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Fichamento:

A seleção natural ou a perseverança do mais capaz,


A origem das Espécies, Charles Darwin

 Hooker e Asa Gray o fizeram notar, a variabilidade que observamos entre todas as
nossas produções domésticas não é obra direta do homem. O homem não pode
produzir nem impedir as variações; pode apenas conservar e acumular as que se
lhe apresentam.

 Toda a variação, por menos nociva que seja ao indivíduo, traz forçosamente o
desaparecimento deste. Dei o nome de seleção natural ou de persistência do mais
apto à conservação das diferenças e das variações individuais favoráveis e à
eliminação das variações nocivas. As variações insignificantes, isto é, que não são
nem úteis nem nocivas ao indivíduo, não são certamente afetadas pela seleção
natural e permanecem no estado de elementos variáveis, como as que podemos
observar em certas espécies polimorfas, ou terminando por se fixar, graças à
natureza do organismo e às das condições de existência.

 Compreenderemos melhor a aplicação da lei da seleção natural tomando para


exemplo um país submetido a quaisquer ligeiras alterações físicas, uma alteração
climatérica, por exemplo. O número proporcional dos seus habitantes muda quase
imediatamente também, e é provável que algumas espécies se extingam. Podemos
concluir do que temos visto relativamente às relações complexas e últimas que
ligam entre si os habitantes de cada país, que toda a alteração na proporção
numérica dos indivíduos de uma espécie afeta seriamente todas as outras
espécies, sem falar na influência exercida pelas modificações do clima. Se este país
está aberto, novas formas aí penetram certamente, e esta emigração tende ainda a
alterar as relações mútuas de seus antigos habitantes.

 É necessário jamais esquecer, que no termo variação, compreendo as simples


diferenças individuais. O homem pode produzir grandes alterações nos seus
animais domésticos e nas suas plantas cultivadas, acumulando as diferenças
individuais numa dada direção; a seleção natural pode obter os mesmos
resultados, mas muito mais facilmente, porque a sua ação pode prolongar-se por
um lapso de tempo mais considerável.
 O homem tem apenas um fim: escolher para vantagem de si próprio; a natureza,
ao contrário, escolhe para vantagem do próprio ser. O homem reúne num mesmo
país as espécies provindas de muitos climas diferentes; exercita raramente de uma
forma especial e conveniente os caracteres que escolheu; dá a mesma atenção aos
pombos de bico longo e aos pombos de bico curto; não exercita de maneira
diferente o quadrúpede de longas patas e o de patas curtas; expõe às mesmas
influências climatéricas os carneiros de lã comprida e os de lã curta.
 Pode dizer-se, metaforicamente, que a seleção natural procura, a cada instante e
em todo o mundo, as variações mais ligeiras; repele as que são nocivas, conserva e
acumula as que são úteis; trabalha em silêncio, insensivelmente, por toda a parte e
sempre, desde que a ocasião se apresente para melhorar todos os seres
organizados relativamente às suas condições de existência orgânicas e inorgânicas.

 Quando estudamos os numerosos pequenos pontos de diferença que existem


entre as espécies e que, na nossa ignorância, nos parecem insignificantes, não
devemos esquecer que o clima, a alimentação, etc., têm, sem dúvida, produzido
alguns efeitos diretos. É necessário não esquecer tampouco que, em virtude das
leis da correlação, quando uma parte varia e a seleção natural acumula as
variações, se originam, por vezes, outras modificações de natureza mais
inesperada.

 O que a seleção natural não saberia fazer, era modificar a estrutura de uma espécie
sem lhe procurar qualquer vantagem própria e unicamente em benefício de outra
espécie. Ora, posto que as obras sobre história natural apresentem, por vezes,
semelhantes fatos, não encontrei um único que possa resistir ao exame. A seleção
natural pode modificar profundamente uma conformação que somente fosse
muito útil uma vez durante a vida de um animal, se é importante para ele.

 É então possível que a seleção natural modifique os dois sexos relativamente aos
hábitos diferentes da existência, como algumas vezes sucede, ou que um sexo se
modifique relativamente ao outro sexo, o que acontece freqüentemente. Isto me
leva a dizer algumas palavras a respeito do que denominei seleção sexual.

 As investigações modernas têm diminuído muito o número dos supostos


hermafroditas, e, entre os verdadeiros hermafroditas, há muitos que se copulam,
isto é, que dois indivíduos se unem regularmente para a reprodução da espécie;
ora, é este o único ponto que nos interessa. Todavia, há muitos hermafroditas que,
certamente, se não copulam habitualmente, e a grande maioria das plantas
encontra-se neste caso.

 Todos os horticultores que se ocupam de cruzamentos, sabem quanto a exposição


à umidade torna difícil a fecundação de uma flor; e, contudo, que multidão de
flores têm as anteras e os estigmas completamente expostos às intempéries do ar!
Admitindo que um cruzamento acidental é indispensável, ainda que as anteras e o
pistilo da planta estejam tão próximos que a fecundação de um para outro seja
quase inevitável, esta livre exposição, por desvantajosa que seja, pode ter por fim
permitir livremente a entrada do pólen proveniente de outro indivíduo.

 Poder-se-ia fazer esta objeção que, em uma grande árvore, coberta de i-


numeráveis flores, é quase impossível que o pólen seja transportado de árvore em
árvore, e que apenas poderia ser de flor em flor sobre a mesma árvore; ora,
somente se podem considerar num sentido muito limitado as flores da mesma
árvore como indivíduos distintos. Creio que esta objeção tem um certo valor, mas a
natureza proveu a isto suficientemente dando às árvores uma grande tendência a
produzir flores de sexos separados. Ora, quando os sexos são separados, ainda que
a mesma árvore possa produzir flores masculinas e flores femininas, é preciso que
o pólen seja regularmente transportado de uma flor a outra, e além disso este
transporte oferece uma probabilidade para que o pólen passe acidentalmente de
uma árvore para outra.

 Se interrogamos a natureza para lhe pedir a prova das regras que acabamos de
formular, e se considerarmos uma pequena região isolada, seja qual for, uma ilha
oceânica, por exemplo, posto que o número das espécies que a habitam seja
bastante reduzido, como veremos no capítulo sobre a distribuição geográfica-
todavia a maior parte destas espécies são endêmicas, isto é, foram produzidas
neste lugar, e em mais parte nenhuma do mundo. Pareceria então, à primeira
vista, que uma ilha oceânica era muito favorável à produção de novas espécies.
Mas estamos muito expostos a enganarmo-nos, porque, para determinar se uma
pequena região isolada tem sido mais favorável do que uma grande região aberta
como um continente, ou reciprocamente, à produção de novas formas orgânicas,
seria preciso poder estabelecer uma comparação entre tempos iguais, o que nos é
impossível fazer.

 A seleção natural atua unicamente por meio da conservação das variações úteis a
certos respeitos, variações que persistem em razão desta mesma utilidade. Devido
à progressão geométrica da multiplicação de todos os seres organizados, cada
região contém já tantos habitantes quantos pode nutrir; resulta daí que, à medida
que as formas favorecidas aumentam em número, as formas menos favorecidas
diminuem e tornam-se raras. A geologia ensina-nos que a raridade é o precursor da
extinção. É fácil de compreender que uma forma qualquer, tendo apenas alguns
representantes, tem grandes probabilidades para desaparecer completamente,
quer em razão de alterações consideráveis na natureza das estações, quer por
causa do aumento temporário do número dos inimigos.
 M. H. C. Watson julga que atribuo demasiada importância à divergência dos
caracteres (de que me parece, além disso, admitir a importância) e que o que pode
chamar-se a sua convergência deve igualmente desempenhar qualquer papel.

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