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Manaus – AM
Setembro de 2019
LÉXICO DE TERMOS FUNDAMENTAIS À COMPREENSÃO DA TEORIA DO
CONHECIMENTO I
ALIENAÇÃO (in. Alienation; fr. Aliénation; ai. Entfremdung; it. Alienazione): Esse
termo, que na linguagem comum significa “perda de posse, de um afeto ou dos poderes
mentais”, foi empregado pelos filósofos com certos significados específicos. 1. Na
Idade Média, às vezes foi usado para indicar um grau de ascensão mística em direção a
Deus. Assim, Ricardo de S. Vítor considera a A. como o terceiro grau da elevação da
mente a Deus (depois da dilatação e do solevamentó) e considera que ela consiste no
abandono da lembrança de todas as coisas finitas e na transfiguração da mente em um
estado que não tem nada mais de humano (De gratia contemplatíonis, V, 2). Nesse
sentido, a A. não é senão o êxtase (v.). 2. Esse termo foi empregado por Rousseau para
indicar a cessão dos direitos naturais à comunidade, efetuada com o contrato social. “As
cláusulas deste contrato reduzem-se a uma só: a A. total de cada associado, com todos
os seus direitos, a toda a comunidade” (Contrato social, I, 6). 3. Hegel empregou o
termo para indicar o alhear-se a consciência de si mesma, pelo qual ela se considera
como uma coisa. Este alhear-se é uma fase do processo que vai da consciência à
autoconsciência. “A A. da autoconsciência”, diz Hegel, “coloca, ela mesma, a
coisalidade, pelo que essa A. tem significado não só negativo, mas também positivo, e
isto não só para nós ou em si, mas também para a própria autoconsciência. Para esta, o
negativo do objeto ou a auto-subtração deste último tem significado positivo, isto é, ela
mesma; de fato, nessa A. ela coloca-se a si mesma como objeto ou, por força da
inscindível unidade do ser-para-si, coloca o objeto como si mesma, enquanto, por outro
lado, nesse ato está contido o outro momento do qual ela tirou e retomou em si mesma
essa A. e objetividade, estando, portanto, no seu ser outra coisa como tal, junto a si
mesma. Este é o movimento da consciência que nesse movimento é a totalidade dos
próprios momentos” (Phãnomen. des Geistes, VIII, 1).
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APRIORISMO: Doutrina ou princípio que atribui papel central a experiências ou
raciocínios a priori.
CULTURA (lat. cultura): 1. Conceito que serve para designar tanto a formação do
espírito humano quanto de toda a personalidade do homem: gosto, sensibilidade,
inteligência. 2. Tesouro coletivo de saberes possuído pela humanidade ou por certas
civilizações: a cultura helênica, a cultura ocidental etc. 3. Em oposição a natura
(natureza), a cultura possui um duplo sentido antropológico: a) é o conjunto das
representações e dos comportamentos adquiridos pelo homem enquanto ser social. Em
outras palavras, é o conjunto histórica e geograficamente definido das instituições
características de determinada sociedade, designando “não somente as tradições
artísticas, científicas, religiosas e filosóficas de uma sociedade, mas também suas
técnicas próprias, seus costumes políticos e os mil usos que caracterizam a vida
cotidiana” (Margaret Mead); b) é o processo dinâmico de socialização pelo qual todos
esses fatos de cultura se comunicam e se impõem em determinada sociedade, seja pelos
processos educacionais propriamente ditos, seja pela difusão das informações em
grande escala, a todas as estruturas sociais, mediante os meios de comunicação de
massa. Nesse sentido, a cultura praticamente se identifica com o modo de vida de uma
população determinada, vale dizer, com todo o conjunto de regras e comportamentos
pelos quais as instituições adquirem um significado para os agentes sociais e através dos
quais se encarnam em condutas mais ou menos codificadas. 4. Num sentido mais
filosófico, a cultura pode ser considerada como um feixe de representações, de
símbolos, de imaginário, de atitudes e referências suscetível de irrigar, de modo bastante
desigual, mas globalmente, o corpo social. 5. Cultura de massa é uma expressão, de uso
ambíguo, frequentemente utilizada para designar a possibilidade de uma população ter
acesso aos bens e obras culturais produzidos no passado e no presente.
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verificável” (Louis de Broglie). 2. Doutrina filosófica que implica a negação do *livre-
arbítrio e segundo a qual tudo, no universo, inclusive a vontade humana, está submetido
à necessidade. Com Descartes, a natureza é matemática em sua essência: uma natureza
que não fosse matemática contradiria a ideia de perfeição divina. Para Espinoza, “não
há na alma nenhuma vontade absoluta ou livre”. Em Kant, o determinismo deixa de ser
metafísico para fazer parte da legislação que o espírito impõe às coisas para conhecê-
las. Não há oposição entre o determinismo e a liberdade, porque ele pertence à ordem
dos fenômenos, enquanto a liberdade pertence à ordem numenal. 3. O princípio do
determinismo universal é aquele segundo o qual todos os fenômenos naturais estão
ligados uns aos outros por relações invariáveis ou leis. Inaugurado por Laplace, este
princípio afirma que o conhecimento do estado do universo, num momento dado, e o
conhecimento das leis da mecânica permitem prever rigorosamente todos os estados
futuros, porque não há nenhuma independência das séries causais. “Devemos considerar
o estado presente do universo como o efeito de seu estado anterior e como a causa
daquilo que vai seguir-se. Uma inteligência que, por um instante dado, conhecesse todas
as forças de que a natureza é animada e a situação respectiva dos seres que a compõem,
englobaria na mesma fórmula os movimentos dos maiores corpos do universo e os do
mais leve átomo; nada seria incerto para ela, e o futuro, como o passado, seria presente
a seus olhos” (Laplace). Observemos que esse determinismo cada vez mais cede lugar a
um postulado mais próximo da realidade científica: o real é inteligível. Fala-se ainda de
determinismo psicológico: nosso passado, nossa educação e nossa situação social
determinam (são a causa de) aquilo que acreditamos ser nossas escolhas. Em outras
palavras, o determinismo psíquico é uma teoria segundo a qual toda ideia, toda imagem,
toda representação etc., vindo espontaneamente à consciência, encontra-se
necessariamente ligada ao conflito patogênico do qual ela é a representação despistada.
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pensarmos a história, diz Hegel, importa-nos concebê-la como sucessão de momentos,
cada um deles formando uma totalidade, momento que só se apresenta opondo-se ao
momento que o precedeu: ele o nega manifestando suas insuficiências e seu caráter
parcial; e o supera na medida em que eleva a um estágio superior, para resolvê-los, os
problemas não resolvidos. E na medida em que afirma uma propriedade comum do
pensamento e das coisas, a dialética pretende ser a chave do saber absoluto: do
movimento do pensamento, poderemos deduzir o movimento do mundo; logo, o
pensamento humano pode conhecer a totalidade do mundo (caráter metafísico da
dialética). 4. Marx faz da dialética um método. Insiste na necessidade de considerarmos
a realidade socioeconômica de determinada época como um todo articulado,
atravessado por contradições específicas, entre as quais a da luta de classes. A partir
dele, mas graças sobretudo à contribuição de Engels, a dialética se converte no método
do materialismo e no processo do movimento histórico que considera a Natureza: a)
como um todo coerente em que os fenômenos se condicionam reciprocamente; b) como
um estado de mudança e de movimento; c) como o lugar onde o processo de
crescimento das mudanças quantitativas gera, por acumulação e por saltos, mutações de
ordem qualitativa; d) como a sede das contradições internas, seus fenômenos tendo um
lado positivo e o outro negativo, um passado e um futuro, o que provoca a luta das
tendências contrárias que gera o progresso (Marx-Engels).
EPISTEMOLOGIA (do gr. episteme: ciência, e logos: teoria): Disciplina que toma as
ciências como objeto de investigação tentando reagrupar: a) a crítica do conhecimento
científico (exame dos princípios, das hipóteses e das conclusões das diferentes ciências,
tendo em vista determinar seu alcance e seu valor objetivo); b) a filosofia das ciências
(empirismo, racionalismo etc.); c) a história das ciências. O simples fato de hesitarmos,
hoje, entre duas denominações (epistemologia e filosofia das ciências) já é sintomático.
Segundo os países e os usos, o conceito de “epistemologia” serve para designar, seja
uma teoria geral do conhecimento (de natureza filosófica), seja estudos mais restritos
concernentes à gênese e à estruturação das ciências. No pensamento anglo-saxão,
epistemologia é sinônimo de teoria do conhecimento (ou gnoseologia), sendo mais
conhecida pelo nome de “philosophy of science”. É neste sentido que se fala de
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epistemologia a propósito dos trabalhos de Piaget versando sobre os processos de
aquisição dos conhecimentos na criança. O fato é que um tratado de epistemologia pode
receber títulos tão diversos como: “A lógica da pesquisa científica”, “Os fundamentos
da física”, “Ciência e sociedade”, “Teoria do conhecimento científico”, “Metodologia
científica”, “Ciência da ciência”, “Sociologia das ciências” etc. Por essa simples
enumeração, podemos ver que a epistemologia é uma disciplina proteiforme que,
segundo as necessidades, se faz “lógica”, “filosofia do conhecimento”, “sociologia”,
“psicologia”, “história” etc. Seu problema central, e que define seu estatuto geral,
consiste em estabelecer se o conhecimento poderá ser reduzido a um puro registro, pelo
sujeito, dos dados já anteriormente organizados independentemente dele no mundo
exterior, ou se o sujeito poderá intervir ativamente no conhecimento dos objetos. Em
outras palavras, ela se interessa pelo problema do crescimento dos conhecimentos
científicos. Por isso, podemos defini-la como a disciplina que toma por objeto não mais
a ciência verdadeira de que deveríamos estabelecer as condições de possibilidade ou os
títulos de legitimidade, mas as ciências em via de se fazerem, em seu processo de
gênese, de formação e de estruturação progressiva.
IDEOLOGIA (in. Ideology; fr. Idéologie; ai. Ideologie; it. Ideologia): 1. Termo que se
origina dos filósofos franceses do final do séc. XVIII, conhecidos como “ideólogos”
(*Destutt de Tracy, *Cabanis, dentre outros), para os quais significava o estudo da
origem e da formação das ideias. Posteriormente, em um sentido mais amplo, passou a
significar um conjunto de ideias, princípios e valores que refletem uma determinada
visão de mundo, orientando uma forma de ação, sobretudo uma prática política. Ex.:
ideologia fascista, ideologia de esquerda, a ideologia dos românticos etc. 2. Marx e
Engels utilizam o termo em A ideologia alemã (1845/1846), em um sentido crítico, para
designar a concepção idealista de certos filósofos hegelianos (*Feuerbach, *Bauer,
*Stirner) que restringiam sua análise ao plano das ideias, sem atingir portanto a base
material de onde elas se originam, isto é, as relações sociais e a estrutura econômica da
sociedade. A ideologia é assim um fenômeno de *superestrutura, uma forma de
pensamento opaco, que, por não revelar as causas reais de certos valores, concepções e
práticas sociais que são materiais (ou seja, econômicas), contribui para sua aceitação e
reprodução, representando um “mundo invertido” e servindo aos interesses da classe
dominante que aparecem como se fossem interesses da sociedade como um todo. Nesse
sentido, a ideologia se opõe à ciência e ao pensamento crítico. “A produção das ideias,
das representações, da consciência é diretamente entrelaçada com a atividade material e
com as relações dos homens. Se na ideologia os homens e as suas relações aparecem de
cabeça para baixo, como numa câmara escura, esse fenômeno deriva-se do processo
histórico de suas vidas. Os pensamentos dominantes nada mais são do que a expressão
ideológica das relações materiais dominantes concebidas sob a forma de pensamentos,
por conseguinte as relações que fazem de uma classe a classe dominante, por
conseguinte os pensamentos de sua dominação” (Marx e Engels, A ideologia alemã). 3.
O termo “ideologia” é amplamente utilizado, sobretudo por influência do pensamento
de Marx, na filosofia e nas ciências humanas e sociais em geral, significando o processo
de racionalização — um autêntico mecanismo de defesa — dos interesses de uma classe
ou grupo dominante. Tem por objetivo justificar o domínio exercido e manter coesa a
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sociedade, apresentando o real como homogêneo, a sociedade como indivisa,
permitindo com isso evitar os conflitos e exercer a dominação.
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simplesmente I. ou século das luzes. l s O I., por um lado, adota a/écartesiana na razão
e, por outro lado, acha que é bem mais limitado o poder da razão. A lição da modéstia
que o empirismo inglês, sobretudo em Locke, dera às pretensões cognoscitivas do
homem não é esquecida: o empirismo, aliás, passa a fazer pa/te integrante do I. A
expressão típica desta limitação dos poderes da razão é a doutrina da coisa em si (v.),
lugar-comum do I. e como tal compartilhado por Kant. Essa doutrina significa que os
poderes cognoscitivos humanos, tanto sensíveis quanto racionais, vão até onde vai o
fenômeno, mas não além. Assim, o I. é caracterizado, em primeiro lugar, pela extensão
da crítica racional aos poderes cognoscitivos, portanto pelo reconhecimento dos limites
entre a validade efetiva desses poderes e suas pretensões fictícias. O criticismo kantiano,
que, como Kant afirma, pretende levar a razão ao tribunal da razão (Crít. R. Pura, Pref. à
l1 edição), nada mais é que a realização sistemática de uma tarefa que todo o I. assumiu.
Ao lado desta limitação dos poderes cognoscitivos, primeira característica do I. por ser
o primeiro efeito do compromisso de estender a crítica racional a qualquer campo, há
outro aspecto fundamental desse mesmo compromisso: não existem campos
privilegiados, dos quais a crítica racional deva ser excluída. Sob este segundo aspecto, o
I., mais que extensão, é correção fundamental do cartesianismo. De fato, para Descartes
a crítica racional não tinha direitos fora do campo da ciência e da metafísica. Os campos
da política e da religião deveriam continuar sendo tabus, e no próprio campo da moral
Descartes acha que a razão não tenha a sugerir outra coisa a não ser a reverência às
normas tradicionais. O I. não aceita estas renúncias cartesianas; seu primeiro ato, aliás,
foi estender a indagação racional ao domínio da religião e da política. O deísmoiy.)
inglês é de fato a primeira manifestação do I.; consiste na tentativa de determinar a
validade da religião "nos limites da razão" (como dirá Kant), mas de uma razão cujas
possibilidades jã foram delimitadas previamente pela experiência. Por outro lado, os
Tratados sobre o governo de Locke iniciam a crítica política iluminista, depois retomada
e levada a termo por Montesquieu. Turgot, Voltaire e pelos escritores da Revolução. No
domínio moral, a Teoria dos sentimentos morais (1759) de Adam Smith, as obras dos
moralistas franceses (La Rochefoucauld, La Bruyère, Vauvenargues), que punham em
evidência a importância do sentimento e das paixões na conduta do homem, bem como
as doutrinas morais de Hume, marcam a abertura deste campo de indagação à crítica
racional e à busca de novos fundamentos para a vida moral do homem. Ao mesmo
tempo, a obra de BECCARIA, Dei diritti e delle pene (1764), abria à indagação racional
o domínio do direito penal. Obviamente, os resultados obtidos em todos esses campos
são diferentes e sua importância varia. Mas o significado do I. não consiste na soma de
seus resultados, mas no fato de haver aberto à crítica domínios até então fechados e por
haver iniciado em tais domínios um trabalho eficaz que desde então não foi
interrompido. A atitude crítica própria do I. está bem expressa em sua resoluta
hostilidade à tradição. Na tradição, o I. vê uma força hostil que mantém vivas crenças e
preconceitos que é sua obrigação destruir. Aquilo que impropriamente tem-se
denominado anti-hístoricismo iluminista na realidade é antitradicionalismo: a recusa em
aceitar a autoridade de tradição e de reconhecer nela qualquer valor independente da
razão. O Dicionário histórico e critico (1697) de Bayle, concebido como coletânea e
refutação dos erros da tradição, é o maior documento da atitude constante dos
iluministas de todos os países. Tradição e erro para eles coincidiam. E embora hoje essa
tese possa parecer extremista e tão dogmática quanto a tese que identifica tradição e
verdade, não se deve esquecer que só ela, graças a um esforço hercúleo, possibilitou a
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libertação dos fortes entraves que a tradição impunha à livre pesquisa, permitindo
chegar aos novos conceitos (de que ainda hoje dispomos) de história e de historiografia.
Esta última vinha constituindo, nesse período, os cânones que lhe garantiam, na medida
do possível, a Independência em relação a crenças e preconceitos no reconhecimento e
na avaliação dos fatos. Por outro lado, a história vinhase configurando como o
progresso possível (v. adiante). 2 e Já se disse que o empirismo fez parte do í. De fato,
só a atitude empirista garante a abertura do domínio da ciência e, em geral, do
conhecimento, à crítica da razão, pois consiste em admitir que toda verdade pode e deve
ser colocada à prova, eventualmente modificada, corrigida ou abandonada. ISSO
explica por que o I. sempre esteve estritamente unido à atitude empirista. O empirismo é
o ponto de partida e o pressuposto de muitos deístas; é a filosofia defendida por
Voltaire, Diderot, D'Alembert e que, através da obra de Wolff, domina os rumos do I.
alemão até Kant. Em estreita ligação com essa atitude está a importância que o I. atribui
à ciência. Com o I., a ciência, esta filha mais nova da cultura ocidental, candidata-se ao
primeiro lugar na hierarquia das atividades humanas. A física, cuja primeira
sistematização se encontra na obra de NEWTON {Princípios matemáticos de filosofia
natural, 1687), é acatada pelos iluministas como a ciência mãe ou como a "verdadeira"
filosofia. As pesquisas de Boyle encaminham a química para a guinada decisiva, que
levou à sua organização como ciência positiva; a obra de Buffon e de outros naturalistas
assinala, também para as ciências biológicas, etapas fundamentais de desenvolvimento.
Mas, também aí, o mais importante não são os resultados obtidos, mas sim a direção do
caminho tomado. Tudo o que esses resultados têm de dogmático, incompleto,
provisório, pode ser corrigido pelo próprio compromisso fundamental do I., de não
bloquear a obra da razão em nenhum campo e em nenhum nível. 3 a O I. não é somente
uso crítico da razão; é também o compromisso de utilizar a razão e os resultados que ela
pode obter nos vários campos de pesquisa para melhorar a vida individual e social do
homem. Esse compromisso não é compartilhado igualmente por todos os iluministas.
Alguns deles, que contribuíram de forma eminente para o desenvolvimento da crítica
racional do mundo humano, não o aceitam. Isso ocorre, p. ex., com Hume, que declara
filosofar para seu próprio deleite. Mas, por outro lado, ele constitui a substância da
personalidade de muitos pensadores iluministas e também de empreendimentos como a
Enciclopédia, que tomaram para si a tarefa da luta contra o preconceito e a ignorância.
Essa luta, assim como a luta contra os privilégios empreendida pela Revolução Francesa
com base nos compromissos e nas concepções iluministas, tem como objetivo declarado
a felicidade ou o bemestar do gênero humano. Nesse aspecto, o I. é responsável por
duas concepções de fundamental importância para a cultura moderna e contemporânea:
a concepção de tolerância e a de progresso. O princípio da tolerância religiosa, que não
só exige a convivência pacífica das várias confissões religiosas, mas também impede
que a religião se torne um instrumento de governo, encontra no I. a primeira defesa no
sentido de defini-lo como elemento da cultura ocidental, não suscetível de negação no
âmbito dessa mesma cultura. Por outro lado, o compromisso de transformação, próprio
do I., leva à concepção da história como progresso, ou seja, como possibilidade de
melhoria do ponto de vista do saber e dos modos de vida do homem. Voltaire,
Condorcet e Turgot são os que mais contribuem para formular a noção de um devir
histórico aberto à obra do homem, suscetível de receber as marcas que o homem lhe
quer imprimir. Essa noção serviu para apagar o sentimento de fatalidade histórica que
impedia qualquer iniciativa de transformação. Mais tarde, o Romantismo dirá que a
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história é a própria Razão Absoluta, que nela, em cada um de seus momentos, tudo
aquilo que deve ser é e o progresso é fatal ou inevitável; e verá no I., que contrapôs a
história à tradição e negou esta última, uma concepção "abstrata" ou "anti-histórica".
Mas na realidade o que o Romantismo visava era apenas declarar inútil ou impossível o
compromisso de transformação: confiando na força da Razão Histórica, pretendia
imprimir o selo da eternidade nas instituições em que a via encarnada. Isso confirma
que, se e quando a filosofia quiser assumir a tarefa (que Platão já lhe atribuía) de
transformar o mundo humano, a atitude iluminista e seus pressupostos fundamentais são
as primeiras condições dessa tarefa.
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sobre aquilo que se oculta por trás da natureza, e a torna possível. A diferença (entre a
física e a metafísica) repousa, grosso modo, sobre a distinção kantiana entre fenômeno e
coisa-em-si” (Schopenhauer).
NATUREZA (gr. púoiç; lat. Natura, in. Nature, fr. Nature, ai. Natur, it. Natura): 1. O
mundo físico, como conjunto dos reinos mineral, vegetal e animal, considerado como
um todo submetido a leis, as “leis naturais” (em oposição a leis morais e a leis
políticas). As forças que produzem os fenômenos naturais. Em um sentido teológico, o
mundo criado por Deus. Opõe-se a cultura, no sentido daquilo que é criado pelo
homem, que é produto de uma obra humana. Opõe-se também a sobrenatural, aquilo
que transcende o mundo físico, que lhe é externo. 2. Natureza de um ser: sinônimo de
*essência; conjunto de propriedades que definem uma coisa. Ex.: “Sou uma substância
cuja essência ou natureza é pensar” (Descartes). 3. Tudo aquilo que é próprio do
indivíduo, aquilo que em um ser é inato e espontâneo. Ex.: a inteligência como um dom
da natureza ou um dom natural. 4. Estado de natureza: hipoteticamente, o estado em que
viviam os seres humanos, sem leis, antes de se organizarem em sociedade. Segundo
Hobbes, seria o domínio da anarquia e do conflito, “a guerra de todos contra todos”.
Segundo Rousseau, o estado do “bom selvagem”, a pureza originária do homem. “O
homem nasce bom, a sociedade o corrompe.” 5. Nas éticas estoica e epicurista, a
natureza é o fundamento dos princípios morais. O ser humano faz parte do mundo
natural, sendo que os preceitos morais em que se deve basear a conduta humana
consistem em reproduzir a harmonia do próprio cosmo, atingindo assim o homem o
equilíbrio que haveria na natureza. 6. Filosofia da natureza: classicamente, a
cosmologia. Estudo dos princípios e leis que governam o mundo natural, p. ex., a
causalidade. Em Kant, a filosofia teórica, o conhecimento racional da realidade baseado
em conceitos, em oposição à filosofia prática, o domínio da moral e dos valores.
NECESSIDADE (gr. xpeía ou àváyicn; lat. Necessitas; in. Need; fr. Besoin; ai.
Bedürfniss; it. Bisogno): Característica daquilo que é *necessário, admitindo as
seguintes acepções: 1. Necessidade física: determinação de um encadeamento causal,
relação em que uma mesma causa determina sempre um mesmo efeito. Trata-se da
necessidade tal qual existe no mundo físico, material. Ver causalidade; determinismo. 2.
Necessidade lógica: é necessária a *proposição cuja contraditória implica a
*contradição, seja em termos absolutos, seja dependendo de certos pressupostos do
universo de discurso. “É necessário que todo objeto seja igual a si mesmo” (lei da
identidade). Ver modalidade; verdade. 3. Necessidade metafísica: o *ser necessário é
aquele que não depende de nenhuma outra causa ou condição para existir. P. ex., Deus,
segundo Descartes; a *substância, segundo Espinoza. Oposto a contingência. 4.
Necessidade ética: obrigação expressa por um *imperativo categórico. Dever que
resulta da *lei moral. 5. Em Kant, a necessidade é uma das três categorias da
modalidade, resultando da união da possibilidade com a existência (Crítica da razão
pura). 6. Hume, e em geral os céticos, argumentam que a necessidade é apenas resultado
de nossa forma habitual de perceber o real, projetando-se sobre este, sendo portanto de
natureza meramente psicológica.
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OBSTÁCULO (in. Obstacle, Hindrance, fr. Obstacle. ai. Hinderniss; it. Ostacolo):
Limite à atividade. Fichte definiu o O. do seguinte modo: "O que significa uma
atividade e como se torna atividade? Simplesmente pelo fato de a ela se opor um
O."(Sittenlehre, 1798, Intr., § VI; Werke, IV, p. 7). Cf. R. LE SI-NNK, Obstacle et
raleur, 1934.
OBSTÁCULO EPISTEMOLÓGICO: Retardos ou perturbações que se incrustam no
próprio ato de conhecer, apresentando-se como um instinto de conservação do
pensamento, como uma preferência dada mais às respostas do que às perguntas e
impondo-se como causas de inércia. Os principais obstáculos, detectados por Bachelard,
são: a *experiência primeira do senso comum, o conhecimento geral e o
*substancialismo.
PRÁXIS: Com esta palavra (que é a transcrição da palavra grega que significa ação), a
terminologia marxista designa o conjunto de relações de produção e trabalho, que
constituem a estrutura social, e a ação transformadora que a revolução deve exercer
sobre tais relações. Marx dizia que é preciso explicar a formação das idéias a partir da
"práxis material", e que, por conseguinte, formas e produtos da consciência só podem
ser eliminados por meio da "inversão prática das relações sociais existentes", e nào por
meio da "crítica intelectual" (A ideologia alemã, 2; trad. it., p. 34) (v.
MATKRIALISMO HISTÓRICO). Por "inversão da P.". Engels entendeu a reação do
homem às condições materiais da existência, sua capacidade de inserir-se nas relações
de produção e de trabalho e de transformá-las ativamente: esta possibilidade é a
subversão da relação fundamental entre estruturai: superestrutura, em virtude cia qual é
somente a primeira (a totalidade das relações de produção e de trabalho) que determina
a segunda, constituída pelo conjunto das atividades espirituais humanas (cf. ENGHI.S,
Antidübring, 1878).
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positivo e crítico. Pode ainda limitar-se a um domínio ou aspecto da experiência
humana: racionalismo moral, racionalismo religioso (Feuerbach), racionalismo político
(Montesquieu) etc.
SER SOCIAL (do lat. socialis: feito para a sociedade): Caráter próprio do homem de
viver naturalmente em sociedade: “O homem é um animal social” (*Aristóteles).
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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