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compreensiva das dinâmicas organiza- J osé Matias Alves é professor do Ensino Se-
cundário e mestre em Ciências da Educação, na
5
cionais, é entre nós uma realidade recente que especialidade de Administração Escolar, pela
busca o seu próprio objecto, as suas metodologias
e o seu reconhecimento institucional e social.
Universidade do Minho. No passado mais longín-
quo, exerceu as funções de presidente do Conse-
ORGANIZAÇÃO, GESTÃO E
O percurso que proponho ao leitor procura chamar
a atenção para a necessidade da construção crítica
lho Directivo, Pedagógico e Administrativo da
Escola Secundária de Gondomar e trabalhou na
PROJECTOS EDUCATIVOS
e pessoal de um saber que pensa a escola enquanto
realidade organizacional que é socialmente cons-
Escola Superior de Educação do Porto no campo
de formação de professores. DAS ESCOLAS
truída. Foi ainda Adjunto do Secretário de Estado dos En-
Nesta reedição são introduzidas as questões do sinos Básico e Secundário (1992-93), Director-
planeamento e avaliação dos Projectos Curricu- -Geral do Departamento do Ensino Secundário
lares e equacionadas as condições e os modos da (1994-96) e Consultor de Formação (1998-00). É
·····························
mudança educacional. Director do Centro de Recursos de Informação e José Matias Alves
Procura-se, assim, manter actual uma publicação Apoio Pedagógico da ASA (CRIAP-ASA).
que tem sido bem recebida pelos professores que 6.a Edição
se interessam pela gestão das escolas. Revista e aumentada
·····························
José Matias Alves
6.a Edição
Revista e aumentada
TÍTULO
ORGANIZAÇÃO, GESTÃO E PROJECTO
EDUCATIVO DAS ESCOLAS
COLECÇÃO
Cadernos Pedagógicos
AUTOR
José Matias Alves
CAPA
José Pedro Costa
ILUSTRAÇÃO DA CAPA
Rui Guimarães
Janeiro de 2003/6.a Edição/Depósito Legal n.o 187 421/02
© EDIÇÕES ASA
EXECUÇÃO GRÁFICA
GRAFIASA
SEDE
E-mail: edicoes@asa.pt
Internet: www.asa.pt
DELEGAÇÃO EM LISBOA
Escrito há mais de dez anos, o presente caderno tem sido favoravelmente acolhido
pelos leitores, talvez porque apresente o lado menos falado (menos mediatizado) da
escola. A escola enquanto realidade organizacional é uma descoberta (relativamente)
recente que se tem vindo a afirmar como objecto de estudo, enfim liberta do peso da
visão institucional.
Falar da escola como organização é falar dos seus objectos concretos, das funções que
realiza, das estruturas, dos poderes, do tempo, dos processos e modos de decisão, das
lideranças, das estratégias… E estas variáveis assumem um relevante papel na susten-
tação e renovação das práticas.
Não obstante a pertinência desta temática impunha-se uma revisão do texto e uma
ampliação. Quanto à revisão apenas se realizaram pequenos ajustamentos; já o con- 5
teúdo foi amplamente aumentado em dois domínios: nos modelos de análise da escola
e no projecto curricular (de escola e de turma).
Cremos, desta forma, ter actualizado de forma suficiente uma publicação e colocá-la
de novo ao serviço dos potenciais leitores.
O autor
1. INTRODUÇÃO
CIÊNCIA HERMENÊUTICO-INTERPRETATIVA
Ou ainda como:
As racionalidades burocráticas
Segundo a perspectiva burocrática, a escola é uma organização formal caracterizada
pela divisão do trabalho, pela fragmentação das tarefas, pela hierarquia da autoridade,
pela existência de numerosas regras e regulamentos que aspiram a tudo prever e res-
ponder, pela centralização da decisão, pela impessoalidade das relações, pelo predomí-
nio dos documentos escritos, pela uniformidade de procedimentos organizacionais e
pedagógicos.
O conjunto destas características configura um sistema de acção concreta que pressu-
põe o domínio da racionalidade, a dominação pela autoridade, a superioridade técnica,
a existência de objectivos claros e unívocos que orientam o funcionamento da organiza-
ção e as acções das pessoas.
Uma acção é insensata quando se deixa determinar pelo formalismo vazio de sen-
tido, quando as decisões não têm em conta as pessoas, as organizações e as especifi-
cidades do contexto, quando a análise se enclausura na razão técnica (estabelecendo
a relação meios/meios) e não se deixa orientar pela razão crítica (estabelecendo a
relação meios/fins), quando as consequências nunca são interrogadas. 15
É sabida a forte presença da lógica burocrática na “organização política e administra-
tiva da nação”. E também no sistema de ensino, desde o topo à base. Uma presença
marcada pelos traços da uniformidade, formalismo, impessoalidade, legalismo e pelo
peso centralista.
É sabido que a lógica burocrática conduz (e é intrinsecamente) muitas vezes a uma
acção insensata. É o caso dos grandes concursos públicos centralizados de aquisi-
ção/distribuição de bens e equipamentos às escolas. Equipamentos que, muitas
vezes, as escolas não querem e que permanecem encaixotados. É o caso dos relató-
rios de “reflexão crítica” para mudança de escalão. Vazios (a maioria) de qualquer
razão, de qualquer efeito, de qualquer sentimento. É o caso das delegações de com-
petências ministeriais. E das subdelegações. E das subsubdelegações. É o caso do
controlo de assiduidade dos alunos (designadamente no ensino secundário).
É sabido que a ordem burocrática é uma ordem infeliz e pessimista. Que perdura
porque desresponsabiliza, securiza e protege. Porque cria a ilusão do poder e do con-
trolo. Não haverá alguém que a ouse questionar?
Se olharmos a escola a partir deste ponto de vista verificaremos que, de facto, o sistema
de ensino e a organização escolar evidenciam a presença de muitas destas característi-
cas. É a forte centralização do poder de decisão, visível, por exemplo, nos currículos,
programas e no regime de avaliação; é a extensa cadeia hierárquica que é suposta regu-
lar a acção das escolas e dos agentes educativos; é a divisão e a fragmentação do traba-
lho visíveis no modo de organização dos saberes disciplinares, do tempo e dos espaços;
é a impessoalidade das relações interpessoais favorecidas pelo sistema de exames, con-
cursos e mobilidade na relação pedagógica; é a uniformidade de currículos e progra-
mas; é o isolamento da acção docente e discente; é a dependência (e a segurança) face
às normas por outros produzidas.
A pregnância e a persistência deste modelo ideológico e organizacional pode ser expli-
cado pelo facto de oferecer “aos indivíduos uma muito feliz combinação de indepen-
dência e segurança” (Crozier, 1963: 253), de assegurar a protecção face aos contextos.
De facto, “todo o sistema burocrático pode ser considerado como uma estrutura de pro-
tecção” (id., ib.) que desresponsabiliza os agentes perante a resolução dos problemas
concretos, sendo este o preço a pagar pela falta de autonomia e liberdade.
No entanto, esta visão é incapaz de dar conta de todas as lógicas de acção concreta e
16 não consegue explicar evidências diversas que revelam que as escolas não se limitam a
aplicar de modo objectivo, uniforme e racional os currículos, os programas e os regula-
mentos. Sendo um “locus de reprodução normativa” marcado pelo traço da fidelidade, a
escola é também um locus de produção de outras regras de jogo (e até de outro jogo),
de infidelidades várias, como demonstrou Licínio Lima (1992: 477):
As perspectivas políticas
A perspectiva política vê a organização escolar como “uma arena onde a política
domina; os detentores de influência rivalizam entre si e perseguem fins pessoais”
(Mintzberg, 1986: 545), o que gera dinâmicas de coligação e de conflito quer entre fac-
ções ou grupos internos quer entre estes e grupos externos.
Segundo Nord (1995: 400 ss) há diversos postulados que revelam a natureza política
das organizações, dos quais destacamos dois:
“as organizações são constituídas por coligações que competem umas com as
outras para alcançar recursos, energia e influência; as coligações tentam prote-
ger os seus interesses e posições de influência através de trocas, regateio e nego-
ciação”,
A perspectiva neo-institucional
Segundo a perspectiva neo-institucional, as práticas de escolarização são caracterizadas
pela débil conexão entre estruturas e actividades, pela escassa avaliação e controlo do
processo e dos resultados da instrução, pelo reduzido exercício da autoridade sobre o
trabalho da instrução (cf. Meyer e Rowan, 1978: 89 ss). Esta situação “deve-se essen-
cialmente ao facto da função prioritária da escola consistir em responder às normas, aos
18 valores e às expectativas da sociedade, estando, por isso, em causa a legitimação da sua
própria existência” (Costa: 1996: 100-101).
Neste contexto, as estruturas formais, os regulamentos e os discursos assumem-se,
sobretudo, como dispositivos de legitimação, como significantes que pretendem fazer
crer que a escola cumpre a sua missão instrutiva e educacional, procurando-se ocultar
ou tornar invisíveis os sinais da sua ineficácia. Neste esforço de construir uma boa ima-
gem social que legitime a sua existência, a instituição escolar organiza-se hipervalori-
zando os rituais de classificação, o regime de avaliação e certificação, com destaque
para os exames e outorga de diplomas que crê sejam importantes credenciais quer para
o prosseguimento de estudos quer para o ingresso na vida “activa”, aqui fundando o
essencial dos seus investimentos e controlo formal.
Por outro lado, para dissimular a escassa conexão e congruência entre discursos,
decisões e acções(7) e a débil coesão intra-organizacional, a dinâmica da acção é carac-
terizada pela “lógica da confiança” que corresponde ao pressuposto de que cada indiví-
duo confia na competência e no trabalho dos outros:
As perspectivas da ambiguidade 19
A visão que olha a escola como um sistema ambíguo (ou como uma “organização anár-
quica(9)) considera-a como uma realidade complexa, heterogénea, problemática e ambí-
gua em que as intenções e os objectivos surgem insuficientemente definidos, em que as
tecnologias (o modo de realizar a educação) são pouco claras e frequentemente mal
dominadas, em que a participação dos actores é fluida, em que a tomada de decisão é
desordenada, imprevisível e improvisada, funcionando segundo o modelo do “caixote
do lixo”(10), em que as preferências e as referências são inconsistentes e mal definidas.
Por outro lado, a escola surge como um sistema debilmente articulado, verificando-se
uma débil conexão entre intenções, metas e acções, passado-presente-futuro, órgãos de
linha e staff, sistemas de autoridade (autoridade legal/poder de especialista), eleitores e
eleitos, processos e resultados, problemas-decisões-acções-resultados, instituindo-se
como uma dinâmica geral de ambiguidade, visível no planeamento da acção educativa,
na adopção de tecnologias pedagógicas e didácticas, na tomada de decisões, no estilo
de liderança e na relação com o ambiente externo.
No caso do planeamento da acção educativa, traduzido no projecto educativo de escola e
no plano anual de actividades, verifica-se a ambiguidade de objectivos, quer na relação
com os normativos de referência quer na sua escassa explicitação, coesão interna e exe-
quibilidade, a ambiguidade de papéis e articulações, ambiguidade de critérios e indi-
cadores de avaliação da qualidade dos processos e resultados. No caso das tecnologias
organizacionais e pedagógicas – e dada a ambiguidade dos objectivos – ocorrem situa-
ções de recurso a tecnologias inconsistentes e incoerentes ou então nem sequer se rea-
liza um trabalho de ponderação dos modos de fazer mais adequados às finalidades da
escola. A tomada de decisão é caracterizada pelo encontro aleatório entre contextos-
-problemas-recursos e soluções, sendo a sua racionalidade de natureza anárquica.
No capítulo da liderança, verifica-se a co-ocorrência de quatro tipos de ambiguidade
(cf. Cohen e March, 1974: 195 ss):
Finalmente, no campo do ambiente externo também não é linear nem unívoca a relação
que a organização com ele mantém. De facto, esta relação é “oportunisticamente adap-
tativa” (Estevão, 1997: 231), significando isto que as pessoas e os grupos agem e rea-
gem em função da leitura que fazem dos seus próprios interesses e dos interesses e das
pressões dos contextos.
Não obstante a validade dos contributos desta perspectiva para a compreensão da lógica
da acção nas organizações escolares – nomeadamente quando acentua a ambiguidade
dos fins, das tecnologias e dos processos decisórios – importa considerar que não
fornece uma visão integrada e consistente dos móbiles da acção, nem avança no sentido
de procurar explicar as razões de ser desta gramática organizacional, parecendo, por
isso, necessário adoptar um enfoque teórico que conjugue a diversidade de perspectivas.
2.1. Organização formal e informal
O ICEBERG ORGANIZACIONAL 21
Aspectos formais:
Objectivos
Estrutura
Tecnologia
Políticas
Recursos
Percepções
Atitudes
Sentimentos
Valores
} Sobre os sistemas
formal
e informal
Interacções
Normas de grupo
DIMENSÃO SUBDIMENSÃO
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3. FINALIDADES E FUNÇÕES DA ESCOLA
Já referimos que a escola é uma organização específica da educação formal, isto é, visa
proporcionar de uma forma sistemática e sequencial a instrução (transmitindo e produ-
zindo conhecimentos e técnicas), a socialização (transmissão e construção de normas,
valores, crenças, hábitos e atitudes) e a estimulação (promoção do desenvolvimento
integral do educando) das gerações mais jovens. Básica e genericamente, são estas as
funções do sistema educativo e é este o mandato que a sociedade atribui à escola de
interesse público.
Poderemos especificar esse mandato particularizando, por um lado, as funções do sis-
tema educativo (e da escola enquanto instância educativa) e, por outro lado, introdu-
zindo a distinção conceptual entre finalidades e funções. Enquanto as finalidades da
escola são os efeitos intencionalmente pretendidos e desejados, as funções reportam-se
aos efeitos intencionais e não intencionais da actividade educativa. Como finalidades, a
escola persegue, com maior ou menor ênfase, a finalidade cultural, ao transmitir todo
o património de conhecimentos, técnicas e crenças; a finalidade socializadora, ao inte-
grar os indivíduos na comunidade, através da transmissão e construção de normas e
valores; a finalidade produtiva, ao proporcionar ao sistema económico e demais siste- 25
mas sociais o pessoal qualificado de que necessitam; e a finalidade personalizadora,
ao promover o desenvolvimento integral da pessoa; a finalidade igualizadora, ao pro-
curar corrigir as desigualdades sociais (cf. Formosinho, 1986). Como funções, a escola
pode assegurar, para além das referenciadas às finalidades, a função de custódia (guar-
dar os filhos enquanto os pais trabalham); a função selectiva (seleccionar para legiti-
mar diferentes oportunidades pessoais e sociais); a função de facilitar a obtenção de
títulos académicos (sucedâneos dos títulos nobiliárquicos, instrumentos de mobilidade
social ascendente); e a função de substituto familiar. O esforço analítico dos actores
da educação procurará identificar as finalidades e as funções predominantes da organi-
zação escolar segundo o ponto de vista normativo e segundo o ponto de vista dos acto-
res centrais do processo educativo – a direcção, os professores e os alunos. Procurará
saber se a organização dispõe de alguma autonomia na determinação dessas finalida-
des, qual o nível e agentes que mais influenciam a sua fixação e quais os processos usa-
dos para a construção e divulgação dos objectivos centrais. Mais especificamente, inte-
ressará reter se as finalidades são impostas por entidades exteriores ou se são definidas
no interior do “território social” e se são definidas por consenso ou por conflito ou até
se é matéria ambígua, imprecisa ou marginal.
A LEI DE BASES DO SISTEMA EDUCATIVO
Finalidades do sistema de ensino
Percentagem de frequência
36%
17%
0%
29%
21%
29%
26
Na análise de conteúdo da Lei de Bases a que procede João Formosinho, o autor con-
clui: “da análise feita podemos concluir que: 1.°) à escola é atribuído um decisivo papel
de socialização da geração jovem e de igualização das oportunidades de acesso e de
sucesso educativo, sendo tais finalidades mais importantes no ensino básico; 2.°) a fina-
lidade personalizadora na educação é considerada bastante importante em todos os
graus de ensino; 3.°) o ensino básico e o ensino secundário são ensinos muito diferencia-
dos a nível das suas finalidades” (Formosinho, 1988: 61).
Sendo este o ordenamento das finalidades, como as trabalha e desenvolve a escola?
Que diferença entre as finalidades e as funções (aquilo que a escola realmente faz?).
4. ESTRUTURAS FUNCIONAIS
ESTRUTURAS
ADMINISTRATIVAS PEDAGÓGICAS
ESTRUTURA
Simples 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Complexa
Rígida 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Flexível
Hierárquica 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Lateralizada
Objectiva 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Subjectiva
Informal 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Formal
30 Burocrática 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Adocrática
Adequada
às
finalidades 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Inadequada
Observações/Comentários -------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
-------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
-------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
---------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
5. OS NÍVEIS DA ORGANIZAÇÃO
NÍVEL INSTITUCIONAL
NÍVEL INTERMÉDIO
32 NÍVEL OPERACIONAL
I• Poder físico, baseado na superioridade física, é o tipo de poder, por vezes ainda
utilizado pelo professor, traduzido no castigo corporal e que fez parte de uma “peda-
gogia da porrada” (Alves, 1991) em declínio, mas que ocorre ainda sobretudo no 1.°
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ciclo do ensino básico.
II• Poder material ou remunerativo, baseado na possibilidade da direcção da escola
fixar, arbitrariamente, recompensas materiais e financeiras, o que no caso da escola
pública não é praticável uma vez que escapa à decisão da organização.
III• Poder normativo, baseado na possibilidade do recurso a normas jurídicas, pro-
fissionais, morais, ideológicas. Este tipo de poder é recorrentemente utilizado num
contexto organizacional burocrático que prevê e regulamenta grande parte da acção
organizacional, como será em parte o caso das nossas escolas. Os actores dirigentes,
à falta de outras bases de poder, sempre podem recorrer ao espírito e/ou à letra da lei,
das normas, dos ofícios, para mostrarem ascendência organizacional.
IV• Poder cognoscitivo (ou de especialista) baseia-se em conhecimentos científicos,
técnicos e tecnológicos, sendo um tipo de poder que se distribui por uma pluralidade
de actores escolares e que pode originar conflitos de poder diversos. De facto, na
escola pós-1.° ciclo do ensino básico há diversos especialistas disciplinares que pode-
rão conflituar com a direcção. Por exemplo, de que forma o director/Conselho
Directivo poderá exercer o poder autoritativo ou normativo sobre matérias disciplina-
res de que não é especialista?
V• Poder autoritativo ou autoridade, baseado na posição oficial de superioridade
formal de A sobre B. Convirá, no entanto, notar que esta superioridade formal pode
não ser aceite ou reconhecida e de per si é geralmente insuficiente para garantir o
exercício do poder.
VI• Poder pessoal baseia-se nas características afectivas, temperamentais e de per-
sonalidade próprias de cada indivíduo, sendo uma das leis nucleares da relação
educativa num contexto organizacional marcado pela heterogeneidade de interesses
e motivações e pela ambiguidade e diluição do poder e responsabilidade.
Legítimo Pedir silêncio; definir regras Erguer a mão para falar; pedir licença,
de comportamento e de avaliação; acatar regras. 35
definir ritmo, espécie e duração
do trabalho e verificar o seu
cumprimento; pedir atenção; fazer
a chamada; marcar faltas, etc.
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7. TEMPO ESCOLAR
O tempo é uma das variáveis da organização escolar mais naturalizada e sobre a qual
parece haver maior consenso. O calendário escolar ordena o tempo segundo uma lógica
própria de uma cadeia de montagem: prevê o início e o fim do ano, os dias lectivos, as
férias, períodos escolares em que o ano se divide, as datas reservadas à avaliação, os
momentos de progressão, tempos para reuniões, etc...
As cerca de 900 horas/ano por norma atribuídas aos currículos das escolas são distri-
buídas por períodos, semanas, dias, componentes e disciplinas.
Flexibilizado o início/fim do calendário escolar, a norma institui três períodos sensivel-
mente idênticos, fixa o número de horas por semana que varia em função dos ciclos e
do currículo (oscilação entre 31 e 39 horas/semana), estipula o número máximo de
horas por dia (oito horas) e o número de horas por disciplina, segundo critérios de rele-
vância (ou prestígio) científico e académico e/ou social.
A distribuição interna das horas das disciplinas é também superiormente fixada, consi-
derando-se haver critérios racionais (ligados à especificidade dos conteúdos, tipo de
trabalho pedagógico idealizado...) válidos para todas as escolas e disciplinas. O modo
distributivo segue, norma geral, a unidade horária (1+1+1...) numa prática de fragmen- 37
tação dos saberes que propicia um modo de trabalho pedagógico de tipo expositivo em
que o aluno é o passivo receptor/consumidor de mensagens.
Deste conjunto de unidades temporais apenas algumas breves anotações sobre a uni-
dade semana e a unidade dia.
É geralmente reconhecido o excesso da carga horária semanal (sempre superior a 30
horas e nalguns casos chegando às 37 horas), o que obriga os alunos a permanecerem
de manhã e de tarde na escola sem que esta lhes proporcione (em muitos casos) activi-
dades educativas para além das previstas explicitamente no plano de estudos.
Os tempos mortos raramente são convertidos em tempos livres educativos, deixan-
do-se ao acaso as interacções informais, a ocupação do tempo.
Quanto ao dia escolar, ele pode ser teoricamente organizado de quatro modos: compar-
timentado concentrado, compartimentado integral, integrado concentrado e inte-
grado integral (Formosinho, 1988: 63). O primeiro corresponde a uma manhã ou
tarde, quatro ou cinco horas usadas de modo contínuo e intensivo, não havendo tempo
para actividades extraplano de estudos. O aluno, qual peça numa cadeia de montagem,
passa rapidamente por diversos professores, suportes, métodos, conteúdos, melancolias
diversas. Reduzir a carga horária actual e fixá-la, por exemplo, nas 25 horas/semana e
manter esta tecnologia será uma óptima maneira de aperfeiçoar a cadeia de montagem
poupando milhões de contos.
O segundo modo – compartimentado integral – é aquele que a generalidade das nossas
escolas conhece. Durante todo o dia – 7 horas, 8 horas – sucedem-se as disciplinas,
professores, os métodos, o tédio, os toques de campainha.
O terceiro e o quarto modos – integrado “o uso do tempo escolar está sob o controlo do
professor (as equipas docentes) que elabora(m) para cada dia o horário das actividades
lectivas” (id., ib.: 2). Nestes modos a variável dia escolar está dependente das práticas
pedagógicas e potencia um melhor uso das tecnologias educativas, e prática da inter-
disciplinaridade, uma melhor relação tempo-especificidade das práticas de ensino-
-aprendizagem.
A adopção de um destes modos nunca é inocente ou neutra. Ela interfere com a valori-
zação de determinadas finalidades/funções educativas, condiciona o uso de determina-
das tecnologias, ilustra mesmo determinados conceitos de educação e de organização
educativa.
A “escolha” generalizada de modo compartimentado integral que vigora na generali-
38 dade das nossas escolas, e que a racionalização de recursos ainda tentará converter no
modo compartimentado concentrado, é congruente com a ideia de uma instrução indus-
trializada, de uma escola-fábrica que rapidamente vai “processando” as matérias-pri-
mas, um currículo racionalista, académico, uniforme, que parece esquecer as finali-
dades da educação.
OS DEVERES
Para além do tempo ocupado pelas actividades de instrução – 30/37 horas por semana
– à generalidade dos alunos é ainda exigida a produção domiciliária de “deveres”. É
frequente acontecer que após 7/8 horas de trabalho na escola venha o aluno para casa
e seja obrigado a um trabalho extraordinário de mais 2/3 horas, o que poderá totalizar
uma jornada de 11 horas! A marcação dos deveres por parte de cada professor não
tem presente a marcação eventualmente feita pelos outros professores, ignora as
condições culturais, familiares, especiais do locus de produção, esquece que muitos
alunos têm de realizar trabalhos domésticos (trabalho em casa, no campo...), descuida 39
as aprendizagens que os alunos realizam noutros contextos (música, dança, línguas
estrangeiras...), não considera o tempo despendido no percurso casa-escola-casa,
ignora a necessidade de convivência, do jogo, dos “hobbies”...
Os deveres transformam os alunos em reféns da escola, em objecto nas mãos de tira-
nos que raramente interrogam a complexidade de uma ordem tão simples. Já alguém
terá reflectido nos efeitos perversos dos deveres? Já alguém terá pensado no forte
contributo dos deveres para o insucesso escolar, pessoal e social? Já alguém terá ima-
ginado o drama em gente de um trabalho infantil forçado? Já alguém...?
8. PROCESSO DECISIONAL
Qualquer que seja o nível organizacional em que os actores se situem todos tomam
decisões. Certamente que haverá decisões específicas e especializadas sobre determina-
dos objectos e haverá também actores que ocupam uma parte significativa do seu tempo
a decidir. Convirá, no entanto, considerar que “as decisões são a área em que se dis-
tribuem os recursos através dos quais os indivíduos e grupos são capazes de alcançar
posições de influência, aumentando as probabilidades de alcançar os seus objectivos”
(Bacharach, 1981, cit. González, 1989: 121).
Nas diversas funções que os actores desenvolvem – planificação, organização, coorde-
nação, orientação, execução, controlo (Newman, cit. Ciscar e Uria, 1988: 195) – os
actores têm de tomar decisões que tanto podem implicar acção como inacção ou espera.
Como mostrou Simon numa obra clássica que remonta a 1945 (1983: 56, 69, 73 ss) a
decisão é sempre atravessada por uma “racionalidade limitada” pois os actores, consciente
ou inconscientemente, não dominam todo o conhecimento necessário para analisar as
alternativas possíveis, têm dificuldades em avaliar os efeitos das decisões e não controlam
o universo dos comportamentos possíveis dos actores que trabalham na organização.
O processo escapa assim à racionalidade programada das metodologias que conduzem 41
à melhor decisão, tornada impossível pela imprevisibilidade dos comportamentos e pela
complexidade das situações e dos contextos. Face à ilusão racionalista e ao seu carácter
“profundamente optimista”, a “tomada de decisões humilde” baseada em informações e
conhecimentos incompletos e imperfeitos é o modo mais capaz de gerir a imprevisibili-
dade e a complexidade e que Etzioni (1991) compara com o “modo clínico” de tomar
decisões.
Não obstante esta limitação do “racional”, uma tipologia da natureza do processo deci-
sional pode identificar e descrever um modo racional, colegial, político, pessoal e
indefinido (Bush, 1986) de tomar decisões que relevam de pressupostos, valores, esti-
los de liderança bem definidos.
Uma outra focalização desta problemática procurará determinar qual a relação entre as
decisões, nomeadamente as decisões substantivas que marcam a orientação política da
organização e a finalidade e funções predominantes da escola. Bush (1986) sinaliza
cinco modos de relação. Decisões baseadas nas finalidades e funções explícitas de
organizações, normalmente fixadas exteriormente, decisões baseadas em funções e
finalidades partilhadas pelos actores, decisões baseadas nos objectivos e interesses dos
grupos dominantes, decisões baseadas em objectivos particulares e pessoais dos mem-
bros e, finalmente, decisões não relacionadas com as finalidades e funções da escola.
Outro enfoque analisará se o processo está centralizado nas diferentes estruturas direc-
tivas ou centralizado nos actores. Num caso, teremos o reforço da hierarquia e o apelo
ao poder autoritativo, no outro, o apelo à participação, à autonomia e à assunção da
responsabilidade segundo um contínuo expresso na figura:
TOMADA DE DECISÃO
Centralização da decisão
Poder autoritativo
Descentralização da decisão
Poder partilhado
1 2 3 4 5 6
Os pólos extremos deste contínuo de processos de decisão evidenciam dois modos dis-
42 tintos de estruturar o funcionamento da organização escolar. Enquanto de um lado
encontramos os papéis formalmente bem definidos, margens de liberdade reduzidas,
comportamentos regulamentados por decisões e orientações escritas, estruturas funcio-
nais rígidas e delimitadas e um poder autoritativo singular e hierárquico, do outro, os
papéis, os regulamentos e as estruturas são flexíveis, as zonas de liberdade e autonomia
são maiores, acredita-se na eficácia decisional das subjectividades dos actores e o poder
é exercido de forma colegial (Open University, Block 3, 1981: 20).
9. A PARTICIPAÇÃO
Como referimos, o processo decisional é uma construção em que podem intervir os acto-
res de uma organização. O objecto da participação pode ser, no entanto, muito mais alar-
gado, sendo possível estender-se às diversas funções administrativas (planear, organizar,
coordenar, orçamentar, controlar...) e a diversas actividades planeadas e realizadas pela
escola.
Antes de delimitarmos os objectos e os procedimentos de análise procederemos a uma
breve revisão da problemática da participação do ponto de vista político e organizacional.
Segundo Machado (1982: 121-122), é útil distinguir os conceitos, contíguos mas opos-
tos, de ser parte e participante. Enquanto parte, o actor afirma a sua autonomia pessoal
contra outros particulares, mas, enquanto participante, “ele representa e afirma o inte-
resse de um grupo” e “aparece como portador de uma função no todo colectivo” (ib.).
A participação é assim um processo (consensual e conflitual), um modo de contribuir
para a construção da organização, sacrificando, até certo ponto, os objectivos, os inte-
resses singulares e pessoais e a liberdade e autonomia individuais. Esta tensão entre ser
parte e participante pode explicar, ainda que parcialmente, as dificuldades da participa-
ção(13). O actor pode sentir o desejo de participar para controlar as margens de incerteza 43
organizacional, o seu modo de trabalho e o seu percurso profissional. Mas, “por outro
lado, tem receio de participar, na medida em que teme perder a sua própria autonomia e
ser limitado e controlado pelos co-participantes” (Crozier, 1963: 252).
Por outro lado, é ainda necessário esclarecer um problema, quanto a nós estrutural, e
que se liga com o estatuto dos actores – nomeadamente, professores e alunos – na
organização escolar. Teoricamente, os professores podem ser membros da organiza-
ção, aí trabalhando exclusivamente ou quase exclusivamente e identificando-se com o
projecto e objectivos ou simples prestadores de um serviço à organização, sendo
alheios às suas especificidades. E os alunos podem sentir-se e serem tratados como
membros, clientes ou meros beneficiários do trabalho da escola. Esta diversidade de
situações possíveis ajuda a compreender os processos participativos e contribui para
explicar a ênfase autoritária ou participativa da organização.
Para apreender os diferentes modos participativos é útil a tipologia proposta por Lima
(1988: 68 ss) e aqui apresentada numa figuração ligeiramente adaptada.
Como refere o autor, “esta categorização, pelo seu carácter multidimensional e pelo
facto de se basear num processo de conjunção de diversos elementos, poderá talvez
escapar mais facilmente aos perigos característicos de certas classificações e tipologias
unidimensionais”, frisando, no entanto, tratar-se de “uma espécie de tipos puros ou ideais
(no sentido weberiano)” (ib.: 71), pelo que a realidade pode não se conformar com a
grelha apresentada.
Este modelo descritivo servirá para sondar os processos participativos, sobretudo atra-
vés de procedimentos de indução e inferência. Interessa também identificar os agentes
e os campos de incidência da participação, isto é, saber quem participa dentro das cate-
gorias professores, alunos, pais, elementos da comunidade – e em quê –, dentro das
dimensões planificação de actividades curriculares e extracurriculares, realização de
actividades extracurriculares, avaliação, análise de funcionamento e elaboração de
regulamento interno, e eleição de órgãos directivos, tendo em conta a perspectiva de
professores e alunos.
TIPOS DE PARTICIPAÇÃO
CRITÉRIOS
A – Representatividade B – Regulamentação C – Forma D – Objectivos da organização
D1. Convergente
C1. Activa
44 B1. Formal
D2. Divergente
D1. Convergente
C2. Passiva
D2. Divergente
A1.
Directa D1. Convergente
C1. Activa
D2. Divergente
B2. Informal
D1. Convergente
C2. Passiva
D2. Divergente
Participação
D1. Convergente
C1. Activa
D2. Divergente
B1. Formal
D1. Convergente
C2. Passiva
D2. Divergente
A2.
Indirecta D1. Convergente
C1. Activa
D2. Divergente
B2. Informal
D1. Convergente
C2. Passiva
D2. Divergente
Já aludimos à distinção weberiana entre autoridade – poder legítimo, aceite por aqueles
sobre os quais se exerce – e poder – probabilidade de um actor, dentro de uma relação
social, estar em posição de realizar a sua própria vontade a despeito da resistência. O con- 45
ceito de liderança que adoptámos está próximo do conceito de autoridade, nomeadamente
de autoridade carismática e do conceito de poder pessoal referido por Formosinho (1980),
deles se distinguindo por ser um poder que se exerce sobre um grupo.
Neste sentido “a liderança não seria mais do que o exercício do poder por parte de um
actor sobre um grupo” sendo “esta especificação de grupo, enquanto destinatário do
exercício do poder, que constitui uma das características básicas, e geralmente reconhe-
cidas, do conceito de liderança” (Jesuíno, 1987: 8).
Para além da especificidade de relação de assimetria numérica, Jesuíno (ib.: 11),
seguindo Parsons (1963), sustenta que a liderança “envolveria ainda, e sobretudo, a
intenção explícita de promover a eficácia da acção colectiva, constituindo esta a condi-
ção de sua legitimação” e tendo em conta a “realização de objectivos comuns, tanto de
líderes como dos seguidores”.
Clarificado o conceito, e sem nos determos no exame dos traços do perfil do líder,
sejam eles a inteligência, a personalidade e motivação, mas frisando as implicações
situacionais e contextuais, apresentaremos e comentaremos três modelos descritivos do
comportamento dos líderes formais.
Um decorrente do trabalho de Kurt Levin identifica três estilos de liderança: autoritá-
rio, democrático e “laissez-faire” (Jesuíno, 1987: 49, Ghilardi e Spallarossa 1989:
105). Num estilo autoritário o líder formal determina a política da escola, as estraté-
gias gerais, dispensa mecanismos e processos de participação, orienta a sua acção atra-
vés de dispositivos de submissão pessoal e normativa. O poder cognoscitivo ou de espe-
cialista dos professores e formadores aliado à organização do tempo e dos espaços
dificultam o exercício do estilo autoritário, embora seja possível um exercício autoritá-
rio de dominação nas relações sociais que se estabelecem no exterior da sala de aula.
O estilo democrático caracteriza-se pelo incentivo à participação na formulação de
políticas e estratégias e nas tomadas de decisão havendo margens significativas de
autonomia e liberdade para os membros da organização.
Por último, no estilo “laissez-faire” há uma diluição do poder de líder, escassos ou
nulos procedimentos avaliativos da eficiência e eficácia do trabalho desenvolvido, um
apagamento do líder formal. Este estilo pode caracterizar uma organização específica
como é a escola com um corpo docente móvel, não pertencente estatutariamente à orga-
nização, prestador de um serviço com o qual não tem tempo para se identificar, e com
um horário de trabalho reduzido e quase exclusivamente lectivo, embora seja prudente
46 não generalizar.
Um outro modelo, formulado por Getzels-Guba (cit. Sergiovanni e Carver, 1976: 231 ss),
descreve três estilos possíveis de liderança:
Nomotético: o líder enfatiza a dimensão institucional da organização, que existe inde-
pendentemente dos seus membros individuais, a organização administrativa e pedagó-
gica da escola, o cumprimento dos papéis fixados em função dos objectivos.
Ideográfico: o líder enfatiza as necessidades dos indivíduos que trabalham na organiza-
ção. Preocupa-se com a relação pessoal, o bem-estar e a satisfação profissional. Para o
líder ideográfico a organização é sobretudo as pessoas, os seus interesses e necessidades.
Transaccional: é um estilo que tenta conciliar os dois processos de liderança anteriores.
Bass (1988: 30 ss), na linha deste modelo, propõe uma distinção entre liderança
transaccional e transformacional. Para a liderança transaccional interessa clarifi-
car o que se espera dos professores e alunos, precisar papéis e satisfazer necessida-
des de forma a atingir os resultados esperados, utilizando quer o “reforço eventual”
(prometendo recompensas em função do esforço realizado e os resultados conse-
guidos por professores e alunos) quer o “castigo eventual” (penalizando professores
e alunos quando não atinjam os níveis pretendidos).
Ao contrário, uma liderança transformacional quer que os seus seguidores sejam
também líderes. A liderança transformacional motiva os seguidores para que
façam mais e melhor do que o esperado, consciencializa da importância e valor
dos processos e produtos desejados, promove a superação dos interesses pessoais
imediatos em benefício da organização, eleva o nível de confiança e amplia as
necessidades dos seguidores.
5 5-5
Orientação
para as
tarefas 4
estruturar
3 (grau zero
controlar
de liderança)
supervisionar
2
1-1 9-1
1
1 2 3 4 5 6 7 8 9
Pouca Orientação para as Elevada
tarefas
48
A escala que se apresenta na página seguinte pode ser um instrumento para a descri-
ção e análise do comportamento dos órgãos directivos (ou de gestão), podendo for-
necer um exercício de metacognição e metapraxis.
Esta revisão de diversas tipologias poderá ajudar à análise dos modos de liderança das
escolas, variável que consideramos importante num contexto em que a mobilização ideo-
lógica parece perder consistência.
ESCALA DESCRITIVA DO COMPORTAMENTO DO DIRECTOR DA ESCOLA
Assinale com (x) o número que melhor traduz a sua opinião quanto ao comportamento e atitudes do director da
escola, segundo escala: 1 — Sempre; 2 — Com frequência; 3 — Por vezes; 4 — Raramente; 5 — Nunca;
6 — Não sabe.
8. Decide sobre o que deve ser feito e como deve ser feito. 1 2 3 4 5 6
Outros autores (Ghilardi e Spallarossa, 1976: 113, Owens: 247, Vala et al., 1988; Open
University, 1981: 31), não obstante algumas diferenças, propõem definições que apre-
sentam um conjunto de denominadores comuns, sobressaindo a ideia-chave das percep-
ções globais e do valor que os actores atribuem a uma série de dimensões.
Essas dimensões configuradoras do clima podem ser, segundo Andersen, citado por
Nóvoa (1990: 35-70), reduzidas a quatro: a ecologia, que abrange elementos físicos e
materiais como o tamanho, características do edifício, equipamento, o sistema social,
caracterizado pelas regras que regulam os comportamentos e interacções entre os mem-
bros da organização, o meio ambiente, definido pelas características pessoais dos
actores e pelo modo de integração no contexto social e cultural da escola, metáfora
fluida que recenseia os valores e os sistemas identificados partilhados(14).
Por sua vez, e numa tipologia centrada nos comportamentos dos professores e dos
directores, Halpin e Croft (citados, entre outros, por Open University, 1981: 31, Owens,
1976: 261 ss, Ghilardi e Spallarossa, 1989: 14) enumeram oito factores para descrever
o clima, quatro referenciados ao comportamento dos professores e quatro ao comporta-
mento do director. Quanto ao comportamento dos professores cita-se o “disangage-
ment”, que descreve a tendência dos professores para se alhearem do projecto da
escola, suas marcas específicas e singulares, os impedimentos (“hindrance”), que refe-
rencia as percepções sentidas pelos docentes de que as rotinas, as tarefas burocráticas
são um estorvo e um constrangimento para a acção pedagógica, o moral, em que os
professores sentem satisfeitas as suas necessidades sociais e como tal sentem-se
52 auto-realizados pessoal e profissionalmente, e a sociabilidade, que indica o grau de
coesão social entre os professores. Quanto ao comportamento do director, refere-se o
distanciamento, caracterizado por um comportamento formal e impessoal, estilo
nomotético de liderança, ênfase na produção, o que induz ao reforço dos mecanismos
de controlo, a “propulsão”, que caracteriza um comportamento dinâmico e incentiva-
dor que valoriza e reconhece o trabalho dos professores, tendo em vista a consecussão
dos objectivos da escola e a consideração que revela um comportamento orientado
para uma relação pessoal e humanizada.
A articulação destes diferentes factores permite, ainda segundo Halpin e Croft, cons-
truir uma tipologia de seis “climas escolares” (Open University, op. cit.: 32-33, Owens,
op. cit.: 263-271).
Clima aberto
O clima aberto caracteriza uma situação de alto moral. Os professores gostam de tra-
balhar em equipa, sentem-se motivados e satisfeitos com o trabalho realizado (baixo
grau de “disangagement”) que não é sobredeterminado pelo cumprimento burocrático
das funções (baixo nível de impedimentos).
O director não enfatiza a dimensão produtiva, adopta procedimentos propulsivos e de
consideração em relação ao grupo.
Clima autónomo
A marca distintiva deste clima organizacional é a quase completa liberdade que o
director confere aos professores no sentido de estabelecerem as estruturas de interac-
ção que melhor satisfaçam as necessidades sociais e deste modo contribuam para um
melhor desempenho profissional. O baixo “disangagement”, moral elevado, baixo
nível de impedimentos, elevado nível de distanciamento, baixa ênfase produtiva são
outros traços deste clima.
Clima controlado
A preocupação da produtividade em detrimento da satisfação das necessidades sociais
é a marca maior deste clima. Trabalho individualizado, escasso tempo para a relação
pessoal, cumprimento estrito de normas, ênfase na comunicação escrita, ênfase na pro-
dução, pouca sociabilidade, baixa consideração.
Clima familiar
Elevada cordialidade, elevado moral, sociabilidade e consideração, baixo distancia- 53
mento e pouca ênfase produtiva. Relação e comunicação informal, sensação de fazer
parte de “uma grande e feliz família”.
Clima paternalista
Elevado “disangagement”, “baixos impedimentos” e sociabilidade. Ênfase produtiva,
controlo, centralização de papéis.
Clima fechado
Elevado “disangagement” e impedimentos, distanciamento, ênfase produtiva, baixo
moral, consideração e sociabilidade são marcas-tipo deste clima. Reduzida autonomia,
impessoalidade e formalização.
Uma outra tipologia referenciada, entre outros, por Owens (1989: 247 ss) e citada tam-
bém por Nóvoa (1990: 77-78) identifica duas categorias básicas – clima fechado, clima
aberto – cada um com duas subcategorias – autoritário, paternalista, consultivo e parti-
cipativo, como se pode observar.
CLIMA DE ESCOLA
Fechado Fechado
Autoritário Paternalista
Clima da
Escola
Consultivo Participativo
Aberto Aberto
Admita que o clima escolar pode ser o resultado das interacções entre as pessoas, das relações
entre os órgãos, dos valores partilhados (ou não) pelos elementos da organização, do tipo de
comunicações estabelecidas e enforma a percepção que cada indivíduo tem da instituição em
que trabalha.
Considerando este conceito, assinale (x) o número da escala que melhor traduza a sua opinião
em relação aos itens que se seguem.
1. Rotineiro 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Inovador
2. Rígido 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Flexível
3. Cooperativo 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Competitivo
4. Estável 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Instável
5. Agradável 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Desagradável
6. Gratificante 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Frustrante
55
7. Animador 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Desanimador
8. Aberto 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Fechado
10. Poderia qualificar com os adjectivos que considerar mais pertinentes, e que não tenham
aparecido nos itens anteriores, o clima da sua escola?
____________________________________________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________________________________________
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12. A TECNOLOGIA
O conceito de tecnologia que aqui usamos tem a ver com o saber fazer organizacio-
nal, a capacidade de analisar e resolver problemas, os processos de ensino-aprendiza-
gem adoptados, a gestão de espaços e tempos, os modos de realizar as funções tendo
em vista as finalidades educativas (cf. Paisey, 1981: 44).
Há vários modos tecnológicos de organizar as actividades educativas dependendo de
diversas variáveis (nível etário dos alunos, modalidade de ensino) e da especificidade
da organização escolar.
Apresentaremos dois modelos que podem servir para descrever a tecnologia usada na
escola.
O primeiro (cf. Paisey, 1981: 55 ss) considera que os modos de trabalho escolar podem
ser descritos segundo três processos: “job production” (produção individualizada),
refere-se a um processo em que a “unidade” a produzir é completamente realizada por
um indivíduo ou um grupo, sendo mobilizados todos os recursos da organização para a
sua concretização. No contexto escolar, este tipo de tecnologia aconteceria se cada
aluno pudesse aprender segundo as suas próprias necessidades e ao seu próprio ritmo.
O 1.° ciclo de ensino básico dispõe de condições para a utilização desta tecnologia. 57
Se o trabalho da escola é concebido para um grupo e este evolui numa série de patama-
res e em determinada sequência encontramos o conceito de “batch production” (pro-
dução em fornada). A “produção em fornada” é uma tecnologia bem característica da
escola massificada, que dispõe os alunos em turmas, organiza a progressão por anos,
obrigando todos os alunos a cumprirem o mesmo percurso no mesmo tempo.
Por seu turno, a “flow production” (produção em fluxo, corrente) consiste na realiza-
ção de uma produção contínua e progressiva na qual as unidades progridem indepen-
dentemente da sucessão nos patamares, o que se poderá verificar se a escola permitir
que nas diferentes disciplinas o aluno progrida à medida que vai realizando as aprendi-
zagens (será o caso de uma progressão modular). Como refere Paisey (1981: 56) a dife-
rença crítica entre esta operação e a da “job production” é que nesta o aluno segue um
programa, enquanto na “flow production” segue um percurso de aprendizagem indivi-
dualizado.
Estes três modos tecnológicos de organizar a escola traduzem pressupostos educativos
e organizacionais diversos, enfatizam determinadas funções e finalidades.
A tipologia proposta por Thompson (citado Paisey, 1981: 57, Formosinho, 1986) também
oferece um modo de olhar e compreender o trabalho docente. Uma tecnologia enca-
deada (“long linked technology”) consiste na passagem obrigatória de uma série de
etapas independentemente da especificidade dos problemas a resolver e do destinatário.
É uma tecnologia presente em muitos domínios da escola como, por exemplo, sequên-
cias pré-determinadas de conteúdos a que todos são obrigados, regulamento disciplinar
e de assiduidade (Alves, 1991) – e que é congruente com um sistema centralista buro-
crático como demonstrou Formosinho (1984 e 1985).
Numa tecnologia mediadora, os agrupamentos discentes e docentes são flexíveis,
podem organizar-se verticalmente, os alunos com níveis de aprendizagem diferentes ou
com necessidades diversas reúnem-se para aprender conjuntamente. O exemplo escolar
mais característico são as visitas de estudo e os intercâmbios escolares.
Finalmente, numa tecnologia intensiva, a organização mobiliza todos os seus recursos,
todos os seus saberes e serviços para alterar ou modificar um objecto. Dada a especificidade
da escola em que a educação do aluno é a finalidade explícita e uma vez que os alunos
são diferentes, a tecnologia intensiva, pela sua centração no “cliente” singular, pela reu-
nião de meios e saberes colocados para suprirem as necessidades, pela retroacção que
avalia os processos, seria a tecnologia mais congruente com as finalidades da escola.
58
13. A ESCOLA DE SERVIÇO PÚBLICO:
RELAÇÕES COM OS CONTEXTOS E COM O ESTADO
Administração
directa do
Estado
Administração
indirecta do
Estado
Administração
societária
Administração
mista
Administração
autónoma
Legenda — ausência
— presença (Retirado de Formosinho, 1991)
As dinâmicas institucionais e de funcionamento da escola estatal têm configurado uma
escola como serviço local de Estado tendo o ano de 1991, com a publicação do novo
ordenamento jurídico da administração, direcção e gestão das escolas, produzido o iní-
cio da possível viragem para uma escola-comunidade educativa. Que conheçamos,
ninguém melhor que João Formosinho (1991) caracterizou estes dois tipos de escola e
explicitou os pressupostos desta passagem anunciada:
A escola apresenta ainda muitas características similares a uma organização do tipo fabril.
O seu fim parece ser preparar os alunos para uma futura incorporação num mundo laboral
em extinção. A obrigação dos alunos permanecerem longos períodos de tempo na escola
ocupados por um horário uniforme, fragmentado e em espaços uniformizados, o culto da
subserviência, da passividade, o reino da uniformidade do “one best way” tornam a escola
cada vez mais anquilosada que já nem sequer cumpre o papel funcionalista.
O reino da uniformidade organizativa pode ser assim genericamente caracterizado:
63
14. OS ACTORES
Não há organização sem actores em interacção. Conhecer donde vêm, que fazem, como
trabalham, como interagem, que estratégias desenvolvem: eis alguns motivos da investi-
gação. Como ponto de partida para um ensaio compreensivo do estatuto dos actores da
organização escolar apresentamos uma tipologia descritiva do comportamento organi-
zacional dos professores elaborada por Gouldner e adaptada por Sergiovanni e Carver
(1976: 465).
Segundo os autores, os professores, considerando as variáveis I) dedicação à escola;
II) compromisso para com a especialização própria; e III) orientação para um grupo de
referência, podem classificar-se como cosmopolitas e locais. Os primeiros dedicam-se
pouco à escola, possuem um elevado autoconceito do exercício profissional e identifi-
cam-se com grupos externos de referência; os segundos dedicam-se inteiramente à
escola, possuem “baixos compromissos para com a habilidade profissional” e identifi-
cam-se com o grupo interno de referência.
No primeiro tipo, os autores identificam dois subtipos – os Estranhos e os Constru-
tores do Império – e no segundo quatro subtipos – os Dedicados, os Verdadeiros Bu-
rocratas, os Protectores da Escola e os Anciãos. 65
TIPOS DE PROFESSORES
• As pessoas são indolentes e preguiçosas por • As pessoas são esforçadas e gostam de ter o 69
natureza, evitam o trabalho ou trabalham o que fazer; o trabalho pode ser motivo de satisfa-
menos possível em troca de recompensas sala- ção, dependendo de condições várias não exclu-
riais ou materiais. sivamente salariais ou materiais.
• As pessoas não gostam de assumir responsa- • As pessoas têm motivações básicas e capaci-
bilidades, preferem ser dirigidas e sentem-se dades para assumir a responsabilidade, a inicia-
seguras na dependência. tiva e a criatividade.
OS SISTEMAS E OS ACTORES
Terminaremos este Caderno com uma análise das possibilidades da concepção, desen-
volvimento e avaliação de projectos educativos numa organização escolar marcada
pelos traços da complexidade, diluição dos objectivos, participação escassa e fluida,
tecnologias rotineiras, difusão e policentrismo do poder, incerteza e turbulência de con-
texto, multiplicidade de valores e heterogeneidade de formação e interesses dos actores.
Este conjunto de características é aqui assumido como hipóteses organizacionais gera-
das no pressuposto de falência do sistema centralizado e burocrático(15). De facto, parece
anunciar-se uma “ordem pós-moderna” que acentua a precariedade e a instabilidade e a
emergência de um novo paradigma organizacional que se ordena reconhecendo a dis-
puta de estratégias, as liberdades dos actores e multicausalidade dos problemas, a mor-
fogénese de estruturas e valores, a escassa intencionalidade da acção, as contradições e
os paradoxos, a desordem da ordem.
Neste quadro político, a organização escolar não tem mais possibilidade de ser dirigida
do exterior nem pode mais ser ordenada pelos ditames concebidos no centro e manda-
dos executar em todas as periferias. É a esta luz que pode ser interpretada a vontade
política da descentralização e da autonomia escolar, que terão de ser legitimadas por 71
um conceito de escola enquanto comunidade educativa.
O problema que se pode então colocar poderá ser assim enunciado: como conceber,
realizar e ordenar um projecto educativo num contexto político e organizacional mar-
cado pela individualidade, pela ordem da desordem (pela desordem da ordem), pela
incerteza, pelos conflitos e pelos paradoxos? Ou, ainda de forma mais radical, é possí-
vel um projecto educativo numa organização onde será difícil reconhecer uma totali-
dade de elementos solidários em interacção?
A limitação deste Caderno não permite esclarecer a segunda questão. Por isso, partimos
do princípio de que é possível um projecto educativo, e de que ele é necessário para
tornar socialmente reconhecível a identidade de uma escola mais autónoma, mais li-
berta das imposições normativas vindas do exterior. Contudo, esta necessidade só será
exequível se os actores do projecto tiverem consciência do (novo) quadro político e
organizacional em que a escola se insere e se se dispuserem a uma acção investigativa
que revele a complexidade dos modos possíveis da acção educativa.
O MITO DO PROJECTO EDUCATIVO
O Projecto Educativo de Escola (PEE) está na agenda educativa dos últimos dez
anos. Primeiro foi o Diário da República que o decretou – todas as escolas têm de
ter um projecto… Depois foram as escolas que o foram redigindo, em regra através
de um grupo de trabalho, e aprovando. E, no entanto, poucas escolas, não obstante o
esforço persistente e continuado da maioria, terão realmente um projecto educativo
que dê sentido estratégico e unifique a acção.
A tese que aqui quero apresentar e defender é a de que muitas escolas não têm um
PEE porque não podem, porque não dispõem de condições institucionais e organi-
zacionais que o possibilitem. E assim, o PEE é um mito que vai sossegando as consciên-
cias e ajudando a manter um modelo escolar que está na origem da sua impossibili-
dade.
Aqui chegados, importa tentar compreender as razões do mito. Elas residem, em
grande parte, na especificidade do modelo e da organização escolares. De facto, a
escola é uma organização sui generis, caracterizada pela compartimentação e ato-
mização dos saberes a ensinar, pela fragmentação dos espaços e tempos, pela
72 escassa articulação curricular horizontal, pela ambiguidade dos fins educativos,
pelo individualismo da acção pedagógica, pela diversidade de interesses e culturas
profissionais, pela presunção de que todos são competentes na sua acção individual,
merecem a confiança e dispensam a mobilização e concertação colectivas.
É desta especificidade que surge a necessidade de um PEE que aumente a visibili-
dade dos processos de escolarização, que reforce a legitimidade da escola pública,
que globalize e unifique a acção educativa, que mobilize e federe vontades e recur-
sos. Mas são também estes traços que tornam muito difícil conceber, concretizar e
avaliar um projecto educativo.
Neste contexto, o PEE é, em muitas situações, um simulacro e um processo de miti-
ficação da realidade que pouco ou nada traz de novo às práticas educativas. Significa
esta tese que deveremos abandonar a sua construção? Não. Porque o PEE é um mito
útil. Um mito que poderá acender o desejo individual e colectivo, mobilizar as boas
vontades e as inteligências, induzir a um trabalho mais solidário e cooperativo. E
para que este mito vá tocando a realidade é necessária uma política organizacional
geradora de compromissos individuais e lideranças democráticas e transforma-
cionais. Mas esta é já uma outra reflexão que ficará para um próximo suplemento.
O PROJECTO EDUCATIVO
Certamente que o leitor terá notado a pouca discriminação dos seis tipos apresentados,
o carácter algo arbitrário, redutor e tautológico da tipologia. Se apesar de tudo aqui a
apresentamos sem termos procedido a alterações estruturais, foi para evidenciarmos
que há modos diversos de abordar o problema de construção do projecto e que podería-
mos reduzir a três: o tipo empiricista/normativo/intuitivo; o tipo gestionário/funcional;
e o tipo transformacional.
De seguida, desenvolvendo os princípios referidos por Obin e Cross (ob. cit.), apresen-
taremos os requisitos necessários a uma abordagem transformacional do projecto edu-
cativo. 75
A prática educativa que estamos a caracterizar exige uma metodologia geral do tipo
investigação (na/pela) -acção. Agir para proporcionar o sucesso educativo a todos e a
cada um, proporcionando a realização pessoal e social dos alunos e a mobilidade social
ascendente, para praticar da democracia. E investigar para conhecer os paradoxos, os
efeitos perversos, os problemas; investigar para iluminar os “buracos negros” da acção,
para aumentar as probabilidades de consecussão das finalidades da escola. Agir –
interagir – investigar – interagir – agir: ciclo em espiral.
A investigação é necessária porque temos um problema e não sabemos como resol-
vê-lo. O projecto educativo deve ser uma resposta aos problemas da comunidade esco-
lar, deve ser uma acção não alienada, deve ser uma acção que se interroga a si mesma,
que tem consciência dos seus sucessos e insucessos, uma acção investigativa.
ESPIRAL DA INVESTIGAÇÃO-ACÇÃO
Realização do
projecto
Exploração e Planificação do
análise das práticas projecto
Apresentação e análise
dos resultados
Percepção de um
problema
Definição das 77
Enunciado dos metodologias/actores
problemas
Avaliação/Conclusão
Tomada de decisões
Problema
CRITÉRIOS DE VALORIZAÇÃO 0 1 2 3 4
1. ATRACTIVO para a comunidade escolar (pais, professores, alu-
nos...) de forma a responder às suas necessidades e interesses.
2. BENÉFICO para a comunidade escolar porque potencia o seu
desenvolvimento pessoal, social e cultural.
3. CONGRUENTE entre o que propõe (intenções), experiências
passadas (atitudes) e resultados prováveis (comportamentos).
4. DISTINTIVO de qualquer outro, como resposta às necessidades
próprias da organização escolar.
5. FUNCIONAL para a comunidade escolar, proporcionando-lhe
aprendizagens e experiências socialmente úteis.
6. EFICAZ ao especificar de forma operacional os resultados espe-
ráveis, os processos de os atingir e de os avaliar.
7. EQUILIBRADO na quantidade de objectivos que devem alcan-
çar todos os membros (alunos, professores, equipas directivas...) e
no tipo de problemas (inovações ou soluções de problemas).
8. ATENTO à diversidade social, cultural, linguística e a eventuais
78 necessidades que alguns membros possam ter.
9. POTENCIADOR da organização através da melhoria do clima,
nível profissional dos docentes, abertura aos contextos.
10. ABERTO à sociedade para potenciar de forma permanente a
máxima inter-relação.
11. COMPLETO, já que mobiliza a participação de todos na con-
cepção, execução e avaliação.
12. COERENTE entre os problemas que diagnostica, os objectivos
que estabelece e as relações que propõe.
13. SELECTIVO em todas as decisões. Usa várias estratégias,
métodos, recursos e selecciona as melhores sem se deixar iludir
pelo racionalismo.
14. DISTRIBUIDOR de responsabilidades, tempo, método e recur-
sos para garantir a consecussão dos objectivos.
15. FLEXÍVEL no seu desenvolvimento de forma a permitir utili-
zar alternativas, rever-se, adaptar-se permanentemente.
16. RENDÍVEL, pois os custos totais de preparação e desenvolvimento
são menores que os benefícios que proporciona a sua realização.
17. INOVADOR, porque não aceita o determinismo social e cultu-
ral e ensaia novas respostas organizacionais para os problemas.
(adaptado de Munício, 1987)
O projecto curricular de escola (e de turma)
Princípios
Para se desenvolver a dinâmica do projecto curricular, importa ter presente os seguintes
princípios: 79
Questões Guia
Para além dos princípios, há determinadas questões que podem funcionar como roteiros
de acção:
Era uma vez um detonador que acendia um fósforo, às vezes todos os fósforos.
Uma palavra. Um contexto. Um olhar. Uma consciência. Um estímulo. Uma lide-
rança. Um reconhecimento. Uma política mobilizadora. E havia então o fogo, o
lume que aquecia uma relação. Um entusiasmo.
Era uma vez o oxigénio que mantinha a chama acesa. Contra o vento, contra a de-
sautorização, contra a rotina, contra a inércia, contra o medo, contra a indiferença,
contra a humidade que tornava os fósforos inúteis.
Que palavras, que contextos, que consciências, que estímulos, que lideranças, que
reconhecimentos, que políticas farão acender e durar a chama de uma acção profis-
sional dedicada e justa?
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16. SÍNTESE
VARIÁVEL PRAXIS
Finalidades da escola Analisar as finalidades do sistema educativo (LBSE); identificar a relação finali-
dades/ciclo de estudo; analisar congruência entre essas finalidades, o currículo e
os programas das diferentes disciplinas; recordar “a instrumentalidade” das disci-
plinas e dos programas; inquirir até que ponto a escola pode ter finalidades pró-
prias, congruentes com o contexto local; conhecer a interpretação dos actores
quanto às finalidades e procurar consenso organizacional através da negociação
dos conflitos de ponto de vista...
Processo decisional Analisar o estilo e os actores da decisão; criar condições para a descentralização e
para um modo colegial de tomar decisões; analisar a relação entre as decisões e as
finalidades da escola.
Processo de liderança Analisar os estilos e os actores da liderança; criar condições para uma liderança
transformacional.
(continua na página seguinte)
Participação Estudar os modos e os actores da participação; criar condições para uma partici-
pação directa, formal e informal, activa e convergente.
Contexto Analisar o contexto social, económico e cultural dos alunos, professores, funcio-
nários e pais dos alunos; analisar a inserção da escola no meio social, cultural;
analisar relações com o Estado.
Que fazer com este Caderno? Que fazer com a constelação de conceitos, instrumentos
de análise, sugestões para a praxis organizacional? Como aumentar a consciência crí-
tica das práticas correntes? Como melhorar a capacidade de compreensão e explicação
dos fenómenos organizacionais?
Escrever estas interrogações, olhar os propósitos iniciais deste Caderno e o percurso
entretanto realizado. E dizer que se pretendeu apenas proporcionar o início de uma
reflexão sobre a especificidade de um objecto entalado entre as visões macro e micro e
que se torna necessário descobrir. Enquanto abordagem inicial – e superficial – não
poderia ter a pretensão de problematizar os conceitos apresentados, integrá-los numa
teoria geral de organização educacional e, necessariamente, caiu em reduções e falsas
transparências. Espera-se, por isso, a distância crítica dos leitores e o trabalho sobre
estas (e outras) insuficiências.
Nestas condições se espera que esta publicação – se contar com a disponibilidade do
leitor para aprofundar e complexificar os problemas – seja um primeiro passo de um
processo de investigação-acção.
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NOTAS
(1) Estas quatro primeiras características permitem ilustrar um conceito de escola que a torna distintiva
em relação a formações avulsas e pontuais, ensino à distância, casos de educação de crianças despro-
tegidas. A última – interesse público dos serviços que presta – permite operar a distinção em relação
às escolas de beleza, condução, dactilografia, ballet, já que traduz a ideia de que são “escolas que
veiculam o projecto básico da sociedade para a educação da geração jovem” (Formosinho, 1986,
sublinhado do texto).
(2) O recurso a diversas tipologias das organizações permitiria clarificar vários sentidos organizacionais.
A tipologia de Etzioni (1964) e Blau e Scott (1970) são provavelmente as mais conhecidas e ope-
rantes. Para Etzioni as organizações, segundo uma tipologia baseada no controlo, podem dividir-se
em coercitivas (o poder é imposto pela força física ou controlo baseado em prémios ou punições),
utilitárias (o poder baseia-se no controlo de incentivos económicos) e normativas (o poder baseia-se
no consenso sobre objectivos e métodos). Blau e Scott, partindo da variável “beneficiário principal da
organização”, divide as organizações em associações de beneficiários mútuos (em que os benefi-
ciários são os próprios membros), organizações de interesses comerciais (em que os beneficiários
são os proprietários ou accionistas), organização de serviços (em que os beneficiários são os
clientes) e organização do Estado (em que o beneficiário é o público em geral) (cf. Chiavenato,
1983: 335-337). As escolas, segundo o ponto de vista dos diversos actores envolvidos, seriam organi-
zações normativas na tipologia de Etzioni e de serviços e do Estado na tipologia de Blau e Scott.
86 Considere-se, no entanto, a passagem de um conceito de Escola – serviço do Estado – ao conceito de
escola – serviço da comunidade educativa (cf. Formosinho, 1989 b).
(3) Lima (1991), em estudo sobre a Escola Secundária (1974-1988), conclui pela oscilação entre a ordem
burocrática e a ordem anárquica.
(4) Os quatro grandes factores que, segundo Peter Gronn, justificam a caracterização da escola como
arena política são os seguintes:
– a escassez de recursos: os diferentes grupos componentes da arena escolar dificilmente estão de
acordo sobre a necessidade, a quantidade, a utilização ou a eficiência dos recursos pretendidos;
– a diversidade ideológica: as concepções, as crenças e as atitudes acerca da realidade escolar e dos
objectivos diferem de actor para actor e radicam nas diferentes concepções de homem, de sociedade
e de educação de cada indivíduo;
– a conflitualidade de interesses: a escola é constituída por uma heterogeneidade de indivíduos (e de
grupos) com interesses próprios e diversificados de ordem pessoal e profissional sendo muitas vezes
comum que aquilo que interessa a uns não interessa a outros;
– as diferenças de personalidade: o ser humano vai, desde o seu nascimento, formando (em inte-
racção com o meio) uma personalidade própria que o identifica como pessoa e que individualiza os
seus procedimentos sociais. Esta personalidade traduz-se em diferentes tipos caractereológicos e
estilos comportamentais que, não raras vezes, entram em conflito (cit. por Costa, 1996: 80).
(5) “Considero as escolas (...) campos de luta, divididas por conflitos em curso ou potenciais entre os
seus membros, fracamente coordenadas e ideologicamente diversas. Julgo essencial, se queremos
compreender a natureza das escolas como organizações, conseguir uma compreensão de tais confli-
tos” (Ball, 1989: 35, cit. Costa: ib.: 83).
(6) O estudo de Natércio Afonso (1995), A reforma da administração escolar, é um possível exemplo
deste enfoque teórico. Segundo o autor, a sua investigação “mostrou que os professores concebiam o
seu trabalho lectivo como a verdadeira base tanto da sua influência política e poder na escola, como
da sua autonomia profissional” (p. 280), salientando ainda os interesses das diferentes clientelas a
propósito da implementação do modelo de gestão configurado no Decreto-Lei n.° 172/91.
(7) Brunsson (1989) sustenta a existência de uma lógica da hipocrisia constituída pelo facto de se dizer
uma coisa, decidir outra e fazer ainda uma outra para agradar às diferentes audiências e legitimar a
acção da instituição.
(8) O profissionalismo terá uma dimensão mítica porque a actividade docente não reunirá todas as carac-
terísticas de profissional, no sentido liberal do termo (designadamente na relação de responsabilidade
face ao “cliente”), o que leva alguns autores a apelidarem a actividade docente como semiprofis-
sional.
(9) “A organização anárquica não é, como o seu nome poderia implicar, um conjunto informe ou impre-
visível de indivíduos. É antes uma organização com uma estrutura própria que é determinada em
parte por pressões externas e em parte é um produto da natureza da organização. É anárquica no sen-
tido de que as relações entre as metas, os membros e a tecnologia não é tão claramente funcional
como a teoria convencional da organização indica que será” (Bell, in Ball, 1989).
(10) A metáfora do “caixote do lixo” pretende ilustrar um modo decisional caracterizado por um espaço
para onde se atiram problemas e soluções e donde se retiram soluções aleatórias que podem não cor- 87
responder aos problemas.
(11) Por estrutura orgânica entendemos o conjunto articulado de órgãos formais, distribuídos pelos dife-
rentes níveis organizacionais que desenvolvem funções tendo em vista a consecussão das finalidades
de organização. Este é um sentido mais restrito do que o de estruturas da organização que referimos
anteriormente.
(12) French e Raven (1968 cit. Hall op. cit.: 96), baseando-se na natureza da relação, refere cinco tipos
(ou bases) de poder:
• o poder de recompensa, existente quando os subordinados percebem que os subordinantes têm
capacidade de recusar, permitir ou aumentar as recompensas;
• o poder coercitivo, baseado nas percepções do receptor sobre a capacidade do detentor de poder
distribuir punições (demissões, tarefas indesejáveis);
• poder legítimo, próximo do conceito de autoridade weberiana, que consiste na aceitação das
directrizes e normas em virtude de se reconhecer a posição e o status dentro de uma determinada
hierarquia;
• poder referente, quando o receptor do poder se identifica com o detentor percepcionando-o
como um modelo a seguir;
• poder de especialista, decorrente da percepção de maiores conhecimentos científicos e técnicas
sobre determinada matéria.
Etzioni (1975), baseando-se também na relação entre os actores, identifica o poder coercitivo,
remunerativo e normativo e desenvolve os processos possíveis de resistência e/ou acatamento.
Crozier e Friedberg (1977: 72), interrogando-se sobre as causas do reconhecimento do poder como
legítimo e sobre as razões da confiança e da obediência, enunciam quatro bases do poder todas refe-
renciadas ao domínio de zonas de incerteza que caracterizam todas as organizações:
• o poder de especialista, decorrente da “posse de uma competência ou de uma especialização
funcional dificilmente substituível”. O saber fazer, o saber resolver “problemas centrais da orga-
nização” é, segundo os autores, uma das bases do poder;
• o poder relacional, decorrente do domínio das relações com o contexto da organização. Porque
conhece e domina as redes de informação e comunicação que interagem com a organização, o
detentor desta base detém um poder efectivo na acção organizacional.
• o poder comunicativo, próximo do anterior, e que consiste na organização e domínio de uma
rede de comunicações;
• o poder decorrente do conhecimento das regras organizacionais.
Morgan (1986, cit. Sedano e Perez, 1989: 131) alarga a perspectiva de análise e de forma algo tau-
tológica identifica catorze bases do poder na organização, das quais citamos onze:
– autoridade formal, decorrente da posição hierárquica na organização;
– controlo dos recursos financeiros;
– uso das estruturas, regras e normas da organização;
– controlo do processo de decisão;
88 – domínio de saberes específicos e da informação;
– controlo das relações com os contextos;
– capacidade de reduzir a incerteza;
– controlo da tecnologia, entendida como o saber fazer organizacional;
– alianças interpessoais, redes e controlo da organização informal;
– controlo das organizações concorrentes;
– o poder pessoal.
(13) A participação tem sobretudo a ver com o ordenamento político, social e cultural de uma dada
sociedade. Uma atitude e uma prática participativa nos assuntos que interessam e afectam os
cidadãos é uma aprendizagem societária que pode ser incentivada ou refreada pelos diversos sis-
temas. Uma ordem democrática terá de criar condições estruturais (pela educação, pela regulação do
trabalho...) para que o cidadão queira e possa participar na definição presente e futura dos modos de
vida, mesmo na esfera das organizações.
(14) Num texto “culturas organizacionais – uma metáfora à procura de teorias” Vala et. al. (1988),
através de uma revisão teórica, acentuam a concepção de cultura como sistema de ideias, a dis-
tinção entre cultura e estrutura social, enfatizam a pregnância dos símbolos e significados partilha-
dos e enunciam diversas dimensões estruturantes do conceito. Apresentando os resultados de uma
pesquisa das culturas organizacionais, os autores consideram que, não obstante as insuficiências
teóricas e metodológicas, é relevante pensar as organizações como “espaços sociais de criação,
comunicação e gestão de significados”. Operando a distinção conceptual entre cultura e clima, os
autores referem que o conceito de cultura é mais amplo e mais profundo que o de clima, sendo este
entendido como “uma dimensão da cultura, aquele que se refere aos seus aspectos especificamente
perceptivos”.
(15) Licínio Lima (1991), num estudo sobre a escola como organização e a participação na organização
escolar, haveria de concluir que a Escola Secundária em Portugal no período de 1974-1988 se carac-
teriza por um “modo de funcionamento (...) díptico, isto é, dobrado em dois”, determinado ora pela
imposição normativa de tipo burocrático, ora pela “ordem anárquica da desconexão”.
(16) O leitor interessado em conhecer a problemática da avaliação de projecto poderá consultar
Stufflebeam e Shinkield (1987).
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BIBLIOGRAFIA REFERENCIADA