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Área Temática: Gestão de Pessoas e do Capital Intelectual

O Processo de Aprendizagem Interníveis


e o Desenvolvimento de Competências
Claudia Simone Antonello
Doutora em Administração de Recursos Humanos pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS
Professora e pesquisadora no Programa de Pós-Graduação em Administração da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS
[csantonello@ea.ufrgs.br]

Endereço da autora: Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS


Rua Washington Luís, 855 - sala 315, Centro – Porto Alegre – RS Cep. 90010-460 – Brasil

Recebido em 26 de junho de 2007 / Aprovado em 30 de outubro de 2007

RESUMO Palavras-chave:
Este estudo teve por objetivo discutir e explorar Aprendizagem organizacional. Desenvolvimento
as articulações entre aprendizagem organizacional de competências. Aprendizagem interníveis.
e o desenvolvimento de competências indivi-
duais, funcionais e organizacionais. Trata-se de ABSTRACT
uma pesquisa qualitativa longitudinal que inves- This study aimed at discussing and exploring the
tigou três grupos de gerentes sobre os processos connections between organizational learning and
de aprendizagem nos níveis individual, grupal e the development of individual, functional and
organizacional. Os resultados obtidos auxiliaram organizational competences. This longitudinal
na identificação da difusão de competências por qualitative research investigated three groups of
meio do trabalho interativo e em equipe; pelo managers about the learning processes in the in-
intercâmbio de experiências com especialistas; dividual, group and organizational levels. The
em reuniões; desenvolvimento de projetos e de results allowed the identification of the diffusion
maneira informal. Os resultados também per- of competences through the interactive and team
mitiram propor a noção de aprendizagem work; through the exchange of experiences with
organizacional e o desenvolvimento de compe- experts; in meetings; in the development of
tências por interníveis. O principal obstáculo a projects and in an informal way. The results also
ser superado para realizar tal integração é substi- allowed the proposition of the notion of
tuir a tendência de se pensar em termos de cate- organizational learning and competence
gorias fixas de aprendizagem e trabalhar com a development for inter-levels. The main obstacle
noção de processos dinâmicos, no qual o nível to be overcome to achieve such integration is to
grupal é fundamental. O artigo conclui suge- substitute the tendency of thinking in terms of
rindo uma agenda para estudos futuros sobre fixed categories of learning and work with the
as conexões entre os processos de aprendiza- notion of dynamic processes, in which the group
gem organizacional e o desenvolvimento de com- level is fundamental. The article concludes
petências. suggesting an agenda for future studies on the

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connections between the processes of organizational tarem com os desafios cotidianos que se impõe
learning and the development of competences. em suas atividades de trabalho.
A aprendizagem nas organizações pode ser
Key-words: entendida como um processo permanente de
Organizational learning. Competences development. construção e desenvolvimento de competências,
Interlevel learning. baseado na apropriação de novos conhecimentos,
voltados para o desenvolvimento de novos mapas
RESUMEN cognitivos que possibilitam as pessoas compreen-
Este estudio tuvo por objetivo discutir y explorar derem a si próprias, a organização e o ambiente
las articulaciones entre el aprendizaje organizacional que as cerca, estabelecendo novas atitudes em re-
y el desarrollo de competencias individuales, lação ao seu trabalho, sua empresa e o mundo
funcionales y organizacionales. Se trata de una externo (FLEURY; FLEURY, 2000; KOLB,
investigación cualitativa longitudinal que investigó 1984; SWIERINGA; WIERDISMA, 1995).
tres grupos de gerentes con relación a los procesos Koenig (1994) afirma que a aprendizagem
de aprendizaje en las categorías individual, grupal nas organizações, entendida como fenômeno co-
y organizacional. Los resultados obtenidos letivo de aquisição e elaboração de competências,
ayudaron a identificar la difusión de competencias pode contribuir efetivamente para o processo de
mediante el trabajo interactivo y de equipo; por mudança. Segundo o autor, a dimensão coletiva
el intercambio de experiencias con especialistas; da aprendizagem pode ser ativada de duas manei-
en reuniones; por el desarrollo de proyectos y ras, não excludentes uma da outra.
de manera informal. Los resultados también O primeiro modo baseia-se na circulação
permitieron proponer el concepto de aprendizaje de idéias ou na difusão de práticas construtivas
organizacional y el desarrollo de las competencias de novas competências. Nesse caso, o impacto da
por interniveles. El principal obstáculo que hay aprendizagem cresce com a diversidade de inter-
que superar para realizar tal integración es sustituir pretações produzidas pelos indivíduos. À medida
la tendencia de pensar en términos de categorías que as pessoas passam a compreender de forma
fijas de aprendizaje y trabajar con la noción de similar as diferentes percepções por elas produzi-
procesos dinámicos, en los que el nivel del grupo das, a sua aprendizagem aumenta a possibilidade
es fundamental. Finalmente el artículo sugiere de aquisição de uma nova competência. O segun-
una agenda para estudios futuros sobre las do modo é sustentado pela criação de relações
conexiones entre los procesos de aprendizaje entre as competências pré-existentes, visando uma
organizacional y el desarrollo de competencias. maior confrontação e articulação entre os atores,
que normalmente estão habituados a mobilizar
Palabras-clave: suas competências de maneira independente.
Aprendizaje organizacional. Desarrollo de com- Koening (1994) apresenta as seguintes formas
petências. Aprendizaje interniveles. para ativar o processo de aprendizagem coletiva:
(1) Difusão de competências por meio do traba-
lho interativo e em equipe; (2) Intercâmbio de
experiências com especialistas ou entre domínios
1 INTRODUÇÃO
de competências, por intermédio de reuniões, proje-
As pesquisas sobre aprendizagem nas or- tos comuns ou ainda de maneiras mais informais
ganizações têm se revelado cada vez mais impor- e (3) Coleta de novos conhecimentos, acessíveis
tantes para que se possa não só compreender, aos funcionários.
como também intervir em processos de mudança Pode-se identificar na literatura freqüen-
organizacional. Investigar esse fenômeno envolve tes estudos que investigam a questão da aprendi-
compreender como as pessoas, individual e cole- zagem organizacional e o desenvolvimento de
tivamente, pensam, decidem e agem ao se defron- competências de forma descolada. O presente

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estudo tem como objetivo principal discutir e avan- junto a própria organização. Os gestores foram
çar a etapa de análise e propor uma ampliação selecionados, considerando os critérios: ser parti-
do que se entende por aprendizagem organiza- cipante dos referidos cursos e que estivesse exer-
cional e suas conexões com o desenvolvimento cendo a função de gerência pelo menos há dois
de competências. Isto somente foi possível de ser anos em sua organização, período suficiente para
realizado por se tratar de um estudo longitudinal o sujeito já ter tido contato com as políticas de
que investigou os processos nos níveis individual, recursos humanos e ambiente organizacional.
grupal e organizacional e não somente resultados Foram acompanhados e pesquisados durante o
da aprendizagem. Dessa forma, foi a partir do período de dois anos, 24 gestores da empresa Te-
micronível organizacional (indivíduo e seu grupo) lefonia (segmento de telefonia móvel) - gerências
que se realizou uma análise envolvendo o macro- de RH, Callcenter, Engenharia, Financeiro, Co-
nível organizacional, atribuindo-se destaque aos mercial, Lojas, Jurídico, Quiosques, Administra-
processos e níveis de aprendizagem. Assim, este ção e Operações; 10 gestores da empresa Metal
artigo se constitui de cinco principais seções: (1) a (segmento de máquinas e implementos agrícolas)
metodologia empregada; a apresentação e análise pertencentes às áreas de Planejamento, Financei-
dos resultados simultaneamente associados à lite- ro, Comercial, Exportação, Engenharia, Custos,
ratura sobre o assunto (2) a análise dos ciclos de Compras, RH, Produção e 09 gestores do caso
aprendizagem (processos); (3) a análise da cria- ALFA pertencentes a diferentes e áreas de atua-
ção de conhecimento (níveis), (4) a apresentação ção e empresas dos segmentos de Petroquímica,
de uma proposta de noção de aprendizagem orga- Ensino Superior e de Línguas, Médico-Hospita-
nizacional e o desenvolvimento de competências lar, Agronegócios, Construção Civil, Metalurgia
por interníveis; e (5) encerra-se com proposições e Comércio.
para estudos futuros e considerações finais. Na investigação, foram adotados recursos
metodológicos da grounded theory. Essa aborda-
gem metodológica visa a construção de teorias em
2 O ESTUDO E A METODOLOGIA
pesquisa qualitativa. Assim, foram empregados os
A pesquisa desenvolvida caracteriza-se métodos de comparação constante e de
como um estudo exploratório de natureza predo- codificação dos dados para captar a essência dos
minantemente qualitativa, construído a partir de fenômenos estudados dando sentido aos dados
um desenho longitudinal (dois anos). Teve como (STRAUSS; CORBIN, 1990). Trata-se de um
unidade de análise o gestor e constituiu-se de três procedimento que, ainda no levantamento, ad-
etapas - inicial, intermediária e avançada –, o que mite passos de construção de conceitos – princi-
permitiu cortes profundos para uma análise pro- palmente indutivos – e teorias. Para Mayring
cessual do tema investigado. (2002) a grounded theory parte da suposição de
O estudo investigou como ocorre o de- que o pesquisador, durante a coleta de dados,
senvolvimento de competências gerenciais dos desenvolve, aprimora e interliga conceitos teóri-
participantes de programas de especialização e cos, construtos e pressupostos, de tal maneira que
mestrado profissional em administração no âm- levantamento e análise se sobrepõem. A principal
bito de uma Universidade Pública e os processos técnica para coleta de dados em diferentes mo-
de aprendizagem implicados. Os entrevistados mentos no campo foi a entrevista em profundi-
participavam de duas modalidades de curso: de dade. “O campo de aplicação clássica da grounded
especialização e mestrado profissional in company theory é a pesquisa na qual o próprio pesquisador
(Caso I – Telefonia e Caso II – Metal) e de cursos está envolvido, geralmente por meio da observa-
abertos1 (Caso III – ALFA). O desenho do curso ção participante” (MAYRING, 2002, p.106).
da empresa Telefonia era diferenciado dos demais, Dessa forma, também foram utilizadas as técni-
pois se solicitava o desenvolvimento de projetos cas de observação participante acerca da interação

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e atuação dos alunos em workshops e a realização juntamente com outras três do mesmo segmento
de grupos de foco, perfazendo um total de 130 de atuação. Os gestores da Telefonia já possuíam
horas. Esses métodos foram empregados para in- antes da fusão um estilo de atuação voltado para
vestigar quais competências foram desenvolvidas a questão das melhorias, modificando as regras e
e quais os processos de aprendizagem envolvidos procedimentos existentes (aprendizagem de ciclo
- formais e informais - na percepção dos gestores. simples). Em determinados momentos, na fase
O objetivo era responder ao questionamento: Como seguinte a de implantação até a primeira troca de
ocorre o processo de intercâmbio entre as práticas acionistas chegaram a transitar pelo ciclo de apren-
informais e formais de aprendizagem no processo de dizagem duplo; (a) realizando mudanças também
desenvolvimento de competências numa dimensão nos insights (teorias, conhecimentos, opiniões, argu-
individual e coletiva? No decorrer do levantamento mentos) subjacentes às regras; (b) desenvolvendo
de dados, gerou-se um referencial teórico que foi mudanças em um maior nível de profundidade e
sendo modificado e complementado. Ao exami- abrangência; (c)muitas vezes originando confli-
nar quais competências poderiam estar sendo tos entre indivíduos e departamentos; (d) numa
desenvolvidas, houve preocupação em se investi- postura de maior proatividade (preventiva) do que
gar e analisar qualitativamente aspectos relacio- corretiva, principalmente na área de engenharia,
nados aos processos de aprendizagem. Em fase perguntando o porquê das regras (SWIERINGA;
posterior, a análise dos dados foi apresentada aos WIERSDISMA, 1995). Contudo, no ritmo ace-
sujeitos pesquisados, com a finalidade de certificar lerado de mudanças, a própria troca de acionistas
se as descobertas eram coerentes com a realidade. da empresa e um considerável corte de recursos
A teoria gerada foi também confrontada com a financeiros, fez esse movimento continuamente
literatura pertinente ao tema de pesquisa a fim de oscilar para o ciclo simples de aprendizagem, envol-
identificar os contrastes e contribuições. vendo a descoberta e correção de erro dentro
de um conjunto de variáveis administrativas e
mudanças de natureza mais incremental, na ten-
3 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE tativa de obter feedback rápido e na seqüência
DOS RESULTADOS realizar ajustes rápidos sobre as situações impre-
vistas e indesejadas (ARGYRIS; SCHÖN, 1978).
3.1 Os processos de aprendizagem organizacional Após a consolidação da fusão, os gestores
Considerando a amplitude e a profundi- passaram a questionar princípios essenciais sobre
dade dos dados coletados no período de 24 me- os quais se fundamentava a empresa: a posição
ses, tornou-se possível realizar uma análise mais que organização ocupava no ambiente externo, o
fidedigna dos processos (ciclos) de aprendizagem tipo de empresa que queria tornar-se, sua identi-
organizacional (ARGYRIS; SCHÖN, 1978 ; dade e suas competências organizacionais. As ins-
CROSSAN; LANE; WHITE, 1999 ; KOLB, tâncias de tomada de decisão de maior porte e
1984; SWIERINGA; WIERSDISMA, 1995); processos nobres da empresa foram transferidos
a criação de conhecimento (NONAKA; para a matriz que se localizava em outro estado,
TAKEUCHI, 1997) e competências individuais, não permitindo que estabelecesse um processo de
gerenciais e organizacionais (LE BOTERF, 1999; “ruptura e desenvolvimento, impedindo assim, a
RUAS, 2001; SANDBERG, 2000) no Caso I, geração do ciclo de aprendizagem triplo”
complementados pelos casos II e III. (SWIERINGA; WIERDISMA, 1995). Com a
As competências essenciais definidas e realização dos cursos in company, houve um mo-
perseguidas pela Telefonia eram: Gestão do Negó- vimento e esforço dos gestores e estes passaram a
cio, Sensibilidade ao Cliente, Prontidão Para retomar o ciclo duplo de aprendizagem. Para ilus-
Mudanças e Gestão Humana do Trabalho. Após um trar isso, se apresenta um exemplo a partir dos
ano do início deste estudo, a empresa foi adquirida projetos desenvolvidos na figura 1.

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Figura 1 – Exemplo de ciclos da aprendizagem.


Fonte: Elaborado a partir de dados coletados de Argyris e Schön (1978) e Swieringa e Wierdisma (1995).

A aprendizagem organizacional em seu E 7 – Eu acho que foi que mudou na ca-


nível mais básico recorre à aquisição de compre- beça de todo mundo, porque antes era
ensão, experiência, técnicas e práticas que são em vamos botar cliente, e isso foi uma das
algum grau novas para a organização, tais como: coisas que a gente falou muito, do valor
reposicionamento da área de Marketing em relação do cliente. Foi uma coisa no momento
à proximidade ao cliente; o redimensionamento adequado, a gente pensou, refletiu, o cli-
do sistema de atendimento a clientes no callcenter; ente é importante, mas também tem que
novas práticas de avaliação e estabelecimento de ser efetivo.
indicadores. A aprendizagem se manifestou em
novos pensamentos e ações, mudanças de com- Para Argyris e Schön (1978), a aprendiza-
portamento e atitudes e visões subjacentes e, no gem de ciclo simples é uma forma de aprendiza-
redesenho de práticas e processos organizacionais. gem instrumental O relato acima exemplifica a
O sucesso da aprendizagem organizacional mos- mudança de variáveis governantes, abrangendo
trou-se dependente da habilidade de seus gestores uma mudança na direção estratégica e a revisão
e equipes para perceber as coisas de diferentes for- dos sistemas. Os gestores procuraram ampliar os
mas, obter novos insights e compreensões (princi- resultados através da captação de clientes sem
palmente a noção de foco no cliente), adotar no- muitos critérios, não estavam até certo ponto vol-
vos padrões de comportamento, estratégias para tados para descoberta e correção de erros em per-
captação e manutenção de clientes rentáveis a lon- seguição a metas presentes dentro de estruturas
go prazo. (ARGYRIS; SCHÖN, 1978) existentes. Em contraste a esta aprendizagem de

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repetições se tem a de duplo ciclo, de caráter não balho em equipe” ou “a equipe anterior que eu
rotinizado e baseada em processos cognitivos. gerenciava desta forma funcionava” - e uma outra
consistente com o que eles faziam (teoria em uso)
E8- A gente utiliza o erro como uma opor- – “centralização das informações e da tomada de
tunidade de crescimento. Isso sempre foi decisão”. A fim de realizar melhores escolhas so-
o foco, sempre que tem o erro, nós erra- bre as ações a serem tomadas, os gestores precisa-
mos aqui, mas onde é que a gente pode ram conhecer sua teoria em uso, pois esta tratava
melhorar. O que a gente não fez, ou o que das regras que governavam o seu comportamento
deveria ter feito ou ter olhado pra que esse – no caso muito controle e pouca autonomia e
erro não ocorresse. Só que no início, como responsabilidade para sua equipe de trabalho. Á
a rede era nova, tem implantação, proble- medida que o curso e os projetos lhe oportunizaram
ma de qualidade, trabalhamos durante o questionamento, a reflexão e o diálogo conse-
muito tempo na reação, correndo atrás das guiram aproximar-se de suas teorias esposadas (re-
coisas. Mas de um ano e meio pra cá, quan- gras sobre as quais os gestores acreditavam basear
do se conseguiu efetivamente trabalhar seu comportamento) e passaram a ter maior con-
na prevenção. Baixamos de 30% de hora fiança, a compartilhar informações e ouvir suas
extra do pessoal de campo para 8. Se con- equipes e a construir decisões em conjunto.
seguiu inclusive mensurar isso. Argyris e Schön afirmam que as teorias em
uso são desenvolvidas por variáveis governantes -
Aprendizagem de duplo ciclo resultou em valores aceitos pelo indivíduo e que determinam
mudanças nas estruturas mentais subjacentes dos suas estratégias de ação. Por exemplo: E20 - “as
gestores tais como: teorias em uso (forma mais pessoas são passivas tenho que dizer o que devem
centralizada para mais flexível de gerir equipes); fazer”- essa estratégia de ação terminava sendo
suposições - “está funcionando bem assim”, “cli- reforçada no dia-a-dia de trabalho, pois os resul-
ente tem que ser atendido rapidamente”- para: tados terminavam sendo alcançados, ou seja, as
(a) associação de atendimento rápido com quali- ações tomadas geraram conseqüências que
dade casado com venda; (b) das estratégias realimentavam o julgamento das estratégias de
organizacionais (de “marketing distante para pró- ação. Quando as conseqüências das ações vão de
ximo ao cliente”) e de normas (redimensiona- encontro às expectativas, surge uma necessidade
mento de controles, procedimentos e indicado- de mudança que pode acontecer de duas formas
res utilizados); e (c) as formas nas quais foram diferentes relacionadas aos conceitos de aprendi-
construídas as competências e ambientes. Pelo zagem de ciclo simples e ciclo duplo. Na primei-
surgimento e mudança de teorias variáveis em uso, ra, o resultado da ação é analisado apenas em ní-
a aprendizagem de ciclo duplo conduziu a troca vel das estratégias de ação. Porém, não se questio-
transformacional para a franqueza, flexibilidade nam as variáveis que guiam tais ações (E17: “se
e autonomia das equipes de trabalho. Ainda de minha equipe é composta de pessoas passivas não
acordo com Argyris e Schön, as pessoas possuem questiono porque”). A aprendizagem em ciclo
em suas mentes mapas sobre como devem plane- simples consiste em não se desafiar ou questionar
jar, implementar e avaliar suas ações. No entan- os pressupostos mais arraigados dos indivíduos.
to, poucas pessoas estão conscientes que os ma- Salienta-se que este tipo de aprendizagem é ineficiente
pas que usam em suas ações são diferentes das em uma situação de mudança organizacional, pois
teorias explicitamente assumidas. O curso de es- resolve apenas aparentemente a questão e porque
pecialização e mestrado in company e o desenvol- não questiona as causas do problema.
vimento de projetos permitiu a externalização, o
compartilhar e rever estes modelos mentais. Exis- E12 - E aí com o trabalho em cima do
tia uma teoria consistente na qual os gestores projeto eu comecei ver, mas só um
verbalizavam (teoria esposada): – “acredito no tra- pouquinho, se eu fizer uma coisa de for-

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ma estruturada, onde em vez de eu ficar prol de alguma coisa, enfim, tu tens uma
berrando daqui o que eu quero e fizer o parte. Porque MKT fez a sua parte, por-
pessoal começar a pensar nisso, será que que o callcenter fez a parte dele , e porque
eu não vou ter o resultado que eu espero? garantia de receitas fez a sua parte, garan-
Comecei me dar conta. Apareceu um tindo a qualidade. Então eu diria, me des-
monte de coisas, de trabalhar diferenças, pertou muito mais a visão sistêmica da
tem pessoas que não têm o mesmo tipo coisa. Despertou essa coisa de ver que um
de conhecimento, de trabalhar com pla- fato não é isolado, e me desenvolveu esse
nejamento. E aí a equipe se envolveu, co- lado de poder olhar, por que isso tá acon-
meçou a dar resultado, em vez de eu ficar tecendo? Tem que ter outro reflexo.
berrando aqui de cima o que eu queria,
eles começaram a participar mais. Enquanto as atividades do ambiente de
trabalho, no caso os projetos, tomaram parte do
Já quando na aprendizagem de ciclo du- contexto dentro do qual aprendizagem acontece,
plo houve a preocupação em revisar as variáveis o processo de aprendizagem não iniciou ou pa-
governantes. Neste caso a aprendizagem foi mais rou formalmente (WATSON; HARRIS, 1999).
efetiva uma vez que o gestor questionou alguns O que se percebe analisando o caso I é que a apren-
modelos mentais que governavam suas decisões e dizagem organizacional requer processos formais
as suas ações. Como resultado, houve uma maior ou informais e estruturas pelas quais a aprendiza-
conscientização quanto ao processo de tomada de gem possa ser empreendida e então, difundida e
decisões. Nessa aprendizagem de ciclo duplo, transferida entre os indivíduos e grupos e, isto
houve um processo de questionamento sobre as ocorreu pela articulação dos cursos in company
causas dos problemas, auxiliando o gestor a to- com as práticas de trabalho. Enquanto processos
mar atitudes mais efetivas sobre a realidade. Os e resultados da aprendizagem individual são con-
questionamentos foram feedbacks que lhe permi- dições prévias para aprendizagem organizacional
tiram rever as regras de comportamento que go- (PROBST; RAUB; ROMNHARDT, 2002 ),
vernam as ações. Exemplo de rotinas defensivas aprendizagem individual pode se dissipar se não
que surgiram entre a etapa de reflexão e a etapa for compartilhada em nível de grupo e inserida
de formação dos conceitos, durante os workshops em nível organizacional nos sistemas, estruturas,
desenvolvidos nos cursos (exercício em pequenos estratégias e rotinas (LUNDBERG, 1995).
grupos) foram: “Isso eu já sei; Isso é muito com-
plexo; Tenho pressa, urgência; Na prática é dife- E7 – Tinha pessoas tipo do callcenter que
rente; Qual a utilidade disso?; O que eu ganho eu conhecia quando muito por telefone,
com isso?; Isso é óbvio; Isso é muito acadêmico; não tinha contato direto. Isso foi uma das
Já vimos isso ontem ”. Um dos questionamentos grandes aprendizagens. O trabalho do pro-
que impulsionou o processo de transição do ciclo jeto é um dos co-responsáveis por a gente
de aprendizagem simples para o duplo, foi de obter estar mais unido hoje. Porque a gente sen-
uma visão sistêmica da organização, a partir das tava todo mundo junto, trocava idéias,
discussões nos workshops. Os participantes foram vimos a gente trabalha junto, não somos
levados a se questionar e refletir sobre sua entrega inimigos, nós temos o mesmo objetivo,
(DUTRA, 2001) em diversos momentos. isso foi super importante, essa troca. Por-
que tem pessoas que ficam fisicamente em
E3- O que a tua área entrega sabe? Para locais diferentes, que não interagem nun-
que existe garantia de receitas na minha ca. A engenharia é uma área que não
empresa?” Então me despertou isso, qual interage nunca. A gente teve oportunida-
é a entrega da minha área? Tu tens que de de ver como eles trabalham, como fa-
saber o que tu faz. Tudo tem que ser em zem, como o trabalho deles reflete no teu

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trabalho, esse foi um momento muito rico mediante adaptações progressivas de novas idéias
do curso. Aumentou o inter relacionamen- ou propostas - “memória coletiva organizacional”;
to das áreas, a capacidade de interagir com e (b) aprenderam com os projetos postos em prá-
as áreas distantes. tica. Portanto se o primeiro processo permitiu
certa estabilidade na organização, dada pela sua
Tal aprendizagem tornou-se real e objeti- cultura organizacional e pela sua própria história
va quando se manifestou em uso como a teoria coletiva de modos de atuar (gerir a experiência),
da organização (LUNDBERG, 1995); da mesma os projetos em que se envolveram os gestores,
forma a aquisição de conhecimento, a distribui- possibilitaram a sua regeneração e a aprendiza-
ção e interpretação da informação (ARGYRIS; gem pela experiência prática. Um e outro depen-
SCHÖN, 1996). O que também ocorreu na Te- dem, em grande parte, das redes de colaboração
lefonia - fato comum de acordo com Argyris e que existem entre os seus membros, visto que,
Schön - é que a empresa não estava no seu todo sem um intercâmbio de experiências e ideais, o
atuando num mesmo ciclo de aprendizagem. Isso centro como instituição terá poucas possibilida-
é intensificado pelo fato de alguns gestores não des de mudança. No relato a seguir ficam eviden-
terem participado dos cursos e outros que parti- tes estes aspectos, onde de acordo com o gerente
ciparam não revelaram mudança em seus mode- de recursos humanos os funcionários que pedi-
los mentais, gerando certas disparidades no dia- ram demissão ou foram demitidos da empresa,
a-dia da organização. permaneceram de alguma maneira impregnando
Alguns relatos permitiram identificar que a cultura da organização.
o nível mínimo de aprendizagem, que é o de su-
perfície e de utilidade imediata, não tem longa E9 - Algumas coisas foram embora com
duração ou implicações de desenvolvimento. O as pessoas. Outras ficaram. O estilo de ad-
nível seguinte - assimilativo - aconteceu quando ministrar ficou. Isso não sai. Fora algumas
o comportamento foi incrementalmente modifi- características pessoais, o que é natural de
cado para retificar erros numa situação específica cada gestor, o “jeitão” de administrar fi-
e assim, satisfazer as metas e valores existentes, cou, mas ficou porque já tava sedimentado
denominado ciclo simples (ARGYRIS; SCHÖN, por outras políticas ou por outras práti-
1978) ou aprendizagem adaptativa (SENGE, cas. Alguma coisa mais especifica de cada
1990). Aprendizagem generativa ou de ciclo du- área provavelmente foi junto com a pes-
plo, por contraste, envolveu um maior grau de soa, mas porque daí era conhecimento
reflexão e questionamento de valores subjacentes, dela. A administração do negócio, a ges-
percepções e teorias em uso do indivíduo. Este tão dos processos principais das áreas, to-
nível requer “olhar para trás” e um empreendi- dos esses permaneceram, em todas as áre-
mento reflexivo crítico para promover uma mu- as. O que a gente perdeu mesmo foi a pos-
dança mais fundamental (ARGYRIS; SCHÖN, sibilidade de desenvolver esses processos
1978). Alguns gerentes (conforme figura 1) con- que ficaram com aquela pessoa que já do-
seguiram modificar ou desenvolver sua forma de minava.
aprender, a tirar suas lições de experiência a partir
dos projetos, aprender a aprender e mobilizar os Os conceitos de memória e reflexão tam-
recursos de competência. bém são importantes. Aprendizagem ao ser dis-
De acordo com Walsh e Ungson (1991), cutida, não só envolveu aquisição de conhecimen-
conceber a empresa a partir da noção de aprendi- to, mas também o uso de memória para armaze-
zagem organizacional implica que se construa o nar o conhecimento que foi adquirido. Por me-
seu conhecimento a partir de dois processos que mória e reflexão, os indivíduos geraram modelos
puderam ser evidenciados na Telefonia. Seus gestores mentais que estruturaram o pensamento e a ação.
(a) aprenderam com a experiência acumulada, Desse modo, estabeleceram sentido do mundo;

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categorizam nova informação ou conhecimento, dizagem implica na criação de condições estrutu-


avaliaram suas conseqüências, consideraram o que rais que a tornam possível, onde as pessoas pos-
fazer e então entraram em ação (CROSSAN; sam estar disponíveis, em termos de atitudes, para
LANE; WHITE, 1999). aprender em contextos de trabalho, tanto geran-
Enfim, pode-se dizer ocorreu aquisição de do e fazendo o intercâmbio de conhecimentos a
conhecimentos, desenvolvimento de competên- partir da própria prática, como processando social-
cias, correlações ao longo do curso; a partilha des- mente o conhecimento procedente de agentes
ses conhecimentos pela difusão e disseminação do internos ou organizações externas. Os membros
que foi aprendido; o uso da memória de uma organização se comunicam e assimilam
organizacional a partir da experiência anterior, valores, normas, procedimentos durante a interação
inclusive de funcionário que “permaneceram na formal ou informal no trabalho. Assim, qualquer
cultura” da organização; e por fim, a utilização organização conta com processos formais e infor-
destes conhecimentos a partir da integração desta mais e estruturas para adquirir, partilhar e utilizar
aprendizagem disponível, sendo generalizada e conhecimentos e habilidades e estes podem ser
reformulada em novas situações. empregados de forma sistêmica ou não, depen-
Na análise realizada, confirma-se o já consta- derá da organização e de seus integrantes.
tado por Beeby e Simpson (1998) em seus estudos
sobre o assunto. A aprendizagem organizacional 3.2 Criação de conhecimento: o papel do grupo
“sugere a importância de” e o “potencial para”: (1) Diversos relatos dos entrevistados permi-
novas formas de pensar e agir: os gestores relata- tiram concluir que pela interação, talvez muitas
ram novas formas de perceber os contextos inter- vezes incidental, os gestores em seu processo de
no e externo da organização (visão sistêmica), de aprendizagem, adquiriram e desenvolveram for-
melhor perceberem a si próprios (autoconheci- mas explícitas e implícitas de conhecimento. Os
mento) e evidenciaram isso em suas ações; (2) uma gestores utilizaram formas tácitas e explícitas de
transformação de modelos mentais, sistemas de conhecimento ao lidar com assuntos e problemas
valores e estruturas mentais: identificados princi- no seu ambiente de trabalho no cotidiano e em
palmente na análise dos projetos, modelos men- sala de aula. Em diferentes situações, identificou-
tais em relação a equipe; noção de atendimento a se que pela socialização obtiveram um “conheci-
cliente; noção de problema e desenvolvimento de mento compartilhado” – modelos mentais ou
projetos propriamente dito, que institucionaliza- habilidades técnicas compartilhadas (NONAKA;
ram-se; (3) processos de diálogo: oportunizado TAKEUCHI, 1997). Na externalização, ocorreu
pelo desenho de curso que articulava desenvolvi- o conhecimento conceitual, expresso por meio da
mento de competências e aprendizagem; (4) aten- comparação de métodos de trabalho e formas de
ção para o sistema de capacitação e barreiras para solucionar seus problemas. Por meio da combi-
aprendizagem produtiva e a mudança: investimen- nação, surgiu o conhecimento sistêmico que apre-
tos realizados nos cursos; (5) a longo prazo estra- sentou como resultado a geração, por exemplo,
tégias de empowerment: autonomia e responsabi- de novos relatórios de controles estatísticos. Fi-
lidade no período de implantação da Telefonia e nalmente pela internalização deram origem ao
nas equipes no desenvolvimento de projetos. conhecimento operacional, executando as novas
A exposição realizada nesta seção permite atividades, por exemplo, de atendimento ao cli-
dizer que as novas aprendizagens organizacionais, ente. Por fim, estes esses tipos de conhecimento
dependentes da emergência de novos padrões não eram estanques, mas sim dinâmicos,
organizacionais, como a criação de interpretações interagindo entre si.
de fatos e conhecimentos construídos socialmen-
te, tornam-se parte da organização, geradas inter- E12 - Mas a gente podia ver que tinha
namente ou induzidas por agentes externos. Dar muita diferença, primeiro que não tinha
primazia a essa dimensão organizacional da apren- um padrão, tipo os controles estatísticos

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agora são mais padronizados. Eu me ma- nhecimentos vão sendo difundidos de modos di-
tava fazendo uma coisa aqui, e ela se ma- ferentes como parte do processo de aprendizagem
tava fazendo a mesma coisa lá e não exis- organizacional. Conhecimento técnico e habili-
tia essa aproximação. A gente acabou sen- dade, muito do qual é organizado e formulado
tando na mesma mesa e discutindo coisas explicitamente, foi compartilhado mais facilmente
que nos afetavam, em vez de esconder o e difundido subsidiando procedimentos, normas,
projeto. Começamos a discutir as questões, manuais ou estabelecendo rotinas fixas (por exem-
a ver que as dificuldades, base, tipo de plo, os controles estatísticos e estabelecimento de
pensamento, problemas eram os mesmos. indicadores no callcenter).
Começamos a fazer o projeto, nos envol- Por outro lado, o conhecimento e habili-
vemos, vimos que tínhamos soluções para dades envolvidas em relações sociais são mais di-
as mesmas dificuldades. fíceis de articular, diferenciar e difundir. No caso
da Telefonia, o conhecimento que está inserido
Davenport e Prusak (1998) afirmam que nas suposições, crenças e valores da organização
a aquisição de conhecimento está claramente re- (noção de foco no cliente) necessitou de mais tem-
lacionada com o processo de aprendizagem e é po para ser compartilhado, porque é individual e
mais amplo e mais profundo do que a mera acu- coletivamente internalizado (TOMPKINS,
mulação de dados e informação. No caso I, a 1995). Embora já houvesse interações antes dos
aprendizagem surge da tensão entre o novo e o cursos, foi necessário praticamente dois anos
velho conhecimento, e da transformação do co- oportunizando relações pelas quais o conhecimen-
nhecimento presente na memória de seus funcio- to explícito e/ou tácito pudesse ser originado, dis-
nários. Este contexto de aprendizagem acontece cutido e processado pelos indivíduos e grupos, de
quando conceitos, estruturas e capacidades são forma que tal conhecimento se tornasse parte da
criados ou se desenvolvem à luz do conhecimen- teoria em uso (VON KROGH; ICHIJO;
to que é novo ao indivíduo. NONAKA, 2000 ). Além do ambiente
organizacional interno e dos gerentes, os que es-
E9 - Os debates e discussões voltados para a tão envolvidos na cadeia de valor - clientes, for-
estratégia. Os conceitos que eles [profes- necedores, os consultores externos, etc. - também
sores] nos passaram, estão permeando a possibilitaram oportunidades importantes para
organização como um todo. A gente apren- aprendizagem, o que talvez tenha se modificado
deu marketing integrado. Ele conceituou é a forma como os gestores passaram a tratar estes
algo que a gente queria fazer, algo que a eventos como oportunidade de aprendizagem.
gente acreditava. Ele formalizou, susten- Os elementos-chave que facilitaram o
tou algo que a gente achava que era bom e compartilhamento de aprendizagem, além do es-
começamos a praticar. Então esse concei- paço em curso, foram (a) a abertura dos canais de
to de marketing integrado tá aqui, tá instau- comunicação entre gestor e sua equipe; (b) o
rado, já existe. A gente se baseia nele pra redesenho e unificação do callcenter e (c) a trans-
tomar uma série de atitudes, planejar ações. ferência de todos os gestores da área administra-
ção para o mesmo andar do prédio; (d) discussão
A partir da proposta de se estabelecer rela- e revisão de alguns procedimentos e rotinas e o
ções entre os níveis de aprendizagem, utiliza-se a uso de método para planejar-se, permitindo aos
literatura proposta por Kolb (ênfase no individu- membros da organização utilizar a investigação
al), Nonaka (ênfase no grupal) e Crossan (ênfase ao invés de confiar no conhecimento tácito
no organizacional), apresenta-se no quadro (1) um (MARQUARDT, 1996 ; PROBST; RAUB;
exemplo tomado a partir dos relatos dos entrevis- ROMNHARDT, 2002 ; VON KROGH;
tados que participaram dos cursos in company da ICHIJO; NONAKA, 2000). Assim, embora
Telefonia. Observa-se que tipos diferentes de co- com dificuldades, alguns gestores abandonaram

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O Processo de Aprendizagem Interníveis e o Desenvolvimento de Competências

Ênfase
Individual Grupal Organizacional
Nível Kolb Nonaka E Takeuchi Crossan Et Al.

Experiência (experiências concretas): os Intuição: (a) alguns gestores con-


gestores partiram de sua experiência de trabalho seguiam intuitivamente identificar as
que é onde se deparam com novas experiências possibilidades e/ou padrões inerentes
concretas, e transacionam com ela em termos de sua experiência pessoal. (b) No
de novos sentimentos, observações e reações. Socialização: ocorreu nos gerenciamento de suas equipes de
INDI workshops para desenvolvimento trabalho.
VIDUAL de competências; na interação no
Observação Reflexiva (observação e ambiente de trabalho e em sala Interpretação: ocorreu quando os
reflexão): os gestores tiveram oportunidade de de aula durante o curso de espe- gestores em sala de aula procuraram
observar a nova situação quando da elaboração cialização e mestrado facilitando explicar um insight (“cair as fichas”
do projeto. No primeiro momento eles adiciona- o “compartilhamento de expe- como denominam) ou ter algumas
ram ou ajustaram sua percepção baseados na riências e modelos mentais dos idéias para si mesmos e para os
sua aprendizagem anterior. Assim, refletiram membros”. outros.
sobre experiências passadas e passaram a
pensar sobre a experiência corrente com o
projeto como algo a ser tomado como modelo
ou não. Depois realizaram observação cuidadosa
na fase de avaliação dos resultados do projeto.
GRUPAL
Conceituação Abstrata (formação de A externalização foi provocada Integração: é o processo de desen-
conceitos abstratos e generalizações): a medida pelo “diálogo ou reflexão coletiva” volver o entendimento comparti-
que algumas experiências se adaptaram a dos significativos, durante o curso lhado entre indivíduos e a tomada de
um padrão, então os gestores formaram e no desenvolvimento dos pro- ação coordenada por ajuste mútuo.
uma generalização e um conjunto de conceitos jetos, auxiliando as pessoas a Instigados pelo curso estabeleceram
para definir a situação. Por exemplo a unifi- externarem o conhecimento tácito diálogo dentro e fora do ambiente de
cação do atendimento no callcenter. A medida – que, de outra forma, seria mais sala de aula e do trabalho, produ-
que desenvolveram este conceito e generali- difícil de ser transmitido. zindo uma ação em comum até obter
zação, seu pensamento passaram imaginar desenvolvimento do entendimento
outras diferentes experiências concretas que A combinação que surge através compartilhado. Por exemplo, duas
levantaram novas questões, como a possibili- da “colocação do conhecimento gerências de lojas de diferentes
dade de além de atender, vender para o cliente, recém-criado e do conhecimento municípios identificaram que seus
o que exigiu a elaboração e generalização de já existente proveniente de outras problemas eram os mesmos e estavam
outros conceitos. seções da organização em uma sendo tratados de formas diversas,
rede”, quando os gestores utiliza- implicando em muito esforço e
ram o espaço das orientações em dificuldade de cada gestor individual-
grupo nos workshops e a apresen- mente. Este processo foi inicialmente
tação dos resultados dos projetos ad hoc e informal, embora também
ORGANI como meios para combinar ocorresse em ambiente formal. As
ZACIO diferentes conhecimentos . ações selecionadas e coordenadas em
NAL cada projeto, na sua maioria ocorre-
ram periódica e significativamente.

Experimentação Ativa (teste das implicações A internalização trata-se do Institucionalização: processo que
dos conceitos em novas situações, as quais por processo de conversão do conheci- assegura que as ações rotinizadas
sua vez levarão a novas experiências). Alguns mento explícito em tácito. Ela aconteçam. O callcenter, por ex.,
projetos, por exemplo, não foram necessaria- ocorreu quando os gestores foram mantém em andamentos cerca de
mente completos, exigindo novos testes e a campo e colocaram em prática 80% dos projetos desenvolvidos na
aperfeiçoamento, bem como, novas experiên- as atividades propostas por seu ocasião do curso, ou seja, houve
cias concretas, iniciando-se um novo ciclo projeto. institucionalização, pois ocorreu a
inserção da aprendizagem dos ges-
tores e grupos dentro da organiza-
ção e incluiu sistemas, estruturas,
procedimentos e estratégia.

Quadro 1 – Quadro com exemplo das relações entre Kolb, Nonaka e Crossan.
Fonte: Elaborado pela autora a partir da literatura.

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alguns comportamentos e suposições para permi- Esse aspecto condiz com o que Locke e Jain
tir o desenvolvimento de novas teorias em uso. (1995) comentam sobre os fatores que podem
Cabe dizer, neste momento, que em vez impedir a aprendizagem individual de propagar-
de olhar para aprendizagem no trabalho em ní- se pela organização: incluem políticas organiza-
veis diferentes, profissionais ou de hierarquias cionais e procedimentos e a falta de uma massa
organizacionais, eles têm que ser vistos como pro- crítica com novas competências para trabalharem
cessos entrelaçados entre si. Nesses processos, a juntas para mudança. No caso I embora surjam
aprendizagem está conectada aos contextos de tra- conflitos para superar estas barreiras, há um nú-
balho. Os processos reflexivos são instrumentos mero suficiente de pessoas capacitadas, com co-
para explicar e produzir conhecimento implícito nhecimento e liderança para aplicação da nova
contido nos contextos. Isto também significa que aprendizagem. O diálogo entre gestores como o
não é possível entender aprendizagem somente elemento-chave, encorajou-os a pensarem juntos
como uma construção de conhecimento formal. e no processo, aliviando perturbações que podem,
por outro lado, limitar a aprendizagem no nível
3.3 Processo interníveis da aprendizagem individual (ROMME; DILLON, 1997).
organizacional e as competências Da forma como transcorreram os proces-
A natureza da relação entre a aprendiza- sos de aprendizagem na Telefonia, pode-se, a par-
gem individual e organizacional é um tema de tir deste estudo, propor uma noção de “processo
relevância neste estudo. Observa-se que no Caso dinâmico de interníveis” para aprendizagem
da Telefonia o desenvolvimento de projetos no organizacional. Considerando a aprendizagem
ambiente organizacional e a interação em sala de organizacional como a capacidade ou processos
aula favoreceram a obtenção dos efeitos necessá- dentro de uma organização para manter ou me-
rios entre estes níveis. A aprendizagem individual lhorar o desempenho baseado em experiência e,
foi inicialmente compartilhada em grupos e por sendo ela construída e interpretada como um fe-
comunicação, por meio de processos institucionais nômeno sistêmico que vai além da aprendizagem
para transferir o que é aprendido pelos indivídu- dos indivíduos, pode-se identificar quatro níveis
os para a organização e o reverso, bem como, para de complexidade - níveis individual, equipe/
armazenar e acessar o que é aprendido grupal, interáreas e organizacional - que impactam
(CROSSAN; LANE; WHITE, 1999 ; no desenvolvimento da aprendizagem na organi-
LUNDBERG, 1995). O que também se obser- zação (figura 2). E, além disso, pode-se propor a
vou é que, mesmo ocorrendo certa disparidade noção de aprendizagem organizacional: como um
entre os gestores que participaram do programa processo contínuo e sistêmico em interníveis (in-
de desenvolvimento gerencial, por intermédio dividual, grupal, interáreas e organizacional) de
através dos cursos alguns mecanismos foram se apropriação e geração de novos conhecimentos,
instalando para suprir esta defasagem, conforme envolvendo todas as formas de aprendizagem -
relato do gestor de recursos humanos: formais e informais – no contexto organizacional;
alicerçado numa dinâmica de reflexão e ação so-
E11- Como tinha essa distância entre os bre as situações-problema e voltado para o desen-
gestores que estavam no desenvolvimento volvimento de competências gerenciais e
de gestores e os que não estavam, em algu- organizacionais.
mas situações faltava conceito. E aí iam para Aqui aprendizagem envolve um “fluxo de
discussão, um falava uma coisa, dois enten- mudança” pelos níveis individual, de equipe/grupo,
diam, um não entendia. Acabava que as interáreas e organizacional que é altamente depen-
pessoas tinham que explicar, não é o mais dente da administração efetiva da atividade de
estruturado, não é o mais indicado. Mas internível. É um processo cíclico de quatro fases
funcionava, porque senão a pessoa que já inspirado em Kolb (1984) - experimentação; obser-
tem o conceito não consegue discutir. vação/reflexão; conceitualização; e experimenta-

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O Processo de Aprendizagem Interníveis e o Desenvolvimento de Competências

Figura 2 – Aprendizagem nas organizações – interníveis.


Fonte: Elaboração própria

ção ativa - que combina ação e conceitualização sistema de operações (cobertura do sinal). O cui-
quando empregado em questões de mudança. Em dado exigido é o esclarecimento e o desfazer-se
cada um dos níveis ocorrem diversos ciclos de estereótipos normalmente identificados nas
experienciais e ao interagir com outros interníveis organizações (vendas não considera capacidade de
são gerados novos ciclos experienciais. produção; administração só tem procedimentos
Num primeiro nível, é necessário que o burocráticos impedindo atendimento ágil aos cli-
indivíduo mova-se pelas fases do ciclo de aprendi- entes, dentre outros). Ou seja, a aprendizagem
zagem, refletindo sobre e estando aberto a experiên- neste nível é particularmente propensa a distorção
cias, prestando atenção consciente em pensamen- pelos efeitos de dinâmica de intergrupo negativa,
tos internos e sentimentos quando frente a situa- onde distinções rígidas entre grupo e exterior do
ções e eventos. Um segundo nível de aprendizagem grupo são sustentadas por estereótipos positivos
em grupo envolve dar atenção para ambas ques- de si e estereótipos negativos de outro(s) (basea-
tões, de conteúdos que estão relacionados à tarefa do em CROSSAN; LANE; WHITE, 1999 ;
e processar questões da dinâmica de grupo - como NONAKA; TAKEUCHI, 1997).
essas se desenvolvem e impactam na coesão do Por fim, o nível de aprendizagem
grupo por intermédio do diálogo; é onde ocorre organizacional requer a integração dos níveis de
a difusão e compartilhar de competências indivi- aprendizagem 1, 2 e 3 sobre como aprender a res-
duais (baseado em ARGYRIS; SCHÖN, 1978; peito do ambiente externo e da estratégia
NONAKA; TAKEUCHI, 1997; SENGE, 1990). organizacional. Em todos os níveis a aprendiza-
Na aprendizagem de terceiro nível do gru- gem é habilitada ou inibida na medida em que
po interáreas, volta-se a atenção para os efeitos de indivíduos, em equipes ou pelo grupo interáreas,
perspectivas culturais no processo e conteúdo de se empenham ou não na exploração conjunta de
aprendizagem e estabelecem-se, em alguns casos suposições e modelos mentais (baseado em
competências ditas específicas de cada área. Por ARGYRIS; SCHÖN, 1978; CROSSAN; LANE;
exemplo, a competência funcional da área de WHITE, 1999;).
MKT é a de otimizar segmentação de produtos e Observa-se que o curso instigou os gestores
serviços e construir rede de relacionamento, dife- ao processo de questionamento e reflexão e a pos-
rente da competência funcional da área de enge- sibilidade de comunicação e troca entre seus par-
nharia que é a de garantir o funcionamento do ticipantes. Portanto, uma das condições para que

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este processo ocorra é que os indivíduos estejam a) a importância de não se negligenciar o


atentos a eficácia do diálogo (SCHEIN, 1993) contexto social da aprendizagem onde os
como dos uns meios práticos de transformar rela- indivíduos estão inseridos, considerando
ções adversas em relações mútuas, alterando os suas relações e preocupando-se em não
modos das pessoas de pensar e agir nos seus siste- estabelecer rupturas entre o conhecimen-
mas e de facilitar a evolução de modelos mentais to e a ação (RAELIN, 1997; RICHTER,
compartilhados e processos de pensamento que 1998). Isto possibilita que a ação, neste
são perpassados por sub-culturas organizacionais. caso, em que se conjugaram as dimensões
Evidenciando assim, que a teoria e prática de diá- individual, grupal, interáreas e organiza-
logo são meios importantíssimos na facilitação da cional seja analisada a partir de novos ní-
aprendizagem nas organizações. veis de complexidade;
Seguindo ainda a linha de pensamento de b) a conexão dos conceitos de aprendizagem
aprendizagem organizacional como um processo organizacional e difusão/disseminação,
internível dinâmico, pode-se também representar quer dizer que a aprendizagem coletiva
esta noção como uma rede de níveis de aprendi- trata-se também da difusão de competên-
zagem que são sistematicamente interdependentes cias do indivíduo para os membros do
por um padrão complexo e fluido de transações de coletivo (nível grupal) pelo comparti-
mão-dupla, com entradas e saídas e ciclos de feedback lhar (NONAKA; TAKEUCHI, 1997).
(CROSSAN; LANE; WHITE, 1999). Conforme O que aumenta a capacidade da organiza-
Tompkins (1995), a representação não-linear do ção para entrar em ação efetiva gerando
processo de difusão pode requerer muitas repeti- novas competências individuais, fun-
ções completas ou ciclos para que a aprendizagem cionais e organizacionais. Desta pers-
coletiva possa acontecer, assegurando a aprendi- pectiva: aprendiza-gem coletiva é igual
zagem entre todos os níveis do modelo proposto. a compartilhar e disseminar competên-
Por fim, para esta noção de interníveis também cias mais a capacidade ampliada para
se deve considerar dois aspectos fundamentais: entrar em ação efetiva.

Foco Valorização (classificação a partir de Gubman,1998) Segmento Empresa Empresa

Clientes Relacionamento Telecom Telefonia

Clientes Relacionamento Ensino Superior Ensinar

Clientes Relacionamento Ensino Línguas Línguas

Clientes Relacionamento Médica Medicare

Clientes Relacionamento Comércio Vestir

Operações método, resultados concretos Construção Civil Arquitetura

Operações método, resultados concretos Petroquímica Petros

Produto Inovação Máquinas Agrícolas Metal

Produto Inovação Agronegócios Agro

Produto Inovação Moto-serra Motor

Produto Inovação Metal-Forjas Metal

Quadro 2 – Entrevistados do caso II – Metal e caso III – ALFA.


Fonte: Dados empíricos.

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O Processo de Aprendizagem Interníveis e o Desenvolvimento de Competências

4 SUGESTÃO PARA ESTUDOS FUTUROS e os ciclos de aprendizagem. No quadro 2 apre-


senta-se a relação das empresas de cada gestor
Enquanto o Caso I possibilitou se obter entrevistado, além da Metal e da Telefonia, seus
algumas considerações, as informações e análises respectivos segmentos e focos de negócio.
obtidas a partir dos Casos II e III permitem le- Examinando as evidências do comporta-
vantar algumas questões para estudos futuros so- mento gerencial e organizacional e as suas relações
bre a possível relação entre as competências e os com os ciclos de aprendizagem, levanta-se a possi-
níveis de aprendizagem organizacional. Conside- bilidade de melhor avaliar que tipo de aprendiza-
rando que nas entrevistas em profundidade reali- gem sustenta ou propicia algum tipo de competên-
zadas com os gestores foi solicitado além de uma cia, pois cada ciclo de aprendizagem organizacional
autobiografia profissional que descrevessem a or- termina refletindo um conjunto de processos e roti-
ganização a qual estavam vinculados; relatassem nas adotado pela organização e seus gestores (FIOL;
situações de mudança que tivessem de alguma LYLES, 1985). Se as conexões entre os ciclos de
forma impactando no negócio e nas pessoas; ações aprendizagem organizacional e desenvolvimento
de desenvolvimento e práticas de trabalho; com- de competências forem identificadas, isto traria
petências requeridas pela organização entre ou- maiores implicações para a formação de competên-
tros aspectos, isto oportunizou uma série de sub- cias organizacionais e para o desempenho da orga-
sídios, que de certa forma, possibilitam aqui pro- nização. A partir das entrevistas foi possível identi-
por uma análise, mesmo que incipiente, sobre as ficar alguns tipos de orientação para aprendizagem,
possíveis conexões entre competências gerenciais que serão apresentadas a seguir, vide quadro 3.

Organização
Características
Orientada para

1. Mudanças simples z A habilidade para mudança é básica e ad hoc porque a aprendizagem ocorre principalmente por meio
da experiência em pequenos passos e avanços incrementais.
2. Estrutura z Sistemas e procedimentos são primordiais para auxiliar a empresa a aprender e crescer cultivando
uma base para prescrever como fazer melhor as coisas.
z Qualquer mudança mais significativa é reativa.
3. Eficiência z No gerenciamento as pessoas começam a reconhecer a necessidade de melhorar a eficiência para
resolver problemas relativos a fazer as coisas de forma correta.
z A produção aumenta por causa da melhoria da eficiência e esforços de eficiência orientados para
maior aprendizagem.
4. Valor z Através do reconhecimento que a aprendizagem passada está baseada num ciclo simples de
aprendizagem, as pessoas começam a questionar o sistema presente perguntando “por que”.. Isto
conduz a incongruências do sistema presente porque existem crenças que serão alteradas.
z A mudança virá de um maior engajamento e proatividade para inovação e melhoria incremental,
criando valor agregado da mudança de processos.
z Ambos, gerentes e funcionários estão orientados para aprendizagem e a visão de mundo é
constantemente modificada.
z A empresa começa a colocar maior prioridade sobre sistemas de pensamento e geração de novo
conhecimento passa a ser importante.
5. Dinâmica de z Mudança passa a ser uma forma de vida como cultura da empresa.
Aprendizagem z Questionamento crítico e reflexão são comuns.
z Aprendizagem é caracterizada pela forte alteração da noção de capacidade do indivíduo para a de
grupo. As equipes e o ambiente interno são dinamicamente integrados.
z Pensamento sistêmico é comum e, inovação e criação de conhecimento são muito valorizados.

Quadro 3 – Tipos de orientação para aprendizagem.


Fonte: Elaborado pela autora a partir de dados coletados.

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A partir dessas categorias, procurou-se lo- ciclos diferentes. O quadro é no sentido de


calizar cada uma das empresas representadas pe- elucidar as possíveis conexões aqui propostas.
los entrevistados e relacionar com as competênci- Da mesma forma, as orientações sugeridas
as transversais desenvolvidas a partir dos cursos para aprendizagem são as que emergiram dos en-
(quadro 4). Evidentemente essas competências trevistados, certamente em outras empresas po-
não são universais e tão pouco generalizáveis, a derão ser identificadas novas orientações. Cabe
idéia é desenvolver um tipo de raciocínio que ins- ainda ressaltar que conforme Weick ( 1991), a
tigue estudos futuros. Pelo quadro proposto ob- capacidade de uma organização para responder
serva-se que a passagem de um ciclo para o outro ao ambiente será dependente de sua capacidade
pode ser gradual, e ainda, esta classificação não de percepção, do processo de exploração e sua
necessariamente representa toda a empresa, mas capacidade de resposta. Conseqüentemente, o
uma ênfase, algumas áreas podem situar-se em esquema de uma organização ou visão de mundo

Ciclo Apren- Orientação da


EMPRESAS COMPETÊNCIAS DESENVOLVIDAS
dizagem Aprendizagem

1. Orientada Metal Desenvolvimento de competências não ocorre num planejamento


p/ mudanças seqüencial, pois qualquer tomada de decisão é mais flexível por não
simples existirem procedimentos e sistemas.

SIMPLES 2. Orientada Metal – grupos de COMPETENCIAS TÉCNICAS


para Estrutura melhorias 1. Conhecer Processos e atividades da empresa
2. Conhecer e saber como e quando aplicar ferramentas
3. Conhecimentos específicos e gerais em sua área de atuação
4. Capacidade de rever conceitos

COMPETENCIAS DE GESTÃO - Capacidade para:


3. Orientada Metal – Times da 1. Estabelecer objetivos
Para Eficiência Qualidade 2. Questionar Entrega – Atividade/Trabalho
3. Contextualizar – leitura de ambiente/situação interna-externa
4. Visão sistêmica
5. Tomada de decisão
DUPLO 6. Prontidão à Mudança – flexibilidade
7. Visão de Negócio
8. Negociação

COMPETÊNCIAS SOCIAIS - Capacidade de:


1. Relacionamento Interpessoal
2. Comunicação
Telefonia – fase de 3. Gestão de Pessoas
implantação até 4. Trabalhar em grupo
TRIPLO 4. Orientada p/ fusão 5. Desenvolver equipes
Dinâmica de
Aprendizagem COMPETÊNCIAS DE APRENDIZAGEM - Capacidade de:
1. Reflexão
2. Visão crítica – emancipatória
3. Observação – Olhar observador
4. Estabelecer um conhecimento reflexivo
5. Permitir-se o erro
6. Autodesenvolvimento
7. Lançar mão dos conhecimentos na ação – Agir

Quadro 4 – Ciclos de aprendizagem e competências desenvolvidas.


Fonte: Elaborado pela autora a partir de dados coletados.

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O Processo de Aprendizagem Interníveis e o Desenvolvimento de Competências

poderá variar do altamente avançado ao muito uma atividade social que acontece dentro de um
básico e inadequado para lidar com estímulos ambiente participativo, onde a interação entre
ambientais. pessoas conduz a uma terceira dimensão instruí-
De acordo com alguns autores, as evidên- da, “saber quem”. Cada uma destas três dimen-
cias de aprendizagem de ciclo duplo e triplo estão sões deve ser vista como uma competência que
por trás da criação da competência organizacional pode ser elaborada através de múltiplos níveis de
(BECKETT; MURRAY, 2000). Quando grupos análise. Juntas elas subsidiam uma estrutura in-
trabalham para criar significado compartilhado de clusiva para guiar a compreensão e o desenvolvi-
suas experiências, boas ou ruins, as suas experiên- mento das competências que contribuem para a
cias traduzem-se numa competência integrativa, construção das competências organizacionais.
conduzindo a maior capacidade que transcende Modelos semelhantes já foram aplicados em ou-
experiência individual. Dessa forma, identificar tros domínios de conhecimento (DEFILLIPPI;
quais competências são ou podem ser desenvol- ARTHUR, 1996 em carreiras; QUINN;
vidas a cada ciclo de aprendizagem organizacional ANDERSON; FINKELSTEIN, 1996, capital
auxiliaria a compreender como são constituídas intelectual).
as competências organizacionais. Enfim, a pro- Assim, encerra-se apresentando, então, o
posta aqui é a de instigar o leitor ao desenvolvi- Caso I (figura 3) como ilustração da noção pro-
mento de novas pesquisas. posta neste artigo de aprendizagem organizacional
em interníveis pela disseminação e o comparti-
lhar de competências.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nesta ilustração (figura 3), o gerente desen-
A partir deste estudo, pode-se dizer que volve competências de Gestão, Técnicas, Sociais
transitar entre o micro e macro nível de análise é e de Aprendizagem ao mover-se pelas fases do
claramente essencial se quisermos avançar o pen- ciclo de aprendizagem, refletindo sobre e estando
samento sobre aprendizagem organizacional. O aberto a experiências, dentre outras maneiras, pelas
principal obstáculo que deve ser superado para práticas de trabalho de seu dia-a-dia. Num segun-
trazer tal integração é substituir a tendência de se do nível de aprendizagem, em grupo, ocorre a
pensar em termos de categorias fixas de aprendi- expansão dessas competências ditas funcionais
zagem e trabalhar com a noção de processos di- (por exemplo, na Engenharia principalmente a
nâmicos de aprendizagem, onde o processo em competência Técnica), que estão relacionadas à
nível de grupo é fundamental. É importante levar tarefa em que ocorre a difusão e compartilhar de
em conta que a competência é um fenômeno que competências individuais. Os processos de apren-
está evoluindo constantemente, está em constru- dizagem nesse nível podem ocorrer a partir da ela-
ção por indivíduos que interagem dentro de con- boração de projetos por uma equipe de trabalho
textos e níveis organizacionais variáveis. Para me- ou em reuniões e é quando são desenvolvidas com-
lhor entender a noção de competências também petências ditas específicas de cada área. Na apren-
é útil fazer algumas distinções entre os diferentes dizagem de terceiro nível, de grupo interáreas,
modos de conhecimento. Kim (1993) utiliza a teo- desenvolvem-se competências que darão susten-
ria da aprendizagem experiencial para sugerir que tação às competências organizacionais. Por exem-
aprendizagem acerca do “saber como” é sobre ha- plo, o Callcenter - à medida que tem que garantir
bilidades e trabalho relacionados ao conhecimento ao cliente atendimento ágil e de qualidade, bem
e, “saber por que” é o conhecimento das convicções como prontidão de resolução aos seus problemas
e valores que constroem a identidade. Conclui-se - expande principalmente a competência funcio-
que a interação de ambas as formas de aprender nal Social. Quando o Callcenter desenvolve um
provê a conexão essencial entre pensamento e ação. projeto conjunto com MKT (que tem como com-
A abordagem proposta, a partir dos resul- petência funcional a Gestão) para aproximação
tados deste estudo, sugere que a aprendizagem é de suas interfaces de trabalho, ocorrem processos

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Claudia Simone Antonello

Figura 3 – Aprendizagem organizacional e desenvolvimento de competências – Telefonia.


Fonte: Elaborado pela autora a partir de dados coletados e literatura pesquisada.

de aprendizagem e a difusão de competências que REFERÊNCIAS


podem facilitar o desenvolvimento de uma com-
petência organizacional, Sensibilidade ao Clien- ARGYRIS, C.; SCHÖN, D. Organizational
te, emergindo a possibilidade de aprendizagem learning: a theory of action perspective. San Fran-
organizacional. cisco, CA: Jossey-Bass, 1978.
Cabe ressaltar que o contexto organiza-
cional é uma complexa trama de referências ______; ______. Organizational learning II:
(intercâmbio de informações, idéias, dentre theory, method, and practice. Cambridge, MA:
outros) que, em longo prazo, pode auxiliar a con- Addison, 1996.
figurar o saber dos indivíduos e, em igual tem-
po, determinar uma textura social para este BECKETT, R.; MURRAY, P. Learning by auditing:
saber. Compreendido deste modo, o contexto a knowledge creating approach. The TQM Ma-
onde ocorre a aprendizagem pode ou não criar gazine, Bingley, v. 12, n. 2, p. 125-36, 2000.
equilíbrio dinâmico entre o saber/teoria e saber-
fazer/prática. É através desta estreita inter- BEEBY, M.; SIMPSON, P. Barriers, boundaries
dependência ou co-produção de conhecimento and leaks in an organization development
teórico-prático que as competências podem ser dimension. The Leadership and Organization
desenvolvidas. Aprender significa desenvolver Development Journal. v. 19, p. 353-61, 1998.
competências por envolvimento num processo
contínuo e dinâmico de aprendizagem. Como CROSSAN, M.; LANE, H.W.; WHITE, R.E. An
tal, a aprendizagem não é apenas reprodução, mas organizational learning framework: from intuition
também reformulação e renovação do conheci- to institution. The Academy of Management
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