Você está na página 1de 94

Sobre a revista

www.conbrasd.org/revista

E-mail: editorial@conbrasd.br

A Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação é uma publicação eletrônica semestral


do Conselho Brasileiro para Superdotação. Fundada em 2013, a revista tem o objetivo de divulgar
pesquisas, estudos, resenhas, ensaios, relatos de experiências com o intuito de colaborar com a
atuação e formação dos profissionais que trabalham com Pessoas com Altas
Habilidades/Superdotação. A Revista recebe os originais para publicação na edição do primeiro
semestre até o dia 30 de abril e, para o segundo semestre, até o dia 30 de setembro de cada ano.
Uma vez recebidos, os artigos serão encaminhados ao processo de revisão (peer review) entre os
membros do Conselho Editorial ou da comunidade científica especializada, em sistema duplo de
revisão anônima (blind review), ou seja, tanto os nomes dos pareceristas quanto dos autores 2
permanecerão em sigilo. As opiniões emitidas pelos autores dos trabalhos são de sua exclusiva
responsabilidade. Os originais recebidos após essas datas serão encaminhados para avaliação e
eventual publicação no semestre seguinte.

Presidente: Susana Graciela Pérez Barrera Pérez (RS) Soraia Napoleão Freitas (RS) (Presidente)
Vice-presidente: Bartira Santos Trancoso (PR) Mara Eli de Matos (PR)
Primeira secretária: Eliane Regina Titon Hotz (PR) Laura Ceretta Moreira (PR)
Segunda secretária: Paula Mitsuyo Yamasaki Vera Lúcia Palmeira Pereira (DF)
Sakaguti (PR) Denise Maria de Matos Pereira Lima (PR)
Primeiro tesoureiro: Albert Friesen (PR) Nara Joyce Wellausen Vieira (RS)
Segunda tesoureira: Walquíria Rodiani Plaça Andrezza Belota Lopes Machado (AM)
Teixeira (PR) Maria da Penha Benevides (ES)
Vera Alice Pereira da Silva (AC)
Elizabeth Carvalho Veiga (PR)
Larice Bonato Germani (RS)
Maria Alice d’Ávila Becker (AM)
Marli Teresinha Deuner (RS)
Mara Regina Nieckel da Costa (RS)
Maria Alice D’Ávila Becker (AM)
Débora Diva Alarcón Pires (GO)
Carly Cruz (ES)
Sheila Torma da Silveira (RS)
Suplentes:
Graziela Cristina Jara (MS)
Vera Lúcia Palmeira Pereira (DF)
Fabiane Chueire Cianca (PR)
Angélica Shigihara de Lima (RS)
Silvia Helena Altoé Brandão (PR)
Maria da Penha Benevides (ES)
Carly Cruz (ES)
Erondina Miguel Vieira (ES)

Maria Helena Novaes Mira (in memoriam) (RJ)


Eunice Maria Soriano de Alencar (DF)
Zenita Cunha Guenther (MG)
Sara Couto César (RJ)

Angela Mágda Rodrígues Virgolim (DF)


Christina Menna Barreto Cupertino (SP)
Paulo André Norberto (PR)
Rubens Rodrigues Fontes (DF)

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan/jun 2013, p. 2


Corpo Editorial

Editora-chefe: Ms. Mara Regina Nieckel da Costa (Porto Alegre, RS)


Dra. Angela Mágda Rodrígues Virgolim (DF)
Mnda. Angélica Shigihara de Lima (RS)
Ms. Larice Bonato Germani (RS)
Dra. Nara Joyce Wellausen Vieira (RS)
Dra. Soraia Napoleão Freitas (RS)
Mnda. Sheila Torma da Silveira (RS)
3

Dra. Angela Mágda Rodrigues Virgolim (UnB, DF)


Dra. Christina Menna Barreto Cupertino (UNIP, SP)
Dra. Cristina Maria Carvalho Delou (UFF, RJ)
Dra. Denise de Souza Fleith (UnB, DF)
Dr, Juan A. Alonso (Centro Huerta del Rey/Ficomundyt, Espanha)
Dr. Luis Ernesto Gutiérrez López (PUC-Perú)
Dra. Maria Alice D’Ávila Becker (UFAM, AM)
Dra. María Alicia Zavala Berbena (Universidad de Guanajuato, México)
Dra. Nara Joyce Wellausen Vieira (UFSM, RS)
Dra. Soraia Napoleão Freitas (UFSM, RS)
Dra. Susana Graciela Pérez Barrera Pérez (ConBraSD/AGAAHSD, RS)
Dra Yolanda Benito Mate (Centro Huerta del Rey/Ficomundyt, Espanha)

Rubens Rodrigues Fontes (DF)

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan/jun 2013, p. 3


Normas para publicação

Orientações Gerais
A REVISTA BRASILEIRA DE ALTAS HABILIDADES/SUPERDOTAÇÃO, do Conselho Brasileiro para
Superdotação, tem como objetivo veicular artigos e resenhas inéditos na área das Altas
Habilidades/Superdotação e em outros temas que tenham relevância para a mesma área. A revista tem
periodicidade semestral. A Comissão Editorial reserva-se o direito de não publicar artigos referentes a
estudos que foram também submetidos a outros periódicos nacionais ou internacionais, bem como
aqueles encaminhados para livros ou capítulos de livros. O processo de submissão e avaliação de
artigos encaminhados é recebido através do site do CONBRASD. Ao serem submetidos, os trabalhos são
previamente avaliados pelo Conselho Editorial: aqueles que estiverem fora das normas editoriais serão
4
devolvidos aos autores; os demais, encaminhados a pareceristas para avaliação. A identificação dos
autores e instituições não consta no texto enviado para avaliação. A aprovação ou recusa de cada
artigo depende da disponibilidade e agilidade do Conselho Editorial. As submissões que não estiverem
de acordo com as normas serão devolvidas aos autores.

Instruções aos Autores


Ao redigir o seu artigo, solicitamos considerar os itens a serem avaliados, que são:
1) Relevância e abrangência do tema Altas Habilidades/Superdotação;
2) Desenvolvimento e aprofundamento do tema;
3) Estrutura do trabalho;
4) Diálogo com a literatura atualizada em relação ao tema pesquisado;
5) Conclusão e contribuição para área das Altas Habilidades/Superdotação.
Os autores deverão observar as seguintes instruções:
1. O texto poderá ser redigido em língua portuguesa, espanhola, ou inglesa.
2. Deverá estar digitado no editor Word em fonte Arial, tamanho 11, com espaçamento simples,
parágrafo de 1cm e separação de 6 pt entre parágrafos. Os subtítulos ou títulos das seções deverão
estar em negrito, com um espaço de 6 pt antes e outro depois. Se possuir figura, a mesma deverá vir no
formato JPG; se houver tabela ou quadro, estes deverão vir redigidos no Adobe Table ou Excel, com o
seguinte tamanho: largura máxima de 12 cm e altura máxima de 16 cm, inseridos nos locais
adequados do texto.
3. O texto, em geral, deverá ter uma extensão de até 8000 palavras, desconsiderando na contagem o
resumo, abstract e as referências.
4. O(s) nome(s) do(s) autor(es), por extenso deverá(ão) constar logo abaixo do título em português e
inglês e, em nota de rodapé, a titulação, filiação institucional, e endereço de e-mail.
5. Cada artigo deverá ser encabeçado por um título em português (em negrito) e em inglês (ou
espanhol e inglês), e resumo e abstract de, no máximo, 300 e, no mínimo, 200 palavras, em português
e inglês (ou espanhol e inglês). O resumo e o abstract não deverão ser redigidos na primeira pessoa e
deverão conter o foco temático, o objetivo, o método, os resultados e as conclusões do trabalho.
Deverão ser indicadas três palavras-chave, em português e inglês (ou espanhol e inglês). Os textos
devem ser inéditos e podem ser escritos em português, espanhol ou inglês.
6. As notas de rodapé devem ser utilizadas para algumas informações de caráter explicativo, não
excedendo a utilização de 200 palavras.
7. A revisão ortográfica e gramatical é de responsabilidade do(s) autor(es), mas os textos com erros
ortográficos e/ou gramaticais, caso aprovados, serão devolvidos para correção antes de sua
publicação.
8. A redação do texto, citações e referências deverão ser redigidas segundo as normas da ABNT NBR-
6022 e 6023. Sugere-se o uso do More (link: http://www.rexlab.ufsc.br:8080/more/index.jsp), sistema

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan/jun 2013, p. 4


Normas para publicação

gratuito on-line de formatação bibliográfica. Ressalta-se que o seu uso não dispensa a revisão do
artigo.
Prazos de envio:
Para publicação na edição do primeiro semestre, os artigos ou resenhas deverão ser enviados,
impreterivelmente, até dia 31 de abril de cada ano; para publicação na edição do segundo semestre,
até dia 30 de setembro de cada ano.
Instruções para submissão de resenha:
1. A resenha deverá ter cerca de 2000 palavras.
2. Essa produção deverá situar o campo ao qual a obra pertence, apresentar as principais ideias do
autor e realizar uma apreciação crítica, referindo sua contribuição para o contexto teórico e prático na
área das Altas Habilidades/Superdotação.
5
3. Observar as demais instruções para publicação.
Os artigos ou resenhas deverão ser enviados ao Coordenador da Comissão Editorial, pelo e-mail
editorial@conbrasd.org.

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan/jun 2013, p. 5


Sumário

Sobre a revista...............................................................................................................................2
Corpo editorial..............................................................................................................................3
6
Normas para publicação .......................................................................................................4-5
Apresentação ............................................................................................................................ 7
Susana Graciela Pérez Barrera Pérez

Editorial ...................................................................................................................................8-9
Mara Regina Nieckel da Costa

Maria Helena Novaes e a Simplexidade – uma homenagem ............................................. 10-20


Christina Menna Barreto Cupertino

Pessoas com Altas Habilidades/Superdotação: das confusões e outros entreveros ............. 21-30
Susana Graciela Pérez Barrera Pérez; Sheila Torma Rodrigues

Altas habilidades/superdotação por estudantes com altas habilidades/superdotação ...... 31-39


Renata Gomes Camargo; Soraia Napoleão Freitas

Processo de identificação de indicadores de altas habilidades/superdotação em acadêmicos


do PET na UFSM ................................................................................................................... 40-49
Taís M.Barbieri; Rose C. Mendes Oleques; Andressa da Silva Bobsin; Nara Joyce Wellausen Vieira
A identificação de alunos para programas especializados na área das altas
habilidades/superdotação: problemas e desafios .............................................................. 50-66
Angela Virgolim

A criatividade no ensino de atenção às diferenças: reflexões acerca da educação de alunos


com altas habilidades/superdotação ................................................................................. 67-77
Marisa Ribeiro de Araujo; Maristela Lage Alencar

Filhos com Altas Habilidades/Superdotação: sentimentos, dificuldades e expectativas dos pais


.......................................................................................................................................... 78- 86
Paula Mitsuyo Yamasaki Sakaguti; Maria Augusta Bolsanello

A alteridade na constituição da identidade da pessoa com altas habilidades/superdotação


.......................................................................................................................................... 87- 94
Karina Inês Paludo

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan/jun 2013, p. 6


PÉREZ, S. G. P. B. Apresentação

¿Para qué sirve la utopía? Para eso sirve: para caminar.


Eduardo Galeano

Tornar realidade um dos sonhos que a nossa comunidade – pesquisadores, familiares 7


e responsáveis das Pessoas com Altas Habilidades/Superdotação (PAH/SD), professores e, claro,
as próprias PAH/SD - tinha há muito tempo é uma gratificação muito grande para o ConBraSD.
Hoje inauguramos a primeira edição da Revista Brasileira de Altas
Habilidades/Superdotação, uma publicação científica, semestral, que – esperamos –
preencherá uma lacuna nos meios acadêmicos, oferecerá um espaço para contribuir com o
avanço das pesquisas na área de Altas Habilidades/Superdotação de uma forma muito mais
especializada do que é possível em outros meios e fomentará o fértil intercâmbio teórico e
prático dentro do nosso imenso País e com as demais nações.
As publicações científicas também cumprem uma função muito importante, que é
subsidiar a elaboração de políticas públicas e que, no nosso caso, é ainda mais relevante,
devido à falta de dispositivos legais educacionais mais claros, eficazes e eficientes; à
constante violação do direito dos estudantes com Altas Habilidades/Superdotação ao
atendimento educacional especializado e à escassez endêmica de políticas públicas que
beneficiem as PAH/SD nas demais instâncias sociais.
A sistematização e a socialização de experiências bem-sucedidas no Brasil e em
outros países – particularmente nos latino-americanos – é uma fonte inesgotável e rica que
permitirá alimentar e apoiar pessoas e instituições que trabalham com PAH/SD.
Pensar e repensar teorias e criar novas ideias nos permitirá renovar e flexibilizar o
nosso fazer cotidiano.
Mesmo que o longínquo horizonte do qual Galeano fala esteja hoje mais perto,
sempre teremos espaço para caminhar e tornar possíveis todas as utopias sonhadas.

Julho de 2013
Dra. Susana Graciela Pérez Barrera Pérez
Presidente do ConBraSD (2013-2014)
Recebido em 10/06/2013 – Aceito em 30/06/2013

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan/jun 2013, p. 7


COSTA, M. R. N. da Editorial

Afinal, o que representa o lançamento de uma publicação científica sobre o tema


AH/SD? Na trajetória brasileira percorrida nesta temática, registram-se muitas lutas, cursos
realizados em diferentes recantos e eventos que têm cumprido a importante função de 8
congregar vozes, linhas teóricas, posições políticas. Além disso, trabalhos acadêmicos têm
proliferado e pesquisas ganharam mais dimensão. No entanto, ainda não tínhamos um
espaço privilegiado para reunirmos produções sobre as AH/SD. É imenso o nosso orgulho -
como Diretoria do ConBraSD, Comissão Editorial, Conselho Editorial e autores - por estarmos
todos participando deste momento histórico e apresentando a primeira edição da Revista
Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação.
Temos muito a festejar!
Nessa época de tantos desafios, mudanças e liberdades, é preciso que afirmemos,
mais claramente, valores como ética, respeito pelo conhecimento, compartilhamento de
ideias, pluralidade de conceitos, valorização da diversidade. A Revista Brasileira de Altas
Habilidades/Superdotação, embasa-se nestes princípios e é de grande interesse para todos:
- para as pessoas com AH/SD, representa um espaço nobre para exercer seu
protagonismo na busca de atenção às suas singularidades, valorização de suas causas,
defesa de seus direitos e compreensão de suas características;
- para os estudiosos e profissionais, especialmente da Educação e Psicologia,
passa a ser uma referência para sua constante qualificação, fonte de pesquisas e divulgação
dos estudos desenvolvidos no Brasil e fora dele;
- para os familiares, é um espaço de informações sobre o assunto AH/SD e um
incentivo ao posicionamento crítico sobre o atendimento que seus filhos recebem em seu
contexto;
- para os gestores, significa um referencial à organização social e política na sua
abrangência, ao direcionamento de recursos públicos, aos relatos de experiências.
A nossa edição de estreia já nasce grande, na medida em que somos
presenteados por Christina Menna Barreto Cupertino, que divide conosco um tesouro: palavras
de quem melhor representou (e sempre representará) o movimento pelas Altas
habilidades/Superdotação no nosso país! Ninguém mais valiosa do que a querida Maria
Helena Novaes! Ter acesso ao manuscrito dela e entendê-lo pelas palavras da Dra Christina é
um privilégio como poucos. Emocionem-se, aprendam, sintam...
E o que vamos ler nesta primeira edição? O artigo que inaugura a Revista Pessoas
com Altas Habilidades/Superdotação: das confusões e outros entreveros fala da
representação cultural (talvez por isso as autoras Susana Graciela Pérez Barrera Pérez e Sheila
Torma da Silveira tenham escolhido uma expressão regional de sua origem: entreveros!) e das
formas de compreender as AH/SD, as questões culturais, as concepções de inteligência, de
comportamento e de cognição que estão implícitas na identificação dos alunos com AH/SD e
consequentemente no atendimento educacional especializado.
No artigo seguinte - Altas Habilidades/Superdotação por estudantes com Altas
Habilidades/Superdotação – as autoras Soraia Napoleão Freitas e Renata Gomes Camargo

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan/jun 2013, p. 8-9


COSTA, M. R. N. da Editorial

descrevem uma pesquisa que investigou o mundo subjetivo das pessoas com AH/SD sobre si
mesmas e a importância deste conhecimento para a qualificação das oportunidades
educacionais a serem oferecidas para este grupo de alunos.
O Programa de Educação Tutorial é apresentado como O Processo De
Identificação de Indicadores de Altas Habilidades/Superdotação em acadêmicos do PET na
UFSM e destaca a importância da igualdade de oportunidades, o direito ao desenvolvimento
de potencialidades e o respeito aos alunos também nos contextos universitários. As vivências
das pesquisadoras Nara Joyce Wellausen Vieira, Taís Marimon Barbieri, Rose Carla Mendes
Oleques e Andressa da Silva Bobsin foram fundamentais para sua produção.
O texto A identificação de alunos para programas especializados na área das
altas habilidades/superdotação: problemas e desafios aborda questões muito pontuais do
atendimento à área, como a complexidade do processo de identificação, o atendimento aos
9
alunos com AH/SD e distúrbios de aprendizagem, TDAH e Síndrome de Asperger. Angela
Virgolim provoca também reflexões sobre as singularidades da presença de meninas nos
programas especializados.
Outra contribuição desta edição é o artigo de Marisa Ribeiro de Araujo e Maristela
Lage Alencar A criatividade no ensino de atenção as diferenças: reflexões acerca da
educação de alunos com altas habilidades/superdotação, na qual é ressaltada a
necessidade de propostas e políticas que privilegiem as diferenças e o desenvolvimento do
potencial criativo dos alunos.
Em Filhos com Altas Habilidades/Superdotação: Sentimentos, Dificuldades e
Expectativas dos Pais, Paula Mitsuyo Yamasaki Sakaguti e Maria Augusta Bolsanello
apresentam seu estudo, no qual investigaram quais as percepções familiares na relação com
os filhos com AH/SD, ressaltando a relevância das orientações e da multiplicação de
conhecimentos sobre as características deste grupo no seu contexto.
Fechando esta edição, o artigo de Karina Inês Paludo A Alteridade na Constituição
da identidade da Pessoa com Altas Habilidades/Superdotação discute a importância do
“outro” significativo para a construção da identidade e justifica que relações alteras são
imprescindiveis no processo de construção da identidade da pessoa com AH/SD e na
percepção que tem de si mesma.
Como podemos perceber, a Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação
já representa uma fonte valiosa e dinâmica de conteúdo relacionado à temática. Muito nos
satisfaz saber que, em versão online, seremos lidos em qualquer parte do mundo, o que é
mais um motivo de orgulho e de responsabilidade. Sendo assim, esperamos maximizar as
possibilidades de aproximação entre os estudiosos na área, favorecendo a troca e
articulação de esforços científicos para novas conquistas. É a democratização do saber!
Por fim, agradecemos a todos e, em especial, aos membros do Conselho Editorial
que, com sua parceria, poderão atestar, ao longo desta gestão, a divulgação de bons
manuscritos científicos na área das AH/SD!
Boa leitura!

Mara Regina Nieckel da Costa


Comissão Editorial

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan/jun 2013, p. 8-9


CUPERTINO, C. M. B. Maria Helena Novaes e a smplexidade

Maria Helena Novaes e a Simplexidade – uma homenagem

Christina Menna Barreto Cupertino1


No mundo moderno, a eletrônica e a desenvolver novas formas de compreensão,
automação tornam indispensável o exemplificando com sua existência o que é
ajustamento de todos ao vasto ambiente viver uma vida criativa.
global e, como vivemos num meio de
Um exemplo desse movimento é o texto
informação codificada, é preciso
que apresento aqui como homenagem, e
desenvolver no homem novas formas de
que me foi entregue por ela mesma logo
adaptação e outros tipos de percepção da
após um dos congressos do ConBraSD, ao
realidade, a fim de que possa aproveitar das
notar o meu profundo interesse pela
novidades fornecidas pela inovação
apresentação que acabara de fazer. Ao 10
tecnológica.”
entregar-me o papel, disse: Para você, que é
Essas são as palavras de Maria Helena capaz de compreender o que está aqui. É o
Novaes na apresentação de seu livro manuscrito de sua apresentação sobre a
“Psicologia da Criatividade”, de 1971. E “Simplexidade”, intrigante conceito forjado
continua mais adiante: por Alain Berthoz e por ela pesquisado para
poder amenizar nossas angústias diante de
“Como afirma Carl Rogers, para se
um mundo em transformação como nunca
aprender é preciso, primeiramente, não ter
antes se viu, carregado de diferenças por
atitudes defensivas, para se poder expressar
vezes aparentemente inconciliáveis, com o
incertezas, dúvidas, esclarecer problemas e
qual temos que lidar diariamente em nossas
compreender a significação das próprias
práticas de inclusão.
experiências.”
Guardo esse manuscrito como uma joia
Encontro nessas palavras a expressão
preciosa, não só pelo conteúdo pioneiro que
de quem era Maria Helena (ou de algumas
ele carrega, mas também pelo que ele
de suas muitas e fascinantes formas de se
simboliza da relação que ela teve com todas
mostrar a nós), talvez a pessoa mais aberta e
nós, suas privilegiadas discípulas, para quem
menos “defensiva” na exploração de “outros
ela sempre foi o paradigma, como
tipos de percepção da realidade”.
profissional e como pessoa.
A um só tempo detentora de um saber
Considero sua publicação como a mais
enciclopédico e clássico combinado ao
perfeita homenagem que podemos prestar a
interesse e contato profundo com os
Maria Helena, mostrando que seu
estudiosos mais recentes da
pensamento continua vivíssimo entre nós e
contemporaneidade, Maria Helena sempre
que ela permanecerá conosco para sempre.
foi um fator de desestabilização bem
O conceito também não poderia ser mais
humorada, alegre e sensível das nossas
apropriado para traduzir o espírito de Maria
certezas, ao introduzir constantemente em
Helena: aquilo que, em sua simplicidade,
nossas rodas de discussão as tendências mais
carrega o que é complexo.
atuais e provocadoras de nosso tempo.
Mantive-me completamente fiel à
Inesgotável fonte de referências, entre
redação do manuscrito, lembrando que não
nós ela era sempre a que tinha lido a maior
era um trabalho voltado para publicação, e
parte dos trabalhos inovadores sobre as
sim para orientá-la ao longo da
mudanças de paradigma e a vida nesse
apresentação, que foi brilhante. Nesse
nosso conturbado mundo contemporâneo.
sentido, podemos observar ao longo da
Onde a maioria via perplexidade e, muitas
leitura que muitos aspectos são apenas
vezes, a paralisia, o conformismo e mesmo o
mencionados, no que entendo como uma
desastre iminente, um mundo
proposta de nos instigar a buscar o
incompreensível que não tem mais jeito,
aprofundamento dessas questões.
Maria Helena percebia, com sua contagiante
empolgação, o desafio e o estímulo para
_______________________
1
Doutora em Psicologia, especialista em Altas Habilidades. Recebido e aprovado em 15/06/2013.

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan/jun 2013, p. 10-20


CUPERTINO, C. M. B. Maria Helena Novaes e a simplexidade

Muitas afirmações deixam-nos em discussão que estou certa que era a intenção
dúvida quanto à definição dos conceitos, dela ao trazer essas ideias para nós.
que ela ia explicando ao vivo enquanto
Por último, esclareço que para não
falava.
perder o caráter de memória desse
Como complemento a esse aperitivo documento, além de transcrevê-lo
que agora entrego, comprometo-me a literalmente, fiz cópias digitalizadas do
produzir um material de esclarecimento, que original, que alterno com a transcrição, para
possa ser publicado futuramente na revista, que vocês possam aproveitar também sua
não só para esclarecer melhor essa forma de meticulosa caligrafia.
pensar, mas também para promover a

11

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.10-20


CUPERTINO, C. M. B. Maria Helena Novaes e a simplexidade

O conceito atual de simplexidade 12


M. H. Novaes
PH. D. Psicologia
Profª Emérita da PUC-Rio

Em nosso viver cotidiano são evidentes as características do mundo contemporâneo,


como:
 A de uma cultura plural e polifônica
 Novos paradigmas do conhecimento
 O poder da imagem e da realidade virtual
 A passagem da linguagem dialógica para a digital
 A fragmentação e velocidade dos eventos
 As mudanças nos estilos comunicativos
 A efemeridade dos acontecimentos
 As relações descartáveis
 O aparecimento do poder (???)
 A ressonância criativa como fenômeno
 A transdisciplinaridade do saber
 A banalização da vida
Todos concordam em dizer que é “um mundo de complexidade reinante” que leva a
alterar o modelo da causalidade, do conflito das racionalidades procurando articular
contradições e pontos de vista opostos nos novos tecidos sociais e científicos constituídos de
múltiplas tramas.
Como já foi dito, “passamos da época da revolução e da reflexão para a do botão”,
referindo-se ao poder da informática e da televisão.
O fato é que a informação é o novo liquido amniótico da humanidade, passando as
mensagens mais rápidas e simplificadas, onde aparecem variedades de funções cognitivas e
comunicativas através de conexões rápidas das redes de difusão e de uma nova “oralidade”
cultural, por assim dizer.

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.10-20


CUPERTINO, C. M. B. Maria Helena Novaes e a simplexidade

13

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.10-20


CUPERTINO, C. M. B. Maria Helena Novaes e a simplexidade

14
O jornalista Luli Radfahrer, em artigo recente publicado no jornal Folha de São Paulo
com o titulo de “O mundo pacato em que vivíamos”, comenta com muita lucidez: “o atual
mundo conectado surgiu como uma prótese e se transformou em uma infraestrutura, a ponto
de quase só ser percebido quando começa a falhar.” Defini-lo é quase tão difícil quanto
pensar na vida pacata e primitiva que se levava há pouco tempo atrás, quando não havia
uma rede de informações eficiente... No ano 2000 o próprio Google não existia, e não havia
a Wikipédia.
Mas... muita coisa mudou, todos se tornaram mais acelerados e angustiados, a internet
se tornou um organismo vivo e transparente, faz parte da vida de forma tão significativa que
tentar explicá-la demanda um enorme esforço, sabendo que num ambiente digital muita
coisa muda e, ao mesmo tempo, nada se perde.
E tudo mal começou.
Outro artigo da jornalista Marion Strecker, publicado nesse mesmo jornal em 23/092 tinha
como titulo “É complicado ser simples” e escreve que os computadores em geral,vêm com um
monte de fios e peças externas que precisam ser instaladas e conectadas, além de mantidas.
Depois, vêm as dificuldades do uso, o que também acontece com os celulares, as TVs que
estão sempre mudando e com controles diferentes, precisando conviver com várias tomadas
em cada parede. Daí surge a preocupação do mundo tecnológico em melhorar a
usabilidade dos produtos, fazendo com que o controle dos equipamentos seja quase intuitivo,
mas obrigando o usuário a aprender coisas que sabia fazer antes. Conclui: fazer o que já
sabemos fazer, mesmo que seja complicado é, muitas vezes, mais fácil do que fazer o mesmo
de uma maneira nova, ainda que mais simples.

2
23/09/2010, data em que Maria Helena escreveu e apresentou esse texto.
Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.10-20
CUPERTINO, C. M. B. Maria Helena Novaes e a simplexidade

15

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.10-20


CUPERTINO, C. M. B. Maria Helena Novaes e a simplexidade

16
Tais artigos ilustram bem a preocupação de todos com a “complexidade” das coisas, a
“complicação” do viver, e a dificuldade da simplicidade.
Sabemos que um “sistema complexo” é, ao mesmo tempo, mais e menos que a soma
de suas partes, devido à ocorrência de comportamentos coletivos, sempre surpreendentes e
até imprevisíveis. Daí o termo “complexidade da complexidade” ligado ao conceito de auto-
organização. Aliás, Proust, o grande escritos Frances, já dizia: “cada átomo da sociedade é,
por sua vez, complexo e, como num jogo de espelhos, traz um mundo inteiro dentro de si”.
Já um “pensamento complexo” é aquele que reconhece a causalidade complexa,
aceita e valoriza o papel do imprevisto e do caos, alem de se pensar pensante.
Para entender melhor um fenômeno complexo é preciso aceitar que entre causa e
efeito possa existir uma constante relação circular. Daí surgir a ideia de que o “simples” é não
mais fundamento de todas as coisas, mas apenas a articulação entre as complexidades
diversas.
Como essa discussão pode durar muito tempo, procurei aqui encontrar um novo
patamar de compreensão dessas diferenças que possam facilitar a adoção de medidas mais
eficazes e duradouras, respeitando as diferenças encontradas nas várias situações, bem
como os limites impostos pelo próprio sistema sociocultural.
Alain Berthoz, membro da Academia de Ciências e professor do Collège de France, co-
diretor do Laboratório de Fisiologia da percepção e da ação, em livro publicado em 2009,
trouxe uma grande contribuição ao propor o conceito de “simplexidade”, em Paris. Para ele,
consiste em nova maneira de levantar e solucionar problemas para se chegar a ações mais
rápidas e eficazes e até, segundo ele, “mais elegantes”.

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.10-20


CUPERTINO, C. M. B. Maria Helena Novaes e a simplexidade

17

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.10-20


CUPERTINO, C. M. B. Maria Helena Novaes e a simplexidade

18
Tal conceito consiste num conjunto de soluções encontradas pelos organismos vivos
para que o cérebro possa preparar o “ato”, a “ação”, e projetar suas conseqüências. Está
baseado em princípios de modularidade antecipação, cooperação, redundância, que
levam à inovação e invenção.
Esse processo exige uma demanda do inibir, selecionar, ligar e imaginar para depois
então agir, adotando o “melhor” como parâmetro. Considera sempre a noção do tempo e
permite a mudança rápida do pensar e agir, criatividade maior e tolerância, respeitando os
limites da condição humana e da natureza, usando muito a intuição na busca constante do
novo. Consiste, em síntese, numa maneira de viver mais sutil e adaptativa, que parte da
energia do sujeito para explorar suas possibilidades.
Sem dúvida contrapõe-se ao conceito tradicional de “complexidade” e, sobretudo, ao
da “complicação”, o grande problema de todos eles. O mais importante é que leva à
compreensão de que o complexo é simples, se o dominarmos, como subentende o
paradigma da complexidade de E. Morin, que no seu tetragrama coteja ordem X desordem,
interação X organização, como que prenunciando outros elementos como o caos, a
circularidade das ações e a busca de criativas soluções.
O conceito de simplexidade de Berthoz pode ajudar a pessoa a enfrentar o acaso, o
imprevisto, de modo mais consistente, considerando a prevalência do instante e a dimensão
temporal dos espaços vazios e dos não-lugares, na dimensão espacial e as constantes
transformações que ocorrem no cotidiano do ser humano, diminuindo de forma expressiva a
ansiedade, o estresse, a sensação de estar sempre correndo atrás na constante trepidação
da vida moderna.

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.10-20


CUPERTINO, C. M. B. Maria Helena Novaes e a simplexidade

19

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.10-20


CUPERTINO, C. M. B. Maria Helena Novaes e a simplexidade

20
Em suma, contradições e incertezas estão sempre presentes em nossas vidas. Apesar de
mais perplexos e vulneráveis, precisamos encontrar novos caminhos de renovação da
convivência humana, enfrentando o novo e o desconhecido que sempre assusta e nos obriga
a experimentar e inaugurar novas formas de nos adaptarmos a esse nosso mundo.
A própria revolução em marcha no mundo das ciências e da tecnologia prevê uma tal
metamorfose epistemológica, onde se admitirão sistemas irracionais, imprevisíveis e até
caóticos.
O ser humano ameaçado pela massificação, alienação, narcisismo e imediatismo,
sentimentos de ambigüidade constante deseja superar a desordem com o estabelecimento
de novas ordens mais criativas e eficazes. Nesse contexto, talvez o conceito de “simplexidade”
possa ajudá-lo a encontrar ações mais eficazes na busca de uma realização pessoal mais
autêntica e criativa. Como dizia um poeta, “a vida tende a dar certo, nós é que a
complicamos”.
No texto famoso do filósofo, cienasta-ator Charles Chaplin intitulado “Quando me amei
de verdade” destacamos o seguinte trecho:
“quando me amei de verdade deixei de temer meu tempo livre e desisti de fazer
grandes planos. Abandonei os projetos megalômanos de futuro. Hoje faço o que acho certo,
o que gosto, quando quero e no meu próprio ritmo. Hoje sei que isso é simplicidade. Não
devemos ter medo de confrontos. Até os planetas se chocam e do caos nascem as estrelas.”

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.10-20


PÉREZ, S. G. P. B.; RODRIGUES, S. T. Das confusões e outros entreveros

Pessoas com Altas Habilidades/Superdotação: das confusões e outros entreveros

Highly able/gifted people: about confusions and other mixtures

Susana Graciela Pérez Barrera Pérez (ConBraSD/AGAAHSD)3


Sheila Torma Rodrigues (UFSM/AGAAHSD/ConBraSD)4

RESUMO

Apesar de somarem mais de 8 milhões de pessoas das quais 2,5 milhões – como mínimo – são alunos
matriculados nas escolas de Educação Básica e Superior, um número infinitamente menor –
aproximadamente 11.000 alunos na Educação Básica – foram registrados no Censo Escolar de 2012
como sendo alunos com Altas Habilidades/Superdotação (AH/SD). A dificuldade de identificar essas 21
pessoas vem de longa data e está fundamentalmente atrelada à falta de informações e de formação
dos professores que deveriam atender esses alunos na Educação regular e em sala de recursos
multifuncional e aos mitos e crenças populares que a sociedade foi criando para as Pessoas com Altas
Habilidades/Superdotação (PAH/SD). Além dessa representação cultural equivocada que temos como
sociedade, ainda existe um problema maior devido à frequente confusão das AH/SD com a
precocidade, a prodigalidade, a genialidade ou o bom desempenho acadêmico e, em um nível
ainda mais grave, devido à confusão com transtornos como o do Déficit de Atenção com
Hiperatividade (TDAH) e o Transtorno de Asperger, dentre os mais comuns. Neste artigo, apresenta-se a
fundamentação teórica de cada uma dessas condições e as razões que levam às confusões
mencionadas, com o intuito de contribuir com a identificação dos alunos com AH/SD e
fundamentalmente, com o atendimento educacional especializado ao qual têm direito.

Palavras chaves: Altas Habilidades/Superdotação; Educação Especial; identificação.

ABSTRACT

Although they are over 8 million people out of which at least 2.5 millions are students attending schools
(from elementary through university), an infinitely smaller number – about 11,000 students in elementary
and high schools– is recorded in the 2012 Educational Census as being highly able/gifted (HA/GT)
students. The difficulty to identify these persons comes from long ago and is essentially linked to the lack
of information and education of teachers and professors who should serve these students both in the
regular classes and resource rooms, and to the myths and popular believes society has created for
Highly Able/Gifted Persons. In addition to this wrong cultural representation, there is also a greater
problem due to the frequent confusion between HA/GT and precociousness, prodigiousness, genius or
good academic achievement, and, even an more serious issue due to confusion with disorders such as
Attention Deficit/Hyperactivity Disorder (ADHD) and Asperger’s Disorder, among the most common ones.
This paper presents theoretical backgrounds for each of them and the reasons leading to the
abovementioned confusions, aiming at contributing to the identification of HA/GT students, and
especially to the special educational services they are entitled to.

Keywords: High Abilities/Giftedness; Special Education; Identification.

Recebido em: 09/06/2013.


Aprovado em: 05/07/2013.

3
Doutor em Educação (PUCRS), sócia fundadora e Presidente do ConBraSD, membro do Conselho Técnico da
AGAAHSD; membro e delegada de Brasil perante a Ficomundyt e membro do Grupo de Pesquisa CNPq da UNIP
Inteligência e Criação: práticas educativas para Portadores de Altas Habilidades. E-mail: susanapb@terra.com.br
4
Mestranda em Educação (UFSM), especialista em Educação de Bem-dotados (UFLA), professora da Sala de
Integração e Recursos de Altas Habilidades/Superdotação da Secretaria Municipal de Educação de Porto Alegre,
membro da Comissão Técnica do ConBraSD, presidente da Associação Gaúcha de Apoio às Altas
Habilidades/Superdotação, membro da Ficomundyt. E-mail: shetorma@gmail.com

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.21-30


PÉREZ, S. G. P. B.; RODRIGUES, S. T. Das confusões e outros entreveros

Os alunos com Altas matemática, sob uma concepção de


Habilidades/Superdotação (AH/SD) são uma inteligência multidimensional, podemos
importante parcela do público-alvo da afirmar que a precocidade também
Educação Especial; conforme as estimativas acontece em outras inteligências e,
mais conservadoras, metade de todos os parafraseando o autor, com o estímulo
alunos com deficiência juntos. Infelizmente adequado, também poderíamos conseguir
esse número não é sequer conhecido, já que que as crianças desenvolvessem outras
a grande maioria destes alunos permanece habilidades antes do tempo. De fato, se
invisível nas escolas porque os profissionais oferecermos os recursos e estímulos
da Educação desconhecem as necessários a uma criança que tenha maior
características que os identificam por falta de facilidade na inteligência corporal-
formação ou por confusões que são bastante cinestésica, ela poderia, por exemplo,
frequentes. caminhar antes do tempo, o que também 22
constitui uma precocidade. Como Tarrida
É muito comum ouvir falar em criança-
(1997, p. 92) refere, “não se trata de maior
prodígio, criança precoce e gênio como
inteligência, mas de uma ativação de
sinônimos de criança com AH/SD; também
recursos mais rápida e mais cedo”.
ocorrem confusões com patologias como o
Transtorno de Déficit de Atenção com Muitas pessoas apontam a
Hiperatividade (TDAH) e o Transtorno de precocidade na leitura como indicador de
Asperger, por apresentarem sintomas AH/SD; porém, esse não é o único indicador,
semelhantes a alguns comportamentos uma vez que nem todas as crianças com
próprios das AH/SD, assim como também não AH/SD apresentam precocidade. Algumas
é raro ouvir dúvidas sobre se uma criança crianças com Transtorno de Asperger
com AH/SD não seria apenas uma criança também leem antes da idade esperada,
inteligente ou estimulada. mesmo que não tenham total compreensão
sobre o que é lido. As crianças com AH/SD, se
Da confusão com a precocidade leem, desde cedo compreendem o que
leem e o fazem com fins específicos, para
A precocidade é o desenvolvimento de obter conhecimentos.
habilidades antes do tempo previsto para a
maioria das crianças. Uma criança precoce Para Guenther (2000), precocidade não
na leitura, por exemplo, desenvolve essa é sinônimo de potencial, uma vez que os
habilidade antes dos seis ou sete anos, estudos e pesquisas realizados nesta área
quando uma criança qualquer costuma revelam que menos de um terço das pessoas
aprender a ler. produtivas e mais capazes foram crianças
precoces e menos de um terço de todas as
Tarrida (1997, p. 91) afirma que “a crianças precoces estudadas chegou a altos
precocidade é um fenômeno independente níveis de desempenho e produção. Para a
da superdotação e do talento. De fato, sua mesma autora, um dos melhores sinais de
natureza não corresponde a uma produtividade e excelência na vida adulta
determinada configuração intelectual, mas está no interesse intenso, na busca e gosto
trata-se de um fenômeno evolutivo”. por algum tipo de ocupação ou atividade
Segundo o mesmo autor, na criança desde cedo na infância.
precoce, as etapas de desenvolvimento são Normalmente, as crianças com AH/SD
as mesmas que nas demais crianças, porém, costumam ser crianças precoces,
com uma temporização diferente e o nível de especialmente na área em que apresentam
desenvolvimento cognitivo final será o mesmo o comportamento de AH/SD, mas nem toda
que nas demais crianças, mas atingido antes. criança precoce será uma criança com
Afirma o autor (p. 92) que, “com a AH/SD.
estimulação adequada poderia se conseguir
que cerca de 20% da população infantil Winner (1998, p. 13) diferencia as
aprendesse a ler aos 4 anos”. Como Tarrida crianças superdotadas das crianças
discorre sobre a precocidade exclusivamente precoces, explicando que, estas últimas:
nas inteligências linguística e lógico-
Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.21-30
PÉREZ, S. G. P. B.; RODRIGUES, S. T. Das confusões e outros entreveros

[...] requerem suporte adulto extensivo - realizações extraordinárias em qualquer tipo


instrução, apoio e encorajamento – para de atividade real (por exemplo, uma
progredir. Elas não fazem descobertas sobre o
domínio por conta própria. E não apresentam a atividade intelectual, musical ou artística,
fúria intrínseca por dominar, demonstrada pelas etc.)”.
crianças superdotadas. Além disso, elas
tipicamente não alcançam os níveis atingidos Winner e Martino (2002) referem que um
aparentemente tão sem esforço pelas crianças prodígio é alguém que pode dominar um
superdotadas. campo fácil e rapidamente com expertise,
Uma das características da criança que apresenta talentos que se encaixam
precoce é justamente que ela abandona bem nesse campo reconhecido pela
facilmente as atividades se não estiver sociedade como importante.
acompanhada por um adulto que a auxilie e Morelock e Feldman (2002), assim como
estimule permanentemente, simplesmente outros autores, relacionam a prodigiosidade 23
porque ela não consegue vencer os desafios diretamente a uma precocidade extrema em
sozinha. Precocidade não é sinônimo de alguma área e referem que, apesar de haver
AH/SD. uma crença de que as crianças-prodígio
teriam necessariamente elevados escores em
Da confusão com a criança-prodígio testes de QI, os quatro estudos científicos
sistemáticos realizados até a época sobre o
Feldman (1993, p. 189) refere que a tema não conseguiram demonstrar uma
definição que ele costumava dar de relação direta entre elevado QI e
“prodígio” era “uma criança (normalmente prodigiosidade. Feldman (1993, s.p.) refere
com menos de 10 anos) que tem um que “os prodígios parecem ser indivíduos
desempenho no nível de um adulto com talento acadêmico geral médio ou
altamente treinado em um campo de acima da média e talentos em domínios
desempenho cognitivamente muito específicos profundamente poderosos”.
exigente”. Nessa definição, enfatiza-se o
desempenho e não a “inteligência Gardner (1997) comenta que os
psicométrica”; considera-se o prodígio como prodígios podem ter três destinos diferentes
um fenômeno humano que ocorreria com a depois que crescem: alguns deixam de ter o
ajuda de outros seres humanos; enfatizam-se desempenho que tinham temporária ou
os domínios específicos nos quais aparecem permanentemente; outros continuam com um
esses comportamentos e há nela um caráter desempenho de alto nível na vida adulta,
comparativo, visto que é possível medir de tornando-se especialistas e o terceiro grupo
formar razoável o grau de prodigiosidade em são aqueles que se tornam criadores de
relação às normas de desempenho dentro primeira classe. Essa última “transformação
de um determinado campo (FELDMAN, 1993). requer o desejo de se transformar de alguém
As crianças-prodígio costumam se destacar que segue o padrão em alguém que não
na música, na matemática, no xadrez, nos tem equivalente, e a habilidade e a sorte
esportes e na ginástica. O autor (1993) refere para efetuar essa transformação (p. 67)”.
que são poucos os casos de prodígios na Gardner (1997) e Winner (1999)
escrita e, nas artes visuais, são ainda menos assinalam claramente que a criança-
os casos relatados. Poucos ou nenhum caso prodígio, ao contrário do criador, não rompe
de prodígio têm sido relatados nas ciências com as normas estabelecidas, mas tem uma
naturais, na filosofia, na dança ou nas artes excelente performance dentro dos padrões
plásticas, assim como nas áreas que culturais aceitos e valorizados pela
requerem um grande número de anos de sociedade em que vive. O exemplo de
preparação, como a Medicina ou o Direito, Mozart é apresentado por Gardner (1997),
por exemplo. como a criança prodígio que amadureceu e
Shavinina (2009, p. 233) concebe uma conseguiu chegar a ser um Mestre criativo.
pequena alteração na definição de Segundo Gardner (1997, p. 66-67):
Feldman; para ela, o prodígio é “uma
O prodígio é marcado por um domínio fluente,
criança que, antes dos 10 anos, apresenta talvez até fácil, de uma atividade já existente [...]
um desempenho intelectual-criativo e/ou Mas os pequeninos crescem e se tornam adultos,

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.21-30


PÉREZ, S. G. P. B.; RODRIGUES, S. T. Das confusões e outros entreveros

e a novidade termina. De fato, o prodígio unilateral, da atividade criativa em determinada


crescido é indistinguível de seus pares que esfera.
nunca foram prodígios mas que, por meio de
esforço e treinamento, conseguem agir como Um gênio, então, em primeiro lugar é
perfeitos adultos no domínio escolhido.
uma pessoa adulta, já falecida, visto que o
Desta forma, uma criança-prodígio
reconhecimento de toda uma cultura exige
pode ser também uma PAH/SD, mas somente
um afastamento histórico que permita avaliar
o desempenho em nível de um adulto em
a relevância do seu descobrimento ou
uma área especializada até os 10 anos,
invenção. É, como costumamos dizer, uma
aproximadamente não é indicador suficiente
pessoa que estava no lugar certo, na hora
de AH/SD.
certa; como Gardner afirma, um criador com
“C” maiúsculo. O descobrimento ou invenção
Da confusão com o gênio
de um gênio requer, necessariamente, uma 24
A sinonímia entre AH/SD e o termo grande experiência num determinado
“gênio” é bastante comum, especialmente campo e num determinado domínio, algo
na grande imprensa, que costuma usar que uma criança não pode ter pelo simples
expressões como “pequeno gênio” ou fato de não ter vivido o suficiente para isso.
criança-prodígio para nomear crianças com Desta forma, não podemos confundir uma
AH/SD. criança com AH/SD com um gênio.

O gênio foi uma pessoa reconhecida Da confusão com o Transtorno de Déficit de


pela sua grande contribuição para a Atenção com Hiperatividade (TDAH)
Humanidade por toda uma cultura; é um
criador por excelência. Não é raro ouvir as pessoas dizerem que
uma criança é “hiperativa” porque “não para
Winner e Martino (2002, p. 107-108)
quieta” ou “está no mundo da lua”, por
referem que, “muitas vezes, inicialmente um
desconhecerem que a hiperatividade
gênio criativo apresenta talentos que não se
caracteriza apenas um dos subtipos do TDAH.
encaixam totalmente no domínio no qual
É bastante comum que profissionais da área
trabalham e que não se encaixam nos gostos
da saúde, quando não têm conhecimento
estabelecidos do campo”.
sobre as AH/SD, diagnostiquem as PAH/SD
Gardner (1997, p. 62) comenta que “a como pessoas com TDAH, pela semelhança
palavra gênio só deveria designar os que se entre os sintomas do TDAH e alguns
destacavam até mesmo entre os comportamentos de AH/SD.
extraordinários – aqueles raros indivíduos
A Associação Brasileira de Déficit de
cujas sombras dominam a história em épocas
Atenção (ABDA) (2012) define o Transtorno de
sucessivas”.
Déficit de Atenção como “um transtorno
Simonton (2002, p. 115) refere que o neurobiológico, de causas genéticas, que
gênio “não somente nasce (gênio); também aparece na infância e frequentemente
é feito – pelas circunstâncias ambientais nas acompanha o indivíduo por toda a sua vida.
quais o(a) jovem desenvolve seu talento”. Ele se caracteriza por sintomas de
Vigotsky (1931-1998, p. 9) explica a desatenção, inquietude e impulsividade. Ele
genialidade como: é chamado às vezes de DDA (Distúrbio do
Déficit de Atenção)”.
[...] nível superior de talento que se manifesta em
uma máxima produtividade criadora, de Segundo Rohde e Halpem (2004, p.
excepcional importância histórica para a vida S64), a prevalência do TDAH conforme os
social. A genialidade pode revelar-se nas critérios do DSM-IV é de 3 a 6% das crianças
diversas esferas da criação humana: a ciência,
as artes, a técnica, a política, etc. A genialidade em idade escolar, sendo as causas de ordem
se diferencia do talento principalmente pelo genética e ambiental e “como uma
nível e caráter da criação: os gênios são atividade mais intensa é característica de
‘iniciadores’ de uma nova época histórica no seu pré-escolares, o diagnóstico de TDAH deve
âmbito. [...] Normalmente, a genialidade, ao
igual que o talento, é difícil que seja global e
ser feito com muita cautela antes dos 6 anos
multifacética; em geral, trata-se de um de vida”.
desenvolvimento exorbitante, mais ou menos

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.21-30


PÉREZ, S. G. P. B.; RODRIGUES, S. T. Das confusões e outros entreveros

Para os mesmos autores, algumas pistas as tarefas relacionadas a esse interesse, é


que devem ser observadas são a duração extremamente organizada (embora possa sê-
dos sintomas de desatenção e/ou lo a seu modo) e apresenta grande
hiperatividade/impulsividade, presentes comprometimento com a tarefa. Mesmo
desde a idade pré-escolar ou, pelo menos, assim, quando está envolvida em suas
durante vários meses e de forma intensa; a atividades de interesse, sentindo-se
constatação de pelo menos seis dos sintomas desafiada e motivada, pode esquecer
de desatenção e/ou seis dos sintomas de atividades diárias que não considera
hiperatividade/impulsividade descritos no importantes.
DSM-IV- todos eles frequentemente - na vida
Dos sintomas relacionados à
da criança, em vários locais ao longo do
hiperatividade, as atitudes de agitar as mãos
tempo e sem períodos assintomáticos; e a
ou os pés, se remexer na cadeira ou 25
existência de prejuízos clinicamente
abandoná-la em situações nas quais se
significativos causados pelos sintomas, sendo
espera que permaneçam sentadas, bem
cada um deles avaliados cuidadosamente.
como correr ou escalar em demasia, quando
A ABDA (2012, s. p.) explica que o isso é inapropriado, podem ocorrer em
diagnóstico de TDAH requer várias crianças com AH/SD na área corporal-
avaliações, às vezes multidisciplinares, coleta cinestésica, particularmente quando o tema
de informações com pais, cuidadores e e as atividades trabalhadas em sala de aula
escola, além da utilização de escalas para não contemplam essa área. Se as
avaliar a presença e gravidade dos sintomas brincadeiras ou as atividades de lazer forem
e que “não existe, até o momento, NENHUM do seu interesse, as crianças com AH/SD não
exame ou teste que possa sozinho dar seu têm dificuldade alguma em desempenhá-las.
diagnóstico, nem mesmo os mais modernos A atitude de estar frequentemente “a mil” ou
tais como ressonância magnética funcional, muitas vezes agir como se estivesse “a todo
PET, SPECT, eletroencefalograma digital ou vapor” é um comportamento bastante
dosagem de substâncias no sangue ou em comum nestas crianças cheias de energia e,
fios de cabelo”. quando estão em um ambiente estimulante,
podem, também falar muito.
A 4ª edição do Manual de Diagnóstico
e Estatística de Transtornos Mentais (DSM-IV) Os sintomas de impulsividade também
da Associação Americana de Psiquiatria podem ser erroneamente atribuídos à
(1994) diferencia três subtipos de TDAH de criança com AH/SD, pois a antecipação das
acordo com a predominância dos sintomas respostas é algo natural quando dominam o
nos últimos seis meses: Combinado; assunto em discusão e, em consequência,
Predominantemente Desatento e como qualquer criança entusiasmada, não
Predominantemente Hiperativo-Impulsivo. conseguem esperar sua vez para responder e
podem até se intrometer “em assuntos de
As crianças com AH/SD, muitas vezes
outros”. Entretanto, esse comportamento não
têm comportamentos que podem ser
é constante em todos os contextos, como é
confundidos com alguns dos sintomas do
requerido para ser considerado um “sintoma”
TDAH no DSM-IV razão pela qual, quando é
de impulsividade, mas reflexo dessa imensa
feita uma avaliação pouco cuidadosa e sem
“paixão” pelo que gostam e sabem fazer.
conhecimentos sobre as AH/SD,
frequentemente são diagnosticadas como Por isso, é relevante reforçar as
crianças com TDAH. observações de Rhode e Halpem (2004, p.
S63) quando referem que “sintomas que
Os sintomas de desatenção, que levam
ocorrem apenas em casa ou somente na
a confundir a criança com AH/SD com a
escola devem alertar o clínico para a
criança com TDAH, podem ser atitudes
possibilidade de que a desatenção,
frequentes quando a atividade é
hiperatividade ou impulsividade possam ser
desinteressante. Esses comportamentos não
apenas sintomas de uma situação familiar
acontecem em atividades de interesse,
caótica ou de um sistema de ensino
quando ela é extremamente atenta aos
inadequado”; que esses sintomas “sem
detalhes, observadora e persistente, conclui

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.21-30


PÉREZ, S. G. P. B.; RODRIGUES, S. T. Das confusões e outros entreveros

prejuízo na vida da criança podem traduzir flexibilidade, têm dificuldades no campo das
muito mais estilos de funcionamento ou relações sociais.
temperamento do que um transtorno
Conforme Moore (2005), as dificuldades
psiquiátrico” e que a avaliação de cada
de função executiva tornam-se evidentes
sintoma não é apenas a verificação da
quando se espera que os estudantes tomem
listagem de sintomas (RHODE; HALPEM, 2004,
conta dos seus pertences, lidem com tarefas
p. S63).
de etapas múltiplas ou façam tarefas em um
Também é importante recordar que há tempo determinado. Muitos têm problemas
PAH/SD que também apresentam o TDAH e, para começar e parar as atividades. Eles não
nesses casos, o diagnóstico é mais difícil de são preguiçosos e descuidados, apenas
fazer porque as características e carecem de habilidades cognitivas de se
comportamentos de AH/SD modificam os automonitorar e pensar de maneira flexível. 26
sintomas do TDAH e vice-versa, razão pela
A Teoria da Mente é a capacidade
qual é extremamente importante a avaliação
mental para interpretar as ações dos outros
por um profissional capacitado para fazer a
e, assim, poder modular as relações e o
identificação das AH/SD e o diagnóstico do
comportamento social. Para Beyer (apud
TDAH ou por uma equipe multidisciplinar que
BAPTISTA, 2002, p.113-125), essa capacidade
inclua ambos os profissionais.
está presente nas crianças a partir dos quatro
anos, quando evidenciam condições de
Da confusão com o Transtorno de Asperger
interpretar as intenções dos demais, tanto
Com a recente difusão dos reais quanto simuladas. O mesmo não se
conhecimentos sobre o Transtorno de verifica em sujeitos que apresentam déficit na
Aspeger (TA), não é raro encontrar pessoas Teoria da Mente, ou seja, aqueles com TGD.
com AH/SD equivocadamente Para Baron-Cohen, Leslie e Frith (apud
diagnosticadas com esse transtorno e vice- TREVARTHEN, 1996, p. 52), o principal fator
versa. dessa desordem é a incapacidade de
Dentro da categoria dos Transtornos atribuir crenças aos outros. A criança não
Globais do Desenvolvimento - TGD, o TA consegue formar uma imagem mental do
afeta, sobretudo, as relações sociais, fator que pode se passar nas mentes de outras
ocasionado pelo déficit na função executiva pessoas e isso deriva de uma deficiência na
e na teoria da mente. hora de pensar sobre seus próprios estados
mentais, assim como sobre os estados
De acordo com Fuster (apud ROTTA, mentais dos demais. A hipótese sobre a teoria
2006, p.375), as funções executivas são da mente normal é de que seja uma
consideradas "um conjunto de funções capacidade cognitiva inata que aparece
responsáveis por iniciar e desenvolver uma primeiramente no segundo ano de vida, o
atividade com objetivo final determinado". qual também é marcado pelo
Conforme Belisário e Cunha (2010), é o que desenvolvimento da capacidade de uma
permite flexibilizar os modelos de conduta criança brincar utilizando símbolos.
adquiridos pela experiência, para a
adaptação às variações nas situações do Embora tenham uma capacidade de
presente, bem como para a possibilidade de memorização destacada, precisam de ajuda
sincronizar as condutas em função das para guardar e acessar informações mais
intenções, considerando aspectos novos de complexas que expliquem fatos ocorridos e
cada momento e situação. Também estão as suas consequências.
implicadas as mesmas capacidades para O mesmo acontece com a leitura
adequar a escolha de assuntos, de palavras, precoce devido à hiperlexia, que é a
de atitudes, bem como para adiar ou deixar habilidade em decodificar um texto muito
de atender a impulsos para obter um fim cedo, mas sem compreensão no mesmo
social, como, por exemplo, ser bem aceito nível. Podem se alfabetizar aos três anos,
ou conquistar a amizade de alguém. As devido ao fascínio pelas letras e números,
crianças com TA, por não apresentarem esta podendo ler um romance desde cedo sem
conseguir entender o que leem.
Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.21-30
PÉREZ, S. G. P. B.; RODRIGUES, S. T. Das confusões e outros entreveros

O equívoco no encaminhamento de nesses casos a identificação correta exige o


crianças com TA como sendo crianças com envolvimento de profissionais que tenham
AH/SD acontece devido à falta de conhecimentos sobre as AH/SD e sobre o
informação sobre os traços característicos Transtorno ou de uma equipe multidisciplinar
das AH/SD, bem como o comportamento que incluam esses profissionais.
manifestado por estas crianças, embora
algumas delas possam apresentar também Uma Pessoa com Altas
AH/SD. Muitas vezes, o erro provém de uma Habilidades/Superdotação ou apenas uma
concepção de inteligência relacionada criança inteligente?
somente ao poder de memorização e
reprodução de conteúdos ensinados, o que Finalmente, é comum os professores
é um equívocos. e/ou familiares referirem que uma criança
com AH/SD é apenas uma criança inteligente 27
As crianças com AH/SD podem ter ou identificarem como uma criança com
problemas nas relações com seus pares pela AH/SD um estudante que é apenas estudioso
dificuldade em compartilhar seus interesses e e esforçado, tem um bom desempenho
atividades, procurando assim a companhia escolar e boas notas. Essa confusão ocorre
dos mais velhos que são os que podem geralmente, porque quando se pensa em
oferecer uma troca significativa de uma criança “inteligente”, a primeira
conhecimentos e experiências. Também associação que se faz é com o aluno que
necessitam ficar sozinhas, algumas vezes, tem bom desempenho escolar.
para buscar seus interesses e desenvolver
alguma atividade que requer afastamento, Ao identificar nas crianças com AH/SD
mas isto não significa um isolamento total ou três características atípicas (a precocidade,
déficit na cognição social. a insistência em fazer as coisas a seu modo e
a fúria por dominar), Winner (1998, p. 13)
Na área linguística, no que se refere ao refere que elas diferem qualitativamente do
aspecto quantitativo do vocabulário, que costumamos chamar de crianças
pronúncia e quantidade de informações “inteligentes”, que são apenas precoces e
sobre um tema, pode haver semelhança muito estimuladas, ou seja “crianças comuns
entre as crianças com AH/SD e as crianças motivadas a trabalhar duro. Crianças que
com TA, mas há distanciamentos visíveis são alertas, inteligentes e curiosas” e “podem
principalmente no que se refere à habilidade dedicar muitas horas enquanto tentam
pragmática. As crianças com TA apresentam dominar uma área”.
dificuldades e não entendem o que é
transmitido por meio do tom de voz, de Strip e Hirsch (2000, p. 25) comentam
gestos ou ironias, ou seja, não captam o que que, hoje em dia, as crianças tendem a ser
está subentendido. As crianças com AH/SD, precoces pelo grande número de estímulos e
por outro lado, manifestam prazer em que as que são assim favorecidas já
questões que envolvam o pensamento ingressam à escola prontas para aprender,
divergente, a apresentação de muitas geralmente se destacando nos primeiros
respostas ou soluções, bem como em anos escolares:
atividades que possam usar a fantasia, Elas são brilhantes, vivas e muitas vezes,
imaginação e o jogo de ideias. Elas socialmente habilidosas – a ideia do aluno
desenvolvem uma capacidade de superdotado do público (e às vezes dos pais e
professores). Porém, se os adultos observarem
argumentação e questionamento muito essas crianças durante um período de tempo,
grande, assim como também, conforme eles podem notar que, no terceiro ou quarto
Hollingworth (apud Alencar, 2001, p. 177), ano, algumas dessas crianças estão “nivelando-
capacidade de entender e se envolver com se” – ou seja, elas têm um desempenho
questões éticas e filosóficas, antes de equivalente à maioria de seus pares etários.
Ainda são muito inteligentes, mas sua
estarem emocionalmente maduras para lidar capacidade intelectual agora está sendo
com tais questões. desafiada por materiais mais complexos.
Também não deve ser esquecido que
As autoras referem que existem
há PAH/SD que também apresentam TA;
diferenças muito claras entre a criança

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.21-30


PÉREZ, S. G. P. B.; RODRIGUES, S. T. Das confusões e outros entreveros

“esperta” (smart) e a criança superdotada incomodam com relativa facilidade, falando


quanto à velocidade de aprendizagem e sobre suas emoções sem maiores
aplicação de conceitos; ao estilo de dificuldades, enquanto que a criança com
questionamento; aos aspectos emocionais; AH/SD experimenta os sentimentos de forma
ao nível de interesse; à habilidade linguística mais intensa e profunda, podendo inclusive
e à preocupação com a justiça. atrapalhar outras áreas de desempenho, é
apaixonada e pode ser extremamente
Em relação à velocidade de
empática ou ter medo de demonstrar seus
aprendizagem e aplicação de conceitos, as
sentimentos. A criança esperta sabe que os
crianças “espertas” aprendem de forma
relacionamentos têm altos e baixos e pode
convergente e linear, acumulando os fatos
discutir acaloradamente com um amigo e ao
até compreenderem um conceito, adotando
final do dia esquecer tudo; já a criança com
e entendendo as informações apresentadas 28
AH/SD faz investimentos emocionais muito
em aula; enquanto que a criança com AH/SD
grandes nos relacionamentos e fica
aprende de forma divergente e/ou
extremamente desapontada se perceber
rapidamente, pulando as etapas que outra
algo errado ou alguma deslealdade de um
criança seguiria para compreendê-lo,
amigo (STRIP; HIRSCH, 2000).
sintetizando as informações apresentadas e
aplicando-as a situações novas. A criança Quanto ao nível de interesse, as
que é apenas “inteligente” aproveita os crianças espertas são curiosas em relação a
exercícios de fixação e repetição e não tem diversos assuntos, enquanto que as crianças
dificuldades em aprender mecanicamente e com AH/SD são extremamente curiosas sobre
nem em seguir instruções, enquanto que a quase tudo e geralmente mergulham em
criança com AH/SD processa as informações uma área de interesse específica. As crianças
de formas particulares e únicas, é intuitiva na inteligentes trabalham muito e muito
solução de problemas, inverte o processo energicamente e terminam as tarefas
necessário para alcançar a pergunta inicial e conforme solicitado, geralmente para
não gosta de repetição porque costuma agradar algum familiar ou professor; as
aprender logo após o primeiro ou segundo crianças com AH/SD demonstram muita
exercício; se for necessário, consegue seguir energia nas atividades relacionadas à(s)
instruções, mas prefere encontrar formas área(s) de interesse e grande entusiasmo, ao
novas de resolver problemas (STRIP; HIRSCH, ponto de criar suas próprias tarefas e projetos
2000). sem necessidade de muitas orientações ou
sugestões; se envolvem profundamente e
Quanto ao estilo de questionamento, a
podem não terminar as tarefas ou projetos a
criança inteligente faz perguntas que têm
tempo porque se distraem com algum
respostas e as repete mais de uma vez,
aspecto ou parte delas, podendo até ignorar
enquanto que a criança com AH/SD faz
outras áreas (STRIP; HIRSCH, 2000).
perguntas sobre ideias abstratas, teorias e
conceitos que podem não ser fáceis de A habilidade linguística nas crianças
responder e, se repetir a pergunta, inteligentes demonstra-se na facilidade de
geralmente o faz de forma diferente. A aprendizagem de novas palavras,
criança esperta acumula os fatos geralmente adequadas para sua faixa etária,
relacionados a uma mesma tarefa e prefere na compreensão da estrutura da língua e na
que eles sejam apresentados facilidade para aprender línguas estrangeiras
sequencialmente, enquanto a criança com com a prática; nas crianças com AH/SD, o
AH/SD gosta da complexidade, prefere vocabulário é extremamente rico e extenso,
imaginar novas relações, descobrir causas e com conhecimento de nuances das palavras
efeitos, prever novas possibilidades e pode que os demais desconhecem; aprendem
até gostar de respostas ambíguas (STRIP; rapidamente as habilidades linguísticas e
HIRSCH, 2000). novas línguas com extrema facilidade e
rapidez, gostam de jogos de palavras e
Nos aspectos emocionais, a criança
trocadilhos e geralmente superam seus
inteligente demonstra suas emoções e
colegas e inclusive os adultos em termos de
consegue superar incidentes que lhe
linguagem. As crianças espertas esperam sua

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.21-30


PÉREZ, S. G. P. B.; RODRIGUES, S. T. Das confusões e outros entreveros

vez para falar em uma conversação, ALENCAR, Eunice M. S. de; FLEITH, Denise de S.
enquanto que as crianças com AH/SD podem Superdotados: determinantes, educação e
dominar uma conversação pelo entusiasmo ajustamento. São Paulo: EPU, 2001.
pelas ideias, embora às vezes sejam muito
AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION.
quietas e tenham que ser incentivadas a falar
Diagnostic and Statistical Manual of Mental
(STRIP; HIRSCH, 2000).
Disorders. Washington, DC: American
Finalmente, Strip e Hirsch (2000) referem Psychiatric Association, 1994.
aspectos relacionados à preocupação com
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE DÉFICIT DE
a justiça, também diferenciados nas crianças
ATENÇÃO (ABDA). Sobre TDAH. 2012.
inteligentes e nas crianças com AH/SD. As
Disponível em:
primeiras têm opiniões firmes em relação ao
http://www.abda.org.br/br/sobre-tdah/o-que-
que é justo ou injusto, geralmente 29
e-o-tdah.html. Acesso em: 30 nov., 2012.
relacionadas a situações pessoais e
compreendem o raciocínio relacionado a BAPTISTA, Claudio R.; BOSA, Cleonice. Autismo
isso, enquanto que nas crianças com AH/SD, e educação: Reflexões e propostas de
a preocupação é com a justiça e com a intervenção. Porto Alegre: ArtMed, 2002.
equidade de uma forma mais global, tendo FELDMAN, David H. Child prodigies: A
uma compreensão das sutilezas de questões distinctive form of giftedness. Gifted Child
morais e éticas complexas, defendendo seus Quarterly, Fall 1993.
pontos de vista fervorosamente, focalizando e
discutindo a justiça de uma determinada GARDNER, Howard. Mentes Extraordinárias:
situação. Perfis de 4 pessoas excepcionais e um estudo
sobre o extraordinário em cada um de nós.
Passando a limpo Rio de Janeiro: Rocco, 1997.
GUENTHER, Zenita C. Desenvolver
Se há algo em que todos os principais
capacidades e talentos: um conceito de
pesquisadores da área (mesmo que tenham
inclusão. Petrópolis: Vozes, 2000.
definições diferentes) - tanto internacionais
(ver, por ex. GAGNÉ, 1991, 1995, 2009; MOORE, S. T. Síndrome de Asperger e a
LANDAU, 2002; MÖNK, 1991; RENZULLI, 1978, escola fundamental: Soluções práticas para
1986, 1999, 2004; STERNBERG, 2003; WINNER, dificuldades acadêmicas e sociais. São
1998) quanto nacionais (por ex.: ALENCAR e Paulo: Associação Mais 1, 2005.
FLEITH, 2001 e 2007; CUPERTINO, 2008; MORELOCK, Martha J.; FELDMAN, David H.
FREITAS, 2006; FREITAS e PÉREZ, 2012; Prodigies, Savants and William Syndrome:
GUENTHER, 2006; PÉREZ, 2004, 2008, 2009; Windows into Talent and Cognition. In: HELLER,
VIRGOLIM, 2007) - concordam é justamente Kurt A. ; MÖNKS,Franz J. ; STERNBERG, Robert
que 1) as AH/SD não são equivalentes à J.; SUBOTNIK , Rena F. International Handbook
capacidade, potencial ou desempenho of Giftedness and Talent, Oxford: Pergamon,
acima da média somente e 2) que as AH/SD 2002.p. 227-242.
não são sinônimo de precocidade,
prodigiosidade nem genialidade e, claro, ROHDE, Luis A.; HALPERN, Ricardo. Transtorno
também não são sinônimos de TDAH e nem de déficit de atenção/hiperatividade
TA. (atualização). Jornal de Pediatria [Rio de
Janeiro], 2004: p. 61-70.
O grande equívoco nas definições e
encaminhamentos resulta da falta de ROTTA, N. T. et. al. Transtornos da
informações e de formação sobre as AH/SD e aprendizagem: abordagem neurobiológica e
isso tem contribuído para considerar as AH/SD multidisciplinar. Porto Alegre: ArtMed, 2006.
uma patologia e até um transtorno SIMONTON, Dean K. Genius and Giftedness:
psiquiátrico e, o que é mais grave, tem sido, Same or Different? In: HELLER, Kurt A. ;
na escola, um dos grandes empecilhos para MÖNKS,Franz J. ; STERNBERG, Robert J.;
garantir o atendimento educacional SUBOTNIK , Rena F. International Handbook of
especializado que é oferta obrigatória. Giftedness and Talent. Oxford: Pergamon,
REFERÊNCIAS 2002. p. 111-122.

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.21-30


PÉREZ, S. G. P. B.; RODRIGUES, S. T. Das confusões e outros entreveros

STRIP, Carol A.; HIRSCH, Gretchen . Helping


Gifted Children Soar: A Practical Guide for
Parents and Teachers. Scottsdale: Great
Potential Press, 2000.
TARRIDA, A. C. Problemática Escolar de las
personas superdotadas y talentosas. In:
BRAVO, C. M. (Org.). Superdotados.
Problemática e Intervención. Valladolid
(España): Servicio de Apoyo a la Enseñanza,
Universidad de Valladolid, 1997.
TREVARTHEN, Colwyn. Children with Autism:
Diagnosis and Interventions to Meet Their 30
Needs. 2ª ed. London: Jessica Kingsley, 1996.
VIGOTSKY, Lev. S. La genialidad y otros textos
inéditos. Buenos Aires: Almagesto, 1998.
WINNER, Ellen; MARTINO, Gail. Giftedness in
Non-Academic Domains: The Case of the
Visual Arts and Music. In HELLER, Kurt A. ;
MÖNKS,Franz J. ; STERNBERG, Robert J.;
SUBOTNIK , Rena F. International Handbook of
Giftedness and Talent . Oxford: Pergamon,
2002. p. 95-110.

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.21-30


CAMARGO, R. G.; FREITAS, S. N. Altas Habilidades/Superdotação por Estudantes com Altas Habilidades/Superdotação

Altas habilidades/superdotação por estudantes com altas habilidades/superdotação

High abilities/giftedness by students with high abilities/giftedness

Renata Gomes Camargo5


Soraia Napoleão Freitas6

RESUMO

As discussões a respeito da definição de Altas Habilidades/Superdotação –AH/SD- são amplas e estão


sempre sendo atualizadas, principalmente em função da qualificação do entendimento sobre as 31
pessoas com AH/SD, para melhor atendê-las nas suas necessidades educacionais especiais. Neste
sentido, este trabalho objetiva destacar e analisar o que pensam os estudantes com AH/SD sobre o que
significa ou como entendem que se constituem as AH/SD. A metodologia do trabalho foi embasada na
investigação qualitativa (GIL, 2010), a partir da análise de conteúdo (BARDIN, 2011) das falas de 24
estudantes, que frequentam três diferentes programas de enriquecimento extraescolar á respeito do
que acreditam ser AH/SD. Como principal resultado teve-se que o entendimento dos estudantes sobre
AH/SD resulta de uma combinação entre diferentes definições e conceitos. Sendo assim, mostra-se
como importante reconhecer o que estes estudantes pensam sobre AH/SD, o que auxilia a organização
dos diferentes espaços educacionais frequentados por eles a melhor entenderem estes sujeitos, visando
assim, a qualificação das oportunidades educacionais, e até mesmo, sócio emocionais, atendendo às
suas necessidades educacionais especiais, apreciando a singularidade de cada um.

Palavras-chave: Altas habilidades/superdotação. Estudantes. Conceitos.

ABSTRACT

The discussions about the definition of High Abilities/Giftedness -AH/SD- are broad and are always being
updated, mainly due to the qualification of understanding about people with AH / SD, to better assist
them in their special educational needs. In this sense, this paper aims to highlight and analyze what
students think with AH/SD about what it means or how to understand who are the AH/SD. The methodology
of the study was based on qualitative research (Gil, 2010), from the content analysis (BARDIN, 2011) the
speech of 24 students, who attend three different extracurricular enrichment programs about what they
believe will be AH / SD. The main result was that the students' understanding of AH/SD results from a
combination of different definitions and concepts. Thus, it is shown how important to recognize what
these students think about AH/SD, which helps the organization of the different educational areas
frequented by them to better understand these subjects, thereby targeting the qualification of
educational opportunities, and even, socio emotional, given their special educational needs,
appreciating the uniqueness of each.

Key-words: High abilities/ giftedness. Students. Concepts.

Recebido em: 11/06/013


Aprovado em: 05/07/2013

5
Mestre em Educação. Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). E-mail: re_kmargo@hotmail.com.
6
Prof.ª Dr.ª Departamento de Educação Especial. Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) E-mail:
soraianfreitas@yahoo.com.br.

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.31-39


CAMARGO, R. G.; FREITAS, S. N. Altas Habilidades/Superdotação por Estudantes com Altas Habilidades/Superdotação

(GIL, 2010) com eles, sendo que os


Iniciando a discussão responsáveis pelos estudantes assinaram o
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido –
O que é afinal Altas TCLE para participar da pesquisa, bem como
Habilidades/Superdotação? cabe ressaltar que o projeto de pesquisa foi
A resposta é que ainda não existe um aprova pelo Comitê de Ética em Pesquisa da
consenso do conceito/da definição de Universidade Federal de Santa Maria- UFSM.
AH/SD, como apontam Nakano e Siqueira Ao trazer a análise de conteúdo
(2012), apenas indicativos que ajudam a (BARDIN, 2011) para investigar as falas dos
refletir sobre os comportamentos/indicadores estudantes, entre as categorias de análise
e características apresentados por pessoas que compuseram a referida dissertação,
com AH/SD e/ou tentativas de explicar o alto escolheu-se para elaboração deste artigo o 32
funcionamento do intelecto humano em uma estudo da Categoria I: “Características das
ou mais áreas específicas. AH/SD”, à partir da sua subcategoria : “I:
Partindo de estudos sobre as AH/SD que Reconhecimento das AH/SD, ao objetivar
dão embasamento teórico à discussão traçar uma reflexão sobre os conceitos que
proposta para este artigo, desenvolveu-se a giram em torno da definição de AH/SD
reflexão que segue, com o objetivo de combinada ao que pensam os estudantes
destacar e analisar o que pensam os com AH/SD sobre os mesmos.
estudantes com AH/SD sobre o que significa
ou como entendem que se constituem as O que pensam os estudantes com AH/SD
AH/SD. sobre AH/SD?

Este trabalho é parte de um capítulo da Na diversidade de conceitos e


dissertação de mestrado intitulada definições que envolvem a temática AH/SD,
“Estratégias de acessibilidade para e por pensar na “atualização” desses, por meio das
estudantes com Altas pessoas que apresentam AH/SD é uma forma
Habilidades/Superdotação”, sendo que a de perceber o que os estudos têm
discussão feita nesse foi entendida como contribuído para o entendimento delas sobre
importante na pesquisa realizada, porque elas mesmas.
acredita-se que, antes de voltar o foco para
Visando esclarecer a reflexão, foi
a investigação de estratégias de
elaborado o Quadro 1, apresentado na
cessibilidade Educacional, é essencial pensar
sequência, com conceitos chaves que
nas pessoas para as quais estas se
aparecem na definição das AH/SD. Isto, para
direcionam. que participaram da referida
entender os diferentes olhares que
pesquisa.
proporcionam o entendimento das pessoas
O artigo teve sua metodologia com AH/SD, como também, em virtude dos
embasada na investigação qualitativa (GIL, diferentes espaços educacionais que os
2010), a partir de falas de 24 estudantes, que estudantes participam, com destaque para
frequentam três diferentes programas de os programas de enriquecimento
enriquecimento extraescolar7, que extraescolar, partirem de perspectivas
participaram da pesquisa que constituiu a teóricas e conceitualizações diferenciadas:
dissertação de mestrado, por meio da
realização de uma entrevista semiestruturada

7
Programas de enriquecimento extraescolar são
espaços educacionais que oferecem atividades
educacionais direcionadas aos estudantes com AH/SD,
proporcionando experiências que geralmente não são
oferecidas na escola comum, que englobam
conteúdos, informações, materiais e metodologias que
contemplam as necessidades educacionais específicas
dos estudantes, bem como exigem profissionais
preparados para a atuação junto desses (GERSON e
CARRACEDO, 2007; SABATELLA e CUPERTINO, 2007).

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.31-39


CAMARGO, R. G.; FREITAS, S. N. Altas Habilidades/Superdotação por Estudantes com Altas Habilidades/Superdotação

Quadro 1 – Diferentes perspectivas e definições de AH/SD. Elaborado pela pesquisadora.

TALENTO DOTAÇÃO SUPERDOTAÇÃO AH/SD

“Notável superioridade Posse e uso de A superdotação é identificada “No Brasil, é adotado o


em competências capacidade natural através da interação/intersecção termos altas
sistematicamente notável (chamada entre uma tríade de habilidades/
desenvolvidas, aptidão elevada, comportamentos, relacionados Superdotação.
(conhecimento e ou dote), em pelo simultaneamente, porém passível O termo altas
habilidades), em pelo menos os de diferentes intensidades de habilidades dá maior
menos um campo da 10%superiores no apresentação, ao sofrer ênfase ao desempenho
atividade humana, a um grupo de pares influencia do ambiente. São eles: do que as
grau que coloca o etários que são ou habilidades gerais ou específicas características da 33
individuo entre pelo já foram, ativos acima da média, elevados níveis pessoa, enquanto o
menos os 10% superiores naquele campo, ou de comprometimento com a termo “superdotado”
no grupo de pares etários áreas. (GUENTHER, tarefa e elevados níveis de sugere habilidades
que são ou já foram, 2008, p.33) criatividade (RENZULLI 2004; extremas (Alencar, 2001;
ativos naquele campo, RENZULLI e REIS, 2012). Alencar e Fleith, 2001;
ou áreas” (GUENTHER, Virgolim,1997)”
2008, p.33). (CHAGAS, 2007, p. 15).

Ao analisar o quadro, pode-se perceber no momento da concepção –também por


que talento e alta habilidade podem ser acaso- e até o momento, com todo avanço da
ciência [...] Não há nada que a Educação possa
entendidos como conceitos similares, pois fazer para modificar o plano genético, uma vez
ambos apontam para uma destreza superior constituído [...] (GUENTHER, 2006, p. 25).
no desenvolvimento de atividades
Já ao analisar o conceito de
relacionadas a uma ou mais áreas. Apesar
superdotação, o mesmo pode ser definido
de se referir somente a talento, Guenther
por comportamentos/indicadores, uma vez
(2008), explica ambos conceitos, uma vez
que indica relatividade, sendo assim, não se
que talento, nada mais é do que uma
pode negar que a pessoa é superdotada,
habilidade bem desenvolvida, em outras
mas os comportamentos relacionados
palavras, uma alta habilidade.
podem estar mais ou menos aparentes
Talentos representam o que é expresso em dependendo da situação vivenciada.
desempenho, ou resultado do processo de
desenvolvimento daquele talento. Um talento Altas Habilidades/Superdotação
emerge progressivamente pela transformação combinam todos os elementos anteriores,
de aptidão elevada em características e
habilidades bem treinadas, e sistematicamente
pois o conceito atual traz a afirmação que
desenvolvidas, em um campo determinado de uma pessoa com habilidade/potencial
atividade humana (GUENTHER, 2008, p. 34). intelectual superior, possivelmente terá um
excelente desempenho nas atividades
Quanto à dotação e superdotação,
desenvolvidas, relativa à(s) área(s) a(s) qual
ambos os conceitos asseveram que a pessoa
(is) seu potencial está mais associado. Então,
tem uma habilidade/potencial intelectual
“[...] o entendimento de que as altas
superior, porém o segundo considera a
habilidades se relacionam tanto com o
importância da influência do ambiente na
desempenho demonstrado quanto com a
manifestação deste, e o primeiro conceito
potencialidade em vir a demonstrar um
somente as características
notável desempenho [...]” (VIRGOLIM, 2007, p.
biológicas/hereditárias (METTRAU e REIS, 2007).
28).
“Desta forma, um determinado indivíduo
poderia ser considerado superdotado em Este último conceito é o que embasou o
uma determinada situação e não em outra” estudo realizado, entendendo também que
(ALENCAR e FLEITH, 2001, p. 58). Ao contrário, este, especialmente pela presença da barra
a concepção de dotação é contemplada (/) entre Altas Habilidades e Superdotação,
na seguinte afirmação: trazendo a conotação que estes são
Predisposições, aptidões, atributos presentes na sinônimos e ao mesmo tempo
carga genética são amplamente determinados complementares. Assim, está muito próximo

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.31-39


CAMARGO, R. G.; FREITAS, S. N. Altas Habilidades/Superdotação por Estudantes com Altas Habilidades/Superdotação

do conceito de superdotação de Renzulli Neste sentido, Chacon e Paulino (2011),


(2004) e Renzulli e Reis (2012), sendo através da realização de uma pesquisa
considerados como similares. Neste é bibliográfica, apontam que, no âmbito dos
adotada a conotação de AH/SD. A propósito, estudos realizados em neurociências
o conceito de Altas relacionado às AH/SD, as diferentes
Habilidades/Superdotação é adotado no terminologias indicam que o fenômeno é
Brasil, sendo que desde a publicação da visto como único e resultante do
Resolução nº 02/2001 (BRASIL, 2001), que funcionamento diferenciado do cérebro das
instituía as Diretrizes Nacionais para a pessoas com AH/SD em todas as
Educação Especial na Educação Básica conceituações. Referem algumas
adota-se este termo no país. terminologias relacionadas, como precoce e
prodígio e as apontam como merecedoras
Após este diálogo com os conceitos 34
de estudos diferenciais.
relacionados às AH/SD, interessa ressaltar
que, apesar dos distanciamentos e oposições Traz-se, no Quadro 2, a questão da
na definição de quem é a pessoa com conceituação das AH/SD do ponto de vista
AH/SD, o indicador habilidade/potencial dos estudantes entrevistados nesta pesquisa.
intelectual elevado em uma ou mais área(s), Apresentam-se, assim, a Categoria I:
que aparece como consonante nas Características das AH/SD e a Subcategoria I:
diferentes perspectivas teóricas é ponto Reconhecimento das AH/SD, que traz a
agregador e promotor da identificação e percepção dos estudantes participantes da
reconhecimento dos estudantes com que se pesquisa sobre a conceituação das AH/SD:
diferenciam da média.

CATEGORIA I CARACTERÍSTICAS DAS AH/SD

SUBCATEGORIA I RECONHECIMENTO DAS AH/SD


ESTUDANTES FALAS
A “Uma facilidade que a gente tem”.
“Pra mim é uma pessoa que tem mais assim, não é capacidade, porque todo mundo é
capaz de várias coisas, mas eu acho que é um pouco mais, tu tem um raciocínio lógico
B mais rápido que os outros, mas não que seja diferente em alguma coisa [...] A mais criativa
mesmo que eu já fiz foi a minha tabela periódica, que eu fiz ela toda com metal sabe [...]
eu usei bolinha de isopor e aramezinho em volta.”
“Acho que é ter capacidade de raciocinar rápido. [...] Acho que quando eu criei o
C joguinho do computador [...] eu faço pra mim mesmo.”
“Acho que todo mundo tem uma coisa que sabe fazer bem assim, é alta habilidade,
talento, é uma pessoa que tem muita facilidade, que tem um talento numa área. [...] Era, o
protótipo como é uma coisa pequena não tem robô, ele capta já, se começa uma
D queimada bem pequenininha, são sensores espalhados na floresta, eles já captam, aí
sensor como todo mundo sabe manda sinal [...] lá pro departamento [...] Eu imaginava
tudo, porque pra mim, acho que tudo que você faz você procura é o melhor, não perfeito
o melhor.”
“Olha minha mãe fez pós nisso, ela sabe bastante [...] acho que é uma coisa que deixa a
E criança um pouco mais pra frente, nos estudos [...] eu não fiz, mas eu vou fazer, é uma
historia em quadrinhos que eu acabei de fazer um roteiro de cinco páginas, frente e verso,
sobre um jogo de Playstation [...].”
“Não tenho ideia assim da definição.[...] o desenho de um “Fusca” [...] que eu acho que é
F o desenho que eu mais tentei detalhar, né pra chegar ao real, logicamente que não ficou
tão assim, pelo menos eu tentei, eu achei foi o que mais buscou a realidade.”
“Tipo, escutar uma música no rádio e aprender a tocar ela só de ouvido. [...] Aquela
G invenção foi muito massa, fazer um carrinho de oito rodas, peguei eu tinha dois carrinho de
controle remoto, e peguei só um controle, ficou que nem um trenzinho andando [...].”
“Bom, talento vem desde cedo [...]aí chega na escola um indivíduo que tem assim um
H centro.[...] invenção são as coisa que eu pego na rua, madeiras, é, pedaços de portas que
eu transformo, pinto de branco primeiro e vo pintando tipo tela, eu não tenho muito
dinheiro, e esses material de arte são muito caro[...]”
I “Pra mim é ser mais inteligente que os os outros, os outros não sei o que que é. [...] Trem
voador, eu pensei assim, botar a locomotiva, botar uns coisinha de foguete pequeno assim,
tava pensando em desenvolver um motorzinho elétrico ou um motor de foguete de

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.31-39


CAMARGO, R. G.; FREITAS, S. N. Altas Habilidades/Superdotação por Estudantes com Altas Habilidades/Superdotação

CATEGORIA I CARACTERÍSTICAS DAS AH/SD

SUBCATEGORIA I RECONHECIMENTO DAS AH/SD


ESTUDANTES FALAS
verdade[...] só que tem que ter um trilho que atraia, com uma força magnética, pensei até
em um tipo de trem que seja mais leve, porque ele está sobre os trilhos.”
“É divertido ter altas habilidades, ser como outras pessoas [...] são diferentes só. [...] A base
J de lançamento de foguete, eu usei tudo em casa [...] Foi construir coisas, materiais, eu
adoro construir.”
“Eu não sei porque eu nunca convivi sem, mas sei lá é tranquilo, às vezes você tem mais
facilidade em outras coisas. [...] O meu projeto de lei quando eu tinha uns seis anos, a
K minha mãe tipo ela é advogada, então sempre escutei muito [...] essas coisa de lei [...]fiz
uma leizinha, acho que sobre alguma coisa da minha casa [...].”
“Tipo pessoas que tem uma melhor habilidade em, mais como se diz, no convívio, com
uma habilidade, tipo pintura, desenho, ou nas áreas da escola.[...] eu fiz um quadro que é 35
L um alcezinho assim, que era o alce assim no meio da grama, não era bem grama era mais
um matão assim alto, e só tinha a cabeça dele.”
“Pessoas que tem altas habilidades em algumas coisas e em outras não tanto.[...] daí eu vi
M um cara brasileiro que ia fazer um filme com um velhinho, daí até que surgiu, daí eu fiz um
e fui inventar mais coisas [...].”
“Querer saber um pouco mais das coisas, se interessar mais. [...] Na escola tinha que fazer
N uma célula comestível muito maior, daí a gente pegou o bolo, abriu o bolo, e começou a
enfeitar, detalhar, não ficou o melhor da série, mas eu gostei muito do trabalho.”
“Eu acho que assim por conta da superdotação eu tenho facilidade em fazer textos,
aprender com mais facilidade [...] Quando precisa ser criativa eu nunca consigo ser, a
minha mãe disse esses dias que eu fui super criativa fazendo um trabalho [...] a gente lia
O um livro e precisava representar uma cena desse livro com objetos recicláveis e eu fiz uma
cena que ele tava numa corda bamba, e eu usei é fósforo queimado pra fazer sapatilhas,
as mãos na corda bamba, botões[...]”
“São pessoas que tem facilidade em determinadas matérias ou em geral também, aí ela se
especializa em determinada área.[...] seria uma bicicleta que tem a bateria, só que daí
P você pedala e vai recarregando a bateria, e dai quando você cansar você vai poder
utilizar, ela vai ser bem melhor, você pode trocar os carros facilmente por esta bicicleta [...]”
“É uma coisa que a pessoa sabe fazer bem, que ela tem um talento, tem um jeito de fazer.
[...] Que coisa, reciclar papel, eu achei bem criativo [...] Eu fiz um quadro bem bonitinho,
era uma flor gigante, aquele dia eu tava bem, eu resolvi fazer uma flor com o fundo preto
Q toda colorida porque o preto destaca mais, não foi por eu gostar mais de preto [...]
também fazer biscuit, eu já fiz biscuit, e também colar de missanga, essas coisa, legalzinho
de fazer, exigia muito da sua criatividade, caraca pouca coisa que eu fiz[...]”
“É uma pessoa que tem certa habilidade, pode ser lógica, pode ser social, pode ser
natural, pode ser musical, não lembro todas, e tem acima no normal uma habilidade né,
então uma pessoa superdotada não precisa ser bom em tudo, não é aquela pessoa
R inteligente, que sabe tudo, tira dez em todas as provas, é a pessoa que sabe mas não
necessariamente demonstra. [...] Eu fiz uma receita uma vez, é uma banana com uma
caldinha de chocolate, marshmellow [...]”
“Tipo acho que é alguém que se destaca assim [...] foi eu e o meu amigo, a gente tava
S jogando junto, aí era como se a gente tivesse um forte, que a gente começa pelas lateral
fazendo uma torre assim, depois a gente tem que fechar em cima [...].”
“[...] acho que é uma pessoa com aprendizagem mais rápida. [...] Foi na aula de inglês, a
gente montou a maquete de uma casa, daí a gente tinha que botar todas as partes da
T casa [...]”
“[...] a pessoa tem uma inteligência e pode usar ela para o bem, pra mim é isso
superdotação, altas habilidades, usar ela para o bem. [...] Bom, eu entendo que a gente tá
sempre crescendo [...] Bom, eu não faço muitas invenções assim não, mas igual, a gente
U foi pra um campeonato, pô a gente ganhou o primeiro lugar aqui no estado, segundo
lugar mundial [...] Esse robô era pra ele seguir metas, a você vai ter que subir aqui e descer,
ter que fazer curvas, entendeu? Usar sensores, tudo milimetrado, com uma linha preta no
chão, seguir a linha, desviar de uma pedra, pegar pessoa trazer, vitimas entendeu? [...]”
“É o que o jovem vai pensando conforme o tempo, [...] tem o tempo que pensa no que
você gosta no que você não gosta. [...] Cada pessoa tem o seu jeito de expressar, cada
fase da nossa vida, criança, jovem e velho, desperta algo em você, não adianta você
falar “ai, queria tanto cantar” mas a sua voz não é aquilo né, mas você tem outra
V habilidade que vai despertar em você, e aí sim. [...] Foi a minha ultima luta, eu já tava
planejando ela, a minha adversária, a gente tem que prestar atenção na nossa adversária,
estudar ela, primeira adversaria que eu estudei, estudei, estudei, aí cheguei no ponto final,

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.31-39


CAMARGO, R. G.; FREITAS, S. N. Altas Habilidades/Superdotação por Estudantes com Altas Habilidades/Superdotação

CATEGORIA I CARACTERÍSTICAS DAS AH/SD

SUBCATEGORIA I RECONHECIMENTO DAS AH/SD


ESTUDANTES FALAS
aquele ponto exato, aquele ponto que a gente olha e fala é esse, que eu treinei os golpe
dela, que acabei ganhando e acabei ganhando a passagem pro Rio Grande do Sul [...].”
“A pessoa se destacar das outras, buscar mais conhecimentos. [...] Bá, não sou muito de
W criatividade, uma paisagem que eu fiz uma vez, o pôr do sol [...].”
“A eu não sei explicar assim, é uma pessoa que sabe ver as coisa melhor, fazer mais rápido.
X [...] Em artes, no desenho da garrafa, das asas assim, ficou bem bonito, ficou bem
detalhado [...] pediu pra gente desenhar uma garrafa daquele tipo e detalhes em volta, a
maioria dos meus colegas desenhou flores, e eu quis inventar outra coisa assim.”
Quadro 2 – Reconhecimento das AH/SD pelos sujeitos desta pesquisa. Elaborado pela pesquisadora.

36
Apesar das perguntas terem sido características que se destacam nas falas
direcionadas, de maneira geral, às AH/SD, dos estudantes, confirmando o que a
todos os estudantes incluíram-se como literatura (CHAGAS e FLEITH, 2010; ALENCAR, e
“parte” da resposta. Ao fazer isso, FLEITH, 2001) já aponta como predicados
demonstraram o seu entendimento sobre a comuns às pessoas com AH/SD.
temática, logo o seu reconhecimento no
Estas características provocam a
âmbito daquilo que diz respeito a sua
reflexão de como essas podem ser
singularidade combinada aos
incentivadas nos diferentes espaços
comportamentos de AH/SD, trazendo as
educacionais que estes estudantes
afirmações no sentido de “é assim que
frequentam. Que sejam instigados a pensar
acontece comigo”, abordando as AH/SD
em projetos, produtos, criações, que possam
como algo pertencente a sua caracterização
estar sendo efetivados na realidade a que
subjetiva, em outras palavras, a algo
pertencem, como propõe Renzulli (2005) e,
particular que os constitui.
especialmente, Armstrong (2001), Fleith (2007)
Elementos de todos os conceitos, e Gardner et al. (2010), através de exemplos
apresentados no Quadro 2, são verificados como: criação de projetos de jardinagem e
nas falas dos estudantes, especialmente horta na escola, círculos de debates para
quanto ao consenso percebido nos diferentes reflexão e propostas sobre os êxitos e
termos estudados, de que as pessoas com dificuldades enfrentadas coletivamente na
AH/SD possuem um potencial superior em escola, elaboração de um jornal informativo
uma ou mais áreas do conhecimento. na escola e/ou grupos/associações a que
possam pertencer.
É recorrente nas falas dos estudantes a
necessidade de mostrar que o fato de Bastante interessante destacar que
apresentarem AH/SD não os deve distanciar alguns estudantes (J, N, R e T) consideraram
das outras pessoas, mas que é algo que faz as suas invenções, atividades e/ou produções
parte deles e proporciona que desenvolvam como as mais criativas, aquelas que, em um
suas atividades de uma maneira diferente da primeiro momento, não parecem ter ligação
maioria. Por vezes, até negam seus com suas áreas de maior interesse. Porém, ao
comportamentos/indicadores de AH/SD, se pensar nos conceitos de habilidade
buscando assim se aproximarem dos outros. acadêmica e produtivo-criativo de Renzulli
O que se sabe sobre isso, é que tais atitudes (2005, 2004), verificou-se que, nesta
dificultam a identificação dos estudantes classificação mais ampla, a referida ligação
com AH/SD, podendo mascarar o seu pode ser identificada.
reconhecimento, impossibilitando que sejam
Os estudos de Renzulli (2005) revelam
dados os devidos encaminhamentos, de
que os comportamentos dos Três Anéis de
acordo com as demandas educacionais e
Superdotação ou as AH/SD podem
sócio emocionais que podem apresentar.
manifestar-se em duas formas essenciais:
O senso ético, a preocupação com o habilidades gerais e habilidades específicas.
meio ambiente, o perfeccionismo, a
As habilidades gerais são aquelas que
facilidade para aprendizagem são as
se aplicam em todos os campos (como, por
Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.31-39
CAMARGO, R. G.; FREITAS, S. N. Altas Habilidades/Superdotação por Estudantes com Altas Habilidades/Superdotação

exemplo, a inteligência geral) ou a domínios ambiente na manifestação da superdotação


mais abrangentes (como, por exemplo, ou AH/SD.
habilidade verbal aplicada a várias
Convém esclarecer que Gardner (et al.
dimensões da área da linguagem), enquanto
2010, 2011) e Vigotski (2006, 2007)
que as habilidades específicas são referentes
desenvolveram seus estudos sobre
à habilidade de adquirir saberes ou técnicas,
inteligência humana perspectivas teóricas
ou a habilidade de realizar uma ou mais
diferenciadas. Apesar disso, do ponto de vista
atividades especializadas. São evidenciadas
adotado nesta dissertação, o conceito de
na destreza de aplicar várias combinações
inteligência humana de ambos assemelham-
das habilidades gerais, a uma ou mais áreas
se muito no que se refere à multiplicidade de
específicas do conhecimento ou do
fatores que a constitui. O primeiro atribui e
desempenho humano, como dança,
aprofunda-se nas questões biológicas 37
ciências, liderança, matemática, música,
relacionadas à caracterização da
etc. (RENZULLI, 2005).
inteligência, o segundo tem foco sobre as
Dando-se continuidade à discussão questões socioculturais. Veja-se a seguir a
sobre AH/SD, convém ressaltar o definição de ambos os autores:
entendimento que se tem de inteligência, A inteligência é um potencial biopsicológico.
com base em estudos (GARDNER, 2010, 2011; Que um indivíduo possa se considerar inteligente
GERSON e CARRACEDO, 2007; VIGOTSKI, ou não, e em que áreas, é um produto, em
1998, 2006, 2007) que voltam o olhar para a primeira instancia, de sua herança genética e
de suas características psicológicas, que vão
questão da cultura como forte influenciador desde seus potenciais cognitivos até suas
na percepção e aplicação da inteligência predisposições pessoais. (GARDNER, 2011, p. 67)
humana. 8

Isso se justifica pelo fato de que foram Frente à ideia de uma única inteligência tem
investigados diferentes contextos de surgido repetidamente a noção de que o
intelecto é mais bem explicado a partir de uma
atendimento aos estudantes com AH/SD,
natureza plural. (GARDNER, 2011, p. 69) 9
logo, foi evidenciado que questões
socioculturais de cada espaço, exercem [...] o intelecto10 não é precisamente a reunião
influencia no entendimento e de determinado número de capacidades gerais
– observação, atenção, memória, juízo, etc. –
reconhecimento da inteligência de uma mais sim a soma de muitas capacidades
pessoa que apresenta um diferentes, cada uma das quais em certa
habilidade/potencial elevado e, por isso, medida, independente das outras. (VIGOTSKI,
destaca-se em seu meio social. 2006, p. 108)

Gardner (2010, p. 21) afirma que “Cada Quanto à diversidade presente na


um de nós tem potenciais dentro do espectro expressão das AH/SD, vê-se como complexa
de inteligência. Os limites de realização e multifacetada. Acredita-se que pode ser
desses potenciais dependem da motivação, entendida pela Teoria das Inteligências
da qualidade de ensino, dos recursos Múltiplas, de Gardner (1994, 2011), que
disponíveis e assim por diante”. descreve oito inteligências: Linguística ou
verbal, Lógico-matemática, Espacial,
Pode-se relacionar este pensamento de Cinestésico-corporal, Musical, Interpessoal,
Gardner (2010) com o conceito dos Três Anéis Intrapessoal e Naturalista.
da Superdotação de Renzulli (2004) e Renzulli
e Reis (2012), quando estes afirmam que as Sendo assim, a diferenciação de
características do contexto em que a pessoa habilidades geral e específicas (RENZULLI,
vive exercem influência nos 2005) pode ser relacionada à Teoria das
comportamentos/indicadores de Inteligências Múltiplas de Gardner (2011,
superdotação. Por vezes, o 2010, 1994), uma vez que traz a ideia de que
comportamento/indicador de habilidade as AH/SD podem aplicar-se em diferentes
acima da média está em maior evidência do
que os outros dois presentes na 8
Tradução nossa.
superdotação, devido à influência do 9
Tradução nossa.
10
Intelecto neste contexto é entendido como sinônimo de
inteligência.

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.31-39


CAMARGO, R. G.; FREITAS, S. N. Altas Habilidades/Superdotação por Estudantes com Altas Habilidades/Superdotação

áreas do conhecimento, o que também está educacionais frequentados por eles a melhor
presente na referida teoria, em termos de entenderem estes sujeitos, visando assim, a
intelecto humano. qualificação das oportunidades
educacionais, e até mesmo, sócio
Assim, combinando o entendimento
emocionais, atendendo às suas
trazido pelos estudantes com AH/SD com os
necessidades educacionais especiais,
estudos teóricos na área, é possível melhor
apreciando a singularidade de cada um.
reconhecê-los, para, consequentemente,
poder melhor atendê-los nas suas
Referências
necessidades educacionais especiais.
ALENCAR, E. M. L. S.; FLEITH, D. S.
Considerações finais
Superdotados: determinantes, educação e
ajustamento. 2ª. ed. São Paulo: EPU, 2001. 38
Conhecer, para melhor reconhecer, é
essencial na constituição da Acessibilidade ARMSTRONG, T. As inteligências múltiplas na
Educacional dos estudantes com AH/SD. sala de aula. Tradução: Maria Adriana
Apesar de que muito dos dados encontrados Veríssimo Veronese. 2ª ed. Porto Alegre:
nas falas dos estudantes desta pesquisa Artmed Editora, 2001.
serem recorrentes na literatura, estes achados
BARDIN, L. Análise de conteúdo. Tradução:
fazem parte de uma atualização daquilo que
Luís Antero Reto, Augusto Pinheiro, São Paulo:
auxilia a pensar e sistematizar a identificação
Edições 70, 2011.
das pessoas com AH/SD, bem como da
constituição da sua Acessibilidade BRASIL. Conselho Nacional de Educação.
Educacional, podendo ser retomados para Câmara de Educação Básica. Resolução
reflexão e implementação de estratégias CNE/CEB nº 02 de 11 de Setembro de 2001.
educacionais pertinentes às situações e Diretrizes Nacionais para a Educação
demandas específicas. Especial na Educação Básica. Diário Oficial
da União, Brasília, DF, 14 de set. de 2001.
Destaca-se a relevância destas falas
sem desconsiderar a importância de um CHACON, M. C.; PAULINO, C. E. Reflexões
embasamento teórico definido e no qual se sobre precoces, prodígios, gênios e as altas
acredita nas orientações para atuação. habilidades, com base na neurociência
Acima de perspectivas teóricas observadas, cognitiva. Revista Educação Especial, Santa
está a qualidade do atendimento oferecido Maria, v. 24, n. 40, p. 181-194, maio/ago.
aos estudantes com AH/SD. 2011
Este fato é destacado pelos estudantes, CHAGAS, J. F. Conceituação e fatores
especialmente, na diferenciação entre a individuais, familiares e culturais relacionados
apreciação das AH/SD, por exemplo, nos às altas habilidades. In: ALENCAR, E. M. L. S.;
Programas de Enriquecimento Extraescolar e FLEITH, D. S. (Org.) Desenvolvimento de
na escola. Logo, o reconhecimento em talentos e altas habilidades: orientação a
diferentes contextos trazem implicações para pais e professores. Porto Alegre: Artmed,
a constituição da sua acessibilidade 2007. cap. 1, p. 15- 24.
educacional e inclusão educacional. Porém, GARDNER, H. Estruturas da Mente: A Teoria das
concorda-se com Rangni e Costa (2011, Inteligências Múltiplas. Porto Alegre: Artes
p.480), quando afirmam que o principal a ser Médicas Sul, 1994.
considerado no estudo das AH/SD é que “[...]
ações educacionais se mantenham fiéis aos ______. Inteligencias múltiples: la teoria em la
sujeitos possuidores de altas práctica. Tradução por María Teresa Melero
habilidades/superdotação, os quais Nogués. 1ª ed. 4ª reim. Buenos Aires: Paidós,
necessitam dos serviços educacionais 2011
especiais”. ______. O nascimento e a Difusão de um
Sendo assim, reconhecer os estudantes “Meme”. In: GARDNER, H. et. al. Inteligências
com AH/SD, a partir de como eles se veem, Múltiplas ao redor do mundo. Tradução:
auxilia a organização dos diferentes espaços Ronaldo Cataldo Costa, Roberto Cataldo

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.31-39


CAMARGO, R. G.; FREITAS, S. N. Altas Habilidades/Superdotação por Estudantes com Altas Habilidades/Superdotação

Costa.Porto Alegre: Artmed, 2010. cap. 1, Uma retrospectiva de vinte e cinco anos.
p.16-30. Tradução: Susana Graciela Pérez Barrera
Pérez. Educação, Porto Alegre: RS, n. 1 (52),
GERSON, K.; CARRACEDO, S. Niños com altas
ano XXVII, jan./abr., 2004, p.76-131.
capacidades a la luz de las múltiples
inteligências. 1ª ed. Buenos Aires: Magistério ______. The Three-Ring conception of
del Río de la Plata, 2007. giftedness. A developmental model for
promoting creative productivity. In :
GIL, A. C. Como elaborar projetos de
STERNBERG,R. J.; DAVIDSON, J. E. (Org.)
pesquisa. 5ª. ed. São Paulo: Atlas, 2010.
Conceptions of giftedness. 2ª ed., p. 246-279,
GUENTHER, Z. C. Coleção Debutante – CEDET New York: Cambridge University Press, 2005.
– 15 anos. Volume 1: Referencial e Bases
RENZULLI, J. S.; REIS, S. M. The Schoolwide
Teóricas. Lavras:CEDET, 2008. 39
Enrichment Model Executive Summary.
______. Capacidade e Talento – Um Disponível em:
programa para a Escola. São Paulo: EPU, http://www.gifted.uconn.edu/sem/semexec.ht
2006. ml. Acesso em : 16/03/2012.
METTRAU, M. B.; REIS, H. M. M. de S. Políticas SABATELLA, M. L.; CUPERTINO, C. M. B. Práticas
públicas: altas habilidades/superdotação e a Educacionais de Atendimento ao Aluno com
literatura especializada no contexto da Altas Habilidades/Superdotação. In: A
educação especial/inclusiva. Revista Ensaio: Construção de Práticas Educacionais para
Avaliação e Políticas Públicas em Educação. Alunos com Altas Habilidades/Superdotação.
v.15 n.57 Rio de Janeiro, out./dez. 2007. Volume 1: Orientação a Professores. Brasília:
Disponível em: Ministério da Educação, Secretaria de
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_artt Educação Especial, 2007, p.67-80.
ext&pid=S010440362007000400003&lng=pt
VIRGOLIM, A. M. R. Altas
&nrm=iso. Acesso em: 30/01/2012.
habilidade/superdotação: encorajando
NAKANO, T. de C; SIQUEIRA, L. G. G. Revisão potenciais. Brasília: Ministério da Educação,
de publicações periódicas brasileiras sobre Secretaria de Educação Especial, 2007.
superdotação. Revista Educação Especial,
VIGOTSKI, L. S. A formação social da mente: o
Santa Maria, v. 25, n. 43, maio/ago. 2012, p.
desenvolvimento dos processos psicológicos
249-266.
superiores. Organização: Michael Cole
PÉREZ, S. G. P. B. Mitos e Crenças sobre as [et.al.]. Tradução: José Cipolla Neto, Luís
Pessoas com Altas Habilidades: alguns Silveira Menna Barreto, Solange Castro
aspectos que dificultam o seu atendimento. Afeche. 7ª ed. São Paulo: Martins Fontes,
Cadernos de Educação, Santa Maria, nº 22, 2007.
2003. Disponível em:
VIGOTSKI, L. S. La genialidad y otros textos
http://coralx.ufsm.br/revce/ceesp/2003/02/a4.
inéditos. Buenos Aires: Editorial Almagesto,
htm. Acesso em: 10 de maio de 2011.
1998.
RANGNI, R. de A.; COSTA, M. P. R. da. Altas
VIGOTSKII, L. S. Aprendizagem e
habilidades/superdotação: entre termos e
desenvolvimento intelectual na idade
linguagens. Revista Educação Especial, Santa
escolar.In: VIGOTSKII, L. S.; LURIA, A. R.;
Maria, v. 24, n. 41, p. 467-482, set./dez. 2011.
LEONTIEV, A. N. Linguagem, desenvolvimento
RENZULLI, J. S. O que é esta coisa chamada e aprendizagem. Tradução: Maria da Penha
superdotação, e como a desenvolvemos? Villalobos. 10ª ed. São Paulo: Ícone, 2006.

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.31-39


BARBIERI, T. M.; OLEQUES, R.C.M.; BOBSIN, A. S.; VIEIRA, N. J. W. Processo de identificação de indicadores de altas
habilidades/superdotação em acadêmicos do PET na UFSM

Processo de identificação de indicadores de altas habilidades/superdotação em


acadêmicos do PET na UFSM11

The identification process indicators of high abilities / giftedness academics in the


tutorial education program in UFSM

BARBIERI, Taís Marimon12


OLEQUES, Rose Carla Mendes13
BOBSIN, Andressa da Silva14
VIEIRA, Nara Joyce Wellausen15
40

RESUMO

Este artigo tem por objetivo relatar as atividades do processo de identificação dos indicadores de altas
habilidades/superdotação (AH/SD) nos acadêmicos participantes do Programa de Educação Tutorial
(PET) na UFSM. Trabalhamos neste processo com dois suportes teóricos: a concepção de inteligências
múltiplas de Howard Gardner (2000) e a concepção dos três anéis da superdotação, de Joseph Renzulli
(2004 1986). A seleção desta população como alvo do trabalho se justifica pela proximidade dos
objetivos entre o PET e a proposta de atendimento educacional oferecida a estes alunos na educação
básica, intitulada pelo seu autor, Joseph Renzulli (2004), como Programa de Enriquecimento Curricular.
Para estes alunos, o termo inclusão também significa igualdade de oportunidades enfocando,
principalmente o direito de desenvolver suas potencialidades e suplementar seus interesses. A
metodologia utilizada nessa ação esteve alicerçada no paradigma qualitativo, tendo como
procedimento metodológico o estudo de caso. Os procedimentos desenvolvidos foram: entrevistas
semiestruturadas individuais, aplicação de instrumentos padronizados, observação consistente e
persistente dos fenômenos registrados, autoindicação e indicação pelos colegas e discussões de
grupos focais filmadas em vídeo. A complementação do processo de identificação dos indicadores se
deu através do preenchimento de instrumentos padronizados pelos familiares e o professor/tutor destes
acadêmicos. Os dados até aqui apresentados são parciais, pois o procedimento de identificação
adotado necessita de acompanhamento ao longo do tempo para verificação da frequência,
intensidade e consistência com que os indicadores aparecem, porém, foi possível observar que quatro
alunos dos doze participantes da atividade, apresentaram indicadores de altas
habilidades/superdotação. Nesse sentido é importante salientar que não foi necessário propor a
intervenção com este grupo, pois suas necessidades já estão sendo supridas pelo programa, o que
reforça nossa ideia inicial de que o PET é uma boa proposta de atendimento aos alunos com AH/SD na
universidade.

Palavras-chave: Educação Especial. AH/SD em adultos. Processo de identificação das AH/SD em


adultos.

ABSTRACT
This article aims at reporting the activities of the process of recognition the high ability/giftedness
indicators in academics who attend the Tutorial Education Program in UFSM. We have worked in this

11
Este trabalho obteve uma bolsa financiada pelo PROLICEN.
12
Acadêmica do Curso de Licenciatura em Educação Especial Noturno da Universidade Federal de Santa Maria
(UFSM) e estagiária do Núcleo de Apoio às Pessoas com Deficiência, Altas Habilidades/Superdotação e Surdez da
UFSM. E-mail: tais.marimon@hotmail.com
13
Graduada em Letras e Especialista em Gestão Educacional pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e
acadêmica do Curso de Licenciatura em Educação Especial Noturno da UFSM. Bolsista PROLICEN/2013. E-mail:
rosecarlaoleques@yahoo.com.br
14
Acadêmica do Curso de Licenciatura em Educação Especial Noturno da Universidade Federal de Santa Maria
(UFSM) e estagiária do Núcleo de Apoio às Pessoas com Deficiência, Altas Habilidades/Superdotação e Surdez da
UFSM. E-mail: dessa_bobsin@yahoo.com.br
15
Professora adjunta do Centro de Educação da UFSM e coordenadora do Núcleo de Acessibilidade da UFSM. E-
mail: najoivi@gmail.com

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.40-49


BARBIERI, T. M.; OLEQUES, R.C.M.; BOBSIN, A. S.; VIEIRA, N. J. W. Processo de identificação de indicadores de altas
habilidades/superdotação em acadêmicos do PET na UFSM

process with two theoretical supports: Howard Gardner’s multiple intelligences conception (2000) and
Joseph Renzulli’s three ring conception of giftedness (2004, 1986).The selection of this population as work
target is justified by the closeness of purposes between the Tutorial Education Program of and the
proposal of educational services offered to these students on basic education, which has been
denominated by its author Joseph Renzulli (2004), as Schoolwide Enrichment Model. The term inclusion
for these students also means equal opportunities, focusing mainly on the right to develop their potential
as well as complementing their interests. The methodology applied in this action has been based on the
qualitative paradigm and had the case study as methodological procedure. The instruments used for
data collection were: single semi-structured interviews, application of standardized instruments,
consistent and tenacious observation of the phenomena recorded, self-indication and indication by
colleagues, and group discussions filmed on video. The complementation of the process of identification
of the indicators was made by the academics parents and their professor/tutor who filled the
standardized instruments. Data presented so far are partial once that the identification procedure 41
adopted requires accompaniment along time in order to verify the frequency, intensity and consistency
with which the indicators appear. Nevertheless, it was possible to observe that four out of twelve students
who took part in the activity have shown indicators of high ability/giftedness. Thus, it is important to
emphasize that it was not necessary to propose the intervention with this group, since their necessities are
already being supplied by the program, reinforcing our early idea that Tutorial Education Program is a
good work proposal for students with AH/SD on the university.

Keywords: Special Education; AH/SD in Adults; Process of Identification of AH/SD in Adults

Recebido em 17/06/2013
Aprovado em 05/07/2013

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.40-49


BARBIERI, T. M.; OLEQUES, R.C.M.; BOBSIN, A. S.; VIEIRA, N. J. W. Processo de identificação de indicadores de altas
habilidades/superdotação em acadêmicos do PET na UFSM

importância de identificar estes acadêmicos?


O termo inclusão significa que a sociedade
Apresentando a proposta de identificação deve estar “[...] orientada por relações de
das altas habilidades/superdotação na UFSM acolhimento à diversidade humana, de
aceitação das diferenças individuais, de
Os Núcleos de Acessibilidade no Ensino esforço coletivo na equiparação de
Superior foram instituídos pela Política oportunidades de desenvolvimento, com
Nacional de Educação Especial na qualidade, em todas as dimensões da vida”
Perspectiva da Educação Inclusiva (BRASIL, (BRASIL, 2001, p.20). A equiparação de
2008). Nesse sentido, o acesso à universidade oportunidades para a pessoa com
está garantido pelas normativas que regem o deficiência representa o acesso e a
ensino superior e estão sendo feitas ações permanência às diferentes instâncias da 42
referentes ao atendimento educacional sociedade para que vivam de acordo com
especializado de pessoas com deficiência suas peculiaridades. Para os alunos com
dentro das instituições de ensino. Em 2007, a AH/SD, o termo inclusão também significa
Universidade Federal de Santa Maria/UFSM igualdade de oportunidades, enfocando,
criou o Núcleo de Acessibilidade na porém e principalmente, o direito de
instituição, vinculado à Pró-reitoria de desenvolver suas potencialidades e
Graduação/PROGRAD, que tem como suplementar seus interesses. No entanto, era
objetivo desenvolver estratégias que necessário traçar uma estratégia para iniciar
assegurem que pessoas com deficiências, o processo de avaliação, pois não era
transtornos globais do desenvolvimento, altas possível contatar com todos os alunos. Como
habilidades/ superdotação e/ou surdez fazer, então?
tenham garantido seus direitos constitucionais
de acessibilidade. Para tal, desenvolve ações Considerando-se que o Programa de
que promovem a acessibilidade física, de Educação Tutorial (PET) apresenta muitas
comunicação e pedagógica, favorecendo a semelhanças entre sua proposta e a do
permanência bem sucedida dos alunos com enriquecimento curricular, que se constitui
deficiências, surdez e transtornos globais do como o atendimento educacional
desenvolvimento. No entanto, nenhuma ação especializado oferecido aos alunos com
era proposta para atender aos acadêmicos AH/SD na educação básica. A semelhança
com altas habilidades/superdotação (AH/SD) principal consiste em que ambas propostas
na UFSM, apesar do Núcleo nomear esta visam enaltecer o potencial e/ou habilidades
população como sendo alvo de seu olhar. através de atividades extracurriculares dos
discentes em questão. No PET há um professor
Considerando esta lacuna no responsável pelas ações que serão feitas
atendimento do Núcleo, foi iniciado o pelos alunos, porém é responsabilidade do
processo de identificação e atendimento aos discente “[...] formular novas estratégias de
acadêmicos com AH/SD pelo Projeto de desenvolvimento e modernização do ensino
Pesquisa e Extensão intitulado Identificação superior no país” (BRASIL, 2006, p. 7),
dos indicadores de altas habilidades/ buscando estimular através destas estratégias
superdotação nos acadêmicos participantes a melhoria do ensino de graduação. É
do Programa de Educação Tutorial na UFSM objetivo do Programa “[...] oferecer uma
(Registrado no Gabinete de Pesquisa do formação acadêmica de excelente nível,
Centro de Educação/UFSM sob o número visando à formação de um profissional crítico
032332). Na atualidade, estão matriculados e atuante, orientada pela cidadania e pela
na UFSM 28.17516 alunos. Considerando os 3 função social na educação superior [...]”
a 5% estabelecidos como prevalência desta (BRASIL, 2006, p. 8). Desta forma, a proposta
população pela Organização Mundial da do PET, juntamente com o tutor de cada
Saúde, teríamos em torno de 845 a 1.408 grupo tem a missão de estimular a
alunos com AH/SD na universidade. Qual a aprendizagem dos seus membros, através de
vivências, reflexões e discussões. Assim, o
16 Segundo Portal da UFSM (www.ufsm.br). Acesso em aluno aprende a resolver os problemas e a
17/06/2013.

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.40-49


BARBIERI, T. M.; OLEQUES, R.C.M.; BOBSIN, A. S.; VIEIRA, N. J. W. Processo de identificação de indicadores de altas
habilidades/superdotação em acadêmicos do PET na UFSM

ser crítico, opondo-se à forma de ensino mais trabalho destes futuros profissionais. Assim,
centrado, tornando-se mais independente. participaram desta atividade três alunas do
Curso de Licenciatura em Educação Especial
Com isso o programa
da UFSM, sendo duas estagiárias do Núcleo e
[...] visa realizar, dentro da universidade uma bolsista PROLICEN. O acompanhamento
brasileira, o modelo de indissociabilidade do
ensino, da pesquisa e extensão. Assim, além do
e a orientação da proposta foram de
incentivo à melhoria da graduação, o PET responsabilidade da coordenadora do
pretende estimular a criação de um modelo Núcleo e professora das alunas citadas.
pedagógico para a universidade, de acordo
com os princípios estabelecidos na Constituição Tal experiência consistiu numa
Brasileira e na Lei de Diretrizes e Bases da gratificante ação de ensino, pesquisa e
Educação (LDB) (BRASIL, 2006, p. 7). extensão para as estudantes participantes do
43
Considerando os pressupostos acima estudo, oportunizando sua aprendizagem no
mencionados, optamos por iniciar o processo que se refere ao processo de identificação
de identificação pelos alunos do grupo PET. dos indicadores de AH/SD, assim como
Entendemos, portanto, como justificada a puderam verificar na prática a importância
proposta apresentada, que tem como da proposição de um programa que
objetivo identificar os indicadores de AH/SD promove e potencializa as habilidades e
nos acadêmicos participantes do PET na interesses destacados dos acadêmicos com
UFSM. AH/SD, na busca de otimizar sua formação
profissional e pessoal.
A metodologia utilizada nessa ação
esteve alicerçada no paradigma qualitativo, Para compartilhar essa experiência,
tendo como procedimento metodológico o estruturamos o artigo apresentando
estudo de caso. A coleta dos dados para inicialmente os subsídios teóricos que
identificação dos sujeitos foi feita através de: fundamentaram nosso estudo; segue-se o
apresentação do projeto para o grupo e conhecimento do campo empírico, através
convite para participação; aplicação de do mapeamento dos grupos PETs/UFSM, relato
instrumentos padronizados, dentre eles a do processo de identificação com a
autoindicação e indicação dos colegas; aplicação dos instrumentos de identificação,
observação consistente e persistente dos a realização dos grupos focais, a aplicação
fenômenos registrados e discussões de de técnicas grupais para verificação dos
grupos focais, filmados em vídeo. Como domínios dos sujeitos. Por último, são
afirmam Freitas e Vieira (2011, p. 56) o apresentadas a análise e as conclusões.
processo de identificação desde uma
perspectiva qualitativa é “[...] um processo Referencial Teórico
contínuo, garantido pelo acompanhamento
A segunda grande ação e que
dos sujeitos ao longo do tempo e em
acompanhou todo o processo foi a revisão
diferentes situações do seu cotidiano”. Assim,
da literatura, pois em qualquer programa de
a continuidade do processo de identificação
atendimento às AH/SD o processo de
dos indicadores consistiu no preenchimento
identificação é, sem dúvida, um dos fatores
dos instrumentos padronizados pelos
mais importantes a se considerar. Tem-se
familiares e professor/tutor dos acadêmicos
conhecimento que os procedimentos
participantes do grupo selecionado.
utilizados usualmente para o reconhecimento
Desde 2009, a UFSM possui o Curso de destas pessoas não contemplam a totalidade
Licenciatura em Educação Especial que das suas potencialidades (VIEIRA, 2002,
forma professores na área da educação 2005b). Por um lado, os testes de inteligência
especial, no qual uma das ênfases é a área verificam áreas valorizadas pelo sistema
das AH/SD. Pela caracterização diferenciada acadêmico, e, por outro, não investigam
deste curso, o professor da educação áreas como o destaque no uso do corpo, a
especial não é formado para trabalhar criatividade, as expressões artísticas,
somente em escolas de educação básica, musicais, dentre outras.
ampliando desta forma o mercado de

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.40-49


BARBIERI, T. M.; OLEQUES, R.C.M.; BOBSIN, A. S.; VIEIRA, N. J. W. Processo de identificação de indicadores de altas
habilidades/superdotação em acadêmicos do PET na UFSM

O processo de identificação em adultos prolongada numa atividade de interesse;


ainda é pouco estudado. Por este motivo, consciência de si mesmo e de suas
optamos por adotar a sistemática de diferenças; desgosto com a rotina; gosto pelo
identificação proposta pelo grupo desafio; habilidade em áreas específicas;
representativo de pesquisadores nesta interesse por assuntos e temas complexos e
temática, tais como: Pérez (2008), Freitas e persistência perante dificuldades
Pérez (2012), Freitas e Vieira (2011) e Delpretto inesperadas.
(2009).
Considerando estes pressupostos, o
Pesquisadores como Renzulli et al processo de identificação dos indicadores de
(2001), Freeman e Guenther (2000), Gardner, AH/SD nos alunos que concordarem participar
Feldman e Krechevsky (2001) são unânimes do processo de identificação foi subsidiado
44
em afirmar que a identificação deve ser feita pelos seguintes procedimentos: Lista de
através de um conjunto de procedimentos, Verificação de Identificação de Indicadores
que possibilitem uma visão integral deste de AH/SD – Área Corporal-cinestésica (FREITAS
sujeito. Estes autores também valorizam a e PÉREZ, 2012); Questionário para
ideia da utilização de múltiplos critérios, Identificação de Indicadores de AH/SD em
considerando-se informações obtidas de Adultos (FREITAS e PÉREZ, 2012); grupo focal e
diferentes fontes. Neste sentido, pode-se técnicas dirigidas à verificação das
observar, na literatura, processos de inteligências múltiplas, entrevistas individuais
identificação que contemplam tanto a com professores, familiares e colegas. Os
autoinformação ou autorreconhecimento, professores e familiares também preencherão
quanto a identificação dos indicadores por a Ficha Complementar para Características
familiares, amigos e professores (VIEIRA, Esportivas e Artísticas (FREITAS e PÉREZ, 2012).
2005a).
Processo de Identificação na Prática
Muitos são os estudos relacionados à
criança e ao adolescente com estas Depois de aprofundar o campo teórico
características. Porém, somente duas e selecionar os procedimentos a serem
pesquisadoras enfocaram o superdotado17 utilizados, no processo, partimos em direção
adulto (PÉREZ, 2008; DELPRETTO, 2009, 2010). do conhecimento do campo empírico. Pelo
Segundo Pérez (2008) as pessoas com AH/SD mapeamento realizado em 2012, verificamos
adultas têm sido reconhecidas por um que grupos PETs na UFSM são em número de
conjunto de indicadores considerando 17. Com exceção do grupo PET indígena que
diferentes áreas do conhecimento. tem cinco participantes, todos os demais têm
Indicadores são definidos de acordo com a 12 alunos.
concepção adotada por Meirieu (1998,
p.187), que consiste em todo o “[...] Cientes de que não tínhamos
comportamento observável a partir do qual condições de trabalhar neste primeiro
se pode inferir o alcance de um objetivo ou o momento com todos os alunos, nossa
domínio de uma capacidade”. Assim, Pérez primeira ação foi estabelecer contato com a
(2008) considerou como mais frequentes os responsável na PROGRAD por todos os
seguintes indicadores: busca de soluções grupos. Nesta reunião, fomos informados da
próprias para os problemas; capacidade existência dos grupos da diversidade
desenvolvida de análise, avaliação e vinculados à Secretaria de Educação
julgamento; independência de pensamento; Continuada, Alfabetização, Diversidade e
grande produção de ideias; concentração Inclusão – SECADI. Considerando que nossa
área de atuação – Educação Especial –
pertence a esta secretaria, estabelecemos
17 Neste momento, utilizamos o termo “superdotado” como primeiro critério para seleção do
para nomear um tipo específico de sujeitos que se campo de estudo estar vinculado aos PETs da
destacam nas atividades acadêmicas e que são Diversidade. O segundo passo foi estudar o
denominados, segundo Renzulli (1986), de superdotado
acadêmico, pois é muito comum reconhecermos estes projeto de cada grupo PET e estabelecer
sujeitos como superdotados e aqueles que se prioridades na intervenção. Neste sentido,
destacam nas áreas artísticas como “talentosos”.

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.40-49


BARBIERI, T. M.; OLEQUES, R.C.M.; BOBSIN, A. S.; VIEIRA, N. J. W. Processo de identificação de indicadores de altas
habilidades/superdotação em acadêmicos do PET na UFSM

dois grupos foram priorizados: o PET indígena quatro (4) foram mais citados como
e o PET educação no campo. destacados em seu grupo. São duas (2)
mulheres e dois (2) homens, todos solteiros, do
Procuramos estabelecer contato com o
interior do estado do RS, nenhum filho único e
primeiro grupo selecionado. Foram feitos
com média de idade entre 20 e 22 anos.
alguns contatos telefônicos com sua tutora.
Neles explicamos nosso objetivo e tentamos Os indicadores observados nestes
agendar um encontro para explicar melhor o sujeitos são: perfeccionismo, curiosidade,
que pretendíamos realizar, mas percebemos criatividade, liderança, persistência, senso de
bastante resistência por parte da mesma, humor, autonomia, preferência por desafios.
pois solicitou-nos que retornasse a ligação Como é possível observar, muitos destes
por três vezes e na última justificou sua indicadores são citados por Pérez (2008) e
45
dificuldade em participar do projeto por Delpretto (2009) como comuns em pessoas
excesso de atividade e por entender que o com AH/SD adultas.
grupo era muito visado na universidade e
Nos depoimentos relativos à entrevista,
que esta ação poderia prejudicá-lo ainda
abaixo apresentados, é possível perceber
mais.
que as duas alunas sentiram-se surpresas
Tentamos, então, contato com o com o resultado, porém os dois alunos já o
segundo grupo. A tutora prontamente esperavam. Os quatro estudantes e seus
consentiu em participar e agendou uma familiares percebiam seus comportamentos
reunião com todos os acadêmicos, no dia de diferenciados, porém não entendiam como
reunião do grupo. Nesta oportunidade foi sendo indicadores de AH/SD. Somente depois
apresentado o conceito de altas do processo estas situações adquiriram
habilidades/superdotação trabalhado pela sentido para eles.
equipe e a proposta do projeto. Todos os “Eu não esperava o resultado. Eu... sei lá... tipo...
participantes concordaram em participar da eu me via como um integrante normal... assim.
atividade e assinaram o termo de Eu sempre... eu tenho... eu tinha esta
consentimento livre e assistido. característica, estou percebendo muito mais
agora (...) eu percebi mais na faculdade,
As duas próximas reuniões foram grupos quando eu entrei que eu era mais líder da turma.
focais com o tema da escolha deste PET e (...)” (M.J., sexo F., 20 anos).
sua vida escolar pregressa. As reuniões foram “Eu não tinha pensado... Hãm... (...) mas tem
filmadas e transcritas. Na terceira reunião outras coisas que eu assim realmente não
alunos e tutora preencheram a Lista de esperava de me destacar em relação ao grupo.
Algumas características eu não me identifico,
Verificação de Identificação de Indicadores tipo criatividade que foi apontada que eu acho
de AH/SD – Área Corporal-Cinestésica (FREITAS que não” (L., Sexo F., 22 anos).
e PÉREZ, 2012). O resultado desta verificação “Massa... Eu achei interessante participar deste
foi a indicação de cinco alunos (três pelo projeto... não tenho muito o que dizer, sabe, mas
grupo e dois pela tutora) que possuem eu achei legal e é interessante saber se o cara
habilidades destacadas na área corporal- tem, pode ter a possibilidade de ter AH. ... a
cinestésica e indicadores AH/SD. Nesta parte da criatividade... eu sempre, todo mundo
fala pra mim que sou bastante criativo e tal... ”
reunião entregamos o Questionário para (A., sexo M, 21 anos).
Identificação de Indicadores de AH/SD em
“Foi bem tranquilo pra mim, assim. Na verdade
Adultos (FREITAS e PÉREZ, 2012) e solicitamos eu não tinha muita expectativa, assim, sabe...
que nos fosse trazido preenchido no próximo pra mim era uma coisa normal. Eu não esperava
encontro. Tal procedimento tinha a intenção muita coisa. Eu já sabia um pouco assim (das
de verificar o comprometimento com a tarefa características apontadas), teve um indicativo
destes acadêmicos. Todos trouxeram a ficha forte de... de... bah agora esqueci o nome...
de... perfeccionismo. (...) Às vezes eu me sinto
preenchida, menos uma aluna que faltou ao um pouco diferente assim, mas nunca me
encontro. passou pela cabeça que poderia ser alguma
habilidade” (G., sexo M, 22 anos).
Após realizarmos o levantamento do
formulário de indicação dos colegas e da Tal situação pode ser entendida pela
tutora, verificamos que dentre os 12 alunos, dificuldade que as pessoas do sexo feminino

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.40-49


BARBIERI, T. M.; OLEQUES, R.C.M.; BOBSIN, A. S.; VIEIRA, N. J. W. Processo de identificação de indicadores de altas
habilidades/superdotação em acadêmicos do PET na UFSM

demonstram em perceber-se com “Sempre fui uma das alunas mais quietas da
comportamentos indicadores de AH/SD. escola até a faculdade. (...) na metade da
faculdade comecei a interagir um pouco mais
Como refere Pérez e Freitas (2012, p. 679) com os outros, com os professores e até emitir
À mulher são associadas “virtudes” e mais opinião, antes eu tinha minha opinião mas
“qualidades” vinculadas à sensibilidade, à era muito quieta por ser muito tímida. Aqui não
intuição, à dependência, à solidariedade, à eu já conseguia discutir alguma(...) (L., Sexo F.,
compreensão, enquanto que o homem 22 anos).
manifesta sua masculinidade mediante atributos “[...] eu sempre fui aquela pessoa comportada,
como a fortaleza, a independência, a serena, nunca fiz bagunça nem nada (...) eu não
autonomia, a autoconfiança, a coragem, a sou aquela super inteligente, nunca fui aquela
tomada de decisões, a responsabilidade, dentre de fazer mil perguntas, eu não... nunca fui
outros. aquela de estudar, nunca... até hoje assim não
A característica deste grupo e em estudo muito, eu estudo o necessário, mas na 46
escola eu não estudava e passava, não sei
especial das duas alunas é ser oriunda de como, mas passava” (M.J., Sexo F, 20 anos).
municípios do interior do estado e quase
todos pertencentes a famílias que subsistem A entrada na faculdade foi um ponto
do meio agropecuário. Assim, ainda é importante para todos e como referem dois
comum nesta cultura a mulher ser preparada dos alunos: “Na universidade foi um marco
para as atividades domésticas e o homem na minha vida. totalmente... quebrou, é M. J.
para o provento da casa e da família. Neste antes e M. J. depois.(...). (M.J. Sexo F., 20
sentido, há uma valorização das atividades anos)” e “Ah eu acho que a mais prazerosa
masculinas em detrimento das femininas, o foi quando eu passei no vestibular” (G. Sexo
que explica esta situação de desvalorização M., 22 anos)”. Da mesma forma, a
dos potenciais femininos e reforça que o participação no PET permite que
pensamento exposto pelas autoras ainda desenvolvam projetos vinculados a suas
está presente em muitas famílias. áreas de estudo e interesse, apesar de um
dos participantes fazer uma avaliação
Chama atenção, também, a sensação importante do trabalho:
de estranhamento causada pela
“[...] eu acho que agora também é um momento
identificação destas características com a difícil porque a gente não conseguiu ainda
verbalização de não ser “normal”. Esta é uma emplacar o nosso trabalho. (...) é uma coisa
das características que faz com que o adulto muito nova esse trabalho com a população rural
com AH/SD mascare seus potenciais para e também inserir a educação física dentro da
não parecer diferente do grupo. Outro ponto área da saúde. Trabalhar com essa saúde mais
clinica... é um desafio grande, eu acho” (G.,
que chama atenção é a questão da Sexo M., 20 anos).
criatividade. Somente um dos participantes
se reconhece como criativo e nas Neste depoimento aparece com
contribuições dos demais clareza sua preocupação com a evolução
de uma proposta desafiante, mas que
Em relação às vivências escolares foi mesmo assim eles não desistem,
possível perceber pelos depoimentos dos evidenciando o comprometimento com a
estudantes alguns dos indicadores tarefa que caracteriza os sujeitos com altas
mencionados na literatura, tais como: habilidades/ superdotação.
facilidade na aprendizagem, apesar de
serem quietos e de estudarem pouco; Em relação ao que pensam sobre o
precocidade na leitura. atendimento às pessoas com AH/SD na
universidade é possível afirmar que todos
“[...] é obvio que eu estudava, mas eu tinha
facilidade em pegar o conteúdo... eu só
desconheciam o assunto e a primeira atitude
prestava atenção na aula e já ia super bem na que tomariam é aprofundar o estudo sobre a
maioria das provas... o mais curioso era em área e “[...] depois conhecer a pessoa e
matemática... eu nunca estudei matemática, eu através dela e de repente ver alguma forma
olhava para as fórmulas... tem gente que precisa de poder ajuda-la seja dentro do serviço,
fazer toda a conta para conseguir estudar..eu só
olhava para o papel e deu assim...eu nunca tive dentro da escola”. (L., Sexo F., 22 anos).
dificuldade para estudar nesse sentido” (L., Sexo Todos destacaram a importância de informar
F., 22 anos). à pessoa sobre suas características especiais,

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.40-49


BARBIERI, T. M.; OLEQUES, R.C.M.; BOBSIN, A. S.; VIEIRA, N. J. W. Processo de identificação de indicadores de altas
habilidades/superdotação em acadêmicos do PET na UFSM

demonstrando a importância que o PET - como um grupo de excelência e há


(re)conhecimento de suas próprias uma exigência bastante grande em relação
características têm para estes sujeitos. aos seus resultados acadêmicos. Há também,
como podemos perceber na fala de uma
Considerações Finais das acadêmicas do grupo, uma atitude de
gozação por parte dos colegas de aula, que
Muitas são as dúvidas em um trabalho brincam dizendo que ela não toma mais
desta natureza: a identificação pelos refrigerantes Pets.
indicadores numa perspectiva qualitativa é
“[...] quando eu entrei no projeto no grupo
segura? Tradicionalmente, embora se fale em mesmo eu senti bastante gozação dos meus
múltiplos instrumentos, os resultados obtidos colegas, davam risadas, então entrou no grupo
nos testes de inteligência são decisivos para PET qualquer coisa que eu fazia até a primeira 47
a identificação de quem apresenta AH/SD. vez que usei a camiseta do PET eles me tiraram a
(nome da aluna) não toma mais refrigerante de
Optamos neste trabalho em utilizar uma latinha agora só de Pet... tipo aquelas piadinhas
abordagem diferente que já está sabe (risos) é, eu senti bastante isso porque eu fui
consolidada com crianças e adolescente, a única da minha turma a procurar este lado” .
mas que ainda tem poucos estudos com (C., Sexo F., 20 anos).
adultos. Esta foi a primeira dificuldade que Nos encontros procuramos sempre
encontramos: verificamos a existência de desenvolver dinâmicas de grupos voltadas
pouca bibliografia sobre o tema nesta faixa para as áreas de destaque dos alunos,
etária. E nos grupos específicos que formam incentivando sua participação. Em outras
os PETs selecionados os trabalhos são mais palavras, nossa intervenção consistiu na
escassos ainda. Mas, ao mesmo tempo esta verificação do interesse do aluno em
dificuldade transformou-se em desafio na participar do estudo, identificação dos
busca de investigar os indicadores em indicadores de AH/SD através de seus relatos
pessoas adultas. e atividade espontânea. Com isso, buscamos
A segunda dificuldade encontrada definir suas necessidades educacionais
foram as barreiras atitudinais. Na literatura há especiais e elaborar um programa de
diversas crenças errôneas sobre estes sujeitos atendimento a estas necessidades.
e nesta atividade de extensão e pesquisa Este projeto de extensão ainda em
encontramos duas: a que o sujeito com AH/SD andamento está nos permitindo fazer a
não deve saber que tem este potencial e o identificação dos indicadores de AH/SD na
medo do que esta informação possa trazer universidade, bem como nos dará
de malefícios ao sujeito. Estas barreiras foram importantes contribuições para responder se
tão importantes que num primeiro momento o Programa de Educação Tutorial é um
impediram o desenvolvimento da atividade recurso importante para a inclusão dos
com o primeiro grupo selecionado. alunos com AH/SD e que outras ações
No entanto, o desenvolvimento destes educacionais podem auxiliar estes
encontros com o segundo grupo PET acadêmicos.
selecionado está nos possibilitando conhecer Porém, o processo de identificação
a vida acadêmica desses alunos, bem como, deverá continuar com os alunos de outros
conhecer o projeto desenvolvido pelos grupos PETs. No entanto, cabe destacar que
mesmos, no interior da cidade. Ao mesmo não foi encontrada necessidade de
tempo, nos permite entender melhor como intervenção com este grupo, pois suas
este aluno é percebido pelos demais colegas necessidades estão supridas pelo programa,
e professores sendo um aluno PET que por o que reforça nossa ideia inicial de que o PET
muitas vezes sofrem descriminação por é uma boa proposta de atendimento aos
participarem deste grupo de excelência. Esta alunos com AH/SD na universidade.
é outra barreira que foi verificada. Segundo
relatos dos sujeitos, a experiência vinculada
ao grupo é percebida pelos demais –
professores e colegas não participantes do

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.40-49


BARBIERI, T. M.; OLEQUES, R.C.M.; BOBSIN, A. S.; VIEIRA, N. J. W. Processo de identificação de indicadores de altas
habilidades/superdotação em acadêmicos do PET na UFSM

Programa de Pós-Graduação em Educação.


Santa Maria, 2009.
Referências
FREEMAN, J. ; GUENTHER, Z.C. Educando os
BRASIL. Casa Civil. Subchefia de Assunto mais capazes: ideias e ações comprovadas.
Jurídicos. Lei 12.711 de 29 de agosto de São Paulo: EPU, 2000.
2012. Dispõe sobre o ingresso nas FREITAS, S. N.;VIEIRA, N. J. W. Procedimentos
universidades federais e nas instituições qualitativas na identificação das Altas
federais de ensino técnico de nível médio e Habilidades/Superdotação. In: BRANCHER, V.
dá outras providências. Disponível on-line em: R.; FREITAS, S. N. Altas
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011- Habilidades/Superdotação: Conversas e
2014/2012/Lei/L12711.htm. Acesso em Ensaios Acadêmicos. Jundiaí: Paco Editorial, 48
06/12/2012. 2011, p.49-67.
_____. Casa Civil. Subchefia de Assunto FREITAS, S. N.; PÉREZ, S. G. B. Altas
Jurídicos. Decreto 8.724 de 11 de outubro de Habilidades/superdotação: atendimento
2012. Regulamenta a Lei no 12.711, de 29 de educacional especializado. Marília: ABPEE,
agosto de 2012, que dispõe sobre o ingresso 2012. 2º edição revisada e ampliada.
nas universidades federais e nas instituições
GARDNER, H. Inteligência: um conceito
federais de ensino técnico de nível médio.
reformulado. Rio de Janeiro: Objetiva, 2000.
Disponível on-line em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011- GARDNER, H.; FELDMAN, D. H. ; KRECHEVSKI, M.
2014/2012/Decreto/D7824.htm. Acesso em Projeto Spectrum: a Teoria das Inteligências
06/12/2012. Múltiplas na Educação Infantil - Utilizando as
competências das crianças; V.1. Porto Alegre
_____. Programa de Educação Tutorial.
: Artmed, 2001.
Manual de Orientações. Brasília: MEC, 2006.
Disponível on-line em: MEIRIEU, P Aprender... sim, mas como? Porto
http://portal.mec.gov.br/index.php?option=co Alegre: Artemed, 1998.
m_content&view=article&id=12228%3Aprogr
PÉREZ, S. G. P. B. Ser ou não ser, eis a questão:
ama-de-educacao-tutorial-
o processo de construção da identidade na
pet&catid=232%3Apet-programa-de-
pessoa com altas habilidades/superdotação
educacaotutorial&Itemid=480. Acesso em:
adulta. Tese de Doutorado: Porto Alegre,
09/04/2012.
2008.
______. Ministério da Educação. Secretaria de
PÉREZ, S. G. P. B.; FREITAS, S. N. Mulher com
Educação Especial. Política Nacional de
altas habilidades/superdotação: à procura
Educação Especial na Perspectiva da
de uma identidade. Revista Brasileira de
Educação Inclusiva. Brasília: MEC/SEESP, 2008.
Educação Especial. Marília, v. 18, n. 4, p.
Disponível on-line
677-694, Out.-Dez., 2012. Disponível on-line
em:<http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/
em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1413-
pdf/politica.pdf.> Acesso em 09/04/2012.
65382012000400010&script=sci_arttext . Acesso
DELPRETTO, B. Pessoas com altas em 16/06/2013.
habilidades/superdotação adultas:
PLUCKER, J. Intelligence theories on gifted
lembranças do processo de escolarização.
education. Roeper Review, Bloomfield Hills,
Revista Contrapontos, (Eletrônica), Vol. 10 - n.
MI, v. 22, n. 3, p. 124-125, 2001.
2 - p. 218-235 / mai-ago 2010.
RENZULLI, J.; SMITH,L.H.; WHITE, A. J.;
_____. A pessoa com altas
CALLAHAN, C.M.; HARTMAN, R.K.; WESTBERG,
habilidades/superdotação adulta: análises
K.L. Escalas de Renzulli (SCRBSS): escalas
do processo de escolarização com
para la valoración de las características de
elementos da contemporaneidade.
comportamiento de los estudiantes
Dissertação (Mestrado) Universidade Federal
superiores. Salamanca, Espanha: Amarú,
de Santa Maria, Centro de Educação,
2001.

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.40-49


BARBIERI, T. M.; OLEQUES, R.C.M.; BOBSIN, A. S.; VIEIRA, N. J. W. Processo de identificação de indicadores de altas
habilidades/superdotação em acadêmicos do PET na UFSM

RENZULLI, J. O que é esta coisa chamada _____. Inteligências múltiplas e altas


superdotação e como a desenvolvemos? habilidades: uma proposta integradora para
Uma retrospectiva de vinte e cinco anos. a identificação da superdotação. Revista
Educação, Porto Alegre, RS, n.1(52), 2004, p. Linhas, V. 06, Nº02, 2005a. Disponível on-line
75-131. em:
http://www.periodicos.udesc.br/index.php/linhas/ar
_____. The three-ring conception of
ticle/view/1270. Acesso em 11/04/2012.
giftedness: a developmental model for
creative productivity. In: RENZULLI, J.S. ; REIS _____. Identificação das altas habilidades em
S. The triad reader. Connecticut: Creative crianças de três a seis anos: a busca de uma
Learning Press, 1986. proposta integradora. Projeto de Tese
(Doutorado em Educação), Programa de Pós-
VIEIRA, N. J. W. Identificação das altas 49
Graduação da Faculdade de Educação,
habilidades em crianças de três a seis anos:
Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
a busca de uma proposta integradora.
Porto Alegre, 2005b.
Projeto de Tese (Doutorado em Educação),
Programa de Pós-Graduação da Faculdade UFSM. Resolução 011/07. Institui o programa
de Educação, Universidade Federal do Rio de ações afirmativas de inclusão social e
Grande do Sul, Porto Alegre, 2002. racial. Santa Maria: UFSM, 2007.

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.40-49


VIRGOLIM, A. A identificação de alunos para programas especializados na área de altas habilidades/superdotação

A identificação de alunos para programas especializados na área das altas


habilidades/superdotação: problemas e desafios

The identification of students for specialized programs in the area of high


abilities/giftedness: problems and challenges

Angela Virgolim18
RESUMO

A forma com que entendemos e conceituamos o fenômeno da superdotação tem grande impacto nos
serviços e oportunidades que oferecemos às nossas crianças e jovens com altas
habilidades/superdotação. A identificação de pessoas com alto potencial perpassa discussões 50
conceptuais do que entendemos como superdotação, potencial e desempenho, de como
caracterizamos os talentos e em quais grupos esperamos ver desabrochar comportamentos de
superdotação. O objetivo deste artigo é apontar algumas dimensões do complexo processo de
identificação deste grupo de crianças e jovens em uma perspectiva inclusiva, discutindo aspectos
como a necessidade de um atendimento educacional especializado, os propósitos da identificação, a
utilização de testes psicométricos e outras medidas e a diferenciação entre potencial e produção. A
identificação de grupos especiais, como os superdotados com distúrbios de aprendizagem, com
transtorno do déficit de atenção/hiperatividade, com Síndrome de Asperger e ainda a identificação de
meninas para os programas especializados são também apontados e discutidos à luz das modernas
teorias sobre a superdotação.

Palavras-chave: altas habilidades/superdotação; identificação; populações especiais.

ABSTRACT

The way we understand and conceptualize the phenomenon of giftedness has great impact on services
and opportunities that we offer to young people and children with high abilities / giftedness. The
identification of people with high potential pervades conceptual discussions of what we understand for
giftedness, potential and performance, how we characterize talents and in which groups we expect to
see blooming gifted behaviors. The purpose of this article is to point out some aspects of the complex
process of identification of this group of children and young people in an inclusive perspective,
discussing issues such as the need for specialized education, the purposes of identification, the use of
psychometric tests and other measures and the differentiation between potential and production. The
identification of special groups, such as gifted with learning disabilities, attention deficit / hyperactivity
disorder, Asperger Syndrome and identifying girls for specialized programs are also reported and
discussed in the light of modern theories of giftedness.

Key-words: high abilities / giftedness; identification; special populations.

Recebido em: 19/06/2013


Aprovado em: 05/07/2013

18
Doutora em Educational Psychology, pela University of Connecticut, Professora do Departamento de Psicologia
Escolar e do Desenvolvimento – PED do Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília. E-mail:
angela.virgolim@gmail.com

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.50-66


VIRGOLIM, A. A identificação de alunos para programas especializados na área de altas habilidades/superdotação

inclusivo, que identifique o potencial superior


em idades mais precoces, que estimule e
A necessidade do atendimento educacional alimente as habilidades diferenciadas das
especializado nossas crianças e que promova o bem-estar
e a realização do potencial de nossos jovens
Um dos pontos mais críticos e mais promissores durante os anos escolares.
importantes no nosso campo é a questão da
identificação e seleção dos alunos para a Em seu mais recente livro sobre a
entrada em um programa para as altas superdotação (Superdotados: Trajetórias de
habilidades/ superdotação19. Assim, as desenvolvimento e realizações), Fleith e
questões básicas que nos apresentam Alencar (2013) chamam a atenção para a
seriam: Como identificar os superdotados? necessidade de se compreender a
Para quê os estamos identificando? Para superdotação em uma perspectiva sistêmica 51
quais tipos de programa os estamos e inclusiva, a valorizar o desenvolvimento
recomendando?Com o método de socioemocional, moral e intelectual do
identificação utilizado, quem entra e quem superdotado, identificar fatores que
fica de fora? favoreçam o desenvolvimento do potencial e
ainda a defender o investimento
No Brasil, publicações que enfocam a educacional, social e político deste grupo.
educação do superdotado e talentoso ainda
são escassas, embora a necessidade de Sabatella (2005) refere-se à
aumentar os serviços direcionados a esta necessidade de se encontrar alternativas
população tenha sido repetidamente educacionais para esta parcela da
assinalada (Alencar, Blumen-Pardo & população que não recebe nem o
Castellanos-Simons, 2000; Fleith & Virgolim, atendimento nem a assistência que merece,
1999; Machado & Raposo, 1989; Maia-Pinto sendo esquecida nas suas necessidades
& Fleith, 2002; Novaes, 1979; Virgolim, 1997). intelectuais, emocionais e sociais. A autora
Alencar, Blumen-Pardo e Castellanos-Simons denuncia ainda a falta de espaço destinado
(2000), analisando a questão dos a esta área nos cursos de formação
atendimentos aos indivíduos portadores de deprofessores, para que eles possam
altas habilidades na América do Sul, devidamente identificar, reconhecer e
apontam para a necessidade, em um país valorizar o potencial destes alunos nos seus
com proporções continentais como o nosso, campos de atuação.
de desenvolver programas mais amplos e Reflete Gama (2006), que estamos
efetivos que alcancem uma parcela mais ainda longe de oferecer uma educação de
substancial da nossa população. As autoras qualidade em todas as escolas do país, o
chamam também a atenção para a que exige que se lute por ela; tampouco
necessidade da identificação precoce de atendemos todos os alunos que têm
crianças que apresentam altas habilidades e necessidades especiais. A autora alerta
talentos, o desenvolvimento de programas ainda para a necessidade de ações que
educacionais especiais, a preparação devem ser planejadas para os superdotados,
apropriada de professores para lidar com tal para que o país não continue perdendo
grupo e o desenvolvimento de instrumentos, indivíduos extremamente capazes que, sem
publicações e pesquisas nesta área. oportunidades à altura de seus potenciais,
Outras publicações contemporâneas trilham caminhos pouco produtivos.
trazem a preocupação de diversos autores e Também Cupertino, no livro “Um olhar
pesquisadores brasileiros sobre estas e outras para as altas habilidades: Construindo
questões que permeiam o campo, caminhos” (CUPERTINO, 2008), afirma que
pontuando a necessidade de um opções educativas condizentes com as
atendimento educacional especializado e características dessa população não podem
ser deixadas ao acaso; ao contrário, devem
19
A autora reconhece a grande e profícua discussão ser sistemáticas, num contexto articulado e
sobre a terminologia da área e, neste texto, usa de coerente. Ela alerta ainda para o fato de
forma intercambiável as palavras “superdotação”, que, se ignoradas, sem estímulo, a pessoa é
“altas habilidades”, “talento” e “elevado potencial”.

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.50-66


VIRGOLIM, A. A identificação de alunos para programas especializados na área de altas habilidades/superdotação

levada a esconder seu potencial elevado, da superação histórica da segregação que


apresentando frustração e inadequação ao envolve as pessoas com deficiências e
meio. transtornos de desenvolvimento. “Se, de fato,
almeja-se incluir todos os alunos com
Na mesma linha de pensamento, Freitas
necessidades educacionais especiais na
e Pérez (2010) preocupam-se com o
escola, a inclusão de alunos com altas
atendimento destes alunos que, se não
habilidades/superdotação (AH/SD) também
reconhecidos e estimulados, podem ter seu
precisa ser considerada” (pg. 5). Além disso,
desenvolvimento potencial estagnado e, ao
a escola inclusiva e humanizadora deve
adaptarem-se à rotina da sala de aula,
oferecer possibilidades de ação e reflexão
sufocam suas potencialidades, tornando-se
sobre seus objetivos e metas, “de forma a
frustrados e desinteressados. Por isso a
superar a discriminação, o preconceito e a
necessidade de se investir neste alunado por 52
resistência ao aluno que apresenta
meio de um atendimento educacional
características singulares” (PISKE; STOLTZ,
especializado, reforçando a ideia de uma
2013, p.152).
inclusão com maior qualidade.
Tendo em vista a proposta da inclusão
Dutra, em sua apresentação à obra
social nas escolas brasileiras, e comparando-
“Direito à Educação: subsídio para a gestão
as com escolas inclusivas em outros países,
dos sistemas educacionais”, do MEC (DUTRA,
Alencar (2012) aponta que é realmente muito
2004), comenta a respeito da importância de
difícil para o professor do ensino regular ir
fazer do direito de todos à educação, um
além do currículo previsto em sala de aula
movimento coletivo de mudança. Neste
para atender as necessidades do aluno
sentido, Delou (2007) afirma que a garantia
superdotado, ou adaptar o ritmo de instrução
dos direitos na área das altas
para aqueles alunos que dominam de forma
habilidades/superdotação não depende
mais rápida o conteúdo dado. Sabemos que
apenas de leis, resoluções ou políticas
os professores não recebem o treinamento e
públicas nacionais; é necessária ainda a
a capacitação devidos para lidar com
formação docente continuada e integral,
populações especiais em salas de aula
pois
regular. Em muitos países, no
[...] professores e alunos não mudam por decreto entanto,observa-se que a resposta para o
ou qualquer pressão externa. É preciso conhecer
as experiências bem sucedidas na educação
atendimento educacional adequado do
básica e no ensino superior, otimizar a formação superdotado centralizou-se no uso de
crítico-reflexiva, incentivar práticas pedagógicas especialistas ou consultores externos para dar
especializadas para que a mudança baseada apoio à escola, ou na criação de programas
na igualdade de oportunidades gere uma especiais, como escolas residenciais,
sociedade mais justa e cidadã. (p. 38)
programa de férias, créditos em disciplinas
Conforme recomenda Virgolim (2005), universitárias e outros. Alencar salienta que,
esforços devem ser feitos para permitir no Brasil, há ainda resistência à implantação
mudanças no currículo oferecido para estes de programas especiais para o aluno que se
alunos ainda na escola regular, dentro da destaca por suas habilidades superiores; isto
perspectiva de uma educação inclusiva, e se deve às muitas ideias errôneas sobre o
que promova a participação a partir de superdotado, entre elas o entendimento de
novas relações entre os estudantes. Além que este aluno não precisa de um ambiente
disso, as relações pedagógicas devem ser especial para desenvolver seu potencial e
mais centradas nos diferentes modos de que a superdotação é um fenômeno raro,
aprender das crianças e jovens, valorizando que implica em habilidades
a diversidade em todas as atividades, excepcionalmente elevadas e apresentadas
espaços e formas de convivência e trabalho. por poucos.
Esta preocupação é também Em sua investigação sobre
partilhada por Moreira e Stoltz (2012), que características individuais e familiares de
sugerem a necessidade de se conjugar adolescentes superdotados, Chagas (2008)
igualdade e diferença na questão da destaca o despreparo dos professores para
inclusão educacional brasileira, para além atender este grupo:

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.50-66


VIRGOLIM, A. A identificação de alunos para programas especializados na área de altas habilidades/superdotação

As demandas por enriquecimento, diferenciação significados compartilhados pelos membros


e flexibilização curricular, aceleração ou de uma comunidade. Sendo um construto
progressão serial, que visam o atendimento
dessa população, parecem pouco social, a superdotação é interpretada de
reconhecidas ou vistas com reservas por esses formas diferentes em momentos diferentes do
profissionais. Essa realidade pode acentuar tempo e de um contexto cultural para outro
alguns traços evidenciados pelos adolescentes (MOLTZEN, 2009). Não há sentido em falar da
talentosos como a tendência a negar o talento e
a preferência pelo isolamento social. Uma maior
superdotação no “vácuo”, sem referência ao
divulgação dos resultados de pesquisa e da campo de conhecimento, domínio ou
literatura existente sobre o tema pode contribuir atuação humana em que a criança ou
na formação dos profissionais que atuam na jovem se sobressai (WINNER; MARTINO, 1993;
educação. Formação que deve incluir em seu 2000). As forças históricas e culturais moldam
currículo as características peculiares de
indivíduos talentosos e as estratégias tanto a dinâmica psicológica individual
pedagógicas e curriculares mais eficientes e quanto as formas pelas quais um indivíduo é 53
eficazes no acolhimento de suas necessidades percebido como superdotado. Mas é no
especiais. (p. 202) contato contínuo e dinâmico com o seu
Há, portanto, um consenso entre ambiente que as habilidades em potencial
educadores de que é tarefa da escola assistir da criança se tornam efetivas e plenas no
e educar todas as pessoas, inclusive as adulto (TANNEMBAUM, 1997), a depender do
talentosas. Reflete Guenther (2000): seu envolvimento com a tarefa, sua
criatividade e habilidades acima da média
Nós, educadores, estamos trabalhando em
educação, e nossa tarefa é encaminhar o em alguma área do conhecimento (RENZULLI;
desenvolvimento de pessoas e encontrar a REIS, 1997).
melhor e mais apropriada forma de prover a
cada um aquilo de que ele necessita para se Moltzen (2009) acredita que nem
tornar o melhor ser humano que pode vir a ser. sempre os professores conseguem identificar
(p. 20) adequadamente seus alunos que serão
promissores na vida adulta. Isto pode
Entendendo a superdotação acontecer por várias razões. Primeiro, o
talento emerge em momentos diferentes e
A literatura produzida nas últimas em diferentes condições e muitos dos que se
décadas mostra que a superdotação é fruto tornarão eminentes no futuro oferecem
da interação entre o potencial inato poucos indicadores na infância do seu
(incluindo fatores cognitivos e não potencial. Segundo, muitas vezes não se
intelectivos), por um lado, e a experiência, percebem relações entre o que a escola
estilos de aprendizagem e os interesses oferece e os domínios em que alguns adultos
únicos do estudante por outro (CALLAHAN, irão demonstrar sua excepcionalidade.
2009; CLARK, 1992; DAVIS; RIMM, 1994; Terceiro, a forma com que as habilidades
FELDHUSEN, 2005; RENZULLI, 1978; RICHERT, criativas são demonstradas na escola
1987; 1997; TANNENBAUM, 1983). Essa frequentemente não são percebidas como
interação determinará a extensão na qual os um indicador da eminência criativa. Assim, o
talentos, que geralmente emergem na que realmente importa é que a escola veja a
infância, poderão evoluir para a criatividade, criança como potencialmente superdotada
produtividade e expertise no adulto (DAI, e que ofereça múltiplas condições para que
2009; REILLY, 2009; SCHNEIDER, 2000). as crianças e jovens descubram e
Davis e Rimm (1994) assinalam que não evidenciem suas habilidades especiais.
há uma definição única de superdotação Pesquisadores na atualidade estão mais
universalmente aceita e que muitas vezes os interessados nos “padrões” que podem ser
termos “superdotado” e “talentoso” (e outros) observados entre indivíduos do que nas
são usados de forma intercambiável. Além “diferenças” que poderiam distinguir algumas
disso, como bem debate Freeman (2005; pessoas das outras (GARDNER, 1997;
2009), a superdotação existe apenas em MOLTZEN, 2009). Neste sentido, Feldhusen,
relação a um contexto cultural – ou seja, um Asher e Hoover (1984), Renzulli e Reis (1997) e
referencial composto por padrões de Richert (1987) argumentam a favor de se
expectativas, comportamentos, valores e colocar menos ênfase na questão de ser-ou-

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.50-66


VIRGOLIM, A. A identificação de alunos para programas especializados na área de altas habilidades/superdotação

não-ser superdotado, o que leva a uma 2000). Renzulli e Reis (1997) assinalam que o
desnecessária rotulação de alunos e aluno capaz de produzir comportamentos de
dicotomização do termo (DAVIS, 2006) e de superdotação são os que já possuem ou são
se concentrar mais esforços na formulação capazes de vir a desenvolver (por meio de
de programas específicos para atender as oportunidades educacionais variadas)
necessidades dos jovens com maior habilidades acima da média, criatividade e
potencial entre os diferentes extratos comprometimento com a tarefa. Sternberg
socioeconômicos e culturais. (1993) afirma que, “para ser rotulada como
superdotada, a pessoa deve ter potencial
Propósitos da identificação para o trabalho produtivo em algum domínio.
Pessoas sem este potencial, não importa o
Quais seriam então os propósitos da quão excelentes são em algum aspecto ou
identificação? Alguns pontos essenciais são quão raro este aspecto seja, não são 54
salientados por diversos pesquisadores da rotuladas como superdotadas” (p. 187).
área de atas habilidades/superdotação e
serão discutidos a seguir. Embora esta diferenciação seja crucial,
vemos que a distinção entre desempenho e
1. Localização de potenciais. A potencialidade tem se perdido nas últimas
principal meta da identificação de alunos definições adotadas pelo Ministério da
superdotados é a localização de potenciais Educação – por exemplo, na Resolução nº
que não estão sendo suficientemente 02, de 11 de setembro de 2001, da Câmara
desenvolvidos ou desafiados pelo ensino de Educação Básica do Conselho Nacional
regular; se estes alunos não são identificados, de Educação, que estabelece:
o mais provável é que não desenvolvam seus
Art. 5º Consideram-se educandos com
interesses e habilidades neste contexto necessidades educacionais especiais os que,
(ALENCAR, 2012; HANY, 1993, JOHNSEN, 2009; durante o processo educacional, apresentarem:
PFEIFFER, 2008; ROBINSON, 2002). III - altas habilidades/superdotação, grande
No Brasil, a conceituação de altas facilidade de aprendizagem que os leve a
dominar rapidamente conceitos, procedimentos
habilidades/superdotação constante no e atitudes. (BRASIL, 2001, p. 70)
documento elaborado pelo Grupo de
Trabalho nomeado pela Portaria Ministerial nº Focalizando ainda na questão do
555 (BRASIL, 2008) sinaliza a questão do potencial, Gubbins (2005) lembra que o
potencial: desenvolvimento do talento se dá em três
estágios: o estágio manifesto, o emergente e
Alunos com altas habilidades/superdotação
demonstram potencial elevado em qualquer o latente. Para algumas pessoas estes
uma das seguintes áreas, isoladas ou talentos aparecem de maneira óbvia. É o
combinadas: intelectual, acadêmica, liderança, caso da criança pré-escolar precoce que já
psicomotricidade e artes, além de apresentar lê e entende textos de maior complexidade,
grande criatividade, envolvimento na
aprendizagem e realização de tarefas em áreas
ou que manifesta grandes habilidades para
de seu interesse. (p.9, grifo nosso) resolver problemas em matemática ou para
criar músicas originais. No entanto, outras
O conceito de “notável desempenho crianças podem apresentar habilidades ou
e/ou elevada potencialidade” em aspectos talentos em estágios iniciais de emergência,
isolados ou combinados das diversas áreas precisando então de atenção especial e
do conhecimento humano, enfatizado pela encorajamento para que possa atingir
política de Educação Especial traçada em plenamente os requisitos necessários para a
1971 pelo MEC,corresponde ao que ainda é emergência destas capacidades. E ainda há
hoje defendido nos Estados Unidos e alguns aqueles talentos e capacidades que podem
países da Europa em termos de educação estar em estágio latente devido aos níveis de
dos superdotados (DELOU, 2007). Ou seja, desenvolvimento ou pela falta de
uma criança com alto potencial pode ainda experiências e da devida exposição aos
não estar mostrando suas habilidades de domínios.
forma plena, mas para tal necessita ser
descoberta e estimulada (GALLAGHER; Assim, o potencial não se concretiza
GALLAGHER, 1994; FELDHUSEN; JARWAN, sem reconhecimento e suporte. Silverman

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.50-66


VIRGOLIM, A. A identificação de alunos para programas especializados na área de altas habilidades/superdotação

(2013) acredita que “habilidades invisíveis” – A literatura tem ainda demonstrado que
ou seja, aquelas que ficam enterradas, de a superdotação, por si só, não garante
forma completamente inconscientes tanto sucesso educacional ou produtividade
para o indivíduo que as possui, quanto para criativa; e que são as condições
o mundo que o rodeia – se não forem relacionadas ao ambiente familiar e escolar,
nutridas, podem nunca florescer em forma de assim como as relações com os colegas, os
realização. A falta de incentivo, de maiores determinantes do desempenho
experiências de aprendizagem ou de vida acadêmico do superdotado, seja em
enriquecedoras, a falta de reconhecimento direção das suas reais possibilidades, ou em
das capacidades e potencialidades de uma direção ao sub-rendimento e fracasso
criança, poderão, por sua vez, concorrer escolar (KARNES; JOHNSON, 1991; RIMM,
para o desuso destas habilidades e sua 1991). Renzulli (1986) argumenta que talvez
consequente estagnação (GALBRAITH; sejam a persistência em atingir um resultado 55
DELISLE, 1996). ou ideal, a autoconfiança e a vontade de
realizar alguma coisa, que verdadeiramente
Richert (1997) comenta sobre os vários
façam da criança um adulto produtivo.
tipos de confusões sobre o propósito da
identificação e mitos recorrentes na área. Um 2. O conceito de superdotação. Outro
destes mitos estabelece que apenas alunos importante ponto indicado na literatura sobre
com traços manifestos de altas habilidades a identificação de alunos com altas
devam ser selecionados; e que estes traços habilidades/superdotação para programas
podem predizer a superdotação na idade especiais é que os indicadores e instrumentos
adulta. Vários autores têm rebatido este de medidas usados para a identificação
equívoco, na medida em que entendem devem refletir o conceito de superdotação
que: adotado, os tipos de talentos ou habilidades
a serem identificados, e os conteúdos e
(a) a superdotação surge ou
objetivos propostos pelo programa
desaparece em diferentes épocas e sob
(CALLAHAN, 2009; HANY, 1993; GALLAGHER;
diferentes circunstâncias da vida de uma
GALLAGHER, 1994; PFEIFFER, 2008; RENZULLI;
pessoa; assim, os comportamentos de
REIS, 1997; SILVERMAN, 2013). Callahan (2009)
superdotação podem ser exibidos em certas
assinala que as diferentes concepções de
crianças (mas não em todas elas) em alguns
superdotação no campo da educação
momentos (não em todos os momentos) e sob
costumam focalizar dois diferentes conceitos
certas circunstâncias (e não em todas as
em sua base: potencial e produção.
circunstâncias de sua vida) (RENZULLI; REIS,
1997); Na concepção de superdotação como
potencial, a criança é vista como possuidora
(b) a inteligência não é apenas plural;
de qualidades e capacidades latentes que
ela está relacionada ao contexto em que a
supostamente a levarão a obter sucesso na
pessoa vive e trabalha e distribuída entre
escola e na vida. A identificação neste tipo
vários recursos além do indivíduo (GARDNER;
de abordagem utiliza metodologias diversas
KORNHABER; WAKE (1998);
e medidas de aptidão que possam predizer o
(c) o ambiente inicial da criança – lar, desempenho futuro. Já na concepção de
escola e comunidade – tem uma superdotação como produção, o foco se dá
importância fundamental no na produção atual e manifesta da criança e
desenvolvimento de suas habilidades na sua capacidade atual de demonstrar
intelectuais posteriores (GALLAGHER, 1997); habilidades superiores em uma área do
(d) um currículo inadequado, conhecimento. A identificação neste tipo de
educadores não-suportivos, dificuldades abordagem utiliza testes padronizados de
sócioemocionais, pressão dos pares e um inteligência e medidas do desempenho
inadequado estilo parental de educação escolar (CALLAHAN, 2009).
têm a força de extinguir o potencial para a Gallagher e Gallagher (1994) apontam
alta realização das crianças e adolescentes que a indecisão sobre o uso destes dois
superdotados (COLANGELO; DAVIS, 1997).

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.50-66


VIRGOLIM, A. A identificação de alunos para programas especializados na área de altas habilidades/superdotação

conceitos, potencial e produção, podem inteligência, criatividade, nível de


levar à confusão sobre a superdotação: desempenho acadêmico e autoconceito do
Por exemplo, há mais meninos superdotados na estudante, e entrevistados o professor e os
área da matemática do que meninas? Se for pais a respeito das suas características e
usado o critério de produção, a resposta áreas de interesse. Em um segundo estágio, o
certamente seria sim. Se for usado o critério de aluno é convidado para uma entrevista de
potencial, então a resposta é provavelmente
não. Há diferenças na habilidade intelectual
longa duração, durante a qual ele realiza
entre os diferentes grupos raciais e étnicos? Se o algumas atividades acadêmicas e todo o
critério utilizado for produção, a resposta é que material escolar significativo é também
certamente há grandes diferenças. Se o critério examinado. Procura-se observar ainda como
for potencial, então a resposta é provavelmente ele organiza, desenvolve ou lida com tarefas
não. (p. 6)
acadêmicas, identificando também seu estilo
Para resolver o conflito entre a escolha cognitivo pessoal de aprender e sua 56
destas duas posições conceptuais, algumas autopercepção como aprendiz. Com base
definições propõem que a superdotação nos dois estágios, deve-se delinear um
seja vista como potencial quando se trata de programa específico para o aluno, onde suas
crianças pequenas, como desempenho áreas fortes serão reforçadas e as fracas
precoce em estágios de desenvolvimento trabalhadas, com o auxílio dos pais e
posteriores e como eminência ou feitos professores.
notáveis em adultos (CALLAHAN, 2009). De
4. Avaliação. E finalmente, o processo
qualquer forma, há que se notar que o fato
de aprendizagem dos estudantes
da criança demonstrar potencial para
selecionados deve ser avaliado
realização superior em idade precoce não é
periodicamente, a fim de se verificar se os
garantia de que ela vá obter sucesso ou
critérios para admissão ao programa foram
mesmo atingir a eminência na vida adulta;
adequados para se atingir os objetivos
além disso, testes tradicionais de inteligência,
planejados (HANY, 1993). Conforme
utilizados para a indicação de potenciais,
defendem Feldhusen e Jarwan (2000) e
não são favoráveis a grupos étnicos
Renzulli e Reis (1997), a identificação deve
minoritários e às diferenças linguísticas e
ser vista como um processo contínuo, um
socioeconômicas dentro da população e,
conjunto de habilidades que emergem e se
portanto, devem ser utilizados com estas
desenvolvem à medida em que a criança
restrições em mente (BORLAND, 1986;
amadurece; e deve preferencialmente
CALLAHAN, 2009; GALLAGHER; GALLAGHER,
apontar os pontos fortes, aptidões e talentos
1994).
de cada uma, em detrimento de suas
3. Supervisão de especialistas. A fraquezas e incapacidades, como
admissão ao programa especial deveria ser tradicionalmente se tem feito.Além disso,
supervisionada por um grupo de como a maioria dos programas (como
especialistas, depois de discutir os casos também é o caso do Brasil) tem limitações no
individualmente à luz dos dados coletados que se refere ao número de vagas, estes
sobre cada aluno (HANY, 1993, RENZULLI, pesquisadores recomendam que os alunos
2009). Feldhusen e Jarwan (2000) escolhidos sejam aqueles que responderão
recomendam que os talentos específicos, às expectativas e que vão se beneficiar do
aptidões e áreas fortes de cada aluno sejam tipo de serviço oferecido.
delineados na entrada ao programa, de
O bem conhecido Modelo das Portas
forma que sejam adequadamente
Giratórias (RENZULLI, 2009; RENZULLI; REIS,
estabelecidos os recursos e as atividades
1997; VIRGOLIM, 2007a) estabelece que, se
específicas que cada um necessita para
um aluno selecionado para fazer parte do
atingir seu desenvolvimento pleno.
Pool de Talentos exibe comportamentos de
Também Yewchuk e Lupart (1993) superdotação (ou seja, habilidade superior
recomendam que a identificação dos alunos em alguma área, envolvimento com a tarefa
com altas habilidades seja feita em dois e criatividade) em relação a uma área
estágios. No primeiro estágio devem ser feitas particular ou tópico de estudo, ele poderá,
entrevistas e testes para identificar o grau de por algum tempo, desenvolver este interesse

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.50-66


VIRGOLIM, A. A identificação de alunos para programas especializados na área de altas habilidades/superdotação

ou tópico com maior profundidade sob a materiais e meios mais relevantes para a
supervisão de um professor na sala de expressão daquelas habilidades que
recursos. Deve ser explicado tanto aos pais apresentam de forma mais acentuada, em
quanto para o próprio aluno, durante a detrimento de suas áreas fracas ou menos
entrevista de admissão deste ao programa, desenvolvidas (VIRGOLIM, 2007b).
que o aluno poderá continuar a frequentar a
A grande crítica que se faz aos testes
sala de recursos até que seu projeto seja
psicométricos criados nas primeiras décadas
completado; depois deste tempo ele pode
do século XX é que estes se centram
ou não continuar no atendimento,
primariamente na linguagem e na
dependendo basicamente de duas
matemática, abarcando apenas a
condições: (a) de continuar demonstrando
inteligência acadêmica e deixando de fora
alto nível de envolvimento e criatividade para
outras capacidades humanas fundamentais 57
continuar a desenvolver pesquisas mais
para a resolução de problemas. Desta forma,
avançadas na área de interesse; (b) da
estes testes penalizam aquelas crianças que
avaliação da equipe diagnóstica e dos
pensam de forma criativa ou imaginativa, ou
professores envolvidos, que deve apontar
que tendem a demorar-se analisando com
para a continuidade dos ganhos para o
profundidade uma questão. As perguntas nos
aluno de sua permanência no programa.
testes de QI, além de serem apresentadas
fora do contexto, enfatizam mais a memória
A identificação por meio de testes
e a lembrança de fatos, em detrimento do
psicométricos e outras medidas
pensamento de ordem superior e das
Uma postura largamente adotada pelos habilidades de solução de problemas que
modernos especialistas na área (por poderão ser úteis ao indivíduo no mercado
exemplo, BERNAL, 2009; GARDNER; de trabalho (GARDNER; KORNHABER; WAKE,
KORNHABER; WAKE, 1998; RENZULLI; REIS, 2000; 1998). Mesmo assim, a aferição do QI está
STERNBERG, 1996), é que os testes de entre as principais preocupações de pais e
inteligência (QI) podem prever razoavelmente leigos quando buscam por serviços
o êxito acadêmico do aluno; contudo, estão educacionais na área da superdotação
longe de serem as únicas medidas possíveis (JOHNSEN, 2009).
para esta tarefa. Existem várias outras No entanto, Borland (1986) argumenta
habilidades cognitivas exigidas para que um que os testes de QI são uma valiosa fonte de
indivíduo seja bem-sucedido no mundo informação no que diz respeito às decisões
escolar e do trabalho, que não apenas que envolvem os alunos em programas para
aquelas habilidades medidas nos testes de QI superdotados – por exemplo, para a
(JOHNSEN, 2009). identificação de alunos sub-realizadores
Noções já ultrapassadas enfatizavam (underachievers), que possuem alto potencial
que sair-se bem em um teste de inteligência acadêmico, mas que por problemas
era sinal de inteligência. As modernas teorias motivacionais, emocionais ou de
de inteligência preconizam hoje que a aprendizagem não apresentam bom
inteligência pode ser melhor percebida pela desempenho escolar. Este autor reflete que o
observação das pessoas funcionando nos problema com os testes de QI não reside no
seus ambientes cotidianos, e pela instrumento, mas sim no seu uso inapropriado
competência no desempenho de tarefas que e abusivo. Assim, Borland sugere: a) evitar a
estimulam o intelecto dentro da cultura de utilização isolada dos testes de QI para o
cada um e em seu ambiente real (GARDNER; diagnóstico ou entrada do aluno no
KORNHABER; WAKE, 1998). A forma mais programa e utilizá-los sempre associados a
efetiva de se medir a inteligência deve outras fontes de informação; b) combinar
contemplar a utilização de vários tipos de dados advindos de várias fontes (como
medidas, como escalas de comportamento, escalas de comportamento) para se obter
observação, análise de produtos e de uma visão mais ampla das várias habilidades
desempenho em tarefas reais, em adição a dos alunos em áreas diversas; c) reconhecer
tradicionais testes lápis-e-papel. Desta forma, que os testes de QI são sensíveis às
deve-se permitir aos alunos que usem os diferenças étnicas, linguísticas e

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.50-66


VIRGOLIM, A. A identificação de alunos para programas especializados na área de altas habilidades/superdotação

socioeconômicas e, portanto, devem ser não tome conhecimento do seu grande


aplicados com estas restrições em mente; e potencial (DAVIS; RIMM, 1994; GALBRAITH;
d) reconhecer que os testes devem ser DESLILE, 1996; LUPART; TOY, 2009; OLENCHAK;
usados para inclusão, e não a exclusão dos REIS, 2002). Silverman (2013) sugere que é a
alunos. alta motivação e a realização na área de
interesse que se tornam os maiores
A identificação de grupos especiais indicadores de altas habilidades nesse
grupo.
Outra questão apontada pela literatura
na área das altas habilidades/superdotação Albert Einstein, Auguste Rodin e
é que a identificação deve iniciar de forma Woodrow Wilson, por exemplo, tinham
que inclua tantos alunos quanto for possível, dificuldades de aprendizagem da leitura e
garantindo o direito dos que se qualificam escrita (LUPART; TOY, 2009). Isaac Newton 58
para o serviço especial. Diferentes tipos de tirava notas baixas, enquanto John Kennedy
informação devem ser obtidos para se reduzir recebia constantemente em seu boletim
as chances de incorretamente excluir alunos anotações sobre sua dificuldade em soletrar
que poderiam se beneficiar do programa, e tinha baixo rendimento escolar (GALBRAITH;
como os membros de grupos minoritários, DESLILE, 1996). Goertzel e Goertzel
alunos de baixa renda, de outras culturas, (1962/2004) encontraram, em seu estudo
com problemas de aprendizagem e as original com 400 pessoas eminentes, que
meninas; e também aqueles que são tímidos, jovens talentos frequentemente não foram
diferentes em termos da língua ou cultura, reconhecidos por seus professores como
que têm deficiências ou incapacidades tendo grande potencial. De fato, alguns,
(dupla excepcionalidade), que são incluindo Thomas Edison, Marcel Proust, Albert
precoces, estão em salas de aula que não Einstein, Sergei Rachmaninoff, Karl Menninger
encorajam suas habilidades ou escolhem e Wiston Churchill foram percebidos por seus
não demonstrar estas habilidades (ALENCAR, professores como “lerdos” e
2012; BERNAL, 2009; CALLAHAN, 2009; HANY, “desinteressados”. Além disso, ¼ da amostra
1993; GALLAGHER; GALLAGHER, 1994; tinha algum tipo de deficiência ocorrida na
JOHNSEN, 2009; RENZULLI, 2009; RENZULLI; infância (como cegueira; surdez; deficiência
REIS, 1997). física; sobrepeso; tamanho inferior à média;
doença; problema de fala), sendo que a
O superdotado com distúrbios de necessidade de compensar tais dificuldades
aprendizagem - A preocupação com as surgiu como importante fator em seu desejo
necessidades educacionais de grupos de se sobressair. Schneider (2000), por sua
minoritários ganhou adeptos nas últimas duas vez, comenta que dois futuros ganhadores do
décadas, com o movimento educacional de Prêmio Nobel, William Schockley, inventor do
inclusão para todos. Embora não seja um transistor, e Luis Alvarez, que ganhou o prêmio
fenômeno contemporâneo, exemplos na área de física, foram rejeitados no famoso
históricos de pessoas com deficiências, estudo de Terman por não terem QI altos o
incapacidades ou desordens que deram suficiente para colocá-los na amostra.
contribuições significativas à sociedade
surgem como exemplos paradoxais na área A despeito do notório reconhecimento
das altas habilidades/superdotação (sendo destes e outros indivíduos que se tornaram
denominada de dupla-excepcionalidade). eminentes, é provável que muitos indivíduos
Em geral, o superdotado com distúrbio de com deficiências ou incapacidades não
aprendizagem exibe fortes talentos e chegam a desenvolver suas áreas de
habilidades em algumas áreas (como habilidade em potencial por falta de
pensamento abstrato e resolução de reconhecimento, apoio e instrução
problemas) e fraquezas e deficiências em inadequada (LUPART; TOY, 2009).Além disso,
outras (como memória e habilidade sofrem com o mito recorrente nas escolas de
perceptual). Embora brilhantes e inteligentes que deficiência de aprendizagem é sinônimo
em uma ou mais áreas, apresentam grandes de habilidade abaixo da média (OLENCHAK;
dificuldades em outras áreas, o suficiente REIS, 2002).
para que o professor – ou mesmo os pais –
Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.50-66
VIRGOLIM, A. A identificação de alunos para programas especializados na área de altas habilidades/superdotação

Sem o devido acompanhamento superdotado. Por isso mesmo precisam ser


escolar, esta dicotomia entre habilidades precocemente identificadas para receber
manifestas em algumas áreas e dificuldades intervenção individualizada com o objetivo
em outras pode levar a severos problemas de de desenvolver ao máximo seu potencial.
comportamento, depressão e falta de Moon (2002) alerta para o fato de que a
esforço nas atividades escolares (BAUM, 1984; identificação incorreta pode ter
1988). É especialmente confuso para os consequências negativas para o
próprios indivíduos se perceberem como desenvolvimento socioemocional da criança
portadores tanto de altas habilidades quanto com altas habilidades/ superdotação, que
de problemas de aprendizagem, o que leva não teria suas reais necessidades
a sentimentos de desamparo e frustração, educacionais supridas e ainda incorreria no
baixo autoconceito e perda de confiança perigo de receber um tratamento
em si mesmos (BAUM; OWEN, 1988). Na inadequado, como por exemplo, uma 59
escola, estes alunos são geralmente desnecessária medicação.
agressivos, bagunceiros, não fazem as tarefas
No entanto, muitas crianças são
escolares, e quando o fazem, tendem a ser
corretamente identificadas e apresentam
relaxados e pouco esforçados. Buscando a
altas habilidades e TDA/H combinados. Elas
perfeição, estes alunos estabelecem altos
podem se concentrar muito bem em assuntos
padrões para si mesmos, e quando não
que sejam interessantes, ou em material novo
podem atingi-los, sentem-se fracassados.
que é apresentado em um ritmo rápido ou
Sentimentos de desconforto, embaraço e
que seja altamente recompensador;
vergonha, intensa frustração e raiva, assim
contudo, não conseguem se focalizar bem
como dificuldades interpessoais com os
em material menos estimulante, mesmo
pares, professores e com a família são
quando é vantajoso para elas. “Esta é a
também características do grupo de pessoas
natureza do TDA/H: dificuldade em sustentar o
com dupla excepcionalidade, que podem se
foco no material necessário para aprender
transformar em dificuldades emocionais e
uma técnica ou produzir um produto
comportamentais (BAUM; OWEN; DIXON, 1991;
específico que seja menos estimulante ou
GUNDERSON; MAESCH; REES; 1987; YEWCHUK;
menos interessante” (LOVECKY, 2005, p. 66).
LUPART, 1993).
Crianças que são particularmente inteligentes
Os superdotados com transtorno do e brilhantes podem, em séries iniciais, prestar
déficit de atenção/hiperatividade - No grupo atenção apenas em uma pequena porção
de dupla excepcionalidade encontram-se do tempo que passa em sala de aula, mas
também os superdotados com transtorno do devido ao seu alto potencial intelectual,
déficit de atenção/hiperatividade (TDA/H). podem se sair perfeitamente bem nos testes e
Muitos autores no campo da superdotação tarefas escolares quando comparadas com
têm observado que este grupo tem sido seus pares (WEBB et al, 2005). Além disso,
frequentemente mal identificado ou conforme salienta Moon (2002), crianças com
diagnosticado erroneamente como tendo dupla excepcionalidade nesta área podem
TDA/H, quando, na verdade, a fonte do mascarar o déficit de atenção por um
problema pode residir em questões tempo, tornando-o menos visível; porém,
relacionadas a um ambiente escolar pouco esconder o déficit de atenção traz efeitos
estimulante, que pode levar a problemas de negativos para sua autoestima, na medida
comportamento (LOVECKY, 2005; MOON, em que também tenta esconder (sem
2002; WEBB; AMEND; WEBB; GOERSS; BELJAN; sucesso) sua desorganização, o sonho
OLENCHAK, 2005). Ourofino (2007) ressalta acordado, a fala incessante, a inabilidade
que os comportamentos superdotados como de ficar quieta e a imaturidade social,
sintomas de TDA/H são, na verdade, característicos deste transtorno.
características de altas
Crianças e jovens com altas
habilidades/superdotação e estão
habilidades e TDA/H combinados necessitam
associados aos traços de intensidade e
de um ambiente escolar e familiar bem
superexcitabilidade que marcam o
planejado para que possam desenvolver a
comportamento assincrônico do
contento suas habilidades superiores. Lupart

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.50-66


VIRGOLIM, A. A identificação de alunos para programas especializados na área de altas habilidades/superdotação

e Toy (2009) recomendam que as pessoas ideias, fascinações e atividades. Por outro
que cercam as crianças e jovens com dupla lado, podem apresentar talentos
excepcionalidade, especialmente extraordinários que necessitam apoio e
professores e coordenadores da área de desenvolvimento a fim de levarem vidas mais
Educação Especial, se familiarizem bem com produtivas.
as características da pessoa com altas
As meninas superdotadas - As meninas
habilidades/ superdotação e criem situações
são outro grupo negligenciado na
onde as pessoas com deficiências ou
identificação dos superdotados. Tanto no
dificuldades possam mostrar suas habilidades
Brasil quanto na América do Norte e em
e talentos. Eles também recomendam que
países da Europa, o fenômeno se repete:
seja utilizada uma abordagem
meninas são menos indicadas para os
multidimensional na identificação de alunos
programas especiais do que os meninos 60
com dupla excepcionalidade, utilizando-se
(VAN-TASSEL BASKA, 1998). A educação
de testes formais de inteligência e de
feminina tem recebido uma baixa prioridade
aptidão, da nomeação por professores ou
no decorrer da história, onde o papel de
pais e plena observação do aluno em seu
mãe, subserviente ao homem, com a escolha
ambiente de aprendizagem, de forma a
por carreiras ditas “mais femininas” (como a
facilitar uma visão equilibrada e holística das
área da saúde e da pedagogia) limitou as
habilidades deste grupo.
oportunidades educacionais e profissionais
O superdotado com síndrome de para este grupo. Estereótipos com relação ao
Asperger - Nesta mesma linha de papel sexual predominante na cultura
pensamento, também crianças brilhantes ocidental e espelhados nos meios de
com Síndrome de Asperger podem se comunicação e livros-textos tendem a
beneficiar de uma educação especial apresentar a mulher como mais adequada
quando bem direcionada por mentores, para determinadas funções e profissões e
como advoga Temple Grandin (2009). Aos apontar determinadas atividades como mais
três anos, Grandin apresentava todos os apropriadas para o sexo feminino (ALENCAR;
sintomas de autismo, como ausência de fala VIRGOLIM, 2001). Muitas meninas têm sido
e de contato pelo olhar, ataques de birra e histórica e sistematicamente desencorajadas
agressividade e brincadeira solitária. por seus pares, pela família e pela escola a
Contudo, ela se formou em Psicologia e fez usar seus talentos de forma produtiva, sendo
mestrado e doutorado em Zoologia pela sutilmente ensinadas a evitar as áreas de
Universidade de Illinois. Hoje ministra cursos ciência e tecnologia (DAVIS; RIMM, 1994).
na Universidade Estadual do Colorado a
Segundo Phelps (2009), ainda hoje,
respeito de comportamento de rebanhos e
expectativas culturais e sociais que inculcam
projetos de instalação, além de prestar
valores, crenças e comportamentos,
consultoria para a indústria pecuária em
continuam a limitar a realização acadêmica
manejo, instalações e cuidado de animais.
e colocar barreiras no desenvolvimento do
Ela comenta sobre a grande ênfase que as
talento para as meninas que, por sua vez,
escolas colocam nas deficiências, e a falta
escondem suas habilidades usando uma
de ênfase nas áreas fortes, como por
variedade de estratégias de defesa. Também
exemplo, nos padrões de pensamento viso-
são relatados diferenças de gênero nas
espacial ou auditivo que estas pessoas
escolas, onde professores chamam mais os
podem apresentar; e fortemente recomenda
meninos do que as meninas para
estratégias a serem utilizadas com ajuda de
responderem a questões, reforçam mais
mentores para o desenvolvimento deste
prontamente os meninos por seus
grupo. Lovecky (2005) aponta que crianças
comportamentos assertivos do que as
com Síndrome de Asperger apresentam
meninas, avaliando mais os trabalhos dos
muitas dificuldades na área de comunicação
meninos por sua criatividade e das meninas
e de habilidades sociais; embora possam se
pela organização, e fornecendo mais do seu
interessar por outras crianças, geralmente
tempo e orientação para os meninos em
têm dificuldade em fazer amizades. O que
resolução de problemas, mas dando a
realmente importa a eles são suas próprias
resposta correta para as meninas. À medida

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.50-66


VIRGOLIM, A. A identificação de alunos para programas especializados na área de altas habilidades/superdotação

que estes comportamentos se repetem na sociedade como um todo, afetam as


vida escolar das meninas em direção ao meninas e como combater os estereótipos e
ensino superior, sua autoestima e confiança vieses sobre o papel feminino dentro da
diminuem, em um claro contraste com o própria família. Silverman (1993) aponta para
brilho e confiança demonstrada nos anos o papel crucial dos pais em fornecer uma
iniciais (PHELPS, 2009).Assim, as influências base emocional segura para suas filhas, em
culturais e ambientais criam tensão na um ambiente que encoraja a exploração, a
escolha das carreiras das meninas, que independência de pensamento e de
sentem que devem escolher entre as comportamento, assim como tolerância pelas
expectativas do seu papel profissional e as mudanças.
responsabilidades familiares. Muitas vezes
Na escola, múltiplas intervenções
essas meninas brilhantes escolhem reduzir seu
devem ser cuidadosamente pensadas. 61
desempenho escolar, mostrando
Silverman (1993, 2013) sugere que as
gradualmente menos envolvimento com
meninas podem se beneficiar, em muito, da
metas estabelecidas (KERR, 1997; SILVERMAN,
identificação precoce da superdotação
1993), comprometendo suas contribuições
entre as idades de 3 e 7 anos, antes que elas
criativas ao mundo que a cerca, e
se tornem “invisíveis” e antes que isto afete
impedindo a realização plena de seus
sua confiança e grau de aspiração.Kerr
potenciais.
(1997) argumenta que crianças pré-escolares
Em geral, nas meninas a superdotação que mostram sinais de prontidão para a
é mais evidente em idades precoces do que escola – vocabulário avançado, leitura
em meninos, pois elas costumam se precoce, habilidades em matemática e uma
desenvolver mais cedo, tendem a obter sede por aprender – deveriam ser admitidas
melhores notas na escola e a mostrar melhor mais cedo no programa para altas
ajustamento social (KERR, 1997; SILVERMAN, habilidades, dando a elas o “benefício da
1993). No entanto, durante os anos pré- dúvida” (p. 489) mesmo quando os testes
escolares, as meninas comumente aprendem tradicionais ainda não possam ser aplicados,
a esconder suas altas habilidades por medo devido à limitação de idade.
de serem rejeitadas por seus pares,
Van-TasselBaska (1998) sugere também
modificando seu comportamento de acordo
que dentro do âmbito escolar seja
com as normas sociais do grupo; elas são
propiciado exemplos de mulheres bem-
camaleões: simplesmente misturam-se no
sucedidas que possam servir como modelos
grupo e se tornam invisíveis (SILVERMAN,
para as meninas; e outras intervenções,
2013). Este comportamento se torna mais
comoa utilização de mentores,
evidente na adolescência. O estudo de Kerr,
oportunidades para aconselhamento,
Colangelo e Gaeth (1988, apud KERR, 1997)
agrupamento de meninas para trabalhos
sobre as atitudes de adolescentes com
escolares, intervenção sistemática nas séries
relação à sua própria superdotação, mostrou
iniciais em áreas críticas como ciência e
que as meninas superdotadas estavam muito
matemática, maior atenção das professoras
mais preocupadas com o impacto de seus
às exigências e necessidades individuais das
talentos nas atitudes dos outros do que os
meninas e maior envolvimento das famílias
meninos. Apesar de perceberem certas
em todo este processo.
vantagens sociais em serem superdotadas, as
meninas percebiam mais desvantagens que Palavras finais
os meninos, mostrando uma grande
ambivalência sobre o rótulo “superdotado” e Nos últimos anos, percebe-se a
uma grande preocupação com que os preocupação e interesse de um grande
outros iriam pensar. número de pesquisadores pelo estudo da
Van-TasselBaska (1998) alerta para o superdotação, incluindo populações
importante papel que a família tem neste especiais que se encontram em risco social e
processo. Pais devem entender como os educacional e que mostram um grande
sinais sutis de sexismo ou discriminação potencial para o desenvolvimento de suas
contra as mulheres, expressos pela altas habilidades. Nosso entendimento sobre

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.50-66


VIRGOLIM, A. A identificação de alunos para programas especializados na área de altas habilidades/superdotação

as necessidades cognitivas e afetivas deste talento, dotação e educação. Curitiba:


grande grupo se ampliou, nos preparando Juruá, 2012, p. 85-94.
melhor para a sua identificação e para o
ALENCAR, E. M. L. S., BLUMEN-PARDO, S.;
fornecimento de serviços especializados,
CASTELLANOS-SIMONS, D. Programs and
destinados ao aproveitamento e
practices for identifying and nurturing
direcionamento do enorme potencial que
giftedness and talent in Latin American
nossas crianças e jovens têm a oferecer para
countries. In: Heller, K. A.; Mönks, F. J.;
eles mesmos e para o nosso país.
Sternberg, R.J.; Subotnik, R. F. (Eds.).
Novas teorias têm surgido, e com ela International handbook of giftedness and
concordâncias e discordâncias teóricas, em talent, 2nd ed. Oxford: Elsevier Science,2000,
grande parte como resultado do crescimento p. 817-828.
da área e do número crescente de 62
ALENCAR, E. M. L.; VIRGOLIM, A. M. R.
evidências de pesquisas que subsidiam a
Dificuldades emocionais e sociais do
prática educacional. Os desafios da área
superdotado. In: Alencar, E. M. L. S.
são constantes e muito mais pesquisas são
Criatividade e educação dos superdotados.
necessárias para que tenhamos indicadores
Petrópolis, RJ: Vozes, 2001, p.174-205.
para as inúmeras perguntas que estão ainda
sem respostas. No âmbito do Brasil, enquanto BAUM, S. Meeting the needs of learning
vemos crescer o número de publicações disabled gifted students. Roeper Review, 7, p.
sobre o assunto – sem dúvida uma grande 16-19, 1984.
conquista para o nosso país –, vemos _____. An enrichment program for gifted
também crescer a necessidade de obtermos learning disabled students. Gifted Child
mais dados sobre a população brasileira Quartely, v. 1, n. 32, p. 226-230, 1988.
com altas habilidades/superdotação. Dados
de pesquisa também poderão embasar BAUM, S.; OWEN, S. V. High ability/learning
nosso próprio corpo teórico e permitir a disabled students: how are they different?
construção de instrumentos fidedignos, Gifted Child Quartely, v. 3, n. 32, p. 321-326,
padronizados e validados na nossa 1988.
população. Nossos professores ainda BAUM, S., OWEN, S. V.; DIXON, J. To be gifted
precisam de capacitação nesta área, nossas & learning disabled: from identification to
escolas ainda precisam oferecer serviços practical intervention strategies. Mansfield,
especializados para este grupo e nosso país CT: Creative Learning Press, 1991.
ainda precisa abraçar política e
efetivamente o campo das altas BERNAL, E. M. Multicultural assessment. In: Kerr,
habilidades/superdotação. É de trabalho e B. (Ed.).Encyclopedia of giftedness, creativity,
esforço conjuntos que precisamos para and talent. vol. 2. Washington, DC: SAGE,
vencer preconceitos e conseguir mudar este 2009,p. 594-597.
cenário no Brasil. Como bem assinalou nossa BORLAND, J. H. IQ tests: Throwing out the
querida e inesquecível Maria Helena Novaes, bathwater, saving the baby. Roeper Review,
em sua última obra, “Paradoxos n. 8, p. 163-167, 1986.
contemporâneos” (NOVAES, 2008):
BRASIL. Política Nacional de Educação
Contradições e incertezas estarão sempre Especial na Perspectiva da Educação
presentes; cabe, portanto, aos homens
encontrarem caminhos e alternativas para Inclusiva. Portaria Ministerial nº 555.
viabilizarem a expansão do conhecimento e do Disponível em:
saber com vistas à promoção e o bem-estar http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/politic
social de todos, além da construção de um a.pdf.Acesso em: 10 jun., 2008.
mundo mais justo, humano e criativo. (p. 152)
_____.Resolução nº 2. Institui as diretrizes da
Referências educação especial na educação básica.
Conselho Nacional de Educação/Câmara de
ALENCAR, E. M. L. S. O aluno superdotado na Educação Básica. Brasília, 2001.
escola inclusiva. In: Moreira, L. C. ; T. Stoltz
CALLAHAN, C. M. Giftedness, definition. In:
(Org.) Altas Habilidades/superdotação,
Kerr, B. (Ed.). Encyclopedia of giftedness,

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.50-66


VIRGOLIM, A. A identificação de alunos para programas especializados na área de altas habilidades/superdotação

creativity, and talent. v. 1.Washington, DC: talent, or ability. Gifted Child Quarterly, 28 (4),
SAGE, 2009, p. 386-390. 149-151, 1984.
CHAGAS, J. F. Adolescentes talentosos: FELDHUSEN, J. F.; JARWAN, F. A. Identification
Características individuais e familiares. Tese of gifted and talented youth for educational
de doutorado. Universidade de Brasília, programs. In: HELLER, K. A.; MÖNKS, F. J.;
Brasília, 2008. STERNBERG, R.J.; SUBOTNIK, R. F. (Eds.).
International handbook of giftedness and
CLARK, B. Growing up gifted: developing the
talent. 2nd ed. Oxford: Elsevier Science, 2000,
potential of children at home and at school.
p. 271-282.
New York: Macmillan Publishing Company,
1992. FLEITH, D. S.; ALENCAR, E. M. L. S.
Superdotados: Trajetórias de desenvolvimento
COLANGELO, N.; DAVIS, G. A. (Eds.).Handbook 63
e realizações. Curitiba: Juruá, 2013.
of gifted education. 2nd ed. Needham
Heights, MA: Allyn and Bacon, 1997. FLEITH, D. S.; VIRGOLIM, A. M. R. Brazilian
schools: Psychologists' training course in gifted
CUPERTINO, C. M. B. Um olhar para as altas
education. Gifted Education International, n.
habilidades: construindo caminhos.
13, p. 258-264, 1999.
Secretaria da Educação do Estado de São
Paulo, CENP/CAPE. São Paulo: FDE, 2008. FREEMAN, J. Permission to be gifted: how
conceptions of giftedness can change lives.
DAI, D. Y. Essential tensions surrounding the
In: STERNBERG,R. J.; DAVIDSON, J. E.
concept of giftedness. In:SHAVININA, L. V.
(Eds.).Conceptions of giftedness. 2nd ed. New
(Ed.).International handbook on giftedness.
York: Cambridge University Press, 2005, p. 80-
Part One. Gatineau, Quebec: Springer, 2009,
97.
p. 39-80.
______. Cultural conceptions of gifted. In:
DAVIS, G. A. Gifted children and gifted
KERR, B. (Ed.).Encyclopedia of giftedness,
education: a handbook for teachers and
creativity, and talent. vol. 1. Washington, DC:
parents. Scottsdale, AZ: Great Potential Press,
SAGE, 2009. p. 227-229.
2006.
FREITAS, S. N.; PÉREZ, S.G.P.B. Altas
DAVIS, G. A.; RIMM, S. B. Education of the
habilidades/superdotação: atendimento
gifted and talented. 3rd ed. Needham Heights,
especializado. Marília, SP: ABPPEE, 2010.
MA: Allyn and Bacon, 1994.
GALBRAITH, J.; DELISLE, J. The gifted kid’s
DELOU, C. M. C. Educação do aluno com
survival guide: a teen handbook. Minneapolis,
altas habilidades/ superdotação: Legislação
MN: Free Spirit Publishing, 1996.
e Políticas Educacionais para a inclusão. In:
FLEITH, D. S. (Org.).A construção de práticas GALLAGHER, J. J. The meaning and making of
educacionais para alunos com Altas giftedness. In: COLANGELO, N.; DAVIS, G. A.
habilidades/Superdotação. Vol. 1. Brasília, DF: (Eds.). Handbook of gifted education. 2nd ed.
MEC/SEESP, 2007, p. 25-39. Needham Heights, MA: Allyn and Bacon,
1997, p. 27-42.
DUTRA, C. P. Educação Inclusiva: tempo de
transformação: Apresentação. In: Gotti,M. O. GALLAGHER, J. J.; GALLAGHER, S. A. Teaching
(Org.).Direito à Educação: subsídios para a the gifted child. 4th ed. Needham Heights, MA:
gestão dos sistemas educacionais: Allyn and Bacon,1994.
orientações gerais e marcos legais. Brasília:
GAMA, M.C.S. Educação de superdotados:
MEC, SEESP, 2004.
teoria e prática. São Paulo: EPU, 2006.
FELDHUSEN, J. F. Giftedness, talent, expertise,
GARDNER, H. Mentes extraordinárias: perfis de
and creative achievement. In: Sternberg, R.
quatro pessoas excepcionais e um estudo
J.; Davidson, J. E. (Eds.). Conceptions of
sobre o extraordinário em cada um de nós.
giftedness. 2nd ed. New York: Cambridge
Trad. Gilson B. Soares. Rio de Janeiro: Rocco,
University Press, 2005, p. 64-79.
1999.
FELDHUSEN, J. F., ASHER, J.W.; HOOVER, S.M.
Problems in the identification of giftedness,

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.50-66


VIRGOLIM, A. A identificação de alunos para programas especializados na área de altas habilidades/superdotação

GARDNER, H.; KORNHABER, M. L.; WAKE, W. K. MACHADO, J. B.; RAPOSO, H. A. D.


Inteligência: múltiplas perspectivas. Trad. M. Superdotado: como identificar, desenvolver,
A. V. Veronese. Porto Alegre: ArtMed, 1998. integrar. Rio de Janeiro, RJ: Rotary Club,1989.
GOERTZEL; GOERTZEL. Cradles of eminence. MAIA-PINTO, R. R; FLEITH, D. S. Percepção de
Childhoods of more than 700 men and professores sobre alunos superdotados.
women. 2nd ed. with updates by T.G. Goertzel Estudos de Psicologia, v. 1., n. 19, p. 78-90,
and Ariel Hansen. Scottsdale, AZ: Great 2002.
Potential Press, 1962/2004.
MOLTZEN, R. Talent development across life
GRANDIN, T. Asperger’s syndrome. In: Kerr, B. span. In:Shavinina, L. V. (Ed.).International
(Ed.).Encyclopedia of giftedness, creativity, handbook on giftedness. Part One. Gatineau,
and talent. vol. 1Washington, DC: SAGE, 2009, Quebec: Springer, 2009, p. 353-379.
p. 62-63. 64
MOON, S. M. Gifted children with attention-
GUBBINS, E. J. NRC/GT offers a snapshot of deficit / hyperactivity disorder. In: NEIHART, M.;
intelligence. The National Research Center on REIS, S. M.; ROBINSON, N. M.; MOON, S. M.
the Gifted and Talented, 1-2, 2005, winter. (Eds.).The social and emotional development
of gifted children. Texas: Prufrock Press, 2002,
GUNDERSON, C.W.; MAESCH, C.; REES, J.W.
p. 193-204.
The gifted/learning disabled student. Gifted
Child Quartely, 31 (4), 158-160, 1987. MOREIRA, L. C.; STOLTZ, T. Altas
habilidades/superdotação, talento, dotação
GUENTHER, Z. C. Desenvolver capacidades e
e educação. Curitiba: Juruá, 2012.
talentos: um conceito de inclusão.Petrópolis,
RJ: Vozes, 2000. NOVAES, M. H. O desenvolvimento psicológico
do superdotado. São Paulo, SP: Atlas,1979.
HANY, E. A. Methodological problems and
issues concerning identification. In: HELLER, K. _____. Paradoxos contemporâneos. Rio de
A.; MÖNKS, F. J.; PASSOW, A. H. (Eds.). Janeiro: E-papers, 2008.
International handbook and development of
OLENCHAK, F. R.; REIS, S. M. Gifted students
giftedness and talent. Oxford: Pergamon
with learning disabilities. In: NEIHART, M.; REIS,
Press, 1993, p. 209-232.
S. M.; ROBINSON, N. M.; MOON, S. M.
JOHNSEN, S. K. Identification. In: Kerr, B. (Eds.).The social and emotional development
(Ed.).Encyclopedia of giftedness, creativity, of gifted children.Texas: Prufrock Press, 2002,
and talent. vol. 1Washington, DC: SAGE, 2009, p. 177-192.
p. 439-443.
OUROFINO, V. T. A. T. Altas habilidades e
KARNES, M.B.; JONHSON, L.J. Gifted hiperatividade: a dupla-excepcionalidade.
handicapped. In: COLANGELO, N.; DAVIS, In: FLEITH, D. S.; ALENCAR, E. M. S. (Orgs.),
G.A. (Eds.).Handbook of gifted education. Desenvolvimento de talentos e altas
Boston: Allyn and Bacon, 1991, p. 428-437. habilidades: orientação a pais e professores.
Porto Alegre: Artmed, 2007, p. 51-66.
KERR, B. Developing talents in girls and young
women. In: COLANGELO, N.; DAVIS, G.A. PFEIFFER, S. I. (Ed.)Handbook on giftedness in
(Eds.).Handbook of gifted education. 2nd ed. children: psychoeducational theory, research,
Needham Heights, MA: Allyn; Bacon, 1997, p. and best practices. Springer-Verlag New York,
483-497. LLC, 2008.
LOVECKY, D. V. Different minds: gifted children PHELPS, C. L. Girls, gifted. In: Kerr, B.
with AD/HD, Asperger Syndrome, and other (Ed.).Encyclopedia of giftedness, creativity,
learning deficits. 3rd. ed. London, UK: Jessica and talent. vol. 1.Washington, DC: SAGE,
Kingsley Publishers, 2005. 2009, p. 393-397.
LUPART, J.L.; TOY, R.E. Twice exceptional: PISKE, F. H. R.; STOLTZ, T. Criatividade na
multiple pathways to success. In: SHAVININA, L. escola: a necessidade de reavaliar as
V. (Ed.).International handbook on giftedness. práticas educacionais aos alunos
Part OneGatineau, Quebec: Springer, 2009,p. superdotados. In:PISKE, F. H. R.; BAHIA, S.
507-525. (Org.). Criatividade na escola: o

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.50-66


VIRGOLIM, A. A identificação de alunos para programas especializados na área de altas habilidades/superdotação

desenvolvimento de potencialidades, altas SABATELLA, M. L. P. Talento e superdotação:


habilidades/superdotação (AH/SD) e talentos. problema ou solução?Curitiba, PR: Ibpex,
Curitiba: Juruá, 2013, p. 141-157. 2005.
REILLY, R. C. Expertise. In: Kerr, B. SCHNEIDER, W. Giftedness, expertise, and
(Ed.).Encyclopedia of giftedness, creativity, (exceptional) performance: a developmental
and talent. v. 1. Washington, DC: SAGE, 2009, perspective. In: HELLER, K. A.; MÖNKS, F. J.;
p. 342-343. STERNBERG, R.J.; SUBOTNIK, R. F.
(Eds.).International handbook of giftedness
RENZULLI, J. S. What makes giftedness?
and talent. 2nd ed. Oxford: Elsevier Science,
Reexamining a definition. Phi Delta Kappan,
2000, p. 165-177.
v. 3. n. 60 , p. 180-184, 1978.
SILVERMAN, L. K. Counseling needs and
______. The three-ring conception of 65
programs for the gifted. In: HELLER, K. A.;
giftedness: a developmental model for
MÖNKS, F. J.; PASSOW, A. H.(Eds.).International
creative productivity. In: RENZULLI, J. S.; REIS, S.
handbook of research and development of
M. (Eds.).The triad reader. Mansfield Center,
giftedness and talent. Oxford: Pergamon
CT: Creative Learning Press, 1986, p. 2-19.
Press, 1993, p. 631-647.
______. Revolving Door identification Model.
______. Giftedness 101. In: J. C. Kaufman
In: Kerr, B. (Ed.).Encyclopedia of giftedness,
(Series Editor).The Psych 101 Series (Kindle
creativity, and talent. v. 2. Washington, DC:
Edition). NY: Sprienger, 2013.
SAGE, 2009, p. 736-740.
STERNBERG, R. J. Procedures for identifying
RENZULLI, J. S.; REIS, S. M. The schoolwide
intellectual potential in the gifted: a
enrichment model: a how-to guide for
perspective on alternative “metaphors of
educational excellence. 2nded. Mansfield
mind”. In: HELLER, K. A., MÖNKS, F. J.; PASSOW,
Center, CT: Creative Learning Press, 1997.
A. H. (Orgs.). International handbook and
______. The schoolwide enrichment model. development of giftedness and talent. Oxford:
In:HELLER, K. A.; MÖNKS, F. J.; STERNBERG, R.J.; Pergamon, 1993, p. 185-207.
SUBOTNIK, R. F. (Eds.). International handbook
______. Successful intelligence: how practical
of giftedness and talent. 2nd ed. Oxford:
and creative intelligence determine success
Elsevier Science, 2000,p. 367-382.
in life. New York: Simon and Schuster, 1996.
RICHERT, E. S. Rampant problems and
TANNEMBAUM, A. J. Gifted children:
promising practices in the identification of
psychological and educational perspectives.
disadvantaged gifted students. Gifted Child
New York: Macmillan Publishing Co, 1983.
Quarterly, v. 4, n. 31, p. 149-154, 1987.
______. The meaning and making of
______. Excellence with equity in identification
giftedness. In: COLANGELO, N.; DAVIS, G. A.
and programming. In: COLANGELO,N.;
(Eds.).Handbook of gifted education. 2nd ed.
DAVIS,G. A. (Eds.).Handbook of gifted
Needham Heights, MA: Allyn and Bacon,
education. 2nd ed. Boston: Allyn&Bacon, 1997,
1997, p. 27-42.
p. 75-88.
VANTASSEL-BASKA, J. Excellence in educating
RIMM, S.B. Underachievement and
gifted and talented learners. 3rd ed. Denver:
superachievement: flip slides of the same
Love Publishing Company, 1998.
psychological coin. In: COLANGELO, N.;
DAVIS, G. A. (Eds.).Handbook of gifted VIRGOLIM, A. M. R. O indivíduo superdotado:
education. Boston: Allyn and Bacon,1991,p. História, concepção e identificação.
328-343. Psicologia: Teoria e Pesquisa, v. 1, n, 13, p.
173-183, 1997.
ROBINSON, N. M. Individual differences in
gifted students attributions for academic VIRGOLIM, A. M. R. Creativity and
performances. In: NEIHART, M.; REIS, S. M.; intelligence: A study of Brazilian gifted and
ROBINSON, N. M.; MOON, S. M. (Eds.).The talented students. Tese de doutorado.
social and emotional development of gifted University of Connecticut, Mansfield, CT. USA,
children. Texas: Prufrock Press, 2002,p. 61-70. 2005.

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.50-66


VIRGOLIM, A. A identificação de alunos para programas especializados na área de altas habilidades/superdotação

______. (Org.) Talento Criativo: expressão em PASSOW, A. H. (Eds.). International handbook


múltiplos contextos. Brasília: UnB, 2007a. of research and development of giftedness
and talent. Oxford: Pergamon Press, 1993,p.
______. Altas Habilidades e Desenvolvimento
253-281.
Intelectual. In: FLEITH, D. S.; ALENCAR, E. M. L.
S. (Orgs.).Desenvolvimento de Talentos e Altas ______. Giftedness in non-academic domains:
Habilidades. Orientação a pais e The case of the visual arts and music. In:
professores.Porto Alegre: Artmed, 2007b, HELLER, K. A.; MÖNKS, F. J.; STERNBERG, R. J.;
p.25-40. SUBOTNIK, R. F. (Eds.). International handbook
of giftedness and talent. 2nd ed. Oxford:
WEBB, J.T., AMEND, E.R., WEBB, N.E., GOERSS,
Elsevier Science, 2000, p. 95-110.
J., BELJAN, P.; OLENCHAK, F.R. Misdiagnosis
and dual diagnosis of gifted children and YEWCHUK, C.R.; LUPART, J.L. Gifted
adults: ADHD, Bipolar, OCD, Asperger’s, handicapped: a desultory duality. In:HELLER, 66
Depression, and other disorders. Scottsdale, K. A.; MÖNKS, F. J.; PASSOW, A. H.
AZ: Great Potential Press, 2005. (Eds.).International handbook of research and
development of giftedness and talent. Oxford:
WINNER, E.; MARTINO, G. Giftedness in visual
Pergamon Press, 1993, p. 709-725.
arts and music. In: HELLER, K. A.; MÖNKS, F. J.;

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.50-66


ARAÚJO, M. R. de; ALENCAR, M. L. A criatividade no ensino de atenção às diferenças

A criatividade no ensino de atenção às diferenças: reflexões acerca da educação de


alunos com altas habilidades/superdotação

Creativity in teaching of attention to the differences: reflections about the education of


students with high abilities/giftedness.

Marisa Ribeiro de Araujo20


Maristela Lage Alencar21

RESUMO 67

O Brasil tem se destacado, na última década, pela vanguarda acerca dos projetos inclusivos. A atual
Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva se difere das demais, ao
assegurar a educação a todos os alunos em escolas comuns com a devida complementação do
ensino especial. Todavia, o atendimento destinado aos alunos com altas habilidades/superdotação tem
encontrado inúmeras barreiras. Dentre elas, a presença de mitos e crenças de que esses alunos,
apesar de comporem o público alvo da Educação Especial, não necessitam de atendimento
especializado. Nesse cenário, o presente artigo expõe algumas contribuições da literatura sobre o
tema, ressaltando a necessidade de se elaborar propostas e políticas de ações que substituam a
homogeneidade e a uniformidade presentes nas práticas escolares, privilegiando, nesses contextos, a
diferença e o desenvolvimento do potencial criativo dos alunos. Concluímos enfatizando que,
alicerçados na perspectiva da educação inclusiva, diversas estratégias didáticas e mediações
pedagógicas propostas aos alunos com altas habilidades/superdotação poderão impulsionar as
transformações necessárias à construção de uma escola de qualidade para todos.
Palavras-chave: Altas Habilidades/Superdotação. Inclusão. Criatividade.

ABSTRACT

Brazil has excelled, in the last decade, by forefront about inclusive projects. The current National Policy
on Special Education in the Perspective of Inclusive Education differs from the others, to ensure the
education to all students in ordinary schools with the complementation necessary of special education.
However, the service for students with high abilities/gifted has found numerous barriers. Among them, the
myths and beliefs of that these students, despite compose the target audience of Special Education, do
not require specialized complementary educational service. In this scenario, this paper presents some
contributions of the literature about the subject. Emphasizing the need to develop proposals and policies
of actions to replace the homogeneity and uniformity present school practices, focusing, in these
contexts, the difference and the development of the creative potential of students. We conclude by
emphasizing that, grounded in the perspective of inclusive education, various teaching strategies and
pedagogical mediations offered to students with high abilities / giftedness may drive the changes
necessary to build a high-quality education for all.

Keywords: High Abilities/Gifted. Inclusion. Creativity.


Recebido em: 06/06/2013
Aprovado em: 05/07/2013

20
Licenciada em Pedagogia pela Universidade Federal do Ceará – UFC (2000). Especialista em Psicopedagogia
Clínica e institucional pela Universidade Estadual do Ceará – UECE (2005). Mestre e Doutoranda em Educação
Brasileira pela Universidade Federal do Ceará – UFC (2011). Professora da Sala de Recurso Multifuncional – SRM, da
Prefeitura Municipal de Fortaleza. Endereço profissional: Universidade Federal do Ceará. E-mail:
marisa.rdearaujo@yahoo.com.br.
21
Mestre em Educação pela Universidade Federal do Ceará (1980). Doutora em Educação e Psicologia pela
Universidade Minho (2000). Professora Adjunto IV da Universidade Federal do Ceará/ Faculdade de Educação. E-
mail: lagealencar@secrel.com.

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.67-77


ARAÚJO, M. R. de; ALENCAR, M. L. A criatividade no ensino de atenção às diferenças

Decreto presidencial 6.571, de 17 de


setembro de 2008 (BRASIL, 2008b), revogado
Introdução pelo Decreto presidencial 7.611, de 17 de
novembro de 2011 (BRASIL, 2011) - tem sido
Na história da Educação Especial, o crescente para diversos autores a
quadro de exclusão escolar reproduz a compreensão da inclusão escolar como
exclusão social. Deste modo, os sistemas de impulsionadora da mudança do atual
ensino universalizam o acesso, mas persistem paradigma educacional. (DUTRA; GRIBOSKI,
em marginalizar indivíduos considerados fora 2006; MANTOAN, 2003; 2010; ROPOLI, 2010).
de seus padrões homogeneizantes. (SILVEIRA;
FIGUEIREDO, 2010). Nessa vertente, compreendemos que
para responder às necessidades individuais
O paradigma da homogeneidade dos alunos - construindo de fato uma escola 68
revela raízes profundas, evidenciando inclusiva - os sistemas educacionais
historicamente que a diferença desperta a precisam, conforme afiançam Silveira e
curiosidade, inquietação e, por vezes, Figueiredo (2010, p.19), elaborar propostas e
rejeição intensa. A pedagogia da exclusão políticas de ação que substituam a
possui origens remotas, em concordância homogeneidade e a uniformidade presentes
com a visão de homem e de mundo vigente nas práticas escolares, privilegiando nesses
em seu contexto sócio-histórico. Não obstante contextos a diferença. Destarte, “[...] devem
ao discurso da “educação como direito de levar em conta as características dos alunos
todos”, o contexto escolar hodierno ainda respeitando o seu estilo de aprendizagem,
encontra-se alicerçada na resistência ritmo, nível de desenvolvimento intelectual,
silenciosa e velada às diferenças. características do funcionamento cognitivo
A Educação Especial organizada, além de seu desenvolvimento afetivo-social”.
tradicionalmente, como atendimento Voltando-se, especificamente, para o
educacional especializado, substitutivo ao atendimento educacional destinado aos
ensino comum, resultou ao longo de sua alunos com altas habilidades/superdotação,
história na criação de instituições cumpre mencionar que a despeito das
especializadas, escolas especiais e classes diversas características comuns encontradas
especiais para atender ao seu público alvo. nessas pessoas, evidenciam-se uma
Todavia, na última década, nosso País se variedade de habilidades e competências,
destacou pela vanguarda acerca dos demonstradas em diferentes proporções, por
projetos inclusivos. (MANTOAN, 2007). A atual meio de suas performances. Essa
Política Nacional de Educação Especial na heterogeneidade se configura nas discussões
Perspectiva da Educação Inclusiva (BRASIL, acerca da definição desse fenômeno. A
2008a) difere-se das demais ao assegurar a identificação desses indivíduos requer,
educação a todos os alunos em escolas portanto, competência e compromisso dos
comuns com a devida complementação do envolvidos, a fim de evitar equívocos nesse
ensino especial. processo. (GUENTHER, 2000a; 2000b; LAGE et
Com a ampliação dos direitos das al., 1996; 1999; LAGE et al., 2000; OUROFINO;
pessoas com deficiência, transtornos globais GUIMARÃES, 2006).
do desenvolvimento e altas
habilidades/superdotação - relatada nas Altas habilidades/superdotação: conceito
propostas da Educação Inclusiva, presentes multidimensional
na Lei de Diretrizes e Bases da Educação
O fenômeno das altas
Nacional (LDB) nº. 9394/96 (BRASIL, 1996); nas
habilidades/superdotação, percebido de
resoluções advindas do Conselho Nacional
maneira multidimensional, abrange aspectos
de Educação; nos Marcos Político-legais da
concernentes ao desenvolvimento humano,
Educação Especial na Perspectiva da
incluindo além dos aspectos cognitivos,
Educação Inclusiva (BRASIL, 2010); nas
afetivos, neuropsicomotores e de
orientações da Política Nacional de
personalidade, os influenciados pelo
Educação Especial na Perspectiva da
contexto histórico e cultural no qual o
Educação Inclusiva (BRASIL, 2008a); no
Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.67-77
ARAÚJO, M. R. de; ALENCAR, M. L. A criatividade no ensino de atenção às diferenças

individuo está inserido. (OUROFINO; participar de programas especiais de


GUIMARÃES, 2006). Essa adoção de uma atendimento. Já o tipo produtivo-criativo:
perspectiva multidimensional, a exemplo das [...] descreve aqueles aspectos da atividade e
discussões sobre inteligência presentes nas do envolvimento humanos nos quais se incentiva
atuais pesquisas, evidencia que “[...] um o desenvolvimento de idéias, produtos,
ambiente enriquecedor, estimulante, é expressões artísticas originais e áreas do
conhecimento que são propositalmente
essencial para a identificação e para a concebidas para ter um impacto sobre uma ou
proposição de ações para sujeitos que mais platéias-alvo (target audiences). As
possuem tal necessidade específica de situações de aprendizagem concebidas para
aprendizagem”. (DELPRETTO; ZARDO; 2010, promover a superdotação produtivo-criativa
p.20). enfatizam o uso e a aplicação do conhecimento
e dos processos de pensamento de uma forma
Atualmente, o Ministério da Educação integrada, indutiva e orientada para um
69
(BRASIL, 2008a, p. 15) adota uma perspectiva problema real. (RENZULLI, 2004, p. 83).
multidimensional desse fenômeno ao definir Ao realizar amplas pesquisas sobre a
que natureza das altas habilidades/superdotação,
Alunos com altas habilidades/superdotação Renzulli (2004) interessou-se, especificamente,
demonstram potencial elevado em qualquer pelo tipo criativo-produtivo. A partir de então,
uma das seguintes áreas, isoladas ou conceituou as altas
combinadas: intelectual, acadêmica, liderança, habilidades/superdotação com base na
psicomotricidade e artes, além de apresentar
grande criatividade, envolvimento na interação dos seguintes elementos: i)
aprendizagem e realização de tarefas em áreas habilidade acima da média, ii) envolvimento
de seu interesse. com a tarefa e iii) criatividade.
Observamos nessa definição O Modelo dos Três Anéis, como é
semelhanças com a concepção de altas conhecido, tornou-se um marco teórico,
habilidades/superdotação, elaborada no sendo desenvolvido, simultaneamente, ao
referencial teórico denominado O Modelo Modelo Triádico de Enriquecimento. Os
dos Três Anéis, desenvolvido por Renzulli resultados das pesquisas o fizeram perceber
(1986), que, além das contribuições teóricas, a natureza temporal e situacional do tipo
fornece elementos práticos para a produtivo-criativo, sobretudo, nos
identificação e o desenvolvimento do componentes criatividade e envolvimento
potencial desse alunado, mediante com a tarefa. Ao passo que o tipo
programas de enriquecimento22. (ALENCAR, acadêmico que contempla, principalmente,
2007a; RENZULLI, 1986; 2004; 2005). a capacidade acima da média, possui
Renzulli (1986; 2004) distingue dois tipos determinada estabilidade no decorrer do
de altas habilidades/superdotação, vale tempo, divergente dos outros traços, que as
dizer, dois modelos de comportamentos, uma pessoas demonstram oscilações: níveis de
vez que decide utilizar o termo como adjetivo criatividade ou envolvimento com a tarefa.
e não como substantivo: i) escolar ou Nessa perspectiva, Virgolim (2006)
acadêmico e ii) produtivo-criativo. O tipo menciona as experiências exitosas advindas
escolar ou acadêmico refere-se às pessoas do Modelo de Enriquecimento Escolar (The
que aprendem com extrema facilidade e Schoolwide Enrichment Model – SEM), criado
possuem um nível mais elevado de e implementado nos Estados Unidos, por
compreensão; maior destaque, “facilmente” Renzulli, nos anos de 1970. Esse modelo
identificados e selecionados na escola para baseado em pesquisas empíricas tem
evidenciado o suprimento das necessidades
cognitivas e afetivas dos alunos envolvidos,
22
Programas de enriquecimento referem-se a um tipo fundamentando-se em três pilares:
de atendimento educacional, destinados aos alunos [...] (a) O Modelo dos Três Anéis, que
com altas habilidades/superdotação, mais utilizados basicamente fornece os pressupostos filosóficos
nas escolas regulares. As atividades desenvolvidas são utilizados pelo SEM; (b) o Modelo de
compatíveis com seus interesses e necessidades. Dentre Identificação das Portas Giratórias (RDIM), que
os modelos de enriquecimento presentes na literatura fornece os princípios para a identificação e
especializada destaca-se o criado por Renzulli. formação de um Pool de Talentos; e o Modelo
(PEREIRA; GUIMARÃES, 2007).

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.67-77


ARAÚJO, M. R. de; ALENCAR, M. L. A criatividade no ensino de atenção às diferenças

Triádico de Enriquecimento, que implementa as desenvolvimento de um autoconceito


atividades de Enriquecimento para todos os positivo. (CHAGAS; MAIA-PINTO; PEREIRA,
alunos no contexto escolar. (VIRGOLIM, 2006,
p.306). 2007). As atividades de enriquecimento do
tipo III objetivam investigar problemas reais
O Modelo de Identificação das Portas por meio de métodos de pesquisas:
Giratórias (Rotatory Door Identification Model- produção de conhecimentos originais,
RDIM) foi criado por Renzulli em parceria com solução de problemas ou apresentação de
as pesquisadoras Reis e Smith (RENZULLI; um produto, serviço ou performance. Essas
SMITH; REIS, 1981), com objetivo de atividades visam ao desenvolvimento de
evidenciar na prática, dentre outros habilidades de planejamento,
conceitos, a concepção de superdotação gerenciamento do tempo, avaliação e
da Teoria dos Três Anéis. Esse modelo busca habilidades sociais de interação. Possibilitam
aprovisionar diversas experiências de ao aluno vivenciar o papel de “aprendiz de 70
enriquecimento geral (dos tipos I e II de primeira mão” e “produtor de conhecimento”
acordo com o Modelo Triádico de ao experimentar procedimentos e atitudes
Enriquecimento) a um grupo de alunos semelhantes aos de um profissional de uma
talentosos (pool de talentos) identificados área específica do conhecimento. Variadas
com capacidade acima da média. Esses são as atividades a serem desenvolvidas:
alunos são avaliados ao serem observadas desenvolvimento de projetos coletivos e
suas respostas a essas experiências para, individuais; grupos de pesquisa de estudos
posteriormente, serem selecionados os que específicos; criação de peças teatrais,
avançarão para as atividades do tipo III de revistas, livros. Estudos destacam nesse
acordo com as áreas de estudos de contexto, a importância da função
interesse. mediadora do professor. Assinalam, ainda,
O Modelo Triádico de Enriquecimento que as atividades do tipo I, II e III não são
propõe a implementação de atividades de concebidas de forma linear e podem ser
enriquecimento: tipos: I, II e III. As atividades implementadas conforme seu
do tipo I se referem a experiências e desenvolvimento e mais: uma atividade não
atividades exploratórias ou introdutórias, que constitui pré-requisito para outra. (CHAGAS;
visam possibilitar ao aluno o contato com MAIA-PINTO; PEREIRA, 2007).
vários tópicos ou áreas de conhecimento, Ao descrever seu modelo de
comumente, não apreciadas no currículo identificação de alunos com altas
regular. Todos os alunos da sala de aula habilidades/superdotação, Renzulli (2005)
podem participar das atividades vivenciadas assinala a inexistência de um sistema de
que, a propósito, devem ser planejadas a identificação perfeito, tampouco uma única
partir do interesse da turma (palestras forma de desenvolver programas de
proferidas por profissionais e especialistas, atendimento devido, sobretudo, às diversas
oficinas, visitas a instituições, bibliotecas, concepções presentes na literatura
museus e eventos culturais e pesquisas na especializada. Ressalta, entretanto, o
internet). Ademais, esse tipo de atividade imperativo de haver coerência entre os
exploratória apresenta, dentre outros critérios adotados para essa identificação e
objetivos, o enriquecimento curricular e a os objetivos propostos no programa de
prática assentada na experiência de todos atendimento.
os alunos, de modo a propiciar e
desencadear atividades do tipo II e III. Importa elucidar, que a necessidade
(CHAGAS; MAIA-PINTO; PEREIRA, 2007). de implementação de contextos
enriquecidos de aprendizagem, demanda
Nas atividades do tipo II, utilizam-se sua inserção no Projeto Pedagógico da
métodos, materiais e técnicas instrucionais instituição escolar, prevendo a participação
que colaboram para o incremento de níveis de toda comunidade no desenvolvimento de
superiores de pensamento (análise, síntese e um trabalho colaborativo. Delpretto e Zardo
avaliação), diversas habilidades criativas e (2010) asseveram que a adoção de uma
críticas, de pesquisa, liderança, abordagem colaborativa, entre a
comunicação, bem como, o comunidade escolar e o professor da Sala de

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.67-77


ARAÚJO, M. R. de; ALENCAR, M. L. A criatividade no ensino de atenção às diferenças

Recursos Multifuncionais (SRM)23 deve ser submetida este alunado na escola regular
compreendida, como uma das atribuições advém da escassa oferta de serviços
desse profissional. Silveira e Figueiredo (2010, educacionais que permitam a identificação
p.20) coadunam com essa perspectiva, ao e atendimento, aliados à falta de formação
ressaltar a importância do desenvolvimento adequada de professores. Acreditamos que
de uma cultura colaborativa, nas instituições o desconhecimento e o predomínio de
escolares. Destarte, afirmam: “[...] quando inúmeros mitos acerca das necessidades e
funcionam, as culturas colaborativas características dos alunos com altas
contribuem para transformar o aprendizado habilidades/superdotação poderão ser
individual em coletivo”. superados por meio de experiências que
priorizem a formação continuada dos
O Atendimento Educacional Especializado professores, possibilitando a ampliação da
para alunos com altas compreensão sobre o tema. Ourofino e 71
habilidades/superdotação no Brasil Guimarães (2007, p.51) advertem que,
O paradigma da inclusão representa igualdade
Não obstante as garantias legais para o de oportunidades e se concretiza nas ações dos
Atendimento Educacional Especializado aos movimentos inclusivos. Estes movimentos
alunos com altas habilidades/superdotação, centrados na diversidade deverão promover,
a existência de antigos mitos e preconceitos também, o acesso aos programas especiais a
alunos com altas habilidades/superdotação. O
tem constituído significativos obstáculos para indivíduo superdotado requer um
a assistência educacional adequada ao seu acompanhamento especializado que contribua
perfil de necessidades. Nesse cenário, a para o desenvolvimento de suas habilidades,
população, e também profissionais da para o fortalecimento de suas características
Educação, ainda acreditam que produtivas e que o incentive a valorizar sua
sensibilidade, criatividade e aprendizagem em
investimentos nessa área são desnecessários, busca de uma vida mais produtiva e feliz.
sobretudo, quando se ressalta a demanda
relativa ao atendimento de alunos com Portanto, ao ampliarmos as discussões
deficiências ou transtornos globais do acerca das características e necessidades
desenvolvimento. dos alunos com altas
habilidades/superdotação, favoreceremos a
Pérez e Freitas (2009), ao realizarem implementação de ações destinadas a esses
uma pesquisa sobre o estado do educandos. Nessa direção, a criatividade -
conhecimento na área de altas ao ser valorizada e estimulada no contexto
habilidades/superdotação, nas últimas escolar, e sendo compreendida como um
décadas no Brasil, evidenciam que os mitos traço marcante nesses indivíduos - poderá
existentes em torno desses alunos - dentre contribuir, significativamente, para que suas
eles, ideias de que altas habilidades possam emergir e se desenvolver
habilidades/superdotação constituem um de forma harmoniosa.
fenômeno raro - comprometem a
compreensão e, até mesmo, a produção Criatividade: algumas considerações acerca
científica na área. Citam as estatísticas do conceito
oficiais oriundas dos censos escolares,
demonstrando haver um reduzido número de O tema criatividade é caracterizado
alunos com essas características por sua complexidade e, a despeito das
efetivamente atendidos. inúmeras definições presentes na literatura
Pérez (2004) demonstra dentre outros, especializada, Wechsler (2001) elucida a
que a invisibilidade a qual tem sido presença de certo consenso entre os atuais
estudiosos no que se refere à compreensão
23
“As Salas de Recursos Multifuncionais são espaços desse conceito como fenômeno
localizados nas escolas de educação básica, onde se multidimensional, a exemplo das discussões
realiza o Atendimento Educacional Especializado - AEE. em torno da inteligência. Conforme revisão
Essas salas são organizadas com mobiliários, materiais de literatura, a criatividade tem sido
didáticos e pedagógicos, recursos de acessibilidade e
equipamentos específicos para o atendimento aos
estudada sob distintas linhas de pesquisas,
alunos público alvo da Educação Especial, em turno sendo a ênfase dada em alguns trabalhos a
contrário à escolarização”. (ROPOLI et al., 2010, p. 31).

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.67-77


ARAÚJO, M. R. de; ALENCAR, M. L. A criatividade no ensino de atenção às diferenças

aspectos personológicos, processuais, percebida desde a infância como uma


produção ou na interação desses aspectos e, possibilidade para resolver problemas, por
ainda, acerca dos fatores inibidores e meio de jogos imaginativos e dramatizações.
facilitadores do pensamento criativo, dentre Segundo Vigotsky (2003), os desenvolvimentos
outros. (ALENCAR, 2007; MITJÁNS MARTINEZ, do pensamento e da imaginação
2002; PIRES; MITJÁNS MARTINEZ, 2011; NEVES- manifestam-se fundamentalmente em
PEREIRA, 2007; VIRGOLIM; FLEITH; NEVES- períodos genéticos semelhantes. Sendo
PEREIRA, 2000; TORRANCE; 1976; WECHSLER; compreendidos dessa maneira, como
1999, 2001, 2011; WECHSLER; TREVISAN, 2011). funções inter-relacionadas, sobretudo
quando são vinculadas com os processos
Ao inserir nossas discussões, em uma
criativos.
perspectiva histórico-cultural, percebemos
que as demandas do mundo globalizado Ao observar as formas de imaginação
72
exigem, progressivamente, maiores relacionadas com a criatividade, orientadas
para a realidade, vemos que a fronteira entre o
investimentos no desenvolvimento do pensamento realista e a imaginação se apaga,
potencial criativo humano. O surgimento de que a imaginação é um momento totalmente
novos aportes teóricos tem considerado necessário, inseparável, do pensamento realista.
diferentes elementos necessários à (VIGOTSKI, 2003, p. 128).
ocorrência da criatividade. Dessa maneira, Crianças altamente criativas
conforme Alencar e Fleith (2003), até 1970 evidenciam necessidades criadoras muito
havia um predomínio do delineamento do fortes, sendo os estímulos externos essenciais
perfil do indivíduo criativo e o incremento de para sua motivação. Todavia, ambientes
programas e técnicas voltados à expressão repressores da criatividade tendem a
desses traços. Após essa década, as promover sanções contra indivíduos que
pesquisas passaram a vincular os fatores demonstram pensamento divergente.
sociais, culturais e históricos ao Torrance (1976) adverte mencionando
desenvolvimento da criatividade. Nesse acerca da existência de diversos problemas
cenário, corroboramos com Wechsler e decorrentes da exposição à repressão das
Nakato (2011, p.11) ao sintetizar diferentes necessidades criativas desses indivíduos,
elementos já abordados por diversos autores como: tendência ao isolamento; construção
nessa definição: de um autoconceito irrealista ou inseguro;
A criatividade pode ser entendida como um deficiências nas aprendizagens; problemas
construto multidimensional, envolvendo variáveis de comportamento; delinquência e diversos
cognitivas, características da personalidade, tipos de desorganização de personalidade.
aspectos familiares, educacionais, elementos
sociais e culturais. Estas dimensões interagem
dando origem aos estilos de pensar e criar, Criatividade no contexto da educação
sendo, portanto, expressas e encontradas sob as brasileira
mais diversas formas.
A ênfase na reprodução de
O Pesquisador, psicólogo e educador
conhecimentos e a memorização de dados,
norte americano Torrance (1976, p.34)
para Alencar (2001, p.38), têm caracterizado
ofereceu contribuições significativas no
a educação brasileira como “[...] uma
campo da criatividade, na década de 1970
educação que bloqueia e inibe a fantasia, a
e, baseado em seus estudos, definiu o
imaginação, o jogo de ideias”. Nesse
pensamento criativo “[...] como o processo
contexto, os comportamentos que expressam
de perceber lacunas ou elementos faltantes
conformismo e passividade são socialmente
perturbadores; formar ideias ou hipóteses a
mais valorizados. Aprendemos
respeito deles; testar essas hipóteses; e
gradativamente a não explorar as nossas
comunicar os resultados, possivelmente
ideias, inibindo a expressão da criatividade.
modificando e retestando as hipóteses”.
Podemos situar a ênfase na reprodução
Ademais, Wechsler (1993) menciona
e memorização de conhecimentos na
que diversos estudiosos têm ressaltado a
Pedagogia Tradicional, onde na concepção
importância da fantasia no pensamento
“bancária” de educação, formulada por
criativo. Destaca que esta pode ser
Freire (1987), o professor é considerado

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.67-77


ARAÚJO, M. R. de; ALENCAR, M. L. A criatividade no ensino de atenção às diferenças

depositante de conhecimentos, mero desenvolvimento da reflexão das práticas


transmissor de “comunicados” que pedagógicas, abre caminhos para a
posteriormente serão docilmente construção da profissionalização docente,
memorizados e “arquivados” pelo aluno, transformando-a, assim, em um espaço
considerado como depósito desses democrático de formação, onde os saberes
conhecimentos. Nesse cenário, não há vinculados à experiência, ou seja, a sua
espaços para criação, pois o conhecimento realidade escolar são ressignificados por
é percebido estaticamente. meio do confronto com as teorias implícitas
ou explícitas nesses contextos.
Freire (1987, p. 33) adverte que nessa
concepção tanto o professor quanto o aluno Importa aludir, que a escola aberta ao
se “arquivam”, mutuamente, ao não se desenvolvimento do potencial criativo de
perceberam como sujeitos históricos. seus membros deverá reconhecer e a 73
Ressalta, ainda, que “[...] só existe saber na valorizar as diferenças em suas ações,
invenção, na reinvenção, na busca inquieta, explicitando-as em sua proposta
impaciente, permanente, que os homens pedagógica. Desta forma, conforme
fazem no mundo, com o mundo e com os Mantoan (2010, p.45) “[...] As diferenças
outros”. Freire (1996, p.25) nos instiga à crítica trazem uma riqueza de contribuições e,
e à recusa a esse ensino "bancário", quando contempladas nas discussões da
advertindo que essa concepção de equipe escolar, identificam e definem a
educação “[...] deforma a necessária proposta pedagógica e política da escola
criatividade do educando e do educador”. com maior clareza”.
O autor convida-nos a uma ressignificação
da prática pedagógica, elucidando que o Programas para o desenvolvimento do
ensino aprendizagem exige criticidade. potencial criativo
Nesse contexto, a efetivação de um ensino
de qualidade para todos, na perspectiva da Em uma leitura histórico-cultural acerca
Educação Inclusiva, expõe a necessária dos processos criativos, Neves-Pereira (2007)
transformação da escola, impulsionando a elucida alguns aspectos essenciais a nossa
demanda de uma reestruturação das compreensão. A autora apresenta alguns
condições da maioria dessas instituições. posicionamentos teóricos de Vigotsky, que
(MANTOAN; FERNANDES, 2010). ressignificaram as abordagens nesse campo,
uma vez que as concepções oferecidas pela
A incidência de práticas pedagógicas psicologia ocidental tendia a compreender o
inibidoras à criatividade no contexto ato criativo com certo “determinismo
educacional brasileiro evidencia, a nosso ver, biológico”.
dentre outros aspectos, a inexistência de
espaços favoráveis ao desenvolvimento do Vigotsky e colaboradores divergiam
potencial criativo tanto de professores, dessas concepções ao enunciar a existência
quanto de alunos. Nessa direção, Mitjáns de uma relação de interdependência entre
Martínez (2002) alerta para necessária cultura e criatividade. Segundo Vigotsky
interlocução entre o desenvolvimento do (1991), o desenvolvimento humano deve ser
potencial criativo dos alunos e professores, compreendido de forma dialética, atribuindo
sendo a escola compreendida como um importante papel ao contexto sócio-
organização mediadora dessas interações. histórico-cultural na construção dos sujeitos.
As funções psicológicas superiores procedem
Conforme o exposto, o incremento de desse contexto, diferindo o ser humano dos
ações isoladas de alguns professores animais. Destarte, o processo de
possivelmente encontrará inúmeros desenvolvimento ocorre primeiramente no
obstáculos caso a instituição escolar não plano social (interpsicológico) e,
reconheça a necessidade do posteriormente, no plano psicológico
desenvolvimento de potencial criativo de (intrapsicológico). Ainda nessa vertente,
seus membros. Nesse cenário, a Neves-Pereira (2007, p.71) afiança: “o
sistematização de ações - por parte da domínio sócio-histórico-cultural passa a ser o
instituição escolar - que permitam o palco de onde surge a criatividade, a partir

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.67-77


ARAÚJO, M. R. de; ALENCAR, M. L. A criatividade no ensino de atenção às diferenças

da interação entre o sujeito e o meio, contribuindo na construção de reflexões e


proporcionada pelas linhas do ações que considerem a valorização das
desenvolvimento e da aprendizagem”. diferenças. Concluímos enfatizando que,
alicerçados na perspectiva da educação
Conforme Neves-Pereira (2007), a
inclusiva, as propostas de intervenções
despeito de Vigotsky ter fornecido em seus
destinadas aos alunos com altas
trabalhos relevantes contribuições acerca da
habilidades/superdotação poderão
criatividade, não formulou um modelo teórico
impulsionar as transformações necessárias à
estruturado que configure esse fenômeno.
construção de uma escola de qualidade
Para a autora, as propostas de programas
para todos.
para o desenvolvimento do potencial criativo
necessitam considerar - para além da
Referências
dimensão cognitiva do sujeito - as dimensões 74
da motivação, da afetividade e, sobretudo, ALENCAR, E. M. L. S. de. Indivíduos com altas
sua dimensão personológica construída em habilidades/superdotação: clarificando
contexto sócio- histórico-cultural. conceitos, desfazendo ideias errôneas. In:
Vale ressaltar, ainda, os resultados dos FLEITH, D. de S. (Org). A construção de
estudos de Virgolim, Fleith e Neves-Pereira práticas educacionais para alunos com altas
(2000) sobre a implementação de Programas habilidades/superdotação. Vol. 1: Orientação
de Criatividade. Esses programas eram a professores. Brasília: MEC/SEESP, 2007a, p.
destinados tanto para programas de 13-23.
enriquecimento escolar, em sala de recursos ______. Criatividade no Contexto
voltada ao atendimento de alunos com AH/S, Educacional: Três Décadas de Pesquisa.
quanto para desenvolvimento de programas Psicologia: Teoria e Pesquisa. Vol. 23 n.
de formação de professores e psicólogos em especial. 2007b, p. 45-49.
contexto escolar. Foram evidenciados
resultados positivos e promissores, que ______; FLEITH, Denise de Souza. Interação em
interferiram na melhoria da autoestima dos Psicologia. Escala de práticas pedagógicas
alunos e, sobretudo, na satisfação com a para a criatividade no Ensino Fundamental:
instituição escolar. (VIRGOLIM; FLEITH; NEVES- estudo preliminar de validação, 11(2). 2007,
PEREIRA; 2000). As autoras nos instigam a p. 231-239.
transformamos a escola, em um ambiente ______; FLEITH, Denise de Souza.
prazeroso e transformador, ao abrirmos Contribuições teóricas recentes ao estudo da
espaços para o desenvolvimento das criatividade. Psic.: Teor. e Pesq. [on-line]. v.19,
habilidades do pensamento criativo por meio n.1. 2003, p. 1-8.
de estratégias anteriormente testadas e
validadas. ______. Educação criadora: necessidade e
desafio. In: ALENCAR, E. M. L. S. (Org.).
Considerações finais Criatividade e educação dos
superdotados.Petrópolis, RJ: Vozes, 2001,
Conforme o exposto, percebemos a p.38-44.
relevância de fomentarmos em nossas BRASIL. Decreto presidencial 7.611, de 17 de
propostas de intervenções, destinadas aos novembro de 2011. Disponível em:
alunos com altas habilidades/superdotação, <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato201
a implementação de estratégias didáticas e 1-2014/2011/Decreto/D7611.htm> Acesso
mediações pedagógicas adequadas ao em: maio de 2012.
Atendimento Educacional Especilizado -
desenvolvidos nas Salas de Recursos ______. Ministério da Educação. Secretaria de
Multifuncionais ou Centros de Referência - e Educação Especial. Marcos políticos-legais
o processo de ensino aprendizagem da educação especial na perspectiva da
concretizado pelo professor da sala de aula educação inclusiva. Brasília: Secretaria de
comum. Considerando sobretudo, a Educação Especial, 2010.
importância do desenvolvimento do ______. Política Nacional de Educação
potencial criativo no contexto escolar, Especial na Perspectiva da Educação

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.67-77


ARAÚJO, M. R. de; ALENCAR, M. L. A criatividade no ensino de atenção às diferenças

Inclusiva. In: Inclusão: Revista da Educação habilidades. In: Avaliação psicológica:


Especial, Brasília. v. 4, n. 1. jan./jun. 2008a, p. Formas e contextos (vol. VI), 1999, p. 176-179.
7-17.
______. Proposta de Identificação do Aluno
______. Decreto nº. 6.571 de 17 de setembro Talentoso no Município de Fortaleza.
de 2008. Brasília: MEC, 2008b. Avaliação Psicológica Formas e Contextos. v.
4. Braga: Portugal, 1996, p. 501-506.
______. Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional: n. 9.394, edição de 20 de ______; ALENCAR, M. L.; ESTEVES, R. C. C.;
dezembro de 1996. Brasília: MEC, 1996. FONSÊCA, A. S. A. Identificação de alunos
com altas habilidades. In: Sobredotação:
______. Constituição da República Federativa
definição e conceito, identificação,
do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988.
criatividade, família e escola, intervenção,
CHAGAS J. F., MAIA-PINTO, R. R.; PEREIRA,V. L. investigação. ANEIS (Associação Nacional 75
P. Modelo de Enriquecimento Escolar. In: para o Estudo e Intervenção na
FLEITH, D. de S. (Org.). A construção de Sobredotação), v. 1, n.1 e 2, Braga: Portugal,
práticas educacionais para alunos com altas 2000, p. 121-128.
habilidades/superdotação. Vol. 2: Atividades
MANTOAN, Maria Teresa; SANTOS, Maria
de estimulação de alunos. Brasília:
Terezinha Fernandes. Inclusão escolar e
MEC/SEESP, 2007, p. 55-80.
qualidade de ensino. In: Atendimento
DELPRETTO, Bárbara Martins de Lima; ZARDO, Educacional Especializado: políticas públicas
Sinara Pollom. Alunos com altas e gestão nos municípios. 1ª Ed. São Paulo:
habilidades/superdotação no contexto da Moderna, 2010.
educação inclusiva. p.19-27. In: DELPRETTO,
______. Políticas públicas – gestão da escola
Bárbara Martins de Lima; GIFFONI, Francinete
e dos sistemas de ensino. In: Atendimento
Alves; ZARDO, Sinara Pollom. A Educação
Educacional Especializado: políticas públicas
Especial na Perspectiva da Inclusão Escolar.
e gestão nos municípios. 1ª Ed. São Paulo:
Altas Habilidades/Superdotação. v.10. Brasília,
Moderna, 2010.
2010.
______. Educação Inclusiva: Orientações
DUTRA, Claudia Pereira; GRIBOSKI, Claudia
pedagógicas. In: FÁVERO, E. A.G.; PANTOJA, L.
Maffin. Educação Inclusiva: um projeto
M. P.; MANTOAN, M. T. E. Atendimento
coletivo de transformação do sistema
Educacional Especializado: aspectos legais e
educacional. In: Ensaios pedagógicos: direito
orientação pedagógica. São Paulo:
à diversidade Brasília: MEC, SEESP, 2006, p.
MEC/SEESP, 2007, p. 45-60.
209-215.
______. Inclusão escolar: o que é? Por quê?
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes
Como fazer? São Paulo: Moderna, 2003.
necessários à prática educativa. 8. ed. São
Paulo: Paz e Terra, 1996. MITJÁNS MARTÍNEZ, Albertina. A criatividade
na escola: três direções de trabalho. Linhas
______. Pedagogia do oprimido. 17ª ed. Rio
Críticas. v.8, nº 15. Brasília: jul./dez. 2002.
de Janeiro: Paz e Terra, 1987.
NEVES-PEREIRA, M. S. Uma leitura histórico-
GUENTHER, Z. C. Desenvolver capacidades e
cultural dos processos criativos: as
talentos: um conceito de inclusão. Petrópolis,
contribuições de Vygotsky e da psicologia
RJ: Vozes, 2000a.
soviética. In.: Virgolim, A. M. R. (Org.). Talento
______. Identificação de talentos: recurso a criativo: expressão em múltiplos contextos.
técnicas de observação directa. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2007.
Sobredotação: Lisboa, 1 e 2, 2000b, p. 7 –
OUROFINO, V. T. A. T. de; GUIMARÃES, T. G..
36.
Características Intelectuais, Emocionais e
LAGE, A. M. V., ALENCAR, M. L., ESTEVES, R. C. Sociais do Aluno com Altas
C. & PEREIRA, T. M. M. Capacitação de Habilidades/Superdotação. In: FLEITH, Denise
professores como pré-requisito para repensar de Souza (Org). A construção de práticas
o atendimento aos portadores de altas educacionais para alunos com altas
habilidades/superdotação. v.1.Brasília:

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.67-77


ARAÚJO, M. R. de; ALENCAR, M. L. A criatividade no ensino de atenção às diferenças

Ministério da Educação, Secretaria de ______; REIS, S. M.; SMITH, L. The revolving door
Educação Especial, 2007, p. 41-52. identification model. Mansfield Center, CT:
Creative Learning Press, 1981.
PEREIRA, V. L. P.; GUIMARÃES, T. G. Programas
educacionais para alunos com altas ______. Equity, Excellence, and Economy in a
habilidades. In: FLEITH, D. de S.; ALENCAR, M. System for Identifying Students in Gifted
E. L. S. de (Org). Desenvolvimento de talentos Education: a Guidebook. The National
e altas habilidades: orientação a pais e Research Center on the Gifted and Talented.
professores. Porto Alegre: Artmed, 2007, p. University of Connecticut. Storrs, Connecticut.
163-175. 147p. 2005.
PÉREZ, S. G. Gasparzinho vai à escola: um ROPOLI, Edilene Aparecida et al. A educação
estudo sobre as características do aluno com Especial na perspectiva da Inclusão Escolar:
altas habilidades produtivo-criativo. 306 fl. A escola comum inclusiva. Brasília: Ministério 76
Dissertação (Mestrado em Educação) - da Educação, Secretaria de Educação
Pontifícia Universidade Católica do Rio Especial. Fortaleza: Universidade Federal do
Grande do Sul (PUC-RS), Porto Alegre, 2004. Ceará, 2010.
PÉREZ, S. G. P. B,; FREITAS, S. N. Estado do SILVEIRA, S. M.; FIGUEIREDO, R. V. de. A
Conhecimento na Área de Altas educação interativa, a cooperação e o
Habilidades/Superdotação no Brasil: Uma ensino de atenção às diferenças. In:
Análise das Últimas Décadas. Minas Gerais: FIGUEIREDO, R. V. de (Org.) Escola, Diferença
Associação Nacional de Pós-Graduação e e Inclusão. Fortaleza, Edições UFC, 2010.
Pesquisa em Educação (ANPEd), 2009.
TORRANCE, Ellis Paul. Criatividade: medidas,
Disponível em:
testes e avaliações. São Paulo: IBRASA, 1976.
<http://www.anped.org.br/reunioes/32ra/trab
alho_gt_15.html >. Acesso em: maio de 2010. VIRGOLIM, A. M. R. Enriquecimento Escolar em
Salas de Aula Regular e de Recursos para
PIRES, Valdívia de Lima; MITJÁNS MARTINEZ,
Alunos com Altas Habilidades/ Superdotação:
Albertina. A formação reflexiva do professor
uma perspectiva inclusiva. In: Ensaios
na escola: pressupostos ao desenvolvimento
pedagógicos: direito à diversidade. Brasília:
de práticas pedagógicas criativas e
MEC, SEESP, 2006, p. 301- 312.
inovadoras. In: GIGLIO, Zula Garcia; et al
[orgs]. I congresso internacional de ______. Rodrigues. FLEITH, D. de S.; NEVES-
criatividade. Inovação: visão e prática em PEREIRA. Toc, toc...plim,plim!: lidando com as
diferentes contextos. 2011. Disponível em: emoções, brincando com o pensamento
<http://www.crear através da criatividade. 2ª ed.Campinas:
mundos.net/primeros/Revista/Edicao01/Creativ Papirus, 2000.
idad/Crea_Escuela.htm#_ftn1>. Acesso em: VYGOTSKI, L. S. O desenvolvimento
fev. 2012. psicológico na infância. São Paulo: Martins
RENZULLI, J. S. O que é esta coisa chamada Fontes, 2003.
superdotação, e como a desenvolvemos? ______. A formação social da mente. São
Uma retrospectiva de vinte e cinco anos. In: Paulo: Martins Fontes, 1991.
Educação, Porto Alegre, ano XXVII, n. 1 (52),
Jan./Abr. 2004, p. 75–131. WECHSLER, S. M.; NAKATO, T. de C.
Criatividade: encontrando soluções para
______. The three ring conception of desafios educacionais. In: WECHSLER, S. M.; V.
giftedness: a developmental model for L. TREVISAN, de Souza. Criatividade e
creative productivity. In: R. J. Sternberg & J. E. aprendizagem: caminhos e descobertas em
Davidson (Eds.). Conceptions of giftedness (p. perspectivas internacionais. São Paulo, SP;
53-92). New York: Cambridge University Press. Editora Loyola, 2011, p. 11-31.
1986. Disponível em: <http://www.gifted.
uconn.edu/sem/pdf/The_Three- ______. V. L. TREVISAN, de Souza. Criatividade
ing_Conception_of_Giftedness. pdf>. Acesso e aprendizagem: caminhos e descobertas
em: dez. de 2011. em perspectivas internacionais. São Paulo, SP;
Editora Loyola, 2011.

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.67-77


ARAÚJO, M. R. de; ALENCAR, M. L. A criatividade no ensino de atenção às diferenças

______. Criatividade e desempenho escolar:


uma síntese necessária. Linhas Críticas,
Brasília: v.8, nº 15, jul./dez. 2002. Disponível
em: <http://seer.bce.unb.br./index.php/linhas
criticas/article/view/6478/5236>. Acesso em:
fev. de 2012.
______. Criatividade na cultura brasileira: uma
década de estudos. Psicologia: Teoria,
Investigação e Prática – 1. 2001, p.215-226.
______. Avaliação multidimensional da
criatividade: Uma realidade necessária. In:
WECHSLER, S.M.; GUZZO, R.S.L. (Orgs.). 77
Avaliação psicológica: perspectiva
internacional, São Paulo: Casa do Psicólogo,
1999, p.231-259.

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.67-77


SAKAGUTI, P. M.Y.; BOLSANELLO, M. A. Sentimentos, dificuldades e expectativas dos pais

Filhos com Altas Habilidades/Superdotação: sentimentos, dificuldades e expectativas


dos pais

Highly able/gifted children: parents’ feelings, difficulties and expectations

Paula Mitsuyo Yamasaki Sakaguti24


Maria Augusta Bolsanello25

RESUMO

O presente trabalho investigou os sentimentos, dificuldades e expectativas dos pais em relação aos
filhos com Altas Habilidades/Superdotação (AH/SD). Foram entrevistados doze pais (dois pais e dez
mães), cujos filhos frequentavam a Sala de Recursos para Altas Habilidades/Superdotação de uma 78
escola pública da cidade de Curitiba, Paraná. Após análise qualitativa dos dados, observou que os
pais: (a) expressam sentimentos de insegurança, medo, angústia, preocupação frente à educação e
ao futuro de suas crianças, em contraponto com sentimentos de privilégio, felicidade e orgulho. A
desmotivação pela escola, o desajustamento social e o sub-rendimento escolar são algumas das
situações apresentadas pelos pais, nas quais refletem sua ansiedade e preocupação em relação aos
filhos com AH/SD; (b) esperam que seus filhos façam as escolhas a partir do potencial que possuem, que
sejam felizes, “normais”, desfrutem de políticas públicas que valorizem as AH/SD; (c) relatam suas
dificuldades em lidar: com o desenvolvimento sócio-emocional dos filhos; com a discrepância entre o
alto potencial dos filhos e o desenvolvimento motor; com o sub-rendimento escolar; com a curiosidade
dos filhos que fazem muitos questionamentos e nem sempre conseguem responder; a solidão de não
poderem compartilhar com outros pais suas angústias e dúvidas. Conclui pela relevância de se apoiar
os pais e a família por meio de informações e orientações; equipar os pais com subsídios teóricos para
poderem lutar por seus filhos, multiplicando o conhecimento e modificando o que a sociedade pensa
a respeito das pessoas com AH/SD.

Palavras-chave: família; altas habilidades/superdotação; educação especial.

ABSTRACT

The research investigated feelings, difficulties and expectations of highly able/gifted (HA/GT) children
parents. Twelve parents whose children attended a High Ability/giftedness resource room at a public
school based at Curitiba, Paraná, Brazil, were interviewed (two fathers and ten mothers). After a data
qualitative analysis, it was observed that parents: (a) expressed feelings of unsureness, fear, anguish,
concern as to their children education and future, as a counterpart of feelings of privilege, happiness
and proud. Lack of motivation in school, social unfitness and school underachievement are some of the
situations presented by parents, which make them anxious and concerned about their HA/GT children;
(b) expect their children to make choices based on their potential, to be happy, “normal”, to enjoy
public policies valorizing HA/GT; (c) report their difficulties in dealing with their children’s social-emotional
development; discrepancy between high potential and motor development; school underachievement;
curiosity of their children who make a lot of questions, which they not always manage to answer; and
loneness, because they cannot share their anguishes and doubts with other parents. The study shows the
relevance of supporting parents and the family of HA/GT children, providing information and guidelines;
equipping parents with theoretical background in order they could fight for their children, multiplying
knowledge and modifying society’s thoughts about HA/GT people.
Keywords: family; high abilities/giftedness; special education.

Recebido em: 15/06/2013


Aprovado em 05/07/2013

24
Mestre em Educação (UFPR); Professora da Sala de Recursos de Altas Habilidades/Superdotação do Instituto de
Educação de Curitiba, PR. E-mail: paulasakaguti@uol.com.br
25
Doutora em Psicologia, Professora da Faculdade de Educação da UFPR. E-mail: mabolsanello@yahoo.com.br

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.78-86


SAKAGUTI, P. M.Y.; BOLSANELLO, M. A. Sentimentos, dificuldades e expectativas dos pais

Metodologia

Introdução Com o intuito de levantar os


sentimentos, dificuldades e expectativas dos
A família, em suas diversas pais em relação aos filhos com Altas
configurações, constitui um dos pilares na Habilidades/Superdotação, realizou-se o
formação e no desenvolvimento estudo em uma abordagem qualitativa. Esta
biopsicossocial de toda criança, e como tal, abordagem parte da premissa de que o
necessita ser conhecida e compreendida. mundo social não é um dado natural, como
Em qualquer intervenção escolar a ser lembram Bauer e Gaskell (2007), mas
realizada com uma criança com construído por pessoas em suas vidas
necessidades educacionais especiais é cotidianas, construções essas que constituem
importante considerar os diversos contextos a realidade essencial das pessoas, seu 79
de aprendizagem que interferem no mundo vivencial.
processo, dentre os quais o familiar. Assim
sendo, conhecer os sentimentos, expectativas Contexto
e dificuldades enfrentadas pelos pais de
alunos com Altas Habilidades/Superdotação O ambiente para o desenvolvimento da
(AH/SD) pode contribuir para a promoção do pesquisa foi uma Sala de Recursos para
desenvolvimento destas crianças. Alunos com Altas Habilidades/Superdotação
(SRAH/SD), situada em um estabelecimento
Desta maneira, pretende-se discorrer
público estadual, na cidade de Curitiba,
neste artigo uma das categorias analisadas
Paraná.
na pesquisa “Concepções de pais sobre as
Altas Habilidades/Superdotação dos filhos Os participantes foram doze pais (dois
inseridos em atendimento educacional pais e dez mães) de alunos já identificados
especializado”, realizada pela primeira que ingressaram no ano de 2009 na SRAH/SD,
autora, sob orientação da segunda. e, a fim de preservar a identidade dos
mesmos, foram utilizados para cada
participante (e para seus filhos nos relatos),
um nome fictício, a saber (quadro 1):

QUADRO 1: Perfil dos pais quanto à idade, sexo, estado civil, escolaridade e profissão/ocupação

PARTICIPANTES IDADE SEXO ESTADO CIVIL ESCOLARIDADE PROFISSÃO / OCUPAÇÃO


(anos)
ADRIANA 37 Fem. Casada Superior Professora
ANELISE 43 Fem. Casada Superior Designer gráfico
CRISTINA 39 Fem. Divorciada Ensino Médio (subsequente) Agente Técnico
DAIANE 34 Fem. Casada Superior Professora
FERNANDA 24 Fem. Casada Superior Professora
GABRIELA 34 Fem. Casada Pós-Graduação lato-sensu Professora
HELOISA 32 Fem. Solteira Ensino Médio Promotora de Vendas
JORGE 42 Masc. Casado Pós-Graduação (mestrado) Professor e Pastor
LUCIANA 38 Fem. Casada Superior Dentista
MILTON 33 Masc. Casado Superior Incompleto Técnico em Informática
SILVIA 41 Fem. Casada Ensino Médio Do Lar
SUSI 32 Fem. Casada Ensino Médio Incompleto Artesã

A faixa etária dos doze participantes Em relação à escolarização, dois pais


varia entre 24 e 43 anos de idade, sendo a cursaram pós-graduação: Giovana é
maioria do sexo feminino (10 mães). Quanto Especialista em Educação Especial e Jorge é
ao estado civil, dez dos participantes são Mestre em Bioética. Adriana, Anelise, Daiane,
casados, uma das mães é solteira e outra é Fernanda e Luciana concluíram o ensino
divorciada. superior e Milton está cursando esse nível de
ensino. Cristina fez o curso de Técnico em
Administração, Silvia e Heloisa têm Ensino
Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.78-86
SAKAGUTI, P. M.Y.; BOLSANELLO, M. A. Sentimentos, dificuldades e expectativas dos pais

Médio completo e Susi está em fase de que resultaram no levantamento de um


conclusão deste nível de ensino. Susi relatou conjunto de categorias e subcategorias
que voltou a estudar por necessidade de representativas da totalidade das
responder as várias e constantes perguntas comunicações; d) finalmente, a classificação
do filho. e a categorização que levaram a uma
descrição das características relevantes do
Observou-se que o grupo possui
conteúdo pesquisado e possibilitou realizar
formação acadêmica em várias áreas do
inferências sobre todo o processo de
conhecimento, o que o torna um grupo
comunicação que resultaram na
bastante heterogêneo em seu conjunto,
interpretação dos dados.
chamando atenção o grau elevado de
escolarização dos participantes. A seguir, é apresentada a síntese
interpretativa dos dados analisados, e em 80
Quanto à profissão, quatro mães são
seguida, as considerações finais.
professoras. Entre as outras, Luciana é
dentista; Cristina é agente técnica; Heloísa
Desenvolvimento
trabalha como promotora de vendas em
rede de supermercados; Anelise é designer Perguntou-se aos participantes sobre
gráfico em sua própria empresa; e Susi como eles se sentem sendo pai ou mãe de
trabalha como artesã. Silvia informa que se uma criança/adolescente com Altas
ocupa apenas com as atividades do lar. Habilidades/Superdotação (AH/SD).
Jorge é professor e pastor, enquanto Milton Revelaram-se mais acentuados os
trabalha com informática. sentimentos de: insegurança, medo e
preocupação.
Procedimentos de coleta e análise de dados
“Sinto-me insegura. Porque até muitas vezes ele
Como procedimento para a coleta de mesmo me coloca em situações que eu fico
assim sem saber como agir com ele. Até por
dados optou-se pela aplicação de entrevista causa da idade dele” (Anelise).
semiestruturada (Triviños, 1987), com
utilização de um roteiro previamente Com relação aos sentimentos de
elaborado, com perguntas abertas, Anelise, May (2000) aponta que os pais das
possibilitando maior liberdade de resposta crianças com AH/SD muitas vezes sentem-se
por parte dos pais dos alunos. As entrevistas despreparados para acompanhar o nível de
foram realizadas com o prévio consentimento desenvolvimento intelectual e o ritmo
dos pais, seguindo as normas do Conselho acelerado. No entanto, outros sentimentos
de Ética em Pesquisa (CEP), da Universidade são exteriorizados pelos participantes
Federal do Paraná. Os dados foram utilizando-se diferentes adjetivos – carente,
gravados, posteriormente transcritos na angustiado e preocupado – para verbalizar o
íntegra e seu conteúdo analisado à luz do que sentem em relação ao fato de serem
referencial teórico pertinente. genitores de uma criança superdotada.

Como principal referencial para a A combinação de preocupação e


análise dos dados, seguiu-se os passos privilégio de ser pai de filhos especiais pode
utilizados por Bolsanello (1998) em sua ser observada no relato de Jorge:
pesquisa, a qual fundamentou-se no estudo “De certa forma privilegiado, mas ainda
de Bardin, descrito a seguir: a) após a tentando, eu e minha esposa, tentando
transcrição, as entrevistas foram lidas na sua encontrar um caminho para que eles possam
desenvolver ainda mais a sua habilidade,
íntegra; b) em seguida codificaram-se os contribuindo para o País, esta é a minha
dados brutos das respostas de cada item das preocupação sempre. Não tem sido um
entrevistas, agregando-os em unidades, com caminho fácil. A gente tem buscado, mas não
o intuito de se obter uma descrição e tem sido algo fácil” (Jorge).
representação das características pertinentes Aspesi (2003) ressalta a ansiedade e
ao conteúdo; c) no terceiro momento, preocupação dos pais e das mães diante da
reagruparam-se os temas obtidos na educação e desenvolvimento dos filhos.
codificação, procedendo-se a um trabalho Dentre as preocupações, foi comum a
de definição e classificação de categorias,
Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.78-86
SAKAGUTI, P. M.Y.; BOLSANELLO, M. A. Sentimentos, dificuldades e expectativas dos pais

questão do ajustamento social, da perda da Neste sentido, é importante ressaltar o


motivação na escola regular ou do estudo de Germani e Stobäus (2006) que
sofrimento dos filhos, devido às próprias analisam a preocupação de pais de
características. A autora aponta que pais e crianças com AH/SD sobre a educação
mães não demonstraram preocupação em familiar e escolar, pelas próprias
relação à capacidade ou ao potencial de características específicas que seus filhos
seus filhos. apresentam nesses ambientes. A
desmotivação do filho de Fernanda e de
Na mesma direção, May (2000) salienta
tantos outros alunos superdotados pode estar
que os sentimentos dos pais das crianças são
relacionada com as práticas educacionais
afetados por muitos fatores, dentre eles
excludentes, com “estilos educativos que não
destaca os mitos e a desinformação, a
estimulam a autonomia, aptidões para
hostilidade e, em alguns casos, a falta de 81
resolução de problemas de forma criativa e
recursos financeiros. Mas por outro lado,
aptidões investigativas na criança” (GERMANI;
verifica-se que algumas famílias ficam com
STOBÄUS, 2006, p. 142).
sua autoestima elevada e sentem orgulho em
saber que seus filhos são superdotados. Aspesi (2003) também salienta a
ansiedade e a preocupação dos pais e das
Sobre as expectativas em relação aos
mães diante da educação e do
filhos, a crença na alta capacidade dos
desenvolvimento dos filhos. Dentre as
seus, os esforços da família para oferecer
preocupações, foi comum a questão do
uma educação melhor refletem a prioridade
ajustamento social, a perda da motivação
que dão à educação e às expectativas dos
na escola regular e o sofrimento que seus
pais em relação aos seus filhos (ESCRIBANO,
filhos possam ter devido às próprias
2003). Aspesi (2003) destaca que pais e mães
características.
de crianças com AH/SD têm a expectativa de
que seus filhos futuramente trabalhem na Jorge ressalta, no seu relato, o contexto
área de seus interesses, se realizem e educacional brasileiro, que não valoriza os
contribuam para a construção de um mundo talentos, alardeando de incertezas suas
melhor. expectativas quanto ao futuro de seus filhos.
Destaca-se o estudo comparativo “Se eu pudesse dizer uma palavra, a palavra
realizado por Chagas (2003), indicando que seria de desconhecido ainda. Não tenho certeza
daquilo que espera. Todas as crianças, mais
as famílias dos adolescentes superdotados especificamente os meus filhos, porque ainda o
tinham altas expectativas em relação ao futuro é incerto; não por eles, mas pelo próprio
desempenho de seus filhos, priorizavam a País que não valoriza a população; 2% da
educação, mobilizando recursos para o população do Brasil podem, pelo menos
acredito, ter as mesmas condições dos nossos
desenvolvimento dos talentos. filhos” (Jorge).
Vale apresentar a expectativa das Faz-se necessário enfatizar que, quando
participantes de que seus filhos sejam felizes: Jorge fala do País que não valoriza a
“A minha expectativa é que ele seja feliz. Que população, dá a entender seu
seja o que for. Eu não tenho expectativa que ele questionamento sobre o papel da sociedade
ganhe dinheiro, que seja rico, quero que seja
feliz” (Gabriela).
em educar e valorizar os alunos
superdotados, ou seja, o papel exercido
“Quero que ele seja feliz na escolha que fizer” pelas políticas públicas para beneficiar o
(Luciana).
potencial de todos os alunos, inclusive a
Sendo a falta de motivação para parcela da população que apresenta as
aprender, o aspecto que mais preocupa mesmas condições intelectuais, emocionais e
Fernanda, ela espera que o filho vença este sociais de seus filhos. O futuro, para Jorge,
obstáculo em relação à aprendizagem aponta para o desconhecido e incerteza,
escolar. talvez devido ao que Gallagher (2002)
“Que ele consiga ter motivação. Que ele analisa sobre a ambivalência da sociedade
consiga. Me dói muito ver esta desmotivação. em relação aos alunos superdotados
Gostaria muito de estar pagando uma escola refletidas nas incompletas e, algumas vezes,
particular” (Fernanda). contraditórias políticas educacionais.
Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.78-86
SAKAGUTI, P. M.Y.; BOLSANELLO, M. A. Sentimentos, dificuldades e expectativas dos pais

As políticas públicas que afetam os normais, com comportamentos comuns à


alunos deveriam ser motivo de preocupação média da faixa etária dos seus, evidencia,
de todos os envolvidos no processo escolar, como na pesquisa acima citada, uma
pois uma política eficaz norteará e concepção positiva, embora contraditória.
apresentará um retrato de quem são os Parece demonstrar uma fuga da realidade,
alunos superdotados, quem são os seus como um mecanismo de defesa pela
professores, qual a natureza dos programas dificuldade das mães em lidar com as suas
de atendimento e onde serão realizados. “próprias deficiências, sentidas nesse estado
Infelizmente, muitos pais e professores de enfrentamento do problema que é o de
desvinculam a política educacional de sua cuidar de um filho” que apresenta
realidade, mantendo sentimentos de características especiais (MACEDO; MARTINS,
distância e desamparo (GALLAGHER, 2002). 2004, p.150). Isso também implica numa
desvalorização e desperdício do potencial 82
Susi relatou que procura dar ao filho a
de seus filhos, podendo gerar insatisfação e
oportunidade que ela mesma não teve de
frustração pelo escasso desenvolvimento de
estudar:
suas áreas de destaque e de dificuldades.
“No momento a expectativa minha é que ele
melhore primeiro o jeito dele agir, o jeito dele. Eu Assim sendo, oportunamente serão
não tive oportunidade na vida, mas eu quero destacadas três diferentes situações que
dar para ele a oportunidade que eu não tive. Eu podem ocorrer no contexto familiar das
falo para ele: estude, moleque” (Susi).
pessoas com AH/SD em relação às diferenças
Cristina e Daiane manifestaram seu desejo de percebidas: valorização; negação; e
querer que os filhos sejam “normais”: supervalorização, colocando expectativas
“Eu queria, no mínimo, um relacionamento exageradas em relação ao desempenho da
normal, uma vida próxima do normal. Que ele pessoa com AH/SD (PÉREZ, 2008).
possa estudar, fazer uma faculdade, descobrir
realmente o que ele tem de talento” (Cristina). Ao serem indagadas sobre as
“Que ele seja no futuro uma pessoa normal, dificuldades em lidar com a superdotação
tenha uma carreira normal. Claro que se ele do filho, Susi, Luciana, Silvia e Cristina
puder aproveitar as altas habilidades para relataram uma discrepância entre o alto
alguma coisa, ótimo. Mas queria potencial de seus filhos e o desenvolvimento
responsabilidade como uma pessoa normal”
(Daiane). motor, emocional e sub-rendimento escolar
apresentado por eles.
Este desejo de Cristina e Daiane, de
que seus filhos sejam normais, é referendado Susi comentou que sua dificuldade está
por Jorge. A superdotação é vista, por ele, em lidar com aspectos do desenvolvimento
como uma diferença, mas a criança precisa motor e intelectual, revelando uma relação
ser compreendida e tratada como uma conflituosa entre o marido e o filho. Já, para
pessoa normal. Luciana, sua dificuldade estava em não
entender alguns comportamentos do filho -
Assim como ocorre em famílias com “coisas pequenas” para ela, mas com
filhos que apresentam deficiências, os pais dimensões maiores para o filho:
de crianças com AH/SD buscam na condição
“Às vezes a gente não entende algumas
de ser de seus filhos uma vida próxima aos reações, coisas pequenas pra gente. Fomos num
parâmetros da normalidade. A pesquisa de aniversário da amiga da irmã, como todos se
Macedo e Martins (2004) enfatiza que 60% conhecem vai a família também; e ele teve que
das mães de filhos com a Síndrome de Down, vestir aquele coletinho da festa; ele se recusou a
frequentando o ensino regular, conceberam vestir o colete. O pai explicou que era norma,
que ele precisaria usar para poder brincar. Só
a síndrome como sendo algo “normal”. depois de 1h10 resolveu desemburrar e vestir o
Observa-se, de acordo com a prática da colete para ir brincar, isso já quase no final da
primeira autora, que essa concepção é festa. Às vezes, para uma coisa boba, tem
extensiva a todos os pais que possuem filhos reações que a gente não entende. E a gente
procura não valorizar muito, senão vai ficando
com necessidades educacionais especiais. complicado” (Luciana).
Assim, para Cristina e Daiane, o seu Neste sentido, Silvia relata que sua filha
desejo de querer que seus filhos sejam de doze anos é “muito adulta, parece que já

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.78-86


SAKAGUTI, P. M.Y.; BOLSANELLO, M. A. Sentimentos, dificuldades e expectativas dos pais

tem dezoito anos e daí a gente não se dá caracteriza-se pela “discrepância entre o
muito bem nesta parte”. Comenta que é desempenho escolar do superdotado e
diferente de sua prima com a mesma idade, manifestações de seu alto potencial”. As
mais carinhosa e obediente. Revela sua autoras descrevem as pesquisas realizadas
dificuldade em lidar com a adultez da filha, por Reis sobre o baixo rendimento escolar
que apresenta desenvolvimento intelectual dos alunos com AH/SD, que indicam:
avançado e atitudes desafiadoras, (a) o início de um desempenho aquém do
comparadas à prima da mesma idade, o potencial do aluno começa nas séries iniciais do
que acaba afetando a dinâmica familiar. ensino fundamental, (b) uma relação direta
Pode-se observar que o impacto da parece existir entre conteúdo muito fácil ou
inadequado e baixo rendimento escolar na
diferença pode estar associado a um modelo segunda etapa do ensino fundamental e ensino
internalizado pelos pais de um filho ideal médio, (c) o auxílio de colegas próximos pode
(MANNONI, 1988). ajudar na prevenção e reversão desse tipo de
83
desempenho, (d) adolescentes que estão
Pesquisas realizadas por Solow (1995) envolvidos em atividades extracurriculares são
indicam que essa adultez é uma das menos propensos a apresentar um baixo
características que pais observam em seus rendimento escolar, e (e) alunos podem
filhos superdotados. Persuadidos pelo forte apresentar um baixo desempenho acadêmico
em função de um currículo escolar inapropriado
vocabulário, habilidosa argumentação e ou desmotivador (ALENCAR; FLEITH, 2001, p.108-
articulação de ideias, por vezes os pais 109).
podem apresentar dificuldades em lidar com
Escribano (2003) mostra que o fracasso
seus filhos que, emocionalmente, são apenas
escolar dos alunos com AH/SD representa um
crianças ou adolescentes.
desafio complexo tanto para professores
Outra dificuldade apresentada é o quanto para pais. A atmosfera familiar, os
sub-rendimento escolar aliado ao sentimento conflitos entre pais e filhos, a falta de coesão
de impotência como mãe, relatado por e distanciamento emocional entre os
Cristina: membros da família são características
“Até hoje tenho dificuldade em encarar isso. Ele familiares que ocorrem frequentemente em
continua indo mal na escola e eu não sei como famílias de alunos com baixo rendimento
ajudar” (Cristina). escolar que haviam sido identificados como
O depoimento de Cristina denota alunos superdotados.
impotência e frustração frente à condição do A ansiedade dos participantes pode
filho. Extremiana (2000) descreve a frustração estar relacionada com o assincronismo que,
de muitos pais ao verem que seus filhos segundo Extremiana (2000), refere-se à
apresentam um rendimento escolar manifestação de comportamentos próprios
insatisfatório, mesmo com elevado potencial. de indivíduos com idade superior à sua em
Soma-se o relato de Luciana, que às vezes atividades intelectuais, mas tendem a se
“não entende algumas reações do filho, comportar social e emocionalmente, de
coisas pequenas pra gente”, referindo-se a acordo com a sua idade, o que afeta suas
algumas tensões familiares vividas por ela. respostas no relacionamento interpessoal
As características apresentadas pelos assim como no âmbito de aprendizagem.
filhos de Luciana, Cristina, Silvia como o É o que Hollingworth descreveu sobre as
inconformismo, o sub-rendimento crianças que sofriam de isolamento social,
acadêmico, a supersensibilidade, dentre pois tinham o intelecto de um adulto e as
outros, são para Alencar e Fleith (2001), emoções de uma criança (WINNER, 1998).
situações vivenciadas pela criança com
AH/SD que acabam afetando suas relações Esta dificuldade em lidar com as
interpessoais. O inconformismo é uma das discrepâncias que ocorrem entre o
características afetivas apresentadas por desenvolvimento intelectual e emocional dos
algumas pessoas com AH/SD, ao questionar filhos superdotados, bem como às
regras e autoridades. O sub-rendimento capacidades motoras é, para Landau (2002),
escolar, investigado por Davis e Rimm, um problema comumente apontado pelos
descrito por Alencar e Fleith (2001, p. 108), pais de crianças superdotadas.

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.78-86


SAKAGUTI, P. M.Y.; BOLSANELLO, M. A. Sentimentos, dificuldades e expectativas dos pais

Em contrapartida, Jorge e Heloísa não acontece com as famílias de crianças que


veem dificuldades em lidar com as apresentam deficiência, famílias de crianças
características e comportamentos com AH/SD também passam por estresse
apresentados por seus filhos. emocional e necessitam de apoio e
“Não. Às vezes a gente tem que entender um informações sobre a superdotação.
pouco o temperamento deles. Mas não tenho Estudos realizados com famílias de
dificuldades não. A gente procura desenvolver e
dar aquilo que a gente pode dar” (Jorge). bebês com Síndrome de Down indicam que
um programa de orientação a pais deve
“Não. Nesta parte assim não. Para mim eu trato
ele normal” (Heloisa).
permitir que os pais discutam sobre o
impacto vivenciado ao nascimento do bebê
Nestas falas, os pais parecem entender com a Síndrome, discutir sobre o
que, apesar de apresentarem AH/SD, os filhos desenvolvimento infantil e sobre a própria 84
são crianças e adolescentes como quaisquer Síndrome destacando suas implicações no
outros de sua idade, com gostos, desenvolvimento da criança (COLNAGO;
preferências e características de seu BIASOLI-ALVES, 2003).
desenvolvimento.
Percebe-se que o diferencial está no
As dificuldades apresentadas por fato de que o nascimento de crianças que
Adriana e Gabriela referem-se à curiosidade virão a ser identificadas com AH/SD, não
de seus filhos, perguntadores e trazem evidências imediatas desta condição
questionadores: de ser. Somente no transcorrer de seu
“Ele questiona muito a gente, fico sem respostas, desenvolvimento é que suas características
e eu: espere que vou pesquisar” (Adriana). específicas chamarão a atenção da família
“Tem muita coisa que ele pergunta e eu não sei (DELOU, 2007, p. 51). Daí a necessidade de
responder, muitas coisas difíceis. Daí eu tenho apoiar as famílias de crianças com AH/SD
que ler: olha, Carlos, mamãe não sabe, mamãe neste transcurso do desenvolvimento,
vai procurar, eu não sou obrigada a saber tudo. discutindo sobre o desenvolvimento na
A dificuldade comigo mesma de conversar, de
poder responder as perguntas e às vezes eu não infância, adolescência e sobre a própria
sei como reagir. [...] A gente perde a paciência, superdotação, criando um espaço de troca
às vezes se irrita porque irrita aquela de experiências e apoio para que as famílias
perguntarada” (Gabriela). possam atender adequadamente as
Como aponta Virgolim (2007, p.48), necessidades de seus filhos especiais.
dentre as características peculiares da Nesta perspectiva, Webb et al. (2007)
criança superdotada, verifica-se a salientam que a troca de experiências entre
intensidade com que ela busca satisfazer pais de crianças com AH/SD pode
seus interesses, em sua paixão por aprender proporcionar novas perspectivas sobre o
faz “perguntas intermináveis, apreendendo entendimento dos comportamentos
uma grande quantidade de material, apresentados pelos filhos, como também
incapaz de pensar em nada mais, até que possibilitar o desenvolvimento de estratégias
toda a sua energia seja gasta”. para lidar com diferentes situações. Os
Anelise contou sua necessidade em autores ressaltam a sensação de alívio dos
compartilhar com “outras mães” suas dúvidas pais em encontrarem outros pais que
e angústias: vivenciaram as mesmas questões e
preocupações, vislumbrando novos caminhos
“A gente vê uma incompreensão de muitas
pessoas. Às vezes da família. Por um lado que e perspectiva de orientação.
eles são super inteligentes, eles têm as Além disso, somam-se as preocupações
dificuldades deles. Eu precisaria ter mais contato
com outras mães também que têm filhos” que os pais têm em relação aos seus filhos
(Anelise). que se sentem diferentes por causa de suas
habilidades, como também à manifestação
O depoimento de Anelise demonstra a
da extrema sensibilidade, intensidade e
necessidade que pais de crianças com
acentuado senso de justiça e idealismo,
necessidades educacionais especiais têm de
sabendo que estas características podem,
um programa de apoio a pais. Assim como

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.78-86


SAKAGUTI, P. M.Y.; BOLSANELLO, M. A. Sentimentos, dificuldades e expectativas dos pais

futuramente, causar dificuldades aos seus Referências


filhos (WEBB et al., 2007).
ALENCAR, E. M. L. S.; FLEITH, D. S.
Considerações finais Superdotados: determinantes, educação e
ajustamento. 2. ed. São Paulo: EPU, 2001.
Diante do exposto, constata-se que os
ASPESI, C. C. Processos familiares
relatos apresentados pelos pais sobre suas
relacionados ao desenvolvimento de
dificuldades em lidar com os filhos
comportamentos de superdotação em
superdotados, sinalizam a precariedade de
crianças de idade pré-escolar. 2003. 190 p.
uma rede de apoio à família, a dificuldade
Dissertação (Mestrado em Psicologia Escolar
da escola em reconhecer e atender as
e Desenvolvimento)-Instituto de Psicologia,
demandas do aluno com AH/SD e de sua
Universidade de Brasília, Brasília, 2003.
família e os mitos que contribuem para o 85
isolamento dos pais. BAUER M. W.; GASKELL, G. Pesquisa qualitativa
com texto, imagem e som. Rio de Janeiro:
Considera-se relevante a necessidade
Vozes, 2007.
de se apoiar os pais e as famílias que têm
entre seus membros, uma pessoa com AH/SD, BOLSANELLO, M. A. Interação mãe-filho
com informações sobre as características e o portador de deficiência: concepções e
desenvolvimento sócio-emocional e modo de atuação dos profissionais em
orientações sobre a área. Este apoio deverá estimulação precoce. 1998. 146 p. Tese
acontecer nos serviços de Atendimento (Doutorado em Psicologia)-Instituto de
Educacional Especializado (Salas de Recursos Psicologia, Universidade de São Paulo, São
Multifuncionais), nos Núcleos de Atividades de Paulo, 1998.
Altas Habilidades/Superdotação (NAAH/S), nas
CHAGAS, J. F. Características familiares
Secretarias de Educação (municipal e
relacionadas ao desenvolvimento de
estadual) e nas escolas.
comportamentos de superdotação em
Sugere-se a mobilização da alunos de nível sócio-econômico
Universidade, para que esta participe desfavorecido. 2003. 179 p. Dissertação
ativamente da melhoria do ensino especial e (Mestrado em Psicologia Escolar e
em particular das AH/SD, por meio de Desenvolvimento)-Instituto de Psicologia,
atividades de ensino, pesquisa e extensão Universidade de Brasília, Brasília, 2003.
representadas, entre outros, por Cursos de
COLNAGO, N. A. S.; BIASOLI-ALVES, Z.
Formação Continuada e/ou Especialização
Necessidades de famílias de bebês com
em AH/SD para atender a grande demanda
Síndrome de Down – SD: Subsídios para uma
de famílias que buscam atendimento de seus
proposta de intervenção. In: MARQUEZINE, M.
filhos com informações, orientações,
C.; ALMEIDA, M. A.; OMOTE, S.; TANAKA, E. D.
aconselhamentos, avaliações, recursos,
O. (Orgs.). O papel da família junto ao
acompanhamento e práticas educacionais
Portador de Necessidades Especiais.
adequadas.
Londrina: Eduel, 2003, p. 1-14.
A ampliação de oportunidades de
DELOU, C. M. C. O Papel da Família no
participação dos pais em eventos científicos,
Desenvolvimento de Altas
palestras e cursos relacionados à área das
Habilidades/Superdotação. In: FLEITH, D. S.
AH/SD é outra indicação que se enfatiza;
(Org.). A construção de práticas
pois, ao se equipar os pais com subsídios
educacionais para alunos com altas
teóricos, ampliam-se as chances de
habilidades/superdotação: o aluno e a
poderem lutar por seus filhos, multiplicando o
família, vol. 3, Brasília: Ministério da
conhecimento e sensibilizando a sociedade
Educação, Secretaria de Educação Especial,
para o investimento no desenvolvimento de
p.49-59, 2007.
talentos e potencialidades que farão deste
país um Brasil melhor. ESCRIBANO, M. C. L. Análisis de las
características y Necesidades de las familias
con hijos Superdotados: propuesta y
evaluación de un programa de intervención

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.78-86


SAKAGUTI, P. M.Y.; BOLSANELLO, M. A. Sentimentos, dificuldades e expectativas dos pais

psicoeducativa en el contexto familiar. 556 p. MAY, K. M. Gifted children and their families.
Tese de Doutorado. Universidad Complutense The Family Journal, vol. 8, n.1, 58-60, 2000.
de Madrid Facultad de Educación Disponível em:
Departamento de Psicología Evolutiva y de la http://tfj.sagepub.com/cgi/content/abstract/8/1/58
Educación. Madrid, 2003. . Acesso em: 15/08/2008.
EXTREMIANA, A. A. Niños superdotados. PÉREZ, S. G. P. B. Por uma construção sadia
Madrid: Pirámide, 2000. da identidade da pessoa com Altas
Habilidades/Superdotação. In: III ENCONTRO
GALLAGHER, J. J. Society's role in educating
NACIONAL DO CONBRASD; III CONGRESSO
gifted students: The role of public policy.
MERCOSUL SOBRE ALTAS
Connecticut: The National Research Center
HABILIDADES/SUPERDOTAÇÃO; VI ENCONTRO
on the Gifted and Talented, Storrs, 2002,
ESTADUAL REPENSANDO A INTELIGÊNCIA, 2008, 86
Disponível em:
Canela, RS. Anais... Canela: ConBraSD, 2008.
http://www.gifted.uconn.edu/nrcgt.html
p.1-12. CD-ROM.
Acesso em: 29/05/10.
SOLOW, R. Parents‟ reasoning about the
GERMANI, L. M. B.; STOBÄUS, C. D. A
social and emotional development of their
intervenção centrada na família e na escola:
intellectually gifted children. Roeper Review,
prática de atendimento à criança com Altas
v. 18, n.2, p. 142-146, 1995.
Habilidades/Superdotação. In: FREITAS, S. N.
(Org.). Educação e Altas TRIVIÑOS, A. N. S. Introdução à pesquisa em
Habilidades/Superdotação: a ousadia de ciências sociais: a pesquisa qualitativa em
rever conceitos e práticas. Santa Maria: Ed. educação. São Paulo: Atlas, 1987.
da UFSM, 2006, p. 127-150.
VIRGOLIM, A. M. R. Altas
LANDAU, É. A coragem de ser superdotado. Habilidades/Superdotação: encorajando
São Paulo: Arte & Ciência, 2002. potenciais. Brasília: Ministério da Educação,
Secretaria de Educação Especial, 2007.
MACEDO, B. C.; MARTINS, L. A. R. Visão de
mães sobre o processo educativo dos filhos WEBB, J. T. et al. A parent’s guide to gifted
com Síndrome de Down. In: BOLSANELLO, M. children. Scottsdale: Great Potential Press,
A. (Org.). Dossiê: Educação Especial. Educar 2007.
em Revista, Curitiba, PR: Ed. UFPR, n.23,
WINNER, H. Crianças superdotadas: mitos e
Janeiro a Junho, 2004, p.143-159.
realidades. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998.
MANNONI, M. A criança retardada e a mãe.
São Paulo: Martins Fontes, 1988.

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.78-86


PALUDO, K. I. A alteridade na constituição da identidade da pessoa com altas habilidades/superdotação

A alteridade na constituição da identidade da pessoa com altas


habilidades/superdotação

Karina Inês Paludo26


RESUMO

A constituição da identidade versa sobre um processo de desenvolvimento caracterizado pela inter-


relação dos fatores intra e interpsíquicos. Consideram-se, assim, tanto os aspectos biológico e
psicológico quanto o social. Diante disso, pretende-se, nessa oportunidade, dissertar sobre a
importância do entorno social, do “outro” significativo para a construção da identidade. Não basta,
contudo, a mera presença de uma pessoa no mesmo ambiente no qual o desenvolvente está inserido
para que ocorra o desenvolvimento humano; é imprescindível antes, a alteridade, isto é, relações 87
qualitativas desde a mais tenra idade do ser. O método utilizado foi o qualitativo, uma vez que, utilizou-
se de extratos de falas de adolescentes com altas habilidades/superdotação (AH/S) para análise e
discussão da hipótese levantada. A vida é circunscrita por interações nas quais se têm a todo tempo
mensagens sendo emitidas e recebidas, gerando um trânsito de significados. As trocas que existem
nesse movimento são singulares na constituição do “si mesmo”. Deste modo, observa-se que o “outro”,
na existência de relações de qualidade, toma a posição de confirmar e legitimar o ser, predicados
fundamentais para o desenvolvimento cognitivo, afetivo e social da pessoa, e, por conseguinte, da
formação da identidade. Neste raciocínio, infere-se querelações alteras são imprescindíveis no
processo de construção da identidade da pessoa com AH/S;as respostas do “outro” são fundamentais
para (re) elaborar a percepção sobre “si mesmo”. Assim, o conteúdo comunicado a pessoa com altas
habilidades/superdotação tem influência em sua autopercepção e, portanto, na constituição e
aceitação de sua identidade.

Palavras-chave: Altas habilidades/superdotação; identidade; alteridade.

Recebido em 15/06/2013
Aprovado em 05/07/2013

26
Mestre em Educação pela Universidade Federal do Paraná – UFPR. E-mail: karina_paludo@hotmail.com.

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.87-94


PALUDO, K. I. A alteridade na constituição da identidade da pessoa com altas habilidades/superdotação

A identidade faz menção às relações: precisa que o “outro” comunique


características intrincadas ao sujeito, que o sobre ela; entretanto, é um organismo ativo
permite ser conhecido e reconhecido. Essas no processo da construção de sua
características não podem ser entendidas de identidade. A pessoa não apenas integra o
forma fixa e reducionista; condizem, antes, que recebe, todavia analisa, traduz e
com um processo de desenvolvimento interpreta as informações recebidas usando
marcado pela inter-relação dos fatores intra seus recursos já construídos.
(aspectos biológicos e de personalidade) e
Não basta, contudo, a figura de um
interpsíquicos (aspectos dos ambientes e
“outro” presente para que ocorra o
figuras significativas) disponíveis ao ser em
desenvolvimento humano; é imprescindível
desenvolvimento.
antes, a alteridade, isto é, relações 88
Nesse contexto, infere-se sobre o qualitativas desde a mais tenra idade do ser.
processo de desenvolvimento da identidade Como, especialmente no início da vida, o ser
como um fenômeno biopsicossocial, isto é, se humano é dependente do meio social imediato
consideram os elementos biológico, para o desenvolvimento dos aspectos que fazem
psicológico e social como determinantes, parte de sua identidade, a qualidade dos
vínculos formados com os ‘outros’ presentes
não de maneira isolada, mas em sua inter- nesse contexto inicial é de fundamental
relação, na qual o resultante é o sujeito importância para que aprenda a lidar com o
constituído, caracterizado e individualizado, mundo e consigo mesmo de forma segura,
o que expressa a identidade do mesmo. autônoma, afetuosa e flexível (LOOS; SANT’ANA;
NÚÑEZ-RODRÍGUEZ, 2010, p. 7).
Na Psicologia, teorias de diversas
vertentes destacam o “outro” como aspecto É por meio da alteridade que o “outro”
mister para a constituição da pessoa, isto se torna peça importante no processo de
porque desde sua chegada ao mundo o ser constituição do ser, porquanto atua como
está implicado ao “outro” e por essa relação produtor de sentidos. Nas palavras de Lévinas
tem a possibilidade de sobreviver e tornar-se (2009, p. 15) “o outro é sentido por si só”, de
humano. É no interjogo das relações sociais modo que o “outro” é diferenciado no
que a pessoa se apropria da cultura, de suas processo de desenvolvimento de uma pessoa
múltiplas significações e, portanto, humaniza- pela qualidade de sentido que produz no
se. Por meio do conteúdo disponibilizado nas sujeito.
relações sociais, o ser é transformado e Da mesma forma, González-Rey (2004,
transforma durante sua existência. p. 18) ressalta que o “outro” é significativo no
A vida é circunscrita por interações nas desenvolvimento humano apenas como
quais se têm a todo tempo mensagens sendo produtor de sentido subjetivo. Sistema de
emitidas e recebidas, gerando um trânsito de sentido construído desde a chegada do ser
significados. As trocas que existem nesse ao mundo num seguimento histórico de uma
movimento são singulares na constituição do relação com a criança e é exatamente esse
“si mesmo”, pois de acordo com Japur (2004, relacionamento que faz com que
p. 161), “isto quer dizer que compreendemos determinadas pessoas exerçam influência no
aquilo que somos a partir das narrativas que desenvolvimento do sujeito enquanto outras
temos de nós, construídas no processo de pessoas, situadas no mesmo espaço social,
troca dialógica com os outros, e que se não o fazem. Cabe destacar, deste modo, o
encontram em permanente mudança”. O papel imprescindível da alteridade, de
processo de humanização acontece quando relações de qualidade, visto que os sentidos
o sujeito em contato com o “outro” se produzidos se configuram tanto em favor do
reconhece e se constitui como pessoa. desenvolvimento saudável quanto do
patológico.
O conjunto de crenças que a pessoa
tem sobre si mesma – nomeado por Loos A alteridade é o que possibilita a
(2003) como crenças autorreferenciadas “ligação” do “eu” ao “outro”. Tacca (2004)
(autoconceito, autoestima e crenças de destaca que deve existir um entre em toda
controle) -, perpassa os conteúdos das interação do “eu” com o “outro”, isso porque

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.87-94


PALUDO, K. I. A alteridade na constituição da identidade da pessoa com altas habilidades/superdotação

o “eu” não existe por si só e nem a partir da como este pensa e age. Portanto, se torna
contemplação do “outro”. Versa sobre uma humano na ótica da alteridade.
relação dialética, marcada em essência
Diante do explanado, reitera-se a
pela reciprocidade, por meio do trânsito de
importância das relações alteras para uma
sentidos, no qual o outro propicia e demarca
formação saudável da identidade da pessoa
o eu, e ambos se confirmam (TUNES,
com AH/S. De acordo com Virgolim (2007), a
BARTHOLO, 2004). Nesse contexto, pode-se
família exerce uma função preponderante
inferir que a pessoa não é a oportunidade
sobre a maneira como o sujeito superdotado
primeira do Ser, antes a sua sensibilidade à
se percebe.
alteridade.
Ainda que a pessoa com AH/S goste de
A influência da alteridade faz repensar
si e aceite sua identidade, se as respostas
e valorizar os espaços de relacionamento, 89
direcionadas a ela se derem ora positiva ora
como família, escola, instituições, etc. Para
negativa, ou pior, sempre negativa,
Lévinas (2009), a alteridade implica
possivelmente terá uma autoimagem
responsabilidade, isto quer dizer que cada
depreciativa. Porquanto na medida em que
ser tem compromisso pelo “outro”, contudo,
a pessoa se desenvolve, vai incorporar as
frequentemente não se têm as necessidades
informações que recebe do meio,
afetivas atendidas porque os indivíduos não
culminando em algo seu.
compreendem o impacto, as marcas, que
ocasionam um no outro, o que pode ser uma Bahia (2011) chama a atenção para o
justificativa para o caos nas relações fato de que sub-rendimento de alunos com
humanas. Assim, é necessário que o AH/S pode ter como base práticas familiares.
potencial de produção de sentidos que a Nesse sentido, Alencar (2007) elucida que
rede de apoio social (família, escola, etc.) baixas expectativas, excessiva pressão e
abarca seja usada para o profícuo atitudes contraditórias, podem ser o germe
desenvolvimento do ser. de sentimentos de insegurança e
incompreensão, afetando seu
A alteridade permite, em
desenvolvimento.
contraposição, o conhecimento de si mesmo,
na medida em que se tem no outro as Para além da família, acredita-se que
necessidades retratadas. Assim, sem as todos os ambientes que compõem a rede de
relações seria impossível a permanência da apoio social (escola, comunidade, etc.) têm
espécie, não devido ao não suprimento de papel importante para a formação saudável
necessidades essenciais de subsistência, mas da pessoa com AH/S, de maneira que ela
porque não se reconheceria como humano, possa compreender seu potencial e se
e o que disso procede: a humanidade (LOOS; aceitar como pessoa singular e especial.
SANT’ANA; NÚÑEZ-RODRÍGUEZ, 2010). Desse Reitera-se, deste modo, a necessidade
modo, as figuras significativas para o sujeito das relações qualitativas desde a mais tenra
(mãe, pai, irmão, professor, etc.) ocupam, idade da pessoa. Assim, faz-se essencial um
sem dúvida, um espaço particular, pois contexto marcado por relações humanas
atuam no sentido de confirmar o ser como positivas, para conservação e valorização do
sujeito, outorgando-lhe seu valor como “eu”. Contexto marcado pela inexistência de
pessoa. O “outro” é imprescindível para o ameaças ou situações que impeçam o
desenvolvimento das dimensões que sujeito de desenvolver um autoconceito
unificam o ser (cognitiva, emocional e social). positivo, um ambiente no qual a pessoa se
A constituição do ser humano implica sinta amada, aceita e respeitada, onde
sua relação com família, escola, ideias e atitudes são apreciadas
comunidade, contextos que permeiam positivamente.
valores e ideologias presentificadas na
cultura. O “outro” é fundamental nesse Método
processo, afinal, a percepção do “eu
mesmo”, quem sou, o que sente, pensa e O método adotado para
como agir, perpassa a percepção do outro, desenvolvimento da presente pesquisa foi o

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.87-94


PALUDO, K. I. A alteridade na constituição da identidade da pessoa com altas habilidades/superdotação

qualitativo, por meio da coleta27, exposição e As emoções que se percebem no


análise de extrato de fala de adolescentes “outro” também proporcionam conhecimento
com altas habilidades/superdotação sobre para o sujeito entender e regular suas ações,
sua identidade (o que pensam sobre si o que reforça a necessidade de se valorizar
mesmo) e o papel do entorno social para sua essa dimensão. As reações emocionais de
vida (alteridade), além de pesquisa uma figura significativa para a pessoa sobre
bibliográfica em livros e artigos científicos. o seu desempenho afetam as atribuições de
valor e as perspectivas de êxito do ser quanto
Alteridade na formação da identidade da a si mesmo (ARAUJO, 2003; LEME, 2004;
pessoa com altas habilidades/superdotação: MIRAS, 2004; CUNHA, 2010).
ouvindo adolescentes “Sou bom porque elas influenciaram. Ficavam
falando que sou bom. Não foi de um dia pro
Bronfenbrenner (1996) destaca que as outro que eu disse “sou bom em matemática”. 90
relações proximais, isto é, as interações no Descobri que era superdotado no ano passado,
ambiente imediato onde o sujeito está daí melhorei só no finalzinho do ano. Daí só no
primeiro semestre desse ano que melhorei bem.
inserido, funcionam como o principal Melhorei na matemática e piorei no português,
impulsionador do desenvolvimento, podendo não tenho interesse. A professora explica e
demarcar o curso de sua vida. Tacca (2004) acabou, não pode perguntar. Não deixa a
pontua que é a partir das interações com as gente falar o que pensa e só sabe gritar.” (Patati)
figuras significativas que a pessoa se “Os professores são muito estressados... se se
reconhece e constitui. colocassem no lugar da pessoa [do aluno] seria
melhor o clima escolar e a gente se sentiria com
Tais considerações podem ser vontade para prestar atenção.” (Júpiter)
visualizadas nas falas de Jupiter e Patati:
Os comentários acima mostram a
“A proteção dos meus pais faz eu me sentir bem. diferença do impacto causado por diferentes
Ajuda no meu crescimento. O apoio e atenção
deles ajudou a me controlar e aprender a
tipos de qualidade nas interações proximais,
compreender as pessoas, entender o ponto de no caso, entre professor e aluno. Com base
vista delas, e isso fez me conhecer mais e nas referidas falas e recorrendo à literatura,
entender porque tinha algumas atitudes. Hoje Bronfenbrenner (1996) destaca a importância
faço muita coisa diferente do que fazia.” (Júpiter) das díades (ou sistema de duas pessoas) que,
“A psicóloga, a professora e minha mãe foram por sua vez, diz respeito a uma dinâmica na
muito importantes para eu saber que sou bom qual ambas as pessoas dedicam atenção
em matemática. Se não fossem elas, eu não
saberia que sou bom em matemática e nem que
aos atos da outra.
sou superdotado. Eu era muito bagunceiro, daí a As figuras significativas (mãe, pai,
psicóloga foi fazendo umas brincadeiras e
percebeu. Hoje sei que sou bom em
irmãos, professores, etc.) ocupam, sem
matemática. É bom quando alguém reconhece dúvida, um espaço particular, pois atuam no
a gente.” (Patati) sentido de confirmar o ser como sujeito,
outorgando-lhe seu valor como pessoa.
Com base nos extratos de protocolo
Vários participantes do grupo pesquisado
analisados, observa-se que o “outro”, quando
ressaltaram a importância de tais interações,
se constroem relações de qualidade, toma a
percebendo-as como altamente positivas:
posição de confirmar e legitimar o ser,
predicados fundamentais para o “A expectativa da minha mãe vale e faz
desenvolvimento cognitivo, afetivo e social diferença. É bom porque incentiva, às vezes é
chato porque ela fala muito. Sem a minha mãe
da pessoa. Como dito, não trata da mera não seria quem sou hoje.” (Patati)
presença de um “outro”, mas é pelo viés da
“Me sinto aceito e isso é bom para a autoestima.
alteridade que o “outro” se torna realmente Porque sinto que eles me entendem e posso falar
peça significativa no processo de o que penso, posso ser eu sempre.” (Júpiter)
constituição do ser.
“Quando minha família reconhece meu
potencial me sinto orgulhosa e feliz.” (Lua)
27
Pesquisa de acordo com as normas do Comitê de “Minha família me ensinou a nunca me abater
Ética em Pesquisa com Seres Humanos do Setor de por ofensas, a não desistir.” (Sammy)
Saúde da UFPR, aprovada no dia 28 de Novembro de
2012, sob o Registro nº 156.482/CEP e CAAE nº
07700112.9.0000.0102.

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.87-94


PALUDO, K. I. A alteridade na constituição da identidade da pessoa com altas habilidades/superdotação

“Bem, é bom. Porque sinto que eles querem algo “Um episódio muito prazeroso foi quando fiz, no
a mais de mim e sabem que eu posso ano passado, minha festa de aniversário em
conseguir.” (Júpiter) casa e foram seis pessoas do colégio. Senti que
eu podia fazer amigos.” (Miguel)
É por meio das respostas do “outro” que
a pessoa (re) elabora a percepção de “si O “outro” é crucial na construção das
mesmo” (quem é, o que se sente, quais crenças sobre o “si mesmo”. Contudo, não se
atributos possui, como pensa e como age). A aceita o assujeitamento e inércia do
alteridade tem função moduladora, pois atua desenvolvente no processo. A constituição
diretamente na (re) construção da psicológica não pode ser entendida como
autopercepção do ser, como pode ser causa direta e decidida estritamente pelo
observado nas falas seguintes, as quais ambiente externo, o que desconsidera o
apresentam indicadores da mudança e da processo de autorregulação e seu constante
validação das crenças do sujeito: movimento e transformação nas interações 91
do sujeito. O “outro” não pode ser visto como
“Foi uma época da minha vida que pensava em
me suicidar, principalmente por não conseguir elemento suficiente, pois, se assim fosse,
ter amigos. Ultimamente minha vida tem ignorar-se-ia a capacidade autogeradora da
melhorado bastante, acredito que pela vontade mente humana e a complexa e dialética
de estudar e agora meu pai tem motivo para se relação entre o ser e o “outro”, o interno e o
orgulhar de mim... Porque dizia “mas, teu irmão
já fez muito mais coisas para eu me orgulhar”.
externo (GONZALEZ-REY, 2004; MARTINEZ,
Agora acho que posso fazer que ele tenha 2004; SOUZA, 2004; PALUDO, 2012).
orgulho de mim.” (Miguel)
Ao encontro do explanado,
“Em matemática quero o máximo porque gosto Bronfenbrenner (1996; 2011) enfatiza a
e para ser admirado por minha mãe. Isso é bom pessoa como um ser ativo e dinâmico, que
porque a mãe dos meus amigos não tá nem aí.”
(Patati) reestrutura, constitui e é constituída dentro do
contexto social. O desenvolvimento humano
“Minha mãe sempre acreditou em mim, mesmo
antes de ter o documento dizendo que sou
deve ser visto como dialético, vivenciando
superdotado. Ela falava você é capaz, você interações assinaladas por reciprocidade.
consegue. E daí sentia que era mesmo capaz. É
isso.”(Patati)
O ser não é um mero resultado passivo
das relações que vivencia. É, antes, produto
“Sou bagunceiro, daí os caras dizem que sou e produtor, cada sujeito dentro de uma
burro. Mas daí chega na aula de matemática
sou um dos primeiros a resolver. Daí começava a relação influencia a maneira como o “outro”
tirar da cara das pessoas que achavam que sou se porta e responde. Por ser um movimento
burro. Os caras dizem o que é isso - de natureza dialética, acredita-se que as
superdotado?! Queria ser como você. Os caras características encontradas no sujeito com
dizem que queriam ter a habilidade que eu
tenho. O que as pessoas falam faz a diferença.
AH/S, influenciam as respostas das pessoas
Eu tô mal humorado e o cara fala isso, daí já fico que convivem junto dele. Dito isso, as
feliz. Se fala mal, fico bravo com a pessoa, mas respostas das pessoas próximas ao sujeito
não acho que sou o que ele falou.” (Patati) com AH/S afetam a constituição das crenças
Por meio da interação eu-outro a que o superdotado constrói sobre si.
pessoa se avalia, (re)estrutura e (re)significa o De acordo com Siqueira (2006), as
que pensa sobre si mesmo, provocando a diferentes formações dos microssistemas
reorganização do sistema de crenças culminam na rede de apoio social, tão
autorreferenciadas. Nesse sentido, o olhar do importantes para o desenvolvimento da
outro se reveste de grande importância na pessoa, atuando no sentido de reforçar e
construção do self, repercutindo na fortalecer a eficácia pessoal. Isso foi
identidade do sujeito: constatado na presente pesquisa na medida
“Sim e é muito importante [sentir-se aceito pela em que se pode apreender das falas dos
família]. Isso me torna melhor, uma pessoa adolescentes a importância que atribuem à
melhor, mais confiante, não tão agressivo.” família e a escola.
(Matheus)
“Tudo o que quebrava minha vó colocava a
Diante do explanado, infere-se sobre a
culpa em mim e por isso até hoje sou destrutivo.” necessidade da alteridade para uma
(Jon) profícua constituição da pessoa, porquanto

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.87-94


PALUDO, K. I. A alteridade na constituição da identidade da pessoa com altas habilidades/superdotação

na relação eu-outro o sujeito modula as determinação, entre outras, atuarão na


crenças sobre si mesmo, isto é, as (re)constrói, realização de objetivos almejados.
valida e transforma, regulando seu
O autoconceito por si só não pode
comportamento.
prognosticar os comportamentos do sujeito,
pois, se o fizer, ignora as crenças de controle,
Considerações Finais
que podem ser preditivas da atuação
As crenças (autoconceito, autoestima e humana (BANDURA, 1997). Assim, além da
crenças de controle) possuem sua pessoa com AH/S identificar características
importância na constituição do ser e juntas em si, a capacidade intelectual e a
formam o que Loos (2004) nomeia crenças criatividade, é necessário se achar
autorreferenciadas. O autoconceito versa competente para realizar atividades.
sobre o que o sujeito percebe e acredita Com o desenvolvimento do ser e 92
acerca de si mesmo, independentemente de participação em situações cada vez mais
apreciar como bom ou ruim (ALENCAR; FLEITH, complexas, o autoconceito é continuamente
2003; VIRGOLIM, 2007). A autoestima é a revisto. Nele novas informações são
avaliação dos elementos do autoconceito incorporadas, propiciando uma modificação
(bom/ruim, positivo/negativo) e as crenças de paralela das crenças de autoestima. Para
controle se referem ao grau de competência realizar a avaliação sobre o “si mesmo”, o
que o sujeito atribui a si mesmo. sujeito usa dos parâmetros de avaliação
Nesse sentido, o que o sujeito com AH/S (valores) incorporados no seu processo de
percebe em si (autoconceito), a avaliação identificação, construídos a partir de sua
que faz dos atributos que compõe essa interação social com figuras importantes,
percepção (autoestima) e o grau de explicando, por exemplo, a tendência de
competência que atribui a si mesmo (crenças apreciar o que pai, mãe, irmãos valorizam.
de controle) exercem influência sobre seu Constata-se a importância das
desenvolvimento. Isto é, se enxerga interações sociais na constituição das
determinadas características em si e as crenças, visto que, é a partir do conteúdo
avalia como positivas, terá maior disposição emitido pelo “outro” que o ser constrói o
em empreender atividades por se achar quadro de referências utilizado na avaliação
competente. de si mesmo. Desse modo, se as respostas
Se desde muito cedo a criança com que sobrevierem do meio sobre o
AH/S se reconhece como diferente, vivencia desenvolvente forem saudáveis, o sujeito com
sentimentos de dúvida, desespero, confusão, AH/S tende a se aceitar.
isolamento, decorrente da percepção que os A percepção que o indivíduo tem sobre
outros têm sobre ela, sua precocidade pode si funciona como moderadora de seu
fazê-la se sentir como anormal e estranha. comportamento, na medida em que o incita
Esse cenário é o principal contribuinte para a (ou não) a controlar e/ou empreender ações
formação de uma autoimagem negativa e e sentimentos, e regula o comportamento nos
depreciativa, de um autoconceito negativo, diferentes contextos que transita. Ao mesmo
que pode desencadear problemas sérios de tempo em que as crenças autorreferenciadas
ansiedade (ALENCAR, FLEITH, 2001; VIRGOLIM, influenciam ações pró-ativas, são
2007; PANZERI, 2012). mutuamente influenciadas pelo resultado
A existência de uma autoimagem dessas ações.
positiva confere ao sujeito com AH/S a No caso da pessoa com AH/S, suas
tendência de encontrar em si qualidades características próprias fazem com que ela
que lhe agrada (assim como identificará se veja de forma diferente; assim, se os
características negativas, mas a presença recursos/crenças já construídas forem
destas pode servir como mote para mudança positivas, atuarão como protetivas para o
e não bloqueio de seu desenvolvimento). sujeito, logo que podem evitar sentimentos
Tendo essa autoimagem satisfatória, como desespero, isolamento, ansiedade –
características como autoconfiança, altamente prejudiciais para sua formação,

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.87-94


PALUDO, K. I. A alteridade na constituição da identidade da pessoa com altas habilidades/superdotação

além de impulsionar o sujeito para tomada ____. Criatividade: múltiplas perspectivas. 3ª


de decisão, uso da criatividade, motivação. ed. Brasília: EdUnB, 2003.
Se desde cedo o desenvolvente só ARAÚJO, U. F. A dimensão afetiva da psique
recebe conteúdos negativas, é esperado humana e a educação em valores. In:
que os internalize, constituindo, nesse caso, ARANTES, Valéria Amorim (org.). Afetividade na
um sistema de crenças sobre si negativas. Em escola: alternativas teóricas e práticas. São
função disso, há grande probabilidade de Paulo: Summus, 2003.
bloquear o processo de desenvolvimento, na
BAHIA, S. A Vida Emocional e Afetiva dos
medida em que inibe sua capacidade
Alunos Sobredotados. Diversidades. V. 9, n.
natural de pensar e criar; não utiliza seu
34, out./nov./dez. 2011. Disponívelem:
potencial plenamente, e passa a se
<<http://repositorio.ul.pt/bitstream/10451/7719/1/u
identificar como incompetente e inábil 93
lsd_re_Ines_Reis.pdf>>. Acessoem: 10 jun.
(VIRGOLIM, 2007).
2013.
Por outro lado, se a criança receber
BANDURA, A. Self-efficacy: the exercise of
respostas de pessoas significativas para ela e
control. New York: W. H. Freeman, 1997.
concluir que é aceita e valorizada, se
enxergará como alguém competente e BRONFENBRENNER, U. A ecologia do
capaz de criar, além de ter satisfação desenvolvimento humano: experimentos
consigo mesma, e de tal modo, há grande naturais e planejados. Porto Alegre: Artes
possibilidade de desenvolver sua Médicas, 1996.
potencialidade de forma plena (VIRGOLIM, ______. Bioecologia do desenvolvimento
2007). humano: tornando os seres humanos mais
Faz-se oportuno ressaltar que as humanos. Porto Alegre: Artmed, 2011.
crenças autorreferenciadas não condizem CUNHA, E. Afeto e Aprendizagem: relação de
com algo inato e imutável, estático, mas amorosidade e saber na prática
antes, como um processo desenvolvimentista, pedagógica. 2ªed. Rio de Janeiro: Editora
ao passo que muda, transforma-se em algo Wak, 2010.
muito mais complexo, visto que as
percepções que o sujeito tem sobre si podem JAPUR, M.; Alteridade e grupo: uma
sofrer alteração durante toda sua vida. perspectiva construcionista social. In:
MARTÍNEZ, A. M.; SIMÃO, L. M. (org.). O outro
Dito isso, o olhar do outro se reveste de no desenvolvimento humano: diálogos para
importância na formação das crenças a pesquisa e a prática profissional em
autorreferenciadas, e, portanto, da Psicologia. São Paulo: Pioneira Thomson
identidade. A partir dos primeiros anos de Learning, 2004.
vida, por meio das interações, o ser inicia o
processo de construção de recursos internos, LÉVINAS, E. Entre nós: ensaios sobre
o que ressalta a importância de relações alteridade. 4ªed. Petrópolis: Vozes, 2009.
alteras, desde a mais tenra idade para que LOOS, H. Atitude e Desempenho em
aquisições positivas sejam estabelecidas com matemática, crenças auto-referenciadas e
vistas a um desenvolvimento profícuo. Isto família: uma Path-analysis. Tese (Doutorado
porque, nem todo aprendizado se dá de em Educação) – Universidade Estadual de
forma direta, mas muitos conhecimentos Campinas. São Paulo: UNICAMP, 2003.
sobre si são adquiridos pela aprendizagem
vicária, pela observação as pessoas LOOS, H.; SANT’ANA, R. S.; NÚÑEZ-RODRÍGUEZ,
internalizam regras e regulam seu S. I. Sobre o sentido do eu, do outro e da
comportamento. Trata-se do papel do outro. vida: considerações em uma ontologia
acerca da alteridade e da resiliência. In:
Referências GUÉRIOS, E.; STOLTZ, T. Educação e
alteridade. São Carlos: EDUFSCAR, 2010.
ALENCAR, E. M. L. de; FLEITH, D.S. GONZÁLEZ-REY, F. O sujeito, a subjetividade e
Superdotados: determinantes, educação e o outro na dialética complexa do
ajustamento. 2ªed. São Paulo: EPU, 2001. desenvolvimento humano. In: MARTÍNEZ, A. M.;

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.87-94


PALUDO, K. I. A alteridade na constituição da identidade da pessoa com altas habilidades/superdotação

SIMÃO, L. M. (org.). O outro no SIQUEIRA, A. C. Instituições de abrigo, família


desenvolvimento humano: diálogos para a e redes de apoio social e afetivo em
pesquisa e a prática profissional em transições ecológicas na adolescência. Porto
Psicologia. São Paulo: Pioneira Thomson Alegre/RS: Universidade Federal do Rio
Learning, 2004. Grande do Sul, 2006. Dissertação, Pós
Graduação em Psicologia, Universidade
LEME, M. I. S. Resolução de Conflitos
Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre,
Interpessoais: Interações entre Cognição e
2006. Disponível em:
Afetividade na Cultura. Psicologia: Reflexão e
<http://www.msmidia.com/ceprua/dis_aline_siq.pd
Crítica. V.17, n. 3, p.367-380, 2004. Disponível
f>. Acesso em: 12 mai 2012.
em:
<http://www.scielo.br/pdf/prc/v17n3/a10v17n3.pdf SOUZA, M. T. C. C. Alteridade na construção
>. Acesso em: 12/03/2012. do “si mesmo”. In: MARTÍNEZ, A. M.; SIMÃO, L. 94
M. (org.). O outro no desenvolvimento
MARTÍNEZ, A. M. O outro e sua significação
humano: diálogos para a pesquisa e a
para a criatividade: implicações
prática profissional em Psicologia. São Paulo:
educacionais. In: MARTÍNEZ, A. M.; SIMÃO, L.
Pioneira Thomson Learning, 2004.
M. (org.). O outro no desenvolvimento
humano: diálogos para a pesquisa e a TACCA, M. C. V. R. Além de professor e aluno:
prática profissional em Psicologia. São Paulo: a alteridade nos processos de aprendizagem
Pioneira Thomson Learning, 2004. e desenvolvimento. In: MARTÍNEZ, A. M.;
SIMÃO, L. M. (org.). O outro no
MIRAS, M. Afetos, emoções, atribuições e
desenvolvimento humano: diálogos para a
expectativas: o sentido da aprendizagem
pesquisa e a prática profissional em
escolar. In: COLL, C.; MARCHESI, Á.; PALACIOS,
Psicologia. São Paulo: Pioneira Thomson
J. (org.). Desenvolvimento psicológico e
Learning, 2004.
educação. 2 ed. Porto Alegre: Artmed, 2004.
TUNES, E.; BARTHOLO, R. Da constituição da
PALUDO, K. I. Subjetividade do sujeito com
consciência a uma Psicologia Ética:
altas habilidades/superdotação: um ensaio
alteridade e zona de desenvolvimento
sobre alteridade. CONGRESSO NACIONAL DE
proximal. In: MARTÍNEZ, A. M.; SIMÃO, L.M.
EDUCAÇÃO, 10, 2012, Curitiba. Anais...
(org.). O outro no desenvolvimento humano:
Curitiba: PUCPR, 2012, p. 12301-12308
diálogos para a pesquisa e a prática
Disponível em:
profissional em Psicologia. São Paulo: Pioneira
<http://educere.bruc.com.br/CD2011/pdf/5723_2
Thomson Learning, 2004.
956.pdf>. Acesso em: 31 jul. 2012.
VIRGOLIM, A. M. Desenvolvimento do
PANZERI, M. V. Detección e identificación de
autoconceito. In: FLEITH, D. S. (org.). A
altas capacidades intelectuales y creativas:
construção de práticas educacionais para
una abordaje para elprofesorado y
alunos com altas habilidades/superdotação.
losprofesionales de laeducación y lasalud.
Volume 2: atividades de estimulação de
Buenos Aires: Nueva Librería, 2012.
alunos. Brasília: MEC, Secretaria de Educação
Especial, 2007.

Revista Brasileira de Altas Habilidades/Superdotação, v. 1, n. 1, jan./jun. 2013 p.87-94

Você também pode gostar