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O Diabólico e a Invisível

Os Bastardos Bareknuckle #1
(Wicked and the Wallflower)

Sarah MacLean

Sinopse

Quando o diabólico vem chamando...


Quando um homem misterioso encontra o caminho para seu
quarto e oferece ajuda para ela pegar um duque, Lady Felicity Faircloth
aceita - com uma condição. Ela já viveu o suficiente para acreditar na
paixão, e não vai aceitar um casamento sem isso.

A invisível faz uma barganha perigosa...

Filho bastardo de um duque e rei das ruas sombrias de Londres,


Devil passou a vida aproveitando o poder e as oportunidades, e agora
ele encontrou a oportunidade que precisava para finalmente se vingar.
Tudo que ele precisa fazer é transformar um pequeno rato em uma
mulher tentadora, colocar a armadilha e destruir seu inimigo.

Pela Promessa da Paixão...

Mas não há nada simples sobre Felicity Faircloth, que logo decide
que prefere Devil a qualquer outro e os planos cuidadosamente traçados
de Devil tornam-se um caos e ele deve escolher entre tudo que sempre
quis… e a única coisa que ele já desejou.
Prólogo

O passado

Os três estavam entrelaçados muito antes de saberem, fios de aço fiado


e de seda que não podiam ser separados - nem mesmo quando o destino deles
insistia.
Irmãos, nascidos no mesmo dia, na mesma hora, no mesmo minuto para
mulheres diferentes. A cortesã de alto preço. A costureira. A viúva do soldado.
Nascido no mesmo dia, na mesma hora, no mesmo minuto e do mesmo
homem.
O duque, seu pai, cuja arrogância e crueldade puniria sem hesitação,
roubando dele a única coisa que ele queria que o seu dinheiro e poder não
poderia comprar - um herdeiro.
São os Ides de Março que os videntes advertem, com a sua promessa de
traição e vingança da mudança da fortuna e da providência inalienável. Mas
para esse senhor - que nunca era mais do que isso, nunca perto de ser um pai
- eram os idos de junho que seriam sua ruína.
Porque naquele mesmo dia, naquela mesma hora, naquele mesmo
minuto, em que nasceram os três, havia um quarto filho, nascido de uma quarta
mulher. Sua duquesa. E foi este nascimento - o nascimento que todo o mundo
pensava legítimo - que o duque participou, assim como também ele sabia que
o filho que estava para ser seu herdeiro em nome e fortuna e futuro não era
seu, e ainda, de alguma forma, era sua única esperança.
Exceto que ela era uma filha.
E com sua primeira respiração, ela roubou o futuro de todos eles, tão
poderosa em sua infância quanto se tornaria em sua feminilidade. Mas a dela
é uma história para outra hora.
Esta história começa com os meninos.

3
Capítulo Um

O presente

Maio de 1837

Devil1 estava do lado de fora da Casa Marwick, sob a sombra negra de um


antigo olmo, observando seu irmão bastardo lá dentro.
Velas bruxuleantes e vidros manchados distorciam os foliões no salão de
baile, transformando a multidão de pessoas - aristocratas e nobres endinheirados
- numa massa de movimento indecifrável, lembrando a Devil da maré do Tamisa,
fluindo e escorrendo em cor e fedor.
Corpos sem rosto - homens vestidos com roupas formal escuras e mulheres
reluzindo em suas sedas e cetins – se movimentavam juntos, mal conseguindo se
mexer com os pescoços esticados e leques agitando, com fofocas e especulações
fluindo através do ar estagnado do salão de baile.
E no centro deles, o homem que estavam desesperados para ver - o eremita
Duque de Marwick, brilhante e novo, apesar de ter mantido o título desde que
seu pai morrera. Desde que seu pai morreu.
Não, não pai. Reprodutor.
E o novo duque, jovem e bonito, retornou a Londres como o filho pródigo –
uma cabeça mais alta que o resto da assembleia, cabelos louros e rosto de pedra,
com os olhos âmbar que os duques de Marwick haviam ostentado durante
gerações. Capaz e solteiro e tudo o que a aristocracia desejava que ele fosse.
E nada do que a aristocracia acreditasse que ele fosse.
Devil podia imaginar os sussurros ignorantes ecoando pelo salão de baile.

Por que um homem de tal proeminência deveria tocar o eremita?


Quem se importa, contanto que ele seja um duque?
Você acha que os rumores são verdadeiros?
Quem se importa, contanto ele seja um duque?

1 Devil - Diabo
Por que ele nunca veio para a cidade?
Quem se importa, contanto que ele seja um duque?
E se ele é tão louco como eles dizem?
Quem se importa, contanto que ele seja um duque?
Eu ouvi que ele está no mercado para um herdeiro.

Foi o último que convocou Devil da escuridão.


Houve um acordo, feito vinte anos antes, quando eles eram três irmãos de
lutas. E embora muita coisa tivesse acontecido desde que o acordo fora forjado,
uma coisa continuava a ser sacrossanta: ninguém renegou um acordo com Devil.
Não sem punição.
E assim, Devil esperou com paciência infinita nos jardins da residência
londrina de gerações de duques de Marwick pela chegada do terceiro envolvido
no negócio. Fazia décadas desde que ele e seu irmão, Whit - juntos conhecidos
nos cantos nefastos de Londres como os Bastardos de Bareknuckle - tinham visto
o duque. Décadas desde que haviam escapado da casa de campo do ducado na
calada da noite, deixando segredos e pecados para trás, para construir seu
próprio reino de segredos e pecados de um tipo diferente.
Mas, quinze dias atrás, os convites tinham chegado às diversas casas mais
extravagantes de Londres - aquelas com os nomes mais veneráveis - até mesmo
os criados chegaram à Marwick House, armados até os dentes com espanadores
e cera, com ferros e linhas de ventilação. Uma semana antes, os engradados
haviam sido entregues - velas e tecidos, batatas e vinho do porto, e meia dúzia
de caixas de canapés para o enorme salão de baile Marwick, cada um enfeitado
agora com as saias das damas mais elegíveis de Londres.
Há três dias, a News of London chegou à sede dos Bastardos em Covent
Garden2 e lá, na quarta página, uma manchete de tinta manchada pronunciava
“Misterioso Marwick quer se casar?”
Devil dobrou cuidadosamente o papel e deixou-o na mesa de Whit.
Quando ele voltou ao seu espaço de trabalho na manhã seguinte, uma faca de
arremesso estava enterrada no papel fixado no carvalho.

2 Covent Garden (Jardim do Monastério) – é um distrito londrino localizado mais a leste da cidade de
Westminster, e no canto sudoeste do borough londrino de Camden. O uso da denominação "Covent",
um termo anglo-francês para designar uma comunidade religiosa, equivalente a "monastério" ou
"convento".
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E assim foi decidido.
O irmão deles, o duque, havia retornado, aparecendo sem aviso neste lugar
projetado para homens melhores e preenchido com o pior deles, em terras que
ele herdou no momento em que ele reivindicou seu título, em uma cidade que
eles tinham feito deles, e ao fazê-lo, ele revelou sua ganância.
Mas a ganância, neste lugar, nesta terra, não era permitida. Então, Devil
esperou e assistiu.
Depois de longos minutos, o ar mudou e Whit apareceu ao seu lado,
silencioso e mortal como um reforço militar, o que era apropriado, pois isso era
nada menos do que a guerra.
— Na hora certa, — disse Devil, baixinho.
Um grunhido.
— O duque procura uma noiva?
Um aceno na escuridão.
— E herdeiros?
Silêncio. Não ignorância - raiva.
Devil observou seu irmão bastardo mover-se através da multidão, dirigindo-
se para o final do salão de baile, onde um corredor escuro se estendia até as
entranhas da casa. Foi a vez de Devil acenar com a cabeça. — Nós terminaremos
antes que comece. — Ele espalmou sua bengala de ébano, sua juba de leão de
prata, gasta pelo uso, encaixando perfeitamente em sua mão. — Dentro e fora, e
dano suficiente que ele não pode nos seguir.
Whit assentiu com a cabeça, mas não falou o que ambos estavam pensando
– que o homem que Londres chamava Robert, duque de Marwick, o garoto que
antes conheciam como Ewan, era mais animal que aristocrata e o único homem
que chegara perto de superá-los. Mas isso foi antes de Devil e Whit se tornarem
os Bastardos de Bareknuckle, os reis de Covent Garden, e aprenderam a manejar
armas com precisão para igualar suas ameaças.
Hoje à noite, eles mostrariam a ele que Londres era o território deles e o
devolveriam ao campo. Era apenas uma questão de entrar e fazer exatamente isso
- lembrá-lo da promessa que tinham feito há muito tempo.
O duque de Marwick não geraria herdeiros.
— Boa perseguição. — As palavras de Whit vieram em um grunhido baixo,
sua voz rouca pelo desuso.
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— Boa perseguição — respondeu Devil, e os dois se moveram em silenciosa
agilidade para as sombras escuras da longa sacada, sabendo que teriam que agir
rapidamente para evitar serem vistos.
Com graça natural, Devil escalou a sacada, saltando sobre a balaustrada,
aterrissando silenciosamente na escuridão além, seguido por Whit. Eles foram
para a porta, sabendo que o jardim de inverno estaria trancado e fora dos limites
para os hóspedes, tornando-o o ponto de entrada perfeito para a casa. Os
Bastardos usavam trajes formais, preparando-se para se misturar à multidão até
se encontrarem o duque e derem o golpe.
Marwick não seria nem o primeiro nem o último aristocrata a receber uma
punição dos Bastardos de Bareknuckle, mas Devil e Whit nunca desejaram
entregar uma tão bem.
A mão de Devil mal havia pousado na maçaneta da porta quando ela se virou
sob o toque dele. Ele a soltou instantaneamente, recuando, desaparecendo na
escuridão, enquanto Whit se lançava de volta para a sacada e para o gramado
abaixo, sem som.
E então a garota apareceu.
Ela fechou a porta atrás dela com urgência, pressionando-a de volta para ela,
como se ela pudesse evitar que os outros a seguissem com nada além de pura
força de vontade.
Estranhamente, Devil pensou que ela poderia fazer exatamente isso.
Ela estava fortemente encostada, a cabeça contra a porta, o longo pescoço
pálido ao luar, o peito arfando quando uma única mão enluvada descansou na
pele sombreada sobre o vestido, como se pudesse acalmar sua respiração
entrecortada. Anos de observação revelaram que seus movimentos não eram
praticados e sim naturais - ela não sabia que estava sendo vigiada. Ela não sabia que
não estava sozinha.
O tecido de seu vestido cintilava ao luar, mas estava escuro demais para ver
a cor. Azul, talvez. Verde? A luz tornou prata em alguns lugares e preta em outros.
Luar. Parecia que ela estava encoberta pelo luar.
A estranha observação veio quando ela se moveu para a balaustrada de
pedra, e por meio segundo, Devil desejou que ela entrasse na luz para ele dar
uma olhada melhor.

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Isto é, até que ele ouviu o suave e baixo gemido de um rouxinol - advertindo-
o. Lembrando-o do plano deles, com o qual a garota não tinha nada a ver. Exceto
que ela impediu que ele fosse colocado em movimento.
Ela não sabia que o pássaro não era um pássaro, e virou o rosto para o céu,
as mãos pousando no parapeito de pedra enquanto soltava um longo suspiro e,
com ele, a guarda. Seus ombros relaxaram.
Ela foi perseguida ali.
Um fio de algo desagradável o atravessou com a ideia de que ela fugiu para
um quarto escuro e saiu para uma varanda mais escura, onde um homem
esperava que poderia ser pior do que qualquer coisa lá dentro. E então, como um
tiro no escuro, ela riu. Devil endureceu, os músculos de seus ombros enrijeceram,
sua mão se apertou na alça prateada de sua bengala.
Levou toda sua vontade para não se aproximar dela. Para ele se lembrar que
estava esperando por este momento há anos, - tanto tempo que mal conseguia
se lembrar de uma época em que ele não estava preparado para lutar com
seu irmão.
Ele não ia permitir que uma mulher o afastasse do curso. Ele nem sequer
tinha uma visão clara dela e, ainda assim, não conseguia desviar o olhar.
— Alguém deveria dizer a eles o quão horrível eles são, — disse ela ao céu.
— Alguém deveria marchar até Amanda Fairfax e dizer a ela que
ninguém acredita que sua marca de beleza é real. E alguém deveria dizer a
Lorde Hagin que ele cheira mal e faria bem em tomar um banho.
E ela continuou falando.
— E eu deveria amar muito lembrar a Jared da vez em que ele caiu de
cabeça para baixo em uma lagoa na festa na casa de campo da minha mãe e
teve que confiar na minha gentileza para levá-lo para secar suas roupas sem ser
visto.
Ela fez uma pausa, apenas o tempo suficiente para Devil pensar que ela
estava falando sobre o céu.
Em vez disso, ela deixou escapar: — E Natasha deve ser tão desagradável?
— Isso é o melhor que você pode fazer?
Ele se chocou com suas palavras - agora não era a hora de conversar com
uma tagarela solitária na varanda.

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Ele chocou mais Whit, se o som severo do rouxinol que se seguiu fosse
qualquer indicação.
Porém, ele chocou mais a garota.
Com um pequeno grito de surpresa, ela se virou para encará-lo, sua mão
chegando à extensão da pele acima da linha de seu corpete. Que cor era esse
corpete? O luar continuou a jogar truques com ele, tornando–o impossível de ver.
Ela inclinou a cabeça e olhou para a sombra. — Quem está aí?
— Você me faz pensar apenas isso, amor, considerando que você está
falando intempestivamente.
O olhar semicerrado se tornou uma carranca. — Eu estava falando comigo
mesma.
— E nenhum de vocês pode achar um insulto melhor para esta Natasha do
que desagradável?
Ela deu um passo em direção a ele, então pareceu pensar duas vezes em se
aproximar de um homem estranho na escuridão. Ela parou. — Como você
descreveria Natasha Corkwood?
— Eu não a conheço, então eu não sei. Mas considerando que você estava
feliz em criticar a higiene de Hagin e ressuscitar os embaraços do passado de
Faulk, certamente Lady Natasha merece um nível similar de criatividade?
Ela olhou para as sombras por um longo minuto, seu olhar fixo em algum
ponto além do ombro esquerdo. — Quem é Você?
— Ninguém importante.
— Como você está em uma sacada escura do lado de fora de um quarto
desocupado na casa do Duque de Marwick, parece que você pode ser um homem
muito importante.
— Por esse raciocínio, Você é uma mulher de grande importância.
Sua risada veio alta e inesperada, surpreendendo os dois. Ela balançou a
cabeça. — Poucos concordariam com você.
— Eu raramente me interessei pelas opiniões dos outros.
— Então você não deve ser um membro da sociedade, — ela respondeu
secamente, — já que as opiniões dos outros são como ouro aqui. Excessivamente
cuidada.
Quem era ela?
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— Por que você estava no conservatório?
Ela piscou. — Como você sabe que é um conservatório?
— Eu faço o meu negócio para saber as coisas.
— Sobre casas que não pertencem a você?
Esta casa quase foi minha, uma vez.
Ele resistiu às palavras. — Ninguém está usando este quarto. Porque você
estava?
Ela levantou um ombro. E depois deixou cair.
Era sua vez de franzir o cenho. — Você está aqui para um encontro?
Seus olhos se arregalaram. — Eu imploro seu perdão?
— Varandas escuras são ótimas para encontros.
— Eu não saberia.
— Sobre sacadas? Ou ter um encontro amoroso em um lugar secreto? —
Não que ele se importasse.
— Sobre qualquer um, honestamente.
Ele não deveria ter experimentado satisfação com a resposta.
Ela continuou: — Você acredita que eu gosto de conservatórios?
— Eu não acreditaria nisso, — disse ele. — E além disso, o conservatório está
fora dos limites.
Ela inclinou a cabeça. — Está?
— A maioria das pessoas entende que os quartos escuros estão fora dos
limites.
Ela acenou com a mão. — Eu não sou muito inteligente. — Ele também não
acreditava nisso. — Eu poderia te fazer a mesma pergunta, você sabe.
— Qual? — Ele não gostou da maneira como ela tecia a conversa ao redor
deles, torcendo-a em sua própria direção.
— Você está aqui para um encontro?
Por um momento único e selvagem, uma visão reluziu do encontro que eles
poderiam ter aqui, nesta sacada escura no meio do verão. Do que ela poderia
permitir que ele fizesse com ela enquanto metade de Londres dançava e fofocava
fora do alcance.
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Do que ele poderia permitir que ela fizesse a ele.
Imaginou levantá-la sobre a balaustrada de pedra, descobrindo a sensação
de sua pele, o cheiro dela. Descobrindo os sons que ela fazia pelo prazer. Ela
suspiraria? Ela choraria?
Ele congelou. Essa mulher, com seu rosto simples e seu corpo nada notável,
que falava consigo mesma, não era o tipo de mulher que Devil imaginava ter nas
paredes de pedras. O que estava acontecendo com ele?
— Eu tomarei seu silêncio como um sim, então. E te darei licença para
continuar, senhor. — Ela começou a se afastar dele, descendo a sacada.
Ele deveria deixá-la ir.
Exceto ele falou: — Não há nenhum encontro.
O rouxinol novamente. Mais rápido e mais alto que antes. Whit estava
aborrecido.
— Então por que você está aqui? — Perguntou a mulher.
— Talvez pela mesma razão que você, amor.
Ela sorriu. — Eu tenho dificuldade em acreditar que você é uma solteirona
com idade avançada que correu para a escuridão depois de ser ridicularizada por
aqueles que você já chamou de amigos.
Ah! Então ele estava certo. Ela havia sido perseguida. — Eu tenho que
concordar, nada disso soa como eu.
Ela recostou-se na balaustrada. — Venha para a luz.
— Temo não poder fazer isso.
— Por que não?
— Porque eu não deveria estar aqui.
Ela levantou um ombro em um pequeno encolher de ombros. — Nem eu.
— Você não deveria estar na varanda. Eu não deveria estar nos terrenos.
Seus lábios se abriram em um pequeno O. — Quem é você?
Ele ignorou a pergunta. — Por que você é uma solteirona? — Não que isso
importasse.
— Eu sou solteira.
Ele resistiu ao impulso de sorrir. — Eu mereci isso.
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— Meu pai lhe diria para ser mais específico com suas perguntas.
— Quem é seu pai?
— Quem é o seu?
Ela não era a mulher menos obstinada que ele já conheceu. — Eu não tenho
pai.
— Todo mundo tem um pai, — disse ela.
— Ninguém que gostaria de me reconhecer, — disse ele com uma calma que
não sentia. — Então voltamos ao começo. Por que você é uma solteirona?
— Ninguém quer casar comigo.
— Por que não?
A resposta honesta veio instantaneamente. — Eu não... — Ela parou, abrindo
bem as mãos, e ele daria toda a sua fortuna para ouvir o resto, especialmente
depois que ela recomeçou, movendo seus longos dedos enluvados
freneticamente. — Encalhada.
Ela não parecia velha.
— Simples
Simples tinha ocorrido a ele, mas ela não era comum. Na verdade não. Na
verdade, ela pode ser o oposto de Simples.
— Desinteressante.
Isso não era absolutamente verdade.
— Eu competi por um duque.
Ainda não é toda a verdade. — E qual o problema?
— Muito bem, — disse ela. — Embora pareça injusto, como o duque em
questão nunca pretendeu se casar comigo em primeiro lugar.
— Por que não?
— Ele estava muito apaixonado por sua esposa.
— Uma pena, isso.
Ela se afastou dele, voltando seu olhar para o céu. — Não para ela.
Devil nunca em sua vida quis aproximar-se tanto de outra pessoa. Mas ele
permaneceu nas sombras, pressionando-se contra a parede e observando-a. —

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Se você não está familiarizada por todas essas razões, por que desperdiçar seu
tempo aqui?
Ela deu uma risadinha, o som baixo e adorável. — Você não sabe, senhor? O
tempo de qualquer mulher solteira é bem gasto perto de cavalheiros solteiros.
— Ah, então você não desistiu de um marido.
— A esperança é eterna, — disse ela.
Ele quase riu das palavras secas. Por pouco. — E então?
— É difícil, a esta altura, minha mãe ter exigências rígidas para qualquer
pretendente.
— Por exemplo?
— Um batimento cardíaco.
Ele riu disso, um único latido áspero, chocando o inferno fora dele. — Com
padrões tão altos, não é surpreendente que você tenha tido tantos problemas.
Ela sorriu, dentes brilhando brancos ao luar. — É uma maravilha que o duque
de Marwick não tenha caído sobre si mesmo para chegar até mim, eu sei.
A lembrança de seu propósito naquela noite foi dura e instantânea. — Você
está atrás de Marwick.
Sobre o meu cadáver em decomposição.
Ela acenou com a mão. — Minha mãe está, assim como todas as outras mães
em Londres.
— Dizem que ele é louco, — disse Devil.
— Só porque eles não conseguem imaginar por que alguém escolheria viver
fora da sociedade. — Marwick viveu fora da sociedade porque ele tinha feito um
pacto há muito tempo para nunca viver dentro dela.
Mas Devil não disse isso. Em vez disso, ele disse: — Elas mal deram uma
olhada nele.
Seu sorriso se transformou em uma gargalhada. — Elas viram o título dele,
senhor. E é bonito como o pecado. Um duque eremita ainda faz uma duquesa,
afinal de contas.
— Isso é ridículo.
— Esse é o mercado de casamento. — Ela fez uma pausa. — Mas não
importa. Eu não sou para ele.
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— Por que não? — Ele não se importou.
— Porque eu não sou para duques.
Por que diabos não?
Ele não falou em voz alta, mas ela respondeu, no entanto, casualmente,
como se estivesse falando com uma sala cheia de senhoras no chá. — Houve uma
época em que pensei que poderia ser, — ela forneceu, mais para si
do que para ele. — E então... — Ela encolheu os ombros. — Eu não sei o que
aconteceu. Eu suponho todas essas outras coisas: Simples, desinteressante, idade
avançada, invisível, solteirona. — Ela riu com a lista de palavras. — Suponho
que eu não deveria ter desanimado, pensando que encontraria um marido,
quando isso não aconteceu.
— E agora?
— E agora, — ela disse, resignada em seu tom de voz, — minha mãe procura
um pulso forte.
— O que você procura?
O rouxinol de Whit murmurou na escuridão e ela respondeu logo após o
som. — Ninguém nunca me perguntou isso.
— E assim, — ele cutucou, sabendo que não deveria. Sabendo que ele
deveria deixar essa garota para esta varanda e qualquer futuro que ela fosse ter.
— Eu... — Ela olhou em direção à casa, em direção ao conservatório escuro
e ao corredor além, e ao brilhante salão de baile além disso. — Eu gostaria de
fazer parte disso tudo de novo.
— Novamente?
— Houve um tempo que eu... — ela começou, então parou. Balançou a
cabeça. — Não importa. Você tem muito mais coisas importantes para fazer.
— Eu tenho, mas como eu não posso fazê-los enquanto você está aqui,
minha senhora, eu estou mais do que disposto a ajudá-la a resolver isso.
Ela sorriu para isso. — Você é divertido.
— Ninguém em toda a minha vida concordaria com você.
Seu sorriso cresceu. — Eu raramente me interessei pelas opiniões dos outros.
Ele não perdeu o eco de suas próprias palavras de antes. — Eu não acredito
nem por um segundo nisso.

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Ela acenou com a mão. — Houve uma época em que eu fazia parte disso.
Bem no centro de tudo. Eu era incrivelmente popular. Todos queriam me
conhecer.
— E o que aconteceu?
Ela abriu as mãos novamente, um movimento que começava a ser familiar.
— Eu não sei.
Ele levantou uma sobrancelha. — Você não sabe o que fez de você uma
invisível?
— Eu não sei, — ela disse suavemente, confusão e tristeza em seu tom. — Eu
não estava nem perto das paredes. E então, um dia, — ela deu de ombros, — lá
estava eu. Planta. E então, quando você me pergunta o que eu procuro...
Ela estava sozinha. Devil sabia sobre solidão. — Você quer voltar.
Ela deu uma risada pequena e sem esperança. — Ninguém entra de volta.
Não sem um marido influente.
Ele assentiu. — O duque.
— Uma mãe pode sonhar.
— E você?
— Eu quero voltar. — Outro aviso soou de Whit, e a mulher olhou sobre
seu ombro. — Esse é um rouxinol muito persistente.
— Ele está irritado.
Ela inclinou a cabeça em curiosidade, mas quando ele não esclareceu, ela
acrescentou: — Você vai me dizer quem você é?
— Não.
Ela assentiu uma vez. — Isso é o melhor, suponho, pois só saí para encontrar
um momento de silêncio longe de sorrisos arrogantes e comentários sarcásticos.
— Ela apontou para a linha do balcão, na direção do trecho mais claro. — Eu irei
até lá e encontrarei um esconderijo apropriado, e você poderá retomar seu
ataque, se quiser.
Ele não respondeu, não certo do que diria. Não confiando em si mesmo para
dizer o que deveria.
— Eu não vou dizer a ninguém que eu vi você, — acrescentou.
— Você não me viu, — disse ele.

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— Então terá o benefício adicional de ser a verdade, — ela acrescentou,
prestativa.
O rouxinol novamente. Whit não confiava nele com essa mulher.
E talvez ele não devesse.
Ela mergulhou em uma pequena reverência. — Bem, fora de seus atos
nefastos então?
A força dos músculos ao redor de seus lábios não era familiar. Um sorriso. Ele
não conseguia se lembrar da última vez que ele sorriu. Essa mulher estranha tinha
convocado, como uma feiticeira.
Ela se foi antes que ele pudesse responder, as saias desaparecendo na
esquina, na luz. Levou tudo nele para não segui-la. Para pegar um vislumbre dela,
a cor do seu cabelo, o tom de sua pele, o brilho de seus olhos.
Ele ainda não sabia a cor do vestido dela.
Tudo o que ele tinha que fazer era segui-la.
— Dev.
Seu nome o devolveu ao presente. Ele olhou para Whit, mais uma vez na
varanda e ao seu lado nas sombras.
— Agora — disse Whit. Era hora de voltar ao seu plano. Para o homem que
ele prometeu acabar se ele pusesse os pés em Londres. Será que ele deveria estar
tentando reivindicar aquilo que ele roubara uma vez? Ele deveria sequer pensar
em quebrar aquele voto feito há décadas?
E ele iria acabar com ele. Mas não seria com punhos.
— Nós vamos, bruv3, — Whit sussurrou. — Agora.
Devil balançou sua cabeça uma vez, o olhar fixo para o lugar onde a mulher
misteriosa tinha desaparecido. — Não. Ainda não.

3 Bruv - é uma versão reduzida de Brother (no sentido de irmão-camarada, parceiro). É usado em
situações informais como em letras de músicas (geralmente rap, hip-hop, etc.), também em mensagens
de texto (sms) e grupo de amigos.
16
Capítulo Dois

O coração de Felicity Faircloth tinha estado batendo por muito tempo, o


suficiente para que ela pensasse que poderia precisar de um médico.
Começara a bater quando ela saiu do brilhante salão de baile da casa de
Marwick e olhou para a porta trancada à sua frente, ignorando o desejo quase
insuportável de alcançar a touca e extrair um grampo de cabelo.
Sabendo que ela absolutamente não deve extrair um grampo. Sabendo que
ela absolutamente não deveria extrair dois - nem inseri-los no buraco da
fechadura a menos de quinze centímetros de distância e pacientemente trabalhar
com as trancas dentro.
Não podemos permitir outro escândalo .
Ela podia ouvir as palavras de seu irmão gêmeo Arthur como se ele estivesse
em pé ali com ela. Pobre Arthur, desesperado por sua irmã solteirona - 27 anos
e encalhada - ser libertada aos cuidados de outro homem mais disposto. Pobre
Arthur, cujas preces nunca seriam respondidas - nem mesmo se ela parasse de
mexer nas fechaduras.
Mas ela ouviu as outras palavras ainda mais. Os comentários risonhos. Os
nomes...
Felicity desamparada. Felicidade inútil. E o pior... Felicity destruída.
Por que ela está aqui mesmo?
Certamente ela não pode pensar que ninguém iria querer ela.
Seu pobre irmão, desesperado para casá-la... Felicity arruinada.

Houve uma época em que uma noite como aquela teria sido o sonho de
Felicity - um novo duque na cidade, um baile de boas-vindas, a promessa
provocante de um noivado com um novo solteiro, bonito e elegível. Teria sido
perfeito. Vestidos e joias, orquestras completas, fofocas e conversas, cartões de
dança e champanhe. Felicity mal teria espaço livre em seu cartão de dança, e se
tivesse, teria sido porque tomou para si mesma, para que ela pudesse desfrutar
de seu lugar neste mundo brilhante.
Não mais.
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Agora, ela evitava bailes se pudesse, sabendo que eles ofereciam horas de
descanso nas bordas da sala ao invés de dançar através dela. E havia o embaraço
quente que vinha sempre que ela tropeçava em um de seus velhos conhecidos. A
lembrança de como foi rir com eles. Dominar eles.
Mas não havia como evitar um baile que trazia um novo duque brilhante, e
então ela se enfiou em um vestido velho e na carruagem de seu irmão, e permitiu
que o pobre Arthur a arrastasse para o salão de baile de Marwick. E ela fugiu no
momento em que ele se virou para o outro lado.
Felicity tinha fugido por um corredor escuro, com o coração batendo quando
tirou os grampos da touca, dobrou-os cuidadosamente e inseriu um e depois o
outro no buraco da fechadura. Quando um estalido silencioso soou, e o trinco
surgiu como um velho amigo delicioso, seu coração ameaçava saltar em seu peito.
E pensar, que toda aquela pancada ensurdecedora foi antes de conhecer o
homem. Embora, conheci não era precisamente a palavra correta.
O encontro também não parecia certo.
Ele tinha sido algo mais perto de experiente. O momento que ele tinha
falado, o tom baixo de sua voz, envolvendo em torno dela como seda no ar
escuro da primavera, enquanto ele a tentava como vício.
Um rubor tomou conta de suas bochechas pela lembrança, pelo modo como
ele parecia atraí-la, como se estivessem ligados por uma corda. Como se ele
pudesse puxá-la para ele e ela iria, sem resistência. Ele fez mais do que puxá-la
para dentro. Ele tirou a verdade dela, e ela ofereceu com facilidade.
Ela catalogou suas falhas como se fossem uma mudança no tempo. Ela
quase confessou tudo, até as partes que nunca confessou a ninguém. Os pedaços
que ela segurava perto na escuridão. Porque não parecia uma confissão. Parecia
que ele já sabia de tudo. E talvez ele soubesse. Talvez ele não fosse um homem
na escuridão. Talvez ele fosse a própria escuridão. Efêmero, misterioso e tentador
- muito mais tentador do que a luz do dia, em que erros, marcas e falhas
brilharam e eram impossíveis de perder.
A escuridão sempre a tentara. As fechaduras. As barreiras. O impossível.
Esse era o problema, não era? Felicity sempre quis o impossível. E ela não
era o tipo de mulher que o conseguia.
Mas e quando aquele homem misterioso sugeriu que ela era uma mulher
importante? Por um momento, ela acreditou nele. Como se não fosse risível, a
própria ideia de que Felicity Faircloth – simples, solteira, filha do Marquês de

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Bumble, negligenciada por mais do que um solteirão elegíveis por causa de sua
própria má sorte e adequadamente imprópria para este baile, onde um Belo
duque há muito perdido procurava uma esposa - poderia ganhar o dia.
O impossível.
Então ela fugiu, retornando aos seus velhos hábitos e tropeçando na
escuridão, porque tudo parecia mais possível na escuridão do que na luz fria e
dura.
E ele parecia saber disso também, aquele estranho. O suficiente para que ela
quase não o tivesse deixado nas sombras. O suficiente que ela quase se juntou a
ele lá. Porque naqueles poucos e fugazes momentos, ela se perguntou se talvez
não fosse esse mundo pelo qual ela desejava voltar, mas um mundo novo e
sombrio onde ela poderia começar de novo. Onde ela poderia ser outra pessoa
além de Felicity arruinada, solteirona e invisível. E o homem na sacada parecia o
tipo de homem que poderia fornecer exatamente isso.
O que era louco, obviamente. Alguém não fugia com homens estranhos que
encontravam nas varandas. Primeiro, era assim que uma pessoa era assassinada.
E segundo, a mãe dela não aprovaria. E então havia Arthur. Sóbrio, perfeito, pobre
Arthur com o seu: Não podemos permitir outro escândalo.
E assim ela fez o que fez depois de um momento louco no escuro; ela virou
as costas e foi para a luz, ignorando a pontada de arrependimento quando virou
a esquina da grande fachada de pedra e entrou no brilho do salão de baile além
das enormes janelas, onde quase toda Londres se mexia e girava, rindo e
fofocando e competindo pela atenção de seu anfitrião bonito e misterioso.
Onde o mundo que ela uma vez tinha sido parte girou sem ela.
Ela observou por um longo momento, tendo um vislumbre do Duque de
Marwick no outro lado da sala, alto, belo e empiricamente bonito, com boa
aparência aristocrática que deveria tê-la feito suspirar, mas de fato não causou
nenhum impacto.
Seu olhar deslizou para longe do homem da hora, fixando-se brevemente
no brilho de cobre do cabelo de seu irmão no outro lado do salão de baile, onde
ele estava em profunda conversa com um grupo de homens mais sérios do que
o ambiente. Ela se perguntou o que eles estavam discutindo - era ela? Arthur
estava tentando negociar com outro lote de homens a elegibilidade da arruinada
Felicity?
Não podemos permitir outro escândalo.

19
Eles não podiam permitir o último também. Ou o anterior. Mas sua família
não queria admitir isso. E aqui estavam eles, no baile de um duque, fingindo que
a verdade não era a verdade. Fingindo que tudo era possível.
Recusando-se a acreditar que Felicity pura, imperfeita e confusa jamais
conquistaria o coração e a mente e - o que é mais importante - a mão do Duque
de Marwick, independentemente do tipo de eremita potencialmente complicado
que ele era.
No entanto, ouve um tempo em que ela poderia ter tido. Quando um duque
eremita poderia cair de joelhos e implorar a Lady Felicity que o notasse. Bem,
talvez não tanto em colapso e implorando, mas ele poderia ter dançado com ela.
E ela iria ter feito ele rir. E talvez... eles poderiam ter gostado um do outro.
Mas isso tudo foi quando ela nem sequer sonhara em olhar para a sociedade
de fora - quando ela nunca imaginou que a sociedade tivesse um lado de
fora. Ela estava dentro, afinal de contas: jovem, elegível, titulada e divertida.
Ela tinha dezenas de amigos e centenas de conhecidos e convites para visitas
e festas em casa e caminhadas ao longo do Serpentine aos montes. Nenhuma
reunião valeria a pena se ela e suas amigas não estivessem presentes. Ela nunca
esteve sozinha.
E depois... isso havia mudado.
Um dia, o mundo parou de brilhar. Ou, mais apropriadamente, Felicity parara
de brilhar. Seus amigos se ausentaram, e pior, viraram as costas, nem mesmo
livrando-a de seu desdém. Eles tinham prazer em cortá-la diretamente. Como se
ela não tivesse sido uma vez uma deles. Como se nunca tivessem sido amigos
em primeiro lugar.
Que ela supôs que eles não tinham. Como ela não tinha percebido? Como
ela não viu que eles nunca realmente a queriam?
E a pior de todas as perguntas - por que eles não a queriam? O que ela fez?
Felicity tola, de fato.
A resposta não importava mais – havia passado tempo suficiente para que
ela duvidasse que alguém ainda se lembrava. O que importava era que agora
quase ninguém a notava, exceto quando olhavam para ela com pena ou desdém.
Afinal, ninguém gostava menos de uma solteirona do que o mundo que a
criara.
Felicity, outrora um diamante da aristocracia (bem, não um diamante, mas
talvez um rubi. Uma safira, certamente - filha de um marquês com um dote a
20
combinar), agora era uma solteirona adequada, de toucas de renda e convites
oferecidos por pena de seu futuro incerto.
Se ao menos ela se casasse, Arthur gostava de dizer isso... ela no entanto,
poderia evitá-lo.
Se ao menos ela se casasse, sua mãe tambémgostava de dizer... eles
poderiam evitá-lo. Por mais embaraçoso que fosse a solteirice para a solteirona
em questão, era uma insígnia de vergonha para uma mãe - especialmente uma
que se saíra tão bem a ponto de se casar com um marquês.
E assim, a família Faircloth ignorou a solteirice de Felicity, disposta a fazer
qualquer coisa para conseguir um casamento decente. Ignoraram também a
verdade dos desejos de Felicity - aqueles que o homem na escuridão havia
questionado instantaneamente.
A verdade. Que ela queria a vida que tinha sido prometida. Ela queria fazer
parte disso de novo. E se ela não podia ter isso, o que, francamente, ela sabia que
não podia - afinal, ela não era tola – e ela queria mais do que um consolo de um
casamento. Esse foi o problema com Felicity.
Ela sempre quis mais do que ela poderia ter. Que a deixou sem nada, não
foi?
Felicity soltou um suspiro sem graça. Seu coração não estava mais pulsando.
Ela supôs que isso era positivo.
— Eu me pergunto, será que eu poderia sair sem que ninguém percebesse?
As palavras mal saíam de sua boca quando a porta de vidro maciça que dava
para o salão de baile se abriu, e lá se espalharam meia dúzia de foliões, risadas
em seus lábios e champanhe em suas mãos.
Foi a vez de Felicity pressionar nas sombras, encostando-se contra a parede
enquanto eles alcançavam a balaustrada de pedra com uma excitação estridente
e sem fôlego. Reconhecimento queimado.
Claro.
Eles eram Amanda Fairfax e seu marido, Matthew, Lorde Hagin, junto com
Jared, Lorde Faulk e sua irmã mais nova, Natasha, e mais dois - outro casal, jovem
e loiro, reluzindo como novos brinquedos. Amanda, Matthew, Jared e Natasha
gostavam de colecionar novos seguidores. Eles haviam colecionado uma vez
Felicity, afinal.
Ela já foi a quinta no quarteto deles. Amado, até que ela não estivesse mais.

21
— Eremita ou não, Marwick é muito bonito, — disse Amanda.
— E rico, — Jared apontou. — Ouvi dizer que ele encheu esta casa com
mobília na semana passada.
— Eu ouvi o mesmo, — disse Amanda com excitação quase sem fôlego. —
E ouvi dizer que ele está fazendo as rondas dos salões de chá das madames.
Matthew gemeu. — Se isso não faz o homem suspeitar, não sei o que faz.
Quem quer beber chá com uma dúzia de viúvas?
— Um homem que precisa de uma noiva, — Jared respondeu.
— Ou um herdeiro, — disse Amanda, melancolicamente.
— Ahem, esposa, — brincou Matthew, e todo o grupo riu, fazendo Felicity
lembrar por meio segundo o que era ser bem-vindo em suas piadas, brincadeiras
e fofocas. Uma parte do mundo brilhante deles.
— Ele teve que conhecer as mulheres para chegar a Londres aqui esta noite,
não? — A terceira mulher da festa interveio. — Sem a aprovação delas, ninguém
teria vindo.
Houve uma batida de silêncio, e então o quarteto original riu, o som saindo
da camaradagem para a crueldade. Faulk inclinou-se para a frente e bateu na
jovem loura no queixo. — Você não é muito inteligente, não é?
Natasha golpeou o irmão no braço e ofereceu uma repreensão, falsa. —
Jared. Ora veja. Como Annabelle sabe como funciona a aristocracia? Ela se casou
tão longe de si mesma, que a garota precisou ter mesmo muita sorte! — Antes
que Annabelle pudesse sentir a completa chicotada das palavras pungentes,
Natasha se inclinou e sussurrou, alto e devagar como se a pobre mulher fosse
incapaz de entender o mais simples dos conceitos. — Todo mundo teria vindo
ver o duque eremita, querida. Ele poderia ter aparecido nu e todos nós teríamos
felizmente dançado com ele e fingido não notar.
— Com o quão louco todo mundo fez o homem ser, — Amanda interveio,
— acho que estávamos todos esperando que ele aparecesse nu.
O marido de Annabelle, herdeiro do Marquesado de Wapping, limpou a
garganta e tentou contornar o insulto à esposa. — Bem, ele já dançou com uma
série de senhoras esta noite. — Ele olhou para Natasha. — Incluindo você, Lady
Natasha.
O resto do grupo riu enquanto Natasha se aprumava – totalmente-, e
Annabelle, estreitou o olhar para seu marido risonho. Felicity achou a resposta
profundamente gratificante, já que o marido em questão certamente merecia
22
qualquer punição perversa que sua esposa estivesse planejando por ele não ter
pulado em sua defesa.
E agora era tarde demais.
— Oh, sim, — Natasha estava dizendo, olhando desconfiada. — E devo
acrescentar que ele foi um conversador brilhante.
— Ele foi? — Amanda perguntou.
— Ele foi. Não existe um vislumbre de loucura.
— Isso é interessante, Tasha — respondeu Lorde Hagin casualmente,
bebendo seu champanhe dando uma pausa dramática, — quando nós assistimos
a dança inteira, ele não pareceu falar com você uma só vez.
O resto do grupo zombou quando Natasha ficou vermelha. — Bem, isso era
claro que ele desejava falar comigo.
— Certamente, é claro, — brincou seu irmão, brindando-a com seu
champanhe.
— E, — ela continuou, — ele me segurou apertado, eu poderia dizer que ele
estava resistindo à vontade de me puxar para mais perto do que era apropriado.
— Oh, sem dúvida, — Amanda sorriu, sua descrença aparente.
Ela revirou os olhos enquanto o resto do grupo riu. Ou seja, o resto do
grupo, menos um. Jared, Lorde Faulk, estava ocupado demais olhando para
Felicity.
Droga
Seu olhar se encheu de fome e deleite de um jeito que fez com que o
estômago de Felicity se dirigisse diretamente para as pedras sob seus pés. Ela já
tinha visto essa expressão mil vezes antes. Ela costumava ficar sem fôlego
quando aparecia, porque isso significava que ele estava prestes a espetar alguém
com sua sagacidade perversa. Agora, ela ficou sem fôlego por um motivo
diferente.
— Eu digo! Eu pensei que Felicity Faircloth deixou o baile há muito tempo.
— Eu pensei que nós a expulsamos, — disse Amanda, não vendo o que Jared
viu. — Honestamente. Na sua idade - e sem amigos para falar - você pensaria
que ela deixaria de assistir aos bailes. Ninguém quer uma solteirona à espreita. É
positivamente deprimente.

23
Amanda sempre teve uma habilidade notável em fazer as palavras arderem
como o vento do inverno.
— E, no entanto, aqui está ela, — Jared pronunciou com um sorriso e uma
mão acenou em direção a Felicity. O grupo todo se virou em um quadro lento e
horrível, um sexteto de sorrisos surdos - quatro bem praticados e dois com um
leve desconforto. — Espreitando nas sombras, escutando.
Amanda investigou uma mancha em uma de suas luvas de espuma. —
Realmente, Felicity. Tão cansativo. Não há mais ninguém a quem você possa se
esgueirar?
— Talvez um insuspeito senhor cujos quartos você gostaria de explorar? —
Isto de Hagin, sem dúvida, pensando-se extremamente inteligente.
Ele não estava, embora o grupo não parecesse notar, sorrindo e achando
engraçado. Felicity detestava a lavagem de calor que se espalhou pelo seu rosto,
uma combinação de vergonha com a observação e vergonha pelo seu passado,
pelo mesmo caminho que ela, também, usara para rir e achar engraçado.
Ela pressionou de volta contra a parede, desejando que ela pudesse
desaparecer nela. O rouxinol que ela ouviu anteriormente cantou novamente.
— Pobre Felicity, — Natasha disse ao grupo, a falsa simpatia em seu tom
rastejando sobre a pele de Felicity, — sempre desejando que ela fosse mais
importante.
E assim, com aquela única palavra – importante -, Felicity descobriu que já
tivera o suficiente. Ela entrou na luz, ombros para trás e coluna reta, e nivelou seu
olhar mais frio na mulher que uma vez considerou sua amiga. — Pobre Natasha
— disse ela, imitando o tom anterior da outra mulher. — Ora, vamos! Você acha
que eu não te conheço? Eu te conheço melhor do que ninguém aqui. Solteirona,
assim como eu sou. Simples, assim como eu sou. Aterrorizada por ser colocada
de lado. Como eu fui. — Os olhos de Natasha se arregalaram com o que foi
falado. Felicity entrou para o golpe final, desejando punir mais essa mulher - essa
mulher que havia brincado tão bem de ser sua sua amiga e depois a machucado
tanto. — E quando você estiver afastada, esse grupo não vai querer você.
O rouxinol assobiou novamente. Não. Não é o rouxinol. Era um tipo
diferente de assobio, baixo e longo. Ela nunca ouvira um pássaro assim.
Ou talvez fosse a batida de seu coração que fazia o som estranho. Apressada,
voltou-se para as mais novas adições ao grupo, cujos olhos arregalados estavam
fixos nela.

24
— E veja bem, minha avó costumava me alertar para tomar cuidado - ela
gostava de dizer que alguém poderia julgar um homem por seus amigos. O
provérbio é mais do que verdadeiro com este grupo. E você deve se vigiar para
que não seja manchada pela fuligem deles. — Ela se virou para a porta. — Eu, por
exemplo, me considero sortuda por ter escapado deles quando fiz isso.
Quando ela se virou para a entrada do salão de baile, muito orgulhosa de si
mesma por se levantar para essas pessoas que a haviam consumido por tanto
tempo, palavras ecoaram através dela a partir de mais cedo:
Você é uma mulher de grande importância.
Um sorriso brincou em seus lábios com a lembrança.
De fato. Ela era.
— Felicity? — Natasha chamou quando ela chegou ao limiar. Felicity ficou
imóvel e voltou-se.
— Você não escapou de nós — a outra mulher estalou. — Nós nos
afastamos de você. — Natasha Corkwood era apenas... simplesmente...
desagradável.
— Nós não queremos mais você, e nós a jogamos para fora, — Natasha
acrescentou, as palavras frias e cruéis. — Assim como todo mundo tem feito.
Assim como sempre farão. — Ela se virou para a assembleia com uma risada
muito brilhante. — E aqui está ela, pensando que poderia disputar um duque!
Tão desagradável.
Isso é o melhor que você pode fazer?
Não. Sem ele não era. — O duque que você pretende ganhar, correto?
Natasha sorriu. — O duque que eu devo ganhar.
— Receio que você esteja muito atrasada, — disse ela, as palavras chegando
sem hesitação.
— E por que isso? — Foi Hagin quem perguntou.
Hagin, com seu rosto presunçoso e perfume nocivo e cabelos como um
príncipe de conto de fadas. E a pergunta foi feita com tal condescendência, como
se ele se dignasse a falar com ela.
Como se todos não tivessem sido amigos uma vez.

25
Mais tarde, ela culparia a lembrança dessa amizade por sua resposta. O
sussurro da vida que ela perdeu em um instante, sem entender o porquê. A
tristeza devastadora disso. O modo como a catapultou para a ruína.
Afinal de contas, tinha que haver alguma razão pela qual ela disse o que
disse, considerando o fato de que era pura idiotice. Loucura absoluta.
Uma mentira tão enorme que eclipsou o sol.
— Você está muito atrasada para o duque — ela repetiu, sabendo, ao
mesmo tempo em que falava, que precisava impedir que as palavras saíssem.
Exceto que eram como um cavalo fugitivo - solto, livre e selvagem. — Porque eu
já o consegui.

Capítulo Três

A última vez que Devil esteve dentro de Marwick House foi na noite em
que conheceu seu pai.
Ele tinha dez anos, e era muito velho para permanecer no orfanato onde
passara a vida inteira. Devil ouvira rumores sobre o tanto de meninos que
envelheceram no lugar para onde seria enviado. Ele estava se preparando para
fugir, não querendo enfrentar esse tal de reformatório, - caso as histórias fossem
acreditadas -, onde ele provavelmente morreria, e ninguém encontraria seu
corpo.
Devil acreditara nas histórias.
Todas as noites, sabendo que era uma questão de tempo antes de irem
buscá-lo, ele cuidadosamente arrumou seus pertences - um par de meias muito
grandes que ele tinha roubado da lavanderia. Uma crosta de pão ou biscoito duro
salvo da refeição da tarde. Um par de luvas usado por muitos garotos para
contar, também cheio de buracos para manter as mãos quentes por muito
tempo. E o pequeno alfinete dourado que havia sido preso a sua roupa quando
ele tinha sido encontrado como um bebê, preso com um pedaço de bordado, no
qual estava um magnífico M vermelho. O alfinete havia muito tempo perdido sua
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pintura, voltando a ser latão, e o tecido que outrora fora branco havia se tornado
cinza com sujeira de seus dedos. Mas era tudo que Devil possuía de seu passado,
e a única fonte de esperança que ele tinha para seu futuro.
Todas as noites, ele se deitava no escuro como breu, ouvindo os sons das
lágrimas dos outros meninos, contando os passos para ir de sua cama até o
corredor, pelo corredor até a porta. Fora da porta e na noite. Ele era um excelente
alpinista e decidira ir para os telhados em vez das ruas - eles teriam menos
probabilidade de encontrá-lo se eles o perseguissem.
Embora parecesse improvável que alguém o perseguisse. Parecia improvável
que alguém o quisesse.

Ele ouviu os passos ecoarem pelo corredor. Eles estavam vindo atrás dele,
para levá-lo ao reformatório. Ele rolou para o lado de seu catre, agachando-se e
recolhendo suas coisas, movendo-se para ficar de pé na parede ao lado da porta.
A fechadura estalou e a porta se abriu, revelando um fio de luz de vela -
nunca visto no orfanato depois de escurecer. Fez uma corrida, atravessando dois
pares de pernas, chegando na metade do corredor antes que uma mão forte
pousasse em seu ombro e o levantasse do chão.
Ele chutou e gritou, esticando a mão ofensiva.
— Bom Deus. Este é feroz — disse uma voz profunda de barítono, e Devil
ficou perfeitamente imóvel ao som disso. Ele nunca ouvira ninguém falar inglês
tão perfeito e medido. Ele parou de tentar morder, em vez disso, virou-se para
olhar para o homem que o segurava - alto como uma árvore e mais limpo do que
qualquer um que Devil já tivesse visto, com os olhos da cor das tábuas do
assoalho onde deveriam rezar.
Devil não era muito bom em rezar.
Alguém levantou a vela para o rosto de Devil, a chama brilhante fazendo-
o recuar. — É ele. — Era o reitor.
Devil se virou para encarar seu captor mais uma vez. — Eu não vou para o
reformatório.
— Claro que você não vai — o homem estranho dissera. Ele alcançou a
mochila de Devil, abrindo-a.
— Ei! São as minhas coisas!
O homem ignorou-o, jogando as meias e as bolachas para o lado,
levantando o alfinete e virando-o para a luz. Devil se enfureceu com a ideia desse
27
homem, esse estranho, tocando a única coisa que ele tinha de sua mãe. A única
coisa que ele tinha do seu passado. Suas pequenas mãos se fecharam em punhos
e ele deu um giro, conectando-se com o quadril do homem extravagante. — É
meu! Você não pode ter isso!
O homem sibilou de dor. — Cristo o demônio pode dar um soco.
O reitor foi picado. — Ele não aprendeu isso de nós.
Devil franziu o cenho. Onde mais ele teria aprendido? — Devolva.
O homem bem vestido convocou-o para mais perto, agitando o tesouro
de Devil no ar. — Sua mãe deu isso para você?
Devil estendeu a mão e arrancou-o da mão do homem, odiando o
constrangimento que vinha com as palavras. Embaraço e saudade. — Sim.
Um aceno de cabeça. — Eu estive procurando por você.
Esperança ardente, quente e quase desagradável no peito de Devil.
O homem continuou. — Você sabe o que é um duque?
— Não senhor.
— Você vai saber, — ele prometeu.

Memórias eram uma cadela.


Devil percorreu o longo corredor de cima da Marwick House, as tensões da
orquestra sussurrando pelo espaço mal iluminado do andar de baixo. Ele não
tinha pensado na noite em que seu pai o encontrou em uma década. Talvez mais.
Mas esta noite, estando nesta casa, que de alguma forma ainda cheirava
igual, ele se lembrava de cada pedaço daquela primeira noite. O banho, a comida
quente, a cama macia. Como se tivesse adormecido e acordado em um sonho.
E naquela noite, tinha sido um sonho. O pesadelo começara logo depois.
Colocando a lembrança de lado, ele chegou ao quarto principal, colocando
a mão na maçaneta da porta, girando-a rápido e silenciosamente, e entrando.
Seu irmão estava na janela, o copo balançando na mão, o cabelo louro
brilhando à luz das velas. Ewan não se virou para enfrentar Devil. Em vez disso,
ele disse: — Estava pensando se você viria esta noite.
A voz era a mesma. Plantada, medida e profunda, como seu pai. — Você soa
como o duque.

28
— Eu sou o duque.
Devil deixou a porta fechar atrás dele. — Não foi isso que eu quis dizer.
— Eu sei o que você quis dizer.
Devil bateu sua bengala duas vezes no chão. — Nós não fizemos um pacto
todos aqueles anos atrás?
Marwick se virou para revelar um lado do rosto. — Eu tenho procurado por
você por doze anos.
Devil afundou na poltrona baixa junto ao fogo, estendendo as pernas em
direção ao lugar onde o duque estava. — Se eu soubesse.
— Eu acho que você sabia.
Claro que eles sabiam. No momento em que eles amadureceram, um fluxo
de homens tinham chegado a colônia em torno da periferia, perguntando sobre
um trio de órfãos que poderiam ter encontrado seu caminho para Londres anos
antes. Dois meninos e uma menina, com nomes que ninguém em Covent Garden
reconheceu... ninguém além dos próprios Bastardos.
Ninguém além dos Bastardos e Ewan, o jovem duque de Marwick, rico como
rei e velho o suficiente para colocar o dinheiro em bom uso.
Mas oito anos na colônia haviam tornado Devil e Whit tão poderosos quanto
espertos, tão fortes quanto proibitivos, e ninguém falava sobre os Bastardos de
Bareknuckle por medo de retaliação. Especialmente para pessoas de fora.
E com a trilha fria, os homens que vinham farejando sempre soltavam o
cheiro e saíam.
Desta vez, no entanto, não foi um empregado que veio para eles. Foi o
próprio Marwick. E com um plano melhor do que nunca.
— Eu suponho que você pensou que, ao anunciar sua busca por uma esposa,
você chamaria nossa atenção, — disse Devil.
Marwick se virou. — Funcionou.
— Nenhum herdeiro, Ewan — disse Devil, incapaz de usar o nome do ducado
na cara dele. — Esse foi o acordo. Você se lembra da última vez que você
renegou em um negócio comigo?
Os olhos do duque ficaram sombrios. — Sim.
Naquela noite, Devil pegou tudo o que o duque amara e fugiu. — E o que
faz você pensar que eu não farei isso de novo?
29
— Porque desta vez eu sou um duque, — disse Ewan. — E o meu poder se
estende muito além de Covent Garden, não importa como pesado seus punhos são
estes dias, Devon. Eu vou trazer o inferno para baixo em cima de você. E não apenas
de você. Nosso irmão. Seus homens. O seu negócio. Você perde tudo.
Isso teria valido a pena ver ele tentar. O olhar de Devil se estreitou em seu
irmão. — O que você quer?
— Eu lhe disse que viria por ela.
Grace. O quarto elemento deles, a mulher. Whit e Devil, a chamaram de irmã,
embora nenhum sangue fosse compartilhado entre eles. A menina que Ewan
amava até então, quando eram crianças.
Grace, que três irmãos prometeram proteger todos aqueles anos atrás,
quando eram jovens e inocentes, e antes que a traição quebrasse seu vínculo.
Grace, que, na traição de Ewan, se tornara o segredo mais perigoso do
ducado. Pois era Grace quem realmente estava ligada ao ducado. Grace, nascida
do ex-duque e sua esposa, a duquesa. Sua Graça, batizou seu filho - apesar de
ser ilegal - à sua maneira.
Mas agora era Ewan, anos depois, quem levava esse nome batismal. Quem
detinha o título que não pertencia a nenhum deles por direito.
E Grace, a prova viva de que Ewan havia roubado o título, a fortuna, o futuro
– um roubo que a Coroa não tomou conhecimento.
Um roubo que, se descoberto, teria Ewan dançando na ponta de uma corda
do lado de fora de Newgate4. Devil estreitou seu olhar em seu irmão. — Você
nunca vai encontrá-la.
Os olhos de Ewan escureceram. — Eu não vou machucá-la.
— Você é tão louco quanto sua preciosa aristocracia diz, se você acha que
vamos acreditar nisso. Você não se lembra da noite em que partimos? Eu faço
isso, toda vez que eu me olho no espelho.
O olhar de Marwick cintilou no rosto de Devil, para a cicatriz feia lá, o
poderoso lembrete de quão pouca a irmandade tinha significado quando ele veio
para reivindicar o poder. — Eu não tive escolha.
— Todos nós tivemos uma escolha naquela noite. Você escolheu seu título,
seu dinheiro e seu poder. E nós, todos os três, permitimos a você, apesar de Whit

4 Newgate - é o nome de uma das entradas ao oeste da Muralha de Londres, que circunda a cidade
londrina. Está localizada entre as entradas de Ludgate e Aldersgate, e é famosa por ter servido de
prisão.
30
querer extorquir você antes que a podridão de nosso pai pudesse te consumir.
Nós deixamos você viver, apesar da sua clara vontade de nos ver mortos. Com
uma condição - nosso pai era louco por um herdeiro e, embora pudesse obter
um falso em você, ele não receberia a satisfação de uma linhagem deles - nem
mesmo na morte. Nós sempre estaremos em lados opostos nessa luta, Duque.
Nenhum herdeiro era a regra. A única regra. Nós te deixamos em paz todos esses
anos com o seu título ilícito por causa disso. Mas saiba disso - se você decidir
desrespeitá-lo, eu o rasgarei, e você nunca encontrará uma grama de felicidade
nesta vida.
— Você acha que eu estou cheio de felicidade agora?
Cristo, Devil não esperava que ele estivesse. Ele esperava que não houvesse
nada que fizesse o duque feliz. Ele se deleitara com o lendário ermida de seu
irmão, sabendo que Ewan morava na casa em que tinham sido colocados uns
contra os outros, filhos bastardos em uma batalha pela legitimidade. Por um
nome, título e fortuna. Ensinou-lhes a dançar, a jantar e a falar com eloquência
que desmentia a vergonha em que os três haviam nascido.
Ele esperava que toda a memória de sua juventude consumisse seu irmão, e
ele estava consumido com o arrependimento por se permitir interpretar o filho
apaixonado por um maldito monstro.
Ainda assim, Devil mentiu. — Eu não me importo.
— Eu tenho procurado você por mais de uma década e agora te encontrei.
Os Bastardos de Bareknuckle, ricos e implacáveis, controlando Deus sabe que
tipo de crime há no coração de Covent Garden - o lugar que me deu origem,
devo acrescentar.
— Cuspiu você fora no momento em que você o traiu. E nós — disse Devil.
— Eu fiz centenas de perguntas de mil maneiras diferentes. — Ewan se virou,
passando a mão selvagem pelo cabelo loiro. — Nenhuma mulher. Sem esposas.
Não há irmãs para falar. Onde ela está?
Houve pânico em suas palavras, uma vaga sensação de que ele poderia
enlouquecer se não recebesse uma resposta. Devil vivera na escuridão o tempo
suficiente para entender os loucos e suas obsessões. Ele balançou a cabeça,
enviando uma palavra de agradecimento aos deuses por tornar as pessoas de
Covent Garden fiéis a eles. — Sempre além do seu alcance.
— Você a tirou de mim! — O pânico se enfureceu.
— Nós a tiramos do título, — disse Devil. — Aquele que adoeceu seu pai.

31
— Seu pai também.
Devil ignorou a correção. — O título que adoeceu você. Aquele que tinha
você pronto para matá-la.
O duque olhou para o teto por um longo minuto. — Então, eu deveria ter te
matado.
— Ela teria escapado.
— Eu deveria te matar agora.
— Você nunca vai encontrá-la, então.
Um queixo familiar - um eco do pai deles - cerrado. Os olhos ficaram
selvagens, depois vazios. — Então entenda, Devil, não tenho interesse em manter
minha parte do acordo. Eu terei herdeiros. Eu sou um duque. Eu terei uma esposa
e filho dentro de um ano. Vou renunciar ao nosso acordo, a menos que você me
diga onde ela está.
A própria raiva de Devil se alargou, sua mão apertou na cabeça prateada de
sua bengala. Ele deveria matar seu irmão agora. Deixá-lo sangrando na porcaria
do chão, e finalmente dar a linhagem Marwick seu fim merecido.
Ele bateu o final de sua bengala na ponta de sua bota preta. — Você faria
bem em se lembrar das informações que tenho sobre você, Duque. Uma palavra
sobre isso faria com que você fosse enforcado.
— Por que não usá-lo? — A questão não era combativa, como Devil teria
esperado. Era algo doloroso, como se Ewan cumprimentasse a morte. Como se
ele fosse convocá-la.
Devil ignorou isso — Porque brincar com você é mais divertido.
Era mentira. Devil teria felizmente destruído este homem, seu irmão, mais
uma vez. Mas todos aqueles anos atrás, quando ele e Whit tinham escapado da
propriedade Marwick e ido para Londres e seu futuro aterrorizante, prometendo
manter Grace em segurança, eles fizeram outro voto, este para a própria Grace:
Eles não matariam Ewan.
— Sim, eu acho que vou jogar o seu jogo bobo, — disse Devil, em pé e
batendo sua bengala no chão duas vezes. — Você subestima o poder do filho
bastardo, irmão. As damas amam um homem disposto a levá-las a passear na
escuridão. E, felizmente vou arruinar suas futuras noivas. Uma após a outra, até
o final. Sem hesitação. Você nunca terá um herdeiro. — Ele se aproximou de seu
irmão, ficando cara a cara com ele. — Eu tirei Grace de você, — ele sussurrou. —
Você acha que eu não posso levar todas as outras?
32
A mandíbula de Ewan ficou pesada de raiva apaixonada. — Você vai se
arrepender de mantê-la longe de mim.
— Ninguém mantém a Grace de nada. Ela escolheu se livrar de você. Ela
escolheu fugir. Ela não confiava em você para mantê-la segura. Não quando ela
era a prova do seu mais obscuro segredo. — Ele fez uma pausa. — Robert
Matthew Carrick.
O olhar do duque se turvou com som daquele nome, e Devil se perguntou
se talvez os rumores fossem verdade. Se Ewan estava realmente louco. Não seria
uma surpresa, com o passado que o assombrava. Isso assombrou a todos eles.
Mas Devil não se importou, e ele continuou. — Ela nos escolheu, Ewan. E vou
ter certeza de que cada mulher que você escolher faça o mesmo. Arruinarei cada
uma delas, com prazer. E ao fazê-lo, vou salvá-las do seu louco desejo de poder.
— Você acha que não tem o mesmo desejo? Que não herdou isso do nosso
pai Eles os chamam reis de Covent Garden - poder, dinheiro e pecado os cercam.
Devil sorriu. — Cada pedaço disso ganhamos, Ewan.
— Roubaram, eu acho que você quer dizer.
— Você saberia uma coisa ou duas sobre futuros roubados. Sobre nomes
roubados. Robert Matthew Carrick, duque de Marwick. Um belo nome para um
menino nascido em um bordel de Covent Garden.
A testa do duque baixou, seus olhos claramente escuros. — Então deixe
começar, irmão, como parece que já fui presenteado com uma noiva. Lady Felicia
Fairhaven ou Fiona Farthing ou algum outro nome estúpido.
Felicity Faircloth.
Foi disso que as bundas de cavalos na varanda a chamaram antes de rasgá-
la em pedaços, forçando e inspirando ela a reivindicar um noivo ducal em um
ataque de escândalo ultrajante. Devil tinha assistido o desastre se desenrolar,
incapaz de impedi-la de se envolver nos assuntos de seu irmão. Em
seus assuntos.
— Se você pensa em me convencer de que não está no mercado por ter
machucado mulheres, trazer uma garota inocente para isso não é a maneira de
fazê-lo.
O olhar de Ewan encontrou instantaneamente o dele, e Devil se arrependeu
das palavras. E o que Ewan pensaria o que elas insinuaram. — Eu não vou
machucá-la, — disse Ewan. — Eu vou casar com ela.

33
O pronunciamento desagradável aranhou, mas Devil fez o melhor que pôde
para ignorar a sensação. Felicity Faircloth do nome bobo estava definitivamente
mais enredada agora. O que significava que ele não tinha escolha a não ser
envolvê-la.
Ewan pressionou. — Sua família parece bastante desesperada por um duque
– tão desesperada que a própria dama simplesmente nos declarou envolvidos
esta noite. E, pelo que sei, nós nunca nos encontramos. Ela é claramente uma
simplória, mas eu não me importo. Herdeiros são herdeiros.
Ela não era simplória. Ela era fascinante. De boca esperta e curiosa e mais
confortável na escuridão do que ele imaginaria. E tinha um sorriso que fazia um
homem prestar atenção.
Era uma pena que ele tivesse que arruiná-la.
— Eu vou encontrar a família da garota e oferecer-lhes fortuna, título, tudo
isso. O que for preciso. Banhos deve ser postado no domingo — disse Marwick,
calmamente, como se estivesse discutindo o tempo — e eles nos verão casados
dentro de um mês. Herdeiros logo a caminho.
Ninguém entra de volta. Não sem um marido influente.
As palavras de Felicity ecoaram através de Devil. A mulher ficaria encantada
com esta mudança nos acontecimentos. Com o casamento dela com Marwick,
ela conseguiria o que queria. O retorno de uma heroína à aristocracia.
Exceto que ela não retornaria.
Porque Devil nunca permitiria, sorriso bonito ou não. Embora o sorriso possa
fazê-la estragar ainda melhor.
As sobrancelhas de Devil baixaram. — Você terá herdeiros com Felicity
Faircloth sobre o meu cadáver apodrecendo.
— Você acha que ela vai escolher Covent Garden sobre Mayfair?
Eu quero voltar.
Mayfair era tudo que Felicity Faircloth queria. Ele simplesmente teria que
mostrar a ela o que mais havia para ver. Nesse meio tempo, ele jogaria sua faca
mais afiada. — Acho que ela não é a primeira mulher a arriscar comigo, em vez
de passar a vida inteira com você, Ewan.
Acertou em cheio.
O duque desviou o olhar de volta para a janela. — Saia.

34
Capítulo Quatro

Felicity percorreu a porta aberta de sua casa ancestral, ignorando o fato de


que seu irmão estava em seus calcanhares. Ela fez uma pausa para forçar um
sorriso para o mordomo, ainda segurando a porta. — Boa noite, Irving.
— Boa noite, minha senhora, — entoou o mordomo, fechando a porta atrás
de Arthur e pegando as luvas do conde. — Meu Senhor.
Artur sacudiu a cabeça. — Eu não vou ficar, Irving. Só estou aqui para
conversar com minha irmã.
Felicity se virou para encontrar o olhar marrom idêntico ao dela. — Agora
você gostaria de falar? Nós voltamos para casa em silêncio.
— Eu não chamaria isso de silêncio.
— Oh, não?
— Não. Eu chamaria de sem fala.
Ela zombou, arrancando as luvas, usando o movimento para evitar os olhos
de seu irmão e a quente culpa que a atravessou com a ideia de discutir a
desastrosa noite que tinha se desdobrado.
— Bom Deus, Felicity, eu não tenho certeza se há um irmão na cristandade
que seria capaz de encontrar palavras na sequência de sua audácia.
— Oh, por favor. Eu contei uma pequena mentira. — Ela foi para a escada,
acenando com a mão no ar e tentando soar como se não estivesse tão
horrorizada quanto ela estava. — Muitas pessoas fizeram coisas muito mais
escandalosas. Não é como se eu trabalhasse em um bordel.

35
Os olhos de Arthur saltaram das órbitas. — Uma pequena mentira? — Antes
que ela pudesse responder, ele acrescentou: — E você nem deveria saber a
palavra bordel.
Ela olhou para trás, os dois passos que já tinha dado colocando-a acima de
seu irmão gêmeo. — Mesmo?
— Mesmo.
— Eu suponho que você acha que não é apropriado, eu conhecer a palavra
bordel.
— Eu não acho. Eu sei. E pare de dizer bordel.
— Estou deixando você desconfortável?
Seu irmão estreitou seu olhar castanho no dela. — Não, mas posso ver que
você deseja. E eu não quero que você ofenda Irving.
As sobrancelhas do mordomo se ergueram.
Felicity se virou para ele. — Estou ofendendo você, Irving?
— Não mais do que o habitual, minha senhora, — o homem mais velho
disse, todo sério. Felicity deu uma risadinha quando ele se despediu.
— Estou feliz que um de nós ainda é capaz de encontrar leveza em nossa
situação. — Arthur olhou para o grande lustre acima e disse: — Bom Deus,
Felicity.
E eles foram devolvidos para onde eles tinham começado, culpa, pânico e
não uma pequena quantidade de medo correndo por ela. — Eu não quis dizer
isso.
Seu irmão lhe lançou um olhar. — Bordel?
— Oh, agora é você quem está brincando?
Ele abriu bem as mãos. — Eu não sei mais o que fazer. — Ele parou, então
pensou em algo mais para dizer. O óbvio — Como você poderia pensar...
— Eu sei, — ela interrompeu.
— Não, eu não acho que você saiba. O que você fez é...
— Eu sei, — ela insistiu.
— Felicity. Você disse ao mundo que vai se casar com o Duque de Marwick.
Ela estava se sentindo meio enjoada. — Não foi ao mundo.

36
— Não, apenas para seis dos maiores fofoqueiros. Nenhum dos quais gosta
de você, devo acrescentar, por isso não é como se pudéssemos silenciá-los. — A
lembrança de seu desgosto por ela não ajudava suas entranhas agitadas. Arthur
estava insistindo, no entanto, alheio. — Não que isso importe. Você poderia
também ter gritado da plataforma da orquestra pela velocidade com que isso
atravessou o salão de baile. Eu tive que sair de lá antes que Marwick me
procurasse e me confrontasse sobre isso. Ou, pior, antes que ele se levantasse na
frente de todos ali atentos e chamasse você de mentirosa.
Foi um erro terrível. Ela sabia. Mas eles a deixaram tão irritada. E eles foram
tão cruéis. E ela se sentiu tão sozinha. — Eu não queria...
Arthur suspirou, longo e pesado com um fardo invisível. — Você nunca quis.
As palavras eram suaves, quase sussurradas, como se Felicity não pudesse
ouvi-las. Ou como se ela não estivesse lá. Mas ela estava, claro. Assim como ela
pode sempre estar. — Arthur...
— Você não queria ficar presa no quarto de um homem...
— Eu nem sabia que era o seu quarto de dormir. — Tinha sido uma porta
trancada. No andar de cima, em um baile que havia quebrado seu coração.
Naturalmente, Arthur nunca entenderia isso. Em sua mente, ela era sem cérebro.
E talvez tivesse estado sem.
Ele estava falando sobre outra coisa agora. — Você não quis recusar três
ofertas perfeitamente boas nos meses seguintes.
Sua espinha se endireitou. Aqueles que ela quis dizer. — Eles eram ofertas
perfeitamente boas se você gostasse de velhice ou de estupidez.
— Eles eram homens que queriam se casar com você, Felicity.
— Não, eles eram homens que queriam se casar com meu dote. Eles queriam
estar no negócio com você, — ressaltou. Arthur era uma grande mente para os
negócios e podia transformar penas de ganso em ouro. — Um deles até me disse
que eu poderia continuar morando aqui se eu quisesse.
As bochechas do irmão estavam ficando vermelhas. — E o que estaria errado
com isso?
Ela piscou. — Com a vida separada do meu marido em um casamento sem
amor?
— Por favor, — ele zombou, — agora estamos no amor? Você pode muito
bem levar-se ao maldito encalhamento.

37
Ela estreitou o olhar para ele. — Por que isso agora? Você tem amor.
Arthur exalou asperamente. — É diferente.
Vários anos atrás, Arthur havia se casado com Lady Prudence Featherstone
em uma famosa partida de amor. Pru era a garota que morava na propriedade
em ruínas ao lado do rancho do pai de Arthur e Felicity, e toda Londres suspirou
quando se referiram ao brilhante e jovem Conde de Grout, herdeiro de um
marquês, e sua empobrecida, adorável noiva, que imediatamente entregou a seu
marido um herdeiro e estava atualmente em casa, esperando o nascimento de
seu sobressalente.
Pru e Arthur adoravam um ao outro daquela forma irracional que ninguém
acreditava existir até que alguém o testemunhasse. Eles nunca discutiram,
gostavam das mesmas coisas, e costumavam serem encontrados juntos nos
limites dos salões de festas de Londres, preferindo a companhia um do outro à
companhia de qualquer outra pessoa.
Era nauseante, na verdade.
Mas não era tão impossível, era? — Por quê?
— Porque eu conheci Pru por toda a minha vida e o amor não vem para
todos. — Ele fez uma pausa, depois acrescentou: — E mesmo quando isso
acontece, vem com sua própria coleção de desafios.
Ela inclinou a cabeça para as palavras. O que elas quiseram dizer? — Arthur?
Ele balançou a cabeça, recusando-se a responder. — O ponto é: você está
com vinte e sete anos, e é hora de você parar de hesitar e se casar com um
homem decente. Claro, agora você tornou isso quase impossível.
Mas ela não queria nenhum marido velho. Ela queria mais do que isso. Ela
queria um homem que pudesse... ela não mesmo sabia dizer. Um homem que
pudesse fazer mais do que casar com ela e deixá-la sozinha pelo resto de sua
vida, certamente.
No entanto, ela não queria que sua família sofresse por suas ações selvagens.
Ela olhou para as mãos e disse a verdade. — Eu sinto Muito.
— Seu arrependimento não é suficiente. — A resposta foi aguda - mais
aguda do que ela poderia esperar de seu irmão gêmeo, que estava com ela desde
o momento em que nasceram. Desde antes disso. Ela encontrou seu olhar
castanho - olhos que ela conhecia tão bem porque eram os dela também - e ela
viu. Incerteza. Não, pior. Desapontamento.
Ela deu um passo para baixo, na direção dele. — Arthur, o que aconteceu?
38
Ele engoliu e sacudiu a cabeça. — Não é nada. Eu só... eu pensei que talvez
tivéssemos uma chance.
— No duque? — Seus olhos estavam arregalados com descrença. —
Nós não o fizemos, Arthur. Nem antes de eu fazer o que eu fiz.
— Em... — Ele fez uma pausa séria. — Em encontrar um partido adequado.
— E havia uma equipe de cavalheiros clamando para me encontrar hoje à
noite?
— Havia Matthew Binghamton.
Ela piscou. — Sr. Binghamton é mortalmente aborrecido.
— Ele é rico como o rei — ofereceu Arthur.
— Não é rico o suficiente para que eu me casar com ele, eu creio. A riqueza
não compra personalidade. — Quando Arthur resmungou, ela acrescentou: —
Seria tão ruim para mim permanecer uma solteirona? Ninguém vai culpá-lo por
eu ficar sem casar. Papai é o Marquês de Bumble, e você é um conde e herdeiro.
Nós podemos ficar sem um casamento, não é?
Enquanto ela estava totalmente embaraçada com o que tinha acontecido,
havia uma parte não pequena dela que estava muito grata por ter terminado a
charada.
Ele parecia estar pensando em outra coisa. Alguma coisa importante. —
Arthur?
— Também havia Friedrich Homrighausen.
—Friedrich... — Felicity inclinou sua cabeça, confusão queima. — Arthur,
Herr Homrighausen chegou a Londres há uma semana. E ele não fala inglês.
— Ele não pareceu ter problema com isso.
— Como eu não falo alemão, não lhe ocorreu que eu poderia ter problema
com isso?
Ele levantou um ombro. — Você poderia aprender.
Felicity piscou. — Arthur, eu não tenho nenhum desejo de viver na Baviera.
— Eu ouvi que é muito legal. Dizem que Homrighausen tem um castelo. —
Ele acenou com a mão. — Com torres.
Ela inclinou a cabeça. — Estou no mercado de torres?
— Você precisa estar.
39
Felicity observou seu irmão por um longo momento, algo provocante sobre
as bordas do pensamento - algo que ela não podia colocar na voz, então ela se
concentrou, — Arthur?
Antes que ele pudesse responder, meia dúzia de latidos soou de cima,
seguido de: — Oh, querida. Presumo que o baile não saiu como planejado? — A
pergunta vinda do corrimão do primeiro andar, com três Dachshunds5 de pelos
compridos nos calcanhares, o orgulho da Marquesa de Bumble, que, apesar de
ter um nariz vermelho em função do resfriado que a tinha mantido em casa,
estava em perfeita graça, envolto em um lindo roupão cor de vinho, cabelos
prateados sobre os ombros. — Você conheceu o duque?
— Ela não o fez, na verdade, — disse Arthur.
A Marquesa virou um olhar desapontado para sua única filha. — Oh, Felicity.
Isso não pode acontecer. Duques não crescem em árvores, você sabe.
— Não? — Felicity deu sua resposta descarada, desejando que seu irmão
gêmeo se acalmasse enquanto trabalhava para afastar os cães que agora estavam
de pé sobre as patas traseiras, agarrando suas saias. — Desce! Saia!
— Você não é tão divertida quanto pensa, — sua mãe continuou, ignorando
o ataque canino acontecendo abaixo. — Por acaso existe um duque disponível
por ano? Alguns anos, sem duques! E você já perdeu sua chance no ano passado.
— O Duque de Haven já era casado, mãe.
— Você não precisa dizer isso, como se eu não me lembrasse disso! — Sua
mãe apontou. — Eu gostaria de ter uma conversa séria sobre como ele te
cortejou sem nunca ter intenção de se casar com você.
Felicity ignorou o monólogo, que ouvira centenas de vezes antes. Ela nunca
teria sido enviada para competir pela mão do duque se não fosse pelo fato de
que outros homens não estavam exatamente clamando por tê-la, então ela não
se importava que ele tivesse escolhido permanecer casado com sua esposa.
Além do fato de que gostava bastante da Duquesa de Haven, ela também
aprendeu algo crítico sobre a instituição do casamento: que um homem
selvagemente apaixonado era um marido extraordinário.
Não que um marido descontroladamente apaixonado estivesse nas cartas
de Felicity. Aquele navio em particular tinha navegado hoje à noite. Bem. Tinha

5Dachshund ou teckel (em alemão: Dackel), também apelidado de cachorro salsicha, é uma raça de
cães oriunda da Alemanha.
40
navegado meses atrás, se fosse honesta, mas esta noite foi realmente o último
prego no caixão. — Estou misturando metáforas.
— O que? — Arthur estalou.
— Você está o que? — Sua mãe repetiu.
— Nada. — Ela acenou com a mão. — Eu estava pensando em voz alta.
Arthur suspirou.
— Pelo amor de Deus, Felicity. Isso certamente não ajudará a conquistar o
duque — disse a Marquesa.
— Mãe, Felicity não está conseguindo o duque.
— Não, com essa atitude, ela não vai, — sua mãe retrucou. — Ele nos
convidou para um baile! Toda Londres acha que ele está procurando por uma
esposa! E você é filha de um Marquês, irmã de um Conde, e tem todos os dentes!
Felicity fechou os olhos por um momento, resistindo à vontade de gritar,
chorar, rir ou fazer todos os três. — É isso o que os duques estão procurando
nestes dias, dentes?
— É parte disso! — Insistiu a Marquesa, com as palavras em pânico se
transformando em uma tosse seca. Ela pegou um lenço para cobrir a boca. —
Maldito resfriado, ou eu poderia ter feito sua introdução eu mesma!
Felicity fez uma prece silenciosa de agradecimento a qualquer deus que
tivesse resfriado a Bumble House dois dias antes, ou ela sem dúvida teria sido
forçada a dançar ou algum outro tipo de constrangimento com o Duque de
Marwick.
Ninguém gostava de constrangimento. Por que estar em todos os bailes da
cristandade estava além do alcance de Felicity. — Você não poderia ter feito a
introdução, — disse Felicity. — Você nunca conheceu Marwick. Ninguém o
conhecia. Porque ele é um eremita e um louco, se é que se acredita na fofoca.
— Ninguém acredita em fofoca.
— Mãe, todo mundo acredita em fofoca. Se eles não... — Ela parou enquanto
a Marquesa espirrava. — Deus te abençoe.
— Se Deus quisesse me abençoar, ele te casaria com o Duque de Marwick.
Felicity revirou os olhos. — Mãe, depois desta noite, se o Duque de Marwick
mostrasse algum interesse por mim, seria uma indicação clara de que ele é de fato

41
um louco, mexendo naquela enorme casa dele, coletando mulheres solteiras e
vestidas com roupas extravagantes suficiente para um museu privado.
Arthur piscou. — Isso é um pouco sombrio.
— Bobagem, — disse a mãe. — Duques não colecionam mulheres. — Ela fez
uma pausa. — Espera. Depois desta noite?
Felicity ficou em silêncio.
— Arthur? — Sua mãe cutucou. — Como foi a noite, algum problema?
Felicity virou as costas para a mãe e lançou um olhar arregalado para o
irmão. Ela não podia suportar ter que contar a noite desastrosa para sua mãe.
Para isso, ela precisava dormir. E possivelmente láudano. — Sem complicações,
não foi, Arthur?
— Que pena, — disse a Marquesa. — Nenhum solteiro adicional?
— Adicional? — Felicity repetiu. — Artur, você também está procurando um
marido?
Arthur pigarreou. — Não.
As sobrancelhas de Felicity se levantaram. — Não, para quem?
— Não, para mamãe.
— Oh, — disse a Marquesa de longe. — Nem mesmo Binghamton? Ou o
alemão?
Felicity piscou. — O alemão. Herr Homrighausen.
— Dizem que ele tem um castelo! — Disse a Marquesa antes de se dissolver
em outro ataque de tosse, seguido por um coro de latidos.
Felicity ignorou sua mãe, mantendo sua atenção em seu irmão, que fez tudo
o que pôde para evitar olhá-la antes de finalmente responder com irritação. —
Sim.
A palavra desvendou o pensamento que havia sussurrado em torno da
consciência de Felicity mais cedo. — Eles são ricos.
Arthur lhe deu um olhar. — Eu não sei o que você quer dizer.
Ela olhou para a mãe. — Sr. Binghamton, Herr Homrighausen, o Duque de
Marwick. — Ela se virou para Arthur. — Nenhum deles é um bom partido para
mim. Mas eles são todos ricos.

42
— Realmente, Felicity! As senhoras não discutem as finanças de seus
pretendentes! — gritou a Marquesa, os cães latindo e brincando ao redor dela
como pequenos e gordos querubins.
— Exceto que eles não são meus pretendentes, não é? — Ela perguntou,
entendendo, quando ela virou um olhar acusatório em seu irmão. — Ou se
fossem... Eu arruinei tudo essa noite.
A marquesa ofegou com as palavras. — O que você fez desta vez?
Felicity ignorou o tom, como se fosse esperado que Felicity fizesse alguma
coisa para fazer com que quaisquer pretendentes elegíveis fugissem. O fato de
ela ter feito exatamente isso era irrelevante.
O fato relevante era este: sua família guardava segredos dela. — Arthur?
Arthur se virou para olhar para a mãe, e Felicity reconheceu o mesmo apelo
frustrado de sua infância em seus olhos, como se ela tivesse cortado a última
torta de cereja ou pedisse para segui-lo e seus amigos para a lagoa à tarde. Ela
seguiu seu olhar para onde sua mãe estava de vigia do alto, e por um momento,
ela se perguntou sobre todas as vezes que eles estavam nessa posição exata,
crianças abaixo e pais acima, como Salomão, esperando por uma solução para a
sua problemática infinitesimais.
Mas esse problema não era infinitesimal.
Se o desamparo no rosto de sua mãe era uma indicação, esse problema era
maior do que Felicity imaginara.
— O que aconteceu? — Felicity perguntou antes de mudar para ficar
diretamente na frente de seu irmão. — Não. Não para ela. Eu estou no centro
disso, obviamente, então gostaria de saber o que aconteceu.
— Eu poderia pedir a mesma coisa, — sua mãe disse do alto.
Felicity não olhou quando ela falou para a Marquesa. — Eu disse a toda
Londres que eu estava casando com o Duque de Marwick.
— Você o quê?!
Os cães começaram a latir de novo, em voz alta e frenética, enquanto a
senhora sucumbia a outro ataque de tosse. Ainda assim, Felicity não desviou o
olhar do irmão. — Eu sei. É terrível. Eu tenho causado um pouco de problemas.
Mas eu não sou a única pessoa... Eu sou? — O olhar culpado de Arthur encontrou
o dela, e ela repetiu: — Eu sou?
Ele respirou fundo e exalou, longo e cheio de frustração. — Não.
43
— Algo aconteceu.
Ele assentiu.
— Algo a ver com dinheiro. — Ele assentiu novamente.
— Felicity, não discutimos dinheiro com homens.
— Então, por todos os meios, mãe, você deveria ir embora, mas pretendo
ter essa conversa. — Os olhos castanhos de Arthur encontraram os dela. — Algo
a ver com dinheiro.
Ele desviou o olhar, na direção dos fundos da casa, onde, por um corredor
escuro, uma escadaria estreita subia até os aposentos dos criados, duas dúzias
de outros dormiam, sem saber que o destino deles estava na balança. Assim
como Felicity havia feito, todas as noites antes, quando seu irmão, a quem ela
amava de coração cheio, assentiu com a cabeça uma última vez e disse: — Nós
não temos nenhum.
Ela piscou, as palavras ao mesmo tempo esperadas e chocantes. — O que
isso significa?
Frustração explodiu e ele se virou, correndo os dedos pelos cabelos antes de
se virar para ela, de braços abertos. — Como isso soa? Não há dinheiro.
Ela desceu da escada, sacudindo a cabeça. — Como isso é possível? Você é
Midas.
Ele riu, o som totalmente sem humor. — Não mais.
— Não é culpa de Arthur, — a Marquesa de Bumble chamou do patamar. —
Ele não sabia que era um mau negócio. Ele achava que os outros homens eram
confiáveis.
Felicity balançou a cabeça. — Um mau negócio?
— Não foi um mau negócio, — disse ele, suavemente. — Eu não fui
enganado. Eu simplesmente... — Ela se aproximou dele, estendendo a mão para
ele, querendo consolá-lo. E então ele acrescentou: — Eu nunca imaginei que iria
perdê-lo.
Ela estendeu a mão para ele, tomando as mãos dele nas dela. — Vai ficar
tudo bem, — ela disse baixinho. — Então você perdeu algum dinheiro.
— Todo o dinheiro. — Ele olhou para as mãos, entrelaçadas. — Cristo,
Felicity. Pru não pode saber.

44
Felicity não achava que sua cunhada se importaria nem um pouco se Arthur
tivesse feito um mau investimento. Ela ofereceu-lhe um sorriso. — Arthur. Você é
herdeiro de um Marquês. O papai irá ajudá-lo enquanto você restaura o seu
negócio e a sua reputação. Existem terras. Casas. Isto deve endireitar-se.
Artur sacudiu a cabeça. — Não, Felicity. Pai investiu comigo. Tudo se foi.
Tudo o que não foi implicado.
Felicity piscou, finalmente voltando-se para sua mãe, que ficou de pé, com
uma mão no peito, e assentiu. — Tudo.
— Quando?
— Não é importante.
Ela girou em seu irmão. — Na verdade, acho que é. Quando?
Ele engoliu em seco. — Dezoito meses atrás.
O queixo de Felicity caiu. Dezoito meses. Eles mentiram para ela por um ano
e meio. Eles tinham trabalhado para casar ela com uma coleção de homens
menos do que o ideal, então a mandaram para uma festa de campo ridícula para
jogar sua sorte com outras quatro mulheres que estavam tentando atrair o Duque
de Haven para aceitar uma delas como sua segunda esposa. Ela deveria saber
disso, é claro, no momento em que sua mãe, que cuidava da propriedade, seus
cachorros e seus filhos (nessa ordem), apresentara a ideia de Felicity competir
pela mão do duque como um conceito sonoro.
Ela deveria saber quando seu pai permitiu. Quando o irmão dela permitiu.
Ela olhou para ele. — O duque era rico.
Ele piscou. — Qual?
— Ambos. No verão passado. Hoje à noite.
Ele assentiu.
— E todos os outros.
— Eles são ricos o suficiente.
Sangue corria pelas orelhas dela. — Eu deveria me casar com um deles.
Ele assentiu.
— E esse casamento teria enchido os cofres.
— Essa era a ideia.

45
Eles a usavam há um ano e meio fazendo planos sem ela saber. Por um ano
e meio, ela tinha sido um peão neste jogo. Ela balançou a cabeça. — Como você
pôde não ter me dito que o objetivo era o casamento a qualquer custo?
— Porque não foi. Eu não casaria você com ninguém...
Ela ouviu a hesitação no final da declaração. — No entanto?
Ele suspirou e acenou com a mão. — No entanto. — Ela ouviu as palavras
não ditas que se seguiram. Nós precisávamos da partida.
Sem dinheiro.
— E os servos?
Ele balançou sua cabeça. — Nós cortamos a equipe em todos os lugares,
menos aqui.
Ela balançou a cabeça e se virou para a mãe. — Todas essas desculpas - as
inúmeras razões porque não fomos para o campo.
— Não queríamos preocupá-la, — respondeu a mãe. — Você já estava tão...
Desamparada. Arruinada. Esquecida.
Felicity balançou a cabeça. — E os moradores? — As pessoas que faziam o
trabalho duro no campo. Quem confiou no título para fornecer. Para proteger.
— Eles mantêm o que fazem agora, — respondeu Arthur. — Eles trocam por
seu próprio gado. Eles consertam suas próprias casas.
— Protegido agora, mas não pelo título ao qual a terra estava amarrada.
Sem dinheiro. Nada que proteja a terra para as gerações futuras - para os
filhos dos inquilinos. Para o jovem filho de Arthur e o segundo a caminho. Para
o seu próprio futuro, se ela não se casasse.
Não podemos permitir outro escândalo.
As palavras de Arthur ecoaram através dela novamente, espontaneamente.
Com novo significado literal.
Era o século XIX, e ter um título não garantia o estilo de vida que uma vez
possuía; havia aristocratas empobrecidos em toda parte em Londres e, em breve,
a família Faircloth seria acrescentada às suas fileiras.
Não foi culpa de Felicity, mas, de alguma forma, pareceu-lhe inteiramente
assim. — E agora, eles não me querem.
Arthur desviou o olhar, envergonhado. — Agora, eles não vão ter você.
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— Porque eu menti.
— O que a possuía para contar uma mentira tão estonteante? — Sua mãe
gritou, ofegante em pânico.
— Eu imagino que a mesma coisa, que você possuía para manter um segredo
tão impressionante, — Felicity disse, frustração correndo por ela. — Desespero.
Raiva. Solidão. Um desejo de moldar o futuro sem pensar no que pode
acontecer a seguir.
Seu gêmeo encontrou seus olhos, seu olhar claro e honesto. — Isso foi um erro.
Ela levantou o queixo, raiva e terror inundando-a. — Meu também.
— Eu deveria ter dito a você.
— Há muitas coisas que nós dois deveríamos ter feito.
— Eu pensei que eu poderia poupá-la, — ele começou, e Felicity levantou a
mão para parar suas palavras.
— Você pensou que poderia poupá-lo. Você pensou que poderia salvar-se
de ter de dizer a sua esposa, a quem você deveria amar e valorizar, a verdade da
sua realidade. Você pensou que poderia se poupar do embaraço.
— Não apenas embaraço. Preocupação. Eu sou o marido dela. Eu devo cuidar
dela. De todos eles. — Uma esposa. Uma criança. Outro a caminho.
Uma pontada de tristeza percorreu Felicity. Um fio de empatia, tingido com
sua própria decepção. Seu próprio medo. Sua própria culpa por se comportar de
maneira precipitada demais, por falar muito alto, por cometer erros demais.
No silêncio que se seguiu, Arthur acrescentou: — Eu não deveria ter pensado
em usar você.
— Não, — disse ela, irritada o suficiente para não deixá-lo fora do gancho. —
Você não deveria ter.
Ele deu outra risada sem graça. — Suponho que eu entendi o que está por
vir. Afinal, você não vai se casar com um duque rico. Ou alguém rico para esse
assunto. E você não deveria ter que diminuir suas expectativas.
Exceto agora que Felicity contou uma mentira enorme e arruinou qualquer
chance de suas expectativas serem atendidas. E, na balança, arruinou qualquer
chance de o futuro de sua família ser seguro. Ninguém iria querer ela agora - não
só ela estava manchada por seu comportamento passado, ela havia mentido.
Publicamente. Sobre o casamento com um duque.

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Nenhum homem em sã consciência acharia uma ofensa perdoável. Adeus,
expectativas.
— As expectativas não valem os pensamentos desperdiçados se não
tivermos um teto sobre nossas cabeças. — A Marquesa suspirou, como se
pudesse ler os pensamentos de Felicity de cima. — Bom Deus, Felicity, o que
realmente possuiria você?
— Não importa, mãe, — Arthur interveio antes que Felicity pudesse falar.
Arthur, sempre protegendo-a. Sempre tentando proteger a todos, o homem
idiota.
— Você está certo. — A Marquesa suspirou. — Suponho que ele tenha
negado toda essa mentira neste momento, e nós retornamos ao nosso legítimo
lugar de escândalo.
— Provavelmente sim, — Felicity disse, culpa, fúria e frustração por confundir
a guerra nas suas vísceras. Afinal, como mulher, ela tinha um propósito singular
em momentos como esse... casar por dinheiro e devolver honra e riqueza à sua
família.
Exceto que ninguém se casaria com ela depois desta noite. Pelo menos,
ninguém em sã consciência.
Arthur sentiu seu desgosto pela direção da conversa e colocou as mãos nos
ombros dela, inclinando-se para pressionar um beijo casto e fraterno em sua
testa. — Vamos ficar bem, — disse ele, com firmeza. — Eu vou encontrar outro
caminho.
Ela assentiu, ignorando a picada de lágrimas ameaçando vir. Sabendo que
dezoito meses haviam se passado, e a melhor solução que Arthur tivera era seu
casamento. — Vá para casa, para sua esposa.
Ele engoliu com as palavras - com a lembrança de sua linda e amorosa
esposa, que não sabia nada sobre a bagunça na qual todos tinham chegado.
Prudência sortuda. Quando Arthur conseguiu encontrar sua voz, ele sussurrou:
— Ela não pode saber.
O medo em suas palavras era palpável. Horrível. Que bagunça eles estavam.
Felicity assentiu. — O segredo é nosso.
Quando a porta se fechou atrás dele, Felicity levantou sua saia - saias em um
vestido da última temporada, alterada para acomodar mudanças na moda atual,
em vez de ser doado e substituído por algo novo. Como ela não percebeu? Ela
subiu as escadas, os cachorros indo de um lado para o outro na frente dela.
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Quando chegou ao patamar, ela enfrentou sua mãe. — Seus cães estão
tentando me matar.
A Marquesa assentiu, permitindo a mudança de assunto. — É possível. Eles
são muito inteligentes.
Felicity forçou um sorriso. — O melhor dos seus filhos.
— Menos problemas do que todo o resto, — respondeu a mãe, inclinando-
se e recolhendo um animal longo e peludo em seus braços. — O duque era muito
bonito?
— Eu mal o vi, mas parecia que sim. — Sem aviso, Felicity se viu pensando
no outro homem. Aquele na escuridão. O que ela só queria ter visto. Ele parecia
mágico, como uma chama invisível.
Mas se esta noite lhe ensinou alguma coisa, foi que a magia não era real.
O que era real era o problema.
— Tudo o que queríamos era um bom casamento. — As palavras de sua mãe
cortaram seus pensamentos.
Os lábios de Felicity se torceram. — Eu sei.
— Foi tão ruim quanto parece?
Você não escapou de nós; nós saímos de você.
Felicity arruinada. Felicity esquecida. Felicity desamparada.
Você está muito atrasada para o duque; Eu já o consegui.
Felicity assentiu. — Foi pior.
Ela fez o seu caminho através dos corredores escuros para o seu quarto de
dormir. Entrando na sala mal iluminada, ela jogou as luvas e a bolsa na mesinha
do lado de dentro da porta, fechando-a e pressionando contra ela, finalmente
soltando a respiração que estava segurando desde que se vestira para o baile
Marwick horas antes.
Ela foi até a cama na escuridão, se jogando de volta no colchão. Ela olhou
para o dossel por um longo momento, repassando os eventos horripilantes da
noite.
— Que desastre.
Por um breve momento, ela imaginou o que faria se não fosse ela mesma –
alta demais, simples demais, velha demais e sincera, uma invisivel adequada, sem

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nenhuma esperança de atrair um solteiro elegíveis. Ela imaginou se esgueirando da
casa, retornando à cena de seu crime devastador.
Ganhar uma fortuna para sua família e o mundo amplo para si mesma.
Querendo mais do que ela poderia ter.
Se ela não fosse ela mesma, ela poderia fazer isso. Ela poderia encontrar o
duque e cortejá-lo. Ela poderia trazê-lo de joelhos. Se ela fosse linda, espirituosa
e cintilante. Se ela estivesse no centro e não no limite do mundo. Se ela estivesse
dentro do quarto, e não espiando pelo buraco da fechadura.
Se ela pudesse incitar a paixão, o tipo que ela viu, consumiria um homem
como mágica. Como fogo. Como a chama.
Seu estômago revirou com o pensamento, com a fantasia que veio com isso.
Com o prazer de algo que nunca se permitiria imaginar. Um duque, desesperado
por ela.
Um casamento.
— Se ao menos eu fosse chama, — ela disse para o dossel acima. — Isso
resolveria tudo.
Mas isso era impossível. E ela imaginou um tipo diferente de chama,
rasgando Mayfair, incinerando seu futuro. O da sua família.
Ela imaginou os nomes.
Felicity Mentirosa.
Felicity Falsa.
— Pelo amor de Deus, Felicity, — ela sussurrou.
Ela ficou ali envergonhada e em pânico por um longo tempo, considerando
seu futuro, até que o ar ficou pesado, e ela considerou dormir em seu vestido ao
invés de chamar uma empregada para ajudá-la a sair dele. Mas era pesado e
restritivo, e o espartilho já estava tornando difícil de respirar.
Com um gemido, ela se sentou, acendeu a vela na mesa de cabeceira e foi
puxar o cordão para chamar a criada.
Antes que ela pudesse alcançá-lo, no entanto, uma voz soou da escuridão.
— Você não deveria contar mentiras, Felicity Faircloth.

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Capítulo Cinco

Felicity saltou direto no ar com um pequeno grito com as palavras, girando


para enfrentar o outro lado da sala, encoberto pela escuridão, onde nada parecia
fora do lugar.
Levantando a vela para o alto, ela olhou para os cantos, a luz finalmente
tocando um par de botas pretas perfeitamente polidas, esticadas, cruzadas no
tornozelo, a ponta prateada brilhante de uma bengala descansando na ponta de
um pé calçado.
Era ele.
Aqui. Em seu quarto de dormir. Como se fosse perfeitamente normal.
Nada nessa noite era normal.
Seu coração começou a bater mais forte do que antes, e Felicity recuou em
direção à porta. — Eu acredito que você tem a casa errada, senhor.
As botas não se mexeram. — Eu tenho a casa certa.
Ela piscou. — Você certamente tem o quarto errado.
— É o quarto certo, também.
— Este é o meu quarto de dormir.
— Eu não poderia muito bem bater à porta na calada da noite e pedir para
falar com você, poderia? Eu escandalizaria os vizinhos e, em seguida, onde isso
deixaria você?
Ela se absteve de apontar que os vizinhos ficariam escandalizados de manhã
de qualquer maneira, quando toda Londres soubesse que mentira.
Ele ouviu o pensamento de qualquer maneira. — Por que você mentiu?

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Ela ignorou a pergunta. — Eu não converso com estranhos no meu quarto
de dormir.
— Mas nós não somos estranhos, amor. — A ponta de prata da bengala
bateu na ponta da bota em um ritmo lento e uniforme.
Os lábios dela se contraíram. — Tenho pouco tempo para pessoas que não
têm importância.
Embora ele permanecesse no escuro, ela imaginou que podia ouvir o sorriso
dele. — E esta noite você mostrou isso, não é mesmo, Felicity Faircloth?
— Eu não sou a única que mentiu. — Ela estreitou seu olhar na escuridão. —
Você sabia quem eu era.
— Você é a única cuja mentira é grande o suficiente para derrubar esta casa.
Ela fez uma careta. — Você tem o melhor de mim, sirrah6. Para qual
finalidade? Medo?
— Não. Não quero assustar você. — A voz do homem era pesada como a
escuridão em que ele estava encoberto. Baixa, calma e de alguma forma mais
clara que um tiro.
O coração de Felicity trovejou. — Eu acho que é precisamente o que você
deseja fazer. — Aquela ponta prateada bateu novamente e ela virou o olhar
irritado para aquilo. — Eu também acho que você deve sair antes de eu decidir
que, em vez de medo, eu vou sentir raiva.
Pausa.
Toque, toque.
E então ele se moveu, inclinando-se para a frente no círculo de luz, para que
ela pudesse ver suas pernas longas, chapéu preto alto em uma coxa. Suas mãos
estavam descobertas de luvas e três argolas de prata brilhavam à luz das velas
no polegar, na frente e nos dedos anulares da direita, sob as mangas pretas de
seu sobretudo, que encaixavam perfeitamente seus braços e ombros. O anel de
luz terminava em sua mandíbula, afiada e bem barbeada. Ela levantou a vela mais
uma vez e lá estava ele.
Ela inalou bruscamente, lembrando-se ridiculamente de como pensara antes
que o Duque de Marwick era bonito.

6 Sirrah - é um termo desdenhoso usado para se referir a alguém que é de um nível social mais baixo. O
status social oposto da palavra senhor. Uma forma de falar que não mostra respeito por um homem.
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Não mais.
Pois certamente nenhum homem na terra deveria ser tão bonito como este.
Ele parecia notavelmente como sua voz soou. Como um ruído baixo e líquido.
Como tentação. Como o pecado.
Um lado de seu rosto permaneceu na sombra, mas o lado que ela podia ver
era magnífico. Um rosto longo e magro, todos os ângulos agudos e sombras
sombrias, sobrancelhas escuras e profundas, olhos que brilhavam com o
conhecimento que ela apostava que ele nunca compartilhava, e um nariz que
envergonharia a realeza, perfeitamente reto, como se tivesse sido trabalhado
com uma lâmina afiada e segura.
Seu cabelo era escuro e cortado rente a cabeça, perto o suficiente para
revelar a cúpula redonda dele. — Sua cabeça está perfeita.
Ele sorriu. — Eu sempre pensei assim.
Ela largou a vela, devolvendo-o às sombras. — Quero dizer, é uma forma
perfeita. Como você faz o cabelo ficar tão raspado no couro cabeludo?
Ele hesitou antes de responder. — Uma mulher em quem confio.
Suas sobrancelhas se levantaram com a resposta inesperada. — Ela sabe que
você está aqui?
— Ela não sabe.
— Bem, como ela leva uma lâmina a sua cabeça regularmente, é melhor você
ir antes de aborrecê-la.
Um estrondo baixo veio, e sua respiração ficou presa. Foi uma risada? — Não
antes de você me dizer por que você mentiu.
Felicity balançou a cabeça. — Como eu disse, senhor, não pratico conversas
com estranhos. Por favor saia. Do jeito que você entrou. — Ela fez uma pausa. —
Como você entrou?
— Você tem uma varanda, Julieta.
— Eu também tenho um quarto no terceiro andar, não é Romeu?
— E uma treliça resistente. — Ela ouviu o divertimento preguiçoso em suas
palavras.
— Você subiu a treliça.
— Eu fiz isso, de fato.

53
Ela sempre imaginou alguém escalando aquela treliça. Apenas não que fosse
um criminoso. O que ele estava fazendo aqui? — Então eu presumo que a
bengala não é para ajudar no movimento.
— Não esse tipo de movimento, não.
— É uma arma?
— Tudo é uma arma, se alguém está procurando por uma.
— Excelente conselho, já que eu pareço ter um intruso.
Ele deu um tapa na resposta. — Amigável.
— Oh, sim, — ela zombou. — Amigável é a primeira palavra que eu usaria
para descrever você.
— Se eu fosse sequestrá-la e levá-la para o meu lar, eu já teria feito isso
agora.
— Você tem um covil?
— De fato, eu tenho, mas não tenho intenção de levar você para lá. Não essa
noite.
Ela estaria mentindo se dissesse que o qualificador adicional não era
excitante. — Ah, isso vai garantir que eu durma bem no futuro, — disse ela.
Ele riu, baixo e suave, como a luz no quarto. — Felicity Faircloth, você não é
o que eu esperava.
— Você diz isso como se fosse um elogio.
— Isto é.
— Será que ainda será um quando eu bater em você diretamente na cabeça
com este candelabro?
— Você não vai me machucar, — disse ele.
Felicity não gostou de quão bem ele parecia entender que sua bravata era
apenas isso. — Você parece terrivelmente seguro de si mesmo, para alguém que
não me conhece.
— Eu conheço você, Felicity Faircloth. Eu te conheci no momento em que te
vi naquela varanda do lado de fora do conservatório trancado de Marwick. A
única coisa que eu não sabia era a cor do seu vestido.
Ela olhou para o vestido, de uma temporada muito antiga e a cor de suas
bochechas. — É rosa.
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— Não apenas rosa, — ele disse, sua voz sombria com promessa de algo
que ela não gostou. — É a cor do céu de Devon ao amanhecer.
Ela não gostou da maneira como as palavras a encheram, como se ela
pudesse algum dia ver o céu e pensar neste homem e neste momento. Como se
ele pudesse deixar uma marca que ela não pudesse apagar.
— Responda a minha pergunta e eu vou sair.
Por que você mentiu?
— Eu não me lembro disso.
— Sim, você lembra. Por que mentiu para aquela coleção de
desafortunados? — A descrição era tão ridícula que ela quase riu. Por pouco. Mas
ele não pareceu achar divertido.
— Eles não são tão infelizes.
— Eles são aristocratas pomposos e mimados, com as cabeças empinadas,
querendo ser melhores do que os outros, eles não têm a menor ideia de que o
mundo está se movendo rapidamente e que outros em breve tomarão o seu
lugar.
Seu queixo caiu.
— Mas você, Felicity Faircloth. — Ele bateu sua bengala em sua bota duas
vezes. — Ninguém está tomando o seu lugar. E então eu perguntarei novamente.
Por que você mentiu para eles?
Se foi o choque de sua descrição ou sua maneira prática de fazer a descrição,
Felicity respondeu: — Ninguém deseja o meu lugar. — Ele não falou, e então ela
preencheu o silêncio. — O que eu quero dizer... meu lugar não é nada. Não é
nada. Fui uma vez como eles, mas depois... — Ela parou. Encolheu os ombros. —
Eu sou invisível. — E então, porque ela não conseguia se conter, ela acrescentou,
suavemente, — Eu queria puni-los. E eu queria que eles me quisessem de volta.
Ela odiava a verdade nas palavras. Ela não deveria ser forte o suficiente para
virar as costas para eles? Ela não deveria se importar menos? Ela odiava a
fraqueza que ele havia exposto.
E ela o odiava por expor isso.
Ela esperou que ele respondesse da escuridão, estranhamente lembrando
da vez em que visitara a Royal Entomological Society e viu uma enorme borboleta
âmbar presa. Linda e delicada e perfeitamente preservada, mas congelada no
tempo, para sempre.
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Este homem não iria capturá-la. Hoje não. — Eu acho que chamarei um
servo para vir e levar você embora. Você deve saber que meu pai é um Marquês,
e é muito ilegal entrar numa casa da aristocracia sem permissão.
— É muito ilegal entrar na casa de alguém sem permissão, Felicity Faircloth,
mas você gostaria que eu lhe dissesse que estou impressionado com o título do
seu pai e do seu irmão também?
— Por que eu deveria ser a única pessoa que mente esta noite?
Uma pausa, então, — Então você admite isso.
— Eu posso muito bem – já que toda Londres saberá disso amanhã. A tonta
da Felicity com seu noivo fantasioso.
A aliteração não o divertiu. — Você sabe, o título do seu pai é ridículo. Seu
irmão também.
— Eu imploro seu perdão, — disse ela, por falta de qualquer outra coisa.
— Bumble and Grout. Bom Deus. Quando a pobreza, finalmente, os enlaçar,
eles sempre podem se tornar boticários. Vendendo tinturas e tônicos para os
desesperados em Lambeth.
Ele sabia que eles estavam empobrecidos. Todos em Londres? Ela foi a
última a descobrir isso? A última a ser contada, até mesmo pela família que
pretendia usá-la para reverter isso? Irritação chamejou ao pensamento.
O homem continuou. — E você, Felicity Faircloth, com um nome que deveria
estar em um livro de histórias.
Ela lhe deu um olhar. — Eu me perguntei sobre a sua opinião sobre os
nossos respectivos nomes.
Ele ignorou o rebate dela. — Uma princesa de conto de fadas, trancada em
uma torre, desesperada por fazer parte do mundo que a aprisionou lá... para ser
aceita por ele.
Tudo sobre esse homem era inquietante, estranho e vagamente irritante. —
Eu não gosto de você.
— Não, você não gosta da verdade, minha pequena mentirosa. Você não
gosta que eu veja que o seu desejo é uma falsa amizade de uma coleção de
aristocratas perfumados que não pode ver o que você realmente é.
Ela deveria ter uma dúzia de coisas fora de si, com ele ali tão perto e na
escuridão. E ainda assim... — E o que é isso?

56
— Melhor do que aqueles seis pela metade.
A resposta enviou-lhe um pequeno entusiasmo, e ela quase se permitiu ser
atraída por aquele homem que ela poderia estar convencida de que era mágica
com mais champanhe. Em vez disso, ela balançou a cabeça e demonstrou seu
melhor desdém. — Se eu fosse aquela princesa, sirrah - então você não estaria
aqui. — Ela se moveu para a parede, pronta para puxar o cordão novamente.
— Não é esse o pouco que todo mundo gosta? A parte onde a princesa é
resgatada a partir da torre?
Ela olhou sobre seu ombro. — Isso deveria ser um príncipe fazendo o
resgate. Não... seja o que você for. — Ela pegou o cordão.
Ele falou antes que ela pudesse puxar. — Quem é a mariposa?
Ela se virou de volta para ele, com vergonha queimando. — O que?
— Você queria ser uma chama, princesa. Quem é a mariposa?
Suas bochechas arderam. Ela não disse nada sobre mariposas. Como ele
sabia o que ela queria dizer? — Você não deveria escutar.
— Eu não deveria estar sentado em seu quarto escuro, amor, mas aqui estou
eu.
Ela estreitou o olhar. — Eu entendo que você não é o tipo de homem que
presta atenção às regras.
— Você me conhece para seguir alguma delas em nosso longo
conhecimento?
Irritação queimada. — Quem é você? Por que você estava se escondendo
do lado de fora da Casa Marwick como alguns nefasto... esquisito?
Ele permaneceu desarrumado. — Pareço um nefasto esquisito?
Esse homem, como toda Londres, parecia saber mais do que ela. Ele
entendia o campo de batalha, tinha a habilidade de travar uma guerra. E ela
odiava isso. Ela enviou-lhe o seu olhar mais fulminante.
Não teve efeito. — Mais uma vez, amor. Se você é a chama, quem é a
mariposa?
— Certamente não você, senhor.
— É uma pena.

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Ela também não gostou da insolência nessas palavras. — Eu me sinto
bastante satisfeita com a decisão.
Ele deu uma risadinha, um estrondo baixo que fez coisas estranhas para
ela. — Devo dizer-lhe o que penso?
— Eu queria que você não o fizesse, — ela retrucou.
— Eu acho que sua traça é muito difícil de atrair. — Ela franziu os lábios, mas
não falou. — E eu sei que posso pegá-lo para você. — Sua respiração ficou presa
quando ele pressionou. — Aquele cujas asas você já se gabou para metade de
Londres sobre chamuscar.
Felicity estava agradecida pelo quarto mal iluminado, então ele não podia
ver seu rosto vermelho. Ou o choque dela. Ou sua excitação. Esse homem, que
de alguma forma encontrara seu quarto, na calada da noite, na verdade, estava
sugerindo que ela tinha arruinado sua vida, nem as chances de sobrevivência de
sua família?
Esperança era uma coisa selvagem e medonha.
— Você poderia pegá-lo?
Ele riu então. Baixo, sinistro e mal humorado, enviando uma emoção
indesejável através dela. — Como um gatinho para o pires.
Ela franziu o cenho. — Você não deveria provocar.
— Quando eu te provoco, amor, você deve saber disso. — Ele se inclinou
para trás novamente, esticando as pernas para fora, batendo aquela bengala
infernal contra sua bota. — O duque de Marwick poderia ser seu, Felicity
Faircloth. E com Londres nunca sabendo a verdade da sua mentira.
Sua respiração ficou superficial. — Isso é impossível. — E ainda assim, de
alguma forma, ela acreditou nele.
— É algo verdadeiramente impossível?
Ela forçou uma risada. — Além de um duque elegível me escolhendo sobre
todas as outras mulheres na Grã-Bretanha?
Toque, toque. Toque, toque. — Mesmo isso é possível, velha, simples,
opinativa, excluída, tudo sobre Felicity Faircloth. Essa é a parte do livro de
histórias em que a princesa recebe tudo o que ela sempre desejou.
Exceto que não era um livro de histórias. E este homem não podia dar a ela
o que ela desejava. — Essa parte geralmente começa com uma fada de algum
tipo. E você não parece de todo uma fada.
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Um estrondo baixo de uma risada. — Você está certa. Mas existem outras
criaturas além das fadas que se interessam por negócio similar.
Seu coração dela voltou a bater, e ela odiava a esperança selvagem lá, que
este homem estranho na escuridão poderia cumprir sua impossível promessa.
Era uma loucura, mas ela avançou sobre ele, trazendo-o para a luz mais uma
vez, aproximando-se cada vez mais, até que ela ficou no final de suas pernas
impossivelmente longas, no final de sua impossivelmente longa bengala, e
ergueu a vela para revelar seu rosto incrivelmente bonito mais uma vez.
Desta vez, no entanto, ela pôde ver tudo isso, e o lado esquerdo perfeito
não combinava com o direito, onde uma cicatriz grosseira marcava-o do queixo
ao maxilar, enrugado e branco.
Quando ela inalou bruscamente, ele virou a cabeça da luz. — Uma pena. Eu
estava ansioso pelo momento em que você parecia pronta para aceitar. Eu não
achei que você iria descartar tão fácil.
— Oh, eu não estou descartando de jeito nenhum. De fato, sou grata por
você não ser mais o homem mais perfeito que já vi.
Ele se virou, o olhar escuro encontrando o dela. — Grata?
— De fato. Eu nunca entendi o que se faz com homens extremamente
perfeitos.
Uma sobrancelha se ergueu. — O que se faz com eles.
— Além do óbvio.
Ele inclinou a cabeça. — O óbvio.
— Olhar para eles.
— Ah, — ele disse.
— De qualquer forma, agora me sinto muito mais confortável.
— Porque eu não sou mais perfeito?
— Você ainda está muito perto disso, mas não é mais o homem mais bonito
que já vi, — ela mentiu.
— Sinto-me como se fosse insultado, mas vou superar isso. Por curiosidade,
quem usurpou meu trono?
Ninguém. Na verdade, a cicatriz faz você mais bonito.

59
Mas este não era o tipo de homem que alguém diz isso. — Tecnicamente,
ele tinha o trono antes de você. Ele simplesmente recuperou isso.
— Eu vou agradecer por um nome, Lady Felicity.
— Como você chamou para ele antes? Minha mariposa?
Ele ficou imóvel por um momento - não o suficiente para uma pessoa
comum perceber.
Felicity notou. — Eu pensei que você teria esperado, — disse ela, seu tom de
zombaria. — Com a sua oferta para ganhá-lo para mim.
— A oferta ainda está de pé, embora eu não ache o duque bonito. Em
absoluto.
— Nós não precisamos debater o ponto. O homem é empiricamente
atraente.
— Mmm, — ele disse, aparentemente não convencido. — Diga-me por que
você mentiu.
— Diga- me por que você está tão disposto a me ajudar a consertar isso.
Ele segurou seu olhar por um longo momento. — Você acreditaria que eu
sou um bom samaritano?
— Não. Por que você estava fora do baile de Marwick? O que ele é para
você?
Ele levantou um ombro. Deixou cair. — Diga- me por que você não acha que
ele ficaria feliz de se ver comprometido com você.
Ela sorriu. — Primeiro, ele não faz ideia de quem eu sou.
Um lado de sua boca se contorceu, e ela se perguntou como seria receber
toda a força de seu sorriso.
Colocando o pensamento selvagem para o lado, ela acrescentou: — E, como
eu disse, homens extremamente bonitos não têm utilidade para mim.
— Não foi isso que você disse, — respondeu o homem. — Você disse que
não tinha certeza do uso de homens extremamente bonitos.
Ela pensou por um momento. — Ambas as afirmações são verdadeiras.
— Por que você acha que Marwick não iria ter nenhum uso para você?
Ela franziu a testa. — Eu deveria pensar que isso seria óbvio.
— Não é.
60
Ela resistiu à pergunta, cruzando os braços como se quisesse se proteger. —
É rude da sua parte perguntar.
— É rude da minha parte escalar sua treliça e invadir seus aposentos
também.
— Isso é verdade. — E então, por uma razão que ela nunca entenderia, ela
respondeu sua pergunta. Deixando a frustração, a preocupação e um sentido
muito real de desgraça iminente derramar sobre ela. — Porque eu sou o epítome
do comum. Porque eu não sou bonita, divertida ou conversadora brilhante. E
embora eu achasse impossível acreditar que seria uma solteirona idosa, aqui
estamos nós, e ninguém nunca realmente me quis. E eu não espero que isso
comece agora, com um belo duque.
Ele ficou em silêncio por um longo momento, seu embaraço enfurecido.
— Por favor, saia, — ela acrescentou.
— Você parece ser bastante brilhante na conversa comigo.
Ela ignorou o fato de que ele não discordou de suas outras avaliações. —
Você é um estranho na escuridão. Tudo é mais fácil no escuro.
— Nada é mais fácil no escuro, — disse ele. — Mas isso é irrelevante. Você
está errada e é por isso que estou aqui.
— Para me convencer de que sou boa em conversa?
Os dentes brilharam e ele ficou de pé, enchendo a sala com a sua altura. Os
nervos de Felicity vibravam enquanto ela considerada a forma dele, bem longo,
com uma pitada de largos ombros e quadris estreitos.
— Eu vim para lhe dar o que você quer, Felicity Faircloth.
A promessa em seu sussurro passou por ela. Foi o medo que ela sentiu? Ou
alguma outra coisa? Ela balançou a cabeça. — Você não pode, no
entanto. Ninguém pode.
— Você quer a chama, — ele disse suavemente.
Ela balançou a cabeça. — Eu não quero.
— Claro que você quer. Mas não é tudo o que você quer, é? — Ele deu um
passo para perto dela, e ela podia sentir o cheiro dele, quente e esfumaçado,
como se ele tivesse vindo de algum lugar proibido. — Você quer tudo isso. O
mundo, o homem, o dinheiro, o poder. E algo mais, também. — Ele se aproximou
ainda mais, elevando-se sobre ela, seu calor a inundando, inebriante e tentador.
— Algo mais. — Suas palavras se tornaram um sussurro. — Algo secreto.
61
Ela hesitou, odiando que esse estranho parecia conhecê-la tão bem.
Odiando que ela queria responder. Odiando que ela fez. — Mais do que eu posso
ter.
— E quem te disse isso, minha senhora? Quem te disse que você não poderia
ter tudo?
Seu olhar caiu para a mão dele, onde o cabo prateado de sua bengala estava
entre os dedos grandes e fortes, o anel de prata em seu dedo indicador brilhando
para ela. Ela estudou o padrão do metal, tentando discernir a forma na bengala.
Depois do que pareceu uma idade, ela olhou para ele. — Você tem um nome?
— Devil.
Seu coração acelerou com a palavra, que de alguma forma parecia
totalmente ridículo e absolutamente perfeito. — Esse não é o seu nome real.
— É estranho como colocamos esse valor em nomes, você não acha, Felicity
Faircloth? Chame-me do que quiser, mas sou um homem que pode lhe dar tudo
isso. Tudo o que você deseja.
Ela não acreditou nele. Obviamente. De modo algum. — Por que eu?
Ele a alcançou então, e ela sabia que deveria ter recuado. Ela sabia que não
deveria tê-lo deixado tocá-la, não quando os dedos dele desceram pela
bochecha esquerda dela, deixando fogo em seu rastro, como se ele estivesse
deixando sua cicatriz sobre ela, uma marca de sua presença.
Mas a queimadura do toque não era nada parecida com a dor.
Especialmente quando ele respondeu: — Por que não você?
Por que não ela? Por que ela não deveria ter o que queria? Por que ela não
deveria fazer um acordo com esse demônio, que apareceu do nada e logo iria
embora?
— Eu não queria ter mentido, — disse ela.
— Eu não posso mudar o passado. Apenas o futuro. Mas eu posso cumprir
sua promessa.
— Transformar palha em ouro?
— Ah, então estamos em um livro de histórias, afinal de contas.
Ele fez tudo parecer tão fácil - tão possível, como se ele pudesse fazer um
milagre à noite sem qualquer esforço.

62
Era loucura, claro. Ele não podia mudar o que ela disse. A mentira que ela
contou, maior que todos eles. Portas haviam fechado ao redor dela mais cedo
naquela noite, bloqueando-a de todos os caminhos imagináveis. Fechando o
futuro dela. O futuro da família dela. O desamparo de Arthur brilhou. O
desespero da mãe dela. Sua resignação gêmea. Bloqueios não dobráveis.
E agora esse homem... brandindo uma chave. — Você pode fazer isso ser
verdade.
Sua mão girou, o calor dele contra sua bochecha, ao longo de sua mandíbula,
e por um momento fugaz ele era um rei das fadas. Ela estava aprisionada. — O
noivado é fácil. Mas isso não é tudo que você deseja, é?
Como ele sabia?
Seu toque se espalhou pela coluna de sua garganta, os dedos beijando o
ombro dela. — Diga- me o resto, Felicity Faircloth. O que outra coisa faz a
princesa na torre desejar? O mundo a seus pés, e sua família rica mais uma vez,
e...
As palavras sumiram, enchendo o quarto até que sua resposta explodiu dela.
— Eu quero que ele seja a mariposa. — Ele levantou a mão de sua pele, e a perda
foi aguda. — Eu desejo ser a chama.
Ele assentiu com a cabeça, seus lábios se curvando como o pecado, seus
olhos sem cor escuros nas sombras, e ela se perguntou se ela se sentiria menos
presa se pudesse ver a cor deles. — Você deseja tentá-lo para você.
Uma memória se acendeu, um marido desesperado por sua esposa. Um
homem desesperado por seu amor. Uma paixão que não podia ser negada, tudo
por uma mulher que detinha cada centímetro de poder. — Eu quero.
— Tenha cuidado com a tentação, minha senhora. É uma proposta perigosa.
— Você faz parecer como se você já experimentou tal coisa.
— Isso é porque eu fiz.
— Sua barbeira? — A mulher era sua esposa? Sua amante? Seu amor? Por
que Felicity se importava?
— A paixão corta os dois lados.
— Ele não precisa, — disse ela, sentindo-se de repente, estranhamente,
profundamente confortável com este homem que ela não conhecia. — Eu espero
que, eventualmente, ame meu marido, mas eu não preciso ser consumida por
ele.
63
— Você deseja consumir.
Ela queria ser desejada. Irracionalmente. Ela queria estar ansiosa por isso.
— Você deseja que ele voe em sua chama.
Impossível.
Ela respondeu-lhe. — Quando se é ignorada pelas estrelas, você se pergunta
se você pode queimar brilhante. — Imediatamente envergonhada pelas palavras,
Felicity se virou, quebrando o feitiço. Limpando a garganta ela continuou. — Isso
não importa. Você não pode mudar o passado. Você não pode apagar minha
mentira e torná-la verdade. Você não pode fazê-lo me querer. Nem mesmo se
você fosse o diabo. É impossível.
— Pobre Felicity Faircloth, tão preocupada com o que é impossível.
— Foi uma mentira, — disse ela. — Eu nunca conheci o duque.
— E aqui está a verdade... o duque de Marwick não negará sua reivindicação.
Impossível. E, no entanto, havia uma pequena parte dela que esperava que
ele estivesse certo. Se fosse isso, ela poderia salvar a todos eles. — Como?
Ele sorriu. — Magia do diabo.
Ela levantou uma sobrancelha. — Se você puder fazer isso, senhor, você terá
ganho o seu nome bobo.
— A maioria das pessoas acha meu nome inquietante.
— Eu não sou a maioria das pessoas.
— Isso, Felicity Faircloth, é verdade.
Ela não gostou do calor que se espalhou por ela com as palavras, e então
ela ignorou. — E você faria isso com a bondade do seu coração? Perdoe-me se
não acredito nisso, Devil.
Ele inclinou a cabeça. — Claro que não. Não há nada de bom no meu
coração. Quando isso for feito, e você já tenha ganhado ele, coração e mente, eu
devo vir e recolher a minha taxa.
— Eu suponho que esta é a parte em que você me diz que a taxa é meu filho
primogênito?
Ele riu disso. Baixo e secreto, como se ela tivesse dito algo mais divertido
do que ela percebeu. E então, — O que eu faria com um bebê chorão?
Seus lábios se contraíram com isso. — Eu não tenho nada para lhe dar.
64
Ele olhou para ela por um longo momento. — Você se subestima, Felicity
Faircloth.
— Minha família não tem dinheiro para te dar, — disse ela. — Você mesmo
disse.
— Se eles o tivessem, você não estaria nessa situação, estaria?
Ela fez uma careta para sua avaliação factual. No desamparo que queimava
com as palavras. — Como você sabe?
— Que o Conde Grout e o Marquês de Bumble perderam uma fortuna?
Querida, toda Londres sabe disso. Mesmo aqueles de nós que não são
convidados para os bailes de Marwick.
Ela franziu o cenho. — Eu não sabia.
— Não até que eles precisassem de você.
— Nem mesmo assim, — ela resmungou. — Não até que eu não pudesse
fazer nada para ajudar.
Ele bateu sua bengala duas vezes no chão. — Eu estou aqui, não estou?
Ela estreitou o olhar sobre ele. — Por um preço.
— Tudo tem um preço, minha querida.
— E eu suponho que você já sabe o seu.
— Eu sei, de fato.
— E qual é?
Ele sorriu, a expressão perversa. — Dizendo isso a você tiraria a diversão.
Um arrepio se espalhou através dela, através de seus ombros e abaixo de sua
espinha, quente e excitante. E aterrorizante e esperançoso. Qual o preço da sua
família, confortável em sua segurança? Qual o preço da sua reputação como uma
esquisitice, sim, mas nunca como uma mentirosa?
E que preço um marido sem conhecimento do passado dela? Por que não
lidar com esse diabo?
Uma resposta sussurrou através dela, uma promessa de algo perigoso. E ai
nda assim, a tentação trovejou através dela. Mas primeiro, garantia.
— Se eu aceitar...
Aquele sorriso de novo, como se ele fosse um gato com um canário.

65
— Se eu aceitar, — ela repetiu com uma carranca. — Ele não vai negar o
noivado?
Devil inclinou a cabeça. — Ninguém nunca vai saber da sua invenção, Felicity.
— E ele vai me querer?
— Como o ar, — disse ele, as palavras uma promessa encantadora.
Não era possível. O homem não era o diabo. E mesmo se ele fosse, nem
mesmo Deus poderia apagar os eventos da noite e fazer com que o duque de
Marwick se casasse com ela.
Mas e se ele pudesse?
As barganhas cortam dos dois lados, e esse homem parecia mais excitante
do que a maioria.
Talvez na perda da paixão impossível que ele prometeu a ela, ela poderia
ganhar outra coisa. Ela encontrou seu olhar. — E se você não puder fazer isso? Eu
recebo um favor de você?
Ele ficou calado e, então, — Tem certeza de que deseja um favor do Diabo?
— Parece que seria um favor muito mais útil do que um de alguém que é
perfeitamente bom o tempo todo — ressaltou.
A sobrancelha acima de sua cicatriz subiu em diversão. — Justo. Se eu falhar,
você pode reivindicar um favor de mim.
Ela assentiu com a cabeça e estendeu a mão para um aperto de mão
apropriado, um que ela se arrependeu no momento em que sua grande mão
deslizou na dela. Era quente e grande, áspera na palma de uma maneira que
evocava o trabalho muito além de qualquer coisa que cavalheiros educados
realizavam.
Foi delicioso e ela o libertou imediatamente.
— Você não deveria ter concordado, — acrescentou.
— Por que não?
— Porque nada de bom vem de acordos feitos no escuro. — Ele enfiou a
mão no bolso e brandiu um cartão de visitas. — Vou te ver daqui a duas noites,
a menos que você me exija de antemão. — Ele deixou cair o cartão na pequena
mesa ao lado da cadeira que Felicity achava que ela poderia considerar como
sendo para o resto do tempo agora. — Tranque esta porta atrás de mim. Você
não iria querer um personagem nefasto entrando enquanto você está dormindo.

66
— Fechaduras não manteve o primeiro personagem nefasto fora do meu
quarto hoje à noite.
Um lado de sua boca se levantou. — Você não é a única fechadura em
Londres, amor.
Ela corou quando ele inclinou o chapéu e saiu pelas portas da sacada antes
que ela pudesse falar sobre não ser a única com fechadura, sua bengala prateada
brilhando ao luar.
Quando chegou à beira da sacada, ele se foi, apanhado pela noite.
Ela voltou para dentro e trancou a porta, seu olhar caindo para o cartão de
visitas lá.
Levantando, ela considerou a insígnia elaborada lá:

Na parte de trás oferecia um endereço - uma rua da qual ela nunca tinha
ouvido falar - e por baixo, no mesmo rabisco masculino:
Com as boas-vindas de Devil.

67
Capítulo Seis

Duas noites depois, quando os últimos raios do sol se desvaneceram na


escuridão, os Bastardos de Bareknuckle percorreram as ruas sujas dos arredores
de Covent Garden, onde o bairro conhecido por bares e teatros deu lugar a um
conhecido por crime e crueldade.
Covent Garden era uma confusão de ruas bem estreitas e labirínticas,
emaranhando-se e revirando-se até que um visitante ignorante ficasse preso em
sua teia de aranha. Um único desvio errado depois de deixar o teatro podia ter
um toff7 liberado de sua bolsa e jogado na sarjeta, ou pior. As ruas que
conduziam ao fundo do bairro não eram agradáveis para os visitantes -
especialmente os cavalheiros vestidos com roupas mais apropriadas -, mas Devil
e Whit não eram adequados e não eram cavalheiros, e todos ali sabiam que não
deveriam atravessar os Bastardos de Bareknuckle, não importando o que eles
usam.
Além do mais, os irmãos eram reverenciados no bairro, tendo saído dessa
própria área, lutando, roubando e dormindo na sujeira com os melhores, e
ninguém gosta de um homem rico vivendo como um homem pobre. Não
importava tanto que os negócios dos Bastardos passassem particularmente por
essa colônia - onde homens fortes e mulheres espertas trabalhavam para eles,
bons meninos e garotas espertas ficavam atentos para qualquer coisa fora do
comum, relatando suas descobertas por uma bela coroa de ouro.
Uma coroa poderia alimentar uma família por um mês aqui, e os Bastardos
gastavam dinheiro no lixo como se fosse água, o que os tornavam intocáveis - e
seus negócios.
— Sr. Fera. — Uma garotinha puxou a perna da calça de Whit, usando o
nome que ele usava com todos menos com seus irmãos. — Você disse! Quando
estamos ganhando "gelo de limão?

7 Toff - um homem rico, bem vestido ou de classe alta; Janota, Almofadinha, etc.
68
Whit parou e se agachou, sua voz rouca pelo desuso e profunda com o
sotaque de sua juventude, que só voltava para cá. — Ouça, moppet8. Nós não
falamos sobre gelo nas ruas.
Os brilhantes olhos azuis da garota se arregalaram.
Whit bagunçou o cabelo dela. — Você mantém nossos segredos, e você vai
ter suas delícias de limão, não se preocupe. — Uma lacuna no sorriso da criança
mostrou que ela tinha perdido um dente recentemente. Whit dirigiu-a para longe.
— Vá encontrar sua mãezinha. Diga... eh, que estou chegando para o banho
depois de terminar no armazém.
A garota foi embora como um tiro.
Os irmãos retomaram a caminhada. — É bom você deixar a Mary te lavar —
disse Devil.
Whit grunhiu.
A deles era uma das poucas colônias de Londres que tinham água fresca e
comunitária - porque os Bastardos de Bareknuckle haviam se assegurado disso.
Eles também se asseguraram de que tivesse um cirurgião e um padre, e uma
escola onde os pequenos pudessem aprender a ler antes de terem que ir às ruas
e encontrar trabalho. Mas os Bastardos não podiam dar tudo, e os pobres que
moravam aqui eram orgulhosos demais para aceitar, de qualquer forma.
Assim, os Bastardos empregaram o maior número possível deles - uma
coleção de velhos e jovens, fortes e espertos, homens e mulheres de todo o
mundo - londrinos e nórdicos, escoceses e galeses, africanos, indianos,
espanhóis, americanos. Se eles fizessem seu caminho para o Covent Garden e
pudessem trabalhar, os Bastardos os recebiam em um de seus numerosos
negócios. Tavernas e ringues de luta, açougues e lojas de tortas, fábricas de
curtumes e corantes e meia dúzia de outros negócios se espalhavam pelo bairro.
Se não bastasse que Devil e Whit tivessem aparecido na lama do lugar, o
trabalho que eles proporcionavam - por salários decentes e sob condições
seguras - comprava a lealdade dos moradores do bairro. Isso era algo que outros
donos de empresas nunca haviam entendido sobre as favelas, achando que
podiam contratar para o trabalho enquanto as barrigas à distância gemiam de
fome. O armazém na extremidade mais distante do bairro, agora pertencente aos
irmãos, tinham sido usado para negociar safras, mas tinha sido abandonado há
muito tempo quando a empresa que o construíra descobriu que os moradores

8 Moppet – Criancinha, gatinha; uma palavra menos comum para se falar (Gíria)
69
não tinham lealdade a eles e roubavam qualquer coisa que fosse deixado sem
vigilância.
Não era assim quando a empresa empregava duzentos homens locais.
Entrando no prédio que agora atuava como armazém central para qualquer uma
das empresas dos Bastardos, Devil acenou para meia dúzia de homens
cambaleando pelo interior escuro, guardando caixas de licores e doces, couros e
lã - se não fosse tributados pela coroa, os Bastardos de Bareknuckle os vendiam
rapidamente, e barato.
E ninguém roubou deles, pela força do seu nome e por medo da punição
prometida décadas antes e tornou-se mais claras, quando eles lutaram com
punhos mais rápidos e mais fortes do que deveriam ter sido, para reivindicar
território e combater os inimigos sem piedade. Devil foi cumprimentar o homem
que guiava o turno. — Tudo bem, John?
— Tudo bem, senhor.
— O bebê chegou?
Dentes brancos brilhantes brilhavam orgulhosamente contra a pele morena
escura. — Semana passada. Um menino. Forte como seu pai.
O sorriso satisfeito do novo pai era a luz do sol na sala mal iluminada, e Devil
bateu no ombro dele. — Eu não tenho dúvidas sobre isso. E sua esposa?
— Saudável, graças a Deus. Bom demais para mim pela metade.
Devil assentiu e baixou a voz. — Todos são, homem. Melhor que o monte
de nós juntos.
Ele se virou do som do riso de John para encontrar Whit, agora em pé com
Nik, a capataz do armazém, jovem - apenas vinte anos - e com uma cabeça para
organização que Devil nunca havia encontrado em outra pessoa. Pesado casaco,
chapéu e luvas de Nik escondia a maior parte de sua pele, e a luz fraca escondia
o resto, mas ela estendeu uma mão para cumprimentar Devil
quando ele chegou.
— Como estamos, Nik? — Perguntou Devil.
A norueguesa de cabelos louros olhou em volta e depois acenou para o
canto mais distante do armazém, onde um guarda se abaixou para abrir uma
porta que levava ao chão, revelando um grande abismo negro abaixo.
Um fio de desconforto percorreu Devil e ele se virou para o irmão. — Depois
de você.

70
O sinal da mão de Whit falou mais do que as palavras, mas ele se agachou
e pulou na escuridão sem hesitação.
Devil entrou em seguida, estendendo a mão para aceitar uma lanterna
apagada de Nik enquanto ela os seguia, olhando para o guarda apenas para
dizer: — Feche.
O guarda fez o que foi instruído sem hesitação, e Devil estava certo de que
a escuridão do buraco cavernoso era rivalizada apenas pelo da morte. Ele
trabalhou para manter o fôlego. Para não lembrar.
— Porra. — Whit rosnou na escuridão. — Luz.
— Você tem a lanterna, Devil. — Isso, no sotaque escandinavo grosso de
Nik.
Cristo. Ele esqueceu que estava segurando. Ele se atrapalhou com a porta da
lanterna, a escuridão e suas próprias emoções inquietantes fazendo com que
demorasse mais do que o habitual. Mas finalmente, ele trabalhou a pederneira e
a luz veio, abençoada.
— Rapidamente, então. — Nik pegou a lanterna e abriu o caminho. — Não
queremos fazer mais calor do que o necessário.
A área de contenção negra levou a uma passagem longa e estreita. Devil
seguiu Nik e, no meio do corredor, o ar começou a ficar fresco e frio. Ela se virou
e disse: — Chapéus e casacos, por favor.
Devil fechou o casaco, abotoando-o completamente enquanto Whit fazia o
mesmo, baixando o chapéu sobre a testa.
No final do corredor, Nik extraiu um anel de chaves de ferro e começou a
trabalhar em uma longa linha de fechaduras contra uma pesada porta de metal.
Quando todos estavam destrancados, ela abriu a porta e começou a trabalhar
em um segundo lote de fechaduras - doze no total. Ela se virou antes de abrir
a porta. — Nós entramos rapidamente. Quanto mais rápido saímos da porta...
Whit a cortou com um grunhido.
— O que meu irmão quer dizer, — disse Devil, — é que estamos enchendo
esse lugar por mais tempo do que você esteve viva, Annika. — Seu olhar se
estreitou à luz da lanterna ao usar seu nome completo, mas ele abriu a porta. —
Vá em frente, então.
Uma vez lá dentro, Nik bateu a porta com força e eles estavam novamente
no escuro, até que ele se virou, erguendo a luz para revelar o grande salão
cavernoso, cheio de blocos de gelo.
71
— Quanto sobreviveu?
— Cem toneladas.
Devil soltou um assobio baixo. — Nós perdemos trinta e cinco por cento?
— É maio, — explicou Nik, puxando o lenço de lã da metade inferior do rosto
para que ela pudesse ser ouvida. — O oceano aquece.
— E o resto da carga?
— Todos contabilizados. — Ela extraiu um conhecimento de carga de seu
bolso. — Sessenta e oito barris de conhaque, quarenta e três barris de bourbon
americano, vinte e quatro caixas de seda, vinte e quatro caixas de baralho,
dezesseis caixas de dados. Além disso, uma caixa de pó facial e três caixas de
perucas francesas, que não estão na lista e vou ignorar, além de supor que você
as quer entregues no local habitual.
— Precisamente, — disse Devil. — Nenhum dano do degelo?
— Nenhum. Estava bem embalado do outro lado.
Whit grunhiu sua aprovação.
— Graças a você, Nik, — disse Devil.
Ela não escondeu seu sorriso. — Noruegueses como noruegueses. — Ela fez
uma pausa. — Há uma coisa. — Dois pares de olhos escuros encontraram seu
rosto. — Havia um observador nas docas.
Os irmãos se entreolharam. Enquanto ninguém se atreveria a roubar os
Bastardos na colônia, as caravanas terrestres dos irmãos tinham sido
comprometidas duas vezes nos últimos dois meses, roubadas sob a mira de uma
arma quando saíram da segurança de Covent Garden. Fazia parte do negócio,
mas Devil não gostou do aumento do roubo. — Que tipo de observador?
Nik inclinou a cabeça. — Não posso dizer com certeza.
— Tente, — disse Whit.
— A roupa parecia uma concorrência nas docas.
Isso fazia sentido. Havia um grande número de contrabandistas trabalhando
nos ângulos francês e americano, embora nenhum tivesse um método tão
hermético de importação. — Mas?
Ela apertou os lábios em uma linha fina. — Botas terrivelmente limpas para
um jovem mercantil.

72
— Coroa? — Sempre um risco para uma operação de contrabando.
— Possivelmente, — disse Nik, mas ela não tinha certeza.
— As caixas? — Perguntou Whit.
— Fora da vista o tempo todo. Gelo movido por carroça e cavalo, caixas
seguras por dentro. E nenhum dos nossos homens viu nada fora do comum.
Devil assentiu. — O produto fica aqui por uma semana. Ninguém entra ou
sai. Consiga os meninos na rua para ficar de olho em alguém fora do comum.
Nik assentiu. — Feito.
Whit chutou um bloco de gelo. — E a embalagem?
— Inteira. Bom o suficiente para vender.
— Certifique-se de que as lojas de miudezas do bairro tenham alguma coisa
esta noite. Ninguém come carne rançosa quando temos cem toneladas de gelo
por aí. — Devil parou. — E Fera prometeu às crianças delícias de limão.
As sobrancelhas de Nik se levantaram. — Tipo dele.
— Isso é o que todo mundo diz, — disse Devil, seco como areia. — Oh,
aquele Fera, ele é muito gentil.
— Você vai misturar a calda de limão também, Fera? — Ela perguntou com
um sorriso.
Whit rosnou.
Devil riu e bateu a mão em um bloco de gelo. — Envie um desses blocos
para o escritório, sim?
Nik assentiu. — Já feito. E uma caixa de bourbon americano.
— Você me conhece bem. Eu tenho que voltar. — Depois do passeio pelo
bairro, ele ia precisar de um banho. Ele tinha negócios na Bond Street.
E então ele tinha negócios com Felicity Faircloth.
Felicity Faircloth, com a pele que se tornava dourada à luz de uma vela, olhos
castanhos arregalados e inteligentes, cheios de medo, fogo e fúria. E capaz de
lutar como ninguém que ele conheceu na memória recente.
Ele queria outro confronto.
Ele limpou a garganta com o pensamento, voltando-se para olhar para Whit,
que o observava, com um olhar conhecedor nos olhos.

73
Devil ignorou, puxando o casaco apertado em torno dele. — O que foi? Está
fodidamente congelando aqui.
— Foram vocês que escolheram lidar com gelo, — Nik disse.
— É um plano ruim, — disse Whit, olhando diretamente para ele.
— Bem, é um pouco tarde para mudar isso. O navio, pode-se dizer, — Nik
acrescentou com um sorriso, — navegou.
Devil e Whit não sorriram com a piada boba. Ela não percebeu que Whit não
estava falando sobre o gelo; ele estava falando sobre a garota.
Devil se virou e foi para a porta do porão. — Vamos então, Nik, — disse
ele. — Traga a luz.
Ela o fez, e os três saíram, Devil recusando-se a encontrar o olhar sábio de
Whit enquanto esperavam que Nik trancasse as portas duplas de aço e os levasse
através da escuridão para o armazém.
Ele continuou evitando o olhar de seu irmão enquanto eles pegavam a
lavagem de Whit e pegaram o caminho de volta para o coração de Covent
Garden, tecendo seu caminho através das ruas de paralelepípedos para seus
escritórios e apartamentos no grande edifício em Arne Street.
Depois de quinze minutos de caminhada silenciosa, Whit disse: — Você arma
sua cilada para a garota.
Devil não gostou da insinuação nas palavras. — Eu armo minha cilada para
os dois.
— Você ainda pretende seduzir a garota dele.
— Ela, e cada uma que vier depois, se for necessário, — respondeu Devil. —
Ele é tão arrogante como sempre, Fera. Ele pensa em ter seu herdeiro.
Whit sacudiu a cabeça. — Não, ele pensa em ter Grace. Ele acha que vamos
desistir dela para impedir que ele tenha um novo duque com essa garota.
— Ele está errado. Ele não terá Grace nem a garota.
— Duas carruagens, inclinando-se uma contra a outra, — rosnou Whit.
— Ele desviará.
Os olhos do seu irmão encontraram os dele. — Ele nunca fez isso antes.
Memória brilhou. Ewan, alto e magro, os punhos erguidos, os olhos
inchados, os lábios rachados e recusando-se a ceder. Não querendo recuar.

74
Desesperado para vencer. — Não é o mesmo. Nós temos mais fome.
Trabalhamos mais arduamente. O ducado deixa o homem macio.
Whit grunhiu. — E Grace?
— Ele não a encontrará. Ele nunca a encontrará.
— Nós deveríamos tê-lo matado.
Matá-lo teria trazido Londres ao seu redor. — Muito risco. Você sabe disso.
— Isso e nós também fizemos uma promessa à Grace.
Devil assentiu. — E isso também.
— Seu retorno ameaça a todos nós, e Grace mais do que ninguém.
— Não, — Devil disse. — Seu retorno o ameaça mais. Lembre-se, se alguém
descobrir o que ele fez... como ele conseguiu seu título... ele balança na ponta de
uma corda. Um traidor da coroa.
Whit sacudiu a cabeça. — E se ele estiver disposto a se arriscar por uma
chance com ela? — Com Grace, a garota que ele amou uma vez. A garota cujo
futuro ele roubou. A garota que ele teria destruído se não fosse por Devil e Whit.
— Então ele sacrifica tudo, — disse Devil. — E ele não recebe nada.
Whit assentiu. — Nem mesmo os herdeiros.
— Nunca herdeiros.
Então Whit falou, — sempre há o plano original. Nós brigamos com o duque.
Mandamos ele para casa.
— Isso não vai parar o casamento. Agora não. Não quando ele acha que está
perto de encontrar Grace.
Whit flexionou uma mão, o couro preto de sua luva rangendo com o
movimento. — Seria uma diversão gloriosa, no entanto. — Eles andaram em
silêncio por vários minutos, antes de Whit acrescentar: — Pobre garota, ela não
poderia prever como sua mentira inocente a colocaria na cama com você.
Era uma figura de linguagem, claro. Mas a visão veio, no entanto - e Devil
não pôde resistir a isso, Felicity Faircloth, cabelos escuros e saias rosa espalhadas
diante dele. Inteligente e bonita e com uma boca como o pecado.
A ruína da garota seria um prazer.
Ele ignorou o fino fio de culpa que provocou através dele. Não havia espaço
para culpa aqui. — Ela não será a primeira garota arruinada. Vou devolver o
75
dinheiro do pai. O do irmão também. Eles ficarão de joelhos e chorarão com
gratidão pela salvação deles.
— Muito gentil de sua parte, — disse Whit secamente. — Mas e a salvação
da garota? É impossível. Ela não será arruinada. Ela será exilada.
Eu quero que eles me queiram de volta.
Tudo o que Felicity Faircloth queria era voltar àquele mundo. E ela nunca
conseguiria. Nem mesmo depois que ele prometeu para ela. — Ela ficará livre
para escolher seu próximo marido.
— Os homens aristocráticos fazem fila para envelhecer ao lado de
solteironas arruinadas?
Algo desagradável passou por ele. — Então, ela escolhe alguém não
aristocrático.
Uma batida. E então, — Alguém como você?
Cristo. Não. Homens como ele estavam tão abaixo de Felicity Faircloth que
a ideia era risível.
Quando ele não respondeu, Whit grunhiu novamente. — Grace nunca pode
saber.
— Claro que não, — respondeu Devil. — E ela não vai.
— Ela não será capaz de ficar de fora.
Devil nunca estivera tão feliz em ver a porta de seu escritório. Aproximando-
se, ele pegou uma chave, mas antes que pudesse abrir a porta, uma pequena
janela se abriu e depois fechou. A porta se abriu e eles entraram.
— Vocês estão atrasados.
O olhar de Devil disparou para a mulher alta e ruiva que fechou a porta atrás
deles, recostando-se contra a porta, uma mão no quadril, como se estivesse
esperando há anos. Ele imediatamente olhou para Whit, com a cara de pedra. Os
olhos escuros de Whit encontraram os dele com calma.
Grace nunca pode saber.
— O que aconteceu? — Disse a irmã, olhando de um para o outro.
— O que aconteceu com o quê? — Perguntou Devil, tirando o chapéu.
— Você está igual quando nós éramos crianças e você decidiu começar a
lutar sem me dizer.

76
— Foi uma boa ideia.
— Foi uma ideia ruim, e você sabe disso. Você tem sorte de não ter sido
morto na sua primeira noite fora, você era tão pequeno. Vocês dois têm sorte de
eu ter entrado no ringue. — Ela balançou os calcanhares e cruzou os braços sobre
o peito. — Agora o que aconteceu?
Devil ignorou a pergunta. — Você voltou da sua primeira noite com um nariz
quebrado.
Ela sorriu. — Eu gosto de pensar que o galo me dá caráter.
— Isso te dá algo, definitivamente.
Grace deu uma gargalhada e seguiu em frente. — Tenho três coisas a dizer e
depois tenho trabalho a fazer, senhores. Eu não posso ficar à toa aqui, esperando
vocês dois voltarem.
— Ninguém pediu que você esperasse por nós — disse Devil, passando por
sua irmã arrogante em direção aos escuros e cavernosos corredores além e
subindo as escadas dos fundos até os apartamentos.
Ela o seguiu, no entanto. — Primeiro é para você, — ela disse a Whit, lhe
entregando uma folha de papel. — Há três lutas para esta noite, cada uma em
um lugar diferente, começando daqui a uma hora e meia; duas serão justas, a
terceira, imunda. Os endereços estão aqui e os meninos já estão fazendo as
apostas.
Whit grunhiu sua aprovação e Grace pressionou. — Em segundo lugar,
Calhoun quer saber onde está o bourbon dele. Diz que, se nós estamos tendo
tanta dificuldade para obtê-lo, ele vai encontrar um de seus compatriotas para
fazer o trabalho, realmente, existe alguém mais arrogante do que um americano?
— Diga a ele que está aqui, mas não em movimento, no entanto, ele pode
esperar como o resto de nós, ou se sentir livre para esperar os dois meses que
vai demorar para obter uma nova remessa para os Estados Unidos e de volta.
Ela assentiu. — Presumo que seja o mesmo para a entrega do Anjo Caído?
— E tudo o mais que estamos prontos para entregar a partir desta remessa.
O olhar de Grace se estreitou nele. — Estamos sendo vigiados?
— Nik acha que é possível.
Sua irmã franziu os lábios por um momento, depois disse: — Se Nik pensa,
é bem verdade. O que me leva ao terceiro: minhas perucas chegaram?

77
— Junto com mais pó facial do que você pode usar.
Ela sorriu. — Mas, uma garota pode tentar, não pode?
— Nossas remessas não são projetadas como sua mochila pessoal.
— Ah, mas os meus itens pessoais são legais e não exigem pagamento de
impostos bruv, por isso não é a pior coisa no mundo para você receber três
caixas de perucas. — Ela estendeu a mão para esfregar a cabeça tosquiada de
Devil. — Talvez você goste de uma... você poderia ficar com mais cabelo.
Ele afastou a mão da irmã da cabeça. — Se não fossemos sangue...
Ela sorriu. — Nós não somos de sangue, na verdade.
Eles estavam onde contava. — E, no entanto, por alguma razão, eu considero
você como se fosse.
Ela se inclinou para dentro. — Porque eu ganho dinheiro de mão em punho
para você pateta. — Whit grunhiu, e Grace riu. — Viu? Fera sabe.
Whit desapareceu em seus aposentos do outro lado do corredor, e Devil
extraiu uma chave do bolso, inserindo-a na sua porta. — Algo mais?
— Você poderia convidar sua irmã para uma bebida, você sabe. Se eu te
conheço bem, você encontrou um caminho para o seu bourbon chegar a tempo.
— Eu pensei que você tinha trabalho a fazer.
Ela levantou um ombro. — Clare pode cuidar das coisas até eu chegar lá.
— Eu cheiro mal e tenho um lugar para ir.
Suas sobrancelhas atiraram juntas. — Onde?
— Você não precisa fazer parecer que não tenho nada para fazer à noite.
— Entre o pôr do sol e a meia-noite? Você não faz nada.
— Isso não é verdade. — Era vagamente verdade. Ele girou a chave na
fechadura, olhando de volta para sua irmã enquanto abria a porta. — O ponto é,
me deixe agora.
Qualquer réplica que Grace tivesse feito - e Deus sabia que Grace sempre
tinha uma réplica - estava perdida em seus lábios quando seu olhar azul cintilou
sobre seu ombro e, então se alargou o bastante para Devil se preocupar.
Ele se virou para olhar naquela direção, de alguma forma, impossivelmente,
sabendo exatamente o que ele iria encontrar.
Quem ele ia encontrar.
78
Lady Felicity Faircloth, de pé na janela do outro lado da sala, como se
pertencesse a este lugar.

Capítulo Sete

Havia uma mulher com ele.


De todas as coisas que Felicity esperava que pudessem acontecer quando
ela fingiu estar doente e escapou de sua casa no crepúsculo para contratar uma
carruagem para levá-la para o local misterioso rabiscado no verso de seu cartão
de visita – e havia muitas, - ela não tinha esperado uma mulher.
Uma mulher alta e impressionante, pintada com perfeição e cabelos como o
pôr-do-sol, vestida com saias cor de ametista em camadas e um espartilho
decorativo na cor berinjela mais rica que Felicity já vira. A mulher não era
propriamente bonita, mas estava orgulhosa, equilibrada e incrivelmente...
deslumbrante.
Ela era o tipo de mulher pela qual os homens caiam loucamente
apaixonados. Isso não era a questão. Ela era exatamente o tipo de mulher que
Felicity tantas vezes sonhava em ser ela mesma.
Devil estava louco por ela?
Felicity nunca estivera tão feliz em ficar em um quarto mal iluminado quanto
naquele momento, com o rosto em pânico e cada centímetro dela querendo
fugir. O problema era que o homem que se chamava Devil e sua companheira
estavam bloqueando a única saída - a menos que ela considerasse a
possibilidade de pular pela janela.
Ela se virou para olhar para as vidraças escuras, medindo a distância até o
beco abaixo.
— Longe demais para pular, — disse Devil, como se estivesse em sua cabeça.
Ela se virou para encará-lo, passando por ele. — Você tem certeza?
A mulher riu e respondeu. — Bastante. E a última coisa que Dev precisa é de
uma nobre senhora achatada. — Ela fez uma pausa, a familiaridade do apelido
preenchendo o espaço entre eles. — Você é intitulada, não é?

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Felicity piscou. — Meu pai é, sim.
A mulher passou por Devil como se ele não estivesse ali. — Fascinante. E
qual título seria esse?
— Ele é o...
— Não responda a isso, — disse Devil, entrando na sala, colocando o chapéu
em uma mesa próxima e acendendo o gás em uma lâmpada lá, inundando o
espaço com a exuberante luz dourada. Ele se virou para ela e ela resistiu ao
impulso de olhar.
E falhou.
Ela encarou apropriadamente, absorvendo o sobretudo pesado - quente
demais para a estação - e as botas de cano alto embaixo, cobertas de lama como
se ele estivesse brincando com porcos em algum lugar. Ele tirou o casaco e o
despachou sem cuidado, sobre uma cadeira próxima, revelando mais roupas
casuais do que ela quase já havia visto em um membro do sexo oposto. Ele usava
um colete padronizado sobre uma camisa de linho, ambos em tons de cinza, mas
sem gravata. Nada encheu a abertura da camisa - nada a não ser as cordas de
seu pescoço e um longo e profundo triângulo de pele, coberto de um toque
de cabelos escuros.
Ela nunca tinha visto tal coisa antes - podia contar em uma mão o número
de vezes que ela tinha visto Arthur ou seu pai sem uma gravata.
Ela também nunca tinha visto nada tão completamente masculino em sua
vida. Ela foi consumida por aquele triângulo de pele.
Depois de uma pausa longa demais, Felicity percebeu que estava olhando, e
voltou sua atenção para a mulher, cujas sobrancelhas estavam altas em sua testa,
sabendo exatamente o que Felicity estava fazendo. Incapaz de enfrentar a
curiosidade da outra mulher, o olhar de Felicity voou de volta para Devil - desta
vez para o rosto dele. Outro erro. Ela se perguntou se algum dia se acostumaria
com o quão bonito ele era.
Dito isto, ela certamente poderia fazer isso sem ele olhando para ela como
se ela fosse um inseto que ele descobriu em seu mingau.
Ele não parecia o tipo de homem que come mingau.
Ele estreitou seu olhar sobre ela, e ela teve o suficiente disso.
— O que você come no café da manhã?

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— O que em... — Ele balançou a cabeça como se quisesse limpá-la. — O
que?
— Não é mingau, é?
— Bom Deus. Não.
— Isso é fascinante, — disse a mulher.
— Não para você, não é, — respondeu ele.
Felicity se arrepiou com o tom agudo. — Você não deveria falar com ela
desse jeito.
A outra mulher sorriu com isso. — Eu concordo plenamente.
Felicity se virou. — Eu acho que devo ir.
— Você não deveria ter vindo, — disse ele.
— Ei! Você certamente não deveria falar com ela desse jeito — a mulher
disse. Devil olhou para o teto como se pedisse paciência.
Felicity se moveu para passar por ele.
— Espere. — Ele estendeu a mão para detê-la. — Como você chegou aqui
para começar?
Ela parou. — Você me deu seu endereço.
— E você simplesmente marchou até aqui de Mayfair?
— Por que se importa como eu cheguei?
A pergunta agitou-o. — Porque qualquer coisa poderia ter acontecido com
você na viagem. Você poderia ter sido atacada por ladrões. Sequestrada e
resgatada por qualquer número de rufiões.
Seu coração começou a bater. — Tipos nefastos?
— Precisamente, — ele concordou.
Ela fingiu inocência. — O tipo que pode entrar em um quarto sem aviso
prévio? — Ele se acalmou. Então franziu o cenho.
— Oooh! — A outra mulher bateu palmas. — Eu não sei o que isso significa,
mas é delicioso. Isso é melhor do que qualquer coisa que você possa ver na
Drury Lane.
— Cale a boca, Dahlia — disse ele, exasperado.

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Dahlia. Esse parecia ser o nome certo para ela. O tipo de nome que Felicity
nunca poderia levar.
Quando Dahlia não respondeu, ele virou-se para Felicity. — Como você
chegou aqui?
— Eu peguei uma carruagem de aluguel.
Ele amaldiçoou. — E como você chegou aqui? Nos meus quartos?
Ela parou, consciente dos alfinetes enfiados em seus cabelos. Ela não podia
dizer a verdade. — Eles estavam desbloqueados.
Ele estreitou seu olhar sobre ela; ele sabia que era uma mentira. — E como
foi que você entrou no prédio?
Ela procurou por uma resposta que pudesse fazer sentido, algo diferente
da verdade. Não encontrando algo, ela decidiu simplesmente ignorá-
lo. Voltando a sair mais uma vez, ela disse: — Peço desculpas. Eu não
esperava que você estivesse aqui com a sua... —
Ela procurou por uma palavra. — Amiga.
— Ela não é minha amiga.
— Bem, isso não é muito gentil, — objetou Dahlia. — E pensar que você já
foi meu favorito.
— Eu nunca fui o seu favorito.
— Hmm. Certamente não agora. — Ela se virou para Felicity. — Eu sou sua
irmã.
Irmã.
Uma poderosa onda de algo que ela não queria nomear atirou através dela
com aquelas palavras. Ela inclinou a cabeça. — Irmã?
A mulher sorriu, ousada e ampla e por um momento, Felicity quase viu uma
semelhança. — Sua primeira e única.
— E agradeça a Deus por isso.
Ignorando o comentário sarcástico de Devil, Dahlia se aproximou de Felicity.
— Você deveria vir e me ver.
Antes que ela pudesse responder, Devil entrou — Ela não precisa ver você.
Uma sobrancelha vermelha se arqueou. — Porque ela está vendo você?
— Ela não está me vendo.
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A outra mulher se virou para ela com um sorriso conhecedor. — Eu acho que
estou vendo isso.
— Eu não o estou vendo, se isso ajuda, — Felicity disse, sentindo como se
ela devesse interpor para acabar com a estranha conversa.
A outra mulher bateu com o dedo no queixo, considerando Felicity por um
longo tempo. — Você vai, eventualmente.
— Ninguém está vendo ninguém! Dahlia, saia daqui!
— Muito rude, — disse Dahlia, vindo para a frente, as mãos estendidas em
direção a Felicity. Quando ela se estabeleceu nelas, Dahlia puxou Felicity para
perto e beijou uma bochecha e depois a outra, demorando-se no último beijo
para sussurrar: — 72 Shelton Street. Diga-lhes que Dahlia lhe dá as boas-vindas.
— Ela olhou para o irmão. — Devo ficar e jogar de acompanhante?
— Saia.
Sua irmã sorriu. — Adeus, irmão. — E então ela se foi, como se todo o
cenário fosse perfeitamente comum. O que, claro, não era, já que começara com
Felicity saindo furtivamente pelo jardim dos fundos sem uma acompanhante,
andando três quartos de milha e contratando uma carruagem de aluguel para
trazê-la aqui, para o centro de Covent Garden, onde ela nunca tinha estado
antes e por um bom motivo - ou assim ela imaginou.
Exceto agora, que ela estava aqui, neste lugar misterioso com este homem
misterioso, e mulheres misteriosas estavam sussurrando endereços misteriosos
em seu ouvido, e Felicity não conseguia pensar em uma boa razão para não estar
lá. Tudo era terrivelmente excitante.
— Não parece assim, — ele disse enquanto fechava a porta atrás de sua
irmã.
— Como o quê?
— Como se fosse emocionante.
— Por que não? É emocionante.
— O que quer que ela tenha dito, esqueça.
Felicity riu. — Eu não acho que isso vai acontecer.
— O que ela te disse?
— Ocorre que, se ela quisesse que você ouvisse o que ela me disse, ela teria
dito isso para que você fosse capaz de ouvi-la.

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Ele pressionou os lábios juntos em uma linha fina, sua cicatriz ficando
totalmente branca. Ele não gostou dessa resposta. — Você fica longe da Dahlia.
— Tem medo de que ela me corrompa?
— Não, — ele disse bruscamente. — Eu tenho medo que você a destrua.
A boca de Felicity caiu aberta. — Eu imploro seu perdão?
Ele desviou o olhar, em direção a um aparador onde havia uma garrafa de
cristal cheia de líquido âmbar profundo. Como um cachorro farejando a caça, ele
foi para ele, servindo-se de um copo e bebendo profundamente antes de se
voltar para ela.
— Não, obrigada, — ela disse, azeda. — Eu não bebo o que é que você não
me ofereceu.
Ele bebeu novamente. — Bourbon.
— Bourbon americano? — Ele não respondeu. — O bourbon americano é
proibitivamente caro para você beber como água.
Ele nivelou-a com um olhar frio antes de servir um segundo copo e caminhar
até ela, estendendo-o com um longo braço. Quando ela alcançou isto, ele puxou
para atrás, enquanto balançava o líquido fora de seu alcance, o anel prateado no
polegar dele cintilando na luz. — Como foi que você entrou?
Ela hesitou. Então, — eu não quero a bebida de qualquer maneira.
Ele encolheu os ombros e despejou o copo dela no dele. — Tudo certo. Você
não quer responder a isso. Que tal este? Por que você está aqui?
— Temos um compromisso.
— Eu estava planejando ir até você, — disse ele.
A ideia de ele subir a treliça não foi bem-vinda, mas ela disse: — Eu me
cansei de esperar.
Ele levantou uma sobrancelha para isso. — Eu não estou ao seu dispor.
Ela inalou com as palavras frias, não gostando do jeito que elas doíam. Não
gostando muito dele, se fosse honesta. — Bem, se você não esperava que eu
viesse aqui, então talvez você não devesse me deixar um cartão com o seu
endereço.
— Você não deveria estar em Covent Garden.
— Por que não?

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— Porque, Felicity Faircloth, você quer se casar com um duque e assumir seu
lugar de direito como uma joia da sociedade, e se algum velho aristocrata visse
você aqui, isso nunca aconteceria.
Ele tinha razão, mas estranhamente, em nenhum momento durante sua
jornada até aqui, ela sequer considerou as pessoas da sociedade. Ela estava
animada demais com o que a cumprimentaria do outro lado do cartão de visitas.
— Ninguém me viu.
— Eu tenho certeza que não foi por falta de você saindo como uma
margarida na terra.
Suas sobrancelhas se levantaram. — Uma margarida na terra?
Seus lábios se achataram. — É uma figura de linguagem.
Ela inclinou a cabeça. — Isto é?
Ele bebeu. — Covent Garden não é para você, Felicity Faircloth.
— Por que não? — Será que ele sabia que dizer tais coisas a fazia querer
explorar todos os cantos do lugar?
Ele observou-a por um longo momento, seus olhos escuros inescrutáveis, e
então acenou com a cabeça uma vez, virou-se e marchou até o final da sala,
puxando uma corda. Talvez ele soubesse.
— Você não precisa chamar ninguém para me acompanhar, — disse Felicity.
— Eu encontrei meu caminho.
— Isso é claro, minha senhora. E não tenho interesse em que ninguém te
acompanhe. Eu não posso arriscar que você seja vista.
Ele era um homem irritante e a paciência de Felicity começou a se desgastar.
— Com medo de que eu destrua você, assim como a sua irmã?
— Não está fora do reino da possibilidade. Você não tem uma empregada
doméstica ou um acompanhante ou algo assim?
A pergunta a perturbou. — Sou uma solteirona de 27 anos. Muito poucas
pessoas pensariam duas vezes sobre eu viajar sem acompanhante.
— Tenho certeza de que seu irmão, seu pai e qualquer outro funcionário de
Mayfair pensaria muito mais do que duas vezes em descobrir que você está
viajando sem acompanhante para os meus escritórios.
Felicity passou por tudo. — Você acha que ter uma acompanhante tornaria
mais aceitável que eu estivesse aqui?

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Ele franziu a testa. — Não.
— Você me acha mais perigosa do que eu sou.
— Eu acho que você é tão perigosa quanto você realmente é. — As palavras,
tão francas e sem margem, deram-lhe uma pausa, enviando um fio de algo
estranho correndo através dela. Algo tão suspeito como o poder. Ela inalou
bruscamente, e ele nivelou-a com um olhar. — Isso também não é empolgante,
Felicity Faircloth.
Ela discordou, mas achou melhor não dizer isso. — Por que você insiste em
me chamar pelos dois nomes?
— Isso me lembra que você é uma princesa de conto de fadas. Faircloth, de
fato. A mais bela de todas.
A mentira doeu, e ela se odiou por deixar isso acontecer, mais do que o
odiava por falar. Em vez de dizer isso, no entanto, ela forçou-se a rir na sua
brincadeira indesejada.
Suas sobrancelhas se uniram. — Você está se divertindo?
— Não é isso que você pretendia? Você não se acha imensamente
inteligente?
— Como eu estava sendo inteligente?
Ele ia fazê-la dizer isso, e isso a fazia odiá-lo mais. — Porque eu sou o oposto
de mais justo. — Ele não falou, e não desviou o olhar, e ela sentiu que tinha que
continuar. Para fazer seu ponto. — Eu sou a mais simples de todos.
Quando ele ainda não falou, ela começou a se sentir tola. E aborrecida.
— Não é esse o nosso acordo? — Ela perguntou. — Você não vai me deixar
bonita?
Ele a observava com mais intensidade agora, como se ela fosse um espécime
curiosa sob o vidro. E então, — sim. Vou fazê-la bonita, Felicity Faircloth. — Ela
fez uma careta para o intencional uso de seus dois nomes. — Linda o suficiente
para atrair a mariposa à sua chama.
O impossível, tornado possível. E ainda...
— Como você fez isso?
Ele piscou. — Fiz o quê?

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— Como você garantiu que ele não negaria o meu anuncio? Meia dúzia de
viúvas da sociedade vieram para o chá esta manhã em nossa casa, acreditando
que eu sou o futura Duquesa de Marwick. Como?
Ele virou as costas para ela, movendo-se para uma mesa baixa que estava
cheia de papéis. — Eu te prometi o impossível, não foi?
— Mas como? — Ela não conseguia entender.
Ela tinha acordado naquela manhã com um grande senso de iminente
desgraça, certa de que sua mentira tinha sido exposta, o Duque de Marwick a
havia proclamado de louca diante de toda Londres, e sua família tinha sido
arruinada.
Mas nada disso aconteceu. Nada perto disso acontecera.
De fato, parecia que o Duque de Marwick havia confirmado tacitamente o
noivado. Ou, pelo menos, ele não havia negado isso.
Que era impossível.
Exceto, este homem, Devil, tinha feito essa promessa precisa, e isso fez bem
a ela. De alguma forma.
Seu coração batia com cada sucessor de boca aberta, e algo como esperança
tinha queimado em seu peito, ao lado de outra emoção - surpreendentemente
parecida maravilhoso. Este homem, que parecia capaz de salvar ela e sua família.
Então, é claro que ela veio para vê-lo.
Parecia, francamente, completamente impossível não fazê-lo.
Uma batida soou na porta e ele se moveu para atender, abrindo-a e
permitindo que uma dúzia de criados saíssem do corredor, cada um segurando
grandes baldes de água fumegante. Entraram sem dizer uma palavra - sem olhar
para Felicity - marchando pela sala até a parede mais distante, onde uma porta
se abria para um espaço escuro mais além.
Seu olhar voou para Devil. — O que tem atrás daquela porta?
— Meu quarto, — ele disse simplesmente. — Você não deu uma olhada no
ambiente quando você escolheu destravar minha fechadura?
O calor rugiu para a vida em suas bochechas. — Eu não escolhi.
— Você fez isso, no entanto. E eu certamente não entendo como uma dama
tem a habilidade superior de abrir fechaduras, mas espero que um dia você me
conte.

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— Talvez esse seja o favor que você me pede uma vez que você me trouxe
o meu marido.
Um canto de sua boca se contraiu, como que ele estivesse desfrutando da
conversa. — Não, minha senhora, esse conto você deve oferecer livremente.
As palavras eram silenciosas e cheias de certeza, e ela estava agradecida pela
fraca luz da noite, para que o inesperado rubor que elas traziam não fosse óbvio.
Com um pouco de tosse desconfortável, ela olhou para a porta do seu quarto de
dormir, onde uma luz brilhou, brilhante o suficiente para fazer as sombras dentro
dançarem, mas não o suficiente para revelar qualquer coisa do espaço além.
E então os criados retornaram, baldes vazios na mão, e Felicity sabia
exatamente o que eles haviam feito. Antes que eles tivessem a chance de sair e
fechar a porta atrás deles, Devil estava tirando o colete e fazendo o trabalho
rápido dos botões nas mangas da camisa de linho embaixo.
Sua boca se abriu, e ele se virou para entrar na sala, chamando por cima do
ombro enquanto desaparecia: — Bem, nós podemos começar bem.
Ela piscou, chamando por ele: — Comecar o que?
Uma pausa. Ele estava se... despindo? Então, de mais longe —
Nossos planos.
— Eu... — Ela hesitou. Talvez ela estivesse entendendo mal a situação. — Eu
imploro seu perdão, mas você está prestes a tomar banho?
Ele esticou a cabeça para trás em torno da borda da porta. — De fato, eu
estou.
Ele não estava mais vestindo uma camisa.
A boca de Felicity ficou seca quando ele desapareceu de volta ao quarto, e
ela observou a porta vazia por longos minutos, até ouvir os dois golpes de suas
botas e depois o jato de água que ele levava para a banheira.
Ela balançou a cabeça na sala vazia da frente dos apartamentos.
O que estava acontecendo?
E então ele gritou, — Lady Felicity, você quer gritar lá fora? Ou você está
vindo?
Entrando?

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Ela resistiu ao desejo de pedir-lhe que elaborasse, e em vez disso fez sua
escolha, sabendo que fazê-lo poderia facilmente marcar um cordeiro para o
abate. — Estou chegando.
Não, não cordeiro ao abate.
Mariposa a chama.

Capítulo Oito

Ele estava brincando com ela. Ele queria fazer a inocente Lady Felicity
Faircloth reconsiderar sua decisão precipitada de aparecer em seus aposentos
sem ser convidada, sabendo que não havia nenhuma maneira terrestre dela
se juntar a ele em seu quarto de dormir, quanto mais em seu quarto enquanto
ele se banhava.
E lá estava ele, com água até a cintura na banheira de cobre, com um sorriso
afetado no rosto, parabenizando-se por entregar uma lição adequada à dama –
que certamente nunca mais encontraria motivo para vir, sem acompanhante, para
sua porta em Covent Garden novamente, para que ela não fosse confrontada
com a prova da baixeza do bairro - quando a senhora em questão chamou da
sala ao lado, — estou chegando.
Ele mal teve tempo de esconder sua surpresa antes que Felicity Faircloth se
precipitasse em seu quarto, com o copo de seu bourbon duramente segurado na
mão, como se ela pertencesse ali.
Para adicionar insulto à injúria, ele então se viu imaginando como poderia
ser se ela, de fato, pertencesse ali. Se fosse perfeitamente normal que ela se
sentasse em sua cama e observasse enquanto ele lavava a sujeira do dia de seu
corpo, limpando-se antes de se juntar a ela ali, naquela cama.
Limpando-se para ela.
Merda. Isso tudo tinha saído do prumo.

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E não havia como consertá-lo, pois ele estava nu em uma poça de água, e
ela estava completamente vestida, com as mãos entrelaçadas no colo,
observando-o com interesse ávido.
O seu não era o único interesse que era ávido, deveria ser dito.
Não que seu pênis estivesse tendo seu interesse apagado. Este não era o
tipo de mulher que alguém fodia na escuridão. Este era o tipo de mulher a ser
conquistada. Ela não tinha se tornado poética sobre paixão em seu próprio
quarto de dormir?
Seduzir Felicity Faircloth longe de seu irmão levaria mais de uma noite em
seus quartos em Covent Garden. E isso não aconteceria em Covent Garden, já
que ela nunca estaria aqui novamente.
Ele não estava acostumado a se preocupar com a segurança das pessoas no
território dos Bastardos de Bareknuckle, mas com essa mulher, ele estava. Muito
preocupado. Ele ainda não entendia como ela tinha conseguido isso aqui sem ter
problemas.
O pensamento o agradou, e ele encontrou conforto nisso, deixando superar
sua primeira resposta a ela. Não era ele aquele que precisava ser instável. Era ela.
Ele se forçou a inclinar-se para trás, puxou um pedaço de linho da borda da
banheira e moveu-o com determinação. — Quando eu estiver limpo, pretendo
devolver você a Mayfair.
Seu olhar cintilou para onde o braço dele se movia, preguiçosamente
esfregando o peito dele. Ele diminuiu o ritmo quando ela engoliu, um fraco rubor
subindo por seu pescoço. Ela tomou um gole da bebida, e seus olhos se
arregalaram e ficaram um pouco úmidos quando um pequeno som saiu do fundo
da garganta - uma tosse que ela claramente se recusou a liberar. Depois que ela
se recuperou, ela encontrou os olhos dele, estreitando os seus próprios nele. —
Eu sei o que você está fazendo.
— E o que é isso?
— Você está tentando me assustar para eu ficar longe deste lugar. Mas, você
deveria ter pensado nisso antes de me chamar aqui.
— Eu não chamei você, — disse ele. — Eu deixei meu endereço para que
você pudesse me mandar uma mensagem, se necessário.
— Por quê? — Ela perguntou.
Ele piscou. — Por quê?

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— Por que eu precisaria mandar uma mensagem para você? — A pergunta
o colocou de volta. Antes de ser obrigado a fabricar uma resposta, ela continuou.
— Perdoe-me se você não é exatamente o tipo de homem que eu pediria ajuda.
Ele não gostou disso. — O que isso significa?
— Só que um homem que entra no quarto de dormir sem ser convidado
não é o tipo de homem que ajuda a pessoa a entrar em uma carruagem ou pega
um espaço vazio do cartão de dança em um baile.
— Por que não?
Ela lhe deu um olhar. — Você não parece o tipo que dança.
— Você ficaria surpresa com o que eu posso fazer, Felicity Faircloth.
Ela sorriu. — Você está atualmente tomando banho na minha frente.
— Você não teve que entrar.
— Você não precisava me convidar.
Se ele soubesse que mulher difícil ela era, ele nunca teria permitido que esse
plano fosse aprovado.
Mentira.
Ela sentou-se na cama alta então, deixando seus pés cor-de-rosa,
pendurados, as mãos pousando na colcha. — Você não precisa se preocupar, de
qualquer maneira, — disse ela. — Você não é o primeiro homem que vi em
estado de nudez.
Suas sobrancelhas se ergueram. Ele poderia jurar que ela era virgem. Mas
ela sabia como abrir uma fechadura, então talvez houvesse mais sobre Lady
Felicity Faircloth do que ele imaginava. Excitação guerreou com outra coisa, algo
muito mais perigoso. Algo que venceu. — Quem?
Ela bebeu de novo, mais cuidadosa dessa vez, e a bebida não queimou tanto.
Ou ela era melhor em esconder isso. — Eu não vejo por que isso é da sua conta.
— Se você quer que eu te transforme em uma chama, amor, eu devo saber
todas as coisas que você provocou antes.
— Eu te disse. Eu nunca acendi antes.
Ele não acreditou. A mulher era toda faísca - constantemente ameaçando
queimá-lo.

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— É por isso que eu aceitei a sua oferta. Eu temo que nunca acenda. Eu estou
bem encalhada agora.
Ela não parecia encalhada.
— E eu não fui abençoado com a beleza da porcelana.
— Não há nada pouco atraente em você, — disse ele.
— Por favor, senhor, — ela disse secamente, — você não precisa encher
minha cabeça com seus lindos elogios.
Ele não gostou de como essa garota poderia fazê-lo sentir coisas que ele
não sentia há décadas. Coisas como desgosto. — Bem, não preciso.
— Oh. Bem, obrigada.
Ele mudou de assunto, de repente se sentindo como um idiota. — Então,
os homens que você testemunhou em um estado de nudez termina em quem,
seu pai em seu traje casual do campo?
Ela sorriu. — Você está mostrando sua falta de conhecimento da aristocracia,
Devil. O traje casual de meu pai inclui uma gravata e casaco, sempre. — Ela
balançou a cabeça. — Não. De fato, foi o Duque de Haven.
Ele resistiu à vontade de ficar em pé. Ele conhecia Haven. O duque
frequentava The Singing Sparrow - uma taverna a duas ruas de distância, de
propriedade de um americano e de uma cantora lendária. Mas Haven era louco
por sua esposa, e isso não era fofoca - Devil tinha testemunhado isso.
— Eu assumo que este é o duque que te disputou como esposa?
Ela assentiu. — Então não era um estado de nudez que importava, — disse
ela. — Eu era uma das suas solteiras.
Ela disse isso como se explicasse tudo.
— O que isso significa?
Sua testa franziu. — Você não sabe sobre a busca de Haven por uma nova
duquesa?
— Eu sei que Haven tem uma duquesa. Quem ele ama além da razão.
— Ela exigiu o divórcio, — disse Felicity. — Você não lê os jornais?
— Eu não posso articular o quão pouco me preocupo com o conflito
conjugal da aristocracia.
Ela se calou. — Você está falando sério.
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— Por que eu não estaria?
— Você realmente não se importa com o que aconteceu? Saiu em todas as
páginas de fofocas. Eu fui bastante famosa por um tempo.
— Eu não leio as páginas de fofocas.
Uma sobrancelha de mogno se levantou. — Não, eu não imagino que você
faça isso, com o quão ocupado e importante você é.
Devil teve a nítida impressão de que ela estava provocando-o. — Meu
interesse se estende a como isso é relevante para você, Felicity Faircloth, e apenas
quão longe você foi.
Ela lhe deu uma olhada no último. — No verão passado, a Duquesa de
Haven exigiu o divórcio. Houve uma competição para quem ia se tornar a
segunda duquesa. Era tudo tolice, claro, porque Haven absolutamente a amava
além da razão. Foi o que ele me disse. Enquanto estava em seu roupão e
nada mais.
— Ele foi incapaz de se vestir antes de lhe dizer isso?
Ela sorriu, suave e romântica. — Eu não vou permitir que você faça parecer
ridículo. Eu nunca vi ninguém tão devastado pelo amor.
O olhar de Devil se estreitou. — E assim chegamos ao coração das coisas
impossíveis que você deseja.
Ela fez uma pausa, inúmeras emoções passando por seu rosto. Embaraço.
Culpa. Tristeza. — Você não deseja tal coisa?
— Eu disse a você, minha senhora, paixão é um jogo perigoso. — Ele fez
uma pausa. — Então, Haven manteve sua duquesa e o que aconteceu com o
resto de vocês?
— Uma deixou o meio da competição para se casar com outro. Uma outra
tornou-se acompanhante de uma tia idosa e está no continente, procurando um
marido. As duas últimas, Lady Lilith e eu, continuamos solteiras. Não é como se
fôssemos diamantes da primeira linha para começar.
— Não?
Ela balançou a cabeça. — Nós não éramos nem diamantes da segunda
linha. E agora, o desespero de nossas mães para nos fazer corresponder tornou-
se uma espécie de vaga marca negra.
— Que vaga de marca negra?

93
— O tipo que nos faz vagamente arruinada. — Outro gole da bebida. — Não
que eu não estivesse vagamente arruinada antes disso.
Devil sempre achara que as mulheres fossem inteiramente arruinadas ou
não. E ela não parecia arruinada.
Ela parecia perfeita.
— É por isso que seus infelizes amigos se afastaram de você sem motivo
aparente? — Ele perguntou. — Porque isso parece um motivo. Um idiota, mas
que a aristocracia teria prazer em se apegar a fim de queimar um dos seus
próprios.
Ela olhou para ele. — O que você sabe da aristocracia?
— Eu sei que eles gostam de beber bourbon e jogar cartas. — E eu sei que
houve uma época em que eu queria muito ser um deles, assim
como você, Felicity Faircloth. Ele recostou-se no banho. — E eu sei que é melhor
ser o primeiro no inferno do que simular no céu.
Seus lábios se achataram em uma linha reta e desaprovadora.
— De qualquer forma, o seu fim de nossa barganha é mais que um
desafio. O duque de Marwick pode não se importar com uma esposa com uma
reputação tão manchada.
O duque de Marwick não tinha interesse em uma esposa, ponto final.
Devil não disse isso a ela. Nem ele disse a ela que sua reputação manchada
estaria em frangalhos em breve. De repente, ele ficou desconfortável, e ele ficou
de pé, a água escorrendo dele quando ele chegou à sua altura máxima.
Ele estaria mentindo se dissesse que não gostou do jeito que seus olhos se
arregalaram ou do pequeno guincho que ela fez quando ela pulou da cama para
se virar de costas para ele. — Isso foi muito rude, — disse ela para a parede mais
distante da sala.
— Eu nunca fui conhecido por minha polidez, — disse ele.
Ela deu um pequeno bufo. — Que surpresa.
Ele balançou a cabeça, divertido. Mesmo agora, ela permaneceu de boca
esperta. — Você está se arrependendo de sua bravura anterior?
— Não. — A palavra rachou em seu tom alto. Ela bebeu novamente. —
Continue falando.
Era sua vez de suspeitar. — Por quê?

94
— Para que eu possa ter certeza de que você não está se aproximando para
se aproveitar de mim.
— Se eu fosse tirar vantagem de você, eu me aproximaria pela frente, Felicity
Faircloth. Em completa visão, então você teria a alegria de me esperar, — disse
ele. — Mas eu vou falar, com prazer. — Ele se moveu para se vestir, observando-
a o tempo todo. — Vamos começar com um vestido.
— U-um vestido?
Ele vestiu as calças. — Eu prometi que Marwick estaria babando atrás de
você como um cachorro, não foi?
— Eu não disse que queria isso, — disse ela.
Ele sorriu com o desgosto em suas palavras quando ele levantou uma camisa
de linho preta e puxou-a sobre a cabeça, enfiando-a antes de apertar as mantas
de suas calças. — Não, você disse que você achava ele o homem mais bonito que
você já viu, não foi?
Uma pausa. — Eu suponho.
A irritação explodiu e ele descartou. — Você disse que queria que ele viesse
atrás de você como uma mariposa para uma chama. Você sabe o que acontece
com as mariposas quando elas chegam à chama, não é? Você pode se virar.
Ela fez isso, seus olhos imediatamente o encontraram e rastrearam sua roupa
dos ombros até os pés descalços. A excitação em seu olhar quando ela lhe deu
sua leitura franca enviou um fio de consciência através dele - e ele mudou seu
peso com o peso repentino em suas calças recém-passadas.
— O que acontece? — Ele piscou com as palavras, e ela acrescentou: — Para
as mariposas.
— Elas queimam. — Ele puxou o colete.
O olhar dela estava em seus dedos enquanto ele trabalhava os botões do
casaco, e ele não pôde resistir a diminuir seus movimentos, vendo-a observá-lo.
Devil sempre amou o olhar feminino sobre ele, e Lady Felicity
Faircloth observava-o com fascínio puro e inalterado, fazendo-o querer mostrar-
lhe tudo o que ela queria.
— A combustão soa melhor que a baba, — ela disse, as palavras mais
ofegantes do que antes.
— Diz a mulher que não está fazendo nenhum dos dois. — Ele terminou os
botões e alisou o colete sobre seu torso. — Agora. Se você me deixar terminar...
95
— Por todos os meios, baba fora.
Ele mal resistiu à gargalhada que ameaçava sua resposta inteligente. — Se
você quer que ele deseje você além da razão, você deve vestir-se a altura.
Ela inclinou a cabeça. — Sinto muito. Eu devo me vestir para ele?
— De fato. De preferência, algo com pele. — Ele acenou com a mão para o
vestido rosa de gola alta. — Isso não vai funcionar. — Era uma mentira. O vestido
funcionava muito bem, no que dizia respeito ao corpo de Devil.
Ela colocou a mão na garganta. — Eu gosto deste vestido.
— É rosa.
— Eu gosto de rosa.
— Eu notei.
— O que há de errado com rosa?
— Nada, se você é um bebê choramingando.
Ela apertou os lábios em uma linha fina. — Um vestido diferente vai fazer o
que, exatamente?
— Certifique-se de que ele não será capaz de manter as mãos longe de você.
— Oh, — ela disse. — Eu não sabia que os homens eram tão suscetíveis a
roupas femininas que isso os tornava incapazes de controlar suas mãos.
Ele hesitou, não gostando da direção de suas palavras. — Bem, alguns
homens.
— Não você, — disse ela.
— Eu sou mais do que capaz de controlar meus impulsos.
— Mesmo se eu fosse usar... o que foi que você sugeriu? Algo com pele?
E assim, ele estava pensando em sua pele. — Claro.
— E isso é uma aflição particularmente masculina?
Ele limpou a garganta. — Alguns podem argumentar que é uma aflição
humana.
— Interessante, — ela respondeu, — porque pode-se dizer que você estava
a apenas momentos atrás vestindo algo com pele, e minhas mãos de alguma
forma, surpreendentemente, permaneceu bastante longe de sua pessoa. — Ela
sorriu. — Eu não babava de jeito nenhum.
96
As palavras eram como uma bandeira para um touro, e ele queria,
imediatamente, enfrentar o desafio e seduzir Felicity Faircloth a escravizar. Mas
assim estava o perigo, porque ele já estava muito intrigado com a dama, e isso
tinha que parar antes de começar.
— Eu terei um vestido enviado para você. Use-o para a baile Bourne, que
acontecerá em três dias.
— Você percebe que os vestidos não estão simplesmente disponíveis nas
dimensões de quem você gosta, não é? Eles são ordenados. Eles são fabricados.
Eles levam semanas...
— Para alguns.
— Ah sim, — ela brincou. — Para meros mortais. Eu esqueci que você tem
elfos mágicos que fazem vestidos para você. Eu suponho que eles os
transformam da palha? Em uma única noite?
— Eu não te disse que te conseguiria seu duque?
Ela balançou a cabeça. — Eu não sei como você silenciou a negação do
nosso compromisso, Devil, mas é impossível que ele permaneça em silêncio.
Ele não disse a ela que não havia negação ao silêncio. Não disse a ela que
ela tinha jogado diretamente em suas mãos duas noites antes, quando ele fez
parecer impossível para ela ganhar o duque que já havia decidido que ela era
uma marca conveniente. Não disse a ela que ele também decidira que Felicity
Faircloth era uma marca conveniente.
De repente, ele não estava tão certo de que ela fosse conveniente, afinal.
— Eu te disse, eu tenho uma habilidade para tornar o impossível possível, —
disse ele. — Aqui está como começamos: você continua a tratar sua mentira
como verdade, você veste o vestido que eu envio, e ele estará em seu caminho.
Então, será apenas uma questão de vencê-lo.
— Oh, — ela retrucou, — apenas a simples questão de conquistá-lo. Como
se essa fosse a parte fácil.
— É a parte fácil. — Ela já o ganhou. E mesmo se ela não tivesse, ela poderia
ganhar quem ela desejasse. Disso, Devil não tinha dúvidas. — Confie em mim,
Felicity Faircloth. Vista o vestido, vença o homem.
— Eu ainda precisarei me adaptar, Devil, seja qual for o seu nome. E mesmo
que eu use um vestido mágico, construído por fadas e feito para varrer os
homens de seus pés, eu permaneço – como você colocou? Não é nada
atraente?
97
Ele não deveria se sentir culpado por isso. Seu objetivo não era fazer com
que Felicity Faircloth pensasse que ela era linda. Mas ele não conseguia parar de
se aproximar dela. — Quer que eu elabore?
Ela levantou uma sobrancelha e ele quase riu de como ela parecia mal-
humorada. — Eu queria que você não o fizesse. Não sei como resistirei a
desmaiar no ardente abraço de seus elogios.
Um sorriso se contraiu. — Você não é nada atraente, Felicity Faircloth. Você
tem um rosto aberto e cheio, e olhos que revelam cada um de seus pensamentos,
e cabelo que imagino que cai em ondas de mogno quando está solto de suas
amarras severas... — Ele estava em pé na frente dela agora. Seus lábios se
abriram apenas um pouco, o suficiente apenas para ela respirar um pouco.
Apenas o suficiente para ele notar. — ...e lábios cheios e macios que qualquer
homem gostaria de beijar.
Ele queria dizer tudo isso, é claro. Para colocá-lo em evidencia e começar a
sedução de Lady Felicity Faircloth. Para punir seu irmão e ganhar o dia.
Assim como ele queria estar tão perto dela - perto o suficiente para ver as
sardas que cobriam seu nariz e bochechas. Perto o suficiente para ver o pequeno
vinco deixado por anos da covinha que lá vivia piscando. Perto o suficiente para
sentir seu cheiro de jasmim. Perto o suficiente para ver o anel cinza em torno de
seus lindos olhos castanhos.
Perto o suficiente para querer beijá-la.
Perto o suficiente para ver que, se ele fizesse, ela deixaria.
Ela não é para você.
Ele se afastou com o pensamento, quebrando o feitiço para os dois. — Pelo
menos, qualquer toff adequado em Mayfair.
Uma emoção atrás da outra correu através de seu olhar - confusão,
compreensão, mágoa - e depois nada. E ele se odiava um pouco por isso. Mais
do que um pouco, quando ela limpou a garganta e disse: — Vou esperar no outro
cômodo para você me levar para casa.
Ela passou por ele e ele a deixou ir, arrependimento correndo por ele,
desconhecido e picante quase tanto quanto o roçar de suas saias contra suas
pernas.
Ele ficou lá por um longo momento, tentando encontrar a calma – o centro
frio e imóvel que o tinha mantido vivo por trinta anos. Aquele que construiu um

98
império. Aquela calma que tinha sido abalada pelo aparecimento de uma mulher
aristocrática única em seu espaço privado.
E quando ele encontrou aquela calma mais uma vez, ele a perdeu. Porque
a descoberta foi pontuada com o som suave da porta de seus aposentos.
Ele estava se movendo antes que o som se dissipasse, atravessando a sala
exterior agora vazia até a porta, que ele quase arrancou das dobradiças para
entrar no corredor além - também vazio.
Ela foi rápida, maldição.
Ele foi atrás dela, descendo as escadas, determinado a pegá-la. Atravessou
o labirinto de corredores até a saída, a porta estava entreaberta, como uma frase
inacabada.
Exceto que estava claro que Felicity Faircloth havia dito tudo o que ela estava
interessada em dizer.
Ele abriu-a e atravessou-a, imediatamente olhando para a direita, em direção
a Long Acre, onde ela instantaneamente encontraria uma carruagem de aluguel
para levá-la para casa. Nada.
Mas, à esquerda, na direção de Seven Dials, onde ela encontraria problemas
instantaneamente, suas saias rosa já estavam desaparecendo na escuridão. —
Felicity!
Ela não hesitou.
— Maldita! — Ele rugiu, já voltando pelo prédio. Droga, ele calculou mal.
Porque Lady Felicity Faircloth se dirigia para a lama de Covent Garden, na
calada da noite, e seus pés estavam descalços.

Capítulo Nove

Felicity se moveu o mais rápido que pôde para longe na curva rua Arne
Street, de volta para a rua principal, onde ela havia descido da carruagem de

99
aluguel no início da noite. Virando a esquina, ela parou de repente, confiante de
que estava fora da vista da casa de Devil e finalmente conseguiu recuperar
o fôlego.
Uma vez que isso acontecesse, ela encontraria outra carruagem de aluguel
e voltaria para casa.
Ela seria amaldiçoada se ela permitisse que ele a acompanhasse. Ela estaria
tão propensa a ser arruinada por ele quanto seria para ser devidamente cuidada
por ele.
A irritação indignada se acendeu novamente.
Como ele se atreve a falar com ela de tal maneira, discutindo seu cabelo,
seus olhos e seus lábios? Como ele ousa quase beijá-la?
Por que ele não a beijou?
Teria sido quase um beijo, mesmo? Felicity nunca tinha sido beijada, mas
isso certamente parecia ser o tipo de corrida para beijar que ela tinha ouvido
falar. Ou lido sobre nos romances. Ou imaginado acontecendo com ela. Muitas
vezes.
Ele estava tão perto - tão perto que ela podia ver o anel preto em torno do
dourado aveludado de seus olhos, e a sombra de sua barba, fazendo-a se
perguntar como se sentiria contra sua pele, e aquela cicatriz longa e perigosa e
de alguma forma vulnerável, fazendo-a querer estender a mão e tocá-la.
Ela quase fez isso, até que ela percebeu que ele poderia beijá-la, e então
isso era tudo o que ela queria. Mas então ele não tinha interesse em fazer isso.
Pior, ele disse a ela que não tinha interesse em fazê-lo.
— Ele deixaria para um toff de Mayfair me beijar, — disse ela à noite, suas
bochechas queimando de vergonha. Ela nunca estivera tão orgulhosa de si
mesma por pegar o touro pelos chifres, por assim dizer, e deixá-lo ali mesmo, em
seu quarto, onde ele podia ruminar sobre o que se deve e não deve dizer às
mulheres.
Ela virou o rosto para o céu, inalando profundamente. Pelo menos vir aqui
não foi um erro. Ela não achava que jamais esqueceria a irmã dele - uma mulher
que conhecia seu valor, sem questionar. Felicity poderia fazer mais disso sozinha.
Ela fez uma anotação mental para encontrar seu caminho para 72 Shelton Street
- o que quer que ela encontrasse, com certeza seria fascinante.
E mesmo agora, nas ruas cheias de sombras, as montanhas escarpadas de
prédios apertados se erguendo ao redor dela, Felicity se viu sentindo-se
100
destrancada. Este lugar, longe de Mayfair e seu julgamento e observações de
corte... ela gostou. Ela gostou do jeito que a chuva se estabeleceu. O jeito que
parecia lavar a sujeira. O jeito que parecia libertá-la.
— Joga uma moeda pra fora, milady?
A pergunta chegou perto o suficiente para chocá-la, e Felicity se virou para
encontrar uma jovem de pé atrás dela, molhada pela chuva que começara - uma
fina névoa londrina que se infiltrava na pele e nas roupas - num vestido
esfarrapado, com cabelo grosso e solto em volta dos ombros. Seu braço foi
estendido, palma para cima.
— Eu-eu imploro seu perdão?
A mulher indicou a palma da mão aberta. — Tem um bob? Pra alguém
comer?
— Oh! — Felicity olhou para a mulher e depois para a mão dela. — Sim.
Claro. — Ela pegou o bolso de suas saias, onde guardava uma pequena bolsa de
moedas.
Uma pequena bolsa de moedas que não estava mais lá.
— Oh, — ela disse novamente. — Eu não pareço... — Ela parou. — Minha
bolsa está...
Os lábios da mulher se contorceram em frustração. — Aww, as lâminas da rua
já chegou até você.
Felicity piscou. — Até mim?
— Sim. Dama fina como você, o batedor de carteira entrou em ação quando
você desembarcou no bairro.
Felicity tocou o buraco que permaneceu em suas saias. Sua bolsa se foi. E
todo o dinheiro dela. Como ela chegaria em casa?
Seu coração começou a bater.
A mulher franziu o cenho. — Todo mundo é um ladrão por aqui.
— Bem, — disse Felicity, — eu não tenho mais nada para se roubar, parece.
A garota apontou para os pés. — Os chinelos são bonitos. — E então para o
corpete de seu vestido. — E as fitas ali, a renda no pescoço também. — Seu olhar
subiu para o cabelo de Felicity. — E cabeleira marrom. Todos estamos atrás dos
cabelos das senhoras.
Felicity levou a mão ao cabelo: — Meus grampos de cabelo?
101
— Sim.
— Você gostaria de um?
Um brilho brilhou nos olhos da garota, e a ela parecia ter sido oferecido
joias. — Sim.
Felicity estendeu a mão e extraiu um, estendendo-o para a garota, que o
pegou sem hesitar.
— Tem um para mim, senhora?
— E eu?
Felicity girou para encontrar mais duas em pé por trás dela, uma mais velha
e uma não mais do que oito ou dez anos. Ela não as ouvira se aproximar. — Oh,
— ela disse novamente, pegando o cabelo mais uma vez. — Sim. Claro.
— E quanto a mim, menina? — Ela se virou para encontrar um homem além,
magrelo e sorrindo como um lobo, em um sorriso desdentado que fez sua pele
arrepiar. — O que você tem para mim?
— Eu... — Ela hesitou. — Nada.
Um brilho diferente em um olhar diferente. Muito mais perigoso. —Tem
certeza que não?
Felicity recuou, em direção às outras mulheres. — Alguém pegou minha
bolsa.
— Tudo bem - você pode me pagar de outro jeito. Você não é o cara mais
bonita que eu já vi, mas você vai fazer.
Uma mão tocou o cabelo dela, os dedos procurando. — Posso ter outro? —
Ela bloqueou isto de tomar o que ela não ofereceu. — Eu preciso deles.
— Você tem mais em sua casa, não é? — A garotinha choramingou.
— E-eu suponho. — Ela puxou outro grampo de cabelo e estendeu-o para
ela.
— Grata a você, — disse a menina, balançando um pouco reverência,
empurrando o pino em sua juba atada.
— Vá embora, menina, — disse o homem. — É a minha vez de lidar com a
senhora.
Não se vá, pensou Felicity. Por favor.

102
Felicity olhou para a rua escura em direção aos escritórios do Devil, fora de
vista. Certamente ele percebeu que ela tinha ido embora agora, não tinha? Será
que ele a seguiria?
— Você acha que uma dama vai lidar com você, Reggie? Ela não vai tocar
você seu estupido, nem pela fortuna de um rei.
O sorriso repugnante de Reggie caiu, substituído por uma carranca
ameaçadora. — Você está pedindo um tapa na boca, garota. — Ele se moveu em
direção a ela, com o braço para cima, e ela correu de volta, para as sombras.
Satisfeito com sua exibição de poder fraco, voltou-se para Felicity e
chegou mais perto. Ela recuou, encostando-se a uma parede quando ele
estendeu a mão para o cabelo dela, agora solto, caindo ao redor dos ombros
dela.
— Isso é bonito — Ele tocou, suavemente, e ela se encolheu. — Como seda
que é.
Ela se inclinou para o lado, ao longo da parede, arrependida e temendo a
guerra em seu intestino. — Obrigada.
— Ah-ah, senhora. — Ele fechou a mão, pegando um pedaço de cabelo em
seu punho, puxando apertado. Quando ela engasgou com a dor, ele disse: —
Volte aqui.
— Deixe-me ir! — Gritou ela, virando-se, choque e medo colocando-a em
ação, sua mão em punho enquanto ela socava descontroladamente em direção
a ele, roçando seu osso da bochecha quando ele se afastou do ataque.
— Você vai se arrepender desse golpe, você vai. — Ele apertou ainda mais,
puxando a cabeça para trás. Ela gritou.
Dois toques responderam a distância, quase imperceptíveis sobre o som do
seu coração batendo.
— Merda, — o homem segurando ela disse. Ele soltou o cabelo dela como
se tivesse queimado.
— Oh... Reggie — a primeira mulher gargalhou. — Você tem um pouco de
problema agora... — Ela abaixou sua voz para um sussurro enquanto recuava
para a escuridão. — O Devil te encontrou.
Por um momento, Felicity não entendeu, muito cheia de medo, confusão
e imenso alívio que Reggie tinha lhe soltado. Ela correu para o lado, longe dos
maltrapilhos, em direção ao som de passos se aproximando.

103
— Olhe pra ela, indo em direção a ele, — a mulher narrou. — Você tocou na
dama do Bastardo.
— Eu não sabia! — Reggie gritou, sua bravata insolente escapou dele.
E então ele estava lá, o homem que eles chamavam de Diabo - vestindo as
roupas que ela tinha visto em alguns momentos atrás, as calças pretas elegantes
que tinha escorregado sobre sua pele. A camisa de linho preto. O colete. E agora
ele estava usando botas.
Ele carregava aquela bengala na mão nua, os anéis e a cabeça de leão de
prata cintilando como promessa perversa ao luar. Era uma arma, ele assegurou a
ela na noite que eles se encontraram. E agora, ela não tinha dúvida disso.
Ela soltou um pequeno suspiro de alívio. — Graças a Deus.
Ele não olhou para ela, muito concentrado em Reggie enquanto girava o
bastão ameaçadoramente. — Deus não tem lugar aqui. Ele tem, Reggie?
Reggie não respondeu.
O bastão girou e Felicity não conseguiu desviar o olhar do rosto dele, onde
ângulos frios e duros haviam se transformado em pedra, e aquela cicatriz maligna
brilhava totalmente branca contra a escuridão. — Deus nos abandonou aqui no
Covent Garden, não é, Reggie?
Reggie engoliu em seco. Assentindo.
Ele continuou se movendo, passando por ela, como se ela fosse invisível. —
E sem Deus, de quem é a benevolência permite que você permaneça aqui?
Os olhos de Reggie se arregalaram e ele se esforçou para olhar para o outro
homem. — Sua.
— E quem sou eu?
— O Diabo.
— E você conhece as regras do meu território?
Reggie assentiu. — Sim.
— E quais são elas?
— Ninguém toca as mulheres.
— Isso mesmo, — uma mulher cantou a partir das sombras, corajosa uma
vez mais. Segura, mais uma vez. — Fora Reggie.
Devil a ignorou. — E o que mais, Reggie?
104
— E ninguém toca crianças.
— Ou?
— Ou eles vêem o diabo.
Devil se inclinou e disse baixinho: — Nós dois.
Reggie fechou os olhos. — Eu sinto Muito! Não foi nada. Eu não ia fazer
nada.
— Você quebrou as regras, Reggie. — Devil segurou a ponta prateada de
sua bengala e puxou, o anel de aço ecoando nos tijolos do beco.
Felicity engasgou com a aparência da espada de dois metros de
comprimento que vinha de dentro, o aço frio cintilando prateado ao luar, cuja
ponta estava imediatamente na garganta de Reggie.
Os olhos de Reggie se arregalaram. — Eu sinto muito!
Felicity avançou. — Espera!
Devil não olhou para ela. Não pareceu ouvi-la. — Eu deveria cortar sua
garganta aqui, você não acha? Deixar a chuva te levar embora?
— Eu sinto Muito!
Felicity colocou a mão no braço de Devil. — Não haverá cortes na garganta!
Ele não fez nada! Ele puxou meu cabelo! Foi isso aí!
Se possível, as palavras fizeram Devil mais frio. Seus músculos ficaram
incrivelmente mais duros sob sua mão. E por um longo momento, Felicity pensou
que ele poderia usar essa lâmina perversa. Que ele poderia cortar a garganta do
homem. Que o sangue poderia estar nas mãos dela.
— Por favor, — ela disse, suavemente. — Não
Ele olhou para ela então, pela primeira vez, a fúria queimando em seus olhos
negros, e ela resistiu ao instinto de deixá-lo ir. — Você pede a vida dele?
— Sim. Claro. — Ela desejou que o homem fosse embora, mas não morto.
Ele a observou pelo que parecia ser uma eternidade antes de falar, sem tirar
o olhar dela. — Agradeça à senhora Reggie. Ela compra sua vida de mim esta
noite.
A ponta da espada cintilou quando ele a devolveu à bainha de ébano, e
Reggie caiu de joelhos em alívio. — Grato a você, senhora.

105
Ele alcançou seus pés, e ela se afastou, evitando seu toque. — Isso... não
será necessário.
Devil se interpôs entre eles. — Vá embora, Reggie, e suma. Se eu te
encontrar no território dos Bastardos de novo, seu anjo não estará aqui para te
salvar.
Reggie se foi antes que as palavras desaparecessem.
Devil virou-se para as mulheres, espreitando nas sombras. — Vocês três
também. — Ele enfiou a mão no bolso e tirou um punhado de moedas. — Não
precisa trabalhar hoje à noite, Hester — ele disse a primeira, deixando cair um
trenó na mão antes de se virar e dar duas moedas para a mulher mais velha e a
garota. — Vão para casa, meninas, antes que vocês encontrem mais problemas.
Os três fizeram o que lhes foi dito, deixando Felicity sozinha com Devil. Ela
engoliu em seco. — Isso foi gentil.
Ele permaneceu em silêncio, observando o lugar onde o trio havia
desaparecido enquanto os segundos se estendiam como horas, e então ele disse:
— Nada é gentil aqui. — Ele se virou para ela. — Você não deveria ter
desperdiçado uma barganha na vida daquele rato.
A incerteza passou por ela com as palavras. E ainda... — Eu deveria ter
deixado você matá-lo?
— Outros teriam.
— Eu não sou os outros, — ela disse, simplesmente. — Eu sou eu.
Ele se virou para ela, se aproximando. — Você trocou por algo que tinha
muito pouco valor.
— Eu não sabia que era um comércio.
— Nada no aqui é gratuito, Felicity Faircloth.
Ela balançou a cabeça, forçando uma risadinha. — Bem, eu não tenho
dinheiro e estou quase sem grampos, então espero que ele não valha muito a
pena.
Ele congelou. — Você correu sem dinheiro? Como você pensou em chegar
em casa?
— Eu pensei que eu tinha dinheiro, — disse ela. Ela deslizou a mão em suas
saias, revelando o buraco ali. — Alguém o roubou. Eu nem senti isso.

106
Ele olhou para o lugar onde os dedos dela se mexiam no bolso. — Nossas
criaturas da noite são os melhores da cidade.
— Você deve estar muito orgulhoso. — Ela tentou por leveza, incapaz de
escapar do alívio que ainda corria através dela. Quando ele não respondeu, ela
disse baixinho: — Obrigada.
Ele virou-se para a pedra novamente. — Ele não merecia clemência.
— Nada aconteceu. Você veio antes que pudesse. Ele mal me tocou.
Sua cicatriz ficou branca e um músculo bateu em sua bochecha. — Ele tocou
em você. Seu cabelo. — Seu olhar estava trancado onde caía em torno de seus
ombros, descabelado.
Ela balançou a cabeça. — Sim mas não muito. É só porque eu dei às
mulheres meus grampos de cabelo.
— Não muito, — disse ele, aproximando-se dela. — Eu o vi com uma mecha
em sua pata imunda. Eu o ouvi descrevê-lo. Como seda. E eu ouvi você gritar
quando ele puxou. — Ele fez uma pausa, sua garganta trabalhando para manter
as palavras de volta. Palavras que vieram assim mesmo. — Ele tocou. E eu não
toquei.
Um eco veio de antes, de dentro de seu quarto, as palavras que ele usou
para descrever o cabelo dela. O cabelo que imagino que cai em ondas de mogno
quando é solto de suas amarras severas.
Seus olhos se arregalaram. — Eu não sabia que você queria...
Ele levantou a mão, então, e por um momento, ela pensou que ele faria isso.
Tocá-la. Por um momento, imaginou como seria deslizar seus dedos fortes em
seus cabelos e passá-los pelo couro cabeludo, agora livre das amarras apertadas
de grampos e toucas. Ela imaginou se inclinar naquele toque. Inclinando-se para
ele.
Ele inclinando-se para ela.
— Eu deveria tomar, — ele sussurrou. — Meu pagamento. Eu deveria tocá-
lo.
Ela piscou para ele. — Sim.
A decisão guerreou nele. Ela podia ver isso. E ela também viu ele fazer isso,
viu-o ceder ao desejo e chegar para ela. Graças a Deus
Seu toque estava quase lá, e a coisa mais poderosa que ela já experimentou.
Sua respiração ficou presa em sua garganta enquanto ele peneirada seu cabelo
107
através de seus dedos. Será que a sua mão seria quente? Será que ele se deixaria
tocá-la? Será que ele iria beijá-la?
— Eu deveria tê-lo matado por tocá-la, — ele disse, suavemente.
— Não foi... — Ela hesitou, em seguida, sussurrou: — Não foi como este.
Seu olhar encontrou o dela na escuridão. — O que isso significa?
— Não vou me lembrar dele, — disse ela. — Não quando você está aqui
agora.
Ele balançou sua cabeça. — Felicity Faircloth, você é muito perigosa. — Os
dedos de Devil - trabalharam duro e quente - se moveram para sua bochecha,
traçando a curva, até o queixo. Parando lá.
Ela estremeceu. — Estar aqui... com você... isso me faz sentir como se eu
pudesse ser perigosa.
Ele inclinou seu rosto para os seus olhos brilhantes, para a névoa de Covent
Garden. — E se você fosse? O que você faria?
Eu ficaria, ela pensou, loucamente. Eu exploraria esse mundo magnífico e
aterrorizante. Ela não disse essas coisas, no entanto. Em vez disso, ela se
concentrou na terceira resposta - a chocante. Aquela que veio em uma enxurrada
de desejo. — Eu te beijaria.
Por um momento ele não se mexeu, depois respirou fundo e levantou a
outra mão, embalando o rosto dela com o aperto quente antes de repetir: —
Você é muito perigosa.
Ela não sabia onde as palavras vieram quando ela disse, baixinho, — Você
me deixaria?
Ele balançou a cabeça uma vez, seu olhar no dela. — Eu não seria capaz de
resistir.
Mais tarde, ela culparia a escuridão por suas ações. A chuva nas ruas de
paralelepípedos. O medo e a maravilha. Ela culpava suas mãos quentes e seus belos
lábios e aquela cicatriz no lado do rosto que o tornava de alguma forma
incrivelmente bonito. Ela tinha que culpar algo por isso, você vê, como Felicity
Faircloth, envelhecida, invisível, solteirona, não beijava homens.
Além do mais, ela absolutamente não beijava homens que viviam em Covent
Garden e portavam espadas de cana e eram chamados de Diabo.
Exceto naquele momento, quando ela se levantou na ponta dos pés e fez
exatamente isso, pressionando os lábios nos dele, macios. Ele estava tão quente,
108
o calor dele que vinha através de sua camisa de linho e colete - o colete que ela
agarrou imediatamente e sem pensar, como se ele pudesse ser capaz de mantê-
la estável no momento selvagem.
Como se ele não fosse a razão pela qual se sentia tão selvagem, com o jeito
que ele passou os braços em volta dela e a puxou com força contra ele, o
movimento fazendo-a ofegar sua surpresa. Ele rosnou – um som profundo e
delicioso, e seus dentes beliscado seu lábio inferior antes de ele sussurrasse,
como a escuridão, — Tome então. Como você quer fazer isso.
E porque ele lhe deu permissão, ela fez, dando seu primeiro beijo naquele
homem perigoso que parecia o tipo de homem que não dava nada livremente, e
ainda dava tudo de si para esse momento... para o prazer dela.
Não apenas dela, no entanto. Devil lambeu seu lábio inferior, provocando
sua boca aberta para que ele pudesse reivindicá-la com uma carícia profunda e
inflexível. Ele gemeu novamente, o som enviando uma onda de desejo através
dela, se acumulando profundamente em sua barriga. Mais baixo. Esse gemido,
juntamente com seu beijo maravilhoso e perverso, fez ela se sentir mais poderosa
do que ela nunca sentiu antes.
Como se ele fosse um bloqueio que ela escolheu. Ele estava a arruinando.
Só que não parecia uma ruína. Parecia um triunfo.
Ela se aproximou mais dele, querendo-o mais perto, querendo mais desse
momento e de seu poder inebriante. Ele levantou a cabeça para olhá-la, sua
respiração vindo em rajadas curtas e com algo como surpresa em seus olhos. Ele
deu um passo para longe dela, esfregando as costas de uma mão sobre os lábios.
Ele balançou sua cabeça. — Felicity Faircloth, você vai me queimar.
Um grito soou à distância, seguido por gritos e uma coleção de vozes
masculinas. Felicity se aproximou de Devil, mas ele não ofereceu o conforto que
ela procurava, em vez disso balançou a cabeça com firmeza. — Não.
Sua testa franziu. — Não?
Sem resposta, ele pegou o braço dela em uma mão impessoal e a puxou de
volta para seus escritórios. Quando eles contornaram a curva, ele a parou na
rua. — O que você vê?
— Seu covil. — Duas noites antes, ela pensou que era uma descrição boba.
Mas agora - era um covil. O domínio de um homem mais poderoso do que ela
imaginara. Um homem que poderia punir ou proteger por capricho.
— O que mais? — Ele perguntou.
109
Ela olhou em volta. Ela nunca pensou muito sobre a cidade à noite. — É
lindo.
Ele ficou surpreso. — O que?
Ela apontou —Vê lá? Onde a névoa e a luz transformaram os
paralelepípedos em ouro? É lindo.
Ele olhou para o local por um momento, sua cicatriz branca e irritada. E então
ele sorriu. Mas não foi um sorriso gentil. Ou um amigável. Foi algo muito mais
perigoso. — Você acha que o mundo é lindo, não é mesmo, Felicity Faircloth?
Felicity se afastou dele. — Eu...
Ele não deixou que ela respondesse. — Você acha que está aqui para você e
por que não deveria? Você foi criada em poder e dinheiro sem nem mesmo sentir
que alguma coisa está indo mal para você.
— Isso não é verdade, — ela disse, indignada. — Muita coisa foi mal para
mim.
— Oh, claro, eu esqueci, — disse ele, maliciosamente. — Você perdeu seus
amigos terríveis no centro do seu mundo bobo. Seu irmão não pode guardar
moedas no bolso. Seu pai também não. E você está presa tendo que ganhar um
duque que você não quer.
Sua testa franziu com o tom, como se ela fosse uma criança sem qualquer
noção do que era importante. Ela balançou a cabeça. — Eu não...
Ele a cortou. — E aqui está minha parte favorita da sua triste história. Você
nunca sentiu paixão; Você acha que a paixão é doce e gentil e boa - amor além
da razão. Proteção. Cuidado.
Ressentimento queimado. — Não penso. Sei.
— Deixe-me dizer-lhe sobre a paixão, Felicity Faircloth. Paixão é obsessão.
Ele é o desejo para além da razão. Ele é não querer, mas precisar.
E ele vem com o pior dos pecados com muito mais frequência do que ele vem
com o melhor disso.
Ela puxou seu braço, onde os dedos dele cavaram duramente em sua
carne. — Você está me machucando.
Ele a soltou instantaneamente. — Garota boba. Você não sabe o que é doer.
Ele apontou para as janelas escuras acima, para as saliências sombreadas e
as feridas abertas no lado das estruturas de tijolos. — De novo. O que você vê?

110
— Nada, — disse ela, raiva fazendo a palavra alta e dura. — O que vem a
seguir, você me diz que eu não entendo como olhar para um telhado?
Ele a ignorou, apontando para a curva da estrada vazia, onde as entradas
para meia dúzia de becos espreitavam. — E lá?
Ela balançou a cabeça. — Nada. Trevas.
Ele virou-a na direção oposta. — E lá?
O desconforto passou por ela. — N-nada.
— Bom, — ele disse. — Aquele sentimento? O medo? A incerteza? Agarre-
se a isso, Felicity Faircloth, pois isso a manterá a salvo.
Ele se virou de costas para ela, empurrando-a para trás quando ele se
adiantou e bateu sua bengala duas vezes nas pedras duras da rua. Ele olhou para
os prédios sombrios e falou, suas palavras firmes e claras, ecoando contra as
pedras. — Ninguém a toca. — Na rua, não chamando ninguém: — Ela está sob
minha proteção.
E o outro jeito, mais uma vez, falando com o universo. — Ela pertence à mim.
O olhar de Felicity se abriu. — Eu imploro seu perdão! Você está louco?
Ele a ignorou. A prata bateu no chão, clara e nítida. Uma vez. Duas vezes.
Seu eco veio como um trovão. Dois toques, em todo lugar. Acima dela, de
cada lado dela, contra vidraças e muros de pedra e a própria rua, derrubada com
madeira e aço, e os aplausos das mãos e os solavancos das botas.
Deve ter havido uma centena deles, e nenhum deles visto.
Ela olhou para ele, o choque percorrendo-a. Ela balançou a cabeça. — Como
eu poderia não saber?
Seu escuro olhar cintilou ao luar. — Porque você nunca teve que fazer
isso. Vá para casa, Felicity Faircloth. Eu te vejo três noites daqui. Continue com
seu truque até então - não conte a ninguém a verdade sobre você e Marwick.
Ela balançou a cabeça. — Ele vai...
— Eu já tive o suficiente dessa conversa. Você queria uma prova que eu
pudesse fazer como prometi, e eu a forneci. Você continua sem ser drenada, não
é? Apesar de seus melhores esforços para se aterrar de outra forma,
perambulando pelo Covent Garden na calada da noite.
— Eu não perambulo.

111
Ele se virou e ela pensou por um momento que ele amaldiçoou sob sua
respiração. Ele enfiou a mão no bolso e extraiu uma moeda de ouro,
pressionando-a na palma da mão antes de apontar para a estrada, na direção
oposta de onde haviam chegado. — Ali, para carruagens de aluguel. A outra
direção, para o inferno.
— Sozinha? — Com uma centena de pares de olhos observando das
sombras? — Você não planeja me escoltar?
— Eu não, na verdade, — disse ele. — Você nunca esteve em sua vida mais
segura do que está agora.
Ela fez como lhe foi dito, caminhando para a rua principal. Com cada passo,
ela perdeu o medo. Seu nervosismo.
No final da rua, um homem saiu das sombras e saudou-a com um golpe,
abrindo a porta, inclinando a porta enquanto a deixava entrar no transporte.
Enquanto a carruagem balançava para a frente e para trás, batendo nos
paralelepípedos, Felicity observava a cidade além da janela, tornando-se escura
à luz, até chegar em casa.
Devil estava certo. Felicity nunca se sentira mais segura. Ou mais poderosa.

Capítulo Dez

Três noites depois, Devil estava nos jardins dos fundos da casa dos Bourne,
observando as grandes massas em destaque nas enormes janelas do salão,
ouvindo a música se derramando pelas portas abertas, quando seu irmão
apareceu ao seu lado.
— Você gasta muito tempo a observando.
Devil não se virou para enfrentar a acusação. — Observando quem?
Whit não respondeu. Ele não precisava.
— Como você sabe quanto tempo eu gasto observando ela?

112
— Porque os meninos me dizem onde você vai.
Devil franziu o cenho.
— Eu não tenho os garotos seguindo você.
— Eu nunca deixo o jardim.
— Isso não parece verdade hoje à noite. — Infelizmente. Whit permaneceu
em silêncio, e Devil acrescentou: — Temos corredores de rua para correr as ruas,
não para me espionar.
— Você é o único autorizado a espionar as pessoas?
Devil ignorou a resposta lógica. — Estou me certificando de que ela está
fazendo como lhe foi dito.
— Quando foi a última vez que você foi ignorado?
— Felicity Faircloth não atribui as regras que o resto do mundo segue tão
inteligentemente. — Whit fez um ruído baixo e Devil lhe deu uma olhada.
— O que isso significa?
Um enorme ombro ergueu e caiu.
— Você acha que é um plano ruim.
— Eu acho que é um plano que não vai acabar como você imagina.
— A linha Marwick termina com Ewan. Nós concordamos com isso.
Um grunhido afirmativo.
— Mesmo que ele esteja lá, dentro da casa dos Bourne, bebendo limonada e
comendo bolinhos e dançando a quadrilha.
Whit lhe deu uma olhada. — Bolinhos?
— O que quer que eles malditamente comam, — Devil rosnou.
— Ele está esperando por nós para piscar.
Devil assentiu. — E não estamos piscando.
— Ele ainda não conheceu a garota. Felicity Faircloth.
— Não. — Devil tinha vigiado Felicity e o duque desde a noite do baile de
Marwick, e eles ainda não haviam se encontrado. Mas o silêncio de Marwick sobre
o assunto tinha feito com que toda Londres falasse sobre o futuro casamento do
Duque de Marwick com uma dama encalhada.

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— Ele tem um plano, Dev, — disse Whit. — Ele sempre teve um plano. E eu
gosto do que quer que este seja ainda menos do que eu gosto do seu.
A memória cintilou - três garotos sentados lado a lado em uma beira de um
rio, com olhos combinando e filhotes iguais. Ele parou antes de desviar-se na
lembrança, balançando a cabeça e deixando o seu olhar retornar para ao baile
além.
— Você também não vai gostar quando chegar a hora de usar a garota, —
disse Whit.
— Eu não me importo com a garota. — As palavras não pareciam certas em
sua garganta, mas Devil as ignorou.
— Ouvi dizer que você baniu Reggie do Jardim.
— Reggie tem sorte de eu não tê-lo banido da porra da Terra.
— Esse é meu argumento. Hester disse que a dama implorou que você não
fizesse isso e você amoleceu.
Devil empurrou suas mãos em seus bolsos, ignorando a verdade das
palavras. — Eu preciso dela do nosso lado, não é? Não posso mantê-la lá se ela
me ver estripar um homem em um beco.
O grunhido de Whit fez seus pensamentos claros. — Colocando ela sob
nossa proteção?
Aquilo foi inesperado. Nascido de sua própria fúria com a ideia de que ela
poderia ter sido ferida em suas ruas, e sua frustração de que ele não poderia levá-
la para sua cama e mantê-la lá por uma noite. Ou duas. Ou mais. — Eu não posso
muito bem ter uma garota aristocrática ficando morta a poucos passos da nossa
sede, posso?
— Você a convidou.
— Eu dei a ela meu cartão. Foi um erro de julgamento.
— Você não comete erros de julgamento. E precisamos de uma jovem
aristocrática sob nossa proteção como um cão precisa de diamantes.
— Ela não está sob nossa proteção por muito tempo.
— Não. Logo ela será sua vítima. Junto com Ewan.
— Nenhum herdeiro, — disse Devil. — Você se lembra do acordo.

114
Os lábios de Whit se achataram em uma linha reta. — Eu lembro. Eu também
sei que existem maneiras mais limpas e seguras de conseguir o que queremos,
do que comprar um novo vestido de merda para uma invisível.
O diabo estava ficando irritado. — Como o quê?
— Como cortar o rosto do nosso irmão para combinar com o seu próprio.
Devil sacudiu a cabeça. — Não. Desta forma é melhor. — Whit não
respondeu, e Devil ouviu o desacordo tácito no silêncio. — Os punhos são uma
ameaça. Este caminho é uma promessa. Desta forma, lembramos a Ewan que o
seu futuro nos pertence. Assim como o nosso pertenceu a ele.
Uma pausa e depois: — E a garota? O que acontece quando você tiver que
tirar seu futuro dela?
— Pagarei generosamente por isso. Eu não sou um monstro.
Whit deu um pequeno bufo de riso.
Devil olhou para ele. — O que significa isso?
— Só que você é louco se acha que pagar pela ruína da garota não é
monstruoso. Ela não apenas se importará; ela virá para você.
A ideia de Felicity Faircloth, solteirona simples e encalhada, vir para um
Bastardo de Bareknuckle era ridícula. Devil forçou uma gargalhada. — Deixe a
gatinha tentar me destruir, então. Vou manter minha espada pronta.
— Ouvi dizer que ela socou Reggie.
O orgulho explodiu na memória, expulso imediatamente pela fúria ao
mesmo tempo. — Ela perdeu.
— Você deveria ensiná-la a dar um soco.
— Como ela nunca mais estará no jardim, é desnecessário. — De fato, se a
outra noite nas ruas escuras de Covent Garden serviu para ensinar qualquer coisa
para ela, isso a convencera a ficar longe do bairro.
Não importa que ela tenha achado aquelas ruas lindas.
Bom Deus - quando ela apontou para aqueles paralelepípedos reluzentes e
expôs sua beleza, Devil tinha meio que dizer a ela que eles provavelmente
estariam tão encharcados na chuva como se estivessem correndo com sangue.
Mesmo se ela estivesse certa - eles eram lindos.
Que ele nunca teria notado se ela não tivesse dito isso, maldição.

115
Whit grunhiu, então, — Eu acho que você quer dizer, como ela agora tem a
proteção dos Bastardos, é desnecessário.
— Ela não vai voltar, — disse Devil. — Cristo. Eu quase matei um homem na
frente dela.
— Mas você não fez.
Aquele homem a tocou. Aquele cretino sentira a seda do cabelo de Felicity
antes de Devil. A mão em sua bengala coçava para causar dano. Melhor, porque
quando coçava para causar danos, não estava ansioso para tocá-la novamente.
Não estava ansioso para atraí-la de novo. Ele não estava ansioso para beijá-la
novamente.
Mentira.
Ele balançou sua cabeça. — Eu deveria tê-lo matado.
Whit voltou-se para as janelas do salão de baile. — Mas você não fez. E isso
vai fazê-los falar.
— Certamente está fazendo você falar. — Felizmente, isso o silenciou.
Eles observaram em silêncio por longos minutos, e Whit saltou na ponta dos
pés levemente, o movimento incaracterístico de um homem tão frequentemente
imóvel e sólido. Incomum, a menos que você soubesse o que isso significava.
Devil disse: — Há uma luta hoje à noite?
— Três.
— Você está lutando?
Ele encolheu os ombros. — Se eu estiver tentado.
Havia dois tipos de combatentes - aqueles que jogavam pelas regras e
aqueles que lutavam para vencer a todo custo. Whit era o segundo tipo, e ele só
brigava quando não conseguia parar de fazê-lo. Ele preferiu sair das lutas e
treinar os lutadores. Mas quando ele entrava no ringue, ele era quase imbatível.
Isso só aconteceu uma vez.
Outra lembrança se acendeu - no chão, coberto de terra e sangue,
inconsciente. Devil cobrindo-o com seu próprio corpo, tomando o que parecia
uma dúzia de golpes ele mesmo. Cem. Protegendo seu irmão. Até que eles
escaparam.
— Grace tem perguntado sobre sua garota.
Devil olhou para Whit. — Você não disse a ela quem ela é.
116
— Não, mas nossa irmã não é boba, e ela tem seus próprios corredores -
cada um melhor que o nosso. — Os empregados de Grace - exceto por poucos
preciosos - eram mulheres e as garotas podiam se mover rapidamente e sob
aviso na maior parte de Londres.
Devil foi salvo de responder por um flash de tecido dourado dentro. Felicity.
Seu olhar a seguiu através da multidão de pessoas, bebendo-a, como a luz do
sol. — Ela está aqui, — disse ele, incapaz de impedir a suavidade de seu tom. —
Ela está usando.
Whit grunhiu. — Então nós vamos.
Não.
Devil engoliu a palavra e balançou a cabeça. — Não. Eu tenho que ter
certeza de que eles se encontram.
O olhar de seu irmão se mudou para as janelas do salão de baile, e ele
deixou sair um baixo assobio.
— Ewan vai perder a cabeça quando ele vê esse vestido.
Devil assentiu. — Eu quero que ele saiba que estou à frente dele. Que eu
devo sempre estar à frente dele.
— Eu vou dizer isso. Lady Felicity arruma tudo bem.
— Dane-se, — disse Devil, tentado a colocar o punho no rosto do irmão pelo
comentário. Mas fazê-lo exigiria que ele desviasse o olhar de Felicity e não estava
interessado em fazer isso. Ele não estava certo de que poderia fazer isso, se
estivesse sendo honesto.
Ela estava impossível de ignorar.
Ela parecia estar vestida de ouro líquido. Ele sabia que a costureira a serviria
bem, mas isso era magnífico. O corpete foi cortado baixo, revelando uma
impressionante extensão de pele - o suficiente para fazer os homens ao redor da
sala tomarem conhecimento. Que Devil supostamente era o ponto, mas ele
descobriu que não se importava com os homens ao redor da sala, notando. —
Essa linha é muito baixa.
— Você está louco, — disse Whit. — Mesmo Ewan não será capaz de desviar
o olhar.
Devil também não conseguia desviar o olhar. Esse foi o problema. As mangas
estavam ajustadas em seus ombros, um ajuste perfeito, deixando os braços

117
longos e encantadores, escondidos debaixo de luvas de seda dourada que o fez
pensar em coisas completamente nefastas.
Coisas como um homem gostaria de tirá-las dela.
Coisas como se fossem longas o suficiente para amarrar seus pulsos nos
cantos da cama. Se elas eram fortes o suficiente para segurá-la enquanto ele
torcia o prazer dela inúmeras vezes até que ambos estivessem perdidos no
pecado.
E tudo isso antes de Devil se lembrar do que havia sido entregue com o
vestido e as luvas. Seu coração martelava com gêmeos fios de conhecimento
e curiosidade, o estremecimento agravado quando Felicity era atacada por uma
coleção de homens vestidos de preto - vários dos quais Devil reconheceu como
jovens patifes que não deveriam ser permitidos em um salão de baile, muito
menos perto de um mulher que parecia ser tão perfeita como ela estava.
Um deles, particularmente impertinente, apontou o leque de marfim
pendurado no pulso dela – espera lá. No leque? Ou ele estava tocando o pulso
dela?
Devil rosnou baixo em sua garganta e Whit olhou para ele. — Você está
certo. Não há nada de errado com este plano.
Devil franziu o cenho. — Suficiente. — Felicity se afastou do toque,
removendo o leque de seu pulso e passando-o para o homem em questão. —
Quem é aquele?
— Como eu poderia saber? — Whit fez questão de ficar o mais longe
possível da aristocracia.
— Eu pretendo quebrar a mão dele se ele a tocar novamente. Ela claramente
não gosta disso.
O homem do lado de dentro estava escrevendo em seu leque, passando-o
para o próximo homem em seu círculo, depois o seguinte, depois o seguinte. —
O que eles estão fazendo?
— Um ritual aristocrático ridículo, sem dúvida. — Whit bocejou alto. — A
menina está bem agora.
Ela não parecia bem. Ela parecia surpresa. Ela parecia jovem e perfeita,
incerta e surpresa, como se não esperasse que o vestido mudasse nada. Como
se ela realmente acreditasse que a maioria dos homens tinha cérebros em suas
cabeças o suficiente para ver uma mulher pelo seu verdadeiro valor, sem precisar
usar uma roupa que custasse uma fortuna. Ou um pouco de pó. Ou uma pitada
118
de rouge. Se eles tivessem sido capazes de fazer isso como um gênero, então
Felicity Faircloth não estaria encalhada. Ela estaria casada e feliz há muito tempo,
com um homem adequado, com um passado adequado e sem um sinal de
vingança para ser visto.
Mas os homens não foram capazes disso e ela também não, e ficou surpresa
e talvez um pouco perturbada, e Devil descobriu que ele queria ir até ela, para
lembrá-la de que ela estava lá por uma razão - para aproveitar o brilho desta
atenção e encontrar seu lugar na sociedade a que ela tão desesperadamente
desejava ser restaurada.
Para abraçar a promessa de um futuro com um homem que poderia um dia amá-
la como ela merecia.
— Ewan está aqui.
Uma promessa que nunca seria entregue.
Devil engoliu a culpa e, com dificuldade, desviou sua atenção de Felicity,
encontrando o duque no meio da multidão. Observou Ewan revistar a multidão
de foliões. Embora ele inclinasse a cabeça em reconhecimento quando uma
mulher mais velha, com um enorme turbante, falou com ele, sua busca
não parou.
Ewan estava procurando por Felicity.
— Vamos, — disse Whit. — Eu odeio Mayfair porra.
Devil sacudiu a cabeça. — Não até que ele a veja.
E então o duque encontrou sua noiva surpresa, em seu vestido com fios de
ouro, e Devil observou seu irmão - o homem mais bonito que Felicity Faircloth já
vira - olhar, e ele deu uma dupla olhada, seu olhar se estreitando nela.
— Pronto, — disse Whit. — A mensagem foi recebida. O vestido dourado foi
inspirado.
Ele tinha sido calculado para chamar a atenção de Ewan, e suas memórias.
Para lembrar Ewan de uma promessa feita há muito tempo. Uma que ele tinha
cumprido. Uma que ele nunca mais iria cumprir.
O vestido dourado enviaria uma mensagem - tudo sem que Felicity Faircloth
soubesse - que Devil tinha estado lá primeiro. Que ele estava à frente de seu
irmão neste jogo. Que ele venceria.
Marwick observou-a por um longo momento e tudo o que Devil queria fazer
era roubá-la.
119
Ele foi salvo do instinto por um homem diferente, aquele que havia tocado
seu pulso mais cedo. Ele indicou a orquestra e estendeu a mão. Um convite para
dançar. Felicity colocou a mão na sua e ele levou-a para a o lugar destinado as
danças, longe de Ewan.
Longe do Devil.
Whit grunhiu. — Estou indo embora.
— Vá, então, — disse ele. — Vou ficar.
— Com ela?
Sim. — Com eles.
Depois de um longo silêncio, Whit disse, em voz baixa: — Boa perseguição,
— então deixou Devil na escuridão, observando-a enquanto passava de parceiro
em parceiro, girando pelo salão de novo e de novo. Ele viu quando ela sorriu para
uma escolta atrás da outra, catalogando silenciosamente os erros de cada um –
uma mão muito baixa em sua cintura. Um olhar demorado demais para o peito
dela. Um sussurro muito perto do ouvido dela.
Enquanto observava a performance, Devil começou a sofrer com o forte
desgosto pelos homens que conseguiam tocá-la, abraçá-la, dançar com ela. E ele
silenciosamente imaginou puni-los do jeito que ele havia punido Reggie na noite
anterior. Banindo-os de sua presença. Por um momento, imaginou o que
aconteceria se pudesse fazer isso - se pudesse banir um após o outro, até que o
único homem que restasse fosse ele.
Um homem indigno dela, que pretendia usá-la para arruinar outro antes de
deixá-la arruinar a si mesma.
Mas houve um tempo, décadas antes, em que poderia ter sido Devil dentro
daquele salão, vestido com elegância, observando sua noiva, vestida finamente
em dourado, alegremente puxando-a em seus braços e dançando pelo salão.
Houve um tempo em que ele poderia ter sido o duque. Quando ele poderia
ter sido capaz de dar a Felicity Faircloth a vida de que ela tanto sonhava.
E por um momento fugaz, ele se perguntou o que teria feito para abrir a
porta se soubesse que ela estava do outro lado.
Qualquer coisa.
Felizmente, a dança parou, e ela estava sozinha na beira do salão de baile,
atrás de um vaso de samambaia, passando por uma porta aberta para a noite
fora.
120
A noite, onde ele reinou.

Capítulo Onze

Felicity passou grande parte de seus vinte e sete anos no meio da sociedade.
Ela nascera com imenso privilégio, filha de um rico marquês, irmã de um conde
ainda mais rico, prima de duques e viscondes.
Ela tinha estado sorrindo pela sociedade e, quando ela saía, era bem
recebida pelos mais poderosos membros da aristocracia. As mulheres
a convidavam para fofocas nos salões das senhoras, homens beijavam suas mãos
e curvavam-se e lutavam para chegar as mesas de refresco para buscar-lhe copos
de champanhe.
Ela nunca foi a mais bonita, mas ela tinha sido a bela do baile adjacente, o
que significava dançar todas as danças e flertar com os cavalheiros, e convocar,
por compaixão, aqueles indecisos que ficavam na beira do salão de baile.
E ela nunca percebeu o que era estar no centro do salão de baile, porque ela
sempre esteve lá.
Isto é, até que ela foi banida de lá. Então, como um consumidor de ópio,
tudo o que ela queria era voltar.
Devil havia prometido a ela esse retorno e, de alguma forma, ele havia lhe
entregado. Como se ele fosse mágico, afinal de contas. Como se ele realmente
pudesse fazer o impossível, possível.
Ela chegou naquela noite no vestido que ele tinha enviado, que parecia feito
de ouro, e ela foi instantaneamente cercada por rostos sorridentes e acolhedores,
cada um mais elogioso que o anterior, cada um sendo bons com ela. Para fazê-
la rir. E tudo porque a mentira dela não tinha sido revelada. Na cabeça deles, ela
era a próxima Duquesa de Marwick, infinitamente mais valiosa naquela noite do
que na semana anterior - e eles a receberam de braços abertos.
Mas não foi um regresso tão doce como Felicity imaginara. Porque ela não
estava diferente do que tinha sido uma semana antes.

121
E agora, no meio do baile, ela teve meia-dúzia de danças e flertou sem
nenhum esforço, tendo dificuldade em saber quando rir e quando uma risada
poderia ser tomada como um grande insulto, e tendo ficado aterrorizada que ela
pudesse dizer ou fazer algo errado e arruinar essa oportunidade de salvar sua
família, Felicity Faircloth sabia a verdade.
Ser uma queridinha da sociedade era uma lareira cheia de madeira deixada
na chuva - esperançosa e sem valor. Todos na cidade pareciam ter ficado
perdidos e desorientados porque o duque não negou o noivado e não pareceu
interessado em fazê-lo esta noite. Londres parecia ter redescoberto Felicity
Faircloth, simples, solteirona, invisível, e que retomou seu fascinante estilo de vida
sociável e luxuoso.
O que para ela não era verdade, é claro. Ela não era diferente hoje do que
há um mês, exceto que hoje ela se casaria com um duque. Supostamente.
E sua reentrada na sociedade por causa disso - não foi tão gratificante
quanto ela esperava.
Escapando daquela multidão, Felicity se acomodou atrás de uma samambaia
envolta de uma abençoada porta aberta. Tudo o que ela queria fazer era pisar no
limiar e fugir para a escuridão, para se esconder até a hora de partir.
Mas ela não podia fazer isso, pois ainda tinha três danças em seu cartão de
dança.
Três danças, e nenhuma com o Duque de Marwick, que supostamente era
seu noivo. Pelo menos, ele não negara o noivado, e mandara avisar ao pai que
logo chegaria para discutir os detalhes de um casamento iminente, que mandou
a mãe dela para um surto de prazer e fez Arthur sorrir mais uma vez. Até o pai
de Felicity grunhiu seu prazer com a virada dos acontecimentos, e o Marquês de
Bumble raramente tinha tempo para assuntos domésticos, quanto mais tempo
para articular seu prazer com eles.
Ninguém parecia preocupado com o fato do duque não ter julgado
necessário aparecer na porta de Felicity a qualquer momento.
— Certamente, ele vai aparecer eventualmente, — sua mãe respondeu
quando Felicity havia apontado a estranha progressão de eventos e a
invisibilidade de seu suposto noivo. — Talvez ele esteja simplesmente ocupado.
Felicity pensava que um homem tivesse tempo de enviar correspondência
relacionada a um noivado e encontraria tempo para colocar a coisa em
movimento, mas isso parecia irrelevante.

122
Tudo isso, e Devil ainda tinha prometido a ela que o vestido que ela usaria
atrairia o duque, e que iria colocá-lo em seu caminho e ajudar a conquistá-lo,
mas até agora, não tinha havido nenhum indício de tal triunfo. Felicity nem tinha
certeza se o duque estava presente. Seria possível que ele tivesse saído de
Londres? E se fosse isso, o que ela faria - continuaria a mentir descaradamente
para todo o mundo?
Em algum momento, o Duque de Marwick teria que perceber que eles não
estavam, de fato, envolvidos. E nenhum vestido - enviado pelo Devil ou de outra
forma - era mágico o suficiente para protegê-la da verdade uma vez que ela
tivesse que encarar o próprio Duque de Marwick
Nem mesmo esse vestido, que parecia mais mágico do que qualquer outro
que ela já imaginara.
Era perfeito.
Como ele tinha feito isso era um mistério, mas ele prometeu a ela um vestido
perfeitamente ajustado, e tinha chegado um naquela manhã, como se trabalhado
por seres mágicos. Ele havia sido trabalhado, de fato, por Madame Hebert, a mais
recomendada modista de Londres, apesar de Felicity não ter ido a qualquer
costureira em meses - o produto, ela agora percebeu, que sua família não
gastaria tanto, quanto seu próprio desinteresse em vestidos agora que ela não
era bem-vinda no meio deste mundo.
Parecia, no entanto, que Madame Hebert sabia que tipo de vestido seria de
seu interesse. E foi definitivamente mais interessante, Felicity teve que admitir.
Mesmo que as sobrancelhas de Arthur não tivessem disparado no momento em
que ela abriu a grande caixa branca com um H gravado em relevo dourado,
Felicity soube que esse ia ser o vestido mais bonito que ela já usara.
Não tinha sido só um vestido, no entanto. Havia sapatos e meias, luvas e
roupas íntimas - ela corou com a lembrança delas, cada pedaço com fitas em um
rosa tão vibrante que parecia escandaloso.
Eu gosto de rosa, ela disse a ele no início da semana.
Parecia pecaminoso usar aquelas roupas íntimas, seda e cetim deslumbrante,
sabendo que vinham dele. Quase tão pecaminoso quanto vestir o vestido em si,
porque ela não foi capaz de se impedir de pensar em usá-lo para o homem que
o enviou, em vez de para todos os homens que tinham visto esta noite.
Ela até deixou a porta da sua varanda aberta o dia todo, pensando que talvez
ele fosse se esgueirar mais uma vez. Que ele poderia querer vê-la nisso. Que ele
poderia querer ver ela com algo bonito nela.
123
Mas ele não veio.
Ele a beijou na escuridão, dando a ela um gosto de maldade e pecado,
tentando-a com seu poder, prometeu vê-la em três noites, e então... a
abandonou.
Não era como se um homem que vivia em Covent Garden e carregasse uma
arma em sua bengala fosse convidado para um baile oferecido por um dos títulos
mais antigos da Grã-Bretanha. Mesmo que Felicity desejasse isso.
— Ele não veio, o Bastardo, — ela sussurrou para si mesma e para a
escuridão negra.
— Olha a língua, Felicity Faircloth.
Seu coração começou a bater quando ela se virou para encará-lo. — Você é
um demônio real? Eu convoquei você com meus pensamentos?
Seus lábios se contorceram em um sorriso irônico. — Você tem pensado em
mim?
Sua boca caiu aberta. Ela tinha também tomado muito champagne, se ela
estava admitindo isso. — Não.
O sorriso tornou-se em um sorriso de lobo e ele se afastou para as sombras.
— Mentirosa. Eu te ouvi minha invisível faladora. Eu ouvi você amaldiçoar por eu
não ter vindo. Eu era esperado em seus quartos?
Ela corou, grata pela escuridão. — Claro que não. Eu mantenho minhas
portas trancadas agora.
— Então é uma pena que eu não conheço alguém que sabe abrir fechaduras,
maçanetas ou cadeados sem utilizar chaves, só através da manipulação do mecanismo
de fechamento. — Ela tossiu, e ele riu, baixo e escuro e delicioso.
— Entre na escuridão, Felicity, para que você não seja pega se divertindo
com o inimigo.
Suas sobrancelhas se uniram, mas ela o seguiu, no entanto. — Você é o
inimigo?
Ele virou a esquina, onde a luz do salão de baile deu lugar ao escuro. — Só
para todos em Mayfair.
Ela se aproximou da sombra dele, desejando poder ver o rosto dele. — Por
que é isso?

124
— Eu sou tudo o que eles temem, — disse ele, baixo e escuro. — Todo
mundo tem pecado, e meu truque é saber disso. Eu posso lê-los nas pessoas.
— E qual é o meu? — Ela sussurrou, seu coração batendo, ao mesmo tempo
ansioso para ouvir sua resposta e aterrorizada com isso.
Ele balançou sua cabeça. — Esta noite, você está muito inflamada pelo
pecado, Felicity Faircloth. Você queimou tudo. — Ela sorriu, as palavras deixando-
a sem fôlego. — E então, me diga. Você reentrou no rebanho aristocrático?
Ela abriu bem as mãos. — Não mais invisível.
— Pena, — disse ele.
— Ninguém quer ser uma invisível, — disse ela.
— Eu sempre pensei que as flores trepadeiras fossem as melhores da estufa,
— ele respondeu. — Mas diga-me, minha orquídea em vaso, que traças você
atraiu?
Ela franziu o nariz. — Você está misturando metáforas.
— Cuidado, o seu passado de invisível está aparecendo. Nenhuma querida
da sociedade sonharia em criticar a gramática de um homem.
— Nenhuma querida da sociedade jamais sonharia em se encontrar
clandestinamente com um homem como você.
Seus lábios pressionados juntos em uma linha firme, e por um momento, ela
sentiu uma pontada de culpa nas palavras antes de se inclinar para trás contra o
lado da casa. — Conte-me sobre o incidente no quarto de dormir.
Ela ficou imóvel. Não deveria ser uma surpresa que ele soubesse disso -
todos sabiam disso. Mas ele não sabe sobre os outros escândalos em sua vida,
então por que iria ele saber sobre este?
Por que ele tinha que saber sobre isso? Ela engoliu em seco. — Que
incidente?
— Aquele que fez de você uma mulher de elegibilidade questionável.
Ela estremeceu com a descrição. — Como você sabia disso?
— Você vai saber, minha senhora, que há poucas coisas sobre as quais eu
não sei.
Ela suspirou. — Não há nada a ser dito. Houve um baile. E eu me encontrei
no quarto de um homem por acidente.

125
— Por acidente.
— Principalmente, — ela disse.
Ele a observou por um longo momento e depois perguntou: — Ele tocou em
você?
A pergunta surpreendeu-a. — Não, ele, na verdade, ficou completamente
indignado ao me encontrar lá, o que eu suponho que eu deveria ser grata, como
se ele não tivesse sido eu poderia ter... — Ela parou e tentou novamente, — eu
não sou a maior beleza do mundo, para começar, e acrescentar a ela... — Ela
parou.
— O que?
— Nada.
— Eu não acho que isso seja verdade.
Ela suspirou novamente. — Eu estava chorando.
Uma batida. — No quarto de um estranho.
— Podemos terminar com esta conversa?
— Não. Diga-me por que você estava chorando. — Havia uma borda em sua
voz que ela não tinha notado antes.
— Eu prefiro que não.
— Preciso te lembrar que você me deve por esse lindo vestido, Felicity
Faircloth?
— Eu estava com a impressão de que o vestido era parte integrante de
nosso arranjo original.
— Não se você não vai me dizer por que você estava chorando, não é?
Ele era um homem irritante. — Eu prefiro não te contar, porque é bobo.
— Eu não me importo que seja bobo.
Ela não pôde evitar o riso que veio com as palavras. — Desculpe-me, mas
você parece ser o tipo de pessoa que se incomoda muito.
— Conte-me.
— Eu era parte de um grupo. Eu tinha amigos.
— As víboras da outra noite?
Ela encolheu os ombros. — Eu pensei que eles eram meus amigos.
126
— Eles não eram.
— Sim, bem, você não estava lá para me dizer isso, então... — Ela fez uma
pausa. — De qualquer forma, foi por isso que eu fui... em um estado. Nós éramos
inseparáveis. E depois... — Ela fez uma pausa, resistindo ao nó de emoção que vinha
sempre que ela pensava naquele tempo, quando ela era uma querida da sociedade,
e o mundo parecia se curvar a sua vontade. — Como que... nós não éramos. Eles
ainda brilhavam e cintilavam e se amavam. Mas eles não me amavam. E eu não
sabia por quê.
Ele a observou por muito tempo. — A amizade nem sempre é o que
pensamos. Se não formos cuidadosos, muitas vezes se torna o que os outros
desejam.
Ela olhou para ele. — Você não parece o tipo de homem que - perde amigos.
Ele levantou uma sobrancelha. — Eu acho que você quer dizer que eu não
pareço o tipo de homem que os tem para começar.
— Você tem?
— Eu tenho um irmão. E uma irmã.
— Eu gostaria de ser sua amiga. — A confissão chocou os dois, e ela desejou
que ela pudesse pegá-lo de volta.
Ainda mais quando ele respondeu: — Felicity Faircloth, eu não sou nenhum
tipo de amigo para você. — Ele não estava errado, mas ainda assim sabia. — Devo
dizer-lhe por que seus supostos amigos deixaram você?
— Como você saberia?
— Porque eu sou um homem do mundo e sei como isso acontece.
Ela acreditou nele. — Por quê?
— Eles te abandonaram porque você não era mais útil. Você parou de rir de
suas brincadeiras idiotas. Ou parou de rir depois de seus vestidos desbotados.
Ou parado de encorajar a crueldade que eles dirigiam a todos os outros. Fosse o
que fosse, você fez algo para fazê-los perceber que você não estava mais
interessada em lamber suas botas. E não há nada como a perda de um bajulador
para irritar sacos de gasolina como esses quatro.
Ela odiava o raciocínio, mesmo quando sabia que estava correto.
Mesmo quando acrescentou: — Todos os homens e mulheres dentro da sala
são um parasita, Faulk, Natasha Corkwood e Lord e Lady Hagin incluídos. E você
é melhor livrar-se deles, minha linda chama.
127
Com as palavras, ela olhou de volta para o salão de baile, vendo dezenas de
foliões tagarelando, fofocando, dançando e rindo. Eles eram o povo dela, não
eram? Esse era o mundo dela, não era? E mesmo se ela tivesse tido o mesmo
pensamento antes, embora não em tantas palavras, ela deveria defender seu
mundo para esse homem - esse estranho, ela supunha. — Nem todos os
aristocratas são parasitas.
— Não?
— Eu não sou.
Ele saiu da parede então, subindo a toda a sua altura, e ela inclinou o rosto
para encontrar o olhar dele. — Não. Você está tão desesperada para fazer parte
disso novamente que está disposta a fazer um acordo com o diabo para fazer
isso.
E se eu mudei de ideia?
Ela resistiu ao sussurro de seu pensamento. — Eu preciso salvar minha
família, — ela sussurrou, suas bochechas ardendo. Eu não tenho escolha.
— Ah sim. Lealdade familiar. Isso é admirável, mas parece-me que eles
poderiam ter lhe contado a situação deles antes de jogá-la aos lobos que buscam
o casamento.
Ela o odiava um pouco agora. Odiava-o por falar as palavras que mal ousava
pensar. — Eu não vou ser uma esposa ruim.
— Eu nunca disse que você seria.
— Eu vou manter sua casa e fornecer-lhe herdeiros.
Seu olhar encontrou o dela instantaneamente, quente e focado na escuridão.
— Então é esse o sonho? Mãe do próximo Duque de Marwick?
Felicity considerou a questão por um longo momento. — Eu nunca tive
aspirações para a maternidade ducal, mas gostaria de ter filhos, sim. Acho que
seria uma ótima mãe.
— Você faria. — Ele desviou o olhar. Limpou a garganta. — Mas esse não é
o único sonho, é?
Ela hesitou, a pergunta suave girando ao redor deles. Os segredos que
pareciam para entender. O desejo de ser aceito por essas pessoas. Para tomar
um lugar entre eles novamente. — Eu não quero mais ficar sozinha por mais
tempo.
Ele assentiu. — O que mais.
128
— Eu gostaria de ser desejada. — A verdade doeu quando emergiu,
deixando uma dor em sua garganta.
Ele assentiu. — É por isso que você mentiu no começo.
— E por que eu aceitei o nosso acordo, — ela disse, suavemente. — Eu quero
tudo isso. Eu te disse. Muito mais do que eu posso ter.
— Você vale a pena, com todos eles combinados, — disse ele. — Mas ouvir
isso de mim, não é suficiente, não é?
Ele era, mais do que ele pensava ou sabia, a partir do calor que se espalhou
através dela com suas palavras. E ainda assim, não foi o suficiente. — Você não
sabe como foi. Como é isso.
Ele a observou por um longo momento. — De fato, minha senhora, eu sei
exatamente o que é perder pessoas que você acha que pode confiar. Ser traído por
eles.
Ela considerou as palavras e o que ela sabia da vida desse homem estranho
e perverso - o tipo em que a traição poderia viver em cada esquina. Ela assentiu.
— Não importa, não é? Nenhum dos homens que eu cuidadosamente dancei;
não há razão para acreditar que o duque deva.
— Eles pareciam se importar com você quando eles se apinhavam com
você para segurar seu leque por qualquer motivo.
Ela estendeu a mão para o item em questão, espalhando-se para mostrar os
nomes escritos em cada um dos espaços lá. — Cartão de dança. E eles só se
importam comigo, porque eles pensam que eu vou ser a...
— Você tem uma dança não reivindicada. — Ele tinha o leque na mão, e ela
estava amarrada a ele.
Sua respiração ficou presa quando ele puxou, puxando-a um passo mais
perto. — Eu, eu pensei que deveria deixar uma para o meu noivo fictício. — Ela
fez uma pausa. — Não é tão fictício se você ler a correspondência do meu pai.
Como você fez isso?
— Magia, — ele respondeu, a cicatriz do lado do rosto branco nas sombras.
— Como prometi. — Ela começou a pressioná-lo por uma resposta melhor, mas
ele continuou, recusando-se a deixá-la falar. — Ele deve reivindicar essa dança
em breve.
Sua atenção demorou-se na fenda vazia do leque, o modo como parecia
gritar sua falsidade para o mundo. Por um momento único e selvagem, ela se

129
perguntou como seria se Devil alegasse isso. Ela se perguntou o que poderia
acontecer se ele escrevesse seu nome blasfemo com lápis preto.
O que poderia acontecer se ele entrasse no salão de baile com ela, a tomasse
em seus braços e dançasse através da sala. Claro, um homem como Devil não
sabia dançar como a aristocracia. Ele só podia assistir das sombras.
O pensamento a inspirou. — Espera. Você esteve me observando a noite
toda?
— Não.
Era sua vez de dizer: — Mentiroso.
Ele hesitou, e ela teria dado qualquer coisa para ver seu rosto. — Eu tinha
que ter certeza de que você usava o vestido.
— Claro que eu usei o vestido, — disse ela. — É o vestido mais bonito que
já vi. Eu gostaria de poder usá-lo todos os dias. Embora eu ainda não entenda
como você conseguiu isso. Madame Hebert leva semanas para produzir um
modelo. Mais longo.
— Hebert, como a maioria das empresárias, está disposta a trabalhar
rapidamente por um prêmio. — Ele fez uma pausa. — Isso, e ela parece gostar
de você.
Felicity se aqueceu com as palavras. — Ela fez meu enxoval de casamento.
Ou melhor, todas as roupas que eu trouxe comigo para ganhar um marido no
verão passado. — Ela fez uma pausa. — Para perder um, suponho.
Uma batida, e então, — Bem, sem esses, você não teria este vestido. E isso
seria um crime adequado.
Ela corou com as palavras, a coisa mais perfeita que alguém poderia ter dito.
— Obrigada.
— O duque não conseguia tirar os olhos de você, — ele respondeu.
Seu queixo caiu e ela olhou por cima do ombro. — Ele me viu?
— Ele viu.
— E agora?
— Agora, — ele disse, — ele vem para você.
Ela engoliu na promessa das palavras. Na visão que elas invocaram, de um
homem diferente vindo para ela. Nenhum tipo de duque. — Como é que você
sabe?
130
— Porque ele não será capaz de resistir com a maneira como você parece
nesse vestido.
Seu coração batia. — E como eu pareço?
A pergunta a surpreendeu com sua impropriedade, e ela quase a pegou de
volta. Poderia ter, se ele não tivesse respondido. — Você está procurando por
elogios, minha senhora?
Ela baixou a cabeça com a pergunta suave. — Possivelmente.
— Você parece exatamente como deveria, Felicity Faircloth - a mais bela de
todas.
Suas bochechas arderam. — Obrigada. — Por dizer isso. — Pelo vestido. —
Ela hesitou. — E... as outras coisas. — Ele se mexeu na escuridão, e ela estava bem
ciente desse lugar secreto - tão perto de todo o mundo e de alguma forma
privado para eles sozinhos. Ela não sabia o que dizer depois de agradecer a um
estranho virtual por roupas de baixo. — Minhas desculpas. Tenho certeza de que
não deveríamos estar discutindo... Essa.
— Nunca se desculpe por discutir isso. — Outra pausa, e então ele disse,
perverso e suave, — Elas são cor de rosa?
Sua boca caiu aberta. — Eu não acho que eu deveria te dizer isso.
Ele não parecia se importar. — Você gosta de rosa.
Ela nunca tinha sido tão grata pelas sombras em sua vida. — Eu gosto.
— E assim? Elas são?
— Sim. — Ela mal podia ouvir a palavra sussurrada.
— Bom. — A palavra veio em um grunhido irregular, e ela se perguntou se
era possível que ele estivesse tão comovido pela conversa quanto ela.
Ela se perguntou se ele tinha pensado nela vestindo as roupas que ele tinha
enviado metade do que ela pensava em usá-las para ele.
Dele beijando-a nelas.
— Os homens parecem gostar da linha baixa, — disse ela, seus dedos
cobertos de cetim correndo ao longo da borda do vestido, mesmo sabendo que
ela não deveria chamar a atenção para ele. Mesmo quando ela queria que ele
notasse. O que esse homem fez com ela? Magia. — Minha mãe pensou que era...
mal sucedido.

131
Imodesta era a palavra que a Marquesa de Bumble usara antes de insistir
para que Felicity pegasse uma capa imediatamente.
— Sua mãe é muito velha e muito feminina para poder julgar o sucesso ou
o fracasso desse vestido. Como você explicou sua chegada?
— Eu menti, — ela confessou, sentindo como se fosse uma coisa que ela
deveria sussurrar. — Eu disse que era um presente da minha conhecida Sesily. Ela
é muito escandalosa.
— Sansily Talbot?
— Você a conhece? — Claro que ele conhecia. Ele era um homem humano
de sangue vermelho e Sesily era o sonho de todo homem. Felicity não gostou do
fio de ciúme que a atravessou com os pensamentos.
— O The Singing Sparrow fica a duas ruas dos meus escritórios. É de um
conhecido dela.
— Oh. — Alívio explodiu. Ele não conhecia Sesily. Pelo menos, não no
sentido bíblico.
Não que importasse quem ele conhecesse biblicamente.
Felicity não se importava.
Obviamente. Não tinha nada a ver com ela.
— De qualquer forma, — ela disse, — o vestido é lindo. E eu nunca me senti
tão perto de bonita em minha vida, enquanto eu estou o usando. — A confissão
foi suave e honesta, e fácil, porque ela falou para a silhueta dele.
— Devo te contar uma coisa, Felicity Faircloth? — ele disse suavemente,
dando um passo na direção dela. As palavras se envolveram ao redor deles,
fazendo Felicity doer. — Devo dar-lhe um conselho que irá ajudá-la a atrair sua
traça?
Será que vai te atrair?
Ela reprimiu a pergunta. Ela não queria atraí-lo. A escuridão estava mexendo
com seu cérebro. E seja qual for sua resposta foi... Dessa maneira, havia perigo.
— Eu acho que deveria ir, — disse ela, virando-se. — Minha mãe...
— Espere, — ele disse bruscamente. E então ele a tocou. Sua mão veio para
a dela, e ela teria dado qualquer coisa para que sua luva dourada desaparecesse.
Apenas uma vez, apenas para sentir seu toque.

132
Ela se virou para ele e ele se moveu para a luz, cuidando para que eles não
pudessem ser vistos. Ela podia ver seu rosto agora, a força dele, o corte da cicatriz
em sua bochecha, seu olhar âmbar escurecido na escuridão, procurando o dela
antes dele levantar a mão para o rosto dela, passando um polegar ao longo de
sua mandíbula, através de sua bochecha. O anel de prata dele era um ótimo
contato contra o calor de sua pele.
Mais, ela queria dizer. Não pare.
Ele estava tão perto, seus olhos varrendo seu rosto, absorvendo todas as
suas falhas, descobrindo todos os seus segredos. — Você é linda, Felicity
Faircloth, — ele sussurrou, e ela podia sentir a respiração das palavras em
seus lábios.
A lembrança de seu beijo nas ruas de Covent Garden a invadiu, junto com a
frustração dolorida que ele deixou com aquela noite. O jeito que ela sonhava
com ele repetindo isso. Ele estava tão perto - se ela subisse na ponta dos pés, ele
poderia.
Antes que ela pudesse, ele a soltou, deixando-a querendo. Querendo ele. —
Não, — disse ela, com o embaraço quente queimando na sequência da
exclamação. Ela não deveria ter dito isso. Mas ele não queria beijá-la novamente?
Aparentemente não. Ele deu um passo para trás, o homem irritante. — Seu
duque deve encontrá-la hoje à noite, minha senhora.
Frustração explodiu. — Ele não é meu duque, — ela retrucou. — Na
verdade, acho que ele pode estar mais perto de ser o “seu duque”.
Ele a observou por um longo momento antes de dizer, baixinho: — Você
pode ganhar cada um deles. Qualquer um deles. A traça aristocrática de sua
escolha. E você escolheu o seu duque no momento que você pronunciou o seu.
Quando ele for atraído para você hoje à noite, você deve começar a ganhá-lo.
E se eu não o quiser?
Se eu não quiser nenhuma mariposa aristocrática?
Se eu quero uma mariposa que não pertença a Mayfair?
Ela não disse as palavras, em vez disso, falou: — Como vou conquistá-lo?
Ele não hesitou. — Assim como você é. — Era um disparate. Mas ele não
parecia se importar. — Boa noite, minha senhora.
E então ele estava se movendo, voltando para as sombras, onde ele
pertencia. Ela o seguiu até o topo dos degraus de pedra que levavam aos jardins
133
além da casa. — Espere! — Ela chamou, procurando por algo para devolvê-lo a
ela. — Você prometeu ajudar! Você prometeu magia, Devil.
Ele se virou na parte inferior dos degraus, dentes brancos brilhando nas
sombras. — Você já tem, minha senhora.
— Eu não tenho mágica. Eu tenho um lindo vestido. O resto de mim é
totalmente o mesmo. Você enviou um porco para o modista. É um lindo chapéu,
mas o porco continua.
Ele riu na escuridão, e ela estava irritada por não poder ver o sorriso que veio
com o som. Ele não sorriu o suficiente. — Você não é um porco, Felicity Faircloth.
Com isso, ele desapareceu, e ela foi até o corrimão, colocando as mãos na
pedra fria para observar os jardins, zangada e frustrada, imaginando o que
aconteceria se ela o seguisse. Querendo segui-lo. Sabendo que ela não podia.
Que ela tinha feito sua cama, e se ela ou sua família tivessem alguma chance de
sobreviver, ela deveria estar nela. Suínos sacrificados ou não.
— Maldição, Devil, — ela sussurrou na escuridão, incapaz de vê-lo e ainda
de alguma forma sabendo que ele estava lá. — Como?
— Quando ele perguntar sobre você, diga a verdade.
— Essa é a pior ideia que já ouvi.
Ele não respondeu.
Ele a colocou em evidencia para toda a Londres, prometeu-lhe um marido
influente, e deixou-a sozinha com um terrível conselho e sem cumprir a
promessa.
Como se ela fosse a chama que ele lhe assegurou que ela seria.
Exceto que ela não era.
— Este é o pior erro já cometido. Na história — ela disse para si mesma e
para a noite. — Isso está lá em cima, aceitando o presente de um cavalo de Tróia.
— Você está dando uma palestra sobre mitologia grega?
Ela se virou com as palavras e encontrou o Duque de Marwick parado a
menos de um metro dela.

134
Capítulo Doze

Porque ela não tinha certeza do que alguém diria a um homem que esse
alguém havia proclamado seu noivo, Felicity decidiu por um: — Olá.
Ela estremeceu com a palavra decididamente não mágica.
Seu olhar cintilou para os jardins escuros onde Devil tinha desaparecido,
depois de volta para ela. — Olá.
Ela piscou. — Olá.
Ah, sim, tudo isso estava indo muito bem. Ela era toda chama. Bom Deus. Era
só uma questão de tempo antes dele voltar correndo para o salão de baile, parar
a orquestra e denunciá-la publicamente.
Mas o duque não correu. Em vez disso, ele deu um passo na direção dela e
ela voltou para a balaustrada de pedra. Ele parou. — Estou interrompendo
alguma coisa?
— Não! — Ela disse completamente com força. — De modo nenhum. Eu só
estava... Aqui... respirando. — Suas sobrancelhas se levantaram com as palavras,
e ela balançou a cabeça. — Respirando ar. Tomando ar. Quero dizer. Está muito
quente no salão de baile, você não acha? — Ela acenou com a mão em seu
pescoço. — Muito quente. — Ela limpou a garganta. — Quente.
Seu olhar deslizou para o pulso dela. — Foi uma boa previsão para você
trazer algo para combatê-lo.
Ela olhou para o leque pendurado em seu pulso. — Oh. — Ela abriu e se
abanou como uma louca. — Sim. Claro. Bem. Eu tenho uma excelente previsão.
Pare de falar, Felicity.
Essas sobrancelhas subiram novamente. — Você?
Suas sobrancelhas se estreitaram. — Eu tenho.
— Eu só pergunto, porque me parece que alguém desinformado dessa
qualidade em particular, pode achar que você tem o oposto de previsão.
Ela se controlou antes que seu queixo caísse aberto. — Que seria?

135
Ele não respondeu imediatamente, em vez disso, ficou ao lado dela no
corrimão da varanda, dando as costas para os jardins, cruzando os braços sobre
o peito e observando os foliões dentro do salão de festas maravilhosamente
iluminado. A luz fez seu cabelo loiro brilhar em ouro, ao mesmo tempo em que
endurecia os ângulos de seu rosto - maçãs do rosto altas e mandíbula forte; algo
sobre ele sussurrava familiaridade, embora ela não pudesse identificar isso.
Depois de um longo silêncio, ele disse: — Pode-se argumentar que dizer ao
mundo que você está noiva de um duque quando você nunca o conheceu não
tem previsão.
E, assim, a verdade de seu ato estava entre eles. Felicity não estava crivada
do constrangimento ou da vergonha que poderia ter imaginado. Em vez disso,
ela estava consumida com um imenso alívio. Algo próximo ao poder - perto do
jeito que ela se sentia quando ela pegava uma fechadura, como se o passado
estivesse atrás dela e o que estava por vir fosse toda a possibilidade.
O que era, é claro, uma espécie de loucura em si, porque esse homem
mantinha seu destino e o de sua família em suas mãos, e o futuro que ele poderia
infligir era de fato perigoso. A loucura parecia reinar, no entanto. — Por que você
confirmou isso?
— Por que você disse isso?
— Eu estava com raiva, — ela disse baixinho. Ela levantou um ombro. —
Não é uma boa desculpa, eu sei... mas aí está a verdade.
— É uma desculpa honesta, — disse ele, voltando sua atenção para o salão
de baile. — Eu também estou com raiva.
— Sua raiva resultou em um envolvimento tácito com uma pessoa que você
nunca conheceu?
Ele olhou para ela e foi como se a visse pela primeira vez. — Você me lembra
alguém.
A mudança de assunto foi chocante. — Eu... pareço?
— Ela adoraria esse vestido; Prometi mantê-la em carretéis de linha de ouro,
algum dia.
— Você cumpriu essa promessa?
Seus lábios se achataram em uma linha reta e fria. — Eu não fiz.
— Eu sinto muito por isso.

136
— Como eu sinto. — Ele balançou a cabeça, como se para se livrar de uma
memória. — Ela se foi agora. E eu me vejo precisando de um herdeiro para...
Felicity não pôde evitar o riso de surpresa. — Eu digo, você veio ao lugar
certo, Sua Graça, já que não há nada que Londres goste mais do que um duque
na sua situação precisa.
Ele encontrou o olhar dela e aquela estranha familiaridade ecoou. — Se
estamos a ser envolvidos, você deve entender o meu propósito.
— Nós estamos? A ser envolvidos?
— Nós não estamos? Você não tomou essa decisão cinco noites atrás em
minha casa?
— Bem, eu não chamaria isso de uma decisão, — ela disse suavemente.
— Como você chamaria isso?
A questão não parece relevante, então, em vez disso, Felicity perguntou: —
Como ele te convenceu?
Ele olhou para ela. — Quem?
— Como eu disse, você poderia ter me negado e escolhido outra sem
hesitação. Com o que ele te ameaçou para fazer você me escolher? — Ela não
achava que Devil era o tipo de homem que iria ameaçar danos físicos, mas ela
supostamente não o conhecia, e ele tinha subido em sua treliça e entrado em seu
quarto de dormir sem ser convidado, então talvez ele tivesse menos consciência
do que ela pensava.
— O que faz você pensar que eu tive que ser ameaçado?
O duque era um excelente ator, claramente. Felicity quase acreditara que
Devil não o convencera a se casar com ela. Quase.
E então disse: — Eu aceitei sua proposta, não aceitei?
— Mas por quê? Nós nunca nos conhecemos.
— Nós nos conhecemos há alguns minutos.
Ela piscou. — Você está bravo? — Era uma pergunta honesta.
— Você está? — Ele respondeu.
Felicity supôs que isso fosse justo. — Não.
Ele encolheu um ombro. — Então talvez eu também não esteja.
— Você não me conhece.
137
Ele olhou para ela. — Você ficaria surpreso com o que eu sei de você, Felicity
Faircloth.
Um fio de desconforto passou por ela pelo modo como ele disse o nome
dela, um eco de outro homem. O mais justo de todos. — Eu certamente ficaria
muito surpresa, Sua Graça, que você estivesse ciente da minha existência.
— Eu honestamente não estava, até tarde da noite, na noite da minha festa,
quando meia dúzia de madames da sociedade – que eu sequer sabia da existia
de nenhuma delas, a propósito, elas me encontraram a caminho do banheiro
para confirmar meu noivado - como foi que elas te chamaram? - pobre Felicity
Faircloth. Parecia que eles queriam ter certeza de que eu soubesse exatamente
que tipo de vaca eu estava comprando.
— Porco, — ela corrigiu, imediatamente lamentando as palavras.
Ele olhou para ela. — Não tenho certeza se isso é mais lisonjeiro, mas se
você preferir. — Antes que ela pudesse dizer a ele que não estava encantada com
nenhum dos dois, ele pressionou. — O ponto é que eu escapei por pouco do
bando de mulheres e depois do baile - eu deveria agradecer por isso.
Ela piscou. — Deveria?
— De fato. Você vê, eu não precisava mais fazer isso, já que meu trabalho
tinha sido feito por mim.
— E qual trabalho é esse?
— O trabalho de encontrar uma esposa.
— E um herdeiro, — disse ela.
Ele levantou um ombro. Deixou-o cair. — Precisamente.
— E você pensou que uma louca que pronunciava seu noivo era uma boa
escolha para a mãe de seus futuros filhos?
Ele não sorriu. — Muitos diriam que uma louca é minha melhor combinação.
Ela assentiu com a cabeça. — Você é um louco, então?
Ele a observou por um longo momento, até que ela pensou que ele não ia
falar de novo. E então, — Aqui está o que eu sei de você, Felicity arruinada. Eu
sei que você já foi uma opção perfeitamente viável para o casamento - filha de
um marquês, irmã de um conde. Sei que algo aconteceu que te colocou no
quarto de um homem com quem você não era casada e que se recusou a se casar
com você...

138
— Não foi o que você... — ela sentiu que tinha que explicar.
— Eu não me importo, — disse ele, e ela acreditou nele. — A questão é que,
depois disso, você se tornou cada vez mais curiosa, uma esquisitice nas bordas
dos salões de baile. E então seu pai e irmão perderam uma fortuna e você se
tornou sua única esperança. Sem que você soubesse, eles tiraram sua liberdade
de suas mãos e mandaram você embora - eu entendi isso direito? – para disputar
pela mão de um duque casado?
— Sim, — disse ela, as bochechas em chamas.
— Isso soa como o enredo de um romance romântico ridículo.
— Não foi ridículo. E ele era terrivelmente apaixonado pela mulher que ele
já era casado, para que isso acontecesse.
— Hmm, — ele disse. — Então, eu já sei de tudo? Invisível empobrecida e
solteirona?
Felicity odiava ser reduzida a três palavras desfavoráveis, mas entendia. —
Sim. Você está certo. Exceto pela parte em que eu proclamei estar comprometida
com um duque que nunca conheci.
— Ah. Sim. Eu quase tinha me esquecido disso. — As palavras não eram
secas. Elas eram honestas. Como se ele tivesse totalmente se esquecido por que
eles estavam conversando. Ele pode estar bravo.
Felicity continuou. — Sinto muito, Sua Graça, mas por que diabos você - um
duque jovem e bonito, com um passado claro - escolheria permanecer
comprometido comigo?
— Você está tentando me convencer a não ficar comprometido com você?
Ela estava?
Claro que ela não estava. Ele era, afinal de contas, um jovem e bonito duque
com um passado claro, não era? Ela o proclamou falsamente como seu noivo,
mergulhando a si mesma e sua família que estava em uma certa ruína social e
financeira, e ali estava ele, oferecendo seu resgate.
Eu te prometi o impossível, não prometi?
Por um momento estranho e selvagem, ocorreu a Felicity que não era o
duque que oferecia socorro - era Devil, com suas ofertas ultrajantes e seus
negócios selvagens e seus feitos perversos.
Uma mariposa ducal, direto para sua chama. E aqui estava.

139
Magia.
— Mas... porque?
Ele olhou para o outro lado, voltando-se para os jardins escuros, seu olhar
procurando, como o dela havia feito antes dele aparecer. — Como eles chamam
isso? Um casamento de conveniência?
As palavras se estabeleceram entre eles, simples e insatisfatórias. É claro que
a oferta de um casamento de conveniência deveria ter levado Felicity a convulsões
de prazer. Isso significava que ela salvaria a reputação de sua família e a dela
mesma. Significava dinheiro nos cofres de seu pai, a restauração da propriedade,
a proteção do nome.
Além disso tudo, ela se tornaria uma duquesa, poderosa por si mesma, bem-
vinda mais uma vez nos brilhantes e cintilantes salões de baile de Londres. Não
mais estranha ou escandalosa, mas valorizada. Voltando para o lugar que ela
tinha sido parte antes, simples, mas poderosa. Duquesa de Marwick.
Ele era tudo o que ela sempre quis.
Bem, não tudo. Mas muito.
Alguns.
— Lady Felicity? — O duque solicitou mais uma vez, puxando-a de seus
pensamentos.
Ela olhou para ele. — Um casamento de conveniência. Você tem
um herdeiro.
— E você ganha um duque muito rico. Me disseram que é um bem precioso.
— Ele disse como se tivesse acabado de aprender o fato mais cedo naquele dia,
como se toda a história registrada não tivesse sido baseada em mulheres sendo
forçadas a encontrar partidos ricos.
Sua mãe estaria fora de si com prazer.
— O que você diz? — Ele perguntou.
Ela balançou a cabeça. Era possível que fosse tão simples? Um único
encontro e a mentira dela verdade? Seu olhar se estreitou no duque. — Por quê?
— Ela repetiu. — Quando você poderia ter qualquer uma delas?
Ela acenou com a mão para a porta aberta do salão de baile, onde não
menos que meia dúzia de mulheres os observavam abertamente, esperando que
Felicity desse um passo em falso, e que o duque percebesse seu erro. A frustração
explodiu, ao lado daquela familiar indignação - a emoção que havia posto essa
140
insanidade em movimento. Ela resistiu quando o olhar dele seguiu o dela,
demorando-se em solteiras mais bonitas, mais jovens e mais divertidas,
considerando-as.
Quando ele se virou para ela, ela esperava que ele percebesse que ela não
era a noiva mais qualificada para ele. Ela já estava imaginando a decepção nos
olhos de sua mãe quando esse engajamento falso não existisse mais. Ela já estava
lutando por uma solução para os cofres vazios de Arthur. Para os de seu pai.
Talvez ela pudesse convencer o duque a romper o noivado sem revelar seu erro
estúpido. Ele não parecia um homem mau. Ele simplesmente parecia... Bem,
francamente, ele parecia incomum.
Exceto que ele não interrompeu o noivado como ela esperava. Em vez disso,
seus olhos encontraram os dela e, pela primeira vez, parecia que ele a viu. E, pela
primeira vez, ela o viu, frio e calmo, nada perturbado pelo fato de ela estar ali, e
eles estavam prestes a ficar noivos. Ele parecia não se importar, na verdade. —
Eu não quero elas. Você apareceu na hora certa, então por que não?
Isso era ridículo. Casamentos ducais não aconteciam assim. Os casamentos
em geral não acontecia assim – em sacadas vazias com não mais do que um
imprevisível capricho de conveniência.
E ainda assim... isso estava acontecendo.
Ela fez isso.
Não, Devil tinha feito isso. Como mágica.
Assas palavras sussurravam através dela, ao mesmo tempo verdadeiras e
terrivelmente falsas. Devil não tinha feito mágica. Este duque não era mariposa.
Felicity não era chama. Ela era conveniente.
E não havia nada mágico sobre conveniência.
— Você tem espaço nesse livrinho para outra dança? — disse o duque,
interrompendo a onda de consciência que a inundou com o pensamento.
Ela olhou para o leque, para espaço vazio que restava. Um eco veio de mais
cedo. Uma vaga imaginação de um outro homem marcando aquele espaço.
Reivindicando essa dança. Um homem que desapareceu na escuridão, e foi
substituído por este - que reinou na luz. Ela tentou um sorriso. — Eu tenho
espaço, na verdade.
Ele alcançou o leque, parando antes de tocá-lo, esperando que ela o
oferecesse. Devil não tinha esperado. Devil não teria esperado. Ela estendeu a

141
mão para o duque e ele levantou o leque, pegando o pequeno lápis pendurado
na mão e escrevendo seu nome no espaço ali. Marwick.
Felicity imaginou que ela deveria se sentir sem fôlego com a ação - mas ela
não o fez. Nem mesmo quando ele soltou o leque e segurou a mão dela,
erguendo-a em um movimento lento e deliberado, até que seus lábios cheios e
bonitos roçaram sobre os nós dos dedos.
Ela definitivamente deveria ter se sentido sem fôlego com isso. Mas ela não
estava, e nem ele também estava. E enquanto observava o duque de Marwick –
seu proclamado noivo se tornando real – ela levantou a cabeça, com um único
pensamento se apoderando dela.
As asas do duque continuaram sem ser atingidas.
O que significava que Devil não cumprira seu acordo.

Capítulo Treze

Devil já estava estragando por uma briga na noite seguinte, quando ele
entrou pela porta bem guardada do armazém dos Bastardos - tanto que o som
da fechadura girando na grande porta de aço não o confortou como deveria ter.
Ele passou grande parte do dia tentando se concentrar em seus livros,
dizendo a si mesmo que era mais importante do que todo o resto - que ele tinha
muito tempo para procurar Felicity Faircloth e descobrir precisamente o que
havia acontecido entre ela e Ewan.
Na verdade, ele sabia o que havia acontecido. Seu vigia a tinha visto em casa
apenas duas horas depois que ele a deixou - junto com a mãe, ali levada por seu
irmão - e depois disso ninguém saiu de Bumble House, nem por qualquer um
dos egressos do térreo nem pela treliça além. O quarto de Felicity. Esta manhã,
as senhoras da casa tinham passado a manhã no Hyde Park com os cachorros da
Marquesa e voltaram para almoçar, tomar chá e escrever notas ou o que fosse
que as damas faziam à tarde.
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Absolutamente nada fora do comum tinha acontecido.
Exceto que Felicity conheceu Ewan. Devil tinha assistido das sombras
enquanto eles falaram, resistindo ao instinto de ir até ela e parar a conversa. E
então Ewan a beijou - em sua mão enluvada, mas beijou-a mesmo assim - e Devil
ficou imóvel e de alguma forma deu as costas para a cena, em vez de ceder ao
seu segundo instinto mais básico, que era destruir o duque, pegar Felicity e
carregá-la para Covent Garden, deitá-la no chão e terminar o beijo que eles
tinham começado na última vez que ela esteve lá.
Mas ela não era para ele. Ainda não.
Não até a hora de afastá-la de seu irmão e lembrá-lo de quão facilmente
ele poderia ser levantado para ser largado, duro e rápido, no chão, garantindo
que Ewan nunca mais considerasse voar muito rápido ou longe demais.
Que foi por isso que Devil tinha sido tão gentil com ela. Tão cortez. Porque
Felicity Faircloth foi um meio para um fim muito específico. Não porque ele
realmente achasse que ela era linda. Não porque ele realmente se importasse se
ela estivesse usando roupas de baixo rosa. Não porque ele realmente desejasse
que ela acreditasse em seu próprio valor.
Ele não fez isso. Ele não podia.
E então, ele disse a si mesmo que não era nada mais do que curiosidade
geral que o enviou ao armazém para encontrar Whit em mangas de camisa,
gancho na mão, supervisionando a distribuição do carregamento que estava no
porão de gelo por mais de uma semana, esperando para se mover.
Curiosidade geral no negócio e não a lembrança dos lábios de Ewan nas
juntas dos dedos de Felicity. Não remotamente.
Afinal, Devil disse a si mesmo, um império do contrabando não corria por si
só, e havia trabalhadores a serem pagos e acordos a serem assinados e uma nova
remessa para chegar na semana que vem, carregada de bebidas alcoólicas e
contrabando, paro o qual não teriam espaço se eles não se livrassem do que
estava no porão.
Curiosidade geral, e não uma forte necessidade de resistir à vontade de ir à
casa dos Faircloth esta tarde, escalar a maldita treliça e conversar com a garota.
Ele era um homem de negócios. O que importava era o trabalho.
Dentro do armazém, duas dúzias de homens fortes se moviam em harmonia,
os músculos se esforçando sob o peso dos caixotes que passavam da linha, do
buraco nas tábuas do assoalho até uma das cinco caravanas prontas para
143
transportar o produto por terra: duas para uma localizações em Londres; uma a
oeste, para Bristol; uma para o norte, para York; e a última até a fronteira
escocesa, onde seria redistribuída para distribuir em Edimburgo e por todo o
planalto.
Havia um grande número de momentos na vida de um contrabandista que
traziam perigo e incerteza, mas estes eram os piores, sabendo que, uma vez que
as mercadorias saíssem do armazém, o transporte estava mais em perigo do que
nunca. Ninguém poderia provar que os Bastardos de Bareknuckle estavam
contrabandeando mercadorias dentro dos navios de gelo que eles trabalhavam;
não havia como verificar o conteúdo dos navios quando eles entravam no porto,
quase afundando por todo o gelo derretido em seus porões. Neste momento,
porém, com bens que não pagavam impostos, não declaravam, nas mãos de seus
homens leais, ninguém seria capaz de negar a atividade criminosa.
Nas noites em que eles mudavam o produto, todo corpo capacitado na
organização ajudava a fazê-lo o mais rápido possível. A noite mais longa pairava
sobre a colônia, mais seguro para o produto e todos os seus futuros.
Devil foi até Whit e Nik, tirando o paletó e o colete, trocando sua bengala
por um grande gancho curvo. Ele foi até o subsolo, ao lado de Whit, levantando
engradados e passando-os para outro homem, depois outro e outro, e uma
segunda fileira de homens o seguiu imediatamente, formando uma nova linha,
dobrando o ritmo do trabalho.
Nik estava no subsolo, marcando caixas e barris com giz branco enquanto
passavam, marcando seus destinos e contabilizando-os no pequeno livro que
nunca saía de seu bolso. — St. James. Fleet Street. Edimburgo. Iorque. Bristol.
Não era o negócio de contrabando que gerava notícias picantes; caixas de
contrabando não eram interessantes até serem abertas e usadas. Mas os
compradores dessas caixas? Os homens mais poderosos do governo, religião e
mídia? Basta dizer que o mundo estaria ansioso para dar uma olhada na lista de
clientes dos Bastardos de Bareknuckle.
Devil pegou um barril de bourbon na direção da Catedral de York e
levantou-o com um grunhido alto. — Cristo, essas coisas são pesadas.
Whit não hesitou em puxar uma caixa, sua respiração pesada era a única
indicação de que a tarefa exaustiva o estava afetando. — Fraco.
Nik soltou uma risadinha, mas não desviou o olhar da lista dela. Devil
estendeu a mão para a próxima caixa, ignorando a maneira como os músculos
de seus ombros se esticaram quando ele puxou e passou para o homem em suas

144
costas. Ele voltou sua atenção para Nik. — Eu vou ter você sabendo que eu sou
o irmão inteligente.
Ela olhou para ele, os olhos brilhando. — Você é? — Ela marcou uma
caixa. — Banco de Londres.
Whit grunhiu e se inclinou no porão. — E os livros que ele insistiu em ler
quando éramos crianças continuam a mantê-lo aquecido durante a noite.
— Ei! — Disse Devil, enganchando outro cano. — Sem esses livros, eu nunca
aprenderia sobre o cavalo de Troia e, em seguida, onde estaríamos.
Whit não hesitou. — Eu imagino que teríamos que imaginar por nós mesmos
que poderíamos contrabandear uma coisa dentro de outra coisa. No entanto,
teríamos feito isso? — Ele perguntou com um pequeno grunhido enquanto
puxava um barril de conhaque. — Graças a Deus pelo seu conhecimento primitivo
dos gregos.
Devil tirou vantagem do seu gancho vazio e ofereceu um gesto rude ao
irmão, que se virou para os homens reunidos com um largo sorriso branco e
disse: — Você vê? Prova que tenho razão. — Whit olhou para Devil e acrescentou:
— Embora não seja um sinal de inteligência, pode-se apontar.
— O que aconteceu com você hoje sendo um tagarela já que é o irmão que
não fala?
— Estou me sentindo fora do tipo hoje. — Whit levantou uma caixa
pesada. — O que te traz aqui, bruv?
— Eu pensei em verificar o carregamento.
— Eu pensei que você tinha outras coisas para verificar esta noite.
Devil cerrou os dentes e estendeu a mão para uma caixa de cartas de
baralho. — E o que seria isso?
Whit não respondeu.
Devil se endireitou. — Bem?
Whit encolheu os ombros por baixo da camisa molhada de suor. — Só que
você tem seu plano mestre para ver, não?
— Que plano mestre? — Perguntou a sempre curiosa Nik de baixo. — Se
você está planejando algo sem mim...
— Não estamos planejando nada. — Whit voltou para o porão. — É só Dev.
O olhar azul de Nik se moveu de um irmão para o outro. — É um bom plano?
145
— É um plano de merda, na verdade, — disse Whit.
O mal-estar atravessou Devil e sua réplica ficou presa em sua garganta. Era
um bom plano. Era o tipo de plano que punia Ewan.
E Felicity.
Havia apenas uma maneira de responder. Outro gesto rude.
Whit e Nik riram, antes que ela se afastasse de seu lugar abaixo: — Bem, por
mais que eu não deseje terminar esta conversa fascinante, essa é a última.
Devil virou-se para observar os homens na linha guardando o último
produto nas grandes carroças de aço, enquanto Whit acenou com a cabeça e
disse: — Tudo bem então. Diga aos rapazes para enviar o gelo.
Passando seu gancho para baixo para Nik, Devil recebeu outro, frio como o
produto que segurou - o primeiro bloco de seis pedra de gelo. Virando-se, ele
passou o gancho e sua captura para o próximo homem na linha, que entregou-
lhe gancho um vazio, que Devil passou para baixo para pegar sua congelada
carga. O segundo bloco foi passado, e Devil passou para outro gancho vazio, e
assim foi, rítmico e árduo, até que as partes de trás das caravanas de aço foram
enchidas até o teto com blocos de gelo.
Houve um prazer no trabalho exaustivo, na fila de homens trabalhando em
harmonia, rumo a um objetivo comum e realizável. A maioria dos objetivos não
era alcançado com tanta facilidade e, com muita frequência, os que aspiravam a
eles se viam desapontados com o alcance. Isso não. Não havia nada tão
satisfatório quanto a descoberta de que o trabalho terminava bem e o momento
era propício para uma cerveja.
Mas não havia satisfação para se ter naquele dia.
Ele estava descendo para o subsolo quando John gritou por ele; Virando-se,
ele encontrou o grandalhão cruzando a entrada dos fundos do armazém, um
menino se arrastando atrás dele. O olhar de Devil se estreitou ao reconhecê-lo.
Brixton era um dos observadores de Felicity.
Deixou cair o gancho no chão empoeirado, incapaz de se impedir de se
mover na direção deles. — O que aconteceu com ela?
O menino levantou o queixo, forte e orgulhoso. — Nada!
— O que você quer dizer, com nada?
— Nada, Devil, — respondeu Brixton. — Lady está certa como chuva.
— Então por que você está fora de seu ponto?
146
— Eu não estava, até que de repente o alvo me puxou para fora de lá.
John deu um olhar de advertência ao menino, e Devil virou-se para a direção
do segurança do depósito. — O que você estava fazendo em Mayfair?
John sacudiu a cabeça. — Eu não estava em Mayfair. Eu estive em guarda da
lado de fora. — Eles estavam movendo um carregamento esta noite, por isso as
estradas que saem da colônia foram monitorados por uma equipe de homens
em seu emprego. Ninguém entrava ou saía, sem a aprovação dos Bastardos.
Devil sacudiu a cabeça. Ele não poderia ter entendido. Não era possível. Ele
estreitou seu olhar no menino. — Onde ela está?
— Na porta!
Seu coração começou a bater. — Na porta de quem?
— Sua, — disse John, finalmente permitindo o sorriso que estava ameaçando
romper. — Sua senhora está tentando abrir a fechadura.
Devil franziu o cenho. — Ela não é minha senhora. E ela com certeza não
deveria estar no bairro.
— E, no entanto, aqui estamos nós. — Isso, de Whit, que apareceu por trás
do Devil. — Você vai pegar a garota, Dev? Ou você vai deixá-la lá fora como um
cordeiro para o abate?
Droga.
Devil já estava indo para a porta dos fundos. Um baixo estrondo de risadas
por trás dele que não poderia ter sido seu irmão, como Whit certamente não
queria morrer.
Encontrou-a agachada na porta do depósito, um mar de saias pálidas quase
invisíveis ao redor dela, e a onda de alívio ao descobri-la ilesa rapidamente se
dissolveu em irritação e depois em interesse indesejado. Ele parou logo que virou
a esquina do prédio, não querendo alertá-la sobre sua presença.
Dando-lhe um amplo espaço, ele se aproximou dela por trás. Sua cabeça
estava inclinada na direção do bloqueio, mas não vê-lo, - era calada da noite e
mesmo se não estivesse nublado, a luz da lua não teria sido suficiente para ela
ver sua área de trabalho.
Lady Felicity estava falando sozinha novamente.
Ou melhor, ela estava conversando com a fechadura, presumivelmente sem
saber que era imperceptível - projetada não apenas para vigiar, mas para punir
aqueles que se consideravam melhores do que ela.
147
— Aí está você, querido, — ela sussurrou suavemente, e Devil congelou no
local. — Eu não vou ser rude com você. Eu sou uma brisa de verão. Eu sou asas
de borboletas.
Que mentira. Ela ameaçou incinerar todas as borboletas na Grã-Bretanha.
— Boa menina, — ela sussurrou. — São três e... — Ela brincou com as
escolhas. — Hmmm. — Mais murmuro. — Quantos você tem? — Ela brincou
novamente. — Mais importante, o que tem tão importante dentro deste prédio
que algo tão bonito como você tem que protegê-lo... e a seu mestre?
Uma onda de excitação atravessou Devil com as palavras. Aqui, na escuridão,
ela falava dele e, embora ele não pudesse admitir isso para os outros, ou mesmo
para si mesmo, Devil gostava muito disso.
Mesmo que ela não deveria estar aqui, elegante na sujeira.
Ali estava ela, no entanto, seus sussurros suaves na escuridão, como se ela
pudesse abrir a fechadura, e Devil quase pensou que ela poderia. — Mais uma
vez, querida, — ela sussurrou. — Por favor. Novamente.
Ele fechou os olhos por um momento, imaginando aquele sussurro em seu
ouvido, encoberto em uma escuridão diferente, em sua cama. Por favor. Ele
imaginou o que ela poderia implorar. Novamente. Ele cresceu duro com as
possibilidades. E depois...
— Ah! Sim! — Outra coisa que ele gostaria de ouvi-la chorar em diferentes
circunstâncias. Seus dedos doíam para alcançá-la, os músculos de seus braços
não estavam mais cansados do trabalho dentro, agora mais do que dispostos a
tentar levantá-la, contra ele, e deitá-la em algum lugar macio, quente e privado.
— Oh, besteiras.
Ele certamente não pretendia nada parecido com aquela declaração
desapontada, no entanto. As palavras frustradas puxaram-no de suas
imaginações e suas sobrancelhas se ergueram.
— Como é que... — Felicity sacudiu a fechadura. — O que...
Foi a sua deixa. — Eu temo, Felicity Faircloth, que esse bloqueio particular é
imune a seus encantos.
Ele estaria mentindo se dissesse que não amava o modo como os ombros
dela se endireitavam e o pescoço se alongava. Ela não saiu de seu agachamento,
no entanto, não soltou as ferramentas na fechadura.
— Embora fossem belos sussurros, devo confessar, — acrescentou.
148
Ela mal virou a cabeça. — Suponho que isso parece um pouco condenável.
Ele estava grato pela escuridão, enquanto escondia a contração em seus
lábios. — Depende. Parece que você está tentando quebrar e entrar.
— Eu não diria isso, — disse ela, calma. Felicity Faircloth, sempre disposta e
descarada.
— Não?
— Não. Bem, quero dizer, eu certamente estou tentando entrar. Mas eu
nunca pretendi quebrar.
— Você deveria parar de entrar em meus edifícios sem ser convidada.
Ela estava distraída com a fechadura novamente. — Eu pensei que isso era
o que fazemos um com o outro. — Ela sacudiu os grampos. — Parece que eu
acidentalmente danifiquei esta fechadura.
— Você não fez.
Ela olhou para ele. — Garanto-lhe que sou muito boa com fechaduras e fiz
algo com esta. Está travada.
— Isso é porque é suposto ser, minha pequena criminosa.
Compreensão clareou. — É um Chubb9.
Algo próximo ao orgulho explodiu com as palavras dela, junto com algo
como prazer na reverência em suas palavras. Ele não gostava de nenhuma
emoção em relação a Felicity Faircloth. Ele redobrou seus esforços para
permanecer indiferente. — É de fato. Como é que você nunca está acompanhada
de uma dama de companhia?
— Ninguém na minha família espera que eu faça algo próximo disso, — ela
disse, vagamente, enquanto voltava sua atenção para a fechadura, perfeitamente
encaixada na pesada porta de aço. — Eu nunca vi uma Chubb.
— Estou feliz por estar de serviço. Sua família deveria saber melhor. O que
na terra deu em você para entrar em um viveiro de Londres na calada da noite? Eu
deveria ligar para as autoridades.
Suas sobrancelhas se levantaram. — As autoridades?
Ele inclinou a cabeça. — Roubo é uma ofensa grave.

9 Chubb - um tipo de bloqueio de patente que contém um dispositivo que define o ferrolho de forma
imóvel se o bloqueio for escolhido.
149
Ela deu uma pequena risada. — Não tão grave como o que quer que você
tem feito aqui, Devil.
Muito inteligente para seu próprio bem. — Nós importamos gelo, Lady
Felicity. É tudo muito honesto.
— Oh, sim, — ela zombou. — Honesto é um dos três principais adjetivos
que eu iria usar para descrever você. Imediatamente seguindo de adequado e
desinteressante.
Ele sorriu. — Essas três palavras significam a mesma coisa.
Ela soltou uma risada ofegante e a noite de junho ficou excepcionalmente
quente. — Você tem a chave para soltar a fechadura?
As fechaduras da Chubb eram conhecidas por sua segurança perfeita. Elas
não poderiam ser escolhidas porque ao primeiro sinal (ou, no caso de Felicity, o
enésimo sinal) de destravar, elas travavam e só poderiam ser redefinidas com
uma chave especial.
— De fato, eu tenho.
Ele extraiu a chave do bolso da calça e ela se levantou, estendendo a mão
para ela. — Posso?
Ele pegou de volta. — Então você pode aprender meus segredos? Por que
eu permitiria isso?
Ela encolheu os ombros. — Como vou aprendê-los de qualquer maneira, não
vejo razão para você não me poupar algum tempo.
Cristo, ele gostou dessa garota.
Não. Ele não gostava. Ele não podia. Se ele gostasse dela, ele não seria capaz
de usá-la quando necessário.
Ele segurou a chave diretamente em direção a ela, esperando por ela para
alcançá-la. Quando ela o fez, ele a pegou de volta. — Como você encontrou o
armazém?
Ela encontrou seu olhar. — Segui você.
O que?
— Como? — Era impossível. Ele teria notado se tivesse alguém o seguindo.
— Imagino que foi do jeito normal de seguir alguém. Por trás.

150
Se ele não tivesse sido tão consumido com pensamentos do baile da noite
passada, ele teria notado. Cristo. O que essa garota fez com ele? — Ninguém
parou você?
Ela alegremente balançou a cabeça.
Ele pagava aos homens uma grande quantia de dinheiro para garantir que
ele não fosse morto nas ruas de Covent Garden. Ele pensaria que um deles
pensaria em avisá-lo sobre essa mulher o estar seguindo. — Você poderia ter
sido morta. — Pior.
Ela inclinou a cabeça. — Acho que não. Acho que você deixou claro que eu
era intocável. Pouco antes de eu receber rédea livre do seu território.
— Você nunca recebeu rédea livre do meu território.
— Como foi que você colocou? — Colocando as mãos em seus quadris, ela
baixou a voz para um registro que ele supunha que deveria soar como o seu. —
Ninguém a toca. Ela pertence à mim. — Ela relaxou os braços com um sorriso. —
Foi bastante primitivo, admito, bastante fortalecedor.
Droga. — Por que você está aqui?
— Eu vou te dizer se você me der a chave Chubb.
Ele riu da tentativa de negociação dela. — Não, não, gatinha. Você não tem
o poder aqui.
Ela inclinou a cabeça. — Você tem certeza?
Ele não tinha, se ele fosse honesto. Ele guardou a chave mais uma vez. —
Ninguém tem poder aqui além de mim.
Seu olhar permaneceu no lugar onde a chave havia desaparecido e por um
longo e aterrador momento, ele pensou que ela poderia vir em busca disso.
Aterrorizante, porque naquele momento ele queria que ela fizesse isso.
Mas maldição, se a mulher não virou as costas para ele e se agachou mais
uma vez na fechadura. Alcançando sua touca, ela extraiu outro grampo. — Tudo
bem então. Eu mesmo farei isso.
Mulher teimosa. Ele viu quando ela endireitou o alfinete e torceu-o no
final. — O Chubb é imperdoável, querido.
— Até agora, foi sim.
— Você pretende destravá-lo na calada da noite?

151
— Eu farei, de fato, — disse ela. — O que eu sei é que a sua chave funciona
no sentido inverso das teclas normais, não? Ele redefine os ganchos da
fechadura. Nesse caso, se eu puder escolher o mecanismo de fixação, posso
aprender como o bloqueio funciona.
Ele viu quando ela inseriu seu grampo recém-ajeitado na fechadura ao lado
de uma segunda ferramenta, então ele deu a volta para se apoiar na porta,
cruzando as botas e os braços e a observando. — Por que você me seguiu?
Ela raspou o interior da fechadura. — Porque você estava saindo quando eu
cheguei.
— E por que você veio me ver em primeiro lugar?
Mais uma vez, um esforço inútil. — Porque você não veio me ver.
Ele ficou quieto com a implicação de que ela queria que ele viesse vê-la. —
Nós temos um compromisso?
— Não — disse ela calmamente, como se estivessem no Hyde Park no meio
do dia e não em um dos bairros mais perigosos de Londres na calada da noite. —
Mas eu pensei que você iria querer me verificar.
Ele havia checado ela. Ele tinha um vigilante verificando-a a cada minuto do
dia. — Para qual finalidade?
— Para ver se sua promessa foi cumprida.
— Minha promessa?
— O Duque de Marwick, louco por mim.
Ele rangeu os dentes, lembrando dos lábios de Ewan em seus dedos
cobertos de seda. Ela não estava usando luvas agora, e Devil queria queimar
qualquer lembrança do toque de Marwick com seus próprios lábios. Em sua pele
nua.
— E foi?
Ela não respondeu. Ela estava distraída por seus pinos na fechadura.
— Felicity Faircloth, — ele repetiu.
— Hmm? — Ela fez uma pausa. Então, — Ah, eu vejo. — Outra pausa. — Eu
imploro seu perdão, foi o que?
— Minha promessa. Foi feito bem em cima? Você conheceu seu duque?

152
— Oh, — ela disse novamente. — Sim. Nos conhecemos. Ele era muito
bonito. E possivelmente... bem... o que eles dizem sobre ele pode ser verdade.
— O que eles dizem sobre ele?
— Que ele é louco.
Ewan não estava bravo. Ele estava obcecado.
— Ele dançou como um sonho.
Devil não deveria ficar irritado com essa afirmação. Não era isso que ele
queria? Ewan pensando que ele ganhou Felicity? Então doeria mais quando Devil
a roubasse?
Ele queria colocar um punho através de uma parede com a ideia deles
dançando. Ele não pôde resistir a zombar. — Como um sonho?
— Mmm, — ela disse distraidamente. — Ele tem uma forma adorável. Faz
você se sentir como se fosse uma nuvem.
— Uma nuvem, — disse Devil, trabalhando para manter os dentes cerrados.
— Mmm, — ela disse novamente.
Ele estava tão irritado com a visão de uma dança na nuvem que ele disse: —
Você não vem apenas para me ver, Felicity.
— Por que não? Eu tenho algo para discutir com você.
— Não importa. Quando tivermos coisas para discutir, eu vou encontrar
você. Você não aparece no viveiro.
— Isto é um viveiro? Eu nunca estive em um.
Ele teria rido se não fosse tão risível. Os viveiros estavam cheios de fedor e
sujeira, morte e destruição. Eles detinham o pior do mundo - muitas vezes dado
àqueles que mereciam o melhor. Claro que Lady Felicity Faircloth nunca tinha ido
a um viveiro. Ela provavelmente teria estado mais para a lua.
— É muito quieto. Eu teria pensado que seria diferente.
— Está quieto porque você está profundamente dentro da parte mais
protegida disto. Mas você poderia facilmente ter perdido o seu caminho.
— Absurdo. Eu te segui. — Ela se inclinou para a porta e sussurrou: — É isso,
querida.
Devil ficou duro como uma rocha. Ele se endireitou, saindo da porta e
enfiando as mãos nos bolsos para impedi-la de notar sua prematura aflição.
153
Limpando a garganta, ele disse: — Dar-lhe meu endereço foi um erro grave, já
que parece incapaz de entregar uma mensagem escrita aos meus escritórios
como qualquer outra mulher humana normal. — Ele fez uma pausa. — É possível
que você seja incapaz de escrever? A pobreza do seu irmão limitou a quantidade
de tinta em sua casa? A quantidade de papel?
— O papel não é exatamente o produto menos caro, — ela ofereceu.
Clique.
O queixo de Devil caiu. Impossível.
— Deslumbrante e grandiosa garota. Muito bem. — Felicity Faircloth
levantou-se e levantou os braços, habilmente devolvendo os grampos de cabelo
aos lugares adequados. — Vamos ver como você é honesta, então?

Capítulo Quatorze

Ela o chocou.
O Imovel Devil, todo poderoso e controlador, impenetrável e dominador, e
ela o havia chocado. Ela sabia disso, porque seus olhos se arregalaram e sua
mandíbula afrouxou, e por um instante ela pensou que ele poderia ter engolido
algo muito grande.
Ele olhou para ela, depois para a fechadura, depois novamente para ela. —
Você fez isso.
— Eu fiz, — disse ela, feliz.

Ele balançou sua cabeça. — Como?


Ela não conseguia controlar seu sorriso orgulhoso. — Tenha cuidado, Devil.
Vou começar a imaginar que você me achou sem uso.
— Você deveria estar sem uso!

— Eu imploro seu perdão, — disse ela. — As mulheres não devem ficar sem
uso. Devemos falar vários idiomas, tocar piano e bordar com desenvoltura e
liderar uma festa em casa em um empolgante jogo de lustre cego.
Ele desviou o olhar e respirou fundo, fazendo-a pensar que ele poderia estar
procurando por calma. — Tudo tão útil. Você faz tudo isso?

154
— Eu falo inglês e francês imperfeito.

— E o resto?

Ela hesitou. — Eu sou muito boa no bordado. — Ele deu-lhe um olhar, e ela
acrescentou: — Eu odeio isso, mas eu sou bastante decente nisso.
— E o piano?

Ela inclinou a cabeça. — Menos assim.


— O lustre do homem cego10?

Ela deu de ombros. — Não me lembro da última vez que joguei.


— Então, ficamos com destravar fechaduras.

Ela sorriu. — Eu sou muito boa nisso.


— E é útil?

Não sabendo onde ela convocou a coragem impetuosa, Felicity colocou a


mão na maçaneta da grande porta de aço que acabara de destrancar. — Vamos
ver, não vamos? — Ela não esperou, muito ansiosa para ver dentro do armazém
e com muito medo que ele a parasse. Ela puxou a porta, usando todo seu
peso para abri-la uma meia polegada antes que ele reagisse.
A porta bateu fechada, uma de suas enormes mãos espalmadas ampla em
sua cabeça. Ela fixou o olhar naquela mão, seus anéis de prata cintilando no
escuro, quando ele se inclinou para o ouvido dela e disse: — Você não deveria
ter vindo.
Ela engoliu em seco, recusando-se a deixá-lo vencer. — Por que não?
— Porque é perigoso, — disse ele em voz baixa, enviando um arrepio de
crença através dela. — Porque as colônias não são lugar para garotas bonitas
com uma antecipação ofegante de aventura.
Ela balançou a cabeça. — Isso não é o que eu sou.
— Não?

— Não.

10 Lustre do homem cego – Brincadeira de criança, conhecida como cabra-cega. A cabra-cega é um


jogo recreativo (uma brincadeira, no Brasil), em que um dos participantes, de olhos vendados, procura
adivinhar e agarrar os outros. Aquele que for agarrado, passará a ficar com os olhos vendados. Hoje
em dia é um jogo infantil, mas na Idade Média foi um passatempo palaciano.
155
Ele esperou por um longo momento, e então disse: — Eu acho que é
exatamente o que você é, Felicity Faircloth, em seu lindo vestido com seu lindo
cabelo no alto da sua linda cabeça, em seu mundo bonito onde nada dá errado.
As palavras rangeram. — Não é assim que eu sou. As coisas dão errado.
Ele fez — Ah sim. Eu esqueci. Seu irmão fez um mau investimento. Seu pai
também. Sua família é pobre o suficiente para temer o exílio social. Mas aqui está
o problema, Felicity Faircloth: sua família nunca será pobre
o suficiente para temer a pobreza. Eles nunca se perguntarão quando será a
próxima refeição deles. Eles nunca vão temer pelo telhado sobre suas cabeças.
Ela virou a cabeça, quase olhando para ele, ouvindo o indício da verdade em
suas palavras; ele sabia o que era essa pobreza.
Ele continuou antes que ela pudesse falar. — E você — Sua voz ficou mais
baixa. Mais escura. Com um acentuado grosso. — Garota boba... você entra no
Covent Garden como a porcaria do sol, pensando que pode dar uma volta e nos
manter seguros.
Ela olhou para ele então, amaldiçoando as sombras em seus olhos, o que fez
dele um homem diferente. Um mais assustador. Mas ela não estava com
medo. Se ela fosse honesta, a voz baixa e a profanidade sombria a faziam sentir
algo muito diferente do que assustado. Ela endireitou os ombros e respondeu:
— Estou segura.

— Você não está nada perto de segura.

Ela poderia não conhecer esse lugar - ela poderia nunca ter conhecido uma
vida como as que moravam aqui -, mas sabia o que era querer além do que
poderia ter. E ela sabia que, agora, ela tinha ao seu alcance - mesmo que fosse
apenas por uma noite. O desafio explodiu e ela ergueu o queixo. — Então é
melhor nós entrarmos, você não acha?
Por um momento, ela pensou que ele poderia afastá-la. Colocá-la em uma
carruagem de aluguel e mandá-la para casa, assim como ele fez antes. Mas em vez
disso, depois de um longo período em silêncio, ele alcançou trás dela e abriu a
enorme porta com praticamente nenhum esforço, sua mão vindo descansar em sua
cintura para guiá-la para a sala cavernosa além. Era melhor que ele mantivesse a
mão lá, enquanto ela passava pela porta, com olhos arregalados e incrédulos.
Ela nunca tinha visto nada assim.
O que, do lado de fora, parecia um prédio grande, dentro parecia ser do
tamanho de St. James's Park. Ao redor das bordas externas da sala única e maciça

156
havia prateleiras de barris e caixas empilhadas de seis ou sete metros de altura.
Incrustados no teto, na borda externa das prateleiras, havia enormes ganchos de
ferro, cada um preso a longas vigas de aço.
Era magnífico. Ela olhou para Devil, que estava olhando para ela, com mais
cuidado do que ela deveria ter gostado. — É seu?
O orgulho brilhou em seus olhos e algo apertou em seu peito. — É.
— É magnífico.

— Isto é.

— Quanto tempo você demorou para construí-lo?

E assim, o orgulho se foi - extinto. Substituído por algo mais sombrio. —


Vinte anos.
Ela balançou a cabeça. Vinte anos iria fazer-lhe um filho. Não seria possível.
E ainda... ela ouviu a verdade nas palavras. — Como?
Ele balançou sua cabeça. Isso era tudo o que ela receberia dele daquele jeito.
Ela mudou de rumo - voltou para um lugar seguro. — Para que são os
ganchos?
Ele seguiu o olhar dela. — Carga, — ele disse, simplesmente.
Enquanto observava, um homem aproximou-se de um dos ganchos e
passou uma corda por cima, puxando-o para o chão enquanto outros dois
homens erguiam um caixote enrolado em corda no gancho. Uma vez seguro, eles
o empurraram pela sala com o que parecia nenhum esforço.
No outro extremo da sala, a caixa foi removida e colocada dentro de uma
das cinco carroças, a que ficava mais próximas de Felicity, cada uma amarrada a
seis cavalos fortes.
Ao redor deles havia dúzias de homens, alguns carregando fardos de feno
nas extremidades abertas de cada vagão, outros verificando os percalços dos
cavalos e ainda mais correndo de um lado para o outro do armazém - que era
escuro demais para ver - segurando grandes ganchos de metal carregando
maciços blocos de...
— É gelo, — disse ela.

— Eu já falei demais, — respondeu Devil.

— Para quê? Deleites de limão? Framboesa?

157
Ele sorriu. — Você gosta de doces, Felicity Faircloth?
Ela corou com a pergunta, embora não pudesse dizer o porquê. — Todo
mundo não gosta?
— Mmm.

O baixo murmúrio roncou através dela, e ela limpou a garganta. — É tudo


gelo?
— Parece que há alguma coisa além de gelo nesses vagões?

Ela balançou a cabeça. — As aparências enganam.


— Deus sabe que é verdade, Felicity Faircloth, simples, despretensiosa e
desinteressante solteirona encalhada. — Ele fez uma pausa. — O que seus amigos
infelizes e terríveis pensam do seu hobby?
Ela corou. — Eles não sabem sobre isso.
— E sua família?

Ela olhou para longe, calor e frustração queimando. — Eles... — Ela fez uma
pausa, pensando duas vezes sobre a resposta. — Eles não gostam disso.
Ele balançou sua cabeça. — Isso não é o que você ia dizer. Diga-me o
primeiro pensamento. O verdadeiro.
Ela encontrou seus olhos, franzindo o cenho. — Eles têm vergonha disso.
— Eles não deveriam, — ele disse simplesmente. Honestamente. — Eles
deveriam estar orgulhosos disso.
Ela ergueu as sobrancelhas. — De minhas tendências criminosas?
— Bem, você não encontrará críticas de tendências criminosas aqui, amor.
Mas não. Eles devem se orgulhar disso, porque você tem o futuro em suas mãos
toda vez que segura um grampo de cabelo.
Ela parou de respirar com isso, seu coração batendo com a calma avaliação
de sua habilidade selvagem e perversa. Ele foi a primeira pessoa que já
entendeu. Não sabendo como responder, ela mudou o assunto. — Que outra
coisa tem nos vagões?
— Forragem, — disse ele. — Ele isola o gelo na parte de trás, perto das
aberturas das portas.
— Ei! Dev!

A atenção de Devil se voltou para o grunhido da escuridão.


158
— O que é?

— Afaste os olhos da menina e dê uma olhada nos manifestos.


Ele limpou a garganta com as palavras impertinentes e virou-se para
Felicity. — Você. Fique aqui. Não saia. Ou cometa qualquer crime.
Ela levantou uma sobrancelha. — Deixarei todos os crimes para o seu
comprometimento.
Seus lábios pressionaram em uma linha reta e ele cruzou na escuridão,
deixando Felicity sozinha. Sozinha para investigar.
Normalmente, se fosse, digamos, um salão de baile ou um passeio no Hyde
Park, Felicity teria estado com muito medo de se aproximar de um local tão repleto
com homens. Além do puro bom senso - os homens eram muitas vezes mais
perigosos do que não eram - as interações de Felicity com o sexo oposto raramente
terminavam em nada que não fosse um insulto. Ou eles repreendiam a presença
dela ou se sentiam com direito a ela, e nem deixavam uma mulher interessada em
passar tempo com um homem.
Mas de alguma forma, agora, ela estava segura entre eles. E não foi
simplesmente porque Devil a envolveu no manto de sua proteção; foi também pelo
fato que os homens reunidos não ali pareciam notar ela. Ou, se o fizessem, não
pareciam se importar que ela fosse uma mulher. Suas saias não eram interessantes.
Eles não estavam julgando a condição do cabelo dela ou a limpeza das luvas que
ela não estava usando.
Eles estavam trabalhando, e ela estava lá, e nenhuma coisa impactou a outra,
e isso foi inesperado e glorioso. E cheio de oportunidades.
Dirigiu-se para as carroças, maiores do que a maioria, e não eram de madeira
nem de lona, tão comumente encontradas nas ruas de Londres, mas de metal -
grandes placas do que parecia ser de aço achatado. Ela se aproximou do transporte
mais próximo, chegando a tocá-lo, bater nele para ouvir o som da plena carga.
— Curiosa?

Felicity se virou para encarar um homem alto atrás dela. Não, não um homem.
Uma mulher, incrivelmente alta - possivelmente mais alta do que Devil e magra,
magra o suficiente para ser confundida com um homem, vestida com camisa, calça
masculina e botas pretas altas que só serviam para alongá-la, de modo que parecia
como se ela pudesse simplesmente levantar os braços sobre a cabeça e tocar as
próprias nuvens.

159
Mas mesmo sem a altura, Felicity iria ter ficado fascinada por esta Mulher -
por sua fácil postura e seu óbvio conforto. Pelo jeito que ela parecia ali no armazém
mal iluminado e reivindicando-o como seu. Ela não precisava mexer num cadeado
para obter acesso... ela possuía a chave.
Como deve ser por ser uma mulher como essa, agora inclinada para um lado,
olhando para Felicity. — Você pode olhar, se quiser, — disse a mulher, com uma
das mãos acenando para a parte de trás da carroça, com a voz carregada de um
sotaque suave e estranho que Felicity não conseguia identificar. — Devil trouxe
você aqui, então ele deve confiar em você.
Felicity analisou aquelas palavras, e com a certeza de que Devil não faria nada
para prejudicar este lugar ou as pessoas que trabalhavam dentro dele, e então
algo explodiu nela - algo surpreendentemente parecido com culpa. — Eu não
acho que ele confia em mim, — respondeu ela, incapaz de se impedir de olhar na
mesma direção onde a mulher olhava, querendo nada mais do que segui-la e
olhar para dentro desta grande carroça de aço. — Eu me trouxe aqui.
Um sorriso brincou nos lábios da outra mulher. — Eu prometo a você, se o
Devil não quisesse você aqui, você não estaria aqui.
Felicity levou as palavras ao rosto deles e se dirigiu para a parte traseira
aberta da carroça, seus dedos arrastando ao longo do aço, que ficou mais frio
quando ela chegou ao seu destino.
A mulher se virou para um homem por perto. — Samir, este está pronto para
você. Você fica com a estrada do Norte e não para até a luz do dia. Mantenha as
paradas planejadas e você vai ver a fronteira em seis noites. Lá, você será
recebido por outras três pessoas. — Ela entregou ao homem um punhado de
papéis. — Manifestos e direções para as outras entregas. Entendido?
Samir, que Felicity imaginou dirigir a carroça, ajeitou seu boné. — Sim,
senhor.
A mulher bateu a mão no ombro dele. — Bom homem. Boa perseguição. —
Ela se voltou para Felicity. — Devil voltará em breve. Ele só está checando as
cargas.
Felicity assentiu, contornando o canto da carroça para descobrir uma parede
de feno, carregada até o topo. Ela olhou para a mulher. — Eles não têm uma
maneira melhor de trazer gelo para a Escócia do que através de Londres?
A mulher fez uma pausa e disse: — Não é uma que conhecemos.

160
Felicity voltou-se para a carroça e estendeu a mão para tocar a palha grossa
escondendo o que quer que estivesse dentro. — Estranho ninguém percebeu que
Inverness está do outro lado do Mar do Norte, da Noruega. — Ela fez uma pausa.
— Que é de onde o gelo vem, não?

— Ela está incomodando você, Nik? — Felicity afastou a mão e virou-se para
a pergunta, falada muito perto de seu ouvido. Devil tinha voltado para
inspecionar a carroça aberta e Felicity é o que parecia.
— Não, — a mulher chamada Nik respondeu, e Felicity pensou que poderia
ouvir risos na voz da outra mulher, — mas estou imaginando que ela vai
incomodá-lo um pouco.
Devil grunhiu e olhou para Felicity. — Não incomode Nik. Ela tem trabalho a
fazer.
— Sim, eu ouvi, — respondeu Felicity. — Garantir que seu gelo seja
transportado pelas centenas de quilômetros de volta à sua origem. — Ele olhou
por cima do ombro para ela, e ela seguiu seu olhar para Nik, que sorria para ele.
Excitação queimando. — Porque não é gelo, é?
— Veja por si mesma. — Ele passou por ela, puxando um fardo de feno para
baixo da carroça, revelando um bloco de gelo para trás. Ele franziu a testa.
As sobrancelhas de Felicity se levantaram.
— Você está surpresa? — Ignorando ela, ele alcançou outro fardo, e outro,
puxando-os para baixo para revelar uma parede de gelo do comprimento do
vagão e subindo quase até o topo. Ele olhou para Nik, a cicatriz em seu rosto
ficou branca na fraca luz. — Isto é como nós obtemos a fusão.
A mulher suspirou e chamou para a escuridão, — Nós precisamos de outra
fila aqui.
— Sim — veio um coro de homens da escuridão.
Eles vieram quase instantaneamente, carregando grandes alicates de metal,
cada um contendo um bloco de gelo sólido. Um a um, passaram os blocos para
Devil, que subiu no vagão e os encaixou cuidadosamente no vazio deixado no
topo do carregamento, garantindo que restasse o menor espaço possível.
Felicity teria ficado fascinada pelo processo se ela não estivesse tão fascinada
por ele, de alguma forma pendurado na borda do vagão, levantando grandes
blocos de gelo até quase a acima de sua cabeça como se ele fosse sobre-humano.
Como se ele fosse o próprio Atlas, seguro e segurando o firmamento. Ele não
estava usando um sobretudo ou um colete, e o linho de sua camisa branca se
161
esticou e flexionou sobre seus músculos enquanto eles faziam o mesmo, fazendo
Felicity se perguntar se poderia rasgar sob sua força.
Todo mundo estava sempre falando sobre os decotes das mulheres e como
os corpetes estavam ficando cada vez mais lascivos a cada minuto, e saias se
agarravam muito perto das pernas das mulheres, mas qualquer uma dessas
pessoas tinham visto um homem sem um casaco? Bom Deus
Ela engoliu em seco quando ele colocou o último bloco no lugar e saltou para
baixo, erguendo um estranho lábio de aço da base do vagão - aproximadamente
doze polegadas de altura e tão bem encaixado nas laterais do veículo que o ranger
ressoou através do armazém.
— O que é isso? — Ela perguntou.
— Mantém o gelo de escorregar quando o derretimento começa, — disse
ele, sem olhar para ela.
Ela assentiu. — Bem, qualquer um que espreita este vagão pensaria que você
era um entregador de gelo muito hábil, isso é certo.
Ele olhou para ela então. — Eu sou um libertador de gelo muito habilidoso.
Ela balançou a cabeça. — Eu acreditaria, se fosse gelo.
— Seus olhos te enganam?
— Eles fazem, na verdade. Mas o meu toque não.
Sua testa franziu. — O que isso significa?
— Só que se todo esse vagão de aço estivesse cheio de gelo, todo o lado de
fora seria tão fria quanto a parte traseira.
Nik tossiu.
Devil ignorou as palavras, estendendo a mão para balançar a grande porta
traseira da carroça, trancando-a em três lugares diferentes. Felicity observou
cuidadosamente enquanto fechava as fechaduras e entregava as chaves para Nik.
— Diga aos homens que estão prontos.
— Sim, senhor. — Nik se virou para os homens reunidos. — Agora é vez de
voces, senhores. Boa perseguição.
Com as palavras, os homens subiram, os motoristas saltando para os blocos,
segundos se juntando a eles. Felicity observou como a pessoa mais próxima a ela
deslizou uma pistola em um coldre preso a sua perna. Dois outros homens

162
subiram no degrau traseiro da carroça, puxando largas correias de couro ao redor
de suas nádegas.
Felicity se virou para Devil. — Eu nunca vi nada parecido com aqueles –
assentos para batedores. Para impedi-los de ter que ficar de pé por toda a
viagem?
Ele observou quando um dos homens atacou a carroça com a alça. —
Parcialmente para o conforto, — ele respondeu, voltando-se para aceitar algo do
homem à sua esquerda. — Parcialmente porque eles podem precisar de suas
mãos para algo diferente de pendurar. — Avançando, ele entregou um rifle para
o batedor, e outro para o parceiro do homem.
— Ah sim. Agora vejo que tudo é gelo — disse ela secamente. — Por que
mais isso exigiria tantos homens armados?
Ele a ignorou. — Fiquem atentos, garotos.
— Sim, senhor. — A resposta veio em uníssono.
— Acima de tudo, — Devil disse, e seu olhar estalou em seu rosto,
registrando a seriedade de suas palavras e algo mais - algo como preocupação.
Não com a carga, mas com os homens. O peito de Felicity se apertou.
— Sim, senhor. — Eles acenaram com a cabeça, amarrando as armas em seus
peitos e verificando as fixações em seus assentos antes de bater no lado da
carroça.
Abaixo da linha, outros jovens estavam se preparando da mesma forma,
amarrando-os aos vagões e amarrando rifles em seus peitos. Batidas metálicas
ecoavam pela grande sala, até que todas as carroças estivessem prontas para
partir. Um grande tanger soou quando vários homens deslizaram uma enorme
porta de aço aberta - grande o suficiente para passar uma carroça.
— A fronteira, — Nik chamou, e o vagão mais próximo de Felicity saltou para
o movimento, passando através da porta aberta e para a noite. Ela recuou para
Devil, seu braço envolvendo sua cintura para estabilizá-la quando Nik disse, —
York. — Outro vagão se moveu, e Felicity percebeu que ela deveria se afastar de
seu toque, que outra mulher certamente iria fazer isso. Exceto... ela não queria.
Ao lado dele, com os cavalos batendo os pés e os homens gritando ordens,
ela se sentia como a dama de uma fortaleza medieval, com as saias ondulando
ao vento escocês, enquanto ela ficava ao lado de seu senhor e observava seu clã
se preparar para a guerra.
— Londres Primeiro, — gritou Nik acima da raquete de rodas de carroça.
163
Parecia um pouco como a guerra. Como se esses homens tivessem treinado
juntos, tornando-se irmãos de armas. E agora eles peregrinam juntos em serviço
para um propósito maior.
Para Devil.
Devil, cujo braço a segurou mais perto do que deveria. Mais forte do que
deveria. E precisamente como ela achou que desejava. Como se ela fosse sua
parceira e ele o dela.
— Bristol, — Nik chamou, empurrando outra carroça para o movimento.
— London Segunda.
Antes que o último dos veículos saísse do armazém, a porta estava se
fechando, vários homens se movendo para a frente para colocar uma grande viga
de madeira contra ela para evitar que ela fosse aberta do lado de fora. No barulho
da trava da pesada fechadura, Devil a soltou, afastando-se, como se a sua
segurança não fosse nada mais que uma fantasia.
Ela tentou por leviandade. — E assim, o seu gelo está além do seu controle.
— Meu gelo está bem dentro do meu controle até chegar ao seu destino, —
disse Devil, observando quando outro homem se aproximava, este com cabelos
escuros e pele marrom-dourada. — Eu lembraria a você, minha senhora, que sou
capaz de exercer poder considerável com ou sem presença física.
As palavras, um estrondo baixo, enviaram um arrepio através dela,
lembrando-a da maneira como ele parecia exalar poder a partir do momento em
que ela o conheceu. Ele de alguma forma impediu o duque de negar sua
reivindicação de seu noivado. Ele descobriu os segredos de sua família sem
sequer tentar. Ele a fez segura em Covent Garden, mesmo quando ele não estava
com ela. Talvez ele fosse o Diabo, afinal de contas, todo-poderoso e onisciente,
manipulando o mundo sem luta, cobrando dívidas ao longo do caminho.
Mas ele ainda não tinha recolhido sua dívida.
O duque poderia ter oferecido seu casamento, mas um casamento de
conveniência não era seu plano. E então ela estava aqui neste lugar magnífico,
como nada que ela já viu, pronta para enfrentar Devil mais uma vez. E lembrar-
lhe de que o fim da barganha não foi cumprido.
— Não há poder suficiente, — ela respondeu.
Ele voltou sua atenção para ela, seu olhar estreito definindo seu coração
acelerado. — O que você disse?

164
Antes que ela pudesse responder, o outro homem se juntou a eles, também
em mangas de camisa, enrolados em seus antebraços, revelando um padrão de
cor preta que Felicity consideraria mais seriamente se o homem não teria pisado
em uma piscina de luz dourada quando revelou sua rosto - bonito além da
medida. O tipo de rosto que os pintores atribuíam aos anjos.
Ela não conseguiu segurar o suspiro.
Os dois homens olharam para ela.
— Existe algum problema?
Ela balançou a cabeça. — Não. É só que ele é muito... — Ela olhou para o
homem, percebendo que era rude falar dele como se ele não estivesse de pé
diretamente na frente dela. — Isto é, senhor, você é muito... — Ela parou. Era
apropriado dizer a um homem que ele era bonito? Sua mãe sem dúvida se
dissolveria em acesso de raiva. Embora, para ser justa, a mãe dela provavelmente
se dissolveria em desconfianças se soubesse que sua filha estava em qualquer
lugar perto de Covent Garden - muito menos em uma de suas colônias. Então ela
passou muito tempo sem entender o que era apropriado.
— Felicity?
Ela não olhou para Devil. — Sim?
— Você pretende terminar esse pensamento?
Ela permaneceu transfixada pelo recém-chegado. — Oh. Sim. Eu sinto
Muito. Não. — Ela limpou a garganta. — Não. — Balançou a cabeça. —
Definitivamente não.
Uma sobrancelha negra levantou-se, curiosa e avaliadora.
E familiar.
— Irmãos! — Ela deixou escapar, olhando para Devil e para trás novamente,
então deu um passo em direção a ele, enviando-o de volta meio passo, seu olhar
voando para Devil, dando a ela uma chance de inspecionar seus olhos - a mesma
cor misteriosa do Devil - de alguma forma ouro e de alguma forma marrom, e
com aquele anel escuro ao redor deles, e completamente, totalmente
inquietante. — Irmãos repetiu ela. — Vocês são irmãos.
O homem bonito inclinou a cabeça. — Este é o Fera, — disse Devil .
Ela deu uma risadinha com o nome bobo. — Eu suponho que isso é para ser
irônico?
— Por quê?
165
Ela olhou por cima do ombro para Devil. — Ele é a pessoa mais linda que eu
já vi.
Os lábios de Devil se achataram com isso, e ela pensou ter ouvido um
pequeno grunhido de diversão do homem chamado Fera, mas quando ela voltou
sua atenção para ele, ele não se moveu. Ela pressionou. — Seus olhos são os
mesmos. Os
ossos das suas bochechas, suas mandíbulas. A curva dos seus lábios.
O grunhido parecia vir de Devil então. — Eu vou agradecer se você parar de
considerar a forma dos lábios dele.
Suas bochechas ficaram quentes. — Eu sinto muito. — Ela olhou para
Fera. — Isso foi muito rude de mim. Eu não deveria ter notado. Nenhum dos
irmãos parecia se importar com o pedido de desculpas, Devil já se afastando, sem
dúvida esperando que ela o seguisse. Ela supunha que ninguém iria participar de
cerimônia em um depósito de Covent Garden e fazer apresentações, então ela
decidiu fazer isso sozinha. Ela sorriu para o irmão de Devil. — Eu sou Felicity.
Aquela sobrancelha se levantou e ele olhou para a mão estendida, mas ele
não pegou.
Mesmo. Os irmãos foram criados por uma mãe loba? — Esta é a parte em
que você me diz seu nome verdadeiro; Eu sei que não é Fera.
— Não fale com ele — disse Devil, suas longas pernas já comendo o chão
enquanto ele atravessava o armazém.
— Mas você acredita que o nome dele é Devil? — A pergunta veio baixa e
grave, como se Fera estivesse fora de prática usando sua voz.
Ela balançou a cabeça. — Oh. Não, eu não acredito nisso. Mas você parece
mais razoável.
— Eu não sou, — ele respondeu.
Felicity provavelmente deveria ter ficado inquieta com a resposta, mas ao
invés disso, ela achou que ela gostava desse segundo irmão quieto. — Eu não
estava percebendo seus lábios, você sabe, — ela ofereceu. — É só que percebi
que o dele e o seu são os mesmos... — Ela parou quando ambas as sobrancelhas
dele se levantaram. Ela supôs que não deveria ter admitido isso também.
Ele grunhiu, e Felicity imaginou que isso deveria deixá-la à vontade.
Estranhamente, aconteceu. Juntos, eles seguiram Devil, que já havia
desaparecido nas sombras do armazém - esperançosamente longe o suficiente
para que ele não a tivesse ouvido. Enquanto caminhavam, ela procurou por um
166
tópico que pudesse deixar o homem anti-social mais disposto a conversar. —
Você está correndo gelo por um longo tempo, então?
Ele não respondeu.
— De onde vem isso? — Silêncio.
Ela procurou por outra coisa. — Vocês projetaram os vagões de transporte?
Eles são muito impressionantes.
Mais uma vez, silêncio.
— Eu devo dizer, Fera, você sabe como colocar uma mulher à vontade.
Se ela não estivesse prestando muita atenção a ele, ela poderia não ter
ouvido o pequeno grito em sua garganta. Uma risada de algum tipo. Mas ela fez,
e isso a fez se sentir triunfante. — Aha! Você é capaz de responder!
Ele não disse nada, mas eles alcançaram Devil até então. — Eu lhe disse para
não falar com ele.
— Você me deixou com ele!
— Isso não significa que você deveria falar com ele.
Ela olhou de um irmão para o outro e suspirou, depois acenou com a mão
para os homens espalhados pelo enorme quarto. — Estes são todos os seus
funcionários?
Devil assentiu. Fera grunhiu.
Felicity ouviu e olhou o irmão. — O que? O que isso significa?
— Não fale com ele, — disse Devil.
Ela não voltou atrás. — Acho que vou, muito obrigado. O que esse barulho
significa?
— Eles são seus empregados. — O olhar de Fera deslizou para longe dela.
Ela balançou a cabeça. — Isso não é tudo o que isso significa, é?
Fera encontrou seus olhos, e ela sabia que o que ele estava prestes a dizer
era importante. E verdade. — O tipo de empregados que andaria através do fogo
por ele.
As palavras caíram na escuridão, enchendo o armazém, alcançando os
cantos e aquecendo-os. Aquecendo ela. Ela se virou para Devil, que estava a
vários metros de distância, as mãos enfiadas nos bolsos da calça, um olhar de
irritação no rosto. Mas ele não estava olhando para ela. Ele não podia.
167
Ele estava envergonhado.
Ela assentiu, depois disse suavemente: — Eu acredito nisso.
E ela fez. Ela acreditava que este homem que se chamava Devil era o tipo de
homem que poderia gerar profunda, duradoura lealdade naqueles em torno dele.
Ela acreditava que ele era um homem com quem não se enganava, e também
um homem de palavra. E ela acreditava que ele era o tipo de homem que
mantinha sua parte no trato.
— Eu acredito nisso, — ela repetiu, querendo que ele olhasse para ela.
Quando ele fez, ela percebeu que seus olhos não eram os mesmos que os de seu
irmão. O olhar de Fera não fez seu coração bater. Ela engoliu em seco. — Então,
eles ajudam você a contrabandear carga?
A sobrancelha do Devil se franziu. — Eles nos ajudam a movimentar o gelo.
Ela balançou a cabeça. Ela não acreditou nem por um segundo que esses
dois homens, com o modo como eles transbordavam o perigo, eram meros
mercadores de gelo. — E onde você guarda esse suposto gelo?
Ele endireitou seus braços e cerrou suas mãos em seus bolsos, balançando
para trás em seus calcanhares e olhando para o teto. Quando ele respondeu,
suas palavras estavam cheias de frustração. — Nós temos uma área cheia lá
embaixo, Felicity.
Ela piscou. — Andar de baixo.
— Subterrâneo. — A palavra tocou proibida na sala mal iluminada, falada
baixo como pecado, como se ele fosse o Diabo, convidando-a não só para o
subterrâneo - mas tão subterrâneo que ela nunca poderia retornar.
Isso a fez querer experimentar tudo o que prometia. Isso a fez pedir por essa
experiência, sem hesitação. — Mostre-me.
Por um momento, ninguém se mexeu, e Felicity achou que ela havia
perguntado demais. Empurrou muito forte. Afinal, ela não era bem vinda
aqui; ela mexeu na fechadura para entrar.
Mas ela foi bem vinda aqui. Ele a deixou abrir a fechadura. Ele deu a ela rédea
livre do armazém, a deixou ficar entre seus homens e ver a operação e, por um
momento, ele a deixou sentir algo diferente de solidão. Ele deu a ela acesso ao
seu mundo de uma maneira que nenhum homem jamais tinha feito antes. E
agora, embriagada com o poder que veio com esse acesso, ela queria tudo. Cada
polegada.
Mais.
168
— Por favor — acrescentou ela no silêncio que se seguiu à demanda - como
se a polidez afetasse sua resposta.
E isso aconteceu. Porque Devil olhou para seu irmão, que não revelou
nenhum de seus próprios pensamentos quando ele passou um grande chaveiro
de metal para Devil. Uma vez que as chaves estavam na sua mão, Devil se virou,
mexendo em uma grande placa de aço no chão, — destravando-a e abrindo-a,
revelando um grande buraco negro no chão. Felicity se aproximou quando ele
pegou um casaco em um gancho próximo. — Você vai precisar disso, — disse
ele. — Vai ser frio.
Seus olhos se arregalaram quando ela entendeu. Isso estava acontecendo.
Ele ia mostrar a ela. Ela balançou a grande capa pesada em volta dos ombros, o
cheiro de flor de tabaco e zimbro a cercando, e ela resistiu ao desejo de enterrar
o nariz na lapela. O casaco era dele. Ela olhou para ele. — Você não vai estar com
frio?
— Não, — disse ele, pegando uma lanterna por perto e pulou no subsolo.
Ela chegou ao limite e olhou para ele, seu rosto sombreado pela luz
bruxuleante. — Outra coisa que você controla? O frio não te incomoda?
Ele levantou uma sobrancelha. — Meu poder é grandioso.
Ela se virou e desceu a escada embutida na lateral da escotilha, tentando
manter a calma, tentando não notar que seu mundo estava mudando a cada
passo. Que a antiga, simples e invisível Felicity estava sendo deixada para trás, e
em seu lugar estava uma nova, uma estranha mulher que fazia coisas como
desbloquear fechaduras com grampos, que abria portas em vez de fechá-las, e
visitar esconderijos de contrabandista, e usar casacos que cheiravam bem,
homens com cicatrizes que se chamavam Diabo.
Mas verdade quando isso era impossível não notar.
Havia algo a ser dito por estar ligado ao Devil.
Quando Felicity alcançou o chão de terra, falou aos degraus da escada. — Eu
não tenho certeza se você detém o poder que você pensa, sirrah.
— O que você quer dizer com isso? — Ele perguntou, sua voz quieta no
escuro.
Ela virou-se para encara-lo. — Você me fez uma promessa, e você ainda tem
que entregar.

169
— Como o que? — Ele se aproximou? Ou foi a escuridão brincando? — Pelo
que você disse, parece que seu duque foi vencido. Como você falou? Ele dança
como um sonho? O que mais você gostaria?
— Você não me prometeu um duque, — ela insistiu.
— Isso é precisamente o que eu prometi a você, — disse ele enquanto descia
vários degraus da escada e puxava a porta para mais perto do porão a frente
deles, jogando-os na escuridão.
Ela piscou. — É necessário nos calar?
— A porta permanece fechada o tempo todo. Ela impede o derretimento, e
a curiosidade de qualquer pessoa que possa estar interessada no que nós
fazemos dentro do armazém.
— Não, você me prometeu uma mariposa, — disse ela, sem saber de onde
vinha a bravura. Não se importando. — Você me prometeu asas e paixão.
Seus olhos brilhavam com sua atenção. — E?
— O duque não corre o risco de explodir em chamas, — ela respondeu. —
E eu pensei que seria justo eu informá-lo que se você não for cuidadoso, você
está em risco de encontrar-se em dívida comigo.
— Hmm, — ele disse, como se ela tivesse feito um importante ponto de
negócios. — E como você sugere que eu mude isso?
— É muito simples, — ela sussurrou. Ele estava mais perto. Ou talvez fosse
porque ela o queria mais perto. — Você deve me ensinar a atraí-lo.
— Atraí-lo.
Ela respirou fundo, seu calor ao redor dela, flor de tabaco e zimbro
drogando-a fortemente. Com vontade. — Precisamente. Eu gostaria que você me
ensinasse a fazê-lo me querer. Irracionalmente.

Capítulo Quinze

170
A ideia de que qualquer ser humano do sexo masculino não desejaria ter
Felicity Faircloth além da razão superava seu entendimento. Não que Devil
pretendesse dizer isso a ela.
Era importante notar, no entanto, que quando o pensamento caiu ao seu
redor no escuro subsolo do armazém dos Bastardos de Bareknuckle de Covent
Garden, Devil não contava com ele mesmo fazendo parte daquele grupo
particular de homens.
Obviamente, ele tinha muita razão quando se tratava de Felicity Faircloth.
Ele não estava perto disso. Nem mesmo quando ela estava a poucos centímetros
dele, vestindo o casaco dele, falando em homens e em chamas.
Ele era imune aos encantos da dama.
Lembre-se do plano.
As palavras ecoaram através dele enquanto suas mãos coçavam para tocá-
la, dedos flexionando, querendo nada mais do que chegar nas lapelas de seu
casaco e puxar ela para ele, perto o suficiente para tocar, até que ela não
conseguia se lembrar do nome do Duque de Marwick, muito menos a maneira
como o homem dançou.
Como um sonho, minha bunda.
Ele limpou a garganta com o pensamento.
— Você quer uma partida de amor. Com Marwick. — Ele zombou. — Você é
muito velha e sábia demais para ser sincera, Felicity Faircloth.
Ela balançou a cabeça. — Eu não falei nada sobre uma partida de amor; Eu
quero que ele me queira. Eu quero paixão.
Deve ser ilegal para uma mulher como Felicity Faircloth dizer a palavra
paixão. Ele conjurou imagens de grandes extensões de pele e belas madeixas de
mogno em lençóis brancos. Isso fazia um homem se perguntar como ela iria
arquear as costas com o seu toque, como ela poderia pedir por isso. Como ela
poderia guiar isso. Como a mão dela se sentiria na dele, movendo os dedos para
o local exato que ela queria. Como os dedos dela se sentiriam contra o couro
cabeludo dele enquanto ela movia a boca para o local exato que ela queria.
Graças a Deus eles estavam a quinze metros em um porão cheio de gelo.
De fato... — Por aqui. — Ele levantou a lanterna e seguiu para baixo mais
rápido, pelo longo e escuro corredor, em direção onde estava porão de gelo,

171
esquecendo-se, pela primeira vez, que ele não se importava com o escuro. Grato
pela distração, ele falou enquanto andavam. — Você deseja paixão.
Lembre-se do plano.
— Eu quero isso.
— De Marwick.
— Ele é meu futuro marido, não é?
— É apenas uma questão de tempo, — disse ele, sabendo que deveria estar
mais comprometido com o esforço, considerando que Ewan e Felicity tinham que
estar compromissados antes que Devil pudesse roubá-la do noivo. O noivado
fazia parte do plano. Uma parte da lição de Ewan. Claro que Devil queria isso.
— Ele me perguntou ontem à noite.
Ele simplesmente não queria tão rápido, parecia. Ele se virou para ela. — Ele
pediu para você fazer o que?
Seu cabelo brilhava cobre na luz de velas quando ela sorriu para ele. —
Casar com ele. Foi realmente muito simples. Ele se apresentou,
me disse que estava feliz em se casar comigo. Que ele estava no mercado por
uma esposa e eu tinha... como
que ele colocou isso? Oh, ele foi terrivelmente romântico. — Os dentes de Devil
se apertaram enquanto ela procurava as palavras e, em seguida, achou-as, seca
como areia. — Oh sim. Eu tinha aparecido na hora certa.
Bom Deus. Ewan nunca fora um brilhante escritor, mas isso era
particularmente ruim. E prova de que o duque também tinha um plano. O que
significava que talvez o pedido de Felicity Faircloth não fosse uma ideia tão
terrível, afinal. — Terrivelmente romântico, de fato, — ele disse.
Ela encolheu os ombros. — Mas ele é muito bonito e dança como um sonho,
como eu disse.
Não parecia possível que ela estivesse brincando com ele. Como ela poderia
saber como as palavras iriam tocá-lo? — E isso é uma coisa que todas as
mulheres procuram em seus maridos.
Ela sorriu. — No entanto, você sabia?
Ela estava brincando com ele. Ela estava brincando com ele e ele gostou. E
ele não deveria. — Você quer o homem louco por você.
— Bem, continuo não convencida de que ele não é louco em geral, mas sim,
— disse ela. — Toda esposa não quer isso do marido?
172
— Não, não na minha experiência.
— Você tem muita experiência com esposas?
Ele ignorou a pergunta. — Você não sabe o que está pedindo, — disse ele,
voltando-se para o corredor.
Ela o seguiu. — O que isso significa?
— Só que a paixão não é uma coisa que se brinca - uma vez que as asas são
queimadas, a mariposa é sua para lidar com isso.
— Como a traça será meu marido, imagino que terei de lidar com ele de
qualquer maneira.
Mas ele não será seu marido. Devil resistiu ao impulso de dizê-lo. Resistiu
também à emoção que o atormentava enquanto pensava nas palavras. A culpa
— Você me prometeu, Devil — ela disse suavemente. — Você me fez um
acordo. Você disse que me faria chama.
Ele não tinha que fazer nada para transformá-la em chama. Ela já ardia muito
forte.
Eles alcançaram a porta exterior do porão, e ele se agachou, colocando a
lanterna no chão enquanto pegava o anel de chaves. Ela chegou ao lado dele,
estendendo a mão para a fileira de fechaduras, seus dedos traçando uma delas
como se ela pudesse destravá-la somente pelo toque. E com o jeito que ela lidou
com o Chubb mais cedo, ele meio que acreditava que ela podia.
O frio atravessou a porta de aço e ele encolheu os ombros, colocando a
chave na primeira fechadura. — Por que você mexe em fechaduras?
— Isso é relevante?
Ele lançou-lhe um olhar de lado. — Tenho certeza que você pode ver como
seria interessante.
Ela observou enquanto ele trabalhava na segunda fechadura. — O mundo
está cheio de portas. — O Senhor sabia que isso era verdade. — Eu gosto de
poder abrir minhas próprias portas.
— E o que você sabe de portas trancadas, Felicity Faircloth?
— Eu gostaria que você parasse de fazer isso, — disse ela. — Tratar-me
como se nunca quisesse nada em minha vida. Como se tudo tivesse sido meu
para a tomada.
— Não tem sido?
173
— Não, nenhuma das partes importantes. Não o amor. Não... a amizade.
Apenas a família e muito mal.
— Você está melhor sem esses amigos.
— Você está se oferecendo para ser um novo?
Sim.
— Não.
Ela bufou uma risadinha, pegando um dos cadeados da porta enquanto
continuava seu trabalho. Com o canto do olho, ele podia vê-la virando-a
repetidamente em sua mão. — Eu mexo nas fechaduras porque eu posso. Porque
há pouquíssimas coisas no mundo que eu posso controlar, e fechaduras
bloqueadas são algo em que eu sou boa. Elas são uma barreira que eu posso
ultrapassar. E um segredo que eu posso saber. E no final, elas se dobram à minha
vontade e... — Ela encolheu os ombros. — Eu gosto disso.
Ele podia imaginar se curvando para sua vontade. Ele não deveria imaginar
isso. Mas ele podia. Ele abriu a primeira porta pesada, o ar frio passando sobre
eles quando a segunda porta apareceu. Ele começou a trabalhar na próxima fila
de cadeados. — Não é o tipo de habilidade que se espera de uma mulher.
— É exatamente o tipo de habilidade que devemos ter. Todo o nosso
mundo é construído por homens. Para eles. E nós estamos aqui simplesmente
para decoração, vindas no final de tudo que é importante. Bem, eu me canso dos
fins. Bloqueios são começos.
Ele se virou para olhá-la, consumido pelo desejo de lhe dar um começo
infinito.
Ela continuou falando, aparentemente hipnotizada por suas chaves
enquanto ele trabalhava. — O ponto é, eu entendo o que é querer estar do outro
lado da porta. Eu entendo o que é saber que o quarto não é meu para a tomada.
Tantas portas estão fechadas para todos, menos uma fração de nós. — Ele abriu
a última fechadura, e ela terminou, suavemente, — Por que outros deveriam
decidir quais portas são para mim?
A pergunta, tão honesta, tão direta, fez com que ele quisesse quebrar todas
as portas, de onde veio e a partir de agora até o fim do tempo.
Devil sentou-se na frente deles, abrindo a porta para revelar o porão de gelo.
Uma parede de frio os saudou e, além disso, a escuridão. O desconforto trovejou
através dele - resistência à escuridão, um desejo muito familiar para fugir.

174
Felicity Faircloth não tinha esse desejo. Ela entrou no quarto, envolvendo os
braços em volta dela. — Então, é gelo.
Ele a seguiu, segurando a lanterna alta, mesmo quando o espaço cavernoso
engoliu a luz. — Você ainda não acreditou em mim?
— Não inteiramente.
— E o que você acha que eu estava planejando mostrar aqui?
— Seu misterioso covil subterrâneo?
— Covas subterrâneas são altamente supervalorizadas.
— Elas são?
— Sem janelas, e eles são o inferno nas botas.
Sua pequena risada foi um lampejo na escuridão. — Eu espero que eu tenha
algumas explicações para dar amanhã, quando minha empregada ver a barra das
minhas saias.
— O que você vai dizer a ela? — Ele perguntou.
— Oh, eu ainda não sei. — Ela suspirou. — Jardinagem tarde da noite? Não
importa. Ninguém espera que eu faça algo como explorar porões subterrâneos
de Covent Garden.
— Por que não?
Ela fez uma pausa e ele teria dado qualquer coisa para ver seu rosto, mas ela
estava muito ocupada olhando para a escuridão. — Porque eu sou comum, —
disse ela simplesmente, distraída. — Terrivelmente isso.
— Felicity Faircloth, — disse ele, — nos poucos dias em que te conheço,
aprendi uma verdade incontestável. Você não é comum.
Ela se voltou para ele naquele momento, rápida e inesperada, e na luz da
lanterna ele descobriu suas bochechas rosadas pelo frio, o que a fez parecer um
pouco... buscando.
Whit iria comê-lo no jantar se ele soubesse que Devil tinha mesmo pensado
na palavra buscando. Foi uma palavra ridícula. O tipo de palavra usada por
janotas e dândis. Não por bastardos que carregavam espadas escondidas em
bengalas. E ela não estava buscando. Ela era um meio para um fim. Uma antiga,
invisível solteirona que significava, em sua órbita para um único propósito - o fim
de seu irmão.

175
E mesmo que ela não fosse todas essas coisas, ela absolutamente não seria
para ele. Felicity Faircloth era a filha de um Marquês, a irmã de um Conde, e até
agora, acima de sua posição, ela deveria ter um clima diferente. Sua pele de
porcelana era perfeita demais, suas mãos muito limpas e seu mundo grandioso
demais. Seu deleite de olhos arregalados em seu armazém de Covent Garden e
seu orgulho de abrir a fechadura de sua vida criminosa só provaram o ponto.
Lady Felicity Nunca iria saberia o que era ser comum.
Isso, sozinho, deveria ter sido suficiente.
Exceto que ela sorriu antes que ele pudesse parar este jogo louco, e a luz da
vela pregou peças, porque ela passou de atraente a linda. E isso foi antes de ela
dizer, sem fôlego: — Não sou comum; Acho que essa pode ser a coisa mais legal
que alguém já me disse.
Cristo.
Ele tinha que tirá-la de lá. — Bem, agora você viu o porão.
— Não, eu não vi.
— Isso é tudo o que há para ver.
— Está escuro, — ela respondeu, pegando a lanterna. — Posso?
Abandonou-o com relutância, um fio de inquietação que o envolveu com a
ideia de que ele não estava mais no controle da luz. Ele respirou fundo quando
ela se afastou dele e se moveu mais profundo para o porão para descobrir as
pilhas de gelo dentro.
A carga do navio havia sido movida cuidadosamente, através de um longo
caminho reto, removendo blocos de gelo, revelando o centro do porão, que há
apenas algumas horas estava cheio de barris e caixotes e barris e caixas agora a
caminho de uma infinidade de locais. Grã-Bretanha.
Maldição se Felicity Faircloth não se dirigiu diretamente para esse caminho,
como se estivesse participando de uma festa de chá no centro de um
labirinto. Ela falou de volta: — Eu me pergunto: o que vou encontrar dentro do
gelo?
Ele a seguiu.
Não. Ele seguiu a luz. Não a garota.
Ele não se importava com o que acontecia com a garota. Deixe-a explorar o
que ela quisesse. Deixe-a ficar gelada por como ela permaneceu aqui dentro. —

176
Mais gelo, — disse ele, enquanto ela encontrava o centro do espaço, junto com
seu solo frio e lamacento.
— Eu não tenho tanta certeza. — A luz desapareceu quando ela virou a
esquina e desapareceu, a escuridão rastejando sobre ele pela parte traseira. Ele
tomou uma profunda respiração, mantendo o seu olhar sobre a nebulosa
sombra de
sua cabeça e ombros acima do gelo... até que também desapareceu, deixando
sair fora da vista. Ela sem dúvida escorregou na lama molhada do porão - um
perigo de se trabalhar com gelo.
— Tenha cuidado — alertou ele, ganhando velocidade, virando-se no centro
vazio da sala para descobri-la agachada, segurando a lanterna na frente dela com
toda a habilidade de um marinheiro do Tâmisa, à procura de tesouros.
Ela olhou para ele. — Não há nada aqui.
Ele exalou. — Não.
— Nada além de vestígios do que estava aqui antes, — disse ela com um
sorriso irônico. Ela apontou. — Uma caixa pesada, lá. — Mudou de direção. — E
lá, um barril de algum tipo.
Suas sobrancelhas se levantaram. — Bow Street está perdendo seus instintos
investigativos astutos.
O sorriso se tornou um sorriso. — Talvez eu pare por aí a caminho de casa. O
que seria isso?
— Gelo.
— Hmm, — ela disse, — acho que era é algo alcoólico. E eu lhe direi o que
mais...
Ele cruzou os braços sobre o peito e respondeu secamente: — Eu gostaria
que você fizesse.
Ela apontou um dedo para ele triunfante. — Eu estou supondo que foi algo
que veio para o país sem impostos. — Ela estava tão orgulhosa de si mesma que
ele quase disse a ela que tinha sido bourbon americano. Ele quase fez muitas
coisas.
Ele quase a colocou de pé e beijou o trabalho de detetive de seus lábios.
Quase.
Em vez disso, ele esfregou as mãos e soprou nelas. — Excelentes deduções,
minha senhora. Mas está congelando aqui, então vamos voltar para que você
177
possa realizar a prisão de um cidadão por suas acusações - para
as quais você não tem um pingo de prova?
— Você deveria ter usado um casaco. — Ela acenou para ele e voltou para a
parede de blocos de gelo. — O que você faz com o gelo agora?
— Nós enviamos para toda Londres. Casas, açougueiro, lojas de doces e
restaurantes. E você está vestindo meu casaco.
— Isso é muito gentil da sua parte, — ela respondeu. — Você não tem um
colete?
— Nós geramos lucro no gelo, ou não vamos lidar com isso, — disse ele. —
Eu normalmente não me visto para o trabalho manual.
— Eu notei, — disse ela, e Devil chamou a atenção em suas palavras baixas
e suaves.
— Você percebeu.
— Foi praticamente indecente, — disse ela, com a voz mais alta,
defensiva. — Eu não tenho certeza de como eu não iria perceber.
Ele se aproximou dela, incapaz de se conter, e ela recuou, afastando-se dele,
contra o gelo. Estendendo a mão, ela colocou a mão na parede fabricada,
removendo-a instantaneamente quando o frio registrou.
— Tenha cuidado, — disse ele.
— Você está preocupado que eu vou congelar?
Ele disse a verdade. — Estou preocupado que você derreta isso.
Ela levantou uma sobrancelha para ele. — Você esquece que eu ainda não
aprendi a ser uma chama.
Para a vida dele, ele nunca saberia porque ele não parou nisso. Por que ele
não pegou a lanterna e a levou embora. — Você e seu desejo de incinerar a todos
nós, Felicity Faircloth; você é terrivelmente perigosa.
— Não para você, — ela disse suavemente enquanto ele se aproximava, as
palavras quietas como uma chamada de sirene. — Você nunca vai chegar perto
o suficiente para queimar.
Ele já estava perto o suficiente. — É melhor você colocar os olhos em outro,
então.
Não. Coloque-os em mim.

178
Nós podemos queimar juntos.
Ele estava perto o suficiente para tocá-la. — Então você vai me ensinar?
Qualquer coisa. Qualquer coisa que ela pedisse.
— Você vai me mostrar como fazer os homens me adorarem. — Deus, era
tentador. Ela era tentadora.
Se Ewan adorar ela, ela vai feri-lo mais quando você tomar seu longe.
Se ele estiver apaixonado, você vai puni-lo mais.
Mas isso não foi tudo. Agora, havia Felicity. E se ela se permitisse ficar
apaixonadamente sobre Ewan, ela não seria apenas arruinada pela dissolução de
seu namoro, ela seria devastada por isso.
Ela seria uma vítima desta guerra, de décadas, em que ela não tinha nada a
ver com isso. Ela ficaria ferida na balança; esse nunca foi o plano.
Besteira. Esse sempre foi o plano.
O plano era mostrar a Ewan que Devil sempre seria capaz de puxar as cordas.
Que Ewan vivia da benevolência de seus irmãos bastardos e nada mais. Que eles
poderiam acabar com qualquer casamento, que ele pensasse em começar. Que
eles pudessem acabar com ele.
Ensinar Felicity Faircloth sobre paixão seria a maneira mais fácil para Devil
colocar seu plano em prática. Ele podia conquistar a moça mesmo quando ela
cortejava o duque, e então, quando pensassem que se casariam, a seduziria e
enviava sua mensagem clara - sem herdeiros. Sem casamento. Sem livre arbítrio.
Nunca para você.
Esse foi o acordo que eles fizeram, não foi? A promessa que os irmãos tinha
jurado no escuro da noite quando seu pai monstruoso havia manipulado e
punido, nenhuma vez pensando neles como nada mais do que candidatos para
ser o próximo em uma longa linha de Marwicks.
Os três garotos juraram nunca dar ao pai o que ele pediu.
Mas Ewan tinha ganhado o concurso. E depois de ter levado o título, a casa,
a fortuna, o mundo que seu pai tinha oferecido... Ele tomou a frente e tentou
ainda mais. Um herdeiro de um ducado que nunca deveria ter sido dele para
começar.
Um filho ilegítimo, uma vez disposto a matar por legitimidade, agora vem
em outro caminho. Um que ele prometeu que nunca iria viajar.

179
E Devil lhe ensinaria uma lição.
O que significava que Felicity teria que aprender também.
Ele ergueu a lanterna de suas mãos e colocou-a no bloco ao lado dela, a luz
cintilando sobre o gelo nublado, deixando-a com um estranho brilho cinza-
esverdeado. Ele podia ver o pulso batendo em seu pescoço quando ele fez isso,
ele estava tão próximo dela.
Ou talvez ele não pudesse. Talvez ele fosse o único que queria seu pulso
acelerado. Talvez tenha sido o pulso dele que ele sentiu.
Ele encontrou o olhar dela, ansioso e bonito, e se inclinou para ela.
— Tem certeza de que deseja que esta porta se abra, Lady desbloqueadora
de fechaduras? — disse ele, odiando-se pelas palavras. Sabendo que, se ela
concordasse, estaria arruinada. Ele não teria escolha senão arruiná-la.
Ela não sabia disso, no entanto. Ou, se ela soubesse, ela não se importou.
Seus olhos brilhavam, a luz de velas tremeluzindo em profundidades marrons
escuras. — Muita certeza.
Nenhum homem na terra poderia resistir a ela. E então ele não tentou.
Ele estendeu a mão para ela, sua mão chegando a sua bochecha, os dedos
roçando a pele incrivelmente macia de sua mandíbula, traçando os ossos em sua
testa, enfiando-se lá, pegando os grossos cachos de mogno, presos por grampos
de cabelo, dobrados em ferramentas, prendendo ele a ela. Seus lábios se abriram
com o toque, uma entrada suave e impressionante de ar revelando sua excitação.
O desejo dela.
Revelando o dele.
Com a mão livre, ele tocou o outro lado do rosto dela, explorando-o. Revela-
se na seda de sua pele, na maneira em que suas bochechas se erguem e esvaziam,
no pequeno vinco no canto de sua boca, onde uma covinha brilha quando ela o
provoca. Ele inclinou-se para ela, completamente, loucamente com a intenção de
colocar os lábios naquele vinco. Para provar isso.
— O lustre de Blindman, — ela sussurrou. — Suas mãos... É como o jogo.
Um jogo de criança. Um capricho da casa de campo. Um jogador com os
olhos vendados, tentando para identificar o outro pelo toque. Como se Devil
não conhecesse Felicity Faircloth pelo toque pelo resto do tempo. — Feche os
olhos, — disse ele.
Ela balançou a cabeça. — Não é assim que o jogo é jogado.
180
— Eu não estou jogando um jogo.
Seu olhar encontrou o dele. — Você não está?
Não naquele momento. — Feche os olhos, — ele repetiu.
Ela fez, e ele se aproximou, inclinando-se, colocando os lábios no ouvido
dela. — Você me diz o que sente.
Ele podia ouvir o modo como ele a impactou - a respiração que pegou em
seu peito, estremeceu através da longa coluna de sua garganta enquanto ela
exalava, magro e esganiçada, como se fosse difícil para ela respirar.
Devil entendeu o sentimento, ainda mais assim quando uma de suas mãos
subiu para pairar acima do ombro - provocando-o sem tocá-lo. Ele falou
novamente, deixando a respiração dele abanar o arco alto da bochecha dela,
onde ele queria beijar. — Felicity, a mais bela de todas... — Ele sussurrou. — O
que você sente?
— Eu... — ela começou, e então, — eu não sinto frio.
Não, ele não imaginou que ela sentisse. — O que você sente? — Ele
perguntou novamente.
— Eu sinto... — Sua mão acendeu em seu ombro, o peso desse toque como
fogo. Ele mordeu de volta um gemido. Homens crescidos não gemeram ao terem
ama mão roçando contra o ombro.
Nem mesmo se fosse uma chama, quente e impossível no quarto gelado. —
O que você sente?
— Eu acho que deve ser...
Diga, ele desejou, as palavras uma oração a um Deus que tinha
abandonado ele décadas atrás, como se ele tivesse sido
abençoado para começar. Diga, de modo que eu possa dar isso tudo para você.
Era possível que ele dissesse as palavras em voz alta, porque ela respondeu
a elas, seus lindos olhos castanhos, negros na escuridão, encontrando os dedos
dele apertados em seu ombro, sua mão livre vindo para descansar em seu peito
enquanto ela sussurrava, cheia de surpresa e de alguma forma certeza, — Desejo.
— Sim, — disse ele, inclinando-se perto, apertando mais e puxando-a para
ele, de alguma forma encontrando a força para manter o beijo dela. — Eu
também sinto.

181
Seus olhos se fecharam, os longo e escuros cílios numa linha de fuligem
contra sua pele, luminosa e gelada por um momento antes de se abrirem
novamente, e encontrarem os seus. — Liberte-me, — ela sussurrou.
As palavras eram estranhas e perfeita, e irresistível, e Devil fez como ela
ordenou, os dedos deslizando em seu cabelo, seu polegar acariciando sua
bochecha, tomando-lhe os lábios, uma vez, duas vezes, gentilmente, saboreando
o gosto dela - suave e incrivelmente doce.
Ele levantou a cabeça, deixando um espaço minúsculo entre eles, o suficiente
para ela abrir os olhos. Seus dedos se enrolaram no tecido de sua camisa,
puxando-o para trazê-lo de volta. — Devil?
Ele balançou a cabeça, incapaz de se conter. — Quando eu era menino, —
ele sussurrou, inclinando-se para outro gosto, um pouco mais, uma lambida
prolongada, — Eu roubei a feira do dia de maio em Hyde Park. — Outro beijo,
este mais longo, terminando em seu suspiro, bonito como pecado. Ele pressionou
um beijo em sua bochecha, outro no canto de seus lábios, onde estava aquela
covinha, deixando sua língua permanecer no espaço até que ela se virou para ele.
Ele puxou de volta, de repente querendo ela para ouvir a história. — Havia uma
barraca cheia de pedaços de açúcar, brancos e fofos como nuvens - eu nunca vi
nada parecido com eles.
Ela estava olhando para ele, e ele se inclinou para beijá-la gentilmente,
incapaz de evitar lamber o lábio inferior, amando o jeito que ficava frouxo com
o toque, o jeito que ela se abria para ele. — As crianças clamavam por essas
delícias, — ele sussurrou, — e os pais, perdidos nas festividades, eram mais
generosos do que o normal.
Ela sorriu. — E alguém comprou um para você?
— Ninguém nunca comprou nada para mim.
Seu sorriso caiu.
— Eu assisti quando dezenas de outros receberam o seu deleite, e eu os
odiei por saber o gosto daquelas nuvens brancas. — Ele fez uma pausa. — Eu
quase roubei um.
— Por pouco?
Ele havia sido levado pelos guardas do parque antes de poder. — Durante
anos, eu disse a mim mesmo que a ideia de como era o doce, era muito melhor
do que a que eu poderia ter provado.
Ela assentiu. — Diga-me a ideia disso.
182
— Não poderia provar perto do que eu imaginava que fosse, entende? Não
poderia ser tão doce, tão pecaminoso ou tão delicioso. — Ele se aproximou dela,
suas palavras mal respiravam por seus lábios. — Mas você — Ele deixou seus
lábios deslizarem sobre os dela, um toque sedoso. — Você, Felicity Faircloth, só
pode ser todas essas coisas. — Outro deslizado, o pequeno gemido que escapou
dela fazendo-o querer fazer coisas perversas e maravilhosas. — Você só pode ser
mais.
Seus dedos se apertaram, ameaçando rasgar o linho de sua camisa. — Devil.
— Eu vou roubar você, em vez disso, — ele disse então, sabendo que ela
ouviria as palavras como parte da história e não como ela deveria - como a
verdade. — Eu vou roubar você, — ele confessou novamente. — Eu vou roubar
você e torná-la minha.
— Não é roubo se eu permitir, — ela sussurrou.
Menina boba; claro que era. Mas isso não o impediria.

Capítulo Dezesseis

Ela era tão doce, inebriante, exuberante e suave como aquele algodão doce
de todos aqueles anos atrás. Ela era pecado e sexo, liberdade e prazer, algo mais
e algo pior, e ele estava perdido na sensação de seus lábios e no gosto dela
quando ela se abriu para ele como se estivesse esperando sua vida inteira por ele.
Felicity Faircloth era a perfeição - o primeiro gosto que Devil já tivera.
Ela provou ser como uma promessa.
Ela suspirou e ele gemeu, puxando-a mais apertado para ele, seus dedos
emaranhando em seu cabelo enquanto o dela veio para a barba áspera de sua
bochecha, as unhas raspando através dele até que ela estava puxando a cabeça
para ela, como se tivesse esperando toda a sua vida por este beijo, e ela queria
que valesse a pena.
Maldição, ele queria fazer valer a pena.
183
Ele passou um braço ao redor dela, puxando-a com força contra ele
tão rapidamente, tão completamente, que ela engasgou. Ele soltou os lábios e
disse: — Eu queria segurá-la assim mais cedo, quando estávamos observando a
movimentação da carga, — disse ele.
Cristo, por que ele estava dizendo isso a ela?
Ela subiu na ponta dos pés e pressionou a testa na dele. — Eu queria que
você me segurasse assim, — ela sussurrou.
Como ele poderia resistir a isso?
Ele retornou aos lábios dela, brincando sobre eles gentilmente, suavemente,
provocando-a com a língua até que ela suspirou, abrindo-se para deixá-lo entrar,
todo doce, sedoso calor e exuberante promessa. E então Felicity Faircloth,
solteirona, invisível, beijou-o de volta, encontrando sua língua, combinando com
ele, como um anjo caído.
Como uma maldita deusa.
E ele se divertiu com isso, em seu prazer, em seus suspiros e gemidos e o
tremor que passou por ela quando ele abriu seu casaco, não, o casaco dele
e colocou suas mãos nela. Ela quebrou o beijo em um suspiro. — Devil.
— Você está com frio?
Caramba, é claro que ela estava com frio. Eles estavam cercados de gelo. —
Não. — Ela ofegou a resposta, as mãos segurando a camisa em um punho e
puxando-o mais próximo. — Não, eu estou em chamas.
Seu aperto quase o desfez - ela era magnífica, uma rainha na escuridão. Ele
empurrou as lapelas de seu casaco para o lado, resistindo a sua atração para
observar suas mãos sobre ela, naquele bonito vestido branco e rosa que não
pertencia a nenhum lugar perto daquele lugar que era muito escuro e muito sujo
e muito pecaminoso para ela. Felicity não pertencia a este lugar, mas isso não o
impediu de tocá-la.
— Você está em chamas, — disse ele, olhando o movimento de suas mãos,
subindo pelas laterais do corpete até o decote, onde a seda deu lugar a uma pele
incrivelmente macia. Ele a tocou ali, onde a respiração veio forte e rápida,
revelando seu prazer. — Você não precisa de aulas de fogo. Você é um inferno.
Ela assentiu. — Eu sinto.
Ele quase sorriu. — Bom.

184
— Será que você — Ela parou, e, em seguida, — Você me beijaria outra
vez?
Sim. Cristo. Sim. — Onde?
Seus olhos se arregalaram. — Onde?
— Devo te mostrar onde você pode gostar?
Seus lábios se curvaram em um sorriso magnífico. — Sim por favor.
Longe dele negar uma dama. Retornando as mãos à sua cintura, ele a puxou
para mais perto, colocando os lábios em sua mandíbula, deixando a língua
deslizar ao longo da linha dela. — Aqui, talvez?
— Oh, sim. — Ela suspirou. — Isso é muito bom.
— Hmm, — ele disse. — Acho que podemos fazer melhor do que muito
bom. — Ele correu os dentes pela longa coluna de seu pescoço. — E aqui? —
Seus dedos deslizaram por cima de seu cabelo firmemente tosado, as unhas
arranhando seu couro cabeludo, enviando arrepios de prazer através dele
enquanto ele chupava o local onde o pescoço dela encontrava seu ombro,
sabendo que ele deveria ter cuidado. Sabendo que ele não poderia marcá-la.
Querendo desesperadamente marcá-la. Ela choramingou e ele levantou a cabeça.
— O que isso significa?
Ela deslizou seu olhar para o seu, e o olhar em seus olhos quase o pôs de
joelhos ali no porão. — Isso é muito agradável.
A mulher estava brincando com ele. E era delicioso. Ele estava duro como
aço, e ele afrouxou seu aperto, agarrando sua cintura e levantando-a para sentar
no gelo atrás dela. Quando ela guinchou sua surpresa, ele deslizou entre suas
pernas, suas saias pesadas tornando impossível chegar muito perto, o que
provavelmente era melhor.
Definitivamente melhor.
E também o pior.
— Isto não é... — Ela cortou suas próprias palavras sem fôlego.
Ele a alcançou novamente. — Não é o tipo de coisa que as mulheres fazem.
Ela balançou a cabeça, mordeu o lábio inferior. — Não, mas eu acho que não
me importo.
Ele riu, em seguida, um curto e indesejado latido de risada.

185
— É delicioso. Me mostre outro lugar. — E sua risada se dissolveu em um
gemido.
Ele a puxou para mais perto com uma mão, colocando a outra no tornozelo
macio e nu sob as saias. — Você não está usando meias, — ele sussurrou em seu
ouvido.
— É junho, — disse ela.
— E em junho as senhoras são capazes de dispensar meias?
Ela baixou a cabeça e ele adorou o embaraço dela. — Eu não esperava que
ninguém visse.
— Eu não posso ver, — ele sussurrou, deixando sua frustração preencher as
palavras, amando a risada que ele convocado com as palavras.
— Eu certamente não esperava que ninguém tocasse.
— Mmm, — ele respondeu, deixando sua mão subir mais alto. — Esse é o
problema em ser chama, Felicity... traças querem tocar.
— Mostre-me, — ela sussurrou.
Deus o ajude, ele fez, pegando seus lábios e deixando a mão subir mais alto,
empurrando as saias para cima, sobre o joelho, revelando uma longa e macia
extensão de perna. Ele pegou a coxa dela na mão, levantando a perna dela,
pressionando mais perto, e amaldiçoou por ela não chegasse à beira do bloco de
gelo para encontrá-lo. Ele pressionou uma linha de beijos no ombro dela e
desceu a encosta de um dos seios até o decote de seu vestido. — Aqui? — Ele
sussurrou, brincando no lugar onde o seio dela subia do tecido branco rendado.
Ele levantou a mão, puxou o corpete, mostrando mais pele, o suficiente para
revelar a borda superior de um mamilo. — Aqui?
Ele lambeu a pele macia, amando o jeito que se enrugava sob o toque
dele. Ela assobiou com a sensação e ele se afastou dela. — Está com frio?
Ela balançou a cabeça. — Não. Não. Não. Não. — Seus dedos apertaram sua
cabeça e ela se levantou em direção a ele, fechando a distância entre eles. — De
novo, por favor.
Qualquer coisa que ela queira. Tudo.
Ele gemeu e puxou a linha do vestido para baixo, revelando seu mamilo para
seus lábios e língua, raspando-o com os dentes enquanto ele empurrava seu
comprimento duro contra ela, suas calças de repente muito apertadas. Ela gritou

186
quando ele chupou, leve e depois mais duro quando ela sussurrou seu nome na
escuridão. — Devil.
Devon, sua mente sussurrou, e ele afastou o pensamento, recusando-se a
permitir a compra. Ninguém o chamava pelo nome dele. Certamente nenhuma
mulher. E ele não queria deixar que Felicity Faircloth fosse a primeira.
Mas ele deixava que ela fizesse outras coisas - ele a deixava tocá-lo, deixava-
a direcionar sua boca para onde ela queria, deixava-a pressionar mais perto do
comprimento longo e latejante dele, mesmo quando ela não sabia como era
tentador. O que ela estava solicitando. — Eu quero...
— Eu sei, — ele respondeu, balançando contra ela, deixando-a sentir o
prazer que ele poderia dar a ela. Ela rapidamente pegou o jeito, e Devil deixou
ela usá-lo. Ele rosnou e chupou mais fundo, amando o choro que soltou contra
seu cabelo enquanto ele a trabalhava com língua e lábios. Como ela mesma
trabalhou nele. Ela era fogo.
E ele estava em chamas.
Tudo o que ele queria era deitá-la de volta nesse pedaço de gelo e adorá-la
com suas mãos, boca e pau até que ela aprendesse as mil maneiras que ele
poderia lhe trazer prazer. Ela iria deixá-lo fazer. Ela estava perdida pelo prazer,
balançando contra ele, implorando por isso. — Por favor. — Ela suspirou.
Não essa noite.
Ele parou, levantando os lábios do seio dela, mantendo o movimento da
mão na coxa dela, onde brincava na costura de suas roupas de baixo.
Ainda não. Banhos não foram postados.
O sussurro veio de dentro, do lugar que havia planejado vingança contra seu
irmão. Do lugar que odiava seu irmão por vinte anos. Do lugar que odiara seu
pai por muito mais tempo.
O ódio não teve lugar com Felicity Faircloth.
Teria. Haveria um tempo em que ela o odiaria.
Uma forte batida na porta de aço da sala pontuou o pensamento, e ambos
se viraram para ela. Não estava trancada, mas Whit e Nik sabiam melhor do que
ninguém que não poderiam entrar sem permissão. Eles também saberiam melhor
para bater em primeiro lugar, a menos que algo desse errado.

187
Ele se afastou abruptamente, seus dedos soltando a cabeça enquanto ele
abaixava as saias, deixando-as cair sobre as pernas e recuando - colocando
espaço entre eles enquanto a respiração pesada ecoava pelo espaço cavernoso.
Ela estendeu a mão para ele, como uma deusa.
Ele balançou a cabeça, de alguma forma encontrando força para recusá-la.
— Não, — ele sussurrou. — Não mais esta noite, Lady chama.
— Mas... — Ele ouviu a frustração na palavra - a mesma frustração que
rastejou através dele. Ela o queria. Ela queria tudo isso. Mas Felicity Faircloth não
sabia como pedir, graças a Deus, e então ela decidiu: — Por favor.
Cristo, ele queria dar a ela.
Não essa noite. Era cedo demais.
Ele não deveria dar a ela nunca.
Uma batida de novo. Urgente e não querendo ser ignorada.
Ele endireitou o corpete e apertou o casaco ao redor dela quando ela
estremeceu, o frio finalmente a encontrou. — Venha, — disse ele, e ela fez,
seguindo-o de volta através do gelo para a porta de aço.
Atrás disso, Nik.
— É a segunda de Londres. Novamente.
Devil amaldiçoou. — Tem sido o que, uma hora?
— Tempo suficiente para limpar o viveiro, — disse ela. — Eles estavam
esperando por nós. Parou pouco antes de cruzar Long Acre. Dirigido
para Mayfair.
Eles já estavam atravessando a porta de aço, deixando-a bater atrás deles,
enquanto seguiam pelo longo e escuro corredor até a escotilha que os levava ao
depósito.
— O que aconteceu? — Felicity perguntou em seu cotovelo. — É a coroa?
Ele olhou para ela, meio grato por ela saber a verdade e meio irritado por
ela saber a verdade. — O que a Coroa quereria com gelo? — Então, sem hesitar,
ele olhou de volta para Nik. — Os meninos?
— Dinuka retornou. — Um dos batedores. — Ele atirou neles. Pensa que ele
acertou um. Niall e Hamish estão baleados.

188
— Maldição, nós mudamos a rota. — Foi o terceiro sequestro da mesma
entrega em dois meses.
O suspiro de Felicity abafou sua maldição com as notícias. — Sequestrada
por quem?
Nik olhou para ela. — Nós não sabemos.
Se eles soubessem, Devil já teria passado por eles. Ele xingou novamente
quando Nik alcançou a escada e começou a escalar. Niall é um dos melhores
condutores dos Bastardos; o escocês estava com eles desde que era menino.
Hamish era seu irmão - mal saído da infância, nem mesmo crescera a primeira
barba.
— Alive? — ele gritou para Nik quando ela se virou para ajudar Felicity a sair
do porão.
A norueguesa olhou para ele. — Nós não sabemos.
Outra maldição quando ele passou pela lanterna, Felicity se inclinou para
tirá-la dele como se tivesse feito isso uma centena de vezes, em vez de uma
vez. — Devil, — ela disse, suavemente, e ele odiava a pena em seu tom, como se
ela entendesse as emoções tumultuadas nele. Estes eram seus meninos. Cada um
deles, seu para manter seguro.
E esta noite, três deles foram ameaçados.
Ele se afastou do olhar dela, olhando de volta para o porão de gelo.
Erro.
Havia escuridão em todos os lugares, agora que ele havia entregado a
lanterna, e sua proximidade, a maneira como ela se arrastou para os cantos de
sua consciência, era demais. Ele subiu a escada, desesperado para escapar. Exceto
que ele nunca seria capaz de escapar disso. Ele viveu na escuridão.
Mas lá, na superfície, estava Felicity, luz e esperança e tudo o que ele nunca
teria. Tudo o que tinha sido prometido a ele uma vez. Tudo o que uma dia ele
imaginou que poderia ser dele, em um pacote brilhante e lindo.
A preocupação em seus olhos era quase sua ruína.
Ele ladrou uma ordem para Nik fechar a escotilha no porão de gelo. O que
ele estava pensando?
O que ele estava fazendo?

189
Ela não pertencia a este lugar - neste lugar ou em sua vida. Ele balançou a
cabeça uma vez e começou a atravessar o armazém, em direção à porta que ela
nunca deveria ter atravessado, onde Whit estava de sentinela, olhos escuros
vendo tudo, demorando-se em um lugar perto da coxa de Devil. A mão de Devil
se flexionou sob o olhar vigilante de seu irmão, e ele percebeu que a de Felicity
estava em suas mãos.
Ele nem tinha notado.
Devil soltou a mão, pegando a espada de bengala que Whit jogara antes de
atravessar a porta e chamar John, que saltou do teto com o rifle na mão.
Acenando para trás em Felicity sem parar, Devil ordenou, — Leve-a para casa.
A inspiração de Felicity foi alta como um tiro no pátio do armazém. Não.
Devil não olhou para ela.
John assentiu. — Sim, senhor.
— Espere! — Ela perseguiu Devil. — O que aconteceu? Onde você vai?
Deixe-me ir. Eu posso ajudar.
Ela tinha que sair daqui. Ela estava em maior perigo a cada momento que
permanecia. Ela era mais perigosa para ele a cada momento que permanecia. E
se ela não estivesse aqui? Talvez ele tivesse decidido dirigir a plataforma. Então
Niall não teria uma bala nele.
Seu olhar encontrou o de Whit, calmo, controlado e ausente de julgamento,
mas Devil sentiu o julgamento de qualquer maneira.
O que diabos ele estava fazendo, brincando com paixão no gelo enquanto
homens com vidas, famílias e futuros eram baleados em seu nome? Cristo. Ele
nunca deveria tê-la deixado entrar. Whit não tinha dito isso? Devil não sabia
disso?
Que merda de bagunça.
Ele repetiu sua ordem para John. — Leve-a para casa. Atire em qualquer um
que entrar em seu caminho.
— Sim, — John respondeu novamente, pegando seu braço. — Minha
Senhora.
Ela se afastou. Não. A palavra era firme e John hesitou. — Devil. Eu posso
ajudar. Se é a Coroa, ninguém machuca a filha de um Marquês.
Devil parou então, virando-se para ela, incapaz de impedir que sua
frustração aumentasse. — Você pensa por um momento que se alguém vier até
190
você com um rifle, eles se importarão se você for a filha de um marquês? Você
acha que eles vão se importar que você seja uma dama que borda e fala duas
línguas e sabe onde colocar a maldita colher de sopa e está noiva de um maldito
duque?
Seus olhos se arregalaram e ele deveria ter parado, mas não o fez.
Ele estava com raiva. De si mesmo, mas também dela, pela inocência
impassível e pela certeza de que o mundo não era amargo e cruel. — Eles não
vão. Nem por um segundo. Na verdade, eles apontarão para você, parecendo sol
e cheirando a jasmim, porque sabem que homens criados no escuro farão
qualquer coisa pela luz. — Seu queixo caiu, e ele a cortou antes que ela pudesse
falar. — Você acha que pode nos ajudar? — Ele deu um pequena risada, sem
humor. — O que você vai fazer, puxar seus cabelos?
Suas costas ficaram retas, e ele odiava o fio de culpa que vinha com a dor
em seus olhos. — Você não é nenhum tipo de ajuda. Você acha que isso é um
jogo; Você acha que a escuridão é um brinquedo novo e brilhante. Bem, aqui
está sua lição mais importante - a escuridão não é para princesas. É hora de você
retornar à sua torre de contos de fadas. Não volte.
Ele virou as costas para ela, deixando-a em silêncio e andando para o cavalo
no centro do pátio, selado e esperando por ele.
Felicity Faircloth não estava pronta para o silêncio.
— Então você renega? — Ela chamou atrás dele, sua voz forte e firme, uma
chamada de sereia. Ele virou a montaria em torno de modo que ele poderia vê-
la nas sombras das lanternas espalhadas pelo jardim, vento farfalhando suas
saias e várias mechas de cabelo errante que tinha se liberado de suas amarras
quando ele tinha beijado ela.
Seu peito se apertou na imagem - na linha reta de seus ombros e no orgulho
de seu queixo. — Você tem o seu duque, não é?
— Não do jeito que você prometeu.
Puta paixão, como nada que ele já tenha experimentado. Ele nunca deveria
ter chegado perto desse pedido, porque agora, ele estava disposto a fazer
qualquer coisa para impedi-la de compartilhar o ar com seu irmão - e muito
menos compartilhar-se com ele. — Você deveria saber melhor do que acreditar
nas promessas de um homem como eu. O acordo está feito. Vá para casa, Felicity.
Você não é bem-vinda aqui.

191
Por um longo momento, ela observou ele, e cada polegada dele sabia que ele
deveria se virar antes de falar novamente. Mas ele não podia. E então ela falou, suas
palavras provocando e ardendo como um chicote. — Diga-me, Devil, o que você
deve fazer para me manter longe? Trancar as portas?
O que em... Ela estava provocando ele? Será que ela tem qualquer ideia de
quem ele era? Que tipo de homem ele era? Ele se
moveu para desmontar. Para se aproximar dela e... Cristo. Ele queria a beijá-la
sem sentido.
O que diabos ele fez?
— Devil, — advertiu Whit, em cima de sua própria montaria, mantendo o
movimento de Devil.
Havia coisas mais importantes do que ensinar uma lição a Felicity Faircloth.
Ele olhou para ela de seu grande cavalo preto - entregando-lhe o olhar frio e
gelado que aterrorizava homens maiores e mais fortes.
Não mais forte.
— Leve-a para casa, — disse ele, sem olhar para John.
Ela não desviou o olhar dele quando o homem se aproximou dela. De fato,
uma sobrancelha de mogno se erguia em belo desafio.
Devil girou o cavalo para encarar Whit, que o observava com a cara de pedra.
— O que? — Diabo rosnou.
— Cheirando a jasmim? — Whit disse, seu tom seco como areia.
A maldição de Devil foi perdida no vento quando os Bastardos estimularam
seus cavalos em movimento, indo para Fleet Street para resgatar seus homens
feridos.

Capítulo Dezessete

Ele poderia estar morto.


Felicity espetou sua agulha em seu bastidor de bordar duas manhãs depois,
com uma violência que combinava com o pensamento, por pouco evitando que
seu próprio sangue manchasse o bordado - não que a ameaça servisse para
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retardar seu próximo ponto. Ou o próximo. — Eu não me importo se ele está
morto, — acrescentou ela, falando para a marquise de Bumble House em geral,
apesar de estar vazia de criaturas vivas. — Ele foi cruel, e não importa se ele
está morto.
Exceto, antes que Devil tivesse sido cruel, ele não tinha sido cruel. Antes de
Devil ter sido cruel, ele tinha sido completamente o oposto disso.
Ele a beijou, tocou e a fez suspirar de maneiras que ela não sabia que uma
pessoa era capaz de suspirar. Ele a fez sentir coisas que ela nunca sentiu antes.
— Não que nada disso importa, já que ele finalmente se tornou desagradável e
provavelmente esteja morto, — ela repetiu, enfiando a agulha no seu bastidor
de novo, com força perversa.
Ele não estava morto.
As palavras sussurravam em sua mente enquanto ela continuava seu projeto,
resistindo à vontade de encontrar um pedaço de papel e enviar-lhe uma nota
dizendo-lhe em grande detalhe o que ele poderia fazer com ele mesmo se
estivesse morto. Resistindo ao impulso mais urgente de jogar todo o bastidor de
bordar no fogo e voltar para o Covent Garden em plena luz do dia e ver seu
corpo morto por si.
Ocorreu a Felicity que uma mulher deveria ser capaz de sentir a morte de um
homem se ela quase se arruinou com ele em um porão de gelo debaixo de um
armazém poucas horas antes. E ainda assim ela não sentia tal coisa. O universo
era frustrante, de fato.
Ela colocou o aro no colo e soltou um suspiro. — É melhor que ele não esteja
morto.
— Deus, Felicity, é claro que ele não está morto! — Sua mãe cantava na
porta, seu trio de cães latindo animadamente para pontuar a declaração,
assustando Felicity com seu devaneio falador.
Felicity se virou. — Eu imploro seu perdão?
A Marquesa balançou a mão no ar e riu daquele jeito que as mães riam
quando não queriam que suas filhas as envergonhassem. — Ele definitivamente
não está morto! Ele claramente tinha negócios para atender desde a última vez
que você o viu.
Felicity piscou. — Sinto muito, mãe. Quem é quem não está morto?

193
— O duque, é claro! — disse a mãe, e um dos cachorros latiu, logo jogou a
cesta de bordar de Felicity e começou a roer a alça, fazendo com que a Marquesa
acrescentasse, em tom suave: — Não, não, Rosie. Isso não é bom para você.
O cachorro rosnou e continuou mastigando.
— Eu não estava sugerindo que o duque estava morto — disse Felicity —,
mas posso dizer, mamãe, que não é uma impossibilidade. Afinal, não vemos o
duque há vários dias e, por isso, não sabemos se ele está vivo.
— Nós presumimos que ele não tenha perecido no escritório de seu pai nos
últimos cinco minutos, — a marquesa respondeu antes de estender a mão para
arrancar o cachorro da cesta - que não funcionou como planejado, como o cão
simplesmente apertou mais forte e trouxe a coisa toda com ela nos braços de
sua dona.
— Papai está aqui? — As sobrancelhas de Felicity se levantaram. Se o
Marquês de Bumble estava em casa, algo sério estava acontecendo, de fato.
— Claro que sim, — disse a mãe de Felicity. — Onde mais ele estaria com
seu casamento na balança? — Ela puxou a cesta e o cachorro rosnou. —
Rosencrantz. Largue isso, querido.
Felicity revirou os olhos e ficou de pé na ponta da agulha. — É isso que eles
estão discutindo? O meu casamento?
Sua mãe sorriu. — Seu duque chegou para nos salvar de uma vida de
pobreza.
Felicity se calou com as palavras, honesta e de alguma forma irreverente.
Um eco das palavras de Devil duas noites antes. Sua família nunca será pobre o
suficiente para temer a pobreza.
Ela estava na defensiva quando ele disse isso, como se ele não a levasse a
sério.
Mas aqui, enquanto as palavras ecoavam sob o teto de sua família, enquanto
usavam seus vestidos elegantes cercadas pelos cachorros de sua mãe, que
comiam melhor do que as crianças no viveiro onde Devil fez sua vida e eram mais
seguros do que os meninos que trabalhavam para ele – ela os entendia.
Como foi a vida dele?
Ela poderia ter sido manipulada nos últimos meses - forçada a se casar sem
ser informada do motivo, com desapontamento sem motivo -, mas nunca
duvidara do amor de sua família por ela. Ela nunca temia por sua segurança ou
sua vida.
194
Mas Devil tinha - ela sabia disso tão claramente quanto conhecia o beijo
dele. Como ela sabia a sensação do seu toque. E o pensamento a consumiu.
Quem salvou Devil do seu passado?
Ou ele foi forçado a se salvar?
Sua mãe interrompeu os pensamentos. — Bem feito. Agarrar o duque
eremita foi um ótimo trabalho. Eu sabia que você poderia fazer isso.
A atenção de Felicity se voltou para a Marquesa. — Bem, se alguém é jogado
no caminho de duques suficientes, a pessoa é obrigada a ganhar um deles, eu
suponho.
As sobrancelhas de sua mãe se levantaram. — Certamente você não está
insatisfeita com a partida. Este é infinitamente melhor que o anterior.
— Nós não sabemos disso, — respondeu Felicity.
— Não seja tão boba, — a Marquesa bufou. — O último já era casado.
— Pelo menos o último mostrou emoção.
— Ele se ofereceu para casar com você, Felicity. — O tom de sua mãe estava
ficando mais e mais curto. — Isso é emoção suficiente.
— Na verdade, ele não ofereceu, — ela respondeu. — Ele disse que eu era
conveniente. Que facilitei a busca por uma esposa.
— Bem. Eu não vejo a mentira nisso. De fato, pode ser a primeira vez que
você está se acomodando — retrucou a Marquesa. — E para que você esqueça,
não é como se você estivesse em um julgamento... você é filha de um Marquês,
irmã de um Conde!
— E eu tenho dentes excelentes.
— Precisamente! — A Marquesa respondeu.
Mas ela era mais que isso. A mãe dela não via? Ela não era simplesmente a
invisível no baile, desesperada para fazer o que for necessário para ganhar um
marido e salvar as finanças de sua família. Ela parecia luz do sol e cheirava
a jasmim.
O pensamento enviou uma onda de calor através dela. Quando ele disse
isso duas noites atrás, tinha levado tudo nela para não fazê-lo se explicar. Não
parecia ser um elogio ao mesmo tempo que soava como o mais belo elogio que
ela nunca ouviu falar.
Homens criados no escuro farão qualquer coisa pela luz.
195
Ela se perguntou se ele percebeu o quanto ela queria explorar a escuridão.
Exceto que ela não podia. Seus desejos eram segundos para as necessidades
de sua família. Ela era a única esperança deles - e não importava que ela nunca
mais seria livre do jugo que desejavam para ela. Não importa que ela tivesse
acabado de ter apenas um vislumbre do escuro e estivesse perdendo o gosto
pela luz.
Não importava que ela não tivesse interesse em um duque para sua chama.
Que ela desejou outra mariposa. Um conjunto diferente de asas chamuscadas.
Uma mariposa que parecia não ter interesse em voar perto dela. E assim ela
foi deixada aqui: não chama. Apenas Felicity.
A última chance de sua família.
Ela encontrou o olhar de sua mãe. — O duque está aqui para mim ver?
— Bem, ele está aqui para conhecer seu pai. E seu irmão. Para classificar os
meandros do seu casamento.
— Ele está aqui para encher nossos cofres mais uma vez.
Sua mãe inclinou a cabeça - reconhecimento tácito. — Ele é rico como o
diabo, me disseram.
Felicity se absteve de dizer à mãe que conhecia o Diabo, e ele era mais rico
do que qualquer pessoa que conhecesse. Não importava, é claro, porque o
dinheiro de Devil nunca seria a graça salvadora do Marquês de Bumble. Nunca
salvaria seu irmão de certa ruína.
E o que tem ela? Ele poderia resgatá-la?
Não. O dinheiro de Devil não era para salvar Felicity. E nem o homem.
Não volte.
Suas palavras ecoaram através dela, frias e claras.
Então, ela foi deixada aqui, com o duque. Aquele que Devil havia prometido
a ela. O duque de alguma forma que ele lhe entregou. De alguma forma... sem
lhe dizer como. Sem dizer o porquê. Certamente não era uma razão, não estava
lá? Mas isso não era importante o suficiente para ela saber, apenas como não
tinha sido importante o suficiente para sua família dizer a ela seus planos. Para
contar a ela seus medos. Para dizer a ela como pretendiam que ela os salvassem.
Assim como não era importante para o Duque de Marwick dizer-lhe por que
ele estava tão disposto a casar com ela em primeiro lugar.

196
Outra porta trancada.
Desta vez, ela iria desbloqueá-la.
Felicity suspirou novamente. — Eu suponho que eu deveria ir cumprimentá-
lo. — Ela estava saindo da sala de estar, sua mãe cuspindo atrás dela, e na frente
da porta do estúdio fechado de seu pai em instantes.
Ela bateu com firmeza, já girando a maçaneta da porta quando o pai dela
gritou seu — Entre!
Seu irmão ficou de pé quando ela entrou. O pai dela permaneceu atrás de
sua mesa, mas Felicity levou um momento para encontrar o Duque de Marwick,
de pé às longas portas francesas no outro extremo da sala.
— Felicity — Arthur começou.
— Não! Não! Acidente! — Sua mãe cantou no corredor, um trio de cães se
arrastando trás dela. — Acidente! — Isso quando ela entrou na sala com um
aceno de mão. — Felicity não sabia que os homens estavam se encontrando, sua
graça.
O duque se virou, encontrando os olhos de Felicity. — O que você achou
que estava acontecendo?
Ele não era comum, esse homem. Ele não parecia perigoso, mas sim....
incomum. — Eu pensei que você estivesse aqui discutindo nosso casamento e
sua relação com a situação financeira do meu irmão e pai.
Ele assentiu uma vez. — Isso, de fato, é o que estamos discutindo.
Ele estava convidando ela? Isso importava? — Então, tenho certeza de que
você não se importará se eu me juntar a você.
Sua mãe estava quase apoplética. — Você não pode fazer isso. Essa conversa
não é para mulheres!
— Garota, — seu pai avisou atrás de sua mesa.
Sem olhar para longe do duque, Felicity disse: — Acho que deveria ser para
as mulheres, já que todo o seu propósito é colocar um preço em uma, não é?
— Cuidado, Felicity — alertou o pai, e ocorreu a Felicity que, no passado, ela
poderia ter saído com aquela fria e imóvel precaução. Por amor de propriedade.
Para manter o rótulo de filha boa e obediente a um homem que nunca prestou
muita atenção a ela. Nem mesmo quando ela era sua única esperança de
redenção.

197
Mas ela descobriu que não era muito apropriada para o momento.
Ela também não estava no mercado para deixar sua família tomar decisões
sobre seu futuro por mais tempo. Não quando ela era sua única moeda de
barganha.
Ela foi salva de ter que dizer isso, no entanto, pelo duque. — Claro que você
deveria ficar. — E com isso, a decisão foi tomada. Voltou-se para a janela e Felicity
notou que seu cabelo brilhava dourado na sala, como se o homem viajasse com
sua própria fonte de luz.
Ela supôs que outra mulher poderia achá-lo lindamente bonito. Ela tinha, no
passado, não tinha? Não houve um tempo em que ela o chamou de o homem
mais bonito que já viu? Tinha sido uma mentira, claro. Disse a outro homem que
ele era mais bonito.
Um homem que não deveria ser tão bonito, mas era, de fato, tão bonito que
a fazia querer cuspir com o quão irritante ele era.
— Onde você parou?
— Nós estávamos discutindo os termos do nosso casamento.
Ela assentiu com a cabeça. — Sem mim.
— Felicity... — Sua mãe disse antes de virar para o duque. — Sua graça,
perdoa-a. Nós a criamos para ser menos envolvida.
— Isso é só porque você preferiu não me dizer nada sobre seus planos para
o meu futuro, — disse Felicity.
— Não queríamos preocupar você, — Arthur respondeu.
Ela olhou para o irmão. — Devo dizer-lhe o que me preocupa? — Ele não
respondeu, mas ela viu a culpa brilhar em seu rosto. Boa. — O fato de que, mesmo
depois de tudo o que aconteceu, você ainda não consegue enxergar além de
seus próprios problemas.
— Maldição, garota. É assim que é feito — interveio o pai dela. — As
mulheres gostam de pensar que casamento é sobre amor. Não é. É um negócio.
Estamos discutindo negócios.
Ela olhou para o pai e depois de volta para Arthur. — Então você certamente
vai entender que me preocupa que você pensou que eu era uma mercadoria a
ser negociada sem o meu consentimento.
— Pode-se argumentar que você consentiu quando contou a metade de
Londres que nos casaríamos — o duque apontou — não de maneira incorreta.
198
Ela começou a atravessar a sala, na direção dele. — Não obstante, Sua Graça
certamente entenderá que tenho interesse nos termos com os quais você
concordou?
Seu noivo estava mais calmo do que nunca, sua atenção fixa numa sebe na
distância. — Eu certamente entendo, pois são mais os termos com os quais você
concordou.
Felicity hesitou. Seria possível que esse homem fosse um aliado? Era difícil
imaginar o que ele poderia ser com o quão impenetrável ele era. —
Claro. Esqueci que meu pai e meu irmão falam com minha voz.
— Felicity — Arthur começou.
O duque o interrompeu. — Eu não tenho certeza se alguém no mundo fala
com sua voz.
— Isso é um insulto? — Ela perguntou.
— Não, de fato.
Ele era um homem estranho.
— E então? Para o que eu concordei?
— Os banhos vai ser postado imediatamente, e que vai se casar em três
semanas. Após o que, você já concordou em viver aqui em Londres, na casa de
sua escolha.
— Você tem mais de uma casa em Londres?
— Eu não tenho, mas eu sou muito rico, e você é bem-vinda para comprar
outra casa, caso você encontre uma que você preferir.
Ela assentiu. — E você não está interessado em onde moramos?
— Como não vamos morar lá, eu não estou.
As palavras a surpreenderam. Ela olhou para o pai, a mandíbula irritada,
depois para a mãe, cujo queixo caiu ligeiramente, depois para Arthur, que parecia
estar paralisado pelo tapete. Ela voltou sua atenção para o duque. — Você quer
dizer, como você não vai morar lá.
Ele inclinou a cabeça e voltou sua atenção para os jardins além da janela. Ela
o observou por um momento.
— Você não tem interesse em se casar comigo.
— Não particularmente, — ele respondeu distraidamente.

199
Tanto para traças e chamas.
— Mas você vai, no entanto. — Ele ficou em silêncio.
Seu olhar se estreitou. — E o que então?
Um lado de sua boca se levantou em um pequeno sorriso irônico. — Você
será muito rica, Lady Felicity. Certamente você encontrará algo para fazer com
você mesma.
Sua boca se abriu. Sua mãe engasgou. O pai dela tossiu. Arthur ficou em
silêncio.
As palavras não eram cruéis. O duque não estava bravo nem amargo nem
punindo. Ele estava sendo simplesmente franco. E havia algo nessa verdade que
falava com Felicity... tempo suficiente para ela para saber o que, exatamente, ele
estava planejando. — Isso não está indo do jeito que eu pensei que seria.
— E como você achou que seria?
— Eu pensei que você iria querer — Ela parou. — Você acha que nos
amaríamos um ao outro?
Não. O amor nunca fez parte disso. Pelo menos não com ele. Com outro
homem, talvez, quando ela era mais jovem. Outro marido sem rosto. Alto e
moreno e com olhos e lábios dourados que haviam sido forjados em pecado.
Ela empurrou o pensamento de lado. — Não.
Ele assentiu. — Eu não penso assim. — Seu olhar baixou para o bastidor de
bordar que ela continuou a apertar em sua mão. Ele inclinou a cabeça. — Isso é
uma raposa?
Ela levantou o projeto, olhando para baixo, surpresa. Ela tinha esquecido o
que estava fazendo antes dele chegar aqui e tudo ter ido para o pote. — Isto é.
— Com uma galinha?
Era, de fato. O animal laranja e branco segurava uma galinha marrom sedosa
em sua boca. — Sim.
— Bom Deus.
Ela olhou para ele. — Eu sou muito boa no bordado.
— Então eu vejo. — Ele se adiantou, sem levantar o olhar. — O sangue é um
pouco...
Ela considerou o aro, então ofereceu: — Horrível?

200
Ele assentiu. — Horrível.
— Eu estava com raiva quando comecei.
Devil a havia exilado de seu mundo e saiu correndo, armado, para onde Deus
sabia. Ele pode estar morto.
Ele não estava morto.
Isso importava? Ele a mandou para casa e disse para ela nunca mais voltar.
Ele poderia muito bem estar morto por tudo o que ele estava livre dela. Ela não
gostou da forma que seu peito se contraiu com o pensamento. Ela não estava
pronta para se livrar dele. Ou o mundo em que ele vivia, ou as dicas de magia
que ele mostrara a ela.
Mas ele estava pronto para se livrar dela, e aqui estava ela, negociando os
termos de um casamento sem amor com esse estranho duque que não propunha
nada como mágica.
Aqui estava ela, sozinha mais uma vez.
— É assim que você mostra suas emoções? — Marwick pressionou, curioso,
— Bordando?
— Eu também falo comigo mesma.
— Cristo menina... ele vai pensar que você está louca.
Ela não olhou para o pai. — Tudo bem, como eu acho que ele também está
louco.
— Felicity! — Sua mãe ameaçou os vapores, sem dúvida. Um dos cachorros
latiu e atacou a garra da mesa de seu pai.
— Droga, Catherine, — seu pai gritou para sua mãe. — Gilly! Pare com
isso! Sem morder! Guildenstern! O suficiente!
O cachorro continuou.
Arthur olhou para o teto e suspirou.
O duque não pareceu se importar com o caos. Seus olhos foram para as
janelas novamente. — Então estamos resolvidos?
Ela supôs que deveriam estar. Ela olhou para o irmão, encontrando os olhos
castanhos tão familiares quanto os dela. Viu o suplicante neles. A esperança. E
ela não conseguia parar a irritação que se abateu sobre ela. — E assim nós temos
isto. Vamos nos casar e você viverá os felizes para sempre.

201
Seu irmão teve a graça de parecer culpado.
— Você merece, — disse ela, incapaz de manter a tristeza de sua voz. De sua
mente. — Você, Pru e as crianças. Você merece tudo que você sempre desejou.
Você merece felicidade. E terei prazer em dar a você. Mas não tenho certeza de
que vou parar de te contrariar por isso.
Arthur assentiu. — Eu sei.
Ela se virou para encontrar o duque observando pela primeira vez, algo mais
do que o tédio em seu rosto. Algo como saudade. O que era impossível, claro.
Este duque maluco não parece um tipo que ansiava. E certamente não por ela.
Pela a vida dela. E ela não entendia por que ela lhe perguntou: — Você gostaria
de ver os jardins?
— Não, — interveio o pai, sua frustração evidente. — Nós não terminamos.
— Eu, no entanto, — disse o duque, antes de se virar para o marquês. —
Podemos discutir a corda que vou jogar para evitar que vocês se afoguem
quando eu voltar.
Com isso, ele colocou a mão na maçaneta da porta e a abriu na sacada do
outro lado. Ficando de lado, ele permitiu que ela saísse antes de segui-la,
fechando a porta firmemente atrás deles.
Felicity não andou três pés quando ele disse — Eu não ligo para a sua família.
— Nem eu, no momento, — ela respondeu. Então, supondo que ela deveria
oferecer uma defesa, ela disse: — Eles estão desesperados.
Ele passou por ela, indo para os degraus de pedra que levavam aos jardins,
claramente esperando que ela a seguisse. — Eles não sabem o que é desespero.
As palavras eram tão familiares - um eco do discurso de Devil no armazém
- mas na esteira do lugar e do homem que as havia dito primeiro, pareciam
ridículas, e Felicity se viu irritada com elas. — O que faz um duque rico como um
rei saber de desespero?
Ele se virou para ela então, algo em seus olhos inquietante o suficiente para
impedi-la de caminhar. — Sei que seu pai é um marquês e seu irmão é um conde
e, mesmo que nunca casem você, eles não conseguirão entender o nível de
carência que os homens podem alcançar. E sei que, se tiverem até uma ideia de
amor por você, eles se arrependerão de sacrificar você por sua própria felicidade.
Ela inalou bruscamente com as palavras, claras e cheias de honestidade. Ela
abriu a boca. Fechou. Então tentou novamente. — Eles são minha família. Eu
quero protegê-los.
202
— Eles deveriam estar protegendo você, — ele respondeu.
— De você?
Ele pareceu lutar com a resposta, finalmente decidindo: — Você não tem
nada a temer de mim.
Ela assentiu com a cabeça. — Especialmente desde que você não tem
intenção de interagir quando estivermos casados. O que eu temeria? Me perder
em suas pilhas de dinheiro?
Ele não sorriu. — Você esperava que nós interagíssemos?
A pergunta não deveria ter evocado uma visão de duas noites antes - da
interação que Devil lhe oferecera. Do beijo que roubou sua respiração e seus
pensamentos por mais tempo do que deveria. Se essa era uma interação comum
entre casais, ela certamente não esperava. Pressionando as mãos nas bochechas
para afastar o rubor que vinha na memória, ela respondeu: — Eu não sei. Eu
nunca esperei nada disso. — Ele não respondeu, e ela perguntou: — Por que casar
comigo, Sua Graça?
— Eu preferiria que você não me chamasse assim.
Ela inclinou a cabeça. — Sua graça?
— Eu não gosto disso.
— Tudo bem — disse ela devagar, menos surpresa pelo pedido do que pela
maneira simples como ele fez, como se fosse perfeitamente comum. — Por que
se casar comigo?
Seu olhar não deixou a cerca no fim do jardim. — Você perguntou antes. A
resposta não mudou; você é conveniente.
— E eu positivamente desmaiei, — disse ela, secamente.
Ele lhe deu um olhar e ela sorriu. Ele não fez. — Por que você se sacrifica
pela sua família?
— Que escolha eu tenho?
— A escolha que termina com você tendo a vida que você deseja.
Ela sorriu, suavemente. — Alguém realmente tem essa vida?
— Alguns de nós têm a chance disso, — respondeu ele, distraído novamente.
— Não você, no entanto.
Ele balançou sua cabeça. — Não.
203
Ela se perguntou o que teria feito este homem - um príncipe entre os
homens, bonito, rico e titulado, tão perdido em seu próprio futuro que escolheu
um casamento sem amor pela chance de uma vida que desejava. — Você tem
família?
— Não. — A resposta foi cortada e sem emoção.
Ela sabia que seu pai havia morrido anos antes, mas, — Nem mãe?
— Não.
— Irmãos?
— Se foram.
Quão trágico. Não admira que ele fosse tão estranho. — Sinto muito, —
disse ela. — Eu posso estar irritada com Arthur agora, mas eu me importo com
ele.
— Por quê?
Ela pensou por um momento. — Bem, ele é um bom irmão e um bom
marido. Um bom pai.
— Eu não vi nenhuma evidência de ser um bom marido ou pai, mas posso
dizer que ele não parece bom irmão.
Ela apertou os lábios nessa avaliação.
O silêncio caiu, até que Felicity quase pensou que ele tinha esquecido que
ela estava lá. Ele observou a sebe ao longe, seu olhar vazio. E então, depois de
um longo momento, ele disse: — Deve ser bom, — disse ele, — ter tido um
parceiro no passado.
Isso foi. Arthur a enlouquecia, e ela estava irada por ele ter mantido em
segredo o segredo das finanças de sua família, ainda mais por ele ter tentado
manipular seu futuro por causa disso. Mas ele era seu irmão e seu amigo, e ela
tinha dificuldade em acreditar que ele não desejava o melhor para ela. Mesmo
envolta em incerteza, ela sabia que sua família desejava seu bem - afinal, eles não
haviam forçado esse casamento; ela que o fez.
Mesmo assim, agora, ela não queria isso.
Mesmo assim, agora, ela desejava outra coisa, de fato.
Mesmo assim, agora, ela desejava um parceiro diferente. Um futuro
diferente. Um impossível. Mas não era impossível para ele, e ela sentiu que tinha

204
que apontar. — Você percebe, que sem mim... você ainda pode encontrar uma
parceira no futuro?
Como se ele estivesse longe, ele voltou para ela, e ela percebeu o quão perto
ele estava, reconheceu o conflito em seus olhos, um belo marrom dourado - um
estranho e inquietante eco de outro par de olhos que ameaçara consumi-la.
Antes que ela pudesse permitir que seus pensamentos vagassem para Devil,
o duque falou. — Eu não posso encontrá-la.
— Eu não sou ela. — Felicity ofereceu-lhe um pequeno sorriso.
— E eu não sou ele.
Não, você não é.
Ela respirou fundo. — E então?
— E assim, banhos serão postados, e eu enviarei um anúncio para as Notícias
para saírem na segunda-feira. — Era tão simples quanto isso. — E em três
semanas, você pode começar de novo, uma duquesa, com sua família voltando
ao dinheiro, poder, sucesso. Com uma condição — disse o duque, distraído, sua
atenção voltando à cerca. — Um beijo.
Ela se acalmou. — Desculpe?
— Acho que fui claro, — disse o duque. — Eu deveria gostar de um beijo.
— Agora?
Ele assentiu. — Precisamente.
Suas sobrancelhas costuradas juntas. Ela não sabia muito sobre os homens,
ela permitiria, mas não havia dúvida em sua mente que este homem não queria
beijá-la. Não realmente. — Por quê?
— Isso importa?
— Considerando que você já deixou isso mais do que claro, que você não
tem nenhum interesse em paixão, sim, honestamente. Importa.
Ele fechou a distância entre eles. — Justo. Minha razão é que eu desejo isto.
— Eu... — Ela parou. — Um beijo?
Ele abaixou a cabeça em direção a ela, bloqueando sua visão dos jardins com
seus ombros largos e seu belo rosto. — Apenas um.
Por que não? ela pensou. Por que não beijá-lo e ver se os beijos eram tão
magníficos quanto o que Devil lhe dera no porão de gelo?
205
O duque estava perto. — Eu não vou te beijar se você não permitir.
Seu olhar voou para o dele. Talvez os beijos com Devil não fossem especiais.
Talvez tenha sido um beijo comum e simples. — Por que todos os beijos não
seriam os mesmos? — Ela sussurrou. Ela não saberia a menos que ela beijasse
outro homem, e ela simplesmente aconteceu de ter um agora que queria beijá-
la.
— Você está falando para si mesma, — disse ele, observando-a, seus olhos
âmbar vendo muito mais do que ela gostaria. — Eu não vou ser o seu primeiro
beijo, vou?
— Eu não vejo como isso é da sua conta, — ela disse, maliciosamente. — Eu
não serei seu primeiro beijo também.
Ele não respondeu, em vez disso, colocou as mãos nos braços dela e virando-
a de costas para a sebe que ele achou tão fascinante a tarde toda. Depois de
posicionada cuidadosamente - para qualquer motivo -, ele voltou sua atenção
para o assunto em questão, se inclinou e apertou seus lábios nos dela.
Isso foi... sem intercorrências. Seus lábios eram firmes e quentes e
totalmente imóveis. E não apenas no sentido de que o beijo em si que não a
moveu. Ele também, literalmente, se não se moveu. Ele colocou os lábios
firmemente contra os dela e beijou-
a como se ele fosse uma estátua. Uma bela estátua, ela iria permitir, mas uma
estátua, no entanto.
Não era nada no mesmo reino que o beijo que ela recebera de Devil.
A realização mal se formou quando ele ergueu a cabeça e a soltou, como se
tivesse sido queimado - e não de uma maneira simples. Do tipo de maneira que
terminava com tratamento médico.
Ele olhou para ela e disse: — O destino é uma coisa cruel, Lady Felicity. Em
outro momento, em outro lugar, você poderia ter tido outro duque que teria
amado você além da razão.
Antes que ela pudesse responder, ele estava empurrando-a para fora do
caminho e pulando para a cerca, movendo os galhos para o lado e alcançando
um longo braço nela.
Ele estava Louco. Claramente.
Ela deu um passo hesitante em direção a ele. — Hum... Duque?
Ele grunhiu sua resposta, meio dentro do arbusto.

206
— Correndo o risco de ser impertinente, posso perguntar por que você está
tão interessado na sebe?
Ela não sabia o que ele diria. Ela supôs que ele poderia dizer a ela que se
lembrava de alguém ou alguma coisa - o que quer que fosse que o transformou
em um estranho homem. Ela poderia ter imaginado que ele lhe diria que ele tinha
uma afinidade com a natureza - afinal, ele era um notório recluso em Londres,
tendo passado toda a sua vida no campo. Não a teria surpreendido se ele
dissesse a ela que se importava com uma determinada espécie de ave à vista, ou
uma erva daninha brotando abaixo.
Mas ela absolutamente não esperava que ele extraísse um menino da sebe.
A mandíbula de Felicity caiu quando o Duque de Marwick se levantou e
puxou o jovem a seus pés. — Você conhece nosso espião?
A criança parecia não ter mais do que dez ou doze anos, comprida e magra
como um feijão, com o rosto coberto de fuligem e um quepe baixo na testa. Ela
se adiantou e levantou a borda para ver seus olhos, azuis como o mar e apenas
como desafiante. Ela balançou a cabeça. — Não.
O duque comandou a atenção do menino. — Você está me observando? —
O menino não falou. — Não, — disse o duque. — Você não estaria nos jardins se
estivesse me observando. Você estaria na frente, esperando que eu fosse
embora. Você está observando Lady Felicity, não é?
— Eu não estou dizendo a você nada, — o jovem cuspiu.
O coração de Felicity começou a bater. — Você é da colônia.
As sobrancelhas do duque se ergueram, mas ele não falou.
Nem o menino, mas ele não precisava. Felicity não precisou de confirmação.
Algo como pânico estava passando por ela. Pânico e desespero. — Ele está vivo?
— Ela perguntou, observando o menino considerar não respondê-la. Ela se
inclinou, olhando diretamente nos olhos dele. — Ele está?
Um pequeno aceno de cabeça.
Uma onda de alívio. — E os outros?
Um desafio de levantar o queixo. — Eles têm buracos, mas sim.
Ela fechou os olhos por um momento, se recompondo. Então, — Eu tenho
uma mensagem para o seu empregador, — disse ela, olhando para o duque. —
Você diz a ele que logo vou me casar e, portanto, não exige mais a atenção dele
nem a sua. Você entende?
207
O garoto assentiu.
— Qual é o seu nome? — Ela perguntou gentilmente.
— Brixton, — disse ele. Suas sobrancelhas franziram com o nome e o menino
ficou na defensiva. — Foi onde me encontraram.
Ela assentiu, odiando o modo como as palavras apertavam seu peito. — É
melhor você voltar, Brixton. — Ela olhou para o duque. — Deixe ele ir.
Marwick olhou para o menino, como se tivesse acabado de descobrir que
estava segurando uma criança no ar, e disse: — Não deixe de contar a ele sobre
o beijo. — Ele largou Brixton sem hesitar, e o garoto desapareceu como um
lampejo sobre a cerca e para o mundo além. Ela ficou olhando para ele por mais
tempo do que deveria, querendo segui-lo mais do que deveria.
Querendo, ponto final.
Finalmente, ela se virou para o duque, que não parecia surpreso com a
mudança dos acontecimentos. De fato, havia uma luz em seus olhos castanhos
que não existia antes. Algo que parecia satisfação, embora não fizesse nenhum
sentido do por que isso. Ela respirou fundo. — Obrigada.
— Você gostaria de me falar sobre o empregador do menino?
Ela balançou a cabeça. — Eu não farei isso.
Ele assentiu. — Então só me diga. Eu estava certo ou errado?
— Sobre o quê?
— Sobre o beijo ser um relatório digno para o nosso pequeno vigia.
Por um momento, Felicity permitiu que a fantasia passasse por ela - a ideia
de que Devil se importaria com o fato do duque tê-la beijado. Que ele poderia se
importar com os banhos que seria postado. Que ele poderia se importar que ela
tivesse voltado para casa depois que ele a jogou fora e decidiu seguir com sua
vida com outro homem. Que ele possa se arrepender de suas ações.
Mas isso era tudo o que era - uma fantasia.
Ela encontrou o olhar de seu noivo. — Você estava errado.

208
Capítulo Dezoito

Ele veio para dizer a ela, não podia usar seus meninos como mensageiros.
Ele veio para dizer-lhe que ele tinha coisas mais importantes em sua vida -
responsabilidades que superavam em muito a de uma desbloqueadora de
fechaduras entediada -, para quem ele tinha pouco tempo e ainda menos
interesse.
Ele veio para dizer a ela que ele não pertencia a ela, e ela não deveria pensar
nem por um momento que ele pertencesse.
Ele não veio porque Ewan a beijou.
E se ele veio porque Ewan a beijou, não foi por causa de Felicity. Era porque
ele conhecia seu irmão bem o suficiente para saber que Ewan estava tentando
provar um ponto. Tentando enviar sua mensagem ao Devil, que ele tinha seu
casamento e seu herdeiro bem ao seu alcance.
De qualquer maneira, ele não veio para Felicity.
Pelo menos, foi o que Devil disse a si mesmo ao atravessar os jardins da
Bumble House poucas horas depois de Brixton voltar ao viveiro com a notícia do
beijo, sua descoberta posterior e o fato de que Felicity Faircloth o havia devolvido
para entregar uma bronca a seu empregador.
Devil enfiou a bengala debaixo do braço e começou a subir a treliça de rosas
por baixo da janela. Ele estava um punhado de pés acima da terra quando ela
falou de baixo.
— Eu pensei que você estava morto.
Ele congelou, agarrando-se às ripas e cipós por mais tempo do que gostaria
de admitir, detestando a maneira como a voz dela tinha feito sua respiração ficar
presa no peito e o seu coração batendo um pouco mais rápido do que deveria.
Não era por causa dela, ele disse a si mesmo. Era porque ele ainda estava no
limite da última vez que a viu. A partir da notícia de que o carregamento dos
Bastardos tinha sido sequestrado e seus homens feridos. Pelo fato de que ele
tinha estado com ela, em vez de estar cuidando de seus homens.
Isso era tudo.
Ele olhou para ela. Um erro.
209
O sol estava se pondo sobre os telhados de Mayfair, enviando ricos raios de
luz tingida de cobre para os jardins, pegando seu cabelo escuro e colocando-o
em chamas, junto com o cetim de seu vestido. Rosa novamente, agora a cor de
um inferno graças a um truque da luz. Não que Devil deveria ter notado que era
rosa. Ele não deveria ter. Ele também não deveria ter se perguntado se ela estava
usando as roupas de baixo que ele havia comprado para ela dias atrás. Ele
certamente não deveria ter se perguntado se as roupas de
baixo vinham com fitas de cetim rosa como ele havia pedido.
Pedir por isso era outra coisa que ele não deveria ter feito. Cristo. Ela era
magnífica.
Ele também não deveria notar isso, mas era impossível não perceber, como
ela parecia ter sido forjada em fogo e pecado. Ela era linda e perigosa. Ela fez um
homem querer voar direto para ela. Não é como uma mariposa. Como Ícaro.
A única coisa que ele deveria notar era que essa mulher não era para ele.
— Eu não estou morto, como você pode ver.
— Não, você está bem saudável.
— Você não precisa soar tão desapontada, — ele respondeu, descendo um
pé ou dois antes de se deixar cair para o chão e levando sua vara na mão.
— Eu pensei que você estava morto, — ela repetiu, quando ele se virou
para ela, seus olhos castanhos de veludo uma tentação perversa.
Ela estava muito perto, mas ele estava de costas contra uma treliça e não
conseguia se mexer. — E você ficou muito satisfeita?
— Oh, sim, eu estava sobre a lua, — disse ela, desinteressadamente. E então,
depois de um momento, — Você adulterou o repolho.
Suas sobrancelhas se ergueram. — Desculpe?
— Você me mandou embora, — ela respondeu, falando devagar, como se
ele fosse uma criança que não conseguia lembrar os acontecimentos de duas
noites antes. — Você subiu em um cavalo com sua arma idiota - o que não é um
tipo de proteção contra balas, devo acrescentar - e partiu para a escuridão sem
pensar duas vezes em mim. Ali parada. No pátio do seu armazém. Certa que você
seria morto. — Suas bochechas estavam vermelhas, suas narinas dilatadas, o
pulso em sua garganta acelerada. Ela era mais bonita do que nunca. — E então
um dos seus capangas me colocou em uma carruagem e me levou para
casa. Como se tudo estivesse bem.
— Tudo estava bem — disse Devil.
210
— Sim, mas eu não sabia disso! — Ela disse, sua voz alta e urgente. — Eu
pensei que você estava morto!
Ele balançou sua cabeça. — Eu não estou.
— Não. Você não está. Você é simplesmente um bastardo. — Com isso, ela
se virou e o deixou, não lhe dando outra escolha a não ser segui-la, como um
cachorro em vantagem.
Ele não se importou com a comparação, nem com sua aptidão, mas seguiu-
a. — Tenha cuidado, Felicity Faircloth, ou eu vou começar a pensar que você está
preocupada com o meu bem-estar.
— Eu não estou, — disse ela sem olhar para trás.
O mau humor nas palavras fez com que ele quisesse sorrir, o que era
estranho em si mesmo. — Felicity?
Ela acenou com a mão no ar quando cruzou os arbustos altos e labirínticos
na parte de trás do jardim. — Você não deveria estar aqui.
— Você me convocou, — disse ele.
Ela girou em direção a ele, sua frustração anterior se transformando em raiva.
— Eu não fiz tal coisa!
— Não? Você não mandou o meu menino para me buscar?
— Não! — Ela insistiu. — Mandei Brixton embora porque seus espiões não
são bem-vindos em minha sebe.
— Você o enviou com uma mensagem clara para mim.
— Não ficou clara, se você acha que eu quis chamar você.
— Eu acho que você sempre quis me chamar.
— Eu... — ela começou, então parou. — Isso é ridículo.
Ele não conseguia parar de se aproximar dela, de se aproximar o suficiente.
— Acho que você fez um desafio no pátio do meu armazém, parecendo uma
rainha, e quando não subi, você pensou em me levar até você. Você imaginou
que eu apareceria aqui, desesperado por você.
— Eu nunca imaginei você desesperado por mim.
Ele se inclinou. — Então você não é tão criativa quanto eu pensava. Você
não pronunciou a todos reunidos há duas noites que você não terminou comigo?

211
— Não, de fato. Eu disse que não estava terminada com Covent Garden. Isso
é totalmente diferente.
— Não quando Covent Garden pertence a mim.
Ela se virou, indo mais fundo ao longo da sebe. — Eu odeio te despojar de
sua pomposa auto-estima, sirrah, mas você não estava em meus pensamentos,
exceto para deixar você saber que eu estava preparada para cumprir minha
dívida com você.
Ele parou, não gostando das palavras. — Sua dívida.
— De fato, — ela jogou por cima do ombro. — Eu pensei que você gostaria
de saber que suas lições funcionaram.
De todas as coisas que ela poderia ter dito, essas eram as palavras mais
prováveis para desmantelar Devil. — Quais lições?
— Suas lições de paixão, é claro. O duque esteve aqui esta manhã para
discutir os termos do nosso casamento e eu cuidei das coisas.
Sua mão apertou em sua bengala, o instinto fazendo-o desejar que ele
pudesse desembainhá-la e colocá-la no pescoço de seu irmão bastardo. — O
que isso importa?
Ela se virou, ainda se movendo mais profundamente nos jardins, abrindo as
mãos enquanto andava, as bochechas coradas. — Beijar, é claro. — E então,
como se ela estivesse observando o tempo, ela completou um círculo completo
e continuou longe dele. — Brixton não relatou de volta?
Devil bateu a bengala na mão duas vezes. Um fio de desconforto sussurrou
através dele. Brixton havia informado que Ewan a beijara, é claro. Mas quando
Devil tinha pressionado o menino para obter mais informações, tinha sido dito
que a carícia foi curta e superficial, - exatamente o oposto do que tinha
acontecido com ele no gelo há duas noites atrás.
Não havia nada superficial sobre a maneira como ele e Felicity se reuniram.
Então, o que aconteceu depois que Ewan mandou o menino embora? Ela
não estava usando luvas. Eles se tocaram? Pele à pele? Ele a Tinha beijado com
paixão?
Bom Deus. Ela o beijou?
Impossível. E ainda...
Eu cuidei das coisas.

212
Devil a seguiu, contornando uma esquina para vê-la indo para uma
extremidade de um enorme banco de pedra curvado que devia ter seis metros
de comprimento. — Você o beijou.
— Você não precisa dizer isso como se estivesse chocado. Não foi esse o
propósito de suas lições?
Não. O beijo deles poderia ter começado como a instrução, mas ele tinha
terminado como erotismo - puro prazer sem restrições. Prazer que Devil se
recusou a acreditar que ela pudesse sentir com Ewan.
Prazer que ele imaginou que ele nunca poderia ser capaz de sentir com
alguém nunca mais.
Mas Devil não disse nada disso. Em vez disso, ele perguntou: — E? Você
ficou satisfeita com o resultado?
Ela se sentou, espalhando as saias largas e erguendo um bastidor de
bordar do banco. — Bastante.
Seu sangue estava correndo em seus ouvidos - alto o suficiente para fazê-lo
se perguntar se ele estava ficando louco. — O que você fez?
Ela inclinou a cabeça. — O que eu fiz?
— Como você o conquistou?
— O que você está sugerindo? Que não vou chamuscar as asas dele depois
de tudo? O que aconteceu com: você não é um porco, Felicity Faircloth? Com
uma avaliação tão empolgante sua, como eu poderia não tê-lo vencido?
— Você não é um porco, — respondeu ele, sentindo-se um idiota. Sentindo-
se desequilibrado. — Mas esse não é o ponto. Você nunca vai se apaixonar por
Marwick.
— Talvez eu tenha ganhado seu coração com o meu beijo notável. — Seus
lábios se curvaram em um arco perfeito, fazendo-o desejar que eles não
estivessem falando sobre beijar, mas fazendo isso, em vez disso.
— Impossível. — O rosto dela caiu, e ele se odiou pela maneira como ele
tirou o poder dela. Querendo, instantaneamente, devolvê-lo, mesmo que ele não
devesse. Mesmo retornando, isso só a tornaria mais perigosa.
— É isso? Você não me prometeu que ele iria? Você não disse que gostaria
que ele me escravizasse? Queimar as asas dele?
Ele bateu a bengala contra a bota. — Eu menti.

213
Ela franziu o cenho. — De alguma forma, isso não me surpreende.
— Marwick não é um homem que possa lhe dar paixão.
— Você não sabe disso.
— Na verdade, eu sei.
— Como?
Porque eu o vi virar as costas sem pensar duas vezes.
Ela estreitou o olhar para ele. — Ninguém em Londres o conhece. Mas você
conhece, não é?
Ele hesitou. — Sim.
— Como?
— Não é importante. — Que mentira isso era.
— Como ele vai ser meu marido, parece muito importante.
Ele não vai ser seu marido.
Ele não podia dizer isso a ela e ficou quieto.
— Eu deveria ter percebido isso desde o início, — disse ela. — Desde o
momento em que você prometeu ele para mim. Quem é ele para você? Quem é
você para ele? Como fazer você ter tal controle sobre ele?
— Ninguém tem controle sobre o Duque de Marwick. — Isso era verdade.
Isso ele poderia dizer a ela.
— Exceto você, — disse ela. — Quem é ele? Um rival nos negócios? — Sua
testa franziu. — Ele é a razão pela qual seus homens foram baleados?
— Não. — Pelo menos, Devil não achou.
Ela assentiu uma vez, perdida com a lembrança da noite na colônia. Seu
olhar encontrou o dele, cheio de preocupação. — Seus homens. Brixton disse que
eles não estavam...
Seu peito se apertou ao perceber que, mesmo agora, mesmo quando ela
liberava sua raiva contra ele, ela se preocupava com o bem-estar de seus homens
- garotos que ela não conhecia.
— O carregamento se foi, mas os homens vivem. — Os dois homens
tiveram sorte, considerando todas as coisas. Ele e Whit os haviam descoberto
inconscientes, não por perda de sangue, mas por rachaduras no crânio. Ele

214
estava acordado há quase dois dias seguidos, ameaçando os médicos
para garantir que eles permanecessem vivos. — Eles devem se curar.
Ela soltou um suspiro. — Eu sou grata por isso.
— Não tão grato como eu.
Ela sorriu para ele. — Pena que todo o seu gelo tenha sido roubado. É
estranho estar na lista de um ladrão.
Ele levantou uma sobrancelha à sua observação. — As pessoas gostam de
manter as coisas frias.
— Claro, — disse ela. — No entanto, eles fariam isso sem - o que é que eles
chamam vocês? - Os Bastardos de Bareknuckle?
Ele assentiu.
— Por que eles te chamam assim?
Uma lembrança brilhou - sua primeira noite em Londres, depois de três dias
e meio sem dormir - ele, Whit e Grace se amontoaram em um canto da colônia,
famintos e assustados, com nada além de um ao outro e com a lição que seu pai
ensinara a eles - lute tão sujo quanto você puder.
— Quando nós chegamos no viveiro, fomos os melhores lutadores que eles
já viram.
Ela o observou do seu lugar. — Quantos anos você tinha?
— Doze.
Seus olhos se arregalaram. — Vocês eram crianças.
— As crianças aprendem a lutar, Felicity.
Ela pensou por um momento, e ele se perguntou se estava em um palanque
– em um tratado sobre os direitos das crianças e como ele deveria ter tido uma
infância melhor, como se ele não soubesse tudo isso já. Ele endureceu, se
preparando, mas ela não fez.
Em vez disso, ela disse: — Mas eles não deveriam ter que fazer isso.
Deus sabia que isso era verdade.
Ela ficou em pé então, e seu olhar foi para o bastidor de bordar. — Bom
Deus. Isso é uma raposa machucando uma galinha?
Ela atirou-o para o banco. — Eu estava com raiva.
— Eu posso ver isso.
215
Ela deu um passo em direção a ele. — Então, você e a Fera eram jovens e
você aprendeu a lutar.
— Nós éramos jovens e já éramos combatentes, — ele corrigiu. — Nós
lutamos por restos nas ruas por algumas semanas antes de sermos descobertos
por um homem que dirigia um ringue de luta. — Ele fez uma pausa. — Ele
convocou nós três como propriedade dele. E então nós éramos proprietários
do Covent Garden.
— Vocês três?
— Fera, Dahlia e eu.
— Dahlia lutou?
Devil sorriu, a lembrança de Grace em seu vestido sujo e depois em seu
primeiro par de botas bonitas e brilhantes - compradas com seus ganhos.
— Ela lutou mais do que o resto de nós juntos. Recolheu ganhos suficientes
para iniciar seu próprio negócio muito antes de começarmos o nosso. Nós
éramos Bareknuckle Babes em comparação. Dahlia... ela era o Bastardo
Bareknuckle original.
Felicity sorriu. — Eu gosto dela.
Ele assentiu. — Você não está sozinha.
— Mas agora, você não luta com os punhos, — disse ela, baixando o olhar
para onde a mão nua segurava sua bengala. Sua própria mão se moveu, e ele se
perguntou se ela poderia tocá-lo. Ele se perguntou se ele a deixaria.
Claro que ele deixaria.
Ele bateu seu bastão duas vezes contra o dedo do pé em sua bota. —
Não. Uma vez que você aprende a usar um aço, você não volta à carne. — A
pessoa faz o que pode para se manter seguro. Seu irmão e irmã. Sua tripulação.
E uma lâmina era mais poderosa que um punho.
— Mas você ainda luta. — Felicity ainda estava olhando para os nós dos
dedos, e ele estava ficando mais inquieto a cada segundo.
Ele flexionou os dedos. Limpou a garganta. — Só quando eu preciso. Fera é
quem gosta do show.
Seu olhar cintilou para o dele. — Você lutou na outra noite?
Ele balançou sua cabeça. — No momento em que chegamos lá, os produtos
já tinham sido levados.

216
— Mas você teria. — Ela estendeu a mão, e ambos estavam paralisados
enquanto seus dedos traçaram os nós dos dedos dele, brancos sob o aperto
forte que ele segurava em sua bengala, entrecruzados com cicatrizes e marcas,
emblemas que ganhou na colônia. — Você teria se colocado em perigo.
Seu toque era muito venenoso, fazendo-o querer dar a ela tudo o que ela
queria, tudo o que ele tinha. Ele deveria se mover. — Eu teria feito o que fosse
necessário para manter a minha segurança.
— Muito nobre, — ela sussurrou.
— Não, Felicity Faircloth, — disse ele. — Não vá me pintar de príncipe. Não
há nada nobre sobre mim.
Seus lindos olhos castanhos encontraram os dele. — Eu acho que você está
errado.
Seu polegar acariciou os dedos dele, e ocorreu a Devil que ele nunca tinha
percebido o quão sensível a mão era. Quão poderoso um toque poderia
existir. Ele só sentiu dor em seus dedos e aqui estava ela, arruinando-o com
prazer, fazendo-o querer puxá-la em seus braços e mostrar-lhe o mesmo.
Exceto, que ele não deveria querer ela.
Ele moveu a mão por baixo do toque dela. — Eu vim para lhe dizer que você
não pode me chamar.
Seu rico olhar castanho não vacilou. — Eu não posso ir até você, e não posso
convocá-lo para mim.
— Não, — disse ele. — Não há necessidade de nenhum dos dois.
Ela balançou a cabeça e falou baixinho, a voz baixa e exuberante como uma
promessa. — Discordo.
— Você não pode, — disse ele, como se quisesse dizer alguma coisa.
Isso não aconteceu. Na verdade, isso significava tão pouco que ela mudou
de assunto, seu olhar percorrendo seu rosto como se ela estivesse tentando
memorizá-lo. — Você sabe, que nunca vi você na luz do sol?
— O que?
— Eu vi você à luz de velas, e no brilho misterioso do seu porão de gelo, na
calada da noite lá fora e à noite a luz das estrelas em uma varanda de salão de
baile. Mas eu nunca te vi na luz do sol. Você é muito bonito.

217
Ela estava tão perto. Perto o suficiente para que ele pudesse acompanhar
seu olhar enquanto ela explorava o rosto dele, observando todos as falhas e
ângulos. Perto o suficiente para que ele pudesse explorar o dela - perfeição para
sua falha. E de alguma forma, ele não conseguia parar de dizer: — É estranho.
Todas as vezes nos encontramos na escuridão, e eu só vi você na luz do sol.
Sua respiração ficou presa, e levou toda a sua energia para não tocá-la.
O que não importava, quando ela chegou naquele momento e o tocou, seus
dedos pareciam fogo em sua pele, costeando ao longo de sua bochecha e até
sua mandíbula, onde ela traçou os ângulos afiados de seu rosto antes de
finalmente alcançar seu objetivo - sua cicatriz. O tecido ali era estranho e sensível,
os nervos incapazes de distinguir a dor do prazer, e ela parecia saber disso, seu
toque notavelmente gentil. — Como você conseguiu isso?
Ele não se mexeu; ele estava com muito medo de que, se o fizesse, ela
parasse de tocá-lo. Com muito medo, também, de que ela pudesse tocá-lo mais.
Era agoniante. Ele engoliu em seco. — Meu irmão.
Sua testa franziu e seu olhar voou para o dele. — Fera?
Ele balançou a cabeça.
— Eu não sabia que você tinha outro irmão.
— Há muitas coisas que você não sabe sobre mim.
Ela assentiu. — Isso é verdade, — disse ela, suavemente. — É errado que eu
gostaria de conhecer todos eles?
Cristo. Ela ia matá-lo. Ele deu um passo para trás e a perda de seu toque
ameaçou o mesmo. Ele olhou para longe, desesperado por algo para dizer. Algo
que não envolvia beijá-la até que nenhum dos dois se lembrasse de todos os
motivos pelos quais não poderiam estar juntos.
Razões que eram legiões.
Ele limpou a garganta, concentrando-se na forma estranha do banco atrás
dela. — Por que esse banco está curvado?
Por um longo momento, ela parecia muito ocupada observando-o para
responder, seu foco fazendo-o amaldiçoar a luz do dia e desejado as sombras
em que ele poderia se esconder.
Ele deveria partir.
Exceto que ela respondeu. — É um banco sussurrante, — disse ela. — A
acústica é projetada para que, se alguém estiver sussurrando nesse ponto, a
218
pessoa do outro lado possa ouvi-la. Dizem que foi presenteado a uma das
senhoras da casa por seu jardineiro. Eles estavam... — Ela corou, bela e honesta,
em seguida, limpou sua garganta. — Eles eram amantes.
Aquele rubor quase o matou.
Ele considerou o banco, em seguida, mudou-se para o extremo, inclinando-
se para trás, as coxas largas, colocando um braço sobre as costas dele, forçando-
se a parecer casual. — Então, se eu me sentar aqui...
Ela seguiu em frente, retomando seu lugar no extremo oposto. Ela olhou
para o colo. E então ela falou, as palavras em seu ouvido como se ela estivesse
ao lado dele. Como se ela estivesse tocando nele. — Ninguém jamais saberá o
que somos um para o outro.
Era raro Devil se surpreender, mas o banco o surpreendeu. Ou talvez as
palavras de Felicity o tenham surpreendido. Talvez tenha sido a ideia de que essas
suas palavras possam ter peso - que os dois possam ser algo um para o outro.
Ele imediatamente olhou para ela, mas ela permaneceu paralisada por seu
bastidor de bordar.
— Ninguém jamais saberia que estávamos falando, — disse ele.
Ela balançou a cabeça. — O local de encontro perfeito para espiões.
Seus lábios se contraíram com isso. — Você recebe uma grande quantidade
de visitas clandestinas nos seus jardins?
Ela não estava tão hesitante com seu sorriso. — Houve um aumento no uso
da minha treliça rosa recentemente. — Ela olhou para ele e sussurrou: — É preciso
estar preparado para qualquer coisa.
Ele estava paralisado pela forma dela - pela retidão de sua espinha e o subir
e descer de seus seios, a suavidade de sua mandíbula e o volume de seu torso.
Ela era a Dalila de Rubens, fazendo-o desejar que ele fosse Sansão, a seus pés,
cobertos pelas saias beijadas pelo sol.
Disposta a dar-lhe qualquer coisa, até mesmo seu poder. — Você conhece a
história de Janus?
Ela inclinou a cabeça. — O deus romano?
Ele se inclinou para trás, estendendo as pernas para frente dele. — O deus
das portas e dos cadeados.
— Eles têm um deus?
— E uma deusa, na verdade.
219
— Diga-me. — O sussurro estava cheio de antecipação, e ele se virou para
olhar para ela, encontrando seu olhar castanho quente enfeitiçado.
Ele não pôde evitar de sorrir. — Todas as vezes que eu tentei tentá-la, Felicity
Faircloth, e tudo que eu tive que fazer foi falar sobre o deus das fechaduras.
— Você fez muito bem me tentando sem isso, mas eu gostaria de ouvir de
qualquer maneira.
O coração de Devil latejava com a honestidade dela, e era um exercício de
controle para ficar onde ele estava.
— Ele tinha dois rostos. Um sempre via o futuro, o outro sempre via o
passado. Não existia um segredo no mundo que pudesse ser mantido dele,
porque ele conhecia o interior e o exterior. O começo e o fim. Sua onisciência fez
dele o mais poderoso dos deuses, rivalizando com o próprio Júpiter.
Ela estava inclinada em direção a ele, e seu olhar cintilou para o lugar onde
a pele dela, sardenta ao sol, se erguia da seda de seu vestido. O corpete estava
apertado com o ângulo do corpo dela, e Devil era apenas um homem, afinal de
contas; Ele permaneceu lá, observando seus seios se esforçarem pela liberdade.
Era lindo, mas nada como o olhar em seus olhos quando ela repetiu seu pedido.
— Conte-me.
As palavras fizeram com que ele se sentisse como um rei. Ele queria contar-
lhe suas histórias pelo resto do tempo, para entretê-la, para permanecer em sua
presença e aprender as coisas que a fascinavam... as que atingiam o âmago de
quem ela era, sua bela desbloqueadora de fechaduras.
Não era dele.
Ele colocou o pensamento de lado e continuou.
— Mas ver o futuro e o passado é tanto maldição quanto um presente, e
para cada belo começo, ele também viu o doloroso fim. E essa foi a devastação
de Janus, porque ele podia ver a morte na vida e a tragédia no amor.
— Que horrível, — Felicity sussurrou em seu ouvido de muito longe.
— Ele não dormiu. Não comeu. Ele não encontrou prazer em ninguém e em
nada, enquanto passava todo o seu tempo - uma eternidade de tempo –
guardando o passado, evitando o inevitável futuro. Onde outros deuses
rivalizavam e lutavam pelo acesso ao poder de cada um, nenhum deles guerreava
com Janus... eles viram a dor que ele sofreu e se afastaram disso.

220
Ela se inclinou para a frente, seu vestido puxando ainda mais, tentando
ainda mais - como o futuro que podia ser visto e não protegia contra. — Eu
imagino que ele não era uma divindade alegre.
Ele deu um pequeno latido de riso. — Ele não era. — Seus olhos se
arregalaram e ela se sentou. — O que foi?
— Nada, só que você ri tão raramente. — Ela fez uma pausa. — E eu gosto.
Suas bochechas aqueceram. Como se ele fosse um maldito garoto. Ele
limpou a garganta.
— De qualquer forma. Janus podia ver o futuro e sabia que isso só
trazia tragédia. Exceto que havia uma coisa que ele não podia ver. Uma coisa que
ele não podia prever.
Seus olhos castanhos brilharam. — Uma mulher.
— O que te faz dizer isso?
Ela acenou com a mão no ar. — É sempre uma mulher se é imprevisível. Nós
somos mutáveis como o tempo, você não sabia? Ao contrário dos homens que
sempre agem com um propósito claro e lógico. — Ela terminou com um pigarro
seco.
Ele inclinou a cabeça. — Era uma mulher.
— Ah. Entende?
— Você quer que eu conte a história ou não?
Ela recostou-se no banco, segurando o rosto na mão. — Sim por favor.
— O nome dela era Cardea. E ele não pode vê-la chegando, mas uma vez
que ela estava lá, ele a viu em cores brilhantes e vivas. E a beleza dela era a maior
que ele já conhecera.
— Elas não são sempre a maior beleza, essas mulheres imprevisíveis?
— Você acha que é tão inteligente, Felicity Faircloth.
Ela sorriu. — Eu não sou?
— Não neste caso, porque, veja você, ninguém mais podia ver sua beleza. Ela
era simples e desinteressante para o resto dos deuses. Ela tinha sido feita antes
do nascimento, como castigo para sua mãe, que havia cruzado Juno. E assim a
filha foi punida com mediocridade.

221
— Bem, eu certamente posso entender isso, — ela disse calmamente, e
ocorreu a Devil que ela não queria que ele ouvisse as palavras. Ele não teria, se
não fosse pelo banco.
— Mas ela não era clara. E ela não era desinteressante. Ela era linda além da
medida, e Janus podia ver. Ele podia ver o começo dela e o fim dela. E nela, ele
viu algo que nunca se permitiu ver.
Seus lábios cheios se abriram com uma pequena inspiração. Ele a tinha. —
O que ele viu?
— O presente. — Ele teria ficado lá, para sempre, naquele banco, preso por
sua atenção extasiada. — Ele nunca se importou com isso antes. Não até ela
chegar.
Não até que ela lhe mostrasse o que poderia ser.
— O que aconteceu?
— Eles se casaram e, na consumação de seu casamento, Janus, o deus com
duas faces, tornou-se o deus com três. Mas apenas Cardea viu a terceira face -
era apenas para ela, o rosto que experimentava felicidade, alegria, bondade,
amor e paz. O rosto que viu o presente. Apenas Cardea era dotada de uma
olhada no deus em sua forma completa e gloriosa. Como só Janus foi dotado de
uma olhada em sua deusa da mesma maneira.
— Ela abriu-o, — Felicity sussurrou, e as palavras ameaçaram trazer Devil de
joelhos.
Ele assentiu. — Ela era sua chave. — As palavras vieram como rodas no
cascalho. — E porque ela o presenteara com o presente, ele deu a ela o que podia
do passado e futuro, de começos e fins. Os romanos adoravam Janus no primeiro
mês do ano, mas, por sua vontade, eles honravam Cardea no primeiro dia de
cada mês - o fim do que tinha sido, o começo do que estava por vir.
— E depois? O que aconteceu com eles?
— Eles se divertiram um com o outro, — ele respondeu. — Gratos em ter
finalmente encontrado o outro ser em todo o mundo que podia vê-los por quem
eles eram. Eles nunca estavam separados - Janus, para sempre o deus da
fechadura, Cardea, para sempre a deusa da dobradiça. E a Terra
continua girando.
Ela deslizou na direção dele por apenas um momento, até que percebeu o
que estava fazendo - que ela não deveria estar se movendo. Isso não era
apropriado. Não que alguma coisa entre eles tivesse sido apropriada.
222
Ele a queria perto dele. Tocando nele. Este banco era um dispositivo de
tortura. — Você gostou do beijo?
Ele não deveria ter perguntado, mas ela respondeu assim mesmo. — Qual
deles?
Ele levantou uma sobrancelha. — Eu sei que você gostou do que
compartilhamos.
— Tal modéstia.
— Não é vaidade. Você gostou. — Ele fez uma pausa. — E eu também.
Ela inalou agudamente, e ele ouviu isto tão bem como viu isto, o modo que
ela se endireitou. Talvez era a facilidade de sussurros, mas ele não poderia parar-
se de acrescentar: — Será que ninguém nunca disse que você
tem um belo rubor?
Vermelho rastejou para suas bochechas. — Não.
— Você faz isso me faz pensar em bagas de verão e creme doce.
Ela olhou para o colo. — Você não deveria...
— Isso me faz pensar o que eu não posso ver que ficou rosa. Isso me faz
pensar se todo aquele rosa tem um sabor tão doce quanto parece.
— Você não deveria...
— Eu sei que seus lábios são doces - seus mamilos também. Será que você
sabe que eles são da mesma cor? Aquele rosa lindo e perfeito.
Suas bochechas estavam em chamas. — Pare, — ela sussurrou, e ele poderia
jurar que ele ouviu o som dela respirando ao longo de seu caminho secreto de
pedra.
Ele baixou a voz para um sussurro. — Você acha que nós ofendemos o
banco?
Ela deu uma risadinha, e ele ficou duro com o som, tão perto e com ela tão
impossivelmente longe.
— Porque imagino que quando este banco foi presenteado à dona da casa,
seu amante sentou-se no outro extremo e disse coisas muito pior.
Ela olhou para ele então, e ele viu o calor em seu olhar. A curiosidade. Felicity
queria ouvir pior.
Melhor.

223
— Devo dizer-lhe o que imagino que ele disse? — Perguntou ele.
Ela assentiu. Mal. Mas o suficiente. E, milagrosamente, ela não desviou o
olhar. Ela queria ouvir mais, e ela queria ouvir isso dele.
— Eu imagino que ele disse a ela que ele construiu este lugar dentro desta
teia de sebes para que ninguém pudesse ver. Porque, veja, minha encantadora
Felicity, não é suficiente que possamos sussurrar e não sermos ouvidos... porque
você revela tudo o que pensa e sente no seu belo rosto aberto.
Ela levou a mão a uma bochecha e ele continuou sua suave ladainha. — Eu
imagino que o amante da dama adorasse o modo como suas emoções brincavam
em seu rosto - a maneira como seus lábios se abriam como uma tentação
encarnada. Imagino que ele tenha se maravilhado com o rosa deles, imaginando
como eles combinavam com as pontas perfeitas de seus seios redondos e com a
perfeição rosa de algum outro lugar completamente diferente. — Ela engasgou,
seus olhos voando para os dele. Ele sorriu. — Eu vejo que você não é tão inocente
como gostaria que os outros acreditassem, amor.
— Você deveria parar.
— Provavelmente, — ele respondeu. — Mas você prefere que eu continue?
— Sim.
Cristo, aquela palavra só, a glória disto, se revoltou através dele. Ele queria
ouvir isso dela muitas vezes enquanto falava e a tocava, e a beijava. Ele queria
isso enquanto os dedos dela arranhavam seus cabelos, enquanto suas mãos se
agarravam em seus ombros, enquanto dirigiam sua boca para onde ela queria
que ele fosse.
Ele queria isso, ir até ela e continuar com as mãos e os lábios, mas ela o
parou.
— Devil. — Ele encontrou seu olhar. — Você mentiu para mim.
Cem vezes. Mil.
— Sobre o quê?
— Marwick nunca iria chamuscar suas asas.
— Não. — Não que Devil teria deixado isso chegar tão longe. Nem uma vez
ele percebeu o quão quente ela queimou.
— Eu ainda quero as asas chamuscadas.

224
O sol estava saindo e a escuridão estava caindo e, com isso, sua capacidade
de resistir a ela. Ele balançou sua cabeça. — Eu não posso fazê-lo querer você.
Eu não vou.
Que maldita bagunça ele fez. Ele perdeu o controle de tudo isso. Cedido
todo o seu poder para esta mulher, que não tinha compreensão de como ela
exercia isso.
Ela balançou a cabeça. — Eu não quero Marwick.
Ela estava a seis metros de distância, e as palavras sussurradas pareciam
disparas em seus ouvidos, mas ele ainda não acreditava que as ouvira
corretamente. — Diga isso de novo.
Felicity estava observando-o a partir de seu fim do banco, seus olhos
marrom-aveludo inabalável. — Marwick não é minha mariposa.
— Quem é então?
— Você, — ela sussurrou.
Ele já estava se movendo em direção a ela, fogo já o consumindo, sabendo
que ele nunca iria sobreviver.

Capítulo Dezenove

Ela queria ele.


Não neste momento, no banco sussurrante dos jardins, apesar disso
também.
Ela o queria para sempre.
E não só porque não queria o estranho duque que parecia desinteressado
em casamento e ainda menos interessado nas armadilhas dele. Não, ela o queria
porque queria um homem que a beijasse como se ela fosse tudo o que ele iria
querer. Ela queria um homem que a provocasse e depois a enfeitiçasse com

225
histórias antigas. Ela queria um homem que fizesse promessas a ela que só
ele poderia manter.
Ela queria esse homem. Devil.
Ela não sabia o nome verdadeiro dele ou o passado dele, mas ela conhecia
os olhos dele e o toque dele e o modo como ele a via e escutava, e ela o
queria. Para um parceiro. Por um futuro.
Aqui, nos jardins da casa da sua família. Em Covent Garden. Na Patagônia.
Onde ele quisesse. E quando ele ficou de joelhos na frente dela, foi como se ele
estivesse lá mil vezes antes, colocando uma mão em seu quadril e a outra em
volta do pescoço para puxá-la para ele e beijá-la, ela o queria ainda mais, e não
apenas porque seu beijo a fez querer morar aqui, neste banco, sua tentação
sussurrada em seus ouvidos, seus lábios sobre sua pele, pelo resto de sua vida.
— Felicity Faircloth, você deve me arruinar, — ele sussurrou, tomando sua
boca, roubando beijos entre suas palavras. — Eu jurei que viria aqui... para te
dizer para me deixar em paz... para dizer-lhe para esquecer de mim.
As mãos dela chegaram aos ombros dele, segurando o tecido de sua camisa
enquanto ele deslizava os lábios pela bochecha dela, tomando o lóbulo da orelha
dela entre os dentes mordiscando-o. — Eu não quero te deixar, — ela
sussurrou. — Eu não quero esquecer de você.
Eu não quero casar com outro.
Ele se afastou, colocando distância suficiente entre eles para poder procurar
o rosto dela. — Por quê?
Como ele poderia perguntar isso a ela? Como ela poderia encontrar a
resposta?
— Porque eu quero saber tudo de você, — ela respondeu, o eco da história
que ele tinha acabado de dizer a ela. — Eu quero ver seu passado e seu futuro.
Ele balançou sua cabeça. — Eu não sou um deus, Felicity Faircloth. Eu sou o
oposto de um. E você é boa demais para meu passado ou meu futuro.
E quanto ao seu presente? ela queria perguntar a ele, desesperadamente. Em
vez disso, ela o puxou para ela e ele veio, beijando-a novamente, rosnando baixo na
parte de trás de sua garganta, lambendo seus lábios até que ela abriu para ele e ele
podia provocar dentro, tentando-a. Ela suspirou, e ele recompensou o som
aprofundando o beijo, uma mão mexendo nos grampos de cabelo enquanto a outra
encontrava o tornozelo, liso e nu sob as saias. Seus dedos quentes envolveram seu

226
tornozelo, fortes e firmes, então começaram a provocar o interior de sua perna. —
Novamente, sem meias, — disse ele. — Minha perversa solteirona.
— Espere, — ela ofegou, e ele parou seu toque instantaneamente quando
ela se afastou dele, querendo ver seus olhos - aqueles belos olhos âmbar,
rodeados de preto. — Por que você mente pra mim?
— Eu minto para você?
Ela procurou seu rosto por um longo momento antes de dizer: — Eu acho
que você sabe. Eu acho que você mente toda vez que você olha para mim.
— Eu minto toda vez que olho para alguém.
— Diga-me algo verdadeiro, — disse ela.
— Eu quero você. — As palavras foram instantâneas, e ela viu a honestidade
nelas. Prazer passou por ela.
Não foi o suficiente. — Algo mais.
Ele balançou sua cabeça. — Não há mais nada. Não agora.
— Outra mentira, — ela sussurrou, mas ela se inclinou e beijou-o de qualquer
maneira, sentindo seu desejo. Combinando com o dela mesmo. Quando o beijo
terminou, ambos estavam ofegantes.
Ele envolveu uma mão grande e firme em volta da nuca dela e pressionou a
testa na dela. Ele fechou os olhos e disse, dolorosamente suave: — É a única
verdade. Eu quero você. Eu nunca na minha vida sequer sonhei em querer algo
como você. Algo primitivo e perfeito. — Seus olhos se abriram, encontrando os
dela instantaneamente. — É como querer a luz do sol.
Esse homem seria o fim dela. Ele ia arruiná-la para todos os outros.
— Você não pode segurar a luz do sol, no entanto, — ele sussurrou. — Não
importa o quanto você deseje tocá-la, ela escorrega por entre os dedos,
afugentado pela escuridão.
Ela balançou a cabeça. — Você está errado. A luz do sol não é afugentada
pelo escuro. Enche-o. — E então ela o beijou novamente, e ele assumiu o controle,
temperando sua ânsia com sua superior habilidade - fazendo a carícia lenta, longa
e profunda, seus dedos traçando o interior de sua perna.
Ela deixou que ele a tocasse, deixasse que ele provocasse o joelho dela,
abrindo espaço para o toque dele naquela pele que nunca havia sido tocada
antes. Ela engasgou quando ele se moveu mais alto, seu toque como um sussurro,
mal lá e consumindo-a, no entanto.
227
Ele quebrou o beijo. — Então suave, — ele disse, pressionando beijos
quentes e cheios na coluna de seu pescoço enquanto ela ofegava seu prazer. —
Como seda. — Ele acariciou a coxa dela, deixando o fogo em seu rastro até chegar
a uma borda de cetim e renda. Ele tocou a fita que encontrou lá, e ela quis que
fosse embora. — Estas são...
Ela assentiu, sabendo que deveria estar mais envergonhada. Porém, não se
importando. — As que você me deu.
— Se eu fosse olhar... — Ele puxou a fita, afrouxando a perna da calça, e ela
fechou os olhos com a sensação. — Seriam rosa?
Ela assentiu com a cabeça.
— Posso?
Seus olhos se abriram. — Você pode o quê?
Só se você prometer tocar também.
De alguma forma, ela se absteve de dizer as palavras. Mas ela não pôde
deixar de concordar, sabendo que não deveria. Sabendo que ela queria tudo o
que ele prometia.
No momento em que ela fez, ele se moveu, sentando-se para levantar as
saias e revelá-la. Suas bochechas arderam quando ele pegou as fitas de seda
rosa. — Eu vou lembrar estas lindas fitas rosa, — ele disse baixinho, para si mesmo
mais do que para ela, enquanto seus dedos quentes deslizaram por baixo de sua
coxa, sob o tecido, — para o resto da minha vida.
Ela se inclinou para trás, dando-lhe mais acesso. — Eu vou lembrar disso.
Seu olhar cintilou para o dela. Sua mão subiu até a cintura dela, para outra
fita rosa, uma que ele não podia ver, mas sem esforço, no entanto. — Esta?
Ela ofegou. — Sim.
Ele segurou o cós. — Devo dar-lhe outras memórias, amor?
— Sim, — ela sussurrou, e ele puxou, removendo a roupa com eficiência. —
Por favor.
Jogando-a para o lado, ele retornou as mãos para as pernas dela, agora
totalmente nuas, envolto na seda rosa de seu vestido. — Muito mais bonita sem
as fitas, — ele sussurrou, pressionando um beijo suave em seu joelho, a carícia
enviando calor através dela. — Abra para mim, amor.

228
Talvez fosse a sensação do comando contra aquela pele que ninguém jamais
tocara. Talvez fosse o som disso - o grunhido que fez seu coração bater.
Mas era muito provável que o resto tivesse Felicity abrindo as coxas para o
ar, o sol e esse homem magnífico.
Foi o carinho. Amor.
Ele era perigoso de fato.
Porque no momento que ela fez o que ele pediu, suas mãos fortes e mornas
trabalharam no interior de seus joelhos e a manteve aberta, seu olhar fixo no
espaço sombreado entre suas coxas, sua garganta trabalhando como se ele
estivesse se segurando.
Ela estendeu a mão para ele, seus dedos arrastando pelo lado do rosto dele,
correndo sobre sua cicatriz, totalmente branca, mas o músculo se contorcendo
embaixo dela. — Você parece como se... — Ele encontrou seus olhos, e o que ela
viu lá a levou a respiração. — Você parece...
— Com fome. — Suas mãos se moveram então, lindamente, deslizando por
suas coxas, empurrando suas saias até onde elas iriam. — Estou faminto por você,
Felicity Faircloth. Estou morrendo de fome por você. — Seus dedos alcançaram
os cachos escuros que protegiam seu sexo. — Eu quero tocar em você, amor. E
eu quero mais. Eu quero provar você.
As palavras podem tê-la chocado, mas ele as pontuou com um golpe suave,
um lento deslizar enquanto ele a abria. — Eu quero saber cada centímetro de
você. O que te dá prazer. — Um movimento. Um gemido profundo e delicioso.
— Você está tão molhada para mim.
Um rubor subiu em suas bochechas e ele balançou a cabeça, ajoelhando-se
para roubar um beijo.
Não, — ele sussurrou. — Nunca se envergonhe disso. Você quer isso, não
quer? Meu toque?
Ela fechou os olhos. — Sim. — Mais do que qualquer coisa.
— Você quer meu beijo.
Ela o puxou para ela. Tomou seus lábios. — Sim.
— Garota gananciosa. Você pode tê-lo a qualquer momento que você
pedir.
As palavras enviaram uma inundação de fogo líquido através dela. — Eu
quero isso agora.
229
Ele riu das palavras, baixo e áspero. — Eu quero dar isso para você. — Ele
acariciou, e ela ofegou. — Você gosta disso? — Ela assentiu, levantando os
quadris em direção ao seu toque. — Aqui? — Um longo e persistente toque. —
Ou aqui? — Um círculo lento, firme e gentil. Ela ofegou. — Ah... — ele disse. —
Aqui.
Outro círculo, e sua espinha foi direto, seus dedos apertando em seu ombro,
seus olhos se fechando, sua boca caindo aberta. — Sim. Ai. Por favor.
— Hmm. — Os traços circulares continuaram, preguiçosos e perfeitos, e
pensou mexidos. Ela se abaixou para agarrar sua mão, seus dedos circulando seu
pulso. — Você deseja que eu pare?
— Não! — Ela engasgou. — Sim. Eu não sei... — Ele fez, e ela odiava-o um
pouco por isso. Os olhos dela se abriram. — Não pare.
Ele se inclinou e a beijou de novo, depois disse: — Acho que eu deveria lhe
mostrar outra coisa.
— Mas eu gostei disso! — protestou ela.
— Você vai gostar mais disso, — ele sussurrou.
Ela se arqueou em direção a ele enquanto seus dedos recuavam. — Devil,
por favor.
— Devon.
Ela encontrou seu olhar, claro, bonito e cheio de algo que ela não
reconheceu. — O que?
— Me chame de Devon.
Seu coração ameaçou saltar de seu peito, sua mão deslizando por sua
bochecha. — Devon.
Em resposta, ele baixou a cabeça para a coxa dela, como se estivesse
adorando. O que era louco, claro. Ele era o único que merecia adoração. Ela
acariciou seus cabelos, seus dedos tremendo com a necessidade dele. Por seu
beijo, sim. Seu toque sim. Mas ele. — Devon, — ela sussurrou novamente.
O nome o destrancou, e ele pressionou um beijo suave em sua coxa, e outro,
e outro, perseguindo a pele macia para seu sexo, suas mãos ainda acariciando
seu cabelo liso e curto. Ele separou suas dobras, abrindo-a para seu olhar, e, por
um momento, ela lutou, envergonhada por suas ações.
Até que ele falou, sua respiração quente e devastadora contra ela. — Tão
linda. — Ele pressionou um beijo diretamente acima de seu sexo, inalando
230
profundamente, como se convocasse forças. — Eu não deveria ter dito a
você. Agora você me possui.
Se ao menos fosse verdade. E ainda assim... — Devon.
Ele olhou para ela então, seus olhos tudo o que ela podia ver. — Mostre-me
o que você gosta.
Ela balançou a cabeça. — Eu não sei.
— Mas você vai. — E então ele estava beijando-a, e ela estava perdida,
ofegando seu prazer quando ele pressionou sua língua em sua suavidade e fez
amor com ela com aqueles círculos lentos e lânguidos que ele descobriu que ela
gostava tanto. Felicity estava desfeita, as mãos na cabeça dele enquanto a língua
dele acariciava o inchado e dolorido centro dela, enviando onda após onda de
prazer através dela.
Seus dedos apertaram, segurando-o contra ela. Ela se moveu contra ele, e
Devil-Devon gemeu, deixando-a usá-lo, saboreando-a, impossivelmente, como se
ela fosse tudo o que ele desejava. Ao som, Felicity o soltou, envergonhada, e ele
levantou a cabeça instantaneamente, terminando seu prazer. Não! Ela balançou a
cabeça, levantando as mãos. — Sinto muito, eu não nunca...
Ele pegou uma mão dela, pressionando um beijo no centro da sua palma
enquanto ele voltava para sua cabeça. — Nunca se desculpe por pegar o que
você quer, amor. Por me mostrar como te dar prazer.
Ela fechou os olhos, horrorizada com as palavras, certa de que as mulheres
não faziam isso. Devil voltou à sua tarefa, sua língua tremulou apenas no centro
dela. Muito levemente. Quase lá. Ela abriu os olhos. — Devon. — O nome veio
em um gemido. Seus olhos encontraram os dela pela longa extensão de seu
torso, e ela viu o dano neles. — Por favor, — disse ela. — Mais.
— Mostre-me, — disse ele, continuando sua provocação. Ela sabia o que ele
queria dela. Ela poderia fazer isso?
Ele se inclinou para trás e deu um longo e lento sopro de ar sobre ela. Gentil.
Inútil. Entorpecente. Ela levantou os quadris. Ele recompensou o movimento
chupando a carne dela. Ela ofegou.
E então, ardentemente, ele retornou ao seu toque quase inexistente. — Faça
isso!
Ele levantou a cabeça e deu a ela um olhar de puro desafio. —
Você faz isso.

231
Deus a ajudasse. Ela o guiou, levantando os quadris, sentindo prazer. Em
resposta, ele passou os braços ao redor de seus quadris, puxando-a para mais
perto, segurando-a firme e forte, banqueteando-se com ela enquanto ela
suspirava seu nome de novo e de novo, contorcendo-se contra ele. Ele moveu
uma mão para aumentar seu prazer, deslizando–a dentro dela, encontrando um
ponto que a fez ver estrelas. — Devon!
Sua resposta foi um grunhido, a vibração aumentando o imenso prazer que
ele arrancava dela, o comando nela fazendo-a apertar, seus quadris se elevando,
seu peito cheio de prazer. E Felicity estava perdida, incapaz de fazer qualquer
coisa além de entregar-se a esse homem magnífico e seu magnífico toque,
pulsando contra ele, gritando seu nome enquanto o mundo se inclinava e tudo o
que ela sabia mudava.
E de alguma forma, quando ela se afastou, ela começou a rir.
Era incontrolável - uma exclamação de profunda, quase insuportável euforia,
rolando através dela quando ele convocou prazer dela, enquanto ela se movia
contra ele e se soltava. Ela riu e riu e se divertiu com este homem, seu beijo, seu
toque, seus dedos raspando através de seu cabelo bem tosado.
Logo, sua boca suavizou, seus dedos se acalmaram quando ela se acalmou.
Ele virou a cabeça, colocando os lábios na coxa dela mais uma vez, suavemente.
Ela acariciou a cabeça e o rosto dele, a nuca e os belos e largos ombros, sem
querer deixá-lo ir. — Foi isso...
Ele olhou para ela, e ela podia ler o desejo em seus olhos, escuro e
pecaminoso. — Foi glorioso.
Ela corou. — Eu não esperava... Eu não queria rir.
— Eu sei.
Era normal rir? Ela não podia perguntar a ele. Então, em vez disso, ela disse:
— Eu nunca me senti assim.
Algo brilhou em seu rosto, e em seguida ido embora antes que ela pudesse
lê-lo, substituída por um sorriso malicioso, um lado de sua linda boca inclinando-
se. — Eu sei, amor. Eu estava lá. Eu senti você contra mim. Apertada em volta dos
meus dedos. Pulsando contra a minha língua. E essa risada... foi a coisa mais
erótico que eu já ouvi. Para o resto da minha vida, eu vou ouvir essa risada em
meus sonhos.
E então ele se levantou, acariciando sua coxas com as palmas de suas mãos,
os últimos raios de sol fazendo o céu sangrar atrás dele.

232
Ele se foi. Ainda estava lá, mas se foi dela, como se ele nunca tivesse estado
lá para começar. Ela veio para a frente no banco. — Devon?
Ele balançou a cabeça, mal olhando para ela. — Eu não deveria ter lhe dito
isso.
— Por que não?
— Porque não é para você.
As palavras ardiam como um golpe. Ela endureceu.
Ele rosnou, baixo e escuro, passando as mãos sobre a cabeça perfeitamente
formada. Ela odiava que ela percebesse essa perfeição. Odiava que ela notasse
tudo sobre ele - o corte escuro de suas sobrancelhas, baixa sobre seus olhos, o
sulco entre eles. A linha reta de seu nariz e o recuo quase inexistente na ponta
dele. A sombra da barba em suas bochechas, como se ele não pudesse se barbear
o suficiente para manter a escuridão ali. E essa cicatriz, perversa e bonita porque
era dele.
Não é para você.
Nunca para ser dela.
Ele era a fechadura que ela nunca abriria. Não importava que ele parecesse
saber uma dúzia de maneiras de abri-la.
— Você me pediu algo de verdade, — disse ele, com uma voz rouca. — Mais
cedo.
Ela se levantou, querendo se livrar do banco que nunca seria dela novamente,
porque sempre seria dele. — Sim. E você mentiu.
— Eu não fiz, — disse ele. — Eu te disse que queria você.
Por um momento, não para sempre.
Ela não disse isso, e ela estava orgulhosa de si mesma. — E eu também não
menti quando lhe disse que meu nome não era para você.
Ele não precisava dizer duas vezes. Não tinha que picar duas vezes. —
Sim, Devil. Eu não sou estúpida. Eu entendo que seu nome de nascimento é
muito precioso para você compartilhar comigo.
Ele desviou o olhar novamente. Amaldiçoando novamente. — Pelo amor de
Deus, Felicity. Quando digo que não é para você, é porque não é nada precioso.
Porque te contamina falar isso.
Ela balançou a cabeça. — Eu não...
233
— Não é meu nome de nascimento; Eu não tenho nome de nascimento. Fui
encontrado, com dias de idade, embrulhado em panos e gritando nas margens
do rio Culm, um bilhete pregado em mim, com instruções de que eu seria enviado
para o meu pai.
Querido Deus.
Seu peito apertou com as palavras. Na visão do que ele tinha falado, uma
criança. Um bebê. Abandonado. — Quem faria uma coisa dessas?
— Minha mãe, — ele disse sem emoção. — Antes que ela encheu seus
bolsos e caminhou para a água, pensando que seria melhor para mim com ela
fora. — Felicity se sentiu doente. O que essa pobre mulher teve que
enfrentar? Que medo ela deve ter carregado? Que tristeza? E depois ele
acrescentou: — Ela achou que ele me aceitaria.
Claro que ela pensou isso. Quem não iria aceitar ele, este pilar de um
homem, orgulhoso, forte, brilhante e ousado? Como poderia alguém não amar
tal filho?
Como alguém poderia não amar um homem assim?
Como alguém poderia deixá-lo?
O pensamento a perturbou em uma inundação de reconhecimento. Ela o
amava. De alguma forma, ela se apaixonou por ele. O que ela ia fazer?
Ela andou até ele, procurando por ele, querendo mostrar a ele. Querendo
amá-lo. — Devil.
Ele balançou a cabeça com o nome sussurrado e recuou, recusando seu
toque, suas palavras insensíveis. Milagrosamente assim. — Ele não veio para mim.
E ninguém na cidade queria um bastardo rejeitado - então eles me mandaram
para um orfanato. Eu não tinha nome, então eles me deram o nome de Devon
Culm - do condado de onde vim e o rio onde minha mãe morreu.
Ela estendeu a mão para ele novamente, apenas para afastá-lo novamente.
— Seu pai... ele não deveria saber... a carta não deve tê-lo encontrado... ele
nunca teria deixado você.
— Você vai ser uma mãe adorável algum dia, — disse ele. — Eu te disse isso
uma vez antes, mas eu quero que você saiba que eu estou falando sério. Chegará
um momento em que você terá belas filhas, cabelos de mogno, Felicity, e eu quero
que você saiba que você vai ser uma mãe notável.

234
Seus olhos ardiam com lágrimas pelas palavras - pela invocação daqueles
filhos que ela não queria, se não fossem compartilhados com um homem que ela
amava. Com esse homem, a quem ela amava.
— Você queria a verdade, Felicity Faircloth, e aí está. Eu estou tão abaixo de
você que lhe deixo com os meus pensamentos.
Ela ergueu o queixo. — Isso não é verdade. — Ele não via o quanto ele era
magnífico? Ele não entendia que ele valia por dez homens? Mais forte e mais
sábio e mais inteligente do que qualquer um que ela já conheceu?
Ele estendeu a mão para ela então, seus dedos passando por sua bochecha
em uma carícia que parecia muito com uma despedida. Ela estendeu a mão para
capturar a mão dele. — Devil, — ela repetiu. — Não é verdade.
— Eu cometi um erro, — disse ele, tão suavemente que quase foi levado pelo
vento. As palavras fizeram Felicity doer de tristeza.
— Isso não é um erro, — disse ela. — Esta é a melhor coisa que eu já conheci.
Ele balançou sua cabeça. — Você nunca vai me perdoar, — disse ele, olhando
para ela. — Não se eu te tirar da vida que você merece. Não me procure de novo.
Ele baixou a mão e se virou. Ela o observou ir, desejando que ele voltasse.
Dizendo a si mesma que, se ele voltasse, isso significaria alguma coisa. Se ele
voltasse, ele se importava com ela.
Ele não fez isso.
E sua frustração e irritação se agitaram.
— Por quê? — Ela chamou atrás dele, ficando mais irritada naquele momento.
Odiando o jeito que ele a tinha despido e a fez acreditar que ela importava - e
então a deixou como se ela não fosse nada além de uma distração da tarde.
Como se ela não fosse nada.
Ele parou, mas não olhou para ela.
Ela não se moveu, recusando-se a persegui-lo. Até mesmo uma solteirona
encalhada tinha orgulho. Mas ela deixou sua frustração soar. — Por que eu? Por
que me dar um gostinho disso? De você? Do seu mundo? Por que me deixar
pegar e depois arrebatar?
Estava se tornando mais difícil vê-lo sob a luz ofuscante, e ela se perguntou
se ele responderia. Quando ele fez isso, foi suave o suficiente para que ela se
perguntasse se ele queria que ela ouvisse. Se ele percebesse que a brisa levaria
as palavras para ela, assim como o banco havia feito anteriormente.
235
— Porque você é muito importante.
E ele foi embora, na escuridão.

Capítulo Vinte

Felicity havia seguido suas instruções.


Ela não o procurara, nem invadira seus escritórios nem seu armazém, nem
nenhum de seus vigias a vira em Covent Garden. De fato, Brixton retornou ao seu
posto do lado de fora da Bumble House e praticamente não relatara nenhuma
atividade de Felicity desde que Devil a deixara em seus jardins.
Ela nem sequer tinha enviado um bilhete para ele.
Fazia três dias que Felicity o deixara em paz, e Devil descobriu que estava
cada vez mais envolvido com ela a cada segundo que passava.
Talvez ele pudesse ter evitado se não tivesse respondido à convocação que
ela enviara via Brixton. Talvez ele pudesse ter sido capaz de ignorá-la se não a
tivesse beijado nos jardins. Se ele não se lembrasse do som de sua voz, carregada
ao longo daquele banco sussurrante. Se ele não soubesse, que ela ria enquanto
gozava.
Ela riu quando gozou.
Ele nunca conheceu uma mulher que se entregava ao prazer daquele jeito.
Tão completa, e intensamente, que o prazer dela emanava dela em alegria pura e
não adulterada. Pelo resto de sua vida, ele se lembraria do som de sua risada
naquele jardim, compartilhado com ele e o sol poente e as árvores e nada mais.
Pelo resto de sua vida, ele sonharia com o gosto de seu prazer e o som disso.
Ele foi arruinado por ela.
Ele passou três dias fingindo ignorar a lembrança de seu prazer, de sua
gloriosa gargalhada e, finalmente, fracassando, deixara seus escritórios para
atender ao mais recente embarque de gelo no Tâmisa. O sol mal havia se posto
- enviando faixas douradas e roxas pelo céu acima de Londres - e era maré alta.
236
Devil cruzou sobre Fleet Street, em direção às docas, verificando seu relógio
enquanto ele andava - dez minutos depois das nove. Ele notou a calma das
tavernas frequentadas pelos estivadores de Londres, a maioria dos quais estariam
trabalhando aquela noite, vendo navios entrando e saindo das amarras no rio
enquanto a maré estava alta e os barcos podiam ser controlados. Uma vez que a
maré vazasse, demoraria doze horas para que os navios pudessem ser movidos
- e o tempo de envio era fundamental.
Atravessando a margem do rio, com a bengala na mão, ele seguiu as docas
por algumas centenas de metros até o grande leito que os Bastardos arrendavam
nas noites em que recebiam os embarques. Um imenso navio assomava com
tinta negra contra o céu cinzento, apenas ancorado, meio afundado no alto da
água por causa de sua carga - cento e cinquenta toneladas de gelo, uma boa
parte dele derretendo dentro do porão.
Whit já estava lá, chapéu preto baixo na testa, sobretudo agitando ao vento,
com Nik ao seu lado. A norueguesa estava folheando papéis de carga sob o olhar
nervoso do capitão do navio. — Está tudo aqui, de acordo com os papeis, —
disse ela. — Mas não podemos ter certeza até chegarmos a isso.
— Quanto tempo? — Whit perguntou, levantando a queixo ao perceber
a chegada de Devil.
— Se tivermos sorte, quarta à noite. — Duas noites depois. — Se
começarmos a drenagem do derretimento do porão hoje à noite, o momento da
maré começa a declinar, ele pode ser terminado antes disso.
— Duas noites e não mais, — rosnou Whit. — Não podemos nos arriscar a
ficar sentados sem guarda por mais tempo. — Uma dúzia de homens seriam
posicionados para proteger a carga enquanto a água era drenada do porão do
navio, porque não havia outra opção - era impossível acessar o porão enquanto
estava cheio de gelo derretido - mas as docas eram baixas e, enquanto estavam
nelas, o guarda não podia proteger nem a carga nem a si mesmos, assim como
os Bastardos gostavam.
— Duas noites, então. Farei com que os meninos se preparem para botas
molhadas. — Nik acenou para o capitão, liberando-o para seu navio.
— Nós também vamos querer guardas extras em movimento para o
armazém, — Devil disse, batendo sua bengala contra as tábuas do cais. — Eu não
quero ver outra carga comprometida.
— Feito.
— Excelente trabalho, Nik.
237
A norueguesa abaixou a cabeça em um reconhecimento quase inaudito do
elogio.
— Especialmente desde que Devil não teve nada a ver com este, —
acrescentou Whit.
Devil olhou para ele. — O que isso significa?
— Você passou duas semanas pulando atrás da garota.
— Por que diabos você está me seguindo?
Whit desviou o olhar, descendo a doca. — Enquanto ele estiver aqui, vou ter
todos rastreados.
Ewan. — Se ele nos quisesse, ele teria vindo por nós.
— Ele quer Grace.
— Entre seu disfarce e sua guarda, ela está bem protegida.
Whit grunhiu, baixo e cheio de coragem. — Estou surpreso que você sabia
que tinha um carregamento chegando hoje, com todo o tempo que você teve
com sua garota.
Que maldito bastardo seu irmão era. — Eu tinha que convencê-la a confiar
em mim se nós a usássemos para puni-lo.
Whit grunhiu. — Esse ainda é o plano, não é?
— Não — respondeu Devil instantaneamente, mesmo sabendo que ele
estava implorando por problemas, mas ele rejeitou a ideia de usar Felicity como
um peão em seu jogo tão completamente agora que ele não conseguia encontrar
a força para fingir o contrário.
Cristo, ele fez uma confusão disso tudo.
— Má plano, afinal de contas, não é? — disse Whit, e Devil resistiu ao
impulso de colocar o punho no rosto do irmão.
— Sem bobagens.
Whit compartilhou um olhar de soslaio com Nik, que falou para os dois. —
Se esse não é o plano, então o que você tem feito todo esse tempo?
— Você se preocupa com o navio, — disse Devil. — Isso não é da sua conta.
Ela encolheu os ombros e se virou.
— É uma pergunta justa, bruv.

238
Isso foi. Mas isso não significava que Devil tinha que responder. — Hoje à
noite, você encontrou sua língua?
— Alguém tem que ajudá-lo a resolver sua idiotice.
— Eu estou lidando com isso, — disse Devil. Ele iria.
Ele iria.
Tudo o que ele tinha que fazer era parar de pensar em sua maldita risada.
— Você. Maldito. Tolo.
Devil virou-se para as palavras. — Excelente. — Ele olhou para Nik. — Saia
enquanto você ainda pode.
A norueguesa subia a escada para começar sua avaliação do porão, quando
Grace se aproximou, alta, orgulhosa e perfeitamente vestida com um casaco
escarlate feito sob medida. Ela estava flanqueada por dois guardas - mulheres
em casacos pretos semelhantes. Tudo o que era visível sob o traje do trio eram
botas pretas, mas Devil sabia que todas vestiam calças - o que dava uma
caminhada rápida e uma corrida ainda mais rápida, caso precisassem se valer da
habilidade. Os guardas pararam dez jardas deles quando Grace se aproximou.
As sobrancelhas de Whit se ergueram e ele olhou por cima do ombro para
a irmã por um longo momento antes de voltar sua atenção para o navio meio
afundado na água. — Ai vem Dahlia.
Grace estreitou o olhar em Whit. — O que diabos você tem tão falante? —
Antes que ele pudesse responder, ela se virou para Devil. — Vocês dois juntos
têm a sensação de um ouriço de pele adocicada.
— Eu estou rotineiramente impressionado que os melhores e mais brilhantes
de Londres te acham encantadora, — disse Devil.
— Você achou que eu não iria descobrir isso? Você achou que isso poderia
acontecer além meu conhecimento? Será possível que vocês dois sofreram
golpes simultâneos na cabeça e esqueceram que eu sou mais inteligente do que
vocês dois juntos?
Whit olhou para Devil. — Ela parece infeliz.
— Infeliz? — Com a velocidade da luz, Grace encaixotou a orelha de Whit.
— Ei! — Whit dançou para trás, uma mão na parte do corpo ofendido. —
Dane-se maldita!

239
— Você não deve falar quando você está tão fora de prática, Fera. — Ela
andou em direção a ele, um dedo erguido em seu nariz. — Você deveria ter me
contado.
— Contado o que? — perguntou Whit num frustrado quase gemido.
Ela já havia virado as costas para ele, no entanto, contornando Devil, que
segurava sua bengala para impedi-la de chegar perto demais. — E você... Eu
deveria ter você jogado no rio. Você merece o cheiro dele por dias. Você merece
qualquer criatura perversa que encontrar o seu caminho para você vindo da lama.
Devil baixou o bastão, recuando com as palavras. Grace sempre foi a melhor
deles em ameaças verbais. Devil era melhor em cumpri-las bem. — Bom Deus.
Isso é sombrio.
— Você sabe que dia é hoje?
— O que?
— Você sabe. Que dia. É hoje.
— É segunda-feira. — Devil ficou nervoso.
— É, de fato, segunda-feira. — Ela enfiou a mão no casaco e extraiu um
jornal. — E você sabe o que está impresso no jornal de segunda-feira?
— Merda.
Whit soltou um assobio baixo.
— Ah. E assim voltamos à minha avaliação original.
— Ouriços estúpidos — disse Whit.
Grace se virou e levantou um dedo enluvado preto para ele. — Ouriço.
Singular. Um cérebro infinitesimal para ambos compartilharem. — Ela se voltou
para Devil.
— Eu não sei sobre o que você está falando, — ele disse, dando bronca.
— Você nem tente negar isso. E não seja idiota, embora você obviamente
seja um. — Ela fez uma pausa e respirou fundo. E quando ela falou, as palavras
eram mais suaves do que ele esperava. Cheio de mais emoção do que ela
esperava. — Banhos foram postados ontem no St. Paul's. O anúncio do noivado
do Duque de Marwick está nas Notícias de hoje.
Devil pegou o papel. — Dália...

240
Ela bateu na mão dele com o jornal enrolado, e ele recuou. — Quando você
ia me dizer?
— Nós não achamos que você iria gostar — Ele olhou para Whit, que
ofereceu nenhuma assistência. Ele voltou sua atenção para Graça amaldiçoado.
— O que você achou que eu faria? Me jogar da ponte mais próxima?
Devil olhou para longe. — Não. Claro que não.
— Rasgar minhas roupas?
Ele tentou um pequeno sorriso. — Possivelmente.
Ela deu-lhe uma olhada. — Minhas roupas são demasiadas caras para
rasgar.
Ele deu um pequeno bufo de risada com isso. — Claro que são.
— O que, então?
— Bem, assassinato não era uma impossibilidade, — respondeu Devil. — E a
última coisa que precisamos é de um duque morto.
Whit grunhiu. — Não é como se não tivéssemos tido um desses antes.
Grace ignorou os dois. — Eu não estou aqui porque ele vai se casar. Estou
aqui para você explicar por que minhas garotas me dizem que sua noiva está sob
a proteção dos Bastardos de Bareknuckle.
Ele congelou com as palavras.
Grace notou, enquanto notava tudo, uma sobrancelha vermelha subindo.
— Eu não acabei de apontar que a última coisa que precisamos é de um
aristocrata morto? Eu tive que proteger a garota. Ela quer entrar no jardim tanto
quanto qualquer um aqui quer.
— O que a filha do Marquês de Bumble está fazendo no jardim, Dev? —
Perguntou sua irmã.
Whit piorou as coisas. — Devil gosta da garota.
Grace não desviou o olhar dele. — Ele gosta?
Eu gosto muito dela.
— Esta é a garota simples que eu conheci em seus escritórios, correto?
— Ela não é simples.

241
As palavras atraíram a atenção tanto de Whit quanto de Grace. Whit grunhiu
e Grace disse, pensativa: — Não... Eu não suponho que ela seja.
Devil parecia um idiota, mas não respondeu.
Grace mudou de rumo. — Por que você não me disse que está tentando
manipulá-lo?
— Porque nós concordamos que vocês nunca mais se encontrariam. Porque
concordamos que nada sobre ele é seguro para você. — Grace era valiosa
demais. O duque nunca poderia saber onde ela estava. Grace era a prova de um
passado que Ewan faria qualquer coisa para manter em segredo.
Se Grace fosse descoberta, Ewan iria ser enforcado.
Um longo silêncio seguiu as palavras, e ela disse: — Nós concordamos isso
décadas atrás.
— Não é menos verdade agora, e você sabe disso. Ele veio por você. Ele se
lembra do acordo. Nenhum herdeiro. E ele quer negociar.
A compreensão brilhou nos olhos azuis de Grace. — Negociar? Ou ele quer
os dois?
— Ele não recebe nenhum dos dois — respondeu Devil.
Ela olhou de um irmãos para o outro. — Nós não somos mais crianças. Whit
enfiou as mãos nos bolsos do sobretudo, enquanto ela continuava. — Você não
precisa mais me proteger. Eu posso lidar de igual para igual com Ewan a qualquer
dia. Deixe-o vir para mim e eu mostrarei a ponta afiada da minha espada.
Não era verdade. Ewan sempre foi a fraqueza de Grace. Assim como ela era
a dele. E o destino era cruel por torná-los cada um a morte do outro.
— Grace... — Devil começou suavemente.
Ela acenou para o resto. — E então, o que? Que jogo você está jogando,
Dev? Você não está planejando deixar a garota casar com ele, não é?
— Não. — Cristo. Não.
— O que, então? Você planejou terminar o noivado e mandar uma
mensagem para ele? Não há herdeiros? — Ela olhou para Whit.
Whit abriu bem as mãos. — Eu queria dar uma surra nele e enviá-lo de
volta para o campo.

242
Grace sorriu. — Isso ainda é idiota, mas um pouco menos. Cristo, vocês dois.
— Ela ficou séria. — Eu deveria estar no plano, — ela disse suavemente. — Eu
deveria estar incluída nisso daqui em diante.
— Por quê?
— Porque ele não roubou meu futuro.
— Isso é uma mentira maldita, — disse Whit.
— Ele roubou seu futuro no momento em que ele respirou. Seu, mais que o
nosso, — concordou Devil. E o passado dela. E seu coração, mas eles nunca
discutiram isso. — Você era o herdeiro.
Grace ficou quieta, cada centímetro dela se fortalecendo com as palavras. Ela
balançou a cabeça. — Eu nunca fui herdeiro.
Ela era uma menina. Não que isso tivesse importado, já que seu pai, o duque,
havia colocado seu terrível plano em movimento. Devil pressionou. — Você
nasceu da Duquesa, batizada como futuro Duque. Ewan roubou seu futuro tão
intensamente quanto nosso pai.
Grace desviou o olhar, o vento do Tamisa chicoteando todo o tecido de seu
casaco escarlate em torno de suas pernas. — Seu pai me odiava desde o início, —
disse ela, alto o suficiente para ser ouvida ao vento. — Eu esperava sua traição;
Eu não contei para mais do que isso dele. — Ela sacudiu a cabeça. — Mas Ewan...
Devil odiava a confusão na voz de sua irmã. — Ele traiu todos nós. Ele
roubou o futuro de todo de nós. Mas você é a única de quem ele roubou.
Ela olhou para ele, seu olhar rastreando a cicatriz em sua bochecha. — Ele
quase te matou.
— Ele quase matou a todos nós, — respondeu Devil, a marca apertada em
sua pele.
— Ele ainda pode, — disse ela. — E aqui está a outra razão pela qual eu
deveria estar no plano; Eu sou a única que o conhecia melhor. — Isso era verdade.
— E Ewan não pode ser manipulado; ele faz a manipulação.
— Não dessa vez.
— Ele não é bobo; ele sabe que sou a guardiã de todos os seus segredos, —
disse ela. — Meu conhecimento - minha existência - o tem na forca. Ele não
descansará até que ele me encontre. Ele não descansou por vinte anos.
— Dizemos a ele que você está morta, — disse Whit. — Esse sempre foi o
plano, se ele chegasse perto o suficiente para cheirar você.
243
Ela balançou a cabeça. — Você não me coloca no chão até que eu esteja
com frio, rapazes. Ele está perto demais para não me encontrar.
— Nós nunca vamos desistir de você.
— E quando eu me cansei de me esconder? — Rosnou Whit, e ela se virou
para ele.
— Pobre Fera. Sempre querendo colocar seu punho através de algo. — Ela
olhou para Devil, deixando o Jardim em sua voz. — Não se preocupe, bruvs. Ele
não será o primeiro duque que lutamos e vencemos. — Ela fez uma pausa e
depois disse: — Pare de se preocupar comigo e se preocupe com o negócio.
Nenhum herdeiro.
Whit grunhiu e Grace se virou para ele.
— O que?
— Devil estragou tudo.
Devil rangeu os dentes. — Eu não estraguei tudo. Eu tenho um plano.
Grace olhou para ele. — Que tipo de plano?
— Sim, bruv. — Whit olhou para ele. — Que tipo de plano? Nós sabemos que
você não fará mal a menina.
Ele deveria castigá-los. — Eu estou tirando ela disso.
— Do casamento? — Grace respondeu. Quando ele não respondeu, ela
acrescentou: — Como? Se ele a deixar, ela estará danificada. Se ela o deixar, ela
estará danificada. Não há cenário em que a garota não seja destruída e você sabia
disso.
— Ela estava danificada antes de chegar perto dele, — disse Whit.
Devil se virou para o irmão. — Ela não estava.
Uma pausa. Então Grace disse: — Eu ouvi o mesmo. Algo sobre ser
encontrada em um quarto de dormir que não era o dela?
— Como você sabe disso?
Grace levantou uma sobrancelha vermelha em sua direção. — Eu preciso te
lembrar que eu sou a única com a rede de espiões decentes? Devo lhe contar o
que ouvi sobre você e elegante Felicity Faircloth?
Ele ignorou a provocação. — O ponto é que ela não está danificada. Ela é...
Perfeita.
244
Bem. Ele não podia dizer isso. — Oh, querido, — disse Grace.
Whit tirou o chapéu e passou a mão pela cabeça. — Você vê?
— Vê o que? — Perguntou Devil.
— Você se importa com a garota.
— Eu não me importo.
— Então jogue ela ao lobo. Leve-a para a beira do altar e arruíne-a. Prove
para Ewan que ele nunca se casará enquanto viver. Ou, se o fizer, será tão
enganado com herdeiros reais quanto o próprio pai. Que você irá eliminar a
possibilidade de qualquer herdeiro que ele possa encontrar. Cumpra seu voto.
Ele olhou para longe de sua irmã. — Eu não posso.
— Por que não?
— Porque ela será arruinada no confronto. Pelas minhas mãos.
— Minhas garotas de base me dizem que ela já está arruinada, Devil. Metade
do jardim viu você beijar a garota na noite em que disse ao mundo que ela estava
fora dos limites.
Ele nunca deveria tê-la tocado naquela noite. Nem nenhuma das noites
desde então. Mas esse não era o tipo de ruína que ele queria dizer. Não a ruína
tola que veio com um beijo clandestino. Uma noite de prazer - momentos
roubados que não significavam nada. Para o plano de Devil, para o trabalho, ele
teria tido que ter feito isso publicamente. Na frente de todo o mundo.
E Felicity seria exilada por isso. Ela nunca seria uma joia da sociedade. Ela
nunca voltaria a um lugar de honra. Nunca estaria no centro desse mundo pelo
qual ela ansiava.
Grace sorriu com sua falta de resposta. — Diga-me novamente que você não
se importa com a garota.
— Dane-se. — É claro que ele se importava. Ela era impossível não se
importar. E ele fez um bom sinal desde o começo, desde o momento em que a
viu na varanda. A partir do momento em que ele se desviou do seu plano de
mandar seu irmão fazer as malas e, em vez disso, permaneceu com ela... fez
promessas para ela que ele não tinha intenção de manter. Promessas feitas que
ele não poderia cumprir, mesmo que quisesse.
— Você já a jogou para os lobos, Dev, — sua irmã disse. — Só há uma
maneira de salvá-la.

245
Ele se virou para ela, incapaz de manter a raiva fria de sua voz. — Ewan não
tem herdeiros. E ele definitivamente não os recebe da Felicity Faircloth.
Ela é minha.
Uma sobrancelha vermelha subiu. — Não Ewan.
Sua testa franziu. — Quem? Quem nós sabemos que é bom o suficiente para
ela?
Grace sorriu então, cheia e aberta e sem cálculo. Ela olhou para Whit. —
Quem, de fato.
— Fera? — Devil pensou que ele poderia perder a cabeça com a ideia de seu
irmão tocar Felicity.
— Oh, pelo amor de Deus, — rosnou Whit. — Você só pode ter a inteligência
de um ouriço. Ela quer dizer você, Dev. Você se casa com a garota.
Coração acelerado, a emoção se manifestando através dele, a força disso
envolvendo-o. Excitação, desejo e algo perigosamente, impossivelmente perto
da esperança.
Impossivelmente perto e impossível.
Ele fechou as emoções. — Não
— Por que não?
— Ela não me quer. — Mentira. Marwick não é minha mariposa. Você é.
— Você quer ela?
Sim. Claro. Ele não podia imaginar como qualquer homem não iria querer
ela. Sua mão apertou na cabeça do leão de prata em sua palma.
Grace ignorou a resposta. — Você poderia se casar com ela. Salve-a da ruína.
— Não estaria salvando ela. Seria trocar uma ruína por outra. O que é mais
ruinoso para uma dama mais velha do que a vida de uma Sra. Na lama do Covent
Garden? Que tipo de vida ela teria aqui?
— Por favor, — Grace zombou. — Você é rico como um rei, Devil. Você
poderia comprar para ela o limite oeste da Berkeley Square.
— Você poderia comprá-la toda a Berkeley Square, — acrescentou Whit.
Não seria o suficiente. Ele poderia comprar seu Mayfair. Um camarote em
todos os teatros da cidade. Jantares com os homens mais poderosos de Londres.
Audiências com o rei. Ele podia vesti-la nos mais belos vestidos que Hebert
246
poderia criar. E ela nunca seria aceita por eles. Nunca seja bem recebida de volta.
Porque ela seria casada com um criminoso. Um com quem eles conspiraram
alegremente, mas um criminoso, no entanto. Um bastardo, criado em um
orfanato e criado no viveiro.
Se ele tivesse sido o único a ganhar o ducado, poderia ser diferente.
Ele balançou a cabeça, odiando o pensamento e um que ele não tinha tido
em duas décadas, desde que ele era um menino, dolorido com fome e
desesperado para dormir em algum lugar diferente do que nas ruas.
Atrás deles, ouvia-se passos ruidosos, rápidos e furiosos. Uma garota de no
máximo doze anos, loura e magra, parou diante dos seguranças de Grace. — Um
dos meus, — disse Grace, levantando a voz e acenando para frente. — Deixe-
a vir.
A garota se aproximou, um quadrado de papel na mão. Mergulhou num
joelho. — Senhorita Condry.
Grace estendeu a mão para receber a mensagem e a abriu, sua atenção não
mais no Devil.
Graças a Deus. Ele já disse o suficiente para soar como um bobo doente de
amor.
Talvez fosse uma mensagem suficientemente importante para ela parar de
perguntar a ele sobre Felicity.
Ela enfiou a mão no bolso, entregando uma moeda ao mensageiro, que já
estava se voltando para a escuridão. — Vai. Tenha cuidado. — Grace voltou sua
atenção para ele. — Ocorre que a ruína da senhora deve ser sua própria decisão,
você não acha?
Talvez não fosse o suficiente, e Grace iria falar sobre Felicity para sempre,
como perfeita tortura. — Ela já tomou a decisão. Ela mentiu sobre se casar com
um duque para voltar à sociedade. Ela escolheu Marwick, um duque que nunca
conheceu.
Eu queria puni-los, ela disse a ele. E eu queria que eles me quisessem de
volta.
— Eu cometi um erro ao trazer Felicity Faircloth para esta batalha.
Whit grunhiu.
— Deus sabe que é verdade, — concordou Grace.
— Vou tirá-la disso e salvar seu futuro no arranjo.
247
Grace assentiu, voltando sua atenção para o pedaço de papel que havia
recebido. — Eu não estou tão certa de que você está no controle de seu futuro
mais.
— Eu não estou tão certo de que ele já tenha estado no controle, — disse
Whit, apoiando-se contra o vento.
Ele fez uma careta para eles. — Vocês dois podem ir para o inferno.
— Diga-me. — Grace não olhou para cima. — Como parte do seu arranjo, a
dama pediu para ser educada na arte da tentação?
Devil parou. Como Grace saberia disso? — Ela fez. Sim.
Sua irmã olhou para ele. — E você não foi capaz de fornecer a dita instrução?
— Eu a instruí muito bem. — As sobrancelhas de Whit se ergueram, e Devil
teve a nítida impressão de que as rodas estavam saindo do carrinho. — Mas não
se tratava de tentar apenas alguém. Era sobre tentar o intempestivo. Era sobre
tentar Ewan, pelo amor de Deus. Para voltar à sociedade. Para subir a sua altura
total. Ela quer que sua reputação seja restaurada, junto com a de sua família. Você
não está ouvindo?
— A menina não parece se importar nem um pouco com sua reputação,
Devil, — disse Grace. — Eu posso ir tão longe a ponto de dizer que ela não tem
absolutamente nenhum interesse no que a sociedade pensa dela.
— Como você sabe disso? — Ele retrucou. — Você já a conheceu uma vez.
Ela brandiu a nota. — Porque ela está no clube agora.
Ele congelou. — Qual clube?
Uma sobrancelha vermelha perfeitamente arqueada se ergueu enquanto ela
respondia, toda calma: — Meu clube.
Houve uma batida, seguida pela voz calma de Whit. — Maldito inferno.
Ou talvez tenha sido Devil quem disse isso. Ele não estava certo, como ele
estava distraído pela lavagem de fúria que veio sobre ele com as palavras.
Ele se foi em um instante, desaparecendo na escuridão sem se despedir,
pernas compridas comendo o chão até que ele ficou insatisfeito com sua
velocidade e começou a correr.
Grace e Whit ficaram nas docas, observando seu irmão desaparecer na
escuridão antes que ela se virasse para ele e dissesse: — Bem. Isso tudo é
inesperado.

248
Whit assentiu uma vez. — Você percebe que Ewan não vai gostar quando o
Devil vencer.
— Eu sei.
Ele olhou para ela. — Você tem que sumir um pouco, Gracie.
Ela assentiu com a cabeça. — Eu sei.

Capítulo Vinte e Um

Felicity tinha certeza de que 72 Shelton Street era um bordel.


Quando ela bateu na entrada uma hora antes, uma pequena porta incrustada
se abriu, revelando um conjunto de lindos olhos forrados de kohl 11. E quando ela
disse a esses olhos que Dahlia a convidara, a pequena porta se abriu, e ela foi
bem recebida dentro.
Uma beldade alta de cabelos negros em uma roupa safira profunda a levou
para uma adorável sala de recepção, e explicou que Dahlia não estava no
momento e convidou Felicity a esperar. Como era impossível de negar sua
curiosidade, Felicity concordara, é claro.
Naquele momento, ela recebeu uma máscara e foi levada para uma sala
maior, de formato oval, envolta em seda e cetim, e marcada com mais ou menos
uma dúzia de sofás, poltronas e almofadas adornadas. Refrescos haviam sido
oferecidos.
E então os homens chegaram.
Ou melhor, eles começaram a chegar.
A sala ostentava meia dúzia de portas, todas fechadas, exceto para anunciar
a entrada do que deve ter sido um dos homens mais bonitos da Grã-Bretanha. E

11Kohl - é um cosmético antigo para olhos, tradicionalmente feito por moagem para fins semelhantes
ao carvão utilizado em rímel. É amplamente utilizado no Oriente Médio, Norte da África, Mediterrâneo,
Sul da Ásia e no Chifre da África como delineador para contornar e/ou escurecer as pálpebras e como
rímel para os cílios.
249
eles continuavam chegando, esses homens encantadores, oferecendo mais vinho,
mais queijo, doces confeitados e ameixas doces. Eles sentaram-se perto e
presenteou-a com histórias de sua força, contando-lhe piadas deliciosas e
divertidas, e fazendo-a se sentir como se ela fosse a única mulher no mundo.
Fazendo-a esquecer, quase, a razão pela qual ela veio em primeiro lugar.
O que foi extraordinário isso - a charmosa assembleia de homens a fez se
sentir o centro de seu mundo, apesar da presença de muitas outras mulheres,
todas entrando usando máscaras, cujas idas e vindas pareciam ser feitas com o
propósito de se unir a um (e em alguns casos, mais do que um) desses senhores.
Nenhuma dúvida para fazer amor.
Ocorreu a Felicity que havia um tempo em que ela poderia ter se sentido
desconfortável com os acontecimentos dentro da 72 Shelton Street, mas agora
estava mais do que emocionada com sua decisão de aceitar o convite de Dahlia,
porque se alguém pudesse ensiná-la a conquistar um homem como Devil, seriam
esses homens, que foram tão impressionantemente encantador.
Um homem alto e bonito a entretinha; ele se apresentou como Nelson
- como o herói, mas mais bonito - com um sorriso nos olhos gentis que tinha
belas rugas nos cantos, e o fazia parecer o tipo de homem com quem se poderia
passar a vida inteira, não apenas uma noite.
Depois de elogiá-la, Nelson começou a contagiá-la com a história de um
gato que conhecera - alguém que gostava de frequentar cultos regulares na
igreja, e não simplesmente frequentá-los: — Ele gostava particularmente de subir
no púlpito e espalhar-se através do Livro de Oração Comum. É desnecessário
dizer que o vigário não se importou com isso e, rotineiramente, teve que expulsar
o gato para continuar seu sermão.
Felicity riu da imagem quando Nelson acrescentou, olhos escuros brilhando,
— Eu sempre achei que seria um tratamento cruel. A buceta doce só queria um
animal de estimação.
O duplo sentido nas palavras não escapou de Felicity, e seus olhos se
arregalaram com o flerte. Era considerado um flerte se fosse tão evidente?
Antes que ela pudesse descobrir a resposta, duas batidas soaram, e ela
sentiu a vibração nas tábuas do assoalho enquanto o olhar de Nelson piscaram
para um ponto atrás dela, subindo, subindo, até que seus olhos também estavam
arregalados, e ele estava se levantando.
Felicity sabia antes de se virar o que ela iria encontrar lá.

250
Ou melhor, quem ela encontraria.
O coração dela começou a bater descontroladamente quando ela descobriu
Devil em sua escuridão alta, vestido todo de preto, bengala na mão, nuvens de
tempestade em seus olhos. Sua respiração ficou presa quando ele procurou seu
rosto, o músculo em sua mandíbula, duro tiquetaqueando descontroladamente,
fazendo-a querer estender a mão e tocá-lo. Acalmá-lo.
Não.
Não haveria nada disso.
Em vez disso, endireitou a coluna e disse: — O que você está fazendo aqui?
— Este lugar não é para você.
Ela imediatamente resistiu às palavras. — Eu não consigo entender como
você está em posição de dizer isso.
Se possível, os ângulos de seu rosto ficaram mais afiados, seus olhos
escurecendo. — Porque este lugar fica em Covent Garden e eu possuo o Covent
Garden, Felicity Faircloth.
Ela sorriu. — Bem. Então eu sugiro que você pense com muito cuidado antes
de dar liberdade a uma princesa de conto de fadas em sua propriedade.
— Droga, Felicity, — disse ele, sua voz baixa o suficiente para não chamar a
atenção dos outros na sala. — Você não pode sair de Mayfair quando quiser.
— Parece que eu posso, no entanto, não posso? — Graças a Deus por ser
uma solteirona; pois ninguém pensava em verificar para ter certeza de que a
pessoa permaneceu em seu quarto depois que ela se retirou para a cama. Isso
era uma das coisas que fazia com que ela se sentisse bastante satisfeita quando
escapava de casa.
E ainda mais quando conseguia dar uma boa dose a um homem arrogante
que merecia. Sentindo-se orgulhosa de si mesma, virou-se e atravessou a sala,
abrindo uma das belas portas de mogno e atravessando-a - como se tivesse
alguma ideia de para onde estava indo.
Ela se preocuparia com aquilo assim que se livrasse dele.
Felicity fechou a porta atrás dela ao som de sua maldição. Abençoadamente,
havia uma chave na fechadura, que ela virou e embolsou. Ela olhou em volta. Ela
estava em uma escadaria, mal iluminada e coberta de ouro e paredes de cetim
escarlate, escadas estreitas de madeira subindo até o que estava acima.
A maçaneta da porta sacudiu. — Abra a porta.
251
— Não, — ela disse. — Eu não acho que vou.
Uma pausa. E então, novamente, — Felicity. Abra a porta.
Excitação enfiada através dela.
Excitação e uma sensação de liberdade como ela nunca sentiu antes. — Eu
imagino que você preferiu ter um talento com fechaduras agora, não é?
— Eu não preciso de um talento com fechaduras, amor.
Amor. O carinho encheu o espaço pequeno e silencioso. Ela não deveria
deixar isso aquecer ela, mas aconteceu. Ela não deveria deixá-lo aquecê-la. Ele
não a machucou? Ele não a mandou embora? Jurou ela fora dele?
Ela deu um pequeno bufo de frustração. E ainda assim, ela queria esse
carinho. E ainda assim, ela queria o homem.
Felicity virou-se em um salto e saiu, subindo os degraus,
e rapidamente, como ela queria colocar distância entre eles antes que ele
encontrasse uma chave e viesse atrás dela. Ou talvez ela quisesse colocar
distância entre ela e seus sentimentos por ele. Não importava mais. Imaginou que
tivesse um ou dois minutos antes que a linda mulher que a encontrara na porta
lhe desse uma chave.
Ela estava a três quartos do caminho da escadaria quando a porta bateu,
ricocheteando contra a parede apenas para ser pego pelo braço forte de Devil
quando ele entrou pela porta. Sua boca se abriu quando ela parou nos
degraus. — Você está louco? Eu poderia estar parada aí!
— Você não estava, — disse ele, vindo em sua direção.
Ela recuou os degraus, com o coração acelerado. — Você quebrou a porta
da sua irmã.
— Minha irmã é muito rica. Ela consertará isto. — Ele continuou vindo. — Eu
não estou feliz com você agora, Felicity Faircloth.
Ela continuou subindo os degraus, uma mão levantando suas saias para
permitir a liberdade de movimento. — Eu posso ver isso, como você acabou de
quebrar uma porta.
— Eu não teria que fazer isso se você não tivesse aparecido em Covent
Garden.
— Isso não tem nada a ver com você. — Ela recuou.
— Tem tudo a ver comigo. — Ele avançou.

252
— Você me disse para não procurá-lo novamente. — Ele estava se
aproximando dela. E ela descobriu que gostava do modo como seu pulso pulsava
a cada passo medido.
— Então você procura um maldito bordel?
Ela fez uma pausa, colocando uma mão na parede para se equilibrar. — Eu
tinha um pressentimento de que era isso! — Agora ela estava um pouco
lamentando não explorar um pouco mais.
— Um pressentimento? — Devil olhou para o teto como se por paciência. —
O que mais seria isso? Um segundo White’s? Especial para o estilo do Covent
Garden?
Ela inclinou a cabeça. — Ocorreu-me que poderia ser um... você sabe... mas
não me senti assim... num Bordel. — Ele tinha quase alcançado ela. — Por
que todas as senhoras estão mascaradas?
— Você está fugindo de mim?
Ela inclinou a cabeça. — Por enquanto.
— Só porque eu despertei seu interesse e você quer respostas.
— Por que todas as senhoras são mascaradas?
Ele parou no degrau abaixo dela, e a diferença de altura os colocou no
mesmo nível dos olhos. — Porque elas não querem ser reconhecidas.
— Esse não é o ponto? Os clientes não desejam ver os rostos das mulheres?
— Felicity... — Ele fez uma
pausa, um fantasma de um sorriso em seus lábios. —
Querida, as mulheres são as clientes.
Sua boca ficou perfeitamente redonda com a surpresa. — Oh!
Era um bordel - ao contrário.
— Oh, — ela repetiu. — Isso explicaria por que Nelson era tão charmoso.
— Nelson é muito bom em seu trabalho.
— Eu posso imaginar, — ela disse, suavemente.
— Eu prefiro que você não faça isso. — Devil deu um pequeno grunhido.
Seus olhos se arregalaram. Seria possível que ele estava... com ciumes? Não.
Isso era impossível. Homens como Devil não sentiam ciúmes de mulheres como
Felicity Faircloth.
253
Ele interrompeu seus pensamentos. — O que você está fazendo aqui?
Eu vim para aprender como te conquistar. — Eu tenho um convite.
— Sim, e minha irmã tem sorte por eu não ter decidido colocá-la no Tâmisa
por estendê-lo a você. — Ele estava tão perto e falando tão baixo nas sombras.
— Agora eu vou perguntar mais uma vez, minha senhora, e seria melhor você me
dizer a verdade. O que você está fazendo aqui?
Pela primeira vez em sua vida, quando ouviu as palavras minha senhora, ela
se perguntou o que seria realmente, honestamente ser a dama de alguém. Como
seria ficar ao lado dele? Para tocá-lo à vontade? Para ele tocar nela?
Ela queria isso.
Mas, em vez de dizer isso, ela disse baixinho: — Você me disse que eu não
poderia mais vir até você.
Ele fechou os olhos por mais tempo do que deveria. — Sim.
A resposta ralou. — Você quer ter seu bolo e comê-lo também, e eu não vou
permitir isso. Você pode lavar as mãos de mim ou tentar ser meu guardião, Devil,
mas você pode não ter os dois. E eu não estou no mercado para um guardião, de
qualquer maneira.
— Como você está de pé no meio de um bordel de Covent Garden, eu acho
que você absolutamente deveria estar.
— Estou no meio de um bordel de Covent Garden porque estou com os
guardiões e há um grande número de coisas que eu gostaria de aprender.
— Você deveria ir para casa.
— E o que vou aprender lá, como ser um cordeiro de sacrifício? Como se
casar com um homem que eu não amo? Como salvar uma família, acho que me
ressinto mais do que deveria?
Outro rosnado baixo. — E o que você acha que esse lugar vai te ensinar?
Como ganhar você.
Ela engoliu em seco. — Todas as coisas que você se recusa.
Ele estreitou seu olhar nela. — Você se lembra do que eu te contei sobre
paixão, Felicity? Eu lhe disse que não é como o amor - não é paciente ou gentil
ou o que quer que as Escrituras gostem de nos dizer. Não é
querer. É necessidade.

254
Calor estava saindo dele em ondas, envolvendo-se com a promessa de suas
palavras. Como seria ser necessário para ele? Seria tão inebriante quanto a
necessidade dele?
Porque ela estava começando a sentir que precisava dele.
Certamente foi por isso que se machucou tanto quando ele a deixou. Não
porque ela o amava.
E, em seguida, ele acrescentou, — A paixão vem com o pior dos pecados,
muito mais do que com o melhor da virtude.
Ela ouviu a culpa em suas palavras, e não pôde deixar de levantar a mão, de
colocar os dedos na bochecha dele, desejando que suas luvas fossem embora.
Desejando que ela pudesse senti-lo, pele a pele. — Você sabe sobre o pecado,
não é, Devil?
Ele fechou os olhos, inclinando-se em seu toque, enviando uma inundação
de prazer ao núcleo dela. — Eu sei mais sobre o pecado do que você poderia
sonhar.
— Você me disse uma vez que você podia ver o meu pecado, — disse ela.
Seus belos olhos se abriram novamente, escuros e sabedores. — É
inveja. Você inveja o lugar deles. A vida deles. Sua aceitação na sociedade.
Talvez tenha sido esse o caso uma vez. Talvez houvesse um tempo em que
ela teria feito qualquer coisa para ter a vida que o resto da sociedade tinha. A
felicidade. A aceitação. Não mais. — Você está errado. Esse não é meu pecado.
Foi a sua vez de levantar a mão. Para tocá-la, seus dedos magnificamente
quentes contra sua bochecha. — Então o que é?
— É querer, — disse ela, as palavras mal lá.
Ele amaldiçoou suavemente na escuridão, tão perto. Tão impossivelmente,
lindamente perto.
Ela continuou, sabendo que não deveria. Mas, não era possível parar. — Eu
quero você, Devil. Eu quero te conquistar. Eu quero ser sua chama. Mas eu
temo... — Ela fez uma pausa, odiando o modo como ele a observava, como
se ele já soubesse de cada palavra que estava vindo antes que ela falasse. E talvez
ele soubesse. Ele não se importa. — Eu temo que eu seja sua traça, em vez disso.
Seus dedos se moveram, deslizando para a parte de trás do pescoço dela,
em seus cabelos, puxando-a para ele, e colocando-a em chamas.

255
Não havia nada de hesitante sobre o beijo - o que só aumentou a névoa
embriagante que veio sobre ela. Um momento, ela tinha certeza de que ele
queria se livrar dela, e no seguinte, ele estava roubando sua respiração e
pensamento e sanidade, uma mão segurando seu rosto, o outro braço em torno
de suas costas para mantê-la firme e puxá-la para perto, para o calor dele. Sua
boca tocou a dela, enviando onda após onda de sensações que a percorreram,
áspera e perfeita, sua língua quente e luxuriante contra a dela.
Pode ser a última vez que ele a beijava, e foi magnífico. Ela poderia viver feliz
aqui, em seus braços, nesta escada, para sempre.
Exceto uma garganta limpando atrás dele, do que parecia estar a um
quilômetro de distância, e o pânico explodiu ao ser descoberta. Ela empurrou os
ombros dele, e Devil ergueu os lábios dos dela em um lento e prolongado
desengajamento, como se não tivesse razão alguma para se desvencilhar.
— O quê? — Ele perguntou, sem desviar o olhar dela.
— Você quebrou a minha porta, — disse Dahlia de baixo.
Ele grunhiu seu reconhecimento das palavras, ainda sem desviar o olhar de
Felicity, cujas bochechas ardiam. Sua mão livre correu pelo braço dela para pegar
a mão dela na dele.
— Temos quartos para coisas desse tipo, você sabe, — acrescentou Dahlia.
Os belos lábios de Devil se achataram em uma linha reta. Ele se inclinou e
beijou Felicity novamente, rápido e completo, deixando-a sem fôlego quando ele
levantou a cabeça e disse: — Venha comigo.
Como se ela pudesse fazer tudo menos isso.
Eles subiram as escadas, em passos apressados. Ele não hesitou – não
diminuiu o passo, nem mesmo quando Felicity se esticou para ver os lindos e
misteriosos corredores que prometiam aventura e pecado. Em vez disso, ele a
levou para mais alto, o coração de Felicity batendo mais e mais forte até que ele
parou em uma escadaria estreita quase escura, sem nenhum outro lugar para ir.
Ele a soltou e então colocou as mãos no teto, anéis reluzindo na escuridão a
poucos centímetros acima de sua cabeça, e abriu uma porta embutida,
levantando-se para cima e para fora, deixando Felicity boquiaberta com seu belo
corpo, e sua silhueta contra o céu estrelado.
Quando ele se aproximou e lhe ofereceu uma mão, ela não hesitou, e ele a
puxou para a noite, onde reinou.

256
Capítulo Vinte e Dois

Ele levou-a para os telhados.


Ele sabia que não deveria. Ele sabia que deveria empacotá-la em uma
carruagem de aluguel e devolvê-la a Mayfair - intocada, para a casa que estivera
em sua família há gerações. Ele sabia que estava errado em trazê-la para este
mundo que era todo dele e nada dela, que não faria nada além de sufocá-la com
isso.
Mas se o pecado de Felicity era o desejo, o mesmo acontecia com Devil. E
Cristo, ele a queria.
Ele a queria mais do que ele já quis alguma coisa, e Devil passou grande
parte de sua juventude com fome e frio, pobre e zangado. Ele poderia ter sido
capaz de resistir ao seu desejo - mas então ela confessou: Eu quero você. Eu
quero ser sua chama... mas temo que eu seja sua traça.
E tudo que o Devil desejava era levá-la a algum lugar para que eles
pudessem queimar juntos.
Ele fechou a porta depois de puxá-la para o telhado do clube de Grace -
levantando-se da tarefa, para descobrir que ela estava olhando para a noite, a
cidade abaixo e as estrelas acima, tão claras quanto sua visão do futuro.
O que ele gastaria sem ela.
Mas esta noite, ele compartilharia este mundo com ela, mesmo sabendo que
ele iria se arrepender para sempre. Como ele poderia resistir?
Especialmente quando ela levantou a mão e removeu a máscara que havia
recebido, revelando-se à noite quente. Ela virou em um círculo lento, os olhos
arregalados quando ela parou. E então ela levantou o olhar para ele, e o sorriso
ofegante em seu rosto ameaçou mandá-lo de joelhos. — Isso é magnífico.
— É, — disse ele, sua própria respiração vindo duramente.
Ela balançou a cabeça. — Eu nunca pensei nos telhados.

257
Ele estendeu a mão para ela. — Eles são a melhor maneira de viajar. — Ela
colocou a mão na dele, dando-lhe confiança para ele antes que ele a levasse de
um prédio para outro, por uma longa e curva rua da cidade, subindo e descendo
sobre os telhados ao cume, ao redor de chaminés e sobre telhas quebradas.
— Onde estamos indo?
— Longe, — disse ele.
Ela se acalmou com as palavras, soltando a mão dele. Quando ele olhou para
ela, ela estava de costas para ele, em direção à cidade. Enquanto ele observava,
ela abriu os braços e virou o rosto para o céu, respirando a noite, um pequeno
sorriso brincando sobre os lábios.
Devil congelou, incapaz de manter os olhos dela, da alegria em seus olhos, a
lavagem de cor animado em seu rosto, a elevação de seus seios e a curva de seus
quadris, seu cabelo reluzente de prata ao luar. Por um segundo, ela era Cardea,
invisível para todo o mundo, exceto ele - o começo e o fim, o passado e o futuro.
O presente.
Tão bonita quanto o céu da noite.
— Eu amo isso, — disse ela, as palavras fortes e cheias de paixão. — Eu amo
a liberdade disso. Eu amo que ninguém saiba que estamos aqui, segredos na
escuridão.
— Você gosta da escuridão, — disse ele, as palavras saindo de cascalho,
como rodas sobre os paralelepípedos abaixo.
Ela olhou para ele, um brilho nos olhos. — Sim. Eu gosto porque você se
envolve nela. Eu gosto porque você claramente ama isso.
Ele apertou mais sua bengala, bateu duas vezes contra a ponta da bota. —
Eu não amo isso, na verdade.
Suas sobrancelhas se levantaram e ela abaixou os braços para os lados. —
Eu acho isso difícil de acreditar, enquanto você reina sobre isso.
Ele subiu para o topo do telhado, fazendo uma demonstração de considerar
a queda para o próximo, de modo que ele não teve que olhar para ela, quando
ele disse: — Eu temia o escuro quando era uma criança.
Uma batida, e então suas saias farfalharam sobre as telhas enquanto ela se
aproximava. Sem se virar, ele sabia que ela queria alcançá-lo. Para tocá-lo. E ele
não achava que poderia suportar sua compaixão, então continuou em movimento
até o telhado abaixo e subiu os degraus de ferro para o seguinte. E o tempo todo,

258
falando - mais do que ele já havia dito para alguém antes - pensando em impedi-
la de tocá-lo. Para impedi-la de querer tocá-lo novamente.
— As velas eram caras, e por isso não as acendiam no orfanato, — disse ele,
acalmando-se no telhado seguinte, o olhar fixo em uma lanterna balançando do
lado de fora de uma taverna bem abaixo. — E no viveiro, fizemos tudo o que
podíamos para evitar os monstros que espreitavam na escuridão.
Ainda assim, ela avançou, seu nome como uma oração em seus lábios.
Ele bateu sua bengala nos telhados vermelhos marcando a empena do
telhado sob sua bota, querendo virar e encará-la, para dizer: Não se aproxime.
Não se importe comigo.
— Era impossível mantê-los seguros, — disse ele à cidade além.
Ela parou. — Seu irmão e sua irmã têm sorte de ter você. Eu vi o jeito que
eles olham para você; seja o que for que você fez, você os manteve tão seguros
quanto possível.
— Isso não é verdade, — disse ele, asperamente.
— Você era uma criança, também, Devon, — disse ela em suas costas, as
palavras tão suaves que ele quase não ouviu seu nome nelas. Mentira. Claro que
ele ouviu. Seu nome em seus lábios era como a salvação.
Uma que ele não merecia. — Saber disso não ajuda o arrependimento.
Ela chegou a ele então, mas não o tocou, milagrosamente, em vez disso, ela
se sentou a seus pés no topo do telhado, olhando para ele. — Você é muito duro
consigo mesmo; quanto mais velho você poderia ser?
Ele deveria terminar a conversa ali e levá-la para baixo, através da porta
embutida no telhado abaixo, para seus escritórios. Ele deveria mandá-la para
casa. Em vez disso, ele se sentou ao lado dela, enfrentando na direção oposta. Ela
colocou a mão enluvada no teto entre eles. Ele pegou-a, puxando-a para o colo,
maravilhado com a maneira como a lua transformava o cetim em prata.
Quando ele respondeu, foi para esse fio de prata, que de alguma forma,
magicamente, foi transformado, nesta escuridão que ele amava e odiava. — Nós
nascemos no mesmo dia.
Uma batida. — Como isso é...
Ele traçou os dedos lentamente através da luva. Para cima e para baixo,
como uma oração.

259
— Por mulheres diferentes. — Seus dedos se contorciam sob o toque
dele. Abaixo das palavras. — Mas o mesmo homem. Menos Grace.
— Grace, — ela disse, franzindo a testa. — Dahlia.
Ele assentiu. — Ela tem um pai diferente. O que é provável porque ela é
melhor do que o resto de nós juntos. — Seus dedos encontraram os botões em
sua luva e começaram a trabalhar neles.
Juntos, eles observaram a pele de seu pulso revelada, antes que Felicity
dissesse, suavemente: — Eu pensei que você dissesse que não conhecia seu pai.
— Eu disse que meu pai não queria me reclamar quando minha mãe morreu.
— Mas depois?
Ele balançou a cabeça, recusando-se a olhar para o rosto dela, em vez disso,
retirou a luva de cetim em um longo e lento deslizamento que fez sua boca se
encher de água. — Mais tarde, nos tornamos úteis. — Ele fez uma pausa. —
Quando ele percebeu que Grace era tudo o que ele conseguiria.
Ela balançou a cabeça. — Eu não entendo. Ela não era filha dele.
— Ele era casado com a mãe dela, no entanto. E disposto a aceitá-la como
sua, tão desesperado que ele era por um herdeiro.
Um herdeiro significava... — Ele era titulado.
Ele assentiu.
Levou toda a energia dela para não lhe perguntar qual título que eles
discutiam. — Mas... ele teve filhos. Por que não esperar? Por que não tentar por
outro? Um legítimo?
— Não foi possível. Ele nunca conseguiria outro.
Confusão explodiu. — Por quê?
Ela tinha a pele mais bonita. Ele virou a palma da mão e traçou círculos nela.
— Porque ele não podia gerar herdeiros depois que a mãe de Grace atirou nele.
Seus olhos se arregalaram. — Disparou nele onde?
Ele olhou para ela então. — Em um lugar que tornou impossível a criação
herdeiros.
Ela abriu a boca. Fechou. — E assim ele foi deixado com uma menina.
Nenhum herdeiro.

260
— A maioria dos homens teria desistido, — disse ele. — Deixando a
linhagem morrer. Passar para algum primo distante. Mas meu pai estava
desesperado por um legado.
Sua mão se fechou ao redor de seu dedo, capturando-o com seu calor,
fazendo-o desejar que ela ficasse com ele para sempre, mantendo o frio
à distância. — Você e Fera.
Ele assentiu. — Whit
Ela ofereceu um pequeno sorriso ao nome real de Whit. — Eu prefiro isso,
se eu for honesta. Devon e Whit — disse ela, soltando os dedos e levantando a
mão nua para o rosto dele. Ele fechou os olhos, sabendo o que ela estava
pensando antes de tocá-lo, deixando os dedos macios de seus dedos traçarem a
longa cicatriz branca em sua bochecha. — E aquele que fez isso.
— Ewan. — Ele capturou a mão dela, inclinando-se para o toque enquanto
contava a história pela primeira vez em sua vida - ao mesmo tempo odiando a si
mesmo por ressuscitar o passado e tendo um prazer notável em falar sobre isso,
finalmente. — Eu pensei que estava salvo quando ele apareceu no orfanato
- meu pai. — Ela assentiu, e ele continuou. — Minha mãe havia deixado algumas
moedas, mas a família que me recebeu enquanto esperavam a notícia dele as
usou.
— Para o bebê? — Seu choque era palpável, e ocorreu a Devil que havia
algumas coisas que ele nunca lhe diria - coisas que ele iria protegê-la de saber
que existia no mundo. Ele enfiou a mão no bolso da calça e extraiu um pedaço
de tecido. Peludo e desgastado.
Seu olhar caiu quando ele esfregou o polegar sobre o bordado, o pino de
estanho anexado. Ela queria segurá-lo, ele sabia. Para investigar isso. Mas ela não
pediu, e ele estava dividido entre dar a ela e escondê-la - de uma vez querendo
compartilhar e aterrorizado, da prova de que ele nunca seria o suficiente. Ele
resolveu segurá-lo na palma da mão, revelando o outrora fino M vermelho, agora
desbotado para marrom e quase incapaz de se manter unido. Seu talismã.
Seu passado.
Ele queria que ela entendesse. — Eu tinha dez anos quando ele veio - à noite,
ironicamente. Eles vieram me buscar nos quartos dos meninos e ainda posso ver
a luz da vela do reitor. — Ele apertou a mão dela sem saber. — Eu pensei que
estava salvo. Meu pai me trouxe para o campo, para uma propriedade que
rivalizava com qualquer coisa que eu já sonhei. Ele me apresentou aos meus
irmãos. — Ele fez uma pausa, depois repetiu: — E eu pensei que tinha sido salvo.

261
A mão dela apertou, os dedos dela enfiando nos dele, como se ela já pudesse
ver o passado.
— Eu não estava, — disse ele. — Eu troquei um tipo de escuridão por outra.
Devil podia sentir o foco aguçado dela, afiado e sem cessar. Ele não olhou
para ela. Ele não podia. Em vez disso, ele continuou a falar com a mão dela,
virando-a, passando o polegar sobre os nós dos dedos, saboreando a sensação
dos picos e vales deles. — O dia do nosso nascimento deveria ter sido um
embaraço para o pai. Quatro filhos. Três garotos e uma garota. — Ele balançou a
cabeça. — Eu não deveria me alegrar com isso, sabendo como a história termina,
mas tenho orgulho de dizer que tudo que meu pai queria naquele dia era um
herdeiro, e ele não recebeu um. O único que ele poderia ter sido capaz de passar
como herdeiro nasceu uma menina. E os outros — Ele olhou para o céu estrelado.
— Nós éramos todos bastardos.
Ele tentou libertá-la, mas ela não quis.
Sua mão apertou a dele com mais força enquanto ele continuava. — Mas
meu pai não era nada se não astuto. E para ele, o nome era mais importante que
a fortuna. Ou futuro. Ou verdade. E ele alegou que um herdeiro havia
nascido. Um filho.
Os olhos de Felicity se arregalaram. — Isso é ilegal.
Não apenas ilegal. Punível com a morte quando o herdeiro herdaria um
ducado.
— Ninguém descobriu isso? Ninguém disse nada? — Era impossível
acreditar, Devil sabia. Tarde da noite, ele muitas vezes lutava com a lembrança
disso, certo de que ele estava errado. A casa estava cheia de empregados. Muitos
devem ter notado. Deveria ter falado.
Mas ele esteve lá. E as lembranças não mentiram.
Ele balançou sua cabeça. — Nunca ocorreu a ninguém procurar. Grace era
mantida no campo - nunca trazida para a cidade, algo que sua mãe estava mais
do que feliz em permitir, já que Grace também era uma bastarda. Um punhado
de velhos e leais servos foram autorizados a ficar com eles. E meu pai tinha um
plano. Afinal, ele teve três filhos. Bastardos, certamente, mas filhos, no entanto.
Quando tínhamos dez anos, ele nos colecionou. Trouxe-nos para a casa de
campo e nos contou seu plano - um de nós, veja você, seria o herdeiro. Rico além
da medida. Educado nas melhores escolas. Ele nunca iria sofrer por nada.
Comida, bebida, poder, mulheres, o que ele quisesse.

262
Seu aperto ameaçou impedir a circulação de seu sangue através de seus
dedos. — Devil, — ela sussurrou.
Ele olhou para ela então. — Devon.
Era importante lembrar-se disso agora, o nome que herdara não era de uma
família, mas do nada. Importante, também, que ele se lembre, aqui com ela como
pura tentação - fazendo-o desejar que ele pudesse tomá-la por conta própria. Ele
não ganhou a competição. Ele não era o duque. Ele ainda não era nada.
Memórias rodaram. Whit, magro e pequeno, com muitos dentes em seu
rostinho, seu sorriso travesso grande e brilhante. Grace, alta e robusta, com olhos
tristes submersos. Ewan, todas as pernas longas e ossos afiados, como um potro.
E com uma determinação monstruosa.
— Um de nós herdaria tudo. E os outros, eles receberiam um destino
diferente. Um menor.
— Como? — Ela sussurrou para ele. — Como ele escolheu?
Devil sacudiu a cabeça. — Ele diria a você que ele não escolheu. Ele diria que
escolhemos.
— Como?
— Nós lutamos por isso.
Ela exalou a revelação, severa e baixa. — Lutou como?
Ele olhou para ela então, finalmente capaz de encontrar seu olhar. Ansioso
para ver o horror nele. Pronto para ela entender de onde ele tinha vindo. E como.
Pronto para ela ver o que ele sabia desde o início - que ele foi tão abaixo dela
que poderia muito bem estar no inferno.
Quando ela se for de sua vida, ele estará no inferno.
No entanto, ele continuou.
Ela apertou a mão dele, seu aperto mais forte do que ele imaginaria que
poderia ser. — Não. Isso é loucura.
Ele assentiu. — Os desafios físicos foram fáceis. Primeiros paus e pedras.
Punhos e fogo. Mas os mentais - esses foram os que nos destruíram. Ele iria nos
trancar, sozinho no escuro. — Ele odiava dizer a ela, mas de alguma forma, não
conseguia impedir que as palavras viessem. — Dizia-nos que poderíamos ser
libertados, para a luz, se escolhêssemos outro para lutar.
Ela balançou a cabeça. — Não.

263
— Ele nos deu presentes, levou-os embora. Doces Brinquedos. — Ele fez uma
pausa, uma lembrança provocando na borda de sua mente. — Ele me deu um
cachorro. Deixei me aquecer no escuro por dias. E então me disse que eu
poderia guardar para sempre se eu trocasse por um dos outros.
Ela se aproximou dele. Envolveu seus braços ao redor dele, como se pudesse
afastar a memória. — Não.
Ele balançou sua cabeça e olhou para o céu, sugando no ar. — Eu recusei.
Whit era meu irmão. Grace minha irmã. Ewan...
Ewan tinha sido o único autorizado a manter seu cachorro.
O que Ewan fez?
Felicity balançou a cabeça. Pressionou o rosto em seu braço. — Não.
Seu braço veio ao redor dela, acariciando seu cabelo, puxando-a apertado
contra ele. Ewan nunca teria Felicity.
— Ele queria o mais forte de nós para o seu herdeiro. O mais faminto. — Ele
queria o filho que lhe desse um legado. — Em algum momento, parei de
competir. Simplesmente tentei manter os outros a salvo.
— Vocês eram crianças — ela sussurrou, e ele ouviu a ferida em sua voz,
como se nunca tivesse imaginado tal tortura. — Certamente alguém tentou parar
seus crimes.
— Eles apenas são crimes se forem descobertos, — disse ele em voz baixa.
— Encontramos maneiras de ficarmos juntos. Formas de nos mantermos sãos.
Nós fizemos promessas um ao outro, para nunca deixá-lo vencer. Nunca deixar
que ele nos tirasse um do outro.
Felicity estava olhando para o colo dela agora, e ele sabia que este era o final.
Que ela não retornaria ao Covent Garden depois desta história. Ela não voltaria
para ele. Ele se forçou a terminar. — Mas quando chegou a hora... nós não
éramos fortes o suficiente. — A cicatriz em sua bochecha queimava com a
memória da lâmina de Ewan, afiada e desagradável. Com o pedido que causou
isso. A voz do pai dele soando na escuridão.
Se você quiser, garoto, você deve tirar isso dos outros.
Ewan vindo para ele.
Ele exalou, extinguindo a memória. — Não tivemos escolha a não ser correr.
Ela não olhou para cima. — Para aqui.

264
Ele assentiu.
— Quanto tempo você esteve lá?
— Dois anos. Nós tínhamos doze anos quando saímos.
Sua respiração veio em um exalar severo. — Dois anos.
Ele a puxou para perto e deu um beijo em sua têmpora. — Nós
sobrevivemos a isso.
Ela olhou para ele, tempo suficiente para que seu lindo olhar fixasse seu
coração em corrida. — Eu gostaria de poder dar aqueles anos de volta.
Ele sorriu e acariciou o polegar em sua bochecha macia. — Eu iria levá-los.
— Lágrimas brotaram em seus lindos olhos. — Não, amor. — Ele balançou a
cabeça. — Sem lágrimas. Não para mim.
Ela correu para longe. — Não havia ninguém em quem você pudesse confiar.
— Nós confiamos um no outro, — disse ele. E foi a verdade. — Nós
prometemos que cresceríamos fortes e poderosos, ricos como a realeza. E
daríamos uma punição única e interminável - meu pai sempre quis ter herdeiros.
Enquanto nós vivêssemos, ele nunca iria conseguir isso.
Seus olhos brilhavam à luz das estrelas, sua boca em uma linha firme e
reta. — Eu quero ele morto.
Suas sobrancelhas se ergueram.
— Eu sei que está errado. Eu sei que é pecado. Mas seu pai - eu odeio até
chamá-lo assim - ele merece nada menos do que a morte.
Demorou um momento para ele encontrar sua resposta. — Ele recebeu.
Ela assentiu com a cabeça. — Espero que tenha sido doloroso.
Ele não pôde evitar o sorriso dele. Sua magnífica desbloqueadora de
fechaduras, conhecida por toda Londres como uma solteirona, era uma leoa. —
Se ele não estivesse morto, você é o suficiente para me fazer desejar poder trazê-
lo para você como um troféu.
— Não é uma piada, Devon, — disse ela, com a voz vacilante de emoção. —
Você não mereceu isto. Nenhum de vocês. Claro que você está com medo da
escuridão. Foi tudo que você já teve.
Ele puxou-a com força para ele, sussurrando em seu cabelo. — Acredite ou
não, amor, agora é impossível lembrar como as trevas me aterrorizavam. Como

265
é impossível imaginar que alguma vez pensarei em trevas sem pensar nesta noite.
Sem pensar em você.
Felicity virou-se para ele, a mão dela envolvendo a cintura dele, puxando-o
com força quando ela dobrou as pernas e se enrolou contra o lado dele. O
movimento, imediato e sem artifício, consumiu-o, e ele não pôde resistir a espelhar
sua contorção, inclinando-se para ela, envolvendo seu braço ao redor dela,
puxando-a para perto. Pressionando o rosto em seu pescoço e inalando seu
delicioso aroma. Jasmim foi arruinado para ele. Sempre estaria ligada a essa mulher
magnífica, com sua pele macia e seu corpo exuberante e a sugestão disso - o
suficiente para fazer sua boca encher de água.
Foi só então, quando eles se enrolaram juntos, enquanto ele a respirava, que
ele sentiu suas lágrimas, a umidade em seu pescoço, a respiração irregular em
seus pulmões. Ele se afastou e deu um beijo nos rastros úmidos em sua bochecha.
— Não, menina doce. Não, sem lágrimas. Eu não valho a pena.
Seu punho cerrou na borda de seu colete, puxando o tecido e ele mais perto.
— Pare de dizer isso, — ela sussurrou. — Pare de tentar me convencer de que
você não tem valor.
Ele levou a mão nua aos lábios, beijando a palma da mão dela. — Eu não
tenho.
— Não. Cale-se.
Ele roçou os dentes sobre a carne cheia na base de seu polegar. — Você é
uma princesa comparada a mim. Uma rainha das fadas. Você não vê? — Ele
lambeu a pele macia lá. — Meu passado é sem valor. Meu futuro também. Mas
o seu... — Sua respiração estava quente contra sua palma. — Como Janus, vejo
seu futuro. E é glorioso.
Sem mim.
Ela ouviu as palavras que ele não disse. — Você está errado. Seu passado é
quem você é - tem um valor infinito. E meu futuro não é nada sem você. A única
coisa que é gloriosa é o nosso presente.
— Não, amor. Nosso presente... — Ele deu um pequeno bufar de riso. —
Nosso presente é tortura.
— Por quê?
Ele estendeu a mão para ela, envolvendo os dedos em volta do pescoço dela,
puxando-a para perto. Segurando-a ainda para que ele pudesse observar seus
olhos quando ele dissesse a verdade.
266
— Porque meu presente é só você, Felicity Faircloth. E você não pode ser
meu futuro.
Seus olhos se fecharam com as palavras, ficaram assim por um tempo
incrivelmente longo enquanto seus lábios se contorciam de frustração e emoção
e sua garganta trabalhava e sua respiração vinha dura e irritada. Quando ela
finalmente os abriu, havia lágrimas brilhando em suas lindas profundezas
marrons. Lágrimas e raiva, e algo que ele reconheceu porque sabia que se
espelhava em si mesmo.
Necessidade.
— Então vamos viver no presente, — ela sussurrou.
E ela o beijou.

Capítulo Vinte e Três

Pelo resto da vida, Felicity se lembraria de seu calor. Seu calor e o jeito que
ele deslizou a mão em seu cabelo quando ela o beijou. Seu calor, e a maneira
como ele espalhou seus grampos de cabelo no teto e a puxou para o seu colo
para permitir-lhes melhor acesso um ao outro e às carícias.
Ela deslizou as mãos dentro de seu casaco aberto, amando o calor escuro e
luxuoso que encontrou lá, a largura do peito, a elevação e a curva dos músculos
de seus lados e costas, o modo como ele permitia o acesso dela, um grunhido
baixo de prazer rolando através dele, vibrando contra ela enquanto ele abria seus
deliciosos lábios e os explorava.
Seu beijo foi lento e profundo, como se tivessem o resto do tempo para
explorar. E parecia, naquela longa e drogada carícia, como se o fizessem - como
se aquele telhado em Covent Garden, sob a lua e as estrelas, fosse só para eles,
tão privado e perfeito quanto o próprio beijo. Quando ele soltou seus lábios, ela
abriu os olhos e encontrou o dele, observando-a, vendo seu prazer, tomando
o seu próprio nele. E então, ele disse: — Você nunca precisou ser ensinada a ser
a chama, Felicity.
E ela chegou a puxá-lo para ela novamente.
267
— Estava sempre em você, — ele sussurrou contra seus lábios, e ela suspirou
seu prazer, deixando-o capturar o som por um longo momento antes de
acrescentar: — Você é a mulher mais notável que eu já conheci, e se eu tenho só
este momento - este presente - com você, então eu quero fazer você queimar
até que você tenha feito as estrelas invejosas do seu calor.
As palavras eram fogo através dela, rápido e furioso, fazendo sua cabeça leve
e sua respiração rasa quando ele roçou os lábios em sua bochecha, inclinando-
se para sua orelha.
— Você faria isso? Você queimaria por mim? Esta noite?
— Sim, — ela respondeu, um arrepio de prazer suspirando por ela enquanto
ele preocupava o lóbulo de sua orelha. — Sim por favor.
— Tão educada, — disse ele, baixo e delicioso. — Vamos entrar? Eu mal
dormi na minha cama com a lembrança de você sobre ela.
Ela se afastou e encontrou seus olhos, incapaz de manter surpresa e prazer
no seu tom. — Mesmo?
Ele deu-lhe um pequeno sorriso. — Mesmo. Suas mãos na minha colcha,
seus lindos chinelos rosa pendurados nos dedos dos pés. Eu imagino...
— Diga-me, — disse ela quando ele parou.
— Eu não deveria.
— Por favor.
Ele se inclinou com um pequeno gemido, roubando um beijo. Uma lambida
persistente. — Eu não posso te negar.
— Você me nega o tempo todo.
Ele balançou sua cabeça. — Isso não. Nunca isso, amor. — Ele a beijou
novamente, lento e perfeito, e então ele colocou a testa na dela e disse: — Eu
imagino me ajoelhar lá, aos seus pés, removendo aqueles chinelos e explorando
meu caminho até o seu corpo. — Sua mão traçou a linha de sua perna debaixo
dela saias. — Eu estou cansado de imaginar o que está sob esse vestido rosa,
minha senhora. E quando eu deito na cama e persigo o sono, imagino tirando
suas roupas e me aquecendo em você, macia e cheia de curvas, seda e perfeição.
Ela soltou um suspiro longo e trêmulo. — Eu quero aquilo.
— Eu darei a você, minha chama perversa. Eu te darei tudo o que você quiser.

268
Ele se levantou, estendendo a mão para ela, puxando-a para cima, de pé,
acima dele no telhado, apenas o suficiente para que seus lábios estivessem
firmes. Ele a beijou novamente, então sussurrou: — Eu sempre darei a você o que
você quiser.
Era uma mentira, claro, e ela sabia disso.
Me diga algo verdadeiro.
Ele a ergueu nos braços para lhe dar o que prometera, mas ela pôs a mão
no peito dele. — Espera.
Uma rajada de vento girou ao redor deles enquanto Devil se acalmava, seu
casaco chicoteando atrás dele e envolvendo os dois em suas saias. Ele parou,
imóvel, segurando-a como se ela não pesasse nada, seus olhos nos dela
enquanto esperava que ela continuasse. — Qualquer coisa.
— Eu não quero entrar.
Ele fechou os olhos com as palavras, apertando-a com força por um segundo
antes de concordar com a cabeça e dizer suavemente: — Eu entendo. Vamos
para casa, minha senhora.
O coração de Felicity pulou uma batida quando ele se moveu para colocá-la
no chão. — Não, — ela sussurrou. — Você não entende. Eu não quero entrar... —
Ela correu os dedos sobre seu firmemente tosquiado cabelo, amando o jeito que
penas sobre sua pele. — Porque eu quero ficar aqui. — Seus dedos brincavam
sua orelha, e ela adorava a maneira que ele mergulhou sua cabeça em direção a
seu toque, como se ele não pudesse resistir a ela. Deus sabia que ela não podia
resistir a ele. — No seu mundo, — ela sussurrou. — Na escuridão. Sob as estrelas.
Ele permaneceu imóvel por mais um momento, o músculo em sua bochecha,
a única evidência de que ele a ouvira. E então ele desceu do topo, não a soltando
até chegarem ao teto plano abaixo. Ele a colocou no chão e recuou, tirando o
casaco e girando-o, espalhando-o a seus pés.
Uma vez feito isso, ele estendeu um braço longo e forte para ela, com a
palma para cima. Um convite irresistível.
Ela se moveu instantaneamente, descendo do telhado até os braços dele, e
na próxima vez que ele a ergueu, foi para deitá-la sobre a lã macia de seu casaco,
que a envolveu com seu calor e seu aroma antes dele se abaixar sobre ela, unindo
seus lábios nos dela, e começou lentamente a tirar sua sanidade. E as roupas dela.
— Naquela primeira noite, na varanda do baile de Marwick... — Ele tirou seu
casaco. — Estava escuro demais para ver a cor do seu vestido... — Ele deu um
269
beijo na pele macia em sua mandíbula. — E eu imaginei que você estava
encoberta pelo luar.
Suas mãos estavam acariciando sua cabeça. — Você me faz sentir como se
isso fosse possível.
— Tudo é possível, — ele prometeu, roubando seus lábios novamente.
Entre beijos longos e lânguidos, ele desatou as fitas na frente de seu corpete,
separando o tecido para revelar seu espartilho, seus seios subindo acima dele. Ele
soltou seus lábios, sua língua traçando as cordas de seu pescoço para beliscar
seu ombro. Ela ofegou sua surpresa e prazer para as estrelas.
— Você gosta disso? — Ele disse suavemente para sua pele.
— Sim, — disse ela, os dedos se curvando na parte de trás de sua cabeça,
segurando-o lá.
E então ele trabalhou com mágica em seu espartilho, e seus seios
derramado para a noite, o frio do ar correndo através de sua pele presa. Outro
suspiro, este puxando um pequeno riso contra seu ombro enquanto se movia,
acariciando e circulando as pontas do esforço antes que ele levantasse a cabeça,
seu olhar ardente encontrando o dela por um instante antes de cintilar mais
baixo. Seus lábios suavizaram quando ele a levou, e ela se arqueou em direção a
ele, pedindo mais de sua atenção. Mais do seu toque.
Mais dele.
Ele deu, abaixando a cabeça, circulando um mamilo pontiagudo antes que
seus lábios se fechassem sugando suavemente, trabalhando na ponta endurecida
até que ela gritou, flexionando os dedos contra a sua cabeça, segurando-o ali,
como se ela nunca quisesse deixar ele ir.
Ela poderia não tê-lo deixado ir, não se ele não tivesse rosnado através de
sua longa e rítmica sucção. Não se ele não tivesse deslizado a mão mais alto sob
suas saias. Não se ela não tivesse levantado seus quadris para encontrar o toque
dele, balançando contra ele. Não se o movimento não tivesse sacudido sua
tarefa, fazendo com que ele a libertasse de seu beijo, ofegando
descontroladamente. — Cristo, Felicity. Você tem gosto de pecado. — Seus
quadris balançaram contra ela, e uma dor se acumulou em seu núcleo - uma dor
tornada pior e melhor por sua proximidade.
— Devon. — Ela suspirou. — Eu preciso...

270
— Eu sei, amor. — Ele levantou o peso dela e fez o trabalho rápido de seu
vestido e seu colete antes de retornar para ela, suas mãos deslizando sobre sua
pele nua. — Está com frio?
Ela riu. Ela não pôde evitar. A ideia de ser fria com ele... — Não — ela
disse. — Estou queimando.
Seus lábios encontraram os dela novamente. — Deus sabe que isso é
verdade.
Ela pegou a mão dele na dela, deslizando os dedos sobre os dele, afastando-
se quando encontrou o metal frio ali. Passando um polegar gentilmente sobre
cada um dos elos de prata, ela disse: — De onde vieram essas coisas?
Ele seguiu seu olhar para baixo, surpresa em seu rosto, como se ele não
tivesse pensado sobre os anéis em anos. Ele sorriu. — Havia um homem no
Jardim, que costumava fazê-los. Ninguém tinha dinheiro para o ouro, mas prata,
um homem poderia comprar isso. Todos os lutadores usavam esses anéis... um
lembrete de sua força. De seu sucesso no ringue. — Ele apontou para o que
estava em seu polegar. — Esse foi da primeira vez que eu quebrei um nariz. —
Para o segundo em seu dedo anelar. — Esse foi da primeira vez que eu derrubei
um cara. — E ele apontou para o terceiro, em seu dedo indicador. — Esse é da
última luta que eu já lutei porque eu tive que fazer.
Ele flexionou a mão uma vez, duas vezes, enrolando os dedos em um punho
pesado. — Eu nem penso mais neles.
Ela levou a mão aos lábios, pressionando um beijo em cada um dos anéis de
prata. — Prova de sua coragem.
Ele rosnou, puxando-a para um beijo apropriado, e ela aproveitou para
traçar suas próprias mãos sobre sua camisa, puxando-a do cós da calça, roçando
nele. Ela deslizou as mãos por baixo da bainha, encontrando sua pele quente e
suave, desesperada por estar mais perto dele. Imediatamente. — Devil.
— Eu sei, — ele repetiu. E ele fez. Ele conhecia o corpo dela melhor do que
ela poderia sonhar. Ele conhecia os lugares que ansiavam por seu toque, a pele
que queria seu beijo. Seus dedos beliscaram a ponta dura de um seio enquanto
ele lambia seu pescoço, uma vez, duas vezes, enviando grossos arcos de prazer
através dela.
Ela chorou durante a noite, frustrada, ansiosa e desesperada por ele.
Ele parou com o barulho e ela abriu os olhos. Ele a observou, algo magnífico
em seu belo olhar âmbar. — O telhado foi uma excelente escolha.

271
Sua testa franziu. — Por quê?
Ele se inclinou e chupou a ponta de seu seio em sua boca, excitante, quente
e maravilhoso. E quando ela estava em seu prazer, ele a soltou, pressionando a
testa na dela quando ele respondeu: — Porque quando você grita seu prazer a
noite, você pode fazê-lo tão alto quanto quiser.
Ela corou com as palavras. — Eu não vou gritar.
Ele abaixou seus quadris para os dela, entalhando seu comprimento duro
contra a parte mais macia dela. — Talvez não. Talvez você vá.
O rubor se transformou em chamas. — Eu não queria rir...
Devil sacudiu a cabeça. — Não se atreva a se desculpar por isso, amor. Eu
vou morrer com o som desse riso em meus ouvidos. O puro prazer disso. Foi
glorioso. — Ele a beijou novamente. — Tudo o que eu quero fazer é invocá-lo
novamente.
Ela fechou os olhos para isso, constrangimento e desejo guerreando nela.
Desejo venceu. — Eu quero que você convoque de novo. — Ela levantou os
quadris novamente, aproveitando a maldição que veio dele no movimento. Se
fosse possível, o comprimento duro dele ficava mais difícil. Mais longo. — Mas
você está vestindo muito mais roupas do que eu gostaria.
Ele rosnou seu prazer nisso, saindo dela e se levantando para tirar a camisa,
seguindo com botas e calças. Os movimentos não tinham qualquer artifício,
como se ele estivesse imensamente à vontade com seu corpo - e como poderia
não estar? Ele era a perfeição. Ela podia passar horas observando-o.
Quando ele ficou totalmente nu, e se virou para voltar para ela, ela estendeu
a mão. — Espere.
Ele parou, seu olhar faminto e quente. — O que foi?
Ela sentou-se, puxando o casaco ao redor dela. — Eu quero olhar.
As palavras mudaram ele. Ele baixou a cabeça, passando a mão pelo cabelo
bem tosado, o movimento ao mesmo tempo profundamente cativante e uma
impressionante exibição da perfeição de seus braços e ombros. A boca de Felicity
ficou seca quando sua mão envolveu seu pescoço e deslizou sobre seu peito,
esfregando-se para frente e para trás antes de cair para o lado dele. — Olhe o
suficiente, então, minha senhora.

272
Ela acenou uma mão preguiçosamente no ar, como uma rainha, indicando
que ele deveria se virar, e como um milagre, ele fez. Um sorriso nos lábios quando
ele retornou à sua posição original. — Você já decidiu o que fazer comigo?
A memória da primeira noite, em seu quarto de dormir, brincou sobre ela. Eu
nunca entendi o que se faz com homens extremamente perfeitos.
Ela encontrou os olhos dele. — Eu ainda não tenho certeza do que se faz,
mas acho que estou disposta a descobrir.
Ele levantou uma sobrancelha. — Estou muito feliz em ouvir isso.
Querido deus. Ele era esplêndido – a brincadeira de luar sobre sua pele, a
poeira do cabelo sobre o peito. A escultura de seus músculos, sulcos em seus
quadris, a deliciosa curva de seu traseiro, as pesadas cordas de suas coxas. E entre
eles, o comprimento de esforço dele, duro, lindo e palpitante. — Quando te vi no
seu banho... abaixo... — Ela começou, incapaz de afastar o olhar do duro
comprimento dele. — Eu queria olhar para você... — Foi tudo o que eu pude fazer
não para ir para a beira de seu banho e ver...
— Porra, Felicity. — Ele gemeu.
Seu olhar voou para o rosto dele na maldição gemendo. — O que?
Ele olhou para o céu, soltando um longo e lindo suspiro. — Perdoe-me, —
ele disse, tão suavemente que lhe ocorreu que talvez não desejasse que ela
ouvisse. E então ele olhou de volta para ela. — Você lambeu seus lábios, amor.
Sua mão voou para sua boca. — Eu fiz?
Ele sorriu, seus dentes brancos brilhando, e sua primeira olhada em seu
sorriso perverso foi o suficiente para roubar sua respiração. — Não se atreva a
sentir vergonha disso. Eu só - Cristo - eu só quero que isso seja perfeito para
você, e quando você me olha assim - como você me quer... — Ele parou quando
o olhar dela baixou novamente, para o comprimento dele, e então - meu Deus -
sua mão se moveu, e ele estava tomando-se na mão, acariciando aquele
comprimento magnífico, e sua boca estava regando e só havia uma maneira de
administrar bem aquilo.
Ela olhou para a mão dele, para seus movimentos lentos e lânguidos e
engoliu em seco. Ele era tão perfeito. — Eu quero isso.
O som que ele fez - baixa e escuro - enviou desejo correndo através dela,
em lugares que ela tinha acabado de descobrir. E quando ele se moveu, vindo
em sua direção, seu coração começou a martelar. — Eu vou fazer você dizer isso

273
mil vezes antes de terminarmos, — ele rosnou, ajoelhando-se ao lado dela,
estendendo a mão para o casaco que ela envolveu em torno de sua nudez.
Ela apertou com mais força.
Ele inclinou a cabeça. — Felicity?
Seu olhar cintilou sobre ele novamente, absorvendo sua beleza crua. — Eu
estou... — Ela parou.
Devil esperou com infinita paciência.
Ela tentou novamente. — Eu não sou como você.
Ele recostou-se nos calcanhares, como se estivesse totalmente à vontade.
Como se ele pudesse viver toda a sua vida sem roupa e nunca pensar duas vezes.
Seu olhar se suavizou. — Eu sei disso, amor. Essa é uma grande parte da razão
pela qual eu gostaria de remover este casaco.
— Quero dizer... — Ela engoliu em seco. — Eu nunca estive nua antes. Com
um homem.
Ele ofereceu-lhe um pequeno sorriso, torto e lindo. — Eu também sei disso.
— Eu não sou - eu não...
Ele soltou o tecido. Esperou.
— Você é perfeito, — disse ela. — Mas eu, eu sou todas as falhas.
Ele a observou por muito tempo. Uma eternidade. Segundos se esticaram
entre eles como milhas. E então, justamente quando ela pensou que estava tudo
acabado, ele disse, quieto e certo, — Aqui está algo verdadeiro, Felicity Faircloth,
wallflower, desbloqueadora de fechaduras, e maravilhosa; não há uma única
coisa sobre você que seja falha.
Ela corou. E de alguma forma, por um momento fugaz, ela acreditou nele.
— Por favor, amor. Deixe-me te mostrar.
Como se tal oferta pudesse ser negada. Ela largou o casaco. Revelado ela
mesma.
Ele a estudou como se ela fosse uma pintura de mestre, eventualmente
chegando ao seu lado e a derrubando para que eles ficassem juntos, mãos e
bocas explorando, suas mãos em sua pele, seus dedos vasculhando o cabelo
escuro em seu peito. Seus lábios procuravam as covinhas em sua barriga redonda
enquanto suas pernas se separavam em um lento deslizar ao longo de seu
comprimento esticado.
274
— Diga-me novamente, — ele sussurrou para seu estômago, uma mão
deslizando ao longo da pele macia de sua parte interna da coxa.
Ela entendeu instantaneamente. — Eu quero você. — Ela explorou as curvas
de seus músculos, as colinas e vales de seu corpo.
Ele recompensou as palavras com outro beijo. Um sugar. Uma lambida. Uma
carícia. E o tempo todo, suas mãos se aproximaram de seu objetivo.
Dela também.
— Onde você me quer?
Ela se contorceu contra ele, envergonhada pela pergunta, e ele beliscou sua
pele novamente, um pouco arrepiada, o suficiente para fazê-la ofegar e o querer
ainda mais. Como ele sabia disso? Que uma mordida delicada poderia seduzir
assim como um beijo? Antes que ela pudesse perguntar, ele separou as dobras
abaixo de suas coxas e disse, baixo e delicioso, — Aqui?
Outro suspiro. — Sim.
Ele acariciou contra sua carne pulsante, suave, depois firme, girando e
acariciando. — Diga-me novamente. Vou dar-lhe tudo o que você quer,
tudo que você tem a fazer é pedir para ele.
— Eu quero isso, — ela ofegou. Ela balançou contra ele, ansiando por mais
de seu toque. — Por favor. Eu quero...
Seu polegar trabalhou um círculo apertado, colocando-a em chamas. —
Devo dar-lhe as palavras, amor?
— Sim, — disse ela. — Eu quero cada palavra. Todos as perversas.
Ele exalou outra maldição. — Você vai me destruir, Felicity Faircloth.
— Não antes de você me dar as palavras. — Ela suspirou, amando que ele
estava tão emocionado quanto ela.
— Você quer vir, — ele disse. — Você me quer para fazer você vir.
Outra carícia, outro golpe. E outro e outro. — Sim.
— Você quer meus dedos aqui. — Ele se moveu, e ela gritou quando ele
começou a enchê-la, magnificamente, suas mãos vindo à sua cabeça,
empurrando-o para baixo e para baixo. Ele rosnou novamente. — E garota má,
você quer minha boca também.
— Sim, — ela disse novamente. — Sim eu quero isso.

275
Ele deu a ela, colocando sua língua em seu calor suave, saboreando o gosto
dela enquanto seus dedos continuavam seu movimento, fazendo amor com ela
com movimentos lentos e saboreando sua mão livre levantando uma de suas
pernas por cima do ombro, abrindo-a. para ele. Ela não pôde impedir-se de
pressionar os quadris para ele, - não, desejou - gritando aquela única palavra de
novo e de novo, ela só levou suas mãos em seu cabelo, segurando-o até que
encontrou seu orgasmo, gritando seu nome para todo o mundo enquanto ele
trabalhava com as mãos, boca e língua até que tudo o que ela sabia era prazer.
Quando ela desceu de seu prazer, sua língua suavizou, seus dedos se
imobilizaram enquanto ela pulsava contra ele, ela puxou-o para ela, seu nome
rouco em seus lábios, ansiosa por mais. Ansiosa por tudo isso.
Ele seguiu seu toque, subindo sobre ela, roubando seus lábios em um beijo
longo e doce que alimentou o fogo mais uma vez antes que ela recuasse e
colocasse as mãos no torso dele, deslizando-as sobre os cumes e planos de seu
corpo para encontrar a parte de seu corpo que a tinha paralisado.
Quando os dedos dela tocaram o comprimento dele, ele empurrou seus
quadris para longe dela. — Espera Amor.
Ela abriu os olhos. — Por favor, — ela sussurrou. — Por favor, deixe-me tocar
em você.
Ele rosnou e a beijou novamente. — Eu não acho que posso ter isso, doce,
— disse ele em seus lábios. — Eu não acho que posso suportar isso. Eu não quero
que isso acabe.
Ela se acalmou. Não poderia ter acabado. Ela queria o resto. Ela queria tudo
isso. Cada toque, cada beijo, cada movimento que os uniria. Ela assentiu,
recusando-se a abandonar o olhar dele e sorriu.
Seus olhos cintilaram em seus lábios, depois de novo. — Isso é um sorriso
perverso, minha senhora.
— Eu sou sua dama, — ela disse suavemente, sua mão se movendo um
pouco, apenas o suficiente para envolvê-lo. Para explorar provisoriamente.
Ele assobiou seu prazer. — Sim. Porra. Sim. — E então ele alcançou aquela
mão ousada e a devolveu ao peito, um lugar mais seguro.
— Algum dia, — ela disse, — você vai me deixar tocar em você.
Ele desviou o olhar e depois voltou. O movimento mal estava lá. Menos de
um segundo. Menos que isso. E ainda assim, foi o suficiente. Felicity sabia a
verdade. Não haveria um dia. Não amanhã, não na próxima semana, no próximo
276
ano. Não haveria outra noite aqui, no telhado de seus escritórios, ou em seus
quartos, ou no porão de gelo em seu armazém. Esta noite era isso. Ela jogou seu
jogo, e esta noite era isso.
Esta noite era tudo que eles teriam.
E amanhã ele iria embora.
Ela ergueu os quadris para ele novamente, amando o jeito que seu
comprimento acariciava através de suas dobras molhadas, lisas e macias e
quentes como o sol. Seu grito de prazer foi recebido com seu gemido baixo, até
que ele se afastou, abaixando-se mais uma vez. — Você deseja vir de novo, amor?
Para onde ele estava indo? — Espere, — ela disse.
Seus lábios, novamente em seu torso. Felicity tentou se sentar. — Espere,
Devon.
Ele esfregou a sombra áspera de sua barba sobre sua pele. — Eu vou cuidar
de você. Deite-se. Eu pretendo provar o seu prazer uma dúzia de vezes esta
noite. Cem.
Mas não do jeito que ela queria. Não com todo o seu eu.
— Espere, — ela repetiu, desta vez levantando o joelho, pressionando-o
contra ele. Empurrando-o para longe enquanto ela se mexia para se sentar. —
Não.
Ele parou instantaneamente com a palavra, cambaleando para trás, sua mão
quente em sua coxa. — O que foi?
— Eu não quero isso.
Seu polegar acariciou a pele macia e quente de sua coxa, e sua respiração
ficou presa em seu peito, seguido por uma onda de calor quando ele disse, baixo
e escuro, — Você não quer?
Claro que ela queria. Meu Deus, o homem era magnífico. — Eu quero dizer,
eu não quero isso sozinha. Eu quero isso com você. Quero você... — Ela
hesitou. E então, em seguida. — Juntos.
Ele a soltou instantaneamente. — Não.
— Por que?
— Porque, se eu tocar você como... — Ele parou e olhou para longe, para os
edifícios na distância, escuros contra o estrelado céu. E depois de volta para ela.
— Felicity... se eu te foder... você estará arruinada.

277
A linguagem grosseira era para assustá-la. Isso só a fez querer mais. — Você
me disse que me daria o que eu pedisse. Eu quero aquilo. Eu quero esta noite.
Contigo. Tudo isso. Com você.
— Isso não. Eu lhe darei tudo menos isso.
Ele parecia frustrado. — Por quê?
— Felicity — Ele começou a se levantar. — Eu não sou para você.
Ela ficou de joelhos, seguindo-o. — Por que não?
— Porque eu nasci em Deus sabe onde e renasci aqui, na sujeira do Covent
Garden. Eu estou sujo além do reparo. E estou tão abaixo de você que tenho que
me forçar para olhar para você.
— Você está errado, — disse ela, estendendo a mão para ele, sem saber mais
o que fazer. Ele se afastou. — Você está errado.
— Eu garanto a você - eu não estou. As coisas que eu fiz... — Ele fez uma
pausa, correndo uma mão sobre a sua cabeça. — As coisas que eu farei... —
Ele apoiou longe dela. — Não, Felicity. Nós terminamos. Se vista e eu te levarei
para casa.
— Devil, — disse ela, sabendo que, se ela deixasse o telhado, o perderia
para sempre. — Por favor. Eu quero você. Eu... —
Outra hesitação. E então, as únicas palavras que ela poderia encontrar. —
Eu te amo.
Seus olhos se arregalaram e a mão ao seu lado se moveu.
Alcançando ela? Por favor, deixe-o estar vindo para ela. — Felicity... — Seu
nome estava esfarrapado em seus lábios. — Não...
Ela resistiu às lágrimas que ameaçavam. Claro que ele não a amava de volta.
Ele não era o tipo de homem que iria amar ela. E mesmo assim, ela não poderia
deixar de acrescentar: — Você é tudo que eu desejo. Você. Isto. O que quer que
esteja por vir.
Ele balançou sua cabeça. — Você acha que Londres vai querer você de volta
se você se amarrar a mim? Você acha que vai retomar seu lugar nos salões de
festas em Mayfair? Tomar chá com a rainha ou seja lá o que vocês fazem?
— Eu não quero tomar chá com a rainha, seu idiota, — ela respondeu,
deixando sua frustração tomar conta. — Estou cansada de ter minha vida
escolhida por mim. Minha família decide onde eu vou, o que faço, com quem
devo me casar. A aristocracia me diz onde eu pertenço a um salão de baile, o que
278
eu posso esperar como mulher, onde as limitações são para os meus desejos. -
Não pergunte muito, eles advertem. Você é velha demais, simples demais,
estranha demais, imperfeita demais. Eu não deveria querer mais do que o
que eu deveria ser grata ao receber pelos restos do resto do mundo.
Ele a alcançou então, mas ela estava ocupada com sua raiva. — Eu não sou
muito velho. — Ele balançou a cabeça. — Você não é.
— Eu não sou muito simples.
— Você não é nada perto de simples.
— E todos nós somos imperfeitos.
— Você não.
Então por que você não me tem?
Ela abraçou os joelhos contra o peito e confessou seu pecado. — Eu não
quero salvá-los.
— Sua família.
Ela assentiu. — Eu sou a última esperança deles. E eu deveria querer
sacrificar tudo por eles. Para o futuro deles. Mas eu não quero. Eu me ressinto
disso.
— Você deveria se ressentir, — disse ele.
— Eles não se importam com nada, — ela sussurrou para seus joelhos. —
Eles me amam, eu suponho, e eles me toleraram, e sentiriam minha falta se eu
desaparecesse, mas não tenho certeza de que notariam por um bom tempo,
honestamente, minha mãe não notou que eu tenho passado minhas noites em
Covent Garden, e Arthur está tão preocupado com seu próprio casamento, que
ele não tem tempo para pensar por um segundo sobre o meu. E meu pai... — Ela
respirou forte. — Ele é apenas um personagem neste jogo. Ele é como um deus
ex machina12, aparecendo no final para assinar os papéis e tomar o dinheiro.
Ela olhou para Devil.
— Eu não quero isso.
— Eu sei.

12 deus ex machina - O termo refere-se ao surgimento de uma personagem, artefato ou evento


inesperado, artificial ou improvável, introduzido repentinamente em uma trama ficticia com o objetivo
de resolver uma situação ou simplificar um enredo. O uso de deus ex machina surgiu no teatro na
Grécia Antiga, no qual muitas peças terminavam com uma divindade surgindo metaforicamente no
palco, após o ator correspondente ser descido por um guindaste até o local da encenação, para finalizar
as estórias contadas até então.
279
— Eu nunca quis ganhar o duque. Não realmente.
— Você queria mais que isso.
— Sim, — ela sussurrou.
— Você queria o casamento, o homem, o amor, a paixão, a vida, o mundo
amplo.
Ela considerou as palavras dele - encapsulando perfeitamente o que ela
queria. Mas não Mayfair. Não mais Mayfair. Aqui. Agora. Covent Garden. Com o
seu rei.
Mais do que ela poderia ter. Sempre mais.
— Devo te dizer uma coisa verdadeira?
Ele exalou uma respiração longa e dura, o nome dela como uma oração. —
Não.
— Bem, eu vou, considerando que eu já disse o pior, — disse ela, incapaz de
impedir que as palavras chegassem. — Eu odeio chá. Eu quero beber bourbon.
Do tipo que você não vai admitir contrabandeado da América com todo esse
gelo. Eu quero fazer amor com você em seu porão de gelo e tomar banho em
sua enorme banheira, enquanto você assiste. Eu quero usar calças como Nik e
conhecer cada centímetro de Covent Garden. Eu quero ficar ao seu lado aqui, no
telhado e lá na rua abaixo, e eu quero que você me ensine a empunhar uma
espada de cana, assim como eu manejo uma fechadura. — Ela fez uma pausa,
apreciando o olhar estupefato em seu rosto quase tanto quanto ela odiava. —
Mas mais que tudo isso... Eu quero você.
— Este mundo é todo pecado, Felicity, e eu sou o pior disso.
Ela balançou a cabeça. — Não. Este mundo está trancado. Você está
trancado. — Como algo precioso. Ela encontrou seu olhar. Segurou. — E eu
quero entrar. Esta noite. — Sempre.
— Não tem como isso acabar sem a sua ruína.
— Já estou arruinada.
Ele balançou sua cabeça. — Não que isso importa, de qualquer maneira.
Ela achava que isso era um argumento significativo. E então, como uma
promessa, a memória aumentou. Selvagem e louca, assim como ela estava
quando era abraçada. — Eu nunca vou ganhar o duque, você sabe. Os banhos
são postados, sim, mas mesmo se eu fosse casar com ele, não o venceria. Eu não
quero ele. E ele não me quer. Não com paixão. Não com propósito.
280
— Não é importante para ele, — disse Devil. — Ele não sabe sobre paixão.
— Mas você sabe, — ela respondeu.
Ele amaldiçoou na escuridão. — Sim, maldição. Sim, eu sei sobre paixão. Está
me consumindo aqui, esta noite, nu em um telhado em Covent Garden, onde
qualquer um poderia nos vê.
Ela sorriu com as palavras, orgulho e amor se revoltando através dela. Este
homem magnífico. Ela estendeu a mão para ele, e ele a deixou tocar sua coxa,
deixou-a chegar mais perto, mesmo quando ela suavizou suas palavras e disse: —
E se alguém fosse tropeçar em cima de nós?
— Eu teria que matá-los por te ver nua.
Ela assentiu. Querido senhor. Ela nunca mais iria amar qualquer coisa da
mesma forma que ela amava ele. — Devil... — ela sussurrou, sua mão deslizando
por seu peito nu, flertando com a pele lá.
Ele a prendeu em si mesmo. — Felicity...
Ela odiava a resignação em seu tom.
— Fizemos um acordo todas essas noites atrás, — disse ela, inclinando-se,
pressionando um beijo no canto de seus lábios cheios e bonitos. — Eu fui
prometida ficar babando.
Ele viu onde ela estava indo. Balançou a cabeça. — Felicity.
— Não. Esse era o acordo. Você não renegaria, não é?
Ele considerou isso. Ela assistiu a batalha travar em seu belo rosto, sua
cicatriz ficou totalmente branca em sua bochecha enquanto ele fixava seu olhar
por cima do ombro em um telhado distante. Ela aproveitou a oportunidade para
se inclinar e pressione um suave beijo a sua bochecha.
— Devil, — ela sussurrou em seu ouvido, amando o estremecimento que
passou por ele com a palavra. — Pelos detalhes do nosso acordo, você ainda me
deve uma benção.
Suas mãos pousaram nela. Seu braço a envolveu. A puxando para perto. —
Sim.
— Essa é uma palavra maravilhosa.
Ele riu, baixo e grave e sem humor, suas mãos em suas orelhas. — De fato,
é.
— Minha benção, então?
281
Prazer tomou conta dela quando ele acariciou a pele nua de suas costas. —
Peça.
Ela colocou os lábios no ouvido dele. — Eu quero esta noite.
Antes que as palavras tinham desaparecido, Devil estava girando ela,
deitando-se novamente, pairando sobre ela, embalando seu rosto em suas mãos
fortes e arrebatadora com seu beijo longo e exuberante, fazendo seu corpo
cantar, seus seios, suas coxas, e um lugar macio entre eles que ele amava tão
bem e ainda sofria por ele.
Felicity levantou as coxas e se balançou contra ele, e ele arrancou a boca da
sua com um silvo, jogando a cabeça para trás para revelar as longas cordas de
seu pescoço. Quando ele olhou para ela novamente, seus lindos olhos âmbar
estavam cheios de desejo e algo próximo da dor. — Uma noite, — disse ele. —
Uma noite e depois você me deixa. Uma noite e você toma o seu lugar no mundo
onde você pertence.
Como se uma noite fosse o suficiente. — Sim, — ela mentiu.
— Vou fazer o certo, — ele sussurrou. — Eu vou mantê-la segura.
Ela assentiu. — Isso é o que você faz. — Este homem bonito, que passou a
vida inteira como um protetor.
Ele encontrou seu olhar. — Você terá tudo.
Não você, no entanto.
Ela empurrou o pensamento de sua cabeça, estendendo a mão para ele. —
Por favor. — Ela levantou os quadris para ele. — Não pare.
Ele exalou uma risada sem fôlego, inclinando-se para sugar a ponta de um
seio até que ficou duro e tenso. — Eu não tenho intenção de parar, minha garota
gananciosa. — Seus dedos encontraram o caminho para o seu núcleo,
acariciando e demorando, alongando e acariciando, sua respiração ficando cada
vez mais rápida, o prazer correndo através dela. Ela se esforçou para manter a
mão dele contra ela, mesmo quando o toque dele se suavizou.
— Mais, — disse ela. — Eu quero tudo isso.
— Eu também, — ele sussurrou, colocando a testa na dela e a beijando mais
uma vez. — Deus, eu vou amar estar dentro de você quando você vier.
— Sim. — Ela o beijou. — Por favor.
— Tão gananciosa.

282
Ela assentiu. — Devassa.
Ele bufou um risinho tenso. — Você não deveria saber essa palavra.
— Você me ensinou pior, — disse ela.
— Isso é verdade, — ele respondeu, as palavras soando estranguladas
quando ele se balançou contra ela.
— Você não pode tê-los de volta, — ela disse, espalhando suas coxas
amplas para acomoda-lo quando a ponta do membro dele se estabeleceu na
abertura dela, quente e suave e, — Oh...
— Mmm, — ele disse duramente. — Oh...
E então ele estava deslizando para dentro dela com perfeito controle, lento
e suave, e ocorreu a ela que a sensação poderia deixá-la com raiva. Ele estava tão
duro, grande e tão cheio, estirando-a além de qualquer coisa que ela poderia ter
imaginado, não dor ou prazer, mas algumas insuportáveis, combinações gloriosa
dos dois. Não. Prazer. Então, muito prazer. Ela ofegou.
Ele congelou. — Felicity? Fale comigo.
Ela balançou a cabeça.
— Amor... — Ele beijou-a suavemente. — Querida, diga alguma coisa.
Seus olhos voaram para os dele. — Oh...
— Algo mais que oh, amor. Eu não quero te machucar.
Ela flexionou contra a forma completa dele, e ele afundou mais em seu canal.
Ele gemeu, seus olhos se fecharam.
— Oh meu... — ela disse.
Ele riu de novo, rouco e perfeito. — Querida, se você não disser outra coisa
além de alguma variação sobre oh, eu vou parar.
Seus olhos se abriram. — Não se atreva.
Suas sobrancelhas se levantaram. — Bem. Isso é algo diferente de oh.
Ela estendeu a mão para os ombros dele, alisando as mãos sobre seus
músculos, cada um mais tenso do que o anterior. — Você deseja mais palavras?
— Eu preciso delas, — ele disse suavemente. — Eu preciso saber que é bom
para você.

283
Ela sorriu e então se inclinou e tomou sua boca para um beijo demorado.
Quando acabou, ela enrolou a mão atrás do pescoço, olhou em seus olhos e
disse: — Eu quero tudo.
E ele começou - abençoadamente - a se mover. Longos e lentos golpes
enviavam prazer ao curvar através dela, de novo e de novo, — Diga-me como se
sente, amor.
Ela queria dizer, mas era impossível - ela perdeu as palavras novamente. Ele
as roubou com seu beijo e seu toque e a deliciosa extensão dele, acariciando,
guiando, dando prazer a ela. Seus movimentos eram lentos e deliciosos, o
suficiente para afugentar os últimos sinais de dor que haviam permanecido,
deixando apenas suspiros e afagos, e um ritmo perfeito - um que ela estava feliz
em igualar.
E quando ela o fez, ele abriu os olhos, encontrando o olhar dela, e ela perdeu
as palavras novamente com o desejo puro e inalterado neles. Ela estendeu a mão
para ele, correndo os dedos ao longo de sua mandíbula, onde sua cicatriz estava
irregular e branca. — Você quer tudo isso também.
— Sim... — Ele assobiou seu prazer. — Porra, sim, eu quero tudo.
E então seus quadris rolaram lindamente e ela gritou quando ele bateu
contra um lugar magnífico. Ele parou, levantando uma sobrancelha. — Aqui? —
Ele repetiu o movimento.
Ela apertou os ombros dele. — Sim.
Novamente.
— Por favor.
Novamente.
— Devil, — ela engasgou.
— Diga-me novamente, — ele rosnou, levando-a mais e mais. — Dê-me as
palavras novamente.
Seus olhos se abriram para encontrar os dele nos dela. — Eu te amo, — ela
sussurrou quando ele empurrou para dentro dela.
— Sim.
— Eu te amo. — Ela se agarrou a ele, as palavras uma oração. Uma ladainha.
— Eu te amo.

284
— Sim. — Ele segurou seu olhar através de tudo, sussurrando aquela única
e bela palavra, de novo e de novo, quando ele deu a ela tudo o que ela sempre
quis. Tudo o que ela sempre sonhou. Quando ela sussurrou seu amor e eles se
voltaram para o prazer, duro, rápido e perfeito, como a verdade. E quando o
prazer a percorreu como uma onda, ele capturou primeiro seus gritos e então ela
riu com o beijo dele. E só então, o som de seu prazer desenfreado em seus
ouvidos, ele encontrou sua própria liberação, profunda e poderosa, seu nome
em seus lábios.
Minutos depois, horas, talvez, ficaram em silêncio sob as estrelas, no
deslumbrante despertar do que haviam feito. Devil tinha invertido sua posição,
colocando Felicity em seu peito, onde sua cabeça estava deitada e seus dedos
dançavam círculos em sua pele.
Ele segurou-a com força contra ele, seus braços e casaco a mantinham
quente, seus dedos peneirando seus cabelos em uma deliciosa e rítmica carícia,
e por essa breve eternidade, ela imaginou que a noite o tinha mudado tanto
quanto a mudara.
Ela fechou os olhos, a batida constante de seu coração contra seus
pensamentos - a silenciosa fantasia doméstica que terminava com ele pegando
a mão dela e se comprometendo com ela, para sempre. Ela inspirou, dominada
pelo cheiro dele, flor de tabaco, zimbro e pecado, e imaginou que, para sempre,
qualquer sinal disso invocaria as falsas memórias que ela tecia em seus braços.
Um casamento em Covent Garden, uma festa estridente cheia de vinho e
música, e uma noite para seguir neste mesmo teto - uma repetição desta noite,
porém melhor, porque não terminaria com ele deixando-a.
Isso acabaria com uma vida juntos. Um casamento. Uma parceria. Uma fila
de crianças com lindos olhos âmbar e ombros fortes e narizes longos e retos.
Crianças que aprenderiam que o mundo era amplo e bom, e a aristocracia não
era nada comparada com os homens e mulheres trabalhadores que construíram
com a cidade em que viviam e a tornavam melhor a cada dia.
Homens que gostam do pai deles. As mulheres gostam do que ela esperava
se tornar ao seu lado.
Ela fechou os olhos e imaginou aquelas crianças. Queria elas. Já os amava.
Assim como ela amava o pai delas.
— Felicity. — Ele disse o nome dela, baixo e perfeito, e ela levantou a cabeça
para encontrar o olhar dele. — O amanhecer se aproxima.

285
Amanhecer, pronto para queimar a escuridão e com ele, aquelas memórias
preciosas e desfeitas.
Não me mande de volta. Me mantenha aqui. Eu pertenço a este lugar.
Ela não disse as palavras, mas ele parecia ouvi-las de qualquer maneira. Ele
exalou, o som quebrado. — Você merecia mais do que isso, — disse ele. — Você
merecia uma noite de núpcias. Com um homem dez vezes mais do que eu sou.
Com um homem que pode lhe dar dinheiro e título, nome e fortuna,
uma mansão em Mayfair e uma propriedade rural que está na família há
gerações.
Raiva explodiu. — Você está errado.
— Eu não estou.
— Eu não quero essas coisas.
Ele a observou por um tempo. — Diga-me de novo por que você estava
chorando naquele quarto, no dia em que você abriu a fechadura. O dia em que
seus amigos lhe deram as costas. Diga-me de novo o que você lamentou.
Embaraço quente queimava. — Não é a mesma coisa, — protestou ela. —
Eu não sou a mesma. Não me importo com Mayfair e bailes.
— Se eu acreditasse nisso... — Ele olhou para longe, de volta para as estrelas.
— Eu rastejaria para você sem hesitação, mas se eu fizer isso, você não iria ter
sua vida de volta. Nem a aceitação.
— Você me amaria? — Ela sussurrou, o som mal lá, pouco diferente do
que o sussurro do vento sobre as telhas no telhado. O som da pele roçando a
pele. O som da respiração deles se misturou.
O som da esperança.
Ele exalou, longo e irregular. E então ele disse a ela algo verdadeiro. —
Insuficiente.
E lá, sob as estrelas neste lugar que ela tinha vindo a amar, Felicity resolveu
provar que ele estava errado.

Capítulo Vinte e Quatro

286
Tudo tinha mudado, Felicity percebeu, quando ela desceu da carruagem de
sua família na noite seguinte, sua mãe seguindo logo atrás, suas ricas saias de
cetim rosa girando em torno dela.
Um ano atrás, há um mês, duas semanas atrás, Felicity ansiara por esse exato
momento. Era meados de junho e o verão chegara, toda Londres se preparando
para fazer as malas e partir para o campo, mas as melhores fofoqueiras da cidade
não sonhariam em sair antes desse baile especial - o arauto de verão da Duquesa
de Northumberland, o baile mais glamouroso da temporada.
Há um ano, há um mês, duas semanas atrás, Felicity não poderia ter
imaginado um evento mais desejável do que este, subindo os degraus da
residência dos Northumberland, as janelas da mansão reluzindo à luz de velas,
sua mãe vibrando com prazer ao lado de Felicity um punhado de convidados
reunidos do lado de fora e se aglomerando ao redor da porta, reconhecendo-a
sem hesitação.
Acolhendo-a. Reivindicando-a.
Exceto que tudo mudou.
E não simplesmente o fato de que ela não era mais uma estranha, solteirona,
encalhada Felicity. Nem que ela era, para todos reunidos ali, a futura Duquesa de
Marwick.
Oh, certamente foi por isso que a aristocracia acreditou que tudo havia
mudado. Mas Felicity sabia melhor. Ela sabia que o que havia mudado,
sumariamente e irrevogavelmente, era que ela havia se apaixonado pelo mundo
além disso, e pelo homem que revelara isso a ela. E essa verdade traiu outra: esse
mundo que ela tanto gostara não era nada comparado ao dele. A ele.
Que ele não acreditava, e assim, sem recorrer, Felicity tinha vindo a este
lugar, cheio dessas pessoas, para provar isso a ele.
Com a lembrança, ela endireitou a coluna e os ombros. Mantendo o queixo
alto, quando de repente ela não estava disposta a permitir que esse lugar - essas
pessoas - dominassem sobre ela.
Havia apenas uma pessoa que a mantinha em seu balanço. E apenas uma
esperança de conquistá-lo. O que significava que ela tinha que encontrar seu
noivo.
— Seu noivado já fez o mundo tomar conhecimento! — A Marquesa disse
animadamente enquanto elas pisavam na grande entrada de Northumberland,
uma multidão de pessoas em torno deles.
287
Ela olhou para a escadaria principal, cheia de foliões, e deu um pequeno
guincho. — Não fomos convidados no ano passado; não fomos bem vindos. Por
causa do... bem, você sabe.
Felicity desacelerou e olhou para a mãe. — Na verdade não, eu não sei.
A Marquesa olhou para ela e baixou a voz. — Por causa do seu escândalo.
— Você quer dizer o escândalo da minha busca no mercado de casamentos
pelo Duque de Haven?
Sua mãe balançou a cabeça. — Não só isso.
— O escândalo da minha solteirice?
— Pode ter sido um pouco disso também.
— É mais ou menos um pouco do que ser exilado do círculo íntimo das joias
da alta sociedade?
— Realmente, Felicity. — Sua mãe olhou em volta com uma risada muito alta,
claramente com medo de que alguém pudesse ouvi-los.
Felicity estava menos interessada nessa eventualidade. — Eu teria pensado
que o escândalo que eliminou nossos nomes da lista de convidados foi o pai e
Arthur perdendo todo o dinheiro da família.
Os olhos de sua mãe se arregalaram. — Felicity!
Felicity pressionou os lábios, sabendo que agora não era nem o lugar nem o
momento, mas não estava particularmente amável. Virando-se, ela subiu as
escadas em direção ao grande salão de baile. — Não importa, mãe. Afinal,
estamos aqui esta noite.
— Sim, — disse a Marquesa. — Essa é a parte importante. Como é o
duque. E estaremos aqui no próximo ano. E todos os anos depois.
Eu não estarei.
— Até seu pai planeja fazer uma aparição hoje à noite.
É claro que o pai dela, agora que ele sentia que poderia mostrar seu rosto
com os cofres da família, quase cheios, mais uma vez.
Felicity se concentrou no topo da escada. — Eu preciso encontrar o duque.
Ela não tinha feito dez passos quando uma voz chamou de algum lugar
acima, — Felicity!

288
A voz era familiar o suficiente para que ela hesitasse em seu movimento,
virando-se instantaneamente para encontrar os olhos brilhantes de Natasha
Corkwood, brilhando com interesse enquanto ela acenava do topo da escada,
balançando e tecendo para manter contato com Felicity. Ela se virou para dizer
algo a seu companheiro, e Jared, Lorde Faulk, olhou por cima do ombro para
seguir seu olhar, reconhecimento e algo mais queimando em seus olhos. Algo
predatório.
Felicity desviou o olhar imediatamente, redobrando seus movimentos
enquanto subia as escadas.
Quando ela chegou ao topo, Natasha gritou novamente, mais perto do que
Felicity gostaria. — Felicity!
— Querida, devemos parar. Lady Natasha e Lorde Faulk são seus amigos. —
Simples assim, sua mãe varreu o passado, como se dezoito meses de vergonha,
tristeza e confusão não fossem nada.
A amizade nem sempre é o que pensamos.
As palavras de Devil ecoaram através dela, tentando-a a virar as costas e
deixá-las ali, na frente de todos os londrinos cuja boa opinião eles cortejavam. Em
vez disso, ela se virou para encará-los.
— Felicity! — Natasha disse, sem fôlego, o rosto cheio de um sorriso falso.
— Estamos esperando por você! — Sua mão pousou no braço de Felicity.
O olhar de Felicity se fixou no toque ofensivo por tempo suficiente para que
Natasha o removesse, ponto no qual Felicity olhou para cima e disse: — Por quê?
Cor lavou as bochechas de Natasha e ela piscou, com um riso nervoso
acompanhando sua surpresa. — Porque, porque nós sentimos sua falta! — Seus
olhos piscaram para seu irmão. — Não sentimos Jared?
Lorde Faulk sorriu, revelando dentes grandes, quase grandes demais para
sua boca. — Claro.
Como se o passado nunca tivesse acontecido. Como se tivessem uma vaga
discordância depois de muito champanhe, em vez de todos fingirem que Felicity
não existia há dezoito meses. Como se eles ainda fossem as mesmas pessoas.
Como se ela quisesse que eles fossem novamente.
Desgraças
A palavra de Devil novamente, baixa e escura, sussurrando em seu ouvido,
sua memória lhe trazendo força.
289
— Seu vestido é deslumbrante. — Natasha ainda estava falando, e as mãos
de Felicity se moveram por conta própria para suas saias, cheias e fúcsia, tão rosa
quanto rosa existia. O vestido chegara naquela manhã da costureira Madame
Hebert - junto com uma pequena nota da francesa, agradecendo Felicity por seus
negócios com os duques de outrora e futuros... e quaisquer outros que possam
acontecer e curtir você de rosa.
E era impressionante, luxuoso além de qualquer coisa que já tivesse usado
antes, com um decote discreto revelando uma ampla extensão de ombros,
juntamente com magníficas saias rosa salpicadas com fios de seda berinjela, a
coisa toda dando ao vestido a aparência de pôr do sol.
Ou melhor, o céu de Devon ao pôr do sol.
Ela desejou que Devil pudesse ver.
Devil veria, claro. No momento em que ela terminasse com o duque, a quem
ela não conseguia encontrar no meio das pessoas. O pensamento fez seu coração
disparar e Felicity foi à procura de seu noivo, pressionando ainda mais o salão de
baile.
— Obrigada, Natasha - você sempre parece tão bonita também, — a
Marquesa ofereceu no limite de sua atenção, preenchendo o silêncio quando
Felicity não falou.
Tasha mergulhou em uma reverência. — Obrigado minha senhora. E meus
parabéns a você também – pelo seu futuro genro!
A Marquesa riu. Natasha riu.
Jared sorriu.
Felicity olhou de um rosto para o outro e disse: — Estou louca, ou você está
tentando me fazer de amiga mais uma vez?
Cor subiu alto nas bochechas de Natasha. — Eu imploro seu perdão?
— Felicity! — Sua mãe interveio.
— Estou falando sério, Natasha. Parece que você gostaria de fingir que
nunca nos afastamos. Que você e seu grupo nunca se afastou de mim - não foi
isso que você falou?
A boca de Natasha se abriu e depois fechou.
Felicity ignorou sua ex-amiga, notavelmente desinteressada por ela - pela
primeira vez na vida. Ela procurou o mar de foliões indo para o salão de baile.
Liberdade. Sem adeus, ela disse: — Preciso encontrar o duque.
290
— Oh, claro que ela precisa, — a Marquesa disse exageradamente, por
alguma razão ansiosa para manter seus ganchos suspensos. — Você entende, —
ela acrescentou, — casais comprometidos desejam estar na companhia um do
outro tanto quanto possível, você deve saber.
— Oh, é claro, — Natasha bajulou para o benefício de todos reunidos. —
Ainda estamos tão impressionados que você conseguiu conquistar ele! Afinal,
Felicity não é exatamente o tipo de esposa que um duque procura.
— Eu não o consegui, — Felicity disse distraidamente, pressionando para
frente.
Natasha assumiu a aparência de um gato selvagem, com o rato à vista. —
Você não fez?
Seguiu-se o silêncio, depois o riso alto da mãe dela. — Oh, Felicity! Que
piada. Claro, os banhos têm sido lidos! Não era um anúncio na notícia?
— Eu suponho que sim. Bem, de qualquer forma, eu não me interessaria
tanto, Tasha... — Felicity disse, virando um olhar frio para a outra mulher, —
mesmo que eu tenha conseguido, você nunca seria bem-vinda em nossa casa,
de qualquer maneira.
A boca de Tasha se abriu com as palavras, e a mãe de Felicity ofegou seu
horror com a grosseria de Felicity. Felizmente, Felicity foi salva de ter que
continuar com a descoberta de seu noivo, uma cabeça loira mais alta do que
qualquer outra pessoa no salão de baile, do outro lado da assembleia louca. No
momento em que ela o viu, seu coração começou a bater. Ela se afastou de seus
companheiros indesejados, tecendo através da multidão para chegar até ele.
Para se libertar dele.
Ele estava sozinho quando ela chegou a ele, direto e olhando sem rumo para
a multidão. Ela se colocou diretamente na frente dele. — Olá, sua graça.
Seu olhar cintilou para ela, depois de volta para o baile. — Eu pedi para você
não me chamar assim. — Ele fez uma pausa. — Quem é essa mulher?
Ela olhou por cima do ombro para encontrar Natasha brincando por perto,
interpretando a vítima de olhos arregalados.
— Lady Natasha Corkwood.
— O que você disse a ela?
— Eu disse a ela que ela nunca seria bem-vinda em nossa casa.
Ele encontrou seus olhos. — Por que não?
291
— Porque ela me machucou. E acho que estou cansada de estar machucada.
Ele deu de ombros. — Feira suficiente.
— Não que isso importe, já que não dividiremos uma casa.
— Não, — ele concordou. — Mas é uma boa figura de linguagem, e tenho
certeza de que isso ajudou a entender seu ponto de vista.
Ela respirou fundo. — Isso não é o que eu quis dizer, no entanto.
Ele olhou para ela, e ela viu a compreensão em seu olhar. Compreensão e
outra coisa. Algo como... respeito? — O que isso quer dizer?
Parecia apropriado que um compromisso iniciado na frente de todo o
mundo terminasse em frente a eles. Pelo menos Felicity estava terminando tudo
na cara do duque, em vez de uma coleção de fofocas enlouquecedoras. — Receio
não poder casar com você.
Isso chamou sua atenção. Ele a observou por um longo momento e depois
disse: — Posso saber por quê?
Metade de Londres estava assistindo, e Felicity percebeu que não se
importava. Mas certamente o duque se importava.
— Será que você gostaria de encontrar um lugar onde nós pudéssemos...
conversa?
— Não particularmente, — ele disse.
Isso lhe deu uma pausa. — Sua Gra... — Ela parou. — Duque.
— Diga-me por quê.
— Tudo bem, — disse ela, com o coração acelerado. — Porque eu amo
outro. Porque acho que ele poderia me amar. Tudo o que tenho que fazer é
convencê-lo de que o quero mais do que quero qualquer outro deste mundo.
Ele encontrou seus olhos. — Eu imagino que seu pai não vai ficar feliz com
a sua decisão.
Ela balançou a cabeça. — Eu não imagino isso. Eu era uma última esperança
para ele.
— Para seu irmão, também, — ele apontou. — Eles estavam mais do que
felizes em pegar meu dinheiro.
— Em troca de um casamento sem amor, — disse ela, balançando a cabeça.
— Eu não desejo isso.

292
— E o que você sabe sobre o amor? — Ele perguntou, em suas palavras um
silencioso zombeteiro.
Eu andaria através do fogo por ele.
Whit usara as palavras no depósito na outra noite, explicando a lealdade dos
empregados de Devil. Ela entendeu agora. Ela o amava. Ela olhou para o duque.
— O suficiente para saber que eu o quero mais do que eu quero o resto.
Ele sorriu com isso.
— E você também deveria, — acrescentou. Quando ele não respondeu, ela
acrescentou seu pedido, hesitante, — Eu me pergunto se eu poderia convencê-
lo a investir com o meu irmão de alguma forma? Ele é muito conhecedor em
negócios, apesar de...
Ele a cortou. — Diga-me como é.
Ela hesitou. Ele estava perguntando sobre... o amor? — É impossível para
descrever.
— Tente.
Ela olhou para longe, seu olhar parou sobre um par que dançava, a mulher
em um belo vestido de safira. Eles estavam no meio da rodada, as costas dela em
um arco perfeito sobre o braço forte dele, as saias dela queimando atrás dela. Ela
olhava para ele, sorrindo, e ele, para ela, extasiado, e naquele momento, eles
eram perfeitos o suficiente para roubar a respiração. Não por causa de seu
vestido ou o casaco ou como eles se moviam ou o fato de que,
quando eles pararam que por sua vez, suas saias iria girar em torno deles dois, e
ele iria sentir seu volume pesado em suas pernas, e desejando uma vida inteira
dessa sensação.
A tristeza, o desejo e a resolução guerreavam dentro dela quando Felicity
voltou sua atenção para o duque. — Você encontra o seu par. Você encontra o
seu par e deixa que ele a ame.
— Não é assim tão fácil. — As palavras foram ásperas.
— Bem, — ela disse. — Você poderia começar procurando por ela.
— Eu tenho procurado por ela por doze anos. Por mais tempo. Desde que
me lembro. — As palavras eram impossíveis de entender mal. O duque não
estava falando de uma mulher sem nome, sem rosto, com quem ele pode viver
fora o resto de seus dias. Ele estava procurando por alguém específico.

293
Ela assentiu. — Ela vale a espera, então. E quando você encontrá-la, você
ficará feliz por este momento.
— Quando a encontrar, serei mais infeliz do que já estive.
Uma visão brilhou. De Devil, na noite anterior, quando disse que ele nunca
poderia amá-la o suficiente. De tê-la deixado em casa quando a luz começou a
se espalhar pelo céu. Do beijo suave que ele deu nela nos jardins, antes que ela
passasse pela porta da cozinha. De como sentiu ao dizer adeus. Das lágrimas que
tinham vindo, espontaneamente e indesejáveis, mas ali, no entanto, ela decidiu
que estava acabando com o mundo manipulando-a, e que era sua vez de
manipular o mundo.
— Você gostaria de dançar, Lady Felicity?
Sua testa franziu. — O que?
— Estamos no baile, não estamos? Não é uma eventualidade inimaginável.
Ela não queria dançar.
Ele continuou. — Isso, e toda Londres está assistindo, e você não é a pessoa
menos emotiva que eu já conheci.
Não era toda Londres, no entanto. Era uma fração minúscula de Londres, e
ela estava achando cada vez menos tolerável. No entanto, ela deixou que ele a
levasse até o centro do salão e a pegasse em seus braços. Eles dançaram por
vários longos minutos em silêncio, antes de dizer: — Então você acha que meu
irmão está apaixonado por você.
Felicity recuou, ou o mais longe que pôde enquanto dançava. Ela certamente
tinha ouvido mal. Ele claramente não tinha dito... — Eu... eu imploro seu perdão?
— Não há necessidade de você bancar a tola, minha senhora, — disse ele. —
Ele está atrás de você desde o começo, não é? Desde a noite que você anunciou
nosso noivado para o mundo? — Ela perdeu um passo com as palavras, e seus
braços se apertaram ao redor dela, levantando-a do chão por um momento
enquanto ela recuperava o equilíbrio.
Confusão explodiu, seu olhar voando para o dele. Ele não podia estar
falando de Devil.
Devil, cujos olhos eram os mesmos, cor âmbar bonitos como os do duque –
que ela deveria ter notado antes. O que ela teria notado antes se os de Devil não
estivesse tão cheio de calor, e estes não fossem tão frios.
Realização amanheceu. Querido Deus.
294
O pai do Devil fora o Duque de Marwick.
O que fez o homem com ela — Ewan.
Para um observador externo, o nome parecia não ter impacto sobre ele. Mas
Felicity estava em seus braços, a poucos centímetros dele, e ela viu o modo como o
atingiu com tanta clareza como se tivesse cerrado o punho e o tivesse enfiado no
queixo. Cada centímetro dele apertou. Sua mandíbula, sua respiração parou em seu
peito. Sua mão ficou como pedra na dela, e seu braço ficou aço nas costas dela. E então
ele olhou para ela, seus olhos cheios de verdade e algo que parecia ter sido medo.
Mas Felicity não estava com medo. Ela estava confusa e chocada, e meia
dúzia de outras emoções, mas não conseguia encontrar espaço para o medo, pois
estava muito cheia de fúria. Porque se ela estava certa e este homem era Ewan,
o terceiro irmão, sequestrado para o campo para disputar um título em algum
tipo de jogo monstruoso, então ele era o vencedor do jogo. E em vez de manter
seus irmãos próximos e cuidar deles como deveriam ter sido tratados - como
eles mereciam ser cuidados - ele os deixou para sofrer e lutar nas ruas, nunca
sabendo onde eles encontrariam sua próxima gentileza. Nunca sabendo onde
eles sequer iriam encontrar gentileza.
E só por isso ela o odiava.
— Ele falou sobre nós para você, — ele disse. Surpresa nas palavras. Algo
próximo ao temor.
Ela vibrou com raiva. Ela tentou parar a dança. Ele se recusou a permitir isso.
Ela pressionou de volta contra o braço dele com toda sua força. — Me deixa ir.
— Ainda não.
— Você machucou ele.
— Eu machuquei muita gente.
— Você levou uma lâmina para o rosto dele.
— Eu lhe asseguro que não tive escolha.
— Não. Claramente este mundo valeu mais para você do que seu irmão. —
Ela agitou sua cabeça. — Você estava errado. Eu o escolheria em cima deste lugar
qualquer dia. Eu escolho ele agora. Sobre você.
Os olhos do duque brilharam. — Você não vai acreditar em mim, mas não
tem nada a ver com este mundo.
— Não, eu tenho certeza que não, — ela zombou. — Não o título ou as casas
ou o dinheiro.
295
— Acredite no que quiser, Lady Felicity, mas é verdade. Ele era um meio para
um fim. — As palavras não eram cruéis. Elas foram honestas.
Sua testa franziu. — Que tipo de fim exigiria tais meios? — Ela detestava
esse homem. — Você deveria sofrer pelo que fez com ele. Ele era um menino.
— Eu também. — Ele fez uma pausa. Então, casualmente, — Se ao menos
você estivesse conosco, Lady Felicity. Talvez você pudesse salvá-lo. Talvez você
pudesse ter salvado a todos nós.
— Ele não precisa ser salvo, — disse ela, suavemente. — Ele é magnífico.
Forte, corajoso e honrado.
— Ele é?
Algo sobre a questão não estava resolvido, como se o duque fosse um
mestre de xadrez, e ele pudesse ver seu inevitável fim. Ela empurrou contra ele
novamente, querendo estar longe deste homem que virou monstro. — Eu pensei
que você fosse estranho. Você não é. Você é horrível.
— Eu sou. Como ele é.
Ela balançou a cabeça. — Não.
Sua resposta foi instantânea, cheia de escuridão. — Ele não é uma pessoa
sem pecado, minha senhora. Você não está curiosa para saber como você veio a
conhecê-lo? A como ele passou a se interessar por você?
Ela balançou a cabeça, pensando de volta. — Foi por acaso. Eu menti - sobre
o nosso noivado - ele ouviu.
Ele riu então, o som enviando frio através dela. — Em nossa vida, nada nos
aconteceu por acaso. E agora você é uma parte de nós, Felicity Faircloth. Agora
você está amarrada a nós. E nada acontecerá a você por acaso novamente. Não
compromissos. Não a quebra deles. Não bailes de ouro ou espiões em sebes. Até
mesmo os pássaros que você ouve cantar à noite não brinca por acaso.
Felicity esfriava e a sala girava com revelação - que esse homem, esse odioso
e horrendo homem, estava inexoravelmente ligado ao Devil. Que ele tinha sido
assim por anos e, pior, que ele sabia da extensão de suas interações com ele. Que
ele a usou apesar deles. Que ele a usou por causa deles, manipulando-a sem
esforço.
— Você estava me usando para chegar até ele.
— Eu usei. No entanto, para ser justo, não me propus usar você,
especificamente. Aquilo foi um acaso, na verdade. — Ele virou-a, movendo-a pela
296
sala, e para um observador externo, eles devem ter parecido fascinantes um com
o outro - uma combinação perfeita. Ninguém podia ver o jeito que ela empurrava
contra ele, desejando estar longe dele e o que quer que ele estivesse prestes a
dizer.
— Eu os procurei por doze anos, você sabia disso? Sem sucesso. Eu tinha
ouvido algo sobre um par de irmãos em Covent Garden. Negociantes de gelo.
Possivelmente contrabandistas. Mas eles correram pelas ruas, pagaram bem por
lealdade e estavam bem protegidos. Eu não tive escolha a não ser tentar uma
nova abordagem. Eu vim para a cidade, transmitindo a notícia da minha busca
por uma noiva.
Compreensão amanheceu. — Para convocá-los das sombras.
Ele inclinou a cabeça, surpresa em seus olhos. — Precisamente. Eles
poderiam se esconder de mim, mas nunca ficariam quietos se achassem que eu
deveria renegar nosso único acordo. — Seu olhar fixo em um ponto além de seu
ombro.
— Não herdeiros.
Mais surpresa. — Ele também te disse isso?
— Ele nunca planejou para você e eu casarmos, — ela sussurrou.
O duque soltou uma gargalhada e os que estavam ao redor deles se
voltaram para o som inesperado. Ele não se importou. — Claro que ele não fez.
Nós fomos cortados a partir do mesmo pano, minha senhora. Você se mostrou
muito útil para mim... e extremamente útil para ele também.
— Como?
— Você era uma mensagem. Eu não tenho permissão para felicidade. Eu não
tenho permissão para um futuro. Como se essas coisas estivessem sempre em
minhas cartas.
Seu olhar foi para o dele, seu coração batendo em suas orelhas ao lado da
cacofonia do ambiente. — Eu não entendo. Você não me queria. Eu não ia lhe
trazer felicidade.
— Não. Mas você poderia ter me trazido herdeiros. E aqueles, ele não teria
permitido. Essa foi a única punição que poderíamos dar ao nosso pai. Nenhum
herdeiro. A linhagem termina comigo, você vê. E conheço meu irmão o suficiente
para saber que Devon teria certeza disso.
Nós infligiríamos punição interminável.

297
E Felicity era a arma que ele escolheu. A arma, ao que parece, que eles dois
tinham escolhido. E então ele acrescentou: — E a promessa de que você
entregaria Devon para mim.
Ela desacelerou até parar e o duque permitiu isso, suas saias girando em
torno dela, mesmo quando o resto da assembleia continuou dançando. Cabeças
voltadas para eles, sussurros já começando. Felicity não se importou. — Eu lhe
darei o devido crédito; ele fez bem o seu trabalho. — Ele fez uma pausa. — Eu
estou supondo que ele já teve você. Acho que ele esperava que você viesse aqui
esta noite e terminasse nosso acordo. O é claro você fez, porque você se
apaixonou por ele. Porque você se imagina capaz de convencê-lo de que ele
também ama você.
A sala girou em torno deles, a percepção de que Devil tinha traído sua vinda
dura e rápida e fazê-la querer simultaneamente lançar suas contas e fazer dano
físico ao homem arrogante diante dela.
E então ele acrescentou em um tom ausente de emoção: — Pobre garota.
Você deveria saber melhor. Devon não pode amar. Não está nele. Ele, como todos
nós, e como nosso pai antes de nós, não pode fazer nada além de arruinar. Eu
espero que a sua tenha sido pelo menos agradável.
As palavras ameaçaram quebrá-la. Para devolvê-la a Felicity arruinada. Felicity
destruída. Mas ela não permitiria isso. Ela chegou a sua altura total, os ombros
retos, queixo orgulhoso, recusando-se a reconhecer as lágrimas que ameaçavam.
Ela não teria lágrimas. Não havia tempo para elas.
Em vez disso, ela deu um passo para trás, colocando distância entre eles, e
os casais mais próximos desaceleraram, esticando os pescoços para ver. Eles não
precisaram guinchar quando ela deixou a mão voar, nem tiveram que se esforçar
para ouvir o malvado estalo de sua palma contra sua bochecha.
Ele levou o golpe sem uma palavra, e a sala inteira sentiu sua ondulação.

Capítulo Vinte e Cinco

Devil passou horas naquela noite na lama do Tâmisa, trabalhando no


gancho, a melhor maneira de manter sua mente fora do que ele tinha feito. Ele
puxou e levantou até que seus músculos estavam em carne viva, até que suas
roupas estavam encharcadas de suor e parecia que a pele de seus ombros tinha

298
sido esfolada. Só então, ele se forçou a voltar para casa, dolorido, fedorento e
cansado o suficiente para ter uma promessa de um banho e dormir antes de
acordar, duro e quente e alcançar a única coisa que ele não poderia ter.
Cristo. Fazia pouco mais de um dia e ele sentia falta dela como o ar. Ele
amaldiçoou e destrancou a porta de seus escritórios, o prédio pesado de silêncio.
Deixando a exaustão chegar, ele subiu as escadas e estendeu uma chave na
fechadura, apenas para descobrir que nenhuma chave era necessária. Alguém
tinha desbloqueado a porta para a seus aposentos, enquanto havia uma meia
dúzia de possibilidades plausíveis, havia apenas uma pessoa que ele desejava
que fosse, mesmo que ele desejasse que fosse qualquer pessoa, menos ela.
Ele empurrou a porta, a dobradiça gemeu sob o movimento lento.
Felicity estava de pé no centro de seu escritório, no mais belo vestido rosa
que ele já tinha visto - o tipo de vestido que qualquer homem iria matar para
remover – imóvel e serena, seus olhos instantaneamente nos dele, como se ela
sempre estivesse lá, esperando por ele. Como se ela iria ficar lá para sempre,
sempre que ele voltasse.
Presente, passado e futuro glorioso, impossível.
Ele entrou, fechando a porta atrás de si, preparando-se para o que estava
por vir. Invocando a força para mandá-la embora novamente. — Eu gostaria de
te perguntar como você entrou no prédio, mas eu não acho que gostaria da
resposta. — Ele ergueu o queixo para o vestido dela, incapaz de parar de apontar
a elegância. — Covent Garden nunca viu um vestido como esse, minha senhora.
Ela não olhou para baixo. — Eu vim do baile de Northumberland.
Ele assobiou, longo e baixo. — Você deu aos nobres meus cumprimentos?
— Eu não, na verdade, — disse ela. — Eu estava muito ocupada terminando
meu noivado.
As palavras se revoltaram através dele. Ele se aproximou dela sem pensar.
Mentira. Houve um único pensamento. Sim.
Sim, ela era livre, e poderia finalmente, finalmente, ser dele.
Exceto que ela não podia. — Por quê?
— Porque eu não queria casar com o duque ou com qualquer outra pessoa
na aristocracia.
Case comigo.

299
Ela continuou. — Porque eu pensei que se eu fizesse isso lá – se eu
terminasse meu noivado publicamente, na frente de toda a sociedade - então
você veria que eu estava disposta a dar as costas para esse mundo e me juntar a
você aqui, neste lugar.
Seu coração começou a bater.
— Você vê, depois disso... depois de golpear o duque em público...
— Você o acertou? — Ele estendeu a mão para ela. — Ele...
Ela recuou de seu toque e ele parou, pavor e algo mais se acomodando,
instantaneamente, em seu estômago. Medo.
— Eu fiz, de fato. No centro de um salão de baile no assento de um dos
ducados mais poderosos da história. Estou bem e verdadeiramente arruinada
agora.
Ele não se importava com a ruína. Ele se importava com ela. — Por que você
bateu nele? Ele te machucou?
Ela riu, o som amargo. — Se ele me machucou? Não.
— Então por que...
— Eu suponho que alguém pode ser ferido por descobrir que tinha sido
traída pelo homem que ela estava para se casar... — Ela observou ele por um
longo momento, sem falar. — Mas eu não estava para me casar com ele, eu
estava? Não desde o começo?
A questão se estabeleceu entre eles como gelo.
— Eu estava, Devil?
Ele apertou os lábios, de repente desequilibrado; o chão estava se movendo
sob seus pés. — Não.
— Curiosamente, ele não tinha intenção de se casar comigo, então, por uma
vez, você e seu irmão não estavam em conflito. — O sangue correu nos ouvidos
de Devil.
Irmão.
Ela sabia.
— Como você soube?
Uma batida. E então: — Eu sei porque vocês são parecidos.
Não. — Nós não somos nada parecidos.
300
Seu olhar se estreitou nele. — Bobagem. Vocês são mais parecidos do que
imagina.
Ela não sabia como suas palavras arderiam. Como elas iriam enfurecê-lo.
Como elas sussurrariam a verdade.
— Nenhum de vocês pensou duas vezes antes de me usar. Ele, para convocá-
lo das trevas, para encontra-lo depois de doze anos de procura. Mas aqui está a
verdade disso... — Ela fez uma pausa, e ele sabia que o golpe estava chegando.
Sabia, também, que ele não poderia escapar disso. — Eu não me importo com
ele. Eu não confiava nele. Eu não me entreguei e pior – dei meu coração - para
ele. E assim, enquanto seus pecados passados são sem dúvida monstruosos...
enquanto ele mais do que mereceu o golpe que eu dei... enquanto eu lhe desejo
mal além da medida... Seu pecado não é nada em comparação com o seu.
Ela se afastou dele então, contornando a mesa e indo até a janela do outro
lado da sala, o som de suas saias roçando o tapete como um tiroteio. Ele odiava
vê-la deixando-o. Odiava o jeito que o ar parecia esfriar com cada um de seus
passos, como se ele pudesse ficar frio e congelado sem ela.
E ele ficaria.
Ela parou na janela, levantando a mão para um painel de vidro manchado,
pequeno e quase transparente. Não valeu a pena encher as janelas do Covent
Garden com um vidro decente, e ver Felicity vestida como uma rainha passar os
dedos pela vidraça, só ressaltou tudo que o Devil sabia ser verdade. Ele não
poderia tê-la.
Sua descoberta desta noite foi para o melhor.
Ela não era para ele.
— Você me ama? — A pergunta, tão direta, veio como um golpe. — Eu
pergunto porque há duas noites no telhado deste mesmo edifício, você me
disse que você não poderia me amar o suficiente para se casar comigo. E eu
pensei que era um escudo que você usava para se proteger da sua crença tola
de que eu queria aquele mundo em vez deste aqui.
Tinha sido. Cristo. Ele deveria ter dito a ela então, quando ele teve a chance.
Exceto que eles ainda estariam aqui. E doeria ainda mais.
Como se pudesse doer mais.
— Então se eu te perguntar agora, esta noite, você me ama mesmo?
Ele não iria sobreviver a isso. — Felicity.
301
Ele se aproximou dela, contornando a mesa, mas ela não olhou para ele. Ela
permaneceu na janela, olhando para os telhados distorcidos de Covent Garden,
tudo o que ele podia lhe dar. — Eu implorei para você me amar. Eu te implorei
para acreditar que eu era o suficiente para você. Que eu era o suficiente para este
lugar.
Você é. Você sempre foi.
— Felicity. — Seu nome era como cascalho em sua garganta.
— Bem, — disse ela, com um sorriso nos lábios. Envergonhada. — Eu
perguntei tudo isso porque não sabia a verdade. Eu não sabia o quão bem eu
tinha jogado em seus planos.
Seu coração parou, então rugiu para um trovão. — Felicity.
— Pare de dizer o meu nome, — disse ela, as palavras frias e irritadas. —
Você não tem o direito de usar meu nome.
Isso era verdade.
— “Felicity Faircloth”, você sussurrou quando entrou no meu quarto todas
aquelas noites atrás e me fez promessas que nenhum homem jamais seria capaz
de manter. Você zombou do meu nome de conto de fadas, dizendo que poderia
me dar o conto de fadas. Prometendo para mim. Sabendo que era tudo que eu
sempre quis.
— Eu menti, — disse ele.
Ela riu, dura e sem graça. — Então eu adivinhei. Você pensou que poderia
me seduzir em seu jogo com promessas de eu voltar a ser amada novamente. De
ser aceita novamente. De fazer parte daquele mundo. E eu acreditei cegamente.
Alegremente. Porque eu acreditei em você.
Ele detestou as palavras. A afirmação de seu desejo de voltar à sua torre e
brincar de princesa mais uma vez.
— E então você piorou. Você me mostrou um mundo amplo que eu queria
mais do que qualquer coisa que eu tinha antes. Você me mostrou uma vida que
vale a pena ser vivida. E você me presenteou com um homem que vale...
Ela parou, mas ele ouviu o final da frase, no entanto. Um homem que vale a
pena amar. Ele ouviu as palavras que ela nunca lhe daria. Não agora que ela sabia
a verdade.
Ela balançou a cabeça. — Você é pior do que todos eles. Eu preferiria ser
cortada por todos os membros da aristocracia do que ter suas mentiras. Suas
302
promessas manipulativas. Eu queria... — Ela balançou a cabeça e olhou pela
janela. — Eu gostaria que você nunca soubesse meu nome. Eu gostaria que
tivesse sido um segredo. Como o seu.
— Não é mais um segredo, — disse ele. — Eu contei para você.
— Sim. Você fez. Devon Culm. Nomeado no passado.
— Essa é a verdade.
Ela assentiu. — Ele me disse que você pretendia me seduzir e tirar-me dele.
Me usaria para ensinar-lhe uma lição.
Ele assentiu. — Eu fiz.
Ela riu sem humor. — Eu lhe direi isto, você é a única pessoa que eu já
conheci, cuja verdade é toda mentira. Você não me disse seu nome porque se
importava, eu sei disso. — Não era verdade, mas ele não negou isso. — Você não
me disse por qualquer motivo, mas para me tentar ainda mais. Para me fazer seu
peão. Você sabia que a história iria me quebrar. Você sabia que seu passado me
ligaria a você. E você me atacou com esse conhecimento, enquanto planejava
minha morte. — Ela fez uma pausa, raiva e arrependimento guerreando em seus
olhos. O primeiro, Devil poderia gerenciar, ele sempre foi capaz de controlar a
raiva. Mas o último - era uma faca no estômago para pensar nela se
arrependendo. — Tudo isso enquanto me fazia amar você.
As palavras ameaçaram esmagá-lo.
— Nosso acordo. Todas aquelas noites atrás. Você deveria ter me dado o
duque e eu deveria te dá um favor. Qual foi a dívida que você planejou cobrar?
— Felicity.
— O que seria isso? — Sua fúria foi como um golpe.
— Uma noite. — Cristo, ele se sentia como um monstro. — Sua ruína.
Uma batida. Então, suavemente, para si mesma mais do que para ele: —
Sem herdeiros. — Ela riu, sem humor. — Eu não sei o que é pior, — disse ela, e
ele ouviu a tristeza em sua voz. — O fato de que você pretendia me arruinar por
jogo, ou...
— Não foi jogo.
— A vingança é um jogo. Não importa. Nada muda no fim, e o dobro dos
erros foram cometidos. — Ela fez uma pausa. — E pessoas inocentes foram
feridas. Eu me machuquei. — A culpa bateu através dele enquanto ela falava,
quando ela virou seus belos olhos castanhos sobre ele e disse: — Eu já fui ferida
303
milhares de vezes, e nenhuma delas teve importância em comparação a isto... em
comparação com você. Devil, de fato.
Ele passou a mão sobre o peito, onde uma dor havia se estabelecido - uma
que ele não esperava se livrar. — Felicity, por favor...
Ela não hesitou. — O que é pior do que isso, porém - do que o seu plano
estúpido - é que eu teria lhe dado mil noites. E tudo o que você precisava fazer
era pedir. — Ela desviou o olhar dele. — Que tola eu fui, pensando que poderia
ir contra o diabo.
— Felicity.
— Não. — Ela balançou a cabeça. — Você já me fez de idiota por tempo
suficiente. Você e suas lindas palavras. Você é importante, Felicity...
Cristo, ela era.
— Você é linda, Felicity... Você está tão acima de mim que mal consigo ver
você, Felicity... Que lixo total
Exceto que não foi. Deus, ele não queria que fosse.
— E então... Não, Felicity, não podemos. Eu não devo arruinar você... — Ela
fez uma pausa. — Esse é o meu favorito. Que muito, muito rico, quando esse era
o plano o tempo todo. Para arruinar meu noivado. Meu futuro. Eu.
Não. Não no telhado. Até então... tudo que eu queria era te proteger.
Até então, tudo o que ele queria era amá-la.
Ela se virou e olhou para ele, seus olhos brilhando com raiva, frustração e
lágrimas não derramadas. — Você sabe, eu realmente comecei a acreditar. Eu
comecei a acreditar que eu era mais do que tudo isso. Comecei a acreditar que
Felicity arruinada poderia ser a Felicity destemida. Saindo de Mayfair, e eu poderia
ser renascida nos telhados de Covent Garden. Nas suas mãos.
Cada palavra era um golpe, como as facas de Whit, jogadas uma após a
outra, em seu peito, fazendo-o querer se ajoelhar e contar a verdade. Exceto, ela
estava dando a ele a chance de dar a ela a vida que ela merecia. Tudo o que ele
tinha que fazer era resistir a ela. Tudo o que ele tinha que fazer era escolher ela
sobre si mesmo.
Tristeza subiu em seu olhar, e ele se obrigou a não desviar o olhar. Para não
alcançá-la. Não se mexer. — Eu trabalhei o plano para você, não foi? Eu tomei a
decisão por você. Eu escolhi a ruína, pensando que isso me traria felicidade. —
Ela zombou. — Pensando que eu poderia convencê-lo, que poderíamos ser
304
felizes. Que eu não queria nada daquilo se eu pudesse ter isso. Se eu pudesse ter
você. Como você deve ter rido. Como você deve ter se alegrado.
Não. Cristo não. Nada sobre a noite no telhado era sobre vingança. Nada
disso era sobre o irmão dele. Tinha sido sobre ela e sobre ele, e sobre o
conhecimento que ela era tudo o que ele sempre quis, exposta diante dele. Para
sempre.
Ela não tinha sido a que renasceu no telhado, ele tinha sido.
Mas se ele dissesse isso, ela ficaria. E ele não podia tê-la ficando. Aqui não.
Não quando ele poderia dar a ela o resto do mundo.
A tristeza deu lugar à raiva. Boa. Raiva era bom.
Ela poderia canalizar a raiva. Ela poderia sobreviver. E assim ele iria alimentar
essa raiva. — Devo te dizer uma coisa verdadeira?
— Sim, — disse ela, e ele odiava a palavra em seus lábios... aquela palavra
que tinha ecoado em seu ouvido enquanto ele tinha feito amor com ela. Aquela
palavra que significava que eles estavam juntos. Que eles eram parceiros. A
palavra que marcou seu prazer e seu futuro.
Mas não havia futuro compartilhado. Apenas dela. Ele poderia dar a ela um
futuro. Ele poderia lhe dar o presente. E ela merecia isso. Ela merecia todo o
tempo.
— Diga-me, — disse ela, deixando as palavras virem, fortemente raivosa. —
Diga-me uma coisa verdadeira, seu mentiroso.
Então ele fez a única coisa que ele podia fazer. Ele a liberou deste mundo
que não a merecia. Ele a libertou.
Ele mentiu.
— Você foi a vingança perfeita.
Ela ficou quieta, seus olhos ficando estreitos com uma repugnância quente
que não era nada perto do que ele tinha para si mesmo - o que escoou através
dele, estabelecendo-se em músculos e ossos e roubando cada pedacinho de
felicidade que ele poderia ter.
O ódio era bom, ele disse a si mesmo. O ódio não era lágrimas.
Mas também não era amor.
Ele roubou isso dela, como um ladrão. Não, não dela. De si mesmo.

305
E seu amor, sua bela e solteirona, não sabia chorar. Em vez disso, levantou o
queixo e disse, calma como uma rainha: — Você merece a escuridão.
E ela o deixou para isso.

Capítulo Vinte e Seis

Na manhã seguinte, em vez de dirigir-se ao armazém para supervisionar o


movimento do gelo do carregamento que acabara de chegar, em vez de se
preparar para a entrega daquela noite de quase duas toneladas de produtos
ilegais não tributados, em vez de ir para as docas no Tamisa ou para o armazém
central dos Bastardos, Devil vestiu o casaco e o chapéu e foi ver Arthur, Conde de
Grout, herdeiro do Marquesado de Bumble.
Ele foi, não seria uma surpresa para ninguém, rejeitado na porta por um
mordomo que poderia ter saído de qualquer casa pela sua habilidade que exibia
ao olhar o nariz arrebitado, para um homem de não menos de quinze centímetros
mais alto e cinco pedras mais pesadas do que ele.
O Conde de Grout, disseram a Devil, não estava recebendo.
O que, sem dúvida, foi o resultado do cartão de visitas de Devil dizendo
exatamente isso. Diabo.
— Maldita Mayfair, — ele resmungou enquanto a porta se fechava
firmemente em seu rosto, quase alcançando seu nariz. Ninguém deste lado da
cidade notava que homens como Devil eram frequentemente mais ricos e mais
poderosos do que poderiam sonhar e, portanto, bons aliados?
Não para Felicity.
Ele empurrou o pensamento para o lado.
Droga. Ele tinha que encontrar outro caminho. Por ela.
Andando pelos fundos da casa, ele investigou vários caminhos diferentes:
conseguia abrir uma janela para entrar no térreo; ele podia escalar a parede dos
fundos coberta de hera para que Deus soubesse o que havia na janela do terceiro
306
andar; ele poderia voltar para a porta e endireitar o mordomo; ou ele poderia
escalar a árvore que tinha um galho proeminente levando a uma sacada no
segundo andar.
Uma varanda não muito diferente da de Felicity, na Bumble House.
Como ele tivera sorte com aquela sacada em particular, Devil escolheu a
árvore, fazendo um rápido trabalho de escalá-la antes de pousar suavemente no
ferro forjado Julieta, testando a porta em silêncio, que estava aberta.
Todos os aristocratas eram idiotas. Foi um milagre ninguém ter roubado esta
casa isolada.
Apenas antes dele pisar no quarto, ele ouviu uma voz de mulher vinda
de dentro. — Você deveria ter me contado.
— Eu não queria que você se preocupasse.
— Não ocorreu a você que eu começaria a me preocupar quando você
começou a sair de casa antes que eu acordasse e voltasse depois que eu me
deitei na cama? Não lhe ocorreu que eu notaria que algo estava terrivelmente
errado quando meu marido parou de falar comigo?
— Droga, Pru - não é para você se preocupar. Eu te disse, eu cuidarei disso.
Devil fechou os olhos e virou o rosto para o céu. Ele parecia ter descoberto
um quarto de dormir, no qual Grout e sua esposa estavam tendo uma briga de
amantes.
— Não é para eu me preocupar... você está louco se você acha que eu não
tenho interesse em nossa vida.
Devil permaneceu quieto, ouvindo. Por todas as contas eu Devil tinha
encontrado em seu reconhecimento sobre a família de Felicity, Lady Grout era
maçante, em grande parte interessada em livros e aquarelas, mas tinha um
grande jogo de amor de longa data. Grout se casou com ela quando ambos
tinham vinte anos, depois dos quais eles viveram felizes na cidade enquanto
acumulavam uma fortuna em bons investimentos, antes de terem seu primeiro
filho, um filho, cinco anos antes. A dama estava aumentando mais uma vez,
disseram a Devil.
— Você não pode cuidar disso, Arthur. Não sozinho. Você está perdido. E
enquanto eu não tenho duas coroas para esfregar juntas, eu tenho um cérebro
na cabeça e uma disposição para ajudar, apesar de sua decisão de manter os
segredos escondidos de mim.
O pouco sobre Lady Grout ser maçante parecia pouco confiável.
307
— Eu me envergonho! E meus pais! E Felicity!
— Oh homem idiota. Você cometeu um erro! Assim como seu pai. Assim
como sua irmã, devo acrescentar, embora imagine que ela tivesse mais do que
uma razão decente para atacar o duque e gostaria muito de saber.
Houve uma longa pausa e, em seguida, um silêncio, estripado: — Este é meu
trabalho, Pru. Para te manter feliz. Segura. Confortável. Para fornecer para você.
Foi isso que eu prometi quando nos casamos.
Devil entendeu a frustração nas palavras. A sensação de desespero que veio
com querer manter o amor seguro. Não era por isso que ele esteva aqui? Para
manter Felicity segura?
— E eu concordei em obedecer! Mas vou acabar com isso, vou te contar,
Arthur. — As sobrancelhas de Devil se elevaram. A senhora não ficou feliz. —
Somos parceiros na vida ou não somos. Eu não me importo se somos pobres
como ratos da igreja. Eu não me importo se toda Londres nos recusar a entrada
em suas casas. Eu não me importo se nunca formos convidados para outro baile
enquanto vivermos, desde que estejamos juntos.
Eu não sou a mesma. Eu não me importo com Mayfair e bailes.
— Eu te amo, — disse a condessa, em voz baixa. — Eu te amei desde que
éramos crianças. Eu te amei rico. E agora eu te amo pobre. Você me ama?
Você me ama?
A pergunta estava ecoando na cabeça de Devil desde que Felicity
perguntara, seis horas antes. E agora, falado em outro conjunto de lábios,
ameaçava colocá-lo de joelhos.
— Sim, — disse o conde dentro. — Sim, claro. É por isso que eu fiz uma
confusão de tudo.
Sim.
Sim, claro que ele a amava. Ele amava tudo sobre ela. Ela era a luz do sol e
ar fresco e esperança.
Sim. Ele a amava descontroladamente.
E ele arruinou isso. Ele a usou e mentiu para ela e a virou contra ele. Ele a
traíra e a amava. E ele sofreria sua própria condenação vivendo seus dias
loucamente apaixonado por ela e vivendo sem ela.

308
O que provavelmente era melhor, porque o amor não mudava o fato de que
Felicity sempre seria de Mayfair, e ele sempre seria de Covent Garden. Ele nunca
seria bom o suficiente para ficar na luz solar, mas ele poderia absolutamente
protegê-la da escuridão.

Mais do que protegê-la. Ele poderia dar a ela tudo o que ela já sonhou.
Era hora de Devil entrar em um segundo quarto, o de Faircloth e oferecer a
seus habitantes tudo o que desejassem. E desta vez, ele não pretendia falhar.
*****
Depois que ele falou com o conde e a condessa, Devil voltou ao armazém,
onde continuou seu intenso trabalho braçal, preparando o porão para um novo
carregamento, grato pela dor em seus músculos - sua punição pelos pecados
cometidos contra a mulher que ele amava.
Punição por suas mentiras.
Ele trabalhou incansavelmente, ao lado de meia dúzia de outros homens que
estavam girando em turnos para evitar gastar muito tempo nas temperaturas
congelantes. Devil abraçou o frio enquanto ele processava a escuridão e a dor,
aceitando-o como sua punição. Acolhendo-a como tal. A dúzia de lanternas
penduradas no teto não era suficiente para manter a escuridão à distância, e ele
ignorou o fio de pânico que vinha de vez em quando, quando ele olhava de
maneira errada e encontrava escuridão infinita, assim como ele ignorava o suor
encharcando suas roupas. Não muito tempo depois que ele começou a trabalhar,
ele tirou o casaco e o colocou sobre uma das paredes de gelo para permitir maior
liberdade de movimento.
Muito depois de ter perdido a capacidade de relembrar quantos turnos
tinham girado no porão, Whit chegou, fechando a grande porta de aço atrás dele
para manter o frio. Ele usava um casaco, chapéu grossos e botas até o joelho -
que tinha sido útil como ele passou o dia no gelo na doca.
Whit observou Devil agarrar e levantar vários imensos blocos de gelo antes
de rosnar: — Você precisa de comida.
Devil sacudiu a cabeça.
— E água. — Whit passou um gancho em direção a ele.
Devil mudou-se para a pilha de gelo no centro do porão e pegou outro
cubo. — Estou cercado por água.

309
— Você está encharcado de suor. E a carga está a caminho. Os homens
precisarão de você forte o suficiente para ajudar quando chegar.
Devil não revelou sua surpresa com essa informação; se a carga estava em
movimento, o sol se pusera e a escuridão caíra na verdade, chegando perto da
meia-noite, horas depois que ele se abaixou no porão escuro e começou seu
trabalho.
— Eu serei forte o suficiente quando chegar aqui. Eu arrumei a merda toda,
não foi?
O olhar avaliador de Whit rastreou a sala. — Você fez.
Devil concordou com a cabeça, ignorando o frio que o percorria - a
transpiração o esfriava no momento em que ele fazia uma pausa em seu trabalho.
— Então me deixe voltar a isso. E você se preocupa com sua própria força.
Whit observou-o por um longo momento e depois disse: — A Grace se foi.
Devil parou, voltando-se para o irmão. — Por quanto tempo?
— Tempo suficiente para conseguirmos Ewan sob controle. Ele não vai
gostar que você ganhou a garota.
— Eu não ganhei a garota.
— Ouvi dizer que ela marcou o vigia. — Whit fez uma pausa. — Felicity
Faircloth, nome como uma princesa de contos de fadas, gancho direito como um
pugilista.
Devil não respondeu. Ele não achava que seria capaz de encontrar palavras
em torno do aperto na garganta ao orgulho de seu irmão na mulher que ele
amava.
Depois de um longo período de silêncio, Whit acrescentou: — Pelo menos,
ponha o casaco de volta. Você sabe o que acontece no frio, Devil; você não pode
salvar a garota se estiver morto.
Devil olhou para seu irmão, deixando sua fúria em seu olhar. — Eu já salvei
a menina.
As sobrancelhas de Whit se levantaram em uma pergunta silenciosa.
— Você não a vê em nenhum lugar perto do Jardim, não é? Agora dê o fora
daqui.
Whit hesitou, como se pudesse dizer alguma coisa, e então se virou para sair.
— Eles estarão aqui em trinta minutos. Então o verdadeiro trabalho começa.
310
E chegou, na hora certa, e uma fila de operários fortes e robustos
empilhando caixas e barris, engradados e barris - o maior carregamento que os
Bastardos haviam importado - no porão. Depois disso, mais gelo. Milhares de
libras dele, e Devil ficou, ignorando a sede e a fome que provocou em torno de
suas bordas, ignorando a dor em seus ombros e a queimadura do trabalho.
Ele tomaria tudo aquilo sobre o que o esperava acima, em um mundo sem
Felicity.
Os homens fizeram um trabalho rápido de sua carga - uma habilidade
valiosa que veio com anos de prática. O porão só era útil se a carga fosse trazida
e escondida o mais rápido possível, evitando muito derretimento e, por extensão,
possível descoberta.
Uma hora antes do amanhecer, quando o céu do lado de fora estava preto
para o cinza, Devil saiu do porão, lanterna na mão, para confirmar que a entrega
estava completa. A equipe de trabalho estava reunida no andar de cima -
sessenta homens e meninos no total, além de Nik e um punhado de mulheres
jovens do colégio que trabalhavam para ela, mantendo o negócio funcionando
sem problemas.
No outro lado do armazém, Whit subiu em um dos maciços andaimes de
madeira para abordar os homens. Uma onda atravessou o grupo; Whit não era
de grandes discursos. Ou qualquer discurso em tudo. E ainda assim, aqui estava
ele.
— Esta foi uma boa noite de trabalho, rapazes — ele encontrou as mulheres
no meio da multidão, olhou cada uma delas nos olhos — e as moças. A carga fica
aqui até termos certeza de que podemos movê-la e mantê-la segura. Como
vocês sabem, perdemos dinheiro todos os dias se mantemos carga no porão... —
Ele balançou a cabeça e encontrou o maior número de olhos de seus homens, o
sotaque da colônia de afiação em suas palavras. — Mas não pense por um
momento que você não é o mais importante nessa construção. Devil e eu
sabemos disso melhor do que ninguém. E enquanto estamos nisso, podemos
também apontar para a nossa querida Annika, com um cérebro inteligente, assim
como a boca.
Um grito se elevou do grupo, e Nik deu um elaborado e premente arco antes
de se endireitar e colocar as mãos na boca. — Você fala demais, Fera! Quando
podemos beber?
O riso seguiu, os cantos dos olhos de Whit se enrugaram de satisfação
quando ele olhou para a multidão. Quando ele encontrou Devil nas costas, ele
levantou um queixo em reconhecimento antes de dizer: — Calhoun está
311
mantendo o pardal aberto para nós, na verdade. Ale está no Bastardos esta
manhã, bruvs.
Outro grito estridente soou quando Whit saltou para o chão, entrelaçando
os homens, apontando para Devil, que inclinou a cabeça e disse: — Você é tão
bom quanto Wellington com seus discursos empolgantes.
— Terminar com bebida ajuda. Vem conosco?
Devil sacudiu a cabeça. — Não.
— Justo o suficiente. — Whit bateu Devil no ombro, e ele assobiou de dor.
Chocado, Whit imediatamente o soltou. — Você vai adoecer assim. Você
está encharcado de suor. É um milagre que você ainda esteja de pé; Vá para
casa e obtenha um banho quente.
Devil sacudiu a cabeça. — Num momento. Eu tenho que terminar a última
parede e bloquear o porão. Os homens merecem a celebração.
— Você trabalhou o dia todo lá embaixo. Você fez mais trabalho do que
qualquer um de nós. Você merece o resto. — Quando Devil não disse nada, ele
acrescentou: — Vou mandar mensagem para casa. Eles vão te preparar um banho
em uma hora. Esteja lá para isso.
Ele assentiu com a cabeça, não querendo que Whit soubesse a verdade -
que ele não queria voltar para aquele prédio que estava cheio de memórias de
como ele a machucou. — Vai. Eu terminarei e encontrarei uma cama.
— Eu não acho que vai ser uma cama quente com Felicity Faircloth.
A ideia doeu.
— Eu prefiro que você não fale.
— Da próxima vez que você levar a garota para os telhados, Dev, desligue a
guarda.
Ele amaldiçoou em voz alta. — Nunca haverá uma palavra sobre Felicity
Faircloth da guarda.
— Claro que não. Além disso, uma vez que ouviram, que ela enfeitou
Marwick na frente da Duquesa de Northumberland, eles vão amá-la ainda mais.
— Ainda mais?
Os olhos de Whit escureceram. — Há sussurros que ela faz você feliz, bruv.
Ela faz.

312
Bom Deus, Felicity o fazia feliz - mais feliz do que ele jamais fora, se
fosse honesto. Ele não era o tipo de homem que tinha o luxo da felicidade, exceto
em seus braços. E nos olhos dela. — Eu não desejo discutir Felicity Faircloth. E eu
vou demitir quem mais o fizer. Ela não é para o jardim.
Seu irmão observou-o por um longo momento, imóvel, antes que
ele assentiu uma vez e virou-se para longe.
O grupo fez um rápido trabalho de partida, o primeiro grupo de vigias indo
para o telhado. Ninguém entraria no prédio sem uma bala nele primeiro. Não
sem permissão expressa dos próprios Bastardos. Então Devil estava sozinho
quando ele desceu do armazém escuro para o porão mais escuro, onde uma
única lanterna havia sido deixada acesa.
Ele estava sozinho quando pegou o gancho na última fileira de gelo,
erguendo-se e movendo-se até que os blocos estivessem mesmo em uma
parede perfeita, chegando a dois metros, esse esforço, em cima do resto do dia,
era um grande negócio, e sua respiração era dura e difícil até o final de sua
tarefa. Ele se moveu devagar até a porta, pegando a lanterna, e saiu do porão,
colocando a lâmpada no chão e fechando a porta de aço atrás dele, ansioso para
trabalhar as fechaduras rapidamente e se livrar da escuridão.
Como se ele tivesse se livrado da escuridão agora.
Antes mesmo que ele tocasse a primeira fechadura, uma voz soou. — Onde
ela está?
Devil virou-se para encarar Ewan nas sombras. — Como você chegou aqui?
Seu irmão chegou mais perto, na penumbra da lanterna, louro, alto e largo -
largo demais para ser um aristocrata. Foi um milagre que ninguém tinha notado
a sua falta de refinamento - a marca de sua ilegítima mãe, embora Devil tinha
imaginado que a aristocracia via o que eles desejavam ver.
Ewan ignorou a pergunta. Repetiu a sua própria. — Onde ela está?
— Eu vou estripar você se você machucou outro dos meus homens.
— Outro? — O duque disse, toda inocência.
— É você, não é? Roubando nossas remessas?
— Por que você acha isso?
— O toff nas docas, observando nossos navios. O tempo - os roubos
começaram pouco antes de você anunciar seu retorno. E agora... olha você aqui.

313
Não é suficiente que você tenha ameaçado nossas vidas? Você tinha que vir para
nosso sustento também?
Ewan recostou-se contra a parede do túnel escuro. — Eu nunca vim pelas
suas vidas.
— Bobagem. Mesmo se eu não me lembrasse da última noite na casa
grande, quando você veio até nós com uma lâmina afiada o suficiente para nos
liquidar, você tem vindo para nós há anos. Nós conhecemos os espiões, Ewan.
Nós os expulsamos. Nós criamos uma geração no viveiro em uma única regra.
Ninguém fala sobre os Bastardos.
A prata brilhou, e o olhar de Devil cintilou para a mão de seu irmão, onde
ele segurava a bengala de Devil. Seu coração começou a bater e ele forçou uma
risada. — Você pensa em me silenciar? Você acha que ainda é o assassino entre
nós? Eu tenho vinte anos nas colônias em você, toff.
Os lábios de Ewan se achataram.
Devil pressionou. — Mas mesmo que houvesse uma chance de você me
levar, você não iria.
— E por que isso?
— Pela mesma razão que você nos deixou escapar todos esses anos atrás,
porque se você me matar, você nunca saberá o que aconteceu com Grace.
Nada mudou no duque com as palavras, nem a cadência de sua respiração
ou a retidão de sua espinha, mas Devil não precisava de provas de que ele tinha
acertado. Houve um tempo em que ele conheceu Ewan como se conhecesse. E
ele ainda fez. Eles estavam trançados juntos, os três. Os quatro.
— Encontrei você — disse Ewan finalmente.
As palavras enviaram um calafrio em Devil que rivalizava com o gelo. —
Sim. Mas não ela.
— Você cometeu um erro, Dev. — Ele tinha feito uma dúzia deles, e essa
consequência não era nada comparado aos outros. — Você deveria ter sido mais
cuidadoso com Felicity Faircloth.
Me diga algo verdadeiro.
— Ouvi dizer que ela bateu em você.
Ewan levou a mão ao rosto. — Ela não ficou feliz em descobrir meus motivos
ocultos.

314
— Nem o meu.
Eu teria lhe dado mil noites. E tudo o que você precisava fazer era perguntar.
— Eu disse a ela que ela deveria ter estado conosco na mansão. — A casa
de campo onde eles tinham sido treinados e testados, onde Ewan tinha ganhado
seu título e seu pai tinha ganho seu herdeiro.
Se ela estivesse no solar, Devil nunca teria sobrevivido. Ele estaria ocupado
demais protegendo Felicity para se proteger. Ele balançou sua cabeça. — Eu não
a desejaria em qualquer lugar perto da mansão. Eu levaria a morte antes que ela
testemunhasse um momento do que sofremos. Eu não sei como você mora lá. Eu
teria queimado no chão.
— Eu considero isso todos os dias, — Ewan respondeu, todo calmo. —
Talvez, um dia, eu faça isso.
Devil observou-o por um longo momento. Ewan sempre tinha sido assim,
resolvido e avaliado, como se simplesmente não sentisse as emoções feitas pelo
resto do mundo. Como se os achasse interessantes de maneira vaga, encontrava
um gabinete de curiosidades assim.
Grace era a única pessoa capaz de fazer Ewan ter sentimentos. E mesmo
assim, ele quase a matou. Nada ficava entre Ewan e o que ele queria.
Nada além de Devil, parecia. Sempre Devil.
— Eu não sou aquele que roubou sua carga, — disse Ewan depois de um
tempo, a mudança de assunto não remotamente fora do personagem. Devil
acreditou nele. Afinal, tudo estava livre as claras agora e ninguém tinha motivos
para mentir. — Conde de Cheadle está roubando sua carga.
As sobrancelhas de Devil subiram. Ele não tinha certeza se acreditava nas
palavras, mas Ewan tinha poucos motivos para mentir. — Não ocorreu a você
fazer algo sobre isso?
— Somos todos criminosos de uma forma ou de outra, Devon, — disse Ewan,
simplesmente. — E além disso, sua bebida não é o que eu estou procurando.
— Não. Você está atrás de algo muito mais valioso. O impossível.
— Ela é tudo o que eu sempre quis, — disse Ewan. — E Felicity
Faircloth serviu seu propósito para me trazer aqui. Perto o suficiente para
encontrá-la. Eu ainda digo, Lady Felicity era conveniente... Ainda mais conveniente
do que imaginei que ela seria, quando percebi que você se importava com ela.

315
As palavras enfureceram Devil. Felicity era mais do que conveniente. Ela era
mais que um peão. — Como você se atreve a manipulá-la para chegar até mim?
Ewan levantou uma sobrancelha loira em sua direção. — Diga isso de novo.
Desta vez, mais devagar.
Devil jurou. Sim, ele havia usado Felicity. No início. Por um instante, antes
que ele percebesse. No momento em que ele a enviou para o salão de baile, uma
mensagem para Ewan, ele perdeu toda a vontade de seguir com seu plano. Ele
se afundou. E ele caiu.
— O problema Devon, é que Felicity Faircloth não é apenas conveniente. Ela
também é inteligente demais para seu próprio bem. E ela conhece nosso
segredo.
Devil se enrijeceu, as palavras e seu significado soaram como um relatório
de rifle na escuridão. Ele resistiu ao impulso de embrulhar suas mãos em torno
da garganta de seu irmão e acabar com ele agora. — E agora chegamos a isso.
Deveríamos ter matado você quando tivéssemos uma chance.
— Sabe, irmão, na maioria dos dias eu queria que você tivesse feito
exatamente isso. Mas você é quem sempre gostou dos negócios, Devon. Se não
era uma barganha a ser feita, você era o único a ter isso.
Não para ela. Felicity era importante demais para negociar. — Você a toca,
você morre. Esse é o único acordo que importa.
Ewan olhou pelo corredor, na escuridão. — Estou surpreso que você tenha
conseguido amar alguém, Dev. O que, com o quão certo você era uma vez, que
a emoção era uma fábula.
Nos lábios de outro, as palavras podem ter sido cáusticas. Ou poderiam ter
sido gentis. Mas nos de Ewan, elas eram curiosas, como se Devil fosse um
espécime sob vidro.
Ewan continuou.
— Diga-me, quando você percebeu isso? Quando a beijei na varanda do
baile? Em seu vestido de ouro? Esse foi um toque cruel, a propósito.
Devil odiava a revelação de que Ewan o estava manipulando também.
— Apenas um lembrete de que você nunca foi o suficiente para Grace. Que
você nunca cumpriu suas promessas para ela.
Os olhos do duque se estreitaram. — Ou foi quando o menino na sebe
voltou para informar que eu beijei Felicity nos jardins? Foi quando você percebeu
316
que a amava? — Ele fez uma pausa. — Ela já amava você, você sabe. E acho que
você também a amava, com a rapidez com que veio para reivindicá-la.
As palavras doeram. E eles estavam enfurecidos, porque parecia uma traição
do pior tipo que o Duque de Marwick sabia que Devil amava Felicity quando ela
não o fazia. Quando ela nunca saberia, porque se ele contasse, ele poderia não
ser capaz de resistir ao que ela fizesse a seguir, e ela nunca conseguiria a vida
que merecia.
— Se você tivesse decidido amá-la desde o início, em vez de manipulá-la
para me punir, talvez nós evitássemos tudo isso...
— Pense com muito cuidado antes de ameaçar Felicity, bruv.
Os olhos do duque encontraram Devil, tudo calmo. — Por que eu deveria
fazer isso?
— Porque eu não hesitarei em destruir você com seu nome.
— Não há nada que você não faria por ela, não é?
Devil sacudiu a cabeça. — Nem uma coisa. Eu ficaria feliz em desistir de tudo
por sua felicidade. Eu vou ver a forca por matar um duque... sem pensar duas
vezes.
— O negócio é simples, Devon. Você me diz onde eu posso encontrar Grace,
e eu não vou punir Felicity Faircloth por saber o que ela não deveria saber. Melhor
ainda, eu simplesmente não vou deixá-la viver; Vou deixá-la acabar com o nosso
compromisso arruinado. Vou liquidar o dinheiro com o pai dela. Com o irmão
também. Vou deixá-la melhor do que a encontrei. Muito melhor do que ela
poderia estar com você.
Raiva se revoltou através de Devil com as palavras frias do irmão. Na ideia
de Ewan em qualquer lugar perto de Felicity, sua princesa de conto de fadas.
Seu irmão seguiu em frente. — Magnânimo de mim, você não acha? — Ele
fez uma pausa. — Mas se você não me der Grace... Eu não tenho nenhuma
escolha a não ser puni-la. E a você. Eu vou forçar o casamento. Vou levar a garota
para o campo, em algum lugar que você nunca chegará a ela. E vou garantir que
você nunca mais a veja.
Devil endureceu. Forçou-se a levantar uma sobrancelha. — Você acha que há
algum lugar que eu não posso encontrar você? Passei anos na escuridão, Ewan,
enquanto você se tornou suave à luz.
Um longo silêncio. E então um simples: — Venha para ela, então. Mas se
você chegar perto, saiba que eu levo as coisas dela. Coisas que ela ama. Cada
317
vislumbre que você obtém dela resultará em sua privação do mundo que ela só
recentemente veio a se deleitar. Nunca esqueça que eu aprendi o castigo de
nosso pai.
Memória brilhou. Saindo do chão escuro, olhos vermelhos de uma noite de
choro pelo cachorro que seu pai havia tirado dele, para encontrar Ewan no
gramado da mansão, brincando com os seus.
Ewan, que sempre escolheu seu futuro em relação ao passado
compartilhado. O herdeiro perfeito. — Você é um maldito monstro. Assim como
ele.
Ewan não se mexeu. — Possivelmente. Mas você trouxe a garota para isso,
não é? Você a colocou na mesa como uma arma. Estou simplesmente usando ela.
Devil tinha o suficiente. Ele se jogou no corredor escuro, o punho já
levantado, todo o peso de seu corpo por trás do golpe, que se conectava com o
som perverso de osso na carne. A cabeça do duque retrocedeu, o movimento
quebrado pela parede de pedra às suas costas. — Você acha que pode ameaçá-
la?
Ewan se recuperou com uma velocidade insuportável, acertando seu próprio
pesado golpe, o envio de tirar o fôlego e dor irradiando para fora a partir do olho
de Devil. Que já estava puxando seu irmão fora da parede para entregar
uma série de golpes em rápida sucessão.
— Você acha que eu não vou deixar você aqui para apodrecer nessa
bagunça? Eu fiz tudo para mantê-la longe. Eu desisti da minha única chance de
felicidade para mantê-la disso. Do meu passado. Do seu, você é um maldito vira-
lata.
Os olhos de Ewan se abriram, indiferentes. — E o que você faria para
encontrá-la se ela estivesse perdida?
Qualquer coisa.
Respirando pesadamente, Devil jogou seu irmão sangrando no chão e se
afastou do corpo de seu irmão. Na porta para o porão, ele procurou em seu
bolso pelas suas chaves.
— Onde ela está? — Ewan tinha empurrando-se até uma posição sentada,
de costas contra a parede, o rosto nas sombras, sangue negro escorrendo pelo
queixo. — Eu passei doze anos procurando por você. E quando ouço sobre você
- sobre os Bastardos – é só sobre você e Whit. Nenhuma mulher. Sem esposas.
Nenhuma irmã. Onde ela está?

318
Ele podia ouvir a angústia nas palavras de seu irmão, e por um momento –
por um instante - Devil considerou dizer a verdade. Ele seguiria Felicity das
sombras pelo resto do tempo. Ele iria vê-la casar e envelhecer. Ele a observaria
tendo filhos - pequenos arrombadores de cadeados de cabelos castanhos que
eram mais do que pareciam. E se ele não pudesse encontrá-la?
Ele sem dúvida ficaria tão louco quanto seu irmão, sem a mulher que amava.
Mas anos atrás, quando três crianças escaparam de seu passado horrível e
fizeram um futuro brilhante, eles o fizeram por causa do homem à sua frente.
Porque ele os traiu brutalmente.
A cicatriz de Devil palpitou com a lembrança.
E hoje, Devil puniu com rapidez inigualável. — Você tentou matá-la, Ewan.
O último teste de nosso pai e você foi o único a pegar a espada. — Ewan desviou
o olhar. — Ela é a prova do seu roubo. Você roubou um ducado. Mas pior, você
roubou o nome dela.
Ewan se virou para ele com olhos arregalados. — Ela nunca quis isso.
— Você roubou mesmo assim, — disse Devil. — Éramos crianças, mas vocês
dois eram sempre mais velhos por anos. Vocês estavam ligados um ao outro.
— Eu a amava.
Devil sabia disso. Ewan e Grace eram jovens demais para amar, e ainda assim
eles tiveram isso. O que fez o que aconteceu ainda pior. — Então você deveria
ter protegido ela.
— Eu fiz! Eu deixei ela correr com você!
Devil virou o rosto, mostrando sua cicatriz para Ewan. — Só depois que eu
o impedi de destruí-la. Você acha que não me lembro? Você acha que eu ainda
não sinto a queimadura da sua espada?
Punição e proteção, dois lados da mesma moeda. Ele não aprendeu essa
lição para si mesmo? Ele não tinha se punido para proteger Grace todos aqueles
anos atrás? Ele não tinha apenas se punido novamente para proteger Felicity?
Ele não aceitaria sua punição repetidamente por sua segurança? E agora ele
puniria Ewan. — A Grace se foi.
A mentira ecoou pela escuridão, clara e fria. E pela primeira vez desde que
ele apareceu, o duque se mostrou. A inspiração de Ewan era alta e áspera, como
se Devil tivesse desembainhado uma espada e colocado a ponta direita através
de seu coração.
319
E ele tinha. — Onde?
— Onde você nunca vai encontrá-la.
— Diga-me. — A voz baixa de Ewan tremeu.
Devil observou seu irmão com cuidado e deu o golpe final. — Onde
nenhum de nós pode encontrá-la.
Deixe Ewan pensar que Grace está morta.
Ela ficaria furiosa com Devil por isso, sem dúvida, mas se não jogasse o
maldito monstro fora de seu cheiro, ele pegaria o calor de sua irmã. E além disso,
Ewan merecia a dor. Devil iria dormir bem esta noite.
Exceto que ele não iria, porque ele estaria sem Felicity.
Ele voltou para as fechaduras, extraindo as chaves. Cristo, ele estava cansado
de tudo isso. Ele era Janus, amaldiçoado com nada além do passado quebrado. O
futuro sombrio.
E, como Janus, ele não podia ver o presente.
O brilho de prata da cabeça do leão na ponta da bengala chegou tarde
demais para ele se defender. O golpe o pôs de joelhos, a dor excruciante.
— Você deveria protegê-la.
Devil suportou o peso de sua dor e mentiu perfeitamente, uma mentira que
qualquer bom contrabandista se orgulharia. — Você deveria protegê-la primeiro.
Ewan rugiu, sua fúria chegando sem aviso. — Você a levou de mim.
A sala estava girando. — Ela veio de bom grado. Ela veio ansiosamente.
— Você assinou sua sentença de morte hoje à noite, irmão. Se devo viver
sem amor, você pode morrer sem isso.
As palavras foram um golpe mais duro que o físico que Ewan havia feito.
Felicity. Devil estava perdendo a consciência rapidamente.
Ele levantou a mão para a têmpora, sentindo a umidade quente lá. Sangue.
Felicity. Ele não queria morrer sem ela.
Não sem vê-la novamente. Não sem tocá-la, sem sentir o calor suave dela.
Não sem um último beijo.
Não sem lhe dizer algo verdadeiro.
Felicity. Não sem dizer a ela que ele a amava.
320
Ele deveria ter dito a ela que a amava.
Ele teria se casado com ela... ele se casou com ela.
Um ranger de aço soou duro e de alguma forma estranho.
Não. Não, ele não fez. Ele a deixou.
Ele se casou com ela. Em um casamento selvagem de Covent Garden com
um violino, muito vinho e música, e ele disse que a amava centena de vezes. Mil.
Um deslizar. Seu corpo, arrastado pela lama gelada no porão.
Ele se casou
com ela, e ele fez dela a rainha do jardim, e seus homens juraram lealdade
e ela cresceu redonda com uma criança. Com crianças. Com pequenas
meninas com cabeças para máquinas, assim como sua mãe. E ela não se
arrependeu.
E nem ele.
Não. Espere. Ele não fez isso. Não foi passado. Foi o futuro.
Ele rolou para as mãos e joelhos, mal conseguindo ver o lampejo da luz da
lanterna no corredor além. Ele tinha que chegar até ela. Para mantê-la segura.
Para amá-la.
Ela tinha que saber que ele a amava.
Que ela era a luz dele.
Luz. Estava indo embora. Ewan estava na porta. — Se eu devo viver no
escuro, você pode morrer nele.
Devil alcançou a porta, a escuridão do porão já roubando sua respiração.
Não, não a negritude.
— Felicity!
A porta se fechou, apagando a luz.
— Não!
A única resposta foi o som agourento de trancas sendo lançadas. Uma após
a outra. Trancando-o no porão.
— Felicity! — Devil gritou, medo e pânico correndo por ele. Forçando-o a
lutar contra a névoa e correr para a porta. Ele bateu nela.
Não houve resposta.
321
— Ewan... — Ele gritou novamente, loucura vindo com a escuridão. — Por
favor.
Ele se jogou na porta, batendo nela - sabendo que o porão estava muito
baixo e muito bem escondido para qualquer um dos vigias do lado de fora para
ouvi-lo. E ainda assim ele gritou, desesperado para chegar a Felicity. Para mantê-
la segura. Ele se virou, a escuridão em todos os lugares, sentindo-se ao longo do
chão lamacento até que encontrou o gelo, subindo nos blocos para encontrar a
picareta que ele deixara dentro.
A escuridão se fechou nele, pesada e enjoativa no frio congelante, e ele se
forçou a respirar fundo enquanto procurava. — Onde diabos está?
Ele a encontrou e, pegando-a pela maçaneta e rastejando de volta para a
porta, ele gritou o nome dela de novo. — Felicity!
Mas ela não estava lá para ouvi-lo. Ele a empurrou para longe.
Eu te amo, Devil.
Puxou-se para ficar em pé e girou o gancho, fazendo uma cicatriz no aço. E
de novo. E de novo. Ele tinha que chegar até ela. Novamente. Ele tinha que
mantê-la segura. Novamente.
Você me ama?
Sim. Ele a amava.
E naquele momento, quando percebeu a futilidade de seus golpes, ele foi
dominado pela verdade - ele nunca teria a chance de dizer a ela o quanto.
Você merece a escuridão.
A pancada final levou os restos de sua força, e ele caiu no chão e fechou os
olhos, deixando a escuridão e o frio chegarem.

Capítulo Vinte e Sete

322
Incapaz de dormir, Felicity levantou-se ao romper da aurora e foi até a casa
de seu irmão, entrando pela cozinha e indo diretamente aos aposentos da família,
abrindo a porta do quarto para descobrir que ele ainda estava deitado, beijando
sua esposa.
Ela imediatamente virou as costas e levantou a mão para os olhos, gritando:
— Ahh! Por quê?
Embora não tenha sido a resposta mais gentil para a visão de felicidade
conjugal diante dela, foi certamente mais gentil do que outras coisas que ela
poderia ter pensado ou dito, e fez o trabalho.
Pru soltou um gritinho surpreso e Arthur disse: — Droga, Felicity, você é
incapaz de bater?
— Eu não esperava... — Ela acenou com a mão. Ela olhou de volta para
encontrar sua cunhada sentada na cama, a colcha puxada para seu queixo.
Voltando sua atenção para a porta, ela acrescentou: — Olá, Pru.
— Olá, Felicity, — disse Pru, com um sorriso em sua voz.
— É adorável vê-la.
— E a você! Ouvi dizer que está envolvida em um grande acontecimento.
Felicity fez uma careta. — Sim, eu suponho que
você poderia ter ouvido isso.
— Basta! — Disse Arthur. — Eu estou colocando fechaduras em todas as
portas.
— Temos fechaduras em todas as portas, Arthur.
— Estou colocando mais fechaduras nas portas. E usando-as. Duas pessoas
invadindo nossos aposentos privados sem ser convidadas em menos de um dia
são duas pessoas a mais. Você pode se virar, Felicity.
Ela fez, para descobrir que o irmão e a cunhada vestiram robes. Pru, pesada
com a criança, estava atravessando a sala até uma linda penteadeira, e Arthur
estava de pé no final da cama, olhando... descontente.
— Eu fui convidada, — ela se defendeu. — Eu fui convocada! “Felicidade.
Venha me ver imediatamente.” Alguém poderia pensar que você era o rei de
como era uma convocação superior.
— Eu não esperava que você pensasse que você foi convocado para esta
hora.
323
— Eu não conseguia dormir. — Ela não esperava ser capaz de dormir
novamente, honestamente, no momento em que começou a sonhar, era com
Devil, o Rei de Covent Garden, e o jeito que ele olhava para ela e o modo como
ele a tocava e o modo como ele a amava, e quando tudo parecia tão
deliciosamente real, ela acordou, e tudo era horrivelmente falso, e por isso não
dormir parecia uma alternativa melhor. — Eu pretendia vir e ver você hoje, Arthur.
Eu ia vir e pedir desculpas. Eu sei que é terrível, e meu pai desapareceu, e minha
mãe está em constante estado de vapores, mas estive pensando sobre o que
aconteceu há duas noites e... espere. Alguém invadiu seus quartos?
Suas sobrancelhas se levantaram. — Eu me perguntava quando você notaria
isso. — Ele suspirou. — Não me preocupo com o que aconteceu no baile de
Northumberland.
Felicity suspirou. — Bem, você deveria se preocupar, Arthur. Isso foi... Não é
o meu melhor momento. Estou devidamente arruinada.
Ele deu uma risada disso. — Eu posso imaginar.
— Eu acho que esse pode ter sido o seu melhor momento, honestamente, —
Pru disse alegremente da penteadeira. — Marwick soa bastante desagradável.
— Ele é, — disse Felicity. — Na maioria das vezes. Mas... — Ela se conteve
antes que pudesse apontar que sua decisão, por mais livre que fosse, era o
oposto para seu pai e Arthur, que agora não tinham esperança de recuperar suas
perdas. Se Arthur ainda não tivesse contado a Pru, seria uma terrível traição ao
irmão dela.
Mesmo que ele merecesse isso.
Ela olhou para ele, a pergunta em seus olhos. — Ela sabe, — disse ele.
Felicity olhou para Pru. — Você sabe?
— Que esse idiota estava guardando a verdade sobre sua própria ruína de
nós dois? Na verdade, eu sei.
O queixo de Felicity caiu. Ela nunca esperou que sua cunhada chorasse e
lamentasse diante do desastre financeiro, mas também não esperava que fosse
assim... Bem, sinceramente, feliz. Ela olhou para o irmão. — Algo aconteceu.
Seu irmão a observou por um longo momento. — De fato, algo aconteceu.
Seria possível que o duque não permitisse que o noivado terminasse? Ele
estava louco o suficiente para fazer isso - apenas para punir Devil. E por mais que
Felicity estivesse irritada e magoada com Devil, ela não estava interessada em

324
puni-lo. — Eu não vou me casar com Marwick. Eu deixei muito claro no baile... e
até mesmo se ele viesse...
— Não tenho interesse em você se casar com Marwick, Felicity. Francamente,
eu desprezei a ideia desde o começo. Da mesma forma, tenho pouco interesse
em discutir o baile. Eu gostaria de falar sobre o que aconteceu depois do baile.
Felicity congelou. Impossível. — Nada aconteceu depois do baile.
— Não foi o que nos disseram.
Felicity olhou para Pru, depois de volta para Arthur, um fio de suspeita nela.
— Quem invadiu seus quartos antes de mim?
— Eu acho que você sabe.
Ela ficou com frio. — Ele não deveria ter vindo aqui. — Ele a usou. Ele a traiu.
Você foi a vingança perfeita.
Ele causou danos suficiente; ele não poderia me deixar bem o suficiente
sozinha?
— Não obstante, — Arthur disse, — ele apareceu aqui ontem.
— Ele não é importante, — ela mentiu. Arthur levantou uma sobrancelha.
— Ele parece muito importante, se você me perguntar, — Pru interveio.
Ninguém te perguntou, Pru.
— O que ele disse? — Felicity perguntou.
Ele certamente não teria dito a Arthur a verdade sobre a noite no telhado.
Isso corria o risco de levá-lo para uma esposa, e Deus sabia que ele não estava
disposto a arriscar isso por nada.
Deus sabia que ele não estava disposto a sequer considerá-la como esposa.
— Ele disse uma série de coisas, na verdade. — Arthur olhou para Pru. —
Apresentou-se todo educado, apesar do fato de que ele subiu em uma árvore e
invadiu nossos aposentos.
— Ele faz isso, — disse Felicity.
— Ele faz? — Pru perguntou, como se estivessem discutindo a propensão
de Devil para andar.
— Temos que conversar sobre como você sabe disso, eventualmente, —
disse Arthur. — Ele então me criticou severamente por maltratar você.

325
Seu olhar voou para o de seu irmão. — Ele fez isso?
— Ele fez. Lembrou-me que você nunca foi um meio para um fim. Que
estávamos te tratando abominavelmente e que não merecíamos você.
Lágrimas brotaram, junto com raiva e frustração. Ele também não a merecia.
— Ele não deveria ter feito isso também.
— Ele não parece o tipo de homem que pode ser parado, Felicity, — disse
Pru.
Especialmente quando você quer impedi-lo de deixar você.
— Ele estava certo, é a verdade, — disse Arthur. — Nós nos comportamos
de forma abominável. Ele acha que você deveria dar as costas para nós. Pensa
que somos indignos de você.
— Ele realmente não acredita nisso. — Seu valor tinha corrido o seu curso
no momento em que sua utilidade em sua vingança tinha feito o mesmo.
— Para alguém que não acredita em seu valor, ele certamente estava
disposto a pagar uma fortuna por isso.
Ela congelou, instantaneamente entendendo. — Ele lhe ofereceu dinheiro.
Artur sacudiu a cabeça. — Não apenas dinheiro. Resgate de um rei. E não
apenas para mim - para o pai também. Uma boa quantia para encher os cofres.
Para começar de novo.
Ela balançou a cabeça. Pegando o dinheiro de Devil os amarrava juntos
novamente. Ele poderia transformar a qualquer momento para verificar seus
investimentos. Ela não o queria perto dela. Ela não podia suportar ele perto dela.
— Você não pode aceitar.
Arthur piscou. — Por que não?
— Porque você não pode, — ela insistiu. — Porque ele só está fazendo isso
porque ele sente algum tipo de culpa.
— Bem, alguém pode argumentar que o dinheiro de um homem culpado
gasta tão bem quanto o de alguém que dorme bem à noite, mas, deixando isso
de lado, por que o Sr. Culm se sentiria culpado, Felicity?
Sr. Culm. O nome soou ridículo na língua de seu irmão. Devil nunca o usou
antes com ela. Ele amava ser o oposto de um senhor com uma paixão poderosa.
E também, o Sr. Culm a fez lembrar quando ela desejou ser sua Sra.
O que ela não desejava mais. Obviamente.
326
— Porque ele se sente, — ela se estabeleceu em como uma resposta. —
Porque... — Ela parou. — Eu não sei. Porque ele se sente assim.
— Acho que ele pode se sentir culpado por causa da outra coisa que ele
disse enquanto esteve aqui, Arthur.
Arthur suspirou e Felicity olhou para Pru, que parecia o gato que recebia o
creme. — Que coisa foi essa?
— Como ele colocou? — Pru perguntou com um sorriso que deu a Felicity
a forte sensação de que sua cunhada tinha cometido qualquer coisa que Devil
tivesse dito à memória. — Ah. Sim. Ele te ama.
Lágrimas vieram. Imediatamente. Lágrimas, raiva, frustração e aversão por
ele ter dito as palavras que ela desejava ouvir para Prudence e Arthur, e não para
ela. A pessoa a quem ele ostensivamente amava.
Ela balançou a cabeça. — Não, ele não me ama.
— Acho que ele pode te amar, você sabe, — Arthur respondeu.
Uma lágrima solitária escorreu pela bochecha dela e ela a afastou. — Não,
ele não me ama. Vocês não são os únicos que me trataram abominavelmente,
você sabe. Ele também.
Arthur assentiu. — Sim. Ele também nos disse isso. Ele nos disse que ele
cometeu erros suficientes para tornar impossível para ele poder fazer você feliz.
Ela se acalmou. — Ele disse o que?
Pru assentiu. — Ele disse que viveria com o arrependimento por toda a vida.
Que ele se lembraria da chance que teve e perdeu.
Outra lágrima. Outra. Felicity fungou e sacudiu a cabeça. — Ele não se
importava o suficiente comigo.
Arthur assentiu. — Eu não vou te dizer o contrário; você deve decidir se ele
é um homem digno de você. Mas saiba que Devon Culm lhe deu uma fortuna,
Felicity.
— Através de você, — ela corrigiu. — Então, o que eu posso esperar? Que
eu possa ser sua responsabilidade para sempre? Que eu possa pertencer a você,
e viver em tristeza e silêncio aqui neste mundo que costumava ser todo o brilho, e
agora é tinta desbotada, descascando das vigas? Tudo o que ele fez foi tornar
meu futuro uma prisão dourada.

327
— Não, Felicity. Falei corretamente. Culm concedeu uma fortuna a você. Ele
desejou que você tivesse o suficiente para encontrar sua própria felicidade. — Ele
olhou para Pru. — Como ele disse isso?
Pru suspirou. — Um futuro onde e com quem você quiser.
A testa de Felicity franziu. — Um dote? — O bastardo. Ele tinha acabado de
vomitar outra porta. Ela tinha destrancado tudo, e aqui estava ela novamente,
cercada por novas correntes. Novas fechaduras
Arthur sacudiu a cabeça. — Não. É seu. O dinheiro é seu. Uma quantidade
enorme, Felicity. Mais do que você poderia gastar.
As palavras chocantes se estabeleceram quando Pru levantou uma caixa da
penteadeira e foi até Felicity. — E ele te deixou um presente.
— O dinheiro não era presente suficiente? — A caixa era de ônix preta, mais
comprida do larga, tinha apenas uma polegada de altura e amarrada com um
laço de seda rosa. O peito dela se apertou quando viu o pacote bonito que ele
fez. Rosa sobre preto, como luz na escuridão. Como uma promessa.
— Ele foi inflexível que você recebesse isso quando lhe falamos dos fundos.
Ela tirou a fita da caixa, envolvendo-a cuidadosamente em torno de seu
pulso antes de abrir a tampa e descobrir um grosso cartão de linho branco
dentro. Do outro lado, no lindo rabisco preto de Devil, havia três palavras.
Adeus, Felicity Faircloth.
Seu peito apertou com essas palavras, e as lágrimas saltaram novamente
instantaneamente.
Ela o odiava. Ele tirou a única coisa que ela realmente queria. Ele.
Ela levantou o cartão, no entanto, e sua respiração ficou presa no brilho de
metal abaixo, seis linhas retas e finas de aço reluzente e brilhante, lindamente
forjado. Lágrimas vieram livremente agora, sua mão tremendo quando ela pegou
o presente, as pontas dos dedos acariciando o metal liso. — Devil, — ela
sussurrou, incapaz de manter seu nome longe de sua língua. — Eles são lindos.
Pru se virou para olhar na caixa. — O que são? Grampos de cabelo?
— Sim.
— Que presente estranho.
Felicity levantou um da caixa, inspecionando a onda irregular em uma das
extremidades. Colocando-a na almofada de veludo preto - o mais belo baú de

328
ferramentas da cristandade -, passou o dedo pelo ângulo em forma de
L em outro. O final do quadrado plano de um terceiro. — Eles são lockpicks.
O dinheiro era uma coisa. Mas os lockpicks eram tudo.
Você tem o futuro em suas mãos toda vez que segura um grampo de cabelo ,
ele disse todos aqueles dias atrás no armazém, quando ele disse que ela não
deveria ter vergonha de seu talento.
Essas escolhas eram prova de que ele a conhecia. Que ele colocou os desejos
dela primeiro. Sua paixão primeiro. Que ele se importava mais com o que ela
escolheu para si mesma do que por sua própria culpa.
Mas mais que tudo isso, eles eram a prova de que ele a amava.
Ele comprou a liberdade dela - ela nunca mais teria que fazer escolhas
baseadas nos negócios de Arthur ou na casa de sua mãe, ou em sua própria
posição social. Ele a libertou de Mayfair. Do mundo que ela não queria mais. E
ele deu a ela o futuro.
Assim como ele tinha feito no telhado, quando ele resistiu a ela. Quando ele
disse a ela que ele não iria levá-la. Que ele não iria arruiná-la. Que ele não iria
roubá-la do futuro que ele podia ver, como Janus. Naquela hora, ele deixou que
ela escolhesse, e ela tinha, e em nenhum momento se sentindo arruinada.
E agora, ele assegurou que ela nunca seria arruinada novamente; ele
reabasteceria os cofres de sua família e a tornaria rica além da medida. Rica em
dinheiro e liberdade.
Onde e com quem você quiser.
Ela levantou os pinos um após o outro e inseriu-os em seu cabelo.
Ela não queria o mundo da aristocracia. Ela queria o mundo.
E ele era o homem para dar a ela.
Não que ela não estivesse preparada para aceitar isso.

******

De nada adiantou, Felicity bater na grande porta de aço do armazém, meia


hora depois, enquanto o sol se aproximava dos telhados da colônia. De que
adiantaria o benefício de ter recebido a bênção da proteção de um dos Bastardos

329
de Bareknuckle em Covent Garden se a pessoa não pudesse entrar em seu
maldito armazém quando quisesse?
Ela teria que fazer isso de outra maneira. Ela enfiou a mão no cabelo, tirando
um alfinete de aço reluzente e um segundo, cada um lindamente moldado. Devil
havia encontrado um artesão habilidoso que entendia de ferramentas especiais
para abrir fechaduras complexas, que parecia o tipo de coisa que não deveria
existir... mas ele se especializou em coisas que não existem, e por isso ela não se
surpreendeu quando se ajoelhou na terra do lado de fora da porta do armazém.
É melhor ele estar lá dentro, ou ela ficaria muito irritada por ter manchado
seu vestido.
Além disso, é melhor ele estar lá dentro, porque ela estava pronta para dar
a ele uma firme repreensão. Uma que ele merecia, o bastardo.
Depois disso, ela pretendia ficar até que ele dissesse que a amava. Mais de
uma vez. Mas, antes que ela pudesse fazer o trabalho, no entanto, um homem
apareceu por trás dela. — Minha senhora.
Ela se virou para encarar John, o homem simpático e bonito que a havia
deixado em sua casa na última vez que esteve aqui. — Olá, John, — disse ela,
num sorriso descaradamente brilhante em seu rosto bonito.
— Bom dia, minha senhora, — respondeu John em seu barítono profundo.
— Eu espero que você entenda que eu não posso permitir que você arrombe
essa fechadura.
— Excelente, — ela disse. — Então você deve me poupar o trabalho e me
deixar entrar?
As sobrancelhas de John se levantaram. — Receio que não eu posso.
— Mas sou bem-vinda aqui. Estou sob sua proteção. Ele me deu rédea livre
sobre Covent Garden.
— Não mais, minha senhora. Agora nós temos de devolvê-la a Mayfair se
encontrarmos você aqui. Sem hesitação. Você nem vai ver Devil.
Um aperto se estabeleceu em seu peito. Ele nem sequer queria vê-la mais.
O que obviamente era um lixo, porque certamente ele desejava vê-la. Ficou nítido
que ele a amava.
Ele simplesmente só tinha que ser convencido a dizer a ela, na cara dela, o
homem tolo.

330
Em vista disto, esta nova virada de eventos não foi ideal. Felicity tentou uma
nova abordagem. — Eu nunca lhe agradeci por me trazer para casa
naquela noite.
— Se você me desculpar por dizer isso, minha senhora, você estava muito
ocupada protestando contra Devil para me agradecer.
Ela franziu os lábios. — Eu estava muito zangada com ele.
— Sim, minha senhora.
— Não tinha nada a ver com você.
— Não, minha senhora.
— Ele me deixou naquela noite.
— Sim, minha senhora.
Assim como ele a deixou de novo e de novo. Ela encontrou o olhar de John.
— Ele me deixou novamente na noite passada.
Algo cintilou nos olhos escuros do homem. Algo suspeito como pena. Não.
Felicity não estava tendo a pena de ninguém.
— Ele pensa em me dizer o que é bom para mim. Eu não me importo com
isso.
John sorriu. — Eu não imagino que você faça.
— Você nunca deveria contar à sua esposa o que é bom para ela. Não se
você sabe o que é bom para você, John.
Ele riu disso, profundo e cheio. Felicity continuou falando, tanto para si
mesma quanto para ele. — Ele é complacente, é claro, já que ele é mais do que
bom o suficiente para mim. Ele é o melhor dos homens. — Ela olhou para John
novamente. — Ele é o melhor dos homens.
— Só os Bastardos e Nik têm chaves para essa fechadura. — John observou
os telhados por um longo tempo.
— Posso convencê-lo a pelo menos patrulhar a parte de trás do prédio
enquanto eu a abro, então?
— Essa fechadura não é nada fácil.
Ela sorriu. — À medida que nos tornamos mais familiarizados, John, acho
que você descobrirá que sou muito boa com desbloqueios de fecaduras.

331
— Eu vi você com Devil, minha senhora. Não tenho dificuldade em acreditar
nisso.
As palavras colocaram seu coração acelerado e a tristeza encheu seus
grandes olhos castanhos. Ele não ia deixá-la fazer isso. Ele era leal demais a Devil
para permitir que ela entrasse, mesmo quando ele podia ver que suas intenções
eram boas.
— Por favor, John, — ela sussurrou.
— Sinto muito, — disse ele.
Um rouxinol cantou, e Felicity olhou para o som estranho, tão inesperado
aqui, no quintal de um depósito de viveiros. Quando ela não encontrou nada fora
do comum, voltou-se para John, que estava... sorrindo.
Sua testa franziu. — John?
— Lady Felicity. — Um grunhido veio de cima e ela olhou para cima para ver
Whit descendo pelo lado do armazém para saltar ao lado dela.
— Eu vou precisar de calças se eu vou andar muito com vocês, não é?
Ele inclinou a cabeça. — Não é a pior das ideias.
Sua aceitação tácita de sua premissa a encheu de alegria. — Eu estava
dizendo a John que amo seu irmão muito loucamente. — Uma das sobrancelhas
negras de Whit se elevou. — Como resultado, eu tenho a intenção de destravar
essa fechadura impenetrável e entrar lá e dizer a ele que ele tem um cérebro de
repolho por não me amar de volta. Mas isso vai levar algum tempo, pois quando
alguém decide que gostaria de lutar pelo homem que ama, a pessoa gosta de
fazer isso o mais rápido possível, você pode imaginar.
— Eu posso. Mas ele não está aqui. Ele está em casa.
Ela balançou a cabeça. — Não, ele não está lá; Eu fui lá primeiro.
Ele grunhiu em desaprovação.
— Então você pode ver porque eu apreciaria se você me deixasse entrar.
Sua testa franziu. — Você bateu?
— Eu bati.
Ele levantou o punho e bateu forte na porta. — E ele não respondeu?
Felicity não gostou do olhar em seu rosto. — Não.

332
Sua chave estava na fechadura instantaneamente, a porta se abrindo para o
armazém cavernoso em segundos. Silêncio e escuridão os cumprimentaram. —
Devil, — ele gritou.
Sem resposta. O coração de Felicity caiu. Algo estava errado. Ela se virou
para John. — Rápido. Precisamos de luz.
O homem grande já estava se virando para pegar uma lanterna,
quando Whit perguntou atrás dele. — Ele saiu?
A resposta de John foi firme e cortada. — Ninguém entrou ou saiu desde
que você partiu.
— Devil! — Whit gritou.
Silêncio.
John passou uma lanterna para Felicity e ela ergueu-a bem alto.
— Devil?
— Ele deve ter saído, — disse Whit. — Droga, John, há um valor de cem mil
libras em mercadorias aqui e você está dormindo no ponto o suficiente, que
você não vê alguém sair pela única maldita porta do lugar.
— Ele não passou por aquela porta, Fera, — protestou John. — Meus
homens conhecem o trabalho deles. E eles fazem isso bem.
Felicity parou de ouvir os dois homens se aproximando, indo mais
profundamente na escuridão até o canto mais distante do espaço. Para onde a
porta encostada no chão do armazém estava aberta, uma escuridão escancarada
abaixo.
Diabo tinha sido inflexível que aquela porta nunca deveria estar aberta. O
fato dela estar aberta ressaltou que havia algo abaixo do próprio armazém.
— Devil? — Ela ficou na beira do buraco e chamou no vazio por ele. Ele não
estaria lá embaixo. Ele odiava o porão. Ele odiava a escuridão.
E ainda... ela sabia que ele estava lá embaixo. Sem dúvida.
Ela foi para baixo para a escuridão instantaneamente, correndo ao longo
do comprido e escuro túnel, segurando a lanterna no alto, seu coração em sua
garganta.
— Devil? — Ela chamou novamente.
E foi quando ela viu. O flash de luz no chão na frente dela. O brilho de prata.
A cabeça de leão na alça de sua bengala. A arma, descartada no chão.
333
Ao lado da porta do porão de gelo.
Ela pegou a maçaneta. Puxando. Estava trancada. Pelo lado de fora. Seis
pesados cadeados de aço em uma fileira organizada.
Ela bateu na porta em grandes e pesados golpes. — Devil?
Nenhuma resposta.
Mais batidas.
— Devil? Você está aí?
Novamente, sem resposta.
— Devil? — Ela bateu novamente, pressionando o ouvido na porta, incapaz
de ouvir qualquer coisa sobre o bater de seu coração.
Deixou cair a lanterna no chão e pegou os grampos de cabelo sem hesitar.
Ela bateu na porta novamente, o mais forte que pôde, gritando: — Devil! Eu estou
aqui! — Antes de chamar por Whit e John. Mas ela não podia esperar por eles.
Em vez disso, ela caiu de joelhos e começou a trabalhar as fechaduras.
Todo o tempo conversando com a porta, esperando que ele a ouvisse. —
Não se atreva a morrer ai, Devon Culm. Tenho coisas para dizer na sua cara, seu
homem terrível e maravilhoso...
A primeira fechadura se abriu e ela a puxou do trinco, jogando-a no chão do
corredor e imediatamente se pondo para trabalhar na próxima.

— ... Você acha que pode simplesmente aparecer na casa do meu irmão e
dizer que me ama sem me contar primeiro? Você acha que isso é justo? Não é...
e eu vou punir você, fazendo você me contar a cada minuto de cada hora pelo
resto de nossas vidas...

A segunda fechadura se soltou e ela imediatamente colocou as picaretas na


terceira, gritando — Devil? Você está aí? Amor? — Ela bateu na porta
Silêncio. Ela jogou a terceira fechadura para o lado.
— Eu te amo, você sabe disso? — Ela deslizou suas picaretas para a quarta
fechadura, depois a quinta. — Você está com frio, meu amor?
Ela gritou para Whit novamente. E o John
— Estou chegando, — ela sussurrou, agora na sexta fechadura, sentindo o
trinco dentro do interior da primavera - esta era diferente das outras. Ela raspou
as ferramentas juntas, sussurrando de novo: — Eu estou chegando.
334
Feito. Ela jogou a fechadura para o lado e abriu a porta, levantando a grande
laje pesada para o lado, o ar instantaneamente mais frio ao revelar a porta interna,
outra linha de fechaduras. Ela imediatamente veio a seus joelhos na fria lama lá.
Ela não podia nem ver as fechaduras mais; ela trabalhou-as pelo toque.
Chamando por ele. — Devil? Por favor, amor, você está aí? — O coração dela
acelerou e ela se recusou a permitir que as lágrimas viessem. Recusou-se a
acreditar que ela poderia tê-lo perdido. — Devil, por favor - estou trabalhando o
mais rápido que posso. Estou aqui. — Ela repetiu. — Estou aqui. — De novo e de
novo.
E então, quase ali, quase impossível acreditar, ela ouviu.
Uma batida. Tão leve quanto as asas das borboletas.
Como uma mariposa. Sua mariposa.
— Devil! — Ela gritou, batendo na porta. — Eu te escuto! Eu não vou te
deixar. Eu nunca vou te deixar novamente. Você nunca vai se livrar de mim.
Um bloqueio. Um segundo. Um terceiro. Suas mãos estavam mais firmes do
que nunca, os grampos voando pela fechadura.
— Droga. Ninguém mantém gelo por trás dessas muitas madeixas, Devil.
Você é definitivamente um contrabandista. Provavelmente um ladrão também.
Deus sabe que você roubou meu coração. E meu futuro. Estou aqui para pegar
de volta.
A fechadura saltou e ela e ela foi para o quarto bloqueio. Nesse momento,
qualquer um de seus grampos de cabelo teriam sido dobrados ou quebrados,
inutilizados. Mas esses pinos eram perfeitos. Ele era perfeito.
— Você vai ter que se casar comigo, você sabe. Estou tomando decisões
relacionadas à nossa felicidade mútua, porque quando você o faz, só fico triste e
você é deixado... — Ela jogou de lado o quarto. Movendo-se para o quinto. —
Bem... trancado dentro de masmorras de gelo. Presumo que este seja o trabalho
do meu ex-noivo?
Uma pausa, enquanto ela descartou a quinta fechadura e definiu suas
escolhas para a última. — Só mais uma, Devon. Aguente. Por favor. Estou
chegando.
Clique.
Ela jogou a fechadura para longe e jogou a trava pesada na parte inferior da
porta, abrindo-a com todas as suas forças. Ele veio com uma explosão de ar
gelado e Devil, caindo pela porta, em seus braços.
335
Ela apertou-lhe junto a ela e ambos caíram de joelhos sob o peso dele.
Ele tremia de frio, o rosto pressionado na curva do pescoço dela. Ele sussurrou
uma palavra, repetidamente, como uma bênção. — Felicity.
Seus braços se envolveram ao redor dele, desesperada para segurar mais
dele. Desesperada para aquecê-lo. — Obrigada pelos meus lockpicks.
— V-você me s-salvo. — Ele estava tão frio.
— Sempre, — ela sussurrou, pressionando um beijo em sua testa fria. —
Sempre.
— F-Felicity, — ele falou seu nome. — Eu...
Ela esfregou os braços dele com as mãos, falou no alto da cabeça dele. —
Não... não fale. Eu tenho que chamar Whit.
Ele endureceu. — N-não. — Ele engoliu, e ela viu a luta disso. — Estava tão
escuro aqui.
Lágrimas brotaram. — Eu sei. Vou deixar a lanterna.
Seus braços a envolveram como aço, a força de seu aperto surpreendente e
imensamente reconfortante. — N-não a lanterna. Você é a luz Não me deixe.
— Eu não posso carregar você, — disse ela. — Você tem que me deixar
chamar Whit.
Seus olhos se abriram, escuros na luz fraca. — Não me deixe nunca mais.
Ela balançou a cabeça. — Nunca. Mas amor, está tão frio aqui. Nós devemos
aquecer você.
— Você é fogo, — ele sussurrou. — Você é chama. Eu te amo.
As palavras trovejaram através dela, e ela não pôde parar de tocá-lo, parar
de passar as mãos sobre ele, rápido, furiosamente, tentando aquecê-lo. — Devil.
Ele se afastou, seu olhar encontrando o dela. — Eu te amo.
Seu coração redobrou as batidas. — Devil, eu preciso te levar para algum
lugar quente. Você está machucado?
— Eu te amo, — ele sussurrou novamente. — Eu te amo. Você é meu futuro.
Seu coração batia forte. Ele ficou louco. — Meu amor, há tempo para isso,
uma vez que estivermos acima do solo.
— Nunca haverá tempo suficiente, — disse ele, puxando-a para ele, seus
dentes batendo, seu coração acelerado e furioso. — Eu nunca vou ser capaz de
336
lhe dizer o suficiente. — Ele a beijou, seus lábios frios ao toque, e de alguma
forma ainda incendiando ela.
Ela estendeu a mão, acariciando sua bochecha.
Quando ele a soltou, foi para pressionar sua testa na dela e sussurrar,
novamente, — eu te amo.
Ela não conseguiu parar o sorriso que veio - aqui, no escuro, úmido e frio
que quase matara aquele homem, também era o lugar mais perfeito para ele
dizer que a amava. — Você disse ao meu irmão primeiro.
— Sim.
— Estou muito zangada com você sobre isso, você sabe.
— Então você disse.
— Estou com tanta raiva que vim para lhe dizer como estou zangada com
isso. O dinheiro também.
Ele estremeceu, pressionando o rosto no pescoço dela. — Eu queria que
você fosse livre, de tudo isso.
— Eu não quero o seu dinheiro, Devil.
— Eu não precisava mais. Não significou nada sem você.
— Você é um homem lindo e ridículo, — ela disse. — Então por que não me
ter, em vez disso?
— Há um tempo atrás... você me perguntou por que eu escolhi você. — Suas
palavras eram lentas e medidas, como se fosse importante que ela as ouvisse. —
Naquela noite, eu queria que fosse porque eu pensei que você poderia
conquista-lo. Porque você parecia o tipo de mulher facilmente sacrificada.
Ela assentiu. Felicity desamparada. Invisível e infeliz.
— Mas não foi, — continuou ele. — Nunca foi. Foi porque eu te queria perto.
Foi porque não pude suportar a ideia de alguém ter você. Qualquer um além de
mim. — Ele a puxou para perto novamente, seu rosto frio na pele quente do
pescoço dela. — Cristo, Felicity. Eu sinto muito.
— Eu não sinto.
Ele chamou a atenção. — Você não sente?
— Não. Você tem uma vida inteira para compensar isso, e eu pretendo ser
uma boa noiva do Diabo.

337
Ele sorriu. — Vou adorar cada minuto disso.
— Eu quero você fora deste lugar. Eu quero você quente.
Ele a puxou para perto, envolvendo os braços sobre ela. — Eu tenho algumas
ideias sobre como você pode me aquecer.
Ele baixou os lábios para os dela, e ela ficou tão agradecida que ele foi capaz
de pensar em beijar naquele momento que ela se entregou a ele, deslizando as
mãos pelo peito dele até os ombros largos dele e para cima, mandíbula e em seu
cabelo, onde ela descobriu uma mancha molhada.
— Bem. Não é o que eu esperava encontrar aqui embaixo. — Whit chegara.
Devil a libertou do beijo. — Vá embora.
— Não, não vá embora, Whit, — disse ela. — Nós precisamos de você.
— Nós não precisamos dele, — disse Devil, movendo-se para ficar em pé,
respirando com a dor do movimento, fazendo seu coração doer.
Ela moveu a mão para a luz, o sangue brilhando em preto nas pontas dos
dedos. — Você está sangrando. — Ela se virou para Whit. — Ele está congelando.
E ele está sangrando.
Whit imediatamente se adiantou, pegando o braço de Devil por cima do
ombro. — O que diabos aconteceu com você?
Ele colocou os dedos na sua nuca, estremecendo. — Ewan. — Ele pegou
Felicity. — Ele não foi até você.
Ela balançou a cabeça. — Por que ele viria? Eu terminei o nosso
compromisso. Eu bati nele.
Ele sorriu para isso. — Eu sei amor. Estou muito orgulhoso de você por isso.
— Ele mereceu. E mais, pelo que ele fez com você.
— Grace foi aos telhados ontem à noite.
Devil assentiu. — Eu deixei Ewan achar que ela está morta. — Ele puxou-a
para perto e beijou sua têmpora antes de olhar para Whit. — Ele está furioso.
Whit assentiu. — Ele foi embora. O vigia relatou esta manhã, ele saiu da casa
de Mayfair ao amanhecer.
Devil assentiu. — Ele voltará. Ele vai querer nos punir.
Whit levantou a lanterna para olhar o rosto de Devil. — Cristo, ele te bateu
bem.
338
Felicity franziu o cenho. — Nunca um homem precisou de punição mais do
que esse.
Ele olhou para ela e depois para Whit. — Ele recebeu hoje.
Whit grunhiu, parecendo entender o que quer que isso significasse.
Felicity não, no entanto, e seu temperamento queimado. — Ele bateu na sua
cabeça e trancou você em um porão de gelo onde você poderia ter morrido.
Tudo o que você fez para ele não é comparável.
— Isso é falado por alguém que nunca esteve desesperado pela mulher que
ama.
Ela não hesitou. — Bem, eu tenho estado desesperada para chegar ao
homem que amo, então acho que tenho uma ideia.
Os irmãos a observaram por um longo momento, e então Whit disse: — Eu
gosto dela.
Devil sorriu e estremeceu com o movimento. — Assim como eu.
Ela revirou os olhos. — Você está com a cabeça sangrando. Não há tempo
para gostar de mim.
— Sempre haverá tempo para gostar de você, Felicity Faircloth.
Com a ajuda de Whit, eles levaram Devil para o armazém, e, em seguida,
para o pátio, agora iluminado pelo sol.
Felicity já estava chamando pelo John. — Nós precisamos de um
transporte! Ou algo assim - Devil precisa de um cirurgião, imediatamente. E um
decente, não algum tolo desajeitado com uma caixa de sangria.
Em vez de se mover para ajuda-la, no entanto, John balançou para trás em
seus calcanhares, um grande sorriso em seu rosto.
A testa de Felicity franziu em confusão.
— John, por favor. — E então ela se virou para seguir a direção de seu olhar,
para encontrar Devil parado perfeitamente imóvel, dez passos atrás dela.
Ela voou para o lado dele, as saias ondulando ao redor de ambos. — Como
você se sente? — Disse ela, passando as mãos sobre os braços, os ombros. —
Você está ferido em outro lugar? É a sua cabeça? Você aguenta?
Ele agarrou as mãos dela em uma das suas e deu um beijo nos nós dos
dedos. — Pare, amor. Você vai fazer os garotos me acharem fraco.

339
Whit grunhiu. — Os meninos já acham que você é fraco quando se trata dela.
— Só porque eles não acham que eu sou digno dela.
— Eles sabem que você não é digno dela.
Felicity balançou a cabeça. — O que há de errado com vocês dois? Ele
precisa de um médico!
— Eu preciso de você primeiro, — ele disse.
— O quê?
Ele estava bravo. — Você voltou para mim.
— Claro que sim. Eu te amo, seu imbecil.
Whit tossiu uma risada, e Devil pressionou outro beijo em seus dedos. —
Bem, nós vamos ter que trabalhar em você questionando um pouco a minha
inteligência.
— Eu não questiono sua inteligência, — disse ela. — Eu acho que você é
brilhante. Exceto quando você pensa em sugerir que eu não conheço minha
própria mente.
— Eu te amo, Felicity Faircloth.
Ela sorriu. — Quando nos casarmos, você pretende me chamar pelos dois
nomes?
— Só se você me pedir muito bem. — Ele se inclinou para perto. — Acho
que te amei desde o momento em que te encontrei naquela varanda, depois de
destravar a fechadura e encontrar o caminho da luz para a escuridão.
— Para a liberdade, — ela disse, suavemente.
— Naquela noite, no seu quarto de dormir, brinquei sobre o resgate da
princesa da sua torre... Você fez isso — interrompeu ela.
Ele balançou sua cabeça. — Não, amor. Você me salvou. Você me resgatou
de um mundo sem cor. Sem luz. Um mundo sem você. — Ele passou um polegar
sobre sua bochecha. — Linda e perfeita Felicity. Você me salvou. Eu queria você
desde o começo. Era só uma questão de tempo antes que tudo - tudo - ficasse
em segundo plano para eu querer você. Para me manter seguro. Para mim, e eu
amando você. — As lágrimas encheram seus olhos enquanto ele continuava. —
E tudo que eu queria era sua felicidade. A minha não era nada comparada a sua.
— Mas minha felicidade está ligada à sua. Você não vê?

340
Ele assentiu. — Eu não posso te dar Mayfair, Felicity. Nós nunca seremos
bem-vindos lá. Você sempre vai se esvair, não importa o quão rico nós somos. —
Ele fez uma pausa, perdido em pensamentos, e então disse: — Mas eu vou te dar
todo o resto. O mundo. Você só tem que me pedir. — Seus lindos olhos
brilhavam à luz do sol. — Você me resgatou do passado. Você me deu um
presente. E agora... Eu desejo que você me prometa o futuro.
— Sim, — ela sussurrou, incapaz de evitar que as lágrimas se derramassem.
— Sim.
Ele roubou os lábios dela em um beijo perverso que deixou os dois sem
fôlego, e Whit resmungou: — Encontre uma cama.
Felicity se afastou com o rosto corado e disse: — Assim que encontrarmos
um médico. — Ela saiu do prédio e foi para a rua.
— Espere, — disse Devil. — Eu poderia jurar que você insistiu que nos
casássemos lá, na escuridão, enquanto você estava salvando minha vida.
Ela sorriu. — Bem, você estava com muito frio e está tem um ferimento na
cabeça, então eu não estaria tão certa de que você ouviu o que você acha que
ouviu.
— Estou certo, amor.
— As mulheres tipicamente não propõem aos homens. Certamente não
mulheres como eu. Certamente não a homens como você.
— Mulheres como você?
— Solteironas invisíveis, desamparadas e arruinadas.
— Lady Lockpick, você pediu ou não pediu para eu me casar com você?
— Acredito que foi menos pedido e mais uma revelação.
— Faça isso novamente.
Seu rubor se transformou em chamas. — Não.
Ele deu um beijo na têmpora dela. — Por favor?
— Não. — Ela se afastou dele e continuou andando.
— Tão tradicional, — ele zombou. E então, depois de um momento, ele
chamou para ela. — Felicity?

341
Ela se virou para encontrá-lo de joelhos no pátio iluminado. Ela deu um
passo em direção a ele, já se aproximando dele, pensando por um momento que
ele havia caído novamente.
Ele apertou sua mão estendida e puxou-a para mais perto, até que suas saias
estavam ondulando ao redor dele. Ela congelou, olhando para o rosto do homem
que amava quando ele disse: — Eu não tenho muito. Eu nasci sem nada, nada
me foi dado. Eu não tenho um nome digno de você, nem um passado que eu
tenha orgulho. Mas eu juro aqui, neste lugar que eu construí, que costumava
significar tudo e agora não significa nada sem você, que eu passarei o resto da
minha vida te amando. E eu vou fazer tudo que eu puder para dar-lhe o mundo.
Ela balançou a cabeça. — Eu não quero o mundo.
— O que, então?
— Você, — ela disse, simplesmente. — Eu quero você.
Ele sorriu, o sorriso mais bonito que ela já tinha visto. — Você me teve desde
a primeira noite, amor. Agora me diga o que mais você quer.
Ela corou.
Seu coração batia forte quando ele tirou o anel
do dedo anelar, transferindo-o imediatamente para o seu polegar, beijando o
metal e depois passando para os nós dos dedos. Haveria um casamento, sem
dúvida, mas este momento, aqui, neste lugar, parecia uma cerimônia, abençoada
pela luz do sol e pelo ar.
E quando o marido de seu coração se levantou, elevando-se sobre ela com
largos e belos ombros, suas mãos chegando a suas bochechas, cobrindo seu
queixo, inclinando o rosto para ele - Felicity deu a ele o tipo de beijo que uma
rainha de Covent Garden dá a seu rei.
Quando acabou, virou-se para os telhados, e o olhar de Felicity seguiu-o
para os telhados ao redor do pátio do depósito, onde dezenas de homens
estavam em intervalos dispersos, rifles nos lados, sorrisos nos rostos, observando.
Ela corou, e o rubor se transformou em chamas quando ele gritou, tão forte
como sempre, — Minha senhora.
Ele a beijou, longo, lento e profundo, até que os homens bateram os pés e
gritaram seus parabéns para baixo no jardim, criando um eco magnífico e
cacofônico reverberando em torno dos edifícios, tão trovejante que os tremores
nos dedos de seus pés enviaram um prazer selvagem através dela - prazer que

342
se transformou em fogo quando ele a puxou para perto e sussurrou em seu
ouvido. — Seu mundo a espera, meu amor.

Epílogo

Três meses depois

Felicity chegou ao lado de Devil no pátio do armazém dos Bastardos de


Bareknuckle em Covent Garden quando o último vagão de aço deixava a unidade,
com Whit nas rédeas.
O braço do diabo a puxou com força enquanto o vento de setembro soprava,
enviando as saias dela ao redor deles, e eles se levantaram, Rei e Rainha de Covent
Garden, até que o barulho dos cascos dos cavalos desapareceu na noite. Quando
foi embora, substituída pelas vozes dos vigias nos telhados acima e os homens
que haviam passado a noite trabalhando para levar o carregamento para entrega,
ela inclinou o rosto para ele e sorriu. — Outro dia terminado.
Ele se virou para ela, suas mãos cobrindo suas bochechas, segurando ela
quando ele a beijou, longo e profundo, até que ambos estavam ofegando por
ar. — É tarde, esposa, — disse ele. — Você deveria estar na cama.
— Eu prefiro minha cama com você nela, — ela brincou, amando o pequeno
grunhido que ele deu com as palavras. — Me chame de esposa novamente.
Ele se inclinou e pressionou os lábios na pele macia do pescoço dela. —
Esposa... — Ele raspou os dentes no lugar onde o pescoço dela encontrava
seu ombro. — Esposa... — Beliscou a curva lá. — Esposa.
Ela estremeceu, com os braços ao redor do pescoço dele. — Eu não acho
que vou me cansar disso, marido.
Ele levantou a cabeça e encontrou seus olhos, seus próprios escuros à luz da
lua. — Nem mesmo quando você se lembra que se casou na escuridão?

343
O casamento, realizado por licença especial, dias após Felicity ter resgatado
Devil do porão de gelo, tinha sido perfeito... e o oposto de tudo que Felicity
imaginara. Em vez de um grande evento na Catedral de St. Paul, com a presença
da metade da nobreza londrina, tinha sido diferente, uma celebração animada
e cacofônica em um St. Paul - a poucos passos do mercado de Covent Garden.
Para o desgosto dos pais de Felicity, havia sido realizado pelo vigário da colônia,
um homem que conhecia sua cerveja e bebia bem, em uma congregação lotada de
homens e famílias de bastardos. Artur estivera lá, é claro, e Pru, junto com uma coleção
de aristocratas manchados que levara Felicity, Devil e toda a família Faircloth sob sua
ala coletiva - afinal, a Duquesa de Haven havia apontado no casamento no café da
manhã naquela manhã - escândalos devem ficar juntos.
Apenas Grace estava ausente da celebração; ela permaneceu escondida
enquanto os Bastardos trabalhavam para encontrar Ewan, que continuava
desaparecido desde que saiu de Londres meses antes. Mas, antes da cerimônia,
havia um pacote entregue por Madame Hebert e, por dentro, Felicity descobrira
um par de calças de couro de camurça perfeitamente adaptadas, uma linda
camisa branca, um colete de cintura rosa e prateado que rivalizaria com qualquer
vestido em Mayfair. Sobretudo costurado, preto por fora, com forro de cetim
rosa. Junto com as roupas, um par de botas de cano alto de couro se ajustava ao
joelho.
Um conjunto adequado, próprio para uma rainha do Covent Garden. E com
isso, uma mensagem.
Bem vinda irmã.
Naquela noite, houve uma festa desenfreada no Jardim, onde Lady Felicity
Faircloth, agora sra. Felicity Culm, recebera seu terceiro nome - o que ela mais
valorizava: A Noiva do Bastardo.
Tinha sido o dia perfeito para o casamento, pensou Felicity, melhorado à
noite, quando seu novo marido a encontrava em uma onda de risos de boas
intenções, pegou a mão dela e a conduziu até o telhado de seus escritórios em
Covent Garden para observar centenas de pessoas lançando lanternas de papel
no céu dos telhados ao redor deles.
Depois que ela ofegou seu prazer e se jogou em seus braços, ele deu a ela o
beijo que ela exigiu e bateu sua bengala duas vezes em uma chaminé de lata nas
proximidades, dispensando os elfos que o ajudaram antes de entregar sua nova
esposa a uma cama de seda e pelos sob o céu estrelado.

344
Felicity estremeceu com a lembrança daquela noite e Devil puxou-a
para mais perto. — Você está com frio, meu amor?
— Não. — Ela sorriu. — Apenas cheia de memórias.
Ele sorriu em seu cabelo. — Boas?
— As melhores, — disse ela, olhando para ele através de seus cílios. —
Embora seja setembro, e em breve, não poderemos usar os telhados.
Uma sobrancelha negra ergueu-se num entendimento agudo do que ela
estava dizendo. Do que ela estava querendo. — Eu acho que você subestima o
meu poder, Felicity Faircloth.
Ela sorriu. — Felicity Culm, por favor. E eu não sonharia em subestimar você,
Devil... na verdade, eu não consigo imaginar o tempo negando seus desejos.
Ele assentiu e se inclinou, deixando a voz baixa e escura. — O inverno nos
telhados será ainda melhor que o verão.
Seus olhos se arregalaram. — Será?
— Eu vou espalha-la na neve e ver o quão quente eu posso fazer você
queimar, minha linda chama.
Ela ficou quente como o sol. — Eu não acho que eu poderia atraí-lo para um
telhado agora para praticar, eu poderia, minha mariposa bonita?
Ele se endireitou. — Não
— Não?
— Não. Eu tenho algo para mostrar a você. — Ele pegou a mão dela na sua,
levando-a para longe do armazém e de volta para as luzes brilhantes de Drury
Lane. Eles pararam no Pardal Cantante, cheios de seus homens, bebendo e
celebrando o trabalho árduo de uma noite. Segurando a porta para ela, Devil
seguiu Felicity para dentro, com um aceno de cabeça para o proprietário, para um
lugar no salão que tinha sido preparado para a dança - o quarteto de cordas e
tubos estavam nas proximidades, e Devil a puxou para seus braços quando os
músicos começaram a música.
Ela riu para ele quando ele a girou em um círculo surpreendente. — Você
queria me mostrar esta taberna?
Ele balançou sua cabeça. — Houve uma época em que você me disse que
não achava que eu era o tipo de homem que dançava.
Ela lembrou. — E você é?

345
— Eu nunca fui antes - dançar parecia o tipo de coisa que as pessoas faziam
quando estavam felizes.
Seu olhar voou para o dele. — E você não era.
— Não até você.
Ela assentiu, seus dedos brincando por cima do ombro dele. E então ela
encontrou seus olhos e disse: — Mostre-me.
Ele fez, puxando-a para perto o suficiente para escandalizar Mayfair,
balançando-a e levantando-a, e balançando-a e girando-a no compasso da
música alegre e giratória. Ela se agarrou a ele, seus braços fortes a mantendo
segura neles. Ele a girou de novo, e de novo, mais e mais rápido junto com a
música, seu público reunido aplaudindo a tempo até que ela jogou a cabeça para
trás e riu, incapaz de fazer qualquer outra coisa.
E então ele a ergueu em seus braços e a carregou através da taverna e saiu
para a rua, onde uma fina névoa de outono transformara os paralelepípedos de
ouro na luz. Ele a colocou no chão quando ela prendeu a respiração, beijando a
última e persistente risada de seus lábios. — Bem, esposa?
Ela balançou a cabeça. — Não foi como um sonho. — Ele franziu o cenho, e
ela riu de novo, estendendo a mão para ele. — Meu amor... meu Devil... ele foi
melhor. Foi real.
Ele a beijou novamente, longo e profundo. E quando ele levantou a cabeça,
ele estava sorrindo, largo e perverso e maravilhoso. Ela correspondeu o sorriso
com o dela próprio, chegando-se em seus pés para sussurrar em seu ouvido. —
Me ame. Passado, presente e futuro.
Sua resposta veio como chama. — Sim.

Fim

346
Nota do autor

Dois anos atrás, em Londres, conheci um homem que me deliciava com os


contos de seu avô, que vendeu raspas de gelo limão a partir de um bloco de gelo que
ele tinha carrinho das docas em Covent Garden. Eu gostaria de me lembrar do seu
nome, mas onde quer que você esteja, eu estou grata a você, assim como estou a
Gavin Weightman pelo The Frozen Water Trade, que foi um recurso inestimável
sobre a história do gelo em movimento e como isso impactou o mundo.
Na mesma época, fiquei paralisada com o episódio “Perfect Security” do podcast
99% Invisible, que narra a invenção do indecifrável Chubb Lock, e depois a
controvérsia da fechadura de 1851, quando um americano atrevido apareceu na
Grande Exposição, pegou a fechadura e garantiu que o mundo nunca mais se sentiria
seguro. Felicity Faircloth é catorze anos mais nova do que o americano, mas ela
escolhe o Chubb da mesma forma que ele, e sou grata a Roman Mars e sua equipe
por trazer a história para mim no momento perfeito.
O Whispering Bench de Felicity é uma réplica do Charles B. Stover Bench no
Shakespeare Garden do Central Park - o lugar perfeito para contar secretamente.
Covent Garden é um lugar bastante elegante nos dias de hoje - muito pouco
como nos anos 1830. Passei horas no Museu de Londres estudando a extraordinária
pesquisa antropológica de Charles Booth sobre “A Vida e o Trabalho do Povo em
Londres”, de fins do século 19, e sou muito grata ao Museu por disponibilizar um
recurso tão rico à público em formato digital.
Como sempre, meus livros são promovidos e atendidos por um time
incomparável, e tenho imensa sorte de ter a brilhante Carrie Feron do meu lado a
cada passo, junto com Carolyn Coons, Liate Stehlik, Brittani DiMare, Eleanor
Mickuki, Angela. Craft, Pam Jaffee,
Libby Collins e todos os livros da Avon. Meu agente, Steve Axelrod, e a
publicitária Kristin Dwyer são as melhores.
Os bastardos de Bareknuckle ainda seriam um sussurro de uma ideia sem
Carrie Ryan, Louisa Edwards, Sophie Jordan e Ally Carter, e eles não estariam na
página sem minha irmã Chiara, e minha mãe, que me ensina todos os dias como o
mundo muda as mulheres, e como nós as mudamos de volta.
E, finalmente, para Eric, que toma todas as minhas pesquisas no tranco,
incluindo o tipo que termina com me escolher o bloqueio em um seguro, ficar
bêbado em poder, e considerando uma vida de crime: Se estou sempre no
lam, E esperamos que você vai ser com mim.

347
Brazen and the Beast

O plano da senhora
Quando Lady Henrietta Sedley chega a seu vigésimo nono
aniversário, ela tem planos de herdar os negócios de seu pai,
fazer sua própria fortuna e viver sua própria vida. Mas
primeiro, ela pretende experimentar um gosto do prazer
que ela renunciará como uma solteirona confirmada. Tudo
está indo perfeitamente... até que ela descobre o homem
mais bonito que ela já viu amarrado em sua carruagem e
ameaçando arruinar o aniversário da Hattie antes mesmo de
começar.
A proposta do bastardo
Quando ele acorda em uma carruagem aos pés de Hattie,
Whit, um rei de Covent Garden conhecido por todo o mundo
como Beast, não pode deixar de pensar sobre a estranha
mulher que o liberta - especialmente quando ele descobre
que ela está indo para uma noite de prazer... em seu
território. Ele é mais do que feliz em oferecer a Hattie tudo
o que ela deseja... por um preço.
Uma paixão inesperada
Logo, Hattie e Whit se encontram rivais em negócios e
prazer. Ela não vai desistir de seus planos; ele não vai
desistir de seu poder... e nenhum deles vê que, se não for
cuidadoso, não terá escolha a não ser desistir de
tudo... incluindo seus corações.

Brazen and the Beast

Leia para uma prévia da história de Whit


Os bastardos de Bareknuckle, livro 02
2019 de Sarah MacLean

348
Um trecho de Brazen and the Beast

A última coisa de que ele se lembrava era de transportar o carregamento.


Atravessando a Oxford Street. Um tiro. Um garoto ferido. Um golpe na cabeça.
Batidas insistentes contra sua bochecha o devolveram a consciência, muito
suave para a dor, mas firme o suficiente para ser irritante. Ele não abriu os olhos,
anos de treinamento permitindo que ele fingisse dormir enquanto se orientava. Seus
pés estavam amarrados. Suas mãos também, atrás das costas. Ele resistiu ao
impulso de endurecer. Enfurecer-se.
Beast não se enfurecia.
Ele punia, rápido e devastador e sem emoção.
Mas ficou claro; ele estava no chão de uma carruagem em movimento. Bem
equipada, se a almofada macia em sua bochecha fosse qualquer indicação, e em
um vizinhança decente pelo ritmo suave dos paralelepípedos sob as rodas.
Pensou em seu próximo passo - imaginando como ele iria incapacitar seu captor
apesar de suas amarras. Ele imaginou quebrar um nariz com a cabeça. Usando as
pernas amarradas para derrubar um homem.
A batida em sua bochecha começou novamente, seguida por um sussurrado —
Senhor.
Seu captor não era homem.
Seus olhos se abriram, a chuva de luz dourada na carruagem brincando com ele
- parecendo vir não da lanterna balançando gentilmente no canto, mas da mulher
inclinada sobre ele.
Ela estava sentada no banco acima dele, parecendo nada como o tipo de inimigo
que derrubaria um homem e o amarraria em uma carruagem. De fato, ela parecia
estar a caminho de uma baile. Perfeitamente arrumada, perfeitamente penteada,
perfeitamente colorida - pele como porcelana, olhos brilhantes, lábios cheios e
manchados apenas o suficiente para fazer um homem prestar atenção. E isso foi
antes de ele dar uma olhada no vestido - o azul turquesa de um céu de verão,
perfeitamente ajustado à sua figura cheia.
Não que ele devesse estar percebendo algo sobre isso, considerando que ela o
havia amarrado em uma carruagem. Ela não era mulher. Ela era o inimigo.
Ele estreitou seu olhar sobre ela, e seus olhos – era possível que eles fossem
violetas? Que tipo de pessoa tinha olhos violetas? — Bem. Se esse olhar é uma
indicação do seu temperamento, não é de admirar que eles tenham te amarrado. —
Ela inclinou a cabeça. — Por que eles te amarraram?
Whit não respondeu.
— Quem te amarrou?
Mais uma vez, silêncio.
Ela encolheu um ombro e disse: — Justo o suficiente. Eu suponho que não é da
minha conta. Infelizmente para nós dois, no entanto, você é muito inconveniente, já
que preciso desta carruagem esta noite.
— Inconveniente. — Ele não quis responder, e a palavra surpreendeu os dois.
Ela assentiu. — De fato. Você vê, é meu aniversário. E, francamente, eu tenho
planos para isso que não incluem... — Ela acenou com a mão... — o que quer que
esteja acontecendo aqui.
Ele não respondeu.
Ela piscou. — A maioria das pessoas me desejaria um feliz aniversário neste
momento.
Whit não disse nada.
Ela assentiu. — E aqui estava eu, pronta para ajudá-lo.
— Eu não preciso da sua ajuda.
Suas sobrancelhas se levantaram. — Você é muito rude, você sabe.
Ele resistiu ao instinto de ficar boquiaberto. — Eu fui nocauteado e amarrado
em uma carruagem estranha.
— Sim, mas você deve admitir que a companhia está desviando, não? — Quando
ele levantou uma sobrancelha, ela disse, — Tudo bem então. Mas me parece que
você está em apuros. — Ela fez uma pausa, depois acrescentou: — Você percebe
como eu posso me divertir? Em uma aventura?
— Eu vejo como você pode ser imprudente.
— Alguns podem me achar encantadora.
— Eu ainda não vi nada encantador, — respondeu ele, perguntando-se o que o
possuía para discutir com essa tagarela.
— Que triste para você, — disse ela, e soou como ela quis dizer isso. — Não
importa. Mesmo que você não admita, você precisa de ajuda e, como você está bem
amarrado e eu sou sua companheira de viagem, receio que você esteja preso a mim.
E então ela estava agachada a seus pés, como se tudo fosse perfeitamente
comum, desatando as cordas com um toque suave e hábil.
— Quem amarrou esses nós não queria que você se libertasse, — disse ela,
como se estivessem discutindo o tempo. — Você tem sorte de eu ser muito boa com
nós.
Ele grunhiu sua aprovação quando ela o libertou. — E você tem outros planos
para o seu aniversário.
Ela hesitou, suas bochechas rosadas com as palavras antes de dar um breve
aceno de cabeça. — Sim.
350
Whit nunca entenderia o que o fez pressionar mais. — Que planos?
Ela olhou para ele, então, com os olhos grandes demais para o rosto, e disse: —
Não tenho certeza se deveria lhe dizer, embora suponha que estaria tudo bem, já que
claramente não corremos nos mesmos círculos.
Ele levantou uma sobrancelha. — Nós corremos neles hoje à noite.
Ela sorriu, calorosa, plena e natural o suficiente para fazer Whit permanecer
concentrado nela. A carruagem começou a desacelerar e ela espiou pela cortina. —
Estamos quase lá, — ela disse baixinho. — É hora de você ir, senhor. Tenho certeza
de que você concordará que nenhum de nós tem interesse em ser descoberto.
— Minhas mãos, — disse ele.
Ela balançou a cabeça. — Eu não posso arriscar que você se vingue.
Ele encontrou seu olhar sem hesitação. — Minha vingança não é um risco. É
uma certeza.
Ela não desviou o olhar. — Eu não tenho dúvidas disso. Mas não posso arriscar
que você faça isso comigo. Não esta noite. — Ela passou por ele para a maçaneta da
porta, falando em seu ouvido, acima do barulho de rodas e cavalos da rua. — Como
eu disse, tenho planos.
Ele se virou para ela, incapaz de resistir ao cheiro de amêndoas vindo dela. Ela
ainda estava inclinada sobre ele, tentadora como o inferno. — Diga-me o plano, e eu
vou deixar você ir.
Aquele sorriso morno voltou a brilhar. — Você é muito arrogante, senhor.
Preciso te lembrar que sou eu quem te deixa ir?
— Diga-me o plano, — disse ele novamente, subitamente desesperado para
ouvi-lo.
Ele viu a mudança nela. Assistiu a hesitação se transformar em bravura. —
Talvez eu deva mostrar a você, em vez disso.
Cristo, sim.
E então, como se tivesse dito em voz alta, ela o beijou, pressionando os lábios
contra os dele, suave e doce e inexperiente e tentadora como o inferno, e Whit teria
feito qualquer coisa para ter suas mãos desamarradas naquele momento, então ele
poderia assumir o controle e mostrar a ela o quão bem ele poderia ajudar a ver seus
planos.
Mas antes que ele pudesse sugerir que fizesse exatamente isso, ela terminou o
beijo, abriu a porta às suas costas e, com um sussurrado — Adeus, — empurrou-o
da carruagem em movimento.

Continua...

351

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