Você está na página 1de 138

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO


GRADUAÇÃO EM GEOLOGIA

ASPECTOS GEOMORFOLÓGICOS DA ANTIGA ARARAQUARA,


COM ÊNFASE EM SUBSÍDIOS PARA INTERFACE ENTRE QUADROS
DE RELEVO E SÍTIOS ARQUEOLÓGICOS LÍTICOS

Pedro Michelutti Cheliz

Orientador: Prof. Dr. Francisco Sérgio Bernardes Ladeira

Campinas-SP
Dezembro de 2016

1
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO


GRADUAÇÃO EM GEOLOGIA

ASPECTOS GEOMORFOLÓGICOS DA ANTIGA ARARAQUARA,


COM ÊNFASE EM SUBSÍDIOS PARA INTERFACE ENTRE QUADROS
DE RELEVO E SÍTIOS ARQUEOLÓGICOS LÍTICOS

Pedro Michelutti Cheliz

Trabalho de conclusão de curso


apresentado em 13 de Dezembro de 2016
para obtenção do título de Bacharel em
Geologia pelo Instituto de Geociências da
UNICAMP.

Banca Examinadora:
Prof. Dr. Francisco Sérgio Bernardes Ladeira (Orientador)
Prof. Dr.. Pedro Wagner Gonçalvez
Prof. Dr. Fresia Soledad Ricardi Torres Branco

2
Trabalho dedicado aos estudantes em movimento, que em meio a tanta
injustiça e comodismo tomam posição, acreditam e lutam. Pela gratidão
de poder ter convivido com pessoas tão incríveis e humanas - que com
sua resistência, lealdade, empatia, coragem e sonhos relembram as
pessoas de coisas que os atropelos e durezas da vida as vezes fazem
esquecer.

3
Agradecimentos aos amigos, familiares, colegas do Museu de
Arqueologia e Paleontologia de Araraquara e professores e funcionários
do Instituto de Geociências-UNICAMP. E aos professores que pude ter
em Araraquara antes da universidade, que tanto se dedicavam e
procuravam se doar para semear em nos vocações, sentimentos, empatia
e valores... Especialmente a Édina Broldim (Santa Lucia) , dona Silvia
e dona Eneilda (SESI 158) e Manoel Martins (ETE Anna de Oliveira,
“Industrial”) que, cada um a sua maneira e seu foco, nos passavam que
os caminhos só vale a pena quando se volta para algo maior do que nos
mesmos. Ao Manoel em especial por, além de estimular sensibilidade
com a vida, ter todo seu foco especial em semear em nos a sensibilidade
com a natureza e com as temáticas indígenas, temas do presente do
trabalho

4
"Os alunos estão sofrendo um processo tremendo, mas são inteligentíssimos. (...) Tem uma
mocidade fantástica. Fico boquiaberto com a reação deles. (...) Descobrem e cobram. Greve
geral. Ocuparam o Conselho Universitário. Quebraram e derrubaram a porta do Conselho para
entrar, depois se cotizaram e pagaram o conserto depois. (...) Vai haver muita necessidade de
lutar por princípios e valores nos próximos tempos. Gostaria que muitas outras pessoas
pensassem como a gente. Temos que continuar a luta seja contra qual governo for. (...) O que me
dá esperança no Brasil são os jovens estudantes. São eles que não se dobram as pressões"
- Aziz Nacib Ab`Saber

5
“...O impacto da conquista europeia sobre as populações nativas do continente americano foi
imenso. É certo que milhares de pessoas morreram por causa do contato direto e indireto com os
europeus e as doenças por eles trazidas. Devoradores dos inimigos pelo ritual antropofágico,
esses povos indígenas foram devorados e destruídos nas guerras de conquista dos colo-
nizadores, em suas bandeiras e em suas missões. (...) Hoje, mais de cinco séculos depois (e
apesar de tudo), vários grupos insistem em continuar vivendo e afirmando, de modo dinâmico,
seu modo de ser e sua diversidade. Como reparação mínima, os Guarani conseguiram fazer
memória de si. Mortos, ascenderam à imortalidade da lembrança”.
- Rodrigues (2008)

“Lembro de um velho índio contando histórias / De passagens, glórias e tragédias desta terra que
não vivi / Quando das estrelas vieram luzes / E seus sinais estão por ai / Depois de um certo
tempo elas foram embora / E vieram os invasores das terras dos Guarani / Não houve paz /
Sofreu demais quem te ama / Linda, bela Serra / Seus mistérios quero traduzir / Descobrir as
lendas e memórias / De cada légua que eu te percorri”
-Adaptado de Almir Sater

6
RESUMO

Presente trabalho se propõe a estudo geomorfológico de semi-detalhe com foco na compartimentação do relevo num
segmento interiorizado das escarpas basálticas da Bacia do Paraná, correspondente a área da Antiga Araraquara (centro
do estado de São Paulo). A área de estudo realça-se pois quadros morfológicos e registros da estrutura superficial
mesclam-se a registro de numerosos sítios arqueológicos líticos. Coloca-se em pauta a possibilidade de usar inserção dos
sítios nos quadros de relevo e da estrutura superficial como apoio para compreender interpretação de processos
geomorfogenéticos locais, e fornecer - através dos dados levantados dos quadros de relevo e sucessões
cronomorfológicas estimadas - ponderações para discutir aspectos dos sítios arqueológicos em si – em especial, sua
distribuição e validade da aceitação da antiguidade proximal a transição Pleistoceno-Holoceno que discute-se tribuir a
parcela dos citados registros antrôpicos (sítio lítico Boa Esperança do Sul II, BES II). Diante do contexto e objetivos
propostos, buscou-se realizar mapeamento geológico e morfométrico da área de estudo, sobrepondo as duas bases de
dados cartográficos com o fim de delimitar principais unidades de compartimentos de relevo ligadas ao terceiro táxon da
análise geomorfológica de Ross (1990). Delimitou-se as unidades dos Planaltos Residuais de Araraquara, Patamares
Transicionais e Terras Baixas do Jacaré e Mogi-Guaçu. Sumariamente, sugeriu-se que os traços gerais dos grandes
compartimentos de relevo na área relacionam-se a alternância entre processos com predomomínio de plainação lateral
com outros vinculados a dominância de incisão vertical como um dos responsáveis pelos contrastes morfológicos
essenciais da área, com referidos processos tendo ressaltado as diferenciadas resistência das unidades litológicas locais
como fatores do relevo. Verificou-se que maior parte dos referidos sítios e seus achados de mais significativa quantidade
e variedade quantidade de peças encontram-se sobrepostos a segmentos dos quadros de relevo dos Patamares
Transicionais. Discutiu-se possibilidade de maior disponibilidade de afloramentos rochosos capazes de fornecer
matérias-primas para confecção de artefatos líticos decorrentes de mais elevadas declividades destes quadros de relevo e
menor espessura do manto de alteração serem um dos fatores de controle para tal cenário. Verificou-se que uma das
exceção a esta tendência geral de distribuição e instalação dos sítios líticos envolvia justamente sítio de maior
antiguidade atribuída na área (BES II), instalado em terraços fluviais das Terras Baixas do Jacaré-Guaçu. Imediações do
sítio referido foram escolhidas para mapeamento de compartimentação do relevo de detalhe e realização de
pedossequências, visando identificar traços da dinâmica geomorfogenética ao qual a instalação dos vestígios
arqueológicos se mesclam. Sugeriu-se que peças arqueológicas do sítio citado mesclam-se a alguns dos episódios
cronologicamente mais recentes e melhor documentado na área de alternância entre conjuntos de sucessões
cronomorfológicas anteriormente apontadas, vinculadas a alternâncias entre períodos de estabilização do nível de base e
formação de amplas planícies de inundação por outros de adequação dos sistemas fluviais e processos erosivos a
modificações de níveis de base locais contida entre 1 e 2 dezenas de metros. Sugeriu-se também que a antiguidade da
transição Pleistoceno-Holoceno associada ao sítio BES II pode ser alocada adequadamente no contexto de dados
geomórficos e da estrutura superficial levantados, sugerindo que os quadros de relevo no qual insere-se mostram-se
coerentes com sua inserção no período de ocupação humana conhecido como paleoíndio – correlato a transição entre as
duas mais recentes épocas geológicas.

Palavras-chave: Mapeamento Geomorfológico, Araraquara, Cuestas

7
ABSTRACT
This work proposes a semi - detailed geomorphological study with a focus on the subdivision of the
relief in an internalized segment of the basaltic escarpment of the Paraná Basin, corresponding to
the area of Ancient Araraquara (center of the São Paulo´s state). The area of study is highlighted
because morphological pictures and records of the surface structure merge with the registration of
numerous lithic archaeological sites. The possibility of using its insertion in the relief frames and
the surface structure as support to understand interpretation of local geomorphological processes,
and to provide, through the data collected from the physical-natural bases of the area, weights to
discuss aspects of the sites Archaeological in itself - in particular, discuss the validity of the
acceptance of proximal antiquity to the Pleistocene-Holocene transition attributed to the above-
mentioned anthropic records. In view of the proposed context and objectives, we sought to perform
geological and morphometric mapping of the study area, overlapping the two cartographic
databases with the purpose of delimiting the main units of relief compartments linked to the third
taxon of the geomorphological analysis of Ross (1990) . The units of the Araraquara Residual
Plateau, Transitional Patamares and Lower Lands of the Jacaré and Mogi-Guaçu were delimited.
Summarily, it was suggested that the general features of the large relief compartments in the area
allow to suggest alternation between lateral plaiting processes with others linked to the
predominance of vertical incision as one of the responsible for the essential morphological contrasts
of the area, with said processes having emphasize. the differentiated resistance of local lithologic
units as relief factors. It was verified that most of the archaelogical sites and their findings of greater
variety of pieces are superimposed on segments of the relief frames of the Transitional Pataments. It
was discussed the possibility of greater availability of rocky outcrops capable of supplying raw
materials for the manufacture of lithic artifacts due to the higher slopes of these relief frames and
smaller thickness of the soil mantle being one of the control factors for such scenario. It was
verified that one of the exceptions to this general tendency of distribution and installation of lithic
sites involved just the site of greater antiquity attributed in the area, designated Boa Esperança do
Sul II, installed in fluvial terraces of the Lower Lands of the Jacaré-Guaçu. The site was chosen for
geomorphological mapping of detail and pedossequences, in order to identify traces of the
geomorphogenic dynamics to which the installation of the archaeological remains merge. It has
been suggested that archaeological pieces of the site cited merge with the chronologically more
recent and better documented alternation between sets of sequences previously mentioned. It was
also suggested that the Pleistocene-Holocene transition associated with the Boa Esperança II site
can be properly inserted in the context of geomorphic data and the surface structure surveyed,
basing its insertion in the period of human occupation known as Paleoindian.

Key words: Geomorphological Mapping, Araraquara, Cuestas

8
SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO.......................................................................................…….......10
2.MATERIAIS E MÉTODOS…………………………………………………....…18
3.CONTEXTO GEOLÓGICO E GEOMORFOLÓGICO, E CARACTERIZAÇÃO
DAS BASES LITOLÓGICAS E MORFOMÉTRICA…………………………………...…26
4.COMPARTIMENTOS DE RELEVO DA ANTIGA ARARAQUARA, ASPECTOS
GEOMORFOGENÉTICOS E INSERÇÃO DOS SÍTIOS ARQUEOLÓGICOS LÍTICOS
NOS QUADROS DE RELEVO………………………………………………………...…...56
5. CONCLUSÕES…………………………………………………………….......107

9
LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 – Localização da Área de Estudo ………………………………………....14


Figura 2 – Mapa da Bacia Sedimentar do Paraná…………………………………...28
Figura 3 – Coluna Estratigráfica da Bacia Sedimentar do Paraná……...….. ………30
Figura 4 – Mapa Geomorfológico do Estado de São Paulo (Almeida, 1964)…….…32
Figura 5 – Composição de imagens ilustrando unidades litológicas locais (Formação Serra
Geral e Botucatu) …………………………………………………………………………...45
Figura 6 – Composição de imagens ilustrando sedimentos de fundo de vale locais..48
Figura 7 – Composição ilustrando padrões geomórficos dos Planaltos Residuais….61
Figura 8 – Composição com Perfis Geomorfológicos dos Patamares Transicionais..65
Figura 9 – Composição de imagens ilustrando padrões geomórficos dos Patamares
Transicionais………………………………………………………………………………... 67
Figura 10 – Subunidades de Relevo das Terras Baixas (Mogi-Guaçu)……………...71
Figura 11 - Subunidades de Relevo das Terras Baixas (Jacaré-Guaçu)……………. .72
Figura 12 – Padrões Geomórficos das Terras Baixas……………………………….74
Figura 13 – Composição ilustrando Sítio Lítico Gavião Peixoto II…………………84
Figura 14 – Composição ilustrando sítio lítico Rincão I…………………………… 87
Figura 15 – Esquema ilustrando Compartimentação de Relevo nas adjacências do sítio Boa
Esperança do Sul II………………………………………………………………………….98
Figura 16 – Localização das Pedossequências do Sítio Boa Esperança do Sul II….99
Figura 17 – Pedossequências vinculadas ao sítio Boa Esperança do Sul II……….102

Mapa 1 – Mapa Geológico da Antiga Araraquara …………………………………...42


Mapa 2 – Mapa Altimétrico………………………………………………………….50
Mapa 3 – Mapa Clinográfico…………………………………………………………51
Mapa 4 – Mapa da Compartimentação do Relevo e Distribuição de Sítios Arqueológicos
Líticos……………………………………………………………………………………….. 57

10
LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Classes Hipsométricas, por Área ………………………………….51


Tabela 2 – Classes de Inclinação, por Área……………………………………51

11
CAPÍTULO I – INTRODUÇÃO

12
1.0 Aspectos Iniciais

Relatos de viajantes que adentravam o sul-sudeste brasileiro a partir da então chamada


província de São Vicente e se voltaram para as - por eles - desconhecidas extensões a oeste, já
apontam a presença de salientes e súbitas elevações interiores. Englobavam um segundo conjunto
de alinhamentos serranos a dificultar esforços de interiorização, de maneira relativamente similar
como a Serra do Mar exercia no segmento litorâneo. Na cosmologia e toponímia de diversificadas
etnias ameríndias os referidos paredões interiores ocuparam papel de destaque, bem como seu
alinhamento que obstruía o deslocamento no sentido do crepúsculo. Foram nomeados de “Morada
do Sol” – Araraquara – por grupos ameríndios das depressões marginais da Bacia do Paraná.

A designação foi incorporada aos conhecimentos dos aventureiros vindos a serviço do


esforço de expansão ultramarina europeia a partir do século XVII, ainda que extrapolada de seu
significado original. A grande unidade geomórfica de escarpas interiores da Bacia do Paraná
firmou-se como portal de entrada da vasta região histórica nomeada como Campos de Araraquara,
englobando as então desconhecidas imensidões a oeste entre o alinhamento serrano e as barrancas
do centenas de quilômetros distante rio Paraná (MANO, 2006).

As escabrosas saliências de seu relevo escarpado, combinada à densa cobertura vegetal e


intensa presença ameríndia, longamente atuaram como autêntica muralha aos esforços de ocupação
colonial lusitana e do aparato imperial e republicano que lhe sucedeu. Amplamente também
intrigaram a imaginação e ambição dos colonizadores europeus e de seus descendentes.

As expedições da Comissão Geográfica e Geológica na transição entre os séculos XIX e XX


evidenciaram a combinação de atributos que mesclavam fertilidade de perfis regolíticos
comparáveis aos solos vulcânicos colombianos, bem como amplas extensões semi-aplainadas de
seus reversos e das vastas extensões do Planalto Ocidental a oeste. Registraram também condições
hidrológicas marcadas por rios perenes e clima pautado por chuvas abundantes durante o verão e
mesmo em parte dos outonos e primaveras, mesclados a temperaturas próximas aos padrões
tropicais e subtropicais.

Combinação de excepcionais atributos documentados contribuiu para fortalecer o ímpeto de


ocupação dos “Sertões Interiores”, a despeito dos obstáculos que até então dificultaram esforços
similares. As bases do relevo local e de seus atributos pedológicos tiveram papel determinante no
deslocamento do eixo geoeconômico paulista. Demandando novas estratégias de implantação dos
núcleos urbanos e rurais de povoação aos quadros cuestiformes – sensivelmente diferenciados das
extensões das áreas de ocupação colonial e imperial do Planalto Atlântico e Depressões Periféricas.

13
Com advento das universidades e centros de pesquisa com faculdades, institutos ou divisões
voltadas a temática das Ciências da Terra as escarpas interiores da Bacia do Paraná não tardaram a
serem objetos de estudos sob diversificados prismas. Inclusive sob a ótica da discussão dos seus
atributos e fundamentos do relevo, bem como mecanismos geomorfogenéticos e sucessões
cronomorfológicas estimadas. Trabalhos como os de Freitas (1951), Ab`Saber (1959) e Almeida
(1964) com distintas direções de análise podem ser citados nessa direção, visando a discussão da
grande unidade de escarpas interiores em seu conjunto. Posteriormente trabalhos de detalhe e/ou
semi-detalhe visando descrição e ponderação de segmentos específicos e delimitado da grande
unidade geomorfológicas foram feitos em diversificados enfoques, tais como os trabalhos de Fortes
et al (2008) na Bacia do Rio Labrador nas Escapas paranaenses e Ladeira (2002) em segmentos das
Escarpas correspondente a Serra do Itaquerí.

Presente trabalho se insere no referido contexto propondo a realizar estudo geomorfológico


de semi-detalhe, centrado na compartimentação geomorfológica e em aspectos da estrutura
superficial de segmento delimitado das escarpas interiores da Bacia do Paraná. Opção se deu por
investigação dos entornos da extensão original do município que herdou seu nome da região
histórica na qual se instalou, Araraquara (SP).

Procurou-se realizar na área da Antiga Araraquara trabalho buscando combinar atividades de


mapeamento geológico e morfométrico, compartimentação do relevo e realização de
pedosequências e perfis pedológicos capazes de fornecer contribuições para discussões
geomorgenéticas. Buscou-se com os procedimentos empregados fornecer subsídios para aspectos da
caracterização geomórfica e trajetória de sucessões cronomorfológicas da Antiga Araraquara.

A despeito de se tratar de um dos segmentos interiorizados das Escarpas, pautado por


aparente homogeneidade e contrastes menos salientes que aqueles ligados aos fronts externos,
acreditamos que uma análise mais acurada fazem as extensões abrangidas pelo presente trabalho
mostrarem-se morfologicamente diversificada o suficiente para um estudo de semi-detalhe como o
aqui proposto.

Abordagem geomorfológica na área permite enfoque específico, ao considerar que os


quadros de relevo da área de estudo mesclam-se a presença bem documentada de numerosos sítios e
ocorrências arqueológicas líticos (Santos, 2011). Mencionados registros de atividades humanas são
correlacionados as tradição Umbu e Humaitá. Referem-se a ferramentas de pedra lascada de
caçadores e coletores que antecedem os grupos ameríndios do tronco Tupi responsáveis por
designar a toponimia primordial da área, anterior ao período de ocupação colonial pós-cabralino.
Abre-se a possibilidade que a incorporação dos citados registros materiais da ocupação humana

14
pretérita poderia auxiliar a estimar e elencar quadros cronomorfológicos que antecederam a
composição atual dos quadros de relevo da área, e simultaneamente auxiliar a ponderar alguns
atributos dos próprios sítios.

Nas extensões da Antiga Araraquara tal abordagem pode vir a ser de particular interesse,
dentre outros elementos pela presença de sítios com datações apontadas como de significativa
antiguidade arqueológica, como o caso do sítio lítico Boa Esperança do Sul II (BES II). Datação
atribuída ao citado sítio (14500+-3000 anos) por fotoluminescência opticamente estimulada coloca
em pauta a possibilidade de inseri-lo proximamente à transição Pleistoceno-Holoceno (Santos,
2011). No contexto arqueológico, a aceitação de tal data correlata aos quadros de relevo em que o
sítio insere-se teria significativas implicações, já que envolveria situar os sítios numa extensão
temporal do período paleoíndio pouco usual e frequente para este setor específico do estado de São
Paulo (Araújo, 2004). Uma datação isolada porém não é suficiente para eventual validação desta
data de ocupação, sendo necessário entre outros procedimentos o aprofundamento da discussão de
sua adequação na inserção no contexto geomorfogenético associados aos quadros de relevo e
estrutura superficial em que situa-se o sítio BES II.

Abre-se caminho para uma abordagem de via dupla. De simultaneamente empregar sítios
líticos como um dos balizadores para compreensão da dinâmica geomorfogenética da área e de suas
sucessões cronomorfológicas estimadas (em especial como indicadores de datação relativa), e usar
aspectos da caracterização dos quadros geomórficos locais e da estrutura superficial a eles
associadas para contextualização mais acurada de alguns atributos dos registros arqueológicos
propriamente ditos. Em especial de sua distribuição e da antiguidade a eles atribuída. Busca-se
realizar tais procedimentos buscando verificar a hipótese que os compartimentos de relevo locais
podem ter significativa correlação com a concentração de sítios arqueológicos, podendo serem
considerados geoindicadores (Araújo, 2004) da presença de materiais arqueológicos líticos.
Procura-se também ponderar a sugestão de que quadros de relevo da área e sucessões
cronomorfológicas estimadas contribuem para aceitação da datação próxima a transição
Pleistoceno-Holoceno – correlata ao período de ocupação conhecido como paleoíndio – dos
vestígios materiais mais antigos (Síto BES II) conhecidos dentre o material arqueológico da área da
Antiga Araraquara.

1.1 Localização da Antiga Araraquara, e primeiros aspectos referentes a sua inserção no


Conjunto das Escarpas Interiores da Bacia do Paraná

15
A região histórica da Antiga Araraquara, tomada como área de estudo para o presente
trabalho, abrange cerca de 900 quilômetros quadrados equivalentes as extensões originais do
município

16
Figura 1 – Localização da Área de Estudo. Fonte: modificada a partir de Mano (2006)

17
paulista homônimo, no centro geográfico do Estado de São Paulo (Figura 1). Ao se considerar sua
inserção no conjunto da grande unidade de relevo das serras interiores das Escarpas Basálticas (Fi
gura 1), algumas observações prévias de caráter geral se fazem necessárias. Sobretudo ao levar em
conta as características essenciais dos padrões morfológicos da área abrangida pelo presente estudo.

Primeiro aspecto que deve-se considerar é caráter um tanto restrito da delimitação da


extensão da Antiga Araraquara aqui abrangida pela perspectiva geomorfológica. Mostra-se a falta
de contrastes claros com os seus entornos imediatos, que permitiriam individualizá-la como unidade
geomorfológica singularizada.

Não se pode assim tratar a área como Vale do Itajaí do Paraná ou Bacia de São Paulo, que
assumem claro contraste e singularidade com contextos morfo-geológicos em que estão inseridos ao
ponto de lhe coincidirem uma singularidade morfológica de serem distinguidas como grandes
compartimentos individualizados de relevo.

Ocorre na área escolhida justamente o contrário. Ab`Saber (1954) já alertava que em


contraste com o Planalto Atlântico, dentre os demais grandes domínios morfológicos do Brasil
Meridional dificilmente poderia se chegar a distinção de segmentos com subunidades claramente
singularizadas. Assim, mesmo se critério da abrangência tivesse sido outro, seria difícil
individualizar grandes compartimentos individualizados dentro do contexto regional das Escarpas
Basálticas.

Conflui com a opção aqui adotada que diversas classificações morfológicas de abrangência
estadual não realizaram subdivisões detalhadas no Domínio das Cuestas (Almeida, 1964). Algumas
delas chegaram inclusive mesmo a não considerar as Escarpas Basálticas como um dos macro-
compartimentos de relevo do estado paulista, considerando-as entendendo-a como parte integrante e
bordo do Planalto Ocidental Paulista (IPT, 1981 e ROSS e MUROZ, 1994).

Tais conflitos se dão em parte por – em certa medida - o domínio morfológico das Escarpas
Basálticas conter em sua maior parte formas e processos extensivos a sua totalidade. A referida
dificuldade de individualização de subunidades se choca com a necessidade de estudos em detalhes,
o que não deixa alternativa se não o uso de critério de escolha de parcelas em grande medidas
arbitrárias. Desta maneira não julga-se que o caráter intempestivo da escolha da área um problema
uma vez que devido as características citadas do domínio morfológico em questão não haveria outro
procedimento a ser seguido. Trata-se não do estudo de um compartimento, mas sim do
detalhamento de um segmento das Escarpas Basálticas da Bacia do Paraná em seu setor paulista.

18
A citada dificuldade de individualização da área no contexto do grande domínio morfológico
que insere-se, mescla-se com atributos ligados a sobreposição de assimetrias da própria unidade
geomórfica das Escarpas Interiores.

Talvez um das mais significativos e que mais evidenciem-se numa primeira análise mostre-
se ligada as distinções entre as vertentes orientais e ocidentais da grande unidade geomórfica de
escarpas interiores.

A transição topográfica na sua face oriental - vinculada a passagem das formações rochosas
permianas dos segmentos limítrofes da vasta Depressão Periférica para os estratos mesozoicos
vulcano-sedimentares sobrejacentes - é pautada por desníveis verticais de algumas centenas de
metros em diminutas extensões em planta, com bordos de vertentes de elevada dissecação e
declividade.

Seus limites ocidentais, envolvendo transição entre unidades litológicas mesozóicas e


cenozóicas, porém são pautados por tendência a queda topográfica extremamente suavizada,
vinculadas a entrada nas vastas extensões dos Planalto Ocidental do estado de São Paulo. Mostra-se
necessário percorrer centenas de quilômetros em planta ao longo dos citados padrões de queda
topográfica para se chegar a perda altimétrica de mesmo módulo daquela galgada ao se cruzar
alguns poucos quilômetros nas vertentes orientais.

Posicionada num segmento interiorizado do referido conjunto geomórfico, as extensões


da Antiga Araraquara numa primeira vista parecem remeter a esta tendência aparente de suavização
dos contrastes morfológicos proximais aos limites ocidentais das escarpas interiores da Bacia do
Paraná.

Ao se aproximar da área através da maior parte das diversas rotas e meios de acesso
regionais hoje disponíveis, o aspecto geral que se finca é o de aparente crescente monotonia e
homogeneização nos padrões fisiográficos locais.

Para os que chegam a área vindos do sudeste pela rodovia Washington Luiz após
transporem os imponentes fronts externos das Cuestas de Rio Claro, o contato visual inicial com os
quadros morfológicos da área denotam crescente suavização e anulação dos contrastes
morfológicos. Bruscas quebras altimétricas testemunhados apenas algumas dezenas de quilômetros
antes a leste gradam para desníveis verticais locais relativamente discretos. Paulatinamente
declividades das vertentes cruzadas pela autoestrada se tornam mais suaves e mais extensas suas
larguras em planta perpendicularmente aos canais que cruzam, acompanhadas pela intercalação de
cada vez maiores interflúvios semi-aplainados e aplainados.

19
A assimetria relatada é reforçada por aqueles que se dirigem a área da Antiga
Araraquara vindos do nordeste e norte pelas rodovias Antonio Machado Sant´ana e Deputado Aldo
Lupo. Ou mesmo pelas observações iniciais daqueles que vem noroeste através da própria Rodovia
Washington Luiz, vindos das amplas extensões do Planalto Ocidental. Por este conjunto de rotas de
acesso dificilmente serão notados num primeiro momento alterações significativas no quadro
morfológico, em relação aos amplos interflúvios e vertentes suavizadas onipresentes nos Planaltos
Ocidentais do Oeste Paulista. Chegaria-se mesmo a questionar a pertinência de um estudo centrado
na geomorfologia da região, diante de sua aparente homogeneidade geomórfica.

Um viajante que chegue a área através de vôos de média altitude vindo das grandes
regiões metropolitanas do leste do estado pelo aeroporto Bartolomeu de Gusmão terá porém
impressão distinta dos anteriores. Poderá ter acesso a um conjunto de observações de alguns dos
significativos contrastes morfológicos locais, que lembram aqueles presentes no front externo das
cuestas.

Notará que os colossais alinhamentos das Escarpas externas em pontos específicos


sofrem inflexões e retrocedem para noroeste adentrando na área de estudo, perfazendo similar
abrangência espacial e altimétrica ainda que pautados ali por declividades relativamente menos
pronunciadas do que seus segmentos externos. O caráter de um nível interno de fronts e reversos em
meio ao Domínio das Cuestas se mostrará de forma mais nítido como presente dentre os limites da
região da Antiga Araraquara.

Impressão similar terá um viajante que venha do sudeste através da Rodovia


Comandante João Ribeiro de Barros. Diferentemente da maioria das principais vias terrestres locais,
o acesso a área via sudeste não se dispõe afastado dos limites dos principais compartimentos
vinculados aos quadros de relevo da Antiga Araraquara. Ao contrário, transpõe diversas das
principais deles perpendicularmente.

A Rodovia Comandante Barros talvez seja o meio de acesso terrestre a área de estudo
que melhor permita observar os pertinentes contrastes geomórficos locais. Cruza sucessivamente
sucessão de vertentes de baixas a médias declividades pautadas por constante queda altimétrica
seguida de diversificados níveis de terraços elevados alternados com morros residuais, terraços
intermediários e planícies de inundação. Bem como ao seguir pelo mesmo percurso transpõe novo
nível de vertentes arenítico-basálticas que gradualmente galgam duas centenas de metros para
permitir ter acesso a um conjunto elevado de vertentes e interflúvios suavizados e elevadas,
correspondente a extensões interiorizadas dos reversos das escarpas interiores.

20
Numa análise de conjunto, nota-se que a maior parte das principais estradas e rodovias
regionais se disporem sem cruzarem os limites das unidades geomórficas locais. O acesso a
segmentos de interesse geológico e geomorfológico na área de interesse porém não é dotado de
grandes obstáculos.

Os numerosos meios de circulação terrestres secundários que se desmembram das


estradas e rodovias primárias – sobretudo os numerosos caminhos e estradas de terra em meio a
matas e plantações que cercam os centros urbanos locais - permitem circulação sem grandes
dificuldades em porções representativas e bem espalhadas dos terrenos da área de estudo.

Sobretudo os caminhos de solos expostos que margeiam as estradas deputado Aldo


Lupo e Comandante João Ribeiro de Barros, fornecendo acesso a vastas extensões dos segmentos
norte e sul da área de estudo respectivamente. Criam-se assim condições para estudos de detalhes
dos mais diversificados, tendo possibilidade de múltiplos trabalhos de campo para aprofundamento
dos atributos geomórficos da Antiga Araraquara.

21
CAPÍTULO II – MATERIAIS E
MÉTODOS DE TRABALHO

22
2.1 Procedimentos de Trabalho

O presente trabalho orientou-se por realização de procedimentos diversos em etapas


sucessivas. Num primeiro momento consideramos adequado realizar uma apresentação geral da
sucessão das técnicas e atividades desempenhadas. Em seguida se procurou-se realizar
detalhamento de cada um dos procedimentos usados, explicando em linhas gerais como foram
realizados e as contribuições que trouxeram ao presente pesquisa.

Inicialmente realizou-se revisão bibliográfica da área de estudo, seguida de procedimentos


de mapeamento geológico e morfométrico. Destes materiais resultaram as Cartas Geológica,
Altimétrica e Clinográfica necessárias para balizar o nível de análise da Compartimentação Do
Relevo. Com base na sobreposição dos dados elencados foi realizada a Carta de Compartimentação
do Relevo. Todos os citados materiais cartográficos foram elaborados em escala 1:70000.

Foi-se também realizado levantamento e inventário do acervo de sítios arqueológicos líticos


do Museu de Arqueologia e Paleontologia de Araraquara, com ênfase em registrar algumas de suas
características e localização em planta. Trabalhos de campo balizando estas etapas do estudo foram
desenvolvidos entre os anos de 2013 e 2016. Após conclusão deste conjunto de procedimentos,
procurou-se fazer análise e discussão inter-relacionando-os - sob a ótica dos objetivos e propósitos
do presente estudo.

Após este conjunto de levantamentos, foram escolhidos segmentos de detalhe considerados


de especial interesse para compreensão dos mecanismos responsáveis pelas sucessões
cronomorfológicas da área de estudo. Correspondem a áreas de fundo de vale onde mostram-se
melhores condições de encontrarem-se preservados de maneira mais significativa registros da
estrutura superficial ligados a dinâmica geomorfogenética cenozóica da Antiga Araraquara. Neles
foram realizados mapas temáticas de compartimentação de relevo com maior detalhamento – escala
1:25000. Bem como levantamento de pedosequências, e inserção dos registros arqueológicos líticos
locais nos quadros de relevo. Levando em consideração neste momento não somente sua
distribuição em planta do material arqueológico, mas também a sua disposição vertical.

Realizou-se ao fim deste segundo conjunto de trabalhos um novo balanço de análises e


discussões, não somente buscando interligar os procedimentos aqui empregados nesta escala de
detalhes como ponderando-as com os resultados obtidos no nível de estudos de semi-detalhes
anteriormente feitos.

Os conjuntos dos procedimentos citados foram cada um deles aplicados usando técnicas e
procedimentos específicos, descritos em maiores detalhes nos itens a seguir.

23
- Procedimentos Vinculados a Confecção do Mapeamento Litológico e Caracterização das
Principais Formações Rochosas e Coberturas Sedimentares: os mapas litológicos do presente
trabalho foram feitos por métodos tradicionais (Lilse, 2011), em escala 1:70000 na análise de semi-
detalhe e de 1:25000 nos segmentos escolhidos para escala de detalhe. Procurou-se percorrer a área
de forma que puderam ser realizadas descrição de afloramentos rochosos, coberturas de alteração
relevantes e depósitos sedimentares significativos. Procedimentos procuraram serem feitos com
espaçamentos entre os pontos onde realizou-se a descrição serem os mais representativos possíveis
do conjunto da área de acordo com a escala de trabalho adotada.

Referente as recomendações sobre a densidade de pontos mínimos necessárias para um


trabalho de mapeamento de unidades litológicos buscamos levar em consideração a escala
empregada. Tal prática porém foi condicionada em parte pela disponibilidade de acessos e estradas,
e pela densidade das manchas de vegetação e plantações locais. As numerosas estradas de terra
mostram-se na área bastante ramificadas, porém em alguns segmentos específicos as dificuldades
de acesso se impuseram e levaram a uma menor densidade de pontos. Nestes casos buscou-se usar
extrapolações dadas pelo posicionamento altimétrico, padrões de drenagem e geomórficos.

Visou-se atentar para caracterização mineralógica e também estrutural, e realização do


registro de localizações dos afloramentos rochosos e depósitos sedimentares. Procedimentos foram
feitos com uso do equipamento necessário (incluindo martelo petrográfico, aparelho de GPS, lupa de
bolso e bússola Brunton) para se poder realizar a descrição em termos precisos o suficiente para
embasar discussão dos fatores do relevo locais. Nesta etapa buscou-se também coletar amostras de
rocha e sedimentos nos afloramentos de maior interesse e representatividade. Materiais recolhidos
foram encaminhados a posterior preparação para análise laboratorial por meio da petrografia ótica, e
também foram consultados dados de lâminas petrográficas presentes na literatura. De maneira a
visar somar as descrições macroscópicas levantadas em campo com outras de caráter microscópico
vindas de laboratório.

A área pauta-se por relativa raridade dos afloramentos rochosos, face ampla espessura e
extensão dos mantos de alteração regolíticos. Desta maneira o reconhecimento da distribuição das
principais formações litológicas da área se deu sobretudo a partir identificação e análise de seus
produtos de alteração. Áreas tipo onde podia-se observar atributos essenciais dos solos originados
pela alteração dos principais tipos rochosos da área – disponíveis em cortes de estrada, ferroviais ou
em área de pontuais declives mais acentuados – revelaram-se importantes na citada direção.

Procurou-se com base nos atributos dos perfis de alteração registrados nestes segmentos
agregar atributos que pudessem ser extrapolados para extensões da área sem presença significativa

24
de afloramentos. Almejou-se neste procedimento específico também atentar-se para trabalhos
advindos da revisão bibliográfica que legavam contribuições nesta direção, como o de Meaulo
(2007)

A petrografia baseia-se no uso das propriedades de reflexão, refração e absorção da luz


pelos minerais para identificá-los com o uso de microscópio petrográfico (Winchell, 1951). Sua
utilização pode contribuir para os estudos de geomorfologia pela caracterização que permite fazer da
mineralogia dos corpos rochosos e sedimentares. A técnica é capaz de relevar sutilezas que podem
ter importância crucial na compreensão do modelado do relevo. Ainda que não usada amplamente
em trabalhos de geomofologia no Brasil, a petrografia ótica é usada com maior frequência em
diversos outros campos das geociências.

Especificamente quanto a geomorfologia, apesar do seu uso no campo de estudo no Brasil


não ser rotineiro já chegou a ser usada em trabalhos prévios visando problematizar fatores do relevo,
como nos estudos de Dorr (1969) no Quadrilátero Ferrífero. Dorr (1969) chegou inclusive a apontar
que em sua área de estudo era a mesma formação litológica – quartzitos da Formação Moeda - a
responsável tanto pela sustentação das mais elevadas serras quanto dos mais profundos vales.
Atribui tal diferenciação a sutis alterações mineralógicas na matriz dos quartzitos as responsáveis
por dotá-los de maior ou menor sensibilidade a processos de intemperismo químico e posteriormente
desagregação granular. Almeida (1958 e 1961) ilustra o quanto a interface dos mesmos processos
morfodinâmicos atuando sobre diferentes padrões de estruturas e texturas na organização dos
minerais das unidades líticas podem resultar em formas sensivelmente diferenciadas.

Referente a aspectos da Geologia Estrutural, ressaltamos certa limitação de dados da área


referentes a fontes tradicionais de informação (tais como descrição e medidas de direção de fraturas,
bem como identificação e análise de indicadores cinemáticos nos corpos líticos), correlatas a baixa
disponibilidade de afloramentos rochosos.

- Elaboração de Cartas Morfométricas (Clinográficos e Altimétricos): como etapa preliminar para


a confecção dos mapas morfométricos foram preparadas em ambiente SIG cartas bases (Carta
Topográfica e de Drenagem) necessárias. As cartas bases puderam ser feitas com base na
sobreposição da análise de imagens orbitais obtidas de satélite Landsat e Aster no espectro da luz
visível, fotografias aéreas de 1969 em escala 1:50.000 (disponíveis através do Laboratório de
Aerofotometria da FFLCH) e mapeamento topográfico do IBGE de 1972 também em escala
1:50.000. A digitalização deste material foi realizada através de vetorização, usando representações
características de ambientes SIG (Elementos Pontuais, Linhas e Polígonos).

25
O modelo digital de terreno foi confeccionado com base em imagens de satélite Aster
tratadas em ambiente de Sistemas de Informação Georreferenciadas. Na sequência foi transferido o
mosaico das imagens para os software ArcMap 9.3, e a partir dos dados raster se gerará um MDE
pelo método de Interpolação TIN (Triangulated Irregular Network ).

A carta hipsométrica (Mapa 1) foi elaborada a partir do MDE (Modelo Digital de


Elevação) gerado no programa ArcMap 9.3, sendo submetido a uma classificação da altimetria pelo
comando 3D Analyst Tools. Foi-se dividido a área em intervalos em 10 intervalos de altimetria, com
20 metros de abrangência em nove deles e quarenta metros no primeiro deles (500-540; 540-560;
560-580; 580-600; 600-620; 620-640; 640-660, 660-680. 680-700 e 700-720 metros). Adoção de um
intervalo maior no primeiro grupo se deu por, pois estarem conjugado as mais amplas extensões de
menores valores de declividades da área, os métodos indiretos usados preliminarmente mostravam
uma imprecisão mais significativa quando comparados aos dados de campo e folhas topográficas
disponíveis. Desta maneira preferiu-se adotar um intervalo altimétrico mais amplo de forma a se ter
mais segurança dos resultados. Nas demais categorias verificou-se uma correspondência maior entre
dados dos métodos indiretos e as obtidas por outras fontes de informação aqui utilizadas.

A carta clinográfica (Mapa 2) foi produzida em meio digital originalmente também


utilizando o software Arcgis 9.3, a partir do comando slope da ferramenta 3D analyst tool - como
sugerido por Giglioti (2010). Usou-se 7 intervalos de inclinação, sendo o primeiro deles abrangendo
segmentos do terreno com inclinações inferiores a 2 graus, 5 intervalos com 4 graus de
espaçamentos (2-4;4-8;8-12;12-16 e 16-20 respectivamente) e um último intervalo incluindo as
inclinações acima de 20 graus. A tendência geral da área a declividades de magnitude relativamente
reduzidas balizou a escolha de criar uma quantidade maior de categorias para discriminar
heterogeneidades na distribuição dos valores menores, e colocar em uma única os valores de maior
módulo.

Após a confecção do material digital referente as cartas clinográficas e hipsométricas, os


mesmos foram comparados com as cartas topográficas e fotos aéreas disponíveis citadas
previamente bem como a levantamentos de campo realizados. Através desta comparação aspectos da
classificação foram revisados, buscando adequar o levantamento digital realizado a escala de
mapeamento utilizada no presente trabalho. Procuramos neste trabalho entender os dados
morfométricos originados de tratamento por ferramentas de classificação automática ou
semiautomática em ambiente digital como uma base prévia e preliminar, passiva de ser aprimorada e
revista por levantamentos manuais e comparação criteriosa com outras fontes de informações.

26
-Mapa de Compartimentação do Relevo, Inventário e Descrição de Feições Morfológicas de
Detalhe: concluídos as cartas morfométricas e geológica, foi realizada a sobreposição do conjunto
delas ponderada pelas observações de campo e interpretação de imagens aéreas anteriormente
mencionadas para delimitação dos compartimentos de relevo da Antiga Araraquara. O mencionado
procedimento apresenta interface com ampla gama de escolhas de escalas espaciais e também
temporais ligados aos fatos gemorfológicos. Neste sentido, convém realizar ponderações sobre
aspectos da magnitude das unidades de relevo que pretende-se apreender no presente trabalho. Cabe
lembrar que Cailleux e Tricart (1956) buscam estabelecer relação da extensão áreas dos quadros de
relevo e de sua idade. Mescerjakov (1968) por sua vez propôs seis ordens de grandeza dos padrões
de relevo terrestres, enfatizando-os a influência da ossatura litológica, estrutural e a agentes
modeladores exógenos.

Ross (1992), em interface com a proposta de Mscerjakov (1968), procura expor


organização taxonômica do relevo com aplicações centradas na cartografia de forma hierárquica de
acordo com a escala de trabalho a ser utilizada. Apresenta classificação do relevo em seis táxons
distintos, sendo os cinco primeiros os seguintes:
1°. Táxon – o relevo terrestre pertence a uma determinada estrutura que apresentam origens e
idades distintas, que não podem ser consideradas como um substrato passivo, mas um
elemento ativo no processo de desenvolvimento do relevo. O caracterizado por um
determinado padrão de formas grandes do relevo. Exemplos de morfoestruturas são as
regiões de plataformas ou crátons, bacias sedimentares e cadeias orogênicas;

2°. Táxon – a morfoescultura é fruto de ações climáticas subseqüentes e a morfoclimática é o


tipo de agente climático atuante em uma determinada época. Os domínios morfoclimáticos
atuais não são obrigatoriamente coincidentes com as Unidades Morfoesculturais
identificáveis na superfície terrestre. São geradas pela ação climática ao longo do tempo
geológico, no seio da morfoestrutura. Assim, uma unidade morfoestrutural como a Bacia do
Paraná apresenta várias Unidades Morfoesculturais como às Depressões Periféricas,
Depressões Monoclinais, Planaltos em Patamares Intermediários entre outros.

3°. Táxon – é denominado de Unidade de Padrão de Formas Semelhantes. São conjuntos de


formas menores do relevo encontrados em Unidades Morfoesculturais, que apresentam
distinções de aparência entre si em função da rugosidade topográfica ou índice de dissecação
do relevo, bem como o formato dos topos, vertente e vales de cada padrão existente.

4°. Táxon – é denominado como formas de relevo individualizadas dentro de cada Unidade
padrão de Formas Semelhantes. As formas de relevo desta categoria tanto podem ser as de
agradação tais como as planícies fluviais, terraços fluviais ou marinhos, planícies marinhas,
planícies lacustres entre outros ou as de denudação resultante do desgaste erosivo, como
colinas, morros, cristas, enfim, formas com topos planos, aguçados ou convexos.

27
Para fins deste trabalho, unidades de relevo terão abordagem próximas as do terceiro táxon
de Ross (1992) para a escala de semi-detalhe e o quarto táxon para os segmentos de análise de
detalhe.

Dado a vinculação da área de estudo com a região histórica da Antiga Araraquara e com a
busca de interface com registros de ocupação humana, se procurará também – de maneira secundária
– elencar potenciais e restrições gerais de ocupação dadas pelas unidades de relevo delimitadas e
descritas. Observações em questão foram centrados no registro pré-cabralino vinculado aos sítios
líticos locais, visando identificar possíveis quadros de relevo que mostrem-se como palcos de
ocupação preferencial para as referidas modalidades de ocupação.

- Procedimentos para Análise da Estrutura Superficial, em Nível de Detalhe: Referente aos


segmentos de fundos de vale escolhidos para análise de detalhe, pretende-se além de variação dos
procedimentos anteriores em uma maior escala objetivou-se também aplicar a eles algumas
intervenções específicas visando detalhamento de atributos da estrutura superficial local. Justifica-
se a abordagem por considerar que segmentos escolhidos para análise de detalhe são peças-chave
para compreensão das sucessões de quadros cronomorfológicos quaternários da área, sendo neles
onde preferencialmente pode-se encontrar vestígios destas dinâmicas preservadas nos depósitos
sedimentares e horizontes de solo. Pretende-se aplicar análises advindas das pedossequências.

As Pedossequências pautam-se dentro do conceito da análise estrutural da cobertura


pedológica, visando compreensão simultânea das variações verticais e laterais dos solos. No
enfoque que adequa-se aos fins deste trabalho pautam-se pela confecção de escavações espaçadas
ao longo de transectos definidos, realizando descrições das variações pedológicas de cada unidade,
coleta de amostras para eventuais análises laboratoriais e posterior extrapolação de suas variações
verticais por meio da análise integrada (Queiroz Neto, 2002). Pretende-se combinar tal análise com
elaboração de perfis topográficos simplificados dos terraços e vertentes em que se aplicará as
pedossequências, elaborados através da diferença de medidores de níveis. Constitui numa
abordagem que pode contribuir para o entendimento da Estrutura Superficial associada a processos
de pedogênese já consolidados.

- Levantamento e Análise dos Sítios Arqueológicos Líticos: sítios arqueológicos líticos da área de
estudo foram inventariados através de revisão do acervo do Museu de Arqueologia e Paleontologia
de Araraquara (MAPA). Procedimento foi feito a partir de atividades prévias derivadas de estágio
desenvolvido em 2012, e revistas e ampliadas em 2016. Os acervos do museu reúne praticamente a
totalidade do acervo de sítios líticos da Antiga Araraquara. Grupos de pesquisa de arqueologia da
região, cuja maioria dos achados vinculam-se a atividades de arqueologia de contrato envolvendo

28
licenciamentos ambientais, usam os acervos do MAPA como depositário de seus achados. Também
entregam a ele cópias das atividades de pesquisa acadêmica e/ou relatórios técnicos das atividades
de consultoria por eles desenvolvidos.

O levantamento iniciou-se por uma revisão de todo o conjunto dos cerca de 30 relatórios
técnicos disponíveis nos anexos do MAPA, referentes a intervenções e levantamentos arqueológicos
efetuados entre 2002 e 2015. Procurou-se registrar as coordenadas geográficas de cada um dos
conjuntos de sítios descritos neste material, para posterior inserção delas em ambiente
georreferenciada. Em seguida foram feitas consulta aos materiais arqueológicos líticos atribuídos a
cada sítio e atualmente sob a guarda do MAPA. Visou-se realizar registro fotográfico e descrição de
alguns atributos de interesse para presente pesquisa.

Justificamos procedimento com base no apontamento de Aráujo (2004) de que a questão da


diversidade de critérios de classificação das peças líticas devem ser adequadamente ponderados. O
citado geólogo nos lembra que existem múltiplos concepções e sistemas de classificação de peças
líticas, e é importante que um trabalho uso um critério padrão de análise para o conjunto
arqueológico levado em consideração. Como os sítios da Antiga Araraquara foram analisados por
diferentes grupos, pesquisadores e profissionais existiria a necessidade de uma revisão geral do
material para garantir que neste trabalho fossem apresentado por uma ótica única.

Como pretende-se aqui usar os materiais arqueológicos como complemento a um trabalho


de escopo predominantemente geomorfológico, não pretendemos usar analises tecnotipológicas
mais elaboradas. Nossa classificação das peças e sítios se restringiu a identificar as litologias
predominantes das peças envolvidas, e os atributos mais gerais referentes a sua caracterização
morfológica e usos prováveis dentro das cadeias operatórias das industrias líticas (se limitando a
distinções de caráter mais amplo como batedores, raspadores e gumes) – Lee e Devore (1968).

Procurou-se com esta etapa dos procedimentos realizar um catálogo individual para cada um
dos sítios arqueológicos descritos na região. Cada uma das fichas descritivas buscou incluir itens
referentes ao número de peças totais do sítio, litologias predominantes presentes nos artefatos e
instrumentos, coordenadas geográficas de sua localização, morfologias técnicas gerais e usos
prováveis predominantes. Foi também nesta etapa realizado registro fotográfico das peças atribuídas
a cada sítio. Buscou-se realizar tanto fotografias de peças e artefatos tidos como usuais e mais
frequentes de cada sítio como as que mais destoavam dos seus conjuntos, em especial com base no
critério de matérias-primas rochosas de exceção.

29
Por fim procurou-se ao longo dos trabalhos de campo que envolviam o levantamento das
bases litológicas e morfológicas de semi-detalhe e detalhe realizar atividades de reconhecimento
nos locais de onde os sítios foram localizados. Buscando sobretudo verificar ali a presença de
eventuais padrões geomórficos de detalhe que eventualmente poderiam ter relação com presença
dos sítios líticos em questão.

30
CAPÍTULO III - CONTEXTO GEOLÓGICO E
GEOMORFOLÓGICO REGIONAL, E
CARACTERIZAÇÃO DAS BASES LITOLÓGICAS E
MORFOMÉTRICAS LOCAIS

31
3.1 Interface com Contexto Geológico e Geomorfológico da Bacia Sedimentar do Paraná e
Estado de São Paulo
Apesar de já brevemente citados e apontados em segmentos anteriores do presente
trabalho, julgamos que convém uma apresentação formal da revisão do conjunto de convenções
referentes ao contexto geológico e geomorfológico em que o trabalho insere-se.
Atualmente a área de estudo é considera como inserida na unidade geotectônica da
bacia sedimentar intracratônica do Paraná (Carneiro, 2004 e Milani, 1997). Abrange grande
depressão em meio a crosta continental preenchida por rochas sedimentares e magmáticas básicas.
As maiores espessuras do empilhamento sedimentar se registram no centro da Bacia, em geral
seguindo o curso dos Rio Paraná e da Prata, sendo os mergulhos das camadas também orientados de
maneira geral voltados para as proximidades das calhas dos referidos canais fluviais.
Os limites ocidentais e meridionais da Bacia Sedimentar do Paraná ultrapassam as
fronteiras nacionais brasileiras, chegando a abranger Paraguai e Argentina, enquanto os limites
orientais e setentrionais abrangem Mato Grosso do Sul, Minas Gerais e Paraná, Santa Catarina, Rio
Grande do Sul e Argentina respetivamente. Os limites da Bacia Sedimentar do Paraná com as
Faixas Móveis que a bordejam frequentemente são marcados por importantes acidentes
morfológicos, como as fall-lines do estado de São Paulo (Almeida, 1964).
Sua área total chega a exceder 1.500.000 quilômetros quadrados (ver figura 2). A bacia
mostra em planta forma similar um elipsoide, com um eixo maior com disposição próxima da
longitudinal. Milani (2004) recorda que a Bacia do Paraná apresenta características que permite
inseri-la como típica bacia intracratônica, apontando que encontra-se por completo abrangida na
placa sul- americana sem ser intersectada pelas margens da citada placa. O mencionado geólogo
recorda também que os bordos da sinéclise em questão configura limite erosivo que alcança a maior
parte dos 5.500 quilômetros que constituem seu perímetro.
Persiste entre os pesquisadores significavas dificuldades em modelar e chegar a um
consenso referentes a trajetória termo-mecanica ligada a origem de bacias intracratônicas como a
Bacia do Paraná. Uma parcela dos autores, como nos lembram Middleton (1990) e Millani (2005),
dão destaque a distribuição das temperaturas a litosfera e a relações com o surgimento de plumas
astenosféricas e subsidência na superfície. Hoffman (1989) por sua vez destaca dinâmicas ligadas a
estiramento da litosfera e processos de subsidência térmica .
Referente a seu papel como unidade de subsidência e sedimentação-magmatismo, a
Bacia do Paraná usualmente é apontada como atuante entre o Neo-Ordoviciano e o Mesozóico –
num intervalo de tempo que abrangeria ao menos 3 centenas de milhões de anos (450-65 Ma). No
citado intervalo temporal, teriam se sucedido diversificados episódios de sedimentação

32
33
34
Figura 2 – Mapa da Bacia Sedimentar do Paraná, com distribuição dos conjuntos de rochas associadas a cada uma de
suas supersequências. Área de estudo situa-se na transição entre supersequências Bauru e Gondwana III Fonte: Milani
(204)

35
Seu arcabouço estratigráfico é apresentado em seiis unidades de segunda ordem:
Superseqüência Rio Ivaí (Caradociano- Llandoveriano), Superseqüência Paraná (Lochkoviano-
Frasniano), Superseqüência Gondwana I (Westphaliano- Scythiano), Superseqüência Gondwana II
(Neoanisiano- Eonoriano), Superseqüência Gondwana III (Neojurássico- Berriasiano) e
Superseqüência Bauru (Senoniano) – Mianni (2012).
Em relação as unidades litoestratigráficas de terceira ordem, pode-se falar dos Grupo
Paraná, Grupo Itararé, Grupo Guatá, Grupo Passa Dois, Grupo São Bento e Grupo Bauru - ver
figura 3.
A despeito das discussões e debates em curso referentes a ampla trajetória de processos
tectônicos que marcam a origem e trajetória da Bacia do Paraná, a bibliografia existe permite
considerar com segurança que houveram múltiplas sucessões de ambientes sedimentares e
processos deposicionais, o empilhamento sedimentar bem como a perturbação destes processos por
eventos erosivos. A despeito das polêmicas, as interpretações usualmente dados a sucessão de suas
unidades litológicas convergem numa direção geral para a caracterização dos segmentos basais
serem associados ao período Devoniano, marcado por rochas sedimentares associadas
principalmente a ambientes marinhos. Progressivamente o registro litológico passaria porém a
apresentar atributos mais próximos de ambientes deposicionais continentais, conforme se aproxima
do topo da coluna estratigráfica da Bacia do Paraná.
Especificamente nas unidades sedimentares associadas ao Mesozóico, aflorantes na área
de estudo, os efeitos da continentalidade se fariam particularmente evidentes. As condições de
aridez fortalecidas pelo efeito de continentalidade do antigo continente de Gondwana (Almeida,
1954) são associadas aos registros rochosos de arenitos vinculados a grandes dunas eólicas em
amplos setores da Bacia Sedimentar do Paraná. Estes conjuntos sedimentares são truncados e
recobertos por derrames basálticos, cuja magnitude e abrangência espacial dificilmente encontra
rival no registro geológico pós-proterozóico, vinculadas a chamada “Reativação Wealdeniana”. As
lavas basálticas por sua vez são recobertas por conjunto sedimentar heterogêneo e de diminuta
diagênese, correspondente ao marco final do registro sedimentar da Bacia da Paraná. Os dois
primeiros conjuntos rochosos estratigraficamente integram o chamado Grupo São Bento (Baptista,
1984) e são associados as formações litoestratigráficas Botucatu e Serra Geral, enquanto o último
dos conjuntos citados associa-se às formações do Grupo Bauru. Hasui et al (2012) realizam uma
síntese geral das definições das referidas unidades estratigráficas e da interpretação de seu
significado no contexto da geologia histórica, destacando-se que este trabalho de síntese de
bibliografia teve a participação do professor Almeida

36
37
Figura 3 – coluna estratigráfica da Bacia do Paraná, com destaque em vermelho para unidades
litoestratigráficas presentes na área de estudo. Fonte: modificado de Milani (2004)

Referente a bibliografia ligada ao contexto geomorfológico, a área pode ser compreendida


dentro do conjunto de estudos que procuraram caracterizar as divisões fisiográficas do segmento
paulista da Bacia do Paraná. Moraes Rego (1932) ao abordar as subdivisões do relevo paulista,
definiu associados a Bacia do Paraná grandes unidades fisiográficas como o Planalto Ocidental,
apontando as escarpas basálticas como seu limite leste. Delimitou ainda adjacente aos limites do
planalto a zona de relevo suavemente ondulado designada como Depressão Periférica. Procurou

38
ainda realizar subdivisões de relevo das extensões orientais do estado, associadas ao embasamento
cristalino – tais como as terras altas da região de São Paulo, e as serras distribuídas a norte e a sul
da capital estadual.
Deffontaines (1935) elaborou também uma proposta de divisão regional – nela delimitou o
Litoral, o Vale do Médio Paraíba, a Região de Campos do Jordão, a Mantiqueira, as Serra do Norte,
a Zona Cristalina no entorno da capital estadual, a Depressão Periférica Permiana – proximal a
Depressão Periférica de Moraes Rego (1932) e a Zona de Arenitos e Derrames Basálticos do centro
e oeste do estado de São Paulo.
Monbeig (1949) por sua vez – coordenando um grupo de geógrafos do Conselho Nacional
de Geografia, também apresentou uma proposta de caracterização e subdivisão da geomorfologia de
São Paulo. Nela manteve algumas das subdivisões mais amplas propostas por Moraes Rego (1932)
e Deffontaines (1935), tais como o Litoral, a Depressão Periférica e o Planalto Ocidental. Propôs
porém agrupar as múltiplas subunidades de relevo vinculada as áreas do embasamento cristalino
sob a designação única de Planalto Atlântico.
Ab`Saber (1956) realizou sistematização de trabalhos anteriores, fazendo uma caracterização
de maior grau de detalhamento do conjunto das variações morfométricas do conjunto do estado e
internas a cada uma das subunidades delimitadas. Procura realizar reflexões e ponderações
aprofundando a discussão dos processos e aspectos genéticos, enfatizando a relação entre as
unidades litológicas e os distintos processos paleoclimáticos e deformacionais que teriam pautada as
origens da compartimentação fisiográfica estadual. Num segundo momento, Ab`Saber e Bernardes
(1958) subdividem e descrevem o Planalto Atlântico em conjunto ao Litoral em várias zonas
fisiográficas.
Almeida (1968) realiza contribuição buscando enfatizar a relação da influência das unidade
geológicas nos padrões fisiográficos do estado. Sugere uma hierarquização em função das distintas
associações morfométricas com unidades litoestratigráficas diversificadas. Sua proposta se destaca
em relação a anterior pela mais detalhada caracterização dos segmentos das escarpas basálticas

39
Figura 4 – mapa geomorfológico do estado segundo Almeida. I equivale a Planalto Atlântico, II a Província Costeira, III
a Depressão Periférica, IV a Cuestas e V a Planalto Ocidental. Quadrante em que está contido área de estudo da Antiga
Ararauquara aparece destacado em vermelho Fonte: modificado de Almeida (1964), colorido e compilado por Marcelo
Martnelli (2000).

estaduais, que em sua classificação é elevada a ser apresentada como um dos grandes
compartimentos de relevo do estado – e não apenas como um bordo do Planalto Ocidental. A
Carta Geomorfológica de São Paulo, elaborada pelo IPT em 1981, em escala 1:1.000.000 acaba por
ter no trabalho de Almeida (1968) um forte referencial. Nele existe a significativa modificação de

40
que as escarpas basálticas voltam a serem considerados bordos do Planalto Ocidental, e não mais
uma divisão geomorfológica a parte dentro do relevo paulista.
3.2. Revisão de Estudos Prévios Referente as Bases Físicas da Antiga Araraquara
Ao procurarmos inventariar um histórico de levantamentos da Antiga Araraquara ligados a
aspectos das bases físicas regionais relevantes para os fins do presente trabalho, podem-se fazer
algumas ponderações prévias. Sobretudo que a aquisição dos conhecimentos citadas se mescla as
próprias fases históricas de incorporação dos quadros naturais locais pelos grupos humanos. Cada
período de ocupação levantou informações do meio físico pertinentes as suas necessidades
específicas, algumas das quais compartilhadas pelo presente estudo.
Desde as primeiras impressões dos quadros de relevo apreendidas no vasto período pré-
cabralino referente a diversificadas ocupações ameríndias e eventualmente paleoindias. Aos mais
recentes períodos agroindustriais de densas exigências técnicas para subsidiar vastas extensões de
expansão urbana. Passando também pela sucessão dos períodos dos complexos agropostoril e
cafeeiros com fortes demandas ligadas a alocação das fazendas e manejo dos solos agrícolas, ao
período industrial de base local e a estruturação inicial dos alicerces das redes urbanas regionais.
Ligadas ao período pré-cabralino , muito das primeiras impressões humanas sobre as
litologias e formas do relevo da área e de suas imediações se perderam. Face sobretudo a
intensidade com que os antigos grupos indígenas da área foram substituídos pelos complexos
agropostorial e cafeeiro que lhes deram sequencia a partir do século XVIII. Chegam aos nossos dias
ecos e vestígios presentes na toponímia indígena escolhidos para batizar algumas das cidades
implantadas da área, que refletem uma certa antiga preferência por balizar com nomes de
referenciais naturais áreas percorridas através de ampla e longa expansão territorial de grupos
linguísticos pretéritos (Ab`Saber, 2001).
Outra fonte comumente utilizada para resgatar conhecimentos referentes a
caracterizações pioneiras das bases físicas pouco valor terá neste trabalho – os relatos dos
naturalistas europeus que percorreram o Brasil no século XIX. Embora as extensões
correspondentes a Antiga Araraquara já experimentasse então a formação de um discreto complexo
agropastoril em meio a seus campos de cerrado em sucessão ou mesmo colaboração com grupos
ameríndios, dificilmente pode se encontrar menções a atributos da presença de suas bases físicas na
paisagem local. Afora breves menções sobre características do curso de afluentes da margem direita
do Tietê por Spix (1848), dificilmente se encontra menção maior a área aqui estudada. Justifica-se
tal fato por no período de ação dos naturalistas a área de estudo ser ainda um dos mais distanciados
enclave nos então chamados de desconhecidos sertões do oeste, ficando assim distante dos roteiros
percorridos pelos viajantes europeus

41
Resta como opção a consulta a relatos de viajantes coloniais que embora na maioria das
vezes não tenham tido formação cientifica legaram observações de caráter geral úteis e válidas.
Barros (1724) e Juzarte (1769) já registravam descrições referentes a formas de relevo da área de
estudo, sendo o foco dos registros as dificuldades distintas impostas ao avanço pelas heranças
naturais referidas. Neste sentido merecem destaque as repetidas referências a súbito paredão que se
ergue como muralha de algumas centenas de metros isolando duas largas extensão de terrenos
planos (Barros, 1724). A extensão de tal conjunto de grandes escarpas em certa medida usado para
delimitaram a região histórica dos Campos de Araraquara (Mano, 2006), cujos segredos ocultos
pelos paredões íngremes, densos cerradões e vasta ocupação ameríndia por tanto tempo intrigaram
os colonizadores estabelecidos no planalto atlântico e depressão periférica paulista
Trabalhos geológicos propriamente ditos percursores no interior do estado também
legaram importantes informações para compreender o contexto da área de estudo, ainda que não
tenham se dedicado a ela especificamente. Lisboa (1909) realiza em seu trabalho sobre a Geologia
do Oeste Paulista e Sul do Mato-Grosso importantes compilações e descrição de litotipos cuja
distribuição se estende também a área de estudo, incluindo significativas atualizações dos
conhecimentos sobre as principais unidades rochosas que balizam as Escarpas Basálticas.
O que Pedroso e demais viajantes coloniais descreveram como zona de brusca mudança
altimétrica pode facilmente ser associado ao que mais tarde foi chamado por Ab`Saber (1949) de
Escarpas de Circudesnudação, por Freitas (1940) de Escarpas Basálticas e por Almeida (1964) de
Domínio das Cuestas. Nos citados trabalhos se busca de forma mais consistente e sistemática
realizar aprofundamento da discussão sobre inter-relação entre as unidades litológicas e os padrões
geomórficos do contexto onde se insere a área de estudo. Almeida (1964) associa as feições
morfológicas descritas anteriormente ao limite da extensão do grande conjunto de rochas ígneas
mesozóicas da Bacia do Paraná. Muito mais resistentes do que as rochas sedimentares subjacentes,
atuariam como verdadeira carapaça protetora contra efeitos da erosão. Protegeriam as áreas que
recobrem enquanto as adjacentes não poupadas teriam sido escavadas pelos efeitos intensos da
circudesnudação periférica (Ab`Saber, 1949) gerando assim as amplas depressões que as margeiam.
Mais especificamente sobre a zona de estudo, Almeida (1964) destaque a existência de
um nível de cuestas interno. O primeiro seria o descrito pelos viajantes coloniais mencionados. O
segundo seria localizado algumas dezenas de quilômetros a oeste, caracterizados por contrastes
morfológicos relativamente suavizados quando comparados ao primeiro grupo. Tal aspecto
suavizado é tão extremado que um observador desatento pode mesmo atravessar sem notar os
principais componentes que lhe caracterizam, reverso e front.
Talvez por isso a quantidade de estudos específicos referente as bases físicas da área

42
escolhida para o presente trabalho sejam relativamente incomuns. Pouco frequentes são os trabalhos
específicos de geólogos e geomorfólogos, sendo muitas vezes informações importantes para este
estudo registradas de maneira marginal em trabalhos elaborados por outros fins. Foram somente os
relatórios da Comissão Geográfica e Geológica do princípio do século XX, mais especificamente as
expedições do Rio Grande (Comissão Geográfica e Geológica de São Paulo, 1905), as responsáveis
pelas primeiras informações específicas sobre pertinentes aspectos das bases físico-ambientais da
área de estudo, realizando observações gerais que abrangiam aspectos geomórficos e pedológicos
de interesse.
Martim de Almeida (1915 e 1948) ao incluir capítulos intitulados “Bases Geográficas“
nos seus Álbuns de Araraquara também agregou pertinentes informações, contendo compilações
sobre a rede hidrográfica regional incluindo a localização das principais quedas d`água e referências
a descrições morfológicas de caráter geral sobre a área. Leonardi (1976) em seus trabalhos sobre
icnofósseis dedica também relevantes descrições sobre corpos líticos areníticos da área.
O colapso e esgotamento do ciclo cafeeiro e a passagem da região do predomínio do
mundo rural para edificação de centro industrial de base local e o surgimento de uma crescente
população concentrada nas maiores manches urbanas, leva a novas demandas técnicas que
contribuíram para ampliação dos conhecimentos das bases físicas locais. Em particular, a criação
do DAAE (Departamento Autônomo de Águas e Esgotos de Araraquara) – destinado a providenciar
condições de abastecimento para o funcionamento da indústria e das necessidades da crescente
população urbana de trabalhadores industriais - conduz a importantes levantamentos de dados
relevantes ligados sobretudo as unidades litológicas da região. Compensando assim em parte
ausência de centro de estudos locais voltados para geociências.
Os recursos técnicos do DAAE, que por longos períodos permaneceu sob a coordenação
do geólogo Jayro Piuci, puderam ser empregados para significativos levantamentos referentes a
caracterização e distribuição das principais unidades litológicas locais em significativas extensões
da área abrangida pelo presente estudo. Citados trabalhos foram realizados com fim de garantir
subsídios ao abastecimento hídrico e planejamento público da expansão urbana dos centros urbanos
regionais, e legaram significativas contribuições aos conhecimentos das bases físicas regionais.
Nobile e Diniz (1985) reúnem informações levantadas em décadas de atuação da
autarquia de águas, sistematizando informações disponíveis sobre litotipos locais com confecção de
mapa geológico em escala 1:50.000 de parcela da área de estudo. Realizam importantes
compilações dos dados litológicos locais. Realizam mesmo algumas observações referentes a
caracterização geral dos quadros de relevo local e padrões dos horizontes de alteração originados
das principais formações litoestratigráficas. Bem como observações e apontamentos referentes a

43
interfaces das bases geológicas, padrões de relevo associados e padrões de incorporação ao uso
humano deles referentes ao tempo histórico. O seguinte trecho do referido trabalho sintetiza
algumas de suas contribuições nas citadas direções:
“...A ocupação do território onde está situada a cidade de Araraquara, "morada do sol" em
linguagem tupi, iniciou-se pelo colonizador a quase dois séculos, quando o fluminense
Pedro José Neto lá chegou no final do século 18. As condi- ções, favoravelmente
predominantes na parte leste do planalto ocidental do Estado de São Paulo, aliadas à
presença de riquíssimos solos originados da decomposição de certas formações geológicas,
são os determinantes mais importantes na geração de riquezas sociais para a região de
Araraquara, desde o último quartel do século passado e intensivamente nas primeiras
décadas do atual, quando a cafeicultura e, posteriormente, a pecuária leiteira e de corte, e a
cana-de-açúcar, convergiram para tal bem-estar. Observou-se, depois, principalmente na
segunda metade deste século, crescente substituição para outros tipos de ocupa- ções
(lavouras em geral e citricultura) que animam um modesto, porém progressista, parque
industrial e uma tendência a maior integração com a vida metropolitana. Durante os últimos
anos, as "plantations" de cana para finalidades de produção de álcool tomam lugares de
modalidades de usos anteriores, em grandes extensões. (...) A maior parte da cidade está
construída em cima de rochas sedimentares alteradas da Formação Adamantina (com
espessuras de algumas dezenas de metros) e uma parte menor de seu assentamento
desenvolve-se sobre derrames basálticos intemperizados da Formação Serra Geral,
identificada principalmente pela presença de solo marrom avermelhado argiloso (com
espessura de 20 a 30 metros) que é característico da alteração do basalto. Ambas formações
geológicas favorecem a ocupação territorial urbana existente, devido a apresentarem-se
com topografia muito pouco acidentada, resultado de um relevo suave esculpido por erosão
diferencial, onde as estruturas geológicas não proporcionaram heterogeneidade forte para
condicionamento de desníveis topográficos mais acentuados. Além disso, os terrenos com
cotas mais elevadas propiciam arejamento salutar. (...). Na periferia meridional, o
crescimento da cidade está sujeito à interferência da Rodovia Washington Luiz (São Paulo-
São José do Rio Preto) e à da variante (Ribeirão Preto-Bauru). Ao sul desta estrada, onde se
instalou o aeroporto, existe uma área significativa de afloramentos da Formação Botucatu
para a qual se recomendam cuidados especiais com sua preservação, pois existem razões
para supor que, sendo área de recarga do principal aqüífero para o abastecimento da cidade,
determinados tipos de ocupação de seus solos poderiam produzir efeitos degenetativos no
aqüífero explorado (Piuci e Nobile, 1985)”.
Além de sintetizar observações pertinentes referentes a relação das unidades litológicas
locais e quadros de relevo, o trabalho de Piuci e Nobile (1985) realiza compilação dos dados
geológicos de subsuperfície advindos de décadas de perfuração de poços tubulares profundos pela
autarquia de águas. Com base neles e no mapeamento das faixas de afloramentos, os autores
procuram realizar síntese pioneiras referentes a geometria das principais formações litológicas –

44
sintetizadas através de uma série de perfis elaborados a partir de transectos no mapa geológico por
eles elaborados. Nelas notamos apontamentos de uma disposição subhorizontal das unidades
litológicas locais, confirmando uma tendência as faixas de afloramentos rochosos de cada litotipo
local estarem confinadas a intervalos altimétricos relativamente específicos.
Simultaneamente porém pode-se apreender de seu trabalho a existência de setores
específicos – em especial, no segmento leste da Antiga Araraquara - em que os conjuntos rochosos
em subsuperfície apresentam-se pautados por contatos com mergulhos de declividades inferidas
significativas. Em alguns setores os contatos entre distintas formações litoestratigráficas podem se
encontrar com variações verticais superiores a uma centena de metros em extensões em planta não
maiores que um quilômetro.
Tais observações demandaram cuidados específicos nos processos de mapeamento
geológico e de relevo que se procurou fazer no presente estudo, procurando-se realizar ponderações
e cautelas ao projetar a disposição subterrânea dos corpos rochosos delimitadas a partir de medidas
de mergulho de afloramentos expostos. Bem como em se exigir cautela ao ponderar certas
assimetrias de associação entre afloramentos e disposições dos quadros de relevo.
Com a consolidação do processo de desconcentração industrial, e a transferência mais
intensa de industrias da saturada capital paulista para capitais regionais interioranas - como a que
polariza a região da Antiga Araraquara - houveram implicações a dinâmica de aquisição de
conhecimentos das bases físicas regionais. A criação de novos bairros e distritos industriais criados
através de sucessivas “saltações urbanas” em meio a enclaves nas manchas de cerrado nas periferias
então distantes da cidade, ampliou a demanda por atualização de estudos das bases físicas para
subsidiar os rápidos processos de expansão urbana. A circulação de pesquisadores advindos das
universidades estaduais paulistas a região buscando atender referidas demandas de estudos técnicos
cresce.
A criação de uma divisão regional do DAEE (Departamento de Águas e Energia
Elétrica) na área também desempenhou papel relevante para agregar informações significativas,
sobretudos pelo registro de novas sondagens de poços tubulares profundos. Dados e demandas
como as citados constituíram bases de alguns dos novos trabalhos de pesquisadores das
mencionadas universidades estaduais paulistas, como aqueles registrados aos estudos de Hirata el at
(2012) e Meaulo (2004 e 2007).
Com base em compilação de poços profundos, Hirata et al (2012) em estudo sobre
capacidade de fornecimento hídrico das águas subterrâneas locais para subsidiar expansão urbana
regional procura elencar tendências de variações subsuperficiais das unidades litológicas locais. O
seguinte trecho retirado de seu trabalho sintetiza algumas de suas observações na citada direção:

45
.”Ainda, essa unidade (Serra Geral) apresenta uma grande variação de espessura, atingindo
até 266 m no município, com valores de média e mediana de 107 e 113 m,
respectivamente. A análise do mapa da distribuição de isoespessura dos basaltos da
Formação Serra Geral (Figura 3) mostra duas tendên cias de espessamento na cidade: uma a
Centro-sul e outra a Norte-nordeste. Tais variações na espessura estão provavelmente
associadas a um sistema de falhas ou mesmo às irregularidades do paleorrelevo na
sedimentação dos arenitos Botucatu, em ambiente eólico-dunar (seções geológicas A-A’ e
B-B’, Figura 4). Nos locais onde esta formação aflora, nota-se um manto de intemperismo,
formado por solo vermelho argiloso e espessura aproximada de 12 m, podendo alcançar
valores de até 30 m. Entre os derrames, ocorrem lentes de arenitos intertrapianos finos a
médios, com estratificação cruzada tan gencial e espessura entre 2 a 26 m (Raposo, 1992).
Sotopostos à Formação Serra Geral, encontram-se os arenitos das formações Botucatu e
Piramboia, que hidroestratigraficamente integram o SAG (Foster et al., 2009). A Formação
Botucatu, de Idade Jurássica, é composta por arenitos finos a médios, bem selecionados,
estratificações cruzadas, planar ou acanalada, de médio a grande porte, originadas em
campos de dunas eólicos (Assine et al., 2004). A Formação Piramboia, de Idade Triássica, é
predominantemente composta por arenitos de origem eó- lica, com estratificação cruzada e
subordinadamente planoparalela, de médio porte, originada em campos de dunas eólicas
com interdunas úmidas e canais fluviais (Hirata et al., 2011). Nenhum poço perfurado no
município chegou até os argilitos, siltitos, folhelhos e arenitos finos da Formação
Corumbataí, que atua como aquitarde na base do SAG. Desconhece-se a espessura total
desta unidade na área, pois nenhum poço atingiu a Formação Corumbataí. A maior
espessura do SAG na área é de 328 m, observada no poço 26, a Sudeste da área de estudo,
com redução da espessura na direção Oeste. Provavelmente, a espessura máxima se
encontra próxima a 350 m. (Hirata et al, 2012)”.
Cabe registrar a diferença de algumas de suas ponderações em relações a de Piuci e
Diniz. Na abordagem de Piuci e Nobile (1985) aponta-se os poços tubulares profundos locais
alcançando as formações permianas que Hirata et al (2012) apontam como não registradas pelas
perfurações. A referida diferença de interpretação para os fins do presente estudo não chegam a ser
uma interferência significativa. Haja visto que as cotas topográficas apontadas por Piuci e Diniz
(1985) para as referidas formações rochosas – entre 300 e 400 metros – encontram-se ao menos
uma centena de metros abaixo dos menores níveis registrados na topografia da superfície do relevo
para a Antiga Araraquara. Todavia observações referentes a significativas variações de espessuras
de algumas das unidades litológicas locais, e sugestão de possibilidade de associação desta
tendência a associações com sistema de falhas são aspectos de interesse as temáticas passiveis de
discussão no presente estudo.
Referente as contribuições de Meaulo (2004 e 2007), cabe evidenciar a realização de
estudo de caracterização geológica de grande grau de detalhamento em quadrante específico da área
de estudo, adjacente a área de expansão urbana dos novos bairros industriais da cidade de
Araraquara. Em seu trabalho - que buscou fornecer subsídios para determinar áreas cuja ocupação
oferecerem graus variados de riscos de contaminação a água subterrâneas de aquíferos livres - são
realizados amplos levantamentos de dados litológicos, pedológicos e sedimentares para realizar
caracterização dos produtos de alteração dos litotipos da área. Dentre suas contribuições realiza
análises granulométricas das unidades litológicas locais, buscando fornecer critérios para
discernimento entre formações que sob a perspectiva macroscópica mostram-se com alto grau de

46
semelhança e de difícil diferenciação em campo.
Recentes trabalhos de pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas - Celarino
(2008, 2009 e 2011) e Souza (2010) - introduzem aspectos interessantes ao aqui proposto.
Sobretudo ao apresentarem caracterização de detalhe referente a horizontes pedogenéticos
(Celarino, 2008), variações palinológicas (Souza, 2010) e de relações solo-relevo nos sedimentos de
fundo de vale do Mogi-Guaçu (Celarino, 2008) adjacentes a área de estudo. Realçam-se também a
realização de datações por métodos de carbono-14 e fotoluminescência opticamente estimulada nos
terraços do rio Jaracé-Guaçu, que introduzem elementos importantes para discussão da
contextualização da sucessão de quadros cronomorfológicos da Antiga Araraquara.
Cabem mencionar também trabalho de Zancopé (2006) que, ao analisar padrões
morfométricos do conjunto do curso do rio Mogi-Guaçu, inclui menções e caracterizações de
segmentos da área da Antiga Araraquara. Destaca-se não somente por apresentar atributos
morfodinâmicos e morfométricos associados as terras baixas do Mogi-Guaçu, como também a
contextualiza-los dentro do conjunto do curso do citado rio. Apontando as especificidades de certas
feições geomorfológicas vinculadas a dinâmica fluviais ao cruzar a área de estudo, em especial ao
destacar as elevadas larguras em planta em planta de suas planícies de inundação no contexto do
Médio Curso do Mogi-Guaçu..
A criação de legislação exigindo estudos prévios de impacto a obras de médio e grande
porte no estado de São Paulo levaram a realização de numerosos estudos de prevenção de impactos
ambientais (EIA-RIMAs). Vários dos quais fornecem contribuições importantes referentes a dados
de detalhes da estrutura superficial local, em especial a aspectos das caracterizações de horizontes
de solos e coberturas sedimentares da Antiga Araraquara. Sobre os produtos de alteração e registros
superficiais cabe destacar séries de relatórios técnicos (Rodrigues, 2001; 2002. 2004 e 2009;
Zanettini, 2004) que foram abrigados e preservados em cópias manuscritas por grupos ligado ao
Grupo de Estudos de Arqueologia (GEA) e abrigados em anexo do Museu de Arqueologia e
Paleontologia de Araraquara.
Somados as atividades de pesquisa acadêmica desenvolvidas anteriormente e/ou
concomitantemente aos levantamentos empreendidos pelo citado grupo de estudos (Rodrigues,
2012, Galhardo, 2010 e Grossi, 2011), temos dados de caracterização pontual macroscópica dos
horizontes de solo e sedimentos superficiais de dezenas de pontos dispersos na área da Antiga
Araraquara. Frequentemente vinculados a registros derivados da escavação, como trincheiras e
furos.
Mesclando-se a estes registros superficiais soma-se a presença documentada de cerca de
8 sítios arqueológicos líticos e 20 ocorrências líticas esparsas, a maioria dos quais cuja localização

47
encontra-se vinculados a realização dos previamente citados relatórios de previsão de impactos
ambientais. Os sítios em seu conjunto abrangem alguns milhares de peças arqueológicas líticas de
caracterização tecnotipológica usualmente correlacionados as tradições Umbu e Humaita, a maior
parte delas lascadas em arenito. Estilhas, gumes, núcleos e raspadores líticos mostram-se como
alguns dos tipos de peças mais frequentes. Artefatos mostram-se presentes também em significativa
diversidade, desde pontas de projéteis a machados de rocha polida.
Dentre os citados sítios e ocorrências arqueológicas líticas, realça-se o sítio Boa
Esperança do Sul II (BES II). O sítio BES II foi resgatado nos terraços fluviais do Jararé-Guaçu
pela empresa de consultoria Zanettini Arqueologia, por conta de levantamentos ligados ao Programa
Gasoduto Araraquara Norte realizado em 2004. Durante essa etapa de intervenção dentro da
Arqueologia Preventiva, destacou-se a diversidade e quantidade do material lítico, envolvendo
centenas de peças arqueológicas relacionadas a grupos caçadores-coletores, Posteriormente, para
atender os questionamentos levantados nessa época, foi feita mais uma etapa de campo em
Fevereiro de 2010, mas já dentro de projeto de pesquisa acadêmica (Santos, 2011).
Na primeira etapa de campo em 2003 foram realizadas prospecções de campo envolvendo a
cobertura integral da área destinada ao empreendimento, bem como de sua zona de influência
direta, consorciando-se a observação direta de áreas degradadas através de prospecções extensivas
do tipo varredura com o exame detalhado de todos os pontos favoráveis à análise, e intervenções de
subsuperfície (prospecções intensivas com intervalos regulares), através de shovel tests (poços
testes), sondagens e tradagens. Na segunda etapa de campo, em 2010, o objetivo da intervenção,
incluía coletar amostra para fazer datação por Luminescência Opticamente Estimulada (Santos,
2011) em nível arqueológico, cuja datação estaria vinculada proximal a transição Pleistoceno-
Holoceno (14500+-3000 anos antes do presente).
Datação de fotoluminescência ligada ao sítio BES II - se devidamente aceita - o
correlacionaria proximal a transição entre as épocas pleistocênica e holocênica. Mesclariam-se
assim as opções e técnicas dos grupos humanos que criaram seus artefatos num cenário mutável de
quadros climáticos e paisagísticos regionais. Motivo pelo qual, nas etapas posteriores do presente
trabalho, se dará foco e cuidado específico na sua inserção e interface com dados sumarizados do
meio físico e quadros de relevo regionais.

3.3 Aprofundamento da Caracterização das Unidades Geológicas Locais


A Antiga Araraquara trata-se de uma área em que as rochas do Grupo São Bento após
elevarem-se a alguns de seus patamares altimétricos mais elevados (700-1100 metros) nas Serras de

48
São Carlos e Itaqueri a leste e nordeste, decaem em altitude gradualmente ao se aproximarem da
área de estudo para mergulharem sob os sedimentos basais do Grupo Bauru.
A Antiga Araraquara trata-se portanto por uma área de transição e contato entre os principais
estratos mesozóicos da Bacia do Paraná, da associação de rochas areníticas e basálticas vinculadas
as Formações mesozóicas Botucatu e Serra Geral, e das Formações basais do Grupo Bauru. Pode-
se recordar que em várias extensões das Escarpas Basálticas da Bacia do Paraná encontramos
quadros de exceção nas relações estratigráficas e de contato, em que os sedimentos basais do grupo
Bauru assentam-se por vezes diretamente sob os arenitos da formação Botucatu. Nos segmentos da
previamente citada Serra de Itaqueri, algumas dezenas de quilômetros a nordeste dos bordos da área
de estudo, apresentam-se situações como tal. Na área de estudo as relações de contato que pudemos
observar denotam esquemas próximos do contexto estratigráfico convencional.
Em verdade, a interface das unidades rochosas com a superfície do terreno se dá de maneira
que as faixas de afloramentos rochosos correspondam a patamares de relevo relativamente bem
individualizados. A análise do mapa geológico local fornece bons indicadores preliminares da
própria distribuição dos principais patamares de relevo regionais (ver Mapa 1). Os afloramentos de
arenitos da Formação Botucatu e os solos dela derivados afloram nos fundos de vale regionais –
sobretudo nos extremos noroeste e sudeste da área, e nas bases das escarpas que lhes margeiam. Os
basaltos da formação Serra Geral mostram-se como faixas dispostas, em geral, em direção leste-
oeste nos segmentos topográficos intermediários, e em direção próxima do nordeste-sudoeste nos
segmentos das nascentes dos córregos que nascem e correm nas cotas topográficas mais elevadas.
Em seu turno, as áreas associadas aos sedimentos do Grupo Bauru formam, na altura da Antiga
Araraquara, os topos de vale referentes a altimetria das cumeadas melhor individualizados.
A sobreposição elencada das unidades litológicas e de alguns dos elementos gerais da
compartimentação topográfica da área aponta algumas perspectivas relevantes para o presente
trabalho. Entre elas, a de melhor compreender a influência das unidades litológicas locais como
possíveis fatores de relevo. Diante do quadro afora está análise de sua distribuição, apresentamos
algumas caracterizações referentes a atributos específicos de cada uma das unidades líticas
delimitadas e dos critérios usados para sua individualização. Dados são baseados em observações de
campo, ponderados e comparados quando cabível com trabalhos anteriores de mapeamentos de
detalhe feitos em parcela específica da área de estudo (segmento central).

49
50
51
Mapa 1 - Mapa Geológico da Antiga Araraquara. Fonte: elaboração própria (2016). Nota: A divisão temporal “Cretáceo
e Cenozóico” na legenda dos litotipos foi usada apesar da sobreposição com a divisão “Mesozóica” usada no mesmo
quadro, por não ser possível determinar se litotipos em questão encontram-se por completo inseridos no mesmo período
temporal – questão detalhada no corpo do texto

52
Optamos por segmentar a área desta maneira nas seguintes unidades – Arenitos da Formação
Botucatu, Rochas Básicas da Formação Serra Geral, Coberturas Indivisas e Sedimentos
Inconsolidados de Fundo de Vale. Suas características sumárias seguem abaixo:
-Coberturas Arenosas Indivisas: nas cotas topográficas mais elevadas da área de estudo
encontram-se solos de alteração de coberturas sedimentares areno-argilosas, de colorações
alaranjadas e avermelhadas que recobrem discordantemente os basaltos da Formação Serra Geral e
também, minoritariamente e por vezes sem registro de discordância, a Formação Botucatu.
Apresenta constituição mineralógica usualmente pautado por predomínio de quartzo, que perfaz
mais de 90% da composição mineralógica em análises de amostra de mão. Dentre os minerais
acessórios destacam-se as magnetitas, por vezes responsáveis por até 5% das amostras analisadas –
passíveis de serem separadas dos demais minerais por meio de imãs.
Granulometricamente predominam intervalos arenosos, com ocorrência localizada de
superfícies lateríticas relativamente delgadas – de ordem centimétrica ou decimétrica. Associa-se
usualmente as cotas topográficas mais elevadas da área, estando em geral presentes nos intervalos
altimétricos acima de 640 metros.
Proximal aos contato – em geral inferido – com os basaltos subjacentes da formação
Serra Geral, em setores diversos da área encontramos o registro disperso em meio a superfície do
terreno de cascalhos centimétricos de quartzo, incluindo presença de ametistas, de textura
subarredondada. Tais registros mostraram-se mais frequentes em atividades de campo que se davam
após dias marcados por dinâmica de chuvas significativas. Exemplos de tais ocorrências incluem as
registradas em estradas de terra nos interflúvios a norte do bairro Vale do Sol no centro da área de
estudo, e as observadas na transição entre interflúvios e vertentes próximas a estação de tratamento
de efluentes de Santas Lucia – nordeste da área de estudo (pontos de campo 73 e 35).
Em outros segmentos – cortes da rodovia Washington Luiz e na estrada Gavião Peixoto-
Araraquara – onde pode-se observar diretamente cortes que incluem o contato das Coberturas
Indivisas com os produtos da alteração dos basaltos subjacentes, observou-se linhas de cascalheiras
formadas por materiais de similar litologia e granulometria. Referidas linhas de cascalhos revelam
espessuras usualmente contidas entre 1 e 3 centímetros, com disposição suavemente ondulada que
raramente se afasta mais do que entre 3 e 5 cm de um eixo semi-horizontal paralelo a topografia
pouco inclinada do relevo local. Podem ser tomadas como indicativos de contato erosivo entre as
duas citadas unidades litoestratigráficas.
Guardam semelhança com as linhas de seixo descritas por Meaulo (2005) em quadrante
específico dentre a porção central da área de estudo, que o citado geólogo correlaciona a
discordância erosiva entre as formações Adamantina e Serra Geral.

53
A descrição macroscópica das Coberturas Indivisas guarda muita semelhança tanto com os
registros da literatura atribuídos a produtos de remobilização da formação Botucatu, quanto da
formação Adamantina do Grupo Bauru – como aqueles registrados por Nobile e Diniz (1985). Ou
mesmo de depósitos originados da remobilização das duas unidades previamente citadas,
possivelmente de discutível correlação a influências tectônicas pós-cretáceas. Meaulo (2007) em
trabalho de detalhe para segmento específico que corresponde a uma parcela da área total abrangida
por este trabalho optou por dividir as coberturas de topo de vale em dois conjuntos distintos a partir
de sutis diferenças texturais.
Sobretudo, usou como critério para a referida delimitação o grau de seleção que identificou a
partir de análises laboratoriais granulométricas. Onde associava aos produtos da remobilização uma
variação maior entre os intervalos de areia grossa e fina, enquanto nos segmentos não-
remobilizados o nível de seleção mostrava-se mais elevado. Segmentou-as entre as relacionadas a
formação Adamantina do Grupo Bauru e a material originado da remobilização dos arenitos da
Formação Botucatu.
Devido a diferença na escala de trabalho – o presente mapeamento trabalha a partir da
escala 1:70.000 enquanto Meaulo (2007) abordou um quadrante específico entre a área delimitada
para o presente estudo em escala 1:25000 – optamos por considerar tais coberturas de topo de vale
como um conjunto indiviso. Ainda que pudéssemos argumentar referente a possibilidade de
diversas observações pontuais permitirem um grau de segmentação maior - como nos setores em
que coberturas indivisas identificadas como remobilização por arenitos estiverem sobrepondo
segmentos comprovadamente característicos como as citadas rochas clásticas – consideramos o
procedimento referido mais prudente. Sobretudo pela diferenciação entre as duas unidades requerer
métodos além daqueles disponíveis no mapeamento de campo, de forma que não teríamos
condições de aplicá-los homogeneamente ao conjunto da área de estudo. Assim, acreditamos ser
mais coerente a escolha feita com relação tanto a escala de trabalho adotada quanto aos recursos
materiais disponíveis para a presente pesquisa.
-Rochas Básicas da Formação Serra Geral: apresentam-se predominantemente como
basaltos com coloração entre mesocrática e melanocrática, visibilidade afanítica, caráter máfico e de
granulação fina – pontualmente média nos raros diabásios presentes. Trata-se do litotipo com maior
abrangência espacial da área de estudo, abrangendo o centro, oeste, leste e sul da área de estudo.
Encontra-se em contato concordante e abrupto com os sedimentos areno-siltosos da formação
Adamantina que lhe são sobrejacentes e com os arenitos da formação Botucatu que lhe são
subjacentes (ver figura 5).
Macroscopicamente na análise de afloramentos é difícil identificar minerais dado a

54
Figuras 5 – Composição com fotografias obtidas em campo. Observamos na Imagem I contato dos sobrejacentes
basaltos da Formação Serra Geral com Arenitos da Formação Botucatu (próximo a ponto de campo 84), na imagem 2
observamos basalto intemperizado marcado por esfoliação esferoidal com caneta (grifada em vermelho) como escala
(ponto de campo 36), na imagem 3 afloramento de arenito da Formação Botucatu bem preservado (ponto de campo 4) e
afloramento de arenito já significativamente intemperizado, associado a Neossolo Lítico(ponto de campo 163). Fonte:
elaboração própria, a partir de fotográfias do autor (II e III) e Dulcelaine Nishikawa, que acompanhou parte dos
trabalhos de campo.

55
granulação fina predominante. Em alguns segmentos, usualmente associados a escarpas de quebras
bruscas, torna-se entretanto particularmente visível na análise de afloramentos numerosas fraturas
subverticais e verticais, e minoritárias fraturas subhorizontais que por vezes se sobrepõe. Tratam-se
de ao menos duas famílias de juntas – de direções N70E e N30W, respetivamente – de
espalhamento denso ou muito denso (não distantes entre si mais do que 5 cm), abertura pequena –
entre 1 e 3 cm – e preenchidas por veio de quartzo. Nestes segmentos de sobreposição intensa por
juntas notam-se esfoliações esferoidais. Os solos resultados de sua alteração destacam-se pela
graulometria fina ou muito fina, texturalmente argilosa, e de cor vermelha. É possível identificar
magnetitas e goethitas, que mostram-se pautados por caráter subangular e baixo polimento.
Meaulo (2007) aponta o predomínio de plagioclásios e augitas em lâminas petrográficas por ele
analisadas em quadrante específico da área de estudo.
Ainda que seja o litotipo de maior abrangência espacial da área de estudo, seus
afloramentos são raros. Os mais comuns são os encontrados nas calhas de rios em cotas
topográficas mais elevadas da área (usualmente acima de 640 metros), ou os provenientes de corte
de estradas e ferrovias, que permitem a observação tanto das rochas pouco intemperizados e dos
perfis regolíticos associados.
Observações similares podem ser realizados nos afloramentos que capeiam Vertentes
Semi-Verticais dos Patamares Transicionais, ao menos naqueles cujo acesso as calhas fluviais
bordejadas é possível. Também se registram afloramentos decimétricos ou métricos fragmentados
em meio aos segmentos de médias e altas declividades das Vertentes dos Patamares Transicionais,
particularmente simples de serem localizados após enxurradas de maior intensidade.
As características gerais do litotipo o torna pouco propício a ação da desnudação. Ainda
que alguns de seus minerais ferromagnesianos possam ser significativamente propensos a serem
alvos de diversificados processos de intemperismo químicos de áreas quentes e úmidas, a
intensidade dos processos não é suficiente para desenvolvimento de porosidade secundária
significativa. Pelo contrário, a alta coesão entre os minerais da rocha-mãe equivale nos produtos de
sua alteração a regolítos argilosos também bastante coesos. No entanto não pode-se deixar de
considerar a densidade dos fraturamentos – sobreposição de famílias de juntas e/ou estimados
planos de falhas associados a vertentes semi-verticais - que os cortam em determinados segmentos,
que criam zonas de fraquezas passíveis de catalisarem e concentrarem ação erosiva.
-Arenitos da Formação Botucatu: correspondem a arenitos de cores que oscilam
padrões avermelhados, rosados e alaranjados de areias fina-médias, com predominância de fração
de areia fina e presença subordinada de área média e muito fina. Distribui-se sobretudo nos
extremos norte, nordeste, leste e sudeste da área de estudo.

56
Nos raros afloramentos, apresentam estratificações cruzadas de longos foresets com
camadas que podem alcançar até 35 graus de inclinação nas medições de maiores valores feitas em
campo – porém usualmente dificilmente excedente valores entre as faixas de 15 e 20 graus. Dentre
os afloramentos descritos, tais feições encontram-se particularmente evidenciadas naqueles
próximos a trechos basais de escarpa de quebras bruscas próximos a fazenda Rainha dos Montes
(Ponto de Campo 4, registrado na figura 5)
Apresenta-se bastante friável nos segmentos onde porosidade primária permanece
próxima as porcentagens originais da formação da rocha, e mais consolidada e resistente a
desgranulação erosiva em segmentos de maior silicificação e/ou de maior proximidade com o
contato com os sobrejacentes basaltos da formação Serra Geral. Em setores diversos da área de
estudo – sobretudo no leste – encontra-se grau de ampla intensificação da silicificação. Mostram-se
associados a atividades de longa data de extração de rochas a partir das quais se construiu os
calçamentos de pedestres dos núcleos antigos da cidade de Araraquara, vinculados aos conhecidos
registros paleontológico de icnofósseis (Pedreira do Ouro).
O contato com os basaltos da formação Serra Geral é inferido na maior parte da área,
somente sendo observado diretamente num único afloramento (ponto de campo 81, registrado na
figura 5). Neste afloramento em particular nota-se bem preservada a paleosuperfície das dunas
eólicas da formação Botucatu, com basaltos acompanhando contornos ondulados dispostos ao longo
de alinhamento senoidal (Figura 5). Também usualmente é inferido o contato com Coberturas
Arenosas Indivisas que a recobrem.
Seus afloramentos mais comuns encontram-se adjacentes a cortes de estrada ou
associados a faces de Morros Residuais nos compartimentos de relevo dos Patamares Transicionais
e dos Baixos-Intermediários Terraços e Planícies Fluviais. Observam-se nele estruturas de
laminações plano-paralela e estratificações cruzadas de pequeno a grande porte.
A análise em petrografia ótica de Meaulo (2005) das amostras mostra predomínio
mineralógico de 95% de quartzo, 3% de magnetita e 2% de outros minerais com granulometria
média de 0,070 mm, bom grau de arredondamento e porosidade primária de 30%. Em algumas das
amostras registram-se porcentuais variados de preenchimento por sílica dos poros registrado.
Todavia esta oscilação não mostra-se necessariamente associadas a altos do relevo – amostras
retiradas de topos de morros e montes com desníveis verticais de até 20 metros dos entornos
chegam a apresentarem preenchimento por sílica próxima do nulo. Nas lâminas podemos observar
em meio aos arenitos que caráter do arredondamento dos grãos de quartzo mostram-se reduzidos
quando na imediação de magnetitas e esparsos piroxênios.
Padrões de solo de alteração da formação Botucatu mostram-se como solos arenosos, de

57
boa seleção e subarredondamento ou bom arredondamento de seus clastos, colorações alaranjadas e
vermelhas, predomínio mineralógico de quartzo pautando-se por caráter não estruturado e de fácil
desagregação granular.
Sua composição mineralógica predominante de quartzo a tornaria a princípio pouco
vulnerável a ação do intemperismo químico atuante em áreas quentes e úmidas. A elevada
porosidade primária da rocha bem como significativa conectividade entre os poros porém tornam a
rocha especialmente propícia a processos como aqueles vinculados a desgranulação.
-Sedimentos de Fundo de Vale: correspondem aos depósitos sedimentares da área
depositados nos fundos de vale regionais, associados sobretudo a dinâmica deposicional fluvial.
Encontram-se dispostos nos mais rebaixados patamares topográficos da área de estudo,
preenchendo canais e planíceis fluviais.
Agregamos, pela questão da escala do estudo, sob uma mesma designação depósitos
sedimentares sensivelmente diferenciados (ver figura 6).
Num primeiro subconjunto, podemos apontar a presença de depósitos areno-argilosos
referentes a ação da dinâmica subatual dos grandes canais de fundo de vale regionais. Pautam-se
por granulometria de predomínio areno-argilosa, com presença pontual de cascalhos dispersos de
bom grau de arredondamento e espessura total desconhecida – mas que pode em alguns segmentos
atingir ao menos a casa dos 15 metros. Se dispõe em extensões de planta de alguns quilômetros
margeando os cursos dos canais principais de fundo de vale da área de estudo, perfazendo as
planícies de inundação a eles marginais e seus níveis de terraços adjacentes.
Num segundo subconjunto, podemos falar de depósitos de maior variação granulométrica e
também com mais significativas distinções internas – ao ponto de haverem superfícies de contato
entre depósitos de presumíveis ambientes deposicionais significativamente distintos. Situados nas
cabeceiras de afluentes dos canais principais (Ribeirão Anhumas, afluente do Mogi-Guaçu),
apresentam alternância de depósitos arenosos de distintos níveis de oxidação e com presença de
estruturas sedimentares de estratificações cruzadas, e depósitos de silte. Alguns dos níveis de silte
apresentam traços como presença de marcas de raízes. Registram-se neste subconjunto relações de
contato diversificada entre os diversos depósitos, inclusive contatos erosivos capeados por
cascalheiras de clastos centimétricas. Podem apresentar espessuras totais de ao menos 30 metros
(ponto de campo 13).
Como será detalhado em segmentos posteriores do presente trabalho, este segundo
subconjunto de sedimentos de fundo de vale encontram-se adjacente a padrões geomórficos
interpretados como possíveis escarpas de falha. Sua preservação poderia estar ligado ao espaço de
acomodação gerado pelo rejeito das citadas falhas, que teriam criado espaço de acomodação para

58
Figuras 6 – Composição ilustrando fotos tiradas em campo ao longo de perfis verticais com exposição de sedimentos de
fundo de vale. Na imagem I notamos corte vertical em porto de areia, atestando espessura de ao menos próximo a 30
metros do segmento específico de sedimentos de fundo de vale. Na imagem 2 observamos contato entre depósitos
arenosos com baixo e alto grau de oxidação, respectivamente (caneta, com circulo em vermelho no entorno, serve de
escala). Na imagem III e IV observamos detalhes de segmento arenoso pautado por oxidação, com presença de
estratificações cruzadas recobertas discordantemente por cascalheiras. Fotos tirados nos pontos de campo 7 e 6. Fonte:
Elaboração própria, a partir de fotos próprias.

59
preservação de sucessões de ambientes sedimentares cenozóicos que pautaram referente segmento
da área de estudo.
Poderiam porém também tratar-se de sedimentos cretáceos do Grupo Bauru, caso o
falhamento adjacente tenha sido ligado a deformações que se deram anteriormente a erosão de
pacotes sedimentares mais recentes do que os atualmente preservados nas Coberturas Arenosas
Indivisas. Possivelmente levados a patamar altimétrico mais reduzido e com menor distanciamento
do nível de base local, teriam sido submetidos a dinâmica agressiva de menor energia e capacidade
de remobilização que suas contrapartes que permaneceram em cotas altimétricas mais elevadas.
Distinção entre as duas possibilidades passaria por consulta de dados advindos de poços tubulares
profundos capazes de mensurar o rejeito do citado falhamento, e da eventual datação e
caracterização em mais detalhes por palinologia e métodos advindos da paleopedologia dos citados
sedimentos – procedimentos que fogem ao escopo do presente trabalho, mas que podem
eventualmente vir a ser temas de pesquisas futuras.
3.4 Aspectos Morfométricos Essenciais
Referente a um aprofundamento da caracterização das variações altimétricas e de declives, a
análise da compilação efetuada dos mapas altimétricos e clinográficos da área podem ser um bom
ponto de partida (ver mapas 2 e 3). Na compilação altimétrica e clinográfica podemos verificar a
distribuição espacial das altimetrias e declividades da área de estudo. A Tabela 1 – feito pela
tabulação do Mapa Hispsométrico (Mapa 2) – sintetiza as porcentagens em áreas ocupadas por cada
combinação de zonas hipsométricas da Antiga Araraquara. Já a Tabela 2 – elaborada pela tabulação
do Mapa Clinográfico (Mapa 3) – agrupada as porcentagens em área de cada intervalo de faixas de
inclinação abrangidas pela área de estudo.
Tabela 1 – Extensão em Área Classes Hipsométricas da Antiga Araraquara
Intervalo Altimétrico Porcentual da Área Total Área Absoluta (quilômetros
quadrados)
500-540 18% 165
540-580 13% 120
580-610 18% 165
610-640 21% 192
640-670 15% 139
670-700 8% 78
700-720 7% 66
Total 100% 923
Fonte: elaboração própria, através de tabulação de bases digitais revistas dos mapas hipsométricos
elaborados (algumas categorias com valores muito reduzidos presentes no mapa foram agrupadas na tabela)

60
61
62
63
64
Mapa 2 – Mapa Hipsométrico. Fonte: Elaboração própria

65
Mapa 3 – Mapa Clinográfico. Fonte: Elaboração própria

66
Tabela 2 – Extensão em Área – Classes de Inclinação da Antiga Araraquara
Intervalo de Inclinação Porcentual em Área Total Área Absoluta (quilômetros
quadrados)
0-2 8 73
3-6 36 323
6-10 26 240
10-13 14 130
13-16 8 84
16-20 6 45
20 ou superior 2 18
Total 100 923
Fonte: elaboração própria, através de tabulação de bases digitais revistas dos mapas
clinográficos elaborados
Pelos quadros e mapas, notamos que mais de 600 quilômetros quadrados enquadram-se em
meio as faixas hipsométricas contidas 500-680 m de altitude, dominando neste conjunto as
declividades médias inferiores a 13 graus. Envolvem extensas áreas do território da Antiga
Araraquara, abrangendo desde os segmentos mais basais dos fundos de vale dos Rios Jacaré-Guaçu
e Mogi-Guaçu, a quase totalidade do conjunto de escarpas suavizadas que os bordejam e amplas
áreas dos conjuntos de interflúvios elevados e vertentes suavizadas dos Planaltos locais. Apenas
poucos exíguos segmentos mais elevados fogem a este quadro topográfico geral, que representam
bem os diversos patamares internos deste segmento interiorizado das escarpas da Bacia do Paraná.
Analisando de maneira mais proximal os dados apresentados, podemos porém atingir
outras observações de interesse. Verificamos que deste intervalo, os cerca de 180 quilômetros
quadrados de segmentos contidos entre o intervalo altimétrico entre 500 e 540 metros de altitude
correspondem quase que exclusivamente as planícies aluviais dos rios Jacaré-Guaçu e Mogi-
Guaçu. Mostram-se presentes secundariamente em alguns dos afluentes dos citados grandes rios
regionais, e aos conjuntos de planícies fluviais, baixos terraços fluviais e vertentes que os bordejam.
Distribuem-se respectivamente no extremo sul e extremo norte da Antiga Araraquara. Prevalecem
nestes segmentos um predomínio de declividades das mais reduzidas presentes na área de estudo,
com valores predominantes estando abaixo de 6 graus de inclinação.
Ressalta-se aqui que a despeito das calhas dos grandes rios da área de estudo serem
separadas por extensos conjuntos de plataformas interfluviais e escarpas e por significativa distância
em planta (não inferior a ordem de algumas dezenas de quilômetros), sua posição altimétrica é
relativamente semelhante. Tanto a calha do Rio Jacaré-Guaçu e do Mogi-Guaçu quanto as do baixo

67
curso de seus principais afluentes diretos mostram-se contidas entre as cotas de 500 e 520 metros de
altitude, pautando-se ambos por declividades reduzidas e inferiores a 6 graus.
O conjunto de 180 quilômetros quadrados que mescla-se aos intervalos entre 540 e 610
metros por sua vez associam-se de maneira prevalecente ao conjunto de vertentes e escarpas de
diferentes declividades que margeiam os vales dos dois grandes rios da Antiga Araraquara, bem
como as que bordejam alguns de seus afluentes mais significativos. Neste intervalo altimétrico
encontraremos as faixas de intervalos de declividades mais elevadas, estando contindas
prevalecentemente entre 6 e 20 graus de inclinação os intervalos dominantes.
As extensões contidas entre 610 e 700 metros mostram-se associadas ao conjunto de
discretas plataformas interflúviais e vertentes suavizadas que lhes bordejam e posicionam-se
próximos ao divisor de águas que drenam para o Jacaré-Guaçu e Mogi-Guaçu. Ao longo das
extensões delimitadas pelo referido intervalo hipsométrico, as inclinações médias prevalecem
contidas entre os intervalos entre 2 e 10 graus. Os cerca de 60 quilômetros quadrados contidos
entre 700 e 720 metros pautam-se pelos segmentos mais próximos ao centro geográfico da área de
estudo, distribuídos num alinhamento próximo do leste-oeste. Marcam os segmentos mais elevados
dos divisores interfluviais, associados em geral a inclinações reduzidas contidas majoritariamente
entre 1 e 4 graus.
A despeito da relativa homogeneidade, e contrastes altimétricos e de declives
aparentemente pouco salientes o quadro hipsométrico e de clinografia da área de estudo encontra-se
em segmentos diversos impostos a sutilezas e variações locais relevantes. Simultaneamente ao
longo do conjunto de padrões predominantes previamente apresentados superimpõe-se segmentos
de exceção de interesse geomorfológico, como será discutido no capítulo seguinte do presente
trabalho.

68
CAP IV - Compartimentação de Relevo da Antiga
Araraquara, Aspectos Geomorfogenéticos e Inserção
dos Sítios Arqueológicos nos Quadros de Relevo

69
4.1 Compartimentos de Relevo da Antiga Araraquara
Presente tópico busca expor caracterização dos compartimentos de relevo regionais(ver
Mapa 4) a serem usados para interfaces com sítios arqueológicos líticos, dados com base na
sobreposição dos dados das bases físicas da Antiga Araraquara apresentados no capítulo anterior –
em especial dos dados derivados do detalhamento das unidades litológicas locais e da
caracterização morfométrica.
Num contexto de análise geomorfológica e da ponderação de sucessões cronomorfológicas
estimadas, o relevo local tende por vastas extensões a declividades e desníveis verticais locais
relativamente reduzidos. Diferente de outras áreas de estudo, como estudos geomorfológicos
realizados em domínios geotectônicos de Faixas Móveis ou mesmo setores de Bacias Sedimentares
em que relações estratigráficas apresentam discrepâncias mais notáveis – como aqueles marcados
por Altos Estruturais bem pronunciados e evidenciados. A análise em detalhe porém permite
identificar heterogeneidades capazes de fornecer subsídios para as referidas discussões
cronolómorfológicas.
Trata-se de um quadro com singularidades também quando consideramos uma análise
comparativa mais ampla dos quadros de relevo e interface com registros de apropriação humana
ameríndia e paleoíndia.
Muitos de alguns dos sítios arqueológicos líticos conhecidos como os vinculados as
tradições Umbu e Humaitá em outros segmentos de relevo do Brasil Meridional encontram-se
concentrados em compartimentos de relevo de exceção com declives e variações altimétricas
relativamente suavizadas, com potenciais para ocupação que contrastam com seu contexto regional
de quadros geomórficos mais movimentados. Pode-se citar nesta direção a grande concentração de
sítios arqueológicos conhecidos dentre as depressões da Bacia de Taubaté e de São Paulo,
compartimentos de relevo de declividades relativamente reduzidas inseridos em meio aos
movimentados quadros de relevo dos Planaltos Atlânticos. Ou mesmo as concentrações de sítios
registradas associadas a complexos cársticos de Lagoa Santa ou do Alto Ribeira, em meio a
extensões de rochas graníticas-gnáissicas de maiores desníveis verticais locais dos entornos
imediatos.
Dixon (1999) já apontava para grupamentos do modo de vida caçadores que um dos
elementos das bases físicas importantes para compreensão de sua alocação referia-se a terrenos de
declividades relativamente reduzidas, tidos como mais adequados a edificação de acampamentos e
confecção de sítios-oficinas para confecção de ferramentas líticas. Neste sentido os quadros de
relevo da Antiga Araraquara relacionam-se a condições fisiográficas privilegiadas face a ampla
disseminação de alguns dos atributos – como declividades reduzidas – cuja presença pontual

70
71
72
Mapa 4 – Compartimentos de Relevo da Antiga Araraquara. Fonte: elaboração própria

73
em outros setores mostra-se associada com concentração de sítios arqueológicos líticos.
Mesmo considerando as variações topográficas de contrastes menos salientes apontadas
previamente, pode-se porém delimitar heterogeneidades internas suficientes para falar-se da
delimitação de distintos compartimentos de relevo. Sobretudo, pautando-se pela sobreposição dos
dados referentes as bases litológicas e morfométricas. Capazes, na sua análise de detalhes, de
fornecerem subsídios significativos para discussão da dinâmica geomorfogenética regional e de
aspectos das sucessões cronomorfológicas da Antiga Araraquara, e de se empregar sítios
arqueológicos líticos locais para balizar aspectos das referidas discussões geomorfogenéticas. Bem
como realizar sugestões de possíveis assimetrias nos quadros geomórficos locais que possam
contribuir para discutir distribuição dos sítios líticos arqueológicos citados.
A macrocompartimentação de relevo citada já foi em alguns aspectos antecipada no capítulo
anterior. Correspondem ao conjunto de formas de relevo dos fundos de vale regionais (Terras
Baixas de Araraquara), ao segmento transicional de escarpas (Patamares Transicionais) e as
vertentes suavizadas e interflúvios dos segmentos das cumeadas da Antiga Araraquara (Terras Altas
de Araraquara). Suas características essências são abaixo apresentadas e detalhadas:
- Terras Altas - Planaltos Residuais de Araraquara: abrangem associações de
padrões geomórficos de declividades suavizadas que correspondem aos cumes deste segmento
interiorizado das Escarpas Basálticas. Seus trechos mais elevados são marcados por amplas
extensões aplainadas e semi-aplainadas que se estendem por alinhamentos longitudinais e
latitudinais de até meia dezena de quilômetros, os mais elevados dos quais ultrapassando a altitude
de 700 metros. A partir dos bordos destes interflúvios a altitude do terreno decresce na forma de
vertentes que buscam as calhas dos perenes córregos que fluem subparalelos em alinhamentos
próximos a direção NW-SE.
Referente a sobreposição de sítios e ocorrências arqueológicos líticas, a despeito dos
Planaltos Residuais serem o compartimento de maior extensão em área não existe registro
conhecido da presença dos referidos registros arqueológicos. O compartimento concentra os núcleos
pioneiros de povoação agropastoril e do ciclo cafeeiro do período histórico, e também agrega a
maior parte das manchas urbanas formadas nos períodos de industrialização de base local e de
expansão associada a desconcentração industrial.
A tendência geral do relevo é a de declividades reduzidas quando comparada aos demais
compartimentos, associadas à presença de fontes hídricas dadas pelos numerosos córregos e presença de
extensões semiaplainadas dispersas contribuíram para que - a partir do século XVIII e, com mais
intensidade, nos séculos XIX, XX e primórdios do século XXI - esta unidade desenvolvesse a instalação
dos principais núcleos urbanos regionais.

74
Os referidos interflúvios semi-aplainados tomados como unidades de ocupação urbanas
primordiais encontram-se dispostos em alinhamentos próximos da direção W-E, por vezes se
desmembrando em interflúvios secundários de direção próximas da NW-SE ou N-S. Os interflúvios
principais podem exceder alguns quilômetros em planta, e abranger algumas centenas de metros na
direção perpendicular a eles. Os seus desmembramentos de direção NW-SE tendem a apresentar
extensões em planta ligeiramente mais reduzidas, tanto em direções paralelas quanto
perpendiculares aos conjuntos principais. Encontram-se predominantemente capeados por
coberturas arenosas indivisas.
Os interflúvios mais elevados abrangem o divisor hidrográfico principal da Antiga
Araraquara, que se dispõe nos quadrantes nordeste e noroeste dos Planaltos Residuais num
alinhamento de direção grosseiramente W-E. Interflúvios deste segmento dispõe-se ao longo da
previamente citada direção preferencial, marcando posicionamento da montante das cabeceiras dos
conjuntos de múltiplos afluentes dos rios Jacaré-Guaçu a sul e Mogi-Guaçu a norte. O conjunto que
marca a maior extensão em planta dentre eles engloba um polígono contido entre o alinhamento
entre as sedes municipais das cidades de Américo Brasiliense e de Santa Lúcia, com ponto de
cumeada (720 metros) disposto entre os dois citados referenciais. Nos seus cerca de 4000000
metros quadrados dificilmente se registra declividades superiores a 3 graus, e as cotas altimétricas
se mantém rentes a faixa entre 700 e 720 metros. Dispostos na mesma faixa latitudinal em direção a
oeste mostram-se outros segmentos menores mas também expressivos de conjuntos elevados e
preservados dos interflúvios, que apresentam extensões que podem se aproximar de cerca de
3.000.000 metros quadrados pautadas por declividades e altimetrias próximas ao do conjunto de
maior extensão descrito previamente.
Nos afastando rumo a norte ou sul a partir deste conjunto de alinhamentos dos divisores
principais dispostos em direção W-E, observamos que os demais conjuntos de interflúvios tem suas
declividades, continuidades, extensões em planta e altimetrias fortemente correlacionadas com o
distanciamento deste conjunto alinhado de divisores e interflúvios principais de cotas altimetricas
mais elevadas . Quanto mais distantes do conjunto atrelado ao divisor principal, mais fragmentados
e dispersos apresentam-se os interflúvios, e mais reduzidas mostram-se sua extensão em planta,
continuidade e cotas altimétricas.
Nos segmentos proximais ao divisor sua declividade e altimetria alcançam valores

75
Figura 7 – composição de fotografias ilustrando perfil 1, representado no Mapa de Compartimentação, dos Planaltos Residuais. Na
imagem I observamos foto aérea editada, com variações topográficas suaves do compartimento. Em primeiro plano um conjunto de
vertentes suavizadas (Vt Sv 1) que drenam para o Ribeirão das cruzes, em segundo alinhamento de interflúvios suavizados (Int Sa 1),
em terceiro um segundo conjunto de vertentes suavizadas voltadas para a margem direita do Côrrego da Servidão (Vt Sv2), em azul
destacado o fundo de vale, em quarto um terceiro conjunto de vertentes suavizadas voltados para a margem esquerda do Côrrego da
Servidão e por fim um segundo conjunto de Interflúvios Suavizados (Int Sa 2). Em II observamos foto tirada no nível do solo em
trecho terminal de uma das referidas vertentes suavizadas, em III outra foto tirada no nível do solo em segmento de interflúvio semi-
aplainado. Fonte: modificado a partir de Hangar Imagens Aéras, João Perez e acervo público da antiga CTA. Anos desconhecidos.

76
proximais ao alinhamento principal de interflúvios, tendo cotas contidas entre 710 e 720 metros,
inclinações próximas a 2 graus e extensões em planta relativamente proximais ao do bloco
principal.
Nos segmentos mais distanciados porém sua inclinação atinge média de 3 graus, assume
faixas altimétricas predominantemente contidas entre 640 e 680 metros e suas continuidades em
planta dificilmente excedem 1000000 de metros quadrados. Mostram-se predominantemente em
planta proximais das direções nos seus segmentos de maior extensão Norte-Sul e NW-SE,
margeando alguns dos córregos e ribeirões afluentes do rio Jacaré-Guaçu e dificilmente excedendo
dois quilômetros em planta nos alinhamentos paralelos aos córregos e raramente excedendo
algumas centenas de metros nas direções perpendiculares aos canais que margeiam.
Os citados interflúvios secundários pautam-se como níveis onde as inclinações
raramente ultrapassam 2 graus, dispersos em meio a segmentos dominantes de vertentes de relativas
maiores declividades. Podem ser distinguidos pela incorporação de formas de uso estratégicos para
a expansão urbana local nas fases históricas pós-ciclo cafeeiro. Foram tanto tomados para abertura
de avenidas arteriais nodais de topo de vale – Bento de Abreu –, como para instalação de estruturas
centrais para articulação da circulação diária interurbana – como a implantação da sede e garagem
da antiga Companhia Trólebus de Araraquara, ponto nodal de onde se irradiavam pelo restante da
malha urbano as linhas de suporte aos velhos trólebus, e da implantação das sede das estações de
tratamento da autarquia de abastecimento hídrico local (Terarolli, 1975).
As vertentes que bordejam os altos níveis aplainados dos interflúvios por sua vez iniciam
caimento em busca dos leitos dos córregos com declividades suaves, alcançando gradualmente
maior intensidade de inclinação conforme se aproximam das calhas por onde escoam as águas
correntes. Demandam alguns quilômetros em planta para perfazerem os 60 metros de distância
vertical entre os topos dos interflúvios e os fundos dos discretos córregos ali presentes, com
inclinações majoritariamente contidas entre 3 e 7 graus. Conforme passam a se aproximar dos
córregos, registra-se por vezes um crescimento exponencial dos declives. Em alguns segmentos
terminais distados apenas algumas centenas de metros dos canais as inclinações mostram-se
dispostas entre 16 e 20 graus.
A declividade e altimetria média das vertentes encontra-se fortemente correlacionada
também com o distanciamento das nascentes, da confluência e da ordem de grandeza dos canais que
bordejam. Em linhas gerais sua declividade e desníveis verticais locais se reduzem conforme
aumenta o distanciamento das nascentes bem como quando se aproxima da confluência de canais.
Em perfis transversais aos córregos de fundo de vale as vertentes dos Planaltos
Residuais apresentam ainda relativa homogeneidade litológica em cotas altimétricas similares, dado

77
os mergulhos subhorizontais das unidades litológicas locais. Seus segmentos mais proximais aos
canais que bordejam mostram-se pautados pelos basaltos da formação Serra Geral e/ou horizontes
de decomposição originados destes. Já os segmentos de cotas mais elevadas das vertentes e mais
próximos aos interflúvios são pautados pelas Coberturas Sedimentares Indivisas, de caráter areno-
argiloso.
Se do ponto de vista do substrato das formações rochosas as vertentes que margeiam
margens opostas dos múltiplos córregos dos Planaltos Residuais não apresentam heterogeneidade,
pela perspectiva das declividades médias a situação se dá de maneira distinta. As declividades das
vertentes contíguas entretanto não apresentam homogeneidade, sendo frequente o registro de
algumas das vertentes apresentarem declividades até 40% superiores das que marcam as margens
opostas dos respectivos canais que bordejam. No segmento sul dos Planaltos ressalta-se a situação
das vertentes que margeiam o Córrego da Servidão, correspondente aos segmentos de expansão
iniciais do núcleo urbano histórico original da cidade de Araraquara (Centro e Vila Xavier).
No segmento norte evidenciam-se as vertentes dos canais que fluem paralelos a oeste da
sede municipal de Santa Lucia, como aquelas voltadas a oeste dos canais (margens esquerdas) com
declividades até 30% superiores as voltadas para leste (margens direita) . Neste conjunto de canais e
vertentes associadas em particular torna-se evidenciado que embora a assimetria não se altere em
termos relativos, experimenta significativas modificações em termos de declividades absolutas.
Conforme nos dirigimos a oeste nos orientando por um perfil W-E a partir da pequena cidade
citada, os valores absolutos das declividades cada novo par de vertentes transposto diminuem
continuamente. Enquanto o conjunto de vertentes a oeste do córrego adjacente a antiga colônia rural
das Contendas (ponto de campo 40) apresenta declividades entre 16 e 20 graus nas vertentes
voltadas para oeste, até e 12 para as voltadas para leste, os do conjunto de vertentes que margeiam o
próximo canal na citada direção apresentam valores máximos de 15 graus nas vertentes a oeste do
canal e 7 graus nos das vertentes a leste.
Outra tendência geral que se nota refere-se a observação de que as vertentes que
margeiam os canais fluviais de maior vazão encontram-se correlacionados com declividades médias
maiores, bem com por mais elevadas extensões em planta. Chegam mesmo a atingirem até cinco
quilômetros em planta perpendicularmente a direção dos canais mais proeminentes, como no caso
das vertentes do Ribeirão das Cruzes, em contraste com as que bordejam canais de menor vazão,
que em alguns pontos chegam a atingir menos de dois quilômetros em planta - como nas citadas
vertentes do córrego da Servidão.
São raros os afloramentos rochosos afastados das calhas dos estreitos canais fluviais que
ali fluem. Os Planaltos Residuais associam-se nos seus segmentos de menor altimetria a espessos

78
solos originados da alteração de basaltos da Formação Serra Geral, em cujos jeitos dos rios afloram
as próprias rochas in situ. Nos segmentos mais elevados das vertentes e nos interflúvios, associam-
se a coberturas arenosas indiferenciadas e os solos a elas correlacionados. Os solos mencionados,
sobretudo pela combinação de declividades médias reduzidas e exposição a condições climáticas
pautadas por condições subtropicais, apresentam manto de alteração muito espesso. Eles podem
chegar a alcançar dezenas de metros de espessura, como pode ser observado em cortes diversos
realizados para passagens de ferrovias como aqueles presentes entre as estações de Araraquara e
Américo Brasiliense.
Além do registro pedológico encontram-se alguns outros registros esparsos de interesse
para a estrutura superficial da paisagem. Destacam-se níveis conglomeráticos centimétricos de
quartzo e arenitos cimentados por óxidos de ferro que pontualmente visualiza-se em afloramentos a
beira de estrada recobrindo basaltos da formação Serra Geral, os segmentando das coberturas
sedimentares indivisas que os recobrem nestes segmentos. Cabe registrar que em determinados
pontos – em especial no setor Oeste do Planalto a norte do bairro Vale do Sol da cidade de
Araraquara ou no segmento nordeste próximo a Usina de Tratamento de Esgotos da cidade de Santa
Lucia (pontos de campo 156 e 31 respectivamente) – após enxurradas de maior intensidade
encontram-se dispersos fragmentos subarredondados centimétricos de ametista e quartzo.
-Patamares Transicionais: trata-se de compartimento constituído por série de
vertentes majoritariamente de média e alta declividade (predominantemente contidas entre valores
de declividade entre 5 e 50%), canais com diferenciados tipos de bordos – abrangendo aqueles
assemelhados a padrões encaixados, seccionado por paredões rochosos que se aproximam dos 90
graus de inclinação, enxutos patamares aplainados e ocasionais morros residuais (ver figuras 13 e
14). Pauta-se abranger o intervalo altimétrico mais amplo da área de estudo, estando contida
predominantemente entre as cotas de 540 e 670 metros com segmentos isolados que atingem até
730 metros. Litologicamente pauta-se por conter o contato geológico entre as litologias das rochas
básicas da formação Serra Geral e as rochas clásticas areníticas da formação Botucatu.
Os Patamares Transicionais concentram a maior parte dos sítios arqueológicos líticos da
área de estudo, evidenciados particularmente em seus segmentos de maiores declividades.
Destacam-se a presença de diversificados artefatos e peças lascadas em arenito. Dos 26 sítios e
ocorrências líticas arqueológicas documentados na área, cerca de 24 deles situam-se em meio aos
Patamares Transiconais. Referente especificamente aos sítios arqueológicos líticos, dos 8 sítios são
6 deles que situam-se nos Patamares.
Os Patamares Transicionais distribuem-se de forma contígua entre as Terras Altas e
Terras Baixas da Antiga Araraquara, marcando-se como unidade de transição entre os padrões

79
geomórficos dos dois referidos compartimentos de relevo. A extensão em planta dos Patamares
perpendicular aos limites com os dois compartimentos adjacentes é variável. Em alguns segmentos
os Patamares Transicionais ficam proximais aos 8 quilômetros de extensão em planta, em outros
chegam apenas a se aproximarem dos dois quilômetros de extensão.
Suas vertentes possuem frequentemente declividade paralela aos canais que margeiam
próximas as registradas aos alinhamento transversais a eles. Dividem-se entre as de declividade
baixa e média – de inclinação média entre 4 e 12 graus – e as de alta declividade – com inclinações
médias entre 12 e 20 graus, com segmentos específicos (designados Escarpas de Quebras Bruscas)
com extensões contínuas de declives superiores a 20 graus de inclinação (figura 8).
A proporção entre estes dois conjuntos de vertente é que majoritariamente regula a
extensão em planta do próprio compartimento, sendo os segmentos mais extensos usualmente
pautados por predomínio de vertentes baixas e médias e os mais enxutos pelas de alta declividade.
Convém registrar que nos segmentos dos Patamares de extensão em planta mais enxuta e/ou onde
predominam vertentes de altas declividades, os afloramentos rochosos mostram-se mais comuns.
Neles nota-se também os anteriormente referidos afloramentos de basaltos truncados por múltiplas
famílias de juntas, algumas das quais preenchidas por veios de quartzo. Em alguns destes segmentos
de alta declividades se concentram sítios arqueológicos com maiores quantidades de peças
associadas registradas na área de estudo. Podem ser citado especificamente o sítio Gavião Peixoto II
no município homônimo no noroeste da área de estudo, e o sítio Rainha dos Montes, no segmento
nordeste da área abrangida pela presente pesquisa.
Referidos padrões combinam-se com declividade mais acentuada das calhas dos canais
do que nos demais compartimentos, podendo até atingirem 20 graus de inclinação média. As calhas
dos canais frequentemente – sobretudo no segmento basáltico – forma sucessivos níveis de quedas
de água e cachoeiras de pequena dimensão, abrangendo desníveis locais e quedas de até 2 metros no
assoalho dos canais. O conjunto de características mencionada confere aos Patamares Transicionais
um caráter de continua diminuição das cotas topográficas conforme se distancia do limite com as
Terras Altas e se aproxima com os das Terras Baixas.
Pontualmente as significativas declividades médias das vertentes são quebradas por
enxutos patamares aplainados, pautados por declividades médias inferiores a 4 graus por extensões
que atingem até 400 metros na direção geral da queda altimétrica dos entornos e com extensões
laterais de até 3000 metros. Seus bordos são seccionados por vertentes de múltiplas categorias de
declividade, usualmente contidas nas de declividades baixas e médias.

80
81
82
Figura 8 – Composição apresentando dois perfis geomorfológicos (perfis 2 e 3 respetivamente), situando
diferentes segmentos dos Patamares Transicionais nos contextos da transição entre Planaltos Residuais e Terras Baixas.
No primeiro perfil observamos transição pautada por escarpa de quebra brusca, perfazendo diminuto intervalo em
planta. No segundo, transição feita de maneira mais suavizada. Fonte: elaboração própria.

Merecem menções também a presença ocasional de desníveis locais de até 40 metros


representantes por morros de formatos côncavos de extensões variadas, podendo abranger até 20000
metros quadrados em seus segmentos basais. Predominam topos arredondados embora também

83
existam registros minoritários de morros com topos aplainados. Apresentam-se em geral em meio as
vertentes de baixa e média declividade, sendo dificilmente encontrados associados as vertentes de
alta declividade.
Outra forma de relevo de pouca extensão em área mas de grande importância são as
frequentes Vertentes Semi-Verticais (ver figura 9), que se fazem presentes nos Patamares
Transicionais em segmentos diversos. Tratam-se de conjunto de vertentes com declividades que
alternam-se entre 70 e 90 graus associadas a paredões rochosos, estando comumente registrados
bordejadas por Vertentes de Alta Declividades. Perfazem quebras locais no relevo de ordem de até
30 metros e associam-se a canais de ordem de grandeza variadas, estando em muitos casos
associados a canais de diminuta grandeza e vazão. Sendo eles distantes por vezes apenas algumas
dezenas de metros de suas nascentes.
Suas direções médias pautam-se por alinharem-se as direções N30W e N20E havendo
registros mesmo de algumas dispostas perpendicularmente a direção geral de queda topográfica.
Associam-se predominantemente as unidades litológicas dos basaltos da formação Serra Geral,
sendo mais comumente registrados nas cotas topográficas mais elevadas dos Patamares
Transicionais. A comparação com padrões morfológicos de setores imediatamente a jusante dos
canais que bordejam mostram que as Vertentes Semi-Verticais marcam súbitas quebras do relevo,
uma vez que segmentos que lhe antecedem são marcados mesmo por predomínio de vertentes
suavizadas em casos como no nordeste da área de estudo próximo as estações de tratamento de água
da cidade de Santa Lúcia nas cabeceiras de afluentes do ribeirão Anhumas (ponto de campo 32).
Também se nota padrão similar na contextualização das Vertentes Assimétricas do Ribeirão São
Lourenço, afluente do Jacaré-Guaçu, no sudoeste da área de estudo (ponto de campo 93).
Os padrões anteriormente descritos podem ser agrupados em 4 divisões setoriais dentro dos
Patamares Transicionais – O Setor das Vertentes de Média-Alta Declividade de Gavião Peixoto, O
Setor das Morrarias de Boa Esperança, o Setor dos Bordos Abruptos de Araraquara Sudeste e o
Setor das Vertentes de Média Declvidade e Morros Residuais Dispersos e Morros Residuais
Dispersos. Os referidos setores encontram-se discriminados no Mapa de Compartimentos
Geomorfológicos por rachuras que se sobrepõe a cor que designa a extensão total do compartimento
dos Patamares Transicionais.
O Setor das Vertentes de Média-Alta Declividade de Gavião Peixoto, corresponde a
segmento dos Patamares Transicionais que bordejam ambas as margens o rio Jacaré-Guaçu em

84
Figura 9 – Composição de fotografias que ilustram alguns dos padrões Geomórficos dos Patamares Transicionais. Na
imagem I vemos imagem aérea que evidencia segmento que marcam escarpas de quebras bruscas perfazendo limites
com Planaltos Residuais, com trajeto perpendicular a transição representado pelo tracejado vermelho. Na imagem II
observamos segmentos de vertentes de médias vertentes. Nas imagens III e IV vemos feições de detalhe de canais com
vertentes basálticas semi-verticais. Tracejado vermelho nas imagens busca representar direções de maiores declividades
nos trechos em que situam-se. Fonte: elaboração própria através de fotos de Hangar Ultraleves Imagens Aéreas, fotos de
acervo pessoal e de domínio público.

trecho que mostra-se com a extensão em planta de sua planície aluvial na casa de algumas dezenas
de metros em planta. Trata-se de trecho visivelmente contrastante com extensões a montante do
citado rio, pertencentes ao compartimento das Terras Baixas, em que as planícies aluviais com seus

85
terraços e planícies de inundação chegam a se extenderem por vários quilômetros em planta. As
vertentes basálticas deste setor apresentam declives significativamente maiores que as médias para
os patamares transicionais, prevalecendo valores entre 14 e 20 graus de inclinação. Em segmentos
específicos mostram como escarpas de quebras bruscas com inclinações que se aproximam dos 40
graus, em geral margeando anomalias de drenagem retilínias da drenagem de direção próxima da
N-S em meio as padrões meandrantes dominantes com direção geral próxima da W-E. Os desníveis
verticais locais podem atingir até 120 metros entre as calhas do Jacaré-Guaçu e os segmentos mais
elevados das vertentes, em extensões em planta não superiores a dois quilômetros em planta.
O Setor das Morrarias de Boa Esperança, no extremo sul da área de estudo, envolvem
segmentos areníticos dos patamares que apresenta-se com frequentes desníveis verticais locais de
até 50 metros dado pela grande concentração de morros residuais. Mostram-se estes cada vez mais
frequentes conforme nos dirigimos a sul da área, com continuação da tendência ultrapassando a área
de estudo. Os morros apresentam-se areníticos, com presença de cobertura de neossolos. Os topos
mostram-se em significa diversidade de formatos. Predominam topos retilíneos com leve
dissecamento e/ou semi-aplainados, com extensões que podem perfazer cerca de metade da área da
base dos morros com citados topos pautados por declives inferiores a 2 graus de inclinação.
Frequentemente as vertentes dos morros mostram-se assimétrica, com segmentos a leste
com declives até 30% superiores as do oeste. Cabe registrar que existem registros pontuais de topos
angulosos. Particularmente emblemático é o Morro da Figura (ponto 170), próximo a Estrada
Vicinal Francisco Zanin entre Araraquara e Ribeirão Bonito, de área total de 15000 metros basais
que gradualmente se adelga em planta conforme alcança cotas topográficas mais elevadas para
subitamente ao completar 50 metros de desnível local retomar parte da extensão lateral perdida,
sustentando em seu segmento de topo monólito arenítico de cerca de 10 metros de altura e 40
metros de raio de laterais praticamente verticais. Destacam-se ainda os claramente diferenciados
graus de intemperismo químico nos sopés do segmento adelgado que sustenta monolíto arenítico,
com claro maior intensidade nos segmentos de suas bases.
. O Setor dos Bordos Abruptos da Araraquara Sudoeste equivale ao segmento em que
extensão em planta do compartimento dos Patamares mostra suas menores extensões em planta ao
longo de extensão areal significativamente ampla. Ao longo de todo o trecho que se dispõe em
direção W-E bordejando os terraços do ribeirão Chibarro, afluente do Jacaré-Guaçu, e no que
disposto em direção NW-SE limita as planícies aluviais do Rio-Jacaré-Guaçu em sua margem
direita a extensão em planta do compartimento dificilmente excede 2 quilômetros em planta.
Desníveis verticais de até cerca de 200 metros são por vezes transpostos em extensões em planta

86
não superiores a poucas centenas de metros, marcando pelos alinhamentos contínuos mais longos de
escarpas de bordos abruptos da área de estudo.
Por sua vez, o Setor As Vertentes de Média Declividade e Morros Residuais Dispersos
mostra-se como o de maior extensão em área dentre os Patamares Transicionais. Apresentam-se em
geral com extensões em planta mais amplas limitando as Terras Altas das Terras Baixas, alternando
vertentes de média declividade e pontuais níveis de aplainamento e morros dispersos com desníveis
verticais dificilmente superiores a 30 metros. Em alguns segmentos dispersos tem suas vertentes de
média declividade interrompidas por pontuais escarpas de bordos bruscos (tanto em segmentos
areníticos quanto basálticos), sendo tal fato indicados no mapa, porém tais quebras mostram-se
pontuais e não suficientes para quebrar a continuidade do setor como uma subunidade morfológica.
-Terras Baixas - Baixos-Terraços e Planícies Fluviais do Jacaré-Guaçu e Mogi-
Guaçu: pautam-se pela alternância de amplos terraços fluviais e planícies de inundação de
declividade médias abaixo de 5% (ver figura 10), bem como por pontuais morros residuais.
Mostram-se contidos majoritariamente entre as cotas topográficas de 500 e 555 metros contíguos
aos rios Jacaré-Guaçu e Mogi-Guaçu e alguns de seus afluentes (IBGE, 1970). Litologicamente
conjugam-se a arenitos da Formação Botucatu e a coberturas sedimentares arenosas
predominantemente aluviais.
A variação em planta do compartimento, quando se considera traçados perpendiculares
aos cursos dos seus rios, varia consideravelmente. Podemos encontrar desde segmentos onde as
extensões em planta atingem a ordem quilométrica, a outros em que não ultrapassam a casa das
centenas de metros. Nota-se uma tendência aos segmentos do compartimento que margeiam os
cursos fluviais principais - rios Mogi-Guaçu e Jacaré-Guaçu - apresentarem as extensões em planta
mais amplas, bem com os menores valores de declividade e altimetria dentro do próprio
compartimento.
Nos seus segmentos mais amplos, as Terras Baixas que margeiam os cursos dos rios
principais podem chegar a extensões em planta de mais de cinco quilômetros em traçados
transversais ao curso dos rios. Simultaneamente, calhas dos canais permanecem em atitudes
proximais a 500 metros e inclinação dos leitos dificilmente supera 3 graus.
Já nos segmentos que encontram-se margeando os afluentes dos rios principais em seus
segmentos das Terras Baixas mais distantes dos cursos principais, registram-se um estreitamento da
extensão em planta do compartimento bem como a presença dos valores de altitude e inclinação
ligeiramente mais elevados. Nas cabeceiras do ribeirão Anhumas, afluente do Mogi-Guaçu, por
exemplo notamos extensões em planta perpendiculares ao canal não superiores a um quilômetro,
com altimetria das calhas do curso afluente registrando valores de 540 metros e inclinações em seu

87
leito próximas a 5 graus (ponto de campo 24).
Afora as citadas heterogeneidades na distribuição das extensões em planta das Terras
Baixas, cabe mencionar também variações expressivas dentre certos trechos que margeiam os
próprios canais principais (ver figuras 10 e 11). Ao mesmo tempo que registra-se ali extensões em
planta, em média, mais significativas, existem trechos específicos em que as Terras Baixas
apresentam-se adelgadas em planta mesmo ao margear os grandes canais de fundo de vale
mencionados.
Tal dinâmica fica particularmente evidenciada nas Terras Baixas do Jacaré-Guaçu, no
sudoeste da área de estudo – margeando o Ribeirão Chibarro, proximal a antiga Usina da Tamoio
(ponto de campo 173). Ali observamos que nos segmentos proximais a nascente do rio Chibarro as
Terras Baixas mostram-se com extensão em planta dificilmente muito maiores que um quilômetro.
Para passar subitamente a trecho do rio de cerca de 6 quilômetros de extensão em que as Terras
Baixas que lhe margeiam atingem a largura em planta do compartimento na ordem de cerca de
cinco quilômetros, acompanhado de maior evidência pelo padrão meandrante. Após este trecho
volta-se a apresentar estreitamento da extensão em planta do compartimento, que dá lugar ao Setor
das Vertentes de Média-Alta Declividade de Gavião dos Patamares Transicionais que passam a
margear o rio Jacaré-Guaçu, acompanhado de atenuação do caráter meandrante do canal e mesmo
de segmentos em que mostra-se com nítido caráter retilíneo de direção proximal a N-S (ver figura
11).
Dentre o compartimento das Terras Baixas, podemos falar de um conjunto de 3
subcompartimentos de relevo que a integram: as Planícies de Inundação , os Baixos Terraços, os
Terraços Intermediários e as Baixas Vertentes. Cada um deles apresenta discretas variações em
relação ao conjunto das associações de atributos morfométricos e das bases litológicas que pautam o
conjunto do compartimento, e também exercem funções diferenciadas dentro do contexto da
morfodinâmica fluvial (ver figura 12).
As Planícies de Inundação oscilam extensões em planta que variam entre algumas
dezenas de metros a até 3000 metros a partir dos canais que bordejam, apresentando declividades
dificilmente superiores a 3%. Alternam na área de estudo altimetrias majoritariamente contidas
entre 500 e 525 metros, embora possam encontrar valorar ligeiramente maiores naquelas que
margeiam as cabeceiras dos afluentes contidos nas Terras Baixas. Encontram-se associadas
predominantemente a cobertura sedimentar areno-argilosa. Em meio as coberturas arenosas pode-se
encontrar ocasionalmente fragmentos de cascalho, majoritariamente areníticos ou basálticos.

88
89
Figura 10 – realce do mapa de compartimentos geomorfológicos, para evidenciar subunidades
morfológicas das Terras Baixas do Mogi-Guaçu. Fonte: Elaboração própria.

90
Figura 11 - realce do mapa de compartimentos geomorfológicos, para evidenciar subunidades
morfológicas das Terras Baixas do Mogi-Guaçu. Fonte: Elaboração própria.

Minoritariamente encontra-se também raros cascalhos graníticos, possivelmente


trazidos pela dinâmica fluvial do Mogi-Guaçu de áreas em que flue em segmentos cristalinos.
Registram-se, notadamente nos segmentos das Planícies do Mogi-Guaçu, numerosos traçados de
meandros abandonados.
Nas Terras Baixas do Jacaré-Guaçu a distribuição das planícies de inundação mostram-

91
se contínua ao longo das margens dos rios, ainda que com extensões maiores na margem esquerda
do que na direita, enquanto nas do Mogi-Guaçu mostram-se dispersas e frequentemente embutidas
em meio aos Baixos Terraços.
Os Baixos Terraços Fluviais encontram-se limitados pelas Planícies de Inundação dos rios
Jacaré-Guaçu, Mogi-Guaçu e de seus afluentes principais. Por vezes, em casos específicos dentre as
Terras Baixas do Mogi-Guaçu, encontram-se delimitados nas cotas mais baixas pelo próprio traçado
atual dos rios principais de fundo de vale. Mostram-se majoritariamente contidos entre as cotas de
525 e 535 metros. Abrangem extensões em planta que podem atingir até 2000 metros
perpendicularmente aos canais que estão associados. Mostram-se vinculados a cobertura arenosas
pautadas por diferenciados níveis e tipos de pedogênese. Nos terraços que margeiam o Mogi-
Guaçu, registros de unidades de escavação já realizadas apontam a existência de material
arqueológico lítico (sítio Rincão I) e cascalhos esparsos em meio aos perfis já documentados.
Naqueles que margeiam o Jacaré-Guaçu, também se registram material arqueológico lítico em meio
a unidades de escavação já realizadas (sítio Boa Esperança do Sul II) e registra-se intensa gleização
e por vezes presenças de cascalheiras basais situadas em profundidades ades de ordem métrica.
Mostram-se predominantemente associados a fill terraces, os conjuntos de terraços que resguardam
tanto material deposicional associado a deposição em sistemas fluviais quanto os cortes em
superfície deixados pela ação morfodinâmica das águas dos rios (Pederson et al, 2006).
Outra diferença entre os conjuntos de terraço que margeiam os dois canais principais e seus
afluentes encontram-se em certas caraterísticas do limite que os delimita das Planícies de
Inundação. Nos Baixos Terraços do Mogi-Guaçu se registra com frequência desníveis verticais
locais de até 3 metros em relação as planícies de inundação ou as próprias águas do Mogi. Nos
segmentos que margeiam o curso principal do Jacaré-Guaçu os desníveis verticais que pautam seus
limites com as planícies de inundação dificilmente excedem a ordem decimétrica.
Referente a ação morfodinâmica fluvial, os Baixos Terraços encontram-se em
posicionamento altimétrico em que mostram-se além do alcance do extravasamento usual das águas
dos rios por ocasião de suas inundações periódicas. Todavia em casos de condições atmosféricas
particularmente discrepantes da media, vinculadas a valores de precipitação de intensidade acima da
usual, podem ser recobertos pelas águas das inundações dos rios de fundo de vale das Terras Baixas.

92
Figura 12 – Composição de fotos das Terras Baixas. Na Imagem 1 observamos sucessão de subunidades morfológicas
da unidade, adjacente ao rio Jacaré-Guaçu: Baixos Terraços (BT), Planície de Inundação (P.I), Terraços Intermediários
(T.I) e limite com Patamares Transicionais (PT) ao fundo. Na imagem II observamos imagem com detalhe das planíces
de inundação do Jacaré-Guaçu, na Imagem III nota-se planícies de inundação das Terras Baixas do Mogi-Guaçu
observadas a partir de terraços intermediários por elas seccionadas. Na imagem 4 notamos unidade de escavação 1 do
BES II sendo aberta em Baixos Terraços do Jacaré-Guaçu, onde coloração acizentada dos solos aponta gleização ao
qual encontram-se submetidos. Fonte: Zanettini (2005), Santos (2013) e o autor (2014)

Os Terraços Intermediários Fluviais e Baixas Vertentes por sua vez mostram-se bordejando
os Baixos Terraços Fluviais ou, minoritariamente e especificamente em segmentos diversos
margeando o Rio Mogi-Guaçu, em contato direto com os canais principais. Mostram-se abrangidos

93
predominantemente entre as cotas altimétricas entre 530 e 555 metros. Estão associados
majoritariamente a coberturas regolíticas arenosos. São seccionados pelos canais secundários e
canais de menor ordem da área de estudo, tendo frequentemente o limite com os riachos e córregos
dado por quinas verticais ou semi-verticais marcadas por desníveis de até 3 metros entre o nível da
lámina d´água dos canais e o topo dos terraços.
Os mencionados desníveis são registrados tanto em segmentos das Terras Baixas
envolvendo afluentes do Mogi-Guaçu, como o já citado ribeirão Anhumas, como em afluentes do
Jacaré-Guaçu, como no caso dos Terraços Intermediários seccionados pelo rio Boa Esperança. Os
terraços inseridos na presente subunidade de relevo seriam tanto daqueles vinculados a fill terraces
quanto a strath terraces, os chamados “terraços desnudos” - que manteriam cortes em superfície
próximos do aplainamento deixados pela ação fluvial pretérita, mas não reteriam mais os
sedimentos então depositados pela dinâmica das águas dos rios. Somente os desníveis topográficos
e sua localização permaneceriam como sugestões de sua gênese (Bull, 1990).
As aparentes suaves sucessões geomórficas dos Terraços Intermediários e Baixas
Vertentes são rompidas pontualmente por desníveis locais de até 60 metros representados por
morros de formas próximas da côncava que oscilam entre 2500 e 350000 metros quadrados de
extensão. Associam-se predominantemente a arenitos da formação Botucatu e a cobertura de
Neossolos, e pautam-se por declividades que oscilam entre 5 e 35 graus médios. Suas encostas e
topos mostram formato assemelhados aos morros e montes mamelonizados dos planaltos atlânticos,
com topos em padrões arredondados. Mostra-se frequente o registro de assimetria da declividade
das encostas com aquelas voltadas para noroeste, apresentando declividades até 30% maiores do
que as voltadas para sudeste.
Referente a representação das subunidades morfológicas no mapa de compartimentos de
relevo, usamos de rachuras apontando segmentos em que se nota predomínio de Planícies de
Inundação e Baixos Terraços. No caso dos Terraços Intermediários e Baixas Vertentes, a
representamos como uma mesma subunidade – pela dificuldade na escala empregada e densidade
de pontos de campo de diferenciá-las seguramente.
As Planícies e Baixos-Intermediários Terraços Fluviais do Jacaré-Guaçu e do Mogi-
Guaçu estão distados entre si em distâncias que oscilam entre 20 quilômetros nos trechos mais
proximais, mas apresentam entre si marcantes similaridades que permitem agrupa-las como um
mesmo compartimento de relevo. As calhas dos canais principais de ambos os compartimentos
encontram-se no patamar topográfico de 500 metros. Simultaneamente ambos os compartimentos
apresentam níveis de terraços contíguos a canais fluviais principais de similares patamares
topográficos e configurações morfológicas, merecendo destaque neste sentido os canais

94
intermediários na cota média ente 535 e 555 metros em ambos os compartimentos. O padrão de
drenagem dos canais principais em ambos os segmentos pauta-se por alternância de padrões
meandrantes e retílínios, enquanto os canais de menor ordem que seccionam os terraços
intermediários alternam-se entre padrão retangular e dentrítico.
4.2 Aspectos Geomorfogenéticos e Padrões de Interface dos Sítios Arqueológicos com Quadros
de Relevo e Sucessões Geomorfogenéticas Estimadas
Os padrões geomórficos descritos nos compartimentos de relevo podem ser usados para
discussões iniciais referentes aos mecanismos geomorfogenéticos e aspectos das sucessões
cronomorfológicas estimadas da Antiga Araraquara. Destacam-se inicialmente nesta análise a
alternâncias entre níveis de aplainamento e/ou semi-aplainamento, usualmente associado aos
interflúvios mais elevados da área, com outros segmentos pautados por vertentes de declividades
diversificadas.
Poderia-se com base neles sugerir alternância entre sucessões cronomorfológicas associadas
a intervalos predomínio erosional vinculados a incisão vertical no modelado do relevo, seguida de
outras de relativa estabilidades dos níveis de base locais e regionais. Os referidos processos
realçariam as diferenças entre os conjuntos líticos na área de estudo, em que segmentos capeados
por basaltos se mostrariam mais resistentes a redução altimétrica através das fases de incisão
vertical do que segmentos areniticos. Distribuição herdada dos litotipos referidos – influenciada
pela extensão da cobertura dos derrames basálticos, que poderiam ter dificuldades de cobrir altos
topográficos específicos, e/ou variações de suas espessuras poderiam se integrar a fatores para
explicar os motivos pelos quais em determinados segmentos da área se desenvolveram as Terras
Baixas. Enquanto em outros patamares geomorfológicos altimetricamente mais elevados
permaneceram com testemunhos preservados na forma das Terras Altas e Planaltos Residuais.
Uma discussão e análise em mais detalhes dos padrões geomórficos, seu posicionamento e
sua associação com as unidades litológicas podem auxiliar a embasar a referida sugestão. Podemos
considerar inicialmente que os referidos níveis de semi-aplainamento mostram – nas cotas
topográficas acima de 560 metros - sua maior extensão e continuidade em área nas Terras Altas e
Planaltos Residuais, onde apresentam-se nitidamente associados a altimetrias predominantes
contidas entre 680 e 710 metros. Ali apresentam-se associados com Coberturas Arenosas Indivisas
sobrejacentes a basaltos. É interessante recordar porém que mostram-se também presentes, com
menor frequência e extensão, também no macrocompartimento dos Patamares Transicionais –
mostrados ali a montante e a jusante de vertentes de declividades médias, em compartimento de
relevo pautados por relativamente elevados desníveis verticais locais. Ali mostram-se através de
fragmentos basálticos e, subordinadamente, areníticos esparsos e descontínuos de diminuição súbita

95
das declividades das vertentes locais ou de topos de morros locais, distribuídos entre 640 e 550
metros.
Nos segmentos das Terras Baixas os níveis residuais também mostram sua presença, através
de pontuais morros residuais de topo aplainados (550-580 metros) e pelos vastos níveis de terraços
de declividades reduzidas (550-525 metros, como intervalos altimétricos predominantes). Nos casos
específicos existem evidências mais palpáveis – sobretudo presença de fill terraces – que permite
considerar a dinâmica fluvial como responsáveis por ao menos uma parcela dos níveis de
aplainamentos referidos, configurando fases de relativa estabilidade nos níveis de base regionais
vinculadas a plainação lateral.
Níveis de aplainamento em outros compartimentos da área, de maior antiguidade inferida
face posicionamento relativo, porém não poderiam ser discriminados com algum grau de segurança
quanto a seus fatores geradores. Poderiam abranger possibilidades tão distintas quanto serem
resultados de processos de plainação lateral vinculados a ação climática de condições assemelhadas
a semiaridez, quanto a níveis de terraços fluviais que perderam seu capeamento fluvial mas
preservaram o caráter semiaplainado dado pelo corte da dinâmica das planícies de inundação. Ainda
que possa se argumentar que no caso específico das Terras Altas encontramos presença de níveis de
aplainamento com maior nível de continuidade do que fragmentos esparsos dos Patamares
Transicionais, ali também não foram encontrados registros de coberturas de alteração e/ou de
deposição eventualmente concomitantes aos processos de aplainamento.
Todavia, a despeito das dificuldades de caracterizar processos específicos responsáveis pela
origem das pretéritas superfícies de aplainamento parecem haver elementos suficientes para
considerar sua existência como registro na trajetória geomorfogenética da área. Mesmo a
distribuição dos segmentos com níveis aplainados preservados associados a variação das
declividades médias dos canais pode ser interpretada como sugestão da existência de superfícies de
aplainamento mescladas aos compartimentos da área. Os níveis de aplainamento mostram-se
preservados em extensões contínuas no topo da área de estudo, e os valores de declividades dos
canais mostram-se sensivelmente mais reduzidos no mais elevado compartimento das Terras Altas
do que no dos Patamares Transicionais.
Trata-se de padrão diferenciado do registrado em área serranas como as descritas por
Ab`Saber (1956), em que descreve tendência dos níveis de aplainamento estarem mais bem
preservados quanto mais próximos as altimétrias do nível de base local e mais intenso o declive das
calhas do canal quanto mais distante do mesmo nível. Tal assimetria poderia ser interpretada como
um indicativo a mais para sugerir nível das Terras Altas como remanescentes de uma pretérita
superfície geomorfológica, em que a ação da drenagem teria chegado mais recentemente via erosão

96
remontante de maneira que a declividade médias dos canais seria menor e a preservação dos
interflúvios seria maior do que no compartimento dos Patamares Transcionais. A resistência dos
basaltos ali presentes poderia auxiliar a explicar seu grau mais elevado de preservação das
superfícies de aplainamento nas coberturas arenosas que lhes recobrem.
Para se considerar a alternância entre as sucessões cronomorfológicas vinculadas a
plainações laterais para outras pautadas por predomínio de incisão vertical deveria-se porém admitir
a episódios pretéritos de mudanças significativas no nível de base regional. Referente ao controle
destas mudanças de nível de base ao longo da trajetória geomorgenética da área, encontram-se
novamente dificuldades de delimitações mais claras, ao longo da maior parte da extensão temporal
da trajetória pós-cretácea da área. Possibilidades poderiam incluir desde mudanças de controle
neotectônico - como descrito em outros setores do domínio das escarpas basálticas da Bacia do
Paraná por Fortes et al (2008) – até outras ligadas a controle climático - como as apontadas por
Ab`Saber (2001), vinculadas a alternância entre fases semi-áridas e tropicais.
A despeito desta dificuldade de elencar quais seriam os fatores responsáveis pela mudança
dos níveis de base regionais que estariam correlacionados a alternância entre os citados intervalos
de distintas sucessões cronomorfológicas, acreditamos porém ser possível sugerir que em
determinados momentos a elaboração de sucessões vinculadas a incisão vertical seria ao menos
localmente intensificada por ações vinculadas a deformação rúptil – particularmente a falhamentos
sugeridos.
Nesta direção se integram algumas combinação de anomalias de relevo presentes nos
compartimentos de relevo, vinculados a distintos posicionamentos altimétricos e unidades
litológicas.
Notamos em alguns setores da Antiga Araraquara um paralelismo entre feições geomórficas
diversificadas elencadas associados a lineamentos posicionados em diferentes
macrocompartimentos de relevo, mas contidos no mesmo intervalo latitudinal e longitudinal.
Um exemplo das referidas conjugações pode ser mencionado no norte da área de estudo.
Envolvem associação de canais margeados por vertentes assimétricas de direção média de N15E no
segmento norte das Terras Altas - próximas as sedes dos municípios de Américo Brasiliense e Santa
Lucia - a presença nos Patamares Transicionais adjacentes de alinhamentos de vertentes semi-
verticais pontuais alinhadas com canais retilíneos de direção N40E, e segmentos extensos de
vertentes de declividade elevadas ligadas a estreitamento do próprio macrocompartimento, que ali
assumem direção proximal a N20E ao se considerar a direção perpendicular ao caimento
topográfico de maior intensidade registrado. Convém recordar que o conjunto de vertentes
assimétricas mencionados trata-se do conjunto previamente descrito no item que detalhe os

97
Patamares Transicionais (incluindo os pontos de campo 36 e 50) em que as vertentes dos canais em
questão apresentam heterogeneidades de valores porcentuais constantes na oscilação das
declividades, mas absolutos variados.
Nota-se também que o valor absoluto das declividades das vertentes assimétricas
mencionadas situadas nas Terras Altas mostram-se menores quando consideramos pares de
vertentes associadas a canais com maior distanciamento do limite com Patamares Transicionais a
leste.
Consideramos importante adicionalmente recordar alguns atributos da caracterização das
unidades geológicas locais ligadas aos segmentos dos macrocompartimentos de relevo aqui
abordados. No segmento ligado a superimposição das vertentes assimétricas das Terras Altas não
notamos heterogeneidades nas unidades litológicas nos conjuntos de vertentes, as variações
permanecem obedecendo o controle altimétrico predominante no compartimento de relevo.
Nos Patamares Transicionais deste trecho os afloramentos de basaltos se mostram mais
comuns, e concentram os mais numerosos registros referentes a aspectos da geologia estrutural –
apresentam grande concentração de afloramentos com sobreposição de múltiplos planos de juntas.
Por fim, consideramos relevante apontar que nos segmentos das Terras Baixas que margeiam os
Patamares Transicionais neste segmento específico registram-se já citados depósitos sedimentares
inconsolidados de ao menos 30 metros de espessura.
O conjunto das feições descritas quando associadas as variações altimétricas e clinográficas
concomitantes (ver figura 8) poderia ser explicado por meio de interferência deformacional rúptil
no modelado do relevo. Especificamente através de regimes de esforços que teria originado rupturas
que incluiriam falhamentos indiferenciados de direção proximal ao N20E, de rejeito relativamente
significativo – de valor mínimo de 30 metros (dado pela espessura dos sedimentos acumulados no
fundo dos atual vale), mas possivelmente superior. O desnível do nível de base local dado pela
movimentação dos blocos seria o responsável pelas mais elevadas declividades médias neste
segmento dos Patamares Transicionais, quando comparadas a seus trechos adjacentes
imediatamente a norte e sul.
O processo de deformação ligado ao regime de esforços possivelmente responsáveis pela
formação de falhamento sugerido de direção N20E teria tido intensidade o suficiente para modificar
a inclinação média da superfície do terreno dos setores proximais das atuais Terras Altas, através de
basculamento. Essa mudança na inclinação média da superfície passaria a ser aos poucos atenuada
pela ação das águas correntes e da esculturação das vertentes, mas ainda não teria tido uma extensão
temporal suficiente para ser completamente anulada nas feições de relevo. Sendo dai possivelmente

98
originadas o caráter assimétrico das vertentes que margeiam os canais deste segmento específico
das Terras Altas aqui discutido.
Tal proposta explicativa também auxiliaria a explicar o fato dos valores absolutos de
declividade das vertentes assimétricas apresentarem-se tão mais reduzidos quanto consideramos
pares de vertentes mais afastados do limite com Patamares Transicionais possivelmente associado a
ação da deformação rúptil. Seria difícil encontrar outra explicação para as heterogeneidades
apontadas, uma vez que não observamos registro significativo de variação na distribuição e
composição das unidades litológicas aos quais os padrões geomórficos citados associam-se.
Podemos citar também outros segmentos de detalhe em meio aos compartimentos que
poderiam denotar sugestão de influência deformacional que se mesclaria as fases de incisão vertical
do relevo regional, a intensificando. Dentre elas, as combinações de escarpas basálticas bruscas e
anomalias de drenagem retilínea de direção próxima da N-S nos Patamares Transicionais no Setor
das Vertentes de Média-Alta Declividade de Gavião Peixoto; alinhamentos de vertentes semi-
verticais nas cabeceiras de côrregos dispersas em meio ao compartimento dos Patamares
Transicionais em diferentes setores, ou as extensões mais proeminentes das quebras bruscas de
relevo no Setor dos Bordos Abruptos da Araraquara Sudeste.
Convém porém enfatizar que as referidas combinações de anomalias de relevo e drenagem
permitiram apenas sugerir uma interferência pontual da deformação rúptil nas alternâncias de
sucessões cronomorfológicas associadas predominantemente a fases de mais intensa incisão
vertical, vinculadas a outras ligadas a predomínio da plainação lateral. Sua influência estaria
abrangida em formas de relevo próximais do terceiro táxon de análise de relevo de Ross (1990),
formas de detalhe na escala de análise do presente estudo, e não estaria relacionada aos contrastes
essenciais que delimitam os macrocompartimentos de relevo da área, dentro do quarto táxon do
relevo de Ross (1990).
Uma vez feitas as ponderações em torno das discussões gerais referentes a mecanismos
geomorfogenéticos e sucessões cronomorfológicas passíveis de serem ponderados a partir dos
atributos fisiográficos e bases litológicas, podemos mesclar a discussão as maneiras como os sítios
arqueológicos líticos mesclam-se aos quadros de relevo da área. Tal procedimento pode ser usado
para verificar se interface de sítios com quadros de relevo que situam-se podem fornecer
informações e subsídios relevantes para acréscimos nas discussões apresentadas referentes a
geomorfogênese da Antiga Araraquara, e de suas sucessões cronomorfológicas estimadas.
Simultaneamente, também pode auxiliar a explicar determinados atributos dos próprios sítios líticos
– em especial sua distribuição.

99
Acreditamos que os sítios arqueológicos líticos da Antiga Araraquara, sob o ponto de vista
de sua interface com conjunto de quadros de relevo, podem ser analisados sob dois prismas
diferenciados. Primeiramente, daqueles que existem elementos para se acreditar que não se
encontram elementos claros para se distinguir com maior clareza se sua instalação na paisagem se
deu em momentos em que os quadros essenciais referentes a geomorfogênse dos quadros locais
onde instalam-se já estavam dados. Secundariamente, aqueles que apresentam elementos para
sugerir com maior segurança que sua instalação na paisagem se deu simultaneamente a transição
entre distintas sucessões cronomorfológicos, parte delas anteriores a configuração atual dos quadros
de relevo da área de estudo.
Inicialmente, podemos realizar alguns comentários referentes a sítios que não pode-se
distinguir se instalaram-se após aspectos centrais da geomorfogênse dos quadros de relevo em que
situam-se estarem consolidados. Nesta direção podemos citar os numerosos sítios arqueológicos
dispostos ao longo dos Patamares Transicionais, usualmente superimpostos nos segmentos de
declives mais acentuados. Este grupo – Sítios Líticos de Encostas dos Patamares Transicionais –
pode ser apontado como primeira unidade tipológica regional referente a interface entre padrões
pretéritos de assentamento humano e quadros de relevo.
Mostram-se dispostos usualmente em níveis superficiais do terreno e das coberturas
regolíticas, por vezes sendo encontrados dispersos em meio aos declives após serem carreados por
chuvas de maior intensidade (como observado nas incursões a campo, no ponto descritivo 4). A
modalidade de sítios líticos em análise pouca contribuição pode dar a discussão dos mecanismos
geomorfogenéticos e sucessões cronomorfológicas vinculadas aos quadros de relevo em que
situam-se, justamente por não ser possível adequadamente discutir com clareza se sua inserção na
paisagem se deu concomitante ou posteriormente a definição de seus traços morfológicos
essenciais. Sua própria presença nos níveis superficiais das coberturas de alteração colabora nesta
direção.
Todavia, a outra direção proposta no presente trabalho – uso dos atributos dos quadros de
relevo para discutir aspectos dos atributos dos sítios líticos – pode ser adequadamente realizada. Em
especial, por tratar-se do grupo de sítios líticos dominantes na área, perfazendo mais de 70% de
assentamentos com registros de ferramentas de pedra lascada na área de estudo.
Para compreender a dominância deste tipo de sítio lítico nos Patamares Transicionais pode-
se recapitular que, dentre os atributos requeridos para ocupação humana como na modalidade de
caçadores e coletores (Dixon, 2001), a existência de fontes de abastecimento hídrico é comum a
todas as grandes unidades morfológicas elencadas na Antiga Araraquara. Ainda que se registre
diminuição da vazão dos principais rios nos meses de inverno, eles permanecem perenes ao longo

100
de todo o ano no conjunto de compartimentos de relevo da área. Pode-se ponderar também que em
períodos pretéritos de menor volume de chuvas – como nas reduzidas condições de pluviosidade do
pleistoceno terminal – os Planaltos Residuais podem ter tido a vazão de sua rede hidrográfica
comprometida.
Não há registros, porém, de variação - em intensidade suficiente - para se cogitar déficit
hídrico ao longo da maior parte do período em que acredita-se que a área esteve pautada pela
presença humana antiga. Sugere-se que não é com base neste critério que se podem encontrar
diferenças significativas capazes de indicar a razão dos Patamares Transicionais e seus segmentos
de mais elevados declives se pautarem como especialmente atrativas para atividades de grupos
humanos pretéritos.
Uma vez que a presença de fontes de água corrente é comum a todos os grandes
compartimentos de relevo da Antiga Araraquara, é possível voltar-se a abundância de matérias-
primas para confecção de artefatos como fator discriminativo. Ferramentas criadas a partir de
rochas encontram suporte mais adequado justamente no compartimento dos Patamares
Intermediários. Sobretudo devido a maior presença de afloramentos líticos, devido a associação de
maiores declividades e menor espessura dos horizontes de solo. Particularmente, ressalta-se a
disponibilidade dos afloramentos de arenitos de graus diversificados de silicificação. Trata-se de
matéria-prima especialmente adequada para confecção de múltiplos instrumentos líticos.
Apresenta relativo caráter homogêneo na propagação da energia dos impactos que pautam a
confecção das peças a partir dos fragmentos de rocha. Simultaneamente, o arenito mostra-se
resistente o suficiente para suportar as tarefas às quais ferramentas destinam-se – tais como
raspagem de carne da caça, ou de corte de estratos vegetais - mas não tão rígido ao ponto de
dificultar ao extremo o seu lascamento (Araújo, 1992).
A mesma abundância de afloramentos rochosos não se pode notar nos demais
compartimentos da área, pautados pela raridade de afloramentos líticos e maior espessura dos perfis
de solos. Especialmente quanto a grupos humanos dependentes em maior intensidade de artefatos
líticos, nos parece relevante destacar como os Patamares Intermediários – particularmente adjacente
a seus segmentos mais íngremes – oferecem mais adequadas condições para populações
precursoras. Desta maneira, pode-se contribuir para explicar as observações feitas ao se analisar a
sobreposição da localização das principais concentrações de sítios líticos da área de estudo ao Mapa
de Compartimentos Morfológicos (ver mapa 4).
A unidade tipológica de sítios líticos superimpostos a vertentes escarpadas dos Patamares
Transicionais perfaz praticamente a maior parte dos sítios líticos documentados na área . Realça-se
também que alguns sítios arqueológicos citados que apresentam maior número e diversidade de

101
artefatos – como os Sítios Gavião Peixoto II e Rainha dos Montes – encontram-se inseridos nesta
unidade tipológica, e implantados justamente adjacentes a alguns dos mais íngremes segmentos dos
Patamares Transicionais.
O Sítio Gavião Peixoto II pode ser apontado como significativo neste conjunto, e foco de
alguns comentários mais estendidos. Encontra-se adjacente não só à área de alta declividade dos
Patamares Transicionais, como também próximo a segmento de anomalia de drenagem retilínea em
meio a padrões meandrantes do rio Jacaré-Guaçu das Terras Baixas adjacentes. A combinação das
declividades elevadas nos Patamares Transicionais, do estreitamento da extensão em planta e
mudança do padrão de drenagem referidos no trecho adjacente das Terras Baixas sugere ali uma
possível interferência deformacional pontual na morfogênese deste segmento específico.
As elevadas declividades derivadas da influência deformacional na morfogênese
desse setor teria contribuído para inibir percolação das águas e aprofundamento dos mantos de
alteração pedogenética, ampliando as possibilidades de afloramentos rochosos – como dos arenitos
da formação Botucatu
A maior parte das peças do sítio Gavião Peixoto II são justamente lascas de arenitos
silicificados, que abrangem 96% das peças catalogadas neste pretérito assentamento humano. As
litologias de exceção das peças do Gavião Peixoto II se concentram nos artefatos documentados no
referido sítio, representados naqueles designados por GPII-175 (artefato retocado obtido a partir de
calcedônia e quartzo) e GPII-607 (fragmento de artefato de sílex), como observado na Figura13.
Os artefatos citados anteriormente realçam-se pois são simultaneamente de pequeno
tamanho relativo e maior complexidade de retoque quando comparadas ao restante da coleção. A
diferenciação se evidencia dentre outros atributos pelo gume dentilhado da peça GPII-175. Esta
relação se justifica por maior homogeneidade interna referente a matéria-prima adotada para os
artefatos (sílex e quartzo/calcedônia). Mostram-se mais capazes, portanto, de responderem de
maneira mais precisa a impactos e entalhamentos bem como apresentarem dureza alta.
Nota-se assim um grau de discernimento elevado na escolha dos materiais, usando os
mais abundantes arenitos silicificados para as peças de porte maior e caráter mais massivo e
reservando os menos comuns fragmentos de sílex para confecção de artefatos menores e mais
delicados.
Características apontadas de matéria-prima das peças do sítio Gavião Peixoto II se
relacionam com a tipologia de interface entre padrões de assentamento e quadros de relevo em que

102
Figura 5. Composição ilustrando sítio arqueológico lítico Gavião Peixoto II. Em I observamos a localização do sítio,
usando de composição gerada por imagens Landsat a partir do recurso World View do Arcgis. Em II pode-se visualizar
artefatos confeccionados em sílex e quartzo/calcedônia (GPII-607 e GPII-175), e em III mostradas lascas de arenito
(GPII-193, GPII-337 e GPII-576)
Fonte: acervo próprio.

insere-se, a de Sítios de Escarpas Íngremes dos Patamares Transicionais. Considera-se, neste


sentido, que os afloramentos de arenitos são amplos e frequentes nas imediações decorrentes da
elevada declividade média do compartimento de relevo que se instala. O caráter temporário que se

103
discute no relatório da Scientia (2006) para o sítio Gavião Peixoto II encontra possível inter-relação
na existência relativamente próxima de amplas extensões de menores declividades mas sem
afloramentos rochosos (Planaltos Residuais e Planícies e Terraços do Jacaré-Guaçu e Mogi-Guaçu).
Extensões aplainadas seriam mais adequadas à permanência por algumas luas, uma vez que
ferramentas necessárias tivessem sido confeccionadas. Presença de níveis pontuais de aplainamento
em meio aos Patamares Transicionais também se realçam de maneira similar.
Parece necessário porém enfatizar que os sítios líticos abrangidos nesta primeira
unidade tipológica de interface entre assentamentos humanos e quadros de relevo – a de sítios
líticos das encostas íngremes dos patamares transicionais – tiveram sua implantação na paisagem
sem que possa se ter segurança se os atributos essenciais do relevo na qual instalaram-se já estava
determinada antes das chegadas dos gruos humanos. As demais unidades tipológicas de interface
sítios-quadros de relevo aqui propostas porém apresentam implantação nos quadros geomórficos
possivelmente diferenciada.
Atributos múltiplos se integram para sugerir que sua implantação se deu simultaneamente a
etapas de significativas transições entre quadros cronomorfológicos distintos. Mesclariam-se assim
a etapas importantes referentes a geomorfogênese das Terras Baixas da Antiga Araraquara. Desta
maneira podem fornecer informações relevantes para compreensão de alguns atributos das
discussões referentes a geomorfogênese deste segmento interiorizado das Escarpas da Bacia do
Paraná.
Estes últimos conjuntos tipológicos de interfaces entre sítios líticos e quadros de relevo -
instalados nas Terras Baixas do Jacaré-Guaçu e Mogi-Guaçu - são minoritários quando se refere a
quantidade de registros arqueológicos totais documentados na Antiga Araraquara. Distribuição
mencionada ocorre mesmo registrando-se que compartimento de relevo onde situam-se oferece
amplas áreas de declividades reduzidas e exuberância de fontes hídricas, concentrando os maiores
cursos de água da área. Fatores mencionados não são desprezíveis. Sobretudo quando se considera
que a unidade abriga os canais com maiores chances de terem permanecido simultaneamente
perenes e com vazão de água relativamente abundante durante períodos de menor pluviosidade do
passado profundo. Dentre eles, os intervalos associados ao período terminal do Pleistoceno e da
transição para o Holoceno.
A menor quantidade de sítios arqueológicos documentos do compartimento pode ser
discutida, dentre outros elementos, a partir da baixa disponibilidade de afloramentos rochosos
apresentada. Consequente dificuldade para obtenção de fontes adequadas de matérias-primas para
confecção de ferramentas e artefatos líticos necessários para suporte das atividades de antigos
grupos humanos reforça tal entendimento.

104
Parcela dos artefatos arqueológicos registrado no compartimento apresenta inclusive
significativos indícios de usarem meios alternativos para obtenção de fragmentos rochosos
necessários a confecção de ferramenta, que não os próprios afloramentos rochosos. Em alguns casos
estão instalados adjacentes ou mesmo sobrepostos a tais fontes não ligadas diretamente a
afloramentos. Desta maneira, podemos falar de duas unidades tipologicas de interfaces entre sítios
arqueológicos e quadros de relevo referente as Terras Baixas da Antiga Araraquara. São elas os
Sítios de Terraços Fluviais e Sítios Superimpostos a Colinas de Fragmentos de Movimento de
Massa.
O Sítio Rincão I por exemplo apresenta características interessantes em relação a primeira
unidade tipológica citada, a de Sítios de Terraços Fluviais. Pauta-se entre os dois daqueles
instalados adjacentes a fontes aqui designadas como menos convencionais de obtenção de
fragmentos rochosos para industrias líticas. Situa-se em segmento de declive reduzido – interior a 5
graus - e com desnível local de mais de três metros acima da atual Planície de Inundação do Rio
Jacaré-Guaçu, que o secciona através de meandro abandonado.
Situado em compartimento com raridade de afloramentos rochosos, o total de peças
registradas no sítio porém excede 900 peças líticas e registra também uma peça óssea. Deste total,
432 artefatos exibem córtex de seixos rolados, incluindo peça granítica – litologia cujos
afloramentos mais próximos encontram-se a distância da ordem quilométrica. Destaca-se no
conjunto ainda ponta de projetil e quatro raspadores bipolares plano-convexos descritos como
areníticos, como destacados na Figura 14. Tais fatores – sobretudo a presença de córtex de seixos
rolados - em conjunto contribuem para sugerir que uma das principais fontes das matérias-primas
utilizadas para a confecção dos instrumentos do sítio Rincão I foram seixos transportados pelo rio
Mogi-Guaçu. Eles teriam sido depositadas nas planícies de inundações por ocasião das cheias
periódicas do canal.
Merecem comentários também os padrões de distribuição das peças ao longo do perfil
vertical das unidades de escavação vinculados ao sítio Rincão I, como os descritos nos relatórios
técnicos da Scientia e no trabalho de Galhardo (2010). Nos segmentos mais profundos do perfil
(entre 80 e 150 centímetros) foram encontrados exclusivamente artefatos de quartzo, sendo que os
primeiros artefatos de sílex e arenitos somente se registram entre 50 e 60 centímetros.
Simultaneamente o maior adensamento na quantidade de artefatos – tanto de quartzo quanto de
arenitos - concentra-se nos níveis superficiais, entre 10 e 50 centímetros de profundidade.

105
Figura 14. Composição ilustrando Sítio Arqueológico Rincão I. Imagem I - localização do Sítio Arqueológico Lítico
Rincão I, e distribuição aproximada de suas peças em perfil vertical registrada nos relatórios do MAPA. II, III e IV -
Peças arqueológicas do sítio Rincão I. Veem-se instrumentos retocados de quartzo em II, em III lesmas de arenito e
arenito silicificado e no IV ponta de projétil pedunculada em arenito silicificado. Fonte: elaboração própria e acervo
pessoal.

Com base no registro sugeriu-se no já citado relatório técnico a hipótese de que grupos originais da
área – menos numerosos, em face à menor quantidade de registros materiais deixados – teriam
desenvolvidos tradições culturais ligadas a técnicas de trabalho sobre quartzo, sendo posteriormente

106
assimilados a outros grupos que incorporaram técnicas do conjunto original as suas próprias
voltadas ao trabalho com sílex e arenito. O modelo explicativo proposto, sugerido nos relatórios
técnicos responsáveis pela escavação do sítio e disponíveis para consultas na sede do MAPA,
poderia ser tema para aprofundamento de discussão por adensamento de trabalhos específicos para
verificar sua validade.
As possibilidades diversas de explicações do significado arqueológico da sucessão vertical são
múltiplas e necessitam de trabalhos de aprofundamento específicos. A própria presença de material
arqueológico nos perfis escavados em meio ao nível de terraços próximos aos rios principais, mas
alguns metros acima das planícies de inundação atual, pode ter por si só significado morfogenético.
Embora não se tenha datações absolutas disponíveis para muitos destes sítios, a existência de
artefatos arqueológicos em meio aos horizontes de solo nos permite deduzir a informação que a
deposição dos sedimentos dos quais foram originados tais conjuntos pedogenéticos e morfológicos
envolve não excede o intervalo contido entre algumas centenas de anos e a transição Pleistoceno-
Holoceno.
A informação pode ser obtida ao se analisar paradigmas de conhecimentos
acumulados referentes as datas dos sítios conhecidos tanto na região quanto no sul-sudeste
brasileiro. Ainda que se tenham dúvidas sobre a extensão total da antiguidade humana nos referidos
segmentos, nenhuma das propostas em questão propõe que se estenda a idade mais antiga do
povoamento ameríndio para um ponto muito mais distanciado do presente do que a transição
Pleistoceno-Holoceno.
A presença destes registros arqueológicos líticos nos terraços apontaria portanto um
intervalo temporal – do ponto de vista de gênese dos quadros de relevo – relativamente estreito para
formação dos horizontes de solo onde insere-se, abandono deste antigo nível de terraços,
aprofundamento do canal de ordem ao menos métrica e seccionamento do conjunto pelas planícies
de inundação de então do Rio Mogi-Guaçu. Envolveria neste intervalo de datação relativa o
abandono destas planícies de inundação anteriores em favor das atuais planícies marginais ao
referido grande rio. Corroboraria com esquemas de sucessão de quadros morfogenéticos inferidos a
partir de trabalhos em perfis transversais ao grande rio de fundo de vale elaborados em segmentos
do Mogi-Guaçu algumas dezenas de quilômetros a leste da área de estudo, como aqueles descritos
na estação ecológica do Jataí por Celarino (2011).
Também constitui um indicador adicional de que o material do qual se originou os
conjuntos de solos associados aos terraços englobaria sedimentos inconsolidados com deposição em
parte provavelmente simultânea ao período de confecção das peças arqueológicas. Coloca-se assim
em oposição a possibilidade de interpretação de que solos locais teriam sido eventualmente

107
originados a partir da alteração de uma formação rochosa de granulometria similar do ponto de vista
macroscópico. Uma vez que encontram-se dispersos por extensão vertical superior a um metro e
meio em meio ao longo perfis das unidades de escavação, vinculadas aos terraços nos relatórios
técnicos e intervenções como a de Galhardo (2010).
A presença de sítios arqueológicos em meio aos cortes e perfis associados aos terraços
envolveu assim um critério para distinguir os terraços fluviais das Terras Baixas da Antiga
Araraquara entre fill terraces e strath terraces. Mais especificamente, a questão da distinção entre
terraços ligados a solos com origem em sedimentos fluviais e daqueles ligados a solos provindos de
alteração de arenitos da Formação Botacutu.
Tarefa muitas vezes não tão simples devido a pedogênese relativamente desenvolvida. Traço
que se conjuga ao fato da granulométria média de unidades litológicas que afloram das Terras
Baixas – em especial os referidos arenitos – serem macroscopicamente semelhantes a granulometria
dos depósitos associados as planícies de inundação dos rios de fundo de vale regionais.
Complexidade que se torna maior quando se leva em consideração que parcela dos sedimentos
depositados pelos referidos conjuntos fluviais podem ter sua procedência na própria previamente
citadas unidades litológica.
Referente as demais unidades tipológicas de sítios citados, o Sítio Boa Esperança do Sul III
por sua vez permite novas discussões daqueles inseridos entre os Sítios de Colinas de Fragmentos
de Movimentos de Massa. O sítio lítico Boa Esperança do Sul III encontra-se instalado em discreto
morrote nos terraços intermediários e vertentes das Terras Baixas, sendo pautado por desnível
vertical local de até 5 metros. Pauta-se pela presença de depósito de blocos rochosos de arestas com
ângulos próximos a noventa graus, formatos semi-retangulares e com eixos maiores podendo
superar 30 centímetros.
Datação obtida de Santos (2011) por Luminescência Oticamente Estimulada (LOE) aponta
em cerca de 4000 anos antes do presente para nível superficial – cerca de 30 cm de profundidade –
da matriz arenosa do depósito de blocos, em profundidade com presença de material arqueológico
lítico. A data se mescla com o evento paleoclimático conhecido como Optimum Climático, ao qual
usualmente relaciona-se elevação das temperaturas médias em torno de 5 graus e estimados
aumentos da penetração de massas de ar úmidas na fachada leste de amplos setores do continente
sul-americano. A tal evento convencionalmente uma maior intensidade de processos erosivos como
movimentos de massa, dos quais a deposição dos blocos que constituem o morrote em que se
assenta o Sítio Boa Esperança III pode ter sua origem associada.
Especificamente quanto ao sítio Boa Esperança do Sul II (BES II)previamente apresentado,
notamos após a análise geral que - referente a sua localização no contexto da compartimentação do

108
relevo local – ele mostra-se como um sítio de exceção. A maior parte dos sítios e ocorrências líticas
não mostra-se associada ao compartimento de fundo de vale, sendo o sítio BES II um dos dois
únicos sítios localizados no compartimento das Terras Baixas. Todavia, ele apresenta-se não
somente com a mais antiga possibilidade de datação documentada na área como também pauta-se
como o sítio lítico com maior quantidade e diversidade de peças dentre a Antiga Araraquara. A
grande quantidade de instrumentos líticos – em torno de 3000 peças registadas - chama a atenção
dentre outros motivos por não ser visível a presença de afloramentos rochosos in situ no sítio e nos
seus entornos imediatos. Desta maneira escolhemos as imediações do sítio para coletas de dado e
mapeamento de maior detalhamento, para poder realizar ponderações buscando compreender o
referido caráter de exceção atributos a implantação do sítio no contexto morfológico regional.
Acreditamos, pelos motivos expostos a seguir, que sua análise com maiores detalhes também
permitirá somar as discussões referentes a dinâmicas das sucessões cronomorfológicas e
geomorgenéticas as quais o sítio BES II mescla-se
4.3 Contextualização de Detalhamento de Segmento das Terras Baixas nos Entornos do
Sítio Boa Esperança do Sul II
Nos tópicos anteriores do presente trabalho pudemos realizar o mapeamento geológico e
compartimentação do relevo regional, sendo também realizada a sobreposição a eles da distribuição
dos sítios arqueológicos líticos e discussão de aspectos da geomorfogênese da Antiga Araraquara.
Em adição aos citados procedimentos de análise regional de semi-detalhe acreditamos que alguns
segmentos das Terras Baixas apresentam elementos que sugerem que seu estudo em escala mais
próxima a de detalhe agregaria contribuições significativas aos fins do presente trabalho.
As Terras Baixas – por seu posicionamento nos quadros de relevo da Antiga Araraquara –
mostram-se mais propícia a preservação de registros pedológicos e morfológicos das etapas mais
recentes da dinâmica geomorfogenética da área de estudo e de suas sucessões cronomorfológicas.
Ampliam-se potenciais para análises de maiores detalhes de segmentos apontados como interesse, e
realização de discussão e interface com os grandes compartimentos de relevo da área.
Para este fim foi escolhido um segmento das Terras Baixas do Jacaré-Guaçu, aqui
delimitados de “Planícies, Terraços e Vertentes de Boa Esperança”. O segmento em questão
apresenta preservados associações de relevo, coberturas sedimentares e horizontes pedológicos
possivelmente pertinentes para compreensão de sucessões de quadros cronomorfológicos
relativamente mais recentes.
Tratam-se de possíveis registros preservados de processos morfogenéticos cuja repetição no
passado podem auxiliar a compreender a formação dos quadros de relevo atuais da área, sobretudo
no que se refere a compreender processos de esculturação pós-cretáceos. O segmento específico

109
escolhido para o estudo – trechos adjacentes ao sítio BES II das Terras Baixas do Jacaré-Guaçu
proximais a rodovia Comandante Barros (ver Mapa 4) - realça-se também por conter os
previamente citados jazigos arqueológicos que discute-se correlação com transição Pleistoceno-
Holoceno
As numerosas peças do referido sítio lítico encontram-se dispersas e mescladas aos quadros
geomórficos de detalhe, e as sucessões pedológicas e sedimentares dos Baixos Terraços do Jacaré-
Guaçu. De maneira que encontram-se contíguas ao registro das sucessões cronomorfológicas
pretéritas, fazendo com que a inserção de sua interface horizontal e vertical com o setor que instala-
se pode agregar informações significativas dos mecanismos responsáveis pelo fecho da
geomorfogênese local. Simultaneamente, também permitiria discutir adequação da datação próxima
a transição pleistoceno-holoceno referente ao conjunto do meio físico no qual encontra-se inserida.
Procuramos no presente tópico abordar a área a partir de uma contextualização
geomorfológica de maior detalhamento (Cunha e Sousa, 2011), seguida da realização de
pedosequências em trechos adjacentes em trechos delimitados - dentro da concepção da Análise
Estrutural dos Solos da Cobertura Pedológica. Esperamos que a contextualização geomorfológica
em escala de detalhe possa permitir uma inserção do trecho delimitado na compartimentação
geomorfológica regional. Ao passo que o uso em seguida da abordagem das pedossequências
possam ser inserido nos quadros de relevo em que situa-se, e permitir resgatar elementos da
organização tridimensional das coberturas superficiais vinculadas a este trecho específico.
Por fim, ao término destes procedimento específicos em escala de detalhe, pretende-se
realizar interface dele com as escalas de análise anteriores. De maneira a discutir elementos da
macrocompartimentação que auxiliam a discutir aspectos da análise de detalhes, e também como
elementos das análises intermediárias e locais podem complementar as discussões anteriormente
efetuadas referente a análise regional das sucessões cronomorfológicas e sua interface com os sítios
líticos.
Situada no segmento sudoeste da área de estudo a área das Terras Baixas do Jacaré-
Guaçu delimitadas para o estudo de detalhes (ver figuras 14 e 16) pauta-se por um trecho de amplas
planícies e terraços fluviais dispostos entre dois segmentos de nítido adegalmento da extensão em
planta das planícies e terraços do rio Jacaré-Guaçu. Imediatamente a montante e a jusante do setor

110
Figuras 14 e 15 – Detalhamento de compartimentação de um segmento das Terras Baixas do Jacaré-
Guaçu (figura 14), contextualizando local escolhido para realização de pedossequências. Quadrante delimitado para as
pedossequências é o mesmo onde encontra-se implantado o sítio arqueológico Boa Esperança do Sul II Fonte:
elaboração própria

Boa Esperança das Terras Baixas, a extensão em planta do compartimento em traçados


perpendiculares ao curso do Rio Jacaré-Guaçu estreita-se significativamente -ou chega a dar lugar
ao compartimento dos Patamares Transicionais.

111
Ao ponto de apresentarem extensões em planta até quatro vezes menores. Enquanto nas
Planícies, Terraços e Vertentes de Boa Esperança os traçados das planícies aluviais perpendiculares
ao rio Jacaré-Guaçu podem superar oito quilômetros em planta, em trechos adjacentes a montante e
jusantes os mesmos traçados não ultrapassam a casa das centenas de metros. Ao adentrar nas
Planícies, Terraços e Vertentes de Boa Esperança de Sul realça-se também que o traçado
meandrante adquire caráter mais nítido e proeminente. No trecho a jusante o caráter meandrante se
anula bruscamente e se aproxima do traçado retilíneo, e a direção sofre significativa inflexão em
trechos diversos em diminuta extensão em planta – aproximando-se da direção N-S.

Altimetricamente e clinograficamente, as cotas e declividades mais reduzidas das


Planícies, Terraços e Vertentes de Boa Esperança mostram-se associadas as planícies de inundação
que margeiam o rio Jacaré-Guaçu. Podem ser identificados em campo facilmente pela fisionomia da
vegetação hidromórfica que nelas se instala. Pautam-se de discreta ascensão altimétrica a partir da
calha do Jacaré-Gguaçu,, até atingirem o limite com o nível dos Baixos Terraços locais - usualmente
contidos nas altimetrias entre 505 e 515 metros. Convém destacar as significativas heterogeneidades
da extensão em planta das planícies tranversais ao curso principal nos trechos das margens esquerda
e direita do citado grande rio de fundo de vale. Os segmentos de planícies de inundação situadas nas
margens esquerda podem se mostrarem com extensões em planta até três vezes mais amplas do que
os situados nas margens direita.

Nesta escala de maior detalhamento, a unidade dos Baixos Terraços pode ser subdividida em
dois distintos conjuntos de terraços – Baixos Terraços 1 e Baixos Terraços 2 (como já aponto por
Valezio, 2016). Ao adentrar no primeiro conjunto de Baixos Terraços, a ascensão altimétrica e
clinográfica permanece suave nos segmentos perpendiculares a seus limites com as planícies de
inundação e praticamente nula nos segmentos transversais aos limites. No entanto mostram-se com
extensão em planta diversificada – em alguns trechos apresentam-se relativamente adelgados ao se
considerar percursos perpendiculares a seus limites com as planícies de inundação, contidos na casa
das centenas de metros, em outros podem atingir a dimensão quilomêtrica em planta.

Os dois subconjuntos que compreendem os Baixos Terraços encontram-se associados a


coberturas areno-argilosas tidas como predominantemente aluviais. Encontram-se visíveis nos seus
topos, sobretudo dos Baixos Terraços II, meandros abandonados. As citadas paleoformas
apresentam uma significativa diferença em relação aqueles presentes nas planícies de inundação,
anteriormente referidos. A largura dos paleocanais destes meandros abandonados mostra-se
significativamente mais espessa do que a do atual canal do Jacaré-Guaçu. Mostram-se entre duas ou

112
quatros vezes mais largas do que o atual curso do canal, sugerindo que a época de sua formação
haviam condições hidromorfológicas significativamente diversas das atualmente predominantes.

4.4 Detalhamento das Coberturas Superficiais dos Baixos Terraços Contíguos ao


Sítio Boa Esperança do Sul II

Dentre as unidades morfológicas apresentadas, destacamos trecho específico dos Baixos


Terraços (contornados em vermelho na figura 14). Neles que encontram-se registrado a associação
com o sítio arqueológico lítico Boa Esperança do Sul II, e vestígios preservados de associações
solo-relevo capazes de detalhar aspectos das sucessões cronomorfológicas neogênicas vinculadas as
mais recentes alternâncias de fases de predomínio de incisão vertical e de ação da plainação lateral
na área de estudo. O trecho destacado encontra-se delimitado a norte e oeste pelas planícies de
inundação do Jacaré-Guaçu, e a leste e sul pelos Terraços Intermediários e Vertentes Suavizadas.
Neste quadrante apresentado, foram realizados pedossequências e refinamento topográfico
simplificado por meio de medidor de nível simplificado. A distribuição dos pontos das tradagens
realizadas e os traçados podem ser observados na figura 15, através de cinco alinhamentos em
planta, enquanto as pedossequências podem ser vistas na figura 16. Dados serão apresentados num
contexto de uma caracterização geral, com objetivo de subsidiar interface das peças arqueológicas
com processos morfogenéticos. Também serão apresentados dados da unidade de escavação 1 (ver
figuras 15 e 16), feito nos Baixos Terraços 1.

Os perfil topográficos correlatos as pedossequências I, II, III, IV e V confluem em certo


sentido ao apontarem um incremento altimétrico e clinográfico relativamente suave nos segmentos
dos Baixos Terraços relativamente marginais as planícies de inundação, ainda que com nuances. Os
acréscimos altimétricos e declividades maiores mostram-se presentes usualmente próximos a
transição entre os dois terraços, podendo atingir inclinações signficiativas em alguns segmentos
(valores por vezes superiores a inclinações de cinco graus). Ao ponto de poderem mesmo serem
tomados como vertentes por trabalhos que fossem baseados apenas em interpretação de imagens
aéreas ou observação a distância das formas de relevo.

113
114
115
116
Figura 16 – pedossequências em Baixos Terraços do Jacaré-Guaçu. Fonte: elaboração própria.

117
Figura 17 – Composição apresentando Unidade de Escavação 1, vinculada a dissertação de Santos
(2011).com pontilhado vermelho destacando nível de concentração de peças arqueológicas, com esquema ilustrativo de
alguns dos artefatos de arenito lascado vinculados a unidade de escavação. Fonte: elaboração própria, a partir de dados
de campo, e ilustração de José Gomes.

118
Todavia, a análise das coberturas pedológicas no conjunto das pedossequências realizadas deixam
claro tratarem-se de terraços fluviais. Sobretudo por destacam-se no conjunto das tradagens
associadas as pedossequências a intensa gleização, que se manifesta em significativas extensões
tanto horizontalmente quanto verticalmente – presente mesmo nos níveis mais profundos da maioria
das tradagens realizadas. Notamos também que por vezes – sobretudo nas pedossequências voltadas
para segmentos onde planície de inundação aparenta incisão sobre os terraços – os horizontes de
solo dos Baixos Terraços II mostram-se truncados pelos associados aos Baixos Terraços I.
Maior parte das tradagens apresenta textura de granulometria areno-argilosa ou argilosa,
com presença de argila orgânica de alta pegajosidade nas sondagens mais proximais as planícies de
inundação. Não pode-se discriminar horizonte B desenvolvido em nenhuma nas sondagens
analisadas, com horizonte A em geral disposto diretamente sobre os horizonte B.
Notam-se também dois tipos de cascalheiras ao longo das tradagens. Uma delas –
cascalheira do tipo I – composta por níveis de seixos pouco espessos (entre 1 e 4 cm), e incapazes
de impedir a continuidade da tradagem. Simultaneamente, observamos outro tipo que quando
encontrado apresentava características tais que impediam a continuidade das tradagens – por vezes
marcando a ponta do trado com marcas de óxidos de ferro. Níveis de mosqueamento mostravam-se
esparsos entre os perfis. As cascalheiras do tipo 2 fazem recordar de trabalhos anterior da área, a
Unidade de Escavação 1 vinculada ao trabalho de Santos (2011) que por ser acompanhado por nos
(ver figura 17), onde concentra-se o material arqueológico encontrado no sítio Boa Esperança do
Sul II.
Pedossequências por nos realizadas não registraram material arqueológico nas
tradagens, mas campanhas de furos efetuados em resgates arqueológicos vinculadas a Zannetini
Arqueologia (2005) próximos aos percursos o fizeram – sendo na maioria das cerca de 300 peças ali
levantadas pautadas por estilhas de arenito. Os poços escavados nos resgates tinham raio proximal
dos 30 cm enquanto raio da ponto do trado não excedem 3 cm, o que poderia explicar não termos
termos na mesma área encontrado material arqueológico por meio de tradagens face relativa
dispersão dos materiais nas faixas não associadas a cascalheiras basais – sobretudo nos Baixos
Terraços II. Também foi encontrado artefato arqueológico em unidade de escavação próxima a 2x2
metros realizada no topo da sequência IV de pedossequência, sendo encontrado um núcleo lascado
em arenito (Ladeira e Araújo, comunicação verbal). Todavia devido a chuvas não se pode completar
a unidade de escavação, que planejava-se alcançar ao menos 1,6 metros de profundidade – onde
pelas tradagens anteriores estima-se que seria possível alcançar o nível topográfico da cascalheira
de tipo 2.

119
5.3 Inserção das Peças Arqueológicas e Datação Obtidas no Contexto
Geomorfogenético e das Sucessões Cronomorfológicas Estimadas

Para interface do material arqueológico local com dinâmica geomorfogenética, uma


característica a ser levada em conta referente a organização e disposição do Sítio BES II refere-se
a variação em profundidade da distribuição peças arqueológicas. Procuramos aqui inicialmente
apontar alguns elementos referente a variação vertical da distribuição das peças arqueológicas
mesclada aos atributos das coberturas superficiais de solos e sedimentos dos terraços do Jacaré-
Guaçu onde instala-se. A unidade de escavação de 2 m X 2 m aberta durante a pesquisa de Santos
(2011) e que pudemos acompanhar e realizar as descrições pedológicas e sedimentares em seus
termos mais gerais, mostra-se como possível ponto de partida nesta direção de apresentação e
análise de dados. A referida unidade apresenta-se superimposta a depósito sedimentar e manto de
alteração pedológico pautado por nível de clastos basais e segmento arenoso a ele sobrejacente (ver
figura 17).

No nível basal pautado por cascalhos de predomínio arenítico em que ressaltam-se atributos
como a elevada granulometria e o bom grau de arredondamento, com padrões texturais
combinando-se para se sugerir serem considerados seixos fluviais. O grau de semelhança com
outros depósitos similares já documentados permite-nos inferir serem associados aos canais
torrenciais tipicamente ligados a retomada das condições tropicais referenciados na transição entre
Pleistoceno e Holoceno – como aqueles das descrições de Almeida (1964) e Ab’Saber (1998).

Os mencionados conjuntos de depósitos do registro geológico guardam semelhanças com os


originados por canais atuais em áreas de condições assemelhadas a semiaridez, como setores do
noroeste da Argentina. A chegada de precipitações de maior intensidade e maior volume de água em
paisagens pautadas por cobertura vegetal pouco densa são capazes de gerarem fluxos hídricos de
elevada capacidade de remobilização. O caráter esparso da vegetação mostra-se não efetivo em
dispersar parte significativa da energia cinética acumulada das águas das chuvas, contribuindo para
maior potencial de transporte das águas dos mencionados canais efêmeros (Ab`Saber, 1998).

Pode-se observar que as águas correntes dos dias atuais do rio Jacaré-Guaçu, proximal ao
sítio BES II, não são capazes de transportar clastos de granulometria como a que compõe a
cascalheira basal da unidade de escavação. A competência de transporte que o citado rio apresenta
atualmente se limita a mobilização de seixos de alguns poucos centímetros – proximais ao tamanho
de um punho humano cerrado. A granulometria média dos clastos basais ligadas ao sítio BES II 1,
1
O último nível arqueológico do sítio BES II está imediatamente acima da referida cascalheira.

120
por sua vez se aproxima dos 20 centímetros, com clastos maiores aproximando-se dos 40 cm.

Os intervalos areno-argilosos que recobrem os clastos rochosos basais podem ser


interpretados como depósitos de antigas planícies de inundação, que teriam posteriormente sido
expostos a processos pedogenéticos ligados a visível gleização. Numa etapa seguinte, o
terraceamento do conjunto e a continuidade da gleização por segmentos de superfície superiores a
uma centena de metros em planta aponta o abandono da antiga planície e aprofundamento do leito
do canal. Ferricretes encontrados na quadra também se mostraram condizentes com tal proposta
explicativa, apontando ao menos duas grandes alterações referentes as profundidades dos níveis
freáticos locais.

A sucessão de quadros cronomorfológicos mencionados é similar ao conhecido para a


dinâmica fluvial regional, exemplificado nos trabalhos de Celarino e Ladeira (2011) e Souza (2010)
em terraços do rio Mogi-Guaçu algumas dezenas de quilômetros a nordeste da área de estudo.
Também mostrariam-se coerentes com os recentes trabalhos de Valézio (2016) nos terraços do rio
Jacaré-Pepira, algumas dezenas de quilômetros a sul. Trabalhos mencionados nos terraços
proximais do Mogi-Guaçu apontam, com base em dados pedológicos, palinológicos e datação,
mudança significativa do nível de base local e abandono das antigas planícies de inundação em
algum momento após 10.000 anos antes do presente. De maneira similar, datações e cartografia
geomorfológica de Valézio (2016) aponta data similar para abandono dos baixos terraços do rio
Jacaré-pepira. Dados citados são compatíveis com os disponibilizados nos mencionados terraços do
Jacaré-Guaçu, que confluem para a sugestão de aprofundamento do leito do canal proximal as datas
apontadas pelos citados trabalhos dos pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas.

Reconstituição palinológica de Sousa (2010) aponta inclusive gradação de predomínio de


plantas ligadas a associações de vegetais de cerrado mais tolerantes a condições de menores
pluviosidade (como campos limpos) nas bases do perfil por ela estudado com datação proximal a
transição pleistoceno-holoceno. Registra ali também gradação para predomínio daqueles
tradicionalmente ligados a presença de níveis pluviométricos mais expressivos (cerradões)
conforme se aproxima do topo do perfil, e de extensões cronológicas mais recentes. Envolve
portanto evidência adicional que permite sugerir admitir para a área de estudo processos de
transição climáticos proximais aos esquemas tradicionais, que sugerem nestes setores do Planalto
Brasileiro que a transição Pleistoceno-Holoceno seria pautada por passagem de índices
pluviométricos menores para condições de retomadas de valores mais elevados de umidade.

Na direção citada, nos parece adequado relembrar que datação obtida por LOE em nível

121
com presença de artefatos de origem humana perfaz valor de 14500+-3000 anos antes do presente.
A amostra encaminhada para a datação foi obtida próxima ao segmento que marca o limite entre o
depósito de clastos basais e os Gleissolos arenosos que o recobrem. É neste estrato também que se
concentra a maior parte das cerca de oito centenas de peças arqueológicas – predominantemente
areníticas - encontradas na unidade de escavação. A associação da data, do contexto sedimentar-
pedológico e do material arqueológico permite cogitar, assim, a ideia de incluir o sítio de BES II no
conjunto de registros humanos paleoíndios, próximos a transição entre as épocas geológicas do
Pleistoceno e a atual época Holocênica.

As dúvidas e questionamento envolvendo quadro de sítios em geral se passam justamente


pela confirmação da solidez da antiguidade advinda de procedimentos de datação diversificados.
Exemplo desta dinâmica está no Abismo Ponta de Flecha, referente ao Médio Ribeira do Iguapé. A
ligação de ponta de flechas e dentes de animais pleistocênicos lá registrada é sensivelmente
questionada pela possibilidade de indícios de transporte e remobilização, sendo potencialmente
modificadas as características primordiais de deposição. Na situação do sítio Alice Boer, em Rio
Claro (SP), pautam-se ainda dúvidas do contexto do achado em razões referentes a condições da
documentação e registro das escavações. Mesmo referente a sítios apontados como pleistocênicos
tais qual o já citado sítio de Pedra Furada (Piauí), ainda hoje prosseguem os questionamentos sobre
a origem derivada de atividade humana dos carvões usados para datações por Guidon (Prouss,
1990).

Observa-se, porém, que no caso da citada quadra do sítio BES II, tal situação se mostra de
maneira distinta. Vários mecanismos contribuem para relativa baixa probabilidade de significativa
movimentação vertical após a deposição da maioria dos artefatos presentes. Um dos primeiros a
serem citados é a disposição das numerosas peças. Como apontado, a amostra retirada para datação
por fotoluminiscência na unidade de escavação foi extraída de nível que associa-se a centenas de
vestígios materiais de atividades humanas. Marca também a passagem do nível de cascalhos basais
com maximum particule size que se aproxima dos 40 centímetros para Gleissolos areno-argilosos.

As condições apontadas dificilmente seriam compatíveis com processos de significativa


movimentação vertical. Granulometricamente, as peças líticas lascadas no segmento em questão são
significativamente heterogêneas. Difícil seria sugerir um processo de bioturbação ou de ação
erosiva que poderia selecionar, em meio à diversidade de material litológico disponível, justamente
os de significado arqueológico e os concentrar em faixa vertical tão estreita. O próprio caráter de
Gleissolo inibe em certo sentido a existência de bioturbação. A relativa diminuta fertilidade do solo

122
mencionado não favorece a instalação de alguns dos mais vigorosos ecossistemas de cerrado,
diminuindo assim perspectiva da ação da atividade biológica em maior intensidade.

Ao analisar a distribuição vertical das peças do Sítio BES II pode-se sugerir que os antigos
grupos humanos de grupos de caçadores coletores empregariam os seixos fluviais basais como fonte
de matérias-primas para lascamento de suas ferramentas.

Pode-se ponderar que grupos humanos locais, plausivelmente aproveitariam-se de atributos


derivados da retomada da tropicalidade na transição Pleistoceno-Holoceno. Em particular, das
cascalheiras expostas após exaurimento dos canais torrenciais responsáveis pela sua deposição. Elas
configurariam um excepcional atrativo para grupos de caçadores e coletivos no contexto deste
conjunto interno das escarpas cuestiformes da Bacia do Paraná.

Recorda-se que - pelos declives reduzidos e disseminação de espessos horizontes de solo -


os afloramentos rochosos mostram-se significativamente incomuns neste setor interiorizado das
escarpas. No compartimento de relevo específico que situa-se o sítio BES II - fundos de vale - tal
afirmação seria em especial verdadeira. Ao levar em conta a abundância de fontes de matéria-prima
vinculadas a afloramentos rochosos para confecção de ferramentas líticas, pode-se assim estimar
importância que conjunto de clastos rochosos deixadas no rastro dos canais torrenciais configuraria.
Sobretudo quando se leva em conta provável proximidade de corpo hídrico no contexto de
condições climáticas flutuantes.

Sugere-se a ideia da concentração de cascalheiras que, quando expostas, configuram


referencial suficiente para que agrupamentos humanos nômades e/ou seminômades de tempos em
tempos retornem ao assentamento. Eles se aproveitariam da farta abundância de matérias-primas
já em formato que facilitava a obtenção de lascas para confecção de instrumentos necessários a sua
sobrevivência (como os que fornecerem apoio a caça e o trabalho dos animais abatidos, além de
outras atividades). As citadas ferramentas – como raspadores e instrumentos de pontas - seriam em
parte transportados por incursões nos quadros de relevo regionais, pautados por raridade de fontes
de matérias-primas líticas.

Deslocamentos estimados poderiam ser motivados, dentre outros motivos, pelos citados
quadros de relevo circundantes serem mais propensos a abrigarem ecossistemas de cerrado pautados
por maior abundância e variedade de fauna e flora do que os fundos de vale de solos menos férteis.
Cheias periódicas do rio Jacaré-Guaçu depositariam gradualmente sedimentos areno-argilosos sob
o conjunto rochoso deixado pelos canais torrenciais, de maneira que em determinado

123
momento iriam capeá-los e escondê-los dos novos grupamentos humanos chegados a área.
Grupos humanos então se voltariam para escarpas circundantes e os dispersos afloramentos
areniticos in situ para confecção de suas ferramentas.

Cabe registrar a ressalva, porém, que a referida unidade de escavação em baixos terraços em
que centram-se as observações deste tópico não é o único registro de subsuperfície referente ao
sítio. Existe também a série de sondagens nos baixos terraços do entorno, vinculados aos trabalhos
de arqueológia preventiva da empresa Zanettini Arqueologia, . Tais conjuntos mostram material
arqueológico não associado a transição entre depósitos de clastos basais e Gleissolos areno-
argilosos, e mesmo em níveis próximos da superfície. Eles possibilitariam estimar um capítulo da
história de ocupação regional diferenciado aos registros pontuais dos baixos terraços aqui
analisados.

Caberia neste sentido integrar os dados desta unidade de escavação localizado próximo ao
limite do conjunto de Baixos Terraços 1 com as planícies de inundação, com as pedossequências
que pudemos realizar no presente trabalho. O espalhamento dos pontos amplos e a quantidade
significativa de lacunas em que não se permitiu uma interdigitação dos horizontes com maior
segurança – representados por ponto de interrogação nas imagens da Figura 16 – recomendo porém
ressalvas neste procedimento. Torna-se possível falar de ao menos duas possibilidades explicativas
para a integração entre a Unidade de Escavação 1 e as sucessões de pedossequências efetuadas..

Na primeira delas os registros vinculados aos Baixos Terraços II seriam anteriores aos dos
Baixos Terraços I. Corresponderia um momento em que o nível de base local estaria entre 10 e 20
metros mais elevado que o atual, representado pelos meandros abandonados no topo dos Baixos
Terraços e adjacentes as pedossequências por nos realizadas. O sistema fluvial de então, ainda que
com possíveis diferenças do atual como apontado pela diferenciada largura do canal, teria tido
porém condições de formar amplas planícies de inundação. Referidas planícies, a exemplo dos
análogos atuais, poderiam se estender por até alguns quilômetros em planta, depositando os
sedimentos arenosos que posteriormente originariam os solos dos Baixos Terraços 2. As planícies
de inundação permaneceriam tempo o suficiente para impor condições necessárias para gleização
dos horizontes de solo registrados nos Baixos Terraços II.

Seria assim preciso admitir variações regionais para as condições paleoclimatológicas mais
tradicionais, que apontam o segmento terminal do pleistoceno como predomínio de condições semi-
áridas, colocando eventuais pulsos de umidade pontuais em meio ao mosáico de reconstituições.
Abordagens nesta direção já foram efetuados por pesquisadores como Collinvaux (2009), que

124
apontaram em segmentos diversos reconstituições paleoambientais em determinadas regiões do
território brasileiro que divergem dos esquemas convencionais que apontam uma disseminação
predominante das condições de semi-aridez no pleistoceno terminal.

Posteriormente, o nível de base se modificaria para outro nível cerca de 10 metros abaixo do
anterior registrado pelo limite entre a cascalheira basal da Unidade de Escavação 1. O fator
responsável por esta mudança de nível de base não pode ser determinado pelos dados disponíveis a
partir da presente pesquisa – podendo ser tanto de caráter neotectônico, como apontado para outros
setores das Cuestas por Fortes et at (2009) - como climático – como apontado para Ab`Saber
(1998), como correlato a transição entre fases assemelhadas a semi-áridas e únidas. Em seguida as
mudanças associadas as dinâmicas climáticas associadas a transição Pleistoceno-Holoceno
depositariam os clastos de canais efêmeros que são a base da Unidade de Escavação 1, sendo
seguida pelos episódios de interface com grupos humanos descritos anteriormente que originariam
os artefatos arqueológicos ali presentes.

Dai seguiriam-se os previamente apontados depósitos areno-argilosos vinculados as


planícies de inundação do Jacaré-Guaçu, que seriam posteriormente abandonadas por nova
diminuição do nível de base, mas desta vez da ordem de alguns poucos metros, formando o nível de
Baixos Terraços I. Nesta etapa, o rio de fundo de vale passando a ocupar seu nível de base atual.
Neste cenário as cascalheiras do tipo 2 presentes nas bases do Baixos Terraços II seriam de eventos
anteriores tanto as cascalheiras dos Baixos Terraços I quanto aos depósitos dos Baixos Terraços II,
que seriam truncadas e impressos limites erosivos com Baixos Terraços I.

Outra possibilidade explicativa porém seria que tanto as cascalheiras da Unidade de


Escavação I quanto as referidas cascalheiras do tipo II presentes nos Baixos Terraços II seriam
ambas anteriores aos dois conjuntos de Baixos Terraços. Nesta interpretação, as duas cascalheiras
seriam interpretadas como parte de uma única paleosuperfície e formadas em processos
deposicionais do mesmo tipo e concomitantes. Corresponderiam ambas a depósitos de canais
efêmeros vinculados a transição Pleistoceno-Holoceno, tendo sua continuidade quebrada em
determinados segmentos por posteriores processos de remobilização. Após sua deposição e
incorporação por grupos humanos que deixariam os registros de artefatos, o nível de base local teria
experimentado uma ascensão contida entre 10 e 20 metros. Neste novo nível de base, formariam-se
conjuntos de planícies de inundação que depositaria os conjuntos de sedimentos areno-argilosos que
formariam os sedimentos que passariam por processos de gleização e originariam os solos dos
Baixos Terraços II.

125
Mostram-se coerentes com esta abordagem a datação por carbono-14 obtida por Santos e
Araújo em unidade de escavação correspondente ao topo da pedossequência V nos Baixos Terraços
II, em torno de 10000 anos antes do presente (comunicação verbal) – posterior portanto a datação
obtida por Santos (2001) na Unidade de Escavação 01 nos Baixos Terraços Ique registra o limite
dos canais efêmeros com solos arenonosos afetados por gleização, de 14500+-3000 anos antes do
presente.

Após este episódio de ascensão de nível de base, haveria novo episódio de queda dele
levando ao abandono do antigo canal e formação dos Baixos Terraços II. Na transição entre os
níveis de base, a erosão dos Baixos Terraços II seria intensa – originando seus declives, e expondo
parte de suas cascalheiras basais (cascalheiras do tipo II nas pedosequências realizadas), incluindo o
segmento abrangido pelos seixos da Unidade de Escavação 1. A dinâmica de enchentes periódicas
do novo nível das planícies de inundação seccionaria os Baixos Terraços II em seus momentos de
maior acentuação erosivo, mas também poderia depositar os sedimentos areno-argilosos que
recobrem as cascalheiras da Unidade de Escavação 1 e imporiam a eles posterior gleização. Em
seguida, haveria nova diminuição de nível de base em busca do nível topográfico da atual calha do
rio Jacaré-Guaçu.

Esta segunda opção interpretativa permitira tanto conciliar os conhecimentos ligados a


sucessões cronomorfológicas atreladas as interpretação paleoclimatológicas mais tradicionais
(Haffer, 1969) como também aos conhecimentos das mesmas sucessões em escala regional. As
últimas citadas representados pelos trabalhos de Celarino e Ladeira (2011) e Sousa, Branco, Jasper
e Pessenda (2013), que apontam respectivamente abandono dos níveis de baixos terraços regionais
do Mogi-Guaçu em algum momento posterior a 10000 anos A.P, e um clima significativamente
mais seco que o atual anterior a citada data.

Estes dados podem ser combinados a alguns dados geomórficos apresentados no presente
trabalho em etapas anteriores, como o apontamento da similaridade da topografia das calhas do
Jacaré-Guaçu e Mogi-Guaçu a despeito dos dois rios terem atributos hidrológicos
significativamente diferenciados (Jacaré-Guaçu encontra suas nascentes nas imediações da área de
estudo, enquanto as cabeceiras do Mogi-Guaçu mostram-se a centenas de quilômetros – tendo
vazões acumuladas de afluentes sensivelmente distintas). Poderiam em conjunto permitir sugerir
mecanismos de controle regional para as alternâncias de níveis de base proximais a transição
Pleistoceno-Holoceno previamente apontadas..

Cabe ressaltar porém que ambas as possibilidades interpretativas de sucessões

126
cronomorfológicas vinculadas aos quadros de relevo e solos do sítio Boa Esperança II apresentam-
se apenas como sugestões de explicação dos dados de campo, sendo necessário densificação de
estudos para ponderá-las adequadamente. Particularmente, seria necessário abertura de unidades de
escavação em meio aos Baixos Terraços II para melhor caracterizar as cascalheiras apontadas pelas
tradagens, e ampliar a densidade de pontos para poder se realizar interdigitação dos dados com
maior segurança.

Todavia nota-se que ambas as sucessões cronomorfologicas sugeridas para explicar os dados
de campo, a datação atribuída ao sítio Boa Esperança do Sul II pela datação de Santos (2011)
mostra-se encaixar adequadamente no contexto do meio físico. Se não fosse a presença do material
arqueológico, as sucessões em questão poderiam ser entendidas sem maiores ponderações com os
quadros relativamente semelhantes apontados para transição entre condições assemelhadas a semi-
aridez para outras assemelhadas a tropicais registradas na literatura.

127
CAP V – CONCLUSÕES

128
Pudemos no presente trabalho delimitar três grandes conjuntos de macrocompartimentos de
relevo – Planaltos Residuais, Patamares Transicionais e Terras Baixas da Antiga Araraquara - e
apresentar suas associações de características morfométricas e litológicas sumárias, objetivando
realizar interface dos quadros de relevo da Antiga Araraquara com sítios arqueológicos líticos. Bem
como descrever atributos gerais da caracterização e distribuição das formas de relevo detalhe que
marcam a sua a constituição. Elencou-se seus quadros típicos, e detalhou-se também seus
segmentos de relevos de exceção – registrando-se sua localização, e realizando sua caracterização
em termos gerais. Apontou-se também sobreposição dos sítios arqueológicos líticos aos quadros de
relevo mencionados, buscando identificar possíveis padrões preferenciais de associação.
Em termos geomofogenéticos, discutimos que quadros de relevo locais permitem sugerir
conjunto de sucessões morfocronológicas pautadas por possíveis alternâncias entre intervalos onde
prevalecem processos vinculados a dissecação do relevo em busca da adequação a novos níveis de
base e outros vinculados a formações de níveis aplainados ou semi-aplainados.
Ponderamos que não encontramos elementos suficientes para discutir com maior segurança
a possível causa das mencionadas oscilações entre os dados levantados, não permitindo discernir
claramente entre processos eventualmente vinculados a dinâmicas estruturais ou aqueles vinculados
a dinâmica climática. Os contrastes morfológicos essenciais da área seriam dados
predominantemente pelas diferenciadas resistências de seus litotipos a alternância de processos
previamente citados. Consideramos possível porém que produtos das atividades deformacionais se
mesclariam a alternância entre sucessões cronomorfológicas anteriormente citadas, levando em
determinados setores da área a intensificação da dinâmica de incisão vertical e formação de declives
mais intensos.
Abordou-se a respeito de interfaces entre sítios arqueológicos líticos e quadros de relevo
regional. Constatamos que o conjunto dos sítios arqueológicos em sua distribuição associa-se
predominantemente vinculado ao compartimento dos Patamares Transicionais. Procuramos também
realizar discussão procurando ponderar os motivos que levariam a esta modalidade de instalação
preferencial. Bem como procuramos realizar tipologia das principais modalidades de interface entre
modalidades de ocupação humana pretérita e quadros de relevo e geomorfogênese regional.
Propusemos delimitá-los entre sítios líticos de encostas de Patamares Transicionais – instalados em
momentos em que não seria possível definir se os processos essenciais da delimitação dos quadros
de relevo que situam-se encontravam-se já definidos, ou concomitantes a sua instalação – e os sítios
líticos de terraços fluviais das Terras Baixas e Sítios Líticos de Morrotes Deposicionais –
possivelmente instalados concomitantemente ao tempo que se davam a formação das formas de
relevo em que hoje apresentam-se associadas.

129
Apontamos possíveis caminhos em que presença dos sítios permitia acrescentar sugestões ao
entendimento da interpretação da geomorfogênese das formas de relevo em que mostram-se
inseridos, em especial nas Terras Baixas. Também ponderou-se de como atributos dos quadros
geomórficos, posicionamento nos macrocomportimentos em que situam-se podem auxiliar a
explicar certos traços e atributos dos próprios sítios – destacando especialmente as diferentes
modalidades de disponibilidade de matérias-primas para artefatos rochosos fornecidos por cada
conjunto de quadro de relevo.
Notamos que entre os sítios da área, aqueles instalados em terraços fluviais de Terras Baixas
mostram-se como exceção – sendo registrados apenas 2 dos 8 sítios líticos presentes na Antiga
Araraquara, com os demais estando presentes nos Patamares Transicionais. Todavia notamos que o
sítio com maior quantidade de peças líticas e que discute-se aceitação da datação próximo a
Transição Pleistoceno-Holoceno (Sítio Boa Esperança do Sul II, BES II) insere-se na citada
categoria tipológica de exceção de interface com quadros de relevo. Diante do contexto, a
compartimentação morfológica contextualizada de maior detalhe e aspectos da análise da estrutura
superficial de segmentos específicos das Terras Baixas adjacentes ao sítio arqueológico lítico BES
II permitiram algumas ponderações e ponderações com o contexto regional e dados previamente
levantados no presente estudo.
Discutimos possibilidade que registros arqueológicos do sítio mesclarem-se a registro de
sugeridas sucessões cronomorfológicas proximais temporalmente a transição Pleistoceno-Holoceno.
Ponderou-se que as citadas sucessões cronomorfológicas estariam associadas a episódios mais
recentes e melhor preservados de alternância de fases de adequação das sucessões a estabilidade de
níveis de base locais, com outras de adaptação delas a mudanças dos citados níveis na ordem entre
uma e duas dezenas de metros. Observações mostram-se possíveis de serem relacionados não
somente aos dados locais, como também a trabalhos anteriores em segmentos relativamente
proximais a área de estudo nos fundos de vale do Mogi-Guaçu e Jacaré-Pepira.
Registros arqueológicos do sítio BES II sugerem sua inserção em conjuntos de atributos de
quadros de relevo tradicionalmente associados as condições de retomada da tropicalidade que
marcam a transição pleistoceno/holoceno. Clastos basais de canais torrenciais associados a estes
conjuntos podem ter sido usados como fontes de matéria-prima para a indústria lítica do BES II, e
colocando-se como atrativo para permanência e/ou retorno periódico de grupos percursores.
Compensaria-se escassez de matérias-primas no que se refere a relativa raridade de afloramentos
rochosos nas extensões do fundo de vale em que situa-se o sítio, e se potencializaria atributos de
ocupação dados pelas declividades pouco acentuadas quando comparadas aos Patamares
Transicionais que concentram afloramentos rochosos de arenitos e de veios de quartzo.

130
Destaca-se, porém, que a aceitação da data dos quadros de relevo contíguos ao sítio BES II
como próxima da transição Pleistoceno-Holoceno deve apresentar cautela, sobretudo pela
implicação para entendimento de cenários de ocupação humana pretérita. Observa-se sumariamente
que um dos traços marcantes da datação do sítio BES II é a distinção de sua análise sob a
perspectiva da dinâmica geomorfogenética e pela ótica do estudo arqueológico. Dados aqui
levantados mostram que inserção da datação associada ao sítio BES II considerando apenas o
contexto dos quadros de relevo e sucessões cronomorfológica conhecido parece distante de
causar grandes polêmicas, mas sua aceitação enquanto ligada ao sítio arqueológico sugere
cautela antes de aceitar definitivamente a data. Superimpõe-se assim análises temporais
diversificadas ao incorporar vestígios e rítimos de transformações humanas e dos quadros
geomorfológicos, demandando diversificação de estudos e densificação de dados para se chegar a
compreensão adequada.

131
VII – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

132
AB`SABER, A. Áreas de circudesnudação periférica pós-cretácea. In: Boletim Paulista de
Geografia,1949.

______. _________. A terra paulista. Boletim Paulista de Geografia, São Paulo, n. 23, p. 05-38,
jul. 1956.

______. Geomorfologia do sítio urbano de São Paulo. Faculdade de Filosofia, Ciências e


Letras da USP, São Paulo, n. 219, 1956.

______. Participação das Depressões Periféricas e Superfícies Aplainadas na


Compartimentação do Planalto Brasileiro. Revista IG-São Paulo. São Paulo, 1998.

ALMEDIA, F.F.M.. Botucatu, um deserto triássico da América do Sul. 1954.

______. Fundamentos geológicos do relevo paulista. Instituto de Geociências, Universidade


de São Paulo. 1964

______; Geologia e Petrografia do Arquipélago de Fernando de Noronha. Monografia XIII da


Divisão de Geologia e Mineralogia do Departamento Nacional de Produção Mineral. Rio De Janeiro,
1958.

________. Geologia e Petrografia da Ilha de Trindade. Monografia XVIII da Divisão de


Geologia e Mineralogia do Departamento Nacional de Produção Mineral. Rio de Janeiro, 1961.

ARAÚJO, A. G.. M. As propriedades físicas dos arenitos silicificados e suas implicações na


aptidão ao lascamento. Revista do Museu de Arqueologia e Etnologia, São Paulo, n. 2, p. 63-74,
dec. 1992. ISSN 2448-1750. Disponível em:
<http://www.revistas.usp.br/revmae/article/view/108993>. Acesso em: 16 nov. 2016.

______, A. A variabilidade cultural no Período Paleoíndio (11.000-8.000 AP) no Brasil:


algumas hipóteses. Rev. do CEPA, Santa Cruz do Sul, V 28, N 39. 2004.

Baptista, M.B.; Braun, O.P.G.; Campos, D. A. (orgs.). Léxico Estratigráfico do Brasil 1984.
Brasília, DNPM/CPRM, 560 p.

BATE, L.F. Culturas y modos de vida de 10s cazadores recolectores en e1 poblamienro de


America de1 Sur.Revista de Arqueología Americana. 2:89-153, 1990

133
BRADLEY, B.. The North Atlantic ice-edge corridor: a possible Palaeolithic route to the New
World" (PDF). World Archaeology. 36 (4): 459–478. Stanford, Dennis. 2004

BROWN JR, K.S e AB`SABER, A . N. ―Ice-age forest refuges and evolution in the
Neotropics: correlation of palaeoclimatological, geomorphological and pedological data with
modern biological endemism‖. Paleoclimas (São Paulo). 5, p. 1-30. 1979

BULL, W. Stream-terrace genesis: implications for soil development. Geomorphology, 3,


pg 351-367 351 Elsevier Science Publishers B.V., Amsterdam. 1990

CELARINO, A e LADEIRA, F. Análise cronológica e pedológica de uma topossequência na


Estação Ecológica de Jataí, Luis Antonio – SP: relação entre processos pedogenéticos na vertente e
na planície aluvial do rio Mogi Guaçu. Instituto de Geociências, Universidade Estadual de
Campinas. Campinas, 2011.

CUNHA, C; SOUZA, T. CARTOGRAFIA DO RELEVO DE ÁREAS DE SEDIMENTAÇÃO


RECENTE: O CASO DO LITORAL SUL PAULISTA. São Paulo, UNESP,Geociências, v. 29, n. 2, p.
187-199, 2010

CORREAL, G. HAMMEN, T. Investigaciones Arqueológicas en Los Abricos Rocosos Del


Tequendama. Bogotá, 2007

DIXON, E.J. Human colonization of the Americas: timing, technology and process.
Quaternary Scinece Reviews. 20277-299, 2001.

DORR, J. Physiographic, Stratigraphic and Structural Development of the Quadrilatero Ferrifero


Minas Gerais, Brazil. UNITED STATES GOVERNMENT PRINTING OFFICE, WASHINGTON, 1969

FIGUEIROA, S. Modernos bandeirantes: a Comissão Geográfica e Geológica de São Paulo


e a exploração científica do território paulista (1886-1931). Dissertação (Mestrado) – Faculdade de
Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo. 1987.

FORTES, E; SORDI, M; CAMOLEZI; B, VOLKMER, S. CONTROLE


MORFOESTRUTURAL E TECTÔNICO DA EVOLUÇÃO DOS DEPÓSITOS DE FLUXOS
GRAVITACIONAIS DA BACIA DO RIBEIRÃO LAÇADOR - PARANÁ, BRASIL: UMA
ABORDAGEM PRELIMINAR. In: Anais do XIII Congresso da Associação Brasileira de Estudos
do Quaternário. 2008.

134
GRAMLY, R.M "The Lamb Site, A Pioneering Clovis Encampment". 1999.

HAFFER, J. (1969) Speciation in Amazonian forest birds. Science165:131-137. ______


Ciclos de tempo e indicadores de tempos na história da Amazônia. Estud. av., São Paulo, v. 6, n. 15,
Aug. 1992 .

HASUI, Y; CARNEIRO, C, ALMEIDA, F e BARTORELLI, A. Geologia do Brasil. 2012.

HAYNES, C. Fluted Projectile Points: Their Ages and Dispersion. Science, vol 145. 1964.

HIRATA, R; UCCI, M; WAHNFRIED, I ; VIVIANI-LIMA, J. Explotação do


SistemaAquífero Guarani em Araraquara. Geol. USP, Sér. cient. [online].

HOLMES, C. Broken Mammoth. In American Beginnings: The Prehistory and


Palaeoecology of Beringia, pp. 312 - 318. University of Chicago Press, Chicago. 1996

LEE, R. e DEVORE, I. Man the Hunter. Chicago: Aldine, 1968

LEONARDI, G. 1980. On the discovery of an ichno-fauna (vertebrates and invertebrates) in


the Botucatu Formation s.s. in Araraquara, São Paulo, Brazil. Anais da Academia brasileira de
Ciências, 52(3): 559-567. PIUCI, J; DINIZ, H. Conhecimento do Aquífero Botucatu na cidade de
Araraquara- SP. In: Revista IG São Paulo.1985

MANO, M. Os campos de Araraquara : um estudo de história indígena no interior paulista


2006.

MARTINS DE ALMEIDA, Nelson Album de Araraquara, 1 edição. 1915.

______. Album de Araraquara, 2 edição. 1948.

MEAULO, F. Vulnerabilidade natural à poluição dos recursos hídricos subterrâneos da área


de Araraquara (SP). UNESP, 2004.

______. Caracterização geológica, hidrogeológica e o mapeamento da vulnerabilidade


natural à poluição dos aqüíferos, na escala 1:25.000, das áreas urbana e de expansão do município
de Araraquara-SP. UNESP, 2007

MEGGERS, B; EVANS, C. Lowlands of South America and Antilles. J.D. Jennings (Ed.)

135
Ancient Native Americans. San Francisco, W.H. Freeman and Company. 1977.

MENTZ RIBEIRO, P.A.M. & RIBEIRO, C.T.1999. Escavações arqueológicas no


sítio RS-TQ-58, Montenegro, RS, Brasil. Rio Grande, Editora da FURG

MILANI, E.J. Comentários sobre a Origem e Evolução da Bacia do Paraná. In: Neto, V;
Bartorelli, A; Carneiro, C.D.R e Brito-Neves, b. . Geologia do Continente Sul-Americano: Evolução
da Obra do Professor Fernando de Almeida. 2004.
MILNER, H. Sedimentary Petrography. Murby and co, Londres. 1940.

MOTTA-JUNIOR, J; GRANZIONOLLI, M; DEVELEY, P. Aves da Estação Ecológica de


Itirapina, Estado de São Paulo. In: Brasiç Biota Neotrop. [online]. 2008, vol.8, n.3, pp. 0-0.
NEVES, W. Afinidades biológicas de grupos pré-históricos do vale do rio Ribeira de Iguape (SP):
uma análise preliminar. 2005.

NOELLI, F, FERREIRA, L. A persistência da teoria da degeneração indígena e do


colonialismo nos fundamentos da arqueologia brasileira. 2007.

OKUMURA, M. Dardo ou Flecha? Testes e Reflexões Sobre a Tecnologia de Uso de Pontas


de Projétil no Sudeste e Sul do Brasil Durante a Pré-História. Cadernos do Lepaarq volume 12
número 24. Pelotas, 2015.
PEDERSON, J; Anders, M; Tammy, M; Rittenhour, T; Sharp, W; Gosse, J e Karlstrom, K.
Using fill terraces to understand incision rates and evolution of the Colorado River in eastern Grand
Canyon, Arizona. JOURNAL OF GEOPHYSICAL RESEARCH, VOL. 111, F02003,
doi:10.1029/2004JF000201, 2006
PIUCI, J; NÓBILE, H. CONHECIMENTO DO AQUÍFERO BOTUCATU NA CIDADE DE
ARARAQUARA -SP. Rev. IG, São Paulo, 6(112);23-37, jan./dez. 1985

ROOSEVELT, A. C. Moundbuilders of the Amazon: geophysical archaeology on Marajo


Island, Brazil. San Diego: Academic Press, 1991. [ Links ]
_______. Arqueologia amazônica. In: CUNHA, M. C. da. (Org.) História dos Índios no
Brasil. São Paulo: Cia. das Letras, 1992, p.53-86
ROSS, J. S.Registro cartográfico dos fatos geomorfológicos e a questão da taxonomia do
relevo. Rev. Geografia. São Paulo, IG-USP, 1992
ROSS, J; MUROZ, I Mapa Geomorfológico do Estado de São Paulo. 1994

VALEZIO, E. V. Equilíbrio em geomorfologia: Geossistemas, planícies de inundação e


morfodinâmica dos rios Jacaré-pepira e Jacaré-Guaçu/SP. Campinas, Universidade Estadual de
Campinas. 2016.

136
Maack, R. Os propósitos da geografia moderna e a situação do ensino e das pesquisas
geográficas no Paraná. 1956.
Rodrigues, R. Relatório Técnico Mapa 1. 2001. Obs: cópia impressa disponível nos anexos
do Museu de Arqueologia e Paleontologia de Araraquara

_______. Relatório Técnico Mapa 2. 2002. Obs: cópia impressa disponível nos anexos do
Museu de Arqueologia e Paleontologia de Araraquara

_______. Relatório Técnico Mapa 3. 2004. Obs: cópia impressa disponível nos anexos do
Museu de Arqueologia e Paleontologia de Araraquara

________. Relatório Técnico Mapa 4. 2009. Obs: cópia impressa disponível nos anexos do
Museu de Arqueologia e Paleontologia de Araraquara

SANTOS, F. Os Habitantes mais Antigos do Centro-Oeste Paulista. In: Mimesis, vol 30, nº1,
Universidade do Sagrado Coração/USC. Bauru, São Paulo, 2009.

_______. Sítios Líticos do Interior Paulista: Um Enfoque Regional. Universidade de São


Paulo, São Paulo. 2011.

_______. Abordagem Teórica sobre o Estudo de Sítios Líticos no Interior do Estado de São
Paulo, Brasil. In: Techné, Portugal, 2012.

SCHMITZ, P. I. Arqueologia do Rio Grande do Sul, Instituto Anchietano de Pesquisas.


2006.

SILVEIRA, J. D. "Baixadas Litorâneas Quentes e Umidas". Tese de Cátedra. Edição de


Autor. São Paulo, 1950.

SOUZA, M. Palinologia em sedimentos quaternários, localizados na Estação do Instituto


Florestal de Jataí, SP. Instituto de Geociências, Unicamp. 2010. SUGUIU, K. Mudanças Ambientais
da Terra. Instituto Geológico: 2010.

SOUZA, M; BRANCO, F. JASPER, A e PESSENDA, L. Evolução Paleoambiental


Holocênica do Estado de São Paulo, Brasil. Rev. Brasi. Paleont. 2013.

137
ZANETTINI, A. Relatório de Consultoria Arqueologica, Gasoduto Norte - trecho
Araraquara. 2004.

138

Você também pode gostar