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Cena Lusófona

n.º 3 Dezembro 2004

Rua António José de Almeida n.º 2, 3000 - 040 COIMBRA Portugal t (+351) 239 836 679 f (+351) 239 836 476 | teatro@cenalusofona.pt | www.cenalusofona.pt distribuição gratuita

e r t a
c e n a b o rde l
u m c
com o
ba ia n

ofício
de contar
Cándido Pazó ¶ Ângelo
Torres ¶ Antônio Vieira

VIII Congresso Luso-


-Afro-Brasileiro de Ciên-
cias Sociais ¶ Festival
Gravana
Ofício
Editorial

1. O cordel brasileiro é um filão capaz de ligar mundos, de estabelecer pontes entre


diversos níveis criativos, de recentrar a História com a intrusão de factos, argumentos
e vozes, habitualmente na sombra.

Além do acervo literário, mais ou menos editado e documentado, o movimento do


cordel usa meios expressivos directos e eficazes para comunicar. O perfil do cordelista
é o do escritor/performer, alguém que sabe fazer a síntese, de admirável economia de
meios, entre a palavra, a actuação e a musicalidade.

O baiano Antônio Vieira — convidado pela Cena Lusófona para em Setembro


intervir em Portugal — é o cordelista aqui apresentado. De sua autoria é o cordel
Popó do Maculelê de Santo Amaro, separata editada pela Associação dos Jornalistas e
Homens de Letras do Porto e pela Cena Lusófona, cooperação que saudamos.
No âmbito do projecto “Contadores de
As entrevistas com Cándido Pazó e Ângelo Torres prolongam o esforço que temos
desenvolvido na identificação e na apreensão de várias formas de narrar. Constitui raro Histórias”, a Cena Lusófona convocou três nomes
privilégio poder juntar criadores de diferentes geografias num só evento — o Congresso
Luso-Afro-Brasileiro de Ciências Sociais — e numa mesma edição de cenaberta. importantes da narrativa oral — Ângelo Torres
(São Tomé e Príncipe), Antônio Vieira (Brasil) e
2. Defendemos um conceito de intercâmbio efectivo distinto da ideia muito em
voga de “exportação da cultura portuguesa”. Compreendemos este esforço — defen- Cándido Pazó (Galiza) — para participarem no
sável, em especial, quando dirigido a certos “sectores de topo do mercado”, a grandes
montras internacionais — embora reste saber se essa deve ser toda a fatia ou a cota
maior do esforço de internacionalização. A vocação do intercâmbio implica a existência,
VIII Congresso Luso-Afro-Brasileiro de Ciências
também e muito, de projectos mais longos, mais densos, mais complexos, na busca e
na concretização de parcerias, com os custos inerentes.
Sociais, palco em Coimbra de 16 a 18 de Setembro
Na abordagem do teatro, o intercâmbio deve permitir ganhos recíprocos, reco- de 2004.
nhecendo multiplicidade de formas e pertinências, alargando fronteiras, diversificando
vínculos. Na comunidade de língua portuguesa parece-nos bem mais necessário e Estes criadores animaram uma participada
significativo este caminho.

Promover desta forma o intercâmbio cénico na CPLP é modo consistente de sessão do Congresso (Palácio de S. Marcos, 17 de
integrar o teatro na política de defesa da língua, reconhecê-lo como exercício fulgu-
rante da palavra, catalisador das artes, elo de ligação entre grupos e espectadores de Setembro) e a sua presença entre nós permitiu
países diferentes que têm o privilégio de se entenderem em Português. Incluir o teatro,
priorizar as artes no intercâmbio Lusófono, é potenciar relações, superar — falando e conversa. Viabilizou a escrita agora e aqui pu-
não falando — dificuldades de relacionamento, cá e lá.

O Brasil é o protagonista da nossa língua comum para a era global, o terreno fu-
blicada.
turo da batalha. Como afastar o teatro — e o seu papel no sistema das artes — esse
terreno de aventura e redescoberta? Que curtos horizontes e fracos timoneiros nos
fariam privar de tamanha energia e força agregadora, solidária?

3. Sublinhada tem sido a prioridade portuguesa de intercâmbio com o Brasil. Minis-


tros e responsáveis têm-no repetido nos últimos tempos sem que se retire consequência,
reflexiva, política e orçamental, dessa fórmula preconizada.
Cándido Pazó
A palavra
Com independência de factores conjunturais, é altura de projectar um esboço de
política cultural externa e, no caso da intervenção portuguesa no espaço geo-cultural
da CPLP, elaborar um documento orientador, com uma formulação participada, que
seja expressão de um esforço articulador entre ministérios e institutos do Estado e
destes com a sociedade civil.

Não mais se pode navegar ao sabor dos ventos, das marés.

António Augusto Barros Si he sufrido la sed, el hambre, todo


lo que era mío y resultó ser nada,
si he segado las sombras en silencio,
ficha técnica me queda la palabra.

Director António Augusto Barros Blas de Otero


Redacção Augusto Baptista (coordenação e fotografia), António José Silva, Cátia Faísco e Tiago Boavida in En el principio
Concepção gráfica Ana Rosa Assunção

N.º 3 distribuição gratuita | Tiragem 1500 exemplares | Impressão Tipografia Ediliber


Propriedade
Cena Lusófona . Associação Portuguesa para o Intercâmbio Teatral No sossego de uma moradia do Cándido Pazó (CP) — Penso um dia es-
Rua António José de Almeida, n.º 2 crever sobre este barulho...
3000 - 040 COIMBRA, Portugal
pacato bairro Norton de Matos,
em Coimbra, sala luminosa, olhar cenaberta (ca) — Curioso, ontem um
Tel.: (+351) 239 836 679 motorista de táxi falava-me, com nostalgia, do
Fax.: (+351) 239 836 476 debruçado sobre o novo estádio de
teatro@cenalusofona.pt som da chuva a bater nas telhas da sua velha
http://www.cenalusofona.pt futebol da Académica, a entrevista casa de infância.Ao ouvi-lo, ocorreu-me o ping!
capa Xilogravura: Bando de Teatro Olodum
com Cándido Pazó: momento para ping! da goteira a cair na lata: o soporífero
Alto patrocínio desvendar segredos sobre o ofício dos pobres. Espantosa é a memória sonora, a
de contar, espaço para falar das marca que nos deixam estes sons. Sons; que
não ruídos.
palavras.
CP — Mas o frígorífico...
A abrir a conversa, surpresa rouca, o
ca — O frígorífico é fantasmagórico. Brrrrrrr...
ruído do motor de um frigorífico! Até por estar a fazer uma coisa que, quando se
cenaberta 2
de contar

Augusto Baptista
Cándido Pazó no Palácio de S. Marcos

está sozinho, se tem em excesso: frio.A solidão ca — Para chamar a atenção de quem te vê e bares, locais nocturnos, talvez tenha chegado dir-se-ia em contradição com o universo
é gelada. Como as trevas. Por isso reclamas luz ouve usas como objecto-âncora um escadote. à mesma conclusão. E optou pelo vermelho, académico, o ambiente grave, os grandes
nas tuas intervenções. Luz, para ver os olhos Tu próprio te apresentas com uma camisa ver- cor que, nos anos 50, 60, realmente era um cadeirões do palácio, varandim de pedra im-
do público. melha. Isso é por acaso? bocadinho provocatória. pregnado de monarquia...
CP — Contar histórias é conversar. Pode-se CP — Não, não. Isso tem razão de ser. Quando ca — Sendo que, entretanto, vermelha é a cor CP — A questão é: vou trabalhar contra ou a
conversar às escuras, mas esse é outro tipo comecei a contar histórias, apresentava-me da capa dos toureiros... favor da corrente? As duas hipóteses podem
de conversa. No meu caso, preciso de ver os como calhava. Depois pensei: isto é uma arte CP — E da camisola da selecção nacional de funcionar, mas eu só decidi contar aquilo no
espectadores. É muito importante saber como cénica, é palavra cénica. Palavra natural, pala- futebol. Sempre foi vermelha. Mas, se calhar, no momento em que o António Augusto Barros
reage quem me escuta. vra directa, mas é cénica, a actividade. Então, mundo do espectáculo, não será corrente o estava a fazer a apresentação. Só aí verifiquei
ca — Isso pressupõe também proximidade. eu, portador de signos visuais, vou vestir-me uso do vermelho. Não sei. De qualquer modo, que a desconcentração era muita. Então pen-
CP — O melhor é isso. Mas às vezes não se como? A primeira ideia foi vestir-me de preto, no meu caso, há uma questão visual e um lado sei: há que fazer tratamento de choque, ir ao
consegue.Trabalhei na rádio, contei histórias na por ser uma cor neutra, que acentua a im- de homenagem. Concluindo: a questão da cor contrário, apanhar o pessoal não pelo direito,
televisão. O ideal é estar o mais perto possível portância do rosto, das mãos. É normal, no não é gratuita. Entrar no quarto meia hora pelo avesso.
e ter um auditório não muito grande... Claro, palco, ver músicos e artistas vestidos de preto. antes do espectáculo, tirar a roupa normal, ca — Quer dizer, decidiste tudo à última
enquanto profissional, tanto participas em Mas, como eu actuava muito em bares mal ilu- vestir a camisa vermelha... É como o padre hora?
eventos com sessenta, como com seiscentos minados, comecei a notar que visualmente me quando se prepara para rezar a missa. CP — Já tinha admitido ir por aí, mas só quando
espectadores. perdia. Decidi adoptar o vermelho, também em ca — Ou o toureiro, antes de entrar em assistia à apresentação determinei o caminho.
ca — Nas tuas actuações, verifiquei, tens um homenagem a um cómico espanhol muito im- cena. Eu podia contar a história do Castelao, muito
contacto quase físico com as pessoas. portante, falecido há dois anos: Miguel Gila. CP — Para o toureiro, é uma cerimónia in- bonita, delicada, ir a favor do público. Mas pe-
CP — Depende das condições, do público. ca — Gila? tensa. No meu caso, é só vestir uma camisa. guei numa ementa do jantar e...
Quando há cinquenta espectadores, o con- CP — Miguel Gila era um excelente cómico ca — Mas com carga ritual. Antes dos espectá- ca — ... E começaste de improviso, lendo a
tacto físico não é imperativo: embora a vista e um homem íntegro. Soldado do exército culos, vejo-te circunspecto, às voltas, ar de ementa, introduzindo a história. Isto leva-me
seja já contacto físico. Agora, quando há muita republicano, foi aprisionado e fuzilado, junta- quem sabe que breve vai correr riscos. a supor que tu, homem de texto, do apuro
gente e há o perigo de dispersão, tens de apa- mente com mais 20 ou 30 companheiros. Mas CP — Nesses momentos procuro antecipar da palavra, da depuração narrativa, da escrita!,
nhar os espectadores com a mão, interpelá-los fuzilaram-no mal e, como ele dizia, tinha tão o modo como decorrerá a acção, a possível na vertigem da acção assumes o inesperado,
a meio metro de distância. A vista não chega. pouca importância que ninguém foi verificar reacção do público. O que se vai passar aqui? deixas-te tentar pelo risco.
Tens de lançar cordas, cabos para amarrar o se estava mesmo morto. Gila transformou Esta gente estará com vontade de me escutar? CP — As duas coisas estão intimamente
barco da comunicação. Se permites dispersão, esta história trágica num caso cómico. Ora Como vou fazer? Na minha actuação de ontem relacionadas. Só podes improvisar quando
não podes voltar atrás. ele trabalhava de vermelho e, quando morreu, no palácio de S. Marcos, para os congressistas dispões de uma estrutura firme, conhecida,
ca — Um tanto como no namoro, se há rup- decidi-me por esta cor. do fórum de Ciências Socias, eu tinha várias segura. Aí podes lançar-te à aventura, cruzar
tura é difícil reatar. ca — No caso de Miguel Gila, admito, o ver- histórias na cabeça. Uma falava de Castelao, os mares, sem medo, porque sabes que, se te
CP — É possível, mas requer uma energia es- melho era bandeira. um homem da cultura, da política, referência perderes, tens salvação. No meu caso, quanto
pecial. Muitas vezes uma energia louca. Quando CP — Também. E um modo de individualiza- histórica galega, muito conhecido no mundo mais sei a história, mais improviso. Eu comparo
estamos a recuperar uma relação, como a do ção. Há duas semanas eu estava a trabalhar da Sociologia. E havia outras. Mas qual? Então isto ao jazz: os músicos fazem improvisação,
namoro, fazemos muitas parvoíces. Também no fórum de Barcelona, partilhando o palco eu estive a observar e, já que estamos numa mas conhecem muito bem a estrutura. Não
quando se está a contar uma história e se com um grupo de flamenco, todo vestido de de toureio, perguntava-me, vou sair à praça e inventam.
rompe a relação, no desespero, podes fazer preto. Se me apresentasse de preto, não me como vou lidar? ca — Neste jogo, não corres o risco de um dia
disparates, dizer coisas parvas. distinguiria. Ora Gila, que trabalhou muito em ca — Foste atrevido. Escolheste uma história meteres os pés pelas mãos, te baralhares?

cenaberta 3
CP — Tenho, digamos, uma marca própria. com a actualidade galega, espanhola e mundial. CP — Eu trabalho muito na Galiza e em toda Superior de Música e Artes do Espectáculo),
Saio do caminho principal, entro em vias Mas isto não é algo que eu tenha de reflectir a Espanha, sobretudo a Norte. E todos os anos, no Porto. Isto é uma via. A outra é a Cena
secundárias, mas sinalizei o ponto de saída. E muito na hora de contar. Também não tenho ou de dois em dois anos, vou à Venezuela, Ar- Lusófona, a partir da ida a São Tomé e Príncipe.
assim não me perco. Estou a dizer, sei lá, Então a intenção... Eu gosto de contar histórias... A gentina, Colômbia. E agora vou ao Chile. Para Enfim, aos poucos e como uma mancha de
o homem ia no autocarro... Nesta altura, posso que contei ontem no Palácio de S. Marcos é além do espaço hispânico, tenho também o óleo, vais alastrando...
improvisar uma qualquer outra situação. Na um bom exemplo. espaço da lusofonia... Estou, como nós dizemos ca — Isso significa boas perspectivas para as
minha cabeça sinalizei a palavra autocarro e, ca — A história corrosiva de um peido, con- na Galiza, escarrachado, uma perna aqui e outra histórias, para os contadores, para a palavra?
na hora de voltar ao fluxo narrativo principal, tada a académicos, cientistas sociais... lá. Sinto-me natural dos dois mundos. CP — Se a pergunta me fosse feita há uns
retomo Neste autocarro... CP — Numa cota elementar de recepção, esta ca — Nos países de Língua Portuguesa, para anos, não saberia responder. Hoje, vendo que
ca — Até chegares ao apuro de recursos e é simplesmente a história de um peido e suas além de Portugal, estiveste onde? cada vez mais se estruturam os circuitos,
truques, há um trajecto; que começa quando consequências. Mas ali reivindico a memória, CP — São Tomé e Príncipe. cada vez mais se abrem caminhos, crescem
e como? falo de emigração, do desenraízamento, do re- ca — E como correram aí as coisas? os contratantes, estou optimista. Tal qual Blas
CP — Sou um homem de teatro. A partir torno, do reencontro com uma nova paisagem, CP — Houve duas actuações. A primeira foi de Otero, poeta social espanhol, acredito na
de 1989, já escrevia teatro, fazia encenações. outra realidade... Mesmo assim, num momento num imenssíssimo cinema em São Tomé.Aí foi palavra: último reduto, abrigo, barricada. A fas-
Depois, sempre fui um conversador. Gostava dado, achei que a história terminava com pouca difícil. A palavra tem a sua dimensão. É muito cinante matéria-prima com que trabalho.
de contar histórias, sem o mínimo projecto consistência. Foi quando inventei o estrambote potente, mas é frágil. Não pode ser levada a
profissional, sem sequer saber que havia essa final, o remate, concluindo que somos todos um teatro de mil lugares, sem apoio sonoro,
possibilidade. Quando o Quico Cadaval estava muito parecidos nas coisas de cagar, mas temos sem ambiente, com gente a entrar e a sair. Cándido Pazó
a trabalhar em Madrid, encontrou muitos sul- de passar a ser mais iguais nas coisas de comer. A segunda foi no Príncipe. Ali o espaço era perfil breve
-americanos contadores de histórias, nomeada- Confesso que fiquei muito satisfeito por ter apropriado e o público, para além de pessoas candidopazo@tiscali.es
mente columbianos (na Colômbia, cuentero é sido capaz de dar sentido a toda aquela festa da terra, diversificado: brasileiros, angolanos,
uma profissão normal, reconhecida). O Quico da palavra, do humor. portugueses, guineenses... Havia muita gente Nasceu em Vigo, 1960, reside em
gostou daquilo, voltou para a Galiza e montou ca — A história chama-se? e correu muito bem, com comunicação. Santiago de Compostela, Galiza.
o espectáculo Falar por falar. O sucesso foi CP — O peido de Abelardo, o Caruncho. ca — Achas que estas experiências da Cena Formação universitária na área da
grande, o que o levou a pensar numa dinâmica ca — Pelo que percebi, as tuas histórias são introduzem mais-valia no teu trabalho? Filologia Galego-Portuguesa. Contador
contista na Galiza. Desafiou-me e, um dia, no uma espécie de acordeão que esticas mais ou CP — Tudo é um somatório. A primeira vez de Histórias. Actor (Teatro de Adro e
final de um espectáculo, chamou-me ao palco menos, conforme a música que queres tocar. que actuei em Portugal foi aqui em Coimbra Ollomoltranvia). Dramaturgo,
para eu contar uma história. Foi o começo. E te reclamam. num evento chamado Os contos outrora, agora, publicou: O melro branco; Raiñas de Pe-
Hoje trabalho mais a contar histórias do que CP — Por vezes tens de fazer a música que uma espécie de congresso sobre a narrativa dra; Commedia, un xoguete para Goldoni;
no teatro. Embora continue a fazer teatro, a o público pede, sem o saber. Isto passa-se oral, os velhos contos populares. Era um con- O bululu do linier; Ñiqui-Ñaque; O Rei
escrever. muito nas escolas do ensino secundário. Tens texto muito universitário. Depois fui solicitado Nu.
ca — Esta primeira intervenção pela mão do de conquistar esse público jovem, de 15, 16, pela Universidade do Minho. As coisas cor-
Quico Cadaval foi onde? 17 anos, dando-lhe coisas que parecem não reram bem e agora, desde há dois anos, dirijo
CP — Em Santiago de Compostela, no ano lhe interessar: a beleza da palavra, o humor uma acção de formação no ESMAE (Escola
de 1996. Depois, durante muito tempo, fiz aí inteligente. Daí a conclusão de que se pode
a estreia de novas histórias, apresentei novas trabalhar a favor do público, mas nunca su-
estruturas, apurei caminhos, formas, ritmos. perficialmente. Há que ir além das aparências,

Augusto Baptista
As histórias não podem ser, como no teatro, sondar em profundidade.
ensaiadas dentro de portas. Tudo tem de ser ca — Naquilo a que se pode chamar a
provado com o público. Normalmente fazia tua bagagem profissional, carregas quantas
isso num bar de Santiago. histórias?
ca — Onde levavas e colhias histórias. CP — Umas trinta. Mas trinta histórias
CP — Muitas verídicas, em redor da guerra, modulares. Quer dizer, histórias compostas
seus horrores e cicatrizes. Como a de uma por módulos intercambiáveis. Eu tenho um
senhora idosa, que, na década de 60, ia a casa módulo que faz parte desta história, mas que
de velhos falangistas, à hora da morte. Eles na me faz falta noutra, por razões determinadas:
agonia, com padre, mulheres a rezar, homens transfiro.
ao alto, ela entrava vestida de preto, pesarosa, ca — É um puzzle que constróis às vezes
ia à cabeceira do moribundo, ao ouvido, Tu mesmo na hora, no acto de contar?
mataste fulano, em tal sítio. Mataste mais não CP — Sim. Por exemplo, estou a contar a
sei quem, além. Mataste... Isto na justa hora em história delicada de alguém que leva um ramo
que o homem ia prestar contas ao Altíssimo! de flores à amada. Chegado aqui, noto que
Morriam no mais absoluto retorcimento. preciso de mais energia para captar o público
ca — Esta é uma história forte, a suscitar e poder continuar. Recorro então à história de
muita narrativa. um fulano ecologista que levava flores à namo-
CP — Claro, tu podes recriar a história des- rada, mas que as apanhava no cemitério, flores
ta velha, alongá-la, dizeres que ela tinha uma de enterro, que ele assim reciclava. O público ri,
cabra, uma chibinha, construir um caminho, está reposta a energia, posso continuar.
decidir um final. Mas, para chegar a um resul- ca — Uma das tuas preocupações é o ritmo.
tado, necessito de um público cúmplice que CP — O ritmo energético.
me permita testar soluções. E isto não pode ca — Mas, na história do Abelardo que ontem
ser feito em qualquer lugar, com um público contaste, o registo narrativo foi sempre muito
qualquer. intenso, agressivo.
ca — Este caso, que ainda estou a digerir, CP — Ontem, se quiseres, foi especial. Foi um
atravessado pelo universo cruel da guerra, bocado eléctrico. E foi assim por ter concluído
permite construir histórias que abanam con- que, naquele contexto, se eu não fosse eléc-
sciências, desvendar os alicerces da Galiza, trico aquilo perdia-se. Não tem de ser sempre
as contradições. Isto significa dizer que tens assim, nem sempre é assim. Desejável é que
grande margem de intervenção ideológica. a narrativa seja como num bolo: com creme,
CP — Eu e o Quico somos filhos do que nozes, biscoito... Há que misturar. Num ambi-
chamam em Espanha Teatro Independente, ente normal, devem-se criar contrastes, falar
iniciado nos anos 60, 70, em contestação ao baixinho e tal. Talvez me tenha enganado, mas
teatro comercial que se fazia então em Madrid ontem achei que precisava de rédea curta. O
ou Barcelona. O Teatro Independente assumia- público não me conhecia e, quando é assim,
-se contra a ditadura, a favor da amnistia dos é ele o dono do ritmo e do tempo. Nestas
presos políticos, da liberdade. Esta herança condições, não navegas, é o mar que te leva.
estruturou a nossa forma de ser e de fazer. ca — As tuas actuações estão centradas na
Sou um homem de esquerda, preocupado Galiza?

cenaberta 4
Ângelo Torres
Histórias só com a voz

Augusto Baptista
Nasceu na Guiné Equatorial, cresceu
em São Tomé e Príncipe, foi estudar
para Cuba e acabou por pousar as
malas em Portugal. Aqui descobriu
o teatro e o mundo dos contos. As
histórias com que hipnotiza o público
foram em grande parte herdadas do
baú da avó. Da sua velha avó, que pro-
metia uma história, depois de todos
os meninos da aldeia terem tomado
banho. Verdade? Ficção? Senhores e
senhoras, Ângelo Torres…

Com um sorriso de menino que nos vai pregar


uma partida, Ângelo Torres contou — num dia
de muito Sol — como aterrou no mundo dos
contadores de histórias. Finalista do Conser-
vatório de Teatro em Lisboa, desistiu, mudou-
-se para um curso de Artes e Ofícios Circenses,
no Chapitô. Quando terminou os estudos ini-
ciava-se um evento chamado “Sonhar África”.
Nesse ano, 1994, o país homenageado era
São Tomé e Príncipe. Convidado a participar,
Ângelo decidiu contar histórias: «O António
Fontinha estava lá e viu-me. Em Outubro, con-
venceu-me a ir contar histórias para as escolas,
num projecto chamado Multicultura». Nesse
mês propuseram o projecto a escolas de Lis-
boa com uma grande população luso-africana.
Duas aceitaram. Em Maio, as duas passaram a
dezoito e, no ano seguinte, novo salto.
Durante a infância todos nós ouvimos
histórias. Esse ritual era concebido para ador-
mecer crianças irrequietas ou, muitas vezes,
para transmitir lições de vida. À medida que
fomos crescendo, essas histórias começaram
a desaparecer e ganharam novas tonalidades
e formas, através de pequenos relatos do quo-
tidiano que nos fazem sorrir ou torcer o nariz,
numa mesa de café ou naquelas noites em que
a lua vai alta e os ouvidos estão atentos.
Os contadores de histórias são a hipótese de
um regresso a um universo que se julgava per-
dido e que nos devolve cheiros e tons antigos,
apagados na nossa rotina. Através dos contos, perceber, visualizar. dela terá a ver com a sua educação, as suas profissionalismo por agir assim. Numa atitude
Ângelo Torres descobriu o poder mágico da Apesar desta busca, para quem acompanha crenças… Mas, para mim, o essencial é a de desprendimento diz que não vale a pena
palavra: «Houve momentos em que senti, se Ângelo Torres a contar histórias impossível mensagem do conto». perder tempo a autoflagelar-se: «Nascemos
parasse, as pessoas iam chorar e pedir para que é ouvir-lhe só a voz. Os olhos crescem-lhe Há alturas em que sente não conseguir passar para ser felizes».
eu continuasse». Toda a força tem em si uma quando o vilão da história se aproxima do essa mensagem e precisa de se explicar ao
fraqueza. «Mas também já tive a sensação de herói, as mãos acompanham o ritmo do cavalo público. Para exemplificar, refere a recente Ângelo Torres
que se me calasse e me fosse embora, ninguém com que o príncipe corre pela planície, o corpo apresentação no Congresso Luso-Afro- perfil breve
ia reparar que tinha estado ali». curva-se para dizer velha senhora e são todos -Brasileiro, no Palácio de S. Marcos, perto de acuario@netc.pt
Ângelo é um contador que busca a perfeição estes ingredientes que também nos prendem. Coimbra: «Nesse dia enganei-me, interrompi
o aplauso das pessoas. Teria sido uma grande Nasceu em 1969 na Guiné Equato-
em cada sessão. Para ele, o ideal muitas vezes No entanto, não encara isto como um elogio:
rial, reside em Lisboa. Contador de
é o contrário daquilo que acaba por fazer. Ou «Muitas vezes as pessoas vêem mais do que seca e aplaudiram para que eu me calasse? Ou
Histórias. Actor. Integrou os filmes:
seja, a perfeição será atingida, diz, no dia em ouvem e eu creio que assim não se passa o teriam mesmo percebido aquilo que eu queria
“Tudo isto é Fado”, “Nha Fala” e “Preto
que conseguir narrar só com a voz. Sem se objectivo do conto». E qual é o verdadeiro dizer? Interrompi o aplauso e estraguei um
e Branco”. Fez parte do elenco das
apoiar no gesto ou no corpo. Quando alcan- objectivo do conto? Ângelo confessa ser algo momento mágico».
peças: “A Varanda de Frangipani”; “Mar
çar, através da modelação da voz, intensidade, muito pessoal e que varia de contador para Nos dias em que a narrativa não corre tão Me Quer”; “Sorrisos de Bergman”.
densidade, mistério, receio, ironia. Levar o contador: «Todo o conto tem uma mensagem bem, Ângelo Torres faz por não pensar nisso. Eleito em Portugal Shooting Star (actor
público, mesmo de olhos fechados, a sentir, e a maneira como um contador se apropria Confessa que há quem o acuse de falta de revelação) 2004.
cenaberta 5
Antônio Vieira usa chapéu: na ca- «uma senhora contadeira de histórias, branca, Na porta, faziam fila motivação lembrou-se das bandas»:
beça e no nome. O circunflexo é cabelo comprido, tipo uma portuguesa, E ela dizendo: — Me coma! — Me diga, você torce por qual banda?
coisa de registo; o adereço capital é magrinha». Terça armas ao lado de Oliveiros — Doutor, eu gosto das duas.
e Roldão, às ordens de Carlos Magno. Se Não era de meretrício — Um homem tem de se decidir!
opção de artista, marca de criador
arrepia com «caso de bichos, histórias mal Morava numa casinha — Gosto da Lira...
de cordel de tipo novo — remoçado, assombradas, fantasmas e reis». Atrás de uma avenida — Tragam o chicote cinza! — ordenou
diz —, que propõe pensar lógico, Na escola, «todo o mundo contava coi- Porta de frente pra linha o delegado. «E meteram o chicote cinza no
transformar. sas, como prática normal, recreativa. Histórias Tinha o olhar meloso meio da sova».
decoradas, de lobisomem e tal, às vezes em Um trejeito apetitoso — Doutor, eu torço por Apolo!
Mordeu a pedra. À volta, todos, que verso». Entre o jantar e a deita, «era jogar Era do tipo galinha — Tragam o chicote caqui!
poucos eram, suspensos no alvitre. Ouro! pião, fabricar carrinho, correr picula, que é o — Eu torço pelas duas, doutor!
— assegurou Pedrão, garimpeiro velho. E no procura-procura», jogo das escondidas, como Repara em Popó do Maculelê «guiando — Juntem os dois!
lugar donde esta veio, tem muitas! Logo abraços, em Portugal se diz. trole puxado a burro, que trazia as bagagens Caso verídico? «Eu já peguei o bonde
implosão de alegria, júbilo amordaçado: para
não despertar suspeita.
Um caso nascido de acasos. Primeiro a ida
da pequena equipa de topografia para o cu de

Antônio Vieira
Judas, demarcar terrenos. Depois o mergulho
à tardinha do agrimensor no rio, a pepita no
fundo. A reluzir. Ouro! E no lugar donde esta
veio, tem muitas!
Valeu a pena demandar Araguaína, con-

Augusto Baptista
tactar Pedrão, logo logo companheiro de
agrimensores rendidos ao garimpo, ouro
fácil, à superfície. Missão a enricar, no rio não
tardou a companhia do dono da fazenda, dos
donos das fazendas. E outros. Muitos. Mais,
mais.Vindos cada vez de mais longe.
Nascia o garimpo na Serra Pelada!
Antônio Vieira conhece em detalhe a
febre do ouro que fez arder o Brasil na
década de 80: jornalistas, médicos, intelectuais,
vaqueiros, burocratas, operários, deserdados,
marginais, caldo humano a borbulhar na cra-
tera, goelas esgalgadas a engolir a turba. Fez
cordel:

Os barrancos desabavam
Só via gente morrendo
Ou ficavam soterrados
Ou escapavam fedendo
Alguns ficavam pra sempre
Traumatizados, doentes
Do garimpo maldizendo.

Aprendeu casos de gente que bamburrava


eufórica, atraindo pistolagem. Soube de muito
garimpeiro morto, por não vender pepita ao
governo. Apurou números: «A produção
acumulada de Serra Pelada até Setembro de
1984 foi da ordem de trinta e três toneladas
de ouro.» Catou e guardou histórias, sem
cair na tentação do garimpo: «O meu ouro
era outro».

Várias classes de pessoas


O garimpo faz nascer
Prostitutas, pistoleiros Crescendo, aos 13 anos aprende violão. E dos passageiros do cais do porto (no Conde) andando» — assegura. «Isto foi-me con-
Quem rouba para viver histórias da História. Pasma com as pregações para o centro da cidade». Retém os ecos da tado pela minha família». O real e a ficção:
Garimpeiro bamburrava de António Conselheiro em 1889, «o Bom fantástica epopeia do capoeirista Besouro, dois chicotes. Neste entrosado, António se
O ladrão o tocaiava Jesus prometendo montanhas de cuscus morto mas nunca vencido, «nome manchado fez homem, temperou ideias, descobriu o
Só sorte para não morrer! e rios de leite para todos». Um caso que proposital e preconceituosamente pela tarja lado que lhe estava reservado na barricada
poucos conhecem, lamenta: «Conselheiro e da marginalidade». social.
No garimpo, a crueldade a sua gente se instalaram numa fazenda aban- Atreve-se nas primeiras quadras, caligra-
É coisa de assustar donada na região que hoje se chama Monte fia indecisa em papel de embrulho, relato do Semear consciência
Não se tem dó de ninguém Santo, fundaram a povoação de Canudos. Os caso de um enfermeiro, que — diariamente Um dia, a vida empurra-o para fora de
Não adianta gritar fazendeiros, sem mão-de-obra, pressionaram e por mais dum ano — vê correr para aplicar Santo Amaro, joga-o para o imenso Brasil.
Triste de quem adoece as autoridades para acabar com aquilo». Os injecção numa moça, «doente com uma gripe, Anos de andanças, mais de vinte: Feira de
Se for pra morrer falece ataques foram todos repelidos. «Até que, após muito bonita». Ufano, mostra a criação aos Santana, Goiás, Brasília, Imperatriz do Ma-
Só Deus lhe pode salvar. três anos de guerra, o Ministro do Exército à catraios mais velhos: «Incinere isso, rapaz! ranhão... E, enfim, regresso recente a chão
frente das tropas arrasou Canudos — 20 mil Você é maluco?!». baiano: Salvador.
Me coma! mortos: homens, mulheres e crianças». Se Antônio tendia para a malandragem Nesta peregrinação, estuda, serve o
Antônio Vieira nasce na heróica e bene- Na vida, aprende Feliça, «a prostituta que nas letras, também Santo Amaro fervia de exército, tira curso técnico de agro-pecuária,
mérita cidade de Santo Amaro da Purificação, ensinou uma geração inteira»: samango, mariola «a emprenhar vizinha». E constitui família. Nos quadros do Ministério
no estado da Bahia, em 1949. Filho mais velho outros casos. Conta que na cidade havia (e há) da Agricultura, entre outros afazeres, «acom-
de uma prole de seis, cedo histórias, casos, O rapaz vinha de longe duas bandas de música, rivais: a Lira (uniforme panhei o assentamento de populações nas
dramas, lhe preenchem a vida. Para comer a negona cinza e vermelho) e a Apolo (uniforme caqui zonas rurais». Explica: No tempo do governo
Desde menino, na venda do pai, escuta Um saía outro entrava — verde claro — e vermelho). «Pois uma militar, houve uma reforma agrária, «de cima
narrativas. Conhece Ferrabrás, irmão de Flo- Ela deitada, abertona vez, preso um sujeito sem qualquer razão, para baixo, de Brasília para o campo». Foram
ripes e filho de Balaão, pela voz de Donata, Os meninos de família o delegado queria dar surra nele. À falta de distribuídas terras, «fazendeiros, os antigos
cenaberta 6
posseiros, a disputarem solo fértil, nas mar- dos Bush da vida. E o Brasil aceitou isso».
gens dos rios; nos outros lugares ficava gente
sem terra, vinda da cidade». O cordel ao poder!
Antônio integrava uma equipa técnica Outras vocações atribui Antônio ao Café com cordel
«de vistoria e preenchimento de laudos das cordel. Ao seu cordel. Rodeia o assunto,
propriedades, que acompanhava a subdivisão dá voltas, conta a história do cientista que Ano quatro de dois mil,
da terra e o assentamento das pessoas». O chamou um barqueiro para atravessar um Vinte, rigorosamente,
epicentro do sismo! «Nesse processo se rio. Na viagem, para avaliar o grau de conhe-
Do nono mês que é Setembro,
geram corrupções, invasões, pistolagem, um cimentos do remador, o cientista multiplicou-
camarada ocupa uma terra, tem direito à -se em perguntas: Sabe Matemática? Biologia? Surgiu, esteve presente
vizinha, aí manda assassinar o cidadão para Astrofísica? Termodinâmica? No bonito Santa Cruz,
poder...». A selva! Também geografia privile- A cada pergunta, ouviu um não de res- Café vetusto, de truz,
giada para caçar histórias, coleccionar casos, posta. E, para cada não, o sábio judiciava:
Cordelista competente.

Cordel novo
Antônio de nome próprio
Vieira de apelido
Fez Coimbra vir à Baixa
Para escutar o sonido
De poema de eleição
conhecer os homens, a sociedade: «A história — Pois é, perdeu um percentual impor- Com fundo de violão
dos menos favorecidos sempre me chamou a tante da sua vida.
E muito aplauso batido.
atenção. Sempre quis compreender o porquê Às tantas, arma-se uma tempestade, o
das diferenças sociais». barqueiro inquire:
A terra e o gado, a causa agrícola, abrem- — Sabe nadar, doutor? Não! Então, vai De chapéu claro na cuca
-lhe horizontes, mostram-lhe o Brasil social, perder a vida toda já! Apresentou-se o bacano
visto de baixo. Desvendam-lhe espaços. «Nessa hora — adianta Antônio — não
Extasia diante de Alto Paraíso, «uma das interessa o nome da capital da Hungria, ou da
Que é cordelista afamado
regiões mais lindas do mundo». Conhece Rússia. O importante é saber nadar!». Remata: Do Recôncavo baiano
Pedro Afonso, cidade entre os rios Sono e «Com o cordel o que queremos é mostrar E falou de Santo Amaro,
Tocantins, a sua fauna: «Dá peixe de 100 qui- esta realidade e ensinar a nadar, a raciocinar. De Feliça, trato caro,
los, o Filhote, por exemplo, peixe de couro». Propor cidadania, integrar. Daí a razão do
Ronda Serra Pelada, o garimpo. Trabalha cordel remoçado. O cordel tradicional ele é Besouro e de mais fulano.
na Transamazónica «estrada que pega de lúdico, engraçado, mas neste ponto é inóquo.
Brasília, em Goiás, atravessa Tocantins, Pará, Não influi nem contribui. Nas entrelinhas de Alta andava a noite já
Amazonas». nossos versos, a gente coloca essa questão da
Houve enfim que terminar
Por onde passa, aprende: «Enquanto os necessidade de pensar. Pensar lógico».
outros iam para um simples serviço, eu fazia Desempenho que atribui ao cordel é tam- Para desgosto de todos
pesquisa sócio-económica por minha conta. bém salvar do esquecimento «os momentos, Meninas em particular
Fui anotando, ouvindo termos, conceitos, gestos, os mil modos como o povo, as popula- Que eram muitas, bonitonas,
sacando comportamentos». Contacta popu- ções e seus heróis intervieram no curso dos
lações índias, interpela gente andarilha em acontecimentos e na formação do Brasil». A
Olhos grandes, azeitonas,
busca de uma vida melhor. propósito assinala que, na História oficial, os E negrinha a atasanar.
«Autómato no emprego, autónomo na protagonistas, os agentes das transformações
parte literária», ganha lastro cultural, colhe são os generais. E o povo? «Um general não E quando todo o mundo alçou
experiência humana. E decide semear cons- ganha uma guerra sozinho. Também, parale-
ciência. Opta pelo cordel: «Por ser veículo lamente às macro-acções, uma multidão de Deste café com cordel
ideal para transmitir mensagens, popularizar actos influencia sobremaneira o processo». O baiano encantador
a cultura, deselitizar o saber». Denunciar: Daí a urgência, através do cordel, «de cantar Foi amarrar o tropel
«No Maranhão, o minério de ferro passa em o povo e a actuação popular, repor verdade
Posto que copofonia
composições quilométricas puxadas por um na avaliação histórica».
trem e o povo não sabe a origem nem o des- A par da exaltação do herói colectivo, Rima com lusofonia
tino daquilo. Fica tipo espectador de quadra «função do poeta é o resgate, o evidencia- Só na trova, no papel.
de ténis. O interesse da minha literatura é mento de certas acções e indivíduos, como
difundir informações, ainda que diluídas em Besouro de Santo Amaro, que reagiu com
água com açucar, só a manchete, mas que o pernada, valentia, à proibição oficial de jogar
povo saiba que o minério está a ser tirado de
Augusto Baptista

capoeira. E lembrar grandes nomes, exemplos


Carajás, um dos grandes celeiros de ferro do que o povo precisa conhecer. Multiplicar os
mundo, para o Japão. Se alguém quiser saber Albert Schweitzer da vida, as Madres Terezas
mais, que vá buscar». de Calcutá».
Demora-se em referências à incon- Perante tanta tarefa, tanta necessidade de
tornável superficialidade do cordel, embora multiplicação, de milagre, tempero, apetece
momento de possíveis indagações ulteriores: perguntar, sem lirismo, o que pode a Donata,
«O que escrevo no cordel é uma sinaliza- o Popó do Maculelê, a Feliça, Lâmpião, Be-
ção para o aprofundamento. Quem quiser souro, o que podem eles juntos na inversão
permanecer só no conhecimento do cordel, do curso das coisas, agregar, humanizar? O
tem um princípio necessário para o consumo. que pode o cordel na transformação do
Aquele que quiser aprofundar — a posição mundo?
social dos protagonistas, o ambiente... «Veja bem» — diz-me Antônio, no seu
— pode fazê-lo». jeito pausado e sereno de contar história.
No cordel “Se a ferrovia traz progresso, «Veja bem, neste caso, o cordel seria aquele
porquê o trem parou?” freme a indignação: passarinho que estava com o bico pegando
«Nós temos 20 mil quilómetros de estrada água para apagar o incêndio. E os outros
de ferro e de repente sucatearam, arruinaram animais da floresta lhe disseram: Então você
estações, arrancaram os trilhos em algumas quer apagar o fogo assim?! E o passarinho,
cidades, fizeram avenidas. Porquê, se estão sem interromper o trabalho: Estou fazendo
fazendo o metro em Salvador?». Logo a res- a minha parte!»
posta: «O comboio foi desmantelado prepo-
sitadamente em função da Shell, em função antoniovieira.cordel@ig.com.br Santa Cruz: Cena no Café com Antônio Vieira

cenaberta 7
> cenas breves
Companhia do Feijão
apresenta “Mire Veja”
O Bando, 30 anos Cena Só estreia
“O Sistema”
ordem social injusta».
A cantora paulista Cida Moreira assina a banda sonora
Ao registar trinta anos de percurso, o
A Companhia do Feijão apresentou durante o mês de No- Cena Só, grupo de teatro sãotomense, estreou “O Sistema” d”O Assalto”.
Bando ofereceu-nos uma bela prenda
vembro, em São Paulo, cidade-sede do grupo, o espectáculo no Festival Gravana que decorreu entre os dias 20 e 29 de
“Mire Veja”.
organizando em quatro dias de Outubro
Agosto, em São Tomé. A peça resulta de um trabalho colec-
“Mire Veja” estreou em 2003 no Festival de Curitiba e (15 a 18) umas “jornadas retrospectivas tivo, com encenação de Ayres Major, e aborda o submundo
resulta de uma adaptação livre da obra “Eles Eram Muitos e de reflexão” que encheram de estu- dos esquemas que atravessa a sociedade. “Para Além do
dantes, críticos, professores de teatro e
Cavalos”, do escritor mineiro Luíz Ruffato. «São 24 histórias
curtas, fragmentadas e entrelaçadas, que falam da vida na teatreiros vários as acolhedoras instala-
Entretanto,“Pedro Andrade, a Tartaruga e o Gigante”, ante-
rior produção do grupo, itinerou pelas povoações de S. João
Tejo” pelo Teatro
metrópole de S. Paulo». Nesse ano foi prémio da APCA
(Associação Paulista de Críticos de Arte) para Melhor
ções da sua quinta em Palmela.
Nesses quatro dias o Bando propor-
dos Angolares e Neves, na ilha de São Tomé.
Meridional
“Para Além do Tejo”, espectáculo con-
Espectáculo e Prémio Shell na Categoria Especial. cionou a apresentação de seis dos seus cenaso@hotmail.com
cebido para o Festival Percursos 2004
Paralelamente a esta produção, a companhia mantém em espectáculos, Gente Feliz com Lágrimas
circulação “Reis da Fumaça”, uma performance de rua pelo Teatro Meridional, esteve no Teatro
(2002), Os Anjos (2002), Ensaio sobre da Garagem, em Lisboa, entre os dias 28
inspirada na cultura popular brasileira. No seu repertório
a Cegueira (2004), Horas do Diabo Os Fidalgos adaptam
constam ainda “O Ó da Viragem”, “Antigo 1850”, “Movido Abdulai Sila de Outubro e 28 de Novembro.
(2004), Alma Grande (2003) e Amanhã A criação deste projecto no âmbito do
a Feijão” e “Julgamento do Filhote de Elefante”. Os Fidalgos, grupo de teatro guineense, estrearam “Mistida”,
(1990) que serviram de mote a outras Percursos – Festival Europeu de Artes
Nascida em 1998 a Companhia tem-se dedicado à «pes- de Abdulai Sila, no dia 30 de Outubro, em Bissau.
quisa de linguagens cénicas baseadas no trabalho do actor
tantas discussões sobre os textos, os do Espectáculo para um Público Jovem
Com este trabalho, baseado em dois capítulos do romance
e aborda predominantemente temas brasileiros a partir processos de criação e a recepção de do escritor guineense Abdulai Sila, publicado em 1997, Os – promovido pelo Centro de Pedagogia e
de obras literárias, trabalho de campo e documentos cada um deles. Fidalgos, pela voz de Amélia da Silva, pretendem «mostrar Animação do Centro Cultural de Belém,
históricos». A estas discussões somou-se ainda um que cada um tem a sua mistida, um assunto muito importante assentou, segundo Miguel Seabra e Na-
conjunto de debates temáticos:“O colec- na vida para resolver, seja onde for». tália Luíza, responsáveis pelo espectáculo,
www.companhiadofeijao.com.br tivo como opção política”,“dinâmica das Nas palavras do autor, que escreveu ainda “Eterna Paixão” «na procura de um trabalho de explora-
imprensa@companhiadofeijao.com.br relações com as populações”,“implanta- e “A Última Tragédia”, “Mistida” significa amor, demanda
ção de linguagem gestual, visando tornar
ção na comunidade”, “a consciência do interior que nos impele à sua procura.
expressivo um universo que identificasse
actor em cena”, “O Bando no contexto A direcção artística do espectáculo está a cargo de Amélia
o Alentejo».
Pia Fraus em digressão com “Bichos artístico português”, “O Bando no con- da Silva, Jorge Biague e Musa Camará, com o apoio de
do Brasil” Andrzej Kowalski. O percurso do “Para Além do Tejo”
texto teatral internacional”, “espaços começou em Outubro de 2003 e es-
Pia Fraus, companhia de teatro de São Paulo, Brasil, está Paralelamente a esta estreia, Os Fidalgos preparam a re-
cénicos e espaços sonoros”, “métodos treou no dia 9 de Outubro deste ano,
em digressão com “Bichos do Brasil”. A peça, da autoria de montagem do espectáculo “O Lutador”, uma co-produção
Beto Andretta e Beto Lima, tem no elenco quatro actores e
e multiplicidade de linguagens (texto, dra- paralelamente à exposição fotográfica
do grupo com a Cena Lusófona estreada em 2002 e
mais de cinquenta bonecos concebidos especialmente para maturgia e encenação, experimentação e “Tempos e Modos na Planície Alente-
apresentada no ano passado em Coimbra no programa
o espectáculo, a partir de elementos naturais. cruzamentos disciplinares)”. da Estação. jana” e ao lançamento do livro “Diários
Segundo o site oficial do grupo, “Bichos do Brasil”, actual- Nestes debates participaram nomes de Um Percurso”.
mente em São Paulo, é um «espectáculo que busca a riqueza como João Brites, Idalina Conde, Eu- amejo2002@yahoo.com
da fauna brasileira através de recursos plásticos». génia Vasques, Ana Pais, Nuno Porto, www.teatromerional.net
Pia Fraus estreou a produção desta peça em Maio de 2001 Hélia Correia, Maria Helena Serôdio,

Augusto Baptista
teatromeridional@teatromeridional.net
na cidade de São Paulo e, desde então, tem sido premiada Clara Crabbé Rocha, António Pinto
várias vezes. Ribeiro, George Banu, Amauri Tangará e

Teatro Meridional
Apostando em diversas áreas artísticas (teatro, dança, circo, Massimo Marino. A Cena Lusófona par-
teatro de bonecos e de máscaras), o grupo mantém ainda
ticipou também com um depoimento
em repertório os espectáculos:“A Lenda do Guaraná”,“Flor
sobre o trabalho do Bando no contexto
de Obsessão” (que esteve em Portugal em 1999), “Farsa
da CPLP.
Quixotesca”, “Navegadores” e “Gigantes do Ar”.
Com este encontro o Bando pretende
www.piafraus.com estabelecer uma forma própria de ce-
piafraus@piafraus.com.br lebrar um aniversário tão significativo.
Através de um olhar interno de revisão
de métodos e de processos e de um con-
Gabriel Villela encena vite ao olhar externo sobre os efeitos
na Seiva Trupe vários sociais, culturais e propriamente
Seiva Trupe, companhia de teatro com mais trinta anos de artísticos dos seus trabalhos, o Bando
carreira, levou a cena “Quarteto/Relações Perigosas”, de mostrou-se como é, um lugar único e
Heiner Müller, de 30 de Setembro a 17 de Outubro, no imprescindível do nosso panorama cul-
Teatro do Campo Alegre, na cidade do Porto.
tural, um lugar da prática e da reflexão, Luiz Paulo Vasconcellos “O Túnel dos Ratos” no II Encontro
A peça foi encenada pelo brasileiro Gabriel Villela, que,
um lugar (agora tão bem concretizado no encena “O Assalto” de Teatro Ibérico
em 2001, passou por Portugal com Galpão (companhia de
teatro de Minas Gerais) para apresentar “Romeu e Julieta”,
espaço físico de Palmela) de aproximação Luiz Paulo Vasconcellos, actor e encenador gaúcho, dirigiu O Centro Dramático de Évora (CENDREV) estreou em
de William Shakespeare, espectáculo de rua em que assinava e de encontro teatral. “O Assalto”, uma peça de José Vicente, apresentada entre Novembro, na abertura do II Encontro de Teatro Ibérico,
a concepção artística e a encenação. Em “Quarteto/Relações 13 de Novembro e 5 de Dezembro, em Porto Alegre, no “O Túnel dos Ratos”, uma peça do eborense Armando
Perigosas”, Gabriel Villela responde pela cenografia, figurinos www.obando.pt Brasil. Nascimento Rosa.
e a direcção geral da peça. geral@obando.pt “O Assalto”, peça de estreia do dramaturgo mineiro José “O Túnel dos Ratos”, encenado por José Russo, assinala a
Entretanto, está em cena no Teatro do Campo Alegre a mais Vicente, foi escrita na década de 70. Em entrevista a um conclusão de um ciclo dedicado às novas dramaturgias, no
Nuno Patinho

recente produção da Seiva Trupe,“Variações Enigmáticas”, de jornal brasileiro, o autor refere que este texto teatral «é uma qual passaram nomes como Bernard Marie Koltés,António
Eric-Emmanuel Schimtt, com encenação de Júlio Cardoso. colocação existencial e política do problema da esquerda, Lobo Antunes e António Rodriguez Almodôvar.
Os espectáculos da Seiva Trupe apresentam-se no Auditório que na época assaltava bancos para fazer a revolução». O Encontro, organizado pelo CENDREV, decorreu em Évora
do Teatro do Campo Alegre, de terça a sábado às 21h45, O encenador, Luiz Paulo Vasconcellos, dirigiu, entre outros, entre os dias 25 e 28 de Novembro sob o tema “Da Escrita
domingos às 16h00. “A Ópera dos Três Vinténs” (Brecht), “Vestido de Noiva” Dramática como Prática Cénica” e procurou promover
(Nelson Rodrigues) e “Boneca Teresa” (Carlos Carvalho). o contacto entre agentes de criação teatral de Espanha
www.seivatrupe.pt Na sua opinião, apesar dos anos que se passaram, «os e Portugal para que, no futuro, surjam mais intercâmbios,
teatro@seivatrupe.pt valores permanecem os mesmos, atuantes, significantes, parcerias de criação e produção teatrais.
instigantes. Afinal, apesar das mudanças, ainda vivemos uma A Espanha marcou presença com “Hamlet Garcia” do

Restaurante Marisqueira Cervejaria Snack Bar | Rua de Moçambique 34, 3030-062 COIMBRA telef (239) 701 461

cenaberta 8
cenas breves <
Teatro de Acción Candente e “El Hombre Probable” do que este ano foi Clóvis Massa, professor de Teatro da Uni- criativos e o produto final, o conto, também na sua vertente Quico Cadaval, em entrevista a um jornal galego, refere-
Tatary Teatro. Na programação portuguesa, “Gestos Para versidade Federal de Porto Alegre. de tradição oral, de recriação da palavra dos contadores -se ao método de trabalho utilizado nesta adaptação do
Nada” com Dinarte Branco e Nicolau dos Mares; “Adélia e aprendizes do contar, enquanto expressão da memória, romance de Cunqueiro: reescrever a história de memória,
Z.” do Teatro da Garagem; “Audição – Com Daisy ao Vivo cultura e afectos populares. voltar a ler a obra em galego «para procurar manter a
no Odre Marítimo”, uma co-produção de O Espaço do 31.ª Edição da Jornada Em 2003, o Palavras Andarilhas envolveu cerca de 60 bibliote- mesma fraseologia, prosódia e ritmo», e, no fim, consultar
Tempo e Propositário Azul. Internacional de Cinema da Bahia cas portuguesas e mais de 200 participantes. Este ano houve a novela original.
A encerrar o Encontro “A Verdadeira História da Bela Ador- A 31ª edição da Jornada Internacional de Cinema da Bahia mais uma vez espaço dedicado a oficinas, com a exploração “O Ano do Cometa” é uma reflexão sobre o mundo dos
mecida”, um texto de António Rodriguez, numa co-produ- concretizada este ano entre os dias 9 e 15 de Setembro, do universo dos contos e das actividades paralelas, e houve sonhos e da realidade, com o protagonista no desempenho
ção entre o CENDREV e La Fundición de Sevilha. na Bahia, Brasil, decorreu sob o lema “Por um mundo mais “Papa Contos”, sessões de narrativas para pais e filhos. No de um emprego inesperado: sonhador municipal. O livro,
humano”. programa principal desta VI edição estiveram presentes, publicado em 1974 com o título original “El año del cometa
www.evora.net/cendrev Com mais de trinta anos de existência, o festival, dos primei- para além de contadores portugueses, Paula Carballeira com la batalla de los cuatro reyes”, é considerado o testa-
cendrev@mail.evora.net ros no Brasil a mostrar as produções cinematográficas da de Espanha, Marina Colassanti do Brasil, Horácio Santos mento literário de Cunqueiro.
África Lusófona, atribuiu nesta edição destaque a Angola, de Cabo Verde e Ana Padovani da Argentina. O espectáculo esteve em cena em Abril, no Centro Dramáti-
Guiné-Bissau e, sobretudo, a Moçambique, que este ano co Galego, fez digressão por Vigo, Orense e Pontevedra,
Festival Recife do Teatro Nacional assinala os 40 anos do ínicio do processo de luta armada palavrasandarilhasbmbeja@hotmail.com entre outras cidades galegas.
A sétima edição do Festival Recife do Teatro Nacional decor- pela independência.
reu de 11 a 21 de Novembro deste ano, levando aos prin- A realizadora portuguesa Margarida Cardoso e o escritor

Augusto Baptista
cipais teatros da capital pernambucana (o histórico Teatro José Eduardo Agualusa foram alguns dos convidados desta 10.ª Edição do Mindelact
Santa Isabel, o Teatro do Parque, o Teatro Barreto Júnior, edição e integraram o júri para o apuramento do melhor O Mindelact, Festival Internacional de Teatro do Mindelo,
o Teatro Apolo, o Teatro Hermilo Borba Filho) alguns dos filme da Jornada. abriu mais uma vez as portas ao público entre os dias 4 e
espectáculos que, desde o início do ano, mais se destacaram “Nha Fala”, de Flora Gomes, e “O Mineiro”, do realizador 19 de Setembro, no Mindelo, Cabo Verde.
nos principais centros de produção teatral brasileira – Minas moçambicano Gabriel Mondlane, foram dois dos filmes A 10ª edição do encontro, sob a direcção de João Branco,
Gerais, Bahia, Rio de Janeiro, São Paulo e Pernambuco. apresentados no certame dedicado ao cinema da África apostou numa forte presença brasileira: Grupo XIX de Teatro,
O coordenador-geral do Festival, o encenador António Lusófona. Portugal esteve representado por Rui Filipe Tor- Priscila Camargo, Companhia Livre de Teatro, entre outros.
Cadengue, também responsável pela acção cultural da res com “Pescadores de Tractor”, Margarida Cardoso com Em declarações ao site noticioso visãonews, o director do
prefeitura do Recife, convidou o dramaturgo Aimar Labaki “Kuxa Kanema” e Catarina Alves Costa com “O Arquitecto Festival esclarece esta escolha: «sempre que temos grupos
para curador tendo este proposto o tema central. “Sob o e a Cidade Velha”. brasileiros, há um frenesim no público mindelense que se
tema Identidade e Contemporaneidade olhamos para espec- Nesta edição foram homenageados Amílcar Cabral, herói da identifica muito com os trabalhos apresentados».
táculos e plateias com o mesmo desejo de contribuir para luta pela independência de Cabo Verde e da Guiné-Bissau, O primeiro dia do evento foi comemorado com o espectá-
um diálogo profícuo entre artistas e cidadãos. (…) Nada Ítalo Zappa, embaixador brasileiro, e Thomas Farkas, um dos culo “Bernard à Mindelo”, do belga Bernard Massuir.
mais contemporâneo que assumir nossa identidade sem principais produtores independentes do cinema brasileiro e O teatro português esteve representado pelo grupo 3 Em
medo de mudar as fórmulas no diálogo ininterrupto com um dos mais reconhecidos fotógrafos do Brasil. Pipa com a peça “A Maior Flor do Mundo”, uma adapta-
o tempo, seguros de que o essencial permanece inalterado: ção da obra de Saramago; a Companhia do Chapitô com
o compromisso com a qualidade e com o ofício teatral”, http://geocities.yahoo.com.br/jornadabahia/ “Talvez Camões” e “Serafim Ponte Grande” & “Confissão de
justifica Labaki ao propor a sua programação. jornada@ufba.com.br Caboclo”, uma co-produção da companhia luso-brasileira
Desta programação, que incluiu quinze espectáculos dife- Entretanto Teatro.
rentes, destacamos “O Inspector Geral”, de Gogol, pelo Nas participações especiais, a Itália, com o espectáculo “12
Galpão; “A Procissão” e “Aldeotas”, de e por Gero Camilo; de Setembro”, de Leo Bassi, e “New Orleans Society”, dos
“Comédia do Fim”, de Beckett, dirigido por Luiz Marfouz franceses TC Spectacles.
para o Teatro Castro Alves; “Agreste”, de Newton Moreno, Na celebração dos dez anos do Mindelact estiveram presen-
dirigido por Marco Aurélio para a Companhia Razões In- tes vários grupos cabo-verdianos como o Grupo Juventude
versas; “O que Morreu Mas Não Deitou”, projecto coor- em Marcha, de Santo Antão, que encerrou o Festival com a
denado por Francisco Medeiros com jovens actores de São peça “Coruja”, de Jorge Martins. Lançamento da
Paulo; “Guiomar, A Filha da Mãe”, de Lurdes Ramalho, pela
actriz Augusta Ferraz; “Carta Aberta”, de Denis Guénon”, www.mindelact.com revista Sinais de
com o actor Lori Santos, dirigido por Fernando Kinas; “O
que Diz Molero”, de Dinis Machado, dirigido por Aderbal
mindelact@hotmail.com
Cena
Freire-Filho para o Centro de Demolição e Construção
O primeiro número da Sinais de Cena,
do Espectáculo. “Nação Teatro – História do Teatro revista para o estudo e crítica do teatro
O Festival integrou ainda uma homenagem ao dramaturgo em Cabo Verde” em Portugal, foi lançado no dia 14 de
recifense Luis Marinho (1926-2002) – com leituras dramáti- “Nação Teatro, História do Teatro em Cabo Verde”, obra Outubro, no Salão Nobre do Teatro
cas e exercícios sobre as suas peças e a publicação de um da autoria de João Branco, editada pelo Instituto Nacional Nacional D. Maria II, em Lisboa.
livro -, projectou um ciclo de reflexões sobre o tema geral da Biblioteca e do Livro de Portugal, foi lançada no dia 13 A revista pertence à Associação Por-
e organizou cursos, oficinas e encontros com artistas e de Julho, no Mindelo, Cabo Verde. O livro dá a conhecer, tuguesa de Críticos de Teatro (APCT),
produtores culturais estrangeiros onde a Cena Lusófona em cinco actos, o percurso histórico do teatro cabo-
conta com a colaboração do Centro de
também participou. verdiano.
Estudos de Teatro da Universidade de
Para além de uma selecção cuidada de espectáculos, ligada O prefácio de “Nação Teatro, História do Teatro em Cabo
Verde” é assinado por Francisco Fragoso, ex-director e
Lisboa (CET) e é editada pela Campo
por um desenho temático coerente, o Festival Recife fez
passar pelas plateias (quase todas esgotadas) e pelos par- fundador do grupo Korda Kaoberdi, figura importante da das Letras.
ticipantes um desejo de pensar o teatro consentâneo com história do teatro em Cabo Verde. Na sessão de apresentação da Sinais de
o seu fruir. Neste sentido, a temática do actor-narrador, João Branco fundou em 1993 o Grupo de Teatro do Centro Cena, Georges Banu, teatrólogo e profes-
na constatação de uma nova épica que atravessa o teatro Cultural Português do Mindelo, de que é encenador e direc- sor da Sorbonne, também colaborador
contemporâneo, foi glosa e fio condutor que atravessou VI Palavras Andarilhas tor artístico. É ainda responsável pela fundação da da revista, protagonizou uma breve
os espectáculos, as palestras, as oficinas e as discussões em Beja Associação Mindelact, a qual realiza anualmente o Festival conferência sob o tema “L’acteur: entre
várias que os prolongaram noite dentro por um público A VI edição do Palavras Andarilhas – Encontro de Aprendizes Internacional de Teatro do Mindelo (Mindelact). l’âge et l’image”.
ávido e interessado. do Contar realizou-se este ano nos dias 23, 24 e 25 de No índice da publicação, Maria Helena
No último dia realizou-se uma avaliação pública do festival, Setembro, em Beja. O evento, nascido em 1999 e com Serôdio, professora da Faculdade de Le-
no Teatro Apolo, onde, num notável exercício de cidadania, periodicidade anual, é organizado pela Biblioteca Municipal Quico Cadaval tras de Lisboa na área de teatrologia e
os responsáveis pelo desenho e pela organização do Festival, de Beja e pela Associação de Defesa do Património Cultural adapta Álvaro Cunqueiro
incluindo o Secretário Municipal de Cultura da Prefeitura,
directora da revista, frisa que esta surgiu
desta cidade. O encenador, actor e contador de histórias galego Quico
responderam às diferentes observações e críticas dos par- Os objectivos do encontro são, entre outros, a promoção do Cadaval adaptou, para o Centro Dramático Galego, em
porque «se julgou vital criar um espaço
ticipantes. A sessão, como já é hábito do Festival, organiza-se relacionamento dos que trabalham com as palavras e com Santiago de Compostela, “O Ano do Cometa”, de Álvaro de documentação, debate, análise e ava-
a partir de um texto proposto por um avaliador convidado, os livros, cruzamento de saberes que valoriza os dois pólos Cunqueiro. liação do que no campo do teatro – e

Artigos Escolares e de Escritório, Lda.

FIDALGO'S
mariofidalgo@iol.pt
Rua do Senhor da Serra, 111 - Vendas de Ceira - 3030-908 Ceira COIMBRA Tel. (239) 923 426 Fax (239) 923 737 Telem. 963 040 926

cenaberta 9
cenas breves <
de outras artes performativas – se vem Teatro e Literatura de Língua Cenaberta digital de dramaturgos franceses e internacio-
praticando nas suas múltiplas vertentes Portuguesa nas Edições Cotovia O cenaberta entrou no mundo digital com o número dois nais, procurando “devolver o estatuto
criativas, tanto em Portugal, como no Até ao final do ano as Edições Cotovia reservam-nos, em da edição em papel. Duas versões de um mesmo jornal literário à escrita teatral”.
resto do mundo». matéria teatral, o segundo volume das obras completas que se complementam e encontram sinergias frutuosas: A obra de Abel Neves, traduzida por
Periodicidade bi-anual, a revista integra de Brecht (com “A Vida de Eduardo II”, “A Ópera dos na memória do papel ficam notícias acabadas que se Alexandra Moreira da Silva, vai ter
dez rubricas fixas e tem um preço de Três Vinténs”, “Um Homem é um Homem”, “A Cria do desenvolvem na edição online. como título “Au-delà les Étoiles Sont
capa de 12 euros. Elefante” e “Ascensão e Queda da Cidade de Mahagonny”) Na versão Internet o cenaberta tem uma outra regularidade Notre Maison” e integrará a colecção
e ainda “Figurantes”, a última obra de Jacinto Lucas Pires, que vai além das quatro edições anuais do papel. Com uma Répertoire Contemporain.
www.apcteatro.org encomendada e encenada por Ricardo Pais, com estreia actualização e newsletter mensal, cenaberta digital aco- Abel Neves integra o conjunto de
recente no Teatro Nacional de S. João, no Porto. lhe notícias que requerem uma publicação mais imediata dramaturgos lusófonos editados na
Em preparação para o próximo ano estão duas obras e abre para temas e assuntos que encontram no online
colecção de teatro Cena Lusófona com
de Ruy Duarte de Carvalho, que é já um dos autores espaço privilegiado de explanação.
"Supernova". Esta obra estruturou a co-
emblemáticos da editora, depois de aí ter publicado “Vou O cenaberta online conta já com cerca de 100 utilizadores
produção com o mesmo nome estreada
Timor Lá Visitar Pastores”, “Como Se o Mundo Não Tivesse registados que recebem regularmente a newsletter com
a 25 de Abril de 2000 no Teatro Vila
visto por Pedro Rosa Mendes Leste”, “Observação Directa”, “Actas de Maianga” e “Os as últimas notícias de teatro e cultura do espaço lusófono.
Velha, em Salvador, Bahia, Brasil.
e Alain Corbel Papéis do Inglês”. As duas novas edições de Ruy Duarte Com cerca de 10 mil visitas desde o lançamento, a edi-
“Madre Cacau”, o novo livro do jornalista e escritor deverão surgir em Março:“Poesia Reunida”, que resgatará ção online alarga o leque de leitores do jornal da Cena
www.editionstheatrales.fr
Pedro Rosa Mendes e do ilustrador Alain Corbel, acerca um conjunto de obras já esgotadas ou nunca publicadas Lusófona e potencia as iniciativas teatrais promovidas no

Augusto Baptista
de Timor, foi lançado no dia 2 de Dezembro, na Cultur- em Portugal, e “O Branco da Namíbia” que segue uma espaço lusófono. O cenaberta online estimula ainda uma
gest, em Lisboa. pista deixada em “Os Papéis do Inglês”, a última obra de intervenção directa de colaboradores e agentes teatrais
Depois de nos transportarem numa magnífica viagem ficção do autor. e culturais de todo o espaço CPLP.
pela África Lusófona em “Ilhas de Fogo”, Pedro Rosa A atenção muito especial que a Cotovia tem dedicado ao
Mendes e Alain Corbel voltam a trabalhar em conjunto Brasil terá continuidade no próximo ano através da edição www.cenalusofona.pt/cenaberta
transmitindo-nos um mundo de descobertas “em que o de um “Curso Breve de Literatura Brasileira”, um projecto
olhar jornalístico se combina com a linguagem da banda de grande expressão, em dezasseis volumes, coordenado
desenhada para oferecer ao leitor um percurso que é ao por Abel Barros Baptista. O projecto contempla as áreas
mesmo tempo rigoroso e onírico”. da poesia, ficção e teatro, cada volume dedicado a um
“Madre Cacau” apresenta-nos rostos e histórias de Timor
na actualidade, país em reconstrução que ressurge depois
autor, com ensaios introdutórios assinados por diversos
especialistas.
Abel Neves publi-
de um passado de guerra. Recorde-se que o livro de contos “O Voo da Madrugada”, cado em França
Paralelamente ao jornalismo, Pedro Rosa Mendes tem es- de Sérgio Sant’anna, também editado pela Cotovia, foi uma Éditions Théâtrales, prestigiada editora
crito acerca de África, sendo autor de “Baía dos Tigres”, das três obras galardoadas recentemente no Brasil pelo francesa, lançou em Novembro a versão
“Ilhas de Fogo” e “Atlântico-Romance Fotográfico”. Prémio Portugal Telecom da Literatura, talvez o principal francesa de “Além as Estrelas São a
Alain Corbel ilustrou, entre outros, “Contos da Terra do prémio literário da actualidade brasileira. Bernardo de Nossa Casa”, do dramaturgo português
Dragão”, de Wang Suoyng e Ana Cristina Alves, “Contos Carvalho, com “Mongólia”, outro autor da mesma chancela Abel Neves. Esta editora centra-se no
de Macau”, de Alice Vieira, e “A Cor Instável” de Paulo editorial, foi o autor premiado no ano passado. universo teatral e aposta na qualidade
Cotrim.

As Virgens Loucas
de António Aurélio Gonçalves, Cabo Verde, adaptação teatral de Cândido Ferreira (2001)
– 10,50 euros

Teatro do Imaginário Angolar

Almedina Coimbra Hotel


de Fernando de Macedo, São Tomé e Príncipe (2000) Inclui as peças Capitango e Cloçon Son
– 10,50 euros

Supernova
de Abel Neves, Portugal (2000)
– 10,50 euros

As Mortes de Lucas Mateus


de Leite de Vasconcelos, Moçambique (1999)
– 9,45 euros

Teatro I e II
obra dramatúrgica de José Mena Abrantes, em dois volumes, Angola (1998)
– 10,50 euros (cada volume)

Mar me quer
de Mia Couto e Natália Luiza, Portugal / Moçambique (2002)
– 10,50 euros.

Floripes Negra
Floripes na Ilha do Príncipe, em Portugal e no mundo (2002)
o seu hotel
no coração
de Augusto Baptista, Álbum Fotográfico/Reportagem/Ensaio – 26,25 euros

Revista Setepalcos
(esgotadas números 0, 1 e 2)
N.º 3 – 10,50 euros de Coimbra
N.º 4 – Setepalcos especial sobre Teatro Galego15,75 euros

TEATRO Naum Alves de Sousa a editar


a obra completa do dramaturgo brasileiro

Cena Lusófona
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3000-040 COIMBRA, Portugal
Tel.: (+351) 239 836 679
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cenaberta 10
Questão social em

Augusto Baptista
congresso
A oitava edição do Con- da Câmara Municipal de Coimbra, António
Augusto Barros, director da Cena Lusófona,
gresso Luso-Afro-Brasileiro
Carlos Fortuna, presidente do Conselho
regressou este ano a Coim- Científico da Faculdade de Economia, Luis
Manuel Fernandes, Vice-Ministro da Ciência
bra, cidade que acolheu pela e Tecnologia do Brasil, Celeste Amaro, De-
primeira vez o encontro em legada Regional da Cultura, Fernando Seabra
Santos, Reitor da Universidade de Coimbra
1990. Mais de mil e quinhen- e Elísio Estanque, Presidente da Comissão
tos participantes oriundos Organizadora do Congresso.
Boaventura de Sousa Santos alertou para
dos vários países da CPLP en- a necessidade da sensibilização das classes
contraram-se para debater “A políticas que não «têm estado atentas para
a importância científica e cultural deste
Questão Social no Novo Milé- espaço». Sublinhou ainda o interesse e a im-
nio”. Organizado pelo Centro portância da intensificação desta rede das
ciências sociais na CPLP, para que surjam mais
de Estudos Sociais e pela programas de pós-graduação, mais investiga-
Universidade de Coimbra, o ção e mais articulação entre as instituições
científicas.
Congresso decorreu nos dias Luís Manuel Fernandes demonstrou que este
16, 17 e 18 de Setembro. congresso «antecipa o movimento que está
hoje no coração da própria política externa
Durante três dias, mais de mil e quinhentos brasileira, que é o encontro da pátria com o
cientistas da Comunidade dos Países de Lín- mundo da lusofonia».Acrescentou ainda que
gua Portuguesa abraçaram uma língua comum existe uma necessidade premente de ampliar
e fizeram falar mais alto os problemas e as os laços e o intercâmbio internacional da pá-
possíveis soluções para várias preocupações tria lusófona.
com que a sociedade contemporânea se de- António Augusto Barros assinalou a oportu-
para. Estes debates foram realizados ao longo nidade de se poder analisar uma experiência
de mais de setenta sessões temáticas, painéis de terreno como a Cena Lusófona, «numa cultural no espaço da CPLP”. No segundo dia desta edição, decorreu no
e grupos de discussão. área que nem sempre conhece a honra de No programa cultural, o Congresso apresen- Palácio de S. Marcos um jantar para todos
A sessão de abertura do Congresso, no ser objecto de análise». tou o concerto “Venham mais Cinco”, uma os congressistas, acompanhado por uma ses-
Teatro Académico de Gil Vicente, na manhã A Cena Lusófona integrou o programa desta homenagem à Revolução Portuguesa de são de Contadores de Histórias. Esta sessão,
do dia 16, foi presidida por Boaventura de edição, não só com uma participação cultural, Abril com a presença de vários músicos de organizada pela Cena, contou com a presença
Sousa Santos, director do Centro de Estudos mas também com um painel de discussão intervenção como Manuel Freire, João Lóio do sãotomense Ângelo Torres, do baiano An-
Sociais(CES), Carlos Encarnação, presidente intitulado “A Cena Lusófona e o intercâmbio e Francisco Fanhais, entre outros. tônio Vieira e do galego Cándido Pazó.

A Cena e o intercâmbio cultural na CPLP *


A Cena Lusófona e o intercâmbio cultural no espaço A comunicação de António Augusto Barros sublinhou o papel dos Centros de Intercâmbio em curso, e que — à luz das especificidades
da CPLP foi o tema escolhido para centrar o correspondeu a um olhar abrangente sobre Teatral — CITs —, estruturas em implantação africanas — seria importante estender, para
debate do Grupo de Discussão sobre cultura as várias frentes de trabalho da Cena Lusófona, no espaço lusófono, vocacionadas para acções além dos edifícios, também a terreiros, praças,
e teatro no espaço lusófono e a experiência da as cumplicidades construídas a nível dos Oito em rede, «para a melhoria de condições de sítios em que normalmente acontece teatro
Cena, no âmbito do VIII Congresso Luso-Afro- em quase uma década de intercâmbio teatral, trabalho e ensaio, para dar voz e autonomia ao ar livre.
-Brasileiro de Ciências Sociais. um caso com «carácter de exemplaridade às pretensões dos agentes locais». Pedro Rodrigues fez o desenho sintético do
A sessão, nas instalações da Faculdade de Eco- que pode ser aproveitado como material de Manuel Pais de Sousa enquadrou a acção da último Estágio Internacional de Actores, o ter-
nomia da Universidade de Coimbra (UC), sala reflexão sobre o papel da troca cultural na Cena nas áreas da Documentação e da Infor- ceiro, em Dezembro de 2003, numa acção con-
Keynes, na tarde de 17 de Setembro 2004, foi CPLP». mação e do trabalho do Centro de Documen- junta da Cena Lusófona e da companhia teatral
moderada por André Brito Correia (Centro A contrario do conceito de «exportação cultural tação e Informação, CDI, já com um acervo A Escola da Noite, com o apoio financeiro da
de Estudos Sociais da UC) e integrou, como e da internacionalização da cultura portugue- significativo (monografias, revistas, video, DVDs, Coimbra 2003 - Capital da Cultura.
interventores: António Augusto Barros (Cena sa», situou o intercâmbio no âmbito da Cena fotografias), parcialmente disponível na internet Intervenção derradeira, Nuno Porto assinalou
Lusófona), José António Bandeirinha (Arquitecto, como meio de «alterar as condições concretas em http://www.cenalusofona.pt «as articulações que se têm tentado fazer no
UC), Manuel Pais de Sousa (Documentalista, em que os agentes desenvolvem o seu trabalho, José António Bandeirinha destacou a experiên- trabalho da Cena e algum trabalho de investiga-
UC), Nuno Porto (Antropólogo, UC), Pedro quebrando isolamentos quase intransponíveis cia do levantamento dos espaços cénicos nos ção, sobretudo no campo da antropologia».
Rodrigues (A Escola da Noite). em alguns países africanos». Neste quadro, Países Africanos de Língua Portuguesa, tarefa Após uma espécie de inventário, na ordem
do dia disse estar o projecto dos Narradores
Orais, que coordena, e a decisão de o núcleo
Grupo de Trabalho: António Augusto Barros (a apresentar comunicação), José António Bandeirinha, André Brito Correia, Nuno Porto, Manuel Pais de Sousa, Pedro Rodrigues
dos estudantes de Antropologia da UC cons-
Augusto Baptista

tituir uma equipa já encarregada de reunir


materiais publicados sobre as questões per-
formativas na CPLP.
André Brito Correia encerrou os trabalhos.
Confiou que a experiência da Cena Lusófona
«com o seu esforço notável e toda a riqueza
que aqui nos apresentou, revelará que, de facto,
há muitas Línguas numa só, há muitos teatros
num só».

*Notícia desenvolvida: www.cenalusofona.pt/cenaberta

cenaberta 11
Festival Gravana anima São Tomé e Príncipe

António José Silva


Agosto em São Tomé e
Príncipe foi mês de mais um
Festival Gravana. Durante
10 dias, de 20 a 29, teatro,
música, artes performativas
fizeram da capital do arqui-
pélago um espaço em festa,
os ritmos, a cor, a dança, no
adeus à época seca.

Gravana é termo usado em São Tomé


e Príncipe para referir a estação seca. E é
também nome de festival, este ano na ter-
ceira edição, com a cultura santomense a
cruzar outras culturas, vindas de diferentes
paragens, e a dar um especial colorido à
cidade capital.
No primeiro dia do Festival, grupos de
Danço Congo, Tchiloli e outras artes per-
formativas animaram o Estádio Nacional 12
de Julho, aqueceram o final de tarde já de
Abertura oficial do Festival Gravana: Estádio Nacional 12 de Julho
si escaldante. Nem a poeira, nem as duas
horas de espera até a abertura oficial do Commedia dell’Arte. Esta Oficina, sobre a tecto José António Bandeirinha proferiu Festival resultou de uma criação colectiva
evento, com os habituais discursos políticos, técnica da máscara, foi a primeira iniciativa uma conferência subordinada ao tema “A do gupo “Cena Só” que, com “O Sistema”,
levaram a plateia a procurar outros destinos. oficial do Centro de Intercâmbio Teatral de Evolução dos espaços cénicos: da Antigui- apresentou uma crítica mordaz à corrupção,
À noite subiu ao palco, no Arquivo Histórico, São Tomé (ver caixa). dade Clássica à contemporaneidade”. O burocracia, compadrios.
“O julgamento de dona Anofélis” peça do Paula Só, d' O Bando, por seu turno apre- evento, que contou com o apoio da Cena De 25 a 29 de Agosto, o Gravana ins-
grupo santomense Os Parodiantes da Ilha, sentou o monólogo “Ti Miséria”, retrato de Lusófona e do CIT São Tomé, decorreu no talou-se no Estádio Nacional 12 de Julho.
sobre a problemática do paludismo, tratada uma velhota que, por não querer morrer, Arquivo Histórico, no dia 26 de Agosto. Espectáculos centrados nos grupos musicais
de forma pedagógica. aprisiona a Morte no cimo da nogueira do Por toda a cidade capital, fora dos santomenses, todos amadores, palco no rel-
A programação teatral continuou com seu quintal. A senhora, vendedora de boli- espaços formais, em palcos improvisados, vado, o público assistiu ao desfilar de uma
duas apresentações de “A História do Tigre”: nhos de nozes, não previu que essa acção os transeuntes eram surpreendidos por panóplia de sons e de ritmos, quebrados no
monólogo de Dário Fo levado à cena por redundasse numa romaria à sua porta, gente Tchiloli, Danço Congo, música, danças. último dia pela chuva. A chuva a declarar o
Filipe Crawford. O actor português, presen- a pedir liberdade para a guardiã do descanso Tentados, encalhavam. A ver: sentados no fim da Gravana, duplamente: o Festival e a
te no certame a convite da Cena Lusófona, eterno. chão, de pé... época seca.
dirigiu ainda uma Oficina de Actores sobre Inserido no Festival Gravana o arqui- O último espectáculo de teatro do

António José Silva


António José Silva

CIT São Tomé Filipe Crawford. O programa da formação incidiu na


Durante o Festival Gravana, no dia 25 de Agosto, o iniciação à Técnica da Máscara com algum trabalho
CIT São Tomé foi inaugurado oficialmente. Presentes prático com máscaras neutras e máscaras de Com-
estiveram Álvaro Santiago, Ministro da Educação media dell’Arte. A Oficina, dividida em três momentos
e Cultura de São Tomé e Príncipe, Nazaré Ceita, diferentes, centrou-se: nos aspectos dedicados à
Directora-Geral de Cultura, Ayres Major, responsável assimilação de regras básicas; na abordagem às
local do CIT e director artístico do grupo Cena Só, máscaras de Commedia dell’Arte; na revisão do trabalho,
o Presidente da Assembleia Geral da Cena Lusófona, com o objectivo de apurar o grau de aproveitamento
José António Bandeirinha, e individualidades locais e dos participantes.
agentes teatrais santomenses e portugueses. A Oficina foi frequentada por 14 formandos, na maio-
A primeira iniciativa do CIT foi uma oficina de ria actores do Cena Só e do Grupo de Teatro Estudantil
Oficina de Formação com Filipe Crawford formação sobre a Técnica da Máscara, orientada por da Alliance Française de São Tomé.

Bom apetite…

Estrada da Beira, n.º 389 - 3030-173 COIMBRA


reservas Tel. (239) 701460 / Telem. 967 857 937
encerramos ao Domingo.
Destaques: Filetes de Polvo | Bacalhau com natas | Secreto de Porco Preto com Castanhas | Posta Mirandeza

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