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Aula 03 – Psiquiatria Rafael Guedes de Lira - 006

Exame Psiquiátrico

- Funções psicopatológicas:

 Atenção: a capacidade para manter o foco em uma atividade ->


 A vigilância é a capacidade de voltar o foco da atenção para os estímulos externos -> pode estar hipervigil
(podendo haver prejuízo de atenção para o estímulo principal) ou hipovigil (desatento em relação ao meio).
 A atenção depende de duas variantes: tenacidade (capacidade de manter a atenção no foco) e mobilidade
(capacidade de desviar-se a atenção de um objeto para outro).
 Alterações de atenção:
 Hipoprosexia: Perda básica da capacidade de atenção
 Aprosexia: Total abolição da capacidade de atenção, por mais fortes e variados que sejam os
estímulos.
 Hiperprosexia: Estado de atenção exacerbada.

 A rigidez da atenção constitui um estado de hipertenacidade com hipomobilidade da atenção (pessoa


concentrada). Ocorre em indivíduos normais quando por exemplo leem um livro ou pode ter um cunho
psíquico, como na depressão, em relação a pensamentos e recordações dolorosas; no TOC em relação às
ideias recorrentes, etc.
 A labilidade da atenção constitui um estado de hipotenacidade com hipermobilidade de atenção
(incapacidade de concentração). Ocorre na mania; intoxicações por álcool, no transtorno de déficit de atenção
e hiperatividade, etc.

 Orientação: a capacidade do indivíduo de se situar no tempo, espaço ou situação e reconhecer sua própria pessoa.
 Orientação temporal: dia de hoje
 Orientação espacial: capacidade de saber o local em que se encontra, etc.
 Orientação autopsíquica: dados do paciente, o que faz ali, etc. Devem ser conferidos com um familiar
confiável.
 Orientação alopsíquica: capacidade de identificar seus familiares, amigos, pessoal que o atende, etc.
 Estar apenas orientado quanto ao tempo e ao espaço não dá garantias de orientação total, numa questão
psicótica, por exemplo, a orientação autopsíquica ou alopsíquica podem estar comprometidas.

 Sensopercepção: a união da sensação e da percepção (sentir e compreender respectivamente).


 Alterações qualitativas da sensopercepção:
 Ilusões: Ocorrem quando os estímulos sensoriais reais são confundidos ou interpretados erroneamente.
Geralmente ocorrem quando há redução de estímulos ou do nível de consciência (delirium).
 Na alucinação o objeto não é encontrado, já na ilusão o objeto é encontrado, mas interpretado de forma
deturpada. Pode ser encontrado na macropsia (maior), micropsia (menor), dismegalopsia (deformado).
 Ocorre em diversas patologias, como esquizofrenia, intoxicação por alucinógenos, etc. Exemplo de
ocorrência de ilusão é na anorexia nervosa, em que o paciente se vê como gordo, mesmo estando
extremamente magro.
 Alucinações: Ocorre a percepção sensorial na ausência de estímulo externo.
 Visuais: comum em usos de substâncias psicoativas. “Ver coisas que não existem”.
 Auditivas: alucinações mais comuns, principalmente em pacientes psicóticos. Se apresentam como
zumbidos, estalidos, etc. As mais complexas e comuns, as auditivo-verbais incluem fonemas (palavras,
frases, “vozes”), que podem ser imperativas, condenar, criticar, etc.
 Táteis: impressões sinestésicas, normalmente referidas como picadas de insetos.
 Vestibulares: impressões relacionadas ao equilíbrio e localização no espaço. Sensação de estar rodando
ou voando, por exemplo.

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 Olfativas: comum em epilepsias, quadro neurológicos, sentir cheiros que não existem, ou achar que
alguém percebe o próprio cheiro.
 Somáticas: experiências sensoriais irreais envolvendo o corpo ou órgãos (sentir o fígado apodrecido, por
exemplo).
 Extracampina: o objeto percebido encontra-se fora do campo perceptivo. Por exemplo ouvir o que falam
a 1km de distância. Ocorre com frequência na esquizofrenia.
 Sinestesia: um estímulo sensorial em uma modalidade é percebido como uma sensação em outra
modalidade. Por exemplo, ouvir cores, ver sons, etc.
 Entre outras alucinações incluem-se: déjà vu, jamais vu, despersonalização, desrealização,
 A alucinação negativa é a ausência de registro sensorial de determinado objeto presente no campo
sensorial do paciente. Por exemplo não ver uma pessoa que está diante dos seus olhos.
 A alucinação verdadeira apresenta todas as características de uma imagem perceptiva real, sendo essa
produzida pelo próprio paciente. Possui um alto poder de convencimento, por ser aceito pelo juízo de
que existe.
 As alucinoses, assim como nas alucinações verdadeiras, são percebidas no espaço objetivo externo.
Porém, se diferenciam das verdadeiras por serem adequadamente criticadas pelo individuo como um
fenômeno patológico.

 Alterações quantitativas da sensopercepção:


 Hiperestesia: consiste num aumento global da intensidade perceptiva, as impressões sensoriais
tornam-se mais intensas, mais vívidas ou nítidas. Na modalidade visual, as cores ficam mais
brilhantes. Pode ser encontrado na mania, intoxicação por alucinógenos, etc.
 Hipoestesia: consiste numa diminuição global da intensidade perceptiva, o mundo parece mais escuro
e sem brilho, a comida é insossa, os sons abafados. Ocorre em casos de quadros estuporosos (abolição
da psicomotricidade) como na depressão, esquizofrenia ou delirium.
 Anestesia: Abolição total da sensibilidade.

 Memória: a capacidade de registrar, fixar ou reter, evocar e reconhecer objetos, pessoas e experiências passadas
ou estímulos sensoriais.
 A memória de curto prazo possui uma capacidade de armazenamento limitada e dura de segundos a minutos.
 A memória de longo prazo representa o armazenamento permanente de informações.
 Paramnésia é conhecida como a alucinação de memória, a recordação de algo que de fato não ocorre, embora
para o paciente tenha ocorrido. Comum em idosos, no delirium.
 A fabulação é um tipo especial de paramnésia que ocorrem em quadros amnésticos de origem orgânica, como
no transtorno amnéstico, na demência e no delirium.
 Alterações da memória:
 Amnésia: incapacidade parcial ou total de evocar experiências passadas
 Amnésia anterógrada: o paciente esquece tudo o que ocorreu após um fato ou acidente importante.
Ex: traumatismo craniano.
 Amnésia retrógrada: o paciente esquece situações ocorridas anteriormente a um trauma, doença ou
fato importante.
 Amnésia lacunar: o paciente esquece fatos ocorridos entre datas. Ex: não se lembra do ano de 2003,
em que ocorreu sua separação.
 Amnésia remota: esquecimento de fatos ocorridos no passado, desde os primeiros anos de vida.
 Memória imediata: o que ocorreu nos últimos 5 minutos.
 Memória recente: engloba os últimos dias e horas.

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 Inteligência: a capacidade intelectual de um sujeito, medida em QI.


 Para a psiquiatria, analisa-se a compatibilidade cronológica com a função psíquica esperada para aquela
idade. Por exemplo, perguntar a um jovem de 18 anos algo compatível com sua idade. Analisar nível cultural,
grau de estudo, etc.
 Na avaliação de inteligência, a capacidade de abstração deve ser avaliada através da solicitação de
interpretação de provérbios e metáforas. Ex: “quem não tem cão, caça com gato”, o que isso significa?
 Afetividade e humor: humor é a tonalidade de sentimento predominante, e mais constante, que pode influenciar
a percepção de si mesmo, e do mundo ao seu redor.
 Humor seria, portanto, a emoção predominante, constante, enquanto afeto seria a sua expressão, o que se
observa, sendo mais flutuante.
 A avaliação da afetividade e do humor é feita ao longo da entrevista, observando-se expressão facial,
conteúdo afetivo predominante no relato (tristeza, euforia, irritabilidade, etc.), o tipo de afeto que transmite
e o que desperta no entrevistador, dentre outras possíveis observações.
 Define-se como afeto achatado, aplanaiado ou embotado nos casos de severa redução na expressão afetiva;
por outro lado, nos casos de exagero e valorização das próprias capacidades ou importância, chama-se de
afeto em grandiosidade ou expansão.
 Deve-se observar se o paciente comenta voluntariamente ou se precisa pedir para que informe como se
sente.
 Afeto: Qualidade e tônus emocional que acompanham uma ideia ou representação mental. Componente
emocional de uma ideia. Representa a modulação, por exemplo, ao ver algo triste, sente tristeza, ao ver algo
feliz, torna-se alegre. É situacional, baseado no estímulo (sendo condizente ou não), mas não modifica o
humor.
 Humor: Tonalidade de sentimento mantido pelo paciente durante a entrevista. Pode ser:
 Deprimido
 Tranquilo
 Eufórico
 Irritável
 Embotamento afetivo: diminuição da intensidade e da excitabilidade dos afetos, sejam eles positivos ou
negativos.
 No estado de diminuição de afetividade, o paciente torna-se indiferente ao meio, às outras pessoas, e algumas
vezes, a si próprio, sendo a expressão emocional bastante restrita. A perda do afeto pode levar a anedonia,
perdendo até mesmo a capacidade de sentir prazer.
 Na labilidade afetiva o indivíduo muda de humor frequentemente e bruscamente, sem motivo e de forma
inesperada. Os afetos atingem grande intensidade (exaltação afetiva) mas são de curta duração.
 A incontinência afetiva consiste num distúrbio da regulação afetiva mais grave que a labilidade. As reações
são exageradas e desproporcionais, se prolongam mais que o normal, e manifestam-se normalmente sob a
forma de riso, prantos convulsos, ou de raiva extrema. Há uma perda completa da capacidade de controle da
expressão efetiva, pela falha de mecanismos frenadores, inibitórios adquiridos na educação e convívio.
 Na rigidez afetiva existe uma perda na capacidade de modular a resposta afetiva de acordo com cada
momento. Faz com que seu estado de humor varie muito pouco com o decorrer do tempo.
 Paratimia: caracteriza-se por uma inadequação entre o afeto expresso e a situação vivenciada. Ex: rir em um
velório.

 Pensamento: conjunto de funções integrativas, capazes de associar conhecimentos novos e antigos, integrar
estímulos externos e internos, analisar, abstrair, julgar, concluir, sintetizar e criar. É avaliado em forma, curso e
conteúdo.
 A distorção do pensamento é a principal característica da psicose.
 A esquizofrenia, por exemplo, é um tipo de psicose, crônica, progressiva e incurável.
 Obs: o tratamento para esquizofrenia normalmente é de bom proveito; as internações foram praticamente
extintas. Desde que sejam garantidos ao indivíduo esquizofrênico bom tratamento, vigia constante (CAPS,
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por exemplo), e antipsicóticos, o paciente é estabilizado, apesar de não deixar de ser esquizofrênico. O risco
para ele e para a sociedade é bastante reduzido, sendo possível a convivência e a reinserção social.
 Aspectos do pensamento:
 Forma (produção): o normal é que a produção do pensamento, seja lógica, clara e fácil de seguir e
entender.
 Curso: caracteriza-se pela quantidade de ideias que vêm ao pensamento, podendo ser abundante ou
escassa.
 Conteúdo: são as ideias propriamente ditas, e sua conexão ou não com a realidade, refletindo ou não
aspectos reais do mundo externo ou interno.
 Alterações do pensamento:
 Produção: ilógica (irreal, difícil ou impossível de seguir a linha de raciocínio, desagregado); mágica
(misticismo, poderes, influência a distância). Característico do esquizofrênico.
 Curso: acelerado, com fuga de ideias (associação de palavras de maneira inapropriada, por exemplo
branco-preto caixão); perda de associações (paciente se perde no meio do discurso, sem saber o que
estava falando).
 Conteúdo: delírio ou ideia delirante (ideia falsa ou crença irreal com impossibilidade de conteúdo, certeza
extraordinária, e impossibilidade de remover essa certeza pela lógica); ideias supervalorizadas (crença
exagerada, implicância gratuita, desconfiança exacerbada).
 Temas do delírio: perseguição, prejuízo, influência, grandeza, ciúmes, erotomaníaco, somático, culpa,
negação, místico, fantástico.
 Juízo crítico: a capacidade de medir as consequências dos seus atos. (em alguns casos é visto como uma
função psicopatológica própria).

 Linguagem: a maneira como a pessoa se comunica, verbal ou não verbalmente, envolvendo gestos, olhar,
expressão facial ou por escrito.
 Pedolalia: o paciente fala com uma voz infantilizada.
 Solilóquio: Refere-se ao comportamento de falar sozinho. Também pode ser indicação de alucinação auditiva.
 Exemplos de alterações da linguagem: disartria, bradilalia, taquilalia, ecolalia, afasia, logorreia, mutismo,
vulgaridade, coprolalia, disgrafia, alterações da mímica facial, neologismos.

 Conduta e psicomotricidade: comportamentos observáveis ao indivíduo, comportamento motor, atitudes, atos,


gestos, tiques, impulsos, verbalizações, etc.
 As ações psicomotoras possuem um conteúdo psicológico, uma expressão do psiquismo.
 A motilidade consiste na via final de todo evento psíquico, e é a única forma de acesso que temos ao
psiquismo de outra pessoa. A linguagem corporal.
 A hipocinesia caracteriza-se pela diminuição acentuada e generalizada dos movimentos voluntários.
Movimentos lentos e com grande dificuldade.
 Na acinesia (estupor) há abolição dos movimentos voluntários por longos períodos.
 A hipercinesia caracteriza-se por um aumento patológico da atividade motora voluntária. Pode ser dividida
em inquietação, agitação e furor (em ordem de intensidade).
 A ecopraxia é a repetição automática e despropositada das ações motoras executas por outra pessoa diante
do paciente. Os gestos, postura, etc., são imitados.
 Na flexibilidade cerácea, ao colocar o indivíduo numa posição, ele permanecerá, mesmo que seja
desconfortável, como um boneco de cera. Mais comum em esquizofrênicos.
 Alterações da psicomotricidade: inquietação, agitação ou retardo.

 Volição e pragmatismo: ter à vontade (volição) e por em prática a vontade (pragmatismo).


 O processo volitivo envolve 4 etapas: (1) intenção ou propósito; (2) deliberação ou análise; (3) decisão; (4)
execução.
 A hipobulia se caracteriza por uma sensação de indisposição, fraqueza, desânimo ou falta de energia.

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 Os atos impulsivos auto e heteroagressivos, a frangofilia e a piromania são considerados atos impulsivos; não
existe uma análise para o comportamento; vai direto da intenção para a execução.
 Pragmatismo é a capacidade de colocar em prática o que se deseja ou foi planejado.
 Só pode se alterar quantitativamente e para menos: hipopragmatismo ou apragmatismo.
 A prospecção é o planejamento para o futuro. O exame é feito perguntando-se diretamente ao paciente o
que ele planeja fazer, por exemplo, quando tiver alta hospitalar, ou num futuro distante. Podem ser
adequados e exequíveis ou inadequados e inexequíveis (não compatíveis com a realidade do paciente).

 O exame psiquiátrico, portanto, depende de diversos fatores, de junções de diagnósticos, dos sinais e sintomas
(primeiramente sindrômicos e depois nosológicos), e portanto, deve ser feito com calma e cuidado. Não existe
nada patognomônico para se basear.

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