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Responsabilidade Civil do Estado

Basicamente, nesta aula se estudará o artigo 37, § 6º, da Constituição Federal (CF),
que traz o fundamento da responsabilidade do Estado quando ele age e quando causa dano
aos particulares. É um tema que analisa apenas um parágrafo da CF. Há muita Jurisprudência
do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o tema que as Bancas transformam em questões
de prova. Também chamada de responsabilidade extracontratual, a responsabilidade civil
contempla a indenização do Estado por danos materiais e morais.

Cabe ressalta quanto ao fato de o Estado não é um garantidor universal, ele não vai
resolver todas as situações em que estiver envolvido. Há situações em que poderá alegar a
sua excludente afastando, assim, a sua responsabilidade.

Quando um agente pratica uma conduta, pode gerar uma responsabilização


administrativa, uma responsabilização penal e uma responsabilização civil. Na
responsabilização civil, a ação é contra o Estado. O Estado, uma vez condenado, entra com
uma ação de regresso contra o agente.

A responsabilidade é extracontratual porque está fora de um contrato. Entre o


Estado e os particulares não existe um contrato, mas uma responsabilidade extracontratual,
fora de uma relação contratual, uma responsabilidade nos termos da Lei, nos termos da CF.

 Responsabilidade subjetiva – análise de dolo ou culpa do agente


 Responsabilidade objetiva – independe de se provar dolo ou culpa.
 Responsabilidade comissiva – decorre da prática de uma conduta. Sendo a objetiva
a Responsabilidade do Estado.
 Responsabilidade omissiva – ocorre quando o agente deixa de impedir um dano ao
qual está obrigado. Via de regra, haverá a análise do dolo e da culpa, sendo, portanto,
uma responsabilidade subjetiva do Estado.

A responsabilidade subjetiva dependerá da demonstração do dolo ou da culpa daquele


agente que causou o resultado danoso. Na responsabilidade subjetiva, deve-se analisar o que
se passava na cabeça da pessoa que praticou a conduta. O dolo é a vontade livre e consciente
de praticar a conduta, se teve mesmo intenção de fazer o que fez ou se teve culpa, que é a
falta de cuidado. Essa culpa é caracterizada pela negligência, imprudência ou imperícia.

A responsabilidade objetiva não depende de provar dolo ou culpa. É um tipo de


responsabilidade mais avançada. Na responsabilidade objetiva, se a pessoa que praticou a
conduta, teve dolo ou culpa, é indiferente, não tem relevância. O que importa é demonstrar
que houve a conduta e houve o dano.
Há alguns casos de responsabilidade objetiva, por exemplo, no Direito do Consumidor:
aquele que coloca um produto para o consumidor, responde objetivamente pelos danos
causados. O fornecedor responde objetivamente pelos danos causados ao consumidor. No
Direito Civil há a responsabilidade civil dos pais pelos atos praticados pelos filhos menores.
No Direito Ambiental, quem causa dano ambiental, independentemente de dolo ou culpa, tem
que reparar esse dano. São situações nas quais a legislação brasileira, e muitas vezes a CF,
traz a responsabilidade objetiva. Na relação de consumo, por exemplo, é um benefício para a
outra parte que nem precisa discutir culpa.

No Direito Penal não existe responsabilidade objetiva, apenas a responsabilidade


subjetiva a depender da conduta do agente, do dano, do nexo causal e, ainda, da
demonstração da conduta, se for com dolo ou culpa. Alguma doutrina discute, em casos
excepcionais, a existência da responsabilidade objetiva também no Direito Penal, mas não é
conclusiva.

O Estado responde OBJETIVAMENTE pelos danos causados aos particulares. A


responsabilidade por ação ou por comissão é a que decorre da prática de uma conduta.
Quando o agente pratica uma conduta, ele age por ação. A responsabilidade por ação ou por
comissão (ação/comissiva) é objetiva.

A responsabilidade omissiva decore da falta de uma ação, quando o agente deixa


de impedir um dano, deixa de praticar uma conduta que leva a um resultado danoso. Essa
responsabilidade do Estado é subjetiva, dependerá da demonstração de culpa, da falta de
ação, da falta de cuidado.

Responsabilidade objetiva com base na TEORIA DO RISCO – art. 37, § 6º, CF

A teoria do risco administrativo é um tipo de responsabilidade e, por essa teoria, o


Estado pode alegar um fator de exclusão – não é um garantidor universal, não é um segurador
universal. Assim, a responsabilidade objetiva abarca duas espécies: RO com base no risco
integral (não aceita excludentes) e RO com base no risco administrativo (aceita excludentes).

Não é porque o Estado estava na relação que sempre será obrigado a pagar a conta
– pode alegar fatores de exclusão da sua responsabilidade. Existe a responsabilidade pelo
risco integral e a responsabilidade pela teoria do risco administrativo, que é a regra geral da
CF.

Responsabilidade do Estado – Evolução Teórica

a) Irresponsabilidade – no Estado absolutista a teoria vigente era a da irresponsabilidade


do Estado. Nos Estados absolutistas a figura do Estado se confundia com a figura do
próprio rei – o rei era o Estado, o Estado era o rei, os dois se confundiam. O Estado nunca
errava porque o rei nunca erra. O Estado absolutista é a primeira forma de Estado (povo,
território e governo soberano) – as civilizações anteriores não eram entendidas como um
Estado.

Hely Lopes Meirelles: “A doutrina da irresponsabilidade está inteiramente


superada, visto que as duas últimas nações que a sustentavam, a Inglaterra e
os Estados Unidos da América do Norte, abandonaram-na, respectivamente,
pelo Crown Proceeding Act, de 1947, e pelo Federal Tort Claims Act, de 1946”.

b) Teorias Civilistas – à medida em que o Estado absolutista entra em decadência no final


do século XVIII, surgem novos modelos de Estado, o Estado de Direito, um Estado
baseado em outras premissas, um Estado baseado na lei. Cria-se o Poder Legislativo com
a função de legislar, de fiscalizar e avança-se da teoria da irresponsabilidade para a
da responsabilidade porque as teorias do Direito Civil começaram a influenciar. Iniciou
fazendo a diferenciação entre atos de império e gestão – responsabilidade subjetiva
para atos de gestão. O agente teria de ser identificado e a culpa do agente devia ser
demonstrada para que o Estado tivesse responsabilização. Atualmente não é assim.
Quando fosse ato de império, que é um ato de supremacia do Estado frente ao
particular, mesmo na teoria Civilista não haveria responsabilidade. Quando fosse ato
de gestão, quando o Estado está no mesmo nível do particular, se o Estado causasse
dano a esse particular teria responsabilidade, contudo de forma subjetiva: necessitando
de se identificar o agente e demonstrar sua culpa para que o Estado tivesse qualquer
obrigação.
 Atos de império – irresponsabilidade do Estado;
 Atos de gestão – responsabilidade subjetiva do Estado, baseada na culpa do agente.
Com previsão no CC de 1916.

c) Teorias Publicistas – abarcou duas teorias:

a. Culpa Administrativa / do Serviço / Anônima – era, ainda, uma teoria baseada


na culpa, não do agente, mas uma culpa administrativa. Alguns chamavam de
culpa anônima porque já não era necessária a identificação do agente: a culpa
é da Administração, a culpa é do serviço, mas uma culpa presumida. Culpa do
serviço: faute du servisse. Era necessário provar que o Estado: não funcionou;
funcionou mal; funcionou atrasado. Comprovada a ineficiência do Estado,
caracterizar-se-ia a responsabilidade.
Nos livros brasileiros o sinônimo de faute du servisse é falta do serviço. Faute, em
francês, não é falta, é culpa. A expressão falta do serviço não é a mais adequada.

b. Responsabilidade Objetiva / Teoria do Risco – fundamenta-se na teoria do


risco, isto é, na repartição de benefícios e encargos. Quando há uma atividade do
Estado, por exemplo, ao capturar um criminoso, muitas pessoas estão sendo
beneficiadas. Quando o agente no encalço de um criminoso dá um tiro que atinge
um particular antes de prender o criminoso: a sociedade foi beneficiada com a
prisão do criminoso, mas quanto ao particular o Estado terá responsabilidade.
Substituição da culpa pelo nexo de causalidade. Hoje, a teoria não é mais
baseada na culpa do agente, não é mais baseada na culpa do serviço, evoluiu: é
a teoria de uma responsabilidade objetiva, não discute culpa. A culpa para a
responsabilização do Estado é um fator que já não tem mais relevância – outros
requisitos devem ser apresentados, mas a culpa não é mais um requisito para a
responsabilidade objetiva que é pregada pela Teoria do Risco.

A Teoria da Responsabilidade Objetiva substitui a antiga ideia de culpa pela


demonstração do nexo de causalidade. Os elementos da Responsabilidade Objetiva são:
conduta, dano e o nexo causal. É necessário provar que entre a conduta do Estado e o dano
ao particular houve uma relação de causa-efeito – o resultado foi resultado da conduta do
Estado.

d) Teorias do Risco:

a. Administrativo – a teoria do RISCO ADMINISTRATIVO vem sendo adotada


desde a Constituição de 1946. Antes disso, o Código Civil regulava a
responsabilidade do Estado. O Diploma civil anterior consagrava a
responsabilidade subjetiva do Poder Público, sendo posteriormente modificado,
ficando em sintonia com a Constituição. Na teoria do Risco Administrativo existem
fatores de exclusão da responsabilidade. O Estado pode alegar alguns fatores da
sua exclusão da responsabilidade. O Estado pode alegar culpa exclusiva da vítima.

b. Integral – a teoria do Risco Integral não admite fator de exclusão.

Como regra geral, a teoria adotada pela Constituição Federal no art. 37, § 6º foi a teoria
do Risco Administrativo: ou seja, o Estado tem responsabilidade, mas poderá alegar fatores
de exclusão. Na teoria do Risco Integral basta demonstrar o resultado, o dano pelo qual o
Estado tem de responder, é um garantidor universal, é o responsável mesmo que não tenha
praticado com dolo ou culpa.

Contudo, o sistema jurídico brasileiro em situações específicas, aplica da teoria do


Risco Integral. Para o Direito Administrativo, três são essas situações, conforme admitem
alguns autores:

 Danos nucleares (art. 21, inciso XXIII, d, da CF). Somente a União explora a atividade
nuclear e causando danos ao patrimônio particular responde objetivamente;
 Atos terroristas (em decorrência do ataque as Torres Gêmeas nos EUA);
 Atos de guerra contra aeronaves brasileiras.

Há um caso no Direito Ambiental que alguns autores defendem como de


responsabilidade objetiva pelo risco integral para quem causar dano ao meio ambiente e
terá de fazer a reparação, independente de dolo ou de culpa, não podendo alegar fator de
exclusão.

Obs.: a CF de 1988 não consagrou a teoria do Risco Integral, e sim a teoria do Risco
Administrativo como regra geral.

Dos requisitos da responsabilidade

 Responsabilidade Subjetiva
o Conduta: necessária a presença de dolo e/ou culpa;
o Dano;
o Nexo causal.

 Reponsabilidade Objetiva
o Conduta: poderá ser lícita ou ilícita;
o Dano: que poderá ser moral (o dano moral diz respeito à violação do direito de
personalidade, ou seja, refere-se à violação de honra, dignidade ou intimidade)
ou material: corresponde a um dano financeiro. Tanto o dano moral quanto o
dano material são passíveis de indenização.
o Nexo causal: necessária correspondência entre a conduta e o dano causado.

Obs.: a mera expectativa de um dano, sem que ele tenha de fato ocorrido, não gera
indenização. Exemplo do presídio que se instala em cidade pacata, não é válido o argumento
da insegurança de uma possível fuga.
Dano Moral in re ipsa – o dano moral in re ipsa trata-se de um dano moral presumido, que
dispensa comprovação do prejuízo extrapatrimonial, sendo suficiente a prova da ocorrência
de ato ilegal.

Abaixo, são reproduzidos alguns julgados referentes à responsabilidade civil do


Estado:

 STJ – A Administração Pública pode ser condenada ao pagamento de indenização


pelos danos cíveis causados por uma ação de seus agentes, mesmo que
consequentes de causa excludente de ilicitude penal (ex.: legítima defesa putativa).
REsp 1266517/PR, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado
em 04.12.2012, DJe 10.12.2012.

 STF – Nexo causal e o preso foragido. Responsabilidade civil do Estado. Art. 37, §
6º, da Constituição do Brasil. Latrocínio cometido por foragido. Nexo de causalidade
configurado. Precedente. A negligência estatal na vigilância do criminoso, a inércia das
autoridades policiais diante da terceira fuga e o curto espaço de tempo que se seguiu
antes do crime são suficientes para caracterizar o nexo de causalidade. Ato omissivo
do Estado que enseja a responsabilidade objetiva, nos termos do disposto no art. 37,
§ 6º, da Constituição do Brasil. (RE 573.595-AgR, Rel. Min. Eros Grau, julgamento em
24.6.2008, Segunda Turma, DJE de 15.8.2008).

 Responsabilidade civil do Estado. Art. 37, § 6º, da Constituição Federal. Faute du


service public caracterizada. Estupro cometido por presidiário, fugitivo contumaz,
não submetido à regressão de regime prisional, como manda a lei. Configuração
do nexo de causalidade. Recurso extraordinário desprovido. Impõe-se a
responsabilização do Estado quando um condenado submetido a regime prisional
aberto pratica, em sete ocasiões, falta grave de evasão, sem que as autoridades
responsáveis pela execução da pena lhe apliquem a medida de regressão do regime
prisional aplicável à espécie. Tal omissão do Estado constituiu, na espécie, o fator
determinante que propiciou ao infrator a oportunidade para praticar o crime de estupro
contra menor de 12 anos de idade, justamente no período em que deveria estar
recolhido à prisão. Está configurado o nexo de causalidade, uma vez que se a Lei
de Execução Penal tivesse sido corretamente aplicada, o condenado dificilmente teria
continuado a cumprir a pena nas mesmas condições (regime aberto), e, por
conseguinte, não teria tido a oportunidade de evadir-se, pela oitava vez, e cometer o
bárbaro crime de estupro. (RE 409.203, Rel. p/ o ac. Min. Joaquim Barbosa,
julgamento em 7.3.06, DJ de 20.4.07).
Das Excludentes de Responsabilidade

A responsabilidade do Estado é objetiva, conforme determinado pela teoria do risco


administrativo. Desse modo há, portanto, fatores de exclusão. As excludentes da
responsabilidade civil do Estado são apresentadas a seguir:

a) Culpa exclusiva da vítima – quando verificada a culpa exclusiva da vítima, será afastada
a responsabilidade do Estado, de maneira que não caberá a ele fazer nenhum tipo de
indenização. Ex.: suicídio de alguém em via pública. A culpa concorrente, configurada pelo
fato de tanto a vítima quanto o Estado serem culpados, não afasta a responsabilidade do
Estado, mas a atenua. Ex.: acidente decorrente de um semáforo desligado em cruzamento
perigoso.

b) Caso fortuito / Força maior – o caso fortuito e a força maior dizem respeito a situações
do campo da imprevisibilidade, fatos imprevistos ou inevitáveis, que decorrem da ação da
natureza ou da ação humana (ato de terceiro), afastando a responsabilidade do Estado.
Ex.: fato de ação humana: pode-se exemplificar o fato de ação humana com os
denominados atos de multidões, como ocorre, por exemplo, nos casos dos arrastões, em
que diversas pessoas saem cometendo delitos pela cidade. Fato de ação da natureza:
terremoto.

Obs.: é possível que, diante de atos de multidões, o Estado possa ter responsabilidade
subjetiva, desde que comprovada sua omissão. A mesma teoria será aplicada em relação ao
caso fortuito, de ação da natureza, quando comprovada a omissão do Estado como ocorrido,
por exemplo, em caso de enchentes decorrentes da falta de limpeza dos bueiros ou da não
realização de obras necessárias.

No que se refere à matéria em estudo, cabe analisar o que dispõe o artigo 37,
parágrafo 6º, da Constituição Federal de 1988:

Art. 37. § 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado


prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes,
nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra
o responsável nos casos de dolo ou culpa.

Perceba que haverá responsabilidade objetiva das pessoas jurídicas de direito


público (União, Estados, Distrito Federal, Municípios, Autarquias e Fundações Autárquicas)
e das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos (Empresas
Públicas, Sociedades de Economia Mista, Concessionárias e Permissionárias).
Obs.: o STF entendeu que a responsabilidade das concessionárias e permissionárias é
objetiva, para usuários e para terceiros não usuários do serviço. Desse modo, caso
ocorra, por exemplo, um acidente entre um ônibus e um ciclista, todos os envolvidos que
sofreram danos poderão entrar com uma ação diretamente contra a concessionária.

A responsabilidade subjetiva, por sua vez, será adotada em relação às Empresas


Públicas e Sociedades de Economia Mista exploradoras de atividade econômica (ex.:
Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Petrobras) e nos casos de demonstrada omissão
do Estado.

Da Omissão Genérica (subjetiva) e Da Omissão Específica (objetiva)

Para o autor Sergio Cavalieri, havendo omissão genérica do Estado, que é aquela em
que o dano não decorre diretamente da omissão, aplica-se a tese da responsabilidade
subjetiva, devendo o particular provar a culpa (omissão) para ter direito à indenização. Trata-
se aqui da típica teoria da faute du service (culpa/“falta” do serviço).

Por outro lado, havendo omissão específica, em que o dano decorre diretamente da
omissão, haverá responsabilidade objetiva, dispensada a discussão acerca da omissão
(culpa). Nesse ponto é que reside a inovação do autor, por atribuir hipótese de
responsabilidade objetiva no caso de omissão.

Cabe destacar ainda que, conforme dispõe o parágrafo 6º do artigo 37, o Estado
responderá pelos danos que seus agentes, ou seja, qualquer pessoa que exerça função
pública, agindo nessa qualidade, causarem a terceiros.

Obs.: José dos Santos Carvalho Filho (2009, p. 529) compreende que os Serviços Sociais
Autônomos estão incluídos na regra da responsabilidade objetiva do Estado.

Abaixo segue a reprodução de um julgado de um caso especial, referente a danos


causados por notários (tabeliães) e oficiais de registro:

Jurisprudência do STF – Danos causados por notários e oficiais de registro

O STF entendeu que o Estado responde, objetivamente, pelos atos dos tabeliães e
registradores oficiais que, no exercício de suas funções, causem danos a terceiros, devendo
haver o dever de regresso contra o responsável (ação regressiva), nos casos de dolo ou
culpa, sob pena de improbidade administrativa.

Fixou também a corte que o Estado possui responsabilidade civil direta, primária e
objetiva pelos danos que notários e oficiais de registro, no exercício de serviço público por
delegação, causem a terceiros. Na ação regressiva, a responsabilidade civil dos notários e
registradores é subjetiva (nesse sentido, o art. 22 da Lei n. 8.935/1994, alterado pela Lei n.
13.286/2016. RE 842846/RJ, rel. Min. Luiz Fux, julgamento em 27.2.2019. (RE-842846).

Casos especiais

a) Estado “garante” / Situação propiciatória de dano ou risco / Risco suscitado –


quando há a situação de Estado garantidor, ou seja, quando o Estado está na tutela
de pessoas ou coisas, este responderá objetivamente, conforme a teoria do risco
administrativo, pelos danos que decorrerem do seu dever de guarda. Ex.: no que se
refere às pessoas, o Estado será responsável, por exemplo, pelos alunos presentes
na escola, pelos presos em presídios e pelas pessoas nos hospitais. Em relação às
coisas, o Estado será responsável, por exemplo, por acidente decorrente do manuseio
de materiais químicos em uma universidade, por possuir a tutela de coisas perigosas.
Obs.: cabe lembrar que a teoria do risco administrativo comporta o fator de
exclusão, de modo que, diante de situações determinadas de culpa exclusiva da
vítima, por exemplo, será afastada a responsabilidade do Estado. ATENÇÃO,
Cuidado: a princípio, o suicídio é tratado como matéria de culpa exclusiva da vítima,
afastando a responsabilidade do Estado, no entanto, o STJ entende que o Estado
tem responsabilidade objetiva em relação ao suicídio de preso dentro do
presídio, mas ainda não se aplica a teoria do risco integral.

b) Danos de obras públicas – primeiramente, deve-se ter em mente a diferenciação


entre danos pelo “fato da obra” e danos pela “execução da obra”.

 “Fato” da obra – não há a presença de irregularidades ou ilegalidades,


constituindo-se a obra em si em danosa. Nesse caso, haverá a responsabilidade
objetiva do Estado. Ressalta-se que para constituir o direito de indenização deverá
existir dano concreto e específico.

 Execução da obra – a execução pode se dar direta ou indiretamente pelo Estado

o Direta – na execução direta o próprio Estado executa a obra, nesse caso,


haverá a responsabilidade objetiva do Estado;
o Indireta – na execução indireta, a execução da obra será realizada por uma
empresa/empreiteira contratada pelo Estado. Nesse caso, haverá
responsabilidade subjetiva do contratado.
c) Atos (típicos) do Poder Judiciário – o ato típico do Judiciário diz respeito às decisões
judiciais. Nesse caso, quando estiver funcionando com órgão jurisdicional e proferir
uma sentença/acórdão para a solução de um ato concreto, será aplicada a regra da
irresponsabilidade do Estado – mesmo perante o prejuízo a alguém –, não cabendo,
desse modo pedido de indenização. Como exceção dispõe a CF em seu art. 5º: LXXV
– o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar
preso além do tempo fixado na sentença.

a. Via de regra, a prisão preventiva não gera direito à indenização, mesmo que o
réu seja absolvido ao final do processo (RE 429518). O STJ já entendeu que a
prisão preventiva manifestadamente desproporcional acarretará tal direito.

b. Diante de ato atípico do Poder Judiciário, ou seja, diante de ato administrativo,


será aplicada a responsabilidade civil objetiva.

c. Presídios em situações precárias – se faz importante destacar a existência


de um acórdão do STF que gera direito a indenização quando o preso cumpre
sentença em presídios que não possuem as condições mínimas
estabelecidas relativas à dignidade da pessoa humana.

d) Atos (típicos) do Poder Legislativo – o ato típico do Poder Legislativo diz respeito à
criação de leis. Desse modo, leis aplicadas à toda extensão da sociedade (leis de
efeitos gerais) e que causam prejuízo a determinadas pessoas não geram direito a
indenização, pois, assim como ocorre no campo do Poder Judiciário, em relação aos
atos típicos do Poder Legislativo também é aplicada a regra da irresponsabilidade do
Estado. Existem duas exceções no que concerne à aplicação da regra no cenário do
Poder Legislativo:

a. Lei de efeito concreto – possui forma de lei, mas natureza de ato


administrativo. Essa espécie de lei não atinge toda a sociedade, mas apenas
pessoa ou grupo de pessoas determinado, podendo beneficiar ou causar
prejuízos.

b. Lei declarada inconstitucional pelo STF – aqueles que tiveram prejuízo


decorrente de lei declarada inconstitucional terão direito a indenização.

Obs.: diante de ato atípico do Poder Legislativo, ou seja, diante de ato administrativo, será
aplicada a responsabilidade civil objetiva.
Da ação regressiva

A ação regressiva consiste na ação de regresso contra o agente, de modo que a ação
se dará pela vítima contra o Estado, ou seja, contra a pessoa que tem responsabilidade
objetiva, que, mediante a condenação, postulará ação regressiva contra o agente. Cabe
destacar um importante julgado do Superior Tribunal Federal (STF) em relação a essa
temática:

A vítima somente poderá ajuizar a ação de indenização contra o Estado; se


este for condenado, poderá acionar o servidor que causou o dano em caso de
dolo ou culpa; o ofendido não poderá propor a demanda diretamente
contra o agente público. A teor do disposto no art. 37, § 6º, da Constituição
Federal, a ação por danos causados por agente público deve ser ajuizada
contra o Estado ou a pessoa jurídica de direito privado prestadora de
serviço público, sendo parte ilegítima para a ação o autor do ato, assegurado
o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa. STF.
Plenário. RE 1027633/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 14/8/2019
(repercussão geral) (Info 947).

Desse modo, pode-se verificar três relações (vítima > Estado > agente), em que vigora,
conforme o determinado pelo STF, a teoria da dupla garantia: a garantia para a vítima cobrar
do Estado, na responsabilidade objetiva, e a garantia para o agente de só ser demandado
pelo Estado. Assim, de acordo com a teoria da dupla garantia, a vítima não poderá ingressar
diretamente contra o agente e tampouco contra o Estado e contra o agente ao mesmo tempo
através do chamado litisconsórcio, situação configurada pela existência de mais de uma
pessoa no polo passivo da ação.

Cabe ressaltar que o Estado não poderá denunciar à lide para chamar o agente
ao processo para que seja efetuada a resolução das duas relações através de uma única
sentença “dividida” em dois capítulos no mesmo processo.

Obs.: na esfera da vigência do antigo Código de Processo Civil (CPC), o STJ possui julgados
que dispõem que a denunciação à lide não é obrigatória, visto que anteriormente todos que
pretendiam exercer o direito de regresso deveriam efetuar a denunciação à lide, de modo que
caso não o fizessem, seria perdido o direito de regresso. Nesse sentido, o STJ fundamentava
que, ao se tratar de ação de responsabilidade civil do Estado, a denunciação à lide não seria
obrigatória, de modo que não sendo efetuada a denunciação pelo Estado, este poderia
perfeitamente entrar com uma ação autônoma de regresso contra o agente posteriormente.
O novo CPC de 2015, no entanto, não traz nenhum caso de denunciação à lide obrigatória,
de maneira que essa jurisprudência do STJ perderá sua força. Entretanto, caso alguma banca
disponha em sua prova que para o STJ a denunciação à lide não é obrigatória, o candidato
deverá considerar a assertiva correta, pois o examinador estará referindo-se ao acórdão do
STJ que, apesar de não estar atualizado, ainda existe.

Perceba, ainda, que a ação da vítima contra o Estado, como regra, será objetiva; e a
ação do Estado contra o agente – a partir da condenação – será sempre subjetiva, de maneira
que o agente só responderá perante o Estado caso tenha agido com dolo ou culpa.

 Vítima contra Estado – via de regra, responsabilidade objetiva;


 Estado contra o agente – a responsabilidade sempre será subjetiva, necessária a
análise de dolo ou culpa.

Obs.: os juízes somente responderão em caso de dolo, fraude ou retardamento


injustificado do processo. Assim, os juízes não responderão por culpa.

Da prescrição das ações indenizatórias

Conforme o Decreto n. 20.910/1932, a vítima terá um prazo de 5 (cinco) anos para


entrar com ações que visam cobrança de danos em razão de condutas do Estado ou,
conforme dispõe a Lei n. 9494/1997, das pessoas de direito privado prestadoras de serviço
público.

No que concerne à ação do Estado contra o agente, é importante destacar que até
2018 o STF entendia que as ações de regresso eram imprescritíveis, com base no parágrafo
5º, artigo 37 da Constituição Federal, mas o entendimento mudou e, atualmente, o STF
entende que a imprescritibilidade das ações de regresso somente diz respeito às ações
decorrentes de atos (dolosos) de improbidade dispostas no parágrafo 4º, artigo 37, da CF,
de modo que a Fazenda Pública está sujeita a prazo previsto em lei para a ação de regresso.
Desse modo, há a prescrição em razão de ilícito civil e de ilícito civil em razão de ato culposo
de improbidade, mas não há a prescrição em razão de ilícito civil em razão de ato doloso de
improbidade.

Obs¹.: o STJ entende que é imprescritível a pretensão de recebimento de indenização


por dano moral decorrente de atos de tortura ocorridos durante o regime militar
(Informativo n. 523).

Obs².: é prescritível a ação de reparação de danos à Fazenda Pública decorrente de ilícito


civil, salvo se decorrente de ato de improbidade. (RE n. 669069)

Jurisprudência – abaixo, seguem alguns julgados referentes ao tema:

 O STF entendeu que a União, na qualidade de contratante, possui


responsabilidade civil por prejuízos suportados por companhia aérea em
decorrência de planos econômicos que impossibilitaram a empresa de reajustar
suas tarifas. Com a decisão, foi garantida indenização em virtude da suposta
diminuição do seu patrimônio decorrente da política de congelamento tarifário
referente ao período de outubro de 1985 a janeiro de 1992. A empresa, concessionária
de serviço aéreo, argumentou que o congelamento das tarifas violou o direito ao
equilíbrio econômico-financeiro contratual. RE 571969/DF, rel. Min. Cármen Lúcia,
12.3.2014

RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO.


ALTERAÇÃO DE ALÍQUOTAS. INDÚSTRIA NACIONAL. IMPACTO
ECONÔMICO-FINANCEIRO. RISCO DA ATIVIDADE. Não se verifica o dever
do Estado de indenizar eventuais prejuízos financeiros do setor privado
decorrentes da alteração de política econômico-tributária, no caso de o
ente público não ter se comprometido, formal e previamente, por meio de
determinado planejamento específico. REsp 1.492.832-DF, Rel. Min. Gurgel de
Faria, por maioria, julgado em 04/09/2018, DJe 01/10/2018.

POSSE TARDIA EM CARGO PÚBLICO. Na hipótese de posse em cargo


público determinada por decisão judicial, o servidor não faz jus à
indenização, sob fundamento de que deveria ter sido investido em
momento anterior, salvo situação de arbitrariedade flagrante. RE
724347/DF, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o acórdão Min. Roberto
Barroso, 26.2.2015. (RE-724347)

POSSE TARDIA E PROGRESSÃO FUNCIONAL RETROATIVA. A nomeação


tardia de candidatos aprovados em concurso público, por meio de ato judicial,
à qual atribuída eficácia retroativa, não gera direito às promoções ou
progressões funcionais que alcançariam se houvesse ocorrido, a tempo
e modo, a nomeação. STF. Plenário. RE 629392 RG/MT, Rel. Min. Marco
Aurélio, julgado em 8/6/2017 (repercussão geral) (Info 868).

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