Você está na página 1de 41

0

UNIJUÍ – UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO


RIO GRANDE DO SUL

DHE – DEPARTAMENTO DE HUMANIDADES E EDUCAÇÃO

CURSO DE PSICOLOGIA

POSSIBILIDADES DE TRATAMENTO PARA


DEPENDENTES QUÍMICOS

DÁLCIO ARTUR PETRY

Ijuí, novembro de 2015


1

DÁLCIO ARTUR PETRY

POSSIBILIDADES DE TRATAMENTO PARA


DEPENDENTES QUÍMICOS

Trabalho de Conclusão de Curso


apresentado como requisito parcial para
conclusão do curso de formação de
Psicólogo da Universidade Regional do
Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul
– UNIJUÍ.

Orientadora: Profª Angela Maria Schneider Drügg

Ijuí, novembro de 2015


2

AGRADECIMENTOS

Termina aqui mais uma etapa de muitas aprendizagens.


Foi necessário lutar com muita garra e dedicação e ter
coragem para enfrentar e vencer todos os desafios que
foram surgindo durante o curso. Muitas noites mal ou
pouco dormidas, e muitos quilômetros rodados para dar
conta das aulas e dos trabalhos.
Agradeço primeiramente a Deus por ter me dado forças e
ânimo nesta caminhada. Ele tem estado presente em
todos os momentos da minha vida.
À minha amada esposa Claudete, que esteve sempre
junto, me incentivando quando eu demonstrava fraqueza,
sua força e carinho fizeram toda a diferença nesse
período.
À minha querida filha Pyetra, que tem me compreendido
todas as vezes que não consegui dar a atenção que
merecia. Obrigado filha pelo teu sorriso que me anima
todos os dias.
Agradeço à Professora Angela M. S. Drügg, pela
orientação durante diversos momentos da minha
formação, mas de forma especial, a realização deste
trabalho que sua atenção e direção possibilitaram
concluir.
Aos demais colegas e familiares, que de longe ou de
perto, fazem parte desta conquista. Muito obrigado a
todos.
3

RESUMO

O presente trabalho aborda a temática da dependência química e as possibilidades


de tratamento. Para tanto, percorre-se primeiramente o caminho da investigação do
uso de drogas na história da humanidade. Na abordagem seguinte, trabalha-se as
principais complicações clínicas, psicológicas e sociais no uso de drogas. Na
sequência, buscou-se trabalhar as possíveis intervenções na dependência química;
e, a escuta possível através da psicanálise a partir de Freud, do sofrimento psíquico,
e de sintoma social a partir de Melman. Para finalizar trabalhou-se a recaída como
uma possibilidade sempre presente.

Palavras-chave: Drogas. Complicações. Tratamento. Recaída.


4

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ............................................................................................................. 5

1 DROGAS................................................................................................................... 7
1.1 ASPECTOS HISTÓRICOS..................................................................................... 7
1.2 CLASSIFICAÇÃO E EFEITOS ............................................................................. 10
1.3 PADRÃO DE USO ............................................................................................... 12
1.4 DEPENDÊNCIA DE SUBSTÂNCIAS PSICOATIVAS .......................................... 13
1.5 PRINCIPAIS COMPLICAÇÕES CAUSADAS PELO USO DE SUBSTÂNCIAS
PSICOATIVAS ........................................................................................................... 17
1.6 COMPLICAÇÕES CLÍNICAS E PSICOLÓGICAS ................................................ 18
1.7 COMPLICAÇÕES SOCIAIS ................................................................................. 20

2 O TRATAMENTO NA DEPENDÊNCIA QUÍMICA .................................................. 22


2.1 REDUÇÃO DE DANOS ........................................................................................ 22
2.2 INTERVENÇÃO BREVE ...................................................................................... 23
2.3 TERAPIA COGNITIVO COMPORTAMENTAL ..................................................... 25
2.4 TERAPIA E ACOMPANHAMENTO ATRAVÉS DA PSICANÁLISE ...................... 25
2.5 RECAÍDA ............................................................................................................. 28
2.6 PROCESSOS DA RECAÍDA ................................................................................ 30
2.7 FATORES DE RISCO E PROTEÇÃO .................................................................. 30
2.8 DETERMINANTES DA RECAÍDA ........................................................................ 32

CONCLUSÃO ............................................................................................................ 36

REFERÊNCIAS .......................................................................................................... 39
5

INTRODUÇÃO

O presente trabalho visa compreender como, através de diferentes


possibilidades, seja possível acolher e escutar o dependente químico e lidar com a
possibilidade da recaída.
O uso de substâncias que alteram o comportamento sempre estiveram
presentes em diferentes contextos da humanidade. O uso de drogas é relatado em
muitas literaturas em diversas culturas e ao longo da história. Através de uma
análise da utilização de drogas em diferentes tempos, é possível perceber sua
utilização relacionada a diferentes propósitos como também associado à procura de
prazer.
Com a pergunta, “qual a importância da intervenção psicológica no
tratamento da dependência química”, procura-se encontrar possibilidades e meios
de compreender o que se passa na vida da pessoa que tem usado droga
continuamente, a ponto de colocar sua saúde em risco ou inclusive à morte. Para
construir esse percurso nos apoiamos em diversos autores entre eles Freud e suas
experiências com as drogas, principalmente a cocaína.
O primeiro Capítulo busca, nos primórdios da história, compreender que o
uso das drogas era usado na busca de respostas para aquilo que se estava vivendo
em determinada época e inserido numa determinada cultura, como por exemplo,
substâncias utilizadas sobretudo com fins ritualístico-religiosos ou para suportar as
adversidades ambientais, como o hábito de mascar folhas de coca e tabaco para
suportar a fome e a fadiga.
Na atualidade, percebemos as substâncias psicoativas incorporadas pela
cultura como uma “mercadoria”, influenciadas pelo comportamento da sociedade de
consumo. A indústria do tráfico de drogas é a entidade que movimenta as maiores
6

cifras no mercado mundial. A falta de perspectiva de futuro dos jovens, a ânsia por
experiências cada vez mais intensas, o isolamento, a perda de vínculos afetivos e
sociais, e o sistema econômico, acabam por contribuir para uma sensação de vazio
existencial que propicia o uso de drogas como sintoma de algo que não vai muito
bem.
No segundo capítulo, apresentaremos algumas abordagens terapêuticas
sugeridas por autores contemporâneos, como a estratégia de redução de danos que
formula práticas que diminuem os danos para os usuários de drogas e para os
grupos sociais com que convivem. Veremos ainda sobre intervenções breves, e
terapia cognitivo comportamental, realizadas por profissionais com diferentes tipos
de formação.
O estudo ainda abordará a terapia e acompanhamento do dependente
químico através da psicanálise. Compreender o motivo do uso de drogas, o uso
como sintoma e a recaída que envolve diversos aspectos e possibilidades.
7

1 DROGAS

A vida, tal como a encontramos, é árdua demais para nós: proporciona-nos


muitos sofrimentos, decepções e tarefas impossíveis. A fim de suportá-la,
não podemos dispensar as medidas paliativas (FREUD, 1996).

Uma leitura atenta sobre as observações de Freud sobre o tema drogas, no


contexto de sua exposição sobre as dificuldades experienciadas pelos homens na
existência civilizada, permite intuir as razões por que um grande número de pessoas
tem seguido esse caminho. Afinal, de maneira quase mágica e instantânea, o seu
uso possibilita a produção de sensações de prazer e ao mesmo tempo, livra, pelo
menos momentaneamente dos sofrimentos, das aflições e desgostos trazidos pela
realidade.
Neste sentido, uma primeira atitude lúcida na abordagem esse assunto
delicado seria não negar o enorme potencial de sedução presente no mundo das
drogas.
Outra forma de conceituar droga é olharmos a definição segundo a
Organização Mundial de Saúde (OMS). Define que droga é qualquer substância
natural ou sintética que, administrada por qualquer via no organismo, atua sobre o
cérebro, modifica seu funcionamento, altera as sensações, o humor, o grau de
consciência, o estado emocional, bem como outras funções psicológicas e
comportamentais.

1.1 ASPECTOS HISTÓRICOS

O uso de substâncias psicoativas é tão antigo quanto a história do homem,


entretanto, um importante fator a ressaltar é que essas substâncias eram utilizadas
sobretudo com fins ritualístico-religiosos ou para suportar as adversidades
ambientais, como o hábito de mascar folhas de coca e tabaco para suportar a fome
e a fadiga (DIEHL et al., 2011).
Já em 4.000 anos a.C., os sumérios, que ocupavam a região que hoje
corresponde geograficamente ao Irã, faziam uso da papoula de ópio, que era
conhecida como “planta da alegria”, como uma forma de obter contato com os
deuses. Em diversos arquivos históricos de arquitetura e artesanato dessa época
encontram-se retratadas as alusões à papoula ou aos estados de torpor decorrentes
8

de seu uso nesses rituais. Por volta de 2.000 a.C., o uso da Cannabis (maconha)
com finalidades terapêuticas e ritualísticas era difundido na China, na Índia e no
Egito. Também sobre o Egito Antigo, são encontrados, na mesma época, registros
de pinturas e desenhos denotando estados de embriaguez pelo uso excessivo de
álcool, representados por homens sendo carregados por diversos outros, após o uso
da substância. Em meados dos anos 500 a.C., o povo Cita, antigos habitantes da
região do Rio Danúbio e do Rio Volga, queimava haxixe, um derivado de maior
concentração da Cannabis, durante os rituais religiosos de luto (DIEHL et al., 2011).
A síntese da cocaína acontece por volta de 1580, isolando-se a substância
ativa da folha de coca. Mas seu uso é bastante difundido somente a partir de 1800,
sendo consumida a princípio pelas propriedades analgésicas e anestésicas. Foi
usada como tonificante e fortificante, numa infusão de álcool com folhas de coca, e
da Coca-cola, no início composta de várias substâncias com efeitos estimulantes,
seu uso recreativo difundiu-se rapidamente entre as elites intelectuais.
No meio médico, Freud foi um dos primeiros a recomendar o uso da
cocaína, por suas propriedades antidepressivas e analgésicas, além de ele próprio
ter feito uso, por vários anos. Chegou a prescrever a cocaína para um amigo, Ernst
von Fleischl-Marxow, que era dependente de morfina, resultando em sua morte por
overdose de cocaína.
Apesar dos efeitos aparentemente benéficos, seu uso se alastrou com
rapidez pelo mundo. Na época, já se observavam as diversas consequências
danosas decorrentes de seu consumo, provocando alterações de comportamento,
aumento da agressividade e estabelecendo dependência, o que levou à
subsequente proibição de seu uso.
Com o início da Revolução Industrial, um cenário de importantes mudanças
sociais e comerciais, marcado, sobretudo, pela transição do modelo artesanal de
trabalho para o modelo industrial de produção em série, com intensa exploração do
trabalhador, baixos salários e condições subumanas de produção, o álcool adquire
um papel importante, no momento em que passa a ser usado de forma abusiva por
operários, como forma de alívio para as péssimas condições de trabalho e de vida
na época. Mas na década de 1850 esse uso de álcool passa a ser percebido como
algo realmente problemático.
9

Com o aparecimento da AIDS na década de 1980 e a importante associação


da transmissão do vírus pelo uso de drogas injetáveis e com as sucessivas mortes
pela doença entre esses usuários, as instituições de saúde mundiais passaram a dar
maior atenção a esse fenômeno. Em diversos países da Europa começaram a ser
organizados movimentos no sentido de minimizar danos e riscos decorrentes do uso
de drogas, como a Experiência de Liverpool, na Inglaterra, na qual médicos
prescreviam heroína para os usuários como forma de diminuir os riscos de overdose,
e os primeiros centros de distribuição e troca de agulhas e seringas na Holanda e na
Inglaterra, entre 1986 e 1987. Diversas práticas aos poucos foram se difundindo ao
redor do mundo, como a distribuição de seringas descartáveis, a criação de salas de
uso seguro e a comercialização, na Holanda, de drogas consideradas mais leves,
em detrimento do uso daquelas consideradas pesadas e de maior risco, como a
heroína e a cocaína, pelos estabelecimentos de pontos comercias de venda e uso
(DIEHL et al., 2011).
Na década de 1980, com a invenção do crack, um derivado mais barato da
cocaína, como forma de aproveitar o sobressalente de menor qualidade de sua
depuração, observou-se também uma grande migração de usuários de drogas
injetáveis para o uso de crack, pelo medo da contaminação com o vírus da AIDS.
Com o passar dos anos, vê-se uma rápida expansão do uso dessa droga ao redor
do mundo, falando-se atualmente de uma epidemia de crack, o que configura um
grave problema de saúde pública. Tanto isso é verdade que tem sido verificada a
migração para o crack de usuários de outras drogas e o rápido desenvolvimento de
dependência com pouco tempo de uso entre pessoas de todas as idades e classes
sociais.
Em O tratamento do usuário de Crack, 2012, temos um breve relato desse
acontecimento:

O Crack surgiu entre 1984 e 1985 em bairros pobres e marginalizados de


Los Angeles, Nova York e Miami. Era obtido a partir de um processo caseiro
e utilizado em grupos, em casas abandonadas e precárias (chamadas crack
houses). Os cristais eram fumados em cachimbos e estralavam (cracking)
quando expostos ao fogo, daí o nome da droga. Essa substância produzia
uma euforia de grande magnitude e curta duração, seguida de fissura
intensa e desejo por uma nova dose.
Em geral, os usuários de crack eram, em sua maioria, jovens, usuários de
cocaína refinada atraídos pelo baixo preço da substância, usuários de
maconha e poliusuários, que o adicionaram a seu padrão de consumo, e,
ainda, indivíduos que adotaram o crack como sua primeira substância. Após
o advento da aids, usuários de cocaína por via intravenosa, geralmente
10

mais velhos, também optaram pelo crack em busca de vias de


administração mais seguras, sem diminuição da intensidade dos efeitos. O
baixo preço também atraiu novos consumidores, de estratos sócias mais
baixos, que pagavam por dose consumida (RIBEIRO; LARANJEIRA, 2012,
p. 33).

Pela observação do uso de substâncias psicoativas ao longo da História, é


possível concluir que inicialmente o uso estava de fato mais ligado a uma forma de
lidar com as adversidades ou a rituais religiosos. Com ligeira oscilação, as
substâncias psicoativas foram sendo incorporadas de forma gradativa pela cultura
como uma “mercadoria”, influenciadas também pelo comportamento da sociedade
de consumo. Nos dias atuais, a indústria do tráfico de drogas é a entidade que
movimenta as maiores cifras no mercado mundial. Além disso, a falta de perspectiva
de futuro dos jovens, a ânsia por experiências cada vez mais intensas, o isolamento
e a perda de vínculos afetivos e sociais acabam por contribuir para uma sensação
de vazio existencial que propicia o uso de drogas como estratégia de enfrentamento
dessas dificuldades (DIEHL et al., 2011).

1.2 CLASSIFICAÇÃO E EFEITOS

As drogas são popularmente conhecidas pelo seu caráter lícito ou ilícito. Do


ponto de vista médico, elas são classificadas de acordo com sua forma de agir no
cérebro, modificando a atividade do sistema nervoso central. Conhecemos então
drogas que são depressoras ou estimulantes da atividade cerebral e ainda as que
causam alucinações.

Quadro 1: Classificação das drogas do ponto de vista legal


Drogas lícitas Drogas ilícitas
- São aquelas comercializadas de forma legal, - São as proibidas por lei.
podendo ou não estar submetida a algum tipo Ex.: maconha, cocaína, crack, etc...
de restrição, como o álcool, cuja venda é
proibida a menores de 18 anos, e alguns
medicamentos que só podem ser adquiridos por
meio de prescrição médica especial.

A classificação das substâncias psicoativas podem também acontecer de


formas diferentes para alcançar objetivos específicos. Neste caso queremos
apresentar estas substâncias a partir da ação das mesmas no organismo humano
conforme a obra Panorama Atual de Drogas e Dependências (2006).
11

As drogas depressoras são aquelas que tornam mais lento o funcionamento


do sistema nervoso central (SNC). Em decorrência dessa lentificação, pode aparecer
sonolência, que depende da quantidade de droga ingerida pela pessoa. Por causar
estes efeitos, algumas dessas substâncias também são chamadas de “sedativos” ou
“hipnóticos”. Várias delas são usadas com fins médicos, como os benzodiazepínicos,
os opiáceos, os indutores de sono e a anestesia.
Quanto às drogas estimulantes, essas provocam uma aceleração do
funcionamento mental e modificam o comportamento, provocando agitação,
excitação, insônia e outros efeitos. A cocaína, as anfetaminas e a nicotina são as
mais associadas a problemas físicos, mentais e sociais no Brasil.
Podemos ainda classificar as drogas como perturbadoras e alucinógenas.
São denominadas perturbadoras as plantas e as substâncias que, quando ingeridas,
produzem uma série de distorções qualitativas no funcionamento do cérebro, como
delírios, alucinações e alteração na capacidade de discriminar medidas de tempo e
espaço (ex. maconha). Esse conjunto de efeitos caracteriza um estado que os
usuários conhecem como “viagem”.
Em seu artigo Über Coca, Freud descreve alguns efeitos sentidos ao usar e
ao pesquisar outros usuários:

O efeito psíquico da Cocainum muriaticum em doses de 0,05-0,10g consiste


em exaltação e euforia duradoura, em nada diferente da euforia normal de
uma pessoa saudável. A sensação de excitação que acompanha o estímulo
por álcool está de todo ausente; também não se verifica a característica
necessidade de atividade imediata que o álcool produz. A pessoa sente um
aumento do autocontrole, maior vigor e capacidade para o trabalho. Por
outro lado, ao trabalhar, sente falta da intensificação das capacidades
mentais promovida pelo álcool, chá ou café. A pessoa está simplesmente
normal e logo acha difícil acreditar que se encontra sob a influência de
alguma droga. Isso dá a impressão de que o estado de ânimo produzido por
tais doses de coca se deve, não tanto à estimulação direta, quanto ao
desaparecimento de componentes que, no estado geral de bem-estar,
provocam a depressão. Poder-se-ia talvez supor que a euforia resultante da
boa saúde também nada mais é do que a condição normal de um córtex
cerebral bem nutrido que “não está consciente” dos órgãos do corpo a que
pertence. Esta fase de atuação da cocaína não é percebida senão pelo
surgimento daqueles sintomas que têm sido descritos como o maravilhoso
efeito estimulante da coca. O trabalho mental ou físico de longa duração e
intensidade pode ser executado sem fadiga. É como se a necessidade de
alimento e de sono, que em outras circunstâncias se faz sentir
marcadamente em determinados momentos do dia, houvesse desaparecido
inteiramente. Enquanto perduram os efeitos da cocaína, a pessoa poderá
comer fartamente sem repulsa, se instada a fazê-lo, mas tem a clara
sensação de que a refeição é supérflua. De igual modo, à medida que o
efeito da coca diminui, é possível deitar-se e dormir, mas o sono pode ser
dispensado com a mesma facilidade, sem consequências desagradáveis.
12

Durante as primeiras horas de efeito da coca, não se consegue dormir, mas


essa insônia não é de maneira alguma penosa. Eu mesmo experimentei
cerca de uma dúzia de vezes esse efeito da coca, que afasta a fome, o
sono e a fadiga e robustece a pessoa para o esforço intelectual; não tive
oportunidade de me ocupar com trabalho físico (http://www.appoa.com.
br/uploads/arquivos/revistas/revista26_-_uber_coca.pdf, p. 112).

1.3 PADRÃO DE USO

A partir dos padrões de consumo e suas complicações é possível determinar


a diferença entre uso nocivo e dependência.
O primeiro é caracterizado pela presença de danos físicos e mentais
decorrentes do uso, no entanto, não há presença de complicações crônicas
relacionadas ao consumo, como a síndrome de abstinência, a cirrose hepática,
desnutrição, entre outras.
Já a dependência, é identificada a partir de um padrão de consumo
constante e descontrolado, uma relação disfuncional entre um indivíduo e seu modo
de consumir uma determinada substância psicotrópica, visando principalmente a
aliviar sintomas de mal-estar e desconforto físico e mental, conhecidos por síndrome
de abstinência. Frequentemente, há complicações clínicas, mentais e sociais
concomitantes (Guia prático sobre uso, abuso e dependência de substâncias
psicotrópicas para educadores e profissionais da saúde, 2006).
Apresentamos a seguir quadro explicativo sobre padrão de consumo:

Uso na vida - qualquer uso (inclusive um único uso experimental) alguma


vez na vida.
Uso no ano - uso, ao menos uma vez, nos últimos 12 meses que
antecederam a pesquisa.
Uso no mês - uso, ao menos uma vez, nos últimos 30 dias que
antecederam a pesquisa.
Uso frequente - uso, em 6 ou mais vezes, nos últimos 30 dias que
antecederam a pesquisa.
Uso pesado - uso, em 20 ou mais vezes, nos últimos 30 dias que
antecederam a pesquisa.
Uso abusivo - padrão de uso que tenha causado um dano real à saúde
física ou mental do usuário, mas a pessoa ainda não preenche critérios para
ser considerada dependente.
Dependência - conjunto de sinais e sintomas que determinam que a pessoa
está dependente da substância (SUPERA, 2006, p. 14).
13

1.4 DEPENDÊNCIA DE SUBSTÂNCIAS PSICOATIVAS

A dependência de substâncias psicoativas é identificada a partir de um


padrão de consumo constante e descontrolado, visando principalmente aliviar
sintomas de mal-estar e de desconforto físico e mental, surgindo uma relação
disfuncional entre um indivíduo e seu modo de consumir uma determinada
substância.
De acordo com Marlatt (1993), antes do uso problemático de uma substância
psicoativa ser vista como uma doença, esta era muitas vezes vista como um
problema de “controle de impulso”, no qual faltava ao indivíduo força de vontade,
fibra moral e capacidade de exercer controle apropriado sobre seu comportamento.
Moralistas cristãos têm visto o alcoolismo como resultado de falhas morais e ato
pecaminoso.
Nesta perspectiva, Marlatt e Gordon (1993, p. 6) relatam o conteúdo de um
bilhete encontrado em meio a garrafas de vinho em um supermercado que dizia:

CORREÇÃO: NÃO É DOENÇA; É ESTUPIDEZ!!! Centenas de colunas em


jornais e milhões de dólares têm sido usados na exposição e combate ao
“abuso de drogas” e ao “alcoolismo”. “O abuso de drogas é aquilo que as
pessoas infligem sobre si mesmas”, de acordo com um artigo publicado no
Journal of Nervous and Mental Disease. Em outras palavras, considerando-
se as consequências, é simplesmente o caso de as pessoas usarem drogas
– incluindo o álcool – para abusar de si mesmas. Obviamente, portanto,
deveríamos admitir que o que é tão comumente denominado de “abuso de
drogas” e “alcoolismo” não é doença, mas o resultado do exercício
voluntário da estupidez. O registro oficial de Deus acrescenta estes fatos:
“Você sabe que o indigno não herdará o reino de Deus? Não se engane;
nem fornicadores, nem idólatras, nem adúlteros, nem afeminados, nem
aqueles que abusam de si mesmos, nem ladrões, nem mentirosos, nem
avarentos, nem beberrões, nem caluniadores, nem usuários, herdarão o
Reino de Deus”. É chegada a hora do arrependimento!

Com o avanço das pesquisas, verificamos uma abordagem focada mais no


orgânico, em fatores fisiológicos. Finalmente chegamos a algumas conclusões mais
brandas e empíricas, onde um conjunto de fatores contribui para que o indivíduo se
torne dependente de determinado produto. Dentre tantos fatores podemos citar a
susceptibilidade à dependência, fatores genéticos, fatores ambientais e estresse. O
dependente químico é um indivíduo em crise, em conflito consigo mesmo e/ou com a
família e/ou com a sociedade. Emotivamente frágil, incapaz de estabelecer relações
14

interpessoais bem sucedidas, refugia-se na droga para não experimentar a angústia


diante de situações difíceis nas quais se sente desconfortável.
E assim começamos a definir dependência de substâncias psicoativas,
dizendo que há uma relação alterada entre o usuário e o seu modo de consumo.
Qualquer consumo de substâncias psicoativas e psicotrópicas, é influenciado por
uma série de fatores que diminuem ou aumentam o risco de complicações agudas e
crônicas. Com o passar do tempo, cada um desenvolve um padrão particular de
consumo. Este padrão é constantemente influenciado por uma série de fatores de
proteção e risco de natureza biológica, psicológica e social.
A interação destes fatores determina a evolução do consumo da substância
usada. Ressalta-se que nunca um fator de risco isolado leva à dependência.
Para ilustrar apresentamos a seguir quadro explicativo sobre fatores de
risco:

Quadro 2: Fatores de risco para o surgimento da dependência química


BIOLÓGICOS
- Predisposição genética.
- Capacidade do cérebro de tolerar presença constante da substância.
- Capacidade do corpo em metabolizar a substância.
- Natureza farmacológica da substância, tais como potencial de toxicidade e dependência, ambas
influenciadas pela via de administração escolhida.
PSICOLÓGICOS
- Distúrbios do desenvolvimento.
- Morbidades psiquiátricas: ansiedade, depressão, déficit de atenção e hiperatividade, transtornos
de personalidade.
- Problemas/alterações do comportamento.
- Baixa resiliência e limitado repertório de habilidades sociais.
- Expectativa positiva quanto aos efeitos das substâncias de abuso.
SOCIAIS
- Estrutura familiar disfuncional: violência doméstica, abandono, carências básicas.
- Exclusão e violência social.
- Baixa escolaridade.
- Oportunidades e opções de lazer precárias.
- Pressão de grupo para o consumo.
- Ambiente permissivo ou estimulador do consumo de substâncias.
Fonte: Guia Prático sobre Uso, Abuso e Dependência de Substâncias Psicotrópicas para Educadores
e Profissionais da Saúde. Prefeitura da cidade de São Paulo, 2006, p. 19.

O CID-10 (Classificação Internacional de Doenças) e o DSM-IV (Diagnostic


and Statistical Manual)1, são dois critérios diagnósticos que servem para ajudar o
profissional de saúde a classificar a doença em questão.

1
Manual de Diagnóstico e Estatística – 4ª revisão.
15

Critério da CID-10 para Uso Nocivo (ou prejudicial) de substâncias: Padrão


de uso que causa prejuízo físico ou mental à saúde, que tenha causado um dano
real à saúde física ou mental do usuário, sem que os critérios para dependência
sejam preenchidos.
Critérios da CID-10 para Dependências de substâncias: Um diagnóstico
definitivo de dependência só pode ser feito se 3 ou mais dos seguintes critérios
tiverem sido detalhados ou exibidos em algum momento do último ano.

(a) forte desejo ou senso de compulsão para consumir a substância;


(b) dificuldades em controlar o comportamento de consumir a substância,
em termos de início, término e níveis de consumo;
(c) estado de abstinência fisiológico, quando o uso da substância cessou ou
foi reduzida, como evidenciado por síndrome de abstinência característica
para a substância, ou o uso da mesma substância com a intenção de aliviar
ou evitar sintomas de abstinência;
(d) evidência de tolerância, de tal forma que doses crescentes da substância
psicoativa são requeridas para alcançar efeitos originalmente produzidos
por doses mais baixas;
(e) abandono progressivo de prazeres e interesses alternativos, em favor do
uso da substância psicoativa, aumento da quantidade de tempo necessária
para obter ou ingerir a substância ou para se recuperar de seus efeitos;
(f) persistência no uso da substância, a despeito de evidência clara de
consequências manifestamente nocivas, tais como: danos ao fígado, por
consumo excessivo de bebidas alcoólicas; estados de humor depressivos,
consequentes a períodos de consumo excessivo da substância; ou
comprometimento do funcionamento cognitivo, relacionado à droga. Nesse
caso, deve-se fazer esforço para determinar se o usuário estava realmente
(ou se poderia esperar que estivesse) consciente da natureza e extensão do
dano (SUPERA, 2006, p. 4).

Transtornos Mentais e de Comportamento: os transtornos provocados pelo


uso de substâncias são codificados por uma letra e dois números. Os diagnósticos
relacionados ao uso de substâncias psicoativas, incluindo as bebidas alcoólicas, têm
sempre a letra F seguida por dois números que vão de 10 a 19.
Estes são os códigos da CID-10 que indicam a que tipo de substância
psicoativa o transtorno está associado:

"Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de substância


psicoativa":
F10 - Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de álcool.
F11 - Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de opiáceos.
F12 - Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de
canabinóides (maconha).
F13 - Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de sedativos
e hipnóticos.
F14 - Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso da cocaína.
16

F15 - Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de outros


estimulantes, inclusive a cafeína.
F16 - Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de
alucinógenos.
F17 - Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de fumo
(tabaco).
F18 - Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de solventes
voláteis.
F19 - Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de múltiplas
drogas e ao uso de outras substâncias psicoativas.

Um terceiro número deve ser acrescentado ao código para indicar o tipo de


transtorno:

0 - Intoxicação aguda.
1 - Uso nocivo para a saúde.
2 - Síndromes de dependência.
3 - Síndrome [estado] de abstinência.
4 - Síndrome de abstinência com delirium.
5 - Transtorno psicótico.
6 - Síndrome amnésica.
7 - Transtorno psicótico residual ou de instalação tardia.
8 - Outros transtornos mentais ou comportamentais.
9 - Transtorno mental ou comportamental não especificado (SUPERA, 2006,
p. 3).

Para melhor entendimento, colocamos a seguir os critérios necessários para


caracterizar dependência química, conforme DSM IV:

Critérios para Dependência de Substância


Um padrão mal-adaptativo de uso de substância, levando a prejuízo ou
sofrimento clinicamente significativo, manifestado por três (ou mais) dos
seguintes critérios, ocorrendo a qualquer momento no mesmo período de 12
meses:
(1) tolerância, definida por qualquer um dos seguintes aspectos:
(a) uma necessidade de quantidades progressivamente maiores da
substância para adquirir a intoxicação ou efeito desejado.
(b) acentuada redução do efeito com o uso continuado da mesma
quantidade de substância.
2) abstinência, manifestada por qualquer dos seguintes aspectos:
(a) síndrome de abstinência característica para a substância (consultar os
Critérios A e B dos conjuntos de critérios para Abstinência das substâncias
específicas)
(b) a mesma substância (ou uma substância estreitamente relacionada) é
consumida para aliviar ou evitar sintomas de abstinência
(3) a substância é frequentemente consumida em maiores quantidades ou
por um período mais longo do que o pretendido
(4) existe um desejo persistente ou esforços mal-sucedidos no sentido de
reduzir ou controlar o uso da substância
(5) muito tempo é gasto em atividades necessárias para a obtenção da
substância (por ex., consultas a múltiplos médicos ou fazer longas viagens
de automóvel), na utilização da substância (por ex., fumar em grupo) ou na
recuperação de seus efeitos
17

(6) importantes atividades sociais, ocupacionais ou recreativas são


abandonadas ou reduzidas em virtude do uso da substância
(7) o uso da substância continua, apesar da consciência de ter um problema
físico ou psicológico persistente ou recorrente que tende a ser causado ou
exacerbado pela substância (por ex., uso atual de cocaína, embora o
indivíduo reconheça que sua depressão é induzida por ela, ou consumo
continuado de bebidas alcoólicas, embora o indivíduo reconheça que uma
úlcera piorou pelo consumo do álcool)
Especificar se:
Com Dependência Fisiológica: evidências de tolerância ou abstinência (isto
é, presença de Item 1 ou 2).
Sem Dependência Fisiológica: não existem evidências de tolerância ou
abstinência (isto é, nem Item 1 nem Item 2 estão presentes)
(www.psiquiatriageral.com.br/dsm4/sub_index.htm).

Os quadros apresentados acima indicam diagnósticos de transtornos devido


ao consumo de substâncias psicoativas (CID-10), e do diagnóstico da própria
dependência química a partir do DSM-IV.

1.5 PRINCIPAIS COMPLICAÇÕES CAUSADAS PELO USO DE SUBSTÂNCIAS


PSICOATIVAS

As complicações clínicas ou orgânicas e sociais, causadas pelo consumo de


substâncias como o álcool, tabaco ou de drogas ilícitas, a maconha, cocaína, LSD, e
outros, são hoje bem conhecidas e consideradas um problema de saúde pública. O
tabaco, por exemplo, foi o maior fator responsável pelas mortes nos Estados Unidos,
em 1990, contribuindo substancialmente para as mortes relacionadas a neoplasias,
doenças cardiovasculares, doenças pulmonares, baixo peso ao nascimento e
queimaduras. Cerca de um terço dos acidentes vasculares cerebrais em adultos
jovens está associado ao consumo de drogas. Entre indivíduos de 20 a 30 anos,
esse índice chega a 90%. (Usuários de substâncias psicoativas: abordagem,
diagnóstico e tratamento, 2003).
18

Figura 1: Esquema sobre a relação entre uso de álcool e outras drogas


e problemas sociais, de saúde física ou mental

Fonte: Adaptado de Babor et al. (2003).

Se observarmos o quadro acima, percebemos que a forma, o padrão e


quantidade de uso de álcool e outras drogas, estará trazendo efeitos de acordo com
o consumo. Haverá problemas inicialmente com o próprio indivíduo, porém este
afetará o meio familiar e dependendo da quantidade e do padrão de consumo, é
possível apontar algumas consequências que podem ser de ordem social ou ainda
resultarem em doenças crônicas.
Em cada caso, a ocorrência de danos pode ser relacionada a um ou mais
mecanismos diferentes e depende do tipo e da forma de uso da substância e da
quantidade utilizada. A gravidade dos danos vai depender também de fatores, que
variam de pessoa para pessoa e que podem ser fatores de proteção ou de maior
vulnerabilidade (física, psicológica ou social).

1.6 COMPLICAÇÕES CLÍNICAS E PSICOLÓGICAS

As complicações clínicas são resultados de um uso de drogas nocivo à


saúde do indivíduo. Diagnosticá-las a tempo permite que, na maioria das vezes,
sejam passíveis de tratamento e recuperação completa. Muitos indivíduos recusam-
se a admitir que seus problemas estejam ligados com o uso da droga, mas, devido à
19

gravidade de seu quadro, aceitam iniciar o tratamento. Quando surgem


complicações clínicas, muitas vezes servem como facilitadores e até estimuladores
para a continuidade da abstinência.
Estaremos a seguir, apresentando algumas complicações clínicas de acordo
com, Panorama Atual de Drogas e Dependências (2006):

Sistema Nervoso
- Neuropatia periférica: 5 a 15 % dos alcoolistas.
- Transtornos mentais orgânicos, temporários ou permanentes, tanto pelo
efeito direto do álcool, como por deficiência de vitaminas específicas (Sd.
De Wernicke e Sd. De Wernicke-Korsakoff) em cerca de 5% dos
pacientes.
- Incoordenação motora permanente por degeneração cerebelar em
menos de 1% dos pacientes.
- Risco aumentado de acidentes vascular cerebral do tipo hemorrágico.
- Demência alcoólica.
Sistema Cardiovascular
- Estima-se que 25% dos alcoolistas desenvolvem algum tipo de
comprometimento cardiovascular.
- Miocardiopatias.
- Hipertensão arterial sistêmica.
- Dislipidemias.
- É importante lembrar que o álcool pode diminuir os sinais dolorosos de
alerta enquanto aumenta a lesão cardíaca potencial ou a isquemia em
pacientes com angina.
Sistema Hematológico
- Anemia megaloblástica, provavelmente relacionada à deficiência de
ácido fólico.
- Leocopenia.
- Produção reduzida dos fatores da coagulação e plaquetas.
- As diminuições em vários aspectos do sistema imunológico podem
contribuir para o aumento da vulnerabilidade a tuberculose, infecções
virais ou bacterianas e neoplasias.
Sistema Reprodutivo e Função Sexual
- As alterações no sistema reprodutivo são, em geral, temporárias e com
melhora após cerca de três a quatro meses de abstinência.
- Redução na produção de esperma.
- Redução na produção e defeitos na mobilidade do esperma.
- Produção reduzida de testosterona e impotência nos homens.
- Irregularidades menstruais nas mulheres.
- Aumento da prevalência de abortos espontâneos entre mulheres
alcoolistas (SILVEIRA, 2006, p. 138).

Freud em 1883 mostrou-se interessado pela cocaína após a leitura de um


artigo de Aschenbrandt que descreve o seu efeito em soldados. Freud experimentou
por várias vezes bem como solicitava a seus colegas que também usassem para
somar informações a sua pesquisa. Em seu artigo Über Coca, 1884, ele descreve
algumas complicações observadas naquela época:
20

Mantegazza refere-se aos seguintes efeitos ocasionais da coca: eritrema


temporário, aumento da quantidade de urina, ressecamento da conjuntiva e
das mucosas nasais. O ressecamento das mucosas da boca e da garganta
é um sintoma habitual, que dura horas. Alguns observadores (Marvaud,
Collan) falam de um ligeiro efeito catártico. Diz-se que a urina e as fezes
adquirem o cheiro da coca. Diferentes observadores fornecem descrições
muito diversas do efeito sobre o ritmo do pulso. Segundo Mantegazza, a
coca provoca rapidamente uma intensificação considerável no ritmo do
pulso, que se acelera ainda mais com doses maiores. Collins também notou
aceleração do pulso depois da ingestão de coca, enquanto Rossier Demarle
e Marvaud experimentaram, após a aceleração inicial, um retardamento do
ritmo do pulso de duração mais longa. Sob efeito da coca, Christison
observou que o esforço físico lhe causava menos aceleração no ritmo do
pulso do que experimentara em outras circunstâncias. Reiss contesta
qualquer efeito sobre o ritmo do pulso. Para mim, não é difícil explicar a
razão dessa discordância: isto se deve, em parte, à variedade dos
preparados utilizados (infusão quente das folhas, solução fria de cocaína,
etc.) e ao modo como eram aplicados,* e em parte às variadas reações
individuais. Com a coca, este último fator, como Mantegazza já havia
relatado, é em geral muito importante. Diz-se haver pessoas que não
conseguem de forma alguma tolerar a coca; por outro lado, não são poucos
os que se mantêm insensíveis a 5cg, que é uma dose ativa para mim e para
outros (www.appoa.com.br/uploads/arquivos/revistas/revista26_-uber_coca.
pdf, p. 111).

Devemos ainda considerar que o uso abusivo de substâncias que modificam


o funcionamento mental aumenta muito o risco de surgimento ou agravamento de
transtornos mentais. Poderemos ter dificuldades de identificar o que é causa e o que
é consequência. Algumas pessoas que sofrem de problemas psíquicos tendem a
usar álcool ou outra droga, que por sua vez agravam os problemas já existentes.
São chamados de comorbidades os quadros que ocorrem ao mesmo tempo
(SUPERA, 2006).

1.7 COMPLICAÇÕES SOCIAIS

Podemos considerar que o funcionamento social é tão doentio quanto as


doenças que produz. Bucher (1996) problematiza posicionamentos que levam a
conclusões unilaterais, apontando que precisamos ir além dos questionamentos que
buscam explicar e justificar como o usuário de drogas interfere na vida da família, da
comunidade e da sociedade onde vive, nos permitindo, também, analisar como
essas organizações interferem na vida desses sujeitos ao ponto deles se verem
excluídos, marginalizarem-se ou entregarem-se às drogas.
Da mesma forma que em outros países, no Brasil, nas últimas décadas, tem
ocorrido aumento significativo da criminalidade, da violência e da superlotação das
21

prisões. É nesse contexto que jovens e seus familiares se veem envolvidos por uma
mistura de ausência de emprego estável com remuneração justa, falta de opções de
lazer, dificuldades escolares, dificuldade de relacionamentos da família e
convivência constante com atividades criminosas, violência, repressão policial e
carência de políticas de assistência pública.
Nas famílias que tem melhores condições de vida, os problemas nos
relacionamentos familiares também se associam ao aumento do consumo de álcool
e outras drogas que, por sua vez, agravam a situação (SUPERA, 2006).
22

2 O TRATAMENTO NA DEPENDÊNCIA QUÍMICA

As primeiras abordagens terapêuticas para tratamento da dependência


química datam do século XIX, embora existam relatos e quadros de alcoolismo
desde a antiguidade. Devido à complexidade, ainda hoje são realizadas pesquisas
que buscam avaliar quais tratamentos sejam mais eficazes.
A dependência química resulta da interação de vários aspectos da vida do
indivíduo: biológico, psicológico e social. Desse modo, as intervenções devem ser
diferenciadas para cada indivíduo e devem considerar todos os aspectos envolvidos.
Neste capítulo estaremos apresentando alguns modelos de tratamento
usados atualmente que procuram auxiliar no processo de recuperação e orientação
diante do uso, abuso ou dependência de drogas lícitas ou ilícitas.

2.1 REDUÇÃO DE DANOS

Na década de 20, a Inglaterra, diante da dificuldade de ter acesso aos


usuários de heroína injetável, e sem a possibilidade de tratá-los de uma
dependência grave e de evolução fatal, desenvolveu intervenções denominadas
redução de danos, como administrar a própria substância para esses usuários
(DIEHL et al., 2011).
Para Duarte e Andrade (2011), redução de danos constitui uma estratégia de
abordagem dos problemas com as drogas que não parte do princípio de que deve
haver imediata e obrigatória extinção do uso de drogas, seja no âmbito da
sociedade, seja no caso de cada indivíduo, mas que formula práticas que diminuem
os danos para os usuários de drogas e para os grupos sociais com que convivem.
Constituíram o impulso inicial das estratégias de Redução de Danos, as
ações voltadas para a diminuição dos riscos de contaminação com micro-
organismos por via injetável ou por via sexual. Em seguida, outras práticas de risco
se tornaram foco de ações de Redução de Danos, entre elas os problemas com
drogas não injetáveis, como é o caso do crack nos dias de hoje.
Em Integração de competências no desempenho da atividade judiciária com
usuários e dependentes de drogas (2011), lemos, “no Brasil, as estratégias de
Redução de Danos foram implementadas em decorrência da preocupação com o
crescimento do contágio com o HIV entre usuários de drogas injetáveis.” Troca de
23

seringas usadas por seringas estéreis e descartáveis, distribuição de preservativos,


disponibilização de informações sobre como utilizar o equipamento de injeção com
menos risco de contaminação e cuidados para a prática de sexo seguro, são
estratégias adotadas. Estas estratégias sempre são discutidas com o paciente.

No tratamento baseado em Redução de Danos, os objetivos, as metas


intermediárias e os procedimentos são discutidos com o paciente e não
impostos. A interrupção do uso de drogas quase sempre é um dos objetivos,
mas outros avanços são valorizados, como evitar colocar-se em risco,
melhorar o relacionamento familiar e recuperar a atividade profissional. A
participação do paciente nas escolhas das metas e etapas do tratamento
valoriza e aumenta sua motivação e engajamento. Por trajetórias diversas,
muitos têm histórias de relacionamentos conturbados com figuras
significativas, e esse é um dos motivos pelos quais é comum que pessoas
com problemas com drogas tenham problemas com sua autoestima. Essa
insegurança é agravada pelas sucessivas perdas decorrentes do uso de
drogas. Por isso, reagem de forma negativa e intensa quando se sentem
controladas ou criticadas em suas opções (DUARTE; ANDRADE, 2011, p.
301).

Os usuários também recebem informações sobre serviços de saúde para a


realização de exames e de tratamento para problemas clínicos e para a
dependência de drogas. Percebemos que a atividade de troca de seringa, por
exemplo, não é um fim em si, mas um serviço oferecido com muitos outros cujo
objetivo geral é a preservação da saúde.

2.2 INTERVENÇÃO BREVE

A intervenção breve é considerada uma intervenção psicossocial para o


tratamento de transtornos por uso de substância. Conforme Diehl et al. (2011), hoje
é evidente a eficácia da intervenção breve em reduzir o consumo e os problemas
ligados ao álcool, e também aparece como a intervenção mais eficaz em reduzir os
riscos ao álcool em serviços de rede de atenção básica de saúde.
A intervenção breve refere-se a uma estratégia de intervenção bem
estruturada, focal e objetiva, que utiliza procedimentos técnicos, permitindo estudos
sobre sua efetividade. Um objetivo importante da intervenção breve é ajudar no
desenvolvimento da autonomia das pessoas, atribuindo-lhes a capacidade de
assumir a iniciativa e a responsabilidade por suas escolhas.
A intervenção breve pode ser realizada por profissionais com diferentes tipos
de formação, como: médicos, psicólogos, enfermeiras, auxiliares de enfermagem,
24

nutricionistas, assistentes sociais, agentes comunitários e outros profissionais da


saúde (SUPERA, 2006).
A seguir apresentamos algumas considerações importantes para a
realização de uma boa intervenção:

1. Evite usar rótulos, jargões, como: alcoólatra, maconheiro, drogado etc.


Isto só intimida e envergonha o paciente, dificultando o estabelecimento do
vínculo necessário para uma boa intervenção;
2. Procure fazer perguntas abertas, como: "me fale mais sobre seu
consumo de maconha...";
3. Procure fazer a chamada Escuta Reflexiva, que é um modo de
demonstrar o entendimento do que o paciente lhe diz. Por exemplo: "você
está querendo me dizer que o seu consumo está causando problemas em
seu trabalho?" ou "Se eu entendi bem, você disse que costuma beber
grandes quantidades quando está com seus amigos de trabalho...". Isto
evita que o paciente negue alguma afirmação já feita, mencionando que não
foi isto que ele quis dizer, ou que você entendeu errado;
4. Procure demonstrar sensibilidade e empatia, sendo sempre receptivo às
questões abordadas pelo paciente;
5. Procure aumentar a consciência do paciente sobre os benefícios
relacionados a sua mudança de comportamento. Mostre a ele que as coisas
podem melhorar, mas que isso depende principalmente de um
posicionamento dele (responsabilidade). Reforce sua liberdade de escolha;
6. Sempre encoraje o paciente e reforce sua autoeficácia (self-efficacy), em
relação aos comportamentos que ele gostaria de mudar. Diga que você
confia nele, que acredita em sua capacidade de mudar;
7. Preste atenção à comunicação não-verbal do paciente, ou seja, se ele
parece agitado, inquieto, nervoso, etc... (SUPERA, 2006, p. 8).

Conforme Diehl et al. (2011, p. 244), a intervenção breve, uma vez aplicada,
pode:
1. facilitar o diagnóstico precoce de problemas ligados ao álcool;
2. diminuir o consumo de risco;
3. prevenir problemas ligados ao consumo;
4. prevenir o desenvolvimento de quadros mais graves;
5. encaminhar pacientes com quadros mais graves a serviços
especializados.
Segundo Diehl et al. (2011), no Brasil a intervenção breve precisa ser melhor
organizada, como vemos na citação a seguir:

Infelizmente, no Brasil, a inclusão de instrumentos de rastreamento e


estratégias e IB nos serviços de atenção primária de saúde acontece de
forma muito lenta. É necessário informar os profissionais sobre a existência
desses serviços e da importância dessa intervenção, além de treiná-los de
maneira adequada para poderem implementá-la (DIEHL et al., 2011, p.
250).
25

A intervenção breve poderá, se bem conduzida, evitar muitos danos à


pessoa, pois haverá condições de verificar a situação e fazer os encaminhamentos
necessários.

2.3 TERAPIA COGNITIVO COMPORTAMENTAL

Teoria desenvolvida por Aaron Beck2 na década de 1960, afirma que o que
não conta é a vivência em sí, mas o significado que o indivíduo dá a essa vivência e
o que ele interpreta com o que acontece (DIEHL et al., 2011).
Para Neufeld (2014), as intervenções visam produzir mudanças nos
pensamentos, nos sistemas de significados e uma transformação emocional e
comportamental duradoura, e proporcionar autonomia, alcançando assim o alívio ou
a remissão total dos sintomas.
Diehl et al. (2011) afirmam que a terapia cognitivo-comportamental parte do
pressuposto que cognições, pensamentos e emoções estão entre os fatores
considerados precipitadores ou mantenedores do comportamento.
Grande parte da terapia cognitiva (TC) é devotada a técnicas de solução de
problemas; os pacientes aprenderão a seguir os passos necessários, como definir o
problema, gerar maneiras alternativas de resolvê-lo e implementar soluções
alternativas.

2.4 TERAPIA E ACOMPANHAMENTO ATRAVÉS DA PSICANÁLISE

A psicanálise é convocada para realizar uma necessária transformação no


foco do problema da toxicomania. O olhar deve se voltar para o sujeito e não para o
objeto. E é com esse olhar que Freud, em seu texto O mal-estar na civilização
(1930), menciona a intoxicação como uma estratégia muito eficaz para o
apaziguamento da dor de existir.
Ao olharmos para o momento atual, verificamos que pouco mudou em
relação ao tempo de Freud, que menciona:

2
BECK, A. T. The current state of cognitive therapy: a 40 year retrospective. Arch Gen Psychiatry,
62(9):953-9, 2005.
26

As exigências da sociedade tornam o viver dificílimo para a maioria das


criaturas humanas, forçando-as com isso a se afastarem da realidade e
dando origem às neuroses, sem que o excesso de coerção sexual traga
maiores benefícios à coletividade (FREUD, 1996, p. 64).

Quando Freud (1996) afirma que a vida é árdua demais para nós, menciona
também que existem três medidas paliativas a serem consideradas na tentativa de
amenizar o sofrimento. “Derivativos poderosos, que nos fazem extrair luz de nossa
desgraça; satisfações substitutivas, que a diminuem; e substâncias tóxicas, que nos
tornam insensíveis a ela” (FREUD, 1996, p. 83).
Para Freud (1996), destes, o método mais atraente para evitar o sofrimento
são as substâncias tóxicas, por agirem diretamente sobre a química do corpo
humano e, assim, tornar os homens insensíveis à própria desgraça. Pois, segundo
ele, "todo sofrimento nada mais é do que sensação; só existe na medida que o
sentimos, e só o sentimos como consequência de certos modos pelos quais nosso
organismo está regulado" (FREUD, 1996, p. 85). Nesse sentido, certas substâncias
tóxicas "quando presentes no sangue ou tecidos provocam em nós, diretamente,
sensações prazerosas, alterando tanto também as condições que dirigem nossa
sensibilidade, que nos tornamos incapazes de receber impulsos desagradáveis"
(FREUD, 1996, p. 86).
A tese freudiana sobre o recurso à substância tóxica, ao sintoma e ao
tratamento psicanalítico fundamenta-se na clínica da neurose. A partir desta, que
teve início com a investigação sobre a histeria, Freud teorizou sobre a morte do pai,
elaboração que se encontra de forma detalhada no texto “Totem e tabu” (1912-
1913), e, consequentemente, sua permanência como mito na realidade psíquica do
ser humano. Dessa maneira, Freud defende que o pai tem função determinante na
constituição da neurose, motivo pelo qual podemos estender a interpretação,
afirmando que a função paterna é um fator determinante no recurso ao tóxico,
compreendido como uma tentativa de amenizar os efeitos do recalque na neurose.
Neste momento, precisamos ainda lembra sobre a abordagem proposta no
livro “ALCOOLISMO, DELINQÜÊNCIA, TOXICOMANIA: Uma Outra Forma de
Gozar” de Charles Melman (1992), o alcoolismo, a delinquência e a toxicomania são
discutidos como sintoma social, pois estão numa posição discursiva própria do
discurso social.
27

A apresentação do livro é feito por Contardo Calligaris, que deixa bem claro
que Melman (1992) “não se contenta em propor um entendimento: se o sintoma é
social não tem porque o analista se eximir frente à responsabilidade de propor a
partir de seu discurso respostas também sociais”. Afirma também que o alcoolismo
fala da reinvindicação de um gozo que aparece ao sujeito como o lote exclusivo de
um Outro seja ele feminino, seja ele capitalista. A toxicomania parece inventar um
meio para continuar gozando de uma falta.
Percebemos na leitura de Melman (1992, p. 66), a toxicomania como um
sintoma social.

Não basta que um grande número de indivíduos em uma comunidade seja


atingido por algo para que isso se transforme em um sintoma social. É claro
que pode haver um certo percentual de fóbicos em uma dada população
sem que, no entanto, isto faça da fobia um sintoma social. Mas pode-se
falar de sintoma social a partir do momento em que a toxicomania é de certo
modo inscrita, mesmo que seja nas entrelinhas, de forma não explícita, não
articulada como tal, no discurso que é o discurso dominante de uma
sociedade em uma dada época. É somente neste sentido que podemos
falar de sintoma social. E se é um sintoma, é certamente porque este
sintoma vem dizer uma verdade que conhecemos e que temos todos
lembrado, aquela mesma verdade já sublinhada por Freud em Mal-estar na
civilização, onde ele fala, bem entendido, das drogas.

Assim, após as considerações de Freud e Melmann, poderemos construir


um saber que permita pensar sobre a importância da terapia e do acompanhamento
psicanalítico. Compreender que o uso de drogas vai muito além de um problema de
saúde pública, mas envolve o sujeito em sua subjetividade e sua inclusão no meio
social. A escuta através de um saber psicanalítico vai proporcionar uma
oportunidade ímpar de reelaboração na vida do sujeito.
É necessário, portanto pontuar, que esta não é uma tarefa muito fácil para o
psicanalista, considerando que as razões para o uso da droga são muito complexas,
de natureza singular mas ao mesmo tempo de natureza social, econômica e de
outros tantos determinantes.
Nogueira Filho (1999, p. 14-15) afirma que:

O psicanalista é um mestre da linguagem, um mestre disposto a ouvir se há


uma verdade por aí sendo dita, sem o devido reconhecimento. Para além
das intenções voluntárias, egóicas, narcísicas do enunciado. E esta não é
uma tarefa fácil para o psicanalista quando o sujeito em ato é o toxicômano.
O toxicômano reduplica a alienação que a linguagem impõe para o humano.
O toxicômano é um desistente do jogo de linguagem, é um desistente da
28

simbolização. O toxicômano é aquele que encontrou um meio (a droga) para


o prazer que aniquila com o passar do tempo, o próprio prazer. Não são
poucos os usuários de drogas que reconhecem que o álcool, a cocaína, não
exercem mais efeitos prazerosos e isto não é condição nem necessária nem
suficiente para que abandonem o uso da droga.

Assim sendo, o psicanalista não trata a dependência química, mas trata de


um sujeito que sofre de toxicomania. Nas toxicomanias tem-se uma formação
sintomática, na qual há uma cristalização da posição do sujeito numa relação de
exclusividade com a droga. Dando ênfase às questões do sujeito é possível o
afastamento do paradigma da dependência química, para considerar a relação do
sujeito com o tóxico. As toxicomanias se constroem enquanto sintoma quando o
sujeito entra em uma relação tóxica com a droga, isto é, quando seu consumo passa
a ser solução para seus conflitos psíquicos, não considerando qualquer ingestão de
drogas como toxicomanias.
Nesse sentido, o processo de cura aposta numa mudança de posição
subjetiva, no qual o analista deve abster-se de indicar qual a melhor saída para o
sujeito. Diferentemente de outras correntes, para a psicanálise, a indicação de cura
não significa abstinência ou não-abstinência, mas sim a escuta do desejo
inconsciente (TOROSSIAN, 2004).

2.5 RECAÍDA

É difícil reconhecer que as diversas propostas terapêuticas estão longe de


um sucesso absoluto, ainda mais, se este for medido exclusivamente pelo padrão da
abstinência, e que usuários, dependentes ou não, continuarão existindo.
Bittencourt (1994), sinaliza a existência de um outro perigo, quanto à
dificuldade de recuperação ou de reelaboração das questões singulares, quando
afirma que o “equívoco básico, e perigoso do ponto de vista da saúde pública, é
confundir a incapacidade ou a falta de motivação, num dado momento, para a
abstinência, com a impossibilidade de reduzir os danos advindos desse consumo
que persiste.”
Podemos constatar aqui que o uso de drogas faz parte da história, sempre
existiu e sempre existirá. Bittencourt (1994, p. 72) afirma que:
29

Usuários problemáticos e não problemáticos das diversas substâncias


psicoativas sempre existiram e sempre existirão no horizonte do humano, e
tanto mercados existirão e serão criados desde que as necessidades que
engendram o consumo se desloquem para novos produtos, por força da
dinâmica social espontânea ou por força das injunções jurídicas, policiais ou
de outra natureza.

Assim, certo de que teremos sujeitos com dificuldades maiores outros


menores de ressignificação de sua vivência, do seu uso e abuso de drogas,
olharemos para as mudanças alcançadas, mas que no decorrer da vida,
experimentam o retorno à drogadição.
Ao olharmos a recaída pela abordagem da Prevenção da Recaída de Marlatt
e Gordon (1993), verificamos a recaída como um processo transicional ou
transacional, como uma série de eventos que podem ou não ser seguidos por um
retorno aos níveis básicos do comportamento-alvo. Sem uma visão pessimista na
qual a recaída é vista como um beco sem saída, fracasso do tratamento ou retorno
ao estado de doença, entende-se que houve inicialmente um lapso como uma
bifurcação na estrada, com um trajeto retornando ao nível de problema anterior ou
recaída e ainda reinstalação da dependência química, e outro continuando na
direção de uma mudança positiva.
Diante disso, a recaída é uma importante característica da dependência de
substâncias psicoativas o que torna um problema primário no tratamento de abuso
de drogas (STEWART, 2000), e o que tem levado ao desenvolvimento de técnicas
de prevenção de recaída (LARIMER; PALMER; MARLATT, 1999). A recaída é o
retorno ao uso do álcool aos mesmos níveis antes da intervenção terapêutica ou
abstinência (MARLATT, 1993). Esse conceito pode ser estendido a todas as outras
substâncias psicoativas.
As pessoas em tratamento para a dependência de substâncias psicoativas,
após um período sem o uso da substância, seja de semanas, meses ou anos, ao
tentarem fazer uso controlado ou esporádico da mesma, se não buscam ajuda de
imediato, em breve voltam a apresentar os sintomas de dependência, isto é, ocorre a
reinstalação da síndrome de dependência.
Considerando que o indivíduo inicia com o uso, o abuso, uso nocivo, ao
atingir os padrões de dependência, parece não haver mais retorno para o consumo
nos padrões de uso ou de abuso, mesmo após um período sem usar a substância.
Ou seja, ao usar a substância, ocorre a reinstalação da síndrome de dependência. A
30

síndrome de dependência, processo que pode levar até anos para se desenvolver,
pode reinstalar-se num prazo de 72 horas após a quebra da abstinência, como se
houvesse uma “memória” irreversível (RAMOS; BERTOLOTE, 1997).

2.6 PROCESSOS DA RECAÍDA

O processo da recaída é complexo, mas podemos e precisamos buscar


entendê-la se quisermos contribuir de algum modo. É relativamente fácil mudar
nosso comportamento por algumas horas ou até por alguns dias, mas o difícil é
manter a mudança projetada. Quando falamos em dependência química, a
dificuldade é semelhante. Parar de usar drogas, sejam elas lícitas ou ilícitas, não
representa o maior obstáculo, a manutenção desta proposta, que se torna
normalmente penoso. Por ser um transtorno crônico, aumenta ainda mais as
chances a lapsos e recaídas.
Ao estudarmos o modelo cognitivo-comportamental utilizado na Prevenção à
Recaída de Marlatt, verificamos a recaída como uma retomada do antigo padrão de
consumo e que o uso ocasional ou apenas um episódio, poderá ser considerado um
lapso.
A recaída, isto é, o uso de drogas depois de um período de abstinência,
assume diferentes padrões, cada um dos quais exibe diferentes implicações para o
tratamento e a recuperação (DE LEON, 1990-91). A recaída pode referir-se a um
incidente único, discreto, ou a um retorno completo aos níveis de uso de antes do
tratamento.

2.7 FATORES DE RISCO E PROTEÇÃO

As pessoas que enfrentam problemas com dependências químicas, bem


como seus familiares, precisam aprender a detectar situações de risco. Enquanto o
indivíduo estiver consumindo drogas, aumenta a probabilidade desta detecção não
acontecer de forma satisfatória.
Numa análise de Marlatt (1996), de 311 episódios de recaída ocorridos com
problemas associados ao beber, tabagismo, adição em heroína, jogo compulsivo e
excesso alimentar, os pesquisadores identificaram que quase três quartos das
recaídas estavam associadas com três categorias de situações de alto risco:
31

a) estados emocionais negativos: 35% da amostra. Humor ou sentimento


negativo ou desprazeroso (frustração, raiva, ansiedade, depressão ou
tédio, antes ou no momento da ocorrência do primeiro lapso);
b) pressão social: 20% da amostra. Situação em que o indivíduo está
respondendo à influência de outra pessoa ou grupo de pessoas. Esta
pressão social pode ser direta (contato interpessoal direto com persuasão
verbal), ou indireta (observando o comportamento de outras pessoas
adictas, mas sem pressão direta);
c) conflito interpessoal: 16% da amostra. Conflitos em andamento ou
recentes associados com qualquer relacionamento interpessoal:
casamento, amigos, relação empregador-empregado.
As situações de risco em relação ao uso de álcool e outras drogas são
variáveis e envolvem aspectos psicológicos, ambientais, comportamentais e
genéticos. Ou seja, estão tanto no próprio indivíduo, como na família, na escola, na
comunidade, na sociedade em geral. Vale ressaltar também, que em fases
diferentes da vida, ocorrem também diferentes fatores de risco, que podem levar o
indivíduo ao uso ou a quebra da abstinência. Um mesmo fator pode representar
risco para uma pessoa e proteção para outra.
Na adolescência é grande o risco para envolvimento com substâncias
psicoativas atribuindo-se em parte este risco às características da adolescência, tais
como: necessidade de aceitação pelo grupo de amigos, desejo de experimentar
comportamentos vistos como "de adultos", sensação de onipotência "comigo isso
não acontece", grandes mudanças corporais gerando insegurança, início do
envolvimento afetivo, aumento da impulsividade e busca de sensações novas.
Há outros aspectos importantes a ressaltar, em relação ao uso de drogas na
adolescência:

1. É no período compreendido entre a adolescência e a fase jovem da idade


adulta que ocorrem os maiores níveis de experimentação e problemas
relacionados ao uso de álcool e outras drogas.
2. A adolescência é um período do desenvolvimento humano em que
ocorrem importantes transformações de ordem física, emocional, cognitiva e
social, e o uso de substâncias pode comprometer este processo.
3. O início do uso de substâncias, em geral, acontece na adolescência.
Sabe-se que os jovens, apesar do pouco tempo de uso de substâncias,
passam muito rapidamente de um estágio de consumo para outro, além de
fazerem uso de múltiplas substâncias.
32

4. Por outro lado, uma grande parcela deles diminui significativamente o


consumo no início da idade adulta, para adequar-se às expectativas e
obrigações da maturidade, como trabalho, casamento e filhos.
5. Vários estudos demonstram associação positiva entre precocidade do
uso de substâncias e desenvolvimento de dependência (SUPERA, 2006, p.
56).

Outras situações de risco, como ambientes impróprios, famílias em conflitos


e/ou disfuncionais e conceitos próprios em relação às drogas, facilitam o uso, o
abuso e na continuidade da instalação da dependência química nos adolescentes.
Todas as situações de risco anteriormente citadas são igualmente perigosas numa
situação de abstinência pós-tratamento para uma eventual recaída.
Os principais fatores de proteção ao uso de drogas são especialmente
relacionados à família:
- bom relacionamento familiar;
- supervisão ou monitoramento dos pais em relação ao comportamento dos
filhos;
- noções claras de limites;
- valores familiares de religiosidade ou espiritualidade.
Na fase adulta temos fatores de risco e proteção mais voltados para a
realidade de cada indivíduo. Muitos fatores de risco estão atrelados com o
comportamento anterior, ou seja, na adolescência ou na juventude. Idosos que
iniciaram um consumo na juventude ou na maturidade, o mantiveram ao longo da
vida (SUPERA, 2006).

2.8 DETERMINANTES DA RECAÍDA

Enquanto o indivíduo experiência o autocontrole na abstinência sente-se


confiante. Esta fase se reforça a cada instante, ou seja, quanto mais tempo em
abstinência maior a percepção de autoeficácia. O comportamento em geral está sob
controle desde que, não ocorra neste período, uma situação de alto risco.
Podemos definir uma situação de alto risco como qualquer situação que
represente uma ameaça ao senso de controle do indivíduo e aumente o risco de
recaída (MARLATT, 1993).
Com o intuito de avançar em nossa temática, apresentamos o quadro a
seguir:
33

Resposta de Aumento da Diminui a


enfrentamento autoeficácia probabilidade de
recaída

Situação
de risco

Sem resposta Diminui Uso inicial


de autoeficácia de álcool
enfrentamento Expectativas (lapso)
de resultado
positivo

Efeito de violação da
abstinência: culpa e
autorresponsabilidade

Fonte: Marlatt (1993, p. 35).

Marlatt afirma que se o indivíduo for capaz de dar uma resposta de


enfrentamento cognitiva ou comportamental a altura da situação de risco, a
probabilidade de recaída diminui. Toda vez que houver resposta de enfrentamento
haverá compensação, ou melhor, o sujeito experienciará um senso de domínio ou
percepção de controle, sentimento que lhe fará muito bem. Ao superar uma situação
desconfortante, normalmente a pessoa aumenta sua capacidade de lidar
eficazmente num próximo evento desafiador.
A expectativa de ser capaz de lidar com sucessivas situações de risco está
intimamente associada com a noção de autoeficácia. Saber e sentir-se capaz de
enfrentar as adversidades tende a aumentar a autoconfiança à medida que a
duração da abstinência aumenta e o indivíduo é capaz de lidar efetivamente com
mais e mais situações de alto risco. A percepção da eficácia aumenta de forma
cumulativa e a probabilidade de recaída diminui proporcionalmente.
Por outro lado, quando não há resposta de enfrentamento em situações de
risco ou alto risco, inicia-se um processo de recaída. O indivíduo ao não dar uma
resposta de enfrentamento, estará diminuindo sua autoeficácia associada a um
34

sentimento de impotência e tendência de render-se passivamente a situação. Na


medida em que a autoeficácia diminui na situação de risco, a expectativa para lidar
eficazmente com situações problemáticas também começa a cair. A probabilidade
de recaída aumenta ainda mais se o indivíduo continua mantendo expectativas
positivas quanto ao resultado dos efeitos da substância envolvida. Esta combinação,
incapacidade de lidar com situações de risco e as expectativas de resultado positivo
para os efeitos da antiga droga, aumentam imensamente a probabilidade de
ocorrência de um lapso e da recaída (MARLATT, 1993).
Conforme Marlatt (1993), algumas situações importantes são apontadas
como situações de alto risco para a recaída:
A – Determinantes intrapessoais
1. lidar com estados emocionais negativos (frustração, depressão);
2. lidar com estados físico-fisiológicos negativos (relacionados ou não com
as drogas);
3. intensificação de estados emocionais positivos;
4. testar o controle pessoal ("vou consumir para ver se não volto a ficar
dependente");
5. ceder a tentações ou desejos de consumir.
B – Determinantes interpessoais:
1. estados emocionais positivos;
2. conflito interpessoal;
3. pressão social.
As estratégias de enfrentamento de situações de risco podem e devem ser
aprendidas e aplicadas. A estratégia é um plano de ação. É a capacidade de saber
usar as ferramentas necessárias para atingir o objetivo de enfrentar, lidar com
segurança numa situação de risco. Todo dependente em tratamento precisa
identificar, a partir de sua realidade, de seu meio, quais são as situações de risco
que irá enfrentar. Apontá-las e elaborar respostas de enfrentamento, principalmente
para aquelas situações em que se achar mais vulnerável, é um bom exercício.
Pensar o uso de drogas e consequentemente a recaída através de outro viés
permite reconhecer as várias possibilidades existentes. A toxicomania a partir de um
sintoma social e a recaída a partir do mal-estar. Melman (1992, p. 66) afirma, “Esta
verdade é o mal-estar na civilização, quer dizer, nossa civilização como mal-estar: a
civilização é um mal-estar”.
35

Melman (1992) seguindo os pensamentos de Freud, nos lembra “que se


trata do mal-estar que concerne à insatisfação fundamental, no qual o ser falante
está mergulhado, que culmina na insatisfação sexual.” Neste momento entendemos
a tentativa do toxicômano como uma entre outras, para remediar este mal-estar.
Melman (1992) toma como verdade que o toxicômano não somente tem seu
objeto ao alcance da mão, mas que ele supõe que é impossível estabelecer uma
relação verdadeiramente analítica. Neste caso o sujeito-suposto-saber estaria
destituído de antemão que o saber estivesse do lado do dependente químico e não
do lado do analista.
Percebemos assim a dificuldade no tratamento, e as possíveis causas da
recaída a partir do sistema capitalista. Melman (1992) afirma:

Por outro lado, vejo uma causa que, estranhamente, é social. Quer dizer
que o que se chama para nós “a sociedade de consumo” repousa sobre um
ideal, mas ignora que esse ideal é o toxicômano que o realiza. Com efeito, o
sonho de todo publicitário, de todo fabricante é de realizar o objeto do qual
ninguém poderia mais passar sem; objeto que teria qualidades tais que
apaziguaria, ao mesmo tempo, as necessidades e os desejos, que
necessitaria de uma renovação permanente, uma perfeita dependência.

Falar do uso de drogas, ou ainda, do retorno ao uso após um período de


abstinência, remete-nos ainda a pensar a drogadição pela vertente da defesa.
Defesa contra tudo e contra todos. Um uso como alívio, uma amenização da
angústia, do sofrimento, mas que não dá muito certo. Defesa contra a depressão,
contra a psicose, contra as frustrações e decepções (NOGUEIRA FILHO, 1999).
36

CONCLUSÃO

Os encaminhamentos deste trabalho tiveram o propósito de conceber a


compreensão do uso, abuso ou dependência de drogas, através de um percurso não
apenas psicanalítico, mas também com outros olhares teóricos voltados ao uso das
drogas como doença, inclusive crônica e incurável.
Iniciamos esta pesquisa buscando compreender o uso de drogas através da
história. Percebemos que certas substâncias eram utilizadas já na antiguidade com
fins ritualísticos-religiosos ou para suportar as adversidades ambientais, como
suportar a fome e a fadiga. Esta primeira descoberta não nos impressiona muito,
porque ela nos parece muito viva ainda na contemporaneidade, frente as
dificuldades diárias que enfrentamos. Soma-se a esta descoberta, a gradativa
incorporação das substâncias psicoativas na cultura como uma mercadoria e ainda
como sintoma social.
As drogas, a partir da psiquiatria, são classificadas de acordo com sua forma
de agir no cérebro e podem ser divididas em depressoras, estimulantes e ainda, as
que causam alucinações. Compreender o que significa padrão de consumo, desde
um único uso na vida, uso frequente, ou de abuso até chegar à dependência, tem
me levado a pensar a partir desse “padrão” e da classificação, de qual é, e de
quanto preciso, para aliviar sintomas de mal-estar ou de desconforto físico? O que
esse consumo diferenciado para cada pessoa, nos quer mostrar no momento que
analisamos esta informação através da psicanálise? Talvez seja uma verificação
importante na busca de compreensão do conflito, da angústia ou ainda de busca de
prazer simplesmente.
Na continuidade dos trabalhos, verificamos que o uso abusivo de
substâncias que modificam o funcionamento mental, aumentam muito o risco ou
37

agravamento de transtornos mentais. Devemos também considerar que o uso de


substâncias pode acontecer justamente devido um sofrimento psíquico já existente.
Os modelos de tratamento detalhados durante a pesquisa nos servem de
parâmetros e de observação do que está sendo realizado em busca de respostas
para a questão do uso e abuso de drogas. A redução de danos surge no Brasil na
tentativa de diminuir os riscos de contaminação do vírus HIV. Logo em seguida o
foco das ações envolvia os problemas com as drogas não injetáveis como o uso de
crack, por exemplo. Na intervenção breve, percebemos a preocupação em reduzir o
consumo e os problemas ligados ao álcool. Nesta abordagem, vemos a busca por
autonomia das pessoas, ajudando-as a resgatar capacidades de assumir a iniciativa
e a responsabilidade por suas escolhas.
Na terapia cognitivo comportamental, são apresentadas técnicas de solução
de problemas. Os usuários aprenderão a seguir os passos necessários, como definir
o problema, gerar maneiras alternativas de resolvê-lo e implementar soluções
alternativas.
Com tudo isto que foi construído é necessário, agora, pensar em como a
psicanálise pode vir a ser suporte para o sujeito que está em sofrimento.
Compreender o sujeito usuário de drogas a partir do entendimento da toxicomania
permite uma ampliação do olhar sobre esse sujeito que vai além do ponto de vista
da dependência química. Uma das conclusões é que a psicanálise possibilita a
escuta do sujeito da dependência, e não apenas da dependência do sujeito, ou em
outras palavras, tratar o sujeito do sintoma e não o sintoma do sujeito.
Com as abordagens, podemos entender a toxicomania a partir de outras
perspectivas, o que permite enxergar que a toxicomania ou então o uso de
substâncias, não se reduz a fenômenos de compulsão e de dependência química, e
que não representa simplesmente uma tentativa do sujeito de destruir-se, pelo
contrário, através da psicanálise, percebemos a toxicomania como uma busca do
sujeito por um lugar para existir. Destacamos ainda que o processo de cura aposta
numa mudança de posição subjetiva, onde não é possível indicar a melhor saída
para o sujeito.
Uma questão que pode ser elaborada a partir deste trabalho é como aplicar
o entendimento psicanalítico da toxicomania no tratamento de dependentes
químicos em uma instituição que possui profissionais de formações diversas, onde
diferentes olhares são lançados simultaneamente na busca de respostas que
38

dificilmente são encontradas. Talvez a resposta surja quando, por exemplo, num
momento em que uma técnica cognitiva comportamental, aliada a um trabalho de
escuta subjetiva do desejo inconsciente, tragam resultados mais satisfatórios.
Assim, realizamos um percurso que permite entender, ao menos em alguns
pontos, o que o uso de drogas representa à psicanálise e a outras abordagens, mas
há muito ainda a ser discutido, uma vez que, os sujeitos vão se reinventando no
decorrer da história. É necessário que a busca, a interpretação e o estudo continuem
produzindo referenciais para aqueles que procuram entender o sofrimento psíquico.
39

REFERÊNCIAS

BUCHER, R. A função da droga no (dis)funcionamento social. In: Drogas e


Sociedade nos Tempos da AIDS. Brasília: UnB, 1996.

DEL PRETTE, Z. A. P.; DEL PRETTE, A. Psicologia das habilidades sociais na


infância: teoria e prática. Rio de Janeiro: Vozes, 2005. 270p.

DIEHL, A. et al. Dependência química: prevenção, tratamento e políticas públicas.


Porto Alegre: Artmed, 2011. 528p.

DUARTE, P. C. A. V.; ANDRADE, A. G. Integração de competências no


desempenho da atividade judiciária com usuários e dependentes de drogas.
Brasília: Ministério da Justiça, Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas, 2011.
352p.

FREUD, S. Cinco lições de psicanálise, Leonardo da Vinci e outros trabalhos (1910).


In: Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund
Freud. Tradução J. Salomão. Rio de Janeiro: Imago, 1996. v. XI.

FURASTÉ, P. A. Normas técnicas para o trabalho científico: explicitação das


normas da ABNT. 17. ed. Porto Alegre: Dáctilo-Plus, 2014.

http://www.appoa.com.br/uploads/arquivos/revistas/revista26_-_uber_coca.pdf.
Acesso em: 03 nov. 2015.

http://www.appoa.com.br/uploads/arquivos/revistas/revista26_-_uber_coca.pdf.
Acesso em: 03 nov. 2015.

MELMAN, C. Alcoolismo, delinquência, toxicomania: uma outra forma de gozar.


São Paulo: Escuta, 1992.

NOGUEIRA FILHO, D. M. Toxicomania. São Paulo: Escuta, 1999. 136p.


40

RIBEIRO, M.; LARANJEIRA, R. O tratamento do usuário de crack. 2. ed. Porto


Alegre: Artmed, 2012. 664p.

SUPERA – SISTEMA PARA DETECÇÃO DO USO ABUSIVO E DEPENDÊNCIA DE


SUBSTÂNCIAS PSICOATIVAS. Encaminhamento, intervenção breve, reinserção
social e acompanhamento. Brasília: Secretaria Nacional Antidrogas, 2006.

TOROSSIAN, S. D. De qual cura falamos?: relendo conceitos. Revista da


Associação Psicanalítica de Porto Alegre, n. 26, 2004.

www.psiquiatriageral.com.br/dsm4/sub_index.htm. Acesso em: 09 nov. 2015.

Você também pode gostar