Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Revista O Moinho Das Bruxas #1 Solstício de Verão 2017 PDF
Revista O Moinho Das Bruxas #1 Solstício de Verão 2017 PDF
UMA
INTRODUÇÃO
A WICCA
Wicca, o Renascimento da Bruxaria
A Wicca no Brasil - História e Conquistas
Crenças e Práticas da Wicca
Iniciação e Tradição
Dicas de Leitura para Iniciantes
O MOINHO DAS BRUXAS | #1 - 2017
Saudações!
Cara leitora e leitor, Feliz Encontro...
Gerald B. Gardner, o pai da Bruxaria Moderna deixou esse lado do véu em 1964 abençoando o
mundo com seu legado. Doreen Valiente, a mãe da Bruxaria Moderna, que ajudou a transformar
a Wicca no que ela é hoje, partiu na nau para a Terra do Verão em 1999, podendo ver o trabalho
que ela e Old Gardner construíram, e que floresceu.
Hoje em pleno século XXI, exatamente no ano de 2017 onde escrevo esse artigo, a Bruxaria que
antes assumia uma aura misteriosa, ocupa cada vez mais um lugar na popularidade, e as redes
sociais estão ai para demonstrar.
Contudo, o lugar que a Wicca ocupa no cenário atual, sobretudo o brasileiro, é atravessado por
diversas questões e como conseqüência tem sofrido uma banalização de seus conteúdos,
oferecendo aos outros que, sentem real desejo de trilhar seus sagrados caminhos, sejam
introduzidos a conteúdos distorcidos e práticas incoerentes que nem de longe são uma Bruxaria
Contemporânea.
Essas desinformações veiculadas em diversas mídias de internet parecem desconhecer
completamente os significados mais essenciais que compõe a Religião e que a faz ser um todo
diante da comunidade que a representa. Exaltando assim, um desrespeito a própria constituição
da mesma. E embora, se tenha muitos livros publicados e traduzidos no território nacional sobre o
tema, muitos são de uma qualidade ruim, que apenas se apropriam do nome Wicca como uma
forma de comercialização de conteúdos. Outro aspecto que essa banalização tem assumido é da
apropriação de termos e nomes como bruxa e bruxaria, por pessoas que usam de má fé para
enganar jovens desavisados.
Mas há outro lado disso tudo. Existe sim uma Bruxaria séria que foi construída e bem
fundamentada em nosso país. Seriedade essa que está visível em seus legítimos iniciados e
maduros praticantes solitários que, não só tem permeado um genuíno e profundo florescer de
nossa amada religião, como também tem travado um diálogo constante com toda a comunidade
internacional de bruxos que ajudaram a tornar a Arte o caminho fantástico que ela é hoje.
E pensando nessa perspectiva de coesão e maturidade é que essa revista nasce das mãos desse
bruxo e escritor, para permitir aos que nada conhecem da religião possam receber realmente
uma introdução séria e que ao mesmo tempo seja simples, sem que isso confira uma banalização
de um conteúdo inicial.
E como conteúdo inicial presente nesse projeto, digital e gratuito, pretendo então alavancar no
leitor e buscador assíduo uma legítima introdução a outras fontes publicadas que o ajudaram a
compor os diversos aspectos trazidos no decorrer desse manual.
A primeira edição da revista (#1-Solstício de Verão/2017) “O Moinho das Bruxas” tem a tarefa de
conduzir o leitor para o que há de mais comum e coeso entre as diversas tradições e caminhos
que compõe como comunidade e religião Wicca.
Conteúdo:
Afinal, o que é Bruxaria?
1
Wicca, O Renascimento da Bruxaria
5
A Ética das Bruxas
16
Crenças e Práticas da Wicca
22
Iniciação e Tradição
41
AFINAL, O QUE É BRUXARIA?
1
Bruxaria é uma religião neopagã iniciática e de mistérios, não revelada,
não institucionalizada e de orientação matricêntrica.
Por neopaganismo se compreende religiões contemporâneas que
inspiram seus mitos e ritos (crenças e práticas), bem como sua visão de ser
humano e de mundo, em um período pré-cristão da história da cultura humana,
sobretudo um período cuja presença de divindades femininas (Deusas) era
cultuada e ofereciam outra experiência religiosa para as pessoas.
No entanto, essa é ainda uma visão muito particular do que seja um
neopaganismo. Por essa razão é preciso compreender o significado da palavra.
Pagão e Paganismo vêm do termo pagus, que quer dizer o pedaço de
terra onde se era cultivado o alimento vegetal, pois naquele período pré-cristão
os indivíduos possuiam uma forte relação, local, com o cultivo da terra por meio
da agricultura. Essa relação agrícola por meio de clãs proporcionava diferentes
concepções e noções de divindades que habitavam a natureza manifesta. Desse
modo, não eram Deuses revelados, como o dos cristãos, por exemplo, e sim
divindades presentes na experiência cotidiana desses grupos e clãs, sendo assim
imanentes. Por esse motivo a visão politeísta e panteísta é comum no
paganismo. Assim sendo, cada clã possuía diferentes divindades e concepções
mitológicas do mundo. Contudo, a natureza era a inspiração para o material
2
tradições se inspirem na cultura celta, egípcia, nórdica e greco-latina, não há
uma unanimidade na atualidade que possa definir sobre qual cultura a Bruxaria
Contemporânea está orientada, em vista de que a mesma tem buscado
inspiração, sobretudo mitológica em Deusas e Deuses de diferentes culturas.
Mas existe uma forte influência celta-germânica, exatamente por conta da
região em que a religião foi reconstruída e da nacionalidade de seus mais
proeminentes precursores.
A Bruxaria/Wicca é também uma religião iniciática.
Iniciação representa um caráter fundamental em nossa crença e prática,
pois não somos uma religião de massas, mas de pequenas células (Covens) ou
de indivíduos solitários. Também não possuímos uma liderança que fale ou diga
por nós, como os Católicos que possuem seu Papa. Esse caráter iniciático da
Wicca se relaciona com a sua proposta de religião atual e ocidental. Seu
propósito é devolver a ligação perdida do ser humano à natureza, bem como
limpar os entulhos de eras de empréstimos culturais patriarcais que nos
aprisiona com relações de culpa e medo. Por essa razão, a Iniciação esta
relacionada como um processo de metamorfose da alma de seus buscadores.
Essa metamorfose diz respeito ao autoconhecimento promovido através das
práticas e exercícios de desenvolvimento, e também diz respeito o despertar de
3
executar seus ritos e criar os seus mitos, obviamente não com esse nome e
conjunto de práticas. Desse modo, a Bruxaria/Wicca é uma religião ensinada.
Portanto, ela também não é uma religião que tem uma igreja, um local físico
que a represente como instituição, já que segundo a nossa crença, a natureza é
o nosso único e legitimo templo.
Também a Bruxaria/Wicca é uma religião de profunda inspiração e
orientação matricêntrica.
O Matricêntrismo é o contrário de patriarcado. Matricêntrismo relaciona-
se com uma ideologia que tem na figura do feminino o seu centro de inspiração
cultural e de se relacionar socialmente com os outros, e com o planeta inteiro.
Essa expressão também se relaciona com divindades femininas, as Deusas, que
dentro da nossa religião possuem maior proeminência. Por isso, somos uma
religião femêocentrada.
A Bruxaria Contemporânea é então uma religião neopagã que dialoga
com as questões pertinentes a atualidade, e que a partir desse diálogo crítico
com a realidade comum, resignifica o seu próprio olhar, permitindo assim o seu
florescer. Pois como veremos a Wicca de Gardner se modificou muito, embora
muito tenha se conservado, houve muitas e positivas transformações.
Esse caráter contemporâneo de Bruxaria demonstra que a nossa religião
4
WICCA, O RENASCIMENTO DA BRUXARIA:
A Religião Wicca deve seu surgimento, tal como é hoje, graças aos
esforços de Gerald B. Gardner (1884 -1664). Um inglês de descendência
escocesa, que reconstruiu a mesma a partir de fragmentos de uma suposta
Bruxaria Tradicional que remontava desde a Inquisição. Cujo conhecimento, foi
passado ao longo dos séculos por grupos (Covens) de bruxas. Contudo,
historiadores têm demonstrado que existe muita controvérsia na suposta
ancestralidade ininterrupta da Bruxaria.
Para melhor compreendermos isso é preciso retomar a trajetória que
levou a Bruxaria ao seu renascimento tal como é hoje.
E a nossa história começa no Paleolítico, cujo desenvolvimento das
primeiras culturas humanas surgiu. Esse era um tempo em que os seres
humanos possuiam um profundo relacionamento com a natureza, que era
representada pelo corpo feminino de uma Deusa.
Para eles, a divindade era feminina, pois se acreditava que assim como a
Terra as mulheres concebiam os filhos por meio de seu poder criativo. Contudo,
esse era um tempo em que os homens desconheciam o seu papel na
fecundação. Os clãs eram, portanto matrilineares. Viviam sob um coletivismo e
5
Na realidade, tudo isso foi uma propaganda difamatória de um novo
sistema religioso e social que queria se instalar. E muitas vezes para atingir seus
objetivos usavam da violência, do medo e da opressão.
Com o surgimento dos impérios houve também uma maior opressão das
divindades femininas, que agora passaram a consortes de divindades
masculinas.
Mais tarde, com a ascensão do Cristianismo no Império Romano e sua
tomada como religião oficial, iniciaram-se perseguições de tudo o que não era
relacionado à crença cristã. Haverá então nesse período uma demonização das
práticas pagãs, sobretudo aquelas relacionadas à magia popular e os ritos
agrários que outrora havia orientado as religiões mais ancestrais.
Por meio da figura de um Deus Onipotente e Onipresente, que assumia
um caráter punitivo e vingativo, politicamente pensado, a religião cristã
instaurou o medo e a perseguição a tudo o que era diferente dela.
Essa perseguição levaria na Inquisição milhares de mulheres, crianças,
homossexuais, cientistas, ciganos, doentes mentais, etc., a tortura e a fogueira, e
mais a tarde a forca. Todos acusados de heresia. A maioria das mulheres que
morreram torturadas e queimadas/enforcadas eram acusadas falsamente de
Bruxaria e pactos demoníacos. Também botânicas, curandeiras e parteiras eram
6
que se organizavam sobre uma filosofia hermética e oculta, e que possuiam
algum tipo de prática ligada à magia.
Essas ordens ou escolas começaram a unir o conhecimento esotérico
ocidental antigo com o conhecimento filosófico e espiritual oriental, como por
exemplo, a Teosofia. Mas foi pela criatividade da Golden Dawn, uma ordem de
magos burgueses europeus que o caráter prático e filosófico da magia ocidental
viria ganhar um pressuposto para a criação de muitas outras práticas.
Nesse mesmo período também, antropólogos, arqueólogos, folcloristas e
historiadores começaram a se debruçar sobre os mitos relacionados à Bruxaria
medieval.
Em seus estudos teorizavam que, as ditas bruxas, eram na verdade
praticantes de uma Antiga Fé pagã da fertilidade, no qual a Igreja com medo de
perder seus fiéis havia demonizado. E que essa Antiga Religião, possuía uma
Deusa e um Deus, o seu consorte.
Temos como principais percussores dessa tese os seguintes
pesquisadores e pesquisadoras: Sir James Frazer, Charles Godfrey Leland e
Margareth Alice Murray, que publicaram importantes trabalhos que no século
seguinte (década 50) influenciaria o pensamento de Gerald B. Gardner para
reunir os fragmentos de uma suposta Bruxaria Medieval.
7
muitos bruxos surgiram e construíram suas tradições e caminhos, inspirados nos
rituais escritos e pensados por Gardner e seus iniciados.
O que é importante compreender da história do ressurgimento da
Bruxaria, pelo nome amistoso de Wicca pelas mãos de Gardner, é que ela na
verdade é uma reconstrução inspirada nas crenças pagãs e em práticas de
magia ocidental, sobretudo a cerimonial. Mas hoje, devido aos empréstimos
judaico-cristãos da magia cerimonial, bruxas e bruxos contemporâneos tem
inspirado a sua própria reconstrução ritual nas culturas pré-agrárias, nativas e
matricêntricas espalhadas pelo globo.
Gardner morreu em 1964 enquanto fazia uma viagem de navio, deixando
um importante legado que se transformou e se resignificou na medida em que
ia passando de mão em mão.
Temos após Gardner grandes nomes, que vale a pena a pesquisa,
sobretudo para conhecer os meandros e pormenores interessantíssimos das
origens modernas de nossa crença e prática. São elas e eles: Doreen Valiente,
Patrícia Crowther, Janet e Stuart Farrar, Alex Sanders, Raven Grimassi, Raymond
Buckland, Z. Budapest, Susana Fox, Starhawk, Laurie Cabot e Claudiney Prieto.
Esse último brasileiro, vivo e atuante na divulgação da Wicca em nosso país,
cujo trabalho é reconhecido internacionalmente. Todos eles possuem uma vasta
8
7- Crença na Reencarnação
8 - Crença na Grande Teia Universal, a idéia do Todo fazendo Parte dos
Deuses.
9 - Ausência de preconceitos e aceitação da diversidade
10 - Celebração dos ciclos da Natureza, os Sabás e Esbás que se alteram
em contexto mitológico e ritualístico de acordo com cada tradição.
11- Celebrações de ritos de passagem social e pessoal, como
Handfasting (Casamento) Wiccaning (Batizado), etc.
12- Prática de magia natural, que também muda e se altera de acordo
com a visão mágicka da tradição.
13- Proibição completa de proselitismo.
9
um rico trabalho, tem colocado o nosso país como um pólo de importância, e
de respeito, para o desenvolvimento da Bruxaria, perante a comunidade
neopagã internacional. Compreender os aspectos históricos da Wicca no Brasil é
um motivo da conscientização do orgulho de sermos brasileiros e bruxos,
valorizando assim a nossa marca às futuras gerações de pagãos.
Para a produção desse ensaio, (que espero ver desenvolvido ainda mais,
seja por eu, ou por outros bruxos que se interessam sobre o tema) busquei nas
seguintes referências sua construção: a monografia de ARÁUJO, Kallyne F. P.
Wicca e a metamorfose da Bruxa. Universidade Federal do Rio Grande do
Norte Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes, Curso de História. Natal/RN,
2015 (p. 37-42) (disponível em:
https://monografias.ufrn.br/jspui/bitstream/123456789/1110/1/Monografia-
Wicca_%20Kallyne%20Ara%C3%BAjo.pdf). E o artigo de FILHO, Celso L. T. A
institucionalização da Wicca no Brasil: entrevista com a bruxa wiccaniana
Mavesper Cy Ceridwen. REVER, Ano 14, Nº 02. Jul/Dez 2014. (disponível em:
https://revistas.pucsp.br/index.php/rever/article/view/21761).
Os autores referidos para a construção desse ensaio elucidaram que, é
difícil traçarmos uma origem ou fundação da Wicca no Brasil, exatamente pelo
caráter fluído e não institucionalizado que a própria religião possui. Outra
10
demonstra que muitos futuros adeptos da Wicca e do neopaganismo da década
de 90, conheceram antes outros caminhos de magia, que eram muito comuns
na época, antes que a Wicca se consolidasse como uma comunidade e
veiculasse uma prática coesa e ressonante com a sua comunidade internacional.
A primeira publicação sobre Wicca no Brasil foi à obra de Hans Holzer,
cujo título é “A verdade sobre a Bruxaria”. Holzer foi um pesquisador de
fenômenos psíquicos que, ao longo de vários anos, travou contato com alguns
membros da Arte, como Sybil Leek, Alex Sanders, na Inglaterra e nos EUA. A
obra do autor foi lançada no exterior em 1969, tempo esse que a Wicca há
muito tinha saído das concepções dos covens Gardnerianos e ganhado outros
aspectos. E em 1977, a obra seria traduzida e publicada no Brasil pela Editora
Record. Contudo a obra foi amistosa, e não causou tanto impacto no momento
de seu lançamento.
Em 1990 dá-se o lançamento da obra que influenciaria o pensamento
emergente da Wicca no Brasil, que foi a tradução, pela Editora Campus, do livro
“O Poder da Bruxa”, de Laurie Cabot. O livro já foi lido por centenas de bruxos
brasileiros e influenciou, desde seu surgimento, o estopim para o surgimento da
Wicca por aqui. Ainda citando a tradução de obras importantes como O Deus
dos Magos (1993) do casal Janet e Stewart Farrar, Feitiçaria: A tradição
11
popular por cristais e linguagens alternativas que se esbarraram e se
misturavam entre astrologia, magia, Paulo Coelho e cristais.
Mas sem sombra de dúvidas, “A Dança Cósmica das Feiticeiras” da bruxa
norte americana, Starhawk, criadora da Tradição Reclaiming, influenciaria
definitivamente a subjetividade emergente e diânica da Bruxaria brasileira. A
obra traduzida pela Distribuidora Record de Serviços de Imprensa S.A. chegou
ao publico brasileiro em 1993.
Assim como a literatura de Paulo Coelho, mais especificamente seu livro
“Brida” (1990), outras literaturas como as obras de Marion Zimmer Bradley, As
Brumas de Avalon (1983) que, segundo (2015, p.38) se Kallyne F. P. Araújo “se
tornou uma grande febre, pela forma como Bradley apresentou o ciclo
arthuriano através de uma visão feminina, de um culto voltado à Deusa desde
os tempos remotos, que foi substituída pela Virgem Maria com o advento do
Cristianismo na Inglaterra.”
Mas vai ser por um grupo de pessoas, na cidade de São Paulo que a
Wicca irá se formatar como uma prática coesa:
Duarte (2013) nos conta que entre a década de 1980 e 1990, um grupo
de praticantes, na cidade de São Paulo formou junta a loja Além da
12
Mas a entrada do século XXI, com a sua transição de paradigmas, trouxe
também muitas banalizações, seja pela deliberada veiculação hollywoodiana de
filmes como Harry Potter, que embora trouxesse uma visão positiva de bruxo,
nada de real se tinha da Bruxaria como religião. Mas que, em contrapartida
trouxe um interesse para o assunto.
No início dos anos 2000, pela editora Escala, iniciaram-se publicações de
uma autora, Eddie Van Feu, e de sua revista intitulada de Wicca, que constou de
63 edições. Contudo, as publicações da revista, embora tivesse uma linguagem
acessível e popular, nada contribuíram para o entendimento do que era a Wicca
como religião neopagã iniciática e mistérica. Em suas revistas, a autora
procurava mesclar temas relevantes a magia, de diversas escolas de
pensamento, tudo com um caráter reducionista. O produto final dessa onda
Pink Wicca foi à fabricação de uma massa popular que faz misturas até hoje e
chamam isso tudo de Wicca.
E na busca de um cenário que fosse real para a Wicca, tivemos o
surgimento de coletivos como UWB (União Wicca do Brasil, 2004) no Rio de
Janeiro, que surgiu a partir das idéias dos sacerdotes Diogo Ribeiro, Leo Maciel
e Og Sperle. E nessa toada temos então o surgimento, do que podemos chamar
de o primeiro processo de institucionalização da Wicca, com a criação da Igreja
“(...) foi durante o 13° BBB (Brux@s Brasileir@s em Brasília) que um grupo
de bruxos debateram a criação de uma entidade religiosa registrada
conforme o código civil. O conselho de Elders18 foi formado por cinco
bruxos de tradições diferentes e assumiram a direção da IBWB (Igreja da
Bruxaria e Wicca do Brasil). Na palavra de Mavesper Cy Ceridwen em sua
entrevista a Celso Luiz Terzzeti Filho, que esta disponível no artigo A
institucionalização da Wicca no Brasil: entrevista com a bruxa wiccaniana
Mavesper Cy Ceridwen, ela afirma: Desde então, a proposta dividiu os
wiccanianos no Brasil em três grupos: os que eram a favor, contra ou os
que não ligavam para isso. A proposta da igreja é apresentada como uma
alternativa de proteção legal aos direitos dos Bruxos em relação às
garantias de liberdade de culto de sua religião. Para os críticos, é
puramente uma tentativa de centralização da Wicca nas mãos de uma
única organização. Para os defensores, uma oportunidade de terem sua
religião legitimada pelo poder público (FILHO, 2014, p.280).”
13
Na busca por espaços cada vez maiores, a Wicca precisou se
institucionalizar em parte. Por isso a primeira associação da Wicca no Brasil foi a
ABRAWICCA (1998) através de Wagner Perico e Denise de Santi, ao participarem
de um encontro público de praticantes da Arte no Brasil, onde nesse encontro
se teve a iniciativa de fazer uma associação para os praticantes, que resultou na
ABRAWICCA, e teve como seu primeiro presidente Claudiney Prieto, que deixou
a presidência da associação em 2003, sendo substituído por Mavesper Cy
Ceridwen (Márcia Bianchi) que já era assistente jurídica da associação (FILHO,
2014). Mas, nas palavras de Kallyne F. P. Araújo (2015, p. 42):
Embora Mavesper por muito tempo tenha mantido a palavra que não era
necessário que a ABRAWICCA se tornasse uma igreja, até porque todas
eram tratadas como associações de um modo geral, com as mudanças da
lei, ela também precisou se adaptar a essas mudanças e mudar a sua
posição. Essa idéia causou um choque no neopaganismo, mas para ela o
que tornava importante tomar essa decisão, eram as vantagens da
institucionalização serem bem maiores. Esse choque ele ocorre, porque o
paganismo é livre, não há autoridades centrais, ou um livro principal,
afirma Mavesper (2014) durante a entrevista. Ao que diz as vantagens no
14
Através de todos esses caminhos, trazido a luz até esse momento, a
Wicca no Brasil, tem florescido. A apropriação crítica que fazemos da sua
história nacional nos permite compreender a subjetividade presente no discurso
ideológico e na prática da Bruxaria, como instância religiosa. Bem como os
paradigmas de sua prática. Hoje vislumbramos conquistas. E a mais recente
delas foi, graças aos esforços de Claudiney Prieto (sacerdote da Wicca, e um dos
maiores propagadores da religião no Brasil) em parceria com a deputada Clélia
Gomes, a da instituição do "Dia Estadual dos Wiccanianos, Cultuadores do
Sagrado Feminino, Pagãos e Praticantes das Artes Mágicas” 1 em 13 de
Setembro de 2016. Sendo que, esse ano (2017) em 30 de Outubro, os bruxos
celebraram o primeiro ano de conquista da lei, com direito a honraria ao mérito
pagão, onde diversos membros da comunidade da Arte, muitos desses citados
ao longo desse ensaio, foram homenageados. Agora o projeto de lei busca
consolidar-se em outros estados, um deles o Rio de Janeiro.
Essa é a nossa história, que ainda esta para ser escrita. Uma história cujo
nascimento foi há pouco tempo, mas que já vêm dados frutos preciosos ao
mundo. Também uma história atravessada por muitas problemáticas, onde se
desemboca hoje na terrível banalização que a Wicca tem sofrido no território
nacional. Talvez essa banalização seja oriunda de uma falta de interesse em
Deixo abaixo uma lista de sites da web que considero importantes para a
compreensão da Wicca como comunidade e como essa se relaciona com os
seus membros, bem como promove suas intervenções:
http://www.nemorensis.com.br/
http://www.wiccagardneriana.com.br/pages/brasil.html
http://www.amapagao.com/abrawicca
http://www.encontroregionaldebruxos.com.br/
http://www.worldgoddessday.com/brasil/
http://uniaowiccadobrasil.org.br/
http://www.tradicaodianicadobrasil.com.br/
1
Veja o projeto de lei completo: https://www.al.sp.gov.br/repositorio/legislacao/lei/2016/lei-16309-
13.09.2016.html
15
A ÉTICA DAS BRUXAS:
Compreendendo tudo isso fica mais fácil adentrarmos a ética e valores próprios da
Bruxaria.
A Bruxaria é uma religião inteligente e de sujeitos autoconscientes (pelo menos é o
que se espera!), por isso, os princípios éticos como: “Faça o que desejar se há ninguém
17
prejudicar”, “Não proselitismo”, “Respeito Absoluto a Vida” e “Valorização da Diversidade”
não são uma espécie de mandamento da Deusa. Na verdade, muitos desses valores éticos
correspondem a uma forma contemporânea de uma conduta neopagã que dialoga com
questões pertinentes da atualidade. Isso demonstra que a Religião Wicca não é um caminho
fossilizado, como o fundamentalismo vigente. Somos uma religião de transformação em si
mesma, uma religião VIVA. Pois, se antes bastasse à aceitação a Rede Wicca e a Lei Tríplice,
hoje os wiccanianos são chamados para ter uma atitude ecológica, feminista, sustentável e
que pensa e valoriza as lutas sociais de classe, raça, liberdade religiosa e valorização da
diversidade. Por isso, ficou comum, mais proeminente a partir da década de 80, bruxas e
bruxos assumir para si uma postura sacerdotal que vai além da honra aos Deuses no Círculo
das Tradições. E sim ir às ruas protestarem, engajar-se em grupos de resistência, pedir
assinaturas para causas ambientais, etc. Com isso, estabeleceu-se que um bruxo ético, é
aquele que minimamente consiga ir além do aperfeiçoamento pessoal, mas um
aperfeiçoamento e desenvolvimento coletivo também.
Isso estabelece que, bruxos sejam indivíduos inteiramente frutos do contemporâneo,
que procura usar o passado pré-cristão como fonte de inspiração e não de reprodução
alienada. Que bruxos estão atentos aos telejornais, aos diálogos de sua família, de amigos,
colegas de trabalho, e que não se calaram perante as injustiças e desigualdades, podem até
não se manifestar diretamente, mas com certeza agirão!
18
RESPEITANDO OS PARADIGMAS DA RELIGIÃO:
A vida contemporânea espelhada nas redes sociais parece apontar um caminho cada
vez mais caótico no cenário brasileiro da Bruxaria Contemporânea/Wicca. Deixando assim
escapar uma impressão, errônea, de que a nossa religião é um território de ninguém. Tal
impressão tem fomentado muitas discussões nas redes e tem dividido há muito o
movimento neopagão no Brasil. Mas a verdade é que há mais pessoas pegando o que lhe
convém do que assumindo um comprometimento coerente na Wicca. Mas isso não quer
dizer que a BRUXARIA É TERRITÓRIO DE NINGUÉM!
Dizer que a Wicca não é território de ninguém não implica que a Bruxaria aposta em
uma “liderança” que guiará as bruxas de hoje para uma jornada profética. Nem muito
menos representam que as bruxas precisem fazer um concílio dos mais renomados nomes
da Arte para decidirem quais serão os eixos que nortearão a prática religiosa daqui para
frente. Mas implica sim, que a Bruxaria Contemporânea/Wicca tem suas bases fundamentais
que a caracterizam em um cenário global onde seus membros se reconhecem em uma
comunidade que, é criativa e viva em si e para si mesma. Por isso o respeito crítico aos seus
pressupostos, já dados, é primordial.
Partindo disso, a Wicca não é uma religião a ser completada por outras crenças, ela já
possuí as suas, e cabe ao comprometimento de quem por ela se envereda abrir mão de
19
Contudo, a confusão mais terrível que tem sido usada para banalizar os seus
conteúdos e até mesmo comercializá-los, é acreditar que a liberdade prática que na Wicca
Eclética se vivencia representa um caldeirão de sincretismos. Entenda, a liberdade prática de
nossas crenças relacionam-se a ela e para ela mesma, e não o acréscimo de outras religiões
e espiritualidades. A reflexão que se deve tirar disso, é que: quando adentramos a Bruxaria
por escolha pessoal trazemos juntos nossos empréstimos religiosos, e que aos poucos
vamos percebendo que não dialogam com os paradigmas da Arte. Porém, o trilhar da
Wicca promove uma transformação de paradigma. Cabe a você a consciência e
responsabilidade de querer usar nossas lentes para enxergar o mundo ou não. Caso, não.
Saía para explorar. A Bruxaria não ata ninguém aos seus domínios e nem tem como
princípio o proselitismo. E se a questão de sua procura é a magia, é preciso então rever o
que você quer. A magia possui diversos sistemas e filosofias. Magia não é religião.
Bruxaria e Wicca são sinônimas, de uma mesma religião, que tem na natureza
manifesta sua inspiração e sabedoria. Com isso, podemos estabelecer um limiar. Há pessoas
que se denominam como bruxas e que praticam uma verdadeira salada de sistemas e
crenças. Isso implica que a Wicca não irá fiscalizar quem é legitimamente bruxa, como em
uma espécie de uma inquisição interna. Não. Mas se autodenominar bruxa e se apropriar
dos nossos rituais e simbolismos sem ao menos reconhecer sua fonte é no mínimo,
inescrupuloso, e combatido por nós que colocam a cara para bater e dizer: Sim, somos
20
É comum também que muitos não compreendem todos esses pressupostos
apresentados até agora. Muitos insistem em pegar o que lhes interessa da
Wicca e misturar com outras práticas bem incoerentes. E depois ainda saem dizendo
que a mesma é muito simplista, que é somente uma filosofia. Também saem forjando para
si títulos espirituais afirmando que a sua Bruxaria é a Tradicional. E ainda ficam irritados
quando questionados por pessoas, com o mínimo de coerência dentro da Bruxaria,
apontam o erro de seus paradigmas.
Toma tudo o que é nosso: celebrações, instrumentos, nomes e rituais. Mas na hora
de assumir a Arte não querem! Falar isso parece que bruxas e bruxos sérios são
fundamentalistas pagãos que estão querendo resgatar um tipo de ortodoxia wiccana. Ou
que somos arrogantes e detentores de um saber. Mas não é isso que estamos querendo
dizer.
O que precisa ser dito é: todas as religiões têm sua legitimidade preservada, e por
que a Bruxaria não pode ter? É preciso que se respeite a Bruxaria tal como é. Ou pega tudo
ou não pega. A Wicca não é uma religião alienada, ela reconhece que há outras religiões
além de si. Mas isso não quer dizer que ela afirma ou não a existência dessas como
verdades para si. Simplesmente não é da nossa ossada e ponto. Por exemplo, não há
demônios na Bruxaria, mas Evangélicos acreditam em demônios. Exato! Os Evangélicos
acreditam, nós não. Isso quer dizer que demônios não existam? Para nós não. Mas para os
21
CRENÇAS E PRÁTICAS DA WICCA:
A DEUSA E O DEUS.
22
A Deusa se relaciona então a força criativa e primitiva de toda a criação e o Deus é o
seu amante, consorte e filho que, ajudou-a na ordenação cósmica das coisas. Basicamente,
essa é a dinâmica divina que a Bruxaria encarna. Mas a Deusa e o Deus têm para as bruxas
contemporâneas os aspectos que circundam toda a sua Arte e inspira seus ritos sazonais e
lunares.
Para nós bruxas, a Deusa e o Deus funcionam como planos reais da existência, como
forças divinas que ajudam a humanidade e a natureza em seu desenvolvimento, bem como
energias que mantém as coisas como são. Mas nem por isso são forças distantes de nós,
estão presentes na Terra e no Céu, e em nós mesmos. E por estabelecerem uma profunda
conexão com todas as coisas da natureza manifesta, é na mesma que podemos encontrar
os seus significados que têm em nossos mitos, símbolos e rituais seus atributos encarnados.
E por essa aproximação com o todo, entendemos que os Deuses são um relacionamento
que estabelecemos, podendo ser acessados e ouvidos por meio de nossas práticas
meditativas e rituais. Também a Deusa e o Deus das Bruxas Contemporâneas/Wicca
possuem um atributo que é mágicko. Isso é. Eles emprestam a sua força para nos auxiliar
por meio da magia.
A Deusa é o princípio feminino manifesto e transcendente no universo. Ela é,
portanto para nós a Mãe do Todo. De seu corpo cósmico e de seu ventre, é que todas as
coisas surgem e para onde todas as coisas retornam. Ela é a própria esfera terrestre e o
23
ano. Sua função passou a ser como, a energia que fecunda a Terra (Ventre Feminino) da
Deusa.
Compreender o desenvolvimento da cultura humana e suas respectivas mitologias,
desde o paleolítico até os dias de hoje, é um caminho de elucidação para entender quem é
a Deusa e o Deus, e quais sãos suas fontes de inspiração para uma interpretação prático-
relacional contemporânea com eles dentro de uma ótica neopagã na Wicca.
FEITIÇARIA:
Antes de tudo é preciso situar o que a palavra Feitiço quer dizer. Feitiço vem do
Latim facticius e quer dizer: artificial, não-natural. Mais tarde a palavra passou a representar
um objeto ou intenção sobrenatural provocada por um agente: o feiticeiro. Mas a idéia de
um feitiço como algo artificial pode nos dizer muito pouco sobre a natureza da intenção
implícita na feitiçaria na Bruxaria. Por tanto, um feitiço é uma intenção criada (artificial) por
um agente (a bruxa ou feiticeiro/a) para provocar uma ação no mundo objetivo ou
subjetivo. Desse modo, um feitiço é uma atitude simbólica, que funciona como uma lente,
uma intenção ritual que pretende provocar uma mudança. E a mecânica por de trás de um
feitiço é a própria Magia. Segundo Dion Fortune (1890 – 1946) a magia é a Arte de provocar
24
substrato filosófico e religioso que a embase. Ela é simplesmente um conhecimento
reduzido de símbolos e rituais que visam atingir diversos objetivos por meio dos feitiços
que, foram passadas por uma tradição oral e sobrevivem em folclores e costumes
populares. Por essas razões, feiticeiras não são bruxas, mas bruxas são feiticeiras também!
Ressalvo que, existem certas práticas xamânicas que utilizam o termo Feitiçaria e
Feiticeiros/as para se denominarem, e por isso possui outro sentido, para mais leia as obras
de Carlos Castaneda.
Então, a feitiçaria resgatada pela Wicca é uma inspiração do paganismo e que foi
influenciada pelas práticas mágickas dos Grimórios de Alta Magia e Magia Cerimonial, mas
devido ao berço judaico-cristão dessas práticas muitas bruxas procuram resgatar métodos
mais ancestrais e xamanísticas que possuem uma profunda orientação matricêntrica e pagã
em seus simbolismos.
Mas qual é o caráter da feitiçaria dentro da Bruxaria?
Feitiçaria dentro da Bruxaria tem dois atributos:
1- permitir que a bruxa atinja por meio da mecânica da magia um objetivo;
2- feitiços, é outra forma de promover o autoconhecimento.
O primeiro atributo coloca que a bruxa é co-criadora de sua realidade, não é passiva
no mundo objetivo e subjetivo, ela é provocadora de suas mudanças apoiando a sua
atitude por meio da ética “faça o que desejar se ninguém prejudicar”. O segundo atributo
25
latina que encarna esse atributo. Logo, uma rosa é um símbolo de Vênus e por isso do
amor! E foi nessa lógica que os povos antigos construíram seus ritos propiciatórios de
fertilidade da terra, de proteção, etc. E é nos povos Caldeus e Persas, que vamos ter a
grande relação analógica do acima e do abaixo presente no axioma hermético mencionado.
Foram estabelecidos atributos divinos aos sete planetas denominamos hoje de: Sol, Lua,
Marte, Mercúrio, Júpiter, Vênus e Saturno. Esses vistos a olho nu (nessa lógica o Sol e a Lua
são considerados planetas).
Os sacerdotes, desse antigo sistema religioso, acreditavam que esses corpos celestes
representavam suas divindades, e cada uma possuía um nome específico e um atributo. Elas
emprestavam e patrocinavam suas qualidades a elementos da natureza, animais, metais e
vegetais. Por essa razão, quando um mago-sacerdote queria pedir um auxílio aos seus
Deuses bastava que esse fizesse uso de elementos atribuídos a essas divindades em seus
rituais. Essa é a mesma intenção ritual, atual, dentro da Bruxaria!
Essa lógica dos magos-sacerdotes persas também inaugurou a Astrologia, pois a
aparição de certas estrelas e constelações permitia previsões de acontecimentos futuros
que influenciariam o plantio e a colheita, bem como a ordem social organizada pelos reis-
sacerdotes.
Com o passar do tempo, e a decadência desse sistema para os sistemas mais
monoteístas, essa lógica de congruência ficou restrita ao território dos ditos magos e
26
escolas de renascimento da Magia Ocidental (Golden Dawn, Rosa Cruz, Teosofia, etc.)
dando-nos todo o arsenal simbólico que hoje orientam Bruxas e Magistas em suas práticas
contemporâneas.
Por essa razão, é importante a bruxa iniciante conhecer essas relações simbólicas a
partir desses pressupostos, e a bruxa experiente expandirem-los, para que uma feitiçaria
real e positiva possa ser executada. E mais, permitindo que cada um construa os seus
próprios feitiços que, funcionaram como chaves que despertam o nosso poder pessoal.
Temos, por essa razão, tabelas de correspondências que podem lhe ajudar nesse sentido.
Há diferentes tipos de tabelas em diferentes grimórios ou Livro das
Sombras. Também há em cada Tradição da Arte um tipo de correspondência simbólica
diferente. Na verdade, as tabelas apenas expressam símbolos que se relacionam a um
conceito.
Mas não basta conhecer os símbolos (chaves) é preciso saber usá-los. Por esse
motivo um feitiço jamais será uma receita de bolo, onde se coloca ingredientes e se tem um
resultado. O feitiço é um veículo pelo qual a nossa intenção (energia) pode ser canalizada e
lançada no campo da ação. Então, antes que você saia por ai fazendo feitiços entenda os
símbolos, e mais, aprenda a trabalhar com técnicas de concentração, visualização e envio e
recebimento de energias. Através dessas técnicas é possível a manipulação das energias
presentes na natureza. Na Bruxaria, as divindades também emprestam seus atributos para
27
Os primeiros registros de práticas mágickas são observados nos primeiros cultos aos
mortos, datando por tanto desde o Neolítico. Nesse período, o ser humano criou suas
ancestrais tecnologias para facilitar a sua sobrevivência, e a Magia foi uma delas. Através de
um princípio analógico e simpático, as primeiras feiticeiras e líderes espirituais dos clãs
matricêntricos auxiliavam na caça e na coleta, no plantio e na fertilidade da Terra por meio
de rituais. A Magia também era uma ferramenta subjetiva eficaz para aplacar a angústia
humana frente aos processos existenciais.
O declínio das culturas matrilineares fez com que pouco a pouco a Magia ganhasse
outro território, o do Sacerdócio, que passou progressivamente a ser veiculado pela figura
do homem em detrimento da mulher. A inserção da escrita e quem detinham o seu acesso
também delimitaria as novas configurações da Magia. À medida que as culturas se
desenvolveram, em grandes sociedades e impérios, organizados pelo eixo dos reis-
sacerdotes, as práticas mágickas, que outrora era de domínio feminino e de toda uma
coletividade, foi sendo elitizada.
A elitização da Magia cria então uma propaganda ideológica de difamação. A
difamação tinha uma intenção clara: não perder o poder conquistado pelo medo sobre as
culturas ditas “primitivas”, as matricêntricas. Com isso, a Magia assumiu suas primeiras
características morais. A Magia sobrevivente dos povos mais ancestrais, praticada pelos não
letrados, é aquela que vai sendo conhecida como baixa, negativa, selvagem, e por isso foi
28
Quando temos então a inserção da lógica satânica, o Cristianismo pode separar a
Magia ainda mais, através da dialética opressiva da Alta Magia versus a Baixa Magia.
A Alta Magia era a magia superior, do sacerdote e homem letrado, burguês e nobre.
A Baixa Magia era a magia camponesa, folclórica, remanescente dos cultos pré-agrários e
pré-cristãos. Portanto, a magia também estava dividida por classes sociais, ou melhor,
refletia as classes sociais bem como a lógica patriarcal, já que a dita Alta Magia tinha (e
ainda tem, já que muitos se identificam com esses conceitos) profundas raízes abrâamicas.
Esse conceito, que foi absorvido nas escolas esotéricas do séc. XIX (Golden Dawn,
Rosa Cruz, etc.), é que moldou o pensamento mágicko ocidental até os dias de hoje. Depois
a idéia mudou para a cor, mas conservando seus preconceitos, por isso até hoje quando
falamos em magia negra, estamos na verdade deturpando práticas ancestrais que pelo
estigma social assumiu um ar degradante, eurocêntrico e etnocêntrico. Até hoje muitos
associam práticas mágickas do Candomblé, por exemplo, com Magia Negra.
Por isso devemos desconstruir esse conceito. E a Magia na Bruxaria Contemporânea
vem favorecer isso, e trazer outro conceito que trabalha na lógica da intenção mágicka. Mas
é preciso salientar que por muito tempo a Bruxaria/Wicca foi embebida da substância da
Alta Magia através de seus percussores, como Gerald B. Gardner e outros. Ressalvo que isso
foi um momento histórico que teve sua importância, porém hoje a Bruxaria procura nas
práticas ancestrais matrilineares suas inspirações mágicko-rituais que, estão bem distantes
29
mas também se construiu todo o aparato tecnológico que salva vidas e as transforma. A
Magia é intenção, é ciência, e se quiser praticá-la com sinceridade abandone suas roupas
sociais e seus empréstimos morais, conheça-se!
OS INSTRUMENTOS DE PODER:
A Wicca é uma religião, cujas crenças e práticas pretendem levar seus seguidores a
um contato íntimo com o divino imanente na natureza manifesta, a Deusa ou os Deuses
Antigos.
Esse contato e relacionamento promovem o autoconhecimento em seus praticantes,
bem como o desenvolvimento de suas habilidades psíquicas.
Por essa razão, rituais de um profundo simbolismo, que são baseados na mudança
das estações e das fases da Lua, os elementos da natureza, etc., se utilizam de instrumentos
operacionais que facilitam à dinâmica subjetiva presente em nossos rituais.
30
roupas pretas, nos cristais e amuletos, nas velas, nisso e naquilo. Quando na verdade nada
disso torna ninguém legitimamente uma bruxa. Essa realidade também se faz, pois pouco
se compreendem da própria crença, prática e simbolismos existentes dentro de nossas
ferramentas e seu real papel em nossa vida espiritual.
Antes de tudo, os instrumentos da Bruxaria são veículos de acesso que, quando
utilizados da maneira correta, tornam-se facilitadores do transe, da visualização ativa e da
canalização de energias presentes na própria habilidade psíquica da bruxa (o) em operar
com as forças a sua volta. O que nos faz refletir que o grande instrumento da bruxa é ela
mesma. Outro papel dos instrumentos da Arte é representar as forças que a bruxa convoca
em seus rituais, bem como as forças que ela se devota.
Então podemos compreender que os Instrumentos da Bruxaria
Contemporânea/Wicca assumem dois papéis: um mágicko operacional que auxilia a Bruxa
ou Bruxo em seu trabalho ritual; e um devocional que auxilia a Bruxa ou Bruxo a honra e
serviço aos seus Deuses Tutelares.
Os Instrumentos mais comuns à Bruxaria, que são quase que cem por cento
presentes na maioria das Tradições/Covens ou caminho Solitário/Eclético são: Altar,
Athame, Bastão, Cálice, Caldeirão, Pantáculo e Vassoura. Além desses, alguns utensílios
compõe nossos rituais como: água, incenso e incensário, óleos, sal e velas e castiçais.
Altar: o Altar na prática e religião das bruxas tem um duplo significado; um que
31
ao Oeste do Altar. É o instrumento de ligação do Sagrado Feminino, e por isso representa a
Deusa e a Lua.
Caldeirão: geralmente é de ferro e com três pés que simbolizam as três faces da
Deusa: Donzela, Mãe e Anciã. Fica ao centro do Altar, pois representa o Espírito e o Útero
Cósmico da Grande Mãe. Simboliza a transformação das energias, o renascimento.
Geralmente ateia-se fogo dentro dele para certos rituais.
Pantáculo: é um disco plano de madeira do tamanho de um prato com símbolos
desenhados que representam uma determinada tradição ou intenção. Ele é usado para selar
energias e materializá-las, também é usado como proteção. É relacionável a Terra, e fica ao
Norte do Altar. Representa a Deusa em seu aspecto telúrico.
Vassoura (Besson): feita pela própria bruxa, é uma vassoura mágicka que funciona
como um instrumento de fertilidade, proteção e banimento das energias contrárias as
intenções do ritual. Varre-se o ar com ela, o espaço ritual, com a intenção de limpar as
energias. Representa a união do Sagrado Masculino (cabo) com o Sagrado Feminino
(cerdas).
Todos esses instrumentos descritos acima precisam passar por um ritual de
consagração, antes do uso. A intenção desse ritual, é não só purificar a ferramenta de
quaisquer energias contrárias à Arte, como também devotá-los de forma sagrada a prática,
para que assim eles se tornem veículos de canalização de seu poder pessoal e
32
A essência dos instrumentos reside na mensagem de que, a Natureza é o nosso Altar
e Templo, e nós somos o veículo da manifestação de sua Totalidade.
33
Os elementos possuem tanto um aspecto físico, invisível e interior. Conhecê-los é
fundamental. Cada tradição carrega em si uma direção para os elementos e às vezes
assumem outras características e importâncias.
Tradicionalmente os elementos são relacionáveis a pontos cardeais dentro do círculo
da seguinte maneira: Terra/Norte, Ar/Leste, Fogo/Sul e Água/Oeste.
O Norte é um ponto tradicional de abertura e convocação do círculo em muitas
tradições, sobretudo àqueles de inspiração Diânica. Ele representa a Terra e por isso a
Deusa.
O Leste esta relacionado com o elemento Ar representando o amanhecer, a Luz, a
clareza e coisas relacionadas com esse elemento. Sobretudo em tradições, cuja inspiração,
está na Magia Cerimonial.
Sul é o Fogo, é o calor, e também o espírito e a transformação.
O Oeste é o entardecer, a morte, onde a barca dourada do Sol se põe ao fim do dia
em busca do eterno renascimento.
A estrutura do círculo Wicca segue um padrão ritualístico semelhante em todas as
Tradições. Mas às vezes essa estrutura pode sofrer pequenas alterações. A ritualística do
Círculo Mágicko, bem como os outros rituais criados, e sua respectiva liturgia, por Gerald B.
Gardner, funcionam como um verdadeiro template que dentro de uma visão Eclética da
Wicca, são verdadeiras chaves meditativas que despertam a consciência para os planos
Preparação; é toda a parte que se usa para preparar a si, os objetos, ambiente para o
fim ritualístico específico, sendo que cada componente é usado e colocado sobre o altar, as
ferramentas da Arte são sempre usadas independentes de quaisquer simbolismos rituais.
Limpeza: Limpeza de energias não compatíveis, seja no local, seja das pessoas que
farão o ritual. É o marco do ingresso em um momento e espaço sagrados.
Centramento: Conexão com as energias telúricas que deve estar presentes em todos
os rituais, conexão com a Deusa em seu aspecto de Mãe Terra.
Estrutura;
Traçado do Círculo Mágico e Invocação dos Deuses: Criação do espaço sagrado,
onde as energias deveram ser chamadas, energias essas: os Quadrantes como Vigias e
Testemunhas do Rito, sendo eles os quatro elementos da natureza Terra, Ar, Fogo e Água.
Depois invocação da Deusa e o Deus de acordo com aspecto do Rito.
34
Harmonização: Harmonizar-se com a energia chamada no círculo, afim de que se
possa começar o trabalho ritual.
Conexão com a energia dos Deuses: Feita de diversas formas: meditação,
dramatização, dança, visualização criativa; neste momento o ritual acontece em si.
Feitiçaria: Este é um ato opcional em rito, sendo que o círculo poderá ser aberto para
este propósito ou não, mas o feitiço deve vir de acordo com o propósito do ritual.
Cone de Poder: É o momento de liberação da energia evocada, afim de que se
cumpra seu objetivo ou comunique-se com as outras realidades. É o ápice e declínio do
ritual.
Grande Rito: É a celebração da União do Divino Feminino e do Divino Masculino, pela
junção simbólica do Cálice (vagina) e do Athame (pênis), que evocam o ato criador, origem
da vida. É a consumação da energia elevada em ritual.
Celebração: Momento de compartilhamento de comida e bebida, onde oferendas de
alimentos podem ser direcionadas a Deusa e ao Deus.
Fechamento do círculo e encerramento do Ritual, aterramento da energia.
OS ANCESTRAIS:
35
Ancestrais do Espírito são aqueles antepassados que passaram em nossas vidas
cuja ligação não tem haver com o sangue propriamente dito, mas há uma irmandade de
almas.
Ancestrais da Terra são aqueles longínquos, presentes em algum passado remoto,
que estão presentes na Terra, no sentido literal da palavra, em que vivemos.
Cada um desses ancestrais tem a capacidade de nos tocar e fazer-nos tocar facetas
desconhecidas de nós mesmos. Podem ser portadores de lembranças amargas ou doces, e
ainda aqueles que revelam algum dom herdado e na qual sem motivo aparente sentimos
uma afinidade.
Na Wicca trabalha-se os ancestrais através de rituais meditativos. Também o uso de
oráculos é feito para contatá-los. Cria-se um espaço para esse tipo de contato através de
um altar dedicado para eles. Lá é feito meditações, orações e oferendas de alimentos.
RITOS DE PASSAGEM:
36
Todos esses rituais de passagem se estabelecem dentro da ritualística do Círculo
Mágicko. Também possuem uma forte relação analógica com as fases da Lua e a estação do
ano. E o melhor lugar para celebrá-los é na natureza, o nosso legitimo templo.
Basicamente os Ritos de Passagem na Wicca falam de acesso iniciático e mistérico:
Iniciações Femininas, Iniciações Masculinas e Iniciações Humanas.
Os ritos de passagem presentes na Bruxaria Contemporânea/Wicca são:
Blessingway: esse é uma cerimônia ritual de celebração do nascimento de uma
criança, que acontece desde o momento que o casal ou a mãe descobre estar gestando até
o dia do nascimento. Um altar é criado para meditações de ligação entre os pais e o futuro
bebê.
Wiccaning: é um ritual cerimonial de unção (semelhante ao batizado) do recém-
nascido. Nessa cerimônia bênçãos e proteções são conferidas ao recém nascido por meio
de seus pais bruxos e pagãos.
Menarca: esse é o rito de transição do Sagrado Feminino manifestado no útero das
mulheres. Por essa razão esse ritual de passagem é realizado somente por mulheres, e para
mulheres. Essa ritual marca a transição da menina para a fase de amadurecimento vindo
com a primeira menstruação. É um rito coletivo, onde as mulheres maduras passam
segredos e ensinam as mais novas a honrarem seu sangue e seu Sagrado Feminino. Rituais
menstruais são feitos mensalmente pelas mulheres da Arte, onde um altar específico é
37
OS SABÁS:
38
Quatro Celebrações Sazonais: Equinócio de Primavera (Ostara), Solstício de Verão
(Litha) que marcam a parte ascendente do ano, Equinócio de Outono (Mabom) e Solstício
Inverno (Yule) que marcam a parte descendente do ano.
Mais Quatro celebrações entremeadas entre os equinócios e solstícios que marcam o
momento de apogeu e declínio de cada estação e suas respectivas forças, como: Beltane
(Apogeu/Declínio da Primavera), Lammas (Apogeu/Declínio do Verão), Samhain
(Apogeu/Declínio do Outono) e Imbolc (Apogeu/Declínio do Inverno).
OS ESBÁS:
A Lua no céu, seja em qualquer fase, representa diretamente a idéia da Deusa. Desde
os primórdios da humanidade, este satélite, fez com que seres humanos de todos os
lugares criassem mitos e ritos em torno dela.
Para muitos povos antigos e pagãos, a Lua era muito mais feminina que masculina,
pois as plantações, marés, rios, fluxos menstruais e reprodução de animais estavam ligados
diretamente aos fluxos lunares.
A Lua era mais importante nos tempos antigos do que ela é hoje, já que os povos
orientavam-se diretamente com sua luz e seu ciclo no céu. Hoje é muito raro encontrar
39
buscadas. Mas é mais comum celebrar a Lua Cheia que, encarna em si mesma, a Totalidade
da Deusa. As correntes astrais formadas nessa fase são importantes elos de poder e magia
para a alma dos bruxos, e seu desenvolvimento psíquico, pois carregam pontes entre as
forças internas com as forças externo-internas da Deusa.
Em muitos ritos de Esbás existe uma cerimônia chamada: Atrair a Lua. Esta é uma
face importante no contexto do rito lunar, pois é nesse momento, que através de
invocações o bruxo se conecta profundamente com a energia da Deusa que é invocada
através da Lua, unindo-se desta forma a seus poderes e aprendendo os seus mistérios
internos.
Nos Covens, esta cerimônia é feita por uma Alta-Sacerdotisa que canaliza os poderes
da Deusa através da ajuda do Alto Sacerdote. Esse momento de canalização, quando a
Lua/Deusa invade o corpo da Alta Sacerdotisa permite que essa, através de um rito oracular,
revele alguns mistérios.
Nessas cerimônias tão antigas da Lua, é que surgiram lendas fantásticas na Inquisição
ao nosso respeito, em que uma assembléia de bruxas se reunia nuas em uma clareira no
bosque à luz do luar, e ouviam de uma Bruxa Rainha (a Alta-Sacerdotisa) os mistérios da
magia; que na verdade nada mais eram que a voz da Deusa manifestada internamente
dentro de cada um de nós, que por meio da canalização ocorria uma ligação sagrada e
mágicka.
40
INICIAÇÃO E TRADIÇÃO:
41
Hoje existem mais bruxas e bruxos solitários querendo entrar em Covens do que
Covens sérios que possam abarcá-los de maneira inclusiva, por essa razão membros de
Tradições ou não, tem incentivado a prática coesa e solitária da Bruxaria
Contemporânea/Wicca, seja através de uma vasta literatura, seja através de programas de
treinamento e cursos de orientação prático-teórico.
O Caminho Solitário, como uma alternativa para se trilhar a Wicca, possuí sim uma
legitimidade, que pode não possuir a formalidade de uma tradição, mas que busca
inspiração no que há de mais acessível nelas para a sua construção. Por isso, é comum que
a jornada solitária seja eclética por natureza. Por essa razão precisamos definir esse
ecletismo.
Eclético, como adjetivo, quer dizer aquilo que selecionamos por parecer melhor
diante do que esta disponível e acessível para nós, em doutrinas, métodos ou estilos.
Também, tem a ver com a composição de diversos elementos colhidos em diferentes
fontes.
Portanto, eclético como caminho solitário da Wicca, quer dizer que o buscador do
mesmo seleciona práticas e teorias da Bruxaria, e não de outras religiões, para compor sua
jornada. Mas seleciona dentro do critério que atenda a sua realidade. Assim sendo, recolhe
informações de diversas tradições que depositaram e transferiram o seu saber dentro de
literaturas, palestras, workshops, rituais coletivos e públicos, troca com pessoas mais
42
Logo há uma formatação por onde o dedicado e/ou Iniciado terá que
percorrer. Mas mesmo que o caminho pareça dado, isso não representa uma
facilidade e nem muito menos um caminho cortado. É só um caminho
mapeado, e que por essa razão merece nossa atenção e respeito.
Porém, a prática Solitária e Eclética, tem uma natureza caótica em si.
Caótica, pois há um desejo muito sincero no indivíduo que trava sua jornada,
mas há pouco respaldo prático e teórico que atendam aos seus anseios. Esse
abismo cria uma tensão, pois demora em ser preenchido com conteúdos que
sejam realmente coerentes. Por isso, um solitário precisa antes de tudo ter uma
construção de conteúdos essenciais e mínimos (não menores) que sustentaram
um ponto de partida.
O caminho solitário da Arte não é algo revelado, e sim algo a ser
revelado constantemente pelo buscador. O próprio trilhar, constante e
sistemático, é o descortinar dos mistérios para a abertura de outros. E essa
sensação promove, em muitos que o percorrem, de que estão perdidos. E estão
mesmo! Mas, esse estar perdido não é de todo, ruim, quando você aprende a
entregar-se a própria vivência com calma e alma.
É preciso compreender que trilhar a Wicca não é uma corrida ao poder. É
uma vivencia de autoconhecimento e transformação de paradigmas. Sendo que,
43
pela frente. São vorazes. Comem tudo. Como se ao comer estivessem já
vivenciando a Arte.
Mas percebem que há muito pela frente, que os livros não revelam
muitas coisas além das entrelinhas e que por isso precisam partir rumo a uma
consistência prática. Recolhem-se resignados em seus casulos de auto-
treinamentos, meditações, vivencias rituais, procurando experienciar tudo de
maneira idiossincrática. E recolhidos começam a ouvir os Antigos, a Deusa e o
Deus a sussurrar em vossos corações, já que agora podem realmente ouvir os
mistérios que sempre estiveram latentes, mas que aguardavam um legítimo
desabrochar.
E lá no casulo permanecem fechados, reclusos, provocando em si,
reflexões profundas. Vivenciando sem preocupação a Arte. Sem terem que
provar a alguém que estão ou são algo. Vivem. E um dia, quando se sentirem
prontos procuram sofrer por si mesmos uma auto-iniciação que promove a
saída do casulo preparando-se para o vôo para novos horizontes, que poderá
ser na via solitária ou em alguma Tradição. Mas agora podem realmente
entender, debater, questionar e ouvir, pois carregam dentro de si, uma chama
que já os despertou para a sabedoria. Cabendo então mais entrega ou não. É
sempre uma escolha...
44
sensação de uma pseudo experiência ritual, quando na verdade não passará de
uma mera exposição de conteúdos do seu próprio ego. E de forma triste, você
acreditará nessas pseudo-sensações, colocando-as como legítimas, e as
chamará de Deuses, espíritos, vozes, etc., quando na verdade fazem parte de
um conteúdo subjetivo extremamente caótico.
Por essa razão, o trabalho na Bruxaria exige de nós uma verdadeira
sinceridade e reflexão que é constante. Por isso desde já se aproprie do hábito
de escrever. Crie um diário. Esses registros, escritos a mão, proporcionam um
concatenar da mente com a experiência vivida em ritual ou fora dele. Com esses
registros você alcança mais profundidade, e começa a nomear experiências
subjetivas para posteriormente começar a nomear as que são extra-subjetivas, e
que afloram na experiência não verbal de um ritual efetivo de Bruxaria.
Somente após essa apropriação mínima das técnicas rituais, é então que
se pode começar a trabalhar técnicas com as ferramentas da Arte, e depois tudo
isso unido em um ritual. Não que isso representa um “pode” e um “não pode”,
mas é preciso compreender o que realmente é necessário.
O Caminho Solitário pode ser caótico, mas é gratificante quando
abraçado com todos os pressupostos levantados até agora. E para vivê-lo basta
ser criativo, inteiro e fundamentado.
45
sociedade pautada na lógica patriarcal de berço abrâamica. Que através de seus
valores, de ser humano e de mundo, são bem distintos da Wicca. Esse encontro
provoca em nossa subjetividade uma desestabilização de crenças e valores.
Questionamentos começam a ser feitos, e através dos exercícios de
desenvolvimento meditativo e psíquico vamo-nos apropriando de nós mesmos
de outra maneira, e isso gera um autoconhecimento tão profundo e sistemático
que é como se cruzássemos a margem de uma antiga vida para uma nova. Pois,
tamanho é o horizonte que abrimos em nós que percebemos que, aquela parte
antiga não existe mais, e então um ritual de Auto-Iniciação ou Iniciação sela
esse momento.
Mas não apenas isso. Um ritual de Auto-Iniciação ou Iniciação deve
provocar no sujeito uma morte-renascimento simbólica que, não apenas
instaura isso em sua consciência, como também lhe abre para o compromisso
maduro e responsável que a Arte exige de nós.
O compromisso da Bruxaria é o seu Sacerdócio, que não apenas está em
promover os rituais da Arte e honrar os Deuses antigos, mas também envolve
uma consciência e dever para com a natureza manifesta, a sociedade e a
diversidade. Tornar-se bruxa ou bruxo é um compromisso a ser vivido e
enlaçado na vida vivida, não é uma religião que se adota aos domingos por
46
desenvolvimento psíquico e ritual têm esse propósito, além é claro de trabalhar
a nossa intuição e sensibilidade aguçada.
Por esses pressupostos, muitos Tradicionalistas não aconselham uma
Auto-Iniciação, já que é preciso que outro lhe conduza e ajude a cruzar os
portões. Mas, quando se pratica com entrega, profundidade e sinceridade, uma
Auto-Iniciação é tão válida quanto uma feita pelas mãos de uma Alta
Sacerdotisa ou Sacerdote de uma Tradição. Algo que é preciso compreender
nisso tudo, é que um ato ritual iniciático tem muito mais a ver com a nossa
capacidade de se colocar frente às transformações promovidas pela Bruxaria do
que uma inserção a uma comunidade.
A Bruxaria considera que existem somente dois tipos de membros de sua
comunidade, são eles: Iniciados de uma tradição/Coven da Arte e/ou Auto-
Iniciados (ecléticos/solitários), Dedicados de uma tradição/Coven e/ou Auto-
Dedicados (solitários). Esses dois nomes, Iniciados e Dedicados representam
dois estágios de aprendizado e comprometimento na Wicca.
Quando decidimos que iremos percorrer o caminho da iniciação ou auto,
somos conhecidos como Dedicados ou Auto-Dedicados. Ser Dedicado ou Auto-
Dedicado é ter passado por um ritual que marca a passagem de nosso mero
interesse na Arte para o nosso primeiro compromisso com ela, ou seja,
47
A lógica é a mesma da graduação acadêmica, se você se formou em
letras isso não lhe dá o poder de ser matemático, você pode até gostar de
matemática, fazer cálculos tão bem quanto um formado, mas perante a uma
comunidade que representa acadêmicos de exatas você é um leigo acadêmico
de Letras, mas não de exatas! E o mesmo ocorre para um Auto-Iniciado. Porém
é preciso compreender o que isso quer dizer.
Não podemos interpretar isso como uma desvalorização da iniciação
alheia, como muitos bruxos excludentes fazem. Não. Deve-se olhar isso com a
compreensão de que, aquele indivíduo que se julga iniciado ou auto-iniciado é
de fato até que se prove o contrário, pois isso tem a ver com ele e seu
relacionamento íntimo com os Deuses, do mesmo modo que a sua auto-
iniciação ou iniciação diz respeito a você ou a sua Tradição. Graças aos Deuses a
Bruxaria não é uma religião institucionalizada e com uma liderança única que
nos represente o que nos torna uma espiritualidade de liberdade, que nos
coloca como co-autores para o acesso ao numinoso e aos mistérios.
Mas quem inicia-nos? Muitos pensam que é um determinado bruxo, mas
outro é meramente um canal, quem de fato inicia-nos é o nosso relacionamento
íntimo com os Deuses. Esse relacionamento, como já dito, através de práticas e
estudo comprometido e sério, é o único capaz de despertar a bruxa interior. Do
48
consigo mesmo. Trave contato com outros iguais a você. E quando perceber o
Ritual de Auto-Iniciação selará essa etapa.
A Bruxaria é uma religião muito bonita e profunda, e sua beleza esta
exatamente por abarcar o autoconhecimento. Iniciar-se é, portanto tornar-se
consciente disso, e manifestar de forma grandiosa essa consciência ao mundo.
Bibliografias Recomendadas:
49
décadas posteriores ao surgimento da religião. São autores que devem ser lidos
para a construção de um conhecimento mais profundo a respeito de nossa
religião. Essas leituras são essenciais para a construção de um pensamento
crítico a respeito dos muitos aspectos que compõe a Wicca tal como ela é hoje.
Vejamos:
MURRAY, Margaret Alice. O Deus das feiticeiras. São Paulo: Gaia, 2002.
50
Após essas referências bibliográficas específicas são importante leituras
que nos dão uma visão ampliada de mundo, que atravessam as temáticas da
Bruxaria, mas que não são sobre a Bruxaria. Essas referências configuram um
caráter de formação profunda no pensamento e nos estudos de cada praticante,
pois oferecem reflexões críticas frente a muitas questões como: psicologia,
mitologia, sagrado feminino, ecologia, política, feminismo, xamanismo,
ocultismo, Alta Magia que, estão presentes na própria substância do caminho
da Wicca. São elas:
LÉVI, Eliphas (2001). Dogma e Ritual de Alta Magia (Edson Bini, trad.).
São Paulo: Madras. (Originalmente publicado em 1855). 5ªedição.
Espero que tenha sido útil ter colocado as referências bibliográficas desta
primeira edição da revista, como uma dica de leitura, para assim orientar seus
estudos. É claro que existem muitas outras bibliografias a serem estudadas.
Apenas coloquei literaturas que considero importante, e nas quais já li e pude
refletir criticamente sobre. Debater esses livros com outros que, já se
apropriaram deles, pode ser um caminho interessante para um aprofundamento
do tema. Existem muitas obras maravilhosas que ainda aguardam a sua leitura,
muitas estão disponíveis em inglês, mas isso não é um impedimento para que
51
você as acesse. Pelo contrário, pode ser uma oportunidade de não só aprender
sobre Bruxaria, mas aprender uma nova língua.
52
GOSTOU?
ENTÃO SUGIRA
UM TEMA PARA
A SEGUNDA
EDIÇÃO
EQUINÓCIO DE
OUTONO/2018!
ENVIE SUA SUGESTÃO, OPINIÃO OU
CRÍTICA PARA:
SERGIO.LOU.JUNIOR@HOTMAIL.COM
omoinhodasbruxas.blogspot.com.br