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COZINHA DE CARNES E AVES

Professor: Yury Feliciano

Tema: Carne Suína

Prezados(as) alunos(as),

Inicialmente vamos abordar um pouco sobre a cadeia produtiva dos suínos no Brasil
e no Mundo.

PORCO x SUÍNO
A carne suína enfrenta preconceitos históricos relacionados aos riscos sanitários devido às
condições de higiene em que os antigos “porcos” eram criados, e quanto ao seu teor de gordura,
colesterol e calorias.
Chiqueiros com poças de lama e alimentação com “lavagem” já não são mais a realidade
da carne suína produzida com inspeção sanitária. A lavagem é a mistura de sobras de alimentos dos
humanos com água, em processo de fermentação.

Já que o vocábulo “porco” é historicamente associado à sujeira e más condições sanitárias,


os produtores criadores dirigem suas estratégias de marketing no sentido de fixar no consumidor a
expressão “carne suína”.
A doença mais comumente transmitida pela carne de porco era a verminose chamada
teníase. Há duas espécies deste verme: a Taenia solium e a Taenia saginata, sendo que a primeira
usa como hospedeiro intermediário o porco, e a segunda os bovinos.
Quando o suíno consome alimento com ovos da tênia e não é vermifugado ele terá larvas de
tênia (cisticercos) na sua musculatura e órgãos, que são transmitidas a quem consome a carne com
tais larvas vivas, passando a ser o hospedeiro final, o que vai desenvolver dentro do intestino a
tênia adulta.
As medidas mais simples para evitar a contaminação pela ingestão de carne eram o
congelamento prévio e a cocção até o ponto de bem passada, o que mata os cisticercos. É por tal
motivo que nossos antepassados temiam comer carne de porco mal passada.
Há o risco do ser humano também consumir os ovos da tênia e tornar-se o hospedeiro
intermediário, o que é muito preocupante, pois os ovos entram na corrente sanguínea e podem
gerar larvas que além de se alojar na musculatura podem infestar o cérebro, caracterizando a
cisticercose.
Muitas vezes a contaminação é visível na carne, em pontos claros que são nada menos que
as próprias larvas.
Na imagem abaixo, carne suína com cisticercos visíveis, popularmente chamados de
“canjiquinha”.

A cisticercose em humanos muitas vezes é causada pela ingestão de vegetais mal lavados,
água contaminada ou autocontaminação após usar o sanitário e não lavar bem as mãos.
O risco destas doenças nos obriga a trabalhar sempre com carne suína inspecionada, de
origem idônea. Suínos oriundos de criações ditas caipiras que não sigam o protocolo de
vacinações, vermifugações e cuidados com higiene nunca devem ser utilizados por profissionais de
gastronomia. Daí confirmada a necessidade do cozinheiro conhecer bem seus fornecedores in loco.

HISTÓRIA
Estima-se que o porco tenha sido domesticado pelo homem por volta de 5000 a.C., na Ásia.
O fato dos suínos serem onívoros facilitou muito sua domesticação que inclusive ocorreu antes da
dos bovinos.
A civilização romana previa penas agravadas para ladrões de porcos.
Na idade média o consumo de carne suína era luxo.
Cristóvão Colombo trouxe para a América porcos que foram soltos na selva em sua
segunda viagem, em 1494. Acabaram por se tornar uma praga já em 1499, pois prejudicavam as
plantações, chegando até o Equador, Peru, Colômbia e Venezuela.
No Brasil os porcos foram trazidos pelo nobre português Martim Afonso de Sousa, então
Governador da Colônia, em 1532.
A domesticação proporcionou grandes mudanças morfológicas e fisiológicas nos suínos
selvagens. O javali selvagem por exemplo, possui enormes dentes expostos para fora da arcada
bucal, tem membros dianteiros fortes, uma cabeça grande e pesada, enquanto que na sua parte
traseira são encontradas musculaturas mais fracas. Esta constituição é obviamente útil para sua
sobrevivência e enfrentamento dos seus predadores naturais.
Os suínos domesticados de hoje, após gradativa seleção genética que privilegia a produção
de carnes nobres, tem uma razão de 30% de massa anterior e 70% de massa posterior, o que seria o
inverso dos porcos selvagens, e sua carne é mais clara, evidenciando a menor capacidade de
oxigenação que é necessária ao javali para fugas e ataques velozes.
Além da nova vida sedentária, recebendo todos os alimentos necessários e ao abrigo de
inimigos naturais, os suínos vinham sendo selecionados para serem fontes de gordura. A banha
suína era um dos principais insumos da cozinha brasileira até a chegada do óleo de soja ao
mercado. Hoje os frigoríficos privilegiam seleções genéticas para produzir suínos com mais carne
do que gordura.
Até que a produção dos óleos vegetais se desenvolvesse e as dietas ricas em gordura fossem
condenadas persistiu a seleção de suínos com grande teor de banha, com espessuras de toucinho
entre 5 e 6 cm.

QUESTÕES RELIGIOSAS LIGADAS À CARNE SUÍNA


Existem tabus religiosos quanto ao consumo de carne suína para muçulmanos e judeus, que
encontram explicação no auto índice de ocorrência da teníase e da cisticercose no século XII.
Segundo descrições de Maimônides, médico da corte judaica, a proibição da Torá é necessária pois
os “hábitos e a alimentação dos suínos são imundos”. Certamente refere-se ao fato dos suínos se
banharem de lama e excrementos em épocas de altas temperaturas, o que tornava tais animais a
principal fonte dos parasitas da cisticercose. Textos antigos dão cota de que Moisés também
impunha tal proibição pelos mesmos motivos, que foi assimilada pelos árabes em época anterior ao
surgimento do islamismo. O Alcorão também proíbe veementemente o consumo de carne suína.
Também existem teorias antropológicas como a de Marvin Harris, que enxerga razões
ecológicas e econômicas, já que suínos necessitam de água e grãos, artigos raros na Arábia e em
Israel na época. Assim, os suínos eram considerados competidores com os humanos pela
alimentação com grãos e água.

EVOLUÇÃO DA CADEIA PRODUTIVA


Atendendo à demanda dos consumidores por uma alimentação mais saudável, a cadeia
produtiva da carne suína no Brasil e no mundo vem evoluindo no sentido de privilegiar a produção
de carnes mais magras. Constantemente são implementadas mudanças no processo de cria,
alimentação e melhoramento genético com a finalidade de diminuir percentuais de gordura na
carcaça dos suínos.
Segundo o Agricultural Research Service do United States Department of Agriculture, num
espaço de 15 anos (1991 até 2006) os seis cortes mais consumidos dos suínos apresentaram
redução de 16% de gorduras totais, e 27% menos de gordura saturada.
Abaixo podemos acompanhar parte desta evolução:
Na década de 1990 o grande progresso nas novas tecnologias que possibilitaram o estudo
do genoma das espécies animais possibilitaram que os produtores de carne suína selecionassem as
qualidades desejáveis no produto final, até o ponto em que existem porcos que são abatidos com
espessura de toucinho que não ultrapassa 1 cm, e são constituídos por até 60% de carne magra na
carcaça. Antigamente eram comum ter toucinhos com até 6 cm de espessura e produção máxima
de 45% de carne magra.
A carne de um suíno que foi selecionado geneticamente pode ter seus teores de gorduras
totais, saturadas, colesterol e calorias menores que a da carne de frango sem pele.

VALOR NUTRICIONAL
A carne de porco contém todos os aminoácidos considerados essenciais e tem percentual de
digestibilidade entre 95% e 100%, enquanto que as proteínas vegetais são de 65% a 75%
digeríveis.
Sobre índices de gordura, há 7 cortes de carne suína que têm menos gordura que o peito de
frango sem pele. No gráfico abaixo é ilustrada a quantidade média de gordura, em porções de 100g
de carne.

Fonte: www.abcs.org.br
No quadro abaixo também vemos que o teor de colesterol da carne suína também não é
excepcionalmente maior do que o das outras.

Abaixo dados sobre a produção de carne suína no Brasil no biênio 2019/2020:

Fonte: https://abcs.org.br/wp-content/uploads/2020/11/novo-mercado_agosto.pdf
A seguir estão listados os países que mais recebem carne suína brasileira de janeiro a maio de
2020:

Fonte: https://abcs.org.br/wp-content/uploads/2020/11/novo-mercado_agosto.pdf

Segundo a Associação Brasileira de Criadores de Suínos, o Brasil é o 4º maior produtor


mundial de carne suína, e também o 4º maior exportador, mesmo exportando apenas 16% do que
produz.
A cadeia de produção de carne suína movimenta 22,2 Bilhões de dólares, e gera mais de 1
Milhão de empregos diretos e indiretos.

Adaptado de: http://abcs.gasoline-digital.com/wp-content/uploads/2020/06/Dados-Mercado-de-Su


%C3%ADnos_2019-1.pdf
Fonte: http://abcs.gasoline-digital.com/wp-content/uploads/2020/06/Dados-Mercado-de-Su
%C3%ADnos_2019-1.pdf

CURIOSIDADES
A maçã é associada ao leitão assado devido ao fato de ser
tradicionalmente abatido na época do outono, já que cresciam na
primavera e eram engordados no verão. Na mesma época também eram
colhidas as maçãs.
Há certa similaridade entre os organismos humano e suíno. A medicina
moderna utiliza pele, válvulas cardíacas retiradas de suínos, insulina
produzida por pâncreas suínos, além de ilhotas pancreáticas que podem
ser implantadas em pacientes diabéticos visando a autossuficiência de
produção de insulina.
Também são retiradas substâncias da glândula pituitária e da tireoide do
suíno para tratamentos médicos.
Fonte: https://acsurs.com.br/noticia/consumo-per-capita-de-carne-suina-cresce-14-em-cinco-anos/

PORCIONAMENTO PROFISSIONAL
Em regra, porções individuais de carne suína in natura pesam em torno de:

· 125g até 150g por pessoa, para cortes sem osso.


· 170g até 250 g para cortes com ossos.
· 250g até 500g especificamente para costelas, que tem muito mais ossos, gorduras
que podem ser descartadas e cartilagens.
ARMAZENAMENTO
Entre 4 °C e 60 °C a carne suína crua está sujeita aos riscos da proliferação bacteriana e
decomposição.
A carne suína cozida não deve ser deixada fora de refrigeração por mais de 2 horas, e em
dias quentes, por no máximo 1 hora. Deve-se embalar hermeticamente a carne cozida a ser
refrigerada. O prazo máximo para refrigeração moderada é de 4 dias, caso o consumo esteja
previsto para um prazo maior a carne cozida deve ser congelada.
Em qualquer processo de armazenamento é de suma importância manter os pacotes
etiquetados com data de manipulação, data de validade e identificação do corte, para evitar
transtornos e perdas.

REFRIGERAÇÃO ABAIXO DE 4 °C
No prazo de refrigeração moderada influi também as condições em que a carne foi
adquirida, ou seja, o tempo de prateleira a que ela foi submetida no fornecedor.
Embalagens herméticas ajudam a impedir o ressecamento pelo ar.
Deve-se atender aos princípios da manipulação mínima, conservando a carne na
embalagem original o quanto possível. Assim, carnes moídas, que foram manipuladas e tiveram
maior quantidade de superfície exposta ao ar tem validade de 1 a 2 dias enquanto que as peças
inteiras podem ficar de 2 a 3 dias refrigerados após a abertura da embalagem.
É altamente aconselhável servir a carne suína cozida na margem de 60 °C, e para
regeneração, é seguro ter como temperatura mínima os 85 °C pelos menos na superfície.

CONGELAMENTO

O congelamento é um grande vilão no que se refere às melhores qualidades de qualquer


carne, entretanto, uma operação de congelamento e descongelamento conduzida corretamente
minimiza os danos.
Um congelamento rápido evita que cristais de gelo grandes e pontudos se formem no
interior da carne, o que iria furar os tecidos celulares e dar caminho ao escape do suco da carne.
Para tanto, existem equipamentos modernos, os ultracongeladores, que promovem o congelamento
quase que instantâneo. Mesmo não dispondo de tais equipamentos, o dimensionamento da
quantidade de carne a ser congelada de forma compatível com a capacidade de refrigeração do
equipamento utilizado pode diminuir bem a quantidade destes cristais pontudos.
A temperatura ideal de congelamento é abaixo de -18 °C (dezoito graus negativos). Nunca
lote numa única etapa um freezer com carne a ser congelada, o faça gradativamente, caso contrário
as porções de carne vão demorar mais a atingir a temperatura ideal, possibilitando a formação de
cristais pontudos e maiores.
Quando se trata de câmaras frias e grande quantidade de carnes, o ideal é que exista 1 metro
cúbico de espaço para cada quilo de carne a ser congelada.
Na tabela abaixo são apresentados prazos ideais para congelamento:

IMPORTANTE:
Para melhores resultados, o descongelamento deve ser lento, de um dia para o outro, sob
refrigeração.
Um dos defeitos indesejados do congelamento é a “queima pelo frio” que ocorre nas extremidades
das peças onde a embalagem hermética esteja mais frouxa. A porção de carne “queimada pelo frio”
fica dura, sem suculência, com aparência de couro e com sabor descaracterizado. Tais
extremidades devem ser descartadas da peça antes da cocção.
Nunca esqueça de etiquetar corretamente carnes armazenadas.
ALGUMAS RAÇAS SUÍNAS - FONTE: www.porkfoodservice.org
PADRÕES DE QUALIDADE

Além da cor, firmeza e exsudação são considerações importantes na avaliação da qualidade


da carne suína, o teor de gordura intramuscular (marmorização) da carne magra é também um fator
importante. A gordura entremeada contribui para a suculência e sabor do produto. Os níveis de
marmorização variam amplamente na carne suína fresca, e a seleção para animais mais magros
reduziu em geral o conteúdo de gordura intramuscular.
Assim como acontece com a carne bovina, as alterações do pigmento muscular da
mioglobina na presença ou ausência de oxigênio fazem variar a cor da carne suína.
Cores em tons de marrom em carnes suínas cruas indicam a presença da metamioglobina,
indicativo da oxidação completa da mioglobina, não significando que a carne está imprópria para
consumo ainda, mas dando certeza de que ela está há bastante tempo fora de uma embalagem
hermeticamente livre de oxigênio.
O pH (partes de Hidrogênio) e o processo de resfriamento pós abate também influenciam
nas cores das carnes suínas.
A cor da carne pode ser influenciada significativamente pelo pH da carne e pelo processo
de resfriamento após o abate. É objetivamente mensurada utilizando o Minolta Light Meter
(medidor de luz), que mede o índice de refração da luz. A pontuação da cor otimizada varia de 40 a
50.

PADRÕES DE COR
PADRÕES DE MARMOREIRO (ENTREMEAMENTO DE GORDURA)

As cores vermelhas mais vivas e brilhantes indicam a presença de oximioglobina, ou seja,


a carne já está há algum tempo em contato com o oxigênio do ar. Quando a carne está embalada à
vácuo é esperado que apresente tons vermelhos mais escuros, devido à desoximioglobina.

PONTOS DE CARNE SUÍNA

Existe uma complexa controvérsia em relação às temperaturas exatas para classificar os pontos das
carnes em geral. Vejamos alguns exemplos:
Acima uma tabela dos EUA indicando temperaturas em °F. Há muita discrepância entre as
publicações nacionais e internacionais sobre a temperatura dos pontos de carne suína. Para os
brasileiros são cerca de 5 °C acima dos pontos de carnes bovinas.

Mapa dos cortes tradicionais suínos:

Mapa dos cortes suínos encontrados no mercado atualmente:


Mapa de cortes suínos tradicionais nos EUA:

A imagem abaixo indica a localização de alguns cortes tradicionais em 3D:


SAIBA MAIS:
No link abaixo é possível acessar materiais de divulgação da carne suína da ABCS (Associação
Brasileira de Criadores de Suínos), onde você vai encontrar receitas, informações técnicas e
imagens.
http://abcs.org.br/materiais-e-publicacoes/

O site Mais carne suína promove uma campanha publicitária para incentivar o consumo de carne
suína no Brasil.
http://www.maiscarnesuina.com.br/

SAIBA MAIS:

A Universidade do Nebraska disponibiliza um modelo 3D de uma carcaça suína.


Use os controles para scanear a carcaça suína e fique familiarizado com a anatomia.
Muito útil para quem pretende um dia desossar um suíno inteiro.

https://porcine.unl.edu/

IMAGENS DE AULAS PRÁTICAS


Costela suína assada em temperatura rigorosamente controlada (ficha técnica online)

1 – Lado de cima de uma costela suína serrada com 15 cm de largura e 8 ossos, estilo Outback.
2 – Lado de baixo (interno) da costela, onde pode ser visto um resíduo da fraldinha.
3 e 4 – Os temperos e ervas descritos na ficha técnica são adicionados e a costela é colocada para
marinar por pelo menos 4 horas sob refrigeração. Depois, a costela é posicionada sobre uma folha
de glaspel (pode ser papel manteiga).
5 e 6 – Embrulha-se a costela na folha de glaspel, derramando os líquidos restantes da marinada
dentro do embrulho, e tentando fechar o mais hermeticamente possível.
7 – O próximo passo é embrulhar em papel alumínio, dando 5 voltas. A costela deve ser assada por
cerca de 3 horas e meia, em temperatura controlada de 125º C a 135º C. Ao se abrir o pacote, se a
costela não estiver corada o suficiente, pode-se terminar o douramento por 4 minutos na função
GRILL do forno (próximo à resistência elétrica incandescente).
9 – Resultado visual, com discreta contratura da carne em relação aos ossos, indicando que a
costela perdeu pouca suculência.
10 – O ponto de carnes com ossos assadas lentamente exige que a carne se solte facilmente dos
ossos, como na imagem, facilitando a refeição do comensal e garantindo a maciez ideal.
Desossa de meia carcaça de suíno:

Prime-rib suíno (Lombo com ossos de costela)


Torresmo de barriga enrolado e pururucado por fritura (rocambole)
T-bone suíno. Acima lombo, abaixo filé mignon. A linha demarca o contorno do osso em forma de
T que separa as duas carnes.

Carcaça partida

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