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Direito Administrativo

NOÇÕES INTRODUTÓRIAS

SURGIMENTO DO DIREITO ADMINISTRATIVO Página | 1

A doutrina especifica que o direito administrativo, surgiu quando ocorreu uma mudança de
pensamento por parte de uma classe crescente na Europa. Esta nova classe era detentora do

poder econômico, tendo em vista terem conseguido esta ascensão em decorrência da


expansão comercial.

Este novo seguimento foi nominado de burguesia, fração da sociedade que não aceitava
mais os excessos cometidos pelo Monarca Luiz XVI, que mesmo tendo na primeira parte de

seu reinado ideias iluministas, acabou sucumbindo frente às necessidades das mudanças
sociais requeridas pelo povo e pela nova classe detentora do capital.

Diante deste fato, deu-se início a reconhecida Revolução Francesa, um ciclo virtuoso que

tinha como finalidade precípua, modificar, revolucionar, modernizar os mecanismos políticos


e administrativos no Estado Francês, entre os anos de 1789 e 1799, o que, consequentemente,

levou ao fim do absolutismo.

Conforme o exposto, a revolução teve a participação inicial e à frente a burguesia, mas não
seria possível se não tivesse a participação popular, já que não seria suficiente para modificar

as bases de um Estado, a manifestação política apenas de uma das classes sociais. A crise
política e social era enorme, o que fez com que a revolução obtivesse um alto grau de

radicalismo, tendo em vista que a sociedade francesa passava por sérias dificuldades naquele
momento.

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Para a história da humanidade a Revolução Jacobina inaugurou um novo momento

civilizatório, posto que fez surgir diversos mecanismos jurídicos, levando a universalização
dos direitos sociais e liberdades individuais, advindas da Declaração do Homem e do

Cidadão. Página | 2

Notadamente, que este novo movimento jurídico e político, inaugurou o processo de


consolidação do sistema Republicano, baseado na participação e representação popular, o

que posteriormente foi denominado de democracia representativa, como a que hoje é


apresentada por John Rawls. Como se vê, as ideias do iluminismo foram determinantes para

que este levante pudesse ocorrer e obter o respectivo sucesso.

ONDE E QUANDO SURGIU O DIREITO ADMINISTRATIVO

Diante destas premissas, o direito administrativo surgiu na França como consectário de todos

os instrumentos jurídicos criados durante a revolução no fim do século XVIII e início do século
XIX, tendo seu reconhecimento como ramo autônomo do direito no início do processo de

desenvolvimento do Estado de Direito, calcado no princípio da legalidade e da separação


dos poderes.

Importante ressaltar que devido à criação do Estado de Direito e a sua consequente

necessidade de garantir um mínimo de segurança na relação entre Administração Pública e


os administrados, foi preciso criar ramos autônomos do direito para regular a relação

supracitada, cabendo ao direito administrativo delimitar funções e organizar as ideias


governamentais para assegurar os direitos decorrentes da mencionada relação, garantindo

os interesses gerais da coletividade, chamados de interesse público.

Como dito, diante da necessidade de se organizar o Estado, surge o direito administrativo


como um ramo autônomo do Direito Público, destinado à regular as atividades do Estado,

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ordenar os órgãos e os agentes, direitos e obrigações do Estado e os atos praticados pela

Administração Pública no exercício do poder público, visando satisfazer os interesses


públicos.

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Assim, o direito administrativo originou-se na França, no período pós-revolucionário, com o

Estado de Direito, em uma época tomada pela revolta existente em relação às ideias políticas
que eram juridicamente aceitas.

Nesta época, buscava-se um critério ou uma ocasião específica para determinar quando seria

necessária a aplicação do direito administrativo.

A primeira ideia que fundamentou a aplicação de Direito Administrativo foi a puissance

publique1, ou seja, o poder do Estado em face dos administrados.

Posteriormente, Leon Duguit, na tentativa de substituir a puissance publique pelo conceito


de serviço público, atribuiu a este a base do Direito Administrativo por serem serviços

indispensáveis prestados pelo Estado com o fim de suprir as necessidades gerais da


sociedade, podendo-se concluir que o "poder" é a base do Direito Administrativo, e que este

visa a saciar os interesses da coletividade, sem deixar de regular as ações do Estado.

Todavia, referido entendimento foi seguido por uma crescente discussão que entendia que
não somente o poder era a base do Direito Administrativo, mas também os deveres, já que

estes correspondiam às funções do Estado de Direito, ou seja, garantir a proteção dos direitos
coletivos e individuais. Atualmente, entende-se que o poder é o ato de cumprir um dever, e

o dever é aquela ordem expressa nos textos de lei.

1
Mello, Celso Antonio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Ed. Malheiros, 22ª ed, 2007, p. 43

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Os pensamentos de poder e dever foram frutos das ideias de Rousseau e Montesquieu, as

quais colaboraram para a formação do Estado Democrático de Direito.

Nesse sentido, Rousseau reverberava em seu pensamento que todos os homens eram iguais Página | 4
em sua convivência em sociedade, introduzindo, assim, o princípio da igualdade entre todos

e consequentemente a soberania popular. A base jurídica deste princípio estaria determinada


sob o fundamentando de que os homens são iguais e livres perante a sociedade de modo

que para haver um Poder organizacional era necessário que todos renunciassem uma parcela
de liberdade.

Isso porque, para Rousseau, todos os homens eram igualmente competentes para estarem
no poder, todavia, considerando que não era possível uma detenção simultânea do poder,

elegiam um representante para o exercício desta função. Deste modo, o Poder era visto
como uma divindade ou resultado de determinado fato.

O pensamento de Montesquieu, segundo leciona Celso Antonio Bandeira de Mello 2, era de

que:

Todo aquele que detém Poder tende a abusar dele e que o Poder vai até onde encontra
limites (...). Deveras, se o Poder vai até onde encontra limites, se o Poder é que se impõe, o

único que pode deter o Poder é o próprio Poder. Logo, cumpre fracioná-lo para que suas
parcelas se contenham reciprocamente. Daí sua conclusão: cumpre que aquele que faz as

leis, não as execute nem julgue; cumpre que aquele que julga não faça as leis nem as execute;
cumpre que aquele que executa, nem faça as leis nem julgue. E assim se afirma a ideia de

tripartição do exercício do Poder.

2
Montesquieu, Charles Louis de Secondat, baron de la Brède et de. L'Esprit des Lois. Paris: Garnier Frères, Libraires Éditeurs,

1869, p. 142. Apud MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Op. cit., p. 47

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Isso produz o chamado sistema de "freios e contrapesos", o qual visa impedir a concentração

de poderes, sendo que só o poder é capaz de intervir e limitar a atuação de outro.

Assim, considerando que o poder e o dever cumprem as funções de Estado de Direito, é Página | 5
importante expor seu significado, que para Hans Kelsen3, em sua obra "Teoria Pura do

Direito" é:

"Estado de Direito" neste sentido específico é uma ordem jurídica relativamente centralizada
segunda a qual a jurisdição e a administração estão vinculadas às leis - isto é, às normas

gerais que são estabelecidas por um parlamento eleito pelo povo, com ou sem a intervenção

de um chefe de Estado que se encontra à testa do governo -, os membros do governo são


responsáveis pelos seus atos, os tribunais são independentes e certas liberdades dos

cidadãos, particularmente a liberdade de crença e de consciência e a liberdade de expressão


do pensamento, são garantidas.

Deste modo, pode-se concluir que Estado de Direito é a centralização de um ordenamento

jurídico independente e a garantia da proteção de determinados direitos coletivos e


individuais. Daí que se pode afirmar que sem Estado Democrático de Direto, não há que se

falar em Direito, considerando que referido Estado é marcado pela submissão à ordem
jurídica - do Poder ao Direito, originando o ramo que disciplina e regula a organização e a

relação jurídica entre a Administração Pública e os administrados.

Assim, os pensamentos que formaram o Direito Administrativo são exatamente aqueles que
originaram o Estado Democrático de Direito, ou seja, os pensamentos de Rousseau e

Montesquieu.

3
Kelsen, Hans. Teoria Pura do Direito. São Paulo: Ed. Martins Fontes, 6ª ed, 2003, p. 346
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Portanto, o direito administrativo surgiu com a instauração dos governos subordinados a

uma constituição. Diferentemente dos governos absolutistas que só respeitavam leis de


manutenção de assuntos financeiros e patrimoniais privados.

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O conhecido Estado de Polícia precedeu o direito administrativo. A afirmação do princípio

da divisão dos poderes e a sujeição do poder executivo às normas criadas no poder


legislativo tornou possível a própria eficácia das leis de organização e atividade dos órgãos

da administração pública, além do surgimento de relações jurídicas entre o Estado e os


cidadãos.

A partir do nascimento na França do direito administrativo com a Lei de 28 pluviose, o


mesmo se afirmou a partir da dominação francesa ou da adoção espontânea dos princípios

do governo constitucional pelos mais diferentes Estados.

O CONSELHO DE ESTADO FRANCÊS

O órgão que foi responsável inicialmente pela formação dos institutos jurídicos do Direito
Administrativo, foi o Conselho de Estado Francês. Este era um órgão administrativo no qual

suas decisões formavam jurisprudência e foi responsável pela criação do contrato


administrativo, responsabilidade civil do Estado, entre tantos outros dispositivos que até

nossos dias são utilizados pelo direito público.

O PRIMEIRO CASO DE RESPONSABILIDADE CIVIL NO ESTADO FRANCÊS

Trata-se de um caso de uma garota de 5 (cinco) anos, chamada Agnès Blanco, que, em
1871, ao passar em frente a uma fábrica de tabaco de Bourdeax (Companhia Nacional da

Manufatura do Tabaco – empresa pública), foi atropelada por um vagão, conduzido por 4

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(quatro) empregados, que estavam acabando de sair da referida fábrica, ficando

gravemente ferida ocasionando a amputação de uma de suas pernas.

Assim, diante do acontecimento, o genitor da menina, representante legal da mesma, ora Página | 7
inconformado, ajuizou, em 1872, ação indenizatória contra o Estado, asseverando a

responsabilidade civil (patrimonial) deste frente a falta cometida pelos seus quatro
empregados (faut du service ).

Por essa razão, o ajuizamento da ação ocasionou um conflito entre a jurisdição

administrativa (contencioso administrativo - sendo o Estado parte) e a jurisdição judicial

comum (os particulares) sendo decidido pelo Tribunal de Conflitos, através do voto de
minerva proferido pelo Ministro da Justiça, que a competência para o processamento e

julgamento da ação seria da jurisdição administrativa, ou seja, pela adoção das normas de
direito público já que tratava-se de relação jurídica envolvendo o Estado e o dano

proveniente da realização do serviço público.

Após a corte superior pacificar o conflito de competência, a decisão do Conselho do Estado


concedeu uma pensão vitalícia à acionante que fez com que embasasse e fomentasse a

criação da Teoria do Risco Administrativo estabelecendo a responsabilidade objetiva do


Estado por danos causados pelos seus agentes.

Nesse sentido, é importante mencionar o seguinte trecho da referida decisão:

"Considerando que a responsabilidade que pode incumbir ao Estado os danos causados


aos particulares, causados pelas pessoas empregadas pelo serviço público, não pode ser
regida pelos princípios que são estabelecidos no Código Civil, para as relações jurídicas de
particular a particular; que esta responsabilidade não é plena nem absoluta; que ela tem

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suas regras especiais que variam de acordo com as necessidades do serviço e a necessidade
de conciliar o direito do Estado (direito público) com os direitos privados (direito civil)."

Assim sendo, depreende-se que a competência administrativa é definida por seu objeto, Página | 8
leia-se, o serviço público, estabelecendo, assim, o princípio da ligação, isto é, suas regras

bem como o nexo entre o direito a ser aplicado e sua competência.

AS PRIMEIRAS IDEIAS DO DIREITO ADMINISTRATIVO NO BRASIL

Um destes Estados foi o Império do Brasil, visto que a Constituição de 1824 foi influenciada

verdadeiramente pela da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão.

Exemplos foram à liberdade de ofício, a despeito da escravidão existente no Brasil, e a


influência da Lei de Chapelier que combateu as corporações.

Além destes fatos, temos a divisão dos poderes estatais em Poder Executivo, Poder

Legislativo, Poder Judiciário e Poder Moderador.

Após essa inclusão do direito no país, Veiga Cabral, por volta de 1857, inclui a cátedra de
direito administrativo nas escolas de direito de Recife e São Paulo.

A FORMAÇÃO DO DIREITO

O Direito é o conjunto de normas de conduta, com força coativa, impostas pelo Estado,

traduzindo-se em princípios de conduta social tendentes a realizar a justiça, assegurando a


sua existência e a coexistência pacífica dos indivíduos em sociedade.

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O Direito, para fins didáticos, e como ciência jurídica, é dividido inicialmente em ramos.

Consoante a sua destinação, pode ser interno, internacional, público ou privado. Essa ordem
jurídica pode ser dividida em duas facetas: ordem jurídica interna, quando estabelece os

princípios jurídicos vigentes em cada Estado, respeitados os limites de sua soberania, e ordem Página | 9
jurídica internacional, quando se constitui em regras superiores aceitas reciprocamente pelos

Estados, visando à harmonia entre as diversas Nações, bem como dos indivíduos que as
compõem nas suas relações externas.

RAMOS DO DIREITO

Reconhecem-se dois grandes ramos, consoante a sua destinação:

- Ramo do Direito Público: compõe-se predominantemente de normas que disciplinam as


relações jurídicas, tendo o Estado como parte, seja nas questões internas, seja nas

internacionais, visando a regular, precipuamente, os interesses estatais e sociais, cuidando


apenas reflexamente da conduta individual. Nessa perspectiva, são ramos do Direito Público:

o Direito Administrativo, que é o objetivo deste trabalho e os Direitos Constitucional,


Tributário, Penal, Processual, dentre outros.

- Ramo do Direito Privado: rege as relações entre particulares, tutelando, sobretudo, os

interesses individuais, de modo a assegurar a convivência harmônica das pessoas em


sociedade, além da fruição de seus bens, pensando nas relações de indivíduo a indivíduo.

Esse ramo do Direito compõe-se, notadamente, de normas supletivas que podem ser
modificadas por acordo das partes. São ramos do Direito Privado: o Direito Civil e o Direito

Comercial ou Direito de Empresa, como preferem denominar, após o novo Código Civil, os
autores mais modernos.

* ATENÇÃO!! Regra de direito público ≠ regra de ordem pública.

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BIBLIOGRAFIA UTILIZADA:

https://leticiadantasduarte.jusbrasil.com.br/artigos/1114506178/o-caso-de-agnes-blanco-e- Página | 10
a-responsabilidade-civil-do-estado <acessado em 17.10.2022>.

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 33ª. ed. rev., atual. e

ampl. – São Paulo: Atlas, 2019.

CRETELLA JR. José. Curso de Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Forense, 1989.

Kelsen, Hans. Teoria Pura do Direito. São Paulo: Ed. Martins Fontes, 6ª ed, 2003.

MARINELA, Fernanda. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Saraiva Jur, 12ª Ed., 2018.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. São Paulo: Malheiros, 36ª. Ed., 2009.

Mello, Celso Antonio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Ed. Malheiros,

22ª ed, 2007.

Montesquieu, Charles Louis de Secondat, baron de la Brède et de. L'Esprit des Lois. Paris:
Garnier Frères, Libraires Éditeurs, 1869, p. 142. Apud MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Op.

cit., p. 47.

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