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ASPECTOS CULTURAIS E O ENSINO DE LÍNGUA

INGLESA1

Aparecida de Jesus Ferreira


UNIOESTE - Cascavel

RESUMO:O trabalho objetiva discutir questões que falam


sobre o ensino de língua inglesa e os aspectos culturais
que envolvem o ensino de línguas. As discussões serão
feitas em quatro partes: na primeira parte tratarei da
definição de cultura; na segunda parte fazer uma
retrospectiva histórica de como era ensinada a cultura
desde o método gramática e tradução até a abordagem
comunicativa; na terceira parte analisar o papel da
linguagem na cultura e por último discutir sobre o
professor, aprendiz e a cultura no ensino de língua inglesa.

PALAVRAS-CHAVES: ensino - cultura - língua inglesa


ÁREA DE CONHECIMENTO: língua inglesa.

INTRODUÇÃO

Falar sobre cultura e o ensino de língua inglesa, não é tão


simples como parece, pois há várias implicações principalmente
por estarmos falando de uma língua, do ponto de visto do país
da fala, domina e/ou se impõe economicamente.
Tomando como base o acima exposto e a partir de uma
pesquisa realizada em escolas da rede pública de Cascavel em
1998 pudemos observar alguns estereótipos que ligam o ensino
de Língua Inglesa e aspectos culturais. Neste artigo proponho

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Línguas & Letras. CECA/CVEL, v1., no.1, p. 117-127, jan/jun.2000.
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retomar discussões da pesquisa colocada, cujo viés será uma
reflexão partindo da conceituação de cultura, após fazendo uma
retrospectiva histórica dos métodos de ensino de línguas de
como era ensinada a cultura dentro desses métodos até o
momento atual, e num terceiro momento analisar o papel da
linguagem na cultura e finalmente fazer uma reflexão sobre o
professor, aprendiz e a cultura no ensino de línguas.

1. DEFINIÇÃO DE CULTURA

Existem várias conceituações de cultura, mas neste


momento estou fazendo opção por essas, por acreditar que são
as mais relevantes para a reflexão que me propus a fazer. Há
duas definições que pontuo, sendo uma definição antropológica
de cultura e uma definição humanista. No trabalho vai ficar
mais transparente a minha opção pela definição antropológica,
por acreditar que cultura é muito mais amplo do que somente
ver a cultura do ponto de vista do mundo letrado, pois vejo a
cultura que vai além, ou seja, todo comportamento e forma de
viver de uma povo, independentemente de sua classe social e
sua condição financeira. E com isso apontamos como não sendo
a condição financeira de uma pessoa ou um grupo social, que
evidencia a cultura de um povo, mas sim um conjunto de
situações que definem a cultura desse povo.

1.1 Definição Antropológica de Cultura


"Cultura é todo comportamento humano-cultural,
transmissão social...Cultura é saudação dirigida a alguém ... é a
forma de educar a prole ... é o modo de vida da sociedade ...
Cultura é um termo que dá realce aos costumes de um povo."
(Ullmann, 1980:86 )

1.2 Definição Humanista de Cultura


"Preparar o homem para as atividades públicas para funções
que exigem a arte da palavra e da escrita."( Folliet, l968:28)
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Santos (1983:24), apresenta duas concepções básicas de
Cultura:
A primeira preocupa-se com todos os aspectos de uma
realidade social. Assim cultura diz respeito a tudo aquilo
que caracteriza a existência social de um povo ou nação
ou então de grupos no interior de uma sociedade.
Podemos assim falar na cultura francesa ou na cultura
xavante. Do mesmo modo falamos na cultura camponesa
ou então na cultura dos antigos astecas.
A segunda está se referindo mais especificamente ao
conhecimento, as idéias e crenças, assim como as
maneiras como eles existem na vida social. Observem que
mesmo aqui a referência à totalidade de características
de uma realidade social está presente, já que não se pode
falar em conhecimento, idéias, crenças sem pensar na
sociedade à qual se referem.

Conforme percebemos nas citações acima, não há


uma cultura melhor ou pior do que a outra, mas sim maneiras
diferentes de comportamentos e costumes de povos que fazem
parte de uma sociedade. E mesmo fazendo parte de uma
sociedade há pessoas com diferentes níveis sociais que
compõem essa sociedade e cada um tem seus aspectos culturais
que juntos formam a cultura de um país ou uma região.

2. RETROSPECTIVA HITÓRICA DAS


ALTERAÇÕES METODOLÓGICAS NO ENSINO DA
LÍNGUA INGLESA VISTA PELO VIÉS DA CULTURA.

Ao escolher esta quatro abordagens de ensino que seguem


foi com a intenção de fazermos uma retrospectiva histórica de
como era visto o ensino da cultura dentro do ensino de Língua
Inglesa até chegarmos ao momento atual, a opção pelas quatro
abordagens, embora existam outros, é pelo fato de serem as que
mais se destacaram.
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Fazendo essa retrospectiva conseguimos perceber nas
abordagens um perfil de ensino, de professor e de aluno que é
esperado dentro de cada abordagem.

2.1 Grammar Translation Method ( 1840 )


Leitura de textos clássicos difíceis é feito em estágios
iniciais. ( Totis, 1991:25)

2.2 Direct Method (1900 )


A cultura da língua-alvo é aprendida indutivamente.
(Totis, 1991:25)

2.3 Audiolingual method ( 1950 )


Dá-se importância aos aspecto culturais da língua-alvo.
(Totis, 1991:26)

2.4 Communicative Approach ( 1980 )


A abordagem comunicativa chamou a atenção dos professores
para a importância de outros aspectos da língua que não o significado
proposicional, auxiliando-os a analisar e ensinar uma língua
estrangeira de modo integrado. (Totis, 1991:29).
Por essas várias transformações metodológicas, percebe-
se que o ensino de língua inglesa era centrado no ensino da
cultura, mas não de uma forma que produzisse a integração
entre a cultura da língua que era ensinada e a cultura de quem
estava aprendendo uma língua estrangeira. Com todas as
mudanças metodológicas, chegamos a abordagem
comunicativa, que abre oportunidades para vermos o ensino de
línguas integrado com a cultura e percebendo este ensino mais
crítico. Pennycook apud Bannell ( 1997:275) diz que, "to use
English is to engage in social action which produces and
reproduces social and cultural relations. The worldliness of
English referes both to its local and its global position, both to
the way in which it reflects social relations and constitutes
social relations and thus the worldliness of English is always a
question of cultural politics..."
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Pois é através de um ensino de Língua Inglesa mais
crítico que poderemos dar oportunidades ao nosso educando de
agir e interagir dentro da nossa sociedade e isso passa pelo
reconhecimento da sua cidadania, vendo-se através de seus
aspectos culturais.

3. O PAPEL DA LINGUAGEM NA CULTURA

Ullmann (1980:132) diz que, a linguagem é o reflexo das


experiências e da cosmovisão de um povo .A linguagem deve
ser inserida no contexto cultural global e não pinçada como
algo estranho e a parte. Ela constitui o espelho de uma
mentalidade.

A língua dá acesso à cultura e, por outro lado, para


aprender uma língua é preciso um mergulho cultural, a
aquisição das habilidades orais e escritas, isto é, a
competências comunicativa não fica assegurada apenas
com o conhecimento das estruturas lingüísticas(...)
saudar uma pessoa, fazer um convite, pedir um favor,
servir um cafezinho, pedir desculpas(...) são todas
situações que se inserem profundamente num contexto
cultural . ( Dalpian, 1996:51)

Quero salientar que cabe ao professor de língua inglesa


saber utilizar esses momentos, e discutir com seus alunos os
hábitos de qual língua está sendo ensinada e fazer uma análise
contrastiva com a sua língua materna, para que assim o seu
aluno perceba que cultura da língua que está aprendendo, tem
suas diferenças mas que nenhuma é superior a outra e sim há
hábitos diferentes porque a situação está em um outro contexto.
O objetivo principal quando se ensina uma língua estrangeira é
perceber que estamos aprendendo para nos comunicar através
dessa nova língua e sendo assim como coloca ( Almeida Fillho,
l993:15) conforme se vai aprendendo uma outra língua essa se
desestrangeiriza.
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O PROFESSOR, O APRENDIZ E A CULTURA NO
ENSINO DE LÍNGUA INGLESA.
Moita Lopes (1996:42) , lembra a todos os professores de
inglês como segunda língua que nosso trabalho
verdadeiro é fazer amigos para o nosso país ao ensinar
aos alunos inglês e o tipo de estilo de vida que ele
representa
( ...) . A exigência de uma pronúncia tão perfeita quanto a
do nativo e a incorporação de hábitos culturais, ou seja,
a cópia xerox do falante nativo, não pode ter outro
motivo senão e de domínio cultural. Tal atitude de
imitação perfeita é o primeiro sintoma de alienação a se
detectar, já que se trata de uma identificação total com o
outro, com o conseqüente abandono de sua própria
identidade cultural.

Temos que ter claro que ao ensinar uma língua


estrangeira não estamos fazendo com que nosso aluno adquira a
cultura do outro, mas sim saiba que um povo se comporta de
uma forma e outro se comporta de outra forma. Mas que com
isso nossa cultura não deixa de ser superior ou inferior a outra .
E que muitas vezes é confundido com a situação econômica do
país da língua a qual estamos ensinando. E no caso da língua
inglesa a maioria dos países que falam esse idioma são
economicamente dominantes como os Estados Unidos,
Inglaterra, Canadá , Austrália e Nova Zelândia e isso acaba
gerando na maioria um sentimento de inferioridade e assim
passando a considerar a cultura do outro melhor do que a
própria.
O papel do professor nesse momento é muito importante
para tentar resgatar no seu aluno através das habilidades
lingüísticas a auto-confiança, identidade política, social e
cultural do aluno (Moita Lopes, 1996:59). A sala de aula de
língua estrangeira é uma ótima oportunidade para discutir essas
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questões, seja através de textos, filmes, poemas, músicas
trazidas para o interior da sala de aula para desmistificar alguns
estereotipos que foram se construindo através dos tempos. E
assim sendo possível fazer boas discussões nas aulas de língua
inglesa fazendo com que o aluno perceba que a língua inglesa é
necessária sim, mas como um instrumento de comunicação com
o mundo e não como sendo uma língua desse ou daquele país.
Com essas discussões o aluno vai perceber que a língua inglesa
não vem como instrumento de aculturação ou dominação e sim
como uma maneira de dominar o instrumento de comunicação
daqueles que nos dominam. Pois é a partir do momento que
domino os instrumentos que o dominador domina é que passo a
poder me comunicar com ele.
" O ensino de línguas estrangeiras deve enfatizar que os
estereótipos atribuídos a cada povo, inclusive o nativo, não são
absolutos, ou seja, nenhum povo é desse ou daquele jeito. O ser
humano é complexo e alguma variação mais genérica de
comportamento que possa existir não se deve a características
inerentes aos povos. " ( Moita Lopes, 1996:32)
A pesquisa abaixo, foi feita com intuito de utiliza-la nesta
comunicação, foi realizada em 1998 com professores do Ensino
Fundamental e Médio de Língua Inglesa da Rede Estadual de Ensino
do município de Cascavel. Esta pesquisa foi feita com 10 professores.
Observando o quadro abaixo podemos perceber quais são
os estereótipos que ficam mais evidentes . Mas na opção
"trabalhador", os professores responderam o mesmo tanto para
o povo brasileiro quanto para os povos de língua inglesa.
Embora se tenha discutido muito, ultimamente, sobre a
abordagem comunicativa de se ensinar uma língua estrangeira e
que, com essa língua se objetiva trabalhar de uma forma
integrada, ainda há grandes barreiras a serem vencidas por parte
dos professores de Língua Inglesa, que ainda não conseguiram
se desvencilhar da forma estereotipada de ver o ensino de
línguas como uma elevação sempre da cultura do outro e a
desvalorização da sua. Quando paramos para analisar o quadro
abaixo, percebemos que os adjetivos que dão sempre a
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conotação de descompromisso estão atribuídos aos brasileiros,
como: brincalhão, desonesto, romântico, informal e
indisciplinado. Isso revela que os professores, quando
trabalham com a Língua Inglesa, passam esses conceitos a seus
alunos quando estão em sala de aula e certamente irão de
alguma forma refletir na vida futura desse educando, fazendo
com que o mesmo não se aperceba, enquanto cidadão, de um
país que é oprimido por países que dominam economicamente.
Passando assim a valorizar os povos e costumes de quem fala a
Língua Inglesa como: honestos, sérios, educados, realistas,
formais e disciplinados. Acredito que todos esses valores que
foram colocados aqui são muito sérios e que comprometem a
atuação desse aluno como cidadão de um país que está
passando por dificuldades sérias e que, mais do que nunca,
precisa de cidadãos comprometidos com o seu país, ou seja,
“BRASIL”.
Paulo Freire (1987: 150) faz algumas considerações sobre
invasão cultural e diz que “invasão é uma forma de dominar
econômica e culturalmente o invadido ... Quanto mais se
acentua a invasão, alienando o ser da cultura e o ser dos
invadidos, mais estes quererão parecer com aqueles: andar
como aqueles, vestir à sua maneira, falar a seu modo”. E dessa
forma nós, professores, se não fizermos uma reflexão sobre que
tipo de alunos queremos, vamos contribuir para a perda da
nossa identidade cultural.
Como bem coloca ainda Paulo Freire (1987: 156), “a
reconstrução da sociedade, que não se pode fazer
mecanicistamente, tem, na cultura que culturalmente se refaz,
por meia desta revolução, o seu instrumento
fundamental”.Quero salientar que, de forma alguma, estou
negando que, ao se ensinar uma língua estrangeira, seus
aspectos culturais não sejam importantes enquanto informação
para quem está aprendendo e até para fazer um contraponto
com a sua cultura. Mas isso não indica que devemos negar as
nossas raízes e costumes em detrimento de outra.
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Conforme segue, está o questionário aplicado aos
professores.
Tabela retira do livro: Moita Lopes, Luiz Paulo da.
Oficina de Lingüística Aplicada. A natureza social e
educacional dos processos de ensino aprendizagem de línguas.
Campinas, SP. Mercado de Letras, 1996.
Faça um x ao lado do adjetivo que melhor
caracteriza o povo brasileiro e os povos de língua inglesa. Se
tal descrição é irrelevante, faça um x no traço do meio:
Povo Irrelevante Povos de Sem resposta
brasileiro língua inglesa
a. honesto 3 1 6

b. desonesto 5 2 3
c. sério 9 1
d. brincalhão 10

e. educado 1 6 3
f. mal-educado 4 2 4

g. trabalhador 6 6 4
h. preguiçoso 3 2 5
i. romântico 10

j. realista 2 5 3
l. formal 9 1

m. informal 10
n. disciplinado 9 1
o. indisciplinado 9 1

Tabela retirada do livro: Moita Lopes, Luiz Paulo da.


Oficina de Lingüística Aplicada. A natureza social e
educacional dos processos de Ensino Aprendizagem de
Línguas. Campinas, SP. Mercado de Letras, l996.
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5. CONSIDRAÇÕES FINAIS
Este texto buscou refletir sobre algumas questões
procurando instigar principalmente os alunos do curso de letras
(habilitação língua inglesa) e professores, tentando provocar
uma reflexão e nos questionar. Que tipo de alunos queremos,
um aluno passivo que não reflete sobre sua cultura e só se
percebe dentro da cultura do outro? Ou um aluno que participa
das discussões que se vê como sujeito e que faz parte do
processo cultural do seu país e por isso reconhece sua cultura e
não a expurga mas sim a valoriza?
Algumas sugestões para trabalho em sala de aula
para desmistificar esses estereótipos . Sempre que trouxer algo
para ilustrar suas aulas com aspectos culturais de língua inglesa
dê um exemplo similar da nossa cultura ou mostre em que
situações fazemos algo parecido. Isso pode ser proposto aos
alunos que procurem algumas manifestações culturais do Brasil
e dos países em que a língua inglesa é falada seja em forma de
cartazes, teatro , etc., e faça uma amostra na escola.

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

1. ALMEIDA FILHO, José Carlos Paes de. Dimensões


Comunicativas no Ensino de Línguas. Campinas-SP.
Pontes, 1993.
2. BANNELL, Ralph Ings. Cultural Politics, Critical Pedagogy
and EFL Education. Anais do XIV - ENPULI Encontro
Nacional de Professores Universitários de Língua
Inglesa.p. 271-283. Belo Horizonte, 1997.
3. DALPIAN, Laurindo. A Língua e o acesso á Cultura .
Signos. Ano XVII, n. 27, p.49- 54. Lajeado:
FATES/FECLAT, l996.
4. FOLLIET, Joseph. O Povo e a Cultura. Culturas em Debate.
Rio de Janeiro. Ed. Forense, 1968.
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5. MOITA LOPES, Luiz Paulo da. Oficina de Lingüística
Aplicada. A natureza social e educacional dos processos
de Ensino Aprendizagem de Línguas. Campinas, SP.
Mercado de Letras, l996.
6. RICHARDS, Jack. C; Rodgers, Theodore S. Approaches
and methods in Language Teaching. Cambridge
University Press.1986.
7. SANTOS, José Luiz dos. O que é cultura. São Paulo.
Brasiliense, 1983.
8. TOTIS, Verônica Pakrauskas, Língua Inglesa: Leitura. São
Paulo. Cortez, 1991.
9. ULLMANN, Runholdo Aloysio. Antropologia Cultural.
Escola Superior de Teologia. Porto Alegre. São Lourenço
de Brindes, 1980.

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