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ARTIGOS

AS IMPLICAÇÕES DA REFORMA DO ESTADO BRASILEIRO PARA A REFORMA DA


EDUCAÇÃO E DA GESTÃO EDUCACIONAL
THE IMPLICATIONS OF THE BRAZILIAN STATE REFORM TO THE EDUCATION REFORM
AND THE EDUCATIONAL MANAGEMENT

Getânia Fátima Zoia1


Isaura Monica Souza Zanardini2

Resumo: Este artigo tem como propósito tecer considerações que nos possibilitem compreender as
implicações da reforma do Estado brasileiro para a reforma da Educação Básica e da Gestão Educacional.
Para isso, remetemo-nos à identificação do contexto econômico, político, social e ideológico que as
determinam, em suas relações com o movimento internacional de reestruturação produtiva, do final do século
XX, articulado aos condicionantes reformistas neoliberais. Mediante esse contexto explicitamos as razões que
impulsionaram a reforma da Educação Básica e da Gestão Educacional, na década de 1990. Evidenciamos, a
partir das proposições de um novo modelo de gestão, a intencionalidade subjacente à manutenção da ordem
vigente.
Palavras-chave: Reestruturação produtiva. Reforma do Estado. Reforma da educação.

Abstract: This paper aims to make considerations that allow us to understand the implications of the reform
of the Brazilian State to the Basic Education reform and the Educational Management. For this, we refer to
the identification of the economic, political, social and ideological context that determine them, in their
relations to the international movement of the productive restructuring, in the end of the 20th century,
articulating to the neoliberal conditioning reformers. Through this context we make it explicit the reasons that
promoted the Basic Education reform and the Educational Management, in the 1990s. We evidenced from the
propositions of a new management model, the underlying intentionality to the maintenance of the current
order.
Keywords: Productive Restructuring. Stare reform. Education reform.

1
Professora da Educação Básica – Anos Iniciais do Ensino Fundamental na Rede Pública Municipal de Ensino de Cascavel, PR.
Discente do Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Educação, nível de Mestrado da Universidade Estadual do Oeste do
Paraná - UNIOESTE – Campus Cascavel. Membro do GEPPES – Grupo de Estudos e Pesquisas em Política Educacional e
Social. (Rua Silveira, nº 255, Jardim Universitário. Cascavel, PR. CEP: 85.819-140) getaniazoi@hotmail.com. Fone: (45) 3038-
1883/9117-4489.
2
Doutora em Educação. Docente do Colegiado de Pedagogia e do Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Educação, nível
de Mestrado da Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE – Campus Cascavel. Membro do GEPPES – Grupo de
Estudos e Pesquisas em Política Educacional e Social.monicazan@uol.com.br .

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108 As implicações da reforma do estado brasileiro para a reforma da educação e da gestão educacional

INTRODUÇÃO própria reforma engendrada no cenário global do


capital, sob a imposição de novas relações para
Discutir acerca das implicações da reforma assegurar sua manutenção, ampliação e
do Estado brasileiro para a educação e a Gestão concentração face à crise estrutural que se
Educacional remete-nos, necessariamente, à dissemina, dada à contradição que lhe é inerente,
identificação do contexto econômico, político, característica de seu processo sóciometabólico
social e ideológico que a determina, considerando (MÉSZÁROS, 2008; 2009).
que as políticas educacionais não se estabelecem Todavia, a crise do capital da década de
isoladamente, mas condicionam-se aos 1970, serve-se de estratégias econômica, política e
determinantes da política econômica e da política ideológica de atribuir aos estados Keynesiano e
social. desenvolvimentista a culpa pela estagnação,
Nessa direção, faz-se necessário justificando, inclusive, que os desequilíbrios
compreender a reforma do Estado no contexto orçamentários derivavam do excesso dos gastos
internacional de reestruturação produtiva, públicos, principalmente no setor social.
delineado no final do século XX, articulado-a ao Justamente por isso, caracterizavam-na como uma
movimento de globalização e de implementação crise de governabilidade (FIORI, 1997a).
do neoliberalismo, que materializa ações em torno Nesse panorama, a globalização e o
da redefinição do papel do Estado. O Estado é neoliberalismo emergem como reação estratégica
assim entendido como o mediador fundamental a mais uma crise do capital. Seus pressupostos se
para sustentar a liberdade do mercado e para estendem para além do domínio econômico às
assegurar as condições essenciais à manutenção relações sociais e, como movimento global, não
do processo de acumulação do capital. apenas nos países industrializados, mas nomundo
Esse movimento de reformas consubstancia em desenvolvimento.
a introdução do novo modelo de administração A alternativa norte-americana, que delimita
pública denominada gerencial, em evidencia na o início da grande virada no plano político,
propalada crise do Estado brasileiro. Esse mesmo alavancou-se com a vitória dos neoliberais
modelo vem determinando as políticas nacionais Margaret Thatcher, na Inglaterra, nas eleições de
em curso no cenário educacional e tem se 1979 e de Helmuth Kohl, na Alemanha, em 1982.
difundido nas unidades escolares, com A partir de então, com o respaldo desses
implicações especificamente para a Gestão governos, iniciou-se a restauração conservadora,
Educacional, mediante incorporação de novas a revolução financeira global, promovida pela
formas de controle, organização e funcionamento estratégia de desregulação e deflação, na qual o
das escolas. setor financeiro passou a constituir uma espécie
de espaço mundial, ditado pelo sistema financeiro
O CONTEXTO DA GLOBALIZAÇÃO dos Estados Unidos, então adotada nos países
industrializados (FIORI, 1997b).
As discussões ínsitas a reforma da A partir de 1980, o fenômeno da
Educação Básica e da Gestão Educacional globalização delineia a nova ordem política e
remetem-nos, necessariamente, a identificação do econômica, para a gestão do capitalismo,
contexto econômico, político, social e ideológico pressupondo a superação da crise que se
que a determina em suas estreitas relações com a agudizava, refletindo a decadência da hegemonia
reorganização do capital em âmbito mundial. Essa americana.
reorganização vem consubstanciando ações, Em 1989, sob a ameaça de uma nova crise,
programas e projetos em curso para os diferentes o FMI e o BIRD começam a assumir a
setores, com destaque à política social, na qual se administração das políticas econômicas dos países
insere a política educacional, reorganizada a até então nominados do Terceiro Mundo,
contar da década de 1990, com as proposições da mediando às negociações entre o governo
reforma do Estado brasileiro. americano, o setor privado e os governos
A compreensão desse processo não se tomadores de empréstimos. “Consolida-se e
limita apenas às considerações das implicações da generaliza-se a nova estratégia econômica norte-
reforma do Estado para a educação, e americana para sua periferia imediata e para todos
consequentemente para a Gestão Educacional, os que deixam de ser países em desenvolvimento
mas articula-se ao movimento de produção da

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para transformar-se em mercados emergentes” proposições de inserção do nosso país no cenário


(FIORI, 1997a, p.121). de um mundo globalizado, preconizada a partir da
Dessa forma, se estabelece o processo de reforma do Estado (DEITOS, 2012).
globalização na América Latina e em particular no Esse receituário além de redefinir o Estado
Brasil, por meio das renegociações das dívidas especifica “[...] a função que ele ocupa como
externas, atreladas inicialmente as componente da crise e solução para ela no atual
condicionalidades reformistas, com base no estágio de desenvolvimento da sociedade mundial,
ideário neoliberal, derivadas do Consenso de que corresponde ao nome dado de globalização”
Washington. (DEITOS, 2010, p.210).
Destaca-se, ainda que, as reformas À ineficiência do Estado agrega-se, ainda, a
empreendidas na América Latina pressupunham o crise dos paradigmas da razão moderna, dos
equilíbrio fiscal, reduzindo os gastos públicos por princípios epistemológicos, filosóficos, políticos e
meio de reformas administrativas, trabalhistas e culturais, que serviram de sustentação a esse
previdenciárias, e de uma rígida política mesmo Estado. Isso significa que, juntamente com
monetária com vistas à estabilização, seguindo a a crise da hegemonia, temos uma suposta crise
desregulação dos mercados, culminando com a cultural e moral.
privatização e a abertura comercial. Dissemina-se nesse contexto a ideologia da
Todavia, cabe pontuar que, ao pós-modernidade, ligada a um conjunto de
compreendemos a importância da estabilidade que estratégias formuladas para combater os ideais
o Consenso de Washington acabou por que pressupunham a superação do capitalismo
representar, assim como sua indispensabilidade ao com a emergência da crise de superprodução, logo
capital, desvelamos o enigma que consubstancia a ao findar da Era de Ouro do desenvolvimento
promoção de um desenvolvimento equitativo em capitalista. Essa lógica aqui é entendida como a
âmbito mundial. Isso porque a principal ameaça produção teórica que sustenta os interesses do
reside na desordem que a pobreza é capaz de capitalismo no contexto da globalização.
impulsionar. É elucidativo o posto de destaque As bases do pensamento pós-moderno se
que assume a pobreza nas ações econômicas e configuram na década de 1960, mas, pressupondo
sociais em nível mundial. Logo, ela tem de ser a superação da modernidade, se institui como
aliviada e administrada em graus suportáveis, lógica cultural do sistema capitalista financeiro,
visto que pode vir abalar a conquista da propriamente, na década de 1970. Enquanto a
estabilidade (LEHER, 1998). modernidade centrava-se no domínio das
Isso é expressão das contradições inerentes máquinas mecânicas, com o desenvolvimento
ao próprio modo de produção capitalista, calcada tecnológico e produção de novos objetos, a pós-
na exploração de uma classe pela outra, a tal modernidade
ponto que, para assegurar sua manutenção a
própria burguesia precisa criar mecanismos que [...] centra-se no mundo da comunicação,
contraditoriamente mantém a existência do na informática, nas máquinas eletrônicas,
trabalhador (MARX; ENGELS, 2008). na produção de símbolos. Isso significa
Nesse prisma, é importante enfatizarmos que antes de produzir objetos se produzem
os símbolos; ou seja, em lugar de
que “A dominação capitalista internacional
experimentar, como fazia a modernidade,
significou a submissão do desenvolvimento das para ver como a natureza se comportava a
economias nacionais às exigências da reprodução fim de sujeita-la ao desenvolvimento do
do capital em escala mundial” (XAVIER, 1990, homem, a pós-modernidade simula
p.26-27). E, que, particularmente no caso modelos, por meio de computadores, a
brasileiro, esse processo reflete também a forma imagem do objeto que pretende produzir
dependente, característica do modelo de (SAVIANI, 2007, p.424-425).
desenvolvimento econômico adotado. Ou seja, de
uma burguesia absolutamente dependente, porém, A ideologia da pós-modernidade também
coerente com seus próprios interesses (XAVIER, enfatiza o individualismo acima dos interesses de
1990). classe, concebendo um indivíduo flexível,
Da mesma forma justificamos a opção passível às mudanças; propõe olhar à realidade
política e econômica, levada a cabo por um grupo guiando-se pelos conhecimentos advindos da
renomado de intelectuais brasileiros, frente às emoção e da cultura, superando a utilização da

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razão moderna, que primaria pela cientificidade; produtividade em um sistema que os condiciona a
celebra a diversidade e o mercado, ignorando os “vestirem a camisa da empresa”. Dessa forma,
conceitos de classe social e de Estado a favor do reforça-se a necessidade da educação escolar para
mercado, volatizando a possibilidade de superação a formação da mão de obra. Nesse contexto,
do capitalismo; e o princípio da verdade é porém, requisitada como flexível, polivalente e
substituído pelo princípio da eficiência, atribuindo com conhecimentos não apenas de uma
à ciência um caráter pragmático. determinada área, mas gerais; sustentando de
Nessa perspectiva, essa ideologia relaciona- forma ressignificada a teoria do capital humano
se com o neoliberalismo pela lógica inconstante (SAVIANI, 2007).Isso porque, a partir da década
do mercado, pela necessidade de flexibilizar e de 1990,
atender aos anseios da clientela, exigindo, a
redefinição das instituições sociais da A educação passa a ser entendida como
modernidade em crise. Diante de uma nova um investimento em capital humano
racionalidade, que teria em vista a eficiência e a individual que habilita as pessoas para a
flexibilidade, seriam introduzidas novas formas de competição pelos empregos disponíveis. O
acesso a diferentes graus de escolaridade
gestão e de controle do trabalho.
amplia as condições de empregabilidade
Como reação a essa crise também se do indivíduo, o que, entretanto, não lhe
desencadeia a reestruturação dos processos garante emprego, pelo simples fato de que,
produtivos, com a substituição do fordismo pelo na forma atual do desenvolvimento
toyotismo. A partir de então, as grandes fábricas capitalista, não há emprego para todos: a
que agregavam tecnologia pesada, pautadas nos economia pode crescer convivendo com
métodos tayloristas de racionalização do trabalho, altas taxas de desemprego e com grandes
com vistas a atender ao consumo de massa, com a contingentes populacionais excluídos do
produção padronizada e em grandes quantidades, processo (SAVIANI, 2007, p.428).
vai sendo substituída pela introdução da
tecnologia leve, de base microeletrônica flexível, A dita nova racionalidade seria um novo
com produção variada, em pequenas quantidades, artifício utilizado para sustentar ideologicamente
afim de atender determinada clientela (SAVIANI, o novo modelo de acumulação capitalista. Isso
2007). manifesta a necessidade contínua do próprio
Opera-se, assim, a “substituição” do capital, para assegurar sua reprodução.
modelo taylorista-fordista, com a introdução de Assim, concebe-se a crise do Estado, que
novas tecnologias e novas formas de organização nesse movimento de modernização da sociedade,
e controle do trabalho no setor produtivo. A pós- não poderia conviver harmonicamente com
modernidade e o toyotismo impõem um novo formas arcaicas de organização e administração
modo de pensar, sentir, agir, organizar e planejar, oriundas da modernidade, em crise. A partir desse
almejando superar a rigidez característica da pressuposto, ou seja, inserida no contexto da
modernidade fordista, acelerando o tempo de giro globalização, sustentada pelos princípios do
da produção e do consumo. neoliberalismo e pela ideologia da pós-
O modelo toyotista é proposto como modernidade, disseminou-se a reforma do Estado,
alternativa a mais uma crise do capital, dada à que tomaremos para análise a seguir.
necessidade do domínio dos processos, da gestão Consideraremos, para tanto, as proposições
e do controle do trabalho, tendo em vista a assumidas pelas mediações constantes no Plano
manutenção e reprodução do capital. Assim, Diretor da Reforma do Aparelho do Estado, que
reflete na intensificação da exploração da força de se alinham ao receituário preconizado em âmbito
trabalho e extração da mais-valia, com profundas internacional.
alterações no tempo e no espaço, reduzindo o
tempo de duração e, portanto, acelerando e A REFORMA DO ESTADO
intensificando o consumo na lógica do descartável
e do supérfluo. As proposições de reforma do Estado no
Enquanto o fordismo presumia a Brasil, conduzidas por um grupo seleto de
estabilidade no emprego, no toyotismo os intelectuais brasileiros, coordenadas pelo então
trabalhadores disputam constantemente as presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC),
posições, precisamente, aumentando sua convergem com os determinantes da economia

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mundial, preconizando a inserção do país no a forte concentração e centralização de funções,


cenário da globalização (DEITOS, 2012). pela rigidez dos procedimentos, excesso de
Os pressupostos desses liberais condensam- normas e de regulamentos (BRASIL, 1995).
se na irremediável mediação do Estado para a A reforma do Estado propõe a redefinição
sustentação da liberdade de mercado. O Estado é do papel do Estado de administrador e provedor
mediador fundamental no processo “[...] de do desenvolvimento tanto econômico como social
acumulação e reorganização das relações para avaliador, incentivador e gerador de políticas
produtivas e financeiras, selando mais um período de médio e longo prazo. Visa transferir, assim, as
de estabilidade e governança [...]” (DEITOS, atividades que permitem a regulação do mercado
2012, p. 205). para o setor privado, por meio do público não
Ao longo do Plano Diretor da Reforma do estatal. Utiliza, para os serviços competitivos ou
Aparelho do Estado são apresentados os fatores não exclusivos do Estado, um programa de
que produziram a crise da década de 1980, publicização. Porém, assegura o financiamento e
também concebida como uma crise do Estado, em controle com a instituição por intermédio de
um discurso fundamentado historicamente e parcerias entre o Estado e a sociedade (BRASIL,
convincente às mudanças que respectivamente 1995).
precisavam ser implementadas. A ideia, expressa no Plano, é reduzir a
Nessa estrutura, metodologicamente, presença estatal no setor de produção de bens e
define-se a crise do Estado, destacando os serviços, mas permanecer com os subsídios dos
determinantes de uma administração pública que, serviços sociais, com destaque para a educação e a
para corresponder à nova ordem, deveria ser saúde básica, almejando instituir mecanismos que
substituída; prosseguindo com a apresentação das permitam o controle e a participação da sociedade.
três formas de administração pública: Na sequência, justifica-se a necessidade de
patrimonialista, burocrática e gerencial; substituição da administração pública burocrática,
retomando brevemente as tentativas ao longo da marcada pela ineficiência, rigidez e controle dos
história brasileira, em reformar a administração processos para a administração pública gerencial,
pública, a contar da década de 1930, culminando caracterizada pela eficiência e flexibilidade,
com a aprovação da Constituição Federal de 1988, consoante ao atendimento proposto aos cidadãos,
ora caraterizada como retrocesso burocrático; sob a alegação de corroborar com a governança
após, apresenta-se o diagnóstico da situação da (BRASIL, 1995).
máquina administrativa brasileira, versando É interessante frisar que, como alternativa à
acerca dos setores do Estado e seus respectivos essa crise, a proposição centra-se na substituição
tipos de gestão, para, a partir desses setores e suas do modelo de administração pública racional
formas de propriedade instituir a propriedade burocrática para a pública gerencial. Tanto que,
pública não estatal; restando, daí por diante, a para pontuar essa essencialidade o Plano Diretor,
exposição dos objetivos e estratégias a serem pautado em um breve histórico, apresenta as três
seguidas ao longo desse processo (BRASIL, formas de administração pública.
1995). Inicialmente, caracteriza a administração
De acordo com o exposto no Plano Diretor pública patrimonialista, cujo funcionamento
da Reforma do Aparelho do Estado, a crise da atribuído ao aparelho do Estado assemelha-se ao
década de 1980 é definida também como uma prolongamento do poder do soberano, cerceado
crise do Estado, em virtude do modelo de pela nobreza real, composta por servidores e
desenvolvimento adotado por governos anteriores demais auxiliares. Os cargos eram atribuídos
de agir diretamente no setor produtivo, daí a como benefícios, prebendas, dado ao alto
justificativa da reforma para promover a rendimento e a escassez do trabalho, sendo
estabilização e o crescimento econômico, inerente a corrupção e o nepotismo, ditos
corrigindo as desigualdades sociais e regionais inaceitáveis sob a dominação capitalista e a
que se asseveraram em virtude da crise que democracia (BRASIL, 1995).
deteriorou os serviços públicos, juntamente com a Em seguida, situa o surgimento da
crise fiscal e a inflação (BRASIL, 1995). administração pública burocrática, no século XIX,
A crise brasileira, evidenciada por meio da como um meio a defender a coisa pública, res
crise fiscal e pela falência da estratégia de pública, das benesses do patrimonialismo, ligado
substituição das importações, também é atribuída ao nascimento do Estado liberal. De acordo com a

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112 As implicações da reforma do estado brasileiro para a reforma da educação e da gestão educacional

argumentação apresentada no documento, esse Para tanto, a legislação trabalhista no serviço


tipo de administração centra-se no controle rígido público é adjetivada como inadequada, dado ao
dos processos para combater a corrupção e o protecionismo, à estabilidade proporcionada por
nepotismo, perdendo-se na função basilar de meio do ingresso no serviço público por concurso,
servir a sociedade, cabendo ao Estado assegurar a impedindo formas de seleção mais flexíveis; “[...]
propriedade privada e a manutenção da ordem, inexistindo um sistema de incentivos para o
administrando a justiça. profissional, sendo patente a ausência de uma
Finalmente, dada a ampliação das funções política orgânica de formação e capacitação
do Estado nos setores econômicos e sociais, ao permanente e de remuneração condizente com a
desenvolvimento tecnológico e a globalização valorização do exercício da função pública”
econômica, o documento situa, no último cartel do (BRASIL, 1995, p. 28). Para completar, a
século XX, a necessidade de uma administração administração pública não conta com um sistema
eficiente, a pública gerencial, voltada ao de informação e indicadores de desempenho.
atendimento com qualidade ao cidadão, agora O que se destaca é justamente que esses
visto como cliente, pois, contribui com os obstáculos podem ser superados com a
impostos e como pagamento beneficia-se dos administração pública gerencial. Sendo que o
serviços prestados pelo Estado, porém, tendo em sucesso de sua implementação depende,
vista, também, a redução dos custos, desses sobretudo, de mudanças na dimensão
serviços (BRASIL, 1995). institucional-legal, cultural e na dimensão-gestão,
Esse modelo de administração preservaria ou melhor, da capacidade de gestão, da técnica de
alguns princípios da administração pública saber fazer (BRASIL, 1995).
burocrática, mas flexibilizando-os, utilizando E, a partir das atividades constitutivas do
rígidos critérios de mérito para as admissões, um aparelho do Estado, a saber, atividades exclusivas
sistema único e estruturado para as remunerações, do Estado na qual se insere o núcleo estratégico,
regulamentando a carreira, instituindo a avaliação serviços não exclusivos e o setor de produção de
de desempenho e o treinamento sistemático, bens e serviços para o mercado, relaciona suas
voltando-se do controle dos processos para os respectivas formas de propriedade e tipos de
resultados. Além disso, a administração gerencial gestão.
estimularia a competição administrada entre as Assim, para o núcleo estratégico e as
unidades internas do Estado, presumindo a atividades exclusivas do Estado a propriedade
descentralização do poder, também possibilitaria a teria que, obrigatoriamente ser estatal, e o modelo
maior participação de empresas privadas e demais de administração um misto entre burocrática e
organizações da sociedade (BRASIL, 1995). gerencial, visto que, apesar da rigidez, o modelo
Embora o documento esclareça que a burocrático asseguraria a efetividade das decisões,
administração pública não pode ser confundida prioritária neste setor (BRASIL, 1995).
com a administração de empresas, ao longo do Nas atividades não exclusivas do Estado a
Plano, fica evidente que este não apenas se propriedade indicada é a pública não estatal, ou
inspira, mas direciona-se a atender os interesses seja, não é propriedade estatal porque aí não se
privados do capital, embora justifique que a exerce o poder de Estado, também não é
intenção é atender ao interesse público, da propriedade privada porque se trata de um tipo de
coletividade. Ou seja, as leis que regulam o serviço por definição subsidiado, conforme
mercado, na lógica do capital, passam a regular o exposto no Plano. Neste setor,
funcionamento da sociedade, por intermédio dos
serviços ofertados. [...] a definição do regime de propriedade
Assim, sob a argumentação de proporcionar é mais complexa. Se assumirmos que
maior qualidade e eficiência aos serviços sociais devem ser financiados ou fomentados pelo
prestados pelo Estado, justifica-se a introdução da Estado, seja porque envolvem direitos
humanos básicos (como educação e
cultura e das técnicas gerenciais modernas na
saúde), seja porque implicam
administração pública. externalidades envolvendo economias que
Não há dúvidas, portanto, de acordo com o o mercado não pode compensar sob a
exposto no documento, que o aparelho do Estado forma de preço e lucro (educação, saúde,
necessitaria de uma política voltada aos recursos cultura e pesquisa científica), não há razão
humanos, condizente com suas reais necessidades. para que sejam privados. Por outro lado,

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uma vez que não implicam o exercício do O mais interessante é que essas
poder de Estado, não há razão para que Organizações Sociais possuirão maior autonomia
sejam controladas pelo Estado. Se não financeira e administrativa, em compensação será
têm, necessariamente, de ser propriedade exigida maior responsabilidade de seus
do Estado nem de ser propriedade privada,
administradores pelo seu sucesso. Servirão
a alternativa é adotar-se o regime de
propriedade pública não-estatal, isto é, também como mecanismos para desenvolver a
utilizar organizações de direito privado cultura de participação social, diga-se, controle
mas com finalidades públicas, sem fins por parte da sociedade para quem a Organização
lucrativos. “Propriedade pública” é aqui Social presta serviços, uma vez que requer
utilizado no sentido de que se deve dedicar conselhos de administração. Destaca-se bem,
ao interesse público, que deve ser de todos “Adicionalmente se busca uma maior parceria
e para todos e que não visa ao lucro; “não- com a sociedade, que deverá financiar uma parte
estatal”, no sentido de que não é parte do menor, mas significativa dos custos dos serviços
aparelho do Estado (BRESSER- prestados” (BRASIL, 1995, p. 60).
PEREIRA, 2003, p.327-328).
Logo, a crise do Estado abarca também suas
ações e instituições. Sendo assim, a reforma é
Seguindo ainda o critério da eficiência, sob
preconizada também para a educação,
o slogan de oferecer serviços de qualidade e baixo
especificamente para a Educação Básica e sua
custo aos cidadãos, a administração deve ser a
gestão.
gerencial para este setor. Enquanto que para o
setor de bens e serviços para o mercado a
A REFORMA DA EDUCAÇÃO BÁSICA E
propriedade deve ser privada, visto que pode ser
DA GESTÃO EDUCACIONAL
regulada pelo mercado; e como o critério é a
eficiência, recomenda-se também a administração
As proposições concernentes ao
gerencial (BRASIL, 1995).
financiamento e à oferta da educação, presentes
Perante a crise convém reconstruir o Estado
no Plano Diretor da Reforma do Aparelho do
para que, além de assegurar a propriedade privada
Estado, alinham-se ao cenário internacional de
e os contratos, atue juntamente com o mercado no
globalização do capital, difundidos e assumidos a
gerenciamento da economia, reduzindo as
partir da Conferência Mundial de Educação para
desigualdades sociais (BRASIL, 1995).
Todos.
Assim, por meio da reforma do aparelho do
Nessa Conferência propôs- se a
Estado, objetiva-se modernizar o Estado e torná-lo centralidade da Educação Básica e sua essencial
eficiente com a implementação da administração
contribuição para a superação dos problemas
pública gerencial, torna-se, também,
mundiais da contemporaneidade, dentre os quais
imprescindível aumentar sua governança,
se destacam o aumento da dívida externa, a
promover a descentralização a partir da criação
estagnação e a decadência econômica, o aumento
das Agências Autônomas e Organizações Sociais,
da população e as diferenças econômicas entre as
instituindo nas atividades não exclusivas do
nações.
Estado a propriedade pública não estatal, como
Essa Declaração fomenta investimentos em
alternativa para a privatização e a terceirização
políticas de cunho econômico, social e cultural,
(BRASIL,1995).
voltados à população e ao futuro dos países,
Em síntese, a reforma consiste em
mobilizando recursos financeiros públicos ou
descentralizar o poder do Estado, transmudando
voluntários, promovendo um maior envolvimento
de um Estado executor para avaliador,
solidário no cenário internacional, convocando os
incentivador e promotor de políticas de médio e
organismos financeiros a prestarem auxílio aos
longo prazo. Institui nas atividades exclusivas do
países com maiores dificuldades para promover a
Estado as Agências Autônomas, ou seja, as
universalização da Educação Básica.
autarquias e fundações que vinculadas as
Metodologicamente, isso denota rever as
atividades exclusivas do Estado, serão
práticas que estariam desvirtuando a função
transformadas em Agências Autônomas, e, no
primordial da educação, para o ideário neoliberal,
nível dos serviços não exclusivos as Organizações
de servir a lógica do capital, cabendo adequá-la à
Sociais, seguidas pelo projeto de publicização.
nova racionalidade em voga, a saber, da ideologia
da pós-modernidade.

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114 As implicações da reforma do estado brasileiro para a reforma da educação e da gestão educacional

Essas proposições materializam-se na Mello (1990) afirma que, por intermédio da


implementação de Referenciais, Parâmetros e educação, o Brasil poderia se desenvolver e
Diretrizes Curriculares, abrangendo desde a superar a ineficiência apontada neste setor com a
Educação Infantil até o Ensino Médio, por meio implementação da descentralização, autonomia e
de Programas e Projetos à eles articulados, dentre democracia participativa.
os quais destacamos o Fundo de Manutenção e Assim, a lógica da eficiência, guiada pelo
Desenvolvimento do Ensino e Valorização do mercado, deveria ser transportada também para a
Magistério (FUNDEF), substituído pelo Fundo de Gestão Educacional sob a justificativa de
Manutenção e Desenvolvimento da Educação gerenciar tanto as ações implementadas como os
Básica e de Valorização dos Profissionais da resultados a serem obtidos. Visa-se, por fim, o
Educação (FUNDEB), o Programa Dinheiro sucesso da reforma da Educação Básica que,
Direto na Escola (PDDE), o Programa de consoante à reforma do Estado, pressupõe a
Merenda Escolar (PME), o Projeto Escola Jovem, superação de problemas técnicos para alavancar a
O Sistema Nacional de Avaliação da Educação eficiência no setor educacional, tendo como eixo
Básica (SAEB) e o Exame Nacional do Ensino sua relevância para o desenvolvimento econômico
Médio (ENEM). e respectiva redução dos índices de pobreza
Das orientações, programas e projetos (MELLO,1990).
acima citados todos se associam fortemente ao A ineficiência, apontada neste setor, seria
lema aprender a aprender. Consoantes, portanto, superada com a introdução de um novo modelo de
às recomendações presentes no Relatório Jacques gestão, evidentemente, o mesmo preconizado pela
Delors, voltados à formação de hábitos, valores, reforma do Estado, pautado nos mecanismos de
habilidades e atitudes requeridos em uma descentralização, participação, autonomia e
sociedade globalizada. avaliação de resultados, voltados à preocupação
Esses “conhecimentos” e competências com a qualidade e a equidade, primando pela
elementares são concebidos como ferramentas eficiência, frente à racionalização e a
indispensáveis à aprendizagem futura, com produtividade.
conteúdos imanentes à ética voltada à Parte-se, então, do pressuposto de que há
responsabilidade, condensam uma concepção de um erro de racionalidade, visto que a ineficiência
justiça social, que, sem cair em anacronismos, na da escola se deve a falta de eficiência da gestão
mesma proporção em que prega o respeito às dos seus recursos, jamais por sua escassez.
diferenças, estimula a competição, com destaque Como vimos, assim como a reforma do
ao esforço pessoal. Estado propõe a desburocratização e
Da mesma forma, a concepção de Educação modernização da administração pública, as
Básica, bem como seus aspectos cognitivos e mesmas proposições se estendem à gestão dos
morais são prescritos em consonância com o sistemas e unidades escolares. É preciso,
mesmo Relatório, que orientou a elaboração dos sobretudo, enfatizarmos que a eficiência da escola
Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), e demais políticas sociais requer na verdade o
servindo de sustentação para a elaboração dos controle político, ideológico e financeiro das
currículos no Brasil. Ou seja, tem servido para instituições, possibilitando a instituição da
orientar as reformas empreendidas desde 1990, propriedade pública não estatal, e da
expandindo-se para além das escolas “[...] administração pública gerencial, voltada à redução
passando por ambientes empresariais, de custos, porém, regulada pelo Estado.
organizações não governamentais, entidades A elaboração do Ministério da Educação
religiosas e sindicais, academias e clubes (MEC), a partir da Lei de Diretrizes e Bases da
esportivos, sem maiores exigências de precisão Educação Nacional 9.394/96, atende
conceitual e rigor teórico [...]” (SAVIANI, 2007, eficientemente as proposições da reforma do
p.432). aparelho do Estado, via programas e projetos
O Relatório Jacques Delors, orientados para a descentralização dos recursos.A
ideologicamente, advoga a educação como meio ideia central, desses programas e projetos,
para garantir uma convivência harmônica no consiste justamente no princípio da racionalidade,
quadro do capital, no ideário da globalização. Daí, ao enviar recursos diretamente para as instituições
a difusão da ideia de rever as relações postas entre escolares, ao mesmo tempo, eliminar possíveis
Estado e educação. desvios dos recursos, bem como, envolvê-las e

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ZOIA; ZANARDINI 115

responsabilizá-las pelos resultados. Ou seja, por direcionando a centralidade das discussões e


intermédio da descentralização e autonomia, é encaminhamentos para o campo educacional.
possível introduzir novas e modernas formas de As considerações convergem, portanto, com
gestão com a participação da comunidade para a a análise de (SHIROMA, 2011), corroborando
respectiva fiscalização e prestação de serviços com a tese de Roger Dale, acerca da existência de
voluntários, promovendo uma forma de gestão, uma agenda globalmente estruturada para a
dita democrática. educação, com expressiva participação dos
Reafirma-se, dessa maneira, que não há organismos internacionais, direcionada à
falta de recursos e sim problemas na gestão formação e disseminação da administração
desses. Logo, não são os recursos que podem pública gerencial entre os gestores e professores,
melhorar a eficiência da escola, mas o elemento expandindo-se ao envolvimento, consentimento e
humano. Daí justifica-se a formação do diretor participação da sociedade em geral, em
nos moldes gerenciais. consonância com os ditames derivados da reforma
A participação e a autonomia permitidas do Estado brasileiro, que vem determinando até o
requerem a competição administrada, mediante presente, o curso da política educacional no
um sistema de monitoramento para divulgar e Brasil.
cobrar resultados. Ou seja, somente são permitidas
na medida em que são manipuladas ao encontro CONSIDERAÇÕES FINAIS
dos interesses do capital.
De forma análoga, mesmo sendo transferido De acordo com o exposto neste artigo,
para as Organizações Sociais o Estado assegura o destacamos que, o processo de globalização,
controle administrativo da educação vinculando disseminado no final do século XX, assim como
aos contratos de gestão o controle dos resultados e todo o arauto que lhe serve de sustentação,é
os indicadores de desempenho, obtidos pelos prescrito como estratégica solução à mais uma
sistemas de avaliação; alinhando-se às exigências crise do modo de produção que, dada às
dos organismos internacionais. contradições emergentes entre capital e trabalho,
Paradoxalmente, mas coerente com a necessita da intervenção estatal para assegurar sua
análise prescrita, por intermédio das avaliações produção e reprodução.
intensifica-se o controle do trabalho, embora Para sua sustentação são fundamentais a
negado na perspectiva do discurso, mas coerente manutenção do poder e a difusão de uma dada
com o modelo taylorista, materializado, na medida ideologia. Assim, para se reafirmar, as
em que aufere a padronização dos métodos no proposições disseminam-se via reformas, em um
intuito de atingir resultados de excelência, aparato econômico, político, social e ideológico
inclusive, mediante adoção de mecanismos de para os diferentes setores, que visam, acima de
premiação, como estímulo e competitividade. tudo, a hegemonia das economias centrais e a
Dentre essas instituições, requisitadas a estabilidade em âmbito mundial. No caso do
adequar-se a nova racionalidade, estão as Brasil, materializadas nas proposições assumidas
instituições escolares, que acabam cumprindo a partir da reforma do Estado, da década de 1990.
determinada função, como requer o contexto Nesse panorama, as proposições, com
econômico, político, social e ideológico. Pois, na destaque à política social, na qual se insere a
medida em que são ineficientes dificultariam a política educacional, indicam alinhamentos às
introdução do Brasil no cenário de um mundo recomendações preconizadas em âmbito mundial.
globalizado, focalizando, dessa forma, para o Convergem, portanto, com a existência de uma
setor educacional a responsabilidade pelas “agenda globalmente estruturada para a educação”
desigualdades econômicas e sociais, que na (SHIROMA, 2011).
verdade são derivadas da ordem econômica e Face essa estrutura, à educação é delegada a
social, acabando por coroar a educação como função de assumir a responsabilidade pela crise, e,
redentora da sociedade (XAVIER e DEITOS, na mesma medida, impedir o desvelamento do
2006). contexto em que são produzidas as desigualdades
A educação assume, assim, a função econômicas e sociais, oriundas do próprio modo
ideológica de impedir o desvelamento do contexto de produção capitalista, tendo como princípio
em que são produzidas tais desigualdades, basilar assegurar a produção e reprodução das
condições essenciais à sua manutenção.

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116 As implicações da reforma do estado brasileiro para a reforma da educação e da gestão educacional

Contudo, partimos do pressuposto de que, MELLO, Guiomar Namo de. Social Democracia e Educação:
como política social, as proposições para a teses e propostas. In: MELLO, Guiomar Namo de. Social
Democracia e Educação: teses para discussão. São Paulo:
educação são permeadas por constantes embates e Cortez Editora, 1990.
disputas, que se travam entre as classes sociais,
influenciando na implantação da legislação. MÉSZÁROS, István. A crise em desdobramento e a
Dessa maneira, consideramos que, como relevância de Marx. In: A crise estrutural do capital. São
política em disputa, a educação e nesse contexto Paulo: Boitempo, 2009.
as proposições prescritas para a Gestão
________. A educação para além do capital. São Paulo:
Educacional, não são somente determinadas, mas, Boitempo, 2008.
poderão vir a ser, cada vez mais, determinantes
também, na medida em que, paulatinamente, vão SAVIANI, Dermeval. Neoprodutivismo e suas variantes:
sendo colocadas a serviço da classe trabalhadora. neo-escolanovismo, neoconstrutivismo, neotecnicismo (1991-
Assim, os próprios princípios de descentralização, 2001). In: SAVIANI, Dermeval. História das idéias
pedagógicas no Brasil. Campinas, SP: Autores Associados,
participação e autonomia, postos à Gestão 2007.
Educacional, preconizadas pelo programa de
reforma do Estado, constituem-se em um dos SHIROMA, Eneida Oto. Redes sociais e hegemonia:
grandes desafios por meio do qual a comunidade apontamentos para estudos de política educacional. In:
poderá, gradativamente, exercer o controle e o AZEVEDO, Mario Luiz Neves de; LARA, Angela Mara de
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