podia deixar que me matasse. Você
teria se odiado. Me desculpe — ele repetiu. — Sinto muito.
Seu irmão o traiu?
Não é possível. Ele nunca faria uma coisa tão terrível.
— Eu fiz um acordo com a diaba — continuou Sin. — Nunca vou me perdoar,
mas melhor eu do que você, certo? Você não vê? Você não vai se preocupar com a
coroa ou com os clãs. Agora está possuído pelo demônio da Indiferença. — Ele
bateu em Puck no peito e sua voz endureceu. — Vocês dois estão juntos pelo resto
da eternidade.
Tristeza, determinação e fúria — tanta fúria — de repente brilharam dentro
de Puck. Uma explosão! Seu irmão o traiu. Tinha planejado ativamente sua ruína.
Mas assim como tudo mais, a tristeza, a determinação e a fúria desapareceram,
até que apenas o desinteresse frio permaneceu.
Puck o Invicto tinha acabado de se tornar Puck o Fodido.
Ele devia partir. Podia não ter uma aspiração para matar seu irmão, ou de
ficar aqui, ou até mesmo de partir, mas o bom senso dizia: não fique com quem o
prejudicou.
Músculos se soltando finalmente dos ossos, ele se levantou.
— Fiz isso por nós — Sin endireitou-se, estendendo a mão para ele. — Diga-
me que entende. Diga-me que vamos ficar juntos.
Silencioso, ele se afastou de seu irmão. Ele ia dar uma volta, pensar no que
havia acontecido e no que devia fazer em seguida.
— Puck...
Ele saiu da tenda sem olhar para trás.
Séculos se passaram. O número exato escapava a Puck. Ele não se importou
em contar.
Ele não voltou para seu irmão ou clã, mesmo quando ouviu rumores sobre a
brutalidade de Sin. Aparentemente, seu irmão havia se transformado no tirano
mais sanguinário da história de Amaranthian. Ele destruiu metade da floresta —
só tinha duas — para construir uma fortaleza. Fez dos Connachts escravos e de
quaisquer outros membros de clã que capturasse, e matou qualquer um que
"planejasse sua queda".
Ele acreditava que milhares de pessoas planejavam sua queda.
Na realidade, Puck sabia a verdade. A alma negra de Sin finalmente saiu para
brincar.
Sem rumo, Puck vagou de uma extremidade a outra de Amaranthia. Aqueles
que se metiam no seu caminho morriam. Se ele vinha a cruzar com algo necessário
à sua sobrevivência, ele o tomava. Comida. Armas. A hospedagem de uma noite.
Alguma vezes ele aceitava uma amante. Conseguia ter ereção e uma mulher podia
se satisfazer, mas ele não se importava com o prazer dela — e não conseguia
alcançar o dele. Embora sentisse uma necessidade fisiológica de liberação,
ninguém tinha o poder de fazê-lo gozar. Nem ele mesmo.
Lembrava-se de como uma vez secretamente sonhara em estar com a mesma
mulher várias vezes. Quando realmente fez isso, achou a experiência nada
satisfatória.
Quando Puck se acostumou à Indiferença, percebeu que o demônio não podia
— não conseguia — roubar ou apagar suas emoções, apenas enterrá-las e escondê-
las. O que o demônio não preferia mais fazer; ele tinha desenvolvido um gosto em
puni-lo sempre que Puck sentisse muito por muito tempo.
Nunca indiferente quanto a isso, não é, demônio?
Mesmo agora, a criatura rondava sua mente, cada passo como o balanço de
uma marreta enquanto aguardava Puck errar.
Ele tinha que aprender a enterrar e esconder suas emoções por conta própria,
e cobri-las com grossas camadas de gelo místico, convocado por magia, que ele se
certificava de que sempre tinha à disposição. O tipo de magia que poderia exercer
em qualquer lugar, a qualquer hora. Com o gelo vinha a dormência, com a
dormência, paz.
Um processo necessário. Um poço de fúria, ódio, dor, preocupação e
esperança ainda fervilhavam dentro dele. Ele era um barril de pólvora e um dia
explodiria.
Quando isso acontecesse...
Indiferença o mataria? Puck aceitaria a morte ou lutaria?
Pelo menos o demônio o advertia sempre que uma emoção escapava. Rosnados
se igualavam a um tapa no pulso. Rugidos significavam que Puck estava pisando
em terreno perigoso. Quando ele ouvia ronronar, era porque tinha sentido muito
por muito tempo, e o inferno estava prestes a ser lançado sobre ele.
O demônio esgotaria sua força, deixando-o imóvel por dias. Praticamente em
coma.
Para contornar a punição, Puck criou regras que seguia ao sem falhar.
Não confie em ninguém, nunca. Lembre-se de que todo mundo mente.
Matar qualquer um que ameace minha sobrevivência e retaliar sempre pela
mínima desfeita.
Comer três refeições por dia e adquirir roupas e armas sempre que possível.
Sempre persistir.
Em certo ponto, Puck veio a cruzar com a Princesa Alannah, de Daingean. Ela
gritou e correu para longe dele, aterrorizada com o monstro que se tornara. Oh,
bem.
Embora a magia ainda girasse dentro de Puck, ele perdeu sua habilidade de
mudar de forma. Os chifres permaneciam no alto de sua cabeça, duas torres de
vergonha de marfim. O pêlo em suas pernas e os cascos em seus pés também
permaneciam; não importava quantas vezes ele os cortasse, pensando que talvez,
apenas talvez, que pudesse libertar sua mente de Indiferença se libertasse seu
corpo de seus atributos bestiais.
Com o passar do tempo, homens diferentes o atacaram, determinados a matar
o desgraçado príncipe Connacht. Puck foi esfaqueado, empalado e pendurado,
puxado e esquartejado, e queimado. Sempre que possível, ele lutava contra. E se
não pudesse revidar por causa do demônio, esperava até que seu corpo se curasse,
e então se vingava implacavelmente, impiedosamente, tomado por uma raiva que
ele não podia controlar.
Claro, Indiferença sempre o penalizava depois.
Certa manhã, quando Puck andava pelas dunas de areia que uma vez adorara,
seus pés latejavam. Ou melhor, seus cascos. Um rápido olhar para baixo provou
que ele sofria de vários ferimentos, deixando um rio de sangue em seu rastro. Ele
precisou roubar e alterar magicamente um par de sapatos. E roupas. Ele se
esqueceu de se vestir.
Dois sóis dourados ressaltavam um pequeno acampamento à distância.
Perfeito. Roupas diferentes pendiam em uma corda ancorada no topo de duas
tendas lado a lado. O cheiro de carne flutuava na brisa enquanto um coinín assava
acima de uma fogueira.
Não havia gente do lado de fora, embora vozes vazassem de uma das tendas.
—... Anunciou esta manhã. O príncipe Taliesin de Connacht matou o pai
enquanto ele dormia.
— Acho que isso significa que Taliesin é o rei agora — foi a resposta
resmungada. — O príncipe Neale seria o sucessor, mas ele está morto, eu acho.
Puck parou subitamente. Sin matou o pai deles?
Os dois desprezavam o homem, mas matá-lo a sangue frio enquanto o
Connacht dormia? Isso era baixo.
Puck esperou por um soco de surpresa... nojo... raiva... alguma coisa. Nem
um pingo de emoção atravessou seu gelo. Enquanto vestia uma calça de pele de
carneiro apertada demais, perguntou-se o que deveria sentir. Todas as emoções
acima, talvez? Necessidade de impedir o seu irmão, definitivamente.
— Se o príncipe Neale não está morto — disse um dos homens — ele ainda é
uma fera.
Neale — Puck.
— Você prefere ter Taliesin ou uma fera dominando sua família? — Perguntou
o outro homem.
— Fera — disseram os dois homens em uníssono.
O fato de alguém querer Puck em vez de Sin... os Connachts devem estar
desesperados.
Posso realmente me afastar e deixar meu clã em perigo?
E se Sin se casasse com uma mulher que o amasse, matasse Puck e unisse
os clãs? Amaranthia certamente entraria em colapso.
Sin tinha que morrer.
Sempre persistir.
Bem, tudo bem então. Puck salvaria os Connachts de um louco e todo o reino
da devastação — e finalmente se vingaria de seu irmão. E no fundo de seu coração,
Puck queria vingança. Pelo futuro brilhante que perdera, e o amor que Sin tinha
destruído tão friamente.
Puck merecia se enfurecer contra ele. Esse direito era merecido.
Indiferença rosnou um aviso. Puck convocou um fio de magia para encobrir
seu coração e mente com mais gelo.
À medida que a lógica glacial retornava, a compreensão se instalou: se o
demônio conseguisse drená-lo de força, Sin o venceria.
Ele já conhece as minhas fraquezas...
Puck fechou as mãos em punhos. Ele precisava descobrir a fraqueza de Sin.
Ninguém oferecia uma direção melhor do que os Oráculos.
Puck comeu cada pedaço de coinín — regras eram regras — encontrou, alterou
magicamente e calçou um par de botas, então se dirigiu para leste. Os oráculos
viviam na parte mais perigosa de Amaranthia, onde a poderosa magia engrossava
o ar, criando fendas que levavam a outros reinos, poços intermináveis, o centro de
um vulcão e até mesmo o fundo de um oceano. Somente os cidadãos mais
desesperados se atreviam a se aventurar ali. Aqueles que buscavam se salvar ou a
um ente querido, reis que precisavam de orientação ao escolher um herdeiro, ou
pessoas como Puck, sem nada a perder.
A jornada de três dias o prejudicou. Nenhum acampamento, sem comida ou
água. Pelo menos ele conseguiu evitar as fendas.
Finalmente, alcançou a torre de areia mais alta do reino. Os Oráculos viviam
no topo, com uma visão de... tudo. Muito fraco para escalar, Puck usou sua última
magia para criar uma escada de areia.
Ele precisava adquirir mais magia, o que significava que teria de matar alguém,
e logo.
Deveria matar um dos oráculos? A história alegava que o trio criou Amaranthia
como um refúgio seguro para qualquer pessoa com inclinações mágicas. Seu
suprimento de magia devia ser ilimitado, até mesmo sem fim.
Houve um tempo em que pensar em ferir uma mulher o teria repugnado. Agora?
Pode trazer. Uma fonte era uma fonte.
Negócios primeiro. Quando subiu ao nível superior sem trilhos ou paredes,
descobriu três mulheres juntas, cada uma vestida do peito à coxa em lenços
coloridos. Uma névoa fina e escura obscurecia seus rostos.
Como cumprimento, ele disse:
— Vocês sabem por que estou aqui — elas deviam. — Como recupero o que é
meu? Liberdade do demônio. A coroa de Connacht. Unificação para os clãs.
Proteção para o meu reino. O coração negro de Sin em uma bandeja de ouro. A
princesa Alannah.
Ele a tomaria como espólio.
À medida que os ventos se tornavam mais violentos, as mulheres perguntaram
em uníssono:
— Qual é o nosso credo, Puck o Invicto?
Toda Amaranthia aprendia o credo delas desde o berço. Nada dado, nada
ganhado. Quanto mais pessoal for o presente, mais detalhada será a resposta.
O que era mais pessoal do que seu coração enegrecido?
Não seria capaz de matar depois.
Vale a pena.
Determinado, retirou uma adaga de uma bainha da cintura e enfiou a lâmina
em sua caixa torácica. Sangue quente escorreu pelo seu peito. A dor devorou sua
força com a mesma tenacidade que Indiferença, queimando todas as terminações
nervosas de seu corpo. Eventualmente, seus joelhos cederam. Mas mesmo
enquanto caía, continuou a cortar músculos e ossos. Finalmente, sucesso.
Como imortal, ele se recuperaria... logo. Aqui e agora, sua mente permaneceria
consciente por um minuto, talvez dois. Muito tempo para conseguir o que precisava.
Sin lhe ensinara bem: todo o curso da sua vida poderia mudar entre uma
respiração e outra.
Com um movimento de seu pulso, o coração ainda pulsante rolou na direção
dos Oráculos. Gorjeios de aceitação soaram, seguidos por vozes, um Oráculo após
outra falando.
— Você ama nosso lar, nossa gente, apesar de suas... limitações. Mas o que
foi previsto não pode ser desfeito. O que está para acontecer, vai acontecer.
— Uma profecia pode trabalhar junto de outra, e o que aconteceu pode ser
endireitado.
— Para salvar a todos nós, case-se com a garota que pertence a William da
Escuridão... ela é a chave...
— Traga sua esposa para nossas terras e conduza o sombrio depois para cá.
Apenas o homem quem vai viver ou morrer pela garota tem o poder de destronar
Sin, o Demente.
Quando Sin tinha ganhado o apelido de “o Demente”?
— Só então você terá tudo o que deseja.
— Mas não se esqueça das tesouras de poda de Ananke, pois elas são
necessárias...
Juntos, os Oráculos sussurraram:
— Não há outro modo.
No silêncio que se seguiu, os pensamentos de Puck giraram. William da
Escuridão. Ele nunca tinha ouvido falar dele ou da garota pela qual o homem iria
"viver ou morrer". Os dois precisavam ser trazidos para Amaranthia, um depois do
outro. Muito bem.
Quando uma pesada escuridão brincou com as bordas de sua mente, ele
ordenou e definiu suas tarefas.
Encontrar William da Escuridão. Casar com a garota que ele ama. Guerrear com
Sin.
Uma profecia não substituía a outra. Em vez disso, as duas trabalhariam em
conjunto. O que significava que William não mataria Sin, apenas o destronaria. O
resto caberia a Puck.
Nada o impediria de completar cada tarefa. William. Casar. Guerra. Um dia
Puck usaria a coroa de Connacht, salvaria seu povo e uniria os clãs.
Finalmente a escuridão parou de brincar e começou a devorar, engolindo-o
inteiro. Ele não teve mais consciência de nada.
Gillian Shaw, AP (Antes de Puck)
Faltando 4 dias e 32 segundos para o aniversário
2
Aqui ela se refere a meio-irmãos horrorosos ou stephorrors. Achamos melhor deixar assim para dar a conotação do
quanto os odiava.
Sentindo-se rejeitada por William, ela tentou evitá-lo. Ele a procurava de
qualquer maneira, agindo como se nada tivesse acontecido. Na verdade não. Isso
não era cem por cento preciso. Ela tinha compartilhado com ele o pior do seu
passado, e ele passou a tratá-la como se fosse feita de vidro.
Agora havia duas Gillians — duas lobas em guerra. Uma Gillian tinha medo
de seus sentimentos por William, e a outra só queria sentir mais. Uma olhava para
ele e pensava: ele é o homem mais assustador da Terra. A outra olhava para ele e
pensava: ele é o homem mais sexy da Terra.
Isso que era um conflito mental! O que pesava mais — assustador ou sexy?
Hmm, e que tal nenhum dos dois? Ele era bom, a única qualidade que
importava.
Ultimamente, porém, ele passava cada vez menos tempo com ela. E se ele se
cansasse dela? E se a abandonasse?
Havia apenas uma maneira de manter um homem interessado em uma
mulher...
Seu estômago se contorceu. Você está provando o argumento dele. Você não
está pronta. Isso não está certo.
Não, não! Dar ouvidos ao medo? Não mais. Esta noite ela assumia o controle
de seu destino e provaria que poderia satisfazer todas as necessidades de Liam.
Gillian jogou água no rosto e olhou para seu reflexo no espelho. Olhos escuros
e assombrados a olharam de volta, e franziu o cenho. Ninguém, neste mundo ou
em qualquer outro, odiara os próprios olhos mais do que ela odiava os dela.
Quer que eu pare de te tocar? Então diga a esses lindos olhos para pararem de
me implorar por mais.
Suor frio porejou sua testa e seu estômago ameaçou se rebelar pela segunda
vez.
OK, então. Garantido que surtaria hoje à noite.
— Você vale a inconveniência — ela murmurou. — Bem como Liam.
Com sua bondade e gentileza, ele conquistou sua confiança, lealdade e amor.
E milagre dos milagres, ela conquistou a dele também. Ele tinha que confiar e amá-
la, apesar de sua rejeição. Por que outro motivo ele lhe daria uma festa de pré-
aniversário particular ontem e a surpreenderia com um carro novo? Um Mercedes-
Benz S600 Guard, para ser exata.
De acordo com suas invejosas colegas de classe, era o veículo mais seguro do
mercado porque resistia a atiradores de elite, granadas lançadas por foguetes e
projéteis de alta velocidade. Ah, e tinha custado seiscentos mil dólares, uma
quantia absolutamente obscena de dinheiro. Mas além de tudo, William era um
homem de negócios experiente, e tinha muito dinheiro para gastar.
Mas a coisa que valia mais do que o Mercedes para ela? O livro de cupons de
desconto feito à mão que ele havia lhe dado. Dentro havia ingressos para os
desafios de videogames que duravam a noite toda, restaurantes em qualquer lugar
do mundo e uma extravagância em compras enquanto ele carregava sua bolsa.
Havia também vinte cupons para "a cabeça ou o coração de um inimigo".
Mas ainda melhor do que tudo isso? Ela ouviu uma conversa entre o grupo de
amigos que os dois compartilhavam. William considerava Gillian sua companheira
destinada!
O problema era que ele continuava vendo outras mulheres.
Preciso ganhá-lo agora, antes que ele se apaixone por outra pessoa.
Um pouco vacilante nos passos, Gillian usou a escova de dentes sobressalente
para esfregar a boca uma terceira e quarta vez. Ele me ama. Ele sempre me amará.
Certamente.
Não muito tempo atrás, ela saiu com uma turma da sua escola. Ela estava
desconfortável, mas determinada a se divertir. Mas quando todos se formaram
casal, deixando-a sozinha com um dos garotos, ela entrou em pânico. E se ele desse
em cima dela? Bem quando ela pensou que poderia surtar, William apareceu.
— Você não toca nela. Nunca — ele disse, sua voz pura ameaça. — Se tocar,
você morre.
Ao contrário de seu padrasto, ele a protegia. Ele era uma luz brilhante em uma
vida cercada por escuridão.
Com ele, quase se sentia normal.
Gillian precisava se sentir normal. Tantas garotas da idade dela estavam
animadas para descobrir os “prazeres” do sexo. Mas ela já desprezava o ato. Os
cheiros, sons e sensações. A dor, humilhação e impotência.
E se William pudesse apresentá-la a esses prazeres?
Seu celular vibrou. Uma mensagem de William? Esperançosa, mas também
cheia de pavor, ela checou a tela. Keeley.
Pergunta rápida. Sem resposta errada. Se você fosse uma rainha — como EU
— e alguém fizesse alguma coisa que a machucasse a fim de salvá-la, você o
perdoaria ou o mataria?
Torin, outro amigo imortal, tinha recentemente se juntado a Keeley. Ele era
um cara bom, com um amor pelo sarcasmo.
Gillian mandou uma mensagem de volta: Saí. Por quê?
Torin: Por que mais? Por que eu gosto de ter certeza que a sua boca atrevida
está a salvo.
Seus dedos voaram sobre o teclado. Ou você prometeu a William que ficaria
de olho em mim enquanto ele estivesse fora?
Torin: Isso também. Agora de volta aos negócios. Saiu para onde?
De jeito nenhum ela mentiria. "Mentira" era a única língua que seus meio-
horrores falavam. Mas de jeito nenhum Gillian contaria a Torin a verdade completa.
3
Jujuba
Três dias depois
Então. Essa é a mulher pela qual William da Escuridão vai viver ou morrer.
Puck estava agachado no corrimão de uma sacada do século XVIII em estilo
gárgula, e espiava um apartamento espaçoso com apenas dois ocupantes. William
da Escuridão e Gillian Shaw.
Logo ela seria Gillian Connacht.
William. Casar. Guerrear.
Agora que Puck tinha encontrado William, suas tarefas mudaram: casar com
a garota, levá-la para Amaranthia, voltar para buscar o homem. Casar. Transportar.
Retornar.
Talvez ele devesse parar de secar a mulher com os olhos primeiro?
Impossível.
Enquanto o demônio grunhia em desagrado, Puck sorvia a queda escura de
ondas sedosas de Gillian e os olhos da cor de uísque. Olhos sedutores cheios de
lenha. Um dia, um homem acenderia seu fósforo, e ela arderia por ele e somente
ele.
Pele dourada impecável e lábios vermelho sangue apenas aumentavam seu
apelo, fazendo dela a personificação de uma princesa de conto de fadas.
Minha princesa.
Puck mordeu a língua — deveria ter sentido gosto de sangue, mas por causa
de Indiferença, não sentia gosto de nada. Não havia como negar a verdade. Ficar
perto da mulher com a qual planejava casar vinha com uma complicação
inesperada. Indiferente? Dificilmente. Ela despertava seus instintos mais
possessivos.
Logo ela pertenceria a ele. Seria sua primeira e única "minha", sem ser
realmente sua.
Preciso policiar meus pensamentos com relação a ela ou estragarei tudo.
Ele sentia como se estivesse observando Gillian há dias, até semanas, como
se a conhecesse, e ainda assim se maravilhava com cada novo detalhe que aprendia.
Ela era chocantemente humana, com um espírito gentil e uma aura de bondade.
Seu sorriso sedutor era contagiante, as raras vezes que ela o revelava.
Principalmente, ela estudava as pessoas e o mundo ao seu redor, de alguma
forma presente e destacada, ao mesmo tempo em que irradiava uma tristeza
profunda.
Muitos séculos haviam se passado desde que Puck experimentara uma
emoção tão sincera. Antes de sua possessão, ele poderia ter simpatizado com ela
— quaisquer que fossem seus problemas — e procuraria melhorar as coisas. Agora?
Ele a usaria sem hesitação. Ele precisava.
Guerra antes de uma mulher.
— Sou necessário em outro lugar — disse William, e beijou o rosto dela.
Puck examinou sua competição pelos afetos da mulher: 1,95cm de altura,
solidamente construído, cabelos negros, olhos azuis, belo se você gostasse de
perfeição, e logo ficaria com o nariz quebrado se beijasse a futura noiva de Puck
outra vez.
Tapa interior. Para alcançar seus objetivos, Puck precisava que Gillian e
William cooperassem.
— Hades requer minha experiência para destruir o mais novo palácio de
Lúcifer — continuou William.
Lúcifer. O irmão mais velho do homem.
Gillian franziu o cenho. Logo ela iria sorrir. Perto de William, seu humor tendia
a mudar rapidamente, como se ela quisesse se sentir de um jeito, mas ele a fizesse
se sentir de outro.
— Não, você vai ficar aqui. — Sua voz, mesmo atada com um toque de raiva,
tinha o poder de seduzir.
Não é de se admirar que William tivesse caído por ela e por mais ninguém.
Puck na verdade havia encontrado o homem centenas de anos atrás, não
muito tempo depois dos Oráculos proferiram sua profecia. Naquela época, William
não amava ninguém além de si mesmo, forçando Puck a voltar seus esforços para
a obtenção das tesouras de Ananke.
Ela era a deusa dos Elos, e rumores afirmavam que suas tesouras conseguiam
cortar qualquer laço espiritual, emocional ou físico sem deixar consequências.
Claro, rumores também alegavam que o artefato acabava cortando mais do que o
usuário esperava.
O que era verdade? O que era mentira?
A princípio, Puck tinha pensado em usar a tesoura para cortar sua ligação
com o demônio. A criatura tinha se tornado uma parte dele, outro batimento
cardíaco que ele precisava para sobreviver. Abandoná-lo sem penalidade... algo
poderia ser melhor?
Por que mais os Oráculos o instruiriam a encontrar a tesoura?
Mas se usar a tesoura em Indiferença tivesse sido a resposta para o dilema de
Puck, por que instruí-lo a se casar com Gillian e recrutar William?
E se a tesoura cortasse a conexão de Puck com Indiferença, mas também suas
emoções? Ele ficaria pior do que antes. E se ele usasse a tesoura e morresse? O
artefato poderia considerar a morte uma bênção e não uma consequência.
Muitos riscos.
No final, Puck optou por manter seu plano original e trabalhar com William.
Ajude-me a derrotar meu irmão. Em troca, eu me divorcio de sua mulher e a
devolvo a você.
Puck voltou seu olhar para a Gillian de cabelos escuros. Ela tinha seios tão
exuberantes. Sem barriga e quadris arredondados. Pernas longas destinadas a
envolver a cintura de um homem — a minha cintura.
Seu coração batia com uma determinação renovada, como se o órgão tivesse
voltado à vida, mesmo apesar de nunca ter morrido. Como se dissesse, estive
esperando por ela.
Seus ouvidos tocaram como um sino quando seu sangue se transformou em
combustível. Ele chiou, faminto e ansiando, e ficou duro como uma pedra, sua
ereção lutando contra o zíper.
Quero tocar sua pele. Ela o queimaria vivo? Que jeito bom de morrer.
Quero beijar aqueles lábios carnudos e vermelhos. Ela teria um gosto tão doce
quanto o açúcar, como ele suspeitava? Preciso saber.
Ela tinha o poder de fazê-lo gozar? Preciso mesmo saber.
Ele rangeu os dentes. As respostas não importavam. Precisava usar do seu
famoso controle.
Tarde demais. Indiferença já tinha metido as garras em sua mente, fazendo-o
sentir como se tivesse uma hemorragia interna.
Hora do gelo. Puck hesitou... depois emitiu a invocação.
Hoje em dia ele quase sempre hesitava em usar magia para colocar seus
pensamentos e sentimentos em um congelamento literal. Não porque usar magia
fora de Amaranthia exigisse um impulso extra de energia — precisava mesmo —
mas porque ele se tornaria um assassino selvagem sem piedade nem
arrependimento.
Como se você não tivesse sido um assassino selvagem antes?
Ele não amansaria até o gelo rachar ou descongelar, um processo que não
podia controlar. Em vez disso, precisava esperar que algo ou alguém provocasse
uma emoção forte o suficiente para quebrar o gelo — ou quente o suficiente para
queimá-lo.
Se o gelo permanecesse, ele poderia perder o interesse em seus objetivos.
Vale o risco. Ele não poderia alcançar seus objetivos se Indiferença o
enfraquecesse.
O congelamento profundo o entorpeceu como esperado, mas não tão depressa
ou densamente como de costume. As camadas eram muito finas, suas emoções
fervorosas demais para serem negadas, por si só.
Fervorosas o bastante para que sentisse uma ressaca emocional que o deixou
com dor de cabeça e o estômago revirado.
Ele invocou mais gelo. Mais ainda.
Pronto. Melhor. Até a ressaca desapareceu.
Ele podia achar a garota fascinante, mas e daí? Ela era um meio para um fim,
nada mais.
Uma vez que Sin estivesse destronado, Puck se casaria com outra pessoa e,
com sua amada rainha ao seu lado, finalmente mataria o irmão, cumprindo assim
ambas as profecias.
Gillian ancorou as mãos nos quadris, os seios forçando a camisa. Com o gelo
no lugar, Puck não teve reação. Excelente.
— Seja qual for a nova e brilhante guerra que você espera começar, ela pode
esperar — disse ela a William.
O homem lhe ofereceu um grunhido falso.
— Você não é minha chefe.
— Discordo — De cabeça erguida, ela tirou um pedaço de papel amassado do
bolso da calça jeans. — Estou resgatando um dos meus cupons. O direito de... —
o quê? — Mandar em você por 24 horas consecutivas.
William deixou os ombros cair e soltou um suspiro derrotado.
— Dê a ela um livro de cupons, eles disseram. É divertido e criativo, eles
disseram.
Ela soltou uma risada encantadora, provando as suspeitas de Puck — e
rachando seu gelo duramente conquistado só com aquilo.
Ela pode ser humana, mas também era uma feiticeira, e mais perigosa do que
qualquer inimigo que eu já enfrentei.
Geralmente ele evitava distrações, mas precisava de uma agora que permitisse
que sua mente vagasse...
O que seus amigos achariam de Gillian?
Durante sua busca pelas tesouras, ele tinha conhecido irmãos possuídos por
demônios. Cameron, Guardião de Obsessão, e Winter, Guardiã de Egoísmo. Eles
entendiam sua situação e se ofereceram para ajudar. O que queria dizer que
Cameron estava obcecado pela missão de Puck, e Winter decidiu que ela poderia
trabalhar a situação a seu favor.
Todas as dificuldades que eles suportaram logo seriam compensadas.
A campainha tocou, puxando Puck de volta ao presente.
Com uma aura inebriante de inocência e malícia, Gillian bateu os cílios longos
e negros para William.
— Seja um cordeirinho e vá receber os nossos convidados.
Murmurando em voz baixa, o Sempre Excitado caminhou até a porta e a abriu.
Diferentes imortais entraram no apartamento. Entre eles, Harpias, um Enviado,
uma deusa e doze guerreiros possuídos por demônios como Puck. Abraços foram
trocados e presentes foram entregues a Gillian.
Uma festa de aniversário?
— Não, não, não — disse uma loira baixinha enquanto entrava no vestíbulo.
— Ainda não. Esta é apenas uma pré-celebração. Ou é pós-pré-celebração já que
William já fez uma pré-celebração? Tanto faz! A festa de verdade é amanhã. Talvez.
Mas provavelmente não em definitivo.
— Keeleycael — disse William com um aceno de saudação. — Pode me fazer
um favor e deixar a loucura de lado por hoje?
Ela soprou-lhe um beijo.
— Mas estou falando com a sua concorrência. Alerta de spoiler. Ele ganha!
— Eu ficaria bravo com você por ousar mentir pra mim — respondeu William
com um tom fácil — se eu tivesse alguma competição.
Puck franziu a testa. Keeleycael, a Rainha Vermelha? As suspeitas dançavam
dentro da sua cabeça, a tensão apertando cada um de seus músculos — o gelo
voltando a rachar.
Quando Indiferença rosnou, Puck ignorou sua relutância habitual e invocou
outra camada de frio desinteresse. E daí se ela fosse a mesma Keeleycael que deu
a pequena caixa de joias a Sin. O que isso importava a Puck?
Keeleycael beliscou a orelha de um guerreiro — Torin, o Guardião de Doença
— antes de sussurrar algo para William.
Puck captou apenas um punhado de palavras.
— Perigo... espera... planejam eliminar...
William franziu a testa, seu corpo ficando rígido.
— Você tem certeza?
A loira assentiu, inflexível.
— Seus inimigos planejam matá-la.
Ela — Gillian?
A fúria pulsou de William enquanto ele se aproximou da garota e a levou para
um canto particular.
— Algo terrível surgiu. Eu preciso sair por uma hora, talvez duas. Deixe-me ir
sem protestar ou exigir detalhes, apesar do cupom, e eu vou te compensar. Eu juro.
Desapontamento brilhou em seus olhos escuros, mas ela assentiu.
— Claro. Faça o que precisa fazer.
— Obrigado. — Ele apertou o nariz dela antes de riscar... movendo-se de um
local para outro com apenas um pensamento. Para onde ele foi?
Puck ficou parado, observando Gillian. As horas estipuladas se passaram,
mas William não apareceu. Eventualmente, os outros se despediram e saíram do
apartamento, até que apenas Keeleycael permaneceu.
Puck deveria se aproximar? Ele poderia não ter outra chance de falar com
Gillian sem William por perto. Mas o que diria?
Séculos atrás me disseram que você é a chave para destronar meu irmão. Casa
comigo?
— Pergunta rápida — disse Keeleycael a Gillian.
— Keeley — a garota respondeu com um gemido. — A gente precisa fazer isso
agora?
Keeley. Um apelido.
— Precisamos — disse a mulher de cabelos claros. — Qual é o seu maior desejo?
— Além de uma sociedade governada por mulheres, onde homens são animais
de estimação?
— Obviamente. — Pensativa, a loira bateu uma unha afiada no queixo. — Eu
vou guardar esse desejo em particular para o seu aniversário de oitocentos anos.
Gillian bufou.
— Oito séculos? Por favor. Mas você sabe o que eu realmente quero? Ser mais
parecida com você. Tão forte. Tão corajosa. Tão livre.
Puck armazenou cada “desejo” em um arquivo mental chamado Esposa.
Maneiras de conquistá-la? Faça com que ela se sinta forte, corajosa e livre.
— Ding, ding, ding. Resposta absolutamente certa, então vá em frente e me
considere a sua fada madrinha. — Keeley puxou um frasquinho de um cordão de
couro pendurado em seu pescoço. — Tome. Beba isso e me agradeça depois.
As sobrancelhas de Gillian se juntaram.
— O que é isso?
— Fale menos e beba mais. Vire o frasco. E feliz aniversário de dezoito anos,
pequena. Isso vai fazer todos os seus sonhos se tornarem realidade... sonhos que
você nem sabe que tem. Não precisa me agradecer muito. — Keeley levou a mão de
Gillian até a boca, até mesmo a ajudou a inclinar o frasco, despejando o conteúdo
na garganta da garota. — Você não se recusou a beber, então não vai morrer,
levando William à morte dele. Ou ele já morreu? Espera. Estou confusa.
— William vai morrer? — Gillian grasnou.
— Você não estava ouvindo? Ele não vai. Agora. Eu posso mudar meu tom em
uns quinhentos anos, ou mais.
Puck sorveu o ar e franziu a testa. Ele farejou uma poção poderosa destinada
a transformar um humano em um imortal. Uma poção rara, supostamente extinta.
Enquanto Keeley continuava a tagarelar, Gillian ficou imóvel. A cor drenou de
suas bochechas. Suor escorria pela sua testa e ela segurava a barriga.
— Keeley, o que você me deu... — Seus olhos arregalaram quando ela
engasgou.
Choramingando agora, ela correu pra fora da sala de estar. Puck saltou para
a borda da janela seguinte, sem vontade de deixá-la fora de vista nem por um
segundo. Ela parou no banheiro, onde vomitou.
Fraca demais para ficar de pé, ela desabou no chão. Gemendo, fechou os olhos
e se enrolou em si mesma.
Keeley a seguiu, dizendo:
— Tenho cem por cento de certeza de que tenho noventa e três por cento de
certeza de que te dei a dose correta. Hmm. Seus sintomas são... bem, não estou
satisfeita. Talvez tenhamos que seguir com o Plano B?
A vontade de atravessar a janela bombardeou Puck. Ele pegaria a garota nos
braços e... o que? O que ele podia fazer pra ajudar? Como alguém cuidaria de uma
mortal quase imortal doente?
Soldados em Amaranthia eram forçados a cuidar de suas próprias doenças e
ferimentos com magia. Se você não fosse forte o suficiente para se recuperar sem
ajuda, não merecia viver.
Deixa pra lá. Não havia necessidade de ajudá-la. Keeley desapareceu assim
que William entrou no banheiro.
Ao ver Gillian, sua preocupação foi palpável.
— Qual é o problema?
Puck passou a língua sobre os dentes enquanto sua tatuagem de borboleta se
movia, como uma cobra deslizando para um novo esconderijo. Do peito até as
costas, depois até a coxa. Assim como ele vagou por Amaranthia, sem objetivo, o
demônio perambulava pelos contornos de seu corpo sempre que Puck
experimentava algum tipo de emoção de mudar a vida.
Que emoção de mudar a vida ele experimentava agora?
Uma rápida olhada debaixo da superfície do gelo revelou... compaixão e inveja?
Não quero nada, não preciso de nada.
Além disso, William não chegava nem perto de Puck em nada. Apesar da
desvantagem de Puck, ele era mais forte, mais rápido e muito mais capaz.
A verdade era a verdade.
— D-doente — Gillian sussurrou em uma voz quebrada. — Dói.
— Não se preocupe — disse William. — Eu cuidarei de você. Vou cuidar de
tudo. — Ele estendeu a mão de repente, brilhando com poder.
Puck prestou atenção. William tinha runas. Rolos dourados se retorceram das
pontas dos dedos até o pulso, um canal para qualquer magia que ele possuísse.
Com uma única onda, ele cortou uma fenda no ar, abrindo uma porta entre
dois reinos diferentes. Através da porta, Puck viu... uma parede de pedra?
— Eu vou consertar isso, você tem a minha palavra. — Gentil, tão gentil, o
guerreiro pegou a beldade de cabelo escuro nos braços e a levou pela porta.
Pouco antes dela fechar, Puck irrompeu pela janela, quebrando o vidro, correu
pela sala e mergulhou.
Puck rolou até parar. Ao se endireitar, estudou seu novo ambiente. Uma
caverna fortemente guardada por feitiços de proteção — um tipo de magia protetora
derivada de símbolos. Essas proteções em particular eram preparadas para reagir
às intenções de um invasor. Entrar sorrateiramente no reino? Perca os olhos. Tem
estupro em mente? Perca seu membro. Pronto para cometer assassinato? Diga
adeus à sua cabeça.
Havia também uma proteção para alertar William sobre a chegada de alguém.
Pela primeira vez, Indiferença serviu Puck bem; as proteções o tratavam como se
ele fosse um animal selvagem, ignorando-o.
Fora dos limites da caverna, ele descobriu um paraíso tropical. Palmeiras
amarelas pesadas com frutas. Um céu branco. Quilômetros de água rosada. Ondas
lambiam a areia branca e púrpura brilhante, o cheiro de sal e de coco enchia uma
brisa suave.
Ele rastreou William até uma casa extensa, onde grandes pássaros com bicos
de metal e garras guardavam o perímetro. Mais uma vez, Puck foi considerado uma
não-ameaça e ignorado.
O preocupado William não fazia ideia de que havia sido seguido.
Vê só, Gillian? Eu sou o melhor guerreiro.
Encontrando uma alcova sombreada em uma varanda, Puck assistiu através
de uma janela quando William colocou a morena em cima de uma cama enorme e
ternamente enxugou sua testa com um pano.
— Não foi assim que pensei em passar a semana do seu aniversário, boneca.
Você precisa melhorar. — O arrependimento envolvia a voz masculina. — Amanhã
é suposto ser o começo... bem, isso não importa agora. — Ele roçou os dedos ao
longo de sua mandíbula e disse: — Já volto.
O mais simples protesto escapou dela antes dele se afastar.
Um minuto se passou, dois. Devastada pela febre, Gillian se virava e revirava.
Puck ficou onde estava, cheio de ânsia... empatia?
Soltando uma maldição, ele se concentrou em fortificar o gelo ao redor de seu
coração. Já estava farto de emoções, farto de Indiferença.
Como a garota o afetava de maneira tão forte, tão rapidamente, afinal? E por
que ela estava doente? A poção deveria tê-la fortalecido enquanto fazia a transição...
A resposta lhe veio com um tapa na cabeça e seus pulmões se contraíram.
Morte ad vitam. Ela não sobreviveria à transição. Seu corpinho queria evoluir e
continuava tentando, mas não era forte o suficiente para completar o feito; a cada
hora que passava, ela enfraquecia ainda mais.
Ela enfraqueceria até morrer.
Uma onda de fúria e medo fez o gelo quebrar. Quando as garras de Puck
cortaram suas palmas, um grito de negação se formando no fundo de sua garganta,
Indiferença protestou com um rosnado.
Cuidado. Mais gelo. Agora!
Puck se acalmou, mesmo enquanto reconhecia que não queria aceitar aquele
desenvolvimento. Gillian não tinha permissão para morrer. Eles tinham que se
casar, e ele tinha que usá-la para conquistar a lealdade de William.
Ele só teria que proceder como se ela fosse viver — porque ela viveria! Se
William não conseguisse salvá-la, Puck salvaria.
Ele considerou suas opções. Aproximar-se dela agora e iniciar uma conversa?
Mas como iria começar?
Você sabe o que eles dizem — uma vez que você for fera, sempre se deliciará.
Não. Tudo errado. Ele tinha que fazê-la se sentir forte, corajosa e livre.
Seja minha, e você nunca mais saberá o que é fraqueza.
Ela poderia olhar para ele e morrer de medo.
O resultado de um “primeiro encontro” nunca foi tão importante. Ele precisava
pisar com o pé — casco — direito, usando o necessário para encantar e seduzir.
Recordou os seus dias pré-demônio. As mulheres o temiam, o Invicto, mas
muitas o encorajavam, de qualquer forma. Mas qualquer carisma que ele tivesse,
havia perdido. E sua aparência...
Bem, nem sempre foi o obstáculo que esperava. Um certo tipo de mulher
gostava de sua forma bestial. Chifres estavam na moda e eram incrivelmente
populares em romances.
Ele sabia disso, porque às vezes lia livros para Winter a pedido dela.
Aparentemente, frases como "seus mamilos suculentos" e "desejo trêmulo" soavam
divertidas em sua voz monótona. Tanto faz. Em todas as histórias, Puck tinha se
identificado mais com o vilão, mas ele certamente poderia representar o papel de
herói. Ele poderia agir como um cavaleiro de armadura brilhante, pelo menos por
um tempo, e se oferecer para resgatar sua donzela em perigo.
Ela não saberia a verdade até que fosse muito tarde.
Com um plano em mente, ele deu um passo a frente.
William se materializou na sala com outro imortal ao seu lado e Puck ficou
imóvel.
— Este homem é um médico — disse William. — Ele vai te examinar.
A única resposta dela foi um gemido de dor.
O médico passou a maior parte de uma hora examinando Gillian. Quando ele
sussurrou o diagnóstico para William e proclamou que não havia nada que ele
pudesse fazer, William deu-lhe um soco tão forte que ele voou para a parede oposta.
— O q-que ele disse? — Perguntou Gillian.
— Não importa. Ele é um charlatão — anunciou o guerreiro. — Vou encontrar
outro médico. Um melhor.
Ele desapareceu, mas ainda assim Puck ficou para trás, esperando que o
macho retornasse.
William reapareceu com um segundo médico... depois um terceiro e um quarto.
Cada um checou os sinais vitais da garota enquanto ela perdia e recobrava a
consciência, tremendo conforme William berrava ordens e fazia ameaças. Sangue
foi coletado, exames foram feitos, mas o diagnóstico permaneceu o mesmo.
Ela morreria mais cedo que tarde.
— Vão para a sala de estar — William comandou a infinidade de médicos. —
Montem um laboratório. Façam mais exames. Encontrem uma maneira de salvá-
la ou morram. E se pensarem em fugir, saibam que vou encontrá-los e machucá-
los. Vocês vão rezar para a morte chegar.
Enquanto corriam para obedecer, ele se sentou ao lado da cama de Gillian,
sua expressão gentil.
— Pronto, pronto, boneca — mais uma vez, ele enxugou a testa dela com um
pano. — Você vai se curar. Isso é uma ordem.
— O que há de errado comigo? — Ela conseguiu falar. — O que Keeley me deu?
— Alguma coisa sobrenatural, mas não se preocupe, tenho os melhores
médicos imortais em busca de uma cura.
Puck apertou os lábios. Por que esconder toda a verdade dela?
Quando Gillian caiu em um cochilo intermitente, o homem segurou a mão
dela, talvez tentando transmitir sua força para seu corpo frágil.
Puck queria odiar o homem. Ele estava pronto para sair do banco e entrar no
jogo.
Em algum momento, o pai de William apareceu. Hades, um dos nove reis do
submundo. Ele era urbano, mas não civilizado. Um homem alto e musculoso como
William, com pele bronzeada, cabelos negros e olhos tão negros que não tinham
começo nem fim. Ele tinha um aro prateado no nariz e estrelas tatuadas em cada
um dos nós dos dedos.
Quantas outras tatuagens estavam escondidas debaixo do seu terno risca de
giz?
— O que há de tão especial nela? — Perguntou Hades.
— Não vou discutir ela com você — William retrucou.
— Então não a discutirei com você. Não pode ficar com ela. Não pode ficar com
ninguém. Sabe tão bem quanto eu que sua felicidade anda de mãos dadas com sua
desgraça.
— Estou procurando uma maneira de quebrar minha maldição e...
— Você está procurando — interveio Hades — há séculos.
— Meu livro...
— É um disparate. Um truque para fazer você esperar pelo que nunca poderá
ter, para que sua morte seja mais doce... para os seus inimigos. Se o livro pudesse
ser decodificado, já teria sido.
Puck não concordava com Hades. Em toda a sua pesquisa, ele tinha ouvido
muito sobre o livro de códigos destinado a salvar William da morte pelas mãos de
uma amante. Várias fontes confirmaram a validade do livro.
— Veio aqui para me deixar puto? — William resmungou.
— Deixar você puto é um bônus — disse Hades. — Eu vim para alertá-lo.
— Bem, já fez as duas coisas.
— Não, filho, eu não fiz. — A voz do rei endureceu, afiada o suficiente para
cortar aço. — O aviso é este, se eu achar que você está se apaixonando por essa
garota, eu mesmo a matarei.
William enrijeceu.
De um congelamento profundo em um segundo a fervendo de raiva no
seguinte, Puck se curvou.
Matar Gillian, minha chave? Experimente e veja o que acontece.
Com um grito de guerra, William se lançou sobre Hades. Uma feroz batalha
sangrenta se seguiu, nada contido. Socos no nariz e nos dentes. Cotoveladas no
peito e na barriga. Joelhos na virilha. E ainda assim, um oponente nunca tentava
matar o outro.
Eles deviam sentir carinho um pelo outro, do jeito que Puck e Sin...
Não. Não Sin. Não importava a provocação, um irmão adorador não
amaldiçoaria o outro a uma eternidade infernal, forçando-o a existir em vez de viver.
Eu iria preferir morrer a machucá-lo. Agora estou disposto a morrer para
machucá-lo.
Enquanto Puck esperava que a luta terminasse, ele fez o melhor para se
acalmar. Mas um zumbido estranho logo começou a vibrar no fundo de sua mente,
e se não fosse por Indiferença, ele teria culpado a sensação à impaciência.
Finalmente, Hades foi embora. William acariciou o topo da cabeça de Gillian,
murmurou algo sobre encontrar um médico melhor e se desmaterializou.
Hora do show.
Puck entrou no quarto em silêncio, e avançou. Espera. Ele tinha se lembrado
de se vestir hoje? Um rápido olhar para baixo revelou que suas calças de pele de
carneiro estavam tão rasgadas que pareciam uma tanga.
Não importa. O estilo bárbaro chique realmente destacava seus chifres e se
encaixava em toda a mística de herói-de-livro-de-romance que ele esperava
transmitir. Poderia até mesmo se passar pelo Príncipe Encantado — bem, um
príncipe precisando de um beijo de amor verdadeiro.
Os pontos de pulsação de Puck ganharam um ritmo selvagem quando ele
chegou ao lado da cama e espiou sua futura noiva. Ele não era o único personagem
de conto de fadas no quarto. Bela adormecida está diante de mim.
Faixas escuras de cabelo se derramavam sobre o rosa pálido do travesseiro.
Seus olhos estavam fechados, longos cílios negros lançando sombras sobre suas
bochechas. Um rubor rosado espalhava-se por suas feições delicadas enquanto ela
abria os lábios.
Praticamente implorando pelo meu beijo.
Foco! Seja rápido e doce. Não havia como dizer quando William retornaria.
— Gillian — ele murmurou, surpreso com o tom rouco de sua voz.
Uma doce fragrância emanava dela. Respirando, ele detectou uma nota de
poppiberries e sua cabeça enevoou. Seu sangue esquentou. A tatuagem de
borboleta chiou em seu torso, certamente derretendo sua pele.
Indiferença rosnou com mais força e cortou sua mente. Um problema se
formava.
Fortifique o gelo. Recupere o controle.
Gillian virou a cabeça em direção a ele e piscou rapidamente antes de se
concentrar nele. O pânico encheu seus olhos cor de uísque antes que ela desviasse
o olhar — olhando para qualquer lugar, menos para Puck. Sua boca se abriu
amplamente, como se estivesse tentando gritar. Apenas um ruído escapou.
— Nada disso agora. — Para provar que era inofensivo, colocou as cobertas ao
redor dela, como tinha visto William fazer. — Não estou aqui para te machucar. —
Verdade.
O movimento fez com que as lâminas emaranhadas em seus cabelos clicassem,
juntando-se, chamando a atenção dela. Seu olhar disparou para ele e escureceu
com choque e descrença. Ele engoliu uma maldição. Os heróis dos romances não
costumavam contrabandear armas dentro dos seus cabelos.
Preciso prosseguir de qualquer maneira. Puck não se separaria de suas
navalhas; elas eram sua salvação. Toda vez que era desafiado e não tinha espada
ou adaga, ele arrancava uma lâmina e começava a cortar.
Lágrimas caíram pelas bochechas de Gillian e seu queixo tremeu. Tão
vulnerável. Tão fragilizada. Uma pontada de... algo penetrou em seu peito.
De forma mais gentil possível, ele enxugou suas lágrimas. Pele macia como a
seda e mais quente que o sol.
A ação ajudou a relaxá-la, mesmo que enrijecesse músculo após músculo dele.
O pânico dela começou a desvanecer até que seu olhar se fixou na tanga. Ou melhor,
na ereção debaixo da tanga. Com um choramingo, ela começou a se debater em
cima da cama numa tentativa desesperada de escapar.
Pensava que ele tomaria o que ela não lhe oferecia? Nunca.
— Olhos aqui em cima, moça.
Seu olhar se elevou... ela engasgou, como se tivesse notado o rosto dele pela
primeira vez. Confusão contorceu suas feições antes que um tom mais profundo
de rosa se derramasse sobre suas bochechas.
Ela gostava do que via?
— Me disseram que eu poderia ajudá-la. — Mais uma vez a verdade, ele disse
a si mesmo. — Que podemos nos ajudar um ao outro.
Sua testa franziu, sua confusão se intensificou.
— Não me disseram que você pertencia a William da Escuridão. — Uma
mentira necessária, e algo que o velho Puck teria protestado. O Puck possuído por
um demônio tinha poucos escrúpulos. Como tudo mais, os meios haviam deixado
de importar. Apenas o resultado final. — Também não me disseram que você estava
doente. Ou que era humana — acrescentou ele. Olhe para mim, mulher. Tão
inocente. Eu não sei nada sobre você, mas minha curiosidade é grande. Fique
lisonjeada em vez de assustada. — O que você está fazendo com um homem com
a... reputação de William? — Pronto. Semeando a dissidência. Uma tática que ele
aprendeu com Sin.
— Q-quem é você? — perguntou ela, retribuindo sua curiosidade.
Um bom sinal, não é? Ele passou uma mecha do seu cabelo entre os dedos,
saboreando a textura sedosa.
Saboreando? Puck?
O que ela está fazendo comigo?
Indiferença rosnou.
Ele propositalmente se concentrou na pergunta dela e na melhor forma de
responder — até que ela se encolheu, como se estivesse enojada com o toque dele.
Outra pontada, esta mais aguda, quando ele deixou o braço cair de lado.
Ele não ficou chateado com a reação dela. Não ficou!
— Eu sou Púkinn. Você pode me chamar de Puck. Sou o Guardião da
Indiferença. — Ele se forçou a fazer uma pausa, como se precisasse de tempo para
considerar as próximas palavras. — Não estou certo se você pode me ajudar, mas
acho que vou permitir que tente. — Outra mentira. Você vai me ajudar, mulher. De
um jeito ou de outro.
Ela estava intrigada?
Ela permaneceu em silêncio, simplesmente olhando para ele, como se ele fosse
um quebra-cabeça que não conseguia resolver.
Sim. Intrigada.
Outra pontada afogou seu peito, criando fraturas em seu gelo, permitindo que
as emoções que enterrou subissem à superfície de sua mente. Excitação. Fome.
Impaciência. Ânsia. Fúria. Mais excitação. Seu corpo parecia expandir para
acomodar o influxo, a tatuagem de borboleta se movendo novamente. Músculos
inchados e cheios de nós. Pele esticada. Gotas de suor apareceram em sua testa e
entre suas omoplatas.
Indiferença se preparava para dar um golpe letal.
Não não não. Não aqui, não agora.
Concentrando-se em sua respiração, Puck mudou o peso do corpo de um pé
para o outro, nunca permitindo que sua figura assumisse a postura de um
guerreiro... embora os guerreiros tivessem o que desejavam, quando desejavam.
Estenda a mão. Toque-a. Sacie sua fome...
Não! Ele não devia sentir fome.
Vá embora. Deixe-a querendo mais.
— Eu voltarei depois que você se acostumar com a ideia. — E depois que me
acalmar.
Ele abriu a boca para dizer que encontraria uma maneira de salvá-la —
plantar as sementes da possibilidade, mas os olhos de Gillian já haviam se fechado.
Ela adormeceu. Ela deve se sentir segura com ele, pelo menos em algum nível. Caso
contrário, a adrenalina a teria mantido consciente.
Vitória, bem ao meu alcance...
Embora cada passo longe dela se provasse um tipo especial de inferno,
considerando o desejo que sentia por ela, ele retornou para a varanda, pretendendo
velá-la pelo resto da noite.
— Ora, ora, ora— uma voz familiar disse atrás dele. — Quem temos aqui?
Antes que Puck pudesse se virar, dedos duros se emaranharam em seu cabelo
puxaram, arrancando-o da sacada. Uma de suas navalhas cortou sua bochecha
quando ele caiu em um banco de árvores. Cascas e areia espalharam em todas as
direções.
Por um momento, enquanto jazia no chão, uma lembrança passou pela sua
cabeça.
Depois de um dia de treinamento particularmente horrível, ele e Sin se
amontoaram, comendo os roedores que conseguiram pegar, porque os soldados
eram responsáveis por sua própria comida. Se você não caçava, você não comia.
Eu queria que você tivesse ficado com a mamãe, Sin, mas estou tão feliz por
você estar comigo.
Você é minha pessoa favorita em todos os reinos, Puck. Eu vou ficar com você
pra sempre.
Mas "pra sempre" não durou muito tempo, não foi?
Puck engoliu o nó amargo na garganta e forçou o passado de sua mente.
Lutando para respirar, ele ficou de pé.
Em um redemoinho de fumaça negra, Hades apareceu diretamente à sua
frente.
— Então, você é o possuído por Indiferença. Eu me perguntei sobre o idiota
azarado a quem ela o entregou, todos esses séculos atrás.
Puck desembainhou uma adaga, o metal cintilando à luz do sol.
— Se fala de Keeleycael... Keeley, ela deu Indiferença ao meu irmão, e ele deu
o demônio para mim.
Dar. Uma palavra tão bonita para uma traição tão terrível.
Então a compreensão veio. Hades sabia a verdade sobre a possessão de Puck.
Outros assumiram que ele recebeu Indiferença enquanto estava preso no Tártaro,
uma prisão para imortais. O que era um erro compreensível.
Há muito tempo, quando Zeus governou o Monte Olimpo, doze membros de
seu exército de elite roubaram e abriram a Caixa de Pandora — um contêiner muito
parecido com o que continha Indiferença. Só que aquele libertou incontáveis
demônios em um mundo despreparado, os piores dos piores. Os soldados foram
punidos por seu ato sem sentido e forçados a receber um demônio, assim como
Puck. Com mais demônios do que soldados, no entanto, as sobras precisavam de
hospedeiros. Prisioneiros selecionados foram escolhidos.
Hades deu um sorriso frio.
— Keeley não faz nada sem compreender o grand finale.
Keeleycael... Keeley... A amiga de Gillian era a infame Rainha Vermelha.
— Por que ela iria interferir na minha vida? Por que ela me quer possuído? —
Puck não tinha feito nada para feri-la. Não sabia de sua existência até que o
atacasse.
— Para salvar meu filho. Keeley e eu estávamos noivos na época, e ela sabia
que eu faria qualquer coisa, e eu quero dizer qualquer coisa, para garantir a
segurança dele.
Forçar Puck a receber Indiferença de alguma forma salvou a vida de William?
Ridículo! Ele suspeitava que Hades via o passado através das lentes de seu orgulho.
Mas de qualquer forma, Hades deixara claro que planejava destruir aqueles
que se pusessem no caminho do seu filho.
Matar qualquer um que ameace minha sobrevivência e sempre retaliar.
Indiferença rosnou quando fúria aumentou.
Inalar, exalar. Puck invocou o gelo... em vão, como se o rei tivesse negado sua
única defesa. Ou suas emoções já estivessem muito fora de controle.
— Você gostaria de sua liberdade? — Hades perguntou. — Uma vez eu
governei os demônios. Eu poderia remover Indiferença sem problema... mas eu o
prejudicaria no processo. Um privilégio para mim, já que gosto de prejudicar os
outros.
Fúria, intensificando.
— Eu passo.
— Então escute, principezinho, porque é hora da história. — Hades o rodeava,
ameaça em cada passo. — A Rainha Vermelha também me disse que minha vida
mudaria no dia em que eu me encontrasse com um guerreiro de força e ferocidade
inigualáveis que me ajudaria a consertar o problema do meu amado filho. Se eu
fosse um bom menino e me impedisse de matá-lo. Agora aqui está você, farejando
o filho e o problema em questão.
Força e ferocidade inigualáveis — soa como eu.
— Esse problema tem um nome?
— Ela tem.
Ela. Gillian, então.
— Ela pode ser um problema para William, mas é uma solução para mim. Não
deixarei este reino sem ela.
— Não deixará então? — Hades arqueou uma sobrancelha escura. — Já
possessivo com relação a ela, apesar de acabar de conhecê-la. Apesar de
Indiferença. Bem, considere minha curiosidade levemente estimulada. Na verdade,
a um nível abaixo de leve. Parcamente.
Se Hades pensasse em afastar Puck de sua futura esposa — de seu futuro,
ponto final — Hades morreria.
— Sua força e ferocidade são maiores que as minhas? — Perguntou Hades.
Não precisava refletir.
— Sim.
— Vamos descobrir com certeza, sim?
Em um segundo Hades se colocou fora na distância de um golpe, no outro,
sua respiração abanou o rosto de Puck.
Em rápida sucessão, Puck bloqueou o primeiro, segundo e terceiro soco,
salvando seu nariz de ser quebrado. Mas Hades era apontado como um mestre da
estratégia por um motivo, e claramente esperava a resistência; forçando Puck a
jogar na defesa, ele foi capaz de usar a mão livre para roubar a outra adaga
embainhada na cintura de Puck. Punhalada, punhalada, punhalada. Hades
esfaqueou seu rim, fígado e intestinos.
Qualquer um desses golpes poderia ter matado um humano. Todos três?
Morte certa. Embora dores agonizantes atravessassem Puck, o sangue quente
fluindo em rios carmesins pelas pernas o enfraquecendo, ele permanecia
imperturbável.
Desacorrentado pela necessidade de uma luta justa, ele bateu seu joelho entre
as pernas de Hades. Testículos, aproveitem seu encontro e cumprimentem a garganta
do seu mestre. Quando o rei se curvou, ofegando por um ar que não conseguia
respirar, Puck o esmurrou no queixo.
Hades tropeçou para trás, seu berro enfurecido ecoando pelo reino. Quando
se endireitou, seu olhar pousou em Puck e se estreitou.
Quando as facadas de Puck se curaram, ele checou as cutículas. Hmm. Elas
precisavam de uma aparada.
Agora Hades ria, um som de diversão genuína.
— Acha que me venceu, não é? Odeio acabar com a festa, a quem estou
enganando? Adoro acabar com a festa, assim como adorarei acabar com você. Eu
já ganhava batalhas quando você ainda sujava as fraldas. Não pode me derrotar.
Principalmente quando conheço Indiferença mais do que você jamais conhecerá.
Uma provocação com a intenção de provocar medo e tirar Puck do jogo? Que
pena.
Utilizando a velocidade sobrenatural com a qual nasceu, ele fechou a distância
e socou Hades no estômago. O rei tropeçou e Puck mergulhou nele, derrubando-o.
Eles tombaram. No ar, Hades tentou reivindicar a posição superior — e falhou.
BUM! Impacto. O ar jorrou dos pulmões do outro homem, deixando-o
momentaneamente imóvel.
Puck não sofreu tal deficiência e tirou proveito, arrancando uma lâmina do
cabelo e cortando os olhos de seu oponente, cegando-o temporariamente .
Com um rugido, Hades atingiu Puck, quebrando sua maçã do rosto,
mandíbula e traqueia. Ele já viveu coisas mil vezes piores e lutou através das novas
ondas de dores lancinantes, cortando repetidamente o rosto do rei. Sangue se
derramava de múltiplas lacerações.
Ao mesmo tempo, Puck usou a mão livre para roubar de volta o punhal que
Hades havia roubado. Mas o rei também esperava essa ação e inclinou a lâmina
para cortar a palma de Puck. Carne e músculo rasgaram. Osso rachou.
Hades deu um soco poderoso em sua mandíbula. As juntas recém-curadas
deslocaram. Estrelas piscavam em sua visão e mais ondas de dor se juntaram à
festa. Mas Puck não revelou por palavras ou ações. Simplesmente se levantou e
pisou com a bota no nariz de Hades, quebrando a cartilagem. Uma pausa. Ele
forçou a mandíbula a voltar ao lugar. Melhor.
Quando ele levantou o pé para dar outra pisada, Hades pegou seu tornozelo e
o torceu. Após cair no chão, Puck girou para trás e deslizou em pé para uma boa
distância.
— Posso continuar o dia todo — disse ele. — Venha. Me dê o seu pior. — Ele
deu um um encolher exagerado, uma provocação. — Ou você já me deu o seu pior?
De pé com muito mais graça do que qualquer um deveria exibir depois de levar
uma pisada no rosto, Hades ofereceu-lhe outra risada divertida.
— Você quer a garota, tudo bem, ela é sua. Porque, não importa o que meu
filho pense, ela não é a pessoa certa para ele. De acordo com Keeleycael, ele vai
morrer se vier a se casar com Gillian. Então amanhã eu o manterei ocupado,
permitindo que você faça um pouco de romance. Ou muito. Já se olhou no espelho
ultimamente? Vai ter que se esforçar muito para conseguir um rabinho de saia.
Vincule-se a ela, é o único jeito de salvá-la, e leve-a para longe daqui.
Casar com Gillian causaria a morte de William? Interessante. Talvez fosse por
isso que Puck teria de casar com aquela pela qual o príncipe do submundo viveria
ou morreria, de modo que William sobrevivesse tempo suficiente para destronar
Sin.
Talvez Gillian causasse a morte de William depois que Puck a devolvesse.
Não é problema meu. Uma vez que William cumprisse a profecia, Puck não se
importava com o que aconteceria com ele. Mas manteve seus lábios fechados. De
jeito nenhum admitiria o plano de tirar Gillian de William apenas temporariamente.
Deixe Hades pensar no que quisesse pensar. Ele...
Vincule-se a ela, ele disse. Não casar. A única maneira de salvá-la.
Compreensão e choque atingiram Puck com força suficiente para derrubar um
elefante. A vinculação uniria suas almas, permitindo que Gillian aproveitasse a
força dele e terminasse sua transição para a imortalidade. Ela seria mais do que
sua esposa. Ela se tornaria sua outra metade.
Minha!
Um pequeno problema. Fraca como estava, ela poderia agir como um sifão e
drená-lo completamente, matando os dois. Um resultado que William deveria temer.
Caso contrário, ele já teria se ligado à sua amada, não é?
Vale a pena o risco.
Ele faria a proposta e ela concordaria, ou para salvar William de um coração
partido e da culpa — ou impedi-lo de correr o mesmo risco. Ela não iria querer
comprometer a vida do seu precioso.
Vantagem para Puck.
Sua lealdade implacável ao homem deveria ter agradado a Puck — isso
garantiria sua vitória. Então por que estava rangendo os dentes e apertando os
punhos com tanta força que os nós dos dedos tentavam rasgar sua pele?
Não importa. Dilema potencial: divórcio não seria mais possível. Separação
significaria a morte.
William nunca concordaria em...
Puck respirou fundo. As tesouras. Claro. Ele poderia usar as tesouras de
Ananke para libertar Gillian de seu vínculo, permitindo que ela retornasse para
William viva, livre de seu marido.
Cada ação ditada pelos Oráculos tinha uma razão e, finalmente, essas razões
faziam sentido.
Puck reajustou suas tarefas. Vincular-se a Gillian. Escoltá-a até Amaranthia.
Retornar para buscar William.
Vincular. Escoltar. Retornar.
Com um sorriso frio de volta ao lugar, Hades o saudou.
— Excelente. Vejo as engrenagens girando em sua cabeça. Vou deixá-lo com
seus esquemas. Boa sorte, Pucker. Você vai precisar. — Depois de lhe soprar um
beijo, o rei do submundo desapareceu.
Sozinho, Puck olhou para a sacada de Gillian, ondas de determinação se
derramando sobre ele, antagonizando Indiferença novamente.
Inalar, exalar. Hades prometeu distrair William amanhã. Puck não confiava
nele. Nem em ninguém. Sin lhe ensinara. Mas dúvida e preocupação eram uma
coisa que no momento ele não sentia. Ele continuaria como planejado, e o que
acontecesse, aconteceria. Ele negociaria.
O que não faria? Desistir.
Moça, você já é minha.
Puck passou a noite apaziguando Indiferença, reforçando cada camada de gelo
em torno de seu coração e mente. Não sinto nada, não quero nada. Guerra vem
antes das mulheres, sempre.
Quando encarasse Gillian em seguida, ele estaria preparado. Sua beleza não
o afetaria, nem seus instintos possessivos o conduziriam.
Assim estava decidido, assim seria.
Quando o sol nasceu, Puck se posicionou em um banco de sombras,
observando enquanto Hades tentava — e falhava — convencer William a deixar o
reino. Horas se passaram, a sensação de impaciência retornando.
O tempo não era seu amigo. O tempo não era amigo de Gillian.
Finalmente, Hades disse a William que tinha uma pista de uma cura para
Gillian e William felizmente abandonou o navio, concedendo a Puck uma
oportunidade de se encontrar com Gillian sem restrições. A menos que o rei do
submundo pretendesse emboscá-lo?
Não importa. Estarei preparado.
Puck vagou por um oásis de palmeiras, o olhar trancado em seu alvo. Ela
descansava na praia em uma espreguiçadeira, um dossel branco e fino lhe
fornecendo sombra. Ela já havia perdido o peso que não podia se dar ao luxo de
perder. O brilho do seu cabelo tinha esmaecido, e o lindo tom de rosa em suas
bochechas abatido.
Quanto tempo lhe restava?
Instintos protetores surgiram. Gelo rachou quando sua borboleta tatuada
viajou do ombro até a coxa.
Respirando fundo, procurando calma, ele se aproximou de Gillian. Um sol
dourado se punha no horizonte, pintando o céu com um arco-íris de cores
diferentes e refletindo a água — e os olhos dela. Um ambiente tão bonito e tranquilo,
perfeito para a sedução. Ele quase sorriu. William preparou o palco da sua própria
ruína.
Ao redor dela, oito guardas armados.
Só oito?
Minha futura esposa — reformular a frase. A garota merecia coisa melhor.
Preciso ensinar a William o erro de seus atos.
— Precisa de alguma coisa, senhorita Bradshaw? — falou um dos guardas.
Bradshaw, um dos seus codinomes. William não queria que soubessem de sua
verdadeira identidade?
— Não, obrigada — Gillian disse, sua voz pouco mais que um sussurro.
Tão fraca. Tão perto do fim. Crack, crack, seu gelo estava rachando. Se o
demônio derrotasse Puck antes que ele garantisse um vínculo com ela... Preciso
agir mais rápido.
Movendo-se a uma velocidade que nem mortal nem imortal poderia
acompanhar, ele derrubou os primeiros quatro guardas. Quando os outros
perceberam que um inimigo se escondia por perto, armas foram erguidas. Tarde
demais. Puck os derrotou com a mesma facilidade e rapidez.
Limpando as mãos após um trabalho bem feito, ele caminhou para o lado de
Gillian. O cheiro de poppiberries encheu seu nariz, deliciosamente intoxicante e
tão mágico quanto o lar, incitando-o a se aproximar ainda mais e...
Rosnado.
Puck quase perdeu o equilíbrio. E eu me considerava preparado? A garota
mantinha algum tipo de encanto estranho sobre ele, capaz de fazer em segundos o
que a maioria das pessoas não conseguia fazer em meses: afetá-lo.
Ao avistá-lo, ela ofegou. Então olhou para baixo, como se não pudesse
suportar sua imagem. Pânico irradiava dela, a emoção que ele não queria que ela
sentisse — e ele ainda não tinha falado uma palavra!
Por que ela temeria a presença dele quando não a machucara da última vez?
Por que iria...
Seu olhar disparou para ele, demorando-se em sua tanga, antes que ela mais
uma vez desviasse o olhar.
O material estava danificado, esfarrapado e revelando mais do que escondia.
Facilmente remediado.
Deveria remediar a situação? Talvez ela temesse sua reação ao corpo dele.
Talvez ela gostasse demais da imagem dele.
Um homem podia sonhar.
Em um piscar de olhos, Puck retornou a um soldado caído, roubou uma
camisa e colocou os braços através dos buracos. As calças do homem eram muito
pequenas. Cada calça provou ser muito pequena. Muito bem. Pelo menos a camisa
era comprida o suficiente para cobrir seu membro enquanto ele crescia... e crescia.
Quando ele voltou para Gillian, abotoou as lapelas, não percebendo até muito
tarde que ele havia alinhado os dois lados incorretamente.
— Melhor? — Ele perguntou.
— Você os matou? — Ela exigiu em sua voz quebrada, ignorando sua pergunta.
Ele sentou ao lado de sua cadeira e olhou para a água, dando-lhe um momento
para se ajustar à sua presença, fazendo o seu melhor para convencê-la — e
Indiferença — de que não estava ciente de todos os seus movimentos.
— Apenas os coloquei para dormir. Mas posso cortar suas gargantas, sem
problema. Apenas diga uma palavra.
O desejo dela, sua ordem.
— N-não. Por favor. Não — ela deu uma sacudida quase imperceptível de
cabeça.
Chateada com a ideia de alguns assassinatos? Adorável.
— Muito bem, então. — Vê como posso ser complacente, mulher? Sou perfeito
para você.
Enquanto ela o estudava mais atentamente o avaliando, seu pânico retrocedeu.
Excelente. Ele deu uma rápida olhada em seu rosto para julgar quanto tempo
levaria para que ela ficasse de calma a intrigada — do jeito que ele a deixou durante
a última visita — e franziu a testa.
Ela não estava calma. Estava agradecida. Pobre moça. Quão baixos eram seus
padrões de masculinidade?
Não que Puck se importasse. Claro que não se importava.
— Por que você está aqui? Realmente? — Ela perguntou, franzindo a testa.
Ele precisava de uma desculpa, algo que ela pudesse acreditar, mas
interessante, talvez até embebido em verdade, em vez de mentiras.
— Eu te disse que sou o Guardião de Indiferença e que você pode me ajudar.
Você pode me ajudar a sentir. — Ou melhor, sentir sem consequências. Uma vez
que Puck reivindicasse a coroa de Connacht, matasse Sin e unisse os reinos, ele
arriscaria usar as tesouras em Indiferença.
— Eu prometo a você — disse ela, absolutamente sincera — que não posso
fazê-lo sentir nada.
Você já fez. Mais do que qualquer outra pessoa.
Tão necessária para meus objetivos quanto perigosa... Um dia ele poderia ser
mais bem servido a matando.
Isso! Esse era o perigo do gelo.
Inconsciente de seus pensamentos, ela se moveu para ficar mais perto dele,
lembrando-o de um gatinho em busca de mais calor. Como ele queria estender a
mão, passar os dedos pelos cabelos dela, traçar os nós dos dedos ao longo da sua
mandíbula e se deleitar na sua suavidade.
Deleitar? Eu? Resista ao seu fascínio.
— Você pode. Você vai — ele disse, consternado pela rouquidão de seu tom.
Não deveria ter problemas em se manter destacado.
Hora de mentir.
— Disseram-me que sua situação é tão triste que vou vir a me importar. E
quero muito me importar...
O sexo frágil gostava de bad boys — ou melhor, de projetos de bad boys — que
se derretiam por apenas uma mulher especial. Não vê, moça? Você é a única com o
poder de me salvar...
— Quem te disse isso? — Perguntou ela. Seu olhar assumiu um tom longínquo,
como se sua mente tivesse vagado, mesmo quando falou em seguida: — E por que
iria querer se importar? Tire isso de mim. Se importar com outra pessoa é algo
altamente superestimado. — Ela mordeu o lábio inferior. — Você se importa... com
alguma coisa?
Ele fingiu pensar sobre e suspirou.
— Nem sequer um pouco — Embora ela parecesse perdida em seus
pensamentos novamente, ele acrescentou: — Foram os Oráculos do meu reino que
me falaram de você. E eu quero me importar porque é meu direito. — Mais verdade,
tom mais duro, as palavras escapando espontaneamente. Importar-se sem punição
era um direito de todos, humanos e imortais.
Se ela ouviu a última parte de seu discurso, não mostrou.
— Alguma vez sente algo? — Ela perguntou, algo parecido com inveja
pulsando dela e o confundindo.
— Só muito raramente, e então... — Ele apertou os lábios. Não havia uma boa
razão para contar a ela sobre a fraqueza que o demônio lhe infligia, e havia todos
os motivos para manter a informação em segredo. Conhecimento era poder, e Puck
nunca de bom grado concederia a alguém mais poder sobre ele.
— Sorte — ela murmurou. Estava com inveja dele. Que criatura estranha.
Mas ela não sabia o preço de uma existência apática. Como ela iria perder
seus entes queridos e amigos, família e lar. Como suas comidas favoritas se
tornariam insípidas. Como viver equivaleria a sobreviver. Como passatempos
amados já não despertariam alegria. Como o sexo a deixaria vazia.
— Sorte? Moça, eu poderia atear fogo em você. Enquanto gritasse em agonia,
eu a veria queimando, apenas interessado no calor das chamas em uma noite fria.
— Ok — ela disse, sua aceitação calma da admissão não intencional dele o
surpreendendo, — talvez sorte seja uma palavra muito forte. — Uma vez, duas
vezes, ela deu uma olhada para ele através do espesso leque de seus cílios. — Você
vai atear fogo em mim?
— Não. — Em um esforço de provocá-la como os heróis muitas vezes
provocavam suas heroínas, ele acrescentou: — Deixei meus fósforos em casa.
Sucesso! A sugestão de um sorriso enrolou os cantos da boca que parecia um
arco de Cupido, como se ela o achasse adorável.
O desejo aqueceu seu sangue e endureceu todos os músculos de seu corpo,
ganhando um grunhido de Indiferença. As mãos de Puck se fecharam em punhos.
Para que seu plano funcionasse, ele precisava parar de responder a cada
palavra e ação dela, e rápido.
Uma brisa fresca e salgada atravessou as areias e Gillian estremeceu. Ainda
febril?
Não quero nada, não preciso...
Foda-se. Então. Naquele exato momento, Puck se tornou indiferente ao
demônio, ao castigo, a qualquer consequência que pudesse ter que enfrentar.
Tremendo com a necessidade de cuidar de sua futura esposa, ele tirou sua camisa
e deixou o material cair sobre seus ombros delicados. Enquanto ela se enroscava
no calor da roupa, uma chocante satisfação quase o desfez. Ele a saboreou, sua
mente despojada de qualquer defesa.
Satisfação... como sentiu falta disso. Não apenas sexualmente, mas a
satisfação de um trabalho bem feito. Uma guerra bem travada. Me dê mais. Eu
preciso de mais.
ROSNADO.
Puck enrijeceu. Talvez ele devesse ir embora, ganhar tempo para se reagrupar
e retornar quando reorganizasse suas prioridades com sucesso. Sim, sim. Era
exatamente isso que deveria fazer. Ao se levantar, entretanto, o olhar de Gillian
caiu em seu peitoral e se demorou, e Puck quis rugir de prazer. Sem pensamento
consciente, ele se viu mudando de marcha... e se acomodando com mais firmeza
onde estava. Talvez ficasse um pouco mais.
— Obrigada — ela murmurou.
Pela camisa?
— Não há de quê — Qualquer coisa por você, moça. Confie em mim...
A culpa o incomodou — quero sua confiança, mas não a mereço. Mesmo assim,
ele destruiu impiedosamente essa emoção.
— Então, é, como você ficou invisível? — Ela perguntou. — Quero dizer,
quando lutou com os guardas.
— Não fiquei. Eu me movi rápido demais para você ou eles acompanharem.
— Isso é legal.
Apenas legal?
— Minhas habilidades são lendárias. — Vangloriando-se agora? Esperando
impressioná-la?
Ela lambeu os lábios, como se estivesse se preparando para uma discussão.
— Para adquirir uma habilidade assim, você deve ter vivido muito tempo.
Provavelmente conhece todos os tipos de fatos sobre, digamos, uma doença
sobrenatural... como morte ad vitam.
Ah. Ela tinha ouvido o termo e agora procurava respostas. Contar ou não
contar?
— O que é morte ad vitam? — Ela perguntou quando ele permaneceu em
silêncio.
Ele passou a mão na mandíbula, a barba espessa o cumprimentando.
— É isso que você tem, então?
— Sim. Todo médico concorda — ela engoliu em seco. — O que significa?
Conte, ele decidiu.
— Você recebeu uma poção. Seu corpo está tentando evoluir, tentando se
tornar imortal, mas não é forte o suficiente. Agora só há uma chance possível de
sobrevivência. — Ele fez uma pausa para um efeito dramático. — Você deve se
casar... vincular-se a um imortal e unir sua alma à dele.
Esperança iluminou seus olhos. Um piscar de olhos, e a esperança se foi.
— Mas nem mesmo isso é uma garantia — continuou ele. — Você poderia
drenar sua força e matá-lo. Ou pior, torná-lo humano.
Primeiro ela exibiu choque. Depois horror, aceitação e medo. Finalmente
repulsa. Sua confusão retornou redobrada. Por que repulsa? Mulheres não
sonhavam em se casar com um homem forte que oferecesse a elas segurança ao
longo da vida?
Medo ele entendia e esperava, mesmo quando parte dele se ressentia. Ela
recuava com o pensamento de pôr a vida de William em perigo.
Sorte de William, ter uma mulher tão preocupada com seu bem-estar a ponto
de fazer qualquer coisa, até mesmo morrer, para salvá-lo.
Morrer... para salvar outro homem... Por um momento, Puck viu vermelho.
Literalmente. Minha esposa será leal a mim e não a outro!
Indiferença rugiu com desagrado.
Inalar, exalar. Proceda com cuidado. Muito perto de cruzar a linha de chegada.
Inalar. Bom, isso era bom. Expirar. A névoa carmesim desapareceu do olhar de
Puck.
— Bem, isso é uma merda — Gillian murmurou, alheia ao tumulto que causou.
Com o olhar distante novamente, ela começou a balbuciar. — Eu não fazia ideia...
pensei que imortais fossem criados totalmente formados ou nascessem de outros
imortais.
— Imortais nascem de mais de uma maneira.
Ela piscou rapidamente, voltando sua atenção a ele. — Quanto tempo eu
tenho antes de...
— Considerando sua condição atual, eu diria outra semana, talvez duas. —
No máximo.
— Que chato — ela enrugou o nariz. — Nunca vou conseguir fazer as coisas
da minha lista de desejos. Quer dizer, se eu tivesse uma.
— Talvez devesse fazer uma. Eu posso ajudar — sua primeira sugestão:
vincular-se a uma fera.
Ela inclinou a cabeça para o lado, os olhos cor de uísque mais uma vez
admirando.
— Por que você iria querer me ajudar com isso?
De alguma forma, seu escrutínio fez com que ele se sentisse menos como um
monstro e mais como um homem, como se ela não visse o que ele era, mas o que
poderia ser.
Uma ilusão, nada mais.
— Você poderia usar uma distração e eu poderia usar uma nova meta. — Um
núcleo de verdade com a intenção de ganhar pena. Outros podiam desdenhar um
golpe em seu orgulho, mas não Puck. Não mais. — A mulher que eu queria não me
queria, então nos separamos. — Verdade. Ninguém me quer, buá. Pobre de mim.
— Agora... — Ele deu de ombros. Me conforta?
A mulher em questão — Winter. Ele a desejava o máximo que era capaz; nunca
conheceu uma mulher como ela. Forte o suficiente para derrubar um exército por
conta própria. Mas quando ela o recusou, ele não se importou o suficiente para
tentar fazê-la mudar de ideia.
Desculpe, menino fera, mas estou apaixonada por outra pessoa. Eu! Você
entende, não é? Sem ressentimentos. Tirando esse ressentimento aí dentro da sua
calça.
Ele se afastou sem uma pontada de arrependimento.
— Mulheres são metas para você? — Perguntou Gillian, parecendo um pouco
ofendida, mas muito curiosa ante a perspectiva.
Curiosidade continuada era muito bom sinal.
— Por que não? Meus objetivos, assim como minhas regras, me impedem de
sentar em um sofá, assistindo novelas o dia todo, todos os dias, enquanto como
pizza velha.
Vincular. Escoltar. Retornar.
Hesitante, ela disse:
— Mas se você não consegue sentir, como quer uma mulher?
— Eu raramente sinto emoção, mas muitas vezes sinto desejo — Em particular,
desejo uma certa beldade de cabelos escuros. — Os dois não são mutuamente
exclusivos, moça.
Se Gillian o quisesse, ele se iria pra cama com ela. As coisas que ela o fazia
desejar...
Mais uma vez ele se perguntou se ela teria o poder de fazê-lo gozar, e como
Indiferença reagiria.
Havia apenas uma maneira de descobrir...
Se tivesse que mentir e dizer a William que nunca tocaria nela, mentiria.
Qualquer coisa para alcançar seus objetivos. Ou talvez estaria melhor servido se
recusando manter suas mãos pra si mesmo. Homens ciumentos faziam coisas tolas,
como concordar em ajudar um completo estranho a assassinar outro completo
estranho.
Claro, tudo dependia da capacidade de Puck em salvar Gillian da morte certa.
— Você tem um bom argumento, suponho. — Ela lhe ofereceu um pequeno
sorriso, e mesmo assim, nunca uma mulher lhe pareceu mais triste. — Eu sinto
todo tipo de emoção, mas jamais desejo.
Então ela não ansiava em ir pra cama com seu precioso William? Uma mentira,
com certeza.
— Nunca desejou um homem? — Fale-me a verdade. Fale agora. Por alguma
razão, Puck precisava saber.
Indiferença cavou suas garras mais fundo enquanto emitia outro rugido de
advertência.
Gillian se afastou dele, seu corpinho ainda mais tenso do que antes, os olhos
escuros assombrados. Envolta pelo sol poente, ela irradiava mais dor do que
qualquer pessoa poderia suportar. Ou sobreviver a tal. Principalmente uma
humana frágil à beira da morte.
O gelo que ele tinha conseguido manter — já era.
— Não quero falar sobre isso. — Lembrando-o de um animal ferido
encurralado por um predador faminto, ela atacou, dizendo: — Mude de assunto ou
vá embora.
Puck não mudou de assunto e não foi embora. Escolho a porta número três,
moça.
— Ah. Entendo — ele disse. — Alguém te machucou. — Ele proferiu as
palavras com naturalidade, mas no fundo, no fundo, ele fervia. Quem tinha se
atrevido a brutalizar sua esposa?
Pensando nela como esposa agora, em vez de futura esposa?
A tatuagem de borboleta chiou ao retornar ao seu ombro.
Por causa das punições do seu demônio, Puck estava intimamente
familiarizado com a impotência que acompanhava a incapacidade de impedir um
ataque. Enquanto incapacitado e incapaz de lutar de volta, ele também fora
brutalizado dos piores modos. Só quando sua força retornava é que era fácil
retribuir a violência com piores formas de violência. Ele duvidava que aquela flor
frágil já tivesse reunido força suficiente para fazer o mesmo.
— Vou matar o homem responsável, quem quer que ele seja. — Com prazer.
Derramando muito sangue. — Só me diga o nome dele.
— Nomes. No plural — ela retrucou, depois apertou os lábios.
— Um homem ou cem, não faz diferença para mim. — Mataria todos eles.
Sangue fluiria num fluxo grande e arrebatador.
— Obrigada pela oferta — ela murmurou desinflando — mas acho que eles já
estão mortos.
Ela achava ou sabia?
Considerando seu relacionamento com o da escuridão...
— William deve ter dado a punição. — E escondido os detalhes dela?
Pelo que Puck já havia observado do homem cheio de segredos — sim,
absolutamente.
Um de seus ombros delicados se ergueu, sua única resposta a pergunta dele.
— Você e William são colegas?
— Eu já ouvi falar dele, e tenho certeza que ele já ouviu falar de mim — quem
não? — mas nunca nos conhecemos oficialmente. — Verdade.
— Se quer ser amigo dele, entrar escondido em sua propriedade não é...
— Oh, não quero ser amigo dele. — Outra verdade surgiu espontaneamente.
— Ele pode me odiar. — Ódio era garantido. — De uma forma ou de outra, eu não
me importo.
— Isso é imprudente. Se não é amigo dele, é seu inimigo. Seus inimigos têm
uma morte dolorosa.
— Você se importa? — Se ela conseguia aceitar o lado sombrio de William,
poderia aceitar o de Puck. Um ponto a seu favor. — Meus inimigos morrem
agradecidos, felizes por finalmente escaparem de mim.
Agora ela revirou seus olhos.
— Vocês imortais e suas rixas de sangue.
— Não quer dizer nós, imortais? — Melhor que ela aceitasse seu destino o mais
rápido possível. Uma eternidade a esperava, ela estando pronta ou não.
Ânsia pulsava nela.
— Não, não quis. Eu vou morrer, lembra? Antes da transformação estar
completa. O que significa que seria estúpido fazer uma lista de coisas para fazer
antes de morrer.
Porque ela seria forçada a escolher coisas que poderia fazer de seu leito de
morte? Que... triste.
— Você vai morrer, sim — Ele encontrou uma pedrinha e a jogou na água,
dando-lhe um momento para que ela absorvesse suas palavras. A hora de bancar
o herói tinha chegado. — Ou eu poderia me vincular a você. — Ansioso demais? —
Eu suponho — acrescentou. Não estava bom o suficiente. Ele precisava soletrar
seu papel. — Eu poderia salvá-la unindo as nossas almas.
Ela o olhou de boca aberta... com interesse?
— Hã, o único jeito de me salvar é se vinculando a mim? Então você está
literalmente me fazendo uma proposta de casamento?
— Sim. — Aproximando-se do “ansioso demais” outra vez? — Não — disse
então. Desinteressado demais? Um som frustrado se formou em seu peito e ele
apertou os lábios. — Eu não quero me vincular a você, mas também não quero não
me vincular a você. — Se ele pudesse ter chutado a própria bunda, teria chutado.
Vai pôr tudo a perder. — É apenas algo a se fazer. Algo mutuamente benéfico —
Melhor.
Ela achatou as mãos no estômago como se para afastar uma dor terrível.
— Você não está preocupado que eu o transforme em mortal?
Não mais. Nem um pouco.
— Sou o dominante entre nós. Minha força vital dominará a sua, tenho certeza
disso. — Então você será minha, e somente minha... por um tempo.
Ela abriu a boca, fechou. Abriu e fechou.
Dentro de Puck, a antecipação e o nervosismo competiam pela supremacia,
incitando Indiferença a atacar e se rebelar.
Vamos, moça. Rápido! Diga-me o que preciso ouvir.
Finalmente, Gillian suspirou e disse:
— Obrigada pela gentil oferta/não oferta, mas acho que vou passar.
Uma nova onda de frustração se juntou ao dilúvio, fazendo com que a birra
do demônio se intensificasse mais um grau. Cuidado.
Não! Nada de cuidado. Nem aqui e nem agora. Puck precisava saber o que
havia feito de errado.
Tentando um tom razoável, ele disse:
— É por causa dos meus chifres? — Dos pêlos? Cascos? Se ele pudesse mudar
de forma, como podia antes de ser possuído.
Parecendo perdida novamente, ela cruzou os braços. Despertando
compaixão...
— Eu posso serrá-los — ele disse, prosseguindo. — Eles somem por um tempo.
Sem resposta.
— Eu nem sempre tive essa aparência.
— Não — ela respondeu, e ele teve que pensar ao que ela se referia..
Aos seus chifres, ele percebeu.
— Aparência não tem nada a ver com isso. — Quando ela olhou para ele
novamente, sua respiração estava trabalhosa, sua pele pontilhada pela
transpiração. — Você iria querer ter... você sabe.
Você sabe?
— Sexo?
Com um rubor glorioso aparecendo em suas bochechas momentaneamente
dando-lhe a ilusão de saúde, ela assentiu.
Muitas vezes e de todas as formas, moça.
Se ele pudesse gozar sem punição. Inferno, se ele pudesse gozar e pronto.
Embora a garota o tivesse feito sentir nas últimas vinte e quatro horas o que
ninguém conseguiu... ele não podia se lembrar há quanto tempo... ela podia não
ser capaz de superar sua necessidade constante de ceder à Indiferença.
— Correto — ele disse, sua voz mais dura do que pretendia, cheia de força e
nenhuma sedução. Considerando a tragédia de seu passado, ela iria requerer
gentileza. Uma habilidade que Puck não tinha certeza se empregava. Antes de sua
posse, ele tomava suas mulheres de modo rude. — Eu gostaria.
— Bem, eu não faria. Nunca.
— Você pensa isso agora, mas eu a faria mudar de ideia — Ou morreria
tentando.
Não, absolutamente não. Guerra vinha antes das mulheres.
Se ele tivesse que tirar o sexo do jogo, ele faria. E diria isso a ela... iria
tranquilizá-la... a qualquer momento agora...
Ele pressionou a língua no céu da boca e permaneceu em silêncio. De jeito
nenhum se limitaria a um grau desses. Porque quando se tratava de sexo, ele não
mentiria. Nisso, sempre seria sincero com ela.
Enquanto considerava cuidadosamente sua próxima declaração, ele
encontrou e atirou outra pedra.
— Eu nunca a forçaria — disse. — Esperaria até que você quisesse... me
quisesse.
— Estou te dizendo, não importa o quanto seja habilidoso, você teria que
esperar para sempre.
— Eu a teria na cama dentro de um mês, garantido.
Ela amoleceu, irradiando arrependimento, como se temesse ter ferido seus
sentimentos. Ao mesmo tempo, arrepios agraciavam sua pele, como se ela gostasse
da ideia.
Tão expressiva... tão linda.
Mais gelo rachou, calor floresceu no centro do peito. Ele ficou duro e dolorido,
seu corpo desesperado por alívio.
Ah, sim. Com ela, ele seria capaz de gozar.
A excitação ardia profundamente dentro dele. Silenciosamente, disse a ela:
Confie em mim, mulher. Deixe-me libertá-la dos seus medos.
RUGIDO.
Puck saltou, o calor esfriando.
À distância, um galho estalou. Orelhas se movendo, ele enrijeceu e procurou
no oásis... logo pegando o cheiro de assassinato e caos de William na brisa.
— William retornou — em péssima hora. — Ele estará aqui em cinco... quatro...
três...
— Você deve ir — Gillian fez um movimento de enxotá-lo com as mãos. — Por
favor.
Ela se preocupava com o bem-estar de Puck? Que doce e adorável. E
totalmente inesperado.
— Um — disse ele, terminando a contagem regressiva. Ele disparou para uma
palmeira a cem metros de distância, o tronco grosso o escondendo enquanto
também permitia que ele pudesse vigiar Gillian.
William saiu da casa, as pernas levando-o diretamente para a garota. Quando
ele notou os guardas inconscientes, maldade brilhou em seus olhos,
transformando momentaneamente as íris cristalinas em vermelho néon.
— Você está bem, boneca? Os guardas...
— Estou bem — disse ela, examinando a área. Não encontrando sinal de Puck,
ela deu um suspiro... de alívio? Feliz por ele ter escapado em segurança? Ou feliz
por Puck não lutar, nem ferir, seu precioso William?
Ele fechou os punhos com raiva.
— O que aconteceu com meus soldados? — William perguntou enquanto se
agachava ao lado dela.
Ela diria a verdade? Tentaria proteger Puck? Ele queria que ela tentasse —
que se importasse?
— Alguém aconteceu a eles — disse ela, então hesitou. — Um homem. Puck.
Um lampejo de desapontamento. Ela mencionaria sua proposta? Se William
conseguisse bloquear sua união, toda esperança estaria perdida.
— Ele veio aqui e se moveu tão rapidamente que eu não consegui segui-lo —
acrescentou ela. — Os guardas não foram páreo para sua velocidade e força.
Ela me elogia. Um arrepio de orgulho fez outra fissura no gelo.
Indiferença meteu as garras na mente de Puck, enviando tentáculos de
fraqueza aos seus ossos. Ele praguejou, porque sabia. Era isso, esse era o aviso
final.
Em seguida o demônio ronronaria e Puck estaria ferrado, incapaz de se mover
ou se proteger. Incapaz de ajudar Gillian quando a doença a drenasse.
Ele extinguiu o orgulho com um toque de verdade fria e dura: se falhasse em
alcançar seus objetivos, Sin permaneceria no trono de Connacht. Os cidadãos
sofreriam. Amaranthia sofreria.
Raiva cintilou e ele emitiu outra maldição. Não havia como evitar. Tinha que
invocar mais gelo. Pronto. Melhor.
— Puck. Guardião de Indiferença — William se levantou com uma adaga em
cada mão. Parecia que a reputação de Puck o precedia. — Ele jurou vingança a
Torin por prendê-lo em outro reino.
Errado. Cameron e Winter juraram vingança a Torin. Puck não se importava
o suficiente.
— Mas como Puck escapou? — William perguntou, como se pensando em voz
alta.
Facilmente. Cameron, sendo Cameron, tinha ficado obcecado em encontrar
uma saída.
Gillian enrugou a testa.
— Como sabe o que ele jurou se você nunca o conheceu?
— Meus espiões estão por toda parte, boneca. — O vermelho neon retornou
aos olhos de William. — Puck disse alguma coisa? O canalha fez alguma coisa com
você? Hades o mencionou, disse que ele poderia estar por perto e que eu deveria
deixá-lo em paz, mas isso só me faz querer machucá-lo ainda mais.
Ela bufou e soprou como o grande lobo mau que ela absolutamente não era,
e os cantos da boca de Puck se contorceram.
— Ele me disse o que é morte ad vitam — Quando William lamentou línguas
soltas e visitantes indesejados, ela acrescentou: — Você não vai machucá-lo por
isso. E não vai matá-lo. Nem pagar alguém para matá-lo. Eu deveria ter ouvido a
verdade de você, mas não ouvi, então ele gentilmente se ofereceu para ajudar.
Ela estava tentando proteger Puck.
Gelo, rachando tudo de novo. Corpo indo derreter.
— Se. Ofereceu. Para. Ajudar. Como? — William exigiu.
— Me prometa primeiro — ela insistiu, e se ela não estivesse com a morte
pintada no rosto, poderia ter se passado como meio que feroz. — Por favor.
Silencioso agora, o guerreiro estendeu a mão para arrancar a camisa que Puck
tinha dado a ela. Ela ofegou, assustada. Depois choramingou. William não mostrou
piedade, puxando o tecido dos seus ombros. Assim que a roupa saiu, ele a jogou
na água.
Interessante e revelador — em mais de uma maneira. Embora William nada
soubesse sobre a proposta, já estava se mordendo de ciúmes.
A reação exata que Puck queria, que precisava. Então por que estava olhando
para o peito do outro homem, imaginando afundar uma lâmina em seu coração?
O segundo gemido de Gillian fez com que Puck seguisse em frente, ansioso em
transformar a fantasia em realidade, sem pensar ou se preocupar com Indiferença,
o gelo completamente derretido. William sofreria.
Outro fio de fraqueza se instalou em seus ossos e ele tropeçou. Puck se
agarrou a uma árvore e se escondeu atrás do tronco.
Murmurando um pedido de desculpas, William pegou Gillian nos braços,
agora infinitamente terno, e levou-a para dentro da casa. Embora Puck soubesse
que deveria sair e procurar abrigo, ele se aproximou... ainda mais. Paredes de vidro
do chão ao teto davam boas-vindas à natureza lá dentro — bem como o seu olhar.
Não havia nenhum lugar na casa que ele não pudesse observar.
—... Só pra você saber — Gillian estava dizendo enquanto William a levava
para o andar de cima — eu não vou me vincular a você.
O coração de Puck quase parou. O outro homem havia feito a proposta?
William a colocou em cima da cama, sentou ao lado dela e ofereceu um sorriso
rígido.
— Eu não me lembro de ter pedido, boneca.
Um suspiro pesado de alívio escapou de Puck. Não, nenhuma proposta foi
feita.
— Eu sei que não pediu, assim como sei que não vai pedir — disse ela. —
Deste modo, quando eu me for, você não vai perder tempo se sentindo culpado se
perguntando se deveria ter pedido.
— Você não vai morrer. — Apesar do tom suave de William, uma malícia
inconfundível atava cada palavra. — Eu não vou deixar.
Errado. Eu não vou deixar que ela morra.
Tremendo, ela estendeu a mão para apertar a de William.
— Eu te amo, Liam. Quando não tinha nada nem ninguém, você me deu
amizade e alegria, e serei eternamente grata a você.
Puck respirou fundo. Ela estava se despedindo, preparando-se para a morte,
não estava?
Lute, Gillian. Lute para viver.
Agressão pulsava de William.
— Pare de falar como se isso fosse seu fim.
Ela ofereceu a ele o mesmo sorriso triste que ofereceu a Puck.
— Você tem defeitos. Um monte de defeitos. Mas é um homem maravilhoso.
— Este homem maravilhoso vai encontrar uma maneira de salvá-la — disse
William, seu tom duro como granito. — Estou trabalhando todos os dias, todas as
horas, todos os minutos para garantir que o vínculo não seja necessário. Agora
descanse um pouco. — Cabeça erguida, ele se levantou e saiu do quarto. A porta
bateu atrás dele.
Em vez de olhar aquela porta esperando o retorno de William, Gillian olhou
para a varanda, sua expressão ilegível. Estava esperando por Puck? O peito dele
estufou e não houve como impedir.
Quando os olhos dela se fecharam, Puck entrou no quarto e se aproximou,
como se atraído por um pouco de magia. Ele respirou seu perfume de poppiberry.
— Durma, moça. Vou me certificar de que fique a salvo. — Outra mentira. Por
que enquanto falava, Indiferença começou a ronronar.
Como se uma tampa de ralo tivesse sido puxado em uma banheira, força e
vigor foram drenados de Puck até que seus joelhos mal conseguiram sustentar seu
peso.
Hora de ir.
Ele não foi capaz de deixar o quarto tão silenciosamente quanto entrou, mas
Gillian não acordou. Iria para algum lugar seguro, aguentaria a punição de
Indiferença, depois recuperaria sua força e retornaria. Se a garota morresse nesse
meio tempo...
Era melhor ela não morrer.
Puck tropeçou através das árvores, a injustiça de sua situação borbulhando
dentro dele. A experiência lhe dizia que logo estaria fraco demais para se mover. Às
vezes, ficava completamente inconsciente de seu entorno. Outras, ele sabia o que
acontecia ao redor, mas permanecia incapaz de agir.
Por dias, qualquer um poderia cruzar com ele, atacá-lo — fazer o que desejasse
com ele. Raptar. Prender. Estuprar. Até mesmo cortá-lo em pedacinhos.
Mas não estava preocupado consigo mesmo. Considerando a condição de
rápida deterioração de Gillian, o tempo era o maior inimigo dela — e seu.
Preciso garantir minha sobrevivência. Não poderia ajudá-la se morresse.
Prioridade: assegurar um esconderijo.
Nunca se aproximar de um inimigo até ter observado sua localização e garantido
um abrigo.
A voz de Sin saiu da lama da memória de Puck, tão bem-vinda quanto
desprezada. Estava tão envolvido em Gillian e com as coisas estranhas que o fazia
sentir, que não tinha se preocupado com os seus arredores. Provavelmente não
teria se importado, de qualquer maneira. E não apenas por causa de Indiferença.
Sin costumava fazer toda a parte de exploração e segurança, deixando Puck com a
batalha. Agora, em seu estado mais fraco, ele precisava encontrar abrigo e criar
uma defesa indestrutível.
A menos que Hades interviesse, William iria procurá-lo.
Em momentos como esse, Puck sentia falta de Cameron e Winter. Eles o
amavam do jeito especial deles, quando ninguém mais amaria ou conseguiria.
Sempre que Indiferença o sobrepujava, eles o protegiam. Por séculos, eles
garantiram que suas habilidades de batalha permanecessem bem afiadas,
forçando-o a praticar. E quando ele perdia seus objetivos de vista, eles o lembravam.
A relação também não tinha sido unilateral. Sempre que Obsessão superava
Cameron, o guerreiro passava dias — semanas — trancado em um quarto,
conversando apenas com o demônio, recusando-se a comer ou dormir. Ele
precisava de um campeão disposto a lutar e lutar muito, para distraí-lo com uma
nova obsessão. Winter nunca foi a melhor candidata. Para ela, um único ato
altruísta vinha com consequências devastadoras.
Demônios sempre vinham com um preço.
Sempre que Winter desafiava Egoísmo e agia de forma altruísta, ela caía em
uma odisséia de loucura que durava uma semana. Só tempo suficiente para
destruir um reino inteiro, sem deixar sobreviventes... e Winter com lembranças
violentas que nunca poderia esquecer.
Puck ajudava os irmãos de maneiras que ninguém mais conseguiria e
compartilhava seu gelo.
Os irmãos tinham sofrido sem ele?
Talvez, provavelmente, mas pelo menos eles tinham um ao outro, do jeito que
Puck um dia teve a Sin.
Puck! Puck! Outra memória surgiu, Sin, aos onze anos de idade, soluçando
na cabeceira de Puck. É melhor você se curar desse ferimento ou serei forçado a
matar... todo mundo. Eu não posso fazer a vida sem você.
Oh, como Puck sentia falta do menino que Sin tinha sido. O amigo que se
tornou.
Indiferença ronronou mais alto enquanto escorregava pelo seu corpo e sugava
cada vez mais de sua força. Tremores cascateavam por seus membros. Um por um,
seus ossos pareciam se transformar em macarrão cozido e seus músculos em sopa.
Cada passo adiante se tornava uma lição de angústia.
Quando seu pé encontrou uma pedra, ele tropeçou. Embora tentasse se firmar,
seus joelhos cederam. Ele caiu, grãos de areia agarrados à sua pele suada. A
escuridão provocava os limites de sua mente, rapidamente ganhando novos
territórios.
Não. Lute! Em um local tão aberto assim, ele era um alvo. Um alvo fácil. Mas
ainda enquanto lutava para ficar de pé, o demônio drenou o resto de sua energia,
transformando respirar em uma façanha.
— Aí está você. Finalmente! — O riso feminino se filtrou em sua consciência.
— Eu estava começando a pensar que tinha confundido os dias, mas depois lembrei
que a única vez em que errei foi quando pensei que estava errada.
Ele reconheceu a voz dela. Keeley, a Rainha Vermelha. Amiga de Gillian e de
William. Aquela que havia dado Indiferença a Sin com instruções de possuir Puck,
e depois encarregado Hades a lhe oferecer ajuda.
Que horror novo ela tinha reservado para ele hoje?
— Torin, uma mãozinha, por favor — pediu ela.
Torin, Guardião de Doença. Aquele que esperava que Puck atacasse na
primeira oportunidade.
Ele estava fraco demais para protestar quando braços sólidos como rocha o
envolveram e o puxaram para cima contra um peito musculoso. Por dentro, no
entanto, ele lutava como a fera que se tornaria — sem sucesso.
— Onde você o quer? — Torin perguntou. — E não se atreva a dizer dentro
das minhas calças. Não outra vez.
— Das calças de quem? Da sua ou da minha?
— De qualquer uma — respondeu o Guardião de Doença.
Keeley resmungou.
— Eu gosto dele exatamente onde está. Olhe pra você, querido. Seus bíceps
estão saltando!
Um puff leve deixou Torin, como se ele lutasse contra uma vontade poderosa
de rir e xingar ao mesmo tempo.
— Concentre-se, princesa, e me diga para onde estamos indo.
— Para a nossa cabana secreta de amor, é claro.
O som de passos se misturou com o estalo de galhos, criando um refrão
sinistro. Puck detestava aquilo com cada fibra de seu ser. A impotência. A incerteza.
A maneira como a escuridão em volta de sua mente o provocava, ameaçando enviá-
lo ao esquecimento a qualquer momento.
— Minha fera sexy é magnífica, não é? — Perguntou Keeley. Dedos quentes e
macios percorreram a testa dele.
Um grunhido reverberou no peito de Torin, sem nenhum indício de diversão.
— Ouvir você ser poética com outro homem tende a me deixar com um humor
assassino.
Sexy — Puck? A fera dela? O casal sabia sobre seu plano de se unir a Gillian,
chantagear William e matar Sin? Teria Keeley realmente sabido o que aconteceria
todos aqueles séculos atrás quando ela dera a caixa a Sin? Hades parecia pensar
que sim.
— Own, a auto-estima do meu bebê está doendo. — Sua voz estava baixa,
rouca. — Aqui, deixe-me ajudar a melhorar.
O som de uma palma batendo em pele.
— Ai. — O corpo inteiro de Torin se sacudiu. — Isso dói.
— E há mais de onde veio — disse Keeley, e Puck a imaginou balançando o
dedo para o marido. — Você é o homem mais incrível de todos os tempos, e eu sou
a mulher mais fiel. Aja de acordo.
— Sim, senhora — Torin deu risada, só para depois ficar sério. — William vai
ficar furioso se descobrir que estamos ajudando o futuro marido de Gilly.
Ajudando o futuro marido da garota — eu? A Rainha Vermelha previu até isso?
Claro que sou eu! O prêmio já era meu.
Ela soltou um suspiro pesado.
— Eu lido com William quando chegar a hora. Você sabe, quando ele perceber
que eu salvei a vida de Gillian, e a sua eternidade, e a sua verdadeira companheira,
e ele implorar pelo meu perdão. Oh! Dê uma olhada. Hoje mais cedo eu falei com o
espelho mágico de Hades.
— O que contém a deusa dos muitos futuros?
— Exatamente. Agora eu tenho uma boa pista sobre o melhor caminho para
Willy e, uau, aquele garoto entrará em um mundo de dor. Sua companheira vai lhe
dar bastante trabalho. O que me lembra. Eu devo contar a Gideon e a Scarlet sobre
o bebê deles.
— Há algo errado? — Torin perguntou, sua preocupação evidente. — Ou você
está tentando me dizer que Gideon e Scarlet darão à luz a companheira de William?
— Não, nada assim. Mas eles precisam saber que ilusão não é apenas ilusão,
mas também visão, e William precisa saber... o que? Esqueci. Algo sobre o
decifrador de códigos... uma ilusão...
— Eu não tenho ideia do que você está falando, princesa.
Nem Puck, e ele não se importava o suficiente para gastar energia tentando
encaixar as peças do quebra-cabeça.
Torin pulou em uma pedra, o movimento abrupto chocando o cérebro de Puck
contra o crânio. A escuridão parou de brincar e começou a encobrir sua mente. Ele
perdia e ganhava consciência, só recobrando-a quando seu salvador o colocou em
uma superfície dura e plana, com pedras frias se enterrando em suas costas.
—... fazendo isso? — Torin estava dizendo.
— Ele quase foi meu enteado — respondeu Keeley. — Eu quero vê-lo feliz, o
que quer dizer que ele tem que ser empurrado para o caminho certo. Mas também
amo Gillian e quero que ela seja feliz. Também amo Puck e quero que ele seja feliz.
Ou eu vou amar Puck, um dia. Essa é a única maneira de alcançar o final perfeito
para todos os três jogadores, um plano que coloquei em prática há muito tempo.
Ela amava Puck — ou amaria — mesmo sem conhecê-lo? Ela pensava que
forçá-lo a hospedar Indiferença o ajudaria a alcançar o final perfeito?
Mulher louca. Ela tinha arruinado tudo.
— Você esteve errada antes, você sabe. Ele não vai nos agradecer —
murmurou Torin. — Nunca.
— Eu não te ensinei nada? — Perguntou Keeley. — Temos que fazer o que é
certo, não importa a reação que vamos receber dos outros. Além disso, as pessoas
podem surpreendê-lo.
— Você está certa. As pessoas podem surpreender... com uma faca nas costas.
A escuridão se fechou mais uma vez...
Enquanto Torin soltava uma série de palavrões, as pálpebras de Puck se
abriram. Através de uma névoa, ele pensou ter visto paredes rochosas, a sombra
de um guerreiro e o perfil de uma loira peituda.
— Ela também não vai nos agradecer por isso — disse Torin.
— Ela vai — Keeley respondeu, depois suspirou. — Bem, talvez não no começo,
mas um dia. Se a recompensa não valer à pena... — Dedos suaves bateram,
bateram, bateram, na bochecha de Puck. — É melhor que você valha isso, Plucky.
O tempo está se esgotando. Ela está morrendo. Você está quase atrasado. Ou talvez
já esteja muito atrasado. A vida e a morte são tão confusas para os com inclinações
psíquicas.
Embora ele lutasse para acordar — devo chegar a Gillian! — a escuridão caiu
novamente.
***
Gillian perdia e recobrava a consciência. Em seu estado febril, ela pensou que
talvez sim/talvez não, provavelmente estivesse/ provavelmente não tendo uma
conversa com Keeley.
Ela não conseguia decidir o que era real e o que não era porque, por uma vez,
não fazia ideia se estava sonhando ou acordada, ou se estava confundindo o
presente com o passado e o passado com o futuro, assim como a Rainha Vermelha,
que vivera por milhares de anos, memórias e previsões se empilhando uma em
cima da outra, detalhes se perdendo na confusão.
Isso era um gosto da imortalidade? Gillian poderia viver assim para sempre?
Será que ela se lembraria dessa estranha interação ou esqueceria, como a
Rainha Vermelha costumava esquecer?
— Você me perdoa, certo? — Perguntou sua amiga, parecendo nervosa e
insegura. — Eu não sou só uma estranha, lembre-se. Sou sua melhor amiga. E
salvei sua vida.
— Perdoar... — Por quê? Oh, espera. Keeley a enganara para que bebesse uma
maldição eterna. — Deveria ter... deixado morrer... — Levar o fardo de viver com
seus medos e fobias para sempre? Não, obrigada.
— Que absurdo! Agora seja uma boa menina e diga sim para Puck, ok? Você
vai ser uma noiva tão linda.
OK. Aquilo tinha que ser uma alucinação. Nenhum dos senhores ou seus
companheiros a encorajariam a se casar com Puck.
— Você tem que crescer, claro — continuou sua amiga. — Vamos encarar,
garotinha, você é imatura e imprudente. Você faz coisas tolas. Você é confusa.
Muda de ideia num piscar de olhos. Veja se isso te lembra algo. — Em uma voz de
falsete, ela disse: — Oh, William. Você é tão perfeito para mim. Não, não, William,
estou determinada a continuar sozinha todos os dias da minha vida. William, eu
quero você. William, não estou interessada em nenhum tipo de relacionamento
romântico com você.
O fogo se espalhou pelas bochechas de Gillian, e ela duvidou que tivesse algo
a ver com sua doença.
— Você não sabe o que quer ou o que precisa — continuou Keeley. — Só sabe
que precisa mudar, certo? Bem, tchram! Hoje é seu dia de sorte/Puck. Você só tem
que lutar para melhorar. Lute, Gillian. Lute!
Seus pensamentos fragmentados se esforçavam para acompanhar.
Sorte/Pucky... Puck. O homem mais bonito que ela já viu. Sim, ele ofuscava
William, lembrando-a de um príncipe egípcio que ela viu em um livro de história,
mas com muito mais volume. Sério, o cara parecia ter ensinado Jason Momoa a se
exercitar. E quando ele falava... adeus sanidade. Ele tinha um leve sotaque irlandês
que provocava arrepios na espinha.
Seus olhos eram da cor de carvão congelado e margeados pelos cílios mais
longos e grossos de todos os tempos. À primeira vista, ela achava que ele usava
delineador e mil camadas de rímel preto. Não. Nele, o look esfumaçado era todo
natural.
Ele tinha maçãs do rosto tão afiadas quanto vidro, um nariz imperial e lábios
macios e orvalhados como uma rosa de cor rosa escura, o inferior mais carnudo
que o superior.
Também à primeira vista, a visão de seus chifres a assustou. Ela tinha se
encolhido, o desejo de lutar ou sair correndo crescendo. Lutar? Eu? Por favor! Se
ela tivesse tido força suficiente, teria corrido como se seus pés estivessem em
chamas.
À segunda vista, aqueles chifres a haviam intrigado. Ela não sabia por que.
O homem nunca sorria. Na verdade, sua expressão nunca traía uma pitada
de emoção. Ele parecia alheio do mundo ao seu redor, não afetado por...
absolutamente nada. Exceto, talvez... eu. Uma ou duas vezes ele pareceu arder por
ela.
Um erro de sua parte?
No entanto, apesar de seus atributos bestiais e comportamento frio, ele não
era nada além de honrado. Ele pediu a sua ajuda, e em troca queria que ela o
ajudasse a sentir algum tipo de emoção. Ela poderia?
Não deveria tentar? Por um lado, Puck era sua última esperança. Sua única
esperança. Possivelmente seria sua salvação. Por outro lado, se ela morresse, não
haveria mais miséria ou medo. Não haveria mais fraqueza. O passado seria
apagado.
Lute finalmente, Gillian. Por favor. Lute!
Lutar para viver? Lutar contra o mal? Ela poderia? Ela se perguntou
novamente.
Desta vez, a resposta bateu em sua mente com a força de um caminhão. Sim!
Ela poderia lutar contra o mal. Precisava lutar contra o mal. Havia muitas meninas
e meninos sendo abusados por pessoas em posições de poder, e eles mereciam um
defensor.
Eu quero ser uma defensora.
Olá, lista de coisas para se fazer antes de bater as botas.
Por muito tempo, ela não teve propósito. O medo a possuíra, roubando alegria,
esperança e prazer. Mas não mais! Hoje era um novo dia. A garota que costumava
ser se foi, uma nova ficou em seu lugar.
Pela primeira vez em sua vida, ela tinha um motivo para viver. Então, sim,
lutaria.
— Isso mesmo — disse Keeley, como se estivesse lendo seus pensamentos. —
Esse é o seu destino. A razão pela qual você nasceu. O primeiro passo é sempre o
mais difícil, mas não se preocupe, logo você estará correndo. — Ela limpou Gillian
de cima a baixo com um pano molhado, depois penteou seu cabelo e escovou seus
dentes. — Bônus: William não vai enlouquecer e se culpar pela sua morte, ontem,
hoje ou amanhã.
William, doce William.
— Talvez um dia alguém faça um filme sobre sua vida — disse Keeley. —
Dezoito anos e casada com um imortal, e um demônio! Mas a verdade é mais
estranha que a ficção, hein? Quem acreditaria?
Gillian estava vivendo isso e mal podia acreditar. Puck disse que um vínculo
com ele faria o truque. Ela poderia ter concordado, se ele não quisesse transar com
ela.
Sexo permanecia em sua lista de nunca-jamais.
— Chegará um momento em que você ansiosa e felizmente colocará o sexo na
sua lista de sempre-sempre — Keeley sussurrou, novamente parecendo ler os
pensamentos de Gillian e mais certamente provando ser uma alucinação. — Admita.
Você se dói por Puck.
Ela? Se doer? Quando o belo guerreiro com músculos em abundância tinha
olhado para ela com olhos gelados — os olhos de um predador. Olhos que diziam
que caçaria sua presa por horas, dias, esperando pelo momento perfeito para
atacar. Não. Mas quando ele talvez/talvez não olhou para ela com um calor ardente,
seu corpo pareceu acordar de um sono profundo, seu ritmo cardíaco acelerando,
diferentes partes latejando, desesperadas para aprender o significado de felicidade.
Ele poderia ensiná-la?
É claro que um medo demasiado familiar a envolvera todas as vezes. Quase
culpa, também. Como seu corpo se atreve a trair William?
Um pensamento tão tolo. William era um amigo, nada mais.
Ela ainda queria mais? Se não, tudo bem. Poderia se relacionar com Puck e
salvar sua vida. Se sim... Precisava proceder com cautela. Caso se unisse à Puck,
nunca mais teria chance de ficar com William.
Keeley pressionou seus lábios na testa de Gillian.
— O casamento com Puck lhe dará uma ficha limpa. Você vai se redefinir, ter
um novo começo. Só... sobreviva agora e descubra o resto depois, ok?
Ficha limpa. Novo começo. De ratinha assustada a defensora destemida.
Enquanto o sono chamava, Gillian ficou presa a um único pensamento:
William ou Puck?
Com os olhos bem abertos, Puck se levantou. Ofegante, examinou seus
arredores. Uma caverna vazia e sem proteções, com uma entrada para outro reino
no canto mais distante. Mas... não era a mesma entrada que tinha usado para
entrar no reino. Para onde essa levaria?
Na parede oposta, ele viu uma mensagem escrita em sangue. Algumas das
letras tinham se emaranhado.
Peça outra vez. Ela está pronta para dizer sim ao vestido.
***
Puck lutou contra a ereção mais feroz de sua vida. Poppiberries — o aroma de
Gillian — enchia seu nariz. Só que agora sua doce fragrância acrescentara
profundidade porque se misturava com o cheiro dele, tornando-se o cheiro dos dois.
Eles estavam completamente ligados.
O seu corpo frágil exigiu o que era devido, pegando o que precisava do corpo
dele. Ele mal havia se recuperado da punição de Indiferença; agora boa parte de
sua nova força já o havia abandonado. Mas... estava feliz. Ou quase feliz.
Um preço tão pequeno a pagar pela transformação estonteante de Gillian.
A cor voltou a sua pele, os belos tons dourados agora corados de rosa. O peso
que ela perdeu reapareceu num piscar de olhos, seus olhos não estavam mais
afundados, suas bochechas se arredondaram mais uma vez. Cabelos sem vida e
sem brilho tinham novo brilho e cintilavam como se estivessem polvilhados com pó
de diamante.
Puramente feminina. Deliciosamente carnal.
Mais radiante do que nunca. Por causa dele. Por causa de Púkinn Neale Brion
Connacht IV. Porque seu poder fluía através dela, garantindo que seu coração
continuasse a bater.
Orgulho estufou seu peito. Nenhum homem tinha uma esposa mais adorável.
Nenhum homem tinha uma esposa mais assustada, ele percebeu, seu peito
se contraindo. Seu olhar disparou para a esquerda e depois para a direita.
Procurando uma saída? Agora mesmo ela o lembrava de uma presa ferida
encurralada por um predador faminto.
— Fique tranquila, moça — ele disse áspero. Ele pensou... não, certamente
não. Mas talvez? A emoção parecia fluir entre seu vínculo. Medo, tristeza.
Esperança, felicidade. Raiva, preocupação.
Tinha que ser um erro. E, no entanto, Indiferença permaneceu em silêncio.
Gillian respirou fundo pela boca e fechou os olhos. Por vários segundos, ela
ficou imóvel como uma estátua. Quando ela exalou, ela se concentrou em Puck, a
selvageria desaparecendo de seus olhos. Olhos que se moviam para evitar o seu
olhar.
— Sinto muito — disse ela, e esfregou as têmporas.
Ele pressionou dois dedos debaixo do seu queixo e o levantou. O olhar dela
também se levantou e segurou o dele, inabalável.
— Melhor — disse ele. — Eu gosto dos seus olhos, quero vê-los.
Ela piscou, como se estivesse surpresa.
Quando ele alisou uma mecha de cabelo para trás da orelha dela, as pontas
dos seus dedos formigaram, e desejo incandescente o atravessou. E ainda assim,
Indiferença permaneceu calado. Ainda mais chocante, Gillian suavizou e se
inclinou para o seu toque.
— Você é linda — disse ele, e nenhuma palavra mais verdadeira jamais foi dita.
Círculos rosados mais escuros se espalharam por suas bochechas,
emprestando um ar de inocência à sua sensualidade carnal.
— Obrigada. E você...
— Não sou. Eu sei.
— Ei. Não coloque palavras...
— Gillian! — A voz dura de William ecoou pelas paredes, sacudindo as tábuas.
Termine sua frase, Puck quis rugir. O que ela achava que ele era?
— William — ela fez com a boca, mas sem som. Excitação iluminou os olhos
dela, extraindo um rugido irregular de Puck.
Rugido irregular? Estou usando-a. Seus sentimentos por outro homem não me
afetam.
Adaga na mão, ele deu um salto. Na hora. William atravessava uma parede,
pedaços de madeira voando em todas as direções. Raiva crepitava em seus olhos
azuis elétricos — não, seus olhos vermelhos néon. Arcos de raios zuniam sob a
superfície de sua pele enquanto fumaça e sombras se estendiam acima de seus
ombros como asas. Cachos negros flutuavam ao redor de seu rosto, impulsionados
por um vento que Puck não conseguia sentir.
Que tipo de imortal era aquele homem?
Ele era filho de Hades por algum tipo de adoção imortal; os dois não
compartilhavam laços de sangue.
Seja lá o que ele fosse, William tinha perdido a chance de fazer uma jogada
contra Puck. Agora, o que acontecia com o marido também acontecia com a esposa.
Corte Puck e Gillian sangraria. Quebre seus ossos e os dela se quebrariam.
Aqueles olhos vermelhos néon se estreitaram nele, estalando com o tipo de
raiva que Puck desejava sentir.
— Você vai morrer, mas não até que implore por uma piedade que nunca
receberá. Ela é minha e eu protejo o que é meu.
E aqui começa.
A primeira regra da negociação: estabelecer uma base sólida sobre a qual se
posicionar. A segunda: destrua seu oponente de todas as maneiras possíveis.
Quanto mais fora de ordem William se sentisse, menos confiança ele teria. Quanto
menos confiança ele tivesse, mais fácil Puck poderia trabalhar a situação a seu
favor.
— Não — Gillian grasnou, levantando-se da cama para se colocar ao lado de
Puck. — Nada de matar.
Pensa em proteger o homem quem poderia tê-la poupado dias de agonia?
Esqueça uma base sólida. Puck foi direto na garganta.
— Ela é sua? — Zombou. — Eu fiz o que você estava com medo demais de
fazer. Lutei pelo prêmio... e ganhei.
Uma bomba detonou dentro dos olhos de William, faíscas literais crepitando
pelos cantos.
— Você selou seu destino, demônio.
Se Gillian ouviu a conversa, ela não deu atenção, seu olhar implorando a
William. Esperando que ele a salvasse de Puck?
A raiva que ele desejava sentir há apenas alguns momentos agora o enchia,
sua tatuagem de borboleta ardia e dançava sobre sua pele. Músculos cheios de
sangue e ossos vibravam. Suas garras se afiaram.
Sua mente... permaneceu quieta. Mesmo assim, ele invocou gelo. Nunca tinha
precisado mais de sua força, não poderia arriscar um castigo.
Frio e calculista, ele se aproximou de Gillian e disse a William:
— Ela é minha. Eu nunca machucaria minha mulher.
William levantou uma adaga, pronto para atacar.
— Não, William. Estou falando sério. — Ela se pôs na frente de Puck e esticou
os braços, como se para... protegê-lo? — Você não pode machucá-lo.
Ah, sim. Ela pensava em protegê-lo. Uma coisa que seu irmão não havia feito,
bem no fim.
Uma parte de Puck queria investigar a fonte de sua proteção — desejo? Algo
que ele podia fazer. Só por um dia. Talvez dois. Talvez uma semana. O tempo que
demorasse para chegarem em Amaranthia. De acordo com os Oráculos, ele teria
que esconder Gillian antes de lidar com a outra chave.
Além disso, quanto mais tempo se passasse entre a cerimônia de ligação e as
negociações de Puck com William, mais o guerreiro entenderia a brevidade de suas
circunstâncias.
Minha lógica é ótima.
— Ah, boneca — William dirigiu um sorriso cheio de malevolência para a
garota. — Eu te garanto que posso machucá-lo.
— Você não entende. Ele me salvou. Ele é meu marido agora. Nós nos
vinculamos. — Ela lambeu os lábios enquanto se movia de um pé descalço a outro.
— Machucá-lo me machuca. Eu acho. — Olhando por cima do ombro, ela
encontrou o olhar de Puck. — Estou certa?
Ele assentiu.
Uma mistura de choque e fúria tocou as feições de William.
— O vínculo. Você concordou. Realizou a cerimônia.
Lágrimas encheram os olhos dela.
— Eu não queria morrer.
— Você não tem ideia do que fez. — O outro homem tropeçou para trás, como
se tivesse sido chutado. — Ele a está usando para alguma coisa.
— Eu sei — ela respondeu, e parecia um pouco triste, muito preocupada.
Não, ela sabia apenas das mentiras com as quais Puck a tinha alimentado.
— Você sabe? — Ameaça pulsava de William. — Você também sabe que
pertence a ele, em espírito, corpo e alma? Que os vínculos nunca podem ser
rompidos?
— Eu pertenço a mim mesma — disse ela. Então sua bravata evaporou. — Eu
sinto muito. Eu só... há muito que eu quero fazer. Tanto que quero realizar.
Puck colocou a mão no ombro dela, com cuidado para não arranhá-la com
garras prontas para rasgar William em pedaços. Assim como antes, ela se inclinou
ao seu toque; apenas por um momento, um belo momento roubado, antes que ela
percebesse o que tinha feito e se endireitasse.
Um momento foi o suficiente.
William notou.
Com uma adaga achatada contra o coração, ele deu outro passo para trás.
Fúria e civilidade tinham sido arrancadas dele, revelando desesperança e uma
flagrante melancolia. Gillian tinha sido uma tábua de salvação para ele. O homem
agora a considerava uma âncora?
— Eu posso trancá-lo. Posso mantê-lo a salvo, ao mesmo tempo mantê-lo
longe de você — disse William. — Todos ganham.
Um gemido a deixou.
— Vá em frente. Tente — Puck disse antes que ela tivesse uma chance de
concordar. Se ela se voltasse contra ele...
Ela se voltaria?
— Gillian — William usou o punhal para apontar para Puck. — Você quer que
eu o prenda?
Os olhos dela se encheram de lágrimas mais uma vez, as gotas escorrendo por
suas bochechas. — Não — disse ela. — Sinto muito. Não quero.
Puck soltou o fôlego que não sabia que estava segurando.
— Muito bem. Nós faremos isso do seu jeito. — Com uma expressão de pedra,
William se virou e saiu da casa da árvore.
Outro gemido deixou Gillian, todo seu corpo tremendo.
— O que eu fiz? — Com um soluço angustiante, ela se jogou na cama.
O gelo se partiu ao meio, mas ele se agarrou de ambos os lados. Ele conseguiu
a primeira parte de seu objetivo, salvar e unir-se a Gillian; o estado de sua mente
deveria ser a menor de suas preocupações.
Então, por que se sentou ao lado dela e passou os dedos pela maciez do seu
cabelo?
Quando ela finalmente se acalmou, ele se viu perguntando:
— Você ama William?
— Sim — ela admitiu com uma fungada. — Ele é o meu melhor amigo. Ou era.
E se ele nunca me perdoar?
Ele vai. O modo como William a olhava... Era prova que o homem a perdoaria
por qualquer coisa. Ele só precisava de tempo. Mas o lado negro de Puck não queria
que Gillian depositasse suas esperanças em uma reconciliação.
Precise de mim. Queira a mim.
— Eu serei seu melhor amigo agora — disse.
— Se isso é uma ordem...
Sim!
— Apenas uma sugestão.
Seu corpo ficou relaxado, a tensão finalmente se esvaindo. Porque Puck a
acalmava... ou porque Indiferença tinha acesso a ela através do vínculo?
O pensamento o sacudiu. O demônio poderia afetá-la agora?
— Eu sou imortal? — Ela perguntou, esfregando as têmporas novamente,
como se para afastar uma dor. — Ou eu te fiz humano?
— Imortal. Eu te disse, eu sou o dominante.
Ele continuou a pentear os cabelos dela com seus dedos, logo se tornando
hipnotizado pela sensação da seda contra sua carne. O contraste de madeixas
escuras com o bronze de sua pele. A maneira como os fios esvoaçavam sobre a
linha elegante de suas costas.
Minha esposa está esparramada em cima de uma cama...
Desejo passou por sua mente, uma bola de demolição no que restava de sua
gélida resolução. A fome o arranhava por dentro. Entre suas pernas, sua ereção
latejava.
Sua mente gritava: devo marcar minha mulher. Mostre a ela — mostre a William.
Ela pertence a mim e somente a mim.
Sim. Sim. Puck lhe daria muito prazer. Ele a ensinaria a amar o seu toque.
Logo, ela iria desejá-lo.
E quando eu precisar devolvê-la ao outro?
William lhe agradeceria por preparar o caminho.
William vai morrer se ele ousar tocar...
Um ruído baixo escapou de Puck. Quando chegasse a hora, ele faria o que
fosse necessário.
— Nós vamos cimentar nosso vínculo agora — disse ele, seu tom rouco, quase
drogado. E eu vou gozar. Finalmente!
Gillian se virou, os olhos arregalados de medo.
— Não. Sem sexo. Nunca. Eu te dou permissão para dormir com outras. Com
tantas você quiser, mas nunca comigo.
Uma faca invisível se contorceu dentro de suas entranhas.
— Nós somos marido e mulher. Deixe-me aliviar seus medos.
— Eu sei que somos marido e mulher, tudo bem — ela falou — mas eu te disse
que nunca tinha experimentado desejo, que nunca quis experimentar desejo, e eu
falei sério.
Sua vontade de compartilhá-lo... irritou-o.
— Muito bem. Será como desejar.
Ela soluçou, então ele continuou, mesmo que ela parasse de ouvir.
— Há coisas que devo fazer antes de sairmos. Você vai ficar aqui e eu garantirei
sua segurança. — Ele se afastou dela então sem olhar para trás, e pulou da árvore.
Ele demoraria um pouco, esfriaria a cabeça, recuperaria as rédeas do controle
e descobriria o que havia acontecido com Indiferença.
Depois disso, encontraria seu próximo objetivo. Tudo ficaria bem — ou ele
faria com que ficasse.
O que diabos está errado comigo?
No momento em que Puck sai, Gillian explode em lágrimas? Agora diferentes
emoções continuavam a bombardeá-la, fazendo-a se sentir como se estivesse
tropeçando em um dilúvio de estrogênio, adrenalina e ácido. Basicamente, a
histeria jogava roleta russa com a loucura, enquanto tristeza e felicidade
envolviam-se num jogo da galinha4. Ela ficava de pé, sentava, dava voltas e voltas
e, ao mesmo tempo, estranhos resmungos e rosnados soavam dentro de sua cabeça.
O vínculo tinha que ser responsável. Mas como eles funcionavam exatamente?
Puck não sentia nada, então não era como se ela tivesse herdado sua tristeza, raiva,
culpa, dor e... desejo. Não é? O formigamento estranho havia retornado, seus
mamilos endurecendo e o ápice de suas coxas doendo — mais forte que antes, e
desta vez não havia dúvida sobre o motivo.
Uma parte dela estava faminta de um jeito que nunca conhecera antes, nem
mesmo com William.
4
Jogo onde tipicamente dois rapazes disputam o amor de uma garota.
Quando Puck tinha se levantado, pronto para vir com tudo, uma pequena
parte dela tinha recebido a ideia de estar com ele de braços abertos. Mas, claro, o
medo rapidamente ofuscou todo o resto.
Se ele tivesse tentado forçar a questão...
Mas ele não forçou. Ele salvou sua vida e foi embora. Agora, ela lhe devia.
Ele alegava que queria sentir alguma coisa — qualquer coisa. Enquanto
Gillian pensava em suas interações, sua mente não mais enevoada pela doença,
começava a suspeitar que ele talvez, possivelmente... mentiu para ela, que ele não
queria sentir de verdade. Porque sempre que ele suavizava o mínimo que fosse,
rapidamente se retraía atrás de um exterior gelado.
Por que ele mentiria? Ele não tinha outro motivo para se casar com ela. Além
disso, como uma adolescente em fuga, ela fez um curso intensivo de enganação;
seu radar de mentira teria apitado.
Mas ela achava que se lembrava dele sentindo arrependimento em algum
momento? Sim, talvez. Se ele sentiu antes de se unir a ela, por que continuar com
a cerimônia e arriscar sua vida? A menos que só quisesse sentir mais?
E, ok, talvez ele não fosse o culpado por sua situação atual. Talvez todos os
imortais novatos passassem por isso — ou seu coração recém-partido estava
desencadeando anos de turbulência.
Partido por William ter exigido que ela escolhesse entre ele e o homem que a
salvou. Mas como ela poderia trair Puck, depois de tudo que ele fez?
Como poderia magoar William assim? Ela o veria novamente?
Que tipo de vida ela e Puck poderiam ter?
***
***
22 anos DU
Caro Puck,
Cameron deixou escapar que você o contratou para manter uma história
detalhada de tudo o que acontece durante sua ausência. Eu decidi ajudá-lo porque
(aparentemente) preciso de um escape para minha raiva. Comecei a dar uma de
Hulk.
Olha, um segundo estou calma. No outro, sinto como se estivesse
experimentando a fúria de mil homens combinada. Sou capaz de arremessar
perdedores de mais de 100 quilos como se fossem pedrinhas.
Fraca e frágil, Pucky? Acho que não! Não mais.
Eu culpo você e seu demônio. O que vocês fizeram comigo?!
Durante uma de Hulk, apenas duas coisas são capazes de me parar. Eu
eventualmente me canso e desmaio, ou me forçam a tomar um xarope de árvore
cuisle mo chroidhe.
Como você provavelmente sabe, a colheita do xarope exige muito tempo e
energia. As árvores são difíceis de encontrar, e sua casca venenosa é um grande
aborrecimento.
Estou pronta para o seu retorno. Se está pensando ela quer me mostrar um
desses surtos de raiva bem de perto, está correto. Você merece. Sabe que merece.
Se está pensando ela é a mesma garota que deixei para trás, e posso facilmente
intimidá-la, você está errado. Ao longo dos anos, fui socada, chutada, espetada,
esfaqueada e decepada. E não vamos esquecer as poucas vezes que Indiferença
voltou para me deixar louca. Agora? Sou durona como pregos, baby.
Que seja. Você ficará feliz em saber — espera. Vamos reformular. Você não se
importará em saber que aprendi a gostar de Winter. Sim, ela é egoísta ao máximo.
Sim, ela sempre quer o primeiro lugar, para todo o sempre. Mas aqueles a quem
ela considera sua “propriedade particular”, ela protege com a vida. Quando
enfrentamos a fome, a peste e a guerra com outros clãs, o seu espírito feroz nos
ajudou a continuar.
Para combater seu demônio, ela transforma tudo em um jogo. Sua maneira de
convidar alguém para seu mundo, eu suponho, uma vez que abertamente dar algo
a alguém faz com que Egoísmo faça minha amiga perder a cabeça.
O que Indiferença faz com você?
A propósito, nunca pensei no nosso beijo. Não. Nem uma vez. Não sinto sua
falta e nunca imagino onde você está, e o que está fazendo. Pensei que gostaria de
saber.
Gillian Connacht
PS: Puck é um saco.
106 anos DU
Caro Puck,
Estou muito animada e tenho que compartilhar com alguém — até mesmo
você. Adivinha. Eu adquiri magia!
Espera. Talvez eu deva recuar um pouco, já que você é tão bom em história e
tudo mais. Cerca de sessenta anos atrás, Cameron marcou runas nas minhas mãos
a meu pedido. Avance rapidamente algumas semanas. Um homem me emboscou,
pensando em tomar algo que eu não estava oferecendo. (Para sua informação, sua
noivinha ainda não tomou um amante. E não porque ela é fiel a você. Ela está
esperando por William. Bum. Microfone cai.)
De qualquer forma, Cameron notou a confusão e correu, mas já era tarde
demais. Eu já tinha começado a cortar.
Depois que minha vítima-atacante expeliu seu último suspiro, névoa escura
subiu de seu corpo imóvel. A mesma névoa que vi no meu primeiro dia em
Amaranthia depois que você matou nossos atacantes. Lembra? Só que desta vez, a
névoa foi absorvida em MIM. O calor! Os arrepios!
Embriagada pelo poder, decidi deixar Amaranthia, visitar os Senhores e suas
Senhoras em Budapeste, me reunir com William e descobrir se ele te trancou em
algum lugar, exatamente como ele prometeu. Quer dizer, não era como se alguém
pudesse me impedir. A aluna já havia superado seus professores.
E não, eu não queria que você tivesse sido trancado. Não te odeio mais, ok?
Só não gosto de você agora. O tempo me amoleceu, acho. Além disso, finalmente
entendi porque você fez o que fez.
Eu tive um momento em que a lâmpada se acendeu no meu cérebro depois
que uma das minhas recrutas me alimentou com informações falsas na intenção
de me levar para uma armadilha. Péssima jogada, certo? Ela planejava me
presentear a um mestre de estábulo. Como se eu fosse uma potranca que
precisasse ser domada e montada. Eu mal a conhecia, e ainda assim sua farsa
doeu. De mais maneiras que uma! Quanto pior foi para você, quando seu próprio
irmão te traiu?
Mais do que isso, você acredita que os Connacht vão prosperar sob seu
domínio. Quer eles queiram ou não, eu acredito que vão perecer sem você. Então,
sim. Eu entendo, realmente entendo. Também quero um futuro melhor para o meu
esquadrão e para as crianças que salvamos. Eu faria qualquer coisa para garantir
o bem-estar delas, até te estriparia. Mas aí é que está. Se você alguma vez me ferir
de propósito, ou mentir para mim, vou fazer um kabob com suas partes masculinas
favoritas e depois assá-lo.
Não será meu primeiro nem meu último.
Agora, o que eu estava dizendo? Oh, sim. Minha saída. Assim que cheguei a
outro reino, minha magia desapareceu. Talvez por eu não ter nascido em
Amaranthia? Talvez por ainda não ser forte o suficiente. Qualquer que seja a razão
(s), recuei às pressas.
Eu mantenho o que é meu.
Agora passo meu tempo alvejando bandidos: estupradores, molestadores e
abusadores de qualquer tipo. Qualquer um que machuque mulheres e crianças,
na verdade. Sou uma máquina de matar e estou vivendo meu sonho. De fato, gosto
de matar quase tanto quanto da magia.
Isso é ruim? Provavelmente é ruim. O que tem dois polegares e não dá a
mínima? Essa garota. (Quero dizer, quem vai ter dois polegares depois que torna a
crescer o que ela acabou de perder? Essa garota!) Se alguém pode apreciar meu
sentimento sobre tendências como de vilã é você, certo?
Estamos mudando Amaranthia pouco a pouco. Nós construímos um orfanato,
bem como um abrigo para mulheres. Embora muitos homens tenham tentado nos
impedir, ninguém conseguiu nos desacelerar.
Uma vez eu quis ser normal. Tolice! Por que se contentar com normal quando
você pode ser extraordinário? Pucky, essa garota ama a vida dela! Menos — bem,
não é da sua conta.
Ah, e o esquadrão que mencionei? Nós começamos um clã próprio só de
estrelas. Nós somos os Shawazons e nós arrebentamos. Cameron é nosso mascote,
e ele está obcecado em nos tornar o maior clã da história. Winter é minha segunda
no comando. A querida garota só tentou me derrubar umas seis vezes, mas eu a
superei em todas as tentativas, e depois nós demos uma boa risada delas. Eu sei
que Egoísmo é o responsável. Demônios são os piores!
Shawazons são compostos de mulheres de estábulos libertas, ex-prostitutas,
sobreviventes de abuso — basicamente qualquer um que os outros clãs considerem
“indigno”. Essas pessoas são a minha família.
Recentemente promovi duas das minhas melhores soldados a general. Espere
até você conhecê-las. Johanna e Rosaleen nos protegem e nós as protegemos. Poder
feminino!
Oh-oh. É melhor eu ir. Winter está gritando por mim, e isso só ocorre quando
um desastre está prestes a acontecer. Ou ela quer que eu limpe sua barraca. Ou
escove seu cabelo. Ou encontre seus sapatos.
Comandante Gillian Connacht.
PS: Eu renomeei você Pucky o Sortudo porque você é casado comigo. Encare.
Eu sou INCRÍVEL!
201 anos DU
Caro Puck,
Caramba, onde você está? Você disse que voltaria a essa altura. Não estou
sentindo sua falta ou algo assim — definitivamente não sonho com nosso beijo
todas as noites — então não fique se achando. Mas qual é! Estou pronta para me
divorciar de você e começar a namorar novamente. Ou pela primeira vez. Tanto faz!
Tenho que ter experiência antes que William chegue aqui, certo???
É o seguinte. Nunca confiei em homens. Sempre me assustei quando as coisas
ficaram mais íntimas, exceto quando... isso não importa. Estou finalmente em um
lugar onde eu quero... eu quero.
Winter diz que ela vai me ajudar a escolher um homem porque ela é Egoísmo,
e egoisticamente me quer feliz. (Sim, ela me ama mais do que você.) Ela até escreveu
o anúncio: guerreira mágica no campo de batalha procura um Magic Mike 5no quarto.
Um partidão e tanto! Propensa a ataques assassinos de raiva. Linda, às vezes é
justa. Domesticada. Vem com uma melhor amiga ainda melhor.
Se ao menos Amaranthia tivesse um jornal com classificados!
5
Referência ao filme.
Está bem, está bem. Não sou de trair, então eu não irei a nenhum encontro
até conseguirmos o divórcio. Eu realmente quero o divórcio, Puck. Por favor, corra
pra casa.
O problema não é você, prometo; sou eu percebendo que estou melhor sem
você. Tenho certeza de que há muitas mulheres solteiras por aí, apenas esperando
para olhar em seus olhos vazios e nunca receber um elogio ou qualquer tipo de
incentivo. E tudo bem, sim, sei que apenas algumas horas, dias ou semanas se
passaram para você, mas dois séculos se passaram para mim. Minhas tiradas de
Hulk estão ficando piores, e eu poderia usar um escape para o excesso de energia.
Além disso, você está melhor sem mim. Eu recentemente fiquei sabendo do
pior sobre a sua profecia, como sua amada rainha deve ajudá-lo a unir os clãs e
tudo mais. Rainha amorosa? Não. Eu não. E eu consegui causar um atrito
irreparável entre todos os clãs.
Hoje em dia, a única coisa que eles têm em comum é o seu desprezo por mim.
Eu matei seus homens, roubei sua magia e ajudei suas mulheres a escapar de
gaiolas douradas. As Shawazons até ensinaram outras mulheres dos clãs a
exigirem respeito de seus homens — ou haveria consequências.
Não tem de quê, projetos de homem.
Por sinal, todo mundo me chama de Gillian, a Saqueadora de Dunas, agora.
O quanto isso é incrível?!
Gillian Connacht Shaw, Saqueadora de Dunas
PS: Puck está sendo jogado pra escanteio.
300 anos DU
Caro Puck,
Onde você está??? Você disse que já estaria de volta.
Tanto faz. Não importa. Seu atraso vai te custar de qualquer forma. Considere-
se oficialmente separado. Pra sua informação, eu ganhei seus amigos e todos os
seus bens do assentamento.
Mas não posso namorar outros homens. Vínculo estúpido! Talvez eu te
despreze novamente. Estou mais do que pronta para riscar sexo da minha lista de
nunca-jamais, mas por sua causa, eu não posso. Não posso prosseguir com a
minha vida.
Então, vou perguntar de novo. Onde é que você está? O que aconteceu com
você? Eu sei que você foi ferido, porque a dor explodiu na minha cabeça sem motivo
aparente, e uma sensação fria envolveu meu pulso. Depois, nada.
Olha, estou preocupada com você, ok, e não gosto de me preocupar. A
preocupação distrai e me drena.
Nota para mim mesma: encontrar uma maneira de quebrar o vínculo sem as
tesouras de Puck.
Espere um segundo. As tesouras. Você planeja usá-las depois que William te
ajudar a matar Sin... o que quer dizer que você já deve ter encontrado as tesouras...
o que quer dizer que você as escondeu em algum lugar em Amaranthia.
Ora, ora. Se você tem 1 par de tesouras e sua esposa tem 0 par de tesouras,
sua esposa agora tem 1 tesoura e você tem 0.
Novo objetivo: encontrar as tesouras, mesmo que eu tenha que faiscar pra
dentro de um vulcão para recuperá-las.
Oh, esqueci de mencionar que posso faiscar? Isso aconteceu acidentalmente
na primeira, oh, nas primeiras zilhões de vezes, e eu vomitava sempre que chegava
ao meu destino, mas já dominei a habilidade.
Winter me diz para não me apegar demais à habilidade, porque a mágica vem
e vai tão rápido — e ela planeja roubar a minha — mas estou gostando do passeio.
Gillian, a Saqueadora de Dunas
PS: Puck vai ter suas tesouras roubadas.
343 anos DU
Caro Puck,
Winter estava certa. Perdi minha capacidade de faiscar quando meu
suprimento de magia diminuiu.
Visitei os Oráculos na esperança de descobrir a magia eterna. Antes que as
três se dignassem a falar comigo, tive de oferecer um sinal da minha apreciação.
(Você deve ter notado que cortei minha mão com o dedo do meio estendido. Eu sou
doce assim. O que elas fazem com todas as partes de corpo que as pessoas lhes
dão, afinal? Imagino caldeirões fumegantes com olhos de salamandra ou algo
assim.)
As Oráculos me disseram três coisas e nenhuma delas sobre magia.
(1) O homem que eu amo tem um sonho, e eu matarei esse sonho.
(2) Devo escolher entre o que pode ser e o que será.
(3) Um final feliz não está no meu futuro.
Não vou me preocupar com o número 1, porque você nunca vai voltar com
William, e ele é o único que poderia me tentar a me apaixonar. (Isso mesmo. Eu
toquei no assunto.) Quanto ao item 2, não tenho ideia do que significa, então decidi
considerá-lo uma besteira absoluta. E o número 3? Danem-se as oráculos. Vou
provar que elas estão erradas.
E quando eu fizer isso, você saberá que pode provar que estão erradas sobre
VOCÊ. Você não precisa da ajuda de William para derrubar Taliesin Connacht.
Pode fazer isso sozinho. Ou eu posso fazer isso por você, se o preço for certo. Então,
venha para casa e me liberte já.
Gillian, a Saqueadora de Dunas
PS: Puck é um saco <- os xingamentos clássicos nunca envelhecem.
405 anos DU
Caro Puck,
Você AINDA não voltou, e eu ainda não encontrei as tesouras, o que me faz
pensar se as Oráculos estavam certas, e estou destinada a ter um final infeliz, no
fim das contas. E se eu ficar para sempre com um marido ausente, um demônio
residente, surtos de fúria dignos do Hulk sem vida amorosa?
Estou sendo cortejada, Puck. Cortejada! Por soldados, príncipes e até reis.
Sim, você leu certo. A temporada do acasalamento atingiu Amaranthia, e sou a
novidade no topo da lista de “Quero comer” de todo mundo.
No começo, todos queriam me capturar ou me matar. Até recebi presentes do
tipo cavalo de Tróia: flores venenosas, notas com feitiços malignos e assassinos.
Você sabe, o de sempre. Quando o negócio todo de matar e capturar falhou, os
caras começaram a me enviar todo tipo de porcaria romântica. Ouro, joias, frutos
de seus pomares particulares, tendas, gado e magia. Bem, não magia, exatamente,
mas homens para eu matar, e então poder beber sua magia como um barril de
cerveja. Quanto a isso, sempre fico feliz em receber.
O único líder que não demonstrou nenhum interesse em mim é seu irmão.
Eu não evitei Sin nem nada, mas só o encontrei duas vezes. Ele construiu um
enorme complexo na terra Connacht e criou algum tipo de labirinto em torno dele.
Seu povo está proibido de sair. Outros clãs devem sobreviver ao labirinto para
entrar. Ouvi histórias de horror sobre monstros, testes de força e resistência,
quebra-cabeças e outras coisas de acabar com qualquer mente.
A primeira vez que vi Sin, soube que ele era seu irmão. Ele se parece muito
com você. O mesmo cabelo longo e escuro — sem lâminas — os mesmos olhos
escuros.
Tenho certeza de que a maioria das mulheres o considera o mais belo da
família — porque Winter mencionou isso umas mil vezes. Para mim, ele não é tão
impressionante. (Diga a verdade. Meu elogio te fez gozar nas calças.) Além disso,
ele não tem chifres. Nem pernas peludas. Nem cascos. Não que eu curta esse tipo
de coisa nem nada. É só que o inverno chegou6— a estação, não a mulher — e eu
me lembro do quanto você é quentinho.
Não que eu queira te abraçar nem nada.
Embora eu admita que pensei muito nas nossas interações. Na maior parte
das vezes, você foi o Homem de Gelo. Outras vezes você foi legal, apesar do demônio.
Quem diria?
De qualquer forma, estou tentada a entrar no complexo de Connacht e
espionar um pouco. Quer dizer, como você se sentiria se voltasse e eu já tivesse
cuidado do seu irmão? Você me agradeceria cortando o nosso vínculo? Ou ficaria
ressentido?
Gillian, a Saqueadora de Dunas
PS: Sabia que Sin está noivo da sua ex-noiva?
422 anos DU
Caro Puck,
6
Referência à personagem Winter, ou inverno em inglês.
Decidi que você nunca vai voltar, eu realmente te odeio novamente e estou
destinada a morrer sem nunca ter um orgasmo. Pelo menos fiz um novo amigo.
Lembra da quimera que quebrou a minha mão no dia que você me abandonou em
Amaranthia? (Logo depois de VOCÊ ter quebrado o meu dedo?) Bem, cerca de dois
anos e meio atrás, sua tataraneta deu a luz a um menino. Um pequeno que chegou
perto da morte mais vezes do que eu gostaria de admitir. Mamãe não queria nada
com o bebê — o gene defeituoso é forte nessa linhagem, eu suponho — então
assumi o cuidado dele.
Seu nome é Peanut 7 , e ele olha para mim como se eu fosse a versão
amaranthiana do Papai Noel, e como se todo dia fosse Natal. Ele tem ciúme de
Winter, Cameron, Johanna e Rosaleen, e de qualquer outra quimera que eu tente
montar.
Amanhã começa seu treinamento. Ele vai ser meu cavalo de guerra.
Acho que tenho uma dívida de gratidão com você, Puck. Se não tivesse me
trazido aqui, eu não o teria conhecido. Não teria treinado, me fortalecido e crescido.
Não ficaria feliz nem teria minha própria família.
Está bem, está bem. Não te odeio de verdade. E sei que as quimeras só vivem
cerca de duzentos anos, e vou perder meu Peanut em algum momento — a menos
que eu encontre uma maneira de torná-lo imortal, é claro.
ONDE VOCÊ ESTÁ??? Onde está William? Eu meio que sinto falta de vocês
dois. Me arrependo de como as coisas terminaram. Eu quero falar com vocês. Por
favor, Puck. Venha para casa.
Gillian, a Saqueadora de Dunas
PS: Me deixe esperando por muito mais tempo e você vai ficar preso — com
uma espada.
7
Amendoim.
501 anos DU
***
.
Puck ficou nas sombras, observando Gillian em seu habitat natural com seu
animal de estimação.
Pode ser que ele me queira, pode ser que não.
Não se pergunte mais, esposa. Ele quer você.
Uma vez que seu animal de estimação adormeceu, ela saiu para ver como seu
povo estava. Puck a seguiu e estudou, sem vontade de passar nem um momento
longe dela.
Deixei-a durante semanas sem problema, agora não posso deixá-la por alguns
minutos?
Duas vezes ela enrijeceu, como se soubesse que alguém a observava, mas nem
uma vez o chamou.
Ela tinha mudado muito mais do que ele tinha percebido. Agora andava com
confiança, a cabeça erguida. Qualquer lugar que entrasse, ela possuía. Seu povo a
adorava, sim, mas ela adorava seu povo também.
Ela tinha um grande coração. Amava com paixão e vivia a vida por suas
próprias regras.
A gatinha se tornara uma tigresa.
Quando uma dos soldados dela interrompeu-a para pedir conselhos sobre
relacionamentos, ela disse:
— Não tenho muita experiência nessa área ou em qualquer outra, mas tenho
certeza de que você deve sempre deixá-lo querendo mais. A menos que ele diga algo
cruel. Ou minta. Ou bata. Então você o deixa morto.
Embora ela claramente tivesse uma tonelada de trabalho para fazer ao redor
da aldeia, sempre parava para conversar com qualquer um que se aproximasse.
Tinha abraços e elogios para as crianças, e garantia que o gado e as quimeras
fossem bem tratados.
Puck se viu estranhamente fascinado — e ainda duro. Vezes demais para
contar, ele olhou para sua boca e se perguntou até onde ela conseguiria tomar o
seu membro.
Ele precisava... não sabia o que precisava. Sua esposa fora de cena? Sua
esposa embaixo dele? Em cima dele? Na frente dele de quatro? Sim, sim. Tudo isso.
Ele precisava que sua esposa gemesse seu nome, arranhasse suas costas e
implorasse por...
O que está fazendo? Resista ao fascínio dela!
Ele odiava todo aquele desejo. Odiava o fim do casamento quando deveria
estar ansioso por isso.
Ela era sua, mas não era.
Sem o vínculo com Puck, ela voltaria a desejar William. A menos que Puck a
viciasse em seu toque. Ele poderia?
Sim. Absolutamente. Ele podia fazer qualquer coisa, era conhecido como o
Invicto por um motivo. Mas não iria viciá-la. Ele ficaria melhor mantendo distância.
Não havia uma boa razão para deixar seus sentimentos se intensificarem e
complicarem uma situação já complicada. Mal conseguia lidar com o que sentia
agora.
Um velho ditado que precisava lembrar: Por que voluntariamente ser ferido
por uma espada quando é possível desviar dela?
***
Gillian jogou uma uva na boca e esperou que Puck agraciasse a festa com sua
exaltada presença. Ela sentou-se diante de uma fogueira crepitante com William
ao seu lado. Shawazons formavam um círculo ao redor deles compartilhando
bandejas de comida, jarras de cerveja e taças de água. O riso ecoava durante a
noite, misturando-se a mil conversas diferentes e o som suave da música enquanto
as mulheres do clã tocavam tambores, flautas e harpas feitos à mão. No centro do
círculo, um grupo de dançarinas balançava os quadris enquanto giravam lenços
com um abandono selvagem.
Cameron dançava entre elas, provocando uma mulher em particular.
Fiel à sua natureza, muitas vezes ele ficava obcecado por uma única mulher
por semanas a fio, às vezes meses, e fazia tudo que estava ao seu alcance para
seduzir e atrair. No entanto, momento em que conquistava seu coração a
perseguição terminava, assim como sua obsessão. Ele passaria para outra pessoa.
Esta mulher em particular havia resistido mais do que a maioria, mas ela iria
ceder. Elas sempre cediam.
Gillian se banhou, vestiu seus melhores couros e trançou o cabelo. Não que
alguém pudesse ver seu cabelo. Ela usava um lenço ousado e colorido. Um de seus
favoritos, embora o material fosse muito leve para proteger contra a areia e o vento.
Ela simplesmente gostava de sua aparência. Contas de cristal pendiam da bainha
superior, dando-lhe uma franja de joias.
William caiu de joelhos no momento em que a viu como se tivesse sido atingido
por um raio. Mesmo enquanto ria, encantada com suas palhaçadas, tremia em
antecipação para descobrir a reação de Puck.
Onde ele estava?
Até Peanut havia se juntado à festa. Como previsto, ele detestou William à
primeira vista e já havia feito xixi em suas botas, mordiscado sua bunda e cuspido
em seu rosto. Para crédito de William, ele não retaliou. Soltou um milhão de
palavrões, sim, mas nada mais. Coisa boa. Se ele atacasse fisicamente, seria
chutado pra fora do acampamento e a missão de Puck estaria condenada.
Mexa com o que é meu, pague o preço.
Droga, por que o Puck não aparecia?
— Você está fazendo isso de novo — William resmungou.
— Fazendo o quê? — Ela perguntou, confusa.
— Esperando Puck, perdendo as minhas melhores cantadas — não apenas
resmungou dessa vez, mas rosnou. — Você não o quer, boneca. Confie em mim,
por favor. A união está ferrando com a sua mente, nada mais que isso.
— Essas são as suas melhores cantadas? Uau. Eu sinto muito por você. — E
como ele sabia que ela desejava Puck? Como que ele soube brincar com seus medos
sobre o vínculo? — Desculpe, Liam, mas você perdeu seu toque de ouro.
Com os olhos entrecerrados, ele se inclinou para ela, a sedução encarnada.
— Você nunca conheceu meu toque — sua voz se aprofundou e ficou rouca.
— Tenho a sensação de que vai gostar muito...
Contudo, ela permanecia indiferente a ele.
— Eu me lembro de uma época em que você não me queria. Na verdade, não
faz muito tempo assim. Apenas algumas semanas se passaram para você. O que
mudou?
— Você — ele falou simplesmente.
— Eu mudei sim. E você estava certo, eu quero Puck — ela admitiu.
Rígido como aço, ele abriu a boca para dizer alguma coisa, pensou melhor e
rangeu os dentes.
— Ele nunca vai te dar o que você precisa.
— E o que eu preciso, hein?
— Devoção.
— Na verdade, eu preciso de orgasmos. — Uma afirmação franca e
perfeitamente verdadeira. Só que uma onda de ânsia se levantou dentro dela.
Devoção soava incrível. Poder confiar em seu amante. Saber que ele nunca a
machucaria ou trairia voluntariamente.
Uma comoção à direita. Por hábito, Gillian estendeu a mão para sua adaga,
apenas para ficar quieta. Puck tinha chegado finalmente.
O resto do mundo desapareceu quando seu olhar colidiu com o dele. Em um
instante, seu sangue se derreteu e seu coração decidiu fazer um solo de bateria de
rock pesado.
Tanto que ela ansiava estender a mão e acariciá-lo.
À luz do fogo, seus chifres pareciam mais longos, mais grossos. Ele não tinha
se barbeado, então uma sombra escura cobria sua mandíbula. Mas ele havia se
banhado. Seus cabelos úmidos gotejavam nas pontas, enviando gotículas de água
aos cumes de seu peito nu. Essas gotas desapareciam debaixo da cintura de sua
calça de pele de carneiro.
Ele era um guerreiro, um homem e um predador como um animal ao mesmo
tempo, o que só piorava seu fascínio por ele.
O que ele achou dela?
Ele olhou para a sua boca enquanto esfregava o polegar sobre o lábio inferior,
como se estivesse imaginando beijá-la. Sim, por favor. Então o olhar dele percorreu
seu corpo, demorando-se em todos os lugares que ela doía, como se soubesse o
quão desesperadamente ela queria que suas mãos e lábios fossem os próximos.
Ele sabia? Com a expressão desprovida de emoção, ele fechou a distância.
Suas mãos... ela respirou fundo. Suas mãos estavam fechadas. Ora, ora. Ele não
era tão estoico quanto queria que ela acreditasse.
Eu o afeto.
Silencioso, ele sentou ao seu lado. O bíceps dele se sobressaiu quando ele
pegou dois medalhões de abóbora assados no fogo de uma travessa próxima, jogou
um para Peanut e colocou o outro na boca. Seu marido mastigou, engoliu e se
concentrou nas dançarinas.
Ela gostava do jeito que sua mandíbula se movia, cada movimento carnal.
Chocante: Peanut o cheirou, depois gentilmente lhe deu uma cabeçada na
mão, exigindo ser acariciado. Seu quimera nunca aceitara ninguém tão
rapidamente.
— Sua cria de demônio sente seu cheiro em Puck — William murmurou. —
Nada mais que isso.
Ela tentou, tentou muito, mas não conseguiu remover seu foco de Puck.
— Percebe que comeu um pedaço de abóbora, certo? — Imitando um homem
das cavernas, ela acrescentou: — Carne bom. Legume ruim. Lembra?
— Eu como para ter força, sempre, mesmo que me ofereçam besteira. — A
atenção dele permaneceu nas dançarinas, mesmo quando sua voz rouca e
profunda invadiu a pele de Gillian como uma carícia. Ele achava uma das mulheres
do seu clã atraente? — Além disso, tudo que eu como é insípido para mim.
Embora ela não tivesse herdado essa desvantagem em particular, a compaixão
superou sua vontade de dispensar as dançarinas.
— Cortesia de Indiferença?
Ele ofereceu um aceno curto.
— As suas amantes também são insípidas? — William se inclinou, pegou o
último medalhão de abóbora e colocou na boca. Seus olhos se fecharam e ele gemeu,
como se tivesse sido apanhado no auge de um clímax. Quando terminou, lambeu
os lábios e sorriu. — Aposto que você se esforça ao máximo para dar a uma mulher
uma experiência medíocre. Bem, eu não me preocuparia mais. Vá em frente e
considere o missionário8 completa.
— Eu não tomei uma amante fora do meu casamento. Talvez precise de mais
prática para alcançar seu nível de sedução — disse Puck. — Diga-me, Derretedor
de Calcinhas. Quantas milhares de mulheres você teve... depois que conheceu
aquela que acredita ser a sua companheira predestinada?
Oh, baby, as garras estavam de fora esta noite. Onde estava a pipoca quando
ela precisava?
E tudo bem, empolgação era provavelmente a reação errada em relação a outra
possível briga de machos. Mas, qual é! Puck admitiu que não dormiu com ninguém
enquanto eles ficaram separados.
Tenso como um arco, William disse:
— Eu nunca quis matar um homem mais do que quero matar você, Pucky.
— O sentimento é mútuo, Excitado.
Querendo — precisando — saber se a tensão sexual atormentava Puck tão
fervorosamente quanto a atormentava, se algo que ela tinha dito ou feito o tinha
alcançado em um nível primitivo, Gillian passou os dedos pelos nós dos dedos dele.
Tão macio, tão quente. Tão perfeito!
Ele virou-se para encará-la, seus olhos se estreitaram e brilharam, suas
respirações vindo em grandes ondas — o volume embaixo do seu zíper era enorme.
— Toque-me novamente, e eu irei jogá-la na areia e meter dentro de você.
Seu primeiro pensamento: Sim! Finalmente!
Seu segundo: Ele me deseja tanto.
Quando sua mente girou e seu corpo chorou de alívio, as íris de William
brilharam vermelhas em ameaça.
— Espero que você goste de um mènage, Pucky, porque vou me jogar nessa
mistura.
— Você pode tentar — disse Puck, a mandíbula cerrada.
— Ei pessoal? Eu preciso que vocês... — O que? Se beijem e façam as pazes?
Hum. Agora isso não seria legal?
Para sua surpresa, Puck levantou e se afastou sem dizer uma palavra.
Exatamente como o esperado, ele não olhou para trás.
Peanut, o traidor, pulou para ir atrás dele.
8
Modificação da expressão missão completa por missionário, a posição sexual mais tradicional.
Ela queria fazer o mesmo, mas se consolou com a medalha de prata e olhou
para William.
— O que foi? — Ele exigiu. — O que eu fiz de errado?
— Pare de flertar comigo na frente de Puck. E pare de antagonizá-lo. Eu não
vou dormir com você, William. Não vou trair meu marido. — Seus sonhos de
namorar outros caras pegaram fogo no momento em que pensou na ideia, ela
sabendo disso ou não.
— Ele é seu marido temporário. Existe uma diferença. E não estou pedindo
que o traia.
— O que está me pedindo para fazer então?
— O que mais? — Ele abriu os braços. — Que dê um beijo apropriado no seu
pretendente. O que foi? Que cara é essa? Beijar não é trair. É uma amiga ajudando
um amigo a encher os pulmões. Beijar é sobreviver.
— Se você acredita nisso, sinto muito pela sua verdadeira amada. — Só para
ser malvada, porque sim, Gillian tinha desenvolvido um pouquinho de crueldade,
ela acrescentou: — Quem quer que ela seja.
Enquanto estudava o rosto dela, talvez procurando pontos fracos em sua
resolução, ele pareceu espantado, como se nunca tivesse conhecido a rejeição —
de qualquer espécie — e não tivesse ideia do que tinha acabado de acontecer. Ele
abriu a boca e fechou. Abriu, fechou.
Finalmente, ele decidiu:
— Seu forte código moral me excita.
— Por favor. Uma brisa suave te excita.
— Eu quero você — disse William, e desta vez seu tom tinha uma leve acidez.
— Ok, digamos que eu o quero de volta. Como poderíamos passar a vida juntos?
— Eu entraria em guerra com Lúcifer, você cuidaria dos meus ferimentos.
Como antes.
Argh.
— Acha que seria suficiente para mim?
Olhos cristalinos brilhando, ele disse com voz rouca:
— Todo tempo que sobrasse, passaríamos na cama.
Ainda. Não. Era. Suficiente.
— E se eu quisesse lutar ao seu lado?
— Nós... negociaríamos.
O que queria dizer que ele tentaria convencê-la a ficar em casa. A velha Gillian
teria ficado emocionada. A nova Gillian queria vomitar.
— Explique porque você me quer, especificamente — ela disse. — Por que viria
até aqui me buscar? Por que ajudaria Puck, apenas para me libertar do vínculo.
Eu tenho uma vaga lembrança de ouvir alguns dos Senhores falando de como você
estava esperando pelo meu aniversário de dezoito anos para me reivindicar. Mais
vividamente me lembro de você dizendo que nunca se apaixonaria ou se casaria.
Ele puxou a ponta de sua trança mais grossa, uma ação divertida que
desmentia a tensão crescente em sua expressão.
— Desde o começo, eu sabia que havia algo diferente em você. Lutei contra
isso. Disse a mim mesmo que não faria nada com você, não importava quantos
anos tivesse, ou não tivesse. Mas no fundo eu sabia que no momento em que
estivesse pronta, eu atacaria. Então Puck a levou embora, e eu senti como se
tivesse perdido...
— O que? O seu brinquedo favorito?
— Tudo.
A única palavra a atingiu como um soco no esterno. Suas costelas pareceram
rachar, ácido vazando entre elas. Por um momento, não disse nada. Não podia.
Esperava que sua intensidade diminuísse e ele fizesse uma piada. Ele não fez isso.
Se realmente a desejava, se considerava Gillian sua companheira
predestinada, por que não evitou outras mulheres e esperou por ela?
Ele deveria ter esperado por ela.
— William...
— Não. Não diga nada. Não até que o vínculo esteja cortado.
Ele estava certo? Seu desejo por Puck realmente desapareceria? Se assim
fosse, ela desejaria William em sua cama — em seu corpo? Agora, ela não conseguia
imaginar desejar alguém além do marido.
Um músculo saltou debaixo do olho dele, uma, duas vezes.
— Se acha que deve ficar com ele, vá, fique ele. Vá tirar o atraso. Durma com
ele para tirá-lo da cabeça — olhando para o céu, ele disse em um tom mais calmo:
— Eu mereço isso, realmente mereço.
— Não estou fazendo isso para te punir — disse ela, então franziu a testa. Ela
não lhe devia uma explicação ou desculpa. — Eu vou tirar o meu atraso, e não
porque você permite.
Se as circunstâncias fossem invertidas, Puck não diria a ela para fosse dormir
com outro homem para tirá-lo da cabeça. Não, ele manteria sua promessa de matar
qualquer um que ela sequer pensasse em namorar. Porque ele queria a paixão dela
só para si. Claramente!
Toque-me novamente que eu irei jogá-la na areia e meter dentro de você.
Calafrios decadentes, calor irresistível.
Toma jeito!
— Só... tome um banho frio hoje à noite — disse ela. — Então dê um beijo e
faça as pazes com Puck, ok? — Oh, bom, aquela imagem de novo! Fiu Fiu. — E
tenha certeza que eu esteja presente para servir como testemunha. — Ela juntou
as mãos para formar uma torre. — Por favor, por favor, mil vezes por favor.
Ele fez tsc-tsc com a língua, sua intensidade diminuindo um pouco.
— Banhos frios são um mito. Nenhum homem jamais tomou um. Estamos
mais inclinados a tomar banhos quentes, e a exercitar o bíceps com movimentos
repetidos pra cima e pra baixo. Se não conseguimos encontrar uma substituta
adequada para quem nos deixou inchados e carentes.
— Então faça isso — ela disse, e fez um gesto de Xô com a mão.
— Qual dos dois? O banho ou a substituição?
— Qualquer um. Os dois.
— Pega leve, mulher. Pega leve. — colocou a mão contra o peito, logo acima
do coração. — Um dia você vai me querer para todo o sempre.
Lá se foi seu divertimento.
— Sinto muito, William, mas...
— Não, não diga nada que vá se arrepender.
Quando sua nuca se arrepiou com uma percepção, talvez antecipação, ela
examinou a multidão — e se emocionou. Puck não tinha deixado a festa, afinal. Ou
se tinha, havia retornado. Ele estava nas margens, envolto por sombras. Ele a
observava?
Com o coração palpitando, ela se levantou antes de perceber que havia se
movido.
— Fique aqui e se divirta, Liam. Pode ser que eu volte ou não.
— Pode ser que eu fique contando os segundos ou não — William lhe soprou
um beijo antes de dar o dedo para Puck.
Notou a presença dele também, não foi?
Gillian se apressou. Pouco antes de chegar a Puck, ele se virou e se afastou.
Desta vez, ela o seguiu.
Rosaleen entrou em seu caminho, parando-a.
— Seu amigo. Aquele com os olhos azuis bebê. Você não me disse que ele era
o homem mais bonito de toda criação. Ele é solteiro?
— Muito — Gillian olhou ao redor. Nenhum sinal de Puck. Droga!
A general abanou as bochechas coradas.
— Se importa se eu der em cima dele?
— Nem um pouco — Rosaleen estaria fazendo um favor a ela, mantendo
William ocupado.
Johanna se aproximou e passou um braço pelos ombros de Rosaleen.
— Perguntou sobre o diabo de olhos azuis?
— Solteiro — a outra mulher respondeu com um sorriso largo.
As duas bateram as mãos.
— E quanto ao chifrudo? — Johanna balançou as sobrancelhas. — Você
terminou com ele, certo?
Gillian enrijeceu, feliz em um momento, pronta para cometer assassinato no
seguinte.
— Ele ainda está casado. Comigo.
As duas mulheres empalideceram enquanto erguiam as mãos, as palmas pra
fora, fingindo inocência e recuaram.
— Opa, opa — disse Rosaleen. — Não há razão para virar Hulk.
— Eu não vou tocar nele, juro — falou Johanna.
Respirando fundo, exalando.
— Desculpa — Gillian murmurou. — Olha, eu tenho que ir. — Ela disparou
em torno de suas amigas, procurando, buscando... se ela não pudesse encontrar
Puck por meios naturais, teria que usar magia.
Com a jornada que estava por vir, preferia acumular o que tinha. Espera! Ali.
Pegadas estranhas, o piso desigualmente distribuído, como se um peso em forma
de casco tivesse desgastado o centro da sola do calçado. Meios naturais ganharam!
Ela seguiu suas pegadas até a... sua casa. A excitação deixando seus membros
fracos, ela fechou e trancou a porta.
Puck ocupava a sala de estar de costas para ela enquanto andava em volta,
examinando as muitas armas que pendiam das paredes. Ele entendia que ela as
guardava como troféus ou duvidava dela como William?
— Onde está Peanut? — Perguntou ela.
— No celeiro, descansando.
Um pensamento repentino a atingiu. Como Puck encontrou sua casa? Ela não
tinha mostrado a ele e nenhum de seus soldados compartilharia sua localização
sem permissão.
Ele me seguiu do jeito que eu o segui, seus desejos fortes demais para serem
negados?
Calafrios cascateando descendo por sua espinha, ela disse:
— Por que está aqui?
— Somos casados. Acredito que já a informei sobre nossos recursos
compartilhados. O que é seu é meu, e eu queria ver o interior da minha nova casa.
— Seu tom estava tão sem emoção como sempre, mas quando ele se virou para
encará-la... seu olhar queimava.
O que mais?
— Você ainda está duro. — As palavras saíram dela, tão imparáveis quanto
um trem desgovernado.
Ele levantou o queixo como se estivesse orgulhoso.
— Parcialmente, pelo menos.
— Quer dizer que fica maior? — Ela perguntou, de repente sem fôlego.
Ele pode ter dado um sorriso convencido.
— Muito maior.
Definitivamente um sorriso convencido.
— E é... por minha causa? — Por favor, por favor, que seja por mim. — Ou por
causa de todas as beldades na festa?
— Eu não quero aquelas outras mulheres... — Ele correu o olhar sobre seus
seios... seus seios doloridos... e entre suas pernas, onde ela agora latejava. Então
acrescentou: — Não quero que elas morram quando você tiver outro ataque de
ciúme.
Quem? O que? Como? Eu?
— Como se você pudesse falar! Estava pronto para assassinar William, o
homem que precisa para ganhar sua coroa.
As narinas dele se alargaram.
— Isso é verdade.
Espera. Ele tinha acabado de aceitar seu ciúme?
— Eu disse a mim mesmo que ficaria longe — ele continuou — que evitaria o
corte da espada, mas aqui estou eu, apenas algumas horas depois, disposto a lidar
com as complicações e as consequências. O que acha que isso diz sobre mim, moça?
Não, fique em silêncio. Não responda. Eu vou te dizer o que isso diz.
Enquanto seu mundo inteiro parecia girar no eixo, ele segurou a virilha e disse
com voz áspera:
— Sim, isso aqui é pra você. Eu quero somente você.
As palavras de Puck ecoavam na mente de Gillian. Evitar o corte de uma
espada — era assim que ele a via? Como uma espada? Fique em silêncio — como
ele ousava emitir tal comando! Somente você — seus joelhos tremeram.
Então ele enrijeceu e ela quis gritar, porque sabia o que aconteceria em
seguida. Ele ficaria frio.
— Se você se transformar no Homem de Gelo agora, vou colocar veneno na
sua próxima refeição — disse ela.
Parecendo a própria definição de destacado, ele levantou uma sobrancelha.
— Continue agindo como uma megera, que eu comerei o veneno de bom grado.
Megera? Como ele ousa?!
Gillian se aproximou, certa de que era uma bomba — com um detonador com
contagem regressiva rápida. Mas enquanto seus olhares permaneciam
entrelaçados, nenhum deles estava disposto a desviar, as inspirações dela se
tornaram as expirações dele, e ela percebeu que estavam respirando o ar um do
outro. Raiva se transformou em excitação.
Tremores arruinaram sua tentativa de parecer não afetada. Tremores e seus
mamilos endurecidos. A febre de paixão provavelmente também corava sua pele.
Passei tempo demais sem o toque dele. Preciso disso.
Como se lesse sua mente — e ficasse mais do que feliz em fazer o favor — ele
entrou em ação. Movendo-se rápido demais para acompanhar, ele a agarrou pelos
quadris, apoiou-a contra a parede e colocou as palmas das mãos ao lado de suas
têmporas. Quando seu grande corpo a prendeu, o cheiro de carnalidade masculina
a envolveu, e sentiu as pálpebras pesarem.
Sua estrutura muscular pareceu inchar diante de seus olhos. De repente ele
estava maior, mais forte. Veias se projetavam como se ele mal conseguisse se
manter no lugar — como se agressão o enchesse até a borda. O olhar que lhe deu...
voraz.
— O que acha que está fazendo? — Ela perguntou, e oh, parecia ansiosa. Já
estava com tesão demais para se importar.
— Estou te colocando onde quero.
Bem, graças a Deus por isso. Ela gostava do lugar onde ele a queria.
— Então, você realmente me deseja? Não voltou a ser o Homem de Gelo?
— Acho que a fera entre as minhas pernas responde às duas perguntas, moça.
Sua boca se curvou nos cantos.
— O rei da apatia acabou de fazer uma piada?
— Ele apenas falou a verdade. — Enquanto brincava com as pontas do cabelo
dela, ele fazia cócegas em seu couro cabeludo. — Eu costumava invocar o gelo para
evitar a punição do demônio. Agora faço isso para nos proteger a todos. Você
deveria ficar grata por isso. Se eu fizesse metade das coisas que estou imaginando...
Invocar o gelo, ele disse. Ele realmente congelava suas emoções? Como? Com
magia?
— Que tipo de punição? — A fraqueza que ele uma vez tinha mencionado? —
E proteger a todos nós de quê? — Ela perguntou, então o resto de suas palavras se
registrou e ela estremeceu. O que ele imaginava fazer com ela?
Os olhos dele se estreitaram e ele enrijeceu.
Tudo bem. Ele podia manter seus segredos. Por enquanto.
— Mas às vezes você descongela. Eu vi.
Um aceno de cabeça.
— O gelo não derrete sozinho. Eu preciso de uma fonte externa para me fazer
sentir algo quente. Como raiva.
— Ou desejo — Desesperada pelo contato com ele, precisando avaliar seu grau
de excitação, ela colocou a mão sobre o coração dele. Pele quente como ouro
derretido derramado sobre granito. Acelerando os batimentos cardíacos.
Seu desespero combina com o meu. Saber disso provocou uma onda de poder
feminino dentro dela.
Ele a pegou pelo pulso e levantou sua mão — prendeu seu braço acima da sua
cabeça.
— Tocar na tatuagem do pássaro está…
— Fora dos limites — sim, ela lembrou. — Por quê?
— Porque eu disse que sim.
Justo. Novamente, por enquanto. Depois...
— E se um dia você parar de sentir completamente e permanecer o Homem do
Gelo?
— Sempre me perguntei o mesmo, mas neste exato momento não posso me
imaginar entrar em um congelamento profundo novamente. — Ele roçou a ponta
do nariz no dela. — Você não tem mais medo de intimidade.
— Não.
— A força que você precisou para superar seus traumas passados. A força que
você precisa. Estou impressionado, moça.
Aquelas palavras... Gemendo, ela ondulou esfregando o centro do corpo em
sua ereção maciça.
— Então você me tem onde me quer, guerreiro, e está totalmente
impressionado comigo. O que vai fazer comigo? — Como ela encontrou a clareza
mental para falar, não tinha certeza. Quero mais. Preciso disso.
Ele sibilou, as mãos apertando seu pulso.
— Eu a terei. Mas também a deixarei partir em breve.
As palavras eram uma promessa ou um aviso? Ele esperava assustá-la ou
atraí-la? Tipo, E aí baby, você não precisa se preocupar comigo me tornando um
perseguidor, porque vou dar o fora o mais rápido possível.
— Errado. Eu terei você — disse ela — e eu te deixarei em breve. — Eu não
serei usada e abusada. Eu vou usar e largar.
Algo escuro e primitivo brilhou na expressão dele.
— Você é minha. Diga.
Ele podia fazer o prato, mas não comer?
— Eu sou — ela hesitou, dando a antecipação a chance de crescer dentro dele
— só minha.
Aquele tom espesso e drogado era mesmo seu?
Bem, porque não? Ela queria esse homem há séculos. E agora, aqui estava
ele, seu para ser tomado. Eles estavam tão perto que realmente compartilhavam o
espaço. Tão perto que ela podia sentir as correntes de paixão correndo pela pele
dele.
Toda vez que inalava, seus mamilos roçavam o peito dele, provocando calor e
atrito. Toda vez que exalava, seus quadris se arqueavam por vontade própria,
procurando mais contato, mais atrito.
Puck pegou o rosto dela na mão, o polegar em um lado do queixo e os dedos
do outro. Um aperto agressivo, e ainda assim ela não estava com medo.
— Se não vai me dizer que é minha, você vai me mostrar.
Ele não esperou por sua resposta, mas soltou o braço que ele tinha no alto
para apertar sua bunda com os dedos abertos — cobrindo o máximo de terreno
possível — ao mesmo tempo abaixando-se para reivindicar sua boca. Aquela não
era uma exploração calma, mas uma demanda feroz. Um selo de propriedade
diferente de tudo que ela já experimentou. Entre incursões sensuais de língua, ele
massageava o pulso vibrando na base de sua garganta.
Esperei tanto tempo por isso. A doçura de seu sabor a enlouquecia. Ele era
uma droga. Sua droga. Todo calor e rigidez masculinos devastando seus sentidos.
Pequenos sons de miado escaparam dela quando colocou os braços ao redor dele e
balançou seu sexo contra ele, repetidamente, incapaz de parar o movimento. Cada
nova colisão com sua ereção a deixava mais quente e úmida.
Mais. Eu preciso de mais. Quinhentos anos de frustração a tinham deixado
devassa. Ou talvez Puck tenha sido o culpado?
— Me toque. Me toque agora — ela exigiu.
— Diga-me onde.
— Dentro. Vá atrás do ouro agora, saboreie mais tarde.
— Para mim, você é toda de ouro.
— Dentro — ela insistiu.
— E se eu quiser brincar com seus seios primeiro, hum? — Ele alcançou
debaixo do seu colete de couro para massagear um seio e brincar com um mamilo.
— Por favor, Puck. Por favor.
— A guerreira agora implora por mim. Ela está necessitada. — Com a mão
livre, ele mergulhou debaixo da bainha de sua saia de couro. — Muito bem. Vai
conseguir o que está implorando.
Enquanto os dedos dele roçavam a parte interna de sua coxa, ela arranhou
suas costas, provavelmente tirando sangue. Tão bom!
— Entre suas pernas... assim? — Um desses dedos exploradores se aproximou
de seu sexo, apenas para se afastar um pouco antes de fazer contato.
Ele a provocava? Agora? Impulsos diferentes a atingiram, um após o outro.
Libertar sua ereção e se esfregar nela. Ir embora, deixando-o dolorido por todos os
séculos que passou longe dela. Por isto! Jogá-lo no chão e o violentar.
— Faça — ela ordenou. — Me dê seus dedos.
Ele obedeceu, os dedos safados empurrando sua calcinha para o lado,
separando-a e se dirigindo ao seu centro dolorido.
Com uma voz como cascalho, ele disse:
— Você está encharcada por minha causa.
Os joelhos de Gillian cederam inteiramente; se não fosse pela mão pressionada
entre suas pernas, a planta da palma de Puck esfregando em seu pequeno feixe de
nervos enquanto os dedos sondavam, ela teria caído e... e...
— Não pare! Por favor, não pare.
Ele colocou um segundo dedo bem fundo dentro dela e ela disparou como um
foguete. Bem assim. Só um boom, e terminou. Finalmente!
— Sim, sim, sim! — O prazer mais sublime explodiu dentro dela, afetando
todas as suas partes. E ele não tinha terminado! Enquanto ela se desfazia, ele
continuava empurrando os dedos, abrindo-os como uma tesoura para estirá-la
antes de colocar um terceiro, prolongando seu climax — enriquecendo-o.
Um grito passou por seus lábios, mas ele engoliu o som e aprofundou o beijo.
Uma coisa boa. Ele possuía o oxigênio do qual ela precisava.
William estava certo. Beijos eram sobrevivência.
Paredes internas apertando e relaxando. Sua mente ficou enevoada,
descarrilando seus pensamentos. Um calor lânguido a invadiu, um ladrão na noite,
roubando toda a razão, deixando-a mole e gloriosamente satisfeita.
Mas a satisfação não durou muito tempo. Gillian só queria mais. Mais Puck.
Mais paixão. Mais contentamento. Nada se comparava. Um orgasmo não era
suficiente. Ela precisava desesperadamente de outro. Precisava de sexo. Agora.
Nesse instante. Nada mais de esperar.
Só que quando alcançou a cintura de suas calças, ele levantou a cabeça para
encontrar seu olhar, as íris brilhantes e selvagens, incendiadas, e ela se acalmou.
Com seu cabelo preto embaraçado, ele parecia tão enlouquecido quanto ela.
Enlouquecido e assombrosamente lindo. Impecável em forma e rosto. Absoluta
perfeição masculina — um homem petrificado por uma mulher. Precisando tê-la, e
somente ela. Ninguém mais serviria.
— Seus olhos — ele disse, parecendo impressionado. — Eles queimam por
mim.
Não estou sozinha nisso. Posso nunca mais voltar a estar só. Uma onda de
vulnerabilidade a abateu.
Então o pior aconteceu.
Num momento estava excitada, pronta para uma segunda vez, no outro estava
chorando como se um estimado amigo tivesse acabado de ser assassinado.
Lágrimas escorriam por suas bochechas, seu corpo todo arfando.
Gillian não havia derramado uma única lágrima em séculos. Agora não
conseguia fazer nada para evitar a maré.
Puck passou os braços ao redor dela, segurando-a enquanto soluçava. Ele até
passou os dedos por seus cabelos, murmurando coisas como:
— Eu entendo. Você já experimentou a traição, e isso... isso é liberdade. — E
— Não suporto ver a minha guerreira chorar. — Seguido de — Diga-me o que fazer
e eu farei.
Ele realmente entendia. Também sofreu uma traição.
Ele a chamou de guerreira.
Tinha lhe dado um orgasmo. O seu primeiro. E ela só teve que esperar
quinhentos e poucos anos. O medo com o qual ela sofreu por tanto tempo... os
pesadelos... o prazer que seus agressores lhe roubaram... Era errado! Era
criminoso! Ela foi enganada, ferida, destruída, arruinada…
Não! Destruída não. Arruinada não. Seu corpo tinha sido usado por outros,
sim, e sua auto-estima havia sido chutada, socada, espancada e esfaqueada, mas
se levantou do chão, ergueu os ombros e o queixo, e viveu. Aprendeu a se defender.
Ajudava quem precisava. E agora ela tinha isso. Uma experiência sexual nascida
do desejo mútuo. Um beijo digno de ir à guerra, nem que seja para ganhar outro.
Uma memória acalentada para ofuscar aquelas que um dia esperava apagar.
— Me desculpe, arruinei o clima — disse quando recuperou o fôlego. O colapso
provavelmente deveria tê-la deixado vazia e fraca, mas sentia-se revigorada, como
se um osso quebrado tivesse finalmente se recuperado e curado mais forte.
— Não se desculpe. — Com movimentos suaves dos polegares, ele enxugou as
lágrimas de suas bochechas. Tão suave. Tão surpreendente.
— Acha que sou fraca agora? — Ela perguntou com uma fungada.
— Acho que é mais forte. As coisas que teve que superar... você é uma
inspiração para mim.
Eu inspirava um grande guerreiro como ele? Teve que piscar para conter uma
nova rodada de lágrimas.
— Essa foi a primeira vez que chegou ao clímax? — Ele perguntou, ainda tão
terno.
Não havia presunção em sua voz, apenas curiosidade e talvez um pouco de
orgulho. A única razão pela qual ela respondeu.
— Sim. Essa foi a primeira vez que escolhi meu parceiro também. — Ternura,
gratidão e afeto substituíram sua vulnerabilidade — cada um deles dirigido a Puck.
— Devemos... cuidar de você agora?
Uma pausa. Então:
— Não — Ele a soltou e recuou. — Eu devo ir.
Ir? Não! Ela não queria distância dele agora — ela queria comunhão.
— Fique — Por favor.
Ele deu uma breve sacudida de cabeça. Então, diante de seus olhos, ele
mudou de uma fonte de conforto para uma de tormento, de necessitado para
distante.
O Homem de Gelo havia voltado com tudo.
Ela disse a si mesma, estou muito cansada para me chatear com isso. Mas não
era fã de banalidades e não mentiria, nem pra si mesma. Ela estava chateada.
Cortar a decepção quase a rachou ao meio.
Eu sabia que ele se aproveitaria e fugiria. Eu sabia! E doía tanto quanto ela
suspeitava.
Mas ele não tinha se aproveitado, não foi? E ainda assim ele encontrou forças
para abandoná-la. Ai.
O que provocou a mudança dentro dele? Por que não a deixou levá-lo ao
orgasmo? Por que a negaria esse privilégio?
Com esta versão de Puck, exigir respostas não a levaria a lugar algum.
— Eu gostaria que você parasse de bancar o Dr. Jekyll e o Sr. Hyde9 com o
Homem de Gelo. Ele é um pé no saco.
— Nós vamos conversar — ele disse, ignorando-a, a voz não mais cheia de
fumaça ou cascalho, mas de gelo.
Oh-oh. Isso não podia ser bom.
O desconforto tomou conta dela. Ainda assim, abriu um sorriso e cruzou os
braços acima do peito para esconder seus mamilos enrugados, toda eu não tenho
nada melhor para fazer.
Um erro! Ela se lembrava o quanto ele quis dar atenção àqueles mamilos
doloridos, mas ela tinha protestado, esperando gozar mais rapidamente. Menina
tola!
Da próxima vez ela... o que? Ela gostaria de uma próxima vez? O que eles
fizeram tinha abalado seu mundo inteiro, é verdade, mas isso... isso ela não podia
tolerar. Agir como se nada tivesse acontecido, olhar para olhos indiferentes,
incapaz de responder como gostaria sem possíveis consequências.
Epa! Se havia um problema, Gillian consertava. Que se danem as
consequências. De agora em diante, ela iria responder do jeito que quisesse!
— Você tem razão. Vamos conversar. — Embora suas pernas estivessem como
geleia, ela conseguiu andar até o sofá que Peanut havia atacado e se sentou. —
Você me disse uma vez que a Princesa Alannah de Daingean é sua mulher.
Casamento arranjado, blá, blá, blá. Você me recusa porque está se poupando pra
ela? Novidade! Duvido que ela esteja se poupando pra você. Ela está noiva do seu
irmão. Tem estado por um tempo, embora eles nunca tenham realmente puxado o
gatilho.
Ele não ofereceu pistas externas de seus pensamentos, o idiota.
Gillian interagiu com a princesa apenas uma vez, mas a observara, curiosa,
sempre que a avistava no mesmo mercado da aldeia que frequentava.
Alannah era bonita de uma maneira discreta, de fala mansa e tímida. O meu
oposto.
A conversa delas tinha sido curta e doce.
9
Referência ao livro clássico O Estranho Caso do Dr. Jekyll e do Senhor Hyde, de Robert Louis Stevenson.
Gillian: Ouvi dizer que você já foi noiva de Puck Connacht.
Alannah: S-sim. Mas ele tem chifres agora e…
Gillian: Eu sou esposa dele e gosto de matar qualquer um que o desrespeite.
Alannah: Por favor, me desculpe.
— Por que isso importa? — Puck finalmente perguntou. Ele sentou-se na
cadeira dizimada em frente a ela.
— Só estou conversando, como você queria. Se preferir, posso voltar para a
festa... e para William.
Ainda sem reação dele. Opa. Talvez ela não devesse ter jogado tão baixo? Puck
não era um adolescente com a sua primeira paixão. Ele era um príncipe e futuro
rei, um guerreiro até os ossos e Guardião de Indiferença. Embora desejasse Gillian
— à sua própria maneira — ele podia se afastar sem hesitar, a qualquer hora, em
qualquer lugar. Como havia provado.
— Eu gostei da ideia dela — ele respondeu, e alívio a percorreu. Ele moveu a
mão sobre um dos chifres como se tivesse vergonha — impossível. — Eu a encontrei
depois de minha possessão, depois que minha aparência foi alterada. Ela saiu
correndo.
Ai. A rejeição deve ter doído, mesmo que ele não tenha sentido a emoção no
momento.
Espera. As emoções se acumulavam dentro dele e entravam em erupção
depois? Se ele precisava de gelo para controlar as reações... ela achava que sim.
Inclinando-se para ele, disse em um sussurro:
— Quer saber um segredo?
Ele balançou a cabeça. Depois franziu o cenho. Depois assentiu.
— Conte-me. Conte-me agora.
Eu detecto ansiedade? Não vou sorrir.
— Eu sempre te considerei bonito.
Ele lhe deu um olhar — um de esperança e desejo — apenas para escondê-lo
atrás de uma máscara indiferente um segundo depois.
Seu coração apertou quando ela disse:
— O que você gostava na princesa?
— Sua aparência e o fato de que seria minha. Na verdade eu não a conhecia.
— Você também não me conhece — apontou Gillian. — Quer me tocar só por
causa da minha aparência? Ou porque já sou sua? — Um fato que você insistiu
para que eu dissesse em voz alta.
— Eu conheço muito sobre você.
— Ah é? Me conte.
— Você...
— O quê? — Ela insistiu.
— Você gosta de ajudar as pessoas. Não gosta de mentirosos.
— Fatos que eu te disse. Dificilmente uma novidade. Eu sei que você gosta da
ideia de machucar seu irmão e que não gosta de William.
— Seu passatempo favorito é colecionar troféus dos homens que você derrotou.
— Algo que você observou dos troféus pendurados na minha parede — ela
ergueu o canto da boca. — Acho que seu passatempo favorito acabou de se tornar
colecionar orgasmos de sua esposa.
O peito dele subiu e desceu em rápida sucessão, mas ainda assim sua
expressão permaneceu vazia.
— Você quer ficar em Amaranthia, mesmo depois de nos divorciarmos. Não
apenas para manter seu clã unido, mas para continuar governando seu clã. Você
acredita que ninguém mais pode garantir o bem-estar dele como você.
Tudo bem. Talvez ele realmente a conhecesse.
— Correto mais uma vez.
— Mas você não pode ficar aqui.
Fúria instantânea.
— Você vai tentar me expulsar de Amaranthia quando for rei? E preste atenção
que eu disse tentar.
— Eu não vou tentar. Eu expulsarei.
— Então você mentiu para mim. Mais uma vez — ela disse com voz áspera. —
Depois que prometeu sempre me dizer a verdade.
Ele nem sequer recuou.
— Eu não menti. Mudei de ideia.
— Por que mudou de ideia? — Ela exigiu.
— Porque posso. — Seu olhar foi tão frio e distante quanto no dia em que ele
quebrou seu dedo, só para provar um argumento. — Este é o meu reino.
Tudo bem, ela estava um pouco confusa demais no momento para lidar com
isso. Para lidar com ele.
— Acabei minha conversa com você. Não gosto de você quando age desse jeito,
então vou voltar para a festa.
Ele não disse nada quando ela se levantou e saiu, logo entrando no frescor da
noite. Um segundo depois, no entanto, a porta bateu. Passos ecoaram. Puck a
seguiu.
Seus pontos de pulsação dispararam, sua pele e sangue aquecendo, seu corpo
pronto para a segunda rodada.
Ignore-o. Quando ela se aproximou da festa, um zumbido familiar correu ao
longo de suas terminações nervosas. Ela parou abruptamente, respirando fundo
para evitar se transformar em Hulk.
— O que você tem? — Puck veio por trás, seu hálito quente acariciando sua
nuca, adicionando fogo em seu sangue, enviando arrepios pela coluna, e ela rangeu
os dentes. — Não vai discutir comigo?
— É isso que quer? — Ela disparou em movimento e ele manteve o ritmo. —
Que eu discuta com você?
— Não. Sim. Eu não sei.
— Até que descubra, fique longe.
Risos explodriam, agora em um volume maior do que a música.
— Gillian! — Johanna chamou. — Venha. Junte-se a nós.
— Ela não sabe que você já foi e já voltou — Puck comentou como quem puxa
conversa.
Mais arrepios, mais calor. Mas ah, ele não tinha o direito de mencionar o
namorico dos dois depois de ameaçar expulsá-la de Amaranthia.
O que a atraía nele? Além do óbvio, é claro — sua beleza sobrenatural, beijos
perversos e toque glorioso. Por que responder sexualmente apenas a Puck? Era
apenas o vínculo? Certamente que não. Sua mente o queria tanto quanto seu corpo.
Tinha que ser o jeito que ele às vezes olhava para ela como se ela fosse uma
revelação. A maneira como ele às vezes concentrava toda a intensidade nela, como
se nada mais tivesse importância.
Viciada...
Johanna e Rosaleen sentavam-se ao lado de um William sorridente. Sorridente
até que ele notou Puck.
Puck deve ter notado ele também porque endureceu.
— Quero que você fique no meu reino — disse ele, sua voz suave — mas não
com William. Estou tentado a estripá-lo toda vez que vejo vocês dois juntos.
Como é que é? Toda essa bobagem de você tem que ir embora por ciúmes?
O quê que eu faço com esse homem?
Antes que ela pudesse pensar em uma resposta, Puck a rodeou para se juntar
ao banquete. Não sabendo mais o que fazer, ela o seguiu.
***
***
Gillian flutuou dentro e fora da consciência. Mais de uma vez notou a manta
aquecida de pelo pressionada ao seu lado e se esfregou nela. Tão macia!
Em diferentes momentos, vozes familiares penetraram sua consciência.
Puck: Você estava com medo dela.
William: Eu sou todos os reinos, todas as idades. Sou escuridão e luz. Sou poder
como você nunca conheceu. Não temo nada e a ninguém.
Puck: Encare, Willy. Você ainda está com medo.
William: Estou puto! Se quer sua coroa, vai manter suas mãos longe dela a
partir de agora. Você me entende? Ah, e mais uma coisa. Se ela estiver indiferente
quando acordar ... É melhor que ela não esteja indiferente!
Puck: Manter minhas mãos para mim mesmo nunca foi parte do nosso trato.
A conversa diminuiu de sua consciência, outra em breve tomando seu lugar.
Winter: De alguma forma você fez o que apenas o xarope pode fazer e a acalmou.
Nada mais funcionou.
Cameron: O problema é que nós drenamos todas as árvores.
Puck: Existem muitas... no território Connacht.
William: Talvez, quando chegar a hora, eu me case com ela no território
Connacht. Você pode servir como testemunha, Pucker.
Eles foram de dormir juntos a casamento? Suspiro.
Gillian não tinha ideia de quanto tempo passou antes de abrir os olhos,
lembranças da batalha a inundando. Oh... merda. Ela machucou William, depois
Puck, depois foi envolvida pelo gelo de Puck.
Sua raiva havia desaparecido. Todas as emoções haviam desaparecido. Ela
não se importava com nada e ninguém. Até mesmo o pensamento de morrer era
insignificante. O pensamento de viver também. Machucar as pessoas que ela
amava? Vá em frente.
A força que Puck empunhava para perseverar sem causar danos colaterais
generalizados... incrível! Sua admiração por ele disparou. Ele era o guerreiro dos
guerreiros. E tudo bem, sim, ela queria abraçá-lo e beijá-lo e lambê-lo todo, o que
significava que o gelo dentro dela já havia derretido.
Diferentes emoções a inundaram. A primeira? Desânimo. Saltou o coração
contra as suas costelas. Que tipo de dano colateral ela causou?
Sentando-se, fez um balanço. Estava em seu sótão, em sua própria cama,
sozinha e sem ferimentos, vestindo roupas limpas. Sem lenço na cabeça. Vozes
abafadas vinham de baixo...
Ela fez seu caminho até o primeiro andar. Puck estava de pé ao lado de Peanut,
dando uma maçã a ele. Minha família...
Saltar, saltar. E não de desânimo neste momento.
Puck havia se banhado, mudado de roupa e prendeu seu cabelo úmido em um
rabo de cavalo chique de guerreiro, com menos lâminas do que de costume
penduradas nas extremidades. Ele parecia impecável e de outro mundo, tão
masculino que pôs fogo em cada instinto feminino seu.
Ele parecia em casa. Uau! Casa? Ela não acabou de pensar isso.
Eles brincaram uma vez, e esperançosamente iriam para a segunda rodada
em breve. Porque sim, ela ansiava por outro orgasmo e ansiava por testemunhar e
— causar — o dele. Mas não conseguia esquecer a tendência dele de dar um gelo
nela depois. Ou que ele planejava deixá-la ir.
Ele pensaria nela novamente? Talvez não. Até agora, não tinha compreendido
totalmente a amplitude de sua apatia. Para ser vazia, completamente desprovida
de emoção — não se sentia como um ser vivo, mas inferior a um animal.
Não há final feliz para você, Gillian Connacht.
Ela mordeu a língua até provar o gosto de cobre do sangue.
Oráculos estúpidos! Certo, finais felizes não eram dados de graça, mas lutaria
com unhas e dentes pelo dela. Ela ajudaria Puck e William a fazer as coisas deles,
até mesmo aceitaria um divórcio. Quando ela aprendesse como é viver sem um
vínculo, governaria os Shawazons e começaria a namorar, assim como ela esperava.
A ideia não era repelente. Ou emocionante.
Por que eu me sinto como se estivesse indo para a minha execução?
William se esticou no sofá, um homem de lazer.
— Notei que Gillian não usa seu anel, Pucker. Mas então você já deu um a ela,
não é? Quinhentos anos de sofrimento10.
Puck ficou rígido.
— Engraçado, quando eu a segurei em meus braços, não foi o seu nome que
ela gritou.
Agora William ficou rígido.
Bom Deus.
— Pensei que vocês dois iriam se beijar e fazer as pazes.
Ao mesmo tempo, os três machos se concentraram nela. William ficou em
silêncio, observando-a com algo parecido com suspeita. Peanut trotou para
acariciá-la, como se dissesse: Você não pode errar, mamãe.
Puck... Oh, meu. Seus olhos escuros a devoravam.
Não reaja!
10
Sofrimento em inglês é suffering, uma analogia que William faz a anel.
— Acabou o Hulk — disse ela, mudando de um pé para o outro para amenizar
a dor súbita entre as pernas. — Me desculpe, William. E eu sei que isso não é bom
o suficiente. Mas como eu devo me desculpar por arrancar seu braço? Cesto de
frutas? Abraço? Me oferecer para pagar cem anos de terapia? Diga que você me
perdoa. Por favor! Porque quando eu digo que sinto muito, sou cem por cento
sincera. Estou falando sério.
— Boneca, eu não posso...
— Você não pode perdoá-la? — Puck interrompeu, e ela pensou que
vislumbrou um brilho provocador em seus olhos. — Você está sendo irracional,
Sempre Excitado. Ela pediu desculpas e foi sincera.
William ficou tenso com agressividade, pronto para atacar.
— É assim que vai ser? Se você quer jogar, Pucker, vamos jogar.
— Não! — Gillian apertou as mãos, formando uma torre. — Sem jogar, sem
lutar. William, seu presente para mim... me pagar de volta por permitir que você
me perdoe... é beijar e fazer as pazes com Puck. Não? Cedo demais? Ok, bem, talvez
vocês devessem ficar longe de mim. E se eu arrancar sua cabeça da próxima vez?
E se eu te matar?
Seu amigo ofereceu um sorriso reprovador.
— Eu não posso ficar com raiva de você. Você está perdoada, e vou apenas
agradecer por permitir isso. Mas suas preocupações são infundadas. Eu sou forte
demais, rápido demais.
Argh! Ele algum dia levaria suas habilidades a sério?
— Sim, mas e se você não for? Você não foi forte ou rápido o suficiente para
impedir seu braço de ser amputado.
Ele espalhou dois braços perfeitos, todo eu sou o último homem saudável do
universo.
— Eu estava surpreso. Da próxima vez estarei preparado.
— Que tal isso — disse Puck, como se sua pergunta fosse totalmente lógica e
ela fosse esperta por perguntar. — Eu vou arrancar os membros de William em
momentos aleatórios. Dessa forma, você não é a única causadora de dor. Nós
dividiremos responsabilidade igualmente.
— Essa é uma oferta muito doce — ela respondeu, com a mão tremula sobre
o coração. —Obrigada.
— Doce? — William berrou.
— Mas — ela acrescentou — e se eu arrancar seus braços? Talvez eu deva...
— Ficar para trás? Excelente ideia — William assentiu.
—... fazer a missão sozinha — ela terminou com um cenho franzido. Ele queria
deixá-la pra trás?
— Se você arrancar meus braços — disse Puck — vai ter que me dar comida
na boca até que eles tornem a crescer.
Por que, por que, por que ela tinha que gostar da resposta dele muito mais
que a de William?
— Combinado.
— Com que frequência acontece de você virar Hulk?
— Uma ou duas vezes por mês.
— Então sou eu quem que lhe deve um pedido de desculpas — disse ele,
desviando o olhar. —Eu sou o culpado por sua raiva. Emoções que eu enterro estão
viajando através do nosso vínculo, e você é a forçada a lidar com elas.
Cara! Mesmo? A raiva pertencia a Puck? Bem, isso não fazia sentido.
O cara ou sentiu muito ou nada. Que existência terrível.
— Tudo bem. Chega de conversa fiada. — William pegou uma pilha de
camisetas dobradas e se levantou. — Temos uma missão para começar. Vocês
ficarão felizes em saber que tomei a liberdade de fazer uniformes de equipe — dando
um sorriso convencido, ele se aproximou dela.
Peanut sibilou para ele, um aviso claro para ficar longe.
William revirou os olhos e jogou uma camisa para Gillian. Na frente, ele
estampou o rosto de Puck dentro de um círculo. A legenda dizia: Eu não tenho
medo de cabras.
Em seguida, ele jogou uma camisa para Puck.
— Não precisa me agradecer. Eu sei que você amou.
Puck ofereceu seu sorriso frio patenteado.
— Minha imagem aninhada contra os seios de Gillian? Eu vou agradecer a
você, Willy.
Narinas dilatadas, William disse com a voz áspera:
— Eu. Vou. Matar. Você.
— Você. Pode. Tentar.
Gillian suspirou.
— Estamos saindo em uma hora e tenho coisas pra fazer. Vão, vocês dois.
Preparem-se.
— Qualquer coisa para você. — William soprou-lhe um beijo e saiu.
Puck permaneceu. Com os olhos em chamas, ele disse:
— Prepare-se, porque eu vou ter você. Eu disse a mim mesmo que não tocaria
em você novamente porque não importa o que, eu deixaria você ir. Eu fiz uma
promessa a William garantindo isso.
Suas palavras não deviam doer. Mas... ai.
— Mas — continuou ele — não consegui ficar longe ontem... e hoje. Eu tenho
você por pouco tempo, e vou aproveitar o quanto puder. Parabéns, moça. Você me
derrotou.
Você deve se preparar, porque eu vou ter você.
Indo aproveitar você enquanto eu puder.
As palavras de Puck ecoaram dentro da mente de Gillian, algumas vezes
repetindo, algumas vezes confusas enquanto ela andava com Peanut pela areia.
Suas pernas mais curtas o faziam mais lento que as outras quimeras, seu andar
mais agitado. Para consternação de William, ela usou a camiseta de bode como um
travesseiro debaixo de sua bunda cada vez mais dolorida.
Um momento ela se excitou pelo anúncio de Puck, tão quente e dolorida que
pensou que poderia morrer sem o toque dele. No seguinte, ela se atrapalhou, tão
confusa que achou que poderia soluçar.
Ela deveria resistir a ele? Ou apenas desistir?
Parabéns, moça. Você me derrotou.
Ele não parecia feliz. Mas então, quando ele já pareceu feliz? Por outro lado —
ou quem sabe o mesmo lado? — ele parecia ressentido.
Gillian havia se casado com uma única tarefa em mente: fazê-lo sentir algum
tipo de emoção. Ela não sabia que viria a desejar o toque dele mais do que qualquer
coisa. Agora, desejava poder fazê-lo sentir desejo — desejo atado com afeição.
A má vontade não seria, bem, tolerada.
Traçou um plano de ação enquanto seu grupo de cinco viajava, jogando cabo
de guerra mental. O que fazer, o que fazer? Deixá-lo ir? Lutar por ele? Pegar o que
pudesse, enquanto pudesse, como ele esperava fazer?
— Eu odeio o começo de uma jornada — disse Winter, tirando-a de seus
pensamentos. — E o fim. E tudo o que acontece entre os dois.
— Mas você adora reclamar de viagens — brincou Cameron — então o resto
de nós tem isso pelo que esperar.
— Isso é verdade — Winter suspirou, desolada. — Ótimo! Há um lado positivo
para todos, menos eu.
Como Winter, William também mantinha um fluxo constante de reclamações.
Os sóis me odeiam.
Boneca, você pode me fazer um favor e colocar um pouco de ânimo no passo do
seu vira-lata? E não, não estou falando do Peanut.
Esqueci de trazer um tratamento profundo de condicionador para o meu cabelo.
Se eu desenvolver pontas duplas, alguém vai ser castrado — não vou mencionar
nenhum nome, mas começa com um P, ou talvez um F, e termina com um uck.
Logo depois, eles chegaram a um pequeno acampamento. Os ocupantes
avistaram Gillian e deram um grito estridente:
— Não a Saqueadora das Dunas!
Ela reconheceu seus rostos em um instante. Dois homens na sua lista de mais
procurados. Abusadores conhecidos.
Antes que eles tivessem tempo de correr, antes que alguém no grupo tivesse
tempo de reagir, Gillian estava de pé, com a espada na mão, fazendo justiça.
Cabeças rolaram e magia a encheu.
William franziu o cenho para ela.
— Minha boneca precisa ser mais cuidadosa. E se eles tivessem lutado de
volta?
Boneca? Ele sempre a veria assim, não é?
— Boa matança — Puck balançou a cabeça em reconhecimento, mas evitou
encontrar seu olhar, como se soubesse que a tensão entre eles finalmente chegaria
a um ponto de ebulição.
Num esforço de distrair todo mundo com conversa, ela tornou a montar em
Peanut e correu na frente, dizendo:
— Do que vocês chamaram suas quimeras?
— Os animais morrem antes dos imortais — disse William. —Melhor não fazer
amizade com eles.
Winter franziu a testa para ela.
— Por que eu daria nome a uma quimera fraca?
Cameron olhou para o céu.
— Quantas nuvens? Eu devo saber!
— Não importa — Puck disse com um dar de ombros.
Inaceitável!
— Não importa é um nome horrível. Puck, você vai chamar o seu Nozes.
William, o seu é Pistachio. Cameron, o seu é Almond. Winter, o seu é Pecan —
Gillian estendeu a mão para acariciar Peanut atrás da orelha. — Eles serão nossos
pequenos excêntricos.
Sem resposta. Boa. Nenhuma resposta significava nenhuma objeção.
Finalmente, pouco antes do anoitecer, eles chegaram ao seu destino: a entrada
para o labirinto de Sin. Um nevoeiro escuro levava aonde a areia terminava e uma
floresta assustadora começava. Ao invés de entrar, eles acamparam em um
pequeno oásis com um rio próximo. Eles iriam ao sair do sol.
— Acha que Sin tem homens esperando lá dentro? — Winter perguntou. —
Eles podem sair e tentar nos matar antes que possamos entrar.
— Ou avisar a Sin da nossa chegada — disse Cameron. — Nós deveríamos...
oh, olha, outra nuvem!
— Ele vai me sentir no momento em que eu chegar a terra Connacht —
respondeu Puck. — Se ele tem homens por perto... — Ele deu de ombros. — Deixe-
os vir.
William desmontou, seu olhar quente em Gillian.
— Como está seu nível de raiva?
— Bom — ela murmurou. Não deveria Puck perguntar sobre os níveis de
excitação dela?
Sempre cavalheiro, William ofereceu-se para montar um acampamento para
ela enquanto ela cuidava de qualquer necessidade pessoal.
Ela aceitou agradecida e conduziu Peanut a uma boa distância até a beira da
água, onde ela o alimentou e escovou. Quando ele estava descansando
confortavelmente em uma cama de peles, ela pegou uma barra de sabão de sua
mochila, dirigiu-se para trás de um bosque de árvores, despiu-se e entrou na lagoa.
Depois de limpa, colocou um vestido confortável feito de lenços. Um presente
de uma das mulheres que ela salvou. Enquanto tirava a água do cabelo, o leve som
de passos capturou sua atenção.
Alguém se aproximava, e ele carregava um leve aroma amadeirado com ele.
Em suas veias, consciência efervesceu como champanhe
— Eu trouxe o jantar — o barítono rouco de Puck acariciou seus ouvidos.
Não havia passado tempo suficiente para qualquer tipo de caça, o que
significava que Puck planejara antecipadamente. Cuidando de mim, mesmo que ele
diga que não se importa comigo?
Embora seu coração disparasse, Gillian se virou devagar... e ficou cara a cara
com o objeto de sua fascinação. O luar acentuava a beleza trágica de um rosto
cortado pela crueldade, sem qualquer indício de calor ou suavidade. Não esta noite,
pelo menos. Como ela, ele tomou banho, deixando o cabelo molhado. Onde ele
tomou banho ela não sabia, já que não havia outro córrego por perto — pelo que
ela sabia. Ele estava sem camisa, seu corpo de guerreiro era uma revelação de força
e tendões. Esta noite, a tatuagem de borboleta corria de um lado a outra das
costelas, estendendo-se sobre o umbigo e ao longo de sua trilha, desaparecendo
sob a cintura de suas peles. Sua boca encheu d’água por um gosto.
Até mesmo a tatuagem de pássaro fora dos limites a atraía. Aquela que ela
não tinha permissão para tocar.
Ele teria alguma objeção a lamber?
Teria ela realmente passado o dia sem saber se devia ou não negá-lo? A
resposta estava tão clara agora.
Eu vou tê-lo enquanto eu puder.
Mas o que eles poderiam fazer hoje à noite? Logo os outros iriam para o rio
esperando tomar banho. Não era como se Gillian pudesse pendurar uma meia em
um galho de árvore como um sinal para ficarem longe. Como William reagiria a
isso? E as ameaças que podem estar por perto?
Espera. Puck ainda a observava, expectante. Ele fez um comentário sobre...
oh, sim.
— Jantar. Obrigado — ela disse.
Ele lhe entregou um saquinho de frutas e nozes.
— Venha. Vamos comer juntos. — Como um encontro! Ela o levou para o
pallet que tinha feito para Peanut. Seu animal de estimação estava exausto demais
para se mover, muito menos abrir os olhos.
Puck se sentou ao lado dela, observando enquanto ela colocava uma fruta
vermelha na boca. Suas pupilas se derramaram sobre suas íris como algum tipo
de eclipse solar erótico enquanto ela gemia de prazer e saboreava o doce suco
molhando sua garganta seca.
— Você foi bem hoje — ele disse rouco.
— Obrigada — ela arqueou uma sobrancelha. — Estamos falando sobre as
mortes, certo?
Os cantos da boca dele se levantaram, fazendo o coração dela palpitar.
— Estou falando sobre como você monta sua quimera sem reclamar.
Ela bufou.
— Ganho um troféu?
— Sim. Ganha. Eu tenho o seu troféu... dentro das minhas calças.
Puck fazendo piadas e insinuações... Não abane suas bochechas
superaquecidas. Ela só encorajaria os dois em um momento em que não deveria
encorajar nenhum deles.
Embora realmente quisesse seu troféu.
Ainda não!
— Você não ganha nenhum prêmio hoje. Quando não estava provocando
William, estava fervendo em silenciosa desaprovação.
— Odeio ele. É tão ruim quanto Sin. O que você vê nele?
Fácil.
— Afeição. Diversão. Apoio. — Pra ser justa, eu prefiria ver essas coisas em
você.
— Eu tenho uma coisa pra você — Ele enfiou a mão no bolso e tirou... um
anel.
Troca de presentes! Só que ela não tinha nada para ele.
— Este é o seu anel de casamento.
O coração dela acelerou quando aceitou a aliança brilhante. Ou tentou. Ele
afastou a mão dela e deslizou o metal sobre o dedo dela. Caimento perfeito.
— Ouro amaranthiano puro — ele disse a ela.
Tradução: inestimável. Estilhaços de arco-íris brilhavam dentro de tons âmbar
pálidos.
— Obrigada — Ela sabia que o comentário de William sobre “sofrimento11”
tinha estimulado o presente, mas ela o amava mesmo assim. Uma marca de posse
de Puck, destinada a alertar outros machos a ficar longe.
— Mas não tenho nada pra você — disse ela.
— Não preciso de nada, não quero nada.
Como é triste, mas também impreciso.
—Você quer tanto a coroa do seu irmão que se vinculou a uma estranha e
barganhou com um demônio.
— Minha coroa — ele interveio. — Só minha.
— Certo. — Ela lhe ofereceu uma fruta. Depois que ele recusou, ela disse: —
Então, o que ele fez exatamente para ganhar sua condenação por vir? Eu sei que
ele te traiu, te deu o demônio, blá, blá, blá, mas tem que ter mais. E você tem que
me contar, desde que você teve seus dedos dentro de mim e tudo.
Com o olhar subitamente em chamas, ele esfregou a mão pelo comprimento
inchado. Ela assistiu, fascinada. Então ele percebeu que estava praticamente se
masturbando diante de seus olhos — sim, sim, continue — ele parou e socou o
pallet debaixo dele.
Ela engoliu um gemido de decepção.
— Não se preocupe. Eu terei meus dedos dentro de você novamente, moça.
Em breve. Junto com outras partes de mim. Mas não aqui, não agora. Seu prazer
é meu para desfrutar. Somente meu. Especialmente para a nossa primeira vez.
Especialmente para a sua primeira vez.
Instintos femininos cantaram. Ele era tão carnalmente masculino.
—Mas eu tenho...
— Não, você não tem — disse ele com uma sacudida de cabeça.
Homem querido. Bela besta.
— Quanto à profecia, as oráculos previram que um irmão mataria o outro e
uniria os clãs com uma rainha amorosa ao seu lado. Tanto Sin quanto eu juramos
que nunca nos casaríamos. Em vez disso, nós governaríamos lado a lado com
controle igual. Eu não sei quando ele começou a conspirar contra mim, só sei que
sua amiga Keeleycael deu a ele uma caixa de bugiganga que continha Indiferença.
11
Suffering, mais uma vez fazendo referência a anel.
— Mas por que?
— De acordo com Hades, ela tomou medidas para garantir a sobrevivência de
William.
Peças de quebra-cabeça se encaixaram um após o outro, deixando Gillian
atordoada com suspeitas. Se Puck não estivesse possuído, ele nunca precisaria de
William. Ou Gillian. Muito provavelmente, Keeley nunca teria dado a Gillian uma
poção para torná-la imortal, e seu casamento não teria tido um não começo. Ela
nunca teria se aventurado em Amaranthia ou aprendido a usar magia. Ou
enfrentado seus medos e vivido seu sonho.
Eu teria perdido todas as boas coisas da vida.
Mas oh, Puck podia não entender se ela dissesse:
— Acho que devo uma dívida de gratidão ao seu irmão.
Ela comeu outra fruta, aproveitando o tempo para pensar em suas próximas
palavras.
— Antes da traição de Sin, você o amava?
— Mais do que já amei alguém. Incluindo eu mesmo — disse ele. E era
estranho ouvir essas palavras sinceras faladas sem uma pitada de emoção. —
Agora, por mais que eu queira proteger meu povo e reino dele, quero vê-lo sofrer.
Pensativa, ela bateu um dedo no queixo.
— Se casar com uma mulher apaixonada é tudo o que Sin precisa fazer para
dar o pontapé inicial na profecia e garantir que você seja o irmão que morre, por
que ele ainda não se casou com a princesa? A menos que ela não o ame? — Esse
certamente foi o problema no caso de Puck e Gillian, não foi? —Você pensaria que
ele estaria mais motivado desde que você já se casou.
— Eu tenho uma esposa, mas não uma amorosa — disse ele, dando voz ao
pensamento dela. — E não iniciamos uma profecia. Elas nos deram o pontapé
inicial.
— Você tem certeza disso? Você nunca teria agido contra Sin se ele não tivesse
agido primeiro contra você.
— Ele nunca teria agido contra mim se não soubesse o destino que nos espera.
Talvez sim, talvez não.
— Se você não adivinhou, eu não sou a maior adepta das coisas sobre
adivinhação.
— Eu não acredito que o destino faça parte de tudo, apenas certas coisas.
— Certas coisas... como casamento e morte?
— Não. Porque erros de relacionamento são cometidos o tempo todo. Algumas
mortes são prematuras — ele franziu o cenho. — Conte-me. Qual você considera
mais poderoso... amor ou ódio?
— Amor, absolutamente. Mas o que isso tem a ver com alguma coisa?
— Acredito que o destino nos conduz ao amor sempre, mas as pessoas nem
sempre cooperam. Livre arbítrio. Ódio. Mal. Seja qual for a razão. Mas estou
disposto a lutar pelo fim desejado, e é por isso que acredito que o destino acabará
em Amaranthia. William vai destronar Sin a meu comando e libertará você. Eu vou
encontrar minha rainha amorosa, assassinar meu irmão e unir os clãs, salvando
tudo que amei uma vez.
Bom ponto. Talvez Gillian precisasse permanecer casada com Puck para salvar
os Shawazons.
— Você poderia se divorciar de mim para cumprir os requisitos do seu voto
para com o William... depois se casar novamente comigo. Eu poderia ajudá-lo com
seus objetivos.
— Você não cumpre o único requisito, lembra? — Ele franziu o cenho, mostrou
os dentes brancos e retos e moveu seu aperto para seus joelhos, as garras cavando
fundo o suficiente para tirar sangue. Para se impedir de alcançá-la? — Você não
me ama. Você pode até me desprezar quando nosso vínculo for cortado.
Mas e se ela se apaixonar por ele? Não era impossível.
Ela girou a aliança no dedo, ainda não acostumada com o peso.
Puck poderia amá-la de volta? Ele a desprezaria no momento em que o vínculo
fosse rompido? Ela poderia realmente ajudá-lo a unir os clãs depois que causou
tanto tumulto?
E se a profecia sobre a vida dele se realizasse, desdobrando-se exatamente
como previsto? Gillian seria forçada a dar uma olhada muito mais dura em sua
própria profecia. Matar os sonhos de seu homem... sem final feliz...
Era esse o destino que ela queria para Puck?
— Você quer que eu me apaixone por você? — Ela finalmente perguntou, seu
tom suave, quase implorando.
— Eu quero... não — disse ele. Rosnou, realmente. Ele balançou a cabeça
inflexível. — Eu não quero que você me ame.
Ele queria dizer realmente essas palavras. Em seus olhos escuros, as
pontinhas de luz brilhavam com resolução intratável. E ela não ficou chateada.
Não. Nem um pouco. O amor só complicaria o arranjo deles.
Caia fora, caia fora – Transe e Jogue fora.
— Bom — disse ela, toda bravata. — Porque esta rainha não quer ser selada
com um rei mandão e insensível.
Nenhuma reação dele.
Melhor ainda! Ela limpou a garganta e voltou ao assunto original.
— Então, por que Sin não te matou quando teve a chance? Por que se dar ao
trabalho de te infectar com indiferença e deixar você ir embora? A não ser que ele
também te amasse e esperasse encontrar uma maneira de vencer a profecia e
manter vocês vivos.
— Ele escolheu o caminho errado.
Verdade.
Encostado na árvore atrás dele, Puck cruzou os braços sobre o peito.
— Ontem você disse que... me acha atraente. Até mesmo bonito. Não se
importa com os chifres e cascos?
Se ele não queria o amor dela — por que ele não queria meu amor? — por que
sua opinião importava?
Se ela perguntasse, ele poderia ir embora num acesso de raiva. Então ela
decidiu seguir um caminho diferente e apontou para os chifres com uma inclinação
do queixo.
— Posso?
Com os olhos arregalados, ele se ajoelhou e curvou a cabeça.
Pequenos tremores percorreram seus membros quando ela se aproximou dele,
ajoelhou-se também e traçou com a ponta do dedo de ponta a ponta ao longo dos
chifres. Quente e tão duro como o titânio. Camadas de marfim sobrepostas
formando múltiplos anéis. Marfim ou seja lá do que a protuberância era feita.
No primeiro contato, ele endureceu. Então gemeu.
Gillian ficou imóvel.
— Eu machuquei você?
— Não! Não pare. Por favor.
Nisso ele estava implorando? Seu desespero chamou a dela, e ela envolveu a
mão em torno da base de cada chifre e apertou.
Ele respirou fundo, como se ela tivesse acabado de apertar um apêndice
diferente.
— Nunca gostei desses chifres. No momento, não tenho certeza se vou
conseguir me separar deles.
Sangue esquentando.
— Ninguém nunca tocou neles?
— Eu não tenho certeza. Nunca me importei em dizer sim ou não, ou lembrar.
— Chiando. Sua barriga tremia, e uma dor começou em seus seios, culminando em
mamilos franzidos... mamilos atualmente no nível dos olhos de Puck.
A dor rapidamente se espalhou para o ápice de suas coxas.
Fervendo agora, prestes a chegar a um ponto sem retorno.
Gillian o soltou e voltou para o seu lugar. Ele ergueu a cabeça lentamente, os
olhos do céu da meia-noite brilhando com todas aquelas estrelas, quase como se
runas percorressem sua íris e suas mãos. O ar entre eles crepitava com consciência,
calor e agressão.
Não posso tê-lo. Não aqui, não agora. Distração!
— Como você era antes de sua posse? — ela conseguiu soltar rispidamente.
— Por que isso importa? — Ele se abaixou. — Eu não sou mais esse homem.
— Conte me então.
Ele deu de ombros, mas disse:
— Eu era conhecido como o Invicto. Se entrasse em uma guerra, ganharia.
Sempre — um tom de orgulho cobria suas palavras. — Sin planejava as batalhas
e eu as lutava.
A vitória importava para ele, mesmo agora. O fato de que Sin o havia traído —
derrotado — deve ter feito seu ódio pelo homem muito pior.
Parabéns, moça. Você me derrotou.
Ele também se ressentiria com Gillian?
— Eu nasci com a capacidade de me transformar em qualquer um a qualquer
hora, sem necessidade de mágica — continuou ele. — Eu não tinha um estábulo,
mas assegurava que a mulher na minha cama estava bem satisfeita.
— Está se gabando agora? Sem necessidade. Baby, tenho experiência em
primeira mão com suas proezas sexuais, lembra?
Puck cambaleou, quase desfeito. Gillian havia tocado seus chifres. Pela
segunda vez em dois dias, ele quase gozou em suas calças como um menino. Agora,
ela falou de sua “proeza sexual” como se fosse morrer sem saber mais.
Antecipação efervecia através dele, e ele pensou: farei qualquer coisa — até
mesmo me afastar de Amaranthia para sempre — para conhecer a sensação de suas
mãos suaves nos meus chifres novamente, ouvir sua voz cheia de prazer gritar meu
nome quando ela gozar.
Tolo! Desejou nunca ter conhecido o êxtase de ter suas mãos nele. O tipo que
ele nunca pensou ser possível. Paixão o tinha governado. Uma mulher o possuíra.
Mas Puck não a possuía. Ele tinha sido tão arrogante ao pensar que poderia
viciar Gillian ao seu toque, em fazê-la ansiá-lo para sempre. As garras de William
estavam profundamente enraizadas no coração dela. William, quem lhe dava
carinho e se divertia com ela, que de alguma forma a fazia se sentir apoiada.
Pelo menos, ele costumava. Talvez os sentimentos dela pelo macho tenham
surgido do passado?
De qualquer forma, a inveja fervia dentro de Puck, um monstro mais poderoso
que Indiferença. Cada célula de seu corpo gritava ao lado dos lamentos constantes
do demônio: conquistá-la do outro macho.
Ele não tinha dado a suas regras uma única consideração, só tinha pensado
nela. Estava se apaixonando por ela, duro e rápido. E o que acontecia quando você
se apaixonava? Você caía com força, e se machucava. Você não se afastava — você
se arrastava.
Quer que eu te ame? A pergunta dela ainda o atormentava. Ele disse que não
e estava falando sério. No momento em que usasse as tesouras, seus sentimentos
por William retornariam. Puck sabia disso sem qualquer dúvida. Se tivesse o
coração dela só para perdê-lo...
Ele jogou o jogo dela: e se...
E se ela desse seu coração para Puck e então o levasse embora? E se ela desse
seu coração para Puck, e deixasse para ele o manter? O que ele faria então?
O que ele desistiria por essa mulher?
Deveria entrar na briga ou continuar a evitar?
Ele reprimiu uma maldição. Por que estava até mesmo contemplando isso? A
resposta era simples. Evitar. Sempre evitar. Ele se contentaria com o corpo dela,
como planejado, e experimentaria qualquer satisfação que ela tivesse a oferecer.
Nada mais.
— Você me contou sobre o Puck adulto — disse ela, alheia à sua agitação —
mas não sobre o Puck bebê.
Implacavelmente, ele voltou de seus pensamentos de amor, sexo e possíveis
futuros diferentes.
— Eu era como qualquer outra pessoa, suponho. Eu comia, molhava as
fraldas e chorava. Não tenho certeza do que mais você gostaria de saber.
— Apenas tudo — ela brincou com uma folha de grama. — Enquanto você
estava caçando William, notei muitas crianças-soldados no campo de batalha.
Quantos anos você tinha quando começou a treinar?
— Sete.
— Sete! — Ela gaguejou por um momento. — Tão jovem.
— Não jovem o suficiente, de acordo com meu pai. Mas minha mãe concordava
com você.
— Bom para ela — disse Gillian com um aceno de cabeça. — Nenhum filho
meu jamais vai para a batalha.
Como sua vida teria sido diferente se tivesse um campeão como Gillian.
Então suas palavras se registraram e ele parou de respirar. Nenhum filho meu.
Uma criança. Um filho dela. O filho deles.
Em sua mente, surgiu uma imagem de Gillian grávida de seu bebê. Uma
imagem que ele não conseguiu tirar da cabeça.
Que tipo de pai seria Puck?
Papai não está orgulhoso de você, filho. Papai não te ama, ou se importa se você
vive ou morre. Pare de chorar antes de eu te dar uma razão para chorar.
Além disso, família torna você vulnerável à traição, como Sin havia provado.
Gillian um dia se casaria com William e daria à luz à sua prole?
Conforme o ciúme queimava dentro de Puck, Indiferença reagiu como se seu
coração tivesse levado um choque com pás de desfibrilador saltando em movimento,
rondando sua mente e uivando com... dor?
Agora você sabe como eu sofri, impotente para agir, tudo a seu comando,
demônio. Oba!
A tatuagem de borboleta em seu peito deslizou sobre sua pele, terminando em
suas costas.
Gillian notou e ofegou.
— O demônio está tentando enfraquecer você?
— Provavelmente, mas está falhando — voltando ao assunto em questão. —
Sin começou a treinar aos cinco. Embora pudesse ter ficado com nossa mãe, ele
escolheu me acompanhar até as barracas.
— Soa como um irmão bastante legal.
Um aceno de cabeça.
— Ele era — O que fez sua traição pior do que... qualquer coisa.
— Qual é a sua lembrança favorita dele?
— Há muitas para escolher.
— Escolha uma, de qualquer maneira.
Ele pensou por um momento, suspirou.
— Alguns dias depois de sermos levados para as barracas, fiz uma birra por
como éramos tratados. Sem travesseiros macios em nossas camas. Nenhum prato
de carne era trazido por mulheres adoradoras. Nenhuma roupa limpa. Fui
espancado pela minha insubordinação. Sin também.
— Uh, isso não parece uma lembrança feliz.
— Estou chegando lá — disse ele. — Paciência, gafanhoto.
— Gafanhoto? — Ela sorriu, e o olhar dele se concentrou em sua boca.
Fome meteu as garras dentro dele, mas se forçou a continuar como se nada
estivesse errado.
— Esperava que ele se queixasse, odiasse a si mesmo por se juntar a mim.
Odiasse a mim mais por não insistir que ele ficasse para trás. Mas ele olhou para
mim com admiração e disse que eu era a pessoa mais forte do mundo, que não
importava quantas vezes eu fosse atingido, não importava quantas vezes eu caísse,
eu voltaria a levantar.
Olhos luminosos ao luar, ela abriu a mão no centro do peito.
— Você está certo. Uma bela lembrança. Você pode odiar seu irmão pelo que
ele fez, mas ama quem ele costumava ser.
Ele deu de ombros.
— Com que facilidade você descarta o que muitos de nós sonhamos em
encontrar — ela disse baixinho. — Eu gostaria de poder dizer que sua vingança é
ou não é doce, e você se sentirá melhor quando seu irmão estiver morto. Mas os
males do passado não são lavados pra longe porque a pessoa responsável se foi.
— Você não se sente melhor ao suspeitar que seus agressores estão mortos?
Uma sacudida de cabeça, tranças escuras dançando sobre os seios.
— Se eles estão mortos, e eu tenho quase certeza de que estão, minha culpa
e vergonha ainda não diminuíram.
— Culpa? Vergonha? Não se atreva a se culpar pelo que aconteceu todos esses
anos atrás. Um homem, qualquer homem, até mesmo um menino, sabe o que é
certo e errado, sempre. Eles simplesmente escolheram o prazer deles acima da dor
do outro.
— O que devo sentir então? Odiá-los não faz bem. Certamente não os machuca.
Pior, isso dá aos meus agressores poder sobre minhas emoções, minha vida.
— Mas olhe pra você agora. Prosperando. Uma rainha de força e bravura. O
passado pode ter te arrastado para baixo por um tempo, mas você lutou para se
erguer. E talvez nem sempre tenha ficado de pé, talvez tenha caído uma ou duas
vezes, mas continuou lutando. Hoje você voa.
Ela parecia florescer a cada palavra, e isso aliviou um pouco da tensão dentro
dele.
— Obrigada, Puck.
Ele assentiu em reconhecimento.
— Conte-me sobre sua mãe — disse ela.
Uma percepção: ele estava falando com uma mulher, compartilhando seu
passado, aprendendo mais sobre o dela — o que ele uma vez sonhou. Seu desejo
secreto, e era melhor do que ele algum dia esperou.
— Ela era uma mulher gentil, gentil com todos que encontrou — ele estendeu
a mão para passar os dedos através das tranças de Gillian. Seda pura. — Ela
cantava para eu dormir enquanto acariciava meu rosto.
— Você disse que era — Ela colocou a mão sobre a dele e ofereceu um aperto
reconfortante. —Ela morreu?
Memória ruim... companhia sedutora. Ele deveria ter mantido suas mãos para
si mesmo. Agora só queria mais.
Agora?
— Ela se matou depois que minha única irmã nasceu morta— ele disse.
— Oh, Puck. Sinto muito.
Uma pontada no peito, novos uivos em sua cabeça.
— Conte-me mais sobre você. Algum irmão?
Ela estremeceu, mas disse:
— Eu sempre quis uma irmã.
— Agora você tem uma, Winter.
— E William. Até mesmo Cameron.
Ela considerava William uma irmã? Eu chamo de falta.
— Tenho certeza que os dois homens adorariam ser comparados a uma irmã.
— Por favor! Ambos dariam boas-vindas a elogios ao seu lado feminino.
Puck enrolou as mãos em punhos.
— Não quero falar sobre eles — Especialmente William. Como odiava ouvir o
nome do homem nos lábios de Gillian.
Um dia, o bastardo terá o que Puck mais queria.
***
— Tudo bem. Conte mais sobre Sin. Por que você não pode tirar a coroa dele?
— perguntou Gillian, sentindo uma mudança sombria no humor de Puck. — Você
certamente é forte suficiente. E eu te vi em ação. Apesar do demônio, você é
incrivelmente feroz.
Seu peito se encheu de orgulho e ela quase riu. De muitas maneiras, ele era
um macho típico. Orgulhoso ao máximo. Em outros modos, nem tanto.
— Sou feroz. Não há ninguém mais feroz. Eu deveria poder tomar a coroa sem
problema, mas por alguma razão, eu não posso. O homem que não desejo mais
discutir é o único capaz do feito.
— As Oráculos nomearam William, especificamente?
— Sim. Disseram que ele viveria ou morreria por você.
Viver ou morrer. Por ela.
— Desculpe, Pucky, mas ninguém está morrendo por mim. — Apesar que se
William morresse em seu benefício, ela conseguiria o seu não tão felizes para
sempre, não é? Seu amigo teria morrido por nada!
Uma profecia se alimentava da outra?
Pressentimento a atingiu. Se alguém tinha que morrer... Coloque-me no jogo,
treinador. Gillian literalmente saltaria numa granada por William. Sua vida por ele.
Puck, Winter e Cameron também. Até mesmo por Peanut. Por Johanna e Rosaleen.
Qualquer um de seu povo, realmente.
— Aquele quem não deve ser nomeado pediu mais detalhes sobre sua profecia?
— Puck perguntou.
Ela poderia ter dito: Pensei que você não queria falar sobre ele. Em vez disso,
abriu-se como Puck tinha feito com ela, e disse a verdade:
— Não. E também não ofereci.
— Você prefere discutir esses assuntos com seu marido e nenhum outro. —
Movendo-se em uma velocidade que ela não podia rastrear, ele a pegou pela cintura,
levantou-a e reclinou contra a árvore mais uma vez, garantindo que ela montasse
a cavalo no colo dele, seu corpo pressionado contra o dele. — Eu sou um excelente
multitarefa. Enquanto ouço você falando, posso demonstrar afeto a você.
— Acho que você está me mostrando luxúria — disse ela, esfregando seu
núcleo contra a ereção dele. — E acho que estou mostrando de volta.
Sibilo.
— Afeto e luxúria, então.
Correntes elétricas corriam de cada ponto de contato, apenas para empoçar
entre suas coxas. Dores começaram em seus seios, entre suas pernas, mais fortes
que nunca antes. O calor da pele dele a atormentava, enquanto os calos em suas
palmas a excitavam, uma combinação letal para sua resistência.
Como se ela tivesse algum tipo de resistência contra ele.
Seus olhos se encontraram, seguraram, a máscara indiferente de Puck se
afastando. Ele não estava calmo ou não afetado pela proximidade deles. Estava em
agonia.
— Por favor, me ouça quando digo essas próximas palavras — ele entoou. —
As oráculos nunca estiveram erradas.
— Eu ouço você. Mas há uma primeira vez para tudo. E se estamos olhando
para a previsão errada, hein?
Ele traçou a ponta de um dedo ao longo do queixo dela, como se não pudesse
tocá-la.
— Você pergunta e se muitas vezes. Por que eu encontro esse traço adorável
em você, e irritante em mim?
A Saqueadora de Dunas, adorável? Por que eu quero me gabar?
— Vou adivinhar aqui. Talvez seja porque eu sou adorável e você é irritante?
O olhar dele se ergueu. Ela piscou inocentemente, e alegria faiscou nos olhos
dele. Apenas um lampejo, mas estava ali assim mesmo.
— Você está certa — disse ele. — Há uma chance de estarmos olhando para
isso tudo errado. Talvez as Oráculos queiram que você não terá um final feliz com...
William. — Ele passou a mão em torno de uma mecha do seu cabelo, sem parar
até chegar à sua nuca. A pressão... quase machucava. Ok, definitivamente doía,
mas ela gostou, escolhendo acreditar que ele temia perdê-la, e a segurava firme. —
Talvez você esteja destinada a ter um final feliz com outra pessoa.
Talvez Puck, o Guardião da Indiferença, tivesse levantado suas esperanças?
Ela ficou emocionada.
— Você quer dizer, um final feliz com o homem que não quer o meu amor?
— Talvez ele só quisesse se proteger quando pronunciasse essas palavras.
Ela se emocionou mais. E se eles pudessem fazer isso funcionar?
Então outras perguntas vieram. E se ela fizesse planos para ficar com Puck, e
colocasse sua própria profecia em movimento, como Sin tinha? Ela um dia
destruiria os sonhos de Puck?
— Olhe além do vínculo — Puck disse, ela ouviu o desejo em seu tom? —Diga-
me como você se sente sobre mim.
Não posso destruir seus sonhos. Simplesmente não posso.
Afaste-se, caia fora. Ela roçou os dedos sobre a barba em sua mandíbula, e
sussurrou:
— Vamos esquecer os sentimentos e futuro, e focar no prazer certo... esse...
momento. — Ela pontuou cada palavra com um balanço de seus quadris.
Outro sibilar dele, como se estivesse satisfeito, então franziu o cenho, como se
estivesse irritado.
— William não é digno de você. Sabe disso, não é?
— Eu sei que quero você.
— Você me quer agora... mas não depois?
À modo de resposta, ela balançou os quadris novamente. Mais prazer. Uma
inundação de calor.
Com outro silvo e uma maldição, ele a colocou de lado e se levantou.
— Estou voltando para o acampamento. Você deveria também.
Espera. O que?
Em silêncio agora, ele se afastou, deixando-a ofegante, doendo... lamentando
a perda de seu toque.
O que diabos tinha acabado de acontecer?
Gillian esperou cinco... dez... quinze minutos antes de seguir Puck para o
acampamento, esperando que sua luxúria e raiva diminuíssem. Por fora, ela
parecia calma. Provavelmente. Por dentro, ela se lamentava e questionava.
Puck tinha se fechado quando ela... o que? Tinha se recusado a prometer seu
futuro a ele? Recusou-se a repudiar William?
Seu marido a queria, isso ela sabia. Ele tinha ficado duro como aço. Mas ele
queria mais do que o corpo dela? Esperava se proteger da profecia dela, não
querendo que seu sonho fosse eliminado? Indiferença ainda lutava com ele?
Os Senhores do Submundo sofriam de uma forma ou de outra sempre que
enfrentavam seus demônios. Puck costumava enfraquecer, mas agora... o que
aconteceu? Poderia se permitir sentir ou o demônio proveria o gelo e destruiria
suas emoções?
— Aqui, boneca — William chamou de um saco de dormir que ele arrumou
enquanto ela tomava banho e conversava com Puck. Ele deu um tapinha no saco
vazio ao seu lado.
Diante dele, uma pequena fogueira ardia, decorando sua pele de bronze em
tons dourados. Ele era um lindo deus do sexo... mas ela não tinha vontade de
prová-lo.
A alguns metros dali, Winter e Cameron tinham erguido mini-tendas. Fácil
dizer qual tenda pertencia a qual irmão. Winter havia pendurado uma pele imortal
sobre a porta. Há alguns anos, ela matou um homem por lhe oferecer seu colo.
Agora a pele servia como um sinal de Afaste-se para qualquer um que pudesse
fazer um pedido semelhante.
Quando ela se esticou ao lado de William, não viu sinal de Puck.
— Por que Winter e Cameron estão nas tendas? — Egoísmo e Obsessão nunca
passavam uma oportunidade de interagir com os outros. Traduzindo, de se divertir.
William estendeu a mão, pretendendo pegar a dela, apenas para grunhir de
irritação quando ela não pegou a dele e empurrou seu braço para o lado.
— Eu os coloquei de castigo por seis horas por terem me irritado.
Hã, como é?
— Você os machucou?
— Quase nada. Eles estão bem, prometo. Ou ficarão bem, se deixá-los
descansar.
Muito bem.
— Só… seja legal com eles, ok? Eles são minha família.
— Eu sou sua família — ele disse, seu tom cortante.
Ela girou para encará-lo e suspirou.
— Eu ainda não te entendo. Quer dizer, entendo porque está aqui. Você se
convenceu erroneamente de que estamos destinados, blá, blá, blá. Mas por que
você fez amizade comigo, todos aqueles anos atrás? Eu sei que você não me olhou
e de repente soube que eu era a pessoa certa. Você dormiu com, tipo, milhares de
outras. E vamos encarar os fatos. Eu era grudenta, carente e confusa.
— Eu não ouço um problema — disse William.
Ela bufou antes dele admitir:
— Foram seus olhos. A primeira vez que encontraram os meus, eu senti como
se estivesse olhando para uma ferida em carne viva e aberta que havia infeccionado
durante anos. Quando era menino, eu via o mesmo olhar em meus próprios olhos
toda vez que via meu reflexo. Eu queria te ajudar.
Com o coração apertando com compaixão, ela perguntou suavemente:
— Você foi abusado quando criança? — Como ela não soube?
— Fui criado no submundo e nem sempre tive Hades como protetor.
Então sim, ele foi. Ela deveria ter adivinhado, no mínimo.
— Eu sinto muito, William.
Ele não ofereceu resposta e, no silêncio, insetos noturnos fizeram uma
serenata para eles. Ao longe, um trovão explodiu. Uma tempestade se aproximava.
— Não se preocupe — disse ele. — Criei uma cúpula sobre nosso
acampamento. Adagas de gelo nunca nos alcançarão.
Elas alcançariam Puck, onde quer que ele estivesse? E o que Puck tinha
pensado dela durante o primeiro encontro deles? Oh, espera. Ela podia adivinhar.
Finalmente encontrei meu peão.
William suspirou.
— Está fazendo isso de novo.
— Fazendo o que?
— Pensando nele. Eu te prometo, o vínculo, e apenas o vínculo, é o responsável.
Eu nunca mentiria para você. Uma vez que o vínculo é cortado, Puke-in 12 não
passará de um pesadelo que você vai desejar esquecer.
Ela não conseguia nem imaginar.
— E se isso... não acontecer?
— Vai.
O desejo por ele havia se tornado uma parte intricada dela, uma função
corporal tão necessária quanto respirar. Um fogo no sangue. Uma droga que ela
ansiava. Embora estivesse furiosa com sua atitude quente e fria, e confusa sobre o
futuro deles, desejava enrolar o corpo contra o dele.
— Onde ele está? — Ela perguntou.
— De guarda — Um músculo pulsou debaixo o olho de William, mas ele deu
um sorriso encantador. — Você se lembra da vez em que me pediu para que a
ensinasse a gostar de sexo?
— Hum, você disse que esqueceria aquela noite — ela murmurou. — Então
esqueça.
— Não posso. — Ele bateu na têmpora. — Culpe ela.
— Seu cérebro é feminino?
12
Trocadilho com o verbo puke, vomitar.
— Todas as melhores coisas são. E adivinha? Depois do seu divórcio, minha
resposta será sim. Eu começarei com...
— Não — ela disse, balançando a cabeça.
— Não? — ele perguntou, e levantou uma sobrancelha.
Sussurrando, falando apenas para os ouvidos dele, ela disse:
— Eu não estou interessada em você romanticamente, Liam. Não mais —
Talvez nunca. Quando adolescente, queria algum tipo de normalidade. Com seu
amor por jogos, seu afeto familiar e proteção feroz, ele havia providenciado essa
normalidade. — Eu não quero te magoar, mas não quero que haja um mal-
entendido entre nós. Eu queria que as coisas fossem diferentes. Eu queria que eu
me sentisse…
— Não precisa se desculpar. Você é perfeita e seus sentimentos são
compreensíveis. Eu tenho que trabalhar para te ganhar, isso é tudo. Minha missão
foi definida e vou sair vitorioso.
Homem teimoso.
— Eu não sou perfeita. Nem chego perto.
— Diga um único defeito — ele desafiou.
— Bem, para começar, eu matei um monte de pessoas.
— Eu também. Você sabe por quê? Porque homens são bastardos, e bastardos
merecem morrer. Nós fizemos um favor ao mundo. Fazer um favor ao mundo é bom.
Próximo.
Uma risada explodiu, mas ela rapidamente ficou sóbria.
— Não considero esse próximo um defeito, mas você sim. William, eu sinto um
desejo enorme por outro homem.
Ele passou a língua sobre os dentes brancos e retos.
— O que gosta nele, exatamente? Diga algo específico. Algo que ele possa fazer
por você que ninguém mais pode.
Com a mesma facilidade com que listou os atributos de William para Puck,
ela listou os atributos de Puck para William.
— A vida é uma revelação para ele. Eu sou uma revelação. Ele se ilumina
quando experimenta coisas novas comigo. Ele aprecia o quanto eu lutei para chegar
onde estou agora. Embora esteja possuído por Indiferença, ele se importa com seu
povo. Ele quer o melhor para eles e para este reino, e está disposto a...
— Tudo bem. Chega — disse William.
— Eu sinto muito — magoá-lo não era sua intenção. — Vá dormir. Amanhã é
um grande dia. Entramos no labirinto, enfrentamos monstros e quebra-cabeças, e
o que quer que Sin tenha inventado.
— E oficialmente começamos o seu processo de divórcio.
Ela quase protestou. Quase.
Eu não vou manter você, moça.
— Sim — ela disse, o tom vazio. — Nós vamos.
***
***
Há poucos segundos, Gillian acreditava que seu corpo estava esgotado e era
incapaz de experimentar outro orgasmo. No momento em que Puck abriu as calças,
ele provou que estava errada. O prazer quase a queimou viva.
Prazer ainda a queimava.
Puck guiou as mãos dela entre suas pernas e colocou dois dedos dentro de
seu sexo, junto com um dos seus. Por séculos, seu próprio toque não lhe trouxera
nada além de frustração e raiva. Aqui, agora, com Puck, o único toque quase a
levou a outro clímax.
Gemendo, arqueando as costas, ela abriu mais as pernas. Oferecendo mais.
Oferecendo tudo.
— Agora envolva seus dedos em volta do meu membro — ele ordenou.
Ansiosa, ela obedeceu. Oh. Oh! A essência de sua excitação proporcionava um
deslizamento fácil, permitindo que o pegasse com mais força. Ele balançou com
seu primeiro vai e vem, e com o segundo, o corpo imenso se elevando sobre o dela.
A expressão dele...
Algum homem já foi tão bonito? Preso nos espasmos da paixão — por minha
causa! — seus olhos estavam fechados e os lábios entreabertos. Sua pele estava
corada e orvalhada de suor.
— As coisas que você me faz sentir — disse ele, agora olhando para ela. Suas
inalações afiadas e superficiais. Os sons que ele fazia... tão carnais, tão sexy. —
Quero que isso nunca acabe. Mas preciso que você aperte mais, moça.
Mais uma vez, ela obedeceu.
— Entre em mim, Puck. Por favor. — Ela precisava dele. O que ele quis dizer
com não havia necessidade de controle de natalidade? Ele não podia engravidá-la?
Talvez planejasse usar magia? Ou não queria penetrá-la porque temia que ela
tivesse algum tipo de doença? — Fiz exames depois que... logo depois. Não estive
com ninguém desde então. Estou limpa, juro.
Ele parou, simplesmente parou, e ela suspeitou que a ação — falta de ação —
tinha que o estar matando. Se a situação fosse revertida, ela não teria encontrado
forças para fazer uma pausa. Com o olhar firme no dela, ele traçou dois dedos ao
longo de sua mandíbula. Uma carícia terna. Uma gota de suor caiu nela. Não, de
suor não. Pingos de chuva frios estavam abrindo caminho pelas copas das árvores.
Vários pegaram os cílios negros de Puck.
— Nunca quis nada mais do que eu quero você, quero entrar em você — ele
entoou — mas eu não vou tomá-la. Não esta noite.
Ela engoliu uma enorme quantidade de decepção.
— Porque os outros estão muito próximos?
— Porque nós vamos experimentar tudo. — Ele deu um beijo suave em seus
lábios, provocando-a com a língua, em seguida se colocou de joelhos.
Iria deixá-la? Não!
— Isto é meu — disse ela, lutando para recuperar o aperto no membro.
Enquanto o acariciava mais forte, mais rápido, os quadris dele se contraíram. —
Eu quero o seu prazer. Dê isso pra mim.
Todas as coisas que ela tinha desejado fazer com um homem, Puck estava lhe
dando em uma única noite. Ele meio que a teve como jantar. O que estavam fazendo
agora, uma dança erótica e uma verdadeira troca de presentes. Ele a fez gozar;
agora ela faria o mesmo por ele.
— Sim. Seu, todo seu. — Ele emaranhou uma mão em seu cabelo e segurou
sua bunda com a outra, puxando-a para mais perto, batendo seus lábios sobre os
dela, beijando-a e tirando seu ar.
Então... oh! Ele usou a mão na sua bunda para chegar por trás e deslizar a
ponta dos dedos no seu centro palpitante. Gillian começou a balançar para frente
e para trás, perseguindo os dedos enquanto acariciava a enorme ereção de Puck.
Logo, eles estavam se esfregandoum no outro, imitando os movimentos do sexo.
Ainda perseguindo. Ainda se acariciando. Desesperados.
— Como você... como eu posso... — Ela gritou quando o prazer explodiu mais
uma vez. Mais forte do que antes, de balancer a terra — transformando a vida. Por
um momento de felicidade, o contentamento absoluto a preencheu. Ela tinha tudo
o que sempre quis, tudo que precisava.
— Moça. Minha moça. É você que está fazendo isso. Você está me fazendo…
eu vou gozar! — Ele jogou a cabeça pra trás e rugiu para as árvores, enquanto seus
quadris se sacudiam sem parar e um líquido quente se derramava sobre a mão
dela.
Uma vez que se acalmaram, lavaram-se no lago. Ele tirou as calças pelo
caminho, apresentando-a com sua forma nua. Tão lindo. Tão perfeito. Quando
terminaram, voltaram ao lugar onde estavam as flores, onde Gillian se aninhou
contra ele e apoiou a cabeça em seu ombro. A tensão havia desaparecido dele, dos
dois.
— Puck — ela chamou.
— Sim.
— Isso foi divertido. — E incrível e maravilhoso.
— Sim — ele repetiu.
— Não me dê um gelo — ela sussurrou. — Essa noite não.
Ele pressionou outro beijo suave em sua têmpora.
— Essa noite não — ele concordou.
Gillian passou a noite aconchegada ao lado de Puck, o calor o e cheiro dele ao
seu redor, assim como seus braços. Suas pernas macias funcionaram como o
cobertor mais quentinho de todos os tempos.
O que tinham feito... foi melhor que suas fantasias. E ele nem sequer a
penetrou!
Como ele a trataria amanhã? O homem de gelo retornaria?
O que faria se o Homem do Gelo voltasse pra ficar?
Ela cochilou levemente, com medo de cair num sono profundo. Duvidava que
Puck tivesse dormido. Ele permaneceu tenso e alerta, pronto para matar qualquer
um que se aproximasse de seu oásis.
Pouco antes dos sóis se levantarem, seu corpo relaxou. Gillian se retirou do
seu abraço e colocou seu vestido. Um rápido olhar para o marido — se fizesse mais
que isso não seria capaz de se afastar. Ele manobrou para o lado, os olhos fechados,
a expressão suave, quase infantil. Quase, porque com sua massa muscular, ele
nunca poderia passar por outra coisa senão todo homem.
O arrependimento a perseguiu implacavelmente quando voltou para o
acampamento, alimentou e deu água a Peanut, e depois deslizou em seu saco de
dormir.
— Tudo o que você esperava e muito mais? — William perguntou. Pela
primeira vez, ele parecia possuído por Indiferença, a voz desprovida de emoção.
Ela soltou um suspiro de corpo inteiro e ofereceu a verdade, só a verdade e
nada além da verdade.
— Sim — E não se sentiria culpada. — Eu gosto dele, Liam.
— Eu te disse. O vínculo gosta dele. Você nem o conhece.
Ele culpou o vínculo antes. Ela também. Assim como Puck. Não mudava o que
ela sentia.
Não demorou muito para que os sóis aparecessem no céu e Puck entrasse no
acampamento, iluminado por raios dourados brilhantes. Seu coração acelerou, e
sua barriga se apertou quando se lembrou das coisas que fizeram... das coisas que
ela ainda queria fazer. Ele lhe prometeu tudo.
Ele havia tomado banho, o cabelo mais uma vez úmido, mas não vestiu uma
camisa, os músculos e tatuagens em uma exibição espetacular. Usava uma calça
limpa.
Ele nem uma vez olhou em sua direção. Ele se arrependia do que fizeram? Ela
estudou o vazio de sua expressão, na esperança de captar algum tipo de
microrreação quanto mais perto ele chegasse, mas o Homem de Gelo havia
retornado com tudo.
Por quê? Por que ele não queria sentir quando Indiferença não poderia puni-
lo?
Isso era parte das consequências que mencionou?
— Tomei a liberdade de conjurar novos uniformes. — Ainda se recusando a
olhar em sua direção, ele jogou uma camiseta para ela.
Confusa, ela sentou-se e estudou a roupa que ele deve ter usado de magia
para criar. Escrito na frente “Eu Gosto de Puck”.
Gillian bufou rindo. Que adorável. E surpreendente.
— Oh, que bom. Um pano pra limpar minha virilha — William riscou para o
lado de Puck com um flash e pegou uma camiseta. — Volto logo — disse ele antes
de desaparecer.
Quando Gillian vestiu sua nova camiseta e uma calça de couro, Puck se virou.
Com medo do que sentiria se me observar ou desinteressado?
— Vai fingir que a noite passada nunca aconteceu? — ela perguntou quando
terminou de escovar os cabelos e os dentes.
— Seria melhor para nós dois, mas não posso fingir. — Ele a encarou,
deixando-a vislumbrar o fogo ardente em seus olhos.
Já zumbindo de antecipação e necessidade, ela deu um passo em sua direção.
Ele deu um passo na dela...
Winter e Cameron saíram de suas tendas.
— Uniformes — Puck resmungou, e jogou uma camiseta para cada irmão. —
Vai, time Puckillian.
Sempre mal-humorados pela manhã, Winter e Cameron murmuraram alguma
besteira enquanto seguiam para o rio. Gillian deu outro passo em direção a Puck,
apenas para parar quando William reapareceu. Argh! O tempo conspirava contra
eles.
William tinha o cabelo molhado e uma camiseta preta limpa que abraçava os
bíceps, bem como um calças camufladas com vários bolsos. Em silêncio, ele
começou a arrumar suas coisas.
Gillian odiava magoá-lo. Odiava vê-lo tão chateado e distante. Mas não podia
dar o que ele queria.
Quando os irmãos voltaram um pouco depois, William disse:
— Agora que a banda está de volta, devemos ir. Quanto mais cedo começarmos,
mais cedo terminaremos.
E mais cedo Puck vai me deixar.
Com o estômago retorcendo, ela se aproximou de Peanut. Um sopro de calor
perfumado com fumaça de turfa e lavanda roçou sua nuca quando Puck apareceu
atrás dela. Ele a pegou pela cintura e a colocou no topo da quimera. Não disse
nada, apenas continuou andando até — bem, ela já tinha esquecido o nome maluco
que ela tinha dado à sua montaria. Walnut? Pecan? Tanto faz. Ela o chamaria de
Lil Nut Sack13.
Os outros montaram. Com William na liderança, Cameron e Gillian no meio,
e Winter e Puck na retaguarda, eles correram para a entrada do labirinto.
— Que os jogos comecem... — William desapareceu dentro da névoa escura.
13
Pode ser traduzido livremente como Saquinho de Nozes.
Quando as dunas de areia desapareceram, o mal arrepiou a pele de Gillian,
gelando-a até o osso. Uma floresta substituiu as areias circundantes. Uma floresta
arrepiante, com árvores retorcidas e nodosas, insetos e ossos humanos espalhados
pelo chão — restos daqueles que haviam entrado no labirinto e caído em seus
horrores?
Gillian golpeava uma mosca irritante do tamanho de uma toranja enquanto
examinava cada árvore, na esperança de encontrar uma cuisle mo chroidhe... não,
sem sorte. O que ela viu? Cedros, pinheiros e sempre-vivas cheias de cobras e
aranhas. Estremeceu e tentou pegar uma adaga, franziu a testa. Bainha vazia.
Um olhar por cima do ombro revelou um brilho de prata do lado de fora do
nevoeiro.
— Espera. — Ela pulou de Peanut e correu... bloqueada! Seu cérebro sacudiu
contra seu crânio quando ela bateu em uma parede invisível e ricocheteou para
trás.
Embora tonta, marchou para frente e bateu na parede invisível mais uma vez.
Puck e William também desmontaram e empurraram a parede.
— Estamos presos — disse Puck, franzindo a testa. — A magia nos mantém
aqui, sem nossas armas. As minhas também estão desaparecidas.
— As minhas também — Winter e Cameron disseram em uníssono.
— Eu me arranjei pra manter as minhas. — Com os lábios apertados, William
riscou... pra lugar nenhum. Ele reapareceu no mesmo lugar e fez uma careta. —
Não posso riscar pra fora do labirinto.
Ótimo! Maravilhoso!
— Tudo o que podemos fazer é seguir em frente então. E pegar suas armas
emprestadas, é claro.
— Por emprestado ela quer dizer nunca vamos devolver — Winter anunciou.
— Um presente dado a essa mina aqui é um presente que nunca será devolvido.
Eles foram até suas quimeras, onde William distribuiu um número
surpreendente de punhais e espadas que ele pareceu produzir do ar.
Montados mais uma vez, eles avançaram lentamente, ficando perto do rio,
atentos a cada passo. Os cheiros de podridão e decomposição pareciam marinar
no ar enquanto a temperatura caía.
— Há minas terrestres — disse Puck, desmontando de Lil Nut Sack em torno
de um terreno plano. — Ali, ali e ali. Devemos prosseguir a pé. Lentamente.
De acordo. Mas quanto mais adentravam, mais armadilhas descobriam.
Armadilhas de videiras subiam do chão para derrubar quem passasse, redes eram
arremessadas e poços falsamente cobertos. Basicamente, todo o labirinto foi
projetado para aterrorizar invasores.
Que pena, que pena mesmo, Sin. Nada mais assustava Gillian. Exceto talvez
seus sentimentos crescentes por Puck.
***
Foco nunca foi tão importante. Perigo espreitava em cada esquina, Indiferença
não se calava e, no entanto, Puck não conseguia parar de pensar em Gillian.
Ele gozou na mão dela enquanto experimentava um dilúvio de puro prazer.
Depois, segurou-a nos braços enquanto ela dormia, protegendo-a do mundo e
desfrutando de muito prazer. Mas acordar e encontrá-la ausente? Enfurecedor.
Precisar dela novamente sabendo que eles tinham uma data de expiração —
angustiante.
Mas ele a tinha agora, e o instinto exigia que permanecesse ao seu lado,
protegendo-a. Era por isso que trotava com sua quimera entre Cameron e Gillian,
por nenhum outro motivo.
Devo ignorar a doçura de seu perfume. A fome arranhando minhas entranhas.
Depois de fazer sinal para Cameron ficar para trás, Puck disse:
— Sua vez, moça. Já falei do meu passado, agora precisa me contar o seu.
O olhar que ela lançou a ele, um de divertida afeição, colocou-o em chamas.
Ou mais em chamas.
— O que você quer saber? — Ela perguntou.
— Apenas tudo — cada parte dela intrigava cada parte sua.
— Bem, eu comia, fazia xixi na fralda e chorava — disse ela, zombando dele.
— Tudo bem. Admito que sou o segundo ser mais irritante em Amaranthia.
Agora ela riu, o som o deleitando e fascinando. Eu fiz isso. Eu a fiz rir — eu a
fiz se divertir, como William.
— Por um tempo, eu era a perfeita menina feminina — disse Gillian. —
Adorava contos de fadas, unicórnios e a cor rosa. Aos doze anos, decidi que queria
ter um salão de beleza. Meu pai, meu verdadeiro pai, me deixava enrolar o seu
cabelo e pintar suas unhas. — Ela sorriu radiante, apenas para franzir a testa e
estremecer. — Ele morreu logo depois. Acidente de moto. Minha mãe se casou um
ano depois e meu padrasto... ele...
— Foi ele quem abusou de você — Puck tremeu com raiva inexplorada, ansioso
para cometer assassinato. Precisando cometer um.
Um aceno de cabeça. Ela respirou fundo, endireitou os ombros.
— Ele e seus dois filhos. Ele os criou para serem monstros e eles eram
excelentes nisso.
Calma. Controle-se.
— Sua mãe nunca te ajudou?
— Um dia, reuni coragem e contei o que estava acontecendo. — Com a voz
mais dura a cada palavra, Gillian disse: — Ela ficou com raiva de mim, disse que
eu estava interpretando errado de afeto demonstrações perfeitamente aceitáveis.
Minha pobre querida. Desesperada por ajuda, sem encontrar nenhuma.
— Não existe estupro mal interpretado. — Como um jovem soldado, ele tinha
um lugar na primeira fila e assistia enquanto os exércitos de seu pai saqueavam
aldeias inimigas. As coisas que homens adultos faziam com mulheres e crianças
indefesas...
Quando Puck e Sin ficaram fortes o suficiente, eles garantiram que aqueles
homens pagassem por seus crimes.
— Não — disse Gillian, seu tom de voz apático. — Não existe.
— Eu lamento, moça. Lamento por cada horror que você sofreu. E estou
orgulhoso da mulher que se tornou. Corajosa e cheia de bravura. Uma heroína
para os em necessidade. Sempre marchando adiante, nunca ficando quieta. Você
não apenas fala sobre o que precisa mudar, você sai e faz as mudanças. — Por
Amaranthia... por Puck.
Ela piscou para ele com surpresa, engoliu em seco.
— Eu... obrigada.
— Uma vez você mencionou que acreditava que William havia matados os seus
estupradores — disse Puck.
— Ela estava certa. Eu matei — William trotou com sua quimera para o outro
lado de Gillian e lançou uma paródia de sorriso. — Até a sua mãe, boneca. Eu
cortei o quarteto horrível em pedacinhos e gostei de cada segundo.
— Finalmente você admite! — Ela exclamou, franzindo a testa para ele. — Por
que se recusou a confirmar ou negar antes? E por que matar minha mãe? Eu sei
que ela estragou tudo. Eu não gostava dela, mas também a amava.
— Por isso. Por isso que fiquei calado. Você amava quem ela foi para você anos
antes, sem vontade de admitir que odiava quem ela se tornou. Eu sabia que você
iria me pedir para poupá-la, e se ressentiria de mim por me recusar. — O vento
soprou, as mechas de William dançando em volta do seu rosto. — Para ser honesto,
não tinha certeza se você seria forte o suficiente para lidar com a verdade. Até agora.
Puck na verdade admirava o homem por seus feitos e invejava aquelas mortes,
desejava que os mortais pudessem morrer mais de uma vez. Embora duvidasse que
mil mortes seriam suficientes para esses mortais em particular. Mas a emoção
predominante? Afinidade. Gillian também teve a alma rasgada em pedaços por um
ente querido. Ela entendia a angústia da traição de um familiar de uma forma que
muitos outros não conseguiam, não podiam.
Ela entendia Puck.
— Eu não me ressinto de você — disse ela a William. — Estou desapontada.
E lá se vai minha admiração. Odeio ele!
— Mas — acrescentou ela, — de agora em diante, você não cometerá
assassinato a sangue frio em meu nome sem falar comigo primeiro.
Winter ofegou.
— Olhe, olhe, olhe. Uma cuisle mo chroidhe sem aranhas nem cobras!
Como se apreciasse a distração, Gillian saltou de Peanut.
— Winter, você é uma salva-vidas — ela correu para a árvore curta e grossa.
— Acomodem-se, meninos — anunciou Cameron. — Nós ficaremos aqui por
um tempo.
Puck desmontou, chamando:
— Cuidado. Pode ser uma armadilha.
Usando magia como um par de óculos invisíveis, ele procurou por qualquer
sinal de problema. Nenhum fio nem bombas. Nenhuma arma mágica. Mas por
outro lado, a árvore se protegia, vazando veneno sempre que algo perfurava uma
camada de sua casca — veneno que poderia paralisar uma pessoa por dias.
— Tudo parece estar bem — disse ele.
William riscou para o lado de Gillian, uma serra na mão.
— Você quer xarope, eu vou te dar xarope.
— Muito gentil da sua parte — Ela lhe ofereceu um sorriso e Puck rangeu os
dentes. Realmente odeio ele. — Mas não vou deixar que se arrisque.
— Eu pego a seiva para Gillian — Puck pegou a serra e, segurando uma ponta,
posicionou a lâmina no centro do tronco da árvore. — Este é o meu reino. Eu
conheço os prós e contras. Você não.
— Eu sei tudo sobre tudo — William segurou o outro lado da ferramenta. — E
eu vou fazer isso.
Eles lutaram pela serra, um puxando para a esquerda, o outro puxando para
a direita — até que estavam na verdade trabalhando juntos.
— Bem, tudo bem, então — Gillian esfregou as mãos. — Eu vou me afastar e
curtir o show.
Puck e William trabalharam por horas. Toda vez que eles cortavam uma
camada de casca, outra se reproduzia. Puck nunca parou de serrar, mesmo quando
suas mãos se empolaram e sangraram.
Quando ele começou a ficar com calor, descartou a camisa. Ou talvez só
quisesse que Gillian visse como seus músculos saltavam de tensão e como as veias
pulsavam.
Ela abanou as bochechas, como se ela estivesse com calor. Winter aplaudiu.
Quando William tirou a camisa dele, Cameron disse:
— Eu não sou gay, mas você poderia me fazer mudar de ideia, Willy. É só dizer.
— E eu? — Puck exigiu.
Winter levantou o braço.
— Eu! Eu! Eu viraria gay para não ter que ficar com você.
Ele lançou-lhe um olhar mortal.
— O que foi? — ela perguntou. — Não curto chifres.
Com olhos de uísque brilhando de alegria, Gillian cobriu a boca com um
esforço fracassado para reprimir uma risada.
Seu coração deu um salto, a tatuagem de borboleta se movendo sobre seu
corpo. Ele pensou ter sentido os cantos da boca levantarem... levantarem ainda
mais...
Sua esposa o encarava com algo parecido com espanto — uma expressão que
ele acreditava que gostaria de ver todos os dias pelo resto da vida.
Pelo resto de sua vida...
Por muito tempo, Puck tinha sido um homem morto ambulante, lutando
contra tudo o que sentia, tornando-se mais intimamente familiarizado com a
miséria.
Quer mudança? Faça algo diferente.
Ele deveria pegar uma página do livro de Gillian e lutar pelo melhor. Para
manter sua esposa, não tinha que esquecer seus objetivos, ele percebeu. Ele só
tinha que modificá-los.
Taliesin Anwell Kunsgnos Connacht andava de um lado para o outro na sua
suíte. Ele tinha mandado seu trio de amantes e guardas embora. Não confie em
ninguém. Nem em si mesmo! Ele foi ver como estava sua noiva... sim? Ou ele a tinha
deixado ir embora?
Não consigo me lembrar. Depois que ele…
Ele respirou fundo. Realmente fez o que achava que havia feito?
Sua mente girava com suspeitas, tantas suspeitas. Ele deve ter feito. Ele
sozinho tinha os meios.
Por séculos, Sin foi coletando magia. Armazenou todo poder, potência e
habilidade em caixas, do jeito que a Rainha Vermelha armazenara Indiferença. As
caixas haviam se tornado baterias — para ele.
Ele só tinha usado as baterias duas vezes. A primeira vez, para criar e
alimentar o labirinto ao redor das terras de Connacht, protegendo seu povo.
Eu sou um líder sem igual. Por que eles me desprezam?
A segunda... para criar e alimentar uma bomba.
Estava certo! Ele tinha usado a bomba contra os Enviados durante uma de
suas cerimônias, destruindo seu templo favorito e matando muitos de seus
soldados de elite.
Por que, por que? Ah, sim. Para se salvar e a seu povo. Claro, seu povo. Esta
era a casa deles, e os Enviados planejavam invadir, aniquilar todo mundo e todas
as coisas em Amaranthia. As Oráculos o avisaram.
Ou talvez tivessem dito que os Enviados aniquilariam Amaranthia se ele
colocasse a bomba? A ordem dos eventos o confundia. Mas isso não importava. O
que estava feito estava feito.
Ele precisava falar com as Oráculos novamente e decidir seu próximo passo.
Se os Enviados pensavam em retaliar...
Ele garantiria que eles não pudessem entrar em Amaranthia.
Agora, o que fazer com Puck? O irmão de Sin se aproximava da fortaleza de
Connacht a cada segundo que passava. Ele podia sentir sua presença.
Eu o amo... não quero machucá-lo...
Mas Puck queria machucar Sin, queria matá-lo. E agora, Puck tinha uma
esposa vinculada. A Saqueadora de Dunas. Ela amava Puck? Talvez sim, talvez não.
Mas provavelmente. A profecia...
Não posso derrotar isso. Devo derrotar essa profecia.
Sin deveria ter matado a garota assim que ficou sabendo dela... Há muitos
séculos. Mas matá-la significaria matar Puck. Ele não estava pronto para acabar
com a vida de seu irmão. Poderia nunca estar.
Um ou outro. Eu ou ele.
Sin bateu os punhos nas têmporas, em seguida lançou maldições vis para o
teto. Por tanto tempo ele tinha sido a corda em um terrível jogo de cabo-de-guerra.
Faça isso. Não, aquilo. Não, isso. Até agora, nada do que fizera o ajudara, nem ao
seu irmão nem ao seu povo. Sin só causou destruição.
Então por que continuava a guerrear consigo mesmo? Por que não desistir e
morrer?
Porque sim! Não posso desistir. Puck precisava dele, sempre precisaria dele.
Seu irmão tinha inimigos e Sin precisava ajudá-lo. Tinha que matar todo mundo.
Se matasse todos os cidadãos de Amaranthia, não restaria ninguém para ferir Puck.
Com um bônus: não restaria ninguém para trair Sin.
E os cidadãos mereciam seu rancor. Eles mereciam! Todos os dias tentavam
roubar tudo dele, de dinheiro à magia e crianças. Nada mais estava seguro.
Quantas vezes as mulheres em seu estábulo tentaram roubar sua semente?
Quantos guardas haviam tramado sua queda? Quantos inimigos haviam se
escondido nas sombras, observando-o, esperando pelo momento perfeito para
atacar? Muitos para contar.
Sin tinha ouvido os sussurros de seu povo. Insano. Paranoico. Suspeito.
Andando de um lado para o outro, pra frente e pra trás. Neste mesmo quarto,
ele cuidou com frequência das feridas de Puck depois da batalha. Puck o Invicto,
uma vez determinado a governar o reino inteiro com Sin ao seu lado. Mas um dia,
Puck teria sucumbido à tentação. Teria assassinado Sin. Provavelmente enquanto
ele dormia. O amor de um irmão não poderia superar a fome de governar.
Melhor trair do que ser traído.
Era?
Ele precisava falar com Puck. Mas primeiro, a Oráculo.
Depois de se carregar com espadas, punhais e venenos, Sin usou magia para
barrar a entrada de outros em seu quarto e atravessou as passagens secretas que
criou, descendo, descendo, até chegar a masmorra debaixo da fortaleza.
— Você finalmente retorna. — A voz familiar feminina ecoou nas paredes
manchadas de sangue.
Sin parou diante da gaiola da oradora e segurou as barras.
— Olá, Oráculo.
Ela estava amontoada no canto mais distante, suja de terra, sua cobertura de
névoa ausente. Com sua pele escura e impecável, cabelos tão azuis quanto um rio
caudaloso, e olhos tão verdes quanto um oásis, ela era uma beleza como nenhuma
outra.
Linda, mas não era sabe-tudo. Nem me viu chegando...
Ninguém nunca via. Ele tinha capturado a Oráculo com facilidade.
Agora uma suspeita dançava em sua mente: e se ela queria ser capturada?
Seu sangue gelou. Deveria matá-la. Antes que ela pudesse prever um destino
pior para ele.
Não! Precisava saber o futuro — para poder se proteger melhor dele.
— A profecia original mudou? — Perguntou Sin. Ele ouviu falar que Puck
visitou as Oráculos séculos atrás e ofereceu seu coração. O que foi dito? Não
importa o quanto tinha torturado essa garota até aqui, ela se recusava a dizer. —
Eu serei forçado a matar meu irmão?
— Você sabe o preço para minhas visões, rei Sin.
Puta gananciosa. Não importa. Ele veio preparado.
— Claro — Ele pegou uma adaga e enfiou a ponta na órbita do olho. Ignorando
a dor lancinante, continuou até que seu globo ocular se soltou.
A Oráculo observava como se estivesse perplexa.
— Talvez você possa usá-lo para ver o mundo através dos meus olhos — disse
ele. Dentes cerrados, sangue quente escorrendo pelo rosto, ele jogou a oferta
macabra aos pés da garota.
Apesar das semanas de fome, ela possuía a graça de uma cobra quando
deslizou para pesar o olho na palma da mão.
— Isso dará um belo brinco. Posso ver isso agora… uma declaração de poder
para todas as mulheres de todos os reinos. Nunca sai de moda — ela riu, como se
soubesse de um segredo que ele não sabia. — Você acharia engraçado se soubesse
do terror que vem em seu caminho.
— Chega! Me diga o que eu gostaria de saber.
Ela deu um sorriso branco e cheio de dentes, talvez o mais cruel que ele já
tinha visto.
— Sin tolo. Talvez nossas previsões sempre se realizem porque a percepção é
a realidade. Talvez não. Os Enviados planejavam atacá-lo antes que você os
atacasse? Você nunca saberá. Seu irmão teria feito uma jogada contra você, se não
tivesse feito uma jogada contra ele? Mais uma vez, você nunca saberá. Mas você
quer saber se a profecia original mudou ou não devido a suas ações. Muito bem.
Vou dizer. Não. Um de vocês morrerá nas mãos do outro. Mas agora há uma
emenda.
Ele não disse nada, simplesmente a encarou.
O vento varreu a masmorra, assobiando através das barras de metal e
farfalhando o comprimento de seus cabelos azuis enquanto ela se aproximava dele.
— O dia chegará, o dia chegará em breve, montado nas asas da fúria. A
vingança contra você será cumprida. Por fim, você encontrará sua amada, mas sera
incapaz de reivindicá-la, pois estará sem a cabeça.
***
Ser um dos nove reis do submundo trazia muitas responsabilidades, mas o
pacote de seguro de saúde não podia ser superado. Se Hades queria que você
vivesse, você vivia.
Ele andou pelos corredores do Grande Templo, um local de encontro para os
Enviados. A mão descansava no bolso da calça, uma pose casual, os dedos em
volta de um pequeno caco de vidro. Hoje em dia, nunca saía de casa sem isso. Um
pedaço dela. Um inimigo, mas também uma aliada cobiçada. Um dia, ele iria
conquistá-la. Ele tinha, ou tudo pelo que lutou estaria perdido.
Mas não iria pensar nela.
Como qualquer bom camaleão, ele mudava seu “visual” dependendo de quem
estaria enfrentando. Hoje escolheu uma camiseta preta justa, calças de couro preto
e botas de combate enlameadas. Exatamente o que se esperava dele. Deixe os
Enviados assumirem que o conheciam.
Melhor emboscá-los depois.
Ele raramente visitava o terceiro nível dos céus, apesar de sua reputação de
depravação carnal, e nunca visitou esse segundo nível, onde os Enviados tendiam
a se reunir.
Nunca — até hoje. Tempos desesperados, medidas desesperadas.
Os demônios assassinos alados não gostavam dele, e o sentimento era bem
mútuo. Ele não estaria aqui se a vida de seu filho não estivesse em perigo.
William da Escuridão não tinha ideia do perigo que ia em sua direção.
Pelo menos a visão de Hades era agradável. O templo tinha os maiores vitrais
já feitos, feixes de luz colorida entrando no prédio, iluminando seu caminho.
Atrás dele marchava um exército. Oito outros reis do submundo, mais o filho
e filha de Hades, Baden, o Terrível, e Pandora, a Gostosuda. Um apelido que ela
desprezava, e era por isso que todos usavam tanto.
Entre os oito: Rathbone, o Único, o braço direito de Hades e um metamorfo
diferente de qualquer outro. Achilles, o Primeiro, um terror que a maior parte das
lendas não sabe nada. Nero, quem não preferia nenhum título, tornando-o o Cher
ou a Madonna do submundo. Baron, o Fazedor de Viúvas. Gabriel, o Louco. Falon,
o Esquecido. Hunter, o Flagelo e Bastian, o Não Convidado, que eram irmãos.
Cada homem levava a marca de Hades: duas adagas que flanqueavam uma
espada bem mais longa no centro.
Juntos, eles guerreavam contra outro homem que se chamava Rei de Todos
os Reis: Lúcifer, o Destruidor. O Astuto. Soberano dos Mortos. O Grande
Enganador. Ele tinha muitos nomes, nenhum deles bom. Ele costumava ser o filho
mais velho de Hades, adotado como William.
Não mais reconhecia a conexão.
Uma vez rompidos, alguns laços não podiam ser remendados.
Hades chegou a um par de portas duplas, empurrou-as com um único chute
e espreitou dentro de uma grande sala enorme. Incontáveis Enviados permaneciam
enfileirados, prontos para a batalha. Do melhor dos melhores — Lysander e
Zacharel — aos recém-eleitos Elite Seven com suas asas douradas, aos generais
com suas asas brancas e douradas, aos guerreiros com suas asas de um branco
puro. Não havia mensageiros ou curandeiros no grupo, não hoje. Também ausente?
O líder deles, o Altíssimo, também conhecido como A Única Verdadeira Divindade
— pelo menos Hades não conseguia vê-lo.
Erguendo o queixo, Hades anunciou:
— Eu ouvi sobre seu plano de atacar o reino de Amaranthia.
Um dos Elite Seven deu um passo à frente, dizendo:
— Sabe quem eu sou?
Um aceno de cabeça.
— Axel alguma coisa ou outra, recentemente promovido à Elite. — Hades
ofereceu um sorriso frio. — Eu sei de tudo. Exceto dos detalhes que não são
importantes demais para lembrar. — Ele até sabia o motivo pelo qual Axel tinha o
mesmo cabelo escuro, feições simétricas e olhos cristalinos de William.
Axel foi encontrado quando bebê, abandonado e criado por uma família
amorosa de Enviados.
Hades tinha encontrado William quando menino — abandonado— e o havia
acolhido.
Os dois nunca se encontraram.
— Eu tenho que dizer. Você e seu bando de homens alegres são... — Axel levou
um momento para dar uma piscadela para Pandora — gatas. Se não nos matarmos,
eu gostaria de ter a chance de te conhecer melhor. — Ela o olhou com ódio, e ele
soprou um beijo. — Nós estivemos assistindo Abracadabra ou o que quer que aquilo
seja por um bom tempo. Tem uma magia do mal séria por lá. Como provado pela
bomba que um de seus reis explodiu em nosso templo — seu tom endureceu ali no
final.
Ele também tinha a irreverência de William.
Um Enviado alto e musculoso com cabelos brancos, pele de alabastro cheia
de cicatrizes e olhos vermelhos de neon veio para o lado dele. Seu nome era Xerxes
e segredos ferviam dentro daqueles olhos. Horrores que ele escondia de seus
companheiros.
— Mantivemos o bombardeio em silêncio, não contamos a ninguém — disse
Xerxes, a voz profunda e rouca. Em algum momento antes de alcançar a
imortalidade completa, ele havia danificado as cordas vocais. — Metade da nossa
Elite foi morta. Outros foram promovidos com apenas um objetivo. A eliminação de
Taliesin Anwell Kunsgnos Connacht. Ele sozinho é responsável por nossa perda
trágica. Talvez ele soubesse que observávamos sua casa e pensou em nos deter. Há
muita atividade demoníaca lá. Mas seja qual for sua razão, ele deve pagar.
Taliesin. O irmão mais novo de Puck.
Através de comunicações secretas, William manteve Hades informado de tudo
o que acontecia em Amaranthia e como eles estavam presos dentro de um labirinto.
Se os Enviados atacassem agora, William seria ferido ou pior. Puck e a garota
também.
Se algo acontecesse com a garota, William culparia Hades.
Além disso, Hades queria que Puck — e toda Amaranthia — estivesse ao seu
lado na guerra contra Lúcifer. Logo o Grande Enganador não teria aliados.
— Vocês não podem destruir um reino inteiro com base nas ações de um
homem — Hades anunciou... apesar do fato dele mesmo, de fato, ter destruído
reinos inteiros com base nas ações de um homem. Duas vezes.
Pelo bem de William, ele alegremente mudou o tom. Seu filho merecia a
felicidade. O que significava que Amaranthia tinha que prosperar, Puck tinha que
permanecer casado com Gillian, e William tinha que dar sua bênção ao casal. Estou
trabalhando nisso.
— Nós podemos — disse Xerxes, com as mãos em punhos. — Nós vamos. Não
conseguimos chegar a Taliesin de outra maneira. Ele deve ser impedido antes que
bombardeie outro templo ou até mesmo outras espécies.
Um loiro deu um passo à frente. Thane dos Três.
— Existem campos de força impenetráveis em volta de Sin. Se destruirmos o
reino, nós o destruímos. Fim da história.
— Sim. O fim de uma história — disse Hades — mas o começo de outra. Uma
de guerra, dor, morte e perda, porque não vou parar diante de nada para punir
todos aqueles que escolheram agir contra mim nessa questão. E não vamos
esquecer os inocentes que estarão matando. É muita hipocrisia?
Sibilos de desaprovação soaram. Rosnados de agressão.
— Vocês não precisam enfrentar Taliesin — acrescentou Hades. — William da
Escuridão prometeu punir o guerreiro. Ele está dentro do campo de força indo para
Taliesin agora, e sua palavra vale ouro. Ele só precisa de mais tempo.
— Tempo não é algo que estamos dispostos a conceder. — O comentário
áspero veio de outro Elite chamado Bjorn, um homem com cabelos escuros, pele
bronzeada e olhos da cor de um arco-íris. — Nossa vingança deve ser rápida, e dias
já se passaram enquanto fizemos o melhor para nos recuperarmos.
Enquanto outros Enviados entoavam “Mate-o!” Rathbone se transformou em
uma pantera negra, sua forma favorita.
A multidão ficou em silêncio enquanto os outros reis do submundo se
preparavam para a batalha. Armadura de prata substituiu a pele de Aquiles. Um
porrete com poderes além da imaginação apareceu nas mãos de Nero. Baron
mostrou os dentes — veneno pingando de seus incisivos. Um machado duplo
apareceu em cada um dos punhos de Gabriel — um golpe poderia quebrar cada
osso do corpo de uma pessoa. As tatuagens no peito de Falon ganharam vida,
enevoando-se de sua pele, envolvendo-o em sombras. Hunter e Bastian
desapareceram, subitamente invisíveis a olho nu.
Hades sorriu.
— Vocês darão duas semanas ao meu filho ou vamos entrar em guerra agora.
Decidam. — Ele omitiu de propósito se falava no tempo mortal ou amaranthiano.
Depois que eles concordassem, informaria o fuso horário.
— Você já está em guerra com Lúcifer — disse Xerxes, com os dentes cerrados.
— Realmente deseja entrar conosco também?
— O que eu desejo e o que farei raramente são a mesma coisa — ele fazia o
que devia, quando devia, sempre. Não importava o quanto fosse desagradável. Não
havia linha que ele não cruzasse.
Os dois lados se enfrentaram, medindo um ao outro. Os Enviados
descobririam que os guerreiros do submundo não recuavam nunca. Eles preferiam
morrer pelo que acreditavam do que viver com arrependimentos.
Silêncio reinava... mas apenas no exterior.
Como os Enviados, sua gente tinha a habilidade de se comunicar com a mente.
Nero: Quanto mais esperarmos, mais fracos eles vão acreditar que somos.
Vamos provar nossa força.
Pandora: Sempre tão desesperado para agir, Nero. Mas então, você gosta de
compensar demais.
Rathbone: O que você tem contra ação, Gostosura? Não está tendo muita
ultimamente?
Pandora: Vai se foder.
Rathbone: Aqui ou quando voltarmos para casa? Eu topo de qualquer maneira.
Baden: Crianças, por favor.
Aquiles: Qual de vocês bebeu meu café com leite esta manhã? Me digam antes
que eu comece a abrir barrigas pra checar.
Bastian: Os Enviados têm sessenta segundos pra se decidirem ou vou matar
todo mundo e ir pra casa. Deixei uma mulher amarrada na minha cama… e o marido
dela pregado na parede.
Hunter: O marido não é o nosso pai e a mulher a nossa madrasta? E você não
vem fazendo isso há quase cem anos?
Bastian: Alguns jogos são sempre divertidos.
Gabriel: Me lembre de confirmar a minha não reserva para a sua próxima
reunião de família.
Falon: Me lembre de confirmar a minha sim reserva para sua próxima reunião
de família.
Baron: Alguém quer comer hambúrguer depois disso?
Baden: Minha mulher me espera. Se alguém não agir logo…
— Muito bem — Xerxes finalmente anunciou. — William tem duas semanas
para matar Taliesin o Demente.
— Duas semanas do tempo de Amaranthian — acrescentou Thane, e Hades
soltou um suspiro, sua omissão havia sido notada. — Se ele for bem sucedido,
Amaranthia vive. Se ele falhar, nós destruímos o reino e todos os seus cidadãos.
Gillian assistiu enquanto um Puck morto de cansaço e William batiam o
xarope do cuisle mo chroidhe. Finalmente, o trabalho duro deles valeu a pena. E,
no entanto, ela não estava tão animada com seu deleite favorito quanto antes. Ou
melhor, seu segundo deleite favorito. Ela tinha encontrado algo mais doce e ainda
mais raro. O sorriso de Puck.
E eu pensei que orgasmos eram uma mudança de vida.
O prêmio de Homem Mais Bonito vai para...
O rosto inteiro dele se iluminou. Olhos brilhando, com ruguinhas nos cantos.
Feições duras definidas em uma expressão suave. A boca se curvou como uma
meia-lua. Dentes brancos perfeitos em exposição.
Quando posso ver isso de novo?
Sorrindo, ela se inclinou.
— Vocês são meus...
Um rugido terrível ecoou à distância, silenciando-a. Ao mesmo tempo, todos
pegaram uma arma. Com um rugido baixo, Puck amaldiçoou.
— Sandman — ele cuspiu.
Gillian gemeu. Ela nunca tinha encontrado um Sandman, mas tinha ouvido
histórias de terror que os pais contavam a seus filhos, contos de advertência para
garantir que bebês inocentes não corressem pelas dunas à noite.
Ao contrário das lendas terrestres, um Sandman amaranthiano não andava
por aí incentivando bons sonhos. Feito inteiramente de areia e magia, um Sandman
te enterrava até você sufocar. E porque ele não tinha órgãos para danificar, você
não podia machucá-lo ou pelo menos revidar.
— Vamos cavar um poço — William puxou uma pá do nada. — A água vai
derrubá-lo.
— Não há tempo — Puck correu para Lil Nut para soltar sua mochila. —
Cameron e eu vamos levar a criatura para longe do resto de vocês.
Espera. Só um momento.
— Eu tenho uma ideia — disse Gillian. — Nós podemos...
— Você vai proteger Gillian, Derretedor de Calcinhas — apontando uma adaga
na direção de William, Puck rosnou: — Fique com ela. Proteja-a com sua vida.
Com um grunhido de frustração, Winter jogou os braços pra cima.
— Ninguém se importa mais com a minha segurança?
— De jeito nenhum você vai ser o herói — disse William para Puck. — Você
fica aqui e guarda Gillian. Eu matarei a criatura e vamos continuar. Você pode me
agradecer mais tarde.
— Tolo! Você simplesmente não mata um Sandman — Puck disse irritado.
— Você também simplesmente não deixa um inimigo fugir — William estalou.
— Gente — disse Gillian, lutando contra seu aborrecimento. — Tudo o que
precisamos fazer é acabar com ele e...
— Ele apenas torna a se formar — interrompeu Puck.
— Não preocupe sua linda cabecinha sobre isso, boneca — William bateu a pá
no chão. — Nós vamos cuidar disso.
Outro grito, mais alto desta vez. Enquanto os caras continuavam discutindo,
Gillian beijou o focinho de Peanut.
— Não deixe o lado de Puck, tudo bem? — Os dois eram amigos, mais ou
menos. Puck iria protegê-lo.
Ninguém percebeu quando ela correu. Cerca de cem metros à frente, insetos,
pássaros e répteis se afastaram apressadamente à medida que árvores e árvores
caíam... revelando uma fera enorme com pelo menos três metros de altura e um
metro e meio de largura, feito inteiramente de areia.
Com as runas brilhando, Gillian separou suas pernas e estendeu os braços.
Ele parou para cheirar, farejar o ar antes de atacá-la.
Boom! Uma rajada de vento atingiu o Sandman diretamente no peito,
impedindo qualquer avanço. Mesmo quando os grãos se espalharam e ele afinou,
ele continuou a lutar, pegando a sujeira do chão. E sim, Puck estava certo. No
momento em que o vento cessasse, o Sandman tornaria a se recompor. Esta era a
razão para o estágio dois.
Liberando outra explosão de magia, Gillian fez o céu despejar uma onda sobre
a fera. Whoosh, splash! Água e areia colidiram, arrastando o Sandman para baixo
até que ele não passasse de uma pilha de lama, seu corpo pesado demais para
levantar.
O vento diminuiu. Os braços de Gillian pareciam pesar mil quilos enquanto
suas runas escureciam. A perda de tanta magia, tão rapidamente, esgotou-a e ela
caiu de joelhos. Ela esperou um segundo, dois, sem ousar respirar, mas o Sandman
permaneceu imóvel.
Ela conseguiu, então. Derrotou o Sandman sozinha! Porque ela governava!
Assim que reuniu força suficiente para se levantar, pegou dois punhados de
lama e voltou para seus amigos — que agora discutiam sobre quem seria a isca
mais saborosa.
— Você é jovem, carne tenra — William estava dizendo para Puck enquanto
ele continuava a cavar.
— Eu sou velho e duro, mastigável como couro — Puck empilhava galhos
caídos em um ângulo. Para criar cobertura para aqueles que ficaram para trás? —
Aposto que você está na flor da idade. E experiente.
Winter estava construindo um abrigo sobre as quimeras, resmungando sobre
como os animais entendiam melhor que ela planejava salvá-los para seu conforto
e nenhuma outra razão. Cameron estava subindo em uma árvore procurando
obsessivamente um pedaço de fruta.
Ninguém havia notado a ausência de Gillian.
— Vocês são os piores! — Ela atirou em Puck, depois em William, com os dois
punhados de lama. — Não você — ela disse a Winter. — Você é maravilhosa.
Continue sendo você.
Winter se gabou, e William balbuciou. Puck piscou para ela.
— O problema está resolvido — Gillian limpou as mãos na calça. — Agora, se
vocês acabaram de agir como idiotas, vamos terminar de coletar o xarope e seguir
em frente.
***
***
***
***
***
***
***
***
Hades descansava em seu trono, seus braços repousavam em seu colo, suas
pernas estendidas na frente dele, seus tornozelos cruzados. Uma pose
enganosamente casual. Seus homens se foram, dispensados pelo dia. Os outros
reis retornaram aos seus reinos, protegendo seus súditos da ira de Lúcifer e da
guerra cada vez mais violenta ocorrendo no submundo. Mas Hades não estava
sozinho.
Seu olhar foi para seu espelho favorito. Siobhan, a deusa de Muitos Futuros,
estava presa lá dentro, seu ódio por ele emanando do vidro. Ela tinha a capacidade
de ver os próximos dias, semanas, anos e ver os diferentes caminhos que uma
pessoa podia seguir. Ela então tinha uma escolha: mostrar os resultados ou não
mostrá-los. Até agora, não mostrou a Hades nada de importante.
Se tivesse vivido em Amaranthia, ela seria anunciada como uma Oráculo.
Certa vez, ainda adolescente, pediu a Hades que se casasse com ela. Disse a
ele que estavam destinados. Claro, Hades a rejeitou. Casar? Ele? Risível! Casar
com uma criança? Nunca! Podia ser um homem sem bússola moral, mas até ele
tinha um limite.
Embora, essa adolescente em particular tivesse procedido a assassinar a
sangue frio todas as amantes de Hades. Passado, presente e — aparentemente —
futuro. Então, como qualquer homem racional, providenciou que ela fosse
amaldiçoada no espelho até que aprendesse sua lição: não mexa com Hades.
— Ainda está aprendendo, obviamente — ele disse.
Queria tanto saber o que estava vindo para ele. William salvaria Amaranthia
e a si mesmo?
Hades enviou Rathbone e Pandora para ajudar, adicionando Galen no último
minuto. Se uma evacuação aérea fosse necessária, as asas seriam úteis. Além disso,
o guardião do Ciúme e da Falsa Esperança faria qualquer coisa pela mulher que
desejava... e Hades a escondeu onde o guerreiro não poderia alcançá-la sem
permissão.
Faça o que digo e as visitas serão encorajadas. Me traia e assista enquanto eu
seduzo o que você deseja.
Pelo direito de ver Legião, Galen faria qualquer coisa para manter William em
segurança. Até mesmo matar a garota, Gillian, se tal ação fosse necessária.
Mesmo assim, Hades deveria ter ido ele mesmo. Em vez disso, voltou para
casa para reprimir outra rebelião estimulada por Lúcifer.
Agora Hades não podia entrar em Amaranthia. O escudo o detia a cada
tentativa. Precisava de Rathbone, mas não conseguia se comunicar com o guerreiro,
apenas William, e William não tinha ideia de onde Rathbone estava. William tinha
até riscado de volta ao último local onde viu o macho, mas Rathbone, Cameron e
Winter já haviam se movido.
— Deve saber que sou o tipo de homem que vai reunir sua família e seus entes
queridos e assassiná-los bem na sua frente — disse ele. — Se é isso que quer,
continue não me mostrando nada. Estou feliz em te obrigar. Ou talvez ainda me
considere seu homem predestinado? Talvez se oponha a me ver transando com um
batalhão de mulheres.
Nada. Nenhuma reação.
Muito bem. Faria o que prometeu. Porque nunca fazia ameaças vãs, apenas
promessas.
A parte de trás do pescoço de Hades subitamente se arrepiou. Alguém se
aproximava.
Ocultando o espelho com invisibilidade, deslizou de pé. Na hora certa. A
Rainha Vermelha apareceu no centro de sua sala do trono, uma visão de beleza
doida de pedra com seu cabelo pálido em rolinhos e seu corpo vestindo apenas um
sutiã rosa e calcinha rendada. Uma perna tinha creme de barbear espalhado da
coxa ao tornozelo.
Ele sorriu um sorriso genuíno.
— A que devo o prazer de sua companhia, meu doce?
Ela fez hmpf.
— Primeiro, não sou seu doce. Nunca fui, ou você não teria me vendido por
um barril de uísque e continuaria todo feliz com sua vida enquanto eu fui torturada
e aprisionada.
— Ofensas banais. Fiz muito pior a outros.
— Não está errado. Mas, sou o doce de Torin, e ele é muito louco por mim. —
Inchada de orgulho, ela afofou seus rolos. — Em segundo lugar, vim para avisá-lo.
Seus ombros se enquadraram com um único movimento brusco.
— Diga-me — Keeley também seria conhecida como uma Oráculo em
Amaranthia. Uma vez, teve vislumbres rápidos do futuro. Ultimamente tinha
longos olhares.
— Alguém que amamos vai morrer — disse ela. — Eu sinto isso.
Hades ficou tenso. Havia apenas uma pessoa que ambos amavam. William.
Puck sabia que tinha chegado a uma séria encruzilhada.
Apenas algumas horas antes, experimentou total e completa satisfação. Seu
primeiro clímax dentro de uma mulher em séculos. Seu primeiro clímax dentro de
sua mulher, desde sempre. Necessidade o tinha governado. Uma necessidade de
possuir Gillian, de reivindicá-la e marcá-la. De enchê-la, dois corpos que se
tornaram um.
Esteve louco de luxúria por ela. Ainda estava. Ansiava por aproveitar o depois
do sexo. Merecia isso. Um dia, vou matar William por interromper o melhor momento
da minha vida.
O filho de Hades ficou longe do acampamento na maior parte da noite, Galen
com ele. Pandora patrulhou o perímetro e, apesar dos berros altos do demônio
dentro da cabeça de Puck, ele permaneceu em alerta por qualquer sinal da magia
de Sin.
Sentiu uma aparente sensação de desgraça, que só o fez querer apertar Gillian
em seus braços e nunca a soltar. Mas quando tentou abraçá-la há alguns minutos,
ela se libertou para andar em volta da fogueira.
Ela agoniza — por causa dele. Pelo homem que ela amava; o homem que
sempre amaria.
Destruído, Puck só podia observá-la e ansiava por seu gelo. A cada minuto
que passava, era machucado por dentro — mais cru — ferido de maneiras que
nunca imaginou ser possível.
Pensava ter desfeito todos os laços familiares. Sem laços, sem traição. Gillian
o fez mudar de ideia.
Ter um laço com outra pessoa, a pessoa certa, não o torna vulnerável a
ataques; isso te fez mais forte. Veja o que aconteceu com Indiferença. Gillian ajudou
a reduzir o demônio a uma criança chorona. A família dava a você uma base sólida
sobre a qual se apoiar. Quando as tempestades chegavam, tinha alguém lá para
ajudá-lo se caísse.
E talvez as emoções de Puck não fossem tão ruins, afinal. A satisfação em seu
peito toda vez que olhava para sua esposa... a conclusão que encontrou nos braços
dela... valia qualquer dificuldade.
Mas William permanecia um problema. Os sentimentos de Gillian pelo outro
homem não eram românticos, ou isso era o que ela acreditava. Mas romântico ou
não, esse amor ligava os dois. E, no fim do dia, seu vínculo com William era maior
que seu vínculo com Puck. Porque ela escolheu William com o coração; ela fez uma
escolha sem coação.
Não importa. Puck tinha decidido lutar por ela, e iria. Nada, nem mesmo isso,
iria detê-lo. Ele a faria amá-lo, mesmo sem o vínculo. Asseguraria que ela o
escolhesse agora e para sempre.
Sempre em frente.
Mas como? Como a alcançaria?
***
Puck jogou Gillian dentro da água. Quando ela emergiu cuspindo água, ele
tirou a roupa encharcada de sangue. Ela o observou, as pupilas se expandindo.
Nu, ele ficou onde estava com os braços de lado, as pernas afastadas,
permitindo que ela olhasse para ele. Estava duro, a ereção plena, pronto para ela.
Ela lambeu os lábios.
Minha mulher me quer.
Indiferença não tinha calado a boca, mas Puck pouco se importava. Estava
embriagado de paixão demais para se incomodar. Muito… feliz.
Eu? Feliz?
Quase bêbado de desejo, entrou na água. Líquido frio o lambeu, mas não
conseguiu esfriar o fervor em suas veias. Na verdade, tinha certeza que
transformara a lagoa em uma fonte quente.
Gillian nadou, esperando enquanto ele mergulhava algumas vezes para limpar
o sangue do cabelo. Quanto mais perto ele chegava dela, mais a antecipação se
agitava em seu estômago. Apenas a um sopro de distância, ele plantou os pés e se
colocou de pé, a linha d'água alcançando o meio de seu torso.
Com um olhar quente para ele, Gillian levantou os braços para se oferecer
como um prêmio de guerra. Ele tirou o top dela, jogou-o na enseada, triunfo o
consumindo. Seios tão lindos. Uma recompensa celestial, atrevida e rechonchuda,
com pontas de botões cor de rosa que ele logo chuparia.
— Eu quero você — ele disse asperamente. — Você inteira — Sempre.
— Vamos negociar. Eu inteira para você e você inteiro para mim.
— Aceito.
Ele deixou a boca cair sobre a dela. Ela gemeu e se abriu para ele, extasiando-
o com sua doçura.
As mãos dela subiram pelo seu peito, as unhas raspando levemente. Quando
ela deu um passo mais perto, pressionou o corpo contra o dele, pele quente contra
pele quente. Ela esfregou seu núcleo na ereção dele uma vez, duas, usando-o para
o seu prazer, e ele não aceitaria de outra forma.
Segurou sua bunda, ajudando a guiá-la em um ritmo mais rápido,
aumentando a pressão. Gritinhos de desespero a deixaram, fazendo-o ofegar.
Então ele a virou, colocando-a de costas no seu peito. Com movimentos hábeis,
ele tirou sua saia e calcinha, segurou seus seios, apertou, deslizou as mãos pelo
seu estômago e enfiou um dedo em sua quente fenda feminina. Suas paredes
internas o agarraram, queimando-o de um jeito mais que perfeito.
Com outro gemido, ela descansou a cabeça no ombro dele. O desejo de meter
nela e gozar agora, agora, agora, deixou seus testículos mais pesados, mas ele
resistiu. Ele se demoraria e faria com que fosse bom para ela. Melhor do que nunca
antes. Marcaria sua essência dentro dela.
Puck caminhou pra frente e a levantou em uma pedra.
— De quatro — disse e ela obedeceu ansiosamente, deixando seu sexo ao nível
dos olhos.
— Deixe-me ver minha linda esposa — ele afastou os joelhos dela ainda mais,
revelando a visão mais apetitosa de todos os reinos.
Ela estava molhada, inchada com a necessidade e o rosa mais bonito.
— Vou me fartar de você — ele traçou um dedo ao longo de seu calor sedoso,
arrastando um gemido de ambos.
— Assim? — Ela perguntou, claramente escandalizada… e intrigada. — Neste
ângulo?
— Neste ângulo — ele concordou. Lambiiiida. O gosto desta mulher!
Ela gritou e ondulou o quadril. Drogado pela sua essência, estendeu a mão
para massagear seus seios, puxar e brincar com seus mamilos. Só quando ela
implorou, ele empurrou dois dedos dentro dela, oferecendo um pouco de alívio.
Sua esposa, sempre um barril de pólvora pronto para explodir, gozou naqueles
dedos, seus gritos de felicidade eram uma canção erótica.
Ele era um barril de pólvora pronto para explodir. O clímax a deixou ainda
mais doce.
Mais... Para arrancar um segundo orgasmo dela, usou a língua e o membro
ao mesmo tempo, empurrando-o para dentro dela. Massageou seu clitóris com o
polegar repetidamente, aumentando a pressão. Choramingos encheram o ar.
Mais! Ele se arrastou pra cima da rocha e se colocou atrás dela, de joelhos.
Embora cada fibra de seu ser exigisse que se enterrasse dentro dela, apenas
provocou sua umidade com a ponta da ereção.
— O quanto você me quer? — Perguntou entre os beijos que depositou ao
longo de sua coluna.
Ela encontrou seu olhar por cima do ombro, os lábios vermelhos e inchados
de seus beijos. Um sorriso lento floresceu, acelerando seu coração em um galope
selvagem.
Alguma mulher era mais perfeita que esta?
— Eu quero você — ela esticou o braço entre suas pernas para acariciar o
comprimento dele da base até a ponta — este tanto.
Bom demais! Cuidado, cuidado. Não posso explodir.
— Então você nunca quis qualquer coisa mais — ele disse, e dirigiu seu eixo
até o fim.
Prazer sublime percorreu Gillian. Puck a encheu, esticou e consumiu. Ela já
tinha gozado duas vezes, mas como a viciada que era — a viciada que esse homem
incrível fizera dela — ela só queria mais.
Ele estava tão quente quanto fogo, tão duro quanto pedra, e a marcou por
dentro e por fora. Macho e fêmea. Marido e mulher.
Enquanto ele investia e empurrava, com mais força e mais rápido, seus
movimentos tornaram-se mais ásperos. Ela podia sentir seu desespero e fome.
— Me beije — disse ela.
— Minha esposa quer ser beijada? — Ele se afastou tempo suficiente para
jogá-la de costas. Mas não a beijou. Empurrou de volta para dentro dela, entrelaçou
os dedos com os dela e levantou seus braços acima da cabeça. A nova posição a
forçou a arquear as costas, erguendo os seios pela atenção dele.
Ele olhou para ela, e ela olhou para ele, observando como os pontinhos de luz
em sua íris se moviam, como estrelas cadentes cruzando o céu da meia-noite.
Homem lindo. Homem brilhante.
— Existem diferentes tipos de beijos — disse ele, e começou a se mexer
novamente. O ritmo de seu acasalamento mudou. — É este o tipo que você quer?
— Movendo-se dentro e fora dela tão devagar, tortuosamente, deliciosamente, ele
se inclinou para balançar a língua sobre um de seus mamilos.
— Sim, sim, esse tipo. Todos os tipos — Correntes elétricas correram direto
até seu núcleo, e ela balançou os quadris, levando-o mais fundo, com mais força.
Era assim que o sexo deveria ser, uma comunhão entre dois adultos que
consentiam. Um dar e receber perfeito. Um bálsamo para um coração ferido. Prazer
sem culpa ou desgosto. Até mesmo... divertido.
Só o vínculo não poderia ser responsável por este... este... milagre.
— Você me possuiu — ela disse rouca.
— A Chuisle, eu sou o único possuído... por você — com o seu próximo
mergulho, ele balançou o corpo dela inteiro.
Pulsar novamente. Ele poderia muito bem ter lançado um feitiço sobre ela.
— Me beija. Esse tipo agora — disse ela, agarrando os lados do rosto dele para
levar os lábios à sua boca.
Sua língua dominou a dela enquanto ele a alimentava com uma paixão tão
selvagem quanto a batida de seu coração. Ainda mergulhando. Mais duro.
Novamente. E de novo. Cada vez com mais força. Mais rápido. Seus mamilos
sensibilizados criaram uma fricção irresistível com o peito de Puck, desejo fazendo
com que ela alcançasse o pico novamente.
Mais prazer. Uma bomba prestes a detonar. Ela emaranhou os dedos no
cabelo dele e cravou as unhas no seu couro cabeludo. Suas terminações nervosas
zumbiam e vibravam, fogo ardia dentro de seus ossos. As chamas cresciam e
cintilavam em cada centímetro dela.
O resto do mundo há muito havia desaparecido de sua consciência.
Ela arqueou os quadris para encontrar seu próximo impulso, enviando-o
ainda mais fundo. Sim, sim, sim. Um grito sem fôlego, carente e lamurioso — esse
som realmente saiu dela?
— Puck! — Ela arqueou os quadris novamente, ofegou. Sim, sim! — Mais disso.
— Você é tão gostosa, esposa. Não tem nada melhor. — Bam, bam. Bam.
Três... dois... um. Detonação!
Sua mente desligou, felicidade a rasgou, atravessando-a, outro grito queixoso
a deixou. Este foi mais poderoso do que qualquer outro clímax, forte o suficiente
para estraçalhá-la pedaço por pedaço, mas doce o suficiente para juntar seus
pedaços novamente.
— Não estou indo... durar... moça! — Puck gritou. Ele investiu dentro dela
mais uma vez, bem fundo, tão maravilhosamente fundo que seu corpo inteiro
estremeceu contra o dela quando seu orgasmo o alcançou.
Assim que desmoronou em cima dela, ele mudou seu peso. Seus braços
permaneceram em volta dela em um aperto que dizia que minha esposa não ia a
lugar nenhum sem mim.
Contente, mas ainda sem fôlego, Gillian se aconchegou contra ele. Quando
seus pensamentos clarearam, ela disse:
— Você algum dia esteve apaixonado? Amor romântico, quero dizer. Com uma
mulher além de mim.
— Não. Eu nunca me permiti conhecer alguém.
Além de William, e depois de Puck, ela nunca teve tempo de conhecer um cara
também. Puck não era perfeito, mas ele era perfeito para ela. E ele faria um rei
incrível. No labirinto, ela conseguiu um lugar na primeira fila em sua força,
habilidade, determinação, honra e resiliência. Amaranthia precisava dele. Os clãs
precisavam dele.
Eu preciso dele.
— Você disse que os Oráculos nunca estiveram errados — disse ela.
Esfregando o pássaro tatuado em seu peito, ele disse: — Isso está correto.
— E se pudermos fazer o impossível e provar que estão errados, a respeito de
tudo? E se eu puder ajudá-lo a alcançar seu sonho sem matar seu sonho? E se eu
puder ter um final feliz com você?
— Eu quero isso — disse ele, seu tom feroz. — Eu vou ter isso.
Por outro lado...
— E se eu não puder provar que os Oráculos estão errados? — Medos a
inundaram, um flagelo que não conseguiu superar. — E se eu destruir seus sonhos?
E se eu não puder ter um final feliz com você?
Prepare-se para o pior, espere pelo melhor.
— Mas não podemos viver pelo e “e se”. E eu te avisei. Não vou deixar você ir
a menos que eu tenha que fazer isso para salvar sua vida. Não mudei de ideia. Não
vou. Saiba que farei tudo ao meu alcance para garantir que você continue sendo
minha. Matarei meu irmão e lutarei por seu final feliz.
Tal ferocidade... ela estremeceu.
— Você quer filhos? Um dia, quero dizer.
Seus olhos eram fogo puro.
— Sim. E você?
— Sim — Meninos com olhos do céu da meia-noite. Meninas com longos cílios
negros.
Silencioso e pensativo, Puck olhou para o céu por um momento.
— Venha — disse ele, e a levantou contra seu peito antes de se levantar.
Enquanto ele atravessava o rio, a água fria acariciava sua pele superaquecida.
Quando chegaram ao outro lado, ele continuou segurando-a e levou-a para o
acampamento.
— Hora do nosso descanso — disse ele.
— Devemos encontrar roupas limpas e armas primeiro — disse ela e bocejou.
Ele abriu caminho até a maior tenda e gentilmente a colocou de pé. Com um
sorriso, deu um tapa na sua bunda de brincadeira.
— Você faz parte do meu estábulo agora, mulher. Fará o que eu disser se
espera misericórdia do seu mestre.
Aquele sorriso... ele parecia tão jovem e infantil, tão bobo, lindo além da
imaginação. Seus olhos brilhavam como runas; as estrelas haviam assumido
completamente.
Este era o homem que ele nasceu para ser. A doçura que seu pai tentou tirar
dele. A rasteira que seu irmão tinha dado quase o destruiu.
Este era Puck Connacht, marido de Gillian.
Então suas palavras computaram e ela cuspiu. Parte do seu estábulo?
— Ha! Neste relacionamento, eu sou o mestre e você é um garanhão no meu
estábulo. Você já tem as pernas pra isso, garotão.
Ele deu um falso grunhido.
— Você gosta das minhas pernas.
— Eu? — Ela estudou suas cutículas.
— No dia em que voltei para Amaranthia, você virou Hulk. Eu te carreguei pra
cama, e por muito tempo você se recusou a me deixar partir. Você se agarrou a
mim, esfregando-se nas minhas pernas a cada oportunidade.
Ela tinha? Bem, porque não? Ela era uma garota inteligente.
— Se você tentar formar um estábulo, vou cortar fora seu precioso e fazer você
comer. Estou falando isso do fundo do meu coração, baby.
Suas palavras devem tê-lo agradado. Os ombros dele se enquadraram e a
coluna se endireitou com orgulho.
— Você não pode ter o suficiente do meu precioso. Mas talvez eu deva pegar
meus desejos em outro lugar. Lembro de uma vez em que me disse que eu tinha
permissão para...
— Considere o seu passe livre revogado. Você é meu — disse ela, inflexível. —
Só meu.
Mais uma vez ele sorriu para ela, fazendo com que seu coração pulasse uma
batida.
— Minha esposa é tão possessiva.
— Sua esposa é perigosa quando contrariada — Ela examinou a tenda. Bem,
bem. O antigo dono tinha recolhido armas, tudo, de machados a espadas e arcos.
Um monte de peles proporcionava uma cama macia e quente, e uma panela de
guisado fervia em cima do fogo. Fumaça rolava em uma abertura no teto da tenda.
Todas as necessidades atendidas.
— Quer a verdade? Nenhuma outra potranca se compara a você — ele alisou
os cachos de cabelo da bochecha dela antes de traçar o polegar sobre os lábios. —
Por que eu tentaria montar outra?
Ela deu um passo mais perto dele, tão perto que seus seios achataram seu
peito. Eles estavam pele com pele, homem e mulher. Desejo com desejo ardente.
Arrepios deslizaram por sua espinha enquanto ela agarrava a base de seu eixo.
Ele estava duro novamente. Do jeito que ela gostava dele.
— Vou fazer você tão feliz porque disse isso...
Sem dúvida, isso é felicidade.
Ontem, Puck tinha feito todas as suas novas coisas favoritas. Ele tinha
mergulhado pelado com Gillian. Fez amor com ela nas rochas, e gozou tanto que
seu cérebro chacoalhou no seu crânio. Mais tarde, ele fez amor com ela na tenda.
Deu comida a ela na boca e foi alimentado por ela antes de ir dormir com o corpo
dela embalado perto do dele.
Gillian antes da guerra.
Gillian antes de tudo.
Esta manhã, ele tinha saído antes dela acordar, escrevendo-lhe uma nota na
areia.
Fique aí. Por favor. Volto logo.
Então foi caçar. Horas se passaram antes que ele encontrasse o que precisava.
Mais horas se passaram enquanto trabalhava para adquirir o que queria. Após seu
retorno, esperava protestos de Gillian. Ou no mínimo uma exigência por respostas.
Em vez disso, ela se iluminou e correu para seus braços. Sua risada esplêndida
encheu o acampamento e sua alma, enquanto ele a girava ao redor.
— Eu não vou destruir seu sonho. Não vou — disse ela, como se não estivesse
preocupada com mais nada o dia todo. Embora ele logo viesse a saber que sua
esposa havia passado seu tempo reunindo todas as armas no acampamento e
estudando um mapa da terra de Connacht. — Um assassinato Connacht e coroa
chegando. Estamos avançando, todos os planos de avançar. Certo?
— Certo — ele disse, e alívio havia emanado dela.
Sem William aqui, Puck não tinha preocupações. Ele derrotaria Sin, salvaria
Amaranthia e teria tudo o que queria.
Ele planejou abandonar o acampamento hoje, mas seu tempo na floresta
custou muita luz do dia. Eles tiveram que ficar mais uma noite. Que farsa.
Agora, o luar fluía através de uma rachadura na aba da tenda, banhando
Gillian com um suave brilho âmbar. Ela estava espalhada nua em cima de um
monte de peles, ronronando enquanto Puck traçava um pedaço de spéir ao redor
de seu mamilo. O brotinho enrugou quando ele lambeu as gotas de suco vermelho.
Seu gemido ofegante encantou seus ouvidos. Quem ele estava enganando?
Cada parte dessa mulher deleitava cada parte dele. Indiferença não era nada mais
que um zumbido no fundo de sua mente.
Puck mudou de direção, traçando a fruta pelos lábios de Gillian. Quando ela
abriu, pronta para morder, ele colocou a fatia na própria boca.
— Bruto — ela riu, tão sensual, tão erótica. — Isso era meu.
— Não, isso é — ele enfiou a mão debaixo do travesseiro ao lado dela e retirou
um grande pote de xarope de cuisle mo chroidhe que ele conseguiu colher.
Com um grito de alegria, ela se levantou e segurou o pote entre os seios.
— É por isso que você ficou fora tanto tempo assim?
Ele assentiu.
— Oh, Puck — ela se inclinou para mordiscar seus lábios. — Obrigada. Quero
dizer, eu não virei mais Hulk desde que, você sabe, a última vez e tudo, e agora
estou quase certa de que nunca mais terei um, porque estou tão feliz, mas agradeço
a você!
Eu fiz isso. Eu a fiz feliz.
— Por você, farei qualquer coisa, a qualquer hora, em qualquer lugar.
— Então você vai ficar onde eu te coloquei, agora mesmo, e me deixar ter meu
jeito malvado com você.— Depois de empurrá-lo de costas, ela abriu o frasco e
passou xarope sobre o peito... e mais abaixo.
Então ela o usou como um bufê self-service.
Quando ela desabou no seu peito, ele se maravilhou com a sensação de seu
corpo sobre o dele como um cobertor. Por um longo tempo, eles se deitaram juntos,
os corações se acalmando enquanto respiravam o ar um do outro. Isto era o céu,
uma satisfação que ele uma vez apenas sonhou alcançar.
— Eu ia perguntar se você gostou do que eu fiz — ela disse — mas meus
ouvidos ainda estão zunindo.
— Você me surpreende — ele levantou a cabeça para esfregar a ponta do nariz
contra o dela, um gesto brincalhão do menino que ele costumava ser.
— Você me sacia.
— Bom. Lembre-se disso. Porque acho que estou prestes a te deixar com raiva.
— Seu aperto nela aumentou, para que não tentasse fugir. — Acho que parte de
você quer ficar aqui o maior tempo possível, no caso de William e Peanut
aparecerem. Isso está correto?
Ela mordiscou o lábio, assentiu.
— Devemos seguir em frente amanhã, quer eles tenham chegado ou não. Você
sabe disso, sim?
Ela o surpreendeu balançando a cabeça novamente.
— Sei e concordo. Pelo que sabemos, eles estão fora do reino, incapazes de
retornar. Mas está bem. Você me tem e não vou descansar até que você seja rei.
Então, qual vai ser o seu primeiro ato?
Fácil.
— As mulheres terão os mesmos direitos dos homens. Cidadãs iguais. Vou
construir mais abrigos e orfanatos. Vou impor punições severas para aqueles que
prejudicam os outros.
Ela sorriu e acariciou seu peito, claramente satisfeita com sua resposta, e tão
bonita que ele foi instantaneamente capturado, incapaz de desviar o olhar. Ele já
tinha memorizado a estonteante pureza de suas íris marrom claro, rodeadas por
um marrom mais escuro. A beleza de sua face. A delicadeza do seu nariz. Como
seus lábios eram vermelhos e tentadoramente carnudos.
Mas um pensamento horrível surgiu, um que ele não conseguia se livrar. Se
realmente amava essa mulher, poderia mantê-la ligada a ele quando seus
sentimentos por ele podiam não ser verdadeiros sem o vínculo? Quando, se não
sem o vínculo, ela podia querer outro homem?
Puck... importava-se com isso. Ele se importava profundamente. Tão
profundamente que os planos que ele fez começaram a pegar fogo, um por um. Sua
certeza se foi.
Faria qualquer coisa por essa garota, percebeu. Até mesmo deixá-la ir.
Havia apenas uma maneira de saber a verdade. E eles tinham que saber a
verdade. Do contrário, Puck poderia traí-la da vida que ela queria e merecia.
— Eu acho que ... acho que eu deveria cortar nosso vínculo, como planejado.
Não importa o que.
— O que? Não — ela balbuciou por um momento. — Nós decidimos. Sem
William, você recebe a coroa e a garota. Nós ficamos juntos e garantimos que eu
tenha o meu final feliz.
— Eu espero que sim — Uma vez, ele mentiu para ela para conseguir o que
queria. Nunca mais. Ele confiava nela e a respeitava, e sempre faria o certo por ela.
— Espero que você ainda me queira depois.
Ela se levantou, as bochechas pálidas da dor de cera.
— Você acredita nas Oráculos. Acha que vou destruir seus sonhos?
— Você já destruiu meu sonho, moça — A verdade era verdade.
Ela se encolheu, como se ele tivesse batido nela.
Puck estendeu a mão, mas ela se levantou para se vestir com as roupas que
eles acharam na noite passada. Uma pequena túnica branca, calças de pele de
carneiro e um par de botas de combate.
Cobrir sua nudez deveria ser um crime.
Ele correu na frente dela e agarrou seus antebraços para segurá-la no lugar.
Quando ela tentou se libertar, ele deu-lhe uma leve sacudida.
— Me deixa terminar.
— Por quê? Tem outra parte do meu coração que você gostaria de pisar?
Ignore suas palavras ou desmorone, são minhas únicas escolhas.
— Meu sonho de governar Amaranthia foi substituído pelo sonho de te fazer
feliz, sempre. Não lamento a mudança.
Suas feições suavizaram, mas seu olhar implorava.
— O pensamento de governar o reino inteiro ao seu lado me faz feliz.
— Eu adoraria nada mais do que passar o resto da eternidade com você ao
meu lado. Teríamos bebês, formaríamos uma família e governaríamos os clãs
juntos. Quando eu romper o vínculo, tudo o que você deve fazer é... me querer. —
O futuro deles era ao mesmo tempo simples e complicado.
— Eu quero você agora — disse ela, erguendo o queixo.
Seu coração se partiu, mas ele se recusou a mudar de ideia.
— Eu vou te libertar. Não voltarei atrás.
— Bem, desculpe-me se eu não acredito em você. Há apenas alguns minutos
você disse que me manteria, não importa o quê! — Em vez de bater nele, como ele
esperava, ela se agarrou a ele. — Você está sendo tolo, ouvindo o medo em vez de
sua esposa. Estou te dizendo, sei que quero você e o vínculo não é responsável.
— Gillian...
— Você é o homem de gelo agora? — Ela exigiu. — É assim que é capaz de
dizer e fazer isso?
— Não sou o homem de gelo — disse ele. — Nunca vou ser esse homem com
você novamente. Não posso. Eu sinto demais. Eu sinto tudo.
Ela se encolheu uma segunda vez, mas disse:
— Se você me deixar ir... — por um momento, ela pareceu como se fosse
vomitar o conteúdo de seu estômago. — Se você me deixar ir, não vou conseguir
meu final feliz. Esta é a razão que isso foi profetizado. Eu sinto isso.
Não, não! Esta era a única maneira de garantir que ela tivesse um final feliz.
— Como você pode saber o que você quer? O vínculo fala por você.
— Eu falo por mim mesma — acinzentada, ela apertou as mãos no peito. — O
vínculo fala por você?
Falava? Como ele podia saber? Assim que perdesse sua conexão com Gillian,
Indiferença teria poder sobre ele novamente. Só um pouquinho, claro. Puck usaria
as tesouras, se ele pudesse. Ele poderia usar o artefato mais de uma vez?
Tantas perguntas sem resposta.
— Se você me quiser depois — disse ele, fazendo o seu melhor para parecer
razoável, como se sua mente não fosse uma zona de guerra — nós nos uniremos
novamente.
Ela tropeçou para trás como se ele a tivesse empurrado. Como ela não podia
entender? Ele fez isso por ela.
— Você hesitou — disse ela. — Você não acha que vai me querer.
Suas mãos se fecharam em punhos ao lado do corpo, armas poderosas inúteis
na maior batalha de sua vida.
— Eu não posso imaginar não querer você, moça.
Lágrimas se derramaram sobre suas bochechas e ela ofegou. Aquelas lágrimas
— pequenas gotas de água — afetaram-no como uma adaga no coração; elas o
estavam matando.
Ela usou a parte de trás do pulso para limpar a umidade. Estreitou os olhos
e levantou o queixo. Enquadrou os ombros. Uma transição que ele testemunhou
muitas vezes antes.
Gillian tinha acabado de entrar em modo guerreiro completo.
— Eu entendo agora — disse ela, seu tom quase amortecido.
Pouco a pouco, a emoção em seu rosto simplesmente desapareceu, até que ela
olhou para ele com olhos frios e duros, desprovidos de afeição, adoração e ternura.
Todas as coisas que ele veio a amar e ansiar. Coisas que ele não podia imaginar
viver sem nunca mais.
Ele não estava morrendo antes, percebeu. Não, ah não. Estava morrendo
agora, observando isso. Assistindo Gillian usar magia para invocar gelo. Isso o
matou. Suas lágrimas tinham sido difíceis de testemunhar, ainda mais difíceis de
testemunhar do que as que ela tinha derramado depois do sexo, porque ela não
esteve quebrada então. Estava livre.
Ela estava quebrada agora. Por minha causa.
Demais!
— Eu realmente não tenho um final feliz — disse ela naquele tom horrível e
amortecido. — Você vai cortar nosso vínculo. Nosso precioso e sagrado vínculo que
nos dá a família que sempre desejamos. Ainda vou sentir saudades de você, mas
você não vai mais ansiar por mim. Ou talvez vamos ansiar um pelo outro, mas não
poderemos fazer nada a respeito disso. Talvez a tesoura vá nos impedir de até
mesmo nos vincularmos novamente. — Ela riu sem humor. — Talvez eu seja uma
oráculo. Posso ver o falecimento do nosso relacionamento tão claramente. Mas não
me importo. Não mais.
— Ninguém nunca quebrou um vínculo e sobreviveu, mas vamos bater as
probabilidades — ele esfregou o pássaro tatuado no seu peito antes de puxar uma
calça e um par de botas. — Se não pudermos nos unir novamente, mas ainda
ansiarmos um pelo outro, podemos nos casar como os humanos fazem.
— Não será o mesmo. Nosso vínculo permite que você controle o demônio e
sinta sem consequências. Nosso vínculo me faz imortal. O que vai acontecer
quando ele te tomar novamente, hein? O que acontecerá quando eu for mortal... se
eu sobreviver à transição?
— Você vai viver, permanecerá imortal. Você tomou a poção e fez a transição.
Isso nunca vai mudar. Você é forte o suficiente agora.
— Mas não vou importar pra você — disse ela e se afastou.
— Você vai importar para mim, sempre — ele sibilou. — O que você não vai
fazer é me transformar em um vilão sobre isso. Estou disposto a desistir do que
mais quero para que você possa ter o que mais precisa. Porque você merece livre
escolha. Eu não serei como seu padrasto. Não vou tomar o que você não deseja dar.
Se seu coração pertence a William, você merece saber disso.
Se o homem a tocar, eu vou...
Nada. Porque nada importava mais do que sua liberdade de escolha. Ele
forçou sua mente a ficar em branco — tão vazia quanto os traços de Gillian.
— Eu disse que te amava e estava falando sério — disse ela. — Eu te amei.
Então. Agora? — Ela deu de ombros.
Seu coração disparou num galope e suor escorreu por sua testa. Ele sentiu
como se tivesse corrido centenas de quilômetros em um instante, adrenalina
fluindo por suas veias.
— O gelo vai derreter. Vou me certificar disso. Você vai me amar de novo.
— Você tem medo — ela continuou como se ele não tivesse falado. — Você tem
medo de eu te trair do jeito que Sin te traiu. Essa é a única razão que você planeja
fazer isso.
Talvez tenha sido uma razão, mas não o motivo.
— E se você só pensa que me ama? — Ele resmungou.
— Nisso, não podemos viver e se.
Palavras que ele tinha falado, agora usadas contra ele. Ainda assim, ele
endureceu sua determinação. Por ela.
— Nisso, não posso viver de outra maneira.
Um momento se passou em silêncio antes que ela levantasse o queixo, como
se tivesse acabado de tomar uma decisão de mudar o mundo.
— Você se convenceu que está fazendo a coisa certa, mas tudo que fez é me
rasgar em pedaços — ela se carregou com diferentes armas e um cantil de água. —
Não há poder grande suficiente para me fazer desejar alguém que eu realmente não
quero. Se eu pensasse que havia a menor chance de pertencer a William, teria
resistido a você. Mas você... alguma parte sua suspeitou que eu queria outra pessoa,
mas você me tomou mesmo assim. Então parabéns. Você não precisa esperar para
cortar o vínculo para descobrir se podemos ficar juntos. Eu terminei com você.
Estamos terminados.
— Nós nunca terminamos — ele rugiu, arruinando tudo o que ele disse
anteriormente. Ele a pegou pelos ombros, girou e puxou contra seu corpo. Então
ele a beijou. Beijou até que ela suavizou contra ele e o beijou de volta.
Alívio o inundou. O gelo dela estava derretendo.
— Mostre-me que você me ama — ela resmungou. — Mostre-me agora.
E ele fez.
***