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Resumo

Este artigo se dispõe a verificar os vários conceitos ligados ao Estado Democrático de


Direito, bem como estudar as instituições policiais ao longo da história, verificando a
inserção das mesmas no Estado Democrático de Direito através da sua atuação, visando
atender aos princípios norteadores de direitos humanos, legalidade e outros pressupostos
democráticos. Para tanto utilizou-se a pesquisa bibliográfica ligada diretamente ao tema.

Palavras-chaves: Polícia; Sociedade; Estado; Sistema e Democracia.

1 – Introdução

A associação é algo intrínseco ao ser humano desde o princípio da civilização. Os


agrupamentos formados por seres humanos visavam garantir a defesa, bem como a
satisfação das suas necessidades primordiais.

Com o surgimento dos agrupamentos humanos surgem os povos, que posteriormente


dão origem aos Estados, que por sua vez podem ser considerados como a reunião de um
povo, em determinado território geográfico, reunidos sobre a égide de um governo
soberano.

Todavia os primeiros Estados eram totalitários, ou seja, o Estado fazia as regras, porém
não se sujeitava a elas. Também não havia a participação popular nas decisões tomadas
pelo soberano, tampouco havia a separação de poderes. Desse modo, a população dos
Estados possuía direitos limitados e pouco definidos, sujeitando-se a constantes abusos
do soberano. Somente com a Revolução Francesa é que houve a quebra desse
paradigma, erigindo-se os pilares de um Estado limitado pela lei, baseado na liberdade,
igualdade e fraternidade.

A partir dessa época surge o chamado Estado Democrático de Direito, que nada mais é
do que o Estado que se submete ao império das leis, permitindo a participação popular
nas decisões, e que tem como sistema de freios e contrapesos a tripartição dos poderes,
impedindo assim a concentração do poder na mão de uma só pessoa.

Com relação às instituições policiais, estas surgem ao longo das civilizações com intuito
de manter a ordem nas sociedades primitivas. Inicialmente tinham um papel de garantir
a governabilidade do soberano, atendendo exclusivamente às suas vontades. A polícia
moderna surge no século XIX, mais precisamente na Inglaterra através dos princípios de
policiamento de Robert Peel. No Brasil a primeira instituição é criada no Rio de Janeiro,
no início do século XIX, com a chegada da Família Real portuguesa. Inicialmente ela
representava apenas os interesses da Coroa.

Ao longo dos anos a polícia muda seu enfoque, abandonando as características


essencialmente militares, voltada para a defesa interna e externa, para o modelo baseado
no Estado Democrático de Direito que visa garantir os direitos individuais e coletivos
dos cidadãos.

Nesse contexto, o novo modelo de polícia que hoje se apresenta, é voltado para garantir
o pleno exercício da cidadania. Baseia-se na premissa de uma instituição que está
permanentemente junto da sociedade atendendo aos seus anseios de segurança e
respeitando seus indivíduos. A filosofia de Polícia Comunitária é uma dessas vertentes
onde a polícia é parceira da população e junto com ela tenta resolver os problemas,
muitas vezes não criminais, mas que influenciam negativamente nas questões ordem
pública em todos os seus aspectos.

Foi utilizado o método indutivo e a técnica é a pesquisa bibliográfica, por meio da


consulta de livros, artigos, trabalhos acadêmicos e publicações eletrônicas.

2 – O Sistema Democrático de Direito

A sociabilidade é uma característica inerente ao homem, ou seja, é uma característica


natural da espécie humana, que sempre procurou agrupar-se visando a autoproteção.
Santo Tomás de Aquino afirma ainda que o isolamento é exceção à regra ocorrendo em
alguns casos pontuais (DALARI. 1998, Pg. 8).
A associação entre os humanos surge da necessidade de eles satisfazerem seus desejos e
assim poderem evoluir, desenvolvendo todo o seu potencial. Nesse sentido entende-se
que a sociedade é o misto entre o impulso associativo do homem com a cooperação da
sua vontade (DALARI. 1998, Pg. 8).

Todavia a corrente contratualista afirma que a vida em sociedade não está baseada
apenas na característica natural inerente ao homem, mas também decorre de um
contrato hipotético firmado entre eles. Esse conceito é apresentado por Platão na obra a
República, onde é feita referência a uma organização social construída racionalmente
(DALARI. 1998, Pg. 9).

Porém, o autor de maior expressividade ligado ao tema contratualismo foi Thomas


Hobbes, que afirmou que o homem em estado natural é eminentemente mau. Assim, a
razão humana leva-o a celebrar o contrato social, trocando liberdade por proteção estatal
(DALARI. 1998, Pg. 9).

Posteriormente Rousseau retomou a linha de Hobbes, onde explica a organização social


com base em um contrato social, apenas discordando quanto à natureza humana, onde
afirmava que predominava a bondade no estado natural. Pode-se dizer que as ideias que
constituem a base do pensamento de Rousseau são consideradas hoje os fundamentos da
democracia. (DALARI. 1998, Pg. 9 -11).

Portanto, pode-se dizer que o elemento sociedade resulta da necessidade natural do


homem, mas também inclui a consciência e a vontade humana de buscar auxílio de
outras pessoas para os problemas que o homem não conseguia resolver individualmente.

Importante ainda fazer a diferenciação entre sociedade e comunidade. Conforme


Toennies a sociedade é a ação conjunta e racional dos indivíduos dentro da ordem
jurídica e econômica. Assim, apesar de toda a interação entre as pessoas elas
permanecem separadas. Já na comunidade ocorre o fenômeno da organização social,
onde predomina a solidariedade através do vínculo psíquico entre os componentes dos
grupos. (TOENNIES apud BONAVIDES. 2000, Pg. 69).

O Estado como conhecemos está presente desde a antiguidade, porém com


características distintas das dos dias atuais. Chamada de polis pelos gregos, civitas e
república pelos romanos, eram a personificação do Estado através do vínculo entre seus
cidadãos e aderência à ordem política e de cidadania. Ainda no império Romano os
vocábulos Imperium e Regnum exprimiam a ideia de Estado, conceito de domínio e
poder. (BONAVIDES. 2000, Pg. 73).

Na Idade Média surge a expressão laender ou países, que tinha mais a ver com a noção
de território. (BONAVIDES. 2000, Pg. 73).

Porém a concepção moderna de Estado surge com Maquiavel em sua obra mais célebre,
onde segundo o autor: Todos os Estados, todos os domínios que têm tido ou têm
império sobre os homens são Estados, e são repúblicas ou principados. (MAQUIAVEL.
1987, p.5).

Ainda com relação ao conceito de Estado, existem várias definições, sendo elas
filosófica, jurídica e sociológica, porém o mais importante se refere aos elementos do
Estado que podem ser de ordem formal e de ordem material. De ordem formal existe o
poder político na sociedade. Já com relação aos elementos de ordem material tem-se o
elemento humano e o elemento territorial. (BONAVIDES. 2000, Pg. 74-78).

Portanto, tem-se como elementos básicos do Estado o Povo que é a reunião de


indivíduos em determinado local, o Território que é o espaço geográfico onde fica essa
população, bem como a Soberania que é o poder de se autodeterminar tanto interna
como externamente.

Quanto ao tema democracia, não é fácil definir um conceito que seja unanimidade pelos
doutrinadores. Todavia, basicamente pode se entender esse termo como sendo a
possibilidade da participação popular nas decisões tomadas dentro de um Estado pelo
seu Governo, que visa principalmente a atender os anseios da população, ou seja, é o
governo para povo exercido por ele diretamente, ou através de seus representantes.
Nesse entendimento a democracia pode ser dividida formalmente em três modalidades:
democracia direta, indireta ou semidireta, tendo cada uma sua peculiaridade no tocante à
participação do povo nas decisões (BONAVIDES. 2000, Pg. 346).

O Estado Democrático de Direito por sua vez é o Estado que se propõe a resguardar os
direitos e garantias fundamentais dos seus cidadãos, através de instituições e
ferramentas que concretizam essas garantias. Nele todos estão sujeitos às regras
jurídicas estabelecidas, principalmente o Estado. Existe ainda no Estado Democrático de
Direito a tripartição dos poderes, havendo um sistema de freios e contrapesos, que tem a
função de limitador jurídico-político da atuação desses entes. Ademais todo
ordenamento jurídico precede de uma constituição, considerada norma suprema, que irá
guiar as demais leis dentro do sistema democrático de direito.

Finalmente, sistema é um conjunto de partes interligadas, porém interdependentes com


um objetivo ou finalidade em comum. Nesse sentido, pode-se entender como Sistema
Democrático de Direito o conjunto de órgãos, agentes e ferramentas, que visam garantir
os direitos e garantias fundamentais, bem como coibir o abuso do Estado.

3 – O Surgimento das Instituições Policias e Seu papel Constitucional na CFRB88

Segundo os diversos autores que falam sobre o tema “polícia”, não existe uma data
precisa quanto ao surgimento das instituições policiais. Todavia, ao longo da história
das civilizações, sempre estiveram presentes pessoas incumbidas de manter a ordem
dessas sociedades. (HIPOLITO. 2012, Pg. 33).

Na obra a república de Platão, existe menção a profissionais pertencentes à estrutura


pública, incumbidos de preservar a ordem da cidade. Também em Roma, durante o
reinado do Imperador Augusto, cabia ao prefeito manter a ordem na rua. (HIPOLITO.
2012, Pg.35).

Durante a Idade Média houve uma série de eventos que provocaram desordem no
continente europeu, como guerras, pestes, pilhagens, havendo nessa época um grande
controle social feito principalmente pela igreja. (HIPOLITO. 2012, Pg.36).

Com a emancipação da burguesia e o fim do feudalismo torna-se cada vez mais


necessária a criação de uma força para controlar a nova sociedade que havia se formado.
Agora com acesso aos bens de consumo as sociedades dividiam-se em classes e era
necessário o controle social. Portanto, entre os séculos XVIII e XIX surgem as polícias
ocidentais, inclusive no Brasil. (HIPOLITO. 2012, P.36-37).
A polícia moderna como a conhecemos surge na Inglaterra no ano de 1785, onde
William Pitt apresentou ao parlamento inglês o projeto para criação de uma polícia
profissional. Todavia, somente em 1829 com Sir. Robert Peel, surge a Polícia
Metropolitana de Londres com intuito de combater os efeitos da industrialização e o
consequente aumento da criminalidade. (HIPOLITO. 2012, P.37-39).

Para isso foram desenvolvidos por Peel nove princípios que norteiam o policiamento
desde aquela época:

1 – A missão fundamental para a polícia existir é prevenir o crime e a desordem.

2 – A capacidade da polícia para exercer as suas funções está dependente da aprovação


pública das ações policiais.

3 – A Polícia deve garantir a cooperação voluntária dos cidadãos, no cumprimento


voluntário da lei, para ser capaz de garantir e manter o respeito do público.

4 – O grau de cooperação do público pode ser garantido se diminui proporcionalmente à


necessidade do uso de força física.

5 – A Polícia não deve se manter (criar prestígio e autenticidade) apenas com prisões,
não preservando assim o favor público e abastecendo a opinião pública, mas pela
constante demonstração de absoluto serviço abnegado à lei.

6 – A Polícia usa a força física na medida necessária para garantir a observância da lei
ou para restaurar a ordem apenas quando o exercício da resolução pacífica, persuasão e
de aviso é considerado insuficiente.

7 – A Polícia, em todos os tempos, deve manter um relacionamento com o público que


lhe dá força à tradição histórica de que a polícia é o público e o público é a polícia, a
polícia é formada por membros da população que são pagos para dar atenção em tempo
integral aos deveres que incumbem a cada cidadão, no interesse do bem-estar da
comunidade e a sua existência.
8 – A polícia deve sempre dirigir a sua ação no sentido estritamente de suas funções e
nunca parecer que está à usurpar os poderes do judiciário.

9 – O teste de eficiência da polícia é a ausência do crime e da desordem, não a evidência


visível da ação da polícia em lidar com ele.

No Brasil a polícia profissional surge durante a monarquia, mais precisamente no Rio de


Janeiro em 1808 com a chegada da família real, e posteriormente avança para a
República no ano de 1889. Na ocasião as polícias foram criadas em nível de províncias
ou estados. É nessa época que surge a dicotomia polícia militar e polícia civil, havendo
ainda a figura da guarda civil. Nesse período as policiais eram voltadas para a proteção
interna e externa, fazendo as vezes de exércitos estaduais. Posteriormente, devido ao seu
poderio, foi considerada força auxiliar do exército, ficando subordinada a este. Durante
o Regime Militar passou a ter o papel de controle e repressão política. (HIPOLITO.
2012, P.48-57).

Posteriormente, a constituição federal de 1988 também conhecida como carta cidadã,


tratou por apresentar no seu artigo 144 o Sistema de Segurança Pública, ou seja, as
instituições que tem como finalidade a preservação da ordem pública e a incolumidade
das pessoas e do patrimônio. Também prevê que a segurança pública é dever do Estado,
mas também direito e responsabilidade de todos.

Nesse contexto é importante trazer o conceito de polícia apresentado por Lazzarini que
a define como sendo (LAZZARINI. 1999, Pg. 12):

Em sentido estrito, polícia é vocábulo que designa o conjunto de instituições, fundadas


pelo Estado, para que, segundo as prescrições, legais e regulamentares estabelecidas,
exerçam vigilância para que se mantenham a Ordem Pública, a moralidade, a saúde
pública e se assegure o bem estar coletivo, garantindo-se a propriedade e outros direitos
individuais.

Portanto, hoje a definição de polícia é muito mais abrangente, avançando para além das
questões criminais. A polícia atua em qualquer situação de conflito tendo hoje um papel
predominantemente de conciliadora da sociedade.
4 – A Atuação Policial dentro do Estado Democrático de Direito

A polícia está intimamente ligada a todos os aspectos da vida em comunidade, prezando


pelo desenvolvimento pacífico, não desatentando das peculiaridades de cada região. A
atuação policial, por isso mesmo, deve estar sempre balizada pelos princípios
constitucionais, sendo impossível desvincular a atividade dos complexos e diversos
interesses da coletividade. Para que os dispositivos constitucionais possam ser
entendidos e aplicados, também se torna necessário o conhecimento do conceito legal
de Ordem Pública, ainda em vigor e constante no art. 2º, item 21 do Decreto Federal n.
88.777, de 1983:

Conjunto de regras formais, que emanam do ordenamento jurídico da Nação, tendo por
escopo regular as relações sociais de todos os níveis, do interesse público, estabelecendo
um clima de convivência harmoniosa e pacífica, fiscalizado pelo poder de polícia, e
constituindo uma situação ou condição que conduza ao bem comum.

Como se vê, a ordem pública é um pressuposto para o funcionamento do sistema de


convivência pública, sendo indispensável à existência de um polissistema social, uma
vez que viver em sociedade importa necessariamente em viver publicamente. Nessa
convivência pública o homem deve poder gozar de sua liberdade, agindo sem ser
perturbado e participar de quaisquer atividades sociais, sem impedimentos e restrições.
Ordem pública, em última análise, é a concretização dos valores de convivência
postulados pela ordem jurídica, a qual pode e deve balizar o emprego do poder de
polícia. A definição de poder de polícia é fornecida pelo Código Tributário Nacional,
que dispõe no artigo 78:

Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou


disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de
fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos
costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas
dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou
ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.
Assim, poder de polícia pode ser entendido como uma faculdade discricionária, da qual
dispõe o Estado para a adequação da rivalidade existente entre o binômio público-
privado.

De modo sintético, segurança pública pode ser considerada como a garantia da ordem
pública, uma vez que esta é objeto daquela, sendo ambas mantidas ou restauradas pelo
exercício do poder de polícia por parte das forças de segurança pública previstas na
Constituição Federal.

O exercício do poder de polícia não é ilimitado, tampouco pode ser deixado ao talante
do policial a estipulação de limites. A própria legislação é que define o alcance e a
legitimidade do mesmo. O uso do poder é prerrogativa da autoridade. Mas o poder há de
ser usado normalmente, sem abuso. Usar normalmente do poder é empregá-lo segundo
as normas legais, a moral da instituição, a finalidade do ato e as exigências do interesse
púbico. Abusar do poder é empregá-lo fora da lei, sem utilidade pública, afastando-se
dos preceitos do estado democrático de direito.

A Polícia é uma das poucas instituições públicas que desenvolve tarefas que interessam
diretamente a toda a população. A manutenção da ordem, a proteção de certos valores
aceitos socialmente, a aplicação das leis, a prevenção e repressão ao crime e a defesa
das condições necessárias para o exercício das liberdades fundamentais constituem-se
nos elementos essenciais para a existência de uma sociedade democrática, cabendo à
Polícia a ininterrupta missão de cumprir com essas atribuições (PRADO, 2008).

A noção de ordem pública já esteve no cerne dos discursos de legitimação das ditaduras.
Para o pensamento autoritário, o fundamental é que tenha lugar uma decisão política
capaz de estabelecer a ordem, de substituir o dissenso político pela adesão, ainda que
imposta pela força, a um determinado conjunto de valores, subtraídos à esfera das
divergências. Se a ordem está em confronto com a lei a opção dos autoritários é sempre
pela ordem.

O fortalecimento da democracia abre espaço para a dicotomia liberdade e igualdade,


onde a liberdade de um está limitada pela do outro, com aceitação da diversidade social,
para que todos os grupos possam viver com respeito recíproco no espaço geográfico,
embora existam diferenças. Assim, é indispensável reconhecer o espaço democrático
como um espaço de tensões e negociações entre a Unidade do Estado e a pluralidade
dos atores sociais.
A difusão dos conceitos de direitos humanos e o exercício da cidadania, por outro lado,
trazem uma sociedade pluralista e cada vez mais exigente no respeito aos seus direitos,
a partir de um movimento comunitário ativo e participativo. Desse modo, exige-se do
profissional de polícia uma compreensão da diversidade social que possibilite uma
conduta orientada por decisões imparciais, não influenciadas por preconceitos e
estigmas. Por certo, isso possibilitará o tratamento mais adequado de uma das principais
questões da ação do policial, qual seja, a clareza da diferenciação entre violência e uso
legítimo da força.

A violência é amadora, desnecessária, ilegítima e ilegal. O uso da força é técnico,


necessário, legítimo e legal. Os novos tempos trazem novas demandas, conforme Rolin
(2012, p. 32):

A evolução está exigindo o abandono, pelas Instituições Policiais Militares, do modelo


comportamentalista de formação e desenvolvimento, onde ao policial é ensinado o que
fazer, como se fosse um ato mecânico, onde as atividades a serem desenvolvidas são
previsíveis, possíveis de serem enumeradas em um manual que deve rigorosamente ser
seguido, sem considerar as condições circunstanciais, produzindo uma prática
robotizada, caracterizada pela ausência do espaço crítico e da decisão. Passando para
um modelo que desenvolva profissionais com visão crítica do seu contexto social e uma
qualificação que possibilite uma adequada capacidade de decisão e de mediação de
conflitos. Assim, o policial começará a considerar outros princípios na prática e na rua,
onde cada caso é um caso e a incerteza é a única verdade, quais sejam a realidade e a
razoabilidade, além da já utilizada legalidade.

Outro desafio é a mudança da cultura do tratamento da segurança pública, onde a


concepção jurídica deve abrir espaço a uma concepção social de se fazer polícia, uma
vez que a criminalidade e a violência são resultantes das condições e relações em
sociedade.

Os melhores resultados nessa área se têm conseguido através do envolvimento de todos


os segmentos da sociedade na discussão e implementação das soluções, de forma a
serem atingidos diagnósticos mais precisos; informações qualificadas; fortalecimento
dos institutos sociais como a família, escola, igreja e vizinhança; diminuição da crise
moral e ética, estimulando comportamentos solidários e coletivos; fortalecimento do
capital social e da organização do espaço urbano de convivência; produção de
orientações de comportamentos seguros e inibidores de condutas antissociais; e
formação de grupos de pressão em busca de políticas públicas apropriadas (ROLIN,
2012).
Orientar a formação do policial militar na lógica dos direitos humanos tem sido o
referencial de diversos países. Entretanto, quanto mais fragmentado é o sistema policial,
mais complexo se torna a unificação da formação, e no Brasil o modelo militarista ainda
resiste em diversos programas estaduais. O resgate humano na formação do policial
militar é essencial para que ele possa refletir sobre a sua condição de cidadão e
compreenda seu relevante papel.

A sistematização do ensino e da instrução deve ser fundamentada nos princípios


democráticos de liberdade e dos ideais de solidariedade humana, visando ao
desenvolvimento das qualidades e das aptidões intelectuais, psicológicas, físicas, éticas
e morais inerentes às atribuições funcionais do profissional de segurança pública. Dessa
forma, seu devido preparo para fazer cumprir a lei e garantir o exercício da cidadania
deve ter como base a comunicação interativa com feedback de mão dupla, o que
provaria mudanças na cultura institucional.

Nesse contexto é preciso repensar e reordenar as forças de segurança pública,


direcionando-as à promoção da cidadania e afastando-as do juízo de autoproteção
constante de seus regulamentos.

As Polícias Militares foram criadas sobre bases doutrinárias das Forças Armadas e não
têm sofrido as reformas necessárias para atender as demandas cada vez mais complexas.
Ainda persiste, mesmo que em menor intensidade, um modelo de gestão que as colocam
em rota de colisão com a realidade contemporânea. Paulatinamente a lógica do combate
tem cedido espaço à aproximação. Este parece ser o caminho mais viável.

De acordo com Bulos (2012), a partir da Constituição Federal de 1988 a segurança


pública passa a ter um novo significado, uma vez que o estado democrático de direito
trouxe um novo sentimento de cidadania.

Embora a pressão social recaia principalmente sobre a polícia, Rodrigues (2010),


pondera que a missão não cabe unicamente a ela. A correção das desigualdades
históricas da sociedade brasileira deve envolver o Estado como um todo, pois segurança
não é apenas “coisa de polícia”. Aliás, a própria Carta Política de 1988 preconiza no
artigo 144 caput, que a segurança pública além de ser um direito, é também
responsabilidade de todos.
Relacionado ao tema democracia, é importante compreender o significado de direitos
fundamentais, que não se confunde com garantias fundamentais. Com peculiar acurácia,
Uadi Lammêgo Bulos afirma que (2012, p. 522):

Direitos fundamentais são o conjunto de normas, princípios, prerrogativas, deveres e


institutos, inerentes à soberania popular, que garantem a convivência pacífica, digna,
livre e igualitária, independentemente de credo, raça, origem, cor, condição econômica
ou status social. Sem os direitos fundamentais o homem não vive, não convive, e, em
alguns casos, não sobrevive. Os direitos fundamentais são conhecidos sob os mais
diferentes rótulos, tais como direitos humanos fundamentais, direitos humanos, direitos
do homem, direitos individuais, direitos públicos subjetivos, direitos naturais, liberdades
fundamentais, liberdades públicas etc.

Ainda de acordo com Bulos (2012, p. 528) garantias fundamentais são as ferramentas
jurídicas por meio das quais tais direitos se exercem, limitando o poder do Estado. Cite-
se, como exemplo, as ações de habeas-corpus e habeas-data, ou ainda a garantia de que
nenhuma lesão ou ameaça a direito será excluída da apreciação do Poder Judiciário
(artigo 5º, incisos XXXV e LXXVII, da Constituição Federal), respectivamente. Deste
modo, os direitos fundamentais cumprem dupla finalidade: de defesa e de
instrumentalização; a primeira permite o ingresso em juízo para proteger bens lesados,
proibindo os poderes públicos de invadirem a esfera privada dos indivíduos. A segunda
(instrumentalização) permite ao particular reivindicar do Estado o cumprimento de
prestações sociais, proteção contra atos de terceiros e a tutela contra discriminações.

O novo cenário da segurança pública está exigindo um profissional com formação


específica e com conhecimento próprio, não se identificando com nenhum dos cursos
hoje existentes. O profissional de polícia deve resultar da simbiose do conhecimento de
técnicas e práticas policiais, com conteúdos afins existentes nas áreas do direito,
administração, sociologia, psicologia, pedagogia, filosofia, informática, comunicação
social, relações públicas e outras. Desenvolvendo um policial com uma visão
multidisciplinar da sua atividade no âmbito da segurança pública, capacitado a construir
estratégias qualificadas, operações táticas apropriadas e técnicas apuradas e modernas;
sobretudo, um policial que tenha uma formação de polícia (ROLIN, 2012).

Fazer polícia, ao contrário de que muitos apregoam, não consiste somente na colocação
intuitiva de policiais e viaturas nas vias públicas. Há outra dimensão, tão ou mais
importante que esta, fundamentada no pensamento estratégico, no planejamento das
operações táticas e na otimização dos recursos humanos e materiais.
5 – Considerações Finais

Conclui-se que o estado de associação é inerente a natureza humana, todavia essa


associação acaba por gerar diversos conflitos entres seus integrantes. Nessa senda, surge
o Estado, como ente que irá regular essa condição associativa.

Todavia o Estado, ou Império das leis, criou instituições para o controle das pessoas que
fazem parte desse Estado. Em um primeiro momento, Essas instituições policias
serviam apenas para proteger os interesses do próprio Estado, condição essa que não
mais deve prevalecer nos dias atuais.

As agencias polícias servem hodiernamente para proteger os direitos e garantias


fundamentais dos cidadãos garantindo o pleno exercício da cidadania. São parte
importante do Sistema Democrático de Direito, que deve garantir, além de tudo, a
dignidade da pessoa humana como bem maior a ser buscado.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Lei n. 5.172, de 25 de outubro de 1966. Dispõe sobre o Sistema Tributário


Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e
Municípios. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5172.htm.
Acesso em 21 dez. 2015.
BRASIL. Decreto n. 88.777, de 30 de setembro de 1983. Aprova o regulamento para as
Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares (R-200). Brasília. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D88777.htm. Acesso em: 03 nov. 2015.

BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. 7. Ed. Ver. E atual. São
Paulo: Saraiva, 2012.

BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. Ed. Ver. E Atual. São Paulo: Malheiros, 2000.

DALARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. São Paulo: Saraiva,
1998.

HIPÓLITO, Marcello Martinez. Superando o mito do espantalho – uma polícia


orientada para a resolução dos problemas de segurança pública. Florianópolis: Insular,
2012.

LAZZARINI, Alvaro. Estudos de Direito Administrativo. 2. Ed. São Paulo: Editora


Revista dos Tribunais, 1999.

MAQUIAVEL, N. O príncipe e escritos políticos. Trad. Lívio Xavier. São Paulo: Nova
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PRADO, Geraldo. Segurança Pública e Democracia: Aspectos constitucionais das


políticas públicas de segurança. 2. Ed. São Paulo. Editora Lumen Juris. 2008.

RODRIGUES, Marcus Paulo Ruffeil. Gestão Da Polícia Militar: a cultura institucional


lcomo agente limitador da construção de uma Policia Cidadã. 2010. 93 f.
Dissertação(mestrado em Gestão Empresarial) – Escola Brasileira de Administração
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ROLIM, Marcos. A crise do sistema penitenciário brasileiro. Disponível em:
http://www.sinpro-rs.org.br/textual/abr11/pdfs/sinpro_revista_textual_22_28.pdf.
Acesso em: 03 de novembro de 2015.

Autores

Carlos Eduardo Rosa

Carlos Eduardo Rosa

Oficial da Polícia Militar de Santa Catarina, Bacharel em Direito pelo Instituto de


Ensino Superior da Grande Florianópolis, Especialista em Gestão de Ecossistemas e
Educação Ambiental, Bacharel em Ciências Policiais pela Academia de Polícia Militar
da Trindade

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Junior Tatch

Junior Tatch

Bacharel em Direito e Bacharelando em Ciências Policiais.

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