Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Com a evolução da civilização, o Estado além de ser um órgão
monopolizador de todo poder, passa a ser, também, um sistema orgânico de
serviços públicos para satisfação das necessidades públicas.
Em tempos remotos a pilhagem, a exploração dos povos vencidos na
guerra, a requisição de coisas e serviços dos súditos constituíam formas
usuais do Estado conseguir os bens e o dinheiro necessários ao
cumprimento de sua função. Na fase contemporânea, o Estado, já evoluído,
paga com dinheiro os bens e o trabalho de que necessita.
Pagando suas despesas em moeda, o Estado precisa conseguir dinheiro , e o
faz por meio da atividade financeira.
Nas palavras de Aliomar Baleeiro: “A atividade financeira consiste,
portanto, em obter, criar, gerir e despender o dinheiro indispensável às
necessidades, cuja satisfação o Estado assumiu ou cometeu àqueloutras
pessoas de direito público”1.
Essa atividade do Estado de arrecadar, gerir e aplicar o dinheiro em suas
finalidades, é objeto de estudo da Ciência das Finanças que é “disciplina
que, pela investigação dos fatos, procura explicar os fenômenos ligados à
obtenção e dispêndio do dinheiro necessário ao funcionamento dos
serviços à cargo do Estado, ou de outras pessoas de direito público, assim
como os efeitos outros resultantes dessa atividade governamental”2. A
Ciência das Finanças é uma ciência do ser, é uma ciência ontológica, que
estuda o acontecimento, o fenômeno real, o fato que realmente aconteceu.
Outrossim, a atividade financeira do Estado é objeto de estudo do Direito
Financeiro, este é o ramo do direito público que compreende o conjunto de
normas jurídicas e princípios que regulam as relações jurídicas decorrentes
da atividade financeira do Estado. O estudo do Direito financeiro abrange o
estudo, da despesa pública, da receita pública, do orçamento público e do
crédito público.
A ciência do direito, ao contrário da ciência das finanças é uma ciência
do dever ser, desta forma, o Direito Financeiro, estuda a atividade
financeira do Estado sob um enfoque diferente, tendo resultados diferentes.
Partindo das conclusões da Ciência das Finanças, os legisladores
conseguem editar normas que condizem com a realidade econômica de um
determinado povo, obtendo uma melhor regulação da matéria. Ao mesmo
tempo, para o estudo completo dos fatos, é imprescindível conhecer as leis
que os regem. Desta forma, pode-se afirmar que a ligação entre a Ciência
das Finanças e o Direito Financeiro é umbilical, uma vez que, partindo dos
resultados obtidos por um, o outro melhor desempenha sua função.
PERÍODOS DA ATIVIDADE FINANCEIRA DO ESTADO
Existem dois períodos nos quais deve ser examinada a atividade financeira
do Estado.
1. PERÍODO CLÁSSICO
Neste período o Estado antes era mero espectador da Economia, simples
consumidor, eivado pelas idéias do Liberalismo Econômico, pregava o
ideal da não-intervenção estatal nos assuntos de mercado, vigorando a auto-
regulação da Economia.
Este período, portanto, era ligado ao Estado Liberal dos séculos XVIII e
XIX, caracterizado pelo princípio do não intervencionismo do Estado no
mundo Econômico.
Aqui o Estado era denominado “Estado de Polícia”, no qual as funções
eram mínimas. Somente era função estatal, aqueles serviços ditos
essenciais, que não podiam ser entregues à execução pelos particulares, tais
como serviço de segurança pública, serviço de justiça, serviço de
diplomacia.
O Estado, portanto, somente precisava arrecadar dinheiro para fazer frente
às despesas com essas funções essenciais, utilizando a tributação
exclusivamente com esse intuito. Por isso, denomina-se a atividade
financeira do Estado, neste período finanças neutras.
2. PERÍODO MODERNO
Já no período moderno, que se inicia no final do séculos XIX, o Estado
percebe, diante dos fatos sociais (desigualdade gerada pela Revolução
Industrial, por exemplo), que não mais pode deixar de intervir diretamente
na Economia, uma vez que a auto regulação econômica gera distorções e
crises, tanto econômicas, quanto sociais.
Desta forma, o Estado passa a intervir no domínio econômico e social,
prestando diversos serviços públicos para suprir necessidades públicas,
bem como utilizando a tributação não apenas com a finalidade de arrecadar
dinheiro, mas também com uma função extrafiscal.
No ordenamento jurídico brasileiro temos vários tributos que são utilizados
com esse plus, ou seja, além da intenção arrecadatória, o Estado utiliza
certos tributos para atingir outras finalidades como controlar o mercado,
desenvolver a indústria nacional, estimular a concorrência, etc. São
exemplos:
Imposto de Importação: previsto no art. 153, inciso I da
Constituição Federal. Este imposto tem relevante função extra fiscal,
quando o Estado quer estimular determinado setor da indústria
nacional, eleva as alíquotas deste tributo, tornando a importação
muito cara e muitas vezes até inviável, o que força a
desenvolvimento da indústria interna. Ao revés, quando quer
estimular a concorrência de determinados setores, diminui as
alíquotas, estimulando a importação, o que faz com que sejam
inseridos no mercado nacional produtos estrangeiros, forçando uma
retenção ou mesmo uma diminuição de preços.
Imposto Territorial Rural: previsto no art. 153, inciso VI da
Constituição Federal. O inciso I do § 4º do citado artigo determina
que este imposto “será progressivo e terá suas alíquotas fixadas de
forma a desestimular a manutenção de propriedades
improdutivas”. Portanto, determina a Constituição Federal que a
propriedade de terras rurais improdutivas seja tributada de maneira
mais pesada, do que a de terras produtivas. O intuito dessa diferença
de tratamento tributário é estimular o adequado aproveitamento do
solo rural.
Neste período, no qual o Estado deixa de ser mero espectador da Economia
e passa a ser atuante, regulando-a, ele utiliza a tributação como meio eficaz
para promover essa intervenção. Desta forma, o tributo deixa de ter uma
função meramente arrecadatória, e passa também a ter uma função
extrafiscal. A moderna atividade financeira do Estado passa a ser
denominada: finanças funcionais.
FORMAS DE INTERVENCIONISMO EXTRAFISCAL
1. intervenção por aumento ou diminuição da carga tributária global:
o Estado procura resultados econômicos válidos mediante a diminuição
ou o aumento, em conjunto, da carga dos tributos. Nesta forma de
intervenção ocorre o aumento ou a diminuição total dos tributos, a
diminuição global provoca uma baixa nos preços de revenda dos
produtos, aumentando a disponibilidade financeira dos particulares,
promovendo o desenvolvimento dos negócios. Já o aumento global
restringe o consumo evitando que o excesso de disponibilidade faça
subir os preços pela desproporção entre a oferta e a procura.
2. Intervenção mediante discriminação: são escolhidos determinados
tributos que incidam sobre atividades específicas, tributando-se
gravosamente as que são consideradas prejudiciais ou as que se quer
desestimular, concedendo-se vantagens fiscais àquelas que devem ser
protegidas ou estimuladas. Por exemplo, em determinada época o
governo desejava o desenvolvimento da indústria automobilística
nacional, para isso elevou enormemente o imposto de importação de
veículos estrangeiros, desestimulando essa atividade, forçando a
indústria nacional a se desenvolver; quando este desenvolvimento
atingiu o patamar desejado, procedeu-se a operação inversa, o imposto
de importação foi reduzido de modo a estimular a entrada de veículos
estrangeiros no mercado nacional, o que promoveu a concorrência e fez
com que os preços dos veículos nacionais fossem reduzidos.
3. Intervencionismo por amputação: através da elevação de imposto
sobre rendas e heranças elevadas, objetiva-se amputar parte delas, com
o intuito de igualar o nível de vida dos indivíduos. Essa forma de
intervenção tem efeito direto e finalidade social, no entanto, não é
utilizada pelos países democráticos, nos quais não há o objetivo de
igualar por igualar os cidadãos, aplicada, em regra, nos países de ideal
socialista.
4. Intervencionismo por redistribuição: o Estado além de retirar parte
das riquezas dos contribuintes, promove a sua redistribuição por meio
de subvenções ou outra forma de auxílio às parcelas da sociedade com
baixa capacidade econômica.
NECESSIDADE PÚBLICA
A necessidade pública é uma necessidade humana caracterizada por um
interesse geral, coletivo em sua realização.
São conceitos de necessidade pública:
“Necessidade pública é a necessidade que tem um interesse geral em
determinado grupo social e é satisfeita pelo processo do serviço
público”3.
“ (…) necessidades públicas, necessidades que por sua natureza, só
encontram satisfação eficaz pela ação coordenada do grupo, quer seja
voluntária, quer seja coativa a participação dos indivíduos que o formam.
(…) A necessidade é pública quando, em determinado grupo social,
costuma ser satisfeita pelo processo do serviço público, isto é, quando o
Estado, ou outra pessoa de direito público, para satisfazê-la, institui ou
mantém um regime jurídico e econômico especial, propício à sua
obrigatoriedade, segurança, imparcialidade, regularidade ou
continuidade, a cargo de seus agentes ou por delegação a pessoas sob sua
supervisão. Necessidade pública é toda aquela de interesse geral, satisfeita
pelo processo do serviço público. É a intervenção do Estado para provê-
la, segundo aquele regime jurídico, que lhe dá colorido inconfundível. A
necessidade torna-se pública por uma decisão dos órgãos políticos”4.
Em determinado grupo social, os legisladores escolhem quais bens são
imprescindíveis à vida da sociedade e determinam que a satisfação das
necessidades coletivas oriundas desses bens, seja realizada pelo Estado, por
meio do processo do serviço público. Daí a afirmação de que toda
necessidade pública é coletiva, mas nem toda coletiva é necessariamente
pública, pois somente será pública a necessidade coletiva, que em
determinado grupo social, em determinada época o Poder Legislativo
afirmar ser direito do cidadão tê-la satisfeita, e em contrapartida, dever do
Estado satisfazê-la. Portanto,só será pública a necessidade coletiva que o
Estado está obrigado a satisfazer, sendo que essa satisfação se dá pelo
processo do serviço público.
E o que é serviço público?
“Serviço público é toda atividade de oferecimento de utilidade ou
comodidade material destinada à satisfação da coletividade em geral, mas
fruível singularmente pelos administrados, que o Estado assume como
pertinente a seus deveres e presta por si mesmo ou por quem lhe faça as
vezes, sob um regime de Direito Público – portanto, consagrador de
prerrogativas de supremacia e de restrições especiais –, instituído em
favor dos interesses definidos como públicos no sistema normativo”5.
“Serviço público é toda atividade material que a lei atribui ao Estado para
que a exerça diretamente ou por meio de seus delegados, com o objetivo de
satisfazer concretamente às necessidades coletivas, sob regime jurídico
total ou parcialmente público”6.
Desta forma, o Estado satisfaz as necessidades públicas por meio da
prestação de serviços públicos: a necessidade pública saúde é satisfeita pela
prestação do serviço público saúde (hospitais, internamentos, medicação,
campanhas preventivas), a necessidade pública segurança é satisfeita pela
prestação do serviço público segurança (policiais militares, Forças
Armadas), a necessidade pública educação é satisfeita pelo serviço público
educação (escolas, material didático, merenda, etc).
Interessa-nos duas formas de serviço público, duas classificações são
importantes porque influem diretamente na tributação. São elas:
Serviço público ‘uti universi’: são aqueles serviços públicos prestados à
coletividade, mas usufruídos apenas indiretamente pelos indivíduos, os
usuários não são identificáveis. Ex.: serviço de defesa do país contra
inimigo externo, serviço de pesquisa científica, serviços administrativos
realizados internamente pela Administração Pública, iluminação pública,
saneamento.
Serviço público ‘uti singuli’: são aqueles que têm por finalidade a
satisfação individual e direta das necessidades dos cidadãos, são serviços
públicos específicos e divisíveis cujos usuários são identificados. Ex.:
energia elétrica, gás, transporte coletivo, coleta do lixo.
Esta classificação é importante para o Direito Tributário porque os serviços
públicos uti universi só podem ter suas despesas sanadas com a receita dos
impostos e das contribuições, já os serviços uti singuli são remunerados
através da cobrança do tributo taxa.
DESPESA PÚBLICA
O Estado na realização da atividade financeira, tem como objetivo obter
dinheiro para aplicá-lo na realização de seus fins, estes obrigatoriamente
tem que ser realizados. Portanto, ele sempre procura adequar, ajustar a sua
receita à sua política, desta forma, a despesa sempre precede a receita. Isto
porque o Estado tem primeiro a preocupação de conhecer as necessidades
públicas que deve realizar, depois disso cuida de adequar sua política
financeira para que arrecade o suficiente. Na atividade pública vale o
jargão “a necessidade faz a despesa”.
A despesa pública pode ser conceituada sob dois pontos de vista distintos, o
orçamentário e o científico.
Do ponto de vista orçamentário despesa pública “é a aplicação de certa
quantia em dinheiro, por parte da autoridade ou agente público
competente, dentro de uma autorização legislativa, para a execução de um
fim a cargo do governo”7. Sob o ponto de vista exclusivamente
científico “a despesa pública é a soma de gastos realizados pelo Estado
para a realização de obras e para a prestação de serviços públicos”8.
EXECUÇÃO DA DESPESA PÚBLICA
Atualmente a regra é a execução das despesas do Estado em espécie, em
dinheiro, existindo excepcionalmente serviços gratuitos, nos quais o Estado
apenas requisita o trabalho particular, ex.: serviço de mesário nas eleições,
jurados do Tribunal do Júri.
CAUSAS DE AUMENTO DA DESPESA PÚBLICA
Causas Aparentes:
variações no valor da moeda em decorrência da inflação;
evolução das regras de contabilidade pública;
anexação de territórios feitas pelo Estado;
aumento da população do Estado.
Causas Reais:
incremento da capacidade econômica do homem contemporâneo;
melhoria do nível político, moral e cultural da humanidade;
guerra total das gerações contemporâneas;
vícios e erros dos governantes;
corrupção.
CLASSIFICAÇÃO DA DESPESA PÚBLICA
Existem diversas classificações de despesa pública, nenhuma delas melhor
ou pior que a outra, bem como nenhuma delas certa ou errada,
simplesmente em cada uma o critério de análise muda. Essa variação não
importa, pois o mérito de todas é facilitar o estudo e a compreensão do
tema.
Classificações da doutrina
Segundo o autor Héctor Villegas, a despesa pública pode ser
classificada de acordo com os seguintes critérios:
Critério Administrativo: depende da organização de cada país (daí a
crítica a este critério de classificação: falta de generalidade), a despesa
pública é classificada de acordo com os vários ramos da atividade do
Estado, como despesas realizadas pelos Poderes Executivo, Legislativo
e Judiciário, despesa realizadas pelas autarquias, despesas realizadas
pelas fundações públicas, etc.
Critério Econômico:
a) despesas de funcionamento ou operacionais e despesas de
investimento;
b) despesas de serviços e despesas de transferência;
c) despesas produtivas e despesas improdutivas.
BIBLIOGRAFIA
1. BALEEIRO, Aliomar. Uma Introdução à Ciência das Finanças. 15ª ed.
rev. e atual. por Dejalma de Campos. Rio de Janeiro. Forense, 2002.