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28/06/2021 19&20 - Historicizando os pontos riscados por Arthur Valle

Historicizando os pontos riscados *

Arthur
Valle
VALLE, Arthur. Historicizando os pontos
riscados.  19&20,
Rio de Janeiro, v. XVI, n. 1, jan.-jun. 2021.
https://www.doi.org/10.52913/19e20.XVI1.07

*
* *

1.    
Nas chamadas religiões afrobrasileiras, pontos
riscados são diagramas rituais que possuem
diversas funções. Já há algumas
décadas, os pontos são muito associados com, embora não
sejam exclusivos
da, Umbanda. Trata-se de uma religião fortemente baseada em cultos
centro-
africanos aos ancestrais, mas que, dependo do terreiro, incorpora
também e em variadas medidas
elementos da religião iorubá dos orixás, oriunda
da África Ocidental; de religiões e práticas
mágicas europeias; de religiões
ameríndias etc. Como postula o historiador da arte estadunidense
Robert Farris
Thompson (2011, p. 119), assim como faz a Umbanda, os pontos riscados
contam
“uma história complexa de contato e de experiência cultural, em forma de
pensamento
geométrico.”

2.    
Neste artigo, apresento aspectos gerais da
iconografia e materialidade dos pontos riscados, mas,
sobretudo, procuro
historicizar seu emprego e recepção no Estado do Rio de Janeiro. Busco,
todavia, complementar tal abordagem considerando os pontos no contexto
geográfico ampliado do
mundo Atlântico, adotando uma perspectiva transcultural
e fazendo referências, ainda que rápidas,
a outros sistemas de diagramas
rituais oriundos de lugares marcados pela diáspora africana, como
as firmas
do Palo Monte cubano e os vévés do Vodu haitiano.

Iconografia
e materialidades

3.    
A designação pontos riscados é usada em
contextos religiosos afrobrasileiros ao menos desde as
primeiras décadas do
séc. XX. Os pontos constituem um sistema parcialmente codificado de
diagramas rituais que se referem a um enorme panteão de divindades e entidades
espirituais.
Usualmente, um determinado ponto se vincula a uma
específica entidade através da incorporação
de elementos iconográficos que
estão associados a esta última. Algumas dessas associações
iconográficas são
muito comuns e difundidas. O antropólogo Raul Lody (2003, p. 202) se refere,
nesse sentido, aos “pontos de conhecimento geral, chamaria de clássicos,”
exemplificando com o
emprego de “arcos e flechas para os caboclos, ou para
Oxóssi; tridentes para os Exus; espadas
para Ogum; estrelas de cinco pontas
para divindades aquáticas e a de Salomão para Xangô, entre
outros motivos.”
 Mas tais associações não dão conta da imensa variedade dos pontos.
O próprio
Lody (2003, p. 202) acrescenta que eles também podem ser
“eminentemente criativos e até
pessoais. [...] inventados a partir da
necessidade comunicadora inerente da própria produção
visual do ponto riscado.”
Além disso, não podemos esquecer que há grande heterogeneidade
dentro do campo
religioso afrobrasileiro. Por isso, é comum que, entre diferentes momentos
históricos ou entre diferentes terreiros, o ponto para uma mesma
entidade espiritual varie. Em

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geral, apenas o conhecimento preciso do contexto


de produção de um ponto pode assegurar a sua
adequada interpretação. É
por essa razão que aqui pouco vou me deter na exegese dos pontos
que
apresento.

4.    
Com frequência, pontos riscados são
sinais transitórios. Na sua modalidade mais conhecida, eles
são desenhados no
chão dos terreiros usando uma espécie de giz grosso chamado pemba.
O
escritor angolano António de Assis Júnior (s. d., p. 333) observa que, em
quimbundo, esse termo
designa uma "substância arenosa branca, usada nos
exorcismos [...]. | Caolino; espécie de
gesso." No final dos anos 1940, o
sociólogo francês Roger Bastide chamou atenção para o
emprego da pemba
no desenho dos pontos no Brasil, qualificando isso como uma
"diferença
essencial" com relação a sistemas de diagramas usados em
África ou em outras parte da
diáspora, como os vévé no Haiti (RIGAUD,
1974; THOMPSON, 1997). Para Bastide (1948, p. 6),
"o aparecimento do giz
de várias cores, substituindo a farinha, a cinza e outros materiais vegetais
ou
minerais [...] constitui a influência da civilização ocidental."

5.    
Em uma fotografia não datada [Figura 1],
vemos a religiosa Zélia de Moraes, uma médium na
Tenda Espírita N. Sra. da
Piedade - fundada no início do século XX e considerada por muitos
como o
primeiro centro umbandista oficial (OLIVEIRA, 2008, p. 90-102) - ajoelhada
diante de
vários pontos desenhados com pemba branca. Digno de
destaque nesta foto é o desenho de um
coração atravessado por uma flecha, o ponto
riscado do principal guia espiritual da Tenda, o
Caboclo das Sete
Encruzilhadas. A foto ilustra, assim, aquela que é provavelmente a mais
importante função dos pontos - i.e., a de invocar, de fazer “baixar” nos
terreiros, entidades
espirituais das mais diversas, contribuindo para
“firmá-las” nos corpos dos médiuns que as
incorporam.

6.    
Todavia, alguns pontos nessa mesma foto,
na forma de estrelas de cinco pontas, não estão sendo
usados propriamente para
invocar entidades, mas, antes, “à maneira Kongo [centro-africana] para
‘centralizar’ a água consagrada [...] em recipientes para os espíritos”
(THOMPSON, 2011, p. 117).
Essa função de consagração ritual é até hoje comum em
práticas litúrgicas afrobrasileiras. Pontos
podem ser usados para
consagrar, por exemplo, uma estátua a determinada entidade espiritual
(MOURÂO,
2012, p. 159-160) ou guias (colares de contas usados pelos religiosos),
como ilustra
uma foto do centro umbandista Casa Vovó Maria do Rosário,
localizado em Santa Cruz, Rio de
Janeiro [Figura 2].

7.    
Pontos riscados também
podem ser desenhados com carvão ou com pólvora. Fotos do Arquivo
Nacional do
Rio de Janeiro - possivelmente do início dos anos 1950[1] -
mostram religiosos
traçando no chão, com carvão, um ponto [Figura 3a]:
este é composto por um círculo no meio do
qual vemos uma cruz cujos braços
terminam em forma de tridentes. Em outra foto da série, vemos
o desenho inicial
sendo coberto com pólvora [Figura 3b].
Sobre essa prática, Bastide (1948, p. 6)
precisou que, no Brasil, o "ponto
riscado torna-se o local [...] de exposição ritual da pólvora, que se
expande
com forte fumaça e permite a quebra dos limites que separam o humano do
divino.” Para
Bastide, isso seria resultado da “influência europeia das cargas
de fuzil feitas nas festas católicas
ou folclóricas,” embora outras fontes
também devam ser consideradas.

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8.    
Finalmente, deve-se notar que alguns pontos
riscados são permanentemente configurados em
objetos espirituais
relevantes, como cálices, roupas, instrumentos musicais etc. Um exemplo
contemporâneo é um ponto riscado de Exu Tranca Rua das Almas, composto
por três tridentes
cruzados, que vemos na longa capa preta que um médium usa,
em estado de transe, no Templo
Espírita Ogum Megê, localizado em Cabuçu, Rio de
Janeiro [Figura 4].
Nesse caso, o ponto em
grande medida identifica a entidade para os
fiéis, ao mesmo tempo em que parece ajudar a “firmá-
la” no corpo do médium. De
resto, pontos podem também figurar em objetos pessoais, como
pingentes
ou anéis. Nesses casos, eles usualmente têm funções apotropaicas. Mais abaixo,
apresento exemplos de pontos sendo usados nesse último sentido.

Controvérsias
sobre as “origens”

9.    
Existe uma relativa polêmica a respeito das
supostas “origens” dos pontos riscados. A tese mais
difundida afirma uma
derivação essencialmente centro-africana. Seu mais conhecido proponente é
provavelmente o referido Robert Farris Tompson. Outros investigadores,
notadamente o historiador
da arte cubano Barbaro Martinez-Ruiz, ex-orientando
de Thompson em Yale, desenvolveram tal
tese em alguns de seus trabalhos
(MARTINEZ-RUIZ, 2007; MARTINEZ-RUIZ, 2013).

10.  
Thompson e Martinez-Ruiz entendem os pontos
riscados como fazendo parte de um corpus bem
maior de sistemas de diagramas
rituais afro-atlânticos. Tomando de empréstimo uma expressão
cunhada pelo
entomusicólogo alemão Gerhard Kubik (1986), Martinez-Ruiz denominou esse
corpus
de “sistemas de escrita gráfica Kongo.” Ele assim os define:

11.                           
     Sistemas
de
escrita gráfica Kongo são códigos complexos de conhecimento compartilhado que
desenvolvem e comunicam cosmologia, mitologia e filosofia, bem como definem
realidades
estéticas. Eles perpetuam e validam memórias coletivas, épicos,
lendas, mitos e conhecimentos
antigos, desempenhando um papel integral na
definição e desenvolvimento de culturas
africanas e afro-caribenhas, e na
prática de religiões de matriz africana tradicionais e
contemporâneas. (MARTINEZ-RUIZ, 2013,
p. 48, tradução livre)

12.  
Nessa definição, o termo “Kongo” é central. Como
explica Thompson (2011, p. 108), "ao escrever
Kongo com K, em vez de C, os
africanistas distinguem a civilização do Kongo e o povo Bakongo
da entidade
colonial chamada de Congo Belga [...] e da atual República Popular do
Congo-
Brazzaville." Um subconjunto da chamada cultura Bantu, os Bakongo
teriam se estabelecido na
África Central como resultado de grandes e complexas
migrações por boa parte do continente
(MARTINEZ-RUIZ, 2013, p. 15-16; LOPES,
2011, p. 107-108). Conceitos culturais e religiosos dos
Bakongo são
compartilhados com outros povos, como os Punu do atual Gabão; os Teke do atual
Congo-Brazzaville; os Suku e os Yaka da região do Rio Kwango, na República
Democrática do
Congo; bem como com grupos étnicos do norte de Angola (THOMPSON,
2011, p. 108). Todos
esses povos sofreram as provações do comércio
transatlântico de escravizados e o trabalho
forçado nas plantations e
cidades do continente americano. Portanto, séculos de escravidão
trouxeram
lembranças e crenças Kongo às Américas. Testemunhos desse traumático processo
seriam as variadas tradições gráficas encontradas não só no Brasil, mas também
em Belize, Cuba,
Haiti, Jamaica, Suriname ou Trinidad.

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13.  
De acordo com Martinez-Ruiz, as primeiras
evidências de “escrita gráfica Kongo” são encontradas
em sítios arqueológicos
ao redor da fronteira entre Angola e a República Democrática do Congo.
Além
disso, ele demonstra convincentemente a semelhança entre os antigos signos
rupestres e
grafias rituais contemporâneas, como as firmas dos
sacerdotes do Palo Monte (MARTINEZ-RUIZ,
2013, p. 82-85) [Figura 5].

14.  
Na contramão da tese que postula origens
centro-africanas para os pontos, há aqueles que
defendem, antes, uma
origem fundamentalmente europeia. É o caso dos antropólogos Julien
Bonhomme e
Katerina Kerestetzi, que, em artigo relativamente recente, criticam o que
interpretam
como “busca da África” (CAPONE, 2012) nas pesquisas de
historiadores como Thompson ou
Martinez-Ruiz. Em contrapartida, Bonhomme e
Kerestetzi frisam a importância fundamental da
magia europeia para os sistemas
gráficos das religiões afro-americanas. Segundo eles,

15.                           
     Se,
em sua forma
e uso, os grafismos da Abakuá e Palo Monte [em Cuba], mas também os do
Vodu
haitiano, da Umbanda e das igrejas espirituais batistas compartilham um ar de
família,
isso sem dúvida se deve menos às suas raízes africanas do que à
influência onipresente da
magia europeia. Isso pode ser comprovado no
vocabulário e nas concepções de magia que
fundamentam o uso de todos esses
grafismos rituais. Geralmente, eles são designados pelo
termo
"assinatura" ou "selo" (por exemplo, firma ou sello
nas religiões afrocubanas, seal nas
igrejas espirituais batistas):
trata-se provavelmente de um legado da magia talismânica
europeia e da teoria
das assinaturas, na qual a primeira se baseou desde o Renascimento.
(BONHOMME & KERESTETZI, 2015, p. 83, tradução livre, grifos meus)

16.  
Me parece pouco produtivo desenvolver aqui a
polêmica a respeito das “origens” dos pontos
riscados, i.e., se estas
seriam predominantemente africanas ou europeias. No meu entender, as
duas
fontes não se excluem; antes, se complementam. O que me parece certo e mais
importante
é justamente entender os pontos como uma expressão artística
essencialmente híbrida (BURKE,
2009). Nesse sentido, vale lembrar que, ao menos
desde os anos 1980, Thompson reconhecia -
embora em grau bem menor- a
relevância da literatura esotérica europeia para as “escritas
gráficas”
afro-atlânticas, lembrando também de outras fontes, como o Catolicismo Romano;
as
religiões Iorubá, Fon e Ewe; e até mesmo a Maçonaria (THOMPSON, 1981, p.
152). Dito isso, me
parece que a questão das fontes europeias dos pontos
brasileiros é instigante e que ela ainda não
recebeu a consideração devida.
Mesmo que brevemente, eu gostaria de tratar disso aqui.

17.  
Bonhomme e Kerestetzi (2015, p. 84, tradução
livre) afirmam que “o aporte da magia talismânica
nos grafismos rituais
afro-americanos se baseia em um fluxo contínuo de livros da Europa para as
Américas desde o séc. XVI.” Fontes brasileiras do começo do séc. XX parecem
confirmar esta
afirmação. Em uma passagem de seu seminal As Religiões no Rio,
publicado originalmente em
1904, João do Rio dizia:

18.                           
     Mas
o que não
sabem os que sustentam os feiticeiros, é que a base, o fundo de toda a sua
ciência é o Livro de S. Cipriano. Os maiores alufás, os mais complicados pais
de santo, têm
escondida entre os tiras e a bicharada uma edição nada fantástica
do S. Cipriano. Enquanto
criaturas chorosas esperam os quebrantos e as
misturadas fatais, os negros soletram o S.
Cipriano, à luz dos candeeiros... (RIO, [1906], p.
32, grafia atualizada)

19.  
Escrita no usual tom racista e derrogatório de
João do Rio, tal passagem é simultaneamente
exagerada e simplista, mas me
parece conter elementos que merecem reflexão. No atual estado

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da investigação,
não sei a que edição do famoso grimório atribuído a São Cipriano de Antioquia
(DAVIES, 2009, p. 114-117) os pais de santo cariocas dos anos 1900 poderiam ter
acesso. Mas se
consultarmos, por exemplo, edições em língua espanhola
aproximadamente coevas, podemos
facilmente encontrar diagramas que, em suas
formas e funções, recordam os pontos riscados. É
particularmente o caso
de certos talismanes, que são descritos como “objetos mágicos, de
diversas espécies, que possuem virtudes maravilhosas. São feitos imprimindo,
gravando ou
cinzelando sobre uma pedra, metal ou outro material, e levam o selo
de um signo celeste” (LIBRO,
s.d., p. 43, tradução livre)

20.  
Tomemos, e.g., o talisman de Marte [Figura 6], ao
qual são atribuídas virtudes apotropaicas, bem
como o poder de dominar
multidões e de atrair espíritos ligados ao planeta vermelho (LIBRO, s.d.,
p.
57). Esse talisman é formado por dois círculos concêntricos, dentro dos
quais estão dispostos
simetricamente vários signos, como palavras em latim, um
pequeno dragão, setas, um tridente etc.
Em termos gerais, a composição visual
do talisman é semelhante à do ponto da Figura 3a. Como
veremos, tal tipo de composição era empregada no Rio ao menos desde os anos
1920.

21.  
Outro importante livro esotérico europeu que
pode ter contribuído para a configuração dos pontos
riscados é a chamada
Clavícula de Salomão (Clavicula Salomonis), um pseudoepígrafo
atribuído
ao Rei Salomão, que data provavelmente do séc. XIV ou XV (DAVIES,
2009). Anúncios publicados
na imprensa carioca em 1908 apresentavam uma edição
desse grimório como um livro que
ensinava a “fabricar e adaptar [talismãs
mágicos] com virtudes maravilhosas” (LIVROS, 1908, p.
10), acrescentando que
ele podia ser adquirido na Livraria Bittencourt, Avenida Passos n. 11.

22.  
Não sei ainda se essa edição da Clavicula
Salomonis era ilustrada, mas várias outras continham
diagramas mágicos
usados para invocar espíritos. Na influente edição organizada por Samuel
Lidell
Mathers em 1889, vemos exemplos do que esse famoso ocultista - o fundador da
ordem
hermética da Golden Dawn - chamava de medals (medalhas) ou pentacles
(pentáculos).[2] A
composição destes - como, e.g., o Segundo Pentáculo do Sol [Figura 7] - é
semelhante à do
talisman de Marte da referida edição espanhola do Livro
de São Cipriano. O pentáculo apresenta
vários signos (do sol, da lua, um
tridente etc.) e os nome de quatro “anjos” em hebraico. Ele
serviria para
“reprimir o orgulho e arrogância dos espíritos solares, que, por natureza, são
completamente orgulhosos e arrogantes” (MATHERS, 1889, p. 65, tradução livre).

23.  
Se as formas de diagramas como esses lembram a
de certos pontos riscados, a maneira como
eles eram utilizados revela,
porém, divergências entre as práticas mágicas europeias e as
religiosidades
afrobrasileiras. Em sua edição da Clavicula Salomonis, Mathers assim se
refere às
medalhas ou pentáculos:

24.                           
     As
Medalhas ou
Pentáculos, que fazemos com o propósito de infundir terror nos Espíritos e
submetê-los à obediência, têm além disso excelente e maravilhosa virtude. Se tu
invocares os
Espíritos com estes Pentáculos, eles te obedecerão sem
repugnância; tendo examinado os
Pentáculos, os Espíritos ficarão surpresos e
temerosos, e tu os verás tão surpresos, com medo
e terror, que nenhum deles
será suficientemente ousado para desejar opor-se à tua vontade.
(MATHERS, 1889, p.
56, tradução livre)

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25.  
O desejo do mago europeu em dominar totalmente
os “espíritos” diverge da atitude usualmente
reverencial que os religiosos
afrobrasileiros nutrem com relação às entidades que são invocadas
pelos pontos
riscados. O clima de potencial conflito com forças sobrenaturais arrogantes
e mesmo
perigosas, que parece pairar sobre rituais como os descritos por
Mathers, também é muito diverso
dos respeitosos modos de sociabilidade entre
humanos e não-humanos que são a norma nos
terreiros. Isso nos alerta
para uma precaução metodológica fundamental: é improdutivo pensar os
fluxos
artísticos entre Brasil e Europa como uma via de mão única, como poder-se-ia
deduzir da
abordagem de Bonhomme e Kerestetzi. Se os pontos realmente se
apropriaram, como parecem
ter feito, de elementos do esoterismo europeu, estes
últimos foram substancialmente
ressignificados no processo por modos de pensar,
viver e cultuar que eram já afrobrasileiros. Com
efeito, tal precaução vale
para toda a arte produzida no Brasil, mas mantê-la em mente é essencial
quando
esta comporta elementos oriundos de matrizes africanas.

Subsídios
para uma historicização

26.  
Relativa escassez e grande dispersão
caracterizam as fontes sobre os pontos riscados. Isso em
grande medida
se deve ao estatuto marginal das religiões afrobrasileiras durante a maior
parte de
sua história. A natureza secreta de muitos de seus ritos e sobretudo a
repressão que elas
sofreram desde tempos coloniais contribuíram para sua
invisibilidade histórica. Punições e/ou
restrições de culto eram explicitamente
formuladas, por exemplo, nas chamadas Ordenações
Filipinas ou na Constituição
Política do Império do Brasil, de 1824. Com a República, apesar da
teórica
liberdade de culto proposta na Constituição de 1891, a repressão continuou e só
veio a
progressivamente arrefecer a partir dos anos 1930. Até o começo dos anos
1940, a repressão foi
legalmente embasada em artigos do Código Penal de 1890
que puniam os chamados “crimes
contra a saúde pública” (BRASIL, 1890, Capítulo
III), como o espiritismo, a magia e o
curandeirismo.

27.  
Logo, o caráter muito fragmentário das fontes
sobre as religiões afrobrasileiras, bem como o fato
das mais antigas terem sido
mormente produzidas por agentes da repressão, dificulta que
historicizemos de
forma precisa os pontos. Nesta parte, eu gostaria de expandir o esforço
que
apresentei em outro trabalho (VALLE, 2020b), apresentando sobretudo
evidências que ainda não
havia discutido.[3] O esboço
de historicização que apresento aqui não pretende ser exaustivo ou
sistemático,
e termina em meados do séc. XX. Todavia, creio que ele pode ser útil para
ulteriores
investigações.

28.  
Até o momento, as fontes mais antigas que
encontrei sobre os pontos são já do séc. XX. Esse fato
não deve nos
levar a crer que formas semelhantes de arte sacra afrobrasileira não existissem
antes. Com efeito, algumas expressões estéticas coloniais e imperiais podem ser
aproximadas dos
pontos. É o caso, por exemplo, de certos diagramas
encontrados nas chamadas bolsas de
mandinga [Figura 8a
e
Figura 8b]
(RAREY, 2018), que usualmente possuíam função apotropaica
e cujas formas já
foram cotejadas às dos pontos por outros investigadores (CALAINHO,
2008). No
exemplo da Figura 8a,
vemos, no topo, um coração atravessado por flechas que faz pensar no

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ponto
do Caboclo das Sete Encruzilhadas, e, ao centro, um diagrama circular contendo
inscrições
e uma cruz latina, que recorda os diagramas mágicos europeus
referidos na parte anterior.[4]

29.  
Uma imagem de tempos imperiais que vale ser
citada é o selo de Dom Obá II, um alferes que se
dizia neto de Abiodun, o Alaafin
de Oyó [Figura 9].
Este selo, “uma espécie de brasão de família
ou timbre de autoridade” (SILVA,
1997, p. 171), circulava em impressos cariocas ao menos desde
os anos 1880.
Nele vemos, em torno do retrato de Obá, representações esquemáticas de
“ferramentas” dos orixás iorubanos Ogum e Oxóssi. Especialmente o damatá
(arco e flecha) desse
último orixá aparece frequentemente em pontos riscados
mais recentes.

30.  
Também parece remontar a tempos
pré-republicanos a prática, muito associada aos pontos, de
desenhar no
chão diagramas mágicos. Normalmente interpretado nesse sentido é um pequeno
desenho aquarelado feito por Jean-Baptiste Debret,
datado de 1828, que há algumas décadas é
intitulado “Negro feiticeiro” [Figura 10]. No
desenho vemos um homem negro, de compleição
esbelta, trajando refinadas roupas
(sapatos, calça, casaca, chapéu com peruca); com o auxílio de
um longo
instrumento, ele traça um círculo no chão, em torno de si. A hipótese de que o homem
seja um “feiticeiro” parece se basear nesse seu gesto, uma vez que, em muitos
ramos da magia
ritual, praticantes desenham círculos mágicos que supostamente
contêm energia, formam um
espaço sagrado e/ou fornecem uma forma de proteção
mágica (THACKER, 2011, p. 61 sg.).
Porém, na ausência de outras evidências,
julgo difícil ter certeza se o personagem de Debret era
de fato um “feiticeiro”
e, caso fosse, em que medida seu gesto dialogava com heranças africanas.

31.  
O certo é que, em hipótese, tal diálogo é
plausível. Ainda que cerca de um século depois, o
emprego de um círculo mágico
em um contexto religioso indubitavelmente afrobrasileiro é descrito
em detalhes
pelo jornalista Francisco Guimarães, o popular Vagalume, em sua série de
reportagens intitulada Mysterios da Mandinga, publicado em 1929 (FARIAS,
2011). Vagalume ali
relata como um feiticeiro chamado Tio Pedro, "um velho
africano," executou um feitiço para um
consulente que desejava se vingar
de um desafeto. Ao iniciar seu feitiço - cujo efeito, vale notar,
teria sido
poderoso e imediato -, Tio Pedro desenhou no chão alguns signos, fazendo-o como
se
traça os pontos até hoje: 

32.                           
     No
meio do
"terreiro",
[Tio Pedro] pegou da "pemba" (giz) e fez um círculo no chão.
Primeiramente andou em torno dele [...] Entoava um cântico em africano [sic],
dava uns passos
à frente e outros à retaguarda e de vez em quando curvava o
corpo e estendia os braços para a
frente exclamando: | - Exú!... Exú!...
Exú!... [...] Um signo Salomão [sic][5] foi desenhado ao
centro e depois de um certo cerimonial, foi sobre aquele desenho, colocado um
monte de
pólvora. (GUIMARÃES, 1929, p. VI, grafia atualizada)

33.  
A reportagem de Vagalume não era ilustrada.
Alguns anos antes dela, porém, já começam a
aparecer imagens de pontos
riscados na imprensa do Rio. O (presumível) exemplo mais antigo
que
encontrei ilustra uma longa reportagem de Carlos Alberto Nóbrega da Cunha
intitulada O
Mysterio da "Macumba," publicada no Correio
da Manhã em setembro de 1923 [Figura 11].
Trata-
se de uma interessante representação do “’canzel’ de ‘um pai de santo’ da
'linha' de 'Umbanda',”
como precisa a sua legenda. Chama a atenção nessa imagem
as diversas cruzes que a pontuam,
especialmente as que estão à frente dos copos
e da vela, no chão aos pés do altar. As cruzes

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ocupam o aposento simulado na


ilustração assim como aquelas que povoam o espaço do papel
encontrado em
uma bolsa de mandinga, reproduzido na Figura 8b.
Thompson (1981, p. 153,
tradução livre) pontua que, “no Rio, diz-se que os
primeiros desenhos feitos sobre a terra eram
cruzes simples ou uma cruz em um
círculo, como no Kongo.” É, porém, improvável que as cruzes
no “canzel” de 1923
sejam os primeiros pontos cariocas. Como Bastide afirmava no começo dos
anos 1980, não havia (e ainda não há) evidências irrefutáveis sobre o momento
preciso em que os
pontos surgiram nas religiões afrobrasileiras (BASTIDE
apud THOMPSON, 1981, p. 153). Creio
que o mais provável é que as cruzes da Figura 11
-
se efetivamente forem pontos - sejam
exemplos mais ou menos tardios de uma
tipologia elementar então já estabelecida, e que
permanece em uso no Rio.

34.  
Ilustrações de outras reportagens que visavam a
apresentar para os leitores os “mistérios da
Macumba,” também assinadas por
Nóbrega da Cunha, mostram pontos mais complexos. Como
comentei em outro
texto (VALLE, 2018, § 27-40), essas ilustrações foram publicadas no periódico
Vanguarda
em 1927 e são de autoria do artista de origem portuguesa Fernando
Correia Dias. O
próprio cabeçalho das reportagens é
cuidadosamente composto tendo em seu centro um ponto
riscado circular,
contendo uma estrela de cinco pontas e as letras maiúsculas J, A, C, O, e B
[Figura 12].
Outros pontos representados por Correia Dias são mostrados no canto
inferior
esquerdo da Figura 13, ou
parcialmente escondidos (talvez deliberadamente) pela figura do pai de
santo ao
centro da Figura 14.[6] As
ilustrações sugerem que estes pontos eram desenhados
sobre tabuletas, uma
prática que é de fato confirmada por textos e fotos da época.

35.  
Em edição do Diário de Notícias de 8 de
novembro de 1932, encontramos outro notável registro de
um ponto riscado
[Figura 15].
Trata-se de uma ilustração para artigo que anuncia a publicação de
uma série de
textos intitulada Espiritismo, Magia e as Sete Linhas de Umbanda, de
autoria do
escritor Antonio Elieser Leal de Souza. A série foi publicada em 56
pequenas partes entre
novembro de 1932 e janeiro de 1933, e parcialmente
reunida nesse último ano na forma de livro
(SOUZA, 2020). Na ilustração que
aqui me interessa, vemos um despacho (uma oferenda ritual),
composto por
uma galinha preta, uma garrafa (provavelmente de cachaça), charutos e moedas.
Esses elementos se encontram assentados sobre, e parcialmente ocultam, um ponto
riscado cuja
composição nos é já familiar. Dentro de um círculo, podemos
ver dispostos simetricamente um par
de flechas que se cruzam e uma estrela de
cinco pontas, cada uma das quais enfatizada por uma
vela acesa. Vale frisar a
importância dada ao ponto nessa ilustração que “abre a gira” para um dos
textos fundacionais da doutrina umbandista. Nele, Leal de Souza se refere aos pontos
diversas
outras vezes. Ao elencar “os atributos e peculiares da Linha Branca”
de Umbanda e Demanda, por
exemplo, ele os define de modo a enfatizar sua função
invocatória e sua potencial polissemia:
“PONTO RISCADO: É um desenho
emblemático e cabalístico.[7] Atrai
com a concentração que
determina para ser traçado, as entidades ou falanges a
que se refere. Tem sempre uma
significação e exprime, às vezes, muitas coisas,
em poucos traços” (SOUZA, 1932, p. 1, grafia
atualizada).

36.  
Diversas matérias de jornal publicadas ao menos
a partir de 1927 e ligadas a repressão policial
contra a religiões
afrobrasileiras também mostram pontos riscados. Já tratei de algumas
delas em

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outros trabalhos (VALLE, 2017; VALLE, 2020a), por isso gostaria de me


voltar aqui para um
aspecto mais tangível, por assim dizer, da repressão.
Trata-se de um conjunto de objetos sacros
apreendidos pela polícia e que faziam
parte do acervo do Museu da Polícia Civil do Estado do Rio
de Janeiro.
Recentemente, esse acervo foi transferido para o Museu da República do Rio
(GOVERNO, 2020, p. 22), onde se espera que ele seja tratado com a dignidade e
respeito que lhe
é devido desde antes de seu tombamento pelo antigo Serviço do
Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional, em 1938 (MINISTÉRIO, 1938).

37.  
Além de uma coleção de pembas de
diversas cores [Figura 16], o Museu da Polícia guardava
algumas peças que
ostentavam pontos riscados. É o caso, e.g., de um tambor pintado nas
cores
verde e branco, que exibe flechas cruzadas, provavelmente vinculadas a
Oxóssi ou a algum
caboclo [Figura 17]. Junto com vários outros objetos sacros, esse
tambor foi apreendido pela
polícia em abril de 1935 e pertenceria a uma
religiosa chamada Judith Candida de Oliveira, que
então residia na Rua
Mambucaba n. 26, no subúrbio do Rio (JUPYRA, 1935, p. 1). Outro exemplo
é um ponto
desenhado sobre papel emoldurado [Figura 18], que provavelmente foi apreendido
pela polícia
no começo de 1941 por ocasião de uma grande investida contra os terreiros
cariocas
organizada pelo Major Filinto Müller, então Chefe de Polícia do
Distrito Federal (FONSECA, 1941,
p. 44).

38.  
Em texto publicado originalmente nos anos 1980,
Thompson se referia, ainda, a duas peças
excepcionais, provavelmente das
primeiras décadas do séc. XX, mas que não constam nos
levantamentos do acervo
do Museu da Polícia que consultei. Vale, portanto, lembrá-las aqui. A
primeira
é uma cabaça de beber laqueada de preto e decorada
com uma cruz latina dentro de uma
Estrela de Davi, ambas inseridas em um
círculo ornado com seis pequenos pentagramas [Figura
19]. Esse ponto, que se aproxima do feito
no chão pelo referido Tio Pedro, seria o ponto riscado de
Pai Velho, “um
ancestral Kongo de poder e percepção especiais. Seu ponto adverte o
mundo de
que ninguém, exceto uma pessoa em seu espírito ou um oficiante
apropriado, pode usar sua
cabaça de beber” (THOMPSON, 2011, p. 118-119). A
segunda peça é um bordado com fios
vermelhos em uma faixa de seda verde, que
ostenta no alto a identificação “S. Jorge” [Figura 20] -
santo que, em contextos religiosos
afrobrasileiros cariocas, é usualmente sincretizado com Ogum.
De acordo com
isso, Thompson propõe que esse ponto representaria as “estradas de
Ogum.” Mas
ele acrescenta que as linhas desse ponto “são também
encruzilhadas, o elemento de Exu - daí,
talvez, os forcados crípticos na
extremidade dos três eixos indicados” (THOMPSON, 2011, p. 119).

39.  
A partir sobretudo dos anos 1930, com a
realização dos Congressos Afro-Brasileiros em Recife
(1934) e Salvador
(1937), aspectos das culturas afrobrasileiras, incluindo as religiões,
conheceram
uma progressiva valorização. Destacam-se, nesse último sentido, a
valorização do Candomblé, na
Bahia, e de certas linhas da Umbanda, entre os
setores médios da sociedade em cidades então
em vias de desenvolvimento, como
Rio de Janeiro e São Paulo. A partir de meados do séc. XX,
passou a ser comum
que artistas ligados ao campo institucionalizado da arte se apropriassem de
elementos das culturas visuais religiosas afrobrasileiras. Renomados artistas
negros como Abdias
do
Nascimento, Rubem Valentim
ou
Emanoel Araújo se valeram
das formas e da iconografia das
chamadas “ferramentas” ou “ferros” de orixás do
Candomblé, mas pontos riscados parecem

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também ter constituído um


repertório privilegiado. Fotos recentes de Jorge dos
Anjos trabalhando
servem para ilustrar tais
apropriações. Nelas, vemos o artista desenhando com pólvora sobre uma
grande
tela branca - podemos, inclusive, reconhecer ali a forma de um tridente [Figura 21]. Tal
performance se relaciona com a poética do
artista mineiro, que costuma produzir formas
queimando a superfície de telas de
feltro com ferro em brasa, ou superfícies de plástico com fogo
(RIBEIRO, 2015).
Mas ela também traz à mente a performance ritual do religioso desenhando um
ponto
com pólvora na Figura 3b.

40.  
Após a realização, em 1941, do I Congresso
Brasileiro de Espiritismo de Umbanda no Rio de
Janeiro, tornaram-se
frequentes as publicações visando a sistematizar a doutrina da religião
(CUMINO, 2006, p. 8). Para os pontos riscados, esse parece ter sido um
marco importante, pois, a
partir de então, surgiu uma tipologia de catálogos de
pontos que viria a se tornar muito popular.
Nesse sentido, o sacerdote e
pesquisador da Umbanda Alexandre Cumino destaca como pioneiro
o livro Umbanda
(Magia Branca) e Quimbanda (Magia Negra) de Lourenço Braga, com primeira
edição datada de 1942, e que contém muitas páginas dedicadas aos pontos [Figura 22]. Fazendo
eco ao congresso de 1941 e à ideia de
“branqueamento” da Umbanda que parece ter sido sua
tônica (SANTOS, 2016), Braga
esboça em seu livro não somente uma sistematização dos pontos,
mas os apresenta
com uma composição visual uniformizada e muito próxima da dos diagramas
mágicos
europeus supracitados. Nas décadas seguintes, esses catálogos de pontos
se ampliariam
muitíssimo em dimensões. Thompson (1981, p. 153, tradução livre)
chamou a atenção para o
fenômeno: “em 1951, 132 pontos foram recolhidos,
classificados e publicados. Em 1975, esse
número havia se multiplicado para
1500.” Catálogos mais recentes (e.g., 3333 PONTOS, 2011)
prometem aos fiéis
quantidades ainda maiores de pontos, deixando entrever, simultaneamente,
a
desconcertante diversidade de entidades espirituais que “baixam” nos terreiros.
Todavia, o estudo
sistemático dessa importante série de catálogos ainda aguarda
por ser feito.

41.  
Um último aspecto que gostaria de considerar,
ainda relacionado ao prestígio crescente de
denominações como a Umbanda em
meados do séc. XX, tem a ver com uma vasta cultura visual
a elas relacionada,
que circulou em diversas media e que, presumivelmente, conheceu grande
difusão. Também nesse campo, os pontos se afirmaram como elementos
visuais emblemáticos. À
guisa de exemplo, vou me deter aqui em duas imagens.

42.  
A primeira é a capa do LP intitulado Macumba,
que registra gravações do músico e pintor Heitor
dos
Prazeres  em 1955 [Figura 23] - umas das músicas se intitula, inclusive, “Segura a Pemba.”[8]
Na
imagem, executada pelo próprio Prazeres, vemos um grupo de três religiosos
negros dançando
e cantando em torno de um atabaque. No canto inferior esquerdo,
pode-se ver a representação de
um ponto riscado. Sua forma é a de um
pentagrama, traçado a branco sobre fundo escuro, com
velas acesas em cada uma
de suas pontas - semelhante, portanto, ao ponto na imagem que
anunciava
os textos de Leal de Souza em 1932. Dentro do pentagrama, destacam-se, ainda,
um
triângulo e uma flecha apontando para a direita, bem como seis pequenos
círculos.

43.  
A segunda imagem é um anúncio de venda de
“anéis de Umbanda,” publicado no periódico carioca
A Noite Ilustrada
em janeiro de 1952 [Figura 24]. A
empresa que comercializava os anéis

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chamava-se Distribuidora de Joias LTDA e


localizava-se na Rua do Ouvidor, no centro do Rio. O
anúncio foi publicado
justamente no momento em que “a Umbanda ating[ia] seu ponto máximo de
crescimento no Estado da Guanabara [sic]”[9]
(ORTIZ, 1999, p. 203). Considerada uma religião
legítima e até “genuinamente”
brasileira, a Umbanda era então capaz de catalisar um sentimento
de pertença
religiosa definidor da própria identidade de seus fiéis e passível de ser
explorado
comercialmente.

44.  
Além de frisar a função apotropaica dos pontos,
o anúncio explicitamente apelava para o “orgulho”
dos umbandistas. Vale aqui
reproduzir suas palavras:

45.                           
     Orgulhe-se
de
ser um UMBANDISTA e procure se identificar sob a proteção de seu "Guia
Espititual". Anéis artisticamente trabalhados em ouro e prata, com pedra
de cor correspondente,
contendo a "linha" e o "ponto
riscado" que lhe correspondem. Procure já o seu anel e mantenha
seu espírito
tranquilo na certeza da proteção permanente que essa joia lhe inspira. | (Os pontos
foram
autorizados pelo Guia). (ANÉIS, 1952)

46.  
O anúncio em A Noite Ilustrada propunha
uma sistematização da iconografia dos pontos referentes
a várias
entidades. Nele vemos, por exemplo: um ponto de “Exu Tranca Rua,” com seu
tridente
característico; um ponto de “São Jorge da Ronda,” que ostenta as
típicas espadas de Ogum, o
equivalente sincrético de São Jorge no panteão da
Umbanda carioca; ou um ponto de "Xangó das
Matas," no qual o machado
do orixá do trovão é cruzado por quatro flechas que se referem aos
caboclos, os
habitantes ancestrais das florestas brasileiras [Figura 24,
detalhes].

47.  
A sistematização apresentada no anúncio é,
certamente, particular e contingente, divergindo em
certa medida dos catálogos
de pontos coevos. Logo, não devemos supor que, em meados do
século XX, as
entidades mencionadas no anúncio fossem invocadas pelos mesmos pontos em
todos
os terreiros do Rio. Mas tal sistematização é um bom exemplo da singular
constância de
certos elementos iconográficos e da lógica sintática dos pontos
riscados, em que, de acordo com
necessidades específicas, diversos
elementos podem ser combinados criativamente para se referir
a uma determinada
entidade espiritual.

48.  
Finalizando, gostaria de frisar que, neste
artigo, busquei principalmente historicizar os pontos
riscados. Trata-se
de uma introdução a um tema vasto, na qual me vali de um olhar “de fora” das
religiões afrobrasileiras, diverso do dos iniciados. Minha preocupação
principal foi também
específica: como historiador da arte, procurei contribuir
para o entendimento dos pontos como uma
expressão estética original e
potente. Nesse sentido, eles exigem a mesma atenção que os
estudiosos da arte
brasileiros reservam para seus objetos canônicos, geralmente de marcada
origem
europeia ou estadunidense. Estou convicto de que uma apreciação longamente
necessária
- mais justa e plural - da arte produzida no solo do que hoje
chamamos Brasil depende de esforços
desse gênero. Tal apreciação é urgente nos
dias atuais, nos quais recrudesce a vetusta
perseguição contra as religiões
afrobrasileiras. Por si só, o reposicionamento das artes ligadas a
esta últimas
no cânone da atual historiografia certamente não resolverá esse problema; mas o

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reconhecimento de expressões afrobrasileiras como os pontos riscados


enquanto exemplos
autênticos de arte sacra e patrimônio cultural nacional pode
nos ajudar a enfrentá-lo.

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noitada de magia negra, em Madureira. A Noite, Rio de Janeiro, ano XX,
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LEMOS, Ubiratan de. Ajoelhado


aos pés de Ogum. O Cruzeiro, Rio de Janeiro, ano XXIV, n. 44, 16 ago.
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LIVROS dos Talimans Mágicos. Jornal


do Brasil, Rio de Janeiro, ano XVIII, n. 144, 23 mai. 1908, p. 10.

ESPIRITISMO, Magia e as Sete


Linhas de Umbanda. Diário de Notícias, Rio de Janeiro, 2a. seção, 8 nov.
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11 DE OUTUBRO DE 1890. Promulga o Código Penal. Disponível em:
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1851-1899/d847.htm
Acesso
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GOVERNO do Estado do Rio de


Janeiro. Diário Oficial do Estado do Rio de Janeiro, ano XLVI, n. 147,
parte I, 12 ago. 2020.

MINISTÉRIO da Educação e
Cultura. Secretaria da Cultura. Subsecretaria do Patrimônio Histórico e
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Nacional. Processo No 35_T_SPHAN/38. Coleção: Museu de Magia
Negra.  Rio de Janeiro, 1938.

____________________

* Esse artigo é uma versão bastante modificada e


ampliada de comunicações apresentadas, em 2019, no 35th CIHA
World Congress
of Art History, Firenze/Italia, e no XXXIX Colóquio do Comitê Brasileiro
de História da Arte,
Pelotas/Brasil. Agradeço ao Comite International
d'Histoire de I'Art e ao Comitê Brasileiro de História da Arte, que
ofereceram
apoio financeiro para que eu realizasse essas comunicações. Agradeço também aos
membros da audiência
destes eventos, por suas perguntas e comentários.
Agradeço, por fim, ao prof. Roberto Conduru, que leu e comentou
versões desse
artigo.

[1] Proponho essa datação porque a mulher nessas


fotos aparentemente é a mesma mostrada em uma matéria
publicada em O
Cruzeiro, em 1952 (cfr. LEMOS, 1952).

[2] Em inglês, apesar do som da palavra, pentacle


muitas vezes não tem a conotação de "cinco" em textos sobre magia.
Designa, antes, talismãs mágicos que podem conter qualquer símbolo ou
caractere. “O mais provável é que [a palavra
pentacle] venha, por via do
italiano e do francês, da raiz pend- ‘para pendurar,’ e é, portanto,
equivalente a um pingente
ou amuleto pendurado no pescoço” (DE PURUCKER, 1999,
tradução livre).

[3] Nesse sentido, gostaria de registrar meu débito


ao pesquisador e umbandista Guilherme Watanabe que, em sua
conta no Instagram
(@teu.urubatao), apresentou algumas das imagens que vou discutir.

[4] Outras possíveis fontes necessitam, porém,


serem lembradas. Por exemplo, o historiador da arte estadunidense
Matthew
Francis Rarey (2018, p. 28, tradução livre) postula que tal “símbolo circular
[...] derivava da vasta gama de
medalhas devocionais e moedas transformadas em
amuletos que circulavam nos corpos das pessoas em todo o mundo
afro-português.”

[5] O dito signo de Salomão, propagado desde eras


longínquas por boa parte do mundo, tem forma de pentágono ou
hexágono regular
estrelado (nessa última forma, ele é conhecido também como “Estrela de Davi”).
Na passagem para o
século XX, o arqueólogo português José Leite de Vasconcellos
escreveu extensamente sobre o emprego desse signo
nas crenças e costumes
populares lusitanos, em obras ricamente ilustradas [ex. imagem] (VASCONCELLOS,
1899-
1900; VASCONCELLOS, 2020). É possível que o signo de Salomão tenha sido
incorporado em práticas rituais
afrobrasileiras por via de fontes ibéricas.

[6] Para uma discussão mais detida dessa


ilustração, ver VALLE, 2018, § 31-40.

[7] Na edição em livro de 1933, a expressão usada é


“desenho emblemático e simbólico” (SOUZA, 2020, nota 11).

[8] Essa música pode ser ouvida em: https://youtu.be/m02jbPVeB6o

[9] A Guanabara foi um Estado do Brasil que existiu


entre 1960 e 1975, no território correspondente à atual localização
do
município do Rio de Janeiro.

www.dezenovevinte.net/obras/av_pontos.htm 15/15

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