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PROCESSO Nº : 11.579-7/2018 (PRINCIPAL) E 13.

301-9/2018 (APENSO)
ASSOCIAÇÃO MATO-GROSSENSE DOS MUNICÍPIOS
INTERESSADO :
ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE MATO GROSSO
ASSUNTO : CONSULTA
RELATOR : CONSELHEIRA JAQUELINE MARIA JACOBSEN MARQUES
PARECER Nº : 29/2018

Excelentíssima Senhora Conselheira,

Tratam-se de consultas formuladas pelo senhor Neurilan Fraga, Presidente da


Associação Mato-grossense dos Municípios (AMM), nos autos do Processo nº 11.579-
7/2018 (principal), e pelo senhor Eduardo Botelho, Presidente da Assembleia Legislativa
do Estado de Mato Grosso (AL-MT), autuada no Processo nº 13.301-9/2018, posterior-
mente apensado ao primeiro, ambos solicitando manifestação deste Tribunal de Contas
acerca de regras de utilização dos recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento
da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), nos se-
guintes termos:

a) Quesitos propostos pela AMM:

1. Poderá o ente fiscalizado justificadamente, repor os recursos uti-


lizados de outras durante o exercício para cobertura de despesas
do Fundeb, devolvendo os recursos para essas fontes?
2. Poderia o ente fiscalizado aplicar recursos do Fundeb que excep-
cionalmente, alheios a sua vontade, permaneceram em conta
acima dos 5% permitidos pela lei, no exercício seguinte, não es-
pecificamente no primeiro trimestre, tendo como parâmetro a lei
141/2012, ser acrescida ao montante mínimo subsequente ao da
apuração da diferença, sem prejuízo do montante mínimo do
exercício de referência e das sanções cabíveis?
3. Poderia o ente o fiscalizado aplicar o saldo remanescente acima
dos 5% em remuneração ao corpo docente mesmo já havendo ul-
trapassado as regras do art. 60 do ADCT?
4. Poderia o ente fiscalizado remanejar os recursos que excepcio-
nalmente alheios a sua vontade acima dos 5% remanescentes
para a fonte ordinária e utilizar em despesas normais da adminis-
tração?
5. Caso o ente fiscalizado não atinja o percentual mínimo de gasto
com o Fundeb (mínimo 60%), ou a aplicação de 25%, devido a
repasses em um montante inesperado nos últimos dias do exer-
cício, qual seria a interpretação técnica desta Corte de Contas?

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b) Quesitos propostos pela AL-MT:

Se hipoteticamente o Estado repassar, de forma extemporânea, a


maior e no último mês do exercício financeiro, ao Município, os
recursos relativos à Lei Ordinária Federal nº 11.494, de 20 de ju-
nho de 2007, que regulamenta o Fundo de Manutenção e Desen-
volvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissio-
nais da Educação – FUNDEB, de que trata o art. 60 do Ato das
Disposições Constitucionais Transitórias, como o Prefeito deve
proceder, quanto à execução financeira e orçamentária dos aludi-
dos recursos, para que não incorra em quaisquer irregularidades
que poderão ser encontradas no âmbito desta Corte de Contas,
considerando que: a) nos termos do art. 21 da Lei Ordinária Fe-
deral nº 11.494, de 20 de junho de 2007, os Municípios devem
utilizar os recursos no exercício financeiro em que lhes forem
creditados, em ações consideradas como de manutenção e de-
senvolvimento do ensino para a educação básica pública, con-
forme disposto no art. 70 da Lei ordinária federal nº 9.394, de 20
de dezembro de 1996; b) e que o aludido repasse supera o valor
constante do §2º do mencionado artigo?

Os consulentes não juntaram outros documentos aos autos.

É o relatório.

1. DO BREVE HISTÓRICO DA CONSULTA

Preliminarmente, cabe ressaltar que as referidas consultas já foram objeto de


análise por esta Consultoria Técnica, que se manifestou por meio dos Pareceres. 12/2018
(Processo nº 11.579-7/2018) e 19/2018 (Processo nº 13.301-9/2018).

Na ocasião, o entendimento esposado por este órgão técnico foi pelo arquiva-
mento dos processos, mediante julgamento singular do Conselheiro Relator, em razão de
não preencherem os requisitos de admissibilidade previstos nos incisos II e III do art. 232
da Resolução n° 14/2007 (Regimento Interno do TCE – RITCE).

O Ministério Público de Contas (MPC), por sua vez, manifestou, inicialmente,


concordância com esta Consultoria Técnica em relação ao entendimento apresentado no
Parecer nº 12/2018, contudo reviu sua posição ao analisar o Parecer nº 19/2018, momen-
to em que considerou o assunto de relevante interesse público.
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Por fim, após encaminhamento deste processo à Eminente Conselheira Relatora,
foi reconhecido, nos termos previstos pelo art. 232, §1º do RITCE, o relevante interesse
público envolvido no assunto e decidido pelo retorno dos autos a esta Consultoria Técnica
para elaboração do respectivo parecer.

2. DO MÉRITO

Inicialmente, cabe registrar que, apesar da decisão pela resposta da presente


consulta, as questões não se apresentam de forma objetiva, de modo que é pertinente
reformular as questões apresentadas para que estas possam refletir melhor a dúvida das
consulentes e para que seja respondida de forma plena e satisfatória.

Desse modo, as questões apresentadas pelas consulentes foram reformuladas,


mantendo-se a sua essência, conforme se expõe abaixo:

1. Ocorrendo atraso nos repasses do Estado, o Município poderá


utilizar recursos de outras fontes, durante o exercício financeiro,
para pagamentos de despesas do Fundeb e posteriormente de-
volvê-los às respectivas fontes?
2. Caso seja apurado saldo superior ao limite de 5% previsto no art.
21, § 2º, da Lei nº 11.494/07, o Município poderá utilizá-lo no cur-
so do exercício subsequente e considera-lo no cálculo dos limites
legais mínimos da educação?
3. Caso seja apurado saldo superior ao limite de 5% previsto no art.
21, § 2º, da Lei nº 11.494/07, o Município poderá utilizá-lo na re-
muneração dos profissionais do magistério, mesmo já havendo
cumprido o limite estabelecido no art. 60, inciso XII, dos ADCT, da
CF/88?
4. Caso seja apurado saldo superior ao limite de 5% previsto no art.
21, § 2º, da Lei nº 11.494/07, o Município poderá remanejá-lo pa-
ra fonte de recursos ordinária e utilizá-lo no pagamento despesas
normais da Administração?
5. Caso o Município não atinja os limites legais mínimos da educa-
ção ou descumpra as regras de aplicação do Fundeb, em razão
exclusivamente de atrasos nos repasses de recursos do Estado,
o gestor municipal será sancionado pelo Tribunal de Contas?

Ademais, destaca-se que as questões reformuladas contemplam integralmente as


dúvidas apresentadas em ambos os processos de consulta.

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Feita essas considerações iniciais, passa-se ao deslinde das questões suscitadas
em consulta, sendo esta elucidação organizada em tópicos para melhor encadeamento
das ideias a serem apresentadas no presente parecer.

2.1 Da regulamentação e da finalidade do Fundeb

Criado pela Emenda Constitucional nº 53, de 19 de dezembro de 2006, e regula-


mentado pela Lei nº 11.494, de 20 de junho de 2007, o Fundo de Manutenção e Desen-
volvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb)
é um fundo especial, de natureza contábil, de âmbito estadual, que recebe recursos para
serem aplicados na educação, em atendimento ao art. 212 da CF/88.

A finalidade do Fundeb é prover recursos para serem aplicados na manutenção e


no desenvolvimento da educação básica pública e na valorização dos trabalhadores em
educação, incluindo sua remuneração condigna, nos termos do art. 2º da Lei nº
11.494/07.

É importante destacar, também, que o Fundeb substituiu o Fundo de Manutenção


e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef), que
era regulamentado pela Lei nº 9.424, de 24 de dezembro de 1996, e trouxe importantes
inovações, como a ampliação da cobertura da educação básica e das fontes de financia-
mento, bem como o aumento da parcela relativa à complementação da União.

2.2 Da origem, da distribuição e da gestão dos recursos do Fundeb

Os recursos que compõem o Fundeb têm origem na própria arrecadação dos Es-
tados, do DF e dos Municípios. Após a sua total implementação, que ocorreu em 2009, o
Fundeb passou a ser composto por 20% de impostos e transferências constitucionais e de
uma parcela de complementação da União para os entes que não conseguirem alcançar o
valor mínimo anual por aluno fixado nacionalmente.1

1 Nos termos dos arts. 3º e 4º da Lei nº 11.494/07, o Fundeb é composto por 20% dos recursos do Fundo de
Participação dos Estados (FPE); do Fundo de Participação dos Municípios (FPM); do Imposto sobre Circu-
lação de Mercadorias e Serviços (ICMS); do Imposto sobre Produtos Industrializados, proporcional às ex-
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Compete ao Poder Executivo Federal, por meio dos Ministérios da Educação e da
Fazenda, publicar anualmente, até o dia 31 de dezembro, para vigência no exercício sub-
sequente, as estimativas da receita total dos Fundos, do valor da complementação da
União, dos valores anuais por aluno no âmbito de cada Estado e do DF, e do valor anual
mínimo por aluno definido nacionalmente, de acordo com o art. 15 da Lei nº 11.494/07.

Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios são os destinatários dos recursos


do Fundeb. A distribuição dos recursos leva em consideração as matrículas nas escolas
públicas e conveniadas apuradas no último Censo Escolar, realizado pelo Instituto Nacio-
nal de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep/MEC), e variáveis como: etapas, modali-
dades e tipos de estabelecimento de ensino.

Os recursos dos Fundos, provenientes da União, dos Estados e do Distrito Fede-


ral, serão repassados automaticamente para contas únicas e específicas dos Governos
Estaduais, do Distrito Federal e dos Municípios, vinculadas ao respectivo Fundo, instituí-
das para esse fim e mantidas no Banco do Brasil S/A ou Caixa Econômica Federal.

A gestão dos recursos recebidos do Fundeb (programação, aplicação financeira,


movimentação bancária, pagamentos, etc.) é de responsabilidade da autoridade respon-
sável pela Secretaria de Educação ou órgão equivalente nos Estados, no Distrito Federal
e nos Municípios.

Os recursos poderão ser aplicados por Estados e Municípios em todas as etapas,


modalidades e tipos de estabelecimento dentro de seus respectivos campos de atuação
prioritária. Deste modo, caberá ao Estado assegurar o ensino fundamental e oferecer,
com prioridade, o ensino médio, e ao Município oferecer a educação infantil em creches e
pré-escolas, e, com prioridade, o ensino fundamental, conforme prevê o art. 211 da CF/88.

portações (IPI-exportação); da Desoneração de Exportações (Lei Complementar nº 87/1996); do Imposto


sobre Transmissão Causa Mortis e Doações (ITCMD); do Imposto sobre Propriedade de Veículos Automoto-
res (IPVA); da Quota-parte de 50% do Imposto Territorial Rural (ITR) devida aos Municípios; além da parcela
referente à complementação da União.
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2.3 Da utilização dos recursos do Fundeb no curso do exercício financeiro

Toda a dinâmica do Fundeb está alicerçada no princípio da anualidade. Os parâ-


metros que o disciplinam são estabelecidos em periodicidade anual (e.g., valor por aluno,
valor mínimo, matrículas, ajustes de contas, etc.). Isto ocorre porque a aplicação mínima
constitucional de impostos e de transferências vinculados à educação é definida em base
anual, nos termos do art. 212, caput, da CF/88:

Art. 212. A União aplicará, anualmente, nunca menos de dezoito, e


os Estados, o Distrito Federal e os Municípios vinte e cinco por cento,
no mínimo, da receita resultante de impostos, compreendida a pro-
veniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do
ensino. (Grifou-se)

Deste modo, os recursos do Fundeb, por originarem-se de parcela dos impostos e


transferências vinculados à educação, consequentemente, também se submetem a regra
geral da anualidade. Nesta linha, tanto a programação orçamentária quanto a execução
financeira dos recursos que compõem o Fundo devem se apoiar neste princípio.

A Lei nº 11.494/07, no caput do seu art. 21, estabelece que os recursos dos Fun-
dos, inclusive aqueles oriundos de complementação da União, serão utilizados pelos Es-
tados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios no curso do exercício financeiro em que
lhes forem creditados, em ações consideradas como de Manutenção e Desenvolvimento
do Ensino (MDE).

A supracitada lei, no art. 22, caput, estabelece que seja utilizado anualmente, no
mínimo, 60% do montante de recursos dos Fundos para o pagamento da remuneração
dos profissionais do magistério da educação básica em efetivo exercício na rede pública.
Essa parcela é denominada como Fundeb 60%.

É importante frisar, neste ponto, que é obrigatória a aplicação de, no mínimo, 60%
dos recursos do Fundeb na remuneração dos profissionais do magistério. O restante, cuja
soma não poderá ultrapassar 40% total dos recursos, deve ser direcionado para paga-
mento das demais despesas consideradas como MDE, nos termos do art. 70 da Lei nº
9.394, de 20 de novembro de 1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional –
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LDB).2 Essa parcela é conhecida como Fundeb 40%.

Assim, a parcela de recursos para remuneração dos profissionais do magistério é


de, no mínimo, 60% do valor anual, não existindo qualquer vedação para que o ente utili-
ze anualmente até 100% dos recursos do Fundo para remunerar esses profissionais.

A regra da anualidade é excetuada apenas pelo comando do § 2º, art. 21, da Lei
nº 11.494/07, que permite a aplicação de uma parcela de até 5% do valor anual dos Fun-
dos no primeiro trimestre do ano seguinte, conforme se transcreve a seguir:

Art. 21. Os recursos dos Fundos, inclusive aqueles oriundos de com-


plementação da União, serão utilizados pelos Estados, pelo Distrito
Federal e pelos Municípios, no exercício financeiro em que lhes fo-
rem creditados, em ações consideradas como de manutenção e de-
senvolvimento do ensino para a educação básica pública, conforme
disposto no art. 70 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996.
(...)
§ 2º Até 5% (cinco por cento) dos recursos recebidos à conta dos
Fundos, inclusive relativos à complementação da União recebidos
nos termos do § 1º do art. 6º desta Lei, poderão ser utilizados no 1o
(primeiro) trimestre do exercício imediatamente subsequente, medi-
ante abertura de crédito adicional. (Grifou-se)

Neste sentido, este Tribunal, em recente apreciação de contas de governo muni-


cipal, entendeu que o superávit financeiro nos recursos do Fundeb de até 5%, apurado
nos termos do art. 21, § 2º, da Lei nº 11.494/07, aplica-se exclusivamente à parte relativa
ao Fundeb 40%, conforme colacionado a seguir:

2 Nos termos do art. 70 da LDB, são consideradas despesas com MDE: I) remuneração e aperfeiçoamento
do pessoal docente e demais profissionais da educação; II) aquisição, manutenção, construção e conserva-
ção de instalações e equipamentos necessários ao ensino; III) uso e manutenção de bens e serviços vincu-
lados ao ensino; IV) levantamentos estatísticos, estudos e pesquisas visando precipuamente ao aprimora-
mento da qualidade e à expansão do ensino; V) realização de atividades-meio necessárias ao funcionamen-
to dos sistemas de ensino; VI) concessão de bolsas de estudo a alunos de escolas públicas e privadas; VII)
amortização e custeio de operações de crédito destinadas a atender ao disposto nos incisos deste artigo;
VIII) aquisição de material didático-escolar e manutenção de programas de transporte escolar.
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Educação. Superávit nos recursos do Fundeb 40%. Aplicação no
exercício subsequente. Parte Fundeb 60%. Utilização exclusiva
no exercício corrente.
1. Sendo apurado superávit financeiro de até 5% nos recursos rece-
bidos do Fundeb no exercício corrente, poderá ser aplicado no pri-
meiro trimestre do exercício subsequente, mediante abertura de cré-
ditos adicionais (art. 21, § 2º, Lei 11.494/2007). Tal previsão legal
aplica-se exclusivamente à parte disponível do Fundeb 40%.
2. A parte do Fundeb 60%, vinculada ao pagamento da remuneração
dos profissionais do magistério da educação básica em efetivo exer-
cício na rede pública, deve ser aplicada anualmente, sendo incabível,
neste caso, a possibilidade prevista no art. 21, § 2º, Lei 11.494/2007.
(Contas Anuais de Governo. Relator: Conselheiro Substituto João Ba-
tista Camargo. Parecer Prévio nº 81/2017-TP. Julgado em
28/11/2017. Publicado no DOC/ TCE-MT em 14/12/2017. Processo nº
7.816-6/2016). (Grifou-se)

Portanto, em regra, os recursos do Fundeb devem ser utilizados dentro do exercí-


cio financeiro em que foram creditados aos entes, tendo em vista a dinâmica da anualida-
de da aplicação dos recursos destinados à educação, estabelecida no art. 212, caput, da
CF/88, e os comandos positivados nos arts. 21 e 22 da Lei nº 11.494/07.

A única exceção ao princípio da anualidade da aplicação dos recursos do Fundeb


foi estabelecida no art. 21, § 2º, da Lei nº 11.494/07, que admite a possibilidade de utiliza-
ção de, no máximo, 5% do valor anual recebido pelos entes no primeiro trimestre do exer-
cício imediatamente subsequente, mediante abertura de crédito adicional.

2.4 Da vinculação dos recursos do Fundeb

Conforme observado no tópico anterior, o art. 212 da Constituição Federal deter-


mina que sejam aplicados anualmente, no mínimo, 18% pela União e 25% pelos Estados,
Distrito Federal e Municípios da receita resultante de impostos e de transferências na ma-
nutenção e desenvolvimento do ensino.

Este dispositivo constitucional estabelece a chamada “vinculação de recursos” pa-


ra a educação. Assim, vinculação de recursos nada mais é do que a destinação legal de
receitas para atendimento de finalidades específicas. No caso da educação, a vinculação
de recursos significa que esta área tem assegurados os recursos de determinados impos-
tos e transferências constitucionais.

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O Fundeb é um fundo especial, de natureza contábil, utilizado para a aplicação de
recursos na manutenção e desenvolvimento do ensino. Todo fundo consiste na particula-
rização de recursos e na sua vinculação a uma finalidade específica com a atribuição de
responsabilidade pelo cumprimento de objetivos. A definição legal de fundo é encontrada
no art. 71 da Lei federal nº 4.320, de 17 de março de 1964, que assim dispõe:

Art. 71. Constitui fundo especial o produto de receitas especificadas


que por lei se vinculam à realização de determinados objetivos ou
serviços, facultada a adoção de normas peculiares de aplicação.

No caso do Fundeb, por força do art. 2º da Lei nº 11.494/2007, a aplicação dos


recursos é vinculada à manutenção e ao desenvolvimento da educação básica e a valori-
zação dos trabalhadores em educação, incluindo sua condigna remuneração, conforme
transcrito a seguir:

Art. 2º Os Fundos destinam-se à manutenção e ao desenvolvimento


da educação básica pública e à valorização dos trabalhadores em
educação, incluindo sua condigna remuneração, observado o dispos-
to nesta Lei.

A Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF)3, no seu artigo 8º, parágrafo único, esta-
belece que os recursos legalmente vinculados à finalidade específica deverão ser utiliza-
dos exclusivamente para atender ao objeto de sua vinculação, mesmo que em exercício
diverso do que ocorrer o ingresso.

Art. 8º Até trinta dias após a publicação dos orçamentos, nos termos
em que dispuser a lei de diretrizes orçamentárias e observado o dis-
posto na alínea c do inciso I do art. 4º, o Poder Executivo estabelece-
rá a programação financeira e o cronograma de execução mensal de
desembolso.
Parágrafo único. Os recursos legalmente vinculados a finalidade es-
pecífica serão utilizados exclusivamente para atender ao objeto de
sua vinculação, ainda que em exercício diverso daquele em que
ocorrer o ingresso. (Grifou-se)

3 Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000.


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Ademais, o inciso I, do art. 50, da LRF, determina que além de obedecer às de-
mais normas de contabilidade pública, a escrituração das contas públicas observará que a
disponibilidade de caixa constará em registro próprio, de modo que os recursos vincula-
dos a fundo sejam identificados de forma individualizada.

Art. 50. Além de obedecer às demais normas de contabilidade públi-


ca, a escrituração das contas públicas observará as seguintes:
I - a disponibilidade de caixa constará de registro próprio, de modo
que os recursos vinculados a órgão, fundo ou despesa obrigatória fi-
quem identificados e escriturados de forma individualizada;

O controle orçamentário dos recursos vinculados deve ser realizado por meio de
código de fonte/destinação de recursos, que é um mecanismo integrador entre as receitas
e despesas. A jurisprudência desta Corte de Contas é no sentido de que os recursos vin-
culados, como no caso do Fundeb, devem ser controlados por fonte, por se tratar de um
mecanismo essencial para o controle e a transparência da aplicação dos recursos:

Despesa. Art. 42 da LRF. Cobertura de insuficiência financeira


entre fontes do Fundeb. Impossibilidade. Controle por fonte de
recursos.
1. Para efeito de atendimento à norma do art. 42 da Lei de Respon-
sabilidade Fiscal (LRF), acerca da não assunção de obrigação de
despesa nos dois últimos quadrimestres do mandato, quando não há
disponibilidade de caixa suficiente, não se pode utilizar o saldo posi-
tivo da Fonte Fundeb 60% para cobrir insuficiência financeira da Fon-
te Fundeb 40%.
2. Em se tratando de recursos vinculados, como no caso de recursos
do Fundeb, o controle deve ser realizado por fonte, o que evidencia
um mecanismo essencial para o controle e transparência entre a ge-
ração da despesa, a disponibilidade de caixa e a obrigação de pa-
gamento, em obediência ao art. 42 da LRF.
(Contas Anuais de Governo. Relator: Conselheiro Substituto Luiz
Henrique Lima. Parecer Prévio nº 54/2017- TP. Julgado em
24/10/2017. Publicado no DOC/TCE-MT em 09/11/2017. Processo nº
8.210-4/2016). (Grifou-se)

Nas especificações do leiaute do Sistema Aplic são estabelecidos os códigos para


controle individualizado por fonte/destinação de recursos de acordo com sua origem, dife-
renciando os recursos destinados exclusivamente à remuneração dos profissionais do
magistério da educação básica em efetivo exercício (código 18), os recursos aplicados
nas demais despesas de MDE (código 19) e os recursos recebidos a título de comple-

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mentação da União (código 31).4

No caso dos recursos do Fundeb, o Município deverá fazer a gestão dos recursos
em conta bancária única e específica para este fim. O controle da aplicação dos recursos
na parcela do Fundeb 60% (código 18) e do Fundeb 40% (código 19) deve ser realizado
contabilmente, conforme a jurisprudência desta Corte:

Acórdão nº 454/2006 (DOE, 30/03/2006). Educação. Ensino Fun-


damental. Fundef. Manutenção dos recursos em conta bancária
única.
O caput do artigo 3º, e seu § 1º, da Lei nº 9.424/1996, determina que
os recursos do Fundef sejam repassados, de forma automática pela
União, para contas únicas e específicas dos Municípios, vinculadas
ao Fundo e instituídas para esse fim. Portanto, não há permissão le-
gal para creditar esses recursos em contas distintas, a fim de fazer a
separação dos 60% e 40% do Fundef. O controle desses gastos de-
verá ser feito contabilmente. (Grifou-se)

Verifica-se, portanto, que os recursos vinculados ao Fundeb devem ser aplicados


exclusivamente para atender a sua finalidade legal, que é a manutenção e o desenvolvi-
mento da educação básica pública e a valorização dos trabalhadores em educação, e o
seu controle orçamentário deve ser realizado por fonte/destinação de recurso.

3. DAS QUESTÕES SUSCITADAS PELO CONSULENTE

Após as considerações necessárias ao deslinde das dúvidas aduzidas pelo con-


sulente, seguem as questões suscitadas, seguidas de suas respectivas respostas. Todas
as questões foram respondidas levando-se em consideração a premissa de ocorrência de
atrasos nos repasses dos recursos do Fundeb por parte do Estado.

Questão 1: Ocorrendo atraso nos repasses do Estado, o Município poderá


utilizar recursos de outras fontes, durante o exercício financeiro, para pagamentos
de despesas do Fundeb e posteriormente devolvê-los às respectivas fontes?

4Disponível em
http://www.tce.mt.gov.br/arquivos/downloads/00080426/Tabela%20de%20fonte%20e%20destina%C3%A7%
C3%A3o%20de%20recursos%202018%20%2818-12-2017%29.pdf .Acesso em: 2 abr 2018.
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Conforme analisado no tópico 2.4, os recursos do Fundeb são vinculados a ma-
nutenção e ao desenvolvimento da educação básica e a valorização dos trabalhadores
em educação e devem ser utilizados exclusivamente para atender ao objeto de sua vincu-
lação, nos termos do art. 8º, parágrafo único, da LRF.

Ademais, o controle orçamentário dos recursos do Fundeb deve ser realizado por
código de fonte/destinação de recursos, por se tratar de um mecanismo essencial para o
controle e a transparência da aplicação dos recursos. Ressalta-se, ainda, que não há pre-
visão legal flexibilizando o controle por fontes/destinação em situações excepcionais.

Portanto, não há previsão legal para o Município utilizar recursos de outras fontes,
durante o exercício financeiro, para pagamentos de despesas do Fundeb e posteriormen-
te devolvê-los às respectivas fontes.

Questão 2: Caso seja apurado saldo superior ao limite de 5% previsto no art.


21, § 2º, da Lei nº 11.494/07, o Município poderá utilizá-lo no curso do exercício sub-
sequente e considera-lo no cálculo dos limites legais mínimos da educação?

Conforme analisado no tópico 2.3, a única exceção ao princípio da anualidade da


aplicação dos recursos do Fundeb foi estabelecida no art. 21, § 2º, da Lei nº 11.494/07,
que admite a possibilidade de utilização de, no máximo, 5% do valor anual recebido pelos
entes no primeiro trimestre do exercício imediatamente subsequente, mediante abertura
de crédito adicional.

Além disso, conforme já citado alhures, a jurisprudência desta Corte de Contas é


no sentido de que o superávit financeiro nos recursos do Fundeb de até 5%, apurado nos
termos do art. 21, § 2º, da Lei nº 11.494/07, aplica-se exclusivamente à parcela relativa ao
Fundeb 40%, não se alcançando a parcela do Fundeb 60%.

Portanto, contraria a legislação a existência de saldo de recursos acima de 5% na


parcela Fundeb 40% e de quaisquer percentuais na parcela Fundeb 60%. Não obstante a
existência de irregularidade, os saldos dos recursos excedentes deverão ser aplicados no
exercício subsequente para atender as finalidades do Fundo.
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Do ponto de vista operacional, a despeito da inobservância da regra legal, o saldo
de recursos excedentes deverá ser utilizado no exercício subsequente mediante abertura
de créditos adicionais. É importante destacar que o superávit financeiro é calculado por
fonte/destinação de recursos, haja vista que somente pode ser utilizado como fonte de
recursos para despesas compatíveis com a sua vinculação legal.

Sendo assim, o superávit financeiro apurado na parcela do Fundeb 60% deverá


ser aplicado na remuneração de profissionais do magistério em efetivo exercício. Por sua
vez, o superávit financeiro apurado na parcela do Fundeb 40% deverá ser aplicado nas
outras despesas relativas às ações de MDE, nos termos do art. 70 da LDB.

Neste sentido, apresenta-se a seguir a jurisprudência deste Tribunal sobre a apli-


cação e a destinação de eventuais saldos de recursos do Fundef:5

Acórdãos nºS 1.607/2002 (DOE, 30/08/2002), 1.197/2001 (DOE,


28/08/2001) e 1.837/2002 (DOE, 03/09/2002). Educação. Ensino
Fundamental. Fundef 60%. Aplicação e destinação da sobra de
recursos. Revisão do PCCS.
1. Os recursos do Fundef devem ser aplicados, anualmente, como
parte integrante dos recursos destinados à manutenção e desenvol-
vimento do ensino, de acordo com o artigo 212, da Constituição Fe-
deral.
2. Uma proporção não inferior a 60% dos recursos do Fundef deve
ser destinada ao pagamento de professores do ensino fundamental
em efetivo exercício do Magistério.
3. Não se pode transferir para outro exercício financeiro a aplicação
dos saldos dos recursos destinados ao ensino.
4. O plano de carreira e remuneração do Magistério, exigência do ar-
tigo 9º, da Lei Federal nº 9.424/1996, visa assegurar remuneração
condigna aos professores do ensino fundamental público.
5. Ocorrendo, eventualmente, saldo financeiro na conta Fundef, rela-
tivo à parcela de 60% destinada ao pagamento de professores do
ensino fundamental, deverá ser distribuído entre os professores do
ensino fundamental em efetivo exercício do Magistério. A distribuição
será proporcional aos respectivos vencimentos, mediante lei autori-
zativa de iniciativa do Chefe do Poder Executivo Municipal e aprova-
da pela Câmara de Vereadores.
6. A tabela salarial dos professores do ensino fundamental será revi-
sada para equalização com os efetivos valores do Fundef, evitando
ocorrência de saldo financeiro. (Grifou-se)

5 Essa jurisprudência é aplicável ao Fundeb porque as regras não alteradas pela legislação superveniente.
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A distribuição de eventual saldo na parcela do Fundeb 60% aos profissionais do
magistério pode ser realizada através de pagamento de abono salarial, instituído median-
te lei na qual se estabeleça o valor, a forma de pagamento e as demais regras para a sua
concessão. Neste sentido, é firme a jurisprudência dos Tribunais de Justiça dos Estados
da Paraíba (TJ-PB) e do Pernambuco (TJ-PE):

APELAÇÃO. AÇÃO ORDINÁRIA DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C


COBRANÇA. RECURSOS DO FUNDEB. PRETENSÃO DE RATEIO.
IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. REMUNERAÇÃO DOS PROFISSI-
ONAIS DO MAGISTÉRIO. SALDO REMANESCENTE. EXERCÍCIO
FINANCEIRO ANTERIOR. DIVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊN-
CIA DE NORMA MUNICIPAL REGULAMENTANDO OS CRITÉRIOS
OBJETIVOS DO REPASSE. OBEDIÊNCIA AO PRINCÍPIO DA LE-
GALIDADE. INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRU-
DÊNCIA. ENTENDIMENTO SUMULADO NO ÂMBITO DESTE SO-
DALÍCIO. MANUTENÇÃO DO DECISUM. SEGUIMENTO NEGADO.
A administração pública é regida, entre outros, pelo princípio da lega-
lidade, conforme preconizado no art. 37, caput, da Constituição Fe-
deral. - Nos moldes da Súmula nº 45, do Tribunal de Justiça da Para-
íba, editada em razão do julgamento do Incidente de Uniformização
de Jurisprudência nº 2000682-73.2013.815.0000, "O rateio das so-
bras dos recursos do FUNDEB fica condicionado à existência de lei
municipal regulamentado a matéria." - O art. 932, IV, "a", do Novo
Código de Processo Civil permite ao relator negar provimento a re-
curso que for contrário a súmula do próprio Tribunal. Vistos.
(TJPB - ACÓRDÃO/DECISÃO do Processo Nº
00004582320128150351, - Não possui -, Relator DES. FREDERICO
MARTINHO DA NÓBREGA COUTINHO , j. em 16-05-2017) (Grifou-
se)

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C CO-


BRANÇA - RATEIO DO FUNDEB - IMPROCEDÊNCIA - IRRESIG-
NAÇÃO - PREVISÃO DO REPASSE NA LEI FEDERAL Nº 11.494/07
- AUSÊNCIA DE LEGISLAÇÃO LOCAL SOBRE A MATÉRIA - PRIN-
CÍPIO DA LEGALIDADE - SÚMULA Nº 45 DO TJPB - APLICAÇÃO
DO ART. 932, IV, "a" DO NCPC - PROVIMENTO NEGADO. - "O re-
passe dos valores do fundeb está condicionado à existência de Lei
municipal, que estabeleça critérios claros para que o gestor municipal
possa utilizar o recurso, com o estabelecimento dos valores, a forma
de pagamento e os critérios objetivos para concessão aos beneficia-
dos." (TJPB; AC 051.2011.001115-5/001; Primeira Câmara Especiali-
zada Cível; Relª Juíza Conv. Vanda Elizabeth Marinho Barbosa;
DJPB 05/07/2013; Pág. 8) - "Súmula nº 45 do TJPB: "O rateio das
sobras dos recursos do FUNDEB fica condicionado à existência de
Lei Municipal regulamentando a matéria". Vistos, etc.
(TJPB - ACÓRDÃO/DECISÃO do Processo Nº
00004573820128150351, - Não possui -, Relator DES. SAULO
HENRIQUES DE SÁ BENEVIDES , j. em 21-03-2017) (Grifou-se)

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ADMINISTRATIVO. SERVIDORA MUNICIPAL. PROFESSORA. RE-
ADAPTAÇÃO FUNCIONAL PARA A FUNÇÃO DE AUXILIAR ADMI-
NISTRATIVO. RATEIO DAS SOBRAS DO FUNDEB. AUSÊNCIA DE
PREVISÃO LEGAL. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA LIMITADA PELO
PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. IMPOSSIBILIDADE DO PAGAMEN-
TO. RECURSO DE AGRAVO DESPROVIDO. DECISÃO UNÂNI-
ME.1. No que concerne à participação da agravante no rateio do
FUNDEB, a Lei 11.494/2007, regulamentadora do Fundo de Manu-
tenção e Desenvolvimento da Educação Básica de Valorização dos
Profissionais da Educação, dispõe, em seu art. 22, acerca da nature-
za do abono, o qual se constitui em uma forma de pagamento que
tem sido utilizada pelos Municípios, quando o total da remuneração
do conjunto dos profissionais do magistério da educação básica não
alcança o mínimo exigido de 60% do FUNDEB, nos termos do artigo
60, inciso XII, do ADCT da Constituição Federal. (...) 6. Outrossim, a
Constituição, ao estipular a utilização deste mínimo à remuneração
dos profissionais do magistério da educação básica, permitiu um pla-
nejamento anual adequado para sua aplicação, contudo, quando o
total da remuneração de tais profissionais não alcançar o mínimo
exigido, permite-se, em caráter provisório e excepcional, o pagamen-
to deste remanescente por meio do abono salarial.7. Assim, esse tipo
de pagamento deve ser efetuado em caráter provisório e excepcio-
nal, apenas nessas situações especiais e eventuais, não devendo
ser adotado em caráter permanente, como entendeu o Juízo de ori-
gem.8. Revela-se absolutamente inviável, no caso, condenar o ente
público a incorporar um benefício marcantemente condicional, sobre-
tudo à servidora que não ocupa a função do magistério da educação
básica, haja vista que, ainda que a agravante fosse enquadrada co-
mo profissional do magistério, o repasse dependeria de sobras orça-
mentárias, que, por sua própria natureza, podem, ou não, existir.
9. Recurso de Agravo desprovido.10. Decisão Unânime.
(Agravo 405610-40000283-70.2006.8.17.0840, Rel. Erik de Sousa
Dantas Simões, 1ª Câmara de Direito Público, julgado em
22/12/2015, DJe 22/01/2016) (Grifou-se)

Deve-se destacar, ainda, que devido ao caráter provisório e excepcional do abono


salarial, este benefício não se integra o salário de contribuição dos profissionais do magis-
tério para fins previdenciários, nos termos da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991.

Quanto a apuração dos limites mínimos a serem aplicados na educação, o saldo


remanescente se integra ao orçamento do exercício subsequente, compondo, por conse-
quência, a base de cálculo do exercício que o recebe. Nesta linha, segue a jurisprudência
do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (TCE-MG):

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CONSULTA - RECURSOS DO FUNDEB - REMUNERAÇÃO DOS
PROFISSIONAIS DO MAGISTÉRIO EM EFETIVO EXERCÍCIO -
BASE DE CÁLCULO PARA APURAÇÃO DOS 60% - O SALDO DE
RECURSOS DO FUNDEB TRANSFERIDOS PARA O EXERCÍCIO
SEGUINTE (§ 2º DO ART. 21 DA LEI N. 11.494/07) COMPÕE A BA-
SE DE INCIDÊNCIA, INTEGRANDO-SE AOS RECURSOS DO
EXERCÍCIO QUE O RECEBE - O SALDO REMANESCENTE DO
EXERCÍCIO ANTERIOR DEVERÁ SER UTILIZADO NO 1º TRIMES-
TRE DO EXERCÍCIO RECEPTOR, MEDIANTE ABERTURA DE
CRÉDITO ADICIONAL - DECISÃO UNÂNIME. O saldo dos recursos
do FUNDEB transferido para o exercício seguinte, nos termos do § 2°
do art. 21 da Lei n. 11.494/07, seja decorrente de verba não utilizada
ou do cancelamento de restos a pagar à conta do referido Fundo,
constitui superávit financeiro e incorpora a base de cálculo do FUN-
DEB do exercício subsequente, em face de sua natureza vinculativa,
compondo, portanto, o total da receita para efeito de cálculo dos 60%
afetos aos gastos com a remuneração dos profissionais do magisté-
rio em efetivo exercício, o qual deverá ser utilizado no 1º trimestre do
exercício receptor, mediante a abertura de crédito adicional.
(Consulta nº 838953. Rel. Cons. Cláudio Couto Terrão. Sessão do
dia: 21/11/12) (Grifou-se)

No mesmo sentido segue a manifestação do Conselho Nacional de Educação


(CNE) que, em consulta realizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores em
Educação – CNTE, se posicionou nos seguintes termos:

Com base nas disposições da legislação vigente, conforme exposto


no mérito, voto no sentido de que, observadas as limitações legais,
os 60% (sessenta por cento) dos recursos do FUNDEB, como míni-
mo, subvinculados à remuneração dos profissionais do magistério da
Educação Básica em efetivo exercício na rede pública, incidam sobre
os recursos anuais totais desse Fundo, nesses totais incluindo-se o
saldo positivo líquido da conta respectiva apurado em balanço e
transferido do exercício anterior.
(Parecer CNE/CEB n. 7/2008. Processo n. 23001.000037/2008-99)
(Grifou-se)

Portanto, havendo superávit financeiro nas fontes do Fundeb, o saldo apurado na


parcela do Fundeb 60% deverá ser aplicado na remuneração de profissionais do magisté-
rio em efetivo exercício. Por sua vez, o saldo apurado na parcela Fundeb 40% deverá ser
aplicado nas demais despesas relativas às ações de manutenção e desenvolvimento do
ensino, nos termos do art. 70 da LDB.

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Conclui-se, também, que o superávit financeiro apurado nas fontes do Fundeb se
integra ao orçamento do exercício subsequente, devendo compor, por consequência, a
base de cálculo dos percentuais mínimos de remuneração dos profissionais do magistério
da educação básica em efetivo exercício na rede pública e de demais despesas com ma-
nutenção e desenvolvimento do ensino do exercício que o recebe.

Questão 3: Caso seja apurado saldo superior ao limite de 5% previsto no art.


21, § 2º, da Lei nº 11.494/07, o Município poderá utilizá-lo na remuneração dos pro-
fissionais do magistério, mesmo já havendo cumprido o limite estabelecido no art.
60, inciso XII, dos ADCT, da CF/88?

O art. 60, em seu inciso XII combinado com o inciso I, dos Atos de Disposições
Constitucionais Transitórias – ADCT e o art. 22 da Lei nº 11.494/2007 dispõem que o Mu-
nicípio destinará, no mínimo, 60% da receita do referido Fundo para o pagamento dos
profissionais do magistério da educação básica em efetivo exercício.

Vale registrar que a parcela para remuneração dos profissionais do magistério em


efetivo exercício é de, no mínimo, 60% dos recursos do Fundeb. Portanto, não há veda-
ção para que se utilize até 100% dos recursos para remunerar estes profissionais.

Conforme analisado, caso ocorra saldo de recursos na conta do Fundeb, o supe-


rávit financeiro apurado na parcela do Fundeb 60% deverá ser aplicado na remuneração
de profissionais do magistério em efetivo exercício; enquanto o superávit financeiro apu-
rado na parcela Fundeb 40% deverá ser aplicado nas demais despesas com ações de
manutenção e desenvolvimento do ensino, nos termos do art. 70 da LDB.

Ademais, a distribuição de eventual saldo na parcela do Fundeb 60% aos profis-


sionais do magistério em efetivo exercício pode ser realizada através de pagamento de
abono salarial, instituído mediante lei na qual se estabeleça o valor, a forma de pagamen-
to e as demais regras para a sua concessão.

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Questão 4: Caso seja apurado saldo superior ao limite de 5% previsto no art.
21, § 2º, da Lei nº 11.494/07, o Município poderá remanejá-lo para fonte de recursos
ordinária e utilizá-lo no pagamento despesas normais da Administração?

Conforme analisado no tópico 2.4, o art. 8º, parágrafo único, da LRF, estabelece
que os recursos legalmente vinculados à finalidade específica serão utilizados exclusiva-
mente para atender ao objeto de sua vinculação, mesmo que em exercício diverso do que
ocorrer o ingresso.

A jurisprudência desta Corte é firme neste sentido:

Acórdão nº 789/2006 (DOE, 19/05/2006). Despesa. Restos a pa-


gar. Artigo 42, Lei de Responsabilidade Fiscal. Obras cuja exe-
cução ultrapassa o exercício. Obrigação de pagamento das par-
celas liquidadas no exercício. Apuração da disponibilidade fi-
nanceira considerando-se a vinculação dos recursos.
A interpretação do artigo 42, da Lei de Responsabilidade Fiscal, es-
pecialmente em relação a regras de contratação de obras cuja exe-
cução ultrapasse o exercício em curso, é:
(...)
5. Na apuração da disponibilidade financeira, é necessário considerar
a vinculação dos recursos, a exemplo dos provenientes de convê-
nios, Fundef e reservas previdenciárias, de aplicação exclusiva em
finalidades previstas na legislação, e, por essa razão, não podem ser
considerados disponíveis para despesas de natureza diversa. (Gri-
fou-se)

Portanto, não é possível transferir os saldos financeiros remanescentes da conta


do Fundeb, acima do limite de 5% fixado pelo art. 21, § 2º, da Lei nº 11.494/07, para fonte
de recursos ordinária visando o pagamento de despesas normais da Administração.

Questão 5: Caso o Município não atinja os limites legais mínimos da educa-


ção ou descumpra as regras de aplicação do Fundeb, em razão exclusivamente de
atrasos nos repasses de recursos do Estado, o gestor municipal será sancionado
pelo Tribunal de Contas?

A não aplicação do percentual mínimo de 25% da receita de impostos, compreen-


dida a proveniente de transferências na manutenção e desenvolvimento do ensino (art.
212 da CF/88) e a não destinação de, no mínimo, 60% dos recursos do Fundeb na remu-
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neração dos profissionais do magistério (art. 60, XII, do ADCT – CF/88) são consideradas
irregularidades gravíssimas, conforme a Resolução Normativa nº 17/2010 do TCE-MT.

Deste modo, o não atingimento destes limites percentuais se configura, de plano,


irregularidades passíveis de sanção. Contudo, no julgamento do caso concreto, cabe ao
magistrado de contas avaliar se a irregularidade deve ser atribuída à conduta do agente
público, ou seja, deve o julgador fazer o juízo de responsabilidade do agente.

Ao constatar, na análise do processo de contas, que a irregularidade ocorreu por


fato imprevisível e comprovadamente alheio à vontade do agente, e que sua conduta não
foi determinante para o resultado, pode o julgador, mediante avaliação de cada caso con-
creto, afastar a aplicação da sanção.

Neste sentido, segue a jurisprudência deste Tribunal:

19.52) Responsabilidade. Pagamento de juros e multas. Exclu-


dente de responsabilidade.
O agente público que deu causa ao pagamento de juros e multas,
decorrentes do atraso de obrigações contratuais, só pode se eximir
do dever de ressarcir os cofres públicos caso comprove a ocorrência
de fato excludente de responsabilidade que se equipare à força mai-
or ou caso fortuito.
(Contas Anuais de Gestão. Relator: Conselheiro José Carlos Novelli.
Acórdão nº 724/2014-TP. Julgado em 01/04/2014. Publicado no
DOC/TCE-MT em 15/04/2014. Processo nº 7.106-4/2013).

Conclui-se que, caso o Município não atinja os limites legais mínimos da educa-
ção ou descumpra as regras de aplicação do Fundeb, exclusivamente em razão dos atra-
sos nos repasses do Estado, devidamente comprovado no caso concreto, é possível a
exclusão da responsabilidade do gestor municipal.

Assim sendo, a aplicação ou não de sanção por descumprimento dos limites le-
gais mínimos da educação ou das regras de aplicação do Fundeb, exclusivamente em
razão dos atrasos nos repasses do Estado, será avaliada no julgamento de cada caso
concreto.

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4. CONCLUSÃO

Pelo exposto, conclui-se que:

a) Em regra, os recursos do Fundeb devem ser utilizados dentro do exercício fi-


nanceiro em que forem creditados ao Município, visto que sua dinâmica está
alicerçada no princípio da anualidade.

b) A única exceção à aplicação anual dos recursos do Fundeb está prevista no


art. 21, § 2º, da Lei nº 11.494/07, que admite a utilização de, no máximo, 5%
do valor recebido no primeiro trimestre do exercício imediatamente subse-
quente, mediante abertura de crédito adicional.

c) Os recursos vinculados ao Fundeb devem ser aplicados exclusivamente para


atender a sua finalidade legal e o seu controle orçamentário deve ser realizado
por fonte/destinação de recurso.

d) Não há previsão legal para o Município utilizar recursos de outras fontes, du-
rante o exercício financeiro, para pagamentos de despesas do Fundeb e pos-
teriormente devolvê-los às respectivas fontes.

e) Ocorrendo, eventualmente, superávit financeiro nas fontes do Fundeb, o saldo


apurado na parcela do Fundeb 60% deve ser aplicado na remuneração de
profissionais do magistério em efetivo exercício; enquanto o saldo apurado na
parte do Fundeb 40% deve ser aplicado nas demais ações de manutenção e
desenvolvimento do ensino.

f) A distribuição do saldo apurado na fonte do Fundeb 60% aos profissionais do


magistério pode ser realizada através de pagamento de abono, instituído me-
diante lei na qual se estabeleça o valor, a forma de pagamento e as demais
regras para a sua concessão.

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g) O superávit financeiro apurado nas fontes do Fundeb se integra ao orçamento
do exercício subsequente, devendo compor, por consequência, a base de cál-
culo dos percentuais mínimos de remuneração dos profissionais do magistério
da educação básica em efetivo exercício na rede pública e das demais despe-
sas com manutenção e desenvolvimento do ensino do exercício que o recebe.

h) É vedada a transferência do superávit financeiro apurado nas fontes de recur-


sos do Fundeb para fonte de recursos ordinária visando o pagamento de des-
pesas normais da Administração.

i) A aplicação ou não de sanção por descumprimento dos limites legais mínimos


da educação ou das regras de aplicação do Fundeb, exclusivamente em razão
dos atrasos nos repasses do Estado, será avaliada no julgamento de cada ca-
so concreto.

5. PROPOSTA DE ENCAMINHAMENTO

Ante o exposto, considerando-se os argumentos apresentados e a inexistência de


prejulgado nesta Corte que responda integralmente à presente Consulta, sugere-se, à
consideração do Tribunal Pleno, com fundamento no § 1º do art. 234 da Resolução
14/2007 (RITCE MT), a aprovação da seguinte ementa:

Resolução de Consulta nº__/2018. Educação. Fundeb. Atraso no


repasse do Estado aos Municípios. Aplicação e destinação da
sobra de recursos. Não aplicação dos percentuais mínimos na
educação. Excludente de responsabilidade.
1. Em regra, os recursos do Fundeb devem ser utilizados dentro do
exercício financeiro em que forem creditados ao Município, visto que
sua dinâmica está alicerçada no princípio da anualidade.
2. A única exceção à aplicação anual dos recursos do Fundeb está
prevista no art. 21, § 2º, da Lei 11.494/07, que admite a utilização de,
no máximo, 5% do valor recebido no primeiro trimestre do exercício
imediatamente subsequente, mediante abertura de crédito adicional.
3. Os recursos vinculados ao Fundeb devem ser aplicados exclusi-
vamente para atender a sua finalidade legal e o seu controle orça-
mentário deve ser realizado por fonte/destinação de recurso.
4. Não há previsão legal para o Município utilizar recursos de outras
fontes, durante o exercício financeiro, para pagamentos de despesas
do Fundeb e posteriormente devolvê-los às respectivas fontes.

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5. Ocorrendo, eventualmente, superávit financeiro nas fontes do
Fundeb, o saldo apurado na parcela do Fundeb 60% deve ser apli-
cado na remuneração de profissionais do magistério em efetivo exer-
cício; enquanto o saldo apurado na parte do Fundeb 40% deve ser
aplicado nas demais ações de manutenção e desenvolvimento do
ensino.
6. A distribuição do saldo apurado na fonte do Fundeb 60% aos pro-
fissionais do magistério pode ser realizada através de pagamento de
abono, instituído mediante lei na qual se estabeleça o valor, a forma
de pagamento e as demais regras para a sua concessão.
7. O superávit financeiro apurado nas fontes do Fundeb se integra ao
orçamento do exercício subsequente, devendo compor, por conse-
quência, a base de cálculo dos percentuais mínimos de remuneração
dos profissionais do magistério da educação básica em efetivo exer-
cício na rede pública e de demais despesas com manutenção e de-
senvolvimento do ensino do exercício que o recebe.
8. É vedada a transferência do superávit financeiro apurado nas fon-
tes do Fundeb para fonte de recursos ordinária visando o pagamento
de despesas normais da Administração.
9. A aplicação ou não de sanção por descumprimento dos limites le-
gais mínimos da educação ou das regras de aplicação do Fundeb,
exclusivamente em razão dos atrasos nos repasses do Estado, será
avaliada no julgamento de cada caso concreto.

Cuiabá-MT, 29 de maio de 2018.

Saulo Pereira de Miranda e Silva Gabriel Liberato Lopes


Auditor Público Externo Secretário Chefe da Consultoria Técnica

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