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RESUMO

CANCLINI, N. “Popular, popularidade: da representação política à teatral”. In: CANCLINI,


N. Culturas híbridas. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo (EDUSP), 2003.

O capítulo “Popular, popularidade: da representação política à teatral”, inscrito na obra


originalmente intitulada como “Culturas híbridas: estrategias para entrar y salir de la
modernidad”, do antropólogo e cientista social Néstor García Canclini, apresenta uma análise
crítica dos processos pelos quais a cultura popular é apropriada/cooptada pelos estratos
políticos e pela indústria cultural. Avaliado integralmente, o texto de “Culturas híbridas”
aborda a elaboração de produtos culturais classificados segundo as categorias de popular,
culto ou massivo, atentando para suas conexões com a modernidade. Canclini elenca as
perspectivas de variados segmentos – os sujeitos das práticas em Ciências Sociais, das artes,
da literatura, dos museus e do aparato midiático e político – a fim de delimitar os modos pelos
quais cada um deles elabora sua própria noção do tradicional e do moderno. Nesse
seguimento, o autor dirá, ainda, que se observa na América Latina o desenvolvimento
histórico de uma cultura híbrida, na qual a noção de modernidade remete ao plural e em
relações nas quais elementos considerados cultos, populares e massivos, subalternos e
hegemônicos, modernos e tradicionais se interpenetram e se entrecruzam.
Segundo Canclini, a ideia de popular concebida pelos media, consideravelmente
assimilada nas pesquisas acerca dessa noção, é normatizada e fundamentada segundo
interesses mercadológicos. Assim, o que se vende de maneira massiva e agrada o maior
quantitativo de pessoas é o que se entende como popular. Como bem diz o autor, “a rigor, não
interessa ao mercado e à mídia o popular e sim a popularidade” (2003, p. 259-260). Ainda de
acordo com essa perspectiva, o popular só interessa como é efemeridade, não se conservando
no tempo: para o mercado e para os aparelhos da mídia interessam as renovações
ininterruptas, a obsolescência, a fugacidade e o esquecimento de toda manifestação cultural
que tenha emergido do que se chama de popular (CANCLINI, 2003, p. 260).
Canclini também chama atenção para uma determinada concepção segundo a qual “o
popular não consiste no que o povo é ou tem, mas no que é acessível para ele, no que gosta,
no que merece sua adesão ou usa com frequência” (CANCLINI, 2003, p. 261). Para o autor,
essa ideia engendra um popular atribuído externamente ao povo a partir de um trabalho de
interpelações e imposições midiáticas unilaterais. No entanto, ressalta Canclini, essa
perspectiva de que o popular se caracteriza pela mera subordinação e passividade não é
consistente, uma vez que os chamados populares também elaboram as suas próprias
estratégias de resistência e, assim, participam dessas relações de poder nas diversas esferas da
vida social.
Após delinear essa ideia de construção de um espectador urdido em uma rede de
relações de força/poder, Canclini passa a fazer algumas considerações acerca de como as
práticas políticas de apelo ao povo, referidas como populismo, se ancoram na cultura para,
assim, articular o poder. Assim,
No populismo estatizante, os valores tradicionais do povo, assumidos e
representados pelo Estado, ou por um líder carismático, legitimam a ordem que estes
últimos administram e dão aos setores populares a confiança de que participam de
um sistema que os inclui e os reconhece” (CANCLINI, 2003, p. 264).

Canclini prossegue frisando que o populismo propiciou aos estratos populares novas
possibilidades de interação em um mundo que se modernizava. Interações com as instituições
do Estado, bem como com demais esferas dominantes/hegemônicas, em um processo que
culminou com parte de seus anseios fossem supridos. Não obstante, Canclini irá elencar três
transformações históricas cujos efeitos fizeram arrefecer essa modalidade de formação
popular, a saber: os processos engendrados pela indústria cultural, incluso aí a elevação dos
custos das campanhas eleitorais, em um reordenamento dos embates e disputas político-
eleitorais a partir dos parâmetros da publicidade; recessões, crises econômicas e alavancada
de uma nova configuração do neoliberalismo capitalista, como observado nos anos 1980,
fatores que se constituem em obstáculos para as práticas populistas baseadas em atender às
demandas populares; o distanciamento das classes populares da política partidária, ao passo
em que se observa o recrudescimento da mediação simbólica feita pelos veículos de imprensa
em lugar dos embates políticos entre movimentos sociais e Estado.
Para o autor, pensar as questões do popular e da popularidade demanda do
investigador um olhar transdisciplinar, trazendo à baila a perspectiva gramsciana da
hegemonia e a teoria da reprodução como direcionamentos teóricos de destaque nesse campo.
Há, no entanto, como bem diz Canclini, o problema de se adequar esses conceitos na seara da
teoria social (CANCLINI, 2003, p. 274), uma vez que, segundo a perspectiva gramsciana, as
culturas populares se reapropriam de suas tradições e experiências nos próprios antagonismos
com os estratos hegemônicos. Por seu turno, a teoria da reprodução observa as culturas
populares como resultantes das apropriações heterogêneas e desiguais de bens simbólicos e
materiais por grupos cultural e socialmente subalternizados.

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